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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ENSINAR A LER E ECREVER: UM GRANDE DESAFIO!
Por: Vaneza Freitas Alves
Orientadora
Prof. Maria Esther de Araújo Oliveira
Niterói
2005
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ENSINAR A LER E ESCREVER: UM GRANDE DESAFIO!
Apresentação de monografia à Universidade Candido
Mendes como condição prévia para a conclusão do
Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em
Supervisão Escolar. Por: . Vaneza Freitas Alves.
3
AGRADECIMENTOS
....à todos os meus professores -
inspiração da minha vida profissional e
pessoal também - , à minha mãe, aos
meus irmãos, aos amigos e parentes...
4
DEDICATÓRIA
....dedico à minha querida mãe Maria Lina,
pelo incentivo, apoio e paciência... sem
ela, eu não seria quem sou... aos meus
irmãos Rodrigo e Rafael, aos meus alunos,
sem eles eu não estaria onde estou...
5
EPÍGRAFE
“Quando nada parece dar certo, vou ver o cortador de pedras martelando
sua rocha talvez 100 vezes, sem que uma única rachadura apareça. Mas na
centésima primeira martelada a pedra se abre em duas, e eu sei que não foi
aquela que conseguiu isso, mas todas as que vieram antes.” (Jacob Riis)
6
RESUMO
A presente pesquisa aborda um dos assuntos mais discutidos atualmente,
na área de educação: o fracasso escolar. Objetiva diagnosticar a origem
principal desse problema que assombra e assola o país, trazendo graves
conseqüências como a evasão, que é a “má alfabetização”. Apontando, através
de uma pesquisa bibliográfica, as dificuldades que os alunos das séries iniciais
da Escola Pública apresentam no processo de aquisição da leitura e escrita –
excluindo os bio-fisiológicos – e os de natureza pedagógica – e portanto de
responsabilidade da escola e de seus profissionais – busca-se trazer para os
professores, soluções a respeito dessas situações.
No primeiro capítulo desse estudo, será apresentado um breve histórico
sobre a Alfabetização e Letramento, conceituando-os e distinguindo-os um do
outro. Na segunda parte, o leitor encontrará dados sobre o analfabetismo no
Brasil e a análise de alguns motivos que levam ao fracasso no ensino da língua
escrita.
Em seguida, são apresentadas as razões pelas quais os alunos deixam
de aprender a ler e escrever, como as dificuldades inerentes à todas as crianças,
os problemas pedagógicos, início e fim em si mesmo (origem e solução dessa
problemática) e algumas questões sociais e econômicas envolvidas.
Por fim, a quarta parte desse trabalho é dedicada a nortear os docentes a
vencer esse desafio, de ensinar a ler e escrever, mostrando as vantagens de se
alfabetizar letrando desde a pré-escola, com variedades de textos, como medida
para a formação de alunos leitores e escritores, ou seja, indicando solução para
a formação de cidadãos plenos e para o fracasso escolar.
7
METODOLOGIA
Após coleta de dados, realizada ao longo do 1o semestre de 2005, em
biblioteca da Universidade Federal Fluminense, Universidade do Estado do Rio
de Janeiro, e com base em análise bibliográfica de autores importantes na área
de educação e alfabetização, o presente estudo pretende apontar os desafios
que os docentes têm que ultrapassar para ensinar seus alunos a ler e escrever,
discutindo as dificuldades “naturais” que essas crianças das séries iniciais, da
Escola Pública apresentam no processo de Alfabetização, algumas questões
sociais e econômicas, e principalmente os problemas pedagógicos que
acarretam uma “má alfabetização”, origem do fracasso escolar brasileiro.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I - Alfabetização e Letramento 11
1.1- Contextualização histórica
11
1.2- Conceito de Alfabetização 12
1.3- Métodos tradicionais de Alfabetização 12
1.4- Letramento 15
1.5- Alfabetização x Letramento 18
CAPÍTULO II – Origem do Fracasso Escolar 21
2.1- O analfabetismo no Brasil 21
2.2- Fracasso no ensino da língua escrita 22
CAPÍTULO III – Os motivos pelos quais os alunos deixam de aprender a ler
e escrever 25
3.1- As dificuldades que os alunos das séries iniciais da
Escola Pública apresentam no processo de Alfabetização 25
3.2- Problemas Pedagógicos 27
3.3- Algumas questões sociais e econômicas 29
9
CAPÍTULO IV – O desafio de ensinar a ler e escrever 31
4.1- Alfabetizar letrando desde a Pré – Escola 31
4.2 - Alfabetização com textos variados 34
4.3 - Formando leitores e escritores 36
CONCLUSÃO 38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 40
ÍNDICE 43
FOLHA DE AVALIAÇÃO
10
INTRODUÇÃO
Um dos assuntos mais abordados no cenário educacional, há alguns
anos, diz respeito ao Fracasso Escolar. Culpam-se sempre ou quase sempre o
aluno. Discutem-se tudo: percentagens de alunos ditos “fracassados”, política,
economia, religião, dentre outros... Porém, raramente procuram estudar uma das
principais origens, verdadeira, do problema: a ação pedagógica. Claro que essa
questão é bastante complexa... Mas em relação à ação pedagógica, a
problemática tem início no ensino da língua escrita, no processo de alfabetização,
que dentre outros motivos, desconsidera o aluno e se presta a cada vez mais
alimentar o quadro do Fracasso Escolar.
A monografia a seguir objetiva desvendar o porquê de um grande
número de alunos das séries iniciais da Escola Pública, terem dificuldades no
processo de aquisição de leitura e escrita (excluindo os problemas bio-
fisiológicos), isto é, as verdadeiras causas do fracasso no processo de
alfabetização; demonstrando através da análise de alguns autores importantes a
eficácia de se “alfabetizar letrando” desde a pré-escola. Também tratará de
mostrar porque há tanta resistência por parte de um número significativo de
11
alunos à leitura. Os motivos que conduzem ao fracasso pedagógico na formação
de alunos leitores, nas escolas públicas brasileiras, será o foco desta pesquisa.
