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I UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE QUÍMICA DE SÃO CARLOS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO UTILIZAÇÃO DE CROMATOGRAFIA EM FASE GASOSA PARA A DETERMINAÇÃO DE ANTIOXIDANTES SINTÉTICOS EM BIODIESEL: UMA ABORDAGEM METROLÓGICA WALDEMAR PACHECO DE OLIVEIRA FILHO Tese apresentada como requisito parcial à obtenção do título de Doutor. Programa de Pós-Graduação em Química Analítica e Inorgânica, Laboratório de Química Ambiental, Instituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo. Orientadora: Profa. Dra. Maria Olímpia de Oliveira Rezende SÃO CARLOS 2013 Exemplar revisado O exemplar original encontra-se em acervo reservado na Biblioteca do IQSC-USP

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Biodiesel

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  • I

    UNIVERSIDADE DE SO PAULO INSTITUTO DE QUMICA DE SO CARLOS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO

    UTILIZAO DE CROMATOGRAFIA EM FASE GASOSA PARA A DETERMINAO DE ANTIOXIDANTES SINTTICOS EM

    BIODIESEL: UMA ABORDAGEM METROLGICA

    WALDEMAR PACHECO DE OLIVEIRA FILHO

    Tese apresentada como requisito parcial obteno do ttulo de Doutor. Programa de Ps-Graduao em Qumica Analtica e Inorgnica, Laboratrio de Qumica Ambiental, Instituto de Qumica de So Carlos, Universidade de So Paulo.

    Orientadora: Profa. Dra. Maria Olmpia de Oliveira Rezende

    SO CARLOS 2013

    Exemplar revisado

    O exemplar original encontra-se em acervo reservado na Biblioteca do IQSC-USP

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    Ao Senhor, por ter tornado possvel a concluso deste trabalho.

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    Agradecimentos

    Danielle, pelo amor e convvio dirio, e por fazer parte de minha vida junto com o Joo Felipe.

    Dra. Maria Olmpia de Oliveira Rezende, pela amizade, compreenso, orientao presente e segura.

    Ao Dr. Fbio da Silva Vinhado, pelo auxlio em vrias etapas deste trabalho.

    Aos Drs. Marcos Roberto Monteiro e Igor Renato Bertoni Olivares, pela contribuio efetiva e dissipao de dvidas decorrentes durante o trabalho.

    Mrcia Valria de Souza Alves, Marcela Ganem Flores, Maria do Socorro Maia Quintino e Vinicius Leandro Skrobot, pelo apoio fundamental para o desenvolvimento deste trabalho.

    Aos colegas do Centro de Pesquisas e Anlises Tecnolgicas da Agncia Nacional do Petrleo, Gs Natural e Biocombustveis, pela amizade e pelo excelente convvio.

    Aos colegas do Laboratrio de Qumica Ambiental do Instituto de Qumica de So Carlos, da Universidade de So Paulo, pela ajuda e pelo companheirismo.

    Ao meu pai, me e irm, pelo incentivo e ajuda em momentos difceis.

    Dilza Peixoto Batista Paiter, pelo amor e pelas oraes.

    Aos membros da Igreja Crist Maranata do Lago Norte-DF, pelas oraes e pelos momentos de alegria.

    ANP e ao IQSC-USP, pelo suporte operacional e financeiro.

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    RESUMO

    O biodiesel um combustvel renovvel composto por steres alqulicos obtidos a partir de leos vegetais e/ou gorduras animais. um produto que devido a sua composio, susceptvel a reaes de oxidao, comprometendo assim sua qualidade e a adequao ao uso. Como preveno de problemas decorrentes de sua oxidao, e tambm para adequao do produto aos requisitos de qualidade, produtores de biodiesel tm utilizado rotineiramente antioxidantes sintticos em seus processos de obteno de biodiesel. Estudos recentes tm apontado o TBHQ (tert-butil hidroquinona) como antioxidante sinttico de melhor desempenho para biodiesel, mas alm deste antioxidante, produtores nacionais tm adotado tambm o BHT (butil hidroxitolueno). Entretanto, ainda no h mtodo analtico difundido entre os agentes econmicos envolvidos com a cadeia do biodiesel para a quantificao dos antioxidantes sintticos para produtos finalizados. Esta determinao, em princpio, pode ser uma ferramenta importante em estudos que confrontam a oxidao do biodiesel com a concentrao de determinado antioxidante que tenha sido adicionado quando da sua produo, ao longo de perodos de armazenamento; tambm em estudos que avaliem possveis impactos ambientais causados pela utilizao desses produtos, que apresentam toxicidade comprovada e possuem teores controlados pelo Ministrio da Sade para a indstria alimentcia. Dentre as tcnicas analticas utilizadas no desenvolvimento de mtodos para quantificao dos antioxidantes sintticos, destacam-se a voltametria (especificamente para TBHQ) e cromatografia lquida, mas ainda sem apresentarem um potencial de uso em larga escala pelos agentes de mercado. Neste trabalho, foi utilizada cromatografia em fase gasosa para o desenvolvimento de um novo mtodo para a quantificao de TBHQ e BHT usados pelos produtores de biodiesel. Inicialmente, foram feitos testes com os antioxidantes fornecidos por um produtor, para verificao de seu uso como padres de calibrao, por meio de cromatografia gasosa com deteco por espectrmetro de massas. Em seguida, realizou-se o desenvolvimento do mtodo propriamente dito, por cromatografia gasosa com detector de ionizao por chama. O mtodo ento foi otimizado, verificando-se possveis limitaes em relao s amostras analisadas, e ento validado, conforme parmetros previstos em protocolos internacionais. Na validao foram empregados mtodos estatsticos pertinentes ao mtodo desenvolvido, e os resultados de validao foram criticamente analisados segundo critrios de aceitao previamente estabelecidos. Destaque para valores de recuperao que oscilaram entre 92% e 106%. Foi tambm estimada a incerteza de medio, ao longo da faixa de trabalho, utilizando conceitos apresentados em guias internacionais de estimativa de incerteza de medio. Foi verificado que o modelo de regresso linear escolhido pode ter impacto direto nos valores de incerteza de medio, que oscilaram entre 1% e 40% dependendo da regio da faixa de trabalho. O mtodo ento foi testado quanto sua aplicabilidade, em amostras comerciais, e relacionando-se os resultados obtidos com os valores de estabilidade oxidao dessas amostras. Aqui, o TBHQ tambm apresentou o melhor desempenho para adequao do biodiesel s especificaes de qualidade, confirmando os dados disponveis na literatura.

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    ABSTRACT

    Biodiesel is a renewable fuel composed by alkyl esters generated from vegetable oils and/or animal fats. Its a susceptible product to oxidation reactions because its composition, thus compromising their quality and use. Currently, biodiesel manufacturers have used synthetic antioxidants in production processes, as prevention to oxidation problems, also as product adjustment to quality requirements. Recent studies have indicated TBHQ (tert-butyl hydroquinone) as the synthetic antioxidant with the best performance for biodiesel, but beyond this antioxidant, national manufacturers have also adopted the BHT (butylated hydroxytoluene). However, there is not a currently analytical method widespread among the economic agents involved in the chain of biodiesel for the quantification of synthetic antioxidants to finished products. At first, this determination can be an important tool to make advance to studies which check the relationship between biodiesel oxidation and the used antioxidant concentration, added in biodiesel production, at long biodiesel storage times. This determination, in principle, can be an important tool in studies which compare the oxidation of biodiesel with the concentration of a particular antioxidant which has been added at the time of its production, over periods of storage, also in studies to assess possible environmental impacts the use of these products, which have proven toxicity levels and possess controlled by the Ministry of Health for the food industry. Among the analytical techniques used in the development of methods for quantification of synthetic antioxidants, stand out voltammetry (specifically for TBHQ) and liquid chromatography, but still without presenting a potential for widespread use by the market agents. In this work, the gas chromatography was used as a new method development for TBHQ and BHT antioxidants (available in biodiesel manufacturers) determination. Initially, tests with antioxidants provided from a manufacturer were carried out, to verify their using as calibration standards conditions, performed by gas chromatography with mass spectrometer detector. Then, there was the development of the method itself, by gas chromatography with flame ionization detector. Then the method was optimized, verifying possible limitations on samples, and validated according to international protocols parameters provided. In this validation, statistical methods compatible to developed method were applied, and the validation results were critically analyzed according to previously established acceptance criteria. Recovery data between 92% and 106% are detached. In addition, the measurement uncertainty was estimated, using presented concepts in according with international guides of measurement uncertainty calculation. The impact of the adopted linear regression model in measurement uncertainty values was verified, as been a notable influence. These values stayed between 1% and 40%, depending of the test method work range. Finally, the new method was verified about its applicability, being carried out for commercial samples, and checking their obtained results and Oxidation Stability values relationship. Here, TBHQ also presented the best antioxidant performance for biodiesel suitability to quality requirements, in agreement with available data in literature.

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    SUMRIO

    LISTA DE ABREVIATURAS X LISTA DE TABELAS XII LISTA DE QUADROS XIV LISTA DE FIGURAS XV 1. Introduo 1 2. Objetivos do Trabalho 2 3. Reviso Bibliogrfica 3 3.1 O biodiesel 3 3.1.1 Produo 3 3.1.2 Controle de qualidade do biodiesel 9 3.1.3 Histrico do biodiesel no Brasil 16 3.1.4 O processo de oxidao do biodiesel 24 3.2 Antioxidantes 29 3.2.1 Uso de antioxidantes em biodiesel 29 3.2.2 Metodologias desenvolvidas para determinao de antioxidantes sintticos em biodiesel 34 3.3 Cromatografia em Fase Gasosa 39 3.3.1 Generalidades 39 3.3.2 Instrumentao 41 3.3.3 Mtodos de derivatizao 46 3.3.4 Cromatografia Gasosa e o biodiesel 47 3.4 Validao de mtodos 49 3.4.1 Metrologia e Validao 49 3.4.2 Incerteza de Medio 54 4. Experimental 57 4.1 Material 58 4.1.1 Reagentes e solventes 58 4.1.2 Solues 58 4.1.2.1 Solues estoque de antioxidantes sintticos 58 4.1.2.2 Solues de calibrao preparadas a partir das solues estoque 59 4.1.2.3 Preparo de solues de amostras 60

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    4.1.3 Vidrarias e instrumentos volumtricos 60 4.1.3.1 Vidrarias 60 4.1.3.2 Instrumentos volumtricos 61 4.1.4 Balana 61 4.1.5 Instrumentao analtica 61 4.1.5.1 Aparelhagem utilizada nos experimentos de caracterizao dos antioxidantes sintticos 61 4.1.5.2 Aparelhagem utilizada nas demais etapas experimentais 62 4.2 Metodologia 62 4.2.1 Caracterizao dos antioxidantes sintticos 62 4.2.2 Desenvolvimento do mtodo proposto 64 4.2.3 Otimizao do mtodo 69 4.2.4 Validao do mtodo 69 4.2.5 Incerteza de medio 72 4.2.6 Aplicabilidade do mtodo 74 5. Resultados e Discusso 75 5.1 Caracterizao dos antioxidantes sintticos 75 5.2 Desenvolvimento do mtodo proposto 79 5.3 Otimizao do mtodo 81 5.4 Validao do mtodo 85 5.4.1 Exatido 85 5.4.2 Preciso 85 5.4.3 Fidelidade Repetibilidade de reas 85 5.4.4 Fidelidade Repetibilidade de tempos de reteno 85 5.4.5 Linearidade 87 5.4.6 Limite de Deteco 96 5.4.7 Limite de Quantificao 101 5.4.8 Sensibilidade 103 5.4.9 Seletividade 103 5.4.10 Estabilidade 103 5.4.11 Intervalo de aplicao 105 5.5 Incerteza de medio 105 5.6 Aplicabilidade do mtodo 128 6. Concluso 134

