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APELAÇÃO CÍVEL Nº 649.927.5/1-00 Apelante: O Ministério Público de São Paulo Apelados: Advocacia Alberto Rollo S/C e André Luís Anchão Braga Parecer da Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos Egrégio Tribunal de Justiça Colenda Câmara Eminentes Desembargadores I – Relatório do necessário 1

Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

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Page 1: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

APELAÇÃO CÍVEL Nº 649.927.5/1-00Apelante: O Ministério Público de São PauloApelados: Advocacia Alberto Rollo S/C e André Luís Anchão BragaParecer da Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos

Egrégio Tribunal de Justiça

Colenda Câmara

Eminentes Desembargadores

I – Relatório do necessário

Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo

Ministério Público de São Paulo, representado pelo

Digníssimo Promotor de Justiça de Porto Ferreira, em face

de André Luís Anchão Braga e Advocacia Alberto Rollo

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Sociedade Civil, visando a anulação do contrato nº 03/2001,

e posteriores aditamentos celebrados nos anos de 2002 e

2003, celebrados entre o Município de Porto Ferreira,

representado pelo então Prefeito André Luís Anchão Braga, e

a Advocacia Alberto Rollo Sociedade Civil, bem como

visando a aplicação, aos Apelados, das sanções previstas no

art.12, II, da Lei nº 8.429/92, sendo que, com relação a André

Luís pleiteou-se a sua condenação ao ressarcimento integral

do dano, à perda da função pública, à suspensão de seus

direitos políticos por 5 anos e o pagamento de multa civil, no

importe de duas vezes o valor do dano. Com relação à

Advocacia Alberto Rollo, pleiteou-se a sua condenação

solidária no ressarcimento integral do dano, no pagamento de

multa civil de duas vezes o valor do dano, e na proibição em

contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais, pelo prazo de 5 anos.

Fundou-se o digno promovente da ação, no

fato de que tais contratos foram firmados para a prestação de

assessoria técnica no acompanhamento de processos

administrativos em curso perante o Tribunal de Contas, com

o oferecimento de defesas, recursos e sustentações orais,

bem como para orientação preventiva em processos

licitatórios, o que seria absolutamente desnecessário,

porquanto poderia tal serviço ser executado pelos próprios

Procuradores Municipais, para quem este acompanhamento

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se trataria de atividade rotineira, possuindo eles

conhecimentos administrativos para tal.

Ademais, não se trataria de serviço singular,

não exigindo conhecimentos técnicos especializados, nem

especiais conhecimentos jurídicos, podendo ser prestado por

vários outros profissionais, e não só pela empresa

contratada, escolhida que foi por critérios subjetivos, já que

não possuía notória especialização nesta área, mas era, sim,

a empresa contratada pelo Apelado André, para tratar de

seus problemas particulares.

Na realidade, o Apelado André, ao firmar

tais contratos, estaria usando dinheiro público para atender

ao seu interesse particular, porquanto ele que poderia vir a

ser responsabilizado pelo resultado da apreciação do

Tribunal de Contas.

Assim, a celebração de tais contratos teria

violado a obrigatoriedade de prévia licitação (art.37, inciso

XXI, da CF, art.2º da Lei 8.666/93 e art.10, VIII, da Lei nº

8.429/92), bem como violado os princípios da legalidade, da

moralidade administrativa e da impessoalidade,

consubstanciando-se, ainda, em atos praticados com desvio

de finalidade.

Por meio da r.sentença de fls.1040/1050,

no entanto, a MM.Juíza de Porto Ferreira julgou

improcedente a presente ação, por entender se encontrar

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Page 4: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

presente a causa de inexigibilidade de licitação, prevista no

art. 25, II, da Lei nº 8.666/93, uma vez que os Apelados

teriam demonstrado a efetiva prestação dos serviços

contratados; a capacitação técnica dos advogados

componentes da Advocacia Alberto Rollo; a fama de que

gozaria o titular de tal escritório, no meio acadêmico, entre

seus pares e entre os juristas, a denotar a sua notória

especialização; as características pessoais e técnicas

possuídas por tal advogado; a singularidade do serviço, por

exigir especial habilidade e contribuição intelectual, e por

outras “peculiaridades plausíveis”; e a inexistência de

flagrante lesão aos princípios da legalidade e

impessoalidade.

Inconformado com tal r.sentença, recorre o Ministério Público de São Paulo para este Egrégio Tribunal, pleiteando a sua reforma, e alegando, para tanto,

que os Apelados não contestaram a inicial, no tocante à

contratação, sem prévia licitação, do serviço de “orientação

preventiva em processos licitatórios”, restringindo-se as suas

defesas a tecer considerações sobre a contratação para

prestação de assessoria perante o Tribunal de Contas,

devendo, portanto, sofrerem o ônus da impugnação

específica, com relação aquele objeto não impugnado do

contrato, o que não foi considerado pela MM.Juíza.

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Page 5: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

Sustenta, ainda, que segundo a melhor

jurisprudência, o poder de contratação de advogado pela

Administração Pública não é ilimitado, só podendo ser

considerada inexigível a licitação, em havendo singularidade

do serviço e notória especialização da pessoa ou empresa

contratada, situações estas que não estão presentes na

espécie.