CAPÍTULO I
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
“a leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta
implica a continuidade da leitura daquele.”
(Paulo Freire)
1.1- Contextualização Histórica
Segundo José Juvêncio Barbosa, em seu livro: “Alfabetização e leitura”; a
abordagem tradicional de alfabetização, teve origem no ensino coletivo e
simultâneo, nos anos de 1880, na Europa.
Os métodos utilizados eram o sintético, o analítico e o analítico - sintético.
Quanto a concepção de escrita, a língua era vista como objeto de análise e objeto
de uso; sem autonomia quanto ao significado; saber era escolar.
12
A característica principal do leitor era a de adquirir o hábito de sonorizar a
escrita: um leitor de letras. O material de leitura era quase sempre a cartilha, o
quadro negro e a literatura infantil. As atividades de escrita eram baseadas em
escrita de um modelo: cópia, ditado, redação, leitura oral; escrita de sons
(problemas ortográficos: a palavra é escrita como se pronuncia); simulação de
situações escrita (redação escolar).
A leitura era baseada na decifração; leitura silabada, lenta; estacionada no
tempo; dificuldade quanto ao significado; tendência à vocalização; tendência à
regressão no texto.
As etapas de ensino eram: pré - alfabetização (pré–escola); alfabetização
e pós alfabetização. Os pré-requisitos para a aprendizagem eram a maturidade
para leitura e escrita.
1.2- Conceito de Alfabetização
Segundo Gramsci1: ”alfabetização é uma prática social, que devem estar
historicamente vinculados, por um lado, a configurações de conhecimento e de
poder e, por outro , à luta política e cultural pela linguagem e pela experiência”.
Para Soares:
“Alfabetização é o processo pelo qual se adquire o domínio de um código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever, ou seja: o domínio da tecnologia – do conjunto de técnicas, para exercer a arte e ciência da escrita. Ao exercício efetivo e competente da tecnologia da escrita denomina-se Letramento que implica habilidades várias, tais como: capacidade de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos.”2
1 GRAMSCI, aput TFOUNI, Letramento e Alfabetização. São Paulo: Cortez 2 In RIBEIRO, V. M. Letramento no Brasil. São Paulo: Global, 2003, p. 91.
13
1.3. Métodos Tradicionais de Alfabetização
Os métodos tradicionais de Alfabetização procuram desenvolver as
habilidades que a criança deve possuir para aprender a ler e escrever. Mas,
somente a presença dessas habilidades não é garantia de sua plena utilização
em tarefas mais complexas, como a leitura de um livro, a escrita de uma poesia,
ou mesmo a execução correta de um manual de instrução qualquer. A chave para
a utilização dessas habilidades e o incentivo desse interesse em aprender a ler é
o contexto social.
Entre os métodos empregados para a Alfabetização, alguns têm sua
origem remota. Os principais são o sintético, que parte da letra e da sílaba para a
palavra, e o analítico, que parte de frases inteiras e as decompõe nos elementos
constitutivos, as palavras. Os dois podem se utilizar da cartilha.
1.3.1. Método sintético
O método sintético consiste, fundamentalmente, na correspondência
entre o oral e o escrito, entre o som e a grafia. Estabelece a correspondência a
partir dos elementos mínimos que são as letras, em um processo que consiste
em ir das partes ao todo. Durante muito tempo se ensinou a pronunciar as letras,
estabelecendo-se as regras de sonorização de escrita no seu idioma
correspondente. Os métodos alfabéticos mais tradicionais, aceitam essa postura.
Posteriormente, sob a influência da Lingüística, desenvolve-se o método
fonético, propondo que se comece do oral. A unidade mínima do som da fala é o
fonema. Assim, neste processo iniciar-se-ia pelo fonema, associando-o à sua
representação gráfica. É preciso que o sujeito seja capaz de isolar e reconhecer
os diferentes fonemas de seu idioma, para poder, a seguir, relacioná-los aos
sinais gráficos.
14
A ênfase está na análise auditiva para que os sons sejam separados e
estabelecidas as correspondências grafema-fonema.
Cita-se alguns princípios do método citado: a) pronúncia correta para
evitar confusões entre os fonemas; b) grafias de formas semelhantes devem ser
apresentadas separadamente para evitar confusões visuais entre as elas; c)
ensinar um par de grafema-fonema de cada vez, sem passar para outro enquanto
a associação não estiver bem memorizada, e d) iniciar com os casos de
ortografia regular, isto é, palavras nas quais a grafia coincida com a pronúncia.
Na aprendizagem em primeiro lugar, está a mecânica da leitura
(decifração do texto), sendo que posteriormente se teria a leitura com
compreensão, culminando com uma leitura expressiva com entonação.
Sejam quais forem às divergências entre os defensores do método
sintético, todas as correntes concordam com o seguinte: inicialmente a
aprendizagem da leitura e escrita é uma questão mecânica; trata-se de adquirir
uma técnica para decifrar o texto, porque se concebe a escrita como a
transcrição gráfica da linguagem oral e ler equivale a decodificar o escrito em
som.
1.3.2. As cartilhas
São a tentativa de coordenar todos esses princípios e pressupostos :
evitar confusões auditivas e ou visuais; apresentar um fonema e seu grafema
correspondente por vez; trabalhar com os casos de ortografia regular. Por isso, a
utilização das sílabas sem sentido, o que acaba acarretando a dissociação do
som em relação ao significado, e portanto, a leitura da fala.
15
Encontra-se na aplicação desse método a proposição da aprendizagem
em dois momentos descontínuos : quando não se sabe, é necessário passar por
uma etapa mecânica; quando já se sabe, chega-se à compreensão (leitura
mecânica, compreensiva).
1.3.3. O método analítico
Para os defensores do método analítico, ao contrário, a leitura é um ato
global e ideovisual. Decroly contesta os postulados do método sintético,
acusando-o de mecanicista, e postula que " no espírito infantil as visões de
conjunto precedem a análise". O prévio, segundo o método analítico, é o
reconhecimento global de palavras ou orações; a análise dos componentes é
uma tarefa posterior. Não importa a dificuldade auditiva daquilo que se aprende,
já que a leitura é uma tarefa predominantemente visual.
