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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA - ProPPEC CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – CPCJ PROGRAMA DE MESTRADO ACADÊMICO EM CIÊNCIA JURÍDICA – PMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: DIREITO E ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES sob o foco da captação ilícita de sufrágio SAMIR CLAUDINO BEBER Itajaí (SC), abril de 2006.

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O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES sob o foco da captação ilícita de sufrágio

SAMIR CLAUDINO BEBER

Itajaí (SC), abril de 2006.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA - ProPPEC CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – CPCJ PROGRAMA DE MESTRADO ACADÊMICO EM CIÊNCIA JURÍDICA – PMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: DIREITO E ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS E PRIVADAS

O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES sob o foco da captação ilícita de sufrágio

SAMIR CLAUDINO BEBER

Dissertação submetida à Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI, para obtenção do grau de Mestre em Ciência Jurídica.

Orientador: Professor Dr. José Isaac Pilati

Itajaí (SC), abril de 2006.

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SAMIR CLAUDINO BEBER

O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES sob o foco da captação ilícita de sufrágio

Essa dissertação foi julgada e aprovada para a obtenção de grau de Mestre em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí.

Itajaí, 25 de abril de 2006. Prof. Dr. Paulo Márcio Cruz Coordenador do Curso BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. José Isaac Pilati Universidade do Vale do Itajaí Orientador Prof. Dr. Luiz Henrique Cademartori Universidade do Vale do Itajaí Prof. Dr. Josel Machado Correa Universidade Federal de Santa Catarina

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DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro para todos os fins de direito, que assumo total

responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando

a Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, a Coordenação do Curso de Pós-

Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica – CPCJ/UNIVALI, a Banca

Examinadora, o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do

mesmo.

Itajaí, 25 de abril de 2006.

SAMIR CLAUDINO BEBER

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AGRADECIMENTOS

A você – AMIGO (A), COLEGA, CRÍTICO, COLABORADOR, SENHOR

(A), EXCELÊNCIA –, anônimo, que se dispôs, por qualquer razão, a ler este

trabalho: esteja certo (a) de que ele só existe por sua causa; que só chegamos ao

fim impulsionados pelo seu estímulo – como um girassol que persegue a Luz.

Aos anônimos – anônimos! –, jamais esquecidos...

Ao Professor Doutor José Isaac Pilati, mais que Professor, mais que

Doutor, um Ser Humano Especial.

A Deus, porque creio, e se não cresse, agradeceria de igual modo,

porque somos muito pouco além de pó!

Obrigado.

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Dedicatória

Aos meus queridos Pais

Espério e Amélia,

que na sua simplicidade merecem mais do que o meu reconhecimento.

A minha pequena grande Família:

Katize, esposa,

que com sua paciência favoreceu este projeto;

Lucas e Luiza,

amados Filhos,

razão de ser,

luz a iluminar,

gérmen de Vida que se faz Vida.

...e se não faltam motivos e razões,

podem faltar palavras,

mas jamais faltará o sentimento de devoção!

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RESUMO

O sistema jurídico brasileiro assegura – e se assim não fosse, regras básicas de conduta e de convivência social as exigiriam – eleições com participação popular, garantindo aos cidadãos o direito de se organizarem e constituírem – criar – partidos políticos; de se submeterem ao sufrágio nas urnas, concorrendo a mandatos eletivos (elegibilidade); e de escolherem seus representantes por meio do voto – livre e secreto –, em eleições idôneas. Diante desse panorama é possível afirmar que, no Brasil, o Estado Democrático de Direito não é apenas uma alegoria retórica ou uma utopia constitucional. Ao contrário, a Sociedade brasileira vive, hoje, essa realidade, mesmo que as vergonhosas desigualdades econômicas, sociais, culturais e políticas possam ensejar dúvidas ou demonstrar quão incipiente ainda é sua Democracia, quão limitada é a efetivação do Direito. E essa situação dicotômica pode ser francamente constatada no abuso do poder econômico nas eleições, ainda mais se focado na captação ilícita de sufrágio, na corrupção eleitoral. E é esse o tema versado neste trabalho, no qual se busca destacar todos os meandros do mais moderno instrumento jurídico à disposição da liberdade de escolha do eleitor, à disposição da lisura do processo eleitoral, penalizando politicamente a mais primária e deletéria mácula das eleições – a captação ilícita de sufrágio –, tratada materialmente no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997. Abuso do poder econômico em eleição se caracteriza pelo uso do poder econômico com a intenção de desequilibrar a disputa eleitoral, o que ocorre de modo irregular, oculto ou dissimulado, e exige potencialidade tendente a afetar o resultado das urnas. Captação ilícita de sufrágio, a seu turno, é conduta isolada – de candidato (ou de terceiro, que age em seu nome e com sua anuência) – consistente em dar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública. Ambas as situações, umbilicalmente ligadas, geram um fenômeno de ordem político-social que estigmatiza o processo eleitoral, marcando absoluta e completamente o destino da Nação – de qualquer Nação! O estudo desse fenômeno tão arraigado na prática política nacional, em uma abordagem legislativa, jurisprudencial e doutrinária, adentrando no funcionamento de todo o processo de coibição e punição, é imprescindível, não apenas para o fim de conhecimento (haja vista a apresentação e demonstração dos instrumentos jurídicos, exegéticos, doutrinários e nuances existentes), mas, principalmente, para iniciar uma avaliação e uma (auto)crítica comportamental; para incitar – muito mais do que proibindo ou punindo – uma mudança positiva de conduta, quiçá a partir dos detentores de mandatos eletivos, mas permeando, necessariamente, o espírito dos cidadãos-eleitores. Se o foco dessa leitura do abuso do poder econômico em eleições está na captação ilícita de sufrágio, o objetivo prático de sua compreensão é a promoção do conhecimento e o estímulo de ações mais concretas e responsáveis de cidadania. E apenas com uma nova conduta será possível chegar mais próximo do verdadeiro Estado Democrático de Direito, no qual, mesmo nos devaneios retóricos de um utópico Estado ideal, não se pode prescindir de consciência política, de combate ao abuso e à corrupção, de participação e de responsabilidade. E assim sendo, ao final dos três capítulos que compõem este trabalho – desenvolvido sob a lógica dedutiva de discurso e o método indutivo de investigação – confirmar-se-á: o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 é o mais efetivo dos instrumentos legais disponíveis para o combate ao abuso ao poder econômico em eleições. Palavras-chave: abuso do poder econômico nas eleições; captação ilícita de sufrágio; corrupção eleitoral.

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ABSTRACT

The Brazilian legal system assures – and if it did not, basic rules of conduct and social living would demand that – popular elections, what guarantee that citizens have the right to organize themselves in order do constitute – create – political parties; to face the voter, standing for a term (eligibility); to choose their representatives by voting – freely and secretly – in regular elections. Facing this panorama, it’s possible to say that in Brazil the Democratic State of Right is not only a rhetorical allegory or a constitutional utopia. On the contrary, the Brazilian society lives today this reality, even if the shameful economical, social, cultural and political inequalities may raise doubts about or demonstrate how incipient its Democracy still is, how limited the effectiveness of law is. This dichotomous situation can be easily observed in the abuse of economic power in the elections, mainly when one focuses on the illegal capture of votes and on corruption in elections. This is the subject of this paper: pointing out all the complexities of the most modern legal device at disposal of the voters’ freedom of choice, at disposal of the correctitude of the electoral process, politically punishing the most primitive and deleterious stain of the elections – the illegal capture of votes – as established by Article 41-A of the Law No. 9.504/1997. The abuse of economic power in elections is characterized when its use intends to unbalance the electoral dispute, happens in an irregular, hidden or disguised way, so strong that can affect the results of the ballot-boxes. Illegal capture of votes, in its turn, is an isolated conduct – of a candidate (or another person who acts in his name and with his consent) – consisting in giving, offering, promising or delivering the voter goods or personal advantages of any nature, including job or public office, in order to get one’s vote. Both situations, deeply linked, create a phenomenon of social-political order that stigmatize the electoral process, marking the Nation’s destiny — any Nation! — in an absolute and complete way. Studying this phenomenon, that is so rooted in the national political practice, through a legislative, a jurisprudential and a doctrinal approach (including the functioning of the whole process of cohibition and punishment), is vital not only for the knowledge (considering the presentation and the demonstration of juridical, exegetic, doctrinal instruments and existing nuances), but also and mainly to start an evaluation and a self-criticism behaviour; to instigate – more than prohibiting or punishing – a positive change in conduct, perhaps beginning with those empowered at that moment, but necessarily penetrating the citizen-voters’ spirit. If the focus of the abuse of economic power lays in the illegal capture of votes, the practical objective of its comprehension is promoting knowledge and stimulating more concrete and responsible acts of citizenship. And only through new conduct it will be possible to come closer to the real Democratic State of Right, in which, even in the rhetoric dreams of an ideal utopian State, there is no way of ignoring the political consciousness, the fight against abuses and corruption, the participation and the responsibility. Therefore, at the end of the three chapters of this paper – developed with the use of deductive logic of speech and inductive method of investigation – it will be confirmed that the Article 41-A of the Law No. 9.504/1997 is the most effective legal instrument we have to fight against the abuse of economic power in elections.

Keywords: abuse of economic power in elections; illegal capture of votes; electoral corruption.

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SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................06

ABSTRACT ............................................................................................................07

INTRODUÇÃO........................................................................................................11

1 O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES:

CONTEXTUALIZACÃO POLÍTICO-CONSTITUCIONAL E CONFIGURACÃO

INFRACONSTITUCIONAL .....................................................................................22

1.1 Contextualização Político-Constitucional.....................................................24

1.2 Características e Configuração do Abuso do Poder Econômico ..............40

1.2.1 O Abuso do Poder Econômico na Constituição Federal ..........................43

1.2.2 O Abuso do Poder Econômico na Código Eleitoral ..................................47

1.2.3 O Abuso do Poder Econômico na Lei Complementar n. 64/1990 ............51

1.2.4 O Abuso do Poder Econômico na Lei n. 9.504/1997 .................................58

1.3 Procedimentos ................................................................................................69

1.4 Penalidades .....................................................................................................71

2 A CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (O ART. 41-A DA LEI N. 9.504/1997).73

2.1 Histórico do Art. 41-A .....................................................................................76

2.2 O Art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 .....................................................................82

2.3 Perspectivas do Art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 ............................................87

2.4 Os Projetos de Lei “Pedro Henry” e “Antonio Carlos Valadares”..............90

2.4.1 O Projeto de Lei “Pedro Henry” .................................................................91

2.4.2 O Projeto de Lei “Antonio Carlos Valadares”............................................94

3 O ART. 41-A E O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES ............97

3.1 Caracterização da Conduta ...........................................................................102

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3.1.1 Participação Direta e/ou Indireta do Candidato........................................106

3.1.2 Dolo Específico ...........................................................................................109

3.1.3 Aspectos Práticos na Jurisprudência .......................................................110

3.1.3.1 Caracterização da Captação Vedada de Sufrágio .................................111

3.1.3.2 Não-Caracterização da Captação Vedada de Sufrágio .........................113

3.2 Penalidades ....................................................................................................116

3.3 Competência e Procedimento.......................................................................119

3.3.1 Lapso Temporal de Incidência da Norma .................................................125

3.3.2 Termo Final para Ajuizamento da Ação de Investigação Judicial

Eleitoral.................................................................................................................126

3.3.3 Litisconsórcio Passivo Necessário nas Eleições Majoritárias para

Cargos do Executivo ..........................................................................................127

3.4 Influência no Resultado do Pleito: Desnecessidade ..................................128

3.4.1 Execução Imediata......................................................................................130

3.4.2 Recurso Contra a Expedição de Diploma e Ação de Impugnação de

Mandato Eletivo: Prova e Inelegibilidade...........................................................134

3.4.2.1 Recurso Contra a Expedição de Diploma e Ação de Impugnação de

Mandato Eletivo....................................................................................................135

3.4.2.2 Recurso Contra a Expedição de Diploma: Prova e Inelegibilidade .....136

3.5 O Art. 224 do Código Eleitoral e Anulação de Eleição na Captação Ilícita

de Sufrágio ..........................................................................................................138

3.5.1 Aplicação do Art. 224 do Código Eleitoral aos Casos do Art. 41-A da Lei

n. 9.504/1997.........................................................................................................139

3.5.2 Renovação de Eleição ................................................................................140

3.5.2.1 Participação do Candidato que deu Causa à Anulação........................142

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3.6 Da Constitucionalidade da Norma ...............................................................143

3.6.1 Posicionamento Doutrinário ......................................................................146

3.6.2 Posicionamento dos Tribunais ..................................................................153

CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................155

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................163

ANEXOS................................................................................................................174

ANEXO 1 – Quadro sinótico “Representação com fulcro no art. 41-A da Lei

n. 9.504, de 1997” .................................................................................................175

ANEXO 2 – Quadro sinótico “Da ação de investigação judicial eleitoral com

fulcro no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990”.....................................181

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INTRODUÇÃO

O fim proposto na presente Dissertação de Mestrado é uma

abordagem do abuso do poder econômico nas eleições sob o foco da captação

ilícita de sufrágio, prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 30 de setembro de

1997.

Originalmente concebido com o título “Abuso do poder econômico nas

eleições”, o projeto de dissertação, de junho de 1998, foi desenvolvido sobre o

tripé “teórico-constitucional-jurisprudencial”, buscando uma visão construtiva que

envolvesse não apenas aporte teórico (Direito, Filosofia do Direito e Política), mas

também legislativo (constitucional e infraconstitucional) e jurisprudencial (termo a

ser compreendido em sentido amplo, ou seja, os julgados dos Tribunais,

especialmente no âmbito da Justiça Eleitoral).

O tempo e os contratempos conduziram a outros rumos, sem que isso

importasse abandono ou prejuízo do projeto e do objeto; apenas não há sentido

em manter pesquisa jurisprudencial focada nos dez primeiros anos da

Constituição Federal (1988-1998) e desenvolver o tema sob esse marco temporal

e histórico (o abuso do poder econômico nas eleições sob a égide do primeiro

decênio constitucional).

Efetiva e literalmente, restou prejudicada a linha original, mas não foi

abandonado o tema, que permanece atual com as inovações trazidas pela

legislação e pela prática política brasileira, tudo a alimentar uma infinita discussão

envolvendo a lisura do processo eleitoral (sob o marco da legitimidade formal e da

legitimidade material), a legitimidade dos mandatos e a importância

comportamental na política. A doutrina e a jurisprudência também evoluíram,

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servindo de estímulo para o aprofundamento da pesquisa – e do debate. E, acima

de tudo, do último panteão, a Constituição Federal – madura, em vista de tantas

vicissitudes e remendos.

Abuso do poder econômico em eleições é tema atualíssimo – presente

em nossas vidas, em nosso dia-a-dia – mesmo que possa passar desapercebido

da população ou tecnicamente ser desconfigurado por quem deva aperfeiçoá-lo.

Mas as manchetes dos jornais, como é notório, dão idéia da importância do

assunto.

Assim, o novo enfoque a delimitar o trabalho é o art. 41-A da Lei n.

9.504/19971, acrescido a esta por meio da Lei n. 9.840, de 28 de setembro de

1999, lei de iniciativa popular que penaliza formas vedadas de captação de

sufrágio, cuja construção e configuração deve-se especialmente à jurisprudência,

e apresenta a seguinte redação:

Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990.

1 BRASIL. Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições, também conhecida como “lei das eleições”, uma vez que veio regulamentar o processo eleitoral na fase de transição do antigo sistema de votação por cédulas para o sistema informatizado. Disponível em <http//www.tre-sc.gov.br/legisjuris/lei_9504.htm> Acesso em: 20 de mar.2005. Oportuno registrar, outrossim, que o Código Eleitoral (Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965), ainda vige.

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Importante lembrar, nessa esteira, que:

1. o processo eleitoral é um concurso, no qual é imprescindível que

os candidatos concorram em condições de igualdade;

2. o conhecimento da realidade eleitoral permite a formação de juízo

mais acertado acerca da burla – das condições e razões – a essa

condição de igualdade;

3. a igualdade eleitoral envolve muito mais do que “uma condição de

concurso entre candidatos”, abrangendo:

o eleitor, ante a igualdade do voto (todo voto tem igual valor);

o voto, ante o direito de o eleitor escolher, por meio do voto igual

e livre, seus representantes políticos;

a verdade eleitoral, que é a garantia que a Sociedade e as

Instituições devem dar quanto ao voto como a manifestação da

real vontade do eleitor.

É com esse pensamento e comportamento que se atingirá o objetivo

máximo de resguardar o direito do voto e preservar a verdade eleitoral, essência

da Democracia, base do Estado Democrático de Direito.

Integrando-se ao “abuso do poder econômico nas eleições”, o art. 41-A

da Lei n. 9.504/1997 dá nova roupagem, novo ânimo, novo fôlego ao estudo de

prática ilegal e nociva ao processo eleitoral, com reflexos no processo político, a

desencadear uma intensa atividade jurisdicional e doutrinária, permitindo ventilar,

genericamente, a configuração, o processo, as penas e a constitucionalidade da

norma (ou seja, aspectos materiais e formais da captação ilícita de sufrágio).

Para isso, será explorada uma visão geral de poder e de abuso de

poder nas eleições, cotejando os aspectos constitucionais (art. 14, §§ 9º e 10 da

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Constituição Federal), legislativo (Código Eleitoral, Lei Complementar n. 64/1990,

e Lei n. 9.504/1997), doutrinário (visão predominantemente de autores nacionais,

haja vista inexistir, sobre o tema específico – captação ilícita de sufrágio (art. 41-

A) – produção científica estrangeira) e jurisprudencial (posição dos Tribunais

Superior e Regionais Eleitorais, e do Supremo Tribunal Federal, com ênfase ao

período 2000-2005).

É oportuno lembrar que a Constituição da República Federativa do

Brasil – CRFB – de 1988 trouxe novo alento ao combate do abuso do poder

econômico nas eleições, o que não significa afirmar tratar-se de algo inédito,

inovador. Ademais, todo aparato legislativo e instrumental vigente, embasado em

norma constitucional, tem se demonstrado ineficiente ou de eficiência relativa no

tocante ao mínimo propósito de provocar “mudança de atitude”, uma mudança

cultural no desenvolvimento dos processos eleitorais. Como se encontra(m)

esse(s) instrumento(s) no contexto do fiel propósito de coibir a prática de

condutas prejudiciais ao processo eleitoral? Considerando-se o conceito de

“poder” – e sua influência social –, utilizando-se da legislação, da doutrina e da

jurisprudência, qual será o interesse na normatização do abuso do poder

econômico e dos respectivos meios para coibi-lo, tendo em vista serem os

detentores do poder legiferante, como regra, o alvo principal da norma? O tipo

penal “corrupção eleitoral”2 – ciente da existência de abalizadas opiniões que não

o admitem na abordagem direta do abuso do poder econômico em eleições, vem

atualizado, com novas penalidades, no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997. Se o

2 A corrupção eleitoral está tipificada no art. 299 do Código Eleitoral, o qual também serve de conceito operacional à Categoria. In verbis: “Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita: Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa”.

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primeiro trata de crime eleitoral – corrupção ativa e passiva; formal; apenado com

reclusão –, o 41-A versa sobre conduta vedada a candidato, atacando o registro

de sua candidatura ou o seu diploma, além de estabelecer pena de multa. É, pois,

idêntica conduta, obedecidas às características e condições da situação, sendo

atacada com rigor em virtude do bem jurídico tutelado, qual seja, a liberdade do

voto, a lisura das eleições, a legitimidade dos resultados. Portanto, sendo

inegável que a corrupção eleitoral está contextualizada no “abuso do poder

econômico”, qual a razão de o processo legislativo do art. 41-A ter seguido o

excepcional caminho da iniciativa popular (como adiante se verá)? Muito mais do

que a construção de um conceito de abuso do poder econômico em eleições,

baseado na legislação, na doutrina e na jurisprudência, é importante estabelecer

a interligação e a interação sistêmica do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 ao “mundo

do abuso em eleições”. E o foco sempre será o constitucional, não obstante

existam dispositivos vigentes, anteriores à Constituição de 1988.

Cuida-se, pois, de pesquisa teórica – doutrinária, legislativa e

jurisprudencial3 – com conotação eleitoral, que não busca um conceito

operacional consentâneo de abuso do poder econômico em eleições, mas a sua

repercussão por meio de condutas vedadas de candidatos e seus efeitos, no

processo eleitoral.

Pode-se adotar, para tanto, alguns pressupostos que direcionarão o

desenvolvimento do trabalho, quais sejam:

3 No caso da Justiça Eleitoral, permita-se provocar uma reflexão acerca do efetivo empirismo materializado em seus julgados, consideradas as suas características técnicas e operacionais, e os exíguos prazos existentes/estabelecidos em face de sua atividade estar sempre direcionada a um evento com data certa, a eleição! Por essa razão, e em outras palavras, ouso afirmar que a jurisprudência eleitoral tem efeito muito semelhante a uma pesquisa de campo, diferindo, essencialmente, na metodologia, mas permitindo organizar o planilhamento de dados com tanta celeridade e riqueza de detalhes quando o mergulho in loco.

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1. o abuso do poder econômico nas eleições, que pode tomar a forma,

na sua configuração, de corrupção ou fraude, é vício social de

imensurável gravidade e extremos e deletério reflexos, pois implica o

controle direto do poder político e incentiva o fisiologismo4;

2. a CRFB e a legislação infraconstitucional oferecem os instrumentos

para o controle do abuso do poder econômico em eleições;

3. nada obstante, e sem ser contraditório, o Poder Legislativo não tem

demonstrado maior interesse na regulamentação da ação

constitucional contra o abuso do poder econômico em eleições –

ação de impugnação de mandato eletivo – sendo obra da

jurisprudência o estabelecimento do rito e/ou a construção

procedimental, do mesmo modo que a captação ilícita do sufrágio é

fruto de iniciativa popular;5

4. o abuso do poder econômico em eleições implica o investimento de

recursos, em campanha, ilícitos e de tal monta, a ponto de quebrar o

equilíbrio do concurso; a corrupção eleitoral, na oferta de vantagens

em troca do voto ou sua abstenção; a fraude, em meios externos de

descaracterização da intenção de voto do eleitor e do real resultado

do pleito; a captação ilícita de voto, na oferta de vantagem em troca

do voto, ou seja, é a versão administrativa da corrupção eleitoral, da

qual difere apenas na sanção e em aspectos técnicos;

4 Segundo KOOGAN/HOUAISS (1995, p. 377), fisiologismo é a “prática política voltada para o interesse e proveito personalizados do praticante, mercê de atos de prevaricação e corrupção ou afins”. 5 [...] “onde está o legislador que tenha a sabedoria e o talento prático suficientes para se valer da luz que ele derrama sobre a ciência da legislação?“ (THOREAU, Henry David. Desobediência civil (resistência ao governo civil) e Walden, p. 38-39).

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17

5. a Lei n. 9.840/1999, que acrescentou à Lei n. 9.504/1997 o art. 41-A,

é o marco de modernidade no trato do abuso do poder econômico

em eleições, haja vista apenar as condutas vedadas nela previstas,

com cassação do registro de candidatura ou, se for o caso, com a

cassação do diploma do eleito – além de multa. Ademais, com a

nova norma legal completa-se o ferramental disponível para o

combate do poder econômico em eleições. Em outras palavras, e

complementarmente, existem à disposição da sociedade, dos

partidos políticos e dos operadores do direito, recursos legais hábeis

e suficientes para coibir e/ou permitir a penalização dos agentes do

abuso do poder econômico em qualquer fase do processo eleitoral e

sob quaisquer prismas, ou seja: quanto ao processo eleitoral

propriamente dito: cassação do registro de candidatura, do diploma

ou do mandato eletivo; quanto aos efeitos administrativos, multa;

quanto aos efeitos supervenientes, inelegibilidade; quanto aos

efeitos penais, reclusão e multa.

O abuso do poder econômico em eleições pode ser discutido e

compreendido a partir do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997. Por outro lado, é

imprescindível divulgar – dar publicidade, tornar público – o dispositivo, o qual,

nascido em 1999 com grande repercussão, apenas em 2004 tornou-se efetivo,

sentindo-se verdadeiramente a sua aplicação (mesmo que, infelizmente, ainda

não seja tão efetivo quanto deveria ser, quanto a realidade política brasileira

exigiria).

Não se trata, contudo – e é importante estar ciente e atento a isso – de

um passe de mágica, em que a matéria em exame, após um simples toque,

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passará a ser singela ou livre de qualquer complexidade formal, material ou

técnica. Para convencer-se disso basta lembrar que, pela sua natureza intrínseca

(política), trilha-se terreno movediço; e que por aquilo que transparece – sua

natureza extrínseca (vaidade, corrupção, acordos, conchavos, ocupação de

espaço político, exercício de poder) – trilha igualmente terreno movediço.6

Estando o fim e o ponto de partida no multicitado art. 41-A, outro

objetivo paralelo é a demonstração da existência de um ferramental legislativo7 e

estrutural completo e efetivo contra a interferência da fraude, da corrupção e do

abuso do poder econômico no processo eleitoral.8

Reiterando item acima exposto, a Lei n. 9.840/1999, ao acrescer à Lei

n. 9.504/1997 o art. 41-A, muito mais do que estabelecer condutas e formas

vedadas de obtenção de voto, penalizando sua prática com a cassação do

registro de candidatura ou do diploma, e multa, completou o cerco ao abuso do

poder econômico no processo eleitoral.

E como o fim de todas as ações no processo eleitoral é a preservação

da livre vontade do eleitor, da lisura do processo e da verdade dos resultados, é

possível focar dois rumos diversos, porém paralelos e complementares, que

norteiam essa construção:

1. a existência de instrumentos técnicos e legais à disposição da

Sociedade, do Estado (Ministério Público, Polícia e Magistratura),

dos operadores do Direito (Juristas e Advogados), dos candidatos

e dos partidos políticos – enfim, dos interessados – para preservar

6 Todas situações a merecer, por ora, uma compreensão gramatical, o que não será pouco para o fim de se vislumbrar onde se quer e onde se pode chegar com a abordagem da matéria. 7 Apenas para ilustrar: Código Eleitoral (1965), CRFB (1988), Lei Complementar n. 64/1990 e Lei n. 9.504/1997 (art. 41-A, acrescido em 1999). 8 Propositalmente faz-se referência, mais uma vez, à corrupção e à fraude no contexto do abuso do poder econômico.

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a lisura do processo eleitoral, coibindo e/ou penalizando práticas

ilícitas;

2. a abrangência de todo o processo eleitoral, em todas as suas

fases, com efeito igualmente amplo: cassação do registro de

candidatura, do diploma ou do mandato eletivo; multa;

inelegibilidade; perda dos direitos políticos; e condenação

criminal.

Por fim, selecionando e delimitando o objeto em face da sua

importância e modernidade, trilhar-se-á o caminho da pesquisa legislativa,

bibliográfica e jurisprudencial, utilizando-se, na operacionalização do trabalho, a

técnica de fichamento – segundo a metodologia proposta por Pasold9 –, e para o

seu desenvolvimento propriamente dito, a lógica dedutiva de discurso e o método

indutivo na investigação, uma vez que a sua construção vem estabelecida na

intelecção teórica e prática da lei, focada na realidade político-social brasileira

(esta consolidada por meio de julgados dos tribunais), com substancial aporte

teórico-acadêmico e doutrinário.

A dissertação será desdobrada, efetivamente, em três capítulos

expositivos. O primeiro, o abuso do poder econômico nas eleições:

contextualização político-constitucional e configuração infraconstitucional, de

cunho mais teórico, situa o abuso do poder econômico dentro de uma visão

política, sociológica e constitucional, trazendo à baila o arcabouço legislativo que

envolve a matéria, os respectivos procedimentos para o seu combate e as

penalidades aplicáveis. O segundo, trata do foco do trabalho, que é o do abuso do

poder econômico sob a ótica do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, abrangendo o seu

histórico como projeto de lei de iniciativa popular, os aspectos construtivos da

9 PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. Florianópolis: OAB/SC, 1999. p. 103-121.

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norma, as perspectivas em torno da sua vigência, e as iniciativas de alteração

legislativa que já tramitam no Congresso Nacional. O terceiro, justificadamente o

maior, é operacional – o art. 41-A e o abuso do poder econômico nas eleições.

Ultrapassada a fase de fundamentação e conhecimento, passa-se a dissecar a

captação ilícita de sufrágio dentro do abuso do poder econômico nas eleições,

apresentando aspectos substantivos, como a caracterização da conduta, e

adjetivos, como as questões relativas à competência e ao procedimento (dentre

vários aspectos processuais), sem esquecer outras características marcantes da

norma, como a execução imediata das decisões prolatadas sob a sua égide, a

questão da renovação das eleições no caso de nulidade de mais de cinqüenta por

cento dos votos e, especialmente, a discussão envolvendo a constitucionalidade

do artigo, tema que envolve a elegibilidade e o art. 15 da Lei Complementar n.

64/1990 – Lei das Inelegibilidades.

Numa apresentação bastante sintética, é disso que trata a presente

Dissertação de Mestrado. Outrossim, toma-se a liberdade, numa última nota,

quiçá conflitante com a singeleza do que foi até aqui exposto, de afirmar que se

está a debater o mais importante instrumento jurídico existente em nosso sistema

para o combate ao abuso do poder econômico nas eleições, qual seja, o art. 41-A

da Lei n. 9.504/1997.

Nessa esteira, mesmo que ainda existam inúmeros e gravíssimos

casos de interferência do poder econômico nas eleições, procurar-se-á

demonstrar que igualmente existem inúmeras formas de combatê-los,

penalizando quem abusa em mais de um Juízo, em mais de uma instância e/ou

em diversas – ou todas – as fases do processo eleitoral. E, nesse contexto, surge

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especialmente efetivo o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, carecedor apenas de

maior divulgação, maior conhecimento – e que nasceu pelas mãos do legislador,

mas não por sua iniciativa.

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1 O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES:

CONTEXTUALIZACÃO POLÍTICO-CONSTITUCIONAL E CONFIGURACÃO

INFRACONSTITUCIONAL

O tema “abuso do poder econômico nas eleições” não é novo, da

mesma forma que a presente exposição não traz mais nenhuma novidade, ainda

que continue atual e presente no dia-a-dia da política nacional. Isso não o torna

defasado ou desinteressante; ao contrário, o fato de não ser novo não tira a sua

atualidade, alimentada por aspectos culturais e por ações isoladas, como a

iniciativa popular contra a corrupção eleitoral – que resultou no art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 –, a demonstrar quão presente ele é.

Mesmo que o foco do abuso do poder econômico emprestado neste

trabalho seja o da captação ilícita de sufrágio, no sistema jurídico pátrio sua base

é constitucional.

Sempre referido – e em qualquer de suas formas – como um mal a ser

combatido, a ser repelido, especificamente quanto às eleições, como se verá em

seguida, vale a norma insculpida no art. 14 da CRFB, que não versa exclusiva

e/ou especificamente sobre o abuso de poder, mas inclusive a ele, nas eleições,

dentro do Capítulo IV, “Dos Direitos Políticos”.

Abuso do poder econômico nas eleições não está conceituado na

Constituição. Mesmo assim, em sentido amplo, é notória a compreensão de que

se trata do uso de recurso econômicos ou financeiros, ou seja, de bens ou

vantagens patrocinadas por condição econômica mais vantajosa; ou de dinheiro

em espécie, para adquirir vantagem eleitoral – no caso deste trabalho, “adquirir

voto”. E se esta é a compreensão vulgar, mas correta, pode-se conceituar – e

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adotar como conceito para o fim desta dissertação, que abuso do poder

econômico nas eleições é a utilização de recursos ilícitos no processo eleitoral,

não estando o abuso vinculado ao montante dos recursos, mas à ilicitude de sua

origem. A compreensão dessa singela diferença entre a intelecção vulgar e o

conceito proposto – licitude ou ilicitude dos recursos – é imprescindível à

exposição e ao resultado almejado. Por isso, abuso do poder econômico nas

eleições não é somente o investimento de riqueza no processo eleitoral, na

captação de voto(s), mas investimento de recursos ilícitos.

Vale o alerta quanto à responsabilidade de se trabalhar conceito tão

importante de forma tão simples, mas suficiente e enquadrado no foco “art. 41-A

da Lei n. 9.504/1997”. É o alerta de José Néri da Silveira10: “Se é exato, assim,

que não há uma definição, desde logo, do que se deva ter como abuso do poder

econômico no processo eleitoral, decerto algumas diretrizes a esse respeito cabe

colher do contexto do sistema eleitoral, a partir da verificação de normas de

caráter proibitivo e de conteúdo econômico” [...], adentrando em particularidades

como a (1) captação de recursos financeiros para financiamento de campanhas

eleitorais e de candidaturas; 2) custeio de transporte de eleitores; 3) propaganda

eleitoral, mesmo a título gratuito; 4) propaganda partidária, mesmo a título

gratuito; 5) corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral); 6) utilização de

organização comercial de vendas, distribuição de mercadorias, prêmios e sorteios

para propaganda ou aliciamento de eleitores (art. 334 do Código Eleitoral).

10 SILVEIRA, José Néri da. Abuso do poder econômico no processo eleitoral, p. 2, 4-5, 7, 43, 59, 62-65, 68-71, 78, 81-82.

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1.1 Contextualização Político-Constitucional

Seria fácil e lógico, seguindo a estrutura do trabalho, iniciar este

capítulo abordando o cerne da questão, qual seja, o abuso do poder econômico

nas eleições focado na captação ilícita de sufrágio, uma vez que a matéria, que

encontrará seu termo no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, permite uma composição

sistêmica e evolutiva do fundamento legal. A bem da verdade, apenas por opção

metodológica, a apresentação da legislação seguiria ordem cronológica, não

hierárquica. Permita-se, contudo, a introduzi-lo – o abuso do poder econômico

nas eleições – quebrando tal regra, para trazer à baila, em prolegômenos,

algumas considerações de ordem constitucional vinculadas ao tema, sem

propriamente integrá-lo.

Reza o art. 1º da Constituição Federal que a República Federativa do

Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito, tendo como fundamento a

soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do

trabalho e da livre iniciativa, e o pluralismo político.

O Brasil é um Estado Democrático de Direito, do que se enfatiza

aspectos essenciais, como Estado de Direito, Estado Democrático e Democracia

– sem ignorar a Cidadania e o Pluralismo Político, que direta e/ou indiretamente

permearão toda a dissertação, de forma mais visível dentro do seu objeto, de sua

delimitação e do seu objetivo.

O Estado de Direito, muito mais do que caracterizado pela divisão dos

poderes e pelo enunciado e garantia de direitos individuais, caracteriza-se pelo

império da lei; lei como exercício de regulação social, formal e materialmente

legítima, ou seja, vinculada à supremacia das necessidades e anseios sociais,

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observando o rito próprio e conquistando o respaldo popular11. A lei é instrumento

para uma melhor convivência social!

Prevê o parágrafo único do art. 1º da CRFB que todo o poder emana

do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente. Cuida-

se, pois, do estabelecimento do Estado Democrático no modelo brasileiro, e sobre

ele – ou melhor, sobre ela, a Democracia – se discorrerá algumas linhas.

Mandato político representativo é o resultado da eleição para o eleito,

elemento básico da Democracia representativa.

Nele – no mandato político representativo – se consubstanciam os princípios da representação e da autoridade legítima. O primeiro significa que o poder, que reside no povo, é exercido, em seu nome, por seus representantes periodicamente eleitos, pois uma das características do mandato é ser temporário. O segundo consiste em que o mandato realiza a técnica constitucional por meio da qual o Estado, que carece de vontade real e própria, adquire condições de manifestar-se e decidir, porque é pelo mandato que se constituem os órgãos governamentais, dotando-os de titulares e, pois, de vontade humana, mediante os quais a vontade do Estado é formulada, expressada e realizada, ou, por outras palavras, o poder se impõe.12

Contudo, não se pode excluir da realidade brasileira a participação

direta do cidadão na formação dos atos de governo, ao que se denomina princípio

participativo ou Democracia participativa.13

11 Esse assunto seria mais bem compreendido – e, de igual modo, mereceria melhor tratamento – sob as luzes da Política Jurídica, a qual permitiria uma visão e uma construção como fenômeno político-social preparatório, preliminar ao Direito, muitas vezes confundindo-se com as próprias “fontes do Direito”. Contudo, tal estudo – e sob esse paradigma – foge do escopo deste trabalho, merecendo destaque, outrossim, a seguinte bibliografia: MELO, Osvaldo Ferreira de. Fundamentos da política jurídica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor/CPGD-UFSC, 1994. 136p. Outrossim, na abordagem não se discute tecnicamente o “Estado Legislativo” e o “Estado Constitucional”, este o paradigma vigente, ante a evolução ao império constitucional como garante dos direitos individuais. 12 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 142. 13 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, p. 145.

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O dispositivo constitucional, seguindo a compreensão histórica do

conceito de Democracia, traz norma clara: havendo sociedade, e o poder

emanando do povo, há Democracia! Mas o que deve chamar atenção são duas

categorias em especial: “Povo” e “Poder”.

Se a Democracia pura é uma utopia14, não é possível perder de vista

os seus princípios fundamentais, quais sejam, o da soberania popular (o povo

como única fonte do poder) e o da participação, direta ou indireta, do povo no

poder (vontade popular), sendo que nos casos em que a Democracia é indireta,

há o princípio derivado ou secundário da “representação”.15

Assim sendo, a

A democracia não teme, antes requer, a participação ampla do povo e de suas organizações de base no processo político e na ação governamental. Nela, as restrições e essa participação hão de limitar-se tão-só às situações de possível influência antidemocrática, como as irreelegibilidades e inelegibilidades por exercício de funções, empregos ou cargos, ou de atividades econômicas, que possam impedir a liberdade do voto, a normalidade e a legitimidade das eleições (art. 14, §§ 5º a 9º).16

O Brasil é, pois, um Estado Democrático de Direito, um modelo de

Democracia representativa, em que a participação popular é indireta, ou seja, o

povo delega, por meio do voto, seu poder ao(s) seu(s) representante(s). É a

eleição: o povo, por meio do voto, outorgando poder representativo e, por via de

conseqüência, legitimando esse poder. Ainda, não se pode quedar silente quanto

14 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 132-133, in verbis: [...] “os que reclamam que a democracia nunca fora realizada em sua pureza em lugar algum concebem-na como um conceito estático, absoluto, como algo que há que se instaurar de uma vez e assim perdurar para sempre. Não percebem que ela é um processo, e um processo dialético que vai rompendo os contrários, as antíteses, para, a cada etapa da evolução, incorporar conteúdo novo, enriquecido de novos valores. Como tal, ela nunca se realiza inteiramente, pois, como qualquer vetor que aponta a valores, a cada nova conquista feita, abrem-se outras perspectivas, descortinam-se novos horizontes ao aperfeiçoamento humano, a serem atingidos”. 15 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 135. 16 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 140-141.

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ao princípio representativo, onde há a participação direta e pessoal do cidadão na

formação dos atos de governo, cabendo o exemplo da Iniciativa Popular, que deu

origem ao art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, ponto central deste trabalho.17

A Constituição Federal brasileira erige como primado o Estado Democrático de Direito, acentuando a importância não só de um Estado de normas, mas, sobretudo, um estado legitimado pela participação popular – um Estado, antes de tudo, democrático. Costumo lembrar que quem só critica políticos, tachando a todos de desonestos, descomprometidos, abusa da boa-fé pública ao carrear a natural revolta da sociedade contra os indisfarçáveis privilégios da elite brasileira. Mas é preciso esclarecer que quem diz que todo político é igual, termina fazendo o desserviço à democracia, termina por fazer crer que melhor então – já que nenhum político presta – é a ditadura. Esses arautos do arbítrio esquecem-se de dizer que existem, sim, os bons políticos e os maus políticos, e está na razão do voto consciente os destinos de nossa comunidade, estado ou país. Neste sentido, o político é a representação do momento político de um povo. O ordenamento jurídico brasileiro estabelece os princípios que devem nortear a análise das eleições: a proteção da probidade administrativa; a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato; e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração pública (CF, no parágrafo 9º do art. 14) e o “interesse público de lisura eleitoral” (LC 64/90, art. 23).18

Ora, se o aparato existente vem sustentado em base constitucional, é

bom lembrar que são raros os casos de condenação criminal por prática de crime

eleitoral relativo ao abuso de poder econômico, feitos em que se utilizam de

procedimentos típicos do Direito Eleitoral19. E é necessário ter presente esse

17 A título de ilustração, cabe anotar importante distinção feita por Silva (1999), ao tratar “Dos Direitos Políticos Positivos” (Título V, Capítulo II), onde, além de abordar de forma didática os “Sistemas Eleitorais”, traz a conceituação de “sufrágio”, “voto” e “escrutínio”. 18 TARGINO, Harisson Alexandre. Captação ilegal de sufrágio: art. 41-A da lei das eleições. Revista de Julgados, Paraíba, v. único, n. 7, p. 13-34, 2003. 19 “Muito embora não esteja tipificado como delito nominado, o processo crime será obrigatoriamente aberto pelo Ministério Público Eleitoral. [...] As representações são os processos de iniciativa das partes mais comuns na Justiça Eleitoral. [...] No Direito Eleitoral, a representação é utilizada largamente, com efeitos de reclamação, pedido de providências, queixas contra infração à lei, e até mesmo como sucedâneo de recursos, quando não há nenhum previsto em lei” (CASTRO, Carlos Fernando Correa de. Paraná Eleitoral, p. 6-8, 10-16).

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aspecto formal para valorizar o rito sumaríssimo (art. 22 da Lei Complementar n.

64/1990) adotado na captação ilícita de sufrágio, feito que servirá de meio – de

instrumento – para a consecução de outros fins, como a persecução criminal, a

inelegibilidade e/ou a perda do mandato.

Nessa esteira, vale o comentário de Mello20 acerca da ação de

impugnação de mandato eletivo, cabível à captação ilícita de sufrágio, ou melhor,

àquilo que a norma visa atingir:

Desnecessário falar da utilidade da ação como meio para impedir o desnaturamento do processo eleitoral, escoimando-o de fraudes, corrupção, abuso de poder econômico e do poder de autoridade. Necessário, no entanto, que ela se viabilize como instrumento moralizador das nossas eleições, em todos os seus níveis. Assim não sendo, sua inutilidade restará definitivamente comprovada, o que é de lamentar-se.

E é do mestre italiano Norberto Bobbio21, conectando a prática política

à conduta social e à realidade social, que se tira a seguinte lição:

Do ponto de vista teórico, sempre defendi – e continuo a defender, fortalecido por novos argumentos – que os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas. Estou de acordo com os que consideram o “direito” como uma figura deôntica, que tem um sentido preciso somente na linguagem normativa. Não há direito sem obrigação; e não há nem direito nem obrigação sem uma norma de conduta.

O art. 41-A busca esse compromisso, essa obrigação, ética e moral,

para com as regras de conduta na política, pois, agora sob o prisma da prestação

20 MELLO, Celso Antônio Bandeira de (org). Estudos em Homenagem a Geraldo Ataliba. Direito Administrativo e Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 616-618. 21 BOBBIO, Norberto. A Era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 1, 3-8.

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jurisdicional, [...] “Não é possível exercer jurisdição onde não há direitos subjetivos

a reclamar a tutela de quem diz o Direito, de quem aplica a norma ao caso”.22

Esses direitos subjetivos podem ser sintetizados na elegibilidade,

condição-direito que permeará o trabalho como um divisor de águas, não apenas

teórico, mas também da constitucionalidade da norma eleita como foco. É que

muitas vezes, enquanto nos prendemos ao exercício dos direitos políticos, ao

exercício da cidadania, nos esquecemos do entorno que acomoda essa condição,

tornando o cidadão elegível ou inelegível.

