O Japãono Brasil
Ano 7 N0
34 R$ 3,50
10
P R Ê M I O G A Ú C H O
D E E X C E L Ê N C I A G R Á F I C A
A B I G R A F 2 0 0 5
AIKIDO,
RAKU,
SUSHI,
ORIGAMI:
O JAPÃO
É AQUI
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Milene Leal
EDITORA E DIRETORA DE REDAÇÃO
REDAÇÃO Angela Farias, Cris Berger, Irene Marcondes, Magali Moraes, Paula
Taitelbaum
REVISÃO Flávio Dotti Cesa
PROJETO GRÁFICO Odyr Bernardi
DIREÇÃO E EDIÇÃO DE ARTE Luciane Trindade [email protected]
ILUSTRAÇÕES Nik
FOTOGRAFIA Angela Farias, Cris Berger, Cristiano Sant’Anna, Letícia Remião
PRODUÇÃO DE ALIMENTOS Jorge Nascimento e Restaurante Sakura
COLUNISTAS Fernando Lokschin, Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros,
Malu Coelho, Ruza Amon, Tetê Pacheco
EDITORA RESPONSÁVEL Milene Leal (7036/30/42 RS)
COLABORADORES Associação Nipo-Brasileira, Cézar Van Der Sand,
Erika Lie Hinohara Aso, Leandro Lopez da Silva, Livraria Cultura, Nádya Pesce da Silveira,
Parque Esportivo da PUC RS
Izabella Boaz
DIRETORA DE ATENDIMENTO
DEPTO. DE ATENÇÃO AO LEITOR Renata Xavier Soares
A revista Estilo Zaffari é uma publicação bimestral da Contexto Marketing Editorial Ltda., sob licença
da Companhia Zaffari Comércio e Indústria. Distribuição exclusiva nas lojas da rede Zaffari e Bour-
bon. Estilo Zaffari não publica matéria editorial paga e não é responsável por opiniões ou conceitos
emitidos em entrevistas, artigos e colunas assinadas. É vedada a reprodução total ou parcial do
conteúdo desta revista sem prévia autorização e sem citação da fonte.
TIRAGEM 25.000 exemplares
PRÉ-IMPRESSÃO Maredi
IMPRESSÃO Pallotti
ENDEREÇO DA REDAÇÃO
Rua Padre Chagas, 185/801– Porto Alegre/RS – Brasil – 90570-080
(51) 3395.2515 (51) 3395.2404 (51) 3395.1781
CAPA: NINA HINOHARA ASO FOTOGRAFADA
POR LETÍCIA REMIÃO
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N O T A D O E D I T O R
Se você é daqueles que ficam com água na boca ao pensar em um sashimi de salmão, vai adorar
esta edição da Estilo Zaffari. Se, ao contrário, tem engulhos só de pensar em comer peixe cru, mas acha
fascinante a cultura japonesa e suas peculiaridades, também vai adorar a revista. Os adeptos das artes
marciais do Oriente vão se encontrar nesta edição da Estilo. Quem sonha em conhecer o Japão vai delirar
com a nossa matéria de viagem. E os apreciadores das artes milenares hão de encher os olhos com a
reportagem sobre o Raku, uma cerâmica japonesa que só se revela por inteiro depois de passar pelo fogo.
Esta edição da Estilo Zaffari tem Japão para todos os gostos, sob várias perspectivas, em diferentes
interpretações. Começamos pela capa. Impossível não se encantar com a Nina, uma menininha de dois
anos e meio, filha de japoneses nascidos no Brasil, que enfrentou heroicamente uma longa sessão de
fotos, mesmo gripada. A Nina resume o espírito desta revista: mostrar que Japão e Brasil estão
superentrelaçados. Ela é uma pequenina e linda porção de Oriente aqui nos trópicos.
Abrindo a edição, Paula Taitelbaum apresenta o perfil de dois sushimans que fazem parte da história
da culinária japonesa em Porto Alegre. Pai e filho, eles comandam o Sakura, um verdadeiro templo da
gastronomia oriental. E são autênticos mestres zen: concentrados, detalhistas, inspirados, habilidosos,
tranqüilos, poderosos. Melhor ainda: eles contam aqui os segredos de algumas das mais incríveis receitas
do restaurante, pra que você possa reproduzi-las em casa.
A publicitária Magali Moraes, que não freqüenta o Sakura por uma questão de foro íntimo – ela não
pode nem pensar em comer peixe cru, passou mal na última vez em que tentou –, redigiu uma matéria
deliciosa sobre a interação das culturas brasileira e japonesa. Magali faz um panorama da presença do
Japão no Brasil e, vice-versa, do Brasil no Japão. Mostra que estamos absolutamente misturados, integrados,
miscigenados e altamente influenciados uns pelos outros.
Repare: tendo ou não olhos puxados, todos nós, brasileiros, já somos um pouquinho orientais.
Sério! Basta olhar em volta e você vai perceber como a cultura japonesa está presente em nosso dia-a-dia:
são os desenhos animados, os gadgets eletrônicos, a comida, o karaokê, a moda, a decoração, os carros,
as plantas... Em quase tudo a gente encontra um pouquinho de Japão.
E se, como diz Luis Augusto Fischer, o Japão parece longe demais, geograficamente falando, os
milhares de encantos dessa cultura estão ao nosso alcance. É só, por exemplo, abrir a sua Estilo Zaffari!
entrelaçados
Brasil e Japão
OS EDITORES
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Correio
MICO PELA ESTILO
Milene e Renata:
Semana passada, sábado, paguei um mico,
um micão no Bourbon Assis Brasil. Vejam bem
que situação. Ninguém merece (eu mereço, por-
que sou louca e faço qualquer coisa pela Estilo)!
Estava nas compras diárias, encontrei minha
amiga Osmarina, seguimos pelos corredores pro-
curando produtos. Tchau, tchau, nos despedi-
mos. Aí, próximo a um caixa, bati o olho na Es-
tilo n° 33. Como se fosse a única, peguei. Na mes-
ma hora revi minha amiga, levantei a revista e gri-
tei bem alto: aqui, vê aqui, saiu, peguei! Olhei para
os lados, tudo parou, todos me olhavam. Os ge-
rentes de caixa sorriam discretamente sem enten-
der nada. Que educação. Passei as compras, o car-
tão e me agarrei na Estilo. Fui! Claro que saí rapi-
dinho sem olhar para lado nenhum. Até minha ami-
ga sumiu. A agonia de ler era maior. Li e devorei.
É, gente da Estilo, meu vício é esta revista.
Agradeço a toda editoria e redação por estarem
próximos a nós com competência, qualidade e
credibilidade. Até as próximas, com saúde e paz.
Sejam sempre profissionais e amigos. Valeu.
MARIA JOSÉ RÜCKHEM PESSOA – PORTO ALEGRE
Maria José, a sua carta é hilária! Ficamos
aqui imaginando a cena e nos divertimos
horrores. Só nos resta agradecer por seu en-
tusiasmo e sua alegria. Que coisa maravi-
lhosa ter leitores assim!!! A Estilo Zaffari
pode até ser um vício, mas é um vício do
bem! Até a próxima e um abração.
E MAIS PARABÉNS
Economizando um tempinho para coisas
agradáveis, abrimos o exemplar de inverno da
revista Estilo Zaffari. Que maravilha! O multi-
facetado cenário gaúcho, o inverno (que nós não
temos), o chimarrão, as sopas, o vinho, os quei-
jos, a roupa pesada, enfim... A revista é sempre
uma festa multicolorida, bem apresentada, bem
redigida, inovadora, surpreendente a cada novo
exemplar. Por tudo isto, nós queremos enviar
aquilo que já virou rotina: os nossos parabéns à
equipe da Estilo. É realmente uma REVISTA!
Abraços carinhosos.
ALICE E RONALD – FORTALEZA
NÃO PODE FALTAR
Oi, pessoal da redação! Como vão? Espero
que os encontre com saúde, numa nice e em paz!
Eu sempre que vou fazer minhas compras no
Zaffari e tem a Estilo já ponho no carrinho! Com
certeza! É a melhor revista! Superbonita, bem
escrita, lindas fotografias! Nota 10! Parabéns e
sucesso da amiga de vocês.
VERÔNICA BRAMBILLA – PORTO ALEGRE
CARDAMOMO NAS RECEITAS
Oi, tudo bem? Trabalho com uma linha de
temperos e conservas para culinária. Sou fã da re-
vista Estilo Zaffari e entendo que novidades de-
vem ser comunicadas em canais afins. O produto
semente de Cardamomo é superespecial, como a
revista Estilo Zaffari, para pessoas de bom gosto e
que procuram diferenciais. Gostaria muito que o
departamento de Produção de Alimentos anali-
sasse a oportunidade de comunicação desse pro-
duto especial em alguma receita. Um abraço.
Atenciosamente,
CINTIA BRANDENBURGER – PORTO ALEGRE
Cintia, adoramos receber os seus elogios e
estamos sempre abertos a sugestões de pau-
tas provenientes dos nossos leitores. Na edi-
ção nº 30, de dezembro de 2004, foi publi-
cada uma receita com o cardamomo. Tra-
ta-se de um drink chamado Margarita de
Manga com Cardamomo. Fez o maior su-
cesso. Se você não viu essa edição, pode-
mos enviar a receita por e-mail. Por favor,
sempre que você tiver sugestões de receitas
elaboradas com especiarias, sinta-se à von-
tade para nos escrever. Estamos sempre bus-
cando fontes diferentes. Agradecemos pelo
contato, abraço.
83677 cartas.p65 9/13/05, 2:08 PM2
MÚSICA COM ESTILO
Olá, Izabella!!! Em primeiro lugar, queremos
parabenizá-la pela excelente qualidade da revis-
ta Estilo, desde a fotografia, as crônicas e entre-
vistas até as receitas deliciosas (já testei várias e
foram muito elogiadas), roteiros turísticos, en-
fim... tudo de muito bom gosto! Nós somos ir-
mãos, moramos em Canoas e formamos uma du-
pla de cantores em violão e voz de música pop
internacional romântica. Nosso repertório inclui
Bee Gees, Beatles, The Coors, Eric Clapton, Dire
Straits, Tears for Fears, Bryan Adams e outros.
UM ABRAÇO DA DUPLA MANFRED & ANNE!!
Queridos leitores, sucesso pra vocês nessa
carreira musical! Nós, da Estilo, amamos
música e vamos querer conhecer o trabalho
da dupla, ok? Abraços!
AFAGOS NO EGO
Olá. Não vou perder tempo tecendo elogios
para a revista. Vocês devem estar bem seguros da
qualidade dela. Mas, ego é ego. Então lá vai: morei
um bom tempo em Porto Alegre e por motivos pro-
fissionais estou agora em Florianópolis. Quando vou
a Porto Alegre, dou aquela passadinha básica pelo
Zaffari (Menino Deus) e trago para cá o exemplar
da Estilo Zaffari da hora. Sou fotógrafo e vou apro-
veitar para elogiar o nível das fotos apresentadas
nas matérias. Tem muita revistinha de circulação
nacional mostrando belas porcarias, com uma visi-
bilidade questionável. É triste. Vocês poderiam es-
tar com a Estilo em bancas. Curiosidade: quando
chego com um novo exemplar aqui no estúdio, mi-
nha sócia sai correndo para pegar a revista e vai
para a seção de culinária... Ela é apaixonada por
cozinha, eu também, e literalmente babamos sobre
as páginas. Em tempo: todas as colunas são boas,
mas as do Fernando Lokschin... estupendas. Para-
béns. Agradeço a atenção.
LUIS VENTURA – FLORIANÓPOLIS
Luis, para quem não ia elogiar, você até
passou da conta! Que coisa boa receber es-
tes seus não-elogios! Quanto ao nosso ego,
que ego? Nós somos tão modestos que nem
sabemos o que é isso... Um superabraço e
fique sempre por perto, por favor!
PARABÉNS 2
Milene, Bella e toda a equipe, parabéns pela
conquista no 1º Prêmio Gaúcho de EXCELÊNCIA
Gráfica. É muito mais do que merecido, pois o tra-
balho de vocês é maravilhoso. Um grande abraço.
ROSA MARIA MAGGIONI – HRM MULTIMÍDIA
PARABÉNS 3
Milene, parabéns a você e toda sua equipe pelo
prêmio com a Estilo! Vocês merecem!!! Beijos.
MARCO PERRONE – DIR. DE NEGÓCIOS – AG2
NO DIA 29 DE JULHO, A REVISTA ESTILO ZAFFARI FOI DES-
TACADA PELA ABIGRAF-RS (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA
INDÚSTRIA GRÁFICA) COM O 1º PRÊMIO GAÚCHO DE EXCE-
LÊNCIA GRÁFICA. A PUBLICAÇÃO CONCORREU COM MAIS
DE 270 PEÇAS, INSCRITAS EM SEIS CATEGORIAS, E FOI
VENCEDORA NO SEGMENTO PERIÓDICOS – REVISTAS DE
CARÁTER VARIADO. EM SUA PRIMEIRA EDIÇÃO, O PRÊMIO
AVALIOU O TRABALHO REALIZADO PELAS INDÚSTRIAS GRÁ-
FICAS DO RIO GRANDE DO SUL. O CORPO DE JURADOS FOI
COMPOSTO POR PROFISSIONAIS DE INDISCUTÍVEL CONHE-
CIMENTO TÉCNICO GRÁFICO E DE CRIAÇÃO, PUBLICITÁRIOS
E PERSONALIDADES, INCLUSIVE DE FORA DO ESTADO.
