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KELI CRISTINA CONTI DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE PROFESSORES EM CONTEXTOS COLABORATIVOS EM PRÁTICAS DE LETRAMENTO ESTATÍSTICO CAMPINAS 2015

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KELI CRISTINA CONTI

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DEPROFESSORES EM CONTEXTOS

COLABORATIVOS EM PRÁTICAS DE LETRAMENTOESTATÍSTICO

CAMPINAS2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

KELI CRISTINA CONTI

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DEPROFESSORES EM CONTEXTOS COLABORATIVOS EM

PRÁTICAS DE LETRAMENTO ESTATÍSTICO

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho

Tese de Doutorado apresentada ao Programa dePós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da UniversidadeEstadual de Campinas, para obtenção do título de Doutora em Educação, naárea de concentração Ensino e Práticas Culturais.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESEDEFENDIDA PELA ALUNA KELI CRISTINA CONTIE ORIENTADA PELA Prof.ª Dr.ª DIONE LUCCHESI DE CARVALHO

Assinatura do Orientador

CAMPINAS2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINASFACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

D DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DEPROFESSORES EM CONTEXTOS COLABORATIVOS EM

PRÁTICAS DE LETRAMENTO ESTATÍSTICO

Autora: Keli Cristina ContiOrientadora: Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho

ANO2015

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RESUMO

Esta pesquisa buscou compreender as aprendizagens e o desenvolvimentoprofissional de professores e futuros professores da Educação Infantil e dosanos iniciais do Ensino Fundamental na perspectiva do letramento estatísticoem contextos colaborativos. Tais contextos se constituíram a partir da formaçãode um grupo de professores, futuros professores e uma pesquisadora, que sereuniram de setembro de 2010 a dezembro de 2011, num total de 20encontros, para estudar a Estatística. O estudo também objetivou - a partir daspráticas letradas - contribuir para o desenvolvimento profissional dosparticipantes, no que diz respeito ao conhecimento, evidenciando o letramentoestatístico, buscando responder a seguinte questão: “Que indícios dedesenvolvimento profissional apresentam os professores e futuros professoresda Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental em contextoscolaborativos em práticas de letramento estatístico?”. No percurso da pesquisaforam utilizados, entre outros autores, aportes teóricos de Barton e Hamilton(2004), Street (2003; 2004; 2008) e Rojo (2009; 2010) relativos ao letramento;Batanero (2001; 2002; 2013); Gal (2002), Watson (2002; 2006) e Lopes (1998;2008; 2011) relativos à Educação Estatística e ao letramento estatístico; no quediz respeito ao desenvolvimento profissional, nossos principais aportes foramPassos et al (2006), Ponte (1995; 2011) e Fiorentini (2009; 2010; 2011), alémde Hargreaves (1998) para compreender nosso contexto colaborativo. Emabordagem qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994), este é um estudo de caso(PONTE, 2006; LUDKE e ANDRE, 1986) composto pelos participantes dogrupo Estatisticando. A opção pela forma narrativa ocorreu depois daobservação e da descrição dos dados (vídeos, diário de pesquisa e outrosmateriais trazidos pelos participantes), e da escolha de alguns momentosvideogravados que, após transcritos, foram analisados à luz do referencialteórico, segundo três eixos de análise: 1) Complexidade do desenvolvimentoprofissional; 2) Colaboração e; 3) Letramento(s). Embora a escrita e ocompartilhamento de experiências pelos participantes não tivessem sidoexigências, esse processo ocorreu e ganhou força se prolongando para alémdos encontros do grupo, tendo gerado a publicação de textualizaçõesnarrativas, artigo e a participação em eventos. O contexto colaborativo criado eo percurso do grupo de estudos também evidenciaram que os professores efuturos professores podem ser investigadores da própria prática e, com isso, sedesenvolverem profissionalmente. Mas, para tanto, necessitam de parcerias,sendo que o contexto colaborativo pode ser um bom alicerce parareflexões/ressignificações compartilhadas. Ressaltamos também que aformação continuada deve ser uma condição de trabalho do professor, quepode ajudá-los nas práticas do cotidiano docente, reconhecendo sua práticapedagógica como ponto de partida; valorizando sua formação e, em especial, aestatística; respeitando suas singularidades e potencialidades; possibilitando aampliação dos conhecimentos e considerando suas necessidades numcontexto colaborativo.

Palavras-chave: Educação. Estatística – Estudo ensino. Letramento.Formação de professores. Ensino Fundamental. Desenvolvimento profissionaldo professor.

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ABSTRACT

This research sought to understand the practices of learning and professionaldevelopment of teachers and future teachers of the first years of ElementarySchool from the perspective of statistical literacy in collaborative contexts. Suchcontexts were constituted from the formation of a group of teachers, futureteachers and a researcher, who met from September 2010 to December 2011,in a total of 20 meetings to study the Statistics. The study also aimed tocontribute to the professional development of participants, from literacypractices, in relation to knowledge and showing the statistical literacy, seekingto answer the following question: "What professional development indices ofteachers and future teachers have of the early years of Elementary School incollaborative contexts of statistical literacy practices?". During the researchthere were used theoretical contributions, among other authors, from Bartonand Hamilton (2004), Street (2003; 2004; 2008) and Rojo (2009; 2010) inrelation to literacy; Batanero (2001; 2002; 2013); Gal (2002), Watson (2002;2006) and Lopes (1998; 2008; 2011) in relation to Statistical Education andStatistical Literacy; in relation to professional development, our maincontributions were from Passos et al (2006), Ponte (1995; 2011) and Fiorentini(2009; 2010; 2011), besides Hargreaves (1998) to understand our collaborativecontext. In a qualitative approach (BOGDAN; BIKLEN, 1994), this is a studycase (PONTE, 2006; LUDKE and ANDRE, 1986) composed by participants ofthe group “Statisticizing”. The choice of narrative form occurred after theobservation and description of the data (videos, journal and other materialsbrought by the participants), and the choice of some videotaped moments weretranscript to be analyzed in the light of the theoretical framework, in accordanceto three axes of analysis: 1) Complexity of professional development; 2)Collaboration and; 3) Literacy. Although the writing and the sharing ofexperiences by the participants were not requirements, this process gainedstrength and extended beyond the group meetings, generating the publicationof narratives, an article and participation in events. This collaborative contextand the way of the study group also showed that teachers and future teacherscould be researchers of the practice and thereby develop themselvesprofessionally. However, they need partnerships, and collaborative context canbe a good foundation for reflections / shared reinterpretation. We alsoemphasize that continuing education should be a teachers working condition,helping them in the practices of everyday teaching and recognizing theirpedagogic practice as a starting point; valuing their graduation and, inparticular, the statistics; respecting their peculiarities and potential; enabling theexpansion of knowledge and considering their needs in a collaborative context.

Keywords: Education; Statistics – Study and teaching ; Literacy; Teachertraining; Elementary school; Teacher professional development.

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RESUMEN

Esta investigación buscó comprender aprendizajes y el desarrollo profesionalpara profesores y futuros profesores de Educación Infantil y de los primerosaños de la Escuela Primaria en la perspectiva de la cultura estadística encontextos de colaboración. Tales contextos constituyen a partir de la formaciónde un grupo de profesores, profesores futuros y un investigador, que sereunieron desde septiembre de 2010 hasta diciembre de 2011, en un total de20 reuniones para estudiar las estadísticas. El estudio también apunta – desdelas prácticas de alfabetización - contribuir al desarrollo profesional de losparticipantes, con respecto al conocimiento, que muestra la cultura estadística,tratando de responder a la siguiente pregunta: "¿Qué índices de desarrolloprofesional tienen los profesores y futuros profesores de Educación Infantil y delos primeros años de la Escuela Primaria en contextos de colaboración enprácticas de alfabetización estadística?”. En el curso de la investigación seutilizaron, entre otros autores, contribuciones teóricas de Barton y Hamilton(2004), Street (2003; 2004; 2008) y Rojo (2009; 2010) relativos a laalfabetización; Batanero (2001; 2002; 2013); Gal (2002), Watson (2002; 2006) yLopes (1998; 2008; 2011) con relación a las estadísticas de la educación y laalfabetización estadística; en relación con el desarrollo profesional, nuestrosprincipales contribuciones fueron Passos et al (2006), Ponte (1995; 2011) yFiorentini (2009; 2010; 2011) además de Hargreaves (1998) para entendernuestro contexto colaborativo. En una aproximación cualitativa (BOGDAN;BIKLEN, 1994), se trata de un estudio de caso (PONTE, 2006; LÜDKE yANDRE, 1986) compuesto por participantes del grupo “Estatisticando”. Laelección de la forma narrativa se produjo después de la observación ydescripción de los datos (vídeos, diarios y otros materiales traídos por losparticipantes), y la elección de algunos momentos en video después de lastranscripciones se analizaron con base en el marco teórico, de acuerdo contres análisis: 1) Complejidad del desarrollo profesional; 2) Colaboración y; 3)Alfabetización. Aunque la escritura y el intercambio de experiencias entre losparticipantes no eran requisitos, este proceso ganó fuerza y se extendió másallá de las reuniones de grupo y generó la publicación de relatos, de artículos yla participación en eventos. El entorno colaborativo creado y el grupo deestudio de la ruta también mostró que los profesores y futuros profesorespueden ser investigadores de la práctica y de esta manera desarrollarprofesionalmente. Pero para esto necesitan colaboraciones, y el contexto decolaboración puede ser una buena base para las reflexiones / reinterpretacióncompartida. También destacamos que la formación continua debe ser unacondición de trabajo del profesor, ayudándole en las prácticas de la enseñanzadiaria y el reconocimiento de su práctica como punto de partida; la valoraciónde su formación y, en particular, las estadísticas; respetando su singularidad ypotencial; permitiendo la expansión del conocimiento; y teniendo en cuenta susnecesidades en un contexto de colaboración.

Palabras clave: Educación; Estadística - Estudio y la enseñanza; Laformación del profesorado; Escuela primaria; Desarrollo profesional docente.

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Desenvolvimento profissional de professores em contextos colaborativosem práticas de letramento estatísticos

Sumário

Apresentação .............................................................................................................. 1

1 - Introdução .............................................................................................................. 3

1.1. Retomando algumas questões ............................................................................ 3

1.2. Novas problemáticas ........................................................................................... 9

2 – O letramento e o letramento estatístico ............................................................ 21

2.1. Letramento(s) .................................................................................................... 21

2.2. Novos estudos do letramento ............................................................................ 23

2.3. Multiletramentos ................................................................................................ 26

2.4. Letramento estatístico ....................................................................................... 31

3 – Complexidade do desenvolvimento profissional na formação de professores.......................................................................................................................... 37

3.1. Formação de professores.................................................................................. 37

3.2. Complexidade do desenvolvimento profissional de professores ........................ 39

3.3. Complexidade do conhecimento necessário para ensinar Estatística................ 43

3.4. Contexto colaborativo ........................................................................................ 48

4 – Metodologia da investigação ............................................................................. 51

4.1. Ponto de partida ................................................................................................ 51

4.2. O grupo de estudos ........................................................................................... 58

4.3. Os participantes do Estatisticando .................................................................... 60

4.4. O papel da pesquisadora................................................................................... 62

4.5. Temas estatísticos de estudo ............................................................................ 63

4.6. Eixos de análise ................................................................................................ 73

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5 – Narrativas do trabalho de campo – contexto de desenvolvimento num grupocolaborativo ..................................................................................................... 77

5.1. Pontapé inicial ................................................................................................... 77

5.2. O conceito de letramento estatístico.................................................................. 81

5.3. Situação pedagógica desenvolvida com crianças da Educação Infantil ............ 86

5.4. O trabalho com a Estatística na Educação Infantil ............................................. 91

5.5. Análise do material disponibilizado por uma participante................................... 94

5.6. Estudo de conceitos básicos I.......................................................................... 101

5.7. Estudo de conceitos básicos II......................................................................... 110

5.8. Momento de avaliar ......................................................................................... 115

5.9. Reinício dos trabalhos – 2011.......................................................................... 117

5.10. Estudo de conceitos básicos III........................................................................ 120

5.11. Estudo de conceitos básicos IV ....................................................................... 126

5.12. Estudo de conceitos básicos V ........................................................................ 129

5.13. Estudo de conceitos básicos VI ...................................................................... 136

5.14. Análise de situação pedagógica de livro didático............................................. 141

5.15. Análise da circulação de ideias estatísticas em sala de aula ........................... 145

5.16. Situações didáticas que levantaram dúvida ..................................................... 152

5.17. Discussão do trabalho realizado por Mie ......................................................... 163

5.18. Planejamento do segundo semestre de 2011.................................................. 168

5.19. Situações pedagógicas para a sala de aula I................................................... 172

5.20. Situações pedagógicas para sala de aula II .................................................... 175

5.21. Situações pedagógicas de Estatística num livro didático de 1.º ano do Ensino

Fundamental.................................................................................................... 177

5.22. Situações pedagógicas de Estatística num livro didático de 1.º e 2.º anos do

Ensino Fundamental........................................................................................ 181

5.23. A finalização o ano .......................................................................................... 185

5.24. Retomada dos eixos de análise....................................................................... 189

6 – Análises narrativas dos professores e futuros professores – potencializandoo desenvolvimento profissional ................................................................... 199

6.1. As análises narrativas de Mie ......................................................................... 204

6.2. O trabalho de Roseli ...................................................................................... 210

6.3. As análises narrativas de Eduardo ................................................................. 215

6.4. As análises narrativas de Rosana e suas parceiras ........................................ 225

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6.5. Potencializando o desenvolvimento profissional .............................................. 227

Considerações finais sobre o desenvolvimento profissional – O caso doEstatisticando ................................................................................................ 233

Referências bibliográficas ..................................................................................... 239

Apêndice A – Termo de consentimento ................................................................ 255

Apêndice B – enviado ................................................................................. 257

Apêndice C – Ficha de identificação ..................................................................... 259

Apêndice D – Excertos de Conti (2009)................................................................. 261

Anexo 1 – Metas curriculares - Portugal ............................................................... 267

Anexo 2 – Expectativas de aprendizagem - NCTM ............................................... 271

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"Visitante mui amigo,pode entrar, a casa é suaAh! É tão bom nesta vida

Abrir a porta da ruaComo quem abre num abraçoFazendo assim como o façoEntre a gosto, a casa é sua."

(Rachel de Queiróz)

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Agradecimentos

Acima de tudo, a Deus!

Fui muito bem acompanhada neste percurso.

Os agradecimentos são muitos:

À professora Dione, minha orientadora desde o mestrado,

pela dedicação na orientação, pelas lições e pela amizade...

À professora Carolina Fernandes de Carvalho, pelo apoio e pela atenção com

que coordenou meu estágio na Universidade de Lisboa, possibilitando troca de

experiências, participação em seminários, grupos de pesquisa e eventos

acadêmicos.

Ao professor Dario Fiorentini, pelas valiosas contribuições.

Aos professores participantes do grupo de estudos Estatisticando, sem os

quais esta pesquisa não se realizaria, e às Faculdades Atibaia, por apoiarem a

realização dos encontros.

Às professoras participantes da banca de qualificação, Carmen L. B. Passos e

Regina C. Grando, que contribuíram muito em nossas reflexões e puderam

continuar a contribuir conosco na defesa; e aos demais participantes da banca

de defesa: Priscila D. de Azevedo e Dario Fiorentini.

Aos colegas dos “novos” e dos “velhos” tempos do grupo Prática Pedagógica

em Educação Matemática (Prapem), pelo apoio nos diversos momentos e

pelas contribuições dadas ao trabalho e ao crescimento acadêmico.

Aos familiares,

pelo apoio e pela compreensão nas minhas ausências.

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A Maurício,

por aceitar compartilhar comigo todos os desafios e conquistas desta fase.

Aos amigos professores de Águas de Lindóia, em especial à Du, que, mesmo

de longe, sempre manifestaram carinho e apoio.

A CAPES, pela concessão da bolsa de estudos e da bolsa do Programa de

Doutorado Sanduiche no Exterior (PDSE).

Aos funcionários da Faculdade de Educação da Unicamp,

que, com simpatia e disponibilidade, sempre me atenderam com atenção e

acolhimento.

À revisora Leda.

Enfim...

A todos e todas que fizeram e fazem parte da minha caminhada, por me

ajudarem a ser a professora que sou hoje.

Cada um deixou uma marca, à sua maneira.

Quisera poder abraçar a todos, mencionados ou não, e expressar minha

gratidão!

Meu muito obrigada!

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Representação de prática e evento de letramento na perspectiva ideológica.

Figura 2: Dinâmica de significados na Pedagogia dos Multiletramentos.

Figura 3: Modelo de letramento estatístico baseado em Gal (2002) e Budgett ePfannkuch (2007).

Figura 4: Participantes do grupo Estatisticando.

Figura 5: Dinâmica de trabalho e pesquisa de grupos colaborativos.

Figura 6: O entrelaçamento entre os materiais estudados e os conhecimentoselencados por Shulman (1987)

Figura 7: Sucos conhecidos pelas crianças de 3 anos

Figura 8: Gráfico dos sucos conhecidos pelas crianças de 3 anos

Figura 9: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (I)

Figura 10: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (II)

Figura 11: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (III)

Figura 12: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (IV)

Figura 13: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (V).

Figura 14: Gráficos apontados por Eduardo.

Figura 15: Dados geradores do gráfico de ramos e folhas

Figura 16: Gráfico de ramos e folhas

Figura 17: Histograma levado para o encontro

Figura 18: Gráfico de linha usado inadequadamente

Figura 19: Círculos para a confecção de gráfico de setores

Figura 20: Montagem do gráfico de setores usando círculos

Figura 21: Gráfico de setores apresentando a quantidade de meninos e meninas

Figura 22: Gráfico de setores representando uma quantidade maior de

Figura 23: Ampliação do número de círculos para construção do gráfico de setores

Figura 24: Gráfico de pizza “humano”.

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Figura 25: Eixos para a confecção de um gráfico de colunas

Figura 26: Gráfico da quantidade de animais de estimação, por família I

Figura 27: Gráfico da quantidade de animais de estimação, por família II

Figura 28: Gráfico da quantidade de animais de estimação, por família III

Figura 29: Exemplo de preenchimento de gráfico

Figura 30: Exemplo de como deveria ser apresentado o gráfico no quadro de giz

Figura 31: Parte do gráfico que suscitou discussão entre as crianças

Figura 32: Participantes presentes no encontro de 15/06/2011

Figura 33: Situação pedagógica discutida pelos participantes do grupo I

Figura 34: Situação pedagógica discutida pelos participantes do grupo II

Figura 35: Modelos de roletas usadas no jogo

Figura 36: Situação pedagógica discutida pelos participantes do grupo III

Figura 37: Situação pedagógica discutida pelos participantes IV

Figura 38: Situação pedagógica discutida pelos participantes V

Figura 39: Alguns participantes do grupo e o gráfico apresentado por Mie

Figura 40: Gráfico construído pelas crianças com Mie

Figura 41: Quadro construído por Mie e as crianças, sistematizando os dados

Figura 42: Matriz para a construção de um gráfico com a turma

Figura 43: Gráfico de barras

Figura 44: Pôster apresentado por Roseli em Congresso de Iniciação Científica

Figura 45: Participação das crianças na construção do gráfico

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Síntese das teorias NLS e Multiletramentos

Quadro 2: Dados dos participantes do grupo Estatisticando

Quadro 3: Encontros do Grupo Estatisticando

Quadro 4: Presença dos participantes em relação ao semestre.

Quadro 5: Situação pedagógica de Estatística com crianças de 3 anos

Quadro 6: Cálculo de mediana das idades dos participantes

Quadro 7: Número do calçado mais comum

Quadro 8: E-mail enviado ao grupo

Quadro 9: E-mail enviado aos participantes do grupo

Quadro 10: Eixos de análise – percurso do grupo

Quadro 11: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala de Silvana

Quadro 12: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala de Eduardo

Quadro 13: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala de Rosana

Quadro 14: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala dosparticipantes

Quadro 15: Trecho da primeira versão do plano de aula apresentado por Mie.

Quadro 16: Trecho da versão final do plano de aula apresentado por Mie.

Quadro 17: Apresentação da primeira proposta de escrita de Mie

Quadro 18: Primeiro arquivo com a proposta de escrita de Mie

Quadro 19: Trecho da análise narrativa publicada

Quadro 20: Último e-mail enviado por Mie às pesquisadoras

Quadro 21: Primeiro Relatório de Iniciação Científica de Roseli

Quadro 22: Segundo relatório de Iniciação Científica de Roseli

Quadro 23: Resultados da IC de Roseli, publicada

Quadro 24: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 06/10/2011

Quadro 25: Apresentação da primeira proposta de análise narrativa por Eduardo

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Quadro 26: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 14/10/2011 (I)

Quadro 27: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 14/10/2011(II)

Quadro 28: Movimento de escrita e reescrita da primeira análise narrativa de Eduardo

Quadro 29: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 20/02/2012.

Quadro 30: Trecho de análise narrativa publicada

Quadro 31: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 16/03/2012

Quadro 32: Trecho de narrativa publicada

Quadro 33: Carta produzida pelo estudante M.(sic)

Quadro 34: Trecho da primeira análise narrativa produzida por Rosana e suasparceiras I

Quadro 35: Trecho da primeira narrativa produzida por Rosana e suas parceiras II

Quadro 36: Trecho da segunda análise narrativa produzida por Rosana e suasparceiras

Quadro 37: Eixos de análise – escrita dos participantes do Estatisticando

Quadro 38: Entrelaçamentos dos eixos de análises – escrita dos professores

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Idade dos participantes para cálculo envolvendo a média

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Desenvolvimento profissional de professores em contextos colaborativosem práticas de letramento estatístico

Apresentação

Esta pesquisa buscou identificar e sistematizar indícios do

desenvolvimento profissional de professores e futuros professores da

Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental quando estão

num contexto colaborativo e são instigados a trabalhar com Estatística numa

perspectiva de letramento(s), caminhando em direção ao letramento estatístico.

O texto está organizado em seis capítulos. O primeiro traz uma pequena

introdução, retomando algumas questões em relação a minha trajetória

acadêmica e profissional e partindo das discussões que a pesquisa de

mestrado “O papel da Estatística na inclusão de alunos da Educação de

Jovens e Adultos em atividades letradas” (CONTI, 2009) levantou, com relação

à Estatística, ao letramento e ao trabalho colaborativo. Apresenta também uma

proposta de formação de professores em contexto colaborativo, com a criação

de um grupo chamado Estatisticando, e uma forma de ensinar Estatística, na

perspectiva de letramento. Esse capítulo ainda anuncia a questão norteadora:

“Que indícios de desenvolvimento profissional apresentam os professores e

futuros professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino

Fundamental em contextos colaborativos em práticas de letramento

estatístico?”.

Ao segundo capítulo cabe fazer uma discussão teórica sobre o

letramento e o letramento estatístico.

O capítulo seguinte discute a complexidade do desenvolvimento

profissional na formação de professores e, mais especificamente, a

complexidade do conhecimento necessário para ensinar Estatística.

O quarto capítulo expõe as opções metodológicas da pesquisa de

abordagem qualitativa e a opção pelo estudo de caso. Ali também o leitor

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encontra a descrição da criação do grupo de estudos, seus participantes, os

temas estudados e os três eixos de análise.

São narrados, no quinto capítulo, os encontros do grupo Estatisticando,

que constituíram o trabalho de campo, e são destacados os indícios de

desenvolvimento profissional dos professores e futuros professores ao longo

das narrativas do trabalho de campo, enfatizando tal desenvolvimento a partir

dos eixos de análise.

A confirmar a importância do papel dos professores como

pesquisadores, mais do que simplesmente sujeitos da pesquisa, o sexto

capítulo analisa o desenvolvimento profissional dos participantes, a partir de

seus trabalhos produzidos e publicados.

As considerações finais retomam a questão de pesquisa; evidenciam

indícios da confiança dos professores e futuros professores em desenvolver,

com os estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental, propostas que

abordam a Estatística e transformaram esses participantes em produtores de

conhecimento; e destacam novamente os eixos de análise e seus

entrelaçamentos. Diante do desenvolvimento profissional possibilitado pela

participação no grupo Estatisticando, defendemos o reconhecimento e a

valorização da participação de professores, futuros professores e

pesquisadores em grupos de contexto colaborativos.

É importante aqui também considerar o ponto de vista adotado para o

relato desta pesquisa: o mesmo movimento de idas e vindas do individual para

o grupo ocorrerá na linguagem com que esse processo será aqui narrado: a

primeira pessoa do singular e a do plural mesclam-se, encontram-se e

desencontram-se no fluir narrativo – somam-se e multiplicam-se. É natural e

necessária essa multiplicidade, fruto da natureza colaborativa do trabalho e da

interlocução com a orientadora, que aqui se revelam também pela forma de

narrar. Impossível falar apenas por mim. Impossível falar apenas por nós.

Impossível falarmos apenas por nós. Imprescindível e naturalmente imperativo

falar por cada um de nós e, simultaneamente, por todos nós.

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CAPÍTULO 1

Introdução

“Aprender é construir,reconstruir, constatar para mudar,

o que não se faz sem abertura ao risco ea aventura do espírito” (Paulo Freire, 2005, p. 69)

1.1 Retomando algumas questões...

A formação do professor, de acordo com Nacarato (2000), inicia-se

desde que tomamos contato com a escolarização, ou seja, enquanto

estudantes do Ensino Fundamental e Médio. Concordamos com a autora que,

nessa fase, modelos de ensino e modelos de professores são muito marcantes

e influenciam nossa atuação docente, principalmente no início da carreira.

Acreditamos, então, ser importante resgatar algumas questões no meu

processo de formação inicial e contínua, como forma de situar o lugar “de

onde” falamos e os caminhos que nos levaram a querer pesquisar e

compreender as práticas que contribuem para o desenvolvimento profissional

dos professores e futuros professores da Educação Infantil e dos anos iniciais

do Ensino Fundamental, na perspectiva do letramento estatístico em um

contexto colaborativo.

Nesse resgate do processo de formação, embora não tivesse

consciência dos caminhos a percorrer, desde pequena pensava em ser

professora1 ou, mais especificamente, traçava uma meta para os anos futuros:

o Magistério. O ato de ensinar; os materiais escolares; a própria escola próxima

a minha casa; a lousinha infantil; o uniforme dos estudantes; os livros — tudo

isso sempre fez parte de minha infância

1 Trechos dessa história também foram apresentados na dissertação de mestrado. Ver Conti(2009).

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Fui cursar o Normal – Magistério de 1.º Grau2 — como queria, logo após

concluir o 1.º Grau (hoje Ensino Fundamental). Tive boas experiências, de

1991 a 1993, com as “metodologias de ensino” nas áreas de Língua

Portuguesa, Matemática, Estudos Sociais, Ciências e Saúde. Hoje percebo que

até concluir aquele curso não havia tido nenhum contato formal ou sistemático

com a Estatística e a Probabilidade, e foram 11 anos de estudo!

Após a conclusão do curso, com 17 anos, enquanto buscava colocação

profissional, frequentei um curso técnico na área de Contabilidade. Aí, sim,

“conheci” a Estatística, com um professor de Matemática. Numa disciplina de

60 horas, construíamos gráficos; utilizávamos, entre outros recursos,

instrumentos de desenho e papel quadriculado, leitura de jornal; éramos

avaliados pela construção correta dos gráficos e das tabelas. Apesar de não

pensar em atuar na área contábil, esse curso despertou em mim o gosto pela

Matemática; talvez porque tivesse vivenciado algumas aplicações, as aulas iam

além da resolução de listas de exercícios, embora isso também estivesse

presente.

Após terminar esse curso, na contramão de muitas de minhas colegas

do Magistério, que optaram pelo curso de Pedagogia, ou mesmo apenas pela

atuação em sala de aula, optei pela Licenciatura em Matemática, que iniciei em

1996 nas Faculdades Integradas de Amparo, no interior de São Paulo, e creio

que fiz a escolha correta. Novamente considerando a Estatística, conheci os

conceitos básicos através de aulas expositivas, durante dois semestres, nos

quais não analisávamos nem discutíamos os resultados dos exercícios.

Nessa mesma época, em 1996, comecei a atuar em turmas de

Educação Infantil (crianças de 3 a 6 anos) como professora efetiva, em uma

rede pública municipal do interior de São Paulo.

Logo que concluí a Licenciatura, em 1999, comecei a atuar também em

turmas do Ensino Fundamental (5.ª a 8.ª séries, na nomenclatura da época) da

mesma rede pública municipal e a substituir professores na rede pública

estadual, momento em que tive contato com a Educação de Jovens e Adultos

(EJA). Sempre com muitos ideais, com vontade de fazer algo diferente do que

2 Conforme a nomenclatura da época.

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havia encontrado em minha formação, mas na prática nem tudo era tão ideal

assim: pouca experiência; classes de estudantes repetentes; pouca confiança

por parte dos estudantes e da direção da escola, durante as substituições;

muita descontinuidade no trabalho; sentimentos de repulsa pela Matemática

por parte dos estudantes, entre outros, como relatado por Rocha (2005, p. 40):

A iniciação à docência é um período marcado por sentimentosambíguos. Se, de um lado, ela é caracterizada como uma etapa detensões, angústias, frustrações e inseguranças, por outro, o iniciantea professor sente-se alegre por ter uma turma, por pertencer a umgrupo de profissionais. Como todo início de profissão, esses primeirosanos constituem uma etapa de profundas mudanças e aprendizagemsobre a profissão.

E, com o objetivo de realizar sempre um trabalho melhor do que aquele

que eu havia vivenciado e via no cotidiano das escolas, continuei atuando com

essas turmas e buscando constantemente cursos, palestras, capacitações,

entre outros recursos, numa perspectiva de “educação contínua”, buscando

respostas a problemas e indagações referentes ao que eu vivia, como nos

trazem Fiorentini e Nacarato (2005, p. 9):

O professor, nessa perspectiva de educação contínua, constitui-se numagente reflexivo de sua prática pedagógica, passando a buscar,autônoma e/ou colaborativamente, subsídios teóricos e práticos queajudem a compreender e a enfrentar os problemas e desafios dotrabalho docente.

E, nessa busca, uma identificação especial com o ensino da Estatística

me foi despertada no XVI Encontro de Professores de Matemática3. Nesse

evento pude ter contato com o trabalho do Gepepei4. A partir de então,

comecei a adaptar e a propor, para as turmas compostas por crianças de 3 e 4

anos, algumas das situações pedagógicas5 elaboradas naquele grupo, que

envolviam probabilidade de ocorrência de determinados fatos, pesquisa de

opinião, construção de gráfico de colunas. Os resultados das situações foram

surpreendentes e motivadores. Crianças muito novas, além de manterem

contato com linguagens próprias da probabilidade, levantaram hipóteses,

3 Promovido em abril de 2002, pelo Laboratório de Ensino de Matemática (LEM) do Instituto deMatemática, Estatística e Computação Científica (Imecc) na Unicamp. Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Estatística e Probabilidade na Educação Infantil, entãocoordenado pela Prof.ª Celi Lopes.5 Estamos entendendo neste trabalho que situações pedagógicas são ações com intençãoeducativa.

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apresentaram opiniões, construíram e interpretaram gráficos, mostraram-se

envolvidos com nas situações e também apresentaram melhora significativa,

principalmente na área de Matemática. E assim fui ampliando essas vivências

para as outras séries em que atuava (séries finais do Ensino Fundamental),

consciente de meu papel na formação dos estudantes e das novas exigências

da sociedade da informação em que vivemos. Em conversas com estudantes

de 5.ª a 8.ª séries, alguns mesmo já perto de concluir o Ensino Fundamental,

percebi que não haviam tido nenhum contato anterior com a Estatística. Isso

me inquietava, assim como a Lopes (1998, p. 15), quando menciona que “não

é possível esperarmos que nosso aluno chegue ao Ensino Médio para

iniciarmos conteúdos essenciais para o desenvolvimento de sua visão de

mundo”.

Nessa busca, no início de 2005, já mais próxima geograficamente à

Unicamp, buscando a “educação contínua” e por sugestão do Prof. Dr. Dario

Fiorentini, comecei a frequentar o Grupo de Sábado (GdS), que se reúne aos

sábados pela manhã, com o intuito de ler, compartilhar experiências, refletir,

investigar e escrever sobre a própria prática escolar em Matemática. O grupo,

desde sua formação em 1999, tem publicado artigos, livros que trazem

narrativas e estudos de professores de Matemática sobre a própria prática

profissional. Tem se constituído

[...] por professores que dão aula de Matemática na Escola Básica,desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, por alunos de cursos dePedagogia e de licenciatura em Matemática e por professores doEnsino Superior que trabalham com disciplinas relativas à EducaçãoMatemática e à Matemática nesses cursos (CARVALHO; CONTI, 2009,p. 7-8).

A participação no GdS, no processo de troca e reflexão, contribuiu muito

para aumentar ainda mais a vontade de fazer parte de um grupo — e um grupo

onde haja colaboração, segundo Fiorentini (2004, p. 50, grifo do autor):

Na colaboração, todos trabalham conjuntamente (co-laboram) e seapoiam mutuamente, visando atingir objetivos comuns negociadospelo coletivo do grupo. Na colaboração, as relações, portanto, tendema ser não-hierárquicas, havendo liderança compartilhada e co-responsabilidade pela condução das ações.

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A partir do trabalho desenvolvido no GdS e do incentivo do grupo para o

registro dessas reflexões, das (re)significações da prática docente, da minha

atuação na EJA naquele momento e querendo de alguma forma fazer algo

diferente com aqueles estudantes dessa modalidade de ensino, reelaborei,

então, o que desenvolvia em outras modalidades de ensino, para propor

também em aulas de Matemática para EJA, as situações que envolviam

probabilidade de ocorrência de determinados fatos, pesquisa de opinião,

construção de gráficos.

Semelhante ao que ocorria com os estudantes que eu recebia no ensino

regular, deparei-me com pessoas, já em fase de conclusão do Ensino

Fundamental e mesmo do Ensino Médio, que não haviam tido contato com a

Estatística ou que tiveram contato mínimo, muitas vezes em circunstâncias não

escolares6. Situação semelhante a esta foi descrita em reflexões a respeito do

INAF7 2002, no trecho em que Lopes (2004, p. 191) comenta os resultados da

avaliação:

Os resultados no INAF 2002 em relação à compreensão dalinguagem gráfica evidenciam a pouca vivência da populaçãobrasileira na leitura de dados que expressam sua realidade, o quegera menores possibilidades de um exercício crítico de sua cidadania,diminuindo as perspectivas positivas de transformações sociais.

Juntei estes elementos: o apoio de um grupo, a identificação especial

com a EJA e a aproximação com a Estatística; o desejo de discutir a ausência

de trabalhos de Estatística nessa modalidade de ensino e de propor algo que

me possibilitasse debater algumas das questões que me angustiavam, como

por exemplo: Quais os objetivos da EJA? Em que o ensino de Estatística

poderia contribuir para alcançá-los? O que os alunos eram capazes de

significar em Estatística?

Resolvi, então, propor um projeto de pesquisa que focasse a EJA e a

Estatística, e o trabalho colaborativo, ingressando no mestrado em Educação

Dados recolhidos na pesquisa de campo do mestrado. Para mais detalhes, ver Conti, 2009.7 INAF – Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional. O INAF consiste no levantamentoperiódico de dados sobre as habilidades de leitura e Matemática da população brasileira. Éuma iniciativa do Instituto Paulo Montenegro e da ONG Ação Educativa.

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pela Unicamp em 2006, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de

Carvalho.

Querendo estar na escola, para vivenciar o trabalho de campo,

escolhemos desenvolver uma pesquisa que compreendesse uma intervenção

na qual eu pudesse atuar tanto como professora de uma turma de EJA quanto

como pesquisadora. Por acreditar na importância da dedicação integral à

pesquisa, candidatei-me a uma bolsa de estudos da Fapesp8. A partir de abril

de 2007, com a aprovação do projeto por essa fundação, passei a me dedicar

exclusivamente à pesquisa.

A pesquisa de campo se constituiu como “pesquisa participante”, assim

descrita por Gajardo (1986, p. 44, grifo da autora): “pesquisa participante é o

termo usado com mais frequência, na atualidade, para fazer referência às

experiências que procuram conhecer, transformando”. Ainda segundo Gajardo

(1986, p. 32), é no campo (no caso, a escola) que surgem os “temas” para

“discussão, reflexão e ação”, e são os alunos participantes que “através da

discussão das unidades, objetivizam um problema do meio, problematizam sua

situação, colocam-se como sujeitos ativos e protagonistas, buscando, a partir

de sua experiência e realidade, um caminho de ação eficaz para enfrentá-los”.

Procurei caminhar para o que Barton e Hamilton (2004, p. 111) chamam de

“etnografia crítica”, tratando de “descobrir e questionar os pressupostos

tradicionais que marcam o letramento e expor as formas em que este foi

construído e imbricado nas relações de poder”, e também comprometida em

documentar o letramento presente naquele cotidiano da Educação de Jovens e

Adultos.

Dois estagiários e eu, sob orientação da Prof.ª Dione, planejamos e

realizamos um trabalho de campo na perspectiva mencionada nos parágrafos

anteriores, que compreendeu o desenvolvimento de um projeto de Estatística

com estudantes de uma 7.ª série do Ensino Fundamental da Educação de

Jovens e Adultos da escola pública estadual localizada na periferia de

Campinas, interior do estado de São Paulo, em 2007.

8 Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Processo n.º 06/59154-3.

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Devido ao percurso do trabalho e as contribuições do grupo de pesquisa

PRAPEM9, decidimos centrar o trabalho no ensino e na aprendizagem da

Estatística, procurando responder a questão: “Qual o papel da Estatística na

inclusão de alunos da Educação de Jovens e Adultos em atividades letradas?”

(CONTI, 2009, p. 16). O trabalho colaborativo entre estagiários licenciandos e

professores da Escola Básica, embora presente, não foi o foco do estudo do

mestrado, tendo sua discussão ficado para outro momento, como, por exemplo,

em publicações do próprio GdS e em eventos da área de Educação e de

Educação Matemática.

Na pesquisa de mestrado, fizemos questão de buscar a inclusão dos

alunos da EJA em atividades letradas, quer respondendo a seus

questionamentos, quer dando-lhes voz ou instigando-os a transformar suas

“vozes” em escrita; e, até mesmo, acreditando que seriam capazes de significar

um texto acadêmico sobre produção de questionários. Pudemos observar

vários indícios de que é possível, sim, “letrar” e “estatisticar”, e que isso pode

acontecer em uma escola pública, de periferia, com alunos que podem superar

suas próprias dificuldades; e essa possibilidade não se resume ao

conhecimento estatístico.

1.2 Novas problemáticas

Partindo das discussões que a pesquisa de mestrado levantou com

relação à Estatística, ao letramento, ao trabalho colaborativo, percebemos a

necessidade de novos estudos para buscar outras práticas pedagógicas.

Novas ideias surgiram, e o fato de, a partir de 2009, atuar com formação de

professores, mais intensamente no curso de Pedagogia, e a influência da

participação no Grupo de Sábado, me fizeram pensar em práticas que

pudessem, da mesma forma, favorecer o desenvolvimento de capacidades

para formular hipóteses, estabelecer relações entre fatos e tomar decisões, ao

mesmo tempo, caminhando para o letramento estatístico, ou seja, para que os

9 Prática Pedagógica em Matemática.

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estudantes pudessem não só utilizar as ideias estatísticas, mas atribuir um

significado a elas em suas vidas. Essas reflexões me instigaram a buscar um

trabalho com formação de professores para atuarem nessa perspectiva.

De acordo com Watson (2006), como a produção de dados e o acaso

não tinham lugar de destaque no currículo da Matemática escolar até a década

de 199010, muitos professores, de todos os níveis, não valorizaram os temas a

ponto de propô-los a suas turmas em lugar de outros mais tradicionais do

currículo da Matemática. A autora apresenta também que era usual o trabalho

com a Estatística e a Probabilidade ser deixado, no planejamento anual, para o

final do ano letivo, muitas vezes para preencher o tempo com a situação

pedagógica, quando os estudantes e os professores já estavam cansados, ou

para ser substituído por outros temas do currículo, caso estes necessitassem

de mais tempo. Além da falta de tempo e da falta de convicção de sua

importância, Lopes (2010, p. 58) aponta como uma das causas da ausência

dessa temática no trabalho com os estudantes a “falta de domínio teórico-

metodológico do professor sobre os conceitos estatísticos e probabilísticos”.

Watson (2002, p. 27) também afirma que o letramento estatístico no

currículo escolar “não deveria ser considerado responsabilidade dos

professores de Matemática, excluindo-se com isso professores de outras áreas

curriculares”, ou seja, a tarefa de levar o estudante a construir conhecimento,

argumentação e de ajudá-lo na apropriação das ideias estatísticas deveria ser

papel também do professor polivalente, formado para atuar na Educação

Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, assim como do professor de

Língua Portuguesa, Geografia, História, Ciências, entre outras áreas. Watson

(2002) considera que o letramento estatístico pode ser um catalisador para

reformas curriculares, apontando para um currículo integrado.

Mas como iniciar a formação na perspectiva citada, de modo que os

estudantes possam se apropriar das ideias estatísticas, quando os professores

polivalentes que atuam ou atuarão nas séries iniciais do Ensino Fundamental

possuem conhecimentos ainda incipientes? Mencionamos essa modalidade de

Watson se refere aos Estados Unidos, mas podemos considerar esta época também noBrasil, pois foi a época da publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN).

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ensino pelo fato de recair sobre esses professores a responsabilidade de

ensinar a ler, a escrever e a contar, indicados por Régnier (2006). Ele discute

que o estudante, em sua “formação escolar de base”, além de tornar-se capaz

de ler, escrever e contar, o que era tido como suficiente até recentemente,

precisa aprender a “estatisticar”, ou seja, ser capaz de usar a Estatística para

exercer sua cidadania, ou seja, este “estatisticar” precisa ser abordado em uma

perspectiva de letramento.

Batanero (2001, p. 6) também aborda essa problemática: quando cita os

professores da Escola Básica, menciona que “na prática ainda são poucos os

professores que incluem este tema [Estatística] e em outros casos o tratam

muito brevemente ou de forma excessivamente formalizada”.

Segundo Lopes (2010, p. 47), nos tempos de hoje, “a presença

constante da Estatística no mundo atual tornou-se uma realidade na vida dos

cidadãos, levando à necessidade de ensinar Estatística a um número de

pessoas cada vez maior” e, devido a isso, muitos países passaram a inserir a

Estatística nos currículos de Matemática na Educação Básica. Lopes (2010, p.

47-48) traz ainda um dado histórico:

A Conferência de Cambridge (Massachusetts), realizada em 1963, éapontada por Rade (1986) como uma das primeiras reuniõescientíficas em que se propôs que a Estatística passasse a integrar osconteúdos de Matemática a serem ensinados na Educação Básica.

A partir da década de 1970, segundo Cazorla e Utsumi (2010, p.19),

surgiu mundialmente um movimento que “reconheceu a importância do

desenvolvimento do raciocínio probabilístico, a necessidade de romper com a

cultura determinística nas aulas de Matemática, a dimensão política e ética do

uso da Estatística”. De acordo com as autoras, esse movimento pode ser

considerado como base para o que se denomina atualmente de Educação

Estatística. Hoje podemos dizer que a Educação Estatística, enquanto área de

pesquisa, objetiva estudar e compreender a forma como as pessoas ensinam e

aprendem Estatística, englobando a epistemologia dos conceitos estatísticos,

os aspectos cognitivos e afetivos do ensino e da aprendizagem, bem como o

desenvolvimento de metodologias e materiais para o ensino, visando ao

desenvolvimento do letramento estatístico.

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Na Educação Estatística e nesse processo de ensino e aprendizagem,

de acordo com Lopes (2010), é que a Estatística se intersecciona com a

Probabilidade, pois o pensamento estatístico também combina ideias acerca

dos dados e da noção de incerteza, para a realização de inferência, ou seja, é

necessário que as pessoas utilizem o pensamento probabilístico para tomar

decisões, conforme a autora apresenta:

A Estatística, com seus conceitos e métodos, configura-se com umduplo papel: permite compreender muitas das características dacomplexa sociedade atual, ao mesmo tempo que facilita a tomada dedecisões em um cotidiano onde a variabilidade e a incerteza estãosempre presentes (LOPES, 2010, p. 51).

Essas ideias reforçam que o papel da Estatística e da Probabilidade na

tomada de decisões pode ser considerado como um dos objetivos da

interconexão dessas duas áreas no currículo.

Internacionalmente, encontramos recomendações para o ensino e a

aprendizagem da Estatística na Escola Básica, como, por exemplo, do National

Council of Teachers of Mathematics (NCTM), na publicação “Princípios e

Normas para a Matemática Escolar” (NCTM, 2008) e, em Portugal, nas “Metas

Curriculares” (PORTUGAL, 2013)11.

Nos Princípios e Normas para a Matemática Escolar (NCTM, 2008, p

XV), que pretendem ser “um recurso e servir de orientação para todos os

responsáveis pelas decisões que afetam a Educação Matemática dos

estudantes do pré-escolar ao 12.º ano de escolaridade”, são propostas

“normas” que, segundo os autores, são “descrições daquilo que o ensino da

Matemática deverá habilitar os alunos a saber e a fazer” (p. 31). Nas “Normas

de Conteúdo”, no item “Análise de Dados e Probabilidade”, há a descrição

explícita dos conteúdos que os estudantes deverão aprender.

Especificamente sobre nosso foco, na Análise de Dados, encontramos

Os programas de ensino do pré-escolar ao 12.º ano deverão habilitartodos os alunos para

11 Pudemos ter contato com esse documento, ente outros, durante o Programa de DoutoradoSanduíche no Exterior (PDSE), realizado em Portugal. N.º processo BEX 9455/12-4. Detalhessobre o documento podem ser encontrados no Anexo 1.

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Formular questões que possam ser abordadas por meio de dadose recolher, organizar e apresentar dados relevantes que permitamresponder a essas questões; Selecionar e usar métodos estatísticos adequados à análise dedados; Desenvolver e avaliar inferências e previsões baseadas em dados; Compreender e aplicar conceitos básicos de probabilidade(NCTM, 2008, p. 52).

De acordo com a publicação, ainda, são propostas expectativas de

aprendizagem, relativas a faixas etárias dos estudantes12.

No Brasil, devido aos reflexos do movimento de inclusão da Estatística

no currículo de Matemática, no final da década de 1990, com a publicação dos

Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997), foi incorporado

oficialmente o “Tratamento da Informação” como um dos blocos de conteúdos

da estrutura curricular de Matemática, que apresenta o currículo mínimo da

Matemática para as diversas faixas etárias dos estudantes, da Educação

Infantil ao Ensino Médio.

O currículo de Matemática para a Educação Infantil, destinada a

crianças de até 5 anos e 11 meses de idade, é estabelecido pelo Referencial

Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998), que organiza os

conteúdos matemáticos em três blocos: Números e Sistema de Numeração,

Grandezas e Medidas e Espaço e Forma. Infelizmente, o RCNEI não traz um

bloco de conteúdos explícito sobre essa área, a do “tratamento da informação”,

pois, quando de sua publicação, as pesquisas quanto à inserção da Educação

Estatística na Educação Infantil ainda estavam se iniciando. Mas, de acordo

com Lopes e Moura (2002), as demandas atuais têm exigido habilidades e

competências matemáticas diferenciadas, já nessa etapa da Educação Básica.

Mesmo no documento de “Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação Infantil” (BRASIL, 2010), aprovado em 11/11/2009, não há a menção

ao trabalho com a Estatística, afirmando que na Educação Infantil podem ser

priorizados, enquanto experiências pedagógicas, em contextos e situações

significativos, “a exploração e uso de conhecimentos matemáticos na

apreciação das características básicas do conceito de número, medida e forma,

12 O detalhamento das expectativas de aprendizagem de acordo com a faixa etária encontram-se no Anexo 2.

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assim como a habilidade de se orientar no tempo e no espaço” (BRASIL, 2010,

p. 94).

O currículo de Matemática para o Ensino Fundamental, destinado a

estudantes de 6 a 14 anos, é estabelecido pelos Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN), os quais orientam que se deve trabalhar com os quatro

grandes blocos de conteúdos: “Números e Operações”, “Espaço e Forma”,

“Grandezas e Medidas” e o “Tratamento da Informação” (BRASIL, 1997).

Ainda nos PCN, encontramos os objetivos gerais do Ensino

Fundamental, os quais propõem que os estudantes sejam capazes de:

• compreender a cidadania como participação social e política, assimcomo exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais,adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação erepúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmorespeito;• posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nasdiferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma demediar conflitos e de tomar decisões coletivas;• conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensõessociais, materiais e culturais como meio para construirprogressivamente a noção de identidade nacional e pessoal e osentimento de pertinência ao País;• conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio socioculturalbrasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos enações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada emdiferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etniaou outras características individuais e sociais;• perceber-se integrante, dependente e agente transformador doambiente, identificando seus elementos e as interações entre eles,contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente;• desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimentode confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética,estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir comperseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania;• conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando hábitossaudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida eagindo com responsabilidade em relação à sua saúde e à saúdecoletiva;• utilizar as diferentes linguagens — verbal, matemática, gráfica,plástica e corporal — como meio para produzir, expressar ecomunicar suas ideias, interpretar e usufruir das produções culturais,em contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções esituações de comunicação;• saber utilizar diferentes fontes de informação e recursostecnológicos para adquirir e construir conhecimentos;• questionar a realidade formulando-se problemas e tratando deresolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, aintuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentose verificando sua adequação. (BRASIL, 1997, p. 6)

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Encontram-se nesses objetivos, explicitamente, inúmeros aspectos

relacionados com o desenvolvimento da competência estatística, como

“cidadania”, “exercício de direitos e deveres”, “posicionar-se de maneira crítica”,

“tomar decisões”, “utilizar as diferentes linguagens”, “saber utilizar as diferentes

fontes de informação”, entre outras.

Com relação ao bloco Tratamento da Informação, os PCN propõem os

seguintes conteúdos para o primeiro ciclo do Ensino Fundamental (1.º ao 5.º

ano):

• Leitura e interpretação de informações contidas em imagens.• Coleta e organização de informações.• Criação de registros pessoais para comunicação das informaçõescoletadas.• Exploração da função do número como código na organização deinformações (linhas de ônibus, telefones, placas de carros, registrosde identidade, bibliotecas, roupas, calçados).• Interpretação e elaboração de listas, tabelas simples, de duplaentrada, gráficos de barra para comunicar a informação obtida.• Produção de textos escritos a partir da interpretação de gráficos etabelas (BRASIL, 1997, p. 52).

Para o segundo ciclo (do 6.º ao 9.º ano), são propostos os seguintesobjetivos:

• Coleta, organização e descrição de dados.• Leitura e interpretação de dados apresentados de maneiraorganizada (por meio de listas, tabelas, diagramas e gráficos) econstrução dessas representações.• Interpretação de dados apresentados por meio de tabelas egráficos, para identificação de características previsíveis ou aleatóriasde acontecimentos.• Produção de textos escritos, a partir da interpretação de gráficos etabelas, construção de gráficos e tabelas com base em informaçõescontidas em textos jornalísticos, científicos ou outros.• Obtenção e interpretação de média aritmética.• Exploração da ideia de probabilidade em situações-problemasimples, identificando sucessos possíveis, sucessos seguros e assituações de “sorte”.• Utilização de informações dadas para avaliar probabilidades.• Identificação das possíveis maneiras de combinar elementos deuma coleção e de contabilizá-las usando estratégias pessoais(BRASIL, 1997, p. 61).

Para o Ensino Médio, destinado a estudantes de 15 a 17 anos, temos os

Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM), que

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apresentam três eixos ou temas estruturadores, que devem ser desenvolvidos

de forma concomitante nas três séries do ensino médio (BRASIL, 2000): 1)

Álgebra: números e funções; 2) Geometria e medidas; e 3) Análise de Dados.

Sobre o eixo “análise de dados”, os PCNEM orientam:

A análise de dados tem sido essencial em problemas sociais eeconômicos, como nas estatísticas relacionadas a saúde,populações, transportes, orçamentos e questões de mercado.Propõe-se que constitua o terceiro eixo ou tema estruturador doensino, e tem como objetos de estudo os conjuntos finitos de dados,que podem ser numéricos ou informações qualitativas, o que dáorigem a procedimentos bem distintos daqueles dos demais temas,pela maneira como são feitas as quantificações, usando-se processosde contagem combinatórios, frequências e medidas estatísticas eprobabilidades. Este tema pode ser organizado em três unidadestemáticas: Estatística, Contagem e Probabilidade (BRASIL, 2000,p.126, grifos do documento).

Sobre o que se espera do estudante com o trabalho, os PCNEM

afirmam:

Contudo, espera-se do aluno nessa fase da escolaridade que ultrapasse aleitura de informações e reflita mais criticamente sobre seus significados.Assim, o tema proposto deve ir além da simples descrição e representação dedados, atingindo a investigação sobre esses dados e a tomada de decisões(BRASIL, 2000, p. 126).

Mais recentemente o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa -

PNAIC (BRASIL, 2014, p. 30)13 expressa que a alfabetização matemática, na

perspectiva do letramento, deve promover “apropriação pelos aprendizes de

práticas sociais de leitura e escrita de diversos tipos de texto, práticas de leitura

e escrita do mundo – não se restringe ao ensino do sistema de numeração e

das quatro operações aritméticas fundamentais”. De acordo com essa proposta

e com sua preocupação com as diversas práticas de leitura e escrita “que

envolvem as crianças e nas quais as crianças se envolvem no contexto escolar

e fora dele”, o trabalho pedagógico deve contemplar situações significativas

para as crianças – entre outras: “estratégias de produção, reunião,

organização, registro, divulgação, leitura e análise de informações, mobilizando

13 Programa Oficial de Formação e acordo formal assumido pelo governo federal, pelo DistritoFederal, por estados, municípios e entidades, para firmar o compromisso de alfabetizarcrianças até, no máximo, 8 anos de idade, ao final do ciclo de alfabetização.

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procedimentos de identificação e isolamento de atributos, comparação,

classificação e ordenação”.

No material de formação do PNAIC, adotou-se a expressão “direitos da

aprendizagem”, indicando a compreensão da educação escolar como direito

social (BRASIL, 2014). De acordo com o material de formação, trata-se de um

marco na busca da articulação entre as práticas e as necessidades do

cotidiano da escola, e esse marco encontra respaldo na necessidade de rever

os PCN (BRASIL, 1997) e incorporar novas leis, pareceres e resoluções, no

que diz respeito às orientações curriculares.

Esse material apresenta, a partir dos direitos básicos de aprendizagem

em Matemática, cinco eixos estruturantes: Números e Operações; Pensamento

Algébrico; Espaço e Forma/Geometria; Grandezas e Medidas; e Tratamento da

Informação/Estatística e Probabilidade.

O Tratamento da Informação, que nesse material é denominado

“Educação Estatística”, apresenta os seguintes objetivos:

Ler, interpretar e fazer uso das informações expressas na formade ícones, símbolos, signos, códigos; em diversas situações e emdiferentes configurações (anúncios, gráficos, tabelas, rótulos,propagandas), para compreensão de fenômenos e práticas sociais; Formular questões sobre fenômenos sociais que gerem pesquisase observações para coletar dados quantitativos e qualitativos; Coletar, organizar e construir representações próprias para acomunicação de dados coletados (com ou sem uso de materiaismanipuláveis ou de desenhos); Ler e interpretar listas, tabelas simples, tabelas de dupla entrada,gráficos; Elaborar listas, tabelas simples, tabelas de dupla entrada, gráficode barras e pictóricos para comunicar a informação obtida,identificando diferentes categorias; Produzir textos escritos a partir da interpretação de gráficos etabelas; Problematizar e resolver situações a partir das informaçõescontidas em tabelas e gráficos (BRASIL, 2014, p. 55).

Sobre o desenvolvimento do letramento estatístico, Watson (2006)

menciona que o currículo tem a responsabilidade de fornecer a base

necessária para os estudantes que desejam prosseguir os estudos em níveis

mais elevados, em Probabilidade e Estatística, mas também tem a

responsabilidade de preparar os estudantes para serem consumidores

estatisticamente letrados nos mais amplos contextos sociais.

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Em síntese, os professores, desde a Educação Infantil e anos iniciais do

Ensino Fundamental, devem buscar desenvolver o pensamento estatístico e

probabilístico dos aprendizes, para que estes sejam capazes de aplicar as

ferramentas estatísticas, mas caminhando para o letramento estatístico. Além

disso, o ensino do Tratamento da Informação deve despertar o interesse do

estudante com propostas por meio das quais ele possa construir seu

conhecimento.

Segundo Batanero (2002), o fato de conteúdos estatísticos fazerem parte

dos currículos oficiais não significa que sejam ensinados nos diversos níveis

escolares. E ainda, de acordo com Lopes (1998), a inclusão da Estatística

apenas como mais um conteúdo a ser estudado na escola, dando ênfase à

parte descritiva, não leva obrigatoriamente o estudante a desenvolver o

pensamento estatístico.

Paralelamente às questões curriculares e do domínio de competências

pela população, surgem as questões de formação – didática e de conteúdo –

dos professores que ensinam Estatística (BATANERO, 2002), pois esse pode

ser o motivo, muitas vezes, para não se dar a devida importância à temática.

Nesse sentido, Lopes (1998) aponta que uma das maiores preocupações,

quando se fala em pesquisa em Educação Estatística, atualmente, é a

formação dos professores, inicial e continuada.

De acordo com Lopes (2010), em um levantamento realizado em 1986

pelo International Statistical Institute (ISI), relatórios enviados por diversos

países informavam insatisfação com relação ao ensino de Estatística, em

especial nas escolas dos anos iniciais, onde seu ensino tem sido ignorado.

Segundo a autora,

[...] aproximadamente duas décadas após esse levantamento,percebe-se que, embora a inserção da Estatística e da Probabilidadeseja reconhecida nas propostas curriculares de Matemática, namaioria dos países do mundo, ainda não tenha sido prioridade naescola, nem nos programas de formação inicial e contínua deprofessores que ensinam Matemática” (LOPES, 2010, p. 48, grifonosso).

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Olhando mais especificamente para o Brasil, podemos constatar a

lamentável situação da população brasileira, quando o assunto é a

compreensão de gráficos e tabelas. De acordo com Lopes (2004, p. 191), isso

“gera menores possibilidades de um exercício crítico de sua cidadania,

diminuindo as perspectivas positivas de transformações sociais”. Sobre esse

tema, Fonseca (2004, p. 23) apresenta os resultados do Indicador Nacional de

Alfabetismo Funcional (INAF)14 de 2002, sobre a temática:

A indicação de que apenas 21% da população brasileira conseguecompreender informações a partir de gráfico e tabelas,frequentemente estampados nos veículos de comunicação, éabsolutamente aflitiva, na medida em que sugere que a maior partedos brasileiros encontra-se privada de uma participação efetiva navida social, por não acessar dados e relações que podem serimportantes na avaliação de situações e na tomada de decisões.