A CRFB, em seu art. 14, estabelece como condições de elegibilidade:

a) nacionalidade brasileira; b) pleno gozo dos direitos políticos; c) alistamento

eleitoral; d) domicílio eleitoral na circunscrição da eleição; e) filiação partidária; f)

idade mínima exigida. Seguindo essa lógica, enquanto [...] “a elegibilidade

consiste no preenchimento das condições exigidas para ser candidato, ou seja, é

a caracterização das condições que em princípio asseguram ao pretendente o ius

honorum, a inelegibilidade consiste na caracterização de situações que afetam a

capacidade eleitoral passiva do cidadão”23. E a própria Constituição (art. 14, § 9º),

prevê a possibilidade de apenas por lei complementar serem estabelecidas

(novas) situações de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de

proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato,

considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das

22 BORJA, Célio. A Justiça Eleitoral e os direitos políticos. In: O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL E A DEFESA DA ORDEM JURÍDICA DEMOCRÁTICA, 2, 1993. Brasília. Anais... Brasília: Imprensa Nacional, 1993. p. 35-36. 23 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à Teoria das Inelegibilidades. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 111/112.

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eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de

função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.24

Como antes pincelado, o tema em comento situa-se na esfera do

Direito, mas não exclusivamente. Perpassa Política e, acima de tudo, Sociologia,

haja vista com propriedade imiscuir-se nos usos e costumes da(s) Sociedade(s) e

nas causas e razões de assim agir. Em uma visão simplista, tratamos da Cultura

da nossa Sociedade, materializada, por um lado, no sistema jurídico vigente,

valendo a observação do sempre atual Nelson Hungria25, de que a [...] “fórmula de

Kelsen é incontestável: ‘O Estado é o direito’” – para o que se toma a liberdade de

estender à Sociedade, originando o tripé “Estado-Direito-Sociedade”.

A Sociedade e o Estado somos nós, pois se cuida de poder delegado a

originar o ente estatal. Por via de conseqüência, considerada a missão precípua

de regular as relações sociais, há o Direito. Ele nasce, vive (sobrevive!) e morre

em função das relações sociais que regula. É o seu ciclo vital.

E o que dizer das relações sociais de interesse público, aquelas que

não são minhas, nem suas, mas nossas? E como vem revestido esse misto de

direito e obrigação que é a manutenção de convivência e coexistência saudáveis

entre os concidadãos? Onde se encaixa o Direito à Eleição, de escolha dos

representantes ou de delegação de competência?

Há, nesse contexto, uma direta vinculação entre Política e Direitos

Humanos, e, em breves linhas, é nesse caminho que se seguirá, explorando

24 PEREIRA, Ricardo Teixeira do Valle. Breves apontamentos sobre condições de elegibilidade, inegibilidades, registro de candidatura e ação de impugnação de pedido de registro de candidatura. Disponível em:<http://www.tre-sc.gov.br/sj/cjd /doutrinas/ricardo1.htm>. Acesso em: 15 jun.2005. 25 HUNGRIA, Nelson. Conflito entre autoridade e liberdade. Revista Eleitoral da Guanabara, Rio de Janeiro, ano I, n. 1, 1968, p. 139-140, 142. Tal fórmula é recebida para o contexto do trabalho, não sendo mais admitida diante dos novos paradigmas do Estado Constitucional.

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estudo patrocinado pela Organização das Nações Unidas – “Direitos Humanos e

Eleições”26 –, que se encaixa perfeitamente no espírito do art. 41-A.

Além de ser um direito humano por si próprio, o direito dos cidadãos de tomar parte na condução dos assuntos públicos, especialmente por meio de eleições, exige, para ser significativamente exercido, o gozo de uma série de outros direitos internacionalmente protegidos. Entre estes, há o direito à liberdade de opinião, expressão e associação, e direitos à assembléia pacífica e livre de medo e intimidação. Todos esses direitos, inclusive o direito a tomar parte no governo, devem ser abertos a desfruto igual, sem qualquer tipo de distinção, tal como raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou outras, origem nacional ou social, propriedade, nascimento ou outras condições. Por fim, um Governo democrático – com a garantia de eleições livres e justas – é por si mesmo um elemento essencial no pleno gozo de uma grande variedade de direitos humanos.

E segue a ONU referindo-se à idêntica necessidade de serem os

processos jurídicos também isentos de corrupção e influências políticas e

partidárias, a fim de garantir eleições justas com a participação igualitária e sem

intimidação dos cidadãos. O mesmo estudo aponta, considerando-as

inadmissíveis, as seguintes limitações impostas ao direito do voto27: a) exigências

econômicas, baseadas em recebimento de assistência pública, propriedade de

terra, ou renda; b) exigências excessivas de residência; c) restrições ao voto para

cidadãos naturalizados; d) exigência de idioma; e) exigências de grau de

instrução; f) limitações excessivas no direito a voto dos criminosos condenados.

Contudo, perfeita a conclusão a que chega o estudo, vazada nos seguintes

termos:

26 DIREITOS Humanos e Eleições. Um Manual Sobre os Aspectos Legais, Técnicos e de Direitos Humanos das eleições. Nações Unidas – Centro de Direitos Humanos. Série Treinamento Profissional n. 2. Tradução de Claudia Bentes David, p. 11, 14, 26, 31-32, 42. 27 Nenhuma delas existentes em nosso sistema jurídico, de forma a prejudicar o exercício do voto.

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A lei eleitoral nacional também deve proteger o processo político contra corrupção, abuso de autoridade, obstrução, influência indevida, falsa ideologia, suborno, ameaça, intimidação e todas as outras formas de prática ilegal e corruptiva. Os processos, procedimentos e penalidades devem respeitar os padrões internacionais para direitos humanos na administração da justiça.

Segundo Araldi28, apresentando um diagnóstico e sugerindo uma

solução, existe uma tradição de manipulação das leis eleitorais no Brasil na

tentativa, nem sempre vitoriosa, de se produzirem determinados resultados. Mas

a “democracia pressupõe igualdade de oportunidades entre os atores que

participam das eleições e transparência quanto aos interesses que representam.

A influência dos interesses econômicos sobre a política é inevitável. O

financiamento público daria, pelo menos inicialmente, certa igualdade de

condições aos partidos, protegendo-os de interesses privados”.

Lauro Barreto29 expressa bem a motivação existente para a tomada de

medidas que fortaleçam e consolidem o processo eleitoral, ante o conflito do bem

jurídico tutelado e as questões política e financeira envolvidas.

O bem jurídico tutelado, a liberdade eleitoral, considerado o pêndulo do observador comum em relação ao candidato não vitorioso transparece, esse fato delituoso pretérito, um contra-senso perseguir através de volumoso processo, em arrastada marcha, um acusado para punir quem já foi punido pelas urnas. Considerado, ainda pela ótica do observador comum, o acusado agora como eleito, o fato toma ares de capricho de quem se insurge contra a vontade popular. Para conter a incidência do abuso de poder econômico no financiamento de nossas campanhas eleitorais, já é unânime a convicção de uma imperiosa necessidade de uma ampla modificação em nossa Legislação Eleitoral. Dentre as propostas mais arrojadas para essas modificações figura a que prevê o financiamento das campanhas eleitorais pelo próprio Tesouro Nacional, que conta inclusive com a simpatia do Ministro

28 ARALDI, Ivete Ana. O jogo das regras: Empresários, reforma eleitoral e distritalização nas eleições proporcionais em Santa Catarina. Dissertação (Mestrado em Sociologia Política) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1997, p. 54-55. 29 BARRETO, Lauro. Escrúpulo & poder: o abuso de poder nas eleições brasileiras. São Paulo: Edipro, 1995, p. 75, 77-80, 83-84, 86-87.

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Sepúlveda Pertence, Presidente do Tribunal Superior Eleitoral quando da realização do pleito de 1994.

E, nesse contexto, há também o papel de outro protagonista – a

Sociedade – que precisa se conscientizar, segundo Cármen Lúcia Antunes

Rocha30, que voto é poder, [...] “o verbo mais vigoroso do cidadão. É sua voz que

se faz soar para a plenificação da democracia representativa. E, como elemento

fundamental de formação dos órgãos governamentais representativos, o voto

sujeita-se a todas as manifestações de corrupção neste que é sempre o seu

terreno mais fecundo: o poder”. E continua lembrando que a cidadania é exercida

pela participação na formação e no exercício do poder político; que a cidadania

realiza a Democracia; que a cidadania é o centro do Poder de Estado; que a

cidadania cresce ou diminui segundo o respeito atribuído aos processos eleitorais;

que a cidadania serve-se do voto31.

Esse o foco do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997: voto não é mercadoria,

pois mercadoria que tem preço; voto tem valor, e valor não é preço! Preço é o que

todos pagam pelo mau uso dos valores... Assim sendo, inspirado em Cármen

Lúcia Antunes Rocha, é possível ir além: voto é liberdade, poder e libertação.

Ives Gandra da Silva Martins32 defende que a anatomia do poder é a

anatomia do direito, a anatomia da vida em sociedade, haja vista a sociedade

apenas recentemente influenciar na formulação do direito e na composição do

poder. E sobre poder e sociedade, divide a humanidade em três estágios: no

30 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Justiça Eleitoral e Representação Democrática. p. 377, 379, 381, 386-387, 389-390, 392. 31 Neste ponto a autora critica o voto obrigatório e refere-se a ele como instrumento de construção: [...] “voto que realize a liberdade de ser parte efetiva, ativa, atuante e responsável no processo político do Estado Democrático [...] A conquista da liberdade de ser membro de uma sociedade tal como se deseja, segundo se necessita e para o que se aspira”. 32 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Uma teoria do poder e o financiamento de campanhas para alcançá-lo., p. 280-282, 284, 286-287, 289-290, 292.

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primeiro, por serem comunidades pequenas, todos participam, produzindo direito

com poder; no segundo, as comunidades crescem, distanciando-se do poder,

influenciando pouco a produção do direito; e no terceiro, atual, conjuga a evolução

da democracia à pressão exercida pela comunidade e, por via de conseqüência,

esta volta a ter forças para produzir direito junto aos detentores do poder (ou seja,

o poder é detido por um grupo distinto).

Orlando Soares33 aborda a situação dos Partidos Políticos, inserindo-os

nesse contexto jurídico e político. Na sua análise, mesmo ideologicamente

carregada (o que não a desmerece), aduz que

[...] a atuação dos partidos políticos burgueses se faz através dos chamados grupos de pressão (lobby), que se utilizam de todos os meios e facilidades, proporcionados pelo poder econômico, ou seja, corrupção, fraude, advocacia administrativa, manipulação da opinião pública (por intermédio dos meios de comunicação social, especialmente rádio e televisão, cujas grandes cadeias agem em conexão com as agências de notícias, com raio de ação internacional, a serviço do capitalismo), e outras práticas, além do emprego da violência, em associação com o crime organizado. Pelo que se expôs, salta aos olhos que a nossa formação histórica, política, militar, religiosa, sócio-econômica e cultural, teve um caráter intrinsecamente autoritário e elitista – a começar com a instituição do regime escravocrata –, como projeção das práticas e concepções dominantes, ou seja, impostas pelas classes exploradoras, economicamente fortes e politicamente dominantes, pois as idéias dominantes são as da classe dominante. Some-se a isso o maquiavelismo das classes dirigentes (empenhadas em dividir para dominar).

Complementa Barbosa34, dando conta de que outro

[...] “problema do pluripartidarismo é o incremento do que Max Weber chamou de patronagem e que há mais de duas décadas se habituou, no Brasil, a chamar de fisiologismo: uma espécie de

33 SOARES, Orlando. Origens das Organizações Partidárias e os Partidos Políticos Brasileiros. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 103, p. 163-165, 169-171, 177, 179, 182-183, 186, 188-189, jul./set. 1989. 34 BARBOSA, Alaor. R. R. Partidos políticos: aspectos do fenômeno. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 26, n. 103, p. 193, 197-199, 206-209, jul./set.1989.

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prática corruptora, mediante a qual os partidos vendem o seu apoio ao governo e o governo compra o apoio dos partidos. A moeda de pagamento do governo são cargos públicos, favores de toda ordem, apadrinhamentos”.

Na esteira do elemento “partidos políticos”, mas sob um prisma

diferente, o Min. Paulo Brossard35 lembra que os partidos políticos são miniaturas

da Sociedade.

[...] Neles, aliás, existe tudo o que existe – o patético, o heróico, o dramático, o cômico, o sublime, o burlesco... tudo o que o barro humano leva em si. Se o fenômeno migratório existe a ponto de fazer de partidos uma espécie de albergue noturno, em que as pessoas entram, e saem sem conhecer o vizinho, é porque a sociedade os tolera; não houvesse essa complacência, que chegar a converter-se em anuência, e haveria de ser menor a sua assiduidade; mas ainda cabe uma observação, desagradável, mas imperiosa: por que o setor partidário e eleitoral há de comportar-se com retidão e higidez, se a corrupção dos costumes se insinua e se alastra insolente e progressivamente, em todo o corpo social [...]

Tocqueville36, que voltará à baila mais adiante, já havia feito menção à

conjugação de forças e objetivos entre o Estado e a Sociedade, do que se pode

sintetizar o espírito envolvido em todo esse processo político-social, quando relata

que na América a Sociedade é de tal forma constituída que pode sustentar-se a si

mesma sem auxílio, pois há um poder dirigente, o da opinião pública!

[...] o que é novo na história das sociedades é ver um grande povo, informado pelos seus legisladores de que as engrenagens do governo estão emperradas. Voltar o olhar para si mesmo, sem precipitação nem temor, e sondar a profundeza do mal, conter-se durante dois anos inteiros, a fim de descobrir com vagar o seu remédio e, uma vez indicado esse remédio, submeter-se a ele voluntariamente, sem que custe uma lágrima nem uma gota de sangue à humanidade.

35 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ata da 190ª Sessão - Discurso do Ministro Paulo Brossard, p. 3. 36 TOCQUEVILLE, Alexis de. A democracia na América. Tradução e notas de Neil Ribeiro da Silva, 2. ed. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Universidade de São Paulo, 1987. p. 82, 92, 100, 105.

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Nessa esteira, precisa e pontual a observação de Grillo37, de que não

há, por parte do Congresso, a vontade e a coragem de usar os meios

constitucionais de que dispõe para obrigar o Executivo a respeitar o que está

disposto nas normas e das quais, a rigor, não seria possível fugir ao cumprimento.

Além do que, a convivência com um Executivo forte, que ocupa indevidamente os

espaços do sistema de poder é uma realidade, e foi aceita durante demasiado

tempo, estabelecendo inúmeras e viciadas práticas; e isso não pode ser desfeito

de um dia para o outro.

Por outro lado, se há em nossa tradição um Executivo forte e um

Legislativo omisso, há também uma classe política inerte com relação à

necessária ação moralizadora que urge com relação ao processo e às práticas

político-eleitorais. Inexiste, efetivamente, interesse de que o processo funcione, o

que será fartamente visto na abordagem procedimental e operacional das normas

concernentes ao abuso do poder econômico nas eleições, quer sob o foco do art.

41-A da Lei n. 9.504/1994, quer sob a ação constitucional de impugnação de

mandato eletivo, ou nas reclamações e/ou representações da Lei Complementar

n. 64/1990 e da Lei n. 9.504/1997.

Nessa esteira, a fim de consignar a importância do Poder Judiciário

– em especial do Eleitoral –, na administração desse conhecimento, apesar

[...] da improvisação, há regras do Direito Eleitoral mostrando evolução e aperfeiçoamento. Todavia, enquanto progredia a publicidade e a transformação científica ia a jato, a mudança jurídica mantinha seu proverbial ritmo lento, criando hiato alimentado pelos maus costumes [...] Fica evidente, ante a deficiência dos mecanismos verificadores da Justiça Eleitoral, que esta carece de aprimoramento de meios materiais e humanos para o perfeito cumprimento de sua missão, nada obstante sejam

37 GRILLO, Vera T. Araújo. O Congresso e a Política Externa Brasileira: um poder visto por ele mesmo. Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Direito da UFSC para a obtenção do Título de Doutor em Direito, Florianópolis, 1991, p. 29, 36, 40-44, 49-50, 58, 60, 68-69, 190.

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reconhecidos os muitos méritos de seus órgãos e agentes, na superação dos obstáculos encontrados ao longo do tempo.38

Focado nos objetivos da Justiça Eleitoral – realização de eleições que

persigam a verdade eleitoral (garantir que o voto dado seja o voto sufragado) –

traz-se à colação o seguinte excerto:

Um processo eleitoral que conduza aos postos de mando aqueles que realmente o povo quer, aqueles que, na verdade, o povo deseja que mandem em seu nome, é condição da democracia representativa. [...] A Justiça Eleitoral foi instituída para o fim de realizar a verdade eleitoral, a verdade das urnas. Esta é a sua missão básica, fundamental, como condição da democracia.39

Ademais, importante ter em mente que [...] “são da essência da

democracia o Governo pelo consentimento, de um lado, e de outro a existência de

direitos dos governados, oponíveis ao Estado e aos governantes”.40

Outras reflexões fazem-se necessárias, algumas delas trazidas à baila

superficialmente nestas linhas – mas, reitero, merecedoras de atenção, foco e

pesquisa, quiçá, inclusive, para um outro trabalho. São antigas bandeiras sempre

atualíssimas em virtude da velocidade com que o processo político se desenvolve

no Brasil, quais sejam, v.g., “voto obrigatório”, “financiamento público de

campanhas”, “voto distrital”, “reforma partidária”, enfim, “reforma política”.

Reis41 dá a exata dimensão dessa realidade:

38 CENEVIVA, Walter. Leis imperfeitas incentivam a ilicitude eleitoral. p. 260, 270-271, 273, 275-277. 39 VELLOSO, Carlos Mário da Silva. A Reforma eleitoral e os rumos da democracia no Brasil. In: FEREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7. Ed., São Paulo: Saraiva, 1989, p. 84, 88. 40 BORJA, Célio. A Justiça Eleitoral e os direitos políticos. In: O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL E A DEFESA DA ORDEM JURÍDICA DEMOCRÁTICA, 2, 1993. Brasília. Anais... Brasília: Imprensa Nacional, 1993. p. 35-36. 41 REIS, Palhares Moreira. O Partido Político e a Lei de 1995. In: VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Direito Eleitoral, Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 157-194.

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[...] o voto compulsório favorece a eleição de oportunistas e demagogos, posto que o indiferente, ante as controvérsias eleitorais, a ponto de só comparecer a pleito em face da obrigatoriedade, é manipulável em grau ainda maior por fisiológicos ou mesmo por quem não tenha a mínima identidade com seus interesses de classe. [...] Do mesmo modo, desde que se faça um efetivo controle dos recebimentos e gastos dos partidos, não só do Fundo Partidário, como dos fundos internos de cada entidade, poderá se acompanhar os efeitos normais ou abusivos do poder econômico (público ou privado), ato de corrupção ou de influência no exercício de cargo ou função pública, nos resultados das eleições e buscar evitar fatos nocivos à prática democrática, como ocorreu durante muitos pleitos e, mais recentemente, de modo abusivo.

E voltando à Democracia e à Cidadania, é bom manter presente que a

Democracia não é apenas uma fórmula política para escolha dos governantes

pelos governados; antes de qualquer coisa, é uma forma de convívio social, que

importa o efetivo e pleno exercício da Cidadania, permitindo escolher seus

representantes e/ou submeter-se ao sufrágio dos demais, num ambiente de

liberdade e igualdade no campo das preferências eleitorais.42

Nessa esteira, completando a inteligência do Min. José Néri da

Silveira, há uma questão relevante – trazida por Marcelo Silva Moreira43 – que é a

consolidação do Estado Democrático de Direito. Para a real consolidação do

Estado Democrático de Direito é imprescindível uma reforma na legislação

eleitoral, afastando-se o casuísmo e as “leis do ano”44, combatendo o

multipartidarismo45, que consiste na existência indiscriminada de micropartidos

42 SILVEIRA, José Neri. p. 2, 4-5, 7, 43, 59, 62-65, 68-71, 78, 81-82. 43 MOREIRA, Marcelo Silva. Eleições e abuso de poder. Rio de Janeiro: AIDE, 1998, p. 85-86; 89, 92. 44 “Leis do ano” é uma referência à praxe de todas as eleições terem regulamentação específica, mesmo que embasadas nas regras históricas – como o Código Eleitoral –, normalmente editadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, a quem compete expedir as instruções necessárias, nos termos do art. 105 da Lei n. 9.504/1997. Ainda, tal referência é uma crítica às alterações legislativas promovidas até um ano antes do pleito para atender a interesses não vinculados ao processo eleitoral. 45 Multipartidarismo e não pluripartidarismo!

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sem nenhuma expressão, os quais, ao invés de favorecer, prejudicam o processo

democrático. Mas é acerca do abuso do poder econômico que mostra grande

precisão à realidade brasileira – além de sua complementaridade com relação à

opinião de Néri da Silveira, acima exposta:

O abuso de poder nas eleições brasileiras é, sobretudo, o reflexo de uma cultura política viciada, alheia à ética e à moral. O ponto mais importante, porém, para a transformação de nossa vida eleitoral está além de uma mudança legislativa. Nosso país anseia por ética na política. Não há mais espaço para deficiências morais e para o atrelamento a interesses menores, de ordem particular. A chave do nosso crescimento como Nação, como Estado, passa, necessariamente, pelo aprimoramento de nossas lideranças políticas sufocadas pela cultura esmagadora do caciquismo. Na Democracia moderna, chamada também de “representativa”, o povo governa por meio de representantes eleitos que, em seu nome, tomam as decisões. Nesse sentido, o cidadão é parte indispensável nessas transformações, pois este, no exercício de sua cidadania, além de exigir a verdade das urnas, deve cobrar daqueles a quem destinou sua representação o cumprimento das promessas assumidas em campanha e a dignidade no exercício dos cargos públicos.

Fica o alerta para o fato de se ter elegido a “constitucionalidade do art.

41-A da Lei n. 9.504/1997” como o tópico mais importante desta dissertação,

mesmo que o capítulo operacional do trabalho seja o mais extenso – “O Art. 41-A

e o Abuso do Poder Econômico nas Eleições”. Por isso, válida também a nota de

Schwartzman46, em artigo comentando a “Atualidade de Raymundo Faoro”, assim

redigida:

Se existem alternativas, cabe ao pesquisador, como cidadão, identificar as diversas tendências e tratar de ajudar a abrir os caminhos que estejam de acordo com seus valores. Na vida política, diria Weber, há uma ética da responsabilidade, em que não valem somente as intenções, mas também a capacidade do indivíduo de entender o mundo em sua complexidade e de assumir a responsabilidade pelas conseqüências dos seus próprios atos. Por outro lado, se a realidade é imutável, só existem

46 SCHWARTZMAN, Simon. Atualidade de Raymundo Faoro. Disponível em: <http://www. schwartzman.org.br/simon/faoro.htm>. Acesso em: 26 jun.2005.

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duas opções, o conformismo ou a postura ética de princípios, de oposição ao que seja percebido como o mal, independentemente do sucesso que se possa ter. A segunda edição de Os Donos do Poder veio à luz em pleno período de dominação política autoritária no Brasil, em que as duas éticas se confundiam. Desde então, e até o fim de seus dias, Raymundo Faoro assumiu e manteve a ética de princípios, ao combater o autoritarismo em todas as suas formas, evidentes ou ocultas, mesmo acreditando, como acreditava, que não haveria como mudar cinco séculos de história.

1.2 Características e Configuração do Abuso do Poder Econômico

Abuso do poder econômico – igualmente o abuso do poder de

autoridade – no processo eleitoral é forma de aliciamento ilegítimo de eleitor,

ferindo a igualdade da disputa eleitoral e a liberdade do sufrágio, deslegitimando,

por via de conseqüência, as eleições.

Obter o sufrágio do cidadão, tratando-o como simples produto de mercado, sujeito à oferta pessoal mais compensadora, em moeda ou em serviços, economicamente mensuráveis, à míngua da persuasão por via de idéias ou da enunciação de programas; realizar a campanha eleitoral, com a utilização de formas de propaganda, vedadas em lei ou fora dos limites nesta previstos, onde se fazer evidentes a ostentação de poder econômico ou abuso do poder de autoridade, eis duas faces do mesmo instrumento, igualmente atentatórias à lisura dos pleitos eleitorais, pela captação ilegítima de sufrágios, ferindo os valores da liberdade e da igualdade que informam a essência da ordem democrática.47

E é com esse texto selecionado que se dá início à preparação do 41-A

– à preparação do foco destacado “captação ilícita de sufrágio” – demarcando a

sua abrangência legislativa no bojo do abuso do poder econômico em eleições.

47 SILVEIRA, José Néri da. Abuso do poder econômico no processo eleitoral, p. 2, 4-5, 7, 43, 59, 62-65, 68-71, 78, 81-82.

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Antônio Carlos Mendes48 completa a visão sistêmica e conceitual antes

exposta, abordando o papel dos protagonistas envolvidos – em especial o Poder

Judiciário –, tornando a matéria aparentemente tão simples que é própria como

complemento ao excerto introdutório do capítulo49. Textualmente:

[...] isso tudo gira em torno deste conceito que não sabemos exatamente qual é, mas intuímos. ‘O abuso do poder econômico em matéria eleitoral consiste, em princípio, no financiamento direto ou indireto dos Partidos Políticos e candidatos antes ou durante a campanha eleitoral, com a ofensa a alguém e às instruções da Justiça eleitoral, objetivando anular a igualdade jurídica de chance dos partidos e tisnando assim a normalidade e legitimidade das eleições’.

A Justiça Eleitoral recebeu, acerca da matéria “abuso do poder

econômico nas eleições”, poderes para definir a abrangência do conceito e para

aplicação das regras jurídicas. As falhas na legislação – e até a CRFB, por

exemplo, queda-se silente com relação ao conceito – desta feita, não são de todo

ruins: permitem uma atualização na prestação jurisdicional, com a participação

fiscalizadora do Ministério Público. E se tais poderes podem ser classificados

como excessivos, vale a nota de Antonio Carlos Mendes, que registra a

impossibilidade de se definirem todas as hipóteses de interferência ou abuso do

poder econômico em matéria eleitoral, valendo, pois, a sabedoria da Sociedade e

a sabedoria do Judiciário. E sentencia confirmando ser um poder excessivo, mas

juridicamente outorgado e voltado a manter lisura do processo eleitoral: [...] “o

48 MENDES, Antonio Carlos. O abuso do poder econômico em matéria eleitoral. In: ENCONTRO DOS PROCURADORES REGIONAIS, 2, 1993, Brasília. Anais... Brasília: Imprensa Nacional, 1993, p. 249, 251-252, 254, 259, 261-263. 49 Ver nota 10.

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grande problema que vejo no Direito Constitucional Contemporâneo é conciliar a

garantia das liberdades com a promoção do bem-estar social”.50

Na seqüência dessa linha conceitual, vale, igualmente, o conceito de

poder de João de Oliveira Filho, para quem “Poder significa possibilidade de

alguém usar de meios materiais e humanos para atingir algum fim. Quem não

dispuser de meios materiais ou pessoais para atingir determinado fim, não tem

poder”.51

O abuso do poder econômico em eleições, não obstante o foco

adotado no presente trabalho – art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 – configura matéria

extremamente abrangente dentro do Direito Constitucional e Eleitoral, e, como

dito, não é nenhuma novidade no sistema jurídico e legislativo nacional. Certa é a

incompetência do Estado – por meio de seus agentes políticos e por questões

estruturais e culturais – de refrear e coibir efetivamente tal prática, pois, não

obstante existam instrumentos hábeis, eles perseguem efetividade.

Por esse motivo, traz-se, em seguida, um breve apanhado dos

dispositivos legais que abrangem diretamente o tema, obedecida a sua ordem

cronológica – excetuada a CRFB, que figurará em seu lugar: o primeiro plano.

Deverá permanecer, contudo, a lembrança – como premissa – de que

a [...] “real competição é aquela significativa e desejável instituição que não é

50 MENDES, Antônio Carlos. O abuso do poder econômico em matéria eleitoral, p. 249, 251-252, 254, 259, 261-263. 51 E, mais: “’Autoridade’ é a pessoa que está investida da possibilidade de usar esses meios para exigir os seus resultados. ‘Força’ é a realidade social para coagir os outros a ceder os meios materiais e humanos para a realização dos objetivos governamentais. ‘Violência’ é a exorbitância da força usada para a realização dos objetivos governamentais”, In: OLIVEIRA FILHO, João de. Poder – Povo – Exercício do Poder. Revista Eleitoral da Guanabara, Rio de Janeiro, ano I, n. 1, 1968, p. 74-76, 79.

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absoluta ou aplicável a qualquer lugar indistintivamente”52, oração a ser

devidamente compreendida no contexto dessa exposição.

1.2.1 O Abuso do Poder Econômico na Constituição Federal

Abuso do poder econômico nas eleições e, por via de conseqüência, a

captação ilícita de sufrágio, têm base constitucional e, mesmo que concentrado

em um único artigo, sua importância é imensurável, a ponto de justificar a

existência de capítulo relativo aos direitos políticos.53

52 BASTOS, Celso. O abuso do poder econômico. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, v. 3, p. 5-12, out./dez.1994. 53 As disposições relativas a abuso do poder econômico nas eleições estão contidas no Capítulo IV da Constituição Federal, “Dos Direitos Políticos”, o qual merece transcrição na íntegra, uma vez que contempla os mais importantes princípios, pressupostos e condições do Direito Eleitoral (a consulta pode ser feita também no site www.tre-sc.gov.br). In verbis: Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular. § 1º O alistamento eleitoral e o voto são: I - obrigatórios para os maiores de dezoito anos; II - facultativos para: a) os analfabetos; b) os maiores de setenta anos; c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos. § 2º Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos. § 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; VI - a idade mínima de: a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador. § 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos. § 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.

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O art. 14 da CRFB, que no seu todo versa sobre os “direitos políticos” –

enfatizados os seus §§ 9º, 10 e 11 –, é, na realidade, o marco inicial quando

abordado o “abuso do poder econômico em eleição”. Tanto é assim que, hoje, ao

estudar do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, fecha-se a teia do emaranhado

legislativo que envolve o tema. Mas tudo parte da norma constitucional.

Com o decorrer dos tempos, ficou constatado que essas garantias eram impotentes para coibir e punir a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso de poder, os quais, com certeza, por causa dessa inocuidade, mais e mais tem crescido. A prática desses expedientes em si, como de quaisquer atos corruptivos, já é difícil de ser flagrada concretamente. A essa dificuldade óbvia, juntam-se a carência de melhor conceituação jurídica das duas figuras e os obstáculos quase intransponíveis para formar um processo com prova pré-constituída, evidente, manifesta, que é o requisito legal de admissibilidade do recurso da diplomação.54

Inelegibilidade – que como regra é a situação excepcional de o cidadão

não poder concorrer aos cargos eletivos de Presidente e Vice-Presidente da

República; Governador e Vice-Governador dos Estados e do Distrito Federal;

Prefeito e Vice-Prefeito municipal; Senador; Deputado Federal; Deputado

§ 6º Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito. § 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. § 8º O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições: I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade. § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. § 10. O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. § 11. A ação de impugnação de mandato tramitará em segredo de justiça, respondendo o autor, na forma da lei, se temerária ou de manifesta má-fé. 54 MENDES, Antônio Carlos. O abuso do poder econômico em matéria eleitoral, p. 24-31.

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Estadual e Distrital; e Vereador, por não preencher alguma das condições de

elegibilidade – é matéria constitucional, com remessa à lei complementar

específica55 para o estabelecimento de outros casos e dos prazos de sua

cessação.

A finalidade desse rigor, que não é excessivo – haja vista os efeitos

gerados e as infindáveis discussões da matéria –, é proteger a probidade

administrativa e a moralidade para o exercício do mandato (considerada a vida

pregressa do candidato), e a normalidade e legitimidade das eleições contra a

influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou

emprego na administração direta ou indireta.

Ainda, é da Constituição a ação de impugnação de mandato eletivo, de

competência da Justiça Eleitoral, a ser proposta – instruída a ação com provas de

abuso do poder econômico, corrupção ou fraude – no prazo de 15 (quinze) dias

contados da diplomação.56

Vale, como registro histórico e corroborando com o que vem sendo

dito, a seguinte nota:

A ação criada pelo § 10, art. 14, da Constituição Federal, visa a impugnar o mandato de quem se elegeu mediante abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. Essa relação é exaustiva e deve ser interpretada literalmente dentro dos estritos limites dos seus conceitos jurídicos. Não se pode a ela acrescentar, por induções ou analogias, outras figuras de direito que lhes sejam semelhantes ou tenham com elas pontos de contato. A noção de ‘abuso’ traduz conduta contrária ao direito ou que excede os limites e finalidades consagradas pelo ordenamento jurídico. De conseguinte, abuso do poder econômico em matéria eleitoral, em princípio, no financiamento, direto ou indireto, dos partidos políticos e candidatos, antes ou durante a campanha eleitoral,

55 Ver BRASIL. Lei Complementar n. 64 de 1990. Estabelece, de acordo com o art. 14, § 9º, da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, prazos de cessação e determina outras providências. Disponível em:<http//www.tre-sc.gov.br/legjurisp/lc_64.htm>. Acesso em: 4 abr.2005. 56 A Lei n. 9.265/1996 prevê a gratuidade das ações de impugnação de mandato eletivo.

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com ofensa à lei e às instruções da Justiça Eleitoral, objetivando anular a igualdade jurídica (igualdade de chances) dos partidos, tisnando, assim, a normalidade e legitimidade das eleições.57

E para concluir, o que dizer da reelegibilidade ante o abuso do poder

econômico nas eleições?

A pretexto de se preservar a continuidade administrativa, desequilibrou-se inteiramente a competição. Ingenuamente ou de má-fé, acreditou-se no senso de responsabilidade dos ocupantes desses altos cargos públicos. Indaga-se: como separar a pessoa do administrador da coisa pública da pessoa do candidato buscando obstinadamente a reeleição? Em sã consciência, pode se esperar, diante do quadro político brasileiro, uma conduta ética e exemplar desses candidatos? Há um velho refrão sempre repetido pelos políticos: “em uma campanha eleitoral, o feio é perder”. É a teoria do vale-tudo ou do fato consumado.58

Mas a matéria vai além, e é na legislação infraconstitucional que o

sistema encontra o seu equilíbrio, sempre balizado pela norma superior.

57 MENDES, Antônio Carlos. O abuso do poder econômico em matéria eleitoral, p. 24-31. 58 SALOMÃO, Paulo César. Abuso do poder econômico e político diante da reeleição, p. 9.

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1.2.2 O Abuso do Poder Econômico na Código Eleitoral

Mesmo tendo por base o Direito Constitucinal, é o Direito Eleitoral –

mais propriamente o Código Eleitoral59 – que dentre a legislação vigente60 trata de

forma mais consistente e efetiva o abuso do poder econômico e seus efeitos, em

diversos de seus dispositivos.61

59 “O nosso Código Eleitoral entrou em vigor em 1965. Desde então até os dias de hoje, duas Constituições e numerosas emendas constitucionais foram promulgadas. Para regular as situações surgidas, com as sucessivas alterações nos textos fundamentais e no tecido social, mais de uma centena de leis foram editadas. Adotou-se a condenável prática de, a cada eleição, aprovar-se uma lei para regê-la, surgindo as denominadas ‘leis do ano’, excessivamente casuísticas e com forte conteúdo fisiológico, porquanto feitas para vigorar em eleições próximas, por políticas que a elas iriam concorrer. [...] A Lei Complementar n. 64, de 1990, prevista no art. 14, § 9°, da Constituição, que disciplina os casos de inelegibilidade e estabelece providências visando coibir o uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, precisa ser reeditada, a fim de ser adaptada à nova redação que lhe deu a Emenda Constitucional n. 4, com o intuito de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato. É do conhecimento geral que, não obstante a incompreensão de muitos, esta Corte tem desenvolvido ingente esforço no sentido de combater o abuso do poder econômico e do poder político e, ainda, a malversação dos dinheiros dos entes governamentais, afastando da vida pública candidatos beneficiários ou envolvidos na prática desses deslizes. Para isso, tem aplicado as leis de regência em harmonia com as regras de moralidade pública contidas na Constituição. O aprimoramento normativo, quanto à matéria, permitirá, ainda mais, a Justiça Eleitoral atuar no sentido de aperfeiçoar os costumes políticos”, in Ata da 190ª Sessão do Tribunal Superior Eleitoral, em 6 de dezembro de 1994 – Discurso do Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, p. 3. 60 Legislação Complementar que será oportunamente abordada: Lei Complementar n. 64/1990, art. 22 e seguintes: representação por uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade; Lei n. 9.504/1997, arts. 73, 75 e 77: condutas veadas aos agentes públicos em campanha eleitoral; art. 74: abuso de autoridade. Ainda, art. 14, § 10, da Constituição Federal, e art. 262, IV, do Código Eleitoral: ação de impugnação de mandato eletivo e recurso contra diplomação, respectivamente. 61 A legislação está disponível no site www.tre-sc.gov.br. Nada obstante, segue, in litteris: Art. 222. É também anulável a votação quando viciada de falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o art. 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei. Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais, ou do Município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações, e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias. § 1º Se o Tribunal Regional, na área de sua competência, deixar de cumprir o disposto neste artigo, o Procurador Regional legará o fato ao conhecimento do Procurador-Geral, que providenciará junto ao Tribunal Superior para que seja marcada imediatamente nova eleição. § 2º Ocorrendo qualquer dos casos previstos neste Capítulo, o Ministério Público promoverá, imediatamente, a punição dos culpados. Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos. § 1º O eleitor é parte legítima para denunciar os culpados e promover-lhes a responsabilidade, e a nenhum servidor público, inclusive de autarquia, de entidade paraestatal ou de sociedade de economia mista, será lícito negar ou retardar ato de ofício tendente a esse fim.

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O Código Eleitoral (Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965), já há

quarenta anos, em seu art. 237, versa sobre a interferência do poder econômico

em desfavor da liberdade do voto, prática coibida e punida, estabelecendo (1) que

o eleitor é parte legítima para (a) denunciar os culpados (candidato ou partido) e

(b) promover-lhes a responsabilidade; 1.2) que a denúncia, relatando fatos e

indicando provas, é dirigida ao Corregedor; 2.1) que nenhum servidor público,

inclusive de autarquia, de entidade paraestatal ou de sociedade de economia

mista, poderá negar ou retardar ato de ofício tendente a esse fim62. Curiosamente,

esse mesmo Código, que inclusive faz referência ao procedimento a ser

observado na investigação respectiva63, não faz qualquer menção à pena

aplicável no caso de procedência da denúncia.

A matéria pode ser vista sob a ótica dos efeitos, não no sentido das

“penalidades” propriamente ditas, mas o efeito decorrente da utilização dos meios

§ 2º Qualquer eleitor ou partido político poderá se dirigir ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, e pedir abertura de investigação para apurar uso indevido do poder econômico, desvio ou abuso de autoridade, em benefício de candidato ou de partido político. § 3º O Corregedor, verificada a seriedade da denúncia, procederá ou mandará proceder a investigações, regendo-se estas, no que lhes for aplicável, pela Lei n. 1.579, de 18 de março de 1952. Art. 262. O recurso contra expedição de diploma caberá somente nos seguintes casos: I – inelegibilidade ou incompatibilidade de candidato; II – errônea interpretação da lei quanto à aplicação do sistema de representação proporcional; III – erro de direito ou de fato na apuração final, quanto à determinação do quociente eleitoral ou partidário, contagem de votos e classificação de candidato, ou a sua contemplação sob determinada legenda; IV – concessão ou denegação do diploma, em manifesta contradição com a prova dos autos, nas hipóteses do art. 222 desta lei e do art. 41-A da Lei n. 9.504, de 30.9.97. 62 O art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990 prevê a legitimidade do partido político, da coligação, do candidato e do Ministério Público para pedir apuração do uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político. 63 Lei n. 1.579, de 18 de março de 1952. Hodiernamente, o procedimento para apuração está previsto nos arts. 21 e 22 da Lei Complementar n. 64/1990. No tocante à Lei n. 1.579/1952, “dispõe sobre as comissões parlamentares de inquérito”, e trata do cumprimento de diligências, convocações, tomada de depoimentos, inquéritos de testemunhas, requisições e apresentação de conclusões.

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versados no art. 237 referido, bem como da propaganda ou da captação ilícita de

sufrágio, qual seja, a anulabilidade da votação (art. 222 do Código Eleitoral).

Nessa esteira, aplica-se aos processos de captação ilícita de sufrágio a

regra do art. 224 do Código Eleitoral: a realização de nova eleição na hipótese de

a nulidade atingir a mais de metade dos votos.64

Quando trata do recurso contra expedição de diploma (art. 262) –

cabível apenas nos casos de (1) inelegibilidade ou incompatibilidade de

candidato; 2) errônea interpretação da lei quanto à aplicação do sistema de

representação proporcional; 3) erro de direito ou de fato na apuração final, quanto

à determinação do quociente eleitoral ou partidário, contagem de votos e

classificação de candidato, ou a sua contemplação sob determinada legenda; e

(4) concessão ou denegação do diploma em manifesta contradição com a prova

dos autos, nas hipóteses do art. 222 do Código Eleitoral e do art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 –, especial e especificamente na situação do 41-A, o Código oferece

mais um meio para a exclusão de candidato eleito, mesmo que na fase final do

processo eleitoral, desde que tenha agido de forma contrária à lei (utilização de

meios fraudulentos para a obtenção de voto, desequilibrando ou não o concurso

eletivo).

Relativamente à corrupção eleitoral [...] “há no Código um dispositivo

único, mas exaurientemente casuístico (art. 299): ‘Dar, oferecer, prometer,

solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra

vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou promover abstenção, ainda

64 Os votos nulos (e em branco) não são computados para o cálculo da maioria absoluta (art. 77, §§ 2º e 3º da Constituição Federal); aplica-se a regra do art. 77 da Constituição Federal à eleição de governador e vice-governador de Estado (art. 28 da Constituição Federal), bem como de prefeito e vice-prefeito de municípios com mais de duzentos mil eleitores (art. 29, II da

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que a oferta não seja aceita’. Como se vê, estão aí reunidas a corrupção ativa e a

corrupção passiva, consumando-se o crime com a simples doação, oferta,

promessa, solicitação ou recebimento do dinheiro, dádiva ou qualquer outra

vantagem (ainda que não econômica), pouco importando a recusa do eleitor ou a

não-realização do ato visado pelo agente corruptor”.65

Constituição Federal); e não há incompatibilidade entre este art. 224 do Código Eleitoral e o art. 77 da Constituição Federal (ver Resolução TSE n. 13.185, de 10 de dezembro de 1992). 65 HUNGRIA, Nelson. Conflito entre autoridade e liberdade, p. 139-140, 142, 135-138.

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1.2.3 O Abuso do Poder Econômico na Lei Complementar n. 64/1990

A Lei Complementar n. 64/199066, sob diversos aspectos, é outro

66 A legislação está disponível no site www.tre-sc.gov.br. Nada obstante, segue, in litteris: Art. 19. As transgressões pertinentes a origem de valores pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais. Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressões mencionadas no caput deste artigo terão o objetivo de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na Administração Direta, Indireta e Fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Art. 21. As transgressões a que se refere o art. 19 desta Lei Complementar serão apuradas mediante procedimento sumaríssimo de investigação judicial, realizada pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais, nos termos das Leis ns. 1.579, de 18 de março de 1952; 4.410, de 24 de setembro de 1964, com as modificações desta Lei Complementar. Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: I – o Corregedor, que terá as mesmas atribuições do Relator em processos judiciais, ao despachar a inicial, adotará as seguintes providências: a) ordenará que se notifique o representado do conteúdo da petição, entregando-se-lhe a segunda via apresentada pelo representante com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 5 (cinco) dias, ofereça ampla defesa, juntada de documentos e rol de testemunhas, se cabível; b) determinará que se suspenda o ato que deu motivo à representação, quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficiência da medida, caso seja julgada procedente; c) indeferirá desde logo a inicial, quando não for caso de representação ou lhe faltar algum requisito desta Lei Complementar; II – no caso do Corregedor indeferir a reclamação ou representação, ou retardar-lhe a solução, poderá o interessado renová-la perante o Tribunal, que resolverá dentro de 24 (vinte e quatro) horas; III – o interessado, quando for atendido ou ocorrer demora, poderá levar o fato ao conhecimento do Tribunal Superior Eleitoral, a fim de que sejam tomadas as providências necessárias; IV – feita a notificação, a Secretaria do Tribunal juntará aos autos cópia autêntica do ofício endereçado ao representado, bem como a prova da entrega ou da sua recusa em aceitá-la ou dar recibo; V – findo o prazo da notificação, com ou sem defesa, abrir-se-á prazo de 5 (cinco) dias para inquirição, em uma só assentada, de testemunhas arroladas pelo representante e pelo representado, até o máximo de 6 (seis) para cada um, as quais comparecerão independentemente de intimação; VI – nos 3 (três) dias subseqüentes, o Corregedor procederá a todas as diligências que determinar, ex officio ou a requerimento das partes; VII – no prazo da alínea anterior, o Corregedor poderá ouvir terceiros, referidos pelas partes, ou testemunhas, como conhecedores dos fatos e circunstâncias que possam influir na decisão do feito; VIII – quando qualquer documento necessário à formação da prova se achar em poder de terceiro, inclusive estabelecimento de crédito, oficial ou privado, o Corregedor poderá, ainda, no mesmo prazo, ordenar o respectivo depósito ou requisitar cópias; IX – se o terceiro, sem justa causa, não exibir o documento, ou não comparecer a Juízo, o Juiz poderá expedir contra ele mandado de prisão e instaurar processo por crime de desobediência;

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marco legislativo importantíssimo67: é a Lei das Inelegibilidades, complementar à

CRFB; prevê a apuração de transgressões várias, inclusive do abuso do poder

econômico nas eleições; estabelece procedimento sumaríssimo para tais

representações e/ou investigações judiciais; empresta tal procedimento à

investigação do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 (que poderia apurar na forma das

representações da própria lei, seguindo o trâmite previsto em seu art. 96).

