APELAÇÃO CÍVEL Nº 649.927.5/1-00Apelante: O Ministério Público de São PauloApelados: Advocacia Alberto Rollo S/C e André Luís Anchão BragaParecer da Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos
Egrégio Tribunal de Justiça
Colenda Câmara
Eminentes Desembargadores
I – Relatório do necessário
Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo
Ministério Público de São Paulo, representado pelo
Digníssimo Promotor de Justiça de Porto Ferreira, em face
de André Luís Anchão Braga e Advocacia Alberto Rollo
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Sociedade Civil, visando a anulação do contrato nº 03/2001,
e posteriores aditamentos celebrados nos anos de 2002 e
2003, celebrados entre o Município de Porto Ferreira,
representado pelo então Prefeito André Luís Anchão Braga, e
a Advocacia Alberto Rollo Sociedade Civil, bem como
visando a aplicação, aos Apelados, das sanções previstas no
art.12, II, da Lei nº 8.429/92, sendo que, com relação a André
Luís pleiteou-se a sua condenação ao ressarcimento integral
do dano, à perda da função pública, à suspensão de seus
direitos políticos por 5 anos e o pagamento de multa civil, no
importe de duas vezes o valor do dano. Com relação à
Advocacia Alberto Rollo, pleiteou-se a sua condenação
solidária no ressarcimento integral do dano, no pagamento de
multa civil de duas vezes o valor do dano, e na proibição em
contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais, pelo prazo de 5 anos.
Fundou-se o digno promovente da ação, no
fato de que tais contratos foram firmados para a prestação de
assessoria técnica no acompanhamento de processos
administrativos em curso perante o Tribunal de Contas, com
o oferecimento de defesas, recursos e sustentações orais,
bem como para orientação preventiva em processos
licitatórios, o que seria absolutamente desnecessário,
porquanto poderia tal serviço ser executado pelos próprios
Procuradores Municipais, para quem este acompanhamento
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se trataria de atividade rotineira, possuindo eles
conhecimentos administrativos para tal.
Ademais, não se trataria de serviço singular,
não exigindo conhecimentos técnicos especializados, nem
especiais conhecimentos jurídicos, podendo ser prestado por
vários outros profissionais, e não só pela empresa
contratada, escolhida que foi por critérios subjetivos, já que
não possuía notória especialização nesta área, mas era, sim,
a empresa contratada pelo Apelado André, para tratar de
seus problemas particulares.
Na realidade, o Apelado André, ao firmar
tais contratos, estaria usando dinheiro público para atender
ao seu interesse particular, porquanto ele que poderia vir a
ser responsabilizado pelo resultado da apreciação do
Tribunal de Contas.
Assim, a celebração de tais contratos teria
violado a obrigatoriedade de prévia licitação (art.37, inciso
XXI, da CF, art.2º da Lei 8.666/93 e art.10, VIII, da Lei nº
8.429/92), bem como violado os princípios da legalidade, da
moralidade administrativa e da impessoalidade,
consubstanciando-se, ainda, em atos praticados com desvio
de finalidade.
Por meio da r.sentença de fls.1040/1050,
no entanto, a MM.Juíza de Porto Ferreira julgou
improcedente a presente ação, por entender se encontrar
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presente a causa de inexigibilidade de licitação, prevista no
art. 25, II, da Lei nº 8.666/93, uma vez que os Apelados
teriam demonstrado a efetiva prestação dos serviços
contratados; a capacitação técnica dos advogados
componentes da Advocacia Alberto Rollo; a fama de que
gozaria o titular de tal escritório, no meio acadêmico, entre
seus pares e entre os juristas, a denotar a sua notória
especialização; as características pessoais e técnicas
possuídas por tal advogado; a singularidade do serviço, por
exigir especial habilidade e contribuição intelectual, e por
outras “peculiaridades plausíveis”; e a inexistência de
flagrante lesão aos princípios da legalidade e
impessoalidade.
Inconformado com tal r.sentença, recorre o Ministério Público de São Paulo para este Egrégio Tribunal, pleiteando a sua reforma, e alegando, para tanto,
que os Apelados não contestaram a inicial, no tocante à
contratação, sem prévia licitação, do serviço de “orientação
preventiva em processos licitatórios”, restringindo-se as suas
defesas a tecer considerações sobre a contratação para
prestação de assessoria perante o Tribunal de Contas,
devendo, portanto, sofrerem o ônus da impugnação
específica, com relação aquele objeto não impugnado do
contrato, o que não foi considerado pela MM.Juíza.
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Sustenta, ainda, que segundo a melhor
jurisprudência, o poder de contratação de advogado pela
Administração Pública não é ilimitado, só podendo ser
considerada inexigível a licitação, em havendo singularidade
do serviço e notória especialização da pessoa ou empresa
contratada, situações estas que não estão presentes na
espécie.
A assessoria técnica da Prefeitura perante o
Tribunal de Contas, bem como a sua orientação preventiva
para licitações, tratam-se de serviços triviais, comuns e
rotineiros, usualmente desempenhados pelos próprios
Procuradores Municipais, não tendo os Apelados neste caso
apontado um motivo especial, da razão pela qual não se
serviu a Prefeitura de Porto Ferreira de seus próprios
Procuradores Municipais, para a realização de tais serviços,
os quais, inclusive, prestaram concurso público, devendo
conhecer o Direito Administrativo, estando, ainda, incumbidos
desta função, conforme previsto no art.81 da Lei Orgânica
Municipal daquele Município.
