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1 XII Seminário Nacional TCMSP Educação Ambiental Mudança de Cultura Período: 26 a 28 de novembro de 2007 Dia: 26/11/2007 Palestrante: Daniel Fink Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo Tema: Educação Ambiental e Cidadania: o Papel do MP O Sr. Mestre-de-cerimônias – Dando continuidade ao XII Seminário Nacional Tribunal de Contas, trazendo agora nesta parte da tarde uma palestra: Educação Ambiental e Cidadania – o Papel do Ministério Público, com a presença do Doutor Daniel Roberto Fink, Procurador de Justiça, membro eleito do Conselho Superior do Ministério Público para o biênio 2006-2007. É bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, mestre em Saúde Ambiental pela Universidade de São Paulo, diretor do Departamento de Defesa do Consumidor – Procon, promotor de justiça do meio ambiente da capital, coordenador do Centro de Apoio Operacional de Urbanismo e Meio Ambiente, membro titular do Conselho Estadual do Meio Ambiente, professor da disciplina de Direito Ambiental e do Consumidor da Faculdade de Direito do Centro Universitário UniFMU, professor de Direito Ambiental nos cursos de pós-graduação “lato sensu” do Centro Universitário UniFMU, professor da Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, professor da Escola Superior de Advocacia da OAB-SP no curso de Introdução ao Direito Ambiental, professor da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro. Tem diversos trabalhos publicados, dentre os quais citamos apenas alguns, como: “Audiência Pública e Material Ambiental do Direito Brasileiro”, Revista dos Tribunais; “Vegetação

XII Seminário Nacional TCMSP Educação Ambiental ... · papel do Ministério Público, eu acho fundamental que nós ... importância na constituição da sociedade do Estado

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XII Seminário Nacional TCMSP

Educação Ambiental

Mudança de Cultura

Período: 26 a 28 de novembro de 2007

Dia: 26/11/2007

Palestrante: Daniel Fink

Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado

de São Paulo

Tema: Educação Ambiental e Cidadania: o Papel do MP

O Sr. Mestre-de-cerimônias – Dando continuidade ao XII

Seminário Nacional Tribunal de Contas, trazendo agora nesta parte

da tarde uma palestra: Educação Ambiental e Cidadania – o Papel do

Ministério Público, com a presença do Doutor Daniel Roberto Fink,

Procurador de Justiça, membro eleito do Conselho Superior do

Ministério Público para o biênio 2006-2007. É bacharel em Direito

pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, mestre em

Saúde Ambiental pela Universidade de São Paulo, diretor do

Departamento de Defesa do Consumidor – Procon, promotor de justiça

do meio ambiente da capital, coordenador do Centro de Apoio

Operacional de Urbanismo e Meio Ambiente, membro titular do

Conselho Estadual do Meio Ambiente, professor da disciplina de

Direito Ambiental e do Consumidor da Faculdade de Direito do Centro

Universitário UniFMU, professor de Direito Ambiental nos cursos de

pós-graduação “lato sensu” do Centro Universitário UniFMU,

professor da Escola Superior do Ministério Público do Estado de São

Paulo, professor da Escola Superior de Advocacia da OAB-SP no curso

de Introdução ao Direito Ambiental, professor da Escola da

Magistratura do Rio de Janeiro.

Tem diversos trabalhos publicados, dentre os quais

citamos apenas alguns, como: “Audiência Pública e Material

Ambiental do Direito Brasileiro”, Revista dos Tribunais; “Vegetação

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e Preservação Permanente em Meio Ambiente Urbano”, Revista de

Direito Ambiental; “A Poluição Sonora e o Ministério Público”,

Boletim Informativo da Escola Paulista do Ministério Público. Tem

diversos livros publicados, os quais citamos também “O Código

Brasileiro de Defesa do Consumidor”, comentado pelos autores do

ante-projeto, pela Forense Editora; “Aspectos Jurídicos do

Licenciamento Ambiental”, também pela Forense; “Reúso da Água”,

pela Editora Manole.

Doutor Daniel Fink, é uma honra para esta casa recebê-lo

nesta tarde, e passamos a palavra ao senhor.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Antes do doutor

Daniel fazer uso da palavra, eu queria dizer que o doutor Daniel

Fink, esta ilustre personalidade da jurídica, vamos dizer assim, do

nosso Estado é um grande amigo desta casa, e este Tribunal aprendeu

a admirá-lo e a respeitá-lo profundamente, não só por suas obras,

mas pelo seu estilo também. E ele já nos informou que ele gostaria

de fazer debates. Todos aqueles também que efetivamente quiserem

fazer perguntas vão estar à vontade.

Então, nós passamos agora a palavra ao ilustre

palestrante, doutor Daniel Fink. Por favor.

O Sr. Daniel Fink – Boa tarde a todos. Queria,

inicialmente, saudar o Presidente Antonio Caruso; dizer que, da

minha parte, é uma honra, de fato, estar aqui no Tribunal de Contas

– já não é a primeira vez, e certamente não será a última. Estou

absolutamente à disposição. Queria parabenizar o Presidente. Nós

estamos realizando, hoje, vejo, o XII Seminário do Tribunal de

Contas, um tema de absoluta relevância, que é a Educação Ambiental.

