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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI MICHELLI CRISTIANE FERREIRA CRIMES FUNCIONAIS CONTRA A NATUREZA: um enfoque à luz da Lei nº 9.605/1998 Florianópolis 2009

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

MICHELLI CRISTIANE FERREIRA

CRIMES FUNCIONAIS CONTRA A NATUREZA:

um enfoque à luz da Lei nº 9.605/1998

Florianópolis

2009

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MICHELLI CRISTIANE FERREIRA

CRIMES FUNCIONAIS CONTRA A NATUREZA:

um enfoque à luz da Lei n. 9.605/1998

Monografia a à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito à obtenção do grau de Especialista em Direito Penal e Processual Penal. Orientador: Professor Dr. Zenildo Bodnar

Florianópolis

2009

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Especialização em Direito

Penal e Processual Penal da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada

pela aluna Michelli Cristiane Ferreira, sob o título Crimes Funcionais Contra a

Natureza à Luz da Lei n. 9.605/1998 foi submetida em [data] à avaliação pelo

Professor Orientador e pela Coordenação do Curso de Especialização em Direito

Penal e Processual Penal, e aprovada.

Florianópolis, novembro de 2009

Professor Dr. Zenildo Bodnar

Orientador

Professora MSc. Helena Nastassya Paschoal Pitsica

Coordenadora do Curso de Especialização em Direito

Penal e Processual Penal

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual

Penal e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Florianópolis, 27 de novembro de 2009

Michelli Cristiane Ferreira

Aluna

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Dedico este trabalho ao meu amado filho,

Nicollas, motivo maior de minha

persistência na busca e no aprimoramento

pessoal, profissional, espiritual, que, com

paciência, compreensão e carinho,

compartilhou comigo todos os momentos

na conquista de mais um objetivo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, por ter me sustentado firme em meus propósitos e objetivos e

por me guiar e iluminar meu caminho.

À minha mãe, Terezinha, pelo apoio e força.

Ao meu amor e companheiro, Hiram, pela força, compreensão e apoio

dispensados em mais uma conquista.

À minha irmã Márcia, pelo carinho e força, sempre presente nos momentos

difíceis.

A todos os profissionais que dedicam o seu trabalho e sua vida na preservação do

meio ambiente, por um mundo mais justo e humano.

E, por fim, ao meu Orientador e Professor Zenildo Bodnar, minha maior referência

e exemplo de profissional na busca da Justiça, por todos os ensinamentos e

orientação na elaboração deste trabalho.

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RESUMO

A importância do meio ambiente para a sobrevivência da espécie humana no

planeta é questão pacificada. Não resta dúvida que a tutela jurídica do meio

ambiente é instrumento que se faz premente para proteger o bem ambiental para

as presentes e futuras gerações. Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988

representa um grande avanço na proteção do meio ambiente ao criar um capítulo

exclusivo (art. 225 e §§) sobre a matéria, estabelecendo a tríplice

responsabilidade (administrativa, civil e penal) das pessoas físicas e jurídicas.

Diante da relevância do meio ambiente, a Constituição erigiu-o a bem jurídico

autônomo e de natureza difusa. A partir dessa premissa, foi editada a Lei Federal

n. 9.605/1998, denominada de Lei de Crimes Ambientais, que estabelece, entre

outras, a responsabilidade administrativa e penal por condutas ou atividades

lesivas ao meio ambiente. Nesse ensejo, buscou-se pesquisar o papel

desempenhado pelos agentes ou funcionários públicos responsáveis pelo

exercício do poder de polícia ambiental, que compõem os órgãos do SISNAMA,

cuja atribuição é cumprir e fazer cumprir as legislações e normas afetas a

proteção do meio ambiente. Diante do comando constitucional que impõe ao

Poder Público o dever de defender e preservar o meio ambiente, infere-se o

importante papel dos agentes ou funcionários que exercem o poder de polícia

ambiental. Nesse contexto, trouxe-se a baila a necessidade da tutela penal para

proteger o meio ambiente. Assim, buscando identificar as condutas e atividades

lesivas ao meio ambiente e a administração pública praticadas por agentes ou

funcionários que exercem o poder de polícia ambiental, pesquisou-se a

responsabilidade penal à luz da Lei de Crimes Ambientais. Dessa forma, abordou-

se os crimes contra a administração ambientais, analisando-se individualmente os

crimes previstos no art. 66 a 69-A da Lei n. 9.605/1998.

Palavras-chave: Poder de Polícia Ambiental. Tutela Penal Ambiental. Lei de

Crimes Ambientais. Crimes Contra a Administração Ambiental.

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ABSTRACT

The importance of the environment for the survival of mankind on the planet is

concerned pacified. There is no doubt that the legal protection of the environment

is an instrument that is crucial to protect the environmental good for present and

future generations. In this sense, the Constitution of 1988 represents a major

advance in protecting the environment by creating a unique chapter (section 225

and § §) in this regard, establishing a threefold responsibility (administrative, civil

and criminal) of individuals and Legal. Given the importance of the environment,

the Constitution has erected it to the legal autonomy is diffuse. From this premise,

was published in Federal Law n. 9605/1998, called the Environmental Crimes

Law, which provides among others, administrative and criminal liability for conduct

or activities harmful to the environment. In this opportunity, we sought through the

inductive method, research the role played by agents or officials responsible for

the exercise of police power environment, which consists's constituent bodies,

whose assignment is to observe and enforce the legislation and regulations

affecting the protection the environment. Faced with the constitutional command

that imposes upon the State the duty to defend and preserve the environment, it is

clear the important role of the agents and officials who exercise police power

environment. In this context, brought to fore the need for criminal oversight to

protect the environment. Thus, seeking to identify the conduct and activities

harmful to the environment and public administration committed by officials or

employees who exercise the power of the environmental police, searched to

criminal liability light of the Law of Environmental Crimes. Thus, together the

following crimes against environmental management, analyzing individual crimes

provided by art. 66 to 69 of Law No 9.605/1998.

Keywords: Power Environmental Police. Law Enforcement Environment.

Environmental Crimes Law. Crimes Against Environmental Administration.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 10

2 TUTELA JURÍDICA DO BEM AMBIENTAL........................................................ 13

2.1 NOÇÕES GERAIS .......................................................................................... 13

2.2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DE BEM AMBIENTAL ........................ 19

3 PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E A RESPONSABILIDADE AMBIENTAL ..... 26

3. 1 ASPECTOS GERAIS ..................................................................................... 26

3.1.1 Princípio do poluidor-pagador .................................................................. 27

3.1.2 Princípio do usuário-pagador ................................................................... 29

3.1.3 Princípio da prevenção .............................................................................. 30

3.1.4 Princípio da precaução .............................................................................. 31

3.1.5 Princípio da função socioambiental da proprie dade .............................. 33

3.1.6 Princípio do controle do poluidor pelo Poder Público ........................... 34

3.1.7 Princípio da natureza pública da proteção amb iental ............................. 35

3.1.8 Princípio do ambiente ecologicamente equilibr ado como direito

fundamental ......................................................................................................... 36

3.2 TRÍPLICE RESPONSABILIDADE EM MATÉRIA AMBIENTAL ...................... 38

3.2.1 Responsabilidade civil ............................................................................... 39

3.2.2 Responsabilidade administrativa ............................................................. 42

3.2.3 Responsabilidade penal ............................................................................ 44

4 O PODER DE POLÍCIA AMBIENTAL .............................................................. 46

4.1 PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVO ....................................................... 46

4.1.1 Origens e evolução .................................................................................... 46

4.1.2 Conceito ...................................................................................................... 48

4.1.3 Razão e fundamento .................................................................................. 51

4.1.4 Objeto e finalidade ..................................................................................... 52

4.1.5 Competência ............................................................................................... 53

4.1.6 Meio e campo de atuação .......................................................................... 54

4.1.7 Atributos e requisitos ................................................................................ 55

4.2 PODER DE POLÍCIA EM MATÉRIA AMBIENTAL .......................................... 57

4.2.1 Conceito ...................................................................................................... 57

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4.2.2 Competência do poder de polícia em meio ambie nte ............................. 59

5 A TUTELA PENAL AMBIENTAL ..................................................................... 62

5.1 BEM JURÍDICO PENAL E A NECESSIDADE DA TUTELA PENAL DO MEIO

AMBIENTE ............................................................................................................ 62

5.2 LEI DE CRIMES AMBIENTAIS (LEI N. 9.605/1998): Aspectos Gerais ........... 66

5.2.1 Tipos penais em espécie: considerações gerais .................................... 70

5.2.1.1 Dos crimes contra a fauna ........................................................................ 70

5.2.1.2 Dos crimes contra a flora .......................................................................... 71

5.2.1.3 Dos crimes de poluição e outros crimes ambientais ................................. 72

5.2.1.4 Dos crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural ............ 73

5.2.1.5 Dos crimes contra a administração ambiental ........................................... 74

5.3 DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO AMBIENTAL: CRIMES

PRATICADOS POR AGENTES OU FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS COM PODER

DE POLÍCIA AMBIENTAL ..................................................................................... 75

5.3.1 Análise individual do art. 66 da Lei Ambienta l ........................................ 77

5.3.2 Análise individual do art. 67 da Lei Ambienta l ........................................ 78

5.3.3 Análise individual do art. 68 da Lei Ambienta l ........................................ 80

5.3.4 Análise individual do art. 69 da Lei Ambienta l ........................................ 82

5.3.5 Análise individual do art. 69-A da Lei Ambien tal .................................... 84

6 CONCLUSÃO .................................................................................................... 86

REFERÊNCIAS .................................................................................................... 91

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1 INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto identificar e analisar a

responsabilidade penal dos agentes ou funcionários públicos revestidos de poder

de polícia ambiental, sob o enfoque da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes

Ambientais).

O seu objetivo é identificar e analisar à luz da Lei nº 9.605/1998, os

tipos penais aplicáveis aos agentes ou funcionários públicos dotados do poder de

polícia ambiental e que são incumbidos pela Constituição Federal de 1998 e

demais normas infraconstitucionais, pela fiscalização e aplicação das leis e

normas que tutelam a proteção do meio ambiente. Assim, pretende-se estudar a

tutela penal ambiental prevista na Lei de Crimes Ambientais e discorrer sobre sua

necessidade para a proteção do meio ambiente, enfocando especificamente aos

Crimes Contra a Administração Ambiental.

A pesquisa revela-se importante, em razão da necessidade cada vez

mais premente de um eficaz sistema protetivo do meio ambiente, mormente por

se tratar de bem erigido constitucionalmente a direito fundamental transindividual,

de natureza difusa, de uso limitado e esgotável, complexo, frágil e indispensável à

sobrevivência de todas as formas de vida no planeta. Nesse cotejo, destaca-se a

previsão constitucional da responsabilidade penal (art. 225, § 3º, CF), impondo ao

Poder Público o dever de proteger o meio ambiente, bem como da

responsabilidade penal prevista na Lei nº 9.605/1998. A partir dessa premissa,

buscou-se destacar um dos principais sujeitos responsáveis pela aplicação das

normas e leis protetivas, que, infelizmente, vem se destacado hodiernamente no

cenário brasileiro em escândalos, envolvidos direta ou indiretamente com sujeitos

ativos nos crimes ambientais. Assim, o estudo visa identificar e analisar as

condutas delitivas que tais agentes públicos podem estar incursos e que

prejudicam, direta ou indiretamente o meio ambiente, quer por sua inércia

(omissão) ou ação, e que são passíveis da sanção penal.

Para tanto, principia-se, no Capítulo 2, tratando da tutela jurídica do

bem ambiental, estabelecendo noções gerais sobre a tutela ambiental, com sua

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breve evolução histórica no nosso ordenamento jurídico pátrio, passando para o

conceito jurídico do bem ambiental e sua natureza jurídica.

No Capítulo 3, discorre-se sobre os princípios estruturantes do Direito

Ambiental, destacando, além dos aspectos gerais e sem esgotar o assunto,

alguns dos princípios do Direito Ambiental que estão ligados ao tema principal

dessa Monografia, considerados, nesse caso, os mais relevantes. Descreve-se,

ainda nesse capítulo, a responsabilidade ambiental pelos danos ao meio

ambiente, que pode resultar na aplicação de tríplice responsabilidade da pessoa

física ou jurídica, independentes entre si, quais sejam: responsabilidade civil,

responsabilidade administrativa e responsabilidade penal.

No Capítulo 4, centra-se no poder de polícia ambiental, tratando

delimitar suas origens e evolução, conceito, razão e fundamento, objeto e

finalidade, competência, meio e campo de autuação e atributos e requisitos do

poder de polícia administrativa. Dentro do campo de autuação do poder de polícia

administrativa, buscou-se discorrer sobre o poder de polícia ambiental, que é

exercido pelos agentes e funcionários públicos que compõem os órgãos

integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), cujas funções

são jungidas à preservação e à proteção do meio ambiente, mediante

licenciamento, autorização, fiscalização aplicação e execução das sanções

administrativas, etc.

No Capítulo 5, busca-se delimitar o tema central da Monografia, ao

destacar a tutela penal ambiental, o bem jurídico penal e a necessidade da tutela

penal do meio ambiente, cuja justificação dá-se em razão da relevância do bem

ambiental e à necessidade desse tipo de tutela para a sua eficaz proteção, visto

que as demais formas de tutela ambiental têm se demonstrado insuficientes.

Buscou-se ainda, aprofundar-se na Lei de Crimes Ambientais, destacando

aspectos gerais sobre a lei, aspectos positivos e negativos, com enfoque geral

nos tipos penais que abrangem crimes contra a fauna e a flora, crimes de

poluição, crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural e crimes

contra a administração ambiental. Ao final, buscou-se aprofundar os estudos nos

crimes contra a administração ambiental, comentando os artigos 66 a 69-A da Lei

nº 9.605/1998, os quais encerram alguns dispositivos cujos sujeitos ativos podem

abranger somente agentes ou funcionários públicos (crimes próprios) e outros

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dispositivos abranger sujeitos ativos particulares e agentes ou funcionários

públicos (crime comum).

O presente relatório de pesquisa se encerra com as conclusões, nas

quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação

à continuidade dos estudos e das reflexões sobre os crimes contra a

administração pública ambiental, praticados por agentes ou funcionários públicos

que estão revestidos do poder de polícia ambiental, cuja função estão jungidas a

tão importante papel esculpido na Constituição, qual seja, a defesa e a proteção

do meio ambiente.

Para a presente monografia, foi levantada a seguinte hipótese: O

ordenamento jurídico contempla os tipos penais que reprimem as condutas

praticadas contra o meio ambiente por agentes ou funcionários públicos que

exercem o poder de polícia ambiental, reguladas pela Lei nº 9.605, de 12 de

fevereiro de 1998 (Lei de Crimes Ambientais).

Quanto à metodologia empregada, foi utilizado o método indutivo com

base no ordenamento jurídico brasileiro e na doutrina.

Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as Técnicas do

Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

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2 TUTELA JURÍDICA DO BEM AMBIENTAL

2.1 NOÇÕES GERAIS

A degradação do meio ambiente representa um dos problemas mais

preocupantes que a humanidade vem enfrentando desde a segunda metade do

século XX, embora seja mais antiga, mas não de maneira acentuada como na

atualidade.

Sem dúvida, a degradação do meio ambiente passou a não só afetar o

bem-estar social, mas ameaçar a qualidade de vida humana e sua própria existência

no planeta.

Historicamente, Trennepohl (2008, p. 30-31) destaca que o aumento do

consumo dos meios naturais veio no fim do século XVIII, fomentada pela Revolução

Industrial e pelo acréscimo populacional, em que o desenvolvimento tecnológico

resultou no uso ilimitado da natureza e, por conseguinte, na degradação ambiental.

No século XIX, houve o aprimoramento dessas técnicas, acelerando ainda mais o

uso dos recursos naturais. Já no século XX, o fenômeno da globalização trouxe

consigo o progresso científico ligado às ciências da natureza na busca desenfreada

pelo uso dos recursos naturais, que até então eram considerados infinitos. No século

XXI, surge o conflito entre o desenvolvimento tecnológico e a obrigação de

estabelecer limites à própria capacidade de intervenção sobre o meio ambiente.

Não obstante, é inegável que a preocupação ambiental mundial está

intimamente ligada ao crescimento populacional e à redução dos recursos naturais,

seja pelo uso irracional e desenfreado seja pela alteração provocada no meio

ambiente pelas atividades humanas.

Nas palavras de Luis Regis Prado (1992, p. 18):

O desenvolvimento industrial, o progresso tecnológico, a urbanização desenfreada, a explosão demográfica e a sociedade de consumo, entre outros fatores, têm tornado atual dramático o problema da limitação dos recursos do nosso planeta e da degradação do ambiente natural – fonte primária de vida. [...] [...] As leis básicas da natureza não foram revogadas, apenas suas feições e relações quantitativas mudaram, à medida que a população humana mundial e seu prodigioso consumo de energia aumentaram a nossa capacidade de alterar o ambiente. Em conseqüência, a nossa sobrevivência depende do conhecimento e da ação inteligente para preservar e melhorar

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a qualidade ambiental por meio de uma tecnologia harmoniosa e não prejudicial.

Quanto à problemática ambiental, Milaré (2009, p. 59, grifo do autor)

alerta que o meio ambiente é questão de vida e morte do próprio homem ao

esclarecer que:

De outro lado, o processo de desenvolvimento dos países se realiza, basicamente, à custa dos recursos vitais, provocando a deterioração das condições ambientais em ritmo até ontem desconhecidos. A paisagem natural da Terra está cada vez mais ameaçada pelas usinas nucleares, pelo lixo atômico, pelos dejetos orgânicos, pela “chuva ácida”, pelas indústrias e pelo lixo químico. Por conta disso, em todo mundo – e o Brasil não e nenhuma exceção – o lençol freático se contamina, o ar se torna contamina, a água escasseia, a área florestal diminui, o clima sofre alterações, o ar se torna irrespirável, o patrimônio genético se degrada, abreviando os anos que o homem tem para viver sobre o Planeta. Isto é, “do ponto de vista ambiental o planeta chegou quase ao ponto de não retorno. Se fosse uma empresa estaria à beira da falência, pois dilapida seu capital, que são os recursos naturais, como se eles fossem eternos. O poder de autopurificação do meio ambiente está chegando ao limite.”

Segundo Prado (1992, p.20), a questão ambiental emerge no terreno

político-econômico e da concepção da vida humana, haja vista que a política

ambiental deve buscar equilibrar e compatibilizar as necessidades de

desenvolvimento e industrialização com a proteção, restauração e melhora do

ambiente. Assim, o desenvolvimento econômico deve propiciar uma melhor

qualidade de vida e bem-estar social.

Nessa ceara, Milaré (2009, p. 64) faz uma importante digressão sobre a

importância do desenvolvimento sustentável, na qual defende a ideia da possível e

desejável conciliação entre o desenvolvimento, o meio ambiente e a melhoria da

qualidade de vida:

É falso, de fato, o dilema “ou desenvolvimento ou meio ambiente”, na medida em que, sendo este fonte de recursos para aquele, ambos devem harmonizar-se e complementar-se. Compatibilizar meio ambiente com desenvolvimento significa considerar os problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se adequadamente a exigência de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a cada contexto sociocultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão tempo/espaço. Em outras palavras, isto implica dizer que a política ambiental não se deve erigir em obstáculo ao desenvolvimento, mas sim em um de seus instrumentos, ao propiciar a gestão racional dos recursos naturais, aos quais constituem a sua base material.

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Baracho Júnior (apud SILVA, 2000, p. 240-241) afirma que a proteção

ambiental é direito fundamental da pessoa humana, pois visa tutelar a qualidade de

vida, na qual abrange a preservação da natureza em todos os seus aspectos e

elementos essenciais à vida humana e à manutenção do equilíbrio ecológico.

Historicamente, Trennepohl (2008, p.31) assinala que o meio ambiente foi

apresentado como problema mundial na Conferência de Estocolmo1 realizada em

1972, a partir da qual se buscou focalizar e enquadrar a necessidade de

conservação e metas a alcançar para o desenvolvimento sustentável2.

Nas palavras de Prado (1992, p. 21-22), a tutela ambiental é uma

exigência mundialmente reconhecida, baseada num imperativo elementar de

sobrevivência e de solidariedade: a responsabilidade histórica das nações na

preservação da natureza para o presente e futuras gerações, voltada aos valores

essenciais relativos aos direitos fundamentais, como o direito à vida e à saúde.

Destaca o mesmo autor (1992, p.19-22) que essa premissa de valores foi

capitaneada pela Declaração de Estocolmo, a qual é um marco importante na

conservação do meio ambiente, porque, além de permitir uma consciência

ecológica, estabelece uma importante trajetória de proteção jurídica internacional do

meio ambiente.

Nesse sentido, Baracho Júnior (apud SILVA, 2000, p. 241, grifo do autor)

ressalta que a Declaração de Estocolmo abriu caminho para que as Constituições

supervenientes reconhecessem o meio ambiente ecologicamente equilibrado como

um direito fundamental entre os direitos sociais, com características de direitos a

serem realizados e direitos a não serem perturbados.

Com muita propriedade, Milaré (2009, p. 67, grifo do autor) justifica a

importância da tutela jurídica ambiental ao discorrer que:

A superação desse quadro de degradação e desconsideração ambiental passa, necessariamente, por alterações profundas na compreensão e conduta humanas. É um avanço que pode ser conseguido, em primeiro lugar, através de adequada educação ambiental, nas escolas e fora delas.

1 Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, promovida pela ONU , contando com a participação de 113 países. A Conferência foi resultado da percepção das nações ricas e industrializadas da degradação ambiental causada pelo seu processo de crescimento econômico e progressiva escassez de recursos (MILARÉ, p. 59). 2 Segundo TRENNPOHL (2008, p.32), desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem também às suas.

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Em segundo lugar, exige a criação (e implementação) de instrumentos legais apropriados, dado que, no embate dos interesses econômicos, só o Poder Público é capaz de conter, com leis coercitivas e imposições oficiais, a prepotência dos poderosos (poluidores e degradadores, no nosso caso), pois, “onde há fortes e fracos, a liberdade escraviza, a lei é que liberta.”