O exame das contas da Prefeitura, feito pelo
Tribunal de Contas, seria realizado anualmente, não se
tratando de controle jurisdicional, nem produzindo coisa
julgada, e nem sequer exigindo defesa técnica.
Existiria um número incomensurável de
advogados, que poderiam desempenhar estes serviços, que
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não se revestiriam de nenhuma característica distinta e
excepcional.
O “curriculum vitae” dos integrantes do
escritório de advocacia contratado (fls.48/56 em anexo) não
revelaria que seriam os mais adequados para o desempenho
de tais funções.
E o seu titular, Dr.Alberto Lopes Mendes
Rollo, não teria concluído cursos de mestrado ou doutorado,
e nem possuiria experiência ou trabalhos naquelas áreas,
mas apenas na área eleitoral.
O Apelado André teria agido com dolo e
desvio de finalidade, porquanto visando a interesse particular,
qual seja, evitar sua responsabilização pessoal em
decorrência de contas não aprovadas pelo respectivo
Tribunal, bem como visando beneficiar o seu advogado
particular, vez que a escolha do escritório de advocacia em
questão não teria sido feita por seus atributos, mas sim por já
patrocinar causas particulares do então Prefeito Municipal.
Assim, os contratos em apreço deveriam ser
anulados, por aplicação dos artigos 2º, “e”, da Lei nº 4.717/65
e 59 da Lei nº 8.666/93.
Finaliza o Apelante o seu recurso,
observando não se poder aceitar nenhuma interpretação da
lei contrária ao texto da CF, sendo totalmente infundada a
alegação levantada contra o MP, de litigância de má fé.
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Contra-Razões apresentadas pela
Advocacia Alberto Rollo S/C Ltda.às fls.1133/1184,
requerendo o não conhecimento do recurso, por suposta
ilegitimidade recursal da pessoa física do Promotor de
Justiça, que não se confundiria com o MP, este sim possuidor
de legitimidade para tal, e porque este Órgão não teria
impugnado os fundamentos da r.sentença, mas sim
apresentado nova réplica à contestação.
Alega, também, que algumas questões já
teriam sido julgadas por este E.Tribunal, nos autos do recurso
de agravo interposto contra a r.decisão liminar, onde teria
sido proferido v.acórdão sem a interposição de recurso,
questões estas que não poderiam mais ser rediscutidas,
referindo-se à inadequação desta ação para apuração de ato
de improbidade administrativa; impossibilidade de se pleitear
ressarcimento ao erário e impossibilidade do MP se basear
em dispositivos extraídos de dois diplomas legais distintos.
Alega, ainda, o Apelado, que o art.12 da Lei
da Improbidade Administrativa, na parte em que estabelece,
como sanções, a aplicação de multa civil, e a proibição de
contratar, receber benefícios ou incentivos fiscais do Poder
Público, seria inconstitucional, por não se encontrarem tais
sanções previstas no § 4º do art.37 da CF, que estabeleceria,
de forma taxativa, quais as sanções passíveis de serem
aplicadas ao agente que comete ato de improbidade.
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No mérito, o Apelado sustenta que a
atuação do advogado junto ao Tribunal de Contas seria sim
de natureza singular, como já teria sido reconhecido por este
E.Tribunal de Justiça em caso similar de Americana, com
apoio em parecer da Procuradoria de Justiça, já tendo
também o E.CSMP se manifestado neste sentido e,
finalmente, o E.STF.
O serviço de advocacia, salvo aqueles muito
rotineiros, seria, por sua natureza, impassível de competição,
escolhendo-se o advogado não pelo melhor preço, mas por
confiança, e dentro do critério de discricionariedade
administrativa, sob pena de mercantilização da profissão, o
que seria vedado pelas normas que regem a advocacia.
O serviço perante o Tribunal de Contas seria
singular, em razão dos requisitos exigidos por lei para o
exercício da função de seu membro, bem como em razão das
variadas leis sobre as quais se referem os seus
procedimentos e, ainda, por haver previsão de recurso
específico para o reexame da matéria.
A Apelada possuiria notória especialização,
na área do Direito Administrativo, constitucional e eleitoral,
possuindo três advogados mestres e um doutor em seus
quadros, bem como advogados com experiência de trabalho
em órgãos públicos. Além disto, o escritório promoveria há
dez anos, defesas no Tribunal de Contas, conhecendo a
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legislação específica. O Dr. Alberto Rollo não possuiria
mestrado ou doutorado, mas seria bacharel em economia e
administração de empresas, tendo feito curso técnico em
contabilidade, já tendo sido Conselheiro da OAB por dois
anos e Presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas
da OAB.
A contratação de serviços externos neste
caso teria sido necessária, em face do elevado número de
feitos já afetos aos Procuradores de Porto Ferreira, e em face
da dificuldade em se locomoverem para a Capital, onde se
encontra o Tribunal de Contas, sendo certo que caberia
apenas ao Administrador Público avaliar a existência, ou não,
desta necessidade.
