Transcript
Page 1: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

1

MED RESUMOS 2011NETTO, Arlindo Ugulino.ANESTESIOLOGIA

AVALIAÇÃO PRÉ-ANESTÉSICA

O objetivo da avalia��o pr�-anest�sica, antes de mais nada, � diminuir a morbidade e a mortalidade durante um eventual procedimento cir�rgico. Todo paciente encaminhado � cirurgia, seja eletiva ou de urg�ncia, deve estar na melhor forma f�sica e mental poss�vel. A maneira mais adequada para alcan�ar tal meta � cuidar do paciente de modo pessoal, isto �, o anestesiologista deve conhecer bem o paciente, estabelecer com ele um v�nculo de confian�a, examin�-lo detidamente, dirigir o preparo de anestesia e cuid�-lo durante e ap�s o ato cir�rgico. Dessa maneira, a equipe cir�rgica estar� preparada e precavida para qualquer intercorr�ncia relacionada com a patologia que levou o paciente � mesa cir�rgica e com as demais patologias concomitantes que este paciente apresenta. Em resumo, as finalidades ou objetivos da avalia��o pr�-anest�sica s�o:

Diminuir a morbidade e mortalidade perioperat�ria; Diminuir o medo e a ansiedade do paciente diante a anestesia e a cirurgia; Conhecer e formar um v�nculo m�dico-paciente Preparo adequado do paciente para o procedimento anest�sico-cir�rgico.

O roteiro adequado para a correta avalia��o pr�-anest�sica deve seguir uma hist�ria completa e um exame f�sico detalhado, analisados junto com os exames laboratoriais. Para isso, o anestesista deve elaborar a seguinte coleta cl�nica:

Anamnese direcionada, objetiva e minuciosa, sobretudo acerca dos sistemas org�nicos mais importantes para a anestesia (cardiorrespirat�rio e endocrinometab�lico);

Exame f�sico detalhado mais objetivo e voltado para os pontos considerados mais importantes pelo anestesista; An�lise exames pr�-operat�rios aos quais o paciente j� foi submetido; Ver possibilidade exames adicionais em fun��o da especificidade de cada paciente; Avaliar a possibilidade do uso de algum f�rmaco pelo paciente que pode, porventura, causar uma poss�vel

intera��o medicamentosa indesejada; Parecer coadjuvante de outras “especialidades”; Conhecer os aspectos �ticos, m�dicos e legais, devendo o anestesista responsabilizar-se por manter a avalia��o

pr�-anest�sica como um documento que revela o modo de atendimento, op��o de anestesia e anota��es diversas sobre o paciente. Esse t�pico � importante pois, nos pa�ses de primeiro mundo em que ocorrem fatalidades durante um ato cir�rgico, a aus�ncia deste documento implica na impossibilidade de defesa do m�dico. Este documento baseia-se em duas vias: uma que fica com o anestesista e outra no prontu�rio do paciente.

Realiza��o de avalia��o pr�-anest�sica no consult�rio/ambulat�rio de anestesiologia.

CONSULTA PR�-ANEST�SICA E EXAMES PR�-OPERAT�RIOSTodo paciente deve ser entrevistado antes da realiza��o da cirurgia, de prefer�ncia pelo anestesiologia que lhe

administrar� a anestesia. A consulta, como vimos, estabelece o relacionamento necess�rio para que o paciente adquira confian�a no profissional que estar� zelando por sua vitalidade e seguran�a durante a cirurgia.

ANAMNESE DIRIGIDAA ficha de anamnese ou de avalia��o anest�sica, deve conter os seguintes par�metros semiol�gicos referentes

ao paciente: nome do paciente, idade, sexo, cor, peso, altura, sinais vitais, motivo da cirurgia/ambulat�rio de anestesiologia com a mensura��o do risco anest�sico-cir�rgico. � dever do anestesiologia ver e avaliar o parecer do m�dico especialista que previamente atendeu o paciente e, ao final, atribuir uma nota ao paciente de acordo com o seuestado f�sico, segundo a Classifica��o Internacional da Anestesia elaborada pela Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA).