No Brasil, a preocupação com a tutela jurídica do meio ambiente remonta

desde as Ordenações dos Reinos3 (Afonsinas, seguidas pelas Manuelinas, de 1521)

ainda na época do Império, com a preocupação voltada a proteger a derrubada de

árvores de lei (pau-brasil), e extração de minérios (ouro, prata, pedras preciosas),

contrabandeados para Portugal e outros países (SIRVINKAS, 2008, p. 24).

Entretanto, Silva (2003, p. 34-35) lembra que a concepção privatista do

direito de propriedade constituía forte barreira à autuação do meio ambiente,

mormente por importar restrições ao direito e aos limites à propriedade e à iniciativa

privada, o que ensejou por muito tempo na desproteção do meio ambiente.

Segundo Milaré (2007, p. 151), as Constituições que precederam a de

1988 quase não tratavam sobre o tema, o que revelava uma total despreocupação

com o espaço habitado.

A Constituição do Império, outorgada em 25 de março 1824, não tratou

sobre a matéria, apenas sobre a proibição de indústrias contrárias à saúde do

cidadão (art. 179, n. XXIV), o que, para época, representava um grande avanço

(MILARÉ, 20008, p. 147). Somente em 1830 é que se fez constar no Código

Criminal o crime de corte ilegal de árvores (SIRVINKAS, 2008, p. 25).

A Constituição de 1891 atribuía competência legislativa para a União

legislar sobre minas e terras. Sob sua vigência, surgiu o Código Civil de 1916, que

previa normas destinadas a proteger direito privado e conflitos de vizinhança. A

Constituição de 19344 ampliou o leque regrando sobre a proteção das belezas

naturais e sobre o patrimônio histórico, artístico e cultural. Conferiu à União

competência em matéria de riquezas do subsolo, mineração, águas, florestas, caça,

3 Ordenações Afonsinas, Livro V, Título LVI, proibia o corte deliberado de árvores frutíferas, Manoelinas, Livro V, Título LXXXIV, vedava caça de perdizes, lebres e coelhos com redes, fios e bois ou outros meios ou instrumentos capazes de causar dor e sofrimento na morte desses animais e Filipinas, Livro LXXV, Título LXXXVIII, parágrafo sétimo, protegia as águas punindo com multa quem sujasse ou matasse os peixes. (OLIVEIRA JÚNIOR, 2006). 4 A partir de 1934 algumas normas específicas sobre proteção do meio ambiente desenvolveram-se, como: Dec. 23.793, de 23.01.1934 - Código Florestal, substituído pelo vigente; Decreto-Lei n. 24645, de 10.07.1934 - Código de Caça; Decreto 24.643, de 10.07.1973 – Código de Águas e Decreto-Lei 794, de 19.10.1938 - Código de Pesca. (SILVA, 2004, p.35-36).

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pesca e sua exploração. Por seu turno, a Constituição de 1937 incluiu matérias de

competência da União para legislar sobre minas, águas, florestas, caça, pesca e sua

exploração; competência legislativa sobre subsolo, águas, florestas; e tratou da

proteção das plantas e rebanhos contra moléstias e agentes nocivos. A Constituição

de 19465 praticamente repetiu a anterior. A Constituição Federal de 19676 manteve a

necessidade de proteção do patrimônio histórico, cultural e paisagístico, bem como

atribuiu à União legislar sobre normas gerais de defesa da saúde e sobre jazidas,

florestas, caça, pesca e águas. A Carta de 1969 insistiu na necessidade de proteção

do patrimônio histórico, cultural e artístico. (MILARÉ, 2009, p.151).

Sob o ponto de vista histórico, Sirvinkas (2008, p. 23-24) define a

proteção jurídica do meio ambiente em três grandes períodos, a saber: I - período

entre o descobrimento (1500) até a vinda da Família Real (1808), que previa normas

isoladas de proteção de recursos naturas que se escasseavam; II – período iniciado

com a vinda da Família Real até a criação da Lei de Política Nacional do Meio

Ambiente (1981), marcada por exploração desregrada do meio ambiente, tutelando

apenas aquilo que tivesse interesse econômico; e III – período que começa com a

criação da Lei n. 6.938, de 31.8.1981 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente) –

denominado fase holística –, mecanismo formal de tutela jurisdicional do meio

ambiente que consistia em proteger, de maneira integral, por meio de um sistema

ecológico integrado.

Akaoui (2003, p. 22) destaca a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente

como um dos diplomas mais notáveis ao propor que:

[...] Inovador e corajoso, o referido compêndio legal teve o mérito de abarcar questões de ordem civil, processual, penal e administrativo que foram o start de uma nova realidade na defesa ambiental, conceituando meio ambiente, poluição, poluidor e outros termos de importância para a correta verificação da amplitude dessa tutela, posicionando-se positivamente

5 O Código Penal de 1940 definia no seu art. 271, o crime de corrupção ou poluição de água potável, que teve pouca aplicação em razão do seu adjetivo “potável” (SILVA, 2004, p. 38). 6 Na década de 60 e 70, houve a edição de algumas normas ambientais: Lei 5.318, de 26.9.1967 – Política Nacional de Saneamento Básico; Decreto 73.030, de 30.10.1973, no âmbito do Ministério do Interior, da Secretaria Especial de Meio Ambiente – SEMA “orientada para a conservação do meio ambiente e o uso racional dos recursos naturais” (SILVA, 2004, p. 37); o Atual Código de Caça, instituído pela Lei 5.197/1967; e o atual Código Florestal, Lei 4.717, de 29.06.1965 (AKAOUI, 2003, p. 22). Destaca-se ainda a edição da Lei de Ação Popular (Lei n. 4.717/1965) que enfoca a proteção aos interesses artístico, estético, histórico ou turístico (o meio ambiente, como termo jurídico, somente veio a ser inserido a partir da CF/88, art. 5.º, inciso LXXIII) e a Lei de Proteção da Fauna (Lei 5.197/67). (OLIVEIRA JÚNIOR, 2006).

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quanto à responsabilidade ambiental do degradador, impondo sanções administrativas e penais independentemente das de natureza civil, entre outros avanços.

No entanto, foi na Constituição Federal de 1988 que foi inserido pela

primeira vez o termo meio ambiente7, tido como o mais avançado do planeta em

matéria ambiental, a partir do qual sugiram diversas normas de todos os níveis do

Poder Público e da hierarquia normativa, voltadas à proteção do desfalcado

patrimônio natural do país. (MILARÉ, 2009, p. 152).

Nesse diapasão, Akaoui (2003, p. 23) ensina que:

[...] fixou o Brasil como o País que contém a mais completa e avançada tutela constitucional do meio ambiente, servindo de exemplo a todos os demais países do mundo, que se curvam à sabedoria do constituinte brasileiro em trazer para o plano seguro da CF matéria de relevância vital a uma Nação.

Nesse contexto, Sirvinkas (2007, p. 13) registra que, antes do advento da

Carta de 1988, a proteção ambiental era regida pela Lei n. 6.938, de 31.8.1981, a

partir da qual o Ministério Público passou a propor as primeiras ações civis públicas,

em razão de não haver lei disciplinando o seu procedimento, o que, posteriormente,

foi regrado com a criação da Lei nº 7.47, de 24.07.1985 (Lei de Ações Civis

Públicas).

Com o advento da Lei nº 9.605, de 12.02.1998 (Lei de Crimes

Ambientais), o meio ambiente passou a ser protegido administrativa, civil e

penalmente, o que será explanado adiante.

Ao analisar a evolução da tutela constitucional do meio ambiente, Cruz

(2009, p.29) ensina que, ao longo da história, passamos da desconsideração do

meio ambiente como um valor em si, para sua elevação à categoria de bem jurídico

dotado de autonomia própria.

Silva (2004, p. 28) justifica a tutela jurídica ambiental a partir do momento

em que a degradação do meio ambiente passa a ameaçar não só o bem-estar, mas

a qualidade de vida humana e sua própria sobrevivência.

7 Coimbra apud Milaré (2009, p. 114) define meio ambiente como: [...] conjunto dos elementos abióticos (físicos e químicos) e bióticos (flora e fauna), organizados em diferentes ecossistemas naturais e sociais em que se insere o Homem, individual e socialmente, num processo de interação que atenda ao desenvolvimento das atividades humanas, à preservação dos recursos naturais e das características essenciais do entorno, dentro das leis da natureza e de padrões de qualidade definidos.

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O preceito constitucional esculpido no art. 225, caput,8 CF 1988, revela,

de fato, a preocupação do legislador pátrio em resguardar um dos direitos

fundamentais do ser humano: a qualidade da vida.

2.2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DE BEM AMBIENTAL

Em sentido amplo, Toledo (apud MASCARENHAS PRADO, 2000, p.61,

grifo do autor) esclarece que bem é tudo aquilo que é valioso, que é necessário para

o homem ao dispor que:

“são coisas reais ou objetos ideais dotados de ‘valor’, isto é, coisas materiais e objetos imateriais que, além de serem o que são, ‘valem’. Por isso são, em geral, apetecidos, procurados, disputados, defendidos e, pela mesma razão, expostos a certos perigos de ataques ou sujeitos a determinadas lesões.”

Antes do advento da Carta Magna de 1988, o ordenamento jurídico

brasileiro previa duas espécies de bens: os de natureza privada e os de natureza

pública, ambos previstos pelo antigo Código Civil de 1916 e repetido pelo de 2002.

Destarte, o Código Civil de 2002 (CC) estabelece como bens públicos

aqueles pertencentes à União, aos Estados ou aos Municípios e são divididos em

três categorias, a saber: os de uso comum do povo (mares, rios, estradas, praças,

ruas); os de uso especial (imóveis pertencentes aos entes federados); e os

dominicais (que constituem como objeto de direito pessoal ou real dos entes

federados). Já os bens particulares ou privados são os bens que não se enquadram

nos bens públicos, pertencentes à pessoa natural ou pessoa jurídica de direito

privado.

Historicamente, Sirvinkas (2008, p. 45-46) esclarece que o conceito de

bem ambiental está ligado ao direito de propriedade, que, com o passar do tempo,

exerceu a função social e não apenas individual. O bem jurídico, que até então era

somente suscetível de apropriação se tivesse valor econômico apreciável (qualidade

8 Brasil, Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

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e quantidade dos recursos naturais existentes na propriedade), passou a ter seu

conceito ampliado e não apenas restrito a valor econômico (como vida, liberdade,

igualdade, justiça). Conforme o autor, o conceito jurídico de bem ambiental passou a

ser considerado mais amplo do que o econômico, pois abrange recursos naturais

essenciais à sadia qualidade de vida, o qual transcende o bem pertencente ao

particular ou ao Poder Público.

De fato, essa dicotomia (privada/pública) trazida pelo Código Civil sofreu

profunda modificação com a Carta Magna de 1988 ao inserir no texto constitucional

uma nova categoria de bens: os difusos.

Essa inovação trazida pela Constituição de 1988 ao ordenamento jurídico

brasileiro é justificada por Fiorillo (apud AKAOUI, 2003, p. 25) ao transcrever que:

Com o advento da Constituição Federal de 1988, nosso sistema de direito positivo traduziu a necessidade de orientar um novo subsistema jurídico orientado para a realidade do século XXI, tendo como pressuposto a moderna sociedade de massas dentro de um contexto de tutela de direitos e interesses adaptados às necessidades principalmente metaindividuais.

Assim, esse conceito encontra-se consagrado notadamente no caput do

art. 225 da CF de 1988, que cuida da tutela jurídica do meio ambiente ao dispor:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Sobre o assunto, Machado (2009, p. 131) ensina que o art. 225 da CF:

“[...] insere a função social e a função ambiental da propriedade (arts. 5º, XXIII, e

170, III e VI) como base da gestão do meio ambiente, ultrapassando o conceito de

propriedade privada e pública”.

Lecionando sobre o conceito de bem ambiental, Piva (apud CRUZ, 2009,

p. 24, grifo da autora) faz distinção entre bem ambiental e recurso ambiental ao

assinalar que:

[...] bem ambiental é “um valor difuso e imaterial, que serve de objeto imediato a relações jurídicas de natureza ambiental”. Assim, o bem ambiental, seria, nos termos da Constituição Federal de 1988, art. 225, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Os recursos ambientais, por sua vez, são os fatores capazes de preservar esta qualidade ambiental e assegurar a preservação do direito à qualidade do meio ambiente.

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Sob a ótica do art. 225 da Constituição Federal de 1988 – CF, Celso

Antônio Pacheco Fiorillo (2009, p. 106, grifo do autor) conceitua que:

O bem ambiental é, portanto, um bem que tem como característica mais relevante ser ESSENCIAL À SADIA QUALIDADE DE VIDA, sendo ontologicamente de uso comum do povo, podendo ser desfrutado por toda e quaisquer pessoas dentro dos limites constitucionais.

No tocante à questão, Piva (apud CRUZ, 2009, p. 28-30) afirma que o

bem ambiental é direito à vida com qualidade, expresso no caput do art. 255 da

Constituição, cuja fruição requer a preservação dos recursos ambientais em

condições mínimas capazes de proporcionar esse direito a todos. A doutrinadora

conclui que: “[...] tudo que for essencial à qualidade de vida é bem ambiental e

integra o conceito de meio ambiente”.

No mesmo sentido, Leite (apud BENJAMIN, 2000, p. 86, grifo do autor),

propõe que:

“Como bem – enxergado como verdadeiro universitas corporalis, é imaterial – não se confundindo com esta ou aquela coisa material (floresta, rio, mar, sírio histórico, espécie protegida etc.) que o forma, manifestando-se, ao revés, como o complexo de bens agregados que compõe a realidade ambiental. Assim, o meio ambiente é bem, mas, como entidade, onde se destacam vários bens materiais em que se firma, ganhando proeminência, na sua identificação, muito mais o valor relativo à composição, característica ou utilidade da coisa do que a própria coisa. Uma definição como esta de meio ambiente, como macrobem, não é incompatível com a constatação de que o complexo ambiental é composto de entidades singulares (as coisa, por exemplo) que, em si mesmas, também são bens jurídicos: é o rio, a casa de valor histórico, o bosque com apelo paisagístico, o ar respirável, a água potável”.

Dissertando sobre o tema, Silva (2004, p. 83) lembra que:

A Constituição, no art. 225, declara que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Veja-se que o objeto do direito não é o meio ambiente em si, não é qualquer meio ambiente. O que é objeto do direito é o meio ambiente qualificado. O direito que todos temos é a qualidade satisfatória, ao equilíbrio ecológico do meio ambiente. Essa qualidade é que se converteu em bem jurídico. A isso é que a Constituição define como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida [...].

Silva (apud AKAOUI 2003, p. 27, grifo autor) justifica a tutela do bem

ambiental ao defender que “a tutela da qualidade do meio ambiente é instrumental

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no sentido de que, através dela, o que se protege é um valor maior: a qualidade da

vida”.

O raciocínio ora desenvolvido encontra apoio nas palavras de Machado

(2009, p. 129, grifo do autor) ao discorrer:

O caput do art. 225 é antropocêntrico. “É um direito fundamental da pessoa humana, como forma de preservar a ‘vida e a dignidade das pessoas’ – núcleo essencial dos direitos fundamentais, pois ninguém contesta que o quadro da destruição ambiental no mundo compromete a possibilidade de uma existência digna para a Humanidade e põe em risco a própria vida humana” [...].

Assim, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado ganha

status de direito fundamental ao lado de valores essenciais constitucionalmente

tutelados, como dignidade, liberdade, igualdade.

Sirvinkas (2008, p. 49) aponta que esse direito ao ambiente

ecologicamente equilibrado como bem essencial à qualidade de vida está assentado

no princípio ao respeito da dignidade da pessoa humana, expressamente arrolado

nos fundamentos da República Federativa do Brasil como Estado Democrático de

Direito (art. 1º, III da CF).

Por sua vez, esse princípio se encontra relacionado aos direitos

fundamentais da pessoa humana, previstos no art. 6º da Constituição, como direito à

saúde, à educação, à segurança, entre outros direitos básicos indispensáveis à

satisfação de uma vida digna, cujo dever incumbe ao Estado assegurar, aos quais

Fiorillo (2009, p. 110) denominou de piso vital mínimo.

Nesse contexto, Cruz (2009, p. 38-39, grifo da autora) propõe que o meio

ambiente, sendo bem jurídico tutelado pela CF, estabelece uma estreita ligação

entre outros valores constitucionalmente relevantes, de sorte a formar um todo

indissociável do direito à vida com qualidade e dignidade. Destarte, complementa a

autora:

Esta percepção dilatada do direito à vida é expressão da análise sistemática da Constituição Federal. No art. 1º, III, encontramos a dignidade da pessoa humana como fundamento da República; no art. 3.º, IV, a promoção do bem de todos como seu objetivo fundamental. O art. 5.º, caput, por sua vez, protege a vida de todos como direito fundamental e liga-se diretamente ao art. 6º, que define os direitos fundamentais sociais, expondo um patamar mínimo de bens tutelados como forma de efetivar o conceito de dignidade humana expresso no art. 1º.

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A partir dessa premissa, o meio ambiente ecologicamente equilibrado9

passou a ser entendido como qualidade de vida e, por conseguinte, indispensável à

sobrevivência da espécie humana.

Como direito constitucionalmente fundamental, Milaré (2009, p. 156-157)

lembra que o direito ao meio ambiente equilibrado é indisponível pelo fato de ser não

só no interesse das presentes gerações, como igualmente das futuras, sendo,

portanto, ambas titulares desse direito. A partir desse preceito, o doutrinador afirma

que surge um dever não apenas moral, como também jurídico e de natureza

constitucional para as gerações atuais de transmitir esse patrimônio ambiental às

gerações futuras.

Com efeito, esse dever imposto não tão somente ao Poder Público, como

à coletividade, vem expressamente esculpido no caput do art. 225 da CF. Dessa

feita, decorre que se cria ao Poder Público uma obrigação de fazer – zelar

(defender) e preservar o meio ambiente, transformando-se em verdadeira atuação

vinculada, imposta pelo legislador constituinte, saindo, portanto, da esfera da mera

conveniência e oportunidade (discricionariedade). Por outro lado, o cidadão (titular

passivo do bem ambiental) passa a ser titular ativo da relação jurídica, pois também

lhe incumbe o dever de salvaguardar (preservar e defender) esse bem juridicamente

tutelado .(MILARÉ, 2009, p.157).

Ao discorrer sobre o princípio da ética e da responsabilidade solidária,

Sirvinkas (2007, p. 72) afirma que a iniciativa privada tem, muitas vezes, mais

condições de fazer estratégias de ação na preservação do meio ambiente do que a

Administração Pública, que nem sempre é suficiente para atender a tantas

necessidades ambientais da sociedade.

Com propriedade, o mesmo autor (2007, p. 70, grifo do autor) ressalta

que o meio ambiente ecologicamente equilibrado deve ser interpretado

sistematicamente, ou seja, binômio desenvolvimento (art. 170, VI, CF) e meio

ambiente (art. 225, caput, CF). Desse modo, explica:

9 Segundo Sirvinkas (2007, p. 70), o “equilíbrio ecológico não significa a inalteralidade das condições naturais. Busca-se, no entanto, a harmonia ou a proporção e a sanidade entre os vários bens que compõe a ecologia (populações, comunidades, ecossistemas e biosfera). É bom ressaltar que equilíbrio ecológico não se confunde com sociedade ambientalmente equilibrada (art. 5º, V, da Lei n. 9.795/99); o primeiro refere-se aos aspectos do meio ambiente natural, cultural, artificial e do trabalho; já o segundo descreve as cidades como sociedades urbanas ambientalmente equilibradas, no sentido de sociedades urbanas sustentáveis.

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Assim, compatibilizar “meio ambiente e desenvolvimento significa considerar os problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a cada contexto sociocultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão tempo/espaço. Em outras palavras, isto implica dizer que a política ambiental não se dever erigir em obstáculo ao desenvolvimento, mas sim em um de seus instrumentos, ao propiciar a gestão racional dos recursos naturais, os quais constituem a sua base material”.

Segundo Fiorillo (2009, p. 105), o novo Texto Constitucional positiva no

ordenamento jurídico brasileiro a existência de uma nova realidade jurídica de bem,

que é o difuso, cuja titularidade difere do bem público e do particular, ou seja,

pertencente a todos, a qual a defesa incumbe tanto ao Poder Público quanto à

coletividade.

Nessa ordem de ideias, Akaoui (2003, p. 26), ao classificar bem ambiental

como bem difuso, explica que:

[...] é o bem ambiental bem jurídico de uso comum do povo e, portanto, não integrante do patrimônio público ou particular, e é essencial à sadia qualidade de vida, o que se coaduna com a transindividualidade dos bens difusos quanto à titularidade, que recai sobre pessoas indeterminadas ligadas por circunstâncias de fato, sendo indivisível.

Corroborando com esse entendimento, Cruz (2009, p. 23-24) esclarece

que: “[...] Trata-se, com efeito, de bem ambiental que tem uma natureza jurídica

própria – não pode ser tutelado a partir de uma ótica individual. Trata-se, pois, de

bem de natureza difusa”.

Sobre a distinção de bens incumbida pelo Codex civilista frente à nova

realidade jurídica de bem prevista na Carta Maior, Fiorillo (2009, p. 109) chega a

afirmar que o art. 66, I do Código Civil de 1916, não foi recepcionado em sua

inteireza pela Constituição Federal, bem como o art. 99, I do Código Civil de 2002,

ser claramente inconstitucional10. Assim, conclui o autor que, após o advento da

Constituição de 1988 no ordenamento jurídico brasileiro, passou a existir três

categorias de bens, quais sejam: os públicos, os privados e os difusos.

10 Nesse sentido Cruz (2009, p. 36-37) afirma que o legislador incorreu em grave inconstitucionalidade ao omitir a categoria de bens coletivos no Código Civil de 2002. Entende a doutrinadora que, ao menos, se deva dar interpretação conforme a Constituição, ou seja, deve-se entender que os bens públicos de uso comum do povo (inciso I do art. 99 do CC), são bens coletivos titularizados por todos nos termos do art. 225, caput, c.c. com art. 5º, caput, da CF.

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Discorrendo acerca da natureza jurídica erigida à categoria de bem

difuso, Cruz (2009, p. 37, grifo da autora) caracteriza bem ambiental como um direito

transindividual, de natureza indivisível, titularizado por pessoas indeterminadas e

ligadas por circunstâncias de fato. Assim esclarece:

[...] após definir que o meio ambiente deve ser considerado um “novo bem jurídico emergente”, não mais se pode qualificar certos componentes ambientais (como o ar, a água e o solo) como res nullius e como tais passíveis de serem utilizados por todos sem obediência a quaisquer regras ou limites. Tais bens agora merecem o qualificativo de bens comuns e são alvos de uma tutela jurídica que visa tornar sua utilização e o seu aproveitamento mais racionais e equilibrados.