E realizar um XII Seminário significa uma preocupação deste

Tribunal com a discussão jurídica, social, intelectual, vamos dizer

assim, de vários aspectos relacionados à atuação desse Tribunal. E

o Ministério Público, e eu pessoalmente não me furtaria jamais a

atender um convite da Presidência do Tribunal de Contas do

Município de São Paulo, e portanto me sinto extremamente honrado de

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estar aqui, sobretudo ao lado de grande juristas, como Marcelo

Lamy, Toshio Mukai – que tem uma história, também, de tradição na

discussão dos temas ligados ao Direito Ambiental –, e portanto é

uma honra muito grande ombrear esta mesa com tão ilustres juristas.

Eu, na verdade, quis trazer aqui algumas reflexões e,

eventualmente, submetê-las aos senhores – por isso eu pedi ao

Presidente que nós pudéssemos, ao final da exposição, que não será

longa, no máximo três ou quatro horas, nós pudéssemos fazer algum

debate, que eu sempre acho bastante produtiva, essa discussão,

sobretudo porque o Ministério Público tem despertado muitas

curiosidades, muitas questões. A discussão sobre esse tema e o

papel do Ministério Público, eu acho fundamental que nós travemos

este diálogo.

E eu queria começar a minha fala lembrando uma coisa que

eu acho que é de domínio de todos. Nós estamos em um mundo

completamente diferente do que era a vinte anos atrás. Eu tenho

certeza absoluta de que o Presidente Antonio Caruso, quando era

pequeno, soltava e corria atrás de balão. Tenho certeza absoluta

disso.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Fazendo só uma

interrupção, eu sou do tempo em que eu chegava em casa e mamãe

estava lavando roupa no tanque, cantando.

O Sr. Daniel Fink – Pois é. E, hoje, soltar balão é

crime. Quer dizer, hoje, soltar, transportar de qualquer forma,

participar desse processo é crime ambiental, pelos riscos que isso

possa ter, em termos de queimada, etc.

Nós somos do tempo em que ter papagaio em casa era algo

absolutamente normal. E nós conhecemos até hoje muita gente que

ainda tem animais silvestres, e papagaios, sobretudo, em casa. E

até pouco tempo atrás, era crime inafiançável ter papagaio em casa.

Ainda é crime, mas não mais inafiançável. Menos mal.

Portanto, de vinte anos para cá, houve uma modificação

profunda na nossa vida. Hoje, quando nós saímos de casa sem o

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telefone celular, Toshio, nós ficamos apavorados, entramos em

pânico; como é possível passar um dia sem o telefone celular?

Precisa tomar cuidado, senão acabamos digitando a senha do banco no

forno de microondas. Quer dizer, as coisas estão completamente

modificadas. A velocidade da comunicação: a internet acabou com o

nosso sossego; ninguém mais tira férias. Ninguém mais consegue

tirar férias, porque é localizado em qualquer canto do mundo, pela

internet, pelo telefone celular.

Outro dia eu cheguei em casa, à noite, assistindo ao

jornal da noite, na televisão, e tinha um atentado à bomba em

Israel, Tel Aviv, e as imagens que passavam eram imagens ao vivo

das pessoas, do resgate, enfim. E eu me dei conta, eram mais ou

menos onze horas da noite aqui no Brasil, e lá deveriam ser umas

quatro, cinco horas da manhã; eu me dei conta de que eu estava

sabendo do acidente, do número de vítimas, onde tinha acontecido,

como tinha acontecido, e o morador de Tel Aviv não sabia ainda

porque ele tinha sequer acordado. Então nós estamos em um mundo

absolutamente diferente.

A questão da biotecnologia, do biodireito. Toshio conhece

muito bem esses temas, enfim. São temas que, de fato, têm nos

colocado diante de perplexidades complicadas. E o Direito Ambiental

traz alguns paradigmas – eu queria me referir a alguns deles, só,

para depois falar um pouco do papel do Ministério Público na

educação ambiental –, mas são temas que nós temos que pensar e

refletir sobre eles, porque certamente eles têm uma relação muito

forte, diretamente, com a questão educacional, porque a Convenção

de Estocolmo, de 72 – no Rio de Janeiro também, a de 92, as duas

mais importantes convenções ambientais internacionais –, elas

iniciam afirmando o caráter difuso do meio ambiente.

O que é o caráter difuso do meio ambiente? Não é só dizer

que todas as pessoas, indistintamente, que vivem sobre a Terra têm

direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado; significa

também dizer que as futuras gerações são titulares desse direito.

Nós, para profissionais do Direito, é algo absolutamente novo. Quer

dizer, como é que nós podemos tutelar direitos de pessoas que

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sequer existem? O direito ia até o nascituro. O Código Civil fala:

até o nascituro, nascido com vida, ele é titular de direitos. Mas

como nós fazemos a educação dos nossos bisnetos, dos nossos

tetranetos? Algo que está afeto a nós e ao mundo jurídico, e nós

precisamos dar conta disso. No campo da bioética e do biodireito, a

discussão jurídica sobre como tratar a questão da clonagem, por

exemplo, é algo absolutamente novo para todos nós.

E nós temos, como profissionais do Direito, que dar conta

disso e nos valermos da Teoria Geral do Direito. Porque é lá na

Teoria Geral do Direito que nós vamos buscar o ferramental, o

embasamento doutrinário para dar conta desses novos institutos. E

nós precisamos fazer isso.

