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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ NÚBIA ROSSANA GOMES A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO: uma análise doutrinária e jurisprudencial da teoria da asserção Tijucas 2009

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ NÚBIA ROSSANA GOMESsiaibib01.univali.br/pdf/Nubia Rossana Gomes.pdfNÚBIA ROSSANA GOMES A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO: uma análise doutrinária

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

NÚBIA ROSSANA GOMES

A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO:

uma análise doutrinária e jurisprudencial da teoria da asserção

Tijucas

2009

NÚBIA ROSSANA GOMES

A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO:

uma análise doutrinária e jurisprudencial da teoria da asserção

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.

Orientador: Especialista Aldo Bonatto Filho.

Tijucas

2009

NÚBIA ROSSANA GOMES

A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO:

uma análise doutrinária e jurisprudencial da teoria da asserção

Esta monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e

aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.

Direito Público/Direito Processual Civil

Tijucas, 20 de Outubro de 2009.

Prof. Especialista Aldo Bonatto Filho Orientador

Prof. Msc Marcos Alberto Carvalho de Freitas Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica.

Este trabalho é o resultado da compreensão, carinho e respeito de

meus pais, irmão e namorado, fruto de todos os ensinamentos por eles

exemplificados. A Deus. A meus amigos que nessas horas tanto os

deixei sem a minha presença. A todos os meus professores, a gratidão

pelo aprendizado e exemplo de dedicação acadêmica. E a todos que

colaboraram de alguma forma com este trabalho. A vocês eu dedico

este trabalho.

Primeiramente a Deus, fonte de vida inspiradora, suprema de todo saber.

Aos meus pais, Almir e Elisete e a meu irmão Júnior, pela confiança depositada, pela

paciência.

Ao meu namorado Adilson, o qual sempre esteve perto, ajudando em tudo com muita

compreensão, carinho e amor.

Aos meus amigos, que são os irmãos que podemos escolher.

Ao meu professor orientador, Aldo Bonatto Filho, sempre atencioso.

Aos Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, campus Tijucas, que

muito contribuíram para a minha formação jurídica.

A todos que de alguma forma contribuíram com esta pesquisa cientifica.

E, na verdade, é o homem um ser formado de corpo e alma, criatura que, por sua tendência ao aperfeiçoamento, caminha em direção ao criador.

Vicente Ráo

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para os devidos fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca

do mesmo.

Tijucas, 22 de Outubro de 2009.

Núbia Rossana Gomes Graduanda

RESUMO

A pesquisa realizada neste Trabalho de Conclusão de Curso buscou identificar o momento processual, como ato cognitivo do Juiz, no qual as condições da ação devem ser analisadas durante a tramitação do processo. O estudo foi desenvolvido a partir da análise doutrinária e jurisprudencial das teorias criadas sobre do tema. Para tanto, o tema foi abordado em torno de questionamentos e hipóteses expostas na introdução do trabalho. A investigação e a colheita de dados para solucionar os problemas e confirmar as hipóteses, foram realizadas com a utilização de diversas técnicas, mas a pesquisa bibliográfica e a jurisprudencial foram utilizadas de forma preponderante. Os dados colhidos foram submetidos ao método de raciocínio lógico no modo dedutivo, como forma de conclusão a partir das premissas formadas. Na ordem de apresentação do trabalho, o primeiro capítulo foi dedicado à definição da natureza jurídica e do conceito de direito de ação. Nessa parte, foi apresentada a evolução cronológica do surgimento das diversas teorias sobre o direito de ação, atentando-se as características de cada teoria e, também, as críticas formuladas em face de cada teoria. No segundo, foi abordada a definição de cada condição da ação, notadamente sob aspecto doutrinário e jurisprudencial. O terceiro capítulo foi dedicado ao desenvolvimento da Teoria da Asserção e sua aplicabilidade jurisprudencial, com foco na identificação da teoria adotada pelo ordenamento jurídico e a natureza jurídica da sentença que analisa as condições da ação a partir da análise ou não do mérito da ação. Por fim, foi apresentada a conclusão da pesquisa com a apresentação das respostas dos questionamentos e a identificação da confirmação ou não das hipóteses formulada no início do trabalho. Palavras-chave: Ação Condição Cognição Mérito.

ABSTRACT

The research done in this Course Completion Work sought to identify the procedural moment as a cognitive act of the Judge, in which the conditions of the act should be analyzed during the acting out of the process. The study was developed from the jurisprudential and doctrinal analysis of the theories created about the subject. Thus, the subject was approached using inquiries and hypothesis exposed in the introduction of this work. The investigation and the data collection to solve the problems and confirm the hypothesis were done using several techniques, but the jurisprudential and bibliographical research was used in a preponderant manner. The data collected was submitted to the method of logical reasoning in the deductive mode, as a form of conclusion from the premises that were formed. In the order of presentation of this work, the first chapter was dedicated to the definition of the legal nature and the right of action concept. In this section, the chronological evolution of the emergence of several theories about the right of action was presented, paying attention to the characteristics of each theory, and also, the reviews formulated in view of each theory. In the second, the definition of each condition of action was addressed, especially the jurisprudential and doctrinal aspect. The third chapter was dedicated to developing a theory of assertion and its jurisprudential applicability, focusing on the identification of the theory adopted by the legal system and legal nature of the sentence that analyzes the conditions of action beginning with the analysis or not of the merit of the action. Finally, the research conclusion was presented, by presenting the answers of the inquiries and the identification of the confirmation or otherwise of the hypothesis formulated at the beginning of this work. Keywords: Action. Condition. Cognition. Merit.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art. (s) Artigo (s) Ag Rg no Resp. Agravo Regimental no Recurso Especial CPC. Código de Processo Civil Cit. Citação Des. Desembargador Dr. Doutor Ed. Edição J. Julgado Min. Ministro MS Mandado de Segurança N. Número Ob. Observar P. ex Por exemplo P. Página REsp Recurso Especial Rel. Relator V. ou Vol. Volume

LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS

Lista de categorias1 que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu

trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais2.

Asserto: “opinião emitida como verdadeira ou assim considerada; asserção”3. Afirmativa formulada. Direito objetivo: “a regra ditada a conduta humana, a norma de conduta à qual o indivíduo se deve submeter e a cuja observância pode ser forçado mediante coação externa ou física.”4. Direito subjetivo: “designa uma faculdade reconhecida ao indivíduo pela lei e que lhe permite levar a efeito determinados atos (Just est facultas agendi).” 5. Pretensão: “exigência da subordinação do interesse alheio ao interesse próprio.” 6. O direito de exigir a prestação objeto da obrigação ou do dever veiculado nessa norma jurídica (relação jurídica) Jurisprudência: “Assim é que se entende a jurisprudência como sábia interpretação e aplicação das leis a todos os casos concretos que se submetem a julgamento da justiça. Ou seja, o hábito de interpretar e aplicar as leis aos fatos concretos, para que, assim, se decidam as causas. Desse modo, a jurisprudência não se forma isoladamente, isto é, pelas decisões isoladas. É necessário que se firme por sucessivas e uniformes decisões, constituindo-se em fonte criadora do Direito e produzindo um verdadeiro jus novum. É necessário que, pelo hábito, a interpretação e explicação das leis a venham formar.”7. Teoria: Trata-se de um “conhecimento especulativo, metódico e organizado de caráter hipotético e sintético”8, organizado de forma racional.

1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 HOUASSIS, Antônio e VILLAR, Mauro Salles. Dicionário houassis da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva 2001, p. 321. 4 RUGGIERO, Roberto. Instituições de direito civil. Traduzido por Paolo Capitiniano. v. 1. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2005, p. 35. 5 RUGGIERO, Roberto. Instituições de direito civil, p. 35 6 CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, v. 1. Ed. 2ª. Traduzido por Hiltomar Martins Oliveira, São Paulo:Lemos e Cruz, 2004. p. 93. 7 SILVA, De Plácito e. Vocabulário Jurídico. p. 807. 8 HOUASSIS, Antônio e VILLAR, Mauro Salles. Dicionário houassis da língua portuguesa, p. 2.697.

SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................................... 07 ABSTRACT .............................................................................................................................. 08 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ............................................................................. 09 LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS .............................. 10 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 12 2 A AÇÃO ................................................................................................................................. 15 2.1 O CONCEITO E A NATUREZA JURÍDICA DA AÇÃO .................................................. 16 2.1.1 Teoria civilista ................................................................................................................... 17 2.1.2 Teoria da ação como direito concreto................................................................................ 22 2.1.3 Teoria da ação como direito abstrato ................................................................................. 24 2.1.4 Teoria da ação como direito potestativo ............................................................................ 25 2.1.5 A teoria das condições da ação .......................................................................................... 28 2.2 CONCEITO DE DIREITO DE AÇÃO ................................................................................ 29

3 AS CONDIÇÕES DA AÇÃO ............................................................................................... 31 3.1 INTERESSE PROCESSUAL .............................................................................................. 33 3.2 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO ...................................................................... 43 3.3 LEGITIMIDADE AD CAUSAM .......................................................................................... 47

4 A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO ................................................................. 51 4.1 DECISÕES DEFINITIVAS E TERMINATIVAS, COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL ............................................................................................................................... 52 4.2 COGNIÇÃO E JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE ............................................................... 58 4.3 O MOMENTO DA ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO E A TEORIA DA ASSERÇÃO ............................................................................................................................... 61

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 73 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E JURISPRUDENCIAIS ....................................... 77

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objeto9 o estudo do momento processual como ato

cognitivo no qual o juiz deve analisar as condições da ação e a conseqüência dessa

circunstância na forma como o processo será extinto: com ou sem resolução do mérito.

A importância deste tema reside no fato de que a forma como o processo é extinto

define a natureza da coisa julgada: material ou formal.

Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito

na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem

colaborar para o conhecimento de um tema que, apesar de não poder ser tratado como

novidade no campo jurídico, na dimensão social-prática ainda pode ser tratado como elemento

novo e repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos.

O presente tema, na atualidade, encontra-se inserido no estudo da Teoria da Asserção,

no campo da Teoria Geral do Processo.

A escolha do tema é fruto do interesse pessoal do pesquisador em verificar a

aplicabilidade dessa teoria desenvolvida na doutrina e na jurisprudência, assim como para

instigar novas contribuições para estes direitos na compreensão dos fenômenos jurídicos-

políticos, especialmente no âmbito de atuação do Direito Processual Civil.

Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho

estudar as teorias desenvolvidas para identificar o momento processual no qual o juiz deve

analisar as condições da ação.

O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel

em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,

campus de Tijucas.

9 Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.

Como objetivo específico, identificar o momento processual no qual o juiz deve

analisar as condições da ação, a natureza jurídica da sentença que extingue o processo por

falta de condições da ação, e espécie de coisa julgada que se forma a partir da sentença.

A análise do objeto do presente estudo incidirá sobre as diretrizes teóricas propostas

por Kazuo Watanabe, na obra Da Cognição no Processo Civil Brasileiro. Este será, pois, o

marco teórico que norteará a reflexão a ser realizada sobre o tema escolhido.

Para o desenvolvimento da presente pesquisa, foram formulados os seguintes

questionamentos:

a) Qual o momento processual em que o juiz deve aferir as condições da ação?

b) A teoria da asserção é adotada no ordenamento jurídico brasileiro?

Já as hipóteses consideradas foram às seguintes:

a) As condições da ação devem ser aferidas em qualquer momento durante a

tramitação do processo;

b) Não, a teoria da asserção não é adotada no ordenamento jurídico brasileiro.

Finalmente, buscou-se nortear as hipóteses formuladas com as seguintes variáveis:

a) O processo deve ser extinto com resolução do mérito na ausência das condições da

ação;

b) O processo deve ser extinto sem resolução do mérito na ausência das condições da

ação.

O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,

delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira atinente ao estudo das

teorias desenvolvidas para conceituar o direito de ação; a segunda atinente ao estudo das

condições da ação; e, por fim, a terceira foi dedicada ao estudo da teoria desenvolvida para

apurar o momento processual de análise das condições da ação.

Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado

o método dedutivo, e, o relatório dos resultados expressos na presente monografia é composto

na base lógica dedutiva10, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se

posições científicas que os sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a

prevalência, ou não, das hipóteses elencadas.

Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente, da categoria,

do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica e jurisprudencial11.

Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa

e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e

seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais

aprofundados no corpo da pesquisa.

A estrutura metodológica e as técnicas aplicadas nesta monografia estão em

conformidade com o padrão normativo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)

e com as regras apresentadas no Caderno de Ensino: formação continuada, Ano 2, número 4;

assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas

úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco Colzani, Guia para redação do trabalho

científico.

A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são

apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos

estudos e das reflexões sobre a teoria da asserção.

Com este itinerário, espera-se alcançar o intuito que ensejou a preferência por este

estudo: o desenvolvimento do estudo do Direito Processual Civil.

10 Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125. 11 Quanto às “Técnicas” mencionadas, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 61-71, 31- 41, 45- 58, e 99-125, nesta ordem.

2 A AÇÃO

O objeto do Direito é a disciplina do comportamento humano, o que se faz por meio

de normas jurídicas12. Isso é necessário não só para resolver, como para evitar o conflito de

interesses, o que surge devido à escassez dos bens da vida, úteis a satisfação das necessidades

do homem.

O direito positivo13 reúne as normas jurídicas dirigidas a todos de forma obrigatória e

geral. A generalidade da norma é característica do direito que recebe o nome de direito

objetivo. O direito objetivo é assim definido, pois é dirigido a todos de forma indeterminada

quanto aos sujeitos, visando proteger a impessoalidade. Logo o direito objetivo é geral e

impessoal.

Violada a norma, nasce para o sujeito a pretensão, ou seja, o direito de exigir a

prestação objeto da obrigação ou do dever veiculado nessa norma jurídica (relação jurídica).

Nesse caso, considerando-se a individualização da norma num caso concreto, o que

transforma a norma geral em concreta tem-se o que se convencionou chamar de direito

subjetivo.

Desse modo, a norma desce do plano abstrato para encontrar-se com o plano concreto.

Portanto, o fato é previsto na norma objetiva de forma abstrata (direito objetivo), agora

ocorrera no mundo dos fatos e transformou-se em concreto (direito subjetivo), pois os sujeitos

passam a ser individualizados.

12 “A proteção coerção é elemento essencial do direito objetivo, tanto assim que as normas jurídicas positivas se distinguem das normas espirituais ou morais, principalmente por seu caráter coercitivo.” RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 6. ed. anotada e atualizada por Ovídio Rocha Sandoval. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 54. 13 “O conjunto sistemático de normas destinadas a disciplinar a conduta dos homens na convivência social, assegurada pela proteção-coerção a cargo do Estado, constitui o direito positivo que é o direito próprio de cada povo.”. RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos, p. 215.

Todavia, negada a pretensão, o sujeito não pode valer-se da força física para realização

do seu direito, pois o ordenamento jurídico lhe nega a autotutela, o que constitui pressuposto

inafastável à organização e à própria existência do Estado 14.

Logo, deve socorre-se ao Estado para o exercício de seu direito. A esse direito de

socorrer-se ao Estado dá-se o nome de Ação.

2.1 O CONCEITO E A NATUREZA JURÍDICA DA AÇÃO

O conceito de ação está intimamente ligado a sua natureza. Na identificação da

natureza, encontra-se o conceito de ação.

Para tanto, várias teorias foram desenvolvidas em diversos ordenamentos jurídicos, até

que uma definição fosse aceita de forma convencionada, embora se tenha que reconhecer que

ainda restam críticas em torno da teoria adotada no ordenamento jurídico brasileiro.

Fábio Luiz Gomes é claro ao afirmar que “[...] não obstante tudo quanto foi escrito

sobre o tema [...] não houve pacificação em torno de uma idéia predominante.” Completa o

autor: “Estamos convencidos de que uma dose excessiva de teorização foi responsável pelos

desentendimentos e seria mais compatível com metódica filosófica.” 15.

Luiz Guilherme Marinone explica que todas as teorias “[...] foram tocadas pelas

características do ordenamento jurídico, dos valores do Estado e da cultura em que foram

concebidas” 16.

O tema é de tamanha complexidade, que Alexandre Freitas Câmara chega a afirmar

que é “[...] dos mais polêmicos, senão o mais polêmico de toda a ciência processual [...]” e

“não há (nem se vislumbra que haja) consenso doutrinário acerca do conceito de ação” 17.

A acepção gramatical da palavra ação não é o melhor caminho para identificar o

conceito de direito de ação, haja vista o conteúdo jurídico que envolve essa categoria. A

categoria, portanto, não retrata apenas um substantivo, verbo, mas sim um instituto jurídico,

devido à importância do tema para a compreensão do Direito Processual Civil.

14 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 91. 15 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 91. 16 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil. V. 1. 3. ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2008, p. 159. 17 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. V. 1. 16 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 119.

O âmbito do presente trabalho é restrito, motivo pelo qual não se pode abordar de

forma exaustiva cada uma das teorias que surgiram ao longo do desenvolvimento do estudo

da ciência do direito processual. Dessa forma, serão destacados os aspectos importantes de

cada teoria, necessários para a compreensão do tema proposto a fim de se conceituar o direito

de ação.

2.1.1 Teoria civilista

A teoria civilista foi desenvolvida por Friedrich Karl Von Savigny a partir da

formulação do jurista romano Celso, para o qual “a ação nada mais é do que o direito de

alguém perseguir em juízo o que lhe é devido” 18.

José Eduardo Carreira Alvim lembra que, embora a teoria tenha sido desenvolvida por

Friedrich Karl Von Savigny, a partir da formulação de Celso, que era Romano, Upiano a

reproduziu quase que textualmente19: “actio autem nihil aliud est quam ius persequendi in

iudicio quod sibi debetur”20.

Luiz Guilherme Marinone, por sua vez, comenta que até meados do século XIX na

Itália e na França admitia-se o “ditado” de Celso e questionava-se apenas a expressão “o que

lhe é devido” para acrescentar a expressão “ou o que é seu”, numa alusão aos direitos reais21.

Dessa citação, concluíam os adeptos de tal teoria que só haveria ação se houvesse

direito material. No resumo de Fábio Luiz Gomes: “não há ação sem direito; não há direito

sem ação; a ação segue a natureza do direito.” 22.

Alexandre Freitas Câmaras explica que:

Essa teoria é reflexo de uma época em que não se considerava ainda o Direito Processual como ciência autônoma, sendo o processo civil mero apêndice do Direito Civil. Por essa concepção, a ação era considerada o próprio direito material depois de violado23.

18 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.159. 19 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, 10. ed. Rio de Janeiro:Forense, 2005, p. 116. 20 A ação nada mais é que o direito de pedir em juízo o que nos é devido. Tradução de SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 91. 21 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.159. 22 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 95. 23 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 119.