Propõe-se ainda a necessidade de começar com unidades significativas
para a criança, daí a denominação ideovisual.
Apesar de existirem grandes diferenças entre os dois métodos, e de
apoiarem-se em diferentes concepções tanto do funcionamento psicológico do
sujeito, quanto em diferentes teorias de aprendizagem, essas, referem-se
principalmente ao tipo de estratégia perceptiva em jogo, auditiva para uns, visual
para outros. Não se distinguem claras diferenças entre métodos de ensino e
processos de aprendizagem do sujeito.
A confusão entre métodos e processos leva à seguinte conclusão: os
sucessos na aprendizagem são atribuídos ao método, ou a quem os transmite, e
não ao sujeito que aprende. A ênfase dada à habilidades perceptivas descuida-
16
se de aspectos fundamentais tais como: a competência lingüística das crianças e
suas capacidades cognoscitivas.3
1.4. Letramento
Letramento é palavra recém-chegada ao vocabulário Educação e das
Ciências Lingüísticas: e na segunda metade dos anos 80, há cerca de apenas
dez anos, portanto, que ela surge no discurso dos especialistas dessas áreas.4
Segundo Mary Kato: ”a língua falada é conseqüência do letramento”5.No
entender de Leda Verdiani Tfouni: “distingue alfabetização de letramento: talvez
seja esse o momento em que letramento ganha estatuto de termo técnico no
léxico dos campos da Educação e das Ciências Lingüísticas”.
Desde então, a palavra torna-se cada vez mais freqüente no escrito e
falado de especialistas, de tal forma 1995, já figura em título de livro organizado
por Ângela Kleiman: “Os significados do letramento: uma nova expectativa sobre
a pratica social da escrita.”
Novas palavras são criadas quando emergem novos fatos, novas idéias,
novas maneiras de compreender os fenômenos. Que novo fato, ou nova idéia, ou
nova maneira de compreender a presença da escrita no mundo social trouxe a
necessidade desta nova palavra: letramento.
3 ZACHARIAS, Vera Lúcia Camara F. . Métodos tradicionais.Disponível em: http://www.centrorefeducacional.pro.br/metodo.html. Acesso em 11 jul. 2005. 4 Uma das primeiras ocorrências está em livro de Mary Kato, No mundo da escrita: uma perspectiva psicolingüística: São Paulo: Ática, 1986.
5 KATO, Mary. op. cit., p. 7.
17
Se a palavra letramento ainda causa estranheza a muitos, outras palavras
do mesmo campo semântico sempre foram familiares analfabetismo, analfabeto,
alfabetizar, alfabetização, alfabetizando e, mesmo, letrado e iletrado.
Analfabetismo, define o Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, é o
estado ou condição de analfabeto, e analfabeto é o que não
sabe ler e escrever, ou seja, é o que vive no estado ou condição de quem não
sabe ler e escrever, a ação de alfabetizar, isto é, segundo o Aurélio, de ensinar a
ler, é designada por alfabetização, e alfabetizado é aquele que sabe ler e
escrever. Já letrado, segundo o mesmo dicionário , é aquele versado em letras,
erudito, e iletrado é aquele que não tem conhecimentos literários e também o
analfabeto ou quase analfabeto. O dicionário Aurélio não registra a palavra
letramento. Essa palavra aparece, porém, num dicionário da língua portuguesa
editado há mais de um século.6 O verbete letramento caracteriza a palavra como
“ant”, isto é, antiga antiquada, e lhe atribui o significado de escrita, o verbete
remete ainda para o verbo “letrar” a que, como transitivo direto, atribui a acepção
de investigar, soletrando e, como pronominal letrar-se, a acepção de adquirir
letras ou conhecimentos literários, significados bem distantes daquele que hoje
se atribui a letramento.
A palavra analfabetismo é familiar aos brasileiros, usa-se a mesma, há
séculos, ela já está presente em textos do tempo em que o país era Colônia de
Portugal. É um fenômeno interessante: usa-se, há séculos, o substantivo que
nega7, e não havia necessidade do substantivo que afirmasse: alfabetismo ou
letramento.
Palavras novas aparecem quando novas idéias ou novos fenômenos
surgem. Convive-se com o fato de existirem pessoas que não sabem ler e
escrever, pessoas analfabetas, desde o Brasil Colônia, e ao longo dos séculos
6 AULETE, Caldas de: Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa, 1948 7 Recorde a analise da palavra analfabetismo na página 30: a(n) + alfabetismo = privação de alfabetismo.
18
se tem enfrentado problemas de alfabetizar, de ensinar as pessoas a ler e
escrever, portanto: o fenômeno do estado ou condição de analfabeto ainda
existe, e por isso sempre houve um nome para ele: analfabetismo.
A medida que o analfabetismo vai sendo superado, que um número cada
vez maior de pessoas aprende a ler e escrever, e à medida que,
concomitantemente , a sociedade vai se tornando cada vez mais centrada na
escrita, um novo fenômeno se evidencia: não basta apenas aprender a ler e a
escrever. As pessoas se alfabetizam, aprendem a ler e a escrever, mas não
necessariamente incorporam a prática da leitura e da escrita, não
necessariamente adquirem competência para usá-las, para envolver-se com as
práticas sociais de escrita: não lêem livros, jornais, revistas, não sabem redigir
um ofício, um requerimento, uma declaração, não sabem preencher um
formulário, sentem dificuldade para escrever um simples telegrama, uma carta,
não conseguem encontrar informações num catálogo telefônico, num contrato de
trabalho, numa conta de luz, numa bula de remédio, entre outras. Esse novo
fenômeno só ganha visibilidade depois que é minimamente resolvido o problema
do analfabetismo e que o desenvolvimento social, cultural, econômico e político
traz novas, intensas e variadas práticas da leitura e de escrita, fazendo
emergirem novas necessidades, além de novas alternativas de lazer. Aflorando o
novo fenômeno, foi preciso dar um nome a ele: quando uma nova palavra surge
na língua, é que um novo fenômeno surgiu e teve de ser nomeado. Por isso, e
para nomear esse novo fenômeno, surgiu a palavra letramento.