Contudo, a Lei das Inelegibilidades tem outro ponto de importância, a

ser destacado: o procedimento do seu art. 22: célere, por ser sumaríssimo; eficaz,

por se coadunar com os resultados propostos; efetivo, por funcionar na forma

como dispõe; legal, por observar o princípio do devido processo. Sob outra ótica

X – encerrado o prazo da dilação probatória, as partes, inclusive o Ministério Público, poderão apresentar alegações no prazo comum de 2 (dois) dias; XI – terminado o prazo para alegações, os autos serão conclusos ao Corregedor, no dia imediato, para apresentação de relatório conclusivo sobre o que houver sido apurado; XII – o relatório do Corregedor, que será assentado em 3 (três) dias, e os autos da representação serão encaminhados ao Tribunal competente, no dia imediato, com pedido de inclusão incontinenti do feito em pauta, para julgamento na primeira sessão subseqüente; XIII – no Tribunal, o Procurador-Geral ou Regional Eleitoral terá vista dos autos por 48 (quarenta e oito) horas, para se pronunciar sobre as imputações e conclusões do Relatório; XIV – julgada procedente a representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3 (três) anos subseqüentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico e pelo desvio ou abuso do poder de autoridade, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e processo-crime, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar; XV – se a representação for julgada procedente após a eleição do candidato, serão remetidas cópias de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral. Parágrafo único. O recurso contra a diplomação, interposto pelo representante, não impede a atuação do Ministério Público no mesmo sentido. 67 Quanto ao abuso do poder econômico em eleições, cronologicamente: o Código Eleitoral, em seus quarenta anos de vigência é marco inicial; a Constituição Federal, quase na maioridade, na seriedade com que trata os direitos políticos, as inelegibilidades e ação de impugnação de mandato eletivo consolida e legitima a supremacia constitucional; a Lei Complementar n. 64/1990, com as inelegibilidades, e, mais, o procedimento da investigação judicial eleitoral, emprestado a outros instrumentos voltados ao abuso do poder econômico nas eleições, completaria o aparato jurídico-legislativo; e, como veremos mais adiante, a Lei n. 9.504/1997, a nova “Lei das Eleições, surgida após o advento da informatização das eleições, mas que também regulamenta “condutas vedadas a agentes públicos” e o procedimento respectivo, além de, a partir de 1999, ter acolhido o art. 41-A (que excepcionalmente se utiliza do procedimento do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990). Estamos diante de marco legislativo importantíssimo, sim, pois muito além de sua inserção no contexto do abuso e da inelegibilidade, prestando-se ao combate dessas práticas, empresta seu rito a outros instrumentos do Direito Eleitoral.

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e em complemento, cuida-se de norma legítima, formal e materialmente. Inexiste,

em sua aura, a mácula de qualquer contestação quanto a sua formulação e a sua

aplicação; é aceita no meio jurídico e social por ter sido bem criada (dentro das

estritas regras constitucionais e do processo legislativo); é aceita pela sociedade

por responder de forma eficaz e efetiva a antigo anseio da legitimação do

processo eleitoral pela valorização do voto e conseqüente promoção da

cidadania68.69

É a Lei Complementar n. 64/1990, hoje, a base processual do Direito

Eleitoral para as questões mais palpitantes.

As situações de “abuso do poder econômico nas eleições” – vindo a

abranger o art. 41-A em comento, as transgressões pertinentes à origem de

valores pecuniários70 e o abuso do poder econômico ou político em detrimento da

liberdade de voto – serão apuradas mediante investigações jurisdicionais

realizadas pela Justiça Eleitoral71, com o objetivo de proteger a normalidade e

legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do

exercício de função, cargo ou emprego na Administração Direta, Indireta e

Fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

68 Cidadania, na definição de Melo (Dicionário de Política, p. 18), é o [...] “pleno gozo dos direitos políticos”. 69 A Lei das Inelegibilidades, em face do seu não ineditismo, já fazia parte do mundo político e jurídico em que inserida, razão pela qual fala-se da sua legitimidade. Vale dizer, nessa esteira, que a Lei Complementar n. 64/1990 é nova por regular dispositivo da CRFB de 1988, valendo reprisar o avanço representado pelo procedimento previsto no seu art. 22. 70 Prevê o art. 25 da Lei n. 9.504/1997 a caracterização de abuso do poder econômico pelo descumprimento das normas referentes à arrecadação e aplicação de recursos nas campanhas eleitorais. 71 Em complemento à nota 67, retro, especificamente quanto ao caput do art. 19 da Lei Complementar n. 64/1990, traz-se à colação também o art. 24, in verbis: “Nas eleições municipais, o Juiz Eleitoral será competente para conhecer e processar a representação prevista nesta Lei Complementar, exercendo todas as funções atribuídas ao Corregedor-Geral ou Regional, constantes dos incisos I a XV do art. 22 desta Lei Complementar, cabendo ao representante do Ministério Público Eleitoral em função da Zona Eleitoral as atribuições deferidas ao Procurador-Geral e Regional Eleitoral, observadas as normas do procedimento previstas nesta Lei Complementar”.

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observado o procedimento sumaríssimo de investigação judicial, realizado nos

termos das Leis n. 1.579, de 18 de março de 1952; n. 4.410, de 24 de setembro

de 1964, com as modificações da Lei Complementar n. 64/1990.

O procedimento sumaríssimo antes referido, que se utiliza

subsidiariamente das Leis n. 1.579/1952, e n. 4.410/1964, é o constante do art. 22

da Lei Complementar n. 64/1990. E sobre a representação e o rito expõe-se:

1. legitimidade ativa: partido político, coligação, candidato ou o Ministério

Público Eleitoral;72

2. competência: da Justiça Eleitoral, por meio dos titulares da

Corregedoria-Geral ou da Regional e, nas eleições municipais, do Juízo

Eleitoral;

3. requisitos: relato de fatos e indicação de provas, indícios e

circunstâncias;

4. objeto: abertura de investigação judicial para apurar:

a. uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico;

b. uso indevido, desvio ou abuso do poder de autoridade73;

c. utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social;

5. beneficiário da conduta vedada: candidato ou partido político em

detrimento da liberdade do voto;

6. rito:

a. o Corregedor – ou, se for o caso, o Juiz Eleitoral –, que terá as

mesmas atribuições do Relator em processos judiciais, ao

despachar a inicial, adotará as seguintes providências:

ordenará que se notifique o representado do conteúdo da petição.

Na notificação entregar-se-á a segunda via apresentada pelo

representante, com cópia dos documentos;

prazo de 5 (cinco) dias para que o representado ofereça

defesa, juntando documentos e apresentando o rol de

testemunhas, se cabível;

determinará que se suspenda o ato que deu motivo à

representação, quando:

72 Há quem conteste a questão da legitimidade trazendo à baila a situação do eleitor, a quem a lei não faz referência. 73 Ver art. 74 da Lei n. 9.504/1997, sobre abuso de autoridade.

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for relevante o fundamento; e

do ato impugnado puder resultar a ineficiência da medida,

caso seja julgada procedente;

indeferirá desde logo a inicial, quando:

não for caso de representação; ou

faltar algum requisito desta Lei Complementar;

b. feita a notificação, a Secretaria do Tribunal – ou o Cartório Eleitoral

no caso de o processo correr no primeiro grau – juntará aos autos:

cópia autêntica do ofício endereçado ao representado; e

prova da entrega ou da sua recusa em aceitá-la ou dar recibo;

c. findo o prazo da notificação, com ou sem defesa, em uma só

assentada, serão ouvidas as testemunhas arroladas pelo

representante e pelo representado;

prazo: 5 (cinco) dias do término do prazo da notificação;

número de testemunhas: máximo de 6 (seis) para cada um;

intimação: desnecessária (comparecimento das testemunhas

independentemente de intimação);

d. cumprimento das diligências determinadas pela autoridade judiciária,

de ofício ou a requerimento das partes;

prazo: 3 (três) dias subseqüentes à inquirição das testemunhas;

não há vedação ao cumprimento de diligência(s) em prazo

comum;

no mesmo prazo, ainda, poderá a autoridade judiciária:

ouvir terceiros, referidos pelas partes, ou testemunhas,

como conhecedores dos fatos e circunstâncias que possam

influir na decisão do feito;

ordenar o depósito ou requisitar cópias de qualquer

documento necessário à formação da prova que se achar

em poder de terceiro, inclusive estabelecimento de crédito,

oficial ou privado;

se o terceiro, sem justa causa, não exibir o

documento, ou não comparecer a Juízo, o Juiz poderá

expedir contra ele mandado de prisão e instaurar

processo por crime de desobediência;

e. encerrado o prazo da dilação probatória, as partes, inclusive o

Ministério Público, poderão apresentar alegações;

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prazo: comum de 2 (dois) dias;

f. terminado o prazo para alegações, os autos serão conclusos à

autoridade judiciária, no dia imediato, para apresentação de relatório

conclusivo sobre o que houver sido apurado;

prazo: 3 (três) dias;

no caso de eleição municipal, o Juiz Eleitoral julgará a

representação74;

g. o relatório e os autos da representação serão encaminhados ao

Tribunal com pedido de inclusão incontinenti do feito em pauta, para

julgamento na primeira sessão subseqüente;

prazo: no dia imediato ao da apresentação do relatório;

h. no Tribunal, o Procurador-Geral ou Regional Eleitoral terá vista dos

autos para se pronunciar sobre as imputações e conclusões do

Relatório;

prazo: 48 (quarenta e oito) horas;

i. julgada procedente a representação, o Tribunal:

antes da eleição:

declarará a inelegibilidade do representado e de quantos

hajam contribuído para a prática do ato;

cominará as seguintes sanções:

inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3

(três) anos subseqüentes à eleição em que se

verificou;

cassação do registro do candidato diretamente

beneficiado pela interferência do poder econômico e

pelo desvio ou abuso do poder de autoridade;

determinará:

a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral,

para instauração de processo disciplinar, se for o caso,

e processo-crime;

determinará, ainda:

quaisquer outras providências que a espécie

comportar;

depois da eleição:

74 Grifado em face da cisão processual decorrente da esfera de abrangência da eleição.

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serão remetidas cópias de todo o processo ao

Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no

art. 14, §§ 10 e 11, da CRFB, e art. 26275, inciso IV, do

Código Eleitoral.

7. aspectos gerais do rito:

a) (uso indevido) na hipótese de o Corregedor ou o Juiz Eleitoral

indeferir a reclamação ou representação, ou retardar-lhe a

solução, poderá o interessado renová-la perante o Tribunal, que

resolverá dentro de 24 (vinte e quatro) horas;

b) o interessado, quando não76 for atendido ou ocorrer demora,

poderá levar o fato ao conhecimento do Tribunal Superior

Eleitoral, a fim de que sejam tomadas as providências

necessárias.

Ainda, por fim, quanto à Lei Complementar n. 64/1990, não é demais

lembrar que o Tribunal – ou o Juízo Eleitoral, ou, melhor, a autoridade judiciária

eleitoral competente, na sua função judicante – formará sua convicção pela livre

apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova

produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou

alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura

eleitoral77.

A liberdade e a flexibilidade para a formação do juízo outorgadas à

autoridade judiciária são proporcionais à importância do bem jurídico tutelado, que

é a liberdade do voto e, por via de conseqüência, a retidão do processo eleitoral,

das eleições. De clareza solar, tal norma dispensa maiores comentários, a não

75 O recurso contra a diplomação, interposto pelo representante, não impede a atuação do Ministério Público no mesmo sentido (parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990). A íntegra do art. 262 encontra-se na nota n. 62. 76 Depreende-se do contexto que o vocábulo “não” foi omitido por engano da expressão “quando for atendido”. 77 Ver art. 23 da Lei Complementar n. 64/1990. Ainda, no mesmo sentido, o art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

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ser pela necessidade de se consignar sua relevância como aparato técnico, como

instrumento disponível, não só ao julgador, mas àqueles que desejarem aplicar o

Direito e promover a Justiça.

1.2.4 O Abuso do Poder Econômico na Lei n. 9.504/1997

A Lei n. 9.504/1997, no contexto do abuso do poder econômico, surge

como receptáculo do art. 41-A.78

A sua importância, contudo, ultrapassa o foco dado ao abuso do poder

econômico nas eleições – seria, efetivamente, desmerecer todo um histórico

progressista e de vanguarda da Justiça e do Direito Eleitoral restringir a sua

importância, atenção!, “apenas à captação ilícita de sufrágio”.79

Vale o registro, para esse fim, do período de transição vivido no Brasil

nos idos de 1995-1996 quando idealizada institucionalmente a eleição

informatizada, mesmo que a partir de diversas experiências realizadas em vários

rincões deste País, especialmente no Estado de Santa Catarina.80

A Justiça Eleitoral, que já em 1988 iniciava a sua informatização, teve,

no biênio 1995-1996, quando presidida pelo Min. Carlos Mário da Silva Velloso, a

informatização da votação e da apuração das eleições brasileiras, com a

utilização de urnas eletrônicas. Idealizado o projeto em biênios anteriores (Min.

José Paulo Sepúlveda Pertence e Min. José Néri da Silveira), projeto que não era

restrito à eleição, mas abrangia a formação de uma infra-estrutura mínima de

78 Numa metáfora rasteira, é como “a mãe adotiva” diante de filho concebido e gerado em outro ventre. Mas não será a ausência da maternidade biológica que diminuirá os laços de afeto entre mãe e filho! 79 O que já seria muito, mas como se verá, é muito mais. 80 Como marco histórico da experiência com o voto informatizado, registram-se as iniciativas do Município de Brusque/SC.

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informática para toda essa Justiça Especializada, obtendo seu marco histórico em

1996, quando o Tribunal Superior Eleitoral era presidido pelo Min. Marco Aurélio

Farias de Mello, com a realização das primeiras eleições eletrônicas do Brasil,

utilizando-se modelo oficial de arquitetura de informática (hardware, software e

periféricos), merecendo destaque as urnas eletrônicas, estas utilizadas em todas

as Capitais da Federação e nos municípios com mais de duzentos mil eleitores.

As eleições eletrônicas de 1996 foram reguladas por instruções do

Tribunal Superior Eleitoral, utilizada, simultânea e concomitantemente, a

legislação vigente. Contudo, o Código Eleitoral, principal legislação eleitoral, é de

1965, vindo a ressaltar a defasagem de mais de trinta anos com o novo

procedimento.

Fruto das novas necessidades e das dificuldades encontradas no pleito

de 1996, numa ação conjunta da Justiça Eleitoral e do Congresso Nacional,

nasceu a Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, inicialmente vista como o novo

Código Eleitoral, mas adquirindo o status de Lei das Eleições, especialmente das

“eleições informatizadas”, da qual se destacam os dispositivos constantes da

nota abaixo.81

81 A legislação está disponível no site www.tre-sc.gov.br. Nada obstante, segue, in litteris: Art. 25. O partido que descumprir as normas referentes à arrecadação e aplicação de recursos fixadas nesta Lei perderá o direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário do ano seguinte, sem prejuízo de responderem os candidatos beneficiados por abuso do poder econômico. Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990. Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: I – ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária; II – usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos que integram;

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III – ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado; IV – fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público; V – nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados: a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança; b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República; c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo; d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo; e) a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários; VI – nos três meses que antecedem o pleito: a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública; b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral; c) fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo; VII – realizar, em ano de eleição, antes do prazo fixado no inciso anterior, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos nos três últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição. VIII – fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos. § 1º Reputa-se agente público, para os efeitos deste artigo, quem exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta, ou fundacional. § 2º A vedação do inciso I do caput não se aplica ao uso, em campanha, de transporte oficial pelo Presidente da República, obedecido o disposto no art. 76, nem ao uso, em campanha, pelos candidatos a reeleição de Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, Prefeito e Vice-Prefeito, de suas residências oficiais para realização de contatos, encontros e reuniões pertinentes à própria campanha, desde que não tenham caráter de ato público. § 3º As vedações do inciso VI do caput, alíneas b e c, aplicam-se apenas aos agentes públicos das esferas administrativas cujos cargos estejam em disputa na eleição. § 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR. § 5º Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos I, II, III, IV e VI do caput, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma. (NR) § 6º As multas de que trata este artigo serão duplicadas a cada reincidência.

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O art. 41-A, como se verá detalhadamente adiante, normatiza a

captação ilegal de sufrágio, numa segunda versão da corrupção eleitoral do art.

299 do Código Eleitoral, pois traz consigo as penas político-administrativas da

cassação do registro, ou do diploma, e multa.

No seu processamento é utilizado o rito sumaríssimo da Lei

Complementar n. 64/1990, não obstante a lei que o agasalhe preveja rito próprio

para as reclamações e representações que envolvam a Lei n. 9.504/199782. Esse

comentário, frise-se, tem cunho meramente ilustrativo, pois não há qualquer

§ 7º As condutas enumeradas no caput caracterizam, ainda, atos de improbidade administrativa, a que se refere o art. 11, inciso I, da Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992, e sujeitam-se às disposições daquele diploma legal, em especial às cominações do art. 12, inciso III. § 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem. § 9º Na distribuição dos recursos do Fundo Partidário (Lei n. 9.096, de 19 de setembro de 1995) oriundos da aplicação do disposto no § 4º, deverão ser excluídos os partidos beneficiados pelos atos que originaram as multas. Art. 74. Configura abuso de autoridade, para os fins do disposto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990, a infringência do disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, ficando o responsável, se candidato, sujeito ao cancelamento do registro de sua candidatura. Art. 75. Nos três meses que antecederem as eleições, na realização de inaugurações é vedada a contratação de shows artísticos pagos com recursos públicos. Art. 76. O ressarcimento das despesas com o uso de transporte oficial pelo Presidente da República e sua comitiva em campanha eleitoral será de responsabilidade do partido político ou coligação a que esteja vinculado. § 1º O ressarcimento de que trata este artigo terá por base o tipo de transporte usado e a respectiva tarifa de mercado cobrada no trecho correspondente, ressalvado o uso do avião presidencial, cujo ressarcimento corresponderá ao aluguel de uma aeronave de propulsão a jato do tipo táxi aéreo. § 2º No prazo de dez dias úteis da realização do pleito, em primeiro turno, ou segundo, se houver, o órgão competente de controle interno procederá ex officio à cobrança dos valores devidos nos termos dos parágrafos anteriores. § 3º A falta do ressarcimento, no prazo estipulado, implicará a comunicação do fato ao Ministério Público Eleitoral, pelo órgão de controle interno. § 4º Recebida a denúncia do Ministério Público, a Justiça Eleitoral apreciará o feito no prazo de trinta dias, aplicando aos infratores pena de multa correspondente ao dobro das despesas, duplicada a cada reiteração de conduta. Art. 77. É proibido aos candidatos a cargos do Poder Executivo participar, nos três meses que precedem o pleito, de inaugurações de obras públicas. Parágrafo único. A inobservância do disposto neste artigo sujeita o infrator à cassação do registro. Art. 78. A aplicação das sanções cominadas no art. 73, §§ 4º e 5º, dar-se-á sem prejuízo de outras de caráter constitucional, administrativo ou disciplinar fixadas pelas demais leis vigentes. 82 A questão do rito foi – é – um dos complicadores para a consolidação da norma, e será novamente abordada.

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resquício de dúvida acerca da importância da Lei n. 9.504/1997, quer pelo corpo

normativo que suporta, quer por sua vocação renovadora do Código Eleitoral.

Se o Código Eleitoral chegou aos quarenta anos, certo é que, até em

virtude do tempo, uma lei de oito anos deve trazer algo mais – e não é demais

lembrar que a “Lei das Eleições”, como é conhecida, nasceu sob os auspícios da

mudança do sistema de votação, com a implantação do sistema informatizado de

votação (numa visão leiga e simplista, na implantação das urnas eletrônicas)83.

Mas existem outras inovações, igualmente importantes, como, por exemplo,

prever e penalizar “condutas vedadas a agentes públicos”; e o seu sumaríssimo

rito para processamento das representações contra infringência à própria lei. Mas

o foco é “abuso do poder econômico, em eleições”, centrando-se, ao final, no

multicitado “art. 41-A”.

Nessa trilha, é também da Lei n. 9.504/1997 o alerta sobre a seriedade

do tema “arrecadação e aplicação de recursos” (art. 25), cujo descumprimento

das regras (art. 17 a 27) poderá acarretar ao partido a suspensão do recebimento

da quota do Fundo Partidário, sem prejuízo de responderem os candidatos

83 As urnas eletrônicas foram implantadas experimentalmente no Brasil em 1996, projeto hoje já incorporado à cultura nacional, mas que naquela oportunidade alcançou as Capitais dos Estados e os municípios com mais de duzentos mil eleitores e, excepcionalmente, o Município de Brusque, em Santa Catarina. O Tribunal Superior Eleitoral era então presidido pelo Min. Marco Aurélio Farias de Mello, que conduziu a fase inicial do processo de implantação/transição, sucedendo ao Min. Carlos Mário da Silva Velloso. Ainda, como registro histórico, em Santa Catarina o processo de implantação/transição foi comandado pelo Des. Francisco José Rodrigues de Oliveira Filho, então Presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina – TRESC. Essas informações, não obstante serem de autoria do signatário desta Dissertação, Servidor do Quadro de Pessoal da Secretaria do TRESC, e que durante a transição metodológica exercia as funções de Diretor-Geral da Secretaria e Secretário-Geral do Tribunal, podem ser obtidas nos sites oficiais da Justiça Eleitoral (www.tse.gov.br e/ou www.tre-sc.gov.br). Como bibliografia, é possível fazer as seguintes referências: CAMARÃO, Paulo César Bhering. O Voto informatizado: legitimidade democrática-modernização da Justiça Eleitoral brasileira. São Paulo: Empresa de Artes, 1997. 212p. Brasil. Tribunal Superior Eleitoral. Relatório das eleições de 2002. Brasília: TSE, 2003. 274p; Brasil. Justiça Eleitoral. Comissão Justiça Eleitoral.Coordenação Eliana Passarelli. São Paulo: IOESP, 2005. 239p.

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beneficiados por abuso do poder econômico, além de regular a respectiva

“prestação de contas” (art. 28 a 32).

Contudo, a grande contribuição da Lei n. 9.504/1997, aperfeiçoada no

que diz respeito ao rigor de suas sanções pela Lei n. 9.840/1999, é o rol de

“condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais”. E é sobre ele

que se investirão as próximas linhas.

O próprio título – Das Condutas Vedadas aos Agentes Públicos84 em

Campanhas Eleitorais (arts. 73 a 78 da Lei n. 9.504/1997) – já indica com nitidez

a matéria versada.

Por outro lado, qual seria o objetivo dessas restrições vinculadas a

cidadãos detentores de cargos ou funções na administração pública, sejam

agentes políticos ou agentes administrativos, servidores ou não? A resposta

encontra-se no caput do art. 73, qual seja, preservar a equanimidade entre

candidatos nos pleitos eleitorais, ou, nos exatos termos da lei, afastar “condutas

tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos

eleitorais”. Ademais, atente-se ao fato de que a igualdade pode ser quebrada

beneficiando-se partido político ou candidato (o beneficiário não é

necessariamente o candidato, podendo a benesse, o favorecimento, recair em

grei político-partidária).

Um dos princípios regentes do Direito Eleitoral é o do tratamento

equânime dos candidatos; in casu, muito mais, em virtude da possibilidade de

84 Reputa-se agente público, para os efeitos dessa norma, quem exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta, ou fundacional (ver § 1º do art. 73 da Lei n. 9.504/1997).

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utilização da máquina administrativa em favor de determinado(s) concorrente(s),

em desfavor de outro(s).85

Mas quais seriam as vedações? São elas:

1. ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou

coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração

direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos

Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de

convenção partidária;86

2. usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas

Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos

regimentos e normas dos órgãos que integram;

3. ceder servidor público ou empregado da administração direta ou

indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou

usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de

candidato, partido político ou coligação, durante o horário de

expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver

licenciado;

4. fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido

político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços

de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder

Público;

85 Vale rever a nota 58. 86 Esta restrição não se aplica ao uso, em campanha, de transporte oficial pelo Presidente da República, obedecido o disposto no art. 76 da Lei n. 9.504/1997 (ressarcimento das despesas), nem ao uso, em campanha, pelos candidatos a reeleição de Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, Prefeito e Vice-Prefeito, de suas residências oficiais para realização de contatos, encontros e reuniões pertinentes à própria campanha, desde que não tenham caráter de ato público.

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5. nos 3 (três) meses que antecedem o pleito até a posse dos

eleitos87, sob pena de nulidade de pleno direito, nomear, contratar

ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou

readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o

exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou

exonerar servidor público, na circunscrição do pleito88,

ressalvadas:

a. a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e

designação ou dispensa de funções de confiança;89

b. a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério

Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos

da Presidência da República;90

c. a nomeação dos aprovados em concursos públicos

homologados até o início daquele prazo;

d. a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao

funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais,

com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder

Executivo;

e. a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais

civis e de agentes penitenciários;

6. nos 3 (três) meses que antecedem o pleito:

87 As disposições contidas neste item dizem respeito, genericamente, ao que se pode classificar como “vida funcional dos servidores públicos”. 88 O art. 13, § 1º da Lei n. 6.091/1974 veda a movimentação de pessoal no período entre os noventa dias anteriores à data das eleições parlamentares e o término, respectivamente, do mandato do Governador do Estado. 89 Vedação aplicada apenas aos agentes públicos das esferas administrativas cujos cargos estejam em disputa na eleição (ver § 3º do art. 73 da Lei n. 9.504/1997). 90 Vedação aplicada apenas aos agentes públicos das esferas administrativas cujos cargos estejam em disputa na eleição (ver § 3º do art. 73 da Lei n. 9.504/1997).

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a. realizar transferência voluntária de recursos da União aos

Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob

pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos

destinados a cumprir obrigação formal preexistente para

execução de obra ou serviço em andamento e com

cronograma prefixado, e os destinados a atender situações

de emergência e de calamidade pública;

b. com exceção da propaganda de produtos e serviços que

tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade

institucional dos atos, programas, obras, serviços e

campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou

municipais, ou das respectivas entidades da administração

indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade

pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

c. fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do

horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça

Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e

característica das funções de governo;

7. realizar, em ano de eleição, antes do prazo fixado no inciso

anterior, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais,

estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da

administração indireta, que excedam a média dos gastos nos 3

(três) últimos anos que antecedem o pleito ou do último ano

imediatamente anterior à eleição.

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8. fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração

dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de

seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início

do prazo para escolha dos candidatos pelos partidos e a

deliberação sobre coligações, até a posse dos eleitos.91

Não bastam vedações, importante a efetiva repressão – isto

considerando que tais condutas, mesmo ilegais, parecem fazer parte dos

costumes vigentes. E, partindo desse pressuposto, a norma estabelece as

seguintes penalidades no caso de seu descumprimento:

1. suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e

multa aos responsáveis92, no valor de cinco a cem mil UFIR

(multas que serão duplicadas em caso de reincidência);93

2. caracterização de “atos de improbidade administrativa”;94

3. nos casos de descumprimento dos itens 1, 2, 3, 4 e 6:95

a. suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso,

e multa aos responsáveis, no valor de cinco a cem mil UFIR;

b. o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito

à cassação do registro ou do diploma. (NR)96

91 “Das convenções para a Escolha de Candidatos” (arts. 7º a 9º da Lei n. 9.504/1997). As convenções realizar-se-ão no período de 10 a 30 de junho do ano da eleição; e a diplomação, como regra, poderá realizar-se até 19 de dezembro do ano da eleição, observados os prazos relativos à prestação de contas de campanha (que deverão estar julgadas até pelo menos 8 (oito) dias antes da diplomação). Ainda, quanto à diplomação, a data limite referida vincula-se ao recesso forense – de 20 de dezembro a 6 de janeiro –, inexistindo orientação específica posterior à Emenda Constitucional n. 45/2004 que, em tese, exige o funcionamento contínuo e ininterrupto do Judiciário. 92 Agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem (ver § 8º do art. 73 da Lei n. 9.504/1997). 93 Sem prejuízo de outras de caráter constitucional, administrativo ou disciplinar fixadas pelas demais leis vigentes (ver art. 78 da Lei n. 9.504/1997). 94 Ver art. 11, inciso I c/c art. 12, inciso III, ambos da Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992. 95 Sem prejuízo de outras de caráter constitucional, administrativo ou disciplinar fixadas pelas demais leis vigentes (ver art. 78 da Lei n. 9.504/1997). 96 Parágrafo com nova redação dada pela Lei n. 9.840, de 28 de setembro de 1999.

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4. suspensão das quotas do fundo partidário aos partidos

beneficiados pelos atos que originaram as multas.

Outras vedações para os 3 (três) meses que antecederem as eleições:

1. na realização de inaugurações, a contratação de shows

artísticos pagos com recursos públicos;

2. aos candidatos a cargos do Poder Executivo, participar de

inaugurações de obras públicas, sujeitando o infrator à

cassação do registro.

Ainda, configura abuso de autoridade, ficando o responsável, se

candidato, sujeito ao cancelamento do registro de sua candidatura, a infringência

ao disposto no § 1º do art. 37 da CRFB (art. 74). Tal dispositivo estabelece que a

“publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos

públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela

não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção

pessoal de autoridade ou servidores públicos”. Outrossim, nesta hipótese, o rito a

ser seguido é o sumaríssimo do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990.

Se muito se discutiu e se discute a reelegibilidade, ainda mais crítico se

torna o tema em face da utilização da estrutura e infra-estrutura governamental

em prol da própria campanha, e encontrar efetivamente a linha divisória entre o

“candidato” e o “presidente da república”; entre o “candidato” e o “governador de

estado” e entre o “candidato” e o “prefeito municipal”. Essa separação não é fácil,

ao contrário. É, pois, muito mais lógica a (con)fusão entre as duas figuras do que

a sua nítida cisão. Tais candidatos são, por si só, verdadeiros estandartes de

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propaganda. E essa condição torna a premissa do tratamento equânime entre

candidatos ainda mais árdua97. E mais uma vez válida a referência a Salomão.98

E o que dizer da possibilidade legal de uso de transporte oficial pelos

detentores desses cargos executivos (numa interpretação mais elástica do

dispositivo)!? E tal uso para campanha de reeleição!?... É o que reza o art. 76 da

Lei n. 9.504/1997, regulando a ressalva contida no § 2º do art. 73, acima referido,

que permite, condicionalmente, a utilização, mediante ressarcimento.

O ressarcimento das despesas com o uso de transporte oficial pelo

Presidente da República99 e sua comitiva em campanha eleitoral será de

responsabilidade do partido político ou coligação a que esteja vinculado, sendo

que o reembolso terá por base o tipo de transporte usado e a respectiva tarifa de

mercado cobrada no trecho correspondente, ressalvado o uso do avião

presidencial, cujo ressarcimento corresponderá ao aluguel de uma aeronave de

propulsão a jato do tipo táxi aéreo. A falta de pagamento importará aos infratores

multa correspondente ao dobro das despesas, duplicada a cada reiteração de

conduta.

1.3 Procedimentos

Observados, no presente capítulo, os aspectos legislativos do abuso do

poder econômico nas eleições e apresentados de forma cronológica, em apertada

97 [...] “irrelevante, para a caracterização da conduta, se o candidato compareceu como mero espectador ou se teve posição de destaque na solenidade” (SALOMÃO, Paulo César. Abuso do poder econômico e político diante da reeleição, p. 1-2, 9). 98 Ver nota 58. 99 A lei só faz referência ao Presidente da República, mas é notório que Governadores e alguns prefeitos fazem uso de transporte oficial para o exercício de suas funções.

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síntese – mas suficiente –, cabe o registro das seguintes formas de

processamento:

1. para a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo100: até 2004

seguia-se o rito ordinário do Código de Processo Civil,

combinado, na fase recursal, com o rito sumário do Código

Eleitoral. Como curiosidade, chama atenção o fato de, não

obstante ser ação constitucional – art. 14, §§ 10 e 11 –, até hoje

aguardar regulamentação, tendo sido o Tribunal Superior Eleitoral

quem estabeleceu o rito ordinário a sua tramitação, exatamente

por ser o mais completo, e, por via de conseqüência, o mais

moroso, o que melhor agasalha o devido processo legal e a ampla

defesa. Hodiernamente, a partir da Resolução TSE n. 21.634, de

19 de fevereiro de 2004, “O rito ordinário que deve ser observado

na tramitação da ação de impugnação de mandato eletivo, até a

sentença, é o da Lei Complementar n. 64/90, não o do Código de

Processo Civil, cujas disposições são aplicáveis

subsidiariamente”.101

100 Ver a íntegra do art. 14 – e §§ 10 e 11 – da CRFB na nota n. 53, retro. 101 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Resolução n. 21.634. Questão de ordem. Ação de impugnação de mandato eletivo. Art. 14, § 10, da Constituição Federal. Procedimento. Rito ordinário. Código de Processo Civil. Não observância. Processo eleitoral. Celeridade. Rito ordinário da Lei Complementar n. 64/90. Registro de candidato. Adoção. Brasília, 19 de fevereiro de 2004. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudência/index.jsp Acesso em: 3 abr.2005. Ainda, da resolução, colhe-se o fundamento da mudança de paradigma, qual seja, “As peculiaridades do processo eleitoral – em especial o prazo certo do mandato – exigem a adoção dos procedimentos céleres próprios do Direito Eleitoral, respeitadas, sempre, as garantias do contraditório e da ampla defesa”.

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2. para a Representação/Reclamação por abuso do poder

econômico da Lei Complementar n. 64/1990102: seguir-se-á o rito

sumário do art. 22 da mesma Lei Complementar;

3. para a Representação/Reclamação por captação ilícita de

sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/1997): em cumprimento à

disposição legal e excepcionalmente, seguir-se-á o rito sumário

do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990 (a excepcionalidade

decorre da existência de rito próprio para as representações e

reclamações contra infrações à Lei. 9.504/1997, o qual não é

observado na captação ilícita de sufrágio);

4. para o Processo Criminal decorrente e/ou conseqüente de abuso

e/ou captação ilícita de sufrágio: observar-se-ão o Código Eleitoral

e o Código de Processo Penal;

5. para Recurso Contra a Expedição de Diploma: seguir-se-á o rito

do Código Eleitoral.

1.4 Penalidades

O presente trabalho centra-se na captação ilegal de votos como foco

do abuso do poder econômico. E sob esse enfoque é importante reprisar a

complementaridade dos dispositivos envolvidos, numa visão que pode ser

classificada como regra geral, a seguir:

102 Ver a íntegra do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990 na nota n. 66, retro.

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1. o art. 41-A da Lei n. 9.504/1990 penaliza política e

administrativamente – perda do registro da candidatura, ou do

diploma, e multa – o candidato103 que “compra votos”;

2. o art. 299 do Código Eleitoral, pela mesma prática, penaliza

criminalmente – reclusão e multa – o corruptor e o corrompido,

candidato ou não, ou seja, os agentes ativo e passivo;

3. o art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990 pune com

inelegibilidade e cassação de registro, fazendo prova pré-

constituída para a ação de impugnação de mandato eletivo;

4. o art. 14, §§ 10 e 11 da CRFB – ação de impugnação ao mandato

eletivo - ataca o mandato eletivo, cuja ação deve ser proposta até

15 (quinze) dias após a diplomação.104

Assim sendo, dando continuidade ao proposto, imprescindível

conhecer de forma consistente o dispositivo legal no qual está focado o abuso do

poder econômico nas eleições, pesquisando sua história, adentrando em sua

construção normativa e perscrutando o que ainda há por vir.

103 Se a ação for praticada por terceiro, com ciência e anuência do candidato, este será igualmente penalizado. O terceiro, a seu turno, poderá sofrer as sanções criminais. Há, ainda, como se verá adiante, quem defenda a aplicação exclusivamente de sanção pecuniária, o que, em tese, permitiria a penalização administrativa de terceiro que age em nome de candidato, dentro do tipo do art. 41-A. 104 Neste tópico, vale recordar do recurso contra a diplomação, na forma no art. 262 do Código Eleitoral, que ataca o diploma do eleito, nas hipóteses versadas em seus incisos, sendo que a captação ilícita de votos encontra-se no inciso IV.

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2 A CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (O ART. 41-A DA LEI N. 9.504/1997)

Perfilar o caminho do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997105 é, sem sombra

de dúvida, seguir um caminho vitorioso, pois é norma legal de Iniciativa

Popular.106

É com base em Boaventura de Souza Santos107 que se inicia o

presente capítulo, buscando o enquadramento possível entre a teoria e a prática.

Cuida-se, pois, de um exercício retórico, com o propósito de demonstrar a

importância e a dimensão do art. 41-A no abuso do poder econômico nas

eleições.

[...] a ciência pós-moderna sabe que nenhuma forma de conhecimento é, em si mesma, racional; só a configuração de todas elas é racional. Tenta, pois, dialogar com outras formas de conhecimento deixando-se penetrar por elas. A mais importante de todas é o conhecimento do senso comum, o conhecimento vulgar e prático com que no quotidiano orientamos as nossas ações e damos sentido à nossa vida. A ciência moderna construiu-se contra o senso comum que considerou superficial, ilusório e falso. A ciência pós-moderna procura reabilitar o senso comum por reconhecer nesta forma de conhecimento algumas virtualidades para enriquecer a nossa relação com o mundo. É certo que o conhecimento do senso comum tende a ser um conhecimento mistificado e mistificador, mas, apesar disso e apesar de ser conservador, tem uma dimensão utópica e libertadora que pode ser ampliada através do diálogo com o conhecimento científico. Essa dimensão aflora em algumas das características do conhecimento do senso comum. O senso comum faz coincidir causa e intenção; subjaz-lhe uma visão do mundo assente na ação e no princípio da criatividade e da responsabilidade individuais. O senso comum é prático e pragmático; reproduz-se colado às trajetórias e às experiências de vida de um dado grupo social e nessa correspondência se afirma fiável e securizante. O senso comum é transparente e evidente; desconfia da opacidade dos objetivos tecnológicos e do

105 Dispositivo acrescentado pela Lei n. 9.840, de 28 de setembro de 1999. 106 E não que o dispositivo reflita uma unanimidade – uma preciosidade técnico-jurídica ou metodológica –, mas é inquestionavelmente uma conquista social, uma rara iniciativa de uma Sociedade notoriamente desabituada a lutar por seus direitos. Mas é fruto de muito trabalho e da indignação, como se verá em seguida. 107 SANTOS, Boaventura de Souza. Um discurso sobre as ciências. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2003.

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esoterismo do conhecimento em nome do princípio da igualdade do acesso ao discurso, à competência cognitiva e à competência lingüística. O senso comum é superficial porque desdenha das estruturas que estão para além da consciência, mas, por isso mesmo, é exímio em captar a profundidade horizontal das relações conscientes entre pessoas e entre pessoas e coisas. O senso comum é indisciplinar e imetódico; não resulta de uma prática especificamente orientada para o produzir, reproduz-se espontaneamente no suceder quotidiano da vida. O senso comum aceita o que existe tal como existe; privilegia a ação que não produza rupturas significativas no real. Por último, o senso comum é retórico; não ensina, persuade.108

Adentrar no senso comum do abuso do poder econômico, daquilo que

se sente e se vive sem conseguir dizer o que é, mas sabe-se do que se trata.

A fim de situar o assunto no campo prático – servido de diagnóstico à

realidade nacional –, traz-se à colação alguns excertos e/ou números de

pesquisas realizadas pela Organização Não-Governamental “Transparência

Brasil”, intituladas “Segunda Pesquisa Transparência Brasil sobre Compra de

Votos em Eleições Populares”109 e “Compra de Votos nas Eleições 2004 –

Corrupção em municípios”.110

É do corpo da primeira:

[...] nas eleições de outubro/novembro (2002) cerca de 3% dos eleitores receberam oferta de candidatos ou cabos eleitorais para vender o seu voto.[...] Com todas as limitações, a pesquisa revela que cerca de 3 milhões de eleitores receberam oferta de vender o seu voto. Vale a pena lembrar que o código eleitoral define essa transação como crime. O código eleitoral de 1965 dispõe, no art. 237, que a interferência de poder econômico e o desvio ou abuso de poder de autoridade serão coibidos e punidos. O art. 299 criminaliza a mera oferta de compra de votos, mesmo que não aceita pelo

108 SANTOS, Boaventura Souza. Um discurso sobre as ciências, p. 13-15, 19-22, 34, 43-44, 47, 50, 52, 55-56. 109 Não se utiliza a primeira em face da sua limitação, uma vez que restrita à compra de votos na cidade de Campinas/SP. Ver “www.transparencia.org.br”. [Estatísticas/Pesquisas e Estudos da Transparência Brasil/Compra de Votos em Campinas (SP) – Setembro de 2003]. No tocante à pesquisa referida e utilizada, de autoridade de SPECK, Bruno Wilhelm e ABRAMO, Claudio Weber, ver <www.transparencia.org.br/docs/crompravotos2002/pdf>. Acesso em: 20 mar.2005. 110 ABRAMO, Cláudio Weber. Compra de votos nas eleições. disponível em: <www. transparencia.org.br/docs/compravotos2004 /pdf >. Acesso em: 20 mar.2000.

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eleitor. Logo, estamos diante de um universo de 3 milhões de infrações criminais ocorridas nas últimas eleições.111

E, da segunda, extrai-se:

Durante a campanha eleitoral de 2004, 9% dos eleitores brasileiros receberam oferta de dinheiro ou de algum bem material em troca de seu voto. As regiões em que o fenômeno se apresentou com mais intensidade foram a Sul, com 12% e a Nordeste, com 11%. Nas regiões Norte/Centro-Oeste foi de 9% e a menos afetada foi a Sudeste, com 5%. [...] Levantamentos como este apontam para a existência de um problema com a realização de eleições que deveria estimular as autoridades, em especial o Tribunal Superior Eleitoral, a aprofundar o diagnóstico. Caberia ao TSE realizar tais pesquisas, para identificar onde a compra de votos e o uso da máquina são mais freqüentes para concentrar ali as ações de prevenção e repressão.

Sintetizando: no primeiro caso, fala-se de aproximadamente três

milhões de eleitores; no segundo, dez milhões!

