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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE DIREITO DE RIBEIRÃO PRETO
FLÁVIO BASILE
As cláusulas pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring
Orientador: Prof. Dr. Rogério Alessandre de Oliveira Castro
Ribeirão Preto
2013
FLÁVIO BASILE
As cláusulas pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo como requisito parcial da
obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Rogério Alessandre de
Oliveira Castro
Ribeirão Preto
2013
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
BASILE, Flávio.
As cláusulas pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring. / Flávio Basile
– Ribeirão Preto, 2013.
89 p. ; 30 cm.
Trabalho de conclusão de curso (Graduação) - Faculdade de Direito de Ribeirão
Preto – Universidade de São Paulo, 2013.
Orientador: Prof. Dr. Rogério Alessandre de Oliveira Castro.
1.Factoring. 2.Cessão de crédito. 3.Endosso. 4.Pro soluto. 5.Pro solvendo.
6.Direito de regresso.
FOLHA DE APROVAÇÃO
Flávio Basile
As cláusulas pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo como requisito parcial da
obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Rogério Alessandre de
Oliveira Castro.
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
Professor Doutor Rogério Alessandre de Oliveira Castro.
Instituição: Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
Assinatura: _________________________________________________________________
Professor Doutor __________________________________________________________
Instituição: ______________________________________________________________
Assinatura: _________________________________________________________________
Professor Doutor _____________________________________________________________
Instituição: __________________________________________________________________
Assinatura: _________________________________________________________________
Ao meu pai.
RESUMO
BASILE, Flávio. As cláusulas pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring. 2013. 45
f. Trabalho de Conclusão de Curso – Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, Universidade de
São Paulo, Ribeirão Preto, 2013.
RESUMO: O presente trabalho de conclusão de curso tem como objeto o estudo das cláusulas
pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring. A possibilidade ou não de o faturizador se
voltar contra o faturizado, no caso de inadimplemento do devedor, é um tema controverso na
doutrina e na jurisprudência e gera significativo impacto econômico para as partes,
influenciando no custo da operação e na segurança jurídica e econômica do negócio. Assim, o
trabalho se inicia com um panorama geral do instituto do factoring e sua distinção face às
instituições financeiras. Feito isso, estuda-se os meios de transferência do crédito no factoring
para, finalmente, enfrentar-se o tema das cláusulas pro soluto e pro solvendo.
PALAVRAS-CHAVE: factoring, cessão de crédito, endosso, pro soluto, pro solvendo, direito
de regresso.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 11
1.1 Recorte temático e justificativa ............................................................................................. 11
1.2 Conteúdo dos capítulos ......................................................................................................... 12
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ............................................................................................................... 15
2.1 Origens históricas: surgimento do factoring ............................................................................... 15
2.2 O surgimento do factoring no Brasil ........................................................................................... 16
3 CONCEITO E PARTICULARIDADES DO FACTORING .............................................................. 21
3.1 Conceito doutrinário de factoring ............................................................................................... 21
3.2 Modalidades ................................................................................................................................ 23
3.3 O contrato de factoring ............................................................................................................... 26
3.3.1 Natureza jurídica do contrato de factoring ........................................................................... 26
3.3.2 Classificação......................................................................................................................... 28
3.3.3 Conteúdo do contrato de factoring ....................................................................................... 29
3.3.3.1 Sujeitos do contrato de factoring ................................................................................... 29
3.3.3.2 Direitos e obrigações das partes .................................................................................... 29
3.4 Legislação aplicável .................................................................................................................... 31
4 INSTITUIÇÃO FINANCEIRA X FACTORING ............................................................................. 33
4.1 Conceito de instituição financeira ............................................................................................... 33
4.2 Distinção entre banco e factoring ................................................................................................ 36
4.3 A operação de factoring e o desconto bancário .......................................................................... 40
5 OS PRINCIPAIS MEIOS DE TRANSFERÊNCIA DO CRÉDITO NO FACTORING .................... 43
5.1 A cessão de crédito ...................................................................................................................... 43
5.1.1 A responsabilidade do cedente pela existência do crédito ................................................... 47
5.1.2 A responsabilidade do cedente pela solvência do devedor: as cláusulas pro solvendo e pro
soluto ............................................................................................................................................. 49
5.2 O endosso .................................................................................................................................... 50
5.2.1 Responsabilidade do endossante quanto ao pagamento do título ......................................... 52
5.2.1.1 A responsabilidade do endossante-sacador pelo pagamento do título na operação de
factoring .................................................................................................................................... 54
6 O DIREITO DE REGRESSO............................................................................................................. 59
6.1 Doutrina majoritária: críticas ....................................................................................................... 59
6.2 Jurisprudência .............................................................................................................................. 64
6.2.1 Jurisprudência contrária à cláusula pro solvendo ................................................................. 64
6.2.2 Jurisprudência favorável à cláusula pro solvendo ................................................................ 70
6.3 A validade da cláusula pro solvendo no contrato de factoring .................................................... 73
6.3.1 A legalidade da cláusula pro solvendo ................................................................................. 73
6.3.2 A cláusula pro solvendo não distingue o factoring das atividades típicas das instituições
financeiras ...................................................................................................................................... 77
6.3.3 Direito comparado ................................................................................................................ 78
6.3.3.1 Convenção sobre factoring internacional – Unidroit ..................................................... 79
6.3.3.2 A possibilidade da cláusula pro solvendo em outros países .......................................... 80
6.3.4 O risco do mercado brasileiro ............................................................................................... 81
7 CONCLUSÃO .................................................................................................................................... 83
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................. 85
11
1 INTRODUÇÃO
1.1 Recorte temático e justificativa
Este Trabalho de Conclusão de Curso traz à discussão o polêmico tema das cláusulas
pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring.
Primeiramente, é importante destacar que a atividade do factoring possui grande
importância para a economia brasileira. Sobretudo, porque ela fomenta o desenvolvimento das
pequenas e médias empresas, que têm pouco ou nenhum acesso ao crédito junto aos bancos e
demais instituições financeiras.
O factoring, através da compra a vista dos créditos provenientes das vendas e serviços
a prazo de seus clientes, possibilita com que as empresas e prestadores de serviço tenham
capital de giro suficiente para honrar seus compromissos e investir no seu negócio. Papel este
que deveria ser dos bancos, em especial os estatais, que não conseguem capilarizar recursos
para atender as micro e pequenas empresas1. Além disso, oferece uma gama de serviços de
assessoria e acompanhamento de contas.
Para ilustrar a importância da atividade, segundo dados da Associação Nacional de
Fomento Comercial (ANFAC), o giro de carteira das empresas associadas registrou no
exercício de 2010 um estoque de ativos, representados por direitos creditórios originados de
vendas mercantis e da prestação de serviços, da ordem de aproximadamente R$ 81,0 bilhões,
contribuindo para viabilizar transações econômicas industriais, comerciais e de serviços e,
ainda, para sustentar 2,2 milhões de empregos diretos e indiretos2.
Além disso, o factoring está fortemente inserido no mercado brasileiro, com cerca de
6.300 empresas espalhadas pelo país, número maior que o de agências do Banco do Brasil3.
Diante disso, o tema das cláusulas pro soluto e pro solvendo no contrato de factoring
impacta diretamente o factoring e sua relação com as empresas-clientes, refletindo na escolha
dos títulos a serem negociados e no custo e segurança da operação.
1DAS NEVES, Alexandre Fuchs. Jornal destaca equívocos jurídicos contra o setor. Disponível em:
http://www.sinfacsp.com.br/v2/content.php?id_page=6&id_content=3183, acessado em 08 de agosto de 2013. 2Disponível em: http://www.anfac.com.br/v3/factoring-estatistica.jsp#factoring, acessado em 08 de
agosto de 2013. 3DAS NEVES, Alexandre Fuchs. Op., cit.
12
Para enfrentá-lo, é preciso responder algumas perguntas, como: pode-se estabelecer o
direito de regresso do faturizador face ao faturizado no caso de inadimplemento do crédito
pelo devedor? A assunção do risco do inadimplemento da obrigação pelo faturizador é
essencial ao contrato de factoring?
Essas são algumas das questões centrais que nortearam este trabalho.
Assim, nos dois capítulos iniciais do trabalho, tratou-se dos aspectos gerais do instituto
do factoring, como sua evolução histórica, conceituação, natureza jurídica e classificação.
Dessa maneira, pôde-se lançar as bases da discussão e delimitar sua importância no tempo e
no espaço.
Mais adiante, levou-se à discussão os temas relativos ao factoring e às instituições
financeiras e aos principais meios de transferência do crédito no factoring. Isso porque são
correlatos e essenciais ao estudo dos temas das cláusulas pro soluto e pro solvendo, estando
na base da investigação.
Passado esse caminho, enfrentou-se diretamente o tema no capítulo específico sobre o
direito de regresso, no qual, discutindo-se a legislação, a jurisprudência, doutrina e a realidade
brasileira, pôde-se chegar à conclusão da pesquisa.
1.2 Conteúdo dos capítulos
Antes de adentrar ao tema proposto é interessante destacar, brevemente, o conteúdo
dos capítulos do trabalho.
Primeiramente, o capítulo 2 traça um panorama histórico do factoring, desde sua
origem no mundo até seu desenvolvimento no Brasil. Assim, busca-se situar o instituto no
espaço e traçar algumas de suas características essenciais.
O capítulo 3 aborda o conceito e as particularidades do factoring. Dessa maneira,
delineou-se as características gerais da atividade no Brasil, apontando sua conceituação
doutrinária, as modalidades praticadas e as particularidades do contrato.
O capítulo 4 diferencia o factoring das atividades típicas das instituições financeiras.
Nesse ponto foi demonstrado que existe uma série de diferenças entre tais atividades, não
sendo a responsabilidade do cedente-faturizado a distinção fundamental.
O capítulo 5 trata dos principais meios de transferência do crédito no factoring.
Principalmente através do estudo da legislação referente ao endosso dos títulos de crédito, em
13
especial da duplicata, e à cessão de crédito. Procurou-se, então, analisar a legalidade da
cláusula pro solvendo.
Finalmente, o capítulo 6 enfrenta definitivamente a questão do direito de regresso ou
possibilidade de inserção da cláusula pro solvendo no contrato de factoring. Diante disso, é
realizada uma análise da doutrina e jurisprudência, do direito comparado e da realidade
brasileira acerca do tema, para que se pudesse chegar à conclusão da pesquisa.
14
15
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Para que se comece a adentrar ao estudo do instituto do factoring, é interessante
contextualizá-lo no espaço e no tempo, apresentando, assim, uma breve evolução histórica do
mesmo, tanto no mundo quanto no Brasil.
2.1 Origens históricas: surgimento do factoring
Diversos autores ligam o surgimento do factoring a períodos remotos, defendendo que
ele teria nascido na Grécia antiga, em Roma ou, até mesmo, na Babilônia.
Segundo Fran Martins, na Grécia e em Roma, comerciantes incumbiam a agentes
(factors), disseminados por lugares diversos, a guarda e a venda de mercadorias de sua
propriedade4.
No entanto, como bem acentua Newton de Lucca, tal indagação não guarda conexão
histórica com o atual instituto do factoring. Isso porque tais agentes possuíam apenas a função
de intermediadores, realizando as atividades de comércio em nome da outras pessoas5.
Assim, a tese mais plausível seria a de que o factoring teria surgido com os
descobrimentos marítimos, no século XVI, mais especificamente, diante do comércio entre a
Inglaterra e suas colônias americanas.
Dessa forma, com a expansão do comércio ultramarino, surge a figura do factor, cujo
papel era o de vender as mercadorias produzidas na metrópole, geralmente produtos têxteis,
antecipando os valores das mercadorias ao comerciante e assumindo o risco pelas vendas. Vê-
se nessas últimas características, a imensa proximidade com o atual instituto do factoring6.
Percebe-se, também, que a grande importância dos factors nesse período, deve-se ao
fato de que eles se instalavam nas colônias. Assim, possuíam ampla visão sobre o mercado
4MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais, ed. rev. e aum. Rio de Janeiro, Forense, 2010,
p. 426. 5DE LUCCA, Newton. A faturização no direito brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1986,
p. 10. 6DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 12-13.
16
local, as necessidades e os compradores, informações de difícil acesso aos distantes
comerciantes da metrópole7.
A atividade dos factors ingleses ainda foi predominante no século XVIII, mas com a
enorme expansão da indústria norte-americana no século XIX, a atividade se deslocou
maciçamente para as antigas colônias britânicas.
Dessa maneira, Newton de Lucca, destaca que o vazio deixado na Europa pelo
deslocamento da atividade do factoring para os EUA, a que oportunamente se refere
Guillamón, foi suprido pela operação de desconto bancário, operação essa, como se sabe de
utilização insignificante nos EUA8.
Por fim, a atividade do factoring apenas foi reintroduzida na Europa na década de
1960. Dessa forma, reiniciou-se na Inglaterra e depois se espalhou para o continente9.
2.2 O surgimento do factoring no Brasil
A primeira vez que o instituto do factoring, faturização ou fomento comercial,
empresarial ou mercantil é trazido à discussão acadêmica no Brasil, segundo autores como
Newton de Lucca10
, foi através de um artigo escrito por Fábio Konder Comparato na Revista
de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, em 197211
.
Neste artigo o autor, através de bibliografia estrangeira, faz uma análise acerca do
tema do factoring definindo suas bases (concessão de capital de giro para pequenas e médias
empresas e algumas características fundamentais: garantia – gestão de crédito -
financiamento), por ele nomeado de faturização, e sua possível introdução no Brasil.
No entanto, a atividade do factoring somente começou a ser praticada no país na
década de 1980. Período no qual ocorreu uma série de discussões sobre o tema e intervenções
do Banco Central diante da dúvida se ela seria ou não atividade típica das instituições
financeiras.
7DE LUCCA, Newton. O contrato de “factoring”. In: Novos contratos empresariais / Carlos Alberto
Bittar (coordenador). São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1990, p. 121. 8DE LUCCA, Newton, Op., cit. p. 122.
9MARTINS, Fran. Op., cit. p. 427.
10DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 7.
11COMPARATO, Fábio Konder. Op., cit.
17
No dia 11 de fevereiro de 1982, Luiz Lemos Leite, funcionário aposentado do Banco
Central, funda a ANFAC – Associação Nacional das Empresas de Fomento Comercial, com o
objetivo de reunir as empresas de factoring, organizar o setor e divulgar suas funções12
.
Coincidentemente, nesse mesmo ano, o Banco Central, a fim de impedir a prática de
atividades próprias das instituições financeiras por agentes não autorizados, baseando-se na
Lei nº 4595/64, que dispõe sobre o Sistema Financeiro Nacional, editou a Circular nº 703 de
16-6-82.
Eis o teor da Circular:
CIRCULAR Nº 703
Em face das disposições da Lei nº 4.595, de 31.12.64, em especial as contidas em
seus arts. 2º, 3º, inciso V, 4º, incisos VI e VIII, 10, inciso V, 11, inciso VII, e 44, §
7º, o Banco Central do Brasil, ouvido o Conselho Monetário Nacional, em sessão
realizada nesta data, decidiu tornar público os seguintes esclarecimentos:
I - As operações conhecidas por "factoring", "compra de faturamento" ou
denominações semelhantes - em que, em geral, ocorrem a aquisição, administração e
garantia de liquidez dos direitos creditórios de pessoas jurídicas, decorrentes do
faturamento da venda de seus bens e serviços - apresentam, na maioria dos casos,
características e particularidades próprias daquelas privativas de instituições
financeiras autorizadas pelo Banco Central.
II - Assim, e até que a matéria seja regulamentada pelo Conselho Monetário
Nacional, as pessoas físicas ou jurídicas não autorizadas que realizarem tais
operações continuampassíveis, na forma prevista no § 7º do art. 44 da Lei nº 4.595,
de 31.12.64, das penas de multapecuniária e detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos,
ficando a estas sujeitos, quando pessoas jurídicas, seus administradores.
Brasília-DF, 16 de junho de 1982
Carlos Geraldo Langoni
Presidente
Dessa maneira, entendendo que a atividade do factoring possuía características
próprias das instituições financeiras, o Banco Central determinou que as Juntas Comerciais
não acolhessem os pedidos de arquivamento e registro dos atos constitutivos das empresas de
factoring, até que a matéria fosse regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional.
Diante dessa imposição do Banco Central, diversas empresas de factoring recorreram
ao poder judiciário para que conseguissem o direito de constituir e registrar suas sociedades.
Assim, em 1986, a segunda turma do Tribunal Federal de Recursos proferiu sentença
favorável13
, determinando que as Juntas Comerciais concedessem o arquivamento dos atos
12
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 11.
18
constitutivos das empresas de factoring sem o exame prévio do Banco Central, até que a
matéria fosse regulamentada por lei.
Vale transcrever a ementa desta decisão:
COMERCIAL E ADMINISTRATIVO - REGISTRO DO COMÉRCIO -
EXERCÍCIO DE ATIVIDADES FINANCEIRAS - "FACTORING",
FATURIZAÇÃO OU COMPRA DE ATIVOS – BANCO CENTRAL DO BRASIL
- FUNÇÕES DE REGISTRO E DE FISCALIZAÇÃO DE ATIVIDADES
COMERCIAIS - DISTINÇÃO - LEIS Nº 4.595/64 e 4.726/65
- 1. Não pode o Banco Central do Brasil interferir nas funções de registro comercial,
reguladas pela Lei nº 4.726/65. Estas funções competem às Juntas Comerciais, sob
supervisão e orientação técnica do Departamento Nacional do Registro do
Comércio. Não há confundir o registro comercial de firmas com o seu
funcionamento. Controle e fiscalização deste, quando implique atividades
financeiras, é que cabe ao Banco Central. 2. Factoring ou "faturização". Enquanto
não regulada por lei a constituição ou registro de sociedades que se proponham
ao exercício desse tipo de atividade comercial, não cabe às autoridades
administrativas, com apoio em simples opiniões doutrinárias opor-lhes, "a
priori", restrições de qualquer natureza. Se, no exercício efetivo de suas
atividades comerciais, se verificar que interferem em atividades financeiras não
autorizadas, então, sim, caberá ao Banco Central agir na forma da lei.
(grifo nosso)
Diante desta e de outras sentenças, o Banco Central editou, em 1988, a Circular nº
1.359/88 revogando a Circular nº 703/82:
CIRCULAR Nº 1.359
Comunicamos que a Diretoria do Banco Central do Brasil, em sessão realizada em
08.09.88, decidiu revogar a Circular nº 703, de 16.06.82, relativa às operações de
"factoring".
Brasília-DF, 30 de setembro de 1988.
Keyler Carvalho Rocha
Diretor
Pode-se dizer, então, que, a partir deste momento, a atividade do factoring passou a ser
vista como comercial e não financeira e ser cada vez mais utilizada pelos empresários de
pequeno e médio porte14
.
13
Brasil. Tribunal Federal de Recursos. Apelação em Mandado de Segurança nº 99.964-RS. Relator: Ministro Costa Lima. Publicação: 24 de dezembro de 1986. 14
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Factoring no Brasil e na Argentina – análise histórica, estrutural e funcional – estudo de direito comparado, Convenção de Otawa do Unidroit. Curitiba: Juruá, 2009, p. 89.
19
Além disso, como aponta Fran Martins, nesse momento foram editados diversos atos
normativos que fazem referência ao factoring, como o art. 28, §1º, c.4, da Lei n. 8.891/95 e a
Resolução nº 2.144/95, do Conselho Monetário Nacional. O primeiro trata do imposto sobre a
renda das pessoas jurídicas e faz referência expressa ao factoring. O segundo dita que
qualquer operação praticada por empresa de factoring, que seja própria de instituição
financeira, será considerada ilícito administrativo, reconhecendo, assim, a natureza comercial
do factoring15
.
Em suma, nos dizeres de Rogério Alessandre de Oliveira Castro16
:
Enfim podemos dizer que o factoring no Brasil passou a ser estudado no início da
década de 70 e praticado no início da década de 80, quando sofre inicialmente
restrição do Banco Central do país. Essa restrição, consistente em condicionar a sua
atividade apenas às instituições financeiras (Circular 703/82), foi removida em 1988
(Circular 1.359). A partir desse momento, passou-se a registrar, enquanto atividade
comercial, crescentes volumes em suas operações internas (factoring doméstico), a
ponto de desencadear iniciativas do Congresso Nacional para sua regulamentação, o
que, contudo, não ocorreu.
15
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 430-432. 16
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 90.
