GT-10: EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
O LABORATÓRIO DE ENSINO DE MATEMÁTICA NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO BÁSICA: CONCEPÇÃO,
CONTRUÇÃO, POTENCIALIDADE E LIMITAÇÃO
Jociano Coêlho de Souza (Universidade Federal de Pernambuco)
1 INTRODUÇÃO
Desde algum tempo, as escolas mostraram uma preocupação para com o
ensino das disciplinas do currículo comum. Para isso, investiu-se em pesquisas,
metodologias e recursos que, de algumas forma, buscassem a melhoria do processo de
ensino e de aprendizagem. Nesse meio, surgiu a ideia de laboratório de ensino, porém
essa concepção de laboratório estava quase sempre ligada ao ensino das disciplinas
ditas ciências naturais (física, química e biologia) marginalizando, assim, as outras
áreas como a da língua portuguesa e da matemática. Deste modo, essas disciplinas
dispuseram de poucos materiais didáticos, e quando tinham, eram geralmente,
guardados em armários e gavetas, longe da sala de aula.
Ademais, hoje, ensinar matemática requer do professor não só um
conhecimento profundo dos conteúdos específicos, mas também de procedimentos e
técnicas de ensino que tenham o objetivo de promover a aprendizagem significativa
de seus alunos. Além do que, esses procedimentos devem ir além do uso do quadro,
do giz e dos livros, isto é, precisamos de metodologias inovadoras que reorganizem a
prática pedagógica.
Essa indicação do uso de metodologias e recursos para tornar o ensino mais
eficaz e a aprendizagem mais significante também não é nova. Estudiosos renomados
desde as épocas mais remotas como Comenius e Locke, passando por Dewey, até os
mais atuais como Piaget e Vygotsky têm defendido a importância do uso de materiais
manipuláveis apropriados para o ensino da aprendizagem matemática.
Deste modo, houve um grande investimento em estudos e pesquisas que
tinham como objetivo o desenvolvimento de recursos que pudessem auxiliar o ensino
da matemática. A utilização de materiais como ábaco, material dourado, tangran,
blocos lógicos e geoplano foram focos de grandes estudiosos, como por exemplo,
Sérgio Lorenzato que publicou o livro “O Laboratório de Ensino de Matemática na
Formação de Professores” em qual se abordava essas temáticas.
Apesar de existirem vários estudos e pesquisas na área, um grande número de
professores ainda encontra dificuldades em trabalhar com materiais manipuláveis,
pois muitas escolas ainda não possuem um espaço próprio para elaborar, organizar e
guardar esses materiais, ou seja, os professores não têm a sua disposição um local
apropriado para desenvolverem algumas atividades pedagógicas que necessitam desse
espaço para elaborarem aulas mais agradáveis aos alunos e também para
desenvolverem também a sua formação – um espaço ao qual nos referimos como
LEM (Laboratório de Ensino da Matemática).
O laboratório de Ensino da Matemática (LEM) é um ambiente que deve ser
construído por professores em colaboração com os alunos, cujo objetivo é de
realizarem atividades teórico/práticas por meio das quais os alunos manipulem
materiais didáticos que são selecionados pelo professor de acordo com os objetivos
cognitivos estabelecidos para cada aula. Porém, antes de selecionar o espaço a ser
utilizado, buscar materiais para integrá-lo, adquirir e confeccionar objetos ou outros
recursos didáticos manipuláveis, determinar os sujeitos envolvidos no processo de
construção, implantar e realizar a manutenção e a utilização do LEM é necessário,
inicialmente, compreender o significado e o sentido deste ambiente, isto é, perceber a
verdadeira relevância deste recurso para processo de ensino e aprendizagem de
Matemática.
Portanto, o presente artigo tem o objetivo de apresentar uma discussão teórica
em torno de um recurso metodológico denominado de Laboratório de Ensino da
Matemática (LEM), uma das propostas desafiadoras que envolvem a aprendizagem
significativa para o ensino da matemática. Pretende-se, então, com a realização desse
estudo, dar uma contribuição aos professores de matemática e aos educadores no geral
que pretendem discutir e construir o LEM.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
As dificuldades que passam os professores de matemática no ato de ensinar,
em termos de aprendizagem, vêm inquietando muitos estudiosos da área da didática
da matemática. Desse modo, caminhos foram trilhados com o objetivo de minimizar
cada dificuldade estabelecendo novas metodologias e elaborando novos recursos que
possibilitem uma melhor compressão em toda esfera do conhecimento matemático
A renovação do ensino da matemática, então, tornou-se uma necessidade cuja
dimensão evolui para as complexidades dos processos de ensino e aprendizagem.