A REVISTA ESTILO ZAFFARI SERÁ UMA DAS REPRESENTAN-
TES REGIONAIS NO PRÊMIO FERNANDO PINI, MAIS DES-
TACADA PREMIAÇÃO DA INDÚSTRIA GRÁFICA NACIONAL,
QUE SERÁ REALIZADO NO FINAL DO ANO, EM SÃO PAULO.
ESTILO ZAFFARI RECEBE
PRÊMIO DE EXCELÊNCIA GRÁFICA
PARABÉNS 1
É com grande alegria que comunicamos que
a revista Estilo Zaffari, na categoria “Revistas de
Caráter Variado”, venceu o 1º Prêmio Gaúcho
de Excelência Gráfica. Na avaliação, além dos
quesitos de excelência gráfica, foram avaliados
também a criatividade e a funcionalidade do pro-
jeto. Portanto, parabéns a todos os envolvidos
neste belíssimo projeto. Que a nossa parceria seja
longa e que a revista Estilo Zaffari continue a ven-
cer em todos os quesitos, do projeto à satisfação
dos seus leitores e anunciantes. Abraços!
COM CARINHO DA DIREÇÃO, GERÊNCIAS, DEPTO.
COMERCIAL E PRODUTIVO DA GRÁFICA PALLOTTI
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Cesta Básica
Viagem: Mundo às Avessas
O Sabor e o Saber
O Japão no Brasil
Aikido, dança da defesa
Lugar: Unique Garden
11
36
52
64
72
82
Í N D I C E
sushiman
Rideu e Jonnhy Fujimoto revelam
receitas de vida e de culinária
e seus segredos
20
Dois
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Arnaldo Antunes
As palavras de
O multiartista falou com exclusividade
para Paula Taitelbaum. Não perca.
90
A magiacerâmica
japonesada
56
83677 indice.p65 9/14/05, 2:32 PM3
Cotidiano
A cultura japonesa está por tudo. É uma invasão consentida.
JAPAS
Alguns anos atrás, a rede de farmácias Panvel fez
uma promoção: na compra de X reais em determinados
produtos, o cliente ganhava um vídeo infantil. Foi assim
que surgiu na minha casa um filme chamado Meu Amigo
Totoro, que contava a história de duas garotinhas, Satsuki
e Mei, que vão morar com o pai no campo enquanto es-
peram a mãe se curar de uma doença no hospital. É nos
arredores deste novo lar que elas descobrem os “totoros”,
criaturas mágicas que não são animais, nem monstros,
nem gente. Aqui em casa todo mundo ficou fascinado
por este desenho. As meninas do filme eram lindas, a
música era delicada, e os cenários, os diálogos, a cultura,
tudo era diferente e cativante. Descobri que o mundo da
animação não se resumia aos estúdios de Walt Disney.
Meu Amigo Totoro foi o primeiro anime do qual to-
mei conhecimento – sem saber ainda o que era um anime
–, e sem imaginar que um dia eu me familiarizaria com
termos como mangá, otaku, inuyasha, cosplay. Se você não
sabe do que estou falando, é questão de tempo.
Anime é desenho animado japonês. Lá do outro lado
do mundo passa o dia inteiro na televisão, mas aqui, ex-
cetuando-se os Pokemón – estes você conhece –, passa
muito raramente, obrigando seus aficionados – os otakus
– a baixarem os desenhos pelo computador, ao som de
Orange Range, Do As Infinity, BoA, que são grupos de
rock que fazem o maior sucesso entre os japas. Além dos
desenhos animados, as histórias em quadrinho japonesas
podem ser lidas nos mangás, que são vendidos em qual-
quer banca de jornal aqui no Brasil. Os mangás são gibis,
cuja diferença é que devem ser lidos de trás para frente.
Se tudo isso parece muito estranho pra você, acre-
dite: já foi estranho pra mim também, até que descobri
que tinha em casa uma especialista em anime e mangá, e
ela não faz parte de uma entidade secreta. Minha filha
mais velha é apenas uma entre vários adolescentes que
são fascinados pela estética e pela cultura pop japonesa.
E abriu os horizontes aqui de casa, onde a imagem do
Japão ainda estava reduzida a sushis, origamis e arigatôs.
O Japão é pequeno, os japoneses são menores ainda,
mas a contribuição deles ao mundo contemporâneo tem
sido gigantesca. Na Europa inteira a cultura japonesa se
faz presente em exposições de arte, moda, design, música
– sem falar, claro, em tecnologia. Atualmente, um dos
mais badalados restaurantes de Paris é o Kong, que fica na
cobertura da loja Kenzo. O ambiente é o que há de mais
moderno e high tech. Tóquio puro.
É uma invasão consentida. Oriente e Ocidente tro-
cando informações e convivendo em paz. O Japão já não
está longe. Está em todo lugar.
M A R T H A M E D E I R O S
MARTHA MEDEIROS É ESCRITORA
10 Estilo Zaffari
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Cesta básica
NESTA SEÇÃO VOCÊ ENCONTRA DICAS E SUGESTÕES PARA CURTIR O DIA-A-DIA E SE DIVERTIR DE VERDADE:
MÚSICA, CINEMA, LUGARES, OBJETOS ESPECIAIS, COMIDINHAS, PASSEIOS, COMPRAS. BOM PROVEITO!
Quem deseja se iniciar nas artes da gastronomia
japonesa já tem ponto de partida: o Riverside’s
promove periodicamente cursos de sushi e sashimi
para novatos, curiosos ou mesmo para quem já
conhece algumas manhas dessa escola culinária.
O professor é Línio Cardoso, sushiman há mais
de nove anos, que aprendeu a técnica com mestres
japoneses no próprio Riverside’s e depois aperfei-
çoou-se em São Paulo e Curitiba. No curso, Línio
ensina não só os segredos do preparo de sushis e
sashimis como também a arte da decoração dos
pratos japoneses. Depois dessas aulas, seus
quitutes vão arrasar em dois aspectos: sabor e
visual. As inscrições podem ser feitas em qualquer
casa Riverside’s ou pelo fone 3231.4032. Informe-se
sobre as próximas datas e já vá afiando as facas...
MILENE LEAL, JORNALISTA
AULAS PRÁTICAS
DE SUSHI E SASHIMI
FOTO: CRISTIANO SANT’ANNA
83677 cestabasica1.p65 9/13/05, 5:14 PM1
O frio parece unir cada vez mais este casal de gaúchos.
Desde 1997, Zelfa Silva e Gunnar Hagelberg passam boa
parte de seus dias percorrendo as paisagens geladas da
Antártida, a bordo de barcos de diferentes tamanhos.
Para eles, quebrar gelo é uma rotina. Tanto que se
associaram a uma empresa especializada em roteiros
pela Antártida e passaram a viajar no papel de guias,
levando ao extremo sul do continente pessoas de
diversos perfis: jovens, idosos, aventureiros, sedentários,
etc. Quem olha as fotos dessas expedições tem vontade
de sair correndo para arrumar a mala. Os cenários são
lindos, impactantes. E o viajante ainda tem o privilégio
de ver de perto pingüins, baleias, leões-marinhos e
várias outras espécies da região. Para saber mais sobre
as viagens, faça contato pelo e-mail
[email protected] ou visite o site
www.antarcticacruises.com.ar. O casal reside em Buenos
Aires, Argentina, e de lá recruta seus passageiros.
Quem sabe você não embarca na próxima expedição?
MILENE LEAL, JORNALISTA
Quebrando o gelo
Cesta básica
Quanto mais eu me interesso por música, mais perto
chego do entendimento da obra. Tom Jobim, por
exemplo: um mestre, uma obra jamais acabada e por
isso infinita... No CD Tom Jobim Inédito, gravado em
1987, em meio à parafernália do estúdio montado na
sala de piano da casa do artista, no Jardim Botânico,
começa mais um espetáculo. Foram 4 meses intensos
de gravações, na intimidade da casa de Tom, resultan-
do no que ele considerou um dos melhores registros
musicais da sua vida. Lançado pela gravadora Biscoito
Fino, reúne músicas maravilhosas como Wave, Chega
de Saudade, Águas de Março, Canção do Amor
Demais. Confira!!! O CD está disponível na Livraria
Cultura do Bourbon Shopping, fone 3028.4033.
IZABELLA BOAZ, EMPRESÁRIA
BISCOITO FINÍSSIMO!
83677 cestabasica2A.p65 9/13/05, 7:36 PM2
Viciados em chocolate, preparem-se! Porto Alegre já
tem uma filial da carioca Chocólatras, uma loja que
explora aberta e despudoradamente o descontrole de
pessoas como eu, incapazes de resistir a uma trufa de
chocolate. O nome já é uma provocação, mas o
cardápio da Chocólatras é puro deboche. Confira os
ingredientes de uma das opções de tortas, a Tricolor:
camadas geladas de trufa de chocolate branco, trufa
de chocolate ao leite e musse de chocolate meio-
amargo. E o pior é que tem muito mais. Aí ao lado,
você pode avistar algumas miniaturas que eles
produzem para fazer os chocodependentes caírem em
tentação. É mesmo irresistível. Fone: (51) 3337.7118.
MILENE LEAL, JORNALISTA
CHOCÓLATRAS, TREMEI!
De acordo com o dicionário, GARBO significa elegância,
galhardia, primor. E é com estes substantivos que Patrícia
Lorensini e Marcelo Duarte Varnieri pretendem distinguir
os clientes do Garbo Hair Designers, salão que funciona em
meio ao burburinho e glamour do Moinhos de Vento, em
Porto Alegre. Glamour, aliás, é outra das fontes de
inspiração da dupla: o nome do salão também faz referência
a Greta Garbo, uma das mais charmosas atrizes do cinema
hollywoodiano. Pois Marcelo e Patrícia formularam uma
receita de trabalho que rima com o nome escolhido. Para
deixar seus clientes elegantes, garbosos, glamourosos, eles
estão sempre em dia com as tendências, preocupam-se com
a atualização dos profissionais e dedicam-se a entender de
estilo de uma forma abrangente, não restrita aos
tratamentos estéticos. De formação, Patrícia é colorista e
maquiadora; Marcelo é cabeleireiro. Mas os dois têm no
DNA os genes da inquietação e da criatividade. O Garbo já
conquistou seu espaço em uma região altamente disputada:
Hilário Ribeiro, 208, fone 3022.4111.
MILENE LEAL, JORNALISTA
Glamour e estilo
FO
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S: C
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TIA
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NN
A
no Garbo Hair
83677 cestabasica2A.p65 9/14/05, 11:33 AM3
Ele veio de Milão para Porto Alegre, mas no caminho
fez várias escalas. Mário Grandella aperfeiçoou seu
talento para a gastronomia em cidades tão diversas
como Londres, Cabo Verde, Moscou e Paris. Então
conheceu uma gaúcha, e o resto da história você pode
imaginar. Mas o que importa é que desde o início deste
ano ele está expondo seus dotes culinários no restau-
rante que batizou de Locanda del Mario, um local onde
a Itália se faz presente em receitas deliciosas, requinta-
das, inovadoras, com autêntico sotaque milanês. Além
de pastas saborosíssimas e risotos deliciosos, Mario
prepara com maestria peixes e frutos do mar, no ponto
exato de cozimento e tempero. Mas o melhor, a meu
ver, está reservado para o final da refeição: peça o
Tiramisu e coma ajoelhado, rezando para não ter que
dividir com ninguém. O Tiramisu do Locanda del
Mario é preparado com autêntico queijo mascarpone,
biscoitos perfeitos e toda a sabedoria de um chef que
se profissionalizou aos 14 anos de idade. O Locanda
del Mario, com apenas alguns meses de vida, já
desponta no cenário gastronômico gaúcho. Foi
escolhido o melhor restaurante italiano de Porto
Alegre pela revista Veja. Vá conferir: Rua Pedro Ivo,
492, Mont’Serrat, fone (51) 3028.8422.
MILENE LEAL, JORNALISTA
O CHEF MILANÊS QUE
CONQUISTOU OS GAÚCHOS
Quando começou a trabalhar com argila branca,
há cinco anos, a artista plástica Simone Vieira
descobriu os encantos das rosas modeladas à mão
e decidiu que elas seriam sua marca registrada.
Desde então, peças decorativas, como centros de
mesa, painéis, cúpulas e candelabros, recebem
delicadas aplicações de flores de cerâmica. Simone
garante que trabalhar em torno de um único tema
é um desafio para a imaginação. “Desenvolvo peças
com formas e cores exclusivas. As pessoas se
surpreendem com a versatilidade das rosas de
argila”, conta. No seu charmoso ateliê em Caxias
do Sul, na serra gaúcha, ela oferece uma linha
pronta e também cria modelos personalizados para
seus clientes. Telefone: (54) 9122-2755.
IRENE MARCONDES, JORNALISTA
Românticas
e femininasFO
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FOTO: LETÍCIA REMIÃO
83677 cestabasica1.p65 9/13/05, 8:51 PM2
O Armazém Ventura reúne delícias gastronômicas, uma
excelente carta de vinhos e um ambiente agradável para
encontrar os amigos, namorar ou simplesmente bater
papo. Os proprietários partiram do conceito dos velhos
armazéns e mercearias e criaram um ambiente aconche-
gante, que reúne nostalgia e modernidade. O casarão
que abriga o Armazém Ventura data do início do século.
O cardápio é cuidadosamente elaborado pela consultora
gastronômica Andréa Kasprzak, que supervisiona a
produção diariamente. As especialidades vão desde
receitas da mãe de um dos proprietários, como bolinho
de aipim e carne moída, até um charmoso peixe com
molho de champanhe e lascas de amêndoas. O Arma-
zém Ventura está localizado na Av. Nilópolis, número 5,
funciona de domingo a quinta das 10h30 à meia-noite e
sextas e sábados das 10h30 à 1h. Fone para reservas:
(51) 3388-5956. Aqui ao lado, confira uma receita
ideal para as noites frias, em frente à lareira, acompa-
nhada de um bom vinho e de um grande amor...