Os resultados do INAF 2004 indicam que a situação não melhorou muito

com relação a 2002, pois constatou que ainda “apenas 23% da população

jovem e adulta brasileira é capaz de adotar e controlar uma estratégia na

resolução de um problema que envolva a execução de uma série de

operações” (INAF, 2004, p. 8), complementando que “nesse grupo é que se

encontram os sujeitos que demonstram certa familiaridade com representações

gráficas como mapas, tabelas e gráficos” (INAF, 2004, p. 9).

De acordo com o relatório do INAF (2004, p.19), “isso sugere o quanto a

Escola Básica precisa dedicar-se ao trabalho com essas representações como

estratégia de democratização do acesso à informação e a recursos e

procedimentos para organizá-la e analisá-la”15.

Segundo Batanero (2001), “a primeira dificuldade vem das mudanças

progressistas que as estatísticas estão experimentando hoje, tanto do ponto de

vista do seu conteúdo, como do ponto de vista das exigências de formação”

(BATANERO, 2001, p. 6, grifo nosso), pois as demandas de uma sociedade

14 Realizado desde 2001, o Inaf/Brasil é baseado em entrevistas e testes cognitivos aplicados aamostras nacionais de duas mil pessoas representativas dos brasileiros e das brasileiras entre15 e 64 anos de idade, residentes em zonas urbanas e rurais em todas as regiões do País.

15 Infelizmente, o Instituto Paulo Montenegro e a Ação Educativa, que realizam o INAF, nãoproduziram, até o presente, novos relatórios detalhados sobre a questão específica dacompetência estatística. Têm sido apresentados apenas relatórios gerais sobre os níveis dealfabetismo funcional.

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cada vez mais informatizada têm exigido a compreensão de técnicas básicas

de análise de dados e sua interpretação adequada.

Nesse sentido, Lopes (2010) ainda destaca que “é essencial lembrar a

importância de continuar a investigar formas de favorecer o raciocínio

estatístico dos alunos, a compreender como o conhecimento estatístico é

construído e a preparar os professores” (SHAUGHNESSY; GARFIELD;

GREER,1996 apud LOPES, 2010, p. 48, grifo nosso). Quando demos destaque

à questão de “preparar os professores”, estamos apontando para uma

formação que considera os professores protagonistas no processo e que

possibilita seu desenvolvimento profissional.

Lopes (2008a, p. 82) ainda apresenta os apontamentos de pesquisas

nacionais e internacionais a respeito da formação do professor e do modo

como a Estatística e a Probabilidade são tratadas:

As pesquisas nacionais e internacionais têm evidenciado que há pelomenos dois problemas que necessitam atenção urgente, um refere-seà formação inicial e contínua dos professores e outro diz respeito aotratamento atribuído à Estatística e à Probabilidade, através decálculos e fórmulas, promovendo a memorização de procedimentos.

Portanto, nesse sentido, cientes de que não basta ensinar Estatística,

temos que abordá-la de modo a produzir conhecimentos significativos, e,

pensando nesse ensino, numa perspectiva de letramento, é que queremos dar

nossa contribuição, a partir de uma experiência de formação de professores e

futuros professores, que os considerou como produtores de conhecimento,

num contexto colaborativo e com o questionamento:

Que indícios de desenvolvimento profissional apresentam osprofessores e futuros professores da Educação Infantil e dos anosiniciais do Ensino Fundamental, em contextos colaborativos em práticasde letramento estatístico?

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CAPÍTULO 2

O letramento e o letramento estatístico

“E aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é,antes de mais nada, aprender a ler o mundo,

compreender o seu contexto,não numa manipulação mecânica de palavras

mas numa relação dinâmica que vinculalinguagem e realidade.

Ademais, a aprendizagem da leitura e a alfabetizaçãosão atos de educação

e educação é um ato fundamentalmente político”(Paulo Freire, 1999, p. 8).

2.1 Letramento(s)

Quando consideramos o letramento, no contexto brasileiro, focamos o

conceito de alfabetização, visando sua relação com o conceito de letramento.

Soares (2003, p. 19) afirma que alfabetizar-se é deixar de ser analfabeto,

esclarecendo também: “alfabetizado nomeia aquele que apenas aprendeu a ler

e a escrever, não aquele que adquiriu o estado ou a condição de quem se

apropriou da leitura e da escrita, incorporando as práticas sociais que as

demandam”. Letramento, segundo Soares (2003, p. 44), nomeia “o estado ou

condição de quem interage com diferentes portadores de leitura e de escrita,

com diferentes gêneros e tipos de leitura e de escrita, com as diferentes

funções que a leitura e a escrita desempenham em nossa vida”, ou,

resumidamente, “estado ou condição de quem se envolve nas numerosas e

variadas práticas sociais de leitura e de escrita”.

Assim se refere Kleiman (1995, p. 15-16, grifo da autora) a respeito do

conceito de letramento:

O conceito de letramento começou a ser usado nos meiosacadêmicos como tentativa de separar os estudos sobre o “impactosocial da escrita” (Kleiman, 1991) dos estudos sobre alfabetização,cujas conotações escolares destacam as competências individuais nouso e na prática da escrita.

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O conceito de letramento é tido hoje como um fenômeno social complexo

e heterogêneo e, mais recentemente, segundo Bevilaqua (2013, p. 99), o foco

de estudo “tem mudado da mente do indivíduo para a prática social na qual os

indivíduos participam” Esses novos estudos, tendo como foco principal o

aspecto social do letramento, em lugar do cognitivo, foram denominados Novos

Estudos do Letramento16. Nesse movimento, segundo Rojo (2009), o conceito

de letramento passa a ser plural – letramento(s) –, justificado pela grande

variedade de práticas de linguagem que envolve, de uma ou de outra maneira,

textos escritos.

Os Novos Estudos do Letramento (NLS) compõem um campo de

pesquisa mais recente, que, segundo Street (2003, p. 77),

representa uma nova visão da natureza do letramento que escolhedeslocar o foco dado à aquisição de habilidades, como é feito pelasabordagens tradicionais, para se concentrar no sentido de pensar oletramento como uma prática social (Street, 1995). Isso implica oreconhecimento de múltiplos letramentos, variando no tempo e noespaço, e as relações de poder que configuram tais práticas. Os NLS,portanto, não tomam nada como definitivo no que diz respeito aoletramento e às práticas sociais a ele relacionadas, preferindo, aocontrário, problematizar o que conta como letramento em um espaçoe tempo específicos e questionar quais letramentos são dominantes equais são marginalizados ou resistentes.

De acordo com Bevilaqua (2013, p. 102), alguns anos depois do

aparecimento dos NLS, em 1994, um grupo de pesquisadores, sobretudo da

Linguística e da Educação, reuniu-se, a fim de discutir “os sérios problemas

pelos quais o sistema de ensino anglo-saxão estava passando”. Esse grupo de

pesquisadores ficou conhecido como New London Group17. Desse encontro,

segundo Bevilaqua (2013, p. 102, grifos da autora), resultou um documento

cujos pontos principais levam em conta: “a crescente diversidade linguística

cultural presente nesses países18 (fruto de uma economia globalizada) e a

multiplicidade de canais e meios (modos semióticos) de comunicação

(resultado de novas tecnologias)”. Esses pontos foram responsáveis pelo

surgimento da denominação “Multiletramentos” (COPE; KALANTZIS, 2000) ou

16 Termo cunhado por Gee (1991, apud STREET, 2003, p. 77) – The New Literacy Studies –NLS.17 Grupo de Nova Londres.18 Estados Unidos, Grã-Bretanha e Austrália.

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“Pedagogia dos Multiletramentos” (COPE; KALANTZIS, 2000, p. 20), que é

voltada para um currículo com responsabilidade social e cultural. Procuramos

detalhar a seguir os conceitos-chave dessas teorias, pois, embora tanto os NLS

como os Multiletramentos tenham como objeto de estudo o letramento numa

perspectiva sociocultural, há enquadramentos teóricos que os distinguem.

2.2 Novos estudos do letramento

Segundo Terra (2013, p. 34, grifo da autora), os NLS trazem princípios e

pressupostos teóricos importantes, dos quais se destacam os fenômenos-

chave:

(i) O binômio modelo autônomo e modelo ideológico deletramento;

(ii) Dois componentes básicos do letramento, quais sejam oseventos e as práticas de letramento.

De acordo com Street (2003, p. 77 e p. 76), no modelo autônomo,

letramento é concebido como habilidades técnicas, propriamente ditas, de

leitura e escrita e “terá o efeito de aumentar suas habilidades cognitivas,

melhorar suas perspectivas econômicas, tornando-os melhores cidadãos,

independentemente das condições econômicas e sociais, que responderam por

seu ‘analfabetismo’ em primeiro lugar”, complementando que “a alfabetização

em si – autonomamente – terá efeitos sobre outras práticas sociais e

cognitivas”.

No modelo ideológico, segundo o mesmo autor, o que está em jogo são

os objetivos práticos; as interações que se estabelecem entre os participantes

da situação; as demandas dos contextos sociais e as representações; os

valores associados ao ler e ao escrever, ao matematizar, ao estatisticar, que

determinado grupo cultural assume e dissemina. Street (2003, p. 77-78) afirma

também que

este modelo começa a partir de premissas diferentes do que omodelo autônomo – que postula que a alfabetização é uma práticasocial, e não simplesmente uma habilidade técnica e neutra, que está

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sempre embutido em princípios epistemológicos socialmenteconstruídos. Trata-se de conhecimento: as maneiras pelas quais aspessoas abordam a leitura e a escrita estão se enraizando emconcepções de conhecimento, identidade, e de ser. Ele tambémsempre está embutido nas práticas sociais, como as de um mercadode trabalho específico ou um contexto educacional em particular e osefeitos do aprendizado e da alfabetização, em especial, serãodependentes desses contextos particulares.

Perante essas considerações, trabalhamos na perspectiva de que o

letramento autônomo e o ideológico não são dois fenômenos diferentes, mas

dois aspectos do mesmo fenômeno. Tal perspectiva é especialmente

adequada, quando estamos investigando a questão da escolarização. Neste

caso, o letramento é efetivo nas relações sociais, não é uma propriedade

individual, não é o mesmo em todos os contextos: existem diferentes

letramentos, que são configurações coerentes e práticas letradas. Não

residem, simplesmente, na mente das pessoas como um conjunto de

habilidades para serem aprendidas e não se encontram apenas no papel, na

forma de textos para serem analisados.

Segundo Street (2012, p. 7), o termo “eventos de letramento”, um dos

dois componentes básicos do letramento, é originário dos trabalhos de Heath

(1982); e o segundo termo, “prática de letramento”, é considerado mais

abrangente, encapsulando o primeiro.

Barton e Hamilton (2004, p. 112) definem práticas letradas como “formas

culturais generalizadas do uso da língua escrita, nas quais as pessoas

encontram inspiração para sua vida”, complementando que, no seu sentido

mais simples, são “o que fazemos com o letramento” (p. 112) e que não são

comportamentos observáveis, pois também implicam em valores, atitudes,

sentimentos e relações sociais. Os autores consideram que “as práticas se

apoiam, tanto no mundo individual como no social e são entendidas mais

utilmente quando se concebem como existentes nas relações interpessoais,

dentro de um grupo ou comunidades” (BARTON; HAMILTON, 2004, p. 113),

em vez de como um conjunto de propriedades que existem internamente nos

indivíduos.

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Com relação aos eventos letrados, Barton e Hamilton (2004, p. 114)

definem que “são episódios observáveis que surgem das práticas e são

formados por elas”. Segundo os autores, na vida muitos eventos letrados são

atividades que repetimos regularmente e que podem ser o ponto de partida

para a pesquisa. E defendem ainda que certos eventos são estruturados de

acordo com as expectativas dos participantes, como, por exemplo, um grupo

de colegas. Barton e Hamilton (2004, p. 114) expressam ainda que os textos

são parte fundamental dos eventos letrados, pois “o estudo do letramento é em

parte um estudo de textos, da maneira como foram produzidos e como são

usados”.

Há também que compreender os eventos de letramento de um ponto de

vista culturalmente mais sensível (STREET, 2008), advogando-se que, nesses

eventos, utiliza-se a língua escrita de maneira integral, como parte de uma

variedade de sistemas semióticos que incluem sistemas matemáticos e

estatísticos, notação musical, mapas e outras imagens sem base textual

(STREET, 2004).

Bevilaqua (2013) sintetiza prática e evento de letramento na perspectiva

do modelo ideológico da seguinte maneira (Figura 1):

Figura 1: Representação de prática e evento de letramento na perspectiva ideológica.

Fonte: BEVILAQUA, 2013, p. 105.

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Vale destacar que a diferenciação entre práticas e eventos de letramento

é metodológica, pois são conceitos interligados. De acordo com Street (2001,

apud BEVILAQUA, 2013, p. 48), “o conceito de ‘evento de letramento’

dissociado do conceito de ‘prática de letramento’ não ultrapassa o nível da

descrição”, pois é o uso das práticas de letramento como instrumento de

análise que permite a interpretação dos eventos, para além de uma simples

descrição.

2.3 Multiletramentos

Segundo Rojo (2010, p. 27), o New London Group se reuniu para discutir

uma questão considerada fundamental: “O que se constitui como um

letramento escolar adequado num contexto de fatores cada vez mais críticos

de diversidade local e de conectividade global?”. De acordo com a autora, com

a proposta dessa questão, admitia-se que o mundo mudara bastante, desde a

última definição da Unesco para analfabetismo funcional19: novas tecnologias

digitais da informação e da comunicação, como, por exemplo, computadores,

celulares, televisão, nos mantêm conectados, e essas tecnologias tornaram-se

as ferramentas e as formas principais de trabalho em nossa sociedade. Rojo

(2010, p. 28) afirma que, “por força da linguagem e da mídia (digitais) que as

constituem, essas tecnologias puderam muito rapidamente misturar a

linguagem escrita com outras formas de linguagem (semioses)” e complementa

que “o fizeram de maneira hipertextual e hipermidiática”. Rojo (2010, p. 29)

também apresenta a seguinte questão: “O que propor como práticas letradas

escolares relevantes, ante estas mudanças?”.

19 A recomendação da Unesco, para padronizar as estatísticas em educação, em 1958, traz aseguinte definição: “É letrada a pessoa que consegue tanto ler quanto escrever comcompreensão uma frase simples e curta sobre sua vida cotidiana”. Em 1978, a Unescoapresentou uma definição revisada: “É funcionalmente alfabetizada a pessoa capaz deenvolver-se em todas as atividades em que o alfabetismo é necessário para um funcionamentoefetivo de seu grupo e de sua comunidade, e também para dar-lhe condições de uso da leitura,da escrita e do cálculo para o seu desenvolvimento pessoal e o de sua comunidade”(SOARES, 1992, p. 8-9).

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Ainda de acordo com Rojo (2010, p. 29), o New London Group

concentrou a resposta num conceito, o de “multiletramentos”, explicando que “o

prefixo ‘multi’ aponta para duas direções: multiplicidade de linguagens e mídias

nos textos contemporâneos e multiculturalidade e diversidade cultural”.

Segundo Rojo (2010, p. 29), a pedagogia dos multiletramentos, para esse

grupo, “está centrada em modos de representação (linguagens) muito mais

amplos do que somente a linguagem verbal, que diferem de acordo com a

cultura e o contexto e que tem efeitos cognitivos, culturais e sociais

específicos”.

Como eixo estruturador da teoria dos Multiletramentos, de acordo com

Bevilaqua (2013), está o conceito de design, que estrutura as concepções de

construção de sentido, interesse, agenciamento e multimodalidade,

consideradas primordiais na contemporaneidade, quando se pensa em ensino.

Design, para a autora, “constitui uma concepção dinâmica de

representação (de linguagem, de aprendizagem, de mundo), sendo definido

como ato de construção de sentido” (BEVILAQUA, 2013, p.106). Para Cope e

Kalantzis (2009), o conceito de design apresenta um duplo significado,

descrevendo, ao mesmo tempo, a estrutura intrínseca ou morfologia (sistemas,

formas e convenções de sentido) e o ato da construção e feliz coincidência de

sentidos: estrutura (sistemas, formas e convenções de sentido) e ato de

construção de sentido (processo criativo no qual o sujeito constrói e representa

sentidos, passando a ser agente e não simples receptor). Devido a essa

estrutura, segundo Bevilaqua (2013), para a teoria dos Multiletramentos, o

conceito de design é central para a constituição de um currículo escolar que

venha ao encontro das novas tendências sociais.

De acordo com Cope e Kalantzis (2009), para a construção da dinâmica

de significados na Pedagogia dos Multiletramentos, três elementos são

necessários:

(i) Design disponível (available designs): disponibilização de recursos

com significados, padrões e convenções de significado em um

contexto cultural particular;

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(ii) O próprio processo (designing): trata-se do processo de construção a

partir do design disponível e reconstrução que transforma o

conhecimento, gerando novas construções da realidade;

(iii) O resultado do processo (design the redesigned)20: trata-se do efeito

da transformação realizada por um sujeito a partir da ação sobre um

significado; e o resultado transforma-se num novo design disponível,

fazendo surgir uma nova fonte de construção de sentido, num ciclo.

Dessa forma, somos os verdadeiros designs do futuro.

Na Figura 2 buscamos representar a construção da dinâmica de

significados na Pedagogia dos Multiletramentos:

Figura 2: Dinâmica de significados na Pedagogia dos Multiletramentos.

Fonte: elaboração da autora, baseada em Bevilaqua (2013).

20 Alguns autores têm preferido manter esses termos em inglês.

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Em termos de aprendizagem, segundo Bevilaqua (2013, p. 108), o New

London Group separou seu teor em três momentos: “O ‘Por quê’ da pedagogia

dos Multiletramentos, o ‘O quê’ (baseado no conceito estruturador de Design) e

o ‘Como’”. Com relação ao ‘Como’, Cope e Kalantzis (2009, p. 17-19) propõem

um enquadramento teórico, composto por quatro gestos didáticos21,

considerados não hierárquicos e tampouco estanques:

1) Experienciamento: devido à cognição humana ser socioculturalmente

situada e contextual, assume duas formas: “Experienciando o

conhecido”, que implica em refletir sobre nossas próprias experiências,

interesses, perspectivas, formas familiares de se expressar e

representar o mundo de acordo com nosso entendimento; e

“Experienciando o novo”, que implica em observar ou ler o

desconhecido, conhecer novas situações, sermos expostos a novas

informações e experiências.

2) Conceitualização: processo de conhecimento no qual os estudantes se

apropriam da teoria e dos conceitos. Nessa perspectiva, os estudantes

devem ser ativos, construindo, por meio de modelos mentais, esquemas

e estruturas mais abstratas, indo do campo experiencial para o campo

do conceitual.

3) Enquadramento crítico: envolve certo tipo de capacidade crítica, que,

nesse sentido, pode significar “analítico” ou crítico propriamente dito. No

significado analítico, incluem-se processos de raciocínio, inferência e

deduções, ao se analisarem conexões lógicas e textuais. O segundo

significado, considerado mais crítico que funcional, inclui a avaliação de

suas próprias perspectivas e a das outras pessoas, interesses e

motivações.

4) Aplicação22: se divide em “aplicação apropriada” e “aplicação criativa”.

Na primeira perspectiva, implica na aplicação de conhecimentos e

entendimentos em situações do mundo real. É considerada previsível e

esperada. Já a aplicação criativa envolve fazer uma intervenção

21 Esses elementos foram renomeados e teoricamente redefinidos por Cope e Kalantzis, comrelação a textos publicados anteriormente.22 Termos originais em inglês: “Experiencing”, “Conceptualising”, “Analysing” e “Applying”(COPE; KALANTZIS, 2009, p. 17).

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inovadora e criativa no mundo, considerando os interesses, as

experiências e as aspirações do esudante, podendo causar uma

transformação à sua volta.

Esses elementos buscam evidenciar o ponto central da Pedagogia dos

Multiletramentos, ou seja, a preocupação com o ensino na contemporaneidade

e, embora os NLS tenham buscado contribuir com as questões relativas ao

ensino, seu foco é o estudo do letramento.

Resumindo as duas teorias, os NLS e os Multiletramentos, de acordo

com Bevilaqua, é possível sintetizar seus pontos principais (Quadro 1):

Quadro 1: Síntese das teorias NLS e Multiletramentos

CATEGORIAS NOVOS ESTUDOS DOLETRAMENTO – NLS

MULTILETRAMENTOS

Localizaçãoespaço-temporal

Final de 1970, início de 1980;América do Sul (Brasil), América doNorte (Estados Unidos); Europa(Reino Unido)

Metade da década de 1990;América do Norte (Estados Unidos);Europa (Reino Unido) e Oceania(Austrália)

Obras seminais Scribner; Cole (1981), Scollon(1981), Heath (1983), Street (1984);Freire (anos 1970)

New London Group (1996)

Conceitos-chave

- Etnografia;- Contexto social (local, situado);- Letramento autônomo x Letramentoideológico;- Prática de Letramento (contexto,cultura, crença, identidade) eeventos de letramento

- Currículo responsivo, ensino;- Diversidade linguística e cultural,tecnologia;- Letramento (monomodal) xmultiletramentos (multimodal,multicultural e multilinguístico);- Design;- Enquadramento pedagógico:experienciamento,Conceitualização, análise eaplicação.

Fonte: Bevilaqua (2013, p. 111).

Devido a essas múltiplas demandas do mundo atual, com relação às

novas tecnologias, na multiplicidade de linguagens e mídias nos textos e na

formação dos professores para lidar com isso (pensando em atingir os

estudantes), é que começamos a trabalhar numa perspectiva de letramento

estatístico, que passamos a detalhar, buscando relacioná-lo com os NLS e os

Multiletramentos.

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2.4 Letramento estatístico

Para Batanero (2013), o termo “letramento estatístico” tem surgido

espontaneamente entre os estatísticos e educadores estatísticos, para

destacar o que é feito na Estatística, que é agora considerado como parte da

herança cultural necessária para uma educação cidadã, pensando em formar

os estudantes para uma vida plena.

Nesse sentido, Gal (2002, p. 1) considera o letramento estatístico como

“uma habilidade-chave esperada de cidadãos em sociedades sobrecarregadas

de informação, frequentemente vista como um resultado esperado da

escolaridade e como componente necessário do letramento e da numeracia de

adultos”. O autor pondera também que o letramento estatístico apresenta dois

componentes inter-relacionados:

(a) Habilidade de interpretar criticamente e avaliar a informaçãoestatística; os argumentos relativos aos dados; ou os fenômenosestocásticos que se encontrarem em contextos diversos; e, quandofor de relevância, (b) a capacidade de discutir ou comunicar suasreações frente a tais informações estatísticas, assim como oentendimento do significado da informação; suas opiniões sobre asimplicações dessa informação; ou seus vínculos com respeito àaceitabilidade das conclusões dadas (GAL, 2002, p. 2-3, grifos doautor).

Gal (2002, p. 3-4) propõe o que chama de “um modelo de letramento

estatístico”, ou seja, um modelo das bases de conhecimento que os adultos e

também os estudantes em processo de formação deveriam ter disponíveis,

para poderem compreender, analisar e criticar as estatísticas que nos cercam,

baseado em “elementos de conhecimento” e “elementos de disposição”, que,

segundo o autor, não ocorrem separadamente, mas são descritos dessa forma

para facilitar a apresentação.

Explorando o que Gal (2002, p. 7) classifica como “elementos de

conhecimento”, temos a necessidade de “habilidades de letramento” –

letramento compreendido em seu sentido mais geral e próximo do que

trouxemos com Soares (2003) –, que surge pelo fato de as mensagens

estatísticas se apresentarem em textos orais ou escritos e por estar a

informação estatística, muitas vezes, inserida em textos complexos. Ou seja,

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tais habilidades são essenciais para a competência de ler e escrever em

práticas sociais. Gal (2002, p. 7) aponta, ainda, que “o letramento estatístico e

o letramento geral estão interligados”. O “conhecimento estatístico” implica

saber como os dados podem ser produzidos e por que são necessários;

familiarizar-se com os termos básicos, com ideias da estatística descritiva, com

representações em gráficos e tabelas, incluindo sua interpretação, com noções

básicas de probabilidade; e conhecer como as conclusões são alcançadas,

naquela realidade – tudo isso traduzido em termos que esclarecem que houve

compreensão. Com relação ao “conhecimento estatístico”, Gal (2002, p. 9)

ainda completa que incluir em um curso uma grande quantidade de conteúdo

estatístico não é suficiente para garantir o letramento estatístico.

Com relação ao “conhecimento matemático” (GAL, 2002, p. 13)

destacamos o papel de apoio que este vem dar não só ao letramento

estatístico, mas ao conhecimento estatístico; entretanto, o conhecimento

matemático não pode ser o centro do processo, pois existem recursos

tecnológicos de apoio, como calculadoras e computadores. O “conhecimento

contextual”, segundo Gal (2002, p. 15), “é a fonte de significado e a base para

a interpretação dos resultados obtidos”, sobre o que significam no contexto em

que os dados foram gerados. E o “questionamento crítico” (GAL, 2002, p.15)

aparece como recurso para avaliação crítica das informações estatísticas,

principalmente devido à forma como muitas vezes essas informações podem

se apresentar, como, por exemplo, com abuso intencional dos dados,

apresentados de forma sensacionalista.

Quanto ao que Gal (2002, p. 17) chama de “elementos de disposição”,

que estamos entendendo como posicionamento, há uma ênfase no fato de os

conceitos de posição crítica, concepções e atitudes estarem interligados. A

posição crítica está relacionada à atitude de questionamento às informações

que nos chegam, pois certas concepções e atitudes estão “na base de posição

crítica das pessoas”, e estas devem acreditar em seu poder de ação crítica.

Budgett e Pfannkuch (2007, p. 7) acrescentam ao modelo de letramento

apresentado por Gal (2002, p. 7) o que chamam de “componente de

raciocínio”. O componente de raciocínio, segundo esses autores, é composto

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por dois elementos: o conhecimento da argumentação estatística e a

visualização em eventos diários a partir de uma perspectiva estatística. Budgett

e Pfannkuch (2007, p. 7) explicitam que o conhecimento de argumentação

incluiria o raciocínio inferencial da Estatística e a construção de declarações

estatísticas baseadas em dados e gráficos; e o conhecimento em eventos

cotidianos envolveria a consciência heurística que as pessoas usam para o

raciocínio e a visualização sobre generalizações, todos os dias, em eventos da

vida, do ponto de vista estatístico.

Procuramos sintetizar as ideias de letramento estatístico de Gal (2002) e

Budgett e Pfannkuch (2007) no esquema na Figura 3:

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Figura 3: Modelo de letramento estatístico baseado em Gal (2002) e Budgett e Pfannkuch(2007).

Fonte: Elaborado pela autora.

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Em síntese, Gal (2002, p. 19) afirma que o “comportamento

estatisticamente letrado”23 precisa da ativação inter-relacionada dessas bases

de conhecimento (elementos de conhecimento), mencionadas na Figura 3, na

presença da disposição crítica com apoio de crenças e atitudes. Gal (2002, p.

19) realça “o papel-chave que fatores e componentes não-estatísticos

desempenham no letramento estatístico e refletem a natureza abrangente

frequentemente multifacetada das situações nas quais a letramento estatístico

pode ser ativado”, que chamamos de elementos de disposição. Acreditamos

também que os componentes acrescentados por Budgett e Pfannkuch (2007),

o elemento de raciocínio, amplia a percepção de que, ao dar um parecer, seu

raciocínio deve ter evidências baseadas não apenas em opiniões pré-

existentes.

Ainda segundo Gal (2002, p. 19), a pessoa não precisa possuir

plenamente todos esses elementos para ter condições de lidar com as

informações estatísticas; e o letramento estatístico deveria ser visto “como um

conjunto de capacidades que podem existir em graus diversos no mesmo

indivíduo, dependendo dos contextos em que é invocado ou aplicado”.

Carvalho e Solomon (2012) explicitam essas capacidades, ampliando o

conceito de letramento estatístico como parte importante para o exercício da

cidadania e a relevância de sua presença na vida cotidiana:

[...] ter conhecimentos estatísticos e compreendê-los e a capacidadede interpretar os números que nos cercam é uma parte crucial doexercício da cidadania que é reflexiva e participativa, uma vez que,coletivamente ou individualmente, todos nós somos chamados a fazerescolhas com base na análise de dados. Assim, parece que asestatísticas podem e devem ter um papel central na vida cotidiana,conectada à matemática, não apenas por causa das frequentesreferências estatísticas em práticas de consumo regulares, comocompras e gestão do dinheiro, ou em esportes e do tempo, porexemplo, mas também por causa de sua ocorrência em ciênciapolítica e debates, onde o desenvolvimento de uma abordagem críticapara estatísticas e sua utilização em discursos dominantes é umaquestão de justiça social (CARVALHO; SOLOMON; 2012, p. 2)

De acordo com Batanero (2002, p. 2), também podemos entender essa expressão como “odesenvolvimento de uma sociedade estatisticamente culta”, termo presente em diversaspublicações e lemas de eventos internacionais, dada a sua relevância atual.

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Nesse sentido, Watson (2006) apresenta quatro premissas inter-

relacionadas, no planejamento de ações, para tornar possível que os

estudantes alcancem níveis de letramento estatístico necessários para o

exercício da cidadania. A primeira premissa é que a construção da

compreensão adequada, quando se pensa em letramento estatístico, deve

ocorrer dentro do currículo escolar. No Brasil e em muitas partes do mundo,

isso quer dizer dentro do currículo de Matemática, pois esse currículo passou a

incluir temas de Estatística e Probabilidade a partir dos anos de 1990.

A segunda premissa, segundo Watson (2006), é que o letramento

estatístico, embora baseado nos conceitos presentes no currículo escolar, deve

entrelaçar as habilidades de letramento, pensamento crítico, compreensão

contextual e a postura crítica na tomada de decisões.

A terceira premissa é que o desenvolvimento do letramento estatístico

ocorre ao longo do tempo e pode ser alimentado pela constante ampliação da

complexidade dos conceitos e das exigências mais sofisticadas de pensamento

estatístico.

A quarta premissa aponta que tarefas e atividades adequadas são

necessárias para construir a compreensão dos conceitos sobre dados e

probabilidade, presentes no currículo escolar, pensados numa perspectiva de

letramento estatístico e em relação a sua crescente sofisticação, objetivando o

desenvolvimento do pensamento crítico.

Perante estas considerações, temos questões com relação ao ensino e

à aprendizagem da Estatística na escola básica, tais como: O professor está

preparado para ensinar Estatística nessa perspectiva de letramento? Sua

formação inicial contemplou questões que envolviam o letramento estatístico?

Qual o conhecimento necessário para ensinar Estatística, levando em conta as

práticas de letramento?

Passamos a discutir a seguir a formação dos professores e sua

complexidade, bem como a complexidade do conhecimento necessário para

ensinar Estatística, refletindo sobre o desenvolvimento profissional do professor

e o papel potencializador do contexto colaborativo no processo.

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CAPÍTULO 3

Complexidade do Desenvolvimento Profissional naFormação de Professores

“Ninguém começa a ser educadornuma certa terça-feira

às quatro horas da tarde.Ninguém nasce educador oumarcado para ser educador.

A gente se faz educador,a gente se forma, como educador,

permanentemente, na práticae na reflexão sobre a prática”

(Paulo Freire, 1991, p. 32)

De acordo com Passos et al. (2006), os termos “formação” e

“desenvolvimento profissional” são, muitas vezes, usados como sinônimos;

outras, com sentidos distintos. Em ambos os casos, esses sentidos passaram

por transformações ao longo do tempo. A seguir refletiremos sobre algumas

ideias relativas à complexidade do desenvolvimento profissional, sem a

intenção de esgotar o tema ou de fazer uma análise histórica. Com o propósito

de aprofundamento, retomá-las-emos continuamente ao longo da tese.

3.1 Formação de professores

Para Passos et al. (2006, p. 194), a palavra “formação”, em seu sentido

comum, “pode ser entendida como ‘dar forma’, modelar algo ou alguém de

acordo com um modelo que se presume ser o mais ideal”. Complementam

ainda que “indica um movimento externo ao objeto e que pressupõe a ação de

alguém (formador) e de uma instituição sobre um objeto de formação – o futuro

professor ou o professor em serviço”. Nesse sentido, Fullan e Hargreaves

(2001, p. 41) também ressaltam que “muitas das iniciativas de formação

contínua assumem a forma de algo que é feito aos professores e não com eles,

muito menos por eles”.

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Sobre esse tema, Ponte (1995) pondera que a “formação” estava muito

associada à ideia de frequentar cursos, e esses eram compartimentados por

assuntos ou disciplinas. Ele critica aquela formação, por considerá-la como um

movimento de fora para dentro, em que o professor assimilava os

conhecimentos e a informação que lhe eram transmitidos. Nessa concepção de

formação, segundo Passos et al. (2006), quem assume o protagonismo da

ação de formar é o formador, e não o formando.

Ainda sobre a formação de professores, em estudos mais recentes, Ponte

(2011, p. 303) menciona que “há um consenso generalizado de que a formação

de professores é um elemento essencial para a qualidade do ensino de

qualquer assunto, incluindo estatística”, complementando que a formação dos

professores costuma ser, frequentemente, alvo de fortes críticas. Citando Smith

(2001), Ponte (2011, p. 303-304) comenta que os programas de formação de

professores veem o ensino como técnico e rotineiro, são de curta duração,

muitas vezes, sem relação com a prática e “tendem a seguir um modelo

‘acadêmico’, com um currículo predefinido e atividades estruturadas com base

em um paradigma de transmissão de conhecimentos”. Ponte (2011) também

menciona que esses cursos têm pouco impacto sobre a prática da sala de aula.

Segundo Almeida (2011, p. 1), tem havido mudanças:

A formação de professores tem evoluído, ao longo dos anos, de umaformação focalizada no professor, para um conceito de formaçãomais abrangente em que, para além do professor, as escolas,enquanto contextos, e também os alunos, assumem um papelimportante, sendo considerados tema e conteúdo relevantes naformação.

Na perspectiva apresentada por Almeida (2011), a escola deixa de ser um

local de aprendizagem exclusiva dos estudantes, mas, articulada aos

processos de formação, é o contexto em que eles atuam. A escola também se

torna um espaço conjunto de interação, visando à melhoria dos processos de

ensino e aprendizagem e a inovação.

Ponte (2011, p. 304) menciona que a formação de professores (inicial ou

continuada) deve se apoiar num processo de desenvolvimento profissional, que

se enquadra em “interagir e compartilhar experiências com outros professores

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e requer articulação de interesses, necessidades e recursos de professores e

seus contextos profissionais”. Passamos, então, a discutir sobre o

desenvolvimento profissional dos professores, buscando superar os conceitos

de formação de professores – inicial e contínua, ou continuada – que na

maioria das vezes não consideram os futuros professores e professores como

produtores de conhecimento e entendem que eles precisam frequentemente se

atualizar com novos saberes e práticas produzidos por especialistas.

3.2 Complexidade do desenvolvimento profissional dos professores

O conceito de desenvolvimento profissional tem sofrido modificações ao

longo do tempo. Nossa abordagem assume a perspectiva de o professor ser

profissional do ensino.

Day (2001, p. 20-21), numa visão holística do desenvolvimento

profissional de professores, apresenta uma definição que busca expressar a

reflexão sobre a complexidade do processo:

O desenvolvimento profissional envolve todas as experiênciasespontâneas de aprendizagem e as atividades conscientementeplanejadas, realizadas para benefício, direto ou indireto, do indivíduo,do grupo ou da escola e que contribuem, através destes, para aqualidade da educação na sala de aula. É o processo através do qualos professores, enquanto agentes de mudanças, reveem, renovam eampliam, individual ou coletivamente, o seu compromisso com ospropósitos morais do ensino, adquirem e desenvolvem, de formacrítica, juntamente com as crianças, jovens e colegas, oconhecimento, as destrezas e a inteligência emocional, essenciaispara uma reflexão, planejamento e prática profissionais eficazes, emcada uma das fases das suas vidas profissionais.

Tal definição, além de buscar expressar a reflexão sobre a complexidade

do processo de desenvolvimento profissional, revela também que se atribui um

papel fundamental à investigação sobre a aprendizagem e sobre o

desenvolvimento do professor para o sucesso dos processos de ensino-

aprendizagem.

Desenvolver-se profissionalmente, de acordo com Ferreira (2003, p. 36),

“poderia ser entendido como aprender a caminhar para a mudança, ou seja,

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ampliar, aprofundar e/ou reconstruir os próprios saberes e prática e

desenvolver formas de pensar e agir coerentes”, e os “conceitos de

aprendizagem, mudança e desenvolvimento profissional se encontram

entrelaçados”. Ferreira (2003, p. 40) destaca ainda que

o processo de desenvolvimento profissional envolve a ideia deaprender, de tornar-se sujeito do próprio processo de aprendizagem.Depende, então, de sua insatisfação com seus conhecimentos e/ouprática de ensino atuais, ou ainda, do desejo de desenvolvê-lo. Não épossível crescer, aprender ou decidir pelo professor. É ele quemprecisa sentir-se motivado e mobilizado para agir.

Day (2001) afirma também que todo desenvolvimento profissional envolve

aprendizagem e, necessariamente, mudança, que só ocorre se o professor

quiser mudar. Lopes (2008b, p. 68) comenta a importância de a mudança partir

do próprio professor:

O processo de desenvolvimento profissional e de mudançadependerá principalmente do próprio professor, do quanto suainsatisfação frente a seus conhecimentos e/ou práticas de ensinoatuais o inquieta e também de sua vontade e empenho emdesenvolvê-los e aprimorá-los.

Esse processo de desenvolvimento profissional, com a mudança partindo

dos professores, possibilita, de acordo com Fiorentini e Nacarato (2005, p. 9),

[...] ajudá-los a se tornar os principais protagonistas de seudesenvolvimento profissional e do processo educacional à medidaque participam da construção dos conhecimentos do trabalho docentee da construção do patrimônio cultural do grupo profissional ao qualpertencem.

Embora tenhamos ressaltado o papel central do professor na mudança,

de acordo com Day (2001), Lopes (2008b) e Fiorentini e Nacarato (2005), é

importante mencionar também, assim como Oliveira (2012, p. 44), que essa

condição de sujeito reflexivo, a exaltação de sua autonomia e seu

protagonismo, “é temperado pelo peso dos constrangimentos e das

responsabilidades, o que pode resultar em fonte de cobrança individual e de

sofrimento profissional”. Ou seja, não basta apenas o desejo do professor de

mudar, pois há o risco de colocar a responsabilidade apenas nele,

responsabilizando-o caso a mudança não ocorra. Concordamos com Oliveira

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(2012, p. 45) que “resta indagar se teriam os docentes as condições objetivas e

subjetivas de se assumirem como sujeitos nessas políticas” públicas.

Ponte (1998, p. 10 e p. 11) defende que tanto o aspecto coletivo quanto

o individual do desenvolvimento profissional são importantes, complementando

que o desenvolvimento individual de cada professor “é algo que é da sua inteira

e total responsabilidade”, pois cabe a ele “investir na profissão, agir de modo

responsável, definir metas para o seu progresso, fazer balanços sobre o

percurso realizado, refletir com regularidade sobre a sua prática, não fugir às

questões incômodas, mas enfrentá-las de frente”. Estas são atitudes que o

professor terá que valorizar e podem ser favorecidas pelo contexto, em

especial o colaborativo (desenvolvimento profissional coletivo), pois dá a ele a

oportunidade de interagir, compartilhar experiências e se sentir apoiado. Sobre

esse tema, Nóvoa (1992, p. 26-27, grifos do autor) expõe que

práticas de formação contínua organizadas em torno dos professoresindividuais podem ser úteis para a aquisição de conhecimentos etécnicas, mas favorecem o isolamento e reforçam uma imagem dosprofessores como transmissores de um saber produzido no exteriorda profissão. Práticas de formação que tomem como referência asdimensões coletivas contribuem para a emancipação profissional epara a consolidação de uma profissão que é autônoma na produçãodos seus saberes e dos seus valores.

Um estudo realizado pelo GEPFPM24, cujo foco de investigação foi a

formação e o desenvolvimento profissional do professor de Matemática,

evidenciou que há múltiplos fatores que participam e interferem no processo de

desenvolvimento profissional, fatores “pessoais, sociais, culturais, históricos,

institucionais, cognitivos e afetivos” (PASSOS et al., 2006, p. 196). Esse estudo

também identificou algumas práticas consideradas promotoras do

desenvolvimento profissional em diferentes espaços considerados formativos:

práticas coletivas de reflexão, colaboração e investigação; reflexão e

investigação sobre a própria prática e análise sistemática sobre a experiência

realizada; produção de diários reflexivos – geralmente narrativos – sobre o

processo de vir a ser professor; participação ativa como docente ou discente

em processos de inovação curricular; projetos de formação inicial e continuada

24 Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Formação de Professores que Ensinam Matemática –FE/Unicamp.

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de professores acompanhados de um processo reflexivo; e problematização e

reflexão sistemática sobre a prática docente.

Concordamos com as características apontadas por Marcelo (2009, p.

10-11), a respeito de uma “nova perspectiva” de desenvolvimento profissional,

a qual estamos assumindo para o desenvolvimento de nossa análise:1) Baseia-se no construtivismo, e não nos modelos transmissivos,

entendendo que o professor é um sujeito que aprende de forma ativa aoestar implicado em tarefas concretas de ensino, avaliação, observação ereflexão;

2) Entende-se como sendo um processo a longo prazo, que reconhece que osprofessores aprendem ao longo do tempo. Assim sendo, considera-se queas experiências são mais eficazes se permitirem que os professoresrelacionem as novas experiências com seus conhecimentos prévios. Paraisso, é necessário que se faça um seguimento adequado, indispensávelpara que a mudança se produza;

3) Assume-se como um processo que tem lugar em contextos concretos. Aocontrário das práticas tradicionais de formação, que não relacionam assituações de formação com as práticas em sala de aula, as experiênciasmais eficazes para o desenvolvimento profissional docente são aquelasque se baseiam na escola e que se relacionam com as atividades diáriasrealizadas pelos professores;

4) O desenvolvimento profissional docente está diretamente relacionado comos processos de reforma da escola, na medida em que este é entendidocomo um processo que tende a reconstruir a cultura escolar e no qual seimplicam os professores enquanto profissionais;

5) O professor é visto como um prático reflexivo, alguém que é detentor deconhecimento prévio quando acede à profissão e que vai adquirindo maisconhecimento a partir de uma reflexão acerca de sua experiência. Assimsendo, as atividades de desenvolvimento profissional consistem em ajudaros professores a construir novas teorias e novas práticas pedagógicas;

6) O desenvolvimento profissional é concebido como um processocolaborativo, ainda que se assuma que possa existir espaço para otrabalho isolado e para a reflexão;

7) O desenvolvimento profissional pode adotar diferentes formas emdiferentes contextos. Por isso mesmo, não existe um e só um modelo dedesenvolvimento profissional que seja eficaz e aplicável em todas asescolas. As escolas e docentes devem avaliar as suas própriasnecessidades, crenças e práticas culturais para decidirem qual o modelo dedesenvolvimento profissional que lhes parece mais benéfico.

Consideramos que tornar os professores protagonistas de seu processo

de formação é uma possibilidade para sua formação na perspectiva do

letramento estatístico, assumindo o caminho apontado por Ponte (1998, 2011)

e Nóvoa (1992), para que o professor possa se formar, fazendo investigações

favorecidas por um contexto colaborativo e se assumindo como “fazedor de

Estatística” (CARVALHO; SOLOMON, 2012), segundo Godino, Batanero e

Flores (1998). Nesse processo, considerando o protagonismo do professor

para o desenvolvimento curricular e profissional, as práticas apontadas como

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potencializadoras por Passos et al. (2006) e Marcelo (2009) convergem para a

incorporação do docente em grupos de investigação.

Passamos agora a refletir sobre os processos de formação e

desenvolvimento profissional especificamente para o ensino e a aprendizagem

da Estatística, para depois refletir sobre os grupos de investigação,

especialmente os colaborativos.

3.3 Complexidade do conhecimento necessário para ensinarEstatística

Além da complexidade do desenvolvimento profissional, também tivemos

em mente a complexidade do conhecimento necessário aos professores e

futuros professores, para efetivamente incorporarem o trabalho de ensinar e

aprender no processo de desenvolvimento profissional. Shulman (1987) afirma

que, para agir na sala de aula, o professor deve ter uma base de conhecimento

para o ensino e dominar o processo pelo qual os conhecimentos profissionais

são construídos.

Segundo Mizukami (2004, p. 4), a base de conhecimento para o ensino

refere-se à questão: “O que um professor necessita saber para ser professor?”.

Ou, mais especificamente no nosso caso: o que um professor que vai ensinar

Estatística nos anos iniciais do Ensino Fundamental deve saber, de forma que

esse repertório lhe possibilite a construção de novos conhecimentos?

Mizukami (2004, p. 4) apresenta que a base de conhecimento para o

ensino

[..] consiste de um corpo de compreensões, conhecimentos,habilidades e disposições que são necessários para que o professorpossa propiciar processos de ensinar e aprender, em diferentes áreasdo conhecimento, níveis, contextos e modalidades de ensino.

Nesse sentido, ainda de acordo com Mizukami (2004), a base de

conhecimento não pode ser considerada como fixa ou imutável; é mais limitada

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na formação inicial; e pode se tornar mais aprofundada, diversificada e flexível

a partir da experiência profissional.

Shulman (1987, p. 8) explicitou alguns tipos de conhecimento ou

categorias dessa base de conhecimento, considerando o conceito de ensino

como profissão: “conhecimento de conteúdo específico”; “conhecimento

pedagógico geral”; “conhecimento do currículo”; “conhecimento pedagógico do

conteúdo”; “conhecimento dos estudantes e suas características”;

“conhecimento dos contextos educativos”; e “conhecimento dos objetivos,

metas e valores educacionais”.

Tomando como referência Shulman (1987) e Mizukami (2004),

detalhamos estes conhecimentos, exemplificando-os à luz de nossos

referenciais do ensino de Estatística

1) Conhecimento de conteúdo específico: conhecimento dos conteúdos

das disciplinas escolares, ou conhecimento da matéria/assunto.

Considerado imprescindível para a docência e para que o professor

possa constituir-se como mediador entre os conhecimentos

historicamente produzidos e os conhecimentos escolares de uma

determinada modalidade de ensino, como os anos iniciais do Ensino

Fundamental, por exemplo, oferecendo condições para que o

estudante se aproprie deles. No caso do ensino de Estatística, o

conhecimento de conteúdo específico para o ensino trata, por

exemplo, de identificar os conteúdos estatísticos para a interpretação

de determinada reportagem que apresenta um gráfico.

2) Conhecimento pedagógico geral: considerado conhecimento que

transcende a área específica, ou seja, são os conhecimentos

necessários à transformação do conteúdo a ser ensinado em conteúdo

a ser aprendido, incluindo, para isso, processos didáticos, motivação,

estratégias de manejo da sala de aula, organização, entre outros. É

constituído pelo conhecimento da Estatística e de sua transformação

em conteúdo a ser aprendido, transcendendo a área específica

(Estatística).

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3) Conhecimento do currículo: refere-se ao conhecimento tanto do

currículo específico da matéria/assunto ou disciplina de determinada

modalidade de ensino quanto da relação delas com a organização e a

estruturação dos conhecimentos escolares. Ajuda os professores a

compreenderem como os conteúdos a serem ensinados se interligam

ao longo do tempo. Por exemplo, como a descrição de uma população

(estudantes da turma) pode auxiliar, no futuro, na compreensão do uso

de amostras para fazer inferências sobre uma população bem maior.

4) Conhecimento pedagógico do conteúdo: é considerado específico da

docência e é construído pelos professores a partir de suas atuações

em situações concretas de ensino e aprendizagem. O conhecimento

pedagógico da Estatística implica especificamente no conhecimento

necessário para as tarefas relacionadas ao ensino, como a gestão da

sala de aula, que vão além do escopo do assunto, e é constituído

constantemente pelo professor ao ensinar a matéria (Estatística).

Segundo Mizukami (2004), é enriquecido com a interação dos

diferentes tipos de conhecimentos e é o único conhecimento em que o

professor pode estabelecer uma relação de protagonismo. Possuir o

conhecimento da Estatística e de seu ensino implica em ter um

repertório de estratégias de conteúdos específicos para os conceitos a

serem ensinados. Esse conhecimento da Estatística e de seu ensino

emerge da prática dos professores experientes ou inexperientes

5) Conhecimento dos estudantes e suas características: envolve o

conhecimento dos estudantes e da forma como aprendem, de acordo

com suas especificidades, nas dimensões cognitiva, emocional, social,

motora e interacional. Consiste no entrelaçamento do conhecimento

da Estatística com o conhecimento do modo como os estudantes

pensam, sabem e aprendem esse conteúdo, antecipando, inclusive,

possíveis dificuldades.

6) Conhecimento dos contextos educativos: envolve tanto o

microssistema relacionado ao trabalho dos estudantes (em grupos ou

na sala de aula), quanto o microssistema que abrange as

particularidades sociais e culturais da comunidade em que está a

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escola, passando pela administração e gestão da escola. Ajudaria a

entender questões subjacentes, como, por exemplo, o currículo como

política, em relação ao conhecimento oficial, e sua relação com os

materiais disponíveis ou com as propostas de formação de

professores.

7) Conhecimento dos objetivos, das metas e dos valores educacionais:

engloba o conhecimento dos fins e propósitos educacionais e de seus

fundamentos filosóficos e históricos, e também contribui para a

compreensão de questões relativas a propostas pedagógicas e de

formação, por exemplo.

Embora as bases do conhecimento estejam apresentadas

separadamente, na prática são todas entrelaçadas, daí a razão de denomina-

las “complexas” e nossa intenção não é dividi-las, pois proceder dessa forma

seria banalizá-las e reduzir sua complexidade. E também concordamos que

essa divisão não é adequada como referência para medir o quanto os

professores e futuros professores sabem ou mesmo para resolver problemas

curriculares num curso de formação de professores ou para ensinar Estatística,

reduzindo-os a itens de testes; Porém consideramos que essas bases de

conhecimento nos ajudam a compreender as experiências que compartilhamos

com os participantes do grupo Estatisticando no contexto colaborativo, nas

análises do processo ocorrido. Esse contexto não foi aqui apresentado ainda,

mas será discutido a seguir, e as experiências vivenciadas no grupo, mais

adiante.

Shulman (1987, p. 15) também propõe um segundo modelo, ponderando

que a base de conhecimento para o ensino compreende processos presentes

nas ações educativas. A esse processo chamou de “processo de raciocínio

pedagógico”, buscando retratar como os conhecimentos são acionados,

relacionados e construídos durante o processo de ensino e aprendizagem. Ele

também defende que a maior parte do ensino é desencadeada por algum tipo

de texto (um livro, o currículo, conjunto de objetivos, material didático,

instruções didáticas entre outros), a partir do qual o processo de raciocínio

pedagógico pressupõe a existência de um ciclo composto por momentos de

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“compreensão”, “transformação”, “instrução”, “avaliação”, “reflexão” e “nova

compreensão”, buscando identificar a maneira como o professor pensa e

coloca em prática, buscando a melhor forma de ensinar. Ele considera a

compreensão como ponto culminante ou disparador do processo e menciona

seis aspectos comuns ao ato de ensinar, que listamos a seguir:

1. Compreensão: dos objetivos, da estrutura da matéria e das ideias

dentro e fora da disciplina.

2. Transformação: envolve outros quatro subprocessos. São eles: a

interpretação (análise crítica de textos, a partir do próprio

entendimento do conteúdo específico da área), a representação

(conjunto de analogias, metáforas, exemplos, demonstrações,

explicações a serem usadas de acordo na transformação do conteúdo

em ensino), a adaptação (levando em conta a adequação às

características dos estudantes) e a consideração de estudantes

específicos (ou personalização, para casos específicos).

3. Instrução ou aplicação: consiste em colocar em prática e envolve a

organização e a gestão da classe, individualmente ou nos trabalhos

em grupo, em exposição e dosagem do conteúdo, nas interações, na

coordenação das atividades, nos questionamentos levantados.

4. Avaliação: trata-se da averiguação da compreensão dos estudantes

sobre o que foi ensinado, durante e depois da aplicação ou instrução.

Também tem o papel de avaliar o próprio desempenho docente e

adaptar-se às experiências.

5. Reflexão: implica rever, reconstruir e analisar criticamente o

desempenho docente e o da classe, ou seja, consiste em processos

reflexivos sobre a ação pedagógica.

6. Nova compreensão: dos objetivos, da matéria, dos estudantes, do

ensino e sobre si mesmo. Consolidação de novas formas de entender

e aprender com a experiência.

Embora os processos neste modelo sejam apresentados

sequencialmente, não se destinam a representar uma série de etapas ou fases

fixas. Muitos podem ocorrer numa ordem diferente, segundo Shulman (1987),

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porém reforçamos a ideia de que a partir deles o conhecimento é acionado,

relacionado e construído.

3.4 Contexto colaborativo

Apesar de o termo “colaboração” estar aparecendo com mais frequência

em trabalhos que estudam o desenvolvimento profissional, o seu significado

nem sempre é o mesmo. Hargreaves (1998) aponta a existência de quatro

formas gerais de culturas docentes25: o individualismo, a colaboração, a

colegialidade artificial e a balcanização, cada uma delas com implicações

diferentes para o trabalho do professor e para a mudança educativa.

O individualismo, que tem como sinônimos, segundo Hargreaves (1998),

o isolamento e o privatismo, pode oferecer privacidade e proteção em relação

às interferências exteriores, de atribuições de culpa e de críticas, mas acarreta

problemas, pois também restringe o aparecimento de elogios e, principalmente,

apoio. Em oposição ao individualismo, são consideradas culturas que

potencializam o desenvolvimento profissional: a colaboração e a colegialidade.

Em ambas, os professores trabalham em conjunto, mas elas diferem pelo tipo

de controle e intervenção administrativa que ocorre. Na colegialidade – à qual o

autor acrescenta o termo “artificial” – há princípios cooperativos próprios das

associações humanas, mas as relações são reguladas administrativamente,

compulsivas, orientadas para a implementação, fixas no tempo e no espaço e

previsíveis (HARGREAVES, 1998, p. 219-220), ou seja, não são espontâneas

e voluntárias, o que torna o trabalho em conjunto uma obrigação regulada

administrativamente, a fim de implementar uma ordem da direção de escola,

por exemplo, ou uma norma em nível estadual. O autor aponta como

consequências da colegialidade artificial a inflexibilidade e a ineficiência, que

comprometem o profissionalismo dos professores.

25 O sentido de cultura docente compreende, de acordo com Hargreaves (1998), crenças,valores, hábitos e formas assumidas de fazer as coisas em comunidades de professores, queajudam a dar sentido, apoio e identidade aos docentes e ao seu trabalho.

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Na cultura da colaboração, de acordo com Hargreaves (1998, p. 216-

217), as relações tendem a ser espontâneas, voluntárias, orientadas para o

desenvolvimento, definidas no tempo e no espaço e imprevisíveis. Costumam

partir dos próprios professores, não há constrangimentos administrativos ou de

coerção, a prioridade não é um calendário com tempo fixo. Uma vez que o

controle daquilo que desenvolvem está nas mãos dos professores, os

resultados não podem ser previstos.

Quanto à balcanização26, Hargreaves (1998, p. 240-242) a apresenta

como uma cultura em que não há o isolamento, mas também não há um

trabalho com a maior parte de seus pares. Ocorrem, então, subgrupos –

disciplinas ou níveis escolares, por exemplo –, embora a balcanização não

consista simplesmente num trabalho em grupos menores. Segundo o autor, ela

tem “permeabilidade baixa”, “permanência elevada”, “identificação pessoal” e

“compleição política”. Nesse caso, então, os grupos tendem a estar isolados

uns dos outros e a ter uma fronteira clara entre si. Uma vez estabelecidos, a

permanência tende a ser estável. A forte identificação pessoal leva a

enfraquecer a empatia e a colaboração com outros grupos. O autor também

aponta que nesse tipo de cultura há diferentes status, dinâmicas de poder e de

interesses.

Assumimos então, a perspectiva da colaboração, defendida por

Hargreaves como potencializadora do desenvolvimento profissional e, em

consonância com nossos propósitos, aquela em que “professores da escola e

da universidade, mestrandos e doutorandos e futuros docentes podiam, juntos,

aprender a enfrentar o desafio da escola atual” (FIORENTINI, 2011, p. 7, grifo

do autor). Quando assumimos a ideia de “juntos”, estamos pensando na

proposta de trabalho em grupo, de um grupo colaborativo, assumindo, como

Fiorentini (2004), que na colaboração:

[...] todos trabalham conjuntamente (co-laboram) e se apóiammutuamente, visando atingir objetivos comuns negociados pelocoletivo do grupo. Na colaboração, as relações, portanto, tendem aser não-hierárquicas, havendo liderança compartilhada e co-

26Designa um processo de fragmentação de um país ou região em partes menores, comelevado nível de tensão e hostilidade. De acordo com Fiorentini (2004, p. 49), Hargreaves(1998) “tomou como modelo o processo de balcanização do Leste Europeu e que envolveu aSérvia, a Croácia e a Eslovênia”.

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responsabilidade pela condução das ações. (FIORENTINI, 2004, p.52)

De acordo com Coelho (2010, p. 17), quando um grupo é formado nesse

sentido da colaboração, com pessoas dispostas a compartilhar

espontaneamente algo de interesse comum – no nosso caso, o letramento

estatístico –, “as distintas contribuições e os diferentes níveis de participação

oferecem condições satisfatórias para a geração de conhecimento e para o

crescimento pessoal dos participantes”.

Sobre isso Fiorentini (2010, p. 582) defende

Em cada grupo colaborativo os formadores, professores e futurosprofessores analisam e discutem os problemas e desafios trazidospelos professores, episódios de aula narrados e documentados pelosprofessores, e negociam conjuntamente significados e outraspossibilidades de intervenção em suas práticas escolares, sobretudotarefas e atividades exploratório-investigativas (FIORENTINI, 2010, p.582).

Quando nos envolvemos nesse processo de desenvolvimento

profissional, num contexto colaborativo, o formador que investiga e apoia o

processo, o professor e o futuro professor, juntos desenvolvem um trabalho

que requer, de acordo com Ferreira (2003), identificar os conhecimentos

teóricos e práticos para desenvolver um ensino efetivo e significativo para os

estudantes e assumir que os professores também constroem conhecimento,

analisando-os; tomando a aprendizagem como um processo contínuo; levando

em conta a contextualização e também a realidade escolar na qual está

inserido ou da qual futuramente fará parte.

Desejando criar um contexto colaborativo, na perspectiva de Fiorentini

(2010), e constituir uma comunidade de aprendizagem profissional e de

pesquisa sobre a prática de ensinar e aprender Estatística nas escolas, é que

planejamos nosso trabalho de campo, que passará a ser detalhado a seguir,

com a apresentação ao leitor do grupo Estatisticando e do processo de sua

criação. Também detalharemos os aspectos metodológicos que nos levaram a

desenvolvê-lo.