Não raro, nós temos inúmeras divergências doutrinárias

com os autores de Direito Ambiental sobre temas que seriam

cotidianos a vinte anos atrás, e hoje já não são mais. Exatamente

porque nós temos a responsabilidade de preservar o meio ambiente

para as futuras gerações. E o Direito é só um ramo do conhecimento

que vai tratar dessa questão; existem inúmeros outros ramos do

conhecimento que vão tratar da questão ambiental, e o Direito deve

procurar, como ciência de regulação de comportamentos, dar conta

exatamente dos comportamentos adequados e inadequados, e sancionar

os inadequados, e de que forma sancionar os inadequados.

O princípio da soberania dos Estados, no qual o mundo –

não só o mundo moderno, mas a história das civilizações se embasou,

sobretudo, lógico, com o aparecimento do Estado moderno, mas o

conceito da territorialidade é algo que remonta a mais ou menos

10.000 a.C. É ali, Presidente, que nós o aparecimento do embrião do

Estado, porque o homem se fixa em um território, para cultivar a

agricultura, e essa noção de territorialidade começa a ganhar

importância na constituição da sociedade do Estado moderno. Quer

dizer, não existe Estado sem território. As nações podem existir

sem território. A nação israelense existiu, durante milênios, e o

Estado de Israel é criado em 1948. A nação cigana, a nação curda,

não têm território. E sobre essa perspectiva territorial que nós

criamos o mundo de hoje. Mas se nós olharmos a Terra, vista de

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cima, não há fronteira. Nós não conseguimos ver o mapa-múndi em uma

fotografia tirada da Lua, por exemplo. Nós não vemos o mapa-múndi

ali. E, no entanto, a soberania nacional é aquilo que marca e rege

todas as relações internacionais. É absolutamente fundamental

garantir, nas convenções internacionais, e o Marcelo Lamy é

professor doutor nesse assunto, que haja respeito às soberanias.

Convenções têm que respeitar as soberanias, porque o poder de auto-

determinação interna e externa dos Estados é fundamental.

Agora vamos imaginar, Presidente, que o Congresso

brasileiro, eleito democraticamente – graças a Deus vivemos uma

democracia política, é bom que se afirme isso sempre –, o

Parlamento brasileiro resolvesse reduzir a reserva legal amazônica,

que hoje é de 80% das propriedades, para 10%. E hoje só restasse

10% da Amazônia. Por projeções científicas internacionais,

significaria que a possibilidade de aumento da temperatura da Terra

fosse um dado concreto, uma realidade. E, portanto, se aumentar a

temperatura da Terra, nós já sabemos, temos discutido, está na

imprensa de todo dia os efeitos estufa, mudanças climáticas, enfim.

E, certamente, haveria conseqüências desse fato, decidido

soberanamente pelo Congresso brasileiro, em todo o globo terrestre.

A pergunta que eu faria é: seria razoável que nós pensássemos em

uma intervenção internacional no Brasil para evitar que essa lei

fosse cumprida? É lógico que nós temos que admitir essa

possibilidade. Que tipo de intervenção é uma outra história; mas

nós teríamos que ter algum tipo de intervenção para evitar esse

fato, porque essa atitude do governo brasileiro, não obstante

baseada na sua soberania – absolutamente legítima e

democraticamente tomada – afetaria todos os habitantes da face da

Terra. E nós estamos discutindo por hipóteses.

Agora, vamos imaginar que nós aprovássemos uma convenção

internacional que mandasse reduzir as emissões de carbono, e

tivesse um país, responsável por 35% dessas emissões, que se

recusasse a fazer essa redução. E esse efeito da emissão de carbono

afeta toda a população. Essa não é uma hipótese; esse é um fato

concreto. Nós temos o Protocolo de Kyoto, que determina a redução

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da emissão de carbono – há quem diga que ainda as reduções são

tímidas. As reduções são tímidas, e mesmo assim os Estados Unidos

da América, responsáveis por 35% das emissões, não assina, não

ratifica o Protocolo de Kyoto, não obstante os efeitos das emissões

americanas atingirem a todo o globo. Agora, é razoável pensar em

uma intervenção internacional nos Estados Unidos? E agora,

Presidente, como nós vamos sair dessa enrascada?

Portanto, não dá mais para pensar, sob o ponto de vista

ambiental, em Estados absolutamente soberanos, em populações

brasileiras, mexicanas, americanas, japonesas. Nós somos uma

espécie só: a espécie é o ser humano. E eu estou falando aqui algo

que certamente eu mesmo contestaria, que é uma visão

antropocêntrica do Direito Ambiental. Como se o homem fosse a razão

de ser do Direito Ambiental, ou do meio ambiente, ou da ecologia, e

evidentemente não é. Quer dizer, nós estamos falando de seres

humanos, mas porque é essa a espécie dominante no planeta. E mesmo

assim nós corremos o risco da, não sei se da auto-destruição, a nos

impor modificações nos nossos hábitos, absolutamente importantes. E

essa questão é uma questão educacional.