LIZE JUNG, JORNALISTA
CREME RÚSTICO COBERTO
COM MASSA FOLHADA
INGREDIENTES: 30 G DE COGUMELOS SECOS, 100 G DE
COGUMELOS PARIS, 200 G DE NATA, 250 ML DE LEITE,
50 G DE FARINHA DE TRIGO, 50 G DE MANTEIGA, 80 G
DE MASSA FOLHADA, 50 ML DE VINHO TINTO, SAL,
PIMENTA-DO-REINO, 1 GEMA.
MODO DE FAZER: HIDRATAR O COGUMELO SECO NA
ÁGUA E NO VINHO POR CERCA DE 45 MINUTOS. FAZER
UM MOLHO BECHAMEL COM A FARINHA, A MANTEIGA E
O LEITE. ACRESCENTAR O COGUMELO HIDRATADO E A
NATA POR ALGUNS MINUTOS (UTILIZAR A ÁGUA EM QUE
O COGUMELO FOI HIDRATADO). DISPOR O CREME QUEN-
TE EM CUMBUCAS QUE POSSAM IR AO FORNO. COBRIR
COM A MASSA FOLHADA PINCELADA COM A GEMA. AS-
SAR ATÉ QUE A MASSA ESTEJA DOURADA.
Armazém
de sabores
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A
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Consumo
A tendência no Ocidente é se orientalizar. E vice-versa.
O JAPÃO E O OUTRO LADO
Ouvi do estilista Walter Rodrigues, apaixonado
pelo Japão: “Eles são tão parecidos fisicamente (pelo
menos a partir do olhar ocidental) que adoram se dife-
renciar. E uma das possibilidades de exercitar isso é
através da roupa”.
De fato. As japonesas são alucinadas por moda.
Ao ponto de lojas como Prada e Armani venderem
mais lá do que em qualquer outra cidade do mundo.
Mas o gosto pela moda no Japão não é só expressado
através desse mundo de grifes globalizadas. Outro fenô-
meno interessante é a forma original como eles montam
seus figurinos, buscando uma identidade exclusiva, uma
expressão da personalidade a qualquer custo, sem medo
de, eventualmente, esbarrar até no bizarro.
A busca frenética pela diferenciação é um vale-tudo.
Os jovens, meninos e meninas, saem de casa com
seu uniformes escolares. E já na estação de metrô come-
çam a desmontar a imagem de estudantes certinhos, par-
tindo para uma verdadeira farra-do-boi fashion. As ruas
em torno do bairro Harajuku são diariamente tomadas
por centenas de adolescentes modernérrimos e esquisi-
tos cuja vitória máxima é figurar nas páginas da revista
Fruits (www.fruits-mg.com) – uma publicação que edita
os melhores looks, fotografados ali na rua mesmo.
Calcule: em Tóquio são 27 milhões de habitantes.
Não existe meca maior do consumo no planeta.
Tudo é comprado e vendido 24 horas por dia.
Os modismos e tendências já nascem com data para aca-
bar. Bares lançados no final do ano passado já são consi-
derados ultrapassados.
A ansiedade talvez venha na contramão da paci-
ência, da contemplação, do respeito ao tempo das coisas,
princípios fundamentais da milenar cultura japonesa.
Já no outro lado do mundo, onde antigüidade sig-
nifica ter pouco mais do que 500 anos, a modernidade se
aplica a valores muito menos ancestrais.
A coisa por aqui, nas américas, ficou tão
despudoradamente dispersa e esvaziada de conteúdo e
valor que nunca se falou tanto em meditação, contem-
plação, ioga. Nunca se desejou tanto uma vida menos
ansiosa, menos consumista, mais interior. Ironia. A moda
do lado de cá é ser o que o lado de lá considera ultrapas-
sado: ser zen.
Se a tendência no Ocidente é se orientalizar e a
tendência no Oriente é se ocidentalizar, quem é mais
moderno?
Os adolescentes que fazem de tudo pra se diferen-
ciar ou os que têm orgulho de se vestir uns iguais aos
outros?
Resposta de cabeça pra baixo.
méugniN: atsopser
T E T Ê P A C H E C O
TETÊ PACHECO É PUBLICITÁRIA
18 Estilo Zaffari
83677 consumo.p65 9/13/05, 3:38 PM1
Sabor
J O N N H Y F U J I M O T O
83677 sabor.p65 9/13/05, 5:41 PM2
T E X T O S P A U L A T A I T E L B A U M
F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O
Sushi
zen
Estilo Zaffari 21
83677 sabor.p65 9/9/05, 9:17 PM3
Eles devem manter as mãos frias e, de preferência,
o coração quente. É bom que tenham paciência, concen-
tração e habilidade. E que possuam com sua faca uma
relação de cumplicidade e confiança, como se o instru-
mento fosse uma extensão do próprio corpo. Mais do que
ser um profissional, o sushiman é um artista. Cada sushi
ou sashimi preparado é uma efêmera escultura, um pe-
queno bibelô, uma flor que desabrocha por entre os dedos
ágeis desse artesão. Seu atelier é o outro lado do balcão e
seus muitos admiradores possuem as mais variadas idades
e profissões. Ou seja, a obra do sushiman caiu no gosto
popular. É pop arte. Muito diferente de vinte e cinco anos
atrás, quando os Fujimoto tinham um pequeno ponto na
Ceasa e comer de pauzinhos era uma excentricidade. Um
quarto de século depois, a família cresceu, a decoração
mudou, o endereço virou dois: na Cristóvão e no Bourbon
Country. O patriarca, Rideu Fujimoto, já não está mais
do lado de lá do balcão. Assim como aquele que foi seu
primeiro assistente, o filho Jonnhy, que agora é um mo-
derno empresário do ramo zen gastronômico. Um sushizen.
Entro no restaurante Sakura e pergunto por Seu
Rideu. “O Gitian está aqui”, diz alguém apontando para
um senhor que lê seu jornal, sentado em frente ao balcão.
Do outro lado, três jovens sushimans preparam os apetre-
chos para dar início a mais uma noite no Sakura. Todos
respeitam o Gitian. E penso que a expressão japonesa talvez
signifique algo como “mestre”. Só depois de alguns minu-
O S U S H I M A N É U M S E N S Í V E L S A M U R A I D O S S A B O R E S
Sabor
22 Estilo Zaffari
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R I D E U F U J I M O T O
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Sabor
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T R A D I Ç Ã O É O P R I N C I P A L T E M P E R O D A C O Z I N H A J A P O N E S A
tos de conversa tomo coragem para perguntar o que quer
dizer. “Vovozinho”, responde Seu Rideu, com um forte so-
taque oriental. Faz quase cinqüenta anos que ele chegou ao
Brasil e o idioma japonês ainda vive com todo vigor em sua
fala. É a força de quem se apega intensamente às suas ori-
gens para assim não perder a sua essência. Gitian me conta
que está aposentado. Só muito de vez em quando veste
suas roupas típicas, empunha suas facas e, como um samurai
renascido, inicia o ritual de cortar os peixes e moldar o
arroz. Quando faz isso, todos que estão por perto ficam fas-
cinados com sua destreza. “Meu pai faz tudo naturalmente,
sem pensar”, diz Jonnhy.
Jonnhy Fujimoto é o principal discípulo do pai. Co-
meçou na cozinha, lavando louça e arroz. Em 1988 foi
para o Japão e lá ficou por quase cinco anos. “Foi assisten-
te de algum sushiman?”, pergunto eu. “Não, não, lá fiz
outras coisas. No Japão, se você diz que vai ficar menos
de dez anos, o sushiman não pega você para assistente,
tem que ficar muito tempo...” Jonnhy me explica que um
verdadeiro sushiman leva anos para dominar a sua técni-
ca, pois é preciso paciência e persistência para deixar o
ofício penetrar na alma. O aprendiz precisa observar mui-
to, já que o mestre normalmente dá poucas explicações.
“O assistente tem que ter sensibilidade, pode perguntar,
pode até errar, mas deve ter iniciativa”, diz Jonnhy. Con-
tinuo querendo saber mais sobre como as coisas são no
Japão e ele me conta que lá existem restaurantes só com
Estilo Zaffari 25
83677 sabor.p65 9/13/05, 5:41 PM7
C O M I D A F E I T A P A R A C O N T E M P L A R A N T E S D E D E G U S T A R
Sabor
mulheres, as sushiwomans. Aproveito para tirar uma dú-
vida: se é verdade que as mãos femininas não são tão
boas para preparar sushi e sashimi por serem mais quen-
tes. Seu Rideu parece não ter certeza sobre isso, mas fala
que as mulheres normalmente usam mais perfume, o que
é desaconselhável, já que o peixe cru absorve qualquer
odor que passa por perto. Já Jonnhy concorda que a tem-
peratura corporal feminina é mais sujeita a mudanças, mas
diz que isso não chega a ser um problema. “Conheci um
sushiman que colocava as mãos no gelo”, conta.
O objetivo da culinária japonesa é aproximar a co-
mida de como ela é na natureza. Não se mói, não se cozi-
nha muito, não se pica nada. O que é frio deve ser degus-
tado bem frio. E o que é quente, bem quente. Não há
excesso de ingredientes, e ao olhar o prato a pessoa deve
identificar todas as iguarias.
O bom é que conseguir o que você precisa para pre-
parar uma nipodelícia está muito mais fácil do que quan-
do Seu Rideu abriu o restaurante. Nos primórdios do
Sakura, encontrar atum ou salmão fresco era coisa rara,
enquanto hoje a oferta é grande e há fornecedores
especializados. Você tem praticamente tudo do que pre-
cisa nos supermercados Zaffari. Tudo para preparar as
receitas que seguem e que foram gentilmente cedidas pela
família Fujimoto. Caso você fique com água na boca, mas
chegue à conclusão de que não tem habilidade suficiente
para o preparo, não se aflija. O Sakura está aí para isso.
26 Estilo Zaffari
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Sabor
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Sashimi
PEIXES FRESCOS COMO: ATUM, SALMÃO,
NAMORADO, LINGUADO, OLHETE, PARGO, ETC.
NABO COMPRIDO
SHOYU – MOLHO DE SOJA
RAIZ FORTE (WASABI)
PEPINO JAPONÊS
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:
Corte o nabo em tiras bem fininhas e deixe em água cor-
rente por, no mínimo, 10 minutos. Preparando a raiz forte:
se for em pó, faça uma pasta acrescentando água aos pou-
cos e mexendo sempre rapidamente, até ficar homogênea.
Tampe por alguns instantes. Existem pastas prontas em
lojas especializadas ou mercados. Depois de lavado, o pe-
pino deverá ser cortado com a casca em fatias delicadas
para decorar, entre o nabo e os peixes. Separe os filés de
peixe e corte-os com 3 cm a 4 cm de largura. Certifique-se
de que não há espinhas. Após, fatie os filés na diagonal
das fibras, utilizando toda a extensão da faca, com mais ou
menos 1 cm cada fatia. Disponha as fatias num prato ade-
quado para sashimi, apoiando as fatias dos peixes nas por-
ções de nabo ralado, como se fosse um leque. É importante
montar o prato com cores contrastantes. A forma correta
de comer um sashimi começa com o preparo do tempero:
coloque uma pequena quantidade de shoyu e wasabi (aque-
la preparada anteriormente) num pequeno recipiente
(kozara), misturando bem e completando com mais shoyu
a seu gosto. Passe delicadamente as fatias no molho, uma
de cada vez, sem soltá-las dos palitinhos (hashis). O nabo
ralado, além de decorar, é importante para a digestão do
peixe cru. Para o consumo de peixe cru, devem ser usados
os 5 sentidos: visão, tato, paladar, olfato e audição (este
serve para escutar o que o vendedor lhe fala). Se houver
desconfiança em algum desses, não adquira o pescado. Caso
não saiba comprar e limpar um peixe, peça para o peixeiro
de sua confiança fazer isto por você, observando onde e
como limpa. A faca deve ser extremamente afiada e espe-
cial para este tipo de corte. Cuidados e precisão são ele-
mentares. Se não tiver faca especial, use uma fina e reta. O
sashimi deve ser consumido o quanto antes, para que os
peixes não percam a temperatura e o sabor ideais.
Fatias de Peixes Crus
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:
Lave o Kombu em água corrente. Coloque em uma panela
junto com a água e deixe ferver. Retire o Kombu, diminua
o fogo e acrescente o Katsuobushi ou Hondashi. Deixe por
um ou dois minutos e desligue. Filtre e guarde. O Kombu
Dashi é um dos caldos básicos mais utilizados na cozinha
japonesa. Utilizado como base para sopas, molhos e cozi-
mento.
Kombu Dashi
Caldo Básico
1 KOMBU (ALGA MARINHA) COM CERCA
DE 20 CM
1,5 LITRO DE ÁGUA
30 G DE KATSUOBUSHI (RASPAS DE PEIXE
BONITO SECO) OU 2 COLHERES (CHÁ) DE
HONDASHI (EXTRATO DE PÓ DE PEIXE BONITO)
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:
Lave o Tofu e corte em cubinhos. Coloque para cozinhar
junto com o Moyashi em uma panela com o Dashi. Desli-
gue antes de ferver. Dissolva o Misô com um coador no
Dashi. Sirva em tigelas.