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CAPÍTULO 4

Metodologia da Investigação

“Pesquisa é o que permitea interface criativa

entre teoria e prática”(Ubiratan D’Ambrosio, 1996)

4.1 Ponto de partida

Querendo compreender as aprendizagens e o desenvolvimento

profissional de professores e futuros professores da Educação Infantil e dos

anos iniciais do Ensino Fundamental (estudantes de 6 a 10 anos) quando estão

num contexto colaborativo e são instigados a trabalhar com Estatística numa

perspectiva de letramento(s), caminhando em direção ao letramento estatístico,

objetivamos, do ponto de vista investigativo:

Compreender o processo de desenvolvimento profissional na

perspectiva do letramento estatístico em contextos colaborativos,

evidenciando indícios de desenvolvimento de conhecimento e de

desenvolvimento pessoal como participantes de um grupo de

professores e futuros professores que se reúnem para estudar

Estatística.

Do ponto de vista formativo, enquanto grupo, também objetivamos:

A partir dos eventos de letramento, contribuir para o desenvolvimento

profissional dos participantes, no que diz respeito ao conhecimento,

perspectivando o letramento estatístico, para que possamos criar

situações em que eles venham a se desenvolver pessoal e

profissionalmente.

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Para que possamos atingir os objetivos propostos, buscaremos evidenciar o

que os professores e futuros professores já sabem sobre a temática, as novas

aprendizagens na participação de um grupo que se propõe colaborativo, as

ressignificações e as transformações no processo de estudo no contexto

colaborativo; analisar os eventos ou episódios de práticas de letramento que se

constituíram no contexto colaborativo, evidenciando os aspectos do letramento

estatístico; ressaltar indícios de como foi revelada, pelos professores e futuros

professores, ao longo dos encontros, sua confiança em trabalhar, com as

crianças dos anos iniciais do Ensino Fundamental, propostas que envolvem a

Estatística; e narrar sobre isso.

De acordo com os objetivos e com os procedimentos para alcançá-los,

decidimos desenvolver uma investigação qualitativa, buscando valorizar a

descrição detalhada das pessoas, das interações, de suas concepções, da

trajetória vivenciada pelo grupo.

De acordo com Bogdan e Biklen (1994), a investigação qualitativa possui

cinco características:

1) Na investigação qualitativa a fonte direta de dados é o ambientenatural, constituindo o investigador o instrumento principal;

2) A investigação qualitativa é descritiva;

3) Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo doque simplesmente pelos resultados ou produtos;

4) Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados deforma indutiva;

5) O significado é de importância vital na abordagem qualitativa(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 47-50),

Consideramos que essas características são adequadas a este estudo27,

pois, cientes da importância do contexto e sua influência no comportamento

dos participantes, recolhemos os dados no grupo Estatisticando, ou seja, na

situação, complementando as informações quando necessário e, com isso,

buscando captar a riqueza nos dados, na dinâmica, nos detalhes, respeitando

os participantes, descrevendo e transcrevendo os encontros e usando o diário

de pesquisa. Também buscamos mostrar como nossas expectativas se

27 Bogdan e Biklen (1994) apontam que nem todos os estudos deixam todas as característicasregistradas fortemente e ainda podem apresentar uma ou mais características.

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traduziram nos encontros do grupo, durante as discussões de situações

pedagógicas, no estudo e na interação entre os participantes. Além disso, os

dados não foram analisados para confirmar ou refutar uma hipótese prévia,

mas para mostrar a forma com que foram agrupados durante o percurso, ou

seja, foram utilizados de forma indutiva, interessando-nos mais pelo percurso

dos professores no grupo e pela forma com que dão sentido ao seu

desenvolvimento profissional que por um produto final.

Na abordagem qualitativa, optamos pelo estudo de caso, que, segundo

Ponte (2006, p. 2), tem como objetivos “conhecer uma entidade bem definida

como uma pessoa, uma instituição, um curso, uma disciplina, um sistema

educativo, uma política ou qualquer outra unidade social” e também

“compreender em profundidade o ‘como’ e os ‘porquês’ dessa entidade,

evidenciando a sua identidade e características próprias, nomeadamente nos

aspectos que interessam ao pesquisador”.

De acordo com Ludke e André (1986, p. 17), “o caso é sempre bem

delimitado, devendo ter seus contornos claramente definidos no desenrolar do

estudo”, e também “o caso pode ser similar a outros, mas é ao mesmo tempo

distinto, pois tem um interesse próprio, singular”.

André (2005) caracteriza o estudo de caso como um tipo de

conhecimento, tendo como questão fundamental o que se aprende ao estudar

o caso. Segundo Merrian (apud ANDRÉ, 2005), o conhecimento gerado pelo

estudo de caso é mais concreto, mais contextualizado, mais voltado para a

interpretação do leitor e baseado em populações de referência determinadas

pelo leitor. Especificando cada aspecto:

Mais concreto – configura-se como um conhecimento que encontraeco em nossa experiência porque é mais vivo, concreto e sensório doque abstrato.

Mais contextualizado – nossas experiências estão enraizadas numcontexto, assim também o conhecimento nos estudos de caso. Esseconhecimento se distingue do conhecimento abstrato e formalderivado de outros tipos de pesquisa.

Mais voltado para a interpretação do leitor – os leitores trazem paraos estudos de caso as suas experiências e compreensões, as quaislevam a generalizações quando novos dados do caso sãoadicionados aos velhos.

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Baseado em populações de referência determinadas pelo leitor – aogeneralizar, os leitores têm certa população em mente. Assim,diferente da pesquisa tradicional o leitor participa ao estender ageneralização para a população de referência (MERRIAN apudANDRÉ, 2005, p. 17).

Avaliamos que estudo de caso foi uma opção adequada, pois foram

considerados como nosso caso o grupo Estatisticando, formado por uma

pesquisadora, professores e futuros professores dos anos iniciais do Ensino

Fundamental – um caso especial, que possui uma especificidade própria, que

se desenvolve em determinadas condições e consideramos que merece ser

estudado. Quisemos investigar os saberes, as reflexões, os conflitos, as

aprendizagens desse grupo, a partir dessa proposta de investigação, e tendo

como questão norteadora:

Que indícios de desenvolvimento profissional apresentam osprofessores e futuros professores da Educação Infantil e dos anosiniciais do Ensino Fundamental em contextos colaborativos em práticasde letramento estatístico?

Embora nosso contexto seja de um grupo colaborativo, esta não é uma

pesquisa colaborativa, segundo Fiorentini (2004), pois a autoria, o processo de

escrita e a análise são reservados a uma única pessoa, a pesquisadora, que

neste estudo fez parte do grupo e atuou como formadora, almejando colaborar

no processo para a formação dos participantes. No contexto colaborativo do

grupo, buscamos priorizar uma produção de saberes que se norteasse pela

concepção de “conhecimento-da-prática”, que toma o professor como centro da

geração de conhecimento e o trabalho colaborativo em comunidades de

investigação, apontados por Cochran-Smith e Lytle (1999, p. 2828) como

fundamentais:

A base desta concepção de conhecimento-da-prática é que osprofessores, ao longo de sua vida, têm papel central e crítico nageração de conhecimento sobre a prática, uma vez que suas salas deaula são locais de investigação, e, ao conectar seu trabalho nasescolas a questões mais amplas, assumem um ponto de vista críticona teoria e pesquisa de outros. Redes de professores, comunidades

Tradução para uso de um subgrupo do Prapem.

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de investigação e outros coletivos escolares nos quais os professorese outros somam esforços para construir conhecimento são o contextoprivilegiado para o aprendizado do professor neste contexto.

No que se refere à recolha de dados da pesquisa, foram utilizados:

1) Gravações de áudio e vídeos29;

2) Ficha de identificação do perfil dos participantes preenchida

individualmente e uma caracterização oral respondida em grupo;

3) Material trazido e produzido pelos participantes;

4) Análises narrativas produzidas por participantes do grupo.

Além disso, também tivemos o diário de pesquisa, que subsidiou a análise

e a escrita da narrativa.

Preferimos iniciar os registros dos encontros com equipamento de áudio,

por considerar que isso seria menos impactante para os participantes. E,

depois de três encontros, quando julgamos que os participantes já estivessem

mais familiarizados com o ambiente em que realizávamos os encontros e mais

à vontade entre si, introduzimos o equipamento de filmagem, que ficava

localizado num ponto fixo da sala, de forma a captar todo o grupo. Optamos por

registrar em vídeo os encontros do grupo logo que foi conveniente, por

concordar com Clement (2000, apud POWELL; FRANCISCO; MAHER, 2004,

p. 86): “é um importante e flexível instrumento para coleta de informação oral e

visual”, pois “ele [o vídeo] pode capturar comportamentos valiosos e interações

complexas e permite aos pesquisadores reexaminar continuamente os dados”.

Bottorff (apud POWELL; FRANCISCO; MAHER, 2004, p. 91) ainda acrescenta

que “os pesquisadores podem visualizar eventos gravados com a frequência

que for necessária e em formas flexíveis, tais como ‘tempo real, câmera lenta,

quadro a quadro, para adiante, para trás’ e podem se ocupar com suas

diferentes características”.

Buscamos estabelecer com os integrantes do grupo um consentimento

pactuado para as filmagens, que, segundo Powell, Francisco e Maher (2004),

29 Pela própria pesquisadora.

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deve ser apresentado por escrito, especificando quem terá acesso aos dados e

ao seu uso, construindo então um “termo de consentimento” (Apêndice A).

Esse termo não foi apresentado num primeiro momento, em que os

consentimentos se deram oralmente, pois quisemos que os participantes

estivessem bem informados, que compreendessem sua participação e que

tivessem a liberdade de interromper ou cancelar uma sessão de gravação.

Confiantes no trabalho do grupo, todos os participantes assinaram o termo de

consentimento e permitiram que fosse usado seu primeiro nome na divulgação

dos resultados da pesquisa. Não obstante, a cada encontro do grupo, os

participantes eram novamente informados que o encontro seria videogravado,

conforme orientações apresentadas por Powell, Francisco e Maher (2004).

Esses mesmos autores sugerem um modelo de análise de vídeo baseado

em sete fases interativas e não lineares:

1) Observar atentamente os dados do vídeo;2) Descrever os dados do vídeo;3) Identificar os eventos críticos;4) Transcrever;5) Codificar;6) Construir o enredo;7) Compor a narrativa (POWELL; FRANCISCO; MAHER, 2004, p. 98).

Buscamos utilizar essa indicação de acordo com as necessidades de

nossa pesquisa. Os vídeos, que foram nomeados com a data em que foram

feitos, foram assistidos várias vezes, foram descritos e, nesse processo,

transcrevemos momentos que percebemos como importantes, significativos

para o nosso foco de análise, pois estavam relacionados aos nossos objetivos

e/ou foram indicando nossos eixos de análise. Buscamos então, a partir do

diário de pesquisa ou de campo, construir o enredo, compondo o texto,

trazendo nossas análises.

Estamos cientes, de acordo com Powell, Francisco e Maher (2004), de

que os registros em vídeo dos encontros são importantes, mas, por si sós, não

garantem uma boa produção de dados e uma boa análise. Essa garantia não

ocorre, devido às limitações do instrumento, pois, por exemplo, além de

demandar tempo com as transcrições, as videogravações não apresentam o

contexto histórico da situação registrada, não são seletivas, devido a limitações

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mecânicas. Também são carregadas de enviesamentos humanos e

tecnológicos, por sermos nós a escolher o tipo de equipamento, o local onde o

colocamos, o momento em que focalizamos ou não uma situação. Sendo

assim, acrescentamos outras fontes de informação, como material trazido pelos

participantes aos encontros (cartazes, cópias de trechos de material didático)

ou produzido por eles (vídeo de aulas desenvolvidas com crianças, planos de

aula, e-mail).

O diário de campo ou diário de pesquisa, segundo Alves (2004, p. 224),

pode ser definido como “um registro reflexivo de experiências – pessoais e

profissionais – ao longo de um determinado período de tempo”. Bogdan e

Biklen (1994, p. 150) complementam essa ideia, defendendo que se trata do

“relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê, experiencia e pensa no

decurso da recolha e refletindo sobre os dados de um estudo qualitativo”. No

diário de pesquisa foram registradas principalmente as percepções pessoais

sobre o percurso do grupo colaborativo e também os interesses do grupo, os

textos lidos, os combinados, o cronograma e pequenos lembretes. O diário

constituiu a base ou o disparador para a escrita da narrativa de análise, que

posteriormente foi sendo lapidada. Alguns desses registros no diário podem ser

considerados anotações iniciais (LANKSHEAR; KNOBEL, 2008) e se deram

“no calor do momento”, quando as coisas estavam acontecendo; outros foram

anotações post factum, ou seja, escritas de memória após os encontros do

grupo.

Foi utilizada também uma ficha, com o objetivo de identificar o

participante, coletar dados a respeito dele, como o ano de seu nascimento, sua

nacionalidade, cidade onde nasceu, estado civil, endereço, formação (tipo de

escola na qual cursou Ensino Fundamental, Médio e Superior), se exercia

trabalho remunerado e em que área. Foram elaborados ainda registros com o

objetivo de avaliar o trabalho que vinha sendo realizado.

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4.2 O grupo de estudos

Segundo Fiorentini (2009, p. 250), a qualidade da educação desejável e

possível precisa considerar a diversidade, e a complexidade da prática

educativa “exige que os professores se organizem em comunidades críticas

nas quais possam avaliar e analisar suas práticas e escolher o melhor caminho

a ser construído e seguido”. Por concordarmos com as ideias do autor,

pedimos autorização a uma instituição de ensino superior de cunho privado, na

qual atuava como professora, para a utilização de um espaço ali disponível,

chamado de “Oficina Pedagógica”, para a realização de encontros do grupo de

estudos. Com a concordância da direção em relação à utilização do espaço,

enviamos um convite, por e-mail, a professores e futuros professores, que

eram meus alunos no momento, a ex-alunos e colegas professores que atuam

na rede pública e particular na cidade de Atibaia - SP. Com isso, demos início

ao movimento de criação do grupo, utilizando o espaço cedido na referida

instituição, na cidade de Atibaia.

Nesse e-mail buscamos esclarecer também algumas questões a respeito

de custos, pois, como não se tratava de um curso, mesmo sendo numa

instituição particular, não haveria taxas. Além disso, a mensagem informava

que escolheríamos dia e horário que fossem convenientes a todos, para nos

encontrarmos com regularidade para os estudos. O e-mail na íntegra encontra-

se no Apêndice B.

Havia, nesse momento, inquietações com relação aos participantes – se

teríamos adesões – e também preocupação em adotar estratégias formativas

que, além de instaurarem o grupo, o sustentassem. Nossas indagações

relativas aos participantes, assim como foi relatado por Oliveira (2013), eram:

seriam professores de escolas públicas ou privadas? Isso poderia implicar em

maior flexibilidade, com relação aos currículos, para levar à sala de aula

propostas estudadas ou sugeridas pelo grupo. Com relação às adesões, assim

como foi vivenciado por Oliveira (2013), poderíamos ter dificuldades para

estabelecer um consenso no tocante aos horários e, com isso, problemas no

deslocamento tanto da pesquisadora quanto dos participantes, o que poderia

inviabilizar os encontros. Ademais, a temática “Estatística”, que aparecia no

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convite, poderia não despertar interesse, pois, de acordo com Oliveira (2013, p.

61), “existia uma percepção da falta de interesse dos professores que ensinam

Matemática por esta área de discussão”. Além disso, os professores da

Educação Infantil, público com o qual trabalhou em sua pesquisa, acabam

buscando formação na área da alfabetização da língua.

Felizmente, em setembro de 2010, havia vários interessados em

conhecer as propostas de trabalho e estudo. Foi exposto que não se tratava de

um “curso convencional”, mas de um grupo de estudos, com o objetivo de

investigar a formação e o desenvolvimento do grupo a partir do estudo da

Estatística, na perspectiva da Educação Estatística e que almejávamos criar

um grupo do tipo colaborativo, tendo consciência de que isso iria se constituir

ao longo da trajetória do grupo e, de acordo com Ferreira (2006, p. 150), em

contraposição “à ideia implícita (em muitas das atuais práticas e propostas de

formação) de que o professor pesquisador que leciona nas universidades já

está ‘pronto’ para o seu trabalho e é que mais tem a oferecer nas propostas de

formação”. Esses pressupostos, que partiram das nossas experiências –

minhas e da minha orientadora – de participação em grupos colaborativos30 e

na formação de professores, motivaram a formação do grupo.

A partir de então, o grupo se reuniu regularmente, voluntariamente,

utilizando o espaço cedido pela instituição, até dezembro de 2011, totalizando

20 encontros. Foi nesse sentido também, com relação à proposta de formação

e à voluntariedade, que optamos por não propor a formação de um grupo numa

escola, no horário de HTPC31 (rede estadual) ou similar (rede municipal), pois

poderia ter o caráter obrigatório, em que alguém da universidade viria com

proposta “pronta” a ser aplicada.

30 Grupo de Sábado (GdS) e Prapem, ambos da Unicamp.31 Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo vigente nas escolas estaduais do estado de SãoPaulo.

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4.3 Os participantes do Estatisticando

O grupo, que logo de início foi chamado de Estatisticando32, chegou a ter

20 interessados, mas na maior parte do tempo, foi formado por 9 participantes:

Keli, pesquisadora e formadora de professores, que atuava nos cursos de

Pedagogia e Matemática; Silvana, professora aposentada, com experiência de

atuação na Educação Infantil (crianças de 3 a 6 anos); Eduardo, professor em

início de carreira, atuando nos anos iniciais do Ensino Fundamental (crianças

de 6 a 10 anos); Rosana, estudante de Pedagogia, que já atuava como

professora na Educação Infantil; cinco estudantes de Pedagogia, sendo que

Roseli e Mie já realizavam atividade de estágio nos anos iniciais do Ensino

Fundamental, por estarem no último ano da primeira graduação, e Thaynara,

Érica e Cíntia encontravam-se no período inicial de estágio nos anos iniciais do

Ensino Fundamental, por estarem no 2.º ano da primeira graduação. Portanto,

eles já tinham nível superior (Curso de Pedagogia), Keli, Silvana e Eduardo; ou

estavam cursando, caso de Rosana, Roseli, Mie, Thaynara, Érica e Cíntia.

Todos os participantes concordaram que fosse usado seu primeiro nome33.

Mais alguns dados sobre os participantes podem ser encontrados a seguir34

(Quadro 2) e foram sintetizados a partir de uma ficha de identificação

preenchida pelo próprio participante (Apêndice C):

Quadro 2: Dados dos participantes do grupo Estatisticando

Nome Idade Escolarizaçãobásica

Graduação Trabalhoremunerado

ExperiênciaComo

professor(a)Silvana 47 Ensino público Pedagogia Aposentada

Tutora Ed. adistância

26 anosEducação Infantil

Eduardo 23 Ensino público eprivado

Pedagogia Professor 5 anosEd. Infantil e Ens.

FundamentalRosana 36 Ensino público Pedagogia

(último ano)Professora 1 ano

Educação InfantilMie 41 Ensino público Pedagogia

(último ano)Não Aulas de japonês

Roseli 33 Ensino público Pedagogia(último ano)

Sim(fora da Educação)

Não

32 Nome sugerido pela participante Silvana. Mais detalhes sobre isso podem ser encontradosna Capítulo 5, na seção 5.1 - Pontapé inicial.33 Conforme termo de autorização (Apêndice A).34 Dados do ano de 2011.

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Érica 25 Ensino público Pedagogia(2.º ano)

Estagiária pref.Munic. Atibaia

1 ano

Cíntia 27 Ensino público Pedagogia(2.º ano)

Estagiária Pref.Munic. Atibaia

1 ano

Thaynara 20 Ensino público Pedagogia(2.º ano)

Professora Redeparticular

9 meses

Keli 35 Ensino público Matemáticae

Pedagogia

Professora Ens.Superior

16 anosEscola básica eEns. Superior

Fonte: Ficha de identificação produzida pela pesquisadora.

Alguns outros interessados chegaram a participar de um ou dois

encontros do grupo apenas, e alguns tiveram alguma participação nas

discussões, mas optamos por considerar para análise apenas os que

participaram com certa regularidade (Figura 4). Quando se tornou relevante

citar a participação desses participantes esporádicos, optamos por utilizar a

letra inicial de seu nome.

Figura 4: Participantes do grupo Estatisticando35.

Fonte: arquivo da pesquisadora.

35 Em pé, da esquerda para a direita: Roseli, Eduardo e Keli. Sentadas, da esquerda para adireita: Silvana, Mie, Rosana, Érica, Thaynara e Cíntia.

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Concordamos com Nacarato e Grando (2013, p. 13) que “a

heterogeneidade existente no grupo possibilita, aos diferentes atores,

assumirem papéis distintos em um processo de ajuda mútua”, pois tínhamos

estudantes de graduação, os futuros professores, e professores com diversas

experiências (de 9 meses a 26 anos de atuação) e atuando com crianças de

várias faixas etárias, professores da rede pública e particular, diversas idades,

diversos momentos de vida e, até mesmo, uma futura professora vinda de

outro país (Mie).

4.4 O papel da pesquisadora

Os participantes do grupo não foram apenas sujeitos de estudo, pois

nossa intenção era que participassem de um processo significativo, que se

desenvolvessem profissionalmente e que os alunos dos participantes que já

atuavam na escola ou os futuros alunos, no caso dos participantes em

formação, fossem de alguma forma beneficiados, mesmo não sendo o foco

principal do grupo.

Não visávamos a um processo de desenvolvimento profissional por parte

somente dos participantes, mas também da pesquisadora. Assim, minha

reflexão como pesquisadora, além do contexto colaborativo, foi alimentada por

consulta a fontes bibliográficas, diálogo com pesquisadores, no grupo de

pesquisa Prapem, em eventos relacionados à área e também no estágio

realizado fora do País36.

Nossa intenção foi, o tempo todo, investigar com os professores e futuros

professores e não por eles, embora, no início dos encontros, eu assumisse um

papel mais de interferência, aos poucos diminuído, em função do contexto

colaborativo.

36 Estágio realizado na Universidade de Lisboa em Portugal, pelo Programa de DoutoradoSanduiche no Exterior (PDSE). N.º do processo BEX 9455/12-4.

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4.5 Temas estatísticos de estudo

Nos encontros, com duração aproximada de 50 minutos a 1 hora,

procuramos nos inspirar na dinâmica de trabalho e pesquisa de grupos

colaborativos proposta por Fiorentini et al. (2011, p. 215): os formadores atuam

em função das demandas dos professores e futuros professores, que trazem

problemas e desafios das práticas escolares, para, juntos, estudar,

problematizar, refletir, investigar e escrever sobre a complexidade de ensinar e

aprender nas escolas. Para sintetizar a dinâmica, recriamos uma figura

proposta pelo pesquisador, adequando-a ao nosso foco estatístico, numa

perspectiva de letramento (Figura 5), em que, juntos, futuros professores,

professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental e

formadores estudam, problematizam, refletem, investigam e escrevem sobre a

complexidade de ensinar e aprender Estatística nas escolas e negociam as

práticas curriculares desejáveis e possíveis para cada realidade.

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Figura 5: Dinâmica de trabalho e pesquisa de grupos colaborativos.

Fonte: Proposta por Fiorentini et al. (2011), reelaborada para o foco no letramento estatístico.

Os eventos, ou seja, as instâncias de uso do letramento, foram

estruturados de acordo com as expectativas dos participantes e se constituíram

em momentos de estudo, em que os textos foram parte fundamental, e em

momentos de discussão da prática de sala de aula, também baseados em

textos. Buscamos utilizar o conceito de práticas de letramento para analisar a

descrição dos eventos letrados, que tiveram como principal objetivo estudar o

letramento estatístico. Também podemos apontar que os “gestos didáticos”

presentes na Pedagogia dos Multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2009),

fizeram parte do percurso do grupo: experienciamento, conceituação,

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enquadramento crítico e aplicação, assim como os designs na construção de

significados e ressignificação sobre o que foi estudado.

Para a seleção dos temas que estudaríamos inicialmente nos encontros,

foram levadas por mim às reuniões, várias publicações e materiais que

contemplassem os conhecimentos elencados por Shulman (1987), buscando

atuar em função das demandas, como apontado por Fiorentini (Figura 5).

Inicialmente, o que chamou atenção do grupo foi o termo “letramento

estatístico”, que aparecia com destaque nos títulos dos textos – livros, capítulos

de livros artigos publicados em anais de congressos. Começamos então por

desvendar esse termo, com apoio de um excerto de Conti (2009). Seguindo

sugestão de Ferreira (2006), não tivemos receio de trazer contribuições da

academia, como algo que sugerisse que apenas esses conhecimentos fossem

válidos.

Demos continuidade aos estudos com a discussão de um relato curto

(cinco páginas) de sala de aula, que descrevia situações pedagógicas

desenvolvidas com crianças da Educação Infantil (LOPES; MOURA, 2002), no

sentido do letramento estatístico e que também buscava contemplar o

conhecimento pedagógico geral, o conhecimento pedagógico da Estatística, o

conhecimento dos estudantes e suas características e o conhecimento dos

contextos educativos. Esse texto faz parte de um livro (LOPES; MOURA,

2002), e outros de seus relatos foram indicados por mim, por se tratarem de

relatos sucintos (cinco páginas em média), escritos por professoras sobre

práticas de sala de aula, e poderiam ajudar a desenvolver a confiança na

possibilidade de realizar um trabalho parecido na sala de aula. Além disso,

poderiam ajudar na ampliação e na reconstrução dos próprios saberes e

práticas. Optei por indicá-los porque se constituíam por situações pedagógicas

reflexivas, que poderiam ser levadas para a sala de aula; eram textos escritos

em linguagem acessível; e não concorreriam com as demandas de leitura dos

futuros professores, pois faziam parte das disciplinas do curso de Pedagogia

ou das tarefas que eles já possuíam, como, por exemplo, planejamento de

aulas, relatórios escolares. No entanto, a seleção final foi feita pelo grupo.

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Posteriormente também foram estudados e discutidos materiais que

abordavam conteúdos estatísticos e matemáticos, como, por exemplo, Van de

Walle (2009). Textos desse teor tiveram como objetivo contribuir para o

conhecimento do conteúdo da Estatística, o conhecimento pedagógico geral e

da Estatística, além do conhecimento dos estudantes da Educação Infantil e

dos anos iniciais e dos contextos educativos.

Com o tempo, os participantes, no contexto colaborativo, se sentiram

mais seguros e passaram a apresentar e a sugerir materiais, como fichas e

situações pedagógicas que conheceram durante o estágio e pelo contato com

livros didáticos (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008a, 2008b) ou com material

apostilado (FERRARI et al., 2006). Esses, assim como os outros materiais já

citados, foram compartilhados e estudados/discutidos e tinham por objetivo

contemplar o conhecimento pedagógico geral e da Estatística, e o

conhecimento do currículo referente à Estatística e aos objetivos, metas e

valores educacionais.

Com relação à seleção de textos para leitura, concordamos com Jimenez

Espinosa (2002, p. 51), que deveriam “estar em sintonia com a realidade vivida

pelos professores; não negar a prática do professor; permitir a reflexão e a

produção de novos significados para a prática dos professores”. Segundo o

mesmo autor, a prática de leitura refletida/comentada no grupo, abre espaço

para a reciprocidade, pois pode estabelecer múltiplas relações entre o texto e

as subjetividades de cada participante do grupo.

Também durante os encontros, foram planejadas situações pedagógicas

envolvendo as temáticas da Estatística, com apoio dos Parâmetros

Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997). Posteriormente desenvolvidas em sala

de aula do Ensino Fundamental por alguns participantes e registradas em

vídeo, foram em seguida discutidas no grupo. Nessas discussões buscamos

contemplar os problemas e desafios das práticas escolares, apontados por

Fiorentini (Figura 5), e dar destaque ao conhecimento do currículo referente à

Estatística. Nossa perspectiva de trabalho, de acordo com Day (2001), buscava

ressaltar a importância da participação dos professores na tomada de decisões

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sobre os sentidos e os processos da sua própria aprendizagem, como parte do

seu desenvolvimento profissional.

Buscamos mostrar, na Figura 6, os entrelaçamentos – no processo de

construção do conhecimento – entre as temáticas, os materiais estudados nos

encontros e o conhecimento, de acordo com Shulman (1987), pensando no

aprendizado do professor segundo a concepção de Cochran-Smith e Lytle

(1999). Ou seja, faz-se necessário o estabelecimento de múltiplas inter-

relações, com a construção de um conhecimento da prática, desenvolvendo o

currículo, analisando trabalhos de crianças e o desempenho de professores,

examinando práticas escolares e investigando a forma como as crianças e os

professores construíram conhecimento.

Ainda de acordo com Cochran-Smith e Lytle (1999, p. 13), estamos

partindo do pressuposto de que “o conhecimento é construído socialmente por

professores que trabalham juntos” e também “por professores e estudantes, à

medida que trocam suas experiências prévias, seu conhecimento anterior, seus

recursos culturais e linguísticos e os recursos textuais e materiais de sala de

aula”.

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Figura 6: O entrelaçamento entre os materiais estudados e os conhecimentos elencados porShulman (1987)

Fonte: Elaborado pela autora.

Com o objetivo de dar uma visão mais detalhada dos encontros,

apresentamos também o Quadro 3, buscando situar os encontros

temporalmente, com relação às temáticas discutidas e também apresentar o

número de participantes e a forma de registro para recolha de dados:

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Quadro 3: Encontros do Grupo Estatisticando

Período Data/Horário Assunto N.º deParticipantesResponsável

Registro

2.ºsem.2010

02/09/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Apresentação dos objetivos do grupo deestudos e propostas aos interessadosque aceitaram o convite: Pontapé inicial

12Responsável:

Keli

ÁudioDiário37

2.ºsem.2010

09/09/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Apresentação sobre “O que életramento estatístico?”Material utilizado: excerto dadissertação de Keli (CONTI, 2009)

6Responsável:

Keli

ÁudioDiário

2.ºsem.2010

23/09/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Discussão do texto escolhido pelosparticipantes: Adivinhe quem vem paraficar (JONSSON, 2002)

6Responsável:

Rosana

ÁudioDiário

2.ºsem.2010

07/10/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Apresentação de um trabalhodesenvolvido na Educação Infantil.Título: Trabalhando com Estatística naEducação Infantil

6Responsável:

Keli

ÁudioDiárioFotos

2.ºsem.2010

28/10/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Análise de material cedido por umaescola pública de Atibaia, utilizado nosanos iniciais e trazido pela participanteRoseli.

8Responsáveis:Roseli e Keli

VídeoDiário

CartazesFotos

2.ºsem.2010

04/11/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Início do estudo do texto escolhidopelos participantes: Conceitos emanálise de dados (VAN DE WALLE,2009)

6Responsável:

Silvana

VídeoDiário

2.ºsem.2010

18/11/2010Quinta-feiraDas 18h10às 19h15

Continuação do estudo do texto:Conceitos em análise de dados (VANDE WALLE, 2009)

5Responsável:

Eduardo

VídeoDiário

1.ºsem.2011

18/02/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Reinício dos trabalhos – apresentaçãode novos participantes

12Responsável:

Keli

VídeoDiário

1.ºsem.2011

25/02/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Continuação do estudo do texto:Conceitos em análise de dados (VANDE WALLE, 2009)

7Responsável:

Rosana

VídeoDiário

1.ºsem.2011

11/03/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Continuação do estudo do texto:Conceitos em análise de dados (VANDE WALLE, 2009)

4Responsável:

Rosana

VídeoDiário

1.ºsem.2011

18/03/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Continuação do estudo do texto:Conceitos em análise de dados (VANDE WALLE, 2009)

5Responsáveis:Keli e Eduardo

VídeoDiárioFotos

37 Termo que abrevia “diário de pesquisa”.

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1.ºsem.2011

15/04/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Discussão de medidas estatísticas, porsugestão dos participantes

6Responsável:

Keli

VídeoDiárioFotos

1.ºsem.2011

29/04/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Análise de situações pedagógicas delivro didático

3Responsável:

Keli

VídeosDiário

1.ºsem.2011

06/05/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Apresentação e discussão de vídeo detrabalho realizado por Eduardo emescola pública dos anos iniciais deAtibaia

7Responsáveis:Eduardo e Keli

Vídeos(sala deaula e dogrupo)

Diário1.º

sem.2011

15/06/2011Quarta-feiraDas 19h20às 21h05

Análise de situações pedagógicas sobreprobabilidade, de material didáticoapostilado de uma escola particular,trazidas pela participante Rosana

9Responsáveis:Rosana e Mie

Vídeos(sala de

aula e dogrupo)DiáriosMaterialdidático

Apresentação e discussão de vídeo detrabalho realizado por Mie em escolaparticular dos anos iniciais de Atibaia

2.ºsem.2011

26/08/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Estudo de texto escolhido pelosparticipantes: “Crianças, máscaras,eleições municipais e gráficos... tudo aver” (FIGUEIREDO, 2002).

5Responsável:

Keli

VídeoDiário

2.ºsem.2011

23/09/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Estudo de texto escolhido pelosparticipantes: “De olho na Mamãe”(CAPP, 2002).

5Responsável:

Rosana

VídeoDiário

2.ºsem.2011

21/10/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Discussão de situação pedagógica parao 1.º ano, selecionadas de livro didáticoadotado pela rede municipal de Atibaia(MILANI; IMENES; LELLIS, 2008a)

4Responsável:

Keli

VídeoDiárioLivro

didático2.º

sem.2011

04/11/2011Sexta-feiraDas 18h10às 19h15

Discussão de situação pedagógica parao 1.º ano e 2.º ano, selecionadas delivro didático adotado pela redemunicipal de Atibaia (MILANI; IMENES;LELLIS, 2008a, 2008b).

3Responsável:

Keli

VídeoDiárioLivro

didático

2.ºsem.2011

08/12/2011Quinta-feiraDas 19h30

às 21h

Finalização do ano.Avaliação

4Responsável:

Keli

AvaliaçõesDiário

Fonte: Diário de pesquisa

Optamos por apresentar o dia da semana em que os encontros

ocorreram, com o objetivo de ressaltar que buscávamos sempre atender as

possibilidades de participação dos membros do grupo. Para complementar as

informações, incluímos o número de participantes, o responsável pela

coordenação do encontro e a forma como foram registrados os dados.

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A cada semestre tivemos mudanças no grupo, com relação à composição

e ao número de participantes. Embora não fosse nosso objetivo controlar a

frequência, no sentido de fiscalização punitiva ou premiação, registramos a

presença de cada um, para fins de acompanhamento do grupo. Apresentamos

os dados da cada participante em relação ao semestre em que participou

(Quadro 4), inspirado em Azevedo (2012)..

Quadro 4: Presença dos participantes em relação ao semestre.

Participantes 2.º Semestrede 2010

1.º Semestrede 2011

2.º Semestrede 2011

Silvana X XEduardo X X XRosana X X XMie X X XRoseli X X XÉrica X XCíntia X XThaynara X XKeli X X X

Fonte: Organizado pela autora com dados da pesquisa.

Vale destacar que, como era de se esperar, o grupo não começou

colaborativo, mas concordamos com Ferreira (2003), quando apresenta alguns

cuidados que precisamos tomar. Baseamo-nos na concepção de Johnston e

Kairschner (1996 apud FERREIRA, 2003, p. 82).

A colaboração não pode ser imposta, ela deve ser construída. Ela éconstruída dentro de relacionamentos nos quais os indivíduos sentemvontade de compartilhar suas diferenças e, ao contrário das formastípicas de autoridade atribuídas aos papéis e relacionamentosinstitucionais, busca por formas mais inclusivas de envolver múltiplasperspectivas e fala através das questões da confiança, mutualidade eequidade. Estabelecer relacionamento leva tempo.

Era esperado que eu, formadora, apresentasse os materiais e

conduzisse as reuniões, porém, gradualmente, todos passaram a participar das

decisões, assumindo responsabilidades no trabalho do grupo, preparando ou

indicando materiais. Foram surgindo indícios de aspectos ou princípios que, de

acordo com Fiorentini (2004), são característicos de um trabalho colaborativo:

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voluntariedade, identidade e espontaneidade; liderança compartilhada ou

corresponsabilidade; apoio e respeito mútuos. Esse movimento vem ao

encontro do que Fiorentini (2004, p. 53) afirma sobre a voluntariedade,

identidade e espontaneidade:

[...] Mas, à medida que seus integrantes [do grupo] vão seconhecendo e adquirem e produzem conjuntamente conhecimentos,os participantes adquirem autonomia e passam a autoregular-se e afazer valer seus próprios interesses, tornando-se, assim, gruposefetivamente colaborativos.

Sobre a liderança compartilhada ou corresponsabilidade, o autor, na

página 55 da mesma obra, afirma que “desde o início do projeto, são

negociadas responsabilidades a serem assumidas por cada um dos

participantes”. E sobre o respeito mútuo assim se pronuncia:

O grupo, nesse caso, tem, de um lado, manifestado profundo respeitoaos saberes conceituais e experienciais que cada professor traz paraos encontros, bem como em relação às suas dificuldades e possíveisfalhas, e, de outro, dando apoio efetivo e tentando encontrarcolaborativamente soluções para os problemas. Isso tem contribuídopara aumentar a confiança, a auto-estima e o respeito mútuo dosprofessores (FIORENTINI, 2004, p. 57).

Para apresentar a análise, como pesquisadoras, compusemos esta

narrativa, respeitando a ordem cronológica em que ocorreram os encontros do

grupo. Escolhemos detalhar alguns momentos transcritos dos arquivos de

vídeo – de acordo com Powell, Francisco e Maher (2004) – e analisá-los, tendo

como referência eixos temáticos. Sendo assim, para a elaboração da narrativa,

usamos os meus diários de pesquisa como elemento disparador, além do

referencial teórico. Fizemos uso também das transcrições das falas gravadas

em áudio e em vídeo, priorizando essa última, a fim de compor outros olhares

sobre o que foi desenvolvido.

Para o processo de análise, os dados foram categorizados em eixos de

análise, descritos a seguir. Eles aparecerão no decorrer da narrativa.

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4.6 Eixos de análise

Os eixos não foram definidos a priori: emergiram no processo de análise

do material produzido no trabalho de campo, nas interações entre os

envolvidos, procurando captar não apenas o que ficou explícito, mas “buscando

indícios” (GINZBURG, 1999) que evidenciassem as percepções ocorridas.

Quando mencionamos “indícios”, estamo-nos referindo ao paradigma indiciário

do referido autor, que nos ajuda metodologicamente a investigar, usando

pistas, marcas, sinais, que nem sempre são perceptíveis de imediato. Segundo

Ginzburg (1999, p. 177), “se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas –

sinais, indícios – que nos permitem decifrá-la”. Para essa busca, as conversas

com a bibliografia e a leitura de outros textos, na mesma perspectiva, foram

fundamentais, assim como a leitura e a revisão cuidadosa dos múltiplos

registros realizados durante o trabalho de campo, como gravações de áudio e

vídeo, diário de pesquisa e formulários de identificação respondidos pelos

participantes do grupo Estatisticando. O processo de construção dos eixos de

análise pode ser caracterizado, de acordo com Fiorentini e Lorenzato (2006, p.

135), como emergente-misto, pois emergiram “mediante um processo

interpretativo, diretamente do material de campo” e no “confronto entre o que

diz a literatura e o que encontra nos registros de campos”.

Com o propósito de analisar o percurso vivenciado pelos participantes

do Estatisticado, para explicitar as respostas à questão de investigação: Que

indícios de desenvolvimento profissional apresentam os professores e futuros

professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental

em contextos colaborativos em práticas de letramento estatístico?,

relacionamos as informações com os seguintes eixos de análise:

Eixo 1 – Complexidade do desenvolvimento profissional

Estamos entendendo o desenvolvimento profissional aqui como o

“caminhar para a mudança”, de acordo com Ferreira (2003), pensando na

evolução. Compõem este eixo dois subitens:

a) Desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de

conhecimento na perspectiva do letramento estatístico;

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b) Desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de

si mesmo ou pessoal.

Embora tenhamos descrito esse eixo de forma subdividida,

consideramos que estão interligados.

O desenvolvimento profissional, como desenvolvimento de

conhecimento na perspectiva do letramento estatístico, considerado fora do

contexto, pode ser apontado como mecânico ou relativo à ideia de frequentar

cursos, mas, segundo nosso entendimento, o conhecimento é potencializador

do desenvolvimento pessoal dos participantes. Para nós, nesse contexto,

aprender é “alterar, ampliar/rever/avançar em relação aos próprios saberes, à

própria forma de aprender e à prática pedagógica” (FERREIRA, 2009, p. 274).

Os professores e futuros professores podem caminhar para a mudança – cuja

necessidade se revela na sua própria sala de aula –, ao aliar seus saberes e

práticas num contexto colaborativo, para estudar e refletir conjuntamente a

partir de suas necessidades e demandas, com auxílio de produções de

diversas instâncias (elaboradas por acadêmicos, por professores, pelo

governo) e da sua própria produção.

O desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de

si mesmo ou pessoal também envolve toda a pessoa que o professor é, suas

crenças, seus pensamentos e atitudes. Esse desenvolvimento também pode

ser influenciado, de acordo com Oliveira-Formosinho (2009), pela maturidade

psicológica, pelos ciclos de vida e pela dimensão da carreira profissional: nosso

grupo tinha participantes de várias idades; sem filhos e com filhos de várias

idades; solteiros ou casados; ainda em formação, em início de carreira ou já na

aposentadoria.

Assim, tendo como ponto de partida os desafios da prática educativa,

num contexto de colaboração formado por uma pesquisadora, professores e

futuros professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, almejávamos a

produção de conhecimento escolar e docente e o desenvolvimento profissional

dos professores.

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Eixo 2 – Colaboração:

a) Contexto de colaboração.

De acordo com Simão et al. (2009), as pesquisas têm demonstrado que

o desenvolvimento profissional (conhecimento, pessoal e curricular) aumenta

quando é valorizado um trabalho colaborativo, em que exista interação,

compartilhamento de experiências de sucesso e de erro, com relação a

contextos em que isso não ocorre. Então estamos entendendo a colaboração e

o contexto colaborativo desenvolvido no grupo Estatisticando como

potencializadores do desenvolvimento profissional de seus participantes.

Consideramos, assim como Ferreira (2009), que juntos aprendemos mais

sobre Estatística, sobre o trabalho com os professores, sobre o trabalho

coletivo e sobre nós mesmos.

Eixo 3 – Letramento (s):

a) Indícios do letramento estatístico

b) Práticas de letramento

De acordo com Rojo (2009), letramento tornou-se um conceito plural, ou

seja, devemo-nos referir a letramento(s). Consideramos que o letramento

estatístico faz parte do(s) letramento(s), a partir da ideia dos multiletramentos e

da preocupação com o ensino a partir das múltiplas demandas do mundo atual.

Os encontros do grupo Estatisticando e seu contexto colaborativo podem

ser tidos como eventos de letramento em que se constroem as práticas de

letramento, pois ali percebemos, nos momentos de discussão e circulação das

ideias estatísticas, indícios do letramento estatístico: questionamentos, dúvidas

e intervenções com as crianças.

Optamos, como já afirmamos, por narrar a análise do trabalho de campo

de forma cronológica e buscando evidenciar os indícios da complexidade do

desenvolvimento profissional, do contexto colaborativo e dos letramento(s). As

narrativas do trabalho de campo encontram-se no capítulo seguinte.

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CAPÍTULO 5

Narrativas do trabalho de campo – contexto dedesenvolvimento num grupo colaborativo

“Ensinar não é transferir conhecimento,mas criar possibilidades para a sua

produção ou a sua construção”(Paulo Freire, 2005, p. 24)

.Durante a composição da narrativa, que ocorreu depois de observar e

descrever os dados (vídeos, diário e outros materiais trazidos pelos

participantes), foram escolhidos alguns momentos gravados em vídeos, que

julgamos importantes. Eles foram transcritos para este capítulo e depois

analisados à luz de nosso referencial teórico e dos eixos de análise. Buscamos

evidenciar, ao longo da narrativa, os processos de desenvolvimento

profissional na perspectiva do letramento estatístico em contextos colaborativos

do grupo Estatisticando.

5.1 Pontapé inicial

Nosso objetivo neste capítulo foi narrar o primeiro encontro do grupo,

apresentando os primeiros participantes, explicitando nossos objetivos da

formação daquele grupo de estudos que almejava ser colaborativo e

escolhendo nosso nome: Estatisticando.

Esse encontro foi realizado em 02/09/2010. Como pesquisadora, me

responsabilizei pelos primeiros registros, feitos em áudio e no diário de

pesquisa. Várias pessoas aceitaram nosso convite, feito por e-mail a alunos,

ex-alunos e colegas professores da rede pública e particular de Atibaia. E

foram chegando... Totalizamos 12 pessoas – estudantes do curso de

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Pedagogia e da Licenciatura em Matemática e professores da Escola Básica

do município de Atibaia.

De início, os presentes foram convidados a se apresentar e a responder

voluntariamente a uma questão: “O que o trouxe aqui?”. Afinal, responderam a

um convite que expressava “Grupo de estudos em Estatística”.

Apresentamos aqui os primeiros interessados – que permaneceram no

grupo durante todas as reuniões, enquanto o Estatisticando existiu – e seus

anseios com relação aos encontros:

Rosana: Eu sou Rosana. Eu faço Pedagogia e todos os cursos queeu tenho possibilidade de vir, principalmente a matemática, porquetive muitas dificuldades com matemática, então busco abrir-memelhor para ela, entendê-la melhor é interessante, tanto para mimquanto para os meus filhos e para os meus futuros alunos, que aindafaltam um ano e meio para me formar, mas eu tenho certeza que vaiacrescentar muito o conhecimento e ajudá-los também, porquesempre a matemática é tratada muito séria, assim, é abominável amatemática. Por exemplo, a minha filha tem dez anos e na escolatodos têm medo da matemática, um ou dois não têm. Dá para contarna sala dela quem vai bem, quem tira nota boa, quem não temdificuldade, mas a maioria das crianças, pelo que eu converso com asmães, têm dificuldade em matemática.

Eduardo: Eu sou o Eduardo, atualmente eu faço pós-graduação aquitambém em educação infantil e conheço o trabalho da Keli, trabalhocom ela aqui na faculdade, ela foi a minha professora, eu gosto muitodo trabalho que desenvolve com a matemática e vim também buscarcoisas novas, aprofundar o que tive com ela e com outras professorasna Pedagogia. Considerando que também atuo em sala de aula,como professor, então acho que é importante buscar coisas a maispara desenvolver um bom trabalho enquanto professor.

Silvana: Bom, meu nome é Silvana, eu me formei em Pedagogia, noano passado, com aquela turma ali e agora eu estou fazendo umapós em Design Educacional em Itajubá. E sou funcionária daprefeitura em Educação Infantil. Você mandou um convite, eu achei aideia muito legal, e na realidade é a primeira vez que eu participo deuma coisa assim, não conheço, não sei como é, não sei comofunciona, nada. Então eu vim para ver. Só que minha únicadificuldade é que eu não consigo chegar muito cedo, precisa ver dia ehorário que seja conveniente para todo mundo.

Mie: Mie, estudante de Pedagogia, quero saber, pois na aula há muitagente, sem espaço para perguntar e aqui pode ser diferente. Moravaantes no Japão. (Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalo detempo do áudio: 0:2:30 a 0:6:50; 0:13:20 a 0:15:24; 0:17:0 a 0:19:50).

Explicitei, então, aos presentes, meus motivos, ligados à minha pesquisa

e alguns objetivos e motivações de um grupo que pretende ser colaborativo.

Expus que não se tratava de um curso, mas de um grupo de estudos, que se

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constituía naquele momento a partir de um interesse: o estudo da Estatística e

do letramento estatístico. Naquela oportunidade, eu quis “colocar as cartas na

mesa” para que os interessados em participar tivessem ciência do que se

pretendia:

Keli: A primeira coisa é que eu pretendo fazer doutorado. Este é meuprincipal objetivo. No doutorado, eu quero pesquisar Estatística, seuensino e aprendizagem. Vocês sabem que eu fui professora dasséries iniciais também, e no mestrado eu trabalhei com Estatística,mas, quando eu era a professora nessa faixa etária, percebia,conversava com muitos e via que a Estatística não acontecia na salade aula das séries iniciais. E depois recebia alunos que não tinhamtido contato com situações pedagógicas de Estatística e doTratamento da Informação. Então estranhava muito, porque eupegava também estudantes mais velhos, das séries finais do EnsinoFundamental, e nada de estatística. Não sabia exatamente do que setratava. E isso me motivou a pesquisar. Depois eu posso até contarmais sobre isso. Então isso me motivou a escrever um projeto, e foipara a Faculdade de Educação da Unicamp. Eu fiz o mestrado lá. Euestou levantando uma questão no princípio de que, muitas vezes, osprofessores não trabalham, não têm vivências, pois se eu não tenhosegurança, fica mais ou menos assim: ”vamos tentar outra situação?”;”vamos fazer outra coisa?”. Então eu queria montar um grupo deestudos, e não um curso, porque um curso eu tenho um certificado,tenho os custos, eu tenho uma determinada quantidade de horas eum currículo preestabelecido; e aqui eu não tenho um currículopronto. E um grupo de estudos a gente vai escolher “o que eu queroestudar desta temática?”. Então o nosso foco vai ser a EducaçãoInfantil e as séries iniciais do Ensino Fundamental, embora possaatingir os estudantes maiores, mas quero deixar todos cientes disso(Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalo de tempo: 0:6:50 a0:09:40 ).

A fim de tentar mobilizar os professores e futuros professores a querer

fazer parte de um grupo, ciente do que Fiorentini (2004, p. 54) apresenta: “a

opção por determinado grupo (ou querer fazer constituir um), entretanto, é

influenciada pela sua identificação com os integrantes do grupo e pela

possibilidade de compartilhar problemas, experiências e objetivos comuns”,

reforcei que a identificação não se dá apenas pela presença de colegas ou

parceiros, mas pela disposição em compartilhar espontaneamente. Procurei

motivá-los, conforme a transcrição, a seguir, procura revelar:

Keli: Outra coisa é que a gente acredita no professor comoprotagonista da sua formação. E um grupo que não tenha certo ouerrado, que seja um grupo de estudos, uma perspectiva colaborativa,onde o grupo não dependa só de mim, mas do compromisso das

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pessoas consigo mesmas e com o grupo, de querer estudar. Por issoque eu convidei professores, para podermos fazer parceria daquelesque têm mais experiências com aquele que está já buscandoexperiências. Isso é muito importante, porque o experiente apoiaaquele que está começando; quem está começando ajuda quem jáestá na prática... Então essa é a ideia... (Arquivo de áudio dapesquisadora. Intervalo de tempo: 0:09:43 a 0:13:20 ).

Com o objetivo de direcionar o próximo encontro do grupo, como

pesquisadora, eu havia selecionado para esse primeiro momento alguns

materiais que já vínhamos estudando ou havíamos produzido, minha

orientadora e eu, como, por exemplo, Lopes e Moura (2002); minha dissertação

(CONTI, 2009); e alguns artigos publicados, como Conti (2009) e Carvalho e

Conti (2009).

Silvana sugeriu como nome do grupo, o termo “Estatisticando”, pois essa

era uma expressão que aparecia com frequência nos materiais que expus aos

participantes, em títulos ou subtítulos, como, por exemplo, na minha

dissertação, em artigos e capítulos de livros. Com a aprovação dos colegas,

esse foi o nome que assumimos e que também foi usado para o grupo de e-

mails que foi criado.

A fim de organizar nossos encontros, ficou estabelecido, a partir de uma

discussão conjunta, em que os participantes sugeriram as datas, o seguinte

cronograma com que pretendíamos atender as necessidades e as dificuldades

de horário de todos e as leituras escolhidas:

- 09/09/2010 – Quinta-feira, 18h10. Tema: O que é letramentoestatístico? Responsável: Keli;- 23/09/2010 – Quinta-feira, 18h10. Discussão do texto: “Adivinhequem vem para ficar?” (Jonsson, 2002). Responsável: Rosana;- 02/10/2010 – Sábado, 10h. Tema: O que é letramento estatístico?Discussão do texto: “Adivinhe quem vem para ficar?” (Jonsson,2002). Responsável: Keli. Esse encontro acabou não tendoparticipantes. (Diário de pesquisa, 02 set. 2010, com anotações feitasposteriormente).

Nesse momento eu considerava importante a minha liderança, a fim de

organizar o tempo e fazer o grupo dar os “primeiros passos”.

Inicialmente, foram programados três encontros, os dois primeiros às

quintas-feiras e o terceiro, num sábado, repetindo o que havia sido proposto

para discussão nos dois primeiros, pois alguns participantes já tinham

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compromissos nas quintas-feiras estabelecidas, mas depois disso poderiam se

organizar para as seguintes. Consideramos que isso poderia ajudar os

interessados em participar, mesmo os que tinham restrições com relação às

primeiras datas. Infelizmente o encontro de sábado só contou com a minha

presença. Entendemos que, numa carreira com uma carga horária tão grande e

na maior parte do tempo se dividindo em duas escolas, o professor não

consegue se comprometer também no sábado.

Consideramos importante que, já nos primeiros encontros lêssemos

algum texto. Rosana se voluntariou em escanear o texto e providenciar, via e-

mail, o compartilhamento, com os colegas, do material a ser lido previamente,

ou seja, o texto de Jonsson (2002). Ofereceu-se também para coordenar a

discussão.

Após a finalização do encontro, consideramos que foi um bom “pontapé

inicial” para o Estatisticando.

5.2 O conceito de letramento estatístico

No dia 09/09/2010 tivemos nosso primeiro encontro de estudos

propriamente dito e, como agendado, nosso objetivo foi conhecer e discutir os

conceitos de letramento e letramento estatístico, a partir da questão: “O que é

letramento estatístico?”.

Como primeira tarefa, houve a leitura, aos presentes, dos registros do

encontro anterior, buscando, com isso, começar uma prática de escrita e de

valorização de registros do grupo.

Consideramos que o termo e o tema “letramento estatístico”

despertaram curiosidade e interesse nos participantes, desde o encontro

anterior, pois aparecia com frequência nos materiais apresentados.

Para iniciar nosso estudo e nossas discussões, os participantes foram

indagados sobre o que entendiam por “letramento”, se já haviam ouvido esse

termo, se tinham estudado sobre isso. Tratava-se do levantamento das

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concepções iniciais a respeito do assunto. Com isso, foram surgindo as

primeiras ideias apresentadas pelos participantes, algumas das quais

transcrevemos:

Eduardo: Eu já vi algumas discussões sobre a diferença que se tementre alfabetização e letramento. Vamos ver se eu lembro. Enquantoalfabetização está ligada à questão da criança aprender ler, escrever,reconhecer as letras, letramento está ligado às questões de leitura demundo.

Rosana: Eu não sabia exatamente qual definição para esseletramento. Letramento vem de letra...

Silvana: Eu acho que tem um pouquinho a ver com a vivência social.(Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:2:15 a0:4:04)

Talvez Eduardo tenha trazido a concepção de letramento que se

aproxima mais daquela que temos trabalhado. Notamos que ainda havia certo

receio, por parte dos participantes, em apresentar suas ideias.

Foi apresentado então um texto, com cópias para todos. Tratava-se de

um excerto da minha dissertação (Apêndice D). Esse se constituiu num

momento que Bevilaqua (2013) classifica como evento e prática de letramento.

Um evento mediado pela escrita, materializado pelo texto de apoio, em que as

práticas se apoiam no individual e no social e surgem nas relações.

Iniciamos a leitura com as definições usadas por Soares (2003) e o

contexto histórico que essa autora apresenta. A partir daí, fomo-nos

aproximando das discussões de letramento estatístico. Também observamos e

discutimos cada item do “modelo de letramento estatístico” de Gal (2002). Os

participantes foram apresentando também exemplos pessoais, como a

participação numa pesquisa a respeito de intenção de voto e os levantamentos

estatísticos para um trabalho de conclusão de curso, ilustrando o que estava

sendo apresentado, ou como forma de tornar mais próxima a teoria.

Durante as discussões, em alguns momentos foram levantadas as

questões de como a Estatística pode ser usada para manipular as pessoas,

principalmente quando se tem pouco conhecimento sobre o assunto, e a

importância dos vários elementos apresentados por Gal (2002),

exemplificando-os. Seguem transcrições de arquivo de áudio, dos momentos

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que consideramos importantes por estar em foco o desenvolvimento

profissional como desenvolvimento de conhecimento. Esse evento de

letramento se concentrou no conhecimento da Estatística (conteúdo

específico), de acordo com Shulman (1987):

Keli: Alguém aqui já foi entrevistado para essas questões de eleição?Em algum ano?

Silvana: Em algum ano já!... Foi uma... como eu explico... eu estavaem São Paulo, tinha ido no Museu do Livro, não Museu da LínguaPortuguesa e uma turma de uma faculdade, mas não me lembro donome. Estavam fazendo pesquisa para um trabalho deles lá. E aí,eles perguntaram se tinha alguma preferência por candidato. Já fazbastante tempo isso. Não deve ter sido à toa. Não era nenhum"Ibope" assim.

Keli: Uma pergunta: Se eu entrevisto pessoas que estão num museu?Museu da Língua Portuguesa?

Mie: Professor, estudante, quem gosta de leitura, assim alguma coisaintelectual.

Keli: Entendeu? Quando eu estou fazendo uma pesquisa num lugarassim, pode ser que eu esteja privilegiando uma parcela, mas não seiqual era exatamente a pesquisa. Mas vamos percebendo esseselementos. Se fosse uma pesquisa numa feira?

Rosana: Às vezes eles fazem uma "lavagem cerebral" assim napessoa. Ficam martelando aquilo até a pessoa falar: vou votar,porque a gente vai ganhar. Aí depois ela vai dizer que "fui eu quevotei na pessoa que ganhou".

Roseli: Tem gente que tem pensamento assim: "eu sabia que fulanoia ganhar".

Keli: E isso mostra a influência da Estatística na nossa vida cotidiana.(Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:19:45 a0:21:50).

Nesse momento do encontro, estávamos refletindo a respeito do modelo

do letramento estatístico proposto por Gal (2002) e exemplificando o que o

autor classifica como elemento de conhecimento: questionando as informações

que nos chegam e acreditando em nosso poder de ação crítica.

Especificamente no trecho “Quando eu estou fazendo uma pesquisa num lugar

assim, pode ser que eu esteja privilegiando uma parcela, mas não sei qual era

exatamente a pesquisa. Mas vamos percebendo esses elementos. Se fosse

uma pesquisa numa feira?” (Keli), são levantados exemplos a respeito do que

Gal (2002) chama de questionamento crítico.

38 Aqui a participante estava se referindo a uma empresa privada chamada IBOPE – InstitutoBrasileiro de Opinião Pública e Estatística – que costuma realizar pesquisas no País.