20
21
3 CONCEITO E PARTICULARIDADES DO FACTORING
Faz-se necessário, antes de adentrar ao assunto específico das cláusulas pro soluto e
pro solvendo nos contratos de factoring, realizar um breve estudo sobre o conceito do
instituto, suas modalidades, características contratuais e legislação aplicável.
3.1 Conceito doutrinário de factoring
Apesar de a atividade do factoring, como visto, vir sendo praticada no Brasil desde a
década de 1980, a produção doutrinária sobre o assunto ainda não é muito vasta. No entanto, é
indispensável analisarmos a conceituação do instituto no direito brasileiro.
Para Fábio Konder Comparato, o precursor do estudo acadêmico sobre o assunto, o
conceito de factoring ou faturização, baseia-se em seu tríplice objeto17
, a saber: garantia na
liquidação dos valores no vencimento ou com antecipação, gestão de créditos (serviços de
faturamento, cobrança, etc) e financiamento, já que com a negociação de seus títulos
decorrentes das vendas a prazo, o faturizado ganha liquidez e capital giro.
Segundo Fran Martins18
:
O contrato de faturização ou factoring é aquele em que um empresário cede a outro
os créditos, na totalidade ou em parte, de suas vendas a terceiros, recebendo o
primeiro do segundo o montante desses créditos, mediante o pagamento de uma
remuneração.
Na visão de Orlando Gomes19
:
Factoring é o contrato por via do qual uma das partes cede a terceiro (o
factor) créditos provenientes das vendas mercantis, assumindo o cessionário
o risco de não recebê-los contra o pagamento de determinada comissão a que
o cedente se obriga.
Arnaldo Rizzardo adota conceito semelhante a este20
.
17
COMPARATO, Fábio Konder. Op., cit. p. 61. 1818
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 425. 19
GOMES, Orlando. Contratos. 26 ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 580. 20
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 1387.
22
Para Waldírio Bulgarelli21
:
(...) a operação de factoring repousa na sua substância, numa mobilização de
créditos de uma empresa; necessitando de recursos, a empresa negocia os seus
créditos cedendo-os a outra, que se incumbe de cobrá-los, adiantando-lhe o valor
desses créditos (conventional factoring) ou pagando-os no vencimento (maturity
factoring); obriga-se contudo a pagá-los mesmo em caso de inadimplemento por
parte do devedor da empresa.
Luiz Lemos Leite, fundador da já citada ANFAC, baseando-se na Convenção
Diplomática de Ottawa - Maio/88, dita que factoring é22
:
É a prestação contínua de serviços de alavancagem mercadológica, de avaliação de
fornecedores, cliente e sacados, de acompanhamento de contas a receber e de outros
serviços, conjugada com a compra de créditos de empresas resultantes de suas
vendas mercantis ou de prestação de serviços, realizadas a prazo.
Para Antonio Carlos Donini23
:
(...) a operação de factoring ou fomento empresarial resume-se em atos que
envolvem a compra de crédito, antecipação de recursos não-financeiros (matéria-
prima) e prestação de serviços convencionais ou diferenciados, conjugados ou
separadamente, a título oneroso entre dois empresários, faturizador e faturizado.
Assim, pode-se perceber que, geralmente, as definições atribuem duas funções básicas
ao factoring, a compra de crédito e a prestação de serviços. Dessa forma, o factoring se
mostra como técnica financeira e de gestão comercial24
.
Em relação ao primeiro ponto, a técnica financeira, o faturizado/empresa-cliente vende
os direitos/créditos provenientes de suas vendas realizadas a prazo, recebendo o valor a vista,
pagando uma remuneração, que também é denominada fator de compra. Os títulos de crédito
são transferidos através do endosso e da cessão de crédito.
Através dessa operação, a empresa de factoring acaba financiando a empresa-cliente,
já que lhe dá liquidez ou capital de giro, para que possa cumprir suas obrigações financeiras
junto aos fornecedores, funcionários, etc.
21
BULGARELLI, Waldírio. Contratos mercantis. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 541. 22
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 4. 23
DONINI, Antônio Carlos. Manual do Factoring. 1 ed. São Paulo: Klarear, 2004, p.4. 24
Diversos autores defendem a apresentação do factoring com técnica financeira e de gestão comercial, dentre eles: MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais, ed. rev. e aum. Rio de Janeiro, Forense, 2010, p. 432; DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 6 ed. Rio de Janeiro: Ed. Saraiva, 2006. v. 4, p. 82-83; RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 1388.
23
É indispensável destacar, como bem afirma Luiz Lemos Leite, que a empresa de
factoring não cobra juros sobre os títulos de crédito, e sim um fator de compra, que é o preço
de compra dos mesmos, sendo livremente pactuado entre as partes25
.
Como explicita este autor, „juro‟ representa a remuneração pelo uso do capital de
terceiros, levando-se em conta o „prazo‟ e o „risco do desembolso‟, excluídas outras despesas
e impostos.
Enquanto o que ocorre na operação de factoring é a venda realizada, pelo faturizado,
dos seus créditos mercantis ao faturizador, que os compra à vista, através da estipulação de
um preço (fator). Assim, a operação representa uma compra e venda mercantil.
Em relação ao segundo ponto, a técnica de gestão comercial, o factoring, além da
negociação dos títulos de crédito, tem como característica a prestação de uma série de
serviços, como acompanhamento de contas a receber e a pagar, cobrança, análise de riscos,
consultoria, etc.
Ou seja, o faturizado tem à sua disposição, quando necessário, com o pagamento de
certa remuneração, uma série de serviços de gestão comercial, que têm por base gerar uma
maior eficiência econômico-financeira em sua empresa.
Apesar desses dois pontos comuns a quase todas as definições de factoring
apresentadas na doutrina, há alguns outros que causam grandes discussões acadêmicas, o que
é o caso, principalmente, da configuração do factoring como contrato bancário e da
necessidade ou não da cláusula pro soluto, sendo este último tema central do presente
trabalho.
Tais tópicos serão abordados com vagar mais adiante.
3.2 Modalidades
Embora o tema deste trabalho diga respeito, fundamentalmente, ao factoring
convencional, existem outras modalidades presentes no mercado. Assim, é interessante que se
faça um breve estudo sobre elas, no intuito de distinguir a modalidade que aqui está sendo
tratada das outras que existem.
Diversos autores26
dividem o instituto do factoring em três grandes manifestações,
classificação que Newton de Lucca denomina de levantamento histórico27
.
25
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 63.
24
Tais manifestações seriam:
a) Colonial factor (século XVI ao século XIX): espécie já desaparecida, nela o factor
tem o papel de comissionário ou intermediário, operando como distribuidor dos produtos da
metrópole na colônia. O factor tem a função de cobrar créditos, garantir a operação (star del
credere) e conceder adiantamentos.
b) Old line factor (fins do século XIX): nesta, em geral, deixa de existir a compra e
venda de mercadorias, e há, por parte do factor, a atividade de gestão e cobrança dos créditos
do faturizado. Há a concessão de adiantamentos dos créditos a prazo cedidos e pode haver a
assunção dos riscos da operação pelo factor. Exemplos: conventional factoring, maturity
factoring e import-export factoring – estas modalidades serão tratadas mais especificamente
nesse subitem.
c) New style factor ou new line factor (a partir de 1930): desempenha a mesma função
do old line factor, mas utilizando diversas técnicas financeiras especializadas. Exemplos: non-
notification factoring (não é realizada a notificação do devedor, a fim de preservar a imagem
do faturizado em relação aos fornecedores), undisclosed factoring (o faturizado vende suas
mercadorias ao faturizador, que as revende para os clientes do primeiro), entre outros28
.
No entanto, mostra-se mais relevante abordar neste trabalho, as modalidades
praticadas no Brasil, que quase em sua totalidade são derivadas do old line factor.
Como bem aponta Antonio Carlos Donini, as modalidades praticadas no país
atualmente são29
:
a) Factoring convencional (conventional factoring): é a modalidade mais comum no
Brasil, e é a que está sendo abordada neste trabalho. As definições dadas no item 3.1, dizem
respeito a este modelo, no qual se vê presente duas funções básicas: i) compra de crédito e ii)
prestação de serviços.
b) Maturity factoring: o objeto deste contrato é a compra de crédito pelo faturizador,
com o pagamento na data de vencimento dos títulos. Nesta modalidade, o faturizador assume
o risco contra o inadimplemento, ficando o faturizado desincumbido em relação aos custos de
26
Diversos autores apresentam dividem o factoring a partir destas três grandes manifestações, como: DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 20-24; CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 120-122; GERSCOVICH, Carlos G., y LISOPRAWSKY, Silvio V. Factoring – análisis integral del negocio; aspectos legales, comerciales y operativos; financiamento de laspymes, modelos de contrato. Buenos Aires: Ediciones Depalma, 1997, p. 18-21; BIANCHI, Renzo. Il factoring i problema gestionaliche comporta. Turim: G. Giappichelli, 1970, p. 13-14. 27
DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 20. 28
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 122. 29
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 17-22.
25
cobrança e ao inadimplemento por conta do devedor. O faturizador, também, poderá prestar
serviços, como os do factoring convencional, ao faturizado.
c) Trustee: nesta modalidade, o faturizador oferece uma gama de serviços
diferenciados, dirigindo e administrando as contas a receber e a pagar do faturizado,
realizando consultoria e assessorando o faturizado na seleção de clientes e riscos. No entanto,
somente é objeto desta modalidade a prestação de serviços, não havendo a cessão de crédito30
.
d) Compra de matéria-prima: nesta operação, ocorre a antecipação de recursos não
financeiros, no caso, matéria-prima para a produção do faturizado. Assim, o faturizador
negocia diretamente com o fornecedor da matéria-prima, assumindo o pagamento dos
insumos, comprando-os em nome próprio ou do faturizado. Em contrapartida, o faturizador
terá direito de exclusividade sobre os créditos decorrentes das vendas dos produtos derivados
da matéria-prima financiada.
e) Factoring de importação-exportação: segundo Antônio Carlos Donini, este tipo
de contrato é voltado exclusivamente para o campo do comércio exterior, onde o factoring
atua em três frentes: importação, exportação e a chamada garantia ou securitização31
. Nessa
operação, atuam o exportador, o importador, o factoring de exportação e o factoring de
importação (este está estabelecido no lugar da importação). Resumidamente, o importador
solicita ao factoring de exportação um limite de crédito, baseado no valor das exportações.
Assim, o factoring de exportação contata o factoring de importação, solicitando que este
analise e aprove o crédito. Aprovado o crédito, o exportador embarca as mercadorias e
notifica o importador de que os direitos constantes das faturas foram cedidos e que o
pagamento deve ser realizado ao factoring de importação. Feito isso, o exportador entrega os
documentos de embarque ao factoring de exportação, que, em contrapartida, lhe paga o
equivalente a 80% do valor das mercadorias. Por fim, o factoring de importação, em posse de
toda documentação, remete o valor da importação ao factoring de exportação, descontadas as
comissões pactuadas, e cobra do importador o montante devido32
.
30
Autores como Antônio Carlos Donini e Maria Helena Diniz excluem da definição do trustee a operação de cessão de créditos. No entanto, para Rogério Alessandre de Oliveira Castro ela está presente também nessa modalidade. Além disso, este último autor compara a função do trustee com a da recuperação judicial/extrajudicial de empresas, já que basicamente tem como objetivo a superação da crise econômico-financeira do faturizado. (DONINI, Antônio Carlos. Manual do Factoring. 1 ed. São Paulo: Klarear, 2004, p. 18; DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 6 ed. Rio de Janeiro: Ed. Saraiva, 2006. v. 4, p. 86; CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Factoring no Brasil e na Argentina – análise histórica, estrutural e funcional – estudo de direito comparado, Convenção de Otawa do Unidroit. Curitiba: Juruá, 2009, p. 124.) 31
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 19-21. 32
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 318-324; GERSCOVICH, Carlos G., y LISOPRAWSKY, Silvio V. Op., cit. p. 121-127.
26
3.3 O contrato de factoring
3.3.1 Natureza jurídica do contrato de factoring
Há uma grande discussão, na doutrina brasileira, em torno da natureza jurídica do
contrato de factoring. Isso porque não existe lei específica regulamentando o instituto e, por
ele ser atípico, a doutrina e a jurisprudência divergem quanto ao seu conteúdo essencial.
A doutrina é unânime em apontar a cessão de crédito como elemento essencial do
contrato de factoring. No entanto, como veremos com profundidade neste trabalho, diverge se
é obrigatória a cláusula pro soluto, pela qual o faturizador-cessionário assume o risco de
inadimplemento do devedor, ou se o faturizador está facultado a incluir a cláusula pro
solvendo, a qual obriga o faturizado a recomprar os títulos não pagos pelo devedor.
Além disso, diversos autores apontam, como também sendo da natureza jurídica do
contrato de factoring, a prestação de serviços ao faturizado, como serviços de cobrança,
avaliação de riscos, seleção de clientes, entre outros. Dentre esses autores, alguns julgam que
a prestação de serviços deve ser, obrigatoriamente, conjugada com a compra de créditos, e
outros defendem que tal conjugação é facultativa.
Como ilustração do tema, convém citar a posição de alguns doutrinadores brasileiros
acerca do tema.
Para Fábio Konder Comparato, a natureza jurídica da operação é a cessão de crédito a
título oneroso33
. Fran Martins34
, Arnaldo Rizzardo35
e Waldírio Bulgarelli36
defendem posição
no mesmo sentido.
Segundo Newton de Lucca, a natureza jurídica da operação consiste em um desconto a
forfait (compra e venda de título de crédito, sem direito de regresso) e em uma cessão de
crédito a título oneroso37
.
Para Luiz Lemos Leite38
e Rogério Alessandre de Oliveira Castro39
, a natureza jurídica
da operação é a cessão de créditos e a prestação de serviços. O último autor baseia sua tese da
obrigatoriedade da prestação de serviço, mencionando as leis tributárias que fazem referência
ao factoring e os projetos de lei nº 230/95 e nº 3615/00.
33
COMPARATO, Fábio Konder. Op., cit. p. 64. 34
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 425. 35
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 1387. 36
BULGARELLI, Waldírio. Op., cit. p. 545-546. 37
DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 64. 38
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 4. 39
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 161.
27
Contrariando esta última posição, Antônio Carlos Donini defende que a cessão de
crédito é a natureza jurídica da operação de factoring. Embora a prestação de serviços possa
ser conjugada com a cessão de crédito, ela não figuraria, necessariamente, como pressuposto
básico da atividade do factoring40
.
Tal autor rebate diretamente a tese de Luiz Lemos Leite, a qual diz que a pesquisa
cadastral, por exemplo, seria uma prestação de serviços. Se tal atividade fosse considerada
como prestação de serviços, poderia ser cobrada uma remuneração de até 3% sobre o valor
dos títulos adquiridos pelo faturizador, o que, em sua visão, seria abusivo.
Além disso, por não haver definição clara e precisa dos serviços que seriam prestados
pelo factoring, a exigência de cumulação da prestação de serviços com a cessão de créditos,
causa insegurança para o faturizador, que, por exemplo, vem sofrendo exigência, por parte
dos Conselhos Regionais de Administração de vários Estados, para que se registrem,
apresentem um responsável técnico com formação em administração, paguem anuidade e se
sujeitem aos seus ditames.
Por fim, Antonio Carlos Donini subdivide os serviços que poderiam ser prestados pelo
factoring em duas modalidades: convencionais e diferenciados.
Os primeiros, típicos da conventional e maturity factoring, se caracterizam como
serviços administrativos usuais, que não requerem uma relação de parceria e cogestão entre
faturizador e faturizado. Entre esses serviços estão a avaliação de fornecedores e clientes,
acompanhamento de contas a receber e a pagar, análise de crédito, cobrança simples em nome
do faturizado, entre outros. A remuneração, para estes serviços, variaria em torno de 0,5% a
1% do valor de face dos títulos cedidos pela faturizada.
Os segundos, típicos da modalidade trustee, configurar-se-iam como serviços de
gestão empresarial, cogestão, entre outros, onde há relação de grande confiança e
responsabilidade entre faturizador e faturizado. Além do que, a remuneração do faturizador
seria estipulada livremente com o faturizado.
Percebe-se, portanto, que o entendimento mais atual é considerar como sendo da
natureza jurídica do factoring a cessão de crédito e a prestação de serviços. Parecendo o
entendimento mais acertado o de que essas duas atividades não necessariamente devem estar
cumuladas.
40
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 12-15.
28
3.3.2 Classificação
Para que se possa analisar com mais atenção o contrato de factoring, faz-se necessário
classificá-lo.
O contrato de factoring pode ser classificado basicamente como:
a) Atípico misto: segundo Antônio Carlos Donini, o contrato é considerado atípico,
visto que não possui lei que o regulamenta (art. 425, Código Civil) e misto já que mescla
formas contratuais típicas, como prestação de serviços e cessão de crédito, e atípicas41
.
b) Bilateral: tanto o faturizador quanto o faturizado têm obrigações. Por exemplo, o
faturizador tem obrigação de pagar pelos títulos de crédito adquiridos e o faturizado,
obrigação de entregá-los, acompanhados das faturas e demais documentos, e transferi-los.
c) Consensual: como é natural dos contratos, há proposta e aceitação.
d) Oneroso: Carlos Roberto Gonçalves define como contratos onerosos aqueles em
que ambos os contraentes obtêm proveito, ao qual, porém, corresponde a um sacrifício42
. No
contrato de factoring, por exemplo, o faturizado recebe à vista o valor de seus títulos a prazo,
mas deve pagar uma remuneração, e o faturizador recebe uma remuneração, mas tem o dever
pagar os títulos à vista.
e) Comutativo: as prestações são certas e determinadas, desde a formação do
contrato.
f) Personalíssimo: como bem acentua, mais uma vez, Antônio Carlos Donini, o
faturizador, no contrato de factoring, considera como elemento determinado para a
contratação, a pessoa do faturizado, sendo elemento causal do contrato43
.
g) Não solene e não formal: apesar de usual e recomendável que o seja, o contrato de
factoring não necessita de forma escrita, perfazendo-se pela simples manifestação de vontade
entre as partes.
h) De adesão: o contrato de factoring, geralmente, possui um modelo pré-
estabelecido, ao qual o faturizado adere. Assim, possui cláusulas pré-estabelecidas, como a
que dita que haverá uma cessão de créditos ao faturizador, mediante o pagamento de
determinada remuneração. No entanto, é possível que as partes negociem algumas cláusulas.
g) De execução sucessiva: assim o é porque permite várias prestações continuadas.
41
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 89. 42
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III: contratos e atos unilaterais. 5 ed. ver. e atual – São Paulo: Saraiva, 2008, p. 71. 43
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 89.
29
3.3.3 Conteúdo do contrato de factoring
3.3.3.1 Sujeitos do contrato de factoring
Como bem acentuam autores como Rogério Alessandre de Oliveira Castro44
, Maria
Helena Diniz45
, Fran Martins46
e Arnaldo Rizzardo47
, há três sujeitos relacionados com o
contrato de factoring, a saber: o faturizador, o faturizado (fornecedor ou vendedor) e o
comprador (cliente ou devedor).
É interessante de destacar, como chama atenção o primeiro autor, que somente são
partes do contrato o faturizado e o faturizador, já que são eles que pactuam o contrato de
factoring. No entanto, o comprador é elemento essencial, já que é ele quem deve pagar ao
faturizador o crédito devido.
` O faturizado pode ser pessoa física ou jurídica, mas necessariamente empresário, e o
comprador pode ser pessoa física ou jurídica, sem a necessidade de ser configurado como
empresário.
O que gera polêmica na doutrina nacional, nesse sentido, é se a empresa faturizadora
deve ou não ser instituição financeira, tema que será abordado mais adiante.
3.3.3.2 Direitos e obrigações das partes
Como ressaltado no tópico anterior, os sujeitos envolvidos pela operação de factoring
são o faturizador ou sociedade de factoring, o faturizado ou empresa cliente e o devedor.
Ademais, por ser bilateral, o contrato de factoring gera direitos e obrigações para as partes, os
quais merecem destaque neste subitem.
Sobre esse tema, Rogério Alessandre de Oliveira Castro faz indispensável ressalva,
dizendo que, por ser o contrato de factoring atípico no Brasil, não há lei específica que regule
os direitos e obrigações das partes, prevalecendo certa liberdade contratual e variação no
conteúdo de suas cláusulas48
.
44
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 128-129. 45
DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. 6 ed. Rio de Janeiro: Ed. Saraiva, 2006. v.4, p. 77. 46
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 432. 47
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 1388. 48
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 133.