Misoshiro
Sopa de Misô
2 XÍCARAS DE DASHI (CALDO BÁSICO)
2 COLHERES (SOPA) DE MISÔ (PASTA DE SOJA)
50 G DE TOFU (QUEIJO DE SOJA)
½ XÍCARA DE MOYASHI (BROTO DE FEIJÃO)
Estilo Zaffari 29
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Sabor
1 LULA MÉDIA (SÓ O “TUBO”) LIMPA E FRESCA
80 G DE COGUMELOS SHIMEJI FRESCOS
2 COLHERES (SOPA) DE SHOYU
2 COLHERES DE MANTEIGA
1 COLHER (SOPA) DE MIRIN (SAKÊ DE COZINHA)
Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:
Pré-aqueça uma frigideira e coloque 1 colher (sopa) de man-
teiga e refogue os cogumelos ligeiramente. Acrescente o shoyu
e o mirin e deixe cozinhar em fogo baixo por cerca de 5 minu-
tos. Desligue. Preencha a lula com este recheio e feche-a com
um palito. Em seguida, em outra frigideira, coloque 1 colher
(sopa) de manteiga ou azeite e doure a lula em fogo médio
por 2 minutos de cada lado. Retire a lula da frigideira e com
uma faca afiada corte a lula em anéis e disponha no prato.
Decore ao seu gosto.
Ika no Bata
Lula na Manteiga Recheada com Shimeji
Sabor
Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:
Lave os pepinos. Retire um pouco da casca, corte ao meio
no sentido do comprimento e remova as sementes. Corte
em fatias finas. Coloque em uma tigela e salpique com sal.
Deixe descansar por meia hora. Esprema e retire o excesso
de líquido. Acrescente os outros ingredientes e misture.
Sunomono
Salada de Pepino com Kani
3 PEPINOS JAPONESES
½ COLHER (SOPA) DE SAL
1 COLHER (SOPA) DE AÇÚCAR
2 COLHERES (SOPA) DE VINAGRE BRANCO
2 TABLETES DE KANI DESFIADO
30 Estilo Zaffari
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Sabor
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200 G DE MASSA PARA YAKISOBA (PODE SER
NISSIN)
50 G DE CAMARÕES MÉDIOS
160 G DE LEGUMES VARIADOS À SUA ESCOLHA
(ACELGA, REPOLHO, CENOURA, BRÓCOLIS,
COUVE-FLOR, VAGEM TORTA). PODE-SE USAR
BROTO DE BAMBU (TAKENOKO) E DE FEIJÃO
(MOYASHI).
ÓLEOS DE GIRASSOL E GERGELIM
CEBOLINHA PICADA
1 XÍCARA DE CALDO BÁSICO DE FRANGO
AMIDO DE MILHO
AJI-NO-MOTO
2 COLHERES (SOPA) DE SHOYU
Yakisoba
Massa Frita com Camarões e Legumes
Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:
Cozinhe a massa al dente e escorra na água fria e reserve.
Numa panela wok ou, se não tiver, frigideira grande antiade-
rente, aqueça o óleo de girassol suficiente para cobrir a meta-
de da massa e frite-a levemente. Retire e deixe escorrer o ex-
cesso de óleo. Limpe e unte a panela para refogar primeiro os
camarões picados e depois os legumes. Não cozinhe demais.
Acrescente o shoyu, uma pitada de aji-no-moto e misture ra-
pidamente; depois, o caldo de frango. Deixe ferver e coloque
um pouquinho de amido de milho para encorpar. Desligue e
acrescente a cebolinha picada e o óleo de gergelim. Numa
travessa coloque a massa e cubra-a com o molho de legumes.
Obs.: o fogo deve ser sempre o mais alto possível, para que os
ingredientes não cozinhem demais, apenas fiquem refogados.
2 LOMBOS DE PORCO (180 G CADA)
4 FOLHAS DE REPOLHO FINAMENTE FATIADO
1 COLHER (SOPA) DE ÓLEO
MOLHO DE GENGIBRE
4 COLHERES (SOPA) DE SHOYU (MOLHO DE
SOJA)
4 COLHERES (SOPA) DE SAKÊ
2 COLHERES (SOPA) DE MIRIN (SAKÊ DE
COZINHA)
1 COLHER (SOPA) DE GENGIBRE RALADO
2 COLHERES DE AÇÚCAR
Shoga-Yaki
Lombo Temperado com Gengibre
Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:Modo de preparo:
Combine os ingredientes do molho de gengibre numa ba-
cia, e deixe os lombos de porco marinando por 10 a 15 mi-
nutos. Aqueça uma frigideira com o óleo. Retire os lombos
do molho e frite em fogo alto por 2 a 3 minutos, até dou-
rar de um lado. Vire, diminua o fogo e frite tampando a
frigideira por mais 4 minutos. Retire da frigideira. Colo-
que o molho de gengibre para aquecer na frigideira num
fogo médio e cozinhe em fogo baixo por 2 minutos. Sirva
num prato decorando com o repolho. Derrame o molho da
frigideira sobre os lombos.
Estilo Zaffari 33
83677 sabor.p65 9/13/05, 5:55 PM15
Bom conselho
P O R M A L U C O E L H O
SABEDORIA JAPONESA
34 Estilo Zaffari
Um país com costumes tão diferentes, conhecido pela forma
peculiar de ver a natureza, a religião, as artes, o trabalho, a família e
por sua sabedoria milenar. Ao falar no Japão acabamos nos trans-
portando a um mundo muito especial, de real beleza. Além disso,
tudo que se conhece das atitudes dos japoneses nos faz realmente
admirá-los e imaginar que temos muito a aprender.
A graciosidade dos origamis
O apreço aos detalhes popularizou o origami, que é muito mais do
que simplesmente dobradura em papel – é delicadeza, perfeição, fé,
esperança, oração, saúde, fortuna, distração e paz.
O origami mais popular do Japão é o tsuru, “garça da sorte”. Con-
siderada uma das dobraduras mais perfeitas, pois a sua forma serve de
base para compor outras dobraduras, desde animais até plantas.
Que tal uma Garça da Sorte?
Além da função decorativa, a garça passou a ser oferecida em
altares e templos, e ao dobrar a figura as pessoas depositam nela
toda fé e esperança. Antigamente se costumava pendurar essas aves
de papel no teto para distrair as crianças, especialmente bebês –
dizia-se que ela trazia longevidade.
Nos dias atuais a garça de papel é utilizada na decoração de
presentes, em casamentos, ano-novo, nascimentos e todo tipo de
comemoração festiva, simbolizando saúde e fortuna.
Crendices ou não, o certo é que as pessoas se unem no Japão
todos os anos, para confeccionar milhares de garças e depositar no
Monumento da Paz em Hiroshima, onde caiu a bomba atômica,
formando uma corrente de pensamento positivo pela paz mundial.
Se você está com vontade de fazer algum tipo de arte, o origami
não representa nenhum custo. Só leva papel, paciência, habilidade
manual e dedicação. E acima de tudo pode lhe trazer muita sorte e
vida longa. Os japoneses que o digam!
SÃO OU NÃO SÃO CHEIOS DE MISTÉRIOS?
O MÓBILE DE ORIGAMI QUE
ENFEITA ESTA PÁGINA É UM
TSURU E FOI CONFECCIO-
NADO PELA DESIGNER MA-
RIANA REIS, ESPECIALMEN-
TE PARA A ESTILO ZAFFARI.
FONE: 9955.3098.
83677 bom conselho.p65 9/13/05, 9:25 PM1
MAIOR TORII DO JAPÃO, NO MAR SETO (VISTO DO SANTUÁRIO DE ITSUKUSHIMA)
Viagem
83677 viagem Japao.p65 9/13/05, 3:12 PM2
às avessasT E X T O S E F O T O S A N G E L A F A R I A S
Mundo
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:36 PM3
Formado por um arquipélago de cerca de 4 mil ilhas, o
Japão é um lugar fascinante. Da agitada Tóquio à ilha sagra-
da de Miyajima, aqui há muito o que aprender. O povo é
gentil, reservado, religioso, trabalhador e em plena era da
globalização faz questão de manter intactos sua cultura e
seus costumes. Terra de aparentes contradições... Bem-vin-
dos ao Nippon, ou “terra do sol nascente”!
A primeira sensação que se tem ao chegar no Japão
é de que o mundo virou às avessas: trocamos o dia pela
noite, o verão pelo inverno e o trânsito tem mão inglesa.
Tarefa complicada até para os próprios japoneses,
encontrar endereços em Tóquio é uma aventura: fora as
grandes avenidas, a maioria das ruas não têm nome e a
numeração dos prédios não é por ordem seqüencial, mas
em ordem de construção. Para driblar este caos, consiga
sempre um mapa detalhado com explicações do tipo:
descer na estação de metrô “X”, saída “Y”, andar 50 m
até a loja de bicicletas, virar à direita, andar até o café e
atravessar a rua... Não se preocupe, esta é uma prática
absolutamente corriqueira para eles.
AO CHEGAR, A
SENSAÇÃO É DE QUE
O MUNDO VIROU ÀS
AVESSAS: TROCAMOS
O DIA PELA NOITE, O
VERÃO PELO INVERNO
MERCADO DE PEIXES E MAIOR TORII DO JAPÃO, NO MAR SETO
38 Estilo Zaffari
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:37 PM4
Encontro meu prédio e digito a senha para entrar.
Isto é Japão! Uma sucessão de duas ou três portas automá-
ticas me faz lembrar a abertura do “Agente 86”. O apar-
tamento não é tão pequeno como a maioria de nós imagi-
na. Aqui há milhares de “JKs” bem menores... O que
chama a atenção é o pé-direito, muito mais baixo do
que o nosso. Basta levantar o braço e encosto a mão no
teto! E eu só tenho 1,63 m!
Está escuro lá fora e um cansaço terrível me abate. Eu,
que não sou de dormir cedo, vou ter que me entregar a
Morfeu. Devem ser 10h da noite. Os efeitos do jet lag são
avassaladores – só de Guarulhos a Narita são 24 horas de
vôo, somadas ao trecho Porto Alegre–São Paulo, mais es-
peras no aeroporto, uma hora e meia de ônibus de Narita
até Tóquio e doze horas de diferença de fuso horário. Mas
não é hora para matemática, e o sono é grande. Só por curi-
osidade, dou uma olhadinha no relógio: 5 da tarde! Não
pode ser! Azar, vou ter que dormir.
Totalmente renovada, desperto às 3h com todo o
gás e ansiosa por conhecer de perto esta terra tão dife-
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:22 PM5
rente da nossa. A vontade de sair é tanta que não consigo
esperar o sol raiar e me aventuro pelas calçadas de Tóquio.
A fama de que esta é uma das cidades mais seguras do mun-
do é suficiente para me arrancar de casa. Saio a pé para
conhecer o bairro, Akasaka, de madrugada, o que em qual-
quer outro canto do mundo seria no mínimo uma impru-
dência. Em Tóquio decididamente não é! Há várias pessoas
na rua passeando com seus cachorros. Em quase todos os
quarteirões há quitandas e lojinhas de conveniências aber-
tas 24 horas. E pessoas comprando!
Finalmente amanhece. A cidade é linda, a limpeza
impecável. Mesmo que se procure não há sequer baganas
de cigarro pelo chão – e como eles fumam! A elegância
das japonesas chama a atenção tanto quanto o equilí-
brio que desenvolvem sobre sapatos de plataformas gi-
gantes. Mas confesso que vi algumas torcendo o pé...
Começa a se formar um formigueiro humano – Tó-
quio tem cerca de 12,5 milhões de habitantes. Enquanto
alguns vão de carro, a pé ou de bicicleta, milhões de japo-
neses e eu nos dirigimos ao metrô. A rede é muito eficien-
Viagem
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:39 PM6
te e abrange praticamente toda a cidade. É fácil entender
as placas de sinalização das estações.
Os japoneses em Tóquio andam com uma rapidez
impressionante. O ritmo é frenético e me dou conta de
que este movimento é apenas uma outra face da rapidez
com que o Japão se desenvolveu após a guerra e da velo-
cidade com que inventam tecnologias de ponta. Não é à
toa que projetaram o shinkansen, trem-bala que alcança
até 275 km/h, e os maglev, que em vez de rodas usam
ímãs e atingem mais de 500 km/h.
Vou para Akihabara, o bairro dos eletrônicos. E é
preciso preparar o espírito: lá tem tanta novidade tec-
nológica que você sai com a sensação de, no Brasil, viver
na era das cavernas. Mas este não é um bom lugar de
compras para nós, pobres dinossauros. Além dos preços
muito altos, grande parte da tecnologia não está dispo-
nível no Brasil e você pode ter problemas para encon-
trar assistência técnica especializada.
Um dos bairros mais bacanas de Tóquio é Harajuku.
E domingo pela manhã é o dia certo para visitá-lo. É bom
HARAJUKU É O
BAIRRO MAIS
DESCOLADO DE
TÓQUIO. OS JOVENS
SE FANTASIAM PARA
SEREM FOTOGRAFADOS
ADOLESCENTE EM HARAJUKU E TALISMÃS PARA SAÚDE, VITÓRIA, PROTEÇÃO CONTRA TERREMOTOS...
