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VALES DA UVA GOETHE COMO UM ARRANJO PRODUTIVO LOCAL (APL): UMA ANÁLISE PELO MODELO DE DIAMANTE DE PORTER. Patricia de Sa Freire (UNESC ) [email protected] Adriana Carvalho Pinto Vieira (UNESC ) [email protected] Roseli Jenoveva Neto (UNESC ) [email protected] VANESSA ESTEVAM (unesc ) [email protected] A principal característica da sociedade contemporânea é a hipercompetitividade que impõem uma nova direção para a produção de valor à organização, passando do capital, da terra e da mão-de- obra para a informação e o conhecimento. Porém, tanto a informação como o conhecimento, para serem criados precisam ser, antes de tudo, compartilhados. Desta maneira, este mundo sem fronteiras carrega em si o paradoxo de exigir que as empresas atuem de maneira cooperativa para se tornarem competitivas. Surgem as redes cooperativas como os arranjos produtivos locais (APL) com a gestão de recursos e negócios por meio da reciprocidade para alcançarem ganhos conjuntos. Os agentes propositalmente se interconectam, se inter-relacionam e desenvolvem interdependência a favor do ganho comum. É o momento de amadurecimento dos quais cada participante tem a consciência que ganhará muito mais se estiver trabalhando conjuntamente com os “vizinhos”. Neste contexto, este estudo vem contribuir para uma melhor compreensão dos APLs ao definir como objetivo do estudo, compreender os “Vales da Uva Goethe”, em Urussanga, Santa Catarina como um arranjo produtivo local com base no Método Diamante de Porter (1993). Para alcançar este objetivo fez-se necessários explorar os fenômenos estudados - arranjo produtivo local e “Vales da Uva Goethe” e descrever a interação e interdependência de suas manifestações pelo Método Diamante de Porter. Atingindo o objetivo da pesquisa, pode-se afirmar que os Vales pode ser considerado um APL pela visão do Método Diamante, pois gerencia os determinantes da competitividade colaborativamente, além de estarem sujeitos enquanto coletividade ao acaso e as ações do governo. Palavras-chaves: Vales da Uva Goethe, Arranjo Produtivo Local, Modelo de Diamante, Competitividade, Inteligência Competitiva. XXXIV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Engenharia de Produção, Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável: a Agenda Brasil+10 Curitiba, PR, Brasil, 07 a 10 de outubro de 2014.

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VALES DA UVA GOETHE COMO UM

ARRANJO PRODUTIVO LOCAL (APL):

UMA ANÁLISE PELO MODELO DE

DIAMANTE DE PORTER.

Patricia de Sa Freire (UNESC )

[email protected]

Adriana Carvalho Pinto Vieira (UNESC )

[email protected]

Roseli Jenoveva Neto (UNESC )

[email protected]

VANESSA ESTEVAM (unesc )

[email protected]

A principal característica da sociedade contemporânea é a

hipercompetitividade que impõem uma nova direção para a produção

de valor à organização, passando do capital, da terra e da mão-de-

obra para a informação e o conhecimento. Porém, tanto a informação

como o conhecimento, para serem criados precisam ser, antes de tudo,

compartilhados. Desta maneira, este mundo sem fronteiras carrega em

si o paradoxo de exigir que as empresas atuem de maneira cooperativa

para se tornarem competitivas. Surgem as redes cooperativas como os

arranjos produtivos locais (APL) com a gestão de recursos e negócios

por meio da reciprocidade para alcançarem ganhos conjuntos. Os

agentes propositalmente se interconectam, se inter-relacionam e

desenvolvem interdependência a favor do ganho comum. É o momento

de amadurecimento dos quais cada participante tem a consciência que

ganhará muito mais se estiver trabalhando conjuntamente com os

“vizinhos”. Neste contexto, este estudo vem contribuir para uma

melhor compreensão dos APLs ao definir como objetivo do estudo,

compreender os “Vales da Uva Goethe”, em Urussanga, Santa

Catarina como um arranjo produtivo local com base no Método

Diamante de Porter (1993). Para alcançar este objetivo fez-se

necessários explorar os fenômenos estudados - arranjo produtivo local

e “Vales da Uva Goethe” e descrever a interação e interdependência

de suas manifestações pelo Método Diamante de Porter. Atingindo o

objetivo da pesquisa, pode-se afirmar que os Vales pode ser

considerado um APL pela visão do Método Diamante, pois gerencia os

determinantes da competitividade colaborativamente, além de estarem

sujeitos enquanto coletividade ao acaso e as ações do governo.