Nas palavras de Machado (2009, p. 131): “O Poder Público passa a

figurar não como proprietário de bens ambientais, mas como um gestor ou gerente,

que administra bens que não são deles e, por isso, deve explicar convincentemente

sua gestão.”

Como bem de uso comum do povo, a Constituição confere ao meio

ambiente a qualidade de entidade autônoma, da qual trazemos à colação os

ensinamentos de Milaré (2009, p. 144):

[...] a proteção do meio ambiente, embora sem perder os vínculos originais com a saúde humana, ganha identidade própria, porque é mais abrangente e compreensiva. Nessa nova perspectiva, o meio ambiente deixa de ser considerado um bem jurídico per accidentes e é elevado à categoria de bem jurídico per se, isto é, com autonomia em relação a outros bens protegidos pela ordem jurídica, como é o caso da saúde humana.

Consoante estabelece o caput do art. 225 da CF, os bens tipicamente

ambientais por serem de uso comum do povo pertencem à coletividade, não sendo

bens de propriedade de qualquer ente público ou particular, podendo ser utilizados

por todos, dentro dos limites constitucionais.

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3 PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E A RESPONSABILIDADE AMB IENTAL

3. 1 ASPECTOS GERAIS

São inúmeros os princípios ambientais arrolados pelos doutrinadores, a

saber: princípio do direito humano fundamental, princípio democrático, princípio da

prevenção e cautela, princípio do poluidor-pagador, princípio da responsabilidade,

etc.

Sobre a importância dos princípios do Direito Ambiental, Sirvinkas (2008,

p. 181) sustenta que: “[...] os princípios do direito ambiental têm por escopo proteger

a biodiversidade no planeta, propiciando, assim, uma qualidade de vida satisfatória

ao ser humano das presentes e futuras gerações”.

Princípio é utilizado como alicerce ou fundamento do Direito que pode ser

modificado de acordo com dado momento histórico, sendo uma verdadeira regra

fundamental de uma ciência. (SIRVINKAS, 2007, p. 51).

Milaré (2009, p. 817, grifo do autor), ao citar diversos doutrinadores

acerca do sentido de princípio do ordenamento jurídico, afirma:

A palavra princípio, em sua raiz latina, significa “aquilo que se torna primeiro” (primum capere), designado início, começo, ponto de partida. Princípios de uma ciência, segundo José Cretella Júnior, “são as proposições básicas, fundamentais, típicas, que condicionam todas as estruturas subseqüentes. Ou, como averba Celso Antônio Bandeira de Mello, princípio é, por definição, “mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servido de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.

Lecionando sobre o assunto, Canotilho (apud SIRVINKAS, 2007, p. 51,

grifo do autor) ensina que os “princípios não proíbem, permitem ou exigem algo em

termos de tudo ou nada; impõem a optimização de um direito ou de um bem jurídico,

tendo em conta a reserva do possível, fáctica ou jurídica”.

Discorrendo acerca da violação aos princípios previstos no ordenamento

jurídico, Mello (apud MILARÉ, 2009, p. 817-818) destaca que:

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Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa mão apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comando. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.

Por seu turno, Sirvinkas (2007, p. 54) estabelece a importância dos

princípios do Direito Ambiental ao aduzir que este “tem por escopo proteger toda

espécie de vida no planeta, propiciando uma qualidade de vida satisfatória ao ser

humano das presentes e futuras gerações.”

Na esfera ambiental, ao tratar de Direito Ambiental, a doutrina apresenta

vários princípios não havendo unanimidade entre os doutrinadores quanto a sua

abordagem, variando quanto à sua classificação e o conceito, razão pela qual se

abordará os mais relevantes a esse campo de estudo.

3.1.1 Princípio do poluidor-pagador

Esse princípio busca compensar a degradação do meio ambiente

resultante do processo produtivo, devendo o poluidor suportar com o custo social

resultante da poluição por ele causada. Portanto, busca esse princípio corrigir esse

ônus adicionado à coletividade ao criar um mecanismo de responsabilidade aos

agentes econômicos por dano ecológico, impondo-se a estes sua internalização dos

custos externos, como lembra Milaré (2009, p. 827).

Essa interpretação é dada por Machado (apud CRUZ, 2009, p. 173) ao

concluir que:

[...] o princípio poluidor-pagador significa que o utilizador do recurso deve suportar dos custos destinados a tornar possível a sua utilização e os custos advindos de sua própria utilização, para que estes não sejam suportados nem pelo Poder Público, nem por terceiros.

Entretanto, esse princípio não objetiva tolerar a poluição mediante o

pagamento de um preço tampouco limitar-se a compensar os danos causados, mas

possui caráter preventivo de modo a evitar danos ao meio ambiente, consoante

lembra Milaré (2009, p. 828).

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Assim, está claro que esse princípio busca uma forma de compensação

pela poluição causada (polui-paga), mas a recíproca não é verdadeira, isto é, paga

para poder poluir. Absolutamente não, pois a atividade econômica poluidora não

pode lucrar com a degradação do meio ambiente. O objetivo principal do princípio do

poluidor pagador é prevenir os danos ao meio ambiente.

Nesse sentido, Cruz (2009, p. 172) assevera que o princípio poluidor-

pagador tem caráter preventivo porque visa alcançar efeitos futuros na prevenção de

danos e, se necessário, na sua reparação.

O princípio do poluidor-pagador encontra agasalho no art. 4º, VII, da Lei

6.938/1981, em que estabelece como um de seus fins a imposição ao poluidor e ao

predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados. A

Constituição de 1988 consagra, no art. 225, §3º, o princípio da responsabilidade

ambiental ou poluidor-pagador, a qual prevê a sujeição às sanções na esfera

administrativa e penal independentemente da obrigação de reparar os danos

causados. A Lei n. 9.605/1998 reforçou a ideia, sujeitando o degradador ambiental a

sofrer todos os custos de sua atividade poluidora.

Sobre o assunto, Freitas (apud CRUZ, 2009, p. 175) salienta que a Lei de

Crimes Ambientais em várias oportunidades destaca a importância jurídico-penal da

reparação do dano, constituindo um verdadeiro instrumento protetor do meio

ambiente como recurso para obter a reparação ou a recuperação do dano ambiental.

Adiante, a mesma autora (2008, p. 175, grifo da autora) adverte:

Desta forma, a norma penal estabelece um custo para o potencial poluidor, tornando sua conduta onerosa e definindo a sua autuação preventiva como dever jurídico-penal, com o que estabelece um reforço na tutela do bem jurídico.

Assim, o princípio poluidor-pagador por ser uma forma de

internacionalização total dos custos da poluição, objetiva através do desestímulo as

práticas lesivas ao meio ambiente (comissivas ou omissivas), prevenir danos ao

meio ambiente.

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3.1.2 Princípio do usuário-pagador

Segundo Milaré (2007, p. 829), este princípio busca evitar por parte do

mercado a hiperexploração dos recursos naturais, fundamentando-se no fato de que

os bens ambientais, notadamente os naturais, constituem patrimônio da coletividade

ainda que pese sobre eles o justo título de propriedade.

Nesse diapasão, Machado (2009, p. 66) esclarece que: “[...] o utilizador

do recurso deve suportar o conjunto dos custos destinados a tornar possível a

utilização do recurso e os custos advindos de sua própria utilização.”

Partindo dessa premissa, não se pode olvidar que o meio ambiente é

fonte inesgotável de recursos naturais, daí decorrendo a necessidade de o Poder

Público impor ao usuário o pagamento não só pela sua utilização, como também

pela sua preservação e recuperação. Igualmente, esse princípio visa limitar a

utilização indiscriminada desse bem essencial à manutenção da vida de todos os

seres vivos no planeta.

Milaré (2009, p. 830) destaca a importância do princípio usuário-pagador

ao propor que:

É importantíssimo criar uma mentalidade objetiva a respeito deste princípio do usuário-pagador, porquanto o uso dos elementos naturais e o usufruto do patrimônio ambiental (nacional, estadual, municipal) podem afetar o interesse social maior, que é o grande referencial do bem trazido para o uso dos interessados. Seria supérfluo dizer que, em caso de uso de bens ambientais para fins econômicos geradores de lucro para empreendedores privados, o pagamento não é apenas justo, é necessário e impositivo.

Esse princípio encontra respaldo no art. 4.º, VII, da Lei 6.938/1981, ao

impor ao usuário uma contribuição pela utilização dos recursos ambientais com fins

econômicos.

Com muita acuidade, Milaré (2009, p. 830, grifo do autor) faz uma clara

distinção entre princípio do poluidor-pagador e usuário-pagador ao discorrer que:

O poluidor que paga, é certo, não paga pelo direito de poluir: este “pagamento” representa muito mais uma sanção, tem caráter de punição e assemelha-se à obrigação de reparar o dano. Em síntese, não confere ao infrator. De outro lado, o usuário que paga, paga naturalmente por um direito que lhe é outorgado pelo Poder Público competente, como decorrência de um ato administrativo legal (que, às vezes, pode até ser discricionário quanto ao valor e às condições); o pagamento não tem

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qualquer conotação penal, a menos que o uso adquirido por direito assuma a figura de abuso, que contraria o direito.

Deveras, no princípio usuário-pagador não há uma punição, pois inexiste

ilicitude, porém o pagamento pela utilização do recurso natural (água, solo, ar,

florestas, etc.) visa sobremaneira, evitar a dilapidação desse patrimônio ambiental

esgotável e torná-lo o mais acessível possível à coletividade (geração presente) e

mantê-las para as futuras gerações.

3.1.3 Princípio da prevenção

Conforme lembra Milaré (2009, p. 822), não há consonância entre

doutrinadores acerca do princípio da prevenção, haja vista que alguns tratam como

sinônimo de princípio de precaução.

Ao tratar sobre o assunto, Sirvinkas (2007, p.57) afirma que prevenção é

gênero das espécies precaução e cautela.

Embora ambos os princípios sejam parecidos, a diferença reside

basicamente no seu alcance como tutela de proteção do meio ambiente, consoante

colecionado adiante.

Etimologicamente, prevenção é substantivo do verbo prevenir que deriva

do “[...] latim prae = antes e venire = vir, chegar e significa ato ou efeito de antecipar-

se, chegar antes; induz uma conotação de generalidade, simples antecipação no

tempo, é verdade, mas com intuito conhecido” (MILARÉ, 2009, p. 822).

Indubitavelmente, a tutela ambiental no Direito Ambiental objetiva a

prevenção de danos, pois as lesões ao meio ambiente podem ser irreparáveis ou,

quando possível, é onerosa ou extremamente lenta.

Cruz (2009, p. 175) destaca que a Constituição Federal de 1988 adota a

tutela preventiva como linha fundamental de todo o sistema de proteção do meio

ambiente, ao impor, em seu art. 225, caput, o dever ao Poder Público e a

coletividade de preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Ao aprofundar sobre o assunto, Milaré (2009, p. 823) esclarece que o

princípio da prevenção trata de riscos ou impactos conhecidos pela ciência, ao

passo que o princípio da precaução se destina a gerir impactos desconhecidos, dos

quais decorre a diferença entre ambos. Enquanto o princípio da prevenção busca

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preservar o meio ambiente sob o enfoque daquilo o que a ciência já conhece, ou

seja, real ou presumível, o princípio da precaução vai mais além da esfera cognitiva

da ciência, pois se preocupa com o risco incerto.

O mesmo autor (2009, p. 823) ainda explica que o princípio da prevenção

aplica-se quando o perigo ao meio ambiente é certo e quando se tem elementos

seguros de que uma determinada atividade é efetivamente perigosa, ou seja, o

perigo é concreto. Destarte, conclui que, na prática, objetiva impedir a ocorrência de

danos ao meio ambiente mediante imposição de medidas acautelatórias, antes da

implantação de atividades ou empreendimentos considerados efetivamente ou

potencialmente poluidores.

Nessa linha de raciocínio, Fiorillo (2009, p. 53 e 56) ensina que é um dos

mais importantes princípios que norteiam o direito ambiental, no qual se encontra

sua aplicabilidade através das licenças, sanções administrativas, autorizações, entre

outros atos da administração pública11.

Dentre tais instrumentos públicos, o principal instrumento de prevenção

ambiental é a elaboração do estudo de impacto ambiental (EIA), como lembra

Martins da Silva (2004, p. 412).

3.1.4 Princípio da precaução

Etimologicamente, precaução é substantivo de o verbo precaver-se e

deriva do latim prae = antes e cavere = tomar cuidado, e sugere cuidados

antecipados com o desconhecido, cautela para que uma atitude ou ação não venha

a concretizar-se ou a resultar em efeitos indesejáveis. (MILARÉ, 2009, p. 822).

Com percuciência, Cruz (2009, p. 178, grifo da autora) justifica aplicação

do princípio da precaução ao lecionar que:

O princípio da precaução surgiu como um desenvolvimento necessário da idéia de prevenção de danos no Direito Ambiental. Sua necessidade parte da constatação de que muitas vezes a própria prevenção pura e simples é insuficiente para prestar a tutela ambiental eficaz.

11Nessa linha, Milaré (2009, p. 824) cita como exemplo de fundamento constitucional do princípio da prevenção o estudo de impacto ambiental, previsto no art. 255,§ 1.º, IV, da CF.

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Esse princípio deve ser utilizado quando há incerteza científica e

indicações de que os possíveis efeitos sobre o meio ambiente, a saúde das pessoas

ou dos animais ou a proteção vegetal possam ser potencialmente perigosos e

incompatíveis com o nível de proteção escolhido. (MILARÉ, 2009, p. 824).

O princípio da precaução se destina a risco incerto, de modo a instituir

meios capazes de prevenir futuros danos ambientais.

Assevera Lavieille (apud MACHADO, 2009, p. 78) que o princípio da

precaução consiste: “[...] em dizer que não somente somos responsáveis sobre o

que nós sabemos, sobre o que nós deveríamos ter sabido, mas, também, sobre o de

que nós deveríamos duvidar”.

Sobre o princípio, Coimbra (apud CRUZ, 2009, p. 180) afirma que este

constitui um forte alicerce para a proteção do meio ambiente ao estabelecer três

elementos-chave para a segurança das ações humanas, a saber:

[...] a) o reconhecimento de que determinada técnica ou produto envolve algum risco em potencial; b) o reconhecimento de que pairam incertezas científicas sobre o impacto imediato ou as conseqüências futuras relacionadas ao uso de determinado produto ou técnica; c) a necessidade de agir preventivamente em relação aos riscos latentes em quaisquer situações desse tipo.

Assim, a doutrinadora assevera:

O princípio da precaução atua antes do princípio da prevenção. Ele legitima a intervenção para a tutela do meio ambiente antes de uma ação propriamente preventiva do dano (a qual pressupõe a existência de uma ameaça de dano). Existindo dúvida se determinada ação é ou não prejudicial ao meio ambiente, cabe intervenção para impedi-la. A prevenção atua no sentido da eliminação de perigos ao meio ambiente, já comprovados ou legalmente presumidos; a precaução atua para eliminar quaisquer riscos antes mesmo de uma comprovação científica absoluta [...] (CRUZ, 2009, p. 180).

Esse princípio encontra respaldo na Constituição de 1988, manifestada no

art. 225, V, ao controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,

métodos e substâncias que comportem risco de para a vida, a qualidade de vida e o

meio ambiente. Do mesmo modo, a Lei de Crimes Ambientais considera como

circunstância capaz de sujeitar a reprimenda mais severa a omissão na adoção

ddidas de precaução em caso de risco ambiental grave ou reversível. Já a A Lei nº

11.105/2005 (Lei de Biossegurança) prevê, em seu art. 1º, caput, o estímulo ao

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avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à

saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a

proteção do meio ambiente. Na mesma linha, o Princípio 15 da Declaração do Rio12

estabelece que a ausência de certeza científica absoluta não deve servir de pretexto

para procrastinar a adoção de medidas capazes de evitar a degradação do meio

ambiente. (MILARÉ, 2009, p. 824 e 825).

3.1.5 Princípio da função socioambiental da proprie dade

Esse princípio decorre da nova concepção acerca do direito de

propriedade, na qual o uso da propriedade deverá estar condicionado à função

social da propriedade, ou seja, ao bem-estar social.

Com efeito, a propriedade não mais se limita a uma concepção

individualista de direito à propriedade, na qual prevalecia a condição de direito

absoluto ao proprietário, de modo que o proprietário poderia utilizá-la ou degradá-la

ao seu talante. Portanto, o direito à propriedade não é mais absoluto, pois obriga o

proprietário rural ou urbano a preservar o meio ambiente impondo regras de

condutas proibitivas ou condutas comissivas, haja vista que o meio ambiente

ecologicamente equilibrado é bem de uso comum do povo (art. 225, caput, CF

1988).

Segundo Carvalho (apud MILARÉ, 2009, p. 831), a propriedade privada

se socializou de modo a oferecer à coletividade uma maior utilidade, passando o

social a orientar o individual.

Milaré (2009, p. 831) esclarece que a função social e ambiental não se

limita a permitir ao proprietário fazer tudo aquilo que não prejudique o meio ambiente

ou a coletividade. Não obstante, vai além ao permitir impor regras de

comportamentos positivos para que a propriedade se adéque à preservação do meio

ambiente.

12 Princípio 15: “Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”. (MILARÉ, 2009, p. 824).

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Diante da importância da função socioambiental erigido na Constituição, o

mesmo doutrinador (2009, p.833) adverte que: “[...] só fica reconhecido o direito de

propriedade quando cumprida a função social ambiental, como seu pressuposto e

elemento integrante, pena de impedimento ao livre exercício ou até de perda desse

direito”.

Nessa linha, o Código Civil de 200213 contemplou a função social da

propriedade condicionando o seu uso à observância dos preceitos legais na

preservação do equilíbrio ecológico. Na Constituição Federal, a função social da

propriedade está presente em várias partes, como nos artigos 5º, inciso XXIII14; 170,

inciso III15; 182,§ 2º16 e 186, inciso II17.

3.1.6 Princípio do controle do poluidor pelo Poder Público

Assenta-se esse princípio das atribuições e intervenções do Poder

Público necessárias à manutenção, preservação e restauração dos recursos

ambientais, com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente.

(MILARÉ, 2009, p. 826)

O mesmo autor (2009, p. 826) lembra que a ação dos órgãos do Poder

Público efetiva-se mediante o exercício do poder de polícia administrativa, atributo

da Administração Pública que limita o exercício dos direitos individuais, objetivando

o bem-estar da sociedade, cuja matéria será aprofundada mais adiante.

Nesse contexto, Machado (2009, p. 110) assevera que:

13 Código Civil, art. 1.228, §1º - O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. 14 Brasil, Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso XXIII – a propriedade atenderá a sua função social; 15 Brasil, Constituição Federal, art. 170, inciso III – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] III – função social da propriedade; 16 Brasil, Constituição Federal de 1988, art. 182 [...]. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. 17 Brasil, Constituição Federal de 1988, art. 186 – A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigências estabelecidos em lei, os seguintes requisitos: [...] II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente.

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Os Estados têm o papel de guardiões da vida, da liberdade, da saúde e do meio ambiente. Garantir a liberdade responsável: liberdade para empreender, liberdade para descobrir e aperfeiçoar tecnologias, liberdade para produzir e comercializar, sem arbitrariedades ou omissões, liberdade que mantém a saúde dos seres humanos e a sanidade do meio ambiente. A liberdade exige um Estado de Direito, em que existam normas, estruturas, laboratórios, pesquisas e funcionários, independentes e capazes.

Esse princípio encontra-se fundamentado na Constituição Federal, art.

225, §1º, inciso V18, bem como em algumas leis ordinárias, como o art. 5.º, § 6º, da

Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985),19 que trata do compromisso de

ajustamento de conduta com os agentes poluidores. (MILARÉ, 2009, p. 827).

3.1.7 Princípio da natureza pública da proteção amb iental

Esse princípio surge em função da previsão legal de que o meio ambiente

é considerado bem de uso comum da coletividade, considerado pela Constituição

como patrimônio público, cuja proteção é incumbida ao Poder Público.

Milaré (2009, p. 821) afirma que esse princípio está intimamente

relacionado com o princípio geral de Direito Público, da primazia do interesse público

e do Direito Administrativo, da indisponibilidade do interesse público. Esclarece o

doutrinador que, por ser de natureza pública, deve prevalecer sobre os interesses

privados e, na dúvida quanto à aplicação da norma, deve prevalecer o interesse da

sociedade. Por seu turno, a natureza pública que qualifica o interesse na tutela do

meio ambiente torna-a indisponível, de modo a poder exigir coativamente, e

inclusive pela via judicial, de todos os entes federados o cumprimento efetivo de

suas tarefas na proteção do meio ambiente.

18 Brasil, Constituição Federal de 1988, art. 225[...], §1º1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: [...]; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente 19 Brasil, Lei 7.347, de 24.07.1985 – Art. 5º[...] § 6° - Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial

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No ordenamento jurídico brasileiro, esse princípio está previsto

explicitamente na Carta Política, art. 255, caput, assim como no art. 2º, inciso I, da

Lei 6.938 de 1981.20

3.1.8 Princípio do ambiente ecologicamente equilibr ado como direito

fundamental

Segundo Antunes (2001, p. 23-24), esse princípio é o mais importante do

Direito Ambiental, haja vista que o direito ao ambiente é um direito fundamental,

decorrendo desse todos os demais princípios ambientais.

Milaré (2009, p. 818) esclarece:

[...] por conta do progressivo quadro de degradação a que assiste em todo o mundo, ascendeu ao posto de valor supremo das sociedades contemporâneas, passando a compor o quadro de direitos fundamentais ditos de terceira geração21 incorporados nos textos constitucionais dos Estados Democráticos de Direito.

