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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – CPCJ CURSO DE MESTRADO ACADÊMICO EM CIÊNCIA JURÍDICA – PMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO LINHA DE PESQUISA: PRODUÇÃO E APLICAÇÃO DO DIREITO A RESPONSABILIDADE CIVIL DO JUIZ POR ATOS CONTRÁRIOS AO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: Uma análise doutrinária e jurisprudencial FÁBIO LUIZ COLZANI ORIENTADORA: PROFESSORA DOUTORA CLÁUDIA ROSANE ROESLER Itajaí, 02 de agosto de 2010.

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A RESPONSABILIDADE CIVIL DO JUIZ POR ATOS CONTRÁRIOS

AO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO:

Uma análise doutrinária e jurisprudencial

FÁBIO LUIZ COLZANI

ORIENTADORA: PROFESSORA DOUTORA CLÁUDIA ROSANE ROESLER

Itajaí, 02 de agosto de 2010.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM CIÊNCIA JURÍDICA – CPCJ CURSO DE MESTRADO ACADÊMICO EM CIÊNCIA JURÍDICA – PMCJ ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FUNDAMENTOS DO DIREITO POSITIVO LINHA DE PESQUISA: PRODUÇÃO E APLICAÇÃO DO DIREITO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO JUIZ POR ATOS CONTRÁRIOS

AO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO:

Uma análise doutrinária e jurisprudencial

FÁBIO LUIZ COLZANI

Dissertação submet ida ao Curso de Mestrado em Ciência Jurídica da

Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito final à obtenção do

Título de Mestre em Ciência Jurídica.

ORIENTADORA: PROFESSORA DOUTORA CLÁUDIA ROSANE ROESLER

Itajaí, 02 de agosto de 2010.

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Meus agradecimentos:

À Ana Paula e Ana Luiza, minhas irmãs e minha sobrinha Isabela,

que fazem parte de mim e tornam minha vida especial;

À Patrícia Trentin, pelo companheirismo

e por me mostrar que a vida e o amor

verdadeiro valem à pena;

À Professora Doutora Cláudia Rosane Roesler,

pelo auxílio e dedicação nessa jornada;

Ao Professor Doutor Moacyr Motta da Silva,

pelos inesquecíveis debates acerca da moral e ética;

A Angelin Panceri (in memoriam ), Iracema Panceri ( in memoriam ),

Leopoldo Colzani (in memoriam ) e Eulália Werner Colzani

por terem me dado os melhores pais do mundo.

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Este trabalho dedico:

A Valdir Francisco Colzani e Marinez Panceri Colzani,

meus mestres na academia e também fora dela.

O primeiro, por ter me guiado nos caminhos

apaixonantes do direito e da justiça. A segunda,

por ter me ensinado que, acima de tudo,

la famiglia vene primo.

A ambos, minha eterna dívida e gratidão por todo

o esforço despendido em minha educação e vida.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total

responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho,

isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a Coordenação do Curso de

Mestrado em Ciência Jurídica, a Banca Examinadora e a Orientadora de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 02 de agosto de 2010.

FÁBIO LUIZ COLZANI Mestrando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho e respectivos conceitos operacionais.

AGENTES ADMINISTRATIVOS:

São todas as pessoas físicas que prestam serviços ao Estado e às entidades

da Administração Indireta, mantendo vínculos profissionais, sujeitos à hie-

rarquia funcional e ao regime jurídico da entidade estatal a que servem.

AGENTES DELEGADOS:

São os particulares que recebem a incumbência da execução de

determinada atividade, obra ou serviço e o realizam em nome próprio do

Estado e sob a permanente fiscalização do delegante. Nessa categoria

encontram-se os concessionários e permissionários de obras e serviços

públicos, os tradutores e intérpretes públicos, e as demais pessoas que

recebem as delegações para a prática de atividade estatal ou serviço de

interesse coletivo.

AGENTES HONORÍFICOS:

São as pessoas convocadas, designadas ou nomeadas, para prestar,

transitoriamente, determinados serviços ao Estado, em razão de sua

condição cívica, de sua honorabilidade ou de sua notória capacidade

profissional, mas sem qualquer vínculo empregatício ou estatutário e,

normalmente, sem remuneração. Estes serviços constituem os serviços

públicos relevantes (também chamado múnus público). São exemplos

dessa categoria o jurado e mesário eleitoral.

AGENTES POLÍTICOS:

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São componentes do governo nos seus primeiros escalões, investidos de

cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, desig-

nação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais.

Assim temos nessa categoria tanto os chefes do Poder Executivo quanto

seus auxiliares diretos (Ministros de Estado e Secretários de Estado), os

membros do Poder Legislativo, também os da Magistratura, Ministério

Público, Tribunais de Contas e representantes diplomáticos.

AGENTES PÚBLICOS:

“são todas as pessoas físicas incumbidas, definitiva ou transitoriamente, do

exercício de uma função estatal”1.

CULPA:

“A culpa em sentido amplo, como violação de um dever jurídico, impu-

tável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de

diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a violação intencional

do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela impe-

rícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um

dever”2.

DOLO:

Vontade consciente do agente de violar um direito. Assumir um risco e se

responsabilizar por seus fins.

ESTADO:

É a sociedade dotada de poder soberano e voltada para o bem comum.

IMPERÍCIA:

“Falta de habilidade ou inaptidão para praticar certo ato”3.

1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo, p. 56. 2 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 352.

3 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 35.

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IMPRUDÊNCIA:

“Age com imprudência o profissional que tem atitudes não justificadas,

açodadas, precipitadas, sem usar de cautela”4.

INDENIZAÇÃO:

Espécie do gênero reparação – compensação por ato lícito.

JULGADOR:

“Autoridade judiciária, a que se comete julgar as questões jurídicas”5.

NEGLIGÊNCIA:

A negligência revela-se na omissão de conduta do profissional, que

deveria adotar um determinado procedimento e não o adota.

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO:

Conjunto de regras e princípios que formam o sistema jurídico vigente no

Brasil.

REPARAÇÃO:

Compensação dos prejuízos causados à vítima, através de ressarcimento

(por ato ilícito) ou indenização (por ato lícito).

RESPONSABILIDADE CIVIL:

“É a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano

moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma

praticado, por pessoa por que ela responde, por alguma coisa a ela

pertencente ou de simples imposição legal”6.

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA:

Responsabilizar alguém pela prática de um ato danoso independente-

mente da comprovação de conduta culposa pelo agente.

4 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico, p. 80.

5 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, p. 508. 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 3.

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RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA:

Responsabilizar alguém pela prática de um ato danoso tendo como

fundamento a comprovação da culpa ou do dolo.

RESSARCIMENTO:

Espécie do gênero reparação – compensação para danos materiais.

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SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................................................xii

ABSTRACT .......................................................................................................................xiii

INTRODUÇÃO .................................................................................................................1

Capítulo 1

A RESPONSABILIDADE CIVIL

1.1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS............................................................... 6

1.1.1. A responsabilidade civil no direito brasileiro............................................ 12

1.2. CONCEITOS E PRESSUPOSTOS ............................................................................. 14

1.3. AS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL..............................................19

1.4. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA......................................................23

1.5. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL.............................29

1.6. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E NÃO SOLIDÁRIA ........................................31

1.7. A PRESCRIÇÃO E A DECADÊNCIA NO ÂMBITO DA RESPONSABI-

LIDADE CIVIL .............................................................................................................33

Capítulo 2

OS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE

2.1. DOLO E CULPA..........................................................................................................43

2.2. AÇÃO E OMISSÃO ..................................................................................................46

2.3. NEGLIGÊNCIA, IMPRUDÊNCIA E IMPERÍCIA ......................................................53

2.4. ATO ILÍCITO E ATO LÍCITO......................................................................................58

2.5. DANO..........................................................................................................................61

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2.5.1. Dano moral............................................................................................................64

2.5.2. Dano material.......................................................................................................67

2.6. NEXO DE CAUSALIDADE ........................................................................................69

2.7. REPARAÇÃO DOS DANOS .....................................................................................73

Capítulo 3

A RESPONSABILIDADE DO JULGADOR BRASILEIRO

3.1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ...............................................................75

3.2. CONCEITO DE JULGADOR .....................................................................................83

3.3. A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO POR SEUS PREPOSTOS ........84

3.4. O ERRO DO JULGADOR AO DECIDIR CONTRA A ORDEM JURÍDICA ..........87

3.5. A RESPONSABILIDADE PESSOAL DO JULGADOR..............................................95

3.6. AS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL ..............................................98

3.6.1. Culpa exclusiva da vítima............................................................................. 100

3.6.2. Força maior ........................................................................................................ 101

3.6.3. Caso fortuito ....................................................................................................... 102

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 104

REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS............................................................. 108

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RESUMO

A presente dissertação trata da responsabilidade civil

do julgador brasileiro, especificamente quando ele, por culpa ou dolo,

decide contra o ordenamento jurídico pátrio. A pesquisa mostra que o

Estado seleciona os agentes pelo qual objetiva ver suas vontades

exteriorizadas e aplicadas, desse modo o julgador deve servir apenas de

instrumento de aplicação das leis, seguindo o que manda o ordenamento

jurídico. Assim, quando decide de acordo com sua vontade, ferindo a

ordem jurídica, despe-se do Estado e faz por si, devendo, portanto,

responder pessoalmente por tais atos, pois não se pode admitir que o

Estado (soma de todos os cidadãos), sem redundâncias, seja o único

responsável pela irresponsabilidade de apenas um agente seu.

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ABSTRACT

This dissertation explores the civil responsibility of

Brazilian judge, specifically when, through negligence or fraud, it decides

against the native legal system. The research shows that the state selects

agents for which we aim to see their wills externalized and applied, so the

judge must serve only as an instrument of law enforcement, following the

orders of the legal system. Thus, when the judge decides personally, injuring

the legal order, leaving the state behind and making a decision by

yourself, should respond personally for such acts being the only one

responsible for it.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objeto de investigação

“a responsabilidade civil do julgador brasileiro por atos contrários ao

ordenamento jurídico” e como objetivos: institucional, produzir uma disser-

tação para obtenção do título de mestre em Direito, pela Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI; geral , investigar, à luz da legislação, da doutrina e

da jurisprudência nacionais, a responsabilidade civil do julgador brasileiro,

especialmente nos casos em que age contra o ordenamento jurídico;

específico, analisar se tal responsabilidade é objetiva ou subjetiva e se

prescinde ou não de culpa.

Portanto, não se circunscreve na sua temática, a

responsabilidade penal do julgador.

Para encetar a investigação adotou-se o método

indutivo, operacionalizado com as técnicas do referente, da categoria,

dos conceitos operacionais e da pesquisa de fontes documentais. Para

relatar os resultados da pesquisa, empregou-se o método dedutivo, em

conjunto com as técnicas propostas por COLZANI7.

A pesquisa foi desenvolvida tendo como base a

seguinte hipótese: a) o julgador quando, por culpa ou dolo, decide contra

o ordenamento jurídico e causa lesão ao jurisdicionado, deve responder

pessoalmente pelos danos causados, independentemente da responsa-

bilidade civil objetiva do Estado pelos atos de seus agentes.

O resultado final da investigação foi dividido em três

capítulos.

7 COLZANI, Valdir Francisco. Guia para redação do trabalho científico, p. 75-186

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O primeiro para tratar da responsabilidade civil, no

qual se apresenta breve relato histórico acerca da origem da responsa-

bilização do homem até sua evolução onde se abandonou a vingança

pessoal, trazida pelo código de Hamurabi, “olho por olho, dente por

dente”, chegando à composição voluntária, onde ofensor e ofendido

compunham um acordo através de pecúnia para que o dano fosse

recompensado.

Posteriormente, trata-se da responsabilidade civil no

direito brasileiro, sua divisão histórica originando-se no Brasil-colônia com

as Ordenações do Reino tendo influência no direito romano, posterior-

mente, através do Código Criminal de 1830, momento primeiro em que o

tema foi positivado através de lei, explicitando a adesão ao direito

francês, e a terceira e última que teve como patrono Teixeira de Freitas,

que distinguiu a responsabilidade civil da responsabilidade criminal.

Após, traz-se o conceito dos doutrinadores, os pres-

supostos da responsabilidade civil, as suas excludentes, onde o ofensor

terá sua responsabilidade excluída ao praticar um ato lícito, como

quando agir por legítima defesa, exercício regular de um direito ou

praticado a fim de remover perigo iminente, e até mesmo partindo de um

ato ilícito, desde que haja situação que afaste o nexo causal entre o dano

e a ação ou omissão, como nos casos de força maior e do caso fortuito e

a culpa exclusiva da vítima.

São também tecidas considerações sobre: a diferença

entre responsabilidade subjetiva, aquela que prescinde de culpa e

objetiva, onde não se considera a culpabilidade do agente, mas tão

somente o nexo entre sua ação ou omissão e o dano sofrido pelo

ofendido; contratual, quando o dever jurídico advém de um negócio

jurídico preexistente celebrado entre as partes e extracontratual, quando

esse dever jurídico decorre de lei ou princípio geral do direito; solidária,

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como quando o demandado responderá pelos atos praticados por

terceiros, empregado seu, por exemplo, quando a lei assim exigir, e não

solidária, quando o próprio ofensor responderá pessoalmente pelo dano; e

por fim, trazendo breves comentários acerca da prescrição, que é a

perda do direito de ação do ofendido por um ato estatal, como no

presente trabalho, e decadência.

No segundo capítulo abordam-se os pressupostos da

responsabilidade, como: o dolo, quando o ofensor tem a intenção de

alcançar o resultado danoso, e a culpa, quando o resultado danoso

deriva de erro sem intenção, como a negligência, imprudência ou

imperícia; ação, quando o ofensor age, causando a outrem um dano, e

omissão, quando o ofensor não age e, por isso, causa igualmente um

dano a alguém; negligência, que se consubstancia pela não observância

por parte de um profissional ao seguir determinados procedimentos;

imprudência, quando se age sem a devida cautela e; imperícia, quando

falta ao profissional o devido preparo e conhecimento técnico.

Trata-se também de ato ilícito, quando o ofensor

responderá pelo dano, pois agiu em desconformidade à ordem jurídica

previamente estabelecida, e do ato lícito, composto por uma ação em

conformidade à lei, podendo o ofensor, entretanto responder pelos

prejuízos causados a terceiros.

Discorre-se, ainda, sobre os danos morais, aqueles

causados na esfera extrapatrimonial do ofendido, ou seja, que cause

dano a seu sentimento causando desgosto, revolta e dor íntima; danos

materiais, aqueles ligados diretamente ao patrimônio do ofendido

causando-lhe diminuição presente ou futura; nexo de causalidade, que é

o liame entre a ação ou omissão do ofensor e o dano sofrido pelo

ofendido; e por fim, a reparação de danos que divide-se em duas

espécies, o ressarcimento, que é trazer ao ofendido o restabelecimento

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do seu stato quo ante patrimonial, e a indenização, que serve de

acalento para todos os outros danos sofridos fora da esfera patrimonial.

No terceiro e último capítulo, analisa a responsabili-

dade civil do julgador brasileiro. Inicia-se com uma breve consideração

histórica sobre a função do magist rado, seu método de escolha, que era

ligado diretamente ao seu objetivo funcional, qual seja, optar entre

decisões perfeitamente técnicas ou decisões que representassem de fato

a justiça, passando a figura do julgador como um profissional escolhido

entre os mais bem sucedidos membros de um ramo, no caso, o jurídico.

Não esquecendo, evidentemente, de conceituar o termo julgador, que é

a pessoa investida de autoridade pública administradora da justiça.

Trata-se ainda da responsabilidade objetiva do Estado

por seus prepostos devendo a administração pública responder pelos

danos que seus funcionários causarem a terceiros independente de culpa,

estando resguardado a ela o direito a ação de regresso quando a

conduta daquele contiver culpabilidade.

Posteriormente, se debate acerca do erro do julgador

quando esse decidir contra a ordem jurídica, ou seja, quando se despe da

autoridade pública a ele cedida, e age por si, não pelo Estado,

mandando prender quando a lei manda soltar, mandando tirar quando a

lei manda dar, por exemplo.

Entretanto, a lei processual civil não prevê tal

responsabilização pessoal a não ser nos casos previstos no artigo 133, quais

sejam, quando houver recusa, retardo ou omissão a uma providência

processual determinada advinda de requerimento da parte ou por ofício,

sem justa causa. Não dispondo sobre a hipótese em que o julgador

decide literalmente contra o ordenamento jurídico.

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Assim, ocorrendo decisão contrária ao ordenamento

jurídico, busca-se como hipótese cerne deste trabalho, a responsabi-

lização pessoal do julgador já que, não pode o patrimônio público ser

desfalcado pela conduta ilícita, insculpida de vontade própria, de agente

do Estado.

Por fim conclui-se a pesquisa com as excludentes de

responsabilidade civil, especificamente, a do Estado/julgador, quais

sejam, culpa exclusiva da vítima, quando a própria vítima contribui para o

evento danoso transformando o ofensor em mero instrumento para seu

intento; força maior, quando há fato imprevisível resultante de ato alheio

indo muito além das forças humanas para que não ocorra sua

manifestação e; caso fortuito, derivado de forças naturais, imprevistas,

inevitáveis e estranhas a vontade humana.

Registra-se que as categorias estratégicas deste

trabalho, elencadas em rol próprio, constam do texto sem quaisquer

destaques.

Nas considerações finais apresentam-se breves sínteses

de cada capítulo e se demonstra se as hipóteses básicas da pesquisa

foram ou não confirmadas.

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Capítulo 1

A RESPONSABILIDADE CIVIL

1.1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS; 1.1.1. A RESPONSABILIDADE CIVIL NO

DIREITO BRASILEIRO; 1.2. CONCEITOS E PRESSUPOSTOS; 1.3. AS EXCLU DENTES DA

RESPONSABILIDADE CIVIL; 1.4. RESPONSABILIDADE CIVI L SUBJETIVA E OBJETIVA; 1.5.

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL; 1.6. RESPONSABILIDADE

SOLIDÁRIA E NÃO SOLI DÁRIA; 1.7. A PRESCRIÇÃO E A DECADÊNCIA NO ÂMBITO

DA RESPONSABILIDADE CIVIL.

1.1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS

No início da humanidade na terra, a força física era o

único modo de defesa do homem, tanto que se usava da vingança para

reparar o dano causado a outrem, já que não havia regras para tal

conduta e isto estava incutido nas pessoas como uma concepção de

“justiça”, entendida como o que era justo.

Conforme preceitua LIMA8, apud ALONSO, “é a vingança

privada forma primitiva, selvagem, talvez, mais humana, de reação

espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os

povos nas suas origens, para a reparação do mal sofrido feito pelas

próprias mãos da vítima de lesão, ou seja, a pena privada perfeita”.

Tal conduta pode ser vista sob o aspecto da

reparação do mal pelo mal, não importando a culpa do causador do

dano, mas tão somente o dano em si (a responsabilidade civil objetiva

moderna).

Evidente que nem sempre era possível o ofendido

reagir no exato momento do dano, mas isso não o impedia de reagir,

8 ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p. 5.

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mesmo que depois da lesão. Entretanto, tal “castigo tardio” precisava ser

regulamentado, momento que se deu origem à máxima do “olho por

olho, dente por dente” contida na Lei de Talião.

Nota-se que a responsabilidade penal surgiu muito

antes da responsabilidade civil, podendo inclusive afirmar que esta evoluiu

daquela. No entanto, a existência de ambas perdura ao passar dos

séculos, cada qual em seu ramo, a primeira no âmbito do direito público e

a segunda no direito privado.

Posteriormente, com a evolução da sociedade e com

a implementação de leis passou-se a usar a composição voluntária como

forma de dirimir tais conflitos, na qual o agressor e a vítima faziam um

acordo em que a pecúnia, ou outros bens de propriedade daquele, era

dado a este numa maneira de se reparar a agressão sofrida.

Nestes dois primeiros marcos iniciais não se cogitava a

hipótese da culpa, como elemento fundamental na reparação do dano.

Segundo PEREIRA9, origina-se do direito mesopotâmico,

a idéia de punir o dano, penalizando o agente com um sofrimento igual

ao causado à vítima, preceito este, contido no Código de Hamurabi

(1790-1770 a.C.) e no Código de Manu, entretanto, como afirma KFOURI

NETO10, somente com a Lei Aquília (ano 468) se tem início a generalização

da responsabilidade civil.

Tal lei se originou de um plebiscito proposto pela plebe

de Aquilius, Roma, atribuindo-se a ela a origem do elemento culpa como

fundamental na reparação do dano11.

9 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p.1.

10 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico, p. 34.

11 ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p. 7.

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Segundo GONÇALVES12,

É na Lei Aquília que se esboça, afinal, um princípio geral

regulador de reparação do dano. Embora se reconheça que não continha ainda “uma regra de conjunto, nos

moldes do direito moderno”, era, sem nenhuma dúvida, o germe da jurisprudência clássica com relação à injúria, e

“fonte direta da moderna concepção da culpa aquiliana, que tomou da Lei Aquília o seu nome característico”.

Ainda sobre a Lei Aquília, dispõe PEREIRA13,

Onde se realiza a maior revolução nos conceitos jusromanís-

ticos em termos de responsabilidade civil é com a Lex Aqui-lia (...) Tão grande revolução que a ela se prende a deno-

minação de aquiliana para designar-se a responsabilidade extracontratual em oposição à contratual. Foi um marco

tão acentuado, que a ela se atribui a origem do elemento “culpa”, como fundamental na reparação do dano.