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Nos trechos “Às vezes eles fazem uma ‘lavagem cerebral’ assim na

pessoa. Ficam martelando aquilo até a pessoa falar: vou votar, porque a gente

vai ganhar. Aí depois ela vai dizer que ‘fui eu que votei na pessoa que ganhou’”

(Rosana) e “Tem gente que tem pensamento assim: ‘eu sabia que fulano ia

ganhar’” (Roseli), nossa crítica foi justamente a falta de crença, por parte de

muitas pessoas, em seu poder de ação crítica, exemplificando o que Gal (2002)

chama de elementos de disposição e, especificamente, a postura crítica.

Outros elementos apontados por Gal também foram aparecendo ao

longo das discussões, como neste momento em que Rosana exemplifica o

conhecimento estatístico (Gal, 2002):

Rosana: Numa empresa que eu trabalhei, eu precisava explicar parao meu contratante o que estava dizendo aquele gráfico, se eu sóapresentasse o gráfico ele não sabia do que se tratava, pois o gráficopor si só não explica, você precisa interpretá-lo. Eu acho a maioriados gráficos confusos. (Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalode tempo 0:24:45 a 0:25:39).

...

Rosana: o gráfico pode enganar visualmente também (Arquivo deáudio da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:26:15 a 0:26:19).

Mie e Silvana apontaram situações envolvendo a importância do

conhecimento matemático e seu papel no letramento estatístico, como apoio ao

conhecimento estatístico:

Mie: Se tem seis pessoas, três já são 50%. É preciso saber quantaspessoas.

Silvana: Tive uma experiência no TCC, de 100 questionários, cincoresponderam, então o meu grupo de análise tinha cinco pessoas e eutentei trabalhar com porcentagem, então ficava 20% dosentrevistados, ou seja uma pessoa... a Keli me ajudou nesse sentido.(Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:26:59 a0:27:26).

O conhecimento contextual como fonte para a interpretação dos

resultados foi apontado por Rosana:

Rosana: Isso é manipulado também dentro das empresas, parasatisfazer o cliente. Manipulam a informação. (Arquivo de áudio dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:28:16 a 0:28:22).

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Mais ao final do encontro, apareceram indícios do retorno ao tema

“letramento”, com foco nas habilidades de letramento apontadas por Gal (2002)

e em sua importância, quando pensamos no ensino de Estatística caminhando

para o letramento estatístico. Eis um trecho desse diálogo:

Rosana: É uma ideia legal de perspectiva de trabalho!

Mie: Em sala de aula é possível fazer todo dia, como, por exemplo,na quantidade de crianças.

Keli: Não é só ensinar Estatística pura, mas deve ser um ensino deEstatística com compreensão.

Roseli: Vai ser natural depois para eles [as crianças] falarem depois.

Keli: Tem pessoas que sabem construir um gráfico, mas quando sedeparam com essa questão... nas reportagens, de realmenteconseguir interpretar, porque a nossa sociedade está cheia dessasinformações. Em tudo aparece questões de Estatística. (Arquivo deáudio da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:44:49 a 0:46:00).

Também surgiram elementos que nos fazem pensar sobre um trabalho

que não contribui para o desenvolvimento de pessoas estatisticamente mais

competentes, questionando e revelando a preocupação com a forma de

trabalho com as crianças. Percebemos também indícios de indignação com

relação a essa formação que tiveram ou à ausência dela:

Rosana: Eu acho que não estudei estatística na escola. Eu fico aquicavando para ver se eu lembro coisas, mas contato com Estatísticafoi no trabalho, quando precisei montar gráfico.

Silvana: Eu... foi no trabalho.

Rosana: Uma coisa... Quando eu comecei a trabalhar eu sofri muito,não sabia nem fazer o cálculo de percentual... Não sabia... quando eucomecei a trabalhar e tinha 15 anos.

Mie: Não estudou?

Rosana: Não foi trabalhado de uma forma clara, para mim!

Silvana: Para passar de ano tinha que decorar.

Rosana: E era decorado!

Silvana: Fez a prova, passou... esqueceu. (Arquivo de áudio dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:43:19 a 0:44:00).

Segundo Day (2001), um resultado necessário do desenvolvimento

profissional é a mudança do professor, e esse, na sua complexidade, depende,

entre outros fatores, das suas experiências passadas, como história de vida; e

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o empenho no processo de mudança implica ultrapassar a transmissão de

conhecimento e a crítica de suas experiências passadas.

As discussões no grupo poderiam continuar e ser aprofundadas, mas

tivemos o tempo como limitador, embora a temática tenha voltado às

discussões dos encontros seguintes. Concluímos ter sido um evento de

letramento, estruturado de acordo com as expectativas dos participantes, em

que o texto pode ser considerado uma parte fundamental nas reflexões,

implicando valores, atitudes e sentimentos nas relações sociais.

5.3 Situação pedagógica desenvolvida com crianças da Educaçãoinfantil

Nosso objetivo no encontro do dia 23/09/2010, foi conhecer uma

situação pedagógica desenvolvida com crianças da Educação Infantil e, para

isso, o grupo selecionou em nosso primeiro encontro o texto “Adivinhe quem

vem para ficar?”, de Jonsson (2002), que pôde ser disponibilizado com

antecedência, porque Rosana escaneou o material e providenciou o envio por

e-mail aos participantes.

Mas antes de iniciar as discussões a respeito do texto, perguntamos se

havia acontecido a alguém alguma coisa referente à Estatística, desde nosso

último encontro, lembrando que haviam se passado 15 dias. Uma das

participantes, Roseli, comentou que durante a semana houve situações

pedagógicas envolvendo gráfico na escola em que ela realiza estágio. Devido à

curiosidade dos participantes, combinamos que, se possível, ela traria o

material, para que pudéssemos observar e discutir em um de nossos

encontros. Outra participante, Rosana, comentou que notou algo na tarefa

escolar da filha, principalmente quanto à organização de dados, mas não um

gráfico, propriamente dito. Mas o momento que considerei mais importante foi

quando comentamos que eu havia recebido a visita “do censo”, ou seja, de um

recenseador, pois naquele momento estávamos num processo de pesquisa

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nacional39. Como outras pessoas do grupo também já haviam recebido a

mesma visita em outro momento, conversamos mais descontraidamente sobre

isso. A transcrição de áudio revela esses momentos:

Rosana: As pesquisas mostram... são alfabetizadas...

Roseli: Mas será que estão entendendo o que estão lendo?

Rosana: Eu conheço pelo menos 7 pessoas que moram próximas àminha casa e que sabem muito pouco assim... ler... e sãoconsiderados alfabetizados.

Keli: A pergunta é feita dessa forma [você sabe ler e escrever], paraatender a quem? Eles não perguntam se a pessoa consegue lerjornal e entender, por exemplo (Arquivo de áudio da pesquisadora.Intervalo de tempo 0:9:10 a 0:11:04).

Rosana: Eu achei que fosse um padrão, mas, pelo que eu estouvendo, em cada lugar eles [recenseadores] perguntam uma coisa.Devia ter um padrão. Se é uma pesquisa só, por que essa diferença?

Silvana: Acho que é porque, quando os recenseadores fazem ocurso, cada um fez em um lugar e também recebe aquela maquininhae interpreta a sua resposta.

Rosana: Mas a pergunta já vem fechada, só para assinalar namaquininha.

Silvana: Me fizeram diversas perguntas: “quantas pessoas moram emcasa?”, “como é estrutura da casa?”, e a moça perguntou para gentese a gente tinha acesso à informação, por exemplo, televisão, jornal,revista. Foi a única pergunta que eu achei bem diferente assim...

Keli: Olha que pergunta que dá várias interpretações: “Você temacesso a jornais, TV, computador?”. A pessoa pode dizer que tem,porque na casa dela tem, mas pode ser que ela não saiba ler, mas nacasa dela alguém lê e ela acaba tendo acesso às informações viaoutra pessoa. Ter acesso a informação não quer dizer que a pessoafaça uso dela nas práticas sociais necessariamente (Arquivo de áudioda pesquisadora. Intervalo de tempo 0:17:10 a 0:18:04).

Depois, retomando as gravações, pudemos constatar que algo já havia

mudado na fala de algumas pessoas, ou seja, percebemos mudança de

discurso: houve indícios da ressignificação do que discutimos no encontro

anterior, com relação aos termos “alfabetização e letramento”, na perspectiva

dos autores Soares (2003) e Gal (2002), e apropriação das ideias desses

39 O Censo 2010, como os anteriores, compreendeu um levantamento minucioso de todos osdomicílios do País. Nos meses de coleta de dados e supervisão, 191 mil recenseadoresvisitaram 67,6 milhões de domicílios nos 5.565 municípios brasileiros para colher informaçõessobre quem somos, quantos somos, onde estamos e como vivemos (Fonte: IBGE – InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística)

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autores na fala dos participantes, quando, por exemplo, os participantes

começaram a questionar a forma com que as pesquisas foram feitas.

Consideramos um dos indícios do conceito de letramento estatístico

apresentado por Gal (2002) e classificado como um “elemento de disposição”,

chamado de “crenças e atitudes”, quando expressaram seus questionamentos

para algo que estiveram vivenciando.

Passamos às discussões do texto propriamente dito, que consideramos

momento de práticas e evento de letramento, mas não mais importantes que

nossas discussões iniciais.

Eduardo comentou que o que mais chamou sua atenção no texto foi que

ele desmitificou um pouco a questão de que “Tratamento da Informação” é

apenas “gráfico”, pois isso é o que lhe tinha sido apresentado até então.

Silvana comentou que a situação pedagógica desenvolvida pela professora,

autora do texto que estava sendo estudado, levou as crianças a raciocinar,

elaborar o pensamento a partir da proposta de escolher um animal que poderia

ser criado na escola. Retomamos a questão apresentada no texto que lemos:

“Que animal seria possível ser criado em nossa escola? Qual animal seria

impossível e o pouco provável?” (Jonsson, 2002, p. 32). Eis o que

selecionamos do arquivo de áudio:

Eduardo: O que mais me chamou a atenção foi um pouco do que ascrianças trabalharam, essa questão de que não é só a elaboração degráfico. Isso para mim serve um pouco por que a vivência que eu tivede escola, do contato com outros professores era de que oTratamento da Informação era GRÁFICO, GRÁFICO, GRÁFICO, e euachei que nessa atividade apresentada não tem a elaboração degráfico. Foi diferente, pois trabalhou com outras coisas.

Rosana: Eu fiquei pensando. Como que eu vou fazer uma atividadecom as crianças? Me senti a pior das piores, que atividade eu poderiamontar que estivesse nesse sentido? Não sei. (Arquivo de áudio dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:18:37 a 0:20:0).

...

Silvana: Isso de levar as crianças a argumentarem, verbalizar. "Queanimal seria possível ser criado em nossa escola?". Bem diferentedaquilo que a gente vê bastante ainda na Educação Infantil, em que oprofessor chega com as coisas prontas: hoje nós vamos estudarsobre o pintinho ou nós vamos estudar o tal do coelho porque éPáscoa.

Keli: É verdade.

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Silvana: As datas comemorativas, consideradas o máximo dosmáximos na Educação Infantil e às vezes se faz isso tãoautomaticamente, tão automaticamente que não permite à criançapensar, elaborar pensamento, verbalizar o que ela acha sobre aquilo.Então foi uma maneira bem inteligente que ela encontrou, e aí euentendi que não foi imediato, eu entendi que levou um certo tempo.

Rosana: Não estava pronto, a professora forçou eles a pensarem.

Silvana: Deve ter tido pesquisa, uma roda de conversa muito legal!(Arquivo de áudio da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:20:50 a0:22:49).

Com relação à associação do termo Tratamento da Informação aos

gráficos, conforme mencionado por Eduardo, Lopes (2010) aponta que o

pensamento estatístico, para a realização de inferências, também combina

ideias acerca dos dados e da noção de incerteza, sendo necessário o

pensamento probabilístico na tomada de decisões. De acordo com a mesma

autora (1998), isso pode ser reflexo do ensino de Estatística e Probabilidade

como um momento para a realização de cálculos, exercícios mecânicos,

aplicação de fórmulas e leitura de tabelas que provavelmente não viabilizam o

desenvolvimento do pensamento estatístico e probabilístico e sua utilização

para resolução de problemas.

Chamamos a atenção, durante nossa conversa, para o tempo em que a

professora, autora do texto lido, havia realizado a situação pedagógica: três

dias é um período longo. Essa questão do tempo no desenvolvimento de uma

situação pedagógica com as crianças acabou sendo retomada nos encontros

posteriores, em que tivemos a apresentação de trabalhos desenvolvidos pelos

participantes em sala de aula.

Também comentamos que, caso a situação pedagógica tivesse sido

realizada em outra escola, a sensibilidade poderia ser outra. Por exemplo, a

questão seria: “Qual bicho é possível criar numa escola de zona rural”? São

contextos diferentes, e por isso as crianças poderiam levantar possibilidades

diferentes. Chamamos a atenção do grupo também para a questão do universo

dos “possíveis” e “impossíveis” e da probabilidade de ocorrência de um evento,

que era apresentado pela autora do texto que estávamos discutindo. Eduardo

também comentou que as pessoas trabalham muito com chance no dia a dia,

por exemplo, há “tantos por cento de chance de chover hoje”.

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Já caminhando para a finalização do encontro, retomei uma anotação no

diário de pesquisa, a respeito da baixa autoestima de Rosana, quando

comentou que se sentiu “a pior das piores”, ao mencionar a possibilidade e,

indiretamente, sua insegurança para realizar uma proposta de trabalho desse

tipo com crianças. Perguntei, então, se os participantes se sentiam capazes de

realizar uma proposta de trabalho como essa que conheceram. Da

audiogravação desse episódio trazemos este excerto:

Eduardo: Eu não sei, eu tenho... a gente estudou um pouco eu sei...eu tenho um pouco aquela noção de Estatística elaboração degráfico. Eu acho que preciso de...

Rosana: Modelos.

Eduardo: Mais situações pedagógicas de trabalho com o tratamentoda informação... Que vão um pouco além.

Rosana: Era a minha dificuldade de colocar alguma coisa, eu queriacolocar alguma coisa, mas fiquei com receio (Arquivo de áudio dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:45:25 a 0:46:39).

Nesse momento não percebemos indícios da confiança dos participantes

para desenvolver algo semelhante com crianças, mas isso era esperado, dado

o curto percurso do grupo até aquele momento. Por indicação dos

participantes, decidimos estudar mais um pouco sobre situações pedagógicas

com crianças da Educação Infantil.

Ficamos contentes com o surgimento de algumas atitudes: assumir uma

tarefa, colaborar com o grupo, como foi o caso de Rosana, ao disponibilizar os

materiais e coordenar as discussões, e de Roseli, ao apresentar material da

escola para nossas discussões. Estes são indícios do que Hargreaves (1998)

chama de cultura da colaboração, em que as relações tendem a ser

espontâneas e voluntárias, demostrando compromisso com o grupo, embora,

em alguns momentos, ainda tenhamos oscilações, como, por exemplo, a fala

de Rosana: “Eu queria colocar alguma coisa, mas fiquei com receio”. Afinal, o

grupo, nesse momento, ainda começava sua caminhada.

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5.4 O trabalho com a Estatística na Educação Infantil

Nesse encontro iniciou-se uma prática de levar “lanchinhos” e

guloseimas para as reuniões. A primeira contribuição nesse sentido foi de Mie.

Isso caracteriza o tipo de relação que o grupo começava a estabelecer,

caminhando para a constituição de um contexto colaborativo.

Foram apresentados aos participantes os registros que eu tinha de uma

situação pedagógica desenvolvida com crianças de 3 anos, na ocasião, meus

próprios estudantes. As imagens puderam ser vistas num notebook. Passamos

a relatar aqui a situação pedagógica (Quadro 5):

Quadro 5: Situação pedagógica de Estatística com crianças de 3 anos

Que suco você gostaria que fosse feito na escola?A pergunta que “disparou” nossa situação pedagógica foi “Que suco você gostaria que fossefeito na escola?”. A situação pedagógica foi realizada numa escola municipal de periferia dacidade de Águas de Lindóia, estado de São Paulo, em 2002, motivada pelos trabalhos noGepepei40, que conheci em um evento na Unicamp41.

A primeira coisa que foi levantada com as 15 crianças foram os tipos de sucos queelas conheciam, como forma de trabalhar o universo conhecido por elas. Elas conheciam sucode uva, limão, laranja, abacaxi, acerola, morango e beterraba, que foram ilustrados pelaimagem da fruta ou do legume que os produziria, seguidas também da escrita do nome dafruta (Figura 7).

Figura 7: Sucos conhecidos pelas crianças de 3 anos42

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

40 Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Estatística e Probabilidade na Educação Infantil, entãocoordenado pela Prof.ª Celi Lopes.41 XVI Encontro de Professores de Matemática, promovido em abril de 2002, pelo laboratóriode Ensino de Matemática (LEM) do Instituto de Matemática, Estatística e ComputaçãoCientífica (Imecc). A partir do alto, da esquerda para a direita: uva, limão, laranja, abacaxi. Segunda linha, daesquerda para a direita, morango e beterraba. Última linha: acerola.

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No segundo dia de desenvolvimento da situação pedagógica, trabalhei, com ascrianças, os sucos que eles consideravam que seria possível fazer na escola e os queconsideravam pouco prováveis. Durante as nossas discussões, foram eliminados os sucos debeterraba e acerola. A beterraba porque eles não gostavam e acerola porque eles não sabiamonde comprar.

Dando continuidade à situação pedagógica , no terceiro dia, foi escolhido por cadacriança o suco que gostaria que fosse feito na escola e confeccionado um cartão com suaopção desenhada, para representar sua escolha. Considerei interessante a atitude dascrianças com relação ao que foi escolhido: não mudaram de opinião, após a escolha de seuscolegas ou no dia seguinte.

No quarto dia da realização da situação pedagógica é que construímos o gráfico,tendo previamente traçados os seus eixos; e, com o auxílio das crianças , foram colados oscartões, organizados em colunas, com a escolha de cada um.

Figura 8: Gráfico dos sucos conhecidos pelas crianças de 3 anos

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Embora a criança apresentada na Figura 8 ainda não soubesse comparar

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quantidades, informando que “7” é maior que “5”, ela foi capaz de informar que o suco queseria feito na escola seria o “suco de abacaxi”, mostrando que a coluna formada pelos cartõesdesse suco era mais alta que a coluna dos outros sucos, como o morango e o limão.

Depois da escolha, compramos o abacaxi, para que fosse feito o suco na aulaseguinte (quinto dia). Nesse momento exploramos o abacaxi e suas características e a receita,antes de degustar o suco, escolhido pela maioria das crianças da turma de 3 anos.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

Também foram apresentadas outras situações pedagógicas, realizadas

de forma semelhante, mas não com tantos detalhes: “salada preferida”,

“programa de TV preferido” e “como está o tempo?” Os participantes foram

fazendo comentários ao longo de toda a exposição, demonstrando entusiasmo,

falaram de situações pessoais, mas o que chamou atenção, mais ao final do

encontro, foi uma pequena mudança de postura numa das participantes, que já

não se sentia com tão baixa estima, de acordo com nossa interpretação. Este

excerto confirma essa constatação:

Rosana: Será que é difícil fazer isso na sala? Rs... Algumasatividades que eu vejo, relaciono com a escola onde estou fazendoestágios, até dá vontade, mas eu não sei como é a abertura paraisso, porque agora tem o livro didático já "fechado" para eles [osestudantes] fazerem. Fico com medo de também atrapalhar otrabalho do professor.

Keli: Acho que, bem planejado, esse trabalho pode dar muito certo!

Rosana: Mesmo agora, quando está acabando o ano, acho que podeser interessante...

Mie: Eles podem ver semelhanças, diferenças...

Keli: Temos que começar desde cedo... senão vamos continuar tendouma situação ruim, como por exemplo, já peguei estudantes da 8.ªsérie que nunca tinham tido contato... Lembram do que contei?

Roseli: É crítica a situação nas escolas... essas atividadescontribuiriam como um todo (Arquivo de áudio da pesquisadora.Intervalo de tempo 0:32:18 a 0:34:17).

No trecho em que Rosana pergunta “Será que é difícil fazer isso na

sala?”, avaliamos que começa a ser cogitada a possibilidade de fazer um

trabalho semelhante com crianças. Percebemos indícios de um aumento na

confiança, com relação ao encontro anterior, mas talvez, nesse momento,

ainda não suficiente para a concretização da proposta, pois o trecho é seguido

de indícios de esquiva, “até dá vontade, mas eu não sei como é a abertura para

isso”.

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Mesmo com poucos encontros, já houve indícios da contribuição das

práticas coletivas de reflexão para o desenvolvimento profissional do professor,

como desenvolvimento de conhecimento, que começa a ter reflexos no seu

desenvolvimento pessoal (com relação a se sentir seguro).

5.5 Análise do material disponibilizado por uma participantes

Esse foi nosso primeiro encontro gravado em vídeo. Preferimos iniciar

como esse tipo de gravação apenas quando os participantes se sentissem à

vontade com o grupo e com sua dinâmica. Foi possível notar que os

participantes se sentiram apreensivos apenas nos momentos iniciais da

filmagem, depois se acostumaram com a presença do equipamento e voltaram

ao seu comportamento usual.

Roseli havia proposto que discutíssemos o material que ela havia visto,

referente à construção de gráficos pelas professoras em uma das escolas em

que realizara seu estágio. Roseli conseguiu trazer o material para a reunião do

grupo, conforme propôs.

Constituíram-se, então, como material de análise nesse encontro, cinco

gráficos, apresentados na forma de cartaz, em papel do tipo kraft. Nosso

objetivo foi analisar o trabalho realizado pelas professoras da escola na qual

Roseli estava fazendo estágio, discutindo-o formativamente.

Roseli iria coordenar as discussões, mas, como previu um pequeno

atraso seu, deixou o material (cartazes) previamente na sala em que nos

reuniríamos. Então fomos abrindo os cartazes de forma aleatória.

As discussões começaram com um gráfico que, de acordo com a

indicação, no alto do papel, era do 5.º ano (Figura 9).

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Figura 9: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (I)

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Nossas indagações começaram a respeito “do que tratava o gráfico”.

Como ele não trazia um título, mas apenas “5.º ano A”, foi levantado que ele

podia tratar do “esporte preferido dos estudantes” “do esporte praticado pelos

estudantes” ou ainda “do esporte conhecido pelos estudantes”, pois ele

continha um quadro que listava os esportes futebol, natação e judô. Nossas

discussões se focaram na importância do título, da autoria e da data em que foi

realizado, numa situação como essa, em que se sintetizam informações para o

outro, alguém que terá acesso àquelas informações.

As mesmas indagações se repetiram no gráfico seguinte, que foi

continha 4.º ano (Figura 10) e 2.º ano (Figura 11), e outras indagações também

surgiram. Perguntamo-nos onde havia sido realizada a pesquisa. Qual a

escola? Qual a cidade? Quando? Mencionamos a importância dessas

informações para a leitura do gráfico, conforme as imagens e a transcrição de

arquivo de vídeo:

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Figura 10: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (II)

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Figura 11: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (III)

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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Keli: Gráfico do 4.º ano A.

Eduardo: Falta um título. Não sabermos se é o esporte preferido, se éo esporte praticado...

Silvana: Ou o que eles mais conhecem. Se for comparando com aoutra classe, pode ser o que eles conhecem.

Roseli: Se for o que eles praticam... Acho que não... Esgrima? KungFu?

Keli: De onde será que é? Será que é de Atibaia mesmo? Será que aRoseli faz estágio aqui em Atibaia? Porque tem muitas cidades aquivizinhas.

Eduardo: Em São Paulo acho que teria esgrima para crianças, masem Atibaia?

Keli: Em Atibaia? Tem?

Silvana: Para praticar? Acho que não. Até Kung Fu eu acho que nãotem...

Keli: Parece que é irrelevante, mas tudo isso são informações queajudam a ler as informações. (Arquivo de vídeo da pesquisadora.Intervalo de tempo 0:2:08 a 0:3:30).

Nesse momento das discussões, ainda que não explicitamente, era

perceptível a abordagem do letramento estatístico. Estávamos discutindo

elementos importantes do gráfico, mas principalmente o que Gal (2002) chama

de “elemento de conhecimento” e, mais especificamente, “conhecimento

contextual”, ou seja, a base para a interpretação dos resultados obtidos com

sentido e a forma como isso faz sentido no contexto apresentado. De acordo

com Watson (2006), muitas vezes esse contexto é esquecido nas definições

apresentadas nos livros didáticos, mas é importante para relacionar os

elementos presentes no currículo escolar com o letramento estatístico

requerido fora da sala de aula.

Notamos também que as construções foram feitas pelos estudantes,

“manualmente” e apresentavam indícios de que estavam em desenvolvimento

com relação à construção de gráfico, usando régua, lápis e papel, ainda

apresentando dificuldades em lidar com esse registro, numa escala de “cartaz”

para ser apresentado na escola. Mas consideramos que saber construir um

gráfico usando régua ou usando recursos computacionais não é o suficiente

para caracterizar o aprendizado, quando pensamos no letramento estatístico.

Depois de observarmos novamente os três gráficos é que levantamos a

possibilidade de que uma turma, a do 4.º ano, dividida em grupos de

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estudantes, houvesse pesquisado as outras turmas da escola, sintetizando a

informação em gráficos que se intitulavam “5.º ano”, 4.º ano” e “2.º ano”. Foi

nesse momento que Roseli chegou à reunião e pôde nos esclarecer: tratava-se

de uma proposta desenvolvida pelos estudantes de uma escola rural da cidade

da Atibaia. No bairro em que se localiza a escola, não há acesso à internet. A

professora do 4.º ano do Ensino Fundamental propôs aos estudantes

pesquisarem o “esporte preferido”, tendo como universo a escola (período da

manhã). Cada grupo de estudantes levantou dados com uma sala da escola e

apresentou os resultados na forma de um cartaz. Toda a pesquisa foi então

sintetizada posteriormente numa tabela (Figura 12) e também apresentada

num cartaz; depois disso, houve a construção de outro gráfico (Figura 13).

A partir dessas informações, os gráficos fizeram sentido para os

participantes do grupo.

Figura 12: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (IV)

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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Figura 13: Cartaz trazido por Roseli ao encontro (V).

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Como foi uma gentileza das professoras da escola ceder os cartazes,

nos contentamos em trabalhar com o que nos foi oferecido, mas, observando a

tabela e o número de estudantes “entrevistados”, constatamos que não

tínhamos todos os cartazes produzidos.

Consideramos que o momento se constituiu, para os estudantes da

escola, numa tentativa, por parte da professora, de abordar o letramento

conectado com o contexto esportivo e com as mudanças atuais, utilizando

várias linguagens, na perspectiva dos multiletramentos.

Nossas discussões seguintes foram a respeito de como realizar um

trabalho como esse, buscando formas de trabalhar melhor, ou seja, pensando

num trabalho melhor com os estudantes, caminhando para o letramento

estatístico, e em mudanças de práticas mais tradicionais com as quais tinham

contato até então. Sugeri situações pedagógicas que pudessem oportunizar,

principalmente, o envolvimento com pesquisa e leitura que nos auxiliasse em

relação ao conhecimento da Estatística, porém de forma integrada com outras

situações e não de modo isolado, pois, de acordo com Lopes (1998, 2008a), os

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contextos interdisciplinares poderão proporcionar a aquisição de

conhecimentos menos compartimentalizados.

Keli: Se eu fosse essa professora e tivesse trabalhando isso com ascrianças. Pesquisei o assunto preferido e acabou a história aí...

Silvana: Tinha que dar uma continuidade como a história dos animaispossíveis, né? Não seria legal?

Keli: O que ela poderia fazer?

Eduardo: Organizar um campeonato, por exemplo.

Keli: Ir assistir uma partida... de futebol, por exemplo. De repente,fazer uma pesquisa sobre o futebol... É possível trabalhar com váriaspráticas que envolvem a leitura e a escrita. Então o trabalho comEstatística não morre com o gráfico, ele dá possibilidade para outrascoisas. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:7:43a 0:9:09).

Pensando na continuidade do trabalho com os estudantes, Eduardo

sugeriu que eles poderiam anotar as conclusões sobre o gráfico no caderno, e

Silvana indicou o papel quadriculado para a reprodução ou a construção dos

gráficos. Cogitou também que poderiam ter escolhido um esporte para

“conhecer melhor”, e, nesse caso, a professora poderia fazer pesquisas na

internet, fora do bairro, para subsidiar o trabalho dos estudantes. Para finalizar,

depois de conhecermos um pouco o contexto da escola, que é cercada de

chácaras, discutimos se a pesquisa sobre esportes seria a melhor temática a

ser trabalhada com os estudantes. Deixamos como perguntas finais: Será que

a temática da pesquisa poderia ter sido escolhida por eles, os estudantes?

Será que, dessa forma, poderia ter sido valorizado mais o contexto local?

Nossas discussões se centravam nos multiletramentos, buscando definir

o que se constituiria como um letramento estatístico adequado ao contexto

dessa escola. Tentamos, ainda, muito timidamente, pensar num novo design,

que, segundo Bevilaqua (2013), é um eixo estruturador da teoria dos

multiletramentos; ou seja, tentamos pensar numa nova forma de construção de

significados pelos estudantes, dando continuidade ao ciclo explicitado a seguir.

De acordo com Bevilaqua (2013), consideramos que partimos do design

disponível (os cartazes), passamos para o próprio processo, ou seja,

reconstruímos a partir do design disponível, gerando novas construções da

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realidade, resultando num novo design disponível, fazendo surgir nova fonte de

construção de sentido. E, a partir disso, a partir desse novo design, o ciclo se

repetiria.

5.6 Estudo de conceitos básicos I

Com este encontro, iniciamos uma série de seis encontros dedicados ao

estudo de um dos capítulos do livro Matemática no Ensino Fundamental:

formação de professores e aplicação em sala de aula (VAN DE WALLE, 2009).

Esse livro foi apresentado aos participantes, que resolveram estudá-lo, em

razão da abordagem da Estatística no capítulo intitulado: “Conceito em análise

de dados”.

Nesses eventos de letramento em que estudamos o texto, o caminhar

para a mudança, no desenvolvimento profissional dos professores, objetivava

ampliar, aprofundar e reconstruir os saberes, buscando o conhecimento da

Estatística (conteúdo específico), o conhecimento pedagógico geral e da

Estatística, o conhecimento dos estudantes e suas características e o

conhecimento dos contextos educativos (Shulman, 1987). Ou seja, investia-se

no desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de

conhecimento negociado no grupo e não imposto. Consideramo-nos de acordo

com Fiorentini (2004, p. 60), quando afirma que “os participantes [do grupo]

negociam metas e objetivos comuns, co-responsabilizando-se para atingi-los” e

também com Passos et al. (2006, p. 203), ao afirmar que o bom

desenvolvimento do trabalho no grupo, principalmente no que diz respeito à

reflexão compartilhada, depende, entre outros fatores, “de ações coordenadas,

planejadas e negociadas coletivamente”.

Este encontro foi coordenado por Silvana, que chegou um pouco mais

cedo, pois queria esclarecer um termo que tinha ficado em dúvida: “senso

numérico”. Estabelecemos o seguinte diálogo, transcrito da videogravação:

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Keli: Você se lembra quando apresentei uma foto de uma criança,comentando que, mesmo ela não sabendo contar, devido à poucaidade, ela conseguia distinguir diferenças entre maior, menor?

Silvana: Sim, me lembro.

Keli: Então, ela já tinha certo senso, com relação às quantidades,estabelecendo relação entre elas. Certo senso numérico.

Silvana: Senso, senso, de noção? De conseguir distinguir.

Keli: Tem vários pesquisadores investindo em desenvolver o sensonumérico das crianças do 1.º ano, investigando seu desenvolvimento,que não envolve apenas saber contar. Outro sentido de censo é o derecenseamento43.

Silvana: Agora ficou claro que é bem diferente. Como faz diferençaentender o significado da palavra! A gente compreende! (Arquivo devídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:02:52 a 0:04:17).

Nesse diálogo, Silvana revela que procurou se preparar para conduzir as

discussões do encontro, lendo previamente o texto e buscando ajuda no que

havia ficado em dúvida. Percebemos indícios de “respeito e apoio mútuo”

(FIORENTINI, 2004), pois, sabendo que poderia contar com alguém do grupo,

não temeu compartilhar comigo e depois com o grupo suas dúvidas. Tais fatos

são indícios do nosso contexto de colaboração.

Silvana começou o encontro, mencionando que, quando fez a leitura do

texto, o que chamou sua atenção foi a presença cada vez mais evidente da

Estatística em diversas situações no mundo a nossa volta, o que, às vezes,

acaba passando despercebido, como, por exemplo, na maior parte das

propagandas na TV. Ela chegou a citar uma situação encontrada no texto.

Nesse depoimento, transcrito de arquivo de vídeo, Silvana revela perceber um

trabalho diferenciado com a Estatística, como algo possível de ser realizado

com os estudantes:

Silvana: Eu achei legal a forma como eles abordaram, eles usaram apropaganda “9 entre 10 dentistas recomendam a pasta de dente ‘tal’”.Achei ótimo! Quantas vezes a gente está dentro da sala de aula epode trabalhar com isso de uma maneira tão gostosa e acaba nãoligando, não associando a conteúdos importantes! Achei essecomentário muito interessante. (Arquivo de vídeo da pesquisadora.Intervalo de tempo 0:12:00 a 0:12:28).

43 Quando faladas, as palavras “senso” e “censo” possuem a mesma sonoridade, mas, quandoescritas – com “s”, “senso”, ou com “c”, “censo” –, seus sentidos são totalmente diferentes.Havia indícios de que essa diferenciação não fosse muito clara naquele momento.

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Dando continuidade às reflexões sobre o texto, Silvana mostra indícios

de que se sente bem em compartilhar suas descobertas no espaço daquele

grupo:

Silvana: O autor também menciona que desde a Educação Infantil atéa 3.ª série eles fazem análise de dados. Esse é o bloco que a gente jáviu, chamado Tratamento da Informação. De início eu não havia feitoessa associação. Para mim, análise de dados era uma coisa etratamento da informação era outra coisa, e agora eu vi que sãosinônimos, com relação aos currículos. [...] Olha só, sem querer,passei lá na página 496 [VAN DE WALLE, 2009] e o gráfico de pizzachama gráfico de setores [risos]. Sem querer descobri isso! (Arquivode vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:12:52 a 0:14:30).

Sobre a associação que Silvana faz entre os termos “análise de dados” e

“tratamento da informação”, concluímos que, como se trata de uma tradução de

uma publicação americana, foi traduzido para o português, e o termo usado

pelo NCTM44 é “data analysis”. No Brasil, para se referir a um conjunto similar

de conteúdos, usa-se o termo “tratamento da informação”. Assim como para

Silvana, a relação poderia não ter ficado clara para os outros participantes, por

isso consideramos importante o compartilhamento das suas “descobertas”.

Também refletimos sobre o fato de o capítulo escolhido ter despertado

interesse dos participantes logo de início, reforçando o sentimento de

identificação com as propostas e o desejo de continuar a fazer parte do grupo,

ou seja, indícios da constituição de um contexto colaborativo.

Na introdução do capítulo de Van de Walle são apresentadas algumas

ideias que chamaram a atenção de Silvana e dos outros participantes e,

inclusive, foram grifadas em minhas anotações no diário de pesquisa. Silvana

leu para os colegas estes itens, conforme registro no arquivo de vídeo:

[...] A classificação é o primeiro passo na organização dos dados.

[...] A escolha de representação gráfica pode influenciar o quão bemos dados serão compreendidos.

[...] O uso de um gráfico ou de uma estatística particular pode mediaro que os dados informam sobre a população. (VAN DE WALLE, 2009,p. 485).

44 National Council of Teachers of Mathematics (Conselho Nacional de Professores deMatemática).

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E sobre isso Silvana comentou:Silvana: Nas ideias importantes. Ele fala que a classificação é oprimeiro passo para a organização dos dados... Para mim, nunca fizessa associação. E depois que eu li isso, me pareceu tão óbvio! Tão(rs) Como pode eu nunca ter pensado nisso! Achei bem interessante!O item três, quando ele fala das organizações de dados, forneceinformações diferentes sobre os dados, e a escolha da representaçãográfica pode influenciar o quão bem os dados serão compreendidos.Me lembrei do nosso encontro passado, quando a gente viu aquelastabelas dos pontos dos esportes e que calhou, conforme a estrutura,a apresentação, a gente tem uma compreensão melhor, né? Acheique a gente viu esse detalhe bem na prática. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:20:29 a 0:22:00).

Silvana também chamou a atenção dos colegas para outro trecho:

Silvana: Eu queria ter lido essa frase quando a gente estava lá naaula do curso de Pedagogia. Olha que resposta linda: “Que asmedidas que descrevem dados com números são chamadasestatísticas”45 (risos). Olha só, lembra de nossa aula, Keli, e daquelapergunta: “O que é estatística?”. A gente ouve tanto falar, temexemplo, mas o que que é? Não é possível! Vinte anos dando aula enão saber responder essa pergunta! Mas aqui está tão simples, tãoassim! Demorei um pouquinho para aprender! (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:23:22 a 0:24:34).

Dando continuidade às discussões, Silvana também comentou o que

havia aprendido sobre a palavra “senso”, mostrando novamente indícios de que

há um desejo em compartilhar seus saberes, descobertas e experiências.

Ela destacou em seguida as conexões da área do tratamento da

informação com as outras áreas do currículo, apresentados pelo autor: senso

numérico; frações, razões e porcentagens; medida; e álgebra. Com relação ao

“senso numérico”, Van de Walle (2009, p. 485) apresenta que “crianças

analisam e usam os gráficos para conversar sobre quantidades”, completando

que “os gráficos indicam relações numéricas de maior, menor, diferença e

magnitude relativa. Cada barra de um gráfico é uma parte do todo (relações

parte-todo)”. Com relação às “frações, razões e porcentagens”, o autor destaca

que são usados para descrever dados” e afirma, ainda, que “muitos dos dados

do mundo real que são coletados consistem em medidas”, complementando

que, “quando os alunos fazem medições, respondem às questões e criam

dados para serem analisados” (VAN DE WALLE, 2009, p. 485-486). Quanto à

45 Leitura de Van de Walle (2009, p. 485).

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álgebra, Van de Walle (2009, p. 486) aponta que ela “é usada para analisar e

descrever relações” e que “sempre que os dados são coletados com duas

variáveis relacionadas (por exemplo, altura e palmo, idade e crescimento), a

álgebra pode ser usada para descrever a relação entre as variáveis”.

A questão da álgebra foi o que mais chamou a atenção dos

participantes. Silvana comentou o que havia entendido do termo a partir das

explicações trazidas pelo autor:

Silvana: O exemplo que ele deu aqui é de uma relação, idade ecrescimento, eu imagino aquele gráfico que fazemos, das idades ealturas e mais para frente ele [o autor] fala, quando encontramos opadrão desse gráfico, podemos predizer que uma criança com “talidade” terá mais ou menos “tal altura”. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:08:06 a 0:08:51).

Comentei que as “personagens” mais famosas da álgebra são a

equação e a igualdade e que, nessa área que trabalha com as letras – como o

“x” para representar valores desconhecidos –, dependendo da situação, os

valores podem se comportar como incógnitas (valor fixo) ou como variáveis

(assumindo diversos valores). Com um bom trabalho nessa área, os

estudantes podem compreender melhor a generalização através de uma

fórmula, que permite prever o que vai acontecer futuramente. Dei o exemplo da

fórmula usada para o cálculo do IMC (índice de massa corpórea), explicando

que se trata de uma fórmula que já generalizou a questão da relação peso e

altura. Rosana lembrou e relacionou o exemplo do IMC com os gráficos de

crescimento das crianças – aqueles feitos logo depois do nascimento da

criança, para acompanhar o crescimento e o peso mês a mês.

Passamos, então, para outro tópico do texto de Van de Walle (2009, p.

486), intitulado “Coletando dados para responder questões”. Silvana comentou

que, quando percebeu que o termo usado pelo autor – “análise de dados” – é

similar ao que chamamos aqui de “tratamento da informação” (BRASIL, 1997),

as ideias que começamos a estudar com esse autor fizeram mais sentido para

ela. Ela também apresentou suas percepções sobre o trabalho em sala de

aula:

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Silvana: Eu acho que nós, os brasileiros, estamos tentando, não seise estamos conseguindo, mas a educação está tentando fazer comque as crianças formulem as questões, para que elas busquem assoluções e cheguem a uma conclusão, mais do que olhar o livroapenas e responder a uma questão. Acho que estamos tentando.Acho que, quando fazemos isso, estamos trabalhando também acomunicação. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:14:36 a 0:15:20).

Quando Silvana menciona “a educação está tentando fazer com que as

crianças formulem as questões, para que elas busquem as soluções e

cheguem a uma conclusão, mais do que olhar o livro apenas e responder a

uma questão”, está em sintonia com a abordagem de um trabalho com

resolução de problemas, que, segundo Lopes (2011, p. 1), ao abordar a

Estatística e a Probabilidade, envolve “a elaboração de questões para

responder a uma investigação sobre a realidade, que possibilita o fazer

conjecturas, formular hipóteses, estabelecer relações e tirar conclusões”. Ainda

segundo Lopes (2011, p. 1), um trabalho nesse sentido, em Estatística e

Probabilidade, deve contribuir para que “a escola cumpra seu papel de

preparar os estudantes para a realidade à medida que promove o

desenvolvimento do raciocínio crítico através da análise de situações diversas

que envolvem a incerteza”. Nesse sentido, Lopes (2011, p. 1) considera a

metodologia da resolução de problemas recomendada para o trabalho com

Estatística e Probabilidade, “por torná-lo mais significativo, de forma a viabilizar

ao estudante o estabelecimento de relações entre os conceitos matemáticos e

estatísticos”.

Ainda no trecho transcrito, Silvana afirmou julgar que, ao desenvolver

atividades nesse sentido, estamos, pelo menos, tentando trabalhar a

comunicação. De acordo com nossa interpretação, há indícios também de uma

abordagem interdisciplinar nas aulas, o que, de acordo com Lopes (2011, p. 1),

“poderá proporcionar aos alunos uma aquisição de conhecimentos menos

compartimentalizados, através de experiências que lhe[s] permitam o

desenvolvimento de habilidades essenciais ao pensar científico, fundamental

para sua formação”.

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Ainda discutindo o tópico de Van de Walle (2009), “Coletando dados

para responder questões”, encontramos menção ao NCTM (2008, p. 48)46,

expressando que os estudantes devem “formular questões que possam ser

tratadas com dados e coletar, organizar e expor [comunicar] os dados

relevantes para respondê-las”. Algo que nos chamou atenção também foi a

ênfase dada por Van de Walle (2009, p. 486) ao propósito de situações

pedagógicas que trabalhem com o tratamento da informação: “a coleção de

dados deve ter um propósito, responder a uma questão, da mesma maneira

que no mundo real”. E o autor completa: “evite reunir dados simplesmente para

construir um gráfico”. Nesse sentido, Watson (2006) complementa que a ideia

de que o gráfico é o início e o fim de um trabalho com análise de dados deve

desaparecer do trabalho do professor. Esse propósito da realização de

situações pedagógicas foi discutido e, inclusive, continuou nas discussões nos

encontros posteriores, como forma de crítica às situações pedagógicas que

encontramos em livros didáticos.

Outro aspecto que nos chamou atenção e foi apontado por Silvana foi

justamente a menção aos livros didáticos e ao que frequentemente apontam

para ser desenvolvido com os estudantes:

Os livros didáticos geralmente fornecem aos estudantes as questõesa que devem responder como também os dados com os quaisrespondê-las. Embora esses possam ser contextos interessantespara a Análise de Dados, as questões não são necessariamente deinteresse para seus alunos. Os estudantes devem ter oportunidadepara gerar suas próprias questões, decidir-se por dados apropriadospara ajudar a responder a essas questões, e determinar os métodospara coletar os dados. (VAN DE WALLE, 2009, p. 486)

Comentei que o autor também traz o estudante como protagonista no

processo de coleta e exploração dos dados. Sobre esse fato, uma das

participantes comentou:

Roseli: Você construir é mais interessante. Não querer tudo pronto eolhar a resposta. Traz uma autoestima maior também. (Arquivo devídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:17:46 a 0:17:59).

46 O termo era desconhecido e foi explicado aos participantes: National Council of Teachers ofMathematics (Conselho Nacional de Professores de Matemática).

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Sobre isso, os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p. 56)

também apontam que a finalidade do trabalho com o Tratamento da

Informação é “fazer com que o aluno venha a construir procedimentos para

coletar, organizar, comunicar e interpretar dados, utilizando tabelas, gráficos e

representações que aparecem frequentemente em seu dia-a-dia”.

Silvana comentou que, se o conteúdo for significativo, o estudante não

vai esquecer quando sair da sala, pois o que for trabalhado tem significado

para ele. Rosana opinou que isso também pode contribuir positivamente para a

melhora na autoestima da criança, porque ele vai interagir com questões mais

próximas à sua realidade, não será aquele conteúdo imposto pelo material

didático e que obrigatoriamente tem que ser reproduzido. Exemplificando essa

situação, Rosana também expôs que se deparou com uma experiência em que

uma professora precisou abordar uma temática que não fez muito sentido para

as crianças de 4 anos, da escola em que estagiava, o “caranguejo eremita”.

Mas o desenvolvimento dessa situação pedagógica envolvendo o tal

caranguejo foi algo que o material do tipo apostilado e adotado pela escola

apresentou e a professora teve que trabalhar. Nesse caso, Rosana considerou

que, se as questões partissem das crianças e dos seus interesses naquele

momento, possivelmente as situações pedagógicas teriam mais sentido e

seriam mais significativas para elas.

Nessa parte do encontro observamos que, assim como já havíamos

vivenciado em outros grupos de que participamos, como o GdS, e como já

relatado por Fiorentini (2004), é habitual os professores levarem suas

expectativas, angústias e dilemas da prática profissional para compartilhar com

o grupo, sem se restringir ao tema em estudo – no nosso caso, a Estatística –,

mas referindo-se a coisas que vivenciam no dia a dia, nas aulas, como a

angústia de trabalhar com questões ou situações pedagógicas com as quais

não concorda ou que poderão não ser significativas para as crianças.

Dando continuidade às discussões, apontamos o trecho de Van de Walle

em que são apresentadas algumas sugestões para a sala de aula,

considerando que “as questões mais fáceis de abordar são aquelas que podem

ser respondidas com cada membro da turma contribuindo com uma parte dos

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dados” (VAN DE WALLE, 2009, p. 486). Algumas sugestões apresentadas por

ele foram mencionadas pelos participantes, lendo no texto:

Favoritos: Shows de televisão, jogos, filmes, sorvetes, plataformas dejogos de vídeo, times esportivos, CDs de música (Quando existiremmuitas possibilidades, sugira que os alunos restrinjam o número deescolhas).

Quantidades: o número de animais de estimação, irmãs ou irmãos;horas assistindo TV ou horas de sono; aniversários (mês ou dia demês); hora de dormir; tempo gasto no computador.

Medidas: altura, antebraço, área do pé, distância em salto emdistância, comprimento da sombra, segundos para percorrer umcaminho, minutos gastos no ônibus. (VAN DE WALLE, 2009, p. 486)

Para finalizar, Silvana concluiu que acredita que não estamos muito

distantes de um bom encaminhamento do ensino de Estatística, de acordo com

sua leitura de Van de Walle, pois considera que já realizamos pesquisas com

nossos crianças sobre “favoritos” (times, programas a que assistem),

“quantidade de coisas que temos” (número de irmãos, tempo de estudo), por

exemplo. Mas concluiu que não é muito comum vermos trabalhos na temática

referente a “medidas” – medida do pé, do antebraço, por exemplo. De acordo

com Cochran-Smith e Lytle (1999), percebemos indícios de que, na sua

conclusão, Silvana estaria considerando o conhecimento e a teoria produzidos

por outros, material gerador para o questionamento e a interpretação e, ao

mesmo tempo, considerando sua sala de aula, local para investigação

intencional.

Para finalizar, alguns participantes se manifestaram, mencionando

impressões sobre nossos estudos. Consideramos que, nesse momento, o que

estava em foco era o desenvolvimento profissional, como desenvolvimento de

si mesmo, ou seja, o momento em que as crenças, os pensamentos e as

atitudes, muito importantes na reflexão, revelaram que as experiências

negativas de uma formação mecanicista, enquanto estudante da escola básica,

influenciaram no relacionamento do professor com a Estatística, com a própria

Matemática e com a escola, de modo geral.

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Silvana: Se eu tivesse um professor que tivesse falado isso quandoeu estava estudando...

Eduardo: Seria tão mais fácil!

Silvana: Eu iria pegar gosto por esse negócio!

Keli: Pega agora!

Silvana: Vou pegar agora! Mas a gente sofreu tanto. Eu sofri tanto naescola!

Rosana: Falo que hoje eu consigo perceber isso, mas a escola,muitas vezes, foi tempo perdido. Faça, decore, faça 50 contas pordia. Você não sabe nem por que estava fazendo. Eu decorava afórmula e fazia a prova. Hoje eu reflito mais, vejo as coisas de outraforma, de um outro papel.

Roseli: Eu acho que tem que fazer como você já fez conosco,descobrir qual a relação com a Matemática, para poder trabalhar comos alunos melhor. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo detempo 0:09:42 a 0:10:52).

Finalizamos o encontro, decidindo quem iria coordenar o encontro

seguinte: Eduardo. Numa negociação de responsabilidades e fazendo um

rodízio nessa função, voluntariamente, coordenaria dando continuidade ao

estudo do texto de Van de Walle (2009). Fiorentini (2004, p. 56) utiliza o termo

“liderança compartilhada” para denominar essa prática em que o próprio grupo

define quem coordena a atividade, mencionando a possibilidade de rodízio na

tarefa, como ocorreu no Estatisticando.

5.7 Estudo de conceitos básicos II

Dando início ao encontro, foram compartilhados no grupo a pasta de

materiais que estávamos organizando para o grupo e para a pesquisa, com os

arquivos em áudio e vídeo, gravados em CDs e DVDs; os textos estudados; os

materiais que foram trazidos por Roseli (cartazes); e o diário de pesquisa. Esse

momento reforçou o contexto colaborativo que estava se instaurando, pois,

segundo Fiorentini (2004, p. 60), “os participantes compartilham significados

acerca do que estão fazendo e aprendendo e o que isso significa para suas

vidas e prática profissional”.

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Depois desse momento de compartilhamento, demos continuidade às

discussões, usando como base o texto de Van de Walle (2009). Quem

coordenou o encontro foi Eduardo, como combinado.

O foco de nosso estudo nesse encontro foram as representações

gráficas. Segundo apontado por Eduardo em Van de Walle (2009, p. 491),

“como os dados são organizados deveria estar, em primeiro lugar, diretamente

relacionado à questão que fez você coletar dados”. Completando, Eduardo

também apontou a seguinte afirmação da mesma página: “diferentes técnicas

gráficas ou tipos de gráficos podem fornecer uma imagem instantânea diferente

dos dados como um todo”. Para exemplificar, Eduardo apontou uma imagem

(Figura 14) apresentada por Van de Walle (2009, p. 492, grifo do autor),

mencionando “como um gráfico de pizza mostra as informações diferentemente

de um gráfico de imagens?”

Figura 14: Gráficos apontados por Eduardo.

Fonte: Van de Walle (2009, p. 492).

Eduardo mencionou que o autor aponta esses gráficos como

disparadores de discussão sobre a mensagem ou sobre informações que cada

um fornece para responder a questão “Qual a fruta de que mais gostamos?”.

Avaliando os gráficos, Eduardo considerou que o gráfico de pizza ou

setores não seria muito adequado para representar a quantidade de crianças

que gostam de cada fruta, preferindo, para isso o gráfico de barras (terceiro

gráfico, da esquerda para a direita, que aparece na imagem). Silvana comentou

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que, para crianças menores, como as da Educação Infantil, o gráfico de setores

também dificultaria a leitura pelos estudantes, que ainda teriam dificuldades de

lidar com a legenda. E complementou que talvez fosse melhor que as imagens

das frutas aparecessem dentro do círculo:

Eduardo: Eu achei o gráfico de barras mais interessante para osalunos entenderem essa pergunta: “Quantas crianças gostam decada fruta?” do que o gráfico de setores.

Silvana: Na Educação Infantil, se tivesse essa figurinha dentro degráfico de setores, eles visualizariam melhor, porque elesentenderiam pelo tamanho. A legenda ainda seria difícil para eles.(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:8:30 a0:9:35).

Complementei, informando que o gráfico de setores permite a

comparação parte-todo. Eduardo considera ter compreendido a questão de

trabalhar com uma figura que permite ao estudante entender o quanto daquela

turma prefere determinada fruta. Silvana acredita que, para uma primeira

experiência das crianças, ainda seria um pouco complicado o uso dessa

representação, ao invés do uso do gráfico de barras.

Ainda discutindo o texto conforme transcrição de arquivo de vídeo a

seguir, focamos na questão da construção do gráfico e nas questões de

análise. Consideramos estas últimas, assim como destaca Van de Walle

(2009), mais importantes, chamando a atenção para a questão de que letrar,

no sentido mais geral, não é só ensinar a técnica e, no nosso caso específico,

letrar estatisticamente não é só ensinar a técnica de construção de gráfico.

Eduardo: Eu acho legal essa construção coletiva do gráfico, com aparticipação, o aluno participando. Isso é bem mais interessante doque o aluno ficar fazendo no papel quadriculado no caderno dele.

...

Eduardo: O que não deveríamos fazer: "ficar ansiosos demais sobreos detalhes tediosos da construção de gráficos. As questões deanálise e de comunicação são as agendas principais de trabalho esão muito mais importantes do que a técnica" (VAN DE WALLE,2009, p. 491). Eu achei isso magnífico!

Keli: O que está por trás da técnica é o mais importante!

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Eduardo: E às vezes não é essa a intenção que a gente vê na sala deaula. Às vezes a intenção é que eles construam perfeitamente ográfico, mas o mais importante é sobre o que está se falando!

Keli: Isso nos lembra da primeira coisa que a gente estudou:letramento estatístico.

Eduardo: Exatamente. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalode tempo 0:14:43 a 0:15:40).

Em um dos trechos do texto aparecem os termos “média”, “mediana”

“dispersão” e “desvio padrão”, e, pelo silêncio do grupo, notei que aquilo não

fazia muito sentido para eles. Expliquei que média aritmética, mediana e moda

são chamadas medidas de tendência central e se resumem em apenas uma

informação: características dos dados. Como forma de tornar aquilo mais

significativo, resolvi propor que trabalhássemos com as idades dos presentes

naquele encontro. Como ninguém se opôs, perguntei a idade de cada um e

anotei no diário de pesquisa, organizando-as numa tabela, que foi preenchida,

etapa a etapa. Cada participante recebeu como identificação uma letra (A, por

exemplo), e as idades não foram organizadas em ordem crescente ou

decrescente, mas na ordem em que cada participante falou, conforme registro

no meu diário de pesquisa (Tabela 1):

Tabela 1: Idade dos participantes para cálculo envolvendo a média

Participante Idade (anos)

A 28

B 40

C 46

D 22

E 32

F 34

Total 202

Fonte: Elaborada pela pesquisadora.

Fui explicando que, para encontrarmos a média, fizemos a somatória

das idades (202) e dividimos pelo número de participantes naquele dia (6); ao

encontrarmos um valor com várias casas decimais, fiz a aproximação, o que foi

considerado tranquilo pelos presentes, pois já haviam trabalhado com o

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conceito de média, principalmente no cálculo de média da nota (bimestral, por

exemplo), e com os critérios de aproximação. Também comentei que havia

idades menores e maiores que a média, que era 34 anos. O que nos chamou

atenção foi o fato de inicialmente esse conhecimento parecer algo “novo” e, ao

mesmo tempo, ser algo que já haviam feito em algum momento da vida, como

estudantes da escola básica ou como professores (cálculo de média).

Acreditamos que detinham esse conhecimento de Estatística como algo

mecânico, que repetiam, sem ter oportunidade de refletir sobre ele.

Passei, então, para a explicação da mediana, mencionando que nesse

caso estávamos interessados em um valor central do conjunto de valores que,

no nosso caso, ficariam organizados em ordem crescente, para que

pudéssemos encontrar o valor que estivesse no centro da distribuição.

Expliquei também que, como tínhamos um número par de idades, para

encontrar a mediana, faríamos a média entre os dois valores centrais – no

nosso caso, 33 anos. Essas informações estão anotadas no diário de pesquisa

(Quadro 6).

Quadro 6: Cálculo de mediana das idades dos participantes

Campinas, 18 de novembro de 2010.

22 28 32 34 40 46

33Diário de pesquisa

Complementei, dizendo que, se nossa quantidade de valores fosse

ímpar, não seria necessário o cálculo da média entre os valores centrais, pois o

valor central já dividiria nosso conjunto em dois blocos. Exemplifiquei,

acrescentando mais um valor ao nosso conjunto, apenas para constatar que

localizariam a mediana, como técnica ou cálculo. A transcrição revela indícios

de que Silvana ainda não tinha uma boa percepção do conceito:

Silvana: Quando você calcula a mediana, você faz ... Divide aquantidade...

Keli: Pode ver que eu deixei organizado na ordem.

Silvana: É o meio da quantidade e não o meio da ... quantia.

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Keli. Eu tenho um, dois, três, quatro, cinco, seis. O meio desseconjunto de valores, desses seis valores, três para um lado, três parao outro. Se fossem sete valores, iria sobrar um valor no meio, queseria a mediana, como temos seis valores, junto esses dois valorescentrais e divido por dois. O valor encontrado é a mediana. (Arquivode vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:27:03 a 0:28:40).

Embora a palavra “moda” não aparecesse no trecho do capítulo que

estávamos lendo, aproveitei e mencionei mais essa medida, dizendo que se

tratava do valor que mais aparecia em nosso conjunto de dados. Como no

nosso caso não se repetia nenhuma idade, tratava-se de um caso em que não

havia moda, ou amodal.

Explicado algo sobre as medidas de tendência central, levantei a

discussão a respeito do que seria mais justo ou deveria ser utilizado, pois, se

tivéssemos dois valores de “salários” para fazer a média, como, por exemplo,

10 e 100, a média, seria 55, o que está muito distante dos “salários recebidos”

e poderia nos levar a uma análise equivocada. Teríamos, então, que olhar para

o desvio padrão, ou seja, o valor que mostra a dispersão dos dados em relação

à média. Quanto maior o valor de desvio padrão, maior é a variabilidade dos

dados, isto é, quanto os dados se distanciam da média.

Considerado por Shulman (1987) como conhecimento de conteúdo

específico, o conhecimento estatístico – uma das bases do letramento

estatístico, que as pessoas deveriam possuir para utilizar na vida – ainda era

algo mecânico, abordado sem reflexão pelos participantes do grupo.

Como não houve tempo suficiente para maiores discussões a esse

respeito nesse encontro realizado em 18/11/2010, comprometemo-nos a

retomar o assunto – e o fizemos no encontro realizado em 15/04/2011.