Quando eu falei que o Presidente soltou balão – porque eu

também soltei balão, quando pequeno –, nós talvez encarássemos isso

como um fato corriqueiro, e hoje já não é mais. Quer dizer, quantas

coisas nós não fazemos hoje em dia, ainda – jogar um simples papel

no chão até, enfim, andar com carros desregulados, não usar

transportes coletivos, desperdiçar água, enfim.

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O Sr. Daniel Fink – Nós temos que reeducar essa população

e investir maciçamente na educação dessas futuras gerações. Se nós

queremos ter um planeta com uma razoável higidez ambiental, da qual

nós temos responsabilidade jurídica de zelar para as futuras

gerações, nós temos que mudar o nosso comportamento. E essa questão

ambiental, educacional é fundamental para que isso ocorra.

Princípio da vulnerabilidade ambiental. O princípio da

vulnerabilidade ambiental prega não só que o meio ambiente seja

algo vulnerável, passível de agressões, não; no plano

internacional, o princípio da vulnerabilidade ambiental determina

que a maior quantidade de recursos ambientais existentes no planeta

está nos países pobres. É uma verdade, essa, porque são

subdesenvolvidos. Não conseguiram investir sobre esses recursos

naturais como fez o Hemisfério Norte, o primeiro mundo, e a maior

quantidade de recursos ambientais está aqui. Mas, por outro lado, a

menor quantidade de dinheiro capaz de preservar esses recursos está

aqui também.

Ali, rapidamente conversava com a doutora Yara, na mesa,

um pouco antes da nossa conversa, falando um pouco sobre políticas

públicas – educação, saúde, saneamento, segurança, enfim. É

absolutamente claro que, evidente, tirando a má gestão do recurso

público – nós estamos em um Tribunal de Contas que zela por isso,

procura orientar os Municípios, o Município de São Paulo, enfim, o

Tribunal de Contas do Estado –, além da má gestão, nós não temos

capacidade financeira. Quanto custa um sistema de vigilância da

Amazônia capaz de manter a floresta do jeito que ela está hoje.

Quanto custa, isso, para o governo brasileiro? E mais: a quem

beneficia essa preservação da Amazônia? Não é só ao Brasil.

Acabamos de ver que, se ela for desmatada, de uma hora para a

outra, vai prejudicar o mundo inteiro; a sua preservação beneficia

o mundo inteiro. Então é absolutamente indispensável o investimento

nos países de terceiro mundo, para preservação ambiental. É

absolutamente indispensável.

Com todas as auditorias que os programas das Nações

Unidas tenham sobre esses recursos, lógico que sim, os Tribunais de

Contas, é evidente que sim. Mas nós não podemos, hoje, pensar que

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os recursos produzidos no Brasil, ainda que fossem rigorosamente

administrados, fossem capazes de atender a todas as políticas

públicas necessárias. E a ambiental não é uma política pública para

o Brasil somente.

Eu acho, Presidente, a dívida externa brasileira imoral.

Imoral. E eu não estou nem pensando no passado, como ela foi feita,

como ela se constituiu. Não, não estou pensando nisso. Estou

pensando no futuro. Porque o dinheiro que nós pagamos na dívida

externa brasileira é um dinheiro que pode ser empregado

tranqüilamente na proteção ambiental, na preservação dos recursos

ambientais, na recuperação dos recursos ambientais, que é para todo

mundo: preservar os oceanos, as reservas legais, as áreas

ambientais especialmente protegidas, os biomas, a Mata Atlântica,

cerrado, pantanal. Como nós vamos arrumar dinheiro para isso tudo?

A dívida externa, eu estou convencido de que é imoral. Imoral. E

essa é a contribuição internacional, sob pena de nós não

conseguirmos, de fato, preservar o meio ambiente. Essa é a

verdadeira vulnerabilidade ambiental: nós não temos recursos. Isso

precisa ser reconhecido, dito e reafirmado, porque os organismos

internacionais precisam entender, os países precisam entender. A

exploração financeira, econômica do terceiro mundo vai levar ao

colapso do planeta, com certeza.

Princípio da responsabilidade ambiental. É um princípio

muito ligado ao Ministério Público. Nós temos uma forte atuação

repressiva. Promotor: ninguém gosta de promotor. Quem gosta de

promotor é, às vezes, a mulher dele. Às vezes. Eu costumo brincar,

Presidente, que outro dia tocou o telefone em uma promotoria, aí o

funcionário atendeu. A pessoa falou: “Eu queria falar com o

promotor, por gentileza.” “Olhe, infelizmente, o promotor faleceu.”

“Ah, pois não, obrigado.” Desligou o telefone. Dois minutos depois,

aquela pessoa ligou de novo para a promotoria: “Eu queria falar com

o promotor.” “Ah, infelizmente, o promotor faleceu.” “Ah, pois não,

obrigado.” Dois minutos depois, ligou de novo. Na décima vez, o

funcionário já não agüentava mais. “Mas eu já não falei para o

senhor que o promotor morreu?” “É que é tão bom ouvir isso.”

