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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO UMA CONTRIBUIÇÃO À GESTÃO MUNICIPAL NO ESTABELECIMENTO DE PRIORIDADES DE MELHORIA NA ÁREA SOCIAL Juarez Bortolanza Florianópolis, Abril de 2005.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA PROGRAMA … · A aplicação do modelo num município do Planalto Serrano, próximo a Florianópolis SC, tornou possível constatar as deficiências,

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA DE PRODUO

UMA CONTRIBUIO GESTO MUNICIPAL NO ESTABELECIMENTO DE

PRIORIDADES DE MELHORIA NA REA SOCIAL

Juarez Bortolanza

Florianpolis, Abril de 2005.

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JUAREZ BORTOLANZA

UMA CONTRIBUIO GESTO MUNICIPAL NO ESTABELECIMENTO DE

PRIORIDADES DE MELHORIA NA REA SOCIAL

Tese apresentada ao Programa de Ps-

Graduao em Engenharia de Produo

(PPGEP) da Universidade Federal de Santa

Catarina (UFSC) para a obteno do ttulo de

Doutor em Engenharia de Produo.

Orientador: Professor Osmar Possamai, Dr.

Florianpolis, Abril de 2005.

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Juarez Bortolanza

UMA CONTRIBUIO GESTO MUNICIPAL NO ESTABELECIMENTO DE

PRIORIDADES DE MELHORIAS NA REA SOCIAL

Esta tese foi julgada adequada para a obteno do ttulo de Doutor em Engenharia, especialidade Engenharia de Produo, e aprovada em sua forma final pelo Programa

de Ps-graduao em Engenharia de Produo.

Florianpolis, Abril de 2005.

Prof. Edson Pacheco Paladini, Dr. Coordenador do Programa

Banca Examinadora:

Prof. Osmar Possamai, Dr. Universidade Federal de Santa Catarina

Orientador

Prof. Luiz Veriano Oliveira Dalla Valentina, Dr. Universidade do Estado de Santa Catarina

Moderador

Prof. Gregrio Jean Varvakis Rados, PhD. Universidade Federal de Santa Catarina

Prof. Eduardo Moreira, Dr. ITAIP- BINACIONAL

Prof. Jlio Miranda Pureza, Dr. Universidade do Estado de Santa Catarina

4

DEDICATRIA

A DEUS

A meus pais, Victrio e Geni, pelo exemplo

de vida a mim repassado.

E ao meu filho, Victor, pelo aprendizado de

vida que est oferecendo.

5

AGRADECIMENTOS

Ao prof. Dr. Osmar Possamai, meu orientador, pela oportunidade, confiana em

mim depositadas, ensinamentos, apoio e colaborao na realizao deste trabalho e

principalmente pela amizade construda.

A minha esposa Lslei e a todos familiares pela contribuio e motivao

dispensada.

Universidade Estadual do Oeste do Paran e principalmente aos professores

do Curso de Administrao do Campus de Marechal Candido Rondon- PR, pelo

incentivo na realizao deste trabalho.

Universidade Federal de Santa Catarina e em especial aos professores, e

colaboradores da secretaria do Programa de Ps-Graduao em Engenharia de

Produo pela oportunidade deste aprendizado e ateno dispensada.

Aos colegas do GAV/EPS, em especial ao Dante e Charles, pela amizade,

solidariedade e convivncia neste perodo.Em nome destes, agradeo a todos colegas

do PPGEP.

Ao ex-prefeito, Sr. Mrio C. Goedert, e ao atual, Sr. Valcir Hugen, pela

oportunidade e acolhida prestada. De igual forma, meu muito obrigado aos

secretrios, diretores e aos que colaboraram na aplicao deste trabalho.

A todos que direta, e indiretamente, contriburam nesta jornada, meus sinceros

agradecimentos.

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RESUMO

Bortolanza, Juarez. Uma contribuio gesto municipal no estabelecimento de prioridades de melhorias na rea social. 2005. 219 pg. Tese (Dutorado em Engenharia de Produo) - Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo, UFSC, Florianpolis.

Os municpios brasileiros tiveram, nas ltimas dcadas, importantes conquistas constitucionais, relacionadas autonomia poltica, administrativa e poder em legislar pelos interesses locais. Este fortalecimento constitucional proporcionou s instituies municipais mais atribuies para o atendimento da populao na perspectiva social. Por sua vez, as gestes municipais, apresentam carncias administrativas por falta de experincia em administrao pblica, forte conotao poltica nas aes e uso dos recursos, desconhecimento da prpria realidade local e falta de critrios tcnicos para a aplicao adequada dos recursos. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo principal a elaborao de um modelo para auxiliar os gestores municipais no estabelecimento de prioridades de aes, com vistas a obter a melhor efetividade na aplicao dos recursos na perspectiva social. Para isso, a perspectiva social foi desdobrada em trs contextos principais, ou seja: habitabilidade, sade e educao. Para cada um destes contextos, est apresentado um conjunto de indicadores, especialmente selecionados e utilizados mundialmente por serem essenciais na apreciao desta perspectiva e para dar suporte ao modelo proposto. Todos indicadores foram avaliados por critrios tcnicos que permitem o estabelecimento de uma ordem de importncia. Os pontos com maior prioridade de ao e ateno dos gestores municipais, indica a tomada de deciso para o melhor uso dos recursos. Uma das principais contribuies do trabalho est na construo de um mapa de relaes causais entre os indicadores, com a avaliao da influncia exercida por cada indicador sobre os demais indicadores e, por conseguinte, sobre toda a perspectiva social em anlise. A aplicao do modelo num municpio do Planalto Serrano, prximo a Florianpolis

SC, tornou possvel constatar as deficincias, limitaes e carncias tcnicas dos gestores municipais, relacionadas tomada de deciso para o bom direcionamento das aes e dos recursos. Por sua vez, o trabalho demonstra que o modelo foi de tal valia que os gestores municipais esto, atualmente, empregando o mesmo para fins do planejamento anual do corrente ano e para o delineamento das aes das secretarias, visando o planejamento plurianual.

Palavras chave: Administrao municipal. Indicadores sociais. Tomada de deciso.

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ABSTRACT

Bortolanza, Juarez. A contribution to the municipal administration in establishing improvement priorities in the social area \ Juarez Bortolanza; orientador: prof. Osmar Possamai.-Florianpolis, 2005.

The Brazilian municipalities have had in the last decades, important constitutional conquers connected to political and administrative autonomy and to legislation capability by local interests. This constitutional strengthen has provided more attribution to the municipal institutions for the population attendance on the social perspective. By it means, the municipal administration experience in public administration, strong political connotation in to action and source usage, acknowledgement of the local reality itself and lack of technical criteria for the suitable resources application. On this way this task has as main purpose a pattern elaboration to help the municipal administrators in the establishment of action priorities, aiming to get the best effectiveness in the sources application on social perspective. For that, the social perspective has been spitted off in three main contexts that means: habitability, health and education. For each one of these contexts, it is presented a set of indicatives, specially chosen and used worldwide for being essential in the appreciation of such perspective and for giving support to the proposed pattern. All indicatives have been evaluated by technical criteria that permit the establishment of an important order. Points with more action priority and attention from the municipal administrators show a decision taking for the best sources usage. One of the main work contribution is in the building of a map of casual relationship among the indicatives with the evaluation persued by each indicator about other indicatives and, furthermore, about all the social perspective under analyses. The proposed pattern application was performed in a Planalto Serrano municipality, near Florianpolis-SC, which allowed to confirm the precariousness, limitation and technical lack of the municipal administrators connected to the decision taking for the good action and sources route. By it means, the work shows that the pattern has been so useful that the municipal administrators are nowadays using the same ways for the annual planning for the current year and for the delineation of the secretaries action, aiming to elaborate the pluriannual planning.

Key-words: Municipal administration. Social indicators. Decision taking.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 2.1 - A perspectiva social no desenvolvimento municipal................................31

Figura 2.2 - Municpios, por nvel de instruo do prefeito, segundo faixas de

populao, Grandes Regies e Unidades da Federao 2001.............43

Figura 2.3 As nove variveis do desempenho segundo Rummler e Brache (1992)..48

Figura 2.4 - Pirmide do modelo TIM (HARRINGTON; HARRINGTON (1997)............49

Figura 2.5 - Os blocos que compem a pirmide da Melhoria Total

(HARRINGTON e HARRINGTON, 1997).................................................50

Figura 2.6 Modelo proposto por Sink e Tuttle (Sink e Tuttle, 1993).........................52

Figura 2.7 - Famlia de medidas do modelo Quantum (HRONEC, (1993)...................53

Figura 2.8 Modelo Quantum de Medio de Desempenho (HRONEC, 1993)..........54

Figura 2.9 - Definindo as relaes de causa e efeito da estratgia

(KAPLAN e NORTON, 2000)....................................................................56

Figura 2.10 - O Balance Scorecard como estrutura para ao estratgica

(KAPLAN e NORTON, 1997)....................................................................57

Figura 2.11 - Perspectivas do Balanced Scorecard aplicado ao Setor Pblico

(proposto por ESTIS; HYATT, 1998)........................................................58

Figura 2.12 Inter-relao do SIGAU com o processo decisrio

(ROSSETTO, 2003)...................................................................................60

Figura 3.1 Exemplo de diagrama de enlace causal do contexto da sade.............104

Figura 3.2 Diagrama de enlace causal do contexto da sade.................................107

Figura 3.3 Diagrama de enlace causal do contexto da educao...........................108

Figura 3.4 Diagrama de enlace causal do contexto da habitabilidade....................109

Figura 3.5 Verificao da influncia (impacto) existente entre os indicadores........111

Figura 3.6 Relao de influncia exercida entre os indicadores.............................113

Figura 3.7 Abordagem geral do trabalho.................................................................114

Figura 4.1 Diagrama para comparar as funes.....................................................123

Figura 4.2 Diagrama com a relao de importncia das funes............................123

Figura 4.3 diagrama com os valores de importncia entre as funes...................124

Figura 5.1 Fluxograma das fases do modelo proposto............................................130

Figura 5.2 Fluxograma do encadeamento das etapas do modelo proposto............132

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Figura 5.3 Exemplos de critrios para auxiliar na seleo dos membros da

equipe.....................................................................................................133

Figura 5.4 Lista de indicadores sugeridos para aplicao no modelo proposto......135

Figura 5.5 Quadro para registro da situao atual dos indicadores........................137

