Água e Saneamento: Um direito ou um
comércio?
Marcelino Abreu, APDC -Associação Portuguêsa de Direito do Consumo
Incumbe ao Estado no âmbito económico e
social:a) Promover o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de
vida das pessoas, em especial das mais desfavorecidas”.
Art. 81 da CRP
Incumbe ao estado garantir que: -- todos os cidadãos tenham
acesso, em igualdade de circunstancias, aos bens e
serviços essenciais à vida e à saúde e bem-estar;
-- todos tenham acesso à educação; à protecção social; à
habitação.
Incumbe ao Estado a protecção dos interesses económicos do
consumidor.
Art. 60 CRP
A água potável é um bem escasso (há zonas no planeta sem água ou
em que esta é de difícil acesso)
A água é essencial à vida
O tratamento dos efluentes é fundamental
quer por razões ambientais, quer por
razões de saúde pública.
A 22 de Março de 1992 a ONU instituiu o "Dia Mundial da Água", publicando um
documento intitulado "Declaração Universal dos Direitos da Água".
A água faz parte do património do planeta.
A sua proteção constitui uma obrigação jurídica para todo
o homem ou grupo social que a utiliza.
Serviços Públicos essenciais (entre outros):
a) Serviço de fornecimento de água;
f) Serviço de recolha e tratamento de águas residuais;
g) Serviços de gestão de resíduos sólidos urbanos.
Deve o Estado deixar nas mais dos privados (entidades que buscam o lucro) o cumprimento da tarefa de
assegurar a todos o acesso aos serviços e bens essenciais?
-- Os privados defendem interesses próprios;
-- Os privados visam o lucro;-- Os privados especulam;
-- Ao estado cabe a defesa do bem comum;-- O estado não tem por finalidade o lucro;
-- Ao Estado cabe a defesa da Justiça social;
Devem os serviços públicos de água e saneamento ser
actividades lucrativas? ou
Devem ser bens e serviços acessíveis a todos em
igualdade de circunstancias?
A ideia de que tudo tem que ser lucrativo é errada.
Há sectores que não podem ser lucrativos.
Quais?
Serviços públicos essenciaisTransportes públicos
SaúdeEducação
Defesa nacional
Os serviços de águas e saneamento têm que ter como objectivo garantir a todos, em condições de igualdade, a fruição dum serviço e de um bem
que é um direito.
Isto só se consegue com a propriedade e gestão públicas e sem
fins lucrativos.
O que existe nas PPs?
As concessões dos serviços de água e saneamento são
actos com vista à protecção do interesse público e do ambiente
ou negócios lucrativos?
Para que servem as cláusulas de reequilíbrio financeiro?
Para que servem as taxas de rentabilidade mínimas
previstas nos contratos de concessão?
A privatização dos serviços de água significa uma cedência de
poder político em favor dos interesses económico.
A cedência das infra-estruturas municipais de água e saneamento
pertencentes aos municípios, pagas por todos, para empresas privadas, implicam que os municípios passem a comprar aquilo que era de todos,
com prejuízos evidentes para as populações/consumidores.
PPPs = a negócio ruinoso = a negócio leonino
Pacto leonino consiste na atribuição apenas de direitos ou obrigações a uma das partes
contratantes
“É nula a cláusula que exclui um sócio da comunhão nos lucros ou que o isenta de
participar nas perdas da sociedade”. ARTIGO 994º Cod. Civ.
Em Barcelos, a autarquia foi condenada por um Tribunal Arbitral a pagar uma
indemnização à concessionária no valor de 172 milhões de euros (valor quase 3 vezes
superior ao Orçamento Municipal) a título de reposição do equilíbrio económico financeiro.
Porquê?
Não se terem verificado os consumos previstos no contrato de concessão - sendo
que o contrato da concessão previa cerca de 141 litros por pessoa, quando o consumo
médio de água neste concelho é de cerca de 70 litros per capita.
O mesmo contrato de concessão que garante ainda aos accionistas privados “uma taxa interna de rentabilidade accionista, em
termos anuais nominais, para todo o prazo da concessão de 10,34%”.
Que benefícios para o consumidor?Nenhum!
Que prejuízos? Vários!
-- bens e serviços mais caros (por causa do objectivo do lucro e porque o ente público quer atenuar os valores
que paga a título de reequilíbrio financeiro);
-- não tem garantia de efectiva qualidade…
Os utilizadores que disponham de título válido para a ocupação do imóvel
podem solicitar a contratualização dos serviços de abastecimento público de
água e de saneamento de águas residuais sempre que
os mesmos se encontrem disponíveis.
Art. 63 do DL 194/2009
Todos os edifícios, existentes ou a construir, com acesso ao serviço
de abastecimento público de água ou de saneamento de águas residuais devem dispor de
sistemas prediais de distribuição de água e de drenagem de águas
residuais devidamente licenciados, de acordo com as
normas de concepção e dimensionamento em vigor, e estar ligados aos respectivos
sistemas públicos.
Art. 63 do DL 194/2009
Ilus. e Ex.mo Senhor Carlos Pinto Coelhodigno director da Companhia das Águas edigno membro do Partido Legitimista:
Dois factos igualmente graves e igualmente importantes, para mim, me levam a dirigir a V. Exa. estas humildes regras: o primeiro é a tomada de Cuenca e as últimas vitórias das forças Carlistas sobre as tropas Republicanas, em Espanha. O segundo é a falta de água na minha cozinha e no meu quarto de banho. Abundam os Carlistas e escassearam as águas, eis uma coincidência histórica que deve comover duplamente uma alma sobre a qual pesa, como na de V. Exa., a responsabilidade da canalização e a do direito divino. Se eu tiver fortuna de exacerbar até às lágrimas a justa comoção de V. Exa., que eu interponha o meu contador, Exmo. Senhor, que eu interponha nas relações de sensibilidade de V. Exa., com o Mundo externo; e que essas lágrimas benditas de industrial e de político caiam na minha bandeira! E, pago este tributo aos nossos afectos, falemos um pouco, se V. Exa. o permite, dos nossos contratos. Em virtude do meu escrito, devidamente firmado por V. Exa., e por mim, temos nós – um para com o outro – um certo número de direitos e encargos. Eu obriguei-me, para com V. Exa., a pagar a despesa de uma encanação, e aluguer de um contador e o preço da água que consumisse. V. Exa. fornecia, eu pagava. Faltamos, evidentemente, à fé deste contrato; eu, se não pagar, V. Exa., se não fornecer. Se eu não pagar, faz isto: corta-me a canalização. Quando V. Exa. não fornecer, o que hei-de fazer, Exmo. Senhor? É evidente que para que o nosso contrato não seja inteiramente leonino, eu preciso, no análogo àquele em que V. Exa. me cortaria a canalização, de cortar alguma coisa a V. Exa. Oh! E hei-de cortar-lha!… Eu não peço indemnizações pela perda que estou sofrendo, eu não peço contas, eu não peço explicações, eu chego a nem sequer pedir água. Não quero pôr a Companhia em dificuldades, não quero causar-lhe desgostos nem prejuízos… Quero apenas esta pequena desafronta, bem simples e bem razoável, perante o direito e a justiça distribuída: – quero cortar uma coisa a V. Exa.!Rogo-lhe, Exmo. Senhor, a especial fineza de me dizer, imediatamente, peremptoriamente, sem evasivas nem tergiversações, qual é a coisa que, no mais santo uso do meu pleno direito, eu posso cortar a V. Exa.
Tenho a honra de serDe V. Exa. com muita consideraçãoe com algumas tesouras
Água e Saneamento, um direito de todos
não um negócio de alguns.
Será que vamos ter na Europa os Cheiques da Água…?