Disso, portanto, decorre a denominação da teoria como civilista. Há autores que

utilizam à denominação dessa teoria como imanentista, pois, segundo Luiz Rodrigues

Wambier, considerava-se a ação imanente ao direito material24.

No Brasil, a teoria ganhou apoio de Clóvis Beviláqua, para o qual a ação era “o

mesmo direito em atitude de defesa”, “um elemento constitutivo do direito subjetivo” 25.

Também foram adeptos dessa teoria, segundo Rogério Lauria Tucci, João Monteiro e João

Mendes de Almeida Júnior26.

Inclusive, essa teoria foi adotada pelo Código Civil de 1916 em seu artigo 75, cujo

conteúdo dispunha: “A todo direito corresponde uma ação, que o assegura” 27 28.

Essa teoria não logrou êxito em definir a ação tampouco sua natureza, pois não

distinguia ação e direito material como de naturezas distintas.

Foram os juristas Adolf Wach, Bernhard Windscheid, Teodor Muther e Oskar von

Bülow que, a partir dos meados do século XVIII, enfrentaram a teoria civilista e expuseram os

erros cometidos em sua formulação29.

Merece destaque a colocação de Fábio Luiz Gomes que além das concepções

abordadas por esses juristas, poucos doutrinadores se deram conta de que a definição de ação

trazida pela teoria civilista partiu de “[...] uma óptica jamais imaginada pelo romano”(Celso) 30.

Além disso, o equívoco da teoria civilista decorre da circunstância de que o direito

romano “não distinguia entre actio e direito subjetivo” 31, como lembra Rogério Lauria Tucci.

Mas o início da chamada autonomia da ação, entendida como tal a desvinculação entre

a ação e o direito subjetivo material, como pretendiam os civilistas, teve início na denominada

polêmica entre os juristas Bernhard Windscheid e Teodor Muther32.

24 WAMBIER, Luiz Rodrigues, ALMEIDA, Flávio Renato Correia de e TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. V.1. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 125. 25 Apud CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 119. 26 TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudos sistemáticos). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 60. 27BRASIL. LEI 3.071 de 1º Janeiro de 1916, Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L3071.htm> . Acesso em: 20 out. 2009. 28 A Lei nº 10.406/02, Código Civil, não reproduziu esse dispositivo no Livro III da Parte Geral. 29 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 38-39. 30 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 95. 31 TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudos sistemáticos), p. 60.

Em 1856, Bernhard Windscheid publicou na Alemanha um trabalho sobre a actio

romana33 intitulado Die Actio des römischen Civilrecths, vom Standpunkte des heutigen

Rechts34.

Nesse trabalho, Bernhard Windscheid argumentava, segundo Luiz Guilherme

Marinone, que o “direito romano não dizia que alguém tinha um direito, mas sim que alguém

possuía uma actio – ou seja, que a actio romana não era um meio de defesa, mas sim o

próprio direito -, afirma que a actio nada mas era, do que o direito é no direito moderno.” 35.

Com isso, pretendia demonstrar que a actio romana não é o mesmo o que, ao seu

tempo, os juristas alemães denominavam de Klege, ou klagerecht36.

Para Bernhard Windscheid, a actio romana correspondia, sim, ao conceito de

pretensão (também ao seu tempo), denominada pelos juristas alemães como (anspruch)37.

Nesse aspecto, Luiz Guilherme Marinone destaca:

Windscheid concluiu que a pretensão é o equivalente moderno da actio, delineando-a como uma situação jurídica substancial, distinta tanto do direito de se queixar quanto do próprio direito subjetivo, do qual é uma emanação que funda a possibilidade de o autor exigir a realização judicial do seu direito 38.

Em 1857, Teodor Muther publicou sua obra intitulada39: Zur Lehre von römischen

Actio, dem heutigen Klagerecht, der Litiscontestation und der Singularsuccession in

Obligationen 40.

Nessa obra, escrita com o propósito de atacar a teoria de Bernhard Windscheid,

Teodor Muther “procurou demonstrar que havia uma perfeita coincidência entre a actio

romana e a Klage germânica.” 41.

32ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 118-119. 33 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 118-119. 34 A actio do Direito Civil Romano do ponto de vista do Direito moderno. Tradução: ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 118-119. 35 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.160. 36 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 97. 37 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 121. 38 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.161. 39 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 119. 40Sobre a teoria da actio romana, do moderno direito de queixa, da litiscontestação e da sucessão singular nas obrigações. Tradução: ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 119. 41 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 119.

Ao contrário de Bernhard Windscheid, que afirmava que o direito romano era uma

ordenação de pretensões que poderiam ser perseguidas em juízo, Teodor Muther afirmava que

a ordenação romana era de direitos42.

Para sustentar tal posição, afirmava Teodor Muther que a fórmula outorgada pelo

magistrado ao litigante (período per formula43) dependia da existência do direito material,

mas não estava vinculado a este, pois o juiz ou árbitro não estavam obrigados a julgar o

pedido procedente 44.

Dessa forma, quem tinha o direito à fórmula (exigida do magistrado ou pretor) tinha o

direito subjetivo como pressuposto fundamental, mas não necessariamente teria um

julgamento procedente. Portanto, poderia ter a direito a fórmula, mas não o direito subjetivo.

A conclusão de Teodor Muther é resumida por Luiz Guilherme Marinone:

Afirmou Muther que o direito à concessão da fórmula nasce de um ‘direito originário’, e que, enquanto o obrigado perante o ‘direito originário’ é o particular, o obrigado diante do direito à fórmula somente pode ser o pretor ou o Estado. Existia, portanto, dois direitos, sendo o direito privado o pressuposto do direito contra o Estado; os dois direitos coexistiriam, ainda que o direito contra o Estado existisse para proteger o direito privado 45.

Também merece destaque a síntese do pensamento de Teodor Muther formulada por

José Eduardo Carreira Alvim:

O ordenamento jurídico romano não era um ordenamento de pretensões judiciais perseqüíveis, senão um ordenamento de direito e somente estes (em seu sentido subjetivo) eram susceptíveis de persecução judicial. Quem tinha o direito a que se lhe conferisse a fórmula deveria ter também um direito subjetivo, que era pressuposto do fundamento do primeiro. O obrigado pela concessão da fórmula era o pretor, na sua qualidade de titular do poder judicial do Estado. O obrigado pelo direito primitivo do autor, em troca, são pessoas (ou o Estado, mas como pessoa).

42 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.163. 43 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 115. 44 “A fórmula é uma instrução escrita, com a qual o magistrado nomeia o juiz, fixa os elementos sobre os quais este deverá fundar seu juízo outorgando-lhe um mandato, mais ou menos determinado, para a condenação eventual do réu ou sua absolvição”. ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 115. 45 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p. 163.

Temos, pois, dois direitos distintos, em que um é pressuposto, mas pertencem a campos distintos, já que um é direito privado e o outro de natureza pública. Esse Direito público ou direito de acionar, ou actio, como assim entendida, pode imaginar-se como vinculado, desde o começo, com o direito primitivo; pode ser concebido como um direito vinculado, mas não como um ‘anexo’ dele, e sim como um direito especial, condicionado, existente junto a esse outro direito, com o propósito de tutelá-lo. Mas pode ser imaginado como direito nascido incondicionalmente, de modo que a sua existência só se revele com a lesão desse direito primitivo 46 .

Ao final completa: A actio é, pois, a pretensão do titular frente ao pretor, a fim de que este

lhe confira a fórmula, para o caso de o seu direito ser lesado 47.

Parte daí a autonomia da ação em relação ao direito subjetivo, ou seja, ambos têm

naturezas jurídicas distintas.

Bernhard Windscheid, em resposta a teoria desenvolvida por Muther, publica, em

1857, A actio. Réplica ao Dr. Teodor Muther (Die Actio. Abwehr gegen Dr. Th. Muther), mas

acaba aceitando as idéias desenvolvidas por Teodor Muther e admite “a existência de uma

ação processual ao lado da pretensão de direito material” 48.

A aceitação de Bernhard Windscheid causou polêmica no meio jurídico porque

Teodor Muther havia sido severo em suas críticas, inclusive de forma “deselegante” 49.

Fábio Luiz Gomes afirma que “já no prólogo adianta-se Teodor Muther em deixar por

conta do mau costume da época interpretar a luta contra uma doutrina como dirigida à pessoa

do adversário.” 50.

A partir dessa época as demais teorias aceitaram a autonomia do direito de ação e sua

natureza pública, mas o tema ainda não havia sido superado.

46 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 120. 47 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 121. 48 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo civil, p.165. 49 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.163. 50 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 97.

2.1.2 Teoria da ação como direito concreto

Antes de abordar o tema, é importante destacar que a teoria do direito de ação como

direito abstrato surgiu antes da teoria da ação como direito concreto, mas, por razões

didáticas, a doutrina inverte a ordem cronológica do surgimento das teorias quando as

abordam. Explica Fábio Luiz Gomes que prefere “analisar primeiro a teoria do direito

concreto por considerarmos a outra mais avançada em direção ao posicionamento que

entendemos adequado” 51.

A teoria da ação como direito concreto foi desenvolvida por Adolf Wach em 1888 na

sua obra A pretensão à declaração (Der Festsllungspruch; em espanhol: La pretensión de

declaración) 52.

Fábio Luiz Gomes sintetiza a teoria de Adolf Wach com a seguinte explicação:

Após reconhecer estar segundo os passos de Windscheid, parte Wach para demonstrar, definitivamente, a autonomia do direito de ação, afirmando desde logo que o mesmo não se confunde com o direito subjetivo privado e, muito menos, com a pretensão de direito civil (La pretensión de declaración, cit., p. 40). Em seguida, refere o exemplo – já citado quando analisamos a teoria civilista – da ação declaratória negativa, através do qual deixou sem qualquer poder de reação os seguidores da doutrina clássica (ob. cit. p. 51). Acrescenta Wach que o direito de ação, ou a pretensão de proteção do direito, é de natureza pública, dirigindo-se contra o Estado e também contra o adversário (demandado): enquanto ao primeiro cabe outorgar a proteção do direito, ao segundo cabe tolerá-la (ob. cit. p. 59), coexistindo, assim, duas realidades distintas: a relação processual e a relação de direito privado (Manual, cit., p.67). Para Wach, entretanto, embora autônomo, na medida em que não nasce juntamente com o direito material, nem deste por sua vez decorra (como na ação declaratória negativa), o direito de ação só compete a quem é titular de um interesse real e não imaginário (Manual, cit., p. 45). Segundo Wach, o direito de ação, embora não nascendo junto com o direito subjetivo material, dele haverá de decorrer, sempre e necessariamente, à exceção da hipótese de ação declaratória negativa. Assim, distingue os dois direitos, mas o segundo nascerá depois do primeiro quer da violação deste, ou da ameaça ao mesmo 53.

51 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 102. 52 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 103. Merece destaque o comentário dos autores sobre a tradução do título da obra de Wach: “Digna de nota a observação feita por Hélio Tornagli relativamente à tradução de Der Feststellungsanspruch, pois, segundo ele, ‘traduz-se corretamente ação declaratória – ao pé da letra: Exigência de uma situação firma’ (ob. cit., p. 256)” 53 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 103.

É de se constar que Adolf Wach subordinava o direito de ação a uma sentença

favorável ao autor, isso para afastar a crítica da teoria civilista que não conseguia explicar o

fenômeno da ação declaratória54.

Todavia, esse aspecto foi utilizado pelos seus críticos para afastar sua teoria, pois não

havia em tal teoria como sustentar o fenômeno da ação quando o pedido de provimento fosse

julgado improcedente.

Luiz Guilherme Marinone explica a concepção de como Adolf Wach se defendia das

críticas nesse sentido, atribuindo à prestação da tutela jurisdicional ao réu quando o pedido

fosse julgado improcedente:

Mas a tutela jurídica é prestada pela sentença favorável. Ela é prestada ao autor, na ação declaratória de existência e não ação declaratória de inexistência, quando a sentença reconhecer, respectivamente, a existência e a inexistência da relação jurídica, isto é, quando a sentença for de procedência, mas será prestada ao réu quando for de improcedência. Ou seja, o direito à tutela jurídica requer uma sentença favorável. Na verdade, Wach distinguia a pretensão à tutela jurídica da pretensão à sentença, sendo a primeira devida a uma das partes e a segunda a ambas. Ainda que o autor e o réu tivessem pretensão à sentença, a pretensão à tutela jurídica dependia de uma sentença favorável 55 .

Correlato ao pensamento de Adolf Wach, também em 1888, Oskar von Bülow em sua

obra: Die Lehre von den Prozesseinreden und die Prozessvoraussetzungen,56 desenvolve sua

própria teoria da ação como direito autônomo, condicionado não a uma sentença de

procedência, mas sim a uma sentença justa 57.

José Eduardo Carreira Alvim cita as palavras de Oskar von Bülow:

“Segundo Bülow, ‘não se podendo conhecer precisamente o resultado da sentença, não se pode falar num direito à sentença favorável, nem falar desse direito, fundando-se em fatos anteriores ao processo, porque a sentença se funda na convicção do juiz, que pode não corresponder à realidade dos fatos’. ” 58 .

54 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 126. 55 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: Teoria geral de processo civil, p.167. 56 Teoria das Exceções e dos Pressupostos Processuais. Tradução: ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 36. 57ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 122. 58 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 115.

A teoria de Oskar von Bülow padeceu das mesmas críticas da que sofreu a teoria de

Adolf Wach. Todavia, a maior relevância dessa teoria é o fato de que a autonomia do direito

de ação em relação ao direito subjetivo e/ou material foi desenvolvida a partir da relação

jurídica.

Nesse aspecto, ao tratar da teoria de Oskar von Bülow explica Fábio Luiz Gomes:

Além das razões históricas, nela [obra Oskar von Bülow] são lançados conceitos de penetrante atualidade. Para Bülow, o processo encerra uma relação jurídica dinâmica, de natureza pública, que se desenvolve gradualmente, não decorrendo exclusivamente do direito subjetivo alegado pelo autor. Uma vez que os direitos e as obrigações processuais se estabelecem entre os funcionários do Estado e os cidadãos, essa relação pertence, a toda evidência, ao direito público, constituindo o processo uma relação jurídica de natureza pública (ob. cit., p. 1-2). E como qualquer relação jurídica, o processo exige para a sua formação os sujeitos, o objeto e a causa, expõe Bülow, denunciando uma intuição sem dúvida genial (ob. cit., p. 4)59 .

Embora a teoria de Oskar von Bülow não tenha logrado êxito em definir a natureza

jurídica da ação, foi para o direito processual civil um marco no desenvolvimento dessa

doutrina, o que ficou conhecido como o início do processualismo científico60 .

Passa-se agora a teoria da ação como direito abstrato onde se observará as mudanças

que vão ocorrendo no conceito de direito de ação.

2.1.3 Teoria da ação como direito abstrato

A teoria da ação como direito abstrato foi desenvolvida pelo alemão Heinrich

Degenkolb61 e pelo húngaro Alexander Plósz62, por volta de 1876 e 1877.

Explica Fábio Luiz Gomes, que o direito de ação, segundo “a concepção de

Degenkolb e Plósz é o direito subjetivo público que se exerce contra o Estado e em razão do

qual sempre se pode obrigar o réu a comparecer em juízo” 63 .

Merece destaque da síntese formulada por Fábio Luiz Gomes a respeito da teoria

abstrata de Heinrich Degenkolb:

59 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 109. 60 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 36. 61 Título da obra: Einlassungszwang und Urteilsnorm – Ingresso Forçado e Norma Judicial (traduzido na obra). 62 Título da obra: Beiträge zur Theorie des Klagerechts – Contribuição ao Direito de Queixa (traduzido na obra). 63 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p.109.

Em razão da manifesta incoveniência do exercício da chamada justiça de mão própria, expõe degenkolb, proibiu-se o Estado, assumindo ele esta grave tarefa, mediante a função jurisdicional. Ao cidadão, impedido de exercê-la diretamente, foi concedida a ação judicial, que representa, assim, o preço pelo qual renunciou a defesa privada (‘Einlassungszwang und Urteilsnorm’,

apud Alfredo Rocco, La sentenza civile, cit., p. 6, nota 9) 64 .

A denominação da teoria da ação como direito abstrato não decorre da circunstância

de que o direito de ação não está condicionado a uma sentença favorável (concreta), em

oposição à teoria da ação como direito concreto, mas sim, denomina-se abstrata por que o

direito que se tem a proteger é o direito objetivo, cuja característica é ser abstrato.

Isso é observado por Rogério Lauria Tucci na seguinte citação:

Pertence a todos os membros da comunhão social como decorrência da própria personalidade, exige-se, apenas, que o autor faça referência a um interesse seu, protegido em abstrato pelo direito objetivo; incumbindo ao Estado, à vista dele, exercer sua atividade jurisdicional, com o proferimento de sentença, ainda que desfavorável 65 .

Em vista ao entendimento de Alexander Plósz de que o direito de ação exige do autor

apenas boa-fé, Luiz Guilherme Marinone faz referência à teoria de Ludovico Motara:

A teoria de Mortara se assemelha às de Degenkolb e Plósz. Mortara também sustenta que o direito de agir não reclama o reconhecimento da existência do direito material e, nesse ponto, coloca-se ao lado das teorias de Degenkolb e Plósz. Porém entende que a ação se funda na mera afirmação de existência do direito e, portanto, que não é preciso dizer que a ação somente existe quando exercida conscientemente ou de boa-fé 66 .

O que revela essa teoria, portanto, é que, a partir dela, o direito de ação passa a ser

visto como um direito subjetivo, exercido para que o Estado preste a tutela jurisdicional.

2.1.4 Teoria da ação como direito potestativo

A teoria da ação como direito potestativo vem em sentido convergente às teorias

desenvolvidas por Alexander Plósz e Heinrich Degenkolb, na medida em que o direito de

ação tem natureza de direito subjetivo.

64 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p.109. 65 TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudos sistemáticos), p. 67. 66 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p.166.

A teoria da ação como direito potestativo foi desenvovida por Giuseppe Chiovenda e

teve como ponto de partida a teoria do direito potestativo também desenvolvida por ele.

Dessa forma, para se compreender a teoria da ação como direito potestativo é

necessário conhecer o conceito de direito potestativo desenvolvido por Giuseppe Chiovenda,

a partir de sua explicação.

Após definir bem a sua relação com a necessidade do ser humano (interesse),

Giuseppe Chiovenda define duas “categorias de direito”:

Em duas grandes categorias, como já indicamos, se dividem todos os direitos: - direitos tendentes a um bem da vida a conseguir-se, antes de tudo, mediante a prestação positiva ou negativa de outros (direito à uma prestação); - direitos tendentes à modificação do estado jurídico existente (direitos potestativos) 67 .