Um recurso de valor para o anestesiologista � a revis�o do prontu�rio m�dico e de dados importantes, como peso, altura, sinais vitais de rotina e motivo da interna��o. Esses relat�rios de anestesias pr�vias informam sobre f�rmacos usados e seus efeitos, subst�ncias e t�cnicas anest�sicas empregadas, poss�veis dificuldades t�cnicas (bloqueios regionais, intuba��o, ven�clise, etc.). Esses prontu�rios podem ainda fornecer dados relacionados com uma poss�vel patologia associada que muitas vezes pode implicar no procedimento anest�sico.

Munido do maior n�mero de dados poss�veis, o anestesista deve realizar sua entrevista com o paciente de maneira profissional e dele obter uma hist�ria dirigida, ou seja, orientada objetivamente pela patologia cir�rgica, considerando tamb�m doen�as concomitantes e suas implica��es na anestesia planejada. Para isso, o anestesista deve dar import�ncia aos seguintes pontos:

Deve-se interrogar sobre alergias. Muitos pacientes relatam rea��es al�rgicas inespec�ficas, enquanto outros referem asma, rinite ou dermatite. Alguns poucos j� ter�o apresentado rea��o al�rgica do tipo anafilact�ide a

Page 2: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

2

antibióticos ou anestésicos (se um medicamento provocou reação alérgica, não deve ser repetido). Se o paciente refere reação alérgica a contrastes iodados em exames radiológicos e necessita de novas investigações desse tipo, deve receber anti-histamínicos e corticóides na véspera; acesso venoso durante o exame e o material de ressuscitação devem estar à mão.

Os medicamentos usados pelo paciente para tratar sua doença atual ou outras devem ser avaliados com cuidado, principalmente quanto a doses e regime terapêutico. Deve-se saber quais as substâncias utilizadas, o benefício de seu uso e as possíveis interações com os anestésicos. Deve-se saber, especificamente, sobre fármacos para tratar doenças cardíacas e hipertensão arterial, agentes imunossupressores (corticóides), substâncias psicoterapêuticas e fármacos de substituição endócrina. É necessário conhecer as possíveis reações de sensibilidades aos fármacos e efeitos que podem retardar o despertar da anestesia.

Deve-se perguntar, especificamente, sobre experiências prévias em anestesias. O paciente pode informar sobre acordar muito demorado, consciência no transoperatório, náuseas e vômitos pós-operatório, febre ou dor de garganta pós-operatória, até dados mais drásticos como internação em UTI pós-parada cardíaca ou insuficiência respiratória.

Interrogar o paciente sobre transfusões de sangue prévias e reações que tenham provocado. O paciente deve ser interrogado sobre o abuso de drogas e adições a elas (fumo, álcool, barbitúricos,

diazepínicos, opiódes). Pesquisar ainda sobre o uso de drogas ilícitas como maconha, cocaína, etc. É necessário pesquisar ainda patologias como hipertensão arterial, dislipidemias, obesidade ou sedentarismo. A pesquisa da presença de dor no período transoperatório ou no período pós-operatório imediato é bastante

significante. Avaliar intercorrências graves como paradas cardíacas ou qualquer outro fator que tenha necessitado de uma

terapia intensiva em UTI.

OBS1: Ao realizar a história em pacientes do sexo feminino, deve-se abrir espaço para a história menstrual e obstétrica. Se a mulher está em idade fértil, deve-se interrogar sobre a data da última menstruação, para evitar o risco de anestesiar um paciente no primeiro trimestre de gestação. O uso de anticoncepcionais deve fazer lembrar da possibilidade de tromboembolismo. A história obstétrica informa sobre doenças próprias dessa situação (doença hipertensiva específica da gestação, posições anômalas da placenta levando a sangramentos exagerados) e também sobre anestesias realizadas para partos e cesarianas.