Neste contexto, Mascarenhas Prado (2000, p. 31, grifo da autora) analisa:

[...] diante da complexidade da sociedade contemporânea, onde situações de dano ou de risco, provocadas por um ou mais agentes, pessoa física ou jurídica, atingem não apenas o homem individualmente, mas também enquanto coletividade, e diante do reconhecimento de novos valores – Estado Social – ao lado do interesse privado [...] e do interesse público [...] ganharam importância interesses transindividuais (coletivos e difusos), que representam a proteção da sociedade em parte (grupos

20 Brasil, Lei Federal n. 9.638 de 31 de agosto de 1981 – art. 2º [...] I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo;

21 Bonavides (apud BARACHO JÚNIOR (2000, p. 241-242, grifo do autor) classifica os direitos fundamentais a partir de quatro gerações, a saber: “Os direitos fundamentais de primeira geração são os direitos de liberdade, sendo os primeiros a constar no texto constitucional. Compreendem os direitos civis e políticos [...]. Os de segunda geração compreendem os direitos culturais, sociais e econômicos, assim como os direitos coletivos ou de coletividade, [...]. A terceira geração de direitos fundamentais surgiria da consciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas. Segundo Bonavides, tal consciência deu lugar a uma nova dimensão de direitos fundamentais, assentada sobre a fraternidade. [...] Emergiram eles da reflexão sobre temas ao desenvolvimento à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade. [...] Os direitos de quarta geração, segundo Bonavides, seriam o direito à democracia, à informação e ao pluralismo. “Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência.”

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intermédios, como por exemplo, associações) ou em sua totalidade (número indeterminado de pessoas).

Esse princípio encontra-se previsto no caput do art. 225 da Carta Maior,

estabelecendo, ao lado dos direitos e deveres individuais (art. 5º, CF/1988), direito

ao ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa

humana. Igualmente, encontra-se expresso na lei infraconstitucional (art. 2º, Lei

6.938/81)22. Foi reconhecido internacionalmente na Conferência das Nações Unidas

sobre o Ambiente Humano, em 1972 (Princípio 1)23, reafirmado pela Declaração do

Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992 (Princípio 1)24, e pela Carta

da Terra de 1997 (Princípio 4)25. (MILARÉ, 2009, p. 819).

Discorrendo sobre o assunto, Milaré (2009, p. 819) chama a atenção ao

reconhecer o direito ao meio ambiente sadio como extensão à vida, tanto sob o

enfoque da existência física e saúde dos seres humanos, como ao aspecto da

dignidade dessa existência com qualidade de vida, a qual incumbe ao Estado buscar

diretrizes destinadas a assegurar o acesso aos meios de sobrevivência dos

indivíduos ou da coletividade.

Esse autor adverte: “É, sem dúvida, o princípio transcendental de todo o

ordenamento jurídico ambiental, ostentado o status de verdadeira cláusula pétrea.”

(MILARÉ, 2009, p. 819).

22 Brasil, Lei Federal n. 9.638 de 31 de agosto de 1981 - Art. 2º - “A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: [...]” 23Princípio1: “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade, e ao desfrute de adequadas condições de vida em um meio ambiente cuja qualidade lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar e tem a solene obrigação de proteger e melhorar esse meio para as gerações presentes e futuras.” (MILARÉ, 2009, p. 818) 24Princípio1: “Os seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza.” (MILARÉ, 2009, p. 818). 25 Princípio 4: “Estabelecer justiça e defender sem discriminação o direito de todas as pessoas à vida, à liberdade e à segurança dentro de um ambiente adequado à saúde humana e ao bem-estar espiritual”. (MILARÉ, 2009, p. 819).

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3.2 TRÍPLICE RESPONSABILIDADE EM MATÉRIA AMBIENTAL

O art. 225, §3º da Constituição Federal de 1988 proclamou que:

Art. 225: [...] §3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, as sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Neste contexto, Sampaio (apud MARTINS DA SILVA, 2004, p. 683, grifo

do autor) ressalva a importância da responsabilidade ambiental ao discorrer que:

[...] houve um reconhecimento internacional no sentido de que a responsabilização das pessoas que causam danos ou lesões ao meio ambiente é um dos mais importantes instrumentos de compatibilização das necessidades e atividades humanas com a manutenção eficaz do equilíbrio ecológico, a conservação da natureza e dos recursos naturais renováveis e não renováveis, bem como com a preservação da saúde das populações.

Com isso, o referido dispositivo constitucional reconhece três tipos de

responsabilidades por danos causados ao meio ambiente, independentes entre si,

quais sejam: a administrativa, a penal e a civil.

Nesse contexto, Milaré (2009, p. 971) esclarece que “[...] a danosidade

ambiental tem repercussão jurídica tripla, já que o poluidor, por um mesmo ato, pode

ser responsabilizado, alternativa ou cumulativamente, na esfera penal, na

administrativa e na civil.”

Com propriedade, Leite e Dantas (2000, p. 25) fazem uma diferenciação

entre as responsabilidades penal, civil e administrativa, ao lecionar que:

As responsabilidades penal e civil, em geral, estão encaixadas na esfera do Poder Judiciário, porém com perspectivas distintas. Enquanto a penal visa a enquadrar a conduta do agente e sancioná-la, a civil procura o ressarcimento do prejuízo por parte de quem lhe deu causa. Já a responsabilidade administrativa, vinculada ao Poder Executivo em suas funções de realizar o poder de polícia, busca coibir e sancionar condutas e atividades quando em desacordo com as determinações legais.

Outro fator importante introduzido pela Constituição de 1988 e

concretizada pela Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998) no ordenamento

jurídico brasileiro, no âmbito da tutela do meio ambiente, foi a figura da

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responsabilidade penal da pessoa jurídica, até então só prevista para pessoas

físicas.

Na esfera civil, antes da Constituição de 1988, a responsabilidade civil por

danos causado ao meio ambiente estava disciplinada na Lei da Política Nacional do

Meio Ambiente (Lei 6.938/1981, art. 14,§1º)26.

Com o advento da Lei 9.605/1998 que dispõe sobre as sanções

administrativas e penais derivadas de condutas lesivas ao meio ambiente, houve um

grande reforço na tutela ambiental.

Portanto, o Direto Ambiental atua nas três esferas básicas de atuação: a

preventiva, a reparatória e a repressiva. (MILARÉ, 2009, p. 951).

3.2.1 Responsabilidade civil

Em linhas gerais, a responsabilidade civil representa a obrigação de o

agente infrator reparar (recuperar) ou ressarcir (indenizar) os danos27 causados ao

meio ambiente.

Com efeito, como mecanismo simultâneo de tutela e controle da

propriedade, a responsabilidade civil pressupõe prejuízo a terceiro, ensejando

pedido de reparação de dano, consistente na recomposição do status quo ante

(represtinação = obrigação de fazer) ou em uma importância em dinheiro

(indenização = obrigação de dar). (MILARÉ, 2009, p. 951).

Nas palavras de Martins da Silva (2004, p. 697, grifo do autor):

[...] Em outras palavras, significa a obrigação de responder pelas ações próprias (responsabilidade civil por ato próprio, subjetiva ou direta) ou dos outros (responsabilidade civil por ato de terceiro, objetiva ou indireta), quando estas resultem em dano, direto ou indireto, causado ao patrimônio material ou imaterial de terceiros, voluntariamente, por imprudência, por

26 Brasil, Lei Federal nº 6.938/1981. .Art. 14, § 1º, verbis: Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente 27 Entende-se por dano toda lesão a um bem jurídico tutelado. Dano ambiental, por sua vez, é toda agressão contra o meio ambiente causada por atividade econômica potencialmente poluidora, por ato comissivo praticado por qualquer pessoa ou por omissão voluntária decorrente de negligência. (SIRVINKAS, 2008, p. 186).

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negligência, por imperícia ou, ainda, por falta de exação de dever funcional, e que deve ser pronta e integralmente ressarcido.

Entretanto, existem duas espécies de teorias para demonstrar a

responsabilidade civil: a subjetiva e a objetiva. A responsabilidade subjetiva é

baseada na demonstração da culpa do agente (imprudência, negligência ou

imperícia), bem como a conduta comissiva ou omissiva e o nexo causal entre o fato

e o dano. A objetiva não exige demonstração de culpa, bastando apenas a

demonstração da existência do fato ou ato, o dano e o nexo causal.

Na esfera ambiental, o ordenamento jurídico adotou a teoria objetiva. A

responsabilidade civil objetiva foi introduzida pela Lei 6.938/1981, art. 14,§1º, a qual

prevê que o poluidor é obrigado a indenizar ou reparar os danos causados ao meio

ambiente ou a terceiros independentemente de culpa. Essa lei infraconstitucional foi

reforçada, ou melhor, recepcionada pela Constituição Federal de 1988, § 3º, art.

225.

Ao justificar essa teoria adotada pelo ordenamento jurídico, Sirvinkas

(2008, p. 188 e 190) afirma que o legislador reconheceu a importância do bem

ambiental ao buscar responsabilizar o agente por dano independentemente de

culpa. Esclarece ainda que sem essa responsabilidade objetiva seria muito difícil

comprovar a culpa do agente causador da poluição.

Nessa linha de raciocínio, Milaré (2009, p. 953) afirma que a teoria da

responsabilidade objetiva justifica-se quando a atividade normalmente desenvolvida

causar riscos aos direitos de terceiros. Esclarece que a responsabilidade civil

baseada na teoria da culpa não era suficiente e adequada para proteger as vítimas

do dano ambiental, apontando três fatores importantes, quais sejam: natureza difusa

(pluralidade de vítimas dificultava a composição de danos), dificuldade de prova de

culpa do agente poluidor (quase sempre sob o manto da legalidade do Poder

Público que se reveste mediante licenças e autorizações) e, por fim, as excludentes

de responsabilização (ex. caso fortuito e força maior).

O mesmo autor (2009, p. 961), sobre a teoria do risco da atividade, da

qual decorre a responsabilidade objetiva, cita três principais conseqüências para que

haja o dever de indenizar, a saber: a) prescindibilidade de investigação da culpa; b)

a irrelevância da ilicitude da atividade; e c) a inaplicação das causas de exclusão da

responsabilidade civil.

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Discorrendo sobre os sujeitos responsáveis pela degradação ambiental,

Leite e Dantas (2004, p. 2) afirmam que, havendo mais de um causador do dano

ambiental, todos serão solidariamente responsáveis pela reparação pretendida.

Essa regra se aplica na esfera ambiental com fundamento no art. 94228 do Código

Civil Brasileiro.

Alguns autores, como Sirvinkas, Milaré e Martins da Silva, defendem a

responsabilidade solidária do Pode Público na condição de poluidor indireto por

danos causados por terceiros.

Ponderam Leite e Dantas (2004, p. 7), que acionar o Estado, em caráter

solidário com o terceiro degradador, pela omissão em fiscalizar e impedir a

ocorrência de dano, significaria transferir a vítima (a sociedade), a responsabilidade

pela reparação com todos os ônus dela decorrentes.

Contra, Martins da Silva (2004, p. 700) ensina que:

É evidente que o disposto no § 6º do art. 37 da Constituição aplica-se aos danos ambientais causados pelo Estado e as concessionárias de serviços públicos. Inclusive, não é demais consignar que eles são justamente os maiores degradadores do meio ambiente, seja por suas ações seja por omissões em fiscalizar as atividades potencialmente poluidoras.

Nesse sentido, Milaré (2009, p. 966) também expõe:

Assim, afastando-se da imposição legal de agir, ou agindo deficientemente, deve o Estado responder por sua incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitado que, por direito, deveria sê-lo.

Nesse contexto, Sirvinkas (2008, p. 19) sustenta que a pessoa jurídica de

direito público interno deve ser responsabilizada civilmente pelos danos ao meio

ambiente, mormente por omissão na fiscalização ou pela concessão irregular do

licenciamento ambiental, sem prejuízo de responsabilidade do verdadeiro causador

dos danos ambientais.

28 Brasil, Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.

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3.2.2 Responsabilidade administrativa

A responsabilidade administrativa fundamenta-se no art. 225, § 3º da

Constituição. Na opinião de Afonso da Silva (2004, p. 301), a responsabilidade

administrativa resulta da infração das normas administrativas, sujeitando o infrator a

uma sanção de natureza administrativa que pode ser: advertência, multa simples,

multa diária, apreensão dos animais, produtos ou subprodutos da flora e fauna,

destruição ou inutilização do produto, suspensão de venda e fabricação de produto,

embargo de obra ou atividade, demolição de obra, suspensão parcial ou total de

atividades, restritivas de direitos.

Faz-se necessário destacar que a responsabilidade administrativa, como

também a penal, constitui importantes instrumentos na repressão às condutas e às

atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, o que os diferencia nesse sentido

da responsabilidade civil. (MILARÉ, 2009, p. 882).

Discorrendo ainda acerca das diferenças entre as esferas de

responsabilização, o mesmo autor (2007, p. 882) destaca que, em matéria de tutela

ambiental, os ilícitos administrativos e criminais não dependem da configuração de

prejuízo, podendo coibir condutas que apresentem mera potencialidade de dano ou

mesmo de risco de agressão aos recursos ambientais. Assim, enquanto as sanções

civis e penais são impostas somente pelo Poder Judiciário, as penalidades

administrativas são impostas pelo Poder Executivo (órgão da Administração direta

ou indireta).

A apuração da responsabilidade administrativa é efetuada pela apuração

da infração administrativa ambiental, mediante lavratura do auto de infração pela

autoridade competente de um dos órgãos ou entidades que integram o Sistema

Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA)29.

As infrações, o procedimento e as sanções administrativas encontram-se

disciplinadas na Lei de Crimes Ambientais e no Decreto Federal 6.514, de 22 de

julho de 200830, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio

29 O SISNAMA é “o conjunto de órgãos e instituições que nos níveis federal, estadual e municipal são encarregados da proteção ao meio, conforme definido em lei”. (SIRVINKAS, p. 2007, p. 573). 30 Decreto Federal nº 6.514 de 22 de julho de 2008. Art. 2o Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, conforme o disposto na Seção III deste Capítulo.

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ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração dessas

infrações

Sirvinkas (2008, p. 570) ensina que a autoridade ambiental que tiver

conhecimento da infração ambiental deverá promover imediatamente proceder a sua

apuração sob pena de co-responsabilidade.

Assim adverte:

[...] Tal omissão poderá acarretar ao servidor outra tríplice responsabilidade, de ordem pessoal, traduzida em sanções administrativas (poderá responder pelas sanções previstas no Estatuto do Servidor),cíveis (poderá responder solidariamente com o infrator ambiental e por improbidade administrativa – art. 11, II, da Lei n. 8.429/92) e penais (poderá responder pelos arts. 66, I, do Decreto n. 3.688/41 e 68 da Lei n.9.605/98). (SIRVINKAS, 2008, p. 571).

Conforme esclarece Milaré (2007, p. 882), a aplicação das sanções

administrativas figuram entre as mais importantes expressões do poder de polícia

conferido à Administração Pública. Com efeito, a coercibilidade é um dos atributos

do poder de polícia, cuja matéria será tratada em outro capítulo, da qual decorrem

as penalidades administrativas.

No que tange à natureza jurídica, as responsabilidades administrativa e

penal exigem para a sua configuração a ocorrência de uma conduta, omissiva ou

comissiva, que, de qualquer forma, concorra para a prática da infração (arts. 13,

caput, e §2º, e 29, do CP, e do art. 2º da Lei 9.605/1998). (MILARÉ, 2009, p. 884).

Destarte, esclarece o autor ao propor que:

Sendo assim, a responsabilidade administrativa ambiental caracteriza-se por constituir um sistema híbrido entre a responsabilidade civil objetiva e a responsabilidade penal subjetiva: de um lado, de acordo com a definição de infração inscrita no art. 70 da Lei 9.605/1998, a responsabilidade administrativa prescinde de culpa31, de outro, porém, ao contrário da esfera civil, não dispensa a ilicitude da conduta para que ela seja tida como infracional, além de caracterizar-se pela pessoalidade, decorrente de sua índole repressiva. Por isso, se a responsabilidade civil ambiental, sob a modalidade do risco integral, jamais admite a incidência das chamadas excludentes, a responsabilidade administrativa, em certos casos, pode ser elidida com base na alegação de força maior, caso fortuito ou fato de terceiro. Já na responsabilidade penal, a pessoa nunca pode ser punida uma vez caracterizada a presença de uma daquelas situações. (MILARÉ, 2009, p. 885, grifo do autor).

31 Machado apud Milaré (2009, p. 883) afirma que, das dez sanções previstas no art. 72 da Lei 9.605/1998 (incisos I a XI), somente a multa simples utiliza o critério de responsabilidade com culpa, as demais sanções irão incidir o critério da responsabilidade objetiva.

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Com relação às sanções administrativas, Fiorillo (2009, p. 64 e 65)

sustenta que estão relacionadas ao poder de polícia, vinculada pela doutrina ao

Direito Público. Todavia, no que tange à tutela jurídica dos bens ambientais, destaca

que o poder de polícia não estaria vinculado ao interesse público, mas aos

interesses difusos.

3.2.3 Responsabilidade penal

Igualmente às demais, a responsabilidade penal está prevista no art. 225,

§3º da Constituição, bem como na Lei dos Crimes Ambientais e nas leis esparsas

que cuidam da matéria.

A tutela penal na área ambiental deve ser reservada à lei, como aplicação

rigorosa ao princípio da legalidade, de forma que “não há crime sem lei anterior que

o defina, nem pena sem prévia cominação legal” (art. 5º, XXXIX, CF/1988).

Entretanto, a imposição das sanções penais às agressões contra o meio

ambiente somente deve ser aplicada em última análise, quando as medidas na

esfera civil ou administrativa não lograrem êxito.

Como princípio da intervenção mínima do Direito Penal, Cruz (2009, p.

61) ensina que a necessidade da tutela penal na proteção dos bens relevantes

pauta-se pelos princípios da subsidiariedade e da fragmentariedade, uma vez que

esses bens são anteriormente tutelados por outros ramos do Direito.

Segundo Milaré (2009, p. 971), a imposição das sanções penais justifica-

se em razão de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um dos

direitos fundamentais da pessoa humana e, como tal, deve ser aplicado em extrema

ratio e em última ratio, na medida em que “somente nos casos em que as agressões

aos valores fundamentais da sociedade alcancem o ponto do intolerável ou sejam

objeto de intensa reprovação do corpo social”.

Com o advento da Carta de 1988, o legislador pátrio incluiu, de modo

genérico, a previsão de responsabilidade criminal da pessoa jurídica, posteriormente

concretizada pela Lei de Crimes Ambientais, definindo as penas às pessoas físicas e

jurídicas separadamente, uma não excluindo a outra.

Importante destacar que, embora a Lei n. 9.605/1998 prescreva crimes

contra o meio ambiente, o legislador infraconstitucional não explicitou quais as

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legislações foram revogadas, sendo esta uma das grandes críticas à nova lei. Dessa

forma, cabe ao operador de direito a responsabilidade de examinar e comparar as

normas conflitantes para solucionar o conflito aparente das normas que foram

tacitamente revogadas e as que ainda continuam em vigor.

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4 O PODER DE POLÍCIA AMBIENTAL

4.1 PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVO

4.1.1 Origens e evolução

Di Pietro (2005, p. 109) ensina que a palavra polícia vem do grego politeia

e é utilizada para designar as atividades da cidade-estado (polis), sem qualquer

relação com o sentido atual da expressão.

Portanto, suas origens remontam desde as cidades gregas, onde seu

papel era tão importante quanto hoje nas grandes metrópoles, transladando-se da

polis grega para a urbe romana, sob a designação latina politia e, posteriormente,

para o vocábulo português polícia. (MEIRELLES, 2003, p. 449).

Segundo Mello (2005, p. 750), a expressão “poder de polícia” traz consigo

a evocação de uma época pretérita, a do “Estado de Polícia”, antecedendo ao

Estado de Direito.

De fato, na Idade Média, durante o período feudal, o príncipe detinha um

poder conhecido como jus politae, em que tudo que fosse necessário à boa ordem

da sociedade civil estava sob a autoridade do Estado, em contraposição à boa

ordem moral e religiosa, de competência exclusiva da autoridade eclesiástica.

(CRETELLA JÚNIOR apud DI PIETRO, 2005, p. 109).

Ao dissertar sobre o assunto, Antunes (2001, p. 92) esclarece que a

centralização do poder político nas mãos dos soberanos e a lenta e contínua

desagregação do período feudal fizeram com que esse poder concedido ao príncipe

fosse ampliado em função do chamado interesse público. Por força da necessidade

de regular e ordenar os diversos aspectos da vida social, impôs à Administração o

exercício de práticas que passaram a ser conhecidas como atividades de polícia,

que começaram a prevalecer sobre as demais formas de Direito.

Destarte, o autor acrescenta: É a plena prevalência do direito dos

príncipes, dos soberanos, que irá embasar aquilo que, posteriormente, se afirmará

como o poder de polícia propriamente dito. (ANTUNES, 2001, p. 92).

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O mesmo autor (2001, p. 92) afirma ainda que o poder de polícia está

ligado diretamente ao estado absolutista, no qual inicialmente prevalecia a vontade

do príncipe sobre os seus súditos sem freios ou limites impostos pelo ordenamento

burguês. Dessa forma, o poder estava diretamente subordinado ao monarca,

evidenciando a inexistência de uma clara divisão entre os diversos ramos da

atividade estatal, sendo essa concepção somente modificada com o surgimento do

Estado Democrático de Direito.

Nos fins do século XV, o jus politae volta a designar toda a atividade do

Estado na qual o príncipe detinha ingerência sobre a vida privada dos cidadãos,

abrangendo a vida religiosa e espiritual, sob o pretexto de alcançar a segurança e o

bem-estar coletivo. Posteriormente, logo se estabeleceu uma diferenciação entre a

polícia e a justiça, em que a primeira previa as normas baixadas pelo príncipe, sem

direito de apelo aos tribunais; e a segunda previa normas que eram baixadas pelos

juízes fora do alcance do príncipe. Com o tempo, o direito de polícia conferido ao

príncipe sofreu profundas delimitações, deixando de alcançar gradativamente as

atividades eclesiásticas, em seguida as militares e financeiras, até o momento em

que foi reduzida as normas relativas à Administração. Mais tarde, passou-se a

distinguir a atividade de polícia das demais atividades administrativas, chamadas

hodiernamente de serviço público e fomento. (DI PIETRO, 2005, p 109).

Sobre o assunto, Caetano (apud ANTUNES, 2001, p. 93) destaca que as

transformações políticas e jurídicas que procederam à ascensão revolucionária da

classe burguesa contribuíram para a transformação do significado da palavra polícia

que vigorava até o século XIX. A Revolução Francesa substituiu o “Estado de

polícia”, que era arbitrário, pelo “Estado de Direito”, fundado na lei e em princípios

claros e definidos previamente.