Estilo Zaffari 41
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:19 PM7
TEMPLO KINKAKUJI (OU TEMPLO DE OURO), EM QUIOTO
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 8:08 PM8
chegar antes das 10h, quando o movimento ainda é pe-
queno. Depois, tem tanta gente que mal se consegue an-
dar. Imagine a multidão da Rua da Praia na hora do almo-
ço e multiplique por cem! Mas se você não conseguir acor-
dar cedo, não desista: encare o formigueiro, porque o pas-
seio vale a pena! É para lá que se dirigem centenas de
jovens com cabeças e sacolas cheias de fantasias. Encon-
tram a sua “tribo” e começam a superprodução: maquia-
gem caprichada e roupas extravagantes, eles normalmen-
te copiam o estilo das bandas de rock japonesas e se diver-
tem posando para os curiosos fotografarem. Tudo muito
colorido, eles pontuam a sua popularidade de acordo com
o número de pessoas que pedem para fotografá-los. Aqui,
quantidade é sinônimo de qualidade.
Se você tiver sorte também pode assistir a algum
show de dança ou de rock japonês. Os novos artistas se
apresentam na praça, na esperança de que algum produ-
tor esteja assistindo e lhes ofereça um contrato. Algu-
mas bandas de sucesso surgiram assim. Harajuku tam-
bém é cheio de brechós, butiques ultramodernas e cafés
com mesas nas calçadas. Aqui é um ótimo lugar para
comprar artigos regionais. O Oriental Bazaar é conheci-
do como a melhor loja para encontrar quimonos, xilo-
gravuras, cerâmicas, artesanatos em madeira, papel e até
mesmo móveis.
À noite, dê um passeio pela Av. Ginza. Cheia de
painéis eletrônicos e vitrines sonorizadas, lembra um
pouco Nova Iorque, só que é muito mais legal.
A comida
Não gostar de comida japonesa ou falta de habilida-
de com os hashi – pauzinhos – não são desculpas para evi-
tar o Japão. Inúmeras são as opções gastronômicas dispo-
níveis: da sofisticada cozinha francesa ao fast food, passan-
do por churrascarias, restaurantes italianos, mexicanos,
chineses, tailandeses ou indianos. Em qualquer um deles
você será muito bem servido e atendido, mas atenção:
nem pense em dar gorjeta! Este hábito é considerado uma
indelicadeza, e além de não aceitarem de jeito nenhum os
japoneses se sentem muito ofendidos. Muitos restauran-
tes têm uma vitrine com cópias perfeitas dos pratos feitas
em plástico ou resina. Se você não entender o cardápio é
só mostrar o prato que deseja.
Para os amantes da culinária japonesa, o óbvio: você
está no paraíso! Mas o detalhe que conta e que faz toda a
diferença é que todos os pratos são elaborados com in-
gredientes extremamente frescos. Os peixes para o pre-
paro dos sashimis saem praticamente do mar para a mesa,
o que lhes confere um sabor especial. No mercado ataca-
dista de peixes Tsukiji, os barcos abarrotados de frutos do
mar e peixes chegam por volta das 3h da manhã e lá pelas
6h começam os leilões. Dali saem quase todos os peixes que
A IMAGEM DO
TEMPLO FOLHEADO
A OURO REFLETIDA
NO LAGO DE QUIOTO
É INESQUECÍVEL
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:20 PM9
vão ser consumidos durante o dia em Tóquio. Nos arredo-
res do mercado há inúmeras bancas que vendem peixes e
frutos do mar direto para o consumidor. Muitos japoneses
comem sushi no café da manhã!
A comunicação
Apesar do confuso sistema de endereços, não é di-
fícil andar sozinho pelo Japão. Pelo menos nas grandes
cidades as informações principais estão disponíveis tam-
bém em inglês. Mas prepare-se para, em determinadas
circunstâncias, sentir-se um analfabeto: até hoje eu não
sei se não comprei ração para cachorro pensando ser
uma caixa de Sucrilhos... Pior que isso, além de não ler
ou escrever, você ainda não entende o que eles falam.
Em geral, esta situação não é assim tão desesperado-
ra porque a maioria dos japoneses, principalmente os mais
jovens, entende o inglês. Você pode “fisgar” o japonês com
um sumimasen – com licença – e pedir as informações em
inglês. O povo é muito gentil e atencioso, e se você pedir
uma informação para um japonês que não fale inglês, te-
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:33 PM10
AO ENTRAR NOS
TEMPLOS E NAS CASAS
VOCÊ DEVE TIRAR
OS SAPATOS. FICAR
CALÇADO É GAFE!
nha certeza de que ele ficará muito mais desesperado do
que você e sairá, ele mesmo, à procura de alguém que possa
ajudar. É comum que alguns deles entendam bem o inglês
escrito, então tenha sempre papel e caneta à mão.
No entanto, mesmo para os que têm o inglês fluen-
te, é necessário fazer algumas “adaptações” para en-
tender o sotaque carregado dos japoneses. Eles não
conseguem pronunciar o “l”, então o substituem por
“r”. O “v” é trocado por “b”. Quando há duas consoan-
tes juntas ou uma consoante muda no fim da palavra,
acrescenta-se um “a”, “o” ou “u”, conforme o caso. Com-
plicou? Aqui vão alguns exemplos: Milk, leite, vira mi-
roko, hot dog passa a ser hoto dogo, Yakult é yakuruto,
Mc’Donalds, macu donaruto, Varig Brazilian Airlines fica
muito engraçado: Barigu Burazirianu Airurines... Não tem
jeito, é preciso acostumar o ouvido, e se você conseguir
imitá-los fica mais fácil de se fazer entender.
Aqui tira sapato!
A maior e pior gafe que você pode cometer no Japão é,
SANTUÁRIO DE ITSUKUSHIMA EM MIYAJIMA - PALCO E LANTERNA DE PEDRA
Estilo Zaffari 45
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:40 PM11
OS CERVOS SÃO
CONSIDERADOS
MENSAGEIROS DOS
DEUSES. ESTES EU
FOTOGRAFEI NA
ILHA DE MIYAJIMA
ao entrar em uma residência, não trocar os sapatos pelos
chinelinhos que ficam na entrada. Para os japoneses, as
impurezas vindas do exterior não devem ser levadas para
dentro de um lar. Você também deve tirar os sapatos ao
entrar em templos, restaurantes tradicionais, provadores
de lojas e ryokans – hospedarias em estilo japonês. E se em
qualquer outro lugar você vir os chinelinhos na porta, não
hesite. Caso você tenha que pisar em um tatame, tire os
chinelos e fique descalço ou de meias. Um detalhe impor-
tante: quando for ao banheiro, você precisará trocar os chi-
nelos por outros de borracha ou de plástico. Não esqueça de
destrocá-los ao sair. Quando isto acontece – com um oci-
dental, é claro! –, eles acham constrangedor e engraçado.
Peça desculpas e vá correndo trocar.
Evitando micos
Alguns detalhes são imprescindíveis para enfrentar
com elegância as enormes diferenças culturais entre nós,
brasileiros, e os japoneses. Ao cumprimentá-los, em hi-
pótese alguma os beije ou abrace, e evite o aperto de mão.
CERVOS EM MIYAJIMA E LANTERNAS JAPONESAS
46 Estilo Zaffari
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:41 PM12
Qualquer contato físico é considerado extremamente ín-
timo para um cumprimento. Os japoneses deixam os bra-
ços estendidos ao longo do corpo e o curvam para a frente
a partir da altura do quadril. Mas há uma série de regras a
serem seguidas neste gesto aparentemente simples. O grau
de curvatura do corpo e quem levanta antes é algo deter-
minado pela idade e pela hierarquia das pessoas envolvi-
das no cumprimento. Para não fazer feio, não tente imitá-
los. O mais adequado é um simples sorriso. Assim você
não cometerá nenhuma indelicadeza e eles entenderão
que você não conhece as regras por ser um estrangeiro.
Olhar para um japonês diretamente nos olhos é,
praticamente, o mesmo que xingá-lo. A menos que você
queira partir para a briga, ao conversar com um japonês
olhe na altura dos seus ombros. Ao receber um cartão de
visitas – e você receberá muitos – segure-o com as duas
mãos e olhe-o com muita atenção, mesmo que você não
entenda nada, por alguns segundos antes de guardá-lo.
E, finalmente, se for brindar com alguém, diga
“kanpai”. Lembre-se: nunca, jamais, nem que o mundo
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:20 PM13
OS PEIXES SAEM
PRATICAMENTE DO
MAR PARA A MESA. OS
MERCADOS SÃO UMA
ATRAÇÃO À PARTE
acabe, diga “tintim”! O que significa? Uma maneira pouco
polida de se referir ao órgão sexual masculino. Chato, né?
Viajando pela Ilha de Honshu
É hora de pegar o shinkansen e ir para o sudoeste.
Até Quioto, parada obrigatória, são 512 km e somente
2h40min de viagem. No caminho, a apenas meia hora
de Tóquio, você pode ver pela janela o monte Fuji, cari-
nhosamente chamado de Fuji-san pelos japoneses. Qui-
oto foi, por mais de mil anos, a capital do Japão. Observe
que o caractere “quio”, que significa “capital”, aparece
tanto em Quioto como em Tóquio, que se chamava Edo
antes de a capital ser transferida para lá. Das principais
cidades japonesas, Quioto foi a única que escapou dos
bombardeios da segunda guerra, transformando-se em
símbolo da história do Japão. A cidade é um charme e
algumas casas têm bonsais na entrada. Dentre inúmeras
opções, resolvi visitar o Templo Ryoanji, a fim de co-
nhecer o mais famoso jardim de pedras, ícone do zen-
budismo japonês. De uma porção de seixos brancos cui-
MERCADO DE PEIXES
48 Estilo Zaffari
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:41 PM14
dadosamente alinhados emergem quinze pedras que re-
presentam ilhas ou montanhas no mar. Recomenda-se
que a pessoa sente em frente a ele em estado contempla-
tivo. Juro, tentei obedecer. Mas em menos de cinco mi-
nutos fui invadida por uma terrível sensação de culpa:
eu tinha pouco tempo para ficar na cidade e me ator-
mentava a idéia de não estar me dirigindo a pelo menos
mais um dos 1.599 templos budistas restantes ou um dos
cerca de 300 santuários xintoístas existentes em Quio-
to. Saí de fininho tentando me esconder da minha pró-
pria falta de paz de espírito e sucumbi ao meu desejo de
turista-correndo-tentando-ver-tudo-o-que-dá!
Visitei, ainda, alguns jardins japoneses maravilhosos
e fui para o Kinkakuji, réplica do pavilhão de ouro construí-
do por um xogum em 1390 e destruído por um incêndio. A
imagem do tempo folheado a ouro refletida no lago é mais
uma das agradáveis lembranças que trago do Japão.
Nara, conhecida como Heijo-ko – cidadela da paz –,
foi a primeira capital do Japão e fica bem pertinho, cerca
de 40 km de Quioto. Vale a pena conhecer o Templo To-
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 6:21 PM15
CASTELO SHIRASAGI-JO OU CASTELO DA GARÇA BRANCA, EM HIMEJI
Viagem
83677 viagem Japao.p65 9/12/05, 2:42 PM16
daiji, construído em meados dos anos 700, e o Daibutsu,
que é uma imagem de Buda de 15m de altura feita em
Bronze. Passear no Parque de Nara é uma delícia, e você
pode ver centenas de cervos andando livremente.
Himeji localiza-se a 130 km de Quioto e é a cidade
que abriga um dos castelos – ex-fortaleza militar – mais
lindos do Japão. O castelo, que hoje é patrimônio da hu-
manidade, aparece no filme Ran, de Akira Kurosawa, e é
conhecido como Shirasagi-jo, ou “castelo da garça bran-
ca”. Dizem os japoneses – que imaginação fértil! – que o
formato das paredes brancas do castelo lembra a ave vo-
ando na planície... Mais do que um legado atômico, Hi-
roshima é uma cidade bonita e moderna. Não fosse pelo
Parque, pelo Museu Memorial da Paz e pelo Domo da Bom-
ba-A – ruína do único prédio que sobrou após a explosão
–, seria difícil imaginar que já foi o palco de uma das mai-
ores tragédias da humanidade. O mais bonito de Hiroshi-
ma é, sem dúvida, a postura dos japoneses em relação ao
seu passado: eles não lamentam o horror, simplesmente
lutam e promovem a paz mundial. O museu está ali ape-
nas como um exemplo a não ser seguido. Ainda assim, a
visita ao Memorial da Paz foi um golpe forte. Saí de lá
completamente calada, sem pensamentos, vazia de tudo...
Sensação de flutuar
Por sorte, ali, quase ao lado, a apenas 13 km de Hi-
roshima, fica a ilha de Miyajima. Para chegar a ela é preci-
so pegar um trem e uma balsa que leva mais ou menos 10
minutos para cruzar o mar Seto. Do mar se ergue o maior
torii – pórtico, este com mais de 16 m de altura – do Japão,
indicando que a partir dali o território é sagrado. Tão sa-
grado que antigamente era proibido nascer ou morrer em
Miyajima. As mulheres grávidas e os doentes eram imedi-
atamente afastados de lá, para evitar que cenas demasiado
humanas acontecessem na ilha. Até hoje não há cemité-
rios ou maternidades no local. Coberta por florestas vir-
gens, Miyajima tem cerca de 31 km de circunferência.
A mais ou menos 10 minutos a pé partindo do píer está a
principal atração da ilha: o Santuário de Itsukushima,
construído em 592 em homenagem a três deusas. Nesta
pequena caminhada, dezenas de cervos extremamente
mansos vieram ao meu encontro. Não deve ser por acaso
que esses simpáticos animais são considerados “os men-
sageiros dos deuses”. A companhia deles foi muito diver-
tida e deixei para trás o “efeito Hiroshima”. Ao chegar no
santuário, procurei um monge para saber a que horas a
maré estaria cheia. Ele puxou um livrinho com uma tabe-
la e falou um horário preciso, algo como 11h38min. Tão
pontual como os japoneses – que são mais pontuais que os
ingleses –, o mar parou de subir na hora exata. O templo
pareceu flutuar sobre as águas tanto quanto, algumas ho-
ras depois, eu deixei a ilha... Flutuando...
