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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - SCHLA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS - DECISO GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA CURITIBA 2013

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS … · respondida: os chineses que optam por trabalhar em pastelarias e lanchonetes o fazem devido a pouca necessidade de qualificação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - SCHLA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS - DECISO

GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO

A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA

CURITIBA

2013

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GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO

A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA

Monografia apresentada ao Departamento

de Ciências Sociais da Universidade

Federal do Paraná, como requisito parcial

para a obtenção de grau de Bacharel e

Licenciado em Ciências Sociais.

Orientador: Prof. Dr. Márcio de Oliveira

CURITIBA

2013

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GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO

A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA

Monografia aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel e

Licenciado no Curso de Ciências Sociais, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da

Universidade Federal do Paraná, pela seguinte Banca Examinadora:

Orientador: Prof. Dr. Márcio de Oliveira

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

Prof. Dr. Lorenzo Macagno

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

Prof. Dr. Alexsandro Eugênio Pereira

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

Curitiba, de dezembro de 2013

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AGRADECIMENTOS

Antes de tudo, aos meus pais, Simone e Marcos, que me colocaram no mundo

e me ensinaram a vivê-lo, minha gratidão e admiração eterna.

À família, agradeço por compartilharmos as dores e alegrias da vida, ante as

quais estivemos sempre unidos.

Aos meus avós e ao meu tio, cujas lembranças continuarão presentes, sou grato

por tê-los conhecido e pelo tempo que vivemos juntos.

Às amigas e amigos, posso apenas expressar minha alegria pelos nossos

caminhos terem se encontrado e agradecer por me ajudarem a ser o que sou.

Aos professores e professoras, aos quais me juntarei um dia, agradeço pelos

ensinamentos, pela dedicação e por acreditarem na Educação.

A todxs funcionárixs da Universidade Federal do Paraná, por me propiciarem

condições para desenvolver meus estudos, e especialmente àqueles que trabalharam no

Restaurante Universitário, agradeço.

Enfim, sou grato à natureza e à existência, por viver aqui e agora.

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RESUMO

A presente pesquisa monográfica tem como principal objeto a imigração chinesa e a

formação de uma comunidade sino-brasileira na cidade de Curitiba, e visa conhecer e

compreender as características de tal comunidade e seus integrantes, a partir de

preceitos e métodos da Sociologia. Para tanto, retoma o longo processo das diásporas

chinesas, intimamente ligado à história da China, passando pela imigração desse grupo

para as Américas e o Brasil, atendo-se ao caso específico da capital paranaense, na qual

foi realizada pesquisa empírica junto aos imigrantes chineses. Apresenta também um

panorama atual dos movimentos migratórios internacionais e foca-se na história da

imigração chinesa para o Brasil, a partir do século XIX, que suscita uma série de

debates acerca da identidade nacional e do futuro do país. A monografia reúne os

resultados de três linhas técnicas diferentes de pesquisa, a saber: 1) levantamento

bibliográfico sobre o tema da diáspora chinesa pelo mundo, sobre a imigração chinesa

para a América Latina e mais especificamente para o Brasil; 2) coleta de dados

estatísticos secundários e informações sobre o tema, nos mais variados órgãos, institutos

e associações; 3) pesquisa qualiquanti, por meio da aplicação de questionários e de

conversas e interações com imigrantes e pessoas relacionadas ao tema. Estima-se que

existam 42 milhões de chineses vivendo fora da China (chineses overseas), sendo que

no Brasil vivem aproximadamente 200 mil e entre três e cinco mil na cidade de

Curitiba, vindos principalmente a partir de meados do século XX em busca de melhores

condições de vida e trabalho.

Palavras-chave: China. Chineses Overseas. Imigração. Curitiba. Sociologia

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

QUADRO 1 - COLETA DE DADOS ...................................................................... 14

QUADRO 2 - POPULAÇÃO CHINESA NO EXTERIOR (CHINESES

OVERSEAS) - 2012 ................................................................................................. 29

QUADRO 3 - CHINESES NA AMÉRICA, POR PAÍS DE RESIDÊNCIA -

CENSOS ................................................................................................................... 38

QUADRO 4 - POPULAÇÃO CHINESA NA AMÉRICA - 2012 ........................... 38

QUADRO 5 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - BRASIL -

2013 .......................................................................................................................... 53

QUADRO 6 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - PARANÁ -

2013 .......................................................................................................................... 53

QUADRO 7 - MIGRAÇÕES - ESTRANGEIROS E NATURALIZADOS NO

CENSOS ................................................................................................................... 55

QUADRO 8 - FLUXO E SALDO MIGRATÓRIA CHINA - BRASIL .................. 57

QUADRO 9 - AUTORIZAÇÕES DE TRABALHO CONCEDIDAS A

CHINESES - 1993 A 2012 ....................................................................................... 57

QUADRO 10 - ANISTIAS CONCEDIDAS A CHINESES - 1998/2009 ............... 59

QUADRO 11 - POPULAÇÃO RESIDENTE POR NACIONALIDADE -

PARANÁ .................................................................................................................. 60

QUADRO 12 - CONVERSAS REALIZADAS ....................................................... 68

FIGURA 1 - MAPA POLÍTICO DA CHINA .......................................................... 17

FIGURA 2 - A DIÁSPORA CHINESA ................................................................... 32

FIGURA 3 - COMÉRCIOS NA REGIÃO CENTRAL DE CURITIBA ................. 74

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 - POPULAÇÃO DE CHINESES QUE RESIDEM NO BRASIL,

PARANÁ E CURITIBA - 2010 ............................................................................... 56

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11

1 AS DIÁSPORAS CHINESAS E AS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS .... 16

1.1 CHINA - SITUAÇÃO ATUAL ......................................................................... 16

1.2 PANORAMA DAS MGRAÇÕES INTERNAICOAIS ..................................... 20

1.3 A DIÁSPORA CHINESA .................................................................................. 23

1.4 DOIS MIL ANOS DE EMIGRAÇÕES ............................................................. 24

1.5 CHINESES OVERSEAS - CHINESES ULTRAMARINOS .............................. 27

2 A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA AS AMÉRICAS E O BRASIL ............... 33

2.1 A IMIGRAÇÃO FEZ A AMÉRICA .................................................................. 33

2.2 O COMÉRCIO DE COOLIES ........................................................................... 35

2.3 A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA BRASIL .................................................... 40

2.4 A QUESTÃO CHINESA ................................................................................... 43

3 A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA O BRASIL NA SEGUNDA METADE

DO SÉCULO XX .................................................................................................... 48

3.1 CHINESES NO BRASIL DE HOJE .................................................................. 49

3.2 MARCOS JURÍDICO E INSTITUCIONAL ..................................................... 50

3.3 DADOS ESTATÍSTICOS SECUNDÁRIOS ..................................................... 52

3.3.1 Polícia Federal ............................................................................................... 52

3.3.2 IBGE ............................................................................................................... 54

3.3.3 Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) ................................................ 57

3.4 - ANISTIAS ........................................................................................................ 58

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3.5 CHINESES NO PARANÁ ................................................................................. 59

4 CHINESES EM CURITIBA .............................................................................. 62

4.1 LEVANTAMETO BIBLIOGRÁFICO .............................................................. 62

4.2 TRABALHO DE CAMPO - NOTAS INTRODUTÓRIAS ............................... 65

4.3 RESULTADOS .................................................................................................. 68

4.3.1 Origens e anos de imigração ......................................................................... 69

4.3.2 Fatores de expulsão ....................................................................................... 70

4.3.3 Fatores de atração ......................................................................................... 71

4.3.4 Educação ........................................................................................................ 72

4.3.5 Localização geográfica e atuação profissional ............................................ 73

4.3.6 Língua ............................................................................................................. 76

4.3.7 Desejo de retornar à China ........................................................................... 78

4.4 SINO-MOÇAMBICANOS ................................................................................ 79

4.5 TRAJETÓRIAS DA IMIGRAÇÃO ................................................................... 81

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 83

REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 86

APÊNDICES ........................................................................................................... 92

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INTRODUÇÃO

Os textos introdutórios às Ciências Sociais, que costumam ser lidos no início

da graduação, apontam a importância para um cientista social de estar atento àqueles

temas e objetos de estudo que passam despercebidos ou são deixados de lado pelo

mainstream acadêmico, e que podem ser enquadrados dentro do "senso comum", o par

oposto do conhecimento científico. Além disso, tais textos também falam sobre o

familiar e o exótico1, sobre os movimentos entre ambas estas esferas que são tão caros

ao fazer antropológico.

O empreendimento que se segue busca retirar do escopo do senso comum um

fato recorrente nas grandes metrópoles brasileiras, que é a existência de chineses e seus

descendentes, e trazê-lo para o campo das Ciências Sociais, a partir da análise do

processo de imigração e das comunidades chinesas estabelecidas no Brasil, mais

especificamente na cidade de Curitiba, a partir do ano de 1949, ano da revolução

comunista na China e divisor de águas de sua história moderna e de seu longo processo

migratório.

Em outras palavras, transformar o familiar em exótico, uma vez que nós

(habitantes de grandes cidades) já estamos habituados à sua "existência"; e o exótico em

familiar, pois a China, os chineses e sua cultura talvez representem o nosso "outro"

ideal, no sentido de uma alteridade total.

Este trabalho de conclusão de curso, sob a forma de monografia, teve seus

primeiros delineamentos a partir da realização de uma matéria intitulada "Sociologia da

Imigração", durante o 2º semestre letivo de 2012 e ministrada pelo professor Márcio de

Oliveira.

O trabalho final dessa disciplina consistiu em abordar um fato atual pertinente

ao tema à luz das teorias ali estudadas ao longo do semestre. Na ocasião, optei por fazer

1 DA MATTA, Roberto. O ofício do etnólogo ou como ter anthropological blues. IN: NUNES, Edson O.

(org.) A aventura sociológica: objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de

Janeiro: Zahar, 1978.

VELHO, Gilberto. Observando o Familiar. IN: NUNES, Edson O. (org.) A aventura sociológica:

objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

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um breve estudo sobre a imigração chinesa em Curitiba, inicialmente motivado pelo

questionamento sobre qual a relação que havia, se é que de fato havia, entre os

imigrantes chineses e o ofício a que muitos se dedicavam: o comércio de alimentos, seja

em pastelarias, restaurantes, bares ou armazéns.

A percepção de que havia cada vez mais estabelecimentos comerciais desse

gênero sob o comando de chineses levou-me a buscar entender, por meio de uma

pesquisa sociológica, essa relação entre grupo étnico, nacionalidade e ofício, juntamente

à questão da imigração em si.

O resultado não foi muito animador: além da escassez de informações e

estudos sobre a imigração chinesa para Curitiba,em que apenas duas obras abordavam o

tema (um artigo sobre os sino-moçambicanos2

e um livro sobre a história e a

comunidade chinesa3) a maioria dos chineses contatados

4 mostrou-se relutante em

estabelecer diálogo e, mais ainda, em responder a um breve questionário.

Entretanto, os poucos5 que foram mais receptivos e que não se importaram em

conversar sobre suas vidas me permitiram, além de fazer o trabalho, ter uma breve ideia

dos desafios e possibilidades de um estudo mais aprofundado sobre este tema.

A dúvida inicial acerca da relação entre etnia e ofício pode ser parcialmente

respondida: os chineses que optam por trabalhar em pastelarias e lanchonetes o fazem

devido a pouca necessidade de qualificação e comunicação, além do rápido retorno

financeiro que o comércio de alimentos oferece. Mas inúmeras outras surgiram e a

questão da imigração chinesa para Curitiba e o estabelecimento de uma comunidade

expressiva nessa cidade passou a ser o objeto de estudo que se segue.

Ao realizar esta pesquisa almejo mais a apresentação do "estado da arte" deste

tema, devido à escassez de informações e estudos, do que sua análise sociológica

completa e detalhada. Uma vez que os caminhos a se trilhar são quase que

2MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma dispersão. In: Andréa

Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento, Brasília, 2012, (no prelo). Disponível em

<http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/files/Comunicacoes/Seminario23Fevereiro2012.pdf>. Acesso em:

22/10/2013; 3 FONTOURA, Rubens Oliveira. Cultura e a longa marcha de chineses e chinesas até Curitiba.

Edição do autor, Curitiba, 2012; 4 Conforme ver-se-á adiante.

5 O processo de interação e contato com os chineses em Curitiba serão o tema do quarto capítulo.

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desconhecidos, a apresentação do tema e a elaboração de perguntas torna-se mais

premente do que o fornecimento de respostas

As questões que dão origem e permeiam este estudo são: como explicar a

recente imigração chinesa para o Brasil e mais especificamente para Curitiba? É um

grupo com perfil social homogêneo ou compreende histórias díspares e sem conexões?

Quem e quantos são? Quais seus ofícios e onde se estabelecem? Como viviam na China

e como estão vivendo hoje? São as relações com os brasileiros boas ou permeadas por

pré-conceitos?

Para a realização desta monografia foram realizadas três linhas diferentes de

pesquisa, a saber: 1) levantamento bibliográfico sobre o tema da diáspora chinesa pelo

mundo, sobre a imigração chinesa para a América Latina e mais especificamente para o

Brasil (capítulos I e II, respectivamente); 2) coleta de dados estatísticos secundários e

informações sobre o tema, nos mais variados órgãos, institutos e associações que

porventura pudessem contribuir (capítulo III); 3) pesquisa quantitativa, por meio da

aplicação de questionários, e qualitativa, por meio de conversas e interações com

imigrantes e pessoas relacionadas ao tema (capítulo IV).

No primeiro capítulo me dedico à apresentação da atual situação dos

movimentos migratórios pelo mundo no século XXI e ao tema da diáspora chinesa

(chinese overseas), que é objeto de estudo recorrente em várias partes do mundo.

Entretanto, a maioria desses estudos está situada no exterior, o que dificulta o acesso à

grande parte da bibliografia, exceto aquela disponível em ambiente virtual.

No segundo capítulo busco apresentar a questão da imigração chinesa na

América Latina e no Brasil, apontando as comunidades chinesas mais expressivas. Não

posso deixar de mencionar também a América do Norte, que reúne aproximadamente

75% da população chinesa das Américas.6

O terceiro capítulo contém o resultado da coleta de dados estatísticos

secundários junto aos mais variados órgãos, associações e instituições, apresentados a

seguir. Realizarei também considerações sobre as fontes e as disparidades do dados e

6OVERSEAS CHINESE POPULATION DISTRIBUITON. IN: Overseas Community Affairs Council

(OCAC).Republic of China (Taiwan). 2012. Disponível em:

<http://www.ocac.gov.tw/english/public/public.asp?selno=8889&no=8889&level=B>. Acesso em:

06/11/2013

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das formas de mensuração do fenômeno. Nem todos forneceram informações ou dados

relevantes, sendo que alguns sequer responderam aos meus e-mails. Ainda assim os

elenco a seguir:

QUADRO 1 - COLETA DE DADOS

INSTITUIÇÃO, ASSOCIAÇÃO, ÓRGÃO FORMA DE CONTATO

Embaixada da China Pessoalmente

Consulado da China em São Paulo e Rio de Janeiro E-mail

National Bureau of Statistics of China E-mail

Chinese Academy of Sciences; E-mail

Organização Internacional para Migração (IOM - ONU) E-mail

Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR -

ONU) E-mail

Conselho Nacional de Imigração (CNIg) Lei de Acesso à Informação

Ministério da Relações Exteriores (Itamaraty) Pessoalmente, E-mail e Lei de

Acesso à Informação

Ministério do Trabalho e Emprego Lei de Acesso à Informação

Ministério da Justiça Lei de Acesso à Informação

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Lei de Acesso à Informação

Polícia Federal Lei de Acesso à Informação

Comitê Estadual para Refugiados e Migrantes, do Departamento de

Direitos Humanos e Cidadania (DEDIHC) da Secretaria de Justiça do

Paraná

Pessoalmente

Instituto Confúcio em Brasília Pessoalmente e E-mail

Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH) Telefone e E-mail

Associação Chinesa de São Paulo E-mail

Associação Cultural Chinesa do Paraná (ACCPAR) Telefone

FONTE: O autor

O quarto e último capítulo busca compreender o processo e os resultados do

trabalho de campo, realizado em Curitiba ao longo do ano de 2013. Junto a isso,

apresento e discuto os resultados do levantamento bibliográfico realizado para esta

pesquisa. A recente imigração chinesa para o Brasil ainda não recebeu a devida atenção

por parte das Ciências Sociais, visto que os estudos significativos sobre o tema podem

ser contados nos dedos, conforme também aponta DWYER (2011)7.

7 DWYER, Tom. A China e o Brasil: mudanças e desafios para a Sociologia brasileira. Conferência

proferida durante o XV Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado em Curitiba, 2011. Disponível em:

<http://www.gr.unicamp.br/ceav/content/pdf/pdf_seminario_china_tpdwyer.pdf> Acesso em: 22/10/2013.

Além disso, pode também ser encontrado em <http://www.youtube.com/watch?v=uTphy-HKCV8>.

Acesso em: 22/10/2013. Nesta conferência, traça um panorama das relações entre os dois países,

apresenta em linhas gerais a sociologia chinesa e a lacuna de interesse por temas afins na academia

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Ciente da grande relutância de meus interlocutores em estabelecer diálogo e da

dificuldade em explicar minhas motivações, entrei em contato com uma professora do

Centro de Línguas (CELIN) da UFPR e pedi que traduzisse uma carta de apresentação8

por mim escrita para o mandarim, na qual explico os objetivos de minha pesquisa,

solicito um breve diálogo e se possível a resposta a um questionário9.

Ainda que tal carta tenha facilitado meu trabalho, pois agora conseguia ao

menos dizer porque estava ali, a relutância ao diálogo continuou, principalmente entre

os chineses de bares e pastelarias, sob a principal desculpa de que não dispunham de

tempo e não sabiam falar português. Apenas quatro pessoas se dispuseram a responder o

questionário, e três delas foram contatadas via internet por meio de amizades em

comum, tendo elas mesmas lido e respondido.

Dessa forma, devido ao pouco sucesso na aplicação de tal questionário e à falta

de representatividade que sua utilização poderia adquirir, optei por deixar de lado a seu

uso como instrumento de pesquisa. A parte empírica desta monografia se baseia em

conversas informais realizadas com as mais diversas pessoas, o que será melhor

detalhado no último capítulo.

brasileira. Aponta o trabalho de Daniel VERAS (20008) e Rosana PINHEIRO-MACHADO (2009) como

"únicas contribuições de maior fôlego". 8 Apêndice A.

9 Apêndice B.

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16

CAPÍTULO 1 – A DIÁSPORA CHINESA E AS MIGRAÇÕES

INTERNACIONAIS

1.1 - CHINA - SITUAÇÃO ATUAL

A República Popular da China (RPC) está localizada no oeste da Ásia,

ocupando um território de 9.572.900 (aprox. 9.6 milhões) km², (7% do solo terrestre e

quase o tamanho da Europa). É composta por 33 unidades administrativas, sendo 22

províncias, cinco regiões autônomas, quatro municípios e duas regiões administrativas

especiais (SAR, na sigla em inglês: Hong-Kong e Macau).10

Sua população é estimada em 1.349.911.000 (1,35 bilhão) de pessoas no ano de

2012, um quinto da população da Terra, sendo que 51,3% da população vive em áreas

urbanas. É composta por 56 etnias diferentes, mas 92% pertencem à etnia Han. A língua

oficial é o mandarim, embora existam mais de 1000 dialetos falados dentro de seu

território, como cantonês, min e vu. Não há uma religião oficial, e 40% da população se

declara não religiosa ou atéia, ainda que crenças tradicionais como o Confucionismo e o

Taoísmo estejam na base de toda a cultura chinesa.11

10 CHINA. IN: Encyclopædia Britannica. Encyclopædia Britannica Online, 2013. Disponível em:

<http://www.britannica.com/EBchecked/topic/111803/China>. Acesso em: 02/11/2013. 11

Ibidem

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17

FIGURA 1 - MAPA POLÍTICO DA CHINA

FONTE: Wikipedia

12

A civilização chinesa é a mais longa que já existiu e tem seu início entre 3000 e

1500 anos a.C.. Entretanto, o início da sua história imperial data do ano de 221 a.C. sob

a dinastia Qin, que unificou a China ao impor determinada forma de escrita e assumir as

ideias confucionistas, que desempenharam grande influencia por toda sua história.