Com muita propriedade, Di Pietro (2005, p. 109) dispõe que, com o

surgimento do Estado de Direito, estabelece-se uma nova fase em que um dos

princípios básicos é o da legalidade, submetendo o próprio Estado às leis por ele

mesmo postas. Baseado no liberalismo, num primeiro momento, a preocupação

estava voltada à garantia dos direitos à liberdade, em que prevaleciam os direitos às

liberdades individuais assegurados nas Declarações Universais de Direitos,

posteriormente assegurados pelas Constituições. A intervenção do Estado era em

caráter excepcional, somente para assegurar a segurança pública, na qual a polícia

administrativa era essencialmente uma polícia de segurança. Num segundo

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momento, o Estado liberal passa a ser mais intervencionista, cuja atuação estende-

se também à ordem econômica social. Antes do início do século XX, autores

passaram a conceituar polícia geral, relativa à segurança pública, e em polícias

especiais, que atuaram nos diversos setores das atividades particulares.

Nesse cotejo, Milaré (2009, p. 878) afirma que o poder de polícia vem

sofrendo modificações com a transição de um Estado liberal para um Estado do

bem-estar social. Com essa evolução, da polícia geral, surgem as polícias especiais,

cujas atribuições compreendem a cuidar da elaboração e da aplicação de normas

que regulam interesses da coletividade.

Desse modo, esse doutrinador (2009, p. 878, grifo do autor) observa: “a

polícia passa a ser vista como uma parte das atividades da Administração, destinada

a manter a ordem, a tranqüilidade, a salubridade públicas”.

Analisando a evolução do poder de polícia, Meirelles (2003, p. 449) afirma

que esse poder ganhou maior extensão com a ampliação das funções do Estado

Moderno, cada vez mais ativo e constrangedor das liberdades públicas,

acompanhando o desenvolvimento das cidades, a multiplicação das atividades

humanas, a expansão dos direitos individuais e as exigências do interesse social.

4.1.2 Conceito

Nas palavras de Mello (2005, p. 751), o poder de polícia possui dois

conceitos, um em sentido amplo e outro em sentido estrito. Para o autor, poder de

polícia em sentido amplo compreende tanto atos do Poder Legislativo quanto do

Executivo, ou seja, abrange a atividade estatal de condicionar a liberdade e a

propriedade ajustando os interesses coletivos. Em sentido estrito, relaciona-se tanto

com as intervenções, quer gerais e abstratas, quanto com os regulamentos, quer

concretos e específicos (tais como as autorizações, as licenças, as injunções),

apenas do Poder Executivo, objetivando, em ambos os casos, prevenir e obstar o

desenvolvimento de atividades particulares que se contrapõem aos interesses

sociais.

Hodiernamente, no direito brasileiro, o poder de polícia é: “[...] a atividade

do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do

interesse público.” (DI PIETRO, 2005, p. 111).

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Assim, Cavalcanti (apud DI PIETRO, 2005, p. 108, grifo do autor)

esclarece:

[...] “constitui um meio de assegurar os direitos individuais porventura ameaçados pelo exercício ilimitado, sem disciplina normativa dos direitos individuais por parte de todos”. E acrescenta que se trata de “limitação à liberdade individual mas (sic) tem por fim assegurar esta própria liberdade e os direitos essenciais ao homem”.

Meirelles (2003, p. 449) define poder de polícia como: “[...] é a faculdade

de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e o gozo

de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio

Estado.”

Sobre o assunto, Caetano (apud Carvalho Filho, 2007, p. 68) destaca:

“É o modo de atuar da autoridade administrativa que consiste em intervir no exercício das atividades individuais suscetíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo por objeto evitar que se produzam, ampliem ou generalizem os danos sociais que a lei procura prevenir.”

Caio Tácito (apud Meirelles, 2007, p. 451) define que poder de polícia é,

em suma, o conjunto de atribuições concedidas à Administração para disciplinar e

restringir, em favor do interesse público adequado, direitos e liberdades individuais.

Fink, Alonso Jr. e Dawalabi (2000, p. 82), por sua vez, discorrem que:

Quanto ao conceito, podemos definir poder de polícia sendo a atribuição conferida à Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens e exercício de atividades e direitos individuais, com o objetivo de compatibilizá-los como o interesse público ou social.

No direito positivo brasileiro, o poder de polícia está previsto no art. 78 do

Código Tributário Nacional (CTN) – Lei nº 5.172, de 25/10/1966 –, que conceitua

poder de polícia, in verbis:

Art. 78 . Considera poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável,

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com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

Milaré (2009, p. 878), ao analisar o parágrafo único do art. 78 do CTN,

observa que:

[...] poder de polícia é prerrogativa da Administração Pública, que legitima a intervenção na esfera jurídica do particular, em defesa de interesses maiores relevantes para a coletividade, e desde que fundado em lei anterior que o discipline e defina seus contornos.

No tocante à questão, Di Pietro (2005, p. 111) adverte que o poder de

polícia divide-se entre o Legislativo e o Executivo. O Poder Legislativo exerce o

poder de polícia mediante criação de lei das chamadas limitações administrativas ao

exercício das liberdades públicas, ao passo que a Administração Pública, no seu

exercício, regulamenta as leis e controla a sua aplicação, preventivamente (por meio

de ordens, notificações, licenças ou autorização) ou repressivamente (mediante,

imposição de medidas coercitivas).

Meirelles (2007, p. 449-450) distingui polícia administrativa da polícia

judiciária e da polícia de manutenção da ordem pública. Adverte o autor que polícia

administrativa incide sobre os bens, os direitos e as atividades, e a polícia judiciária

e a polícia de manutenção da ordem pública atuam sobre as pessoas, individual ou

coletivamente.

A esse respeito, Di Pietro (2005, p. 112) faz uma digressão sobre poder

de polícia ao estabelecer duas áreas de atuação estatal, quais sejam: a

administrativa e a judiciária. Para a autora, a principal diferença reside no caráter

preventivo da polícia administrativa e no repressivo da polícia judiciária. Entretanto,

adverte que a polícia administrativa pode agir tanto preventiva quanto

repressivamente. Nesses casos, objetiva impedir que uma atividade ou um

comportamento de um particular cause prejuízo à coletividade. Por outro lado, a

polícia judiciária também pode assumir natureza preventiva em função do caráter

pedagógico da sanção aplicada. Outra diferença importante apresentada pela

doutrinadora é que a polícia judiciária é privativa às corporações especializadas

(polícia civil e militar), enquanto a polícia administrativa se divide entre diversos

órgãos da Administração Pública.

Nesse sentido, Lazzarini (apud DI PIETRO, 2005, p. 112) explica:

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[...] a linha de diferenciação está na ocorrência ou não de ilícito penal. Com efeito, quando atua na área do ilícito puramente administrativo (preventiva ou repressivamente), a polícia é administrativa. Quando o ilícito penal é praticado, é a polícia judiciária que age.

Em sentindo análogo, Carvalho Filho (2007, p. 73) aprofunda o tema ao

afirmar que:

A Polícia Administrativa é atividade da Administração que se exaure em si mesma, ou seja, inicia e se completa no âmbito da função administrativa. O mesmo não ocorre com a Polícia Judiciária, que, embora seja atividade administrativa, prepara a autuação da função jurisdicional penal, o que a faz regulada pelo Código de Processo Penal (arts. 4º e seguintes) e executada por órgãos de segurança (polícia civil ou militar) ao passo que a Polícia Administrativa o é por órgãos administrativos de caráter mais fiscalizador.

Segundo a forma de atuação, Machado (2008, p. 328) observa que o

poder de polícia pode agir por meio de ordens e proibições, mormente por meio de

normas limitadoras e sancionadoras, ou pela ordem de polícia, pelo consentimento

de polícia, pela fiscalização de polícia e pela sanção de polícia.

4.1.3 Razão e fundamento

A razão do poder de polícia reside na necessidade de proteção do

interesse social, e seu fundamento está na supremacia geral que a Administração

Pública exerce, em seu território, sobre todas as pessoas, bens e atividades.

(Meirelles, 2007, p. 451)

Martins da Silva (2004, p. 610), sobre o assunto, explica:

[...] a supremacia se revela nos mandamentos constitucionais e nas normas de ordem pública, que a cada passo opõem condicionamentos e restrições aos direitos individuais em favor da coletividade, incumbindo ao poder público o seu policiamento administrativo.

No que se refere aos fundamentos do poder de polícia, Meirelles (2003,

p. 452) cita alguns exemplos desses mandamentos previstos na Constituição e nas

leis infraconstitucionais, ao assinalar que:

Sem muito pesquisar, deparamos na vigente Constituição da República claras limitações às liberdades pessoais (art. 5º, VI-VII); ao direito de

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propriedade (art. 5º, XXII-XXIV); ao exercício das profissões (art.5º, XIII); ao direito de reunião (art. 5º, XVI); liberdade de comércio (arts. 170 e 173). Por igual, o Código Civil condiciona o exercício dos direitos individuais ao seu uso normal proibindo o abuso (arts. 159-160 do CC 1916; arts. 186-188 do CC2002); e, no que concerne ao direito de construir, além de sua normalidade, condiciona-o ao respeito aos regulamentos administrativos e ao direito dos vizinhos (arts. 554, 572 e 578 do CC 1916; arts 1.277 e 1.299 e ss., do CC 2002). Leis outras – a Lei de Recursos Hídricos, o Código de Mineração, o Código Florestal, o Código de Caça e Pesca, a Lei do Meio Ambiente, o Código de Defesa do Consumidor – cominam idênticas restrições, visando sempre à proteção dos interesses gerais da comunidade

Nessa linha de raciocínio, Fink, Alonso Jr. e Dawalabi (2000, p. 82)

discorrem que o fundamento do poder de polícia é a supremacia do interesse

público sobre o individual, a qual encontra base, de forma mediata, no art. 3º da

Constituição, cujo inciso IV dispõe que, entre os objetivos fundamentais da

República Federativa do Brasil, está o de promover o bem de todos, o que significa

perseguir sempre o interesse público.

Carvalho Filho (2007, 74) defende que: “[...] a intervenção do Estado no

conteúdo dos direitos individuais somente se justifica ante a finalidade que deve

sempre nortear a ação dos administradores públicos, qual seja, o interesse da

coletividade.”

4.1.4 Objeto e finalidade

Sobre o objeto do poder de polícia, Fink, Alonso Jr. e Dawalabi (2000, p.

83) esclarecem que seu objeto é amplo, abrangendo bens, direitos e atividades, o

que permite tornar a polícia administrativa presente em diversos campos de

autuação, tais como, trânsito, meio ambiente, costumes, construções, etc.

O objeto do poder de polícia administrativa é todo bem, direito ou

atividade individual que possa afetar a coletividade ou pôr em risco a defesa

nacional, exigindo, por isso mesmo, regulamentação, controle e contenção pelo

Poder Público. (Meirelles, 2003, p. 452).

Quanto à finalidade, Carvalho Filho (2007, 74) propugna que é a proteção

dos interesses coletivos, denotando estreita conotação com o próprio fundamento do

poder que é o interesse público, devendo este ser entendido em seu sentido mais

amplo para alcançar não só valores materiais, como moral e espiritual.

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4.1.5 Competência

Em termos gerais, Mello (2004, p. 774) acrescenta como critério

fundamental a competência para o poder de polícia administrativa, seguindo a regra

de quem for competente para legislar sobre a matéria.

Nesse raciocínio, Carvalho Filho (2007, p. 69) elucida essa assertiva ao

pugnar que:

A competência para exercer o poder de polícia é, em princípio, da pessoa federativa à qual a Constituição Federal conferiu o poder de regular a matéria. Na verdade, os assuntos de interesse nacional ficam sujeitos à regulamentação e policiamento da União; as matérias de interesse regional sujeitam-se às normas e à policia estadual; e os assuntos de interesse local subordinam-se aos regulamentos edilícios e ao policiamento administrativo municipal.

Segundo o mesmo autor (2007, p. 70), essa previsão de competências

encontra-se fixada em linhas gerais nos arts. 21, 22, 25 e 30 da Constituição Federal

(CF). Entretanto, essa competência partilhada entre os três graus federativos –

federal, estadual e municipal – pode ser concorrente, ensejando o exercício em

conjunto dos três entes, em razão da previsão constitucional do art. 22, parágrafo

único32, 2333 e 2434 da CF. Portanto, algumas das hipóteses de competência

concorrente podem resultar em sistema de cooperação calçado no regime de gestão

associada, mediante convênios administrativos ou consórcios públicos para

atenderem aos objetivos de interesse comum, conforme estabelece o art. 24135 da

CF.

Por seu turno, Milaré (2009, p. 878) defende que, embora o poder de

polícia seja prerrogativa do Poder Público, sobretudo do Executivo, pode ser

32 Brasil, Constituição Federal. Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...]. Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. 33 Brasil, Constituição Federal. Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios [...]. 34 Brasil, Constituição Federal. Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre [...]. 35 Brasil, Constituição Federal. Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.

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exercido diretamente ou por meio de delegação. Alerta, contudo, que tal delegação

deverá ter previsão legal, não podendo ser arbitrária nem ampla e indefinida.

Inobstante à competência do poder de polícia, não se pode olvidar que o

âmbito de incidência compreende qualquer ramo de atividade que possa contemplar

a presença do indivíduo. Dessa premissa decorre que os direitos individuais não são

absolutos, ou seja, não podem ser exercidos de forma a prejudicar valores de

interesse de toda a sociedade (FINK, ALONSO JR.; DAWALABI, 2000, p. 83).

4.1.6 Meio e campo de atuação

Considerando o poder de polícia em sentido amplo, no qual envolva

atividades do Poder Legislativo e do Poder Executivo, Di Pietro (2005, p. 75) afirma

que o Estado utiliza, para o seu exercício, duas maneiras: atos concretos, que são

as leis que criam as limitações administrativas ao exercício e aos direitos individuais,

dirigida indistintamente às pessoas; e atos administrativos e operações materiais de

aplicação da lei, compreendendo as medidas preventivas e repressivas.

Sobre o assunto, Carvalho Filho (2007, p. 75) divide os meios de atuação

em atos normativos e atos concretos. Segundo o autor, os atos normativos têm

como características o seu conteúdo genérico, abstrato e impessoal, sendo suas

restrições impostas aos administrados através de decretos, regulamentos, portarias,

resoluções, instruções e outros de conteúdo idêntico. Já os atos concretos são

direcionados a determinados indivíduos identificados, quando da aplicação da lei ao

caso concreto.

Nesse cotejo, Meirelles (2003, p. 457) defende que a polícia

administrativa age preferentemente de maneira preventiva, através de ordens e

proibições e, sobretudo, por meio de normas limitadoras e condicionadoras da

conduta daqueles que utilizam bens ou exercem atividades que possam afetar a

coletividade, a qual chama de limitações administrativas.

Quanto ao campo de autuação, o poder de polícia é bastante amplo e

complexo. Conforme Machado (2009, p. 328), o poder de polícia originariamente

restringia-se à segurança, moralidade e salubridade, estendendo-se posteriormente

à defesa da economia e organização social e jurídica em todas as ordens

imagináveis.

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4.1.7 Atributos e requisitos

Na doutrina, os atributos do poder de polícia compreendem a

discricionariedade, a autoexecutoriedade e a coercibilidade.

Segundo Meirelles (2003, p. 454-455), a discricionariedade resulta na

faculdade de escolha pela Administração Pública, que, por oportunidade e

conveniência, exerce o poder de polícia ao aplicar as sanções legais e meios

conducentes para atingir a proteção do interesse público. Contudo, esclarece que

para que o ato seja legítimo, deve estar dentro dos limites legais e que a autoridade

permaneça na faixa de opção que lhe é conferida.

Por seu turno, Mello (2004, p. 765) adverte que, no Estado de Direito,

inexiste, a rigor, um poder discricionário abrangendo toda uma classe ou ramos de

autuação administrativa, pois há atos da Administração Pública que são

discricionários e atos que são totalmente vinculados.

Nesse passo, Di Pietro (2005, p. 113) argumenta que, embora o poder

discricionário esteja presente na maior parte nas medidas de polícia, a

Administração pode atuar de modo vinculado. Dessa forma, a autora justifica que a

lei deixa margem de liberdade de apreciação em razão da impossibilidade de o

legislador prever todas as hipóteses possíveis para exigir a autuação de polícia

administrativa. Em outros casos, a lei estabelece determinados requisitos que a

Administração deverá adotar sem possibilidade de opção, como é o caso da

expedição de licenças.

Nessa linha e raciocínio, Meirelles (2003, p. 455) aduz que, em princípio,

o poder de polícia será discricionário, porém será vinculado na medida em que a

norma legal que o rege estabelecer o modo e a forma de sua realização. Entretanto,

observa que discricionariedade não deve ser confundida com arbitrariedade.

Discricionariedade é a liberdade de agir dentro dos limites legais, portanto é legítimo

e válido; arbitrariedade é a ação fora ou excedente à lei, com abuso36 ou desvio de

poder37, sendo, por conseguinte, ilegítimo, inválido e nulo.

36O abuso de poder ocorre quando a autoridade, embora competente para praticar o ato, ultrapassa os limites de suas atribuições ou se desvia das finalidades administrativas. (MEIRELLES, 2001, p. 104). 37 Desvio de finalidade ou de poder verifica-se quando a autoridade, embora atuando nos limites de sua competência, pratica o ato por motivos ou com fins diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse público. (MEIRELLES, 2001, p. 104).

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Di Pietro (2005, p. 114) define autoexecutoriedade como “[...] a

possibilidade que tem a Administração de, com os próprios meios, pôr em execução

as suas decisões, sem precisar recorrer previamente ao Poder Judiciário.”

Contudo, Carvalho Filho (2007, p. 79) observa que há atos que não

autorizam a imediata execução pela Administração, necessitando da intervenção

judicial, como é o caso da cobrança de multa. Desse modo, a autoexecutoriedade

não deve constituir abuso de poder, devendo, para tanto, o ato estar dentro das

prerrogativas legais e na medida em que o interesse coletivo assim o exija.

Nesse diapasão, Meirelles (2003, p. 457) observa que “[...] a auto-

executoriedade é restrita aos atos de proteção à coletividade, não servindo de meio

da coação para cobrança de créditos fiscais.”

Assim, Di Pietro (2005, p. 114-115) discorre que:

A auto-executoriedade não existe em todas as medidas de polícia. Para que a Administração possa se utilizar dessa faculdade, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público. No primeiro caso, a medida deve ser adotada em consonância com o procedimento legal, assegurando-se ao interessando o direito de defesa, previsto expressamente no artigo 5º, inciso LV, da Constituição. No segundo caso, a própria urgência da medida dispensa a observância de procedimento especial, o que não autoriza a Administração a agir arbitrariamente ou exceder-se no emprego da força, sob pena de responder civilmente o Estado pelos danos causados (cf. art. 37, § 6º, da Constituição), sem prejuízo da responsabilidade criminal, civil e administrativa dos servidores envolvidos.

Do mesmo modo, Mello (2004, p 771) propugna que são três as hipóteses

que permitem a aplicação da autoexecutoriedade, a saber: quando a lei

expressamente a autorizar; quando a medida for urgente para a defesa do interesse

público e não comportar a demora de um provimento judicial; e, por último, quando

inexistir outro meio capaz de assegurar o interesse público a ser protegido.

O atributo da coercibilidade resulta da imposição coativa das medidas

que a Administração utiliza no seu exercício de poder de polícia, resultando, para o

destinatário do ato, ônus ou conduta, dos quais não se pode abster de cumpri-las,

admitindo, para tanto, o emprego da força pública para o seu cumprimento, quando

resistido (FINK, ALONSO JR.; DAWALABI, 2000, p. 84).

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Conforme o entendimento de Di Pietro (2005, p. 115), a coercibilidade é

indissociável da autoexecutoriedade. O ato de polícia só é autoexecutório se dotado

de força coercitiva.

No que tange aos requisitos de validade do poder de polícia

administrativa, competência, finalidade, forma, motivo, objeto e causa seguem os

mesmos requisitos de validade do ato administrativo.

Entretanto, Meirelles (2003, p. 460) acrescenta mais dois requisitos ou

condições de validade do poder de polícia, quais sejam: a proporcionalidade e a

legalidade dos meios empregados. De acordo com o autor, deve haver

proporcionalidade entre a restrição imposta pela Administração e o benefício social

que se tem em vista, assim como correspondência entre a infração cometida e a

sanção aplicada, quando se tratar de aplicação de penalidade administrativa. Do

mesmo modo, os meios empregados devem estar revestidos de plena legalidade,

ainda que lícito e legal o fim pretendido, pois os fins não justificam os meios, sob

pena de invalidade dos atos praticados em função do poder de polícia. Assim,

conclui o doutrinador: “[...] os meios devem ser legítimos, humanos e compatíveis

com a urgência e a necessidade da medida adotada.”

A respeito da proporcionalidade, Di Pietro (2005, p. 116) ressalta:

[...] o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício, condicionando-o ao bem-estar social; só poderá reduzi-los quando em conflito com interesses maiores da coletividade e na medida estritamente necessária à consecução dos fins estatais.

4.2 PODER DE POLÍCIA EM MATÉRIA AMBIENTAL

4.2.1 Conceito

Segundo Milaré (2009, p. 878), o poder de polícia ambiental decorre da

lógica e direta competência para o exercício da tutela administrativa do ambiente,

incumbida ao Estado através do art. 225 Constituição Federal.

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Segundo Machado (2009, p. 327-328), poder de polícia ambiental é

definido como:

“[...] atividade da Administração Pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato em razão de interesse público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou de outras atividades dependentes de concessão, autorização/permissão ou licença do Poder Público, de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza.”

Com efeito, o conceito de poder de polícia ambiental não difere do

conceito geral anteriormente estudado, delimitado por suas especificidades quanto

ao campo de autuação que está voltado às questões ambientais.

Quanto à função do poder de polícia administrativa do meio ambiente,

Silva (2009, p. 613) estabelece que:

[...] tem a função de fazer com que os administrados mantenham a ordem pública do meio ambiente, cumprindo as determinações legais e obedecendo aos parâmetros normativos capazes de estabelecer um patamar mínimo de salubridade ambiental (padrões ambientais).