Ao tratar do direito potestativo, explica:

Esta categoria de direitos [potestativos] recentemente estudada pela doutrina, particularmente processual, contrapõe-se nitidamente à primeira [direito à prestação; direito subjetivo], porque carece completamente daquilo que é característico dos direitos a uma prestação, ou seja, precisamente a obrigação de uma pessoa de realizar uma prestação. Em muitos casos, a lei concede a alguém o poder de influir, com sua manifestação de vontade, sobre a condição jurídica de outro, sem o concurso da vontade deste: a) ou fazendo cessar um direito ou um estado jurídico existente; b) ou produzindo um novo direito, ou estado ou efeito jurídico 68 .

Em síntese, definia Giuseppe Chiovenda que o direito real ou pessoal é direito a uma

prestação de outrem advinda de uma relação jurídica; daí a expressão de direito à prestação.

Por outro lado o direito potestativo, também subjetivo, não concede prestação de

outrem, mas sim a modificação (extinção) de uma relação jurídica, na qual o sujeito nada tem

a prestar a outrem, mas sim sujeitar-se a extinção dessa relação; por isso é utilizada a

expressão direito de sujeição, ou melhor direito potestativo.

67 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, 3. ed. V. 1. Tradução de Paolo Capitanio. Campinas: Bookseller, 2002, p. 26. 68 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 30.

Assim, definia Giuseppe Chiovenda que o direito de ação, embora autônomo, é um

direito potestativo na medida em que não é dirigido em face do Estado para que este cumpra

uma prestação (base da teoria de Alexander Plósz e Heinrich Degenkolb que via o direito de

ação como um direito subjetivo à prestação da tutela jurisdicional pelo Estado), mas sim em

face do réu para que esse se sujeite aos efeitos da lei 69 .

A teoria em comento foi desenvolvida por Giuseppe Chiovenda em 1903 em uma

conferência que proferiu na Universidade de Bolonha, na Itália, com o título: Lázione nel

sistema dei diritti70, o que ficou conhecida como prelação bolonhesa 71.

Todavia, o Autor a reproduziu na sua obra, Intituições de Direito Processual Civil

(Instituzioni di Diritto Processuale Civile).

Nessa obra, traduzida para português por Paolo Capitanio, explica:

Quanto a mim, que comecei a ocupar-me desses problemas quando a categoria dos direitos potestativos estava já largamente estudada na doutrina, não tive dificuldade, com subsídio de semelhantes estudos, em ser o primeiro a inscrever a ação naquela categoria: reconhecendo a parte substancial da teoria de Wach, defini a ação como um ‘direito potestativo’(1903) 72 .

E define ação com os seguites argumentos:

A ação é um poder que nos assiste em face do adversário em relação a quem se produz o efeito jurídico da atuação da lei. O adversário não é obrigado a coisa nenhuma diante desse poder: simplemente lhe está sujeito. Com seu próprio exercício exaure-se a ação, sem que o adversário nada possa fazer, quer para impedi-la, quer para satisfazê-la 73 .

Foi devido a afirmativa de que o réu não está sujeito a obrigação, é que a teoria de

Giuseppe Chiovenda foi criticada, como se observa na citação de Fábio Luiz Gomes:

Apesar do prestígio que desfrutava Chiovenda na Itália, não foi poupado de imediatas e severas críticas. A ausência de qualquer obrigação por parte do réu, em decorrência do exercício de um direito potestativo pelo autor, geraria, conforme Alfredo Rocco, uma relação jurídica deformada, já que teria um só termo.

69 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 42. 70 Ação no sistema de direitos. Tradução: ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 40. 71 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 42. 72 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 41. 73 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 42.

O que a doutrina de Chiovenda erigiu em direito autônomo e chamou potestativo, continua A. Rocco, nada mais é do que a faculdade, naquele direito compreendida, de o titular respectivo iniciar o exercício do mesmo por meio de expressa declaração de vontade (La sentenza civile, 1905, ed. De 1962, p. 86 et seq) 74 .

Ressalvando as críticas, a teoria de Giuseppe Chiovenda fixou ainda mais o caráter de

direito subjetivo do direito de ação, além de ressaltar seu caráter público.

2.1.5 A teoria das condições da ação

Essa teoria foi desenvolvida por Enrico Tullio Liebman em 1949 e apresentada em

uma aula inaugural na Universidade de Turim, na Itália. Para Enrico Tullio Liebman a ação é

um poder em face do Estado de provocar a tutela jurisdicional75 .

Segundo Luiz Guilherme Marinone, Enrico Tullio Liebman fazia referência a esse

poder a partir da formulação “à existência de um direito constitucional que garante que todos

os cidadãos podem levar as suas pretensões ao Poder Judiciário.” 76. Tal argumento está

veiculado na norma prevista no art. 24, 1ª parte, da Constituição da República Italiana 77 .

Para Enrico Tullio Liebman há manifesta distinção entre direito subjetivo material e a

ação, como se observa na citação a seguir:

A distinção entre o direito subjetivo material e a ação manifesta-se por vários aspectos. Enquanto o primeiro deles tem por objeto uma prestação da parte contrária, a ação visa a provocar uma atividade dos órgãos judiciários; justamente por isso, o direito dirige-se à parte contrária e tem, conforme o caso, natureza privada ou pública e um conteúdo que varia de caso a caso, enquanto a ação se dirige ao Estado e por isso tem natureza sempre pública e um conteúdo uniforme, qual seja, o pedido de tutela jurisdicional a um direito próprio (embora varie o tipo de provimento que cada vez se pede ao juiz)78 .

Com isso, verifica-se a adesão de Enrico Tullio Liebman a teoria da autonomia da

ação e que se trata de um direito subjetivo. Acrescenta o Autor:

74 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p.109. 75 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 114. 76 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p. 170. 77 MARINONE, Luiz Guilherme. Curso de direito processual civil: teoria geral de processo civil, p. 170. 78 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil. V. 1. 3. ed. Tradução e notas de Cândido Rangel Dinamarco, São Paulo:Malheiros, 2005, p. 198.

O direito de ação adquire, com isso, uma fisionomia suficientemente precisa: é um direito subjetivo diferente daqueles regidos pelo direito substancial, porque é dirigido ao Estado, se destinar à obtenção de uma prestação deste79.

Em síntese, Enrico Tullio Liebman definia a ação como direito a um julgamento de

mérito, sem garantia de um resultado favorável e condicionado a existência de três requisitos:

possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade.

Sem esses requisitos não haveria ação e o processo deveria ser extinto sem julgamento

do mérito, ou sem resolução do mérito, como dispõe o art. 267 do Código de Processo Civil80.

Essa teoria, embora tenha sofrido críticas da doutrina, haja vista a impossibilidade de

se definir o direito exercido quando o processo é extinto sem julgamento do mérito, foi

adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, como se observa no teor dos seguintes

dispositivos do Código de Processo Civil:

Art. 3o Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade. Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: […] VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual; 81 .

A definição de cada uma das condições da ação será objeto do capítulo seguinte, haja

vista o interesse do assunto na abordagem do tema.

2.2 CONCEITO DE DIREITO DE AÇÃO

Merece destaque a síntese formulada por Rogério Lauria Tucci após o estudo de todas

as teorias para formulação do conceito de ação:

Por isso que todas elas [teorias] devem ser contempladas pelo estudioso do tema, pelo menos como ponto de partida, sem olvidar as inúmeras objeções e críticas que sofreram as diversificadas proposições examinadas, das quais cumpre enfatizar, sucintamente que seja, as seguintes: a) a teoria imanentista [ou civilista] não logra explicar o fenômeno da ação infundada, isto é, daquela que, não obstante processada até o final iudicium, culmina com a proclamação da inexistência do direito subjetivo material e a ser tutelado pelo órgão jurisdicional;

79 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 201. 80 BRASIL. Código de Processo Civil. 38. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p 50. 81 BRASIL. Código de Processo Civil, p 23 e 50.

b) por igual, não consegue os seus expositores esclarecer a existência da ação declaratória negativa; c) de outra banda, a teoria da ação como direito concreto à tutela jurídica esbarra, principalmente, nas situações em que o pedido é julgado improcedente, de sorte a não encontrarem qualquer justificação os atos processuais praticados até o proferimento da sentença; d) no tocante à doutrina de Chiovenda, ou seja, da ação como direito potestativo, por certo que o fato de o Estado e o cidadão terem comum interesse na atuação da Lei não quer significar que não tenham direitos e obrigações, ou deveres, recíprocos; e, mais, ainda, teria o grande mestre italiano confundido direito subjetivo com a faculdade de exercê-lo – mera expectativa no campo dos direitos – coisa bem diversa, induvidosamente; e) por fim, quanto à concepção da ação como direito abstrato, peca ela pelo excessivo abstracionismo, tanto que DEGENKOLB teve a necessidade de impor-lhe forte limitação, a ponto de quase abalar o prestígio da teoria, que se manteve graças à autoridade de ALFREDO E UGO ROCCO sectários da doutrinação 82 .

Como observado, não há teoria que não tenha sofrido críticas, mas as críticas que

surgiram na tentativa de sobrepor concepções às que existiam ao seu tempo demonstra a

evolução do conceito do direito de ação.

Dessa evolução, verificando-se que a cada teoria que surgia eram reafirmadas

características definidas por outras teorias, formaram-se, portanto, conceitos convencionados

e admitidos. Nessa óptica, restou reconhecido a autonomia do direito de ação em relação ao

direito material deduzido em juízo. Da mesma forma, ficou convencionado o caráter público

do direito de ação.

A abstração ficou fixada pelo reconhecimento do direito de ação sem a necessidade de

uma sentença favorável.

A concepção de que o direito de ação é dirigido ao Estado para exigir-lhe a prestação

da tutela jurisdicional deu ao direito de ação natureza jurídica de direito subjetivo, desde a

concepção de Heinrich Degenkolb e de Alexander Plósz83.

Ao certo que a exposição do tema não se esgota nesse trabalho, é importante o

destaque que Fábio Luiz Gomes dá ao conceito de direito de ação: “A ação não é um direito,

nem uma pretensão. A Ação é o exercício de um direito pré existente.”84. Portanto, direito de

exigir do estado a prestação da tutela jurisdicional, logo direito subjetivo.

82 TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo penal (estudos sistemáticos), p. 69 e 70. 83 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 124. 84 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Luiz Fábio. Teoria geral do processo, p. 94.

3 AS CONDIÇÕES DA AÇÃO

Embora as condições da ação tenham sido utilizadas por Enrico Túlio Liebman na

elaboração de sua teoria sobre a natureza jurídica do direto de ação, a definição de cada

condição da ação tem origem no estudo pioneiro de Adolf Wach.

Para Adolf Wach, conforme ensina Fábio Luiz Gomes, há três condições para a ação:

a) a existência de um direito violado ou ameaçado de violação, sob pena de não haver legítimo interesse, que deverá ser real, e não imaginário; b) a legitimação, ou seja, a necessidade de que o direito violado ou ameaçado fosse do próprio autor; c) a possibilidade jurídica do pedido, ou a adequação do direito ao ordenamento jurídico concreto, materializado em fato-tipo previamente determinados85.

Embora com argumentos diversos, Giuseppe Chiovenda definia as condições da ação

com o seguinte argumento:

Entende-se como condições da ação as condições necessárias a que o juiz declare existente e atue a vontade concreta da lei invocada pelo autor, vale dizer, as condições necessárias para obter um pronunciamento favorável. Varia segundo a natureza do pronunciamento. Assim, se pleiteia uma sentença condenatória, veremos que as condições da ação para obtê-la normalmente são: 1º a existência de uma vontade de lei que assegure a alguém um bem obrigando o réu a uma prestação; 2º a qualidade, isto é, a identidade da pessoa do autor com a pessoa favorecida pela lei e da pessoa do réu com a pessoa obrigada; 3º o interesse em conseguir o bem por obra dos órgãos públicos 86.

Portanto, antes da elaboração da teoria das condições da ação já havia considerações

sobre o tema, embora não sob a vertente da natureza jurídica da ação. Até porque Adolf Wach

e Giuseppe Chiovenda defendiam posições diferentes sobre a natureza jurídica da ação.

85 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo civil, p. 104. 86 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 89.

Enrico Túlio Liebman desenvolveu a teoria das condições da ação, como argumento

de que “elas são os requisitos de existência da ação, devendo por isso ser objeto de

investigação no processo, preliminarmente ao exame do mérito, ainda que implicitamente

como costuma ocorrer” 87.

E definiu três condições da ação: possibilidade jurídica, legitimidade ad causam e

interesse de agir88 .

Merece destaque a explicação de Candido Rangel Dinamarco indicada em nota de

rodapé da tradução da obra de Enrico Túlio Liebman89. Até a segunda edição do Manuale di

diritto processuale civile,90 Enrico Túlio Liebman definia três condições da ação como

indicadas acima.

Todavia, em 1973, quando da publicação da terceira edição, na Itália, foi publicada a

lei que instituiu o divórcio, cuja ausência dessa legislação era o exemplo clássico utilizado por

Enrico Túlio Liebman sobre a impossibilidade jurídica do pedido. Ou seja, sem a previsão

legal de divórcio não se podia formular tal pretensão em juízo91.

Com isso, afirma Candido Rangel Dinamarco, o “[…] autor sentiu-se desencorajado a

incluir entre as condições da ação a possibilidade jurídica do pedido.” 92.

Todavia, no mesmo ano foi publicada, no Brasil, a Lei nº 5.869/73 que instituiu o

Código de Processo Civil, mas a teoria das condições da ação foi adotada, indicando as três

condições da ação apresentadas originariamente por Enrico Túlio Liebman93.

A influência dessa teoria no Brasil ocorreu pela presença de Enrico Túlio Liebman no

Brasil no período compreendido entre 1939 e 1946, no qual ministrou aulas na Faculdade de

Direito de São Paulo. A época, na Itália, fora professor de Direito Processual Civil da

Universidade de Parma 94.

87 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 203. 88 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 203. 89 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 204. 90 Tradução do Autor: Manual de direito processual civil. 91 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 204. 92 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 204. 93 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 204. 94 LIEBMAN. Disponível em: <http://www.abdpc.org.br/abdpc/imortal.asp?id=10>. Acesso em: 28 Ago. 2009.

Dentre seus alunos, surgiram vários juristas brasileiros que se consagraram no estudo

do Direito Processual Civil, tais como Alfredo Buzaid, Moacir Amaral dos Santos, José

Frederico Marques, Luís Eulálio Bueno Vidigal, Cândido Rangel Dinamarco e Kazuo

Watanabe 95.

Dessa influência, é que a doutrina refere-se a Enrico Túlio Liebman como criador da

Escola Processual de São Paulo. Essa influência foi relatada por Rodrigo da Cunha Lima

Freire em sua obra:

Sendo Alfredo Buzaid, autor do anteprojeto do atual CPC brasileiro, um discípulo de Liebman, era natural que na vigente lei processual brasileira prevalecesse nitidamente à teoria eclética, prevendo como condições genéricas de toda e qualquer ação o interesse de agir, a legitimidade para a causa e a possibilidade jurídica do pedido (art. 267, IV) 96.

Dessa trajetória histórica, se verifica a influência da doutrina italiana no Direito

Processual Civil Brasileiro, principalmente pelo fato de Enrico Túlio Liebman ter sido aluno

de Giuseppe Chiovenda97, o qual por sua vez foi discípulo de Adolf Wach 98.

3.1 INTERESSE PROCESSUAL

O estudo desse tema requer uma explicação de ordem doutrinária. O interesse

processual não se confunde com o interesse de direito material.

O interesse de direito material é tema da Teoria Geral do Direito e não da Teoria Geral

do Processo. Merece destaque a colocação de Ovídio Araújo Baptista da Silva sobre o tema:

Um dos fatores que mais contribuíram para alimentar as controvérsias a respeito do conceito de ação foi sem dúvida a imprecisão lingüística e a utilização pelos processualistas de conceitos e categorias de direito material, em geral de direito privado. O fenômeno se repete quando se trata dos conceitos de legitimidade e interesse

99.

95 LIEBMAN. Disponível em: <http://www.abdpc.org.br/abdpc/imortal.asp?id=10>. Acesso em: 28 Ago. 2009. 96 FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 83. 97 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da, e GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo, p. 114. 98 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo, p. 40. 99 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Comentários ao código de processo civil: do processo de conhecimento. Ats. 1º a 100. 2. ed. V. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 42.

O Autor explica que isso ocorreu porque, na época da edição do Código de Processo

Civil de 1939, “dominava o conceito civilístico de ação” 100.

O interesse, segundo José Eduardo Carreira Alvim, foi submetido a uma “rigorosa

análise de síntese, por Francesco Carnelluti” 101 .

Para esse Autor, o conceito de interesse “é fundamental tanto para o estudo do

processo quanto para o do Direito” 102 e definia-o com o seguinte argumento, após discorrer

sobre a necessidade do homem e os bens da vida para satisfazer essa necessidade:

Interesse não significa juízo, mas uma posição do homem, ou mais exatamente: a posição favorável à satisfação de uma necessidade. A posse do alimento ou do dinheiro é antes de tudo, um interesse, porque quem possui um ou outro está em condições de satisfazer a sua fome. Os meios para a satisfação das necessidades humanas são os bens. E se acabamos de dizer que interesse é uma situação de um homem favorável a satisfação de uma necessidade, essa situação se verifica, pois, com respeito a um bem: homem e bem são os dois termos da relação que denominamos interesse. Sujeito do interesse é o homem e objeto daquele é o bem 103.

Já Ugo Rocco, apud Rodrigo da Cunha Lima Freire104, definia o interesse como “um

ato de inteligência, juízo de utilidade ou de valor que precede e constitui o escopo da

vontade.” 105.

Em síntese ao pensamento desses autores, define Arruda Alvim, apud Rodrigo da

Cunha Lima Freire:

“Conquanto não se deva negar que o interesse resulta numa posição, esta é necessariamente precedida de um juízo, desde que o homem é um ser racional, e à ‘posição’ chega o homem ao depois de um juízo, matriz do seu querer, dado que o juízo é pressuposto pelo seu querer.” 106 107.

100 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Comentários ao código de processo civil: do processo de conhecimento, p. 42. 101 ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria geral do processo. p. 01. 102 CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil. V. I, 2. ed. Traduzido por Hilton Martins Oliveira, São Paulo: Lemos e Cruz, 2004, p.55. 103 CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, p. 55. 104 FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir, p. 21. 105 FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir, p. 21. 106 FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir, p. 21. 107 Essa citação também é utilizada por José Eduardo Carreira Alvim.