30
O mesmo autor coloca como obrigações da sociedade de factoring, o pagamento ao
cliente dos créditos por ela adquiridos, a notificação da cessão ao devedor (art. 290, Código
Civil), quando pactuado, a assunção do risco pelo inadimplemento, quando também pactuado
(contrato com cláusula pro soluto) e a prestação de serviços diversos.
Dentre os direitos da empresa de factoring estão: a análise dos créditos apresentados
pelo cliente faturizado, a faculdade de recusar os créditos apresentados, a cobrança de uma
remuneração pela aquisição dos créditos a prazos do cliente e outra pela prestação dos
serviços, a exigência da restituição do valor pago pela cessão em caso de vício redibitório e o
direito de regresso em relação ao cliente faturizado, em caso do inadimplemento do devedor,
se o contrato estipulado contiver a cláusula pro solvendo.
As obrigações do cliente-faturizado são: o pagamento à sociedade de factoring da
remuneração pactuada, a notificação da cessão de crédito ao devedor, se assim pactuado, a
remessa dos créditos a serem negociados com a empresa de factoring, relacionados em um
borderô, a responsabilidade pela existência dos títulos de crédito negociados (art. 295, Código
Civil), a prestação das informações do devedor solicitadas pela empresa de factoring.
Quanto aos direitos do cliente-faturizado, são eles o recebimento da empresa de
factoring do valor do título negociado, descontados a remuneração e demais encargos legais,
o recebimento das informações quanto à liquidação dos créditos negociados e o usufruto dos
serviços contratado com a empresa de factoring49
.
Por fim, as obrigações do devedor decorrem do contrato de compra e venda ou
prestação de serviços realizados junto ao cliente faturizado. Ademais, o devedor tem a
obrigação de pagar diretamente à empresa de factoring se houver sido notificado da cessão de
crédito (art. 290, Código Civil) e o direito de opor as exceções que lhe competirem, bem
como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente
(art. 294, Código Civil).
A doutrina nacional não diverge muito quanto ao tema dos direitos e obrigações entre
os sujeitos da operação do factoring. Um dos pontos de maior divergência seria o de que o
faturizador não poderia estabelecer o direito de regresso contra o faturizado em caso de
inadimplemento do devedor, tema central do presente trabalho50
.
49
Rogério Alessandre de Oliveira Castro muito bem especifica estes direitos e obrigações do sujeitos na seguinte obra: CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 132-134. 50
Autores como Fran Martins e Arnaldo Rizzardo adotam essa posição, contra o direito de regresso: MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais, ed. rev. e aum. Rio de Janeiro, Forense, 2010, p. 436; RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 1389.
31
3.4 Legislação aplicável
De maneira geral, a legislação utilizada para o balizamento do factoring, pode ser
sistematizada na tabela a seguir51
:
Base legal do factoring
Garantia constitucional Constituição Federal: arts. 5º, incisos II e XIII, e
170, parágrafo único
Prestação de serviços Código Civil: arts. 594 a 609
Compra e venda de créditos Código Civil: arts. 481 a 532
Cessão de crédito Código Civil: arts. 286 a 298
Vícios redibitórios Código Civil: arts. 441 a 446
Evicção Código Civil: arts. 447 a 457
Fiança Código Civil: arts. 818 a 839
Devedor solidário Código Civil: arts. 264 a 266 e 275 a 285
Aval
Código Civil: art. 897
Decreto 57.663/66: arts. 30 a 32
Lei 5.474/68: art. 12
Lei 7.357/85: arts. 29 a 31
Endosso
Código Civil: arts. 910 a 920 e 923
Decreto 57.663/66: arts. 11 a 20
Lei 5.474/68: art. 25
Lei 7.357/85: arts. 17 a 28
Imposto de renda Lei 9.249/95: art. 15, §1º, inciso II, alínea d
IOF Lei 9.532/97: art. 58
PIS Lei 10.637/02: art. 4º
COFINS Lei 10.833/2003: art. 5º
Limites de atuação do factoring
Lei 4.595/64: arts. 17 e 18
Lei 7.492/86: art. 1º
Lei 1.521/51: art. 2º
Ilícito administrativo e criminal Lei 4.595/64: art. 44
Lei 7.492/86: art. 16
51
GUILHERME, José Carlos Dias. Factoring: teoria e prática. 1. ed. – São Paulo: Klarear, 2009, p. 89.
32
Lei 1.521/51: art. 4º, alínea b
Código Penal: art. 160
Vale citar que há um projeto de lei para a regulamentação do factoring, Projeto de Lei
da Câmara, nº 13 de 2007, que está em tramitação no Congresso Nacional. Como o presente
trabalho se baseia no factoring segundo seu balizamento legal atual, o projeto não será
estudado aqui.
33
4 INSTITUIÇÃO FINANCEIRA X FACTORING
Uma das grandes discussões que gira em torno do instituto do factoring é o seu
enquadramento ou não como instituição financeira. Ver-se-á, a seguir, que as duas figuras não
devem ser confundidas e possuem naturezas distintas.
4.1 Conceito de instituição financeira
O conceito legal de instituição financeira está contido no caput do art. 17 da Lei 4.595,
de 31 de dezembro de 1964, a saber:
Art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em
vigor, as pessoas jurídicaspúblicas ou privadas, que tenham como atividade principal
ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação derecursos financeiros próprios ou
de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor depropriedade
de terceiros.
Como se pode notar, o conceito de instituição financeira trazido pela lei é muito
confuso e gera polêmica.
No entanto, a maior dificuldade nessa definição é compreender com clareza e exatidão
a expressão que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou
aplicação de recursos próprios ou de terceiros.
A primeira dúvida que surge é se a coleta, intermediação e aplicação dos recursos
financeiros teriam que ser realizadas de forma conjugada ou separada.
Luiz Rodrigo Lemmi, através de uma interpretação teleológica da lei, defende que
para se caracterizar atividade financeira, necessariamente, deverá haver captação de recursos
conjugada com sua aplicação52
.
Esse autor chega a tal interpretação observando os objetivos almejados pela lei para ao
definir o conceito de atividade financeira. Estes seriam a proteção da poupança popular, a
proteção do sistema financeiro, impedir a multiplicação das reservas bancárias e a usura53
.
52
LEMMI, Luiz Rodrigo. Atividade financeira e factoring no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 44. 53
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 40-41.
34
Dessa forma, não haveria sentido que a lei considerasse instituição financeira, uma
instituição que capta recursos do público e não os aplica ou intermedia. Ou seja, seria absurdo
que um banco recebesse depósitos do público e não aplicasse ou intermediasse esses valores
através de operações como as de empréstimo ou desconto bancário. Se assim o fosse, a
instituição não deveria ser caracterizada com financeira, já que não apresenta risco ao sistema
financeiro nacional, não merecendo uma tutela legal tão específica.
Nesse sentido, Arnoldo Wald também defende que os vocábulos coleta, intermediação
ou aplicação não devem ser considerados isoladamente, mas em conjunto com os outros.
Finaliza seu argumento dizendo que o verbo aplicar está intimamente relacionado com
atividade caracterizadamente de banco ou entidades similares54
.
Já autores como Luiz Lemos Leite55
e Marcos Cavalcante de Oliveira56
, entendem que,
para a caracterização de instituição financeira, as atividades de captação, intermediação e
aplicação não precisam, necessariamente, estarem conjugadas. Isso porque „coleta,
intermediação ou aplicação‟ estão interligados pela conjunção alternativa „ou‟, e não pela
conjunção aditiva „e‟. O último autor fundamenta seu argumento no art. 1º da Lei
7.492/198657
.
Esta última interpretação parece mais coerente com o texto legal.
No entanto, é uma segunda dúvida suscitada pela lei a que traz maiores problemas na
definição de instituição financeira, além de ser o ponto alto de distinção entre factoring e tais
instituições, qual seja: deveria ser considerada instituição financeira aquela que realiza as
operações apenas através de recurso próprios e não de terceiros?
O já citado art. 17 diz que será considerada instituição financeira a pessoa jurídica ou
física que exerce como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação
de recursos financeiros próprios ou de terceiros.
Para Luiz Rodrigo Lemmi é essencial para a caracterização da atividade financeira a
captação de recursos de terceiros. No entanto, a lei teria incluído o termo recursos financeiros
54
WALD, Arnoldo. Regime legal das empresas de factoring. In: Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 16, p. 260, Jul/1996DTR/1996/346. 55
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 30-32. 56
OLIVEIRA, Marcos Cavalcante de. Moeda, juros e instituições financeiras – regime jurídico. – Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 97. 57
Art. 1º Considera-se instituição financeira, para efeito desta lei, a pessoa jurídica de direito público ou privado, que tenha como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não, a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros (Vetado) de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a custódia, emissão, distribuição, negociação, intermediação ou administração de valores mobiliários.
35
próprios para que não houvesse confusão quando a instituição financeira aplicasse recursos
próprios, já que58
:
(...) uma hora, por operar com recursos financeiros coletados de terceiros, seria
atividade financeira, sujeita a controle governamental e a um determinado regime;
outra hora, por operar com recursos próprios, não seria atividade financeira e haveria
uma liberdade maior (...). Exatamente para fugir dessa dificuldade, a lei prevê não
somente a aplicação de recursos de terceiros, mas também a de recursos próprios,
caracteriza atividade financeira.
Autores como Luiz Lemos Leite59
, Antônio Carlos Donini60
e Sacha Calmon Navarro
Coelho61
também concordam de que não faria sentido a caracterização de uma atividade como
típica das instituições financeiras se não houver captação de recursos de terceiros.
Ademais, para dirimir qualquer dúvida quanto a questão, o art. 1º da já citada Lei
7.492/86, posterior à Lei 4.595/64, exclui o termo aplicação de recursos próprios da sua
conceituação de instituição financeira:
Art. 1º Considera-se instituição financeira, para efeito desta lei, a pessoa jurídica de
direito público ou privado, que tenha como atividade principal ou acessória,
cumulativamente ou não, a captação, intermediação ou aplicação de recursos
financeiros (Vetado) de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a
custódia, emissão, distribuição, negociação, intermediação ou administração de
valores mobiliários. (grifo nosso)
Apesar de todos os argumentos acima apresentados, Marcos Cavalcante de Oliveira
defende que não é necessária a captação de recursos de terceiros para a caracterização de
atividade típica de instituição financeira, mas não justifica sua afirmação62
.
Para encerrar este último ponto cabe transcrever interessante argumento de Luiz
Rodrigo Lemmi sobre o tema63
:
Colocado que a finalidade almejada pela lei ao definir o conceito de atividade
financeira é a proteção à poupança popular (o que engloba também a proteção ao
58
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 25. 59
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 30-33. 60
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 53-54. 61
COELHO, Sacha Calmon Navarro. O negócio jurídico denominado factoring. A possibilidade de cessão onerosa de crédito, com garantia de pagamento pelo cedente por inadimplemento do sacado – IOF – não-incidência. In: Revista de Direito Mercantil, v. 120, p 257-272. São Paulo: Malheiros. 2000, p. 263. 62
OLIVEIRA, Marcos Cavalcante de. Op., cit. p. 99. 63
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 43-44.
36
sistema financeiro) e o controle da multiplicação dos depósitos à vista, percebe-se
que essa finalidade só pode ser alcançada quando houver prévia captação de
recursos junto ao público. Só há risco à poupança popular, quando esta tiver sido
confiada a terceiros; os recursos só se multiplicam, quando depositados à vista
àqueles que os vão reemprestar. Então, só há sentido em enquadrar um empresário
no conceito de instituição financeira (e, por consequência, impor-lhe toda a pesada
carga de obrigações que visam conferir-lhe saúde financeira) se este captar recursos
no mercado, sendo irrazoável se o referido empresário apenas aplicar seus próprios
recursos.
Por fim, além dessas discussões, é interessante citar o parágrafo único do art. 17 e o
caput do art. 18, ambos da Lei 4.595/64.
O primeiro determina que são equiparadas às instituições financeiras as pessoas
físicas que exerçam qualquer das atividades referidas neste artigo, de forma permanente ou
eventual. Ou seja, serão enquadradas como instituições financeiras as pessoas físicas que
exercem atividade financeira sem autorização das autoridades monetárias, sendo sujeitas às
devidas responsabilizações cíveis e criminais.
O segundo dispositivo dita que as instituições financeiras somente poderão funcionar
no País mediante prévia autorização do Banco Central da República do Brasil ou decreto do
Poder Executivo, quando forem estrangeiras. Tal norma declara expressamente que não se
pode exercer atividade de instituições financeiras, sem prévia autorização do Banco Central,
sendo uma atividade altamente regulada.
Portanto, percebe-se que o conceito de atividade financeira é complexo e que,
sobretudo, visa proteger a poupança popular e a multiplicação dos meios de pagamento.
Assim, devido ao alto impacto que essa atividade causa e pode causar na economia, o
Banco Central submete seu funcionamento mediante autorização, regulando e fiscalizando de
perto sua atuação.
4.2 Distinção entre banco e factoring
Antes que se adentre às questões doutrinárias em relação a distinção entre instituição
financeira e factoring, ou, mais especificamente, entre banco e factoring, cabe rememorar,
brevemente, o disposto em alguns atos normativos do Banco Central, já citados no item 2.2
deste trabalho.
Como visto, o Banco Central, em meados de 1982, entendendo que a atividade do
factoring possuía características próprias das instituições financeiras, editou a Circular
37
703/1982, que determinava que as Juntas Comerciais não acolhessem os pedidos de
arquivamento e registro dos atos constitutivos das empresas de factoring, até que a matéria
fosse regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional.
Mais tarde este ato normativo foi revogado pela Circular 1.359/1988, a qual tirou,
mais uma vez, as sociedades de factoring da clandestinidade, liberando as Juntas Comerciais
a acolher e registrar seus atos constitutivos.
No entanto, é através da Resolução 2.144/1995 do Banco Central que este distingue as
sociedades de factoring das instituições financeiras.
Eis o conteúdo essencial da mesma:
RESOLUÇÃO Nº 2144
Esclarece sobre operações de "factoring" e operações privativas de instituições
financeiras.
O BANCO CENTRAL DO BRASIL, na forma do art. 9º da Lei nº 4.595, de
31.12.64, torna público que o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, em sessão
realizada em22.02.95, tendo em vista o disposto no art. 4º, inciso VI, da referida Lei,
e face ao contido no art.28, "parágrafo 1º, alínea ""c.4"", da Lei nº 8.981, de
20.01.95, que conceitua como "factoring" a atividade de prestação cumulativa e
contínua" de serviços de assessoria creditícia,mercadológica, gestão de crédito,
seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber,compras de direitos
creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços,
RESOLVEU:
Art. 1º Esclarecer que qualquer operação praticada "por empresa de fomento
mercantil ("factoring") que não se ajuste ao" "disposto no art. 28, parágrafo 1º,
alínea ""c.4"", da Lei nº 8.981, de" 20.01.95, e que caracterize operação privativa de
instituição financeira, nos termos do art 17, da Lei nº 4.595, de 31.12.64, constitui
ilícito administrativo (Lei nº 4.595, de 31.12.64) e criminal (Lei nº 7.492, de
16.06.86).
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 22 de fevereiro de 1995
Persio Arida
Presidente
Esta resolução, ao tratar das sanções em relação às sociedades que, sem autorização,
atuam como instituições financeiras, distingue claramente a atividade do factoring em relação
a estas.
38
Em relação ao tema Arnoldo Wald afirma que a resolução foi considerada, pelas
associações de empresa de factoring, como dando a estas um estatuto legal definido e um
atestado de idoneidade, fazendo-as sair do limbo jurídico em que se encontravam64
.
Visto estes marcos normativos, faz-se essencial agora adentrar à distinção entre banco
e factoring realizada pela doutrina brasileira.
Iniciando a discussão, Luiz Lemos Leite apresenta interessante quadro comparativo
das diferenças entre banco e factoring65
.
Em linhas gerais, o autor traça as seguintes diferenças:
a) O banco é um intermediário do crédito, realizando operações ativas (realização de
empréstimos, por exemplo) e passivas (recebimento de depósitos), enquanto o factoring
realiza operação dicotômica, compra de créditos e prestação de serviços.
b) O banco capta recursos de terceiros no mercado, o factoring não o faz, trabalhando
com recursos próprios.
c) O banco, em suas operações ativas, remunera-se com a cobrança de juros, enquanto
o factoring tem sua remuneração proveniente de duas fontes, a comissão cobrada ad valorem
pela prestação de serviços, quando há, e o fator de compra na compra e venda dos direitos
creditícios, que, como já citado, não é juros.
d) O banco se remunera do spread, que é a diferença entre o custo de captação e
aplicação dos recursos coletados no mercado, enquanto o factoring do fator, que é a
precificação da compra de créditos, que leva em consideração o custo de oportunidade dos
recursos, os custos operacionais, a tributação e a expectativa de lucro e risco.
Arnaldo Rizzardo66
dita que:
(...) a finalidade que leva a constituir uma empresa de factoring nunca será a coleta
ou captação de recursos monetários e a intermediação – o que é característico das
instituições financeiras. Nesta ordem, não integram os escritórios de factoring o
Sistema Financeiro Nacional.
Nesse mesmo sentido seguem as opiniões de Antônio Carlos Donini67
e Arnoldo
Wald68
.
64
WALD, Arnoldo.Regime legal das empresas de factoring. In: Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 16, p. 260, Jul/1996DTR/1996/346. 65
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 28. 66
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 1387-1388. 67
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 53-54. 6868
WALD, Arnoldo. Regime legal das empresas de factoring. In: Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 16, p. 260, Jul/1996DTR/1996/346
39
Este último afirma que a captação de recursos junto ao público pela empresa de
factoring está vedada porque importaria em transformá-la em instituição financeira, pois
levantaria recursos (junto ao público) para financiar os seus clientes.
Assim, percebe-se claramente, que o ponto mais claro na distinção entre banco e
factoring é justamente a não captação de recursos de terceiros pelo último.
Além disso, um tema relacionado a este ponto é se a captação de recursos, por parte
das sociedades de factoring junto a instituições financeiras se caracterizaria como captação de
recursos de terceiros.
O Banco Central permite tal operação, entendendo que a mesma não configura
captação de poupança popular por parte do factoring, como é atestado pela Circular 2.715/96.
Eis a transcrição do referido ato normativo:
CIRCULAR N° 2715
Dispõe sobre operações de crédito com empresas cujo objeto social seja a prática de
compra de faturamento.
A Diretoria Colegiada do Banco Central do Brasil, em sessão realizada em 28.08.96,
com base no disposto no art. 3º, inciso I, da Resolução nº 2.118, de 19.10.94,
D E C I D I U:
Art. 1º Permitir às instituições financeiras:
I - a realização de operações de crédito com empresas cujo objeto social, exclusivo
ou não, seja a prática de operações de compra de faturamento ("factoring");
II - o aporte de recursos a empresas de "factoring" e promotoras de vendas.
Art. 2º Esta Circular entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º Fica revogado o art. 3º da Circular nº 2.511, de 02.12.94.
Brasília, 28 de agosto de 1996
Alkimar Ribeiro Moura
Diretor
Esta circular deixa claro que as empresas de factoring apenas podem utilizar recursos
de terceiros na sua atividade, desde que o façam por intermédio de instituições financeiras,
como qualquer outra empresa comercial ou industrial o faz69
.
69
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 27.
40
Luiz Rodrigo Lemmi fundamenta essa posição, defendendo que ao se fazer uma
interpretação teleológica da Lei 4.594/64, chega-se a conclusão que sua finalidade máxima é a
proteção da poupança pública.
No entanto, continua o autor, a utilização de recursos captados através dos bancos não
ameaça a poupança popular, já que diz respeito à poupança do banco, e esta não precisa de
proteção, já que as instituições financeiras dispõem de meios próprios.
Portanto, ao não arriscar os recursos do público, não há motivos para que se vedasse a
aplicação, pelo factoring, de recursos alcançados junto aos bancos70
.
Apesar de o entendimento da natureza comercial do factoring e de sua não confusão
com as instituições financeiras ser o majoritário, alguns autores, sustentam que a atividade é
tipicamente financeira e que deveria ser submetida ao crivo do Banco Central.
Entre os que defendem este ponto de vista estão Fábio Konder Comparato, que dita
que diante do texto amplíssimo do art. 17 da Lei n. 4.595, de 1964, não há a menor dúvida de
que as empresas que praticassem o „conventional factoring‟ seriam consideradas instituições
financeiras71
e, com argumentação semelhante, Newton de Lucca72
.