Tais números não são apenas contundentes e vultosos: eles falam,

eles questionam, eles respondem, eles denunciam...112

111 Os pesquisadores ainda registram que, na prática, encontraram duas dificuldades: a delimitação do fenômeno e a confirmação da compra de votos, ou seja, “Num sentido estrito, a compra de votos envolve trocas do voto por dinheiro, por bens materiais ou outros favores. Mas além das trocas individuais há também a negociação coletiva de votos, realizada por líderes influentes. Para alguns, muitas promessas são irreais feitas em campanhas eleitorais a grupos específicos de eleitores constituem uma compra do voto desses eleitores. Na escolha entre uma definição mais abrangente, que deixa margem para a imprecisão, e outra mais restrita, optamos pela última. Na definição da Transparência Brasil, a compra de votos se limita à negociação individual do voto por dinheiro, bens materiais, favores administrativos ou outras vantagens oferecidas a eleitores individuais” e “A realização de levantamentos esbarra no constrangimento dos entrevistados quando perguntados sobre a participação na negociação do voto, que é um ato ilegal, passível de punição”. 112 Sobre essa abordagem, ver, também o artigo “A compra de votos – uma aproximação empírica”, de SPECK, Bruno Wilhelm, publicado em OPINIÃO PÚBLICA, vol. IX, n. 1, ano 2003, p. 148-169 [ou “www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-62762003000100006”].

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2.1 Histórico do Art. 41-A113

A Lei n. 9.840/1999 representa, de sua gênese à sua consagração, a

resposta da Sociedade, capitaneada por significativos e representativos

segmentos organizados, às deficiências de ordem comportamental da classe

política114. É que muitos votos têm sido rasgados!

É da Constituição Federal:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular.

Num raro – único, no âmbito do legislativo nacional – exemplo de

mobilização popular, surge o art. 41-A, gerado a partir do Projeto de Lei n. 1.517,

de 1999, e nascido sob a maternidade da Lei n. 9.840, de 28 de setembro de

1999. Na realidade, a maternidade é múltipla... E todo o processo contou com a

participação direta de mais de um milhão de eleitores, observada a adesão

mínima de um por cento do eleitorado nacional para Iniciativas Populares de Lei.

Justificado no objetivo de dar à Justiça Eleitoral melhores condições

para coibir – com mais eficácia – o crime de corrupção eleitoral ou,

simplistamente, “compra de votos”, foi apresentado ao Congresso Nacional, como

113 Nesse enfoque, sobre o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, acesse: Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – Comitê Nacional (CNBB, OAB, FENAJ, CONTAG, ABONG E CUT) – www.lei9840.org.br e/ou www.votolegal.org.br. End.: SAS 5 LOTE 01 BL M, Brasília – DF – Conselho Federal da OAB – tel.: (61) 316 9690. E-mail: [email protected]. Acesso em: 5 mar.2005. 114 Dá-se propositalmente a conotação de deficiência comportamental, haja vista parecer que a média da ética acolheria com muita normalidade os desmandos na política e na gestão da coisa pública (v.g. o que dizer das últimas Comissões Parlamentares de Inquérito, envolvendo os poderes executivo e legislativo, partidos políticos e empresários; tráfico de influência; corrupção etc.?).

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Iniciativa Popular de Lei, projeto próprio, que contou com o patrocínio da

Comissão Brasileira Justiça e Paz – CBJP – e o apoio da Conferência Nacional

dos Bispos do Brasil – CNBB.115

A razão da Iniciativa Popular – extraída do Diário da Câmara dos

Deputados antes referido116 –, em sua singeleza e objetividade, repousa no que é

fato:

No Brasil já se tornou habitual que candidatos, na época das eleições, distribuam favores, bens e até dinheiro a eleitores, visando obter seus votos. Ora, essa prática desvirtua inteiramente o sentido do voto. Ele deixa de ser exercício do poder dos cidadãos na escolha de seus representantes no governo e a eleição se transforma num negócio. Isto permite também que candidatos inescrupulosos se aproveitem das carências populares, conseguindo os votos dos eleitores mais pobres pela satisfação de suas necessidades imediatas – uma cesta básica, uma conta atrasada, uma consulta médica, um saco de cimento. Esta conduta se torna ainda mais perversa porque, para esse tipo de político, é importante que existam muitos pobres, e que estes continuem sempre pobres para que possa de novo envolvê-los na eleição seguinte. Com isso, se falseia o próprio processo eleitoral – a numerosa população brasileira mais carente forma um verdadeiro “exército eleitoral de reserva”, convocado a cada eleição para manter no poder os de sempre.

115 Consta do Projeto de Lei, publicado no Diário da Câmara dos Deputados de 15 de setembro de 1999, p. 41.595, a relação de todas as entidades que apoiaram a iniciativa. São elas: Agência de Notícias da Infância – ANDI; Associação Brasileira de Empresários pela Cidadania – CIVES; Associação Brasileira de Escolas Superiores Católicas – ABESC; Associação Brasileira de Imprensa – ABI; Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais – ABONG; Associação de Educação Católica do Brasil – AEC; Associação Juízes para a Democracia: Cantas Brasileira; Central Única dos Trabalhadores – CUT; Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais – CERIS; Comissão Nacional da Pastora Operária – CPO; Comissão Pastoral da Terra – CPT; Conferência dos Religiosos do Brasil – CRB; Ordem dos Advogados do Brasil – OAB; Conselho Indigenista Missionário – CIMI; Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil – CONIC; Conselho Nacional de Leigos – CNL; Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP; Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE; Federação Nacional dos Jornalistas – FENAJ; Força Sindical; Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE; Instituto Brasileiro de Desenvolvimento – IBRADES; Instituto de Estudos Sócio-Econômicos – INESC; Movimento de Educação de Base – MEB; Movimento d Ministério Público Democrático; Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST; Movimento Nacional dos Direitos Humanos – MNDH; Movimento Nacional Juventude Comunidade Justiça e Cidadania – JCJC; Pastoral Carcerária; Pastoral da Criança; Pastoral da Juventude do Brasil – PJB; Pastoral Universitária – PU; Pensamento Nacional das Bases Empresariais – PNBE; Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES. Disponível em: <http//www.camara.gov.br.> Acesso em: 20 mar.2005. 116 PROJETO de Lei n. 1.517 de 1999. Diário da Câmara dos Deputados, Brasília, 15.set.1999. p. 41-596. Disponível em: <htttp//www.camara.gov.br> Acesso em: 4 fev.2005.

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A preocupação com a morosidade processual (e, neste ponto,

necessário um breve parêntese: morosidade processual que não é fruto de um

Poder Judiciário inoperante, mas de um somatório de fatores – causas e efeitos –

que devem ser avaliados sob a premissa de uma legislação ultrapassada, e, a

partir dela, o permeio de toda a estrutura e a infra-estrutura estatal envolvida) e a

vontade de tornar a Justiça Eleitoral mais eficaz, movimentou a Sociedade para

uma resposta mais célere à corrupção eleitoral, já tipificada no art. 299 do Código

Eleitoral117, sem prejuízo do competente e necessário processo-crime eleitoral.

Daí surgiu a Iniciativa Popular, com foco em três mudanças:

1. a possibilidade de cassação imediata do registro do candidato

que tentar corromper eleitor, ou seja, que captar ou tentar obter

indevidamente voto, ação a ser enquadrada no tipo do art. 299

do Código Eleitoral. O resultado dessa proposta, que era a

introdução de um novo artigo na Lei n. 9.504/1997,

originariamente, repete-se, foi o seguinte: “Art. 41 – Constitui

processo de captação de sufrágio vedado por essa lei, doar,

oferecer ou prometer, o candidato ou alguém por ele, bem ou

vantagem pessoal de qualquer natureza, desde o registro da

candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa

de 1.000 (mil) a 50.000 (cinqüenta mil) UFIRs, e cassação do

registro ou do diploma”;118

2. a cassação do registro pelo uso da máquina administrativa,

apenando os candidatos beneficiados pelas condutas vedadas

117 Ver nota 2. 118 PROJETO de Lei n.1.517. Diário da Câmara dos Deputados, Brasília, 15 set.1999, p. 41.596. Disponível em: <http//www.camara.gov.br/ Acesso em: 20 mar.2005.

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do art. 73, incisos I, II, III, IV e VI da Lei n. 9.504/1997, agentes

públicos ou não, com a cassação do registro ou do diploma, a

suspensão imediata da conduta vedada (se for o caso) e multa,

de cinco a cem mil UFIR;

3. o perdão judicial para “eleitores ludibriados” na corrupção

eleitoral, propondo o seguinte parágrafo único ao art. 299 do

Código Eleitoral: “Se o Juiz verificar, quanto ao eleitor, tratar-se

de réu primário, cujo grau de instrução e condição de

necessidade material no momento do crime poder-lhe-ia ter

reduzido a capacidade volitiva de recusar a oferta, promessa

ou doação, conceder-lhe-á perdão judicial”.119

O processo legislativo surtiu efeito, vindo a ser promulgada a Lei n.

9.840, em 28 de setembro de 1999. Foram acolhidas as duas primeiras propostas

antes referidas – ou seja, foi excluído o perdão judicial dos agentes passivos no

crime de corrupção eleitoral –, resultando, com a redação original modificada, no

art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 120.

Merecedor de registro, igualmente, debate acerca do art. 41-A após as

“suas primeiras eleições”, realizado no Fórum Social Mundial de 2001121.

Inicialmente, partindo da premissa de ser uma inovação positiva sob os aspectos

legal e político – este, por suas repercussões institucional, filosófica e prática na

afirmação da cidadania; e, aquele, na medida em que possibilita a efetiva

aplicação de sanção administrativa que, por sua vez, pode inviabilizar a condução

119 PROJETO de Lei n.1.517. Diário da Câmara dos Deputados, Brasília, 15 set.1999, p. 41.596. Disponível em: <http//www.camara.gov.br/ Acesso em: 20 mar.2005. 120 O dispositivo referido encontra-se, na íntegra, na Introdução (ver nota 1). 121 SILVA, Luiz Márcio. A Lei 9.840/99. Disponível em: http://www.pt.org.br/assessor/ reflexao%20sobre%20a%20lei%209840.htm.

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de corruptos a cargos efetivos –, propôs-se uma análise legal e política,

desdobrando em efeitos pedagógico, prático (e sua repercussão política),

institucional e jurídico. Em apertada síntese:

a. sobre o efeito pedagógico, alertam para a ruptura, patrocinada

pela própria sociedade, do que qualificam de “conservadora

dominação econômica”, fazendo valer o Estado Democrático

de Direito (art. 1º da Constituição Federal) e reafirmando “um

conceito muitas vezes eclipsado: cidadania!”;

b. do efeito prático e sua repercussão política, há o conhecimento

do “potencial repressivo da lei”;

c. dos possíveis efeitos institucionais, destacam a célere

tramitação do projeto no Congresso Nacional, impulsionando a

discussão da reforma política122, e, dentro desta, de temas

relevantes, como o dimensionamento dos gastos eleitorais; o

financiamento público de campanhas; o fim do ressarcimento

fiscal às emissoras de rádio e televisão (pelo acesso aos meios

para campanhas políticas); a adoção das listas partidárias

122 Apenas uma nota, a título de provocação crítica, da conveniência e oportunidade da reforma política deflagrada pelo atual Governo Federal. Sem adentrar no mérito da histórica e efetiva necessidade de se passar a limpo o sistema político nacional, quais os verdadeiros motivos que induziram o Executivo, ao término do seu mandato (sim, pois já se ultrapassou a primeira metade dele!), a impulsionar tão relevante reforma? O que dizer da forma como o mesmo Executivo está conduzindo o processo? Por outro lado, na esteira dos últimos acontecimentos no cerne da República, há a iniciativa do Tribunal Superior Eleitoral de organizar uma “Comissão de Notáveis” e envolvendo a Justiça Eleitoral, capitaneada pelas Corregedorias e Regionais, proceder a estudos a sugestões de alterações legislativas no âmbito do Direito Eleitoral, a contribuir com o aperfeiçoamento de sistema e do processo, tanto político quanto eleitoral vigentes. Tais trabalhos, contudo, estão em desenvolvimento e sobre eles não se falará mais do que isto – e de uma nota ao final desta exposição – haja vista ser não apenas incipiente, como de resultado temerário, ante o processo legislativo que após os estudos se cumprirá.

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(sistema pelo qual os [...] “Partidos serão os gestores da

distribuição entre as candidaturas” [...]);

d. quanto às implicações jurídicas, filtra-se a cassação do registro

ou do diploma e a condenação à pena pecuniária e, já

ultrapassada, a discussão acerca dos efeitos da norma.

Na trilha do registro e do resgate históricos, vale anotar a receptividade

do uso do novo instrumento pelo Tribunal Superior Eleitoral. Cuida-se, e é

importantíssimo frisar, de fato que modifica absolutamente o cenário jurídico,

político e legal: não se está a enxergar a norma em si e/ou a norma fruto da

iniciativa popular, mas a mesma norma sob o crivo do Órgão máximo da Justiça

Eleitoral, aqui representada por excertos selecionados dos Min. Fernando Neves

e Min. José Delgado, que seguem:

A introdução da regra do citado art. 41-A, resultado de um magnífico movimento popular que sensibilizou o Congresso Nacional, trouxe para a Justiça Eleitoral um instrumento forte e eficaz, que por isso mesmo tem que ser cuidadosamente aplicado, o que não é tarefa simples, pois a caracterização do tipo e seus requisitos envolvem a análise de fatos e provas, muitas vezes confusas e contraditórias, sempre dependentes da avaliação subjetiva de cada julgador.123 Trata-se de uma norma que se insere numa categoria maior, qual seja, a de princípio de conduta com dois fins: purificar o regime democrático e valorizar a cidadania quando ela exerce a sua liberdade no voto. Eis que temos aí duas vertentes muito fortes que inovam por inteiro o nosso ordenamento jurídico. Pela primeira vez, no Brasil, surge uma regra de natureza fisiológica, com a finalidade de purificação do regime democrático, no que concerne à escolha de representantes políticos, dando ênfase à moralidade. Essa ênfase, mesmo que não conste expressamente no texto da lei, é de natureza absoluta.124

123 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 21.264. Recurso especial eleitoral. Representação. Prática de conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/9, acrescentado pelo art. 1º da Lei n. 9.840, de 28.9.99: compra de votos. Recorrente Diretório Regional do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e outro. Recorrido: João Alberto Rodrigues Capiberibe e outros. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, DF, 27 de abril de 2004. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudência/index.jsp.>. 124 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004.

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É uma história de luta, recente, presente, eterna: a luta pela verdade

eleitoral, pelo respeito ao voto e ao eleitor!

2.2 O Art. 41-A da Lei n. 9.504/1997

Após uma visão panorâmica desse mundo político e jurídico que é o

abuso do poder econômico nas eleições, cujo objetivo era deixar aberto, de

antemão, o campo de pesquisa, a fim de facilitar o trabalho sobre o foco

destacado, adentrar-se-á no tema específico (nas próximas linhas), iniciando pela

transcrição do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 para, depois, dar seqüência ao

trabalho. Reza o dispositivo:

Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos125, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o

125 Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei, dentre outros: I – confecção de material impresso de qualquer natureza e tamanho; II – propaganda e publicidade direta ou indireta, por qualquer meio de divulgação, destinada a conquistar votos; III – aluguel de locais para a promoção de atos de campanha eleitoral; IV – despesas com transporte ou deslocamento de pessoal a serviço das candidaturas; V – correspondência e despesas postais; VI – despesas de instalação, organização e funcionamento de Comitês e serviços necessários às eleições; VII – remuneração ou gratificação de qualquer espécie a pessoal que preste serviços às candidaturas ou aos comitês eleitorais; VIII – montagem e operação de carros de som, de propaganda e assemelhados; IX – produção ou patrocínio de espetáculos ou eventos promocionais de candidatura; X – produção de programas de rádio, televisão ou vídeo, inclusive os destinados à propaganda gratuita; XI – pagamento de cachê de artistas ou animadores de eventos relacionados à campanha eleitoral; XII – realização de pesquisas ou testes pré-eleitorais; XIII – confecção, aquisição e distribuição de camisetas, chaveiros e outros brindes de campanha; XIV – aluguel de bens particulares para veiculação, por qualquer meio, de propaganda eleitoral; XV – custos com a criação e inclusão de sítios na Internet; XVI – multas aplicadas aos partidos ou candidatos por infração do disposto na legislação eleitoral.

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procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990.

São características construtivas da norma:

1. regula “captação proibida de sufrágio”;

2. ressalva as situações dispostas no art. 26 da Lei n. 9.504/1997;

3. define o que venha a ser “captação ilegal de voto”;

4. apresenta a configuração da ação vedada:

a. agente ativo: o candidato;126

b. agente passivo: o eleitor;

c. objeto: o voto;

d. ação: doar, oferecer, prometer, ou entregar, bem ou

vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive

emprego ou função pública;

e. termo inicial: desde o pedido de registro da candidatura;

f. termo final: até o dia da eleição, inclusive;

g. penas:

multa de mil a cinqüenta mil UFIR; e

cassação do registro ou do diploma;

h. processamento: rito do art. 22 da Lei Complementar n.

64/1990.127 128

126 Admite-se como sujeito ativo terceiro que aja em nome ou com anuência do candidato, não obstante a pena da captação ilícita de sufrágio recaia exclusivamente sobre este. Esse tema será oportunamente apresentado na seqüência do trabalho. 127 A Resolução TSE n. 21.1666, de 1º de agosto de 2002, estabelece a competência do juiz auxiliar para processamento e relatório da representação do art. 41-A, observado o rito do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990, e desmembramento do feito para que infrações ao art. 73 sigam o rito do art. 96, da Lei n. 9.504/1997. 128 Segundo Rodrigo López ZILIÓ (2004, p.23-47) “São legitimados ativos para ajuizar a representação por violação ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 qualquer partido político, coligação, candidato e o Ministério Público Eleitoral. Ao eleitor somente é admitido o direito de petição, não se reconhecendo, pois, a legitimidade ativa. Do mesmo modo, indispensável a presença de advogado, i. e, capacidade postulatória, a teor do art. 133 da CF e do Estatuto da OAB” (in ZILIÓ, Rodrigo López. Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004).

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O procedimento utilizado é o do art. 22 da Lei Complementar n.

64/1990 – Lei das Inelegibilidades – que é a lei complementar referida no § 9º, do

art. 14, da Constituição Federal.

Dentre vários outros aspectos relevantes da captação ilícita de sufrágio

– do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, enfim – chama-se atenção para o embate

sobre a sua constitucionalidade, centrada na exigência constitucional de as

inelegibilidades serem estabelecidas por lei complementar e não por lei ordinária

(Lei n. 9.840/1999 com a Lei n. 9.540/1997).

Mas será que o art. 41-A estabelece nova situação de inelegibilidade?

A exemplo do art. 73 da Lei n. 9.504/1997, que trata das condutas vedadas aos

agentes públicos em campanhas eleitorais, e que segue o procedimento previsto

no art. 96 da mesma lei, o bem jurídico tutelado não seria outro, vindo a

desconfigurar a hipótese de inelegibilidade para, ao contrário, impor pena

administrativa em virtude da prática de conduta vedada? Ademais, há, ainda, a

ação de impugnação de mandato eletivo (art. 14, § 10 da CRFB).

São vários os instrumentos; cada qual com uma utilidade e uma

finalidade; todos complementares; todos buscando, com criatividade, atingir uma

demanda social reprimida: igualdade nas eleições por meio do combate ao abuso

do poder econômico e à compra de votos.

Adentrar no art. 41-A é imiscuir-se em seara abrangente, envolvente e

apaixonante – política, social, cultural e juridicamente. Isso já foi dito e repetido.

Contudo, [...] “se é correto dizer que a compra de votos é expediente reprovável,

que merece pronta censura e punição, não é menos correto evitar que a regra

seja indevidamente aplicada, isto é, que se puna alguém sem que haja prova

suficiente para tanto” e, nessa esteira, imprescindível [...] “investigar a fundo, em

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cada caso, se o procedimento ocorrido realmente configura compra de voto, ainda

que mediante promessa não concretizada, e quem são ou foram os responsáveis

por tal conduta”.129

Outro aspecto relevante é a interligação existente entre a matéria –

substantiva e adjetivamente –, para atacar fins diversos, mas vinculados. É o caso

da vinculação existente entre registro de candidatura e a representação do art.

41-A, situações diversas tratadas pelo legislador de forma diferenciada, ou seja,

no registro de candidatura [...] “o fim perseguido é a demonstração da presença

das condições de elegibilidade e a ausência de inelegibilidade, para que se dê o

candidato como apto a participar do pleito”, enquanto que a representação com

base no 41-A tem como objeto [...] “não a aferição das condições para o

deferimento do registro, mas apurar condutas ilegais praticadas pelo já candidato

durante sua campanha eleitoral”.130

E sobre esse enfoque, irretorquíveis as palavras do Min. Celso de

Mello131, que vê no art. 41-A norma de proteção à vontade do eleitor,

estabelecendo expressamente qual a conduta vedada (compra de voto),

penalizando o candidato com multa e a cassação do registro ou a cassação do

próprio diploma, sem que para isso o beneficiário aja pessoalmente – mas

revelando-se imprescindível [...] “que se estabeleça, entre o ilícito eleitoral em

129 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. 130 E continua o voto: “O fato de que, na apuração do delito, seja observado o previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990, não altera meu entendimento, pois o que deve ser seguido é apenas o procedimento, não as punições lá previstas, entre as quais se encontra a inelegibilidade por três anos. Aliás, as penas próprias do art. 41-A nele estão perfeitamente definidas: multa de mil a cinqüenta mil Ufirs e cassação do registro ou do diploma. Observo que as alterações da Lei n. 9.504/1997, entre as quais consta a introdução do art. 41-A, vieram ao encontro da vontade da sociedade de ver rapidamente apurados e punidos os ilícitos eleitorais, razão pela qual a corrupção, que constitui crime previsto no art. 299 do CE, passou a ser também causa da perda do registro da candidatura ou do diploma, sem que o legislador condicionasse os efeitos da decisão proferida na representação ao seu trânsito em julgado” (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 970, Relator: Min. Waldemar Zveiter,2001. Voto do Min. Fernando Neves). 131 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004.

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questão e o candidato, uma dupla vinculação causal, tanto de caráter objetivo,

quanto de ordem subjetiva, o que reclama prova consistente, clara e inequívoca

de que, se o candidato não foi o autor material e direto de qualquer das condutas

vedadas, ao menos a estas aderiu de modo consciente e voluntário”.

Contudo, o art. 41-A não carrega a exceção da unanimidade. Apesar

do seu sucesso, inclusive em face do seu histórico – do seu processo legislativo

pela via da Iniciativa Popular –, salutarmente não é uma unanimidade.

Mesmo que criticado sob vários aspectos por diversos e respeitados

autores, é Joel José Cândido132 que se destaca pela crítica geral e irrestrita, de

quem, apenas para ilustrar, se traz o texto que segue:

Na nova lei, a pena prevista ao infrator é somente a de multa. O pobre não a paga; o rico paga rindo e os remediados a pagam em parcelas, mas nenhum deles fica inelegível, podendo concorrer novamente no próximo pleito, apesar do dano social que causarem à normalidade e legitimidade das eleições. O ordenamento anterior previa inelegibilidade ao infrator, sanção moderna, barata e de facílima executariedade, adequada para este tipo de infração. Os condenados ficavam temporariamente afastados da vida política eletiva. Em relação à eventual cassação do registro ou do diploma, a Lei n. 9.840/1999 em nada melhorou o que já constava da lei anterior. Ao contrário, trouxe inconstitucionalidade que naquela não havia, à medida em que a cassação do diploma erege-se em inelegibilidade, sanção política absolutamente incompatível com lei ordinária.

O excerto revela contradições. Ora, se a norma não versa sobre

inelegibilidade, apenas penaliza, política e administrativamente, com menos rigor

que as normas já existentes quem capta ilegalmente voto, não há que se falar de

inconstitucionalidade; muito menos sob o único argumento de que tais situações

devam estar/ser estabelecidas na Constituição Federal/em lei complementar.

Outrossim, o art. 41-A não excluiu do mundo jurídico todo o ferramental legislativo

132 CÂNDIDO, Joel José. Direito Eleitoral Brasileiro. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Edipro, 2004. p. 457-458.

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até então existente – até hoje vigente (não revogou nenhuma outra norma) –, ao

contrário, completou-o, mostrando-se mais eficiente do que os demais em vista da

possibilidade de as decisões em si fundadas serem imediatamente executadas.

Cuida-se, como dito, apenas de uma nota para deixar flagrante a

complexidade da matéria, a ser vislumbrada em seu todo, e não apenas

pontualmente.

2.3 Perspectivas do Art. 41-A da Lei n. 9.504/1997

Uma breve síntese: a) o art. 41-A representa muito mais um avanço

político-social, com reflexo jurídico, do que um avanço legislativo (termo a ser

recepcionado no sentido operacional), uma vez que o mérito de sua iniciativa é da

Sociedade, movida pela preocupação com os rumos da política nacional e pela

necessidade de uma solução mais eficaz e eficiente – efetiva – para os abusos

ocorridos no processo eleitoral, atacando especificamente a captação ilícita de

sufrágio ou, em outras palavras, a compra de voto(s), a corrupção eleitoral; b) a

captação ilícita de sufrágio tratada no art. 41-A em comento é, genericamente, o

mesmo ilícito do art. 299 do Código Eleitoral, diferindo apenas sua conotação, seu

foco, que é político e administrativo (naquela), e não criminal (nesta); c) como

penalidade à conduta ilícita previu-se a cassação do registro, ou do diploma, e

multa, não se configurando em inelegibilidade, inelegibilidade que poderá vir a se

materializar por meio de ações paralelas ou derivadas, estas conseqüentes da

aplicação dos abusos e/ou causas previstas na CRFB (inelegibilidades e/ou

abuso do poder econômico, corrupção e fraude nas eleições), na Lei

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Complementar n. 64/1990 (inelegibilidades, uso indevido, desvio ou abuso do

poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou

meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político) e

na Lei n. 9.504/1997 (condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas

eleitorais); d) os termos inicial e final do ilícito de captação ilegal de voto são o dia

do pedido de registro da candidatura e o dia da eleição; e) a captação ilícita de

sufrágio, por disposição legal, será processada pelo rito do art. 22 da Lei

Complementar n. 64/1990, e é ligada às condutas vedadas do art. 73 da Lei n.

9.504/1997 e ao recurso contra a diplomação (art. 262 do Código Eleitoral).133

Tratar das perspectivas do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 é tarefa

cômoda. Por outro lado, fica o alerta para o fato de que toda novidade, ou toda

renovação, gera o ambíguo e contraditório sentimento da adoção – recepciona-se

ou rejeita-se – que faz parte do sistema binário arraigado na cultura universal –,

sendo mais fácil destruir do que construir. Mas é nessas idas e voltas que tudo

evolui, cada coisa seguindo um caminho e um ritmo, colhendo os resultados das

imprescindíveis opções/decisões, sejam elas certas ou não. E avaliar

sociologicamente a tendência natural de o ser humano destruir é algo que não

saberia fazer, mas milênios de história demonstram uma competência muito maior

na ação destrutiva do que o inverso. É que – conjecturando – os processos

construtivos (de desenvolvimento) são muito mais complexos e demorados, uma

vez que se utilizam da razão, das faculdades mentais; enquanto os destrutivos,

muito mais simples (rápidos e eficazes), envolvem paixões e desvios. Por isso a

situação exige alguma reflexão e, para tanto, para não se ficar restrito ao campo

133 Sobre o tema, ver LANGOWSKI, Luis Sergio e PUPPI, Letícia Küster.Reflexões acerca da Lei n. 9.840/99. Disponível em: <http//www.paranaeleitoral.gov.br/art._impresso.php?cod_texto =35> Acesso em: 4 jan.2005.

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da opinião, algum aporte teórico extra-eleitoral se faz necessário – e será

buscado nas linhas precedentes ou nas que seguem.

Da mesma forma que a Sociedade viu-se compelida a se organizar em

prol de ações mais efetivas que assegurassem a idoneidade das eleições,

atacando, no caso do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, o candidato que comprasse

voto(s) e, por via de conseqüência, resguardando o eleitor e a sua manifestação,

hoje os representantes eleitos por essa mesma Sociedade maquinam alterações

que modificam ou revogam essa norma.

Vale lembrar que são raríssimos os casos de condenação criminal por

prática de crime eleitoral134; que a ação de impugnação de mandato eletivo e, por

via de conseqüência, a representação por captação ilícita de sufrágio, são

instrumentos moralizadores das eleições135; que o Direito tem origem na luta em

defesa de novas liberdades contra velhos poderes136; que não é possível exercer

jurisdição onde não há direitos a reclamar137; que a Cidadania é um direito

humano por si próprio138 e vem fundado na liberdade139 e na igualdade140. Por

isso, o que se pode esperar do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997?

134 CASTRO, Carlos Fernando Correa de. O abuso do poder econômico no Direito Eleitoral. Paraná Eleitoral, Curitiba, n. 13, p. 6-8, 10-16, abr./jul.1990. 135 MELLO, Celso Antônio Bandeira de (org). Estudos em Homenagem a Geraldo Ataliba. Direito Administrativo e Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 616-618. 136 BOBBIO, Norberto. A Era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 1, 3-8. 137 BORJA, Célio. A Justiça Eleitoral e os direitos políticos. In O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL E A DEFESA DA ORDEM JURÍDICA DEMOCRÁTICA, 2, 1993. Brasília. Anais... Brasília: Imprensa Nacional, 1993. p. 35-36. 138 DIREITOS Humanos e Eleições. Um Manual Sobre os Aspectos Legais, Técnicos e de Direitos Humanos das eleições. Nações Unidas – Centro de Direitos Humanos. Série Treinamento Profissional n. 2. Tradução de Claudia Bentes David, p. 11, 14, 26, 31-32, 42. 139 BARRETO, Lauro. Escrúpulo & poder: o abuso de poder nas eleições brasileiras. São Paulo: Edipro, 1995, p. 75, 77-80, 83-84, 86-87. 140 ARALDI, Ivete Ana. O jogo das regras: Empresários, reforma eleitoral e distritalização nas eleições proporcionais em Santa Catarina. Dissertação (Mestrado em Sociologia Política) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1997, p. 54-55.

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2.4 Os Projetos de Lei “Pedro Henry” e “Antonio Carlos Valadares”

A partir dessa introdução, importante para não isolar o art. 41-A da Lei

n. 9.504/1997, retornar-se-á ao foco – perspectivas141 – apresentando iniciativas

existentes e em curso, e, a partir delas, colacionar elementos ensejadores de

maior reflexão e, quiçá, auxiliares à formação de convencimento. Vale lembrar,

contudo, o disposto no art. 13 e o seu § 2º da Lei n. 9.709, de 18 de novembro de

1998, in verbis:

Art. 13. A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. [...] § 2º O projeto de lei de iniciativa popular não poderá ser rejeitado por vício de forma, cabendo à Câmara dos Deputados, por seu órgão competente, providenciar a correção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação.

O dispositivo dá a exata dimensão do papel do Poder Legislativo no

encaminhamento de projetos de lei pela via da iniciativa popular, servindo de

parâmetro para a análise das propostas que seguirão.

141 Cândido, Joel José (Direito eleitoral brasileiro, p. 460), ao concluir sua crítica tenaz ao art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, “A solução, salvo se por razões alheias ao campo jurídico se quiser ‘salvar’ o art. 41-A da sua própria incompetência e inaptidão, deverá ser a sua pura e simples revogação, para que outro, de melhor técnica, venha perseguir e alcançar tão meritório objetivo”. Para Souto Maior Filho, [...] “em análise aprofundada do art. 41-A da lei 9.504/97, na melhor das hipóteses o máximo, que na prática pode acontecer com o candidato que capte voto ilicitamente é a aplicação da pena administrativa de multa. [...] Estando então o art. 41-A plenamente eivado de inconstitucionalidade, por invasão de matéria própria e exclusiva de espécie normativa especial (complementar), como taxativamente expresso na Constituição Federal. Sendo assim, a única inovação desta lei no que tange ao art. 41-A é a aplicação de multa aqueles que captarem sufrágio”[...]. (sic)

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2.4.1 O Projeto de Lei “Pedro Henry” 142

Projeto de Lei – PL-2.895/2004 – encaminhado à Câmara dos

Deputados em janeiro de 2004 pelo Sr. Pedro Henry, Deputado Federal do

Partido Progressista do Mato Grosso, propõe a alteração de dispositivos do

Código Eleitoral (Lei n. 4.737/1965), da Lei n. 9.504/1997 e da Lei n. 9.840/1999.

Sem desmerecer o trabalho do parlamentar, mas resumindo sua

iniciativa, as alterações propostas restringem-se a dar efeito às decisões da

Justiça Eleitoral que atingirem registro de candidatura, expedição de diploma de

eleitor e fixação de multa pecuniária, somente após o trânsito em julgado.

Efetivamente, a proposta limita-se a acrescer: 1) ao art. 96 da Lei n.

9.504/1997143, o § 11, com a seguinte redação: “A decisão proferida que atingir o

registro de candidatura, expedição de diploma ao eleito e fixar multa pecuniária

surte efeito a partir do trânsito em julgado”; 2) ao art. 262 do Código Eleitoral144,

os §§ 1º e 2º, respectivamente com a seguinte redação: “Fica assegurada a

produção de todas as provas em direito permitido nos recursos contra a

expedição de diploma” e “A decisão que atingir a expedição de diploma surte

efeitos a partir do trânsito em julgado”; 3) ao art. 41-A da Lei n. 9.504/1997,

parágrafo único, nestes termos: “A decisão contida no caput, somente surte efeito

a partir do trânsito em julgado”.

Em apertada síntese, a execução das decisões fica vinculada ao

trânsito em julgado. Em outras palavras, uma das principais armas do art. 41-A –

142 A íntegra do Projeto de Lei pode ser acessada na página da Câmara dos Deputados (www.camara.gov.br), em “proposições” “2895/2004”. Acesso em: 20 mar.2005. 143 O art. 96 da Lei n. 9.504/1997 versa sobre o procedimento das reclamações ou representações relativas ao descumprimento dessa lei. 144 O art. 262 do Código Eleitoral versa sobre o recurso contra a expedição de diploma.

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a execução imediata – está sendo suprimida, voltando a submeter todo o

processo eleitoral à histórica morosidade propiciada pela gama de recursos –

possíveis! – existentes no sistema legal.

Contudo, indaga-se: qual seria a justificativa para a formulação desse

projeto? Extrai-se do corpo do projeto:

observância aos princípios constitucionais da ampla defesa e de que

ninguém é considerado culpado até o trânsito em julgado da decisão, “o

que não pode ser diferente em sentença na área eleitoral”;

a Lei Complementar n. 64/1990 assegura, nos casos de inelegibilidades, o registro da candidatura e o diploma ao eleito, até o trânsito em julgado da decisão judicial: [...] “se alguém tiver o registro de sua candidatura impugnado, no momento próprio, poderá, através de recursos sucessivos, levar a questão, em certos casos, até o pronunciamento definitivo do Supremo Tribunal Federal, em virtude da regra do art. 15 da Lei Complementar n. 64/90. Já no caso de a representação estribar-se no art. 41-A, da Lei n. 9.504/97, alterado pela Lei n. 9.840/99, quando o processo começa, após o deferimento da candidatura, durante a campanha eleitoral, não se aplica o art. 15 da referida Lei Complementar”; “Ocorre que a inelegibilidade só pode ser tratada pela Constituição Federal e pela Lei Complementar (§ 9° do art. 14 da Constituição Federal: ‘A Lei Complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidades e os prazos de sua cessação...’). E o art. 41-A foi introduzido por lei ordinária”; [...] “persistem uma dúvida e uma grande preocupação: nas últimas eleições municipais os juízes eleitorais não aplicaram sumariamente o referido art. 41-A, talvez por ser novidade, introduzida no final do ano anterior. E agora, com a posição do TSE, poderão aplicá-lo, em nível de primeiro grau, deixando de lado as questões constitucionais do duplo grau de jurisdição e da ampla defesa? A matéria, sem essa cautela da introdução do parágrafo único ao art. 41-A, somente ficará suficientemente esclarecida depois de alguns casos concretos levados ‘a apreciação do Supremo Tribunal Federal. E quando houver a decisão do STF, a corrigir a anomalia jurídica, as eleições já terão acontecido, deixando inúmeras vítimas pelo caminho”; “O Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a interpretação que deu, executando ou mandando executar de imediato as decisões, nivelou por baixo todos os candidatos”;

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“Daí a necessidade do pronunciamento do Poder Legislativo, através desta proposta de lei, afastando a possibilidade de se ‘legislar via interpretação’”.

O que mais chama a atenção, salvo melhor juízo, é a preocupação

desmedida que o parlamentar deixa transparecer com relação à ação do

Judiciário Eleitoral. A conotação do texto é de autopreservação, reativa e não

proativa, quer sob a ótica do autor “potencial candidato” ou “legislador”. Suas

conclusões, utilizando-se de excertos de julgados do Tribunal Superior Eleitoral,

de igual modo, atendem a sua conveniência.

Preocupar-se com o fato de a Justiça Eleitoral legislar pela via da

interpretação?! Ora, se o Legislativo se sente ofendido pela suposta interferência

de outros Poderes – in casu, especificamente o Judiciário – no exercício de sua

atividade precípua – legislar –, o que dizer quanto ao exercício da função

jurisdicional, que é, em linhas gerais, fazer Direito no caso concreto? E o que

dizer do Legislativo que não legisla ou o faz em causa própria? O que dizer, para

não sair do Direito Eleitoral, da ação de impugnação de mandato eletivo, prevista

na Constituição de 1988 e até hoje não regulamentada, mas que vem sendo

francamente utilizada em virtude de sólida construção jurisprudencial? O que

dizer das medidas provisórias?

A preocupação é fruto de um desequilíbrio, pois se os Poderes são

autônomos e independentes – mas harmônicos –, o exercício do poder pressupõe

ação – não omissão –, preenchimento de espaço, e onde há omissão ou

incompetência, há espaço.

Outrossim, utilizar-se da tese da inconstitucionalidade, matéria pisada e

repisada nos Tribunais – e que por mais polêmica que seja, encontrará porto

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seguro com uma cabal e definitiva apreciação do Supremo Tribunal Federal –,

especialmente sob o manto das inelegibilidades, parecer demonstrar a pouca

importância atribuída às centenas de milhares de adesões colhidas na iniciativa

popular.

Por derradeiro, o projeto de lei altera a redação de dispositivos

repressivos a práticas deletérias no processo eletivo, sugestionando o

enquadramento constitucional, em tese não soluciona a inconstitucionalidade,

pois apenas modifica aspecto formal (procedimental). Em apertada síntese, o

projeto não trata do vício, ao contrário, alimenta instrumentos de postergação da

prestação jurisdicional; nada traz de novo, senão a pecha do retrocesso, pois não

inova e não soluciona.

2.4.2 O Projeto de Lei “Antonio Carlos Valadares”145

O Projeto de Lei do Senado – PLS n. 76, de 2003 –, do Sr. Antonio

Carlos Valadares, Senador da República do Partido Socialista Brasileiro de

Sergipe, propõe nova redação ao art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, nos seguintes

termos:

Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde a escolha do candidato na convenção partidária até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil UFIR, e cassação do registro ou diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990, sem prejuízo da sanção penal prevista no art. 299 da Lei n. 4.737, de 15 de junho de 1965. (NR). [sem grifo no original]

145 A íntegra do Projeto de Lei encontra-se publicada no Diário do Senado Federal de 25 de março de 2003, p. 4.573-4.575.

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Notícias veiculadas por meios não-confiáveis – internet e correio

eletrônico – davam conta de que a proposta em comento retiraria da lei eleitoral a

punição pela compra de voto. Mais que isso: estaria sendo proposta a revogação

do art. 41-A.

Não é o que se vê da transcrição acima.

Por outro lado, há diferenças entre a redação vigente e a proposta, as

quais encontram-se acima destacadas, e às quais se buscará a justificativa no

próprio projeto de lei, que de forma objetiva vem vazado nos seguintes termos:

“O presente Projeto objetiva tornar eficaz o dispositivo legal”; “A razão dessa mudança decorre do fato de que alguns candidatos de fato, ainda não registrados, efetivam a malfadada compra de votos, pois entre a escolha em convenção partidária e o dia do registro da candidatura (5 de julho do ano que acontece eleição) há um lapso temporal lacunoso que acoberta o ilícito”; [...] “acrescentou-se também que a denominada compra de voto prevista no art. 41-A da Lei Eleitoral não afastará a hipótese do art. 299 do Código Eleitoral, que estabelece sanção penal, enquanto que aquele dispositivo abarca somente sanções administrativas e políticas”.

Não há novidades e é interessante tornar o dispositivo ainda mais

efetivo.

Veja-se item a item. Com relação ao primeiro ponto de reforma, cuida-

se de crítica devidamente registrada na doutrina, sendo que a Justiça Eleitoral

observa rigidamente os termos inicial e final da prática delituosa. Acrescer ao

período original o lapso temporal compreendido da escolha em convenção ao

pedido de registro da candidatura atende à premissa da maior efetividade da

norma. O segundo ponto, ao seu turno, apenas materializou efeito que a

jurisprudência, a doutrina, e a hermenêutica já consideravam: o mesmo ato

delituoso gera mais de uma conseqüência, dentre elas a penal (art. 299 do

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Código Eleitoral), responsabilidade apurada em processo próprio e desvinculado

do 41-A.

Concluída a apresentação do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 – seu

histórico, suas características construtivas, sua perspectiva e os projetos de lei

que tramitam no Congresso Nacional – parte-se para outro desafio, que é a

abordagem operacional da captação ilícita de sufrágio dentro do abuso do poder

econômico nas eleições, vindo a constituir o último e mais extenso capítulo desta

Dissertação, em face da dissecação dos aspectos processuais envolvidos na sua

aplicação.

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3 O ART. 41-A E O ABUSO DO PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES

As matérias constantes deste trabalho talvez pareçam – na realidade

não parecem, efetivamente são! – repetitivas. Nada obstante, essa repetição, que

para uns pode parecer vício, consolida a complexidade do tema, por menos

abrangente que se afigure. Reitera-se, a complexidade está exatamente na

semelhança – praticamente na identidade – de assuntos diferentes; e a repetição

destina-se a firmar essas diferenças para a sua correta compreensão.

Em 2001, praticamente em seguida ao nascimento da Lei n.

9.840/1999 – ou melhor, após a primeira eleição sob a égide do art. 41-A –, o

Tribunal Superior Eleitoral buscava estabelecer parâmetros diferenciais para

clarear as diversas situações jurídicas e fáticas a comportar a aplicação do

procedimento da Lei Complementar n. 64/1990 na apuração da captação ilícita de

sufrágio. E isto não envolvia exclusivamente processo e procedimento, mas o

balizamento de situações materiais que se enquadrassem e clareassem o efetivo

conteúdo na norma: de um lado, a representação por abuso do poder econômico;

de outro, a captação ilícita de sufrágio; de um lado, a exigência do trânsito em

julgado para o cumprimento da decisão; de outro, a execução imediata; de um

lado, abuso do poder econômico, corrupção e/ou fraude; do outro, a compra de

voto (corrupção eleitoral); de um lado, a inelegibilidade; de outro, a cassação do

registro de candidatura ou do diploma, e multa; de um lado, o bem jurídico

“resultado da eleição; de outro, “a vontade do eleitor”. E mais, a “demonstração

diabolicamente impossível do chamado nexo de causalidade entre uma prática

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abusiva e o resultado das eleições”146, a potencialidade de influência no resultado

da eleição, a necessidade de prova cabal do ato abusivo ou da captação vedada.

Fala-se, pois de uma realidade em construção, um arcabouço em

evolução, valendo a lembrança de Targino147, de que o ordenamento jurídico

brasileiro estabelece os princípios que devem nortear as eleições: [...] “a proteção

da probidade administrativa; a moralidade para o exercício do mandato,

considerada a vida pregressa do candidato; e a normalidade e legitimidade das

eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de

função, cargo ou emprego na administração pública (CF, no parágrafo 9º do art.

14) e o ‘interesse público de lisura eleitoral’” (LC 64/90, art. 23).

Há, também, voto prolatado pelo Min. Fernando Neves, constante do

Acórdão TSE n. 970/2001, e o Acórdão TSE n. 19.553/2002, da lavra do Min.