Figura 5.6 Formulrio para registro da avaliao dos indicadores..........................139

Figura 5.7 Sugesto de faixas para pontuao dos indicadores nos critrios.........142

Figura 5.8 - Exemplo de Matriz de Deciso para priorizao dos indicadores..........143

Figura 5.9 Sugesto para construo do diagrama de Ischikawa...........................144

Figura 5.10 - Exemplo de formulrio para implantao de solues..........................147

Figura 5.11 - Exemplo de formulrio para acompanhamento da implantao da

soluo..................................................................................................148

Figura 5.12 - Exemplo de formulrios sugerido para acompanhamento da

implantao da soluo........................................................................148

Figura 6.1 Qualificao da equipe formada para aplicar o modelo.........................157

Figura 6.2 Lista de indicadores sugeridos para aplicao no modelo.....................159

Figura 6.3 Lista de indicadores com as metas estabelecidas.................................161

Figura 6.4 Quadro com o registro das metas e da situao atual dos indicadores..162

Figura 6.5 Formulrio com o registro da avaliao dos indicadores.......................164

Figura 6.6 Diagrama para estabelecer pesos de importncia aos critrios.............166

Figura 6.7 Diagrama para estabelecer a relao de importncia dos indicadores..167

Figura 6.8 - Necessidade de investimentos para as melhorias em cada indicador...168

Figura 6.9 - Impacto exercido entre os indicadores...................................................169

Figura 6.10 -Tempo necessrio para implantar as melhorias em cada indicador......170

Figura 6.11 - Dificuldade para a implantao de melhorias nos indicadores.............171

Figura 6.12 - Faixas para pontuao dos indicadores nos critrios...........................172

Figura 6.13 - Pesos dos critrios estabelecidos nos indicadores. ............................173

Figura 6.14 - Formulrio para implantao de solues............................................193

Figura 6.15 - Formulrio para acompanhamento da implantao da soluo...........194

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LISTA DE SIGLAS

ADA - Associao Dentria Americana

AHP - Analytic Hierarchy Process

AIH - Autorizaes de Internao Hospitalar

ANEEL - Agencia Nacional de Energia Eltrica

AU - Anlise de Utilidade (ou UA - Utility Analysis)

BCG - Bacilo de Calmette e Gurin (vacina)

BNH - Banco Nacional de Habitao

BSC - Balanced Scorecard

CE Constituio Estadual

CEPA - Center for Economic Policy Analysis

CEPAM - Centro de Estudos e Pesquisa de Administrao Municipal

CF - Constituio da Repblica Federativa do Brasil

CFM - Conselho Federal de Medicina

CFO - Conselho Federal de Odontologia

CGU - Controladoria Geral da Unio

CNI - Confederao Nacional da Industria

CPIs - Comisses Parlamentares de Inqurito

D.P.T. - Difteria, Ttano e Coqueluche

DATASUS - Banco de Dados do Sistema nico de Sade

DI - Desenvolvimento Institucional

DS - Desenvolvimento Sustentvel

DTP + Hib - Difteria, Ttano e Coqueluche mais doenas causadas pelo Hemfilos b

EUA - Estados Unidos da Amrica

EVN - Esperana de Vida ao Nascer

FGV - Fundao Getulio Vargas

FIOCRUZ - Fundao Osvaldo Cruz

HIV - Vrus da Imuno-Deficincia Humana

IADB - Inter-American Development Bank

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

IBGE/CD - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica/ Censo Demogrfico

IBGE/IDS - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica/ Indicadores de

desenvolvimento Social

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IBGE/SIS - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica/ Sntese de Indicadores

Sociais

ICV - ndice de Condies de Vida

IDEs - Investimento Direto Estrangeiro

IDB - Indicadores de Dados Bsicos

IDH - ndice de Desenvolvimento Humano

IDH-M - ndice de Desenvolvimento Humano Municipal

INAF - Indicador nacional de Alfabetizao Funcional

INAMPS Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social

INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

LDO - Lei de Diretrizes Oramentrias

LOA - Lei Oramentria Anual

LRS - Lei de Responsabilidade Fiscal

MAUT - Multi-Attribute Utility Theory

MCDA - Metodologias Multicritrios de Apoio Deciso

MCDM - Multiple Criteria Decision Making

MEC Ministrio de Educao e Cultura

MS Ministrio da sade

OECD - Organisation for Economic Co-operation and Development.

OMS - Organizao Mundial da Sade

ONU - Organizao das naes Unidas

OPAS - Organizao Pan-americana da Sade

PAI - Programa Ampliado de Imunizao

PIB - Produto Interno Bruto

PIBM - Pesquisa de Informaes Bsicas Municipais

PMDS - Plano Municipal de Desenvolvimento Sustentvel

PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios

PNB - Produto Nacional Bruto

PNI - Programa Nacional de Imunizaes

PNSB - Pesquisa Nacional de Saneamento Bsico

PNUD - Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

PPA - Plano Plurianual

PRODASE - Companhia de Processamento de Dados do Sergipe

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PSF - Programa Sade Famlia

SAEB - Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento

SNIS - Sistema Nacional de Informaes sobre Saneamento

SFN - Sistema Financeiro Nacional

SIGAU - Sistema Integrado de Gesto do Ambiente Urbano

SIS - Sntese de Indicadores Sociais

SUS - Sistema nico de Sade

TCU - Tribunal de Contas da Unio

TIM - Total Improvement Management

TJ - Tribunal de Justia do Estado do Paran

TRIPS - Direitos de Propriedade Intelectual e Cultural Relacionados com o Comrcio

UNDP - United Nations Development Programme

UNESCO - United Nations Educational Scientific and Cultural Organization

UNFPA - United Nations population Fund

UNICEF - Fundo das Naes Unidas para a Infncia

WHO - World Health Organization

WWF - World Wildlife

WWI - World Watch Institute

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SUMRIO

CAPTULO 1 INTRODUO....................................................................................15

1.1 - Apresentao do Problema de Pesquisa.............................................................15

1.2 - Objetivos do Trabalho..........................................................................................18

1.3 - Justificativa...........................................................................................................19

1.4 - Ineditismo do Trabalho.........................................................................................20

1.5 - Escopo do Trabalho.............................................................................................21

1.6 - Contribuio Terica............................................................................................22

1.7 - Premissas do Trabalho.........................................................................................23

1.8 - Estrutura do Trabalho...........................................................................................23

CAPTULO 2 FUNDAMENTAO TERICA..........................................................25

2.1 - Aspectos do Crescimento Populacional e Econmico mundial...........................25

2.2 - O Contexto da Habitabilidade...............................................................................32

2.3 - O Contexto da Sade...........................................................................................34

2.4 - O Contexto da Educao ....................................................................................37

2.5 - O Municpio no Cenrio Brasileiro........................................................................39

2.6 - Modelos de Auxlio de Melhoria de Desempenho Organizacional.......................46

2.7 - Consideraes......................................................................................................62

CAPTULO 3 OS PRINCIPAIS INDICADORES PARA A REA SOCIAL...............63

3.1 - A Importncia dos Indicadores.............................................................................63

3.2 - Indicadores do Contexto da Habitabilidade..........................................................66

3.3 - Indicadores do Contexto da Sade......................................................................77

3.4 - Indicadores do Contexto da Educao.................................................................92

3.5 Consideraes dos Indicadores Sociais ..........................................................101

3.6 Consideraes...................................................................................................115

CAPTULO 4 - INTRUMENTOS DE AUXLIO AO PROCESSO DECISRIO........116

4.1 - O Problema da Tomada de Deciso..................................................................116

4.2 - Modelos de Tomada de Deciso........................................................................119

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4.3 - A Tcnica MUDGE.............................................................................................122

4.4 - A Tcnica DELPHI.............................................................................................125

4.5 Consideraes...................................................................................................129

CAPTULO 5 MODELO PROPOSTO.....................................................................130

5.1- Apresentao Geral do Modelo...........................................................................130

5.2 - Descrio das Etapas do Modelo.......................................................................132

5.3 - Condies para Futuras Aplicaes do Modelo.................................................149

CAPTULO 6

APLICAO DO MODELO PROPOSTO........................................150

6.1 - Apresentao do Municpio Pesquisado............................................................150

6.2 - Descrio da Aplicao do Modelo....................................................................156

6.3 Avaliao Global do Modelo..............................................................................195

CAPTULO 7 CONCLUSO...................................................................................197

7.1 Concluses........................................................................................................197

7.2 - Sugestes para Futuros Trabalhos....................................................................199

REFERNCIAS..........................................................................................................200

15

CAPTULO 1 INTRODUO

1.1- Apresentao do Problema de Pesquisa

O marco da instituio municipal, no Brasil, ocorreu com a implantao do

municpio de So Vicente em 22 de janeiro de 1532. Entretanto, a formao

administrativa das instituies municipais esteve em atendimento dos interesses

Lusitanos ainda no Brasil Colnia. Com a descentralizao das capitanias, as

atribuies de ordem administrativas dos municpios se desenvolveram com o amparo

da Igreja e por iniciativa prpria. A fora dos municpios estava no poder poltico da

vereana e no poder econmico dos grandes proprietrios rurais, onde o direito

costumeiro se imps pela falta de textos escritos (GHISI, 1991). Constata-se que a

fora poltica e de poder se fez presente nas instituies municipais desde sua

formao.

A instituio municipal obteve avanos e alguns retrocessos nas Constituies

Federais (CF), mas se fortaleceu, principalmente, com a CF de 1988, pela ampliao

da autonomia poltica e administrativa do municpio e sua competncia para legislar. A

abertura da autonomia municipal constitui, desta forma, um fato recente, o que

proporciona exigncias ao aprimoramento e consolidao da instituio municipal.

Outro aspecto marcante aos municpios est na quantidade implantada de

novos municpios a partir de 1980, perodo em que havia 3991 municpios, passando

para 5560 at o ano de 2001. O tamanho populacional dos municpios uma

caracterstica marcante, pois 25% dos mesmos tm uma populao inferior a cinco mil

habitantes, 73% tem uma populao de at vinte mil habitantes e 96% tem uma

populao inferior a cem mil habitantes, o que demonstra o predomnio de municpios

de porte pequeno no Brasil (IBGE, 2004; 2005).

Entre outros fatores, mas principalmente pelo fortalecimento constitucional e

aumento expressivo de novos municpios resultou, no contexto administrativo, uma

srie de problemas. Os mais sentidos decorrem das deficincias relacionadas

administrao pblica pelos gestores municipais e da quantidade de atividades

inerentes destas administraes, principalmente, voltadas ao atendimento das

funes da rea social populao.