5.8 Momento de avaliar

Com o final de nosso primeiro semestre de estudos, depois de sete

encontros, consideramos que seria necessária uma avaliação mais formal,

embora os participantes tivessem escolhido as temáticas e os materiais e, na

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dinâmica de nossos trabalhos, tivéssemos percebido indícios de relações

colaborativas. Consideramos a avaliação mais formal, pelo fato de ser escrita e

de ser entregue a mim, pesquisadora. Ela foi composta por três expressões:

Parabenizo, Critico e Sugiro. Nosso objetivo era que servisse diretamente aos

participantes, ou seja, informações avaliativas que fossem úteis para, ao

mesmo tempo, melhorar nosso processo de estudo e comprometer o

participante com seu próprio processo de desenvolvimento profissional.

Recebemos seis avaliações. Todos foram unânimes em elogiar a

proposta da criação do grupo de estudos, e os professores que já atuavam

consideraram que era algo de que sentiam necessidade e que as “formações

de professores” nos moldes que conheciam não davam conta de suas

necessidades profissionais. Na avalição feita pelos futuros professores,

apareceu a expressão “oportunidade de aprender mais” (Roseli), além da

afirmação que esse conhecimento seria usado com seus futuros alunos,

projetando possíveis mudanças no desenvolvimento dos conteúdos de

Estatística. Quatro participantes também apontaram como positiva a escolha

do autor que estávamos utilizando nos nossos estudos, Van de Walle (2009),

ou seja, responderam ao estudo teórico positivamente.

Julgamos adequada a sistemática reflexiva gerada nos encontros do

grupo, principalmente por considerarmos cada um como evento de

letramentos. Foram trazidos ora aportes teóricos, ora aportes práticos, ligados

à sala de aula, o que fornece indícios de que contribuíram para o

desenvolvimento do trabalho colaborativo. Também entendemos que os

encontros contribuíram para articular teoria e prática, mobilizando ou

ressignificando os saberes docentes, contribuindo para o desenvolvimento

profissional dos participantes. Avaliamos que, nos encontros, houve ênfase

tanto na questão do desenvolvimento de conhecimento de Estatística

(conteúdo específico) quanto no conhecimento pedagógico da Estatística.

Nesse sentido, os participantes estavam mais confiantes após os encontros,

indicando a criação de um clima de colaboração no grupo.

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5.9 Reinício dos trabalhos – 2011

O encontro de 18/02/2011 marcou o reinício dos trabalhos no ano.

Tivemos a participação de seis estudantes do curso de Matemática

(ingressantes no 1.º semestre do curso) e de mais uma participante do curso

de Pedagogia: Cíntia, além de Rosana, Mie, Roseli, Eduardo e eu. Os

estudantes do curso de Matemática não continuaram no grupo. São múltiplos

os fatores que mobilizam pessoas a querer fazer parte de um grupo, mas

levantamos a hipótese de que não houve identificação inicial. Alguns deles até

apresentaram a justificativa de que houve um compromisso de última hora e

não puderam comparecer. Nessa situação, preferimos não provocar

constrangimentos com interrogatórios.

Começamos as discussões, especialmente considerando os

participantes novos, expondo novamente nossos objetivos como grupo de

estudos e nosso interesse no estudo da Estatística; apresentando os

participantes que já compunham o grupo, as temáticas que tínhamos estudado,

os materiais que já tínhamos arquivado em pastas físicas, como, por exemplo,

diários, textos, gravações em áudio e vídeo. Expusemos também as questões

éticas envolvidas, visto que a filmadora e o gravador de voz estavam ligados.

Uma das perguntas que surgiu foi a respeito da periodicidade dos encontros.

Foi explicado por mim que aconteciam de acordo com as possibilidades dos

participantes, mas que a proposta inicial era nos encontrarmos de 15 em 15

dias.

Passamos para a reapresentação dos participantes que já eram

membros do grupo e a apresentação de uma nova integrante47, Cíntia:

Rosana: Meu nome é Rosana, estou no último ano de Pedagogia.Estou desde o ano passado nesse trabalho, buscando conhecer maisa Matemática e a Estatística. Vocês [novos participantes] sãoestudantes de Matemática, mas, para nós, Matemática é uma coisaestranha. Na minha época de estudo, a Matemática não era bemtrabalhada, e a Keli trouxe, nas aulas, uma outra visão da Matemática

47 Embora todos que estiveram presentes se tivessem apresentado, optamos por não trazer astranscrições dos que não permaneceram no grupo ou compareceram apenas a um dosencontros.

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para a gente. E agora, nos encontros, temos também uma outra visãoda Estatística.

Cíntia: Meu nome é Cíntia, estou no 2.º ano de Pedagogia e eu vimpor curiosidade, para saber como é, como funciona, e eu queria umsuporte, um reforço para poder ensinar... esse é o meu interesse.

Mie: Meu nome é Mie, sou japonesa, sou estrangeira aqui. Sou do 3.ºde Pedagogia. Já estudei muito com a Keli. Há muita diferença entrea forma de ensinar às crianças. Embora a Matemática seja universal,há muita diferença. E eu quero estudar mais.

Roseli: Meu nome é Roseli. Estou no grupo de estudos com opessoal, o que me estimula a pensar como passar a Estatística paraas crianças. É difícil? É, mas todos podem aprender. E queroaprender mais ainda.

Eduardo: Meu nome é Eduardo. Terminei a Pedagogia em 2009.Atualmente faço pós-graduação em Educação Infantil eAlfabetização. Trabalho na rede municipal aqui de Atibaia, dando aulapara um 3.º ano e trabalho aqui na FAAT na oficina pedagógica ecomo monitor da graduação. Comecei o ano passado no grupo deestudos. Eu vim com o intuito de ...assim, o Tratamento daInformação, a questão da Estatística, vejo que ela fica um pouco delado. Dá-se muita importância aos números e operações e otratamento da informação é um bloco que acaba... vejo osprofessores que não têm muita dinâmica, que não gostam detrabalhar muito com essa área. Vim aprofundar o que já aprendi naPedagogia [curso].

Keli: Todos você já me conhecem, sou a Keli e trabalho na área daPedagogia e da Matemática. Trabalho nos dois cursos. Bom, a minhaproposta nesse grupo de estudos é nos reunirmos para estudar aEstatística. Uma das coisas que estudamos foi o letramentoestatístico. Alguém já ouviu essa palavra?

Participantes novos: Não.

Keli: Letramento... alguém já ouviu? [silêncio]. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:08:21 a 0:16:55).

Resolvemos trazer aqui as reapresentações dos participantes que

haviam frequentado o grupo porque notamos, em suas falas, indícios de já se

sentirem parte dele. Temos como exemplo o sentimento de pertença,

evidenciando o contexto colaborativo, mostrado na fala de Rosana e de Roseli,

quando mencionaram o grupo e o fato de fazerem parte dele. No caminho já

percorrido pelo grupo, o aprendizado para a mudança, com a ampliação, o

aprofundamento e a ressignificação dos próprios saberes, também foi

mencionado com as expressões “buscando conhecer mais” (Rosana), “Vim

aprofundar o que aprendi” (Eduardo), “quero estudar mais ainda” (Roseli),

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“Nova visão” (Rosana), evidências do desenvolvimento do professor, como

desenvolvimento pessoal, e da valorização do desenvolvimento do professor,

como desenvolvimento de conhecimento. Ainda percebemos indícios da

consciência da diferença entre conhecimento de Estatística e conhecimento

pedagógico da Estatística e da importância de seu entrelaçamento, nas

expressões “há muita diferença entre a forma de ensinar às crianças” (Mie),

“pensar como passar a Estatística às crianças (Roseli) e “os professores não

têm muita dinâmica” (Eduardo).

Também a fala de Cíntia, que cursava Pedagogia e passou a fazer parte

do grupo, quando menciona que buscava “um suporte, um reforço para poder

ensinar”, revela indícios do que Perrenoud (2002) chama de “ilusão”, ou seja, a

ilusão, por parte dos estudantes que querem se tornar professores, de que

devem apenas dominar os conteúdos e saberes para transmiti-los aos seus

aprendizes e de que isso seria garantia de sucesso.

Conversamos um pouco sobre conceitos que já havíamos estudado e

sobre nossa perspectiva de estudos sobre letramento estatístico. Definimos

que as questões da Estatística devem ser compreendidas e utilizadas na

prática diária, sem restringir o conhecimento ao conteúdo da sala de aula, mas,

principalmente, colocando em prática esse conhecimento, interligado às outras

bases de conhecimento apontadas por Shulman (1987).

Nessa ocasião aproveitei e fiz propaganda de um evento que ocorreria

em 2011 e poderia ser de interesse dos participantes (Congresso de Leitura do

Brasil – COLE)48. Aproveitamos também para planejar os próximos encontros,

definindo o dia da semana que seria melhor aos participantes (no caso desse

semestre, as sextas-feiras) e as datas. Também me comprometi em

providenciar cópias do material que estávamos estudando (VAN DE WALE,

2009) para os interessados e a enviar um convite para fazer parte de nosso

“grupo de e-mails”.

Durante o encontro procuramos não enfatizar questões como: “novos”

participantes e participantes “antigos”, professores iniciantes ou experientes,

48 Esse evento acabou não ocorrendo em 2011, mas foi realizado em 2012, com aapresentação de trabalho por um dos integrantes do grupo.

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porque estávamos reforçando o contexto colaborativo, entendendo que todos

aprendem juntos. Entendemos que a situação “novos” e “antigos” pode ser

complicada algumas vezes e o desafio num trabalho em grupos de contexto

colaborativos pode ser envolver os considerados “novos”, sem desmotivas os

participantes mais “antigos.

5.10 Estudo de conceitos básicos III

O objetivo deste encontro foi retomar algumas questões que já tínhamos

abordado e desejávamos retomar, em razão da participação de pessoas novas

no grupo, mas infelizmente nenhum dos estudantes do curso de Matemática

presentes no encontro anterior pôde estar presente.

Durante a nossa conversa inicial, assuntos não diretamente relacionados

a nossa temática acabaram surgindo. São temas não menos importantes, pois,

de acordo com Fiorentini (2004, p. 59), “há momentos durante os encontros,

para bate-papo informal, reciprocidade afetiva, confraternização e comentários

sobre experiências e episódios da prática escolar ocorridos durante a semana”.

O primeiro assunto foi levantado por Silvana, nos contando que estava tendo

uma experiência na Educação a Distância e, conversando com uma colega,

descobriu que ela não sabia que, na mistura de cores, a mistura do azul com

amarelo dava verde. Isso a surpreendeu negativamente, pois uma pessoa que

iria ensinar na Educação Infantil deveria possuir certa experiência com essa

mistura de cores. E, para concluir, Silvana disse que tem sido incentivado esse

tipo de capacitação para os professores.

Aproveitando o rumo da conversa, pedi licença para refletirmos

exatamente sobre uma palavra: “capacitação”. Mencionei que estava tendo

contato com estudiosos contrários ao uso dessa palavra. Que esses estudiosos

preferiam pensar em “formação”, “formação continuada”. Antes tínhamos muito

o uso de “treinamento”, “reciclagem” “capacitação”, e essas palavras tinham o

sentido de “ensinar fazer”, como se fosse uma fábrica, capacitando o

profissional para operar uma máquina. Houve um período em que se usava

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muito a palavra “reciclagem”, atualmente associada à “reciclagem do lixo”, por

exemplo. Mencionei que, muitas vezes, a mudança do termo não faz com que

as formas de trabalho sejam diferentes, mas hoje se prefere usar o termo

“formação”, para indicar um estudo baseado na reflexão e na investigação

sobre a prática. Nesse sentido de formação, concordamos com Azevedo e

Passos (2014, p. 58) que as experiências no grupo evidenciam que “a

formação continuada é uma necessidade para o trabalho docente e deveria ser

uma condição de trabalho do professor” e complementam que tal formação

“não só pode suprir possíveis lacunas da formação do professor, mas também

ajudá-lo a fundamentalmente nos problemas, nos dilemas e nas dificuldades do

cotidiano docente”.

Quando retomamos o estudo a partir do texto de Van de Walle (2009),

nos detivemos no trecho em que o autor apontava novamente os estudantes

como protagonistas em seu processo de aprendizagem, assim como

almejávamos que os participantes do grupo fossem:

Os alunos devem estar envolvidos em decidir como eles queremapresentar seus dados. Porém, crianças com pouca experiência comos vários métodos de visualizar dados não estarão cientes das muitasopções que estão disponíveis. Às vezes você pode sugerir um novomodo de apresentar e comunicar os dados e orientar as crianças naaprendizagem da construção daquele tipo de gráfico ou quadro. [...]A ênfase ou objetivos desse ensino deve ser ajudar as crianças aperceber o que os gráficos e quadros comunicam sobre asinformações e que tipos diferentes de representações informamcoisas diferentes sobre os mesmos dados. O valor de orientar osalunos a construir seus próprios gráficos não é tanto que aprendamas técnicas, mas que eles estejam pessoalmente envolvidos com osdados e que eles aprendam como um gráfico pode comunicarinformações (VAN DE WALLE, 2009, p. 491, grifos nossos).

Depois de nossos comentários a respeito do protagonismo do estudante

e de seu envolvimento com os dados, comentamos também sobre o livro

didático, que, num sentido contrário, às vezes, apresenta não só as questões,

mas os dados com os quais os estudantes devem respondê-las. Com isso,

outro assunto acabou surgindo, pois Rosana quis relatar um episódio escolar,

ocorrido durante a semana, no acompanhamento que realiza, com um

estudante com necessidade especial, numa sala de aula do 2.º ano do Ensino

Fundamental. Em circunstâncias como esta, de acordo com Fiorentini (2004),

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no contexto colaborativo, os participantes sentem-se à vontade para expor

seus pensamentos e sentimentos.

Rosana mencionou que não houve tempo para perguntar ou saber mais

sobre uma situação pedagógica que a professora da turma desenvolveu, mas a

situação que estava presente no livro didático da turma consistia em colocar

cinco peças azuis e dez peças amarelas dentro de um saco. A professora

também fez um quadro para registrar qual das duas equipes em que a classe

foi dividida (azul e amarelo), atingiria primeiro dez pontos. Retirava-se

aleatoriamente uma peça de dentro do saco e registrava-se um ponto para a

equipe correspondente. Havia a devolução da peça retirada.

Rosana mencionou que, muito provavelmente, a “equipe amarela” iria

ganhar, ou seja, a probabilidade de o amarelo ser sorteado era maior, fazendo

dez pontos. Mas ela considerou que não entendeu a lógica da situação

pedagógica desenvolvida, pois ela foi conduzida de forma a seguir instruções

de execução e, após a realização de uma rodada, os estudantes não

compreenderam a finalidade, tornando-se um jogo “aparentemente sem

sentido”. Eles preencheram as questões do livro didático sobre a situação

pedagógica, seguindo as instruções da professora, mas Rosana considerou

que não foi algo significativo para a turma ou que permitisse envolvimento,

discussões e tomada de decisão, levantados pelo autor que estávamos

estudando: Van de Walle (2009).

Rosana: No livro está dez amarelas e cinco azuis. Ela [a professorada turma] colocou dentro de um saquinho. Eu vi que estava no livro,pedindo para fazer isso, colocar as pecinhas, dez de uma cor e cincode outra, e desenhar, no caso, na lousa, dez colunas para cadaequipe e aí eles iam sorteando para ver quem iria ganhar. Mas...

Silvana: Sempre vai ganhar o amarelo!

Keli: Acho que, nesse caso, o objetivo era que eles percebessem quea chance maior era do amarelo.

Rosana: Mas no final das contas ela não explicou isso. Eu estavacom um aluno com necessidade especial, que eu trabalho comatividades diferenciadas e, quando vi, fiquei pensando... Mas não tivetempo de perguntar para ela [a professora da turma], qual era a lógicadaquela atividade. Será que é buscar que o aluno perceba que dejeito nenhum uma equipe vai ganhar?

Keli: De jeito nenhum, nem sempre. Pode ter uma chance bempequena...depende...

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Rosana: Mesmo só tendo cinco peças?

Rosana: Porque você vai ter que tirar até chegar no final.

Eduardo: Eu estou entendo o que a Rosana está falando, porque vaitirar todas as peças até acabar. [não considerando a reposição].

Rosana: Equipe Azul e equipe Amarela, só que eu tenho cinco peçasazuis e dez amarelas. Quem chega primeiro aqui [ao final do quadrocom dez lacunas]? Se vai tirando a peça até chegar aqui, não vejo apossibilidade do azul ganhar...

Keli: Tira e devolve para o saquinho?

Silvana: Aí realmente precisava ver a estrutura da atividade.

Rosana: Agora a Keli falou uma coisa, é verdade, como ela devolvia apeça...

Eduardo: Isso faz diferença.

Rosana: Ah, entendi. Mas eu não entendi a lógica daquilo.

Keli: A chance é menor, mas pode acontecer.

Silvana: É uma boa questão de probabilidade.

Rosana: Eu lembrei de nossos encontros, na hora. A oportunidade detransformar aquilo, como a gente vem trabalhando aqui! Mas não estásendo um jogo justo, na minha visão.

Keli: Mas talvez seja exatamente para isso, para eles perceberemque, jogando várias vezes o azul, provavelmente estava comvantagem.

Rosana: Então, o certo seria ela ter trabalhado dessa forma?Perguntando, por exemplo, "qual a chance do azul ganhar?" Porqueficou no ar.

Roseli: Ela quis facilitar para as crianças.

Rosana: A aula foi superagitada, o amarelo ganhou, todo mundo dogrupo feliz. Mas, como não teve essa intervenção da professora, paramim, ficou no ar...

Keli: Se puder, tira uma cópia dessa página e traz para a genteconhecer melhor. Com relação a essa questão que eu acabei defazer, responder uma questão, ter um objetivo. Ela pode ter feitoapenas para cumprir o que estava no livro ou ela pode transformaraquilo numa investigação. Perguntar por quê, fazer de novo.

Roseli: Despertar a curiosidade!

Keli: Ir lançando umas perguntinhas assim... Senão a criança faz semsaber porque faz aquela atividade. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:15:00 a 0:19:43).

Ainda sobre a discussão levantada por Rosana, Watson (2006, p. 170)

apresenta que as conexões entre “chance e justiça” podem ser mais complexas

do que esperamos. Segundo a autora, nesse contexto de jogos, ser justo

“significa que cada jogador tem a mesma chance teórica de ganhar o jogo”.

Possivelmente o jogo era exatamente propiciar uma discussão sobre esses

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termos, “chance” e “justiça”, e possibilitar a apresentação das crenças das

crianças. As experiências são consideradas importantes nesse processo de

compreensão dos conceitos probabilísticos.

Compartilhar esse episódio proporcionou não só a Rosana, mas também

aos outros participantes, a oportunidade de refletir sobre a situação e, a partir

de então, começar a olhá-la de forma diferente, pois novas hipóteses passaram

a surgir, como, por exemplo, a devolução ou não da peça ao saquinho. Ou

seja, os participantes ampliaram seu conhecimento pedagógico do conteúdo.

Percebemos também indícios da preocupação em promover mudanças

na prática de sala de aula em benefício dos estudantes e não apenas para

enriquecimento pessoal do professor, ou seja, o desenvolvimento profissional

estava passando pelo desenvolvimento de conhecimento, pelo

desenvolvimento pessoal do professor. Um bom exemplo disso é a fala de

Rosana, principalmente no trecho “A oportunidade de transformar aquilo, como

a gente vem trabalhando aqui”, que também apresenta indícios do contexto

colaborativo.

Essa discussão acabou levando a outra, sobre os conteúdos, o currículo

e a proposta de escolas públicas e particulares, ou seja, de acordo com

Shulman (1987), sobre o conhecimento do currículo; o conhecimento dos

estudantes e de suas características; o conhecimento dos contextos educativos

e dos objetivos, metas e valores educacionais. Rosana, ainda comentando a

questão da situação pedagógica que mencionou, justificou que, muitas vezes,

por ter que cumprir certa quantidade planejada de conteúdos, as situações

pedagógica são desenvolvidas sem considerar a qualidade:

Rosana: Não sei como é dar aula no lugar dela [a professora daturma], mas a [escola] particular é muito amarrada a aquele... aqueleplano de aula. Então não dá tempo de você fazer um trabalho que acriança entenda o real significado, mas você tem que cumprir aqueleplano de aula rigorosamente. (Arquivo de vídeo da pesquisadora.Intervalo de tempo 0:22:39 a 0:22:51).

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Nesse sentido, Rosana também comentou que questões como “plano de

aula” e “contexto de escola particular”, são novas para ela, pois está iniciando

sua carreira. Sobre a questão das apostilas usadas em escolas particulares,

Silvana comentou:

Silvana: Daí o professor tem uma ideia iluminada na hora que ele vêaquela criança com os olhinhos brilhando, mas não dá tempo. Vocênão tem o que fazer... Ou o aluno entende o que o livro explicou oufica sem entender... (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo detempo 0:24:50 a 0:25:10).

Novamente surgiram nas discussões temas muito importantes, como o

relato ocorrido em sala de aula, currículo, contexto de escola particular e escola

pública, início de carreira. Os participantes quiseram se desculpar por levantar

outros assuntos, mas acreditamos que eles tenham surgido justamente pelas

relações colaborativas que foram se instaurando no grupo. Completamos,

dizendo que, se as pessoas não encontram um espaço como esse para falar e

discutir sobre suas angústias com relação ao desenvolvimento de sua

profissão, onde o farão? Na escola, em geral, não há essa possibilidade, e

devemos, sim, aproveitar e discutir esses assuntos quando eles surgem! Nesse

sentido, Jimenez Espinosa (2002, p. 49) afirma, sobre seu trabalho em que

analisa um grupo colaborativo:

Embora essa não fosse a preocupação inicial do Grupo, percebeu-secom o tempo que o professor tem necessidade de compartilhar comseus colegas, suas preocupações, incertezas e dúvidas, pois essasperpassam toda a vida profissional dos professores e portantoacabam refletindo no trabalho grupal (JIMENEZ ESPINOSA, 2002, p.49)

Ressaltamos, mais uma vez, que o desenvolvimento profissional estava

centrado no grupo e nos processos interativos que buscávamos promover nos

encontros. Observamos também que ainda há muito que aprender

relativamente ao Tratamento da Informação, em especial no que diz respeito à

probabilidade (conhecimento de conteúdo específico). Como exemplo,

podemos citar esta fala da Rosana: “Não vejo a possibilidade do azul

ganhar...”.

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Tivemos a oportunidade de discutir novamente sobre essa situação

pedagógica, no encontro realizado em 15/06/201149. Assumi a condução desse

debate justamente para poder aprofundar nossas discussões, que serão

apresentadas adiante.

5.11 Estudo de conceitos básicos IV

A responsável pela coordenação desse encontro foi Rosana, e nosso

objetivo foi começar a discutir sobre os tipos de gráficos e, especialmente,

conhecer um deles, chamado de ramo e folhas, desconhecido de todos.

No momento inicial, nos concentramos em entender o que foi

apresentado por Van de Walle (2009, p. 494), ou seja, primeiro nosso olhar

estava na construção do gráfico em si.

Logo de início comentamos que a expressão “forma popular de gráfico

de barras” provavelmente está ligada ao contexto do autor (americano), pois

esse não é um gráfico que costuma aparecer no “nosso” cotidiano, ou seja, no

cotidiano dos participantes do grupo. Watson (2006) apresenta também que o

gráfico de ramo e folhas, embora esteja se tornando mais comum50, inclusive

nas avaliações, ainda não é popular nos meios de comunicação. Esse tipo de

gráfico é indicado pelo NCTM (2008) como uma expectativa de aprendizagem

por estudantes do 6.º ao 8.º ano, mas nos PCN que data de 1997, ele não

aparece.

No exemplo apresentado pelo autor, encontramos uma suposta lista de

resultados da Liga Americana de Beisebol (Figura 15).

49 Veja sessão 5.16 Situações pedagógicas que levantaram dúvidas. Contexto australiano.

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Figura 15: Dados geradores do gráfico de ramos e folhas

Fonte: Van de Walle (2009, p. 494).

Logo em seguida, Van de Walle descreve a forma como o gráfico foi

construído, apresentando a seguinte figura:

Figura 16: Gráfico de ramos e folhas

Fonte: Van de Walle (2009, p. 494).

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Fomos, então, entendendo o que foi apresentado, olhando a lista e o

gráfico e acompanhando a descrição do autor:

Os gráficos de ramo e folhas são significativamente mais fáceis paraos alunos construírem do que os gráficos de barras, pois todos osdados são mantidos, eles fornecem um método eficiente de ordenaros dados e os elementos individuais dos dados podem seridentificados (VAN DE WALLE, 2009, p. 494).

Após a leitura coletiva do trecho, nossas discussões continuaram,

envolvendo sua interpretação e ampliadas pela possível utilização com

crianças, conforme revela a transcrição seguinte:

Keli: O que vocês acham disso?

Eduardo: Com todo o respeito, como é mesmo o nome dele?[o autor]Eu discordo.

Rosana: Eu acho que foge, confunde as crianças. Se a criança aindanão sabe "unidade, dezena, centena"...

Eduardo: Até faz sentido a organização do gráfico, mas ele não émais fácil que o gráfico de barras.

Rosana: Para mim perde o sentido. A primeira vez que eu bati o olho,eu li noventa e quatro mil, cento e sessenta e um [se referindo aográfico apresentado por Van de Walle como “b” – Veja Figura 16].

Keli: Esse seria o ramo principal e aqui, as folhas.

Rosana: Mas a tabela é que está nos orientando.

Cíntia: Se não tivesse a tabela, não sei se entenderia.

Rosana: Talvez construir seja mais fácil, mas você vai ficar ensinandoapenas a técnica? (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo detempo 0:18:30 a 0:19:43).

O contato com o novo, o desconhecido, como esse tipo de gráfico, gera

ainda insegurança. Quando são mencionadas as dificuldades que as crianças

poderiam ter, talvez haja indícios da dificuldade dos próprios professores na

compreensão, o que se refletiria no trabalho com as crianças. De acordo com

Souza, Mendonça e Lopes (2013, p. 124), esse é um dos desafios da

Educação Estatística, pois ensinar Estatística não é tarefa fácil,

[...] principalmente porque não é suficiente apresentar diferentesmodelos e mostrar suas aplicações [...] é necessário aprofundar cadaquestão, pensando em como obter conhecimento através dos dadose como ajudar os alunos a desenvolver uma intuição coerente, deacordo com ideias controversas, como aleatoriedade e causalidade.

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Nesse sentido, segundo Watson (2006), enquanto esperamos que esse

e outros tipos de representação sejam mais frequentes na mídia, há muitas

oportunidades para desenvolver o letramento estatístico, usando gráficos de

barras, mais frequentes nos meios de comunicação.

5.12 Estudo de conceitos básicos V

Nesse encontro coordenado por Eduardo, nosso objetivo foi dar

continuidade ao estudo sobre os tipos de gráfico, apresentados por Van de

Walle (2009) no capítulo intitulado “Conceitos em Análise de Dados”.

Analisando previamente com Eduardo o que o autor apresentava sobre

gráficos de segmentos (ou linhas), histogramas e de círculo (setores/pizza),

consideramos que tínhamos um bom material para discussão sobre o gráfico

de segmentos e de setores. Entretanto, concluímos que o trecho que aborda

histograma não seria ideal para nosso estudo, pois o autor apresentava um

histograma construído a partir de uma calculadora gráfica. Embora

considerássemos importante o uso da tecnologia, como não dispúnhamos

desse recurso, poderia ficar muito limitado apenas olhar a figura produzida

numa calculadora gráfica, pois também não foram apresentados os dados

geradores.

Watson (2006) menciona que os recursos tecnológicos, assim como

pacotes de softwares, estão se tornando cada mais fáceis de usar e adaptados

para o uso de crianças cada vez mais novas, mas adverte que os estudantes

precisam ter experiências na criação de gráficos e aponta que apenas a

exposição a uma tela de computador pode ser limitante, pois os estudantes

precisam criar suas próprias representações para contar sobre os dados que

coletaram. Além disso, é desejável que atribuam significado para os símbolos

utilizados na elaboração dos gráficos, de forma a discutir sobre os rótulos e a

escala apropriada. A autora menciona também, como um fator importante, o

equilíbrio, a partir do contexto, entre o uso da tecnologia e a experiência na

criação dos próprios gráficos.

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Escolhemos, então, utilizar um histograma que eu já havia trabalhado

com uma turma do Ensino Fundamental, levando para o encontro cópias do

material (Figura 17).

Figura 17: Histograma levado para o encontro

Fonte: Pires e Pietropaulo (2002).

Começamos nossas reflexões a partir de interpretação do histograma

apresentado, iniciando pela tabela e conferindo o gráfico. Conforme as dúvidas

foram surgindo, fomos discutindo, como revela a transcrição:

Silvana: Se eu quisesse, por exemplo, identificar esses três alunosaqui [apontando para o intervalo 1,55 a 1,60, cuja frequência era 3] efaz de conta que um mede 1,59. Eu teria que fazer um pontinho bemlá pertinho do 1,60?

Keli: Não tem como. Se eu só tenho o histograma e os intervalos jáprontos assim, você só consegue saber que há três alunos nesseintervalo, por exemplo, pode ser que tenha um que meça 1,55, 1,56,1,57, 1,58 ou 1,59. Pode ser até que ninguém meça 1,59 ou mesmodois com a mesma altura. É separado em intervalos, porque senão eupoderia até ter que fazer uma coluna para cada aluno. São 30 alunosaqui, e eu poderia ter até 30 alturas diferentes ou no máximo 2 ou 3com a mesma altura. Eu conseguiria identificar, caso eu tivesse osdados brutos, aluno por aluno e sua altura.

Roseli: Fazer por aluno ficaria enorme!

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Keli: Se eu quero identificar de cada aluno, o ideal seria que eufizesse uma tabela.

Eduardo: Acho que o histograma existe justamente por conta disso,porque é difícil a gente fazer um gráfico medindo um a um.

Keli: E peso, então? Isso seria um enrosco! Já pensou? Quem pesa,30 quilos, 31,5 quilos, 31,6 quilos... Então você faz "grupos". Issotambém envolve a criança fazer classificação: esse faz parte dessegrupo, esse faz parte de outro grupo e assim por diante. Você separaem intervalos do mesmo "tamanho", chamados de classes. E eutambém escolho como vou separar essas classes. Pode ter classesmaiores ou menores. Nesse caso, o intervalo é de 5 centímetros.Quando falamos do peso, por exemplo, poderia ser um intervalo de 5quilos. Quando eu faço os grupos, eu não posso fazer assim: quemmede de 1,55 a 1,57 e de 1,57 a 1,67. Tem que ter o que chamamosde mesma amplitude. Eu tenho que verificar o que vai ser maisadequado. O ideal é que a gente tenha no mínimo 5 e no máximo 10classes.

Eduardo: É importante entender a diferença dele com o gráfico debarras.

Keli: Depende também dos dados com os quais eu estoutrabalhando. Se eu faço uma pesquisa sobre time de futebolpreferido, você não vai ter esse intervalo, ou você escolhe o time A outime B e assim por diante. Percebe o tipo de dado? São maisadequados para variáveis quantitativas contínuas, como peso, altura,idade, embora possa ser utilizada para variáveis discretas, como, porexemplo, pontuação, número de filhos, mas é raro. (Arquivo de vídeoda pesquisadora. Intervalo de tempo 0:12:45 a 0:19:14).

Um ponto de destaque nesse encontro também foi a tentativa de

diferenciação entre o gráfico de colunas e o histograma, pois é comum vermos

em livros didáticos um gráfico de colunas, mas formadas por retângulos

contíguos (característica do histograma). O histograma usa barras verticais ou

colunas, como o gráfico de colunas, mas a diferença é que elas representam

intervalos. Esse conhecimento de Estatística e esse conhecimento pedagógico

da Estatística são muito importantes no trabalho de sala de aula.

Continuando nossos estudos, as discussões passaram a ser sobre

gráfico de linha ou segmentos. O que nos chamou a atenção foi justamente um

gráfico apresentado como inadequado (Figura 18) para o uso com valores

discretos, como o número de irmãos (exemplo apresentado pelo autor). Van de

Walle (2009, p. 496) aponta que “todo ponto na linha deve ter um valor” e

questiona: “quais são os valores onde as setas estão apontando?”. Também

concluímos que o ideal para a representação desse tipo de dados seria o

gráfico de barras.

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Figura 18: Gráfico de linha usado inadequadamente

Fonte: Van de Walle (2009, p. 495).

Esse tipo de gráfico, o de linha, pareceu mais rotineiro para os

participantes, talvez pela frequência com que costuma aparecer nos materiais

didáticos e nos meios de comunicação. Sendo assim, não foram levantados

outros questionamentos ou outras dúvidas.

Passamos, a seguir, para a discussão do gráfico de setores, ou círculos,

como era apontado por Van de Walle (2009):

Keli: Eu disse que ia trazer um modelo do gráfico de círculo, de pizzaou de setores. Vocês já viram isso?

Silvana: Vou esperar você mostrar porque não sei se eu vi.

Keli: Aqui o autor fala em software, usar um programa, mas eletambém fala de aproveitar o conhecimento de fração. Com isso aqui acriança não precisa ter conhecimentos tão avançados como pré-requisitos, como por exemplo, de grau, de porcentagem, paratrabalhar com esse gráfico.

Roseli: Quando eu vi, eu pensei ou fração ou relógio.

Keli: Então são dois círculos coloridos, com um corte no raio [Figura19 ]

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Figura 19: Círculos para a confecção de gráfico de setores

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Silvana: Nooosssa! Que legal! Não tinha visto, não! Recortadinho! Agente sempre fez...

Keli: Isso permite que eu possa ir mexendo nele [Figura 20].Independente de eu saber exatamente a porcentagem ou ângulo, euconsigo ir mexendo nele, por exemplo, quantidade de meninos emeninas, 10 meninos e 10 meninas, então eu deixaria ele assim[Figura 21] e também faria uma legenda. Se tem um menino a maisque menina, eu poderia deixar assim, se o menino fosserepresentado pelo verde [Figura 22].

Figura 20: Montagem do gráfico de setores usando círculos

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Figura 21: Gráfico de setores apresentando a quantidade de meninos e meninas

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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Figura 22: Gráfico de setores representando uma quantidade maior demeninos (verde) em relação ao número de meninas (vermelho)

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Silvana: Que jeito prático! Quanto tempo eu sofri com isso!

Keli: Pode colocar quantos círculos você quiser, mas vai ficando maiscomplexo para a criança [Figura 23]. Eu posso até trabalhar com aporcentagem depois, mas não necessariamente a criança tem quesaber calcular essa porcentagem para saber trabalhar.

Figura 23: Ampliação do número de círculos para construção do gráfico de setores

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Silvana: Mas isso aqui é muito legal!

Eduardo: No Ensino Médio eu quase morri para fazer esses gráficoscom o transferidor.

Keli: O importante é a criança entender o que vem expresso atravésdaquele gráfico, e não apenas elementos matemáticos como grau eporcentagem. Acho que isso até ajuda na compreensão desseselementos futuramente. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalode tempo 0:24:03 a 0:28:03).

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Eduardo também chamou a atenção do grupo para o exemplo que o

autor apresentava, chamado de “Gráfico de ‘pizza’ humano” (Figura 24). Nesse

tipo de trabalho, que deve ser realizado num local com espaço, cada criança

faria sua escolha e seriam agrupadas de acordo com essa escolha. O grupo

todo formaria um círculo e, para evidenciar os grupos, mostrando as divisões

de acordo com as escolhas, seriam usadas cordas no chão, do centro até o

local em que as crianças estivessem. De acordo com Van de Walle (2009),

com um disco de centésimos, ou seja, um disco dividido em 100 partes,

colocado no centro desse gráfico “humano”, seria possível observar as

porcentagens aproximadas. Assim como no modelo apresentado

anteriormente, um “gráfico de pizza muito bom e sem medida e nem

porcentagem” e, segundo os participantes, possível de ser trabalhado com as

crianças dos anos iniciais.

Figura 24: Gráfico de pizza “humano”.

Fonte: Van de Walle (2009, p. 496)

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No que diz respeito ao gráfico de setores, nossas discussões se

centraram no conhecimento pedagógico da Estatística (conhecimento

pedagógico do conteúdo, segundo Shulman [1987]). Notamos que houve uma

participação empolgada pela descoberta de Silvana, ao analisar o seu percurso

como professora, refletindo sobre o que realizou comas crianças, já que ela é

uma professora que pode ser considerada experiente. Indícios desse fato

podem ser percebidos na expressão: “Que jeito prático! Quanto tempo eu sofri

com isso!”.

Também podemos notar indícios de um ensino centrado nas técnicas

para construir um gráfico sem o uso de tecnologia ou de instrumentos, como

apresentado por Eduardo, na fala: “No Ensino Médio eu quase morri para fazer

esses gráficos com transferidor”.

Watson (2006) aponta que o gráfico de setores é usado nos meios de

comunicação porque dá uma visão de parte-todo e de seus tamanhos relativos.

Segundo a autora, alguns currículos têm diminuído a recomendação da criação

de gráfico de setores, devido às complexas exigências relacionadas a

proporção e a cálculos baseados em 360º em um círculo. Concordamos com

Watson (2006) que a utilização do gráfico de setores na mídia significa que ele

deve ser trabalhado, mesmo que as habilidades técnicas para criá-los ainda

estejam ausentes. Nesse sentido, nossas propostas e a indicação de Van de

Walle (2009) sinalizam que é possível um trabalho com esse tipo de

representação, mesmo com crianças dos anos iniciais, envolvendo não só a

apresentação dos dados, mas a coleta, a construção e sua interpretação.

5.13 Estudo de conceitos básicos VI

Esse encontro coordenado por mim encerrou um ciclo de seis encontros

em que estudamos o capítulo intitulado “Conceitos em Análise de Dados”, de

Van de Walle (2009). O trecho explorado no encontro seria uma retomada de

algo que já havia sido estudado por alguns dos membros do grupo num dos

encontros realizados anteriormente. Mas constatamos que poderia ser algo

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ainda a ser construído para os participantes que começaram a fazer parte do

grupo em 2011. Na primeira sondagem sobre o conhecimento a respeito de

média, pudemos sentir a influência da forma de calcular a média que

comumente temos na escola ou faculdade: a somatória das notas de provas,

que em geral são duas, dividida por dois. Watson (2006) menciona que essa

associação, como medida empregada na escola para o cálculo da nota, reflete

a história da média no currículo e sua ligação diária às avaliações, pelos

estudantes.

Concordamos com Gitirana et al. (2010, p. 105), quando afirmam que,

“apesar de sua constante utilização, o conhecimento de média aritmética ainda

está baseado no domínio do algoritmo de cálculo”. Esses autores ainda

completam que, mesmo conhecendo o algoritmo para o cálculo, as pessoas

apresentam dificuldade, principalmente, na interpretação do valor encontrado.

Nesse sentido, Watson (2006) apresenta que a média não deve ser concebida

apenas como uma série de valores descritos e resumidos como algo que é a

soma de suas partes. Tampouco deve ser simplificada como um algoritmo

numérico que, se for memorizado e aplicado, reflete pouca necessidade de

entender as informações que podem estar contidas ou ser interessantes no

conjunto de números. Podemos encontrar indícios disso nas transcrições:

Keli: Se eu quisesse calcular a média simples desses númerosapresentados pelo autor 1,1, 3, 5, 6, 7, 8, 9 (VAN DE WALLE, 2009,p. 497), como eu faria?

Cíntia: Somava tudo isso e dividiria por 2?

Keli: Por que por dois?

Érica: Por oito?

Keli: Por que por oito?

Cíntia: Quantidade de números apresentada? (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:02:46 a 0:03:08).

Depois de discutirmos as definições apresentadas por Van de Walle

(2009, p. 499), nossa atenção se concentrou nas discussões a respeito da

média “como um conceito de equilíbrio”. Segui a indicação do autor, utilizando

“notas adesivas” para montar um gráfico de colunas para acompanhar as

variações ou não da média em diversas situações, conforme será detalhado a

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seguir. Watson (2006) também afirma que, para consolidar a ligação entre

gráficos e médias, uma boa proposta é mover os valores dos dados individuais

e observar o que acontece com a média e as outras medidas, no processo,

considerando também que o aspecto visual pode ser um reforço melhor do que

apenas o cálculo. Assim transcorreu o diálogo videogravado:

Keli: Fiz um parecido com o dele [Figura 25 ]

Figura 25: Eixos para a confecção de um gráfico de colunas

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Keli: Eles estão falando de animais de estimação. Quantos animaisde estimação tem cada família. Como eu penso que foi feita apesquisa? Eles devem ter perguntado: Quantos animais de estimaçãovocê tem? Perguntaram para várias pessoas, e o gráfico foi sendoconstruído assim: tinha cinco pessoas que tinham um animal, tinhacinco pessoas aqui. Uma pessoa tinha três, duas pessoas tinhamcinco animais e duas pessoas tinham seis animais. Aí, se eu fossecalcular a média de animais, eu faria assim: essa pessoa tem umanimal, 1 mais 1, mais 1, mais 1, mais 1, são 5 animais. Essa tem trêsanimais. Essa tem 5 e essa tem 5, ou seja, mais 10 animais. Mais 6,mais 6. Então deu 30 animais. Quantas pessoas participaram dapesquisa?

Rosana: Dez pessoas.

Keli: Então eu tenho 30 animais, 10 pessoas. 30 dividido por 10, dáuma média de 3 animais por pessoas. Mas estão vendo aqui: só umapessoa tem 3 animais [Figura 26]. O que essa média está dizendo?

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Figura 26: Gráfico da quantidade de animais de estimação, por família I

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Rosana: A média é perigosa!

Keli: Num dos sentidos da média, ela representa o conjunto de dadoscomo se eles fossem “iguais”, ou seja, nesse exemplo, três. (Arquivode vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:09:40 a 0:12:03).

...

Keli: Vamos trocar os papeizinhos de lugar para ver o que acontece.Tem uma pessoa que tem oito, ou duas pessoas que têm oito [...].Vamos ver o que vai acontecer com a média agora? [Figura 27 ]

Figura 27: Gráfico da quantidade de animais de estimação, por família II

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Keli: Embora com quantidades diferentes de animais por família, elase manteve igual, ou seja, três. Eu mudei os papéis de lugar, masequilibrando, pois houve papéis que foram para o oito, mas, emcompensação, outros foram trazidos para o dois e três, por exemplo.

Rosana: Por isso que ele [o autor], coloca aquelas flechinhas lá [sereferindo à figura apresentada no material de estudo]. (Arquivo devídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:12:20 a 0:13:04).

...

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Keli: Já nesse caso [figura 28], o que acontece? Puxou a média umpouquinho para cima. Foi por causa dessas pessoas que têm maisanimais de estimação. Nossa média aqui é 3,4.

Figura 28: Gráfico da quantidade de animais de estimação, por família III

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Keli: Isso pode acontecer, principalmente, com um conjunto pequenode dados. A média pode ser afetada por esse valor mais alto, que nonosso caso é o oito.

Rosana: Verdade. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo detempo 0:14:39 a 0:15:15).

Consideramos que a premissa de que o conceito de média é um

conceito fácil deveria ser revisto. Concordamos com Gitirana et al. (2010, p.

118) que é importante também “conectar o trabalho com as várias formas de

representação de um conceito, neste caso o de média”, pois nosso processo

de ensino e aprendizagem centrado no algoritmo tem contribuído pouco para

seu uso com compreensão, e a média tem acabado sendo definida pelo seu

algoritmo de cálculo. A utilização de situações problema e a apresentação dos

dados na forma de gráfico, em consonância com o que é apresentado por

Watson (2006), parecem indicar uma abordagem útil. Ou seja, o foco sobre o

algoritmo para o cálculo da média precisa ser substituído pelo foco em

discussões significativas dentro de um contexto.

Segundo Watson (2006), também deve ser ressaltada a ideia de

equilíbrio incorporada na de média. A autora argumenta que o trabalho

criterioso com gráficos para a visualização dos dados, em conjunto com o

cálculo da média, pode ser útil para analisar a variação presente na história

que aqueles dados contam. E complementa que, posteriormente, o desvio

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padrão ajuda a combater a crença de que, quando a média é calculada, o

trabalho de resumir os dados está acabado.

Ainda discutimos a respeito dos conceitos de moda e de mediana. Com

essas discussões, consideramos que havíamos terminado o que nos

propusemos a estudar em interlocução com Van de Walle (2009).

Ressaltamos que nosso objetivo, nesses encontros em que pudemos

discutir conceitos, não foi verificar o conhecimento anterior dos participantes,

mas identificar os eventos de letramento que contribuíram para o seu

desenvolvimento profissional, no que diz respeito ao conhecimento. E

enfatizamos o letramento estatístico como forma de desenvolvimento pessoal,

para que pudéssemos criar situações em que nossos estudantes venham a

ampliar seu letramento estatístico.

5.14 Análise de situação pedagógica de livro didático

Para este encontro, havíamos previsto a discussão de situações

pedagógicas a respeito de probabilidade, presentes em um material apostilado

e que seria disponibilizado por Rosana, mas devido a problemas de saúde, ela

não teve tempo hábil para providenciar o material. Substituímos aquelas

propostas por duas situações pedagógicas destinadas a crianças do 2.º Ano do

Ensino Fundamental (crianças de 7 anos), encontradas em livros didáticos

adotados pela rede municipal de Atibaia. Foram disponibilizadas cópias aos

participantes na hora do encontro.

Acabamos nos interessando mais pela segunda situação didática

selecionada, que aborda gráfico de colunas e tem a seguinte redação (Quadro

7):

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Quadro 7: Número do calçado mais comum

O número de calçado mais comumEsta é uma pesquisa estatística para descobrir qual é o número de calçado mais comum naturma.A professora desenhará colunas de retângulos no quadro-de-giz.Você e seus colegas vão ao quadro e cada um preenche com giz um retângulo na coluna emque está o número de seu calçado.

Fonte: Milani, Imenes e Lellis (2008b, p. 193)

A seguir, passamos à discussão, da qual transcrevemos um excerto:

Keli: Como será que foi feita a escolha desses valores? Menor que27, 27 ou 28...[referindo-se ao número do calçado do aluno].

Eduardo: Por conta da idade deles, né? Possivelmente eles usamesses números.

Keli: Caso eu perceba que há crianças que usam números maiores,eu posso ampliá-lo mais para cá [direita].

Cíntia: Tem alguma ordem no preenchimento? Cada um pode ir nalousa e preencher?

Keli: O que você acha?

Cíntia: Nesse exemplo, o número mais alto ficou no meio [sereferindo à coluna dos números 31 ou 32]- [Figura 29]. Isso que euestou pensando: se não haveria problema, da sequência.

Figura 29: Exemplo de preenchimento de gráfico

Fonte: Milani, Imenes e Lellis (2008 b, p. 193)

Keli: Aqui embaixo foi colocado na sequência, menor que 27, 27 ou28, 29 ou 30... Vamos imaginar... Ou melhor, escolhe uma opção denúmero do calçado para você, fazendo de conta que você é uma dascrianças da classe. Eu vou escolher um e o Eduardo vai escolher um.Vamos pegar essa apresentação do livro e fazer de conta que é alousa [Figura 30 – exemplo do que deveria ser apresentado às

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crianças para a construção do gráfico do número do calçado maiscomum]. Eu venho aqui e digo: “Eu tenho o pé pequeno, calçonúmero 28” [e hachurei o primeiro quadrinhos desta coluna]. E você,Cíntia?

Figura 30: Exemplo de como deveria ser apresentado o gráfico no quadro degiz

Fonte: Milani, Imenes e Lellis (2008b, p. 193)

Cíntia: Menor que 27.

Keli: E aí, teve problema de você pintar antes do meu?

Cíntia: Não.

Keli: Eduardo, qual que você escolheu?

Eduardo: Maior que 34. Rs...

Keli: Aí ele vem e pinta aqui. E a gente vai perguntando para todos ascrianças e vamos supor que muitas crianças calcem 27 e 28. Tinhacomo prever que a maioria estaria aqui?

Cíntia: Não.

Keli: Fiz essa organização aqui embaixo [eixo horizontal], mas ascolunas não precisam estar na ordem crescente de tamanho, porexemplo, a coluna que teve o menor número de "votos" primeiro, atéa coluna que teve o maior número de "votos" por último. Às vezesisso pode acontecer, como uma coincidência e depende também comquais variáveis estou trabalhando. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:05:30 a 0:8:50).

Sobre a situação pedagógica também comentamos que, devido ao rótulo

da coluna trazer o número de dois calçados, o gráfico não mostraria o número

mais comum, mas os números mais comuns, como por exemplo, 31 ou 32.

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Nesse encontro pudemos perceber indícios de crenças sobre a forma de

apresentação dos dados num gráfico de colunas, a ideia equivocada de que as

colunas devem estar em ordem crescente, a partir da fala da Cíntia, que

menciona: “Nesse exemplo, o número mais alto ficou no meio [se referindo à

coluna dos números 31 ou 32]. Isso que eu estou pensando se não haveria

problema, da sequência”. Algumas vezes isso pode acontecer, em função da

frequência, mas nem sempre. Foi suposto que os exemplos ou situações que

Cíntia tivesse vivenciado ou com que tivesse tido contato, mostrassem essa

situação, em que as colunas tinham frequências crescentes. No exemplo que

estudamos, uma questão importante na organização estava em representar os

rótulos das colunas em ordem crescente, por estarmos trabalhando com uma

variável quantitativa discreta e para facilitar a representação dos dados e,

posteriormente, sua interpretação.

Constatamos no grupo, durante o estudo da situação pedagógica, que

as “orientações aos professores”, apresentadas pelos autores do livro didático,

não auxiliariam o professor, caso ele tivesse dúvidas no desenvolvimento da

proposta, pois trazem a seguinte orientação:

A Ação da página 193 é uma pesquisa estatística. As crianças devemser avisadas com antecedência para se informarem sobre o númerode sapato que usam. A professora deve desenhar as colunas depequenos retângulos no quadro-de-giz, parecidas com as que semostram no livro, para possibilitar a construção do gráfico (MILANI;IMENES; LELLIS, 2008b, p. 52, grifo dos autores).

Em oposição ao que é apresentado nas orientações aos professores por

Milani, Imenes e Lellis (2008b), Watson (2006) afirma que uma característica

importante no desenvolvimento de habilidades gráficas dos estudantes é dar-

lhes oportunidades para criar seus próprios gráficos, ainda que sem regras

rígidas e usando muitas vezes desenhos, ligando pessoas aos gráficos ou

utilizando blocos, pois isso pode criar conexões mais significativas para os

estudantes do que o preenchimento de caixas em uma grade ou numa planilha.

Mais uma vez, o contexto colaborativo possibilitou a exposição e o

esclarecimento de dúvidas que possivelmente nem imaginaríamos que

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pudessem existir e poderiam ser deixadas de lado, durante o trabalho com os

estudantes, como a questão da ordem das colunas.

Cíntia, embora faça parte do grupo há menos tempo que seus colegas,

pois começou a participar dos encontros no segundo semestre, mostra que se

sente à vontade para se expressar, apresentar suas dúvidas e aprender com

os outros, no contexto colaborativo.

Nessa situação, podemos também evidenciar o desenvolvimento

profissional do professor como desenvolvimento de conhecimento, em que a

compreensão e a ampliação dos conceitos pode dar suporte e segurança para

a construção de um ambiente de aprendizagem capaz de proporcionar uma

formação mais efetiva, no que diz respeito ao letramento estatístico.

5.15 Análise da circulação de ideias estatísticas em sala de aula

O objetivo deste encontro foi assistir a um vídeo que intitulamos

“Comemorando aniversários no 3.º ano do Ensino Fundamental” e discuti-lo. A

situação pedagógica levada aos estudantes foi planejada por Eduardo em

parceria comigo. O vídeo foi feito de forma bastante artesanal, contando com a

colaboração da coordenadora de uma escola municipal da cidade de Atibaia

(SP) em que Eduardo leciona, e procura mostrar o desenvolvimento de uma

situação pedagógica de construção de gráfico, por ele e sua turma. Eduardo

disponibilizou-nos um DVD com o vídeo e autorizou seu uso de forma irrestrita

no grupo e por mim.

Nessa ocasião, usamos outra sala, também cedida pela instituição que

nos acolhia, em que havia uma TV grande e equipamentos de DVD e de som.

Para nossa discussão, foram selecionados por mim, como pesquisadora,

alguns trechos do vídeo, que tinha duração total de 1 hora e 40 minutos e seria

muito longo para o tempo disponível em nosso encontro. Pude assistir ao vídeo

previamente, como pesquisadora, e selecionar, em especial, a apresentação

da situação pedagógica por Eduardo à turma, parte do desenvolvimento e as

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análises realizadas pela turma, por considerá-los os momentos mais

importantes do trabalho desenvolvido.

No vídeo, Eduardo começa a apresentar a proposta aos estudantes,

mencionando que irão montar o “Gráfico dos Aniversariantes do 3.º ano”51. Ele

também menciona o motivo da realização do gráfico, ou seja, seu objetivo com

a proposta: comemorar os aniversários dos estudantes durante o ano.

Eduardo, desejando garantir que a situação pedagógica tivesse significado

para os estudantes, também indaga a eles do que se trata, quando se

menciona a “data de aniversário”.

As crianças demonstravam-se motivadas e participando da situação

pedagógica. Um dos primeiros comentários dos participantes do grupo foi em

relação ao número de crianças da turma de Eduardo, pois esse foi considerado

um fator que influencia o desenvolvimento da situação pedagógica:

Rosana: São numerosos, Eduardo!!!

Eduardo: 35 alunos. Nesse dia faltaram quatro alunos, mas é umaturma grande, sim.

Rosana: Olha, eles participam! (Arquivo de vídeo da pesquisadora.Intervalo de tempo 0:04:40 a 0:04:52).

Também percebemos receio, demonstrado por uma das participantes do

grupo, em relação à presença de uma outra pessoa na sala de aula, durante a

realização da situação pedagógica:

Rosana: Quem é que estava filmando?

Eduardo: A coordenadora... que foi professora deles no ano passado.

Rosana: A coordenadora estava filmando? Que beleza, Eduardo![com certa ironia].

Eduardo: Já que eu ia desenvolver uma atividade para o grupo, elaaproveitou e fez um registro de aula.

Rosana: Que "responsa", Eduardo!

Eduardo: Ela acompanha aula... faz relatório... (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:05:54 a 0:06:15).

51 Detalhes sobre a situação pedagógica podem ser encontrados no capítulo 6, na seção 6.3 –As análises narrativas de Eduardo.

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Notamos que mostrar a prática da sala de aula ao grupo não gerava

receio, mas a presença da coordenadora da escola, sim, causava

constrangimento, possivelmente gerado pelas relações desenvolvidas no

espaço da escola. O episódio revela mais um indício de respeito mútuo,

aspecto característico da colaboração, pois, sabendo que podem contar com o

apoio dos colegas, os participantes não temem partilhar com o grupo tentativas

de mudança na prática escolar ou, mesmo, alguma situação mais difícil, como

aparece nos trechos a seguir, em que podemos notar, na fala de Eduardo,

indícios da mudança de comportamento das crianças e do professor:

Rosana: Deve ser uma emoção para as crianças... Filmando...

Eduardo: Eles ficam todo todo... A coordenadora junto! E eles sãodanados, tem um que falou: “Que tanto está pedindo desculpahoje?”, por que tudo eu falo: "Gente, perdão, eu errei", e daí ele falou:“Que tanto está pedindo desculpa hoje?” e olhava para a cara dacoordenadora!

Rosana: Eles são!

Keli: Não é fácil, você dando aula e a coordenadora lá, filmando!

Rosana: É tenso! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo detempo 0:12:20 a 0:13:14).

Também pudemos discutir nossas percepções a respeito das

discussões levantadas pelas crianças, com relação às ideias estatísticas

que estavam circulando. Nesse momento, a partir das intervenções que

Eduardo estava fazendo durante a realização da situação pedagógica,

levantávamos hipóteses sobre as ideias apresentadas pelas crianças.

Erica: Errou ali. Você falou "onde"? Rs... Você até se confundiu!

Keli: O que será que eles estão dizendo? Ele pôs até o seis ali [eixovertical – Figura 31 ] e as crianças se invocaram com aquele seis!

Rosana: Por que ela reclamou?

Mie: Acho que eles relacionaram o número apenas à primeira coluna,que ele foi fazendo coluna a coluna e marcando.

Keli: Acho que eles acharam que o número estava errado porque emfevereiro só tinha cinco.

Rosana: Ah, tá!

...Keli: Eles ainda não ficaram satisfeitos com o desfecho.(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:19:34 a0:21:15).

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Figura 31: Parte do gráfico que suscitou discussão entre as crianças

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Keli: Por que será que as crianças estão tão invocadas com esse"seis"? Eles retomaram a discussão!52

Rosana: Elas estão indo pela referência do eixo vertical.

Eduardo: Sim.

Rosana: Elas não se conformavam!

52 No decorrer do vídeo feito com os estudantes de Eduardo, notamos que a estudante estavaassociando o eixo vertical (que tinha a variável “quantidade de alunos” e tinha como valormáximo “6”) apenas com a primeira coluna (que tinha “5” aniversariantes). Para ela, portanto,havia um erro, pois considerou que ambas deveriam ir até o “5”. O equívoco foi desfeito peloprofessor Eduardo, associando novamente, no decorrer da aula, cada coluna à quantidadecorrespondente no eixo vertical, mostrou seu objetivo, a escala utilizada.

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Roseli: Precisou levantar para mostrar!! [com relação a uma criançaque levantou do seu lugar e foi à lousa mostrar o suposto equívoco].

Rosana: Para nós está claro, mas para elas, não.

...

Rosana: O legal é que ele está insistindo em explicar!

(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:24:07 a0:24:40).

De acordo com Watson (2006), o gráfico de barras é utilizado com mais

frequência nos anos iniciais, pois tem ligações com outros aspectos do

currículo de Matemática, como, por exemplo, correspondência termo a termo,

adição, subtração, que estarão envolvidos na interpretação básica desse tipo

de representação dos dados. Outro aspecto apontado por Watson (2006, p. 89)

é “o orgulho de propriedade do gráfico que os estudantes criam para si”,

acrescentando que isso, além de motivá-los, incentiva-os a continuarem a se

desenvolver, no que diz respeito ao letramento estatístico.

O contexto colaborativo possibilitou essas discussões a respeito da

situação pedagógica desenvolvida por Eduardo com sua turma. Destacamos

também o trecho em que busquei problematizar a situação, pensando no

desenvolvimento dessa mesma proposta pelos participantes do grupo com

outras turmas:

Keli: O que será que o Eduardo poderia falar para facilitar para ascrianças?

Rosana: Ele até falou que era para contar, mas não falou "contar ográfico inteiro".

Mie: Será que colocar no início seria melhor? Colocar até 10, será?

Eduardo: É que, dessa forma, a gente vai contando com eles... Se eucolocasse até 10, não seria pior? Pois ali só teve no máximo seis...