Nesse contexto, Abreu (1997, p. 48) nos relatou que “o problema de ensinar da
mesma forma como lhe foi ensinado não é motivo de preocupação. Permanecer nesta
prática é que é alarmante”.
As instituições escolares, espaço onde acontece a prática pedagógica, o
processo de ensino e aprendizagem, a escolha dos conteúdos, a escolha da
metodologia e o planejamento pedagógico podem contribuir para que os alunos
desenvolvam habilidades relacionadas à representação, comunicação e investigação
na área da matemática. Para isso, o fazer didático-pedagógico dos professores de
matemática nesse ambiente deve contar com recursos didáticos. Nesta perspectiva é
que se propõe a construção de um Laboratório de Ensino de Matemática (LEM) como
um espaço para aulas de matemática, para planejamento e elaboração de projetos, para
criação de atividades experimentais, para produção de recursos didáticos e para
formação continuada dos professores.
2.1 Concepções de LEM
Antes de adentrar nas concepções de LEM, faz-se necessário pensar o que seria um
laboratório. Nas ideias de Oliveira (1983, p.82), o Laboratório é um ambiente de caráter
experimental e ainda, o “Laboratório é entendido aqui como o espaço onde se criam situações
e condições para levantar problemas, elaborar hipóteses, analisar resultados e propor novas
situações ou soluções para questões detectadas”.
Neste estudo, a concepção de LEM não se restringe a um espaço físico de
depósito de materiais didáticos e pedagógicos, mas um lugar na instituição escolar,
como afirma Lorenzato (2012), alocado para aulas regulares de matemática; um
espaço para tirar dúvidas dos alunos e aplicações de avaliação; para professores
planejarem suas aulas ou ainda um espaço reservado a exposições; para planejamento
de olimpíadas de matemática; sala de vídeo e de debates de documentários em
matemática. Portanto, para esse autor seria um local para criação e desenvolvimento
de atividades experimentais, com produção de materiais práticos e teóricos para o
aprimoramento da prática pedagógica dos professores em sala de aula; reuniões da
comunidade de pais de alunos que estão envolvidos em projetos e cursos de
matemática voltados para as olimpíadas; reuniões com alunos nos preparativos para
realização e participação em amostras de ciências e matemática.
Lorenzato, grande pesquisador na área da Educação Matemática, construiu
várias concepções de laboratório. Porém, concordamos mais quando ele caracteriza o
LEM como um espaço,
Especialmente dedicado à criação de situações pedagógicas
desafiadoras e para auxiliar no equacionamento de situações
previstas pelo professor em seu planejamento, mas imprevistas na
prática, devido aos questionamentos dos alunos durante as aulas.
Neste caso, o professor pode precisar de diferentes materiais com
fácil acesso. Enfim, o laboratório de ensino de matemática, nessa
concepção, é uma sala-ambiente para estruturar, organizar, planejar
e fazer acontecer o pensar matemático, é um espaço para facilitar,
tanto ao aluno como ao professor, questionar, conjeturar, procurar,
experimentar, analisar e concluir, enfim, aprender e principalmente
aprender a aprender (LORENZATO, 2012, p.7).
Na concepção de Turrioni, o LEM é como um agente de mudança que tem o
objetivo a busca de novas alternativas para o aperfeiçoamento do ensino da
matemática, bem como dos currículos do ensino fundamental e médio. Logo, de
acordo com a autora,
o LEM contribui na formação de professores de Matemática com
duas abordagens: a primeira seria no desenvolvimento profissional,
ao permitir ações que possibilitem aos futuros professores
vivenciarem situações adversas na sala de aula, onde o licenciando
como futuro professor, com a colaboração do professor formador, e
dos demais colegas, simularia diversas situações de sala de aula. A
segunda seria a contribuição do LEM na formação do professor
pesquisador, quando as atividades desenvolvidas tenham um caráter
de contribuir para que o professor possa refletir sobre sua prática de
sala de aula, aplicando metodologias de ensino-aprendizagem que
contribuam para uma atividade docente de forma investigativa.
(TURRIONI, 2006, p. 63)
Franzoni e Panossian (1999, p.114) lembram ainda que o LEM “é um
ambiente que propicia aos alunos a possibilidade de construção de conceitos
matemáticos, além da análise e nova interpretação do mundo em que vivem”. Deste
modo, o LEM adquire também o papel de um local para reunião de professores, para
discussão, elaboração de aulas e atividades, enfim, para formação continuada, pois
oferece praticidade para a utilização de recursos e materiais disponíveis.
Com isso, percebe-se que não é possível atribuir apenas uma única definição
para o LEM, ou assumir uma única concepção diante da literatura existente, pois
existem vários objetivos para seu uso e diferentes organizações de sua estruturação.