Desde então, foi governada por diversas dinastias, sendo as principais: Qin

(221 a.C. - 206 a.C.); Yuan (1279 - 1368); Ming (1368 - 1644); Qing (1644 - 1911).13

Um episódio central à compreensão da história contemporânea da China são as

Guerras do Ópio (1839-1842 e 1856-1860), conflitos armados entre o Império Qing e as

principais potências européias, principalmente o Império Britânico. A China exportava

grandes quantidades de chá, porcelana e seda para a Europa, e em troca aceitava apenas

12 Disponível em: en.wikipedia.org/wiki/China. Acesso 30/11/2013.

13 Para uma história da China Imperial mais detalhada e completa, cf. Encyclopædia Britannica op. cit.

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18

ouro e prata (que eram extraídas nas colônias européias), pois não demonstrava

interesse em nenhuma mercadoria oferecida pelos mercadores europeus.

O grande déficit comercial fez o Império Britânico começar a vender ópio

produzido na Índia, sua colônia, aos chineses. Tal medida alcançou grande êxito, pois a

droga tinha alta aceitação e grande poder de vício. Dessa forma, a venda de ópio cresce

exponencialmente e equilibra a balança comercial entre os dois impérios. Isso faz com

que o governo chinês proíba o seu uso e comércio, desencadeando o conflito armado.

Com a vitória européia, a China é forçada a assinar tratados que abrem suas

portas ao domínio estrangeiro e seus portos aos navios europeus, além do pagamento de

multas e da cessão de territórios, como a ilha de Hong Kong. Estes tratados dão início a

um "século humilhação", devido à intervenção do imperialismo estrangeiro.14

Até 1911 a China vivia sob um regime imperial, que se encerra com a tomada

do poder pela Aliança Revolucionária, cujo principal líder era Sun Yixian. Funda no

ano seguinte o Kuomitang, Partido Nacional do Povo. Nos primeiros anos de república,

o poder foi exercido pelo general Yuan Shikai, que se revelou um ditador e pretendeu

restabelecer a monarquia.

Com sua morte em 1916, o país se fragmenta politicamente, devido a falta de

uma autoridade central, e passa a ser governado por chefes militares, inaugurando a Era

dos Senhores da Guerra, que dura até 1928.

A República da China (1911-1945) foi um período conturbado da história

chinesa, pois o país foi alvo de frequentes invasões estrangeiras e estava dividido

internamente entre nacionalistas, liderados por Chiang Kai-Shek, e comunistas,

liderados por Mao Tsé-Tung.

Os nacionalistas do Kuomitang eram acusados de favorecer países estrangeiros

e as elites econômicas e feudais da China, dando continuidade ao establishment que

vinha desde o Império e privilegiava pequenas parcelas da população, cuja maioria se

encontrava na miséria.

14 Sobre as Guerras do Ópios, cf. PINEHIRO-MACHADO (2009) e SAHLINS (2004).

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19

Os comunistas propunham a reforma agrária, a emancipação dos pobres e o

anticolonialismo, fundando em 1931 a República Soviética da China, na cidade de Jui-

chin. O governo nacionalista os reprime e tem início a Longa Marcha do Exército

Vermelho, que percorre o interior do país e recebe a simpatia do povo.

Em 1937 os dois partidos, o comunista e o nacionalista, se unem para expulsar

os japoneses, que haviam invadido o território chinês em 1931. Permanecem unidos até

o final da Segunda Guerra, período em que o partido comunista se fortalece e expulsa os

nacionalistas, criando a República Popular da China (RPC) em 1949. Durante os

primeiros trinta anos do regime comunista, alguns episódios merecem destaque:

- o primeiro Plano Quinquenal (1953-1958), que implantou a reforma agrária, a

formação de cooperativas e a obrigatoriedade da educação;

- o Desabrochar das Cem Flores (1956-1957), no qual foi incentivado o debate

e a crítica ao regime como forma de aperfeiçoá-lo;

- o Grande Salto Adiante (1958-1961), que pretendia a coletivização do campo

e a industrialização urbana em tempo recorde;

- a Grande Fome (1958-1961), que como consequência das políticas anteriores

e de condições climáticas adversas levou à morte mais de 30 milhões de pessoas;

- a Revolução Cultural (1966-1976), uma campanha lançada por Mao contra

artistas, intelectuais, burocratas e qualquer crítico do regime, levando-os à prisões,

exílio, trabalhos forçados e inclusive à morte. É dessa época o famoso Livro Vermelho

de Mao, principal símbolo do movimento revolucionário.

Com a morte de Mao em 1976, a liderança da RPC passa para Deng Xiaoping,

que começa o período de reformas e abertura econômica e política (embora esta em

menor grau) da China. Dentro de uma corrente pragmatista e que pretendia criar um

"socialismo com características chinesas", cria as Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) e

o programa das quatro modernizações, que envolvia indústria, agricultura, ciência e

tecnologia e forças armadas.

Atualmente é a segunda maior economia do mundo, possui um sistema político

unipartidário e o Partido Comunista Chinês (PCC) governa o país. Sua autoridade

política máxima é o presidente Xi Jinping. A história da China, que já dura

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20

aproximadamente cinco mil anos, viu-se intimamente conectada à história dos seus

fluxos migratórios.

1.2 - PANORAMA DAS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS

De acordo com o World Migration Report (2010)15

, da IOM, existem

atualmente cerca de 214 milhões de migrantes internacionais ao redor do mundo, 740

milhões de migrantes internos, 26 milhões de pessoas deslocadas internamente (IDP,

internally displaced persons) e 15,2 milhões de refugiados em 2008. Caso o ritmo de

crescimento das migrações internacionais continue igual, estima-se que ela atinja a

marca de 405 milhões de pessoas em 2050.

Dois fatores podem ser apontados como responsáveis por parte significativa

dos motivos de emigração no presente século: a questão do trabalho e a das mudanças

climáticas. O primeiro apóia-se sobre as disparidades entre países mais e menos

desenvolvidos, principalmente no que tange ao crescimento da força de trabalho:

enquanto nos mais desenvolvidos ela deve permanecer estável, por volta de 600

milhões, nos menos deve atingir 3 bilhões em 2020 e 3,6 bilhões em 2040 (IOM, 2010,

p. 4). Tal diferença criará uma grande demanda por mão-de-obra qualificada e por

estudantes nos países desenvolvidos aliado ao seu excesso nos outros países.

Já as mudanças climáticas tendem a causar deslocamentos populacionais cada

vez maiores, ainda que suas reais consequências sejam imprevisíveis. Tais mudanças

devem contribuir mais para migrações internas do que internacionais, e catástrofes

devem ser menos impactantes do que mudanças graduais e de longo prazo. Para se ter

uma ideia, desastres causados por eventos naturais deslocaram 36 milhões de pessoas

em 2008, e nos últimos 30 anos o número de pessoas deslocadas pelas secas foi o dobro

das deslocadas por tempestades (IOM, 2010, p. 121).

15IOM (International Organization for Migration).World Migration Report 2010: The future of

migration: building capacities for change. 2010. Disponível

em:<http://publications.iom.int/bookstore/free/WMR_2010_ENGLISH.pdf>. Acesso em: 02/11/2013.

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21

A intensidade e frequência dos desastres naturais (cuja relação com as

mudanças climáticas é difícil de ser avaliado) vêm crescendo e se torna cada vez mais

visível na Ásia. O terremoto na província de Sichuan, na China, deslocou 15 milhões de

pessoas, 40% do total de pessoas deslocadas por desastres naturais nesse ano de 2008.

Além disso, 31 milhões (86%) desse total de pessoas moravam na Ásia e 17 dos 20

eventos que mais deslocaram pessoas ocorreram nesse continente (IOM, 2010, p.168).

Ainda que se reconheçam as dificuldades e insuficiências dos métodos de

mensuração dos fluxos e estoques de migrantes, principalmente devido à fragmentação

dos dados, é consenso que tais números vêm crescendo e se tornando mais complexo.

Para tal mensuração o relatório aponta como principais métodos os censos, os dados da

administração pública e os programas de regularização de imigrantes irregulares levados

a cabo em alguns países.

Especial atenção merece ser dada à questão das migrações irregulares, que

pode ser definida como referente àquelas pessoas que entraram em outros países

ilegalmente (sem inspeção), ou com documentos falsos, ou, ainda, que permaneceram

em determinado país por período superior àquele permitido pelo seu visto. Há quem

atue como facilitador nesse processo, em troca de dinheiro: os chamados coiotes

(smugglers) e traficantes (traffickers). A principal diferença entre eles reside no fato de

que os coiotes auxiliam apenas no ato de cruzar fronteiras ilegalmente, enquanto

traficantes, além da travessia, pretendem explorar o trabalho dos migrantes ilegais no

país de destino. (SKELDON, 2000, p.7 - 8)16

Estima-se que tais atividades geraram entre cinco e sete bilhões de dólares em

1995 e que um barco com migrantes chineses para os EUA dê um lucro próximo a seis

milhões de dólares, ou em outros termos, o tráfico de oito migrantes irregulares equivale

ao de 1kg de heroína, embora o perigo e as penas do tráfico humano sejam irrisórios se

comparados aos do tráfico de drogas. (SKELDON, 200, p.21)

Dos 214 milhões de migrantes internacionais em 2010, estima-se que entre 10

e 15% sejam irregulares, ou seja, aproximadamente 30 milhões de pessoas (IOM, 2010,

p.29). Embora os Estados Unidos e a Europa Ocidental sejam os principais destinos,

16 SKELDON, Ronald. Myths and Realities of Chinese Irregular Migration.IOM Migration Research

Series, Suiça, n. 1, 2000.Disponível em: <http://publications.iom.int/bookstore/free/mrs_1_2000.pdf>.

Acesso em 02/11/2013.

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22

não são os únicos. O fluxo migratório, regular ou não, entre países do hemisfério sul e

na região oeste da Ásia também é significante.

Os movimentos migratórios se inserem em um complexo contexto mundial de

globalização, no qual diversos fatores permeiam sua existência, como as melhorias nos

sistemas de comunicação e transporte; os direitos humanos e as desigualdades sociais

intra e internacionais; a configuração política de Estados-Nações e sua fronteiras; e o

principal fator, a demanda por trabalho.

Tal demanda apresenta-se nos países mais desenvolvidos sob uma dupla

característica: as taxas de natalidade são baixas, muitas vezes registrando índices de

crescimento populacional negativos, e há cada vez menos disponibilidade de mão-de-

obra "nativa", ainda mais para trabalhos físicos intensos, perigosos e subvalorizados,

contribuindo para isso o alto nível educacional da população, menos disposta a aceitar

tais serviços. (SKELDON, 2000, p. 11)

Assim, a insuficiente oferta de força de trabalho local e a continua demanda

por ela, independente de sua origem, favorece e pode ser considerada o principal pilar

da migração ilegal, podendo até se afirmar que sua ilegalidade é apenas virtual, uma vez

que é uma condição desejada por países desenvolvidos para os trabalhadores de baixa

qualificação, pois estes não teriam acesso à direitos providos pelo Estado e formariam

aquilo que Marx chamou de exército de reserva.

A migração irregular chinesa talvez seja a que mais se destaca nesse cenário,

por meio de redes criminosas bem organizadas e estruturadas, que envolvem pessoas

tanto no país de origem quanto no de destino. Entretanto, SKELDON (2000) aponta que

tal destaque se deve a fatores diferentes de sua real dimensão, principalmente devido ao

medo, por parte dos países de destino, do potencial migratório de um país com 1,3

bilhão de pessoas em que as principais regiões de emigração representam apenas 12%

da população do país.

A província de Fujian, região costeira e próspera da China, é o lugar de origem

da maioria dos migrantes irregulares, e as cidades de Fuzhou e Changle merecem

destaque, não por sua pobreza, mas pela percepção de que há mais oportunidades em

outros lugares. Enquanto o salário médio na China era de U$ 100 dólares, nos EUA

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girava em torno de U$ 1.359 dólares para os imigrantes ilegais (CHIN, 1999, p.14 apud.

SKELDON, 2000, p.17).

Segundo HOOD (1998, p. 3 apud. SKELDON, 2000, p. 18), deixaram a

província de Fujian entre 1979 e 1995 entre 300 e 400 mil pessoas, a maioria

irregularmente, uma média entre 19 e 25 mil pessoas por ano.

1.3 - A DIÁSPORA CHINESA

O termo "diáspora" está historicamente associado aos judeus, mas ultimamente

tem sido usado em referência aos armênios, africanos e também chineses. Ele carrega

consigo algumas características importantes, conforme aponta VERAS (2008)17

baseado

em autores como HALL (2003), COHEN (1996), TÖLÖLYAN (2004), SAYAD (2000)

e SAFRAN (1991): uma consciência étnica; a ideia de retorno; a dispersão por dois ou

mais locais; uma certa idealização da terra natal e o constante contato com os que ali

ficaram.

A migração, entendida como processo essencialmente coletivo, apresenta

unidade e coerência entre os eventos do ciclo de vida e os significados

percebidos e atribuídos ao longo de sua experiência (de indivíduos e grupos

sociais). Tal coerência interna do processo empírico deve-se àquilo que

Sayad (2000: 11) chamou de retorno, o elemento constitutivo da condição do

imigrante. De fato, um paradoxo inerente à constituição do fenômeno

migratório que o define e unifica, pois a noção de retorno "está

intrinsecamente circunscrita à denominação e ideia de emigração e

imigração. Não existe imigração em um lugar sem que tenha havido

emigração a partir de outro lugar; não existe presença em qualquer lugar que

não tenha a contrapartida de uma ausência alhures". (FAZITO, 2008, p.

152).18

17 VERAS, Daniel Bicudo. As diásporas chinesas e o Brasil: a comunidade sino-brasileira em São

Paulo. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), PUC-SP, 2008 18

FAZITO, Dimitri. Situação da migrações internacionais no Brasil contemporâneo. IN: Populações e

políticas sociais no Brasil: os desafios da transição demográfica e das migrações internacionais.

Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2008. p. 150-172. Disponível em:

<http://www.cgee.org.br/publicacoes/demografica.php>. Acesso em 06/11/2013.

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Tratar a diáspora chinesa como homogênea e única é uma opção delicada, uma

vez que ela é a mais longa e expressiva diáspora humana que se tem notícia. Melhor do

que isso talvez seja abordá-la no plural, enquanto diásporas, ou então diáspora

fragmentada, como o faz WEI-MING (1994)19

.

José de Souza Martins (2003)20

nos adverte sobre a redução que o termo

imigrante contém, na qual diluem-se as diferenças em favor de uma categoria

homogênea, genérica. Essa redução ocorre tanto no que tange às origens étnicas e/ou

nacionais, agrupando toda uma variedade de personagens sob o nome de chinês, como

se o fato de alguém ser oriental seja suficiente para classificá-lo como tal. Ainda assim,

tentarei esboçar uma breve história desse processo migratório.

1.4 - 2000 MIL ANOS DE EMIGRAÇÕES

Segundo GUNGWU (1991, apud LEW & WONG, 2002)21

a diáspora chinesa

pode ser dividida em quatro períodos: o primeiro, que se inicia no século III a.C. e vai

até a metade do XVI, é caracterizado pelos mercadores (homens, em sua maioria) que

viajavam por países próximos, como Filipinas, Malásia e Indonésia, buscando novas

mercadorias e eventualmente estabelecendo-se nestes países, criando culturas híbridas

por meio do casamento inter-étnico. Esse período é caracterizado como padrão

Huashang (chinês comerciante).

A emigração foi proibida na China durante a dinastia Qing, a última dinastia

imperial, entre 1644 e 1911. Entretanto, essa situação muda após as guerras do ópio,

quando a Europa subjuga o império chinês e faz com que sua demanda por mão-de-obra

para a agricultura, principalmente nas Américas, seja atendida. Este segundo período,

Huagong (chinês coolie), vai de 1840 até 1920, é composto majoritariamente por

19 WEI-MING, 1994, apud.VERAS, 2008, p .62

20 MARTINS, José de Souza. O imaginário da Imigração Italiana. São Caetano do Sul: Fundação Pró-

Memória. 2003 p . 85 21

LEW, A.A. and WONG, A. Tourism and the Chinese Diaspora.In: C.M. Hall & A.M. Williams (orgs.).

Tourism and Migration: New Relationships Between Production and Consumption. Kluwer

Academic, Dordrecht, The Netherlands, 2002, (no prelo). Disponível em:

<http://www.geog.nau.edu/publications/Lew_Wong-Chinese-Diaspora.pdf>. Acesso em: 28/10/2013

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homens de origem rural e é o primeiro fluxo migratório chinês significante para fora da

Ásia.

O terceiro período, entre 1911 e 1949, é caracterizado pelos migrantes Huaqiao

(chinês de estadia temporária), com maior tempo de estudo e mais bem qualificados,

além de forte sentimento nacionalista e com objetivos de divulgar a cultura chinesa para

além-mar, na Europa e sudeste da Ásia.

A emigração durante estes três períodos foi originada predominantemente do

sul e sudeste da China, principalmente das províncias de Fujian e Guangdong

(Cantão). Voltarei a essa questão em outro momento.

SKELDON (2000, p. 15) aponta a importância das migrações chinesas do final

do século XIX e início do XX no estabelecimento de redes mundiais entre as

comunidades chinesas que favoreceram as migrações recentes do final do século, após a

sua interrupção durante os 30 primeiros anos do regime comunista.

Enfim, nos final dos anos 1970, após certa abertura do regime comunista para o

mundo e a permissão de emigrar, ocorre uma nova onda de migração. Ainda que

continue a predominar o aspecto econômico, agora se têm chineses originados das mais

diversas regiões da China e cujos principais destinos são a América do Norte e a

Austrália. GUNGWU (1991, apud LEW & WONG, 2002) caracteriza esse período

como uma forma moderna de migrantes Huashang (comerciantes) e Huagong

(trabalhadores), além dos Huayi (descendentes), que reemigram para outros países.

CHAN (1999, apud LEW & WONG, 2002, p. 5) aponta a grande diversidade

da população chinesa no exterior (chineses overseas), que compreende pessoas de

diferentes gerações, origens, destinos e classes sociais. Tal população se origina de uma

"série de pequenas diásporas geográficas", sendo que permanecem unidos apenas pela

sua "Chineseness".22

22 O termo diz respeito ao "caráter chinês" (VERAS, 2008, p. 113), algo como uma cultura idealizada ou

um tipo ideal, para utilizar uma categoria mais sociológica. Pode ser traduzido para o português como

"chinesidade", embora eu tenha optado por utilizar a palavra em língua inglesa.

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DING (2010)23

usa o termo diáspora digital chinesa para se referir aos

emigrantes chineses que utilizam a internet para organizar suas comunidades

diaspóricas e manter fortes as conexões sentimentais e materiais com a China. Tais

redes aumentam o senso de identidade e solidariedade, fortalecendo os valores culturais

tradicionais (Chineseness) e permitindo uma maior participação em questões políticas

na China.

Esse fato redefine a identidade chinesa ao facilitar e expandir a comunicação, a

associação e o ativismo transnacional. Para o regime comunista, isso pode tanto

contribuir para a imagem e influência da China como também facilitar o acesso à

informação e aumentar as críticas ao governo, que pretende controlar as informações

disponíveis para seus cidadãos. (DING, 2010, p.6).

Para exemplificar sua tese, o autor relata que em 2008 mais de 80 mil chineses

receberam o visto de estadia permanente (green card) nos EUA, consequência da maior

qualificação tempo de estudo. Aliado a isso, cerca de 90% dos asiáticos americanos

utilizam a internet, sendo que os chineses são o grupo que a utilizam por mais tempo.

(DING, 2010, p.3)

Ainda que fatores de expulsão favoreçam as migrações, é importante

considerar que ela depende também de outros fatores, como contatos e redes pré-

estabelecidas. VERAS (2008) se propõem a analisar o fenômeno migratório em sua

dupla dimensão: individual, baseada em depoimentos e pesquisa junto aos imigrantes; e

coletiva, com base em dados estatísticos e bibliográficos.

Ele aponta como fatores de expulsão da China: instabilidade política e medo de

guerras; medo da perda de patrimônio por famílias mais abastadas, devido a Revolução

Comunista; falta de perspectiva econômica e perseguição política, sendo que a esta

última atribui maior peso, com base em depoimentos coletados direta e indiretamente.