A assessoria técnica da Prefeitura perante o

Tribunal de Contas, bem como a sua orientação preventiva

para licitações, tratam-se de serviços triviais, comuns e

rotineiros, usualmente desempenhados pelos próprios

Procuradores Municipais, não tendo os Apelados neste caso

apontado um motivo especial, da razão pela qual não se

serviu a Prefeitura de Porto Ferreira de seus próprios

Procuradores Municipais, para a realização de tais serviços,

os quais, inclusive, prestaram concurso público, devendo

conhecer o Direito Administrativo, estando, ainda, incumbidos

desta função, conforme previsto no art.81 da Lei Orgânica

Municipal daquele Município.

O exame das contas da Prefeitura, feito pelo

Tribunal de Contas, seria realizado anualmente, não se

tratando de controle jurisdicional, nem produzindo coisa

julgada, e nem sequer exigindo defesa técnica.

Existiria um número incomensurável de

advogados, que poderiam desempenhar estes serviços, que

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não se revestiriam de nenhuma característica distinta e

excepcional.

O “curriculum vitae” dos integrantes do

escritório de advocacia contratado (fls.48/56 em anexo) não

revelaria que seriam os mais adequados para o desempenho

de tais funções.

E o seu titular, Dr.Alberto Lopes Mendes

Rollo, não teria concluído cursos de mestrado ou doutorado,

e nem possuiria experiência ou trabalhos naquelas áreas,

mas apenas na área eleitoral.

O Apelado André teria agido com dolo e

desvio de finalidade, porquanto visando a interesse particular,

qual seja, evitar sua responsabilização pessoal em

decorrência de contas não aprovadas pelo respectivo

Tribunal, bem como visando beneficiar o seu advogado

particular, vez que a escolha do escritório de advocacia em

questão não teria sido feita por seus atributos, mas sim por já

patrocinar causas particulares do então Prefeito Municipal.

Assim, os contratos em apreço deveriam ser

anulados, por aplicação dos artigos 2º, “e”, da Lei nº 4.717/65

e 59 da Lei nº 8.666/93.

Finaliza o Apelante o seu recurso,

observando não se poder aceitar nenhuma interpretação da

lei contrária ao texto da CF, sendo totalmente infundada a

alegação levantada contra o MP, de litigância de má fé.

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Page 7: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

Contra-Razões apresentadas pela

Advocacia Alberto Rollo S/C Ltda.às fls.1133/1184,

requerendo o não conhecimento do recurso, por suposta

ilegitimidade recursal da pessoa física do Promotor de

Justiça, que não se confundiria com o MP, este sim possuidor

de legitimidade para tal, e porque este Órgão não teria

impugnado os fundamentos da r.sentença, mas sim

apresentado nova réplica à contestação.

Alega, também, que algumas questões já

teriam sido julgadas por este E.Tribunal, nos autos do recurso

de agravo interposto contra a r.decisão liminar, onde teria

sido proferido v.acórdão sem a interposição de recurso,

questões estas que não poderiam mais ser rediscutidas,

referindo-se à inadequação desta ação para apuração de ato

de improbidade administrativa; impossibilidade de se pleitear

ressarcimento ao erário e impossibilidade do MP se basear

em dispositivos extraídos de dois diplomas legais distintos.

Alega, ainda, o Apelado, que o art.12 da Lei

da Improbidade Administrativa, na parte em que estabelece,

como sanções, a aplicação de multa civil, e a proibição de

contratar, receber benefícios ou incentivos fiscais do Poder

Público, seria inconstitucional, por não se encontrarem tais

sanções previstas no § 4º do art.37 da CF, que estabeleceria,

de forma taxativa, quais as sanções passíveis de serem

aplicadas ao agente que comete ato de improbidade.

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Page 8: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

No mérito, o Apelado sustenta que a

atuação do advogado junto ao Tribunal de Contas seria sim

de natureza singular, como já teria sido reconhecido por este

E.Tribunal de Justiça em caso similar de Americana, com

apoio em parecer da Procuradoria de Justiça, já tendo

também o E.CSMP se manifestado neste sentido e,

finalmente, o E.STF.

O serviço de advocacia, salvo aqueles muito

rotineiros, seria, por sua natureza, impassível de competição,

escolhendo-se o advogado não pelo melhor preço, mas por

confiança, e dentro do critério de discricionariedade

administrativa, sob pena de mercantilização da profissão, o

que seria vedado pelas normas que regem a advocacia.

O serviço perante o Tribunal de Contas seria

singular, em razão dos requisitos exigidos por lei para o

exercício da função de seu membro, bem como em razão das

variadas leis sobre as quais se referem os seus

procedimentos e, ainda, por haver previsão de recurso

específico para o reexame da matéria.

A Apelada possuiria notória especialização,

na área do Direito Administrativo, constitucional e eleitoral,

possuindo três advogados mestres e um doutor em seus

quadros, bem como advogados com experiência de trabalho

em órgãos públicos. Além disto, o escritório promoveria há

dez anos, defesas no Tribunal de Contas, conhecendo a

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legislação específica. O Dr. Alberto Rollo não possuiria

mestrado ou doutorado, mas seria bacharel em economia e

administração de empresas, tendo feito curso técnico em

contabilidade, já tendo sido Conselheiro da OAB por dois

anos e Presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas

da OAB.