Da definição de interesse, Francesco Carnelutti definiu seu conceito de lide: “Chamo

litígio ao conflito de interesse qualificado pela pretensão de um dos interessados e pela

resistência do outro” 108.

Todavia, o interesse processual foi definido por Enrico Túlio Liebman com outros

argumentos.

Vale lembrar que Enrico Túlio Liebman denominava essa modalidade de condição da

ação como interesse de agir. Todavia, o Código de Processo Civil utiliza a expressão interesse

processual109, motivo pelo qual essa denominação é utilizada nesse trabalho.

Nelson Nery Júnior refere-se a essa circunstância da seguinte forma: “Deve preferir-se

utilizar o termo da lei ao equívoco ‘interesse de agir’, eivado de falta de técnica e precisão.” e

explica: “Agir pode ter significado processual e extraprocessual, ao passo que ‘interesse

processual’ significa, univocamente, entidade que tem eficácia endoprocessual.” 110.

Para a compreensão de Enrico Túlio Liebman, convém citar a definição na íntegra:

O interesse de agir decorre da necessidade de obter através do processo proteção do interesse substancial; pressupõe, por isso, a assertiva de lesão a interesse e aptidão do provimento pedido a protegê-lo. Seria uma inutilidade proceder ao exame da demanda para conceder ou negar o provimento postulado quando a situação de fato apresentada não se encontrasse afirmada uma lesão ao direito ou interesse que se ostenta perante a parte contrária, ou quando os efeitos jurídicos que se esperam do provimento já tivessem sido obtidos, ou ainda quando esse provimento fosse em si mesmo inadequado ou inidôneo a remover a lesão, ou finalmente, quando ele não pudesse ser proferido, porque não admitido em lei (por ex.: a prisão por dívidas) 111.

A expressão final da citação “por que não admitido em lei” decorre da circunstância de

que no período em que foi escrito, Enrico Túlio Liebman havia abandonado o conceito de

possibilidade jurídica do pedido, como foi explicado acima.

108 CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, p. 93. 109 BRASIL. Código de Processo Civil, p. 50. 110 NERY JÚNIOR, Nelson. Condições da ação. Revista de direito processual civil, nº. 64, ano 16, 1991, p. 33. 111 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 206.

A categoria “lesão ao direito”, apontada por Enrico Túlio Liebman, a nosso ver,

decorre da conceituação dessa categoria por Giuseppe Chiovenda: Quando ao direito a uma

prestação deixa de corresponder o estado de fato, por não se haver satisfeito a prestação, diz-

se lesado o direito112. Isso porque, como já foi dito, Enrico Túlio Liebman foi aluno de

Giuseppe Chiovenda.

Isso quer dizer que para haver interesse processual deverá existir pretensão resistida,

ou seja, litígio como definiu anteriormente Francesco Carnelutti. Portanto, haverá interesse

processual quando houver pretensão resistida.

A necessidade, segundo Cássio Scarpinella Bueno decorre da vedação a autotutela no

ordenamento jurídico, haja vista o caráter substitutivo da função jurisdicional113. Ou seja, é

necessário porque o sujeito, não tem outro meio de obter o bem pretendido, pois o

ordenamento jurídico lhe nega buscá-lo com as próprias mãos.

Um exemplo encontrado na jurisprudência e discutido na doutrina é a necessidade de

requerimento do autor de pedido formulado e negado administrativamente para configuração

da pretensão resistida e consequente interesse processual.

Esse entendimento é observado no teor da seguinte ementa:

PROCESSUAL CIVIL. CARENCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. PREVIDENCIARIO. APOSENTADORIA POR IDADE. FALTA DE PEDIDO ADMINISTRATIVO. 1 - A AUSENCIA TOTAL DE PEDIDO NA VIA ADMINISTRATIVA, INGRESSANDO A SEGURADA, DIRETAMENTE, NA ESFERA JUDICIARIA, VISANDO OBTER BENEFICIO PREVIDENCIARIO (APOSENTADORIA POR IDADE), ENSEJA A FALTA DE UMA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO - INTERESSE DE AGIR - POIS, A MINGUA DE QUALQUER OBSTACULO IMPOSTO PELA AUTARQUIA (INSS), NÃO SE APERFEIÇOA A LIDE, DOUTRINARIAMENTE CONCEITUADA COMO UM CONFLITO DE INTERESSES CARACTERIZADO POR UMA PRETENSÃO RESISTIDA. 2- RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO PARA EXTINGUIR O FEITO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO (ART. 267, VI, DO CPC) 114.

112 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 33. 113 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. V. 1. São Paulo: Saraiva 2007, p. 358. 114 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 151818/SP, da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, j. em 10.03.1998, publicado em 30.03.1998. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=151818&b=ACOR.Acesso em 15 out 2009.

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. 1. Carece de interesse de agir, para a ação de exibição de documentos, a parte que não demonstra ter apresentado requerimento administrativo a fim de obter a documentação pretendida. Precedentes do STJ. 2. Ademais, rever o entendimento do Tribunal de origem de que a parte não comprovou a negativa do INSS em exibir os documentos demandaria a análise do acervo fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula 7/STJ. 3. Agravo Regimental não provido115.

PROCESSUAL CIVIL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO X EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR . 1. Uma das condições da ação é a existência de interesse de agir, que se caracteriza pela necessidade e utilidade do provimento jurisdicional . 2. A necessidade não pode ser visualizada quando não há sequer um primeiro requerimento administrativo que tenha sido negado ou em relação ao qual tenha transcorrido prazo irrazoável para sua apreciação . 3. Não se confunde necessidade do requerimento administrativo indeferido ou não analisado, do qual surge o interesse de agir, com o exaurimento da via administrativa, este sim desnecessário. 4. O princípio constitucional da inafastabilidade do controle judicial pressupõe a prévia negativa de uma pretensão ou a omissão em sua apreciação, de onde emergirá, no mínimo, ameaça de lesão a direito. Antes deste momento não se fala em controle judicial, posto que sequer ameaça à direito ou interesse existirá . 5. Apelação não provida. Sentença confirmada116.

Todavia, quanto ao tema, há entendimento em sentido contrário amparado no princípio

do acesso a justiça, como se observa no teor das seguintes ementas do Superior Tribunal de

Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. INTERESSE DE AGIR. PRECEDENTES. 1. Não é obrigatório o prévio requerimento na via administrativa para o ingresso no Poder Judiciário mediante a impetração de mandado de segurança, ante o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido. 117.

115 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1089433/PR, Rel. Ministro Herman Benjamim, j. em 28.04.2009, publicado em 17.06.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=1089433&b=ACOR Acesso em 15 out 2009. 116 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1º Região. Apelação Cível nº 2000.01.00.067194-0, Rel. Juiz Federal César Augusto Bearsi, j. em: 17.08.2005. Disponível em: http://arquivo.trf1.gov.br/default.asp?processoX=200001000671940. Acesso em 15 out 2009.

PROCESSUAL. SERVIDOR. ADICIONAL DE TEMPO DE SERVIÇO. REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. INTERESSE EM AGIR CARACTERIZADO.PRINCÍPIO DO LIVRE ACESSO À INSTÂNCIA JUDICIAL. - A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, com base no cânon constitucional que preconiza o livre acesso ao Poder Judiciário, é pacífica no sentido de que a exaustão da instância administrativa não é condição para o pleito judicial. - Patente a existência do interesse em agir, de vez que desnecessário o prévio requerimento na via administrativa para ensejar o ingresso na via judiciária, mormente quando a vantagem pleiteada é imposta à administração por imperativo legal.- Recurso especial conhecido 118 .

Sobre a utilidade, discorre Cássio Scarpinella Bueno:

O interesse de agir, neste sentido, representa a necessidade de requerer, ao Estado-juiz, a prestação da tutela jurisdicional com vistas à obtenção de uma posição de vantagem (a doutrina costuma se referir a esta vantagem como utilidade) que, de outro modo, não seria possível alcançar. O interesse de agir, portanto, toma como base o binômio “necessidade” e “utilidade”. Necessidade da atuação jurisdicional em prol da obtenção de uma dada utilidade

119.

Na definição desta necessidade, Rodrigo da Cunha Lima Freire:

Afirma-se, comumente, que o interesse de agir se concretiza na exigência de um resultado útil do processo e, portanto, da jurisdição. Mas, o que significa esta utilidade? São vários os sentidos empregados na doutrina a respeito da utilidade da tutela jurisdicional. A utilidade da jurisdição, e não a necessidade desta, segundo alguns, decorreria da existência de uma lesão ao direito subjetivo ou de um dano ao titular deste direito, devendo o juiz verificar a existência de uma concreta utilidade do processo para o autor 120.

117 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRe em REsp 772.692/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, j. em 19.08.2008, publicado em 08.09.2008. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=772692&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 15 out 2009. 118 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 261158/SP, Rel. Vicente Leal, j. em 22.08.2000, publicado em 11.09.2000. Disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=261158&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 15 out 2009 119 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, p. 358. 120 FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir, p. 157.

Para Cândido Rangel Dinamarco, ao definir interesse como necessidade, se refere à

adequação ao invés de utilidade121, ao passo que Marcus Vinícius Rios Gonçalves se refere à

adequação como categoria autônoma122.

Em posição diversa, Cássio Scarpinella Bueno argumenta que:

Aceitando como premissa fundante do pensamento do direito processual civil a noção de que todos e quaisquer aspectos relativos à forma devem ceder espaço aos resultados úteis da função jurisdicional (sempre vale a ênfase, exercitada mediante um devido processo), não há razão para elevar a ‘adequação’ à categoria de componente do ‘interesse de agir’. 123.

Nelson Nery Júnior acrescenta ao tema: “Movendo a ação errada ou utilizando-se do

procedimento incorreto, o provimento jurisdicional não lhe será útil, razão pela qual a

inadequação procedimental acarreta inexistência do interesse processual” 124.

Na síntese dessa divergência, Teresa Arruda Alvim Wambier discorre:

Parece-nos, entanto, que, no binômio de que se falou – utilidade e necessidade –, está embutida a idéia de ‘adequação’, pois, se a via escolhida é inadequada, por conseguinte é inútil, Só a via adequada há de ser útil para que, teoricamente (= se fundado o pedido), possam ser atingidos os objetivos colimados 125 .

Não obstante a divergência, esses entendimentos são observados em julgados do

Superior Tribunal de Justiça como se observa no teor das seguintes ementas:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. INTERESSE DE AGIR. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Nos termos do art. 3º do Código de Processo Civil, a prestação jurisdicional tem de ser útil, o que decorre da conjugação da necessidade concreta da atividade jurisdicional e da adequação da medida judicial pleiteada. 2. Em ação de exibição de documentos, aquele que pretende questionar, em ação principal a ser ajuizada, as relações jurídicas decorrentes de documentos em poder da parte adversa, detém interesse de agir.

121 DINAMARCO. Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. V. 2. 3 ed. São Paulo Malheiros, 2003, p. 302. 122 GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Novo curso de direito processual civil. V. 1. 5 ed. São Paulo Saraiva, 2008, p. 92. 123 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, p. 358. 124 NERY JÚNIOR, Nelson. Condições da Ação. Revista de Direito Processual Civil, nº. 64, ano 16, 1991, p. 37. 125 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 60.

3. Não se coaduna com a relevância da questão social que envolve a matéria previdenciária, instituir óbice ao exercício do direito do segurado em obter acesso ao procedimento administrativo que culminou na percepção do seu benefício previdenciário. 4. Recurso especial provido126.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL EMBARGADA. AÇÃO DECLARATÓRIA INCIDENTAL. INTERESSE PROCESSUAL. INEXISTÊNCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. A propositura de ação declaratória incidental à execução fiscal já embargada denota o descabimento da impugnação autônoma por ausência de interesse de agir; mercê do descabimento da mesma em processo satisfativo onde não haverá definição de direitos. 2. O interesse jurídico-processual, uma das condições do exercício do direito de ação, deflui do binômio necessidade-utilidade da prestação jurisdicional, sendo certo que: "Encarta-se no aspecto da utilidade a escolha correta do procedimento adequado à pretensão deduzida. Assim, se a parte pede em juízo uma providência de cunho petitório e utiliza o processo possessório, da narrativa de sua petição já se observa a inadequação do remédio escolhido para a proteção que pretende; por isso, é inútil aos seus desígnios, por conseqüência, ao autor, faltará o interesse de agir. Exemplo típico da falta de interesse de agir é o que se verifica em ação meramente declaratória na qual se observa da prescrição da ação condenatória respectiva à pretensão declarada. Nesse seguimento, se a parte dispõe de título executivo para iniciar o processo satisfativo de execução e demanda determinada obrigação através do processo de conhecimento, há manifesta inutilidade da via eleita, porquanto a duplicação de processos com a prévia cognição e posterior execução revela-se desnecessária diante do documento que o exeqüente possui, ressalvada a possibilidade de utilização do documento para fins de antecipação de tutela. Expressiva hipótese de interesse de agir prevista em lei é a do art. 4º, do CPC, e seu parágrafo único, no qual o legislador permite a propositura de ação declaratória ainda que a parte possa promover, de logo, a ação condenatória. É que em toda condenação está embutida uma declaração, como de resto, em qualquer pronunciamento judicial. Entretanto, a lei permite que a parte 'pare no meio do caminho', postulando tão-somente a declaração, o 'acertamento da responsabilidade', para após, segundo a sua conveniência, promover ou não o pedido de condenação, com a premissa da responsabilidade previamente definida. Observe-se que, não fosse o dispositivo legal expresso, a parte que intentasse a ação declaratória podendo mover a condenatória incidiria em falta de interesse de agir." (Luiz Fux, in "Curso de Direito Processual Civil", Vol. I, 4ª Ed., Rio de Janeiro, 2008, págs. 178/179).3. […] 5. A inadequação do instrumento processual eleito ("ação declaratória incidental"), que pretende a anulação do título executivo que embasa a execução fiscal, denota a falta de interesse de agir, razão pela qual se impõe a extinção do feito sem resolução de mérito, ex vi do disposto no artigo 267, VI, do CPC, revelando-se escorreita a sentença que indeferiu liminarmente a inicial com espeque no artigo 295, III, do Codex Processual. 6. Recurso especial desprovido 127 .

126 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1103961/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, j. em 14.04.2009, publicado em 04.05.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=1103961&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1 Acesso em 10 out 2009.

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CARTÃO DE CRÉDITO. MEDIDA CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PREPARATÓRIA DE AÇÕES REVISIONAIS DE DÉBITOS. INTERESSE DE AGIR. - A exibição de documentos como medida cautelar tem por escopo evitar o risco de uma ação principal mal proposta ou deficientemente instruída. - O que caracteriza o interesse processual ou interesse de agir é o binômio necessidade-adequação; necessidade concreta da atividade jurisdicional e adequação de provimento e procedimento desejados. - Tem interesse de agir para requerer medida cautelar de exibição de documentos aquele que pretende questionar, em ação principal a ser ajuizada, as relações jurídicas decorrentes de tais documentos. Recurso especial provido 128.

Portanto, embora haja consenso quanto à necessidade como elemento do interesse

processual, quanto à utilidade e à adequação, o tema é divergente. Todavia, considerando-se o

conteúdo das decisões citadas, a adequação é tratada como elemento constitutivo do conceito

de interesse processual.

O certo é que na obra de Enrico Túlio Liebman não se verifica a utilização da

categoria adequação com referência ao procedimento (rito) adotado, mas sim quanto ao

provimento.

A utilidade, por sua vez, se refere ao fato de que se não há pretensão resistida, o que

denominava lesão ao direito, é inútil propor a ação, pois não haveria prestação descumprida

para ser exigida.

Quanto às ações que versam sobre provimento declaratório e constitutivo, nas quais

não há pretensão resistida, haja vista inexistência de prestação, não se pode utilizar o

entendimento formulado acima para identificar o interesse processual.

127 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 940.314/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, j. em 24.03.2009, publicado em 27.04.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=940314&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1 Acesso em 10 out 2009. 128 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 659.139/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. em 15.12.2005, publicado em 01.02.2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=659139&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1 Acesso em 10 out 2009.

Quanto a essas categorias, explicou Enrico Túlio Liebman:

Nas ações condenatórias e constitutivas o interesse de agir é muito visível, porque fica pressuposto com a afirmação de um direito em estado de insatisfação. Adquire maior relevância nas ações declaratórias (em que o interesse é representado pela incerteza sobre a existência da relação jurídica: infra, n. 83) e nas cautelares (interesse fornecido pelo periculum im mora: infra, n.96), uma vez que nessas categorias de ações a causa pretendi reside na afirmação de uma situação de fato cujo caráter lesivo é necessário avaliar caso a caso 129.

Na jurisprudência, há julgados que abordam o tema sob essa óptica:

O INTERESSE DE AGIR POR MEIO DE AÇÃO DECLARATORIA ENVOLVE A NECESSIDADE, CONCRETAMENTE DEMONSTRADA, DE ELIMINAR OU RESOLVER A INCERTEZA DO DIREITO OU RELAÇÃO JURÍDICA. 2. A DECLARATORIA TEM POR CONTEUDO O ACERTAMENTO, PELO JUIZ, DE UMA RELAÇÃO JURÍDICA. 3. CASO EM QUE FOI ALEGADA, E NÃO DEMONSTRADA OFENSA AO ART. 2 DO C. PR. CIVIL DE 1939 A QUE CORRESPONDE O ART. 4 DO C. PR. CIVIL DE 1973. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE O STF NEGA CONHECIMENTO 130. PROCESSUAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL.EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. - O interesse de agir por meio de ação declaratória envolve a necessidade concretamente demonstrada de eliminar ou resolver a incerteza do direito. A transferência da propriedade dos imóveis no registro imobiliário depende da apresentação de Certidão Negativa de Débito - CND da construtora, proprietária dos imóveis, relativa a todos os seus débitos, e não somente em relação à obra onde estejam localizados os imóveis adquiridos. Assim, os compradores de imóveis são carecedores de ação por falta de interesse no tocante à declaração de inexistência de débito circunscrito aos imóveis adquiridos por eles, visto que a circunstância não viabiliza a transferência dos imóveis. - Apelação desprovida131.

Portanto, o interesse processual está relacionado com a necessidade e a utilidade do

provimento jurisdicional, aliado ao entendimento de que a escolha do procedimento de forma

errada afeta o interesse processual.