Palavras-chaves: Vales da Uva Goethe, Arranjo Produtivo Local,

Modelo de Diamante, Competitividade, Inteligência Competitiva.

XXXIV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Engenharia de Produção, Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável: a Agenda Brasil+10

Curitiba, PR, Brasil, 07 a 10 de outubro de 2014.

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1. Introdução

A sociedade contemporânea tem múltiplas designações na literatura científica, como a

Economia do Conhecimento, Nova Economia, Economia Digital, Economia em Rede, Nova

Sociedade, Sociedade da Informação, Sociedade do Conhecimento, entre outras (FREIRE,

2014). Mas, é consenso que sua principal característica é a hipercompetitividade (HORNEY,

1945) que impõem uma nova direção para a produção de valor à organização, passando do

capital, da terra e da mão-de-obra para a informação e o conhecimento. Assim, estes ativos

intangíveis – informação e conhecimento - transformaram-se no real fator de produção por

agregar valor distintivo e configurar vantagem competitiva. (NONAKA; TAKEUCHI, 1997;

TERRA, 2001).

Porém, tanto a informação como o conhecimento, para serem criados precisam ser,

antes de tudo, compartilhados (FREIRE et al, 2013). Desta maneira, este “mundo sem

fronteiras” (OHMAE,1991, p.18) carrega em si o paradoxo de exigir que as empresas atuem

de maneira cooperativa (SHARMA; ERRAMILLI, 2004; LEONIDOU et al, 2010) para se

tornarem competitivas (PORTER, 1989).

Pode-se então considerar a compreensão de Casaroto e Filho (1999) sobre o tema

quando afirmam que as empresas que agem de modo individualizado, principalmente as

pequenas e médias, terão suas forças reduzidas e sugere a inserção destas em redes de

cooperação.

Neste caminho, para vencer o desafio da hipercompetitividade desta economia

globalizada, as estratégias organizacionais passaram a determinar a agilização e otimização

dos processos de cooperações para potencializar as competências distintivas. Ao se perceber a

aprendizagem como um processo determinante da manutenção e da melhoria contínua do

desempenho (Nevis et al, 1995), abriu-se uma janela para que a organização aprendesse com

a experiência do “outro”. Surgem as redes cooperativas.

As redes organizacionais, como os arranjos produtivos locais (APL) são caminhos

colaborativos, encontrados pelos agentes, para a gestão de recursos e negócios por meio da

reciprocidade para alcançarem ganhos conjuntos (Powell, 1990). Os agentes propositalmente

se interconectam, se inter-relacionam e desenvolvem interdependência a favor do ganho

comum. É o momento de amadurecimento dos quais cada participante tem a consciência que

ganhará muito mais se estiver trabalhando conjuntamente com os “vizinhos”.

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Em seu estudo, Mozatto (2012) destaca a importância de se ampliar a abrangência das

investigações sobre as cooperações organizacionais, principalmente os APLs que ainda se

configuram em um fenômeno novo e, por isso ainda estão se constituindo um objeto de estudo

científico.

Neste contexto, partindo-se do pressuposto de que as pesquisas científicas tem

importante papel no desenvolvimento socioeconômico do país, este estudo vem contribuir

para uma melhor compreensão dos arranjos produtivos locais (APLs) ao definir como

objetivo do estudo, compreender os Vales da Uva Goethe, na região de Urussanga, Santa

Catarina como um arranjo produtivo local com base no Método Diamante de Porter (1993).

Para alcançar este objetivo fez-se necessários explorar os fenômenos estudados -

arranjo produtivo local e os Vales da Uva Goethe e descrever a interação e interdependência

de suas manifestações pelo Método Diamante de Porter. Para uma melhor fluidez da leitura,

os Vales da Uva Goethe serão chamados a partir deste ponto de Vales.