Sepúlveda Pertence, que contextualizam com precisão – vindo a servir de

paradigma para o aperfeiçoamento desses instrumentos – o abuso do poder

econômico e a captação ilícita de sufrágio. Extrai-se do primeiro:

Este dispositivo – o art. 41-A – trata da cassação de registro de candidatura ou do diploma e foi acrescido à lei eleitoral pela Lei n. 9.840, de 28.9.99, razão pela qual teve incidência somente no pleito de 2000. Desse modo, pouquíssimas vezes esta Corte teve oportunidade de analisar a matéria, não o tendo feito, pelo que pude apurar, sobre a questão relativa à aplicação do art. 15 da LC n. 64/90. [...] 148 Vê-se que aqui se cuida da apuração e punição de conduta delituosa de quem já havia se apresentado à Justiça Eleitoral como candidato, diferentemente do que ocorre nos processos de registro, em que se discutem condições de elegibilidade ou causas de inelegibilidade.

146 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 19.553. Recurso especial eleitoral. Recorrente: João Petrus Filho e outro. Recorrido: Aurino Vieira Nogueira e outros. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Brasília, 21 de março de 2002. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudência/index.jsp>. Acesso em: 4 mar.2005. 147 TARGINO, Harisson Alexandre. Captação ilegal de sufrágio: art. 41-A da Lei das Eleições. Revista de Julgados, Paraíba, v. único, n. 7, p. 13-34, 2003. 148 No acórdão, transcrição do art. 41-A.

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E, do segundo aresto mencionado:

[...] É certo bastar a potencialidade de influência no resultado do pleito para a procedência da investigação judicial: a verificação dessa probabilidade, no entanto, pressupõe prova cabal de existência de fatos abusivos ou de captação ilícita de sufrágios delatados. [...] Registro, é certo, que a jurisprudência da Corte é firme no sentido de que em se tratando de abuso de poder econômico, além de ser necessária a prova cabal de sua existência, basta a potencialidade ou a probabilidade de que tenha tais fatos para influir no resultado das eleições [...] Mas o pressuposto da verificação dessa potencialidade é o acertamento da existência dos fatos abusivos, fundado em prova conclusiva. [...] embora inviável a condenação por violação da LC 64/90, art. 22, e L. 9.504/97, art. 41-A, constam dos autos indícios da configuração, em tese, do crime de corrupção (C.El., art. 299) – pela oferta de dinheiro e outras vantagens para a obtenção de votos – a serem apurados pela via processual adequada [...] [...] O forte do recurso é a invocação de nossa jurisprudência no sentido de bastar a potencialidade, e não o que eu tenho chamado da demonstração diabolicamente impossível do chamado nexo de causalidade entre uma prática abusiva e o resultado das eleições.149

As duas transcrições acima sintetizam com precisão o tema em

comento. Mesmo assim, é possível acrescer outro aspecto importante, qual seja,

o estabelecimento do bem jurídico protegido150, que no abuso do poder

econômico são as eleições; e na captação vedada de sufrágio, a vontade do

eleitor. “Minha preocupação era só essa, porque, no art. 41-A, o bem protegido

não é o resultado da eleição. O bem protegido pelo art. 41-A é a vontade do

eleitor. Então, há um bem protegido distinto, o que não autoriza, com isso, falar-se

em potencialidade”.151

149 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.553, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, 2002. 150 “O princípio do bem jurídico, refletido por diversas normas constitucionais (art. 5°, caput, 6°, 14, 144, 170 e segs.), deve integrar todo o sistema penal moderno, afeiçoado às exigências de um Estado Democrático de Direito, e compor o vasto repertório de fatos ilícitos” (DOTTI, 1996, p. 299). 151 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.553, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, 2002. Ver, também, BRASIL, Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 1.282. Agravo regimental. Medida Cautelar. Ação de impugnação de mandato eletivo – AIME. Abuso de poder. Ação de investigação judicial eleitoral. – AIJE. Captação ilícita de sufrágios (Lei n. 9.504/97, art. 41-A) Agravante: Maria Vanúsia de Oliveira Sousa e outro. Agravado: Diretório Municipal do Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB. Relator: Ministro Barros Monteiro. Brasília, 05 de agosto de 2003. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/index.jsp.> Acesso em: 9 jun.2005.

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Em complemento, digna de nota a iniciativa da Justiça Eleitoral, por

ocasião do VI Encontro do Colégio de Corregedores da Justiça Eleitoral, realizado

em maio de 2002, oportunidade em que foi apresentado trabalho dirigido àquele

pleito – Eleições Gerais de 2002 –, abordando a “Ação de Investigação Judicial e

o Art. 41-A da Lei n. 9.504. de 1997”152. Esse trabalho, de valor histórico e

operacional, serviu de diretriz e, a partir de então, adotado pela Justiça Eleitoral,

auxiliou uniformização da prestação jurisdicional, o que não significa ser

documento fechado, com procedimentos e orientações rígidos. Ademais: sendo

os processos político e eleitoral muito dinâmicos, tal marca caracteriza,

igualmente, essa Justiça Especializada – razão pela qual a rigidez deve ser muito

bem avaliada.

Como fechamento destes prolegômenos – o que serve a toda a

exposição precedente e servirá àquela que se seguirá – captação ilícita de

sufrágio e abuso do poder econômico nas eleições são coisas distintas, distinção

apresentada pelo Tribunal Superior Eleitoral, nos seguintes termos:

[...] a captação ilícita de sufrágio, tipificada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, configura-se por conduta isolada daquele que venha a doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, e visa resguardar a vontade do eleitor [...] O abuso do poder econômico, por sua vez, se caracteriza pela “utilização do poder econômico com a intenção de desequilibrar a disputa eleitora, o que ocorre de modo irregular, oculto ou dissimulado”, e exige potencialidade tendente a afetar o resultado de todo o pleito [...]153

152 O trabalho, de autoria do Des. Antônio Hélio Silva, Corregedor Regional Eleitoral de Minas Gerais, não possui catalogação bibliográfica, mas integra documento referente ao Conclave. Nada obstante, em vista do contorno operacional do texto, encontram-se nesta dissertação, como anexos 2 e 3 (quadros sinóticos), um referente á “Representação com fulcro no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997” e, outro, “Da ação de investigação judicial eleitoral com fulcro no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990”. 153 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 21.312.Agravo regimental no recurso especial eleitoral. Cassação de diploma de prefeito e vice-prefeito e declaração de inelegibilidade. Agravante: Ministério Público Eleitoral. Agravada: Olívia Miranda Souza e outra. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, DF, 02 dezembro de 2003. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/ jurisprudencia/index.jsp> Acesso em: 20 mar.2005.

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Isso posto, não é possível dissociar a conduta tipificada no art. 41-A da

Lei n. 9.504/1997 do abuso do poder econômico. É que o investimento de

recursos vultosos e ilícitos, a ponto de comprometer o resultado da eleição, pode

vir materializado de inúmeras maneiras, não apenas por meio de recursos

financeiros, bastando recordar as condutas vedadas no art. 73 da Lei n.

9.504/1997, que também podem deflagrar o abuso, tanto do poder econômico

como do poder político. Outro exemplo, didático – no limite de refletir a nossa crua

realidade social – é a distribuição de cestas básicas, consultas médicas,

dentaduras, óculos, remédios, material de construção, emprego etc. Benefício ou

vantagem em troca de voto é corrupção, e a mesma prática pode caracterizar

tanto o abuso quanto a captação ilícita de sufrágio, bem como crime-eleitoral.

Não é o volume de recursos despendidos que caracterizará o abuso.

Este é caracterizado pela aplicação de recursos ilícitos, que comprometam a

premissa do tratamento igualitário entre concorrentes, igualdade medida na

utilização de recursos captados e executados na forma da lei – e não no

montante.

Nessa esteira, se de um lado a captação ilícita de sufrágio exige três

elementos indispensáveis – [...] “(1) a prática de uma ação (doar, prometer, etc.),

(2) a existência de uma pessoa física (um eleitor focado na intenção ou ato

praticado) e (3) o resultado a que se propõe o agente, que é a obtenção de

voto”154 –, por outro lado155, para a [...] “caracterização do abuso do poder

econômico não é necessário que a conduta se tipifique penalmente. O abuso do

poder econômico não pressupõe, portanto, que o fato se constitua crime. Se a

mesma conduta se amoldar a uma figura penal, na seara penal deverá ser

154 Exige, ainda, com base na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a prática, a participação ou a anuência expressa do candidato na conduta ilícita, nos termos do Acórdão TSE n. 19.877/2004, rel. Min. Carlos Velloso (ver, no mesmo sentido, BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 19.176. Recurso especial eleitoral. Cassação de registro de candidatura L. 9504/97, art. 41-A. Recorrente: Rubens Pimentel Filho. Recorrido: Primo Bitti e outro. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Brasília, 16 de outubro de 2001. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/index.jsp> e BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 19.566. Recurso especial. Inelegibilidade. Arts. 22 da LC n. 64/90 e 41-A da lei n. 9.504/97. Recorrentes: Adelino Carvalho Lino e outra. e Adão Pereira Santos e outro. Rel. Min. Sepúlveda Pertence e Sálvio de Figueiredo. Brasília, 18 de dezembro de 2001. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/index.jsp>Acesso em: 3 abr.2005, respectivamente). 155 Considerando que a norma contida no art. 22 da LC n. 64/1990 busca impedir que o poder econômico seja utilizado por candidato em detrimento da liberdade do voto, preservando os princípios da moralidade e da igualdade a que têm direitos os postulantes a cargo eletivo na corrida eleitoral.

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apreciada a questão, sem prejuízo da apuração do abuso do poder econômico em

sede de investigação judicial eleitoral. Inteligência dos incisos XIV e XV do art. 22

da LC 64/90”156. Em complemento, recorde-se que a [...] “norma censuradora do

abuso visa a garantir a normalidade das eleições com o fim de tutelar os

princípios da moralidade e da isonomia que devem reger o processo eleitoral.157

Apenas para registrar, ante a importância do posicionamento (firmado

nos idos de 2001), merece nota a admissão do desmembramento das sanções do

41-A, num procedimento misto de abuso e captação ilícita, importando a

aplicação de multa dissociada da perda do registro ou do diploma.158

3.1 Caracterização da Conduta

Tratar da caracterização da conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 não parece ser a situação mais inusitada e, por via de conseqüência,

nem a mais complexa. A verdade é que o 41-A torna-se complexo na sua

inteireza, complexo por não ser só, nem isolado, mas parte de um todo

concentrado no abuso do poder econômico em eleições.

156 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 17.045. Recurso - Investigação judicial. Recorrentes: Epitácio Bittencourt Sobrinho e Partido da Frente Liberal – PFL de Imaruí. Recorridos: Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, Partido Democrático Trabalhista – PDT, Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB e Partido Trabalhista Brasileiro – PTB de Imaruí. Rel. Juiz Otávio Roberto Pamplona. Florianópolis, Disponível em: <http//www.tre-sc.gov.br/acordaos.htm> Acesso em: 5 mar.2005. 157 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 17.082. Recurso. Investigação judicial eleitoral. Art. 41-A da Lei 9.504/97. Afastamento de sua aplicação. Recorrentes: Antonio Zamignan e Silvano de Pariz. Relator: Juiz Rui Francisco Barreiros Fortes. Florianópolis, 4 de outubro de 2001. Disponível em: <http//www.tre-sc.gov.br/legisjurisp/> Acesso em: 4 abr.2005. 158 “A sanção da inelegibilidade se circunscreve às hipóteses previstas no procedimento judicial do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, em que se configura o abuso do poder econômico ou político. [...] Não demonstrada a efetiva prática de atos que impliquem abuso do poder econômico ou político, mas persistindo condutas isoladas, que não possuem, contudo, potencialidade de interferir diretamente no resultado das eleições, devem ser essas apenadas mediante cominação de multa pecuniária” (SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 16.968, Relator: Oswaldo José Pedreira Horn, 2001.). O assunto será novamente abordado, haja vista que na doutrina também há quem admita essa posição.

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Adotado pela clareza e simplicidade, merece registro o voto do Min

Sepúlveda Pertence no Acórdão TSE n. 19.176/2001, onde resta consignado que,

para a caracterização da captação ilícita de sufrágio, é indispensável a prática de

uma ação (doar, prometer etc.); a existência de uma pessoa física (um eleitor

focado na intenção ou ato praticado); e o resultado a que se propõe o agente, que

a obtenção do voto. E, mais, segundo orientação do Tribunal Superior Eleitoral,

exige a prática, a participação ou a anuência expressa do candidato na conduta

ilícita.159

A ação “captação ilícita de sufrágio” exige prova robusta e

incontroversa de sua prática, e deve estar centrada na obtenção de voto em troca

de algo (um benefício!). Nesse sentido o Acórdão TRESC n. 19.848/2005160, do

qual se transcrevem os seguintes excertos:

Para a configuração de captação de sufrágio, abuso do poder econômico e de autoridade para os fins do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, exige-se prova robusta e incontroversa da sua prática. [...] Do dispositivo em análise, constata-se que a doação, promessa, entrega de bem ou vantagem pessoal ao eleitor deve ter sempre a intenção específica de obter-lhe o voto, significando que o sujeito ativo da infração só poderá ser candidato.161

159 Ver BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 19.566. Recurso especial. Inelegibilidade. Arts. 22 da LC 64/90 e 41-A da Lei n. 9.504/97. Recorrentes: Adelino Carvalho Lino e outra e Adão Pereira Santos e outro. Relator: Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Brasília, 18 de dezembro de 2002. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/index.jsp.> e BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 19.877. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo e Min. Carlos Velloso. 160 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 19.848. Recurso. Investigação judicial eleitoral. Lei Complementar n. 64/1990. Captação de sufrágio. Suposta violação do art. 41-A. Abuso do poder econômico e de autoridade. Ausência de provas. Não configuração. Recorrentes: Coligação A Força do Povo de Lebon Régis (PPS/PMDB/PTB/PT) Recorridos: Milton Sebastião de Melo; Milton Ribeiro da Silva. Relator: Juiz Rodrigo Roberto da Silva, 2005. Florianópolis, 10 de fevereiro de 2005. Disponível em: <http://arvoredo.tre-sc.gov.br/legjurisp/acordaos.htm> Acesso em: 5 jan.2005. 161 A conclusão desse segundo excerto possui outra dimensão, como se verá em seguida.

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Rodrigo López Zilió162, numa visão crítica fundada especialmente em

Joel José Cândido e Adriano Soares da Costa, ao tratar dos elementos

caracterizadores da captação ilícita de sufrágio conclui:

[...] para a procedência do pedido é necessária a prova da autoria, participação (direta ou indireta) ou anuência do candidato, com a entrega da vantagem especificada na norma a algum(ns) eleitor(es) determinado(s), além da prova do elemento subjetivo (fim de obter o voto). Fundamental, pois, que o eleitor, a quem a captação ilícita foi dirigida, seja determinado ou determinável, à semelhança do exigido para a configuração do crime do art. 299 do Código Eleitoral. Distingue-se, no ponto, com tal exigência, a figura prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 do abuso do poder político ou do abuso do poder econômico (art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990).

Há, ainda, questão de ordem prática passível de aplicação da regra

geral, mas, que, no caso concreto, pode comportar juízo diverso: são as hipóteses

de “pedido específico” e “pedido genérico” – o primeiro, caracterizador da

captação ilícita de sufrágio, e, o segundo, como regra, não!

O que é um “pedido específico” e o que é um “pedido genérico”?

[...] Se algum candidato distribui cestas de alimentos para várias pessoas, em um caminhão com vários adesivos e cartazes com o seu nome e foto pregados no veículo, sem que peça explicitamente votos para si, estará praticando captação ilícita de sufrágio? Da mesma forma, se um outro candidato é flagrado distribuindo tijolos e sacos de cimento para uma comunicada carente, sem que esteja pedindo votos, haverá captação de sufrágio? Nessas hipóteses, e em outras símiles, o pedido de votos decorre do gesto filantrópico, todavia não se enquadraria no pedido explícito exigido pelo TSE: seria um pedido genérico de votos, e como tal poderia configurar abuso de poder, mas não se qualificaria como captação ilícita de sufrágio, não incidindo o art. 41-A da Lei n. 9.504/97.163

162 Extraído do artigo “Do terceiro não-candidato e da aplicação das sanções pela captação ilícita de sufrágio”, publicado na Revista de Jurisprudência do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Ver <http://www.tre-sc.gov.br/sj/cjd/doutrinas/rodrigo.html>. Acesso em: 20 mar.2005. 163 COSTA, Adriano Soares da. Captação de sufrágio: novas reflexões em decalque, p 19-20.

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De fato, o intuito não é responder à questão, mas alertar à existência

dessa característica que, no caso concreto, certamente levará os Juízos Eleitorais

a dar maior ou menor elasticidade à norma, até porque o tipo é formal e se

consuma com a promessa: havendo agente ativo e destinatário identificável,

materializado o delito.

E é a partir dessas afirmações que se buscará trazer à colação outras

situações – atos ou fatos – caracterizadores da captação ilegal de voto, como

segue:

[...] O art. 41-A da Lei n. 9.504/97 só tipifica a captação ilícita de votos entre candidatos e eleitor, não a configurando a vantagem dada ou prometida por um candidato a outro, visando a obter-lhe a desistência;164 [...] Para a configuração do ilícito inscrito no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, acrescentado pela Lei n. 9.840/99, não é necessária a aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral;165 [...] para que ocorra a violação da norma do art. 41-A, não se torna necessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo próprio candidato. É suficiente que, sendo evidente o benefício, do ato haja participado de qualquer forma o candidato ou com ele consentido [...]”166. Ainda, resta [...] “caracterizada a captação de sufrágio prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, quando o candidato praticar, participar ou mesmo anuir explicitamente às condutas abusivas e ilícitas capituladas naquele artigo;167 Para a configuração da infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 não é necessária a identificação do eleitor;168 [...] Oferta feita a membros da comunidade. A pluralidade não desfigura a prática da ilicitude”169. “Apanhados os fatos tais como descritos pela decisão recorrida, resta configurada a infração prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, uma vez evidenciado que

164 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.399, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, 2001. 165 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. 166 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. 167 BRASIL.Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.566, Relator: Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 2001. 168 BRASIL.Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.120, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2003. 169 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.120, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2003.

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a candidata ofereceu ou prometeu dinheiro a determinado grupo de eleitores em troca de voto;170 [...] Para a configuração do ilícito previsto no art. 22 da LC n. 64/90, as condutas vedadas podem ter sido praticadas antes ou após o registro da candidatura. [...] Quanto à aferição do ilícito previsto no art. 41-A, esta Corte já decidiu que o termo inicial é o pedido do registro da candidatura;171 e A caracterização da conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97 requer que a promessa ou entrega da benesse seja acompanhada de expresso pedido de voto.172

3.1.1 Participação Direta e/ou Indireta do Candidato

A participação direta do candidato – se compreendida a ação

“participação direta” como a prática do ato pelo candidato pessoalmente – é

desnecessária. A exegese da norma evoluiu, abandonando a literalidade, ante a

exigência de prova robusta da participação do candidato na captação ilícita de

voto. Hodiernamente, e de forma mais elástica, considera-se suficiente a ciência e

a anuência do candidato sobre a conduta ilegal praticada em seu favor, ou, em

outras palavras, que haja uma adesão, uma concordância consciente e voluntária

do candidato. Já em 2001 o Tribunal Superior Eleitoral sentenciou:

[...] tem-se por caracterizada a captação de sufrágios com a participação do candidato ou mesmo por sua explícita anuência às práticas ilícitas capituladas naquele artigo. Não fosse isso, em face da costumeira criatividade dos candidatos e dos seus colaboradores, correr-se-ia o risco de tornar inócua a citada norma, mantendo impunes e até mesmo estimulando os candidatos na prática de abusos e ilícitos que a sociedade,

170 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. 171 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.566, Relator: Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 2001. No mesmo sentido: Acórdão TSE n. 19.229, Rel. Min. Fernando Neves, 2001. 172 BRASIL.Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 772. Recurso ordinário. Cerceamento de defesa. Captação ilícita de sufrágio. Provas robustas. Recorrente: Flávio dos Santos Chaves. Recorrida: Procuradoria Regional Eleitoral em Roraima. Relator: Min. Humberto Gomes de Barros. Brasília, 29 de junho de 2004. <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/index.jsp.> Acesso em: 20 abr.2005.

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notadamente a mais próxima dos fatos, repudia com justificada veemência.173

De clareza solar e abrangência ímpar o voto vencido do Min. Celso de

Mello, no Acórdão TSE n. 21.264/2004, in verbis:

O reconhecimento desse ilícito e a imposição das conseqüências jurídicas dele resultantes, não obstante analisadas fora de sua dimensão estritamente penal (pois não se cuida, na espécie, de procedimento de índole criminal), não dispensam, para efeito de configuração da conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97, a existência de prova que permita constatar, além de qualquer dúvida razoável, a efetiva participação, direta ou indireta, material ou intelectual, do candidato, nos atos legalmente vedados de captação de sufrágio, em ordem a permitir, no plano da relação de causalidade, que se lhe impute, tanto objetiva quanto subjetivamente, qualquer dos comportamentos de transgressão ao preceito legal em análise. Isso significa, portanto, que, sem a intervenção pessoal do próprio candidato (incidindo em qualquer dos comportamentos abusivos legalmente proibidos) ou, ao menos, sem a sua consciente e voluntária adesão a um projeto concebido por terceira pessoa e que, por esta implementado, culmine por transgredir a norma vedatória inscrita no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, não há como reconhecer configurada a infração eleitoral em causa, sob pena de o candidato – cuja aquiescência e adesão a uma proposta ilícita jamais podem ser presumidas – vir a ser responsabilizado por fato imputável a outrem. [...] Se não houver prova inequívoca de que o candidato, pessoalmente ou por intermédio de terceiros, por ele expressamente autorizados para tal fim, tenha participado, voluntária e conscientemente, dos fatos definidos no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, solicitando voto ao eleitor em troca de indevida vantagem, não há como se ter por configurado o ilícito eleitoral da captação de sufrágio.174

Resta, contudo – já que admitida a participação de terceiro mediante a

anuência do interessado –, a questão da penalidade, uma vez que o art. 41-A da

Lei n. 9.504/1997 pune apenas o candidato.

173 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.566, Relator: Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 2001. 174 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. Voto vencido do Min. Celso de Mello.

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Salvo melhor juízo, justa, pois, a indignação daqueles que defendem a

possibilidade de punir outro agente ativo que não seja o candidato, tese muito

bem exposta por López Zilió no artigo já referido, do qual se extrai o seguinte

excerto:

Ora, ao se admitir – além da participação direta – a forma indireta de participação do candidato na conduta reprovável, estar-se-á admitindo, de modo implícito, que a conduta principal foi praticada por outrem. E, em sendo punível a participação indireta do candidato, é de ser admitida, também como punível, a conduta do agente principal que não é candidato. Implausível, raciocínio diverso. No julgado mencionado, foi punido o candidato que somente anuiu explicitamente à conduta vedada de terceiro. No entanto, para que o candidato seja punido – e no caso concreto o foi –, é necessário, como um antecedente lógico, que o praticante da conduta principal, à qual o candidato aderiu, também receba as sanções do mesmo artigo de lei. Somente essa interpretação pode manter uma coerência lógica sobre o tema, de modo a não subverter o sistema jurídico. Não se trata, aqui, de dar uma interpretação extensiva a normas proibitivas ou sancionatárias; trata-se, apenas, de – por uma interpretação sistemática – restabelecer critérios de logicidade e de preservar conceitos básicos e norteadores do direito de punir do Estado na seara extrapenal.

O entendimento de López Zilió não é isolado. Marco Antônio Souto

Maior Filho175 tem opinião idêntica, e assim se pronunciou:

Outro desvirtuamento foi a exclusão da responsabilidade de outros correligionários das sanções pela prática do delito de captação irregular do sufrágio, que após a subtração da expressão “ou alguém por ele”, ficou restrito à aplicação ao candidato a responsabilidade pela captação, ou seja, só ele é que poderá ser punido.

Essa tese é mais do que defensável, é justa. Contudo, exatamente por

imiscuir-se em sanções político-administrativas, efetivamente não é lícito estender

a punição – a punibilidade. Por outro lado, a mesma conduta pode e dever ser

175 MAIOR FILHO, Marcos Souto. O Art. 41-A da Lei 9.504/97 à luz da interpretação do TSE. Dataveni@, São Paulo, n. 82, abril 2005. Disponível em: http://www.datavenia.net/artigos/art41dalei9504_97aluzdainterpretacaodotse.htm#_ftn1> Acesso em: 5 mai.2005.

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coibida e/ou penalizada pela via criminal – corrupção eleitoral do art. 299 do

Código Eleitoral –, essa sim, aberta à denúncia e processamento do agente. O

próprio autor – López Zílio – admite mais adiante tal situação – mas a utiliza para

manter sua posição pela punibilidade: “A partir do acréscimo do art. 41-A ao corpo

da Lei n. 9.504/1997, portanto, um mesmo e único fato jurídico pode ter reflexos

em searas diversas. Aquele que captar ilicitamente sufrágio, hodiernamente,

sofrerá além das reprimendas penais cabíveis, as sanções previstas no art. 41-

A”176.

Reitera-se: para o mesmo fato, mais de uma reprimenda, cada qual

processada segundo o rito próprio – e, no caso de terceiro, não há previsão legal

para que seja assimilado pela norma do 41-A.

3.1.2 Dolo Específico

A ação delituosa deve sempre estar focada na obtenção do voto,

cabendo reprisar que no próprio art. 41-A consta que a doação, promessa,

entrega de bem ou vantagem pessoal ao eleitor deve ter sempre a intenção

específica de obter-lhe o voto, significando que o sujeito ativo da infração só

poderá ser candidato177, agindo pessoalmente ou por meio da ação de terceiro,

com seu conhecimento e/ou anuência.

Essa posição – de exigir dolo específico (conduta voltada à obtenção

do voto do eleitor) – está absorvida no objeto do art. 41-A, para o qual [...] “não se

investiga potencialidade, ou seja, se a compra de voto tinha condições de influir

176 ZILIÓ, Rodrigo López. Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, v. 9, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004. 177 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 19.848, Relator: Juiz Rodrigo Roberto da Silva, 2005.

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no resultado do pleito. Como por diversas vezes declarado por este e outros

tribunais eleitorais, o bem jurídico protegido não é o resultado da eleição, mas,

sim, a livre formação da vontade do eleitor”178. Vale lembrar, em outras palavras:

“Para a configuração do ilícito previsto no referido art. 41-A, não é necessária a

aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral, porquanto a

proibição de captação de sufrágio visa resguardar a livre vontade do eleitor e não

a normalidade e equilíbrio do pleito”.179

3.1.3 Aspectos Práticos na Jurisprudência

Afinal, na prática, o que caracteriza e o que não caracteriza a captação

ilícita de sufrágio?

Outra pergunta singela, mas importante... Singela porque a norma não

traz, em si, nenhuma novidade, pois o art. 299 do Código Eleitoral, com a

variação da pena e o envolvimento do corrompido, traz situação análoga;

importante em virtude dos diversos caminhos permitidos para atacar as condutas

que desabonam o processo eleitoral, todos vinculados a juízos de valor formados

em critérios materiais, mas ligados umbilicalmente ao livre convencimento do Juiz,

valendo o contido no art. 23 da Lei Complementar n. 64/1990180 ou no art. 5º da

Lei de Introdução do Código Civil.

178 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, rel. Min. Carlos Velloso, 2004. Voto vencido do Min. Fernando Neves. No mesmo sentido: Resolução TSE n. 20.531/999, rel. Min. Maurício Correa; e Acórdão TSE n. 19.229/2001, rel. Min. Fernando Neves. 179 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.248, Relator: Min. Fernando Neves, 2003. 180 Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

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O art. 41-A, reitera-se, [...] “trouxe para a Justiça Eleitoral um

instrumento forte e eficaz, que por isso mesmo tem que ser cuidadosamente

aplicado, o que não é tarefa simples, pois a caracterização do tipo e seus

requisitos envolvem a análise de fatos e provas, muitas vezes confusas e

contraditórias, sempre dependentes da avaliação subjetiva de cada julgador”. 181

Enfim, o que caracteriza e o que não caracteriza captação ilícita de

sufrágio?

3.1.3.1 Caracterização da Captação Vedada de Sufrágio

Dentro deste subtítulo são trazidos precedentes jurisprudeciais de

situações caracterizadoras da compra de votos na forma do art. 41-A da Lei n.

9.504/1997, como seguem.182

Representação com base no art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Emissão de bilhetes autorizando DISTRIBUIÇÃO DE ALIMENTOS. Captação ilícita de votos. Conjunto probatório concludente. Confissão da representada quanto à autoria dos escritos. Robusta prova testemunhal quanto à sua motivação. Abuso do poder caracterizado. Confirmação da sentença;183 Para ser enquadrado no art. 41-A, da Lei n. 9.504/97 basta a oferta do candidato ao eleitor. E o candidato ofereceu SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS pelas ondas do rádio. Delito formal que não se vincula com o resultado;184 A oferta de SERVIÇOS MÉDICOS gratuitos a eleitores, por candidato, no período eleitoral, caracteriza a infração modelada no

181 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. Voto vencido do Min. Fernando Neves 182 Situações destacadas em maiúsculas para melhor caracterizar a prática. 183 BAHIA. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 420. Representação com base no art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Envio de bilhetes autorizando distribuição de alimentos. Recorrentes: Partido Trabalhista Brasileiro – PTB de Mortugaba. Recorridos: Antenor Souza e Helena Monteiro Carvalho. Relator: Juiz Eduardo Carvalho. Salvador, 8 de outubro de 2001. Diário da Justiça, 26 out.2002. p. 76. 184 CEARÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 12.295. Recurso. Captação de sufrágio. Recorrente: Ministério Público Eleitoral. Recorrido: João kennedy Carvalho Alexandrino. Relator: Des. José Mauri Moura Rocha. Fortaleza, 3 de abril de 2001. Diário da Justiça, Bahia, 26 out.2001. p. 76.

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art. 41-A da Lei 9.504/97, sujeitando o agente, quando não eleito, à pena de multa;185 Revelando-se consistentes e incontroversas as provas de prática eleitoreira, visando à captação de votos, mormente quanto à incitação de prática de INVASÃO DE TERRENO PÚBLICO, com o intuito de antecipar sua distribuição às famílias carentes, sem a observância dos dispositivos legais, tem-se por procedente a investigação judicial;186 Constitui captação de sufrágio a prestação gratuita de SERVIÇOS MÉDICOS por candidato médico, em residência particular, bem como a promessa de medicamentos gratuitos, com a entrega de material publicitário de campanha política;187 DISTRIBUIÇÃO DE PASSAGENS RODOVIÁRIAS, CESTAS-BÁSICAS, DINHEIRO E VALE COMBUSTÍVEL, mediante ajuda de assessores, em troca de voto [...] Tipificação prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97. [...] Provas robustas e incontestáveis a ensejar o decreto condenatório;188 Promessa de doação de casa e fechamento de empresa caso não eleitos. Pagamento de BÔNUS A EMPREGADOS. Conduta ilícita. Captação de sufrágio. Influência no resultado do pleito. Possibilidade de cassar o diploma por conduta ilícita tipificada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97;189

185 GOIÁS. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 1130112. Recurso eleitoral. Contratação de serviços médicos por candidato no período eleitoral, para atendimento de consultas gratuitas à população. Conduta que configura captação de sufrágio tipificado pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Recorrente: José Cosme de Freitas. Recorrido: Ministério Público Eleitoral. Relator: Juiz Sílvio Mesquita. Goiânia, 1º de outubro de 2001. Diário da Justiça, Goiânia, 19 out.2001. p. 67. 186 GOIÁS.Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 110.273, Relator: Juiz Gonçalo Teixeira e Silva, 2000. Recurso eleitoral. Investigação judicial. Improvimento. - Diário de Justiça, Goiânia, Tomo 1, 26 out.2000. Volume 13407, p. 68. 187 MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral Acórdão n. 3.775. Recurso eleitoral. Consultas médicas gratuitas e promessa de remédios. Captação de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Recorrente: Rui Barbosa. Recorrido: Coligação Novo Milênio, Novos rumos (PSDB, PSD, PFL e PPB). Relator: Juiz Carlos Alberto Pedrosa de Souza. Campo Grande, 6 de dezembro de 2000. Diário da Justiça, 5 dez.2000. 188 MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 3.884. Recurso eleitoral. Investigação judicial eleitoral. Agravos retidos. Conhecidos e improvidos. Recorrente: José Domingues Ramos. Recorrido: João Niero Friosi. Relator: Juiz Manoel Mendes Carli. Campo Grande, 30 de maio de 2001. Disponível em: < http://www.tre-ms.gov.br/ac2001/Ac3884.pdf > Acesso em: 5 fev.2005. 189 MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 3.891. Recurso. Representação. Promessa de doação de casa e fechamento de empresa caso não eleitos. Pagamentos de bônus a empregados. Recorrente: Alonso Honostório de Rezende e José Carlos Lopes. Recorrido: Ministério Público Eleitoral. Relatora: Juíza Janete Lima Miguel. Campo Grande, 11 de junho de 2001.Disponível em:<http://www.tre-ms.gov.br/ac2001/Ac3891.pdf Acesso em: 2 mar.2005.

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Doação de FARDAMENTO DE TIME DE FUTEBOL, realização de torneio e churrasco – Configuração do previsto no art. 41-A, Lei n. 9.504/97;190 O candidato a posto eletivo que distribui COMBUSTÍVEL visando à captação da vontade do eleitor sujeita-se às penas previstas no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997;191 e Promessa de continuação do PAGAMENTO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, em caso de eleição do candidato majoritário da coligação da representada. [...] Incide no que dispõe o art. 41-A, da Lei n. 9.504/97, a promessa de o eleitor continuar a receber o benefício social, caso o candidato da coligação da representada venha a ser eleito.192

3.1.3.2 Não-Caracterização da Captação Vedada de Sufrágio

Dentro deste subtítulo são trazidos precedentes jurisprudeciais de

situações em que a compra de votos, na forma do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997,

não restou caracterizada.193

[...] O art. 41-A da Lei n. 9.504/97 só tipifica a captação ilícita de votos entre CANDIDATOS E ELEITOR, não a configurando a vantagem dada ou prometida por um candidato a outro, visando a obter-lhe a desistência;194 ATOS PRATICADOS POR CABO ELEITORAL, SEM COMPROVAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DIRETA DO CANDIDATO beneficiado, não podem configurar o abuso do poder econômico e

190 PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 25.146. Vereador. Reeleição. Doação de fardamento de time de futebol, realização de torneio e churrasco – configuração do previsto no art. 41-A, Lei n. 9.504/97. Condenação à multa de 20.000 UFIR’S e inelegibilidade por três anos.Recorrente: Albino Szesz. Recorrido: Ailton Nunes da Silva. Relator: Des. Gil Trotta Telles. Curitiba, 23 de agosto de 2001. Diário da Justiça, Curitiba, 5 set.2001. 191 PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 25.087. O candidato a posto eletivo que distribui combustível visando a captação da vontade do eleitor sujeita-se às penas previstas no artigo 41-A da Lei n. 9.504/1997. Recorrente: Coligação Unidos por Jardim Alegre. Recorrido: Osmir Miguel Braga. Relator: Juiz Jaime Stivelberg. Curitiba, 28 de junho de 2001. Diário da Justiça, Curitiba, 31 jul.2001. 192 SÃO PAULO. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 138024. Exigência de candidato, no sentido de que o eleitor retire placa de adversário, sob ameaça de perda de benefício social. Recorrente: Zenaide Guimarães Alves. Recorrido: Ministério Público Eleitoral. rel. Juiz Souza Pires. São Paulo, 03 de outubro de 2000. Diário Oficial, São Paulo, 6 out.2000. 193 Situações destacadas em maiúsculas para melhor caracterizar a prática. 194 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.399, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, 2001.

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de autoridade para os fins do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, que, de outra parte, exige prova robusta e incontroversa da sua prática;195

[...] A EXPLANAÇÃO DE PLANO DE GOVERNO não caracteriza captação de sufrágio;196

Por sua vez, para caracterizar a captação ilegal de sufrágio, três elementos são indispensáveis, segundo consta do voto condutor do Ac. n. 19.176/2001, rel. Min. Sepúlveda Pertence: (1) a prática de uma ação (doar, prometer, etc.), (2) a existência de uma pessoa física (um eleitor focado na intenção ou ato praticado) e (3) o resultado a que se propõe o agente, que é a obtenção de voto. Exige, ainda, esta Corte, a prática, a participação ou a anuência expressa do candidato na conduta ilícita (Ac. n. 19.566/2001, rel. Min. Sálvio de Figueiredo). Adotando esse entendimento, este Tribunal, ao apreciar condutas como a promessa, em campanha eleitoral, de MANUTENÇÃO DE PROGRAMA DE BENEFÍCIOS (Ac. n. 2.790/2001, rel. Min. Fernando Neves) e o COMPROMISSO FORMAL DE ATENDIMENTO A REIVINDICAÇÕES DE REPRESENTANTES DE IGREJAS POR CANDIDATOS, caso eleitos (Ac. n. 19.176, rel. Min. Sepúlveda Pertence), não reconheceu a captação ilícita de voto, porque ausentes os elementos do tipo;197

Não havendo a prova inconteste de que o candidato exercia influência na DISTRIBUIÇÃO DO LEITE, a fim de obter dividendos políticos com tal conduta, deve ser julgada improcedente a Investigação Judicial;198

Promessa de DOAÇÃO DE SANTINHOS em troca de apoio a candidatura não caracteriza infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97, porque ausente o elemento eleitor;199

A prestação de serviços a produtores rurais, através de MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO PATRIMÔNIO PÚBLICO, feita mediante autorização legal de índole municipal e dentro da habitualidade dos serviços já prestados pelo Executivo Municipal,

195 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 19.829, Relator: Juiz Rodrigo Roberto da Silva, 2005. 196 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 4.168, Relator: Min. Francisco Peçanha Martins, 2003. 197 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.877, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. 198 MARANHÃO. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 3.657, Relator: Juiz Carlos Santana, 2000. 199 MINAS GERAIS. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 206. Recurso. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Atipicidade da conduta narrada na inicial. Rejeição de plano pelo magistrado a quo. Promessa de santinhos em troca de apoio a candidatura não caracteriza infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97, porque ausente o elemento eleitor. Relatora: Juíza Maria Luiza Mendonça. Belo Horizonte, 09 de março de 2001. Diário da Justiça, Belo Horizonte, 30 mar.2001.

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não caracteriza conduta atinente à tipicidade descrita no art. 41-A da Lei n. 9.504/97;200

Promessa de ISENÇÃO DA TAXA DE IPTU à população de baixa renda. [...] Compromisso social e político inseridos no plano de gestão do candidato. [...] Para a constituição da infringência do art. 41-A da Lei 9.504/97 a vantagem prometida deve ser de caráter pessoal, estabelecendo uma relação de cumplicidade;201

Utilização de SALÃO DE FESTAS E DA GRÁFICA da APAE em benefício de candidatos. Comprovado o devido pagamento do aluguel e serviço gráfico respectivos. [captação de sufrágio não caracterizada]. Oferecimento de FESTAS E DE CADEIRA DE RODAS, em troca de votos. Alegação que restou sem comprovação;202

Decisão que julgou improcedente Representação que visava cassação de registro de candidatura por infração ao art. 41-A, da Lei n. 9.504/97. Entrega de VALE-GASOLINA em troca de voto. [...] Havendo dúvida quanto ao caráter eleitoral da entrega do vale e dada a ausência de provas suficientes, nega-se provimento ao recurso;203

Reunião promovida por Associação de produtores de frutas, na qual participou outro candidato a Prefeito. Documento firmado, na oportunidade, por um dos candidatos, contendo PROMESSA DE REALIZAÇÕES, COMO PLATAFORMA DE REALIZAÇÕES do candidato. Não caracterização da conduta prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, porque a promessa não foi dirigida a determinado

200 MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 3.916. Ação de investigação judicial eleitoral. Execução de serviços pela municipalidade em propriedade particular de eleitor Parceria entre municípios e produtores rurais. Recorrente: Coligação Caarapó de Volta ao Progresso. Recorrido: Guaracy Boshilia. Relator: Juiz Antônio Rivaldo Menezes de Araújo. Campo Grande, 27 de agosto de 2001. Disponível em: http://www.tre-ms.gov.br/ac2001/Ac3916.pdf.> Acesso em: 5 abr.2005. 201 PARÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 16.537. Recurso eleitoral. Ordinário. Investigação judicial. Promessa de isenção da taxa de IPTU à população de baixa renda. Inexistência de nexo causal entre a promessa feita e a lisura das eleições e de pessoalidade da vantagem oferecida. Recorrente: Coligação “Nós moramos em Tucuruí”, por sua advogada, Dra. Ivana Maria Fonteles Cruz. Recorrido: Parsifal de Jesus Pontes, candidato ao cargo de Prefeito – Coligação “Sempre Confiando em Deus”, por seu advogado, Dr. Luiz Gonzaga de Almeida Peixoto. Relator: Juiz Ronaldo Marques Valle. Pará, 21 de novembro de 2000. Diário da Justiça, Pará, 27 de novembro 2000. 202 PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 25.295, Relator: Jaime Stivelberg, 2001. 203 PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 24.878. Decisão que julgou improcedente representação que visava cassação de registro de candidatura por infração ao art. 41-A, da Lei n. 9. 504/97. Entrega de “vale gasolina” em troca de voto. Recorrente: Coligação Flor da Serra para todos. Recorridos: Luiz Carlos Guimarães e Luci Rolim. Relator: Juiz Fredi Humphreys. Curitiba, 04 de dezembro de 2000. Diário da Justiça, Curitiba, 12 dez.2000.

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eleitor. Proposta dirigida genericamente, como qualquer promessa feita em palanque de comício;204

Distribuição de informativo com alegada veiculação de promessa de vantagem: CRIAÇÃO DE FACULDADE COMUNITÁRIA. [...] Incomprovado o dolo específico – qual seja, o de obter votos com o oferecimento da vantagem – caracterizador da infração eleitoral descrita no supra-referido dispositivo legal;205 Apreensão de CESTAS BÁSICAS [...] Não evidenciada, pela prova dos autos, a presença de dolo específico, necessário à configuração do tipo estabelecido no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, nega-se provimento ao recurso;206 e [...] CESTAS BÁSICAS com gêneros alimentícios - Falta de prova quanto à distribuição - Intenção não punível.207

3.2 Penalidades

O art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 é de clareza solar: a captação ilícita de

sufrágio será penalizada com a perda do registro da candidatura, ou do diploma, e

multa.

A condenação terá efeito imediato, ou seja, é desnecessário aguardar-

se o trânsito em julgado da decisão, incidindo a regra geral do Código Eleitoral

(art. 257): os recursos eleitorais não têm efeito suspensivo. O fato de a

representação do art. 41-A seguir o rito sumaríssimo da Lei Complementar n.

64/1990 não importa observar a regra do seu art. 15, dispositivo que versa sobre

204 PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 25.205. Inelegibilidade. Cassação de registro. Documento contendo promessa de realizações. Art. 41-A Lei n. 9. 504/97.Recorrentes: Sebastião Rogatti e José Nunes Araújo. Recorrido: Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB. Relator: Juiz Nilson Mizuta. Curitiba, 10 de setembro de 2001. Diário da Justiça, 27 set.2001. 205 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 19001001. Recurso. Representação. Investigação judicial eleitoral. Cassação de registro de candidatura. Distribuição de informativo com alegada veiculação de promessa de vantagem: criação de faculdade comunitária. Captação de sufrágio (Lei n. 9.504/97, art. 41-A). Recorrente: Coligação Vitória para Todos (PTB-PPB-PMDB). Recorrido: Évio Buenevides Maciel. Relator: Juiz Isaac Alster. Porto Alegre, 26 de abril de 2001. Diário de Justiça , Porto Alegre, 28 de maio de 2002. p. 50. 206 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 16.895, Relator: Juiz Rui Francisco Barreiros Fortes, 2001. 207 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 16.897, Relator: Juiz Rui Francisco Barreiros Fortes, 2001.