16

Diante da pouca experincia administrativa pblica dos gestores, as prprias

propostas de governo passam a se configurar como aes administrativas, com a

conotao poltica acima das necessidades e viabilidade tcnica, onerando muitas

vezes a comunidade local pela falta de um planejamento compatvel com as

condies e aspiraes da prpria comunidade. Isto decorre, em muitos casos, do

pouco conhecimento disponvel da realidade local, em que medidas administrativas

so, por vezes, tomadas sem um estudo ou critrio tcnico adequado

(BORTOLANZA; POSSAMAI, 2001).

O amadorismo predomina nas administraes municipais e pode gerar crise de

governabilidade, por negligenciar preceitos constitucionais e legais que so

instrumentos de gesto obrigatrios, desde a Constituio Federal (CF) de 1988. Isto

visto, ao se observar que, em 1999, somente 16% das prefeituras possuam o Plano

Diretor, o qual fornece o ordenamento bsico da estrutura territorial urbana.

(IBGE/PMB, 2001; 2002).

As deficincias das administraes municipais podem ser vistas, utilizando-se

como exemplo o estado do Paran, no qual 60% das prefeituras tiveram seus

balanos desaprovados pelo Tribunal de Contas nos anos de 2000 e 2001. Durante o

ano de 2004, o Ministrio Pblico denunciou 54 crimes efetuados pelos prefeitos, alm

de enfrentarem outras 485 denncias na justia. Os dois principais crimes esto

caracterizados pelo desvio de verbas e fraude em licitaes, incluindo, tambm, as

compras sem concorrncia pblica (TJ, 2004). Fato semelhante se percebe no Rio

Grande do Sul, pois na ltima dcada, 169 prefeitos foram condenados por crimes, o

que representa uma pequena parcela da problemtica das administraes municipais

no Pas.

O Tribunal de Contas da Unio (TCU) acompanha as gestes municipais por

amostragem, com sorteio das prefeituras de todo Pas para prestao de contas. Das

50 sorteadas e apreciadas pelo TCU em 2004, 48 apresentaram irregularidades em

suas gestes (TCU, 2004). E nos relatrios concludos da Controladoria Geral da

Unio, consta que dos 200 municpios fiscalizados, apenas 7 no apresentaram

indcios de qualquer problema administrativo (CGU, 2005).

O desconhecimento ou negligncia da realidade local, pelas administraes

municipais, pode ser visto no contexto da habitabilidade da populao, pois faltam

mais de seis milhes de novas moradias. Alm desta carncia, prximas a dois

milhes e meio de moradias esto com adensamento excessivo e em torno de um

17

milho de outras moradias, se encontram em condies inadequadas, decorrentes do

tempo de uso e falta de manuteno (IBGE/SIS, 2002; 2004). O abastecimento de

gua por rede geral feito em 80% dos domiclios brasileiros. Entretanto, este

abastecimento no descreve a especificao do tipo de rede existente nem a

qualidade da gua ofertada. O sistema de esgotamento sanitrio, ligado rede

coletora, atende 45,4% das moradias e 80% do esgoto coletado transportado sem

tratamento para os rios, lagos ou para o mar (IBGE/BRASIL, 2003, 2004; IBGE/PNAD,

2003).

Assim, muitas doenas j eliminadas h tempo, em pases desenvolvidos,

apresentam surtos e persistem em continuar atingindo a populao brasileira. Entre

outras, as doenas do aparelho respiratrio, circulatrio e doenas infecciosas e

parasitrias ocupam as principais posies de freqncia, apontando as precrias

condies da populao. Isto fortalece uma caracterstica na rea da sade no Brasil,

que compreende o atendimento asilar curativo frente ao preventivo, necessitando de

maior quantidade de recursos da populao.

No sistema educacional, a alfabetizao, conforme os resultados do III

Indicador Nacional de Alfabetizao Funcional (INAF, 2003), 8% da populao

brasileira na faixa etria de 15 a 64 anos, analfabeto absoluto, enquanto que o

IBGE/SIS (2005), aponta que em 2003, a taxa de analfabetos, nesta faixa etria,

correspondia a 11,6% da populao.

A taxa de freqncia na Educao Infantil de 37,7 % (IBGE/BRASIL, 2005;

IBGE/SIS, 2005). A Educao Infantil contribui para o ingresso e melhor desempenho

no Ensino fundamental, que apresenta uma taxa esperada de concluso de 59%

(INEP, 2002). O Ensino Mdio atinge unicamente 18% da populao e o percentual de

brasileiros com nvel superior completo de apenas 4% (MEC, 2001; IBGE/SIS,

2003).

A deficiente ateno voltada educao tambm se faz sentir nos gastos, pois

segundo a Confederao Nacional da Indstria (CNI, 2002), o Brasil gasta pouco com

o Ensino Bsico e direciona mal, os recursos para a educao. Prioridades

equivocadas, desperdcios na arrecadao e repasse inadequado de recursos

agravam este quadro de escassez. Estima-se que s 50% do montante investido no

Ensino Bsico chegue efetivamente escola e, no necessariamente, sala de aula.

A CNI (2002), aponta ainda que somente a repetncia na primeira e segunda srie do

Ensino Fundamental proporciona um custo adicional de US$ 2,5 bilhes todos os

18

anos. O gasto excedente chega a 30% em razo da repetncia no Ensino

Fundamenta (INEP, 2003).

Tais constataes denotam a situao precria de acesso da populao ao

conjunto dos servios pblicos nos contextos de Sade, Educao e Habitalbilidade,

determinantes na compreenso da qualidade de vida da populao.

Esses aspectos demonstram que as administraes municipais carecem de

instrumentos e suportes tcnicos para estabelecer prioridades de investimentos e

verificar seu desempenho administrativo. O contexto administrativo peculiar, das

administraes pblicas municipais, exige, por parte dos gestores, o conhecimento da

realidade local e transparncia nos interesses da municipalidade. Para isso, a boa

aplicao dos limitados recursos disponveis, torna necessria a apresentao de

critrios adequados para a aplicao dos mesmos em aes e atendimento s causas

locais mais prioritrias. Em face ao exposto, pode-se formular a seguinte pergunta de

pesquisa: Como instrumentalizar os gestores municipais na identificao das

condies sociais bsicas da populao, com vistas a apontar as prioridades de

investimentos?

A partir da formulao da pergunta de pesquisa, pode-se estabelecer os

objetivos que nortearo o trabalho.

1.2 - Objetivos do Trabalho

Objetivo Geral.

Desenvolver um modelo para estabelecer prioridades de aes, com vistas ao

aumento da eficincia do uso de recursos para a rea social em gestes municipais.

Objetivos especficos:

- Determinar um conjunto de indicadores para a rea social, mais adequado

para o gerenciamento municipal;

- Identificar as relaes de influncias entre os indicadores levantados e sua

importncia para a gesto municipal:

- Determinar uma ordem de prioridades de execuo para as aes de melhoria

na rea social.

- Propor parmetros para o acompanhamento contnuo do desempenho da

Gesto Municipal na rea social.

19

1.3 Justificativa

O desafio da administrao pblica municipal brasileira est na crescente

quantidade de competncias exigidas, seja em seu nmero, variedade e

complexidade. A administrao pblica o instrumento usado pelo Estado para

elaborar e executar planos e programas que atendem as necessidades sociais

(EMMERICH, 1999; PEREIRA; SPINK, 2001).

A administrao, no seu estgio atual, deve estar constantemente procura de

novas bases de anlise quantitativa, e nada deve ser aceito simplesmente por ter sido

aplicado no passado. Alm disso, Frost, (1960), Quaglia, (1976), Porter, (1989), e

Pereira e Spink, (2001), afirmam que novos mtodos de medio devem ser

investigados, testados, verificados e adotados nas prticas administrativas atuais,

caracterizando uma lacuna a ser pesquisada.

A administrao de instituies pblicas, como as administraes municipais,

tornam delicados, complexos e morosos vrios processos que se podem apresentar

mais simples e dinmicos na empresa privada, cujos objetivos so mais claros e o

foco do controle externo uma pequena frao daquele exercido sobre uma empresa

financiada pela sociedade (JOHNSON, et al, 1996; PORTER, 1989).

A administrao privada guiada pelo motivo de realizar lucro, enquanto que

os objetivos da administrao pblica no so medidos em termos de dinheiro e no

podem ser verificados por mtodos contbeis, apontam Waldo, (1966), e Porter,

(1989). Na administrao pblica, no h conexo entre receita e despesa, pois os

servios pblicos somente gastam o dinheiro da receita derivada dos tributos impostos

pela lei.

A administrao pblica se focaliza diretamente no interesse pblico, no

havendo preo de mercado para as realizaes, j que os assuntos no podem ser

aferidos por resultados econmicos. Torna-se indispensvel operar as reparties

pblicas segundo princpios inteiramente diferentes dos aplicados para a obteno de

lucro, como os existentes nas empresas privadas (PEREIRA; SPINK, 2001; WALDO,

1966).

Desta forma, Waldo, (1966), e Porter, (1989), afirmam que uma repartio

pblica no uma empresa, procura de lucros; no pode fazer uso do clculo

econmico; nem resolver problemas desconhecidos das empresas privadas. Na

esfera do governo, o resultado no tem preo estabelecido pelo mercado. No pode

20

ser comprado nem vendido, enquanto que a empresa privada est sujeita aos fatores

ambientais do mercado (KOTLER; ARMSTRONG, 2003).

Os trabalhos de Porter, (1989), e Kotler & Armstrong, (2003), mostram que

muitas das tcnicas, empregadas na gesto de empresas, so usadas nas

administraes pblicas e fazem parte do intercmbio de idias dos estudiosos da

administrao. Mas algumas peculiaridades inerentes as diferenciam, delineando os

limites ao intercmbio de princpios e processos em cada uma das reas,

configurando um estudo especial para as tcnicas da administrao municipal.

Enquanto os resultados da administrao privada so vistos como ganhos de

capital, os da administrao pblica so obtidos pela melhoria das infra-estruturas,

das condies de vida e bem-estar da populao. O patrimnio e os recursos pblicos

devem ser geridos com o mesmo grau de eficincia e racionalizao, utilizado pela

iniciativa privada, visando o lucro contido no bem comum. O uso inadequado dos

recursos pblicos mais difcil de se averiguar, diante da razoabilidade da

administrao, utilizada nos oramentos pblicos, inibindo as malversaes dos

recursos econmicos em poder dos gestores municipais (MATA, 1994). Por sua vez,

os indicadores mostram a pouca ateno dos gestores municipais ao bem-estar da

populao por meio da rea social.