A contratação de serviços externos neste

caso teria sido necessária, em face do elevado número de

feitos já afetos aos Procuradores de Porto Ferreira, e em face

da dificuldade em se locomoverem para a Capital, onde se

encontra o Tribunal de Contas, sendo certo que caberia

apenas ao Administrador Público avaliar a existência, ou não,

desta necessidade.

O Apelante não teria comprovado o dolo ou

a culpa do Apelado que, aliás, não poderiam ser

reconhecidas, em razão da controvérsia existente sobre a

matéria.

Não teria, também, comprovado a

ocorrência de prejuízo ao erário, até porque os serviços

foram prestados, gerando eventual devolução do valor gasto

ao Município o seu enriquecimento ilícito.

É a síntese do necessário. Passo a opinar.

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II- Preliminares do Apelado

As preliminares levadas pelo Apelado não

têm nenhum fundamento, merecendo total rejeição.

Evidentemente, foi o Ministério Público de

São Paulo que interpôs o recurso de apelação ora analisado,

conforme está esclarecido na introdução de suas razões

recursais (fls.1075), decorre logicamente de seus termos, e

do papel timbrado utilizado (fls.1074/1127), figurando o digno

Promotor de Justiça oficiante como mero representante

daquela Instituição (fls.1074), inequivocamente legitimada

para a interposição do apelo (fls.499, § 2º, do CPC).

O recurso interposto, ademais, apresentou

longa e substanciosa fundamentação, a respeito das razões

pelas quais não devem prevalecer os fundamentos invocados

pela r.sentença recorrida (fls.1074/1127), cumprindo, à toda a

evidência, o disposto no art. 514, II, do CPC.

Por outro lado, as “questões” suscitadas

pelo Apelado, como tendo sido abordadas pelo v.acórdão

proferido nos autos do agravo de instrumento interposto

contra a r.decisão liminar, o foram como “motivação” do

v.acórdão (vide nos autos em apenso), não tendo sido

produzidas com relação a tais questões, portanto, os efeitos

da coisa julgada, nos termos do art.469, I, do, do CPC.

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Mesmo porque, tratam-se de questões

absolutamente superadas, porquanto o E.STF já sumulou o

entendimento de que a ação civil pública é adequada para a

defesa do patrimônio público (Súmula 329); a possibilidade

do pedido de ressarcimento está expressamente prevista no

art..37, § 4º, da CF, inexistindo qualquer impedimento legal a

que o Ministério Público fundamente os seus pedidos em

mais de um diploma legal.

Finalmente, não tem razão o Apelado, em

sustentar suposta inconstitucionalidade da multa civil, e da

proibição de contratar ou receber benefícios e incentivos

fiscais do Poder Público, porquanto como vem sendo

apregoado pela doutrina e pela jurisprudência, “Em que pese

o fato de o dispositivo constitucional não ter previsto as

sanções de perda dos bens, multa e proibição de contratar

com o Poder Público ou receber incentivos fiscais ou

creditícios, tal não tem o condão de acarretar a

inconstitucionalidade material de parte das sanções previstas

nos incisos do art.12 da Lei nº 8.429/92”. (in “Improbidade

Administrativa”-3ª edição - Emerson Garcia e Rogério

Pacheco Alves-2006 - pag.429/430).

E isto porque, conforme ensinam os citados

mestres, a norma inserta no § 4º do 37 da CF seria de caráter

programático, de eficácia limitada, tendo estabelecido

princípios mínimos a serem seguidos, mas delegando à

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legislação infraconstitucional a tarefa de discriminar as

sanções que realmente poderiam vir a ser aplicadas.

Não foi intenção do legislador constituinte

estabelecer todas as sanções que poderiam vir a ser

aplicadas ao ímprobo, tanto que se referiu, no § 4º do art.37,

também, à indisponibilidade de bens, que não é sanção, mas

um instrumento garantidor da sanção de natureza pecuniária.

Um entendimento contrário a este implicaria

em se reconhecer, por absurdo, que a CF determinou a

elaboração de um estatuto em prol do ímprobo, com o “direito

subjetivo” de somente sofrer as sanções previstas no texto

constitucional, o que contrariaria o sentido teleológico da

norma, de repressão à desonestidade e preservação do

interesse público (vide obra citada).

Veja-se, no mesmo sentido, o

posicionamento do E.STJ sobre a matéria, entendendo que o

rol previsto no § 4º, do art.37 da CF não é taxativo, podendo

a lei prever outras sanções que se coadunem com o texto

constitucional:

“O disposto no art. 12 da Lei n.º 8.429/92 se coaduna com a ordem constitucional vigente, mais precisamente com o art. 37, § 4º, da atual Constituição Federal, sendo cabível a aplicação de sanções outras que não as previstas no

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referido dispositivo constitucional.” (REsp 440.178/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08.06.2004, DJ 16.08.2004 p. 135).

III- Mérito

a- Assessoria preventiva em licitações– Atividade típica e comum dos Procuradores Municipais

Com razão o digno Recorrente, quando

afirma que os réus não impugnaram especificamente parte do objeto desta ação, contido na petição inicial, o que, por si

só, já se afigura suficiente para a reforma da r.sentença

recorrida e condenação dos mesmos nos termos da inicial.