(VERAS, 2008, p. 28).

A região sul da China (Fujian, Hong-Kong, Cantão), além de possuir redes e

conexões com outros lugares já estabelecidas, tinha a emigração facilitada por questões

23DING, Sheng.Sons of the Yellow Emperor Go Online: The State of the Chinese Digital Diaspora.

Global Migration and Transitional Politics Series, N. 13, Geroge Mason University, 2010.Disponível

em: <http://gmtp.gmu.edu/publications/gmtpwp/gmtp_wp_13.pdf>. Acesso em: 05/11/2013.

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geográficas, uma vez que o terreno montanhoso dificultava a expansão territorial e o

acesso ao mar propiciava o deslocamento via navegação.

Junto a isso, o desenvolvimento industrial dos séculos XIX e XX acarretou no

êxodo rural de grandes contingentes da população do interior do país, que se dirigiram

para os centros urbanos da costa e produziu um excesso demográfico nessas áreas, o que

impulsionava a emigração.(VERAS, 2008, p. 40)

Além das províncias de Fujian e Guangdong, podemos citar as cidades

Wenzhou e Qingtian, ambas na província de Zhejiang, também costeira, como

principais origens de migrantes chineses, nesse caso principalmente para a Europa.

ARAÚJO (2009, p. 230) fala que entre 1980 e 1995 deixaram a China cerca de

2.429.000 chineses.24

1.5 - CHINESES OVERSEAS - CHINESES ULTRAMARINOS

A noção de chineses overseas (que pode ser traduzido por chinês ultramarino,

chinês no exterior, chinês expatriado; em mandarim, utiliza-se huaren ou huaqiao) é

criada no contexto das emigrações da segunda metade do século XX com o objetivo de

valorizar tais emigrantes, antes condenados, uma vez que eles eram fonte de grandes

contribuições financeiras para a terra natal.

O termo chineses overseas é usado para designar aqueles chineses que, mesmo

no exterior, nunca deixam de carregar sua identidade cultural e étnica, ainda que em

1980 a República Popular da China tenha proclamado uma lei que impedia a dupla

nacionalidade. Normalmente é aplicado aos chineses e seus descendentes (huayi),

mesmo que possuam passaporte e/ou outra nacionalidade.25

24ARAÚJO, Marcelo Silva. Chineses no Rio de Janeiro: notas sobre nação, território e identidade através

da prática comercial e religiosa. Cadernos do CEOM – ETNICIDADES. Ano 23, nº 32, p. 221-240,

jun. 2010.Disponível em: <http://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/issue/view/77/showToc>.

Acesso em: 22/10/2013 25

Para uma discussão acerca da terminologia e suas implicações, cf. JIANLI, Huang. Conceptualizing

Chinese Migration and Chinese Overseas: The Contribuition of Wang Gungwu. IN: Journal of Chinese

Overseas. N°. 6, 2010, p. 1-21. Disponível em:

<http://www.academia.edu/380322/_Conceptualizing_Chinese_Migration_and_Chinese_Overseas_The_

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De acordo com o World Migration Report (IOM, 2010, p. 167), no ano 2000

aproximadamente 24% dos emigrantes asiáticos estavam nas Américas, e no mesmo

ano, 5,8 milhões de pessoas haviam emigrado da China.

Sobre o número de chineses no exterior (chineses overseas), as fontes de dados

diferem bastante: LEW & WONG (2002, p.7) falam em 30,6 milhões em 1991, embora

tais dados estejam defasados; Wikipédia, com base nos censos de cada país, fala em

aproximadamente 47,5 milhões em 2012, ainda que tal fonte seja duvidosa26

;o

Escritório de Estatística da Alemanha (State Statistical Office, Germany) relata que os

20 países com maior população chinesa somam 39,6 milhões de pessoas27

; um centro de

estudos sobre a China, da Universidade de Ohio, estima em 32,6 milhões, com base em

censos nacionais realizados nos anos 1990 e começo dos anos 2000.28

DING (2010, p.2) aponta uma taxa de crescimento anual de 1,8% da população

chinesa no exterior a partir de 1979, quando ocorreram reformas políticas na China que

a tornaram mais aberta para o mundo. Em 2005, essa população totalizava 38,4 milhões

de pessoas.

VERAS (2008, p.82) também aborda o tema, o que reforça as disparidades

entre as fontes: de acordo com Chu Wan Tai, entre 50 e 70 milhões (MUSEU DA

IMIGRAÇÃO, 1997, P.6 apud.VERAS, 2008); para a Academia de Ciências Sociais de

Pequim, cerca de 35 milhões (JORNAL BBC, 2007, apud. VERAS, 2008) e 55 milhões

para CHIN (1999, apud. VERAS, 2008).

Talvez a fonte mais confiável de dados, ainda que certas objeções possam ser

levantadas, é o Overseas Community Affairs Council (OCAC), da República da China

(Taiwan), que fala em aproximadamente 41,4 milhões de chineses espalhados pelo

mundo no ano de 2012. Confiável pois dispõe de dados, informações e instrumentos

estatais e, logo, exclusivos. Tais objeções mencionadas referem-se aos entraves

Contribution_of_Wang_Gungwu_Journal_of_Chinese_Overseas_6_1_May_2010_1-21>. Acesso em:

06/11/2013 26

OVERSEAS CHINESE. IN: Wikipedia, The Free Encyclopedia. 2013. Disponível em:

<http://en.wikipedia.org/wiki/Overseas_Chinese#Current_numbers>. Acesso em: 06/11/2013 27

GERMANY: State Statistical Office. Manager Magazin, n. 42, 3/2012, p. 87.Disponível em:

<http://www.statista.com/statistics/223451/countries-with-the-largest-number-of-chinese-expatriates/>.

Acesso em: 06/11/2013 28

DISTRIBUITON OF CHINESE OVERSEAS POPULATION. IN: Dr. Shao You-Bao Overseas

Chinese Documetation and Research Center.Ohio University. Disponível em:

<http://www.library.ohiou.edu/hosted/shao/ch_databases_popdis.html>. Acesso em 06/11/2013.

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29

históricos entre a RPC (China continental, comunista) e a RC (Taiwan), além dos

problemas com os chineses no exterior levantados anteriormente. Os dados são

apresentados na tabela abaixo, onde constam apenas as comunidades com mais de 200

mil pessoas29

:

QUADRO 2 - POPULAÇÃO CHINESA NO EXTERIOR (CHINESE OVERSEAS) - 2012

PAÍS POPULAÇÃO (milhões de pessoas)

TOTAL 41,36

ÁSIA 30,72

Indonésia 8,12

Tailândia 7,51

Malásia 6,78

Singapura 2,83

Filipinas 1,41

Mianmar 1,06

Vietnã 1

Japão 0,68

Rússia 0,47

AMÉRICA 7,69

Estados Unidos 4,24

Canadá 1,56

Peru 0,99

Brasil 0,28

EUROPA 1,61

França 0,46

Reino Unido 0,42

Itália 0,20

OCEANIA 1,07

Austrália 0,87

ÁFRICA 0,27

FONTE: República da China: Overseas Community Affairs Council. (2012)

O quadro mostra que aproximadamente 73% dos chineses ultramarinos

encontra-se no continente asiático, o que se explica pela proximidade geográfica e pela

emigração de longa duração, conforme já exposto. Nas Américas encontram-se 19% da

29OVERSEAS CHINESE POPULATION DISTRIBUITON. IN: Overseas Community Affairs Council

(OCAC).Republic of China (Taiwan). 2012. Disponível em:

<http://www.ocac.gov.tw/english/public/public.asp?selno=8889&no=8889&level=B>. Acesso em:

06/11/2013.

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população chinesa no exterior, tema que será tratado no capítulo II. Em seguida temos

Europa (4%), Oceania (3%) e África (1%).

Dada a grande dispersão da população chinesa na região sudeste da Ásia, além

de sua importância econômica e cultural, alguns autores utilizam o conceito "China

Cultural" ou "Grande China" para se referirem a este fenômeno.

Assim sendo, a "Grande China" não é apenas uma concepção abstrata. É uma

realidade cultural e econômica que cresce rapidamente, e que está começando

a se tornar uma realidade política. Os chineses foram responsáveis pelo

espetacular desenvolvimento econômico dos anos 80 e 90: na China

continental, nos Tigres (dos quatro, três eram chineses) e nos países do

sudeste asiático, cujas economias estavam dominadas por chineses (...) Em

outras áreas do Sudeste Asiático, os chineses de ultramar dominaram as

economias de seus respectivos países. No começo da década de 90, os

chineses representavam 1 por cento da população da Filipinas, mas

respondiam por 35 por cento das vendas das empresas de propriedade

nacional. Na Indonésia, em meados da década de 80, os chineses eram de

dois a três por cento da população, porém eram donos de cerca de 70 por

cento do capital privado doméstico. Dezessete das 25 maiores empresas eram

controladas por chineses, e consta que um conglomerado chinês respondia

por cinco por cento do PNB da Indonésia. No início dos anos 90, os chineses

formavam 10 por cento da população da Tailândia, mas eram donos de nove

dos 10 maiores grupos empresariais e respondiam por 50 por cento do seu

PNB. Os chineses são cerca de um terço da população da Malásia, porém

dominam quase totalmente a economia do país. Fora Japão e Coréia, a

economia da Ásia Oriental é basicamente uma economia chinesa.

(HUTINGTON, 1997, p. 211-212 apud. VERAS, 2008, p. 81-82).

A importância econômica dos chineses ultramarinos para a China é enorme. Se

antes estes eram considerados traidores por terem deixado o país em busca de melhores

condições de vida, a partir das reformas políticas e econômicas promovidas por Deng

Xiaoping no final dos anos 1970 essa situação se reverte. Uma frase sua resume bem

esta transformação: "Chineses de todo mundo, enriquecei-vos" (CHUNG, 2005, p. 32

apud. VERAS, 2008, p.67).

Os chineses de além-mar passam a confiar no mercado financeiro da China e se

tornam a principal fonte de investimento estrangeiro, alavancando o desenvolvimento

do país nas últimas décadas. HUNTINGTON (1997, p. 213 apud. VERAS, 2008, p. 89)

aponta que 80% dos investimentos estrangeiros diretos na China, em 1992, vieram de

chineses fora da China continental, e as remessas internacionais para a China em 2009

somaram 47 bilhões de dólares (IOM, 2010, p.168).

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31

Xiaoping, mais do que criar condições propícias e incentivar estes

investimentos, estimula o reforço dos laços culturais e sentimento de identidade do povo

chinês (chineseness) e das comunidades chinesas no exterior, que agora são motivo de

orgulho e vistas com bons olhos.

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32

FIGURA 2 - A DIÁSPORA CHINESA

FONTE: WSJ Research, The Shao Center at Ohio University, CIA World Factbook.30

NOTA: Com o declínio econômico e social do Império Qing durante o século XIX, muito cidadãos

deixaram o país, inadvertidamente ajudando a China a estabelecer uma presença global. Este mapa

mostra onde estão os chineses ultramarinhos hoje.

30 Disponível em:<filipspagnoli.wordpress.com/tag/diaspora>. Acesso em: 30/11/2013

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33

CAPÍTULO 2 – A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA AS AMÉRICAS E O BRASIL

2.1 - A IMIGRAÇÃO FEZ A AMÉRICA

A importância que a imigração internacional teve na formação do continente

americano já é largamente conhecida e, em linhas gerais, bem documentada e estudada.

Ainda que toda a colonização do continente tenha sido feita por imigrantes, no sentido

de pessoas nascidas em outros lugares, sem esquecer os povos indígenas que aqui

viviam e os africanos escravizados trazidos para estas terras, é apenas no século XIX

que os fluxos migratórios para as Américas se tornam mais substantivos e passíveis de

análises mais específicas sobre tal.

Herbert Klein (2000)31

parte do pressuposto que a equação entre fatores de

expulsão e fatores de atração (pull-push factors) é fundamental na escolha de uma

pessoa sair de sua região. Na maioria das vezes, as questões econômicas são centrais

nesse processo, mas pode haver também questões políticas, religiosas, dentre outras.

Ele divide a imigração para as Américas em dois períodos, mas cujo principal

fator de expulsão era comum: a transição demográfica na Europa, influenciada pela

revolução industrial dos meios de produção, que diminuiu a necessidade de mão-de-

obra humana devido ao surgimento das máquinas, aliada ao crescimento populacional,

causado pelo aumento da natalidade e diminuição da mortalidade, graças aos avanços

científicos na saúde e produção de alimentos. (KLEIN, 2000, p.14)

Já o fator de atração principal era o acesso a terra, uma vez que as Américas

possuíam grandes quantidades disponíveis à ocupação e usufruto, e logo, mais baratas

que na Europa, se é que tinham dono, além da escassez da mão-de-obra, o que a

encarecia. (KLEIN, 2000, p.16)

O primeiro período, chamado de "Velha Imigração", vai do início da

colonização do continente até 1880, sendo que durante os primeiros 200 anos o aporte

31 KLEIN, Herbert S. Migração Internacional nahistória das Américas. IN: FAUSTO, B. (org.). Fazer a

América. São Paulo. Edusp, p. 13-31

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34

de imigrantes era pequeno e vai crescendo paulatinamente até atingir maior volume no

século XIX.

Esse período é caracterizado por fluxos constantes de camponeses europeus,

em sua maioria do norte do continente e com destinos principais na América do Norte,

Brasil e Argentina. Junto a isso, os escravos africanos também entraram em grande

número, estimados em cerca de 3,6 milhões somente para o Brasil.

A partir de 1880 há grande mudança no volume do fluxo migratório Europa -

América, que, favorecido pelas melhorias tecnológicas das comunicações e transportes,

aumenta exponencialmente os intercâmbios entre o Velho e o Novo Mundo até o ano de

1915, agora caracterizado por europeus do sul e do leste, período conhecido como

"Grandes Imigrações". (KLEIN, 2000)

Embora dez milhões de africanos e possivelmente cerca de quinze milhões de

europeus houvessem cruzado o Atlântico antes de 1880, a penúltima década

do século XIX assinalou um ponto decisivo no fluxo migratório da Europa.

(...) O ritmo da migração europeia intensificou-se durante o último quartel do

século XIX e atingiu seu pico nas primeiras duas décadas do século XX.

Entre 1881 e 1915, cerca de 31 milhões de imigrantes chegaram às Américas.

Mais uma vez, como no período anterior a 1880, os Estados Unidos eram o

principal país de recepção, recebendo 70% desses imigrantes. O segundo

lugar em importância, porém, não era o Canadá, que recebeu apenas 2,5

milhões, mas dois países latino-americanos: a Argentina, com 4,2 milhões, e

o Brasil, com 2,9 milhões de imigrantes. (KLEIN, 2000, p. 23-25).

Os fluxos migratórios para as Américas diminuem durante o período das duas

grandes guerras (1914 - 1945), chegando a serem quase insignificantes. Ressurgem,

entretanto, após a década de 1950, porém agora com novo perfil caracterizado por mão-

de-obra qualificada e por imigrantes de origens diversas: os europeus perdem sua

centralidade e agora dividem lugar com os asiáticos (em sua maioria chineses) e os

próprios americanos, cuja migração interna ao continente ganha expressão. (KLEIN,

2000)

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35

2.2 - O COMÉRCIO DE COOLIES

Há estudos32

que apontam a chegada dos chineses às Américas e ao Brasil

antes de Colombo e Cabral, fato que contradiz toda a história que nos é ensinada

durante a vida escolar e que recebeu críticas de diversos historiadores, apontando a

insuficiência de provas para tais afirmações.

No Brasil, o contato teria ocorrido em 1421, pelo litoral dos estados que hoje

chamamos de Pernambuco e Maranhão, sendo que em seguida os almirantes chineses

rumaram para Argentina e completaram uma volta ao redor da Terra. (MENZIE, 2009

apud. FONTOURA, 2012, p.112)

Afirmar o primado da exploração chinesa no Novo Mundo e da Austrália não

(...) (subestima) as realizações e memórias de Bartolomeu Dias, Colombo,

Magalhães e Cook. As façanhas desses homens bravos e hábeis jamais serão

esquecidas, mas é hora de reverenciar outros homens que se permitiu caírem

no esquecimento por tempo demais. Esses notáveis almirantes chineses

dobraram o Cabo da Boa Esperança 60 anos antes de Bartolomeu Dias,

passaram pelo Estreito de Magalhães 98 anos antes de Magalhães, fizeram o

levantamento da Austrália três séculos antes do capitão Cook e da América

70 anos antes de Colombo. Os grandes almirantes Zheng He, Hong Bao,

Zhou Man, Zhou Wen e Yang Qing merecem também ser lembrados e

celebrados, pois foram os primeiros, os mais bravos e os mais ousados de

todos. Os que os seguiram, por maiores que tenham suas realizações,

navegaram na esteira por eles deixada. (MENZIE, 2009, p. 408 apud.

FONTOURA, 2012, p. 112).

De acordo com a historiografia oficial, a imigração chinesa para as Américas

data do início do século XIX, mas adquire maiores dimensões a partir de meados do

século, quando surge o comércio de coolies33

como alternativa à mão-de-obra escrava.

Assim, insere-se no segundo período migratório descrito no capítulo anterior.

Entretanto, comércio de coolies significa que eles eram literalmente a

"mercadoria" da troca, ou seja, estavam em condição análoga à da escravidão negra

ainda presente em diversos países americanos. Muitas vezes eram pessoas sequestradas

32 Cf. MENZIE, Gavin. 1421: O ano em que a China descobriu o mundo. Tradução: Ruy Jungmann. 6ª

ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. 33

Palavra oriunda do hindu kuli e que significa "massa móvel de trabalhadores assalariados que se

espalharam pelo mundo". (YANG, 1974, p. 5-6 apud. VERAS, 2008, p.107).

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36

e contrabandeadas, outras forçadas a assinar contratos fictícios e submetidas a condições

de viagem e trabalho sub-humanas.

Segundo HUI (1995 apud. VERAS, 2008, p. 40) os coolies, também

conhecidos por porcos humanos (chu-tsai), foram comerciados oficialmente de 1840 a

1920. Dentre os principais destinos estavam Cuba, onde entraram 125 mil chineses

dentro desse sistema e são apontados como pilares da sociedade cubana (MOTES, 2000;

MORENO-FRAGINALS, 1989; HU-DeHART, 2004, apud. VERAS, 2008).

Também foram levados para trabalhar em minerações na África do Sul, com

cana no Havaí, tabaco na Sumatra, além de Samoa, Rússia (recrutados pelo exército

para lutar na 1ª Guerra Mundial), Guiana, Caribe (por volta de 150 mil pessoas),

Jamaica e México (onde desempenharam atividades de burguesia comercial), Chile,

Austrália, Canadá e EUA, entre outros.

No México, os chineses somavam mais de um milhão de pessoas na época da

Revolução (1919), concentrados principalmente na província de Sonora, região de

fronteira com os EUA. Por terem ascendido socialmente enquanto parte de uma

burguesia comercial, durante a Grande Depressão foram vítimas de ataques e

expropriações por partes dos exércitos revolucionários, que resultaram em sua expulsão

da região. (HU-DeHART, 2004, apud. VERAS, 2008)

O Panamá recebeu também grande fluxo de imigrantes chineses,

aproximadamente 100 mil, mas apresenta uma característica particular: ao contrário do

restante da América, onde costumavam trabalhar na economia agrícola, os coolies ali

foram utilizados na construção de ferrovias, financiadas pelos Estados Unidos. (SIU,

2004, apud. VERAS, 2008).

Lesser (1995)34

diz que as principais colônias asiáticas (chineses, coreanos e

japoneses) na América do Sul são Brasil, Peru e Paraguai. No Brasil ressalta a

imigração pós-1949, sendo que a maioria da comunidade chinesa no Brasil, estimada

pelo consulado chinês de São Paulo em 120 mil pessoas no ano de 1993, veio de

Taiwan.

34LESSER, Jeffrey.Asians in South America. IN: Encyclopedia of World Cultures. Vol. 7, South

America.Edited by Johannes Wilbert. New York: G.K. Hall/Macmillan, 1995. P. 58-61. Disponível em :

<http://www.everyculture.com/South-America/Asians-in-South-America.html>. Acesso em: 08/11/2013.

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37

O Peru, ao contrário do Brasil, incentivou a imigração chinesa ainda na

segunda metade do século XIX, uma vez que era um país pouco atrativo para imigrantes

europeus devido à escassez de terras e baixos salários. Dessa forma, 133 mil chineses

entraram no Peru nesse período, principalmente para trabalhar em plantações de cana-

de-açúcar, mas também na mineração de guano35

e na construção de ferrovias através

dos Andes. (LESSER, 1995, p. 2)

Já os Estados Unidos começam a receber coolies chineses após sua

Independência, em 1865, numa tentativa de substituir a mão-de-obra escrava pela

assalariada, devido à proibição do tráfico de escravos. Conforme já apontado, o

comércio de coolies nasce com essa ambição, mas já nasce morto.

Nesse país, eles foram empregados principalmente na mineração e na

construção de ferrovias e constituíram as famosas Chinatowns, já retratadas em filme

homônimo. A vida nesses guetos deixou-os isolados e criou um enclave étnico, pois era

desnecessário o contato com a sociedade receptora uma vez que se obtinha todo o

necessário ali dentro. (VERAS, 2008, p. 105)

No século XIX, os imigrantes chineses representavam 4% do total de

imigrantes nos Estados Unidos (LIU, 1995, apud. VERAS, 2008, p. 104). Porém a

partir do ano de 1882, no qual é criada uma lei que proíbe a entrada de chineses, essa

população começa a diminuir e ser alvo de represálias e preconceitos.

Tal lei ficou conhecida como Lei de Exclusão Chinesa e insere-se dentro de um

debate sobre a qualidade dos imigrantes chineses na formação da Nação, suscitando

questões acerca dos perigos da "raça amarela" e de suas características biológico-

culturais, as quais a levariam a uma possível inassimilação, conforme será mostrado no

final deste capítulo.

Segundo o World Migration Report (IOM, 2010, p. 166) aproximadamente

24% dos 10 milhões de emigrantes da Ásia estavam nas Américas em 2000, sendo que

60% do total eram de origem chinesa.

35 Fezes de pássaros acumuladas em ilhas do Pacífico e exportadas durante a virada do século para

utilização como fertilizante natural.

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38

QUADRO 3 - CHINESES NA AMÉRICA, POR PAÍS DE RESIDÊNCIA - CENSOS

CENSOS

País Anos

1960

Anos

1970

Anos

1980

Anos

1990

Anos

2000 Anos 2010

1

Argentina - - - 2297 4184 8929

Bolívia - - - 489 533 -

Brasil 5188 8255 11213 8322 10.301 19.397

Canadá - - - - 657.930 -

Chile - 491 - 788 1653 -

Costa Rica - 828 2024 - 1327 389

Equador - - 816 480 1214 -

EUA - - - 921.070 1.518.650 -

México - 1846 54 1129 1648 -

Panamá -

- - 3244 9093 13.910(RPC) /

248(Taiwan)2

Paraguai - - - 1868 865 -

Peru - - 1714 3728 - -

Venezuela - - 5334 6121 9364 -

FONTE: CELADE/CEPAL (2006)36

Nota: Os dados referentes aos censos de 2010 e anos próximos foram buscados nos sites de cada país,

tendo sido encontrados apenas estes. 2Nota: RPC refere-se à República Popular da China, continental e comunista. Taiwan refere-se à

República da China (RC), governo republicano que fugiu da China continental em 1949, por causa da

Revolução Comunista, e instalou-se na ilha de Taiwan.

QUADRO 4 - POPULAÇÃO CHINESA NA AMÉRICA - 2012

PAÍS POPULAÇÃO (milhões de pessoas)

TOTAL 7,69

Estados Unidos 4,24

Canadá 1,56

Peru 0,99

Brasil 0,28

Panamá 0,14

Argentina 0,1

Venezuela 0,08

México 0,06

Costa Rica 0,04

Jamaica 0,03

Equador 0,03

República Dominicana 0,02

Chile 0,02

Guatemala 0,02

Suriname 0,01

Guiana 0,01

Trindade e Tobago 0,01

Outros 0,05

FONTE: República da China: Overseas Community Affairs Council. (2012)

36 MIGRACIÓN INTERNACIONAL. Ano 1, nº 1. Santiago do Chile: CEPAL/ONU, 2006.

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39

As diferenças percebidas entre os dados de ambos os quadros têm sua origem,

a meu ver, principalmente na forma como são conduzidos os censos. Ainda que não

tenha tido acesso aos censos dos outros países, a pergunta realizada no caso brasileiro é

sobre o país de residência em determinada data do passado, cuja informação sobre a

nacionalidade só veio a ser incluída a partir do censo de 2000.

Dessa forma, se exclui das contagens tanto a população descendente como, na

falta da pergunta sobre a nacionalidade, aquelas pessoas naturais de determinado país,

mas que se encontravam residindo em outro na data apontada pelo questionário, e,

porventura, brasileiros que residiam em outro país são incluídos na contagem. Além

disso, obviamente os imigrantes ilegais não são contabilizados nos censos.

Quanto aos métodos e instrumentos utilizados para a obtenção dos dados

fornecidos pela República da China, não disponho de informações, mas devido aos altos

números provavelmente dizem respeito às comunidades chinesas em cada país, que

inclui os huaqiao e huayi, chineses no exterior e seus descendentes, respectivamente.

No quadro 4 percebe-se a continuidade histórica do fluxo migratório chinês

para cada país, pois aqueles que receberam grande número de imigrantes durante o

século XIX, sob o comércio de coolies, continuam a figurar entre as comunidades

chinesas mais expressivas, como é o caso dos Estados Unidos, Panamá, Canadá e Peru.

Entretanto, a ausência de Cuba no quadro 4 é estranha, pois foi um dos países com

maior influência chinesa na sua formação. (MOTES, 2000 apud. VERAS, 2008).

A continuidade histórica das migrações confirma a importância de contatos e

redes pré-estabelecidas nas escolhas dos migrantes pelo país de destino e também o

caráter coletivo (leia-se social) das migrações.

Ao contrário dos outros países, o Brasil não recebeu grande aporte de

imigrantes chineses até pelo menos metade do século XX, embora o país esteja na

quarta posição entre aqueles com maior número de chineses overseas. Tal fato reitera

minha hipótese de que a imigração chinesa para o Brasil apenas ganha importância a

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40

partir da Revolução Comunista, conforme exponho adiante.37

Sobre a população chinesa

residente no Brasil e as fontes estatísticas de dados, conferir o terceiro capítulo.

2.3 - A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA O BRASIL

A presença chinesa no Brasil tem seus primeiros contornos em 1807 quando se

pensou na possibilidade de trazer dois milhões de chineses para trabalhar na agricultura,

mas o primeiro registro de entrada de chineses acontece em 1810, quando alguns foram

trazidos para trabalhar no cultivo de chá, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro,

incentivados por D. João VI. (LESSER, 2001, p. 40)

Tal projeto foi considerado um fracasso pelo governo da época, devido à

dificuldade de comunicação e preconceitos mútuos entre ambos os povos. Além disso,

os chineses estavam sujeitos a condições deploráveis de trabalho, o que levou muitos a

fugir e tentar outras profissões, como mascates e cozinheiros.

A imigração chinesa passa a ser mal vista tanto pelo governo brasileiro como

pelo chinês, que não queria seus cidadãos submetidos à escravidão, e por isso não se

desenvolve (LESSER, 2001). Em 1845 foi aprovada a Lei Aberdeen que tornava pirata

os navios negreiros e dificultava o transporte de escravos para o continente americano,

fato que reacende a possibilidade de se importar mão-de-obra chinesa.

Lesser (2001, p. 45) afirma que por volta de 1860 havia menos de mil chineses

no Brasil e Chang-Sheng (2009)38

estima que quatro mil chineses tenham vindo para o

país até o fim do período imperial, em 1889.

Em 1873 o governo chinês proíbe a imigração, exceto a voluntária, visando

parar o comércio de coolies. Ainda assim, o contrabando de chineses para o Brasil

continuou, juntamente com as discussões acerca da questão chinesa. Esse fato levou o

governo brasileiro a assumir a dianteira na busca por imigrantes, influenciado pelo

37 Outros autores têm posicionamentos semelhantes. Cf. VERAS (2008), PINHEIRO-MACHADO

(2009), ARAÚJO (2009), FONTOURA (2012). 38

CHANG-SHENG, Chu. Imigrantes e Imigração Chinesa no Rio de Janeiro (1910-1990). Revista

Eletrônica Boletim do TEMPO, Ano 4, Nº07, Rio de Janeiro, 2009 [ISSN 1981-3384]

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41

senador alagoano João Lins Vieira Cansação de Sinimbu. Esse papel, que até então era

atribuído aos homens de negócio, transformou a questão da imigração em política

nacional. (LESSER, 2001)

No ano de 1880 é assinado o tratado de "amizade, comércio e navegação" com

a China, que ainda assim se recusa a permitir a contratação de seus cidadãos, pois

acreditava que estes seriam tratados como os escravos negros.

Dois anos depois, em 1882, é criada a Companhia do Comércio e Imigração

Chinesa (CCIC), que trouxe mil chineses para trabalhar na empresa britânica

Companhia Mineradora de São João d'El-Rey, dona da maior mina da América do Sul.

Ao chegarem e perceberem as condições de trabalho, os chineses se recusaram a

trabalhar ou fugiram pouco tempo depois. Devido ao seu fracasso, essa Companhia é

dissolvida no ano seguinte. (LESSER, 2001, p. 58)

No ano de 1883 é criada a Sociedade Central de Imigração39

, privada e não

governamental, que tinha por objetivo promover e organizar a vinda de estrangeiros

para o Brasil, dentro de um projeto maior de modernização do país. Entretanto, os ideais

que pautavam tal projeto concebiam as populações mestiças como degeneradas e

visavam à importação de mão-de-obra branca e europeia, conforme se percebia na sua

publicação mensal, A immigração.

Em 1890, após o fim da escravidão e a Proclamação da República, é

promulgado pelo governo republicano o decreto 528, que pretendia regularizar a entrada

de imigrantes e que demonstrava a posição do Estado sobre os imigrantes não brancos,

como os asiáticos e os africanos, que foram proibidos de entrar no país sem a aprovação

do Congresso Nacional (LIMA, 2005, p.110)40

:

Art. 1º. É inteiramente livre a entrada, nos portos da República, dos

indivíduos válidos e aptos para o trabalho, que não se acharem sujeitos à ação

criminal do seu país, excetuados os indígenas da Ásia, ou da África que

somente mediante autorização do Congresso Nacional poderão ser

admitidos de acordo com as condições que forem então estipuladas.

39 HALL, Michael M. (1976). Reformadores de classe média no império brasileiro: a Sociedade Central

de Imigração. IN:Revista de História, Ano XXVII, vol. LIII, nº105, pp. 147-171. 40

LIMA, Silvio C. de Souza. Determinismo Biológico e Imigração Chinesa em Nicolau Moreira

(1870-1890).Dissertação (Mestrado em História das Ciências da Saúde), FIOCRUZ, Rio de Janeiro, 2005.

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42

Art. 2º. Os agentes diplomáticos e consulares dos Estados Unidos do Brasil

obstarão pelos meios a seu alcance a vinda dos imigrantes daqueles

continentes, comunicando imediatamente ao Governo Federal pelo telégrafo

quando não o puderem evitar.

Art. 3º A polícia dos portos da República impedirá o desembarque de tais

indivíduos, bem como dos mendigos e indigentes. (LIMA, 2005, p. 110,

grifos do autor).

Tal decreto reflete a posição das elites econômicas e intelectuais da época, que

tinham na Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional o principal palco de debates

sobre a "questão chinesa". Posteriormente, os debates sobre a integração étnica

continuam, agora tendo como palco os principais jornais da época.

Em 1900, é registrada a primeira entrada oficial de chineses em São Paulo, em

número próximo a uma centena. Em 1911, ano da Revolução Republicana da China que

pôs fim a quase cinco mil anos de império, imigram para o Rio de Janeiro chineses da

cidade de Qingtian, na província de Zheijiang. Sua principal atividade era o comércio

ambulante, conhecido como tibao, atividade que requeria pouco capital e era flexível

em relação ao espaço e ao tempo. (CHANG-SHENG, 2009)

Durante a guerra sino-japonesa (1931-1945) chegaram ao Brasil alguns

industriais chineses que optaram por transferir suas fábricas para cá, fugindo da guerra e

da revolução comunista em seguida. (JYE et al., 2009)41

O ano de 1949 foi marcado pela Revolução Comunista Chinesa, liderado por

Mao Tsé-Tung. Muitos chineses fugiram para a ilha de Taiwan, principalmente aqueles

com maiores posses e os líderes da República da China, e alguns fugiram em direção a

outros países. Diversos países fecharam suas embaixadas na China e as transferiram

para outros lugares. O Brasil, por exemplo, mudou sua representação diplomática para o

Japão e em seguida para Taiwan, negando-se a reconhecer o regime comunista e sob

forte influência política dos Estados Unidos. (CHANG-SHENG, 2009)

Para fins analíticos, divido a imigração chinesa para o Brasil em dois períodos

históricos. O primeiro, que vai do início do século XIX até meados do XX, no qual o

41 JYE, Chen T., SHYU, David J.S., BEZERRA DE MENEZES JR, Antonio J. Os imigrantes chineses

no Brasil e a sua língua. In: Synergies Brésil n° 7, pp. 57-64, São Paulo, 2009. Disponível em:

http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Bresil7/chen.pdf. Acesso em: 07/11/2013

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43

fluxo migratório é pequeno e marcado por episódios pontuais, período em que

predomina a migração dos coolies, não apenas no Brasil como também no mundo. Além

disso, essa fase da imigração chinesa suscitou debates acerca da identidade nacional,

conforme aponta Jeffrey Lesser (2001).42

O segundo período se inicia a partir da metade do século XX até os dias atuais,

no qual a migração é "livre" e começa a adquirir volume expressivo, principalmente no

final do século. O marco temporal por mim instituído para tal divisão é o ano de 1949,

data da revolução comunista chinesa, que desencadeia uma série de fatos que servirão

como vetores para a diáspora chinesa. Este período é o tema do próximo capítulo.

2.4 - A QUESTÃO CHINESA

A imigração chinesa para o Brasil foi marcada por um debate sobre a questão

da identidade nacional. A partir de meados do século XIX anunciava-se o fim do tráfico

de escravos negros para as Américas e surgia a demanda por um novo tipo de mão-de-

obra para substituir aquela, processo que ocorreu por todo o continente.

Junto a isso, o Brasil passava por um período de formulação da identidade

nacional, uma questão presente nos debates da intelligentsia brasileira e das elites

econômicas, influenciadas pelas correntes europeias da biologia cultural e da

antropometria, nas quais questões culturais estavam intimamente relacionadas às

biológicas. Além dessas correntes, o darwinismo social, que era uma adaptação das

teorias biológicas evolucionistas de Darwin para a esfera social, também exercia grande

influência sobre o pensamento ocidental, o que se refletia no Brasil.

Tais correntes acima descritas, pretensamente científicas, propunham uma

escala evolutiva das raças, em que na base estariam os negros e no topo os europeus, os

asiáticos estando no meio. Raça era um conceito que delimitava as características

42 LESSER, Jeffrey. A mão de obra chinesa e o debate sobre a integração étnica. In: LESSER, Jeffrey. A

negociação da identidade nacional: Imigrantes, minorias e a luta pela etnicidade no Brasil, p. 37- 85,

São Paulo, SP: UNESP, 2001.

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culturais de um povo, sendo os negros selvagens e próprios para trabalhos pesados, os

amarelos dóceis, mas inassimiláveis, e os brancos, o suprassumo da humanidade.

Dessa forma, o debate acerca da possibilidade de utilização da mão-de-obra

asiática envolvia a discussão sobre seu grau de assimilação e sua contribuição para a

construção da identidade nacional. Temia-se que os asiáticos fossem agravar ainda mais

a degeneração da nação, "mongolizando-a".

Para as elites, um país que já contava com grande quantidade de negros e

índios em sua constituição necessitava um processo de "embranquecimento", que

apenas seria alcançado por meio da inserção de europeus, cuja miscigenação

paulatinamente produziria uma nação melhor e mais branca.

A "questão chinesa" nunca pôde ser desvinculada das ideias sobre o futuro do

Brasil, dividindo opiniões das mais variados pessoas, como Quintino Bocaiúva

(político), Alfredo d'Escragnolle Taunay (senador), os barões de Mauá e de Cotegipe,

Joaquim Nabuco, Sinimbu, Lacerda Werneck, Nicolau Moreira, Xavier Pinheiro,

Salvador de Mendonça, entre outros. (LESSER, 2001, p. 39).

As posições assumidas por esses políticos nem sempre eram coerentes com

sua filiação liberal ou conservadora, e alianças políticas as mais bizarras eram

a norma. O grupo "anti" reunia os nacionalistas/racistas ardorosos, que

asseguravam que os chineses eram biologicamente degenerados; os

abolicionistas, que acreditavam que os chineses viriam a constituir uma

classe de neo-escravos; e alguns grandes proprietários de terras, que estavam

convencidos de que apenas os africanos eram biologicamente adequados ao

extenuante trabalho na lavoura. O outro lado agrupava uma mistura de

fazendeiros que queriam substituir os escravos africanos por um grupo mais

barato e mais dócil; outros fazendeiros, que acreditavam que os chineses

eram biologicamente adequados ao trabalho agrícola, podendo assim

contribuir para tornar o Brasil mais competitivo no mercado mundial; e os

abolicionistas, que viam que os chineses, como mão-de-obra contratada,

representariam um passo adiante em direção a um regime pleno de trabalho

assalariado. Mas todos estavam de acordo quanto a que os trabalhadores

chineses eram pouco mais que uma mercadoria. (LESSER, 2001, p, 39-40).

O principal crítico da imigração chinesa foi o fazendeiro Lacerda Werneck. Em

suas Idéias sobre a Colonização, de 1855, diz que tal povo é avesso à civilização,

moralmente atrasados e presos à tradição. Anuncia o desaparecimento dos povos

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orientais frente ao poder ocidental, que seria o único capaz de transformar o Brasil em

um país civilizado. (LIMA, 2005)

Do outro lado estava o republicano Quintino Bocaiúva, que em 1968 escreve A

crise da Lavoura, em que apontava a imigração de coolies como principal alternativa à

escassez de força de trabalho advinda do gradual término da escravidão e utiliza os

exemplos dos Estados Unidos e outros países para reforçar seus argumentos sobre o

sucesso da introdução de imigrantes chineses.

Junto a Bocaiúva, Xavier Pinheiro também era um árduo defensor da imigração

chinesa, conforme se nota em um trecho de sua obra Importação de trabalhadores

chins, na qual ataca os sinófobos e explicita as diferentes posições que permeavam o

debate sobre o tema:

Não foram poucos os que se receiaram da superstição dos chins, da sua

fealdade repugnante, do cruzamento de sua raça com alguma das raças

existentes no país, dos seus hábitos extravagantes. Da sua linguagem pouco

eufônica e até seus trajes sem elegância. Ouvindo esses prudentes encarecer

temores, crera qualquer um que o povo brasileiro corria o risco de perder a

sua fé de católico ante o exemplo dos adoradores de Buda, de assombrar-se

com a vista, mais jocosa do que terrível, dos súditos do filho do céu, de

contaminar o seu bom gosto imitando a moda de pekim e nanking, de

degenerar na pureza de sangue pela aliança com esses homens emigrados do

extremo oriente. Deviam tranqüilizar-se. Não vinham eles nem para nos

converter à sua religião, nem para se casarem com brasileiras, nem para

fazerem competência com os mestres do bom gosto parisiense que abriram

escola na Rua do Ouvidor. Vinham trabalhar muito, ganhar salários módicos

e depois de um prazo tornariam a sua terra com algumas escassas economias.

Não poderia haver mais modesta ambição, nem mais inocente viver.

(PINHEIRO, 1869, p. 20-21 apud. LIMA, 2005, p. 89)

Ambos, Quintino Bocaiúva e Xavier Pinheiro, encaravam tal questão

primordialmente pelo seu aspecto econômico, pois os chineses forneceriam uma mão-

de-obra barata e servil, aptos ao trabalho na lavoura e de difícil assimilação, o que faria

com que voltassem para a China após o término dos contratos de trabalho. Ainda assim,

compartilhavam os ideais evolucionistas da época, nos quais os asiáticos eram vistos

como povos inferiores e moralmente pervertidos, além de serem viciados em ópio.

(LIMA, 2005; LESSER, 2001)

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46

Durante as buscas por alternativas à mão-de-obra escrava, o governo brasileiro

solicitou que Salvador de Mendonça, cônsul-geral do Brasil nos Estados Unidos,

relatasse a experiência da imigração chinesa naquele país. Para esse diplomata, a

introdução dos asiáticos no país seria uma boa solução para o problema da mão-de-obra,

pois estes eram de fácil adaptação e dispostos ao trabalho. Além disso, o ideal seria o

direcionamento dos orientais para a agricultura e dos norte-americanos para a

colonização do país. (PEREIRA, 2009)43

É importante lembrar a associação que muitos brasileiros faziam entre os

coolies (índios da Ásia) e os índios brasileiros, ambos pertencentes à raça amarela, o

que servia de argumento tanto para contrariar sua vinda, alegando sua inabilidade ao

trabalho pesado e raça degenerada, quanto para apoiá-la, uma vez que se dissipariam em

meio à sociedade brasileira, como havia acontecido com os índios brasileiros (que mais

que dissipados, foram dizimados), argumentos igualmente racistas. (LESSER, 2001)

Por volta de 1870 ressurge o debate sobre a "questão chinesa", quando uma

comissão especial da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, criada para estudar

as possibilidades da imigração chinesa, apresenta um parecer no qual defende a

importação de mão-de-obra coolie e convence o governo imperial a decretar um plano

para tanto.

Tal parecer apoiava-se na crença de que eles seriam o tipo ideal para trabalhar

nas lavouras brasileiras, pois eram dóceis, climaticamente adaptáveis, dispostos a

trabalhar por baixos salários e a voltar para sua terra assim que juntassem dinheiro, não

tendo ambições de se tornarem proprietários.

A reação dos opositores foi imediata e, a partir de então, esta instituição foi

palco de boa parte dos debates sobre o tema, em que havia tanto posicionamentos a

favor, como contra a vinda de asiáticos para o Brasil, fortemente influenciados pelas

experiências com a mão-de-obra coolie em outros países do mundo presentes em

diversos relatos e livros publicados na Europa. Em seguida, tais debates ganham a

imprensa e passam a ser realizados por toda a sociedade. (LIMA, 2005; LESSER, 2001)

43 PEREIRA, Gabriel T. A diplomacia da americanização de Salvador de Mendonça (1889-1898). São

Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. ISBN 978-85-7983-006-8. Disponível em:

<books.scielo.org/id/gshz7/02>. Acesso em: 19/11/2013

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47

Outro ponto que merece atenção é a questão da sexualidade e da miscigenação,

introduzida no debate pelo fazendeiro Domingos José Nogueira Jaguaribe Filho.

Segundo ele, por serem os homens os produtores da identidade nacional, as relações

sexuais inter-étnicas produziram filhos degenerados e mongolóides, e o mesmo era

defendido por quem acreditava que a "cultura fluía do útero". (LESSER, 2001, p. 55).

Tanto Jaguaribe como Joaquim Nabuco, pretensos abolicionistas, combatiam

veementemente a imigração asiática e o casamento inter-étnico, pois acreditavam que

tal mistura degeneraria a população brasileira e sua identidade nacional ainda precoce.

Após a Proclamação da República, a corrente sinófoba tem seu principal defensor na

pessoa do senador Alfredo d'Escragnolle de Taunay.

Tais debates contribuíram para retirar do dualismo brancos/negros a questão da

identidade nacional e preparar o terreno para o período das grandes imigrações. Ainda

que a imigração chinesa tenha sido incipiente durante o século XIX, os debates sobre

ela fizeram com que se criassem parâmetros e projetos para o futuro do Brasil e revelam

mais sobre a formação da identidade nacional do que sobre os chineses propriamente

ditos. Conforme escreve Lesser (2001, p.47): "embora o tópico fosse a mão-de-obra

chinesa, o assunto era a identidade nacional."

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CAPÍTULO 3 – A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA O BRASIL NA SEGUNDA

METADE DO SÉCULO XX

A Revolução Comunista na China, em 1949, leva grandes contingentes

populacionais a sair do país, muitos em direção a Taiwan, para onde se transfere a sede

do governo da República da China e se refugiam muitos chineses do continente,

receosos de perderem suas posses e das consequências do novo regime. Além de

Taiwan, é grande o fluxo de migrantes internacionais para outros países.

Entre os anos de 1949 e 1978 o fluxo migratório de chineses para o Brasil é

pequeno, devido à ascensão do comunismo na China, às guerras da região e à

Revolução Cultural chinesa. Nesse período, a maioria dos trabalhadores que migraram o

fizeram clandestinamente, uma vez que era proibido deixar o país durante o regime de

Mao e o Brasil não tinha relações diplomáticas com a RPC, que são restabelecidas

apenas em 1974.

Após 1979, com a reabertura econômica e política da China e com o

restabelecimento das relações diplomáticas com Brasil, começa a crescer o número de

imigrantes, alguns em busca de oportunidades profissionais e outros visando reencontrar

parentes que aqui estavam.

Durante minha pesquisa de campo, constatei que a maior parte dos chineses

contatados havia entrado no país após o ano de 1979, principalmente nos últimos 20

anos do século. Apenas um deles havia vindo em período anterior, na década de 1950,

ainda criança.

KLEIN (2000)44

observa que a partir dos anos 1960, a imigração asiática para a

América começa a ganhar força, principalmente para o Brasil e EUA. Muito semelhante

ao padrão da imigração europeia da virada do século, esses imigrantes aceitam trabalhos

de baixo status e salários (altos em comparação a terra de origem). Peculiar a ela é a

tendência de se investir na educação dos filhos como forma de escapar da classe

44 KLEIN, Herbert S. Migração Internacional na história das Américas. IN: FAUSTO, B. (org.). Fazer a

América. São Paulo. Edusp, p. 13-31

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trabalhadora, "subir de vida", conforme constatado também em minha pesquisa de

campo.

3.1 - CHINESES NO BRASIL DE HOJE

A imigração chinesa para o Brasil, principalmente a que ocorreu a partir de

meados do século XX e que se torna cada vez mais visível nos dias de hoje, é quase que

desconhecida.

Na verdade, ela é bem conhecida nos grandes centros urbanos pela maioria da

população, pois o número de comércios sob a direção de chineses é expressivo o

suficiente para que qualquer habitante de metrópoles como Rio de Janeiro, São Paulo e

Curitiba já tenha entrado em algum. Ainda que se saiba que existem chineses por aqui e

por aí, tal fato permanece um mistério.

Esse mistério reside em três fatores: i) o mais imediato, sua "exoticidade",

devido à distância cultural que os separam de nós, brasileiros, e sua (nossa também)

falta de "predisposição à interação"; ii) a falta de dados e informações sobre o fluxo

migratório China - Brasil, lacuna causada pela inabilidade dos órgãos e da estatística

oficial (estatal) em mensurar tal fenômeno e também pelo fato da migração ilegal; iii)

causa (e talvez consequência) dos outros fatores, a pouca atenção da Academia/Ciência,

especialmente das Ciências Sociais, ao tema.

Diversas fontes tentam estimar a quantidade de chineses no Brasil. VERAS

(2008, p. 128) traz depoimentos que dizem 100 mil, outro 150 mil, e o Consulado de

São Paulo fala 200 mil. De qualquer forma, a maioria das estimativas falam entre 100 e

250 mil chineses e descendentes em território brasileiro, ainda que a variação de 150

mil pessoas seja enorme. Todas as fontes consultadas concordam que o estado de São

Paulo abriga a grande maioria da população sino-brasileira.

É difícil dimensionar a presença chinesa no Brasil. Existem problemas de

declaração de nacionalidade e imigrantes irregulares. O Consulado Geral da

China no Rio de Janeiro calcula que há 150 mil pessoas no Brasil entre

chineses, chineses naturalizados e descendentes— 7 mil no Rio de Janeiro,

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140 mil no Estado de São Paulo, 3 mil em Curitiba. Mas existem também

estimativas de uma população em torno de 250 mil, da qual cerca de 10 mil

residem no Rio de Janeiro. Os levantamentos indicam a capital paulista como

o grande centro chinês, com cerca de 90% dessa população. Rio de Janeiro e

Curitiba viriam na seqüência do ranking populacional. (CHANG-SENG,

2009, p. 1)

Em 1987 a estimativa é de que havia 100 mil chineses no Brasil, população que

praticamente dobra nos dias de hoje, ainda que as estatísticas tenham dificuldades

devido ao alto índice de imigrantes ilegais. (HUI, 1992 apud. SHOJI, 2004, p.76)

Segundo CHANG-SHENG (2009, p. 5) "em 1995, havia no Saara apenas duas

ou três lojas atacadistas chineses, número que aumentou cada vez mais. Em 2007, o

número chegou a 40 lojas qingtianesas e, hoje, os chineses ocupam mais de 20% dos

espaços comerciais da área", o que demonstra o crescimento da população chinesa no

Brasil ao final do século.

3.2 - MARCOS JURÍDICO E INSTITUCIONAL

No Brasil, os assuntos relacionados à imigração são de competência

compartilhada entre os Ministérios do Trabalho e Emprego, da Justiça e das Relações

Exteriores, cujos principais órgãos e atribuições estão expostos abaixo.

Dentro do Ministério do Trabalho e Emprego, o Conselho Nacional de

Imigração (CNIg), que tem por atribuição orientar, coordenar e fiscalizar as atividades

de imigração; e a Coordenadoria Geral da Imigração (CGIg), encarregada de coordenar,

orientar e supervisionar as atividades relacionadas a autorização de trabalho a

estrangeiros. (OIM, 2010, p.60)45

No Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Estrangeiros da

Secretaria Nacional de Justiça, cujas competências são processar, opinar e encaminhar

os assuntos relacionados à nacionalidade, naturalização, regime jurídico dos

45 OIM (Organização Internacional para Migração). Perfil Migratório Brasileiro 2009. 2010, Disponível

em : <publications.iom.int/bookstore/free/Brazil_Profile2009.pdf>. Acesso em: 10/11/2013

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estrangeiros, extradição, expulsão, deportação, refúgio e asilo político; CONARE

(Comitê Nacional para Refugiados), que conduz a política nacional sobre refugiados;

Departamento da Polícia Federal, responsável pelo controle das fronteiras e registros

dos estrangeiros. (OIM, 2010, p. 60)

E o Ministério das Relações Exteriores, mediante o Departamento de

Imigração e Assuntos Jurídicos, a quem compete a concessão de autorização para

entrada e permanência de estrangeiros no país e também de vistos de trânsito.

Quanto ao marco jurídico, as leis que regem os assuntos relacionados à imigração

são: Estatuto do Estrangeiro, que cria o Conselho Nacional de Imigração (CNIg) (Lei Nº

6.815/80); Lei de Refugiados, que cria o Conselho Nacional de Refugiados (CONARE)

(Lei Nº 9.474/97); Plano Nacional contra o tráfico de pessoas (Lei Nº 11.106/05); e a

que estabelece a política de imigração (Lei Nº 10.683/03).

A Lei Nº 6.815/80, conhecida por Estatuto do Estrangeiro, dispõe sobre a

situação jurídica dos estrangeiros e cria o Conselho Nacional de Imigração (CNIg),

órgão colegiado responsável por formular, orientar e coordenar as atividades e políticas

referentes à imigração, dentre outras atribuições.46

Posteriormente essa lei é reformulada

pela Lei Nº 6.964/81.

A atual Lei dos Estrangeiros foi aprovada em regime de urgência no ano de

1980, sob pressão do poder executivo federal, à época ditatorial. A situação política fez

com que tal lei tratasse o tema das migrações internacionais sob a ótica da segurança

nacional, além de restringir a elaboração das políticas de migração ao executivo.

Critica-se também sua inobservância aos tratados internacionais e aos direitos humanos.

(OIM, 2010).

Em 2009 o poder executivo enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei

5.655, que pretende substituir o atual Estatuto dos Estrangeiros, além de transformar o

Conselho Nacional de Imigração (CNIg) em Conselho Nacional de Migração. Há

quatro anos está tramitando no Congresso, ainda que esteja sob regime de prioridade.

46 Para mais informações, acessar: http://portal.mte.gov.br/cni/conselho-nacional-de-imigracao-cnig.htm

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Atualmente "aguarda parecer na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional

(CREDN)".47

Essa mudança reflete o novo foco que se almeja dar ao tema, inserindo as

questões dos direitos humanos e não criminalizando o imigrante ilegal, promovendo

políticas públicas que sejam capazes de lidar com as atuais especificidades temáticas

advindas da globalização.

3.3 - DADOS ESTATÍSTICOS SECUNDÁRIOS

Os dados que serão apresentados a seguir foram coletados junto às mais

diversas fontes, todas ligadas ao Estado. São chamados de secundários por não terem

sido produzidos pelo autor do texto, e a maior parte deles foi obtida pela Lei de Acesso

à Informação (Lei nº 12.527/11).

3.3.1 - Polícia Federal

De acordo com a Coordenação Geral de Polícia de Imigração da Polícia

Federal, responsável pelo controle das fronteiras e pelo registro dos estrangeiros que

entram e residem no país, existem 39.393 chineses no Brasil com registros ativos no

SINCRE (Sistema Nacional de Cadastro e Registro de Estrangeiros).48

O pedido de informações para a Polícia Federal foi feito por meio da Lei de

Acesso a Informação. Ao solicitar dados mais específicos, com detalhamentos anuais do

fluxo de migrantes chineses, o órgão apontou a dificuldade na produção e extração de

informações do SINCRE,o que acarretaria em ônus ao trabalho da Polícia Federal e

47 A tramitação da PL 5.655/2009 pode ser acompanhada em:

<www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=443102>. 48

O SINCRE (Sistema Nacional de Cadastro e Registro de Estrangeiros) é um sistema criado em 1986

para o registro unificado da entrada e saída de imigrantes, mas que cujo manuseio para a extração de

informação é limitado e requer trabalho de especialistas. Atualmente está em fase avançada de

desenvolvimento o SINCRE II, um sistema mais moderno.

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tornaria o fornecimento de tais dados inviável. Os dados fornecidos são fruto de

levantamento já feito pelo órgão.

QUADRO 5 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - BRASIL - 2013

Classificação Estrangeiros com Registro Ativo no SINCRE

Permanente 37046

Temporário 2292

Provisório 04

Outra 51

TOTAL 39393

FONTE: O autor com base em dados fornecidos pela Polícia Federal via Lei de Acesso a Informação.

Dados emitidos em 12/09/2013.

De acordo com o mesmo órgão, os números de imigrantes chineses para o

estado do Paraná são os seguintes:

QUADRO 6 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - PARANÁ - 2013

Estrangeiros Masculino Feminino

Permanentes 1336 1228

Temporários 16 10

TOTAL 2590

FONTE: O autor com base em dados fornecidos pela Polícia Federal via Lei de Acesso a Informação.

Dados emitidos em 31/05/2013

As categorias utilizadas nos quadros referem-se a situação do estrangeiro junto

à Polícia Federal, que é vinculada ao Ministério da Justiça. Este é responsável pelo

registro dos estrangeiros que pretendam residir no Brasil, para fins de estudos, trabalho,

refúgio, asilo ou outros. Vale ressaltar que a emissão de vistos, que são expectativas de

direito, são atos administrativos de atribuição do Ministério das Relações Exteriores, e

referem-se apenas ao ingresso no país.

O termo permanente se refere àquelas pessoas que pretendem fixar-se

definitivamente em território nacional; o termo temporário àquelas pessoas que

possuem vínculos por tempo determinado; o termo provisório diz respeito aos

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estrangeiros em situação irregular e que desejam regularizar-se, como os que entraram

com pedido de anistia, conforme se verá adiante.

De acordo com o Ministério da Justiça, em junho de 2011 havia cerca de 1.4

milhão de estrangeiros no Brasil, dos quais 35 mil eram chineses. Isso representa um

aumento de quase 50% em seis meses, já que em 2010 esse número era de 27 mil e o

total quase um milhão (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2011).49

Já o jornal Folha de São

Paulo (2000)50

, tendo como fonte a Polícia Federal, diz que em 2000 haviam 30.337

chineses legalizados no país.

3.3.2 - IBGE

O quadro abaixo apresenta a evolução demográfica brasileira entre 1872 e

2010, com especificação dos naturalizados brasileiros e estrangeiros. Percebe-se que a

população estrangeira mantém-se praticamente estável até o censo de 1970, quando

começa a decrescer.

A queda acentua-se nos três últimos censos, atingindo o menor patamar, em

números absolutos e proporcionais à população, desde o ano de 1872, quando se iniciou

o censeamento da população. Proporcionalmente, o ápice da população estrangeira foi

no ano de 1900, quando essa representa quase 6% do total do país, refletindo o grande

afluxo de imigrantes do período das grandes imigrações.

49 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / ESTRANGEIROS. Número de estrangeiros regulares no Brasil

aumenta 50% em seis meses. 01/11/2011. Disponível em: <portal.mj.gov.br>. Acesso em: 17/09/2013;

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / ESTRANGEIROS. Anistia a estrangeiros irregulares atende

expectativa do governo. 07/01/2010. Disponível em: <portal.mj.gov.br>. Acesso em: 16/09/2013 50

JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO. "Anistia da PF regularizou 9.229 imigrantes". IN: Folha de São

Paulo, São Paulo, 23 de julho de 2000. Disponível em:

<www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2307200009.htm>. Acesso em: 25/11/2013.

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QUADRO 7 - MIGRAÇÕES - ESTRANGEIROS E NATURALIZADOS NOS CENSOS

Período População total Brasileiros natos Naturalizados brasileiros Estrangeiros

1872 9.930.478 9.547.149 1.288 382.041

1890 14.333.915 13.982.603 - -

1900 17.438.434 16.159.371 - 1.074.511

1920 30.635.605 29.045.227 52.326 1.513.635

1940 41.236.315 39.822.487 122.736 1.283.833

1950 51.944.397 50.727.113 128.897 1.085.287

1960 70.191.370 68.790.890 148.013 1.252.467

1970 93.139.037 91.909.909 146.383 1.082.745

1980 119.002.706 117.900.142 198.062 912.848

1990 146.825.475 - - 767.781

2000 169.872.856 169.189.026 173.763 510.067

2010 190.755.799 190.163.229 161.250 431.319

Fonte: IBGE51

De acordo com o Censo 2010 (IBGE, 2012)52

, dos 431 mil estrangeiros que

moravam no Brasil, 303 mil fixaram residência antes do ano 2000, 42 mil de 2001 a

2005 e 85 mil nos 5 anos que antecederam o censo, entre 2006 e 2010.

Ainda que o site do IBGE disponibilize diversos dados, informações, séries

históricas, estudos e análises, não foi possível localizar informações mais específicas

sobre o tema da imigração chinesa. Em geral, os dados encontrados no site do IBGE não

especificam a nacionalidade dos estrangeiros residentes ou dos brasileiros naturalizados,

indicando apenas a quantidade de estrangeiros que entraram no Brasil (com série

histórica de 1820 a 1975) e as populações residentes no país, estados e municípios com

base no último local de residência (de cinco anos para trás), e no tipo de nacionalidade

(brasileira, naturalizada ou estrangeira).

51Directoria Geral de Estatística, [187?] -1930, Recenseamento do Brazil 1872-1920; IBGE, Censo

Demográfico 1940-2010. Até 1980, dados extraídos de Estatísticas do Século XX, Rio de Janeiro, 2007

no Anuário Estatístico do Brasil 1995. Rio de Janeiro: IBGE, v. 55, 1995. IBGE, Censo Demográfico

1972/1991.Disponível em:

<http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=CD105&t=migracoes-

estrangeirosnaturalizados-censos-demograficos>. Acesso em 01/11/2013 52

IBGE, Censo Demográfico 2010. Nupcialidade, Fecundidade e Migração: resultados da amostra. Rio

de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/d_detalhes.php?id=798>. Acesso em:

18/11/2013

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Ao solicitar informações ao Instituto Brasileiro de Geografia Estatística

(IBGE), via Lei de Acesso à Informação, sobre os dados referentes à imigração chinesa,

obtive a seguinte tabela como resposta:

TABELA 1 - POPULAÇÃO DE CHINESES QUE RESIDEM NO BRASIL, PARANÁ E CURITIBA -

2010

Lugar de residência População nascidos na China

Brasil 19397

Paraná 1761

Curitiba 977

FONTE: BME. Censo Demográfico 2010.

A primeira informação que salta aos olhos é a diferença entre os dados do

IBGE e da PF apresentados anteriormente. Os números do primeiro órgão são inferiores

que aos do segundo, tanto a nível nacional, quanto estadual. Segundo o IBGE, residiam

no Brasil, no ano de 2010, aproximadamente 20 mil chineses, enquanto a PF aponta o

número de quase 40 mil chineses registrados em solo nacional, um número duas vezes

maior.

No que tange ao estado do Paraná, a discrepância entre ambas as fontes passa

próxima de 800 pessoas, o que talvez possa ser explicado por deslocamentos

populacionais constantes na região oeste, entre as cidades de Foz do Iguaçu, no Brasil, e

Ciudad del Este, no Paraguai, conforme aponta Rosana Pinheiro-Machado (2009).

Além disso, se compararmos ambas as fontes às estimativas da população sino-

brasileira, as contagens oficiais chegam a ser dez vezes inferiores, ainda que o Censo e

o SINCRE não contabilizem descendentes e nem ilegais.

Analisando a evolução da população chinesa no Brasil através dos Censos,

constata-se um crescimento de quase 100% em comparação ao último censo, de 2000,

quando foram registrados 10 mil chineses. Do censo de 1990 para o de 2000, o

crescimento foi de 24%, e de 1980 para 1990 houve decrescimento de 26% (cf. Quadro

4).

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Quanto à imigração de data fixa, na qual se investiga o local de residência há

exatos cinco anos atrás, aproximadamente 268 mil pessoas declararam residir em outro

país no Censo 2010, dos quais 3.571 na China, ainda que não haja distinção por

nacionalidade e saiba-se que a taxa de retorno geral foi de 65,6%. (IBGE, 2012)

Em uma tentativa de se medir o fluxo migratório entre China e Brasil, os dados

apresentados abaixo revelam uma entrada de quase seis mil chineses na última década.

QUADRO 8 - FLUXO E SALDO MIGRATÓRIO CHINA - BRASIL

TOTAL Homens Mulheres

A) Pessoas que residiam há menos de 10 anos ininterruptos na

UF, segundo o país de residência anterior - CHINA 7261 3905 3356

B) Brasileiros natos que residiam há menos de 10 anos

ininterruptos na UF, segundo país de residência anterior -

CHINA

1337 628 709

Saldo (A - B) 5924 3277 2647

FONTE: IBGE, CENSO 2010

3.3.3 - Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)

Outra fonte de dados que pode ser utilizada na tentativa de mensuração do

fenômeno migratório e da população chinesa no Brasil é o Ministério do Trabalho e

Emprego, por meio das autorizações de trabalho concedidas a estrangeiros e publicadas

em relatórios anuais pela Coordenação Geral de Imigração (CGIg) e pelo Conselho

Nacional de Imigração (CNIg).53

QUADRO 9 - AUTORIZAÇÕES DE TRABALHO CONCEDIDAS A CHINESES - 1993 À 2012

ANO AUTORIZAÇÕES CONCEDIDAS

1993-1997 1103

1998-2004 4051

2005-2008 6002

2009 1405

2010 2160

2011 2602

2012 3104

1993-2012 (TOTAL) 20427

FONTE: Base Estatística Coordenação Geral de Imigração, Ministério do Trabalho e do Emprego;

53 Disponível em: <http://portal.mte.gov.br/trab_estrang/estatisticas.htm>. Acesso em 20/11/2013

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De acordo com o quadro, que não faz distinção entre autorizações permanentes

e provisórias, e ainda que até 2008 os dados estejam agregados por período, percebe-se

o crescimento anual da quantidade de autorizações, que atinge seu valor máximo em

2012, o que indica um crescimento na imigração chinesa ou um maior índice de

migrantes legais.

3.4 - ANISTIAS

Os imigrantes em situação irregular são muitas vezes submetidos a trabalhos

forçados e desumanos, pois sua condição ilegal lhes impede de recorrer às autoridades e

de certa forma os torna vulneráveis à agência de máfias e outros aproveitadores de sua

situação, além de não terem acesso aos serviços públicos básicos. Para combater tais

situações, eventualmente o governo fornece a possibilidade de legalização de sua

residência.

No Brasil foram realizadas quatro anistias a imigrantes ilegais, permitindo sua

regularização nos anos de 1980, 1988, 1998 e 2009. Esta última foi promovida pela Lei

Nº 11.961/09 e pelo Decreto Nº 6.893/09, possibilitando a regularização de estrangeiros

que tenham entrado no país até 1º de fevereiro do mesmo ano e que se encontram em

situação irregular, por meio da concessão de residência provisória, em sua primeira fase,

e a transformação dessa em permanente, durante a segunda fase, em 2011.

De acordo com Rosita Milesi (2013)54

, na anistia de 1980 cerca de 27 mil

estrangeiros requereram regularização, na de 1988 foram aproximadamente 37 mil e na

anistia de 1998 quase 41 mil pessoas o fizeram.

Abaixo seguem os dados referentes aos anos de 1998 e 2009, fornecidos pela

Polícia Federal e disponíveis na imprensa e site do Ministério da Justiça. Informações

sobre as duas primeiras anistias não forem encontrados, e quando solicitados à PF

54 MILESI, Rosita, ANDRADE, Willian C. Migrações Internacionais no Brasil: Realidade e Desafios

Contemporâneos. IMDH, 2013. Disponível em

:<www.gritodelosexcluidos.org/media/uploads/migracionesintbr.pdf>. Acesso em: 25/11/2013.

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alegaram as mesmas dificuldades em extrair dados estatísticos do SINCRE apontadas

anteriormente.

QUADRO 10 - ANISTIAS CONCEDIDAS A CHINESES - 1998 / 2009

ANO 1998 2009

ANISTIAS CONCEDIDAS

CHINESES 9.229 5.492

FONTE: Ministério da Justiça; Departamento da Polícia Federal

Na anistia de 1998 foram regularizados quase 41 mil estrangeiros em situação

irregular, dos quais 9.229 eram chineses (JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO, 2000).

VERAS (BARRETO, 2001, p. 65 apud. VERAS, 2008, p. 128) também apresenta estes

dados, entretanto o número de chineses beneficiados é 9.940. Dependendo da fonte, os

chineses são o primeiro ou segundo maior grupo beneficiado por esta anistia.55

Já na anistia de 2009 os dados são mais precisos: de cerca de 43 mil

regularizações realizadas, 5.5 mil foram de chineses, que ocupam a segunda posição

entre as nacionalidades mais beneficiadas, atrás apenas dos bolivianos, com quase 17

mil imigrantes regularizados. Os estados com maior número de requerimentos foram

São Paulo, com 30.402, Rio de Janeiro, com 2.425 e Paraná, com 1.489. (MILESI,

2013, p. 6)

3.5 - CHINESES NO PARANÁ

Segundo o Censo 2010 (IBGE, 2012), o estado do Paraná foi o que apresentou

o maior índice de imigrantes internacionais nos últimos 10 anos. Das 611.903 pessoas

que residiam no estado há menos de 10 anos, 67 mil (11,2%) eram oriundas de países

estrangeiros. No total, aproximadamente 455 mil pessoas imigraram de outros países

para o Brasil no mesmo período, sendo que 14,7% dirigiram-se para o Paraná.

55 Ainda que a diferença seja pequena, de aproximadamente 700 pessoas, ambas as fontes divergem de

maneira mais acentuada sobre os números de imigrantes bolivianos: a FOLHA aponta 9.155 beneficiados

e VERAS diz que foram 14.006. Não saberia dizer a origem de tal discrepância.

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Mais da metade dos imigrantes internacionais da última década chegaram ao

Brasil nos dois últimos anos antes do censo, ou seja, 2008 e 2009, o que está

relacionado com a crise econômica mundial. Entretanto, não é possível saber qual a

porcentagem de estrangeiros e brasileiros nos números apresentados acima, e a

migração de retorno é parte considerável deles visto que os principais países de destino

são Estados Unidos e Japão, que receberam grande número de brasileiros em décadas

passadas.

QUADRO 11 - POPULAÇÃO RESIDENTE POR NACIONALIDADE - PARANÁ - 2000/2010

ANO Total Brasileiros Natos Naturalizados brasileiros Estrangeiros

2000 9.564.643 9.514.981 20.504 29.158

2010 10.444.526 10.394.109 21.816 28.601

FONTE: IBGE

Além da população chinesa na cidade de Curitiba, que será objeto do próximo

capítulo, é importante ressaltar o caso das cidades de Foz do Iguaçu, no oeste do estado,

e Ciudad del Este, no Paraguai, que, a despeito de se encontrarem em dois países

distintos, podem ser consideradas um mesmo centro urbano.

É nessa região que Rosana Pinheiro-Machado (2009) realizou suas pesquisas

acerca da comunidade chinesa e das redes de mercadorias estabelecidas entre a China,

Paraguai e Brasil. Segundo ela, a região concentra uma população de aproximadamente

10 mil chineses, metade da que existia nos anos 1990. (PINHEIRO-MACHADO, 2006,

p. 2)56

Nos anos 1970 e 1980, como descrito por Cunha e Mello (2005) e também

por Machado (2006), boa parte dos chineses em atividade no Brasil penetra

por Foz do Iguaçu, no Paraná, vindos de Ciudad de Leste, no Paraguai.

Estima-se que mais de 90% dos chineses no Brasil se estabeleceram em São

Paulo, ocupando áreas geográficas específicas, especializando-se no

comércio de produtos para presentes e itens de papelaria. Os outros 10%

espalharam-se pelo Brasil, com predominância no Rio de Janeiro, Paraná e

áreas de zona franca. (ARAÚJO, 2009, p. 227).

56 PINHEIRO-MACHADO, Rosana. (Re)pensando a diáspora chinesa: Fluxos globais e dinâmicas locais

da imigração contemporânea. IN: Encontro Anual da Anpocs, 30, 2006.

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Além disso, tal região é um importante meio de entrada de chineses no Brasil a

partir de 1949, pois, com a Revolução Comunista e a quebra das relações diplomáticas

entre Brasil, a RPC e a RC, muitos chineses imigram de Taiwan para o Paraguai, que foi

um dos poucos países a reconhecer e manter relações diplomáticas com a República da

China. Assim, com a inauguração da Ponte da Amizade em 1975, o fluxo de

mercadorias e pessoas entre Brasil e Paraguai é facilitado e, logo, cresce.

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CAPÍTULO 4 – COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA

O presente capítulo pretende expor e analisar o trabalho de campo realizado

junto à comunidade e imigrantes chineses da cidade de Curitiba, durante o ano de 2013.

Explicitarei minhas motivações, dificuldades e resultados durante esse processo. A

utilização do termo "comunidade" não significa que os chineses residentes nessa cidade

estejam articulados e organizados de forma geral, e nem que exista uma identidade

comum a todos, a não ser pelo fato de terem uma origem comum: a China.

Para tentar compreender o fenômeno migratório e as características da

comunidade chinesa em Curitiba, dividi minha pesquisa empírica com fontes diretas em

dois caminhos: um qualitativo, por meio da interação e conversas informais com todos

os chineses e descendentes que pude ter contato, alguns por indicações de conhecidos,

mas a maioria por abordagem aleatória nos comércios das ruas de Curitiba; e outro

quantitativo, por meio da aplicação de um questionário que seguia o mesmo padrão de

seleção e da pesquisa qualitativa.

Conforme já dito na introdução, a aplicação de questionários não trouxe os

resultados esperados, pois foram poucos os que se dispuseram a respondê-lo e tal

amostra não teria qualquer possibilidade de representar o universo estudado. Dessa

forma, as informações obtidas por meio dele serão utilizadas juntamente às demais, que

são resultados de conversas informais.

Em Curitiba existe a Associação Cultural Chinesa do Paraná (ACCPAR),

localizada no bairro Santa Quitéria e fundada em 1989 pelos sino-moçambicanos

(MACAGNO, 2012, p. 2), cujo presidente atual é Francisco Guo Zude. Segundo ele, "o

trabalho na Associação, que é voluntário, tenta criar elementos, atividades, para unir os

chineses e criar interação com a comunidade brasileira." (FONTOURA, 2012, p. 204).

Por uma série de motivos não consegui me encontrar pessoalmente com o

presidente da Associação, o que sem dúvidas seria de grande importância, pois

conheceria o único elo associativo organizado e institucionalizado da comunidade

chinesa em Curitiba e teria acesso a um discurso oficial. Tal fato é uma lacuna na

realização desse trabalho de campo.

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4.1 - LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO

Considerando o processo de levantamento bibliográfico, algumas obras

merecem destaque e podem ser apontadas como pioneiras no estudo de tal temática. Na

área das Ciências Sociais, apenas um livro e um artigo sobre a imigração para

Curitiba57

foram encontrados, e alguns outros trabalhos sobre chineses em São Paulo58

,

Rio de Janeiro59

, Pernambuco60

e Foz do Iguaçu/Ciudad del Este61

.

Outras obras que merecem destaque e que não podem ser catalogadas como

pertencentes às Ciências Sociais, ainda que dialoguem com ela, são: SHOJI (2004)62

,

que aborda as reinterpretações do budismo chinês no Brasil; JYE(2009)63

, sobre o

fortalecimento do bilinguismo entre as comunidades sino-brasileiras; CHEN (2010)64

,

acerca da imigração chinesa para a cidade de Cascavel, Paraná; CARVALHO (2011)65

,

que apresenta uma abordagem psicossocial do relacionamento entre brasileiros e

chineses em contextos nos quais o imaginário e as representações simbólicas são

57 FONTOURA, Rubens Oliveira. Cultura e a longa marcha de chineses e chinesas até Curitiba.

Edição do autor, Curitiba, 2012;

MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma dispersão. In: Andréa

Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento, Brasília, 2012, (no prelo). Disponível em

<http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/files/Comunicacoes/Seminario23Fevereiro2012.pdf>. Acesso em:

22/10/2013; 58

VERAS, Daniel Bicudo. As diásporas chinesas e o Brasil: a comunidade sino-brasileira em São

Paulo. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), São Paulo, PUC-SP, 2008; 59

ARAUJO, Marcelo Silva. Chineses no Rio de Janeiro: notas sobre nação, território e identidade através

da prática comercial e religiosa. Cadernos do CEOM – ETNICIDADES. Ano 23, nº 32, p. 221-240,

jun. 2010.Disponível em: <http://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/issue/view/77/showToc>.

Acesso em: 22/10/2013

CHANG-SHENG, Shu. Imigrantes e Imigração Chinesa no Rio de Janeiro (1910-1990). Revista

Eletrônica Boletim do TEMPO, Ano 4, Nº07, Rio de Janeiro, 2009 [ISSN 1981-3384] 60

SILVA, Marcos Araújo. Guanxi nos trópicos: um estudo sobre a diáspora chinesa em Pernambuco.

Dissertação de Mestrado (Antropologia Social) PPGA- UFPE. Recife, 2008. 61

PINHEIRO-MACHADO, Rosana.MADE IN CHINA: Produção e circulação de mercadorias no

circuito China-Paraguai-Brasil.Tese (Doutorado em Antropologia Social) PPGAS-UFRGS. Porto

Alegre, UFRGS, 2009. 62

SHOJI, Rafael. Reinterpretação do Budismo Chinês. REVER -Revista de Estudos da Religião. Nº

3,São Paulo, 2004, pp. 74-87. Disponível em <www.pucsp.br/rever/rv3_2004/p_shoji.pdf>. Acesso em:

22/10/2013. 63

JYE, Chen T., SHYU, David J.S., BEZERRA DE MENEZES JR, Antonio J. Os imigrantes chineses no

Brasil e a sua língua. In: Synergies Brésil n° 7, pp. 57-64, São Paulo, 2009. Disponível em:

http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Bresil7/chen.pdf. Acesso em: 07/11/2013 64

CHEN, Miao S. Cultura e educação dos imigrantes chineses na cidade Cascavel: dois mundo, um

mesmo objetivo. Monografia, (Curso de Especialização em História da Educação Brasileira). Cascavel,

UNIOESTE, 2010. 65

CARVALHO, João G. da S. Em terra de papagaio dragão não se cria: uma abordagem psicosocial da

relação entre brasileiros e chineses.IN: Contemporânea. N°. 2, p. 165 - 182, jul./dez. 2011.

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tensionadas; TEIXEIRA (1995)66

, sobre as influências e intercâmbios históricos entre

Brasil e China nas mais diversas esferas, como a cultural, artística e arquitetônica; e

PROCÓPIO (2012)67

, cujo foco são as relações internacionais entre Brasil e China.

Sobre a presença de chineses em Curitiba, o livro do desembargador Rubens

Fontoura (2012) é o estudo mais completo já realizado, no sentido em que pretende

abordar as diversas esferas da vida dessas pessoas à luz da Sociologia e História. O

autor, cujas motivações para a realização da pesquisa foram semelhantes às minhas,

divide seu livro em duas partes: uma, em que retoma a história da China, seus aspectos

culturais e políticos; e a outra, em que apresenta a comunidade chinesa em Curitiba com

base em entrevistas realizadas com imigrantes chineses.

A outra referência sobre a temática da imigração chinesa para Curitiba é a

pesquisa do antropólogo e professor Lorenzo Macagno (2012), da Universidade Federal

do Paraná. Sua pesquisa está focada nos sino-moçambicanos, ou chineses da "Beira",

cidade em Moçambique que, à época colônia portuguesa, recebeu imigrantes chineses a

partir do final do século XIX, durante o período do comércio de coolies. Ali

constituíram uma comunidade expressiva que durou até a guerra pela independência de

Moçambique, entre o final de 1960 e 1975.

Em São Paulo, que abriga o maior contingente de imigrantes chineses no

Brasil, a única obra de maior profundidade a abordar o tema é a tese de doutorado em

Antropologia de Daniel Veras (2008), em que o autor apresenta a questão da diáspora

chinesa pelo mundo, os intercâmbios culturais, políticos, econômicos e populacionais

entre Brasil e China (e também Ocidente e Oriente), o estabelecimento de comunidades

e as transformações das identidades dos sino-brasileiros no estado de São Paulo.

Na cidade do Rio de Janeiro, apenas alguns artigos foram encontrados: o de

Shu Chang-Sheng (2009), que retoma de forma breve a história da imigração chinesa

para o Brasil, com foco no Rio de Janeiro; e o artigo de Marcelo Araujo (2010), que

com base em pesquisa etnográfica entre chineses evangélicos problematiza as noções de

66TEIXEIRA, Jose Roberto Leite.A China no Brasil: influências, marcas, ecos e sobrevivência

chineses na sociedade e na arte brasileiras. Tese (Doutorado em Artes). Campinas, Unicamp,1995. 67

PROCÓPIO, Argemiro. O Capitalismo Amarelo: Relações Internacionais da China. Curitiba, Ed.

Juruá, 2012.

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território, nação e identidade, que não podem ser consideradas como categorias puras e

estanques, mas sim a partir da circulação e constante atualização dos seus significados.

Marcos Araujo Silva (2008) realizou pesquisa antropológica entre os chineses

de três cidades em Pernambuco visando a análise dos processos de construção de

identidade étnica transnacional desse grupo. Além disso, problematiza, como a obra de

Araujo (2010) no Rio de Janeiro, noções identitárias fixas postas em termos "puros" ou

"tradicionais", relativizando o que seria "ser" chinês fora da China na

contemporaneidade.

Por fim, a produção acadêmica da antropóloga Rosana Pinheiro-Machado

(2006; 2007; 2009)68

merece especial destaque por sua continuidade temporal, fruto de

mais de dez anos de pesquisa, e qualidade, tendo sua tese de doutorado ganho os

principais prêmios acadêmicos do Brasil.

Em sua tese de doutorado, a autora realizou uma pesquisa etnográfica

multissituada em Ciudad del Este, Paraguai, e na província da Cantão, China, tendo

como objeto de estudo a cadeia formal e informal de produção e circulação de bens

entre os dois países acima citados e o Brasil. Junto a isso, analisa as relações sociais

entre os imigrantes chineses e a comunidade que os recebeu.

Além da tese, aborda questões referentes à ética confucionista, que incentiva o

trabalho, a poupança e a harmonia, e suas aproximações com o sistema capitalista,

tendo como referência e contraponto a obra de Max Weber sobre “A Ética Protestante e

o Espírito do Capitalismo”. Analisa o paradoxo existente entre o intenso consumismo

das novas gerações na China e a poupança e trabalho árduo dos chineses de ultramar,

características que os constituem enquanto grupos imigrantes.

68 PINHEIRO-MACHADO, Rosana. “A Ética Confucionista eo Espírito do Capitalismo”:Narrativas

Sobre Moral, Harmonia e Poupançana Condenação do Consumo Conspícuo Entre Chineses Ultramar".

IN: Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, ano 13, n. 28, p. 145-174, jul./dez. 2007.

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66

4.2 - TRABALHO DE CAMPO - NOTAS INTRODUTÓRIAS

Por não possuir contatos e nem informantes chineses, optei por iniciar a

pesquisa percorrendo as ruas do centro da cidade e adentrando estabelecimentos

comerciais cujos trabalhadores aparentemente eram de origem chinesa. Dessa forma,

buscava iniciar o diálogo explicando que era estudante e que desenvolvia um estudo

sobre pessoas que mudaram de país em busca de uma nova vida.

Destarte, as dificuldades de comunicação e a urgência do trabalho faziam com

que mais da metade dos chineses abordados se negasse a estabelecer uma conversa.

Embora eu acredite que haja outras razões para tais negativas, como a desconfiança

frente a um desconhecido inquirindo-lhes sobre suas vidas (como me afirmou o dono de

uma lanchonete, ao não querer conversar: "isso diz respeito a minha vida particular"),

eram esses os principais motivos alegados por eles.

Muitos, ao contrário, foram extremamente receptivos, conversando comigo por

algum tempo, ainda que estivessem trabalhando, e me contando suas histórias de vida.

Um ou outro, inclusive, me ofereceu café e água (e também sopa de maçã, que como

disse Ane, "tomamos nas refeições como vocês tomam água ou suco").

Entretanto, por estarem em ambiente de trabalho, diversas vezes a conversa era

interrompida, pois precisavam atender seus clientes e resolver outros assuntos. Mario,

por exemplo, que trabalha em um bar próximo à Praça Santos Andrade, em uma região

"underground" e frequentada por um público seleto, conversava comigo ao mesmo

tempo em que atendia muitas pessoas ao longo do balcão do bar, o que complicava o

desenvolvimento e a compreensão do diálogo.

Em um segundo momento, dadas as dificuldades relatadas, elaborei um

questionário e uma carta de apresentação, contratando uma tradutora para traduzi-la

para o mandarim, o que acreditava tornar o processo de apresentação mais fácil. De

fato, ao apresentar tal carta conseguia perceber que meus interlocutores demonstravam

certa simpatia, o que não significa que se dispunham a conversar e muito menos a

responder o questionário, alegando os mesmos motivos de antes.

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67

Responder o questionário enfrentava grande resistência por parte de meus

interlocutores, pois, embora alguns se dispusessem a conversar, quando lhes perguntava

se aceitariam responder um questionário ou se eu podia anotar as respostas, mostravam-

se receosos.

Acredito que esse receio esteja relacionado a uma desconfiança natural em

situações como essa (passei por isso ao trabalhar com pesquisas de intenção de voto),

acrescida à minha pequena inserção em campo e ao estranhamento frente a um

desconhecido ansioso por saber sobre suas histórias de vida.

Dessa forma, optei por abandonar a utilização do questionário, pois havia

conseguido apenas quatro respostas, uma pessoalmente e três pela internet, com jovens

indicados por amigos. A falta de tempo para continuar em busca de pessoas dispostas a

respondê-lo e a baixa representatividade que obteria também pesaram nessa decisão.

Além dos chineses contatados pelos métodos acima descritos, tive a

oportunidade de conversar com alguns jovens estudantes de português do Centro de

Línguas da Universidade Federal do Paraná - CELIN/UFPR, mas que não foram

inseridos no quadro abaixo, que foi elaborado a partir das conversas informais

realizadas durante o presente ano.

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QUADRO 12 - CONVERSAS REALIZADAS

Nome Naturalidade Idade Ocupação Antes de

Migrar Ocupação Atual

Quando

Imigrou

Yuri Moçambique 50

(aprox.) -

Comerciante -

Distribuidora de Doces

1980

(aprox.)

Wilson

(Pais) Brasil (Taiwan)

22

( - ) Pai - Costureiro

Estudante Química

(Pastelaria)

1970

(aprox.)

Camila Taiwan 30 Estudante Comerciante -

Restaurante 1997

Marcos China (Cantão) 34 Estudante Assalariado -

Restaurante 2005

Ana China 40

(aprox.) Costureira

Comerciante -

Restaurante 1996

Jean China (Cantão) 33 Estudante Comerciante -

Restaurante 1995

Mario China (Cantão) 45 Operário, Agricultor,

Eletricista, Gari

Comerciante - Bar

(Família) 1992

Maria China (Cantão) 40

(aprox.) Operária

Comerciante -

Pastelaria 1993

Luiz China 53 - Comerciante -

Pastelaria 1963

Karina China (Cantão) 38 Estudante Comerciante -

Restaurante 1993

Alex China (Cantão) - - Comerciante -

Lanchonete 1979

Talita China (Cantão) - Vendedora Comerciante -

Lanchonete 1997

Ane China (Cantão) 34 Enfermeira / Médica Comerciante -

Restaurante

Após

2008

Hu China (Cantão) 19 Criança Estudante -

Administração 1999

Yanna China

(Zhejiang) 50 -

Comerciante -

Restaurante 1993

Zhong China (Cantão) 51 - Comerciante –

Restaurante 1993

FONTE: O autor

4.3 - RESULTADOS

Conforme dito na introdução deste trabalho, as questões que deram origem e

que permeiam este estudo são: como explicar a recente imigração chinesa para o Brasil

e mais especificamente para Curitiba? É um grupo com perfil social homogêneo ou

compreende histórias díspares e sem conexões? Quem e quantos são? Quais seus ofícios

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69

e onde se estabelecem? Como viviam na China e como estão vivendo hoje? São as

relações com os brasileiros boas ou permeadas por pré-conceitos? Abaixo pretendo

esboçar algumas respostas a partir das conversas realizadas durante meu trabalho de

campo.

É extremamente difícil saber quanto chineses vivem atualmente em Curitiba.

SHOJI (2004)69

fala em 5000 famílias, chegadas principalmente a partir de 1998. Além

dos chineses, em sua maioria cantoneses, há também os chineses da Beira, sino-

moçambicanos, estimados em 100 famílias e 1000 indivíduos (MACAGNO, 2012).

O Consulado Geral da China no Rio de Janeiro estima em três mil (CHANG-

SHENG, 2009); Rubens Fontoura, desembargador e autor do único livro sobre os

chineses em Curitiba, e Chang Yuan Chiang, professor de línguas em Curitiba, estimam

em 2000 pessoas (FONTOURA, 2012, p. 256).

4.3.1 - Origens e anos de imigração

Assim como já exposto em capítulos anteriores, as regiões costeiras do sul e

sudeste da China, principalmente Cantão e Fujian, são os principais locais de origem

dos chineses que emigraram pelo mundo. Esse fato pode também ser constatado no caso

de Curitiba, em que a maior parte dos chineses contatados é de origem cantonesa.

Além disso, apenas uma pessoa vindo de Taiwan, uma de Moçambique e uma

de Zhejiang, região também costeira, ao leste da China. Junto a isso, a importância de

redes já estabelecidas e a presença de amigos e familiares facilita e incentiva o fluxo

migratório.

Dez dos dezesseis contatados imigraram para Curitiba durante a década de

1990, apenas quatro antes disso e dois após os anos 2000. Dos que imigraram antes, um

o fez quando era proibido deixar a China (nas primeiras décadas do regime comunistas)

e os outros três logo no início da abertura política do país, no final dos anos 1970.

69 SHOJI, R. Reinterpretação do Budismo Chinês e Coreano no Brasil. Disponível em: <

http://www.pucsp.br/rever/rv3_2004/p_shoji.pdf >. Acesso em: 04/03/2013.

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70

4.3.2 - Fatores de expulsão

Ciente da controvérsia acerca dos fatores de expulsão e atração, na qual muitas

vezes tende-se a considerar apenas um deles na análise dos fenômenos migratórios,

tentarei estabelecer abaixo quais foram os principais fatores apontados pelos

entrevistados, tanto do lado do país que expulsa, como do que recebe. Vale lembrar que

KLEIN (2000) considera as condições econômicas como o mais importante fator de

expulsão, o que se verifica parcialmente nos casos analisados aqui.

Os principais fatores de expulsão foram a busca por melhores condições de

vida e trabalho, o que foi mencionado por sete pessoas, e a existência de parentes no

Brasil, mencionado por outras sete. Nesse caso, vieram para ajudar os avós, como é o

caso de Mario e Alex, ou para acompanhar o marido, como Ana e Ane. Alguns ainda

vieram quando crianças, não tendo a opção da escolha e não sabendo elencar os motivos

que trouxeram os pais.

A existência de parentes no Brasil poderia ser enquadrada como fator de

atração, e não expulsão, conforme apontado pelos entrevistados ao serem indagados

sobre o principal motivo que os levou a sair do seu país natal. Entretanto, a importância

que a família tem dentro da cultura chinesa, centralidade oriunda das crenças

confucionistas, faz com que o chamado de um parente que passa por dificuldades seja

motivo suficiente para atravessar o mundo e ajudá-lo.

A utilização do mecanismo de redes com uma complexa dinâmica interna

aciona, com uma eficiência impressionante, estratégias empreendedoras que

se adaptam ao capitalismo ocidental utilizando-se, por vezes, de uma filosofia

genuinamente oriental, o confucionismo: a da edificação do comércio à

semelhança da edificação de uma família. Há um adágio que diz “Quem

quiser fundar uma empresa que funde primeiro uma família”, pois a família

(jiajing) é a base de todo edifício. (ARAUJO, 2010, p. 223).

No caso moçambicano pode-se dizer que os fatores de expulsão foram mais

importantes que os de atração, sendo que, conforme demonstra MACAGNO (2012), a

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comunidade chinesa em Moçambique encaminhava-se para uma incorporação, pelo

menos nos discurso oficial.

Yuri, proprietário de uma distribuidora de doces no centro de Curitiba, apontou

a Guerra de Independência como principal fator de expulsão de Moçambique, além do

fato de seus pais já morarem aqui e estarem velhos para trabalhar. Voltarei à questão

dos sino-moçambicanos nas páginas seguintes.

4.3.3 - Fatores de atração

Como principal fator de atração, quando questionados sobre o porquê de terem

escolhido o Brasil, a principal razão enunciada foi já terem parentes aqui, sendo que

estes vieram em busca de melhores condições de vida. Entretanto, devido à dificuldade

em ter acesso aos homens da primeira geração migrante, que em geral são aqueles a

imigrar antes e que, após juntar algum dinheiro e estabelecerem-se melhor, trazem suas

famílias, não posso afirmar que a busca por melhores condições de vida seja de fato um

motivo válido para eles ou se está apenas no discurso dos imigrantes mais recentes.

O fato de já existirem redes estabelecidas de migração facilita os movimentos

entre os dois países, pois as comunidades nos lugares de recepção fornecem suporte e

auxílios aos recém-chegados, conforme citado por alguns interlocutores. Muitos

enunciaram o fato de não terem tido escolhas: as esposas, porque os maridos vieram

antes e depois as buscaram; outros porque migraram ainda jovens, com os pais, como é

o caso de Camila, Luiz, Marcos, Jean, Karina e Ana.

Além disso, quando indaguei a alguns o porquê da escolha por Curitiba,

classificaram a cidade como tranquila, com baixo custo de vida, segura e "boa para criar

os filhos", ao contrário de São Paulo e Rio de Janeiro. Acredito que a exaustão

demográfica destas últimas metrópoles, que concentram a maior parte da população

chinesa no Brasil, além da ampla concorrência nos negócios, tenha contribuído na vinda

para Curitiba.

Cabe ressaltar a facilidade de comunicação e a maior abertura dos chineses

mais jovens, alguns nascidos no Brasil, que propiciaram conversas e informações

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valiosas para a elaboração dessa monografia. Wilson, 22 anos, que conheci na

lanchonete cuja família é dona, nasceu no Brasil e atualmente cursa faculdade de

Química. Disse-me que seus pais vieram de Taiwan há aproximadamente 40 anos e não

sabem falar português muito bem, além de não gostarem de falar sobre o passado.

Uma amiga me passou o contato de Hu (19), estudante de Administração,

nascido na cidade de Kaiping (Cantão), e que veio para Curitiba em 1998, então com

cinco anos, junto à sua mãe e irmã. O pai já estava aqui e, com ajuda de familiares,

juntou dinheiro para pagar a passagem para o resto da família. Apontou como motivo de

saída da China a dificuldade financeira de se viver, tanto antes como agora, pois embora

o país esteja em expansão econômica, as condições de trabalho e remuneração são

deploráveis.

4.3.4 - Educação

A educação é encarada pelos chineses como forma de ascender socialmente,

"subir de vida", o que justifica os onerosos investimentos na educação dos filhos,

conforme aponta Klein (2000, p. 27). A esperança de que as próximas gerações possam

"trabalhar com o que quiserem e não com o que dá" foi enunciada por uma das

entrevistadas. Tal concepção sobre a educação também é apontada por Rosana Pinheiro-

Machado ao pesquisar a comunidade chinesa de Ciudad del Este/Foz do Iguaçu:

Os imigrantes não utilizam qualquer atividade de lazer, abdicam de todas os

prazeres lúdicos em nome de um futuro melhor para seus filhos (que, em

geral, acreditam que vem através da educação). Tudo o que se ganha, através

de uma jornada de trabalho extremamente longa e árdua, poupa-se pensando

no tempo futuro. A lógica é prescritiva. A crença operante é que o único

caminho para construir algo é o do “dia após dia”. (PINHEIRO-MACHADO,

2006, p.20)

Pude constatar tal tendência a investir na educação por meio de um fato

interessante advindo do trabalho de campo: todos os entrevistados, sem exceção,

mantêm seus filhos em escolas particulares, sendo que todas as crianças e jovens na

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idade do ensino fundamental e médio frequentam o Colégio Bom Jesus, de renome na

capital paranaense.

4.3.5 - Localização geográfica e atuação profissional

O centro da cidade de Curitiba concentra a grande maioria dos chineses aqui

residentes, o que é um fato comum entre as comunidades chinesas pelo mundo, embora

não existam no Brasil as famosas Chinatowns, "modelo clássico de ocupação urbana da

imigração chinesa" (ARAUJO, 2010, p. 230).

No caso de São Paulo talvez não seja válida tal afirmação, por ser uma

metrópole e possuir diversos "centros", embora haja uma maior concentração no bairro

da Liberdade, tradicional reduto de japoneses e atualmente também de chineses

(VERAS, 2008). No Rio de Janeiro também não há tal concentração em "espaços

étnicos territorialmente localizados" (ARAUJO, 2010, p.230), embora muitos se

encontrem na região do comércio popular do SAARA.

Elaborei um mapa com alguns estabelecimentos comercias de chineses na

região central de Curitiba, embora não tenha sido possível um mapeamento mais

completo.

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FIGURA 3 - COMÉRCIOS NA REGIÃO CENTRAL DE CURITIBA

FONTE: O autor; adaptado de google maps.

A maioria dos chineses que encontrei pelo centro da cidade (talvez mais de

90%) estava trabalhando em comércios de alimentos, que inclui pastelarias,

lanchonetes, bares, restaurantes, distribuidoras de comidas, de doces e empórios. Além

disso, me deparei com lojas de roupas, artigos eletrônicos, e ouvi dizer que há um hotel

cujos donos são chineses.

A escolha pelo comércio de alimentos se dá pela falta de conhecimento e

capacitação para o trabalho em outras áreas, pela pouca necessidade de comunicação,

pela rapidez de retorno financeiro e pelo fato de que a demanda é constante, uma vez

que "todos precisam comer". Alguns alegaram já ter trabalhado em outros ramos, como

comércio de bijuterias e de roupas, mas a maioria está no ramo de alimentação desde

que chegou ao Brasil.

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Ponto comum na conversa com todos foi a questão do trabalho, principal e

talvez única atividade da qual muitos se ocupam. Diziam-se muito atarefados e essa

questão foi utilizada várias vezes como motivo para interromper a conversa ou sequer

iniciá-la.

Em alguns casos percebia que de fato era inviável estabelecermos um diálogo

em meio aos seus ambientes de trabalho, pois o movimento era constante e requeria

bastante atenção. Em outros, entretanto, creio que tenha sido uma simples desculpa para

não conversar, pois o movimento era pequeno e se encontravam sentados à espera de

clientes.

Acredito que existe certa hierarquia entre os estabelecimentos comerciais do

ramo de alimentação. Na base estariam as pastelarias, lanchonetes e bares, seguidos

pelos restaurantes e distribuidoras de doces. Aqueles que possuem pastelarias são os que

mais trabalham, em jornadas diárias de quase 14 horas, em geral, das 6h da manhã até

22h, sem contar o tempo dedicado à limpeza e à realização de compras, o que faz com

que não sobre tempo para fazer outras coisas.

Já os que possuem restaurantes, embora também trabalhem todos os dias,

costumam servir apenas almoço, o que diminui o tempo dedicado ao trabalho. Karina,

proprietária de um restaurante há 10 anos, afirmou já ter trabalhado em pastelaria

própria e de outros, mas a rotina era muito exaustiva e agora consegue trabalhar menos.

Para Maria, os brasileiros têm mais possibilidades de emprego e de mudar de

vida, enquanto que para os chineses só resta trabalhar arduamente, por falta de

qualificação e por causa da barreira da língua. Ela e o marido são donos de uma

pastelaria há nove anos e trabalham todos os dias das 6h da manhã até às 21h, mas ela é

a principal responsável pelo negócio, uma vez que o marido veio para o Brasil há cinco

anos e não sabe falar português.

É possível distinguir três nichos básicos de atuação profissional destes

imigrantes no Rio de Janeiro: as lojas de artigos para festas (as populares

lojas de 1,99), as pastelarias e os vendedores ambulantes de pequenas – e, em

geral, falsificadas – mercadorias, tais como relógios de pulso, bijuterias etc.

Dentre estas, as duas primeiras são as numericamente mais expressivas.

Considerando o grupo mais proporcionalmente numeroso, Cantão

(Guangdong), região litorânea chinesa, é a província de onde se origina a

maioria dos profissionais de pastelaria. Taiwaneses e imigrantes das demais

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procedências, estas em número reduzido, atuam em outras modalidades

comerciais. Todos estes partilham, de forma combinada ou não, três aspectos

esclarecedores de sua fixação no Brasil: as razões e oportunidades

econômicas, a prática religiosa em específicos espaços de culto e a existência

de redes sociais baseadas em solidariedade étnica, que fornecem suporte aos

recém-chegados. (ARAÚJO, 2010, p. 230)

Talita, que trabalha no bar/lanchonete dos pais, no centro histórico de Curitiba,

relatou dificuldades em manter os negócios devido ao aumento do custo de vida no

Brasil, dos preços de alimentos, aluguel e bebidas, o que fez com que ela tenha parado

de servir almoço e encontre dificuldades em repassar os aumentos ao consumidor, dada

a grande concorrência na região. Foi comum em alguns relatos certa "reclamação" sobre

a falta de disposição para trabalhar dos brasileiros e sobre a dificuldade em arranjar

empregados.

Uma característica marcante percebida por mim, e também apontada em outros

estudos70

, é a confluência entre os âmbitos do trabalho, da família e do lar, que

costumam se concentrar no mesmo local. Em geral, os estabelecimentos comerciais são

gerenciados pelos membros da mesma família, que muitas vezes fazem do seu local de

trabalho o mesmo de residência. Evitam-se, assim, maiores gastos com aluguel e

deslocamento, por exemplo, ao mesmo tempo em que aumenta a dedicação ao trabalho.

4.3.6 - Língua

A maioria dos chineses ouvidos para essa pesquisa afirmaram que costumam

conversar com a família em chinês (mandarim ou cantonês, em geral). Karina diz

conversar com os filhos apenas em chinês, pois gostariam que eles aprendessem e

mantivessem a língua. Jean também conversa com os filhos em chinês, mas sem

mencionar as razões para isso.

70 Cf. VERAS (2008), PINHEIRO-MACHADO (2009), ARAUJO (2010).

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Trata-se de uma postura de clausura vivenciada pelos informantes. O extremo

de tal condição pode ser ilustrado através do fato de que a grande maioria dos

imigrantes não domina as línguas locais, português e espanhol, mesmo depois

de 20 anos de imigração. Nem as professoras das escolas supracitadas sabem

falar espanhol. Elas são, em geral, mulheres dos comerciantes e não detêm

formação profissional na área de educação. Dão aula por considerarem que

alguém deve desempenhar esse papel na comunidade. Os imigrantes sabem,

entretanto, a linguagem do comércio, que os possibilita falar com seus

empregados paraguaios e clientes brasileiros. (PINHEIRO-MACHADO,

2006, p.15)

Lucia Lippi (2002)71

aborda a questão da língua ao analisar a imigração para o

Brasil. Segundo ela, o primeiro desafio enfrentado pelo imigrante, também identificado

como estrangeiro, é a barreira linguística, o que definirá o grau de adaptação e os

desafios na nova terra.

O bilinguismo ou a competição entre a língua de origem e a nova definem a

construção da identidade do imigrante como um novo brasileiro ou como um

estrangeiro que vive e trabalha na nova terra. A manutenção da língua

materna, as dificuldades de comunicação com a nova sociedade, os conflitos

linguísticos entre os mais velhos e a nova geração, entre pais e filhos,

marcam também o fenômeno da imigração. O desejo de ser bilíngue se

apresenta como meio de o imigrante se tornar brasileiro e ascender

socialmente. (OLIVEIRA, 2002. p. 12)

Wilson comentou que os pais, há 40 anos aqui, não sabem falar português.

Aliás, muitos demonstraram dificuldade na comunicação, tanto os entrevistados como

outros, que se utilizaram desse fato para não dialogar. Nesse ponto, realmente tenho

dúvidas quanto a veracidade de seu discurso, a meu ver utilizado como forma de

"proteção", para evitar o diálogo.

De qualquer forma, é fato que grande parte dos chineses aqui em Curitiba

encontra dificuldades na comunicação em português, ainda que vivam aqui há 20 anos

ou mais. Se na língua falada já apresentam restrições, alguns disseram ter maior

dificuldade na língua escrita, seja para ler ou escrever, o que acredito aplicável a todos

aqueles que não frequentaram escolas ou cursos de português, ou seja, a maioria dos

imigrantes adultos.

71 OLIVEIRA, Lúcia L. O Brasil dos Imigrantes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editores, 2ª ed., 2002.

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Além da língua, apontada por vários como uma das principais dificuldades

encontradas ao mudar-se para o Brasil, a diferença entre os costumes também foi

mencionada como um grande choque nessa transição entre os dois países,

principalmente os costumes alimentares.

Karina relatou que foi muito difícil a adaptação de sua família ao Brasil: seu

pai veio antes, pois os avós já estavam aqui, e depois voltou para buscar a família.

Estabeleceram-se primeiramente na cidade de Santos (SP), mas não gostaram do lugar e

após um ano mudaram-se para Curitiba. Lembra-se que, no começo, sua mãe chorava

bastante, pois queria voltar para a sua terra natal.

4.3.7 - Desejo de retornar à China

Quando indagados se desejam voltar para a China, Luiz foi o único a afirmar

que sim, mas que só não volta por falta de dinheiro. Disse que hoje em dia é muito

melhor lá do que aqui, mas antes, quando o comunismo era mais rígido, era pior.

Wilson afirmou que, ao contrário dele, seus pais desejam voltar, mas não o fazem

porque tem que pagar seus estudos aqui. Talita também gostaria de voltar para a China,

pois tem um filho de nove anos que vive lá.

A resposta mais comum para essa questão foi que, embora tivessem saudades,

não pretendiam voltar nesse momento, pois haviam construído uma vida aqui, tinham

empregos e família, e que lá teriam que começar tudo do zero, embora muitos

costumem visitar frequentemente a China, o que ficou mais fácil com o barateamento

das passagens aéreas, segundo Alex.

A disseminação do acesso à internet facilitou o contato entre os chineses no

Brasil e seus parentes e amigos em sua terra natal, conforme relatado em algumas

conversas. Ana, que há 15 anos era dona de um restaurante, recentemente fechado, disse

que quando as cartas eram o principal meio de comunicação, conversar com os parentes

e amigos na China era um processo lento, pois as cartas demoravam até três meses para

chegar, mas agora, com o advento da internet, é tudo mais rápido e barato.

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O mais surpreendente nesse tema foi a afirmação, de pelo menos seis

entrevistados, de que a situação da China está mudando muito rapidamente e para

melhor, sendo que muitos afirmaram ter melhor remuneração lá do que aqui, que há

vários chineses voltando para lá e também brasileiros indo em busca de oportunidades.

Camila disse haver muitos impostos no Brasil e Mario que falta mão-de-obra tanto lá

quanto aqui.

Hu afirmou que o fluxo migratório de chineses para o Brasil diminuiu

consideravelmente, pois várias famílias chinesas ricas, aqui no Brasil, não conseguem

mais atrair chineses, embora ofereçam casa, salário, comida, trabalho e uma condição de

vida melhor do que teriam lá.

4.4 - SINO-MOÇAMBICANOS

Em um artigo intitulado "Os chineses da Beira, Moçambique. Itinerários de

uma dispersão", MACAGNO (2012)72

analisa a imigração chinesa para Moçambique,

no final do século XIX, e sua posterior dispersão pelo mundo devido à guerra de

independência de Moçambique. Os principais destinos foram Macau, Taiwan e Curitiba.

Chegam à África no período de transição da mão-de-obra escrava para a

assalariada, na qualidade de coolies, e estabelecem uma comunidade na cidade de Beira,

Moçambique, então colônia portuguesa. Ocupam-se, no começo, com pesca,

horticultura e carpintaria, além de trabalharem nas filias das companhias britânicas de

comércio marítimo. Com o tempo, passam a ocupar cargos na administração colonial e

surgem comerciantes e empresários. (MACAGNO, 2012, p.2)

Na metade do século XX, em um contexto em que Portugal adota um discurso

de multirracialidade e simpatia para com os habitantes de suas colônias, previa-se a

incorporação desses chineses à comunidade lusa. Além disso, os principais jornais da

72 MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma dispersão. In:

Andréa Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento, Brasília, 2012.

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Beira aumentavam a atenção aos sino-moçambicanos, por meio de um discurso

adulatório aos “bons portugueses”. (MACAGNO, 2012, p.6)

Entretanto, durante a guerra pela independência de Moçambique, travada entre

a Frente de Libertação de Moçambique - FRELIMO e o exército português, muitos

chineses são convocados para lutar pelo exército português. Após a vitória do exército

revolucionário e a consequente independência do país, os chineses da Beira passam a

sofrer perseguições e hostilidades, vistos como cúmplices do regime, e iniciam sua

diáspora pelo mundo, tendo como principal destino a cidade de Curitiba, Brasil. O

receio da implantação de um regime comunista em Moçambique também influenciou

nessa diáspora, pois muito haviam ido para este país fugindo do regime de Mao

(MACAGNO, 2012).

"Com a independência de Moçambique, o tênue fio da simpatia – aquele que

fazia dos chineses “bons portugueses” – é quebrado. As circunstâncias

políticas mudam. No Portugal da Revolução dos Cravos, a figura dos

retornados, incluindo a dos “sino-moçambicanos”, passa a se tornar

incômoda. Em troca, o Brasil, governado naquela altura por Ernesto Geisel –

e no contexto das políticas de recepção para os retornados da África

portuguesa – permite-lhes o acesso aos vistos de estadia e autorizações de

trabalho." (MACAGNO, 2012. p. 17)

A partir disso, podemos tomar a história de vida de Yuri como exemplo desse

fluxo migratório, percebendo como a macro e micro história se entrelaçam. Aliadas às

forças históricas (fatos) estão os aspectos subjetivos (indivíduos), que se co-constituem.

Yuri, nascido em Moçambique73

, muda-se para Macau durante a guerra de

independência, vindo para o Brasil algum tempo depois, no começo dos anos 1980.

Teve pastelaria e restaurante, e há 15 anos tem uma distribuidora de doces na Praça

Santos Andrade.

Em seu discurso, alguns pontos merecem destaque: fica evidente a sua empatia

para com negros que, segundo ele, não gostam de brancos e são "muito selvagens".

Além disso, acha os chineses "fechados, sem muita simpatia,"o que me leva a crer que

73 Não sei se ele nasceu na cidade da Beira, pois só fui descobrir a história dos sino-moçambicanos em

pesquisa posterior à entrevista.

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ele não se identifica enquanto chinês, mas seria precipitado afirmar que ele se considere

"branco", embora seu discurso aponte para isso.

4.5 - TRAJETÓRIAS DA IMIGRAÇÃO

O termo assimilação passou por diversas acepções ao longo de sua utilização

no âmbito da Sociologia da Imigração, conforme aponta TRUZZI (2012).74

Cunhado

inicialmente nos Estados Unidos, anos 20, pelos integrantes da Escola de Chicago,

entendia-se que os imigrantes se "aculturavam", perdiam sua identidade étnica em favor

de uma americana, sendo incorporados ao mainstream. Nos anos 50 e 60, esse processo

era visto não apenas como inevitável, mas desejável. Sob a acusação de etnocêntrico e

anglo-conformista, esse modelo é criticado nos anos 70 pelos pluralistas e "assimilação"

passa a ser entendida como um processo mais complexo, multidirecional, que não

implica o desaparecimento de características étnicas, mas sim sua manutenção e

transformação, focando-se mais no processo, que deve ser analisado em suas

especificidades.

O conceito de assimilação passa por nova acepção com o trabalho de Alba e

Nee (2003), que difere das acepções assimilacionistas clássicas e das pluralistas,

aproximando este conceito à "etnicidade", ou seja, concomitante ao processo em que se

constrói uma identidade pautada por características étnicas e pelas da sociedade

acolhedora, há também o processo de eliminação das fronteiras e distinções entre os

diferentes grupos que compõe a sociedade.

"o declínio de uma distinção étnica e de suas diferenças culturais e sociais

resultantes. Declínio significa nesse contexto que tais distinções se tornam

menos relevantes, que as ocorrências para as quais elas são significativas

diminuem em número, e que, portanto, elas produzem efeitos sobre domínios

cada vez mais restritos da vida social. As origens étnicas dos indivíduos

tornam-se cada vez menos relevantes em relação a membros de outro grupo

étnico (tipicamente, mas não necessariamente, o grupo étnico majoritário), e

que indivíduos de ambos os lados da fronteira se vêem como cada vez mais

74 TRUZZI, Oswaldo. Assimilação Ressignificada: Novas Interpretações de um Velho Conceito. Dados,

vol. 55, n. 2, pp. 517-553

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parecidos, assumindo-se como similares em termos de algum outro fator

crítico, como a classe social;" (ALBA e NEE, apud. TRUZZI, 2012)

A partir desse conceito, ao analisar o caso da imigração chinesa posso perceber

que ainda são grandes as barreiras e distinções entre a comunidade chinesa e a

curitibana, embora não tenha entrado especificamente nesse tema e sequer tenha

abordado a questão de um possível preconceito, com exceção da conversa com Wilson,

brasileiro, que afirmou que "não temos nenhum tipo de preconceito" ao ser indagado

sobre a relação com os outros brasileiros.

Em algumas falas era perceptível o isolamento dos chineses em torno da

família e da comunidade étnica, ainda que muitos afirmassem frequentar ocasiões

sociais esporadicamente, na ocasião de festas familiares ou comemorações tradicionais.

Karina, por exemplo, afirmou ter mais de 100 parentes em Curitiba e que costumam se

reunir em festas. Maria e Marcos, ao contrário, disseram que são raros os momentos de

lazer fora do âmbito familiar mais próximo, pois o trabalho demanda muito tempo e

energia.

Arrisco-me a afirmar, pautado nas falas de Maria, por exemplo, que disse ser

muito difícil para eles conseguir um emprego em outro lugar, e de Mario, que apontou a

educação como possibilidade de ascender socialmente e que deposita em seus filhos

essa esperança, que a assimilação, nos termos de Alba e Nee, ainda é incipiente no caso

dos chineses em Curitiba.

Além disso, a maior parte da imigração chinesa em Curitiba é muito recente, a

maioria tendo chegado a partir dos anos 1990, o que faz com que a adaptação ainda

esteja em curso e os entraves linguísticos continuem presentes. Entretanto, concordo

com Hu quando ele diz que "[provavelmente] a segunda geração em diante de chineses

aqui no Brasil (no caso a minha e demais), seguirão os mesmos passos que as colônias

japonesas: largam os negócios dos pais, seguem carreira acadêmica (i.e. se formam em

alguma universidade publica) pra entrar num mercado de trabalho de advogado, médico,

engenheiro, enfim..."

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As diásporas chinesas pelo mundo já duram dois mil anos. Primeiramente

restritas ao sudeste asiático, chegam às Américas, África e Europa a partir do século

XVIII, sob a forma do comércio de coolies, trabalhadores considerados mercadorias e

destinados ao trabalho árduo, seja na agricultura, seja em minerações e construções de

ferrovias.

Segundo GUNGWU (1991, apud LEW & WONG, 2002), a diáspora chinesa

pode ser dividida em quatro períodos: o primeiro, entre século III a.C. e XVI d.C., é

caracterizado pelo Huashang (chinês comerciante); o segundo período, Huagong (chinês

coolie), vai de 1840 até 1920;o terceiro é caracterizado pelos migrantes Huaqiao (chinês

de estadia temporária) e dura de 1911 a 1949; enfim, do final dos anos 1970 aos dias de

hoje, a diáspora assume uma forma moderna de migrantes Huashang (comerciantes) e

Huagong (trabalhadores), além dos Huayi (descendentes), que reemigram para outros

países.

Para dar conta da grande quantidade de chineses pelo mundo é criado o termo

chineses overseas, usado para designar aqueles chineses que, mesmo no exterior, nunca

deixam de carregar sua identidade cultural e étnica. As estimativas sobre o número de

chineses no exterior diferem bastante, indo de trinta a setenta milhões de pessoas. Neste

trabalho, adotei os dados do Overseas Community Affairs Council (OCAC), da

República da China (Taiwan), que fala em aproximadamente 41,4 milhões de chineses

espalhados pelo mundo no ano de 2012.

No Brasil, a imigração chinesa como alternativa à mão-de-obra escrava

suscitou uma série de debates durante a segunda metade do século XIX acerca da

construção da identidade nacional e do futuro do país. Tais debates contribuíram para

retirar do dualismo brancos/negros a questão da identidade nacional e preparar o terreno

para o período das grandes imigrações.

Ainda que a imigração chinesa tenha sido incipiente durante o século XIX, os

debates sobre ela fizeram com que se criassem parâmetros e projetos para o futuro do

Brasil e revelam mais sobre a formação da identidade nacional do que sobre os chineses

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propriamente ditos. Conforme escreve Lesser (2001, p.47): "embora o tópico fosse a

mão-de-obra chinesa, o assunto era a identidade nacional."

É somente após a Revolução Comunista Chinesa, em 1949, que o fluxo de

chineses para o Brasil ganha força, fortalecendo-se nas duas últimas décadas do

segundo milênio. O principal destino desses imigrantes é São Paulo, que concentra

quase 90% da população chinesa no Brasil. Além de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e

Curitiba também possuem comunidades sino-brasileiras expressivas.

Sobre o número de chineses no Brasil, as estimativas são variadas, indo desde

100 mil até 280 mil. Além disso, os métodos de mensuração dos estoques de migrantes

e dos fluxos migratórios carecem de precisão e as fontes oficiais consultadas apresentam

dados desencontrados, sendo que o IBGE fala em 20 mil chineses e a Polícia Federal

em 40 mil.

Em Curitiba, acredito que a população chinesa seja entre três e cinco mil

pessoas, vinda principalmente a partir do ano de 1980, em busca por melhores

condições de vida e trabalho. Além disso, a existência de parentes e redes já

estabelecidas é um fator importante nesse movimento migratório.

Nessa cidade, a origem mais comum dos imigrantes é a região sul da China,

principalmente a província do Cantão, havendo também chineses oriundos de Taiwan e

outras regiões costeiras. Especial destaque àqueles chineses vindos de Moçambique, na

África, em decorrência da guerra pela independência do país.

A maior concentração demográfica dos chineses em Curitiba é no centro da

cidade, em que atuam majoritariamente em negócios ligados à alimentação, como

pastelarias, restaurantes e lanchonetes, pois é um ramo que exige pouca qualificação e

domínio da língua portuguesa e cujo retorno financeiro é imediato e permanente, uma

vez que "todos precisam comer".

É característica sua dedicação ao trabalho, que em pastelarias e lanchonetes

começa às 6h da manhã e vai até às 22h, todos os dias da semana. Já em restaurantes

exige-se menor jornada de trabalho, o que acredito estabelecer uma hierarquia entre os

estabelecimentos, estando pastelarias, lanchonetes e bares na base e restaurantes um

nível acima, sinal de ascensão profissional.

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Chamam atenção seus investimentos na educação dos filhos, esperança de

ascensão social nas próximas gerações, "para trabalhar com o quiserem, e não com o

que dá". Optam por matricular os filhos especificamente em um colégio particular

renomado da cidade, além de alguns deles cursarem faculdades particulares.

O desejo pela manutenção da língua materna e da cultura chinesa também foi

um fato percebido nessa pesquisa, uma vez que muito interlocutores afirmaram

conversar com familiares apenas em mandarim, e às crianças é ensinado esta língua em

casa e o português na escola, o que a torna bilíngue.

A vontade e possibilidade de fazer uma pesquisa empírica (trabalho de campo)

durante minha monografia foi um fator importante na escolha do tema aqui apresentado.

Além disso, a falta de estudos na área das Ciências Sociais e a curiosidade

(compartilhada por muitos colegas) pela questão da imigração chinesa para Curitiba

também contribuíram para essa decisão.

Entretanto, reconheço diversas lacunas em minha pesquisa e a insuficiência do

trabalho de campo realizado, que careceu de maior dedicação e esforço, além de tempo.

Ainda assim, considero essa experiência de pesquisa fundamental em minha formação

acadêmica enquanto cientista social.

Espero que essa monografia possa contribuir para um maior entendimento do

fenômeno migratório China-Brasil e para uma melhor compreensão da comunidade

chinesa de Curitiba, além de reduzir distâncias étnicas e culturais, que fazem da China e

de seus representantes pouco e superficialmente conhecidos pelos brasileiros, ainda que

em muitos casos convivam cotidianamente nas grandes cidades.

Mais do que oferecer respostas, esse trabalho exige aprofundamentos e mostra

possibilidades de novos estudos, abrindo caminhos para maiores intercâmbios

acadêmicos e culturais entre Brasil e China, esferas que não têm acompanhado a

crescente interação econômica e política entre ambos os países.

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APÊNDICE A

Olá,

Meu nome é Gabriel e sou estudante de Sociologia na Universidade Federal do

Paraná. Estou estudando a imigração chinesa para Curitiba e a comunidade aqui

estabelecida, tentando entender as causas e os fatores que levaram muitas pessoas a sair

da China e escolher o Brasil como lugar para estabelecer residência e construir uma

nova vida.

O objetivo desse estudo é entender um pouco melhor a vida, a cultura e os

costumes da população chinesa e de seus descendentes em Curitiba, na crença de que

através disso possa haver maior aproximação entre brasileiros e chineses que aqui

convivem, ao mesmo tempo em que se busca maior diálogo inter-cultural e maior

compreensão das diferenças intrínsecas a cada cultura.

Por isso gostaria de saber se você está disposto a conversar comigo sobre sua

vida, e se possível responder a um breve questionário, que contém perguntas sobre sua

vida na China e no Brasil. Desde já esclareço que o questionário pode ser respondido de

forma anônima e que todas as informações têm um fim meramente acadêmico. Além

disso, você não precisa responder às perguntas que não quiser e pode desistir a qualquer

momento.

Desde já agradeço pela atenção, compreensão e colaboração.

Atenciosamente

Gabriel Portugal Sorrentino

Telefone: 3016-0925 / 9944-3364

Universidade Federal do Paraná

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ANEXO