Dentre os doutrinadores mais atuais, que detêm este posicionamento minoritário, está
Fábio Ulhoa Coelho. Segundo ele a única diferença que separa o contrato bancário do
desconto para o de factoring seria a ausência de direito de regresso, possuindo os dois a
mesma função econômica. Dessa forma, o factoring deveria ser submetido à autorização do
Banco Central para seu funcionamento.73
No entanto, o autor faz a ressalva de que enquanto o Banco Central não entender a
operação de factoring como tipicamente financeira, tal autorização não poderá ser exigida.
Apesar das ideias contrárias, a posição mais acertada é a que distingue as sociedades
de factoring das instituições financeiras, sobretudo por aquela não captar recursos junto ao
público e ter natureza mercantil ou comercial, o que as desenquadra da definição adotada pelo
art. 17 da Lei 4595/64.
4.3 A operação de factoring e o desconto bancário
70
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 58-59. 71
COMPARATO, Fábio Konder. Op., cit. p. 65. 72
DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 31. 73
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, volume 3: direito de empresa. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 164.
41
Embora o contrato de factoring guarde semelhanças com diversos tipos contratuais, é
com o contrato bancário do desconto que reside as maiores discussões e proximidades.
Como bem acentua Rogério Alessandre de Oliveira Castro, a confusão entre esses dois
institutos provavelmente foi uma das causas que impedia a busca da identidade própria do
factoring. Como o desconto bancário é atividade típica das instituições financeiras, confundi-
lo com a operação do factoring geraria a equivocada conclusão de que este estaria ilegalmente
invadindo a atividade daquelas74
.
Este autor continua sua argumentação apresentando as semelhanças e diferenças entre
os dois institutos75
, as quais são muito pertinentes.
Entre as semelhanças, ele elenca duas básicas.
A primeira é a de que as duas operações tem como objetivo satisfazer a necessidade
de crédito do cliente, detentor de vendas mercantis ou prestação de serviços a prazo.
A segunda é a de que ambas cobram remuneração pela transformação dos créditos a
prazo em créditos à vista, no entanto a mesma têm nomes distintos. No desconto bancário, a
remuneração é denominada de taxa e, no factoring, de fator.
Dentre as diferenças, o mesmo autor elenca, basicamente, seis, a saber:
a) Os recursos utilizados na operação de desconto bancário, por ser realizado através
de instituição financeira, são captados de terceiros (captação de poupança popular). Enquanto
o factoring utiliza recursos próprios para a compra dos créditos.
Disso decorre, também, que o desconto bancário é operação privativa de instituição
financeira e o factoring uma atividade mercantil.
Esse tema foi suficientemente esgotado no item anterior e se caracteriza como uma das
mais importantes diferenças entre as duas operações.
b) No factoring a avaliação do risco e a definição de compra levam em conta a
capacidade econômica do devedor, enquanto no desconto bancário a capacidade econômica
do cliente descontário.
c) No factoring, junto com a operação de compra de créditos existe a prestação de
serviços variados ao cliente, o que não ocorre no desconto bancário.
Vale acrescentar neste ponto, como visto no item 3.3.1 do presente trabalho, que a
obrigatoriedade da cumulação entre compra de crédito e prestação de serviços no contrato de
factoring não é pacífica na doutrina e não parece a mais acertada. Assim, tal distinção nem
sempre estará presente nos contratos de factoring.
74
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 165. 75
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 165-167.
42
d) O factoring pode envolver qualquer tipo de crédito, ainda que não representado por
título de crédito, enquanto que o desconto bancária é realizado apenas através de títulos de
crédito.
e) No desconto bancário a remuneração cobrada envolve juros, já no factoring se
cobra um deságio, que é denominado fator de compra, além de remuneração ad valorem pelos
serviços prestados, quando, como defendido anteriormente, houver.
f) O factoring adquire os créditos na modalidade pro soluto (sem direito de regresso
contra o credor), enquanto no desconto bancário os créditos são adquirido na modalidade pro
solvendo (com direito de regresso contra o credor).
Diversos autores, como, por exemplo, Orlando Gomes76
, Fábio Ulhoa Coelho77
e
Maria Elizabete Vilaça Lopes78
também defendem que a distinção entre desconto bancário e
factoring está na ausência de direito de regresso.
Devido a esta diferença, Fábio Konder Comparato79
e Newton de Lucca80
assemelham
o contrato de factoring ao contrato bancário do desconto a forfait, que seria, basicamente, um
desconto bancário com cláusula pro soluto.
No entanto, como veremos nos capítulos seguintes com profundidade, a questão do
direito de regresso não é pacífica, e a cláusula pro solvendo é comum nos contratos de
factoring, não sendo esta diferença determinante e sempre presente entre os contratos de
desconto bancário e factoring.
Diante do exposto, percebe-se, portanto, que, por diversas características, não se pode
confundir os institutos do factoring e do desconto bancário, que, apesar de apresentarem
semelhanças, são distintos. E que esta conclusão confirma, também, a operação de factoring
como distinta das atividades privativas de instituições financeiras.
76
GOMES, Orlando. Op., cit. p. 580. 77
COELHO, Fábio Ulhoa. Op., cit. p. 164. 78
LOPES, Maria Elizabete Vilaça. O contrato de "factoring" e o sistema financeiro nacional. Revista de Direito Mercantil Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 28, n. 74, p. 57-71, abr./jun. 1989, p. 59. 79
COMPARATO, Fábio Konder. Op., cit. p. 63. 80
DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 53-56.
43
5 OS PRINCIPAIS MEIOS DE TRANSFERÊNCIA DO CRÉDITO NO
FACTORING
As cláusulas pro solvendo e pro soluto estão ligadas aos meios de transferência do
crédito. Assim, a forma como esta se perfizer determinará a possibilidade ou não do direito de
regresso do faturizador contra o faturizado em caso de não pagamento da dívida pelo devedor.
Como já dito anteriormente, a cessão de crédito faz parte da essência do contrato de
factoring. Além disso, como se demonstrará, o endosso também é peça fundamental, já que os
títulos de crédito, como a duplicata, exigem que a cessão dos direitos seja realizada através
desse instituto cambiário.
Vale relembrar que o contrato de factoring no Brasil, por ser atípico e não
regulamentado por lei específica, vale-se de diversos institutos legais já existentes para se
concretizar, como é o caso da cessão de créditos instituída pelo Código Civil e a legislação
cambiária, como a Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas promissórias, a
Lei da duplicata, entre outras.
Neste capítulo, abordar-se-á regulamentação de tais institutos, com enfoque na
possibilidade ou não da garantia da solvência do devedor pelo cedente/endossante-faturizado.
5.1 A cessão de crédito
Faz-se interessante, neste tópico, abordar de maneira geral a cessão de crédito, com
ênfase nas cláusulas pro solvendo e pro soluto.
Esse instituto está regulado no Código Civil, nos artigos 286 a 298, do livro do direito
das obrigações, como forma de transmissão das obrigações.
Assim, o respectivo art. 286 determina que o credor pode ceder o seu crédito, se a isso
não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor81
.
Diante da disposição legal, cabe demonstrar a conceituação do instituto pela doutrina.
Para Caio Mário da Silva Pereira82
:
81
Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação. 82
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, v. 2: Teoria geral das obrigações. – 25 ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 351.
44
Chama-se cessão de crédito o negócio jurídico em virtude do qual o credor transfere
a outrem a sua qualidade creditória contra o devedor, recebendo o cessionário o
direito respectivo, com todos os acessórios e garantias. É uma alteração subjetiva da
obrigação, indiretamente realizada, porque se completa por via de uma transladação
da força obrigatória, de um sujeito ativo para outro sujeito ativo, mantendo-se em
vigor o vinculum iuris originário.
Ademais, Orlando Gomes define cessão de crédito como o negócio jurídico bilateral
pelo qual o credor transfere a terceiro sua posição na relação obrigacional83
.
A definição no sentido de que a cessão de crédito é um negócio jurídico onde ocorre a
transferência da qualidade de credor a outrem é adotada pela maior parte da doutrina84
.
O instituto tem sua gênese na necessidade da circulação do crédito na economia e a
consequente transmissão das obrigações. Diante disso, é considerado um negócio jurídico
abstrato, já que a qualidade creditória é transferida independentemente do questionamento de
sua causa85
.
Pode ser classificada, basicamente, como:
a) Bilateral;
b)Onerosa ou gratuita: sendo que na operação de factoring ela sempre será onerosa,
já que haverá a compra e venda dos créditos. Como se verá mais adiante, essa questão é
relevante na definição da responsabilidade do cedente;
c) Voluntária ou necessária: será voluntária quando derive da vontade das partes e
necessária quando decorrer da lei ou de sentença judicial. No caso da operação de factoring
ela será voluntária, já que decorre de acordo entre as partes;
d) Não solene e não formal: em regra não necessita de forma determinada, salvo
quando a lei o exigir, como no caso da cessão de direitos relativos a imóveis, ditado pelo art.
108 do Código Civil de 200286
.
O objeto da cessão pode envolver qualquer crédito, pois, como bem destaca Orlando
Gomes, ele pode ou não constar de um título, estar vencido ou por vencer, tenha como
fundamento contrato, testamento ou preceito legal e esteja livre e desembaraçado de ônus ou
83
GOMES, Orlando. Op., cit. p. 245. 84
Arnoldo Wald e Arnaldo Rizzardo, por exemplo, definem o instituto nessa mesma linha, a saber, respectivamente: WALD, Arnoldo. Direito civil: direito das obrigações e teoria geral dos contratos, vol. 2. – 18 ed. reformulada com a colaboração dos professores Semy Glanz, Ana Elizabeth L. W. Cavalcanti e Liliana Minardi Paesani – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 192; RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002 – 4. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 253. 85
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op., cit. p. 353. 86
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
45
gravado por usufruto ou penhor87
. A lei expressamente veda a cessão neste último caso,
conforme o art. 298 do Código Civil88
.
Pode-se perceber, assim, que qualquer direito é suscetível de cessão, desde que
disponível e não sofra as contingências ou limitação da ordem pública ou convencional89
.
Diante disso, na operação de factoring, pode ocorrer a cessão dos mais diversos
direitos creditórios. No entanto, o factoring convencional, na maioria dos casos, trabalha com
a negociação de títulos de crédito, como o cheque e a duplicata e outros títulos cambiários
como a nota promissória.
É importante ressaltar, também, como será abordado no próximo item deste capítulo,
que os direitos decorrentes dos títulos de crédito, como a duplicata, são cedidos através da sua
entrega e mediante endosso90
.
Quanto ao alcance da cessão, o art. 287 do Código Civil de 2002 determina que serão
abrangidos todos os acessórios do crédito cedido91
. Dentre estes, pode-se destacar os de
garantia, como o penhor e a hipoteca, os juros compensatórios e/ou moratórios e os direitos
potestativos inerentes ao crédito, como o direito de constituir o devedor em mora.
Ou seja, o cessionário sub-roga-se nos direitos do cedente, o que abrange tanto crédito
quanto seus acessórios.
Relativamente a terceiros, a cessão de crédito, segundo o art. 288 do Código Civil,
somente terá eficácia se celebrada mediante instrumento público ou instrumento particular
revestido das solenidades do §1º do art. 654. Dessa forma, somente é oponível a terceiros se
dada devida publicidade ao seu ato. Diante disso, a cessão de créditos vem sempre expressa
no contrato de factoring.
Em relação ao devedor, a cessão apenas terá eficácia quando ele for devidamente
notificado (art. 290, Código Civil de 200292
). Assim, a notificação ao devedor é o meio
87
GOMES, Orlando. Op., cit. p. 248. 88
Art. 298. O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos de terceiro. 89
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 257. 90
RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações: Lei nº 10.406, de 10.01.2002 – 4. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 256; WALD, Arnoldo. Direito civil: direito das obrigações e teoria geral dos contratos, – 18 ed. reformulada com a colaboração dos professores Semy Glanz, Ana Elizabeth L. W. Cavalcanti e Liliana Minardi Paesani, São Paulo: Saraiva, 2009, 2 v., p. 196-197. 91
Art. 287. Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios. 92
Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
46
técnico de levar ao seu conhecimento a transferência da relação creditória93
. É através dela
que o devedor será informado de que deve pagar ao novo credor, o cessionário.
A notificação pode ser realizada tanto pelo cedente quanto pelo cessionário, podendo
isso ser estipulado por convenção entre as partes.
Além disso, muito embora o devedor não participe diretamente da cessão de crédito e
esta não dependa de sua anuência, tal operação lhe interessa, já que deverá realizar o
pagamento ao sujeito que tomou o lugar do credor originário94
.
Dessa forma, o Código Civil assegurou, através do art. 29495
, meio de defesa ao
devedor, podendo este opor ao cessionário todas as exceções que lhe competirem, inclusive as
que possuía contra o cedente no momento em que veio ter conhecimento da cessão.
Além do mais, é essencial destacar a responsabilidade do cedente quanto ao crédito
cedido.
Como já dito, o cessionário se sub-roga na qualidade creditória do cedente, ficando
investido em todos os seus direitos e garantias, salvo estipulação em contrário96
.
No entanto, para o regular desfrute do crédito e da relação creditícia, a lei trouxe,
basicamente, duas garantias ao cessionário, na cessão onerosa decorrente do contrato de
factoring: a responsabilidade do cedente pela existência do crédito e a responsabilidade do
cedente pela solvência do devedor.
A primeira garantia é cogente, sempre presente na cessão onerosa, por decorrência
legal. A segunda pode ser estipulada pelas partes.
As duas responsabilidades serão aprofundadas nos subitens seguintes.
Por fim, é importante destacar, novamente, que o contrato de factoring, para se
concretizar, se vale de diversos institutos, como é o caso da cessão de crédito. Esta, apesar de
ser considerada a essência do referido contrato (ver subitem 3.3.1), não se confunde
totalmente com ele, guardando algumas diferenças.
Dentre as diferenças, destaca Rogério Alessandre de Oliveira Castro97
:
a) a abrangência de cada figura contratual, pois a cessão de crédito não exaure o
conteúdo do contrato de factoring, que é muito mais abrangente, envolvendo
prestação de serviços variados, que ajudam o cliente faturizado a organizar sua
contabilidade, a controlar seu fluxo de caixa, a acompanhar suas contas a receber e a
93
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op., cit. p. 359. 94
GOMES, Orlando. Op., cit. p. 249. 95
Art. 294. O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente. 96
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op., cit. p. 364. 97
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 164.
47
pagar, a fazer o orçamento de custos, a buscar novos clientes, a melhorar o padrão
de seus produtos, dentre outros;
b) a cessão de crédito pode ser gratuita ou onerosa (Código Civil brasileiro, art.
295), enquanto o factoring sempre envolverá uma transferência de crédito a título
oneroso;
c) a cessão de crédito é um contrato de execução instantânea, enquanto o factoring é
um contrato de trato sucessivo e de adesão.
5.1.1 A responsabilidade do cedente pela existência do crédito
O art. 295 do Código Civil instituiu a responsabilidade obrigatória ou garantia legal
em relação à existência do crédito.
Vale transcrever o referido artigo:
Art. 295. Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se responsabilize,
fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe
cedeu; a mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se tiver
procedido de má-fé. (grifo nosso)
Como se pode depreender do texto legal, criou-se uma responsabilidade obrigatória na
cessão onerosa, por parte do cedente, de garantir a existência do crédito.
Na cessão gratuita, se proceder o cedente com má-fé também há tal responsabilidade.
No entanto, como a mesma não é utilizada na operação de factoring, não se aprofundará seu
estudo.
Dessa forma, Caio Mário da Silva Pereira justifica essa responsabilidade na cessão
onerosa da seguinte maneira98
:
E isto mesmo (a responsabilidade pela existência do crédito ao tempo da cessão) na
cessão a título oneroso, porque embolsando o correspectivo da cessão, traz lesão ao
cessionário se a dívida a este tempo já não existe. Se não existir o crédito cedido,
terá recebido sem causa uma quantia ou coisa, o que terá como consequência a
obrigação de restituir, fundada na teoria do enriquecimento sem causa.
Em outras palavras, faz-se obrigatória a garantia do cedente pela existência do crédito
para que ele não aja com má-fé, obtendo um enriquecimento sem causa.
98
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op., cit. p. 362-363.
48
Vale acrescentar, ainda, que essa responsabilidade não abrange somente o fato da
existência do crédito, mas, também, o de o cedente ser titular do mesmo. Assim, não pode ter
ocorrido pagamento ou compensação do crédito entre este e o devedor99
.
Ainda quanto à existência do crédito, Arnaldo Rizzardo ressalta100
:
A existência do crédito envolve vários aspectos: a veracidade do crédito; ausência de
vícios ou nulidades no mesmo; a titularidade em receber a favor do cedente de modo
que não pertença a terceiro, e não tenha já sido transferido; que não esteja submetido
a condições suspensivas e até resolutivas; a abrangência dos acessórios além da
obrigação principal, e assim das garantias (fiança, aval, hipoteca, penhor), dos juros
e rendimentos, dos encargos e outros consectários.
Quanto à operação de factoring, Antonio Carlos Donini destaca três hipóteses em que
esse tipo de responsabilidade é aplicável, ilustrando com alguns exemplos, a saber: crédito
inexistente, antecipação, prorrogação, dedução ou compensação e vício e evicção101
.
O primeiro caso pode ser exemplificado quando o cedente-faturizado entrega ao
cessionário-faturizador duplicatas com base em venda futura ou saca duplicata sem lastro.
O segundo caso ocorre quando, por exemplo, o sacado-devedor antecipa o pagamento
do título antes do prazo de vencimento do mesmo. Se a antecipação for efetuada ao sacador-
faturizado antes da notificação da cessão ao devedor, deve aquele recomprar o título, a fim de
evitar o enriquecimento sem causa.
O terceiro caso pode ocorrer quando o sacado-devedor se recusar em realizar o
pagamento do título por motivos como: não correspondência com os serviços efetivamente
contratados; vícios ou defeitos na qualidade dos serviços prestados, ou defeitos e diferenças
na qualidade ou na quantidade das mercadorias; não recebimento das mercadorias, entre
outros.
Por fim, cabe acrescentar que a doutrina e a jurisprudência são pacíficas quanto à
aplicabilidade da responsabilidade obrigatória do cedente pela existência e titularidade do
crédito na operação de factoring, o que não ocorre em relação na responsabilidade do cedente
pela solvência do devedor, tema central deste trabalho e que será tratado a seguir.
99
WALD, Arnoldo. Direito civil: direito das obrigações e teoria geral dos contratos, vol. 2. – 18 ed. reformulada com a colaboração dos professores Semy Glanz, Ana Elizabeth L. W. Cavalcanti e Liliana Minardi Paesani – São Paulo: Saraiva, 2009, p. 197. 100
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 270. 101
DONINI, Antonio Carlos. Factoring: regulação, funções desempenhadas, modalidade e o direito de regresso. In: Revista dos Tribunais, v. 802, p. 727, Agosto/2002DTR\2002\400.
49
5.1.2 A responsabilidade do cedente pela solvência do devedor: as cláusulas pro solvendo
e pro soluto
O art. 296 do Código Civil institui a responsabilidade do cedente pela solvência do
devedor, abrindo a possibilidade de que a cessão seja pro soluto ou pro solvendo.
Vale colacionar o referido dispositivo legal:
Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela
solvência do devedor. (grifo nosso)
Como se pode depreender do texto, a regra é a cessão pro soluto, não assumindo o
cedente o risco pela solvência do devedor, responsabilizando-se apenas pela existência e
titularidade do crédito. Dessa forma, a cessão pro solvendo será realizada mediante
estipulação expressa das partes.
Nesta última modalidade, quando o cedente garante a solvência do devedor, não se
compromete a proporcionar uma fonte de enriquecimento ao cessionário, mas o protege dos
prejuízos que serão ocasionados pela falta de pagamento por parte do sujeito passivo102
.
Ademais, é importante destacar que, para gozar do direito de regresso contra o
cedente, o cessionário deve ser diligente e se utilizar dos meios necessários para garantia do
recebimento do crédito. Isso porque se, diante das contingências econômicas do sujeito
passivo, o titular do crédito não tomar as providências cabíveis e acauteladoras, será isento
aquele de sua responsabilidade103
.
Além disso, o art. 297 do Código Civil de 2002 delimita o montante da
responsabilidade do cedente, a saber:
Art. 297. O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do devedor, não
responde por mais do que daquele recebeu, com os respectivos juros; mas tem de
ressarcir-lhe as despesas da cessão e as que o cessionário houver feito com a
cobrança.
Dessa forma, comprovada a insolvência do devedor, o cedente fica obrigado a
ressarcir o valor do crédito cedido, com os respectivos juros compensatórios e as despesas
realizadas pelo cessionário na cessão e na cobrança da dívida.