2. Arranjo Produtivo Local (APL)

Para compreender os arranjos produtivos locais, ou Cluster em inglês, é

importante explorar o tema sob uma visão histórica identificando as dimensões de análise dos

pesquisadores.

Porter (1993, 1998) é um dos pesquisadores que mais se destaca ao levar o tema a

ser reconhecido como um novo paradigma para o desenvolvimento da economia de uma

nação, estado ou das cidades. Mas, antes dele, a discussão teórica e empírica já norteavam as

pesquisas científicas.

Em 1937, Coase provocou as discussões sobre a necessária cooperação em um

arranjo de trocas e fornecimento, pois, como descreve o autor, nenhuma empresa é capaz de

prover a si mesma de todos os produtos e serviços necessários para seus processos eficientes

de transformação. Com esta discussão o novo paradigma (KUHN, 2005) de perceber a

organização dos agentes econômicos não mais pela forma e força dos agentes, mas por sua

relação. Expoente desta linha de pensamento, em 1984, Marshall apontou os positivos

resultados coletivos entre agentes cooperativos que se agrupassem em distritos industriais.

Inclusive, Williamson (1975) com olhar nos relacionamento interorganizacional destaca a

importância de se analisar tanto o mercado como a hierarquia nele existente como uma rede.

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Outros e diversos autores tem fortalecido esta visão de mundo sem fronteiras (OHMAE,1991,

p.18) e interconectado os quais a atenção para o sucesso organizacional deve ser não mais nos

agentes e, sim nas relações entre eles.

Uma das definições mais aceitas, referencia-se a de Porter (1998, p.197) que

descreve os APL (clusters) como “...concentrações geográficas de empresas interconectadas,

fornecedores especializados, provedores de serviços, firmas em indústrias relacionadas e

instituições associadas”. Esta visão geográfica, segundo o autor aponta para a formação de

uma rede de agentes interconectados que podem abranger uma cidade, uma região, um estado,

país ou mesmo uma rede de países vizinhos.

Conforme afirmam Pedrozo et al (2004), sabe-se que as interações existentes

entre os agentes que compõem um arranjo produtivo estabelecem relações de

complementaridades e interdependência entre eles com o objetivo de sucesso e aprendizado

para todos. Inclusive, uma cadeia organizada pode ser indutora do desenvolvimento

socioeconômico regional em que, as necessidades geradas nos diferentes elos da cadeia

promovem ações individuais e coletivas que acabam por criar valor para toda a rede,

principalmente se existe um APL (NORONHA e TURCHI, 2005).

Os APL’s agroindustriais veem influenciando o desenvolvimento regional a

medida que geram empregos, renda, comércio e prestação de serviços para a localidade e,

consequentemente, melhores condições de vida para a população rural (BALESTRINI et al.,

2005). Mas Porter (1998) destaca que o objetivo maior de um APL não é o desenvolvimento

socioeconômico da região, mesmo que a consequência natural o seja. O autor afirma que os

“...clusters se alinham melhor com a natureza da competição e com as fontes de vantagens

competitivas” (PORTER, 1998, p. 205). Ou seja, os APL’s são constituídos para a criação de

vantagens competitivas para seus membros.

Corroborando, Balestrini et al. (2005) esclarecem que a lógica da atuação em rede

surge a partir da necessidade da cooperação objetivando maior eficiência e competitividade.

Essa dinâmica interativa dos agentes para o alcance de estratégias de eficiência e

competitividade relacionam os APL como uma derivação do Modelo Diamante (PORTER,

1993). Como é o caso das Indicações Geográficas (IG) no universo das Propriedades

Intelectuais. Como ativos intangíveis, as IGs favorecem a competitividade das APL por, como

conclui Souza (2010, p.12), existir o “reconhecimento que esta abordagem abre uma

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possibilidade contemporânea baseada nos diferenciais regionais para maior competitividade

do aglomerado”.