Neste sentido, o trabalho busca determinar as prioridades de melhoria na rea

social, por ser o grande entrave dos gestores municipais, principalmente quando da

aplicao adequada dos recursos oramentrios com vistas ao bem-estar da

populao. A literatura se abstm de tratar um problema j conhecido no meio

empresarial, mas com peculiaridades prprias na administrao pblica, a qual no

permite que os modelos existentes sejam diretamente aplicados na gesto municipal,

sem sofrerem as devidas adequaes.

1.4 Ineditismo do Trabalho

As discrepncias existentes entre os reais propsitos das administraes

municipais, frente s carncias existentes nos municpios, a reduo desse hiato nas

gestes. Portanto, esse trabalho prope fazer uso de alguns indicadores conhecidos

mundialmente, bem como criar outros indicadores coerentes com as realidades

municipais para atender as lacunas existentes.

21

O destaque est na caracterizao de um conjunto de indicadores adequados

e pertinentes para analisar as condies sociais de um municpio. O trabalho contm

a existncia de um conjunto de laos causais que permita estabelecer as relaes de

causa e efeito entre estes indicadores de modo a avalias as relaes de impacto que

cada indicador exerce no alcance da melhoria das condies de vida da populao.

Por fim, estabelece critrios que permitam ofertar uma ordem de priorizao e

investimentos a cada indicador que se mostrar deficitrio.

Os indicadores utilizados pelo World Bank, (2000; 2001), OPAS (2001; 2002),

PNUD (1998; 2002; 2003), IBGE/IDS (2002), IBGE/SIS (2003; 2005), UNICEF (2003),

UNESCO (2001) OMS (1995; 2002), entre outros, contemplam um conjunto

abrangente de dados estatsticos de determinado pas ou municpio, mas como so

apresentados na literatura existente, no respondem s necessidades das gestes

pblicas municipais, por no fornecerem o suporte, os critrios e a importncia de

cada indicador para o contexto social e peculiar que envolve um municpio. As

condies de sade da populao, por exemplo, segundo a OMS, (1995; 2002),

Gotlieb, (1981), Barboni e Gotlieb, (2004) e Simes, (2002), por si no apontam

caminhos para melhorar as condies de vida da populao, sendo necessrio

estabelecer procedimentos e metas prioritrias para balizar a ao das autoridades.

A complexidade da rea social induz os gestores municipais aplicao dos

recursos de forma dispersa, sem atender adequadamente as reais prioridades da

populao. Portanto, o modelo a ser proposto deve contribuir para o estabelecimento

de prioridades das aes de melhoria para a rea social, envolvendo aspectos da

sade, educao e habitabilidade da populao no municpio. Selecionar

adequadamente os indicadores problemticos e com maior impacto na rea social,

pode direcionar as aes dos administradores municipais na aplicao mais efetiva

dos recursos oramentrios.

1.5 Escopo do Trabalho

O tratamento do contexto social, mesmo no mbito municipal, pode ser muito

abrangente se forem apreciados todos os indicadores contidos, no WORLD BANK,

(2000), na UNICEF, (2003), no IBGE/IDS, (2002), e IBGE/SIS, (2003; 2005).

Entretanto, ao considerar a amplitude permitida para a apreciao da rea social, mas

em busca de atender a pergunta de pesquisa e os objetivos estabelecidos para este

22

trabalho, busca-se proporcionar aos gestores municipais um procedimento de auxlio

nas decises, com prioridade para o atendimento dos pontos com maior exigncia de

ao para o bem-comum do municpio.

Para isto, a perspectiva social ser delimitada nos seguintes contextos: da

sade, da educao e da habitabilidade, no atingindo a rea econmica e ambiental,

mesmo que tenham interface com as mesmas. Mesmo assim, nestas reas, pela

abrangncia pertinente em cada uma, sero destacados os indicadores essenciais e

necessrios a serem considerados para promoverem uma boa gesto municipal na

conquista do progresso social num municpio.

1.6 - Contribuio Terica

A constituio de um conjunto de indicadores que retratem as condies sociais

locais, com a apresentao da performance de cada um dos indicadores e a

importncia nas melhorias das condies sociais ser uma contribuio mpar s

gestes municipais na conduo de suas atividades e bom gerenciamento do setor

pblico.

A combinao desse conjunto de indicadores prprios e direcionados ao apoio

deciso para os gestores municipais atender s peculiaridades das administraes

pblicas, seja de ordem poltica, pois os benefcios aos muncipes do respaldo aos

gestores, seja de ordem legal, pois atende aos contextos constitucionais; seja de

ordem econmica, por viabilizar procedimentos mais coerentes e viveis de aplicao

dos recursos e investimentos a serem efetivados, alm dos princpios ticos, morais e

deveres do administrador pblico.

O modelo proposto cria condies para que o planejamento municipal passe a

ser elaborado e implantado por um grupo de pessoas (tcnicos, representantes da

comunidade, especialistas, entre outros), com vistas a atender aos princpios tcnicos

e com maior viabilidade, criando tambm subsdios para que o processo decisrio

pblico sofra menor influncia poltica, deixando o vis poltico como conseqncia

das boas aes efetivadas pelos gestores.

Outra contribuio importante que o trabalho proporciona a de evidenciar as

relaes de causa e efeito entre os indicadores de contextos distintos como sade,

educao e habitabilidade, de modo que seja possvel determinar o grau de influncia

23

com que as aes realizadas em uma secretaria municipal exercem sobre outras

reas do municpio.

1.7 Premissas do Trabalho

Com vistas a facilitar a modelagem do problema proposto, alguns pressupostos

iniciais se fazem necessrios:

1 - as aes municipais previstas em seu planejamento municipal voltadas ao bem-

estar social, so de competncia dos gestores municipais e no dos gestores do

Estado ou da Federao (salvaguardando as questes legais);

2

as aes necessrias ao bem-estar da populao, mas que fogem da

competncia/responsabilidade exclusiva dos gestores municipais, devem ser

conduzidas pelos gestores municipais;

3 - a perspectiva social compreender trs contextos: da habitao, da sade e da

educao, cabendo o mesmo peso de importncia a cada um, no alcance da

adequada responsabilidade social do municpio;

4

na perspectiva social, os indicadores de cada contexto (habitabilidade, sade e

educao) so obtidos em consonncia com os indicadores universalmente utilizados

para cada grupo e, portanto, independem da vontade ou escolha dos gestores

municipais, muito embora pequenos ajustes possam ser feitos;

5 - um planejamento municipal, considerado adequado, dever ser baseado nos

preceitos de Desenvolvimento Sustentvel - DS, cabendo ao aspecto Social o mesmo

peso de importncia que o dos aspectos Econmicos e Ambientais;

6 - existem conjuntos de ndices adotados universalmente para medir o grau de DS

Desenvolvimento Social de municpios (IDH, IDH-M, ICV), mas no so formatados s

exigncias e peculiaridades das gestes municipais.

1.8- Estrutura do Trabalho

O trabalho est estruturado em seis captulos.

O Captulo 2 apresenta uma contextualizao da rea social nas Condies de

Habitabilidade, da Sade e Educao, presente em todos os continentes, mas com

nfase, principalmente, s condies existentes no Brasil.

24

O Captulo 3 apresenta um constructo terico que permite identificar os

indicadores da rea social, essenciais para o bem-estar da populao, com destaque

para a relevncia de cada indicador e como o mesmo medido.

O Captulo 4 apresenta um conjunto de tcnicas que serviro de base para a

construo do modelo a ser proposto no Captulo 5.

O Captulo 5 apresenta o modelo proposto, descrevendo detalhadamente cada

um de seus passos para a implantao e acompanhamento dos resultados obtidos.

No Captulo 6 so apresentados e analisados os resultados obtidos com a

aplicao do modelo proposto.

Finalmente, o Captulo 7 apresenta as concluses do trabalho, bem como as

sugestes para trabalhos futuros.

25

CAPTULO 2 FUNDAMENTAO TERICA

Este Captulo parte de uma abordagem do contexto social mundial para, em

seguida, retratar as condies brasileiras na perspectiva social. As problemticas das

condies na perspectiva social no Brasil, mesmo com os avanos ocorridos,

principalmente aps a dcada de 70, deixam a desejar para a maior parte da

populao brasileira. Neste sentido, sero abordados aspectos relevantes na

perspectiva social, por meio de um conjunto de indicadores considerados mais

apropriados para a apreciao desta perspectiva e que permitiam avaliar as condies

sociais de uma populao.

2.1

Aspectos do Crescimento Populacional e Econmico mundial

A populao em 8000 a.C., calculada pelos meios estatsticos da poca, era de 5

milhes de habitantes. Com seu crescimento natural, em 1650 a populao era de

500 milhes de habitantes. Em 1850, aps 200 anos, foi registrado o 1 bilho de

seres humanos. O segundo bilho, ocorreu em 1930, ou seja, a duplicao

populacional ocorreu num perodo de 80 anos. O terceiro bilho deu-se em 1960 e o

quarto bilho em 1975, ocorrendo, novamente, duplicao da populao, mas desta

vez num perodo de 45 anos. O quinto bilho de pessoas foi atingido em 1987 e o

sexto bilho ocorreu no dia 12 de outubro de 1999, institudo pela ONU como o dia

dos seis bilhes (HAUB, 1998; BROWN; POSTEL, 1987).

Diante deste crescimento populacional, as estimativas apontam para 9,3 bilhes

em 2050. Isto representa um crescimento de 50 % da populao no prximo meio

sculo, sendo que 95% deste crescimento populacional est ocorrendo em pases em

desenvolvimento, aumentando as questes gerais a serem solvidas no planeta

(GORSON, 1996; FREITAS, 2000).

A concentrao da populao em reas urbanas outro imperativo conjuntura

do planeta. Em 1960, um tero da populao morava em reas urbanas, passando

para 47% em 1999 e praticamente j metade da populao mundial vive em reas

urbanas, o que poder chegar a 61% at 2030 (WORLD BANK, 2003b,c; HAUB,

1998).