A história deve começar por uma avaliação global do paciente: seu estado geral atual, sua atividade física e tolerância ao exercício, sua atitude mental em relação à doença e à cirurgia. Após a história, realiza-se o exame físico. Como a história, deve ser bem objetivo e consiste em várias etapas:

Determinar peso e altura do paciente; Determinar pressão arterial do paciente; Examinar pulsos periféricos; Examinar os pulsos carotídeos e jugulares; Examinar os prováveis locais para futuras punções venosas e arteriais; Examinar o tórax, verificando possíveis alterações; Fazer ausculta cardíaca e pulmonar atenta, dando atenção especial à ausculta das bases pulmonares para

verificar estertores indicativos de insuficiência cardíaca e ausculta cuidadosa para roncos, sibilos e outros sons indicativos de doença pulmonar.

AVALIA��O DO SISTEMAS ESPEC�FICOSDepois desta introdução sobre avaliação pré-anestésica, faz-se uma revisão geral de algumas doenças de maior

interesse para o anestesista.

AVALIAÇÃO DO SISTEMA CARDIOVASCULAR Angina ou infarto do miocárdio: a isquemia coronariana ocorre sempre que há desequilíbrio entre o suprimento e

a demanda de oxigênio no miocárdio. O suprimento de oxigênio ao miocárdio é determinado pelo conteúdo de oxigênio e pelo fluxo sanguíneo coronariano. A demanda de oxigênio é determinada por frequência cardíaca, contratilidade e tensão da parede. Os fatores de risco para doença cardíaca coronariana são idade, sexo masculino, mulheres em menopausa, história familiar positiva, hipertensão arterial, fumo, hipercolesterolemia. A angina ou dor torácica pode ser instável e estável, e deve ser avaliada quando ao fator desencadeante: pequenos, médios ou grandes esforços.

Hipertensão arterial: é a doença cardíaca mais prevalente. Estatísticas mostram que a expectativa de vida está inversamente relacionada com a elevação das pressões sistólica e diastólica. Os anestesistas devem estar atentos aos fármacos usados no tratamento da hipertensão, devido à sua interação com os anestésicos. Em geral, devem ser mantidos pelo paciente até a véspera ou a manhã da cirurgia.

Síncopes: tonturas e desmaios podem estar relacionados a doenças cardiovasculares que devem ser pesquisadas.

Page 3: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

3

Alterações na fonese das bulhas cardíacas: sopros ou qualquer outro ruído adventício cardíaco devem ser pesquisados pela ausculta e sua etiogenia comprovada por exames complementares.

Distúrbios na condução elétrica do coração: os pacientes com arritmias cardíacas devem ser avaliados quanto à etiologia de seu problema: se está relacionada com alterações hemodinâmicas ou se o paciente está fazendo uso de antiarrítmicos. Deve-se avaliar a integridade do nódulo sinusal (nódulo de Keith-Flack). Os pacientes com marca-passos exigem do anestesiologista, além da avaliação global incluindo sistema cardiovascular e fármacos usados, conhecimento específico sobre estes aparelhos. O manejo de um paciente com marca-passo inclui a avaliação e otimização da doença existente. É importante saber a indicação e o início do uso do marca-passo(bloqueio atrioventricular, bloqueio bi ou trifascicular, disfunção do nó sinusal, etc), o tipo (de demanda ou definitivo), a última avaliação do marca-passo e sua bateria (se funciona adequadamente), bem como obter informações sobre o programa do marca-passo, verificar, pela palpação do pulso enquanto se observa ECG adequado, se a descarga do gerador corresponde à sístole mecânica, e verificar se o marca-passo pode ser programável.

SISTEMA RESPIRATÓRIOAs metas no cuidado do paciente com doenças pulmonares são evitar a hipoxemia e hipercarbia

transoperatórias, prevenir broncoespasmo e aumentos na pressão intratorácica e minimizar complicações pós-operatórias. Deve-se pesquisar, durante o exame clínico, os seguintes achados:

Dispnéia: avaliar ver freqüência quanto aos esforços (pequenos, médios ou grandes esforços). Tosses e sintomas concomitantes: avaliar o tipo de tosse (se produtiva ou não) e se há presença de febre. Secreção: avaliar os aspectos da secreção (textura, cheiro, quantidade, consistência) e a presença de um

processo infeccioso. Expansibilidades torácicas: avaliar o grau da capacidade expansiva pulmonar. Presença dos sinais frênicos: Asma brônquica: é uma doença definida por (1) trocas inflamatórias crônicas na submucosa das vias aéreas; (2)

resposta aumentada das vias aéreas (hiper-reatividade) a vários estímulos e (3) obstrução reversível ao fluxo aéreo expiratório. A tosse também característica da asma, pode variar de não-produtiva até aquela com produção copiosa de secreção. O tratamento é feito com antiinflamatórios esteroidais.

Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC): esse termo engloba várias doenças que têm em comum resistência aumentada ao fluxo respiratório nas vias aéreas. Geralmente, esse aumento de resistência ocorre durante a expiração e vários fatores estão envolvidos em sua produção. Estão incluídas na doença pulmonar obstrutiva crônica a bronquite crônica, enfisema pulmonar e a bronquite asmática. Todas essas patologias podem cursar com sibilos e roncos que devem ser avaliados pelo anestesista para que ele identifique a origem dessas alterações.

A anestesia nos pneumopatas requer algumas peculiaridades. Quanto a pré-medicação, recomenda-se sedação leve, estando indicado o uso de benzodiazepínicos (como o diazepam). Os opióides devem ser evitados, principalmente nos pneumopatas com broncoconstrição ou com retenção de CO2. Os barbitúricos podem desencadear broncoconstrição.

FÍGADO E VIAS BILIARESO fígado recebe 25% do débito cardíaco. Durante uma anestesia, vários fatores alteram o fluxo sanguíneo:

alterações no débito cardíaco, alterações produzidas por fármacos a anestésicos, ventilação com pressão positiva, trocas na pressão parcial do CO2, estímulos simpáticos e trauma cirúrgico. Todos os anestésicos, inclusive os administrados por via espinhal e peridural, reduzem o fluxo sanguíneo hepático por queda na pressão arterial sistêmica e, assim, reduzem a absorção de oxigênio pelo fígado.

Entre as funções hepáticas, temos: síntese de proteínas (como a albumina); síntese de enzimas (como a colinesterase hepática); secreção de bile (cerca de 1 L por dia); síntese de fatores de coagulação; biotransformação e eliminação de substancias como a bilirrubina; metabolismo dos fármacos. Deve-se avaliar os seguintes parâmetros com relação ao fígado e vias biliares:

Hepatite: caso o paciente apresente esta doença parenquimatosa, é de fundamental importância o seu diagnóstico, uma vez que está associada com mortalidade e morbidade elevadas em casos de cirurgia. O anestesista deve avaliar o padrão histológico da doença e o tipo de hepatite encontrada.

Icterícia: avaliar, por meio da coloração da pele, da urina e das fezes, aumento das bilirrubinas direta ou indireta. Cólicas biliares: podem indicar inflamações da vesícula. Alcoolismo: avaliar o consumo do álcool feito pelo paciente. Cirrose hepática: é caracterizada por morte difusa das células hepáticas, com formação de tecido fibroso e

regeneração nodular do tecido hepático. É necessário avaliar a função hepática por meio de exames adequados para esta finalidade. Pacientes cirrórticos podem necessitar de anestesia para anastomoses porto-sistêmicas (anastomose porto-cava, esplenorrenal) ou correção de varizes esofágicas sangrantes.

Page 4: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

4

SISTEMA ENDÓCRINOTodo distúrbio hormonal pode alterar a resposta aos fármacos e aos procedimentos anestésicos, assim como a

anestesia e a cirurgia são, muitas vezes, responsáveis por alterações no equilíbrio hormonal. Entre as alterações hormonais importantes para o anestesiologista, deve-se enfatizar doenças da tireóide, das paratireóides, do pâncreas, do córtex supra-renal e da medula supra-renal.

Doenças da tireóide: em casos de hipertireoidismo, os maiores riscos estão associados ao sistema cardiovascular. Pacientes com hipotireoidismo grave sem tratamento podem apresentar coma por mixedema, que pode ser fatal. O ideal para a anestesia desses pacientes é que eles estejam devidamente compensados. Quando descompensados, os riscos maiores estão ligados aos sistemas cardiovascular e respiratório.

Doenças das paratireóides: a conduta pré-operatória nos pacientes portadores de hiperparatireoidismo é tentar aumentar a excreção de cálcio por via urinária, mediante hidratação e uso de diuréticos.

Doenças do córtex supra-renal: atentar para a síndrome de Cushing (excesso de glicocorticóides), que pode ocorrer por hipersecreção endógena (por adenoma pituitário produtor de ACTH ou produção não-endócrina ectópica de alguns tumores de pulmão) ou uso crônico de altas doses de corticosteróides. O excesso de produção de glicocorticóides também pode ser causado por adenoma ou carcinoma de supra-renal. Nessas situações, o paciente em preparo cirúrgico deve receber suplementação com glicocorticóides.

Doenças da medula supra-renal: de maior importância, são os tumores de tecido cromafim da medula supra-renal que produzem secreção excessiva de catecolaminas (epinefrina e norepinefrina), que na circulação vão produzir quadro clínico característico: crises paroxísticas de hipertensão arterial, sudorese, cefaléia, tremores, nervosismo, taquicardia e arritmias, intolerância a glicose, perda de peso e alterações psicológicas. Em relação à anestesia, não existe preferência específica por fármacos ou técnicas. Acredita-se que uma boa sedação pré-anestésica, uma indução em plano adequado (evitando estimulação simpática na indução, laringoscopia e incisão da pele) e uma boa comunicação entre o anestesista e o cirurgião são muito importantes para a boa evolução desses casos.

Doenças do pâncreas: o diabetes melito (hipofunção pancreática) é a doença endócrina mais comum e de importante avaliação do anestesista. A hiperfunção pancreática resulta em hipoglicemia e pode ocorrer em várias situações (como no insulinoma).

SISTEMA RENALA anestesia e a cirurgia frequentemente complicam o manejo dos pacientes com doenças renais. A existência de

doenças que causam um déficit na função renal exige adequação da técnica anestésica. Entre as principais funções dos rins, temos: regulação do volume e da composição dos líquidos corporais; balanço ácido-básico; desintoxicação e excreção de várias substâncias, incluindo fármacos; produção de renina; funções endócrinas, como a secreção de eritropoietina, conversão dos metabólitos da vitamina D, homeostasia do cálcio e fosfatos.

Devemos avaliar os seguintes pontos: Infecções urinárias: avaliar a etiologia e o eventual tratamento do quadro, pesquisando possíveis repetições. Cálculos renais: avaliar a presença de cólicas renais por cálculo e hidronefrose. Lesões renais: saber se o paciente é portador de lesão (insuficiência) renal aguda ou crônica. Diálise peritoneal ou hemodiálise: avaliar se o paciente necessita a realização de hemodiálise (pacientes diálise-

dependentes) ou não (pacientes com disfunção renal sem diálise). Função renal: além da histórica clínica (em que o paciente pode relatar poliúria, disúria, hematúria, fadiga, etc),

deve-se avaliar a função renal do paciente por meio dos seguintes exames: exame qualitativo de urina; densidade urinária; eletrólitos; concentração sérica de uréia e creatinina; depuração de creatinina.

Pacientes com rins transplantados: são pacientes suscetíveis a infecções, em que monitorização invasiva deve ser a mínima necessária e os cuidados em prevenir infecção bacteriana devem ser redobrados.

TRATO GASTRINTESTINALAs doenças gastrintestinais podem produzir extensas alterações nos volumes líquidos, nos eletrólitos e no

estado de nutrição dos pacientes. Vômitos ou náuseas: avaliar a aparência dos vômitos e o fator desencadeante. Diarréia: avaliar se a diarréia é aguda ou crônica e a consistência das fezes. Diabetes mellitus: também deve ser avaliada nas funções endócrinas. Gastrite ou úlceras: o tratamento destas afecções pode ser feito pela introdução dos antagonistas dos receptores

H2 (cimetidina, ranitidina). No entanto, quando o manejo clínico falha e o paciente sangrante precisa de cirurgia, o procedimento é de emergência e envolve riscos maiores.

Refluxo gastroesofágico / esofagite com refluxo: Sangramentos oculto nas fezes

SISTEMA HEMATOLÓGICOPara avaliação do sistema hematológico, devemos observar os seguintes parâmetros:

Presença de anemia.