Com base na Teoria da Vantagem Competitiva e no Modelo Diamante de

Competitividade de Michael Porter (PORTER, 1993; 1998) pode-se analisar os APL como

uma estratégia competitiva visto que, valorizam as inter-relações dos 4 componentes do

Modelo que formatam o ambiente os quais as empresas competem promovendo ou

impedindo, aumentando ou diminuindo a vantagem competitiva. Os componentes são:

condições de fatores; condições de demanda; setores correlatos e de apoio; estratégia,

estrutura e rivalidade das empresas. Somado a estes determinantes das competitividades,

Porter (1993) aponta duas variáveis que podem influenciar sobremaneira os APL, o acaso que

está fora do controle das empresas, mas pode se configurar em oportunidades, e o governo

que com suas ações e intervenções pode melhorar ou piorar o cenário competitivo.

Figura 1: “Modelo Diamante de Competitividade” de Porter

Fonte: Elaborado pelas autoras como base em Porter (1993, p. 163)

Neste entendimento, pode-se considerar que os APLs manifestam a interação

destes quatro componentes ambientais e as duas variáveis de maneira a promover nas para a

rede, o aumento da produtividade; a ampliação da capacidade de inovação e, a geração de

novos negócios. Complementando Pereira e Pedrozo (2004, p 70) detalham que, “a

formalização da cooperação entre duas ou mais organizações constitui-se numa decisão

estratégica que visa dividir riscos, trocar recursos, acessar novos mercados, alcançar

economias de escala, obter sinergias e, por fim, garantir vantagem competitiva”.

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Mas, nem todos os objetivos são tão simples de serem alcançados, pois para um

APL se constituir realmente cooperativo é preciso que sejam gerenciados diversos fatores

(PEDROZO et al, 2004; MONTEIRO, 2003; MOZZATO, 2012) que hoje são considerados

como responsáveis pelo insucesso da rede, como: a não geração dos resultados comerciais

esperados; não haver a transferência do conhecimento pretendido; dificuldades e desconexão

na comunicação interna da rede; a complexidade da gestão e os custos de manutenção; falta

de confiança e aprendizagem; inexistência de comprometimento dos participantes; e falta de

percepção da geração de valor (SADOWSKI E DUYSTERS, 2008; TOIGO e ALBA, 2010).

Desta forma, gerenciar a colaboração para o atendimento das expectativas

compartilhadas é importante para o sucesso do APL, principalmente porque o arranjo

produtivo foi constituído em resposta a necessidade de competitividade, ou seja com a

transferências de habilidades, conhecimentos e capacidade tecnológica (KOGUT, 1988).

3. Procedimentos Metodológicos

Para a classificação da pesquisa, toma-se como base a taxionomia apresentada por

Vergara (2009), que a qualifica em relação a dois aspectos: quanto aos fins e quanto aos

meios de investigação.

Quanto aos fins a pesquisa é caracterizada como exploratória e descritiva. Quanto aos

meios de investigação classifica-se como bibliográfica, documental e estudo de caso. É uma

pesquisa bibliográfica, pois foi necessário levantar o que já foi publicado pela ciência sobre o

fenômeno dos arranjos produtivos locais. Foi necessário analisar o fenômeno em sua realidade

organizacional. Pode também ser considerada documental, pois para conhecer os Vales foi

necessário analisar a sua história em manuais e documentos da ProGoethe. Em relação as

fontes primárias, foi realizada uma pesquisa de campo por meio de entrevistas livres, não

estruturadas, com o Presidente da ProGoethe, Sr. Renato Damian.

4. A APL do Vales da Uva Goethe

Criada em 2006, a Associação ProGoethe deu início a busca pela criação de valor aos

produtos a partir da uva Goethe. Em 18 de agosto de 2010 sob o registro n°. IG201009 a

ProGoethe protocolou no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) o primeiro

processo de reconhecimento de Propriedade Intelectual pela Indicação de Procedência (IP) de

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Santa Catarina, dos vinhos e espumantes dos “Vales da Uva Goethe”, a qual obteve o

reconhecimento em 2012 (publicado na Revista INPI n°. 2.145, em 14 de fevereiro).

Para a Associação, o projeto está proporcionando a organização do APL para a

competitividade dos produtores com a qualificação do produto e pretende-se com a

participação de todos os produtores da região delimitada, realmente agregar valor aos

produtos que carreguem o selo da Indicação de Procedência de acordo com as normas do

Conselho Regulador propostas no Manual de Controle Interno da IPVUG.