129 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 207. 130 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 85486/PR, Rel. Ministro Antonio Neder, j. em 03.11.1977, publicado em 07.11.1977. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(85486.NUME.%20OU%2085486.ACMS.)&base=baseAcordaos. Acesso em 10 out 2009. 131 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Cível nº 200170000379779 /PR, Rel. Des. João Surreaux Chagas, j. em 27.04.2004, publicado em 30.06.0004. Disponível em: http://www.trf4.jus.br/trf4/jurisjud/inteiro_teor.php?orgao=1&numeroProcesso=200170000379779&dataPublicacao=30/06/2004. Acesso em 10 out 2009.

3.2 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO

Embora na quarta edição da obra de Enrico Túlio Liebman, não haja referência à

possibilidade jurídica do pedido como categoria autônoma de condições da ação, o tradutor de

sua obra, Cândido Rangel Dinamarco, traduz a definição de possibilidade jurídica do pedido

que foi formulada na terceira edição.

Essa tradução se observa o conceito desenvolvido por Enrico Túlio Liebman:

Possibilidade jurídica do pedido. O terceiro requisito da ação é representado pela admissibilidade em abstrato do provimento pedido, isto é, pelo fato de incluir-se este entre aqueles que a autoridade judiciária pode emitir, não sendo expressamente proibido. Quaisquer que sejam as circunstâncias do caso concreto, não pode ser apreciada pelo mérito uma demanda com vista a um provimento que o juiz não possa pronunciar. O juiz não pode, p. ex: decretar o divórcio dos cônjuges, nem ordenar a prisão por dívidas, nem anular um ato administrativo, ainda que ilegítimo e lesivo a um direito do cidadão (lei de 20.3.1865, art. 4º, ‘E’) 132.

Quanto à circunstância de que Enrico Túlio Liebman tenha abandonado a

possibilidade jurídica do pedido como condição autônoma, Cássio Scarpinella Bueno,

argumenta que isso não afeta o fato de o ordenamento jurídico brasileiro adotar o conceito

originário dessa categoria, como explica:

Mais do que nas outras condições da ação, com relação à ‘possibilidade jurídica do pedido’, a doutrina sempre se mostrou bastante arisca. Isto tem razão de bem documentada e ela reside na circunstância de seu idealizador, Liebman, ter deixado de se referir a ela em edições ulteriores de sua obra à falta de situações que a descrevem adequadamente no direito italiano. Embora esta constatação seja verdadeira, não há como negar a peculiaridade do direito brasileiro de tê-la acolhido expressamente e, por isto, nenhuma diferença faz o fato de, doutrinariamente, ela ser mais ou menos aceita pelo seu próprio idealizador e pela doutrina que se seguiu a ele, no exterior e no Brasil133.

O conceito de possibilidade jurídica do pedido formulado por Enrico Túlio Liebman

foi adotada pela doutrina, haja vista que a exigibilidade de previsão de vedação ao pedido de

provimento jurisdicional é característica preponderante dessa categoria. Ou seja, o pedido não

pode ser vedado no ordenamento jurídico.

132 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 205. 133 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, p. 359.

Assim, define Cássio Scarpinella Bueno:

Por ‘possibilidade jurídica do pedido’ deve ser entendido que o pedido de tutela jurisdicional a ser formulado ao Estado-juiz não pode ser vedado pelo ordenamento jurídico ou, quando menos, que as razões pelas quais alguém pede a prestação de tutela jurisdicional do Estado não sejam, elas mesmas, vedadas pelo ordenamento jurídico 134 .

O Autor Marcus Vinícius Rios Gonçalves adota tal entendimento e vai além, ao

abordar o tema sob a óptica da impossibilidade jurídica do pedido no âmbito da causa de

pedir, como se observa na sua explicação:

Não se admite a formulação de pretensões que contrariem o ordenamento jurídico. Aquele que vai a juízo postular algo vedado por lei terá sua pretensão obstada. Não haveria sentido em movimentar a máquina judiciária se já se sabe de antemão que a demanda será mal sucedida porque contraria o ordenamento jurídico do pedido. Por essas razões, a expressão ‘possibilidade jurídica do pedido’ diz menos do que deveria dizer, porque não se restringe ao pedido, mas a todos os elementos da ação. Também não se admite pedido ou causa de pedir que, embora não afronte diretamente a lei, ofendam a moral e os bons costumes. Não se pode, por exemplo, ingressar em juízo para cobrar por prestação de serviços de prostituição. A imoralidade, e não a ilegalidade impede que processo siga adiante135 .

Merece destaque a explicação de José Roberto Bedaque porque deixa claro o que

chama de “fórmula negativa” de aferir a possibilidade jurídica do pedido:

5. Possibilidade jurídica da demanda – A demanda apresenta-se juridicamente possível sempre que inexista, no ordenamento jurídico, vedação ao provimento jurisdicional decorrente de uma dos elementos da ação (partes, pedido ou causa de pedir) (39) Na medida em que, pelo menos no âmbito civil, a tipicidade dos modelos abstratos é vaga e indefinida, não deveria conceber essa condição da ação em termos afirmativos, como existência de previsão legal. A fala dessa previsão nem sempre levará à exclusão, pelo ordenamento, da pretensão do autor. Sugere a doutrina mais autorizada à adoção de fórmula negativa: apenas quando o legislador, em abstrato, veda a pretensão, existe carência de ação por impossibilidade jurídica do pedido136.

134 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, p. 359. 135 GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Novo curso de direito processual civil, p. 91. 136 BEDAQUE, José Roberto. As condições da ação. In Justitia nº 156, São Paulo, 1991, p. 54/56.

A previsão em abstrato da norma cuja prestação se exige em juízo, ou seja, previsão

no âmbito do direito objetivo, é ressaltado por Moacyr Amaral Santos: “Possibilidade jurídica

do pedido é condição que diz respeito à pretensão. Há possibilidade jurídica do pedido quando

a pretensão, em abstrato, se inclui entre aquelas que são reguladas pelo direito objetivo.” 137.

Da análise de decisões do Superior Tribunal de Justiça, fica evidenciado, tanto pelo

aspecto quantitativo, haja vista a reiteração de julgados no mesmo sentido, bem como pelo

aspecto qualitativo, posto que se trate de decisões proferidas por tribunal cuja função é

unificar a interpretação da norma federal, que a possibilidade jurídica do pedido está ligada

diretamente à inexistência expressa de vedação legal ao pedido de provimento formulado pelo

autor, como se observa no teor das seguintes ementas:

RECURSO ESPECIAL. CESSÃO DE CRÉDITO POR INSTRUMENTO PARTICULAR.AUSÊNCIA DE REGISTRO. INEFICÁCIA EM RELAÇÃO A TERCEIROS.ILEGITIMIDADE PASSIVA. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. 1. A possibilidade jurídica do pedido consiste na admissibilidade em abstrato da tutela pretendida, vale dizer, na ausência de vedação explícita no ordenamento jurídico para a concessão do provimento jurisdicional. Não havendo vedação normativa explícita para a cobrança de alegada cessão de crédito, a impossibilidade jurídica do pedido aventada pelo Tribunal a quo há de ser afastada. No caso em exame, se de ausência de provas da dívida se cogita, caso seria de improcedência do pedido e não de carência de ação 138 .

DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PRELIMINARES DE IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA E DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. REJEIÇÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. SANÇÃO A SER APLICADA. AUSÊNCIA DE JUSTO RECEIO. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. […] 2. "A impossibilidade jurídica do pedido é de ser reconhecida apenas quando há expressa proibição do pedido no ordenamento jurídico" (MS 11.513/DF, Rel. Min. LAURITA VAZ, Terceira Seção, DJ de 7/5/07). Considerando ser plenamente cabível pedido de afastamento de sanção disciplinar, rejeito a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido 139.

137 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil: processo de conhecimento. 25 ed. V. 1. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 178. 138 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 301.981/SP, Rel. Ministro Luiz Felipe Salomão, j. em 18.08.2009, publicado em 02.09.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=301981&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=2. Acesso em 01 out 2009. 139 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. MS 13.717/DF, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, j. em 10.06.2009, publicado em 29.06.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=13717&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 10 out 2009.

RECURSO ORDINÁRIO. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. FIGURAS DISTINTAS QUE NÃO PODEM COINCIDIR. ACÓRDÃO QUE INTERPRETOU DE FORMA EQUIVOCADA A QUESTÃO. PEDIDO POSSÍVEL. MÉRITO NÃO ANALISADO. RETORNO DOS AUTOS PARA NOVO JULGAMENTO. 1. A impossibilidade jurídica do pedido pode ser conceituada como uma vedação explícita do ordenamento que impede, de pronto, ainda que abstratamente, que a pretensão deduzida em juízo seja analisada pelo Poder Judiciário. Doutrina 140 . DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO. POSSE EXERCIDA APENAS SOBRE PARTE DE IMÓVEL URBANO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. AFASTAMENTO. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL À PRETENSÃO DA AUTORA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. […] 3. A possibilidade jurídica do pedido consiste na admissibilidade em abstrato da tutela pretendida, vale dizer, na ausência de vedação explícita no ordenamento jurídico para a concessão do provimento jurisdicional 141 . ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. NÃO-OCORRÊNCIA. PRESENTES NECESSIDADE E UTILIDADE. TESE DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. REJEIÇÃO. […] 3. Segundo entendimento jurisprudencial e doutrinário, a impossibilidade jurídica do pedido é de ser reconhecida apenas quando há expressa proibição do pedido no ordenamento jurídico. 4. Agravo regimental desprovido 142 . PROCESSUAL CIVIL. PETIÇÃO INICIAL. INDEFERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. I - Só há impossibilidade jurídica do pedido quando a pretensão do autor, considerada em abstrato, enfrenta vedação explícita no direito positivo. […] 143 .

140 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RMS 17.009/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, j. em 21.05.2009, publicado em 08.06.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=17009&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 10 out 2009. 141 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 254.417/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, j. em 16.12.2008, publicado em 02.02.2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=254417&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 10 out 2009. 142 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 853.234/RJ, Rel. Ministra Laurita Vaz, j. em 02.12.2008, publicado em 19.12.2008. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=853234&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 02 out 2009.

Portanto, haverá impossibilidade jurídica do pedido quando a pretensão for

“expressamente” vedada pelo ordenamento jurídico.

3.3 LEGITIMIDADE AD CAUSAM

A legitimidade processual não se confunde com capacidade processual, nem com

capacidade de estar em juízo. No estudo dessa condição da ação, a distinção dessas categorias

é importante. Para tanto, a explicação de Ernandis Fidélis dos Santos é suficiente:

Não se deve também confundir a capacidade de ser parte, a capacidade para estar em juízo e a legitimação para a causa. A primeira é capacidade genérica para figurar como parte; a segunda, a capacidade de defender direito próprio ou alheio em juízo; a terceira importa na titularidade ativa e passiva da ação. A parte, mesmo sendo ilegítima, é parte, mas a capacidade de ser parte e a capacidade de estar em juízo são pressupostos processuais144.

A capacidade de ser parte, portanto, diz respeito à personalidade que em nosso

ordenamento é característica da pessoa seja física ou jurídica. Portanto, toda pessoa pode ser

parte. A ressalva a tal regra diz respeito a exceções veiculadas em norma jurídicas, como por

exemplo, o nascituro, cujos direitos à lei põe a salvo desde a concepção, conforme o disposto

no art. 2º do Código Civil145.

Nessa exceção, também estão incluídas a massa falida, o espólio, as sociedades sem

personalidade, o condomínio, a herança vacante ou jacente, conforme o disposto no art. 12, II,

III, IV, V, VII, do Código de Processo Civil146.

Um exemplo dessa exceção criada pela doutrina e pela jurisprudência, é a denominada

capacidade judiciária atribuída as Câmaras de Vereadores e às Assembléias Legislativas para

postularem em juízo mesmo sem personalidade jurídica. Essa explicação é evidenciada no

teor das seguintes ementas do Superior Tribunal de Justiça:

143 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 439.314/MG, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, j. em 28.03.2006, publicado em 08.05.2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=439314&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 10 out 2009. 144 SANTOS. Ernandis Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. V. 1. 12 ed. São Paulo: Saraiva 2007, p. 62. 145 BRASIL. Código Civil, 58. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.19. 146 BRASIL. Código de Processo Civil, p.24.

RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CÂMARA MUNICIPAL. SERVIDORES. ILEGITIMIDADE PASSIVA. A doutrina e jurisprudência desta Corte são absolutamente pacíficas em afirmarem que as Câmaras Municipais têm apenas personalidade judiciária, e não jurídica, motivo pelo qual podem estar em juízo na defesa de seus interesses institucionais. Tratando-se de demanda envolvendo servidores da Câmara Municipal de São Paulo, na qual pleiteiam verbas salariais, a legitimidade passiva é do respectivo município. Recurso provido para afastar a Câmara Municipal da relação processual, na qualidade de agente passivo 147 .

PROCESSUAL CIVIL - CÂMARA MUNICIPAL - PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. A Câmara Municipal não tem personalidade jurídica e sim judiciária, e pode estar em Juízo defendendo os seus interesses. Tendo o Município interesse a defender na lide, deve ele figurar em seu pólo passivo. Recurso provido 148.

Sobre a capacidade de ser parte, e capacidade de estar em juízo, em consonância ao

explicado acima, merece destaque a posição de Araken de Assis:

A personalidade processual é atributo de todos: das pessoas naturais e jurídicas aos entes despersonalizados (v.g., o condomínio) e aos movimentos sociais (v.g., Movimento Sem Terra – MST), passando por órgãos das pessoa jurídicas de direito público (v. g., a mesa da Câmara de Vereadores). Nesse sentido, a personalidade processual, ou capacidade para estar em juízo, corresponde à aptidão genérica e abstrata para figurar em qualquer processo149 .

A capacidade de estar em juízo, por sua vez, diz respeito à capacidade civil, ou seja, ao

exercício do direito, cuja falta é suprida pela representação ou assistência, nas hipóteses de

capacidade relativa.

A legitimidade de agir é definida por Enrico Túlio Liebman a partir do interesse de

agir, como se observa na sua explicação:

147 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 262028/SP, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, j. em 13.02.2001, publicado em 26.03.2001. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=262028&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 10 out 2009. 148 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 241637/BA, Rel. Ministro Garcia Vieira, j. em 17.02.2000, publicado em 20.03.2000. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=1103961&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 10 out 2009. 149 ASSIS, Araken de. Substituição processual. In Revista Dialética de Direito Processual nº 9, dez. 2003, p. 9.

Legitimação para agir (legitimidade ad causam) é a titularidade ativa e passiva da ação. O problema da legitimação consiste em individualizar a pessoa a quem pertence o interesse de agir (e, pois, a ação) e a pessoa com referência a qual [Nei cui confrontti] ele existe; em outras palavras, é o problema que decorre da distinção entre a existência objetiva do interesse de agir e a sua pertinência subjetiva 150 .

Isso quer dizer que a legitimidade diz respeito à titularidade do direito material

invocado, tanto que Enrico Túlio Liebman indica, ao final da explicação, o disposto no art. 81

do Código de Processo Civil italiano:

É isso que dispõe o art. 81 do Código de Processo Civil: ‘fora dos casos expressamente previstos em lei, ninguém pode defender no processo, em nome próprio, um direito alheio’151 .

Essa norma está veiculada no art. 6º do Código de Processo Civil, cujo conteúdo

dispõe: “Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado

por lei” 152.

Portanto, a legitimidade de agir diz respeito à identidade entre as partes da relação

jurídica de direito material objeto do processo e as partes do processo, haja vista que ninguém

poderá pleitear direito alheio, tampouco direito de quem não está obrigado, salvo quando

autorizado por lei. Tem-se nesse caso o que se convencionou chamar de legitimidade

ordinária.

Na conclusão de Marcus Vinícius Rios Gonçalves: “Não se pode admitir, salvo

excepcionalmente, que alguém vá a juízo, na condição de parte, para postular ou defender

interesse que é atribuído a outra pessoa.” 153.

Nos casos em que a lei permite que terceiro alheio a relação jurídica de direito material

pleiteie o direito de outrem, tem-se o que a doutrina denomina de legitimidade extraordinária,

o que é bem explicada por Marcus Vinícius Rios Gonçalves:

150 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 208. 151 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 209. 152 BRASIL. Código de Processo Civil, p 23. 153 GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Novo curso de direito processual civil, p. 92.

Há aí um fenômeno de substituição. Substituto processual é aquele que atua como parte, postulando ou defendendo um direito que não é seu, mas do substituído. Por isso que a legitimidade extraordinária é também chamada de substituição processual. Quando ela se verifica, há dissociação entre a qualidade de parte e a titularidade do direito material alegado154 .

A legitimidade extraordinária também é destacada por Enrico Túlio Liebman e a

define: “o direito de perseguir em juízo ‘um direito alheio’ (art. 81, cit)” 155.

Cássio Scarpinella Bueno faz importante síntese da discussão a respeito da natureza

jurídica da legitimidade extraordinária que merece ser transcrita:

Não será por outras razões, aliás, que parcela da doutrina nacional – forte nos processualistas alemães – não deixa de querer ver a legitimidade extraordinária como fenômeno que se dá no âmbito dos pressupostos processuais (legitimidade para o processo – quem pode, em nome alheio, ser condutor do processo) e não no das condições da ação (legitimidade para a causa – a quem pertence o bem da via deduzido em juízo. É dizer: para estes doutrinadores, a ‘legitimidade extraordinária’ só tem relevância para o processo, só diz respeito a saber quem pode conduzir validamente o processo, sendo menos importante, para este fim, saber de quem é o bem da vida nele deduzido 156 .

Sobre as condições da ação, maiores considerações ultrapassaria o propósito do presente trabalho.

154 GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Novo curso de direito processual civil, p. 93. 155 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 211. 156 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, p. 357.

4 A COGNIÇÃO DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO

A afirmativa de que a ação é condicionada gera críticas da doutrina, na medida em que

não se consegue explicar qual a natureza do ato praticado pela parte, caso não haja condições

da ação e o processo seja extinto sem resolução do mérito, bem como a natureza da atividade

exercida pelo juiz, se jurisdicional, ou não.

Fredie Didier Júnior, parte dessa conclusão para aferir crítica à denominação

“condições da ação”, haja vista que, considerar que não houve ação quando o processo é

extinto por falta de uma dessas condições, seria o mesmo que “negar a natureza jurisdicional

ao juízo de admissibilidade.”157, de modo que sugere a modificação dessa denominação, como

se observa a seguir:

Há quem proponha a mudança do nome do instituto para ‘condições do exercício legítimo do direito de ação’ pois nada diz quanto à existência do direito de ação (incondicionado), mas apenas quanto a seu exercício. O dizer-se abstrato e autônomo tal direito já elimina qualquer possibilidade de cogitar-se de carência de ação 158 .