  • IX

    7. Referncias Bibliogrficas 137 ANEXO 1 Trabalhos publicados 145 ANEXO 2 Equaes Complementares utilizadas nas regresses lineares 151 ANEXO 3 Equaes utilizadas nos testes estatsticos para definio do mtodo de regresso 153 ANEXO 4 Parmetros de qualidade para algumas amostras comerciais de biodiesel utilizadas neste trabalho 157

  • X

    LISTA DE ABREVIATURAS

    A/D ANALGICO / DIGITAL ABNT ASSOCIAO BRASILEIRA DE NORMAS TCNICAS ANP AGNCIA NACIONAL DO PETRLEO, GS NATURAL E BIOCOMBUSTVEIS AOM ACCELARATED OXIDATION METHOD ASTM AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS B100 BIODIESEL B20 MISTURA CONSTITUDA DE 20% DE BIODIESEL EM LEO DIESEL FSSIL B6 MISTURA CONSTITUDA DE 6% DE BIODIESEL EM LEO DIESEL FSSIL BHA BUTIL HIDROXIANISOL BHT BUTIL HIDROXITOLUENO CEIB COMISSO EXECUTIVA INTERMINISTERIAL DE BIODIESEL CG CROMATOGRAFIA GASOSA CGL CROMATOGRAFIA GS-LQUIDO CGS CROMATOGRAFIA GS-SLIDO CITAC COOPERATION ON INTERNATIONAL TRACEABILITY IN ANALYTICAL CHEMISTRY CLAE CROMATOGRAFIA LQUIDA DE ALTA EFICINCIA CLC CURVA LIMITE DE CONFIANA CLP CURVA LIMITE DE PREVISO CTAB CETYLTRIMETHYLAMMONIUM BROMIDE CV COEFICIENTE DE VARIAO D/A DIGITAL / ANALGICO DIC DETECTOR DE IONIZAO POR CHAMA EM ESPECTROMETRIA DE MASSAS EN EUROPENNE NORME EUA ESTADOS UNIDOS DA AMRICA GC GAS CHROMATOGRAPHY GUM GUIDE OF UNCERTAINTY MEASUREMENT HT HIGH TEMPERATURE

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    IA NDICE DE ACIDEZ IEC INTERNATIONAL ELECTROTECHNICAL COMMISSION IEO INDUCED ELECTRON OXIDATION IP NDICE DE PERXIDOS ISO INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION LCI LIMITE DE CONFIANA INFERIOR LCS LIMITE DE CONFIANA SUPERIOR LD LIMITE DE DETECO LII LMPIDO E ISENTO DE IMPUREZAS LP LIMITE DE PREVISO LPI LIMITE DE PREVISO INFERIOR LPS LIMITE DE PREVISO SUPERIOR LQ LIMITE DE QUANTIFICAO MME MINISTRIO DE MINAS E ENERGIA MMQO MTODO DOS MNIMOS QUADRADOS ORDINRIO MMQP MTODO DOS MNIMOS QUADRADOS PONDERADO MS MASS SPECTROMETRY MSTFA N-N-TRIMETILSILILTRIFLUOROACETAMIDA NBR NORMA BRASILEIRA NIST NATIONAL INSTITUTE OF STANDARDS AND TECHNOLOGY P-DSC CALORIMETRIA DIFERENCIALDE VARREDURA SOB PRESSO PFC PONTO DE FULGOR CALCULADO PG PROPIL GALATO PNPB PROGRAMA NACIONAL DE PRODUO DE BIODIESEL RBC REDE BRASILEIRA DE CALIBRAO RCLA REATORES CONTNUOS DE LEITO AGITADO RELACRE ASSOCIAO DE LABORATRIOS ACREDITADOS DE PORTUGAL RSSOT RAPID SMALL SCALE OXIDATION TEST S10 LEO DIESEL COM TEOR MXIMO DE ENXOFRE DE 10 mg/kg TBHQ TERT-BUTIL HIDROQUINONA TMS TRIMETILSILIL UV ULTRAVIOLETA VVC VALOR VERDADEIRO CONVENCIONAL

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    LISTA DE TABELAS

    1. Composio percentual em cidos graxos para algumas matrias-primas 9 2. Parmetros de qualidade para o biodiesel 10 3. Especificaes do biodiesel 15 4. Mtodos de cromatografia gasosa em anlises de biodiesel 48 5. Parmetros gerais para validao de mtodos 52 6. Reagentes e solventes 58 7. Solues estoque de antioxidantes sintticos 59 8. Solues de calibrao 59 9. Preparo de solues para leitura de amostras 60 10. Condies de operao CG-EM 63 11. Condies de operao 66 12. Protocolo de validao 72 13. Teor de gua nas amostras utilizadas inicialmente no desenvolvimento da metodologia

    83 14. Teor de gua para o novo conjunto de amostras 84 15. Resultados da validao 86 16. Teste Jacknife para TBHQ 89 17. Teste Jacknife para BHT 90 18. Teste Ryan-Joiner para TBHQ 91 19. Teste Ryan-Joiner para BHT 91 20. Teste de Durbin-Watson para TBHQ 92 21. Teste de Durbin-Watson para BHT 92 22. Teste de Brown-Forsythe para BHT 94 23. Limites de deteco e quantificao 101 24. Quantificao de amostras com concentrao prxima ao LD e ao LQ 102 25. Recuperaes para concentraes prximas ao LQ 102 26. Comparao dos coeficientes angulares 103 27. Estimativa da Estabilidade 104 28. Repetibilidade do preenchimento do balo volumtrico 113

  • XIII

    29. Repetibilidade de volume da micropipeta 118 30. Ensaio de repetibilidade 123 31. Resultados de Concentrao e de Estabilidade Oxidao 129 32. Resultados 131

  • XIV

    LISTA DE QUADROS

    1. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza das massas 111 2. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza do volume do balo para soluo estoque 112 3. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza da Concentrao da soluo estoque 116 4. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza do Volume pipetado de soluo estoque 117 5. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza da massa do padro 1 120 6. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza combinada dos padres 121 7. Determinao de antioxidantes em biodiesel incerteza final 122

  • XV

    LISTA DE FIGURAS

    1. Reao de Transesterificao 3 2. Grfico quantitativo de converso em uma reao progressiva de transesterificao 4 3. Fluxograma esquemtico de processo empregado para a produo de biodiesel 6 4. Mapa evidenciando a estratgia do governo de explorar o potencial de matria-prima para produo do biodiesel por regio 18 5. Cadeia de produo e distribuio de biodiesel no Brasil 19 6. Evoluo da produo de biodiesel no Brasil 20 7. Infraestrutura da produo de Biodiesel no Brasil - 2011 20 8. Evoluo das matrias-primas utilizadas para a produo de biodiesel 21 9. Planta de usina produtora de biodiesel 21 10. Ricinoleato de metila, constituinte majoritrio do biodiesel de mamona 24 11. Equipamento Rancimat 27 12. Grfico obtido no ensaio Rancimat de uma amostra de biodiesel 28 13. Alguns antioxidantes sintticos 29 14. Espectro obtido em estudo por espectrofotometria UV-Visvel 32 15. Curvas de nvel utilizadas para demonstrar graficamente a eficincia do TBHQ 32 16. Cromatograma ilustrado em Tagliabue et al 34 17. Reao de oxidao de hidroquinona para quinona 35 18. Voltamogramas cclicos evidenciando que o uso de surfactante melhora o sinal eletroqumico para determinao 35 19. Voltamogramas evidenciando que o CTAB o surfactante que melhor potencializa o sinal de oxidao do TBHQ 36 20. Voltamogramas, para adio-padro na quantificao de TBHQ em biodiesel 36 21. Voltamograma com potencial selecionado para aplicar a quantificao 37 22. Cromatogramas obtidos por cromatografia em fase gasosa em

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    mtodo para aplicao em leos vegetais 38 23. Cromatograma tpico obtido por separao dos componentes A e B por Cromatografia em Fase Gasosa 40 24. Componentes bsicos de um sistema cromatogrfico 42 25. Esquema bsico de um detector de ionizao por chama 45 26. Diagrama de Ishikawa utilizado na estimativa de incerteza da Determinao do Ponto de Fulgor Calculado para biodiesel 56 27. Reao geral de silanizao do TBHQ com MSTFA 65 28. Esquema-resumo da metodologia proposta 68 29. Cromatograma de corrente inica total obtido no experimento CG-EM para TBHQ comercial 75 30. Cromatograma de corrente inica total obtido no experimento CG-EM para TBHQ comercial 76 31. Espectro de massas para pico em 9,34 minutos no cromatograma da Figura 29 76 32. Espectro de massas para pico em 6,29 minutos no cromatograma da Figura 29 77 33. Espectro de massas para pico em 9,64 minutos no cromatograma da Figura 30 77 34. Espectro de massas para pico em 8,4 minutos no cromatograma da Figura 30 77 35. Espectro de massas para pico em 6,86 minutos no cromatograma da Figura 30 78 36. Espectro de massas para pico em 8,93 minutos no cromatograma da Figura 30 78 37. Cromatograma obtido para amostra de biodiesel livre de antioxidantes 79 38. Cromatograma obtido para amostra de biodiesel fortificada com TBHQ 80 39. Cromatograma obtido para amostra de biodiesel fortificada com BHT 80 40. Regio de cromatograma com destaque para o pico correspondente antioxidante TBHQ, para amostra de biodiesel com 982 mg/kg de teor de gua e 509 mg/kg de gua 84

  • XVII

    41. Grfico de resduos obtido para TBHQ 88 42. Grfico de resduos obtido para BHT 89 43. Grfico de Durbin-Watson para TBHQ 93 44. Grfico de Durbin-Watson para BHT 93 45. Curva analtica obtida por MMQP para TBHQ 95 46. Curva analtica obtida por MMQO para BHT 96 47. Utilizao do mtodo do cruzamento das curvas de previso e analtica, para a obteno dos limites de deteco e quantificao 97 48. Relao entre os desvios-padro das reas e a massa de antioxidante para TBHQ 100 49. Estimativa da estabilidade 104 50. Diagrama de Ishikawa para a metodologia proposta 106 51. Relao entre a incerteza expandida e a concentrao de antioxidante 125 52. Regresso de quarto grau entre a incerteza expandida e o valor da concentrao de antioxidante TBHQ 126 53. Regresso de segundo grau entre a incerteza expandida e o valor da concentrao de antioxidante BHT nas amostras utilizadas para verificao da aplicabilidade do mtodo 127 54. Concentrao encontrada de TBHQ em amostras comerciais e suas respectivas Estabilidades Oxidao 130 55. Concentrao encontrada de BHT em amostras comerciais e suas respectivas Estabilidades Oxidao 130 56. Cromatogramas na regio do pico de TBHQ de amostras Quantificadas 133 57. Cromatogramas na regio do pico de BHT de amostras Quantificadas 133