Como conceito de responsabilidade, temos o vocá-

bulo “responsável”, oriundo de responder 14, que por sua vez advém do

verbo latino respondere15. Referido termo traz a raiz latina spondeo,

fórmula essa que se vincula no direito romano, tratando-se da figura do

devedor nos contratos verbais16.

TOMASZEWSKI17 ensina que “imputar a responsabilidade a

alguém, é considerar-lhe responsável por alguma coisa, fazendo-o

responder pelas conseqüências de uma conduta contrária ao dever,

sendo responsável aquele indivíduo que podia e devia ter agido de outro

12 GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao código civil, p. 5.

13 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 3-4.

14 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico , p. 1222.

15 DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade civil, p. 33.

16 DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade civil, p. 33.

17 TOMASZEWSKI, Adauto de Almeida. Separação, violência e danos morais: a tutela da personalidade dos filhos, p. 245.

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modo”. Desta maneira, “responsabilidade” pode revelar a obrigação de

todos os atos que se praticam, como também conduzir à idéia de uma

relação obrigacional.

COELHO18 define que “a responsabilidade civil é a obri-

gação em que o sujeito ativo pode exigir o pagamento de indenização

do passivo por ter sofrido prejuízo imputado a este último”.

Classifica-se como obrigação não negocial, “porque

sua constituição não deriva de negócio jurídico, isto é, de manifestação

de vontade das partes (contrato) ou de uma delas (ato unilateral).

Origina-se, ao contrário, de ato ilícito ou de fato jurídico”19.

Segundo GAGLIANO e PAMPLONA FILHO20, a noção jurídica

de responsabilidade pressupõe a atividade danosa de alguém que,

atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente (legal

ou contratual), subordinando-se, dessa forma, às conseqüências do seu

ato (obrigação de reparar), dizendo que “a Responsabilidade civil deriva

da agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando-se,

assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária à

vítima, caso não possa repor in natura o estado anterior das coisas”21.

Permanecendo nesta linha, STOCO22 salienta que não se

pode deixar de entender que a responsabilidade civil é uma instituição,

“enquanto assecuratória de direitos, e um estatuário para onde acorrem

os insatisfeitos, os injustiçados e os que se danam e se prejudicam por

comportamento dos outros. É o resultado daquilo que não se comportou

18 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 252.

19 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 252.

20 DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade civil, p. 34.

21 GAGLIANO, Pablo S.; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, p. 9.

22 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência, p.112.

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ou não ocorreu secundum ius”23.

Portanto, trata-se de uma conseqüência e não uma

obrigação original. Sendo assim, STOCO24 comenta:

Toda vez que alguém sofrer detrimento qualquer, que for

ofendido física ou moralmente, que for desrespei-tado em seus direitos, que não obtiver tanto quanto foi avencado,

certamente lançará mão da responsabili-dade civil para ver-se ressarcido. A responsabilidade ci-vil é, portanto, a

retratação de um conflito.

Visando à restauração de um equilíbrio moral e

patrimonial desfeito, a responsabilidade civil tem função essencialmente

indenizatória, ressarcitória ou reparadora.

O direito Francês aperfeiçoou as idéias românicas,

estabelecendo um principio geral da responsabilidade civil, como

exemplo, o direito à reparação sempre que houvesse culpa, ainda que

leve, separando-se a responsabilidade civil da responsabilidade penal ou

a existência da culpa contratual que não está ligada a um crime ou um

delito, mas se origina da negligência ou imprudência.

A noção da culpa in abstracto25 e a distinção entre

culpa delitual e contratual, segundo GONÇALVES26 foram inseridas no Códi-

go de Napoleão de 1.804, inspirando a redação dos artigos 1.382 e 1.383.

ALSINA27, apud ALONSO, mostra fundamentos da respon-

23 Secundum ius = segundo (conforme) o direito.

24 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência, p.112.

25 “Atendendo-se a que somente a pessoa dotada de atenção e diligência excepcional poderia evitar a violação, é a culpa levíssima ou muito leve chamada de culpa em abstrato (in abstracto)” (SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico , p. 233).

26 GONÇALVES. Carlos Roberto. Comentários ao código civil, p. 5.

27 ALSINA, Jorge Bustamante. Teoria geral da responsabilidade civil, p. 10.

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sabilidade civil debelados no Código de Napoleão, que serviram de

alicerce ou foram adotadas nas legislações da grande maioria dos países,

especificamente na responsabilidade extracontratual, resultante dos

enunciados de seus artigos 1.382 e 1.383:

a) a obrigação geral de responder pelo dano causado a outrem;

b) a imputabilidade do dano ao autor do fato, a qual não tem outro

fundamento senão através da culpa (não há responsabilidade sem

culpa);

c) que a culpa tanto pode ser intencional como pode decorrer de simples

negligência ou imprudência;

d) que, sendo a culpa a violação do dever genérico de não causar dano

a outrem, ela converte em ilícito o ato executado em tais condições;

e) que sem dano não há responsabilidade civil;

f) que a obrigação de responder é uma sanção de ressarcimento, e não

repressiva, que consiste em reparar o dano causado.

Por fim, observa DINIZ28 que a responsabilidade civil tem

dupla função: garantir o direito lesado à segurança; servir como sanção

civil, de natureza compensatória, mediante a reparação do dano causa-

do à v ítima, punindo o lesante e desestimulado a prática de atos lesivos.

Desse modo, visa garantir o direito lesado à segurança,

mediante o pleno ressarcimento dos danos que sofreu, desfazendo tanto

quanto possível seus efeitos, restabelecendo-se na medida do possível o

statu quo ante29.

Independente das diferentes teses doutrinárias que por

ora, divergem entre sí, mas que trazem à tona os conceitos de

28 DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade civil, p. 9.

29 DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade civil, p. 9.

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equivalência e contraprestação, chega-se a um consenso comum de

obrigatoriedade.

1.1.1. A responsabilidade civil no direito brasileiro

No direito brasileiro, a responsabilidade civil pode ser

dividida em três fases. A primeira existiu através das Ordenações do Reino,

durante o Brasil-colônia, sendo esta, influenciada pelo direito romano. A

segunda fase teve origem no Código Criminal de 1830, sendo esta, a

primeira legislação nacional, a tratar do tema responsabilidade civil. Já a

terceira, teve como patrono Teixeira de Freitas, que não aceitava a

ligação da responsabilidade civil com a responsabilidade criminal.

No Brasil, tanto o Código Criminal de 1830 quanto o

Código Civil de 1916, sofreram influência do direito francês, sendo a

responsabilidade civil pautada na idéia da existência de culpa por parte

do ofensor. Nota-se tal afirmação com uma breve leitura do artigo 159 do

Código Civil de 1916:

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, causar prejuízo a

outrem, fica obrigado a reparar o dano.

Mas o que seria então um dano passível de repara-

ção? CASILLO30 posiciona-se com clareza:

O Código indica como dano reparável, isto é, indenizável,

aquele decorrente de prejuízo causado ou direito violado. Pretendesse o legislador vincular a noção de dano apenas

às hipóteses onde houvesse prejuízo no sentido de diminuição patrimonial, não teria incluído a expressão violar

direito. Bastaria dizer que aquele que causasse prejuízo ficaria obrigado a repará-lo.

30 CASILLO, João. Dano à pessoa e sua indenização, p. 52-53.

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(...) O direito à indenização nasce quando seja causado o

prejuízo ou simplesmente violado o direito. (...) Basta a violação, a ofensa ao direito, para que a proteção

jurídica referente à reparação imediatamente nasça, independentemente de outra cogitação.

Nota-se então, que para o direito brasileiro, a responsa-

bilidade civil se pautou na demonstração de três requisitos essenciais: o

ato ilícito, o dano e nexo causal.

Portanto, a responsabilidade surge a partir do momento

em que o cidadão deixa de cumprir determinada obrigação, ou se sua

atitude vier a causar dano a outrem, somente existindo assim, após a vio-

lação de um dever jurídico originário, seja contratual ou extracontratual.

Neste sentido GONÇALVES31 ensina que “responsabili-

dade civil é, assim, um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o

dano decorrente da violação de um dever jurídico originário”.

Define assim PEREIRA32:

Como sentimento humano, além de social, à mesma ordem jurídica repugna que o agente reste incólume em face do

prejuízo individual. O lesado não se contenta com a punição social do ofensor. Nasce daí a idéia de reparação,

com estrutura de princípios de favorecimento à vítima e de instrumentos montados para ressarcir o mal sofrido.

Na responsabilidade civil está presente uma finalidade

punitiva ao infrator aliada a uma necessidade que eu designo de pedagógica, a que não é estranha a idéia de

garantia para a vítima, e de solidariedade que a sociedade humana deve-lhe prestar.

31 GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao código civil, p. 6.

32 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 230.

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Assim, a responsabilidade civil deve ser entendida

como um fato humano, como a necessidade de se proporcionar uma

reparação em virtude de um ato que ocasionou um dano.

1.2. CONCEITOS E PRESSUPOSTOS

Para que se possa manter a paz social e a harmonia

humana, é necessário que se estabeleçam normas jurídicas, através da

exigibilidade e coercibilidade, para que, caso haja a violação destas

normas (um ato ilícito), o agente possa ser responsabilizado pelos danos

causados.

Assim, pode-se afirmar que não é possível gerir uma

sociedade organizada sem a existência concomitante de normas capazes

de persuadir33 o ser humano à sua obediência.

Portanto, caso haja a violação de um interesse priva-

do, e esta violação vier a causar um dano a alguém, poderá o agente, ser

condenado a reparar tal ato, através de uma indenização à vítima,

fundamento, portanto, da responsabilidade civil.

Assim, “a responsabilidade serviria, portanto, para

traduzir a posição daquele que não executou o seu dever”34.

A palavra responsabilidade origina-se do latim “respon-

dere”, ou seja, responder a alguma coisa ou responsabilizar alguém por

seus atos danosos.

No entanto, a doutrina não encontra pacificação no 33 Dotadas, portanto, de exigibilidade e coercibilidade.

34 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 35.

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que tange ao conceito acerca do que significa exatamente responsa-

bilidade civil, já que uns se utilizam da culpa para defini-la, outros a tratam

de maneira genérica.

É pacífico, no entanto, que a responsabilidade civil,

modernamente, possui dois aspectos absolutamente opostos: a objetiva e

a subjetiva, que serão estudados adiante.

DINIZ35, diz que responsabilidade civil “é a aplicação de

medidas que obrigam uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial

causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por

pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou

de simples imposição legal”.

Já para PEREIRA36, a responsabilidade civil “consiste na

efetivação da responsabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito

passivo da relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito passivo

compõem o binômio da responsabilidade civil, que então se enuncia

como o princípio que subordina a reparação à sua incidência na pessoa

do causador do dano”.

Não importa se o fundamento é a culpa ou se é inde-

pendente desta. Em qualquer circunstância, onde houver a subordinação

de um sujeito passivo à determinação de um dever de ressarcimento, aí

estará a responsabilidade civil.

Portanto, para o autor, reparação e sujeito passivo

“compõem o binômio da responsabilidade civil, que então se enuncia

como princípio que subordina a reparação à sua incidência na pessoa do

causador” desse dano, pouco importando se o fundamento depende ou 35 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito Civil, p. 30.

36 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 11.

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não da caracterização da culpa, de modo que, em qualquer “circuns-

tância, onde houver a subordinação de um sujeito passivo à determi-

nação de um dever de ressarcimento, aí estará a responsabilidade civil”37.

Para SAVATIER38, apud RODRIGUES, “a responsabilidade

civil vem definida como a obrigação que pode incumbir uma pessoa a

reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de

pessoas ou coisas que dela dependam”.

Assim sendo, quando houver uma violação de um

dever jurídico preexistente, e essa violação resultar dano a outrem, a

responsabilidade civil estará caracterizada.

O atual Código Civil brasileiro trata da responsabi-

lidade civil em seu artigo 186, que dispõe:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Assim sendo, a responsabilidade poderá advir de ato

próprio, de terceiro sob responsabilidade do agente (filhos, tutelados,

curatelados, empregados, etc.) ou ainda por danos causados por coisas

ou animais que lhe pertençam.

Com base neste preceito, o patrão responde pelos

atos de seus empregados, os educadores pelos seus educandos, os

hoteleiros pelos seus hóspedes, bem como, as pessoas jurídicas de direito

privado por seus empregados, e as de direito público por seus agentes.

Destacando-se que a responsabilidade por danos causados por animais e

37 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 11.

38 SAVATIER, René apud RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 6.

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coisas que estejam sob a guarda do agente é, em regra, objetiva, ou seja,

independe da prova de culpa39.

No entendimento de DINIZ40, “a ação, elemento consti-

tutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou

omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio

agente ou de terceiro, ou o fato animal ou coisa inanimada, que cause

dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado”.

Portanto, a ação é o que desencadeia a responsa-

bilidade jurídica, podendo advir de ato ilícito, derivado da culpa, ou de

ato lícito, baseado no risco, assim como, o comportamento poderá ser

uma omissão (deveria agir e não o fez) ou comissão (a prática de um ato

que não deveria realizar).

O artigo 186 do Código Civil dispõe sobre o dolo

quando se refere à ação ou omissão voluntária e também à culpa

quando trata da negligência ou imprudência.

Dolo consiste na vontade do agente em cometer um

ato ilícito, sendo, portanto, “a violação deliberada, consciente,

intencional, do dever jurídico” 41. No evento culposo, por sua vez, não se

deseja o dano, pois ele decorre da negligência, imprudência ou imperícia

do agente.

Não havendo a comprovação de que o ato do

agente causou dano à vítima, não há que se falar em indenização, sendo

a responsabilidade civil ligada diretamente ao dano a ser reparado, já

que este é um pressuposto da mesma, dano este, que poderá ser 39 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 26.

40 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 33.

41 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 27.

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patrimonial ou moral.

Para GONÇALVES42, “ainda mesmo que haja violação de

um dever jurídico, e que tenha existido culpa e até mesmo dolo por parte

do infrator, nenhuma indenização será devida, uma vez que não se tenha

verificado prejuízo. A inexistência de dano é óbice à pretensão de uma

reparação, aliás, sem objeto”.

Para DINIZ43, nem todo o dano é indenizável, a menos

que obedeça certos requisitos, dentre eles: a diminuição ou destruição de

um bem jurídico, patrimonial ou moral pertencente a uma pessoa; a

efetividade ou certeza do dano; a causalidade; a subsistência do dano; a

legitimidade e ausências de causas excludentes.

A diminuição ou destruição de um bem jurídico,

patrimonial ou moral pertencente a alguém corrobora com a idéia de

que não existe reparação ou responsabilidade civil se não houver dano à

vítima, mesmo que haja violação a um direito. A efetividade ou certeza

do dano consiste na comprovação do dano, devendo este ser real e

efetivo, salvo nos casos de dano presumido, pois a lesão não poderá ser

hipotética, como acentua DINIZ44.

Dá-se o nome de causalidade a relação entre o início

da conduta do agente, e o dano sofrido pela vítima, dano este que deve

ser reparado, sendo que somente a vítima e os seus beneficiários possuem

legitimidade para pleitear tal indenização.

Há que se considerar também outro pressuposto da

responsabilidade civil, chamado de nexo causal, que é o vínculo entre a 42 GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao código civil, p. 28.

43 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 49-52.

44 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 49-51.

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ação e o prejuízo, sendo de fundamental relevância a ligação entre

ambos, para que possa ser considerado como causa.

Sobre o nexo de causalidade, ensinam REMÉDIO; FREITAS E

LOZANO JÚNIOR45, que “o dano experimentado pelo ofendido deve ser

decorrente da ação do agente. Se não resultou da conduta deste, não

haverá o dever de indenizar. O nexo causal fica excluído quando o

evento decorrer de força maior ou caso fortuito ou por culpa exclusiva da

vítima”.

Assim, para que esteja caracterizada a relação de

causalidade é necessário que haja vínculo entre o prejuízo e a ação. O

dano causado à vítima deverá ser "efeito" da ação praticada pelo

agente, que poderá ser de forma direta ou conseqüência previsível, pois

“bastará que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse

acontecido. Este poderá não ser a causa imediata, mas, se for condição

para a produção do dano, o agente responderá pela conseqüência”46.

Não são admissíveis, para que haja um dano indeni-

zável, causas de excludentes de responsabilidade, tais como: caso

fortuito, força maior e culpa exclusiva da vítima.

1.3. AS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Existem situações nas quais o agente pratica o ato

coberto pelo manto de uma excludente de antijuridicidade, o que retira

da responsabilidade o elemento imputabilidade, necessário para sua

caracterização.

45 REMÉDIO, José Antonio; FREITAS , José Fernando Seifarth de; LOZANO JÚNIOR, José Júlio.

Dano moral: doutrina, jurisprudência e legislação, p. 7.

46 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 77.

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Neste caso, se o ato lesivo foi praticado em razão de

um fato que levou o indivíduo a uma legítima defesa ou no exercício

regular de um direito, o dano causado não é ressarcível, pois foi praticado

diante de uma conjuntura lícita.

O artigo 188 do Código Civil estabelece os casos em

que o dano será praticado por um ato lícito: os praticados em legítima

defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido e ou o

praticado a fim de remover perigo iminente, neste último, com a ressalva

do parágrafo único, quando for absolutamente necessário e não

havendo excesso.

Mas não são essas as únicas situações nas quais o

agente pode ter sua responsabilidade extinta. Mesmo que o dano

decorra de um ato ilícito, em princípio, havendo uma situação que exclua

o nexo de causalidade entre o dano e a ação ou omissão do agente,

como é o caso da força maior e do caso fortuito e a culpa exclusiva da

vítima, é possível que haja a exclusão da sua responsabilidade.

É importante registrar que a cláusula de irresponsa-

bilidade, acima referida, somente pode ser válida se tratar-se de responsa-

bilidade civil contratual, já que se trata de ajuste bilateral e não pode ser

imposta unicamente por uma das partes contratantes.

As excludentes da responsabilidade civil registradas

pela doutrina são: a) a culpa exclusiva da vítima; b) o fato de terceiro; c)

o caso fortuito ou força maior; e d) a cláusula de não indenizar, no campo

estritamente contratual.

Tais excludentes visam atenuar ou extinguir o dever de

ressarcir o dano causado à vítima, além de tais casos excluírem o nexo de

causalidade entre o agente e a vítima.

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GONÇALVES47 ensina que, quando o evento danoso

acontece por culpa exclusiva da vítima,

desaparece a responsabilidade do agente. Nesse caso,

deixa de existir a relação de causa e efeito entre o seu ato e o prejuízo experimentado pela vítima. Pode-se afirmar

que, no caso de culpa exclusiva da vítima, o causador do dano não passa de mero instrumento do acidente. Não há

liame de causalidade entre o seu ato e o prejuízo da vítima.

Em algumas vezes, a culpa da vítima é parcial ou

concorrente com a culpa do agente, ambos assim, contribuindo para o

ato ilícito.

Via de regra, a obrigação de reparar um dano sofrido

por outrem é do causador, entretanto, nem sempre este é o responsável

pelo dano, como, por exemplo, o fato de um motorista atropelar alguém

na rua por ter sido esta empurrada por terceiro, caracterizando assim o

fato de terceiro, o ato advém de terceira pessoa com interferência do

agente.

Isso decorre do dever de vigilância sobre o incapaz,

não em relação ao nexo causal entre o ato ou omissão do incapaz e o

dano. Portanto, somente quando o incapaz estiver sob sua guarda e

vigilância decorre o dever de vigiar, pela exegese do inciso I e II do artigo

932 do Código Civil brasileiro, mas neste caso estará novamente a lei

sendo redundante, ao repetir a regra anteriormente prevista no artigo 928

do Código Civil brasileiro. Por outro lado, há nova redundância ao

estabelecer que não haverá obrigação de indenizar se os responsáveis

não possuírem meios suficientes.

Contudo, a última parte do artigo 928 do Código Civil

47 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 505.

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brasileiro, no seu parágrafo único, determina que: “a indenização prevista

neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não terá lugar se privar do

necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem”.

REMÉDIO; FREITAS E LOZANO JÚNIOR48 dispõem sobre os

pressupostos exigidos para caracterizar o fato de terceiro:

a) causalidade – o ato deve ser causa do dano;

b) imputabilidade – o ato não pode ser imputado ao devedor;

c) qualidade – terceiro é qualquer pessoa além da vítima e do

responsável;

d) identidade – o fato de terceiro há de poder ser atribuído à alguém;

e) iliceidade – se o fato de terceiro é causa exclusiva do evento, não há

se indagar se é ilícito ou não. Se for causa concorrente com a conduta

do responsável, este não pode alegá-lo senão quando for culposo.

O artigo 393, parágrafo único, do Código Civil trata do

caso fortuito e da força maior, elementos estes, que afetam a relação

causalidade. Dispõe o artigo, “o caso fortuito, ou de força maior, verifica-

se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar, ou impedir”.

PEREIRA49 diferencia-os dizendo que

(...) o caso fortuito é o acontecimento natural, derivado da força da natureza, ou o fato das coisas, como o raio, a

inundação, o terremoto, o temporal,

na força maior há um elemento humano, a ação das autoridades (factum principis50), como ainda a revolução, o

48 REMÉDIO, José Antonio; FREITAS , José Fernando Seifarth de; LOZANO JÚNIOR, José Júlio.

Dano moral: doutrina, jurisprudência e legislação, p.13.

49 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 303.

50 Fato principal: "fato autônomo, que não está em dependência ou subordinação a qualquer outro. É o fato que tem existência própria e por si mesmo, ao contrário do acessório, que pressupõe a existência de outro fato, dito principal” (SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico , p. 349).