26

Esse crescimento populacional e sua concentrao proporcionam conseqncias

considerveis nas reas econmica, social e ambiental diante das distores da

sociabilidade existente, como ser abordado nos prximos itens.

O panorama mundial visto pela dimenso social, constata a corroso das

condies de vida e sobrevivncia da espcie humana. O fortalecimento de uma

minoria favorecida forja, sob inmeros aspectos, a decadncia de uma massa

crescente de pessoas, vivendo em plena pobreza. Esta constatao confrontada

estatisticamente, em que os valores numricos descrevem a condio de vida da

populao mundial.

Em 1999, a economia global correspondia a US$ 32,5 trilhes, com movimento

dirio no mercado mundial de U$ 1,5 trilhes. Esta economia poder chegar a US$

140 trilhes at meados deste sculo (WORLD BANK, 2003a, b).

Todavia, existem 2,8 bilhes de pessoas que sobrevivem com menos de US$

2,00 por dia, entre os quais, 1,2 bilho com menos de US$ 1,00/dia, o que significa

condies de pobreza extrema. (PNUD, 2001, WORLD BANK, 2002; 2004a). Somente

na ltima dcada, 100 milhes de pessoas passaram a fazer parte deste cenrio e as

projees do Banco Mundial, com bases nas tendncias recentes, apontam para o

crescimento nas disparidades entre os pases ricos e pobres e, conseqentemente, o

nmero de pessoas que subsistiro abaixo dessa linha internacional de pobreza

poder atingir 1,9 bilho at 2015 (WORLD BANK, 2004a, b; PNUD, 1999; PNUD,

2002).

A concentrao monetria pode ser lida pelo PIB, um indicador econmico, que

mostra que a diferena entre a quinta parte mais rica com a quinta parte mais pobre

da populao, que era de 30 vezes em 1960, em 1997 passou a ser de 74 vezes.

(UNFPA, 2003; PNUD, 1999). Num outro prisma, vale dizer que o recurso econmico

do 1% mais rico da populao mundial equivalente aos dos 57% mais pobres e

quando esse referencial passa a ser entre os 5% mais ricos e 5% mais pobres a

diferena de 114 vezes (PNUD, 2002; WORLD BANK, 2003a,c; 2004a,b).

Em termos econmicos, os EUA, com um PIB de cerca de US$ 9,9 trilhes,

produzem, sozinhos, em torno de 30% das riquezas do mundo. Quando incorporado o

PIB do Japo e da Alemanha, o resultado corresponde a metade do PIB mundial. Os

25 pases com maior PIB do mundo produzem cerca de 90% de toda a riqueza do

planeta. Por analogia, mais de 175 pases contribuem com apenas 10% do PIB

mundial (PNUD, 2002; WORLD BANK, 2003a, c).

27

Esta concentrao econmica se faz sentir nos pases menos favorecidos, pois a

renda mdia per capita em 40 pases cresceu apenas 3% ao ano desde 1990. Por sua

vez, 133 pases tiveram um declnio da renda per capita no mesmo perodo e, 80

destes pases contam com uma renda atual per capita inferior aos obtidos h dez

anos (PNUD, 2002; WOLD BANK, 2004a; 2003a, b).

Este hiato proveniente do sistema econmico entre ricos e pobres, em virtude do

tratamento dispensado questo, tende a perdurar ou inclusive a aumentar como

aponta o relatrio do Banco Mundial diante das tendncias recentes (PNUD, 1999;

WOLD BANK, 2004a, b, c).

A UNICEF (2003c), demonstra essa possibilidade por meio de um estudo que

realizou com 30 pases em desenvolvimento e indica que a dvida externa dos pases

menos desenvolvidos subiu de 62,4% do PNB (Produto Nacional Bruto), em 1985,

para 92,3%, em 1997 e dois teros destes pases destinam mais verba para o

pagamento da dvida do que para servios sociais bsicos. Mesmo assim, o saldo

negativo da dvida crescente, penalizando mais esses pases menos favorecidos.

As polticas ou processos mundiais em andamento que visam diminuir tais

realidades no surtem os efeitos desejados, pois os incentivos dos pases altamente

desenvolvidos, aos menos favorecidos, no alcanaram o patamar previsto de 0,7%

do PNB destes pases. Alis, estes incentivos, diminuram em um tero desde 1986,

permanecendo em 1997 na casa de 0,22% do PNB, ou seja, num nvel mais baixo

que 1970. Devido a este fator as diferenas aumentaram consideravelmente (WORLD

BANK, 2002; 2003a, c; 2004a).

Estas discrepncias foram sentidas, principalmente, por 48 pases menos

desenvolvidos, em 1998, por atrarem menos de 3 bilhes de dlares de Investimento

Direto Estrangeiro (IDEs), apenas 0,4% do total. Soma-se a isso, o fato de que as

exportaes destes pases representaram menos de 0,4% das exportaes mundiais

(PNUD, 2002; WORLD BANK, 2003a; 2004b).

A ONU reconhece que o crescimento econmico apresenta melhorias

generalizadas da vida humana e das condies de vida, mas destaca que as pessoas

so o recurso econmico mais importante e a verdadeira riqueza das naes;

portanto, no basta ter apenas resultados de cunho econmico para o progresso de

uma nao (PNUD, 1998).

O ndice de Desenvolvimento Humano (IDH), criado em 1990, pelos economistas

Mahbub ul Haq e Amartya Sen, procura espelhar a renda (calculada atravs do PIB

28

real per capita); a longevidade de uma populao (expressa pela sua esperana de

vida ao nascer) e; o grau de maturidade educacional (que avaliado pela taxa de

alfabetizao de adultos e pela taxa combinada de matrcula nos trs nveis de

ensino). Antes do IDH, o conceito de Desenvolvimento Humano era baseado no PIB

per capita, sendo incorporado mais dois agregados, a longevidade e a educao,

nesta avaliao utilizada pela ONU e por muitos pases (PNUD, 1998).

O IDH, ndice de Desenvolvimento Humano, que contm as dimenses de renda,

longevidade e educao, com pesos iguais e concebidos para comparar o

desenvolvimento humano entre pases. O IDH serviu como referncia para a criao

de outros ndices como o IDH-M - ndice de Desenvolvimento Humano Municipal, que

teve adaptaes do IDH para se adequar anlise do municpio (ATLAS, 1998). O

ICV, ndice de Condies de Vida nos municpios, inclui 20 indicadores bsicos,

agrupados em cinco dimenses: renda (com cinco indicadores), educao (com cinco

indicadores), infncia (quatro indicadores), habitao (quatro indicadores) e

longevidade (dois indicadores) (ATLAS, 1998). Contudo, esses ndices fazem uma

abordagem do contexto social de cada municpio, sem contemplar as melhores aes

a serem efetivadas pelos gestores para melhor atender a perspectiva social no

municpio.

O contexto mundial, em decorrncia do crescimento populacional e econmico,

que se destaca, devido a sua concentrao, aponta os desvios que sero sentidos na

rea social de cada pas e conseqentemente nos municpios, conforme constam nos

objetivos deste trabalho.

O modelo econmico, utilizado no Brasil, a partir da dcada de 30, e as

condies promissoras do cenrio internacional interferiram no desenvolvimento

brasileiro. Os resultados das aes, voltadas ao modelo econmico implantado,

proporcionaram alteraes importantes no setor agrrio, at ento a base de

exportao, para a implantao de parque industrial, com vistas a substituir as

importaes por meio da industrializao no Pas (CASTRO, 1985; Brasil em

Nmeros, 1994). A partir deste perodo, alterou-se a demografia, em crescimento e

deslocamento da populao, que passou de 41 milhes de habitantes em 1930, para

70 milhes em 1960 e a taxa de urbanizao passou de 31 para 41%.(MARICATO,

2001; IBGE/SIS, 2002, 2003; IBGE/AEB, 2003).

Essa mobilizao da populao para a rea urbana decorreu, principalmente, do

sistema de mecanizao empregado para produo agrcola em larga escala. Assim,

29

entre 1960 e 1980, mais de 30 milhes de trabalhadores rurais deixaram suas

atividades e migraram para cidades e essa migrao foi de 50 milhes somente nas

ltimas trs dcadas (CASTRO, 1985; IBGE/BRASIL, 1999; 2003; IBGE/SIS, 2002).

Essa nova paisagem do desenvolvimento econmico surtiu seus efeitos nas

questes sociais, pois este incremento populacional, proporcionou um aumento do

nmero de assentamentos irregulares nas cidades e numa extenso irracional da

malha urbana que consolidou as periferias como local de moradia da populao de

menor renda. Esta constatao percebida no aumento de 22% das reas de favela

entre 1991 e 2000, contribuindo para a ocupao irregular e ilegal do solo. As

condies dos 38 milhes de habitantes na rea rural no so mais favorveis, pois

73% tm renda anual inferior linha da pobreza (SAULE Jr., 2001; MARICATO, 1987,

2001; IBGE/SIS, 2002, 2003).

A desigualdade de rendimentos constitui uma caracterstica marcante da

sociedade brasileira, a qual j perdura h dcadas e com crescimento na dcada de

90. Em 2001, o 1% mais rico da populao detinha 13,3% do rendimento total, quase

o equivalente ao percentual dos 50% mais pobres com 14,3%. Ao ampliar esse

conjunto dos extremos da populao, dos mais ricos e dos mais pobres, os 10% mais

ricos ganham 18 vezes mais que os 40% mais pobres. Neste sentido, o rendimento

per capita mensal de 22,9% das famlias menos favorecidas corresponde a 0,45

salrio mnimo, enquanto que os 10% na outra extremidade conta com um rendimento

de 13,4 salrios mnimo, equivalendo uma renda per capita familiar 22 vezes maior.

Outro aspecto relacionado ao rendimento diz respeito constituio familiar. Pois em

2001, as famlias com rendimento per capita de at 25% de salrio mnimo eram

compostas, em mdia, de 4,8 pessoas e 2,8 filhos, enquanto as famlias com

rendimento per capita superior a 5 salrios mnimos apresentavam nmero mdio de

pessoas e filhos igual a 2,6 e 0,8 filhos. O maior nmero de filhos em famlias mais

carentes um dos fatores do agravo da situao econmica, havendo um correlato ao

crescimento populacional mundial, principalmente em pases com maiores

dificuldades econmicas (PNUD, 2003; IBGE/SIS, 2002).