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Responsabilidade ambiental é um assunto muito ligado ao

Ministério Público. Nós temos por vocação, vamos dizer assim, e por

dever legal, profissional, processar alguém. A responsabilidade

civil, na ação civil pública, a responsabilidade criminal, a ação

penal é de titularidade exclusiva do Promotor de Justiça. Mas nós

não estamos felizes com isso. O que eu quero dizer, sobretudo nesse

tema de hoje, Educação Ambiental, é que não dá nós imaginarmos que

eu possa contribuir só com repressão. É lógico que educação é a

forma mais longa de se mudar comportamentos; ela é a forma mais

longa. Mas ela é a mais eficaz. Uma vez transformado, uma vez

educado, uma vez preparado para o consumo sustentável, por exemplo,

que é um outro princípio importantíssimo, isso não muda mais. Isso

não muda mais. E nós, do Ministério Público, queremos dar uma

contribuição efetiva nesse processo.

Tanto é verdade que, em 15 de dezembro de 2006, o

Procurador-Geral de Justiça, Doutor Rodrigo Pio, publica o Ato

nº 85, que constitui um grupo de trabalho para discutir exatamente

a relação do Ministério Público com a educação – e aí não só a

educação ambiental, mas a educação em geral. O que interessa para

nós é a questão da educação. Isso é fruto de duas teses aprovadas

no III Congresso Estadual do Ministério Público, realizado em 86, e

no X Congresso de Meio Ambiente, também do Ministério Público de

São Paulo, realizado também no ano passado. O autor desta tese, o

Doutor Eduardo Martines Júnior, é um colega brilhante que, hoje, é

membro do Conselho Estadual de Educação, o que faz crer que ele

está lá como conselheiro, e não como representante do Ministério

Público, mas a contribuição que o Eduardo Martines tem dado na

questão da educação e vice-versa – ele é um elo de ligação entre as

políticas educacionais e o Ministério Público e vice-versa –, para

que o Ministério Público, através do diálogo, e nesse ponto, a meu

ver, o que comporta mesmo é o diálogo e não a repressão, o

Ministério Público possa dar uma contribuição decisiva para a

introdução curricular como matéria trans, inter e multidisciplinar

– que é o Direito, a ecologia, as questões ambientais que possam

ser discutidas em todos os níveis de ensino. Aliás, a Constituição

prevê isso, que é dever do Poder Público a educação ambiental em

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todos os níveis de ensino e a consciência da população a respeito

dos aspectos da ecologia.

Parece-nos, no Ministério Público, que é absolutamente

indispensável uma parceria com o Conselho Estadual de Educação, que

nós já temos, e com o Conselho Estadual de Meio Ambiente. É através

desses dois conselhos que nós poderemos, de fato, implantar

efetivamente uma política de educação ambiental. E é consenso.

Consenso não só da Lei Federal nº 9.597, mas também da Lei Estadual

recentemente aprovada, não sancionada pelo menos até hoje. Não vi o

Diário Oficial hoje, mas não havia sido sancionada ainda, que foi

aprovada no dia 9 de novembro agora, a Lei Estadual de Política de

Educação Ambiental. É um consenso dessas duas legislações que a

matéria meio ambiente não deve ser uma disciplina autônoma; é um

consenso. E todos nós estamos de acordo em relação a isso.

Mas é preciso capacitar os professores a tratar a questão

ecológica dentro de suas próprias disciplinas. O professor de

Geografia tem uma festa para fazer. Quando vai discutir vegetação,

tipos de floresta, clima, bacias hidrográficas. Dá para fazer quase

que uma ecologia geográfica. Professor de História, professor de

Biologia, professor de Química, professor de Português – “vamos

interpretar um texto, vamos dar uma redação.” E hoje, nos

curriculum, espaço absolutamente de sobra para tratar a questão da

educação ambiental, e é importante tratá-la dessa maneira mesmo

porque a ecologia faz parte do nosso dia-a-dia. Ela não é o mico-

leão dourado, que está lá na floresta, lá longe, distante; não, é o

dia-a-dia. 80% da população do mundo vive em meio ambiente urbano.

Nós temos que dar conta disso; nós temos que dar conta do

planejamento urbano; da sustentabilidade.

E é absolutamente consenso, também, de todos que tratar a

questão ambiental no currículo escolar, além de matéria

transversal, deve ser tratada em todos os aspectos do conceito de

meio ambiente, seja ele o natural, seja ele o artificial, o

cultural, o do trabalho. Ainda que o meio ambiente do trabalho não

seja uma disciplina específica do Direito Ambiente, mas

evidentemente que tem que ser tratado. Nós temos que ensinar para

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as pessoas que a nossa memória nacional é tão importante quanto a

memória individual.

Nós todos, Presidente, com certeza todos nós que estamos

aqui hoje temos, lá na nossa casa, uma gaveta, uma caixa, um baú,

onde tem desde o certidão de batismo até o último fato importante

que tenha acontecido na nossa vida, as fotografias, as cartas da

primeira namorada. Se perdêssemos a memória, de repente, de uma

hora para a outra, onde nós iríamos resgatar quem nós somos? É

nesse baú. É nesse baú que nós vamos saber qual é a escola onde nós

estudamos, onde nós moramos, quem foram os nossos amigos. Isso é

memória. A memória nacional também se faz assim também, e não

derrubando prédios, monumentos. Isso é meio ambiente urbano. Isso é

preservação, é qualidade de vida. Ninguém pode viver sem memória.

Então não é só o meio natural; não é só o meio urbano que é

importantíssimo, mas o meio ambiente cultural também. Nós temos que

dar conta disso.