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furto, o roubo, o assalto, (...) na força maior o caráter

invencível do obstáculo e no caso fortuito o caráter imprevisto.

A última excludente é a cláusula de não indenizar,

conceituada por RODRIGUES51, como

aquela estipulação através da qual uma das partes con-tratantes declara, com a concordância da outra, que não

será responsável pelo dano por esta experimentado, resultante da inexecução ou da execução inadequada de

um contrato, dano este que, sem a cláusula, deveria ser ressarcido pelo estipulante.

Porém, tal cláusula só será válida se observados os

seguintes pressupostos: bilateralidade, não contrariedade de preceito

cogente de lei, ordem pública e os bons costumes, e não poderá eximir o

dolo do estipulante.

1.4. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA E OBJETIVA

A responsabilidade subjetiva encontra-se na compro-

vação da culpa, devendo a vítima provar que tal dano ocorreu por culpa

do agente, pressuposto esse fundamental ao se falar em responsabilidade

subjetiva.

O que não acontece na responsabilidade objetiva, na

qual a reparação do dano não depende da comprovação da culpa,

entretanto, há de existir o nexo causal entre o ato do agente e o dano à

vítima.

GONÇALVES52 trata sobre a teoria do risco para explicar

a responsabilidade subjetiva: 51 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 17

52 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 18.

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Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade

cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A

responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como “risco-proveito”, que se

funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em conseqüência de uma atividade

realizada em benefício do responsável (...).

Pode-se dizer que elementos de caráter social como a

equidade, a solidariedade, a prevenção, a assistência e a segurança, são

os pressupostos da responsabilidade objetiva53.

DIAS54, um dos principais doutrinadores sobre o tema,

mostrando a respeito de seu posicionamento contrário à teoria subjetiva,

pondera que:

A teoria da culpa, resumida, com alguma arrogância, por

Von Ihering, na fórmula “sem culpa, nenhuma reparação”, satisfez por dilatados anos à consciência jurídica, e é, ainda

hoje, tão influente que inspira a extrema resistência oposta por autores insignes aos que ousam proclamar a sua insufi-

ciência em face das necessidades criadas pela vida moder-na, sem aludir ao defeito da concepção em si mesma.

Como dito no começo deste capítulo, no início da

civilização, a vingança privada era a forma utilizada para se fazer justiça e

reparar os danos, caracterizando-se assim, a responsabilidade objetiva,

pois não se discutia a culpa do agente que cometia o fato doloso.

Esse método de justiça foi abandonado pela

sociedade ao passar dos anos, e a culpa passou a ser analisada para que

pudesse haver uma “melhor justiça”, nascendo aí, a responsabilidade

subjetiva.

53 ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p. 43.

54 DIAS, Aguiar. Da responsabilidade civil, p. 36.

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25

Todavia, a partir da segunda metade do século XIX,

com a Revolução Industrial, o homem foi levado a uma situação de

perigo permanente decorrente do enorme desenvolvimento tecnológico,

e a responsabilidade objetiva voltou a ser aclamada pelos doutrinadores,

haja vista o antigo fundamento de culpa não mais atender aos anseios da

sociedade55.

É assim também que entende CAIO MÁRIO DA SILVA

PEREIRA, apud STOCO56,

A multiplicação das oportunidades e das causas de danos evidenciaram que a responsabilidade subjetiva mostrou-se

inadequada para cobrir todos os casos de reparação. Esta, com efeito, dentro da doutrina da culpa, resulta da

vulneração de norma preexistente, e comprovação de nexo causal entre o dano e a antijuridicidade da conduta

do agente.

Verificou-se, que nem sempre o lesado consegue provar estes elementos. Especialmente a desigualdade econômi-

ca, a capacidade organizacional da empresa, as cautelas do juiz na aferição dos meios de prova trazidos ao processo

nem sempre logram convencer a existência da culpa, e em conseqüência, a vítima remanesce não indenizada, posto

se admita que foi efetivamente lesada.

Na legislação brasileira, são adotadas as duas espécies

de responsabilidade, a subjetiva (teoria da culpa) e a objetiva (teoria do

risco).

Explica COELHO57 que, como regra geral,

A responsabilidade civil é subjetiva. Em princípio, só

responde por danos causados a outrem quem tiver sido

55 ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p. 33-39.

56 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial, p. 76.

57 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 295.

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26

culpado por eles. Como regra especial, ela é objetiva se

expressamente prevista em lei ou se o sujeito passivo ocupa posição econômica que lhe permite socializar os custos de

sua atividade.

No Código Civil brasileiro, a responsabilidade subjetiva

é a adotada, como preceitua os artigos 186 e 927, que exige a compro-

vação do dolo e da culpa do agente para que haja a caracterização do

dano e sua posterior reparação, o que não é admitido pelo Código de

Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11/09/1990), que adota a teoria da

responsabilidade objetiva para defender os direitos do consumidor.

A responsabilidade objetiva, fundada na teoria do

risco, decorre no direito brasileiro, de acidentes de trabalho; acidentes

resultantes do exercício de atividades perigosas; furto de valores praticado

por empregados de hotéis contra hóspedes; queda de coisas de uma

casa ou seu lançamento de lugar indevido; pagamento de cheque falsifi-

cado por banco; comportamentos administrativos comissivos prejudiciais a

direito de particular e atos praticados no exercício de certos direitos, e

diversas outras58.

Para STOCO59, em razão da necessidade de adaptar a

legislação aos avanços sociais e tecnológicos “pouco a pouco a

responsabilidade civil marcha a passos largos para a doutrina objetiva,

que encontra maior supedâneo na doutrina do risco”.

Como diz RODRIGUES60:

na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois,

desde que exista relação de causalidade entre o dano

58 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p 43-46.

59 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial, p.79.

60 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 10.

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experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o

dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente.

A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo

essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo,

ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada,

objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comporta-mento do agente e o dano experimentado pela

vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele.

Diante disto, o diploma civil de 2002, em vigor desde

11/01/2002, manifesta grande tendência de aderir à teoria da responsa-

bilidade objetiva como regra geral.

Prova maior disso é o que dispõe o artigo 927, pará-

grafo único, que estabelece que:

Art. 927. (...).

Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano,

independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo

autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem.

GONÇALVES61 assevera:

A inovação constante do parágrafo único do art. 927 do

Código Civil será significativa e representará, sem dúvida, um avanço, entre nós, em matéria de responsabilidade civil.

Pois a admissão da responsabilidade sem culpa pelo exercício de atividade que, por sua natureza, representa

risco para os direitos de outrem, da forma genérica como consta do texto, possibilitará ao Judiciário uma ampliação

dos casos de dano indenizável.

61 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 32.

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Observando tal dispositivo no que tange à responsa-

bilidade civil, percebe-se que as mudanças em relação ao antigo código

são importantes, principalmente no que se refere ao dever de reparar o

dano causado, em que não é mais necessária a demonstração da culpa,

e sim do fato, que se tornou o elemento mais importante para que se

concretize o dever de reparar tal dano.

Tal alteração pode ser considerada de vital importân-

cia ao se falar de responsabilidade civil, sendo que o judiciário, para

atribuir os efeitos da responsabilidade objetiva, deverá interpretar se a

atividade exercida é ou não de risco.

Este também é o posicionamento de RODRIGUES62, ao

comentar o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil:

A segunda hipótese é de considerável interesse, pois se inspira diretamente na teoria do risco em sua maior pureza.

Segundo esta (...), se alguém (o empresário, por exemplo), na busca de seu interesse, cria um risco de causar dano a

terceiros, deve repará-lo, mesmo se agir sem culpa, se tal dano adveio. (...)

Muito aplauso merece o legislador de 2002 pela inovação

por ele consagrada. Em conclusão, poder-se-ia dizer que o preceito do novo

Código representa um passo à frente na legislação sobre a responsabilidade civil, pois abre uma porta para ampliar os

casos de responsabilidade civil, confiando no prudente arbítrio do Poder Judiciário o exame do caso concreto,

para decidi-lo não só de acordo com o direito estrito, mas também, indiretamente, por eqüidade.

Apesar das inovações no novo código, a redação do

62 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 162.

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artigo 186, antigo 159, persistiu tratando que “aquele que, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar

dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

1.5. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

Com a violação de um dever jurídico, seja ele de

descumprir uma obrigação contratual ou praticar um ato ilícito, é que

nasce a responsabilidade pelo dano o dever de indenizar.

Portanto, o dever jurídico, advindo de um negócio

jurídico preexistente, um contrato acordado entre as partes, por exemplo,

trata-se de responsabilidade contratual.

Mas, se por força de lei ou princípio geral do direito,

esse dever jurídico for violado, a responsabilidade será extracontratual ou

aquiliana.

Assim sendo, quando decorre de um contrato, de um

prévio acordo entre as partes e o agente descumpre o pactuado, a

responsabilidade será contratual, e quando o agente infringir um dever

legal ou ir de encontro ao ordenamento jurídico, a responsabilidade

então será extracontratual.

GONÇALVES63 dispõe que o Código Civil distinguiu as

duas espécies de responsabilidade, disciplinando genérica-mente a

responsabilidade extracontratual, nos artigos 159, 160 e 1.518 e seguintes;

e a contratual, nos artigos 956 e seguintes e 1.056 e seguintes; omitindo

qualquer referência diferenciadora.

63 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 22.

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CARLOS ROBERTO GONÇALVES, apud REMÉDIO; FREITAS E

LOZANO JÚNIOR64 traça as diferenças básicas entre as duas espécies de

responsabilidade, que podem ser assim resumidas:

a) ônus da prova: na responsabilidade contratual, o credor apenas tem a

obrigação de provar que a prestação foi descumprida, independente

da culpa, tendo o devedor que demonstrar a ocorrência de alguma

das excludentes legais para se eximir da obrigação de indenizar. Na

extracontratual, a vítima deverá demonstrar que o fato se deu por

culpa do agente, já que não existe a presunção de culpa ocorrente na

relação contratual;

b) fonte : a responsabilidade contratual deriva da convenção entre as

partes, enquanto a extracontratual decorre da obrigação legal de não

causar dano a ninguém (art. 159 do CC);

c) capacidade do agente: na responsabilidade contratual, a capacidade

é mais limitada que na extracontratual. O contrato exige sempre a

capacidade do contratante ao tempo da sua celebração, sob pena

de não ter validade e não produzir efeitos indenizatórios. Já no caso da

obrigação decorrente de um delito, o ato do incapaz pode gerar a

obrigação de indenizar do seu guardião;

d) gradação da culpa: na responsabilidade contratual, a culpa é

escalonada, variando de intensidade de acordo com as diferentes

hipóteses em que ela ocorre, enquanto na delitual ela é mais rigorosa,

alcançando até a falta ligeiríssima.

No entendimento de STOCO65, na culpa contratual

há um dever positivo de adimplir o que é o objeto da

avença. Na culpa aquiliana é necessário invocar o dever 64 REMÉDIO, José Antonio; FREITAS , José Fernando Seifarth de; LOZANO JÚNIOR, José Júlio.

Dano moral: doutrina, jurisprudência e legislação, p. 5.

65 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial, p. 68.

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negativo ou obrigação de não prejudicar, e, comprovado o

comportamento antijurídico, evidenciar que ele percutiu na órbita jurídica do paciente, causando-lhe um dano

específico.

1.6. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E NÃO SOLIDÁRIA

Via de regra, só quem dá causa ao dano é que

responde por ele, é o que dispõe o artigo 186 do Código Civil.

Há casos, no entanto, que o legislador determinou que

o demandado deve responder por atos ilícitos praticados por terceiros:

trata-se da responsabilidade solidária ou por fato de terceiro.

Segundo GONÇALVES66, para haver a responsabilidade

do patrão por ato do preposto, é preciso que haja a concorrência de três

requisitos, tendo o lesado a incumbência da prova:

1º. qualidade de empregado, serviçal ou preposto, do causador do dano

(prova de que o dano foi causado por preposto);

2º. conduta culposa (dolo ou culpa stricto sensu) do preposto;

3º. que o ato lesivo tenha sido praticado no exercício da função que lhe

competia, ou por ocasião dela.

A responsabilidade solidária decorre do contido no

artigo 942, parágrafo único do Código Civil brasileiro:

Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano

causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.

66 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 123.

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Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os

autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932.

Desta forma, o legislador determinou que a responsa-

bilidade por ato de terceiro fosse solidária com intuito de conceder

efetividade ao próprio conteúdo da obrigação exposta no artigo 932 do

Código Civil brasileiro:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;

II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

III - o empregador ou comitente, por seus empregados,

serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabele-cimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de

educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;

V - os que gratuitamente houverem participado nos produ-

tos do crime, até a concorrente quantia.

Essa intenção do legislador ficou exposta explicita-

mente no artigo 933 do mesmo Diploma Legal:

Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo

antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali

referidos.

Destaca-se ainda que, só será caracterizada a

responsabilidade solidária quando o empregado, serviçal ou preposto do

patrão, amo ou comitente for o autor do ato ilícito. Sendo o agente do

fato, sócio do estabelecimento responderá este por ato próprio com base

no artigo 186, do Código Civil, não havendo responsabilidade solidária.

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1.7. A PRESCRIÇÃO E A DECADÊNCIA NO ÂMBITO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

O tempo é fator que sempre influenciou nas relações

jurídicas das quais o indivíduo participa, e configura o personagem

principal do instituto da prescrição67.

Segundo GONÇALVES68, “o instituto da prescrição é

necessário para que haja tranqüilidade na ordem jurídica, pela

consolidação de todos os direitos”.

A decadência, por sua vez, configura “a perda do

direito potestativo pela inércia do seu titular no período determinado em

lei”69.

A diferenciação básica entre prescrição e decadência

é feita pela doutrina clássica da seguinte maneira: prescrição "é a

extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular

durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas de

seu curso"70; decadência "é a extinção do direito pela inação de seu

titular que deixa escoar o prazo legal ou voluntariamente fixado para seu

exercício"71.

Para GONÇALVES72,

Um dos critérios usados pela doutrina para distinguir

67 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral, p. 471.

68 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral, p. 472.

69 AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução, p. 561.

70 CÂMARA LEAL apud DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabili-dade Civil, p. 336.

71 CÂMARA LEAL apud DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabi-lidade Civil, p. 350.

72 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral, p. 491.

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prescrição de decadência consiste em considerar que,

nesta, o prazo começa a fluir no momento em que o direito nasce. Desse modo, no mesmo instante em que o agente

adquire o direito já começa a correr o prazo decadencial. O prazo prescricional, todavia, só se inicia a partir do

momento em que este tem o seu direito violado.

Ensina COELHO73 que tanto a prescrição como a deca-

dência possuem os mesmos elementos, quais sejam, “inércia do sujeito em

exercer o direito (fator subjetivo) e decurso do tempo fixado em lei (fator

objetivo)”. Daí porque se afirma que

não há critério consistente de distinção entre prescrição e decadência. Se a própria norma jurídica não fixar a

natureza do prazo extintivo do direito, deve-se pesquisar o entendimento predominante na doutrina e jurisprudência74.

Entretanto, a doutrina diferencia prescrição e deca-

dência por três aspectos:

Quanto à fluência (só a prescrição suspende-se ou interrompe-se), à disponibilidade (somente a prescrição é

renunciável, mas apenas os prazos decadenciais podem ser alterados por vontade das partes) e pela possibilidade de

conhecimento judicial de ofício (a decadência pode ser decretada independentemente de alegação da parte,

mas a prescrição, não)75.

O Código Civil de 1916 tratava do assunto no artigo 75,

sem correspondente no novo Código Civil brasileiro de 2002 onde o

legislador expressou a seguinte redação, no artigo189: “violado o direito,

nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos

prazos a que aludem os arts. 205 e 206”. São prazos que atingem as

73 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: parte geral, p. 374.

74 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: parte geral, p. 376.

75 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: parte geral, p. 379.

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35

pretensões, as quais são veiculadas mediante ação condenatória, na sua

maioria.

Os prazos decadenciais, ao contrário do Código revo-

gado, agora se encontram dispersos pelo Diploma Legal referido, em

cada situação específica, referem-se/atingem direitos formativos, direitos

potestativos ou de sujeição, os quais são veiculados, na sua grande

maioria, mediante ação predominantemente constitutiva (positiva ou

negativa). Como exemplos, pode-se referir aos artigos 119 e parágrafo

único, art.178 e incisos I, II e III, art. 445 e §1º, 1555 e §1º, 1560, I; 1560 §2º do

Código Civil brasileiro.

Com o advento do Código Civil brasileiro de 2002, a

prescrição da pretensão de reparação civil, objeto do presente estudo,

está expressa (art. 206, § 3º, V), com prazo de três anos, ao contrário do

Código revogado, cuja prescrição era vintenária.

Entretanto, em se tratando de responsabilidade civil do

Estado por atos de seus agentes, o prazo prescricional é de cinco anos, a

teor do contido no Decreto 20.910/32, que configura verdadeiro regime

de exceção76.

Mas a doutrina não é pacífica. NERY JÚNIOR E NERY77

afirmam que

doutrina autorizada entende que a ação de reparação civil

contra a Fazenda Pública prescreve em cinco anos (D20910/32) para as pretensões que tenham “por objeto

evento danoso ocorrido até a entrada em vigor do atual CC”, e em três anos para as “pretensões ressarcitórias,

estribadas em dano ocorrido após a vigência da

76 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral, p. 345.

77 NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil comentado, p. 382a.

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36

codificação” (Luiz Duarte de Oliveira, Da prescrição das

ações em face da Fazenda Pública e o novo Código Civil, in Cianci, Prescrição, p. 76).

Para CARVALHO FILHO78, a regra disposta no artigo 206,

§3º, V, do Código Civil aplica-se plenamente aos casos envolvendo

responsabilidade extracontratual do Estado, deixando de ser qüinqüenal,

a teor do que prevê o Decreto 20.910/32, para ser trienal.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, pela 13ª

Câmara de Direito Público, na Apelação Cível n. 994.09.234520-1 – São

Vicente79, firmou entendimento no sentido de que o prazo prescricional,

após a vigência do Código Civil de 2002, é de três anos:

Apelação Cível. Reparação por danos morais. Prescrição. Ação ajuizada após o transcurso do prazo prescricional de

três anos previsto no inciso V do art. 3" do novo CC -Reconhecimento da prescrição da pretensão, com base no

art. 10 do Decreto n. 20.910/32 - Processo julgado extinto com fundamento no inciso IV do art. 269 do CPC. Nega-se

provimento ao recurso, com observação.

E, do corpo do referido acórdão, extrai-se:

De rigor a verificação da prescrição. Com efeito, de fato o artigo 1º do Decreto n. 20.910/32 prevê que as dívidas

passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal,

estadual ou, municipal seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou

fato do qual se originaram. Entrementes, o mesmo Decreto n. 20.910/32 determina a aplicação de prazos inferiores se

assim dispostos no ordenamento normativo, consoante se observa do artigo 10, cuja transcrição é de inteiro rigor: "O

disposto nos artigos anteriores não altera as prescrições de

78 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo , p. 475.

79 Disponível em: <www.tj.sp.gov.br>. Acesso em 19 jul. 2010.

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menor prazo, constantes das leis e regulamentos, as quais

ficam subordinadas às mesmas regras". Assevera o autor que a causa do pleito de indenização se sucedeu no dia

02.05.2005, tendo sido a ação proposta em 05.05.2008, de toda sorte que tanto o fato, como a propositura da ação

constituem eventos posteriores a vigência do Novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002), que entrou em

vigor um ano após a sua publicação (Cf. artigo 2044).

A prescrição regulada pelo artigo 206, parágrafo 3o, inciso V, do Código Civil (Lei n. 10.406/2002), fixa o prazo de três

anos para pretensão de reparação civil, de tal arte que por força do artigo décimo do Decreto n. 20.910/32 o regra-

mento civil extintivo do direito de ação se aplica na hipó-tese, consoante, inclusive, jurisprudência do Colendo

Superior Tribunal de Justiça, conforme se observa do REsp. n. 1.137.354-RJ, em que foi Relator o Ministro Castro Meira,

juntado em contra-razões, sublinhe-se, porquanto o Venerando Acórdão guarda no bojo precedentes da Corte em igual sentido.

Segundo explica ASSUNÇÃO80, entretanto, há inúmeros

precedentes do STJ considerando devida a aplicação do prazo especial

previsto no Decreto n°. 20.910/32 em detrimento do prazo geral da lei civil,

consoante a aplicabilidade do princípio da especialidade e, ainda que a

controvérsia seja sob o pálio do Código Civil de 1916, “é possível que a

concepção de julgados (...) se mantenha na Corte”, conforme segue:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RESPONSA-

BILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. DECRETO LEGISLATIVO 20.910/32. APLICAÇÃO. NORMA ESPECIAL.

1. O art. 1º do Decreto nº 20.910/32 dispõe acerca da prescrição qüinqüenal de qualquer direito ou ação contra a

Fazenda Pública, seja qual for a sua natureza, a partir do ato ou fato do qual se originou.

2. In casu, tendo a parte interessada deixado escoar o

80 ASSUNÇÃO, Matheus Carneiro. A responsabilidade civil do Estado na visão do STF e do

STJ, p. 1.

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38

prazo qüinqüenal para propor a ação objetivando o

reconhecimento do seu direito, vez que o dano indenizável ocorrera em 24 de outubro de 1993, enquanto a ação

judicial somente fora ajuizada em 17 de abril de 2003, ou seja, quase dez anos após o incidente, impõe-se decretar

extinto o processo, com resolução de mérito pela ocorrência da inequívoca prescrição.