102
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op., cit. p. 362. 103
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 272.
50
No entanto, apesar da disposição legal, quando se transporta a questão da cessão pro
solvendo para a operação de factoring surge uma série de controvérsias.
Isso porque, como se verá no próximo capítulo, a doutrina e a jurisprudência
majoritárias, quase sempre com pouca ou nenhuma fundamentação, defendem a não validade
da cláusula pro solvendo no contrato de factoring104
.
Como já dito, o contrato de factoring no Brasil é atípico, não possuindo
regulamentação específica. Assim, vale-se de diversos institutos do ordenamento jurídico para
sua concretização, dentre eles a cessão de crédito, a qual permite expressamente a cláusula
pro solvendo105
.
Dessa forma, realizando uma interpretação conforme o ordenamento jurídico, no que
tange a matéria da cessão de crédito instituída pelo Código Civil, resta clara a legalidade do
direito de regresso em relação ao cedente-faturizado pela insolvência do devedor, desde que
estipulada expressamente no contrato, conforme o já citado art. 296 do Código Civil.
5.2 O endosso
O endosso é o meio pelo qual se transfere a propriedade de um título de crédito com a
cláusula à ordem, podendo, também, ser constituído como mandato (endosso procuração).
No entanto, é a primeira modalidade a que interessa para o presente trabalho, já que a
maior parte das operações realizadas pelo factoring gira em torno da compra e venda e de
títulos de crédito, sobretudo, a duplicata106
.
Muito embora o atual Código Civil, nos arts. 910 e seguintes, regulamente de maneira
geral o instituto do endosso, tal meio de transferência é tratado por legislações específicas.
Dentre elas, a Lei da Duplicata (Lei n. 5.474/1968), a Lei Uniforme de Genebra sobre letras
de câmbio e notas promissórias (promulgada pelo Decreto n. 57.663/1966) e o Decreto n.
2.044/1908 (regula a matéria relativa às letras de câmbio e notas promissórias).
104
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 68. 105
Adotam essa premissa autores como Antonio Carlos Donini, Luiz Lemos Leite e Luiz Rodrigo Lemmi: DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 37; LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 229; LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 80. 106
Nas palavras de Amador Paes de Almeida, a duplicata, num enunciado simples, pode ser conceituada como um título de crédito que emerge de uma compra e venda mercantil ou da prestação de serviços (...). ALMEIDA, Amador Paes de. Teoria e prática dos títulos de crédito. – 29. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2011, p. 196.
51
Em se tratando de cheques, deve-se buscar a regulamentação em relação ao endosso na
Lei Uniforme em matéria de cheques (promulgada pelo Decreto n. 57.595/1966) e na Lei do
Cheque (Lei n. 7357/1985).
Todavia, far-se-á aqui uma análise com enfoque à legislação atinente ao endosso das
duplicatas, já que este é o título de crédito predominante nas negociações realizadas pelo
factoring convencional no Brasil.
É indispensável ressaltar que a Lei da Duplicata, em seu art. 25107
, determina que se
aplicamà duplicata e à triplicata, no que couber, os dispositivos da legislação sobre emissão,
circulação e pagamento das Letras de Câmbio. Ou seja, a matéria legal relativa ao endosso de
duplicatas deve ser buscada, também, na Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e
notas promissórias e no Decreto n. 2.044/1908.
Segundo o art. 8º, caput, do Decreto n. 2.044/1908108
, o endosso transmite a
propriedade do título, sendo que para sua validade basta a assinatura do endossatário ou
mandatário especial no verso da letra.
Ademais, o art. 14, caput, da Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas
promissórias109
, dita que o endosso transmite todos os direitos emergentes da letra.
Dessa forma, no caso da duplicata, o endosso se dá pela assinatura no seu verso,
perfazendo-se a transferência com a tradição do título.
Além disso, o endosso translativo de propriedade possui duas espécies, a saber: o
endosso em preto e o endosso em branco.
O endosso em preto, na lição de Fran Martins, é aquele em que o proprietário da letra
(ou duplicata) a transfere a uma outra pessoa, designando-a110
.
Ou seja, nessa espécie de endosso, o endossante ou mandatário especial, ao lado de
sua assinatura, menciona expressamente o nome do endossatário. Essa é a espécie utilizada
nas operações de factoring.
O endosso em branco (art. 13, Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e
notas promissórias111
), nas palavras do mesmo doutrinador, é aquele em que o endossante não
107
Art. 25. Aplicam-se à duplicata e à triplicata, no que couber, os dispositivos da legislação sôbre emissão, circulação e pagamento das Letras de Câmbio. 108
Art. 8º O endosso transmite a propriedade da letra de câmbio. Para a validade do endosso, é suficiente a simples assinatura do próprio punho do endossador ou do mandatário especial, no verso da letra. O endossatário pode completar este endosso. 109
Art. 14 - O endosso transmite todos os direitos emergentes da letra. 110
MARTINS, Fran. Títulos de Crédito. – 15. Ed. atualizada por Joaquim Penalva Santos e Paulo Penalva Santos – Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 104. 111
Art. 13 - O endosso deve ser escrito na letra ou numa folha ligada a esta (anexo).Deve ser assinado pelo endossante.
52
designa a pessoa a quem transfere a letra (ou duplicata). Dessa maneira, esse endosso é feito
pela simples assinatura do endossante ou mandatário especial no verso da letra112
.
Assim, o endosso em branco se assemelha a um título ao portador, podendo o
proprietário transferi-lo mediante simples tradição. Além do mais, o endosso em branco pode
ser transformado em endosso em preto, completando-se o título com o nome do endossatário
(art. 14, Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas promissórias).
Por fim, cumpre ressaltar, que, como dito no início deste item, a transferência dos
títulos de crédito com cláusula à ordem se dá por endosso. No entanto, o art. 11 da Lei
Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas promissórias113
, determina que quando o
título contiver a cláusula não à ordem a letra só é transmissível pela forma e com os efeitos de
uma cessão ordinária de créditos.
Portanto, neste último caso, prevalecerá a cessão civil e não o endosso para a
transferência do título.
Aparte da breve descrição do instituto do endosso realizada acima, deve-se agora
analisar a responsabilidade do endossante em relação ao aceite e pagamento do título, que faz
parte do tema principal do presente trabalho.
5.2.1 Responsabilidade do endossante quanto ao pagamento do título
O tema que envolve o direito de regresso do endossatário-faturizador contra o
endossante-faturizado pelo não pagamento da duplicata/insolvência do devedor causa grandes
embates doutrinários em relação ao factoring.
Antes de entrar nesse mérito, vale destacar como a lei cambiária trata do tema.
Vale relembrar que a Lei da Duplicata, em seu art. 25, determina que se aplicam à
duplicata e à triplicata os dispositivos da legislação sobre circulação das Letras de Câmbio.
O endosso pode não designar o beneficiário, ou consistir simplesmente na assinatura do endossante (endosso em branco). Neste último caso, o endosso para ser valido deve ser escrito no verso da letra ou na folha anexa. 112
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 106. 113
Art. 11 - Toda a letra de câmbio, mesmo que não envolva expressamente a cláusula a ordem, é transmissível por via de endosso. Quando o sacador tiver inserido na letra as palavras "não a ordem", ou uma expressão equivalente, a letra só é transmissível pela forma e com os efeitos de uma cessão ordinária de créditos. O endosso pode ser feito mesmo a favor do sacado, aceitando ou não, do sacador, ou de qualquer outro co-obrigado. Estas pessoas podem endossar novamente a letra.
53
Ou seja, a matéria legal relativa ao endosso de duplicatas deve ser buscada, também, na Lei
Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas promissórias e no Decreto n. 2.044/1908.
Assim, a Lei Uniforme de Genebra sobre Letra de Câmbio e Notas Promissória, no seu
art. 15, primeira parte, dita o seguinte:
Art. 15 - O endossante, salvo cláusula em contrário, é garante tanto da
aceitaçãocomo do pagamento da letra. (grifo nosso)
Ou seja, em uma primeira leitura, pode-se depreender que, em regra, o endossante
responde subsidiariamente pela aceitação e pagamento do título. Dessa forma, se o sacado-
comprador não pagar o título, poderá o portador agir regressivamente contra o sacador e os
endossantes.
Nas palavras de Fran Martins114
:
(...) essa garantia de pagamento assumida pelo comprador ao se tornar aceitante do
título – ou seja, quando lança sua assinatura no mesmo, subscrevendo declaração de
reconhecimento da duplicata – todas as pessoas que assinam a duplicata, seja o
sacador ou aqueles outros a quem o título foi transferido por endosso e que o
transferiram a outras pessoas, todo eles respondem perante o portador, pelo
pagamento da duplicata, em face de estar esse título amparado pelos preceitos do
direito cambiário. (grifo nosso)
Porém, o referido dispositivo legal faculta às partes que realizarão a transferência
estabelecer cláusula que exima o endossante da responsabilidade pelo pagamento da dívida,
tanto em relação ao sujeito a quem o título foi transferido, quanto às outras pessoas para as
quais este, posteriormente, endossará o crédito115
.
No entanto, o art. 9º, da Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas
promissórias, faz uma exceção a essa possibilidade do endossante se eximir da garantia do
pagamento da dívida, a saber:
Art. 9º - O sacador e garante tanto da aceitação como do pagamento de letra.
O sacador pode exonerar-se da garantia da aceitação; toda e qualquer cláusula pela
qual ele se exonera da garantia do pagamento considera-se como não escrita.
(grifo nosso)
114
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 447. 115
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 447.
54
Dessa forma, pode-se perceber que apenas os obrigados-endossantes intermediários
podem estipular cláusula que exima sua responsabilidade quanto ao pagamento do título.
Portanto, como bem assevera Fran Martins, o sacador, pondo o título em circulação
(isto é, endossando-o, mesmo antes do aceite) assume sempre a obrigação subsidiária de
pagar, não podendo, jamais, eximir-se dessa responsabilidade116
117
.
Dessa maneira, qualquer cláusula que afaste a responsabilidade do sacador-endossante
pelo pagamento da duplicata deverá ser considerada como não escrita.
Diante disso, em poucas palavras, a responsabilidade subsidiária do endossante pelo
pagamento do título é obrigatória quando é o próprio sacador quem o transfere. Todavia,
quando o título é transferido por um dos endossantes intermediários, pode-se estabelecer
cláusula que o exonera da garantia do pagamento.
A primeira situação gera grandes discussões quanto sua aplicabilidade na operação de
factoring, como se verá no próximo subitem.
5.2.1.1 A responsabilidade do endossante-sacador pelo pagamento do título na operação de
factoring
À luz apenas da legislação cambiária, o tema da responsabilidade do endossante pelo
pagamento do título parece não apresentar grandes preocupações.
No entanto, quando se transporta o instituto do endosso para dentro da operação de
factoring, o tema se torna alvo de grandes controvérsias.
Isso porque, se se tomar apenas como referência a lei cambiária, o factoring sempre
operará de maneira pro solvendo. Ou seja, sempre haverá direito de regresso do endossatário-
faturizador contra o endossante-sacador-faturizado, em caso de insolvência do devedor.
Na cessão de crédito, a regra é não haver essa garantia. Porém, como o factoring
trabalha, sobretudo, com a compra e venda de duplicatas, o endosso se torna indispensável, já
que a legislação especial determina que seja o único meio de transferência para este título.
Parte da doutrina se debruçou no sentido de estudar esse impasse.
Dentre os doutrinadores, Fran Martins é o que tem o pensamento mais rígido sobre o
tema. Para ele, é da natureza da operação de factoring o faturizador arcar o risco do
116
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 447. 117
Nesse mesmo sentido assevera Mauro Delphim Moraes: PEREIRA JÚNIOR, Antonio Jorge (coord). JABUR, Gilberto Haddad (coord). Direito dos contratos. São Paulo, Quartier Latin, 2006, p. 427-428.
55
inadimplemento por parte do devedor, sendo que o instituto do endosso, que deve ser
respeitado, desnatura essa característica, quando da negociação da duplicata118
.
Vale apresentar com mais detalhes essa posição.
Tal doutrinador inicia sua crítica apontando que o art. 2º da Lei n. 5.474/1968 (Lei da
Duplicata)119
determina que os créditos decorrentes das vendas de mercadorias feitas a prazo
somente poderão ser cobrados através de duplicatas. Por conseguinte, esses créditos deverão
ser cedidos via endosso.
Contudo, como já visto no subitem 5.2.1, o art. 9º da Lei Uniforme de Genebra sobre
letras de câmbio e notas promissórias determina que, quando o endossante for o próprio
sacador, no caso da duplicata o vendedor, qualquer cláusula que o exima da responsabilidade
pelo pagamento do título é considerada nula.
Assim, como a esmagadora parcela das duplicatas endossadas é emitida pelo próprio
endossante-faturizado, não haveria como este se eximir da responsabilidade pelo não
pagamento da dívida pelo devedor. Dessa forma, estaria desnaturada a operação como sendo
típica do factoring.
Nas palavras de Fran Martins120
:
Nessas condições, sendo característica essencial do contrato de faturização a isenção
do faturizado da responsabilidade de pagar o crédito cedido caso o comprador das
mercadorias não o faça – o que torna o contrato de factoring uma operação de risco,
portanto especulativa, e não uma operação de crédito, como são as operações
bancárias.
`
Para ele, a solução desse problema, com a consequente regularização do contrato de
factoring, seria a modificação do art. 2º da Lei das Duplicatas a fim de permitir a utilização de
outros títulos de crédito, como a letra de câmbio, como instrumento de cobrança de vendas a
prazo. Dessa forma, seria afastada a aplicabilidade do art. 9º da Lei Uniforme de Genebra
sobre letras de câmbio e notas promissórias, podendo-se estabelecer regra de isenção da
responsabilidade do vendedor pelo não pagamento da duplicata por parte do comprador.
No entanto, esse posicionamento é radical e não parece o mais acertado.
118
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 427-430. 119
Art. 2º No ato da emissão da fatura, dela poderá ser extraída uma duplicata para circulação como efeito comercial, não sendo admitida qualquer outra espécie de título de crédito para documentar o saque do vendedor pela importância faturada ao comprador. 120
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 430.
56
Como já dito, o contrato de factoring é um contrato atípico. Todavia, embora se utilize
de diversos institutos legais, possui suas características próprias. Dessa feita, é preciso
adequar os institutos para a consecução de seu fim contratual.
Nesse sentido, esclarece Arnaldo Rizzardo121
:
Nesta linha, impossível o endosso utilizado para a livre circulação de títulos, e
manter seu significado e o tratamento previsto em leis especiais. Já que um
mecanismo jurídico diferente apareceu, não se pode vê-lo como uma sombra, ou
simbiose, ou remodulação de institutos que possuem individualidade própria.
Dessa forma, como expresso de maneira de detalhada no subitem 3.3.1 deste trabalho,
a natureza jurídica do factoring tem predominância da cessão de crédito. Diante disso, as
regras atinentes a este instituto devem mitigar o disposto na legislação cambiária,
especialmente no que concerne à restrição da isenção de responsabilidade do endossante-
faturizado pela insolvência do devedor.
Marcelo Moraes Tavares, apresentando essa posição, cita os seguintes de dizeres de
Antônio Carlos Donini122
:
Embora não seja o único instituto utilizado, pois, para a tradição do título (duplicata
ou cheque) indispensável o endosso, onde se aplica a Lei Uniforme, a cessão de
crédito é a figura jurídica que mais se aproxima do contrato de factoring. (...) Sendo
o factoring ligado ao crédito que se constitui em bem de caráter patrimonial
suscetível de transferência, essa transferência se faz através da cessão de
crédito,sendo o endosso utilizado como instrumento para a tradição dos títulos
cambiais,objeto da cessão.
Portanto, a interpretação mais acertada é no sentido da mitigação do disposto no art. 9º
e 15 da Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas promissórias, prevalecendo o
que dispõe o Código Civil sobre a responsabilidade do cedente quanto à solvência do
devedor.
Ou seja, o endossante-faturizado somente garantirá o pagamento da duplicata em caso
de inadimplemento se houver cláusula expressa nesse sentido. Caso contrário, a transferência
terá caráter pro soluto.
É o que diz César Fiuza123
:
121
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 104-105. 122
TAVARES, Marcelo Moraes. A atividade de factoring e a responsabilidade do faturizado na transferência dos títulos por endosso. In: Revista Faculdade Arnaldo Janssen Direito, v. 3, n. 3, janeiro a dezembro de 2011.
57
É que na faturização opera-se verdadeira cessão de crédito. Por outros termos, se o
devedor do título não pagá-lo, tanto pior para o faturizador, que não poderá regressar
contra o faturizado, a não ser que este, expressamente, tenha assumido tal
responsabilidade, seja endossando o título, seja avalizando-o.
Assim afirma, mais uma vez, Antonio Carlos Donini124
:
Para o endossatário-faturizador responsabilizar o endossante-sacador-faturizado pela
insolvência do devedor em razão do título negociado, indispensável esteja essa
condição estipulada, por escrito, no contrato de factoring (art. 296 do Código Civil),
independentemente do disposto no art. 15 da Lei Uniforme de Genebra, face à
natureza contratual do factoring.
Em síntese, deve-se levar em consideração que os institutos do endosso e da cessão de
crédito são, sem dúvida, distintos125
, mas devem ser conciliados de maneira a atingir a
finalidade a que se destina o contrato de factoring.
Por conseguinte, na compra de títulos de crédito, como a duplicata, tanto o endosso
como a cessão de crédito estarão presentes e, fazendo-se uma interpretação legal coerente
desses institutos, pode-se estabelecer a responsabilidade do endossante-sacador-faturizado
pelo pagamento da dívida, desde que expressamente convencionado. Na ausência de
convenção, não haverá tal garantia.
123
FIUZA, César. Direito Civil: curso completo. – 6. ed. rev., atual. e ampl. De acordo com o Código Civil de 2002. – Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 575. 124
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 47. 125
Tal distinção para Rubens Requião: (...) São os dois institutos, de fato, inconfundíveis, pois o endosso é ato unilateral de declaração de vontade que impõe forma escrita, ao passa que a cessão é um contrato bilateral, que pode concluir-se de qualquer forma. Em seus efeitos o endosso confere direitos autônomos, enquanto da cessão surgem direitos derivados. No endosso, a nulidade de um não afeta os endossos posteriores, devido à autonomia das relações cambiárias. Na cessão, a nulidade de um acarreta a das posteriores. Na cessão o devedor pode opor ao cessionário a mesma defesa que teria contra o cedente. O devedor, segundo o art. 1072 do Código Civil de 1916 (art. 294 do Cód. Civ. de 2002), pode opor tanto ao cessionário como ao cedente as exceções que lhe competirem no momento em que tiver conhecimento da cessão. No endosso, não: o endossatário não pode opor exceção senão diretamente contra o endossante que lhe transferiu o título. REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial, 2º volume. – 25. ed. rev. e atual. por Rubens Edmundo Requião. – São Paulo: Saraiva, 2007, p. 419.
58
59
6 O DIREITO DE REGRESSO
No presente capítulo, abordar-se-á a questão que envolve as cláusulas pro soluto e pro
solvendo ou, mais especificamente, a existência ou não do direito de regresso do faturizador
contra o faturizado no caso de insolvência do devedor.
Para uma melhor organização e coerência, optou-se por dividir o capítulo em subitens
que tratam, respectivamente, das críticas à doutrina majoritária, da jurisprudência e da
validade da cláusula pro solvendo no contrato de factoring.
Isso porque, como se verá, a maior parte da doutrina e da jurisprudência defende que o
factoring deva assumir o risco pelo inadimplemento do devedor. Porém, na contramão deste
entendimento, no último subitem, defender-se-á sistematicamente a possibilidade de inserção
da cláusula pro solvendo no contrato de factoring.
6.1 Doutrina majoritária: críticas
Como já adiantado, a doutrina, majoritariamente, entende que a operação de factoring,
essencialmente, possui caráter pro soluto126
. Dessa forma, o faturizador sempre assumiria os
riscos pelo inadimplemento do devedor.
No entanto, como bem afirma Luiz Rodrigo Lemmi, a esmagadora maioria dos que
defendem tal posição o fazem com pouca ou nenhuma fundamentação127
.
Não obstante esse dado, cabe aqui organizar da melhor maneira possível a posição dos
que defendem que o factoring pode operar somente de maneira pro soluto.