Não obstante, o poder de polícia ambiental é um dos diversos setores de

atuação do exercício do poder de polícia. Ademais, possui os mesmos fundamentos,

atributos e requisitos de validade do poder de polícia administrativa já mencionados.

Nesse cotejo, Milaré (2009, p. 879) disserta:

[...] No caso, estão em jogo a defesa e a preservação do meio ambiente, assim como a manutenção da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico essencial – tudo em função do patrimônio ambiental (que é público) e do desenvolvimento sustentável (que é do interesse da sociedade).

Adiante, o mesmo autor (2009, p. 879) esclarece que o poder de polícia

ambiental é exercido mais comumente por meio das ações fiscalizadoras, pois

compreendem, dentre outras, medidas corretivas e de inspecção. Aponta ainda

como relevante forma do exercício do poder de polícia ambiental o licenciamento

ambiental, haja vista atuar como papel importante no condicionamento para prática

de atos que, caso não observado, pode ensejar em ilícitos ou efeitos imputáveis.

O poder de polícia, na esfera ambiental, é exercido por profissionais

técnicos, podendo ser reforçado por outras modalidades de polícia, como as Polícias

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Militares Ambientais, que agem por delegação expressa do Poder Executivo

competente, segundo os objetivos e os métodos de polícia administrativa. (MILARÉ,

2009, p. 879).

Em linhas gerais, o poder de polícia ambiental é exercido pelos órgãos

integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), instituída pela Lei

Federal nº 6.938/1981, constituindo um complexo de órgãos federais, estaduais e

municipais, cujas funções estão voltadas à preservação e proteção do meio

ambiente.

4.2.2 Competência do poder de polícia em meio ambie nte

Em regra, a competência para o exercício de poder de polícia segue a

competência legislativa, isto é, ao ente a que a Constituição Federal outorga a

competência para legislar sobre a matéria, conforme exposto anteriormente.

A Constituição Federal estabelece em seu art. 24, que a União, os

Estados e o Distrito Federal têm competência concorrente para legislar sobre o meio

ambiente (inciso VI), e proteger o meio ambiente (incisos VII e VIII).

Contudo, Fink, Alonso Jr. e Dawalabi (2000, p. 83-84) assinalam que os

municípios podem legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a

legislação federal e estadual sobre questões ambientais, por força do disposto no

art. 30, incisos I e II, da Carta Magna, respectivamente.

Com relação ao poder de polícia, a proteção e a preservação do meio

ambiente é competência comum entre os entes federativos (União, Estados, Distrito

Federal e Municípios) por força do disposto nos incisos II, VI e VII do art. 23 da

Constituição Federal38.

Nesse particular, Milaré (2009, p. 881) afirma que o poder de polícia

ambiental pode e deve ser exercida cumulativamente por todos os entes federados,

consoante dispõe o art. 225, caput, da Constituição.

38 Brasil, Constituição Federal. Art. 23. “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; [..] VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII - preservar as florestas, a fauna e a flora; [...]”

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Com propriedade, Fink, Alonso Jr. e Dawalabi (2000, p. 96) assinalam

que a competência comum não é sinônima de competência concorrente. Na

competência comum (plano horizontal), há o exercício pleno e harmônico em

determinada matéria por cada um dos entes federativos, mediante cooperação. Já

na competência concorrente (plano vertical), cada ente da federação exerce suas

competências sobre a mesma matéria, mas em níveis distintos.

Nesse contexto, Ferraz Júnior (apud FINK; ALONSO JR; DAWALABI

(2000, p. 96) assevera:

As competências do Estado federal são repartidas horizontal e verticalmente. A repartição horizontal ocorre pela atribuição a cada ente federativo de uma área reservada, que lhe cabe, então, disciplinar em toda a sua extensão. A repartição vertical distribui uma mesma matéria em diferentes níveis (do geral ao particular) e a reparte entre os entes federativos. No primeiro caso (horizontal), as competências ou são comuns ou privativas. No segundo (vertical), temos a competência concorrente.

Por outro vértice, não se pode olvidar que a legislação infraconstitucional,

a Lei nº 6.938/1998, recepcionada pela Constituição de 1998, ao estruturar o

SISNAMA (art. 6º),39 conferiu aos municípios a responsabilidade pelo controle e pela

fiscalização na esfera local, das atividades capazes de provocar degradação do

ambiente, assim como elaborar normas supletivas e complementares (art. 6º, § 2º)40

39 Brasil, Lei Federal n. 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Art. 6º - Os órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, assim estruturado: I - órgão superior: o Conselho de Governo, com a função de assessorar o Presidente da República na formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os recursos ambientais; II - órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida; III - órgão central: a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, com a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente; IV - órgão executor: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, com a finalidade de executar e fazer executar, como órgão federal, a política e diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente; V - Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental; VI - Órgãos Locais: os órgãos ou entidades municipais, responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas jurisdições; [...]. 40 Brasil, Lei Federal n.º 9605, de 12 de fevereiro de 1998. Art. 6º - Os órgãos e as entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, assim estruturado: [...]§ 2º O s

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às editadas pela União, pelos Estados e pelo Distrito Federal. (MILARÉ, 2007, p.

881).

Sobre o assunto, Fink, Alonso Jr. e Dawalabi (2000, p. 95) lecionam que:

É no SISNAMA que encontraremos os órgãos públicos encarregados do exercício do poder de polícia em matéria ambiental, com atribuições para exercer todos os atos de polícia do meio ambiente (licenciamento, autorização, fiscalização, aplicação e execução de sanções etc.).

Releva acrescer outra lei infraconstitucional que estabelece a

competência comum dos entes federados, que é a Lei de Crimes Ambientais, ao

prescrever em seu art. 70, § 1º e §2º41 a possibilidade de lavratura de auto de

infração a todos os órgãos ambientais integrantes do SISNAMA, no âmbito das três

esferas da Federação. (MILARÉ, 2009, p. 881).

Ainda nesse contexto, Machado (2009, p. 329) adverte que o exercício de

poder de polícia ambiental pode ser atribuído tanto à Administração direta como à

Administração indireta (empresa pública, sociedade de economia mista ou

fundação). Alerta, entretanto, que os servidores públicos que exercem poder de

polícia ambiental admitidos sem concurso público estão sujeitos à instabilidade na

relação de emprego e não exercerão a referida atribuição com maior eficácia em

função das pressões políticas e financeiras.

Municípios, observadas as normas e os padrões federais e estaduais, também poderão elaborar as normas mencionadas no parágrafo anterior. 41 Brasil, Lei Federal n.º 9605, de 12 de fevereiro de 1998. Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente. § 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha. § 2º Qualquer pessoa, constatando infração ambiental, poderá dirigir representação às autoridades relacionadas no parágrafo anterior, para efeito do exercício do seu poder de polícia.

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5 A TUTELA PENAL AMBIENTAL

5.1 BEM JURÍDICO PENAL E A NECESSIDADE DA TUTELA PENAL DO MEIO

AMBIENTE

Para elucidar a importância do Direito Penal em razão da tutela ambiental,

Cruz (2009, p. 45) defende ser fundamental entender o conceito de bem jurídico. A

doutrinadora esclarece que o bem jurídico, além de definir a função do Direito Penal,

marca os limites de sua intervenção, haja vista que, no Estado Democrático de

Direito, o Direito Penal somente pode interferir na liberdade dos indivíduos para

proteger os bens jurídicos relevantes.

Sob o ponto de vista do Direito Penal, a mesma autora (2009, p. 45)

considera que:

[...] Bens jurídicos são os interesses mais elementares de uma dada sociedade, cuja preservação é essencial à garantia das condições mínimas de existência em sociedade e do pleno desenvolvimento da pessoa humana. Fundamenta-se no conceito de dignidade humana, exposto no art. 1º, III, da Constituição Federal. É aquilo que é lícito considerar digno de proteção na perspectiva dos fins do Direito Penal. O Direito Penal vai então tutelar os bens jurídicos dignos de proteção com o fim de prover à segurança social.

Destarte, conforme leciona Bianchini (apud CRUZ, 2009, p. 46), a noção

de bem jurídico é histórico. Portanto, os interesses que justificam a tutela ambiental

podem sofrer profundas alterações em sua trajetória histórica, não só com relação à

escolha dos bens jurídico-penais que serão protegidos, mas também com relação ao

conteúdo e à abrangência daqueles que já possuíam proteção.

Nesse particular, Prado (2009, p. 96) observa que o bem jurídico trata-se

de um conceito necessariamente relativo e valorativo, pois reflete a realidade social

na qual incidem juízos de valor.

Cruz (2009, p. 47) acrescenta que:

A determinação dos valores essenciais que vão servir de parâmetro à determinação dos bens jurídicos penais vai depender das condições sociais, econômicas e culturais, enfim, do ambiente valorativo de cada sociedade, em cada época histórica.

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Nesse contexto, Prado (2009, p. 94) assinala que a noção de bem jurídico

emerge de determinados parâmetros e valores constitucionais, nos quais o

legislador irá basear-se para definir os bens jurídicos e, por conseguinte, o injusto

penal.

Entretanto, Cruz (2009, p. 48) observa que a intervenção do Direito Penal

somente se justifica para assegurar a proteção necessária e eficaz aos bens

jurídicos fundamentais ao desenvolvimento do indivíduo, voltadas ao princípio da

dignidade da pessoa humana, consoante dispõem os arts. 1º, inciso III, e 6º da

Constituição Federal. Assevera a doutrinadora que, para ser tutelado pelo

ordenamento jurídico-penal, o bem jurídico necessita ser digno dessa tutela, ou seja,

revelar dignidade penal.

Nas palavras de Souza (apud CRUZ, 2009, p. 48), a dignidade penal é

“[...] atributo que reveste direitos e bens jurídicos, os quais, por serem relevantes e

fundamentais para o indivíduo e a sociedade, são, em razão disso, merecedores da

tutela penal.”

Nessa linha de ideias, Prado (2009, p. 93) defende que o bem jurídico

somente é tutelado penalmente quando se estiver diante de graves agressões

consideradas socialmente intoleráveis contra bens fundamentais de indiscutível

relevância, caracterizado no Direito Penal como princípio da fragmentariedade.

Para Cruz (2009, p. 47), o Direito Penal incide sobre os bens jurídicos

relevantes que já são protegidos por outras formas de tutela e somente quando

estes se mostram ineficazes, sendo a sanção penal única forma suficiente para lhe

conferir a efetiva proteção. É o que se denomina no Direito Penal de caráter

subsidiário ou princípio da subsidiariedade. Tanto o princípio da subsidiariedade e

quanto o da fragmentariedade são corolários da mínima intervenção penal que está

ligada à preservação da dignidade humana.

Segundo Prado (2009, p. 94), a noção de bem jurídico emerge de

determinados parâmetros e valores constitucionais nos quais o legislador irá basear-

se para definir os bens jurídicos e, por conseguinte, o injusto penal.

Desse modo, Cruz (2009, p. 52-53) assinala que é na Constituição

Federal que se encontram os bens jurídicos merecedores de tutela, ou seja, todos

os direitos fundamentais necessários ao exercício da dignidade humana (art. 1º, III),

haja vista a sua posição hierárquica superior em relação aos demais bens. Nesse

cotejo, ressalta a necessidade de haver uma relação estreita entre a Constituição e

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a legislação penal para que o Direito Penal possa cumprir seu objetivo, qual seja, a

eficaz proteção de valores definidos como relevantes pela Constituição.

Partindo dessa premissa, Benjamin (apud Cruz, 2009, p. 53) defende que

a norma penal é essencial na proteção do meio ambiente, em razão de que o meio

ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental previsto na

Constituição (art. 225, caput), necessário à vida humana no planeta.

Nesse diapasão, Sirvinkas (2004, p. 17) afirma que a proteção penal do

meio ambiente se mostra absolutamente necessária para garantir a sobrevivência

das presentes e futuras gerações.

Sobre o assunto, Ferreira (apud CRUZ, 009, p. 66, grifo da autora)

defende a necessidade da tutela penal na proteção do meio ambiente, ao observar

que:

“Com as suas características repressiva e retributiva, mas ao mesmo tempo preventiva, o Direito Penal pode ser mais eficaz para demonstrar a reprovação social incidente sobre os atos de perigo ou de agressão à natureza e aos bens que ela nos concede ou que estão nela contidos, podendo intervir quando falharem ou forem insuficientes as medidas administrativas de restrição e controle, ou forem inaplicáveis as normas do Direito Civil. Na verdade, as três áreas coexistem pacificamente e podem, sem dúvida, oferecer conjuntamente as medidas aplicáveis aos casos concretos.”

Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas (2000, p. 31, grifo

dos autores), ao fazerem uma digressão sobre a importância da proteção penal do

meio ambiente, defendem que:

Realmente, a sanção penal em determinados casos se faz necessário não só em função da relevância do bem ambiental protegido, como também da sua maior eficácia dissuasória. No dizer de Eduardo Ortega Martin, “o emprego de sanções penais para a proteção do meio ambiente em determinadas ocasiões se tem revelado como indispensável, não só em função da própria relevância dos bens protegidos e da gravidade das condutas a perseguir (o que seria natural), senão também pela maior eficácia dissuasória que a sanção penal possui”.

Entretanto, Cruz (2009, p.78) alerta que a tutela penal do meio ambiente

não pode levar a criminalização de todas as condutas, sob pena de afronta ao

postulados básicos que norteiam o Direito Penal. Assim, o caráter fragmentário e o

princípio da subsidiariedade irão nortear o poder punitivo do Estado, ensejando a

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tutela penal apenas com relação às mais graves agressões ambientais e quando as

demais formas de tutela mostrarem-se insuficientes.

Nesse particular, Prado (2009, p. 96) adverte que a Constituição deve ser

o ponto jurídico-político de referência obrigatório para o injusto-penal, limitado à sua

estrita necessidade como afirmação do indispensável liame material entre o bem

jurídico e os valores constitucionais.

Acrescenta o doutrinador (2009, p. 96) que a lei penal não atua como

limitador da liberdade pessoal, mas como seu garantidor, razão pela qual a tutela

penal deve ficar adstrita aos bens de maior relevância. Portanto, as infrações de

menor poder ofensivo devem ficar limitadas pela via administrativa.

Entretanto, Mascarenhas Prado (2000, p. 89) expõe:

Ocorre que as normas administrativas, às vezes, são insuficientes no combate a graves lesões contra o meio ambiente. E, então, é feito apelo à tutela penal, que deve ser atendido, desde que não seja para fazer remendos aos vazios da legislação administrativa, ou seja, para simplesmente encobrir a falta ou a deficiência de políticas administrativas a respeito; a falta de aplicação de suas sanções.

]Com efeito, a tutela jurídico-penal do meio ambiente encontra-se

constitucionalmente fundamentada pelos arts. 5º, XLI, e 225, caput e § 3º da

Constituição, sendo erigida a um direito fundamental e, por conseguinte, a bem

jurídico relevante.

Após dez anos da promulgação da Constituição Federal de 1988, foi

editada a Lei de Crimes contra o Meio Ambiente (Lei 9.605, de 12.02.1998), que

dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e

atividades lesivas ao meio ambiente e dá outras providências.

Ressalta-se, entretanto, a assertiva de Prado (2009, p. 141) ao alertar que

algumas das leis pretéritas que tratam sobre crimes ambientais continuam

vigorantes, configurando o que chamou de “uma legislação tipo mosaico”.

Contudo, não se pretende adentrar nesse tema bastante profundo e

complexo, restringindo apenas alguns aspectos gerais da Lei 9.605/1998, adiante

apresentados.

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5.2 LEI DE CRIMES AMBIENTAIS (LEI N. 9.605/1998): ASPECTOS GERAIS

Conforme Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 102-103), antes do

advento da Lei 9.605 de 12.02.1998 (Lei de Crimes Ambientais), as normas penais

que tutelavam o meio ambiente encontravam-se pulverizadas em nosso

ordenamento jurídico em diversas leis e decretos-leis, resultando em grande

dificuldades na sua aplicação. Embora houvesse um grande número de leis

definindo delitos e contravenções penais, inexistia uma definição clara e objetiva dos

crimes, criando verdadeiros obstáculos na compreensão do caráter criminoso,

resultando em uma insatisfatória aplicação das normas penais.

Não obstante, importante conceituar crime42 ambiental que nas palavras

de Copola (2008, p. 23, grifo da autora) significa:

[...] um fato típico e antijurídico que cause danos ao meio ambiente. Ou, em outros termos, crime ambiental é toda conduta prevista como ato ilícito, e que provoca resultado danoso previsto na lei dos crimes ambientais ou outra norma esparsa Sim, porque a existência do crime, o ato típico deve ser, também, antijurídico.

Ao dissertar sobre a Lei de Crimes Ambientais, Machado (2009, p. 700)

assevera que a nova lei trata especialmente de crimes contra o meio ambiente e de

infrações administrativas ambientais, além de dispor sobre processo penal e

cooperação internacional para a preservação do meio ambiente.

Para Prado (2009, p. 141), a Lei de Crimes Ambientais é uma lei de

natureza híbrida, em que se misturam temas diferentes, tais como, matéria penal,

administrativa e internacional, resultando em avanços poucos significativos.

Adiante, explica o mesmo autor (2009, p. 142) que a lei em comento

possui um caráter altamente criminalizador, haja vista que tipifica como crime uma

grande quantidade de comportamentos que, a seu ver, deveriam ser meramente

infrações administrativas ou, quando muito, contravenções penais, destoando,

portanto, com os princípios penais da intervenção mínima e da insignificância.

42 Segundo Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p.26), crime é definido “[...] conduta típica e antijurídica. Típica, porque ela deve estar anteriormente descrita em uma lei, o chamado tipo penal, devendo, portanto, a conduta criminosa adequar-se completamente àquela descrita na lei, caso contrário a conduta é atípica e, portanto, não é crime. Antijurídica é aquela contrária à ordem jurídica, pois uma conduta mesmo típica pode não ser crime, em determinadas circunstâncias, pode estar de acordo com a lei, por exemplo, a legítima defesa, o estado de necessidade, que retiram a condição criminosa da conduta, mesmo que tipificada”.

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Igualmente, ressalta que a lei prevê muitos conceitos amplos e indeterminados,

muitas vezes eivados de impropriedades técnicas, linguísticas e lógicas, ou seja,

com cláusulas valorativas, normas penais em branco e com excessiva dependência

administrativa, tais como, permissão, licença ou autorização da autoridade

competente.

As críticas não param. Sirvinkas (2004, p. 23) afirma que o legislador

infraconstitucional não explicitou as demais normas que foram revogadas com o

advento da Lei 9.605/1998, restringindo-se a singela e clássica fórmula “revogam-se

as disposições em contrário” (art. 82), ficando, destarte, ao encardo do aplicador do

direito a responsabilidade de examinar as normas conflitantes. Desse modo, a

redação certamente criará dúvidas quanto à vigência de normas penais pretéritas.

Assim, observa o doutrinador (2004, p.28-29) que a lei deixou de criar

tipos penais completos e abrangentes, uma vez que se restringiu em sistematizar

normas já existentes e criminalizar condutas que eram contravenções, abstendo-se

de disciplinar ou proteger outros bens jurídicos relevantes para o meio ambiente.

Destaca que muitos tipos penais são extremamente abertos, e a maioria deve ser

complementada com normas penais em branco. Lembra ainda que muitos

dispositivos de legislações esparsas ficaram em vigor, resultando em não solução do

problema da falta de sistematização de maneira ampla e precisa.

Nesse sentido, Milaré (2009, p. 1001) leciona:

Alguns desses vícios são produtos de excisões promovidas por pressões dos diversos lobbies interessados, que, segundo os noticiários, desempenharam importante papel nos vetos presidenciais. Outros parecem resultar de concessões a uma visão equivocada do verdadeiro interesse social onde se insere a preservação da qualidade ambiental e dos recursos ambientais. Vários, enfim, decorrem da prodigalidade do legislador “no emprego de conceitos amplos e indeterminados – permeados, em grande parte, por impropriedades lingüísticas, técnicas e lógicas -, o que contrasta com o imperativo inafastável de clareza, precisão e certeza na descrição das condutas típicas”.

Sob o aspecto negativo da Lei 9.605/1998, Fink, Alonso Jr. e Dawalibi

(2000, p.103) propugnam que:

A conseqüência mais conhecida desta autêntica barafunda legislativa é a insatisfatória aplicação das normas penais, seja pela falta de clareza de alguns tipos penais, seja até mesmo pelo desconhecimento da legislação por parte de quem deveria aplicá-la.

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Nessa linha de raciocínio, Milaré e Costa Jr. (2002, p. 35) criticam o

excessivo número de normas penais em branco, em que deverá encontrar

complementação em outros dispositivos legais, inclusive extrapenal. Dessa feita,

acrescenta, citando Bending, que esse preceito lacunoso é extremamente funesto

ao princípio da legalidade, uma vez que o Direito Penal deverá definir, de modo

completo e autônomo, os componentes de suas normas, evitando a remissão a

outras regras do ordenamento jurídico.

Malgrado às duras críticas feitas pelos doutrinadores, estes defendem a

importância da Lei nº 9.605/1998 na proteção do meio ambiente.

Sirvinkas (2004, p. 23) assevera que, embora a Lei de Crimes Ambientais

tenha trazido avanços e retrocessos, a lei representa o primeiro passo para a

consolidação da legislação ambiental em um futuro próximo.

Nesse compasso, Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 103 e 104)

sustentam que a Lei 9.605/1998 tem um grande mérito, que é a primeira tentativa

bem-sucedida de se dar um mínimo de sistematização e uniformidade às normas

penais ambientais. Pugnam também pelas notáveis inovações trazidas pela lei,

como a imposição da reparação do dano como condição da transação penal e a

suspensão condicional do processo e a responsabilidade penal da pessoa jurídica,

ainda que bastante polêmica.

Milaré (2009, p. 1002) registra que, embora a lei traga defeitos

perfeitamente evitáveis, representa um avanço político na proteção do meio

ambiente, com punição administrativa mais rigorosa, e por tipificar os crimes

ecológicos, incluindo a modalidade culposa. Quanto às condutas típicas, assevera

que atualizou alguns dispositivos já previstos em leis esparsas, transformou algumas

contravenções em crimes, descriminalizou outras e tipificou outras condutas.