3. Deveras, a lei especial convive com a lei geral, por isso que os prazos do Decreto 20.910/32 coexistem com aqueles

fixados na lei civil. 4. Recurso especial provido para reconhecer a incidência

da prescrição quinquenal e declarar extinto o processo com resolução de mérito (art. 269, IV do CPC)” (REsp 820.768/RS,

Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 04.10.2007, DJ 05.11.2007 p. 227)81.

No mesmo sentido extrai-se o aresto a seguir:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL

NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ARTIGOS 206, § 3º, DO CÓDIGO CIVIL E 10 DO DECRETO 20.910/32. PRESCRIÇÃO CONTRA A FAZENDA

PÚBLICA. PRAZO DE CINCO ANOS, A CONTAR DA DATA DO EVENTO DANOSO. ART. 953, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC.

FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. NECESSIDADE DE REEXAME

DOS FATOS DA CAUSA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. O Tribunal de origem decidiu em conformidade com a

orientação firmada nessa Corte de que "O art. 1º do Decre-to nº 20.910/32 dispõe acerca da prescrição quinquenal de

qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja qual for a sua natureza, a partir do ato ou fato do qual se

originou" (REsp 820.768/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 5/11/2007). Precedentes: REsp 692.204/RJ, Rel.

Ministro Teori Albino Zavascki , Primeira Turma DJ 13/12/2007 e AgRg no REsp 1.073.796/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins,

Segunda Turma, DJe 1º/7/2009). 2. Carece de razoabilidade a alegação de afronta ao art.

953, parágrafo único, do CPC, tendo em vista que não se

81 Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em 19 jul. 2010.

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discute, nos presentes autos, pedido de indenização por

injúria, difamação ou calúnia, e sim, em razão de extorsão mediante sequestro, tendo os autores do crime, policiais

militares, sido condenados na esfera criminal. Nesse com-passo, é de rigor a aplicação da Súmula 284 do STF.

3. No que tange ao pedido de redução da verba arbitrada a título de danos morais, o recurso não merece prosperar,

em razão da necessidade do reexame dos critérios fáticos, sopesados de forma equitativa e levados em consideração

pelas instâncias a quo para a fixação daquele montante, sendo aplicável, à espécie, o óbice contido na Súmula

7/STJ. (AgRg no REsp 799.394/BA, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ 26/10/2006 e (AgRg no REsp 972.440/RS,

Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 10/2/2009, DJe 2/3/2009).

4. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag 1230668/RJ 2009/0118528-2, Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, j.

em 11/5/2010).

No mesmo sentido tem-se firmado o entendimento no

Tribunal de Justiça de Santa Catarina82, conforme exposto nos seguintes

acórdãos:

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – PACIENTE VÍTIMA DE

INFECÇÃO HOSPITALAR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DANOS MORAIS – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO REJEITADA –

JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA INO-CORRENTE – PLEITO INDENIZATÓRIO

JULGADO PROCE-DENTE – LITISDENUNCIAÇÃO – CULPA DO MÉDICO NÃO DEMONSTRADA – INDENIZAÇÃO – REDUÇÃO

DO VALOR ARBITRADO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO 1. "'A prescrição contra a Fazenda Pública não é discipl-

inada pelo Código Civil ou pelo Código de Processo Civil, mas pelo Decreto 20.910/32, que prevê o prazo de (cinco)

anos para o ajuizamento de ação, contado da data ou do fato do qual se originaram' (AgRg no Agravo de Instrumento

nº 899.972/MS, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima)." (TJSC, GCDP, AI nº 2008.005604-9, Des. Vanderlei Romer).

82 Disponível em: <www.tjsc.jus.br>. Acesso em 19 jul. 2010.

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2. “O termo a quo do prazo prescricional para o

ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral e material, conta-se da ciência inequívoca

dos efeitos decorrentes do ato lesivo. É que a prescrição da ação indenizatória, in casu, teve como lastro inicial o

momento da constatação das lesões sofridas e de suas consequências." (Precedentes: REsp nº 1.056.605, Min. Luiz

Fux, REsp nº 700.716 e REsp nº 742.500, Min. Teori Albino Zavascki, REsp nº 673.576, Min. José Delgado, REsp 735.377,

Min. Eliana Calmon). 3. “Presentes as condições que ensejam o julgamento ante-

cipado da causa, é dever do juiz, e não mera faculdade, assim proceder” (REsp nº 2832, Min. Sálvio de Figueiredo

Teixeira). 4. As pessoas jurídicas de direito público são civilmente res-

ponsáveis “pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,

causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso

contra o responsável nos casos de dolo ou culpa” (CR, art.

37, § 6º). A responsabilidade é objetiva, circunstância que

não desonera o autor do ônus de demonstrar o “nexo

causal entre o fato lesivo (comissivo ou omissivo) e o dano,

bem como o seu montante. Comprovados esses dois

elementos, surge naturalmente a obrigação de indenizar.

Para eximir-se dessa obrigação incumbirá à Fazenda

Pública comprovar que a vítima concorreu com culpa ou

dolo para o evento danoso. Enquanto não evidenciar a

culpabilidade da vítima, subsiste a responsabilidade

objetiva da Administração. Se total a culpa da vítima, fica

excluída a responsabilidade da Fazenda Pública; se parcial,

reparte-se o quantum da indenização” (Hely Lopes

Meirelles; REsp nº 38.666, Min. Garcia Vieira). É subjetiva, no

entanto, a responsabilidade do servidor público. Não

havendo prova conclusiva de ter dado causa ao evento

lesivo, não há direito regressivo a ser assegurado; não se lhe

pode atribuir responsabilidade pelo ressarcimento do que

vier a despender o Estado litisdenunciante em favor do

ofendido.

5. “A reparação do dano moral para a vítima não passa de

compensação, satisfação simbólica; para o ofensor uma pena para que sinta o mal praticado." (AC nº 35.339, Des.

Amaral e Silva) (Apelação Cível n. 2008.079977-8/000000, de

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São José, Relator: Newton Trisotto, Órgão Julgador: Primeira

Câmara de Direito Público, Data Decisão: 11/08/2009).

APELAÇÃO CÍVEL — AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS — PRISÃO — MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE

RECONHECEU A PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL — APLICAÇÃO DO ARTIGO 1º DO DECRETO N. 20.910/32 — RECURSO

DESPROVIDO. (...) O entendimento predominante nas Cortes é de que o prazo

prescricional para proposição de ação de reparação de danos fundada na responsabilidade civil do Estado é de 5

(cinco) anos, conforme o disposto no Decreto n. 20.910/32, não havendo que se falar em aplicação da legislação civil.

Desta Quarta Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS PESSOAIS, MORAIS E MATERIAIS.

ALEGAÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO DE SANTA CATARINA NO EVENTO DANOSO. FATO OCORRIDO 8 (OITO) ANOS ANTES DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO

INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL RECONHECIDA. ART. 1º DO DECRETO N. 20.910, DE 6.1.1932. SENTENÇA

MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 'As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e

qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza,

prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem' (art. 1º do Decreto n. 20.910, de

6.1.1932). (ACV n. 2007.001470-1, de Curitibanos, Rel. Des. Jânio Machado, Quarta Câmara de Direito Público, julgada

em 09.12.2008)” (Apelação Cível n. 2008.037119-2/000000, de Curitibanos, Relator: Cláudio Barreto Dutra, Órgão

Julgador: Quarta Câmara de Direito Público, Data Decisão: 28/09/2009).

Longe de se pretender pacificar a controvérsia, e

diante das divergentes opiniões doutrinárias e jurisprudenciais apontadas,

todas devidamente fundamentadas, é possível observar que a tendência

jurisprudencial firma-se no sentido de que a prescrição para a intenção de

reparação civil contra o Estado é de cinco anos, contados da data do

ato ou do fato do qual se originarem.

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É possível também registrar-se que o instituto da

decadência quase não tem aplicação no âmbito da responsabilidade

civil, pois esta tem por objeto direitos subjetivos.

Com estas considerações, encerra-se este capítulo

para adentrar ao segundo, para tratar dos pressupostos da responsa-

bilidade civil.

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Capítulo 2

OS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

2.1. DOLO E CULPA; 2.2. AÇÃO E OMISSÃO; 2.3. NEGLIGÊNCIA,

IMPRUDÊNCIA E IMPERÍCIA; 2.4. ATO ILÍCITO E ATO LÍCITO; 2.5. DANO; 2.5.1. DANO MORAL; 2.5.2. DANO MATERIAL; 2.6. NEXO DE CAUSA-

LIDADE; 2.7. REPARAÇÃO DOS DANOS.

2.1. DOLO E CULPA

Qualquer pessoa pode ser responsabilizada por seus

atos quando os comete por dolo ou culpa, por esse motivo, é mister definir

os dois termos.

A principal diferença entre ambos é a intenção do

agente em alcançar o resultado danoso (animus dolandi) no caso do

dolo. Isto é, o agente quer o resultado ilícito, quer violar um direito, para

isso, concorre intencionalmente para a execução do resultado danoso.

Diferentemente da culpa, que consiste num erro do agente sem intenção

de prejudicar outros, decorrendo de negligência, imprudência ou

imperícia.

A culpa é a regra geral contida no ordenamento

jurídico brasileiro, a rigor do disposto no já mencionado artigo 186 do

Código Civil brasileiro. Portanto, se não houver culpa na prática do ato

ilícito83, a regra é de que não há responsabilidade.

Em sentido amplo, pode-se dividir a culpa de duas

83 “O ato ilícito é o praticado culposamente em desacordo com a norma jurídica, des-

tinada a proteger interesses alheios; é o que viola direito subjetivo individual, causando prejuízo a outrem, criando o dever de reparar tal lesão. Para que se configure o ilícito será imprescindível um dano oriundo de atividade culposa” (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 41).

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formas: o dolo, que é vontade consciente/intencional de praticar o ato; e

a culpa denominada em sentido estrito, que compreende a negligência,

imprudência e a imperícia (esta de modo implícito, conforme já afirmado,

eis que não consta expressamente no texto legal)84.

O elemento caracterizador da culpa é a imputabili-

dade, que abrange a capacidade de entendimento do agente, ou seja,

se ele era capaz de conhecer o caráter do ilícito praticado. Diniz85 ensina

que a imputabilidade diz respeito

às condições pessoais (consciência e vontade) daquele que praticou o ato lesivo, de modo que consiste na possibili-

dade de se fazer referir um ato a alguém, por proceder de uma vontade livre. (...) Para que haja imputabilidade é

essencial a capacidade de entendimento (ou discerni-mento) e de autodeterminação do agente.

CAVALIERI FILHO86, apud COUTO FILHO E SOUZA, diz que,

Diferentemente do dolo, a culpa não é vontade de praticar

determinado ato ilícito.

É, antes, a vontade de praticar o ato lícito, mas o agente, por não adotar a conduta adequada, acaba por praticar

ato ilícito. Vê-se, então, que há na culpa uma conduta maldirigida a um fim lícito; uma conduta inadequada aos

padrões sociais; ato ou fato que uma pessoa prudente e cautelosa não teria praticado, é imprevisão do previsível por falta de cautela do agente. Há na culpa, em última

instância, um erro de conduta.

Para que seja o julgador brasileiro responsabilizado

84 É de se registrar que, segundo o artigo 944 do Código Civil, dependendo do grau de

culpabilidade do agente no evento danoso, o legislador autoriza o juiz a reduzir o valor da indenização.

85 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 46.

86 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil, p. 26.

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civilmente por ato praticado, é necessário que tenha ele deixado de

cumprir com seus deveres de apreciar e julgar com prudência, de modo

que o juiz que violar um desses deveres estará agindo com culpa.

Culpa esta, que pode ser dividida em duas modali-

dades: em sentido amplo e em sentido estrito ou restrito.

Para DINIZ87,

A culpa em sentido amplo, como violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato inten-

cional ou de omissão de diligência ou cautela, compre-ende: o dolo, que é a violação intencional do dever

jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deli-

beração de violar um dever.

Segundo REMÉDIO; FREITAS E LOZANO JÚNIOR88, a conduta

do agente pode ser enumerada pelas seguintes espécies:

a) culpa in eligendo: consiste na má escolha da pessoa a quem se confia

a prática de um ato, como o preposto, empregado e representante;

b) culpa in vigilando: consubstancia-se na ausência de cuidado e

fiscalização do procedimento de outras pessoas;

c) culpa in comittendo: decorre de uma conduta imprudente;

d) culpa in omittendo: resulta de uma omissão, de comportamento

negligente;

e) culpa in custodiendo: falta de atenção com alguma coisa que está sob

os cuidados do agente;

f) culpa in contrahendo: ocorre quando a parte procede de forma que a

outra seja lesada com a celebração do contrato, de modo que a

própria avença já se constitua em um dano. 87 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil, p. 25.

88 REMÉDIO, José Antonio; FREITAS , José Fernando Seifarth de; LOZANO JÚNIOR, José Júlio. Dano moral: doutrina, jurisprudência e legislação, p. 8-9.

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A culpa ainda, pode estar na esfera contratual e extra-

contratual, decorrendo do dever violado. No capítulo anterior definiu-se a

diferença entre elas, sendo a culpa contratual resultante de uma violação

de um dever estipulado e existente em um contrato, enquanto a culpa

extracontratual baseia-se no dever de respeitar o direito alheio.

Finalizando, pode a culpa ainda, ser classificada pelo o

grau de culpabilidade, podendo ser de grau leve, levíssima ou grave.

Conforme DINIZ89,

A culpa será grave quando, dolosamente, houver negligên-

cia extrema do agente, não prevendo aquilo que é previsí-vel ao comum dos homens.

A leve ocorrerá quando a lesão de direito puder ser evitada

com atenção ordinária, ou adoção de diligências próprias. Será levíssima, se a falta for evitável por uma atenção

extraordinária, ou especial habilidade e conhecimento singular.

Por exemplo, ocorrendo o fato de o juiz julgar contra o

ordenamento jurídico e comprovada a culpa, incide o dever de indenizar,

o qual compreenderá os danos materiais e morais, em diversos graus de

intensidade e valoração, conforme a intensidade de sua culpa.

2.2. AÇÃO E OMISSÃO

O Código Civil em seu artigo 186 dispõe que “aquela

que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar

direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete

ato ilícito”. 89 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil, p.36.

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O ato jurídico é produzido através de uma manifes-

tação exterior de vontade voluntariamente concebida, unilateral ou por

recíproco acordo de vontades.

A procedência de uma conduta ou sua omissão, pelo

agente, corporifica o ato jurídico, conduta esta (ação ou omissão) que

pode resultar numa obrigação originalmente lícita, decorrente da

assinatura de um contrato, ou ilícita, como o acidente causado por

determinada pessoa na condução de veículo.

Desta forma, parece inconcebível a idéia de responsa-

bilização sem a concreta configuração de uma conduta humana que,

por ação ou omissão, se consubstancie numa contrariedade ao

ordenamento jurídico pré-estabelecido.

STOCO90 ressalta a idéia da voluntariedade haja vista

que o agente não deve possuir a consciência do resultado a ser

produzido ou o propósito da conduta, já que tais elementos configurariam

o dolo. Assim, a conduta voluntária representa a manifestação de uma

conduta, não da intenção ou não do agente em obter resultado.

Assim, entende-se que a responsabilidade civil, que

obriga a reparação quando houver prejuízo a outrem, possui, original-

mente, uma conduta humana que levará a violação de um contrato e

que poderá ser derivada de uma ação ou de uma omissão, como bem

exposto no dispositivo de lei citado.

Partindo de tal princípio, permite-se dividir a ação em

duas vertentes, comissiva e omissiva.

90 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e juris-

prudência, p. 54.

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Pode-se resumir a conduta da seguinte forma: se a

conduta comissiva se consubstancia em uma ação que se materializa no

plano concreto, através de um facere, a omissão, por seu turno, deve

revelar-se num non facere, ou seja, numa conduta contrária que demons-

tre ser relevante para o ordenamento jurídico, atingindo bem juridica-

mente tutelado, externando assim um resultado danoso91. Desta forma, a

“omissão revela-se numa conduta negativa, surgindo porque alguém não

praticou determinada ação. A sua essência está propriamente em não se

ter agido de determinada forma”92.

MARQUES93 ensina que a conduta omissiva é uma

abstração, um conceito de linhagem puramente normativa, sem base naturalística. Ela aparece, assim, no fluxo causal

que liga a conduta ao evento, porque o imperativo jurídico determina um facere para evitar a ocorrência do resultado

e interromper a cadeia de causalidade natural, e aquele que deveria praticar o ato exigido, pelos mandamentos da

ordem jurídica, permanece inerte ou pratica ação diversa da que lhe é imposta.

MONTEIRO94 afirma justamente que o ato de vontade é

a “característica primordial do ato jurídico”. Para RÁO95 dispõe o ato

jurídico como o fato em que o elemento voluntariedade é determinante,

ou seja, existe uma vontade humana de criar ou extinguir uma obrigação.

A ação comissiva deriva da obrigatoriedade do não

fazer, do não praticar. Justamente o contrário da omissiva, quando o

91 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e juris-

prudência, p. 54.

92 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e juris-prudência, p. 55.

93 MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal, p. 49-50.

94 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral, p. 175.

95 RÁO, Vicente. Ato jurídico , p. 24.

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agente deveria fazer ou praticar tal ato e não o fez, sendo assim omisso.

STOCO96, lecionando acerca do tema, ensina que: “a

omissão é uma conduta negativa. Surge porque alguém não realizou

determinada ação. A sua essência está propriamente em não se ter agido

de determinada forma”.

Por omissão entende-se como sendo, segundo JUNIOR97:

(...) a culpa in omitendo e a culpa in vigilando. São casos de

inércia, casos de não-atos. Se cruza os braços ou não vigia, quando deveria agir, o agente público omite-se, empe-

nhando a responsabilidade do Estado por inércia ou incúria do agente. Devendo agir não agiu. Nem como o bonus

pater familiae, nem como o bonus administrator. Foi negli-gente. Às vezes imprudente e até imperito. Negligente, se a

solércia o dominou; imprudente se confiou na sorte; imperito, se não previu as possibilidades da concretização

do evento. Em todos os casos, culpa, ligada à idéia de inação, física ou mental.

Deste modo, analisando a hipótese em concreto da

responsabilidade do Estado, se o dano ocorrer pela decorrência de uma

omissão sua deve-se aplicar a responsabilidade subjetiva, onde MELLO98

ensina:

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omis-

são do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de se aplicar a teoria da responsabili-

dade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o

autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se

96 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial, p. 55.

97 CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo , p. 210.

98 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito administrativo, p. 895-896.

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descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento

lesivo.

Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-

lhe o encargo de suportar patrimonialmente as conseqüên-cias da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato

omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessaria-

mente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que

não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a

norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade

subjetiva.

Presume-se então, que nem todas as ações comissivas

ou omissivas geram um dano.

Faz-se necessário a presença da relevância jurídica da

ação. Se por ventura, surgir um dano da ação comissiva ou omissiva

causada pelo agente, surge o dever de promover a sua reparação, de

modo a reequilibrar o patrimônio desfalcado da vítima, em razão da

ofensa. Porém nem sempre a pessoa que pratica a ação comissiva ou

omissiva, provocando o dano, será responsável pela sua reparação. A

responsabilidade pode derivar, na verdade, de conduta do próprio

imputado, por comportamento de terceiro ou, ainda, do fato de coisas

que dependam do imputado.

Para DINIZ99 ação vem a ser: o ato humano, comissivo

ou omissivo, ilícito ou licito, voluntário e objetivamente imputável do pró-

prio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que

cause dano a outrem, gerando o dever de indenizar os direitos lesados. 99 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil, p. 39.

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Para GONÇALVES100, para que se configure a respon-

sabilidade por omissão, são necessários dois requisitos: a) que exista o

dever jurídico de praticar determinado fato (de não se omitir): e, b) que se

demonstre que, com a sua prática, o dano poderia ter sido evitado. Esse

dever de não se omit ir pode derivar da lei ou de convenção e, por fim, de

alguma situação especial de perigo.

DINIZ101 acrescenta ainda que a omissão é, em regra,

mais freqüente no âmbito da inexecução das obrigações contratuais, e

ainda:

Deverá ser voluntária no sentido de ser controlável pela

vontade à qual se imputa o fato, de sorte que excluídos estarão os atos praticados sob coação absoluta; em estado

de inconsciência, sob efeito de hipnose, delírio febril, ataque epilético, sonambulismo, ou por provocação de

fatos invencíveis como tempestades, incêndios desenca-deados por raios, naufrágios, terremotos, inundações etc.

Já para RODRIGUES102, a ação ou omissão que gera

responsabilidade está ligada ao ato ilícito que, segundo o artigo 186 do

CC/2002, é cometido por aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem ainda

que exclusivamente moral. Desse modo, “a ação ou omissão individual do

agente, para constituir ato ilícito, envolve a infração de um dever

contratual, legal ou social”.

Evidente que nem todos os atos humanos são gerado-

res da responsabilidade civil subjetiva, devendo, antes de tudo, serem

voluntários para que tenham referida implicação jurídica.

100 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral, p. 459.

101 DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade civil, p. 39.

102 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil, p. 20.

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Acerca disso, GAGLIANO E PAMPLONA FILHO103 lecionam

que “a voluntariedade é a pedra de toque da noção de conduta

humana (...), primeiro elemento da responsabilidade, não traduz

necessariamente a intenção de causar dano, mas sim, e tão somente, a

consciência daquilo que se está fazendo”.