O Apelante não teria comprovado o dolo ou
a culpa do Apelado que, aliás, não poderiam ser
reconhecidas, em razão da controvérsia existente sobre a
matéria.
Não teria, também, comprovado a
ocorrência de prejuízo ao erário, até porque os serviços
foram prestados, gerando eventual devolução do valor gasto
ao Município o seu enriquecimento ilícito.
É a síntese do necessário. Passo a opinar.
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II- Preliminares do Apelado
As preliminares levadas pelo Apelado não
têm nenhum fundamento, merecendo total rejeição.
Evidentemente, foi o Ministério Público de
São Paulo que interpôs o recurso de apelação ora analisado,
conforme está esclarecido na introdução de suas razões
recursais (fls.1075), decorre logicamente de seus termos, e
do papel timbrado utilizado (fls.1074/1127), figurando o digno
Promotor de Justiça oficiante como mero representante
daquela Instituição (fls.1074), inequivocamente legitimada
para a interposição do apelo (fls.499, § 2º, do CPC).
O recurso interposto, ademais, apresentou
longa e substanciosa fundamentação, a respeito das razões
pelas quais não devem prevalecer os fundamentos invocados
pela r.sentença recorrida (fls.1074/1127), cumprindo, à toda a
evidência, o disposto no art. 514, II, do CPC.
Por outro lado, as “questões” suscitadas
pelo Apelado, como tendo sido abordadas pelo v.acórdão
proferido nos autos do agravo de instrumento interposto
contra a r.decisão liminar, o foram como “motivação” do
v.acórdão (vide nos autos em apenso), não tendo sido
produzidas com relação a tais questões, portanto, os efeitos
da coisa julgada, nos termos do art.469, I, do, do CPC.
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Mesmo porque, tratam-se de questões
absolutamente superadas, porquanto o E.STF já sumulou o
entendimento de que a ação civil pública é adequada para a
defesa do patrimônio público (Súmula 329); a possibilidade
do pedido de ressarcimento está expressamente prevista no
art..37, § 4º, da CF, inexistindo qualquer impedimento legal a
que o Ministério Público fundamente os seus pedidos em
mais de um diploma legal.
Finalmente, não tem razão o Apelado, em
sustentar suposta inconstitucionalidade da multa civil, e da
proibição de contratar ou receber benefícios e incentivos
fiscais do Poder Público, porquanto como vem sendo
apregoado pela doutrina e pela jurisprudência, “Em que pese
o fato de o dispositivo constitucional não ter previsto as
sanções de perda dos bens, multa e proibição de contratar
com o Poder Público ou receber incentivos fiscais ou
creditícios, tal não tem o condão de acarretar a
inconstitucionalidade material de parte das sanções previstas
nos incisos do art.12 da Lei nº 8.429/92”. (in “Improbidade
Administrativa”-3ª edição - Emerson Garcia e Rogério
Pacheco Alves-2006 - pag.429/430).
E isto porque, conforme ensinam os citados
mestres, a norma inserta no § 4º do 37 da CF seria de caráter
programático, de eficácia limitada, tendo estabelecido
princípios mínimos a serem seguidos, mas delegando à
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legislação infraconstitucional a tarefa de discriminar as
sanções que realmente poderiam vir a ser aplicadas.
Não foi intenção do legislador constituinte
estabelecer todas as sanções que poderiam vir a ser
aplicadas ao ímprobo, tanto que se referiu, no § 4º do art.37,
também, à indisponibilidade de bens, que não é sanção, mas
um instrumento garantidor da sanção de natureza pecuniária.
Um entendimento contrário a este implicaria
em se reconhecer, por absurdo, que a CF determinou a
elaboração de um estatuto em prol do ímprobo, com o “direito
subjetivo” de somente sofrer as sanções previstas no texto
constitucional, o que contrariaria o sentido teleológico da
norma, de repressão à desonestidade e preservação do
interesse público (vide obra citada).
Veja-se, no mesmo sentido, o
posicionamento do E.STJ sobre a matéria, entendendo que o
rol previsto no § 4º, do art.37 da CF não é taxativo, podendo
a lei prever outras sanções que se coadunem com o texto
constitucional:
“O disposto no art. 12 da Lei n.º 8.429/92 se coaduna com a ordem constitucional vigente, mais precisamente com o art. 37, § 4º, da atual Constituição Federal, sendo cabível a aplicação de sanções outras que não as previstas no
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referido dispositivo constitucional.” (REsp 440.178/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08.06.2004, DJ 16.08.2004 p. 135).
III- Mérito
a- Assessoria preventiva em licitações– Atividade típica e comum dos Procuradores Municipais
Com razão o digno Recorrente, quando
afirma que os réus não impugnaram especificamente parte do objeto desta ação, contido na petição inicial, o que, por si
só, já se afigura suficiente para a reforma da r.sentença
recorrida e condenação dos mesmos nos termos da inicial.
Realmente, conforme constou da inicial, do
contrato e respectivos aditamentos que se visa anular por
meio desta ação, tais contratações visaram não só a
prestação de assessoria ao Município de Porto Ferreira junto
ao Tribunal de Contas, como, também, “a orientação
preventiva em processos licitatórios, por meio de pareceres
verbais (em questões de menor complexidade) ou por escrito”
(fls.84/85 e 100).