O aumento populacional, principalmente nos pases em desenvolvimento onde

as taxas de crescimento populacional e as desigualdades socioeconmicas so

maiores, so fatores que proporcionam as diferenas existentes entre os pases

desenvolvidos e os pases em desenvolvimento. As limitaes econmicas dos pases

em desenvolvimento so mercados pouco atrativos para as grandes corporaes

30

internacionais, deixando uma parcela considervel da populao mundial s margens

de atendimento de suas necessidades e possibilidade de crescimento nestes pases.

Os avanos tecnolgicos em matria de transporte, comunicao e informao,

e com eles a transmisso de idias por todo o mundo, contriburam tambm para o

fluxo monetrio e de mercadorias. Desta forma, a reduo do espao e do tempo e o

desaparecimento das fronteiras possibilitam a comunicao direta e individual,

proporcionando uma riqueza sem precedentes aos capazes de obter vantagem do

fluxo crescente de bens e servios pelas fronteiras nacionais. Com forte poder de

barganha, as principais corporaes do mundo, para maximizar a rentabilidade e a

acumulao de capital, exercem presso sobre seus governos para facilitar esse tipo

de integrao, por meio do processo de globalizao, dando lugar

transnacionalizao da economia mundial (FREITAS; BRCIO; AGUIAR, 2000;

WORLD BANK, 2003a,c; 2004a, c; Martin, 1999).

Os registros conferem esta fora organizacional, pois j no inio dos anos 90,

cerca de 37 mil corporaes transnacionais com 170 mil filiais se destacavam na

economia internacional. Entretanto, um conjunto restrito de oito pases detm 96,5%

das 200 maiores corporaes do mundo e 96% de seus lucros (FREITAS; BRCIO;

AGUIAR, 2000). A concentrao, porm, muito maior do que sugerem os nmeros,

j que muitas das 200 maiores no so empresas autnomas. A formao de feudos

e imprios, dotados de um importante grau de autonomia, est estrategicamente

interligada por meio de polticas comuns de administrao, fixao de preos,

produo e comercializao, assim como por redes de inteligncia econmica e

poltica (CAVES; FRANKEL; JONES, 2001; FREITAS; BRCIO; AGUIAR, 2000;

PNUD, 1999).

As corporaes transnacionais recebem apoio de seus governos nacionais e

estmulos dos governos anfitries, como subsdios fiscais acordados, a fim de facilitar

os negcios dessas corporaes nos pases anfitries. (CHOSSUDOVSKY, 1999).

Aos pases industrializados comporta tambm os Direitos de Propriedade

Intelectual e Cultural Relacionados com o Comrcio

TRIPS, pois pertence a estes

pases, 97% de todas as patentes dos produtos comerciais. As corporaes globais

detm 90% de todas as patentes de tecnologias e de produtos (CHADE, 2001; WOLD

BANK, 2003c; 2004c).

Isto coloca em risco e em marginalizao os pases pobres e parcela

considervel da populao mundial, decorrente do controle das inovaes nas mos

31

das empresas multinacionais, por ignorarem as necessidades de milhes de pessoas.

As novas tecnologias planejadas tm preos estabelecidos, restringindo-se para

aqueles que podem pagar. Comprova-se isto nas pesquisas em biotecnologia, em que

os cosmticos, entre outros, assumem prioridade em relao vacina contra a

malria em relao aos estudos genticos dos produtos que so resistentes seca

em regies perifricas (PNUD, 2001; WORLD BANK, 2003a,c; 2004b. c).

Em face do exposto, pode-se verificar a complexidade e o volume de variveis

que deveriam ser analisadas para retratar o Desenvolvimento Sustentvel de uma

regio. Para tanto, e em consonncia com os objetivos do trabalho exposto no

Captulo 1, faz-se necessrio o delineamento de um escopo considerado mais

representativo para avaliar especificamente o desenvolvimento social de uma

populao. Nesse sentido, a figura 2.1 permite a visualizao das reas de interesse

que sero objeto deste trabalho e sobre os quais devero ser efetuados estudos mais

profundos, com vistas obteno de um conjunto de indicadores mais pertinentes.

Figura 2.1 A perspectiva social no desenvolvimento municipal.

Neste trabalho a Perspectiva Social est delimitada em trs contextos de

fundamental importncia s gestes municipais, visando proporcionar o bem-estar da

populao. Esses contextos, destacados na Figura 2.1, compreendem: a

habitabilidade, que trata dos principais pontos das condies de vida da populao e

oferta de servios bsicos; a sade, onde se destacam os principais indicadores para

que a populao tenha uma vida com longevidade e qualidade e o contexto

educacional, que aprecia as condies de escolaridade da populao, fazendo assim,

valerem seus direitos de cidado.

DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

PERSPECTIVA ECONNICA

PERSPECTIVA SOCIAL PERSPECTIVA AMBIENTAL

SADE

EDUCAO HABITABILIDADE

POLTICO SEGURANA

32

A seguir, sero tratados, de forma especfica os contextos de habitabilidade,

sade e educao que, juntamente com outros contextos, formam a perspectiva social

do desenvolvimento sustentvel.

2.2

O Contexto da Habitabilidade

O atendimento da questo social imprescindvel para que haja uma sociedade

equnime e com justia social, oportunizando um mnimo bsico de atendimento e

condies de vida a todos os cidados (FREITAS; BRCIO; AGUIAR, 2000; PNUD,

1999; PNUD, 2001).

A condio de vida da populao, tanto na disposio de infra-estrutura e

servios, quanto na oferta de oportunidade de cultura e entretenimento, quando

analisada pelos mesmos critrios de verificao, induzem a oportunidades de

melhorias e evoluo do bem-estar social.

Em todos pases, a moradia, que por vezes permite identificar a pessoa, um

direito privado para mais de 1,1 bilho de habitantes apenas nas reas urbanas,

conforme a Comisso das Naes Unidas para Assentamentos Humanos. (PNUD,

2001; UNICEF, 1999; 2004b; WORLD BANK, 2003a, c; 2004b).

No Brasil, o governo no foi capaz de atender demanda de infra-estrutura

urbana. Pois, em 2000, havia necessidade de incremento e reposio do estoque de

mais de seis milhes e meio de novos domiclios. Alm desta carncia, dos domiclios

existentes, 5,5% esto com adensamento excessivo de moradores, isto com trs ou

mais moradores por dormitrio e praticamente 2% esto prejudicados, seja pela idade

da construo ou necessidades de grandes reparos que os tornam inadequados para

o uso, aumentando a demanda estipulada (IBGE/PNAD, 2003; IBGE/SIS 2003;

IBGE/CD, 2000).

A OPAS, (2001), aponta que a moradia adequada impede a colonizao dos

vetores da doena de Chagas e reduz, consideravelmente, a esquistossomose e

outras verminoses.

Outro aspecto corresponde ao fato de que 40% da populao mundial carece de

gua suficiente para o saneamento e higiene. Somente nos pases em

desenvolvimento, mais de 1 bilho de pessoas no tem acesso gua potvel. Mais

de 2,2 milhes de pessoas morrem todos os anos vtimas de doenas relacionadas

falta de gua potvel, muitas delas crianas, alm de metade dos leitos hospitalares

33

serem ocupados por pacientes com doenas relacionadas gua (PNUD, 2001;

UNICEF, 2004a;

WORLD BANK, 2004b, c). A gua contaminada aponta a OMS,

(1985), a OPAS, (1995), Drager e Vieira, (2002) e Mara e Feachem, (1999), a

principal causa das enfermidades como: diarrias, clera, entre outras.

Com relao prestao de servios bsicos, no Brasil, o abastecimento de

gua pela rede geral prestado em 74,3% dos municpios, atendendo a 80% dos

domiclios brasileiros. (IBGE/BRASIL, 2003; IBGE/PNAD, 2002; IBGE/PNSB, 2002,

2003).

O saneamento bsico desprovido para mais de 2,4 bilhes de pessoas em

todo mundo (PNUD, 2001; UNICEF, 2004a; WOLD BANK, 2003a; 2004a, d),

constituindo um agente de proliferao de doenas e condies indignas para o

habitat humano.

No Brasil, o servio de esgotamento sanitrio crtico, pois apenas 45,4% das

moradias esto ligadas rede coletora de esgoto e, mesmo assim, com significativa

desigualdade na distribuio e qualidade dos servios. A deficincia deste servio

considervel, pois 47,8%, dos municpios brasileiros no tm qualquer tipo de servio

de rede de esgotamento sanitrio. Contudo, nos 52,2% dos municpios que tm este

servio, em 80% dos mesmos, os sistemas existentes, coletam e transportam o

esgoto sem tratamento para os rios, lagos ou para o mar (IBGE/BRASIL, 2003;

IBGE/PNAD, 2003).

Outro fator de relevada importncia a coleta seletiva do lixo. Dos 5507

municpios brasileiros, em apenas 451 a coleta era seletiva e somente em 352 com

sistema de reciclagem (IBGE/PNSB, 2002, 2003). Do ponto de vista sanitrio, a

destinao de forma inadequada do lixo proporciona condies favorveis

proliferao de vetores como: ratos, moscas, baratas e doenas presentes no sculo

XIX como: a febre amarela, a hepatite, a diarria e mesmo a dengue (IBGE/SIS,

2003).

No prximo item, ser visto o contexto da sade que muito importante para

uma avaliao das condies da mesma com vistas ao Desenvolvimento Sustentvel.

2.3

O Contexto da Sade

Em locais com desenvolvimento saudvel, presume-se que haja uma populao

saudvel, uma vez que a sade contribui na capacidade de desenvolver recursos e

34

potencialidades, quer no plano individual, quer no coletivo, com vista obteno de

melhores nveis de bem-estar e qualidade de vida. Esta condio est na definio de

sade como um estado de completo bem-estar fsico, psquico e social (WHO, 1988).

A rea da sade, para satisfazer suas necessidades e atender seus objetivos,

tem ligao direta com o desenvolvimento social, econmico e ambiental. Assim, na

gua, existem doenas de transmisso e origem hdrica, causando toxidade adversa

sade humana. Alm dos j considerados no item anterior, segundo a Organizao

Mundial da Sade - OMS (WHO, 1988), 80% das doenas nos pases do Terceiro

Mundo so provenientes de gua contaminada. As doenas mais freqentes pelas

precariedades do habitat, do abastecimento de gua e do saneamento incluem: o

clera, as molstias diarricas, a leishmaniose, a malria e a esquistossomose. Em

todos esses casos, as medidas saneadoras ambientais, parte integrante do

atendimento primrio da sade, empreendem um componente indispensvel das

estratgias de controle total da molstia, juntamente com a educao sanitria

(UNICEF, 2004a; WWF, 2004; ESREY, 1996). Os avanos no desenvolvimento de

vacinas e agentes qumicoterpicos possibilitaram o controle de muitas molstias

contagiosas, outras enfermidades, por sua vez, necessitam de um acompanhamento

e atendimento de profissionais de sade e da oferta de infra-estrutura hospitalar.