Este ato voluntário de que tratam os autores, não

significa obrigatoriamente então que houve a intenção de provocar um

prejuízo a outrem, mas tão somente a consciência de que se está, ou

pode-se fazer.

Para eles, essas ações dividem-se em positiva e nega-

tiva dependendo de que maneira ela se manifesta.

A primeira traduz-se pela prática de um comportamento ativo, positivo, a exemplo do dano causado pelo sujeito

que, embriagado, arremessa o seu veículo contra o muro do vizinho. A segunda forma de conduta é de intelecção

mais sutil. Trata-se da atuação omissiva ou negativa, gera-dora de dano. Se, no plano físico, a omissão pode ser inter-

pretada como um “nada”, um “não fazer”, uma ”simples abstenção”, no plano jurídico, este tipo de comportamento

pode gerar dano atribuível ao omitente, que será responsa-bilizado pelo mesmo.

RODRIGUES104 explica ainda que a responsabilidade do

agente possa defluir não só de ato próprio, mas também de ato de

terceiro que esteja sob responsabilidade do agente, e ainda de danos

causados por coisas que estejam sob a guarda deste.

Diz ele105 que a responsabilidade por ato próprio se

103 GAGLIANO, Pablo Stoze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, p. 15.

104 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil, p. 16.

105 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil, p. 16.

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justifica no próprio princípio informador da teoria da reparação, pois se

alguém, por sua ação pessoal, infringindo dever legal ou social, prejudica

terceiro, é curial que deva reparar esse prejuízo, pois:

A responsabilidade por ato de terceiro ocorre quando uma

pessoa fica sujeita a responder por dano causado a outrem não por ato próprio, mas por ato de alguém que está, de

um modo ou de outro, sob a sujeição daquele (...) e ainda pode extravasar os quadros da responsabilidade aquiliana e

se apresentar dentro das relações contratuais, como é o caso da responsabilidade dos hoteleiros e outras pessoas

em situação igual pelas bagagens dos hóspedes (...).

Deste modo, o ato cometido por terceiro, encontra

respaldo no código civil em seu artigo 932, que estabelece que há o

dever de uma pessoa física ou jurídica, de reparar um dano causado por

outrem, que com ela mantenha algum vínculo estabelecido em lei ou

contrato com este.

Percebe-se assim que, a pessoa do imputado é o autor

mediato do dano. Assim cabe também há pessoa lesada, postular a

indenização contra todas as pessoas que podem considerar como

responsáveis pelo prejuízo. O artigo 942, do Código Civil dispõe clara-

mente que: “os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de

outrem fica sujeito à reparação do causado, e, se a ofensa tiver mais de

um autor, todos responderão solidariamente pela reparação”.

Assim, resta claro e evidente que, para haver a

responsabilidade subjetiva é necessário que o dano tenha sido causado

pela vontade, consciente ou inconsciente de alguém.

2.3. NEGLIGÊNCIA, IMPRUDÊNCIA E IMPERÍCIA

Conforme tratado no capítulo anterior, o artigo 159 do

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CC/1916, hoje artigo 186 do CC/2002, dispõe sobre a responsabilidade

civil baseada na culpa subjetiva, pois todo “aquele que, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar

dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Para ALONSO106, ocorre a culpa stricto sensu quando,

“(...) a vontade do agente não era de praticar o ato danoso, mas por

negligência, imprudência ou imperícia veio a causá-lo a alguém, diz-se

que houve culpa não intencional, pois, embora o ato praticado tenha

sido querido pelo agente, o resultado danoso não era o objeto dele”.

A negligência caracteriza-se pela omissão de conduta

do profissional (agente), que deveria adotar um determinado procedi-

mento e não o adota. Igualmente conhecida como desatenção ou falta

de cuidado no exercício de determinado ato que o pratica sem a devida

diligência, implicando assim na omissão ou inobservância de um dever

(de sempre agir de forma diligente, prudente e com o cuidado devido).

A não apreciação proposital de uma prova, o

abandono do processo, medidas protelatórias entre outras ações, podem

ser consideradas exemplos de negligência por parte do julgador.

Segundo KFOURI107, “a fim de que não seja imputada ao

profissional uma conduta negligente é necessário que ele tome todas as

medidas que estejam ao seu alcance e que se suponha seja de seu

conhecimento”.

Para GUIMARÃES108, “falta de cuidado necessário para a

106 ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p. 25.

107 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico, p. 16-17.

108 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário jurídico , p. 406.

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condução de um negócio. Descuido, incúria, dissídio, desleixo. Omissão

voluntária de diligência ou cuidado. Na negligência há culpa in omit -

tendo. É uma forma de culpa que impõe penalidade ao agente. Quem,

por negligência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a

reparar o dano”.

Na imprudência ocorre “(...) culpa comissiva. Age com

imprudência o profissional que tem atitudes não justificadas, açodadas,

precipitadas, sem usar de cautela”109. Ao contrário da negligência, existe

uma ação que pode resultar em dano devido à falta de cautela.

Também conhecida por parte da doutrina como a

teoria da imprevidência, vai além da falta de at enção ocorrida na

negligência. O ato imprudente é revestido em seu escopo pela má-fé e

também pelo dolo. Nele há a ciência, embora não a intenção,

obrigatoriamente e propriamente dita, de que referido ato pode lesar e

causar um mal a alguém.

GUIMARÃES110 ensina que a imprudência é “um dos

elementos da culpa; consiste na falta involuntária de atenção e de

observância de medidas de precaução e de segurança, de conse-

quências previsíveis, que eram necessárias para evitar mal ou perigo ou a

prática de infração”.

Deste modo, age com imprudência aquele que,

deixando de lado a prudência necessária e presente na inteligência

humana e sabendo do risco embutido em determinada ação, assume-o,

acreditando que ele não causará prejuízo a outrem.

Porém, na imperícia falta ao profissional o devido

109 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico , p. 80.

110 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário jurídico , p. 347.

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preparo, o desconhecimento técnico, a falta de preparo prático indo até

a falta de observação das normas da profissão.

Para KFOURI111, na imperícia “não se verifica uma ausên-

cia de conduta, como na negligência; nem falta de cautela necessária,

como na imprudência, mas uma conduta realizada em desacordo com a

melhor técnica, porque o profissional simplesmente não a domina a

contento”.

Na imperícia é necessário que ao agente falte o

conhecimento ou a técnica necessária para a boa conclusão do ato

havendo uma omissão no que concerne aquilo que não deveria ser

desprezado, ainda mais se tratando de um profissional que, pressupõe-se,

ter o conhecimento daquilo que faz.

Entende DINIZ112, que “a imperícia é falta de habilidade

ou inaptidão para praticar certo ato; a negligência é a inobservância de

normas que nos ordenam agir com atenção, capacidade, solicitude ou

discernimento; e a imprudência é a precipitação ou o ato de proceder

sem cautela”.

Por fim, trata-se de uma conduta involuntária, que

assim como a imprudência, tem em seu princípio a má-fé e certa dose de

dolo já que, mesmo tendo conhecimento do mal que seus atos podem

causar, prossegue destemido.

Portanto, a negligência caracteriza-se pela omissão no

cumprimento de um dever, a imprudência na falta de cautela ao

proceder um ato e a imperícia na falta da aptidão ou habilidade para

certos atos. 111 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico, p. 17.

112 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 35.

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Excluem a imputabilidade, contudo, a legítima defesa

(artigo 188, I, 1ª parte, do Código Civil brasileiro); o exercício regular de um

direito (artigo 188, I, 2ª parte, do Código Civil brasileiro); o estado de

necessidade (artigo 188, II e parágrafo único, do Código Civil brasileiro),

desde que as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário e

quando não exceder os limites do indispensável para a remoção do

perigo; no caso do ato ilícito ser praticado por menor de 18 anos,

acarretará responsabilidade objetiva da pessoa a quem incumbe a sua

guarda (artigos 932, I e II, e 933, do Código Civil); a anuência da vítima; a

debilidade mental, que o torne incapaz de controlar suas ações (artigos

932, II, e 933 do Código Civil), mas a responsabilidade passará à pessoa

encarregada da sua vigilância.

Para PEREIRA113 legítima defesa pode ser conceituada

da seguinte forma:

Em face de uma agressão injusta, dirigida contra a própria

pessoa ou de seus familiares, ou contra os seus bens, o indivíduo adota medida defensiva com que repelirá o

agressor. São extremos da legítima defesa: 1) a iniciativa da agressão por parte de outrem, isto é, que do agente não

tenha partido provocação; 2) que a ameaça de dano seja atual ou iminente; 3) que a reação não seja despropor-

cional à agressão.

Assim, referida responsabilidade é chamada de subje-

tiva, ou seja, que depende a comprovação da existência da culpa do

agente para haver o dever de indenizar.

Na responsabilidade objetiva, ou seja, responsabi-

lidade independente da comprovação da culpa, o agente deve reparar

os danos independentemente de comprovada ou não a culpa, em

113 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 295.

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decorrência de uma imputação que lhe é imposta por força de lei. Para

Diniz114, quando se trata de responsabilidade objetiva, a responsabilização

é imposta pela lei porque

a atividade que gerou o dano é lícita, mas causou perigo a

outrem, de modo que aquele que a exerce, por ter a obrigação de velar para que dela não resulte prejuízo, terá

o dever ressarcitório, pelo simples implemento do nexo causal. A vítima deverá pura e simplesmente demonstrar o

nexo de causalidade entre o dano e a ação que o produziu. Nela não se cogita de responsabilidade indireta,

de sorte que reparará o dano o agente ou a empresa exploradora, havendo tendência de solicitação dos riscos,

nem do fortuito como excludente de responsabilidade.

Essa responsabilidade objetiva está bem caracterizada

no ordenamento jurídico brasileiro, a exemplo do empregador, pela

atuação culposa de preposto ou serviçal, no exercício de seu trabalho

(arts. 932, III, e 933, do Código Civil); a responsabilidade civil do Estado (art.

37, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988); a

responsabilidade por danos causados aos consumidores por defeitos de

produtos (art. 12 da Lei n° 8.078/90 ou CDC) ou relativos à prestação de

serviços (art. 14 do CDC); e a responsabilidade decorrente de danos

causados ao meio ambiente (art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81), entre outras.

2.4. ATO ILÍCITO E ATO LÍCITO

O homem é livre para praticar ou deixar de praticar

seus atos, portanto, será responsável por eles ou por sua omissão, através

de atos lícitos ou ilícitos, caso venha a ferir direito alheio.

Comete ato ilícito todo àquele que agir em desacordo

114 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 53.

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com a ordem jurídica previamente estabelecida, inclusive o julgador,

causando um dano a outrem, cometendo assim um delito. Já o ato lícito é

o ato de vontade, baseado num direito que repercute e produz efeito no

ordenamento jurídico.

A antijuridicidade da conduta do agente, na maioria

das vezes, é o que dá causa aos atos lesivos. O ordenamento jurídico,

porém, impõe a responsabilização por tal dano, sendo que a obrigação

de indenizar independe da culpa do mesmo. A responsabilidade objetiva

é o que caracteriza o ato lícito, através da teoria do risco, pois esta se

origina do exercício de um direito.

O Código de Defesa do Consumidor brasileiro acolhe a

responsabilidade objetiva caracterizada pela teoria do risco, na qual o réu

deverá, através da inversão do ônus da prova, alegar e provar uma das

excludentes de responsabilidade.

Na responsabilidade objetiva, quem dá início ao risco

deve responsabilizar-se por ele, mesmo tendo sido, tal risco, proveniente

de uma atividade lícita, provocando dano a outrem, devendo o agente

repará-lo, mesmo não havendo dolo ou culpa por sua parte.

Quem causa um dano proveniente de um ato lícito,

não responde por ele como culpado, mas sim como o autor do dano.

DINIZ115 conceitua ato ilícito como sendo “a infração de

um dever preexistente e a imputação do resultado à consciência do

agente”.

O artigo 188 do Código Civil dispõe sobre as situações

que não constituem atos ilícitos: 115 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p. 351.

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Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I – os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

II – a deterioração ou destruição da coisa alheia, a fim de remover perigo iminente;

Parágrafo único: No caso do inciso II, o ato será legítimo

somente quando as circunstâncias o tornarem absoluta-mente necessário, não excedendo os limites indispensáveis

para a remoção do perigo.

Assim sendo, para o Código Civil, são excludentes de

ilicitude: a legítima defesa, o estado de necessidade e o exercício regular

de um direito.

A legítima defesa, tanto na esfera criminal como na

civil, constitui-se a partir de uma agressão injusta, pessoal ou a terceiros ou

contra seus bens, na qual, o indivíduo repele o agressor, ficando o agente,

isento do dever de indenizar, já que a mesma não se considera ato ilícito.

O estado de necessidade, por sua vez, nasce na

ofensa de um direito alheio e na conduta do agente que pratica um ato

danoso para ressalvar direito seu ou de outrem, de perigo não provocado

por si. Diniz (2004, p. 503) ensina que, via de regra, esse perigo é o

resultado de um acontecimento fortuito, natural ou acidental, entretanto,

tal excludente exclui a ilicitude, mas não o dever de indenizar, salvo se o

dano foi causado àquele que deu origem ao perigo ou ao ofensor.

E ainda, não const itui ato ilícito aquele praticado no

exercício regular de um direito reconhecido. Tal situação fundamenta-se

no princípio de que o direito de alguém não é passível de causar dano a

outrem, não gerando ato ilícito, salvo se praticado de forma abusiva ou

irregular, não estando este, obrigado a reparar o dano, como preceitua o

artigo 188-I do Código Civil.

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Sendo assim, toda vez que houver a violação de um

dever jurídico, ou se cometer um ato derivado de dolo ou culpa,

causando dano a outrem, estará caracterizado o ilícito. Entretanto, no ato

lícito, a violação estará embutida no prejuízo causado a um terceiro,

provindo de ato ou exercício legal de um direito próprio, mesmo estando

afastadas as condições de dolo e culpa.

Por fim, evidencia-se que, o dano advindo tanto de

uma conduta lícita quanto ilícita, será plausível de reparação.

2.5. DANO

Em definição simples e direta, afirma VENOSA116 que

“dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente”. E arremata que a

definição de dano sempre foi objeto de controvérsia na doutrina.

É inadmissível a responsabilização do agente (ainda

que seja objetiva a responsabilidade) se do ato praticado, através de

uma conduta omissiva ou comissiva, não resultar o dano. O dano

configura o prejuízo resultante da prática pelo agente de uma conduta.

Resulta, portanto, de uma concreta definição frente à

conduta lesiva, consoante ensina SCHREIBER117, já que

o dano não pode mais se identificar com uma lesão

abstrata a um interesse merecedor de tutela, conceito excessivamente amplo que se justificava apenas na medida

em que o dever de indenizar dependia da rígida verificação de outros dois pressupostos – culpa e nexo

116 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil, p. 33.

117 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos, p. 182.

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causal, hoje fragilizados em sua importância justamente

pela alteração de função da responsabilidade civil. Daí porque sustentar-se a conceituação de dano como uma

lesão concreta, como violação de uma regra que tutele não o interesse isoladamente, mas de uma regra que,

transcendendo a regulação abstrata de um interesse, estabeleça sua relação com outro interesse igualmente

tutelado.

Trata-se de elemento fundamental na configuração da

responsabilidade civil, pacífico na doutrina. A propósito, nos dizeres de

GONÇALVES118, em sentido amplo, é possível conceituar dano como sendo

a lesão de qualquer bem jurídico, patrimonial ou moral. É toda desvantagem ou diminuição que sofremos em nossos

bens jurídicos (patrimônio, corpo, vida, saúde, crédito, hon-ra, dignidade, imagem etc.). Embora possa haver responsa-bilidade sem culpa, não pode falar em responsabilidade

civil ou em dever de indenizar se não houve dano. Ação de indenização sem dano é pretensão sem objeto, ainda que

haja violação de um dever jurídico e que tenha existido culpa e até mesmo dolo por parte do infrator.

Para COELHO119, é de essencial importância a existência

do dano para a configuração da responsabilidade civil, seja ela subjetiva

ou objetiva, pois “se quem pleiteia a responsabilização não sofreu dano

de nenhuma espécie, mas meros desconfortos ou riscos, não têm direito a

nenhuma indenização”.

COELHO120 ainda difere os danos diretos ou indiretos,

explicando que os primeiros são “conseqüência imediata do evento

danoso”, já os indiretos configuram a “conseqüência medita. O ato ilícito

ou fato jurídico desencadeia o dano direto e este dá ensejo ao indireto”.

118 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 73.

119 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 286.

120 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 290.

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A vítima, entretanto, é indenizada tanto em se tratan-

do de danos diretos ou indiretos, consoante o princípio da indenidade121.

BITTAR122 explica que o dano configura verdadeira

lesão, ou redução patrimonial, sofrida pelo ofendido, em

seu conjunto de valores protegidos no direito, seja quanto à sua própria pessoa – moral ou fisicamente – seja quanto a

seus bens ou a seus direitos. É a perda, ou a diminuição, total ou parcial, de elemento, ou de expressão, compo-

nente de sua estrutura de bens psíquicos, físicos, morais ou materiais.

O dano, portanto, configura verdadeira pedra de

toque da configuração da responsabilidade civil, pois é

Sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não

haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimen-to, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade

sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano. Na responsabilidade objetiva, qualquer que seja a

modalidade do risco que lhe sirva de fundamento – risco profissional, risco proveito, risco criado etc. –, o dano

constitui o seu elemento preponderante. Tanto é assim que, sem dano, não haverá o que reparar, ainda que a conduta

tenha sido culposa ou até dolosa123.

Os danos são subdivididos das mais variadas formas,

todas subdivisões dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais, os quais, em

razão dos objetivos a que se destina o presente trabalho, serão perfuncto-

riamente abordados no decorrer dos próximos sub-capítulos.

121 Princípio da indenidade, segundo o próprio autor define, é aquele segundo o qual “a

lei deve facilitar o acesso da vítima à indenização” (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 283).

122 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil: teoria e prática, p. 9.

123 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil, p. 70.

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2.5.1. Dano moral

Os italianos o consideram como a “alterazzione di stato

de felicita”, nada mais do que a alteração do estado de felicidade do

indivíduo. Ocorre quando ato alheio a sua vontade o agride na esfera

pessoal, trazendo um desgosto que se manifesta em sua esfera íntima.

Para BITTAR 124, danos morais

são aqueles suportados na esfera dos valores da morali-dade pessoal ou social e, como tais, reparáveis, em sua

integridade, no âmbito jurídico. Perceptíveis pelo senso comum - porque ligados à natureza humana - podem ser

identificados, em concreto, pelo juiz, à luz das circuns-tâncias fáticas e das peculiaridades da hipótese sub litem,

respeitando o critério básico da repercussão do dano na esfera do lesado.

SILVA125 ensina que o dano moral pode decorrer de

ofensas à honra, ao decoro, à paz interior de cada um ou a sentimentos

afetivos de qualquer espécie.

Para COELHO126, são tidos como danos pessoais, e se

configuram quando “infligidos a homem ou mulheres que atingem sua

integridade física ou moral ou causam-lhe a morte”.

CAHALI127, por sua vez, entende que a privação ou a

diminuição de bens com valor precípuo na vida do homem como a paz,

a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual,

a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos é o que gera e

124 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, p. 43.

125 SILVA. Wilson Melo. O dano moral e sua reparação, p. 11.

126 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 288.

127 CAHALI. Youseff Said. Dano moral, p. 320.

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caracteriza o dano moral em si. Assim, pode-se classificar deste modo,

como um dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra,

reputação, etc.) um dano que molesta a parte afetiva do patrimônio

moral (dor, tristeza, saudade etc.); um dano moral que provoca direta ou

indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante etc.) e um dano

moral puro (dor, tristeza etc.).

Quanto á quantificação do dano moral deve-se levar

em conta a esfera subjetiva ou o plano valorativo da pessoa na

sociedade, isto é, de que maneira irá repercutir tal dano e que dissabores

irão causar ao ofendido no meio em que vive, e como passará a ser

considerado na sociedade após o tal abalo.

Nesse sentido é a posição do Superior Tribunal de

Justiça:

Na fixação do valor da condenação por dano moral, deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível cultural

do causador do dano; condição sócio-econômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da

culpa (se for o caso) do autor da ofensa; efeitos do dano no psiquismo do ofendido e as repercussões do fato na

comunidade em que vive a vítima. (Resp 355392/RJ, rel. Min. Castro Filho, DJ 17/06/02).

Ainda:

A indenização deve ser fixada em termos razoáveis, não se

justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, considerando que se recomenda

que o arbitramento deva operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial

das partes, às suas atividades comerciais e, ainda, ao valor do negócio, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos

pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se da sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida, notadamente à situação econômica

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atual e as peculiaridades de cada caso. (STJ, Resp 171084/

MA, relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, publicado em 05/10/98).

Já no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o ex

desembargador Anselmo Cerello anotou: que “a indenização por dano

moral não pode levar à riqueza a vítima nem à ruína o seu ofensor, mas

refletir, sob o equacionamento do órgão julgador, a extensão da lesão

material e a suportabilidade da reparação” (Apelação Cível n. 97.000281-

5, de São José).

VENOSA128, tratando da quantificação do dano moral

ensina

Dano moral é o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral

e intelectual da vítima. Nesse campo, o prejuízo transita pelo imponderável, daí por que aumentam as dificuldades

de se estabelecer a justa recompensa pelo dano. Em muitas situações, cuida-se de indenizar o inefável. Não é também qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar

indenização.