Fran Martins, alinhado a esse entendimento, destaca:
126
Nesse sentido: CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit.; COELHO, Fábio Ulhoa. Op., cit. p. 162-163; DINIZ, Maria Helena. Op., cit. p. 76-77 e 88; GOMES, Orlando. Op., cit. p. 580; MARTINS, Fran. Op., cit. p. 429; BULGARELLI, Waldirio. Op., cit. p. 541; WALD, Arnoldo. Op., cit. p. 260; RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p.119-123; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Inconstitucionalidade do art. 58 da Lei 9.532/97 que assemelha as empresas de factoring a instituições financeiras. In: Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, vol. 3, p. 11, Set\1998 DTR\376; SALAMACHA, Consuelo Taques Ferreira. Op., cit. p. 79; DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 21; DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 127; FERREIRA, Carlos Renato de Azevedo. Op., cit. p. 68-94; LOPES, Maria Elizabete Vilaça. Op., cit. p. 58; FAZZIO JUNIOR, Waldo. Op., cit. p. 163; BITTAR, Carlos Alberto. Op., cit. p. 22. 127
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 68.
60
(...) é princípio da essência do contrato de faturização o fato de não responder o
faturizado, ao ceder os seus créditos, pela solvência do devedor, no caso o
comprador, correndo, assim, por conta da empresa de faturização o risco do não
recebimento já que a mesma não pode se voltar contra o faturizado para que esse
satisfaça a obrigação não cumprida pelo comprador.
Quando se diz que é da essência do contrato de faturização operar através da cessão
pro soluto, expressão comumente utilizada pelos doutrinadores já citados, deve-se buscar os
antecedentes históricos do instituto.
Como já exposto no item 2.1 deste trabalho, tais antecedentes remontam os
descobrimentos marítimos, no século XVI. Assim, com a expansão do comércio ultramarino,
surge a figura do factor, cujo papel era o de vender as mercadorias produzidas na metrópole,
geralmente produtos têxteis, antecipando os valores das mercadorias ao comerciante e
assumindo o risco pelas vendas.
Em se falando do panorama histórico do instituto no Brasil, como dito no item 2.2, o
factoring começa a ser praticado na década de 1980, sendo que em 1982 foi criada a ANFAC
(Associação Nacional das Empresas de Fomento Comercial), órgão associativo representativo
do setor.
No início, os empresários do setor e a própria ANFAC defendiam a operação de
factoring sem a garantia da solvência do devedor pelo faturizado e procuravam reforçar a
importância dos serviços prestados pela empresa faturizadora.
Todavia, esse modelo foi defendido em um contexto de grande desconhecimento do
instituto no Brasil, como forma, muitas vezes, de reforçar a licitude da operação. Período esse
em que foi editada a polêmica Circular 703/82 do Banco Central do Brasil, e no qual o
factoring era confundido com a agiotagem e com as instituições financeiras.
É nesse sentido a lição de Antonio Carlos Donini128
:
Antes mesmo da Circular 703 expedida pelo Banco Central do Brasil, em
16.06.1982, proibindo a prática do factoring no país e depois revogada pelo mesmo
órgão através da Circular 1.359, de 30.09.1988, induvidoso que a operação de
factoring, em face do desconhecimento geral, confundia-se com a agiotagem e atos
exclusivos das instituições financeiras.
As empresas de factoring, então, através de seus sindicatos e associações, na
tentativa de demonstrar à sociedade e, principalmente, às autoridades a importante
função social que exerciam junto às pequenas e médias empresas, procuraram
salientar a prestação de serviços por ela desenvolvidas, para afastar, inegavelmente,
a indesejada comparação com práticas de agiotagem e atos característicos dos
bancos.
128
DONINI, Antonio Carlos. Factoring: regulação, funções desempenhadas, modalidade e o direito de regresso. Revista dos Tribunais, v. 802, p. 727, ago 2002.
61
E, nesse clima, apressou-se o factor também em assumir os riscos pela insolvência
do devedor. (...)
Assim também defende Luiz Lemos Leite129
:
O direito de regresso, que, durante muito tempo, constituiu-se um tabu, prevaleceu
nessas operações apenas em função de alguns preconceitos surgidos, que se
cristalizaram naquela ocasião, por ainda não conhecer suficientemente da matéria, a
que estigmatizaram o factoring como atividade não regular no Sistema Financeiro
Nacional, que dependeria de regulamentação do Conselho Monetário Nacional,
Circular nº 703, da Diretoria do Banco Central, de 16-6-82, posteriormente revogada
pela Circular nº 1.359, de 30-9-88.
Porém, com a liberação da atividade, através da Circular 1.359/88 do Banco Central
do Brasil, e seu consequente desenvolvimento, grande parte dos contratos de factoring
passaram a levar a cláusula pro solvendo. Isso porque não existe, como visto no capítulo
anterior, impedimento legal para isto.
Tanto é verdade essa evolução do factoring no país, que Luiz Lemos Leite, presidente
e fundador da ANFAC, diante do V Congresso Brasileiro de Factoring, realizado por esta
associação em 1995, alterou sua posição inicial, admitindo a possibilidade de se estabelecer a
cláusula pro solvendo130
.
Aliás, tal evolução não descaracteriza a operação do factoring, sendo que, como se
verá no subitem 6.3.3, em muitos países ela pode ser realizada tanto de maneira pro soluto
quanto pro solvendo.
Diante dessa síntese histórica, mostra-se incabível a afirmação de que a cláusula pro
soluto é essencial ao contrato de factoring, sendo natural que os institutos jurídicos sofram
algumas alterações ao longo do tempo, amoldando-se ao contexto e necessidades sociais e
econômicas.
Outro argumento utilizado pela doutrina é de que a assunção do risco, pelo faturizador,
do inadimplemento do devedor é um dos elementos que diferencia o factoring da atividade
das instituições financeiras e da operação de desconto bancário131
.
129
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 231. 130
A mudança de posicionamento está expressa no prefácio à 7ª edição do livro do autor: LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. xxvi. 131
Dentre os doutrinadores que adotam essa posição estão: MARTINS, Fran. Op., cit. p. 430; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Op., cit. p. 11; SALAMACHA, Consuelo Taques Ferreira. Op., cit. p. 79; DE LUCCA, Newton. Op., cit. p. 49; LOPES, Maria Elizabete Vilaça. Op., cit. p. 58; FAZZIO JUNIOR, Waldo. Op., cit. p. 167.
62
Como já discutido no item 4.2, diante da exegese do art. 17 da Lei 4.595/64, o que
diferencia a atividade do factoring da atividade financeira é que a última não capta recurso de
terceiros, trabalhando apenas com capital próprio.
Além dessa foram destacadas outras diferenças, como: o banco é um intermediário do
crédito, realizando operações ativas (realização de empréstimos, por exemplo) e passivas
(recebimento de depósitos), remunera-se com a cobrança de juros e do spread bancário.
Insistindo, ainda, no ponto que a ausência do referido direito de regresso diferencia o
factoring das instituições financeiras, afirma Fran Martins que (...) as empresas de faturização
se distinguem das instituições financeiras porque estas não realizam operações especulativas
e sim operações de crédito, enquanto as empresas de faturização realizam operações de
risco132
.
Esse argumento merece ser reconsiderado, já que o simples fato do contrato de
factoring trazer a cláusula pro solvendo não elimina o risco da operação, apesar de minorá-lo.
Isso porque, se o devedor não pagar a dívida, não há garantia que o faturizado o fará. Além do
que não há nenhuma disposição legal que obrigue o indivíduo correr risco em seus
contratos133
.
Além do mais, a operação de factoring, relativa à compra de recebíveis, é uma
operação de crédito, já que há a troca de um bem presente por um bem futuro. Apesar disso,
pelos motivos já expostos, não constitui atividade financeira134
.
Ademais, a afirmação de que a característica pro soluto do factoring o distingue do
desconto bancário foi discutida no item 4.3 deste trabalho. Naquela ocasião foi dito que o
desconto bancário se distingue da operação de factoring por diversos motivos, como: os
recursos utilizados na operação de desconto bancário, por ser realizado através de instituição
financeira, são captados de terceiros; no factoring a avaliação do risco e a definição de
compra levam em conta a capacidade econômica do devedor, enquanto no desconto bancário
a capacidade econômica do cliente descontário135
e, no factoring, junto com a operação de
compra de créditos pode existir de prestação de serviços variados ao cliente.
Adotando outros argumentos, Arnaldo Rizzardo sustenta a obrigatoriedade da cessão
pro soluto no factoring, apontando, também, que a empresa faturizadora possui a faculdade de
132
MARTINS, Fran. Op., cit. p. 428. 133
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 70-71. 134
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 34-39. 135
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 167.
63
escolher os créditos a serem adquiridos e que a sua remuneração estaria baseada na assunção
do risco da insolvência do devedor136
.
Quanto a esse posicionamento, fica claro que o fato de a empresa de factoring poder
escolher os créditos a serem adquiridos, com o acompanhamento dos comprovantes de
entrega da mercadoria, não afasta o risco da operação.
Além do que, obrigar a empresa de factoring a adquirir a globalidade dos créditos do
faturizado seria uma aberração jurídica. Assim, ela não pode ser obrigada a comprar, por
exemplo, duplicatas emitidas contra um sacado sabidamente insolvente na praça. Isso seria
um desrespeito à liberdade contratual e obrigaria o empresário a causar um dano a si próprio.
Quanto à remuneração do factoring, parece absurdo afirmar que ela seria
correspondente ao risco assumido na operação. Isso porque essa remuneração, na realidade, é
um preço, ajustado pelas partes, pela compra a vista dos créditos gerados pelas vendas ou
serviços realizados a prazo pela empresa-cliente137
. O risco inerente à operação influencia
nesse preço, mas não é o seu determinante.
Ou seja, é evidente que o preço estipulado pela compra dos créditos sob a cessão pro
solvendo será menor do que sob a pro soluto, mas seria absurdo dizer que o factoring é
remunerado exclusivamente pelo risco que corre.
Mais além, Rogério Alessandre de Oliveira Castro defende, em regra, a
obrigatoriedade da cláusula pro soluto no contrato de factoring, já que sua operação
pressupõe uma prestação contínua de serviços ao faturizado, havendo uma parceria entre as
partes para gestão do negócio da empresa cliente. Dessa forma, seria uma decorrência lógica a
assunção do risco por parte do factoring138
.
No entanto, como já visto no subitem 3.3.1 deste trabalho, parece mais acertado o
entendimento de que a compra de crédito pode estar conjugada com a prestação de serviços à
empresa-cliente. Todavia, ela é uma faculdade e não obrigatoriedade.
Além do que, mesmo que o factoring preste serviços relativos ao auxílio ao
gerenciamento da empresa-faturizada, é difícil enxergar o porquê ele deve assumir os riscos
pela solvência dos devedores dos créditos que adquiriu.
Tal parceria, sem dúvida alguma, terá o papel fundamental de melhorar e reduzir os
custos do negócio e, para isso, o faturizador não precisa, obrigatoriamente, absorver os riscos
do possível não pagamento dos créditos adquiridos. Lembrando que mesmo uma empresa
136
RIZZARDO, Arnaldo. Op., cit. p. 119-123. 137
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 63-64. 138
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 145.
64
bem gerida, que não necessite de tal apoio, nunca conseguiria se eximir dos riscos do seu
negócio, embora possa minorá-los.
Por fim, vale mencionar que alguns autores, como Fábio Konder Comparato139
e
Gonçalo Ivens Ferraz da Cunha e Sá140
, embora defendam que o factoring opere, em regra, de
maneira pro soluto, afirmam a possibilidade de se receber os créditos de maneira pro solvendo
excepcionalmente.
Além deles, Rogério Alessandre de Oliveira Castro sustenta a possibilidade da
utilização esporádica da cláusula „pro solvendo‟, principalmente no início da relação,
quando ainda não houve tempo para o empresário de factoring se familiarizar com o negócio
do seu cliente141
.
Para aprofundar o tema, far-se-á uma análise jurisprudencial sobre a questão no
próximo item.
6.2 Jurisprudência
Como já adiantado, a jurisprudência majoritária defende a nulidade da cláusula pro
solvendo no contrato de factoring. No entanto, diversos julgados a consideram cabível.
Dessa forma, far-se-á neste item um breve apanhado dos julgados mais recentes do
Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre o tema.
6.2.1 Jurisprudência contrária à cláusula pro solvendo
Como se depreenderá dos julgados que serão apresentados, a jurisprudência que
defende a nulidade da cláusula pro solvendo, basicamente, o faz seguindo os argumentos da
doutrina, já expostos no item 6.1, os quais já foram devidamente criticados.
Os principais argumentos são:
a) é da essência do factoring a assunção do risco do inadimplemento do devedor,
sendo o factoring um contrato de risco;
139
COMPARATO, Fábio Konder. Op., cit. p. 60. 140
SÁ, Gonçalo Ivens Ferraz da Cunha e. O “factoring” e a nova constituição. Revista de Direito Mercantil, Revista dos Tribunais. São Paulo, SP, v. 73, p. 100-119, p. 105, jan./mar. 1989. 141
CASTRO, Rogério Alessandre de Oliveira. Op., cit. p. 145.
65
b) a não garantia do cedente-faturizado pelo inadimplemento do crédito é o que
diferencia a atividade do factoring da atividade das instituições financeiras e da operação de
desconto bancário ou mútuo;
c) o risco corresponde à remuneração, estando inserido no custo da operação;
d) o factoring presta serviços de orientação e assessoramento ao cliente-faturizado, o
que justifica a inexistência de regresso.
Assim, é interessante destacar algumas ementas e trechos dos casos mais interessantes.
Faz-se interessante iniciar a análise pela jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça.
A decisão mais recente é o AgRg. noREsp.nº 1.305.454/SP142
:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FOMENTO MERCANTIL -
FACTORING. RESPONSABILIDADE DO CEDENTE.
1.- Na linha dos últimos precedentes desta Corte o faturizado não pode
ser demandado regressivamente pelo pagamento da dívida.
2.- Agravo Regimental a que se nega provimento.
(grifo nosso)
No teor do voto, o julgado não traz inovações, somente jurisprudência e afirma que o
entendimento do STJ é contrário ao direito de regresso diante da insolvência do devedor.
Além dessa, é interessante citar a ementa do AgRg no Agravo de Instrumento nº
1.071.538/SP143
:
AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO DECLARATÓRIA - NULIDADE DE NOTAS
PROMISSÓRIAS - EMPRESA DE FACTORING – REALIZAÇÃO DE
EMPRÉSTIMOS E DE DESCONTO DE TÍTULOS COM GARANTIA DE
DIREITO DE REGRESSO - IMPOSSIBILIDADE – PRÁTICA PRIVATIVA
DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS INTEGRANTES DO SISTEMA
FINANCEIRO NACIONAL - PRECEDENTES DESTA CORTE - INCIDÊNCIA
DO ENUNCIADO N. 83 DA SÚMULA/STJ - ADEMAIS, ENTENDIMENTO
OBTIDO DA ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - REEXAME
DE PROVAS - ÓBICE DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ -
MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA - AGRAVO IMPROVIDO. (grifo
nosso)
142
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n° 1.305.454 - sp (2012/0010858-3). Agravante: Trendbank S/A Banco de Fomento. Agravado: Pedro Jose Fanelli e outro. Relator: Ministro Sidnei Beneti. 14 de agosto de 2012. 143
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 1.071.538 - sp (2008/0143492-9). Agravante: Pontual Factoring Sociedade de Fomento Comercial Ltda. Agravado: Flexa Retentores Indústria e Comércio Ltda. Relator: Ministro Massami Uyeda. 03 de fevereiro de 2009.
66
Como se pode ver, o Tribunal justificou a impossibilidade do direito de regresso
argumentando que seria prática privativa de instituição financeira.
Vale destacar um trecho do voto deste mesmo julgado:
Houve, portanto, uma cândida admissão de que a faturizadora estava realizando
uma operação de descontos de títulos, já garantindo o direito de regresso
contra a cedente, o que era não só inadmissível, como ilegal.
Como é de entendimento pacífico na jurisprudência, é vedada às empresas de
'factoring' a realização de simples operações de crédito direto, como o mútuo em
dinheiro. Essas operações de crédito, como atividade empresarial, são restritas às
instituições financeiras regulares autorizadas pelo Banco Central.
É vedado também a elas realizar descontos de títulos, podendo apenas adquiri-
los com deságio, caracterizando-se sua atividade como uma operação de risco,
não permitindo exigir garantia de pagamento de forma regressiva. (grifo nosso)
Assim, como já discutido no item anterior, há uma confusão entre a operação de
desconto e a operação de factoring, além do argumento de que o risco é inerente à
atividade144
.
Passando-se à jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, cumpre destacar, também, as ementas e trechos de votos mais interessantes.
O argumento básico dessas decisões, também utilizado nos acórdãos já apresentados, é
o de que assunção do risco do inadimplemento do devedor é da essência do contrato de
factoring.
Nesse sentido, a seguinte ementa, em sede recurso da Apelação Cível nº 0015491-
75.2009.8.26.0020 da Comarca de São Paulo145
146
:
144
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 119.705/RS (97/0010587-3). Recorrente: Organizações Lima Administração e Assessoria Financeira Ltda. Recorrido: Irmãos Thonnigs e Cia Ltda e outro. Relator: Ministro Waldemar Zveiter. 29 de junho de 1998. 145
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0015491-75.2009.8.26.0020, da Comarca de São Paulo. Apelante: AR Assessoria Planejamento e Fomento Comercial Ltda. Apelada: Ulisses Seraphim Marques Reciclaveis ME (TermoplasticosCanaa). Relator: Sérgio Gomes. São Paulo, 18 de junho de 2013. 146
Nesse mesmo sentido: Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0009917-60.2010.8.26.0077, da Comarca de Birigüi. Apelante: Marcio Rodrigo Zago ME. Apelada: Mbr Factoring Fomento Mercantil Ltda. Relator: Tasso Duarte de Melo. São Paulo, 26 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0021241-62.2012.8.26.0114, da Comarca de Campinas. Apelante: Montreal Tecnologia de Ativos Ltda. Apelada: M F Zacharias Comércio de Materiais de Construção ME. Relator: Paulo Roberto de Santana. São Paulo, 19 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 9122216-92.2009.8.26.0000, da Comarca de São Paulo. Apelante: KSQ Factoring Fomento Mercantil Ltda. Apelada: NB Com Importação e Exportação de Produtos Odontológicos Ltda. Relator: Gil Coelho. São Paulo, 20 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de
67
APELAÇÃO AÇÃO DE COBRANÇA DUPLICATAS - SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA.
1. FOMENTO MERCANTIL Regresso contra o faturizado - Inadmissibilidade
Faturizado que responde unicamente pela eventual inexistência dos títulos
adquiridos pelo faturizador Inadimplemento que se insere no risco da atividade
do faturizado, que adquire títulos com deságio.
SENTENÇA MANTIDA RECURSO DESPROVIDO. (grifo nosso)
Além disso, alguns acórdãos trazem a justificativa de que a inexistência de
responsabilidade do cedente-faturizado pelo pagamento da dívida é o que diferencia a
atividade do factoring com a atividade das instituições financeiras e de operações como a de
desconto bancário e de mútuo.