Muitos fatores so agentes das gravidades que necessitam de ateno mdica,

disponibilidade de infra-estrutura hospitalar e medicaes para seu pronto

restabelecimento (UNICEF, 2004a; OMS, 1995; 2001; OPAS, 1995).

A predominncia de tratamento curativo frente ao preventivo avulta em

considerveis custos, sofrimentos e perdas humanas. Os nmeros testemunham tais

constataes, pois em decorrncia da precariedade ou ausncia destes atendimentos,

mais de 100 milhes de mulheres morreram em conseqncia do infanticdio, da

negligncia e do aborto. A falta de cuidados e atendimento na gravidez e,

principalmente, de acompanhamento por profissionais de sade no parto, outras

500.000 mulheres morrem anualmente, marcando assim a importncia de

atendimento s mulheres e aos fetos neste perodo (WORLD BANK, 2003a,c; PNUD,

2001). O reforo ao atendimento sade, principalmente preventivo, como reza a

Carta de Ottawa (WHO, 1986), evitaria muito sofrimento e vidas seriam poupadas

(PNUD, 2001, PNUD, 2002; WORLD BANK, 2003a,c; 2004a. b).

As crianas, principalmente nas classes da populao menos favorecida, esto

na mesma trajetria diante das condies precrias da assistncia sade no mundo,

35

pois todos os anos 11 milhes morrem, principalmente de doenas passveis de

preveno (PNUD, 2003). Entretanto, mesmo com alguns avanos ocorridos nas

ltimas dcadas, no final do ltimo sculo, a mortalidade infantil era de 93 para cada

1.000 nascidos vivos e 27% das crianas tinham peso abaixo do normal (PNUD, 2000,

WOLD BANK, 2002; 2004a, b).

O quadro de condies de sade mostra ainda, que 30 milhes de pessoas

morrem todos os anos, por doenas no transmissveis e outras 18 milhes por

doenas transmissveis, entre estas a AIDS (WORLD BANK, 2003a,c; PNUD, 2001;

2002).

No Brasil, muitas doenas j eliminadas em pases desenvolvidos, apresentam

surtos e persistem em continuar atingindo a populao brasileira. Entre outras, as

doenas do aparelho respiratrio, circulatrio e doenas infecciosas e parasitrias

ocupam as principais posies de freqncias, apontando as precrias condies

da populao. A tbua de mortalidade, contida no IBGE/SIS (2002), reflete todo

aspecto das condies de mortalidade dos brasileiros, que, por sua vez, expressa

as condies de vida de uma populao.

Uma caracterstica notria, na rea da sade, investigada por Cordeiro, (1997),

apresenta o atendimento asilar curativo, com maiores custos, necessidade de

equipamentos e prejuzo populao, frente ao preventivo e inclusive ao regenerativo

que j oferecido populao em muitos pases, principalmente nos mais

desenvolvidos.

No trabalho desenvolvido entre a Fundao Osvaldo Cruz e Organizao

Mundial da Sade (FIOCRUZ/OMS, 2004a), identificou-se que o atendimento sade

da populao tanto no sistema pblico como nos planos privados, deixam a desejar,

uma vez que a insatisfao e descontentamento dos usurios chegam a 57,8% no

sistema pblico e 72% dos usurios dos planos privados. Diante destas condies,

9% dos brasileiros dizem ter a sade ruim, 29% tm doenas de longa durao e 26%

sofrem de tristeza e ansiedade. Alm desta realidade negativa, a mdia de gastos

com sade pelos brasileiros de 19% de sua renda, chegando a atingir 61% da renda

na parte da populao que mais gasta com a sade. Para bancar esses gastos

36

necessrios relacionados sade, 9,1% da populao pesquisada vendeu bens ou

fizeram emprstimos para custear as despesas (FIOCRUZ/OMS, 2004a. b).

Essas questes podem ser vistas pelos gastos per capit, desprendidos pelos

governos na promoo da sade da populao, sendo esse valor de R$ 135,29 (U$

60,00) em 2001 no Brasil (BRASIL, 2004), e U$ 4.887,00 nos EUA no mesmo ano

(OECD, 2003).

O atendimento sade, na rea odontolgica, tambm deixa a desejar e se faz

sentir, pois 14,4% dos brasileiros no tm mais nenhum dente natural e esse

percentual de 55,9% nas mulheres com mais de 50 anos (FIOCRUZ/OMS, 2004a).

No Brasil, o atendimento sade retratado na Constituio Federal, na qual

est presente o acesso universal, igualitrio e gratuidade do atendimento a todos

brasileiros (Lei 8080/90, art. 7, IV e art. 43). A busca numa afirmao ao conceito de

eqidade em sade, compreendido de igual acesso para igual necessidade, embora

no esteja explicitado na Constituio Federal ou na sua regulamentao (Leis n

8080/90 e n 8142/90), contempla a discriminao positiva, de modo a garantir mais

direitos a quem tiver mais necessidades (VIANA et al. 2001). Segundo Rodrigues,

(2003), esta conotao tambm pregada pela Organizao Mundial de Sade,

apontando que a eqidade ateno em sade implica receber atendimento, segundo

suas necessidades (OPAS, 2001; WHO, 1988).

Neste sentido, os indivduos com menos recursos econmicos, mais pobres,

necessitam de uma parcela maior de recursos pblicos em relao aos indivduos

mais ricos. Assim, Rawls, (1995), busca caracterizar as desigualdades justas,

inerentes eqidade, por considerar que o tratamento desigual justo quando

benfico ao indivduo mais carente.

As desigualdades sociais existentes em todos os pases so difceis de eliminar,

ou at impossveis, na viso da lei de mercado; mas buscar a reduo destas

distores existentes, contempla um objetivo de destaque em toda poltica pblica, no

encontro do bem comum (VIANA et al., 2001). A Organizao Pan-americana da

Sade

OPAS (2001), considera a eqidade em sade como um princpio bsico

para o desenvolvimento humano e justia social.

Portanto, a ateno dos gestores pblicos para a sade pblica, compreende

instrumento tcnico-poltico, seja na preveno ou na promoo da sade de todos.

Outro aspecto importante para uma futura avaliao da Perspectiva Social na

gesto pblica, refere-se ao Contexto Educacional que ser visto a seguir.

37

2.4 O Contexto da Educao

H dcadas, as naes do mundo afirmaram na Declarao Universal dos

Direitos Humanos, que toda pessoa tem direito educao. No entanto, apesar dos

esforos realizados por muitos pases, persistem significativas disparidades, tanto no

acesso a esse bem, como na qualidade ofertada (DMET, 2000; WERTHEIN; LOFTIN,

2002).

A educao tem fundamental importncia para o desenvolvimento pessoal e

social. Assim, a Declarao Mundial sobre Educao para Todos, realizada em

Jomtien, em maro de 1990, descreve que as oportunidades educativas favorecem a

satisfazer as necessidades bsicas de aprendizagem que compreendem tanto os

instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expresso

oral, o clculo, a soluo de problemas), quanto os contedos bsicos da

aprendizagem (como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes). Essa

aprendizagem conduz a melhores condies de vida, amplia as potencialidades,

permite viver e trabalhar com dignidade, tomar decises fundamentadas e continuar

aprendendo (WERTHEIN, 2003a, b, c; UNESCO, 1994; DANIEL, 2003).

Entretanto, aproximadamente 113 milhes de crianas, no mundo, esto fora da

escola primria e 232 milhes da escola secundria. Isto desconsiderando que 93

pases, com 39% da populao mundial, no tm dados sobre tendncias da

escolarizao primria o que pode avultar em muito tais dados (PNUD, 2002;

WERTHEIN, 2003a, b, c; UNESCO, 2003; DANIEL, 2003).

Conquistas foram obtidas na reduo da taxa de analfabetismo, estimada em

53% em 1970 para 27% em 1999. Mas somente nos pases em desenvolvimento,

cerca de 1 bilho de adultos ainda so analfabetos (PNUD, 2002; UNESCO, 2003).

Alm disso, mais de um tero dos adultos do mundo no tem acesso ao conhecimento

impresso, s novas habilidades e tecnologias, as quais produzem um efeito

multiplicador diante das informaes importantes e pelas novas capacidades em se

comunicar (PNUD, 2001; UNESCO, 2003).

No Brasil, os esforos despendidos para alfabetizar a populao brasileira vm

alcanando resultados positivos. Mesmo assim, os resultados do III INAF (Indicador

nacional de Alfabetizao Funcional) mostram que 8% da populao brasileira, na

faixa etria de 15 a 64 anos, se encontra em situao de analfabetismo absoluto

(INAF, 2003), 30% da populao capaz de localizar informaes simples como o

38

enunciado de apenas uma frase, 37% consegue localizar textos com informaes

como carta ou textos curtos, e 25% tm habilidades de localizar mais de uma

informao e comparar textos diferentes e estabelecer relaes entre si (INAF, 2003;

IBGE/BRASIL, 2003; INEP, 2003). Neste sentido, na dcada de 70, a Unesco

caracterizou o alfabetizado funcional como toda pessoa capaz de utilizar a leitura e a

escrita para fazer frente s demandas de seu contexto social e usar suas habilidades

para continuar aprendendo e se desenvolvendo ao longo da vida (INAF, 2003;

UNESCO, 1994, 2003).

No Brasil, a educao infantil, que atende as crianas de 0 a 6 anos em creche e

pr-escola, apresenta uma taxa de freqncia de 37,7%. Para as crianas com idade

entre 7 e 14 anos, correspondente ao atendimento no Ensino Fundamental, a

freqncia chega casa de 96,7% (IBGE/BRASIL, 2003; IBGE/SIS, 2003). A

populao com idade entre 15 e 17 anos, relacionadas ao Ensino Mdio, apresenta

uma taxa de escolarizao de 33,4% (SOUZA, 2001). O Curso Superior, que por sua

vez, abrange as pessoas entre 18 e 24 anos, atende menos de 20% desta populao,

e somente 4% da populao brasileira tm esta escolarizao (SOUZA, 2001;

IBGE/SIS, 2003).