  • 1

    1. INTRODUO

    O biodiesel um biocombustvel produzido a partir de leos vegetais e/ou gorduras animais. Sendo assim, existe um grande conjunto de matrias-primas que possibilitam a produo de biodiesel. Estas matrias-primas incluem leos como de soja, caroo de algodo, palma, amendoim, colza/canola, girassol, aafro, coco, dentre outros, alm de gorduras (usualmente sebo bovino), bem como leos de descarte, como leos usados em frituras1. Por se tratar, em sua composio majoritria, de alquil steres de cidos graxos, o biodiesel susceptvel oxidao quando exposto ao ar, e os produtos dessa oxidao, em ltima anlise, afetam a qualidade do combustvel. Em funo disso, a estabilidade (ou resistncia, nesse caso) oxidao tem sido objeto de vrias pesquisas2-11. Um parmetro nas especificaes de qualidade12-15 para a estabilidade oxidao foi includo, e o mtodo utilizado para avaliar a estabilidade oxidao emprega o equipamento Rancimat16. Para garantir que o biodiesel produzido atenda aos requisitos definidos nessas especificaes de qualidade, comumente nos processos de produo so usados antioxidantes sintticos11. Ocorre, porm, que aps a sua comercializao por parte da usina produtora, ou seja, aps a sua certificao de qualidade, o biodiesel pode ficar armazenado por meses at ser misturado ao leo diesel de origem fssil, na proporo estabelecida por legislao vigente17-18. Durante esse perodo de armazenamento, dependendo das condies de exposio ao ar e calor, pode haver comprometimento da qualidade do combustvel no que diz respeito sua oxidao. Considerando que cerca de 80 % do biodiesel nacional proveniente de leo de soja17, que uma matria-prima que gera um biodiesel ainda mais vulnervel quanto oxidao, e que os compostos antioxidantes sintticos possuem certa toxicidade19, de grande utilidade a disponibilidade de metodologias analticas confiveis que determinem teores de antioxidantes sintticos aps a produo de biodiesel. Com essas metodologias, pode-se facilmente avaliar a

  • 2

    concentrao de antioxidante sinttico em funo do tempo de armazenamento do produto, por exemplo. Os laboratrios que so responsveis por certificao de biodiesel no Brasil devem cumprir uma srie de exigncias acerca da qualidade de seus resultados de ensaio20. Tais exigncias seguem como referncias diretivas internacionais baseadas em normas de qualidade para laboratrios de ensaio e calibrao21. Dentro dessas diretivas, est a devida validao de mtodos, que ao serem propostos devem cumprir etapas especficas para serem validados. Assim sendo, a proposio de um mtodo analtico para determinao de antioxidantes sintticos em biodiesel, como qualquer outro mtodo a ser utilizado em laboratrios de certificao, deve ser devidamente validado.

    2. OBJETIVOS DO TRABALHO

    Este trabalho tem como objetivo principal propor um mtodo de determinao dos dois antioxidantes sintticos mais utilizados na indstria de biodiesel no Brasil - o TBHQ (tert-butil hidroquinona) e o BHT (butil hidroxitolueno) - e a validao intralaboratorial desse mtodo, dando um enfoque metrolgico ao trabalho. Dentro desse objetivo principal, so propostas as seguintes etapas:

    1) Desenvolvimento de uma metodologia para identificao e quantificao dos antioxidantes sintticos de interesse, utilizando cromatografia em fase gasosa com deteco de ionizao por chama, verificando condies que permitam um desempenho satisfatrio;

    2) Aplicao da metodologia considerando o biodiesel comercializado no pas e as condies tcnicas das usinas produtoras e dos laboratrios de certificao de biodiesel;

    3) Devida validao da metodologia, seguindo linhas gerais de protocolo de validao aceitas internacionalmente, incluindo estimativa de incerteza de medio adequada.

  • 3. REVISO BIBLIOGRFICA

    3.1 O biodiesel

    3.1.1 Produo

    O biodiesel composto de alquil steres de cidos graxos, e sua obteno resultado de uma reao qumica denominada transesterificao. Nesta reao, leos vegetais ecatalisador (usualmente uma base) com um lcool (usualmente metanol) para produzir os alquil steres correspondentes (para o casometlicos) da mistura de cidos graxos que encontrada no leo vegetal ou na gordura animal de origem. A

    Figura 1 Reao de transesterificao. RO lcool empregado para a produo de biodiesel geralmente o metanol (R[Retirado de GERIS, R; DOS SANTOS, AC; AMARAL, BA; MAIA, IS; CASTRO, VD; CARVALHO, JRM. Qumica Nova 30,5, 1369-1373 (2007

    Diacilgliceris e durante a reao de transesterificaoa relao entre converso e tempo de reao para um processo em que dimonoacilgliceris esto representados como intermediAspectos quantitativos desta figura, como a concentrao final dos vrios tipos

    . REVISO BIBLIOGRFICA

    Produo

    O biodiesel composto de alquil steres de cidos graxos, e sua de uma reao qumica denominada transesterificao.

    Nesta reao, leos vegetais e/ou gordura animal reagem na presena de um catalisador (usualmente uma base) com um lcool (usualmente metanol) para produzir os alquil steres correspondentes (para o caso do metanol, os steres metlicos) da mistura de cidos graxos que encontrada no leo vegetal ou na gordura animal de origem. A Figura 1 apresenta a reao de transesterificao.

    Reao de transesterificao. R1, R2 e R3 representam as cadeias de cidos graxos. O lcool empregado para a produo de biodiesel geralmente o metanol (R

    GERIS, R; DOS SANTOS, AC; AMARAL, BA; MAIA, IS; CASTRO, VD; CARVALHO, JRM.

    1373 (2007)22]

    monoacilgliceris so formados como intermedirios durante a reao de transesterificao. A Figura 2 demonstra qualitativamente a relao entre converso e tempo de reao para um processo em que dimonoacilgliceris esto representados como intermedirios de reao. Aspectos quantitativos desta figura, como a concentrao final dos vrios tipos

    3

    O biodiesel composto de alquil steres de cidos graxos, e sua de uma reao qumica denominada transesterificao.

    gordura animal reagem na presena de um catalisador (usualmente uma base) com um lcool (usualmente metanol) para

    do metanol, os steres metlicos) da mistura de cidos graxos que encontrada no leo vegetal ou na

    igura 1 apresenta a reao de transesterificao.

    s de cidos graxos. O lcool empregado para a produo de biodiesel geralmente o metanol (R4 = CH3)21.

    GERIS, R; DOS SANTOS, AC; AMARAL, BA; MAIA, IS; CASTRO, VD; CARVALHO, JRM.

    monoacilgliceris so formados como intermedirios A Figura 2 demonstra qualitativamente

    a relao entre converso e tempo de reao para um processo em que di- e rios de reao.

    Aspectos quantitativos desta figura, como a concentrao final dos vrios tipos

  • 4

    de glicerdeos e a concentrao mxima que di- e monoacilgliceris podem atingir durante o processo, podem variar consideravelmente de reao para reao, dependendo das condies em que ela realizada. A escala da Figura 2 tambm pode variar se a concentrao (em mol/L) dos componentes empregada em substituio taxa de converso.

    Figura 2 Grfico quantitativo de converso em uma reao progressiva de transesterificao, indicando as concentraes relativas do leo vegetal (triacilgliceris), di- e monoacilgliceris intermedirios, bem como steres metlicos produzidos. Detalhes mais precisos podem variar de reao para reao, conforme mencionado no texto1.

    Vrias revises bibliogrficas relacionadas transesterificao como processo para a produo de biodiesel j foram publicadas na literatura23-27. Da mesma forma, a busca em otimizar a transesterificao tem sido motivo para numerosos artigos cientficos. Geralmente, a transesterificao pode ser realizada por catlise cida ou bsica. No entanto, em catlise homognea,

  • 5

    catalisadores alcalinos (hidrxidos de sdio e de potssio; ou os alcxidos correspondentes) proporcionam processos muito mais rpidos que catalisadores cidos28.

    Em princpio, a transesterificao uma reao reversvel, embora durante a produo de steres alqulicos de leos vegetais, isto , o biodiesel, a reao reversa no ocorra ou seja consideravelmente negligencivel porque o glicerol formado na reao no miscvel no produto, levando a um sistema de duas fases. A cintica de transesterificao do leo de soja com metanol foi definida como de pseudoprimeira ordem ou de segunda ordem29. No entanto, dados cinticos divulgados foram investigados e diferenas importantes foram identificadas. A cintica de reao do metanol com leo de girassol, por exemplo, a uma razo molar metanol: leo de 3:1 foi demonstrada como de segunda ordem no incio da reao, mas a velocidade da reao decresceu medida que o glicerol foi sendo gerado no meio reacional30. Foi demonstrado que a reao imediata (reao em que todas as trs posies do triacilglicerol reagem virtualmente ao mesmo tempo para fornecer trs molculas de steres alqulicos e uma de glicerol) originalmente proposta29 como parte da reao improvvel, que a cintica de segunda ordem no foi seguida, e que o fenmeno de miscibilidade tem uma importncia significativa no processo31. O motivo que o leo vegetal de origem e o metanol so muito miscveis. O fenmeno da miscibilidade resulta em uma fase acelerada na formao dos steres metlicos, como indicado quantitativamente na Figura 2. A formao de glicerol a partir dos triacilgliceris procede por etapas atravs dos di- e monoacilgliceris, com uma molcula do alquil ster de cido graxo sendo formada em cada etapa. A partir da observao de que diacilgliceris atingem sua concentrao mxima anteriormente aos monoacilgliceris, foi deduzido que a ltima etapa, correspondente formao de glicerol a partir dos monoacilgliceris, procedida mais rapidamente do que a formao de glicerol a partir dos diacilgliceris32.

    A qumica descrita fornece os alicerces para a produo industrial de biodiesel. Por outro lado, o processamento e a qualidade do biodiesel esto fortemente relacionados. Os processos utilizados para refinar as matrias-primas e convert-las em biodiesel determinam se o combustvel ir atender s especificaes tcnicas necessrias. A Figura 3 apresenta um diagrama

  • 6

    esquemtico do processo envolvido na produo de biodiesel a partir de matrias-primas contendo um baixo teor de cidos graxos livres. Estas incluem leo de soja, canola (colza) e alguns tipos de leos de fritura oriundos de restaurantes e atividades afins. O lcool, o catalisador e o leo so combinados em um reator e agitados por aproximadamente 1 h a 60 C. Plantas de pequeno porte geralmente utilizam reatores de batelada33, mas a maioria das plantas de grande porte (acima de 4 milhes de litros / ano) utiliza processos de fluxo contnuo envolvendo RCLA (Reatores Contnuos de Leito Agitado) ou reatores de fluxo pistonado (plug flow). A reao muitas vezes efetuada em duas etapas em que aproximadamente 80 % do lcool e do catalisador so adicionados no primeiro estgio RCLA. Depois, o produto derivado deste reator passa por um processo de remoo do glicerol formado na reao, antes de dar entrada no segundo reator RCLA. Os 20 % remanescentes de lcool e catalisador so adicionados nesse segundo reator. Este sistema d condies de se atingir uma reao completa com o potencial de poder empregar menos lcool que os processos realizados em uma nica etapa1.

    Figura 3 Fluxograma esquemtico do processo empregado para a produo de biodiesel1.