Aqui também é importante o critério objetivo do homem médio, o bonus pater familias: não se levará em conta o

psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem do homem de

pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino. Nesse campo, não há formulas

seguras para auxiliar o juiz. Cabe ao magistrado sentir em cada caso o pulsar da sociedade que o cerca. O

sofrimento como contraposição reflexa da alegria é uma constante do comportamento universal.

Ou seja, na falta de critérios previstos em lei, a indeni-

zação deve ser entregue ao livre arbítrio do julgador que, evidentemente,

ao apreciar o caso concreto submetido a exame deve fazer a entrega da 128 VENOSA. Silvo de Salvo. Direito civil, p. 33.

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prestação jurisdicional de forma livre e consciente, à luz das provas que

foram produzidas. Verificará as condições das partes, o nível social, o grau

de escolaridade, o prejuízo sofrido pela vítima, a intensidade da culpa e os

demais fatores concorrentes para a fixação do dano.

O dano moral restará caracterizado quando a lesão

advinda de uma conduta danosa vier a abalar a ordem psíquica do

ofendido, alterando o seu convívio na esfera social, profissional ou pessoal.

Ademais, é sabido que, segundo BITTAR 129

a indenização por danos morais deve traduzir-se em mon-

tante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que não se aceita o comportamento assumido, ou o

evento lesivo advindo.

Consubstancia-se, portanto, em importância compatível

com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expresso, no patrimônio do lesante, a fim de que

sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia eco-

nomicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante.

É importante salientar que pode haver a cumulação

dos danos morais com os danos patrimoniais ou materiais, tal cumulação

encontra escopo inclusive na Súmula 37130 do STJ.

2.5.2. Dano material

Quando um ato lícito ou ilícito, produzir efeitos

negativos no patrimônio da vítima, quem o praticou pode ser condenado

a reparar os danos causados à vítima, inclusive o que deixou de ganhar. 129 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, p. 220.

130 “São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato” (STJ, Súmula 37, DJ de 17/03/92).

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Para SEBASTIÃO131,

a indenização material compreende a reposição de tudo

aquilo quanto à vítima perdeu, como também tudo quanto ficou impedida de ganhar (lucros cessantes). O quantum a

ser pago varia de caso a caso, e sempre depende de prova, cujo ônus é do credor (autor da ação judicial).

É o entendimento da Terceira Turma do Superior

Tribunal de Justiça (STJ):

O dano material é uma lesão concreta que afeta um

interesse relativo ao patrimônio da vítima. Assim, a perda de bens materiais deve ser indenizada, de modo que cada

desfalque no patrimônio de alguém lesado é um dano a ser reparado civilmente e de forma ampla.

Para COELHO132, há diferença entre danos materiais e

patrimoniais, e explica que “danos materiais são os que atingem as coisas,

inclusive os bens incorpóreos”.

Já os danos patrimoniais são “os que reduzem o pa-

trimônio da vítima” e diferencia-os, outrossim, dos danos extrapatrimoniais,

que configuram “os que causam-lhe dor merecedora de compensação”

e arremata: “os danos materiais são necessariamente patrimoniais e os

extrapatrimoniais, sempre pessoais” 133.

Segunda a classificação de COELHO134, portanto, há os

danos materiais e pessoais e os patrimoniais e extrapatrimoniais, estes

últimos chamados, também, de danos morais.

131 SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade médica civil, criminal e ética , p. 35

132 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 288.

133 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 289.

134 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 289.

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2.6. NEXO DE CAUSALIDADE

Além dos pressupostos acima elencados (conduta –

omissiva ou comissiva; culpa; dano), e não menos importante configura-se

o nexo de causalidade.

Explica COELHO135 que, “para que se constitua a

responsabilidade civil, em qualquer caso, é necessário que exista um liame

entre credor e devedor”.

Hodiernamente também chamado de relação de

causalidade, ou de nexo etiológico, pode ser definido como o vínculo que

se estabelece entre dois eventos, onde um representa conseqüência do

outro, conforme explica SCHREIBER136. Para COELHO137,

A relação de causalidade é condição da obrigação de indenizar tanto na hipótese de responsabilidade subjetiva

como objetiva – é dispensada apenas na subespécie obje-tiva pura138.

Deriva das leis naturais e configura verdadeiro liame

que “une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da

relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de

elemento indispensável”139.

E essa aparente simplicidade de definição não é

capaz de afastar as dificuldades práticas de se aferi-lo, especialmente

135 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 386.

136 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos, p. 51.

137 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 386.

138 Afeta exclusivamente ao ramo do Direito Público.

139 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil, p. 47.

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porque consiste no “mais delicado dos elementos da responsabilidade

civil e o mais difícil de ser determinado”140.

Não subsiste a obrigação de indenizar se não houver

configuração do nexo de causalidade entre a conduta do agente e o

dano experimentado: trata-se, pois, de elemento primordial, nos dizeres de

Stoco141. No entanto, interessante registrar que o referido autor não

formula um conceito próprio de nexo de causalidade.

NORONHA142 explica que o nexo de causalidade é o elo

entre o dano e o fato gerador, trata-se do

elemento que indica quais são os danos que podem ser considerados como conseqüência do fato verificado.

Causa de um dano só pode ser um fato que tenha contri-buído para provocá-lo, ou para agravar os seus efeitos;

tudo parece simples, mas não é: na responsabilidade civil, o nexo de causalidade é talvez o requisito que mais dificulda-

des suscita.

A dificuldade na conceituação de nexo de causali-

dade reside na necessidade de determinar a relação causa e efeito.

Para LOPES143, afigura-se condição essencial à própria

existência da responsabilização civil do agente, capaz de ligar o ato

praticado e o dano produzido e, embora pareça de fácil definição,

a noção da causa é uma noção que se reveste de um

aspecto profundamente filosófico, além das dificuldades de

140 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p.76.

141 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e juris-prudência, p. 63.

142 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações, p. 476.

143 LOPES, Miguel Maria de. Curso de direito civil: fontes acontratuais das obrigações e res-ponsabilidade civil, p. 218.

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ordem prática, quando os elementos causais, os fatores de

produção de um prejuízo, se multiplicam no tempo e no espaço.

Desta forma, o dano pode ser mediato, configurando

uma condição para produzir o dano, ainda que não seja a causa

imediata dele, o que não subtrai o agente da responsabilização. É

justamente isto que ensina DINIZ144, quando afirma que o dano

poderá ter efeito indireto, mas isso não impede que seja, concomitantemente, um efeito necessário da ação que o

provocou. P.ex.: se um desordeiro quebrar vitrina de uma loja, deverá indenizar o dono não só do custo do vidro e sua colocação, mas também do valor dos artigos furtados em

conseqüência de seu ato, por ser dano indireto, embora efeito necessário da ação do lesante.

A causalidade pode ser definida como sendo a

relação entre a conduta do agente e o dano sofrido pela vítima. Para que

haja o dano indenizável, ele não pode estar coberto por uma das causas

excludentes de responsabilidade, tampouco de ilicitude (o disposto do

contido no artigo 188 do Código Civil, acima referido). Sobre o nexo de

causalidade entre o agente e a ação, ensinam Remédio, Freitas e Lozano

Júnior145 que

O dano experimentado pelo ofendido deve ser decorrente

da ação do agente. Se não resultou da conduta deste, não haverá o dever de indenizar. O nexo causal fica excluído

quando o evento decorrer de força maior ou caso fortuito ou por culpa exclusiva da vítima.

Para SCHREIBER146, o exame do nexo causal “limita-se a

144 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade Civil, p. 100.

145 REMÉDIO, José Antonio; FREITAS, José Fernando Seifarth de; LOZANO JÚNIOR, José Júlio. Dano moral: doutrina, jurisprudência e legislação, p. 7.

146 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos, p. 183.

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verificar que a atividade desenvolvida pelo responsável vincula-se de

algum modo (próximo, direto, necessário, adequado ou eficiente)” ao

próprio dano, e arremata:

Debruça-se sobre a aptidão da atividade para a produção

do dano; nada diz sobre a atividade em si ou sua compa-ração com o interesse lesado. De outro lado, a verificação

do dano, por sua vez, continua sendo realizada de modo puramente estático. Significa isto dizer que, com relação ao

dano patrimonial, as cortes continuam entendendo suficien-te a matemática demonstração da diminuição econômica

sofrida pela vítima, e, com relação ao dano moral, os tribunais seguem exigindo tão-somente a identificação, em

abstrato, de uma norma que albergue o interesse alegada-mente transgredido, dispensando mesmo qualquer esforço

probatório ulterior; ao argumento de que o dano moral é in re ipsa147.

Para VENOSA148, na identificação do nexo causal, há

duas questões a serem analisadas:

Primeiramente, existe a dificuldade em sua prova; a seguir,

apresenta-se a problemática da identificação do fato que constitui a verdadeira causa do dano, principalmente

quando este decorre de causas múltiplas. Nem sempre há condições de estabelecer a causa direta do fato, sua

causa eficiente. Aponta-se a denominada teoria da equivalência das condições ao se cuidar do nexo causal. É

aquela admitida pelo nosso Código Penal ainda em vigor, pela qual não se distingue causa, condição ou ocasião, de

molde que tudo que concorrer para o evento deve ser apontado como nexo causal.

Arremata BITTAR149 que se configura necessária a

147 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros

da reparação à diluição dos danos, p. 183-184.

148 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil, p. 47.

149 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil: teoria e prática, p. 13.

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verificação de um liame, da relação entre o fato desencadeador e o

resultado danoso, certa e direta, capaz de configurar a “equivalência das

condições”, sem o qual a caracterização do dever de indenizar não se faz

possível.

2.7. REPARAÇÃO DOS DANOS

Dispõe o Código Civil:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Sendo assim, aquele que praticar um ato que causar

dano a terceiro, é obrigado a repará-lo, reparação esta, que visa

compensar/ressarcir os prejuízos causados por aquele que violou direito

alheio, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência.

O gênero “reparação” de danos abriga duas espécies

“ressarcimento” e “indenização”.

Ressarcimento, para reparar os danos materiais

devidamente comprovados, ou seja, tudo aquilo que foi, ou seria, teórica-

mente gasto em razão do ato danoso, o concerto de um carro em um

acidente de trânsito, a reconstrução de um muro derrubado pelo vizinho,

os gastos hospitalares com médicos e remédios em um atropelamento e

assim por diante.

Indenização, para reparar todos os danos fora da esfe-

ra material (morais, estéticos, etc), portanto, danos que não necessitam

de comprovação material (nota fiscal, orçamento, etc).

Há que se registrar que não é adequada a expressão

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“danos patrimoniais” para se referir exclusivamente aos “danos materiais”,

pois, muitas vezes, o maior patrimônio de um cidadão de bem é

exatamente sua moral.

Assim, será indenizável o dano moral de relativa

intensidade, que implique a alguém uma agressão íntima, gerando-lhe

dor, constrangimento e tristeza. Para uma definição clara e objetiva do

termo, pode-se dizer que indenização, nada mais é do que uma

vantagem pecuniária visando amenizar a dor sofrida, vantagem essa que

será argüida pela parte e determinada pelo juiz.

A responsabilidade civil, no primeiro capítulo, e seus

pressupostos neste segundo, serve de alicerce para se adentrar ao

terceiro e último, especificamente para tratar da "responsabilidade civil do

julgador brasileiro", que é o tema central deste trabalho.

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Capítulo 3

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO JULGADOR BRASILEIRO

3.1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS; 3.2. CONCEITO DE JULGADOR; 3.3. A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO POR SEUS PREPOSTOS;

3.4. O ERRO DO JULGADOR AO DECIDIR CONTRA A ORDEM JURÍDICA; 3.5. A RESPONSABILIDADE PESSOAL DO JULGADOR; 3.6. AS EXCLUDENTES

DE RESPONSABILIDADE CIVIL; 3.6.1. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA; 3.6.2. FORÇA MAIOR; 3.6.3. CASO FORTUITO.

3.1. BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS

A partir da Grécia e passando por Roma, a

magistratura no mundo se transformou ao passar dos séculos, as diferentes

situações estabelecidas através do tempo geraram uma soma de teorias

e experiências que se encontram refletidas nos dias de hoje.

Entre elas, o método utilizado para selecionar os juízes,

seleção essa que nunca é feita ao acaso, em que, por vezes, os

detentores dos poderes políticos tentaram, ou ainda tentam, colocar a

magistratura numa situação submissa e dependente, para que possam

controlá-la sem que a mesma pratique qualquer ato de rebeldia, o que

poderia ser uma tragédia para o poder executivo150.

Na cidade-Estado grega, o magistrado poderia ser

escolhido através de eleição ou por sorteio, sendo que qualquer cidadão

poderia concorrer a tal, eliminando assim a exigência de um conheci-

mento específico para a investidura do cargo.

150 DALARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes, p. 7.

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DALLARI151 citando o professor HUGO ENRICO PAOLI, da

Universidade de Florença, na Itália, ensina:

O processo de escolha dos magistrados dependia do sistema político vigente. Em síntese, nos sistemas oligárquicos

só os membros da classe dominante podiam ser magistra-dos, o que demonstra que se tratava de uma posição de

relevo político e social.

Nos sistemas democráticos toda a massa de cidadãos podia aspirar à magistratura e participar da escolha dos

magistrados. Em ambos os casos, o magistrado decidia como representante dos que haviam participado de sua

escolha, recebendo desse processo sua legitimidade para decidir. E pelo universo dos que poderiam ser escolhidos fica

claro que a magistratura não era tarefa para especialistas.

Embora não existisse uma separação nítida entre o

público e o privado, a magistratura se classificava como sendo um serviço

público, porém os julgadores da época acreditavam exercer uma função

privada, pois detinham o cargo para si, e vendiam ao povo a prestação

jurisdicional.

O problema dessa indefinição era que, muitas vezes,

deveriam os juízes dirimir questões entre o poder público e um particular,

como por exemplo, um aristocrata ou grande possuidor de terras. Quando

protegiam um particular contra abuso de servidores públicos, ou decidiam

contra o poder público, a ira dos governantes se despertava, já que estes

acreditavam que os magistrados não deveriam interferir nos assuntos do

Executivo ou Legislativo, prejudicando assim o interesse público.

Entretanto, quando a causa versava sobre direitos

exclusivamente de particulares, na qual o juiz judicava como delegado do

rei, a parte perdedora geralmente culpava o juiz e não o monarca pela 151 DALARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes, p. 9.

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possível “injustiça”. Devido a fatos como este, os magistrados passaram a

ser vistos com certa desconfiança e também temor por parte da

população, já que estes poderiam estar a qualquer momento envolvidos

num litígio, tendo que pagar muito caro por uma interferência do juiz.

Já os membros do governo ou políticos, os viam como

pessoas perniciosas, que visavam mais os seus interesses próprios do que a

justiça, o direito, o bem do povo.

Tudo isso, nos tempos da Revolução Francesa, contri-

buiu para que muitos juízes fossem punidos surgindo aí o interesse de

adaptação do Judiciário aos princípios republicanos e à separação de

Poderes já que era latente uma sociedade cada vez mais sedenta por ver

suas condutas morais e éticas materializadas através do Legislativo e

julgadas por um órgão imparcial que visasse tão somente à justiça, já que,

como é sabido, uma lei por si só, de nada vale se não aplicada

corretamente sob os mesmos princípios éticos e morais pela qual foi

criada, levando ao cidadão a concepção de justiça que este espera152.

Assim, a transformação do Estado Liberal para um

Estado de Bem-Estar Social, fez com que praticamente nenhuma situação

de convívio social deixasse de passar pelo Poder Judiciário, que emite seu

juízo sobre essas situações.

Por esse motivo, as decisões judiciais necessi-tam de

alto teor de responsabilidade já que, por vezes, não objetivam somente às

partes, mas sim a uma sociedade como um todo ensina ROESLER baseada

nos dizeres de PEDERZOLI e GUARNIERI153.

152 HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral, p. 20.

153 ROESLER, Claudia Rosane. Repensando o poder judiciário: os sistemas de seleção dos juízes e suas implicações. 2007. (Apresentação de Trabalho/Congresso).

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ROESLER, citando PEDERZOLI e GUARNIERI154 diz que por tal

razão, é cada vez menos evidente a distinção entre os Poderes Executivo,

Legislativo e Judiciário já que, este último, acaba igualmente sendo o

responsável pelas modificações sociais, implementando também políticas

públicas constantes na Constituição tendo sua atividade muita mais

exposta a uma sociedade que exige dele uma maior responsabilidade já

que, recebem dele, a justiça155.

PICAZO apud ROESLER156 diz que

quando o juiz e o intérprete deixam de ser os servidores de um legislador absoluto e, em virtude do princípio da divisão

de poderes, atuam como órgãos independentes de um Estado democrático, sua função adquire um significado

autônomo – administrar justiça – que, embora se realize em execução da lei, se desvincula de algum modo da ‘vonta-

de do legislador’.

Necessário se faz neste momento, fazer um pequeno

adendo para tratar do tema justiça, não se buscando aqui a definir157,

mas tão somente explicá-la.

154 Segundo PEDERZOLI E GUARNIERI, p. 21 “el hecho de que el juez sea también un

legislador se considera ya hoy como una ‘obvia banalidad’ (Cappelletti, 1998: p.14). Los ámbitos de discrecionalidad de que dispone y las mismas características del pro-cedimiento de decisión le llevan de hecho a participar en la formulación de las políticas públicas. Igualmente se ha visto que hoy es más difícil distinguir entre jurisdicción y administración, sobre todo en lo que se refiere al impacto produ-cido por las sentencias. Desde este punto de vista, la versión tradicional de la doctrina de la separación de poderes ya sufre una erosión visible. (…) Y desde esta perspec-tiva si se quiere evaluar el papel que de hecho ha asumido la justicia, el reparto formal de las competencias es hoy un punto de referencia mucho menos útil que antaño: el sistema judicial tiende a actuar, en efecto, como una estructura multifuncional, que presenta numerosas áreas de superposición con las actividades demandas a las otras instituciones políticas”.

155 ROESLER, Claudia Rosane. Repensando o poder judiciário: os sistemas de seleção dos juízes e suas implicações. 2007. (Apresentação de Trabalho/Congresso).

156 ROESLER, Claudia Rosane. Repensando o poder judiciário: os sistemas de seleção dos juízes e suas implicações. 2007. (Apresentação de Trabalho/Congresso).

157 Já que nem HANS KELSEN conseguiu fazê-la.

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Proveniente do termo latino jus, que significa direito,

pode-se falar que a justiça é a virtude moral de praticar ações em

conformidade tanto com o direito pressuposto (direito natural) quanto

com o direito posto (direito positivo), e assim, atribuir a cada um o seu

direito, que envolve uma relação coletiva na prática do que é justo.

SMITH apud LACERDA158, quando define justiça, diz não se

tratar de uma virtude que depende exclusivamente do seu autor para se

realizar, já que ela pode ser exigida através da força do Estado. Por esta

razão, necessário se faz distinguir o que é meramente reprovável do que é

injusto, e consequentemente, merecedor de uma punição. Por isso a

justiça para SMITH, é tida como uma virtude negativa, já que realizá-la

nada mais é do que cumprir o que é devido.

STODIECK159 lecionando acerca do tema ensina que

(...) a reciprocidade é o fundamento do sentimento da

justiça. Não só a reciprocidade nas relações civis e comerciais, em que a retribuição eqüitativa satisfaz ao que

vende ou presta serviços, mas também a correspondência da pena ao crime praticado, tanto para o primitivo na

vingança ou na lei do tabelião, como para o civilizado na pena proporcional à gravidade do crime praticado.

Considera-se justo, portanto, a retribuição equivalente ao

que se praticou ou cedeu. Se este princípio é universal, como o atestam os antropólogos, varia, no entanto, de

acordo com as diversas sociedades e classes, a medida do que se considera equivalente. Indaga-se se essa

relatividade não pode ser superada por um conhecimento objetivo de valores absolutos. Foi e ainda é este o objetivo das doutrinas do Direito Natural, que procuram descobrir

normas universais que se devem conformar com a natureza.

158 LACERDA, Bruno Amaro. Teorias esquecidas da justiça, p. 32.

159 STODIECK, Henrique. Problemas de filosofia do direito, convenção coletiva do trabalho e outros ensaios, p. 72.

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ARISTÓTELES, em sua concepção de justiça legal (aquela

sob o ponto de vista da lei) a deduz em duas modalidades: distributiva e

comutativa. “A primeira, que regula as ações da sociedade política em

relação ao cidadão, tem por objetivo a justa distribuição dos bens

públicos: honras, riquezas, encargos sociais e obrigações. (...) dar a cada

um o que lhe é devido”.

A segunda “(...) a comutativa, regula as relações entre

cidadãos. São as relações planejadas e voluntárias, como nos casos de

contratos, compra e venda, salários, empréstimos etc. (...) tanto devo,

tanto pagarei. Mas, entre cidadãos acontecem também relações

involuntárias como furtos, traições, estupros, assassinatos. Nestas situações

constrangedoras para uma das partes, cabe à sentença do juiz

restabelecer a igualdade rompida: o juiz repõe, pela sua sentença, a

igualdade entre cidadãos exigida pela justiça”160.

E de que modo repor a igualdade entre cidadãos?

Assim, os métodos de escolha do magistrado variaram de acordo com o

objetivo que se desejava ou se deseja; decisões perfeitamente técnicas

ou decisões que representem uma verdadeira noção de justiça para a

sociedade? Tal pergunta ainda paira no ar sem uma resposta bem

definida.