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Ambos estes fins se constituíram em objeto
principal do contrato, tratando-se, ademais, de tarefas
autônomas entre si, uma podendo ser prestada
independentemente da outra (fls.84/85 e 100).
Ora, evidentemente, que tal orientação
preventiva, e que estava sendo executada pelo escritório de
advocacia contratado (fls.691/693), se constitui em tarefa
típica, básica e rotineira dos Procuradores do Município, que
existiam à época dos fatos (fls.434), sendo absolutamente
desnecessária e indevida a contratação onerosa de terceiros
para o exercício de tal mister, que representa, assim,
inquestionável dano aos cofres públicos, por conduta dolosa
dos réus, que agiram com total consciência da ilicitude do
ato, bem como com vontade manifesta de contrariar a lei e a
moral administrativa, causando dano ao erário municipal
(art.10, “caput”, da Lei nº 8.429/92).
Nenhum motivo poderia justificar tal
contratação externa, e tanto isto é verdade que nenhum dos
réus, em suas contestações, teceu argumentos para tentar
demonstrar a sua necessidade ou cabimento (fls.363/433 e
800/805).
Observe-se que o réu André apresentou
contestação bastante genérica (fls.800/805), enquanto que o
Apelado se limitou a tentar demonstrar a necessidade e
cabimento da contratação de terceiro, para a prestação de
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assessoria técnica do Município junto ao Tribunal de Contas
(fls.363/433).
Assim, em se tratando de contratação de
terceiro com gasto público, evidentemente incabível e
desnecessária, bem como por falta de impugnação específica
dos réus (art.302 do CPC), já seria o caso de vir a ser
reformada a r.sentença “a quo”, porque tal contratação, para
orientação preventiva em licitações, por si só, já é suficiente
para configuração do ato de improbidade pelos réus,
conforme acima especificado.
b- Assessoria técnica junto ao Tribunal de Contas – Desvio de Finalidade – Art.10, “caput”, e incisos I, IX e XI, da Lei nº 8.429/92
No entanto, apenas para fins de se
argumentar e analisar todos os fatos abordados nesta ação,
passa-se a demonstrar a Vossas Excelências, que com
relação ao outro objeto da contratação (assessoria técnica junto ao Tribunal de Contas), houve manifesto desvio de finalidade, porquanto o Prefeito André Luís
contratou o escritório de advocacia Alberto Rollo, visando
evitar a sua responsabilização pessoal, por eventuais
irregularidades em sua gestão que viessem a ser apuradas
por aquele órgão.
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Realmente, a função precípua, básica e fundamental do Tribunal de Contas, conforme está previsto
no art.71 da CF, que se aplica aos Estados e Municípios pelo
princípio da simetria, e em virtude do disposto no art. 75 da
Magna Carta, é julgar e apreciar as contas das pessoas físicas que administrem ou sejam responsáveis por bens, dinheiros ou valores públicos, aplicando-lhes , em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas na lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário (art.71, I, II e VIII, da CF).
Pela análise da Lei Orgânica do Tribunal de
Contas do Estado nº 709/93, bem como pela análise de seu
Regimento Interno, aprovado pela Resolução 3/96 deste
mesmo Tribunal, esta função precípua do Tribunal de Contas
fica ainda mais realçada, porquanto pelo contido no art.5º,
parágrafo único, daquele primeiro diploma legal, ficou
estabelecido que em suas decisões, o Tribunal de Contas
deverá levar em conta a responsabilidade individual e solidária dos gestores e ordenadores de despesa, bem como daqueles que tiverem sob sua guarda ou controle bens ou valores públicos, o que é repetido em seu art.32,
determinando, ainda, o art.34 que em caso de as contas
vierem a ser julgadas regulares, quem recebe a quitação é “o responsável”, sendo que se vierem a ser julgadas
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irregulares, são os ordenadores, gestores ou demais responsáveis por bens e valores públicos que devem sofrer multas e sanções, tais como proibição do exercício
de determinados cargos, proibição de contratar com a
Administração, afastamento do cargo e indisponibilidade de
bens (artigos 101 à 109).
Portanto, muito embora não se possa negar
que a desaprovação de contas por aquele Tribunal possa
gerar conseqüências também para o Município, como a
suspensão de um ato ilegal, é certo que o julgamento feito
por este órgão tem em vista, precipuamente, a conduta do
administrador público, bem como a sua punição e prevenção
de novos atos ilegais, mediante aplicação de sanções de
caráter absolutamente pessoal.
Não se pode esquecer também, dos efeitos
políticos que tais decisões geram ou podem gerar para o
futuro de um político.
Fica claro, assim, que o ex-prefeito André,
ao contratar o escritório de advocacia Alberto Rollo para a
aparente prestação de assessoria técnica ao Município de
Porto Ferreira junto ao Tribunal de Contas, estava, na
realidade, visando evitar o julgamento desfavorável de sua
conduta como Prefeito por tal Tribunal, bem como a
aplicação, à sua pessoa física, das referidas sanções.
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Não havia interesse público em se proceder
à tal contratação, já que os efeitos de um julgamento
desfavorável junto ao Tribunal de Contas incidiriam,
fundamentalmente, sobre a pessoa do ex-prefeito, e não
sobre o Município, não tendo os réus demonstrado ou
comprovado o contrário, como lhes competia fazer.