1.5- Alfabetização x Letramento
Por muito tempo a alfabetização foi entendida como a aquisição de um
código, fundado na relação entre fonemas e grafemas. Numa sociedade formada
em grande parte por analfabetos e marcada por reduzidas práticas de leitura e
19
escrita, a simples consciência fonológica, que permitia a associação de sons e
letras para escrever palavras e frases simples, parecia ser suficiente para
distinguir o alfabetizado do analfabeto.
Mas com o passar dos anos, a superação do analfabetismo em massa e
a cada vez maior, complexidade de nossas sociedades, fazem surgir maiores e
mais variadas práticas do uso da língua escrita. São tão intensos os apelos que o
mundo letrado exerce sobre as pessoas, que não basta somente a capacidade
de decifrar o código da leitura. Pois praticamente em todos os povos do mundo,
a exigência da língua escrita existe não mais como conhecimento desejável, mas
como condição essencial para a sobrevivência e a conquista da cidadania.
Hoje em dia, tão importante quanto conhecer o funcionamento do sistema
da escrita da língua, é poder comprometer-se em práticas sociais letradas.
Assim, enquanto a alfabetização se ocupa da aquisição da escrita por
um indivíduo, ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-
históricos da aquisição de uma sociedade, como disse Leda Verdiani Tfouni.8
Preocupada também em diferenciar as práticas escolares de ensino da
língua escrita e a dimensão social das diversas manifestações escritas em cada
comunidade, Kleiman define o letramento como:
“...um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos. As práticas específicas da escola, que forneciam o parâmetro de prática social segundo a qual o letramento era definido, e segundo a qual os sujeitos eram classificados ao longo da dicotomia alfabetizado ou não-alfabetizado, passam a ser, em função dessa definição, apenas um tipo de prática – de fato, dominante – que desenvolve alguns
8 TFOUNI, Leda Verdiani. Letramento e alfabetização. São Paulo: Cortez, 1995.
20
tipos de habilidades mas não outros, e que determina uma forma de utilizar o conhecimento sobre a escrita.” 9
Segundo Magda Soares:
“Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro das atuais concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas de leitura e escrita, a entrada da criança (e também do adulto analfabeto) no mundo da escrita se dá simultaneamente por esses dois processos: pela aquisição do sistema convencional de escrita – a alfabetização, e pelo desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvam a língua escrita – o letramento.” 10
A autora diz também que os dois são processos independentes, mas ao
mesmo tempo interdependentes, e indissociáveis, onde a alfabetização se
realiza no contexto de e por meio de práticas sociais de leitura e escrita, ou seja,
através de atividades de letramento, e este, somente poderá desenvolver-se no
contexto da e por meio da aprendizagem da leitura e escrita, isto é, da
alfabetização.
9 KLEIMAN, Angela B. (org.) Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado das Letras, 1995.
21
CAPÍTULO II
ORIGEM DO FRACASSO ESCOLAR
“A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer
coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram.
Homens que sejam criadores, inventores, descobridores.”
(Jean Piaget)
2.1- O Analfabetismo no Brasil
Por quase infinitas razões é muito grande o número de pessoas que não
tiveram acesso à escola na fase da infância. Em quase todo o mundo elas
formam um enorme grupo de analfabetos, que se vêem privados da participação
plena nas possibilidades culturais oferecidas pela sociedade em que vivem.
10 SOARES, M agda. Letramento: Um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
22
Porém esse problema é mais urgente nos países menos desenvolvidos, que não
possuem condições de estabelecer uma rede de ensino que atenda a suas
populações. O problema torna-se mais grave ainda devido ao crescimento
demográfico contínuo e acelerado que se verifica nesses lugares.
Falando especificamente do Brasil - que se enquadra perfeitamente nos
países menos desenvolvidos - nos dias atuais há cerca de 20 milhões de
analfabetos. Segundo IBGE11, o índice nacional é de 16.295.000 pessoas
analfabetas, sem contar um grande número de indivíduos que, embora
formalmente alfabetizados, são incapazes de ler textos longos, localizar ou
relacionar as informações lida.
Além disso entre as crianças, mais da metade das que chegam à 4a
série não têm apresentado um rendimento adequado em leitura. Quase 30%
dessas crianças não sabem ler. Isso quer dizer que mesmo para as crianças que
têm acesso à escola e que nela permanecem por mais de 3 anos, não existe
garantia de autonomia às práticas sociais de leitura e escrita. Acontece o que é
chamado de alfabetização funcional, em que a pessoa acaba aprendendo
apenas para a sua sobrevivência.
Sem levar em consideração a qualidade, o ensino no Brasil é
praticamente universalizado, com 97% das crianças de 7 a 14 anos na escola.
Então o que está acontecendo? Por que parte significativa de nossas crianças
não se alfabetizam? Não se está dando a devida importância ao processo de
alfabetização?
Sabe-se que os motivos são diversos e não há aqui a pretensão de
analisá-los a exaustão. Porém em relação à ação pedagógica, a problemática
tem início no ensino da língua escrita, no processo de alfabetização,
permanecendo durante toda a caminhada escolar do aluno, onde a criança é
11 IBGE, Censo Demográfico: Mapa do analfabetismo no Brasil. Brasília: MEC/INEP 2003
23
prejudicada quando o trabalho apresenta falhas, pois uma criança analfabeta, ou
que foi mal alfabetizada não tem compreensão da realidade.
2.2- O Fracasso no Ensino da Língua Escrita
A má alfabetização acarreta conseqüências graves como a evasão. A
criança perde a vontade de estudar quando confunde as palavras, pois não
consegue aprender. Com isso, a escola, ao invés de ajudá-lo, o retêm anos e
anos até eliminá-lo de suas salas de aula. Engrossando mais e mais o quadro, já
delatado, do fracasso escolar.