CAENEGEM, citado por ROESLER161. ensina que se pode

observar ao passar dos séculos, e principalmente na Europa, que o “poder

de julgar” vem se transferindo das mãos de leigos às mãos de juristas

capazes de compreender de maneira mais técnica o direito. Além de

que, a profissionalização tomou o lugar do amadorismo fazendo com que

os “novos” juízes se dedicassem de maneira exclusiva à sua função. 160 PEGORARO, Olinto A. Ética é justiça, p. 33-34.

161 ROESLER, Claudia Rosane. Repensando o poder judiciário: os sistemas de seleção dos juízes e suas implicações. 2007. (Apresentação de Trabalho/Congresso).

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CAENEGEM separa em três os tipos de métodos pelo qual

a história escolheu os juízes a partir da sua profissionalização. O primeiro

consistia na nomeação através da autoridade política de maior poderio.

O segundo dependia da vontade do povo que elegia os seus escolhidos.

Já no terceiro e último os magistrados deveriam fazer parte da nobreza ou

da aristocracia local. Baseado nesses três tipos de escolha, CAENEGEM

demonstra que o primeiro tipo, ou seja, o nomeado pela maior autoridade

política foi o mais usado e o que mais prevaleceu na Europa.

Entretanto, tal opção sofreu lenta metamorfose até

chegar à figura do político ser substituída pela figura de uma elite de

juristas. Deste modo, pode-se dizer, de maneira generalizada, que o

sistema de escolha nos dias de hoje, é uma mescla dos três tipos dispostos

anteriormente.

GUARNIERI, apud ROESLER162, tratando do método de

escolha dos magistrados, em países democráticos ao passar dos anos,

propõe sua distinção em três tipos básicos: uma em que o juiz é designado

pelo Poder Legislativo, pelo Executivo ou por ambos; uma onde o povo

elege, através de voto direto, o magistrado; e outro onde ingressa na

magistratura através de concurso público, com período de experiência

prática ou não. Assim, a opção por um desses sistemas, depende

particularmente da tradição jurídica e do processo de formação dos

órgãos do Estado em cada país.

Constata-se que em basicamente toda a Europa

continental a administração pública acabou por absorver a função

judicial para si, tornando-a um aparato do Estado, exatamente o oposto

dos países da common law onde os juízes jamais foram incorporados ao

aparato estatal. Já nos Estados Unidos há uma junção entre o sistema de 162 ROESLER, Claudia Rosane. Repensando o poder judiciário: os sistemas de seleção dos

juízes e suas implicações. 2007. (Apresentação de Trabalho/Congresso).

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eleição direta do povo com o as instituições políticas na escolha dos

membros do Judiciário163 diz CAENEGEM citado por ROELSER.

Em que pese os diversos métodos de escolha expostos,

nota-se grande tendência à adesão da figura do juiz como um profissional

escolhido dentre os mais bem sucedidos membros de determinado ramo,

no caso, o jurídico, através de métodos de seleção idênticos ao de

funcionários públicos, fazendo assim com que, por analogia, se tornem

parte do Estado.

Deste modo, independente do sistema de seleção,

seja ela derivada de uma nomeação de ente superior ou de uma eleição,

o que se nota nos países anglo-saxões é a exigência de uma variada e

sólida experiência prática aos ingressantes da magistratura164. O que por

óbvio é compreensível visto que os “novos” juízes estão sendo colocados

em seus cargos cada vez mais novos, pois, via de regra, fazem parte de

um grupo de recém formados que fizeram estudo direcionado à carreira

da magistratura, tendo pouca experiência ou vivência para assumir cargo

de tal responsabilidade.

Assim, ao passar da história, os métodos de escolha

sofreram diversas mudanças, restando aos dias de hoje uma grande

diversidade, já que depende de vários fatores, como o papel do próprio

juiz perante a sociedade e o sistema jurídico/político do país que se

encontra.

Feita essa breve análise histórica, será utilizada neste

trabalho, a concepção do juiz como um profissional, um representante do

Estado que gere e concede a justiça à sociedade. 163 ROESLER, Claudia Rosane. Repensando o poder judiciário: os sistemas de seleção dos

juízes e suas implicações. 2007. (Apresentação de Trabalho/Congresso).

164 AGIRREAZKUENAGA, Iñaki. Modelos comparados de organización judicial y régimen de selección o elección de jueces y magistrados, p. 12.

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3.2. CONCEITO DE JULGADOR

Na Grécia antiga, ARISTÓTELES ensinava que o título de

magistrado (arké), era dado a qualquer cidadão que exercesse algum

tipo de poder de comando na esfera do interesse público. Para o

professor DE DOMINICIS, a palavra magistratus derivou de magister, que quer

dizer “chefe”, sendo utilizada inicialmente para designar a pessoa física

que recebia um mandato do povo e agia como seu representante, na

qual ocupava uma posição social de relevo perante a organização

política165.

Para DE PLÁCIDO E SILVA166 julgador é a pessoa que,

investida de uma autoridade pública, vai administrar a justiça, em nome

do Estado. É assim, de modo genérico, o administrador da justiça, estando,

por isso, a seu cargo, conhecer, dirigir a discussão, deliberar sobre todos os

assuntos, que possam suscitar, e julgar os casos controvertidos submetidos

a seu juízo ( sub judice).

Assim, julgador é todo aquele que, representando o

Estado, através do Poder Judiciário, oferece a tutela jurisdicional a todos

os cidadãos, administrando a justiça, conhecendo e julgando o direito

pleiteado por outrem.

Deve, portanto, o julgador possuir um grau apurado do

dever de justiça, para que possa exercer sua missão com dignidade e

eficiência. Porém, a lei impõe aos julgadores limites que devem ser

respeitados, visto sua alta responsabilidade social e civil, objeto de análise

a seguir.

165 DALARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes, p. 6.

166 SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico, p. 553.

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3.3. A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO POR SEUS PREPOSTOS

Cabe analisar neste instante quais fatos ou atos serão

necessários para que se dê origem à responsabilidade civil do Estado e

em que condições este será obrigado a indenizar.

A priori , importante ressaltar que o dano é fundamento

principal do instituto da responsabilidade, e que este está ligado

diretamente a uma causa, de caráter natural ou material que lhe deu

origem. Independente do caráter original, a causa do dano é sempre

advinda do homem, do ser humano, não levando em conta as máquinas,

que se supõem estar sob constante vigilância do agente público.

Corroborando com isso CRETELLA JÚNIOR167 leciona que a

primeira fonte da responsabilidade civil do Estado é o agente público que

se exterioriza, ou por meio de atos administrativos, ou por meio de fatos

administrativos, ou, ainda, por omissões.

Como exposto na norma constitucional a responsabili-

ade objetiva compreende duas teorias. A primeira chamada de teoria do

risco administrativo e a segunda de teoria do risco integral .

DINIZ168 expõe que a teoria do risco integral foi adotada

pelo direito brasileiro no tocante aos atos comissivos do funcionário já que

o artigo 15 do antigo Código Civil dispunha que “as pessoas jurídicas de

direito público são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que

nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao

direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os

causadores do dano” foi em parte modificado pelo artigo 37, § 6º, da

167 CRETELLA JÚNIOR, José. O estado e a obrigação de indenizar, 105.

168 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, p. 526.

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Constituição Federal de 1988, que assim preceitua: “As pessoas jurídicas

de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos

responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a

terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos

de dolo ou culpa”.

Deste modo, com essa assertiva, a Constituição consa-

gra a idéia de que as pessoas jurídicas, tanto de direito público como de

direito privado, devem responder pelos danos que seus funcionários

causarem a terceiros, estando resguardado o direito da ação regressiva

quando a conduta foi insculpida de culpa, já que, não pode o patrimônio

público ser desfalcado pela conduta ilícita de agente do Estado.

DINIZ169 acerca das relações entre o Estado e o

administrado, segue dizendo que a Constituição adota a responsabilidade

objetiva da pessoa jurídica de direito público, quando há comportamento

que denote comissão danosa por parte de seu funcionário.

Tal premissa é fundada na teoria do risco, pelo qual,

basta que haja o dano, o nexo causal com o ato do funcionário e que

este se encontre em serviço no momento do evento prejudicial ao direito

de um particular, para que o Estado responda civilmente, não sendo

necessária a constatação de dolo ou culpa por parte do agente.

Entretanto, há manifesta tendência doutrinária de que

tal responsabilidade funda-se na teoria do risco administrativo.

SILVA170 ensina que

O direito positivo brasileiro consagra a teoria do risco

169 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, p. 526.

170 SILVA, Caio Mário. Responsabilidade civil - de acordo com a constituição de 1988, p. 77.

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integral ou risco administrativo (Supremo Tribunal Federal, in

RTJ, 55/50; TRF in Revista Forense, vol. 268/2). O art. 37, § 6º, da Constituição de 5 de outubro de 1988, repetindo a

política legislativa adotada nas disposições constitucionais anteriores, estabelece o princípio da responsabilidade do

Estado pelos danos que os seus agentes causem a terceiros. A pessoa jurídica de direito público responde sempre, uma

vez que se estabeleça o nexo de causalidade entre o ato da Administração e o prejuízo sofrido (Revista dos Tribunais,

vol. 484, pág. 68). Não há cogitar se houve ou não culpa para concluir pelo dever de reparação. A culpa ou dolo do agente somente é de se determinar para estabelecer a ação de in rem verso, da Administração

contra o agente. Quer dizer, o Estado responde sempre perante a vítima, independentemente da culpa do servidor.

Este, entretanto, responde perante o Estado, em se pro-vando que procedeu culposa ou dolosamente. Não impor-

ta que o funcionário seja ou não graduado (Washington de Barros Monteiro, Curso, vol. 5, p. 108).

BASTOS171 acredita que pelo fato de o Estado lidar com

inúmeros instrumentos de grande potencial ofensivo, assume ele o risco

pelos danos que daí advenham. Por esse motivo, acredita ele ser a

responsabilidade objetiva por risco a teoria dominante.

Ressalta-se que a teoria do risco integral não é aceita

por grande parte, ou senão a maioria, dos juristas brasileiros, pois, segundo

eles o fato de ser o Estado sujeito à teoria da responsabilidade objetiva

não vai ao extremo de lhe ser atribuído o dever de reparação de prejuízos

em razão de tudo que acontece no meio social172.

Entre tantas digressões, num caso hipotético onde

alguém sofre dano passível de responsabilização por parte do Estado,

171 BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à constituição do Brasil, p. 171-172.

172 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo , p. 390.

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MEIRELLES173 com objetividade resume:

Para obter a indenização, basta que o lesado acione a

Fazenda Pública e demonstre o nexo causal entre o fato lesivo (comissivo ou omissivo) e o dano, bem como o seu

montante. Comprovados esses dois elementos, surge natu-ralmente a obrigação de indenizar. P

ara eximir-se dessa obrigação incumbirá à Fazenda Pública

comprovar que a vítima concorreu com culpa ou dolo para o evento danoso. Enquanto não evidenciar a culpabilidade

da vítima, subsiste a responsabilidade objetiva da Adminis-tração. Se total a culpa da vítima, fica excluída a responsa-

bilidade da Fazenda Pública; se parcial, reparte-se o quantum da indenização.

Deste modo, demonstrando o lesado o nexo causal

existente entre o ato lesivo e o dano sofrido, ficará o Estado obrigado a

indenizá-lo, independente de culpa ou dolo de seu agente administrativo,

salvo nos casos explícitos de excludentes de responsabilidade.

Sob esse aspecto, nesta pesquisa, se considerará a

teoria da responsabilidade civil objetiva por risco administrativo.

3.4. O ERRO DO JULGADOR AO DECIDIR CONTRA A ORDEM JURÍDICA

A ordem jurídica de um país consiste no conjunto de

normas, leis, regras e princípios, que dispostos de maneira hierárquica, se

subordinam sempre à Constituição. Esta por sua vez exerce o papel de “lei

maior” em um Estado democrático servindo de norte às “leis menores”

devendo elas serem compatíveis tanto materialmente como formalmente

a ela.

173 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 558.

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O Poder Legislativo é o responsável pela formulação

do ordenamento jurídico, criando leis que exteriorizam o desejo de uma

sociedade em ver seus princípios éticos e morais difundidos e sedimen-

tados através de leis, no meio onde vivem. Então, pode-se entender por

ordenamento jurídico o conjunto de normas, princípios, leis etc, que visam

manter a paz social e garantir os interesses jurídicos do cidadão.

Por tal motivo, a ordem jurídica deve ser mantida sob

qualquer aspecto, não podendo sob nenhuma hipótese ficar ao bel

prazer da discricionariedade do magistrado (ou de quem for), que deve

tão somente e, agindo em conformidade com os princípios legais, aplicá-

la ao caso concreto de maneira imparcial, visando unicamente à

manutenção da justiça não deixando com que seus sentimentos interiores,

pré-conceitos ou qualquer fator externo passível de afastá-lo da justiça,

formem seu juízo. Até porque, neste país, e desde 1.889, vive-se sob o

império da lei, e não sob a lei do império.

BOBBIO ensina objetivamente que “o positivismo jurídico

põe um limite instransponível à atividade interpret ativa: a interpretação é

geralmente textual e, em certas circunstâncias (quando ocorre integrar a

lei), pode ser extratextual; mas nunca será antitextual174”.

Sob a ótica de GUIMARÃES175

Deverá o juiz obedecer à lei, ainda que dela discorde,

ainda que lhe pareça injusta. É um constrangimento que o princípio da divisão dos poderes impõe ao aplicador. Seria o

império da desordem se cada qual pudesse, a seu arbítrio, suspender a execução da norma votada pelos represen-

tantes da nação. Lembremo-nos, ainda uma vez, de que todo o poder vem do povo e que o povo cometeu aos

174 BOBBIO, Norberto; O positivismo jurídico , p. 22.

175 GUIMARÃES, Mário. O juiz e a função jurisdicional, p. 330-331.

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membros da assembléia, e não a juízes, a tarefa de formular

as regras jurídicas que o hão de governar. Admitir possa o magistrado tornar prevalecente a sua opinião, contra a

exarada, por modo lúcido, no texto, fora superpor a sua vontade individual à da maioria parlamentar, nas demo-

cracias, ou a do ditador, nos regimes discricionários.

Já MAXIMILIANO176 ensina que "em geral, a função do

juiz, quanto aos textos, é dilatar, completar e compreender; porém não -

alterar, corrigir, substituir. Pode melhorar o dispositivo, graças à interpreta-

ção larga e hábil; porém não - negar a lei, decidir o contrário do que a

mesma estabelece".

Portanto, deve o julgador decidir em conformidade

com a lei, em algumas hipóteses além da lei, mas jamais, e sob hipótese

alguma, decidir contra a lei e o ordenamento jurídico por seguinte.

Passa-se então a análise das hipóteses em que haverá

a responsabilização estatal advinda de erro do julgador (judiciário), erro

este que para LASPRO177 é o ato jurisdicional que, ou pelo mau enqua-

dramento dos fatos no mundo jurídico ou pela errônea aplicação das

normas, vai de encontro às regras de natureza processual e material, em

qualquer dos ramos do direito.

Para o ex-Desembargador do Tribunal de Justiça de

Santa Catarina, Nicanor Calírio da Silveira,

O erro judiciário disposto no art. 5º, LXXV, da Constituição da

República, deve ser entendido como o ato jurisdicional equivocado e gravoso a alguém, tanto na esfera penal

quanto na civil, conseqüente do ato proferido pela atuação do juiz no exercício da função jurisdicional (decisão judicial).

176 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito, p. 106-107.

177 LASPRO, Oreste Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz, p. 223.

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(...).

O Estado está obrigado a indenizar o particular quando o

juiz, na qualidade de prestador de serviço público, profere decisão judicial ilegal e abusiva, totalmente em inobser-

vância aos requisitos legais, uma vez que possui o dever de respeitar integralmente os direitos subjetivos constitucionais

assegurados ao cidadão, especialmente o de ir e vir.

Ao prender indevidamente o indivíduo, o Estado atenta contra os direitos humanos e provoca dano moral, com

reflexos em suas atividades profissionais e sociais. (Apelação Cível nº 2005.028603-8, da Capital).

A Constituição da República Federativa do Brasil

(CRFB/88) prescreve:

Art. 37. (...). § 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos

danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o

responsável nos casos de dolo ou culpa.

Observa DINIZ178, baseada no ensinamento de CELSO

ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, que tanto as pessoas jurídicas como as físicas,

devem ressarcir os prejuízos causados a outrem.

Caso do Estado, que sendo pessoa jurídica de direito

público não foge à regra, regendo-se sua responsabilidade por princípios

próprios já que, os danos causados por ele, advêm do desempenho de

funções que visam atender os interesses de uma sociedade, não devendo

prosperar o fato de somente uma pessoa sofrer com um evento lesivo

advindo de uma atividade exercida para o benefício de todos. Deste

modo, quem aufere os cômodos, deve obrigatoriamente suportar os ônus.

178 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, p. 428.

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Mais adiante, referindo-se as teorias que fundamentam

a responsabilidade civil do Estado, Diniz sustenta que

O risco é o fundamento da responsabilidade civil do Estado por comportamentos administrativos comissivos, exigindo

tão-somente nexo causal entre a lesão e o ato, ainda que regular, do agente do poder público. Trata-se de responsa-

bilidade objetiva do Estado, bastando a comprovação da existência do prejuízo.

Na responsabilidade objetiva do Estado, não se discute

o quesito culpa visto que a responsabilidade da Administração Pública,

desvinculada de qualquer fator subjetivo, pode ser afirmada independen-

temente de sua demonstração, estando sempre submetida à demons-

tração de que foi o serviço público que causou o dano sofrido pelo autor.

Para CAVALIERI FILHO179, a norma contida no art. 5º, LXXV,

da Constituição é específica para a responsabilidade do Estado por erro

judicial. Assim, se conclui que o objetivo do legislador foi o de estabelecer

temperamento ao princípio estabelecido no § 6º do art. 37 da Carta

Política no tocante à atividade jurisdicional. Segundo ele, a função

jurisdicional não se distingue da atividade administrativa do Estado, por

essa razão, não haveria motivo para o tratamento diferenciado estabe-

lecido na própria Constituição no tocante a responsabilidade do Estado

pelos atos judiciais típicos.

Na mesma linha leciona o Ministro Moreira Alves no

Recurso Especial nº 130.764.

A responsabilidade do Estado, embora objetiva por força do disposto no artigo 107 da Emenda Constitucional n.º 1/69

(e, atualmente, no § 6º do artigo 37 da Carta Magna), não dispensa, obviamente, o requisito, também objetivo, do

179 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil, p. 76.

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nexo de causalidade entre a ação ou a omissão atribuída a

seus agentes e o dano causado a terceiros.

Destarte, em relação à responsabilidade objetiva, ou

sem culpa, o risco constitui o fundamento da responsabilidade civil do

Estado, não se cogitando acerca da culpa.

Como exposto anteriormente, no início da humani-

dade usava-se da força para reparar o dano causado a outrem, método

este que estava incutido nas pessoas como uma concepção de “justiça”,

entendida como o que, de fato, era justo.

A composição voluntária, numa sociedade mais

moderna, seguiu o mesmo caminho, porém a máxima “olho por olho e

dente por dente”180 foi deixada de lado, quando a culpa passou a ser

analisada para que pudesse fazer uma “melhor justiça”.

Nascia nesse momento a responsabilidade subjetiva,

ligada ao direito posto181 (em que se buscava uma melhor interpretação

da lei para não se cometer uma possível injustiça). Ainda assim havia uma

punição, desta vez através de uma indenização (que poderia ser em

dinheiro, bens, terras, entre outros), mas ainda continuava de caráter

pessoal, isto é, o agressor pagava ao agredido, deste modo, este tinha a

sensação de punir aquele, e mais ninguém.

Entretanto, no Brasil, nota-se, através da lei constitucio-

nal e também do código civil de 2002, em particular, manifesta tendência

a aderir à responsabilidade civil objetiva como regra geral.

Explica SÍLVIO RODRIGUES182 que no caso da responsabili-

180 Lei de talião – Código de Hamurabi. Consistente na reciprocidade do crime e da pena.

181 GRAU, Eros. Direito posto e direito pressuposto, p. 70.

182 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil, p. 10.

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dade objetiva exposta no Código Civil, a conduta culposa ou dolosa do

agente causador do dano é irrelevante já que, existindo a relação de

causalidade entre o dano sofrido pela vítima e o ato do agente, o dever

de indenizar surge obrigatoriamente.

Corroborando com isso, o Código Civil estabelece, in

verbis:

Art. 927. (...). Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano,

independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo

autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os

direitos de outrem183.

Já a Constituição da República Federativa do Brasil

(CRFB/ 88) prescreve:

Art. 37. (...). § 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos

danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o respon-

sável nos casos de dolo ou culpa184.

Deste modo, fica o Estado obrigado a indenizar o

particular quando o juiz (na qualidade de prestador de serviço público)

decide contra o ordenamento jurídico, proferindo decisão ilegal ou

abusiva desrespeitando os direitos subjetivos assegurados aos cidadãos,

mandando prender quando a lei manda soltar, mandando tirar quando a

lei manda dar.

183 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Que institui o Código Civil.

184 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, 266 p.

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Prescreve também a Carta Cidadã que “o Estado

indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso

além do tempo fixado na sentença” (CRFB/88, art. 5º, inciso LXXV).

Importante ressaltar que esta pesquisa não se restringe

“apenas” à investigação de “erro do judiciário” e muito menos para

circunscrevê-la a quem restou “preso além do tempo fixado na sentença”,

pois busca mais.