  • 7

    Aps a reao, o glicerol quase totalmente removido dos steres metlicos. Devido baixa solubilidade do glicerol na fase ster, esta separao geralmente ocorre com rapidez e pode ser obtida em decantadores ou pelo emprego de uma centrfuga. O excesso de metanol tende a se comportar como solvente e pode diminuir a eficincia da separao. No entanto, este excesso de metanol no geralmente removido do meio, devido possibilidade de reverso da reao de transesterificao. gua tambm pode ser agregada ao meio reacional depois que a transesterificao est completa para melhorar a separao do glicerol33-34.

    Observando a Figura 3, aps a etapa de separao do glicerol, os steres metlicos sofrem uma etapa de neutralizao e passam ento por um seqestrador de metanol, geralmente um processo de separao a vcuo ou um evaporador de filme lquido descendente (falling film), antes mesmo da etapa de lavagem aquosa. O cido adicionado ao produto para neutralizar qualquer catalisador residual e quebrar qualquer quantidade de sabo que tenha se formado durante a reao. Sabes reagiro com o cido para formar sais solveis em gua e cidos graxos livres, de acordo com a seguinte equao:

    R-COONa + HA R-COOH + NaA Sabo de sdio cido cido graxo Sal

    Os sais sero removidos durante a etapa de lavagem aquosa e os cidos graxos livres permanecero no biodiesel. A etapa de lavagem aquosa tem o objetivo de remover qualquer quantidade residual de catalisador, sabes, sais, metanol ou glicerol livre do produto final. A neutralizao antes da lavagem aquosa reduz a quantidade de gua necessria para o processo e minimiza a tendncia formao de emulses, quando a gua de lavagem adicionada ao biodiesel. Aps o processo de lavagem, qualquer gua residual removida do biodiesel por um processo de evaporao a vcuo.

    A fase glicernica que deixa o decantador, geralmente, contm apenas 50 % de glicerol. Esta fase tambm contm algum metanol excedente e a maior parte do catalisador e sabes formados no processo. Nesta forma, o glicerol tem baixo valor de mercado e sua disposio pode ser relativamente

  • 8

    difcil. O seu contedo em metanol o classifica como um efluente txico e perigoso. A primeira etapa no refino do glicerol usualmente orientada adio de cido para quebrar os sabes em cidos graxos livres e sais. Os cidos graxos livres no so solveis no glicerol e vo flotar superfcie da mistura, de onde podem ser removidos e reciclados. Tais cidos podem ser reaproveitados no processo atravs de uma esterificao35. Os sais que permanecem no glicerol podem ento precipitar da soluo, apesar de tal fato depender fortemente da composio qumica do meio. Uma opo freqentemente considerada para o processo a utilizao de hidrxido de potssio como catalisador da reao e cido fosfrico para a etapa de neutralizao, de forma que o sal formado seja o fosfato de potssio, que pode ser utilizado como fertilizante. Aps acidificao e separao dos cidos graxos livres, o metanol presente no glicerol removido por evaporao a vcuo, ou outro tipo de evaporao. Nesta etapa, o glicerol deve apresentar uma pureza de aproximadamente 85 % e pode ser tipicamente vendido para uma unidade de refino. O processo de refino do glicerol eleva a sua pureza a 99,5-99,7 %, empregando processos de destilao a vcuo ou de troca inica1.

    O metanol, que removido dos steres metlicos e do glicerol, apresenta a tendncia de absorver a gua que possa ter sido formada no processo. Esta gua dever ser removida em uma coluna de destilao antes que o metanol possa ser retornado ao processo. Esta etapa mais complicada se o lcool utilizado na reao formar um azetropo com gua, como o etanol ou o isopropanol. Neste caso, uma peneira molecular dever ser utilizada para remover a gua.

    Como mencionado anteriormente, a escolha da matria-prima de grande relevncia para as caractersticas de um biodiesel final. Algumas matrias-primas possuem em sua composio maior presena de cadeias curtas (at 12 tomos de carbono), denominadas luricas, tm como exemplo palmiste (caroo da palma), coco e babau. Outras j possuem composio mais comum, com cadeias carbnicas predominantes com tamanho mdio (entre 14 e 18 tomos de carbono), com insaturaes ou no. A tabela 1 apresenta de forma resumida a composio, em termos de tamanho de cadeias carbnicas, de cidos graxos para as matrias-primas mais utilizadas para a produo de biodiesel.

  • 9

    TABELA 1 COMPOSIO PERCENTUAL EM CIDOS GRAXOS PARA ALGUMAS MATRIAS-PRIMAS*

    leo/ Gordura

    10:0 12:0 14:0 16:0 16:1 18:0 18:1 18:2 18:3

    Soja - 0,1 0,1 6-13 - 2-5 20-30 50-60 5-11 Milho - - 1-2 8-13 - 2-5 19-49 34-64 -

    Algodo - 0,1 0-2 20-29 2 1-4 13-35 40-57 0,6 Canola - - - 4,3 - 1,3 59,9 21,1 13,2

    Sebo (bovino) - 0,1 2,8-8 23-37 6 14-29 37-50 1-5 0,9 Girassol - - - 6-11 - 3-6 16-29 52-74 -

    Palma (polpa) - 0,1 1,0 42,8 - 4,5 30-45 9-26 0,2 Palma (caroo) 7 51 17 8 - 2 13 2 -

    Coco 12 44,6 16,8 8,2 - 3 10 3 - Babau 10 45 17 9 - 3 10 3 -

    (*) C10:0 corresponde a uma cadeia de 10 tomos de carbono sem insaturaes. C18:1 corresponde a uma cadeia de 18 tomos de carbono com uma insaturao.

    Fonte: Associao Brasileira de Engenharia Automotiva

    Como se pode perceber pelos dados da Tabela 1, a variao entre as composies de matrias-primas grande, resultando tambm numa grande diferena de composio entre os tipos de biodiesel que podem ser produzidos. Aqueles que possuem uma composio mais saturada (exemplo da palma e do sebo, ricos em C16:0 e C18:0), tendem a apresentar propriedades benficas estabilidade oxidao, porm problemas de congelamento em temperaturas mais baixas. Aqueles que possuem uma composio mais insaturada (exemplo da soja e da canola, ricas em C18:1 e C18:2), tendem a no terem problemas com baixas temperaturas, mas so mais vulnerveis oxidao. Mais adiante o assunto da oxidao do biodiesel ser tratado com mais detalhes.

    3.1.2 Controle de qualidade do biodiesel

    O principal critrio para a qualidade do biodiesel o atendimento a um padro apropriado. Geralmente, a qualidade do combustvel pode ser influenciada por diversos fatores, incluindo a qualidade da matria-prima, a

  • 10

    composio em cidos graxos do leo vegetal ou gordura animal de origem, o processo produtivo, o emprego de outros materiais no processo e parmetros posteriores produo.

    Quando as especificaes so atendidas, o biodiesel pode ser utilizado na maioria dos motores a diesel modernos, sem neles exigir qualquer modificao, e sem oferecer comprometimento da durabilidade e da confiabilidade do motor. Mesmo quando utilizado em mistura com diesel de petrleo, o biodiesel deve atender s especificaes, independentemente dos teores empregados. Enquanto algumas propriedades das especificaes, como nmero de cetano e densidade, refletem as propriedades das substncias que compem o biodiesel, outras propriedades fornecem uma indicao da qualidade obtida no proecesso de produo, como teor de ster e glicerdeos. A Tabela 2 lista os parmetros de qualidade previstos na especificao brasileira14 e de que forma cada parmetro est relacionado com a qualidade do biodiesel, tomando como base possveis danos ao consumidor, motores e ao meio ambiente quando do no-atendimento s especificaes15,36.

    TABELA 2 PARMETROS DE QUALIDADE PARA O BIODIESEL

    Parmetro Danos ao consumidor e aos motores

    Danos ao Meio Ambiente

    Aspecto

    Indica a uniformidade do combustvel, bem como a

    iseno de impurezas grosseiras geradas no processo produtivo

    ou contaminao e/ou degradao quando estocado por longos perodos. Tais impurezas ou contaminao podem levar ao

    entupimento precoce de filtros.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    formao de depsitos ricos em carbono na cmara

    de combusto e aumento das

    emisses.

    Massa especfica a 20 C

    Valores de densidade divergentes daqueles da

    especificao levam a uma significativa variao na massa de combustvel injetada, o que

    dificulta a obteno de uma mistura ar/combustvel

    balanceada, podendo levar o motor a perder potncia e aumentar o consumo de

    combustvel, em caso de uma mistura rica e formao de depsitos no caso de uma

    mistura pobre.

    Aumento das emisses de gases

    poluentes e particulados no meio

    ambiente.

  • 11

    TABELA 2 PARMETROS DE QUALIDADE PARA O BIODIESEL (continuao)

    Parmetro Danos ao consumidor e aos motores

    Danos ao Meio Ambiente

    Viscosidade Cinemtica a 40 C

    Valores de viscosidade fora da faixa especificada podem levar a

    perda de potncia, alm de serem inadequados aos

    tamanhos e ao tipo dos sistemas de injeo dos motores.

    Aumento das emisses de gases

    poluentes e particulados no meio

    ambiente.

    Teor de gua

    Teores de gua acima do previsto na especificao podem

    causar crescimento microbiolgico durante o

    armazenamento, antes e depois da mistura com leo diesel,

    causando entupimento de filtros, aumento da acidez (por reaes

    de hidrlise) e conseqente corroso s partes do motor.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Contaminao Total

    Indica o potencial do combustvel em formar partculas insolveis, inicialmente invisveis. Valores

    acima da especificao configuram um produto com

    grande tendncia de formao de partculas insolveis, ou presena de sabes e sedimentos, gerando entupimento de filtros.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Ponto de Fulgor

    Essa caracterstica um importante indicativo de

    segurana ao consumidor no que tange ao manuseio,

    armazenamento e transporte.

    No se aplica.

    Teor de ster

    Indica a pureza do biodiesel, acusando presena de outras

    substncias que no so steres alqulicos. Teores acima do

    especificado dessas substncias podem causar aumento da

    acidez do produto, corroso, queimas incompletas e formao de depsitos, causando tambm

    entupimento de filtros.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

  • 12

    TABELA 2 PARMETROS DE QUALIDADE PARA O BIODIESEL (continuao)

    Parmetro Danos ao consumidor e aos motores

    Danos ao Meio Ambiente

    Cinzas Sulfatadas

    Teores de cinzas elevados indicam presena de abrasivos slidos, sabes e catalisadores

    remanescentes. Essas substncias podem promover

    desgaste no sistema de injeo e em outras partes do motor, alm

    de formao de depsitos.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Enxofre Total

    Teores elevados de enxofre no combustvel podem comprometer

    o desempenho do sistema de controle de emisses dos

    motores.

    As emisses ricas em enxofre

    contaminam a atmosfera

    contribuindo com chuvas cidas.

    Sdio + Potssio

    Teores acima da especificao indicam presena de abrasivos slidos, sabes e catalisadores remanescentes do processo de produo. Essas substncias podem promover desgaste no sistema de injeo e em outras

    partes do motor, alm de formao de depsitos.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Clcio + Magnsio

    Teores acima da especificao indicam presena de sabes

    responsveis pelo travamento da bomba de injeo. Tambm

    podem causar os mesmos danos citados para sdio + potssio.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Fsforo Alta concentrao de fsforo

    pode comprometer conversores catalticos usados em sistemas

    de controle de emisses.

    Descontrole dos sistemas de injeo,

    gerando aumento significativo das

    emisses.