Uma das explicações dadas para o fracasso da alfabetização no Brasil é
a de que a democratização do acesso à educação, ocorrida a partir dos anos 70,
levou a escola a lidar com crianças que teriam, em razão de suas condições de
vida, sérias deficiências culturais e lingüísticas, que acarretariam dificuldades de
aprendizagem. Teriam problemas de indisciplina e não valorizariam a escola.
Sua linguagem oral seria muito distante da língua escrita. Em seu ambiente
familiar não vivenciariam os usos da escrita, nem conviveriam com pessoas que
valorizassem esse aprendizado. Seus pais teriam pouco interesse pela escola.
No entanto, diferentes estudos mostram também que, ao contrário do que em
geral se afirma, essas crianças possuem um adequado desenvolvimento cultural
e lingüístico e que é a escola que apresenta sérias dificuldades para lidar com a
diversidade cultural, lingüística e mesmo étnica da população brasileira.
Não deve haver lugar para o fracasso, a excelência deve ser substituída
pela busca ao desenvolvimento de competências e habilidades. É permitido ter
dificuldade, só não é permitido que se renuncie à busca de uma solução, de uma
convivência, de uma gestão dessas dificuldades.
24
A leitura e a escrita é um compromisso de todas as disciplinas, de todos
os professores, mas a tendência é julgar que cabe somente ao professor de
Língua Portuguesa ensinar e desenvolver habilidades de leitura e escrita. Os
professores de outras disciplinas se queixam com o professor de Português de
que seus alunos não estão sabendo interpretar os textos de suas matérias. Não
percebem que essa responsabilidade não é só do professor de Português, nem
é inteiramente competente para desenvolver habilidade de leitura de um
problema de Matemática por exemplo, porque possui uma terminologia
específica. Também não é o professor de Língua Portuguesa quem vai ensinar
um aluno a ler um mapa, nem quem vai ensinar a ler um gráfico. A escrita de um
texto de Ciências ou de História, não é como escrever um conto, uma crônica,
são gêneros diferentes. Cada disciplina tem um tipo específico de texto que cabe
ao professor dessa área ensinar ao aluno a escrever ou a ler. Não é isso que se
vê porém, mesmo porque os professores das outras áreas não recebido
formação na área de leitura e produção de textos para que pudessem trabalhar a
leitura e a escrita com seus alunos.
25
CAPÍTULO III
OS MOTIVOS PELOS QUAIS OS ALUNOS DEIXAM DE
APRENDER A LER E ESCREVER
“A escrita é importante na escola, porque é importante fora dela e não o
contrário.”
(Emília Ferreiro)
3.1- As Dificuldades que os Alunos das Séries Iniciais da
Escola Pública apresentam no Processo de Alfabetização
26
Pesquisas sobre o processo de alfabetização vêm mostrando que, para
poder se apropriar do nosso sistema de representação da escrita, a criança
precisa construir respostas para duas questões pelo menos: 1) O que a escrita
representa? 2) Qual a estrutura do modo de representação da escrita?
No início do processo toda criança supõe que a escrita é uma outra forma
de desenhar as coisas. O que as crianças das séries iniciais não compreendem
é que a escrita representa a fala, o som das palavras e não o objeto a que o
nome se refere. Como num caso de uma professora do município de São
Gonçalo, que dava aula numa classe da 1a etapa do 1o ciclo12 (Alfabetização), em
que numa atividade, propôs aos alunos que formassem frases com a palavra
sobremesa, e uma das crianças
então escreveu: “Eu goisto de gelatina” , quando questionado pela professora em
relação à inadequação de sua escrita, ficou perplexo com a incapacidade de sua
professora em compreender algo tão evidente: “Gelatina, professora, é a
sobremesa que mais gosto”.
Uma outra dificuldade que se observa nesse início do processo de
alfabetização, é a da criança associar palavras pequenas à coisas pequenas e
palavras grandes à coisas grandes. A separação entre o conhecimento da letra e
das hipóteses da criança em relação à escrita é o que se vê. Em vez de
confirmar, a realidade, dentro da escola, desmente a teoria que o aluno construiu
sobre o que a escrita representa, e força-o a construir uma nova teoria, novas
hipóteses. A criança então constrói duas hipóteses que vão acompanhá-la
durante algum tempo no seu processo de alfabetização: a) é preciso um número
de letras – entre 2 e 4 – para que esteja escrito alguma coisa13 e, b) é preciso
um mínimo de variedade de caracteres para que uma série de letras “sirva para
ler”.
12 O município de São Gonçalo trabalha em forma de ciclos
27
A criança não faz distinção clara entre o sistema de representação do
desenho e o da escrita. O contato com os dois sistemas é que permite
estabelecer progressivamente essa distinção.
Antes de supor que a escrita é a representação da fala, o aluno faz várias
tentativas de construir um sistema parecido com a escrita adulta, diferenciando
as palavras na quantidade, posição e variação de letras utilizadas por ele para
escrevê-las.
A descoberta de que a escrita representa a fala leva a criança a formular
uma hipótese “falsa” e necessária: a hipótese silábica.
O que caracteriza essa hipótese é a crença de que cada letra representa
uma sílaba. Supor que cada letra é uma sílaba é falso em relação à concepção
adulta, mas dá a criança uma resposta à primeira questão “O que a escrita
representa?”, a fala. Porém essa hipótese é necessária, porque as crianças
precisam desses “erros construtivos” para chegar ao sistema alfabético.
Além disso, a hipótese silábica cria condições de contradição, entre o
controle silábico e a quantidade mínima de letras que uma escrita deve possuir
para ser interpretável. Também há contradição entre a interpretação silábica e as
escritas dos adultos, que possuem sempre mais letras.
Enfim, as dificuldades desse processo são muito mais de natureza
conceitual e muito menos perceptual.14
13 A idéia de que uma letra sozinha “não serve para nada”, “não diz nada”, dá uma pista para compreender a dificuldade das crianças, mesmo as mais avançadas, com a escrita isolada dos Artigos. 14 Artigo: Como se aprende a ler e a escrever ou, prontidão um problema mal colocado, de Telma Weisz,, publicado em Ciclo Básico, CENP/Secretaria do Estado da Educação de São Paulo, 1988.