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o trânsito em julgado da decisão que declarar a inelegibilidade do candidato – ou

seja, tem aplicação e objeto diferentes do 41-A, que ataca a candidatura ou o

diploma, por corrupção eleitoral.208

Outro aspecto acerca das penalidades, consecutivamente citado, é

que, [...] “tendo sido expedido o diploma em favor da ora recorrida, a sanção

adequada à espécie é a cassação do mesmo diploma, independentemente da

interposição do recurso contra a expedição de diploma (art. 262 do Código

Eleitoral) ou da propositura da ação de impugnação de mandato eletivo (art. 14, §

10, da Lei Maior)”.209

Curioso o posicionamento do Tribunal Regional Eleitoral de Santa

Catarina, em voto da lavra do Juiz Oswaldo José Pedreira Horn, antes citado,

para quem, “Não demonstrada a efetiva prática de atos que impliquem em abuso

do poder econômico ou político, mas persistindo condutas isoladas, que não

possuem, contudo, potencialidade de interferir diretamente no resultado das

eleições, devem ser essas apenadas mediante cominação de multa

pecuniária”.210

208 Sobre o tema ver: voto do Min. Fernando Neves, constante do Acórdão TSE n. 970/2001, rel. Min. Waldemar Zveiter (transcrito anteriormente); e Acórdão TSE n. 21.248/2003, rel. Min. Fernando Neves. Ver, ainda, Rodrigo López ZILIÓ (Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, v. 9, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004). 209 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. 210 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 19.968. Recurso. Cancelamento de inscrição. Revisão de eleitores. Confirmação de vínculo. Recorrente: Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) de Ermo. Recorridos: Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) de Ermo, Ademir da Costa Mateus e Lídio Possamai Gregorini. Relator: Juiz Pedro Manoel Abreu. Florianópolis, 30 de maio de 2001. Disponível em: <http//www.tre-sc.gov. /legjurisp/> Acesso em: 4 jun.2005. Com conotação um pouco diversa, mas refletindo um novo aspecto da penalização dentro do 41-A, ver Rodrigo López ZILIÓ (Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, v. 9, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004), de quem se transcreve este excerto: “De outra parte, não há como cogitar da perda de objeto da representação por violação ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 caso o candidato não consiga se eleger, pois, nesta hipótese, a representação deverá ter o seu desfecho e, em havendo elementos suficientes para a procedência, será paliçada, então, apenas, a sanção pecuniária”.

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A bem da verdade, tal aplicação só é possível se, descaracterizada a

conduta do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990 – abuso do poder econômico

propriamente dito – remanesça a captação ilícita de sufrágio, esta comportando

pena pecuniária. Observe-se que o inciso XIV do art. 22 citado não faz referência

à pena pecuniária e, de outro lado, não se trata de conduta vedada processada

pelo rito da Lei n. 9.504/1990.211 212

Por fim, Acórdão TSE n. 19.644/2002213 serve de paradigma no tocante

às penalidades inerentes ao abuso do poder econômico e à captação ilícita de

sufrágio, razão pela qual é trazido à colação:

REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILEGAL DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL AFASTADA. INFRAÇÃO CONFIGURADA. IMEDIATA CASSAÇÃO DO DIPLOMA. – Segundo já teve ocasião de assentar esta Corte, a cassação do diploma por infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 não implica declaração de inelegibilidade. O escopo do legislador, nessa hipótese, é o de afastar imediatamente da disputa aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo captação de sufrágio vedada por lei. Inconstitucionalidade parcial da norma afastada. [...] Olivar Coneglian, em sua obra Lei das Eleições Comentada (2002, pág. 298), a propósito anota:

Assim, cometida a infração, instaura-se procedimento com o mesmo rito da investigação judicial eleitoral. No entanto, não se trata de investigação judicial eleitoral, ou seja, não se trata de processo que tenha por finalidade a decretação da inelegibilidade. A referência à Lei Complementar se faz apenas em relação ao rito para a infração do art. 41-A,ou seja, com o intuito de abreviar o tempo do processo escolheu-se um procedimento já existente dentro do arcabouço jurídico-eleitoral. Não se pode pensar que, com a menção à LC 64/90 também se aplicam as sanções dessa Lei Complementar. Não se aplicam.

211 Neste sentido o Acórdão TSE n. 19.877/2004, Rel. Min. Carlos Velloso. Precedentes: Acórdãos TSE n. 12.239/2000 e n. 420/2001, rels. Mins. Nelson Jobim e Ellen Gracie, respectivamente. 212 É do Acórdão TRERS no Processo n. 19001700, rel. Juíza Luiza Dias Cassales: [...] Não há prova concreta de que o material fosse doado sob condição de voto e que nas urnas onde beneficiários votaram tenha sido esmagadora a votação dos recorrentes. [...] Entretanto, os agentes públicos embora não tenham tido o dolo direito de, com tais condutas, obterem o benefício direto e imediato do todo dos eleitores, agiram com culpa. Condenação ao pagamento de multa. 213 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Barros Monteiro, 2004.

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A sanção pela infração prevista no art. 41-A é a multa pecuniária, de mil a cinqüenta mil Ufir, mais cassação do registro ou do diploma, se o corruptor for candidato.

Completando o rol de penalidades pelo ataque à lisura do processo

eleitoral, há, agora, dispositivo que penaliza de forma mais célere o candidato,

quer seja durante a campanha, quer seja após – no curso da campanha e, se

eleito, após a mesma –, sem a complexidade procedimental e processual dos

demais meios legais.

3.3 Competência e Procedimento

Reabordando aspectos preliminares, mas introdutórios às questões da

competência e do procedimento, transcreve-se o seguinte excerto do Acórdão

TSE n. 21.264/2004:

Por outro lado, se é correto dizer que a compra de votos é expediente reprovável, que merece pronta censura e punição, não é menos correto evitar que a regra seja indevidamente aplicada, isto é, que se puna alguém sem que haja prova suficiente para tanto. Necessário, portanto, investigar a fundo, em cada caso, se o procedimento ocorrido realmente configura compra de voto, ainda que mediante promessa não concretizada, e quem são ou foram os responsáveis por tal conduta.214

No mesmo caminho, reitera-se que quando se trata da captação ilícita

de sufrágio, [...] “não se investiga potencialidade, ou seja, se a compra de voto

tinha condições de influir no resultado do pleito. Como por diversas vezes

declarado por este e outros tribunais eleitorais, o bem jurídico protegido não é o

resultado da eleição, mas, sim, a livre formação da vontade do eleitor”.215

214 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.264, Relator: Min. Carlos Velloso, 2004. Voto vencido do Min. Fernando Neves 215 Voto vencido do Min. Fernando Neves, no Acórdão TSE n. 21.264/2004, rel. Min. Carlos Velloso, do qual se absorverá a inteligência do art. 15 da Lei Complementar n. 64/1990.

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Ademais, na linha de outra decisão prolatada pelo Tribunal Superior

Eleitoral, sendo [...] “distintas a causa de pedir da AIME (abuso de poder) daquela

da AIJE (captação ilícita de sufrágios), a cassação do mandato eletivo, como

efeito da procedência da investigação judicial eleitoral, por violação do art. 41-A

da Lei n. 9.504/97, não implica a prejudicialidade desta pela mera circunstância

de haver sido anteriormente julgada a impugnatória (AIME)”.216

Aspecto curioso e interessante é o que detalha a aplicação ou não do

art. 15 da Lei Complementar n. 64/1990 nos procedimentos que envolvem o art.

41-A, ponto versado nos próximos parágrafos217.

A perfeita compreensão desse dispositivo, por estar diretamente ligado

ao rito da Lei Complementar n. 64/1990, é crucial para compreender a captação

ilícita de sufrágio, uma vez que a tênue barreira que separa – ou seria o elo que

liga? – “o abuso do poder econômico” e “compra de votos”, não chega a

comportar, para esta infração, a norma insculpida no dispositivo da lei

complementar. Assim, refletir sobre a aplicabilidade do citado art. 15 quando não

há declaração de inelegibilidade, mas, sim, perda do registro por infringência ao

art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, é essencial à abordagem do tema.

Mais uma vez, o art. 41-A trata da cassação de registro de candidatura

ou do diploma – e multa – e foi acrescido à lei eleitoral pela Lei n. 9.840/1999,

vindo a incidir somente no pleito de 2000. Por via de conseqüência, até então, a

Justiça Eleitoral não havia analisado detidamente a matéria, ou melhor, não o

tinha feito acerca da questão relativa à aplicação do art. 15 da Lei Complementar

n. 64/1990.

Relativamente à representação com base no art. 41-A, cuida-se da

216 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 1.282, Relator: Min. Barros Monteiro, 2003. 217 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 970, Relator: Min. Waldemar Zveiter. Voto do Min. Fernando Neves, 2001. De outra banda, imprescindível alertar que tal decisão vai além – tem outra abrangência – pois apresenta uma visão geral de todos os implicadores envolvidos.

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[...] apuração e punição de conduta delituosa de quem já havia se apresentado à Justiça Eleitoral como candidato, diferentemente do que ocorre nos processos de registro, em que se discutem condições de elegibilidade ou causas de inelegibilidade. A questão da aplicação do art. 15 da Lei Complementar n. 64/90 à espécie é de alta relevância diante das conseqüências que acarreta. Após meditar sobre o tema, concluí que, se não há declaração de inelegibilidade, a eficácia da decisão proferida pela Justiça Eleitoral não está condicionada ao seu trânsito em julgado. Incide a regra geral de que os recursos eleitorais não têm efeito suspensivo (Código Eleitoral, art. 257). [...] O fato de que, na apuração do delito, seja observado o previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990, não altera meu entendimento, pois o que deve ser seguido é apenas o procedimento, não as punições lá previstas, entre as quais se encontra a inelegibilidade por três anos. Aliás, as penas próprias do art. 41-A nele estão perfeitamente definidas: multa de mil a cinqüenta mil Ufirs e cassação do registro ou do diploma. Observo que as alterações da Lei n. 9.504/97, entre as quais consta a introdução do art. 41-A, vieram ao encontro da vontade da sociedade de ver rapidamente apurados e punidos os ilícitos eleitorais, razão pela qual a corrupção, que constitui crime previsto no art. 299 do CE, passou a ser também causa da perda do registro da candidatura ou do diploma, sem que o legislador condicionasse os efeitos da decisão proferida na representação ao seu trânsito em julgado.218

A jurisprudência é pacífica, e se assim não fosse, cuidar-se-ia de

atenção às regras eleitorais, de que compete aos juízes auxiliares – e não ao

Corregedor – o processamento e o relatório de representação ajuizada com

fundamento no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, observado o procedimento do art.

22 da Lei Complementar n. 64/1990. Essa assertiva pode ser melhor explicitada:

nas eleições gerais – para presidente, governador, deputados e senador(es) – ,

ou seja, excetuadas as eleições municipais, a competência é dos Tribunais, que

têm juízes auxiliares; nas eleições municipais, a competência plena – conhecer,

processar e julgar – é dos juízes eleitorais, num desdobramento da competência

218 Este voto do Min. Fernando Neves, constante do Acórdão TSE n. 970/2001, rel. Min. Waldemar Zveiter, já foi anteriormente apontado como paradigma (ver o início deste capítulo).

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do Corregedor Regional. Em síntese, as representações relativas ao art. 41-A

serão processadas e julgadas pelos juízes auxiliares, no segundo grau; e pelos

juízes eleitorais, no primeiro219.

Os feitos, ao seu turno, serão desmembrados: as infrações ao art. 41-A

serão processadas na forma do art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990; as

infrações ao art. 73 da Lei n. 9.504/1997 (ou quaisquer outras relativas à Lei n.

9.504/1997), na forma do art. 96 da mesma lei. E as representações e/ou

reclamações com fundamento nos arts. 41-A e 73, da Lei n. 9.504/1997, e 22, da

Lei Complementar n. 64/1990, individualmente, cada qual seguindo rito de lei.220

Outros aspectos relevantes acerca da competência e do procedimento

são: abertura da investigação e termo inicial; legitimidade; participação de

terceiros e formação do julgamento.

O impulso inicial para a abertura da investigação judicial independe [...]

“de robusto lastro probatório acerca das condutas abusivas praticadas em

detrimento do processo eleitoral, sendo imprescindível tão-somente descrever

situações concretas que tipifiquem, em tese, tais ilícitos, indicando circunstâncias,

219 Apenas para ilustrar, idêntica regra cabe às representações/reclamações relativas ao art. 73 da Lei n. 9.504/1997. Ainda, consta do Acórdão TSE n. 4.029/2003, rel. Min. Barros Monteiro: “A referência à observância do procedimento do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 impõe que a representação objetivando cassação de registro ou diploma com base no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, nas eleições estaduais e federais, seja levada pelo juiz auxiliar ao Tribunal, para decisão colegiada, e não examinada por ele monocraticamente. Nas eleições estaduais e federais, as decisões, em sede de representação fundada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, proferidas após a proclamação dos vencedores, devem ser atacadas por meio de recurso ordinário, na medida em que o diploma pode ser atingido, mesmo que a decisão seja anterior à diplomação. Art. 121, § 4º, IV, da Constituição da República”. Outrossim, a título de ilustração – mas com tênue diferença e completa alteração de competência –, compete ao Corregedor a apuração às infrações relativas ao art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990. 220 “São competentes os juízes auxiliares para o processamento de representação por desobediência à Lei das Eleições, observado o rito previsto no art. 96, exceção feita aos processos que visem apurar captação ilícita de sufrágio, ante a disposição da parte final do art. 41-A, hipótese que deverá ensejar desmembramento do feito, de forma a possibilitar que a infração a esse dispositivo se processe conforme o rito do art. 22 da LC n. 64/90” (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 763, Relator: Min. Luiz Carlos Lopes Madeira).

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indícios e provas a corroborar suas alegações”221. Certo é, contudo, que o termo

inicial é o pedido de registro da candidatura.

“A ação de investigação judicial deve ser proposta não só contra os

que praticaram o ato ilícito como também contra os que porventura tenham sido

diretamente beneficiados pela interferência do poder econômico”222. Ainda, sob

outro prisma, a [...] “legitimidade para propor a ação de investigação judicial

prevista no art. 22 da LC 64/90, não é exclusiva da coligação, podendo cada

partido que a compõe, isoladamente, propô-la”223. Mas, ao se tratar do art. 41-A

da Lei n. 9.504/1997, especificamente, o agente ativo será o candidato e, como se

verá adiante, se a captação de sufrágio se der por terceiro, mas com ciência e/ou

anuência do candidato, este será igualmente penalizado. Outrossim,

diferentemente da norma penal – art. 299 do Código Eleitoral –, na captação ilícita

de sufrágio não se penaliza o eleitor, e tal condição não prejudica qualquer ação

penal, bem como não exime eventual responsabilização por abuso do poder

econômico (art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990).224

Nas representações por captação ilícita de sufrágio é desnecessária

[...] “a citação do vice para integrar a lide, como litisconsorte passivo, tendo em

221 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 19.856, Relator: Juiz José Gaspar Rubik. 222 Excerto do acórdão recorrido, do TREMG, extraído do Acórdão TSE n. 21.221/2003, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, relativamente ao abuso do poder econômico (art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990). 223 SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 17.045, Relator Juiz Otávio Roberto Pamplona, 2001. Nas palavras de Pedro Roberto DECOMAIN, [...] “verificada a possível ocorrência de conduta prevista no presente artigo da Lei, qualquer dos legitimados – partido político, coligação, candidato ou o Ministério Público – poderá ofertar representação para que o fato seja apurado em investigação judicial, que obedecerá ao rito disciplinado ao longo dos incisos do mencionado art. 22 daquela Lei Complementar. O processamento é incumbência do Corregedor-Geral Eleitoral, na eleição presidencial, dos Corregedores-Regionais Eleitorais, nas eleições estaduais e parlamentares federais, e do Juiz Eleitoral, nas eleições municipais” (in Eleições: comentários à Lei n. 9.504/97. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004. p. 250). Sobre o tema – legitimidade – ver os subtítulos relativos à Lei Complementar n. 64/1990 e ao art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, retro. 224 Ver Acórdãos TSE n. 1.282/2003 e n. 19.644/2002, ambos rel. Min. Barros Monteiro.

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vista ser a situação jurídica do titular subordinante em relação a ele, por

concorrerem, no pleito, em chapa”, prescindível, portanto, a participação do vice

inclusive da colheita de provas, ou seja, inexigível a citação de terceira pessoa.225

Por fim, a matéria abordada é de cunho político e, por menos que se

admita, requer dos julgadores o pleno exercício do seu tirocínio. Para tanto, cabe

“ao magistrado a livre apreciação da prova, atendendo aos fatos e circunstâncias

constantes dos autos, desde que indique os motivos de seu convencimento”.226

A decisão que julga procedente a representação com base no art. 41-A

da Lei n. 9.504/1997 deve ser executada imediatamente, não admitindo efeito

suspensivo227. “Já tendo sido expedido o diploma em favor da ora recorrida, a

sanção adequada à espécie é a cassação do mesmo diploma,

independentemente da interposição do recurso contra a expedição de diploma

(art. 262 do Código Eleitoral) ou da propositura da ação de impugnação de

mandato eletivo (art. 14, § 10, da Lei Maior)”.228

Ainda, em se tratando de [...] “decisão fundada no art. 41-A da Lei n.

9.504/97, não se pode cogitar, no caso, da aplicação da norma do art. 22, XV, da

LC n. 64/90, que prevê a remessa de cópias de todo o processo ao Ministério

Público Eleitoral, no caso em que a representação for julgada procedente após a

eleição do candidato, ‘para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11, da

Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral’”229. Inaplicável, à

espécie, o inciso XIV, que traz consigo a pena da inelegibilidade, ponto

225 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.308, Relator: Min. Barros Monteiro. 226 Art. 23 da Lei Complementar n. 64/1990, reproduzido no Acórdão TSE n. 21.264/2004, rel. Min. Carlos Velloso. 227 Cf. SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 19.807, Relator: Juiz Rodrigo Roberto da Silva, 2005. 228 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. 229 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002.

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importantíssimo que será abordado quando em discussão a constitucionalidade –

ou inconstitucionalidade – do 41-A.

3.3.1 Lapso Temporal de Incidência da Norma

Por mais singelo que seja o tema diante da clareza do dispositivo legal

– art. 41-A – arranjou-se espaço para discutir o lapso temporal de incidência da

norma.

Ora, se para a configuração do abuso tratado no art. 22 da Lei

Complementar n. 64/1990 as condutas podem ser praticadas antes ou após o

registro da candidatura, para a configuração da captação ilícita de sufrágio – art.

41-A da Lei n. 9.504/1997 – o termo inicial é o pedido de registro da candidatura.

E, mais, ao se tratar de “registro da candidatura” fala-se do pedido, e não do

deferimento.230

Como termo final, o dia da eleição, inclusive231.

Merece reiterado apontamento que os referidos termos não têm o

condão de descaracterizar eventuais crimes-eleitorais e/ou ilícitos do art. 22 da

Lei Complementar n. 64/1990.

230 Ver Acórdãos TSE n. 19.229/2001 e 19.566/2001, rels. Mins. Fernando Neves e Sálvio de Figueiredo Teixeira. 231 Ver MARANHÃO. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 3.657. Recurso. Investigação eleitoral. Captação indevida de sufrágio. Distribuição de leite. Recorrente: Luiz Sabry Azar. Recorrido: Ananias Barbosa da Silva. Relator: Juiz Carlos Santana Lopes. São Luís, 16 de outubro de 2000. Diário da Justiça, São Luís, 16 out.2000.

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3.3.2 Termo Final para Ajuizamento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral

E é na trilha do item anterior que resta a indagação: qual o termo final

para o ajuizamento da reclamação/representação eleitoral para os fins da

investigação judicial eleitoral (art. 22 da Lei Complementar n. 64/1990), que

também denominam de ação de investigação judicial eleitoral?

Curiosamente, tanto o abuso do poder econômico quanto a captação

ilícita de sufrágio, que observam o rito do art. 22 acima referido, admitem o

ajuizamento até a data da diplomação232 (nada obstante, é preciso ter em mente o

objeto de ambos os feitos, recordando os termos inicial e final do ato delituoso,

vistos no subtítulo precedente).233

Resta, contudo, uma questão curiosa, diretamente vinculada à

execução imediata da decisão que julgar captação ilegal de voto (art. 41-A), qual

seja: a representação pode ser julgada procedente após a realização do pleito?

Segundo Decomain, [...] “a representação pode até ser julgada procedente depois

das eleições, mas, nesse caso, tal decisão não conduz, só por si, à cassação do

diploma. Para que se obtenha tal desiderato, haverá necessidade do manejo do

recurso contra a diplomação”.234

232 MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Ac. 3.891, Relatora: Juíza Janete Lima Miguel, 2001. In verbis: “Não há que se falar em falta de interesse de agir ou impossibilidade jurídica do pedido se a representação, com base no art. 41-A da Lei 9.504/97, foi intentada depois das eleições, mas antes da diplomação dos eleitos, até porque, consoante jurisprudência, a ação de investigação judicial eleitoral prevista no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 pode ser ajuizada até a data da diplomação dos candidatos”. 233 Apenas para ilustrar (quanto às condutas vedadas), ”O prazo para o ajuizamento de representação por descumprimento das normas do art. 73 da Lei das Eleições é de cinco dias, a contar do conhecimento provado ou presumido do ato repudiado pelo representante” (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral, Ac. 748, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2005.). 234 DECOMAIN, Pedro Roberto. Eleições: comentários à Lei n. 9.504/97. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004. p. 253. Conclusão idêntica é a de Adriano Soares da COSTA, para quem [...] “a efetivação da sanção depende, nessa hipótese, de decisão judicial transitada em julgado” (COSTA, Adriano Soares da. Captação de sufrágio: novas reflexões em decalque, p. 17).Esse autor – à fl. 28 do seu artigo doutrinário – fundado em jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, desenvolve o assunto sob a ótica da aplicação imediata da decisão e da efetivação da decisão. Nesse passo, vem à tona a possibilidade de o candidato continuar no concurso eletivo, por sua conta e risco, enquanto sua condenação não transitar em julgado, uma vez que persistente seu direito de recorrer. E é esse o nó górdio da questão: execução imediata, mas com direito de recorrer – e de continuar em campanha, por conta e risco do candidato – situação que permite concluir, efetivamente, que o que torna a decisão definitiva, efetiva, é o trânsito em julgado. A conclusão não poderia ser diferente, pois esse o sistema jurídico vigente: como regra, a decisão é definitiva quando transitada em julgado. Em sentido contrário, ZILIÓ, Rodrigo López. Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, v. 9, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004.

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O autor segue o mesmo raciocínio “do julgamento da representação

após a diplomação”, ou seja, poderá a captação ilícita de sufrágio se julgada

inclusive após a diplomação, mas a cassação do diploma fica vinculada à

interposição do competente recurso.

Não obstante os judiciosos fundamentos trazidos pelo renomado autor,

essa interpretação não é a que melhor se coaduna com a norma. Ora, a utilização

de instrumento que dê efetividade às decisões contra a corrupção eleitoral não

pode ficar vinculada ao manejo de outros instrumentos jurídicos existentes – e

igualmente disponíveis –, razão pela qual, por mais defensável que seja a tese

acima exposta, não merece guarida na aplicação do art. 41-A da Lei n.

9.504/1997.235

3.3.3 Litisconsórcio Passivo Necessário nas Eleições Majoritárias para

Cargos do Executivo

As eleições majoritárias para Presidente da República, Governador de

Estado e do Distrito Federal e para Prefeito Municipal são viabilizadas por meio

de inscrição/registro de chapas. Repete-se: a candidatura, preenchidos os

requisitos de lei, só é viabilizada por meio do registro de chapa. Não se trata, pois,

de candidatura avulsa, individual.

Assim sendo, segundo [...] “a jurisprudência hoje pacífica desta Corte,

é prescindível a citação do vice para integrar a lide, como litisconsorte passivo,

tendo em vista ser a situação jurídica do titular subordinante em relação a ele, por

235 E neste sentido já se pronunciou o Tribunal Superior Eleitoral (BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, rel. Min. Barros Monteiro, 2002): ver nota 213.

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concorrerem, no pleito, em chapa. Era despiciendo, portanto, que participasse da

colhida das provas”236. Improcede, destarte, a obrigatoriedade de o mesmo ser

[...] “chamado a integrar a lide na condição de litisconsorte passivo necessário.

Inexigível é, com efeito, a pretendida citação de terceira pessoa, ainda que tenha

ela praticado as condutas que levaram à cassação do mandato do titular, como é

a hipótese sub examen. Rememoro, por elucidativa, a norma do art. 22, XIV, da

Lei de Inelegibilidade (LC n. 64/90), no que interessa: ‘julgada procedente a

representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de

quantos hajam contribuído para a prática do ato, (...) além da cassação do

registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder

econômico e pelo desvio ou abuso do poder de autoridade (...)’. Ainda mais, não

se pode descurar do entendimento já assentado neste Pretório, no sentido de que

‘a representação pode ser proposta contra os beneficiários da conduta abusiva

assim como contra seus autores’”.237

E é esse o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, inclusive com

relação à ação de impugnação de mandato eletivo e ao recurso contra a

diplomação.238

3.4 Influência no Resultado do Pleito: Desnecessidade

Outra curiosidade do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, dentro da lógica de

foco do abuso do poder econômico, é o fato de não se exigir a sua influência no

resultado da eleição. Ao contrário das representações/reclamações por abuso do

236 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.308, Relator: Min. Barros Monteiro, 2003. 237 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.308, Relator: Min. Barros Monteiro, 2003. 238 Precedentes: Acórdãos TSE n. 15.597/2000, n. 15.817/2000 e n. 3.066/2002, aqueles, rel. Min. Edson Vidigal; este, Min. Sepúlveda Pertence.

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poder econômico, onde a interferência no resultado da eleição é uma condição,

na captação ilícita de sufrágio, suficiente a existência de prova inequívoca do

assédio para compra do voto, termo “compra” a ser compreendido em sentido

amplo – nos literais termos do 41-A.

E sobre o tema assim se manifestou o Tribunal Superior Eleitoral:

Registro, é certo, que a jurisprudência da Corte é firme no sentido de que em se tratando de abuso de poder econômico, além de ser necessária a prova cabal de sua existência, basta a potencialidade ou a probabilidade de que tenha tais fatos para incluir no resultado das eleições [...]. Mas o pressuposto da verificação dessa potencialidade é o acertamento da existência dos fatos abusivos, fundado em prova conclusiva. [...] O forte do recurso é a invocação de nossa jurisprudência no sentido de bastar a potencialidade, e não o que eu tenho chamado da demonstração diabolicamente impossível do chamado nexo de causalidade entre uma prática abusiva e o resultado das eleições.239

E, ainda, no mesmo julgamento: [...] “no art. 41-A, o bem protegido não

é o resultado da eleição. O bem protegido pelo art. 41-A é a vontade do eleitor.

Então, há um bem protegido distinto, o que não autoriza, com isso, se falar em

potencialidade”.240

Conjugando prova, nexo de causalidade e potencialidade do ato

delituoso, traz-se à colação a seguinte lição:

A análise da prova na ação fundada no art. 41-A deverá ser profunda, porque uma vez restada incontestável, irrefutável, isto é, provada a captação ilegal de votos, não há necessidade de perquirir ou de analisar a potencialidade ou influência no resultado das eleições, basta a prova inequívoca da prática da corrupção eleitoral para que seja determinada a cassação do registro ou do diploma.241

239 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.553, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, 2002. 240 Aparte do Min Nelson Jobim constante do Acórdão TSE n. 19.553/2002, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 241 BORGHI, Fátima Aparecida de Souza. Captação ilegal de sufrágio. Disponível em: <www.presp.mpf.gov.br/ art.s_temas/art.s_temas_pdf1.pdf>. Acesso em: 20 mar.2005.

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De forma sintética e didática, podem os fatos tanto implicar abuso do

poder econômico quanto captação ilícita de sufrágio, e quando se trata da

questão da potencialidade, refere-se [...] “à questão da investigação judicial do art.

22, porque no caso do art. 41-A, este Tribunal tem entendido que não é exigida,

bastando a prática de um dos fatos indicados na norma, com a intenção de obter

o voto do eleitor”.242

3.4.1 Execução Imediata

Aspecto processual inovador, e que vem ao encontro dos anseios da

sociedade – e que mais uma vez mostra um diferencial entre abuso do poder

econômico e captação ilícita de sufrágio –, é a execução imediata da decisão.

Na captação ilícita de sufrágio não se aguarda o trânsito em julgado da

decisão (art. 15 da Lei Complementar n. 64/1990). Ao contrário, seguindo o rito

sumário do art. 22 da Lei Complementar para o processamento da

representação/reclamação, aplica-se a regra geral da inexistência de efeito

suspensivo aos recursos eleitorais (art. 257 do Código Eleitoral).

Processado dessa forma, o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 atinge um

outro objetivo, qual seja, o de uma prestação jurisdicional célere e efetiva; a

exclusão imediata - do processo eleitoral - daqueles que conspurcarem o superior

direito do voto, cassando o registro de candidatura ou o diploma, além da

aplicação de pena pecuniária.

Vale, por fim, para concluir, o registro de outra garantia processual da

captação ilegal de voto, ante o seu efeito imediato: “Ainda que se admita a

242 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.566, Relator: Min. Sálvio de Figueiredo, 2001. Voto do Min. Fernando Neves

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hipótese de ser proferida decisão teratológica, sem fundamento, o réu terá, em

seu benefício, todos os meios para modificar esta sentença requerendo a

concessão de efeito suspensivo, mediante mandado de segurança, medida

cautelar, etc”.243

Mesmo com muita polêmica, que conduziu à discussão da

constitucionalidade do art. 41-A – tema a ser oportunamente abordado –, a

execução imediata é pacífica na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, da

qual extraem-se os seguintes julgados244:

Ao contrário do sustentado, não há infringência ao art. 216 do Código Eleitoral, que não tem aplicação neste caso, tendo em vista que a decisão se fundou em abuso de poder e captação ilícita de sufrágio, art. 41-A da Lei n. 9.504/97, este de execução imediata, segundo remansosa jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral;245 REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILEGAL DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL AFASTADA. INFRAÇÃO CONFIGURADA. IMEDIATA CASSAÇÃO DO DIPLOMA. – Segundo já teve ocasião de assentar esta Corte, a cassação do diploma por infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 não implica declaração de inelegibilidade. O escopo do legislador, nessa hipótese, é o de afastar imediatamente da disputa aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo captação de sufrágio vedada por lei. Inconstitucionalidade parcial da norma afastada;246 Julgada procedente a representação, a cassação do diploma deve operar-se de forma imediata, consoante a jurisprudência hoje pacífica nesta Corte;247 [...] Não imposta expressamente a pena de inelegibilidade, não encontra aplicabilidade o disposto no art. 15, LC n. 64/90, razão pela qual o julgado há de ser imediatamente executado;248 e

243 BORGHI, Fátima Aparecida de Souza. Captação ilegal de sufrágio. Disponível em: <http//www.presp.mpf.gov.br/ art.s_temas/art.s_temas_pdf1.pdf>. Acesso em: 20 mar.2005. 244 Sobre a matéria, numa visão geral, ver o voto do Min. Fernando Neves, constante do Acórdão TSE n. 970/2001, rel. Min. Waldemar Zveiter. 245 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.221, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2003. 246 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. 247 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. 248 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 970, Relator: Min. Waldemar Zveiter, 2001.

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É imediata a execução do julgado que decide pela ocorrência de captação ilícita de votos, ainda que tal ocorra após a proclamação ou a diplomação dos eleitos.249

Contudo, mesmo superada a grande discussão inicial, a demonstrar a

complexidade do assunto ante os relevantes efeitos que contempla, bem como o

caráter construtivo dos julgados – construtivo no sentido de normatizador,

regulador, de busca do efetivo espírito da lei –, traz-se à colação situações que

levaram o Tribunal Superior Eleitoral a tomar decisões mistas, já encaminhando,

por outro lado, ao enquadramento da matéria frente ao recurso contra a

expedição de diploma, próximo tópico. In litteris:

Agravo Regimental. Medida Cautelar. Deferimento liminar. Efeito suspensivo a Recurso Especial já em tramitação na Corte. São relevantes os fundamentos dados pela execução imediata das decisões fundadas no 41-A da Lei n. 9.504/97 e pela inaplicabilidade das exceções dos arts. 216 do Código Eleitoral e 15 da Lei Complementar n. 64/90. O periculum in mora resulta da própria demora do Tribunal Regional em julgar o Recurso Inominado. Se o TRE ainda não examinou questão relacionada com a legitimidade de parte, não pode o TSE decidi-la, sem que isso implique supressão de instância;250 [...] A permanência, na urna eletrônica, do nome do candidato que tenha seu registro cassado com base no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997, bem como o prosseguimento de sua propaganda eleitoral – o que se dá por conta e risco do candidato e/ou de seu partido político em virtude da interposição de recurso – não significa retirar o efeito imediato da mencionada decisão, que, entretanto, não pode ser tido como definitivo, antes de seu trânsito em julgado. [...] Como já se disse, não se confunde eficácia ou execução imediata com caráter definitivo da decisão, o que aconteceria se o candidato tivesse seu nome excluído da urna eletrônica ou afastado da propaganda;251 [...] A decisão que, com base no art. 41-A, cassa o registro de candidato tem eficácia imediata, despidos os recursos cabíveis de efeito suspensivo.

249 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 1.282, Relator: Min. Barros Monteiro, 2003. 250 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 1.375, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2004. 251 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.051, Relator: Min. Fernando Neves, 2002.

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[...] Decisão de TRE que, em sentido contrário, determina que a cassação só gere efeitos após o trânsito em julgado não é oponível ao acórdão do TSE que, substituindo o da instância a quo, ordena o cumprimento imediato do julgado. [...] Entretanto, se se cuida de decisão individual tomada no TSE pelo relator de recurso, o seu cumprimento deve aguardar a exaustão do prazo para o agravo regimental ou o julgamento desse;252 e Os precedentes colacionados no recurso especial, com os quais se pretende a comprovação do dissídio jurisprudencial, versam sobre a imediata execução de decisões fundamentadas no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, proferidas, no entanto, em sede de representação ou ação de investigação judicial eleitoral. Naqueles casos, entendeu o TSE que a não-imposição de sanção de inelegibilidade pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97 afasta a aplicação do art. 15 da Lei Complementar n. 64/90, razão pela qual o julgado deveria ser imediatamente executado. Ressalto, entretanto, que os presentes autos versam sobre recurso contra a expedição de diploma, ajuizado com fundamento nos art. 222 e 262, IV, do Código Eleitoral [...]. O fato de o recurso contra a diplomação ter sido ajuizado com prova emprestada de investigação judicial não o torna peculiar, como pretende o agravante. A execução da decisão condenatória proferida por TRE, em sede de recurso contra a expedição de diploma, está condicionada à apreciação pelo TSE em grau de recurso. A regra do art. 216 do CE é clara: “Art. 216. Enquanto o Tribunal Superior não decidir o recurso interposto contra a expedição do diploma, poderá o diplomado exercer o mandado em toda a sua plenitude”. Desta forma, em sede de recurso contra a expedição de diploma, a questão não consiste em aplicar ou afastar a regra do art. 15 da LC n. 64/90, tal como nos julgados com base no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, em sede de representação ou investigação judicial, mas, sim, na incidência do art. 216 do CE, dispositivo que garante, expressamente, ao diplomado o exercício de seu mandato até a manifestação do TSE.253

A execução imediata, reprise-se, é o grande diferencial do art. 41-A da

Lei n. 9.504/1997, diante dos ataques à lisura do processo eleitoral.

252 Questão de Ordem em Recurso Especial Eleitoral no Acórdão TSE n. 19.528/2001, rel. designado Min. Sepúlveda Pertence. 253 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 4.025. Agravo regimental. Recurso contra a expedição de diploma. Procedência fundada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Aplicação do art. 216 do Código Eleitoral. Dissídio jurisprudencial não configurado. Relatora: Min. Ellen Gracie, 2003. Brasília, 25 de março de 2003. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/ index.jsp> Acesso em: 20 abr.2005.

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3.4.2 Recurso Contra a Expedição de Diploma e Ação de Impugnação de

Mandato Eletivo: Prova e Inelegibilidade

O art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, visto como instrumento jurídico em

prol da lisura da eleição, teria inovado apenas quanto às exigências de prova

robusta da captação ilícita de voto e/ou a execução imediata da decisão judicial

prolatada com seu fundamento? Não! A possibilidade de coibir

administrativamente a corrupção eleitoral, dando maior efetividade a aspectos

criminais (igualmente “corrupção eleitoral”254) e constitucionais (inelegibilidade e

cassação), atingindo a candidatura e o diploma – mais multa –, em decisão com

aplicação imediata, é, certamente, outro marco.

Ademais, procedimentos afins e complementares concluem o ciclo do

processo eleitoral.

E, agora, chega-se ao recurso contra a diplomação, a ser dividido em

duas partes distintas, mas igualmente importantes – e, reitera-se, integrantes de

um aparato processual que, bem utilizado, muito pode contribuir à lisura eleitoral –

, quais sejam: 41-A e o Recurso Contra a Expedição de Diploma e a Ação de

Impugnação de Mandato Eletivo [3.4.2.1]; 41-A e o Recurso Contra a

Expedição de Diploma: Prova e Inelegibilidade [3.4.2.2].

254 Tipo penal previsto no art. 299 do Código Eleitoral.

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3.4.2.1 Recurso Contra a Expedição de Diploma e Ação de Impugnação de

Mandato Eletivo

A captação ilícita de sufrágio está contida nas situações ensejadoras

de recurso contra a expedição de diploma – art. 262 do Código Eleitoral –, fruto

da Lei n. 9.840/1999, e casada com o art. 237 do Código Eleitoral, este dispositivo

que trata genericamente do combate e da punição da interferência do poder

econômico e do desvio ou abuso do poder de autoridade em desfavor da

liberdade do voto (de igual modo, recorda-se a Constituição Federal, que

recepciona as disposições do Código Eleitoral).

O art. 41-A permite cassar o diploma de quem captar ilicitamente voto.

O Código Eleitoral prevê recurso para o mesmo fim, inclusive com fundamento no

art. 41-A (art. 262, inciso IV, última parte). A CRFB, a seu turno, e como último

instrumento, prevê a ação de impugnação de mandato eletivo, a ser proposta até

15 (quinze) dias após a diplomação. Contudo, nesse contexto, como fica a

cassação do diploma por captação ilícita de sufrágio ante os outros instrumentos

legais existentes?

Conforme exposto ao tratar de abuso de poder econômico, é posição

considerada no Tribunal Superior Eleitoral: [...] “Já tendo sido expedido o diploma

em favor da ora recorrida, a sanção adequada à espécie é a cassação do mesmo

diploma, independentemente da interposição do recurso contra a expedição de

diploma (art. 262 do Código Eleitoral) ou da propositura da ação de impugnação

de mandato eletivo (art. 14, § 10, da Lei Maior)”.255

255 BRASIL.Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. Ver, também, ZILIÓ, Rodrigo López. Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, v. 9, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004.

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Por outro lado, em se tratando [...] “de decisão fundada no art. 41-A da

Lei n. 9.504/97, não se pode cogitar, no caso, da aplicação da norma do art. 22,

XV, da LC n. 64/90, que prevê a remessa de cópias de todo o processo ao

Ministério Público Eleitoral, no caso em que a representação for julgada

procedente após a eleição do candidato, ‘para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e

11, da Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral’”.256

Contudo, sendo [...] “distintas a causa de pedir da AIME (abuso de

poder) daquela da AIJE (captação ilícita de sufrágios), a cassação do mandato

eletivo, como efeito da procedência da investigação judicial eleitoral, por violação

do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, não implica a prejudicialidade desta pela mera

circunstância de haver sido anteriormente julgada a impugnatória (AIME)”.257

3.4.2.2 Recurso Contra a Expedição de Diploma: Prova e Inelegibilidade

Na esteira do subtítulo anterior, qual seria, então, a relação existente

entre o art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, o recurso contra a expedição de diploma

e/ou a ação de impugnação de mandato eletivo?

Partindo do pressuposto de que a captação ilícita de voto processada

pela via do art. 41-A não gera inelegibilidade, seu enquadramento se dá por servir

de prova às demais ações/iniciativas, quer seja a ação constitucional, o recurso

eleitoral, o processo-crime eleitoral e/ou a investigação judicial eleitoral.

O julgado trazido anteriormente, na execução imediata (Acórdão TSE

n. 4.025/2003), talvez seja ainda mais oportuno aqui. Contudo, existem muitos

outros julgados a respaldar tal entendimento, dentre os quais selecionaram-se:

256 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.644, Relator: Min. Barros Monteiro, 2002. 257 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 1.282, Relator: Min. Barros Monteiro, 2003.

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Recurso contra a diplomação – Inciso IV do art. 262 do Código Eleitoral – Abuso do poder econômico – Investigação judicial – Procedência – Manutenção da sentença – Trânsito em julgado – Ausência. Não é necessário que a decisão proferida em investigação judicial tenha transitado em julgado para embasar recurso contra a diplomação fundado no inciso IV do art. 262 do Código Eleitoral. O recurso contra a diplomação pode vir instruído com prova pré-constituída, entendendo-se que essa é a já formada em outros autos, sem que haja obrigatoriedade de ter havido sobre ela pronunciamento judicial, ou trânsito em julgado;258 [...] é pacífico, nesta Corte, o entendimento de que o recurso contra expedição de diploma pode ser instruído com elementos colhidos de ação de investigação judicial eleitoral, cuja sentença ainda não tenha passado em julgado.259

Curiosidade a ser aqui reportada é a possibilidade [...] “de apurar fatos

no recurso contra a diplomação, desde que o recorrente apresente prova

suficiente ou indique as que pretende ver produzidas, nos termos do art. 270 do

Código Eleitoral”. [...] “A Lei n. 4.961/66 alterou os arts. 222 e 270 do Código

Eleitoral, extinguindo a produção da prova e apuração de fatos em autos

apartados, passando a permitir que isso se faça nos próprios autos do recurso”.260

E, como foi dito, tal possibilidade de aproveitamento de prova se dá

nessa esfera de ações conjugadas em prol da lisura das eleições.

Por fim, a [...] “declaração de inelegibilidade com trânsito em julgado

somente será imprescindível no caso de o recurso contra a diplomação vir

fundado no inciso I do mencionado art. 262 do Código Eleitoral, que cuida de

inelegibilidade”.261

258 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.596, Relator: Min. Fernando Neves, 2002. 259 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.308, Relator: Min. Barros Monteiro, 2003. 260 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.592, Relator: Min. Fernando Neves, 2002. 261 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.596, Relator: Min. Fernando Neves, 2002.

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3.5 O Art. 224 do Código Eleitoral e Anulação de Eleição na Captação Ilícita

de Sufrágio

Apenas para recordar, o art. 224 do Código Eleitoral versa sobre a

anulação de eleições – para presidente, governador e prefeito – caso a nulidade

venha a atingir a mais da metade dos votos válidos do País, do Estado ou do

Município, respectivamente.

Importante, nesse passo, abrir um parêntese: o art. 224 do Código

Eleitoral262 abrange as eleições majoritárias para cargos do executivo.

E às eleições proporcionais? Para estas, há o art. 175 do Código

Eleitoral, em especial o § 4º.263

Está-se diante de disposição legal severa, que pune com rigor máximo

eleições viciadas264. Fala-se de “nulidade”!

Afinal, aplica-se ou não a regra do art. 224 do Código Eleitoral às

hipóteses do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997? É o que se buscará responder.

262 A íntegra do dispositivo encontra-se na nota n. 62, retro. 263 Art. 175 [...] § 3º Serão nulos, para todos os efeitos, os votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados. § 4º O disposto no parágrafo anterior não se aplica quando a decisão de inelegibilidade ou de cancelamento de registro for proferida após a realização da eleição a que concorreu o candidato alcançado pela sentença, caso em que os votos serão contados para o partido pelo qual tiver sido feito o seu registro. [Nota: em face do decidido no Acórdão TSE n. 13.185/1992 e na Resolução TSE n. 20.865/2001 – Consulta n. 708 –, o § 4º é aplicável exclusivamente às eleições proporcionais]. 264 “Viciadas” em sentido amplo, haja vista não se referir exclusivamente à falsidade, fraude, coação, corrupção ou abuso, mas também à ação do eleitor, que pode anular o seu voto.