Realmente, conforme constou da inicial, do

contrato e respectivos aditamentos que se visa anular por

meio desta ação, tais contratações visaram não só a

prestação de assessoria ao Município de Porto Ferreira junto

ao Tribunal de Contas, como, também, “a orientação

preventiva em processos licitatórios, por meio de pareceres

verbais (em questões de menor complexidade) ou por escrito”

(fls.84/85 e 100).

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Page 14: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

Ambos estes fins se constituíram em objeto

principal do contrato, tratando-se, ademais, de tarefas

autônomas entre si, uma podendo ser prestada

independentemente da outra (fls.84/85 e 100).

Ora, evidentemente, que tal orientação

preventiva, e que estava sendo executada pelo escritório de

advocacia contratado (fls.691/693), se constitui em tarefa

típica, básica e rotineira dos Procuradores do Município, que

existiam à época dos fatos (fls.434), sendo absolutamente

desnecessária e indevida a contratação onerosa de terceiros

para o exercício de tal mister, que representa, assim,

inquestionável dano aos cofres públicos, por conduta dolosa

dos réus, que agiram com total consciência da ilicitude do

ato, bem como com vontade manifesta de contrariar a lei e a

moral administrativa, causando dano ao erário municipal

(art.10, “caput”, da Lei nº 8.429/92).

Nenhum motivo poderia justificar tal

contratação externa, e tanto isto é verdade que nenhum dos

réus, em suas contestações, teceu argumentos para tentar

demonstrar a sua necessidade ou cabimento (fls.363/433 e

800/805).

Observe-se que o réu André apresentou

contestação bastante genérica (fls.800/805), enquanto que o

Apelado se limitou a tentar demonstrar a necessidade e

cabimento da contratação de terceiro, para a prestação de

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Page 15: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

assessoria técnica do Município junto ao Tribunal de Contas

(fls.363/433).

Assim, em se tratando de contratação de

terceiro com gasto público, evidentemente incabível e

desnecessária, bem como por falta de impugnação específica

dos réus (art.302 do CPC), já seria o caso de vir a ser

reformada a r.sentença “a quo”, porque tal contratação, para

orientação preventiva em licitações, por si só, já é suficiente

para configuração do ato de improbidade pelos réus,

conforme acima especificado.

b- Assessoria técnica junto ao Tribunal de Contas – Desvio de Finalidade – Art.10, “caput”, e incisos I, IX e XI, da Lei nº 8.429/92

No entanto, apenas para fins de se

argumentar e analisar todos os fatos abordados nesta ação,

passa-se a demonstrar a Vossas Excelências, que com

relação ao outro objeto da contratação (assessoria técnica junto ao Tribunal de Contas), houve manifesto desvio de finalidade, porquanto o Prefeito André Luís

contratou o escritório de advocacia Alberto Rollo, visando

evitar a sua responsabilização pessoal, por eventuais

irregularidades em sua gestão que viessem a ser apuradas

por aquele órgão.

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Page 16: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

Realmente, a função precípua, básica e fundamental do Tribunal de Contas, conforme está previsto

no art.71 da CF, que se aplica aos Estados e Municípios pelo

princípio da simetria, e em virtude do disposto no art. 75 da

Magna Carta, é julgar e apreciar as contas das pessoas físicas que administrem ou sejam responsáveis por bens, dinheiros ou valores públicos, aplicando-lhes , em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas na lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário (art.71, I, II e VIII, da CF).

Pela análise da Lei Orgânica do Tribunal de

Contas do Estado nº 709/93, bem como pela análise de seu

Regimento Interno, aprovado pela Resolução 3/96 deste

mesmo Tribunal, esta função precípua do Tribunal de Contas

fica ainda mais realçada, porquanto pelo contido no art.5º,

parágrafo único, daquele primeiro diploma legal, ficou

estabelecido que em suas decisões, o Tribunal de Contas

deverá levar em conta a responsabilidade individual e solidária dos gestores e ordenadores de despesa, bem como daqueles que tiverem sob sua guarda ou controle bens ou valores públicos, o que é repetido em seu art.32,

determinando, ainda, o art.34 que em caso de as contas

vierem a ser julgadas regulares, quem recebe a quitação é “o responsável”, sendo que se vierem a ser julgadas

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Page 17: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

irregulares, são os ordenadores, gestores ou demais responsáveis por bens e valores públicos que devem sofrer multas e sanções, tais como proibição do exercício

de determinados cargos, proibição de contratar com a

Administração, afastamento do cargo e indisponibilidade de

bens (artigos 101 à 109).

Portanto, muito embora não se possa negar

que a desaprovação de contas por aquele Tribunal possa

gerar conseqüências também para o Município, como a

suspensão de um ato ilegal, é certo que o julgamento feito

por este órgão tem em vista, precipuamente, a conduta do

administrador público, bem como a sua punição e prevenção

de novos atos ilegais, mediante aplicação de sanções de

caráter absolutamente pessoal.

Não se pode esquecer também, dos efeitos

políticos que tais decisões geram ou podem gerar para o

futuro de um político.

Fica claro, assim, que o ex-prefeito André,

ao contratar o escritório de advocacia Alberto Rollo para a

aparente prestação de assessoria técnica ao Município de

Porto Ferreira junto ao Tribunal de Contas, estava, na

realidade, visando evitar o julgamento desfavorável de sua

conduta como Prefeito por tal Tribunal, bem como a

aplicação, à sua pessoa física, das referidas sanções.