28
3.2- Problemas Pedagógicos
Todos os anos chegam à escola pública – nas séries iniciais - um número
significativo de crianças, dentre elas, umas poucas já sabem ler, mas a maioria
não sabe, ainda vai aprender. Porém, algumas crianças levam dois, três, quatro
anos ou até uma vida inteira para aprender a ler. Com certeza, na maior parte
dos casos, não se trata de um distúrbio que a criança possa ter.
Quando ingressam na escola, nas séries iniciais, as crianças são
submetidas a inúmeras atividades de preparação para a escrita, quase sempre
com exercícios de cópia ou ditados de palavras que já foram memorizadas.
Copiam sílabas, depois palavras e frases, e somente bem mais tarde são
solicitadas a produzir escritas de maneira espontânea, essa situação portanto só
acontece na escola, pois no dia-a-dia, as pessoas aprendem de outro modo:
fazendo, errando, tentando de novo até acertar.
A concepção tradicional de alfabetização dá prioridade ao domínio da
técnica de escrever, não importando o conteúdo, tanto que é muito comum
atividades de cópia de escritos que não fazem o menor sentido para a criança:
“Vovô viu a uva.”; “O boi baba”.
Nas classes de alfabetização a preocupação dos professores está mais
voltada para atividades que possibilitem apenas o domínio da escrita e da leitura
em seu sentido mais limitado.
O pensamento central é lançar a palavra-chave, desdobrá-la em famílias
silábicas, formar novas palavras etc. Parece centrar-se na forma, na busca do
melhor método ou da melhor cartilha, já que o conteúdo parece está definido: a
estrutura a análise da escrita.
29
O processo de alfabetização, mesmo quando dito construtivista,
mostrando a necessidade de se estar atento ao processo de construção da
criança, continua preparando primeiro para alfabetizar depois.
Não conseguindo estabelecer uma ponte entre o processo mecânico e
sem sentido e suas expectativas de leitura (gibi, figurinhas, rótulos etc.), a criança
desanima e acaba tomando como sua a incompetência da escola em lhes
garantir a apropriação desse saber.
Mas se os conteúdos selecionados fossem extraídos da necessidade da
criança em conhecer-se e ao mundo também, o processo de apropriação da
leitura e escrita não seria mais o mesmo. Garantiria as mais variadas vivências
possíveis com a escrita, no seu uso e na sua função social.
Como Emília Ferreiro disse, é preciso romper com os métodos
tradicionais de ensino, que não respeitam o saber das crianças e sua forma
natural de aprender a linguagem escrita.
As crianças não se lançarão ao desafio de escrever se houver uma
expectativa de que produzam textos escritos de forma convencional, porque no
início do processo da alfabetização, isso não é possível. Esse é um momento em
que os alunos precisam controlar dois aspectos fundamentais: o que escrever e
como escrever; e quando se está aprendendo é gerado dificuldades que devem
ser compreendidas pelo professor.
Ana Teberosky15 propõe: Escrever o próprio nome parece uma peça-
chave para começar a compreender a maneira pela qual funciona o sistema de
escrita.
15 TEBEROSKY, Ana. Psicopedagogia da linguagem escrita. São Paulo: Trajetória, Unicamp, 1989.
30
É uma boa situação para trabalhar com modelos, já que informa sobre as
letras, a quantidade, a variedade, a posição e o ordem delas. Aprender a
escrever palavras do seu universo pode servir de referência para o aluno produzir
seus próprios textos.
3.3- Algumas Questões Sociais e Econômicas
Não deve haver profissionais de educação que aceite a exclusão “natural”
de algumas crianças, todas podem aprender sem exceção. Para isso é preciso
acabar com a crença de que filhos de pais analfabetos ou que não possuem
material suficiente de leitura em casa não têm condições de aprender a ler e a
escrever.
De fato, dados estatísticos (SAEB entre eles) mostram que o fracasso no
processo de aquisição de leitura e escrita, tende a se concentrar nas crianças
oriundas de meios menos favorecidos. No entanto diferentes estudos mostram
também que, ao contrário do que geralmente se pensa e se afirma, essas
crianças possuem um adequado desenvolvimento cultural e lingüístico e que é a
escola que apresenta várias dificuldades para lidar com essa diversidade
cultural, lingüística e étnica da população brasileira.
“A primeira coisa que a escola deve fazer é descobrir qual grau de
letramento das crianças.” , ensina Magda Soares
Na família escolarizada há muito mais situações de leituras em suas
casas, nos jornais, nas revistas, bilhetes ou lista de compras, mas é bem
provável, mesmo para quem não sabe ler, dominar o conceito de que existe um
código próprio para entender as letras, as palavras e os textos. É possível ser
31
analfabeto e letrado ao mesmo tempo. Essa situação só aumenta a
responsabilidade da escola.
“Nos casos de alunos cujas famílias têm pouca ou nenhuma escolaridade,
o professor, por ser letrado, assume um papel crucial para o letramento deles.”,
enfatiza Ângela Kleiman.
Cabe ao professor conhecer e avaliar as situações já vividas pelo aluno,
para fazê-lo avançar. Um bom caminho é encher a sala de aula, e
consequentemente as crianças, com tudo aquilo que elas não têm em casa:
jornais, revistas, livros, enfim todo tipo de material impresso.
A grande preocupação de Emília Ferreiro em suas pesquisas é assegurar
às classes menos favorecidas, da América Latina, o direito à Alfabetização.
“Alfabetizar não é um luxo, é um direito. E é preciso garantir esse direito às
crianças deste continente.” , desabafa a autora.
CAPÍTULO IV
O DESAFIO DE ENSINAR A LER E ESCREVER
“ninguém ensina ninguém a ler, o aprendizado é, em última instância, solitário
embora se desencadeie e se desenvolva na convivência com os outros e com o
mundo.”
(Maria Helena Martins)
32
4.1- Alfabetizar Letrando desde a Pré-Escola
Hoje em dia, a sociedade é mais letrada do que era antes, com escrita por
todos os lados. Ao sair pela cidade, as pessoas se deparam com placa, letreiros,
jornais, revistas, entre outros tantos; nos comércio, as embalagens, os rótulos, os
cartazes etc.; e mesmo dentro de sua casa, os indivíduos encontram portadores
de texto diversos como: conta de luz, de água, bula de remédios e até a televisão.