  • 13

    TABELA 2 PARMETROS DE QUALIDADE PARA O BIODIESEL (continuao)

    Parmetro Danos ao consumidor e aos motores

    Danos ao Meio Ambiente

    Corrosividade ao cobre

    Indica o potencial do combustvel de corroso quando em contato

    com peas de cobre ou ligas contendo cobre presentes no

    motor. Em caso de valor fora de especificao, o produto ser

    muito cido, gerando desgaste prematuro dos componentes do

    motor, e aumento do consumo de combustvel.

    Mau funcionamento de vrias partes do motor, causando

    aumento significativo das emisses.

    Ponto de entupimento de filtro

    a frio

    Indica o potencial do combustvel em entupir filtros a baixas

    temperaturas. Valores altos podem acarretar em solidificao

    do produto no tanque, comprometendo todo o

    funcionamento do motor.

    No se aplica.

    ndice de acidez

    Determina o nvel de cidos graxos livres presentes no

    biodiesel, formados durante a produo. ndices altos podem

    acarretar em corroso de partes do motor e formao de

    depsitos.

    Mau funcionamento de vrias partes do motor, causando

    aumento significativo das emisses.

    Glicerol livre

    Altos nveis de glicerina livre podem causar formao de

    depsitos no injetor, obstruo do sistema e acmulo de glicerina

    no fundo do tanque.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Glicerol Total, Monoacilgliceris, Diacilgliceris e Triacilgliceris

    Valores acima da especificao indicam que o produto pode

    causar formao de depsitos nos injetores, levar a problemas de operao no motor em dias frios e provocar entupimento de

    filtros.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

  • 14

    TABELA 2 PARMETROS DE QUALIDADE PARA O BIODIESEL (continuao)

    Parmetro Danos ao consumidor e aos motores

    Danos ao Meio Ambiente

    Metanol ou Etanol

    Essa caracterstica est diretamente relacionada ao ponto

    de fulgor, sendo indicativa de segurana no manuseio,

    armazenamento e transporte. O metanol presente no biodiesel

    remanescente da reao de transesterificao.

    O metanol uma substncia

    extremamente txica ao corpo humano.

    Estabilidade Oxidao a 110 C

    Indica o grau de oxidao do produto, bem como sua

    resistncia em oxidar-se. Produtos resultantes da oxidao

    do biodiesel formam vrios polmeros cidos, que, por sua

    vez, causam depsitos no sistema, obstruo e falhas.

    Mau funcionamento dos bicos injetores,

    aumento da formao de depsitos de carbono e,

    conseqente aumento das

    emisses.

    Dentre os parmetros de qualidade citados, pode-se observar que dependendo do pas, h a exigncia de determinado parmetro e em outro, no. Ou at mesmo o parmetro ser exigido em diferentes pases, mas com limites exigidos diferentes. A Tabela 3 apresenta um comparativo entre trs especificaes, a brasileira14, a americana, descrita na norma ASTM (American Society for Testing and Materials) D675115, e europia13. Observando os dados da Tabela 3, verifica-se que a especificao brasileira mais prxima da europia. Isso favorece possveis exportaes do biodiesel nacional. A especificao europia a de referncia mundial, visto que mercados asiticos, africanos e sul-americanos a tm como base para suas especificaes nacionais. Alm disso, o biodiesel possui um maior tempo de uso na Europa, quando comparado aos outros continentes. Porm, a especificao americana tambm relevante, haja vista o forte empenho da ASTM no aperfeioamento contnuo dos mtodos de anlise e nas prprias especificaes, com intuito de satisfazer as necessidades do mercado americano, com suas peculiaridades de clima e logstica. A especificao europia de certa forma limita a obteno de biodiesel de matrias-primas diversificadas, de fato favorecendo a produo a partir de leo de canola.

  • 15

    TABELA 3 ESPECIFICAES DO BIODIESEL Parmetros Brasil E.U.A. Europa

    Aspecto LII* - -

    Massa Especfica a 15 C, kg/m3 - - 860-900

    Massa Especfica a 20 C, kg/m3 850-900 - -

    Viscosidade Cinemtica a 40 C, mm2/s 3,0-6,0 1,9-6,0

    3,5-5,0

    Ponto de Fulgor, C, mn. 100 93 101 gua, mg/kg, mx. 350/200** - 500

    gua e sedimentos, %vol., mx. - 0,05 - Contaminao Total, mg/kg, mx. 24 - 24 Cinzas Sulfatadas, %massa, mx. 0,02 0,02 0,02

    Enxofre, mg/kg, mx. 10 15 10 Corrosividade ao Cobre (3h a 50 C), mx. 1 - 1

    Ponto de Entupimento de filtro a frio, C, mx. Regional - - Nmero de Cetano, mn. Anotar 47 51

    Destilao a presso reduzida, 90 % recuperados, C, mx.

    - 360 -

    Resduo de Carbono dos 10 % destilados, %massa, mx.

    - - 0,3

    Resduo de Carbono, % massa, mx. 0,05 0,05 - ndice de Acidez, mgKOH/g, mx. 0,50 0,50 0,50

    ndice de Iodo, g/100g, mx. Anotar - 120 Metanol e/ou Etanol***, %massa, mx. 0,20 0,20 0,20

    Glicerol livre, %massa, mx. 0,02 0,02 0,02 Glicerol Total, %massa, mx. 0,25 0,24 0,25

    Monoacilglicerol, %massa, mx. 0,80 - 0,80 Diacilglicerol, %massa, mx. 0,20 - 0,20 Triacilglicerol, %massa, mx. 0,20 - 0,20 Sdio + Potssio, mg/kg, mx. 5 5 5

    Clcio + Magnsio, mg/kg, mx. 5 5 5 Fsforo, mg/kg, mx. 10 10 4

  • 16

    TABELA 3 ESPECIFICAES DO BIODIESEL (continuao) Parmetros Brasil E.U.A. Europa

    Estabilidade Oxidao a 110 C, h, mn. 6 3 6 Teor de ster, % massa, mn. 96,5 - 96,5

    ster metlico de cido linolnico, % massa, mx.

    - - 12

    steres metlicos poliinsaturados, % massa, mx.

    - - 1

    (*) Lmpido e Isento de Impurezas. (**) A especificao brasileira atual prev o valor limite para teor de gua de 350 mg/kg at 1 de janeiro de 2014, quando ento o limte ser reduzido para 200 mg/kg14. (***) Apenas a especificao brasileira prev a determinao de Etanol14.

    Isso claramente verificado nos parmetros ndice de Iodo e ster metlico de cido linolnico, onde muitas matrias-primas no disponibilizariam um produto que atendesse a totalidade da especificao. Talvez esse fato aponte para uma poltica de interesses de determinado segmento de agricultores europeus, alm de possvel medida protecionista, pois determinados mercados (asitico e sul-americano, por exemplo) poderiam exportar para a Europa biodiesel a preo competitivo, aproveitando a diversidade de matrias-primas disponveis.

    3.1.3 Histrico do biodiesel no Brasil

    Em 02 de julho de 2003, a Presidncia da Repblica instituiu por meio de Decreto um Grupo de Trabalho Interministerial encarregado de apresentar estudos sobre a viabilidade de utilizao de biodiesel como fonte alternativa de energia. O resultado foi um relatrio que deu embasamento para o estabelecimento do PNPB (Programa Nacional de Produo de Biodiesel) como ao estratgica e prioritria para o Brasil. Tambm por meio de Decreto, o PNPB foi institudo em 23 de dezembro de 2003. A estrutura gestora do Programa ficou definida com a instituio da Comisso Executiva Interministerial, possuindo, como unidade executiva, um Grupo Gestor. Foi aprovado pela CEIB (Comisso Executiva Interministerial de Biodiesel), em 31

  • 17

    de maro de 2004, o plano de trabalho que norteava as aes do PNPB. No decorrer de 2004 as aes desenvolvidas permitiriam cumprir uma etapa fundamental para o PNPB que culminou com o lanamento oficial pela Presidncia da Repblica em 06 de dezembro de 2004. Na oportunidade houve o lanamento do Marco Regulatrio que estabelece as condies legais para a introduo do biodiesel na Matriz Energtica Brasileira de combustveis lquidos37-38.

    O biodiesel foi oficialmente introduzido na matriz energtica do Brasil atravs da Lei n 11.097 de 200537, sendo fixado o percentual mnimo obrigatrio de adio de biodiesel ao leo diesel comercializado ao consumidor final, em qualquer parte do territrio nacional. Nessa lei, foi concedido ainda um prazo de oito anos para a efetiva aplicao desse percentual mnimo. Porm, tal percentual j praticado desde 1 de janeiro de 201018, devido capacidade produtiva do pas j satisfazer o volume necessrio para a prtica do percentual de 5 %. A lei citada tambm atribuiu ANP (Agncia Nacional do Petrleo, Gs Natural e Biocombustveis) a incumbncia de se regular o mercado do biodiesel, assim como de qualquer biocombustvel. A regulao prevista na lei inclui: a implementao da poltica energtica nacional; a fiscalizao das atividades integrantes da indstria do biodiesel; o cumprimento das boas prticas de conservao e uso racional do biodiesel; a autorizao de atividades relacionadas produo, importao, exportao, armazenagem, estocagem, distribuio, revenda e comercializao de biodiesel; a especificao da qualidade e a organizao e manuteno das informaes e dados tcnicos relativos s atividades reguladas38.

    Quando do lanamento do PNPB, as perspectivas eram animadoras devido ao potencial da explorao de matrias-primas que o pas apresentava, observado nos dados levantados at ento. Muito foi especulado da produo de biodiesel a partir de leo de mamona, devido ao potencial de produo que particularmente as regies Norte / Nordeste apresentaram; tais regies tambm poderiam produzir grandes quantidades de Palma e Babau, disponveis para a obteno de biodiesel (regionalizao). Alm disso, eram claros os princpios do Marco Regulatrio que privilegiavam polticas de incluso social, como o selo social, no qual o produtor poderia ter acesso a incentivos fiscais desde que comprovasse que obtinha um percentual mnimo de matria-prima

  • 18

    proveniente de agricultores familiares39, e tambm de facilidades de Financiamentos40. A Figura 4 apresenta um mapa que evidencia a inteno do governo brasileiro, de na poca, explorar ao mximo as caractersticas produtivas de cada regio38. Com o intuito de se estabelecer um controle maior do mercado, a aquisio de biodiesel comeou a ser feita exclusivamente na forma de leiles, promovidos pela ANP41.

    Figura 4 Mapa evidenciando a estratgia inicial do governo de explorar o potencial de matria-prima para produo de biodiesel por regio.

    A Figura 5 apresenta um esquema de como funciona a cadeia do biodiesel no Brasil. Na prtica, o biodiesel produzido de responsabilidade do prprio produtor e este deve garantir que o produto atenda todas as exigncias da especificao (produto certificado). Aps produzido e certificado, o transporte do produto de responsabilidade da adquirente do biodiesel no leilo da ANP. O produto ento armazenado, muitas vezes misturado com

  • 19

    biodiesel de outra procedncia, at ser adicionado ao leo diesel de origem fssil na proporo estabelecida e disponibilizado ao posto revendedor, ou ao grande consumidor (hospitais, centrais eltricas, indstrias ou frotas cativas de transporte). At fins de 2005, havia apenas oito produtores de biodiesel autorizados pela ANP, totalizando uma capacidade de produo nominal de 85.320 m3 por ano42. No fim de 2011, foram registrados sessenta e nove produtores autorizados, totalizando uma capacidade de produo nominal de 6.770.900 m3 por ano. Porm, apenas aproximadamente 40 % dessa capacidade foi de fato produzida em 2011, indicando que existe uma capacidade ociosa de produo por parte das usinas. A Figura 6 apresenta grfico que ilustra a evoluo da capacidade de produo de biodiesel no pas de 2005 a 201343.