O arranjo produtivo VALES DA UVA GOETHE abraça diretamente uma área de

458,9 Km2 compreendendo os municípios de Urussanga, Pedras Grandes, Cocal do Sul,

Morro da Fumaça, Treze de Maio, Orleans, Nova Veneza e Içara no Estado de Santa Catarina,

Brasil (INPI, 2012). Somando as área próximas compreendidas no extremo sul catarinense, o

arranjo produtivo da região delimitada, respeitando a definição de Porter (1998, p.197) pode

então ser considerada uma concentração geográfica de micro, pequena e médias empresas

interconectadas, próximas a seus fornecedores especializados de serviços e produtos, as

indústrias relacionadas e, inclusive, as instituições parceiras como a Universidade do Extremo

Sul Catarinense (UNESC).

Os vinhos Goethe produzidos neste APL são referências de terroirs de qualidade pelas

condições alcançadas na relação específica de clima-solos. Mas nem sempre foi assim. O

processo de aprendizagem vem desde a chegada dos italianos à região em 1878.

A região de Urussanga foi colonizada por 19 imigrantes italianos que, após aportarem

em Pernambuco, passam pelo Rio de Janeiro, Desterro (atual ilha de Santa Catarina), Laguna,

Tubarão e Pedras Grandes, com destino a Urussanga, onde chegam em 26 de maio de 1878.

Logo depois, aportam mais 78 famílias conhecedores dos vinhedos italianos.

O processo de aprendizagem para o acerto da terra e do ramo certo de videira foi

longo. Vários ramos foram trazidos da Itália desde a colonização, mas nenhuma deu origem a

vinhos de qualidade (VELLOSO, 2008). Foi preciso ir além e buscar conhecimentos fora das

fronteiras da rede já constituída. No início do século XX, o regente consular em Florianópolis,

o advogado e jornalista Sr. Giuseppe Caruso Mac Donald, se instala em Urussanga. Em uma

de suas viagens a São Paulo, traz e distribui aos colonos a variedade Goethe para a produção

do vinho branco. O sucesso foi alcançado, conforme atestam Flores e Flores (2012, p. 74).

Durante quase quarenta anos, dos anos 30 até o desenvolvimento das carvoarias nas regiões

de Criciúma e Tubarão por volta dos anos 60, a região de Urussanga e os vinhedos da uva

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Goethe prosperaram. Com sua decadência os produtores se dispersaram, mas nunca

abandonaram os vinhedos.

A APL dos Vales nasce neste último século com uma visão compartilhada por todos

os produtores de Urussanga de resgate do reconhecimento do mercado nacional e com

possibilidade da conquista do internacional. Com a ação positiva de conquista da Indicação de

Procedência (IP) que passa a agregar valor distintivo aos seus produtos.

Assim, pelo Modelo Diamante de Porter (1983) pode-se analisar a APL dos Vales

como segue:

a) Condições de fatores: O maior problema dos Vales se situa na dimensão de

estrutura e financeira, pois a grande maioria dos produtores participantes da IP é

formada de microempresários individuais e familiares e, artesanais (coloniais). A

região é intrinsicamente relacionada a produção da uva e vinho Goethe como visto

anteriormente, somado a fatores naturais propícios como o solo e clima, entretanto

alguns dos produtores ainda, não conseguem eles mesmos, agregar valor ao

produto para formar um preço que retorne além dos custos operacionais.