Nessa mesma linha de raciocínio, Alexandre Freitas Câmara considera as condições da

ação como “requisitos do provimento final” 159 e assevera:

Não se mostra adequada a utilização da designação ‘condições’ uma vez que se está aqui diante de um evento futuro e incerto a que se subordina a eficácia de um ato jurídico, sendo por esta razão preferível falar em requisitos. Ademais, não parece que se esteja aqui diante de requisitos da ação, pois esta, a nosso sentir, existe ainda que tais requisitos não se façam presentes. Mesmo quando ausente alguma das condições da ação, o que levará à prolação de sentença meramente terminativa, a qual não contém resolução do mérito, terá havido exercício de função jurisdicional, o que revela ter havido exercício do poder de ação 160 .

157 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo. São Paulo: Saraiva 2005, p. 210. 158 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo, p. 210. 159 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 128. 160 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 128.

E ao final do raciocínio, conclui: “As ‘condições da ação’, como visto, são requisitos

exigidos para que o processo possa levar a um provimento final, de mérito.” 161.

Nelson Nery Júnior, por sua vez, vê nas condições da ação, a condição da existência

do direito de ação: “Sendo elas objeto de aferição da existência do direito de ação, referem-se

ao Direito Processual Civil em sentido estrito, configurando-se como matéria de ordem

pública.” 162 .

Embora haja críticas quanto à natureza jurídica das condições da ação, tal

circunstância não afeta o tema proposto, haja vista que essa teoria foi adotada em nosso

ordenamento jurídico.

O que nos cumpre identificar é o momento em que a existência das condições da ação

deve ser aferida e a influência que a análise das condições gera na natureza da decisão que

surge a partir desse ato.

4.1 DECISÕES DEFINITIVAS E TERMINATIVAS, COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL

O desenvolvimento desse tema neste trabalho assume importância na medida em que a

natureza jurídica da decisão que analisa as condições da ação gera efeitos na definição da

espécie de coisa julgada.

São definitivas as sentenças que resolvem o mérito (art. 269 do CPC), são terminativas

as sentenças que não resolvem o mérito (art. 267 do CPC)163.

A definição de sentença a partir do conteúdo, embora não seja objeto direto do estudo,

é importante, pois diz respeito à natureza da sentença que analisa as condições da ação.

A redação original do art. 162 § 1º do Código de Processo Civil (revogado) definia a

sentença a partir do momento em que a decisão era prolatada:

Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. § 1º Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa;

161 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 128. 162 NERY JÚNIOR. Nelson. Condições da ação. Revista de Direito Processual Civil, p. 33. 163 BRASIL. Código de Processo Civil, p. 50.

A partir dessa definição, só haveria sentença se a decisão fosse proferida ao fim do

processo, independentemente do conteúdo.

Com a alteração desse dispositivo pela Lei nº 11.232 de 22 de dezembro de 2005, a

sentença passou a ser definida a partir do conteúdo164, entendido como tal, se observa no teor

da atual redação:

Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. § 1o Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei 165 .

A distinção da natureza da sentença a partir da análise ou não do mérito (conteúdo) e a

denominação terminativa e definitiva é definida por Enrico Túlio Liebman:

A sentença pode ser definitiva ou não-definitiva. É definitiva a sentença que define o juízo (art. 279, 2ª parte), ou seja, conclui o processo, exaure-o, ao menos naquela instância [...] A sentença definitiva é, por isso, a sentença final do procedimento de primeiro grau (e, depois, da apelação etc), ou ao menos daquela sua fase que se desenvolveu perante determinado órgão jurisdicional. Não-definitiva é a sentença que não põe fim ao processo, de modo que este deverá continuar depois de sua prolação (art. 279, 2ª parte, n. 4); através dela, o juiz decide uma parte da matéria controvertida, que pode dizer respeito tanto ao mérito quanto às questões preliminares 166 .

No Código de Processo Civil revogado (Decreto-Lei 1.608/39), a distinção tinha

importância na medida em que esse Código previa que da decisão definitiva caberia recurso

de apelação e da terminativa, agravo de petição, como dispunha os arts. 820 e 846 dessa Lei:

Art. 820. Salvo disposição em contrário, caberá apelação das decisões definitivas de primeira instância.

164 A definição de sentença a partir do conteúdo gera efeitos no cabimento dos recursos tanto no de agravo de instrumento quanto no de apelação, haja vista que há sentença que implica situações previstas nos arts. 267 e 269 do CPC mesmo proferidas durante a tramitação do processo, sem extinção, como é o caso da sentença que julga improcedente o pedido formulado na ação denunciatória. Todavia, tal discussão está dissociada do objeto do estudo, motivo pelo qual carece de profundidade. 165 BRASIL. Código de Processo Civil, p 40. 166 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 310.

Art. 846. Salvo os casos expressos de agravo de instrumento, admitir-se-á agravo de petição, que se processará nos próprios autos, das decisões que impliquem a terminação do processo principal, sem lhe resolverem o mérito167.

Embora revogados tais dispositivos, com a vigência do atual Código de Processo

Civil, a distinção dessa categoria permaneceu na doutrina e na jurisprudência, como se

observa no teor das seguintes ementas do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. ANULAÇÃO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. No sistema processual vigente, somente a sentença que põe termo ao processo condenará o vencido a pagar ao vencedor os honorários advocatícios. 2. No caso, o Tribunal a quo anulou a sentença monocrática, determinando o retorno dos autos para novo julgamento da cautelar. Assim não houve vencido nem vencedor, muito menos sentença terminativa, não se podendo falar em condenação em honorários, que serão arbitrados tão-somente quando houver encerramento do processo, com sentença definitiva de mérito. (grifo nosso) 3. Recurso especial provido 168.

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA OBJETIVANDO A QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO (ART. 267, VI). COISA JULGADA. INTERESSE RECURSAL. APELAÇÃO. 1. A extinção do processo sem resolução do mérito não faz desaparecer o interesse processual do réu apelante, quando o mesmo pretende ver apreciada a questão de fundo, que em sua ótica, por via reflexa, foi conhecida pelo juiz a quo. 2. Diversamente, o nomen juris é indiferente à caracterização da sentença sobre ser terminativa ou definitiva, porquanto o que interessa é o seu conteúdo. (grifo nosso) […] 5. Agravo de instrumento provido para determinar o recebimento e o processamento do recurso de apelação da ora agravante". (fls. 70) 4. Recurso especial desprovido 169.

167 BRASIL. DECRETO LEI 1608 de 18 Setembro de 1939, Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/1937-1946/Del1608.htm. Acesso em: 22 set 2009. 168 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 68.318/SP da Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, j. em 20.04.2004publicadoem28.06.2004.Disponívelem:http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=68318&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=3. Acesso em: 20 set. de 2009. 169 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 836.392/RS da Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, j. em 14.11.2006publicadoem14.12.2006.Disponívelem:http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=836392&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em: 20 set. de 2009.

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO JUDICIAL. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE BENS E DOCUMENTOS. UTILIZAÇÃO DE WRIT COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO PREVISTO EM LEI. DECISÃO QUE DESAFIA APELAÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 593, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 267 DO STF. INEXISTÊNCIA DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL A JUSTIFICAR A REFORMA DA DECISÃO ATACADA. PRECEDENTES. 1. A decisão judicial que resolve questão incidental de restituição de coisa apreendida tem natureza definitiva (decisão definitiva em sentido estrito ou terminativa de mérito), sujeitando-se, assim, ao reexame da matéria por meio de recurso de apelação, nos termos do art. 593, inciso II, do Código de Processo Penal. (grifo nosso) 2. O mandado de segurança não é sucedâneo de recurso, sendo imprópria a sua impetração contra decisão judicial passível de recurso previsto em lei, consoante o disposto na Súmula n.º 267 do STF. Precedentes. 3. Recurso desprovido 170.

Noutra vertente, a sentença definitiva faz coisa julgada material e a terminativa coisa

julgada formal.

A coisa julgada é definida por Enrico Tullio Liebman não como efeito da sentença,

mas sim como uma qualidade inerente a tal ato decisório do processo, como se observa no

teor da seguinte citação:

Nisso consiste, pois, a autoridade da coisa julgada, que se pode definir, com precisão, com a imutabilidade do comando emergente de uma sentença. Não se identifica ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando; é, pelo contrário, uma qualidade, mais intensa e mais profunda, que reveste o ato em seu conteúdo e torna assim imutáveis, além do ato em sua existência formal, os efeitos, quaisquer que sejam, do próprio ato 171 .

Depois define coisa julgada material e formal:

Não há, pode-se dizer, discordância entre os escritores sobre o ponto da distinção entre coisa julgada em sentido formal e em sentido substancial (material). É a primeira uma qualidade da sentença, quando já não é recorrível por força de preclusão dos recursos; seria, por sua vez, a segunda a sua eficácia específica, e, propriamente, a autoridade da coisa julgada, e estaria condicionada à formação da primeira.

170 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RMS 25.043/SP da Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz j. em 27.03.2008publicadoem22.04.2008.Disponívelem:http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=25043&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em: 20 set. de 2009. 171 LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p.51.

Dessa distinção deveriam, aliás, importantes conseqüências, especialmente porque, enquanto todas as sentenças são, sem dúvidas, suscetível da primeira, conseguiriam, pelo contrário, a segunda somente se as sentenças que acolhem ou rejeitam a demanda no mérito 172 .

Daí a conclusão de que as sentenças terminativas, as quais não analisam o mérito, a

coisa julgada se dá de modo formal, ao passo que as que analisam o mérito se dão de modo

material.

Melhor síntese é formulada por Luiz Guilherme Marinone e Daniel Mitidiero para

explicar a sentença terminativa e sua relação com a coisa julgada:

1. Sentença Terminativa. Sentença terminativa é aquela que não aprecia o fundo do litígio, extinguindo o processo sem resolução do mérito. Sobre ela se forma apenas a coisa julgada formal, sinalizada com o trânsito em julgado da decisão, que representa a impossibilidade de rediscussão das questões decididas dentro do processo em que foi proferida. A sentença terminativa tem autoridade apenas endoprocessual 173.

Em síntese, a coisa julgada formal impede a análise do pedido no processo em que foi

proferida a decisão, mas não impede que seja proposta outra ação com a mesma causa de

pedir e o mesmo pedido (art. 268 do CPC) 174, motivo pelo qual o processo ajuizado

anteriormente é extinto sem resolução do mérito (art. 267 do CPC) 175.

172 LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada, p.55. 173 MARINONE, Luiz Guilherme, e MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil: comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 258-259. 174 Art. 268. Salvo o disposto no art. 267, V, a extinção do processo não obsta a que o autor intente de novo a ação. A petição inicial, todavia, não será despachada sem a prova do pagamento ou do depósito das custas e dos honorários de advogado. BRASIL. Código de Processo Civil, p. 50. 175 Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito. I - quando o juiz indeferir a petição inicial; II - quando ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes; III - quando, por não promover os atos e diligências que Ihe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias; IV - quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V - quando o juiz acolher a alegação de perempção, litispendência ou de coisa julgada; VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual; VII - pela convenção de arbitragem; Vlll - quando o autor desistir da ação; IX - quando a ação for considerada intransmissível por disposição legal; X - quando ocorrer confusão entre autor e réu; XI - nos demais casos prescritos neste Código. BRASIL. Código de processo civil, p. 50.

Por outro lado, se o processo é extinto com resolução do mérito (art. 269 do CPC) 176,

a causa de pedir e o pedido, relacionados às mesmas partes, não poderá ser objeto de outra

ação, ou seja, a sentença torna-se indiscutível e imutável, conforme o disposto no art. 467 do

CPC.

Art. 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário 177.

A síntese desenvolvida pode ser constatada no teor das seguintes ementas do Superior

Tribunal de Justiça:

SENTENÇA. INDEFERIMENTO LIMINAR DA INICIAL. COISA JULGADA MATERIAL. INEXISTÊNCIA. 1. Não produz coisa julgada material sentença que indefere liminarmente a petição inicial, por impossibilidade jurídica do pedido, inda que fundamentada em suposta inexistência do direito material. 2. A coisa julgada formal não impede novo ajuizamento da ação, exceto no caso do Art. 267, V, do CPC (Art. 268, caput, CPC) 178. (grifo nosso) PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. COISA JULGADA. NOVA AÇÃO. CAUSA DE PEDIR DIVERSA. AUTO-APLICABILIDADE DO ART. 201, § 5º DA CF/88. COISA JULGADA MATERIAL. INEXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. "Extinto o processo em virtude de ser o autor carecedor do direito de ação, há coisa julgada formal, não impeditiva da propositura de nova demanda, com mesmo pedido e mesma causa de pedir, notadamente se os julgamentos anteriores se baseiam em entendimento diametralmente oposto àquele pacificado pelo STF (auto-aplicabilidade do art. 201, §5º da Constituição Federal)" (REsp 278.378/MG, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, Sexta Turma, DJ 14/10/02). (grifo nosso) 2. Recurso especial conhecido e provido 179.

176 Art. 269. Haverá resolução de mérito: I - quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor; II - quando o réu reconhecer a procedência do pedido; III - quando as partes transigirem; IV - quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição; V - quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação BRASIL. Código de Processo Civil, p. 50,51. 177 BRASIL. Código de Processo Civil, p. 71. 178 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1006091/SP da Terceira Turma, Rel. Humberto Gomes de Barros j. em 17.03.2008 publicado em 13.05.2008. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=1006091&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=2 Acesso em: 20 set. de 2009. 179 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 424.153/MG da Quinta Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima j. em 17.04.2007 publicado em 14.05.2007. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=424153&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=2 Acesso em: 21 set. de 2009.

PROCESSUAL CIVIL. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CARÊNCIA DA AÇÃO. COISA JULGADA FORMAL. ART. 201, §5º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUTO-APLICABILIDADE. 1 - Extinto o processo em virtude de ser o autor carecedor do direito de ação, há coisa julgada formal, não impeditiva da propositura de nova demanda, com mesmo pedido e mesma causa de pedir, notadamente se os julgamentos anteriores se baseiam em entendimento diametralmente oposto àquele pacificado pelo STF (auto-aplicabilidade do art. 201, §5º da Constituição Federal). (grifo nosso) 2 - Recurso conhecido e provido 180.

RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA FORMAL. PROPOSITURA DE NOVA AÇÃO. MESMO PEDIDO E CAUSA DE PEDIR. ARTIGOS 267, V, 268 e 467 DO CPC. Coisa julgada formal não impede propositura de nova ação com mesmo pedido e causa de pedir. (grifo nosso) Recurso conhecido e provido 181.

Para este trabalho é importante a conclusão de que a decisão que analisa as condições

da ação é terminativa, pois o processo é extinto sem resolução do mérito, na forma do art.

267, VI, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual a ação poderá ser proposta

novamente, desde que sanado o vício, pois a coisa julgada é formal.

4.2 – COGNIÇÃO E JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

A definição de cognição no âmbito do direito processual civil foi abordada por

Giuseppe Chiovenda da seguinte forma:

Antes de decidir a demanda, realiza o juiz uma série de atividades intelectuais como objetivo de se aparelhar para julgar se a demanda é fundada ou infundada, e, pois, para declarar existente ou não existente a vontade concreta de lei, de que se cogita. Essas atividades intelectuais, instrumento da atuação da vontade da lei mediante verificação, constituem a cognição do juiz. E, naturalmente, uma vez que a cognição é tão necessária para receber como para rejeitar a demanda, a análise dessas atividades pertencia à doutrina da relação processual 182 .

180 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 278378/MG da Sexta Turma, Rel. José Arnaldo da Fonseca j. em 24.09.2002 publicado em 14.10.2002. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=278378&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1Acesso em: 21 set. de 2009. 181 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 278696/MG da Quinta Turma, Rel. José Arnaldo da Fonseca j. em 23.04.2002 publicado em 10.06.2002. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=278696&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1Acesso em: 21 set. de 2009.

No Brasil, o tema foi tratado por Kazuo Watanabe, o qual definiu cognição com o

seguinte argumento:

A cognição é prevalentemente um ato de inteligência, consistente em considerar, analisar e valorar as provas produzidas pelas partes, vale dizer, as questões de fato e as de direito que são deduzidas no processo e cujo resultado é o alicerce, o fundamento do judicium, do julgamento do objeto litigioso do processo 183 .

No desenvolver do tema, cita a observação de José Frederico Marques:

‘O juízo – observa Frederico Marques – é fruto e resultado, sobretudo, da cognição do juiz, o que vale dizer que o elemento lógico e intelectual’. E acrescenta: ‘A hiperatividade do julgado se subordina sempre ao ato de inteligência que precede e lhe dá substância, visto que provém das indagações realizadas pelo órgão jurisdicional para investigar e resolver a respeito das questões jurídicas de fato focalizadas no processo 184 .

E, no final, Kazuo Watanabe aborda o tema na vertente exposta por Giuseppe

Chiovenda, ou seja, sob o “caráter lógico da cognição” 185.

O conceito de Kazuo Watanabe é utilizado por Fredie Didier Júnior e ao tratar do tema

conclui:

A cognição é um dos mais importantes núcleos metodológicos para o estudo do processo moderno (junto com o procedimento e a tutela jurisdicional, cujos conceitos estão intimamente relacionados com o de cognição). Basta ver que a própria noção que se tem de cada tipo de processo (conhecimento, cautelar e execução) estrutura-se a partir do grau de cognição judicial que se estabelece em cada um deles. A análise da cognição judicial é, portanto, o exame da técnica pela qual o magistrado tem acesso e resolve as questões que lhe são postas para a apreciação. É importante perceber que o objeto da cognição é formado por essas questões 186.

A cognição do ato processual postulatório é aferida no âmbito da validade e do

conteúdo: o primeiro diz respeito aos requisitos exigidos por lei para a prática do ato, tais

como previsão, momento, forma (instrumento) e modo (meio); o segundo ao acolhimento ou

rejeição do pedido. A primeira cognição chama-se admissibilidade; a segunda, mérito.

182 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, p. 89. 183 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. 2. ed. Campinas: Bookseler, 2000, p. 58 e 59. 184 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil, p. 59. 185 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil, p. 59. 186 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo, p. 53.

Segundo Fredie Didier Júnior: “O juízo de admissibilidade opera sobre o plano de

validade dos atos jurídicos. Mais precisamente do ato jurídico complexo procedimento [sic].” 187.

A partir disso, desenvolve seu raciocínio:

Toda postulação se sujeita a um duplo exame do magistrado: primeiro, verifica-se se será possível o exame do conteúdo da postulação; após, e em caso de um juízo positivo no primeiro momento, examina-se a procedência ou não daquilo que se postula. O primeiro exame ‘tem prioridade lógica, pois tal atividade [análise do conteúdo da postulação] só se há de desenvolver plenamente se concorrerem os requisitos indispensáveis para tornar legítimo o seu exercício’. 188 .