Nesse contexto, Prado (2009, p. 152) esclarece que não há substancial

diferença entre crime e contravenção. Na Lei de Contravenção, não se admite

tentativa (art. 4º), bastando apenas a voluntariedade (art. 3º), prevendo pena de

multa ou prisão simples; já no crime, a pena é de detenção ou de reclusão. Contudo,

reconhece que a prescrição na contravenção penal era exígua, insuficiente, às

vezes, para concluir o inquérito penal. Com a transformação de contravenção em

crime, a Lei nº 9.605/1998 possibilitou a aplicação com maior eficiência da legislação

ao caso concreto.

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Mascarenhas Prado (2000, p. 91) faz uma ressalva às normas penais em

branco utilizadas na Lei nº 9.605/1998 ao discorrer que:

Em contrapartida, há que se considerar que se trata de um bem complexo e de difícil delimitação, como demonstrado, contra o qual as agressões assumem as mais variadas formas a cada dia e, assim, o legislador penal tem certa dificuldade em elaborar os tipos penais, recorrendo a uma linguagem técnica, a descrições mais específicas e fragmentárias, revelando o problema do recurso freqüente as normas penais em branco, o que implica compatibilizar a técnica com princípios penais constitucionais.

Feito tais apontamentos, cumpre fazer uma breve digressão acerca do

conteúdo da Lei 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, que entrou em vigor em 30 de

março de 1998.

Segundo Sirvinkas (2008, p. 588) a Lei de Crimes Ambientais contém 82

artigos, distribuídos em oito capítulos, cuja divisão está disposta da seguinte forma:

Capítulo I – Disposições Gerais (sujeito ativo, pessoa jurídica, autoria e coautoria);

Capítulo – II Da Aplicação da Pena (tipos de penas, consequências, culpabilidade,

circunstâncias atenuantes e agravantes); Capítulo III – Da Apreensão do Produto e

do Instrumento de Infração Administrativa ou de Crime; Capítulo IV – Da Ação e do

Processo Penal; Capítulo V – Dos Crimes contra o Meio Ambiente (inclui as causas

especiais de aumento de pena), subdividindo em seções os crimes em espécie –

Seção I – Dos Crimes contra a Fauna; Seção II – Dos Crimes contra a Flora; Seção

III – Da Poluição e Outros Crimes Ambientais; Seção IV – Dos Crimes Contra o

Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural; e Seção V – Dos Crimes contra a

Administração Ambiental; e, por último, Capítulo VII – Das Disposições Finais.

Convém assinalar que, apesar de a Lei 9.605/1998 ter entrado em vigor,

alguns dispositivos de leis esparsas continuam vigentes.

Milaré (2009, p. 1012) sintetiza algumas normas incriminadoras

remanescentes em nosso ordenamento jurídico ainda vigentes, a saber: art. 250 do

Código Penal (Dec.-lei 2.848, de 07.12.1940); arts. 31 e 42 da Lei de Contravenções

Penais (Dec.-lei 3.688, de 03.10.1941); art. 26, alíneas e, j, l, m do Código Florestal

(Lei 4.771, de 15.09.1967); arts. 23, 26 e 27 da Lei 6.453, de 17.10.1977 (atividades

nucleares).

Quanto às infrações penais previstas no Código Penal relacionadas ao

meio ambiente, Sirvinkas (2004, p. 253) sustenta alguns dispositivos do Código

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Penal aplicáveis, subsidiariamente, à lei em comento. São eles: arts. 163, 164, 250,

251, 252, 253, 254, 256, 256, 270 e 271 do Código Penal.

Após a edição da Lei 9.605/1998, foi editada a Lei de Biossegurança, que

previa alguns tipos penais, posteriormente revogada pela Lei 11.105, de 24.03.2005,

que tipifica alguns crimes nos arts. 24 a 29.

5.2.1 Tipos penais em espécie: considerações gerais

Em linhas gerais, a Lei 9.605/1998 sintetizou tipos penais esparsos em

uma norma que objetiva tutelar o meio ambiente, capitulando-os em: crimes contras

fauna (arts. 29 a 37); crimes contra a flora (arts. 38 a 53); crime de poluição (art. 54);

crimes contra o ordenamento urbano e patrimônio cultural (arts. 62 a 65); e crimes

contra a administração ambiental (art.s 66 a 69-A).

Importante destacar que todos os crimes contra o meio ambiente

previstos nesse diploma legal são de natureza pública incondicionada, consoante se

depreende do art. 26, caput,43 da Lei de Crimes Ambientais.

Contudo, para fins de limitar os objetivos desse trabalho, será efetuada

uma rápida abordagem das normas incriminadoras da Lei nº 9.605/1998, com

exceção dos crimes contra administração ambiental, tema principal da monografia,

razão pela qual será mais aprofundado.

5.2.1.1 Dos crimes contra a fauna

A proteção da fauna está prevista no art. 225, §1º, inciso VII44, da

Constituição Federal.

43 Brasil, Lei Federal n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Art. 26. “Nas infrações penais previstas nesta Lei, a ação penal é pública incondicionada.” 44 Brasil, Constituição Federal de 1988. Art. 225 “[...] § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: [...]VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.

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A Lei 9.605/1998 estabelece, na Seção I do capítulo V, nove artigos para

os crimes contra a fauna,45 tipificando condutas delituosas praticadas contra

espécies da fauna silvestre.

Contudo, Milaré (2009, p.1003) esclarece que, a rigor do conceito de

animais silvestres, não significa que animais que não pertençam à fauna silvestre

estejam desamparados pela lei, haja vista que o art. 32 prevê crime de abuso e

maus-tratos aos animais silvestres46, domésticos47 ou domesticados48, nativos49 ou

exóticos50.

No que tange às demais leis esparsas que trata da matéria, o mesmo

doutrinador (2009, p.121) afirma que a Lei Ambiental revogou os arts. 27 a 34 da Lei

de Proteção à Fauna (Lei n. 5.197, de 03.01.1967). Restaram, portanto, três leis na

esfera federal que disciplinam a proteção da fauna, a saber: Lei n. 5.197/67 (protege

à fauna); Lei n. 7.643/87 (protege a pesca da baleia); Lei n. 7.679/88 (protege a

pesca em períodos de reprodução); e Decreto n. 221/67 (protege e estimula a

pesca).

5.2.1.2 Dos crimes contra a flora

Assim como a fauna, a proteção da flora51 está expressa no art. 225, §1º,

inciso VII, da Constituição Federal.

45 Segundo Milaré (2009, p. 1002), fauna é o conjunto de animais próprios de uma determinada região, estando intimamente ligado ao conceito de hábitat – local onde vive o animal. A fauna pode ser doméstica, domesticada ou silvestre. 46“ Fauna silvestre é o conjunto de animais que têm seu habitat natural nas matas, florestas, rios e mares, e que normalmente não possuem adaptabilidade natural ao convívio humano [...]” (MILARÉ, 2009, p.1003). 47 Conforme Cardozo Dias (apud MILARÉ, 2009, p. 1003, grifo do autor), fauna doméstica é aquela representada por “espécies que foram submetidas a processos tradicionais de manejo, possuindo características biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem para a sua sobrevivência, sendo passível de transação comercial e, algumas, de utilização econômica”. 48 Fauna domesticada é a formada por espécies que são naturalmente encontradas na natureza, mas que por circunstâncias especiais passaram a conviver harmoniosamente com o homem, dele dependendo para a sua sobrevivência, podendo ou não manter suas características comportamentais de animais silvestres. (MILARÉ, 2009, p.1003). 49 Espécies nativas são aquelas que vivem em determinada região ou país. (SIRVINKAS, 2008, p. 412). 50 Espécies Exóticas são originadas de outros países. (SIRVINKAS, 2008, p. 412). 51 Flora é “o conjunto de plantas de uma determinada região ou período listadas por espécies e consideradas como um todo”[...] (MILARÉ, 2009, p.1004).

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A Lei n. 9.605/1998 prevê quinze artigos sobre a matéria na Seção II do

Capítulo V (arts. 38 a 53), tipificando algumas condutas criminosas.

Milaré (2009, p. 1003) assevera que a Lei n. 9.605/1998 acolheu a

maioria das contravenções florestais da Lei 4.771/1965 (Código Florestal),

transformando-as em crimes e impondo aos infratores reprimendas mais severas.

Prado (2009, p. 149) aduz que a proteção da flora, além de prever a

proteção das unidades de conservação,52 abrange também a diversidade biológica53

existente nas matas, nas florestas, nos rios, nos mares e no ar.

No que se refere a leis esparsas que trata sobre a matéria, o mesmo

doutrinador (2004, p. 152) assinala que todas as infrações previstas na Lei

4.771/1965 (Código Florestal) foram revogadas, com exceção as alíneas e, j, l, e m

do art. 26. Revogou, ainda, os arts. 28 a 36 do Código Florestal, que discorriam

sobre tipos penais considerados contravenções penais.

5.2.1.3 Dos crimes de poluição e outros crimes ambientais

Para esses crimes, a Lei nº 9.605/1998 dispôs oito artigos (arts. 54 a 61

da Seção III, do Capítulo V), tipificando somente nos arts. 54, 55, 56, 60 e 61

condutas criminosas praticadas por aqueles que causam poluição, entre outros

crimes ambientais.

Milaré (2009, p. 1007) registra que conceito de poluição é extremamente

aberto, abrangendo as várias modalidades que encerra, como a atmosférica, a

hídrica, a sonora, a do solo, a eletromagnética, etc.

O conceito de poluição encontra-se definido no art. 3º, inciso III, da Lei nº

6.938/1981 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente), in verbis:

52 Brasil. Lei Federal n. 9.985, de 18.7.2000. Art. 2o Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - unidade de conservação: espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção; 53Brasil. Lei Federal n. 9.985, de 18.7.2000. Art. 2o Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: [...] III - diversidade biológica: a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas;

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Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: [...]; III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; [...].

Com a vigência da Lei nº 9.605/1998, Sirvinkas (2004, p. 192) identifica

que o art. 15 da Lei nº 6.938/1981 foi revogado. Entretanto, esclarece o autor que as

contravenções penais previstas no art. 38 (emissão de fumaça, vapor ou gás) e o

art. 42 (perturbação do trabalho ou do sossego público) não foram revogados pela

nova lei.

5.2.1.4 Dos crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural

A Lei nº 9.605/1998 estabelece quatro artigos para os crimes contra o

ordenamento urbano (arts. 64 e 65) e o patrimônio cultural54 (arts. 62 e 63), na

Seção IV do Capítulo V, tipificando condutas delituosas praticadas contra o bem

público. O patrimônio cultural além de encontrar tutela constitucional no art. 225,

caput, da Constituição, encontra-se definido e protegido pelo art. 216, incisos I a V, §

1º da CF. 55

54 Patrimônio cultural é o conjunto de todos os bens culturais móveis ou imóveis, que podem ser naturais ou criados pelo homem, com relevante valor histórico, paisagístico, arqueológico, ecológico, científico, tecnológico e cultural, e, desse modo, portadores de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. (COPOLA, 2008, p. 172). 55Brasil, Constituição Federal de 1988. Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão;II - os modos de criar, fazer e viver;III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação

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Com propriedade, Milaré (2009, p.1008) destaca a importância do novo

diploma legal na tutela do patrimônio cultural, ao afirmar que:

Com relação ao patrimônio cultural, novas figuras foram delitivas foram criadas, consagrando-se, de uma vez por todas, o conceito de que o patrimônio cultural brasileiro não é apenas o tombado, mas também o protegido por lei ou sentença judicial. [...].

Sirvinkas (2004, p. 214) ressalta que antes da Lei n. 9.605/1998, a

proteção do patrimônio cultural estava inserida no arts. 163, III, 165 e 166 do Código

Penal, no capítulo relativo ao delito de dano. Hodiernamente, segundo o autor, os

arts. 165 e 166 encontram-se revogados.

5.2.1.5 Dos crimes contra a administração ambiental

A Lei 9.605/1998 fixa cinco artigos (arts. 66 a 69-A) na Seção V do

Capítulo V, nos quais tipifica condutas delituosas praticados por funcionários

públicos ou particulares contra a administração ambiental.

Os artigos 66, 67 e 69 dizem respeito a crimes comuns (particulares ou

agentes ou funcionários públicos), e os artigos 68 e 69 a crimes próprios (somente

por agentes ou funcionários públicos).

A Lei Federal n. 11.284, de 2 de março de 2006, acrescentou o art. 69-A a

Lei Ambiental, incluindo mais um tipo penal no rol de crimes contra a administração

ambiental.

Copola (2008, p. 195) assevera que este dispositivo que prevê o crime de

falsificação de laudo ambiental, revela-se necessária em razão de ser esta uma

prática comum adotada por madeireiras em nosso país.

Entretanto, não se pretende esgotar o assunto neste tópico, haja vista que

a matéria será adiante analisada mais profundamente.

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75

5.3 DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO AMBIENTAL: CRIMES

PRATICADOS POR AGENTES OU FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS COM PODER DE

POLÍCIA AMBIENTAL

Segundo Copola (2008, p. 109), em nosso ordenamento jurídico estão

previstos diversos crimes contra a Administração Pública. Assim, as condutas

delituosas praticados por funcionário públicos podem ser encontradas no Código

Penal, na Lei Federal nº 8.666/93 (Lei de Licitações), além das previstas na Lei nº

9.605/1998, sendo esta última objeto desse estudo.

Sirvinkas (2004, p. 223) anota que, antes da Lei nº 9.605/1998, o

funcionário público respondia por crimes previstos no Código Penal, cujos delitos

encontram-se estabelecidos nos arts. 312 e seguintes. Com a criação da Lei

Ambiental, o Código Penal passou a ser aplicado subsidiariamente.

Assim, com a Lei 9.605/1998, os crimes contra a administração e o meio

ambiente passaram a ser tratados em uma seção própria: dos crimes contra a

administração ambiental.

Contudo, para fins de conceito de funcionário público nos crimes próprios

previstos na Lei nº 9.605/1998, deve-se recorrer ao art. 327 do Código Penal, por

força da aplicação subsidiária do art. 7956 da Lei de Crimes Ambientais.

Assim, o art. 327, §1º do Código Penal define funcionário público como:

Art. 327 . Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. §1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função pública em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.

Sobre o assunto, Prado (2009, p. 316) leciona que:

Em realidade, são delitos especiais (próprios) que agasalham determinadas formas de prevaricação do funcionário público, em razão do dever legal de se pautar, no exercício de suas funções, sempre conforme a lei e a veracidade dos fatos (afirmar e não omitir a verdade, informar corretamente, fiscalizar e controlar a atividade administrativa inerente à sua função).

56 Brasil, Lei Federal n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Art. 79. Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.

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A Lei de Crimes Ambientais cuida dos crimes praticados contra a

administração ambiental57, cuja composição é formada por órgãos ambientais,

podendo ser praticados por agentes ou funcionários públicos (crimes próprios) e por

particulares (crimes comuns). (COPOLA, 2008, p.187).

A respeito da administração ambiental, Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000,

p. 111) dissertam:

[...] A administração ambiental, pois, é uma das várias faces da atividade administrativa, justamente aquela voltada para a defesa do meio ambiente, principalmente através do poder de polícia, e plenamente integrada à finalidade geral da Administração Pública, que é a tutela do bem comum da coletividade. É nesse sentido que deve ser entendida a expressão administração ambiental, ou seja, uma atividade típica da Administração Pública consistente na defesa do meio ambiente. Atividade típica porque, como vimos, a Administração Pública tem como finalidade e fundamento a defesa do interesse público, do qual o meio ambiente é indissociável.

Nesse cotejo, Prado (2009, p. 316) observa que, para o cumprimento das

atribuições e proteção dos interesses públicos, gerais e coletivos, a Administração

Pública ambiental necessita operar na esfera de autuação específica de controle,

fiscalização e repressão, utilizando-se do seu poder de polícia. Essa intervenção no

âmbito da proteção do meio ambiente pela administração ambiental, segundo o

doutrinador, se materializa no exercício das funções administrativas ambientais, que

podem ser funções normativas ou de orientação (estabelecimento de regras ou

diretrizes e instruções técnicas), e funções de controle, de polícia e de fiscalização

ou inspeção.

Desse modo, o mesmo autor (2009, p. 316-317) justifica a importância

desses dispositivos legais, a par das já previstas no Código Penal (arts. 312 e

seguintes), em razão das relevantes funções exercidas pelos agentes ou

funcionários da Administração Pública no setor do meio ambiente, mormente por

força do dispositivo constitucional (art. 225, caput, CF) que impõe ao Poder Público

a função de proteger o meio ambiente.

57 A administração ambiental é aquela que cuida da gestão do meio ambiente como interesse ou direito difuso, que, repita-se, é de titularidade de toda a coletividade, e, assim, qualquer crime praticado contra a administração ambiental, terá como sujeito passivo, também, toda a coletividade. (COPOLA, 2008, p. 187).

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Entretanto, no que tange ao eventual concurso de leis, Prado (2009, p.

317) sustenta que tal questão deve ser resolvida, prevalentemente, pelo critério da

especialidade.

Por sua vez, Sirvinkas (2004, p. 253) afirma que, se houver crime comum,

aplicam-se as disposições do Código Penal, em concurso com o delito previsto na

Lei Ambiental.

5.3.1 Análise individual do art. 66 da Lei Ambienta l

A Lei n. 9.605/1998 estabelece em seu art. 66, a seguinte redação: “Art.

66. Fazer o funcionário afirmação falsa ou enganosa, omitir a verdade, sonegar

informações ou dados técnico-científicos em procedimentos de autorização ou de

licenciamento ambiental. Pena – reclusão, de um a três anos e multa.”

Segundo Milaré (2002, p. 190), o tipo penal em comento possui

semelhança com os crimes previstos no art. 29958 (falsidade ideológica) e 31959

(prevaricação), ambos do Código Penal, embora o dispositivo em comento esteja

especificamente voltado para a administração ambiental.

O sujeito ativo é somente o funcionário público (crime próprio), e o sujeito

passivo é o Estado (sujeito direto), que compreende a União, os Estados e os

Municípios, e a coletividade (sujeito indireto). (SIRVINKAS, 2004, p. 224).

Prado (2009, p. 318) leciona que o bem jurídico tutelado é a

Administração Pública, particularmente o correto exercício da função administrativa,

e o meio ambiente.

A objetividade jurídica é manter uma administração pública ambiental

eficiente e correta. (MILARÉ, 2002, p. 190).

58 Brasil, Decreto-Lei n. 2.848, de 7.12.1940. Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular. Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte. 59 Brasil, Decreto-Lei n. 2.848, de 7.12.1940. Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

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A conduta típica incriminadora (elemento objetivo) é fazer o funcionário

público: 1º) afirmação falsa (inverídica) ou enganosa (capaz de induzir alguém em

erro); 2º) omitir a verdade; 3º sonegar (deixar de mencionar, com fraudulento)

informações ou dados técnico-científicos (próprios de determinado ramo do

conhecimento exato e experimental humano). Portanto, as condutas previstas nesse

diploma devem ser realizadas em procedimento de autorização60 e licenciamento

ambiental61. (FINK; ALONSO JR.; DAWALIBI, 2000, p. 113).

Elemento subjetivo é composto pelo dolo, não havendo modalidade

culposa. (PRADO, 2009, p. 319).

Entretanto, Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p 113) advertem que, se o

funcionário público solicitar ou receber vantagem indevida para fazer afirmação

falsa, omitir a verdade ou sonegar dados, responderá por corrupção passiva do art.

31762 do Código Penal, em concurso material, não se aplicando, nesse caso, o

princípio da subsunção.

No que tange à consumação, Milaré (2002, p. 192) propõe configurar-se

com a mera ação ou omissão, independentemente do resultado, bastando apenas o

perigo do dano ao meio ambiente para aperfeiçoar-se o crime.

Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p 113) entendem não ser possível a

tentativa63, haja vista tratar-se de delito formal. O crime consuma-se quando houver

a manifestação falsa, omissão da verdade ou sonegação de informações.

5.3.2 Análise individual do art. 67 da Lei Ambienta l

A Lei de Crimes Ambientais reza, em seu art. 67, a seguinte redação:

60 Autorização é ato administrativo discricionário, pelo qual se permite que o particular realize uma atividade ou se utilize de um bem ou serviço (MILARÉ, 2002, p. 193). 61 Licenças Ambientais são atos administrativos de controle preventivo de atividades de particulares no exercício de seus direitos (Prado, 2009, p. 318). 62 Brasil, Decreto-Lei n. 2.848, de 7.12.1940. Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. § 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa. 63 Nesse sentido Milaré (2002, p. 192) e Copola (2008, p.189). Contra Sirvinkas (2004, p. 225) e Prado (2009, p.319).

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Art. 67 . Conceder ao funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público: Pena-detenção, de um a três anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa.

O sujeito ativo é somente o funcionário público (delito próprio), pois se

trata de delito funcional; o sujeito passivo é o Estado (sujeito direto), e a coletividade

(sujeito indireto). (SIRVINKAS, 2004, p. 225).

O bem jurídico tutelado é a Administração Pública, particularmente ao

correto exercício da função administrativa e o meio ambiente (PRADO, 2009, p.

320).

Segundo Milaré (2002, p. 192), a objetividade jurídica é administração

pública ambiental que deve exigir do funcionário observância das normas

reguladoras da concessão da licença, autorização ou permissão64.

A conduta típica incriminadora (elemento objetivo) é a concessão irregular

de licença, permissão ou autorização. (MILARÉ, 2002, p. 193).

Nas palavras de Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 114), conceder é

outorgar, deferir ao agente algo que lhe foi solicitado por outrem. Desse modo, o

objeto da licença, autorização ou permissão deverá ser atividade, obra ou serviço,

cuja realização depende de anuência do Poder Público.

Entretanto, Copola (2008, p. 190) ressalta que o dispositivo é norma penal

em branco, haja vista que consiste em conceder licença, autorização ou permissão

em desacordo com as normas ambientais. Portanto, será imprescindível a edição de

outras normas ambientais que estabeleçam as exigências legais ou normativas e

que foram preteridas pelo funcionário público.

O elemento subjetivo do tipo é composto pelo dolo (caput, art. 67), que é

a consciência e a vontade de conceder o funcionário público licença, permissão e

autorização em desacordo com as normas ambientais. O dispositivo admite a

modalidade culposa. (PRADO, 2009, p. 319).