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3.5.1 Aplicação do Art. 224 do Código Eleitoral aos Casos do Art. 41-A da Lei

n. 9.504/1997

Efetivamente, nos casos do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 aplicam-se

às regras do art. 224. Prevendo [...] “o art. 222 do Código Eleitoral a captação de

sufrágio como fator de nulidade da votação, aplica-se o art. 224 do mesmo

diploma nos casos em que houver a incidência do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, se

a nulidade atingir mais da metade dos votos”265, tendo-se em mente que no caso

de haver [...] “renovação da eleição, por força do art. 224 do Código Eleitoral, os

candidatos não concorrem a um novo mandato, mas, sim, disputam completar o

período restante de mandato cujo pleito foi anulado”266. Vale dizer: [...]

“Declarados nulos os votos por captação indevida (Art. 41-A da Lei n. 9.504/97),

que, no conjunto, excedem a 50% dos votos válidos, determina-se a realização de

novo pleito, não a posse do segundo colocado”.267

Cassados os diplomas de candidatos a cargo eletivo de chefe do poder executivo, em investigação judicial por violação da norma do art. 41-A, ou representação eleitoral, proposta com base em infringência a pelo menos uma das normas dos incisos I, II, III, IV ou VI do art. 73, ambos da Lei 9.504/97, qual o efeito da decisão: a) deve ser declarado vago o cargo, assumindo o chefe do poder legislativo, até realização de novas eleições ou para cumprir o restante do mandato?; b) devem ser declarados nulos os votos obtidos pelo cassado, e, é óbvio, seu vice, e se, somados aos votos nulos na apuração, atingirem mais de 50%, ser realizadas novas eleições?; ou c) deve ser diplomado e empossado o segundo colocado no pleito? 1) Em nenhuma hipótese, a cassação do diploma e, de conseqüência, do mandato, pela justiça eleitoral, acarretará a vacância de cargo. Esta só decorre de fatos estranhos ao processo eleitoral.

265 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.878, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2002. 266 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.878, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2002. 267 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.759, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2003.

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2) Estando os cassados com seu registro deferido regularmente, sendo, portanto, elegíveis, os votos por ele recebidos serão válidos, daí porque, deve o segundo colocado no pleito ser diplomado e empossado, para cumprir o período restante do mandato do cassado. É que, com a propositura daquelas ações, o processo eleitoral não se concluiu, razão porque, aplicada a cassação ao proclamado eleito, diplomado e empossado, deve o segundo colocado ser chamado a receber o diploma, e, de conseqüência, ser empossado. 3) Somente quando as condutas vedadas ou a captação ilícita de sufrágio tiverem sido de monta capaz de contaminar a totalidade da votação obtida pelos cassados, e desde que proposta ação pedindo a anulação de toda a votação, por corrupção, abuso de poder ou fraude, aí sim, e somente aí, deverão os votos obtidos ser anulados, e caso somados aos declarados nulos na apuração alcancem mais de 50% dos votos, somente aí, incidirá a regra do art. 224 do CE.268

Sob o prisma da renovação das eleições, a jurisprudência tem

evoluído, mas não abandonou a questão da “renovação”, apenas dos seus

participantes, em vista da questão da elegibilidade e inelegibilidade, diretamente

ligada ao art. 41-A.

3.5.2 Renovação de Eleição

A nulidade da votação gerada pela captação ilícita de sufrágio nos

pleitos majoritários do executivo – uma composição dos arts. 41-A da Lei n.

9.504/1997 e 222 combinado com 224, ambos do Código Eleitoral – obrigará a

renovação da eleição. Reprise-se: “Declarados nulos os votos por captação

indevida (Art. 41-A da Lei n. 9.504/97), que, no conjunto, excedem a 50% dos

268 TELES, Ney Moura. Efeitos da decisão que cassa diploma por violação da Lei n. 9.504/97. Disponível em: <http://www.neymoura.com.br/art.s.php?id=21> Acesso em: 25 jun.2005. Ver, ainda, BORGHI, Fátima Aparecida de Souza. Captação ilegal de sufrágio. Disponível em: <http//www.presp.mpf.gov.br/ art.s_temas/art.s_temas_pdf1.pdf>. Acesso em: 20 mar.2005.

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votos válidos, determina-se a realização de novo pleito, não a posse do segundo

colocado”.269

Nos pleitos proporcionais, contudo, declarada [...] “a nulidade de voto

de candidato a vereador, em razão da captação ilícita, aplica-se o disposto no art.

175, § 4º, do C.E.”270. Ou seja, se declarada a nulidade após a realização do

pleito, os votos nulos serão contados para o Partido pelo qual o candidato

cassado tiver efetuado registro.

Não obstante essa seja a posição dos Tribunais, não é voz uníssona

entre os doutrinadores, merecendo destaque Albuquerque271, que faz uma leitura

diferente do art. 41-A para defender sua posição, vazada nos seguintes termos:

De uma leitura atenta do art. 41 A da Lei n. 9.504/97, há de se concluir que, em momento algum, o legislador falou em anulação ou nulidade da votação. Fala, sim, de cassação do registro ou do diploma. No primeiro caso, se a ação for julgada antes do dia da eleição (cassa-se o registro), o candidato não concorre. No segundo caso, se a ação for julgada depois do pleito eleitoral (cassa-se o diploma) e, com a perda do diploma, o eleito perde, via de conseqüência, o mandato. Mais um argumento para não se realizar novas eleições nesta hipótese, simplesmente porque a sentença na ação de Impugnação de Mandato Eletivo não afeta as eleições, porém, de forma personalíssima o candidato fraudador. Repito, porque a eleição só é atingida em recurso próprio interposto perante a junta eleitoral, no prazo preclusivo, de conformidade com os arts. 169, 257 e 259, do Código Eleitoral. No caso de Captação de Sufrágio do art. 41 A da Lei n. 9.504/97, criado pela Lei n. 9.840/99, ocorre a cassação dos diplomas dos eleitos na eleição majoritária ou proporcional, como uma penalidade ao infrator da legislação eleitoral, declarando-se cassados os diplomas do Prefeito, Governador ou Presidente e seu vice-prefeito, já que este não é votado (art. 91 do Código Eleitoral). Aí a sentença não atinge os votos das eleições, mas atinge as pessoas, como pena, porque estes votos foram obtidos mediante fraude e estão eivados de corrupção. Neste caso, a eleição é preservada, tornando-se ineficazes os votos de quem os

269 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.759, Relator: Luiz Carlos Madeira, 2003. 270 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 19.759, Relator: Luiz Carlos Madeira, 2003. 271 ALBUQUERQUE, Marcos Cavalcanti de. Inelegibilidades: intrínsecas e extrínsecas. Abuso de poder e captação de sufrágio do art. 41-A da lei n. 8.504/97. Revista de Julgados, Paraíba, v. 6, p. 13-20.

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recebeu mediante compra ou promessa de vantagem, ou por meio de ameaça ou coação. Quando se apura captação ilegal de sufrágio, deve-se aplicar a regra do art. 257 do Código Eleitoral, ou seja, os recursos não têm efeito suspensivo.

Vale recordar, por fim, como regra – e regra reproduzida pelas

Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais –, que, ocorrendo a

vacância do cargo nos últimos 2 (dois) anos do mandato, as eleições para ambos

os cargos será feita pelas respectivas casas legislativas (Congresso Nacional,

Presidente; Assembléias Legislativa e/ou Distrital, Governador; Câmara de

Vereadores, Prefeito).

3.5.2.1 Participação do Candidato que deu Causa à Anulação

O art. 224 do Código Eleitoral trata da renovação de eleição em virtude

da nulidade de mais da metade dos votos. Contudo, por mais singela que possa

parecer a questão, poderá o candidato que deu azo à anulação participar da nova

eleição?

A resposta, seguindo a orientação primeira do Tribunal Superior

Eleitoral, era “não”! Reitera-se: eleição complementar por força do art. 224 do

Código Eleitoral difere de nova eleição em virtude de sua nulidade. Assim sendo,

[...] “Aquele que tiver contra si decisão com base no art. 41-A não poderá

participar da renovação do pleito, por haver dado causa a sua anulação.

Observância ao princípio da razoabilidade”.272

272 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 19.878. Eleição majoritária municipal. Renovação. Art. 224 do Código Eleitoral. Recorrentes: José Domingues Ramos e Francisco Rodrigues de Souza. Recorrida: Coligação Ribas Passando a Limpo. Recorrido: Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Ribas do Rio Pardo/MS. Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2002. Brasília, 10 de setembro de 2002. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/ serviços/jurisprudencia/index.jsp> Acesso em: 4 fev.2005. No mesmo sentido: BORGHI, Fátima Aparecida de Souza. Captação ilegal de sufrágio. Disponível em: <http// www.presp.mpf.gov.br/ art.s_temas /art.s_temas_pdf1.pdf>. Acesso em: 20 mar.2005.

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Hodiernamente, tal entendimento evoluiu, mantida a preocupação

inicial de cindir a eleição conseqüente do art. 224 do Código Eleitoral com aquela

do art. 77, § 3º, da CRFB:

A “nova eleição” a que se refere o art. 224 do Código Eleitoral não se confunde com aquela de que trata o art. 77, § 3º, da Constituição Federal. Esta última tem caráter complementar, envolvendo candidatos registrados para o escrutínio do primeiro turno. Já a “nova eleição” prevista no art. 224 do CE nada tem de complementar (até porque foi declarada nula a eleição que a antecedeu). Em sendo autônoma, ela requisita novo registro. Nada impede a participação de candidato que deu causa à nulidade da primeira eleição, desde que não esteja inelegível, por efeito de lei ou sentença com trânsito em julgado.273

Atente-se ao fato de os candidatos envolvidos na anulação em virtude

da captação ilícita de sufrágio poderem concorrer nas eleições, haja vista o art.

41-A não acarretar inelegibilidade.

3.6 Da Constitucionalidade da Norma

Inicialmente, traz-se à colação o seguinte excerto de Ferraz Júnior274:

[...] efetividade [...] validade [...] imperatividade é uma qualidade [...] a norma se adapta a mudança e desvios em razão de uma estabilidade conhecida, constituindo num padrão de ordem superior caracterizado pelo rompimento e reconstrução de um padrão aplicável a maiores unidades de tempo. Assim, propomos que haja uma ‘regulagem’ da possibilidade de exigência (validade) e de obediência (efetividade) de um discurso normativo que expressa uma estabilidade, de tal forma, que qualquer desvio (ilegitimidade, falta de competência ou descumprimento, de

273 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Acórdão n. 25.127. Eleição majoritária. Nulidade. Nova eleição. Código Eleitoral, art. 224, candidato que teve seu diploma cassado. Registro para a nova eleição. Recorrente: Waldimir Coronado Antunes. Recorrida: Coligação Trabalho, Respeito e humildade (PL/PP/PSB) e outros. Relator: Min. Humberto Gomes de Barros. Brasília, 17 de maio de 2005. Disponível em: <http//www.tse.gov.br/serviços/jurisprudencia/index.jsp> Acesso em: 7 jan.2005. 274 FERRAZ JÚNIOR. Tercio Sampaio et alii. A Norma Jurídica. Coordenação de Sergio Ferraz. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1980. p. 25.

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aplicação), dentro de um âmbito, é contrabalançado (medidas disciplinares, sanções, anulação, declaração de nulidade).

Não saberia avaliar acadêmica e cientificamente a pertinência de uma

afirmação com esta, mas tratar da constitucionalidade do art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 é abordar, hoje, seu aspecto mais polêmico, contundente e

importante275. De um lado, avaliar se a norma fere ou não dispositivo

constitucional; ou melhor, se ela atende ou não aos ditames da Constituição. De

outro, resultado desse primeiro – ou seja, aspecto derivado –, concluir pela “vida”

ou “morte” de dispositivo legal, política e socialmente tão importante. E sob esse

prisma é possível ir além: não se está trabalhando apenas uma norma jurídica;

está-se diante de norma política, em face do seu conteúdo, de sua história, do

seu respaldo popular; enfim, está-se diante de norma detentora de legitimidade

material.

Mas, não são poucos os que qualificam o art. 41-A de inconstitucional,

ante sua deficiência formal – deficiência formal que, salvo melhor juízo, parece

impor rigor demasiado se, de per si, justificar o decreto da ilegitimidade, mesmo

que os efeitos no campo jurídico sejam os mesmos.

De qualquer modo, uma regra legitimada pela sociedade jamais será

uma aberração jurídica – razão pela qual não se enquadraria o art. 41-A entre as

normas maculadas de ilegitimidade formal –, e, por isso, sobressai a

responsabilidade ou irresponsabilidade de sacrificar a norma na cômoda alegoria

jurídica do plano formal. Acovardar-se por trás do manto da formalidade e fechar

os olhos para os efeitos deletérios decorrentes da sua não-aplicação no caso

concreto – em nossas vidas! – certamente é a atitude mais cômoda.

275 Mais, até, que a “execução imediata”!

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Contudo, não se busca, aqui, comodidade. Também, não se vislumbra

a possibilidade de adotar o velho vício de refutar o mérito na sanha de

preliminares prejudiciais.

Isso dito, cumpre destacar que é a partir de entendimento do Supremo

Tribunal Federal que se encaminha a resposta. O excelso Pretório, sobre a

matéria, pronunciou-se apenas no Acórdão relativo aos autos de Medida Cautelar

em Ação Cautelar 509-4/Amapá, de 2 de dezembro de 2004, rel. Min. Eros Grau,

do qual extrai-se o seguinte excerto:

Ora, as penas de cassação do registro ou do diploma são para serem aplicadas em consonância com a lei complementar, ou seja, observada a ressalva tantas vezes repetida, transitada em julgado a decisão [= transitada em julgado a decisão que julgar procedente a Representação Eleitoral]. Isso, tendo em vista o disposto no art. 22 da LC 64/90, ao qual faz remissão o art. 41-A da Lei n. 9.504/97. A aplicação dessas penalidades provisoriamente, como foi operada pelo TSE, confere a esse último preceito, no caso em que já consumada a eleição e diplomado o eleito, interpretação adversa à Constituição. Há, nessa interpretação do preceito, o que HAURIOU chamaria de “certo modo de inconstitucionalidade da lei”. Não o preceito, mas a interpretação a ele conferida há de ser dita inconstitucional.

Respeitada a posição do Supremo, abordar-se-á a situação doutrinária

e jurisprudencial, ou seja, dos eleitoralistas e dos Tribunais, em especial o

Tribunal Superior Eleitoral.

Nas palavras de Amorim276,

A possível inconstitucionalidade das sanções do art. 41-A da Lei 9.504/97 tem sido alvo de muita discussão. De um lado estão os que defendem que o art. 41-A está em harmonia com a Carta Magna, considerando-se que suas punições são tópicas, não ensejadoras de inelegibilidade, tanto que o candidato mesmo punido naquela eleição pode concorrer ao pleito da eleição seguinte. De outra banda, os que asseguram a

276 AMORIM, Caroline Maria Pinheiro. Captação de sufrágio. Jus Navegandi n. 140, de nov.2003. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4532>. Acesso em: 25 jul.2005.

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inconstitucionalidade do citado dispositivo pelo fato de que este acarretaria a inelegibilidade do candidato, o que fere a ordem constitucional. Porém, ainda há muito o que se discutir acerca da matéria – e é o que se está buscando nessas linhas.

Enfim, será ou não constitucional o art. 41-A? Se não há

inelegibilidade, não há que se falar em inconstitucionalidade, mas segue a

doutrina e a jurisprudência.

3.6.1 Posicionamento Doutrinário

Poderá até parecer descaso com relação ao tema, já qualificado como

o mais importante em qualquer abordagem que se faça do art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 (ora, fala-se de constitucionalidade ou inconstitucionalidade, ou seja,

de “vida” ou “morte”!), mas o núcleo de tão séria discussão é, pura e

simplesmente, se a norma configura ou não nova situação de inelegibilidade.

Adriano Soares da Costa277 traz contribuição valiosa a respeito do tema, pois

inicia sua abordagem crítica ao 41-A – “cassação de registro versus

inelegibilidade” – assim se pronunciando:

A inelegibilidade é a principal sanção prevista pela legislação eleitoral. Não discrepa a doutrina, nem tampouco a jurisprudência, em defini-la como o impedimento para alguém concorrer a um mandato eletivo. Não há outra definição que se possa dar ao termo inelegibilidade. Sempre que haja uma sanção contra alguém, impedindo que ele possa se lançar candidato, estará submetido à cominação de inelegibilidade. Quando alguém pratica abuso de poder econômico ou abuso de poder político, sua pena será a decretação de inelegibilidade. Ou seja, é a inelegibilidade efeito de algum fato jurídico ilícito: não é ela o próprio fato jurídico que lhe dá origem. A inelegibilidade não é o abuso de poder; é o abuso de poder, ao revés, que gera a inelegibilidade.

277 COSTA, Adriano Soares da. Captação de sufrágio: novas reflexões em decalque, p. 25. Observe-se, outrossim, que o excerto em referência traz o conceito operacional de inelegibilidade.

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Não seria necessário ir adiante para poder antecipar a sentença: o

autor defende a inconstitucionalidade do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, em

posição contrária a dos Tribunais. E esta situação é tão evidente que em outra

passagem há a seguinte conclusão:

Na verdade, a interpretação que o TSE está dando ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 visa a salvá-lo de sua evidente inconstitucionalidade, uma vez que o veículo introdutor impróprio de normas sobre inelegibilidade, mercê do que prescreve o § 9º do art. 14 da CF/88. Como apenas através de lei complementar poderia ser criada hipótese nova de inelegibilidade, optou-se por fazê-lo por via oblíqua, subrepticiamente, através de lei ordinária. E como essa lei é uma das poucas provenientes da iniciativa popular, seria muito difícil para a Justiça Eleitoral expurgar uma lei assim tão bem nascida, pela origem e pela sua reta intenção, nada obstante a sua má técnica.278

O que torna a abordagem dada por Costa diferenciada das demais,

muito além da forma com que trata eventuais mazelas do processo legislativo

e/ou da inteligência emprestada pelo Judiciário ao dispositivo em comento, é a

sua conclusão para o tema, que efetivamente serve de alerta a um contexto geral

do processo eleitoral, ante o justo e cabido temor com a desconstrução do

conceito de inelegibilidade. E alerta:

Os que começaram a descontração do conceito de inelegibilidade, para justificar o afastamento daquelas garantias jurídicas positivadas, não imaginavam até onde o revisionismo iria. Hoje, o que temos é um sistema jurídico eleitoral amorfo, confuso e contraditório, razão pela qual nem sistema, a rigor, temos. As decisões judiciais não possuem um mínimo de previsibilidade, de modo que cada processo judicial é uma aventura única através de um mundo desconhecido e surrealista.279

Tal conclusão é drástica, mas defensável. Contudo, não pode ser

isoladamente vista dentro da realidade vigente, tanto jurídica, quanto política e

278 COSTA, Adriano Soares da. Captação de sufrágio: novas reflexões em decalque, p. 32. 279 COSTA, Adriano Soares da. Captação de sufrágio: novas reflexões em decalque, p. 39.

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eleitoral. Outrossim, fica o alerta para que se redobre a atenção à realidade que

está a nossa volta, valendo, de igual modo, contextualizar as hipóteses, utilizando

a idéia de “macro-processo eleitoral” – de Costa.280

É possível afirmar com tranqüilidade que a Justiça Eleitoral tem seu

foco no todo da eleição, e isso vai muito além da teoria ou da retórica - ou do

proselitismo. Para tanto, basta uma retrospectiva sobre a sua participação e

importância no seio da Sociedade para confirmar o seu valor institucional, o seu

valor operacional (prestação jurisdicional e execução do processo eleitoral) e a

sua atualidade.

Decomain281, reconhecido eleitoralista catarinense que muito tem

contribuído para o desenvolvimento e valorização desse segmento do Direito

ainda pouco conhecido dos operadores, referindo-se à cassação do registro do

candidato beneficiado pelo ato de ilícita captação de sufrágio (art. 41-A), é

taxativo: inconstitucional. É que a cassação traz como conseqüência [...] “o

impedimento para que a pessoa siga concorrendo, o que gera situação

substancialmente idêntica à da inelegibilidade” – e – “somente por lei

complementar podem ser vinculadas outras causas de inelegibilidade, além

daquelas emanadas do próprio texto constitucional”.

A continuar nessa trilha, importante consignar que não se está diante

de matéria pacificada, nem entre os doutrinadores, e, em virtude disso, seguirão

outras abalizadas opiniões acerca da constitucionalidade do art. 41-A da Lei n.

9.504/1997, e sobre elas se buscará apontar os pontos mais relevantes.

280 COSTA, Adriano Soares da. Captação de sufrágio: novas reflexões em decalque, p. 15. 281 DECOMAIN, Pedro Roberto. Eleições: comentários à Lei n. 9.504/97, p. 458.

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Inicia-se por Zilió282, reverenciando a bela síntese que apresenta,

abordando aspectos já contidos neste trabalho:

A doutrina perfilha o entendimento de que há inelegibilidade283 sempre que o candidato restar impedido de concorrer ao pleito. O TSE, em verdade, modo implícito, adota um entendimento de profundo valor ético e moral para afastar a inelegibilidade nas sanções de cassação do registro ou do diploma (esta última, inclusive, sem a necessidade de posterior ajuizamento de RCD ou AIME). Longe de ousar pôr termo à decantada polêmica, o entendimento pela incidência, ou não, da inelegibilidade terá consideráveis desdobramentos de ordem prática. De outra parte, não há como cogitar da perda de objeto da representação por violação ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 caso o candidato não consiga se eleger, pois, nesta hipótese, a representação deverá ter o seu desfecho e, em havendo elementos suficientes para a procedência, será paliçada, então, apenas, a sanção pecuniária. O raciocínio é lógico, quase matemático: adotando o entendimento do TSE, no sentido de que o art. 41-A não traz hipótese de inelegibilidade, por conseqüência, não há a incidência do art. 15 da Lei Complementar n. 64/90 – que exige o trânsito em julgado para a execução -, incidindo então o art. 257 do Código eleitoral (“Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo”); adotando o entendimento doutrinário já mencionado, no sentido de que há hipótese de inelegibilidade, em primeiro lugar há a constitucionalidade e, mesmo assim, sendo imposta tais penalidades, aplica-se o art. 15 da LC 64/90.284

O autor faz referência à inelegibilidade e às conseqüências de ordem

prática na incidência ou não de inelegibilidade; ao resgate ético emprestado na

interpretação do Tribunal Superior Eleitoral; e ao raciocínio lógico desenvolvido

282 ZILIÓ, Rodrigo López. Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da Lei n. 9.504/97, p. 23-50. 283 Esta nota consta do artigo doutrinário e, em face de sua importância, é trazida, in litteris: Os conceitos doutrinários de inelegibilidade são diversos, embora não destoem em sua essência. Para José Afonso da Silva (op. cit., p. 339): “Inelegibilidade revela impedimento à capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado). Obsta, pois, a elegibilidade”. Para Tupinambá Miguel Castro do Nascimento (Comentários à Constituição Federal – Direitos e Garantias Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, v. 2, p. 185): “Inelegibilidade é circunstância descrita em norma jurídica, constitucional ou complementar, impeditiva do exercício da capacidade eleitoral passiva, ou seja, que obsta alguém de ser candidato, embora satisfeitas as demais condições de elegibilidade”. No sentir de Moraes (2001, p. 229): ”A inelegibilidade consiste na ausência de capacidade eleitoral passiva, ou seja, da condição obstativa ao exercício passivo da cidadania. 284 ZILIÓ, Rodrigo López. Captação ilícita de sufrágio: art. 41-A da lei n. 9.504/97. Revista do TRE/RS, Porto Alegre, v. 9, n. 18, p. 23-50, jan./jun.2004.

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pela Corte Superior que, ao afastar o art. 15 da Lei Complementar n. 64/1990, e

recepcionar o art. 257 do Código Eleitoral, afasta a inelegibilidade, mantendo a

característica político-administrativa da pena do 41-A.

Djalma Pinto285, ao abordar exclusivamente a questão da

constitucionalidade do art. 41-A, faz uma construção ainda mais consistente da

matéria e é conclusivo. Segundo ele, o 41-A [...] “não criou sanção de

inelegibilidade, caso o fizesse estaria legislando no vazio, inutilmente. Inovou,

porém, validamente apenas quando introduziu na ordem jurídica mais uma

sanção: a multa pela prática da captação ilícita de sufrágio”. E continua:

285 PINTO, Djalma. Constitucionalidade do Art. 41-A. Disponível em: <http://www.almagis. com. br/geral/VisualizarConteudo.asp?Codconteudo=1429&Codmenu=124&Codgrupo=3&Codparta=255> Acesso em: 25 jul.2005. A manifestação do autor, contudo, vem fundamentada na seguinte construção lógico-jurídica: “A bem da verdade, a cassação do registro ou diploma já se encontrava prevista na ordem jurídica brasileira. O art. 41-A não criou nova hipótese de inelegibilidade. Não é difícil demonstrar essa particularidade. Inicialmente, a Constituição Federal, no art. 14, § 10, permite a impugnação e a cassação do mandato para cuja obtenção restou comprovado abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. Por sua vez, o Código Eleitoral, recepcionado como Lei Complementar, no art. 222, já, implicitamente, determinava a cassação do diploma ou do mandato ao considerar anulável a votação obtida através de fraude, coação, abuso do poder econômico ou captação de sufrágio vedada por lei. O art. 224, do CE, autoriza também a cassação do diploma ou mandato ao prever nova eleição, uma vez constatada a prática de abuso para o êxito eleitoral com a conseqüente anulação de mais da metade dos votos do pleito. A Lei Complementar 64/90, de sua parte, no art. 22, XIV, prevê como sanção a cassação do registro e a decretação de inelegibilidade para os casos de abuso do poder econômico e abuso do poder político, visando à conquista do mandato. Regula, inclusive, essa norma, o processo de cassação do registro da candidatura e do diploma, sendo esse procedimento recomendado pelo art. 41-A, da Lei 9.504/97, para os casos de captação ilícita de sufrágio. A captação ilegal de sufrágio - introduzida pelo art. 222, CE - nada mais é do que a conduta ilícita praticada pelo candidato já descrita no art. 299 do Código Eleitoral. O art. 41-A apenas explicitou o seu sentido fora da alçada penal, retirando o eleitor do campo de sua incidência e sistematizando as sanções não criminais à conduta ali descrita. Suprimiu-se apenas o verbo ‘receber’ para não penalizar o eleitor, estimulando-o a colaborar na identificação do candidato que, entre o registro e a data da eleição, macula o processo através de doação, oferta, promessa ou entrega de bem, emprego ou vantagem pessoal para obter voto. Na simples promessa feita pelo candidato ou por alguém sob sua ordem resulta a sua tipificação, afastando-se a necessidade de aferição da potencialidade do ato ou do nexo de causalidade para influir na eleição. A sanção penal está contemplada no citado art. 299, que descreve a ação do agente tipificador de crime. Já a sanção política - cassação do registro ou diploma -, como visto, está estabelecida através da Constituição, bem assim da Lei Complementar 64/90 e ainda pelos arts. 222 e 237, do Código Eleitoral”.

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Há a conduta vedada, o aliciamento da vontade do eleitor, o descredenciamento do candidato para continuar nessa disputa; não há, todavia, o abuso do poder econômico nem inelegibilidade expressamente prevista em lei a impedir-lhe de participar da eleição seguinte. A captação de sufrágio é o embrião, a célula de um possível abuso do poder econômico ou político. Pode concorrer para a sua configuração pela dimensão. Por exemplo, um candidato doou trezentos pares de sapato, exigindo o voto ao entregar a cada eleitor um par, em caixa contendo sua fotografia, seu número com os dizeres "ajude com seu voto quem sempre lhe ajuda". Na doação de cada par restava configurada a captação ilícita de sufrágio. No volume da ilicitude, acabou tipificado o abuso do poder econômico.

Cerello286, ex-Presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Santa

Catarina, também agasalha a tese da constitucionalidade, na mesma linha de

Djalma Pinto, in verbis:

Também não se vislumbra incompatibilidade do dispositivo com o art. 14, § 9º, da Constituição Federal de 1988, por não estabelecer nova causa de inelegibilidade – que seria feito por lei complementar, segundo o texto constitucional. Isso porque o referido art. 41-A comina a pena de cassação de mandato e estabelece sanção de natureza pecuniária, que não são hipóteses de inelegibilidade, pois o apenado continua em pleno gozo de todos os seus direitos políticos e, portanto, elegível para as eleições seguintes. Cuida-se de instrumento altamente moralizador, simples e rápido a sancionar os maus administradores públicos e agentes políticos, uma vez que restam afastados os percalços e demoras de uma ação de impugnação de mandato eletivo, com que os fraudadores e ímprobos se escudam e, por não raras vezes, escapam pelas portas escancaradas da impunidade.

De maneira muito clara e objetiva pronunciou-se Borghi287 para

fundamentar a constitucionalidade da norma tipificadora da captação ilegal de

sufrágio: [...] “a representação com base no art. 41-A não tem como objeto

verificar se presentes as condições do registro, mas sim apurar condutas ilegais

praticadas pelo candidato durante sua campanha eleitoral”.

286 CERELLO, Anselmo. Ação de investigação judicial eleitoral. Resenha Eleitoral, Florianópolis, v. 9, n. 2, jul./dez.2002. p. 13-32. 287 BORGHI, Fátima Aparecida de Souza. Captação ilegal de sufrágio. Disponível em: <.presp.mpf.gov.br/ art.s_temas/art.s_temas_pdf1.pdf>. Acesso em: 20 mar.2005.

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Manifestação de importância ímpar a da Advocacia-Geral da União, na

Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.942, proposta pelo Partido do

Movimento Democrático Brasileiro – PMDB –, requeridos o Presidente da

República e o Congresso Nacional, de cujo parecer se extrai o seguinte excerto e

conclusão:

Portanto, o art. 41-A, da Lei 9.504/97 não traz nenhuma novidade quanto à captação de votos. Esse artigo, apesar de punir a captação de sufrágio, em nada modifica o ordenamento jurídico e, inclusive, em nada contribui para o combate à captação de sufrágio. Esse é o entendimento, por exemplo, de Roberto Amaral e Sérgio Sérvulo da Cunha. Suzana de Camargo Gomes, a propósito, anota que o art. 41-A “em nada alterou a disciplina penal pertinente ao crime de corrupção eleitoral, que continua incólume” (in Crimes Eleitorais, RT, p. 203). Em sendo assim, se o art. 41-A, da Lei n. 9.504/97, nenhuma alteração trouxe ao ordenamento jurídico, esse dispositivo não precisaria ser criado por lei complementar. Isso também se aplica ao art. 3º da Lei 9.840/99. Ante o exposto, a presente ação não merece conhecimento, mas, se conhecida, deve ser julgada improcedente.288

A posição de Langowski e Puppi289 coaduna-se com a intenção de

emprestar ao 41-A interpretação que o preservasse da inconstitucionalidade,

ficando, em razão disso, em um limbo punitivo – apenas a pena pecuniária

(posição já foi defendida pelo Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, não é

aceita pelo Tribunal Superior). Estas as palavras dos autores:

[...] não se estaria a cogitar da definição de uma nova situação de inelegibilidade, fato inviável através de lei ordinária, mas simplesmente em estabelecer uma sanção pecuniária àquele que utilizar-se de meios ilegais para captar votos quando tais atos não chegassem a configurar abuso de poder econômico ou político. Nesta hipótese a lei não seria atingida pelo vício da inconstitucionalidade, pois não estaria estabelecendo hipótese de inelegibilidade, mas simplesmente uma sanção pecuniária que

288 <www.senado.gov.br/advocacia/infoadin/ADI2942.pdf>. Acesso em: 20 mar.2005. 289 LANGOWSKI, Luis Sérgio e PUPPI, Letícia Küster. Reflexões acerca da Lei n. 9.840/99. Paraná Eleitoral, Curitiba, n. 34, p. 45, out./dez.1999.

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não exige veículo legislativo diferenciado para sua cominação, bastando para tal a legislação ordinária.

Como já comentado anteriormente, a tese da inconstitucionalidade

prende-se à inelegibilidade e à especialidade legislativa para sua regência; a da

constitucionalidade, nega a inelegibilidade e, por via de conseqüência, derruba a

alegada falha do meio legislativo eleito, centrando o 41-A como ilícito político-

administrativo.

3.6.2 Posicionamento dos Tribunais

A norma contida na captação ilícita de sufrágio é o afastamento do

processo eleitoral de quem desrespeitar a liberdade de voto. Cuida, [...] “da

apuração e punição de conduta delituosa de quem já havia se apresentado à

Justiça Eleitoral como candidato, diferentemente do que ocorre nos processos de

registro, em que se discutem condições de elegibilidade ou causas de

inelegibilidade”290. E esta é a construção jurisprudencial do Tribunal Superior

Eleitoral, que tem resistido aos defensores da tese contrária, mesmo diante da

renovação de sua composição, que é cíclica e mista!291

“O escopo do legislador é o de afastar imediatamente da disputa

aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo ‘captação ilegal de

sufrágio’. A cassação do registro ou do diploma, cominados na referida norma

legal, não constitui nova hipótese de inelegibilidade”292. E é nessa linha de

290 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 970, Relator: Min. Valdemar Zweiter, 2001. 291 Essa observação fina, aparentemente singela, é importante: os Tribunais Eleitorais têm composição mista, eclética, para investiduras de curto período, e a tese da constitucionalidade tem sido preservada. 292 BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ac. 21.221, Relator: Min. Luiz Carlos Madeira, 2003.

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pensamento, desenvolvida – defendida – pelo Tribunal Superior Eleitoral, que se

estabelecem os contra-argumentos à tese da inconstitucionalidade: o art. 41-A da

Lei n. 9.504/1997 não criou nova forma de inelegibilidade, matéria que deve ser

regulada por meio de norma constitucional e/ou pela via de lei complementar; ao

contrário, respeitando as inelegibilidades de lei, apenas afasta do processo

eleitoral, como penalidade administrativa e pecuniária, aquele que “comprar

voto(s)”.

Como boa síntese do entendimento da Justiça Eleitoral acerca da

constitucionalidade do art. 41-A, é interessante trazer à colação o Acórdão TSE n.

19.644/2002, rel. Min. Barros Monteiro, in verbis:

REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILEGAL DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL AFASTADA. INFRAÇÃO CONFIGURADA. IMEDIATA CASSAÇÃO DO DIPLOMA. – Segundo já teve ocasião de assentar esta Corte, a cassação do diploma por infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 não implica declaração de inelegibilidade. O escopo do legislador, nessa hipótese, é o de afastar imediatamente da disputa aquele que no curso da campanha eleitoral incidiu no tipo captação de sufrágio vedada por lei. Inconstitucionalidade parcial da norma afastada.

Em resumo: a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral está

consolidada quanto à constitucionalidade do art 41-A da Lei n. 9.504/1997, uma

vez que não estabelece nova hipótese de inelegibilidade, mas, ao contrário,

possibilita a cassação do registro ou do diploma e multa ao candidato que doar,

oferecer, prometer ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou

vantagem pessoal de qualquer natureza.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Afirmou-se, ao iniciar este trabalho, que o seu fim era uma abordagem

do abuso do poder econômico nas eleições sob o foco da captação ilícita de

sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/1997), amparada em um tripé “teórico-

constitucional-jurisprudencial”, conduzindo ao debate de uma preocupação

latente: a lisura do processo eleitoral e, por via de conseqüência, o tratamento

igualitário entre os candidatos, a legitimidade dos mandatos e o respeito ao direito

do voto – o respeito ao eleitor.

E tal enfoque coaduna-se com o espírito da norma em apreciação: o

resgate da lisura do processo eleitoral por meio da proteção do eleitor (seu direito

de votar); e/ou o fornecimento de mais um instrumento para atingir tal fim

(proteção do direito de votar), penalizando a compra de voto(s) com a sanção

político-administrativa da cassação do registro da candidatura, ou do diploma,

além da pena pecuniária.

Se a eleição é um concurso em que a igualdade dos concorrentes e a

liberdade dos eleitores tornarão o processo democraticamente justo, são o

conhecimento da realidade político-social e a existência de regras claras – e

efetivas – que facilitarão a coordenação desse certame. Vale dizer: a aplicação do

Direito está diretamente vinculada ao processo eleitoral e à sua coordenação; e,

como conseqüência, vê-se surgir o elo que liga a “prestação jurisdicional” e a

“verdade eleitoral”.

Nessa esteira, se na sentença anterior encontram-se referidos,

implícita ou explicitamente, o eleitor, o voto e o processo eleitoral, estão, também,

Partidos Políticos, Candidatos e Justiça Eleitoral, porque toda a complexa

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logística social, política e operacional passa pelo crivo de cidadãos que escolhem

ou que se submetem ao sufrágio; passa por cidadãos que, integrantes de poder –

agentes políticos – têm o dever de zelar pela retidão do principal instrumento da

democracia, que é a participação social materializada especialmente no direito do

voto, essência da Democracia e base do Estado Democrático de Direito. E é a

ligação existente entre todos esses protagonistas do processo eleitoral que dá

magnitude ao art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, exatamente em face da sua origem

e da sua efetividade; da sua história (Iniciativa Popular) e dos seus resultados

(prescindibilidade do trânsito em julgado para execução das decisões).

A Constituição da República Federativa do Brasil é taxativa quanto à

proteção das eleições da deletéria influência do poder econômico, mesmo que o

aparato legislativo existente em sua órbita tenha mostrado eficiência questionável

(esse o cenário em que o mais novo e efetivo instrumento legal de proteção da

liberdade do voto, dirigido exclusivamente a candidatos – o art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 – foi apresentado).

É oportuno consignar, também, o que pode ser classificado como uma

deficiência da norma, qual seja, basear-se nos efeitos e não nas causas; atacar o

resultado e não os motivos ensejadores – mas mesmo assim continua sendo um

rico e importante instrumento, devendo ser preservadas suas conquistas.

Ora, se instrumentos valiosos como as representações/reclamações

contra o abuso do poder econômico nas eleições reguladas na Lei Complementar

n. 64/1990 não conseguiram efetividade, como o art. 41-A, que faz uso das

mesmas regras processuais, conseguiu? A resposta, mesmo singela, encontra-se

sobejamente trabalhada nas páginas precedentes, e uma síntese ousada poderia

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aludir apenas à execução imediata das decisões prolatadas com base na regra da

captação ilícita de sufrágio. Reitera-se: execução imediata!

O Código Eleitoral, hodiernamente, faz parte da história, encontrando

espaço secundário, subsidiário ou complementar.

O protagonista, hoje, é o art. 41-A. A razão? A celeridade do processo,

somada à execução imediata, esta símbolo de sua efetividade.

Aspecto curioso que permeia toda essa realidade está no fato de o

aparato legislativo – todo – vir supedaneado em instruções (resoluções) e/ou

decisões (acórdãos) da Justiça Eleitoral, vislumbrando-se o fino equilíbrio entre

Estado – Poder Judiciário – e Sociedade, uma vez que o art. 41-A da Lei n.

9.504/1997 é genuinamente Iniciativa Popular.

E volta a pergunta: onde andava o legislador? Pelo que foi apresentado

– pelo que é vivido –, eximindo-se do tema “corrupção eleitoral”, não legislando

em prol do estabelecimento de regras eleitorais modernas, exeqüíveis e

adaptadas à realidade político-social de nosso país. Por outro lado, viu-se

compelido a isso, provocado pela sua “fonte de poder”: o eleitor293.

E, neste ponto, ressurge a prática política – por ação ou omissão –

voltada aos próprios interesses e conveniências, denotando que o fisiologismo

está presente no dia-a-dia daqueles que tudo fazem para manter o poder ou

manter-se nele. A (in)ação legislativa está diretamente ligada à prática do

fisiologismo como forma de manter o poder, fazendo uso da corrupção eleitoral

para concretizar tal intento. E dessa sucessão de ações ilícitas, ao fim e ao cabo,

resulta, em grande parte, o abuso do poder econômico nas eleições, cujo objetivo

293 Fazendo referência ao “eleitor”, recepcione-se, também o seu “voto”.

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é, única e exclusivamente, galgar algum degrau na escala de influência294. Por

isso permanece a indagação: onde está o legislador?...

Características normativas unem tipos diferentes.

A captação ilícita de sufrágio do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 é, de

certa forma, a corrupção eleitoral do art. 299 do Código Eleitoral: aquela, com

foco no candidato, sua candidatura ou seu mandato; esta, com foco no corruptor e

no corrompido sob o prisma da repreensão criminal – mas ambas com ou único

intuito de preservar o voto. Direta ou indiretamente, tutelam o mesmo bem

jurídico: a preservação do voto, em prismas distintos, mas complementares. E é

por intermédio da preservação do voto que contribuem à lisura e à legitimidade

das eleições.

Se é por meio da compra de votos295 que são investidos recursos

ilícitos nas eleições, quebrando o equilíbrio entre os concorrentes, inovou o art.

41-A da Lei n. 9.504/1997, também, ao penalizar o candidato com a cassação do

seu registro e, se já eleito, com a cassação do diploma – além de multa –, sendo

desnecessário o trânsito em julgado da decisão para o cumprimento da decisão.

Cumpre chamar atenção: praticada a conduta vedada, penaliza-se a

partir da candidatura – ultrapassando-a, se necessário –, ou seja, desde o início

do processo eleitoral.

O marco da efetividade já é materialmente sentido. Como abordado no

trabalho, dentre muitas e sérias discussões latentes, duas em especial hão de ser

notadas: a primeira, prejudicial, envolve a constitucionalidade da norma; a

segunda, a execução imediata das decisões fundadas no 41-A.

294 A expressão “influência” traz uma informação muito mais clara e precisa do que se entende por “poder”, razão pela qual é empregada como sinônimo. 295 Captação ilícita de sufrágio.

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A questão da constitucionalidade na norma, suscitada em face da

confusão decorrente do rito processual eleito – o ordinário da Lei Complementar

n. 64/1990 (art. 22) e não o rito da Lei n. 9.504/1997 (art. 96) – já foi superada. O

Tribunal Superior Eleitoral firmou entendimento de que a captação ilícita de

sufrágio não gera inelegibilidade, apenas penaliza o candidato que praticar as

condutas vedadas pela norma com a exclusão do certame (cassação do registro

da candidatura, ou do diploma, e multa).

A questão da execução imediata, também decorrente de errônea

intelecção, neste caso do art. 15 da Lei Complementar n. 64/1990 (que versa

sobre inelegibilidade e exige o trânsito em julgado da decisão – inaplicáveis à

captação ilícita de sufrágio), não foi apenas ultrapassada pelo Tribunal Superior

Eleitoral como, também, pelo Supremo Tribunal Federal.296

Tal posição é importantíssima para o desfecho dessas pendências. A

solução do impasse gerado a partir do art. 15 da LC n. 64/1990 encerra qualquer

querela acerca da constitucionalidade do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997. É que a

inconstitucionalidade fora suscitada a partir do estabelecimento de nova

inelegibilidade pelo 41-A, ou seja, por meio legislativo impróprio, uma vez que tais

situações só podem ser reguladas pela Constituição ou por lei complementar.

Afastado o art. 15 da Lei Complementar n. 64/1990, afastou-se a inelegibilidade; e

afastada esta, excluída qualquer pecha de inconstitucionalidade.

Confirmada a efetividade da norma, poder-se-ia ter por alcançado o

objeto deste trabalho, mas há mais a considerar.

296 Mandado de Segurança 25.458-1, Rel. Originário Min. Marco Aurélio; Rel. para o Acórdão Min. Carlos Velloso, publicado no Diário da Justiça da União (Seção 1) de 16 dez.2005.

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É que “efetividade” possui uma abrangência maior que a certeza da

existência de instrumentos cabais e de um Poder Judiciário alerta e preparado

para responder às demandas na exata medida de sua razão. Efetividade abrange

conhecimento e acesso a tais instrumentos e ao Eleitoral; abrange participação e

voz dos protagonistas da Democracia – o eleitor (cidadão) “com seu voto”. Ela

deve ser vivida e sentida, primeiramente pelo seu rigor (constrangendo os que

fazem uso de meios ilícitos de captação de sufrágio) e, num segundo estágio,

como efeito pedagógico, disseminando mudança de atitude, pois é certa a

existência de instrumentos legais e institucionais voltados à preservação da livre

vontade do eleitor, da lisura do processo e da verdade dos resultados,

abrangendo o processo eleitoral em seu todo, mas o que se busca é, também,

mais consciência e responsabilidade – menos força, coação e constrangimento.