CURIOSIDADES
OS CÃES E OS GATOS SÃO MUITO GORDOS NO JAPÃO.
OS JAPONESES ADORAM LER NO METRÔ, MAS ELES
SEMPRE ENCAPAM OS LIVROS PARA QUE NINGUÉM SAIBA
O QUE ESTÃO LENDO.
POR CERCA DE CEM DÓLARES, ELES PODEM ALUGAR
UM CACHORRO PARA PASSEAR COM O BICHO PELAS RUAS
DE TÓQUIO.
OS JAPONESES SE SENTEM TÃO CONSTRANGIDOS AO
FREQÜENTAR BANHEIROS PÚBLICOS QUE ALGUNS TÊM
ALTO-FALANTES EMITINDO O SOM DA DESCARGA PARA
QUE QUEM ESTEJA DO LADO DE FORA NÃO PRECISE OU-
VIR “OUTRO TIPO DE BARULHO”.
POR CAUSA DA COMPLICAÇÃO EM ACHAR ENDEREÇOS,
OS TAXISTAS SÓ PARAM PARA OCIDENTAIS SE ELES TI-
VEREM NA MÃO O CARTÃO DE VISITAS DO HOTEL OU DO
LUGAR ONDE QUEREM IR. AS PORTAS DOS TÁXIS ABREM
E FECHAM AUTOMATICAMENTE, E OS MOTORISTAS SEM-
PRE USAM LUVAS BRANCAS.
NOS RESTAURANTES, UMA HORA ANTES DE FECHAR
ELES ANUNCIAM O HORÁRIO, PARA QUE OS COMENSAIS
POSSAM FAZER O ÚLTIMO PEDIDO.
QUANDO VOCÊ ENTRA EM UMA LOJA OU RESTAURAN-
TE, ELES SEMPRE FALAM “IRASHAIMASE” – BEM-VINDO!
ALGUNS TURISTAS DESAVISADOS DÃO MEIA-VOLTA,
ACHANDO QUE ESTÃO SENDO EXPULSOS!
SE VOCÊ ESTÁ EM UM SHOPPING QUASE NA HORA DE
FECHAR, TODOS OS FUNCIONÁRIOS FAZEM UMA FILEIRA
FORMANDO UM CORREDOR NA PORTA. QUANDO VOCÊ
PASSA, ELES SE CURVAM PARA CUMPRIMENTÁ-LO.
A VARIEDADE DOS CARACTERES JAPONESES É TÃO GRAN-
DE QUE MESMO UM JAPONÊS CONSIDERADO EXTREMA-
MENTE CULTO NÃO É CAPAZ DE IDENTIFICÁ-LOS TODOS.
83677 viagem Japao.p65 9/13/05, 3:16 PM17
O sabor e o saber
F E R N A N D O L O K S C H I N
A história foi contada por Walpole, ele mesmo um
bispo anglicano. Um rei francês, ao relatar suas fantasias
sexuais extraconjugais, foi severamente recriminado pelo pa-
dre confessor. Após a penitência, o rei quis saber do padre
qual era seu prato predileto. “Perdiz!”, foi a resposta entusi-
asmada. O rei ordenou então ao cozinheiro da corte que
sempre e somente perdiz fosse servida ao padre. Meses de-
pois, quando o rei perguntou ao padre como ia sua vida no
palácio, teria recebido como resposta um lamento desespe-
rado que se tornou proverbial: “Perdiz, sempre perdiz”...
Diferente da perdiz do padre e da esposa do rei, o
arroz tem a rara qualidade de nunca se tornar enfadonho.
Mais de 3 bilhões de pessoas comem arroz 2 ou 3 vezes
todos os dias de suas vidas sem nunca perderem o prazer e
o apetite. O arroz não causa monotonia de cardápio, quanto
mais é comido, mais é gostado.
O arroz brilha pela singeleza: a discrição de tamanho,
forma, consistência, cor, odor e sabor é sua maior qualidade.
É o acompanhante ideal para outros alimentos, seu grão
absorve o caldo em que cozinha e, assim, incorpora o gosto
que se queira dar.
Natural da Índia, o arroz é uma planta do seco que por
mutação se adaptou bem à água. Emigrou para China, leva-
do não pelo homem mas pelos ventos, águas e aves.
Aclimatou-se por toda a Ásia, onde moldou a demografia,
governo, cultura e caráter da região. Na verdade não é pos-
sível definir a Ásia pela geografia, clima, linguagem, etnia,
história ou religião, seu verdadeiro denominador comum é
o arroz! Lá ocorrem 90% do cultivo e consumo do arroz,
numa associação entre homem e alimento sem equivalentes.
A plantação do arroz na Ásia tende a ser coletiva, re-
querer uma força de trabalho volumosa, coordenada, paci-
ente como são aquelas comunidades. Os povos são, ou me-
lhor, tornam-se aquilo que comem.
Na agricultura tradicional, o arroz é o mais eficien-
te dos cereais; os asiáticos, nutridos pelo grão, foram por
séculos mais numerosos, poderosos e sadios do que os
europeus, africanos e americanos. Sem a máquina e a quí-
mica, o arrozal cria um ecossistema paralelo de piscicul-
tura que fornece as proteínas que complementam suas
calorias. Apesar da menor produtividade, há mais em-
prego e conservação do solo.
A tradição chinesa ensina que dos cinco grãos sagra-
dos – arroz, trigo, soja, cevada e milhete – o arroz é rei.
Grande onívoro, o chinês come cães, gatos e macacos, mas,
para ele, alimento mesmo é arroz, todo o resto é mero acom-
panhamento. Sua palavra para ‘arroz’, pán, é a mesma que
para ‘refeição’, e como um equivalente ao nosso “Como vai?”
o chinês pergunta: “Já comeu arroz hoje?”.
Lá, o arroz pode ser totalmente reciclado. Junto a
muita gente e pouco bicho, o chinês não faz qualquer
restrição ao uso de dejetos humanos como adubo, pelo
contrário: agricultores podem disputar o conteúdo de
latrinas e já foi praxe o consumidor pagar parte do arroz
com suas próprias fezes.
E o Japão, apesar da recente ocidentalização, ainda é
visto pelo clichê do arroz cozido e peixe cru. A bebida japo-
nesa é o saquê, aguardente de arroz oferecida aos hóspedes,
antepassados e divindades; o ano novo é celebrado com muki,
bolo de arroz; e nos sushi e sashimi o que faz diferença não é
o peixe, é o arroz, este sim, a verdadeira comida japonesa.
Como na China, a palavra japonesa para ‘arroz’ é a
mesma que para ‘comida’, goham, que ainda recebe o senti-
do adicional de ‘homenageado’. Assim como dizemos café
da manhã mesmo se bebemos leite ou chá, o japonês diz
sempre asagohan, ‘arroz da manhã’.
Para o japonês, só o imperador seria mais sagrado do
que o arroz, e para o budista – e Buda era filho de Sudodana,
‘arroz puro’ em sânscrito –, só Buda seria mais perfeito que o
arroz.
O Japão recebeu o arroz da China junto com a escrita,
o kanji. Cinco mil anos de intimidade se revelam em cente-
nas de ideogramas com o desenho do arroz. Palavras para
‘estação’, ‘outono’, ‘semente’, ‘colheita’, ‘imposto’ e ‘paga-
mento’ trazem em seus símbolos testemunhos literalmente
escritos da importância do arroz: ‘dúvida’ se expressa como
incerteza sobre a produção e preço do arroz, e ‘vizinhança’
como proximidade a um arrozal. Até a palavra ‘dente’ con-
tém o símbolo do arroz, uma comparação de cor e forma,
curiosamente a mesma metáfora usada por Neruda no ver-
RISO DI CARRETIÈREPara quem sorri o arroz com infinitos dentes brancos?
52 Estilo Zaffari
83677 sabor e o saber.p65 9/14/05, 12:34 PM2
REFOGAR CEBOLA PICADA E UM MÍNIMO DE TOMATE. DOURAR ALI O GUISADO E RETIRAR DO FOGO. DERRA-
MAR 2 XÍCARAS DE ÁGUA MINERAL QUENTE. DEIXAR DESCANSAR. FRITAR 2 DENTES DE ALHO. RETIRAR O
ALHO E FRITAR O ARROZ. COAR A CARNE E DESPEJAR O CALDO NO ARROZ. COZINHAR MEXENDO EM FOGO
BAIXO. ADICIONAR 1 CÁLICE DE VINHO BRANCO SECO. PÔR MAIS ÁGUA MINERAL FERVENTE, SE PRECISO.
QUANDO QUASE AL DENTE COLOCAR A CARNE. ADICIONAR ERVILHAS OU BRÓCOLIS. ACRESCENTAR PARMESÃO,
TEMPERO VERDE, CUBOS DE TOMATES SEM PELE E SEMENTES. BORRIFAR OVO DURO PICADO E SERVIR.
83677 sabor e o saber.p65 9/14/05, 12:34 PM3
O sabor e o saber
F E R N A N D O L O K S C H I N
‘riso’ é o mesmo, quem ri muito ouve a frase: mangiato la
minestra di riso (tomou a sopa de arroz/riso).
O arroz fez com que Jefferson acumulasse funções de
embaixador na França e contrabandista. Ao visitar a Itália,
sabedor de que a exportação de arroz era proibida e o con-
trabando um crime capital, ele subornou um muleteiro para
levar uns sacos até o porto de Genova. Temeroso de que o
homem não cumprisse o acordo, Jefferson cruzou a fronteira
com bolsos cheios de arroz que enviou para a Carolina do
Sul. (1787)
Sem a paella, Portugal nunca deu ao arroz o mesmo
destaque que a Espanha. Com a descendência foi o inverso:
o Brasil foi pioneiro no cultivo de arroz no Novo Mundo,
onde é o maior consumidor. Mesmo no sul, los hermanos
compartilham conosco o churrasco e chimarrão, mas não o
Arroz de Carreteiro.
Primeiro país europeu a comercializar com a Ásia, Por-
tugal cedo trouxe o arroz para o Brasil: em 1587 já se culti-
vava na Bahia, em 1650 em São Paulo, e aos poucos o arroz
foi assumindo o lugar da farinha de mandioca como o acom-
panhante de toda e qualquer refeição.
O brasileiro trata o arroz da mesma forma que a água,
o ar ou o afeto: quase indiferença à sua presença diária e
desespero na falta. O prato nacional é o Feijão com Arroz,
‘par sem par’, ícone nacional tal o carnaval, a bunda e o
Redentor. A convivência é tanta que o ‘Feijão com Arroz’
adquiriu o sentido de ‘rotineiro’, de ‘dia a dia’.
Se na Ásia o arroz é o alimento, no Brasil o arroz é o
acompanhamento; sem ele, qualquer comida parece nua e
solitária. O Ocidente tende a guarnecer com batatas, ervi-
lhas ou outros vegetais, mas no Brasil é ‘arroz, sempre arroz’,
o grão ganha atenção secundária mas permanente. E com
infinitos dentes brancos o arroz nos sorri, modestamente.
so: “Para quem sorri o arroz com infinitos dentes brancos?”.
Uma evidência biológica do longo convívio humano
com o arroz é a facilidade de sua digestão. Diferentemente da
maioria dos alimentos, trigo e leite inclusive, não existe qual-
quer alergia ou intolerância ao arroz. Sem glúten, o grão tem
absorção fácil, completa e universal, por isto é o cereal base
das farinhas infantis e suplementos dietéticos. O arroz é bem
recebido pelas barrigas do bebê, do idoso e do doente. Ainda
usamos a água de arroz, cujas virtudes intestinais foram des-
critas há dois mil anos, e a receita de arroz de leite remonta ao
milenar bálsamo estomacal dos médicos romanos.
Além de alimento e medicamento, o arroz purificava
o rosto da gueixa e camuflava as marcas da varíola nas cor-
tes européias: se o rouge tem o rubor do sangue, o pó de arroz
é imaculadamente branco.
Quando atiramos punhados de arroz aos noivos, bor-
rifamos prosperidade e fertilidade. Este é um costume india-
no que passou ao Ocidente, antes se jogavam trigo, figos,
confete e até ovos!
Para os indianos, os grãos de arroz devem ser como
bons irmãos, unidos mas não colados, e para o tailandês o
arroz é o sucedâneo natural do leite materno: a mais branca
e acolhedora nutrição. Como a batata para os incas, é o
arroz que dá a referência de tempo e espaço em Madagascar:
o ‘tempo que leva para cozinhar arroz’ significa um período
de meia hora e uma distância de três quilômetros.
A palavra arroz, como a planta, é de origem oriental,
sua origem está no sânscrito wrihri, que se disseminou via o
grego oryza e árabe ar-ruzz. Conta a tradição que carne de
camelo com o arroz amanteigado era o prato preferido de
Maomé. Seus seguidores, os sarracenos, levaram o arroz até
a Espanha e Sicília, e seus opositores, os cruzados, trouxe-
ram o arroz para a França e Itália. O cultivo do arroz nos
banhados do rio Pó nos legou o risoto e o italianismo das
palavras malária (‘mal ar’), paludismo (‘pântano’) e insalubre.