E conclui:

No juízo de admissibilidade, verifica-se a existência dos requisitos de admissibilidade. Distingue-se do juízo de mérito, que é aquele ‘em que se apura a existência ou inexistência de fundamento para o que se postula, tirando-se daí as consequencias cabíveis, isto é, acolhendo-se ou rejeitando-se a postulação. No primeiro, julga-se se esta admissivel ou inadmissível; no segundo, procedente e improcedente

189 .

As condições da ação são objeto de análise do juízo de admissibilidade do ato

postulatório da ação, o que se materializa com a petição inicial (art. 282 do CPC).

Dessa forma, ausentes as condições da ação, ou apenas uma, o mérito não será

analisado, motivo pelo qual o processo deve ser extinto sem resolução do mérito, conforme o

disposto no art. 267 do CPC:

Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: […] VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual 190;

Portanto, ao analisar as condições da ação, estar-se analisando a validade do ato

postulatório de propositura da ação.

187 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo, p. 22. 188 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo. p. 24. 189 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo, p. 25. 190 BRASIL. Código de Processo Civil, p 50.

4.3 O MOMENTO DA ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO E A TEORIA DA ASSERÇÃO.

A natureza da sentença que afere as inexistências das condições da ação, bem como a

espécie de coisa julgada que se forma, embora tenha sido definida pelo Código de Processo

Civil com terminativa e formadora de coisa julgada formal, é discutida na doutrina da Teoria

da Asserção, a partir do momento em que a decisão é proferida.

Conforme o disposto no art. 267, § 3º do CPC, o juiz conhecerá de ofício as condições

da ação “a qualquer tempo” e em qualquer “grau de jurisdição” 191 .

§ 3o O juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e Vl; todavia, o réu que a não alegar, na primeira oportunidade em que Ihe caiba falar nos autos, responderá pelas custas de retardamento 192.

Isso quer dizer que o Código de Processo Civil não definiu um momento específico

para a análise das condições da ação e a constatação da inexistência das condições da ação,

gera a qualquer tempo, a extinção do processo sem resolução do mérito.

Todavia, a doutrina desenvolveu o que se convencionou chamar de Teoria da

Asserção, a qual define interpretação diversa da definida no Código de Processo Civil.

Essa teoria foi desenvolvida por Kazuo Watanabe na obra193: Da cognição no processo

civil, motivo pelo qual o pensamento do autor é o marco para o estudo do tema:

Seriam ‘condições’ para o julgamento do mérito da causa, impostas basicamente por razões de economia processual, e não condições para a existência da ação. Barbosa Moreira prefere falar em condições do legítimo exercício do direito de ação. O ponto nodal da problemática está em saber se as condições da ação (rectius: ‘condições para o julgamento do mérito’) devem ser aferidas segundo a afirmativa feita pelo autor na petição inicial (in status assertionis) quanto às condições da ação (com a apresentação, evidentemente, das provas necessárias desde o início do processo, como por exemplo, a escritura de aquisição do imóvel na ação reivindicatória, o contrato escrito celebrado por aquele que pretende anulá-lo por vício de vontade, o ato constitutivo que demonstre a existência da associação civil por mais de um ano para a propositura da ação civil pública etc) ou conforme seu efetivo com ‘a

191 BRASIL. Código de Processo Civil, p 50. 192 BRASIL. Código de Processo Civil, p 50. 193 O tema foi objeto discussão por outros doutrinadores, anteriormente ao Autor, mas não sob a óptica da cognição.

situação de fato contrária ao direito’, ou seja, com o objeto litigioso do processo, que vier a ser evidenciado pelas provas produzidas pelas partes. Somente se afigura compatível com a teoria abstracionista a primeira opção. O exame das condições da ação deve ser feito ‘com abstração das possibilidades que no juízo de mérito, vão deparar-se ao julgador: a de proclamar existente ou a declarar inexistente a relação jurídica que constitui a res in iudicium deducata’; vale dizer, o órgão julgador, ao apreciá-las ‘considera tal relação jurídica in status assertionis, ou seja, à vista do que se afirmou’, raciocinando ele, ao estabelecer a cognição, ‘como que admita, por hipóteses e em caráter provisório, a veracidade da narrativa , deixando para a ocasião própria (juízo de mérito) a respectiva apuração, ante os elementos de convicção ministrados pela atividade instrutória’, como preleciona Barbosa Moreira 194 .

A citação de José Carlos Barbosa Moreira firmada por Kazuo Watanabe refere-se ao

fato de que este autor adota a Teoria da Asserção, embora a abordagem do tema não tenha

sido firmada a partir da cognição. Para José Carlos Barbosa Moreira:

O exame da legitimidade, pois – como o de qualquer das ‘condições da ação’ –, tem de ser feito com abstração das possibilidades que, no juízo de mérito, vão se deparar-se o julgador: a de proclamar existente ou a de declarar inexistente a relação jurídica que constitui a re in iudicium deducata. Significa isso que o órgão judicial, ao apreciar a legitimidade das partes, considera tal relação jurídica in status assertionis, ou seja, à vista do que se

afirmou. Tem ele de raciocinar como quem admita, por hipótese, e em que caráter provisório, a veracidade da narrativa, deixando para a ocasião própria (o juízo de mérito) a respectiva apuração, ante os elementos de convicção ministrados pela atividade instrutória 195.

Kazuo Watanabe esclarece que o tema foi objeto de discussão na Obra de Machado

Guimarães, o qual lembra que o tema foi abordado em uma “‘memorável conferência

pronunciada em 29 de setembro de 1949’ pelo Prof. Liebman”. Segundo, afirma, Enrico Túlio

Liebman haveria ensinado nessa conferência que:

‘todo o problema, quer do interesse processual, quer da legitimação ad

causam, deve ser proposto e resolvido, admitindo-se, provisoriamente e em via hipotética, que as afirmativas do autor sejam verdadeiras; só nesta base é que se pode discutir e resolver a questão pura da legitimidade ou do interesse. Quer isto dizer que, se da constatação do réu surge a dúvida sobre a veracidade das afirmações feitas pelo autor e é necessário fazer-se uma instrução, já e problema de mérito.’ 196 .

194 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil, p 80. 195 MOREIRA, José Carlos. Legitimação para agir. Indeferimento da petição inicial. In Temas de direito processual civil. São Paulo: Saraiva 1977, p. 200. 196 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil, p 81.

Em nota de rodapé, Kazuo Watanabe lembra uma importante explicação formulada

por Cândido Rangel Dinamarco a respeito da afirmativa formulada por Enrico Túllio

Liebman, cuja citação se faz necessária:

Informa Cândido Dinamarco que para Liebman ‘as condições da ação não resultam da simples alegação do autor, mas da verdadeira situação trazida a julgamento’ (Execução civil, cit. 139, nota 53), o que revela que, posteriormente, o eminente processualista reformulara a colocação feita na conferência mencionada por Machado Guimarães 197.

José Carlos Barbosa Moreira ressalta que Machado Guimarães utilizou o ensinamento

proferido por Enrico Túlio Liebman para desenvolver sua doutrina e explica:

Em clássica monografia, publicada pela primeira vez em 1939, preleciona, com clareza de sempre, MACHADO GUIMARÃES: ‘deve o juiz, aceitando provisoriamente as afirmações feitas pelo autor – si vera sint exposita – apreciar preliminarmente as condições da ação, julgando, na ausência de uma delas, o autor carecedor da ação; só em seguida apreciará o mérito principal – isto é, a procedência ou a improcedência da ação’ (‘A Instância e a relação processual’ in Estudos de Direito Processual Civil, Rio de janeiro-S. Paulo 1969, pág. 73). 198 .

Do que se conclui até agora, é que a Teoria da Asserção define a seguinte tese: A

existência ou não das condições da ação deve ser aferida no momento da averiguação, pelo

juiz, da admissibilidade da petição inicial (admissibilidade do ato postulatório da ação), com

vista apenas ao asserto firmado pelo autor. Inexistente as condições da ação, a petição inicial

deve ser indeferida e o processo extinto sem resolução do mérito (sentença terminativa; coisa

julgada formal).

Ultrapassada essa fase, com juízo de admissibilidade positivo quanto às condições da

ação, embora de forma provisória, caso seja identificada à ausência das condições da ação,

mesmo que após a instrução, o processo deve ser extinto com resolução do mérito (sentença

definitiva; coisa julgada material).

197 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil, p 81. 198 MOREIRA, José Carlos. Legitimação para agir. Indeferimento da petição inicial. In Temas de direito processual civil, 200.

Além disso, aplicando-se a teoria da asserção, só haveria extinção do processo sem

resolução do mérito quando a ausência das condições da ação fosse aferida no ato de

admissibilidade do processo. Aferida a inexistência das condições em outro momento que não

esse, como, por exemplo, na fase saneadora do processo (art.323 do CPC)199, haveria

resolução do mérito.

O que não se pode concluir com exatidão é se essa teoria foi adotada por Enrico Túlio

Liebman, embora tendo em vista a citação da afirmativa formulada por ele e citada por

Machado de Guimarães200.

Isso porque na obra Manual de Direito Processual Civil, Enrico Túlio Liebman afirma

que as condições da ação “são requisitos para a existência da ação, devendo por isso ser

objeto de investigação no processo, preliminarmente ao exame do mérito” 201.

Para esse autor, ao menos nessa obra, na ausência das condições da ação, o processo

seria sempre extinto sem resolução do mérito, seja em que momento for.

Essa conclusão pode ser observada no trabalho de Alexandre Freitas Câmara, para o

qual há duas correntes sobre o tema e que Enrico Túlio Liebman adota corrente oposta a da

Teoria da Asserção, como se observa na citação a seguir:

Divide-se a doutrina, sobre o tema, em duas grandes correntes. Uma primeira, liderada por Liebmann, e que conta com a adesão, entre outros de Dinamarco e de Orestes Nestor de Souza Laspro, considera que a presença das ‘condições da ação’ deve ser demonstrada , cabendo, inclusive, produzir provas para convencer o juiz de que as mesmas estão presentes. De outro lado, uma segunda teoria, chamada ‘teoria da asserção, ou da prospettazione, segundo a qual a verificação da presença das ‘condições da ação’ se dá à luz das afirmativas feitas pelo demandante em sua petição inicial, devendo o julgador considerar a relação jurídica deduzida em juízo in

status assertionis, isto é, à vista do que se afirmou202 .

199 BRASIL. Código de Processo Civil, p.57. 200 Essa citação é reproduzida por José Carlos Barbosa Moreira in: Legitimação para agir. Indeferimento da petição inicial. In Temas de direito processual civil. 201 LIEBMAN, Enrico Túlio. Manual de direito processual civil, p. 203. 202 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, p. 135.

Depois de discorrer sobre o tema, Alexandre Freitas Câmara expõe sua posição,

adotando a Teoria da Asserção:

Parece-nos que a razão está com a teoria da asserção. As ‘condições da ação’ são requisitos exigidos para que o processo vá em direção ao seu fim normal, qual seja, a produção de um provimento de mérito. Sua presença, assim, deverá ser verificada em abstrato, considerando-se, por hipótese, que as assertivas do demandante em sua inicial são verdadeiras, sob pena de se ter uma indisfarçável adesão às teorias concretas da ação. Exigir a demonstração das ‘ condições da ação’, significaria, em termos práticos, afirmar que só tem ação quem tenha direito material 203 .

José dos Santos Roberto Bedaque defende a Teoria da Asserção como se observa na

citação a seguir:

Devem as condições da ação ser analisadas em tese, isto é, sem adentrar ao exame do mérito, sem que a cognição do juiz se aprofunde na situação de direito substancial . Esse exame, feito no condicional, ocorre normalmente em face da petição inicial, in statu assertionis. Apenas por exceção se concebe a análise das condições da ação após esse momento: é que algumas vezes não há elementos para que tal ocorra naquele instante 204.

Da mesma forma, Fredie Didier Júnior:

Não se trata de um juízo de cognição sumária das condições da ação, que permitiria um reexame pelo magistrado, com base em cognição exauriente. O juízo definitivo sobre a existência das condições da ação far-se-ia nesse momento: se positivo o juízo de admissibilidade, tudo o mais seria decisão de mérito, ressalvados fatos supervenientes que determinassem a perda de uma condição da ação. A decisão sobre a existência ou não de carência da ação, de acordo com esta teoria, seria sempre definitiva. Chama-se de teoria

da asserção ou da prospettazione 205 .

Em análise da Teoria da Asserção, Marici Giannico, relaciona as críticas formuladas

na doutrina sobre o tema:

A maior crítica que se faz a teoria da asserção funda-se na idéia de que um instituto não pode ter sua natureza definida em razão do momento processual em que ele é apreciado.

203 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, 135. 204 BEDAQUE, José dos Santos Roberto. Pressupostos processuais e condições da ação. In Justitia. São Paulo, out./dez. 1991, n. 53, p. 55. 205 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Pressupostos processuais e as condições da ação: o juízo de admissibilidade do processo, p. 217.

Assim, se uma determinada matéria relaciona-se com a impossibilidade jurídica da demanda, a falta de interesse de agir ou a ilegitimidade da parte, deve ser tratada com condição da ação, não importando que sua análise esteja desvinculada do que fora alegado na petição inicial. Além disso, outra severa crítica dirigida aos assertistas diz respeito à lacuna existente no tocante à carência da ação superveniente, a qual não é passível de verificação in status assertionis

206.

Em sentido contrário à Teoria da Asserção, Cândido Rangel Dinamarco reserva um

capítulo em sua obra Instituições de Direito Processual Civil com o título: “condições

existentes e não apenas afirmadas (repúdio à teoria da asserção)”. Merece reprodução na

integra as críticas formuladas, embora o texto seja extenso haja vista a propriedade dos

argumentos:

Ao propor arbitrariamente essa estranha modificação da natureza de um provimento judicial conforme o momento em que é produzida (de uma sentença terminativa a uma de mérito), a teoria della prospettazione incorre em uma série de erros e abre caminho para incoerências que desmerecem, desnecessária e inutilmente o sistema. Eis algumas das objeções que nunca foram satisfatoriamente respondidas: a) só advogados menos preparados iriam incorrer na carência da ação, porque os competentes sabem construir suas petições iniciais dissimulando a falta de uma das condições da ação; b) ao dar provimento à apelação interposta contra uma sentença ‘de mérito’ fundada no fato de que uma das partes ser estranha à relação substancial controvertida (ação de despejo movida a quem não é inquilino), ao tribunal seria permitido examinar as verdadeiras questões de mérito e julgar procedente a demanda, sem suprimir um grau de jurisdição (CPC, art. 515, § 1º); c) se fosse de mérito a sentença que reconhece tratar-se de dívida de jogo (‘improcedência da demanda’), a coisa julgada que se formará em torno dela impediria a plena vigência do art. 1.477 do Código Civil , porque eventual pagamento que se faça seria pagamento de dívida inexistente e não, simplesmente, não suscetível de cobrança judicial (obrigação natural); d) se em dois ou mais processos o mesmo autor pediu a anulação do mesmo ato ou contrato, mas com fundamentos diferentes, a anulação decretada em um deles conduzirá o juiz a concluir, nos demais, que o autor não teria direito à anulação (mas todos entendem que o caso é de falta de interesse de agir, porque o resultado almejado já foi obtido) etc. Para superar essas e outras objeções a uma tese arbitrária e absolutamente desnecessária no sistema, a teoria da asserção busca subterfúgios e precisa propor novas interpretações de uma série de conceitos e institutos jurídico-processuais arraigados na cultura ocidental, como o de mérito, o da coisa julgada material e até mesmo das condições da ação. Para aceitá-la seria indispensável uma mudança muito significativa na ordem jurídico-positiva do processo e em uma série de pilares da cultura processual de fundo romano-germânico 207.

206 GIANNICO, Marici. Carência da ação e a ação rescisória. Jurisprudência. In Revista de Processo nº 123. Ano 30, maio de 2005, p. 16. 207 DINAMARCO. Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001 p. 314 e 315.

Embora a Teoria da Asserção, como qualquer outro instituto objeto de estudos

doutrinários, sofra críticas oposicionistas, a forma com que ela é tratada na jurisprudência leva

a crer que a aplicabilidade dela é aceita na prática forense.

No Superior Tribunal de Justiça, é possível observar a aplicabilidade da Teoria da

Asserção no conteúdo das seguintes ementas:

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO - LEIS N. 8.625/93 E N. 7.347/83 - DANO AMBIENTAL - CERAMISTAS - EXTRAÇÃO DE BARRO - ALVARÁ - LICENCIAMENTO - PROJETO DE RECUPERAÇÃO HOMOLOGADO NO IBAMA - INTERESSE DO MP NO PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA QUE DISCUTE DANO AMBIENTAL E SUA EXTENSÃO - POSSIBILIDADE. 1 - É o Ministério Público parte legítima para propor ação civil pública na defesa do patrimônio público, aí entendido os patrimônios histórico, paisagístico, cultural, urbanístico, ambiental etc., conceito amplo de interesse social que legitima a atuação do parquet. 2 - A referida legitimidade do Ministério Público para ajuizar tais ações é prevista in satus assertionis, ou seja, conforme a narrativa feita pelo demandante na inicial ("teoria da asserção"). […] 208.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. POTENCIALIDADE DE DANO AO MEIO AMBIENTE. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA. EXISTÊNCIA DE PARECER TÉCNICO DE ENGENHARIA APONTANDO SER O CORTE DE ENERGIA CAPAZ DE GERAR LESÃO AO MEIO AMBIENTE. TEORIA DA ASSERÇÃO. FUNDAMENTO INATACADO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. […] III - A alegativa de violação do art. 3º do Código de Processo Civil, por si só, não tem o condão de reformar o acórdão recorrido, visto que a Corte ordinária justificou a existência da legitimidade passiva, in casu, tendo como base, à justa, a teoria da asserção. A recorrente, todavia, prende-se à alegativa de que "não é crível manter uma ação civil pública contra a fornecedora de energia elétrica se ela não produz o dano e muito menos está responsável pela operação de equipamentos que podem, em tese, evitá-lo (...)". Aí é que reside o nó górdio da questão: pela teoria da asserção é possível sim, que isto aconteça. IV - Ademais, consoante cediço, "a legitimidade do Ministério Público para ajuizar tais ações (civis públicas) é prevista in satus assertionis, ou seja, conforme a narrativa feita pelo demandante na inicial ('teoria da asserção')". V - Agravo regimental improvido 209.