As diretrizes curriculares nacionais, como eu disse, não

incluem, dentre as disciplinas ou nessas várias disciplinas, a

questão ecológica e ambiental. É preciso, urgentemente, fazer isso.

Talvez nós tenhamos aí um sopro de esperança, com essa aprovação da

Lei Estadual, para que nós possamos discutir, junto com os

Conselhos Estaduais de Meio Ambiente e Educação, a efetiva

implantação desse tema na grade curricular ou nos programas das

disciplinas curriculares do ensino fundamental, do ensino básico,

e, também, lógico, no ensino superior. É fundamental, isso, para

que nós não fiquemos como estamos desde a edição da Lei nº 9.795,

no papel. Nós precisamos implantar uma política. E eu tenho certeza

que essa política tem absoluta receptividade do Magistério.

Absoluta receptividade.

Os professores estão preocupados, como os cidadãos estão

preocupados. E o que cabe a nós procurar fazer o melhor é a

capacitação desse corpo docente para que ele possa lidar com essas

questões ambientais junto com o seu alunado. Para que eles se

formem cidadãos ambientalmente corretos, e de fato ajudem a

preservar para as suas e para as futuras gerações o meio ambiente

ecologicamente equilibrado.

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Presidente, eu vou parar por aqui, mas eu queria encerrar

reafirmando que, da nossa parte – digo, da nossa, do Ministério

Público –, nós não temos nenhuma vocação nesse tema para processar

ninguém. E não seria o caso. Como é possível se implantar uma

política educacional através de uma decisão judicial? Isso seria o

contra-senso absoluto. Mas nós estamos absolutamente abertos ao

diálogo para dar a nossa contribuição nesse tema. Nós temos colegas

– não falo por mim, porque eu, de todos que lidam com essa questão,

talvez seja o que saiba menos –, mas temos colegas brilhantes para

tratar da questão ambiental, da questão educacional, e contribuir

com essas discussões no âmbito dos Conselhos Estaduais, da educação

municipal, da Secretaria Municipal de Educação também, das

Delegacias de Ensino.

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O Sr. Daniel Fink – Enfim, nós temos uma gama de

promotores espalhados pelo Estado inteiro e reafirmamos: isso não é

um assunto que se resolva através de ação judicial. Esse é um

assunto que tem que se resolver através do diálogo, da consciência

do seu enfrentamento no dia-a-dia na sala de aula. Eu acho que é

essa a contribuição que o Ministério Público pode dar e é essa que

eu venho aqui propor aos senhores.

Muito obrigado.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Bom, nós vamos

abrir agora para perguntas. Quem dos senhores deseja fazer alguma

pergunta?

Eu vou fazer uma pergunta, me atrever a fazer uma

pergunta porque eu estava raciocinando quando o senhor fazia a sua

manifestação, por sinal, como sempre brilhante. O que o senhor

poderia me dizer com referência à poluição, de certa forma, dos

órgãos de informação. Eu digo, a poluição dos órgãos de informação,

no sentido das distorções.

O Sr. Daniel Fink – O senhor diz da grande imprensa.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Da grande

imprensa.

O Sr. Daniel Fink – É isso, de fato, ocorre e, muitas

vezes, a notícia, ao contrário de informar, ela desinforma. Quando

comecei nessa questão ambiental, em 1992, havia nos órgãos da

grande imprensa editorias ambientais, nos jornais, nas televisões,

nas redações, o que, hoje, praticamente, não existe. Mas nós temos

aí alguns profissionais que estão preocupados com essa questão. O

André Trigueiros, por exemplo, o Washington Novaes, o Randal

Marques. Ou seja, nós temos aí algum time da imprensa que está

preocupado com isso. O que eu lamento é, de fato, a notícia, muitas

vezes, procurar servir a interesses econômicos do que propriamente

interesses sociais, ambientais, educacionais, pedagógicos.

15

E, de uma certa maneira, eu vou aproveitar o gancho para

dizer: Presidente, isso passa um pouco pela própria

responsabilidade do Estado, porque nós não falamos aqui de educação

não formal, quer dizer, é muito raro uma campanha de educação

ambiental. Não há. Não é só o professor na sala de aula que pode

transformar. Precisamos começar a dizer às pessoas que o governo

tem aí espaços, afinal de contas, os canais de televisão são

concessões públicas. Tem os espaços para a educação ambiental.

Então, eu acredito que a grande imprensa, sem dúvida

nenhuma, estaria muito melhor se estivesse mais preparada para a

questão ambiental, tivesse, talvez, não um jornalista

necessariamente, talvez um corpo de consultores que pudesse ajudar

nas notícias, numa revisão final, mas, o próprio Poder Público

pudesse, através de campanhas educativas, alertar a população da

importância disso. A única que eu me lembro agora, que me ocorreu,

é a da SABESP economizar água em época de rodízio, de

abastecimento. Fora isso eu não vejo campanhas de educação não

formal através dos meios de comunicação de massa.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Quem deseja

fazer pergunta? A senhora, por favor. A senhora se identifique, por

favor.