O maior desafio ainda parece ser interno ao APL, pois alguns vitivinicultores ainda

não reconhecem o valor agregado pelo selo IPVUG e não conseguem estabelecer

preços com este ativo intangível. Um aprendizado que ainda preciso ser construído

no APL.

b) Condições de demanda: a IP melhorou a demanda dos produtos fazendo com que

o vinho alcançasse um aumento de 20% no faturamento de vinho e a espumante de

30%. Após a concessão do registro da IPVUG conseguiu-se passar ao consumidor

segurança da qualidade do produto, com padrão de características regionais, haja

vista que há um controle da qualidade pelo Conselho Regulador. Novos mercados

sempre estiveram fora do controle dos vitivinicultores de Urussanga. O esperado

com o reconhecimento da IP dos Vales é a consolidação de estruturas coletivas

para facilitação do acesso a novos mercados. Esta nova fase como APL somado a

força do valor distintivo do selo IPVUG deverá possibilitar o comercio dos

produtos em redes de supermercados nacionais, além das já conquistadas redes da

região. Porém, ainda não foi alcançado um dos maiores objetivos dos produtores, a

constância da demanda. A IP tem também o objetivo de impor um equilíbrio da

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demanda rompendo com a inconstância típica de produtos de baixa demanda, mas

para tal ainda precisa-se de tempo e de um maior investimento em marketing. Por

isso, a demanda tanto em volume como em periodicidade ainda é considerada

insatisfatória.

c) Setores correlatos e de apoio: Este fator é satisfatório inicialmente, podendo no

futuro, com o crescimento da demanda exigir uma nova estrutura da rede de

fornecedores. A Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC) está bem

próxima para as pesquisas, cursos e apoios na constituição de relacionamentos

positivos parra a criação e compartilhamento de conhecimentos. A ProGoethe

mantém estreito e proativo relacionamento com diversas entidades locais,

regionais e nacionais com o intuito de fomentar a aprendizagem da rede, bem

como o crescimento da demanda. O Conselho Regulador (CR) a partir das normas

implementadas pelo Manual de Controle Interno (MCI) acompanha a padronização

da produção e a qualidade final dos produtos dos Vales.

Os produtores e vinícolas da região começaram a investir no enoturismo com a

promoção de atividades correlatas como hotelaria, gastronomia, enologia e os

contadores de história da imigração italiana. Mais, neste quesito, ainda estão longe

de poderem competir com outras regiões turísticas do Estado e do Sul do país, pois

ainda falta investimentos para o desenvolvimento de um plano de desenvolvimento

integrado do enoturismo na região.

d) Estratégia, estrutura e rivalidade das empresas: A IP Vales da Uva Goethe

abraça as vinícolas que produzem o vinho e a espumante a partir da uva Goethe.

Por sua peculiaridade de terra e clima, os produtos produzidos na região é

realmente único o que facilita a sua diferenciação de concorrente. Para o APL dos

Vales é forte o valor agregado advindo da IPVUG, tanto para os próprios

produtores, como para seus parceiros e clientes. No Erro! Fonte de referência

não encontrada. são apresentadas os participantes da ProGoethe que são por

assim dizer, reconhecidas como produtoras de vinhos de qualidade:

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Quadro 1: Vinícolas da IPVUG x produtos liberados

VINÍCOLA Produtos Aprovados

CR safra 2013/14

VINÍCOLA MAZON Augusta demi sec e

seco , Goethe classico

VINHOS QUAREZEMIM Margherita demi sec e

seco

IRMÃOS FELLIPE Tulipa

VINHOS TREVISOL Casa del Sole

VITIVINICOLA URUSSANGA

Espumante Goethe

Casa Del Nonno Demi

Sec, Peccato Reserva,

Casa Del Nonno

Goethe Noble

VINICOLA DE NONNI Senhor Valdemar

Fonte: ProGoethe (2014)

Pela divulgação do reconhecimento da IP dos Vales, a curiosidade do turista já

começa a ser despertada e o “vinho Goethe” a ser reconhecido. Somado aos

consumidores locais, com a curiosidade dos turistas, houve um considerado

aumento do faturamento (20% para os vinhos e 30% para a espumante) e, os

vitivinicultores esperam um aumento da preferência pelo Goethe gerando um

aumento no consumo regular do consumo pelos moradores locais e regionais. Esta

visão compartilhada une os participantes do APL e afastam os concorrentes, pois

os produtos que carregam a certificação da indicação geográfica trazem consigo

uma carga cultural enraizada nas tradições regionais acabando por preservar a

identidade do local e, em ciclo virtuoso, geram mais valor aos produtos da uva

Goethe, diferenciando-os dos concorrentes.

e) Acaso: Destacam-se nesta análise, os planos estratégicos do próprio Governo

Federal de incentivo às iniciativas do Projeto Brasil Maior que se configuram em

um acaso que poderá se transformar em oportunidades para os Vales para sustentar

a marca internacionalmente.