Assim, nesse patamar, podemos finalizar essas concepções afirmando que o LEM é
um ambiente que propicia aos professores e alunos uma alternativa para expandir a
criatividade, enriquecer o processo ensino e aprendizagem, desenvolver habilidades e
atividades exploratórias explicitando as relações matemáticas identificadas durante a
experimentação.
2.2 Construção do LEM
Conforme Lorenzato (2010), antes de dar início à construção do LEM, a
instituição deve ter em mente, inicialmente, a quem ele se destina, ou seja, qual
público que irá frequentar ou utilizar o local. Assim, nas ideias do autor, se o LEM se
destina aos alunos da educação infantil, os materiais devem estar fortemente centrados
no apoio ao desenvolvimento deles no que se refere aos processos mentais básicos –
correspondência, comparação, classificação, sequenciação, seriação, inclusão e
conservação – essenciais para a formação do conceito de número. A escolha dos
materiais para essa etapa da educação básica, de acordo com o autor, também tem que
levar em conta o favorecimento da percepção espacial (formas, tamanhos, posições,
por exemplo), além da noção de distância, com vistas à construção do conceito de
medida.
Lorenzato (2010) faz um apelo a um trabalho com o tátil e com o visual, se o
LEM for utilizado por alunos dos primeiros anos do ensino fundamental. Afirma,
ainda, que os materiais devem visar mais diretamente à ampliação de conceitos, à
descoberta de propriedades, à percepção da necessidade do emprego de termos ou
símbolos, à compreensão de algoritmos, enfim, aos objetivos matemáticos.
Para o mesmo autor, essa característica anterior carece continuar presente no
LEM para os alunos dos anos seguintes do ensino fundamental, porém, agora é
preciso investir em materiais que desafiam o raciocínio lógico-dedutivo nas áreas da
aritmética, geometria, trigonometria e estatística.
Já o LEM direcionado ao ensino médio, necessita se constituir em um espaço
no qual pode ser encontrado artigos, jornais, revistas, materiais com problemas
aplicados, questões de vestibulares e do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio),
desafios, entre outros.
Agora, quando o foco por a formação de professores, é inconcebível que,
nesse ambiente, os professores aprendentes realcem a necessidade da autoconstrução
do saber, o significado dos sentidos para ensino e para a aprendizagem, além de
dispor de recursos que possam auxiliar as suas práticas pedagógicas.
A construção de um LEM não é algo que deve ser planejado em curto prazo
nem objetivo, pois, uma vez construído, ele demanda constante atualização e
complementação. Hoje, de acordo com Lorenzato (2010), de modo geral, o LEM pode
constituir-se de coleções de:
livros didáticos; livros paradidáticos; livros sobre temas
matemáticos; artigos de jornais e revistas; problemas
interessantes; questões de vestibulares; registros de episódios da
história da matemática; ilusões de ótica, falácias, sofismas e
paradoxos; jogos; quebra-cabeças; figuras; sólidos; modelos
(artefatos, réplicas); quadros murais ou pôsteres; materiais
didáticos industrializados; materiais didáticos produzidos pelos
alunos e professores; instrumentos de medida; filmes, CDs, fotos,
softwares; calculadoras; computadores; materiais e
instrumentos necessários à produção de materiais didáticos;
sugestões de atividades; perguntas de alunos. (LORENZATO,
2010, p. 3-4)
2. 3 Limitações e Potencialidades do LEM
Como foi dito anteriormente, no Brasil, a utilização de um Laboratório de
Ensino de Matemática, como metodologia de ensino, foi encontrada no capítulo
intitulado “O Método do Laboratório em Matemática”, num livro escrito por Malba
Tahan (pseudônimo de Júlio César de Mello e Souza), publicado em 1962. Na obra, o
autor apresenta o resultado de sua experiência docente e apresenta várias
metodologias de ensino de Matemática, dentre elas o Laboratório de Matemática.
Para Tahan (1962), este espaço não pode ser arquitetado apenas como espaço
lúdico, e, portanto, é papel do professor mostrar aos alunos que as atividades
realizadas neste ambiente têm, além do lúdico, objetivam levá-los a raciocinar no
campo abstrato e auxiliá-los na compreensão dos conteúdos matemáticos.