Com esse teor, o Agravo de Instrumento nº0048420-85.2013.8.26.0000, da Comarca
de Presidente Prudente147148
:
São Paulo. Apelação cível n° 0015491-75.2009.8.26.0020, da Comarca de São Paulo. Apelante: AR Assessoria Planejamento e Fomento Comercial Ltda. Apelada: Ulisses Seraphim Marques Reciclaveis ME (TermoplasticosCanaa). Relator: Sérgio Gomes. São Paulo, 18 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de instrumento n° 0271517-67.2012.8.26.0000, da Comarca de São Paulo. Agravante: Ivantídio Guimarães Mendes. Agravada: Opinião S/A. Relator: Araldo Telles. São Paulo, 11 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0009441-26.2012.8.26.0344, da Comarca de Marília. Apelante: Kiuti Alimentos Ltda e Alcides Spressão Junior. Apelada: Centro Invest Fomento Mercantil Ltda. Relator: Sergio Gomes. São Paulo, 4 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0000233-34.2009.8.26.0114, da Comarca de Campinas. Apelante: Quarter Serviços Ltda., Ana Maria Esqueapatti Sandrin e Carlos Eduardo Fernandes Sandrin. Apelada: Credicamp Fomento Mercantil Ltda. Relator: Vicentini Barroso. São Paulo, 14 de maio de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0042962-29.2009.8.26.0000, da Comarca de Jaguariúna. Apelante: Zfac Comercial Ltda. Apelada: Topic Industria Quimica Ltda, João Roberto Fornereto e Celso Lemi Fornereto. Relator: Cardoso Neto. São Paulo, 6 de março de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0111596-49.2006.8.26.0011, da Comarca de São Paulo. Apelante: Primex Indústria e Comércio Ltda e outro. Apelada: FC Assessoria e Participações em Negócios Ltda. Relator: Virgilio de Oliveira Junior. São Paulo, 28 de janeiro de 2013. 147
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº 0048420-85.2013.8.26.0000, da Comarca de Presidente Prudente. Agravante: Terezinha Urue de Souza, Orlando Batista de Souza e Suzater Industria Comercio e Construtora Ltda. Apelada: Ortega Fomento Mercantil Ltda. Relator: J. B. Franco de Godoi. São Paulo, 5 de junho de 2013. 148
Nesse sentido: Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0040272-97.2010.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos. Apelante: Teckromo Comercio de Prestação de Serviços - ME. Apelada: De Paula Factoring e Fomento Mercantil Ltda. Relator: Sérgio Shimura. São Paulo, 26 de junho 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº 0048420-85.2013.8.26.0000, da Comarca de Presidente Prudente. Agravante: Terezinha Urue de Souza, Orlando Batista de Souza e Suzater Industria Comercio e Construtora Ltda. Apelada: Ortega Fomento Mercantil Ltda. Relator: J. B. Franco de Godoi. São Paulo, 5 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0831790-19.2007.8.26.0003, da Comarca de São Paulo. Apelante: Aldo Dallemule e Mauro Guimarães Souto. Apelada: Kapital Factoring Sociedade de Fomento Comercial Ltda. Relator: Afonso Bráz. São Paulo, 10 de abril de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0000900-29.2011.8.26.0153, da Comarca de Cravinhos. Apelante: Coimbra & Ribeiro Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Caravel – Agencia de Viagens e Turismo Ltda - ME e Util Industria e Comercio de Produtos Plasticos Ltda. Relator: Heraldo de Oliveira. São Paulo, 7 de maio de 2013.
68
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE Execução por título extrajudicial
Duplicatas mercantis Pretensão da empresa de 'factoring' de cobrar a faturizada em
razão do inadimplemento dos títulos - Inadmissibilidade – Negócio jurídico que
transfere o risco do inadimplemento das operações Transferência do risco que
mascara uma operação de mútuo com cobrança de juros abusivos Endosso
translativo quando o título está vinculado a operação de 'factoring' não
responsabilizando a faturizada pela solvência Cláusula contratual abusiva Ausência
de prova de que os títulos foram emitidos sem lastro. Eventual direito de regresso
que deve ser feito através de ação própria Recurso provido. (grifo nosso)
Faz-se mister destacar, também, a seguinte ementa da Apelação nº 0040272-
97.2010.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos, e trecho de sua decisão149
:
AÇÃO MONITÓRIA - CONTRATO DE “FACTORING” INEXISTÊNCIA DE
DIREITO DE REGRESSO CONTRA A FATURIZADA. No contrato de
“factoring”, a empresa faturizada responde pela existência do crédito, mas não por
insolvência do devedor primitivo - Instrumento de confissão de dívida, assim como
as notas promissórias a ele vinculadas, que não podem subsistir - O contrato de
desconto constitui atividade privativa das instituições financeiras integrantes do
Sistema Financeiro Nacional, que ficam sob controle do Banco Central do
Brasil, situação em que não se insere a empresa de “factoring”. Pedido da autora
que não encontra previsão no ordenamento jurídico Impossibilidade jurídica do
pedido - DECRETO DE CARÊNCIA DA AÇÃO, PREJUDICADO O RECURSO
DAS RÉS. (grifo nosso)
Trecho da decisão:
Como se vê, o valor cobrado decorre de contrato de desconto, atividade
privativa das instituições financeiras integrantes do Sistema Financeiro
Nacional, controlada pelo Banco Central do Brasil, o que é vedado às empresas
de “factoring”.
Assim, a autora, não conseguindo receber dos sacados o valor, objeto do contrato de
factoring, não pode se voltar contra a faturizada, pois constitui risco de sua própria
atividade.
(...)
Possibilidade de as partes estabelecerem as cláusulas e condições que lhes forem
convenientes - Impossibilidade, todavia, de se revogarem as cláusulas essenciais,
dentre elas a que atribui ao faturizador os riscos inerentes ao negócio. (grifo
nosso)
Ademais, outros julgados também trazem o argumento de que o risco corresponde à
remuneração recebida pelo factoring, como é o caso da Apelação nº 0061013-
95.2009.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos150
151
:
149
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0040272-97.2010.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos. Apelante: Teckromo Comercio de Prestação de Serviços - ME. Apelada: De Paula Factoring e Fomento Mercantil Ltda. Relator: Sérgio Shimura. São Paulo, 26 de junho 2013. 150
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0061013-95.2009.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos. Apelante: Cumbica Factoring Fomento Mercantil Ltda. Apelada:
69
*AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM COBRANÇA.
Contrato de fomento mercantil. Inadimplemento dos títulos. Faturizadora assume
os riscos da cobrança e, eventualmente, da insolvência do devedor sacado, em
razão de ágio que recebe a título de remuneração pela operação. Ausência de
vício ou fraude nos títulos. Inexistente o direito de regresso pelo inadimplemento do
sacado. Sentença mantida pelos próprios fundamentos. Art. 252 do Regimento
Interno do E. Tribunal. Recurso improvido.* (grifo nosso)
Por fim, pode-se encontrar em alguns acórdãos o argumento de que, por a empresa de
factoring ser parceira e acompanhar os negócios de seus clientes, não se justifica a
manutenção do direito de regresso.
É interessante transcrever o seguinte trecho do voto na Apelação nº 0040272-
97.2010.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos152153
:
Como dito, em sendo a atividade da “factoring” exatamente prestar serviços de
assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito e seleção de riscos, descabido
se voltar contra a empresa faturizada para receber algo que já tinha (ou deveria ter)
conhecimento do risco em face dos sacados.
Thomazini Express Ltda ME e Marco Antonio de Lima. Relator: Erson T. Oliveira. São Paulo, 3 de abril de 2013. 151
Nesse sentido: Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0016477-85.2011.8.26.0302, da Comarca de Jaú. Apelante: Tia Noca Indústria e Comércio de Calçados Ltda - ME. Apelada: Jaucenter Tecnologia e Fomento Mercantil Ltda. Relator: Melo Colombi. São Paulo, 19 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0831790-19.2007.8.26.0003, da Comarca de São Paulo. Apelante: Aldo Dallemule e Mauro Guimarães Souto. Apelada: Kapital Factoring Sociedade de Fomento Comercial Ltda. Relator: Afonso Bráz. São Paulo, 10 de abril de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0006885-50.2011.8.26.0291, da Comarca de Jaboticabal. Apelante: Daniel Aparecido Sabio – ME e Daniel Aparecido Sabio. Apelada: G3 Fomento Mercantil Ltda. Relator: Francisco Giaquinto. São Paulo, 7 de maio de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0061013-95.2009.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos. Apelante: Cumbica Factoring Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Thomazini Express Ltda ME e Marco Antonio de Lima. Relator: Erson T. Oliveira. São Paulo, 3 de abril de 2013. 152
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0040272-97.2010.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos. Apelante: Teckromo Comercio de Prestação de Serviços - ME. Apelada: De Paula Factoring e Fomento Mercantil Ltda. Relator: Sérgio Shimura. São Paulo, 26 de junho 2013. 153
Nesse sentido: Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0000900-29.2011.8.26.0153, da Comarca de Cravinhos. Apelante: Coimbra & Ribeiro Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Caravel – Agencia de Viagens e Turismo Ltda - ME e Util Industria e Comercio de Produtos Plasticos Ltda. Relator: Heraldo de Oliveira. São Paulo, 7 de maio de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0000900-29.2011.8.26.0153, da Comarca de Cravinhos. Apelante: Coimbra & Ribeiro Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Caravel – Agencia de Viagens e Turismo Ltda - ME e Util Industria e Comercio de Produtos Plasticos Ltda. Relator: Heraldo de Oliveira. São Paulo, 7 de maio de 2013.
70
Como se pode perceber os exemplos são inúmeros. No entanto, agora cabe destacar a
jurisprudência favorável à possibilidade de inserção da cláusula pro solvendo no contrato de
factoring.
6.2.2 Jurisprudência favorável à cláusula pro solvendo
Embora ainda minoritária, a jurisprudência que admite a cláusula pro solvendo nos
contratos de factoring sempre se renova.
E os principais argumentos que ela se utiliza para defender esse entendimento são:
a) não há nada no ordenamento jurídico que impeça a estipulação da cláusula pro
solvendono contrato de factoring, devendo ser respeitados os princípios da legalidade e do
pacta sunt servanda;
b) o instituto da cessão de crédito, regulado pelo Código Civil, autoriza que o cedente
se responsabilize pela solvência do devedor, desde que expressamente estipulado (art. 296,
Código Civil);
c) a lei não obriga a nenhuma empresa a correr risco.
Primeiramente, analisando-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é
interessante destacar o REspnº 820.672/DF154
:
Além disso, também cabe menção ao argumento de que o fomento mercantil é
baseado num contrato de risco e, por isso, o faturizador não pode tergarantias do
recebimento dos títulos comprados. Data vênia, a meu ver, esseargumento não
vinga, porque, primeiramente, não há Lei que impute esse risco ao faturizador.
(...)
Convém relembrar que, apesar de já existirem alguns projetos de leiem andamento
no Congresso Nacional, o fomento mercantil não tem regulaçãojurídica própria em
nosso País. Assim, sob o ponto de vista legal, as sociedadesempresárias de fomento
mercantil estão sujeitas aos mesmos direitos e obrigações quequalquer outra
sociedade que explore outra atividade empresarial. Não há razão paradistinção. Em
suma: a exclusão da garantia do endosso às sociedades de fomento mercantil é
incompatível com os princípios constitucionais da isonomia, da livre iniciativa e
da legalidade. Em que pesem as respeitáveis opiniões doutrinárias, em nosso sistema jurídico
doutrina não revoga Lei. O secular e internacional instituto do endosso não pode ser
abolido ou mitigado por construção doutrinária sem respaldo legal.
(...)
(...) Ao se negar ao faturizador o direito de regresso decorrente do endosso é
possível que se esteja a chancelar uma fraude (vulgo calote) decorrente de
154
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 820.672 - DF (2006/0033681-3). Recorrente: Prover Fomento Mercantil Ltda. Recorrido: Marco Túlio de Oliveira - Microempresa. Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros. 06 de março de 2008.
71
possível conluio entre emitente do título e faturizado. Perceba-se que alguém
pode sacar títulosfrios em benefício do faturizado já com prévia intenção de frustar-
lhes o cumprimento(p. ex.: por contra-ordem ao banco sacado, no caso do cheque).
Daí o faturizador, quepagou pelo título garantido pela segurança do endosso, fica
frustrado por umentendimento jurisprudencial louvado em opiniões doutrinárias sem
qualquer aparolegal. (grifo nosso)
Ademais, há outro julgado, o AgRg no agravo em REsp nº 88.022/SP, do mesmo
Tribunal Superior, que admite a responsabilização do faturizado pela solvência do devedor,
desde que expressamente estipulado, a saber155
156
:
AGRAVO REGIMENTAL. FACTORING. TÍTULOS DE
CRÉDITO.DUPLICATAS SEM CAUSA. PROTESTO.
IRREGULARIDADE.INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACÓRDÃO
FUNDADO NOSELEMENTOS FÁTICOS DOS AUTOS. SÚMULA
07/STJ.PRECEDENTES.
1. Ao firmar a conclusão acerca da irregularidade do protesto, oTribunal recorrido
tomou em consideração os elementos fáticoscarreados aos autos. Incidência da
Súmula 07/STJ.
2."O risco assumido pelo faturizador é inerente à atividade por ele
desenvolvida, ressalvada a hipótese de ajustes diversos no contrato firmado
entres as partes" (REsp 992421/RS, Rel. Ministro HumbertoGomes de Barros, Rel.
p/ Acórdão Ministro João Otávio de Noronha,Terceira Turma, DJe 12/12/2008)
3. Agravo regimental não provido. (grifo nosso)
Quanto à jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, é
importante destacar alguns acórdãos.
Os julgados que defendem a possibilidade de inserção da cláusula pro solvendo nos
contratos de factoring, geralmente, fazem-no argumentando não haver norma no ordenamento
jurídico brasileiro que a proíba. Além de ressalvarem que a cláusula deve estar expressa no
contrato, como determina o art. 296 do Código Civil157
.
155
Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial n° 88.022 - SP (2011/0209853-0). Agravante: Lima Vieira Fomento Comercial Ltda. Agravado: Elecap Gráfica Ltda - Microempresa. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão. 25 de setembro de 2012 156
Nesse sentido também: Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 1.115.325 - rs (2008/0230462-3). Agravante: Constec Mercantil de Fomento Ltda. Agravado: Grimon Saneamento e Construções Ltda. Relator: Ministra Maria Isabel Gallotti. 01 de setembro de 2011 157
Nesse sentido: Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0008019-18.2009.8.26.0248, da Comarca de Indaiatuba. Apelante: Lego Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Prior Pack Indústria e Comércio Ltda. Relator: Desembargador Itamar Gaino. São Paulo, 10 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0006148-18.2012.8.26.0451, da Comarca de Piracicaba. Apelant e: New Trade Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Gruppotelhas Industria e Comercio Ltda. Relator: Itamar Gaino. São Paulo, 17 de junho de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0215408-97.2007.8.26.0100, da Comarca de São Paulo. Apelante: Fruits Industria e Comercio de Sabonetes Ltda e outro. Apelada: Procred Tecnologia e Fomento Mercantil Ltda. Relator: Campos Mello. São
72
Aliás, esse foi o entendimento esposado no capítulo anterior deste trabalho.
Nesse sentido, a Apelação n° 0008019-18.2009.8.26.0248, da Comarca de
Indaiatuba158
:
Ação anulatória - Contrato de fomento mercantil ("factoring") Cessão de crédito -
Nota promissória.
1. A responsabilidade do cessionário pelo crédito cedido decorre de estipulação legal
(artigo 295 do CC), respondendo, também, pela higidez econômica do devedor se
a assumir por convenção (artigo 296 do CC). 2. No "factoring" a responsabilidade do cedente-faturízado pode ser
convencionada. Não tendo o faturizador alcançado êxitoperante o devedor-cedido,
cobra o valor da duplicata contra ocedente, em caráter de regresso, havendo clara
estipulaçãocontratual a esse respeito.
Ação anulatória e cautelar julgadas improcedentes. Recurso provido. (grifo nosso)
Vale destacar trecho do voto deste mesmo julgado:
(...) Nada impede, portanto, que no contrato de factoring haja estipulação da
responsabilidade subsidiária do faturizado. Bem ao contrário, há claramente o
permissivo do referido art. 296 do Código Civil.
Outro julgado interessante, a Apelação n° 0215408-97.2007.8.26.0100, da Comarca de
São Paulo, que segue a mesma linha de raciocínio159
:
Com efeito, é sabido que as operações de factoring não estão revestidas de
tipicidade legal. Não há no ordenamento positivo dispositivos que as regulem.
Então, é inelutável a conclusão de que os apontamentos doutrinários a respeito de
sua natureza jurídica, por respeitáveis que sejam, não podem ser adotados pelo
intérprete e aplicador da lei quando contravenham algum dispositivo legal. (...) Não
há nenhum fundamento legal a sustentar a assertiva de que nas operações de
factoring em que haja endosso de títulos não é possível o exercício do direito de
regresso e que o risco do negócio deve ficar concentrado no endossatário. (grifo
nosso)
Paulo, 14 de março de 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0125413-79.2007.8.26.0001, da Comarca de São Paulo. Apelante: Fruits Industria e Comercio de Sabonetes Ltda e Antonio da Silva Prado Filho. Apelada: Milligan Fomento Mercantil Ltda. Relator: Castro Figliolia. São Paulo, 20 de março 2013; Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 9267412-30.2008.8.26.0000, da Comarca de Itu. Apelante: Chromium Cilindros Hidráulicos e Usinagem Ltda, Jair Aparecido Teixeira e Dinalva Lemes Teixeira. Apelada: França Factoring Fomento Comercial Ltda. Relator: Paulo Pastore Filho. São Paulo, 30 de maio de 2012. 158
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0008019-18.2009.8.26.0248, da Comarca de Indaiatuba. Apelante: Lego Fomento Mercantil Ltda. Apelada: Prior Pack Indústria e Comércio Ltda. Relator: Desembargador Itamar Gaino. São Paulo, 10 de junho de 2013. 159
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0215408-97.2007.8.26.0100, da Comarca de São Paulo. Apelante: Fruits Industria e Comercio de Sabonetes Ltda e outro. Apelada: Procred Tecnologia e Fomento Mercantil Ltda. Relator: Campos Mello. São Paulo, 14 de março de 2013.
73
Por fim, há um caso interessante, a Apelação n° 0045716-04.2010.8.26.0001, da
Comarca de São Paulo, que, além de trazer o entendimento de que não há norma que proíba a
cláusula pro solvendo e que obrigue a empresa a correr risco, dita também que a proibição da
mesma pode causar enriquecimento ilícito do faturizado. Isso porque este poderia se
aproveitar da situação cedendo créditos que provavelmente seriam inadimplidos.
Eis a decisão160
:
Embora se destine a garantir operação de fomentomercantil, e isso é inconteste, não
há regra legal de qualquer espécie proibindo a constituição desse tipo de
garantia no mencionado negócio jurídico, que, em si mesmo, não se confunde
com operação de desconto, mas que pode ser garantido pelos instrumentos
jurídicos previstos no sistema, pois não é justo que alguém, embora assuma
riscos, não se possa acautelar contra os mesmos.
Nem o direito impede isso. Até porque a proibição de garantia implicaria possível
enriquecimento ilícito por parte daquele que se beneficia da venda de seus
créditos junto à "factoring". (...) E, segundo preceito do art 5°, II, da Constituição Federal, "ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”
(grifo nosso)
6.3 A validade da cláusula pro solvendo no contrato de factoring
Nos itens anteriores já foram apresentados e contestados os argumentos da doutrina
contrários à inserção da cláusula pro solvendo no contrato de factoring. Assim como foram
apresentados julgados recentes que versam sobre o assunto.
Agora se irá apresentar de maneira sistemática, item a item, o porquê é defendida, no
presente trabalho, a possibilidade de estabelecer o direito de regresso junto ao cedente-
faturizado em caso de inadimplemento do devedor.
6.3.1 A legalidade da cláusula pro solvendo
Como já devidamente fundamentado no subitem 3.3.2 deste trabalho, o contrato de
factoring, por não possuir regulamentação legal específica no direito brasileiro, é considerado
um contrato atípico. Ou seja, vale-se de diversos institutos jurídicos para que se concretize.
160
Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível n° 0045716-04.2010.8.26.0001, da Comarca de São Paulo. Apelante: Himafe Ind. e Com. de Máquinas e Ferramentas Ltda. Apelada: Norte Factoring Fomento Mercantil Ltda. Relator: Ademir Benedito. São Paulo, 25 de fevereiro de 2013.
74
Diante dessa característica, ele deve obedecer aos princípios gerais do direito
contratual, expressos no Código Civil, e às regras dos institutos em que se baseia. Isso
decorre, sobretudo, do princípio da legalidade, ditado pelo art. 5º, inciso II, da Constituição
Federal, a saber161
:
Art. 5º - (...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei;
(...)
Em outras palavras, uma conduta apenas será obrigatória ou proibida se assim a lei
determinar. Dessa forma, como se demonstrará aqui, não há nada no ordenamento jurídico
que impeça a inserção da cláusula pro solvendo no contrato de factoring.
Quanto à matéria dos contratos atípicos, dita o Código Civil:
Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais
fixadas neste Código.
Pelo dispositivo, pode-se perceber que o referido Código privilegia a liberdade
contratual, desde que respeitada a função social do contrato e as normas gerais do direito
civil162
.
Dentre estas vale destacar a que dita que o negócio jurídico é válido quando for
celebrado por agente capaz, possuir objeto lícito, possível, determinado ou determinável e
forma prescrita ou não defesa em lei163
.
Dessa forma, percebe-se que o direito contratual privilegia a vontade das partes, a
liberdade contratual, desde que respeitados os limites da lei.
Quando se transporta a questão para a estipulação da responsabilidade do cedente-
faturizado, percebe-se que não existe nenhuma norma no direito pátrio que a impeça.
Aliás, como já devidamente explorado no capítulo 5 deste trabalho, o instituto da
cessão de crédito, essencial ao contrato de factoring, autoriza expressamente, conforme o art.