A criança convive com a escrita e sua função social desde muito cedo. Ela
é letrada antes mesmo de estar alfabetizada, na verdade, é letrada antes mesmo
de entrar para a escola.
Não é possível então, acreditar que os adultos devam decidir quando a
criança deve ser ‘iniciada” no processo de aquisição da leitura e da escrita, pois
não há hora certa para aprender a ler e escrever. Segundo Emília Ferreiro16,
“ignorar que a criança pensa e tem condições de escrever desde muito cedo é
um retrocesso.”
A alfabetização se inicia muito antes da criança entrar na escola, mas os
preparativos para a alfabetização (dentro da escola) começam, na verdade, no
período pré-escolar.
Quando se discute sobre pré-escola, o discurso do senso comum
considera que a sua função se resume em formar hábitos, atitudes e desenvolver
habilidades para o aprendizado da leitura e da escrita. Discutir a
alfabetização na pré-escola exige portanto pensar sobre a função dessa etapa
escolar.
33
Uma parcela significativa de crianças em idade escolar está fora da
escola. A situação se torna pior ainda se tratando de pré-escola, onde menos de
6% das crianças com faixa etária de 0 a 6 anos freqüentam a pré-escola.17 As
poucas crianças que conseguem romper as barreiras e se matriculam nela
encontram um espaço onde não é esperado que elas aprendam.
Muitos profissionais de educação concordam que no Pré a criança não
tem a obrigação de aprender, e sim de apenas iniciar o processo de
aprendizagem. O compromisso que se assume é o de apenas “preparar” as
crianças para a 1a série; um trabalho de “preparação” para a “escola”. Que tem
como objetivo o desenvolvimento de habilidades perceptivo-motoras necessárias
ao “momento” da alfabetização. Um aprendizado que se dará no futuro, na classe
de alfabetização ou 1a série.
Essas práticas carregam a superada concepção de alfabetização: na
pré-escola se trata de desenvolvimento e só na escola se trata de aprendizagem.
Vygotsky rejeita essa concepção e diz que a aprendizagem possibilita o
desenvolvimento e o desenvolvimento possibilita a aprendizagem. A criança se
desenvolve aprendendo e aprende se desenvolvendo.
O momento da pré-escola é um momento muito rico, porque possibilita a
articulação de várias linguagens de que a criança deveria se apropriar para usá-
las.
Quanto mais a pré-escola abrir para a criança a possibilidade do acesso
às diferentes linguagens que existem no mundo, ao seu redor, mais o seu
universo cultural se ampliará, independente da “classe social’ em que originar.
16 FERREIRO, Emília. Reflexões sobre Alfabetização. São Paulo: Cortez 1994. 17 Dados retirados do documento “Alfabetizar e libertar”, MEC/1990.
34
Por mais que se pense o contrário, ou mesmo não se pense onde o
aluno da pré-escola está inserido – como já foi dito no início do capítulo – numa
sociedade letrada, onde a aquisição da língua escrita é indispensável para que
ela possa entender e intervir no mundo a sua volta, a pré-escola deve ser um
espaço onde a criança tenha muito contato, através de todas as formas possíveis
com a leitura e a escrita: com sentido. Como diz Vygotsky:
“(...) ensinar a escrita nos anos pré-escolares impõe
necessariamente que a escrita seja relevante à vida (...) que as
letras se tornem elementos da vida das crianças, da mesma
maneira como, por exemplo, a fala. Da mesma forma que as
crianças aprendem a falar, elas podem muito bem aprender a
ler e a escrever”18
A pré-escola é o espaço de iniciação nessas linguagens: gráfica,
musical, corporal, plástica etc. Não pode ser vista apenas como ocupação de
tempo, a criança tem de fazer uso, com sentido, das linguagens que existem na
sociedade.
A criança sendo estimulada a colocar no papel o que pensa, através da
linguagem escrita, desde muito nova, seus meros “rabiscos”, passa a ter outro
significado, hoje em dia. Segundo Emília Ferreiro:
“As produções escritas das crianças – que antes eram consideradas meras garatujas – adquiriram um novo significado. Agora sabemos interpretá-las como escritas verdadeiras que não se assentam nos princípios básicos do sistema alfabético, mas às quais não falta uma sistematização. São escritas que se baseiam em outros princípios. As crianças podem usar letras como as nossas, e escrever ‘em outro sistema’, assim como no início da aquisição da linguagem oral,
18 VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
35
podem utilizar palavras da linguagem ambiente, mas com diferentes regras de combinação.” 19
Enfim, o processo de alfabetização pode ter início sim na pré-escola, que
deve ser o começo do ato de alfabetizar - que não se finda - , mas alfabetizar
letrando, ou seja, com algum significado para a criança, é a alfbetização
desencadeada por práticas de letramento, para que ela possa construir e se
apropriar de novos conhecimentos, ao longo do seu processo.
4.2- Alfabetização com Textos Variados
O caminho pedagógico mais importante no trabalho dos professores, tanto
na pré - escola quanto no ensino médio, é a utilização da escrita nas diversas
atividades pedagógicas, correspondendo as formas pelas quais ela é utilizada
nas práticas sociais. Nesse sentido, o ponto de partida e de chegada do
processo de alfabetização é o texto.
Como disse Paulo Freire quando entende que “ a leitura do mundo
precede a leitura da palavra”, ou seja, “existe um mundo a ser conhecido e
descoberto, com todas as suas contradições, dificuldades, conflitos e riquezas.”
Mas a leitura da palavra é fundamental “para que possamos imprimir nossa
marca de sujeito da cultura e da história.”
Sem a leitura do texto, a leitura do mundo se torna incompleta, um vazio,
pois seria um antes sem um depois. A leitura e a escrita de textos precisam ser
praticadas, concretizadas, exercidas.