208 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 265.300/MG da Segunda Turma, Rel. Humberto Martins j. em 21.09.2006 publicado em 02.10.2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=265300&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1Acesso em: 21 set. de 2009. 209 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 877161/RJ da Primeira Turma, Rel. Francisco Falcão j. em 05.12.2006 publicado em 01.02.2007. Disponível em:

ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - TRANSPORTE - PEDIDO DE ADEQUAÇÃO DO SERVIÇO ESSENCIAL - INTERESSE DE AGIR, LEGITIMIDADE E POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. […] 3. Deste modo, uma vez constatada a não-observância de tais regras básicas, surge o interesse-necessidade para a tutela pleiteada. Vale observar, ainda, que as condições da ação são vistas in satu assertionis ("Teoria da Asserção"), ou seja, conforme a narrativa feita pelo demandante, na petição inicial. Desse modo, o interesse processual exsurge da alegação do autor, realizada na inicial, o que, ademais, foi constatado posteriormente na instância ordinária. […] 210.

No mesmo sentido, também do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. ACÓRDÃO QUE, POR MAIORIA, REFORMA SENTENÇA TERMINATIVA E ADENTRA O JULGAMENTO DO MÉRITO. CABIMENTO. […] - Aplica-se à hipótese, ainda, a teoria da asserção, segundo a qual, se o juiz realizar cognição profunda sobre as alegações contidas na petição, após esgotados os meios probatórios, terá, na verdade, proferido juízo sobre o mérito da questão. - A natureza da sentença, se processual ou de mérito, é definida por seu conteúdo e não pela mera qualificação ou nomen juris atribuído ao julgado, seja na fundamentação ou na parte dispositiva. Portanto, entendida como de mérito a sentença proferida nos autos, indiscutível o cabimento dos embargos infringentes. Recurso especial conhecido e provido 211.

No teor do voto do acórdão:

A questão pode – e deve – ser analisada, ainda, sob o prisma da teoria da asserção, que ganha expressão na doutrina, secundada por juristas como Ada Pellegrini Grinover e Kazuo Watanabe. Para os adeptos dessa teoria, como é o caso também de José Roberto dos Santos Bedaque, na análise das

http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=877161&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1Acesso em: 21 set. de 2009. 210 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 470.675/SP da Segunda Turma, Rel. Humberto Martins j. em 16.10.2007 publicado em 29.10.2007. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=470675&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1 Acesso em: 21 set. de 2009. 211 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 832.370/MG da Terceira Turma, Rel. Nancy Andrighi j. em 02.08.2007 publicado em 13.08.2007. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=832370&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1Acesso em: 21 set. de 2009.

condições da ação “se o juiz realizar cognição profunda sobre as alegações contidas na petição, após esgotados os meios probatórios, terá, na verdade, proferido juízo sobre o mérito da questão ” (Direito e Processo, São Paulo: RT, 1995, p. 78). Em outras palavras, sempre que a relação existente entre as condições da ação e o direito material for estreita ao ponto da verificação da presença daquelas exigir a análise desta, haverá exame de mérito. Ainda que tacitamente, a teoria assertista encontra respaldo em julgados desta Corte, nos quais entendeu-se que a decisão acerca das condições da ação implicou numa sentença de mérito. Veja-se, nesse sentido, os seguintes precedentes: REsp 1.678/GO, 4ª Turma, Rel. p/ acórdão Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13.02.1990; REsp 2.185/GO, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de 14.05.1990; REsp 86.441/ES, 1ª Turma, Rel. Min. José de Jesus Filho, DJ de 07.04.1997; REsp 103.584/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13.08.2001. No que tange especificamente à legitimidade ad causam, sua verificação invariavelmente exige a análise da lide em concreto, havendo enorme dificuldade prática em separar tal questão do mérito da causa. Ainda que se admita o exame da “legitimidade in statu assertiones”, muitas vezes é no curso do processo que se chega à efetiva decisão sobre tal condição da ação, importando, desse feita, na análise da relação jurídica de direito material.

No conteúdo dessa ementa, fica evidenciada a forma com que a teoria da Asserção é

adotada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO – TEORIA DA ASSERÇÃO – NECESSIDADE DE ANÁLISE DO CASO CONCRETO PARA AFERIR O GRAU DE DISCRICIONARIEDADE CONFERIDO AO ADMINISTRADOR PÚBLICO – POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. […] 7. Em face da teoria da asserção no exame das condições da ação e da necessidade de dilação probatória para a análise dos fatos que circundam o caso concreto, a ação que visa a um controle de atividade discricionária da administração pública não contém pedido juridicamente impossível. 8. A influência que uma decisão liminar concedida em processo conexo pode gerar no caso dos autos pode recair sobre o julgamento do mérito da causa, mas em nada modifica a presença das condições da ação quando do oferecimento da petição inicial. Recurso especial improvido 212.

212 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, REsp 879.188/RS da Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, publicadoem02/06/2009.Disponívelem:http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=879188&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em: 20 set. de 2009.

No voto do relator, colhe-se a explicação:

De início, se mostra saudável a lembrança de que a doutrina moderna, bem como, em decisões recentes, também o Superior Tribunal de Justiça, têm entendido que o momento de verificação das condições da ação se dá no primeiro contato que o julgador tem com a petição inicial, ou seja, no instante da prolação do juízo de admissibilidade inicial do procedimento. Trata-se da aplicação da teoria da asserção, segundo a qual a análise das condições da ação seria feita à luz das afirmações do demandante contida em sua petição inicial. Assim, basta que seja positivo o juízo inicial de admissibilidade, para que tudo o mais seria decisão de mérito. Não me olvido que a interpretação literal do art. 267, § 3º do CPC leva a entender que o preenchimento das condições da ação pode ser averiguado a qualquer tempo e grau de jurisdição. No entanto, a aplicação literal e irrefletida da literalidade do enunciado normativo, neste particular, gera, muitas vezes, consequências danosas, tal qual a extinção do processo sem julgamento do mérito após longos anos de embate processual. Por este motivo, é que a teoria da asserção vem se tonificando através da doutrina de processualistas como Alexandre Câmara, Kazuo Watanabe, Leonardo Greco, José Carlos Barbosa Moreira, Sérgio Cruz Arenhart, Leonardo José Carneiro da Cunha, Luiz Guilherme Marinoni etc.

No âmbito do Tribunal de Justiça de Santa Catarina há julgados que adotam a Teoria

da Asserção, como se observa no teor das seguintes ementas:

DANOS MORAIS. ACTIO FUNDADA EM SUPOSTA DISTRIBUIÇÃO, POR EMPRESA CONCORRENTE, DE MATERIAL OFENSIVO À HONRA E REPUTAÇÃO DA AUTORA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO FACE À ILEGITIMIDADE PASSIVA AD

CAUSAM. IMPOSSIBILIDADE. ALEGAÇÕES INICIAIS QUE DESVELAM PERTINÊNCIA ENTRE A CAUSA DE PEDIR, O PEDIDO E OS SUJEITOS. TEORIA DA ASSERÇÃO. LEGITIMIDADE

RECONHECIDA. INSTRUÇÃO DEFICIENTE QUANTO AO MÉRITO. SENTENÇA CASSADA. RECURSO PROVIDO 213.

213 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Apelação Cível 2007.057148-3 da Terceira Câmara de Direito Civil, Rel. Des. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, publicado em 20/10/08. Disponível em: http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/acnaintegra!html.action?qTodas=teoria+asser%E7%E3o&qFrase=&qUma=&qNao=&qDataIni=&qDataFim=&qProcesso=&qEmenta=&qClasse=&qRelator=&qForo=&qOrgaoJulgador=&qCor=FF0000&qTipoOrdem=relevancia&pageCount=10&qID=AAAGxaAAIAAAuocAAC. Acesso em: 20 set. de 2009.

APELAÇÃO CÍVEL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - MORTE DO COMPANHEIRO DA AUTORA - ARGUIÇÃO DE ILEGITIMIDADE ATIVA - ALEGADA FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA - MATÉRIA DE MÉRITO - TEORIA DA ASSERÇÃO - RELAÇÃO MORE UXORIO DEMONSTRADA - CULPA DO RÉU - INVASÃO DE RODOVIA PREFERENCIAL - INFRINGÊNCIA DO MAIS ELEMENTAR DEVER DE CUIDADO NO TRÂNSITO - DANOS MATERIAIS - DESPESAS DE FUNERAL E CONSERTO DO VEÍCULO SINISTRADO - ORÇAMENTOS E NOTA FISCAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - PROVA SUFICIENTE DA EXTENSÃO DO PREJUÍZO - PENSÃO MENSAL - ALEGAÇÃO DE CARÊNCIA DE RECURSOS PARA SUPORTÁ-LA - ABSOLUTA FALTA DE PROVAS A RESPEITO - DANO MORAL - PRETENDIDA DIMINUIÇÃO DO QUANTUM - IMPOSSIBILIDADE - RAZOABILIDADE NO ARBITRAMENTO PELO JUIZ - RECURSO DESPROVIDO 214.

No teor do voto, explica o Relator Jaime Luiz Vicari:

Aquilo que o apelante aponta como preliminar de ilegitimidade passiva trata-se, em verdade, de matéria de mérito. É que o exame de cada uma das condições da ação (possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade para a causa) faz-se sobre a narrativa apresentada pelo autor em petição inicial. Se, de acordo com o narrado, as partes são legítimas, há interesse e o pedido é possível juridicamente, o autor não será considerado carecedor de ação, mesmo que a instrução do feito mostre que os fatos descritos na inicial não correspondem à realidade. A prova desses fatos é sempre questão de mérito, objeto de exame ulterior. Já as condições da ação, como tradicionalmente se diz, são preliminares ao mérito, seu exame é prévio e faz-se apenas tendo-se em conta o descrito na inicial. Essa é a chamada teoria da asserção (prospettazione, do Direito Italiano), que melhor atende à teoria eclética da ação (de Enrico Tullio Liebman) e que contradiz o frequente equívoco cometido não apenas por juízes, mas também pelos demais operadores do direito, que costumam dizer que "o exame da preliminar confunde-se com o mérito". Jamais! Condições da ação e mérito da causa são categorias distintas. Do contrário, consagrar-se-ia a teoria do direito concreto de ação (de Adolf Wach), segundo a qual, o direito de ação é o direito público subjetivo a um provimento jurisdicional favorável, ou seja, apenas exerceria ação aquele que, no plano material, fosse, induvidosamente, detentor de um direito.

214 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, Apelação Cível 2008.047619-3 da Segunda Câmara de Direito Civil, Rel. Des Jaime Luiz Vicari, publicado em 28/09/2009, disponível em- http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/acnaintegra!html.action?qTodas=teoria+asser%E7%E3o&qFrase=&qUma=&qNao=&qDataIni=&qDataFim=&qProcesso=&qEmenta=&qClasse=&qRelator=&qForo=&qOrgaoJulgador=&qCor=FF0000&qTipoOrdem=relevancia&pageCount=10&qID=AAAGxaAAKAABBLqAAa. Acesso em: 20 set. de 2009.

Portanto, considerando-se a defesa e a aplicabilidade da Teoria da Asserção, tanto no

aspecto quantitativo de decisões judiciais, aliado ao fato de que se trata de decisões do

Superior Tribunal de Justiça, cuja função, entre todas, é a de unificar a interpretação e a

aplicabilidade das normas jurídicas, quanto no doutrinário, identificado pelo número de

doutrinadores defendendo a mesma tese, embora seu fundamento afaste-se do modelo adotado

pelo Código de Processo Civil, é de se concluir pela sua aplicabilidade na prática forense.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluída a pesquisa, passamos a expor o resultado obtido no presente Trabalho de

Conclusão de Curso.

Os objetivos específicos foram alçados na seqüência dos capítulos.

No primeiro capítulo, após a disposição da ordem cronológica da evolução das teorias

desenvolvidas para apurar a natureza e, por conseguinte, o conceito de ação, foi constatado

que a definição da natureza jurídica da ação partiu de um conceito de direito civil que

identificava uma unidade entre o direito de ação e direito material exigido por meio da ação e

alcançou sua autonomia quando essa unidade foi rejeitada.

Nessa ordem, a partir daí, o Direito Processual Civil passa a ganhar, também,

autonomia científica.

Outra circunstância observada, é que a ação passa ser vista como direito subjetivo e

essa definição, embora com contornos distintos, é mantida.

Além disso, ficou constatado que o tema que envolve a natureza jurídica da ação ainda

enseja discussões doutrinárias na atualidade.

Por, embora seja reconhecido que há divergência em determinados aspectos sobre o

tema, o certo é que, quanto à autonomia do direito de ação, o entendimento é unânime e a

natureza jurídica da ação é de direito subjetivo, o que é defendido pela doutrina, embora nessa

parte não seja unânime.

No segundo capítulo, constatamos que a definição das condições da ação foi tratada

por processualista muito antes do desenvolvimento da teoria das condições da ação formulada

por Enrico Túllio Liebman.

O certo é que nesse período, as condições da ação não eram abordadas sob o tema da

natureza jurídica da ação. Esse aspecto foi abordado por Enrico Túllio Liebman.

Assim, foram abordadas as três condições da ação: possibilidade jurídica, legitimidade

ad causam e interesse processual.

Quanto à possibilidade jurídica do pedido, há a necessidade de vedação expressa, no

ordenamento jurídico, para que o pedido seja considerado como impossível.

Isso é o que José Roberto Bedaque chama de “fórmula negativa” de aferir a

possibilidade jurídica do pedido (p. 46 do presente trabalho).

Essa posição foi encontrada de forma difundida na doutrina e na jurisprudência

pesquisada, o que se pode concluir que o acolhimento de tal definição é unânime entre os

doutrinadores pesquisados.

A definição da condição interesse processual foi construída a partir da distinção entre

interesse de direito material, objeto do estudo da Teoria Geral do Direito Civil e interesse de

agir, no âmbito processual, objeto da Teoria Geral do Processo.

Como explicado no conteúdo do trabalho, foi utilizada a denominação interesse

processual, ao invés de interesse de agir, categoria essa utilizada por Enrico Túllio Liebman,

pois a primeira categoria é utilizada no Código de Processo Civil.

Na exposição de Liebman há interesse processual quando há lesão ao direito.

O interesse processual, portanto, é definido a partir da necessidade da tutela

jurisdicional para a proteção do direito material, haja vista que resistida a pretensão do autor

(demandante). Não só a pretensão resistida, mas também o fato de que a autotutela é vedada

ao sujeito pelo ordenamento jurídico, é o que caracteriza o interesse processual.

Nessa vertente, o interesse foi definido a partir da necessidade e da utilidade do

provimento jurídico pretendido com a ação.

A necessidade é abordada como elemento caracterizado do interesse de forma unânime

pela doutrina pesquisada, mas quanto à utilidade, há divergência doutrinária.

Além disso, há outro elemento definidor que é a adoção do procedimento, cuja escolha

errada acarreta a falta de interesse processual. Nesse último aspecto, foi encontrada

divergência doutrinária, embora haja jurisprudência nesse sentido.

Sobre a legitimidade ad causam, por sua vez, a abordagem do tema teve como ponto

de partida a distinção entre a capacidade processual e a capacidade de estar em juízo, para

depois distingui-las da legitimidade ad causam.

Assim, toda pessoa, por ter personalidade, pode ser parte, mas poderá estar em juízo se

tiver capacidade civil, cuja ausência é suprida pela representação.

Além disso, foi abordada a capacidade judiciária atribuída pela doutrina e pela

jurisprudência para postulação em juízo de entes despersonalizados.

A legitimidade de agir, depois dessas premissas, foi definida a partir da titularidade do

direito material invocado, isso devido à vedação jurídica, bem como lógica, de que não se

pode pleitear direito alheio em nome próprio, salvo nos casos permitidos em lei, o que

configura legitimidade extraordinária.

No terceiro capítulo, por sua vez, antes de abordar o tema da Teoria da Asserção,

foram definidas algumas categorias necessárias a compreensão do tema, tais como sentenças

definitivas e terminativas e a relação dessas categorias com a coisa julgada formal e a

material.

E assim, foi definida a relação: a sentença chamada terminativa extingue o processo

sem resolução do mérito e faz coisa julgada formal, o que impede a discussão dentro do

processo em que foi proferida, mas não impede a propositura de outra ação, como o mesmo

objeto e pedido (sanado o vício), ao passo em que a sentença que extingue o processo com

resolução do mérito é chamada definitiva e a coisa julgada é material, ou seja, nem no

processo em que foi proferida, tampouco em outro processo a demanda será discutida.

Na seqüência foi oportunizado o estudo da cognição, cujo conceito operacional foi

adotado o formulado por Kazuo Watanabe, bem como o estudo da admissibilidade.

A cognição das condições da ação foi definida, portanto, como ato do juiz no qual se

apura o resultado da instrução e valora o fato, a prova do fato e a sua classificação jurídica no

ordenamento jurídico brasileiro.

A admissibilidade teve como definição a elaborada por Fredie Didier Júnior, segundo

o qual a admissibilidade é um juízo sobre a validade do ato processual.

Concluindo-se, dessa forma, que o ato que afere a presença, ou não, das condições da

ação é um ato de admissibilidade.

Por fim, foi abordada a Teoria da Asserção no âmbito doutrinário e jurisprudencial,

cuja conclusão deu origem as respostas dos questionamentos indicados na introdução do

trabalho.

Em síntese: O Código de Processo Civil dispõe no art. 267, § 3º, que as condições da

ação podem ser analisadas a qualquer momento durante a tramitação do processo,

prescindindo, dessa forma, ser no ato de admissibilidade da postulação. Com isso, o processo

será extinto sem resolução do mérito.

Por outro lado, a Teoria da Asserção, que não é adotada no ordenamento jurídico, mas

sim, trata-se de uma construção formulada pela doutrina e pela jurisprudência, tem posição

contrária. Sem incorrer no vício da repetição, retome-se a síntese formulada no terceiro

capítulo.

É que, para a Teoria da Asserção, a existência ou não das condições da ação deve ser

aferida no momento da averiguação, pelo juiz, da admissibilidade da petição inicial

(admissibilidade do ato postulatório da ação), com vista apenas ao asserto firmado pelo autor.

Inexistente as condições da ação, a petição inicial deve ser indeferida e o processo extinto sem

resolução do mérito (sentença terminativa; coisa julgada formal).

Ultrapassada essa fase, com juízo de admissibilidade positivo quanto às condições da

ação, embora de forma provisória, caso seja identificada a ausência das condições da ação,

mesmo que após a instrução, o processo deve ser extinto com resolução do mérito (sentença

definitiva; coisa julgada material).

Portanto, o resultado do trabalho encontrou duas posições: uma adotada pelo Código

de Processo Civil e outra que, embora criada pela doutrina, é objeto da jurisprudência.

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