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Page 18: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

Não havia interesse público em se proceder

à tal contratação, já que os efeitos de um julgamento

desfavorável junto ao Tribunal de Contas incidiriam,

fundamentalmente, sobre a pessoa do ex-prefeito, e não

sobre o Município, não tendo os réus demonstrado ou

comprovado o contrário, como lhes competia fazer.

Ou seja, pelo que está na CF e na lei

complementar nº 709/93, quem deve ser responsabilizado e

punido pela despesa julgada irregular pelo Tribunal de

Contas é a pessoa física do Administrador e não o Município,

visando-se, pelo contrário, mediante tal responsabilização,

reparar-se o dano causado por tal gestor aos cofres públicos

municipais, tanto que em caso de apuração de débito ou

desvio por ele causado, será o mesmo notificado a cobrir o

rombo (art.30, II e 39 da L.C.709/93).

Assim, os interesses públicos municipais não se confundem e podem até mesmo conflitar com os interesses pessoais da pessoa do Prefeito, o que torna

patente o descabimento do Prefeito contratar, em nome do

Município, um escritório de advocacia para promover,

supostamente, a defesa desta pessoa jurídica perante o

Tribunal de Contas.

Vamos supor, por hipótese, que o Prefeito

de um determinado Município tenha cometido um ato de

improbidade ou um crime, durante a sua gestão, e esteja

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Page 19: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

receoso de o Tribunal de Contas vir a perceber isto,

remetendo cópias para o MP, para a tomada das

providências cabíveis.

Se este Prefeito, hipoteticamente

considerado, pudesse, em nome do Município, contratar um

escritório de advocacia para defender a lisura de sua gestão,

perante o Tribunal de Contas, estaríamos, por absurdo,

permitindo um gasto público para defender não só interesses

particulares do Prefeito, mas interesses absolutamente

contrários ao interesse público municipal, pois é evidente que

ao Município e aos munícipes interessa que sejam apurados

os atos de improbidade, bem como que sejam punidos os

responsáveis e reparados os danos cometidos ao erário

público.

Ou seja, não há dúvida que a contratação

realizada neste caso visou a interesse eminentemente

particular do Sr.Prefeito, que pode até conflitar com o

interesse público municipal, sendo manifesto, assim, o desvio de finalidade, e a lesão ao erário, esta última pela

celebração de contratos e respectivos aditamentos, para fins

particulares, com gasto de dinheiro público, nos anos de

2001, 2002 e 2003 (fls.99/103, 104/105 e 313/314).

Inafastável, portanto, o dolo dos agentes,

que agiram visando promover interesse particular às custas

do dinheiro público.

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Page 20: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

O desvio de finalidade, por dolo e com dano

ao erário, fica ainda mais evidente, quando se verifica que os

advogados do escritório de Alberto Rollo já eram contratados pelo Prefeito André, para atender a seus interesses particulares (fls.308), tendo o réu André, em sua

contestação, confessado, expressamente, que o escolheu

enquanto Prefeito, por já ser ele o seu advogado na vida

particular (fls.804).

Aliás, a real especialidade do Dr. Alberto

Rollo, sócio majoritário do escritório contratado, é o direito

eleitoral, com relação ao qual já editou várias obras e proferiu

palestras (fls.110/11), sendo conhecido em seu meio e na

mídia como advogado de políticos com problemas

(fls.662/664), sendo certo, ainda, que sua experiência e

especialidade profissional primordial, comprovada nestes

autos, é o patrocínio de interesses pessoais de políticos,

como mostra o exemplo dos Deputados Abi Chedid (fls.663),

Wadih Helú (fls.620), Hanna Garib (fls.558 e 595), e outros

Prefeitos ou Vereadores que o contrataram (fls.579, 580, 582,

583, 587, 590, 601, 591/596).

Portanto, neste caso, fica claro que André o

procurou para, enquanto Prefeito Municipal de Porto Ferreira,

também evitar a sua responsabilização pessoal, em razão de

julgamentos desfavoráveis de sua gestão e de seus atos

perante o Tribunal de Contas.

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Page 21: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

Os contratos e aditamentos foram assinados

pelo réu André e pelo escritório de advocacia em questão,

representado por seu sócio majoritário (fls.99/103, 104/105 e

313/314), sendo que ambos devem responder pelo ato de

improbidade capitulado no art.10, “caput”, e incisos I, IX e XI,

da Lei nº 8.429/92, o primeiro nos termos do art. 2º da lei e o

segundo nos termos do art.3º do mesmo diploma legal.

Também não há dúvida que, ao assim

agirem, descumpriram ambos os princípios da legalidade, da

moralidade administrativa e da lealdade às instituições,

cometendo ato que repugna ao senso médio comum de

honestidade, gerando a justa expectativa de todos de ver

punidos os responsáveis (art.11 da lei nº 8.429/92).

A questão da licitação, portanto, a rigor, é secundária, pois o contrato em questão e respectivos aditamentos não deveriam nem sequer terem sido firmados pelo Município.

c- Falta de Licitação – art.10, “caput” e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92

Mesmo que assim não fosse, o que se

admite somente para argumentar, não há dúvida que os réus

teriam incidido em outro ato de improbidade, pois a licitação

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Page 22: Prefeitura - Contrato Advocatício - Defesa Administrativa

seria absolutamente necessária, não ocorrendo, na espécie, a causa de inexigibilidade inserta no art.25, II, da Lei nº 8.666/93.