    Figura 5 Cadeia de produo e distribuio de biodiesel no Brasil.

    J a Figura 7 apresenta mapa da estrutura da produo de biodiesel no Brasil no fim de 2011. Observa-se que muitas usinas produtoras encontram-se distribudas na regio Centro-Oeste, isso devido ao grane celeiro de produo de soja que a regio apresenta. A localizao dos produtores est relacionada justamente com a facilidade de obteno da matria-prima, e a

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    representatividade dessa matria-prima para a produo de biodiesel. A Figura 8 apresenta grfico que apresenta a evoluo da participao de cada matria-prima na obteno de biodiesel43. Verifica-se que a soja a matria-prima consideravelmente mais representativa do mercado de biodiesel brasileiro, e tambm pode-se notar que a diversidade de matrias-primas prevista no incio do PNPB no foi alcanada.

    Figura 6 Evoluo da capacidade de produo de biodiesel no Brasil.

    Figura 7 Infraestrutura da produo de Biodiesel no Brasil 2011.

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    Figura 8 Evoluo das matrias primas utilizadas para a produo de biodiesel.

    A Figura 9 apresenta foto de uma planta produtora de biodiesel autorizada pela ANP, no municpio de Veranpolis/RS.

    Figura 9 Planta de usina produtora de biodiesel.

    A segunda matria-prima em representatividade, segundo dados do grfico da Figura 8 a gordura animal (no caso, sebo bovino). Tal matria-prima comeou a ganhar destaque em 2008, devido principalmente ao preo, pois o leo de soja considerado uma commodity internacional, e que na segunda metade da ltima dcada apresentou elevaes de preo, o que

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    desfavorece o seu uso na produo de biodiesel. Uma maior participao da gordura animal complexa, devido ao problema do biodiesel gerado pelo sebo, que apresenta cadeias com maior grau de saturao (Tabela 1) e, conseqentemente, problemas de congelamento em temperaturas menores que 15 C44.

    Considerando o que j foi abordado quanto especificao e caractersticas do biodiesel, alguns imprevistos na implantao do PNPB nos ltimos anos foram detectados, apesar do aumento do percentual da mistura com leo diesel (de 0 % a 5 % em aproximadamente quatro anos). Dentre esses imprevistos, destacam-se os seguintes:

    a) Inviabilidade da produo do biodiesel a partir de leo de mamona. Uma das grandes apostas do PNPB, era o uso do leo de mamona, principalmente na Regio Nordeste, onde o solo favorvel para esta cultura por parte de pequenos agricultores. Porm, a composio majoritria deste biodiesel de ster ricinolico, que contm um radical hidroxila em sua cadeia (Figura 10). Esse radical confere uma massa especfica mdia acima de 900 kg/m3 e uma viscosidade mdia acima de 12 cSt, portanto no atendendo as especificaes internacionais (Tabela 3).

    b) Problemas logsticos e de qualidade acerca do biodiesel produzido. Tais problemas, que passam por congelamento de produto obtido a partir de gordura animal nas bases de distribuio, teores de gua acima do especificado gerando proliferao de microrganismos e massas insolveis nos tanques e bombas de abastecimento, levaram os agentes econmicos, juntamente com a ANP, a reverem prticas de manuseio e armazenamento do biodiesel, resultando em uma norma tcnica de boas prticas45 e em uma cartilha por parte da ANP46. Tais problemas tambm foram vivenciados na Europa e nos Estados Unidos47-49.

    c) A insero compulsria do leo diesel de baixo teor de enxofre na matriz energtica nacional. Devido a questes ambientais e de tendncia mundial, o leo diesel brasileiro nos ltimos anos vem sofrendo mudanas rgidas na sua especificao quanto ao teor de enxofre50. Os processos de refino para a obteno do leo diesel que

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    atenda esses novos limites de especificao resultam no chamado leo diesel S10 (teor mximo de enxofre de 10 mg/kg), que possui uma grande sensibilidade ao teor de gua presente no biodiesel, tolerando no mximo um teor de gua de 200 mg/kg51. Isso em tese obriga o mercado de biodiesel a fazer investimentos ainda mais significativos no processo, a fim de produzir um biodiesel com teores de gua ainda mais baixos que aqueles at ento praticados.

    d) A praticamente exclusividade do uso do leo de soja, aliados aos investimentos contnuos necessrios produo do biodiesel com parmetros de qualidade exigentes levaram o biodiesel a ser produzido, em sua maior parte, por grandes empresas exportadoras de produtos oriundos da soja, com grande capacidade de investimento. Tal observao vai de encontro a um dos objetivos iniciais do PNPB, que previa parcela significativa do plantio das matrias-primas sendo realizado por pequenos agricultores, favorecendo projetos de incluso social.

    e) A produo cientfica visando disponibilizao de matrias-primas de fato vantajosas economicamente, e que no tenham utilidade alimentar, tem sido um desafio acadmico, sem de fato em seis anos ter levado a uma contribuio significativa para o mercado. O uso de matrias-primas diferentes da soja e sebo bovino tem esbarrado na competio alimentar (casos de palma e girassol), que apresentam preos mais vantajosos para tal fim que para a indstria do biodiesel, ou no no atendimento s especificaes (casos de pinho e leo de fritura usado), ou mesmo nas baixas produtividades (casos de uma gama de variedade de oleaginosas)52. Esse cenrio no tem permitido o uso de uma grande variedade de matrias-primas, como previsto pelo PNPB inicialmente.

    f) O uso do etanol, que estava previsto como uma das possveis peculiaridades que o mercado brasileiro apresentaria, no foi de fato implementado, devido pouca disponibilizao do produto no mercado e ao preo. Para os produtores, ainda mais vantajosa a importao do metanol que o uso do etanol para a produo de

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    biodiesel. Dos 69 produtores autorizados pela ANP no fim de 2011, apenas 3 (4 %) afirmaram que utilizaram etanol em algum lote43.

    Figura 10 Ricinoleato de metila, constituinte majoritrio do biodiesel de mamona.

    Diante dos problemas expostos, mesmo com o pas contando com uma capacidade nominal de produo que permitiria at o uso obrigatrio de uma mistura com at 12 % de biodiesel no leo diesel de origem fssil, as perspectivas para um aumento do teor da mistura soam como um desafio tcnico para o pas. O cenrio atual tem convergido para o fim dos leiles da ANP, uma vez que o mercado j est estabelecido, e os agentes econmicos tm mostrado capacidade de negociar preos diretamente com os produtores, e estes tm evidenciado competncia tcnica e capacidade de investimentos para garantir o suprimento da demanda de biodiesel com a qualidade requerida. Talvez a mudana de rumos do PNPB, diferentes de alguns traados originalmente, seja apropriada para o momento que o mercado de biodiesel brasileiro se encontra.

    3.1.4 O processo de oxidao do biodiesel

    O biodiesel susceptvel oxidao quando exposto ao ar e o produto de sua oxidao, em ltima anlise, afeta a qualidade do combustvel. Em funo disso, a estabilidade oxidao tem sido objeto de inmeras pesquisas2-11. Um parmetro de especificao para a estabilidade oxidao foi includo nas especificaes europias de biodiesel, EN (Europeenne Norme)14213 e EN 1421412-13. O mtodo utilizado para avaliar a estabilidade oxidao emprega o equipamento Rancimat16. A Figura 11 apresenta fotografia do equipamento correspondente.

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    As razes para a oxidao do biodiesel esto relacionadas presena de ligaes duplas nas cadeias de vrias substncias graxas. A oxidao de substncias graxas insaturadas procede a diferentes velocidades, dependendo do nmero e da posio das ligaes duplas53. As posies CH2- alqulicas, em relao s duplas ligaes presentes nas cadeias dos cidos graxos, so aquelas efetivamente susceptveis oxidao. As posies bis-allicas em cidos graxos poliinsaturados de ocorrncia natural, tais como os cidos linolico (duplas ligaes em 9 e 10, gerando uma posio bis-allica em C-11) e linolnico (duplas ligaes em 9, 12 e 15, gerando duas posies bis-allicas em C-11 e C-14) so ainda mais susceptveis oxidao que as posies meramente allicas. As velocidades relativas de oxidao fornecidas na literatura53 correspondem a 1 para oleatos (steres metlicos e etlicos), 41 para linoleatos, e 98 para linolenatos. Esta uma propriedade essencial, porque a maioria dos diferentes tipos de biodiesel contm quantidades significativas dos steres dos cidos graxos olico, linolico e linolnico que, por sua vez, podem influenciar a estabilidade oxidativa dos combustveis. As espcies formadas durante o processo de oxidao causam a deteriorao eventual do combustvel. Pequenas quantidades de componentes graxos de maior grau de insaturao tm um efeito forte, porm, diferenciado, sobre os resultados de estabilidade oxidao, obtidos por mtodo IEO (Induced Electron Oxidation)10.

    Inicialmente, hidroperxidos so formados durante a oxidao, gerando aldedos, cidos e outros compostos oxigenados como produtos do processo de oxidao em cadeia53. Entretanto, duplas ligaes tambm podem ser orientadas a reaes de polimerizao que levam a produtos de maior massa molar e, eventualmente, a um aumento da viscosidade do combustvel. Dentre tais produtos podem ser formadas espcies insolveis no combustvel, que podero entupir linhas e bombas de combustvel devido ao tamanho das partculas. Um estudo54 demonstrou que os polmeros formados durante o armazenamento do biodiesel sob condies controladas so, devido sua natureza polar, solveis no biodiesel, e insolveis em misturas de biodiesel com leo diesel mineral, por este ltimo ser basicamente constitudo de hidrocarbonetos.