Page 5: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

5

Avaliar coagulograma: buscar histórias de sangramento gengival, o que pode determinar doenças na cascata da coagulação. Caso haja algum distúrbio como plaquetopenias, algumas das técnicas anestésicas (como os bloqueios regionais) não podem ser utilizados.

Avaliar a presença de petéquias ou equimoses. Fatores da coagulação x discrasias sangüínea. Avaliar a imunologia sorológica, pesquisando doenças como AIDS e hepatite C.

SISTEMA MÚSCULO ESQUELÉTICOÉ necessário avaliar a presença de afecções osteoarticulares e musculares que aumentaram a sua prevalência

nos últimos anos. Esta avaliação é importante não só para o conhecimento específico de patologias que acometam este sistema, mas também para avaliar condições cirúrgicas como a própria posição do paciente na mesa de cirurgia. Muitas vezes, um paciente mal entrevistado é submetido a uma cirurgia, aparentemente sem problema algum, mas sai com uma lesão nervosa importante secundária a um mau posicionamento do paciente em seu leito.

Avaliar a presença de paresias e parestesias e seus respectivos fatores desencadeantes. Avaliar a presença de lesões por esforços repetitivos (LER). Pesquisar anomalias osteo-articulares que acometam a coluna vertebral, o osso do quadril ou os membros.

SISTEMA NEUROLÓGICOA anamnese do sistema neurológico deve ser feita de maneira adequada e, de preferência, pelo especialista

competente nesta área. Deve-se realizar, portanto, uma anamnese objetiva e subjetiva, pesquisando os seguintes parâmetros:

Presença de cefaléia Ocorrências de convulsões (febril na infância) e de epilepsia Distúrbios comportamentais Avaliar um quadro de coma (escala de coma de Glasgow)

VIA AÉREA SUPERIORPara avaliar a acessibilidade da via aérea superior, são necessários alguns parâmetros técnicos fornecidos pela

Classificação de Mallampatti, que determina, por meio de classes, o grau de dificuldade que o anestesista irá encontrar ao tentar intubar aquele paciente. Observe o quadro a seguir:

Classificação das vias aéreas conforme MallampatiiClasse Visualização direta (com o

paciente sentado e de boca aberta)Laringoscopia

Classe I Palato mole, úvula, pilares amigdalianos

Toda a glote

Classe II Palato mole, úvula Comissura posteriorClasse III Palato mole, base da úvula Ponta da epigloteClasse IV Apenas palato duro Nenhuma estrutura da glote

Além desta classificação, a distância tireomentoniana também é utilizada como referência. Este tema será melhor abordado no capítulo referente à intubação traqueal.

CLASSIFICA��O DO ESTADO F�SICO DO PACIENTEEm 1941, Saklad, Rovenstine e Taylor propuseram uma classificação para os pacientes que seriam submetidos

a algum procedimento cirúrgico, de acordo com o seu estado geral de saúde e grau de severidade da doença. Uma revisão dessa escala deu origem à Escala do Estado Físico da American Society of Anesthesiologistis (ASA). Eles propuseram um sistema com seis classificações, em função da doença sistêmica (definitiva, severa ou extrema) ou nenhuma doença.

Page 6: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

6

Classificação Descrição do paciente Mortalidade ASA I Paciente hígido, saudável. Sem dist�rbios fisiol�gicos, bioqu�micos ou psiqu�tricos. 0,06 - 0,08

ASA IIPaciente com doença sistêmica leve ou moderada, sem limitação funcional. Leve a moderado dist�rbio fisiol�gico, controlado. Sem comprometimento da atividade normal. A condi��o pode afetar a cirurgia ou a anestesia.

0,27 - 0,4

ASA III

Paciente com doença sistêmica grave com limitação funcional, mas não incapacitante. Dist�rbio sist�mico importante, de dif�cil controle, com comprometimento da atividade normal e com impacto sobre a anestesia e cirurgia. Seria um paciente que se enquadraria no ASA II, mas, no momento, n�o apresenta seu dist�rbio controlado.