Outrossim, quedou-se silente o trabalho quanto às corriqueiras notícias

de corrupção e fraude veiculadas na imprensa. Em razão disso, apenas uma nota.

Muitos dos fatos em investigação e/ou denunciados são considerados

desvios da Administração Pública, ou desvios no exercício de cargo público, quer

como agente político, quer como agente administrativo; mas outros tantos podem

ter sua origem em campanhas eleitorais, em prestações de contas – partidárias

ou de campanha – fraudulentas, ou no uso indevido de recursos de campanha ou

de partidos políticos, o que permitiria facilmente fazer a ponte ao abuso do poder

econômico, à captação ilícita de sufrágio e/ou à corrupção eleitoral. Mas essa

matéria, para o fim proposto, passa à margem, sem que deixe de ser grave ou

contundente. Ao contrário, reflete uma realidade política e administrativa, onde

público e privado encontram-se curiosamente confundidos.

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No mais, o material selecionado nesta dissertação permite dispensar

tais ocorrências, ainda sob investigação (investigação política, uma vez que sob a

responsabilidade do Poder Legislativo).

A função político-institucional da Justiça Eleitoral (mesmo que

esbarrando na dificuldade da falta de recursos – materiais e humanos –, o que,

todavia, não tem impedido sua evolução e aperfeiçoamento) também tem

contribuído como o aperfeiçoamento do processo eleitoral. Fomentando o

engajamento social e institucional – inclusive das greis político-partidárias – na

busca de um efetivo comprometimento para a consolidação do tão propalado

Estado Democrático de Direito, suas ações reais e resultados concretos são

igualmente efetivos na construção de um sistema político menos desigual. O

exemplo mais contundente dessa participação é constatado em suas decisões –

acórdãos e/ou resoluções –, por meio das quais a legislação eleitoral, dentro da

melhor exegese e aplicação das normas vigentes, é mantida atualizada.

E esse ponto é pertinente por confirmar uma necessidade premente, a

da tão propalada reforma política, mesmo que uma reforma política adequada à

realidade brasileira ainda seja algo remoto, quase utópico. Mas há que ter

destaque a necessidade de se repensar, imediatamente, pelo menos um ponto do

sistema político-partidário: a fidelidade partidária. Refrear o ímpeto da classe

política com relação à troca de partidos, que o faz segundo sua conveniência

pessoal (mais uma vez o fisiologismo!), seria um primeiro e importante passo para

desencadear outras mudanças culturais e procedimentais – não só com relação

ao vínculo “mandato-partido político”, mas, também, “mandato-Sociedade” e

“mandato-Poder Legislativo/Executivo”.

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A facilidade de trânsito, por parte do detentor do mandato eletivo, entre

as greis político-partidárias, é um dos maiores males do sistema brasileiro.

A partir dessa, outras reflexões são vitais, algumas delas já trazidas à

baila superficialmente nestas linhas – mas, reitera-se, merecedoras de atenção,

foco e pesquisa, quiçá em outro trabalho. Fala-se de antigas bandeiras, sempre

atualíssimas em virtude da velocidade com que o processo político se desenvolve

no Brasil, quais sejam: (v.g.) “obrigatoriedade do voto”, “financiamento público de

campanhas”, “voto distrital”, “reforma partidária”, enfim, “reforma política”.

E, de tudo isso, imprescindível ter presente que o voto não é uma

mercadoria, uma mercadoria que tem preço. Voto tem valor, e valor não é preço!

– pois preço é o que todos pagam pelo mau uso dos valores. Voto é valor, é

liberdade, é poder, é libertação.

Existe, à disposição de todos, um aparato estrutural – legislativo e

institucional – a dar suporte à melhoria social por meio do livre exercício do voto;

existe esse novo dispositivo, comprovadamente efetivo no trato da captação ilícita

do sufrágio; existe um chamamento à participação dos cidadãos na vida pública

nacional, a servir de instrumento para combater a máxima de que onde há poder

tende-se ao arbítrio e ao abuso; existe, também, e não é menos verdade, a

responsabilidade desses cidadãos com os destinos políticos da Nação.

Reflitamos, então, se temos sido responsáveis com nossa Sociedade,

com nossa Nação!?

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BRASIL. Tribunal Superior eleitoral. Agravo Regimentado no agravo de instrumento n. 772. Investigação Judicial para apurar abuso de autoridade.

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Recorrente: Flávio dos Santos Chaves. Recorrido: Procuradoria Regional Eleitoral em Roraima. Relator: Ministro Humberto Gomes de barros. Brasília, Acórdão de 29 de junho de 2004. Diário da Justiça, Brasília, DF, 5 nov.2004. Seção 1. p. 159.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Agravo regimental de instrumento n. 12.239. Investigação Judicial para apurar abuso de autoridade (art. 22 da LCM 64/90). Agravante: Maria Aparecida Campos Straus. Agravado: Procuradoria Regional Eleitoral/RJ. Relator: Ministro Nelson Jobim. Brasília, Acórdão de 17 de agostro de 2000. Diário da Justiça, Brasília, DF, 29 set.2003, Seção 1, p. 168.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Agravo regimental na medida cautelar n. 1282. Agravante: Maria Vanusia de Oliveira Sousa e outro. Agravado: Diretório Municipal do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Relator: Ministro Barros Monteiro. Brasília, Acórdão de 5 de agosto de 2003. Diário da Justiça, Brasília, DF, 3 out.2003. Seção 1. p. 103.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ata da 190ª Sessão. - Discurso do Ministro Paulo Brossard. Brasília, 1994. p. 17-19, 24.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Ata da 190ª Sessão. - Discurso do Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Brasília, 1994. p. 3

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Investigação judicial e representações por descumprimento da Lei Eleitoral. Processo administrativo n. 21.166. Interessada: Corregedoria Regional Eleitoral de São Paulo: Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo. Brasília, acórdão de 01 de agosto de 2002. Diário de Justiça, Brasília, DF, 6 set.2002. Seção 1, p. 205.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Processo administrativo n. 20.887. Designação de Promotor de Justiça do Estado para auxiliar o procurador Regional Eleitoral. Interessado: Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco. Relator: Ministro Fernando Neves. Brasília, Acórdão de 4 de out.2001. Diário de Justiça, Brasília, DF, 14 dez.2001. Seção 1, p. 205.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso especial eleitoral n. 13.185. Analfabetismo. Teste de verificação. Recorrente: Procuradoria Regional Eleitoral / TO. Recorridos: Sebastião Gonçalves Lopes e outros candidatos a vereador. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília, acórdão de 23 de setembro de 1996. Diário da Justiça, Brasília, DF, 13 out.1996.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso especial eleitoral n. 19.644. Captação ilegal de sufrágio. Art. 41-A da lei 9.504/97. Inconstitucionalidade parcial afastado. Infração configurada Imediata cassação do diploma. Recorrente: José Silva Monteiro. Recorrido: Rivanda Farias de Oliveira. Relator: Ministro barros Monteiro. Brasília, Acórdão de 3 de dezembro de 2002. Diário da Justiça, Brasília, DF, 14 fev.2003. Seção 1, p. 190.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso especial eleitoral n. 19.395. Investigação judicial eleitoral. Abuso de poder econômico. Captação de votos entre candidatos. Recorrente: Procuradoria Regional Eleitoral/ TO. Recorrido: Hélio Herculano Castro, Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Brasília, Acórdão

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de 23 de outubro de 2001. Diário da Justiça, Brasília, DF, 1º abr.2002. Seção 1, p. 114.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso especial eleitoral n. 13.185. Analfabetismo. Teste de verificação. Recorrente: Procuradoria Regional Eleitoral / TO. Recorridos: Sebastião Gonçalves Lopes e outros candidatos a vereador. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília, acórdão de 23 de setembro de 1996. Diário da Justiça, Brasília, DF, 13 out.1996.

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MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso eleitoral. Investigação judicial eleitoral. Agravos retidos. Conhecidos e providos. Acórdão n. 3.884. Recorrente: José Domingues Ramos. Recorrido: João Niero Friosi. Relator: Dr. Manoel Mendes Carli. Campo Grande, acórdão de 30 de maio de 2001. Diário da Justiça, Campo Grande, 2 jul.2001.

MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso eleitoral. Consultas médicas gratuitas e promessa de remédios. Captação de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Sentença que declara a inelegibilidade com base no art. 22, Inciso XIV, da Lei Complementar n.64/90. Acórdão n. 3.775. Recorrente: Rui Barbosa; Recorrida: Coligação novo milênio, novos rumos (PSDB, PSD, PFL E

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PPB) Relator: Carlos Alberto Pedrosa de Souza. Campo Grande, acórdão de 6 de dezembro de 2000. Diário da Justiça, Campo Grande, 17 jan.2001.

MATO GROSSO DO SUL. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso em ação de investigação judicial eleitoral. Ação de investigação judicial eleitoral. Execução de serviços pela municipalidade em propriedade particular de eleitor. Parceria entre município e produtores rurais. Previsão legal. Acórdão n. 3.916. Recorrente: Coligação Caarapó de Volta ao Progresso. Recorrido: Guaracy Boschilia. Relator: Dr. Antônio Rivaldo M. de Araújo. Campo Grande, acórdão de 27 de agosto de 2001. Diário da Justiça, Campo Grande, 30 set.2001.

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MINAS GERAIS. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 206. Recurso. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Atipicidade da conduta narrada na inicial. Refeição de plano pelo magistrado a quo. Promessa de santinhos em troca de apoio a candidatura não caracteriza infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97, porque ausente o elemento eleitor. Relatora: Juíza Maria Luiza Mendonça. Belo Horizonte, 09 de março de 2001. Diário da Justiça, Belo Horizonte, 30 mar.2001.

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Gonzaga de Almeida Peixoto., Relator: Juiz Ronaldo Marques Valle. Pará, 21 de novembro de 2000. Diário da Justiça, Pará, 27 de novembro 2000.

PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso eleitoral n. 1.495/2000. Decisão que julgou improcedente representação que visava cassação de registro de candidatura por infração ao art. 41-A, da Lei n. 9.504/97. Acórdão n. 24.878. Recorrente: Coligação Flor da Serra para Todos. Recorridos: Luiz Carlos Guimarães e Luci Rolim. Relator: Dr. Fredi Humphreys. Curitiba, acórdão de 4 de dezembro de 2000. Diário da Justiça, Curitiba, 12 dez.2000.

PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso eleitoral n. 1651/2001. Acórdão n. 25.205. Recorrentes: Sebastião Rogatti e José Nunes Araújo. Recorrido: Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB. Relator originário: Dr. Marcos de Luca Fanchin. Relator: Juiz Nilson Mizuta. Inelegibilidade. Cassação de registro. Documento contendo promessa de realizações. Art. 41-A Lei n. 9.504/97. Curitiba, acórdão de 10 de setembro de 2001. Diário da Justiça, Curitiba, 27 nov.2001.

PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso eleitoral n. 1652/2001. O candidato a posto eletivo que distribui combustível visando a captação da vontade do eleitor sujeita-se às penas previstas no artigo 41-A da Lei n. 9.504/1997. Acórdão n. 25.087. Recorrente: Coligação Unidos por Jardim Alegre. Recorrido: Osmir Miguel Braga. Curitiba, acórdão de 28 de junho de 2001. Diário da Justiça, Curitiba, 3 ago.2001.

PARANÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso eleitoral n. 1743/2001. Representação. Art. 22, LC 64/90. Utilização de salão de festas e da gráfica da APAE em benefício de candidatos. Acórdão n. 25.295. Recorrente: Cirineu Dias. Recorridos: Waldemir Gomes, Paulo Wilson Mendes, Amauri Barriquelo, Ana Lucia Mazeto Gomes e Devanir Martinelli. Relator: Dr. Jaime Stivelberg. Curitiba, acórdão de 22 de outubro de 2001. Diário da Justiça, Curitiba, 30 out.2001.

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SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso – Representação – Infração ao art. 41-A da Lei n. 9.504/97 – apreensão de cestas básicas – Ausência de prova robusta e incontroversa – Inexistência de dolo específico. Acórdão n. 16.895. Recorrente: Ministério Público Eleitoral. Recorrida: Laura Custódia Vieira Ortiz. Relator: Juiz Rui Francisco Barreiros Fortes. Florianópolis, 14 de fevereiro de 2001. Diário da Justiça, Florianópolis, 20 fev.2001. p. 95.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Recurso – Representação – art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Acórdão n. 16.968. Recorrentes: Valci Dal Maso, Carlos Luiz Bernardi e Coligação “União Mais Iraceminha” (PPB/PFF/PDT) Recorridos: Coligação “União mais Iraceminha”, Valci Dal Maso e Carlos Luiz Bernardi. Relator: Juiz Oswaldo José Pedreira Horn. Florianópolis, acórdão de 25 de abril de 2001. Diário da Justiça, Florianópolis, 7 mai.2001. p. 96.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Acórdão n. 9.848. Recurso. Investigação judicial eleitoral. Lei Complementar n. 64/1990. Captação de sufrágio. Suposta violação do art. 41-A. Abuso do poder econômico e de autoridade. Ausência de provas. Não configuração. Recorrentes: Coligação A Força do Povo de Lebon Régis (PPS/PMDB/PTB/PT) Recorridos: Milton Sebastião de Melo; Milton Ribeiro da Silva. Relator: Juiz Rodrigo Roberto da Silva, 2005. Florianópolis, 10 de fevereiro de 2005. Disponível em: <http://arvoredo.tre-sc.gov.br/legjurisp/acordaos.htm> Acesso em: 5 jan.2005.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso - Investigação judicial – Candidato a prefeito municipal. Abuso do poder econômico – Conduta que visa

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promover campanha do candidato. Acórdão n. 17.045. Recorrentes: Epitácio Bittencourt Sobrinho e Partido da Frente Liberal – PFL de Imaruí. Recorridos: Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, Partido Democrático Trabalhista - PDT, Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB e Partido Trabalhista Brasileiro – PTB DE Imaruí. Florianópolis, acórdão de 5 de setembro de 2001. Diário da Justiça, Florianópolis, 15 set.2001. p. 115.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional Eleitoral. Recurso – Investigação judicial eleitoral – Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Acórdão n. 17.082. Recorrentes: Antonio Zamignan e Silvano de Pariz. Recorrido: Partido Progressista Brasileiro – PPB, de Quilombo. Relator: Juiz Rui Francisco Barreiros Fortes. Florianópolis, acórdão de 4 de outubro de 2001. Diário da Justiça, Florianópolis, 15 out.2001. p. 116.

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ANEXOS

ANEXO 1 – Quadro sinótico “Representação com fulcro no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997”

ANEXO 2 – Quadro sinótico “Da ação de investigação judicial eleitoral com fulcro no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990”

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ANEXO 1

QUADRO SINÓTICO Representação com fulcro no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997.

1 – Dom bem jurídico

É a vontade do eleitor. Cite-se esclarecimento do Ministro Nelson Jobim, no

acórdão do Recurso Especial n. 19.553 – Bacuri/MA, de 21.3.2002, Rel. Min. Sepúlveda

Pertence:

“...no art. 41-A, o bem protegido não é o resultado da eleição. O bem protegido pelo art.

41-A é a vontade do eleitor. Então, há um bem protegido distinto [do bem protegido em

sede de ação de investigação judicial eleitoral, intentada com fulcro no art. 22 da Lei

Complementar n. 64/90], o que não autoriza, com isso, se falar em potencialidade.”

(Destaques nossos.)

2 – Da potencialidade lesiva do ato ilícito

Não é relevante, pois apenas a sua prática gera influência sobre a liberdade da

vontade do eleitor.

3 – Da tipificação

A conduta está descrita no art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Aspectos relevantes:

� o candidato – ou interposta pessoa, provada a aquiescência do candidato. Citem-se

julgados do Tribunal Superior Eleitoral:

“Para a tipificação da conduta descrita no art. 41-A é imprescindível que o candidato

seja o autor da ação, ou dela tenha participado ou anuído, e não apenas o seu beneficiário.” (Ac.

n. 19.566, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo, e Agravo Regimental na Medida Cautelar n.

1000, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo, de 26.6.01, publicado em 7.2.01)

“(...)

II – Resta caracterizada a captação de sufrágio prevista no art. 41-A da Lei n.

9.504/97, quando o candidato praticar, participar ou mesmo anuir explicitamente às condutas

abusivas e ilícitas capituladas naquele artigo.” (Resp. n. 19.566, Ac. n. 19. 566, de 18.12. 2001.

Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Publicado no DJ, vol. 1, de 26.4.02, p. 185)

� não se exige que o ato se concretize – basta a mera promessa para a tipificação. O

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procedimento é mais célere e não se busca a verdade real como no processo penal.

� bem ou vantagem pessoal, de qualquer natureza, inclusive emprego ou função

pública – as propostas de campanha não se confundem com as promessas vedadas

neste artigo. Citem-se julgados do Tribunal Superior Eleitoral:

“Não configura conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97 promessa de

campanha no sentido de manter programa municipal de benefícios.” (Ag. de Instrumento n.

2.790, de 8.5.01, publicado em 22.6.01)

“Não configura captação de sufrágio a promessa a ‘comunidade evangélica’

documentada em protocolo de intenções, se não voltada a satisfazer interesses patrimoniais

privados.” (Resp. n. 19.176, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, publicado no DJU de 22.2.02)

“A captação de sufrágio vedada por lei constitui oferecimento ou promessa de

vantagem com o fim de obter o voto do eleitor.” (Consulta n. 552, de 14.12.99. Resp. n. 19.229,

de 15.2.01, publicado em 5.6.01)

� em troca do voto – a promessa ou dádiva deve estar vinculada à troca do

voto. Cite-se julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

“(...)

2 – Para a caracterização de conduta descrita no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997,

é imprescindível a demonstração de que ela foi praticada com o fim de obter o voto do eleitor.”

(Resp. n. 19.229, Rel. Min. Fernando Neves. Ac. n. 19.229)

4 – Do instrumento processual

É a representação. Cite-se julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

“A representação para apurar a conduta descrita no art. 41-A não é a investigação

judicial, apenas segue o procedimento previsto no art. 22 da LC 64/90” (Ag. Regimental na

Medida Cautelar n. 970)

5 – Da legitimidade ativa

Estão legitimados a propor a representação do art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997, os

candidatos a qualquer cargo eletivo no pleito, os partidos políticos, as coligações e o

Ministério Público. (Art. 96, caput, do referido diploma legal.)

6 – Da legitimidade passiva

Estão legitimados a figurar no pólo passivo da relação processual os candidatos,

ou qualquer pessoa, candidato ou não-candidato, que atue a seu mando para praticar a

captação de sufrágio vedada por lei.

7 – Do foro competente

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Cabe ao Juiz Eleitoral, nas eleições municipais, aos Juízes Auxiliares dos

Tribunais Regionais, nas eleições estaduais, julgar a representação.

8 – Dos termos inicial e final para a propositura da representação

Pode-se ajuizar representação a partir do pedido do registro da candidatura perante

a Justiça Eleitoral. Não é a partir do seu deferimento ou da escolha do nome do candidato

em convenção. Cite-se julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

“O termo inicial dos atos configuradores de captação vedada de votos é a data do

pedido de registro da candidatura.” (Resp. n. 19.229, de 15.2.01, DJ 5.6.01)

“...

III – Quanto à aferição do ilícito previsto no art. 41-A, esta Corte já decidiu que o

Termo inicial é o pedido do registro da candidatura.” (Resp. n. 19.566. Ac. 19.566. Rel. Min.

Sálvio de Figueiredo Teixeira. Publicado no DJ, vol. 1, de 26.4.2002, p. 185)”

“(...)

1 – O termo inicial do período de incidência da regra do art. 41-A da Lei n. 9.504, de

1997, é a data em que o registro de candidatura é requerido, e não a do seu deferimento.”

(Resp. n. 19.229, de 15.2.01, DJ 5.6.01)

9 – Do rito

É rito sumário cujas fases e prazos estão previstos no art. 22 da Lei

Complementar n. 64, de 1990. Mas a representação será processada e julgada pelo Juiz

Eleitoral Auxiliar dos Tribunais Regionais, na hipótese de eleições estaduais.

10 – Da Sanção

O art. 41-A não gera a inelegibilidade. Apenas afasta o candidato da disputa

imediatamente, além de cominar-lhe a cassação do seu registro ou diploma e multa. Cite-se

julgado do Tribunal Superior Eleitoral.

“As punições para a conduta prevista no art. 41-A estão especificadas neste

dispositivo legal, não sendo aplicáveis as penas estabelecidas no art. 22 da LC 64/90.” (Ag.

Regimental na Medida Cautelar n. 970)

11 – Dos efeitos da decisão

São imediatos. Citem-se julgados do Tribunal Superior Eleitoral:

“A decisão fundada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97 terá efeito imediato.” (MC n.

994, Rel. Min. Fernando Neves, de 31.5.01. Resp. n. 19.023, DJ 14.5.01, Rel. Min. Sálvio de

Figueiredo. MC n. 995, DJ 8.6.01, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo. Resp. n. 19.552, 13.12.01, Rel.

Min. Sálvio de Figueiredo. Resp. n. 19.176, 16.1.01, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Resp. n.

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19.420, Rel. Min. Sálvio Figueiredo)

“Cassação de registro (L. 9.504/97, art. 41-A): eficácia imediata.

1- A decisão que, com base no art. 41-A, cassa o registro de candidato tem

eficácia imediata, despidos os recursos cabíveis de efeito suspensivo...” (Questão de Ordem no

Resp. n. 19.528. Rel.: Min. Ellen Gracie.)

Trecho do voto do Ministro Sepúlveda Pertence, Relator na Questão de Ordem no

Recurso Especial n. 19.528, citando o Ministro Fernando Neves:

“Como observei no precedente já citado (MC n. 970), as alterações da Lei n. 9.504,

de 1997, entre as quais consta a introdução do art. 41-A, vierem ao encontro da vontade da

sociedade de ver rapidamente apurados e punidos os ilícitos eleitorais. Neste caso, o interesse

a prevalecer é o de afastar imediatamente da disputa aquele que, no curso da campanha

eleitoral, tenha incidido no tipo captação de sufrágio vedada por lei. Por isso, o legislador,

diferentemente, de quando tratou das declarações de inelegibilidade, não condicionou ao

trânsito em julgado os efeitos da decisão que cassa diploma por transgressão ao referido art. 41-

A.”

“A representação para apurar a conduta descrita no art. 41-A tem efeito imediato,

não sendo aplicável o art. 15 da LC 64/90.” (Ag. Regimental na Medida Cautelar n. 970)

“A permanência, na urna eletrônica, do nome do candidato que tenha seu registro

cassado com base no artigo 41-A da Lei 9.504, de 1997, bem como o prosseguimento de sua

propaganda eleitoral – o que se dá por conta e risco do candidato e/ou de seu partido político

em virtude da interposição de recurso – não significa retirar o efeito imediato da mencionada

decisão, que, entretanto, não pode ser tido como definitiva antes de seu trânsito em julgado.”

(Questão de Ordem na Instrução n. 55)

Quanto à destinação dos votos obtidos pelo candidato cujo nome constou na urna

eletrônica, sendo negado provimento ao seu recurso após o pleito, o Tribunal Superior Eleitoral

ainda não firmou entendimento acerca da matéria, pois não houve caso concreto ainda, mas

acreditamos que deverão ser considerados válidos.

12 – Do recurso

Interponível no prazo de três dias contra decisão dos Juízes Eleitorais, segundo

previsão do art. 258 do Código Eleitoral, por falta de previsão especial, em eleições

municipais.

No entanto, nas presentes eleições de 2002, considerando que os Juízes

Auxiliares dos Tribunais julgarão as representações do art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997, mister

se faz observar o teor dos arts. 8º e 9º da Resolução n. 20.951, de 13.12.2001, do colendo

Tribunal Superior Eleitoral:

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“Art. 8º - Contra a decisão dos juízes auxiliares caberá agravo, no prazo de

vinte e quatro horas da publicação da decisão na Secretaria, assegurado ao recorrido o

oferecimento de contra-razões, em igual prazo, a contar da sua notificação.

§ 1º - O agravo será levado à sessão pelo próprio juiz auxiliar, que substituirá

membro da mesma representação, observada a ordem de antigüidade, e julgado pelo

Plenário do Tribunal, no prazo de quarenta e oito horas, a contar da conclusão dos autos

independentemente de pauta.”

“Art. 9º - Da decisão de Tribunal Regional Eleitoral caberá recurso especial para o

Tribunal Superior Eleitoral, no prazo de três dias, a contar da publicação.” (Destaques nossos.)

Não há que cogitar de ofensa à garantia constitucional da inamovibilidade, quando

da substituição do Juiz membro da Corte pelo Juiz Eleitoral Auxiliar da mesma categoria, para o

julgamento do agravo, interposto contra decisão deste Juiz Auxiliar em representação fundada

no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997, nas eleições de 2002.

A inamovibilidade é uma das garantias para assegurar a independência do Juiz, que

pode recusar remoção ou promoção, salvo na hipótese legal. Na substituição eventual, que se

faz para o julgamento do agravo, não se fere essa garantia constitucional do magistrado, pois o

que se pretende é atender a um procedimento processual. A substituição pelo Juiz Auxiliar do

membro da Corte de mesma categoria visa a permitir que o julgador que apreciou a questão

enfrentada por meio de agravo possa atuar em sua reapreciação, submetendo-a ao órgão

colegiado.

Portanto, não ocorre a remoção do Juiz membro da Corte contra a vontade dele.

Atende-se apenas a um procedimento processual, que visa à correta apreciação do recurso,

obedecendo-se ao princípio constitucional do devido processo legal.

13 – Dos efeitos do recurso

Não tem efeito suspensivo o recurso contra a decisão que cassa o registro de

candidato ou o diploma a ele conferido, com base no art. 41-A da Lei n. 9.504, de 1997. Cite-se

julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

“Cassação de registro (L. 9.504/97, art. 41-A): eficácia imediata.

1 – A decisão que, com base no art. 41-A, cassa o registro de candidato tem eficácia

imediata, despidos os recursos cabíveis de efeito suspensivo.

2 – Decisão de TRE que, em sentido contrário, determina que a cassação só gere

efeitos após o trânsito em julgado não é oponível ao acórdão do TSE que, substituindo o da

instância a qua, ordena o cumprimento imediato do julgado.

3 – Entretanto, se se cuida de decisão individual tomada no TSE pelo relator de

recurso, o seu cumprimento deve aguardar a exaustão do prazo para o agravo regimental ou o

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julgamento desse.” (Questão de Ordem no Resp. n. 19.528. Ac. n. 19.528. Rel.: Min. Ellen

Gracie.)

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ANEXO 2

QUADRO SINÓTICO

Da ação de investigação judicial eleitoral com fulcro no art. 22 da Lei

Complementar n. 64, de 1990.

1 – Dom bem jurídico

É a lisura do pleito.

2 – Da potencialidade lesiva do ato ilícito

É relevante que os fatos praticados tenham potencial lesivo suficiente para

macular a legitimidade das eleições, em virtude de o bem jurídico protegido ser a sua lisura.

Não se perquire o nexo de causalidade entre os fatos narrados e o resultado do

pleito. Esta relação é relevante somente para o ajuizamento de ação de impugnação de

mandato eletivo. Citem-se julgados do Tribunal Superior Eleitoral:

“Representação. Abuso do poder econômico. Inelegibilidade. Tratando-se de

práticas ilegais, configuradoras de abuso de poder econômico, hábeis para promover um

desequilíbrio na disputa política, não é de exigir-se o nexo de causalidade, considerados os

resultados dos pleitos. (Recursos Especiais ns. 12.282, 12.394 e 12.577)” (Resp. n. 11.469. Ac.

n. 11.469. Rel.: Min. Costa Leite. JTSE, Brasília, v. 8, n. 2, p. 112)

“Abuso de poder econômico.

Inexigível se demonstre a existência de relação de causa e efeito entre a prática tido

como abusiva e o resultado das eleições.

Necessário, entretanto, se possa vislumbrar a potencialidade para tanto.(...)” (Resp.

n. 15.161. Ac. n. 15.161. Rel.: Min. Eduardo Ribeiro. Publicado no Diário da Justiça em 8.5.98, p.

69)

“...A normalidade e legitimidade das eleições como um todo, pressupõe a

normalidade e a legitimidade dos diversos estágios do processo eleitoral, de modo que o

comportamento abusivo adotado em determinada fase (da propaganda eleitoral, por exemplo)

há de ser apurado e punido, considerando-se a sua aptidão para comprometer aquela fase do

processo eleitoral e não obrigatoriamente o resultado final do pleito.” (Rec. n. 2.244. Rel.:

Min. Marco Aurélio. Publicado no JTSE, v. 7, n. 1, p. 251)

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3 – Da tipificação

A ação de investigação judicial eleitoral é ajuizada, por excelência, com fulcro

no caput dos arts. 19 e 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990. Observe-se, contudo, que

há três outras disposições, todas contidas na Lei n. 9.504, de 1997, em seus arts. 41-A, 73

e 74, que permitem a sua propositura, sendo, portanto, também hipóteses de cabimento

da referida ação.

O art. 41-A dessa mesma lei pode fundamentar ação de investigação eleitoral,

na hipótese de corrupção por abuso de poder econômico.

As condutas vedadas pelo art. 73 podem também servir como causa de pedir

para a ação de investigação judicial eleitoral, tendo por efeito a declaração de

inelegibilidade, ex vi do inciso XIV do art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990, muito

embora por meio do procedimento estabelecido no art. 96 e seguintes da Lei n. 9.504, de

1997, seja possível aplicar a sanção de multa e a cassação do registro ou do diploma.

E o art. 74 traz previsão expressa de ajuizamento de ação de investigação

judicial eleitoral, na hipótese de conduta nele descrita.

Os fatos ilícitos atacáveis por ação de investigação judicial eleitoral não se

confundem com as inelegibilidades preexistentes ou a ausência de uma condição de

elegibilidade.

Aspectos relevantes na conduta descrita no caput do art. 22 da Lei Complementar n.

64, de 1990:

uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico – cite-se o mestre em

Direito Processual Civil, que já compôs a Corte do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, o

ilustre Juiz Ernane Fidélis, que esclareceu que seja abuso do poder econômico:

“O abuso econômico caracterizador de infração eleitoral não se revela apenas pelo

negócio escuso, pela compra direta do voto, mas também pelo processo sugestivo ao eleitorado,

mediante gastos excessivos, favores e dádivas concedidas sem razão plausível e sem

fundamento social para tal.” (TRE/MG. Recurso em AIME n. 6/95, 85ª ZE, Rel. Juiz Ernane

Fidélis.)

uso indevido, desvio ou abuso do poder de autoridade – cite-se voto do

digno Ministro Marco Aurélio, em julgamento em que adotou parecer ministerial como razões de

decidir:

“Entretanto, no que diz respeito à relação causal necessária para que determinada

conduta abusiva, antes de apurado o resultado das eleições possa ser considerado atentatório à

normalidade e à legitimidade da eleição, creio que a Justiça Eleitoral deve satisfazer-se com a

probabilidade do comprometimento, seja da normalidade, seja da legitimidade do pleito.

E essa probabilidade de comprometimento (da normalidade ou da legitimidade, mas

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não necessariamente do resultado) do pleito caracteriza-se sempre que resultem comprovados

comportamentos que revelem influência do poder político ou econômico no desenvolvimento do

processo eleitoral. É que, em tais hipóteses, desaparecem ou a imparcialidade que se exige da

administração pública, ou a neutralidade do poder econômico, pressupostos admitidos pela

Constituição como necessários à proteção da normalidade e da legitimidade das eleições (art.

14, § 9º, CF/88).(...)” (TSE. Rec. n. 12.244. Rel.: Min. Marco Aurélio. Publicado no JTSE, v. 7, n.

1, p. 251)

utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social – o

Tribunal Superior Eleitoral assim definiu a matéria:

“Abuso de poder econômico e utilização indevida de meios de comunicação social

(LC 64/90, art. 22).

2 – Tais ações ilícitas ficam caracterizadas quando o candidato, durante o período

de propaganda eleitoral, e com recursos próprios, publica e divulga livro de sua autoria,

versando matéria pertinente a campanha eleitoral, e, mediante “outdoors” e anúncios em jornais

cujos lay outs são coincidentes, na imagem e na mensagem, com os outros “outdoors” e

anúncios de sua candidatura a cargo eletivo.

3 – Irrelevante para a configuração da conduta proibida o volume ou a origem dos

gastos não autorizados por lei ou a vantagem em votos eventualmente obtida.

4 – A Constituição assegura, sob o manto da isonomia legal, a igualdade de

oportunidade entre candidatos e partidos, para tanto definindo, explicitamente, como contrários à

normalidade e à legitimidade das eleições, a influência do poder econômico ou o abuso do

exercício de função, cargo ou emprego na Administração direta ou indireta (Constituição, art. 14,

§ 9º).

A lei complementar, prevista na Constituição, prevê, ainda, como expressões

contrárias ao sentido da Carta, a utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social

em benefício de candidato ou de partido político (Constituição, art. 14, § 9º; LC 64/90, art. 22).

Essa é a razão pela qual a lei eleitoral fixa regras rígidas de igualdade de acesso e

de uso dos meios de comunicação social e de outdoors para fins de propaganda eleitoral.

5 – Precedentes: Recursos 9.354 (“Boscardini”), 9.350 (“Pirapora”), 11.214

(“Aristimunha”) e 12.244 (“Lucena”).

6 – Recurso não provido.”

Quanto ao art. 74 da Lei n. 9.504, de 1997, esclareça-se que o desrespeito aos

limites postos na conduta prevista no art. 37, § 1º, da Constituição da República constitui

abuso de autoridade, para os fins dos disposto no art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990,

ficando o responsável, se candidato, sujeito ao cancelamento do registro de sua candidatura.

Significa que a realização, no período eleitoral, de publicidade dos atos, programas,

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obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos, que não tenha caráter educativo, informativo

ou de orientação social, e ainda nela constando nomes, símbolos ou imagens que caracterizem

promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos, constitui tanto abuso de autoridade

punível na esfera eleitoral, por meio da Lei Complementar n. 64, de 1990, quanto violação

da norma constitucional.

Também a utilização em campanha eleitoral de símbolo ou marca adotado pelo

administrador em material de divulgação dos feitos da sua gestão à frente de Administração

Pública configura abuso de poder de autoridade e econômico, porquanto o ora candidato

valeu-se de verba pública para consolidar esse símbolo ou marca. Por conseguinte, eles se

incorporam ao bem público, não podendo ser utilizados pelo candidato. No que tange ao art.

41-A da mesma lei, é possível o ajuizamento da ação de investigação judicial eleitoral, com

fulcro em abuso de poder econômico. Os fundamentos fáticos da representação podem

assoalhar a pretensão do autor nessa ação. A diferença é quanto ao alcance da sentença.

Enquanto o art. 41-A visa apenas a afastar do processo eleitoral o candidato que pratica atos

que desigualem a disputa eleitoral, influindo sobre a vontade do eleitor, o julgamento procedente

do pedido na ação de investigação leva à declaração de inelegibilidade do candidato naquele

pleito e nos três anos subseqüentes a ele.

4 – Do instrumento processual

Trata-se de representação para pedir a abertura de investigação judicial. Na

verdade, não é mera investigação que visa à apuração de um fato, mas também ao julgamento

desse fato.

É, assim, um processo litigioso, que se inicia por uma representação, e que, embora

desencadeie procedimento denominado investigação, leva a uma decisão de mérito. Alguns dos

fatos apontados se conhecem desde logo; outros se desdobram no curso da instrução,

evidenciando o caráter híbrido da medida e sua atipicidade em relação aos feitos tradicionais da

processualística eleitoral ou ordinária.

5 – Da legitimidade ativa

Estão legitimados a propor a ação de investigação judicial eleitoral os candidatos a

qualquer cargo eletivo no pleito, os partidos políticos, as coligações e o Ministério

Público. (Art. 22, caput da Lei Complementar n. 64, de 1990)

6 – Da legitimidade passiva

Estão legitimados a figurar no pólo passivo da relação processual os candidatos

beneficiados pela prática dos atos ilícitos, qualquer pessoa, candidato ou não-candidato,

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que atue para beneficiar ilicitamente algum candidato ou mesmo pré-candidato, que

obtenha seu registro posteriormente.

7 – Do foro competente

Nas eleições municipais, a representação deve ser dirigida ao Juiz Eleitoral, que

tem competência para processá-la e julgá-la. (Art. 24 da Lei Complementar n. 64, de 1990.)

Nas eleições estaduais, a representação deve ser dirigida ao Corregedor

Regional Eleitoral.

Na eleição presidencial, a representação deve ser dirigida ao Corregedor Geral

Eleitoral. Cite-se julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

“Representação. Investigação judicial. LC 64/90, art. 22.

Competência do Corregedor Regional para processá-la e do Tribunal Regional Eleitoral para o

respectivo julgamento. Impossibilidade de deslocar-se a competência, com base na

conexão, dado seu caráter funcional e, pois, absoluto.” (Rep. n. 233. Ac. n. 20.435. Rel.:

Min. Eduardo Ribeiro. Publicado no DJ em 4.5.99, p. 44) (Destaques nossos.)

8 – Dos termos inicial e final para a propositura da representação

O entendimento do Tribunal Superior Eleitoral é de que não existe Termo inicial

para a propositura da ação de investigação judicial eleitoral, sendo o Termo final da data

da diplomação do eleito, quando se finda a jurisdição eleitoral. Citem-se recentes julgados do

Tribunal Superior Eleitoral:

“(...) II – Para a configuração do ilícito previsto no art. 22 da LC n. 64/90, as condutas

vedadas podem ter sido praticadas antes ou após o registro da candidatura.” (Resp. n. 19.566

Rel.: Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Publicado no Diário do Judiciário em 26.4.2002)

“(...)

I – A ação de investigação judicial do art. 22 da LC 64/90 pode ser ajuizada até a

data da diplomação.(...)” (Resp. n. 15.263. Ac. n. 15.263. Rel.: Min. Nelson Jobim. Publicado no

Diário de Justiça de 11.6.99, p. 87)

9 – Do rito

É sumário e suas fases e prazos estão previstos no art. 22, incisos I a XV, da Lei

Complementar n. 64, de 1990.

10 – Da sanção

O art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990, gera a declaração de

inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato

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considerado ilícito para as eleições que se realizarem nos 3 (três) anos subseqüentes à

eleição em que se verificou tal ato, além da cassação do registro do candidato diretamente

beneficiado.

11 – Dos efeitos da decisão

A ação de investigação judicial eleitoral não se destina, em princípio, a cassar

mandatos de cargos eletivos, mas, tão-somente, a cassar o registro da candidatura e a

decretar a inelegibilidade do candidato, e de quantos hajam contribuído para a prática do ato,

por três anos, contados da data da eleição em que se verificou o fato ilícito a ele imputado. Com

isso, ele perde a sua capacidade eleitoral passiva, mas mantêm íntegros o seu direito à filiação

partidária e de fazer propaganda eleitoral, que só desaparecem quando ele perde ou tem

suspensos os direitos políticos, como nas hipóteses do art. 15 da Constituição da República.

Como desdobramentos do julgamento procedente do pedido formulado em ação

judicial eleitoral têm-se:

� a negação do registro ao candidato ou seu cancelamento, se já tiver sido feito;

� ocorrido o julgamento após a eleição do candidato, sendo julgado procedente o

pedido, pode-se declarar a inelegibilidade do candidato e de quantos hajam

contribuído para a prática do ato para as eleições a se realizarem nos três anos

subseqüentes àquela em que se verificou a ilicitude e o Ministério Público pode,

ainda, ajuizar ação de impugnação de mandato eletivo e recurso contra a expedição

de diploma.

Cite-se julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

“Investigação judicial a que se refere a LC n. 64/90. Procedência. Sanção de

inelegibilidade.

1 – Julgada procedente a investigação após a eleição do candidato, é lícito ao

Tribunal aplicar ao representado a sanção de inelegibilidade para as eleições subseqüentes.

2 – Em tal caso, a conseqüência do julgamento não é apenas a de proceder-se à

remessa de cópias ao Ministério Público Eleitoral.

3 – Recurso especial não conhecido.” (Resp. n. 15.024. Ac. n. 15.024. Rel.: Min.

Nilson Naves. Publicado no Diário da Justiça, em 22.5.98, p. 71)

Citem-se trechos de votos em julgados do Tribunal Superior Eleitoral, que elucidam

ainda mais a questão:

“...Certo que o inciso XV dispõe que ‘se a representação for julgada

procedente após a eleição do candidato, serão remetidas cópias de todo o processo ao

Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição

Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral.’ Mas a remessa que se faz de cópias tem

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por objetivo capacitar o Ministério Público para a ação de impugnação de mandato

eletivo. Não quer a disposição, porém, significar esteja o Tribunal impedido de declarar a

inelegibilidade, competindo-lhe então, em caso que tal, limitar-se a remeter cópias ao

órgão ministerial. De que então serviria julgar-se procedente a ação? Apenas para remeter-se

cópias? Seria pouco, não seria?” (Trecho do voto do Relator, Ministro Nilson Naves, no Resp. n.

15.024. Ac. n. 15.024. Publicado no Diário da Justiça, em 22.5.98, p. 71) (Destaques e grifos

nossos.)

“A razão de ser da exigência contida no referido inciso XV do art. 22 da LC

64/90 é a de preservar, em princípio, o candidato escolhido pelas urnas. Daí porque não

basta a decretação da procedência da investigação judicial, mas se faz necessário

também o exame da matéria em sede de AIME e em recurso contra a expedição de

diploma. Nessa circunstância, a partir do momento em que sejam conhecidos os

candidatos vitoriosos – o que se dá com a proclamação -, a lei para a proteger o eleito

com a exigência de que seja examinada a questão também mediante as vias processuais

específicas. Ou seja, uma vez conhecidos os eleitos, não se pode mais cogitar da pura e

simples cassação do registro da candidatura, como estabelecido pelo inciso XIV do

mencionado dispositivo, mas, em respeito à vontade popular, remeter a questão à sede

própria.” (Trecho do voto do Relator, Ministro Eduardo Alvim, no Resp. n. 15.061, in Revista de

Jurisprudência do TSE, vol. 9, tomo 4, p. 184). (Destaques e grifos nossos.)

12 – Do recurso

Nas eleições municipais – cabe recurso inominado para o Tribunal Regional

Eleitoral contra as decisões proferidas pelo Juiz Eleitoral. Cabe recurso especial das decisões

proferidas pelo Tribunal Regional Eleitoral para o Tribunal Superior Eleitoral, versando sobre

matéria constitucional. Ambas as espécies de recursos devem ser interpostas no prazo de três

dias.

Nas eleições estaduais – cabe recurso ordinário para o Tribunal Superior Eleitoral

das decisões proferidas pelo Tribunal Regional Eleitoral, nos termos do art. 121, § 4º, inciso III,

da Constituição da República.

A regra contida no inciso II do art. 22 da Lei Complementar n. 64, de 1990, não é

aplicável no caso de indeferimento da petição inicial pelo Juiz Eleitoral, nas eleições municipais,

tendo seu alcance circunscrito às investigações processadas perante as Corregedorias Geral e

Regional, ou seja, nas eleições Presidencial e estaduais.

13 – dos efeitos do recurso

Segundo estabelece o art. 15 da Lei Complementar n. 64, de 1990: “Transitada em

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julgado a decisão que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe-á negado registro, ou

cancelado, se já tiver sito feito, ou declarado nulo o diploma, se já expedido.”

Da leitura do referido dispositivo legal extrai-se que a decisão de procedência do

pedido contido na ação de investigação judicial somente será executada após o seu trânsito em

julgado. Portanto, tendo sido interposto recurso, ele deverá ser recebido com efeito suspensivo,

ex vi do referido artigo da Lei Complementar n. 64, de 1990, perfeitamente aplicável à espécie.