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    A questo da estabilidade oxidao afeta a qualidade do biodiesel principalmente em decorrncia de longos perodos de armazenamento. A influncia de parmetros, como a presena de ar, calor, traos de metais, antioxidantes e perxidos, bem como a natureza do tanque de armazenamento, foram investigadas em vrios estudos6-11. Resumindo as descobertas at ento obtidas, a presena de ar, luz, ou de metais bem como de temperaturas elevadas, facilitam o processo de oxidao. Estudos realizados com mtodos IEO automatizados confirmam o efeito catalisador de metais sobre a oxidao; no entanto, a influncia da estrutura dos steres graxos, especialmente o grau de insaturao, foi ainda mais importante10. Vrios outros mtodos, incluindo alguns de via mida como o ndice de acidez (IA), o ndice de perxidos (IP) este pode ser substitudo pelo ndice de Iodo, que uma medio indireta do grau de insaturao do biodiesel e a P-DSC (calorimetria diferencial de varredura sob presso) tm sido aplicados em estudos de oxidao do biodiesel55-57. Alm do mtodo Rancimat16 (mtodo de referncia) para a determinao da estabilidade oxidativa do biodiesel, foi desenvolvido nos ltimos anos, no mbito da ASTM, um mtodo alternativo, com resultados diretamente proporcionais aos resultados do mtodo de referncia. Trata-se do RSSOT (Rapid Small Scale Oxidation Test)58, que possibilita obter-se o resultado em minutos, no em horas. A prpria especificao americana de biodiesel o considera apenas como alternativo15, e em caso de divergncia, o resultado a ser considerado deve ser aquele obtido pelo mtodo de referncia. Dentre as matrias-primas mais utilizadas para produo de biodiesel, nas quais o parmetro de estabilidade oxidao mais crtico, pode-se citar soja, canola, milho, algodo e girassol com base nos dados da Tabela 1, tomando a composio significativa de cadeias carbnicas insaturadas destas matrias-primas59. Considerando a grande importncia da soja como matria-prima do mercado brasileiro, pode-se concluir que a estabilidade oxidao um parmetro crtico na qualidade do biodiesel brasileiro. Na Europa, onde a principal matria-prima a canola, alm do parmetro de estabilidade oxidao a 110 C, especificado teor de ster linolnico (trs insaturaes na cadeia) e teor de steres poliinsaturados, alm do ndice de Iodo. No Brasil, apenas o parmetro de estabilidade oxidao a 110 C especificado

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    (mnimo de seis horas), considerando diretamente a tendncia do biodiesel em oxidar-se. O ndice de Iodo deve ser apenas reportado, no tendo valor limite especificado (Tabela 3). Nos Estados Unidos, o limite de trs horas mnimas no mtodo Rancimat16 adotado, considerado suficiente em estudos60. A especificao Argentina, no exposta na Tabela 3, adota um mnimo de oito horas no mtodo Rancimat. Cabe ressaltar que o biodiesel produzido na Argentina tem como principal destino a exportao61, logo, aquele pas adota um limite mais rgido para sua especificao, prevendo grandes trajetos no transporte e longos perodos de armazenamento.

    Figura 11 Equipamento Rancimat.

    O mtodo Rancimat baseado na medida de uma clula de condutividade. A amostra submetida a 110 C em um fluxo constante (10 L/h) de insero de ar atmosfrico, logo, uma oxidao forada. Aps certo tempo, dependendo da amostra, cidos leves resultantes da oxidao so liberados pela amostra e carregados pelo ar, sendo borbulhados em uma clula de condutividade com gua ultrapura. A clula de condutividade fica ativa desde o incio do ensaio, e assim que os produtos da oxidao so borbulhados, o aumento de condutividade registrado, obtendo-se um grfico

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    da condutividade pelo tempo. A Figura 12 mostra um exemplo de grfico obtido no ensaio. O ponto de inflexo da curva onde a segunda derivada mxima caracteriza o tempo em que a amostra resistente oxidao, e o resultado final do ensaio, em horas.

    Figura 12 Grfico obtido no ensaio Rancimat de uma amostra de biodiesel. Em verde, a curva condutividade x tempo. Em azul, a segunda derivada da curva. Resultado do ensaio em 10,04 horas.

    A estabilidade oxidao tambm tem sido especificada nos limites americanos para B6-B20 (combustvel composto de mistura de biodiesel com leo diesel fssil em proporo que pode variar de 6 a 20 % de biodiesel)62. Isso porque tem sido comprovado que mesmo em proporo menor na mistura, o biodiesel responsvel pela estabilidade oxidao da mistura, por ser bem menos resistente oxidao que o leo diesel fssil60. Para a medio da Estabilidade Oxidao da mistura B6 a B20, adotado mtodo Rancimat, porm com diferenas ao mtodo original acerca da massa de amostra e do tubo utilizado63.

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    3.2 Antioxidantes

    3.2.1 Uso de antioxidantes em biodiesel

    leos vegetais usualmente contm antioxidantes de ocorrncia natural como os tocoferis. Portanto, leos vegetais no refinados que ainda apresentem seus teores naturais de antioxidantes naturalmente apresentam estabilidade oxidativa superior em comparao com leos refinados2, mas no satisfazem a maioria das outras exigncias para uso combustvel. Antioxidantes naturais foram adicionados tambm ao biodiesel para avaliar os seus respectivos comportamentos sobre a oxidao. Alm destes antioxidantes naturais, tambm existe uma variedade de antioxidantes sintticos. Muitos deles so fenis substitudos como o butil hidroxitolueno (BHT; 2,6-di-tert-butil-4-metilfenol), butil hidroxianisol (BHA; 3-t-butil-4-hidroxianisol), tert-butil hidroquinona (TBHQ; 2-tert-butil-hidroquinona), pirogalol (1,2,3-trihidroxibenzeno) e propil galato (PG; ster proplico do cido 3,4,5-trihidroxibenzico). Alguns esto ilustrados na Figura 13. Estes antioxidantes sintticos tambm foram investigados em relao aos seus efeitos sobre a estabilidade do biodiesel11,64-65.

    Figura 13 Alguns antioxidantes sintticos.

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    A estrutura fenlica desses compostos permite a doao de um prton a um radical livre, regenerando, assim, a molcula do acilglicerol e interrompido o mecanismo de oxidao por radicais livres. Dessa maneira, os derivados fenlicos transformam-se em radicais livres. Entretanto, estes radicais podem se estabilizar sem promover ou propagar reaes de oxidao66.

    Esses antioxidantes so utilizados na indstria alimentcia, em leos e gorduras, para prevenir oxidao lipdica. Esta responsvel pelo desenvolvimento de sabores e odores desagradveis tornando os alimentos imprprios para consumo, alm de tambm provocar outras alteraes que iro afetar no s a qualidade nutricional, devido degradao de vitaminas lipossolveis e de cidos graxos essenciais, mas tambm a integridade e segurana dos alimentos, atravs da formao de compostos potencialmente txicos67-69.

    Estudos toxicolgicos tm demonstrado a possibilidade destes antioxidantes apresentarem efeito carcinognico em experimentos com animais70. Em outros estudos, o BHA mostrou induzir hiperplasia gastrintestinal em roedores por um mecanismo desconhecido; em humanos, a relevncia dessa observao no est clara71. A reduo do nvel de hemoglobina e a hiperplasia de clulas basais foram atribudas ao uso de TBHQ68. Por estes motivos, o uso destes antioxidantes em alimentos limitado; TBHQ no permitido no Canad e na Comunidade Europia19. No Brasil, o uso destes antioxidantes controlado pelo Ministrio da Sade que limita 200 mg/kg para BHA e TBHQ e 100 mg/kg para BHT como concentraes mximas permitidas19.

    Para o atendimento s especificaes (Tabela 3), o leo vegetal utilizado como matria-prima do biodiesel quase sempre refinado. Esse processo retira quase que a totalidade dos antioxidantes naturais do leo. Aliado ao processo de transesterificao, para obteno do biodiesel, praticamente todo o teor de antioxidantes naturais removido, sendo praticamente obrigatria a adio de antioxidantes sintticos, quando o biodiesel obtido a partir de leo de soja, girassol, algodo, canola ou matria-prima com grau de insaturao semelhante72. Quando o biodiesel obtido a partir de matria-prima com menor grau de insaturao (gordura animal, leo de palma), tem-se dispensado o uso de antioxidantes sintticos, visto que costumam atender as especificaes no

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    momento da retirada da usina produtora pelo distribuidor. Porm, no se encontram na literatura estudos sobre o comportamento do biodiesel deste tipo aps longos perodos de armazenamento. Apenas existem estudos que apontam que esse tipo de biodiesel, embora apresente melhor estabilidade, ou seja, maior resistncia oxidao, por outro lado tem apresentado problemas de formao de massas insolveis, devido solidificao em baixas temperaturas e presena de contaminantes saturados, mais especificamente monoacilgliceris saturados73-75.

    Diferentes antioxidantes sintticos tm diferentes efeitos sobre o biodiesel, dependendo do tipo de matria-prima63, sem causar alteraes em propriedades, como viscosidade, ponto de entupimento de filtro a frio, densidade, dentre outros. Em outro estudo, diferentes antioxidantes apresentaram pouco ou nenhum efeito quando investigados pelo mtodo AOM (Accelarated Oxidation Method)6. O TBHQ, particularmente, tem sido apontado por vrios estudos como o de melhor desempenho para biodiesel. Ferrari aponta o TBHQ como de melhor desempenho em biodiesel de girassol, aps avaliao pelo mtodo Rancimat e tambm por absoro espectrofotomtrica de compostos resultantes da oxidao (Figura 14)76. Cavalcanti, tambm pelo mtodo Rancimat, avaliou o desempenho de misturas de antioxidantes, nas quais encontrou o melhor tempo de resistncia oxidao em misturas com maior teor de TBHQ77; Dinkov avaliou vrios parmetros que so alterados quando da oxidao do biodiesel (viscosidade, densidade, acidez, etc.) e o efeito quando da adio dos antioxidantes, contribuindo inclusive para a diminuio de material particulado quando da queima de misturas Bx (leo diesel mineral com x % de biodiesel, em volume)78. Mittelbach tambm acusou o melhor desempenho do TBHQ, comparando-o inclusive com antioxidantes naturais79. Borsato, atravs de estudo fsico-qumico (com auxlio de diagramas de nvel) tambm encontrou o melhor desempenho para TBHQ, comparando-o com BHT e BHA (Figura 15)80. Hess levantou a possibilidade de que o uso de antioxidantes sintticos poderiam vir a diminuir as emisses do tipo NOx, emisses essas que o biodiesel apresenta em maior grau que o leo diesel mineral (apesar que nas emisses de CO2, hidrocarbonetos, material particulado e xidos de enxofre o leo diesel mineral apresente um grau consideravelmente maior que o biodiesel)81.

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    Figura 14 Grfico obtido em estudo por espectrofotometria UV (Ultravioleta) - Visvel que monitorava absortividades molares de compostos resultantes de oxidao de biodiesel de leo de girassol, aps adio de antioxidantes sintticos.

    Figura 15 Curvas de nvel utilizadas para demonstrar graficamente a eficincia do TBHQ para a manuteno da estabilidade do biodiesel em relao ao BHA e ao BHT. O diagrama da esquerda foi obtido aps 7 dias de experimento e o da direita, aps 15 dias.

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    Devido ao grande uso dos antioxidantes sintticos, conseqncia da grande participao da soja para o biodiesel brasileiro43, os estudos de estabilidade em funo de variveis no armazenamento tm aumentado, assim como de desempenho dos antioxidantes sintticos. Sendo assim, de grande utilidade que existam metodologias analticas confiveis que determinem teores de antioxidantes sintticos aps a produo de biodiesel. Com estas metodologias, facilmente pode-se avaliar a concentrao de um determinado antioxidante sinttico em funo do tempo de armazenamento do produto, e no somente monitorando-se produtos de oxidao do biodiesel. possvel tambm relacionar dados de concentraes de antioxidantes em funo da estabilidade do produto em um dado momento; Adicionalmente, torna-se vivel analisar indiretamente a degradao do antioxidante atravs de sua concentrao ao longo do tempo.

    Como mencionado anteriormente, existem nveis mximos tolerados destas substncias para consumo humano, e conseqentemente, o uso por parte de uma indstria no-alimentcia no gera maiores preocupaes acerca do controle desses compostos especificamente. Como exemplo, a indstria de biodiesel utiliza esses produtos com o intuito de adequar o produto especificao, logo, quando o combustvel atende os valores especificados, a concentrao utilizada desses compostos tem uma importncia secundria, e tal fato pode gerar impacto ambiental. Tal impacto vem de uma contaminao do solo, possvel porque vazamentos de produto em pequenas quantidades no so tidos como perigosos, pois trata-se de um biocombustvel. Considerando que a maior parte das usinas produtoras se concentra em reas rurais, de plantio de alimentos, teoricamente pode haver problemas de contaminaes de cultivos, alm de problemas para a fauna. Considerando tambm que as unidades de distribuio de combustvel (onde biodiesel armazenado) so em geral prximas s grandes cidades, contaminao de rede de guas tambm pode ser cogitada.