Ou seja, pelo que está na CF e na lei
complementar nº 709/93, quem deve ser responsabilizado e
punido pela despesa julgada irregular pelo Tribunal de
Contas é a pessoa física do Administrador e não o Município,
visando-se, pelo contrário, mediante tal responsabilização,
reparar-se o dano causado por tal gestor aos cofres públicos
municipais, tanto que em caso de apuração de débito ou
desvio por ele causado, será o mesmo notificado a cobrir o
rombo (art.30, II e 39 da L.C.709/93).
Assim, os interesses públicos municipais não se confundem e podem até mesmo conflitar com os interesses pessoais da pessoa do Prefeito, o que torna
patente o descabimento do Prefeito contratar, em nome do
Município, um escritório de advocacia para promover,
supostamente, a defesa desta pessoa jurídica perante o
Tribunal de Contas.
Vamos supor, por hipótese, que o Prefeito
de um determinado Município tenha cometido um ato de
improbidade ou um crime, durante a sua gestão, e esteja
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receoso de o Tribunal de Contas vir a perceber isto,
remetendo cópias para o MP, para a tomada das
providências cabíveis.
Se este Prefeito, hipoteticamente
considerado, pudesse, em nome do Município, contratar um
escritório de advocacia para defender a lisura de sua gestão,
perante o Tribunal de Contas, estaríamos, por absurdo,
permitindo um gasto público para defender não só interesses
particulares do Prefeito, mas interesses absolutamente
contrários ao interesse público municipal, pois é evidente que
ao Município e aos munícipes interessa que sejam apurados
os atos de improbidade, bem como que sejam punidos os
responsáveis e reparados os danos cometidos ao erário
público.
Ou seja, não há dúvida que a contratação
realizada neste caso visou a interesse eminentemente
particular do Sr.Prefeito, que pode até conflitar com o
interesse público municipal, sendo manifesto, assim, o desvio de finalidade, e a lesão ao erário, esta última pela
celebração de contratos e respectivos aditamentos, para fins
particulares, com gasto de dinheiro público, nos anos de
2001, 2002 e 2003 (fls.99/103, 104/105 e 313/314).
Inafastável, portanto, o dolo dos agentes,
que agiram visando promover interesse particular às custas
do dinheiro público.
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O desvio de finalidade, por dolo e com dano
ao erário, fica ainda mais evidente, quando se verifica que os
advogados do escritório de Alberto Rollo já eram contratados pelo Prefeito André, para atender a seus interesses particulares (fls.308), tendo o réu André, em sua
contestação, confessado, expressamente, que o escolheu
enquanto Prefeito, por já ser ele o seu advogado na vida
particular (fls.804).
Aliás, a real especialidade do Dr. Alberto
Rollo, sócio majoritário do escritório contratado, é o direito
eleitoral, com relação ao qual já editou várias obras e proferiu
palestras (fls.110/11), sendo conhecido em seu meio e na
mídia como advogado de políticos com problemas
(fls.662/664), sendo certo, ainda, que sua experiência e
especialidade profissional primordial, comprovada nestes
autos, é o patrocínio de interesses pessoais de políticos,
como mostra o exemplo dos Deputados Abi Chedid (fls.663),
Wadih Helú (fls.620), Hanna Garib (fls.558 e 595), e outros
Prefeitos ou Vereadores que o contrataram (fls.579, 580, 582,
583, 587, 590, 601, 591/596).
Portanto, neste caso, fica claro que André o
procurou para, enquanto Prefeito Municipal de Porto Ferreira,
também evitar a sua responsabilização pessoal, em razão de
julgamentos desfavoráveis de sua gestão e de seus atos
perante o Tribunal de Contas.
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Os contratos e aditamentos foram assinados
pelo réu André e pelo escritório de advocacia em questão,
representado por seu sócio majoritário (fls.99/103, 104/105 e
313/314), sendo que ambos devem responder pelo ato de
improbidade capitulado no art.10, “caput”, e incisos I, IX e XI,
da Lei nº 8.429/92, o primeiro nos termos do art. 2º da lei e o
segundo nos termos do art.3º do mesmo diploma legal.
Também não há dúvida que, ao assim
agirem, descumpriram ambos os princípios da legalidade, da
moralidade administrativa e da lealdade às instituições,
cometendo ato que repugna ao senso médio comum de
honestidade, gerando a justa expectativa de todos de ver
punidos os responsáveis (art.11 da lei nº 8.429/92).
A questão da licitação, portanto, a rigor, é secundária, pois o contrato em questão e respectivos aditamentos não deveriam nem sequer terem sido firmados pelo Município.
c- Falta de Licitação – art.10, “caput” e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92
Mesmo que assim não fosse, o que se
admite somente para argumentar, não há dúvida que os réus
teriam incidido em outro ato de improbidade, pois a licitação
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seria absolutamente necessária, não ocorrendo, na espécie, a causa de inexigibilidade inserta no art.25, II, da Lei nº 8.666/93.
Em primeiro lugar, deve-se afastar,
veementemente, a tentativa do Apelado, de fazer crer que o
E.STF teria analisado o mérito da questão da inexigibilidade
ou não da licitação, para a contratação, pelo Poder Público,
de escritório de advocacia detentor de notória especialização.