19 FERREIRO, Emília. Alfabetização em processo. São Paulo, Cortez, 1996.
36
Porém o que se observa na prática, são os textos sendo deixados de lado,
para depois, quando os alunos tiverem aprendido a técnica da escrita. O que se
vê é o uso de fragmentos soltos e sem sentido algum. Mas até na escrita da
criança do pré - escolar, mesmo ao seu modo, o que se observa é a intenção de
uma escrita com função comunicativa e não fragmentos de escrita. Ao invés de
ajudar no processo de aprendizagem da escrita, esses “fragmentos” podem
tornar-se mais um obstáculo, na já difícil caminhada do aluno na busca do saber.
Por que não alfabetizar com textos? Não basta ensinar os códigos da
leitura e da escrita. É preciso tornar os alunos capazes de compreender o
significado dessa aprendizagem.
É recente a entrada de outros gêneros e de outros tipos de textos nas
salas de aula, o que é necessário, porque as práticas sociais são variadas e é
preciso preparar o aluno para as habilidades de leitura de diversos tipos,
diversos gêneros de texto.
Por mais irônico que possa parecer, uma das coisas mais proibidas na
escola é a escrita espontânea. Falam-se em textos livres, mais recriminam - os
aqueles que demonstram a representação da escrita da melhor maneira que o
aluno é capaz naquele momento de sua evolução.
Os textos são materiais para estudo do professor, por revelarem as
conclusões que as crianças estão chegando sobre a escrita.
Ana Teberosky e Emília Ferreiro, em “Psicogênese da Língua Escrita”,
defendem que os alunos mesmo analfabetos, devem ter contato com diversos
tipos de textos.
Essa proposta significativa de alfabetização, visa formar leitores e
escritores, e não apenas decifradores do sistema de escrita.
37
4.3- Formando leitores e escritores
Segundo questionamento apontado por Sonia Kramer: “Como um
professor que não se torna leitor pode ser capaz de fazer com que a criança
produza a sua palavra, tenha gosto pela leitura e vontade de escrever?”
Toda escola deve assumir a tarefa de formar leitores. O caminho para
transformar alunos copistas em leitores e consequentemente em escritores, exige
que o professor perceba o estágio de alfabetização em que eles se encontram e
ter consciência de que todos podem aprender a ler.
Para que isso aconteça, o professor deverá :
· dar segurança a ele para que se arrisque e se sinta capaz de escrever;
mostre que o erro faz parte da aprendizagem;
· incentivá-lo a desenhar, criar histórias e registrar idéias;
· tornar a leitura um hábito diário na sala de aula;
· enriquecer as atividades com pesquisa em jornais, revistas, livros, gibis e
folhetos;
A escola deve ter por objetivo despertar o interesse, o gosto pelas letras.
39
O ensino da língua escrita somente terá sentido para o aluno quando
forem trabalhados textos concretos e significativos, como os que circulam
socialmente: as embalagens, as placas, os documentos , entre outros tantos.
Ao se ensinar a ler e escrever, devem-se analisar as diferenças entre
linguagens oral e escrita; refletir sobre o sistema alfabético da língua; estudar as
relações internas sobre aspectos verbais, por meio da leitura, interpretação de
imagens e símbolos, reconhecendo as letras do alfabeto, por intermédio de
rótulos, embalagens, do seu próprio nome, dos seus colegas etc.
Além dessas, outras como a ampliação do vocabulário do aluno através
de poemas, pequenos textos, cantigas de roda, letras de músicas, textos
informativos e institucionais.
Enfim, o professor deverá ter consciência do seu papel principal no
processo de aquisição de leitura e escrita, procurando promover o letramento de
seus alunos, desde a pré-escola, para que aconteça, já nessa fase escolar, um
contato, uma aproximação da criança com o mundo da língua escrita, o mundo
das palavras, e consequentemente, com o mundo que a cerca. È o início do
processo de Alfabetização, que como já foi mostrado nessa pesquisa, pode e
deve começar lá na Educação Infantil.
Letramento, que deverá ter continuidade ao longo da vida escolar desses
alunos, principalmente os das classes desfavorecidas, oriundos de famílias
analfabetas, que não têm muito contato com materiais impressos, para que se
possa tentar combater, na sua origem, o tão assustador: fracasso escolar
brasileiro.
“O domínio da língua, oral e escrita, é fundamental para a participação
social efetiva, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à
informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de
mundo, produz conhecimento. Por isso, ao ensiná-la, a escola tem a
responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes
40
lingüísticos, necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de
todos.” (PCN de Língua Portuguesa – 1a a 4a série)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
41
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44
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
EPÍGRAFE 5
RESUMO 6
METODOLOGIA 7
SUMÁRIO 8
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO I
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO 11
1.1 – Contextualização Histórica 11
1.2 – Conceito de Alfabetização 12
1.3 – Métodos Tradicionais de Alfabetização 12
1.3.1 – Método Sintético 13
1.3.2 – Cartilhas 14
1.3.3 – Método Analítico 14
1.4- - Letramento 15
1.5 – Alfabetização x Letramento 18
CAPÍTULO II
ORIGEM DO FRACASSO ESCOLAR 21
2.1 – O analfabetismo no Brasil 21
2.2 – O fracasso no ensino da língua escrita 22
45
CAPÍTULO III
OS MOTIVOS PELOS QUAIS OS ALUNOS DEIXAM DE APRENDER A LER E
ESCREVER 25
3.1 – As dificuldades que os alunos das séries iniciais da Escola Pública
apresentam no processo da Alfabetização 25
3.2 –Problemas Pedagógicos 27
3.3 – Algumas questões sociais e econômicas 29
CAPÍTULO IV
O DESAFIO DE ENSINAR A LER E ESCREVER 31
4.1 – Alfabetizar letrando desde a pré-escola 31
4.2 – Alfabetização com textos variados 34
4.3 – Formando leitores e escritores 36
CONCLUSÃO 38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 40
ÍNDICE 43
46
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes
Título da Monografia: Ensinar a ler e escrever: Um grande desafio!
Autor: Vaneza Freitas Alves
Data da entrega: ___ / 07/ 2005.
Avaliado por: Conceito: