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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ KAMILLA GONÇALVES PELAS LENTES DE OLIVIER RICHON E KAREN KNORR: UM OLHAR SOBRE A JUVENTUDE PUNK EM LONDRES (1970) CURITIBA, 2018

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

KAMILLA GONÇALVES

PELAS LENTES DE OLIVIER RICHON E KAREN KNORR: UM OLHAR SOBRE A JUVENTUDE PUNK EM LONDRES (1970)

CURITIBA, 2018

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

KAMILLA GONÇALVES

PELAS LENTES DE OLIVIER RICHON E KAREN KNORR: UM OLHAR SOBRE A JUVENTUDE PUNK EM LONDRES (1970)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em História – Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciada em História. Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos Sereza.

CURITIBA, 2018

Aos meus pais, principais pilares de toda a minha jornada.

AGRADECIMENTOS Em toda a minha trajetória até aqui, foram indispensáveis as conversas a

respeito de todo o trabalho e esforço, e para isto, contei sempre com pessoas amáveis,

dispostas a aconselhar e apoiar. Meus pais, Jean e Cristiane, estiveram desde sempre

apoiando minhas decisões em todos os momentos de minha vida. Gostaria de

agradecê-los por serem minhas inspirações diárias. Meu pai pela sua inteligência e

carinho, sempre presentes; minha mãe por ser minha melhor amiga, e minha maior

apoiadora. Sem eles, a caminhada até aqui seria muito mais árdua.

Aos meus amigos queridos: Fabianno Gonçalves, Eduardo Valli, Eliza Hayase

e Thiago Amora; que estiveram sempre presentes, me cobrando para que eu focasse

nos meus objetivos, e sempre elogiando-me, para que eu me sentisse capaz de ser

alguém maior. Aos meus colegas de turma: Raiane Albergoni, Isabella Schueda,

Francielle Alves, Flávio Feitas, André Sartorelli e Luan Jacomasso; que participaram

dos melhores anos da minha vida até agora. Obrigada por serem tão companheiros, me

fazerem me sentir parte de algo, e fazerem com que minhas noites fossem mais leves.

Gostaria de agradecer a o meu orientador, o Prof. Luiz Carlos Sereza, por ter

sido tão paciente, observador e tornar as coisas mais simples durante a organização

deste trabalho. Sempre me lembrarei da paciência dele em relação ao meu nervosismo,

e das vezes que me acalmou com frases de conforto. Nada disso teria sido possível

sem seu apoio.

Aos Profs. Pedro Valandro, Liz Andrea Dalfré, Vera Irene Jurkevics, Valéria

Pilão e Pedro Leão da Costa Neto; estes foram meus mestres durante os anos de curso,

e grandes inspirações para mim. À Prof. Andrea Wozniack, que no magistério fora

minha professora, e foi uma das principais razões por eu ter escolhido este curso. Seu

olhar apaixonado ao falar da história, e sua total dedicação aos seus alunos, me fez

quere ser uma professora tão apaixonante quanto ela. Prof. Viviane Zeni, a mãe que

puxa nossa orelha, pega no nosso pé, mas que tem um olhar muito específico sobre

cada um de nós, que a permite reconhecer nossos potenciais e fazer com que

busquemos dar o melhor de nós. Obrigada por sempre estar por perto, e ser tão amável

conosco.

Meu parceiro até aqui; de correções ortográficas até puxões de orelha na vida,

Fabianno. Obrigada por ser meu irmão de outra mãe. Sem a sua companhia, sem seu

humor, sem a sua coragem, esta sua amiga não teria metade da força e inspiração que

hoje ela tem.

Jacqueline, minha tia; meus irmãos Lucas e Eduardo que tanto amo. Vocês são

meus grandes amores, e sou grandemente grata por dividirem muitos momentos

comigo.

Finalizando meus agradecimentos, lembro-me de ser grata pela minha avó

Leisa, que cuidou de mim durante toda a minha infância, me mimou, me ensinou a

fazer os bolos mais gostosos, me deu aconchego; quem dançava ao som de Roberto

Carlos de rosto colado ao meu, e quem eu nem saberia viver, se não tivesse sua

presença sempre amorosa ao meu lado.

RESUMO A presente pesquisa teve por objetivo realizar um estudo sobre a exposição fotográfica, realizada por Olivier Richon e Karen Knorr, no ano de 1977; “Punks”. A produção destas contribui para caracterizar e identificar a juventude Punk londrina na década de 1970. O primeiro capítulo se baseou em contextualizar historicamente a Europa e principalmente a Inglaterra, dos anos de 1970, período em que foram produzidas as fotografias da exposição “Punks”. No segundo capitulo foram apresentadas as 4 fotografias fontes, que deram norte a esta pesquisa.

Palavras-chave: Punks, Identidade, Juventude e Fotografia.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 8

1. SURGIMENTO DA CULTURA PUNK NO CENÁRIO POLÍTICO E SOCIAL

INGLÊS ................................................................................................................. 11

1.1 A PARTICIPAÇÃO DA JUVENTUDE NAS REVOLUÇÕES SOCIAIS E

CULTURAIS (1950 – 1980).................................................................................. 15

1.2 A EMERGÊNCIA DA CULTURA PUNK NA SOCIEDADE MORALISTA

INGLESA NA DÉCADA DE 1970....................................................................... 21

2. UMA ANÁLISE DA JUVENTUDE PUNK ATRAVÉS DA EXPOSIÇÃO

FOTOGRÁFICA “ PUNKS” (1976).................................................................... 27

2.1 OS “PUNKS” LONDRINOS PELO OLHAR DE OLIVIER RICHON KAREN

KNORR.................................................................................................................. 32

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................... 47

FONTES................................................................................................................ 49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 50

8

INTRODUÇÃO

A Inglaterra se apresentava em estado de crise econômica, violência,

desigualdade social durante a década de 1970. Esse cenário caracterizou o berço da

cultura punk inglesa. O termo “Punk” já era utilizado por Shakespeare em suas obras,

para definir as prostitutas. Mais tarde, também atividades sadomasoquistas, e os

marginalizados da sociedade americana no século XVIII. Deste modo, pode-se

compreender o termo, em linhas gerais, no contexto atual, como anarquia, ou

subversão dos valores morais, tendo em vista que caracteriza o sujeito marginalizado

pelo meio social. Muito do que se começou a ver nas ruas desta Londres, eram

vestígios de ações de jovens com fortes ideais de igualdade, já presentes na década de

1960.

Este estudo busca identificar a imagem dos jovens Punks na década de 1970 a

partir das fotografias de dois estudantes de fotografia que concluíram um trabalho

registrando este grupo no ano 1976.

Essa juventude, que segundo Eric Hobsbawn em “A Era dos Extremos”

(1994), é um período onde o ser estará propenso a “grandes mudanças e revoluções”,

incluindo a geração que vivenciou uma verdadeira revolução social, econômica e

cultural que atingiu todo o mundo, entre as décadas de 1950, 1960 e 1970. Foi também

neste período em que a importância e valorização da educação como principal fonte da

revolução, e movimentos de ideais de “esquerda” ganharam força na Europa.

As fontes que darão norte a este estudo são 4 (quatro), das 16 (dezesseis)

fotografias da exposição “Punks”, de Karen Knorr e Olivier Richon, que em 1976

eram estudantes de fotografia e escolheram como modelos alguns jovens punks, que

frequentavam bares londrinos, bares estes, cenário de algumas das fotos, a fim de

interagir, socializar e principalmente representar estes grupos em seu trabalho. As

fontes serão de fundamental importância para traçar uma linha de raciocínio que

possibilite identificar estes jovens, através de uma análise específica voltada para este

tipo de documentação.

Para isso será necessário à apropriação de métodos de análise voltadas para o

pensamento de alguns autores. Ana Maria Mauad, autora de “Através da Imagem:

9

Fotografia e História Interfaces”, propõe uma metodologia de análise fotográfica que

busca compreender a fotografia como parte do processo de “composição do

conhecimento histórico”. Ainda, propõe que a análise fotográfica deva ser feita de

modo a compreender seu conteúdo visual e técnico, além do contexto de produção da

obra.

Para o referencial teórico, este trabalho busca como base o conceito de

“Padrões de Intenção”, idealizado pelo historiador da arte inglês Michael Baxandall,

que em 1985 publicou a obra “Padrões de Intenção: A Explicação Histórica dos

Quadros”, em busca de compreender a intenção dos autores das pinturas. Para

Baxandall, com as técnicas por ele desenvolvidas, é possível desvendar o pensamento

do artista ao produzir tal obra.

O Foco deste estudo tem em vista responder algumas questões como, quais as

características dos Punks através das fotografias fontes desta pesquisa, bem como

buscar compreender as razões que levaram os fotógrafos Olivier Richon e Karen Knorr

a realizarem este trabalho, especificamente com um grupo de Punks, desvendando

quais as técnicas desenvolvidas para a criação destas fotografias. O principal objetivo

da pesquisa é compreender de que modo às fotografias dos autores colaboram para

caracterizar uma juventude de Punks, em Londres, na década de 1970.

A escolha pessoal do objeto de estudo partiu da afinidade do com o a cultura

Punk, pois com a convivência durante a infância, possibilitada pelos pais, que tinham

amigos membros do movimento de Curitiba, a curiosidade de entender sua origem foi

importante para as buscas relacionadas ao tema.

Há uma grande reunião de estudos quando se trata de uma historiografia Punk.

A autora Ana Paula Sant’Ana em seu “O Punk e os Labirintos do Corpo” , aborda

questões estéticas, características e ideias políticas da cultura Punk, no que diz

respeito à representação do “ser punk” a autora diz:

No movimento punk, indivíduos ligados por laços afetivos e identificações no comportamento, na cultura, e no ideal trazem uma desconfiança para com o sistema normativo que emana e conduz a aceitação e à passividade dos indivíduos. No entanto, é muito provável que, ser for o punk, denominado como movimento, dúvidas pairarão porque a sua rejeição ao sistema e suas normas sufocantes tem um alvo obscuro. (SANT’ANA, 2009, p.72)

10

A pesquisa será divida em dois capítulos. Em primeiro momento será

necessário identificar e caracterizar o trabalho dos fotógrafos, inserindo-os nos

contexto inglês de produção das fotografias. No segundo momento então, será feita a

análise da cultura punk através da imagem e memória destes, no ano de 1976, por

meio da exposição fotográfica “Punks”.

11

1 SURGIMENTO DA CULTURA PUNK NO CENÁRIO POLÍTICO E

SOCIAL INGLÊS

Os primeiros anos que seguiram pós Segunda Guerra Mundial, para os países

Europeus, foram de reconstrução, desde seus aspectos físicos, passando também pelo

que dizia respeito a grandes revoluções políticas, sociais, econômicas e culturais. Os

Estados Unidos entrara em um conflito de grande escala com a União Soviética1, e em

meio a esse contexto, ambas também passavam por mudanças intensas e necessárias

para suas reestruturações. Os Estados Unidos era a maior potência econômica da

época, e a que menos passou por revoluções neste período. Foi a partir das memórias

da Segunda Guerra, que principalmente os povos Europeus ganharam uma visão mais

própria e individual de si mesmos, passo importante para as revoluções que viriam nas

décadas seguintes.

O reconhecimento do indivíduo, fora do âmbito coletivo é um retrato do novo

pensamento das novas gerações dispostas a mudanças em diversas esferas,

principalmente pela juventude que não se reconhecia diante os impactos da guerra. O

pensamento político baseado no pensamento de esquerda foi o que movimentou os

primeiros anos do pós-guerra. Ainda que a coletividade fosse de suma importância

para a organização dos movimentos trabalhistas, na década de 1950, o pensamento

individualista era quase inexistente, visto que maior parte das ações dos movimentos

trabalhistas era feitas em esferas públicas, que moviam os operários a se sentirem

pertencentes a uma classe, reconhecida, que não só fosse vista como pobres, ou que

não tivessem segurança econômica.

As décadas de 1950 - 60 -70 seriam marcadas como os anos em que a

economia europeia cresceria fortemente, e a indústria e agricultura teriam avanços

importantes, mas com consequências drásticas no que dizia respeito aos impactos

ambientais provocados pelo aumento das produções industriais, principalmente em

nações socialistas, onde sistemas de produções “arcaicos” eram utilizados

(basicamente ferro e fumaça), provocando grandes desastres ecológicos. Naquele

1 Este conflito entre União Soviética e Estados Unidos ficou marcado como Guerra Fria (1945-1989).

12

momento, apenas estudiosos da área de ecologia se preocupavam com esta situação, e

só muitos anos depois é que estas discussões ganharam espaço.

Os significativos avanços industriais e agrícolas só foram possíveis graças aos

grandes avanços tecnológicos do século XIX. A segunda grande guerra teve

fundamental importância nos crescimento dos estudos tecnológicos. Durante a guerra

equipamentos modernos entraram em teste, e mais tarde eram utilizados pelos civis.

Um exemplo que mais tarde popularizou-se foram os computadores, que desde este

período ganharam diversas formas de facilitar os trabalhos nas indústrias, porém

causando efeitos negativos, pois algumas décadas à frente, as máquinas cada vez mais

ocupavam o espaço da mão de obra dos trabalhadores. Grande parte das revoluções do

pensamento dos indivíduos pertencentes àquele contexto se deu pelo grande número

de desempregados causados pelos avanços tecnológicos, além da questão imigratória.

Moradores do meio rural começam a deixar o campo, para procurar novas

oportunidades empregatícias e recomeçarem suas vidas, mas ao chegarem aos grandes

polos industriais, muitas vezes ficavam sem emprego e sem moradia. Grandes cidades,

como Londres e Paris, foram então ganhando um alto índice populacional, porém

aumentando ainda mais as diferenças entre classes sociais. Os subúrbios eram

habitados principalmente por famílias numerosas, onde os chefes de família, sendo

estes pai e mãe, e algumas vezes mães solteiras, estavam desempregados, não podendo

garantir o sustento dos filhos, que mal tinham acesso a uma educação de qualidade.

É importante destacar que foi nos anos de 1960 que a indústria farmacêutica

teve seus avanços mais relevantes. Num período em que os jovens estavam

vivenciando uma importante revolução social, a partir de movimentos como o hippie2,

a busca pela liberdade do indivíduo na esfera sexual, fez com que esta indústria

promovesse avanços que pudessem garantir uma vida sexual mais segura. O uso dos

anticoncepcionais foi mais bem disponibilizado, além do que, doenças sexualmente

transmissíveis passaram a ser mais fáceis de tratar.

2 Movimento cultural que teve seu início nos anos de 1960. O termo também pode ser usado para

identificar um indivíduo que integra o movimento. Hippie em inglês também pode significar uma derivação do adjetivo “hip”: legal, informado, sofisticado. Disponível em:< http://simbologiahippie.blogspot.com/p/ideologia-e-cultura.html> Acesso em: 22 jan 2018

13

Para melhor ilustrar a juventude, essa, a qual será constantemente citada

durante este trabalho, é importante estabelecer em diversos aspectos, qual o papel dos

jovens nos períodos históricos demonstrados neste texto. Mais tarde, para caracterizar

uma juventude de punks dentro das obras dos fotógrafos Olivier Richon e Karen

Knorr, a exposição fotográfica “Punks” , é necessário compreender a juventude

presente no contexto de produção destas obras. Para além, entender como a juventude

contribuiu para o cenário de revoluções nas esferas políticas, sociais e culturais, e

como esta é compreendida como conceito.

Durante as três décadas do pós-guerra, os jovens, àqueles que não vivenciaram

a Segunda Guerra Mundial de modo a compreender as mudanças ocorridas depois de

seu término, não eram o retrato da memória deste período. Seus pais, avós, eram

aqueles que provavelmente eram gratos por estarem vivenciando a melhor fase

econômica de suas vidas, já acreditando que não haveria um modo de conseguirem

mais realizações. Do outro lado, seus filhos, que apenas compreendiam o mundo pós-

término da guerra, tinham uma vontade de mudança, não sabiam ao certo, do que, para

que; que os moviam, graças também a educação que recebiam, pois estes mesmos

sabiam da importância de uma boa educação para os seus filhos. Foi principalmente

neste período, fins da década de 1960, que as Universidades tiveram altos índices de

frequência, e também cenário de uma das maiores revoluções estudantis já vistas na

Europa3.

Para o historiador inglês Eric Hobsbawn, o período da vida em que mais se

está propenso a grandes mudanças, inquietações e revoluções, dá-se o nome de

“juventude”. Só que, a juventude presente na década de 1970, principalmente, era

aquela ilustrada, até os anos de 1920, e novamente em 1950, como rebelde4. Dentro do

contexto revolucionário, também existia uma juventude que não tinha limites para

conseguir seus objetivos, além de que, uma das ideologias pregadas por uma parte

3 Em Paris, em 1968, uma agitação estudantil, com novos pensamentos filosóficos, fundamentados em

ideias de esquerda, ganhou grande significado cultural, muito maior que até mesmo suas motivações políticas. 4 Em 1950, nos cinemas, o maior representante desta caracterização da juventude rebelde, foi o ator

James Dean, morto as 24 anos em acidente de carro; e na mesma década, Elvis Presley, que tinha o repúdio das tradicionais famílias americanas, pelo “apelo sexual” contido nas letras de suas canções de rock, além de suas vestimentas e seu modo de dançar.

14

destes jovens, era a liberdade individual. Em “A Era dos Extremos” (1994),

Hobsbawn define a juventude dos anos de 1970, como sendo:

A nova “autonomia” da juventude como uma camada social separada foi simbolizada por um fenômeno que, nessa escala, provavelmente não teve paralelo desde a era romântica do início do século XIX: o herói cuja vida e juventude acabavam juntas. Essa figura, antecipada na década de 1950 pelo astro de cinema James Dean, foi comum, talvez mesmo um ideal típico, no que se tornou a expressão cultural característica da juventude — o rock. Buddy Holly, Janis Joplin, Brian Jones, membro dos Rolling Stones, Bob Marley, Jimi Hendrix e várias outras divindades populares caíram vítimas de um estilo de vida fadado à morte precoce. O que tornava simbólicas essas mortes era que a juventude por eles representada era transitória por definição. Ser ator pode ser uma carreira duradoura, mas não ser um jeune premier. (HOBSBAWN, 1994, p. 253)

Para compreender o universo jovem das “décadas de ouro”, é preciso entender

que esta também era um produto comercial de sua época, ou pelo menos, a juventude

demonstrada através dos relatos ao longo dos anos. A própria indústria manipulava os

jovens através do marketing social criado para faturamento comercial. O cinema, a

música, as novas tecnologias, todas estas eram voltadas para este público, utilizando

uma linguagem próxima das ideologias de cada movimento que surgia das ações

juvenis. O movimento Punk, ao longo do tempo, também se tornou um produto

midiático, na medida em que as bandas do gênero começavam a ganhar espaço na

mídia, trajando roupas rasgadas, cabelo despenteados, e adotando uma ideologia

própria. Porém, não se pode desmerecer a ação da juventude nas revoluções deste

período, pois foi neste momento em que muitos movimentos políticos, sociais e

culturais ganharam força.

O sociólogo francês, Pierre Bourdieu, em seu “Questões de Sociologia”

(1983), define juventude como sendo “apenas uma palavra”. Para o autor, este termo

está para além de apenas uma definição de uma parte da vida humana, onde

biologicamente o ser humano passaria por transformações, e sim que existiriam alguns

modos de defini-la, e destaca duas à cerca de seu pensamento: a juventude burguesa, e

a juventude das classes abastadas. Para ambas, ressaltar suas diferenças é de

fundamental importância para redefinir o termo.

15

No próximo tópico, toda a discussão construída até aqui sobre a juventude

presente nas décadas de 1950, até meados da década de 1980, fundamentam a

importância da ação jovem frente ao contexto de revoluções, principalmente as de

cunho social e cultural, que movimentaram o pensamento filosófico e a indústria em

busca de mudanças.

1.1 A PARTICIPAÇÃO DA JUVENTUDE NAS REVOLUÇÕES SOCIAIS E

CULTURAIS (1950 – 1980)

A agitação em busca de mudanças, principalmente das classes mais abastadas

na Europa, tomava corpo à medida que a unidade familiar reconhecia a importância do

trabalho e da educação como meio de avançar as possibilidades de melhorarem suas

condições de vida. Para os pais, que viveram momentos desesperadores durante o

contexto da Segunda Guerra, era importante que assegurassem melhorias para sua

prole, no que dizia respeito às básicas condições de sobrevivência. Para as classes mais

baixas, que não tiveram oportunidades de uma educação que pudesse oferecer-lhes

melhores condições, a única opção que restou-lhes foi procurar conduzir suas vidas

através do esforço do trabalho.

É também neste momento em que, com o grande aumento das produções

industriais, é que uma grande movimentação imigratória dos campos para as cidades

começa, por conta da procura dos ex-moradores das áreas rurais por emprego nas

grandes indústrias. Até a década de 1980, ocorreria uma “morte do campesinato” 5,

onde números apontam que menos de três a cada cem britânicos viviam da agricultura.

Apesar de a urbanização acontecer com rapidez com a evasão do campo para as

cidades na segunda metade do século XX, é importante o destaque para a elevação da

produção agrícola, que com o desenvolvimento tecnológico e das ciências voltadas

para a química e biotecnologia, cooperaram para os grandes avanços no meio,

principalmente pelo uso das máquinas, que também foram aos poucos, fazendo com

5 Termo utilizado pelo autor Eric Hobsbawn, em “A Era dos Extremos” (1994), para definir a evasão

dos moradores do meio agrícola para as grandes cidades.

16

que a mão de obra dos trabalhadores fosse de menos necessária, aumentando a

necessidade de profissionais que compreendessem a operação das novas tecnologias.

Com o aumento da procura de novas oportunidades nas cidades, pelos

moradores que antes residiam em áreas rurais é que aos poucos ocorreu uma

descentralização dos grandes polos. É então que pouco a pouco, devido ao aumento

populacional, pequenos cortiços e favelas se enchem, sendo estes espaços afastados

dos centros, habitados por pessoas de classes baixas, famílias numerosas, e muitas

vezes desempregados. Com a grande procura por emprego nas cidades, muitos dos

moradores vindos do campo, acabaram marginalizados e tendo dificuldades de se

manterem nos centros. Muitos dos jovens que moravam nos subúrbios das grandes

metrópoles acabaram inclinando-se a um dos grupos ideológicos que ganharam força

durante essas décadas. A realidade vivida nos guetos servia de motivação para buscar

melhorias para seus futuros, e a educação teve papel fundamental na formação destes.

Logo no início dos anos de 1950, a procura pela educação superior nos países

ocidentais foi tamanha, que os profissionais das áreas específicas tiveram que

capacitar-se para corresponde a demanda de procura. Até o início dos anos de 1980,

aumenta o número de Universidades, sendo que na década de 1970, os números já

dobravam em relação às décadas anteriores. É importante o destaque de que foi nas

Universidades que os grandes movimentos juvenis ganharam força. Era uma nova

forma de convívio, que permitia discussões filosóficas, que esbarravam nas questões

políticas e sociais, e muitos dos jovens interessados nestas discussões, não a parte

dominante, mas principalmente aqueles que vinham das classes mais baixas, viam nas

organizações dos movimentos em prol de mudanças, uma oportunidade de serem

ouvidos.

Grande parte da força política e social viria dos estudantes universitários,

muitos deles inclinados ao pensamento de esquerda, este que principalmente nas

sociedades de cultura ocidental, voltava-se para uma ideia de “ressentimento contra a

autoridade”. As organizações dos estudantes durantes as décadas de 1960-70-80, tem

participação em grandes momentos políticos ao redor do mundo, como por exemplo, a

17

queda de Pinochet6, no Chile, além do surgimento de grupos radicais no Ocidente,

como o grupo terrorista ETA7, e a formação de grupos comunistas no Peru.

Já na Europa, uma rebelião estudantil resultou numa grande onda de greves

operárias, estes que lutavam por melhores condições de trabalho, além de reajustes

salariais. A principal motivação do Partido Trabalhista, além da ideologia de esquerda,

era a ação pela coletividade, motivados pela insegurança econômica e serem

fortemente foco de uma “segregação social”.

No fim da década de 1970 é que aos poucos os interesses individuais, já

citados no início deste trabalho, dos trabalhadores começaram a sobrepor-se aos

objetivos da ação coletiva dos movimentos trabalhistas. O desenvolvimento das novas

tecnologias, e o uso mais frequente dos novos meios de comunicação, como o rádio e a

televisão, aos poucos foi mudando o modo como às pessoas interagiam socialmente, e

as ações coletivas foram se perdendo. A influência das mídias sociais interferia pouco

a pouco nas decisões de seus telespectadores, além da livre manipulação das

informações. O que se via nas ruas, tanto no modo como os jovens se vestiam e como

se comportavam, até suas ideologias, eram produtos midiáticos influenciados pelos

meios de comunicação. Será possível compreender que aos poucos, o grupo escolhido

para análise neste estudo, os jovens Punks, no decorrer dos anos de 1970 vão

reconhecer-se diante de suas características principais, por meio do surgimento dos

integrantes do movimento que aparecem através da mídia com um padrão específico

de comportamento.

Os fortes efeitos da globalização, uma facilidade no que dizia respeito à

comunicação e demais interações sociais, teve efeito direto no modo como os jovens,

principalmente, passaram a identificar-se com culturas externas. A partir disso, é

possível pensar que o que se entendia por identidade, no período iluminista (século

XVII e XVIII), um fator dado fisiologicamente no nascimento do individuo, teve um

rompimento com a Era das Luzes, no dado momento em que este indivíduo começa a

6 Augusto José Ramón Pinochet Ugarte, que após o golpe militar no Peru, em 11 de setembro de 1973,

foi responsável por ações ditatoriais em relação à população civil. 7 Sigla para o termo basco “Euskadi Ta Askatasuna”, ou em português, “Pátria basca e Liberdade”.

Grupo separatista armado que, pelos países bascos (França e Espanha), é considerado um grupo terrorista.

18

definir-se a partir de elementos de outras culturas, e não só através de suas

especificidades natas.

Outro grupo que merece destaque, por ter ganhado força em meados dos anos

de 1960, foram os grupos feministas. Não só movidas pela juventude, mas por mães de

família divorciadas8, que tendo que chefiar suas famílias, ingressava no mercado de

trabalho cada vez mais. Além dos divórcios, muitas empresas de grande importância

no meio industrial, começaram a mover suas sedes para territórios menores (no campo

principalmente) 9, necessitando de mão de obra masculina, fazendo com que muitos

pais de família migrassem para o meio rural em busca de melhorarem suas condições

de vida, estes que na maioria dos casos estavam vivendo em situações de extrema

pobreza. Não só no trabalho, o aumento no número de procuras pela Educação

Superior pelas mulheres teve um grande salto. O convívio proporcionado pelo

ambiente universitário e de trabalho faziam com que as movimentações femininas em

busca de igualdade social fossem aos poucos tomando forma. Ao perceberem péssimas

condições de trabalho, remuneração baixa em relação aos salários dos homens e menos

espaço cedido à voz das mulheres em meio à sociedade, fomentava-se ainda mais a

busca por reconhecimento do esforço da mulher, em dividir-se entre, cuidarem de suas

famílias, trabalharem para seus sustentos, e estudarem para garantir empregos

melhores.

Foram também as mulheres responsáveis pelo maior consumo da cultura

jovem. As maiores frequentadoras de concertos musicais e da moda nos anos de 1960-

70, eram jovens estudantes, que socializavam-se através das novas tendências juvenis.

Influencias essas que muitas vezes eram obtidas pela televisão, principalmente na

sociedade norte-americana.

Em sociedades mais voltadas para o tradicionalismo religioso, a exemplo do

catolicismo na Itália, culturalmente as mulheres colocavam-se em posições inferiores

8 Na década de 1960 aumentam os números de divórcios, e grandes mudanças ocorrem na relação casa

e família. Apenas nos países Latino-Americanos e Católicos, é que estes números permanecem reduzidos. 9 Grandes empresas adotam práticas offshore neste período. O termo em inglês refere-se a “afastar-se

dos centros”, para que fosse possível realizarem, suas atividades em países distintos ao de origem de uma empresa “x”. Na década de 1960 a prática cresce, pelo interesse das empresas em pagarem menos impostos do que em seu país, registrando suas sedes em territórios fiscais menores.

19

em relação ao sexo masculino. Com um pouco menos de abertura para as discussões

feministas, ainda sim houve movimentação deste pensamento entre mães de família e

jovens em busca de igualdade. O ano de 1974 merece destaque, pois no país houveram

mulheres, criadas tradicionalmente as bases das religiões cristãs, que tiveram forças

para lutarem pelo direito ao divórcio. Um grande passo dado pelas mulheres, ainda na

Itália, foi que em 1981, sob a pressão religiosa que as cercavam, foram capazes de,

através de muito esforço, conseguirem a liberação do aborto.

Neste momento é que se deu o surgimento de “Políticas de Identidade”, como

nomenclou o autor Stuart Hall em seu “A Identidade Cultural na Pós-Modernidade”.

Para Hall, era a partir de um reconhecimento por parte do indivíduo, que estas novas

lutas políticas eram encabeçadas. Movimentos como o feminismo, os antibelicistas e

os de libertação sexual, foram importantes para compreender o surgimento de novos

meios de identificação por parte do indivíduo Pós-Moderno.

Para além de uma mentalidade movimentada pela busca por mudanças, a

juventude presente nas décadas de 1950-60-70, também teve papel importante no

interesse à inserção no mercado de trabalho. Nestas três décadas registrou-se um

aumento da procura por jovens na casa dos 20 anos por oportunidade de emprego.

Empresas voltadas para o desenvolvimento de novas tecnologias, como a IBM10 e

Hitachi11, tiveram grandes avanços criativos, graças à inserção de muitos estudantes

em suas equipes de trabalho.

Este mercado tecnológico se tornou para esta juventude mais uma maneira de

descobrirem novos modos de socializarem-se e descobrir-se através de novos símbolos

uma nova cultura, uma nova identidade. Identidade essa que não se restringia apenas a

reconhecesse-se por uma cultura ou tradição nacional, como anteriormente. Os limites

antes da revolução tecnológica, não permitiam que o indivíduo tivesse acesso a

conhecer modos de vida diferentes ao que foram “acostumados” pelas culturas locais.

Por isso a importância da globalização, para a expansão criativa, e miscigenação de

novas culturas, e inclusive, os Punks, são oriundos dessa troca de identidades,

10

Internacional Business Machines é uma empresa norte americana de desenvolvimento de informática, que teve seu início no fim do século XIX, e opera suas atividades até o presente. 11

Hitachi é uma empresa japonesa, conhecida pela sua influência na produção de produtos eletrônicos.

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composta de elementos diversos, propostos pela expansão de ideias possibilitadas

pelas interações de jovens em diferentes lugares do mundo.

A moda também teve um avanço moderno no que se podiam ver presentes nas

ruas até a década de 1950. O uso do jeans se populariza, principalmente depois da

influência cinematográfica e da música, tendo seus representantes jovens da época de

ouro do rock formando uma nova geração de consumidores da nova tendência. É

possível dizer que foi graças ao rock que os jovens de classe média e alta adotaram a

linguagem das classes mais baixas, e o estilo de vida operário se populariza.

O envolvimento dos jovens na política também teve um grande avanço, que

pensando em décadas anteriores, quase eram nulas as participações destes e das

mulheres nas discussões sobre o tema. A partir da década de 1960, nos Estados

Unidos, Grã-Bretanha, Alemanha e França, a idade mínima para votar diminui para os

18 anos. O convívio no trabalho e nas Universidades propiciava para estes jovens uma

proximidade em discutir política com mais facilidade, e reconhecendo-se dentro de

uma classe social, ficava mais fácil inclinar-se a uma ideologia política, de acordo com

esta identidade.

Em meados da década de 1970, os jovens britânicos de classes mais baixas

estavam cada vez mais engajados na política, pois viam suas perspectivas futuras

perdidas, pela atuação de um governo mais preocupado com a ação individual e a

liberdade do indivíduo, e assim do livre mercado, acima do bem social. A política

Neoliberal liderada pelo governo de Margaret Thatcher12 trouxe à tona a ideologia de

livre mercado como “diretriz” fundamental da administração da economia britânica.

David Harvey, autor da obra “Neoliberalismo: História e Implicações” define a

doutrina da seguinte forma:

O neoliberalismo é em primeiro lugar uma teoria das práticas político-

econômicas que propõe que o bem-estar humano pode ser melhor promovido

liberando-se as liberdades e as capacidades empreendedoras individuais, no

âmbito de uma estrutura institucional caracterizada por sólidos direitos a

12

Margaret Hilda Roberts, mais conhecida como Margaret Thatcher, foi eleita em 1979, foi a primeira mulher eleita a primeira-ministra no Reino Unido e também na Europa. Atuava pelo Partido Conservador do Reino Unido.

21

propriedade privada, livres mercados e livre comércio. O papel do Estado é

criar e preservar uma estrutura institucional apropriada a essas práticas; o

Estado tem que garantir , por exemplo, a qualidade e a integridade do

dinheiro [...]. (HARVEY, 2005, p.7)

Toda a luta trabalhista movida pela sociedade nas décadas anteriores, via-se

perdida pelos próprios trabalhadores que não mais uniam-se pela ação coletiva para

lutarem pelos seus direitos. Com a entrada do Neoliberalismo, um alto índice de

desigualdade social e de desemprego aumentava gradativamente. As lutas políticas nas

ruas eram movidas por jovens da periferia de Londres, que eram contra a política de

ideal conservador que predominava na sociedade britânica, no final da década de 1979,

com maior efetividade.

As ações do governo Thatcher eram marcadas pela restrição do poder sindical,

o fim da solidariedade e democracia social, a fim de promover maior liberdade

individual e das famílias, não promovidas mais pela coletividade. É sob o retrato de

um resgate do tradicionalismo inglês, e uma juventude incomodada com a realidade

que a cercava, que o grupo jovem foco deste estudo, os Punks ingleses fotografados

por Olivier Richon e Karen Knorr, aos poucos iriam surgindo, para o choque de uma

sociedade que visava a moral e o tradicional.

1.2 A EMERGÊNCIA DA CULTURA PUNK NA SOCIEDADE MORALISTA

INGLESA NA DÉCADA DE 1970

É um momento muito importante na filosofia do reconhecimento do próprio

“eu” dos indivíduos os anos de 1960, devido ao crescente número de jovens

ingressando nas Universidades, apropriando-se de novos conhecimentos e vivências,

estas que possibilitavam que a juventude pudesse acreditar em uma nova busca por

ideais que correspondessem à nova visão de mundo à cerca da nova filosofia de vida

que acreditavam. A liberdade do indivíduo à cerca de suas ações era fundamental para

uma juventude disposta a romper com o tradicionalismo imposto pelo sistema

capitalista presente na sociedade a qual estavam inseridos.

22

Os movimentos culturais presentes naquele momento reforçavam o ideal de

liberdade do ser, e o mais conhecido dos movimentos que tinham essa ideologia como

base era o Hippie. As letras das canções, embaladas por melodias suaves, que em suas

composições transmitiam a paz e o amor como o melhor caminho para uma evolução

humana, fazia com que muitos jovens se envolvessem nas ações do grupo. Estes

também acreditavam que a ligação espiritual, com as religiões Orientais e o contato

com a natureza, poderia colaborar para que pudessem lutar por suas ideologias.

Pode-se dizer que o movimento nascido na mesma década, mas não ainda bem

formado e com o nome Punk, bebia da fonte do movimento hippie, no que dizia

respeito à ideologia de liberdade. Porém, para melhor definir a origem do movimento,

a ruptura com a identidade hippie foi o que realmente fez nascer o Punk. Para o

segundo grupo, o discurso ideológico destes era completamente hipócrita, visto que o

convívio com as comunidades hippies demonstravam atitudes contrárias ao que

pregavam. O machismo era muito presente, pois os homens eram tidos como “chefes”

da comunidade, enquanto as mulheres faziam trabalhos domésticos, além da

infidelidade dos maridos com as esposas, podendo apenas os homens ter relações com

outras mulheres, enquanto não era permitido que as mulheres fizessem o mesmo. Para

os jovens que aos poucos inclinavam-se a uma nova ideologia, o rompimento com o

grupo possibilitaria a quebra real com os padrões tradicionais, que ainda estavam

presentes na convivência que muitos jovens viam como “prisional” nas comunidades

hippies.

O novo discurso aflorado nos jovens que inclinaram-se a ideologia Punk era

vista dede o início como uma ideologia muito mais focada na política, principalmente

no movimento inglês, do que focada no visual e na música, como era visto no

movimento norte americano. Era composto em sua maioria por jovens dos subúrbios

de Londres, onde tiveram suas primeiras aparições, com realidades mais duras do que

muitos dos estudantes de classe média que também uniam-se a grupos

“revolucionários”. Grande parte dos hippies vinha da classe média motivada pela

realidade de que seus diplomas não eram a garantia para crescerem a nível social,

privados por um sistema que diminuía suas ações individuais. Os discursos filosóficos

e intelectuais do grupo não iam de encontro com o pensamento dos jovens que viviam

23

nas periferias, muito mais preocupados com a dura e miserável realidade dos

subúrbios.

A estética Punk em seu início ainda não era aquela, que mais tarde ficaria

popularizada, onde as vestimentas e a música eram sua principal marca. Nem se quer o

termo Punk era utilizado para defini-los. Os termos “amor”, “esperança” e “amizade”,

muito utilizadas no discurso hippie eram rejeitados pelos jovens deste novo grupo. A

autora Ivone Gallo, em “Por Uma Historiografia Punk” (2010), descreve o pensamento

do movimento, registrando:

O tom apocalíptico da fala punk, que a princípio não comportava aspirações

políticas formais e institucionais, ao menos não aquelas já conhecidas,

denunciava, entretanto, a podridão da sociedade, na medida em que nela a

vida se desenha como aceitação da miséria e da opressão. O fundamento

desta recusa deve-se, então, à constatação de que as promessas sobre um

reino do bem estar social no futuro, jamais se realizarão numa sociedade de

consumo e de prazeres edênicos, na verdade desfrutados por poucos. A

estética punk que privilegia o sujo, o escuro, a violência, visa representar o

produto mais puro da civilização moderna enquanto dejeto. (GALLO, 2010,

p.288)

O Punk, que em sua origem era marcado como um movimento político, com a

chegada dos anos de 1970, torna-se mais popular principalmente com a chegada dos

membros do grupo que usavam a música como modo de se manifestar. Nos Estados

Unidos, desde a metade da década de 1960, algumas bandas do gênero já eram pouco

conhecidas, como os Ramones e Suicide. Mas o Punk só se torna um gênero e moda

entre os jovens na década seguinte, com a própria banda Suicide, que fica popular

também na Europa, e a migração de algumas bandas norte americanas para Londres, e

suas chegadas até lá causa uma mudança no modo de reconhecimento do grupo.

É em 1972, com algumas bandas Punks, que fizeram com que o gênero ficasse

mais conhecido popularmente, é que este grupo passa a popularizar-se e mais do que

isso, torna-se um produto comercial, o qual cooperava para que a indústria começa-se

a investir na criação de uma “moda” Punk, a partir dos símbolos aparentes nas letras

das músicas e nas vestimentas dos próprios integrantes a cultura. Passa então a existir

um estereótipo de reconhecimento do “ser Punk”. Na mesma década ocorre o

24

surgimento das bandas mais influentes do cenário punk, que se popularizaram com

rapidez entre os jovens, pelo reconhecimento da origem dos integrantes com a

realidade dos ouvintes. O Sex Pistols, The Clash, Buzzcocks, são considerados as três

bandas mais influentes do punk rock britânico. Começaram suas carreiras nas garagens

de suas casas, quando ainda moravam no subúrbio de Londres, influenciadas pelo rock

dos anos de 1950, o jazz e o blues americano. As letras das músicas logo se tornaram

populares e grito de protesto ao sistema político tradicionalista ao qual a sociedade

inglesa estava inserida.

Com a popularização das bandas de Punk rock, logo a marca do grupo passa a

serem suas vestimentas e a atitude, presentes no visual das bandas influência do

movimento. O Sex Pistols foi um divisor de águas na percepção do Punk como um

grupo político, para o Punk como moda. As primeiras bandas que surgiram neste

cenário não priorizava a vestimenta como símbolo da cultura Punk, mas fazia

referência ao modo como vestiam-se os “rockeiros” dos anos d 1950 (jeans e jaquetas

de couro). Depois do Sex Pistols é possível perceber que o visual Punk conhecido até

hoje fica muito além do discurso político do movimento. Os cabelos despenteados, os

coturnos, e as calças rasgadas tornam-se características básicas do visual Punk. Logo,

começa a se popularizar nos principais veículos de comunicação que o novo grupo era

liderado por jovens rebeldes, que não se preocupavam com as consequências de uma

vida cercada por drogas, orgias e anarquismo. Os garotos dos subúrbios eram vistos

como “a escória” da sociedade inglesa, pelo modo como se comportavam e o estilo de

vida que adotavam principalmente pautadas no modo como os representantes do

movimento Punk, no caso, os integrantes das bandas populares, viviam nos bastidores

de suas famas. Alguns jovens perdiam suas vidas ainda cedo, por conta do abuso do

uso de drogas e também por doenças sexualmente transmissíveis.

Importante o destaque de que neste momento ainda se tinha uma cultura

tradicional inglesa, pautada nos grandes eventos que formaram a identidade nacional

coletiva dos indivíduos. O Punk teve papel fundamental nessa ruptura, mesclando

elementos da cultura inglesa, da realidade vivida naquele lugar, além de agregar

elementos de outras realidades, que foram permitidos através da identificação com

outras culturas e modos de agir e pensar.

25

Os grupos Punks também se popularizam pelas suas ações políticas, pois

estiveram presentes em diversas manifestações sociais sobre o tema ao longo das

décadas de 1970-80, mesmo sendo muitas vezes censurados. Muitos integrantes doa

cultura Punk inclinaram-se as artes como modo de se manifestarem, não só na música,

mas também na fotografia, moda, cinema, entre outras. Como não tinham pudor nos

conteúdos expostos, com facilidade eram censurados e muitas obras desses artistas

acabaram por ficar desconhecidas. Algumas bandas mais famosas da causa Punk

compunham músicas que acompanhassem os acontecimentos políticos da época, como

O Sex Pistols quando lançaram a música “No Future” (1977), como crítica ao reinado

inglês. Muitas canções também falavam da dura realidade dos moradores dos bairros

mais periféricos de Londres, como foi o caso do The Clash quando compuseram “The

Guns of Brixton” (1979), bairro onde os integrantes da banda viveram sua juventude:

When they kick at your front door/How you gonna come?/With your hands on your head/Or on the trigger of your gun/When the law break in/How you gonna go?/Shot down on the pavement/Or waiting on death row/You can crush us/You can bruise us/But you'll have to answer to/Oh, the guns of Brixton/The money feels good/And your life you like it well/But surely your time will come/As in heaven, as in hell/You see, he feels like Ivan/Born under the Brixton sun/His game is called survivin'/At the end of the harder they come […]13

Essas características que aos poucos foram sendo atribuídas ao grupo, logo

foram sendo aceitas pelos próprios integrantes do movimento, e incorporada ao visual

e ao pensamento político destes. O punk que conhecemos até os dias de hoje é

lembrado como um grupo de pessoas que moram nas ruas, sujos, rasgados, com

cabelos despenteados, “rockeiros” e com uma ideologia anárquica14, pelo menos no

sentido estético.

13

Quando eles arrombam a sua porta, como você reage?/Vem com as mãos na cabeça ou com mão no gatilho da sua arma/Quando a lei quebrada por alguém, como você reage?/Dá um tiro nele na rua ou espera o corredor da morte/Você pode nos esmagar, você pode nos machuca/Mas terá que se entender com, oh, com as armas de Brixton/O dinheiro faz sua vida ser boa/Mas uma hora sua vez chegará, no céu ou no inferno/Você verá, ele se sente como Ivan, nascido sob o Sol de Brixton/Seu jogo e chamado sobrevivência, no final só o mais forte fica [...]. 14

A anarquia atribuída aos punks nem sempre faz relação ao pensamento do anarquismo no seu sentido literal e filosófico, mas sim para descrevê-los de modo pejorativo, assim como “baderneiros” ou “marginas”.

26

O principal objetivo deste estudo é compreender de fato, através das

fotografias de dois estudantes da Universidade de Westminter, em Londres, colaboram

para caracterizar a juventude Punk de Londres, na década de 1970, uma vez que as

fotos foram realizadas no ano de 1976, para conclusão de curso dos fotógrafos Knorr e

Richon. Também é necessário se apropriar do modo como foram feitas as fotografias

tecnicamente, onde foram realizadas, quem eram os jovens presentes nas imagens; já

que a partir de agora, compreende-se melhor a juventude, não só Punk, mas toda esta

pertencente ao período já datado. Quais suas motivações políticas, e em qual contexto

econômico e social estavam inseridos.

Para a análise das fontes, disposta no próximo capítulo, alguns métodos

adotados por alguns autores teóricos e metodológicos serão de fundamental

importância para que o material, inspiração de todo este estudo, além da afinidade

pessoal com o tema, seja analisado em todas as suas formas, tanto como objeto, e até

mesmo como memória deste grupo.

27

2. UMA ANÁLISE DA JUVENTUDE PUNK ATRAVÉS DA EXPOSIÇ ÃO

FOTOGRÁFICA “ PUNKS” (1976)

O objeto desta pesquisa, mais especificamente a juventude Punk representada

nas fotografias de Olivier Richon e Karen Knorr, será uma passagem importante, para

compreender alguns elementos da cultura Punk inglesa dos anos de 1970. Em 2013

tive conhecimento destas imagens através de pesquisas associadas ao meu interesse

assunto, que vem de muitos anos, desde minha adolescência. Minha proximidade com

a temática, e o interesse pelas mídias visuais trouxe-me a este determinado ponto, o de

trazer estas fotografias para a pesquisa, estas que já eram muito familiares para mim, e

torna-las fontes principais do trabalho.

Para melhor explorá-las, foi necessário que eu aprofundasse o estudo a

respeito do contexto de produção das obras, ou seja, compreender a Inglaterra dos anos

de 1970, como realizado no primeiro capítulo, assim como entender a cultura Punk, e

seus caminhos ao longo das décadas seguintes, e o que se tornou até o momento.

As imagens precisam ser interpretadas não somente por seus elementos

visuais, que ao primeiro olhar ficam de certo modo evidentes aos leitores que apenas

as veem como “fotografias de alguns Punks”, tiradas em preto e branco. É preciso

compreender algumas questões referentes à produção das imagens, tanto

expressivamente, quanto tecnicamente. Para isso, algumas leituras teóricas e

metodológicas foram importantes, para que eu analisasse e compreendesse estas fontes

não só simbolicamente, mas também de que modo elas representam uma juventude de

um determinado grupo.

Para uma análise teórica, busquei embasamento em uma obra importante e

atemporal, que por mais que discuta como analisar historicamente, pinturas e

monumentos históricos, permite associar as técnicas de análises destes objetos, a

outros objetos visuais, como são o caso das fontes desta pesquisa, as fotografias. Em

“Padrões de Intenção: A Explicação Histórica dos Quadros”, de 1985, escrito pelo

historiador da arte inglês, Michael Baxandall, o autor realiza uma análise sobre três

pinturas históricas. A primeira de sua análise foi “O Retrato de Kahnweiler” (1910), de

Pablo Picasso, seguido por “Uma Dama Tomando Chá” (1735), de Jean-Baptiste

28

Simeon Chardin, e por fim “O Batismo de Cristo” (ente 1440-50), de Piero della

Francesca. Além dos quadros, o autor também concedeu uma análise a um monumento

histórico, este, a ponte do Rio Forth, de Benjamin Baker, cujo termino de sua

construção deu-se em 1890.

Para Baxandall, mais do que compreender a explicação do “monumento” em

si, é muito importante entender o contexto ao qual estava inserido o artista, a fim de

perceber qual a intenção deste na criação de sua arte. Sobre seu pensamento em

relação à intenção do autor sobre sua obra, Baxandall diz:

Quando falo em intenção, não me refiro a um estado psicológico real ou particular, nem se quer a um conjunto de acontecimentos que tivessem se passado em determinado momento, na mente de Benjamin Baker ou de Picasso, e à luz dos quais – se eu os reconhecesse – poderia interpretar aponte do rio Forth ou o Retrato de Kahnweiler. Penso, antes, numa condição geral de toda a ação humana racional, uma condição que pressuponho quando organizo uma série de fatos circunstanciais ou exploro os termos do “triângulo de reconstituição”. Nessas situações, me parece correto fala em “intencionalidade”. A hipótese de fundo é que todo ator histórico e, mais ainda, todo objeto histórico têm um propósito – ou um intento ou, por assim dizer uma “qualidade intencional”. Nessa acepção, a intencionalidade caracteriza tanto o ator quanto o objeto. A intenção é a peculiaridade que as coisas têm de se inclinar para o futuro. (BAXANDALL, 1985, p. 81)

Pensando em “intencionalidade”, é importante compreender que para o autor

se faz necessário entender as vivências do artista, pois estas contribuem em suas ações

em relação a sua obra, ao modo como trabalha, contribuindo também na construção da

mensagem final. Para além de compreender a realidade do autor de uma obra, também,

tecnicamente, para Baxandall é indispensável efetuar um levantamento de ideias que

possam auxiliar na análise do objeto histórico. Em resumo, o autor procurou

demonstrar um caminho para facilitar a compreensão a cerca da produção de uma obra

histórica. Listando “encargos”15 e “diretrizes”16 da concepção de uma obra, é possível

“aproximar a obra do seu contexto cultural, social e cientifico”. (BAXANDALL,

1985, 20)

O pensamento de Michael Baxandall a respeito da análise de objetos visuais

pode-se facilmente ser reportado das pinturas históricas, ou demais objetos de

15

Michael Baxandal define “encargo” sendo: do que foi encarregado o autor ao produzir sua obra. 16

Para “diretrizes”, o autor dá a noção dos cuidados que o autor da obra teve ao produzi-la, ou os problemas acerca de sua produção.

29

compreensão visual, para as fotografias. Para o autor torna-se muito importante

descrever o que pensamos sobre um quadro, ou no caso das fontes desta pesquisa, as

fotografias, muito mais do que descrever o quadro, ou foto, em si. Ir além do que está

entregue à vista logo de imediato, desvendando o quadro a partir do conhecimento a

cerca de sua lógica social, cientifica, ou cultural, sem tentar uma falsa descrição do

que se passou na cabeça do autor ao realizá-la. Para melhor compreender este

raciocínio, o autor comenta:

Explicar uma intenção não é contar o que se passou na cabeça do pintor, mas elaborar uma análise sobre seus fins e seus meios, conforme os inferimos a partir da observação da relação entre um objeto e algumas circunstâncias identificáveis. A análise se realiza em constante e ostensiva interação com o quadro. (BAXANDALL, 1985, p. 162)

Para analisar as fotografias da exposição “Punks”, é indispensável perceber as

fontes como instrumento de identificação de uma cultura, que surge ao fim dos anos de

1960. Não acredito que seja dispensável o primeiro olhar, este, mais estético, pois o

objeto se comunica não somente com o leitor que tenha conhecimento prévio a

respeito de sua temática, mas também com aquele que ao se deparar com tais imagens,

sinta-se instigado a compreendê-las mais atentamente.

Segundo Baxandall, todo monumento histórico pode ganhar diferentes

significados dependendo de quem é o leitor, e muito mais do que isso, pode ter seu

significado alterado ao longo do tempo. No ano, momento, ou lugar onde aquele

documento foi produzido, este, tem uma importância e um significado. Para a época

em que foi criado, ou momento histórico, aquele objeto ganha uma determinação, até

mesmo pelos leitores daquele período. Com o passar das décadas, ou até séculos,

novas leituras serão feitas a respeito de tal obra, ganhando novos significados, estes,

que não poderiam ser atribuídos a ele no momento de sua produção. Quantas mais

interpretações ganharam as obras analisadas pelo autor, em sua obra, além das já

conhecidas? Algumas leituras sobre objetos históricos se propagam ao longo do

tempo, porém cada “espectador” é capaz de dar um novo sentido a este objeto, a partir

de seus próprios meios de analisar um documento.

Quando as 16 (dezesseis) imagens produzidas por Karen Knorr e Olivier

Richon foram expostas pela primeira vez, em 1977, em Londres, realizadas para o

30

trabalho de conclusão de curso de fotografia, provavelmente estas ganharam um

significado de imediato, que possivelmente tinha relação com o contexto inglês da

década de 1970. Uma juventude interessada em mudanças nos âmbitos políticos,

sociais, econômicos e também culturais poderia muito bem apreciar estas obras com

um olhar amplo, buscando entender as pessoas presentes nas fotografias como algo

novo, um estilo próprio e até mesmo algo que poderia mudar o estereótipo da

juventude inglesa da década anterior. Não só os jovens, mas também outros

expectadores, mais velho de repente, poderiam compactuar desse pensamento, ou

reagir com estranheza ao diferente, pois para alguns, naquele momento, certos

elementos da cultura Punk (vestimenta, penteado, comportamento) eram algo

completamente novo. Há uma possiblidade também do público dessa exposição,

pensando no fato de ser uma mostra realizada para estudantes de fotografia, ou até

mesmo pessoas que trabalhassem com tal, a análise destes passaria muito

provavelmente pelo aspecto técnico das obras, muito mais do que pelo de conteúdo.

A última exposição destas obras aconteceu em fevereiro de 2018. Um novo

público, outra geração, ou até mesmo, a geração que vivenciou os anos de 1970, hoje,

mais maduros, puderam revisitar estas memórias, e para os mais novos, conhecer um

pouco sobre a cultura Punk depois de 40 anos da realização do trabalho dos fotógrafos.

Não é difícil imaginar que novas interpretações a respeito das obras surgiram assim

como novos questionamentos. Para mim mesma, a relação com as fontes, mesmo antes

da análise para esta pesquisa, de 2013 até agora, ganharam novos significados a cada

descoberta a respeito de seus contextos.

Para aprofundar um pouco mais as questões técnicas a cerca da análise das

fotografias como fonte histórica, busquei compreender metodologicamente o

pensamento da autora Ana Maria Mauad, em seu “Através da Imagem: História e

Fotografia Interfaces”, de 1996. Mauad entende as fotografias como uma mensagem,

esta, que toma forma ao longo do tempo, de acordo com o modo que se insere ao meio

social, e também como “testemunho” de uma época. Para autora:

Toda a imagem é histórica. O marco de sua produção e o momento da sua execução estão indefectivelmente decalcados nas superfícies da foto, do quadro, da escultura, da fachada do edifício. A história embrenha as imagens, nas opções realizadas por quem escolhe, uma expressão e um

31

conteúdo, compondo através de signos, de natureza não verbal, objetos de civilização, significados de cultura. (MAUAD, 1996, p.15)

As imagens, sendo mensagens não verbais, são produtos do meio cultural. A

noção de semiótica17 para Mauad se faz muito presente na utilização de um método

que permita analisar as imagens como uma passagem histórica, um fragmento de

memória, e um ato que organiza os acontecimentos históricos dentro do espaço. As

noções de espaço para a autora são fundamentais para compreender de que modo às

mensagens, ou “códigos”, presentes na imagem se estabelecem, e a partir destes

compõe uma noção de representação e construção de uma “realidade cultural”.

Para a análise de fontes visuais, Mauad estabelece algumas técnicas bem

específicas. Os elementos visuais que compõem a imagem são importantes para

estabelecer a noção de “unidade cultural”, sendo para autora definido como o modo

que os símbolos se comunicam, para criar uma realidade social. Então, distribuindo

estes elementos visuais como “forma de conteúdo” e “forma de expressão”, seria o

modo mais simples de compreender os signos presentes na imagem. A autora criou

duas fichas classificadas como “elementos de forma de conteúdo” e “elementos de

forma de expressão”. A primeira teria de ser preenchida com informações a respeito

dos elementos presentes no conteúdo da imagem, como por exemplo: pessoas

retratadas, objetos aparentes, temática, local da retratação, entre outros. A segunda

ficha teria de ser preenchida com informações referentes à parte técnica de produção

da imagem. Nesta, algumas informações necessárias seriam: formato da foto, tamanho,

nitidez, de acordo com foco e iluminação, enquadramento dos objetos, planos, entre

outros.

Depois desta primeira parte da análise prática da imagem, onde algumas

mensagens puderam ser estabelecidas, seria então o momento de caracterizar os

espaços presentes nas imagens, classificando-os da seguinte forma: espaço fotográfico,

geográfico, do objeto, da figuração, e por fim, da vivência (ou evento). Todos estes

serão capazes de remontar uma experiência que permita compreender o recorte

histórico ao qual a imagem foi produzida, seus códigos e a “unidade cultural” presente

nesta.

17

Representações através de signos criadas pelos seres humanos como forma de compreender sua natureza.

32

Estes dois autores foram base importante para compreender de que modo

analisar as fontes desta pesquisa, a fim de compreender as técnicas de produção destas

imagens, além de caracterizar os “Punks” presentes no trabalho de Karen Knorr e

Olivier Richon.

Das 16 (dezesseis) fotografias expostas na primeira exposição dos fotógrafos,

em 1977, 4 (quatro) delas foram escolhidas para serem analisadas nesta pesquisa.

Além do volume de 16 (dezesseis) fotografias serem muito extenso para um trabalho

menor, as escolhidas tem um significado importante para aqui aparecem. Como já me

eram muito familiares, antes de serem as possíveis fontes da presente pesquisa, cada

uma contém elementos importantes a serem explorados.

O pano de fundo pensado para a narrativa desta análise será o contexto de uma

festa noturna, onde estas pessoas estão presentes, e as fotografias retratam algumas

situações possíveis de terem acontecido nesta “festa”. As ordens a qual estas serão

apresentadas possibilitam visualmente uma indicação de início, meio e fim, de acordo

com o desenrolar da análise. A intenção, é que haja uma organização das ideias, para

que o leitor sinta-se mais envolvido com a narrativa, e que se familiarize com o objeto,

através desta.

2.1 OS “PUNKS” LONDRINOS PELO OLHAR DE OLIVIER RICHON KAREN

KNORR

A escolha do trabalho dos fotógrafos Olivier Richon e Karen Knorr como

fontes desta pesquisa dado pelo meu interesse pessoal pela cultura Punk, despertou-me

para uma análise das fotografias realizadas por eles, e principalmente pelo contexto de

produção das imagens.

A exposição “Punks”, realizada em 1977, por dois fotógrafos em formação

pela Universidade de Westminter, em Londres, chamou-me a atenção para a forma

com foram retratados os jovens Punks daquela década, período onde a cultura ganha

forma através da música, da moda e da ideologia.

Este recorte, década de 1970 para o Punk teve importância, pois foi neste

momento que algumas bandas que faziam parte da cultura Punk começaram a surgir

33

configurando uma aparência, uma atitude e um modo bem específico de pensar. O Sex

Pistols, quase uma década depois de algumas bandas Punks, ainda não reconhecidas

como tal, como The Ramones ainda na década de 1960, foi de extrema importância

para a compreensão do que era ser Punk. Muito do que aparece na moda e visual está

ligada ao que os rapazes dessas bandas trajavam, e desse modo foi se aos poucos

criando um “estereótipo” visual do grupo que a partir da década de 1970, permite

reconhecer o Punk como cultura, e ao longo dos anos agregarem mais elementos de

outras culturas ao visual e a ideologia, como ocorre até os dias de hoje.

Além do contato prévio com as fontes, ligada ao meu interesse pelo Punk na

década de 1970, estas tornaram-se em fontes desta pesquisa com objetivo de procurar,

caracterizar, as pessoas presentes nas fotos, assim compreendendo elementos do que

era o Punk naquela década. Algumas limitações ocorreram ao longo da análise, como

por exemplo, como teria sido a abordagem dos fotógrafos ao grupo Punk que

pousaram para as fotos, ou como se comportavam nos bastidores de produção, porém a

busca maior é pela análise visual e contextual a partir do que pode ser visto nas fotos.

As fotografias como fontes de pesquisa tem uma proposta visual muito forte,

porém contém algumas limitações em sua análise. Os elementos visuais permitem que

o leitor previamente consiga visualizar o objeto, mas não muito além do que a imagem

em si pode entregar se não houver um conhecimento prévio sobre o assunto tratado

nela. É importante a contextualização à cerca da obra, e limitar-se aos elementos

visuais da foto, buscando compreender quais as possiblidades de pensamento

propostas pela obra.

Originalmente, cerca de 30 fotos foram finalizadas por Richon e Knorr, porém

a exposição original, realizada em 1977 contou 16 (dezesseis). Para a análise realizada

nesta pesquisa, das 16 (dezesseis), apenas 4 (quatro) delas serão trabalhadas. A escolha

dessas 4 (quatro) deu-se a partir dos elementos visuais nelas propostas. Vestimentas,

símbolos presentes na cultura punk e a participação das mulheres no grupo são

algumas das possibilidades que estas fontes podem propor pensar. O fato de o Punk ser

uma cultura onde o masculino era mais presente, ou os próprios elementos que

começavam a surgir, serem tão masculinos, muito despertou-me nas fotos uma

34

presença feminina tão recorrente, pois grande parte das imagens da exposição, conta

com poses femininas.

Não tive acesso ao modo como estas fotos estiveram expostas em 1977, porém

foi definido um pano de fundo nesta pesquisa, para que elas fossem apresentadas de

um modo específico ao longo do trabalho.

A primeira imagem é importante para compreender o tom das fotografias, o

clima que ela transmite, no sentido iconográfico18 e familiarização do leitor com as

fontes. Em sua apresentação, fica evidenciado que os autores das obras, os fotógrafos

Knorr e Richon escolheram o preto e branco na escolha final da finalização do

trabalho. Segundo a fotógrafa Karen Knorr, em uma entrevista disponibilizada em seu

site19, afirma que a escolha do preto e branco para as imagens se deu por conta de que

o contraste das roupas escuras, acessórios metálicos e as peles brancas, ficariam mais

em evidência além de dar um tom mais dramático às fotos. Foram todas posadas, de

modo mais natural possível, para causar o efeito contrário, ou seja, as pessoas

presentes nas imagens foram direcionadas, pois a intenção dos fotógrafos era reafirmar

suas presenças, procurando um confronto direto com seus enfocados. O formato

pousado também foi para permitir que a associação externa da cultura Punk como

“suja” e “suburbana”, fosse desmitificada.

Grande parte das fotografias foram feitas em ambientes noturnos, e as que

foram primeiramente expostas, no ano de 1977, quase todas em bares frequentados

pelos jovens Punks. Ao todo foram finalizadas cerca de 30 (trinta) fotografias, em

ambientes diferentes. Ruas, bares e até mesmo na escola, foram cenário de escolha dos

fotógrafos, pois pensavam que o ideal era narra com naturalidade à existência destes

jovens. Infelizmente eu não consegui ter acesso a todas as fotos produzidas, e na época

da primeira exposição, apenas 16 (dezesseis) foram expostas ao público. Em 2013,

pela editora Ghost, os fotógrafos catalogaram as demais fotografias, num livro

ilustrado, que contava um pouco mais sobre os bastidores de produção das imagens.

18

Iconografia é a descrição de uma imagem através de sua representação visual. 19Interview by Niccolo Fano for Italian online magazine Fotografia: Punks, Elites and India’s Secular Culture 2014 <http://karenknorr.com/writings/karen-knorr-interviewed-by-niccolo-fano-for-italian-online-magazine-fotografia-punks-elites-and-indias-secular-culture-2014/>

As 4 (quatro) fotos que aparecem neste trabalho, são as de ambientes noturnos,

produzidas nos bares londrinos

Village, em Charing Cross (destes, apenas o primeiro ainda permanece em atividade).

O trabalho foi realizado durante o período de 3 meses, no ano de 1976, e exposto no

ano seguinte, para a finalização da formação dos fotógrafos Na Universidade de

Westminter, em Londres.

RICHON, Olivier. KNORR, Karen.

http://karenknorr.com/photography/punks/

Na imagem é possível ver duas mulheres, uma sentada ao chão à esquerda da

foto com o rosto a mostra, e uma em pé à direita, mais à frente da primeira, tendo

apenas suas pernas e mão visíveis na foto.

aparentemente usam meias calça idênticas. A mulher sentada ao chão aparece na

imagem com o braço direito apoiado sobre o joelho, olhando fixamente para a câmera.

Nesta ação direta, existe o propósito por parte desta de

devolvendo o olhar fixo para o leitor afirmando sua autossuficiência. Possui cabelo

curto, com franja ao meio da testa, dando a impressão de que foi mal cortado. Usando

delineador nos olhos, a maquiagem não aparenta estar pesada, ou

fotos que aparecem neste trabalho, são as de ambientes noturnos,

produzidas nos bares londrinos Roxy, localizado no bairro Covent Garden, e no

, em Charing Cross (destes, apenas o primeiro ainda permanece em atividade).

ado durante o período de 3 meses, no ano de 1976, e exposto no

ano seguinte, para a finalização da formação dos fotógrafos Na Universidade de

Westminter, em Londres.

RICHON, Olivier. KNORR, Karen. Punks, 1977. 18cm X 28cm. Londres – Inglaterra. Fonte di

otography/punks/

Na imagem é possível ver duas mulheres, uma sentada ao chão à esquerda da

foto com o rosto a mostra, e uma em pé à direita, mais à frente da primeira, tendo

apenas suas pernas e mão visíveis na foto. Ambas estão trajando roupas pretas, e

aparentemente usam meias calça idênticas. A mulher sentada ao chão aparece na

imagem com o braço direito apoiado sobre o joelho, olhando fixamente para a câmera.

Nesta ação direta, existe o propósito por parte desta de protagonizar a imagem,

devolvendo o olhar fixo para o leitor afirmando sua autossuficiência. Possui cabelo

curto, com franja ao meio da testa, dando a impressão de que foi mal cortado. Usando

delineador nos olhos, a maquiagem não aparenta estar pesada, ou

35

fotos que aparecem neste trabalho, são as de ambientes noturnos,

, localizado no bairro Covent Garden, e no Global

, em Charing Cross (destes, apenas o primeiro ainda permanece em atividade).

ado durante o período de 3 meses, no ano de 1976, e exposto no

ano seguinte, para a finalização da formação dos fotógrafos Na Universidade de

Inglaterra. Fonte disponível em:

Na imagem é possível ver duas mulheres, uma sentada ao chão à esquerda da

foto com o rosto a mostra, e uma em pé à direita, mais à frente da primeira, tendo

Ambas estão trajando roupas pretas, e

aparentemente usam meias calça idênticas. A mulher sentada ao chão aparece na

imagem com o braço direito apoiado sobre o joelho, olhando fixamente para a câmera.

protagonizar a imagem,

devolvendo o olhar fixo para o leitor afirmando sua autossuficiência. Possui cabelo

curto, com franja ao meio da testa, dando a impressão de que foi mal cortado. Usando

delineador nos olhos, a maquiagem não aparenta estar pesada, ou com cores muito

36

escuras. Veste uma jaqueta preta, e nesta é possível ver alguns strass presos ao

colarinho e nos ombros, provavelmente estilizados pela própria pessoa. Encostada a

uma parede escura, e sem acabamento, a luz reflete sua sombra nesta, e a iluminação

colabora para que ambas as pessoas presentes na imagem estejam em foco. A mulher

em pé utiliza roupa preta, uma saia curta com tecido brilhoso, meias pretas e cinta liga.

Esta não se encontra encostada a parede, sem possuir sombra refletida a esta. As duas

mulheres na foto não estão utilizando esmaltes nas unhas, e aparentemente as unhas

estavam curtas. As peles brancas são destacadas pela iluminação e as cores preto e

brancas escolhidas para a finalização da foto. O ambiente onde a foto foi tirada é um

dos bares londrinos Roxy ou o Global Village frequentados pelos punks da época, e

sua aparência através dessa imagem causa impressão de que o local era sem muito

luxo, pois a parede foi pintada sem acabamento, e com cor escura. Ainda é possível

ver também que o piso era de cor clara, pois o rodapé na parede é revelado ao fundo da

imagem, próximo do chão.

A presença feminina na cultura Punk utilizando roupas curtas mais sensuais,

como a cinta liga de uma das mulheres na primeira imagem em análise, deve ser

pensada como uma parte importante no novo pensamento a cercado do feminismo, que

naquele momento ganhava força. A própria autora da obra Karen Knorr, afirma na

mesma entrevista sobre as fotografias, em 2013, que o feminismo era uma das razões

que os motivou a realizar esse trabalho. Durante a pesquisa, ao me deparar com tal

afirmação, procurei compreender este raciocínio durante a leitura das fontes, já que

não consegui encontrar um aprofundamento dos próprios autores sobre essa questão.

A identidade Punk para estas mulheres representava um meio de reafirmar o

pensamento feminista, que também era muito presente dentro da ideologia Punk.

Identidade esta que se apropriava de diversos elementos estéticos, que para quem não

vivia o Punk poderia chocar-se. Um exemplo seria as roupas de couro que remetiam as

vestimentas utilizadas em fetiches sadomasoquistas, utilizadas por outra parcela da

sociedade vitima de preconceito. A sexualidade era outra questão que desde os anos de

1960 era tratado como movimento político de liberdade individual. Toda e qualquer

questão relacionada à sexualidade ainda era tratada como algo perverso, mais ainda no

que dizia respeito à homossexualidade e a sexualidade feminina.

37

Todas as questões de identidade feminina construída até os anos de 1960, aos

poucos começam a ser repensadas a partir das grandes revoluções sociais daquele

período. A mulher que aparece “sexualizada”, e com aparência “masculina”, dada pelo

desleixo, cabelo curto, roupas escuras e rasgadas, quebram o tradicionalismo imposto

por um pensamento antiquado, onde a mulher deveria se cuidar fisicamente e não

poder falar sobre sua sexualidade. O choque desta presença feminina Punk nesta

imagem propõe pensar na contribuição política deste ato por parte das mulheres

presentes no meio Punk.

Essa análise iconográfica feita da em primeiro momento, remete ao que Ana

Maria Mauad chama de análise por “forma de conteúdo”. Alguns apontamentos já

foram feitos em relação ao encaminhamento deste tipo de análise. Para fechar esta

parte gostaria de esclarecer algumas questões sobre o ambiente ao qual esta foto foi

produzida.

Não se sabe ao certo em qual dos dois bares já citado, Roxy e Charing Cross,

esta foi fotografia foi feita, pois algumas lacunas ficaram sem serem preenchidas ao

longo da pesquisa. Porém, no sentido mais imagético, é possível perceber que a parede

ao fundo foi pintada em um “muro”, ou mesmo parede, sem acabamento, trazendo

uma percepção de que o ambiente dispunha de pouco luxo.

No que diz respeito a uma análise de “forma expressão”, algumas informações

estiveram dispostas, outras não. As que não conseguirei entregar são justamente por eu

não conter uma formação que permita identificar certas técnicas utilizadas pelos

fotógrafos. Porém conseguirei destacar algumas.

No que diz respeito às dimensões de imagem, estas se apresenta em formato

paisagem, o que caracteriza a fotografia exposta na horizontal. O tamanho da foto é de

18 cm X 28 cm. Importante lembrar que estas dimensões estão dispostas para a

revelação das imagens expostas em 1977, não digitalizadas. A iluminação da imagem

procura deixar em evidência as pessoas presentes na fotografia, e o não existe

desfoque nestes. Ambas a mulheres aparecem em foco, no mesmo plano de imagem.

Antes de partir para a análise da próxima fonte, gostaria de relembrar o pano

de fundo definido para a narrativa da mesma. Como não tive acesso a de que modo, e

em que sequencia as imagens foram expostas, procurei definir um ambiente de festa,

onde a primeira imagem, por estar mais limpa,

parecem mais alinhadas, declará

mulheres da primeira fotografia, estivessem chegando ao bar para começarem a se

divertir. Estes bares onde as fotos foram feitas, eram frequentad

jovens que gostavam de ouvir

apresentaram nestes lugares. E

o público, através da música.

RICHON, Olivier. KNORR, Karen.

http://karenknorr.com/photography/punks/

Na imagem é possível perceber que há uma pessoa de costas, vestindo uma

jaqueta, ou blazer preto, estilizado com algumas correntes presas ao tecido c

alfinetes. O formato em retrato da imagem, no sentido vertical permitiu que o

fotógrafo conseguisse ilustrar a imagem de modo que nossa percepção captasse que o

fundo da imagem é uma pessoa de costas, e assim também, usando

onde a primeira imagem, por estar mais limpa, e as pessoas presentes na imagem

parecem mais alinhadas, declará-la como um “inicio” da noite. Como se as duas

mulheres da primeira fotografia, estivessem chegando ao bar para começarem a se

divertir. Estes bares onde as fotos foram feitas, eram frequentados principalmente por

jovens que gostavam de ouvir rock, e algumas bandas punks daquele período se

apresentaram nestes lugares. Era uma das formas de expressão Punk

o público, através da música.

RICHON, Olivier. KNORR, Karen. Punks, 1977. 18cm X 28cm. Londres – Inglaterra. Fonte disponível em:

otography/punks/

Na imagem é possível perceber que há uma pessoa de costas, vestindo uma

jaqueta, ou blazer preto, estilizado com algumas correntes presas ao tecido c

alfinetes. O formato em retrato da imagem, no sentido vertical permitiu que o

fotógrafo conseguisse ilustrar a imagem de modo que nossa percepção captasse que o

fundo da imagem é uma pessoa de costas, e assim também, usando

38

e as pessoas presentes na imagem

la como um “inicio” da noite. Como se as duas

mulheres da primeira fotografia, estivessem chegando ao bar para começarem a se

os principalmente por

, e algumas bandas punks daquele período se

unk, a interação com

Inglaterra. Fonte disponível em:

Na imagem é possível perceber que há uma pessoa de costas, vestindo uma

jaqueta, ou blazer preto, estilizado com algumas correntes presas ao tecido com

alfinetes. O formato em retrato da imagem, no sentido vertical permitiu que o

fotógrafo conseguisse ilustrar a imagem de modo que nossa percepção captasse que o

fundo da imagem é uma pessoa de costas, e assim também, usando-a como fundo para

39

deixar em foco, no centro da imagem, a estilização presente na vestimenta. As laterais

da fotografia estão mais escurecidas, permitindo que o leitor focasse sua atenção no

centro da imagem, assim como a iluminação propõem. A prata das correntes e dos

alfinetes presos ao tecido fica em evidência em contraste com o preto da jaqueta. Esta

foto também fora finalizada em preto e branco. As laterais da fotografia estão mais

escurecidas, permitindo que o leitor focasse sua atenção no centro da imagem, assim

como a iluminação propõem. As dimensões da foto original exposta são de 18 cm X

28 cm.

A segunda imagem escolhida como fonte dessa pesquisa tem a função de

ilustrar o figurino Punk, na sua melhor essência: o “Do It Your Self”. A cultura Punk

era carregada de ideologias, e uma delas, como já mencionada no primeiro capítulo

deste trabalho, apelava para que os integrantes do grupo fizessem as coisas para si

mesmas, não dependendo do mundo externo, pois este não iria fazer nada por você, a

menos que você mesmo fizesse. Muitas das características do visual Punk permitem

perceber que a diferença entre seus membros remete a esse pensamento, pois cada um

com suas individualidades, criatividade, e gostos, eram capazes de construir uma

identidade própria, e por isso a tamanha singularidade presente no grupo.

Grande parte das vestimentas, principalmente quando a cultura Punk ainda não

tinha esta nomenclatura, e nem era considerada uma cultura em si, eram portadas sem

uma razão específica, a não ser por uma tentativa de desleixo do próprio portador. Um

exemplo claro eram os jeans com rasgos, que muitas vezes eram velhos demais, e

acabavam por rasgar-se, e mesmo dessa maneira, ainda eram usadas. Ao longo tempo,

foi-se criando uma identidade a partir da comunicação entre os jovens, que permitiu

que se apropriassem de símbolos ideológicos, que acabaram se fixando, não só como

ideal, mas também como parte do visual, e criando uma “moda” Punk que foi se

transformando ao longo do tempo. O que era feito pelos próprios integrantes no

passado, como rasgar suas calças, ou estilizar suas jaquetas, mais tarde eram

comercializadas estas roupas com referência a cultura punk em grandes lojas.

Na década de 1970, quando o Punk já era reconhecido como ideologia, não

completamente consolidada, era uma resposta a um padrão social estabelecido, e não

somente, pois também como uma resposta aos problemas sociais daquele dado

momento, como afirma o autor Tiago de

do Punk”. Para o mesmo, toda essa historiografia presente até hoje, foi escrita através

da visão externa sobre o que era “ser

que foi quem no fim das contas conf

por Vieira da seguinte maneira:

[...] De forma alguma devesim como diversas representações ambíguas que, por sua vez, geram um conjunto de novas práticas nos indivídada postura.

Antes mesmo de ser classifi

particular e individual em cada pessoa, a partir de suas vivências, particularidades e

muitas vezes até mesmo p

rock, o anarquismo, e o “

RICHON, Olivier. KNORR, Karen.

http://karenknorr.com/photography/

momento, como afirma o autor Tiago de Jesus Vieira, em “Uma Outra Historiografia

do Punk”. Para o mesmo, toda essa historiografia presente até hoje, foi escrita através

o externa sobre o que era “ser Punk”, muito influenciada pelo olhar da mídia,

que foi quem no fim das contas configurou essa identidade. O “ser

por Vieira da seguinte maneira:

[...] De forma alguma deve-se pensar o punk como identidade fechada, mas sim como diversas representações ambíguas que, por sua vez, geram um conjunto de novas práticas nos indivíduos e /ou grupos, que assumem estdada postura. (VIEIRA, 2011 p.14)

Antes mesmo de ser classificada coletivamente, a essência

particular e individual em cada pessoa, a partir de suas vivências, particularidades e

muitas vezes até mesmo por uma falta de referência. Mesmo com tantas diferenças, o

, o anarquismo, e o “Do It Your Self” era o que acabavam por unir o grupo.

RICHON, Olivier. KNORR, Karen. Punks, 1977. 18cm X 28cm. Londres – Inglaterra. Fonte disponível em:

otography/punks/

40

Jesus Vieira, em “Uma Outra Historiografia

do Punk”. Para o mesmo, toda essa historiografia presente até hoje, foi escrita através

”, muito influenciada pelo olhar da mídia,

ou essa identidade. O “ser Punk” é definido

se pensar o punk como identidade fechada, mas sim como diversas representações ambíguas que, por sua vez, geram um

duos e /ou grupos, que assumem esta

cada coletivamente, a essência Punk era algo

particular e individual em cada pessoa, a partir de suas vivências, particularidades e

or uma falta de referência. Mesmo com tantas diferenças, o

” era o que acabavam por unir o grupo.

Inglaterra. Fonte disponível em:

41

Nesta foto duas mulheres aparecem em destaque, com a iluminação focada em

ambas, que estão encostadas ao canto de uma parede sem acabamento, pintada em tom

escuro. O cenário revela ainda um ambiente sem luxo, pois os interruptores com cabos

a mostra revelam a simplicidade do local.

O corpo da mulher à frente, se sobrepõe a de trás, que a abraça pelos ombros.

A de trás possui anel na mão direita, mesma mão que segura um cigarro aceso. Parece

vestir uma camisa branca, manga longa. A mulher à frente, sobrepondo o corpo da de

trás, veste uma blusa regata bem fina e transparente, que revela seus seios. Preso a

regata estão algumas correntes fixadas com alfinetes. Esta, com os braços para trás,

abraçando a mulher ao fundo, revela em seu rosto maquiagem pesada. Na testa, uma

suástica desenhada com lápis preto, batom escuro, delineador nos olhos bem

marcados, e no nariz, usa um alfinete com piercing preso a uma corrente ligada ao furo

na orelha. No pescoço utiliza alguns colares, um deles mais curto, que fica encoberto

pelo queixo da moça, e outro mais comprido, com um pingente com a letra “G”. O

olhar das duas mulheres está fixo para a câmera, e a mulher à frente está com a cabeça

um pouco inclinada para baixo, e olhar pra cima causa uma sensualidade. As duas

mulheres brancas tem suas peles realçadas por conta da iluminação e as cores preto e

brancas usadas para a finalização da foto.

A escolha desta remete uma busca por compreender a presença da

mulher no punk ilustrando como o feminismo poderia ser agente dentro deste cenário.

Quando Michael Banxandall20 fala sobre “Encargos e Diretrizes”, ou qual o

encargo do autor, e os cuidados na produção, respectivamente, é possível traçar a ideia

do quão fundamental foram estes requisitos para a produção do trabalho de Karen

Knorr e Olivier Richon. Quando um deles conta que existia uma preocupação em

identificar as mulheres na cultura Punk e ilustrá-las, era importante pensar nos

cuidados de reproduzi-las de modo “machista”, ou até mesmo estereotipado. Porém, a

melhor forma de realmente mostrar que eram parte importante do grupo, e tinham um

modo de encarar a posição de reconstrução do pensamento feminino, era reforçando a

presença da mulher nas obras.

20

BAXANDALL, Michael. Padrões de Intenção: A Explicação Histórica dos Quadros. São Paulo, SP: Companhia da Letras, 2006. (Coleção História Social da Arte).

42

As duas mulheres que aparecem na terceira imagem, representam através do

visual a liberdade feminina, que se tornava mais presente com as lutas políticas que

ganhavam força entre 1970, e a década seguinte. Os cabelos curtos, o corpo a mostra,

maquiagem pesada e a sensualidade exposta na imagem, não teriam o efeito de

impacto nos dias de hoje, tanto quanto naquele momento de produção do trabalho dos

fotógrafos e emergência do pensamento punk e feminismo. Dois efeitos são

perceptíveis com a presença visual da foto: O visual Punk sem preocupação com

padrões e a liberdade feminina dentro da cultura Punk.

A iluminação novamente colabora para que a percepção do leitor se volte para

as pessoas presentes na imagem. O ambiente aparentemente remete-nos a pensar que a

primeira foto em análise e a terceira foram feitas no mesmo bar. As paredes escuras,

pintadas sem acabamentos, e os interruptores com os canos a mostra, reforçam a

percepção de um ambiente sem luxo, ou até “decorado” para representar uma cena

underground. A imagem possui foco nas mulheres presentes, e posada com o intuito

de mostrar a força da liberdade feminina, no sentido sexual. Não se sabe exatamente

como estaria vestida a mulher ao fundo, que tem o corpo coberto pelo da primeira,

propositalmente, tendo e vista, que a essência da imagem mostrar como o pensamento

Punk propõe a quebra com os padrões através da rebeldia.

Na fotografia fica muito evidente um símbolo muito utilizado no Punk,

embora seu significado para esta cultura, não tenha o mesmo de quando usado pelas

tropas nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. A suástica21 para os punks que a

utilizavam em seus vestuários com frequência simbolizava a negação ao nazismo, de

modo irônico ao estampá-la tão naturalmente, e a marcação de território do grupo.

Como o símbolo já era automaticamente ligado ao nazismo, era utilizado como uma

maneira de permanecerem os Punks indesejados pela mídia, ou pela indústria.

A autora Ana Paula Sant’Ana, em seu “O Punks e os Labirintos do Corpo”

(2009), compreende a rebeldia Punk, sendo muito mais do que uma atitude:

21

Brâmanes e budistas utilizavam o símbolo com as hastes voltadas para a esquerda, representando sorte, felicidade e salvação. Durante a Segunda Guerra Mundial, os soldados nazistas se apropriaram da utilizam do símbolo, porém, usando-o com as hastes voltadas para a esquerda, tornando-se essa a utilização mais conhecida do símbolo.

O punk teconstrução ou reconstrução, numa guerra de vontades e diferenças inerentes ao grupo, deriva em vontade de abandono do que é conhecido como certo, das regras que antes eram seguidas sem questionarelação à cultura burguesa é geral, há uma negação de todos os valores. Mas existem alguns que são inegavelmente inerentes ao punk, como a rebeldia. Aliada ao nãoautori

A rebeldia, e o pensamento anárquic

do grupo eram recorrentes definições. O anarquismo era um meio de unir o grupo,

muito mais do que um ideal, era um modo comportamental.

Olivier Richon e

Isso colabora também para que o trabalho por eles realizado fosse compreendido como

um meio dos próprios autores terem construído um novo pensamento a respeito do

objeto, pós-produção.

RICHON, Olivier. KNORR, Karen.

http://karenknorr.com/photography/p

As pessoas presentes na imagem são uma mulher em primeiro plano,

segurando um copo cheio, olhando para o lado, não em direção à câmera, e em

O punk tem essa semente: ele é senhor de si, o bando é uma escola. Sua construção ou reconstrução, numa guerra de vontades e diferenças inerentes ao grupo, deriva em vontade de abandono do que é conhecido como certo, das regras que antes eram seguidas sem questionarelação à cultura burguesa é geral, há uma negação de todos os valores. Mas existem alguns que são inegavelmente inerentes ao punk, como a rebeldia. Aliada ao não-conformismo, um comportamento que desafia a hieraautoridade. (SANT’ANA, 2009, p. 19)

A rebeldia, e o pensamento anárquico, para aqueles que pensavam o

do grupo eram recorrentes definições. O anarquismo era um meio de unir o grupo,

muito mais do que um ideal, era um modo comportamental.

Olivier Richon e Karen Knorr não eram punks e também não eram ingleses.

Isso colabora também para que o trabalho por eles realizado fosse compreendido como

um meio dos próprios autores terem construído um novo pensamento a respeito do

er. KNORR, Karen. Punks, 1977. 18cm X 28cm. Londres – Inglaterra. Fonte disponível em:

http://karenknorr.com/photography/punks/

As pessoas presentes na imagem são uma mulher em primeiro plano,

segurando um copo cheio, olhando para o lado, não em direção à câmera, e em

43

m essa semente: ele é senhor de si, o bando é uma escola. Sua construção ou reconstrução, numa guerra de vontades e diferenças inerentes ao grupo, deriva em vontade de abandono do que é conhecido como certo, das regras que antes eram seguidas sem questionamento. O deboche em relação à cultura burguesa é geral, há uma negação de todos os valores. Mas existem alguns que são inegavelmente inerentes ao punk, como a rebeldia.

conformismo, um comportamento que desafia a hierarquia e a

o, para aqueles que pensavam o Punk fora

do grupo eram recorrentes definições. O anarquismo era um meio de unir o grupo,

Karen Knorr não eram punks e também não eram ingleses.