Mas se o poeta associa o arroz com o sorriso, o italiano
o faz com o riso: como o som das suas palavras para ‘arroz’ e
FERNANDO LOKSCHIN É MÉDICO E GOURMET
54 Estilo Zaffari
83677 sabor e o saber.p65 9/12/05, 4:25 PM4
Casa
Raku:
83677 casa raku.p65 9/13/05, 6:09 PM2
T E X T O S I R E N E M A R C O N D E S
F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O
A magiacerâmica
japonesada
83677 casa raku.p65 9/9/05, 7:20 PM3
Casa
83677 casa raku.p65 9/9/05, 7:21 PM4
REPLETA DE SÍMBOLOS, A CERÂMICA
RAKU OCUPA ESPAÇO DE HONRA NA
CULTURA ORIENTAL DESDE O SÉC. XVI
É IMPOSSÍVEL PERCORRER OS CAMINHOS DA ARTE SECULAR DO RAKU SEM RESGATAR A HISTÓRIA
DA TRADICIONAL CERIMÔNIA DO CHÁ – UM RITUAL JAPONÊS INSPIRADO NOS IDEAIS BUDISTAS
QUE CULTUA A TRANQÜILIDADE, O AUTOCONHECIMENTO, A AUSTERIDADE E O EQUILÍBRIO.
OS MESTRES DO CHA-NO-YU, COMO ESTA CERIMÔNIA É CHAMADA, BUSCAM UM FORTE
RESPALDO FILOSÓFICO NAS PEÇAS DE CERÂMICA USADAS NO RITUAL DO CHÁ. FIRMEZA, EQUILÍBRIO
E UMA AGRADÁVEL TEXTURA NA BORDA DAS CUMBUCAS CARACTERIZAM ALGUNS ASPECTOS DO
RAKU MUITO VALORIZADOS PELOS MESTRES. A MÍSTICA DESTAS DUAS TRADIÇÕES ORIENTAIS
COMEÇA NA QUEIMA DAS PEÇAS DE CERÂMICA. AINDA INCANDESCENTES, ELAS SÃO PINÇADAS
DOS FORNOS A UMA TEMPERATURA DE 980ºC E IMEDIATAMENTE MERGULHADAS NUM TONEL
COM SERRAGEM. AS TÉCNICAS DESTE PROCESSO REVELAM UM PRIMEIRO APRENDIZADO: MESMO
DE APARÊNCIA FRÁGIL, A CERÂMICA RESISTE AO CHOQUE TÉRMICO SEM RACHAR E O EFEITO DO
SEU ESMALTE É ÚNICO E IRREPRODUZÍVEL, ASSIM COMO A NOSSA ALMA. A CERAMISTA ADMA
CORÁ ABRIU AS PORTAS DO SEU ATELIÊ EM PORTO ALEGRE E NOS REVELOU DETALHES DA ARTE
DO RAKU – UMA TÉCNICA QUE COMEÇOU EM 1550 NO JAPÃO E CONTINUA ATÉ HOJE REPLETA DE
SIMBOLISMOS.
Estilo Zaffari 59
83677 casa raku.p65 9/14/05, 12:15 PM5
lendas
AS LENDAS DO RAKU
Duas histórias distintas narram o início desta arte em cerâmica de alta temperatura.
Estudiosos japoneses, porém, têm uma certeza: o imigrante coreano Chojiro foi quem ini-
ciou esta técnica no século XVI, no Japão. Antigos registros contam que nesse período
ocorreu um desastre natural no país e ceramistas coreanos foram convidados a ajudar na
reconstrução das casas. Chojiro e seu pai Ameyra estavam entre eles. Como a demanda por
telhas era enorme, o jovem artesão começou a retirar as peças ainda quentes dos fornos, e,
para surpresa de todos, elas resistiram ao choque térmico graças à enorme quantidade de
areia na massa. A outra versão que relata o início do Raku é menos romântica. Conta a
lenda que este ceramista coreano, que vivia em Kioto, produzia cumbucas para a Cerimônia
do Chá. Com as encomendas cada vez maiores, ele se viu obrigado a retirar as peças ainda
incandescentes dos fornos. “Não importa qual é a versão real. O que importa é que a quei-
ma das peças de Raku é um ritual mágico. Aqui no ateliê eu espero para abrir o forno à
noite. Assim, é maior a intensidade do fogo e da cor alaranjada das peças, com quase mil
graus. Convido amigos e familiares para participarem deste ritual. Degustamos vinhos e
aproveitamos para meditar e conversar ao redor das cerâmicas”, conta a artista plástica
Adma, que há 15 anos estuda Raku.
A ESTÉTICA DESTA ARTE
Tanto para os ceramistas quanto para os mestres era importante respeitar critérios
estéticos relacionados às formas e às cores das cumbucas. Preto e vermelho predominavam
no acabamento das peças. Adma conta que as cores eleitas tinham uma importante função:
ressaltar a tonalidade verde do chá que era servido nas cerimônias. Uma pedra do rio Kamo
que continha altas porcentagens de silício, magnésio e ferro dava origem ao esmalte negro.
Já o pigmento vermelho era proveniente da soma de uma substância rica em ferro com
chumbo. “Hoje em dia não passamos nenhum esmalte com chumbo nas peças utilitárias.
Apenas objetos decorativos, como vasos e centros de mesa, recebem acabamento com este
minério. Também temos a liberdade de explorar a vasta paleta de cores para dar novos
acabamentos ao Raku”, revela a artesã.
Se hoje as tonalidades podem variar de acordo com o desejo dos ceramistas, o mesmo
não se pode dizer das formas das cumbucas. Estas devem seguir alguns critérios básicos: são
redondas, simbolizando a harmonia e o círculo virtuoso, e não possuem asas, já que as
pessoas devem segurá-las com as duas mãos. As únicas variações permitidas estão relaciona-
das ao clima. As cumbucas baixas com boca larga são perfeitas para os dias de verão, e as
mais altas com bordas fechadas conservam a bebida quente no inverno. “Quando queremos
ousar nas formas do Raku moldamos vasos, pratos e bules. As cumbucas são sagradas e
mantêm há séculos a mesma modelagem”, explica.
60 Estilo Zaffari
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O RITUAL DO CHA-NO-YU
Uma frase proferida pelos mestres da Cerimônia do Chá resume a essência deste ritual
japonês: “O cha-no-yu é uma estética de austera simplicidade e refinada pobreza”. As rígi-
das normas de etiqueta, que parecem complicadas e difíceis à primeira vista, foram criadas
com o propósito de reduzir ao máximo os movimentos do corpo durante a cerimônia. Só
assim é possível entrar numa atmosfera de meditação cujo objetivo maior é alcançar a har-
monia num mundo cheio de tensões. Quatro palavras-chave definem simbolicamente o
cha-no-yu. A primeira é wa, que significa paz e harmonia entre os homens e todas as coisas.
A segunda é kei, ou seja, o respeito mútuo e o equilíbrio entre os seres humanos e a natureza.
A terceira palavra é sei, que representa a pureza espiritual e corporal. A quarta e última
palavra, djaku, busca a tranqüilidade e a calma em qualquer instante de nossas vidas. “Eu
nunca participei de um ritual do chá. Isso porque é preciso estar na presença de um mestre
que nos oriente e ensine esta arte secular”, revela Adma. “No entanto, eu vivencio estes
quatro símbolos nos momentos em que estou absorvida na criação das cerâmicas de Raku”,
afirma. Adma nos conta que certa vez leu num livro o seguinte relato: “Um ocidental per-
guntou ao grande mestre Sen-no-Rikyu qual era o segredo da arte do chá. Rikyu respondeu
que primeiro era preciso esquentar a água, preparar a infusão verde e em seguida bebê-la da
forma adequada. Decepcionada, a pessoa disse que já sabia de tudo isso. O mestre encerrou
a conversa dizendo: se for assim, com muito gosto serei seu aluno e você será meu mestre”.
OS LEGADOS DO RAKU E DO CHA-NO-YU
A palavra Raku nasceu do ideograma kanji, que significa alegria, prazer, satisfação e
glória do dia. O mestre Sen Soshitsu costumava dizer que a paz no mundo deve perpetuar-
se a partir da compreensão humana e de uma taça de chá. Tanto o Raku quanto o cha-no-
yu buscam preservar os valores espirituais, a arte, o trabalho, a habilidade com as mãos e,
especialmente, a cortesia entre as pessoas. Por isso, quando você tiver a oportunidade de
participar de uma queima de Raku ou de um ritual do chá, lembre-se: você estará diante de
uma das cerimônias mais importantes da cultura oriental. Conhecer seus ensinamentos e
colocá-los em prática significa abrir uma porta que o levará para um mundo melhor.
LIVRO PESQUISADO – RAKU: SUA HISTÓRIA, DE ALEJANDRA RAMOS DE JONES E ANA M. GOLDENBERG DE DIVITO. ATELIÊ ADMA CORÁ – TEL.: (51) 3331.3257
ritual
Estilo Zaffari 63
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Um olho no
T E X T O S M A G A L I M O R A E S
I L U S T R A Ç Õ E S N I K
Estilo
Sushi
Manekineko
outro no
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Atenção: este é um texto cheio de palavras japo-
nesas. Mas fique zen, porque você não vai precisar de
tradução simultânea. A idéia é justamente mostrar
quantos japonismos já foram incorporados ao samba
nosso de cada dia. E vice-versa.
Vamos começar com um passinho para cá, dois para
lá: a palavra sushi dispensa apresentações e foi deliciosa-
mente explicada na matéria de capa. Agora, cá entre nós,
Manekineko pareceu grego para mim. Eu conhecia os sim-
páticos gatinhos mas não sabia que eles tinham esse nome.
Amuleto típico do Japão, o Manekineko é um primo
sortudo da Hello Kitty e possui diversas cores e significa-
dos: o gatinho manchado é o desejo de sucesso profissio-
nal, o preto atrai saúde e o dourado (adivinhe!) é riqueza
na certa. Se o gato estiver com a patinha direita levanta-
da, você vai encontrar um grande amor. Se for a patinha
esquerda, prepare-se para receber bens materiais.
Sim, os japoneses também são supersticiosos como
nós. Siga adiante e descubra que as semelhanças não
param por aí.
O Japão aqui
Enquanto os japoneses dormem no outro lado do
mundo e sonham com celulares miniatura implantados no
tímpano, o Ocidente vive um dia-a-dia cheio de referên-
cias nipônicas e nem se dá conta. Se a palavra Ocidente
parece distante demais para você, esqueça a Europa e os
Estados Unidos. Feche seus olhos e pense no Brasil.
Pedro Álvares Cabral ia achar uma piada se voltas-
se ao Brasil em 2005 e descobrisse o nosso japa way-of-
life. Nas praias, garotas com os cabelos presos com hashis
revelam suas nucas tatuadas com ideogramas japoneses
(eles continuam em alta nas melhores casas de tatoo do
ramo). Nas baladas, essas mesmas mulheres surgem de
Estilo
SE FEIJÃO COM
ARROZ PARECE
BRASILEIRO DEMAIS,
MELHOR DESCONGELAR
UM YAKISSOBA
66 Estilo Zaffari
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cabelos exageradamente lisos por horas de escova, chapi-
nha japonesa e progressiva – quem sabe tentando ser
gueixas à procura de samurais nas pistas de dança.
No centro das cidades, lojas de departamento ven-
dem filmadoras Sony, máquinas digitais Panasonic e DVDs
que vêm com tudo – inclusive karaokê, o passatempo pre-
ferido dos japoneses. As empresas de locação para festas
que o digam: o karaokê e suas pastas cheias de opções
musicais animam desde aniversário de sete anos a jantar
de gente grande. Apesar de eu não achar graça em ver a
imagem congelada do Monte Fuji e a letra da música pu-
lando na parte de baixo do vídeo, o povo se diverte e canta
aos berros para então ganhar uma nota. Silêncio, alguém
lá dentro da TV está pensando... seis e meio!! Parabéns,
você é um excelente cantor de chuveiro!
Na hora do almoço, o feijão com arroz parece bra-
sileiro demais. Melhor chamar um telesushi, passar por
um sushi-drive ou descongelar um Yakissoba comprado
no supermercado. Se a fome for pouca, um Miojo Nissin
ou uma saladinha de cogumelos Shitake temperada com
molho Shoyo resolve o problema.
De tarde, adultos estressados fazem shiatsu no tra-
balho e idealizam um banho de ofurô no fim do dia. Já
as crianças tomam Yakult com lactobacilos vivos e se
divertem com a infinita quantidade de desenhos japo-
neses. Cavaleiros do Zodíaco, Yu-Gi-Oh, Pokémon,
Samurai Jack e Power Rangers agitam ainda mais os
meninos. E para as meninas que amam a gatinha Hello
Kitty, tem o novo desenho Ami e Yumi do Cartoon
Network – inspirado nas roqueiras japonesas mais pop
da terra do sol nascente –, que mistura animação com
cenas verdadeiras dos seus shows.
Se tudo isso parecer coisa de criança, as adolescen-
tes podem ligar a TV no seriado Malhação da Rede Glo-
bo e copiar o modelito que a atriz japa-fashion Daniela
Suzuki está usando. Os garotos vão preferir fazer origami
com o cérebro de quem inventou essas novelinhas teen e
certamente irão escolher um videogame de lutas marci-
ais. Ou ler Mangás – as histórias em quadrinhos japone-
sas que cada vez mais conquistam os brasileiros.
A moda ocidental há tempos reverencia estilistas
japoneses, como Kenzo, Issey Miyake, Yoji Yamamoto e
Rei Kawakubo, da Commes des Garçons. Quimonos e
Obis vão e voltam nas passarelas, orientalizando os guar-
da-roupas de tempos em tempos. A indústria da beleza
também pede a bênção aos lançamentos da Shiseido.