Com efeito, o v.acórdão do E.STF citado pelo Apelado, na realidade, não conheceu do recurso extraordinário interposto com relação a esta matéria (nº 466.705-3), pela incidência de vários óbices sumulares,
entendendo aquela máxima Corte de Justiça, que a questão
atingiria a CF somente de forma reflexa ou indireta, tendo se
tornado preclusa a ofensa à questão federal, requerendo a
análise de provas e não tendo sido prequestionada a matéria
(fls. 1053/1068).
A matéria, no entanto, vem sendo corretamente analisada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica pela ementa abaixo transcrita, que firmou o seu entendimento no mesmo sentido do Promotor de Justiça Recorrente:
“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATO PARA REALIZAÇÃO DE SERVIÇOS
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TÉCNICOS ESPECIALIZADOS, MAS NÃO SINGULARES. ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. LICITAÇÃO. DISPENSA.1. Os serviços descritos no art. 13 da Lei n. 8.666/93, para que sejam contratados sem licitação, devem ter natureza singular e ser prestados por profissional notoriamente especializado, cuja escolha está adstrita à discricionariedade administrativa.2. Estando comprovado que os serviços jurídicos de que necessita o ente público são importantes, mas não apresentam singularidade, porque afetos a ramo do direito bastante disseminado entre os profissionais da área, e não demonstrada a notoriedade dos advogados – em relação aos diversos outros, também notórios, e com a mesma especialidade – que compõem o escritório de advocacia contratado, decorre ilegal contratação que tenha prescindido da respectiva licitação.3. Recurso especial não-provido.(REsp 436.869/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 06.12.2005, DJ 01.02.2006 p. 477)
Veja-se, ainda, o mesmo posicionamento
desta mesma Corte de Justiça, recente, apregoando neste
caso, inclusive, competir aos responsáveis pelo gasto público
o ônus de comprovar a inviabilidade da competição:
“CRIMINAL. RESP. CRIME COMETIDO POR PREFEITO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO
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PELO MUNICÍPIO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE SERVIÇO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE DOLO. NÃO DEMONSTRAÇÃO.RECURSO PROVIDO.I. A inviabilidade de competição, da qual decorre a inexigibilidade de licitação, deve ficar adequadamente demonstrada.II. Os casos de inexigibilidade de licitação ocorrem quando não há qualquer possibilidade de competição, diante da existência de apenas um objeto ou pessoa capazes de atender às necessidades da Administração Pública.III. Hipótese em que a Administração Pública, a pretexto de utilização do seu poder discricionário, contratou advogado sem procedimento licitatório, com base em sua "experiência profissional", através da simples menção de que o casuídico teve seu currículo aprovado pela comissão de licitação e pelo fato de que já prestara serviços a outras municipalidades.IV. Não demonstrada a inviabilidade de competição, da qual decorre a inexigibilidade de licitação, e nem a licitude na utilização de serviço público.V. Não obstante a orientação jurisprudencial desta Corte no sentido da necessidade de verificação do dolo para o recebimento da inicial acusatória nos crimes de responsabilidade de prefeito municipal, no presente caso tal entendimento não se mostra aplicável, se a apontada ausência de dolo na conduta do Prefeito não veio acompanhada de fundamentação suficiente a respaldar tal conclusão.
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VI. Recurso provido, nos termos do voto do Relator.”(REsp 848.549/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 07.12.2006, DJ 05.02.2007 p. 363)
Relativamente a todos os demais julgados,
sentenças ou pareceres juntados aos autos pelo Apelado,
verifica-se que, mesmo de acordo com eles, só se pode
concluir pela inexigibilidade de licitação, desde que
verificados determinados requisitos legais, o que depende da
análise específica das circunstâncias de cada caso concreto.
A Lei nº 8.666/93 é clara em estipular,
primeiramente, que nem todos os serviços técnicos
profissionais especializados (art.13), dentre os quais os
relativos a defesas de causas administrativas (art.13, V)
podem ser contratados pelo Poder Público
independentemente de licitação (art.13, § 1º).
A regra geral, mesmo tendo o contrato por
objeto a contratação deste tipo de serviço, é a
obrigatoriedade de prévia licitação, conforme disposto no
art.13, § 1º, da Lei nº 8.666/93, que tem fundamento
constitucional no art.37, “caput”, e inciso XXI, da Magna
Carta, e assim determina: “Ressalvados os casos de
inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de
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serviços técnicos profissionais especializados deverão,
preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de
concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração.
Portanto, nem todo o serviço advocatício
pode ser contratado pelo Poder Público sem prévia licitação,
mas apenas aquele em que se verifique a presença de
determinados requisitos legais, estipulados no art.25, “caput”,
inciso II e parágrafo primeiro, da mesma lei, os quais, como
se verá abaixo, não se encontram presentes na espécie.
No entanto, importa ressaltar que, além da
disposição legal expressa, determinando como regra geral a
realização de licitação para os serviços de assessoria
advocatícia, temos que a natureza deste, ao contrário do
alegado, não está a afastar a possibilidade de licitação.
Realmente, a advocacia não pode ser
considerada, por si só, um serviço que não possa ser objeto
de avaliação competitiva.