Em primeiro lugar, deve-se afastar,

veementemente, a tentativa do Apelado, de fazer crer que o

E.STF teria analisado o mérito da questão da inexigibilidade

ou não da licitação, para a contratação, pelo Poder Público,

de escritório de advocacia detentor de notória especialização.

Com efeito, o v.acórdão do E.STF citado pelo Apelado, na realidade, não conheceu do recurso extraordinário interposto com relação a esta matéria (nº 466.705-3), pela incidência de vários óbices sumulares,

entendendo aquela máxima Corte de Justiça, que a questão

atingiria a CF somente de forma reflexa ou indireta, tendo se

tornado preclusa a ofensa à questão federal, requerendo a

análise de provas e não tendo sido prequestionada a matéria

(fls. 1053/1068).

A matéria, no entanto, vem sendo corretamente analisada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica pela ementa abaixo transcrita, que firmou o seu entendimento no mesmo sentido do Promotor de Justiça Recorrente:

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATO PARA REALIZAÇÃO DE SERVIÇOS

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TÉCNICOS ESPECIALIZADOS, MAS NÃO SINGULARES. ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. LICITAÇÃO. DISPENSA.1. Os serviços descritos no art. 13 da Lei n. 8.666/93, para que sejam contratados sem licitação, devem ter natureza singular e ser prestados por profissional notoriamente especializado, cuja escolha está adstrita à discricionariedade administrativa.2. Estando comprovado que os serviços jurídicos de que necessita o ente público são importantes, mas não apresentam singularidade, porque afetos a ramo do direito bastante disseminado entre os profissionais da área, e não demonstrada a notoriedade dos advogados – em relação aos diversos outros, também notórios, e com a mesma especialidade – que compõem o escritório de advocacia contratado, decorre ilegal contratação que tenha prescindido da respectiva licitação.3. Recurso especial não-provido.(REsp 436.869/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 06.12.2005, DJ 01.02.2006 p. 477)

Veja-se, ainda, o mesmo posicionamento

desta mesma Corte de Justiça, recente, apregoando neste

caso, inclusive, competir aos responsáveis pelo gasto público

o ônus de comprovar a inviabilidade da competição:

“CRIMINAL. RESP. CRIME COMETIDO POR PREFEITO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO

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PELO MUNICÍPIO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE SERVIÇO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE DOLO. NÃO DEMONSTRAÇÃO.RECURSO PROVIDO.I. A inviabilidade de competição, da qual decorre a inexigibilidade de licitação, deve ficar adequadamente demonstrada.II. Os casos de inexigibilidade de licitação ocorrem quando não há qualquer possibilidade de competição, diante da existência de apenas um objeto ou pessoa capazes de atender às necessidades da Administração Pública.III. Hipótese em que a Administração Pública, a pretexto de utilização do seu poder discricionário, contratou advogado sem procedimento licitatório, com base em sua "experiência profissional", através da simples menção de que o casuídico teve seu currículo aprovado pela comissão de licitação e pelo fato de que já prestara serviços a outras municipalidades.IV. Não demonstrada a inviabilidade de competição, da qual decorre a inexigibilidade de licitação, e nem a licitude na utilização de serviço público.V. Não obstante a orientação jurisprudencial desta Corte no sentido da necessidade de verificação do dolo para o recebimento da inicial acusatória nos crimes de responsabilidade de prefeito municipal, no presente caso tal entendimento não se mostra aplicável, se a apontada ausência de dolo na conduta do Prefeito não veio acompanhada de fundamentação suficiente a respaldar tal conclusão.

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VI. Recurso provido, nos termos do voto do Relator.”(REsp 848.549/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 07.12.2006, DJ 05.02.2007 p. 363)

Relativamente a todos os demais julgados,

sentenças ou pareceres juntados aos autos pelo Apelado,

verifica-se que, mesmo de acordo com eles, só se pode

concluir pela inexigibilidade de licitação, desde que

verificados determinados requisitos legais, o que depende da

análise específica das circunstâncias de cada caso concreto.

A Lei nº 8.666/93 é clara em estipular,

primeiramente, que nem todos os serviços técnicos

profissionais especializados (art.13), dentre os quais os

relativos a defesas de causas administrativas (art.13, V)

podem ser contratados pelo Poder Público

independentemente de licitação (art.13, § 1º).

A regra geral, mesmo tendo o contrato por

objeto a contratação deste tipo de serviço, é a

obrigatoriedade de prévia licitação, conforme disposto no

art.13, § 1º, da Lei nº 8.666/93, que tem fundamento

constitucional no art.37, “caput”, e inciso XXI, da Magna

Carta, e assim determina: “Ressalvados os casos de

inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de

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serviços técnicos profissionais especializados deverão,

preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de

concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração.

Portanto, nem todo o serviço advocatício

pode ser contratado pelo Poder Público sem prévia licitação,

mas apenas aquele em que se verifique a presença de

determinados requisitos legais, estipulados no art.25, “caput”,

inciso II e parágrafo primeiro, da mesma lei, os quais, como

se verá abaixo, não se encontram presentes na espécie.

No entanto, importa ressaltar que, além da

disposição legal expressa, determinando como regra geral a

realização de licitação para os serviços de assessoria

advocatícia, temos que a natureza deste, ao contrário do

alegado, não está a afastar a possibilidade de licitação.