161
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 234. 162
Código Civil, art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. 163
Código Civil, art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.
75
296 do Código Civil, a cessão pro solvendo. Com a ressalva de que esteja expressamente
estipulada no contrato164
165
.
Em consonância com esse dispositivo, como defendido, deve ser interpretada a lei
cambiária. Além disso, art. 25 da Lei das Duplicatas (principal título negociado com as
empresas de factoring) remete à Lei Uniforme, que traz em seu artigo 15 que o endossante,
salvo cláusula em contrário, é garante tanto da aceitação como do pagamento da letra. Ora,
ao registrar “salvo cláusula em contrário”, a Lei Uniforme permite endosso sem garantia. Em
outras palavras, permite o endosso da duplicata para a empresa de factoring sem garantia de
solvência do título negociado166
.
Inclusive esse é o entendimento de parte da jurisprudência, como demonstrado no
subitem 6.2.2.
Assim, analisando-se os princípios do direito contratual no ordenamento pátrio,
destacando-se os princípios da legalidade e da liberdade contratual, e o regramento dos
institutos utilizados para a consecução do contrato de factoring, principalmente os da cessão
de créditos e do endosso, não há nada que vede ou impeça a inserção da cláusula pro solvendo
no mesmo.
Da mesma forma que, é importante ressaltar, não há nada na legislação pátria que
obrigue o empresário ou qualquer pessoa a correr risco, como expressado no item 6.1.
Aliás, assumir esse entendimento é desestimular a atividade do factoring. Isso porque
as sociedades do setor se veem em uma posição de insegurança diante das operações que
realiza. Elas devem estar livres para estabelecer a opção pela cessão pro soluto ou pro
solvendo, tanto devido aos títulos que receber, quanto à negociação do valor da remuneração
junto ao faturizado. Sem dúvidas, a compra de títulos, via cessão pro solvendo, terá um custo
menor para o faturizado.
Ademais, embora não sejam determinantes para a constituição do contrato de
factoring, pode-se tentar buscar outros indícios, no ordenamento jurídico, da licitude da
164
Nesse sentido: LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 220-222; DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 47; GUILHERME, José Carlos Dias. Op., cit. p. 87; PEREIRA JÚNIOR, Antonio Jorge (coord). JABUR, Gilberto Haddad (coord). Op., cit. p. 429; FIUZA, César. Op., cit. p. 575; e TAVARES, Marcelo Moraes. A atividade de factoring e a responsabilidade do faturizado na transferência dos títulos por endosso. In: Revista Faculdade Arnaldo Janssen Direito, v. 3, n. 3, janeiro a dezembro de 2011. 165
Como frisado no subitem 5.2.1.1, na operação de factoring mesmo os títulos de crédito, transferidos mediante endosso, como a duplicata, devem respeitos à regra da cessão crédito quanto à responsabilidade do cedente-faturizado diante da insolvência do devedor, devendo esta estar expressamente estipulada no contrato. 166
Nesse sentido também: COELHO, Sacha Calmon Navarro. O negócio jurídico denominado factoring. A possibilidade de cessão onerosa de crédito, com garantia de pagamento pelo cedente por inadimplemento do sacado – IOF – não-incidência. In: Revista de Direito Mercantil, v. 120, p 257-272. São Paulo: Malheiros. 2000, p. 263.
76
cláusula pro solvendo. Nesse sentido, a legislação tributária aborda de maneira expressa o
factoring.
Em relação a essas leis tributárias, pode-se destacar o art. 15, §1º, inciso III, alínea d,
da Lei nº 9.249 de 26 de dezembro de 1995, e o art. 14, inciso VI da Lei nº 9.718 de 27 de
novembro de 1998. Ambos os dispositivos possuem praticamente omesmo teor e versam
sobre a submissão das empresas de factoring ao regime de tributação pelo lucro real.
O art. 15, §1º, inciso III, alínea d, da Lei nº 9.249 de 26 de dezembro de 1995, dita o
seguinte:
Art. 15. (...)
§1º (...)
III – (...) d) prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia,
mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contas a pagar
e a receber, compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo
ou de prestação de serviços (factoring).
Com quase igual teor, define o art. 14, inciso VI da Lei nº 9.718 de 27 de novembro de
1998:
Art. 14.
VI - que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de
assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos,
administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios
resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).
É importante frisar que o Código Tributário Nacional determina que a lei tributária
não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de
direito privado, não possuindo o poder criar definições no âmbito deste direito167
. No entanto
tais dispositivos servem como referência, já que são os únicos que trazem uma definição legal
de factoring.
Todavia, o que é importante para o presente trabalho é que nem mesmo essas
definições da legislação tributária fazem qualquer menção ou dão qualquer indício de que o
factoring deva assumir o risco da insolvência do devedor do crédito cedido168
. Constatação
esta que mais uma vez reforça a conclusão de que não há nada na lei pátria que obrigue o
factoring a assumir esse encargo.
167
Código Tributário Nacional, art. 110 - A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. 168
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 73-74.
77
Portanto, apesar de grande parte da doutrina e jurisprudência alegar a ilegalidade e
nulidade da cláusula pro solvendo no contrato de factoring, não há absolutamente nada no
ordenamento jurídico brasileiro que impeça, vede ou proíba a sua estipulação.
6.3.2 A cláusula pro solvendo não distingue o factoring das atividades típicas das
instituições financeiras
A doutrina e a jurisprudência muitas vezes afirmam que a assunção do risco do
inadimplemento por parte do factoring é o que o distingue das instituições financeiras e de
suas operações típicas como a de desconto bancário.
No entanto, como já demonstrado no capítulo 4 e reprisado no item 6.1, diante da
interpretação do art. 17 da Lei 4.595/64, há uma série de características que distinguem a
atividade do factoring da atividade das instituições financeiras, que vão além da
obrigatoriedade de arcar com tal risco.
Vale rememorar as principais diferenças entre os bancos e o factoring (item 4.2 deste
trabalho):
a) O banco é um intermediário do crédito, realizando operações ativas (realização de
empréstimos, por exemplo) e passivas (recebimento de depósitos), enquanto o factoring
realiza operação dicotômica, compra de créditos e prestação de serviços.
b) O banco capta recursos de terceiros no mercado, o factoring não o faz, trabalhando
com recursos próprios.
c) O banco, em suas operações ativas, remunera-se com a cobrança de juros, enquanto
o factoring tem sua remuneração proveniente de duas fontes, a comissão cobrada ad valorem
pela prestação de serviços, quando há, e o fator de compra na compra e venda dos direitos
creditícios, que, como já citado, não é juros.
d) O banco se remunera do spread, que é a diferença entre o custo de captação e
aplicação dos recursos coletados no mercado, enquanto o factoring do fator, que é a
precificação da compra de créditos, que leva em consideração o custo de oportunidade dos
recursos, os custos operacionais, a tributação e a expectativa de lucro e risco.
No entanto, como já defendido, o ponto que representa a maior distinção entre as duas
atividades é o fato de que as instituições financeiras estão autorizadas a captar recursos junto
78
ao público, o que é vedado ao factoring169
. Assim, está claro que a estipulação da cláusula pro
solvendo no contrato de factoring não é o ponto distintivo em relação à atividade financeira.
Além disso, a doutrina e a jurisprudência correntemente afirmam que assunção do
risco, pelo faturizador, da insolvência do devedor é o que o diferencia das demais operações
bancárias, principalmente da operação de desconto bancário.
Porém, reprisa-se que a operação de desconto bancário e a de factoring possuem
inúmeras distinções, não sendo essa a que as distinguem definitivamente. Vale rememorar
algumas (item 4.3 deste trabalho):
a) Os recursos utilizados na operação de desconto bancário, por ser realizado através
de instituição financeira, são captados de terceiros, enquanto o factoring utiliza recursos
próprios para a compra dos créditos.
b) No factoring a avaliação do risco e a definição de compra levam em conta a
capacidade econômica do devedor, enquanto no desconto bancário a capacidade econômica
do cliente descontário.
c) No factoring, junto com a operação de compra de créditos pode existir a de
prestação de serviços variados ao cliente, o que não ocorre no desconto bancário.
d) O factoring pode envolver qualquer tipo de crédito, ainda que não representado por
título de crédito, enquanto que o desconto bancário é realizado apenas através de títulos de
crédito.
e) No desconto bancário a remuneração cobrada envolve juros, já no factoring se
cobra um deságio, que é denominado fator de compra, além de remuneração ad valorem pelos
serviços prestados, quando houver.
Portanto, percebe-se que não é a operação pro solvendo que diferencia a atividade de
financeira da do factoring. Dessa forma, como, sobretudo, o factoring opera com recursos
próprios, não há nenhuma restrição quanto à estipulação da cláusula pro solvendo em seu
contrato170
.
6.3.3 Direito comparado
169
Como já mencionado, a Resolução 2.144/95 do Banco Central do Brasil, determina que o factoring não pode operar no campo privativo das instituições financeiras. 170
Nesse sentido: LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 222-225; DONINI, Antônio Carlos. Manual do Factoring (prático e teórico). – 1. Ed.- São Paulo: Editora Klarear, 2004, p. 44-46; LEMMI, Luiz Rodrigo.Atividade financeira e factoring no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 70.
79
É interessante realizar uma breve análise de como a questão das cláusulas pro soluto e
pro solvendo é encarada no cenário internacional. Assim, ver-se-á o equívoco que é dizer que
a garantia dada pelo faturizador contra a falta de pagamento do devedor deve
obrigatoriamente estar presente no contrato de factoring.
Primeiramente, apresentar-se-á o conteúdo da convenção sobre factoring
internacional, promovida pelo Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado
(Unidroit), acerca do tema. A seguir, como a questão é encarada em outros países.
6.3.3.1 Convenção sobre factoring internacional – Unidroit
A convenção sobre factoring internacional foi realizada em 22 de maio de 1988, na
cidade de Ottawa, Canadá, pelo Unidroit. Ela foi realizada no intuito de uniformizar a
regulamentação dos diversos países relativa ao factoring internacional.
Apesar de o Brasil ter enviado representante para acompanhar as reuniões, a
convenção não foi adotada por ele. No entanto, ela foi assinada e ratificada por diversos
países, entre eles França, Alemanha e Itália.
É importante destacar que o tratado versa sobre o factoring internacional. Porém,
como assevera José Leyva Saavedra, apesar de este ser mais complexo, conserva as
características típicas e essenciais do factoring doméstico171
.
Assim, o art. 1º, inciso 2, letra b, da convenção, determina que o factoring deve
desempenhar ao menos duas das quatro funções estabelecidas por ela. Vale transcrever o
dispositivo:
Article 1
2. – (...)
(b) the factor is to perform at least two of the following functions:
- finance for the supplier, including loans and advance payments;
- maintenance of accounts (ledgering) relating to the receivables;
- collection of receivables;
- protection against default in payment by debtors;
(…)
171
SAAVEDRA, José Leyva. La convención de Unidroit sobre factoring internacional. In: Revista de Derecho y Ciencia Política. Lima: Órgano de la Facultad de Derecho y Ciencia Política de la Universidad Mayor de San Marcos, v. 57, nº 1, p. 113-140, primeiro semestre de 2000, p 119.
80
Dessa forma, o texto diz que o factoring deve realizar pelo menos duas das seguintes
funções: i) financiamento; ii) contabilidade dos créditos; iii) cobrança dos créditos; iv)
proteção contra o inadimplemento do devedor.
Portanto, vê-se claramente, que a cláusula pro soluto pode estar presente, mas não é
obrigatória, desde que sejam cumpridas outras funções. Sendo assim, o faturizador pode
adquirir o crédito sem assumir o risco pelo inadimplemento172
.
Assim, através dessa convenção internacional, pode-se perceber mais uma vez que o
fato de factoring operar sob a condição pro solvendo não desnatura sua essência, sendo
plenamente possível em outros países. Isso mostra mais uma vez o equívoco muitas vezes
cometido pela doutrina e jurisprudência brasileiras.
6.3.3.2 A possibilidade da cláusula pro solvendo em outros países
Além da convenção da Unidroit sobre factoring internacional, é interessante
demonstrar que o faturizador não está obrigado a assumir o risco da insolvência do devedor
em outros países. Aliás, perceber-se-á que essa é uma característica frequentemente
encontrada no factoring no âmbito internacional.
No direito espanhol, pode-se estabelecer que o cedente-faturizado se responsabilize
pelo pagamento do crédito em casa de insolvência do devedor, desde que expressamente
convencionado. É o chamado contrato com recurso173
.
No direito português é plenamente possível que a empresa de factoring exerça o
direito de regresso, através da cessão pro solvendo, desde que expressamente
convencionado174
.
Da mesma forma, trata o direito inglês, no chamado recourse factoring175
, o alemão176
e o italiano177
.
No direito grego, há uma lei específica sobre factoring, a Lei nº 1905/1990, que
especifica que seu conteúdo é especialmente a transferência de créditos com ou sem
regresso178
. 172
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 44. 173
GARCIA VILLAVERDE, Rafael (coord). AGUILERA RAMOS, Agustín. El contrato de factoring. Madrid, McGraw-Hill, 1999, p. 302-303; GARCÍA-CRUCES GONZALES, José Antonio. El contrato de factoring. Madrid: Editorial Tecnos, 1990, p. 121-124. 174
VASCONCELOS, Luís Miguel D. P. Pestana de. Dos contratos de cessão financeira (factoring). Coimbra: Coimbra Editora, 1999, p. 338-341. 175
GARCIA VILLAVERDE, Rafael (coord). AGUILERA RAMOS, Agustín. Op., cit. p. 50-51. 176
GARCIA VILLAVERDE, Rafael (coord). AGUILERA RAMOS, Agustín. Op., cit. p. 82-83. 177
LEITE, Luiz Lemos. Op., cit. p. 228.
81
Portanto, nota-se que em muitos países o factoring pode operar através da cessão pro
solvendo, não havendo obstáculos para isso. Fato este que, sem dúvidas, também reforça a
tese de sua possibilidade no Brasil.
6.3.4 O risco do mercado brasileiro
Por fim, vale acrescentar, brevemente, o argumento defendido por Antonio Carlos
Donini em relação ao risco do mercado brasileiro179
. Tema este que se aproxima do aspecto
prático e econômico do negócio.
Esse autor defende que o que mais atemoriza o faturizador não é necessariamente a
insolvência do sacado-devedor, mas sim o faturizado. Isso porque, na prática, é o faturizado
que decide os créditos a serem cedidos, sendo que o factoring escolherá, dentre estes, quais
irá comprar.
Além disso, é extremamente difícil que o faturizador tenha acesso aos livros fiscais e
contábeis, para que se assegure da legitimidade da duplicada sacada.
Ademais, mesmo que a duplicata seja sacada licitamente, é comum o conluio entre o
sacador-faturizado e o sacado-devedor para que este alegue vício, antecipe o pagamento,
compense, invente defeitos e devolva a mercadoria, etc.
Além disso, acrescenta Antonio Carlos Donini180
:
E, ainda, deve-se considerar as distâncias territoriais do nosso país, com dimensões
continentais, é sabido que ainda que aplicáveis à mesma legislação para todo o
território nacional são um povo com culturas e filosofias religiosas diferentes. Por
isso, quando uma empresa de factoring localizada no sul do País adquirir uma
duplicata onde o sacado tenha seu domicílio no Acre, Rondônia ou mesmo no
Nordeste, em caso de inadimplemento desse título, qual a possibilidade de receber o
crédito?
Assim, conclui que todo esse panorama poderá influenciar no valor do fator cobra e
também na condição: „pro soluto‟ ou „pro solvendo‟ da cessão. Só assim haverá equilíbrio do
tratamento entre os contratantes, faturizador e faturizado.
178
LEMMI, Luiz Rodrigo. Op., cit. p. 76. 179
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 46-47. 180
DONINI, Antônio Carlos. Op., cit. p. 46-47.
82
Dessa forma, além de todo o aspecto legal apresentado, não se pode esquecer o
socioeconômico, levando-se em consideração a realidade brasileira. Nesse contexto, nota-se a
extrema importância da possibilidade de inclusão da cláusula pro solvendo no contrato de
factoring, tanto para a segurança do faturizador quanto para a redução de custos para o
faturizado.
83
7 CONCLUSÃO
Diante do que foi estudado e apresentado no presente trabalho, chegou-se à conclusão
de que tanto a cláusula pro soluto quanto a pro solvendo podem ser incluídas no contrato de
factoring.
Como visto, o trabalho foi iniciado com a análise da evolução histórica do instituto no
mundo e no Brasil (capítulo 2) e com um panorama geral do instituto segundo a realidade
brasileira (capítulo 3). Logo após, foi realizada a essencial distinção entre a atividade do
factoring e as atividades típicas das instituições financeiras (capítulo 4).
Lançadas as bases históricas e jurídicas do instituto, a questão das cláusulas pro soluto
e pro solvendo, enquanto meio de transferência do crédito no contrato de factoring, foi
analisada no capítulo 5. .
A partir deste momento, partindo-se da premissa de que o contrato de factoring no
Brasil é um contrato atípico, que se vale de diversos institutos do ordenamento jurídico para
se concretizar, começou-se a vislumbrar a conclusão de que ambas as cláusulas são válidas na
operação do factoring.
Isso porque tanto as leis cambiárias, destacando-se as que versam sobre as duplicatas,
notas promissórias e letras de câmbio, que regulam o endosso de títulos de crédito (art. 25 da
Lei da Duplicata e art. 15 da Lei Uniforme de Genebra sobre letras de câmbio e notas
promissórias), quanto o Código Civil, no que concerne ao instituto da cessão de crédito (art.
296 do Código Civil), permitem que seja estipulada a responsabilidade do faturizado em caso
de inadimplemento da dívida por parte do devedor.
Ademais, apesar do posicionamento contrário da doutrina e jurisprudência
majoritárias, a questão da legalidade da cláusula pro solvendo foi confirmada no capítulo
específico sobre o direito de regresso (capítulo 6).
Dessa forma, além da legislação supracitada, foram apresentadas outras premissas
legais que comprovam a tese defendida, a saber: os princípios da legalidade (art. 5º, inciso II,
da Constituição Federal) e da liberdade contratual (art. 421 do Código Civil) e a disposição
sobre os contratos atípicos (art. 425 do Código Civil). Foram demonstrados outros indícios,
no mesmo sentido, encontrados na legislação tributária (art. 15, §1º, inciso III, alínea d, da Lei
84
nº 9.249 de 26 de dezembro de 1995, e o art. 14, inciso VI da Lei nº 9.718 de 27 de novembro
de 1998).
Assim, como não há disposição no ordenamento jurídico que impeça a inclusão da
cláusula pro solvendo no contrato de factoring, concluiu-se, também, que não há sustentação
legal e jurídica que obrigue o empresário a correr riscos com a contratação única e exclusiva
da cláusula pro soluto.
Ainda dentro da legislação brasileira, sobretudo com a exegese do art. 17 da Lei
4.595/64, percebeu-se que não é a presença ou ausência da cláusula pro solvendo o ponto
distintivo entre o factoring e as atividades típicas das instituições financeiras. O que, sem
dúvida, afastou mais um comum argumento da doutrina e jurisprudência majoritárias.
Ademais, analisando o direito comparado sobre o tema, pode-se perceber que a
cláusula que responsabiliza o faturizado no caso de inadimplemento do devedor é
perfeitamente cabível em outros países.
Finalmente, o mercado brasileiro apresenta grandes riscos para as empresas de
factoring em função delas não terem acesso às informações do faturizado, como seus livros
fiscais e contábeis, e apenas têm como opção de negócio as duplicatas que o faturizado
desejar negociar.
Além disso, pode-se apontar outros riscos, como o conluio entre o faturizado e o
devedor, a fim de dificultar o pagamento do título cedido, e a enorme extensão territorial do
Brasil.
A possibilidade de estabelecer o direito de regresso em relação ao faturizado, em caso
de insolvência do devedor, auxilia a minorar esses riscos.
Não aceitar essa realidade, é desestimular a atividade do factoring no país, o que gera
grande impacto econômico para os pequenos e médios empresários, que têm pouco ou
nenhum acesso ao crédito junto às instituições financeiras.
Portanto, através de toda a base teórica, legal e prática apresentada, conclui-se que a
cláusula pro solvendo é legal e pode ser inserida e regularmente adotada no contrato de
factoring. Dessa forma, fica a cargo da vontade do faturizador e do faturizado, optar pela
cessão pro solvendo ou pro soluto, de acordo com as características do título negociado e da
remuneração a ser pactuada.
85
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