Como qualquer outro tipo de trabalho
técnico ou científico, pode ser analisado quanto à sua
qualidade para o objetivo visado, podendo o edital
estabelecer condições para tal aferição, tais como número de
casos em que o advogado já atuou na matéria, apresentação
de cópias de defesas e recursos interpostos na matéria
visada, êxitos obtidos, certidões negativas junto ao órgão
fiscalizador da profissão, declaração de seus pares, livros
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publicados, artigos, formação acadêmica diferenciada, cursos
realizados, etc.
Também com relação ao valor dos
honorários, nada impede que sejam feitas propostas, e que o
Poder Público avalie qual a mais condizente com o valor de
mercado, e qual a mais vantajosa para a Administração, em
termos de custo e benefício. Se até o particular pode fazer
esta análise, quanto mais a Administração Pública...
Não se estará, aqui, promovendo a
mercantilização da atividade, primeiro porque a licitação não
terá como único critério o preço dos honorários, fazendo-se,
isto sim, uma avaliação de vários itens, dentre os quais o
preço seria apenas um deles.
Segundo, porque o interesse maior, superior
e constitucional a ser preservado aqui, é o interesse público
da sociedade, de ver observados os princípios da
Administração Pública, relativos à publicidade, à legalidade, à
impessoalidade e à moralidade administrativas, que ficariam
seriamente comprometidos pelo absurdo entendimento, de
que o serviço de advocacia não poderia ser objeto de
licitação.
Como bem decidiu a Colenda Terceira
Câmara de Direito Público deste Egrégio Tribunal de Justiça,
“A pretensão de que os serviços advocatícios não se prestam
à licitação por amesquinhar o advogado não encontra
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fundamento legal. A conclusão de que os advogados se
situariam em campo imune ao princípio da legalidade, sob
pena de indevida atividade censória do Ministério Público e
do Judiciário legitimaria uma nova forma de impunidade e um
odioso privilégio afrontoso ao princípio de igualdade de todos
perante a lei.” (Apelação Cível nº 300.448-5/0, da Comarca
de Avaré, tendo como Relator o Exmo.Desembargador
LAERTE SAMPAIO).
Muito embora a confiança pessoal de uma
parte na outra possa ser determinante para a contratação de
um advogado por um particular, os agentes do Poder Público
não podem ter a mesma liberdade de contratação, por critério
meramente subjetivo, pois não se trata de um contrato entre
particulares, a ser pago com dinheiro privado, mas sim de um
contrato com o ente público, a ser pago com o dinheiro
público, só podendo o agente agir de acordo com critérios
objetivos, comprovados e justificados e, evidentemente, de
acordo com a lei.
O que importa analisar agora, é que não se
encontram presentes neste caso, nenhum dos três requisitos
exigidos por lei, para tornar inexigível a licitação.
O primeiro requisito está inserido no “caput”
do art.25 da Lei nº 8.666/93, referindo-se à “inviabilidade de competição”. O segundo está inserido no inciso II do mesmo
art.25, referindo-se à “singularidade do serviço”. E o
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terceiro, inserido no mesmo inciso legal, refere-se à
qualidade da empresa contratada, devendo possuir “notória especialização”, mas de acordo com os critérios objetivos especificados no § 1º do mesmo dispositivo legal.
A assessoria técnica perante o Tribunal de
Contas não se revela como serviço singular, entendido
como tal aquele serviço único ou raro, que possui
características tão especiais, que o torna bastante diferente
ou destacado dos demais afetos à mesma área.
Com efeito, todos os Municípios do País são
obrigados a prestar contas anuais aos Tribunais de Contas, e
isto há muitos anos, de forma que a defesa administrativa
nestes processos apresentada por advogados se trata de
trabalho comum, corriqueiro, e disseminado no País.
Como qualquer outro ramo do Direito, exige
conhecimento, estudos, pesquisas, esforço e dedicação.
Não se vislumbra, assim, nenhuma
especificidade ou complexidade, que o possa distinguir dos
demais ramos do Direito ou dos demais serviços
advocatícios.
Aliás, a prova desta condição comum do
serviço em questão está na leitura das petições apresentadas
por integrante do escritório Alberto Rollo, nos autos dos
processos administrativos do Tribunal de Contas, em
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decorrência dos contratos firmados com a Prefeitura de Porto
Ferreira (fls.704/794).
Tratam-se de petições simples, sem
grandes digressões ou incursões jurídicas, nada distinguindo
este trabalho de qualquer outro feito na área jurídica. Duas
das petições apresentadas foram, inclusive, subscritas por
estagiária de Direito (fls.787/794).
Hoje, especialidade ou atuação maior em
uma determinada área todos os advogados possuem, não se
constituindo tal em elemento diferenciador.
Também não se encontra presente na espécie, a “notória especialização” do contratado.
Primeiramente, deve-se ressaltar que, muito
embora tenha sido contratado o escritório de advocacia de
Alberto Rollo, quem foi designado internamente para prestar
esta assessoria técnica junto ao Tribunal de Contas foi o seu
associado mais jovem, Dr.Arthur Luis Mendonça Rollo
(fls.110/118 e 685/794).