Realmente, a advocacia não pode ser

considerada, por si só, um serviço que não possa ser objeto

de avaliação competitiva.

Como qualquer outro tipo de trabalho

técnico ou científico, pode ser analisado quanto à sua

qualidade para o objetivo visado, podendo o edital

estabelecer condições para tal aferição, tais como número de

casos em que o advogado já atuou na matéria, apresentação

de cópias de defesas e recursos interpostos na matéria

visada, êxitos obtidos, certidões negativas junto ao órgão

fiscalizador da profissão, declaração de seus pares, livros

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publicados, artigos, formação acadêmica diferenciada, cursos

realizados, etc.

Também com relação ao valor dos

honorários, nada impede que sejam feitas propostas, e que o

Poder Público avalie qual a mais condizente com o valor de

mercado, e qual a mais vantajosa para a Administração, em

termos de custo e benefício. Se até o particular pode fazer

esta análise, quanto mais a Administração Pública...

Não se estará, aqui, promovendo a

mercantilização da atividade, primeiro porque a licitação não

terá como único critério o preço dos honorários, fazendo-se,

isto sim, uma avaliação de vários itens, dentre os quais o

preço seria apenas um deles.

Segundo, porque o interesse maior, superior

e constitucional a ser preservado aqui, é o interesse público

da sociedade, de ver observados os princípios da

Administração Pública, relativos à publicidade, à legalidade, à

impessoalidade e à moralidade administrativas, que ficariam

seriamente comprometidos pelo absurdo entendimento, de

que o serviço de advocacia não poderia ser objeto de

licitação.

Como bem decidiu a Colenda Terceira

Câmara de Direito Público deste Egrégio Tribunal de Justiça,

“A pretensão de que os serviços advocatícios não se prestam

à licitação por amesquinhar o advogado não encontra

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fundamento legal. A conclusão de que os advogados se

situariam em campo imune ao princípio da legalidade, sob

pena de indevida atividade censória do Ministério Público e

do Judiciário legitimaria uma nova forma de impunidade e um

odioso privilégio afrontoso ao princípio de igualdade de todos

perante a lei.” (Apelação Cível nº 300.448-5/0, da Comarca

de Avaré, tendo como Relator o Exmo.Desembargador

LAERTE SAMPAIO).

Muito embora a confiança pessoal de uma

parte na outra possa ser determinante para a contratação de

um advogado por um particular, os agentes do Poder Público

não podem ter a mesma liberdade de contratação, por critério

meramente subjetivo, pois não se trata de um contrato entre

particulares, a ser pago com dinheiro privado, mas sim de um

contrato com o ente público, a ser pago com o dinheiro

público, só podendo o agente agir de acordo com critérios

objetivos, comprovados e justificados e, evidentemente, de

acordo com a lei.

O que importa analisar agora, é que não se

encontram presentes neste caso, nenhum dos três requisitos

exigidos por lei, para tornar inexigível a licitação.

O primeiro requisito está inserido no “caput”

do art.25 da Lei nº 8.666/93, referindo-se à “inviabilidade de competição”. O segundo está inserido no inciso II do mesmo

art.25, referindo-se à “singularidade do serviço”. E o

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terceiro, inserido no mesmo inciso legal, refere-se à

qualidade da empresa contratada, devendo possuir “notória especialização”, mas de acordo com os critérios objetivos especificados no § 1º do mesmo dispositivo legal.

A assessoria técnica perante o Tribunal de

Contas não se revela como serviço singular, entendido

como tal aquele serviço único ou raro, que possui

características tão especiais, que o torna bastante diferente

ou destacado dos demais afetos à mesma área.

Com efeito, todos os Municípios do País são

obrigados a prestar contas anuais aos Tribunais de Contas, e

isto há muitos anos, de forma que a defesa administrativa

nestes processos apresentada por advogados se trata de

trabalho comum, corriqueiro, e disseminado no País.

Como qualquer outro ramo do Direito, exige

conhecimento, estudos, pesquisas, esforço e dedicação.

Não se vislumbra, assim, nenhuma

especificidade ou complexidade, que o possa distinguir dos

demais ramos do Direito ou dos demais serviços

advocatícios.

Aliás, a prova desta condição comum do

serviço em questão está na leitura das petições apresentadas

por integrante do escritório Alberto Rollo, nos autos dos

processos administrativos do Tribunal de Contas, em

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decorrência dos contratos firmados com a Prefeitura de Porto

Ferreira (fls.704/794).

Tratam-se de petições simples, sem

grandes digressões ou incursões jurídicas, nada distinguindo

este trabalho de qualquer outro feito na área jurídica. Duas

das petições apresentadas foram, inclusive, subscritas por

estagiária de Direito (fls.787/794).

Hoje, especialidade ou atuação maior em

uma determinada área todos os advogados possuem, não se

constituindo tal em elemento diferenciador.

Também não se encontra presente na espécie, a “notória especialização” do contratado.

Primeiramente, deve-se ressaltar que, muito

embora tenha sido contratado o escritório de advocacia de

Alberto Rollo, quem foi designado internamente para prestar

esta assessoria técnica junto ao Tribunal de Contas foi o seu

associado mais jovem, Dr.Arthur Luis Mendonça Rollo

(fls.110/118 e 685/794).