Mie: Acho que tem que deixar mais explícito, falando eixo barra. Um,está aqui, dois, até aqui... [mostrando com as mãos o eixo e a barrado gráfico]. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:25:30 a 0:26:18).

Concluímos que seria necessário, num futuro desenvolvimento de uma

situação semelhante, que a construção dos eixos fosse mais explorada e

problematizada, minimizando possíveis dúvidas das crianças. Concordamos

que devemos propor mais situações como essas, em que se busque o

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protagonismo dos estudantes, a atuação deles na construção e a possibilidade

de levantarem os questionamentos, não só sobre a análise dos dados, mas

também a partir da construção de gráficos, que pode, inclusive, influenciar na

própria interpretação.

Também opinamos a respeito da duração da situação, conforme

transcrição de arquivo de vídeo. Sobre esse assunto, duração da situação

pedagógica, já havíamos ressaltado a importância da sua adequação ao

contexto, quando discutimos o texto “Adivinhe quem vem para ficar?”

(JONSSON, 2002).

Keli: Talvez uma sugestão fosse, pois quando eu trabalhei com ospequenininhos que eu mostrei para vocês, eu levei cinco dias parafazer a situação. Então, talvez se houvesse um intervalo no meio.Isso acontece não só com uma situação de Estatística.

Eduardo: Sim.

Keli: Conforme vai passando o tempo, eles vão cansando.

Eduardo: Uma sugestão até que a coordenadora deu, seria um diamontar o gráfico e no outro, a interpretação.

Roseli: Porque, senão, fica cansativo para eles mesmo!

Keli: Eles começam a dispersar um pouco.

Roseli: Acho que, se fizer uma parte num dia e no outro darcontinuidade, pode deixá-los mais interessados. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:36:29 a 0:38:15).

Para finalizarmos o encontro, realizamos uma pequena avaliação da

proposta de análise de vídeo. E embora, nem todos expressassem sua opinião,

a proposta foi considerada positiva!

Keli: E aí? Vale a pena investir nessa questão de vídeos? A gente jáestudou bastante...

Rosana: Aproxima da realidade. Dá uma ideia... Corrige...

Eduardo: É!

Rosana: A gente faz uma autocorreção!

Keli: Não é uma crítica ao trabalho dele, mas para pensarmos.

Rosana: Nós temos receio do vídeo, mas ele é importante!

Eduardo: É meu primeiro ano [como professor efetivo na redemunicipal] e eu estou aprendendo muito!

Keli: E isso é bom!

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Eduardo: Eu já não tenho mais receio da coordenadora. E eu gostoque falem, "seria mais legal isso", "chega, me fala". Eu também estouaprendendo! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:38:29 a 0:39:38).

No trecho anterior também podemos destacar indícios da colegialidade

na escola, nas relações de Eduardo e sua coordenadora, que, de acordo com

Hargreaves (1998), apresentam princípios cooperativos, mas as relações são

reguladas administrativamente e não são espontâneas ou voluntárias.

Depois dessa conversa, tivemos uma candidata para o desenvolvimento

de outra proposta com os estudantes, para que pudéssemos continuar a

aprender:

Mie: Vou fazer estágio no 1.º ano. Preciso ver, conversar com adiretora, mas eu quero!

Keli: Eu posso emprestar a câmera!

Mie: Sim! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:40:19 a 0:40:39).

Embora o vídeo ofereça limitações, e tenhamos selecionado

previamente alguns trechos, acreditamos que tivemos uma rica oportunidade,

no que tange a nosso desenvolvimento profissional, conforme evidências

apontadas por Nacarato e Grando (2013, p. 259): “aprendizagens com o outro,

a partir da sua própria prática e da prática do outro” e a “captação de ideias

matemáticas dos alunos e de práticas docentes” – no nosso caso, as ideias

estatísticas dos estudantes e de práticas docentes. No que diz respeito às

aprendizagens com o outro, podemos destacar também, de acordo com as

autoras, a possibilidade de refletir sobre o que deu certo e o que não deu, a

prática de sala de aula, a identificação com determinadas situações, como, por

exemplo, semelhanças com seus próprios estudantes, segurança para

desenvolver situações com outras crianças, autoavaliação do professor e

possibilidade de refletir sobre sua própria prática. Acreditamos que isso se

tornou possível pela presença do grupo e pelas relações estabelecidas entre os

participantes. Também consideramos que foi importante, observar as ideias

estatísticas que as crianças apresentaram, assim como a forma como foram

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conduzidas pelo professor as intervenções e a comunicação entre as crianças,

entre o professor e as crianças, pois, de acordo com Nacarato e Grando (2013,

p. 259), “nesse movimento de se ver e ver o colega em ação na sala de aula,

representou momentos de aprendizagem e metarreflexão das prática

docentes”.

Buscamos ressaltar também, nesse processo, o professor e seu papel

na geração de conhecimento (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999). Foi possível

investir também, no caso dessa situação pedagógica, no registro escrito e no

compartilhamento com outros professores, pois pudemos produzir uma análise

narrativa que foi apresentada num evento (PEREIRA, E. L.; CONTI, 2011) e

posteriormente rediscutida e reescrita para uma publicação PEREIRA; CONTI;

CARVALHO, 2013).

5.16 Situações didáticas que levantaram dúvidas

Em 15/06/2011, pudemos ter um encontro mais longo, em relação ao

que normalmente tínhamos, pois havia a disponibilidade de todos os

participantes (Figura 32), em função do início do período de férias. Preferimos

dividir o encontro em duas partes, para facilitar a análise.

Figura 32: Participantes presentes no encontro de 15/06/2011

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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Na primeira parte do encontro, pudemos discutir dúvidas a partir de um

material didático disponibilizado por Rosana. A temática foi selecionada em

função de um e-mail enviado por ela em 29/04/2011. As situações didáticas

mencionadas no e-mail também foram anexadas e são apresentadas durante a

descrição do encontro.

Quadro 8: E-mail enviado ao grupo

Boa tarde pessoal

Primeiramente, quero pedir desculpas, pois não enviei o scan do livro, mas fiquei doente e tiveque devolver o livro, somente hoje consegui pegá-lo novamente.

Selecionei algumas atividades em que observei dificuldade dos alunos em entender, ou talvez,do professor em explicar:

2º ANOClassificação: Dificuldade para entender o que contém nos dois grupos.Números até 20: Dificuldade para explicar aos alunos, ou seja, uma maneira didática maisadequada.Estimativa: Dificuldade de entendimento.Corrida até dez: Esta é a atividade que eu comentei sobre a probabilidade do vermelhoganhar pelo número de fichas, gostaria de saber como tratar esta atividade, pois a impressãoé que foi dada, mas o objetivo não foi alcançado.Corrida Tartaruga: Segue o mesmo princípio da anterior, só que neste caso é usada umaroleta de modelos diferentes, em que, dependendo do modelo trabalhado a probabilidade deganhar é diferente.Gráfico de Roleta: Como explicar?Gráfico de Peixe: ExplicaçãoGráfico Dinossauro: Explicação

Abraços,RosanaFonte: Arquivo da pesquisadora.

Os participantes decidiram que esse poderia ser um bom material para

estudo. Notamos indícios de iniciativa para colaborar com o grupo, a

responsabilidade e o compromisso assumidos e a justificativa por demorar um

pouco mais para cumpri-lo, pois inicialmente a proposta era de que

trabalhássemos com esse material em 29/04, mas, devido ao problema de

saúde de Rosana, optamos por analisar uma situação pedagógica de livro

didático na ocasião e nesse momento posterior discutir o material

disponibilizado. Consideramos que nesse caso, de acordo com Fiorentini

(2004), o ponto de partida foi um problema ou desafio encontrado pela

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participante nas suas práticas profissionais na escola, e o problema foi trazido

para o grupo para a reflexão coletiva.

Além disso, a escolha do material revela uma preocupação com a

prática, no contexto em que ela acorre, no sentido de querer melhorar também

a qualidade das experiências de aprendizagem dos estudantes.

Rosana iniciou o encontro, expondo mais uma vez o motivo para a

sugestão do material a ser estudado pelo grupo:

Rosana: Todas as atividades que eu trouxe, percebi a nãocompreensão mesmo da atividade. A dificuldade para entender. Paranós, adultos, você vai fazendo e vai entendendo, mas para elesentenderem, eu acho que ficou a desejar. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:1:24 a 0:1:50).

A primeira situação pedagógica discutida aborda a classificação (Figura

33). Iniciamos realizando a situação pedagógica proposta aos estudantes do

1.º ano (crianças de 6 anos).

Figura 33: Situação pedagógica discutida pelos participantes do grupo I

Fonte: Ferrari et al. (2006, p. 8)

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Embora já tivesse sido discutida a temática, notei que duas

participantes, que haviam iniciado no grupo depois de nossas discussões, não

haviam entendido muito bem a proposta. Usei como recurso auxiliar um

conjunto de blocos lógicos, de forma a fazer outras classificações semelhantes,

como, por exemplo, o conjunto dos blocos vermelhos, o conjunto dos triângulos

e a intersecção entre eles (blocos vermelhos e que fossem triângulos). Depois

dessa parte usando o material, fiz perguntas a respeito da situação didática,

para ter certeza de que haviam entendido a proposta. Perguntei, por exemplo,

o que poderia ser desenhado pelas crianças, em resposta a cada uma das

propostas da situação pedagógica: “Desenhe outra roupa que pertença ao

primeiro conjunto”, “Desenhe outra roupa que pertença aos dois conjuntos” e

“Desenhe outra roupa que pertença ao segundo conjunto” (FERRARI et al.,

2006, p. 8).

Rosana concluiu que o objetivo da situação pedagógica era realizar

classificações, identificando o que fazia cada elemento pertencer a cada

conjunto e sua importância no que diz respeito à Estatística. Já havíamos

discutido a temática, pois, segundo Van de Walle (2009), a tomada de decisões

sobre como categorizar coisas é fundamental para a análise dos dados,

incluindo a formulação de questões e a representação dos dados coletados.

Nos trechos a seguir, transcritos do arquivo de vídeo do encontro, há indícios

da preocupação com melhorias na prática e o benefício dos estudantes e

também da mudança da participante, ou seja, do desenvolvimento do professor

como desenvolvimento pessoal.

Rosana: Essa foi uma atividade dada, porém não compreendidapelos alunos! Percebo que nessas séries [crianças de 6 anos] a gentetem que trabalhar muita coisa concreta. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:8:36 a 0:8:42).

...

Rosana: Hoje eu já tenho uma visão diferente da época em queacompanhei o trabalho da professora. E eu me pergunto, mas comoque a professora vai trabalhar essa classificação? Pois para mim amaneira que foi passado não foi compreendido. Acho que teria quetrazer algum material para eles entenderem mesmo e nãopraticamente contar a resposta a eles. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:8:57 a 0:9:28).

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Evidências da mudança de Rosana podem ser percebidas na afirmação

“Hoje eu tenho uma visão diferente da época em que acompanhei o trabalho da

professora” e nas situações em que levanta questionamentos como “Como que

a professora vai trabalhar essa classificação?”, além da preocupação com

melhorias na prática: “Pois para mim a maneira que foi passado não foi

compreendido”. Ela também apresenta possíveis caminhos para auxiliar o

professor nos desafios da profissão docente: “Acho que teria que trazer algum

material para eles entenderem mesmo”.

Ainda nesse dia, discutimos também duas situações pedagógicas que

envolviam probabilidade. Uma delas já havia sido comentada por Rosana num

dos encontros, mas, dessa vez, pudemos conhecer as instruções que a

acompanham (Figura 34).

Figura 34: Situação pedagógica discutida pelos participantes do grupo II

Fonte: Ferrari et al. (2006, p. 94)

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Além da descrição, por Rosana, da sua experiência com a aplicação da

situação pedagógica com crianças do 2.º ano, também surgiram várias

problematizações a respeito da situação:

Rosana: As crianças não perceberam, e eu achava que o objetivo eraa criança perceber quem ia ganhar. Na realidade, a chance dovermelho ganhar era maior que a do azul. Não foi explorado isso. Aturminha achou que... Fizeram várias vezes e o vermelho sempreganhava. E a professora não chegou a explorar isso. Teria que terexplicado? Que a probabilidade de ganhar era maior? (Arquivo devídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:17:21 a 0:18:16).

...

Rosana: Essa questão da quantidade não foi tratada. E depois, naapostila das crianças, havia a resposta "por que sim".

Mie: Fazer a atividade para quê? Qual o motivo?

Rosana: A professora não teria, ao final, que ter mostrado que aprobabilidade de um deles era maior?

Silvana: Acho que a atividade foi desenvolvida sem planejamento.(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:21:21 a0:22:00).

Como sugestão de trabalho, usamos peças de blocos lógicos, para

simular a situação proposta pelo material e a fim de apresentar alternativas,

para a professora, quando se deparar com uma situação de trabalho similar.

Concluímos que, realizando a correspondência termo a termo com as peças,

levantamos a hipótese de que, talvez devido ao apelo visual, as crianças

poderiam compreender mais facilmente que, com um número maior de peças,

havia uma chance maior de vitória para uma das cores. Também refletimos

sobre as questões: “com devolução das fichas ao saco” e “sem devolução das

fichas ao saco”, que se referem a situações nas quais temos medidas de

chances diferentes.

Durante o encontro, houve indícios de mudança nas concepções de

Rosana com relação a termos como “chance de ganhar maior”, ao invés de

“nunca vai ganhar”, usado num dos encontros anteriores para a situação com

devolução da ficha ao saquinho e no contexto em que as fichas não eram

devolvidas, revelando que suas ideias sobre eventos certos, possíveis e

impossíveis já haviam sido reelaboradas e ressignificadas. Nesse sentido,

Watson (2006) considera que se trata da transição da probabilidade subjetiva

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(como por exemplo, na fala de Rosana “nunca vai ganhar”) para a

probabilidade baseada na frequência e na probabilidade teórica e explicita que

isso é um dos objetivos do currículo escolar, como oportunidade de

aprendizagem. Segundo a autora, crenças como essas são comuns, e o

contexto pode oportunizar o aprendizado.

Novamente consideramos que o desenvolvimento profissional como

desenvolvimento de conhecimento, principalmente no que diz respeito ao

conteúdo, contribuiu com o desenvolvimento profissional de Rosana como

desenvolvimento pessoal.

A outra situação pedagógica a respeito de probabilidade que também

discutimos, era intitulada “A corrida da tartaruga e da lebre” e pedia que o

estudante escolhesse entre três roletas (Figura 35), escrevendo “T” para

representar a Tartaruga e “L” para representar a Lebre em cada parte da roleta

a escolher.

Figura 35: Modelos de roletas usadas no jogo

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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A partir da escolha da roleta, a criança dava continuidade à proposta,

registrando o resultado e refletindo sobre ele (Figura 37).

Figura 36: Situação pedagógica discutida pelos participantes do grupo III

Fonte: Ferrari et al. (2006, p. 95)

Nessa situação as crianças poderiam visualizar mais facilmente a parte

relativa do todo atribuída a cada cor. Nossas discussões se centraram, mais

uma vez, no entendimento da criança:

Rosana: Esse segue a mesma lógica [que a situação “Corrida até oDez”]. Eles confeccionaram uma roleta. Eles caíram na mesmacoisa... rss... Ou seja, não entenderam. Na época eu ficavaindignada, porque a criança não entendia.

...

Cíntia: E nessa atividade eles perceberam?

Rosana: Não. Eu fiquei intrigada com a forma de trabalho.

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Keli: Se eu já trabalhei na atividade anterior. Já se chegou aconclusão que havia uma probabilidade maior para uma cor. Essaatividade seria um complemento, para constatar se as criançascompreenderam.

Mie: Quando eles compreendem, todos iriam querer colocar seupalpite na parte maior, por quê? Porque ganha! Isso mostraria queestavam entendendo. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalode tempo 0:32:20 a 0:33:40).

Em nossas discussões, procuramos levantar questões que auxiliassem o

professor no seu papel de mediação da situação pedagógica, como por

exemplo:

- Qual cor ganhou mais vezes? Por quê?

- Se você jogar novamente, o que acha que vai acontecer? Por quê?

- Que cor você escolheria para ganhar? Por quê?

Também pensamos, a partir das roletas, nos eventos certos, nos muito

possíveis ou até mesmo nos impossíveis, a fim de desenvolver a ideia da

probabilidade como uma quantidade contínua. Reforçamos as ideias de

Watson (2006) de que a discussão com as crianças é necessária, a fim de ter

evidências de que os modelos foram entendidos no contexto e as crenças

foram retomadas e ressignificadas.

Novamente podemos apontar indícios da mudança de Rosana, no

desenvolvimento profissional de si mesma, marcados pela questão do tempo

(passado), como, por exemplo, nas frases “Na época eu fiquei indignada, por

que a criança não entendia” ou “eu fiquei intrigada com a forma de trabalho”,

em que consideramos, mais uma vez, indícios da insatisfação com a forma de

trabalho, mas, ao mesmo tempo, o desejo de propor de outra forma, em

benefício do estudante e sua aprendizagem, a partir de nossos estudos.

Demos continuidade ao encontro, discutindo duas situações a respeito

de gráficos (Figuras 37 e 38):

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Figura 37: Situação pedagógica discutida pelos participantes IV

Fonte: Ferrari et al. (2006, p. 101 e 104)

Figura 38: Situação pedagógica discutida pelos participantes V

Fonte: Ferrari et al. (2006, p. 101 e 104)

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As situações pedagógicas apresentavam propostas opostas. Numa

delas, a criança teria que classificar os dados contidos em três grupos: listras,

pintas e bigodes, para realizar uma contagem de peixes e finalizar com um

gráfico. Na outra, o gráfico de barras já estava montado, com o tema

“dinossauros”, e o foco seria na sua interpretação.

Logo de início, o tema “dinossauros” despertou mais atenção e gerou

comentários de que as crianças gostam muito desse tema e de que analisar os

dados é bastante importante no que diz respeito ao desenvolvimento do

letramento estatístico. De maneira geral, concluímos que ambas as situações

não apresentam um propósito, embora tenham questões a serem respondidas.

Em ambas, também, a criança recebe a maior parte pronta: os dados já estão

indicados, a tabela já está pronta, o gráfico já delimitado (caso dos peixes) ou

construído (caso dos dinossauros). Temos estudado indicações que vão

justamente em sentido contrário: os estudantes devem ter oportunidade para

gerar suas questões, tomar decisões, determinar os métodos e coletar dados,

discutir como organizá-los e analisá-los. Esse protagonismo é que pode tornar

as propostas mais significativas para eles, e não apenas reunir dados ou

cumprir páginas de livros ou apostilas.

Outra questão que parece estar presente é o uso do livro didático ou

material didático. Esses recursos têm importância na prática pedagógica diária,

pois constituem um apoio para o professor e para o estudante, auxiliando na

organização do conteúdo estudado. Em algumas situações, pode até ser

considerado único suporte, devido à escassez de recursos, mas muitas vezes

pode ameaçar a autonomia do professor, quando se obriga o professor a seguir

as situações pedagógicas à risca, sempre na ordenação em que são

propostas; a esgotar todo o material didático; ou a realizar exclusivamente as

situações propostas pelo livro ou material de ensino. O material didático não

prevê cada contexto/turma, mas visualiza um professor com competências que

muitas vezes não existem. Podemos dizer também que, muitas vezes, o

problema não é o material ou livro didático, mas a forma de trabalho imposta

pelas instituições ou por falta de preparo do professor. Nesse sentido, o

professor também é visto como alguém que reproduz o conhecimento, e não

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alguém capaz de produzir conhecimento. Embora o livro didático não seja

nosso foco de estudo e análise, seu uso precisa ser discutido, uma vez que

gera tensões prejudiciais à prática profissional do professor. Consideramos

também que os livros didáticos melhoraram muito após o Programa Nacional

do Livro Didático (PNLD).

5.17 Discussão do trabalho realizado por Mie

Dando continuidade ao encontro de 15/06/2011, passamos a discutir o

trabalho de Mie. A partir da apresentação de Eduardo, ela se entusiasmou em

realizar também uma situação pedagógica com crianças.

Bastante empolgada, Mie começou informando aos participantes que

realizou essa proposta com crianças do 1.º ano do Ensino Fundamental na

escola particular em que realizava suas atividades de estágio. Elaboramos um

plano de aula que foi discutido previamente por Mie e por mim. Em maio de

2011 foi realizada a situação pedagógica, também registrada em imagens e

vídeo, com autorização da direção da escola, para que pudéssemos discuti-la

no grupo. Infelizmente, por problemas técnicos apenas a primeira parte da aula

foi filmada, pois as configurações adotadas reduziram o tempo de gravação. A

aula teve como tema os “animais de estimação”53 e como objetivos:

1) Conhecimento e domínio, pelo estudante, de um gráfico de colunas,

de forma a saber interpretá-lo, contar e comparar números, utilizando o

gráfico.

2) Integração com Língua Portuguesa, bastante enfatizada nos anos

iniciais do Ensino Fundamental.

3) Aprendizado de Inglês.

4) Aprendizado de elementos de outra cultura, a japonesa.

53 Mais detalhes sobre a proposta podem ser encontrados no Capítulo 6, na seção 6.1 – Asanálises narrativas de Mie.

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Logo nas primeiras cenas selecionadas para discussão, vimos Mie,

começando a aula, apresentando o trabalho com gráficos, dizendo: “Hoje

vamos aprender a fazer um gráfico”. Para dar continuidade à situação, foram

feitas as seguintes perguntas, relacionadas ao tema “animais de estimação”,

escolhido por Mie, por julgar de interesse das crianças:

- Vocês têm animais em casa?

- Que animal vocês têm?

Em relação à proposta de Mie de “fazer um gráfico”, as crianças

pareceram não estar entendendo muito bem do que se tratava, talvez porque

não houvessem tido experiências com esse conteúdo ou, se o tivessem

conhecido, o termo não havia sido apresentado ou tornado significativo. Um

dos episódios que o grupo considerou mais revelador da ausência de contato

das crianças com os gráficos foi quando percebemos, na transcrição do vídeo,

o instante em que Mie abriu uma folha de papel na qual montariam o gráfico e,

com olhares atentos e curiosos, as crianças manifestaram decepção por não

encontrarem o “tal gráfico” no papel.

Indícios disso podem ser percebidos nos trechos das transcrições de

vídeo:

Silvana: Olha, as crianças perguntaram "o que é gráfico".

Mie: Eu já vou responder a eles.

Silvana: Acho que eles nunca tinham visto...

...

Keli: Agora mostra a Mie abrindo o papel [em que havia feito os eixospreviamente].

Crianças do vídeo: "Nossa", "Oh", "Cadê", "Não tem nada".

Participantes: Não tem nada!!! risos.

Rosana: Papel sem nada Mie... rs

Roseli: Eles já queriam ver o tal gráfico que ela falou tanto!

Keli: Eles devem ter se perguntado: "é isso um gráfico?".(Arquivo devídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:24:28 a 0:26:04).

Depois do ocorrido, com a folha de papel, Mie explicou às crianças que

iriam construir o gráfico juntos. Pudemos refletir, a partir do que Mie relatou,

sobre a realidade da sala de aula, o que ocorreu fora do planejado – quando as

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crianças resolveram que gostariam de escrever os nomes de seus animais de

estimação. Refletimos, também, sobre ser aquela uma oportunidade adequada

ao trabalho com a escrita, ao mesmo tempo em que era uma proposta

complexa, pois os nomes dos animais, algumas vezes, apresentavam

“estrangeirismos” como “Shake”, “Minney” e “Michey”.

Como não pudemos acompanhar todo o desenvolvimento da aula em

vídeo, Mie trouxe o gráfico montado junto com as crianças, para que

pudéssemos ver (Figuras 39 e 40).

Figura 39: Alguns participantes do grupo e o gráfico apresentado por Mie

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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Figura 40: Gráfico construído pelas crianças com Mie

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Ela também quis dar destaque para o momento da discussão a respeito

do gráfico, como podemos constatar:

Mie: Não precisei explicar, porque eles já disseram "Cachorro" [comoanimal com maior frequência]. Perguntei porque e um menino disse:"Por que sim!", apontando para a coluna e para o 10 aqui [no gráfico].Talvez ele quisesse falar: Não precisa explicar, já está visível, éóbvio! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:31:05a 0:31:29).

Assim como no trabalho apresentado por Eduardo, Mie nos relatou da

motivação das crianças durante a realização da situação pedagógica, ou seja,

o que Watson (2006) aponta como orgulho da propriedade do gráfico que as

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crianças criaram. Mie também organizou um quadro com as quantidades de

cada animal e constatou que as crianças também não tiveram dificuldade

nessa fase (Figura 41). Segundo Mie, uma das alunas até antecipou os dados

do quadro, colocando oralmente as colunas em ordem, conforme a quantidade

de animais. Concluímos que a construção do quadro ajudou as crianças a

entenderem melhor as frequências de cada animal, pois, no outro trabalho que

discutimos, o de Eduardo, os estudantes tiveram dificuldade justamente nisso,

em relacionar o eixo das quantidades de estudantes com as colunas.

Figura 41: Quadro construído por Mie e as crianças, sistematizando os dados

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Percebemos também que devido à idade das crianças, o fator tempo

influenciou, pois elas acabaram levando mais tempo que o previsto nos

desenhos, por exemplo, e em anotar os dados do quadro, o que tornou a

situação longa para crianças de 6 anos. Nossa sugestão foi, mais uma vez,

realizar a proposta em dois dias, mas, infelizmente, isso só seria possível, caso

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a professora que Mie acompanhava no estágio, cedesse os dois momentos ou

duas aulas.

Rosana: Eles são pequenos! Cada dia um pouquinho numa dasaulas. Por que eles não aguentam.

Roseli: Pode, inclusive, despertar mais curiosidade.

Mie: É, no final eles ficaram um pouco impacientes. (Arquivo de vídeoda pesquisadora. Intervalo de tempo 0:36:10 a 0:36:34).

Finalizamos o encontro, com Rosana me procurando para sinalizar que

gostaria também de realizar uma situação pedagógica com suas crianças:

Rosana: Vamos ver se no próximo semestre eu faço um também! ?

Keli: Se você quiser, inclusive, a gente pode tentar o apoio de algumadas pessoas do grupo para te ajudar.

(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:37:26 a0:37:54).

Principalmente nesse trecho, fica claro que a questão do

desenvolvimento profissional como desenvolvimento de conhecimento vai

favorecendo o desenvolvimento profissional como desenvolvimento de si

mesmo, e isso vai dando segurança à participante, num contexto colaborativo,

para levar a prática para sua turma e revelá-la aos seus colegas,

compartilhando os conhecimentos produzidos.

5.18 Planejamento do segundo semestre de 2011

Para que pudéssemos planejar os encontros do grupo para o próximo

semestre, considerando necessidades formativas e anseios e, ao mesmo

tempo, buscando indícios de mudanças nas concepções e nas práticas, propus

uma pequena avaliação, centrada principalmente nos trabalhos compartilhados

pelos participantes Mie, Rosana e Eduardo. Essa avaliação foi feita de forma

escrita, proposta no encontro de 15/06/2011, para envio posterior, e depois

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relembrada por e-mail. Este excerto do arquivo de pesquisa, de 23/07/2011

(Quadro 9), revela esse procedimento:

Quadro 9: E-mail enviado aos participantes do grupo

Olá, pessoal!

Espero que estejam aproveitando as férias (para quem está de férias!!!) e que ela estejasendo produtiva (professor sempre aproveita as férias para preparar atividades para ospróximos momentos....)!

Estou enviando uma de nossas fotos, aquela pequena tarefa de avaliação (para lembrá-los) etambém algumas coisas que estudamos logo no início de nossos encontros (para quemchegou depois).

Fico aguardando a tarefa de vocês e também indicações de "coisas" ou temas de estatísticaque gostariam de estudar no próximo semestre. Ainda estou esperando o fechamento dohorário para sabermos quando serão os encontros.

AbraçãoKeli

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Embora não tenha havido uma leitura compartilhada das avaliações, por

e-mail ou mesmo durante o encontro, o que consideramos que seria importante

para o grupo, todos os participantes ressaltaram que foi um semestre muito

proveitoso, em especial os trabalhos dos colegas, pois o foco esteve nas

situações pedagógicas de sala de aula, conforme demonstram trechos das

avaliações escritas:

O trabalho do Eduardo me trouxe um olhar diferente em relação a“dar aula”, pois através da dinâmica desenvolvida por ele, houve aconstrução do conhecimento não só teórico. Os questionamentos dosalunos trouxeram um enriquecimento muito grande à proposta dele epara mim.[...] Sobre o trabalho da Mie, gostei muito da participaçãoefetiva dos alunos e da maneira como as crianças interagiram namontagem da atividade. Dúvidas e questionamentos das criançasenriqueceram muito a aula. (Trechos da avaliação enviada porRosana em 04/08/2011)

As propostas trazidas pela Rosana foram muito legais! Foi muito boaa oportunidade para pensar sobre os conceitos das crianças e nossossobre Probabilidade.[...] Sobre o vídeo do trabalho do Eduardo, foimuito bom, me senti mais segura em como apresentar um conteúdona frente da sala de aula, questionar os alunos, levantar problemas,pensar junto com as crianças e chegar a algo junto com elas. Asatitudes do Eduardo foram ótimas![...] Agradeço muito por ter tidooportunidade de desenvolver também uma atividade!(Trechos daavaliação enviada por Mie em 25/07/2011)

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Os vídeos me despertaram para pensar em outras formas detrabalhar com as crianças. Será uma valiosa experiência para mim,quando começar a lecionar. Pude ver uma forma mais dinâmica decativar as crianças. O semestre foi muito bom, aprendi muito com ogrupo! (Trechos da avaliação entregue em mãos por Roseli em12/08/2011).

O trabalho trouxe um novo olhar para a temática Estatística,apresentando novas e diversas possibilidades de trabalho em sala deaula, mas possibilidades significativas para o aluno. (Trechos daavaliação entregue em mãos por Eduardo em 12/08/2011).

As atividades discutidas foram muito estimulantes no sentido de levaros alunos a pensar, a partir de algo que eles gostam como animais,comemoração dos aniversários. A forma com que o Eduardo e a Mieapresentaram e conduziram as atividades também foi muitointeressante. (Trechos da avaliação entregue em mãos por Érica em26/08/2011).

Também gostaria de destacar nesses trechos a importante participação

das crianças da Escola Básica e o ambiente potencializador da sala de aula.

Os maiores “encantamentos” foram justamente os momentos em que víamos

as crianças participando, levantando questionamentos, a condução da situação

pelo professor e sua mediação. Pudemos perceber sinais de que todos

aprenderam: as crianças que participaram das situações pedagógicas, o

professor que teve sua aula filmada – e, com isso, a oportunidade de rever sua

prática (metarreflexão) – e os demais participantes, na aprendizagem com o

outro. Vários participantes revelaram marcas de seu desenvolvimento

profissional como desenvolvimento de si mesmos: afirmaram que estavam

diferentes ou se modificaram em algum sentido, a partir do trabalho no grupo:

“me trouxe um olhar diferente sobre ‘dar aula’” (Rosana), “me senti mais

segura” (Mie), “me despertaram para pensar em outras formas de trabalhar”

(Roseli), “um novo olhar para a temática” (Eduardo).

Acreditamos que o contexto colaborativo no grupo tenha contribuído

para a prática reflexiva, em um processo necessariamente coletivo, que, de

acordo com Pimenta (2002), pode possibilitar respostas às situações novas,

incertas e indefinidas. Também acreditamos que os currículos de formação dos

profissionais da educação deveriam propiciar o desenvolvimento dessa

capacidade de refletir, porém importa destacar dois aspectos: um treinamento

apenas não é suficiente para tornar o professor reflexivo; a produção do saber

a partir da prática é de enorme relevância.

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O ensino como prática reflexiva tem se estabelecido como umatendência significativa nas pesquisas em educação, apontando para avalorização dos processos de produção do saber docente a partir daprática e situando a pesquisa como um instrumento de formação deprofessores, em que o ensino é tomado como ponto de partida e dechegada da pesquisa (PIMENTA, 2002, p. 22).

Concordamos com Pimenta (2002, p. 24) sobre a importância da prática

e principalmente quando afirma também que “o saber docente não é formado

apenas da prática, sendo também nutrido pelas teorias da educação”. A autora

também enfatiza a relevância da teoria na formação dos docentes,

complementando que ela “dota os sujeitos de variados pontos de vista para

uma ação contextualizada, oferecendo perspectivas de análise para que os

professores compreendam os contextos históricos, sociais, culturais

organizacionais e de si próprios como profissionais” (PIMENTA, 2002, p. 24).

Nesse sentido, Kilpatrick (1996, p. 118) também menciona o papel da

pesquisa e da prática:

Educação é uma profissão na qual o hiato entre pesquisa e prática éespecialmente grande, então os pesquisadores têm umaresponsabilidade particular em assegurar que o trabalho que elesestão fazendo esteja relacionado à prática e informado por ela.

Além de o contexto colaborativo contribuir com a prática reflexiva, os

aportes teóricos que temos estudado no grupo é que têm dotado os

participantes de “variados pontos de vista para uma ação contextualizada,

oferecendo perspectivas de análise”, como apontado anteriormente por

Pimenta (2002, p. 24), identificando o potencial transformador das práticas,

sem deixar de lado a teoria e a importância do desenvolvimento profissional do

professor como desenvolvimento de conhecimento na perspectiva do

letramento estatístico.

Quanto à sugestão de temáticas e de metodologia para o próximo

semestre, as avaliações reforçaram o desejo de trabalhar, estudar, discutir a

sala de aula e as situações pedagógicas para serem ali desenvolvidas, ligadas

ao currículo. Ou seja, ficou clara a importância, para os membros do grupo, de

desenvolver o conhecimento do currículo (SHULMAN, 1987), próximo à cultura

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escolar (conhecimento dos contextos educativos, também de acordo com

Shulman [1987]), pois consideraram ser este um desafio do professor: conduzir

uma proposta ligada às temáticas que temos estudado, embasadas por aportes

teóricos, de forma a realmente construir conhecimento. Tal propósito revelou

indícios da influência do grupo no desenvolvimento profissional, como

desenvolvimento de conhecimento na perspectiva do letramento estatístico e

como desenvolvimento de si mesmo ou pessoal.

5.19 Situações pedagógicas para a sala de aula I

Esse encontro foi realizado em 26/08/2011, com a presença de Mie,

Erica, Roseli, Cintia, além de mim. O texto escolhido por e-mail para discussão

foi “Crianças, máscaras, eleições municipais e gráficos ... tudo a ver?”, de

Figueiredo (2002). É um relato que busca contemplar a prática de sala de aula,

em especial na Educação Infantil, temática solicitada pelos participantes. Logo

notamos uma sintonia com o que temos estudado e tentado colocar em prática:

o trabalho com dados, com um propósito definido, para responder a uma

questão. O texto traz o relato de uma professora que propôs à turma, construir

máscaras de personagens, aproveitando caixas de sapato. Diante do universo

de possibilidades envolvendo personagens, levantado pelas crianças (23

crianças e cerca de 20 escolhas de personagens diferentes), a professora

iniciou um processo que considerou fortemente ligado ao momento que

estavam vivendo: eleições municipais. Iniciou-se, então, o processo de eleição

do personagem preferido, para a confecção de máscaras.

Para a dinâmica do encontro, propusemos a leitura prévia do texto e,

quando nos encontramos, procuramos relembrar as ideias gerais da história

relatada pela professora. Logo surgiram comentários – alguns aqui transcritos,

a partir das videogravações – a respeito de vivência parecida dos participantes

do grupo:

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Keli: É importante a criança sentir que teve esse poder de decisão.Nós escolhemos e depois realizamos.

Roseli: Na escola onde estou fazendo o estágio, fizeram um gráficocom chá. Foi um projeto. Fizeram pesquisa, e, aliás, vai ter de novoesse projeto. Fizeram uma pesquisa em casa, que chá eles maistomavam. Depois disso, conseguiram as mudas para a horta, paraplantar de acordo com o consumo.

Keli: E quais foram os chás escolhidos?

Roseli: Guaco, poejo, hortelã e tinha mais um... Camomila! E depoisfoi exposto no Fruto da Terra [evento promovido pela Diretoria deEducação do município, em que as escolas expõem seus trabalhos].

Keli: Percebe que implica em outras coisas? Não é só fazer o gráfico.

Mie: Muito legal esse projeto.

Roseli: O interessante também é que o gráfico foi feito com as folhasmesmo, de verdade.

Keli: E até para a criança com deficiência visual, a coluna pode sertátil.

Roseli: Fizeram mudinhas para as famílias.

Keli: Foram ligando os projetos da própria escola com as ideiasestatísticas! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:11:90 a 0:14:44).

Mie, empolgada com resultados que encontrou em sua experiência com

as crianças e a construção de gráfico, se voluntariou para desenvolver mais

uma situação pedagógica na escola e informou que o contexto da escola

naquele momento era a “Festa das Nações”. Nossas sugestões ficaram em

torno da escolha de um país e de algo que gostariam de pesquisar sobre ele,

como, por exemplo, música, culinária, cultura. Também pensamos que, caso os

estudantes quisessem pesquisar sobre culinária, poderíamos ter vários

desdobramentos: levantamento de preços, quantidade, proporção, fração.

Lembramo-nos também do relato estudado no nosso terceiro encontro, a

respeito de “possível” e “impossível” (“Adivinhe quem vem para ficar?”, de

Jonsson [2002]), pois também poderia ser discutido com os estudantes a

respeito do que seria possível fazer na escola ou não, de acordo com a

infraestrutura.

Tais fatos parecem revelar que, segundo a Pedagogia dos

Multiletramentos (ROJO, 2010; BEVILAQUA, 2013), já construímos um novo

design, a partir de um disponível, fazendo surgir nova fonte de construção de

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sentido, que possa atender às necessidades do contexto, além de motivar os

estudantes.

Duas participantes que, em geral, falam pouco durante os encontros,

também manifestaram vontade de realizar trabalhos semelhantes no estágio. É

possível perceber oscilam entre a vontade de realizar a situação pedagógica e

a insegurança, o que é próprio da formação inicial.

Cíntia: No estágio, quando a gente vai fazer regência, a gente elaborauma aula, não é? Pra gente seria interessante, não é, Erica?

Erica: Sim.

Keli: E quando vocês vão começar a regência?

Cíntia: A gente vai começar o estágio na próxima semana. Mas aminha turma será de crianças abaixo de 3 anos, de acordo com aprofessora que eu escolhi. É bem difícil, entre 1 ano e meio e dois,então é bem limitado. Mas eu posso tentar fazer alguma coisa.(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:21:45 a0:22:22).

Keli: Será que alguma coisa com suco ou fruta?

Cíntia: Se eu fizer, por exemplo, na segunda, será que eles vãoentender que não é hoje, é amanhã? Será que se eu falo: banana ...banana, eles vão querer na hora?

Keli: O que vocês acham?

Mie: Eu também acho que eles não têm essa noção ainda. Se falaramanhã, já é muito tempo, para eles tão pequenos. Hoje é melhor.

Cíntia: Eu acho melhor pensar nesse contexto. Naquele momento.

Mie: Precisa planejar antes, será que dá?

Keli: E se a gente pensar numa brincadeira? Eles brincam, nãobrincam?

Cíntia: Brincam, mas são bem individualistas ainda. (Arquivo de vídeoda pesquisadora. Intervalo de tempo 0:22:30 a 0:23:57).

O importante, que podemos destacar, é que alguns aspectos, como a

participação e a vontade de realizar situações pedagógicas com suas crianças

ou futuros estudantes, já se faziam diferentes, para essas participantes. O

desenvolvimento profissional como desenvolvimento de conhecimento já

começava a modificar o futuro professor, no desenvolvimento de si mesmo.

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5.20 Situações pedagógicas para a sala de aula II

No encontro realizado em 23/09/2011, estiveram presentes Erica,

Rosana, Thaynara, Mie e eu. Como os participantes não puderam fazer a

leitura prévia do relato “De olho na Mamãe” (CAPP, 2002), Rosana sugeriu que

ele fosse lido no próprio encontro. O objetivo do relato é contar uma situação

pedagógica desenvolvida com crianças da Educação Infantil da Escola

Comunitária de Campinas (SP), no projeto “Dia das Mães”, em que as crianças

recolheram dados a respeito da cor dos olhos de suas mães e os organizaram

em uma tabela e, posteriormente, num gráfico de colunas.

O que nos chamou atenção no texto é que as crianças tinham uma

participação efetiva em todo o trabalho; por exemplo, elas registravam na lousa

a contagem. A todo momento, a condução da professora possibilitava que as

crianças fossem ouvidas, dessem sugestões, discutissem qual o melhor

encaminhamento para a situação.

Algumas dúvidas foram surgindo, durante a leitura:

Erica: Será que foi fácil de diferenciar castanho de castanhoesverdeado? Por que é difícil para a criança pequena... castanhoescuro, castanho esverdeado. Será que ela fez alguma coisa? [sobreas cores apresentadas pelas crianças como cores dos olhos de suasmães]

Rosana: Pelo relato, eles pesquisaram em casa e aí trouxeram. Achoque foi a mãe que falou. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalode tempo 0:6:01 a 0:06:19).

Esse questionamento nos fez olhar para os olhos de nossos colegas,

para entender o universo de cores apresentado pelas crianças (azul, cor de

mel, verde, castanho escuro, preto, castanho esverdeado).

Outro ponto referido por Rosana como interessante foi que as crianças

que já tinham alguma experiência com situações pedagógicas envolvendo

organização de informação notaram que havia divergência entre o gráfico e a

tabela e concluíram que alguma criança havia registrado incorretamente no

gráfico a cor dos olhos da mãe. As crianças conseguiram, inclusive, detectar

quais colunas apresentavam as divergências, o que motivou, em nosso grupo,

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comentários que aqui transcrevemos. Em Watson (2006), essa observação

feita pelas crianças encontra uma justificativa: o autor afirma que tal relação é

possível devido às conexões realizadas entre a coleta de dados, as

representações gráficas e a interpretação.

Rosana: Acho que o interessante foi exatamente a divergência. Eeles perceberam o erro, comparando a tabela e o gráfico.

Keli: Se está na tabela...

Rosana: Tem que estar no gráfico!

Mie: Acho que é fácil as crianças se perderem nas contagens.

Rosana: Muito, muito! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalode tempo 0:16:40 a 0:17:10).

...

Rosana: Virou o interessante da atividade!

Keli: Mesmo quando acontece um erro, a professora aproveitou paraexplorar.

Mie: Fazer alguma coisa!

Rosana: Nos outros dois textos desse livro, não tinha a presença databela ainda, agora já apareceu. E as crianças ainda foram capazesde perceber a diferença [entre a tabela e o gráfico]. (Arquivo de vídeoda pesquisadora. Intervalo de tempo 0:17:45 a 0:19:10).

Novamente Rosana demonstrou querer realizar situações pedagógicas

desse tipo com sua turma, ter um registro sistemático para poder refletir sobre

sua prática:

Rosana: Eu estava pensando aqui. No próximo ano, já começar comesse tipo de registro, gravar. Esse ano é um pouco complicado, mas,no próximo, vou ver se consigo fazer esse registro histórico, poisprecisa de tempo, e o próximo ano, terminando a faculdade vai ficarmais fácil. Começar com aquele registro do aniversário, conhecermelhor os amigos, preferências... Não sei que turma nem que sérieeu vou pegar o ano que vem, mas fazer do começo. Como nós temosmais folga no início do ano letivo, fica mais fácil programar algumacoisa assim.

Keli: Sim. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:19:40 a 0:20:20).

Esperamos que essas experiências possam acontecer em breve com a

turma de Rosana. Também aqui, podemos destacar o desenvolvimento

profissional da participante, como desenvolvimento de si mesma e como

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desenvolvimento de conhecimento, pois ela já está projetando seu

planejamento, projetando mudanças na sua prática.

5.21 Situações pedagógicas de Estatística num livro didático de 1.ºano do Ensino Fundamental

Para esse encontro realizado em 21/10/2011, para atender ao pedido

dos participantes, selecionamos situações pedagógicas envolvendo gráficos e

tabelas, presentes em livros didáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental,

adotados pela rede municipal de Atibaia. Foram discutidas duas situações

pedagógicas destinadas ao 1.º ano do Ensino Fundamental.

A primeira delas, segundo as orientações dos autores (MILANI;

IMENES; LELLIS, 2008a, p. 42), tinha como objetivos:

Construir a noção de gráfico; Exercitar a contagem de 1 a 10 e seguintes; Propiciar contato com a escrita numérica de dez, onze e doze; Trabalhar com a correspondência um a um; Comparar números por meio da relação entre quantidades e sua

representação geométrica.

Os autores apresentavam uma situação desenvolvida numa classe

imaginária, em que crianças haviam votado nas opções “bola-queimada, pega-

pega, pula-macaco e estátua” (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008a, p. 42) e

propunham algumas questões a respeito do gráfico. A partir disso, as crianças

seriam motivadas a construir o gráfico que mostrasse a preferência de sua

classe (Figura 42).

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Figura 42: Matriz para a construção de um gráfico com a turma

Fonte: Milani, Imenes e Lellis (2008a, p. 43)

Embora tivéssemos lido os objetivos apresentados pelos autores,

questionamos o proposto na situação:Roseli: Por que vamos selecionar a brincadeira preferida?

Mie: Para quê?

Keli: Senão fica uma coisa assim: constatamos que a brincadeirapreferida da turma é pega-pega [fazendo referência ao gráficoapresentado pelos autores de livro didático]. Muito bem, vamospassar para a próxima atividade!

Mie: Qual o motivo da escolha, para que eu vou escolher?

Keli: Eu acho importante escolher e implicar em alguma coisa, senãofica uma atividade para cumprir o conteúdo, uma estatística pelaEstatística. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:06:36 a 0:07:18).

Concluímos que, para nós, o que faltaria no desenvolvimento da

situação seria a implicação de algo, como por exemplo, diante da pergunta:

“Qual sua brincadeira preferida?”, seria feita a escolha e isso implicaria no

desenvolvimento dessa brincadeira na escola, entre as crianças. Outra

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indicação foi a inclusão da questão: “Quantos estudantes participaram da

pesquisa?”. Watson (2006) também reforça que, quando os estudantes

produzem suas próprias representações com base num conjunto de dados,

ocorre outro grau de envolvimento, criatividade e conexões, além de possibilitar

um contexto motivador e de interesse dos estudantes.

A segunda proposta discutida abordava o mês de aniversário das

crianças, o que nos fez lembrar da situação pedagógica apresentada por

Eduardo, mas o registro dessa situação se dava com um gráfico de barras.

Seus objetivos, de acordo com Milani, Imenes e Lellis (2008a, p. 120), eram:

“Fazer enquetes e organizar dados; Construir gráfico de barras”. Em sua

comanda, a proposta trazia:

A professora pergunta:

- Quem faz aniversário em Janeiro?

Aí, os aniversariantes de Janeiro levantam a mão.

Você pinta um quadradinho para cada um deles na linhacorrespondente a Janeiro. Depois ela faz a mesma pergunta para osoutros meses e você repete o procedimento.

Ao final terá construído um gráfico (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008a,p. 120).

Roseli assim apresentou suas impressões, baseada no que tinha visto

no seu estágio:

Roseli: Esse gráfico fica confuso para os alunos! [apontando para ailustração do livro didático]. Fica melhor esse do Eduardo. Sabe porquê? Eu substituí uma professora, no primeiro ano, e vi no materialde atividades esse gráfico e lembrei na hora e vi que não deu muitocerto. Havia vários lugares apagados.(Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo 0:24:45 a0:25:22).

Concluímos que talvez fosse melhor a criança ter experiências com o

gráfico de colunas antes do gráfico de barras (Figura 43), pois isso poderia

melhorar seu entendimento. Nesse sentido, mais uma vez, Watson (2006)

aponta para o protagonismo do estudante, para sua liberdade na escolha da

forma como deseja representar os dados, além da criatividade, mesmo que

isso não satisfaça ainda as convenções estatísticas.

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Figura 43: Gráfico de barras

Fonte: Milani, Imenes e Lellis (2008a, p. 120)

Ao final do encontro, Roseli compartilhou um pouco do trabalho que vem

desenvolvendo na escola em que realiza o estágio e sua iniciação científica,

que toma como base o livro didático ali adotado para o 5.º ano do Ensino

Fundamental54. A participante mostrou também algumas fotos da escola,

revelando seu contexto (rural), para que selecionássemos as que poderiam ser

usadas no texto que está escrevendo, como, por exemplo, as que não

mostravam diretamente o rosto das crianças.

Mie também contou um fato que nos deixou contentes: os comentários

de que seu trabalho teve uma boa repercussão na escola em que foi realizado,

conforme transcrição de vídeo:

Mie: A professora me contou que começou a incluir nas suas aulas,gráficos. Ela fez e uma amiga dela do 3.º ano fez também!

Keli e Roseli: Que legal!

54 Mais detalhes sobre isso podem ser encontrados no Capítulo 6, seção 6.2, O Trabalho deRoseli.

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Mie: E a professora também contou que as crianças perguntam:”Cadê a Mie?” E eles se lembram da atividade que eu fiz. Eu achoque eles estão lembrando do que aprenderam. (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:20:26 a 0:21:09).

A proposta refletiu, inclusive, em início de mudança de práticas na

escola, a partir da produção de Mie e do grupo.

5.22 Situações pedagógicas de Estatística num livro didático de 1.ºe 2.º anos do Ensino Fundamental

Esse encontro foi realizado em 04/11/2011, e estivemos presentes Mie,

Rosana, Roseli e eu. Foram discutidas quatro situações pedagógicas

destinadas às crianças dos anos iniciais do Ensino Fundamental, sendo uma

destinada ao 1º ano e três ao 2.º ano.

A primeira delas apresenta um gráfico já montado, representando os

pontos de um torneiro de boliche. Mie quis saber por que o eixo horizontal do

gráfico, que apresentava os pontos obtidos no boliche ia de “dois em dois”.

Investigando a situação pedagógica no contexto do livro didático (MILANI;

IMENES; LELLIS, 2008a), notamos que, nas páginas anteriores, era

apresentado um jogo de boliche, e havia imagens e comandas que faziam

menção a um torneio em que cada pino valia dois pontos. Nas orientações,

havia indicação dos autores para que o jogo realizado pelas crianças fosse

construído com garrafas PET. Nossas discussões nos levaram a concluir que

as situações pedagógicas apresentadas no livro para serem realizadas pelas

crianças não implicavam na realização do jogo, ficavam mais como uma

sugestão ao professor. Sabemos do potencial do uso dos jogos no

desenvolvimento dos estudantes, mas, infelizmente, ainda há preconceito na

realização desse tipo de situação, tido como algo sem importância ou também

que vá tomar muito tempo da rotina escolar, gerar agitação e mais trabalho

para o professor.

Na sequência proposta pelo livro didático, quando chegava a hora da

análise do gráfico, os autores o apresentavam pronto, acompanhado de

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perguntas do tipo: “Quantos alunos fizeram 16 pontos?”, que se repetia com

outras quantidades; ou “Quem fez mais pontos nesse torneio?” (MILANI;

IMENES; LELLIS, 2008a, p. 149).

Considerando nossa interlocução com os textos estudados, caso a

situação pedagógica seja desenvolvida exatamente da forma como é

apresentada no livro didático, mais uma vez as crianças não decidem sobre o

que querem pesquisar e não são protagonistas, não produzem dados, não os

classificam e nem escolhem a forma como poderão apresentá-los. Para nós o

ideal seria que as crianças construíssem seu jogo de boliche, jogassem,

assistissem às jogadas de seus colegas, escolhessem como poderiam registrar

seus pontos e como poderiam organizá-los, de forma a responder questões

levantadas por eles próprios a respeito desses dados. Ou seja, concordamos

com Watson (2006) sobre o papel fundamental da criação e da interpretação

dos gráficos como componentes do letramento estatístico. O diálogo aqui

transcrito reitera esta afirmação.

Roseli: Essa interpretação está tão pobre.

Rosana: Eles não poderiam jogar mesmo, fazer o torneio de boliche?Por ser primeiro ano, seria ideal, acho que deveriam fazer!

Keli: Poderiam! Podia virar o Torneio de Boliche da turma do PrimeiroAno da Escola Tal!

Mie: Se fosse na sala deles seria mais legal! (Arquivo de vídeo dapesquisadora. Intervalo de tempo 0:03:52 a 0:04:29).

A segunda e a terceira situações pedagógicas discutidas foram

destinadas ao 2.º ano (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008b) e seguiam a mesma

ideia da anterior, ou seja, apresentava-se uma situação em que um gráfico

estava montado e depois se sugeria que as crianças montassem um novo,

cujos eixos já estavam definidos e traçados, e as questões a serem

respondidas, prontas. O assunto de uma das situações foi o brinquedo

preferido de uma classe fictícia e o da outra foi o número de irmãos. No gráfico

a respeito do número de irmãos, o recurso usado e reproduzido no livro

didático foi a montagem das colunas com caixinhas de fósforo. Nossas

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discussões apontaram, mais uma vez, para um trabalho de transformação da

situação pedagógica, a ser desenvolvido pelo professor:

Keli: Quando eu vejo assim no livro, acho que fica meio maçante paraas crianças.

Rosana: Eu estava pensando nisso. Que chato ver no livro! Eu achomuito chato!

Roseli: Por quê?

Rosana: Na realidade, tudo o que tem nas fichas de trabalho, tem quedar um jeito de mudar pro concreto.

Mie: Huum.

Keli: Se eu fosse a professora do 2.º ano, o que eu faria?

Rosana: Eu pediria para eles trazerem caixinha [de fósforo], faziacom eles e depois ilustrava isso aqui [falando da representação jápronta do livro didático].

Mie: E trazia fotos dos irmãos, da família, mostrava.

Rosana: Na realidade, eu faço assim: tem o material, ele é bemassim, colorido, para criança mesmo, mas eu faço sem eles olharemo material. Faço na prática. E aí depois eu só vou e registro.

Mie: Hã, hã.

Rosana: Eles têm uma concentração para as fichas de dois minutosno máximo. O que vale é a construção. O tocar, o ver, o agir. Apenasolhar assim é até chato. (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalode tempo 0:08:42 a 0:09:48).

Nossa quarta situação pedagógica discutida indicava um trabalho com “o

peso da turma toda” (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008b, p. 178). Pedia que as

crianças construíssem uma tabela em que cada criança diria seu peso55.

Depois eles eram desafiados a resolver a seguinte questão: “Imagine que toda

a turma suba em uma balança. Quanto marcará essa balança? Para descobrir,

é preciso fazer uma conta. Nesse caso, como a conta tem muitos números

convém usar uma calculadora”. Depois disso, as crianças deveriam construir

um gráfico em que a variável contínua massa havia sido separada em faixas

(menos que 16, de 16 a 19, de 20 a 23, de 24 a 27, de 28 a 31 e mais de 31

quilogramas). Isso logo desencadeou no grupo uma discussão a respeito de

discriminação que o professor pode promover entre as crianças se houver

algum obeso.

55 Embora essa tenha sido a palavra usada pelos autores – possivelmente, para facilitar oentendimento dos estudantes –, o correto seria “massa”, ou seja, a quantidade de matériapresente em um corpo, medida pela balança em quilogramas.

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Mie: Peso... Quantos quilos você pesa? Ah, não! Porque criança, àsvezes...

Roseli: Já teve isso na sua escola, não teve?

Mie: É. A filha da minha amiga é meio gordinha, não vai querer falarquantos quilos pesa.

Roseli: Pode constranger.

Rosana: Você tem que analisar o público que você tem, antes, parafazer uma atividade dessa?

Keli: Eu penso que na Estatística a gente classifica.

Rosana: Pesa outra coisa, então!

Keli: Pesa a mochila!

Rosana: Acho que tudo que envolve o físico é complicado.

Keli: Na Estatística classificamos os dados e os resultados e nossasperguntas ressaltam, quem é o mais pesado?

Mie: Nossa! Rs. Não dá!

Rosana: Lembrei numa atividade que fiz logo no início com minhaturma. Falava: “Quem é alto?”, “Quem é baixo? Começaram a brincare eu já mudei o foco e comecei a pegar os objetos da sala. Mochila,enfim, porque começou a ficar ruim.

Keli: Se você tem o cartão da criança e ela vai marcar para ela, eusou tal, tenho tantos anos... E ela marca para ela é uma coisa, maspor uma tabela assim.

Rosana: Eu já ia surtar! Não quero que me pesem porque eu estounum momento muito difícil... rs... Terminando a faculdade... A gentecome muita porcaria, dorme pouco...

Todos: Rs... (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo de tempo0:27:02 a 0:29:43).

Outro ponto que merece destaque é que os dados para a construção

desse tipo de gráfico poderiam propiciar ótimas discussões a respeito de como

organizá-los e apresentá-los, mas, mais uma vez, isso não ficou a cargo das

crianças.

As propostas discutidas até aqui procuraram permitir a reflexão e a

produção de novos significados para a prática dos professores, buscando uma

sintonia com a realidade, com o contexto.

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5.23 A finalização do ano

Para finalizar os encontros desse ano, tivemos a participação de alguns

integrantes do grupo no I Encontro de Educação Matemática nos Anos Iniciais

(EEMAI), realizado na Universidade Federal de São Carlos nos dias 18 e 19 de

novembro de 2011. Participamos desse evento Eduardo, Rosana e eu, além de

duas alunas da instituição – M. e P. –, que também eram minhas alunas, mas

não faziam parte do grupo. Eduardo apresentou o trabalho “O trabalho com

Estatística no 3.º ano do Ensino Fundamental: a construção do gráfico de

aniversariantes”56. Mie não pôde comparecer, por isso a apresentação do

trabalho “Animais de estimação: a primeira experiência com a construção de

gráfico”57 ficou sob minha responsabilidade. Rosana expôs, em parceria com

M. e P., o trabalho “Experiência de inclusão na Educação Infantil: criando um

recurso para ensinar Matemática”58, que não tinha relação com o trabalho do

grupo, embora fosse orientado por mim.

Todos os que participaram ficaram muito empolgados, gostaram de

conhecer outras pessoas e outros trabalhos, mas, principalmente, sentiram-se

valorizados e produtores de conhecimento.

Depois desse evento, o último encontro do ano foi realizado em

08/12/2011. Estivemos presentes Cíntia, Erica, Mie, Roseli, Rosana, Eduardo e

eu. Nesse encontro tratamos da avaliação do semestre e de algumas questões

éticas da pesquisa.

Na avaliação do semestre, feita por escrito pelos que estavam presentes

ou enviadas por e-mail pelos que não puderam estar presentes, novamente

tivemos observações positivas, como nos trechos a seguir:

56 Mais detalhes sobre o trabalho podem ser encontrados no capítulo 6, na seção 6.3 Asanálises narrativas de Eduardo.57 Mais detalhes sobre o trabalho podem ser encontrados no capítulo 6, seção 6.1 As análisesnarrativa de Mie.58 Mais detalhes sobre o trabalho podem ser encontrados no capítulo 6, na seção 6.4 Asanálises narrativas de Rosana.