Uma das questes relacionadas ao ensino brasileiro pode ser vista nos

estudantes da faixa etria entre 18 a 24 anos, que deveriam estar cursando o ensino

superior, e, no entanto, quando menos de 20% deles estavam freqentando esta

modalidade de ensino, enquanto 42,5% freqentavam o ensino mdio e 25% ainda

cursava o ensino fundamental. Assim, denota-se o atraso escolar e a falta de

sincronismo idade/srie freqentada pelos alunos, que no faz parte apenas desta

faixa etria, mas do ensino todo (IBGE/SIS, 2003).

Segundo dados levantados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais do Ministrio de Educao e Cultura, a taxa de concluso do ensino

fundamental de 59%. Isso significa que se no houver uma mudana no atual

cenrio de desigualdade, cerca de 41% dos estudantes brasileiros continuaro sem

concluir sequer o nvel obrigatrio de escolaridade (HELENE, 2003; ARAJO; LUZIO,

2003).

Outra constatao feita pelo Sistema Nacional de Avaliao da Educao

Bsica mostra que 59% dos estudantes da quarta srie do ensino fundamental no

desenvolveram as competncias bsicas de leitura, isto quer dizer que so

analfabetos ainda, e 52% desses mesmos alunos demonstram profundas deficincias

39

em matemtica uma vez que no conseguem transpor para uma linguagem comandos

operacionais elementares (HELENE, 2003).

Esse desempenho dos estudantes tambm est associado aos gastos em

educao, a oferta de infra-estrutura da escola e qualificao dos professores.

Segundo Souza (2001), o professor um dos principais fatores que incidem sobre a

melhoria da qualidade da educao e apenas 50% deles no ensino fundamental tem

formao superior ( SOUZA, 2001; IBGE, 2004).

Essa apresentao da conjuntura do Brasil se traduz no conjunto de todos os

municpios, local geogrfico de ocorrncia e realizaes de todas essas questes.

Conhecer o municpio, e suas dificuldades a serem atendidas, constitui o

conhecimento de todo o desfecho da situao social-econmica brasileira e de cada

pas.

Uma vez visto os contextos mais significativos a uma avaliao da perspectiva

social, faz-se necessrio melhor compreender o papel do municpio e de seus

gestores no cenrio brasileiro que ser apontado no prximo item.

2.5

O Municpio no Cenrio Brasileiro

A relevncia da conotao municipal se fez presente ainda no Brasil Colnia,

com a formao administrativa das instituies municipais em atendimento aos

direitos Lusitanos os quais compreendiam: um alcaide, juzes ordinrios, vereadores

(em Cmaras) almotacs, juiz de fora, procurador e homens bons.

Um fortalecimento dado s instituies municipais aconteceu no Brasil Imprio,

em que rege a primeira lembrana constitucional.

A autonomia dos competncia do Municpio deriva da Constituio Federal (CF),

pois a Federao adotou a tripartio de competncia. Os poderes da Unio e dos

Municpios esto explicitamente enumerados na Carta da Repblica, reservando aos

Estados as competncias que lhes no sejam vedadas, quer dizer, os poderes

reservados pressupem a exausto dos poderes enumerados. Os art. 1 e 18 da CF

apresentam a autonomia constitucional o exercitamento das atribuies do Municpio

(CF, 1998).

A autonomia dos municpios deve estar de conformidades da CF, da

Constituio Estadual (CE) e Lei Orgnica, enumerados na Carta Poltica (art. 29, I a

40

XIV) em que j se fixa rigidamente a capacidade de auto-organizatria do Municpio.

O art. 30 da CF descrimina basicamente as competncias do municpio, a saber:

- legislar sobre assuntos de interesse local (competncia exclusiva);

- suplementar a legislao federal e a estadual no que couber (Competncia

supletiva);

- alm da competncia exclusiva e supletiva, prev o artigo 23 I a XII da CF a

competncia comum do Municpio (com a Unio Estado e Distrito Federal) (CF, 1998).

A esfera administrativa municipal obteve conquistas na autonomia e

posicionamento governamental relacionada deliberao e atuao nas causas locais

frente aos seus interesses e necessidades. A independncia econmica dos

municpios continua com limitaes diante dos aspectos legais de auferir recursos,

embora obteve avanos na forma de gerenciamento dos mesmos.

As administraes pblicas atendem a alguns princpios que fogem aos da

iniciativa privada, decorrentes da complexidade das funes e espcies dos servios

prestados coletividade (FGV, 1955). Cabe, tambm, neste diferencial, estar luz da

publicidade, pois a priori, o administrador pblico (honesto e ntegro) deve preservar a

soberania do povo em todos seus atos (FGV, 1955; MEIRELLES, 2000).

O governo no controlado por contas de lucros ou perdas, cabe assim o

incentivo de efetividade e vrios mtodos de mensurao dos resultados de seus

feitos, como procedimento de controle das suas aes. Para Meireles (2000) na

administrao privada a ateno lei est em fazer tudo o que ela no probe, alm

de estar em concorrncia com a lei de mercado, enquanto que na administrao

publica s permitido fazer o que a lei autoriza e est a merc da concorrncia de

mercado.

A administrao pblica est alicerada no planejamento pblico o qual de

responsabilidade intransfervel do Estado

(BRASIL, 2001). Com o planejamento

pblico o governo estabelece o atendimento das aes de sua alada, tanto de curto

prazo como numa viso estratgica de longo prazo, em prol do desenvolvimento e

sustentabilidade (MOREIRA NETO, 1995).

O planejamento pblico em sua formalidade comporta o oramento pblico,

documento este que contm as informaes sobre todos os recursos de que o Poder

Pblico dispe e constitui a sntese do compromisso de contribuies da sociedade

(as receitas) e de realizaes do governo (as despesas). Porm, para ter validade,

deve atender certas normas legais e virar lei. Vale destacar tambm que as trs leis

41

que formam o contrato oramentrio brasileiro e direcionam a administrao frente a

este contrato so: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Oramentrias (LDO)

e a Lei Oramentria Anual (LOA) (CF, 1998; PETRNIO, 1994).

Entretanto, mesmo com o atendimento dos princpios constitucionais, em ltima

instncia, cabe ao prefeito a deciso do que dever ser realizado no municpio, tanto

quanto responder pelas penalidades, caso for, conforme o estabelecido no decreto-lei

n 201 de 27 de fevereiro de 1967 que reza sobre as competncias e

responsabilidades do executivo. O sistema mais usual para estabelecer as prioridades

de aes governamentais municipais abrange duas etapas. Uma internamente, com

negociao entre o prefeito e a administrao pblica direta, formada pelos

secretrios e diretores. Nesta etapa, faz-se um documento com as diretrizes a serem

atendidas pelo prefeito em alinhamento ao seu programa eleitoral de governo

(PETRNIO, 1994). A segunda etapa do processo de priorizao trata das

negociaes do governo feitas com a sociedade. Mesmo que, algumas vezes, a

sociedade seja convidada a participar do planejamento, denominado de planejamento

participativo, cabendo por vezes algum atendimento neste sentido, os delineamentos

maiores cabem sempre ao prefeito e sua equipe, detentores do poder (MEDAUER,

1998; MEIRELLES, 2000; ANJOS; ANJOS, 2001; KEINERT, 2000).

Alm destes entraves, o oramento municipal tambm se constitui num enigma

para a comunidade e at para a administrao municipal. A complexidade do mesmo

abre espao, ao executivo, para redirecionar ou aplicar os recursos pblicos de forma

diferente da prevista, sem a percepo e aprovao da opinio pblica. Isto pode

ocorrer quando do emprego de atividades abrangentes de investimentos a serem

efetivados ou quando do uso de altas margens de suplementao; cabendo, assim, a

possibilidade de alterar a execuo do oramento, configurando irregularidades ao

oramento, decorrentes de sua formalizao sem clareza e possibilidade de aferio

das aplicaes e resultados obtidos (GRAHAM; STEVEN, 1994; SNCHEZ, 2002;

KEINERT, 2000; MEDAUER, 2000; CALDERN; CHAIA, 2002).

Tais ocorrncias penalizam a funo do oramento que permitir que a

sociedade acompanhe o fluxo de recursos do Estado (receitas e despesas) e nesse

sentido, ficam sempre a desejar (VAZ, 2000; SNCHEZ, 2002).

Diante deste hiato entre a sociedade e governo no que tange ao

acompanhamento das contas pblicas, inmeras irregularidades administrativas

ocorrem como as apontadas no item 1.1. Tais irregularidades que ocorrem em todas

42

as esferas administrativas, podem ser constatadas no ano de 2004, quando o

Ministrio Pblico denunciou 54 crimes efetuados pelos prefeitos, alm de outras 485

denncias registradas na justia. Os dois principais crimes so o peculato e a fraude

em licitaes.(MARTINS, 2004; TJ, 2004; GALINDO e MORAIS 2004). No Rio Grande

do Sul, na ltima dcada, 169 prefeitos foram condenados por crimes no estado

(MENDES, 2004).

Estes procedimentos e ocorrncias apontadas nos municpios constam na

conduta da esfera administrativa federal. Desde 1990, na Cmara dos Deputados,

foram instauradas 45 Comisses Parlamentares de Inqurito (CPIs) e 4 CPIs se

encontram atualmente em funcionamento. Outras 50 CPIs foram instauradas pelo

Senado, sendo que destas 29 so mistas, ou seja, Senado e Cmara dos Deputados

juntos, o que totaliza 95 CPIs instauradas, mais 4 em andamento em pouco mais de

uma dcada (SILVA, 2003; MAGALHES, 2003).

A falta de critrios mais precisos e definidos proporciona condies favorveis a

procedimentos irregulares nas aplicaes dos recursos. A corrupo, apontada pelo

Wold Bank (2003a, c), corresponde a cerca de 5% do PIB (Produto Interno Bruto)

mundial. Desta forma, os dinheiros pblicos, confiados guarda dos governos, em

todas esferas administrativas, quando no aplicados com os fins do bem comum,

causam prejuzos toda comunidade. Para Feder, (1997) e Robbins e De Cenzo,

(1996), alm do dinheiro em si, o patrimnio pblico, em suas mais diversas formas, ,

algumas vezes, transferido para a posse privada, contrariando as premissas de uma

administrao justa e eficiente.

Atos de ilegalidades administrativas contidas na defesa dos direitos e