Um acaso que a ProGoethe tem consigo transformar em oportunidades para o APL

é a parceria com a Universidade do Extremo Sul Catarinense, por meio do Grupo

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de Pesquisa Propriedade Intelectual, Desenvolvimento e Inovação (PIDI), do qual

as autoras fazem parte. Com dezenas de artigos científicos sobre os Vales sendo

apresentados e publicados em diferentes regiões do Brasil e do mundo (como a

Turquia, Espanha, Chile, México, Portugal, Romênia, entre outros) a IPVUG vai

tomando corpo e se divulgando pelo globo.

f) Governo: O Governo tem apoiado a formação da IG com o seu próprio

reconhecimento que promoveu um ambiente propício para o enoturismo, o

fortalecimento da Progoethe e a motivação da aprendizagem por parte dos

produtores. O Governo do Estado de Santa Catarina, com base neste incentivo da

IG, promoveu região delimitada pela Indicação de Procedência dos “Vales da uva

Goethe” a território de importância única no Estado.

Com base nesta análise, no caso dos Vales a constituição da Associação dos

Produtores da Uva e do Vinho Goethe (ProGoethe) foi por força de exigências legais para o

registro da IG no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), mas também para a

gestão necessária ao sucesso do APL. Como destaca Wegner (2011, p.19) as vantagens de

uma APL “encobrem o fato de que a cooperação demanda esforços de constituição,

coordenação e manutenção”. Pereira et al (2010) ainda complementam afirmando que, sobre

um arranjo produtivo incide custos materiais e de gestão para envolver os participantes e

motivá-los a cooperar, além da gestão de interesses e expectativas diversas que levam a

conflitos manifestos ou não manifestos que bloqueiam os resultados pretendidos pelos

participantes.

A luz de Souza (2010, p.12), pode-se concluir que o APL dos Vales foi constituído no

“universo da propriedade intelectual em sua variante Indicação Geográfica”, abrindo assim

uma possibilidade contemporânea para uma maior competitividade dos agentes e da própria

rede produtiva.

5. Considerações Finais

Atingindo o objetivo da pesquisa, de compreender os Vales da Uva Goethe como

um arranjo produtivo local com base no Método Diamante de Porter (1993), pode-se afirmar

que a IPVUG deve ser considerada um APL pela visão do Método Diamante, pois gerencia os

determinantes da competitividade colaborativamente, além de estarem sujeitos enquanto

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coletividade ao acaso e as ações do governo. Inclusive, confirma-se a classificação dos Vales

como um APL com base nas conclusões de Vieira et al (2013), quando estes afirmam que a IP

gerará um ciclo de agentes interligados e interdependentes que propiciarão benefícios à

coletividade.

Resumidamente, com a conquista da IG, os vitivinicultores dos Vales se uniram

para a conquista de resultados para todos. Os participantes da IPVUG, segundo os

entrevistados, tem alcançado um aumento de 20% no faturamento médio do vinho e 30% na

espumante, configurando-se em sucesso do APL.

Sugere-se a continuidade da pesquisa para aprofundamento do modelo diamante

com a análise aprofundada das estratégias de crescimento da marca no mercado.

Referências

BALESTRINI, A.; VARGAS, L.M.; FAYARD, P. Criação de conhecimento nas redes de

cooperação interorganizacional. Revista de Administração de Empresas, v. 45, n.3, 2005.

CASAROTO FILHO, N.; PIRES, L. H. Redes de pequenas e médias empresas e do

desenvolvimento local: Estratégias para a conquista da competitividade global com base na

experiência italiana. São Paulo: Atlas, 1999.

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University of Chicago Press, 1937.

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between the terms. Espacios. Vol. 34 (7) 2013.

FREIRE, P.S. Compartilhamento do conhecimento interorganizacional: causas essenciais

dos problemas de integração em fusões e aquisições (F&A). [Dissertação] Programa de Pós

Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da Universidade Federal de Santa

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