Pelo “Curriculum Vitae” juntado aos autos,

verifica-se que o Dr.Arthur se formou na faculdade de Direito

de São Bernardo do Campo, seria professor “monitor” em

Processo Civil e em Direito Civil (fls.115), fez mestrado em

Direito das Relações Sociais pela Puc (fls.438), tendo

publicado um artigo sobre a importância do edital de licitação

para a Administração Pública (fls.452/456).

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Portanto, o Dr.Arthur não tem título

acadêmico diferenciado em Direito Público ou Administrativo,

não constando tenha feito qualquer curso específico quanto a

defesas administrativas em Tribunais de Contas, e nem se

podendo considerar o único singelo artigo por ele publicado,

como realização de “estudos” capaz de destacá-lo de outros

profissionais da área.

Também não se comprovou ter o Dr.Arthur

atuado em favor de outros Municípios, em defesas

administrativas junto ao Tribunal de Contas.

Sua juventude, atestada pela foto de fls.452

e pelo número de sua OAB (fls.115), nos permite concluir,

ainda, que não possa ter “longa” experiência na área jurídica.

Ou seja, não se comprovou desempenho

anterior, e nenhum dos demais critérios objetivos

especificados no § 1º do art.13 da Lei nº 8.666/93, como

indicadores de “notória especialização”.

Relativamente ao Dr. Alberto Rollo, sócio

majoritário do escritório de advocacia contratado, o só fato de

ter delegado o trabalho a outro advogado de seu escritório,

com bem menos tempo de advocacia, já demonstra que não

dependia tal serviço de sua alegada “notória especialização”.

Ou seja, não foi a especialização do Dr.Alberto Rollo, que ensejou a feitura do contrato impugnado por meio desta ação, tanto que os serviços

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contratados não foram feitos pelo Dr.Alberto Rollo, mas sim pelo Dr.Arthur.

Mesmo porque, conforme exposto, a

especialidade pessoal efetivamente comprovada pelo

Dr.Alberto Rollo neste caso, se refere à área eleitoral, com

relação à qual já editou várias obras e proferiu palestras

(fls.110/111), sendo conhecido por sua experiência na defesa

de políticos com problemas nesta área, tendo atuado

inclusive em campanhas políticas, e em processos de

cassação (fls.558, 595, 579, 580, 582, 583, 587, 590,

591/596, 601, 620, 662/664), área eleitoral esta que não diz respeito, especificamente, ao objeto contratado com a Prefeitura de Porto Ferreira.

Relativamente às declarações de outros

advogados juntadas a estes autos, sobre a idoneidade e

competência do Dr.Alberto Rollo, deve-se frisar que não se

objetiva aqui, discutir a competência de tal causídico, o que

nem seria devido, mas apenas verificar a existência, ou não,

de critérios estabelecidos pela lei para verificação de “notória

especialização”.

Assim, o serviço não era singular, nem havia

“notória especialização”, tendo sido escolhido o escritório do

Dr.Alberto Rollo por questões puramente pessoais, uma vez

que o Prefeito André Luís já o tinha como seu advogado

pessoal e, obviamente, queria se aproveitar de sua

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experiência, para evitar futuros problemas eleitorais, quando

fosse concorrer a outro cargo.

E mais, tratando-se de serviço advocatício

comum e disseminado no País, que poderia, assim, certamente ser realizado por inúmeros outros escritórios de advocacia, a conclusão lógica e necessária era no

sentido da necessidade da licitação, competindo aos réus o

ônus de comprovar que a competição seria inviável no caso,

como decidiu o E.STJ no caso acima citado, o que não fizeram.

Aliás, tanto o ônus era dos réus, que o

art.26 da lei das Licitações determina que as causas de

inexigibilidade de licitação, estipuladas em seu art.25, devem

ser necessariamente justificadas, o que significa que o

Apelado André deveria ter instruído o processo administrativo

de inexigibilidade de licitação, com documentos

comprobatórios da presença dos requisitos legais, o que

efetivamente não fez, tendo o processo administrativo sido

iniciado e terminado em pouquíssimos dias, conforme se

verifica pelos documentos juntados ao primeiro volume.

A falta de procedimento licitatório, em caso

que era evidentemente necessário (o serviço não era

singular, não havia notória especialização do contratado, e

haviam outros inúmeros prestadores do mesmo serviço no

mercado), escolhendo-se um escritório de advocacia por

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razões puramente pessoais, configura o ato de improbidade

administrativa capitulado no art.10, “caput” e inciso VIII, da

Lei nº 8.429/92, tendo sido praticado com evidente dolo,

representado pela intenção consciente, voluntária e

manifesta de infringir a CF e a lei, tendo se consubstanciado,

ainda, em flagrante violação dos princípios da legalidade, da

moralidade, da impessoalidade e da lealdade às instituições

(art.11 da lei nº 8.429/92).

IV – CONCLUSÃO

Assim sendo, por todas as razões expostas,

opina esta Procuradoria de Justiça sejam afastadas todas as

preliminares levantadas pelo Apelado, bem como seja dado

provimento ao recurso do MP, para o fim de serem os réus

condenados nos exatos termos do pedido inicial, por medida

de JUSTIÇA.

São Paulo, 04 de maio de 2007.

DORA BUSSAB CASTELO

Promotora de Justiça designada em Segunda Instância

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