A responsabilidade pessoal do julgador, quando este

decide contra o ordenamento jurídico, segundo DELGADO E PORTO185 foi

objeto de análise da União Internacional dos Magistrados, cujo encontro

ocorreu em Tunis (Tunísia), de 22 a 26 de outubro de 1980, tanto que ficou

registrado no relatório final dos trabalhos que:

A responsabilidade do magistrado em geral pode ser enca-rada sob diferentes aspectos: em face de um delito come-

tido no exercício de suas funções (por exemplo, corrupção, ou a denegação da justiça), ou em face de uma falta ou

mesmo simplesmente um erro.

A esse respeito, entretanto, uma distinção se impõe:

não se pode responsabilizar o magistrado pelas decisões que tome,

quando se trata de simples erro de apreciação ou de interpretação.

Os únicos casos, nos quais sua responsabilidade

pessoal pode ser admitida, são os que demonstram negligência muito

grave, falta muito séria de comportamento e de cunho inaceitável, que

um magistrado normal e razoavelmente diligente, não cometeria. Como

exemplo de negligência grave, foi citado o caso de demora excessiva

para julgar uma causa, imputável ao magistrado.

185 DELGADO, Mauricio Godinho; PORTO, Lorena Vasconcelos. O estado de bem-estar

social no século XXI, p. 101.

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Assim, necessário se faz, adentrar na questão da

responsabilidade pessoal do julgador, objetivo maior deste trabalho.

3.5. A RESPONSABILIDADE PESSOAL DO JULGADOR

Sabe-se que, mesmo tendo o juiz a responsabilidade

pelo dano que causar, o Estado é que acaba respondendo pelos danos

sofridos pelo cidadão. Porém, além disso, a pessoa que vier a sofrer dano

por ato de magist rado, poderá responsabilizá-lo direitamente, atingindo

sua esfera pessoal/patrimonial, desde que existentes os requisitos subjetivos

de dolo ou fraude, quando se recusar, retardar ou omitir uma providência

processual determinada advinda de requerimento da parte ou por ofício,

sem justa causa, aliás conforme previsão legal disposta no Código de

Processo Civil:

Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz, quando:

I – no exercício de suas funções, proceder com dolo ou II – recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência

que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte.

Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no nº II só depois que a parte, por intermédio do

escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não atender o pedido no prazo de 10 dias.

A responsabilidade que dispõe o artigo citado é de

cunho pessoal, não tendo o Estado qualquer vinculação com os atos

ilícitos praticados pelo magistrado, seu preposto ou agente. Cabível,

todavia, a responsabilização pessoal do juiz, devendo este, e não o

Estado, arcar com as conseqüências oriundas de seus atos.

BARBI186 diz que “quando cabível a indenização por

186 BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao código de processo civil, p. 545.

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perdas e danos, com base no art. 133, ela não será pedida no processo

em que se deram os fatos, e sim em ação própria, com processo em

separado. Terá ela as características comuns das ações de indenização

por ato ilícito: o autor será a parte prejudicada e o réu será o juiz”.

Contudo, se o Autor demandar o Estado, pelo risco

que o mesmo assumiu de sua at ividade (responsabilidade objetiva), o

Estado poderá propor ação regressiva contra o Juiz, se restar provado que

agiu ele com culpa ou dolo.

Assenta DELGADO187, ainda tratando sobre a responsa-

bilidade pessoal do julgador por atos contrários ao ordenamento jurídico,

A esse respeito, entretanto, uma distinção se impõe: não se

pode responsabilizar o magistrado pelas decisões que tome, quando se trata de simples erro de apreciação ou de inter-

pretação. Os únicos casos, nos quais sua responsabilidade pode ser admitida, são os que demonstrem uma negligên-

cia muito grave, uma falta muito séria de comportamento e de cunho inaceitável, que um magistrado normal e razoavelmente diligente não cometeria. Como exemplo de

negligência grave, foi citado o caso de demora excessiva para julgar uma causa, imputável ao magistrado.

E o Judiciário brasileiro, tem limitado e muito a possibi-

lidade de responsabilizar pessoalmente o julgador, aliás, mesmo quando

se tenta cobrar do Estado a “justa” reparação, os Tribunais tergiversam,

como se pode observar pelas decisões abaixo destacadas:

HABEAS CORPUS. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. EXCESSO DE PRAZO.

COMPETÊNCIA. 1. A preservação da pronúncia em grau de recurso não faz

atribuível ao tribunal regional o excesso de prazo na 187 DELGADO, José Augusto. Poderes, deveres e responsabilidade do juiz. Disponível em:

<www.bdjur.stj>. Acesso em 29/10/2009.

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conclusão do processo, transcendente à admissão da

acusação, sendo imputável, sim, ao juízo da causa, perante o qual, no primeiro grau da jurisdição, flui a ação penal, até

porque não se discute o título legal da medida cautelar, mas a subsistência subseqüente da prisão provisória.

2. Pedido estranho à competência do Superior Tribunal de Justiça (Constituição da República, artigo 105, inciso II,

alínea "a"). 3. Habeas corpus não conhecido.

(STJ, HC 10145/BA, 6ª Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, jul. 20/06/2000, publ. 18/09/2000, p. 162).

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. O Estado não responde civilmente por ações ou omissões

de magistrados no exercício de função jurisdicional, a não ser nas estritas hipóteses previstas na Constituição Federal ou quando haja procedimento doloso ou fraudulento de tais

agentes da atividade estatal. Não há como confundir o erro judiciário, suscetível de gerar

indenização pelo Estado, nos termos do inciso LXXV do art. 5º da Constituição Federal, com o decreto de prisão

preventiv a, baixado com suficiente fundamentação e atendidos os pressupostos autorizadores da medida, que

atinge pessoa que, a final, vem a ser absolvida.

Entendimento diverso instauraria insegurança no exercício da função judicante, que é feita de decisões definitivas,

mas também de provimentos acautelatórios, na forma da lei. Apelo do Estado provido. (TJSC, AC 1999.004534-0, Rela-

tor João José Ramos Schaefer, jul. 07/03/02).

Em síntese, o próprio legislador brasileiro estabeleceu

regras para responsabilizar pessoal e diretamente o julgador, mas, como

se pode observar pela análise do artigo 133 do CPC, somente nos casos

nele previstos, esquecendo-se de tratar da questão de decisões judiciais

literalmente contra o sistema jurídico pátrio, o que, a luz da teoria subje-

tiva, abre caminho à ação direta contra o julgador, até porque o Estado,

que é a soma de todos os cidadãos, não pode responder por elas.

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3.6. AS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

Excludentes de responsabilidade civil são as hipóteses

em que o julgador será isentado de responsabilidade, não se trazendo

aqui, contudo, meramente as excludentes de responsabilidade civil, que

já foram vistas de modo genérico no primeiro capítulo, mas sim as mais

diretamente passíveis de alegação por parte dos magistrados.

Apoiada nos ensinamentos de HELY LOPES MEIRELLES, DI

PIETRO188 ensina que somente na teoria do risco administrativo são

admitidas as causas excludentes de responsabilidade civil delineadas

abaixo como: culpa exclusiva da vítima, força maior e caso fortuito.

MEDAUAR189 ensina que “a adoção da responsabilidade

objetiva do Estado levou alguns autores a cogitar de uma nebulosa

distinção entre teoria do risco integral e teoria do risco administrativo. A

primeira representaria um sentido absoluto da responsabilidade da

Administração, para levá-la a ressarcir todo e qualquer dano relacionado

à suas atividades.

A segunda admitiria isenção total ou parcial da

responsabilidade, se fosse comprovada força maior ou participação da

vítima no evento danoso. No entanto, autores que mencionaram em suas

obras a teoria do risco integral, para adotá-la, admitem a isenção da

Administração em caso de força maior ou culpa da vítima, pois em tais

hipóteses deixaria de haver nexo de causalidade ensejadora da responsa-

bilização. Desse modo, parece inexistir diferença substancial entre o risco

integral e o risco administrativo, como ensina Yussef Said CAHALI190”.

188 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanela. Direito administrativo , p. 504.

189 MEDAUAR, Odete. Responsabilidade civil do Estado, p. 431.

190 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado, p. 40-4.

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GASPARINI191 vai além dizendo que

por certo não se há de admitir sempre a obrigação de

indenizar do Estado. Com efeito, o dever de recompor os prejuízos só lhe cabe em razão de comportamentos dano-

sos de seus agentes e, ainda assim, quando a vítima não concorreu para o dano. De sorte que nem se cogita da

responsabilização do Estado por dano decorrente de ato de terceiro.

Isto é mais que óbvio. Desse modo, em duas hipóteses o

Estado não tem que indenizar. A primeira diz respeito a acontecimento, imprevisível e irresistível, causado por força

externa ao Estado, do tipo do tufão e da nevasca (caso fortuito) ou da greve e da grave perturbação da ordem

(força maior). Destarte, demonstrado que o dano é uma decorrência de acontecimentos dessa ordem, não há o

Estado que indenizar, dado não ter sido ele o causador do dano, conforme decisões de nossos Tribunais, a exemplo do

STF (RDA, 128:554) e do TJSP (RT, 445:100). Pela mesma razão a indenização é obrigatória se durante um temporal cai

uma rede telefônica em mau estado de conservação, e seus fios, em contato com os elétricos, vitimam uma criança (RJTJRGS, 58:215). Nos dois exemplos, os danos não foram

causados pelo Estado, mas este, com seu comportamento culposo, facilitou a ocorrência do dano e, por isso, deve

indenizar. A segunda diz respeito aos casos em que a vítima concor-

reu, parcial ou totalmente, para o evento danoso. Logo, provado que a vítima participou, de algum modo, para o

resultado gravoso, exime-se o Estado da obrigação de indenizar, na mesma proporção. Assim, sua responsabili-

dade será parcial ou total conforme tenha sido, numa ou noutra dessas direções, a colaboração das vítimas no

evento (RJTJSP, 85:140; RJ, 550:106)”.

Razão pela qual, passa-se a esmiuçar as excludentes

de responsabilidade civil, sendo elas: 191 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo , p. 606-608.

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3.6.1. Culpa exclusiva da vítima

Caso o evento danoso venha a ocorrer devido a culpa

exclusiva da vítima, a responsabilidade do agente causador do dano

desaparece já que deixa de existir o nexo causal entre a sua conduta e o

prejuízo experimentado pela vítima.

GONÇALVES192 leciona “Pode-se afirmar que, no caso de

culpa exclusiva da vítima o causador do dano é mero instrumento do

acidente. Não há liame de causalidade entre o seu ato e o prejuízo da

vítima”.

STOCO193 segue na mesma linha ensinando que “embo-

ra a lei civil não faça qualquer menção à culpa da vítima como causa

excludente da responsabilidade civil, a doutrina e o trabalho pretoriano

construiu a hipótese, pois como se dizia no direito romano ‘quo quis ex

culpa damnum sentit, non intelligitur damnum sentire’”.

LASPRO194 leciona:

Se um determinado indivíduo sofreu um dano oriundo de

uma ação ou omissão de um agente do estado, em princípio, estaria formado o liame entre a causa e o prejuízo

e, portanto, nasceria o direito ao ressarcimento. Ocorre que, muitas vezes, pode ser que o resultado danoso

somente tenha ocorrido em razão da culpa da vítima, ou seja, esta, por ação ou omissão, contribuiu definitivamente

para que assumisse a condição de vítima. Nessas situações, em princípio, temos o rompimento do nexo causal com o ato do agente estatal, não existindo direito ao ressar -

cimento.

192 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 505.

193 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial, p. 74.

194 LASPRO, Oreste Nestor de Souza. A responsabilidade civil do juiz, p. 82.

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Com efeito, é indispensável se verificar o fenômeno das

concausas. Isso significa que precisamos examinar se a culpa constitui a causa fundamental e exclusiva do dano ou

se, por algum modo, ainda subsiste o nexo causal com a ação do agente estatal. Dessa maneira, sempre que o

dano não for resultado somente da culpa da vítima, mas também da ação do agente estatal, não temos a exclusão

completa do dever de ressarcir, mas sim, uma redução do valor a ser pago, de modo proporcional à responsabilidade

de cada um dos envolvidos.

3.6.2. Força maior

Parte da doutrina brasileira entende que não há

diferença entre força maior e caso fortuito. Tal compreensão se dá pelo

próprio texto legal presente no Código Civil em seu artigo 393, parágrafo

único:

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se

houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou

impedir.

Acerca do artigo de lei citado, RODRIGUES195 ensina que

o Código Civil brasileiro iguala as expressões caso fortuito e força maior

pelo simples advento da imprevisibilidade do fim contida em ambos. Ou

seja, trata-se de um ato alheio e independente da vontade das partes

não sendo derivado de negligência, imprudência ou imperícia, já que

"caso fortuito ou de força-maior representa um excludente de responsa-

bilidade, em virtude de pôr termo à relação de causalidade entre o ato

do agente e o dano experimentado pela vít ima".

195 RODRIGUES, Sílvio. Responsabilidade civil, p. 185.

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O Superior Tribunal de Justiça não tem se preocupado

em distinguir ambos, mas tão somente em constatar particularmente a

presença deles em cada processo.

Assim, muito embora parte da doutrina, julgados e a

legislação brasileira igualem as duas expressões, necessário se faz

alcançar um nível de entendimento pelo qual se encontre ao menos as

diferenças e particularidades entre elas.

Para GUIMARÃES196 força maior é “fato imprevisível,

resultante de ato alheio, que vai além das forças do indivíduo para

superá-lo, ao qual a pessoa não tem meios de se contrapor”.

Trata-se então de atos advindos de uma causa certa e

conhecida pelo homem, mas impossível de se evitar. É a própria atuação

da força humana sendo manifestada pelos fatos de terceiros.

3.6.3. Caso fortuito

Diz GUIMARÃES197, que no caso fortuito trata-se de “im-

previsto, inevitável, estranho à vontade, como terremoto, morte natural,

tempestade, naufrágio; o que não pode ser previsto por meio humano”.

Para COELHO198, caracteriza-se como fortuito

Todo evento desencadeador de danos não originado pela

culpa de alguém. Pode referir-se a fatos da natureza (enchentes, queda de raio, terremoto) ou humanos

(produção em massa, prestação de serviços empresariais). A característica fundamental do fortuito é a inevitabilidade.

196 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário jurídico, p. 317.

197 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário jurídico, p. 148.

198 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações; responsabilidade civil, p. 389.

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O evento é inevitável em razão da imprevisibilidade

(inevitabilidade cognoscitiva), da incapacidade humana de obstar seus efeitos danosos (inevitabilidade material) ou

da falta de racionalidade econômica em obstá-los (inevitabilidade econômica).

O fortuito natural ou humano é sempre excludente da

responsabilidade civil subjetiva, porque descaracteriza a relação de causalidade entre o dano do credor e a condu-

ta culposa do devedor. Quando objetiva a responsabili-dade, porém, apenas o fortuito natural descaracteriza a

relação de causalidade.

Assim, embora a semelhança entre força maior e caso

fortuito, pode-se concluir que a força maior funda-se na irresistibilidade

(greve, motim etc), já o caso fortuito na imprevisibilidade (tempestade ou

qualquer outro ato de causa natural ou não, dês de que não possa ser

previsto, e assim evitado).

A força maior então se caracteriza por um fato/ato

externo, diferentemente do caso fortuito que se encontra inserido no

agente estatal, razão em que o nexo não é rompido persistindo a

responsabilidade.

Nota-se então, que nos casos descritos acima, sendo

por culpa exclusiva da vítima, ou por motivos de força maior ou caso

fortuito o julgador terá sua responsabilidade excluída. Entretanto caso não

incorra o julgador em uma dessas excludentes, o Estado será responsa-

bilizado e pagará pelo seu erro, mesmo que intencional e/ou proposital.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve por objetivo investigar, sob o

amparo da legislação, doutrina e jurisprudência, a responsabilidade civil

do julgador quando este decide contra o ordenamento jurídico brasileiro

e partiu da hipótese de que tal responsabilidade deve ser imputada

diretamente ao julgador, havendo prova de culpa ou dolo.

O ordenamento jurídico brasileiro, que é tido como

modelo em diversas partes do mundo, não pode nem deve ficar a cargo

da discricionariedade do julgador. Esse por sua vez, deve servir apenas de

instrumento para que aquele seja aplicado em conformidade com os

princípios pelo qual foi criado. Por tal razão o presente trabalho se fez

necessário.

No primeiro capítulo, se tratou basicamente da

responsabilidade civil, sua concepção histórica no mundo e no Brasil, as

suas divisões em contratual e extracontratual, solidária e não solidária

além da definição de responsabilidade civil objetiva, onde não se discute

a culpa e da subjetiva, onde a culpa é fator determinante. Por fim, tratou-

se das diversas situações em que a responsabilidade será excluída se

ocorrida em decorrência de legítima defesa, exercício regular de um

direito ou a fim de remover perigo iminente além do caso fortuito ou força

maior e da culpa exclusiva da vítima.

Por fim, expôs-se breve comentário acerca da prescri-

ção e decadência, devendo o fendido respeitar determinado prazo para

acionar o ofensor caso assim deseje.

No segundo capítulo tratou-se dos pressupostos da

responsabilidade civil. Analisou-se a conduta do agente em si, se essa

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advém de uma ação (fazer) ou de uma omissão (não fazer) e se essa

ação ou omissão foi insculpida ou não com a intenção de causar o dano,

ou seja, com dolo, no primeiro caso ou com culpa, no segundo. Diante de

tais pressupostos e havendo uma conduta e um dano, sendo comprovado

o nexo causal existente entre ambos, traçou-se ainda diretrizes sobre a

reparação do dano, seja ele moral ou material.

No terceiro e último capítulo fez-se comentários acerca

da história e do método de escolha dos julgadores ao passar dos anos,

assim, viu-se em um primeiro momento, que o Estado seria o responsável

pelos atos de seus agentes, podendo posteriormente acioná-los através

de uma ação regressiva, salvo os casos em que o magistrado agir com

dolo ou fraude, quando se recusar, retardar ou omitir uma providência

processual determinada advinda de requerimento da parte ou por ofício,

sem justa causa, oportunidade em que o mesmo pode ser demandado

diretamente (CPC, art. 133).

Evidentemente que todo ser humano é passível de erro

e com o julgador não poderia ser diferente, contudo, busca-se com o

presente trabalho, mostrar que “errar” é diferente de “querer errar”, não

sendo justo responsabilizar o Estado quando o julgador decide, com culpa

ou dolo, contra as regras estabelecidas no ordenamento jurídico.

Imputar a responsabilidade por tais ações ao Estado

leva à seguinte indagação: quem é o Estado; onde está o Estado e quem

responde pelo Estado? A resposta parece evidente, por mais que não se

queira: o Estado somos nós, o conjunto de cada um de nós que paga

pelos impostos e também pelos erros dos outros já que “nós” é que

pagamos a conta pela irresponsabilidade civil dos atos praticados pelos

agentes do Estado.

Assim, esse trabalho objetiva imputar ao magistrado o

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preço a pagar pelo seu erro, como no caso de representante do Ministério

Público, por expressa previsão legal199, que “refere-se à responsabilidade

pessoal do representante do MP por dolo ou fraude, e não à responsabili-

zação do Poder Público por atos daquele” (STF-RF 294/189)?

Porque o “Estado” (no caso, a Sociedade) é obrigado

a reparar um ofendido quando o ofensor, fugindo de sua função estatal

(levar à sociedade a justiça) age contrário às suas ordens? Torna-se um

ciclo que começa e termina no mesmo lugar, numa legítima tautologia,

logo, o ofendido ajudará a pagar a indenização que ele próprio tem

direito por ter sofrido por um ato irresponsável de um magistrado (ofensor).

Será que não agiria e julgaria este com mais responsa-

bilidade, com mais conformidade, e por fim, com mais prudência, se

pagasse diretamente pelo próprio erro ao invés de se vestir de Estado e

ficar impune ante suas (in)justiças? Ainda mais quando decide contra a

ordem jurídica, que visa garantir aos cidadãos a verdadeira concepção

de justiça?

O Estado existe para manter as regras e condutas

sociais, entretanto, por si só, isto se torna impossível já que, materialmente

não existe. Deste modo, o Estado seleciona agentes pelo qual exteriorizará

suas vontades. Logo, o magistrado não age por si, mas pelo Estado, por

um conjunto de pessoas que almejaram ver suas vontades e princípios

éticos e morais consagrados perante todos200 e que querem dele somente

a aplicação da lei, do direito, devendo ele ter por objetivo a descoberta

de modos e meios que amparem juridicamente os interesses humanos201.

199 CPC, art. 85. O órgão do Ministério Público será civilmente responsável quando, no

exercí cio de suas funções, proceder com dolo ou fraude.

200 HUME, David. Uma Investigação sobre os princípios da moral , p. 23.

201 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito, p. 19.

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A justiça é maior do que qualquer vontade própria,

maior do que qualquer desejo humano, não podendo ela ser relegada ao

segundo plano ficando ao bel prazer do julgador aplicá-la segundo seus

desejos.

Assim, quando o magistrado, agindo por vontade

própria e com dolo ou culpa grave, decide contra o ordenamento

jurídico, faz por si e não por todos, se despe de Estado para imputar a

alguém a sua vontade, e não a vontade de todos. Por tal motivo deve ele

ser responsabilizado única e pessoalmente pelo mau que aflige àquele

cidadão que espera ver dele a verdadeira concepção de justiça o que

vai ao encontro da hipótese central que norteou a pesquisa.

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