Entretanto, o autor aponta algumas vantagens e desvantagens do seu chamado
“Método de Laboratório”, representadas no Quadro 1, a seguir:
Quadro 1 – Vantagens e desvantagens do "Método de Laboratório"
MÉTODO DE LABORATÓRIO – TAHAN (1962)
VANTAGEN DESVANTAGENS
Conduz o aluno às observações e
descobertas;
Torna o ensino vivo, eficiente e agradável;
Facilita a tarefa do professor;
Permite ao professor apreciar certas
tendências dos alunos. Reabilita o Ensino da
Matemática;
Leva a aprendizagem até aos alunos menos
dotados;
Relaciona o ensino da Matemática com o
ensino de outras matérias.
Exige recursos materiais não disponíveis nas
escolas;
Não pode ser aplicado a todos os conteúdos;
Leva o aluno a fugir das abstrações e
procurar recursos materiais para as suas
demonstrações;
Não pode ser proporcionado a classes
numerosas;
É dispendioso;
Exige grande habilidade, entusiasmo e
dedicação. Leva o aluno a aceitar, como
rigorosas, certas demonstrações
experimentais grosseiras;
Exige muito tempo para o ensino.
Fonte: Tahan (1962)
Nesse sentido, Lorenzato (2012) torna evidente que o LEM apresenta algumas
limitações, prejulgamentos e crendices como alternativa metodológica, representadas no
Quadro 2, a seguir
Quadro 2 – Limitações, Prejulgamentos e Crendices ao uso do Laboratório de Ensino
de Matemática
LIMITAÇÕES, PREJULGAMENTOS E CRENDICES PARA O LABORATÓRIO DE
ENSINO DE MATEMÁTICA (LEM)
Alto custo do LEM.
Exigência de uma boa formação do professor.
Possibilidade do “uso pelo uso” ou até mesmo o mau uso.
O LEM não pode ser aplicado a todos os conteúdos nem a classes numerosas.
Exige mais tempo para ensinar.
É mais difícil utilizar o LEM e pode induzir o aluno a aceitar como verdadeiras as
propriedades matemáticas apresentadas pelo material manipulativo ou ainda, a partir de uma
experiência generalizar propriedades
Fonte: Lorenzato (2012)
Na análise do posicionamento dos dois autores, notamos que tanto Tahan
como Lorenzato apontam objeções à construção e utilização do LEM. Porém, fica
claro que a falta de interesse tanto dos professores e como da instituição, além
indisponibilidade de recursos poderiam influenciar a aplicação desta metodologia.
Assim sendo, Lorenzato (2012) assinala é que o passo inicial seria traçar os
seus objetivos e o público a quem se destina, pois é fundamental definir o tipo de
laboratório que será construído. Em seguida, devem-se listar os materiais,
equipamentos, instrumentos e recursos didáticos necessários. Além do mais, o autor
deixa certo que esse tipo de laboratório não pode ser construído em curto prazo.
3 METODOLOGIA
A investigação em questão é um estudo teórico com abordagem qualitativa que de
acordo com Pádua (1996) busca, por meio de uma metodologia de revisão
bibliográfica, consolidar procedimentos que podem superar os limites das análises
meramente quantitativas servindo também para elaboração de conhecimentos e
discussões que possibilitem compreender e transformar a realidade.
Para a construção do texto foram utilizados artigos, livros, monografias e
dissertações que abordavam a temática em questão.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando as diferentes concepções na literatura sobre o LEM, além das
diversas propostas de elaboração e utilização, o que temos que perceber é a
diversidade e a riqueza do tema, bem como a importância do papel do professor, do
aluno, da instituição diante da construção e uso do laboratório, que precisa, sobretudo,
estar adequado ao meio em que será utilizado.
Ademais, a sua construção deve ser objeto de estudo e discussão em qualquer
instituição de ensino, pois a preocupação em oferecer um ensino mais significativo da
matemática emana essa situação.
Foram apresentadas várias definições e concepções para o Laboratório de
Ensino de Matemática, e, em meio a elas idealizamos a construção de um LEM como
um espaço de explorações e investigações matemáticas que favorece o ensino e a
aprendizagem da matemática.
Por fim, diante do exposto, fica evidente que utilizar materiais didáticos para
ensinar matemática é indispensável no exercício de nossa profissão e construir LEM
em nossas escolas não é uma tarefa impossível.
REFERÊNCIAS
ABREU, Maristela Dalla Porta de (1997). Laboratório de Matemática: um espaço para a formação contin
LORENZATO, S. Potencialidades e Limitações do Laboratório de Ensino de Matemática. In: Congreso de Investigación y Pedagogia. Colombia, 2013
LORENZATO, S. (org.). O Laboratório de Ensino de Matemática na formação de professores. 3ª ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2012. 178p.
PÁDUA, E. M. M. de. Metodologia de Pesquisa (abordagem teórico-prática). São Paulo. Papirus uada do professor – Dissertação de Mestrado. Santa Maria: UFSM
Editora. 1996.