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Vi que muitos já estão no último ano da faculdade ou já sãoprofessores e atuam em sala de aula e eu ainda estou no 2.º ano docurso, mas isso não foi um problema, pude aprender muito com aexperiência deles. Foi ótimo, cada um dando sua contribuição,pudemos aprender com as dúvidas e com as experiências doscolegas (Trechos da avaliação realizada por Cíntia em 08/12/2011).

Vejo o trabalho do grupo como de extrema importância. Melhorouminha relação com a temática, sempre que escuto a palavra“Estatística” logo me recordo de nossas discussões e hoje já vejo issocomo uma coisa mais simples. A contribuição para minha formaçãofoi muito boa, pois ampliou meus conhecimentos e como futuraeducadora, entendo que isso fará diferença para os meus alunos(Trechos da avaliação realizada por Erica em 08/12/2011).

O trabalho do grupo trouxe muitas contribuições, trazendo um novoolhar para o tema e apresentando diversas possibilidades de trabalhoem sala de aula. Todos os encontros que eu pude participarcontribuíram com minha prática em sala de aula, além dos textoslidos e discutidos durante o encontro. Lamentei muito quando nãopude comparecer, devido ao meu trabalho na escola e o horário dosencontros (Trechos da avaliação realizada por Rosana em08/12/2011).

O que mais me motivou a participar foi a dinâmica dos encontros, aforma que estudamos juntos, todo mundo aprendendo junto, dividindotarefas, compartilhando. Além disso, contribuiu com a prática para asala de aula, o que eu aprendi aqui podia levar para o meu estágio etambém para o futuro. O melhor dos encontros foi o que foiapresentado aqui, a prática que eles tiveram na escola e trouxerampara a gente, o trabalho da Mie, do Eduardo, por exemplo. Aprendimuitas coisas, fui superando minhas dificuldades (Trecho dedepoimento dado por Roseli à pesquisadora em 08/11/2011).

Aprendi muita coisa prática, não só o teórico. Tirei dúvidas, eu podiaperguntar e falar sem ter vergonha, isso é importante, pois isso nãoacontece em todos os lugares. Em alguns lugares temos até queesconder nossas dúvidas, mas aqui, não; posso perguntar a qualquerhora. Tive a oportunidade de desenvolver o que aprendi aqui no meuestágio, refleti durante todo o tempo, antes e depois, avaliando o quedeu certo e o que não saiu direito e com o apoio dos meus colegas.Apenas nosso horário é que foi um problema, pois nós queríamosconversar mais, mas não havia tempo, acabava rápido (Trecho dedepoimento dado por Mie à pesquisadora em 08/11/2011).

Todo o trabalho desenvolvido foi muito produtivo!!! O tempo quededicávamos aos estudos revertia-se em conhecimento teórico eprático desse tema tão importante. Foi possível também ter contatocom diversas e diferentes atividades possíveis de seremdesenvolvidas com os alunos. Com as contribuições dos colegasconsegui tirar dúvidas que tinha para poder ensina melhor meusalunos, sem contar que é muito bom partilhar dificuldades eproblemas com colegas, contando com contribuições que ajudem asuperá-los (Trecho de avaliação realizada por Eduardo em09/01/2012).

Trabalhando em escolas públicas e municipais, sempre meincomodou o fato do conteúdo matemático ser na maioria das vezesapresentado em forma de observação, leitura ou questões paraserem respondidas apenas no papel. Por isso, participar do grupoEstatisticando foi a alternativa escolhida para mudar esta realidade.Acredito que fomos estimulados não só pela Keli a comunicar e

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argumentar ideias, investigar e explorar diversas atividades, tirardúvidas, compreender diferentes formas de pensar, ampliando orepertório textual individual e coletivo, compartilhando as vitórias edificuldades vivenciadas pelos colegas. No decorrer dos encontros,foi marcante para mim o que chamarei de “transferências” –procedimentos e/ou retificações que fiz no meu trabalho baseada nasolução encontrada pela experiência de outro colega em situaçãosemelhante (Trecho de avaliação realizada por Silvana, s.d.).

Nas avaliações podemos notar vários indícios do contexto colaborativo

que foi se criando e se consolidando, com confiança mútua e vontade de

compartilhar a experiência vivida. Como exemplo, podemos citar os trechos:

“Cada um dando sua contribuição” (Cíntia), “Todo mundo aprendendo juntos,

dividindo tarefas, compartilhando” (Roseli), “Eu podia perguntar e falar sem

vergonha” (Mie), “Com as contribuições dos colegas, consegui tirar dúvidas”

(Eduardo), “Compartilhando as vitórias e dificuldades vivenciadas pelos

colegas” (Silvana).

No que diz respeito ao desenvolvimento profissional, podemos perceber

indícios que nos fazem refletir sobre o desenvolvimento de conhecimento, que

envolveu a teoria e a prática, como o que foi apresentado por alguns

participantes: “Ampliou meus conhecimentos” (Érica), “O tempo que

dedicávamos aos estudos revertia-se em conhecimento teórico e prático”

(Eduardo), “Aprendi muita coisa prática, não só o teórico” (Mie), No que diz

respeito ao desenvolvimento profissional como desenvolvimento de si mesmo,

notamos indícios nos trechos: “Aprendi muitas coisas, fui superando minhas

dificuldades” (Roseli), “Melhorou minha relação com a temática” (Érica),

“Desenvolveu nosso raciocínio dedutivo, indutivo, lógico e crítico, ampliando

nosso repertório individual e coletivo” (Silvana). Também nestes trechos há

evidências de mudanças que ocorreram ou poderão ocorrer nas práticas:

“Entendo que isso fará diferença com meus alunos” (Érica), “Atividades

possíveis de serem desenvolvidas pelos alunos” (Eduardo), “Apresentando

diversas possibilidades de trabalho em sala de aula. Todos os encontros que

eu pude participar contribuíram com minha prática em sala de aula” (Rosana),

“Tive a oportunidade de desenvolver o que aprendi aqui no meu estágio” (Mie),

“a prática que eles tiveram na escola e trouxeram para a gente” (Roseli), “Foi

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marcante para mim o que chamarei de ‘transferências’ – procedimentos e/ou

retificações que fiz no meu trabalho baseada na solução encontrada pela

experiência de outro colega em situação semelhante” (Silvana). E também foi

apontado o que os participantes consideram “problema”, nos encontros – a

questão do tempo: “Lamentei muito quando não pude comparecer, devido ao

meu trabalho na escola e o horário dos encontros” (Rosana) e “Apenas nosso

horário é que foi um problema, pois nós queríamos conversar mais, mas não

havia tempo, acabava rápido” (Mie). Essas situações apontadas com relação

ao tempo revelam a rotina da vida do professor, com muitas tarefas que

acabam por não permitir que ele dedique tempo – ou tempo suficiente – para

sua formação, como apontou Rosana, e mostram também que o envolvimento

e o sentimento de pertença ao grupo fazem com que o tempo dedicado a isso

não seja um tempo penoso, mas, sim, prazeroso, de dedicação a sua

formação, como apontado por Mie.

Com relação às questões éticas, apresentei o termo de autorização dos

dados – fotografias, entrevistas, depoimentos e gravações em áudio e vídeo

(Apêndice A). Todos os participantes autorizaram o uso de seu primeiro nome

ou de seu nome completo na pesquisa. Os que não estiveram presentes

enviaram posteriormente seus dados.

Com a finalização do ano, decidimos que a coleta de dados para a

pesquisa também terminaria. Embora houvesse o desejo de que os encontros

do grupo continuassem a acontecer, isso acabou não sendo possível.

Para além dos encontros do grupo, também demos início, mais ao final

do segundo semestre de 2011, a um processo de escrita que acreditamos ter-

se tornado potencializador do desenvolvimento profissional dos participantes.

Esse processo se estendeu por todo o ano de 2012, mas foi desenvolvido

principalmente via correio eletrônico, entre mim e cada um dos participantes

em alguns momentos; ou entre as pesquisadoras e o participante, em outros

momentos. Esse processo de escrita desencadeou a publicação de

textualizações narrativas que se aproximam de análises narrativas e de um

artigo, bem como a participação em eventos da área da educação e de

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formação de professores, que passaremos a apresentar e discutir no capítulo

6.

5.24 Retomada dos eixos de análise

Tentamos enfatizar os indícios de desenvolvimento profissional dos

professores e futuros professores ao longo das narrativas do trabalho de

campo, destacando-os a partir dos nossos três eixos de análise, ao apresentar

suas falas; evidenciando o que os professores e futuros professores já sabiam

sobre a temática, as novas aprendizagens, as ressignificações e as

transformações no processo de estudo no contexto colaborativo; e também

usando as práticas de letramento para destacar os eventos de letramento que

se constituíram no contexto colaborativo e evidenciando os aspectos do

letramento estatístico. Buscamos também dar destaque à confiança revelada

pelos professores e futuros professores, ao desenvolver, com as crianças dos

anos iniciais do Ensino Fundamental, propostas que abordaram a Estatística e

propiciaram a transformação desses participantes em produtores de

conhecimento.

Apresentamos agora, sistematicamente, nossos eixos de análise

(Quadro 10) e a seguir seus entrelaçamentos nas transcrições das falas dos

participantes durante os encontros (Quadros 11, 12,13 e 14).

Quadro 10: Eixos de análise – percurso do grupo

Eixo 1: Complexidade do desenvolvimento profissional

Desenvolvimentoprofissional doprofessor comodesenvolvimento deconhecimento naperspectiva doletramentoestatístico

A partir da base do conhecimento para o ensino, ouseja, os conhecimentos apontados por Shulman (1987)– o conhecimento de conteúdo específico; oconhecimento pedagógico geral; o conhecimento docurrículo; o conhecimento pedagógico do conteúdo; oconhecimento dos estudantes e suas características; oconhecimento dos contextos educativos; e oconhecimento dos objetivos, metas e valoreseducacionais –, consideramos que se manifestaramfortemente nos estudos dos textos, tanto nos de

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referencial teórico (CONTI, 2009), quanto nos deconteúdo de Estatística e Matemática (VAN DE WALLE,2009), na discussão de situações pedagógicas de livrosdidáticos (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008) ou materialapostilado (FERRARI et al., 2006), no currículo(BRASIL, 1997), nos trabalhos desenvolvidos pelosparticipantes e na escrita.

O processo de desenvolvimento profissional envolveu aconstrução de novos conhecimentos para o ensino, taiscomo: conceitos básicos de Estatística, planejamento deuma pesquisa estatística, coleta de dados, organizaçãodos dados e sua apresentação, média, moda emediana, medida da chance (probabilidade) eporcentagem, que foram, de maneira gradativa, fazendoparte do discurso, dos saberes e da prática doprofessor. Consideramos que isso contribuiu com asegurança do professor e com seu desejo de realizarsituações pedagógicas nesse sentido.

O processo foi contínuo, com constantes reflexõessobre as práticas, promovendo o aprofundamento doconhecimento para o ensino, ou seja, não houvedissociação entre as questões práticas e as teóricas.

A reflexão, especialmente sobre o próprio trabalhodocente, ajudou os participantes a problematizar, acompreender e a ressignificar suas crenças, seussaberes e concepções. Essa reflexão foi potencializadano contexto colaborativo, passando a ser coletiva.Podemos citar como principais ressignificações nodesenvolvimento de conhecimento na perspectiva doletramento estatístico, a concepção do que é Estatísticae seus elementos, as implicações de uma pesquisa,letramento, letramento estatístico, eventos certos,possíveis e impossíveis e medida da chance.

Desenvolvimentoprofissional doprofessor comodesenvolvimento desi mesmo oupessoal

O planejamento dos encontros e os encontros do grupolevaram em conta cada participante, com sua história devida social e cultural, seus sonhos e crenças pessoais,representando um processo complexo e singular.

Ocorreu de diferentes formas: para alguns participantesapós sua formação inicial; para outros, durante a

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formação inicial.

Os participantes puderam ser protagonistas de seudesenvolvimento profissional, com apoio dos parceirosdo grupo.

Os professores e futuros professores mostraram-secríticos em relação a materiais didáticos e também asuas próprias produções (aulas, narrativas orais eanálises narrativas).

Houve possibilidade de transformar a insegurança emsegurança, para a realização de situações pedagógicascom estudantes ou mesmo sua participação no grupo.

Eixo 2: Colaboração

Contexto decolaboração

Exigiu tempo para que seus participantes se sentissemparte do grupo.

Foi considerado potencializador do desenvolvimentoprofissional.

O grupo, com o tempo, tornou-se um espaço decompartilhamento de estudo, experiências e reflexõesdos professores e futuros professores sobre ensinarEstatística na perspectiva do letramento. Além disso, foipossível produzir, ampliar e desenvolver diferentes tiposde conhecimento.

No contexto colaborativo, a fundamentação teórica emetodológica sobre o letramento estatístico possibilitoua produção de teoria sobre a prática pedagógica e aformação de professores.

A procura por um grupo e sua permanência nelerefletem a busca pelo desenvolvimento profissional.

Eixo 3: Letramento(s)

Indícios doletramentoestatístico

Pudemos, pela disponibilização de designs (narrativasde sala de aula, por exemplo, com foco no letramentoestatístico), fazer a reconstrução do conhecimento,transformando-o em um novo design disponível(Pedagogia dos multiletramentos).

A partir dos textos estudados, pudemos perceber o

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experienciamento do novo, a apropriação da teoria edos conceitos, enquadrando-a criticamente a partir deperspectivas, interesses e motivações dos própriosparticipantes, e a aplicação aos estudantes (Gestosdidáticos).

Práticas deletramento

Apoiaram-se tanto no mundo individual como no socialdos participantes do Estatisticando.

Todos os encontros constituíram eventos letrados;portanto, mediados pela escrita (de autores ou dospróprios participantes).

Houve vários indícios do que fizemos com o letramento,implicando também valores atitudes, sentimentos erelações sociais.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

A seguir, destacamos alguns indícios do entrelaçamento do

desenvolvimento profissional dos participantes, o contexto colaborativo e as

práticas de letramento que consideramos presentes nos encontros do grupo,

trazendo novamente uma transcrição da fala de Silvana (Quadro 11), de

Eduardo (Quadro 12) e de Rosana (Quadro 13), além da fala de Silvana, Mie,

Roseli, Eduardo, Rosana, Érica e Cíntia (Quadro 14).

Quadro 11: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala de Silvana

Práticas de letramento O autor também menciona que, desdea Educação Infantil até a 3.ª série,eles fazem análise de dados.

Contexto colaborativo Esse é o bloco que a gente já viu,chamado Tratamento da Informação.

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico e de si mesmoou pessoal.

De início eu não havia feito essaassociação; para mim Análise deDados era uma coisa e Tratamento daInformação era outra coisa e agora euvi que são sinônimos, com relaçãoaos currículos.

Práticas de letramento Olha só, sem querer, passei lá napagina 496 [VAN DE WALLE, 2009] eo gráfico de pizza chama gráfico desetores [risos].

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Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento de simesmo ou pessoal

Sem querer descobri isso!

Fonte: Transcrições do encontro de 04/11/2010. Grifos nossos.

Quadro 12: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala de Eduardo

Práticas de letramento O que mais me chamou a atenção [notexto] foi um pouco do que as criançastrabalharam.

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento de simesmo ou pessoal

Isso para mim serve um pouco porque a vivência que eu tive de escola,do contato com outros professoresera de que o Tratamento daInformação era GRÁFICO, GRÁFICO,GRÁFICO.

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico

Essa questão de que não é só aelaboração de gráfico e eu achei quenessa atividade apresentada não tema elaboração de gráfico.

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico e de si mesmoou pessoal.

Foi diferente, pois trabalhou comoutras coisas.

Fonte: Transcrições do encontro de 23/09/2010. Grifos nossos.

Quadro 13: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala de Rosana

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento de simesmo ou pessoal

Hoje eu já tenho uma visão diferenteda época em que acompanhei otrabalho da professora. E eu mepergunto, mas como que a professoravai trabalhar essa classificação?

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico e de si mesmoou pessoal.

Pois para mim a maneira que foipassado não foi compreendido.

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico

Acho que teria que trazer algummaterial para eles entenderemmesmo e não praticamente contar aresposta a eles.

Fonte: Transcrições do encontro de 15/06/2011. Grifos nossos.

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Quadro 14: Entrelaçamentos dos eixos de análise – Transcrição da fala dos participantesPráticas de letramento edesenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico

Silvana: Eu queria ter lido essa frasequando a gente estava lá na aula docurso de Pedagogia. Olha queresposta linda: “Que as medidas quedescrevem dados com números sãochamadas estatísticas”59 (risos).(04/11/2010)

Silvana: Eu achei legal a forma comoeles abordaram, eles usaram apropaganda “9 entre 10 dentistasrecomendam a pasta de dente ‘tal’”.Achei ótimo! Quantas vezes a genteestá dentro da sala de aula e podetrabalhar com isso de uma maneiratão gostosa e acaba não ligando, nãoassociando a conteúdos importantes!Achei esse comentário muitointeressante. (04/11/2010)

Eduardo: Eu achei o gráfico de barrasmais interessante para os alunosentenderem essa pergunta: “Quantascrianças gostam de cada fruta?” doque o gráfico de setores. (18/11/2010)

Eduardo: E às vezes não é essa aintenção que a gente vê na sala deaula. Às vezes a intenção é que elesconstruam perfeitamente o gráfico,mas o mais importante é sobre o queestá se falando! (18/11/2010)

Rosana: Talvez construir seja maisfácil, mas você vai ficar ensinandoapenas a técnica? (25/02/2011)

Mie: Acho que tem que deixar maisexplícito falando eixo barra. Um, estáaqui, dois, até aqui... [mostrando comas mãos o eixo e a barra do gráfico].(06/05/2011)

59 Leitura de Van de Walle (2009, p. 485).

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Rosana: Nos outros dois textos desselivro, não tinha a presença da tabelaainda, agora já apareceu. E ascrianças ainda foram capazes deperceber a diferença [entre a tabela eo gráfico]. (26/08/2011)

Roseli: Acho que, se fizer uma partenum dia e no outro dar continuidade,pode deixá-los mais interessados.(06/05/2011)

Roseli: Essa interpretação está tãopobre. (21/10/2011).

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento de simesmo ou pessoal

Silvana: Agora ficou claro que é bemdiferente. Como faz diferençaentender o significado da palavra! Agente compreende! (04/11/2010)

Rosana: Falo que hoje eu consigoperceber isso, mas a escola muitasvezes foi tempo perdido. Faça,decore, faça 50 contas por dia. Vocênão sabe nem por que estavafazendo. Eu decorava a fórmula efazia a prova. Hoje eu reflito mais, vejoas coisas de outra forma, de um outropapel. (04/11/2010)

Eduardo: É meu primeiro ano [comoprofessor efetivo na rede municipal] eeu estou aprendendo muito!(06/05/2011)

Cíntia: A gente vai começar o estágiona próxima semana. Mas a minhaturma será de crianças abaixo de 3anos, de acordo com a professora queeu escolhi. É bem difícil, entre 1 ano emeio e 2, então é bem limitado. Maseu posso tentar fazer alguma coisa.(26/08/2011)

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Contexto colaborativo Silvana: Você mandou o convite, euachei a ideia muito legal, e na realidadeé a primeira vez que eu participo deuma coisa assim, não conheço, não seicomo é, não sei como funciona nada.(02/09/2010).

Rosana: Eu lembrei de nossosencontros, na hora. A oportunidade detransformar aquilo, como a gente vemtrabalhando aqui! Mas não está sendoum jogo justo, na minha visão.(25/02/2011)

Rosana: Lamentei muito quando nãopude comparecer, devido ao meutrabalho na escola e o horário dosencontros. (Avaliação, 08/12/2011)

Indícios do letramento estatístico Erica: Será que foi fácil de diferenciarcastanho de castanho esverdeado? Porque é difícil para a criança pequena...castanho escuro, castanhoesverdeado. Será que ela fez algumacoisa? [sobre as cores apresentadaspelas crianças como cores dos olhosde suas mães]. (26/08/2011)

Mie: se tem seis pessoas, três já são50%. É preciso saber quantaspessoas. (09/09/2010)

Fonte: Transcrições dos encontros. Grifos nossos.

Ainda sobre o aprendizado do professor e as concepções apresentadas

por Cochran-Smith e Lytle (1999, p. 249), que impulsionam muitas vezes as

iniciativas de formação de professores, não quisemos caminhar em direção ao

que as autoras concebem como “conhecimento para a prática” e

“conhecimento em prática”, mas para o “conhecimento da prática”. No

conhecimento para a prática, segundo Cochran-Smith e Lytle (1999, p. 253),

parte-se do pressuposto de que o conhecimento formal e as teorias são

gerados pelos pesquisadores para que os professores usem para melhorar sua

prática, ou seja, “ensinar é, portanto entendido como um processo de aplicação

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de um conhecimento recebido em uma situação prática”. Os professores, de

acordo com essa concepção, não são geradores de conhecimento. A

concepção de conhecimento em prática considera que o conhecimento que os

professores precisam ter para ensinar bem está numa prática exemplar dos

professores mais experientes. Já o conhecimento da prática, de acordo com

Cochran-Smith e Lytle (1999, p. 274), “parte do pressuposto de que o ensino

que os professores devem ter para ensinar bem emana da investigação

sistemática do ensino, dos estudantes e do aprendizado, bem como da

matéria, do currículo e da escola”. Essas pesquisadoras também enfatizam a

importância da construção colaborativa do conhecimento. Ousamos afirmar

que nosso processo de desenvolvimento profissional, num contexto

colaborativo, pode ter influências do conhecimento para a prática e em prática,

mas procurou privilegiar o conhecimento da prática, acreditando que a

“investigação como postura” (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999) pode oferecer

oportunidade de desenvolvimento profissional aos participantes.

A ideia sobre “investigação como postura” tem como objetivo, de acordo

com as autoras, “perceber um pouco da natureza do quanto os que ensinam e

aprendem com o ensino, ao participar de uma investigação, são capazes de

interpretar e teorizar o que estão fazendo” (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999,

p. 291). Nesse sentido, temos uma concepção diferente de professor: o que

“aprende ao longo de sua via profissional, que não cabe distinção entre

novatos e peritos” (COCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999, p. 293).

Cochran-Smith e Lytle (1999) também apontam a fala e a escrita como

uma forma tornar visível o conhecimento tácito de professores e futuros

professores. Após apresentar alguns indícios do desenvolvimento profissional

dos participantes do Estatisticando em suas falas, passaremos a apresentar

outros indícios, a partir de suas escritas.

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CAPÍTULO 6

Análises Narrativas dos professores e futurosprofessores – potencializando o desenvolvimento

profissional

O registro da práticaé o fio que vai tecendo

a história de nosso processo.É através dele que ficamos

para os outros.(FREIRE, 2008, p. 55)

De acordo com Nacarato, Gomes e Grando (2008, p.18), “o professor é

apaixonado por contar seus ‘causos’, suas histórias de aulas”. Por isso, as

narrativas e análises narrativas foram bastante utilizadas no nosso grupo. São

exemplos deste fato os relatos narrativos “Adivinhe quem vem para ficar”

(JONSSON, 2002), “Crianças, máscaras, eleições municipais e gráficos... tudo

a ver” (FIGUEIREDO, 2002) e “De olho na Mamãe” (CAPP, 2002). Já nos

encontros, as narrativas mais presentes eram as orais. Sobre estas, Nacarato,

Gomes e Grando (2008, p.18) defendem que “falta-lhes a escrita dessas

histórias para que possam ser (re)pensadas, (com)partilhadas e possam

contribuir com a formação de novos professores”.

Fiorentini e Miorim (2001, p. 22) destacam que as narrativas

[...] dizem respeito a histórias que ocorrem num determinado tempo (devida estudantil ou profissional ou, mesmo, durante um curso ou umaaula) e lugar (na escola, na universidade, ou na sala de aula), sendo oprofessor o autor, o narrador e o protagonista principal da trama. Asnarrativas, portanto, representam um modo de produzir significados aexperiências passadas e presentes, tendo em vista a possibilidadefutura de novas experiências.

As narrativas também são apontadas por Nacarato, Gomes e Grando,

como potencializadoras do desenvolvimento profissional, e concordamos com

seu destaque como estratégia formativa, no grupo Estatisticando:

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As narrativas, por constituírem uma escrita de si e por revelar o modocomo nós, seres humanos, experienciamos o mundo, sãopotencializadoras de desenvolvimento profissional, além depossibilitarem o compartilhamento de nossas histórias e de nossaprática (NACARATO; GOMES; GRANDO, 2008, p. 18).

As narrativas escritas também são consideradas importantes para os

futuros professores, pois, de acordo com Alarcão (2003, p. 53), esse hábito, “se

adquirido na formação inicial, tem grande probabilidades de perdurar pela vida

profissional adentro”. E complementa que “ajudará a analisar a vida,

desdobrará o percurso profissional, revelará filosofias e padrões de actuação,

registrará aspectos conseguidos e aspectos a melhorar, constituirá um

manancial de reflexão profissional a partilhar com os colegas”.

Concordamos também com Nacarato (2013, p. 29) que é “de

fundamental importância que as narrativas sejam publicadas, para que outros

professores tenham acesso a elas”, pois “tais publicações constituem um

incentivo ao professor para registrar suas práticas e o colocam como

protagonista de seu currículo”.

Embora almejássemos que os participantes pudessem escrever e

compartilhar suas experiências, essa não foi uma exigência para a participação

no grupo e acreditamos que, se isso fosse apresentado de início, poderia

afastar os professores que não se sentiam capazes de produzir saberes a partir

da prática de suas salas de aula. Então, procurando incentivar a escrita, sem

exigi-la, esse processo ganhou força no segundo semestre de 2011, quando o

grupo já se reunia por mais de dois semestres. Também se prolongou para

além dos encontros do grupo, ocorrendo principalmente via e-mail. Assim como

apontado por Nacarato, Gomes e Grando (2008, p. 41), essas transformações

ocorreram de forma diferente para cada participante: “para alguns, elas são

mais rápidas e visíveis; para outros, ficam veladas e só se tornam visíveis pelo

processo de escrita; e para outros, são muito lentas”. Enfatizamos que isso foi

respeitado no nosso contexto colaborativo, assim como a opção de não

produzir uma narrativa escrita ou análise narrativa naquele momento.

Consideramos que os estudos realizados no contexto colaborativo do

Estatisticando incentivaram a investigação da prática pedagógica, inicialmente

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em momentos em que o destaque era para o ensino e a aprendizagem da

Estatística com estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental. Os

resultados, assim como acontece no Grupo de Sábado (GdS), foram

textualizados em forma de narrativas. De acordo com Carvalho e Fiorentini

(2013), essa modalidade de investigação, assim como no caso do GdS, se

aproxima mais de uma análise narrativa. Esses autores afirmam que as

“análises narrativas”

[...] expressam um conhecimento da prática, pois, embora geralmentetenham origem na prática, as situações foram problematizadas,analisadas e sistematizadas narrativamente, tendo como mediaçãoleituras dos campos acadêmico e profissional e as múltiplaspercepções e interpretações de parceiros críticos[...] (p.22, grifo dosautores).

Ainda sobre as textualizações narrativas que se aproximam de análises

narrativas, de acordo com Carvalho e Fiorentini (2013, p. 17, grifo nosso),

“mais que a conceitualização de um gênero textual, esta afirmação nos remete

a um processo”, complementando que nesse processo são gerados textos que

são “ouvidos/lidos/vistos”. Nesse contexto, pensando no processo vivenciado,

passaremos a chamar as textualizações narrativas produzidas pelos

participantes de “análises narrativas de situações de sala de aula”.

Consideramos então que, assim como acontece no Grupo de Sábado, esse

processo de produção ou essa dinâmica de produção “tem sido significativa

para cada autor, em relação à sua formação enquanto escritor, à

transformação de suas aulas e à sua constituição profissional” (FIORENTINI;

CARVALHO, 2013, p. 17).

Nesse sentido, foram produzidos onze textos, dos quais participei como

coautora, fazendo parceria com um dos participantes, buscando atuar como

parceira crítica: dez análises narrativas de situações de sala de aula e um

artigo, fruto de iniciação científica. Oito análises narrativas de situações de sala

de aula foram produzidas em parceria com dois participantes do grupo

Estatisticando, Mie e Eduardo, exclusivamente sobre a temática ali estudada; o

artigo foi escrito em parceria com Roseli, também com temática versando sobre

a Estatística, com destaque para o livro didático; e duas análises narrativas

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foram feitas em parceria com Rosana, contando também com a colaboração de

duas outras estudantes de Pedagogia, sobre temática que não era o foco

principal de nossos estudos, mas sempre almejando, como defende Kilpatrick

(1996, p. 118), o “professor como pesquisador”, mais do que simplesmente

sujeito da pesquisa. Importante mencionar, também, que os trabalhos

produzidos pelos integrantes do Estatisticando foram apresentados em eventos

da área de Educação e de Educação Matemática, como forma de discutir com

a comunidade acadêmica a prática de sala de aula e a do grupo. Quatro deles

foram publicados em periódicos, quatro nos anais dos eventos e outros dois

também nos anais dos eventos, mas na forma de e-book. Um constituiu um

capítulo de livro. Nossa produção, assim, tornou-se pública, como recomenda

Kilpatrick (1996, p.106-107): “pesquisa deve ser pública; ela deve ser

compartilhada”.

Apresentamos aqui os títulos das publicações e, mais adiante,

apontamentos a respeito de cada autor/participante, procurando revelar as

transformações dos professores e futuros professores, que, além de estudarem

e trabalharem, participavam dos encontros do grupo (o que também

demandava tempo extra para leituras e preparações) e ainda disponibilizavam

tempo para o processo de escrita.

Análises narrativas produzidas em parceria com Mie e Eduardo e

trabalho produzido em parceria com Roseli:

1) “Animais de Estimação: primeira experiência com a construção de

gráfico” (KATO60; CONTI, 2011). Trabalho apresentado e publicado

nos Anais do I Encontro de Educação Matemática nos Anos Iniciais

(EEMAI), realizado na UFSCar em 2011.

2) “Primeira experiência com a construção de gráfico: os animais de

estimação dos alunos do 1º. ano do Ensino Fundamental”

(YOKOMIZO; CONTI; CARVALHO, 2012). Trabalho publicado em um

periódico.

60 A partir de 2012, Kato passou a utilizar o sobrenome de casada, passando a ser Yokomizo.

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3) “O Tratamento da Informação presente em livro didático de

Matemática do 5.º ano do Ensino Fundamental” (PEREIRA, R. F.;

CONTI, 2011). Trabalho publicado em periódico.

4) “O trabalho com estatística no 3° ano do Ensino Fundamental: a

construção do gráfico de aniversariantes” (PEREIRA, E. L.; CONTI,

2011). Trabalho apresentado e publicado nos Anais do I Encontro de

Educação Matemática nos Anos Iniciais (EEMAI), realizado na

UFSCar em 2011.

5) “Auxiliando o desenvolvimento do pensamento estatístico através de

uma sequência de ensino: matéria escolar preferida” (CONTI;

PEREIRA, 2012a). Trabalho publicado em periódico.

6) “Interpretando tabelas e construindo gráficos com alunos do 3.º ano

do Ensino Fundamental” (PEREIRA; CONTI, 2012). Trabalho

apresentado e publicado no e-book dos Anais do XVI Encontro

Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE), realizado na

Unicamp em 2012.

7) “Auxiliando o desenvolvimento do pensamento estatístico de alunos

do 4º ano do Ensino Fundamental: construindo o gráfico dos

aniversariantes” (CONTI; PEREIRA, 2012b). Trabalho apresentado e

publicado nos Anais do I Seminário de Escritas e Leituras em

Educação Matemática (SELEM), realizado na Universidade São

Francisco em 2012.

8) “Comemorando aniversários e trabalhando com Estatística no 3.º ano

do Ensino Fundamental” (PEREIRA; CONTI; CARVALHO, 2013).

Publicado na forma de capítulo de livro.

9) “Auxiliando alunos do 4.º ano do Ensino Fundamental no

desenvolvimento do pensamento estatístico” (CONTI; PEREIRA;

CARVALHO; CARVALHO, 2013). Trabalho publicado no e-book das

“Actas de las Jornadas Virtuales em Didáctica de la Estadística,

Probabilidad y Combinatória” promovidas pelo Departamento de

Didáctica de la Matemática de la Universidade de Granada em 2012.

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Análises narrativas produzidas em parceria com Rosana, contando com

a participação de outras estudantes de Pedagogia:

1) “Experiência de inclusão na Educação Infantil: criando um recurso

para ensinar Matemática” (SILVA; GUIMARÃES; DANTAS; CONTI,

2011). Trabalho apresentado e publicado nos Anais do I Encontro de

Educação Matemática nos Anos Iniciais (EEMAI), realizado na

UFSCar em 2011.

2) “Elaborando uma história infantil para ensinar Matemática:

experiências de inclusão na Educação Infantil” (SILVA; GUIMARÃES;

DANTAS; CONTI, 2012). Trabalho publicado em periódico.

Acreditamos que a leitura de narrativas e análises narrativas de outros

professores nos encontros possa ter motivado e potencializado as reflexões

sobre as práticas docentes que são narradas nos textos produzidos.

Concordamos com Nacarato (2013, p. 29) que os espaços compartilhados

como o grupo são mais eficientes na promoção de aprendizagens, pois “neles

os professores podem compartilhar práticas e construir colaborativamente

conhecimentos da prática docente, assumindo-se como protagonistas do

desenvolvimento pessoal e curricular”.

Embora haja indícios da influência do grupo Estatisticando nas

produções escritas, infelizmente não foi possível a participação do grupo como

um todo, a retomada dessas produções com a participação dos integrantes,

para discussões, aprofundamentos e reescritas. Algumas delas também foram

escritas após o encerramento dos encontros.

6.1 As análises narrativas de Mie

Dentre as análises narrativas de situações de sala de aula de Mie,

escolhemos detalhar sua primeira experiência com a construção de gráfico em

sala de aula, na qual atuou como professora, embora também apresentemos

sua segunda análise narrativa. Avaliamos essas análises narrativas como

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interessantes para serem exploradas, pois Mie se encontrava em fase de

transição – concluindo sua formação inicial e começando na vida profissional

propriamente dita –, numa etapa em que já poderia decidir o que propor às

crianças. Mie estava mais confiante em trabalhar com uma temática

relacionada à Estatística devido à qualidade de sua participação no grupo,

desde o início. Além disso, sua proposta de realização de uma situação

pedagógica com crianças surgiu depois da apresentação e da discussão do

trabalho realizado por Eduardo com crianças do 3.º ano do Ensino

Fundamental. No momento em que assistíamos ao vídeo produzido durante a

realização da situação pedagógica de Eduardo com suas crianças, com o

objetivo de comemorar aniversários, propus aos participantes a realização de

outros vídeos e Mie, ainda timidamente, informou que realizaria estágio com

crianças do 1.º ano do Ensino Fundamental e também mostrou preocupação

com o número de crianças (nove). Sua postura aparentemente mudou depois

de o grupo propor ajuda no planejamento da situação pedagógica, conforme se

verifica na transcrição de trecho do registro em vídeo feito em junho de 2011:

Keli: A Mie pode conversar com a professora, se ela disser “ok”...

Mie: O número de alunos é só nove. Nove alunos!

Eduardo: Ai, que inveja!

Keli: Tudo bem! A gente pode ajudar a Mie a planejar o que ela vailevar!

Mie: Oba! (festejando)

Keli: O que podemos fazer com nove crianças?

Rosana: É verdade!

Keli: A gente planeja e a pessoa vai mais segura para lá. Não precisacair de paraquedas... Mie, se você se sentir à vontade, você podeanotar tudo o que vai fazer. O que vai perguntar... E aí você vaimarcando... E aí você já chega lá mais...

Rosana: Preparada!

Keli: Preparada! (Arquivo de vídeo da pesquisadora. Intervalo detempo 0:41:00 a 0:41:57).

Mie, motivada pelas discussões, pelas apresentações de trabalhos de

seus colegas e apoiada pelo grupo, se sentiu mais segura para elaborar e

propor uma situação pedagógica para a turma do 1.º ano do Ensino

Fundamental (crianças de 6 anos) da escola Instituto Educacional Portal do

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Saber, de Atibaia (SP), onde realizava seu estágio obrigatório, em 2011. O

tempo de participação no grupo contribuiu para essa segurança, pois, nessa

época, o grupo já se reunia há aproximadamente um ano. Consideramos que a

disponibilidade, a segurança e a motivação para realizar a situação pedagógica

com as crianças são indícios da contribuição do grupo para o desenvolvimento

profissional de Mie como conhecimento e como desenvolvimento pessoal.

Para o planejamento, tomamos como documento básico de referência os

Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN (BRASIL, 1997), visto que

apresentam o bloco de conteúdo chamado “Tratamento da Informação”, que

contempla o estudo da Estatística.

Inicialmente, Mie colocou algumas ideias no papel e enviou por correio

eletrônico ao grupo. Tratava-se ainda de ideias gerais, sem a preocupação de

utilizar termos adequados e precisos (Quadro 15), que ela nomeou “Plano de

Aula”:

Quadro 15: Trecho da primeira versão do plano de aula apresentado por Mie.PLANO DE AULATEMA: gráfico - quantidade de animais de estimaçãoSÉRIE: 1.º ano do Ensino FundamentalCONTEÚDO: contar números, fazer gráfico, comparar os númerosTEMPO ESTIMADO: 2 aulas

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Depois da discussão no grupo e de mais um envio, via e-mail, para a

pesquisadora, o plano foi reelaborado, apresentando mudanças com relação à

nomeação do tipo de gráfico a ser trabalhado, com a expressão “construção do

gráfico de colunas” e da utilização de termos como “quantificação” e

“comparação de frequências”, em substituição às expressões “contar números”

e “comparar números”, respectivamente (Quadro 16).

Quadro 16: Trecho da versão final do plano de aula apresentado por Mie.

PLANO DE AULA

TEMA: Construção de gráfico de barras - quantidade e tipos de animais de estimaçãoSÉRIE: 1.º ano de Ensino FundamentalCONTEÚDO: quantificação, construção do gráfico, comparação das frequênciasTEMPO ESTIMADO: 2 aulas

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OBJETIVOS:1) Levar o estudante a conhecer um gráfico de colunas, bem como saber interpretá-lo,contar e comparar números utilizando o gráfico;2) Integração com Língua Portuguesa, bastante enfatizada nos anos iniciais do EnsinoFundamental;3) Aprender Inglês;4) Aprender elementos de outra cultura, a japonesa.

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Mais uma vez motivada pelo grupo, que já havia incentivado a realização

da situação pedagógica com as crianças, bem como sua filmagem, Mie

resolveu escrever uma análise narrativa sobre sua experiência. Consideramos

a produção, de acordo com Freitas e Fiorentini (2007, p. 63), sob duas

perspectivas: “como modo de refletir, relatar e representar a experiência,

produzindo sentido ao que somos, fazemos, pensamos, sentimos e dizemos” e

também “como modo de estudar/investigar a experiência, isto é, como um

modo especial de interpretar e compreender a experiência humana, levando

em consideração a perspectiva e interpretação de seus participantes”. De

acordo com essas perspectivas, para Mie, a escrita foi o modo de produzir

sentido à experiência e para nós, como pesquisadoras, o modo de investigar a

experiência.

A primeira versão da análise narrativa de Mie foi enviada via e-mail

unicamente para mim (Quadro 17), pois consideramos que nesse momento, ela

se sentia mais à vontade com isso do que em compartilhar com o grupo. Seu e-

mail revela ainda indícios de insegurança em relação ao que se esperava dela,

presente na expressão “eu acho que preciso reescrever”. Esse pedido de ajuda

traduz o quanto Mie considerava importante, para sua atividade profissional de

professora dos anos iniciais do Ensino Fundamental, refletir sobre sua prática

de sala de aula.

Quadro 17: Apresentação da primeira proposta de escrita de Mie

Estou mandando o relatório de aula sobre a construção de gráfico no Ensino Fundamental.Eu acho que preciso reescrever, mas quero mostrar o meu relatório.É melhor colocar mais comentário? Talvez.Então, até mais!Muito obrigada como sempre!

Primeiro e-mail enviado por Mie à pesquisadora em 09/09/2011.Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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A proposta anexada ao e-mail por Mie recebeu o nome de “Relatório de

aula” (Quadro 18). O texto ainda apresentava indícios da pouca vivência com

esse tipo de escrita narrativa, uma vez que ela enumerou os acontecimentos

vividos em sala de aula, como se fossem tópicos de um relatório. Um dos

objetivos do grupo e das propostas de desenvolvimento profissional era auxiliá-

la nesse desenvolvimento.

Quadro 18: Primeiro arquivo com a proposta de escrita de Mie

Relatório de Aula

1ª ETAPA:1-1 Apresentei o tema de hoje dizendo “Hoje, vamos aprender o gráfico.” Todos os alunospareceram não estar entendendo.1-2 Perguntei para as crianças, [Vocês têm animais em casa?] [Qual animal vocês têm?] Elasresponderam [cachorro, gato, peixe, passarinho e tartaruga].Pedi para levantar as mãos e perguntei [Quem tem cachorro?][Quem tem gato?][Quem tempássaro?][Quem tem peixe?].

Primeiro arquivo enviado por Mie à pesquisadora – 09/09/2011Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Essa proposta foi sendo discutida e reelaborada, utilizando-se,

principalmente, o meio eletrônico, entre nós duas – Mie e eu –, de modo a

enriquecer a análise narrativa e, ao mesmo tempo, contribuir para a reflexão

crítica sobre os acontecimentos vividos em sala de aula, almejando, como

defende Kilpatrick (1996, p. 118), o “professor como pesquisador”, mais do que

sujeito da pesquisa. Com isso, a primeira análise narrativa intitulada “Animais

de estimação: primeira experiência com a construção de gráfico” (KATO;

CONTI, 2011) foi apresentada no I Encontro de Matemática nos Anos Iniciais (I

EEMAI – UFSCar) e publicada nos anais do evento.

Essa primeira análise narrativa serviu de embrião para sua reescrita,

para novas reflexões a partir das experiências de realizar a situação

pedagógica com as crianças e da sua escrita.

No Quadro 19 encontra-se trecho da segunda análise narrativa

publicada, em que podemos perceber avanços tanto da escrita em si, quanto

da reflexão. Podemos citar, como exemplo, a informação presente nas duas

produções – “hoje vamos aprender a fazer um gráfico” e “os alunos pareceram

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não estar entendendo” – que foi ampliada na reescrita, com a interpretação

“talvez dando indícios de que não haviam tido experiências com esse conteúdo

ou, se tiveram, o termo não foi apresentado ou tornado significativo”.

Quadro 19: Trecho da análise narrativa publicada

1ª etapa: começando a aulaMie, que já conhecia as oito crianças da turma, que estava completa naquele dia, começou aaula apresentando o trabalho com gráficos, dizendo: “Hoje vamos aprender a fazer umgráfico”. Os alunos pareceram não estar entendendo muito bem do que se tratava, talvezdando indícios de que não haviam tido experiências com esse conteúdo ou, se tiveram, otermo não foi apresentado ou tornado significativo.Para dar continuidade à atividade, foram feitas as seguintes perguntas, relacionadas ao tema“animais de estimação”, escolhido por Mie, por julgar de interesse dos alunos:- Vocês têm animais em casa?- Que animal vocês têm?As respostas vieram todas de uma vez: “cachorro”, “gato”, “peixe”, “passarinho” e “tartaruga”.Para organizar a participação das crianças, pedimos que levantassem as mãos quem possuíacada animal mencionado.Fonte: Yokomizo, Conti e Carvalho (2012).

Do ponto de vista do tempo de desenvolvimento dessa situação

pedagógica de construção de gráfico de barras com as crianças,

Essa proposta durou apenas uma aula e até se estendeu um poucomais que o disponibilizado pela professora, mas foi muito proveitosa,os alunos mostraram-se motivados e envolvidos, comentando quegostaram da proposta, que a atividade “foi legal”, e até mesmoantecipando resultados.Acreditamos que pudemos proporcionar um bom contato inicial com aEstatística. Os alunos foram incentivados a observar, levantarhipóteses, levantar os dados, organizá-los (tratando-os) e realizar aleitura e interpretação dos mesmos, organizados no gráfico e natabela. Podemos considerar que a escolha do tema “animais deestimação” também foi importante, buscando partir do interesse e da“vida real”, incentivando os alunos a observarem os fenômenos queocorrem à sua volta (YOKOMIZO; CONTI; CARVALHO, 2012).

Quanto ao desenvolvimento profissional de Mie, de acordo com Passos,

Oliveira e Gama (2009, p. 148), percebemos, pelo percurso de escrita da

análise narrativa, sinais de “processos de tomada de consciência de seus

saberes, em uma perspectiva contínua que compreende desde sua trajetória

estudantil até sua fase de busca de autonomia profissional” e sua evolução,

assim como de outros professores, participantes do grupo, quando “assumem a

responsabilidade de seu próprio desenvolvimento profissional”. Podemos

encontrar marcas dessa autonomia e confiança em e-mail enviado por Mie às

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pesquisadoras (Quadro 20), praticamente um ano depois de essa experiência

ter ocorrido:

Quadro 20: Último e-mail enviado por Mie às pesquisadoras

Gostaria de agradecer muito por esta oportunidade e orientações de vocês.A primeira experiência de construir gráfico com as crianças me levou a primeira experiência deassinar a autorização de publicação!Que boa experiência!

E-mail enviado por Mie à pesquisadora 18/05/2012

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

O professor, nesse processo, segundo Fiorentini (2009, p. 253), “adquire

autonomia, torna-se sujeito de sua profissão” e, com isso, “habilita-se a

participar do debate público e a desenvolver projetos e grupos de estudo dentro

e fora da escola, produzindo inovações curriculares a partir da prática escolar”,

ou seja, torna-se mais competente, real “fazedor de estatística”.

6.2 O trabalho de Roseli

Embora tenhamos enfatizado o potencial da narrativa e da análise

narrativa, Roseli optou por desenvolver uma pesquisa a respeito de um livro

didático adotado pela rede municipal de Atibaia. Essa pesquisa fez parte da

sua Iniciação Científica, na mesma instituição de ensino superior que cedeu o

espaço para a realização dos encontros do grupo Estatisticando. Embora ela

tivesse apoio do grupo para a realização de situações pedagógicas na escola,

provavelmente não encontrou espaço suficiente ali, naquele momento para a

realização de uma experiência com crianças, durante seu estágio. Outro ponto

que também merece ser mencionado é que Roseli se sentia mais segura em

caminhar nesse sentido, ou seja, trabalhar com documentação (livro didático) e

produzir um texto, ao invés de uma narrativa ou análise narrativa. Embora a

prática de sala de aula estivesse destacada naquele momento no grupo e

houvesse o incentivo para sua escrita, ela não era a única produção aceita.

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Inicialmente nossa proposta na iniciação científica era analisar o que

poderia ser desenvolvido com crianças do 1.º ano do Ensino Fundamental, no

que tange à Estatística, a partir do uso do livro didático adotado pela escola em

que Roseli realizava suas atividades de estágio. Devido às dificuldades para a

disponibilização do livro utilizado pelos professores do 1.º ano, nosso objetivo

teve que ser revisto, passando a ter como foco o livro didático do 5.º ano, esse,

sim, disponibilizado pelos professores que atuavam com essas turmas. Nossos

objetivos passaram, então, a ter a delimitação das questões de investigação

centradas na Estatística e na formação do estudante (Quadro 21):

Quadro 21: Primeiro Relatório de Iniciação Científica de Roseli

ObjetivosO objetivo desta iniciação científica é analisar o Tratamento da Informação presente em

um livro didático de Matemática do 5.º ano do Ensino Fundamental como forma de ampliar oconhecimento sobre a temática e responder à questão: Que conteúdos são propostos pelolivro didático do 5.º ano do Ensino Fundamental com relação à Estatística? Esses conteúdospropiciam uma formação adequada aos estudantes?Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Grande parte de nossas discussões (Roseli e Keli) se deram de forma

presencial, trabalhando em arquivos impressos, pois Roseli preferia que

ocorressem dessa forma. A análise do livro Matemática do Cotidiano & suas

Conexões (BIGODE; GIMENEZ, 2008), destinado ao 5.º ano do Ensino

Fundamental, adotado pelos professores da escola onde foram realizadas as

atividades de estágio, se deu à luz do que é defendido pelos PCN (BRASIL,

1997) e pelo Guia de livros didáticos (BRASIL, 2009). Como resultados

preliminares, Roseli apresentou a seguinte redação em seu segundo relatório.

Quadro 22: Segundo relatório de Iniciação Científica de Roseli

Resultados preliminaresAcredito que, com os dados, poderemos afirmar se os livros têm contribuído para a

mudança do quadro lamentável da população brasileira com relação à compreensão deinformações contendo as temáticas.Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Embora ainda sem finalização, seus resultados preliminares puderam ser

apresentados no 11.º Congresso Nacional de Iniciação Científica (CONIC), em

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201161, na forma de pôster (Figura 44). Na elaboração do pôster, Roseli usou

as fotos com o apoio do grupo no encontro de 21/10/11. Foram usadas também

imagens do livro didático analisado.

61 Esse evento foi realizado nos dias 18 e 19 de novembro de 2011, pelo Sindicato dasEntidades Mantenedoras de Ensino Superior (SEMESP), em parceria com a UniversidadeSanta Cecília (Unisanta), em Santos-SP.

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Figura 44: Pôster apresentado por Roseli em Congresso de Iniciação Científica

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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As fotos do evento e os resultados de sua apresentação motivaram Roseli

a dar continuidade à escrita, e o que tinha um caráter mais de relatório passou

por um movimento de reescrita e foi submetido à revista Momentum e aceito

para publicação62. As análises, que eram preliminares e tinham apenas poucas

linhas, passaram a ser bem mais abrangentes e aprofundadas:

Quadro 23: Resultados da IC de Roseli, publicada

Resultados da análiseBuscando retomar a questão proposta: “Que conteúdos são propostos pelos livros

didáticos do 5.º ano do Ensino Fundamental com relação à Estatística? Esses conteúdospropiciam uma formação adequada?”, depois da análise do livro didático indicado ao 5.º Anodo Ensino Fundamental, é possível levantar alguns apontamentos:

Do ponto de vista do documento PCN, é clara a indicação da temática “Tratamento daInformação” e dos conteúdos “Estatística”, “Probabilidade” e “Combinatória”. Do ponto de vistado Guia de livros didáticos PNLD 2010, é claro o critério de aprovação, a presença dos quartoblocos de conteúdos e entre eles o Tratamento da Informação. Ainda do ponto de vista doGuia, podemos constatar a proporção relativamente menor de capítulos ou temas relativos aoTratamento da Informação em comparação com os outros blocos.

Já do ponto de vista do livro didático, este apresenta sete páginas destinadasexplicitamente à temática, mas não contempla a temática Combinatória, e essa quantidade depáginas sobre a temática representa algo em torno de 5% do total de páginas do livro, mastambém são apresentadas tabelas ao longo do mesmo.

São propostas atividades de leitura e interpretação de dados, ainda que de formaincipiente, mas não identificamos atividades de coleta e organização de dados, nem oincentivo da escrita de suas conclusões ou produção de texto.

Acredito que, com os dados apresentados, podemos afirmar que o livro didático, comoauxiliar no planejamento e na gestão das aulas, tem contribuído pouco para a mudança doquadro lamentável, apresentado por Fonseca (2004), que aponta a situação da populaçãobrasileira em relação à compreensão e à utilização do Tratamento da Informação:

A indicação de que apenas 21% da população brasileira consegue compreenderinformações a partir de gráfico e tabelas, frequentemente estampados nos veículos decomunicação, é absolutamente aflitiva, na medida em que sugere que a maior parte dosbrasileiros encontra-se privada de uma participação efetiva na vida social, por nãoacessar dados e relações que podem ser importantes na avaliação de situações e natomada de decisões (FONSECA, 2004, p. 23).

Como já foi mencionado, baseado no Guia de livros didáticos, que o livro didático é umrecurso importante, mas não único no processo, mesmo assim, poderia trazer mais subsídiospara a melhoria da prática dos professores, pois, da forma com que são apresentados, osconteúdos ainda não propiciam uma formação adequada.

Fonte: Pereira, R. F. e Conti (2011, p. 132-133)

Infelizmente constatamos que, embora atendendo o Programa Nacional

do Livro Didático (PNLD) (BRASIL, 2009), o livro analisado tem contribuído

pouco para a formação estatística do estudante, como vínhamos estudando no

62 Revista técnico-científica das Faculdades Atibaia.

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grupo. Mais uma vez, o trabalho recai inteiramente sobre o professor, que deve

estar preparado para produzir seu próprio material e desenvolver situações

pedagógicas que possam contribuir com a formação de suas crianças na

perspectiva do letramento estatístico.

6.3 As análises narrativas de Eduardo

Eduardo escreveu, desde sua participação no grupo, seis análises

narrativas, quatro delas, frutos de seu trabalho com crianças do 3.º ano e duas,

resultantes de seu trabalho com a turma do 4.º ano, ambos do Ensino

Fundamental. Novamente de acordo com Freitas e Fiorentini (2007), as

produções tiveram duas perspectivas: para Eduardo, como modo de produzir

sentido à experiência; e para nós, como pesquisadoras, como modo de

investigar a experiência.

Começamos por apresentar sua primeira análise narrativa (PEREIRA, E.

L.; CONTI, 2011), que surgiu a partir de uma situação pedagógica desenvolvida

com suas crianças do 3.º ano do Ensino Fundamental, filmada e

posteriormente assistida e discutida no Estatisticando. A ideia da escrita surgiu

durante tais discussões e foi reforçada pelo incentivo à participação de

Eduardo no I Encontro de Educação Matemática nos Anos Iniciais (I EEMAI),

na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)63.

Inicialmente, podemos destacar a insegurança no processo de escrita, a

partir dos e-mails trocados entre mim e Eduardo:

Quadro 24: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 06/10/2011

Boa noite Keli!!!

Estou com um sério problema: já tenho mais de uma página escrita, e ainda não conseguifalar de como foi a aula, pois contei um pouco de mim, da minha experiência e justifiquei aaula utilizando os Parâmetros.Por favor dê uma olhada. Será que não pode ser mais de uma página?Ah, tb já fucei o word mas não acho onde acrescentar notas de rodapé. Depois vc poderia memostrar?

Grande abraço

63 18 e 19 de novembro de 2011.

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Eduardo

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Sabemos que escrever não é processo simples, principalmente para o

professor com uma rotina sobrecarregada de trabalho. Além disso, para revelar

suas dificuldades e inseguranças, é necessária uma relação de colaboração,

além de vínculos de amizade e companheirismo. É nítida, na escrita de

Eduardo, a influência das narrativas que discutimos no grupo, como, por

exemplo, a de Jonsson (2002), em que a autora começa se apresentando e

falando de sua experiência (primeiro parágrafo), apresenta sua turma (segundo

parágrafo) e suas crenças em relação ao seu papel de educadora (terceiro

parágrafo).

Espelhando-se nessa narrativa, possivelmente devido às experiências

positivas decorrentes dela do ponto de vista do que foi vivido pela autora, do

sucesso desta na escrita e também na situação idealizada pelos participantes,

Eduardo também se apresenta e fala de sua experiência, da escola, de sua

turma e de suas crenças (Quadro 25). Infelizmente, isso revela indícios da

ausência de práticas dessa natureza em sua formação, ou seja, ausência de

oportunidades de lidar com a escrita por meio de narrativas ou análises

narrativas como um modo de “produzir significados às experiências passadas e

presentes, tendo em vista a possibilidade futura de novas experiências”

(FIORENTINI; MIORIM, 2001, p. 22). Mas isso tem sido possibilitado agora,

com a participação no grupo Estatisticando.

Quadro 25: Apresentação da primeira proposta de análise narrativa por Eduardo

O TRABALHO COM ESTATÍSTICA NO 3° ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL: ACONSTRUÇÃO DO GRÁFICO DE ANIVERSARIANTES

Keli Cristina ContiEduardo de Lucas Pereira

Meu nome é Eduardo e sou professor efetivo da Rede Municipal de Atibaia, uma cidadeótima para se viver e que fica localizada no interior do estado de São Paulo. Apesar de jáatuar na educação desde os meus 16 anos, como voluntário e estagiário, este é o meuprimeiro ano de docência. Atuo em uma escola localizada na área central da cidade, ondetrabalho com uma sala de terceiro ano do Ensino Fundamental, composta por 35 alunosque estão me ensinando muito, fazendo com que eu precise estar em constanteaprendizado e estudo para rever e conhecer novas metodologias para ensiná-los. Alémdisso, posso dizer que eles estão tornando minha vida mais dinâmica e feliz, deixandograndes marcas e lembranças, e assim espero também estar fazendo com eles.

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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Mais uma vez, no processo de escrita, é evidenciado, em e-mail trocado

entre mim e Eduardo (Quadro 26), que é necessário dar voz ao professor,

incentivá-lo na escrita, mas também construir uma relação colaborativa que

possibilite a orientação, de forma a auxiliá-lo a adentrar nesse caminho novo e

a acreditar que é possível segui-lo. Exemplos desse fato são as expressões

presentes nas mensagens “estou precisando de uma orientação” e “se vc

pudesse me fornecer algumas questões”.

Quadro 26: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 14/10/2011 (I)

Boa noite Keli!!!

Segue o que fiz até o momento, mas estou precisando de uma orientação no sentido daênfase que poderia dar em alguns momentos. Acredito que se vc pudesse me forneceralgumas questões a serem contempladas no artigo me ajudaria, pois acho que estouescrevendo, escrevendo mas sem conteúdo interessante.

Abraço,Eduardo

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Outro ponto importante se revela nesse e-mail (Quadro 26): a

insegurança de Eduardo na sua capacidade de produzir conhecimento, de

considerar sua sala de aula um local para investigação, segundo Cochran-

Smith e Lytle (1999). Essa insegurança está expressa em “acho que estou

escrevendo, escrevendo, mas sem conteúdo interessante”, considerando,

possivelmente, que não vá produzir conhecimento e ainda iniciando o percurso

de escrita, leitura, reescrita, releitura, reescrita...

Aos poucos esse processo de releitura e reescrita vai aparecendo, com

ajuda do outro (parceiro na leitura e na escrita), assim como o aumento na

segurança para contar a história de sua aula, de forma reflexiva (Quadro 27).

Quadro 27: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 14/10/2011(II)

Boa noite Keli! Tudo bem?

Segue em anexo o que consegui produzir do artigo. Graças às suas orientações, já conseguiescrever bem mais. Muito obrigado!!!Gostaria, por gentileza, que você verificasse alguns aspectos:

- Fucei no word, mas não consegui colocar as duas notas de rodapé para os nossos nomes;

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- Não sei se consegui ligar bem o artigo com o texto que você enviou, e se fiz a referênciacorreta no texto;- Gostaria de umas sugestões de que aspectos poderia abordar nas conclusões.

Muito grato!!!

Grande abraço,Eduardo

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

Nesse trecho do e-mail trocado entre mim e Eduardo, revelam-se

dificuldades em lidar com algumas questões tecnológicas do uso de

computador e também com questões técnicas da redação, e a vontade de se

aprimorar nesse sentido.