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    3.2.2 Metodologias desenvolvidas para determinao de antioxidantes sintticos em biodiesel

    Os mtodos para quantificao de antioxidantes sintticos em leos vegetais foram desenvolvidos com o propsito de se monitorar a concentrao com vistas toxicidade elevada desses compostos19. Logo, o primeiro mtodo disponvel na literatura para quantificao dessas substncias em biodiesel tomou por base mtodo usado em leos vegetais82-83, que consiste na utilizao de CLAE-UV (cromatografia lquida de alta eficincia com detector de Ultravioleta). A Figura 16 ilustra cromatogramas obtidos por este mtodo84.

    Figura 16 Cromatograma ilustrado em Tagliabue et al, evidenciando a eficiente separao dos antioxidantes sintticos em biodiesel. (1) Pirogalol; (2) Pirocatecol; (3) Propil galato; (4) TBHQ; (5) BHT; (6) Ascorbil palmitato.

    Como os estudos disponveis tm apontado o TBHQ como aquele antioxidante de melhor desempenho no biodiesel, os mtodos desenvolvidos

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    mais recentemente foram desenvolvidos somente para TBHQ, fazendo-se uso de tcnicas eletroqumicas, aproveitando-se da natureza do TBHQ, que facilmente pode ser oxidado a quinona e por conseqncia gerando um sinal de corrente quando um potencial aplicado (Figura 17). Arajo utilizou voltametria de varredura linear em eletrodo de pasta de carbono, com auxlio de surfactante (Figuras 18 a 20)85.

    Figura 17 Reao de oxidao de hidroquinona para quinona. Com o TBHQ (Figura 13), ocorre reao semelhante quando um potencial aplicado.

    Figura 18 Voltamogramas cclicos evidenciando que o uso de surfactante melhora o sinal eletroqumico para determinao. (a) meio tamponado em pH 6,52; (b) TBHQ na ausncia e (c) na presena de surfactante CTAB (Cetyltrimethyammonium bromide); (d) CTAB sem TBHQ.

    Figura 19 Voltamogramas evidenciando que o CTAB o surfactante que melhor potencializa o sinal de oxidao do TBHQ. (a) meio tamponado em pH 6,52; (b) TBHQ na

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    ausncia e (c) na presena de surfactante; (d) surfactante sem TBHQ. Da esquerda para direita: CTAB, Triton-100 e Lauril.

    Figura 20 Voltamogramas, para adio-padro na quantificao de TBHQ em biodiesel, com o uso de surfactante CTAB. Todos os mtodos eletroqumicos propostos seguem esta ttica de quantificao.

    Tormin props metodologia amperomtrica direta, sem o uso de surfactante, apenas selecionando eletrlito suporte mais cido, usando

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    eletrodo de carbono vtreo no-modificado e amperometria de pulso mltiplo (Figura 21)86.

    Figura 21 Voltamograma com potencial selecionado para aplicar a quantificao.

    Arajo tambm testou o uso de voltametria de onda quadrada, com bons resultados87. Tormin tambm desenvolveu mtodo utilizando amperometria de com anlise de injeo pontual, porm com de deteco simultnea para TBHQ e BHA88. Caramit recentemente tambm desenvolveu mtodo voltamtrico de deteco simultnea de TBHQ e BHA em biodiesel, usando eletrodos de nanotubos de carbono multicamadas modificado89. Todas essas metodologias propostas utilizaram o mtodo CLAE-UV como referncia, e em geral apresentaram valores de recuperao muito prximos, e ligeiramente melhores em alguns casos. Assim sendo, tem-se mostrado que o mtodo que utiliza CLAE-UV, bem similar aos mtodos disponveis para determinao desses compostos em leos vegetais, pode ser satisfatoriamente substitudo por outras tcnicas. As tcnicas eletroqumicas demonstraram ter grande potencial para determinao de TBHQ, porm ainda no foram testadas para outros antioxidantes sintticos, como foi a metodologia por CLAE-UV. Existe mtodo que utiliza cromatografia em fase gasosa com detector de ionizao por chama90, porm foi desenvolvido para aplicao em leos vegetais e

  • 38

    no biodiesel. Nesse mtodo realizada uma extrao seguida de reao de metilao, substituindo os grupos (-OH) por radicais metila. A extrao realizada pelo fato de que constituintes do leo poderiam interferir na reao de metilao dos antioxidantes sintticos. J a reao de metilao (no caso, procedida com hidrxido de tetrametilamnio) foi escolhida pelo autor para a retirada dos grupos (-OH), que podem causar forte interao ente os analitos e a fase estacionria da coluna, comprometendo o formato dos picos no cromatograma e, conseqentemente, a quantificao. A anlise cromatogrfica foi realizada com coluna de fase estacionria polar, e injeo splitless. A Figura 22 ilustra cromatogramas obtidos com tal mtodo90.

    Figura 22 Cromatogramas obtidos por cromatografia em fase gasosa em mtodo para aplicao em leos vegetais. 1 BHA; 2 BHT; 3 TBHQ; 4 N-tetradecanol (solvente dos padres utilizados). Padres puros (A) e aps extrao no leo vegetal e metilao com hidrxido de tretrametilamnio (B).

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    3.3. Cromatografia em Fase Gasosa

    3.3.1 Generalidades

    A Cromatografia Gasosa um procedimento fsico utilizado para separar-se uma amostra em seus componentes individuais. A base para esta separao a distribuio da amostra entre duas fases uma fase estacionria e uma fase gasosa mvel.

    A fase mvel denominada de gs de arraste ou gs portador, uma vez que trata-se de um gs inerte cuja finalidade transportar as molculas a serem separadas, atravs da coluna.

    De acordo com a natureza da fase estacionria, possvel dividir-se, para fins didticos, a cromatografia gasosa em: cromatografia gs-lquido (C.G.L) e cromatografia gs-slido (C.G.S).

    No caso da cromatografia gs-slido, C.G.S., a fase estacionria um slido de grande rea superficial, usualmente um adsorvente como carvo vegetal, slica-gel, ou peneira molecular (zelita sinttica). A adsoro diferencial dos componentes da mistura a ser separada sobre a superfcie slida a base para a separao cromatogrfica na C.G.S. a qual , geralmente, empregada na separao de gases como nitrognio, oxignio, monxido de carbono e outros.

    Na cromatografia gs-lquido, a fase estacionria uma pelcula delgada lquida, a qual recobre um slido inerte denominado suporte. A base para a separao cromatogrfica, neste caso, a distribuio da amostra dentro e fora desta pelcula, ou seja, a partio da amostra entre a fase mvel e a fase lquida estacionria.

    A fase estacionria encontra-se acondicionada, atravs da qual o gs de arraste flui continuamente. As molculas da amostra iro distribuir-se ao equilibrar-se entre o gs de arraste e a fase lquida. As espcies mais solveis na fase lquida permanecero menos tempo no gs de arraste em movimento e, como consequncia, iro deslocar-se mais lentamente atravs da coluna.

  • 40

    Uma fase lquida que apresente solubilidade seletiva para dois dados compostos, estes podero ser separados por cromatografia gs-lquido, devido diferena de solubilidade na fase lquida.

    A figura 23 mostra o cromatograma correspondente separao de dois compostos por C.G.L. O componente A, menos retido, deixa a coluna em tempo inferior ao B (mais retido). Aps a separao, A e B podem ser identificados e/ou quantificados.

    Devido grande diversidade de fases lquidas disponveis, a cromatografia gs-lquido torna-se a mais verstil e seletiva forma de cromatografia em fase gasosa. Isto permite que sejam analisadas amostras slidas, lquidas ou gasosas desde que sejam volteis ou possam vir a ser volatilizadas de diferentes formas.

    Figura 23 Cromatograma tpico obtido por separao dos componentes A e B por Cromatografia em Fase Gasosa.

    Tempo

    Desta forma, prefervel a denominao cromatografia em fase gasosa uma vez que o processo cromatogrfico ocorre em fase gasosa, independente do estado fsico inicial da amostra91.

    A

    B

  • 41

    3.3.2 Instrumentao

    A Figura 24 apresenta os componentes bsicos de um sistema cromatogrfico. A seguir cada um dos componentes descrito.

    Gs de Arraste

    A funo do gs de arraste, ilustrado na Figura 24 no reservatrio de gs, arrastar a amostra atravs da coluna, ou seja, agir como a fase mvel. Deve ser inerte e no pode interagir quimicamente com a amostra. Sua segunda funo prover uma matriz adequada para o detector diferenciar os componentes da amostra91.

    Injetor

    A obteno de picos ideais em cromatografia gasosa altamente dependente da forma de introduzir-se a amostra na coluna (injeo). Quando do uso de colunas capilares, a injeo precisa ser realizada rapidamente e a quantidade de amostra deve ser muito pequena, geralmente, menor que 1 g. em uma coluna capilar tpica de 25 m, h cerca de 10 mg de fase lquida. Isso mostra que se forem injetadas grandes quantidades de amostra, a coluna pode ser entupida, ou ocorrer vazamentos91. Picos provenientes de colunas capilares so muito estreitos, havendo larguras de poucos segundos, por isso, injees rpidas so necessrias, a fim de minimizar o alargamento de banda produzido por uma injeo lenta91.

    Coluna

    A coluna onde, de fato, ocorre o processo cromatogrfico, uma vez que nela que a separao ir ocorrer. A escolha da coluna apropriada para uma dada separao de suma importncia, e muitas vezes, difcil.

  • 42

    Entre os diferentes parmetros a serem considerados quando da escolha da coluna, dois devem ser destacados: a fase estacionria (o suporte slido e a fase lquida) e o tubo onde ser acondicionado (material, dimenses, etc.). Dentre os materiais mais utilizados, destaca-se slica com poliamida, o que permite a obteno de colunas de grande extenso compactadas em um volume pequeno. Colunas capilares de slica fundida so feitas de slica purificada especialmente que contm quantidades mnimas de xidos metlicos. Esses capilares tm paredes mais finas que as antigas colunas equivalentes em vidro. Os tubos ganham resistncia com recobrimentos protetores de poliamidas, que so aplicados conforme os tubos capilares esto sendo produzidos. As colunas resultantes so bastante flexveis e podem ser enroladas como bobinas com dimetros de alguns centmetros. Colunas capilares esto disponveis comercialmente e oferecem vrias vantagens importantes, como resistncia fsica, reatividade muito mais baixa com relao aos componentes da amostra e flexibilidade. Para a maioria das aplicaes, elas substituram as colunas de vidro antigas.

    Figura 24 Componentes bsicos de um sistema cromatogrfico.

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    Forno

    desejvel que a temperatura da coluna seja suficiente para que o tempo de anlise seja curto, porm suficientemente baixa para que a eficincia desejada seja atingida. Em geral, o tempo de reteno duplica a cada 30 C diminuindo na temperatura da coluna (controlada pelo forno).

    Para a grande maioria das amostras, quanto menor a temperatura da coluna, maior ser a razo dos coeficientes de partio na fase estacionrio e, como consequncia, uma melhor separao ser atingida. Deve ser lembrado, entreta