64 Permissão é o ato administrativo negocial, discricionário e precário, pelo qual o Poder Público faculta ao particular a execução de serviços de interesses coletivo, ou o uso especial de bens públicos, a título gratuito ou remunerado, nas condições estabelecidas pela Administração. (MILARÉ, 2002, p. 193).

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Quanto à consumação, Milaré (2002, p. 192) observa que a conduta

delitiva aperfeiçoa-se com a efetiva outorga ou deferimento pelo funcionário público

da autorização, concessão ou permissão, independentemente de ser executada ou

causar dano ao ambiente.

O dispositivo em análise é crime formal, pois independe do resultado,

configurando-se com a simples expedição do ato administrativo. (COPOLA, 2008,

p.191).

Milaré (2002, p. 193), Sirvinkas (2004, p. 226), Fink, Alonso Jr. e Dawalibi

(2000, p. 115) entendem não ser possível a tentativa,65 em razão de que o ato de

concessão é instantâneo, ainda que o ato venha a ser revisto ou anulado

posteriormente.

Importante destacar que, em relação a concurso e crimes, Fink, Alonso Jr.

e Dawalibi (2000, p 115) alertam que, se o funcionário, para conceder licença ou

autorização, faz afirmação falsa ou enganosa, omite a verdade ou sonega dados

técnicos ou científicos, pratica o crime previsto no art. 67 da Lei n. 9605/98, restando

o crime previsto no art. 66 absolvido. Embora o art. 66 prescreva pena mais rigorosa

(reclusão), as condutas mencionadas tornam-se crime-meio, ou meio de execução

para o crime de art. 67, que é a concessão indevida de licença ou autorização.

Quanto ao concurso de crimes entre a Lei Ambiental e o Código Penal, os

mesmo autores (2000, p. 115) salientam que, se o funcionário público receber ou

solicitar vantagem para a concessão indevida de licença, autorização ou permissão,

estará cometendo corrupção passiva (art. 317 do Código Penal) em concurso

material com o crime do art. 67 do diploma legal em comento. Nesse caso, diante

das condutas adotadas pelo sujeito ativo (funcionário público), ocorre a majoração

da pena final em razão da soma das penas dos crimes em concurso.

5.3.3 Análise individual do art. 68 da Lei Ambienta l

A Lei nº 9.605/1998 prescreve em seu art. 68:

65 Contra, Prado (2009, p. 321) admite, em tese, a tentativa.

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Art. 68 . Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental: Pena - detenção, de um a três anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa.

O sujeito ativo é qualquer pessoa (crime comum) que tiver o dever legal

ou contratual de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, inclusive o

funcionário público; e os sujeitos passivos são a coletividade e a Administração

Pública (PRADO, 2009, p. 322).

O bem jurídico tutelado é a Administração Pública, particularmente ao

correto exercício da função administrativa, e o meio ambiente. (PRADO, 2009, p.

322).

Ao analisar a objetividade jurídica do dispositivo, Milaré (2002, p. 192)

define ser a proteção do meio ambiente, em razão de não se permitir a omissão

daquele que tem o dever de preservá-lo.

A conduta típica incriminadora (elemento objetivo) é o núcleo do verbo

deixar (não fazer, abster-se) de obrigação de relevante interesse ambiental, sendo

imprescindível que o sujeito ativo possua o dever legal (imposto por lei) ou contratual

(advindo de contrato celebrado com o Poder Público ou particular). (PRADO, 2009,

p. 322).

Releva destacar que, a falta disciplinar ou a deficiência funcional, por si

só, não configuram o delito do art. 68 da Lei nº 9.605/98, assim como ocorre com o

delito de prevaricação (art. 319) previsto no Código Penal. (Copola, 2008, p. 191).

Todavia, Milaré (2002, p. 194) observa que o tipo previsto no art. 68 é

demasiadamente aberto, pois o significado de relevante interesse ambiental é

subjetivo, dificultando qualquer critério que possibilite fazer um diagnóstico preciso.

Ainda sobre o elemento normativo do tipo, assevera o doutrinador que a expressão

dever legal ou contratual é norma penal em branco.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo (caput, art.68), admitindo a forma

culposa (parágrafo único, art. 68).

Segundo Copola (2008, p. 192), o delito previsto no art. 68 é crime formal,

pois se consuma com a simples omissão do sujeito ativo, não sendo admitida a

forma tentada66.

66 Nesse sentido, Milaré (2002, p. 195), Prado (2009, p. 323), Sirvinkas (2004, p. 228) e Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 117).

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Quanto ao concurso de crimes entre a Lei Ambiental e o Código Penal,

Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 117) afirmam que, se o funcionário público

deixar de cumprir a obrigação relevante que lhe é imposta por lei, cometerá o delito

previsto no art. 68 da Lei nº 9.605/1998, e não o crime de prevaricação (art. 319 do

Código Penal), em razão da aplicação do critério da especialidade.

Nesse caso, cumpre registrar que a penalidade prevista no art. 68 da Lei

nº 9.605/1998 é mais rigorosa do que a prevista no crime de prevaricação,

mormente pela importância dada pelo legislador ao bem jurídico tutelado.

5.3.4 Análise individual do art. 69 da Lei Ambienta l

A Lei de Crimes contra o Meio Ambiente preceitua em seu art. 67, a

seguinte redação: “Art. 69. Obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público

no trato de questões ambientais: Pena - detenção, de um a três anos, e multa.”

O sujeito ativo é qualquer pessoa (crime comum), inclusive o funcionário

público; e os sujeitos passivos são o Poder Público num plano complementar à

coletividade. (MILARÉ, 2002, p. 196).

O bem jurídico tutelado é a Administração Pública, particularmente o

respeito ao princípio da autoridade, e o meio ambiente. (PRADO, 2009, p. 324).

Sobre a objetividade jurídica do dispositivo, Milaré (2002, p. 196) define

ser a administração pública ambiental.

Prado (2009, p. 324) assinala que a conduta típica incriminadora

(elemento objetivo) é o núcleo de dois verbos, quais sejam: obstar (impedir, causar

embaraço ou impedimento); e dificultar (tornar difícil ou custoso). Nesse caso,

incrimina-se a conduta de embaraço ou o empecilho que obstem a ação

fiscalizadora do Poder Público nas questões referentes ao meio ambiente.

Milaré (2002, p. 196) destaca que o dispositivo em comento é aberto, pois

a expressões obstar ou dificultar a ação fiscalizadora mostram-se por demais

imprecisas e genéricas, resultando em sério risco o princípio da certeza do direito.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo (caput, art. 68), não havendo

previsão legal para a forma culposa.

No que se refere à consumação, Prado (2009, p. 324) observa que a

conduta delitiva aperfeiçoa-se com a mera ação de obstar ou dificultar a fiscalização,

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independentemente da superveniência de qualquer resultado, inadmitindo a forma

tentada.67

Entretanto, Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 118) entendem que, por

se tratar de crime material, há possibilidade da forma tentada. Defendem que, se o

agente tentar obstar, mas não consiga impedir o exercício da ação fiscalizadora,

criando dificuldades para tanto, o crime estará consumado na conduta dificultar.

Contudo, caso o agente não consiga sequer dificultar a ação fiscalizadora, será

configurado a forma tentada.

Quanto ao concurso de crimes entre a Lei nº 9605/1998 e o Código Penal,

Fink, Alonso Jr. e Dawalibi (2000, p. 117) afirmam que, se o sujeito ativo empregar

violência ou ameaça para obstar ou dificultar a legal ação fiscal, estará cometendo o

crime de resistência68 (art. 329 e parágrafos do Código Penal), e não o crime em

análise.

Sobre esse entendimento dos doutrinadores, cumpre anotar que, no crime

do art. 329, caput, do Código Penal, a sanção cominada é mais branda do que o art.

69 da Lei nº 9.605/1998l, pois a pena no primeiro caso é de dois meses a dois anos

de detenção, não havendo multa. Já o art. 329, caput, do CP, prevê a mesma pena

base de detenção, sem aplicação de multa, o que parece um contrassenso. Por

outro lado, o § 1º, do art. 329, do Código Penal, prescreve a pena de reclusão de um

a três anos caso o ato, em razão da resistência não se executa. De outro modo, há

previsão da possibilidade de aplicação das penalidades correspondentes à violência,

se esta ocorrer (§ 2º, art. 329, CP).

67 Nesse sentido, Sirvinkas (2004, p. 231). Contra, Milaré (2002, p. 197) e Copola (2008, p. 192) que admitem a tentativa. 68 Brasil, Decreto-Lei nº 2.848, de 7.12.1940. Art. 329 - Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio: Pena - detenção, de dois meses a dois anos. § 1º - Se o ato, em razão da resistência, não se executa: Pena - reclusão, de um a três anos. § 2º - As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

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5.3.5 Análise individual do art. 69-A da Lei Ambien tal

A Lei Federal n. 11.284, de 2 de março de 2006, acrescentou o art. 69-A

na Lei de Crimes Ambientais.

Destarte, o art. 69-A da Lei n. 9.605/1998 prescreve a seguinte redação:

Art. 69-A . Elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão: Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. § 1o Se o crime é culposo: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. § 2o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se há dano significativo ao meio ambiente, em decorrência do uso da informação falsa, incompleta ou enganosa.

O sujeito ativo é a pessoa encarregada (técnico ou funcionário) de

elaborar estudo, relatório ou laudo; e o sujeito passivo são o Poder Público e a

coletividade. (PRADO, 2009, p. 325).

No entanto, Copola (2008, p. 195) acrescenta que será crime comum,

quando apresentado documento por qualquer pessoa, e funcional no ato de

elaborar, porque este é praticado somente por funcionário público.

A conduta típica incriminadora (elemento objetivo) é constituída por dois

verbos, quais sejam: elaborar (fazer, confeccionar) ou apresentar (entregar,

oferecer, mostrar) em sede de licenciamento69, concessão florestal70 ou qualquer

outro procedimento administrativo, estudo71, laudo72 ou relatório ambiental.73

(COPOLA, 2008, p. 195).

69 Brasil, Resolução n. 237, de 19.12.1997 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA. Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições: I - Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. [...]. 70Brasil, Lei Federal n. 11.282, de 2.03.2006. Art. 3o Para os fins do disposto nesta Lei, consideram-se: [...] VII - concessão florestal: delegação onerosa, feita pelo poder concedente, do direito de praticar manejo florestal sustentável para exploração de produtos e serviços numa unidade de manejo, mediante licitação, à pessoa jurídica, em consórcio ou não, que atenda às exigências do respectivo edital de licitação e demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado; [...]. 71 Brasil, Resolução n. 237, de 19.12.1997 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA. Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições: [...] III - Estudos Ambientais: são todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais relacionados à localização, instalação, operação e ampliação de uma atividade ou empreendimento, apresentado como subsídio para a análise da licença requerida, tais como: relatório ambiental, plano e projeto de controle

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85

O bem jurídico tutelado é a Administração Pública ambiental,

particularmente ao seu correto funcionamento, e o meio ambiente (PRADO, 2009, p.

322).

Entretanto, Milaré (2009, p. 1010) tece uma série de críticas ao dispositivo

em comento. Segundo o autor, um dos grandes problemas reside na possibilidade

de um empreendedor ser incriminado conjuntamente por erro cometido pela

empresa contratada para apresentar o estudo reputado enganoso ao órgão

competente. Igualmente, critica a expressão “dano significativo”, a que alude o §2º

do artigo em comento, por ser demasiadamente subjetivo.

Nessa linha de raciocínio, Copola (2008, p. 196) esclarece que, na

hipótese do §2º, se há dano significativo ao meio ambiente, este deverá ser

constatado por meio de laudo pericial.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo (caput, art.69-A), admitindo a forma

culposa (§1º, art. 69-A).

Segundo Copola (2008, p. 196), o delito previsto no art. 69-A é crime

formal, pois se configura com a ação de elaborar ou apresentar, sendo admitida a

forma tentada74.

ambiental, relatório ambiental preliminar, diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise preliminar de risco. 72 Laudo ambiental é um parecer escrito, elaborado por um perito, sobre matéria ambiental submetida à sua apreciação, “contendo exposição das operações e ocorrências da diligência, respondendo aos quesitos formulados e apresentando suas conclusões”.(elemento extrajurídico do tipo) . (PRADO, 2009, p. 327, grifo autor). 73 Prado (2009, p. 327) define relatório ambiental como: [...] documento que visa a avaliar as interações da implantação ou da operação de uma atividade real ou potencialmente poluidora com o meio ambiente. [...]. 74 Nesse sentido, Prado (2009, p. 323) admite tentativa para as modalidades comissivas dolosas.

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6 CONCLUSÃO

A pesquisa apresenta um estudo acerca dos crimes funcionais praticados

contra o meio ambiente à luz da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais - LCA),

por agentes ou funcionários públicos, responsáveis pelo exercício do poder de

polícia ambiental.

O legislador constituinte erigiu o meio ambiente a categoria de bem de

uso comum do povo e essencial a qualidade de vida, impondo ao Poder Público e

aos cidadãos o dever de protegê-la e defendê-la, reservando-lhe um artigo

específico na Constituição Federal de 1988 (art. 225 e §§).

Com efeito, o meio ambiente ecologicamente equilibrado passou a ser

considerado como direito fundamental (art. 1.º, III, da CF), indispensável à

preservação da dignidade humana, visto que constitui bem essencial à sadia

qualidade de vida (art. 225, caput, CF), ensejando, sobremaneira, na necessidade

imperiosa de uma proteção jurídica eficaz e efetiva.

Desse modo, o meio ambiente jungido à categoria de valor fundamental

como pressuposto ao exercício do direito a uma vida digna e com qualidade, a sua

proteção pela tutela penal é medida diametralmente necessária, mormente pelo

estágio avançado de degradação do nosso planeta e a escassez dos recursos

naturais.

Nessa linha, a tutela penal justifica-se por incidir sobre dois pressupostos

que justificam sua intervenção na proteção e preservação do meio ambiente, quais

sejam, o da fragmentariedade e o da subsidiariedade, ambos decorrentes do

princípio da intervenção mínima do Direito Penal. Portanto, o primeiro diz respeito à

necessidade da tutela penal em razão da elevada dignidade e valor do bem

ambiental, cuja proteção relaciona-se com sobrevivência da própria espécie humana

sobre o planeta. O segundo pressuposto relaciona-se com a exigência de uma tutela

mais rigorosa, na medida em que as demais formas de tutela são insuficientes para

a proteção do bem ambiental.

Contudo, ao lado da necessidade da tutela penal ambiental, bem como a

par dos princípios do Direito Ambiental, não se pode olvidar a observância aos

princípios inerentes ao Direito Penal, máxime o seu poder punitivo, baseados no

Estado Democrático de Direito.

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Entretanto, consoante analisado no segundo capítulo, constatou-se que

os modelos de tutela protetiva do meio ambiente, anteriores à Constituição de 1998,

eram regulados no ordenamento jurídico brasileiro em leis e normas esparsas e de

difícil aplicação. Tal modelo representava a pouca importância dispensada ao meio

ambiente, que era tratado, basicamente, como bem de propriedade individual. Em

1981, foi editada a Lei Federal nº 6.938/1981, recepcionada pela Constituição de

1988, que institui a Política Nacional do Meio Ambiente, estabelecendo princípios,

diretrizes, entre outras, para a proteção do meio ambiente. Contudo, foi com a

promulgação da Constituição de 1988 que houve um marco importante da tutela

ambiental ao tratar sobre a matéria num capítulo específico (Capítulo VI – Do Meio

Ambiente), erigindo o meio ambiente a bem de natureza difusa, ao consagrar como

bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, impondo ao Poder

Público e aos cidadãos o dever de preservá-la e defendê-la, estabelecendo,

inclusive, a tríplice responsabilidade (administrativa, civil e penal) para aos

transgressores (pessoas físicas ou jurídicas) pelas condutas e atividades lesivas ao

meio ambiente.

Com o advento da Lei 9.605/1998, o legislador infraconstitucional buscou

sistematizar as condutas delitivas praticadas meio ambiente, voltadas à ideia de

prevenção, de forma a coibir condutas agressivas ao meio ambiente. Isso porque,

uma vez praticadas, podem causar danos irremediáveis e irreparáveis.

Em que pese as duras críticas apontadas pelos doutrinadores acerca da

Lei nº 9.605/1998, os mesmos autores convergem para um ponto em comum: a Lei

de Crimes Ambientais representa um grande e importante avanço na tutela protetiva

do meio ambiente, sendo, portanto, indispensável em nosso ordenamento jurídico.

De fato, no que tange a tutela penal ambiental, a nova lei fez importantes

inovações ao inserir no nosso ordenamento jurídico, novos tipos penais de condutas

e atividades que lesionem o meio ambiente, bem como transformam algumas

contravenções em crimes e descriminalizam outras. Outra importante inovação foi a

reparação do dano ambiental como condição para a possibilidade de transação

penal e suspensão condicional do processo.

Nesse ensejo, a Lei nº 9.605/1998 tipificou as condutas funcionais

praticadas contra a administração ambiental em uma seção própria (Seção Dos

Crimes contra a Administração Ambiental), tema central da Monografia.

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Antes do advento da Lei de Crimes Ambientais, os crimes funcionais

eram tipificados basicamente no Código Penal, previstos num capítulo próprio

(Capítulo I – Dos Crimes Praticados por Funcionário Público Contra a Administração

em Geral). Portanto, o funcionário público respondia por crimes previstos no Código

Penal, cujos delitos encontram-se estabelecidos nos arts. 312 e seguintes.

Destarte, conclui-se da pesquisa que a Lei de Crimes Ambientais inovou

ao cuidar dos crimes praticados contra a administração ambiental, ao dispor de

cinco artigos específicos (art. 66 a 69-A), incriminando condutas praticadas por

agentes ou funcionários no exercício do poder de polícia ambiental.

Desse modo, o Código Penal passou a ser aplicado subsidiariamente em

razão do princípio da especialidade. Contudo, em alguns casos verifica-se que

poderá ocorrer o concurso material de crimes, ou seja, aplicando-se as condutas

previstas na Lei de Crimes Ambientais conjuntamente com as condutas do Código

Penal. É o caso dos arts. 66 e 67 da Lei nº 9.605/1998 que pode ser aplicado em

concurso material com o crime previsto no art. 317 do Código Penal (corrupção

passiva). Nesses casos, diante das condutas adotadas pelo sujeito ativo (funcionário

público) ocorre a majoração da pena final, em razão da soma das penas dos crimes

em concurso. Entretanto, tal assertiva não ocorre no caso de art. 69 (obstar ou

dificultar a ação fiscalizadora), pois, segundo estudo doutrinário, havendo emprego

de violência, e o sujeito ativo empregar violência ou ameaça para obstar ou dificultar

a legal ação fiscal, ele estará cometendo o crime de resistência (art. 329 e

parágrafos do Código Penal), e não o crime do diploma legal em comento, o que se

entende parecer um contrassenso. Isso porque o art. 69 da LCA prevê pena de

reclusão e multa; em contrapartida, o art. 329, caput, do CP não prevê sanção de

multa.

Nesse contexto protetivo, verifica-se que o exercício do poder de polícia

ambiental é indispensável à tutela do meio ambiente. Conforme abordado no

Capítulo 4, constatou-se que o poder de polícia ambiental é exercido pelos agentes

ou funcionários que integram os órgãos (federias, estaduais e municipais) que

compõe o SISNAMA. Portanto, tais agentes ou funcionários públicos, responsáveis

pela fiscalização, licenciamento, permissão ou autorização ambiental, aplicações de

sanções administrativas, cumprir e fazer cumprir as normas ambientais, dentre

outras atribuições não menos importantes, exercem um papel fundamental na

proteção do meio ambiente. Com efeito, extrai-se do caput do art. 225 da

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Constituição Federal a regra imperiosa a qual incumbe ao Poder Público o dever de

preservar e proteger o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Por

essa razão, exige-se da Administração Pública a máxima seriedade e eficiência no

seu exercício, pautados nos princípios da moralidade, legalidade, publicidade e

eficiência, de forma a evitar danos ao meio ambiente e à sociedade.

No entanto, o cenário nacional não é muito animador. Sob a égide da

legalidade e do licenciamento, da autorização ou da permissão do Poder Público,

muitas atividades lesivas são praticadas contra o meio ambiente, inclusive,

instalação e funcionamento de vultosos empreendimentos, cujo impacto é

irremediável ou irreparável, em detrimento da sociedade que se vê usurpada de um

bem essencial a uma vida digna e com qualidade, bem como do próprio bem

juridicamente tutelado. Ademais, muitas atividades são praticadas ilegalmente, sem

que se exerça efetivamente o poder de polícia ambiental, quer por motivo ou

interesse pessoal do funcionário, ou cedendo a pedido ou “pressão” de terceiros. Por

outro lado, não há, por parte do Poder Público, um controle rigoroso e efetivo da

responsabilidade administrativa (autuações) por lesão ao meio ambiente. Do mesmo

modo, depara-se com órgãos poucos carentes de equipados e de recursos humanos

(profissionais habilitados em diversas áreas ligadas ao meio ambiente, ex. biólogo,

engenheiros florestal, ambiental, químico, civil, agrônomo, médico veterinário,

advogado, técnicos, etc.), quando não, com funcionários ou agentes públicos

despreparados. Outro fator relevante a destacar é atinente às investiduras dos

agentes públicos sem aprovação prévia em concurso público, deixando-os sujeitos à

instabilidade na relação de trabalho ou das designações e, portanto, não poderão

exercer a referida atribuição com maior eficácia, em função das pressões políticas e

financeiras.

Desse modo, se faz premente criminalizar as condutas praticadas por

agentes ou funcionários públicos investidos de poder de polícia administrativa, no

exercício de suas funções e atribuições contra o meio ambiente e a administração

pública. E, nessa linha, a Lei nº 9.605/1998 não poderia ser mais oportuna ao

criminalizar condutas praticadas por agentes ou funcionários públicos no exercício

do poder de polícia ambiental.

Infelizmente, observou-se que a doutrina quanto à matéria é escassa, do

que se infere haver pouca importância ao tema.

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Não obstante, a tutela penal ambiental, notadamente aos crimes contra a

administração ambiental, deve ser aplicada rigorosamente para que o poder de

polícia ambiental seja exercido de forma eficiente e eficaz, em total respeito ao

preceito esculpido no caput do art. 225 da Constituição Federal, que impõe ao Poder

Público o dever de preservar e defender o meio ambiente para as presentes e

futuras gerações.

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