Ao longo da escrita também pudemos perceber como vai se

transformando e refletindo a experiência vivida, movimento que se evidencia no

confronto das versões enviadas da primeira análise narrativa (Quadro 28).

A versão final, que recebeu o acréscimo de alguns trechos, evidencia as

reflexões, tentando dar sentido à experiência, e a lapidação de trechos no

decorrer da escrita e da reescrita. Por exemplo, nestes destaques: “até porque

já haviam sido trabalhadas atividades semelhantes sugeridas pelo livro

didático”, “neste momento, algumas questões interessantes foram tratadas com

relação à organização dos dados e à estética exigida no trabalho com

estatística”, e “chegou-se rapidamente ao entendimento de que...”. Essas

reflexões foram sendo ampliadas no processo de escrita, leitura, reescrita,

releitura.

Quadro 28: Movimento de escrita e reescrita da primeira análise narrativa de Eduardo

Versão preliminar enviada à pesquisadora Versão final enviada à pesquisadora

Para iniciar a atividade, colei a folha depapel pardo na lousa e questionei osalunos sobre o que eles achavam queiríamos fazer. Surgiu a ideia de mural equadro, mas não demorou para quedissessem que se tratava da construçãode um gráfico.

Para iniciar a atividade, colei a folha depapel pardo na lousa e questionei osalunos sobre o que eles viam desenhadono papel e o que achavam que iríamosfazer. De imediato disseram que viamduas linhas desenhadas, surgindo a ideiade mural e quadro, mas não demorou paraque dissessem que se tratava daconstrução de um gráfico, até porque jáhaviam sido trabalhadas atividadessemelhantes sugeridas pelo livro didático.

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Após este questionamento, entreguei umquadrado feito com o color set a cadaaluno, solicitando que escrevessem seunome e o dia em que faziam aniversário.Surgiu o questionamento do porque nãodeveriam colocar o mês e o ano. Sobre oano, chegamos à conclusão de que nãoera necessário, pois não se tratava desaber a data de nascimento; à respeito domês, pedi para que aguardassem paravermos se realmente seria necessáriocolocarmos esta informação.

Foi neste momento que anunciei queiríamos construir um gráfico deaniversariantes da sala. Diante disto,entreguei um quadrado a cada aluno,solicitando que escrevessem seu nome eo dia em que faziam aniversário. Surgiu oquestionamento do porque não deveriamcolocar o mês e o ano. Sobre o ano,chegamos à conclusão de que não eranecessário, pois não se tratava de saber adata de nascimento; a respeito do mês,pedi para que aguardassem para vermosse realmente seria necessário colocarmosesta informação.

Depois que todos já haviam escrito,construí com os alunos o eixo y,relembrando os meses do ano que jáhavíamos estudado. A partir de então, elescompreenderam o motivo de não termoscolocado o mês no papel quepreencheram.

Depois que todos já haviam escritoconstruí com os alunos o eixo x,relembrando os meses do ano que jáhavíamos estudado, considerando querepresentamos cada um deles com ainicial de seus nomes. A partir de então,eles compreenderam o motivo de nãotermos colocado o mês no papel quepreencheram. Como se tratava daconstrução dinâmica do gráfico com osalunos, chamei cada um para colar seuquadrado no mês que fazia aniversário(Figura 2). Neste momento, algumasquestões interessantes foram tratadascom relação à organização dos dados e àestética exigida no trabalho comestatística, como quem deveria colarprimeiro em cada mês e como poderíamosfazer quando tivéssemos duas criançasque faziam aniversário no mesmo dia. Asrespostas não demoraram a surgir: para aprimeira questão, prontamenteentenderam que a coluna de cada mêsdeveria ser confeccionada em ordemcrescente de dia de aniversário; sobre asegunda, chegou-se rapidamente aoentendimento de que, quando tivéssemosduas pessoas que fizessem aniversário nomesmo dia, deveríamos levar em conta aordem alfabética dos nomes (acredito queisto surgiu rápido pois estávamos, naépoca, trabalhando este conteúdo emLíngua Portuguesa).

Fonte: Arquivo da pesquisadora. Grifos nossos.

Essa versão final da análise narrativa foi publicada nos anais do I EEMAI

e transformou-se num embrião para a escrita da análise narrativa

“Comemorando aniversários e trabalhando com Estatística no 3.º ano do

Ensino Fundamental” (PEREIRA; CONTI; CARVALHO, 2013), publicada no

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livro Discussões sobre o ensino e a aprendizagem da Probabilidade e da

Estatística na Escola Básica (COUTINHO, 2013).

Eduardo continuou o trabalho com sua turma do 3.º ano do Ensino

Fundamental, possivelmente motivado pelos resultados encontrados e pelo

apoio do grupo, embora seu projeto não passasse pela discussão no grupo. Ele

adotou a prática do registro (fotográfico, do material produzido pelas crianças e

por ele próprio), então pudemos produzir uma nova análise narrativa, com o

objetivo de compartilhar com nossos pares no 18.º Congresso de Leitura do

Brasil (COLE)64.

Em e-mail enviado a mim (Quadro 29), Eduardo fala da importância de

experiências anteriores com a escrita, principalmente no trecho “não escrevi

com tantos detalhes, procurei ser mais objetivo”, faz sua própria avaliação do

desempenho de sua turma: “aquelas dúvidas do primeiro gráfico não

apareceram mais, foi bem melhor a compreensão dos alunos na construção

deste gráfico” e avalia o trabalho desenvolvido no grupo Estatisticando: “Quer

dizer que o trabalho com estatística está dando certo, valeu a pena!”.

Quadro 29: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 20/02/2012.

Boa noite Keli! Tudo bem?

Segue, em anexo, o artigo com o desenvolvimento da atividade. Parabéns pela ideia deescrevermos sobre a atividade como uma sequência de ensino!!! Adorei!!! Isso nem haviapassado pela minha cabeça.Não escrevi com tantos detalhes, procurei ser mais objetivo. Não coloquei tantas informaçõescomo no artigo da UFSCAR, pois, como já estávamos no final do ano, aquelas dúvidas doprimeiro gráfico não apareceram mais, foi bem melhor a compreensão dos alunos naconstrução deste gráfico. Estava pensando sobre isso... bacana, né? Quer dizer que otrabalho com estatística está dando certo, valeu a pena!Caso queira que eu complete melhor alguma informação é só pedir.

Fico no aguardo das próximas parcerias.

Grande abraço,Eduardo

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

64 Evento realizado de 16 a 20 de julho de 2012 na Unicamp – Campinas. O evento já tinhasido divulgado no grupo no início de 2011, mas não se realizou na ocasião, e foi novamentedivulgado no início de 2012, na ocasião do anúncio oficial do evento pela internet.

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A análise narrativa, intitulada “Auxiliando o desenvolvimento do

pensamento estatístico através de uma sequência de ensino: matéria escolar

preferida” (CONTI; PEREIRA, 2012a), foi apresentada no evento e selecionada

para ser publicada. A situação pedagógica ali descrita foi realizada em

08/12/2011, com a mesma turma que participou da construção do gráfico de

aniversariantes, ou seja, estudantes do 3.º ano do Ensino Fundamental, que

tiveram sua atuação registrada em vídeo e posteriormente discutida no grupo.

Selecionamos um dos registros fotográficos do trabalho em sala de aula

(Figura 45), por considerarmos um reflexo do que vínhamos discutindo no

Estatisticando, ou seja, os estudantes são protagonistas de seu processo de

aprendizagem, tendo oportunidades de coletar dados, discutir como organizá-

los e colocar em prática a organização deles, além de discutir os resultados.

Figura 45: Participação das crianças na construção do gráfico

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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A análise narrativa expõe uma escrita que ampliou a reflexão sobre a

experiência vivenciada e revela a influência dos estudos no grupo

Estatisticando.

Quadro 30: Trecho de análise narrativa publicada

Essa não foi a primeira experiência dos alunos dessa turma de 3º ano do EnsinoFundamental com atividades que contribuem para o letramento estatístico. Devido a isso,consideramos que pudemos desenvolver a proposta mais dinamicamente, com maiorparticipação dos alunos e também pudemos avançar nas formas de interpretação do que foiproduzido.

Consideramos também que, dentro dos limites da idade e escolaridade dos alunosenvolvidos, contribuímos para a motivação para se aprender Estatística, bem como aconscientização de sua importância em nossas vidas, a participação na geração dos dados, oentendimento de conceitos básicos de Estatística como os eixos, seus elementos, aconstrução das colunas do gráfico, a oportunidade de interpretar os resultados encontrados ea oportunidade de comunicar os resultados a outra pessoa, através da escrita.

As atividades nesse sentido não se esgotaram com essa proposta, temos estudado,preparando outras atividades para que possamos cada vez mais desenvolver o pensamentoestatístico, instrumentalizando-os para exercer sua cidadania no mundo que nos cerca.

Fonte: Conti e Pereira (2012a, p. 8).

Na reflexão sobre a experiência, destacamos o trecho: “consideramos que

pudemos desenvolver a proposta mais dinamicamente, com maior participação

dos alunos e também pudemos avançar nas formas de interpretação do que foi

produzido”. Além disso, percebemos o desenvolvimento profissional de

Eduardo, com ênfase no desenvolvimento de conhecimento na perspectiva do

letramento estatístico e o seu desenvolvimento pessoal, potencializado pelo

contexto colaborativo. Esse desenvolvimento refletiu-se no próprio

desenvolvimento das crianças, à medida que lhes foram propiciadas outras

experiências que caminhavam para o letramento estatístico.

Com a realização de outro evento na região, o XVI Encontro Nacional de

Didática e Prática de Ensino (ENDIPE)65, tivemos novamente uma parceria

para planejar a situação pedagógica, desenvolvê-la com as crianças, e

escrever a respeito dela. Iniciou-se, mais uma vez, a troca de e-mails para

produção da análise narrativa (Quadro 31).

65 Realizado na Faculdade de Educação da Unicamp (Campinas – SP), de 23 a 26 de julho de2012.

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Quadro 31: E-mail enviado por Eduardo à pesquisadora em 16/03/2012

Boa noite Keli!!!

Segue, em anexo, o artigo. Infelizmente, não consegui ajudar muito, apenas li, corrigi algumascoisas e completei com as informações das notas. Esta atividade não teve aspectos quechamassem tanta atenção como o gráfico de aniversariantes e a produção da carta sobre ográfico das matérias preferidas. Acredito que o texto está bastante completo, e acho quedeveríamos investir mais na teoria, principalmente com relação ao letramento estatístico. Oque você acha?[...]Abraço,Eduardo

Nesse período, podemos destacar a preocupação de Eduardo com a

questão teórica, no trecho “acho que deveríamos investir mais na teoria,

principalmente com relação ao letramento estatístico”. Novamente se

evidenciou a influência do estudo no grupo e o papel da teoria influenciando as

práticas e as reflexões sobre elas.

Essa análise narrativa foi intitulada “Interpretando tabelas e construindo

gráficos com alunos do 3º ano do Ensino Fundamental”. Os estudantes foram

incentivados a trabalhar com dados que não foram gerados por eles, buscando

um equilíbrio entre a geração de dados e o desenvolvimento de uma postura

crítica em relação aos dados de outros (Watson, 2006). Os estudantes

trabalharam com a interpretação de uma tabela de dupla entrada e, a partir

disso, chegaram a um consenso sobre a forma de organizar esses dados,

conforme demonstra o (Quadro 32):

Quadro 32: Trecho de narrativa publicada

Devido a essa e outras atividades, pudemos realizar uma proposta que consistia nainterpretação de uma tabela de dupla entrada, inspirada na proposta de um Guia deOrientações didáticas ao professor (SÃO PAULO, 2007, p. 148-149). Nela, os alunosprecisavam analisar e responder algumas perguntas referentes a uma tabela que apresentavaa quantidade de crianças que possuíam idades diferentes (menos de 8 anos, entre 8 e 9 anose mais de 9 anos), considerando que a quantidade de cada idade era dividida por gênero(meninas e meninos), conforme quadro 1. Nesse caso, os alunos já começavam a trabalharcom um conjunto de dados pequenos, que não foram gerados por eles, buscando ampliar umpouco o contexto e priorizar uma situação que fizesse sentido a eles (idade de uma turma dealunos). A tabela de dupla entrada ou de contingência serve para relacionar duas variáveis; nonosso caso, uma quantitativa contínua (idade) e outra qualitativa (gênero).

Fonte: Pereira e Conti (2012, p. 5298)

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Nesse evento, o ENDIPE, a apresentação se deu em forma de pôster,

que constituiu mais uma oportunidade para compartilharmos o que vínhamos

desenvolvendo, para que outros professores pudessem ter acesso a essas

situações pedagógicas, incentivando o professor a registrar suas práticas

(NACARATO, 2013).

No ano de 2012, Eduardo passou a atuar com a turma do 4.º ano do

Ensino Fundamental, e com isso pudemos planejar e desenvolver algumas

situações pedagógicas com esses estudantes e, posteriormente, narrar a

experiência vivida. Essas experiências constituíram a análise narrativa

“Auxiliando o desenvolvimento do pensamento estatístico de alunos do 4º ano

do Ensino Fundamental: construindo o gráfico dos aniversariantes” (CONTI;

PEREIRA, 2012b), apresentada no I Seminário de Leituras e Escritas em

Educação Matemática (SELEM)66. Nessa situação pedagógica com as

crianças, demos destaque à escrita delas. Ao final dela, produziram uma carta,

destinada a mim, pesquisadora, em que contavam suas experiências. As

experiências de Eduardo com a escrita começaram a influenciar sua prática,

valorizando a escrita com sua turma, incentivando-os a também contar suas

histórias (Quadro 33), na forma de carta, destinadas à pesquisadora.

Quadro 33: Carta produzida pelo estudante M.(sic)

Atibaia, 02 de maio de 2012.

Querida Keli

O professor Eduardo ensinou pra gente tudo sobre um gráfico, a gente observou bem ográfico. O gráfico se tratava dos aniversariantes da nossa sala.

A primeira coisa que o professor fez no gráfico foi desenhar os eixos na vertical e nahorizontal. A segunda foi colocar os meses. A terceira coisa foram os alunos que fizeram,a gente colou no gráfico o dia que fazemos aniversário. A quarta coisa foi fazer aquantidade de alunos. A quinta foi colocar o título do gráfico e a última coisa foi colocar adata em que começamos a construir o gráfico.

Foi muito legal aprender a fazer um.

Um abraço do aluno M.Fonte: Conti e Pereira (2012b, p. 9).

66 Realizado pela Universidade São Francisco, Campus Itatiba, nos dias 01 e 02 de junho de2012.

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Essa análise narrativa, mais uma vez, serviu para novas reflexões, e a

reescrita, dessa vez, contou com a parceria de duas outras pesquisadoras. A

análise narrativa foi intitulada “Auxiliando alunos do 4.º ano do Ensino

Fundamental no desenvolvimento do pensamento estatístico” (CONTI et al.,

2013) e foi apresentada num evento internacional, as “Jornadas Virtuales em

Didáctica de la Estadística, Probabilidad y Combinatória”67.

Fiorentini e Lorenzato (2006, p. 72) enfatizam que “ninguém parece

discordar que o professor ao refletir e sistematizar sua prática escolar, produz e

renova saberes”. A esse fato, convém acrescentar que essa experiência abriu

possibilidades para outras, novas, futuras, pois Eduardo continuou a narrar

suas experiências mesmo depois da finalização dos encontros do

Estatisticando e para além da temática estudada.

6.4 As análises narrativas de Rosana e suas parceiras

Escolhemos trazer para esta análise as produções de Rosana, pois,

embora não tivessem como foco a temática estudada pelo grupo, revelam

indícios de colaboração: foram desenvolvidas junto com outras colegas do

curso de Pedagogia, o que possibilitou a reflexão coletiva e, possivelmente, a

segurança que a teoria trouxe à sua prática, pois, naquele momento, Rosana

também se dedicava a estudar a temática “inclusão” para a realização de seu

trabalho de conclusão de curso (TCC). Consideramos que se trata de uma

produção indiretamente relacionada com o Estatisticando.

Sua primeira análise narrativa foi apresentada no I Encontro de

Educação Matemática nos Anos Iniciais (I EEMAI), na Universidade Federal de

São Carlos (UFSCar), juntamente com suas colegas de curso, Michele e

Pâmella. A experiência relatada partiu da produção do livro infantil, pelas

próprias autoras, Nino e suas aventuras na Ilha Encantada, com o objetivo de

utilizá-lo como recurso pedagógico para situações pedagógicas em sala de

67 Organizada pelo Departamento de Didática da Matemática, da Universidade de Granada(Espanha).

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aula, envolvendo a Matemática, na Educação Infantil. Buscavam contemplar,

em especial, as crianças com necessidades visuais, através da transcrição do

texto em braile; e as crianças com necessidades auditivas, por meio da

apresentação em Libras, utilizando recurso multimidiático. Rosana relata que

apresentou o livro à uma turma do 2.º ano do Ensino Fundamental, na escola

em que realizava seu estágio obrigatório, durante a “roda de leitura” com as

crianças, que se dispuseram a realizar as atividades propostas nas páginas,

além de, posteriormente, experienciar a escrita em braile com o tato (Quadro

34)

Quadro 34: Trecho da primeira análise narrativa produzida por Rosana e suas parceiras I

Foi realizada a leitura em roda com os alunos, e durante a execução das propostas daspáginas, todos quiseram participar. Os alunos apreciaram as formas, e realizaram comentusiasmo as atividades propostas. Após a leitura os alunos puderam explorar o livro. Cadacriança fechou os olhos para experimentar a leitura do Braille, e passaram a expressar suasopiniões: “Muito legal, mas não consigo ler”, “Diferente”.

Fonte: Silva et al. (2012, p. 9)

Como experiência pessoal, Rosana também apresentou o livro a uma

criança de 6 anos, deficiente visual. Segundo Rosana, ela foi a inspiração para

o livro (Quadro 35).

Quadro 35: Trecho da primeira narrativa produzida por Rosana e suas parceiras II

Ele gostou muito do livro, do contato com os materiais, os sapinhos e as formas geométricas.Como ainda está em fase de alfabetização e não tem domínio do braille, apenas tateou o livroe ouviu a história.

Fonte: Silva et al. (2012, p. 10).

Essa primeira análise narrativa, assim como no caso de Mie, Roseli e

Eduardo, tornou-se a base para a elaboração de uma nova produção, intitulada

“Elaborando uma história infantil para ensinar Matemática: experiências de

inclusão na Educação Infantil” (SILVA et al., 2012). Nesse processo de

reescrita, com a interlocução com suas colegas de escrita, foi possível ampliar

os detalhes e também suas reflexões (Quadro 36)

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Quadro 36: Trecho da segunda análise narrativa produzida por Rosana e suas parceirasDurante sua experiência de estágio no Externato São José, localizada no município de Atibaia,Rosana relata que apresentou o livro aos alunos do 2º ano do Ensino Fundamental, cuja faixaetária é de 7 anos. Embora o livro tenha sido elaborado para a Educação Infantil, foi possívelutilizá-lo também com outras faixas etárias.A leitura foi realizada com os alunos em roda e, durante a execução das propostas feitas emcada página, todos quiseram participar. Os alunos apreciaram as formas, e realizaram comentusiasmo as atividades. Após a leitura, também puderam explorar o livro. Cada criançafechou os olhos para experimentar a escrita em Braille, e, depois, passaram a expressar suasopiniões: “Muito legal, mas não consigo ler”, “Diferente”. Numa experiência pessoal, Rosanarelata que apresentou o livro ao garotinho Gabriel Spera Lozasso, de 6 anos, que apresentanecessidades visuais – uma de nossas inspirações para criação do livro. Ele gostou muito dahistória, do contato com os materiais, dos sapinhos e das formas geométricas. Como aindaestá em fase de alfabetização e não tem domínio do Braille, apenas tateou o livro e ouviu ahistória, passando por um processo similar ao das crianças em fase de alfabetização, queobservam as letras e figuras impressas num livro, ouvem a história contada pelo professor ecriam novas histórias a partir dessas informações.Fonte: Silva et al. (2012, p. 9-10).

Novamente consideramos as produções sob duas perspectivas – a

escrita foi o modo de produzir sentido à experiência e, para nós, como

pesquisadoras, o modo de investigar a experiência.

6.5Potencializando o desenvolvimento profissional

Sempre tivemos o cuidado de valorizar todas as experiências trazidas e

relatadas no grupo, fossem elas orais ou escritas. Sabíamos do papel das

narrativas e das análises narrativas como potencializadoras do

desenvolvimento profissional do professor e futuro professor, no que diz

respeito tanto ao desenvolvimento de conhecimento na perspectiva do

letramento estatístico, consoante com os estudos realizados no grupo

Estatisticando, quanto ao desenvolvimento pessoal, mas produzi-las não foi

uma exigência para participação no grupo.

Apresentamos novamente, sistematicamente, nossos eixos de análise, a

partir da escrita (Quadro 37) e a seguir seus entrelaçamentos nas escritas dos

participantes durante o percurso de escrita (Quadro 38).

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Quadro 37: Eixos de análise – escrita dos participantes do Estatisticando

Eixo 1: Complexidade do desenvolvimento profissional

Desenvolvimentoprofissional doprofessor comodesenvolvimento deconhecimento naperspectiva doletramentoestatístico

Consideramos que os estudos dos textos, tanto os dereferencial teórico (CONTI, 2009), quanto os deconteúdo de Estatística e Matemática (VAN DE WALLE,2009), na discussão de situações pedagógicas de livrosdidáticos (MILANI; IMENES; LELLIS, 2008) ou materialapostilado (FERRARI et al., 2006), no currículo(BRASIL, 1997) e principalmente as narrativas e asanálises narrativas de outros professores, como, porexemplo, Jonsson (2002) e Capp (2002), motivaram epotencializaram as reflexões sobre a prática docente,contribuindo também para aumentar a segurança doprofessor em seu processo de escrita.

Desenvolvimentoprofissional doprofessor comodesenvolvimento desi mesmo oupessoal

O processo de escrita e reescrita de análises narrativasde situações de sala de aula foi evidenciando astransformações e as reflexões dos professores e futurosprofessores sobre ensinar e aprender Estatística naperspectiva do letramento.

Ultrapassou os encontros do grupo, atingindo eventosda área da Educação e Educação Matemática.

Os participantes puderam ser protagonistas, com apoiode alguém mais experiente no processo de escrita.

Eixo 2: Colaboração

Contexto decolaboração

Foi considerado potencializador do desenvolvimentoprofissional.

No contexto colaborativo, a fundamentação teórica emetodológica sobre o letramento estatístico possibilitoua produção de teoria sobre a prática pedagógica e aformação de professores e sua apresentação na formade análises narrativas de situações de sala aulas outexto.

Respeitamos, no nosso contexto colaborativo, a opçãode escrever uma análise narrativa de sala de aula, bemcomo a opção de não produzir uma análise narrativa.

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Eixo 3: Letramento(s)

Indícios doletramentoestatístico

Pudemos, pela disponibilização de narrativas de aulascom foco no letramento estatístico (designs disponíveis)fazer a reconstrução do conhecimento, transformando-oem um novo design disponível (Pedagogia dosmultiletramentos), que pôde ser compartilhado comoutros professores e futuros professores a partir daescrita e da publicação das análises narrativas desituações de sala de aula e texto.

Práticas deletramento

Apoiaram-se tanto no mundo individual como no socialdos participantes do Estatisticando.

As escritas de análises narrativas também constituírameventos letrados; portanto, mediados pela escrita (deautores ou dos próprios participantes).

Houve vários indícios do que fizemos com o letramento,implicando também valores, atitudes, sentimentos erelações sociais.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

A seguir, destacamos alguns indícios do entrelaçamento do

desenvolvimento profissional dos participantes, o contexto colaborativo e as

práticas de letramento que consideramos presentes em seus percursos de

escrita, trazendo novamente trechos das suas escritas (Quadro 38).

Quadro 38: Entrelaçamentos dos eixos de análises – escrita dos professores

Práticas de letramento edesenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento deconhecimento na perspectiva doletramento estatístico

Já do ponto de vista do livro didático,este apresenta sete páginasdestinadas explicitamente à temática,mas não contempla a temáticaCombinatória, e essa quantidade depáginas sobre a temática representaalgo em torno de 5% do total depáginas do livro, mas também sãoapresentadas tabelas ao longo domesmo.São propostas atividades de leitura einterpretação de dados, ainda que de

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forma incipiente, mas nãoidentificamos atividades de coleta eorganização de dados, nem oincentivo da escrita de suasconclusões ou produção de texto.(Resultados da Iniciação Científica deRoseli publicada – PEREIRA, R. F.;CONTI, 2011).

Acho que deveríamos investir mais nateoria, principalmente com relação aoletramento estatístico. O que vocêacha? (E-mail enviado por Eduardo àpesquisadora em 16/03/2012.

Desenvolvimento profissional doprofessor como desenvolvimento de simesmo ou pessoal

A primeira experiência de construirgráfico com as crianças me levou aprimeira experiência de assinar aautorização de publicação!Que boa experiência!(E-mail enviado por Mie àpesquisadora em 18/05/2012).

Contexto colaborativo Segue o que fiz até o momento, masestou precisando de uma orientaçãono sentido da ênfase que poderia darem alguns momentos. Acredito que sevc pudesse me fornecer algumasquestões a serem contempladas noartigo me ajudaria, pois acho queestou escrevendo, escrevendo massem conteúdo interessante. (E-mailenviado por Eduardo à pesquisadora e14/10/2011).

Segue em anexo o que conseguiproduzir do artigo. Graças às suasorientações, já consegui escrever bemmais. Muito obrigado!!! (E-mailenviado por Eduardo à pesquisadoraem 14/10/2011).

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Indícios do letramento estatístico Mie: Para dar continuidade à situaçãopedagógica, foram feitas as seguintesperguntas, relacionadas ao tema“animais de estimação”, escolhido porMie, por julgar de interesse dosalunos:- Vocês têm animais em casa?- Que animal vocês têm? (Trecho denarrativa publicada – YOKOMIZO;CONTI; CARVALHO, 2012)

As análises narrativas de situações de sala de aula puderam dar

significado às experiências vividas, possibilitaram a avaliação dessa

experiência e do seu modo de atuar com as crianças, além de revelar suas

concepções e as contribuições do contexto colaborativo.

Temos a expectativa, assim como Nacarato, Gomes e Grando (2008, p.

43), de que essa produção “possa contribuir para o debate sobre as pesquisas

que o professor escolar realiza em sua sala de aula”, ou seja, de que possa

ampliar a literatura produzida por professores para professores, em especial,

contribuindo para o letramento estatístico de professores, futuros professores e

estudantes e para o desenvolvimento de uma cultura profissional pautada no

conhecimento da prática.

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Considerações finais sobre o desenvolvimento profissional – Ocaso do Estatisticando

Lê e relê o escrito,tira e acrescenta, enxerta,

recompõe.Começa de novo,

ensaiando com outra voz,com outro tom.

Começar a escreveré criar uma voz,

deixar-se levar por ela eexperimentar as suas possibilidades.

(LARROSA, 2003, p. 75)

Quisemos compreender as aprendizagens e o desenvolvimento

profissional de professores e futuros professores da Educação Infantil e anos

iniciais do Ensino Fundamental, quando estão num contexto colaborativo e

foram instigados a trabalhar com a Estatística numa perspectiva de

letramento(s), caminhando em direção ao letramento estatístico.

Muito antes do envio do convite aos professores e futuros professores a

formar comigo um grupo de estudos num contexto colaborativo, para estudar a

Estatística, iniciaram-se os desafios a mim, como formadora e pesquisadora.

Entendemos que esse não foi qualquer convite, mas um convite situado numa

cidade pequena, numa instituição particular, no ano de 2010. E, além disso, a

possibilidade de estudar assuntos de Estatística pode não ter sido atrativo para

muitos professores e futuros professores. Consideramos que minha figura de

professora por trás do convite também possa ter influenciado o aceite ou não.

Como formadora, os desafios foram mobilizar os professores e futuros

professores a quererem fazer parte de um grupo aberto, com participação

voluntária, sem compromissos formais estabelecidos por um programa ou

currículo; instigá-los a trabalhar colaborativamente numa perspectiva de

letramento(s); adotar estratégias formativas e de liderança, que, além de

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instaurarem o grupo, o sustentassem; liderar, de forma a possibilitar a liderança

compartilhada; atuar também em função das demandas dos participantes,

negociando-as. Como pesquisadora, além de registrar e coletar os dados para

a pesquisa, sendo ao mesmo tempo participante do grupo Estatisticando, o

desafio foi dosar os momentos em que devia assumir mais o papel de

pesquisadora, formadora, professora e participante do grupo. No início do

grupo, por exemplo, eu tinha um papel mais de pesquisadora, ao expor meus

objetivos de pesquisa. Ao apresentar alguns materiais para estudo, assumia o

papel de formadora, atuando em função das demandas; no contexto

colaborativo que foi se desenvolvendo, era uma participante do grupo e, junto

com os demais participantes, discutia os temas de estudo. Em outros

momentos, éramos todos professores que compartilhámos dos mesmos

dilemas profissionais, relativos ao uso do livro didático, ao material apostilado,

às políticas educacionais. Além disso, também assumi o papel de parceira

crítica, no processo de escrita dos participantes, momento em que, mais do

que dar sugestões para ultrapassar as dificuldades, também tive oportunidades

de refletir e de organizar essas reflexões.

No início da realização da pesquisa de campo, nos primeiros encontros

do grupo, percebemos nos professores e futuros professores pouca

familiaridade com a temática, pois seus conhecimentos para trabalhar com o

Tratamento da Informação, basicamente, não foram construídos de forma

significativa, que contribuísse para o letramento estatístico, enquanto eram

alunos da Escola Básica, do Ensino Superior (para os que já haviam concluído

essa etapa) ou ainda ao longo de suas carreiras (no caso dos que já tinham

mais tempo de magistério). Tais indícios foram percebidos em seus relatos:

alguns deles nem se lembravam de ter tido contato com a temática, como foi o

caso de Rosana, que revelou, no encontro de 09/09/2010: “Eu acho que não

estudei estatística na escola. Eu fico aqui cavando para ver se eu lembro

coisas, mas contato com Estatística foi no trabalho, quando precisei montar

gráfico”; ou, como ocorreu com as práticas reveladas por Eduardo no encontro

de 18/03/2011: “No Ensino Médio eu quase morri para fazer esses gráficos

com o transferidor”. Ressaltamos que não quisemos dar destaque, ao longo do

trabalho, ao que o participante não sabia, mas buscamos evidenciar,

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justamente, o que mudou no desenvolvimento profissional, em consequência

da participação num contexto colaborativo. Coletamos dados com os

participantes e não sobre eles, pois nossa intenção era que participassem de

um processo significativo e que se desenvolvessem profissionalmente.

Retomando a questão que nos propusemos a responder:

Que indícios de desenvolvimento profissional apresentam os professores

e os futuros professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino

Fundamental em contextos colaborativos em práticas de letramento estatístico?

Para responder a essa questão, descrevemos as aprendizagens e o

desenvolvimento profissional das participantes do grupo Estatisticando, desde

sua criação e no percurso dos 20 encontros realizados de setembro de 2010 a

dezembro de 2011, a partir de nossos três eixos de análise: 1) Complexidade

do desenvolvimento profissional. 2) Colaboração. 3) Letramento(s).

Durante o percurso do grupo, indícios do desenvolvimento profissional

dos participantes foram aparecendo. Em relação à complexidade, o

desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento do

conhecimento na perspectiva do letramento estatístico passou pela

reconstrução de seus conhecimentos e a construção de saberes para ensinar e

aprender estatística nessa perspectiva. Nesse sentido, buscamos contemplar

os conhecimentos elencados por Shulman (1987): o conhecimento do conteúdo

da Estatística, o conhecimento pedagógico geral e da Estatística, o

conhecimento dos estudantes e de suas características, o conhecimento dos

contextos educativos, o conhecimento do currículo referente à Estatística e o

conhecimento dos objetivos, das metas e dos valores educacionais que se

entrelaçavam nos materiais que estudamos. Nesses estudos também foi

possível vislumbrar diferentes formas de ensinar e aprender Estatística no

espaço da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, pois

procuramos não dissociar a teoria da prática. O desenvolvimento profissional

do professor como desenvolvimento de si mesmo ou pessoal foi entendido

como um processo pessoal, e o tempo de cada um foi respeitado. Embora

alguns participantes ainda não tivessem experiência docente ou estivessem

iniciando docência por meio dos estágios, buscavam, a partir de suas

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memórias, refletir sobre o processo de ensino e aprendizagem, contribuindo

com depoimentos e reflexões sobre suas experiências como estudantes.

Consideramos também que isso contribuiu para que os participantes

passassem a dirigir outros olhares para a prática de sala de aula e para os

materiais utilizados.

No nosso contexto colaborativo, que foi se constituindo aos poucos, era

permitido perguntar e também errar, e isso se constituía em momentos de

aprendizagem. O sentimento de pertença também foi se desenvolvendo; e o

tempo disponibilizado pelos participantes, ao quererem fazer parte do grupo,

também foi fundamental, pois disponibilizavam tempo para comparecer aos

encontros; para ler; para compartilhar materiais e informações via e-mail; e,

mesmo depois de os encontros terem sido finalizados, para desenvolver o

processo de escrita e socializar seu trabalho, com a participação em eventos.

Isso também envolveu disponibilidade financeira para inscrições, hospedagem

e produção de pôsteres. Consideramos também que, como almejávamos o

professor como investigador da própria prática, isoladamente essa seria uma

perspectiva difícil de ser alcançada, mas no contexto colaborativo houve

alicerce para reflexões/ressignificações compartilhadas.

Quanto ao(s) letramento(s), consideramos que o letramento estatístico

faz parte do(s) letramento(s), constituindo uma forma de situar a leitura e a

escrita em seus contextos sociais e chamando a atenção para uma situação

específica, a da Estatística. Consideramos que os encontros constituíram

práticas de letramento, pois nossas concepções de ensinar e aprender

Estatística na perspectiva do letramento estatístico são observáveis nos

eventos de letramento mediados pela escrita, pelo texto, em cada encontro.

Podemos afirmar também que a pesquisa contribuiu de forma decisiva

para o meu desenvolvimento profissional, pois visávamos a uma postura

reflexiva não apenas por parte dos participantes, mas da minha própria parte,

como formadora e pesquisadora. No contexto colaborativo foi possível superar

os desafios como formadora e pesquisadora e, até mesmo, como professora,

amadurecer, transformar concepções sobre a formação docente, valorizar o

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trabalho coletivo, respeitar as diferenças, criar um ambiente de aprendizagem,

orientar a escrita, nos transformar.

Mais algumas palavras...

Foi possível criar um grupo, num contexto colaborativo, que permitiu

uma significativa formação no que diz respeito à Estatística, na perspectiva do

letramento estatístico, e ir além deste, contribuindo para o desenvolvimento

profissional dos professores envolvidos. Os diferentes participantes – futuros

professores, professores com diferentes experiências, pesquisadora – tiveram

oportunidade de, no contexto colaborativo, estudar, problematizar, refletir,

investigar e escrever sobre a complexidade de ensinar e aprender Estatística

nas escolas. Os professores traziam problemas e desafios da prática docente;

os futuros professores aprenderam, junto com os professores, a problematizar

as situações do dia a dia escolar, tentando superar os desafios e os problemas;

e eu, pesquisadora, atuei em função das demandas, apresentando subsídio

teórico, problematizando as situações e incentivando a escrita, aprendendo a,

juntos, trabalhar colaborativamente.

Esse contexto colaborativo e o percurso do grupo de estudos também

evidenciaram que esta modalidade de formação continuada, mais do que uma

necessidade para o trabalho do professor, constitui uma condição de trabalho,

ajudando-o nas práticas do cotidiano docente, seja nos problemas, nos dilemas

ou nas dificuldades; auxiliando a suprir possíveis lacunas na sua formação;

reconhecendo a prática pedagógica do professor como ponto de partida;

valorizando sua formação e, em especial, a Estatística; respeitando suas

singularidades e potencialidades; possibilitando a ampliação dos

conhecimentos; e considerando suas necessidades num contexto colaborativo.

Diante dos indícios de desenvolvimento profissional possibilitados pela

participação no grupo Estatisticando, defendemos o reconhecimento e a

valorização da participação de professores, futuros professores e

pesquisadores em grupos de contexto colaborativos. E concordamos com

Grando e Nacarato (2014) sobre a importância de ações que possibilitem que

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mais professores participem de grupos num contexto colaborativo, apontando

para políticas públicas que valorizem a formação de professores, de forma que

A participação no grupo seja considerada como tempo deformação para o professor;

Sejam atribuídas bolsas para professores da Educação Básica queassume o papel de parceiros de pesquisa;

Sejam concedidas bolsas para pós-graduando que tomam aprópria prática como objeto de investigação;

Haja financiamento de projetos dessa natureza (parceriauniversidade-escola, grupos no interior da escola, etc.);

Seja incentivada e promovida a participação dos professores emeventos e reuniões para divulgação das experiências e daspesquisas;

Sejam facilitados os trâmites burocráticos na realização dapesquisa em sala de aula (comitê de ética, videogravação eaudiogravação de aulas etc.). (GRANDO; NACARATO, 2014, p.85-86).

De acordo com as autoras (p. 86), essas ações ainda tornariam o

“trabalho do professor menos solitário e com uma visibilidade e respeito pelas

suas práticas construídas no cotidiano da sala de aula”. Ressaltamos que a

participação em grupos colaborativos não deve constituir uma nova obrigação

para os professores, mas, sim, uma opção formativa.

As experiências que tivemos no grupo Estatisticando e no percurso da

pesquisa reforçam o sentimento de que temos que continuar, pois foi possível

desenvolver-nos profissionalmente, num contexto colaborativo, tanto na

perspectiva do letramento estatístico quanto pessoalmente. A educação e a

educação estatística são áreas que carecem dessas estratégias fundamentais

para a formação de professores e futuros professores.

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APÊNDICE ATERMO DE CONSENTIMENTO

Eu, ________________________________________________________________,

RG:_______________________, autorizo, a título gratuito, mantido o sigilo cabível eticamente

em trabalhos dessa natureza, a utilização de dados que forneci durante os encontros do grupo

de estudos “Estatisticando”, para publicação, reprodução, exposição, comunicação ao público,

edição, adaptação, arranjo, transcrição, divulgação, produção audiovisual, inclusão em base de

dados, armazenamento em quaisquer meios, digitalização e outras transformações em

FOTOGRAFIAS, ENTREVISTAS, DEPOIMENTOS e GRAVAÇÕES DE AUDIO E VÍDEO, pela

professora Keli Cristina Conti, e-mail [email protected], telefone para contato: (19) 3722-

2716/ 9178-5231, para âmbito de sua tese de doutorado, sobre a Estatística e formação de

professores, orientada pela Prof.ª Dr.ª Dione Lucchesi de Carvalho, junto à Faculdade de

Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

Declaro estar ciente de que os direitos autorais do material acima citado serão de

propriedade da professora e que esse material não poderá ser reproduzido, a qualquer título,

sem a autorização prévia e por escrito da professora Keli Cristina Conti.

Expresso minha concordância com relação à reutilização do material acima citado nos

termos citados, sendo certo que, em nenhum caso, a utilização ou reutilização dependerá da

autorização prévia ou de remuneração.

Por estarem de acordo, as partes firmam o presente em 2 (duas) vias de igual teor.

Atibaia, 08 de dezembro 2011.

( ) Autorizo a utilização de meu primeiro nome.

( ) Autorizo a utilização de meu nome completo.

( ) Autorizo a utilização de um pseudônimo, mantido em sigilo meu nome.

_______________________________ _______________________________

Participante Professora

Recebi cópia do documento Keli Cristina Conti

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APÊNDICE B

ENVIADO

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APÊNDICE CFICHA DE IDENTIFICAÇÃO

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APÊNDICE D

Letramento estatístico

Excertos de: CONTI, Keli Cristina. O papel da Estatística na inclusão de alunos daEducação de Jovens e Adultos em atividades letradas. Dissertação (Mestrado emEducação) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas,Campinas, 2009.

O termo “letramento” tornou-se comum atualmente, mas surge a

necessidade de refletir um pouco mais sobre a questão de letramento,

aprofundando a concepção desenvolvida por Soares (2003b), professora titular

da Universidade Federal de Minas Gerais, a fim de discutir o letramento

estatístico.

Letramento é assim explicado pela autora:

Embora correndo o risco de uma excessiva simplificação, pode-se dizer que a inserção no mundo da escrita se dá por meio daaquisição de uma tecnologia – a isso se chama alfabetização, epor meio do desenvolvimento de competências (habilidades,conhecimentos, atitudes) de uso efetivo dessa tecnologia empráticas sociais que envolvem a língua escrita – a isso se chamaletramento (SOARES, 2003b, p. 90, grifos da autora).

Soares (2003b) aponta para a importância de conceituar o que é

letramento justamente pela necessidade de avaliar ou medir o quanto uma

pessoa pode ser considerada letrada ou não.

Para ampliar esta discussão, gostaria de trazer a definição da Unesco,

de 1958, para “padronizar as estatísticas em educação”:

É letrada a pessoa que consegue tanto ler quanto escrever comcompreensão uma frase simples e curta sobre sua vidacotidiana.

É iletrada a pessoa que não consegue ler nem escrever comcompreensão uma frase simples e curta sobre sua vida cotidiana(UNESCO, 1958, apud SOARES, 2003b, p. 71).

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Concordo com Soares (2003a, p. 71): essa definição chama a atenção

apenas para a “dimensão individual do letramento”. De acordo com a autora,

temos a “dimensão individual” e a “dimensão social” do letramento:

Quando o foco é posto na dimensão individual, o letramento é vistocomo atributo pessoal, parecendo referir-se, como afirma Wagner(1983, p. 5), à “simples posse individual das tecnologias mentaiscomplementares de ler e escrever”. Quando o foco se desloca para adimensão social, o letramento é visto como um fenômeno cultural, umconjunto de atividades sociais que envolvem a língua escrita e deexigências sociais de uso da língua escrita (SOARES, 2003a, p.66).

Penso ser essa segunda perspectiva apresentada por Soares (2003a) a

que mais contribui para as análises que realizarei. É possível aproximá-la da

utilização que faz Gal (2002, p. 2, tradução minha), da Universidade de Haifa

(Israel): para ele, o termo letramento tem sido “combinado com termos que

denotam domínios de conhecimento específico”, como letramento escolar,

letramento social ou não escolar, letramento computacional, letramento

científico, letramento cultural, letramento visual, letramento estatístico (que este

trabalho vai explorar), entre outros.

Gal (2002, p. 01, tradução minha) considera o letramento estatístico

como “uma habilidade-chave esperada de cidadãos em sociedades

sobrecarregadas de informação, frequentemente vista como um resultado

esperado da escolaridade e como componente necessário do letramento e da

numeracia de adultos”. O autor pondera também que o letramento estatístico

apresenta dois componentes inter-relacionados:

(a) Habilidade de interpretar criticamente e avaliar a informaçãoestatística; os argumentos relativos aos dados; ou os fenômenosestocásticos que se encontrarem em contextos diversos; e, quando forde relevância, (b) a capacidade de discutir ou comunicar suas reaçõesfrente a tais informações estatísticas, assim como o entendimento dosignificado da informação; suas opiniões sobre as implicações dessainformação; ou seus vínculos com respeito à aceitabilidade dasconclusões dadas (GAL, 2002, p. 02-03, grifos do autor. Traduçãominha).

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Watson (1997, apud GAL, 2002), da Universidade da Tasmânia

(Austrália), apresenta uma estrutura do letramento estatístico, “constituída por

três camadas com crescente sofisticação”, que listo abaixo:

Uma compreensão básica da terminologia estatística eprobabilística.

Um entendimento da linguagem estatística e de seusconceitos, na medida em que estão presentes no contexto deuma discussão social mais ampla.

Uma atitude de questionamento que se pode assumir aoaplicar conceitos para contradizer afirmações feitas sem ofundamento estatístico apropriado (WATSON, 1997, apud GAL,2002, p. 02. Tradução minha).

Gal (2002) propõe o que chama de “um modelo de letramento

estatístico” (Quadro 2), ou seja, um modelo das bases de conhecimento que os

adultos e também os estudantes em processo de formação deveriam ter

disponíveis, para poderem compreender, analisar e criticar as estatísticas que

nos cercam.

Quadro 2 : Um modelo de letramento estatísticoElementos

deconhecimento

Elementosde

disposiçãoHabilidades de letramentoConhecimento estatísticoConhecimento matemáticoConhecimento contextualQuestionamento crítico

Crenças e atitudesPosicionamento crítico

Letramento estatísticoGal (2002, p.4, tradução minha)

Explorando o que Gal (2002) classifica como “elementos de

conhecimento”, vale destacar que eles não ocorrem separadamente e, muitas

vezes, são até confundidos por isso, mas são descritos separadamente para

facilitar a apresentação. A necessidade de “habilidades de letramento” –

letramento compreendido em seu sentido mais geral e próximo do que eu

trouxe com Soares (2003b) – surge pelo fato de as mensagens estatísticas

apresentarem-se em textos orais ou escritos e por estar a informação

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estatística, muitas vezes, inserida em textos complexos; ou seja, tais

habilidades são essenciais para a competência de ler e escrever em práticas

sociais. Gal (2002, tradução minha) aponta ainda que “o letramento estatístico

e o letramento geral estão interligados”. O “conhecimento estatístico” implica

saber como os dados podem ser produzidos e por que são necessários;

familiarizar-se com os termos básicos, com ideias da estatística descritiva, com

representações em gráficos e tabelas, incluindo sua interpretação, com noções

básicas de probabilidade; e conhecer como as conclusões são alcançadas.

Com relação ao “conhecimento estatístico”, Gal (2002) ainda completa que

incluir em um curso uma grande quantidade de conteúdo estatístico não é

suficiente para garantir o letramento estatístico.

Com relação ao “conhecimento matemático”, destaco o papel de apoio

que este vem dar não só ao letramento estatístico, mas ao conhecimento

estatístico; entretanto, ele, o conhecimento matemático, não pode ser o centro

do processo, pois existem recursos tecnológicos de apoio, como calculadoras e

computadores. O “conhecimento contextual”, segundo Gal (2002, p. 15, ,

tradução minha), “é a fonte de significado e a base para a interpretação dos

resultados obtidos”. E o “questionamento crítico” aparece como forma de

avaliação crítica das informações estatísticas, principalmente devido à forma

como, muitas vezes, essas informações podem se apresentar – por exemplo,

com abuso intencional dos dados, apresentados de forma sensacionalista.

Quanto ao que Gal (2002, p. 18) chama de “elementos de disposição”,

há uma ênfase no fato de os conceitos de posição crítica, crenças e atitudes

estarem interligados. A posição crítica está relacionada à atitude de

questionamento às informações que nos chegam, pois certas crenças e

atitudes estão “na base de posição crítica das pessoas”, e estas devem

acreditar em seu poder de ação crítica.

Em síntese, Gal (2002, p. 19) afirma que o “comportamento letrado

estatísticamente” precisa da ativação inter-relacionada dessas cinco bases de

conhecimento, mencionadas no Quadro 2, na presença da disposição crítica

com apoio de crenças e atitudes, e realça “o papel-chave que fatores e

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componentes não-estatísticos desempenham no letramento estatístico e

refletem a natureza abrangente freqüentemente multifacetada das situações

nas quais o letramento estatístico pode ser ativado” (GAL, 2002, p. 19,

tradução minha). Ainda segundo Gal informa nessa mesma página, não

necessariamente a pessoa tem que possuir plenamente todos esses elementos

de conhecimento e disposição para ter condições de lidar com as informações

estatísticas, e o letramento estatístico deveria ser visto “como um conjunto de

capacidades que podem existir em graus diversos no mesmo indivíduo,

dependendo dos contextos em que é invocado ou aplicado”.

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ANEXO 1Metas curriculares - Portugal

No currículo de Portugal, são apresentadas Metas curriculares

(PORTUGAL, 2013), que estabelecem aquilo que pode ser considerado como

a aprendizagem essencial dos estudantes, em cada um dos anos de

escolaridade ou ciclos do ensino básico, com relação à Estatística (Quadro 1).

Quadro 1: Escolaridade obrigatória no ensino básico – Portugal

Níveis Anos de escolaridade Idade

1º Ciclo 1.º - 4.º 6-10 anos2º Ciclo 5.º - 6.º 10-12 anos3º Ciclo 7.º - 9.º 12-15 anos

Fonte: http://www.gepe.min-edu.pt/np4/9.html

No 1º ciclo, são considerados “domínios de conteúdos” Números e

Operações, Geometria e Medida, Organização e Tratamento de Dados. No

tratamento de dados, há, segundo o documento, a inserção de vocabulário

básico da Teoria de Conjuntos. No 2.º ciclo, passam a ser quatro “Domínios de

Conteúdos” (2013), com o acréscimo de “Álgebra”. O documento aponta como

importante a introdução de noção de gráfico cartesiano de uma

correspondência, para ser aprofundado no 3.º ciclo, no trabalho com funções,

no domínio da Organização e Tratamento de dados. Para o 3.º ciclo,

acrescenta-se mais um domínio de conteúdo, o de Funções, Sequências e

Sucessões. No domínio de conteúdos Organização e Tratamento de Dados, é

feita uma iniciação às probabilidades e aos fenômenos aleatórios. De acordo

com as Metas Curriculares (PORTUGAL, 2013), são apresentados:

1.º Ciclo:Escolaridade Conteúdos1.º ano Representação de conjuntos

- Conjunto, elemento pertencente a um conjunto, cardinal de um conjunto;- Diagramas de Venn com conjuntos disjuntos.Representação de dados- Gráfico de pontos e pictograma em que cada figura representa umaunidade.

2.º ano Representação de conjuntos- Reunião e interseção de conjuntos;- Diagramas de Vem e Carroll.Representação de dados

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- Tabelas de frequências absolutas, gráficos de pontos, de barras epictogramas em diferentes escalas;- Esquemas de contagem (tally charts).

3.º ano Representação e tratamento de dados- Diagramas de caule-e-folhas;- Frequência absoluta;- Moda;- Mínimo, máximo e amplitude;- Problemas envolvendo análise e organização de dados, frequênciaabsoluta, moda e amplitude.

4.º ano Tratamento de dados- Frequência relativa;- Noção de percentagem;- Problemas envolvendo o cálculo e a comparação de frequênciasrelativas.

Fonte: PORTUGAL. Programa e Metas Curriculares Matemática: Ensino Básico, 2013

2.º Ciclo

Escolaridade Conteúdos5.º ano Gráficos cartesianos

- Referenciais cartesianos, ortogonais e monométricos;- Abscissas, ordenadas e coordenadas;- Gráficos cartesianos.Representação e tratamento de dados- Tabelas de frequências absolutas e relativas;- Gráficos de barras e de linhas;- Média aritmética;- Problemas envolvendo a média e a moda;- Problemas envolvendo dados em tabelas, diagramas e gráficos.

6.º ano Representação e tratamento de dados- População e unidade estatística;- Variáveis quantitativas e qualitativas;- Gráficos circulares;- Análise de conjuntos de dados a partir da média, moda e amplitude;- Problemas envolvendo dados representados de diferentes formas.

Fonte: PORTUGAL. Programa e Metas Curriculares Matemática: Ensino Básico, 2013

3.º Ciclo:

Escolaridade Conteúdos7.º ano Medidas de localização

- Sequência ordenada dos dados;- Mediana de um conjunto de dados; definição e propriedades;- Problemas envolvendo tabelas, gráficos e medidas de localização.

8.º ano Diagramas de extremos e quartis- Noção de quartil;- Diagramas de extremos e quartis;- Amplitude interquartil;- Problemas envolvendo gráficos diversos e diagramas de extremos equartis.

9.º ano Histogramas- Variáveis estatísticas discretas e contínuas; classes determinadas porintervalos numéricos; agrupamento de dados em classes da mesma

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amplitude;- Histogramas; propriedades;- Problemas envolvendo a representação de dados em tabelas defrequência e histogramas.Probabilidade- Experiências deterministas e aleatórias; universo dos resultados ouespaço amostral; casos possíveis;- Acontecimentos: casos favoráveis, acontecimento elementar, composto,certo, impossível;- Acontecimentos disjuntos ou incompatíveis e complementares;- Experiências aleatórias com acontecimentos elementares equiprováveis;- Definição de Laplace de probabilidade; propriedades e exemplos;- Problemas envolvendo a noção de probabilidade e a comparação deprobabilidades de diferentes acontecimentos compostos, utilizandotabelas de dupla entrada e diagramas em árvore;- Comparação de probabilidades com frequências relativas emexperiências aleatórias em que se presume equiprobabilidade dos casospossíveis.

Fonte: PORTUGAL. Programa e Metas Curriculares Matemática: Ensino Básico, 2013

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ANEXO 2

Expectativas de aprendizagem - NCTMDe acordo com o National Council of Teachers of Mathematics (NCTM),

na publicação Princípios e Normas para a Matemática Escolar (NCTM, 2008),

são apresentadas as seguintes expectativas da aprendizagem, do pré-escolar

ao 5.º ano de escolaridade. Os alunos, segundo os autores, deverão:Normas ExpectativasDeverão habilitar todosos alunos para:

Pré-escolar ao 2.º ano Do 3.º ao 5.º ano

Formular questões quepossam ser abordadaspor meio de dados erecolher, organizar eapresentar dadosrelevantes quepermitam responder aessas questões;

Colocar questões e reunir dadosacerca de si próprios e do seumeio circundante;Agrupar e classificar objetos deacordo com os seus atributos eorganizar dados relativos aosobjetos;Representar dados através deobjetos concretos, imagens egráficos.

Conceber investigações paraabordar uma determinadaquestão e compreender o modocomo os métodos de recolha dedados influenciam a naturezado conjunto dos dados;Representar dados utilizandotabelas e gráficos, comodiagramas de pontos, gráficosde barras e de linhas;Reconhecer as diferenças entreas representações de dadosquantitativos e qualitativos.

Selecionar e usarmétodos estatísticosadequados à análise dedados

Descrever partes de dados e oconjunto total dos dados,enquanto um todo, paradeterminar o que os dadosmostram.

Descrever a forma e ascaracterísticas maisimportantes de um conjunto dedados, e comparar conjuntos dedados relacionados, dandoênfase ao modo como os dadosse encontram distribuídos;Usar medidas de tendênciacentral, principalmente amediana, e compreender o quecada uma indica, ou não,acerca do conjunto de dados.

Desenvolver e avaliarinferências e previsõesbaseadas em dados;

Discutir acontecimentosrelacionados com as experiênciasdos alunos e descrevê-los comoprováveis ou improváveis.

Propor e justificar conclusões eprevisões baseadas em dadose conceber formas de asinvestigar mais profundamente.

Compreender e aplicarconceitos básicos deprobabilidade

Descrever os acontecimentoscomo prováveis ou improváveise discutir o seu grau deincerteza, usando termos comocerto, igualmente provável ouimpossível;Prever a probabilidade deresultados de experiênciassimples e testar as suasprevisões;Perceber que a medida daprobabilidade de umacontecimento pode serrepresentada por um número

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compreendido entre zero e um.Fonte: NCTM (2008, p. 464)

Do 6.º ao 12.º ano de escolaridade, são propostos

Normas ExpectativasDeverão habilitar todosos alunos para:

Do 6.º ao 8.º ano Do 9.º ao 12.º ano

Formular questões quepossam ser abordadaspor meio de dados erecolher, organizar eapresentar dadosrelevantes quepermitam responder aessas questões;

Formular questões, conceberestudos e recolher dadosrelativos a uma característicapartilhada por duas populações,ou a diferentes característicasdentro de uma única população;Selecionar, criar e usar asrepresentações gráficas maisadequadas, incluindohistogramas, diagramas deextremos e quartis e diagramasde dispersão.

Compreender diferenças enteestudos e inferir o que pode serfeito a partir de cada um;Saber como são ascaracterísticas de estudos bemplanejados, e o papel doaleatório nas sondagens eexperiências;Compreender o significado dedados quantitativos equalitativos, de dadosunivariados e bivariados, e dotermo variável;Compreender e usarhistogramas, diagramas deextremos e quartis e diagramasde dispersão;Calcular medidas elementarese distinguir uma medida de umparâmetro.

Selecionar e usarmétodos estatísticosadequados à análise dedados

Identificar, usar e interpretarmedidas de localização emedidas de dispersão, incluindo amédia e a amplitude inter-quartil;Discutir e compreender acorrespondência entre osconjuntos de dados e as suasrepresentações gráficas,sobretudo histogramas,diagramas de caule-e-folhas,diagramas de extremos e quartise diagramas de dispersão.

Apresentar a distribuição dedados quantitativos univariados,descrever a sua forma eselecionar e calcular asmedidas que os definem;Apresentar e analisar, paradados quantitativos, bivariados,um diagrama de dispersão edeterminar coeficientes eequações de regressão ecoeficientes de correlação,usando a tecnologia;Apresentar e discutir dadosbivariados, com variáveisquantitativas;Reconhecer como é quetransformações lineares dedados univariados afetam a suaforma, centro e dispersão;Identificar tendências nosdados bivariados e encontrarfunções que os modelem outransformá-los para poderemser modelados.

Desenvolver e avaliarinferências e previsõesbaseadas em dados;

Usar observações acerca dasdiferenças existentes entre duasou mais amostras, para fazerprevisões sobre as populações de

Usar simulações para explorara variabilidade das medidasestatísticas de amostras econstruir distribuições

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onde as amostras foramretiradas;Formular conjecturas acerca depossíveis relações entre duascaracterísticas de uma amostra,baseando-se em diagramas dedispersão dos dados e em retasde regressão;Usar conjecturas na formulaçãode novas questões e noplanejamento de novos estudospara lhes dar respostas.

amostrais;Compreender como as medidasdas amostras refletem osvalores dos parâmetros dapopulação e usar asdistribuições amostrais;Avaliar relatórios publicados dedados, através da análise doseu plano, da adequação daanálise dos dados e davariabilidade das conclusões;Compreender como usartécnicas estatísticas no controlede qualidade.

Compreender e aplicarconceitos básicos deprobabilidade

Compreender e usar aterminologia apropriada nadescrição de conceitos relativos aacontecimentos complementarese mutuamente exclusivos;Usar a proporcionalidade e umacompreensão básica deprobabilidade para formular etestar conjecturas acerca dosresultados de experiências esimulações;Calcular a probabilidade deacontecimentos compostoselementares, utilizando métodoscomo listas organizadas,diagramas em árvore e modelosde área.

Compreender o conceito deespaço amostral e distribuiçãode probabilidades;Usar simulações para criardistribuições de probabilidadeempíricas;Calcular e interpretar o valoresperado de variáveisaleatórias;Compreender os conceitos deprobabilidade condicionada ede acontecimentosindependentes;Compreender como calcular aprobabilidade de umacontecimento composto.

Fonte: NCTM (2008, p. 465)