Isso colabora também para que o trabalho por eles realizado fosse compreendido como

um meio dos próprios autores terem construído um novo pensamento a respeito do

Inglaterra. Fonte disponível em:

As pessoas presentes na imagem são uma mulher em primeiro plano,

segurando um copo cheio, olhando para o lado, não em direção à câmera, e em

44

segundo plano, um homem cochilando sentado em um sofá. O olhar da mulher, com

um pouco mais de atenção, pode caracterizar uma aparência de cansaço ou até mesmo

de quem pode ter ingerido uma grande quantidade de álcool.

Desta maneira a imagem propõe que ambas as pessoas estão sentada em um

sofá de canto, e um momento de cansaço, proposto pelas interações feitas durante a

festa. O sofá presente na imagem e a parede aparecem em tons mais escuros,

juntamente com as roupa das pessoas. As jaquetas escuras, muito utilizadas na cultura

Punk estão presentes nas vestimentas das pessoas na fotografia. Algumas correntes na

calça de couro da mulher aparecem na imagem, e também na jaqueta. É possível

visualizar que a mesma pessoa está usando uma camisa justa por baixo da jaqueta, e

uma gravata mal ajeitada, causando a impressão de um “visual” bagunçado. Mais ao

fundo o homem sentado a tirar um cochilo veste também uma jaqueta, sem muitos

detalhes na parte da frente, a não ser um botton e algumas correntes presas a alfinetes.

O rosto da mulher aparece com maquiagem escura ao redor dos olhos, no rosto

sombreado pelo movimento do braço que leva o copo a boca. Nas paredes, as sombras

das pessoas na foto, causada pela iluminação da foto que prima colocar em foco o

homem a mulher, e aparentando que a foto foi tirada em um lugar escuro. A

iluminação da imagem procura destacar o rosto dos presentes, para que fosse possível

compreender suas afeições, e o destaque das peles brancas ao preto e branco cooperam

para tal elemento.

Não se sabe ao certo, como se comportavam os jovens Punks fotografados por

Richon e Knorr nestes ambientes noturnos, mas tentando compreender como foi

ambientada a imagem, algo me chamou a atenção na obra de Ana Paula Sant’Ana22 ,

no quer diz respeito ao comportamento e o modo como se vestiam nas festas por eles

frequentadas no período noturno:

Nos shows, como Abalo Sísmico, Tarde pro Rock, Blecaute, sempre se encontrava punks vestidos a caráter, entre eles os mesmos que tinham bandas. Pelas fotos nota-se que a produção pesada era deixada para shows, próprios ou de outras bandas. Os caras e as minas vestem geralmente calças justas e rasgadas, as calças usadas são as jeans, preta ou com motivos de

22

SANT’ANA, Ana Paula de. O Punk e os Labirintos do Corpo: Movimento Punk em Cuiabá. 2009. 104 f. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem) Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem, Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá: MT, 2009.

45

exército, que podem ter patches costurados, muitas vezes estão, tanto um como ou outro, de camiseta sobreposta. As imagens mais presentes são a suástica, o A de anarquia, nomes de bandas. Coletes de couro ou não, cintos e pulseiras de rebite, coturnos ou tênis All Star ou Adidas completam o visual. Para as meninas existe ainda a alternativa de saias curtíssimas com coturno ou tênis e meias, muitas vezes meia calça que pode ser rasgada, e para eles ou elas a bermuda ou o short. As jaquetas de couro já foram usadas por aqui, principalmente na década de 80, mas atualmente só completa o visual se for noite de frio. (SANT’ANNA, 2009, p. 94)

A autora cita o comportamento dos Punks durante a década de 1980 no Brasil,

mas o principal exercício seria ambientar fotografias através de uma narrativa que

permita compreender de qual maneira ocorreu à produção da imagem. O ambiente

remete a um lugar retirado do centro do bar. Pensando nas estruturas de uma casa de

som noturna, onde tocam bandas de rock, por exemplo, podemos perceber que parte

deles possuem mesas com acentos que permitam que seu público possa ficar mais à

vontade, fazendo algumas refeições, conversando e tomando algumas bebidas.

Também presente neste ambiente, um pouco afastado das mesas, que geralmente ficam

mais ao canto, existe ao centro, um palco com uma pista de dança para que o público

possa curtir o som.

Procurei ao longo desta narrativa me atentar aos elementos visuais das

imagens, pela riqueza dos elementos propostos por elas, tendo em vista o fato de tê-las

visualizado uma série de vezes, em busca de um olhar que me permitisse discutir tais

elementos de maneira a explicar quais os símbolos expostos nestas, e suas funções

dentro da cultura Punk, a fim de responder as principais questões da problemática

desta pesquisa.

As experiências vividas pelos jovens do início dos anos de 1960, com todas as

revoluções juvenis, colaboraram para uma nova busca de identidade por parte das

gerações das décadas posteriores. A própria construção do “ser Punk” esteve ligada a

um pensamento de “revolução”. Uma nova maneira de agir, de pensar e de viver era o

norte da busca do Punk para se reinventarem ao longo de suas experiências.

Claramente, foi influenciado por diversos elementos ideológicos e visuais que visavam

desconstruir o tradicional, e possibilitar que não fossem identificados de apenas um

modo.

46

O Punk nunca esteve preso a um estereótipo fixo, a pensar na sua trajetória de

mudanças, tendo em vista a “multipluralidade” do grupo. Os jovens Punks da década

de 1970 presentes neste trabalho, e nas fotografias de Karen Knorr o Olivier Richon,

não simplesmente caracterizam toda uma cultura, mas apenas uma parte dela, que

naquele momento precisava ser reconhecida, pensada e compreendida, não com o

olhar de espanto, e sim de questionamento.

47

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As fotografias de Olivier Richon e Karen Knorr, que foram o norte para pensar

esta pesquisa, trouxeram algumas respostas às questões principais propostas logo no

início do trabalho. Para além de identificar os Punks presentes na obra dos autores,

também foi possível compreender porque razões aparecem caracterizados dessa forma

nas imagens, e o que buscaram os autores ao produzirem tal material.

Ainda eram um momento de construção da identidade Punk os anos de 1970.

Identidade essa, que como afirma o autor Stuart Hall23, constitui um “processo em

andamento”. Foram necessárias algumas décadas para que o Punk que temos

conhecimento hoje fosse visto como uma “movimentação” de liberdade política,

artística e visual. Nascera juntamente a movimentos políticos e sociais que

revolucionavam o pensamento de coletividade. A identidade individual passa a ser

pensada com mais força, porém, proporcionado pelo fato de que estas só foram

possíveis através do acesso ao conhecimento de outras visões além do universo

individual. As Universidades tiveram uma forte colaboração nas ações coletivas por

parte da juventude, nos anos de 1960-70. A busca jovem pelo conhecimento, e

engajamento político promoveram as grandes revoluções sociais destas décadas.

A busca por caracterizar as pessoas presentes nas imagens foi além do que

apenas foi apresentado no sentido iconográfico da análise. Elementos como, símbolos,

vestimentas, o modo como às fotos foram produzidas e a presença feminina dentro da

cultura Punk, colaboraram para compreender que não é simples identificar um

raciocínio linear para entender o objeto deste estudo. O Punk não era uma cultura

baseada em um único conceito, um único visual, uma única atitude, assim como já não

propõe o conceito de identidade. O pensamento de Hall, novamente se faz necessário

para a discussão de identidade quando afirma:

A identidade surge não tanto da plenitude da identidade que já está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é “preenchida” a partir de nosso exterior, pelas formas através das quais nós imaginamos ser visto por outros. (HALL, 2006, p. 39)

23 HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Tradução: Tomaz Tadeu da Silva, Guacira Lopes Louro. 11. Ed. Rio de Janeiro, RJ: DP&A, 2006.

48

Quando o olhar das mulheres, em autoafirmação sobre a atitude sustentada nas

fotos, indica a seriedade do grupo em tratar dos assuntos em relevância no cenário

europeu ao qual foram produzidas as obras. Sustentam a atitude feminista dentro do

grupo, sustentam a aversão ao nazismo, ou com isso, todo o tipo de injustiça social.

Sustentam a liberdade do indivíduo de acordo com suas escolhas, e também a

liberdade criativa dentro das artes.

Considerar a identidade Punk em formação no recorte possibilitado pelas

fontes, e seu tempo de produção, é importante para lembrar que esta é apenas uma

pequena mostra deste universo, que por minhas mãos foi escolhido, pela riqueza de

signos, e o interesse pela década de 1970, tendo em vista o “nascimento” da cultura

Punk inglesa pela mão da juventude que a representa.

Ainda existe muito presente em mim, o trabalho com análises de fonte visuais,

buscando explorar ainda mais a cultura Punk. Dado as limitações pelo recorte

específico de tempo, não foi possível uma análise dos anos posteriores de construção

da identidade do Punk mais a fundo. Os anos de 1980, e o Punk no cenário brasileiro

tem uma forte influência no meu repertório a cerca deste universo. Ainda vejo a

possiblidade de trabalhar com tal raciocínio, visto que o Punk que chegou ao Brasil,

muito influenciado pela música, sofre algumas mudanças do Punk visto até aqui. Este

também me desperta grande interesse e paixão.

49

FONTES

KNORR, Karen; RICHON, Olivier. Punks. 1976. 16 fotografias p&b, 18 cm x 28 cm.

Disponível em:<http://karenknorr.com> Acesso em: 31 mar. 2015.

Entrevistas

Interview by Niccolo Fano for Italian online magazine Fotografia: Punks, Elites and

India’s Secular Culture 2014

< http://karenknorr.com/writings/karen-knorr-interviewed-by-niccolo-fano-for-italian-

online-magazine-fotografia-punks-elites-and-indias-secular-culture-2014/>

50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Artigos

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Janeiro, RJ: Tempo, 1996; p. 73 - 98.

Dissertações

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Fanzines Punks (Curitiba, 1990 – 2000). 215 p. Dissertação (Mestrado) – Universidade

Federal de Santa Catarina. Florianópolis: SC, 2010.

SANT’ANA, Ana Paula de. O Punk e os Labirintos do Corpo: Movimento Punk em

Cuiabá. 2007. 104 f. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem) Programa de

Pós-graduação em Estudos da Linguagem, Universidade Federal de Mato Grosso.

Cuiabá: MT, 2007.

VIEIRA, Tiago de Jesus. Uma Outra Historiografia do Punk. Revista História em

Reflexão. Vol.5, n.10 – Universidade Federal da Grande Dourados. Dourados: MS,

2011.

Livros

BAXANDALL, Michael. Padrões de Intenção: A Explicação Histórica dos Quadros.

São Paulo, SP: Companhia da Letras, 2006. (Coleção História Social da Arte).

BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia. Tradução: Miguel Serras Pereira.

Lisboa: Fim de Século, 2003.

CHARTIER, Roger. A História Cultural: Entre Práticas e Representações; tradução de

Maria Manuela Galhardo. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil, 1990.

DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e Outros Ensaios. Tradução: Marina

Appenzeller, 2. Ed. Campinas, SP: Papirus, 1993. (Coleção Ofício de Arte e Forma).

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Tradução: Tomaz Tadeu

da Silva, Guacira Lopes Louro. 11. Ed. Rio de Janeiro, RJ: DP&A, 2006.

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HARVEY, David. O Neoliberalismo: História e Implicações. Tradução: Adail Sobral e

Maria Stela Gonçalves. SP: São Paulo, Edições Loyola, 2008.

HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991 / Eric

Hobsbawm; tradução Marcos Santarrita; revisão técnica Maria Célia Paoli. SP: São

Paulo: Companhia das Letras, 1995.

O’HARA, Craig. A Filosofia do Punk: Mais Que Barulho. São Paulo, SP: Radical

Livros, 2005.

PINSKY, Carla Bassanezi. (Org). Fontes Históricas. 2. Ed. 1° reimpressão. SP:

Contexto, 2008.

Sites

Karen Knorr

<http://karenknorr.com>

About Karen Knorr

http://www.karenknor.com>

Professor Olivier Richon

<http://www.rca.ac.uk>

The Clash: The Guns of Brixton – Letra original e tradução

<http://www.letras.mus.br>