Pelo “Curriculum Vitae” juntado aos autos,
verifica-se que o Dr.Arthur se formou na faculdade de Direito
de São Bernardo do Campo, seria professor “monitor” em
Processo Civil e em Direito Civil (fls.115), fez mestrado em
Direito das Relações Sociais pela Puc (fls.438), tendo
publicado um artigo sobre a importância do edital de licitação
para a Administração Pública (fls.452/456).
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Portanto, o Dr.Arthur não tem título
acadêmico diferenciado em Direito Público ou Administrativo,
não constando tenha feito qualquer curso específico quanto a
defesas administrativas em Tribunais de Contas, e nem se
podendo considerar o único singelo artigo por ele publicado,
como realização de “estudos” capaz de destacá-lo de outros
profissionais da área.
Também não se comprovou ter o Dr.Arthur
atuado em favor de outros Municípios, em defesas
administrativas junto ao Tribunal de Contas.
Sua juventude, atestada pela foto de fls.452
e pelo número de sua OAB (fls.115), nos permite concluir,
ainda, que não possa ter “longa” experiência na área jurídica.
Ou seja, não se comprovou desempenho
anterior, e nenhum dos demais critérios objetivos
especificados no § 1º do art.13 da Lei nº 8.666/93, como
indicadores de “notória especialização”.
Relativamente ao Dr. Alberto Rollo, sócio
majoritário do escritório de advocacia contratado, o só fato de
ter delegado o trabalho a outro advogado de seu escritório,
com bem menos tempo de advocacia, já demonstra que não
dependia tal serviço de sua alegada “notória especialização”.
Ou seja, não foi a especialização do Dr.Alberto Rollo, que ensejou a feitura do contrato impugnado por meio desta ação, tanto que os serviços
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contratados não foram feitos pelo Dr.Alberto Rollo, mas sim pelo Dr.Arthur.
Mesmo porque, conforme exposto, a
especialidade pessoal efetivamente comprovada pelo
Dr.Alberto Rollo neste caso, se refere à área eleitoral, com
relação à qual já editou várias obras e proferiu palestras
(fls.110/111), sendo conhecido por sua experiência na defesa
de políticos com problemas nesta área, tendo atuado
inclusive em campanhas políticas, e em processos de
cassação (fls.558, 595, 579, 580, 582, 583, 587, 590,
591/596, 601, 620, 662/664), área eleitoral esta que não diz respeito, especificamente, ao objeto contratado com a Prefeitura de Porto Ferreira.
Relativamente às declarações de outros
advogados juntadas a estes autos, sobre a idoneidade e
competência do Dr.Alberto Rollo, deve-se frisar que não se
objetiva aqui, discutir a competência de tal causídico, o que
nem seria devido, mas apenas verificar a existência, ou não,
de critérios estabelecidos pela lei para verificação de “notória
especialização”.
Assim, o serviço não era singular, nem havia
“notória especialização”, tendo sido escolhido o escritório do
Dr.Alberto Rollo por questões puramente pessoais, uma vez
que o Prefeito André Luís já o tinha como seu advogado
pessoal e, obviamente, queria se aproveitar de sua
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experiência, para evitar futuros problemas eleitorais, quando
fosse concorrer a outro cargo.
E mais, tratando-se de serviço advocatício
comum e disseminado no País, que poderia, assim, certamente ser realizado por inúmeros outros escritórios de advocacia, a conclusão lógica e necessária era no
sentido da necessidade da licitação, competindo aos réus o
ônus de comprovar que a competição seria inviável no caso,
como decidiu o E.STJ no caso acima citado, o que não fizeram.
Aliás, tanto o ônus era dos réus, que o
art.26 da lei das Licitações determina que as causas de
inexigibilidade de licitação, estipuladas em seu art.25, devem
ser necessariamente justificadas, o que significa que o
Apelado André deveria ter instruído o processo administrativo
de inexigibilidade de licitação, com documentos
comprobatórios da presença dos requisitos legais, o que
efetivamente não fez, tendo o processo administrativo sido
iniciado e terminado em pouquíssimos dias, conforme se
verifica pelos documentos juntados ao primeiro volume.
A falta de procedimento licitatório, em caso
que era evidentemente necessário (o serviço não era
singular, não havia notória especialização do contratado, e
haviam outros inúmeros prestadores do mesmo serviço no
mercado), escolhendo-se um escritório de advocacia por
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razões puramente pessoais, configura o ato de improbidade
administrativa capitulado no art.10, “caput” e inciso VIII, da
Lei nº 8.429/92, tendo sido praticado com evidente dolo,
representado pela intenção consciente, voluntária e
manifesta de infringir a CF e a lei, tendo se consubstanciado,
ainda, em flagrante violação dos princípios da legalidade, da
moralidade, da impessoalidade e da lealdade às instituições
(art.11 da lei nº 8.429/92).
IV – CONCLUSÃO
Assim sendo, por todas as razões expostas,
opina esta Procuradoria de Justiça sejam afastadas todas as
preliminares levantadas pelo Apelado, bem como seja dado
provimento ao recurso do MP, para o fim de serem os réus
condenados nos exatos termos do pedido inicial, por medida
de JUSTIÇA.
São Paulo, 04 de maio de 2007.
DORA BUSSAB CASTELO
Promotora de Justiça designada em Segunda Instância
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