A Sra. Miriam Res – Boa tarde a todas e todos. Meu nome é

Miriam Res, eu pertenço ao Conselho de Gestão da Reserva da

Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo. Eu quero

parabenizar o Presidente e o palestrante. Eu tenho uma questão para

o palestrante. Excelentíssimo Dr. Daniel Fink, o senhor fala no

princípio de responsabilidade ambiental, o senhor cita claramente

que o Ministério Público está para ajudar no diálogo. Então, será

que o senhor poderia ajudar no entendimento de um documento que eu

fiz para a Prefeitura há dois anos e meio. É o TIDE 50, 63, 86 que

versa sobre obras de geotécnica em áreas de preservação permanente.

O Sr. Daniel Fink – O número eu não entendi a que se

refere.

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A Sra. Miriam Res – É um documento que eu coloquei como

cidadã para a Prefeitura.

O Sr. Daniel Fink – Perfeito. Muito bom. Evidentemente

que posso, mas apenas, nós precisamos respeitar um pouco os canais

institucionais. Eu, hoje, não estou na condição de coordenador da

área de meio ambiente. Uma atualização importante do meu currículo:

hoje, eu faço parte do Conselho Superior do Ministério Público, eu

tive que me afastar porque é impossível acumular essas funções da

Coordenadoria de Meio Ambiente. Mas, eu, pessoalmente, estou a sua

disposição e, funcionalmente, estou a sua disposição para lhe

colocar em contato com a Coordenadoria de Meio Ambiente para

eventualmente ajudar nesse documento que eu não sei exatamente qual

é a finalidade, onde ele será apresentado, qual é o seu destino,

mas, estou absolutamente à disposição para auxiliar no que for

necessário.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Alguém mais? O

Marcos Tadeu.

O Sr. Marcos Tadeu B. de Oliveira – Sou do Grupo

Ambiental do Tribunal de Contas. Parabéns pela palestra e pela

precisão da colocação da necessidade da educação ambiental em sala

de aula, porque a nossa visão, também, é que o professor é o início

dessa questão.

A minha pergunta, embora fuja um pouquinho dessa área,

diz respeito ao Protocolo de Kyoto: qual o futuro do Protocolo de

Kyoto ou aquele que venha a substituí-lo? Também, nessa questão de

educação ambiental, será que seria viável prever alguma coisa em

termos de educação no Protocolo? Ter a previsão para que isso fosse

implantado? Muito obrigado.

O Sr. Daniel Fink – Eu acho que o Protocolo de Kyoto...

Em primeiro lugar, eu tenho que me valer da opinião científica,

porque eu não tenho conhecimento teórico-científico para afirmar o

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que eu vou dizer, mas, pelas leituras que eu tenho feito, o

Protocolo de Kyoto, hoje, já é insuficiente: redução de 5,2% aos

níveis de 1990, seria insuficiente para atender ou refrear ou

minimizar o efeito do aquecimento global.

O que eu acho é que a comunidade científica internacional

vai ter que rediscutir essa questão, se, de fato, isso fica

patenteado que é insuficiente e discutir aquilo que eu provoquei

aqui, de passagem, que é quais são os mecanismos - talvez, o

Marcelo possa socorrer também nessa questão -, de coação

internacional para os países que se recusarem a adotar esses

mecanismos, como é o caso dos Estados Unidos. O Protocolo entrou em

vigor em fevereiro do ano passado, por conta da Rússia ter assinado

e, aí, atingiu os 55% de emissão que era exigível para a sua

vigência, mas os Estados Unidos, que são responsáveis por 35% das

emissões, se recusam terminantemente a assinar.

Então, dentro da soberania dos Estados, quais são os

mecanismos que nós vamos utilizar no campo ambiental para

minimização desse princípio da soberania e de que tipo de salva-

guardas, enfim, restrições nós vamos poder adotar em relação aos

países que não adotam as convenções que são cientificamente

demonstradas como importantes para a higidez do planeta num futuro

não tão longo, nós estamos falando de 50, de 100 anos.

Então, ainda, no Direito Internacional é uma

interrogação, quer dizer, a intervenção militar se dá em último

caso, em situações excepcionalíssimas e, talvez, nem seja o caso de

intervenção militar, estou pensando no caso extremo. Que tipo de

sanções o Direito Internacional poderia colocar à disposição do

Direito Ambiental para obrigar, caso o Protocolo de Kyoto venha a

ser revisto com metas mais ambiciosas, que esses países, de fato,

os grandes países emissores possam adotar, porque eles ratificam ou

não se eles querem, dentro da sua soberania.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Dr. Marcelo.

O Sr. Marcelo Lamy – Já que me foi dada a oportunidade,

Dr. Daniel, eu queria acrescentar o seguinte. Eu talvez não veja

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uma solução assim tão rápida, tão fácil para esse problema da

cedência da soberania, até porque isso se trata de um daqueles

conceitos que nós construímos, como o senhor mesmo bem colocou no

início da sua exposição, nós construímos culturalmente alguns

conceitos como o de propriedade, de território que arraigaram em

nossa alma de tal forma que parece que aquilo é natural. Virou

genético. O que era cultural, o que era uma ficção, aquilo que o

Direito é tão hábil em fazer ficções jurídicas, que tornaram-se,

parece que, elementos de DNA.

A soberania é um conceito já questionado há muito tempo.

Mas, por mais que tenha sido questionado, jamais foi abdicado de

qualquer parcela de soberania. O máximo com o que nós nos deparamos

é com grandes acordos entre diversos países para pressionar aquele

outro soberano para ele ceder, nunca passou disso, ou de uma

intervenção militar, ou de uma outra... Mas, aí, justamente, é o

rompimento do não respeito à soberania.

Esse é um conceito que entra naquela categoria, eu falava

com o Dr. Caruso outro dia, naquela categoria em que ele já não é

mais um paradigma, já é um “paradogma”.

O Sr. Daniel Fink – É verdade.

O Sr. Marcelo Lamy – Falar contra a soberania, talvez,

seja um pecado e vamos todos ao inferno. Para alguns países, isto é

a realidade. Então, eu não vejo solução para isso. O colega Marcos

Tadeu também. Delicada essa situação.

Mas, houve uma notícia talvez boa neste ano sobre o

Protocolo de Kyoto, sobre a questão de emissão de carbono nos

Estados Unidos. Houve uma condenação judicial nos Estados Unidos

dizendo claramente que o governo é obrigado a reduzir a emissão de

carbono. Não se falou do Protocolo, mas se falou juridicamente que

o governo tem a responsabilidade de reduzir a emissão de carbono.

O Sr. Daniel Fink – Os Estados, algumas cidades já adotam

os parâmetros do Protocolo de Kyoto, independentemente de uma

ratificação nacional.

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O Sr. Marcelo Lamy – Agora, aproveitando a oportunidade,

não quero enfadá-los, mas, o senhor comentava na sua exposição, aí,

já é um gancho, que o Dr. Caruso, o senhor, provavelmente, soltaram

balão quando mais novos...

O Sr. Daniel Fink – Caçar passarinhos.

O Sr. Marcelo Lamy – Eu fiquei pensando nessas

circunstâncias, viu como nosso mundo é dinâmico. Eu fiquei

pensando, há um colega português, Professor Paulo Ferreira da

Cunha, Direito Constitucional lá da Universidade do Porto, ele me

contou uma vez uma anedota portuguesa em que o grande conflito de

um senhor que está no inferno é justamente ao contrário desta

questão do balão. Ele falou assim: “O meu problema é que eu estou

aqui por algo que não é pecado mais.”. Isso também acontece. O

inverso pode acontecer.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Mais uma

pergunta, então, por favor.

O Sr. Nelson Terra Barth – Nelson Terra Barth do

Instituto Nacional de Estudos Ambientais Avançados. Dr. Daniel,

meus respeitos. Queria aproveitar a oportunidade dentro do seu tema

e de perguntar a respeito do Ministério Público e a função

educacional dos termos de ajuste de conduta.

O Sr. Daniel Fink – Eu queria cumprimentar o Dr. Nelson

Terra Barth, ilustre advogado, professor com quem temos a honra de

ter ombreado várias questões, não só judiciárias como docentes,

demos aula juntos. O Nelson é uma figura fantástica. Nelson,

obrigado pela pergunta, porque, de fato, me escapou quando eu

falava da repressão, do papel repressivo do Ministério Público. De

fato, não é só um papel repressivo, acredito que no termo de

ajustamento de conduta, na transação ambiental, o Ministério

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Público tem um papel importantíssimo nisso e tem tido. Nós temos

discutido, muitas vezes, com os empreendedores, com os industriais.

Você mesmo sempre esteve colaborando conosco nesse

processo. Está lá envolvido com as indústrias de Cubatão, na

celebração de um termo de ajustamento de conduta que possa, de uma

vez por todas, resolver o problema das emissões lá em Cubatão,

hoje, já infinitas vezes melhorado do que no tempo em que foi

proposta a ação lá atrás, no início da década de 80, antes da Ação

Civil Pública ainda.

Então, o Ministério Público tem um papel importantíssimo

no termo de ajustamento de conduta, na educação ambiental. E eu

sempre acreditei nisso, Nelson, porque eu acredito que o infrator

ambiental, quando ele assume voluntariamente uma obrigação de

restaurar, ele precisa estar consciente da importância dessa

obrigação, porque senão ele vai querer descumprir. Ele vai

descumprir. Ele encara isso como um compromisso que ele possa

descumprir, ainda que esteja previsto multas, etc. É muito melhor

para mim que ele esteja absolutamente consciente da importância

ambiental, da obrigação ambiental que ele tem que cumprir, porque

senão não adianta nada.

Quando trabalharmos o termo de ajustamento de conduta é

importante dizer porque que nós... Não é só porque a lei fala e eu

sou promotor e eu tenho que cumprir a lei. Não é só por isso, é

porque o conteúdo da lei traz algo absolutamente relevante sob o

ponto de vista da higidez ambiental que é importante para ele e

para o filho dele. E, não raro, ele dá o exemplo do filho que chama

a atenção dele quando ele joga o papel no chão ou não usa o cinto

de segurança. A molecada pega no nosso pé. Passa com o farol

vermelho para ver o que acontece.

Essa é a função da educação. Essa moçada precisa crescer

cobrando mesmo de nós, dos pais. Então, é aí que eu pego, o seu

filho precisa de um meio ambiente equilibrado, o seu neto precisa

de um meio ambiente. Então, é importante o que nós estamos

discutindo aqui. Não é algo tolo.

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Isso não só no inquérito civil, como na transação penal

também. Os crimes ambientais que a grande maioria deles admite

transação penal.