1,8 - 4,3

ASA IV

Paciente com doença sistêmica grave e incapacitante. Desordem sist�mica severa, potencialmente letal, com grande impacto sobre a anestesia e cirurgia. Geralmente, trata-se de um paciente que j� est� internado no hospital com alguma desordem que, se n�o corrigida ou amenizada, traz um grande risco de morte ao paciente durante o ato cir�rgico ou anest�sico. O procedimento deve ser adiado at� que sua desordem seja controlada.

7,8 - 23

ASA VPaciente moribundo, sem esperança de vida por mais de 24 horas, com ou sem cirurgia. Ele s� � operado se a cirurgia ainda for o �nico modo de salvar a sua vida. 9,4 - 51

ASA VI Paciente com morte cerebral, doador de órgãos. Paciente doador de �rg�os com diagn�stico de morte encef�lica

-

EDeve ser adicionado à qualquer classificação do ASA em caso de emergências / urgências.

dobrar o risco

OBS²: Emerg�ncia � qualquer procedimento m�dico que deve ser feito de imediato, em at� 60 minutos no m�ximo. Geralmente, considera-se emerg�ncia afec��es do sistema cardiovascular e respirat�rio. Urg�ncia, por sua vez, � uma situa��o m�dica que, embora seja grave (ou n�o), pode esperar at� que haja o preparo fisiol�gico do doente (como uma apendicite, por exemplo).

EXAMES COMPLEMENTARESCaso seja necess�rio, os seguintes exames complementares devem ser realizados para complementar a hist�ria

cl�nica, justificando o risco ou n�o da realiza��o da anestesia: Hematol�gicos Coagulogama Urina Rx de t�rax ECG

Bioqu�mica sang��nea Glicemia Fun��o renal, hep�tica e demais Fun��es de acordo com a patologia de cada

paciente

O anestesista deve verificar todos os exames realizados at� 06 (seis) meses antes da data da cirurgia e os pareceres de especialistas. O anestesista deve avaliar, por meio de todos os meios cab�veis, o risco cir�rgico e o risco anest�sico.

ORIENTA��O SOBRE O JEJUM

DIETA TEMPO DE ESPERA PARA A CIRURGIAL�quidos claros ou sem res�duos 3h (s/ a��car) – 4h (c/ a��car)Leite materno 4hF�rmula infantil 6hLeite n�o humano 6hRefei��o leve 6hRefei��o completa 8h

MEDICA��O PR�-ANEST�SICAA medica��o pr�-anest�sica tem por finalidade:

Redu��o da ansiedade Seda��o Amn�sia (anter�grada e retr�grada)

Page 7: Anestesiologia 02   avaliação pré-anestésica

Arlindo Ugulino Netto –ANESTESIOLOGIA – MEDICINA P5 – 2009.2

7

Analgesia Redu��o das secre��es das vias a�reas Preven��o de respostas simp�ticas e parassimp�ticas aos reflexos auton�micos Redu��o do volume do conte�do g�strico, aumento do pH e t�nus do esf�ncter esof�gico do 1/3 inferior Anti-�mese (por meio de bloqueadores de receptores H2) Facilita��o na indu��o (suave) da anestesia Profilaxia de rea��es al�rgicas (rea��es anafilact�ides x anafil�ticas)

ORIENTA��O E CONSIDERA��ES FINAIS Classifica��o de acordo com ASA Libera��o para cirurgia programada (eletiva) Melhor indica��o da anestesia proposta Esclarecimentos da t�cnica anest�sica D�vidas (relacionamento m�dico – paciente) Confiabilidade da t�cnica proposta Consentimento m�dico-legal do ato anest�sico

Para concluir, pode se dizer que apesar do enorme avan�o tecnol�gico da medicina e da anestesiologia, da disponibilidade de exames especializados, da possibilidade do uso de monitoriza��o sofisticada e complexa, o anestesista n�o pode deixar de lado uma avalia��o global do paciente, a qual necessariamente envolve um estreito canal entre ele. A melhor avalia��o pr�-anest�sica ser� sempre uma hist�ria e exame f�sico minucioso no relacionamento m�dico-paciente.

A melhor medica��o pr�-anest�sica � a confian�a depositada naquele que minimiza o “sofrimento” e a “dor” do seu semelhante.


Recommended