E que brasileira seria kamikaze a ponto de ignorar as japo-
Estilo Zaffari 67
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Estilo
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nesas com sua pele alva e macia, a boca vermelha e peque-
na como uma cereja, o cabelo impecavelmente liso, os
gestos delicados e o corpo esguio?
Apertando os olhos e forçando o foco no Rio Gran-
de do Sul, descobrimos que o Japão também é aqui. Pe-
gue seu Toyota ou Honda e vá até a Praça Japão, no cora-
ção de Porto Alegre. Ou o recanto oriental da Redenção
num belo domingo de sol. Você vai ver muito gaúcho da
gema tomando chimarrão misturado com chá verde. Faz
bem para a saúde, sem dúvida. Mas virou moda. Quem
preferir tomar mate no aconchego de casa pode escolher
a poltrona perto da luminária japonesa e apoiar os pés
num futon de seda. Ou então ir para a tranqüilidade da
sacada decorada com pedrinhas brancas e muro de bam-
bus onde corre um fio de água da fonte presa na parede –
opa, alguém andou vendo revistas zen e buscou inspira-
ção nos jardins japoneses. Só falta um Bonsai no centro
da mesa e carpas no aquário do banheiro.
Se antes eu achava exótico ter bala de algas para
vender no supermercado, imagine agora que fazem no
interior do Estado até campeonato de Sumô, a tradicio-
nal arte que surgiu no Japão há milênios. Por isso, mi-
nha amiga, pegue um saquê e faça um brinde a tudo de
bom que vem do Japão. Desde, é claro, que os gafanho-
tos caramelizados permaneçam bem longe daqui.
O Brasil lá
Enquanto os brasileiros dormem e sonham com o fi-
nal das CPIs, no lado de lá o Japão acorda e se prepara para
outro dia de trabalho árduo – especialmente se forem os
mais de 250 mil dekasseguis, descendentes de japoneses
que largaram o Brasil para voltar à terra dos antepassados.
Mas não pense que eles só enxergam as linhas de
montagem na sua frente. Depois de um dia puxado den-
tro das fábricas, nada como pegar a bicicleta e ir até o bar
mais próximo tomar uma cerveja com os amigos. Se o
assunto for futebol, a pedida é uma Brahma ou Antarctica
(que atravessaram o mundo e continuam geladíssimas) e
ficar conversando sobre a atuação do Zico, técnico da
seleção japonesa de futebol. Quando o assunto terminar,
os brazucas podem fazer como os nativos e apreciar as
árvores de Cerejeira que florescem e formam túneis cor-
de-rosa. A beleza é tanta que o garçom vai entender se
você levantar o dedo e pedir “Salta um Haicai na mesa
3!”. Em caso de fome, que venham o pastel e um churras-
quinho de saideira.
Se mesmo bebendo for difícil entender o que eles
falam, nada de pânico. Onde tem brasileiro, tem jeiti-
nho para tudo. Um bom exemplo é o jornal semanal
Tudo Bem, editado pela JBC – Japan Brazil
Communication, que também faz a ponte aérea de
mangás e livros. O jornal é escrito em português e ven-
dido em mais de 400 locais, além da versão atualizada
diariamente na internet (www.tudobem.co.jp). É um
verdadeiro guia de sobrevivência para os conterrâneos que
vivem no Japão e também o elo com o Brasil. Outra aju-
da providencial é o Jornal Nippo-Brasil e seus sites
www.nippobrasil.com.br e www.nippojovem.com.br, esse
feito exclusivamente para salvar a garotada.
Site lembra internet, que lembra cybercafé, que dá
uma vontade louca de tomar um cafezinho. Se você é
como eu, movida a expressos e cappuccinos, fique tran-
qüila, porque os japoneses já descobriram o kohi (do inglês
coffee) e tomam o pretinho quente ou frio. É, aos poucos
nós estamos invadindo a ilha. Já exportamos até mani-
festações culturais típicas como a festa de São João e, cla-
ro, o carnaval, que no Japão se chama Matsuri e também
enche as ruas de alegria. Quem sabe o próximo a cruzar o
oceano é o Festival de Parintins – consigo imaginar os
bois Caprichoso e Garantido dizendo arigatô no final.
Samba, música sertaneja, show do Supla e gente pu-
lando com a Sandy e o Júnior pedem licença ao J Pop (como
DÁ ATÉ PRA IMAGINAR OS BOIS
CAPRICHOSO E GARANTIDO, DE
PARINTINS, DIZENDO ARIGATÔ
Estilo Zaffari 69
83677 miojo com yakult1.p65 9/13/05, 3:25 PM7
Estilo
eles chamam o som pop nipônico) e arrancam bis da galera.
E mesmo que os japoneses fabriquem ídolos na mesma ve-
locidade com que produzem eletrônicos, sempre tem palco
sobrando para o astral dos brasileiros. Até a Turma da Mô-
nica enfrentou o jet lag para mostrar os planos infalíveis do
Cascão e Cebolinha, o pêlo azul do Bidu e a gula da minha
xará – aposto que a Magali deve ter adorado as melancias
sem sementes que eles inventaram.
Nova Iorque ficaria com ciúmes se visse a quanti-
dade de lojas que vendem produtos brasileiros nas ruas
do Japão. Em algumas cidades, há placas em português
e o brazuca way-of-life bomba nas vitrines. Falando em
consumismo, nós parecemos o Tio Patinhas perto dos
orientais. Pegue sua máquina digital e vá para os bairros
de Shibuya e Harajuku. Você vai se sentir numa
Disneylândia fashion – ou dentro de um Mangá-Rave,
quem sabe numa festa a fantasia de dragqueens. Imagi-
VOCÊ VAI SE SENTIR NUMA DISNEYLÂNDIA
FASHION OU DENTRO DE UM MANGÁ-RAVE
nou algo excêntrico e bizarro? E é mesmo. Foi o jeito que
a molecada encontrou para acabar com esse papo de que
japonês é tudo igual. Quando a semana termina e eles
tiram os sisudos uniformes do colégio, o negócio é se
vestir de Anjo de Luto, Sailormoon da Sapucaí, Barbie-
Pikachu, Gueixa Psicopata, Marilyn Shoyo Manson e
curtir o domingo, cada um na sua tribo.
O Japão é assim, muita informação para assimilar.
Ouvi dizer que tem japonesa colocando silicone no
bumbum para imitar o nosso padrão estético. E não vou
estranhar se a Ana Maria Braga ensinar a fazer cuscuz
de sashimi no seu programa. O fato é que as culturas
oriental e ocidental nunca se misturaram tanto. Viva a
globalização que transformou o globo numa bolinha de
pingue-pongue que a gente joga de lá para cá.
Sophia Coppola que me perdoe, mas existem muito
mais encontros do que desencontros com os japoneses.
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Zen
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P O R P A U L A T A I T E L B A U M F O T O S A N G E L A F A R I A S
EU ACHAVA QUE ERA LUTA E APRENDI QUE É FILOSOFIA. EU PENSAVA QUE ERA ATAQUE, MAS COMPRE-
ENDI QUE É PURAMENTE DEFESA. EU TINHA CERTEZA DE QUE JAMAIS ME INTERESSARIA POR AIKIDO,
ATÉ PERCEBER TODA A BELEZA QUE ORBITA EM TORNO DESSA ARTE MARCIAL. UMA BELEZA QUE
COMEÇA NAS ROUPAS DE SAMURAI, ESTENDE-SE PELOS GESTOS CIRCULARES E VAI ATÉ A ELEVAÇÃO
ESPIRITUAL. AINDA NÃO CHEGUEI A FAZER UMA AULA SEQUER. MAS JÁ COMECEI A ABSORVER OS
ENSINAMENTOS DO MESTRE: DEIXEI A RESISTÊNCIA DE LADO.
Estilo Zaffari 73
Dança
defesada
83677 aikido3.p65 9/12/05, 3:53 PM3
AI
SIGNIFICA HARMONIA,
QUE SURGE POR MOVI-
MENTOS CIRCULARES E
PELA SUPERAÇÃO DAS DI-
FICULDADES E LIMITA-
ÇÕES DO CORPO
A arte da não-resistência
Ao sermos atacados, nossa tendência natural é fu-
gir ou resistir. Já para os praticantes do Aikido é diferen-
te. Eles utilizam a própria energia do atacante para
controlá-lo e neutralizá-lo, sem que para isso precisem
usar a força física. Para entender melhor, é preciso co-
nhecer um pouco dos valores dessa filosofia criada no Ja-
pão por Morihei Ueshiba, um filho de samurai nascido
em 1883. Ao procurar um sentido mais profundo para a
vida, Ueshiba combinou técnica e espiritualidade, crian-
do uma arte marcial voltada para a reconciliação, a har-
monia e a cooperação. Segundo ele – e todos os seus se-
guidores –, os princípios do Aikido poderiam ser aplica-
dos nos desafios diários da vida, nos relacionamentos pes-
soais e na interação com a sociedade e a natureza. No
fundo, Ueshiba queria criar guerreiros da paz. E foi por
isso que, em 1969, o governo japonês declarou que o
mestre criador do Aikido era um tesouro nacional sagra-
do. Hoje, o líder mundial é seu neto, Moriteru Ueshiba,
que dirige e leciona no Hombu Dojo, o mais importante
centro de treinamento do mundo e o local onde Vargas
Sensei já realizou diversos treinamentos intensivos.
Vargas Sensei é Roque Cruz Vargas Filho, a auto-
ridade máxima do Aikido no Rio Grande do Sul. Ser
um Sensei significa ser “aquele que vem primeiro no
caminho”, e a caminhada de Vargas teve início no judô,
quando ele tinha 12 anos. Depois de ser um judoca cam-
peão, de praticar Kempo, Karatê e Kung-Fu, ele encon-
trou-se no Aikido. E é por isso que agora, dezenove anos
depois, Vargas é capaz de responder com tanta certeza
quando pergunto qual a diferença entre o Aikido e as
outras artes marciais: “O Aikido preserva antigos valo-
res de disciplina, hierarquia, gratidão e respeito aos mais
velhos, enquanto as outras artes marciais, por terem se
tornado esporte, perderam isso”. Ele explica ainda que
praticantes de Karatê, por exemplo, podem ter dificul-
dade com o Aikido, porque os comandos são diferentes.
Zen
AIKIDO É UMA ARTE
MARCIAL VOLTADA
PARA A HARMONIA
74 Estilo Zaffari
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Zen
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Além disso, artes marciais que usam mais a força do que
a técnica também acabam prejudicando, já que, no
Aikido, a busca é pela solução e não pela vitória. “Em
vez de sentir raiva e desenvolver a agressão, nós procu-
ramos uma via alternativa” completa o Sensei.
Movimentos que imitam a natureza
No Dojo Central, assisti a uma das aulas semanais de
faixas pretas. Todos eram professores da escola de Vargas.
Todos usando uma calça-saia negra que faria o maior su-
cesso nas passarelas do São Paulo Fashion Week. Em certos
momentos, parecia que eu estava vendo uma apresentação
de dança, pois os movimentos imitam as evoluções da na-
tureza, como a rotação dos planetas, o ciclone e um chorão
balançado pelo vento. Não pense, no entanto, que é só de
delicadeza que vive o Aikido. Observando os faixas pretas
divididos em duplas, eu vi do que eles são capazes com a
sua “não-resistência”. Lá pelas tantas, depois de um passinho
suave aqui e outro ali, plaft, lá se foi um deles para o chão.
Imobilizado, ele foi ficando vermelho até que bateu com os
dedos no chão, o que significa que chegou no limite de sua
dor. Sim, caros leitores, Aikido dói e muito. A força que a
pessoa faz para se livrar da imobilização é usada contra ela
mesma. Nada fácil.
Por falar em dor, ela é uma das responsáveis pela
desistência imediata de alguns principiantes no Aikido.
Mas não é a única. Alguns executivos, por exemplo, acos-
tumados mais a mandar do que a obedecer, não ficam
muito confortáveis ao ter que baixar a cabeça para o pro-
fessor, receber comandos em japonês e permanecer imo-
bilizados. E quando percebem que adolescentes são capa-
zes de fazer coisas que eles não conseguem, então, aí mes-
mo é que saem correndo. Talvez lhes falte um pouco de
humildade e paciência, pois, como diz Vargas Sensei, “a
pessoa só tem uma pálida idéia do que é o Aikido depois
de três meses de prática”. Para diminuir a desistência, o
Dojo Central agora oferece aulas dirigidas, onde o aluno
KI
SIGNIFICA A ENERGIA DA
VIDA QUE FLUI COM VIGOR,
MAS DENTRO DA ÓTICA DA
NÃO-RESISTÊNCIA, SEM O
USO DA FORÇA BRUTA
RESPEITO, DISCIPLINA
E COOPERAÇÃO SÃO
OS VALORES DO AIKIDO
Estilo Zaffari 77
83677 aikido3.p65 9/12/05, 3:55 PM7
DO
SIGNIFICA CAMINHO DE
VIDA, UMA VIA FILOSÓFICA
ORIENTAL PARA O CRESCI-
MENTO DO HOMEM. DE-
MONSTRA A IMPORTÂNCIA
DA EXPERIÊNCIA E DA PER-
SISTÊNCIA
Zen
começa com noções de etiqueta, disciplina e movimentos
básicos. A partir daí, é uma caminhada rumo à faixa pre-
ta. Para chegar lá, o tempo normalmente varia entre 4 e 8
anos, dependendo da capacidade de aprender e da dedi-
cação de cada um. Alongamento e flexibilidade também
ajudam bastante. Fabrício Meirelles, professor da escola,
chegou à faixa preta depois de 3 anos e 8 meses e hoje,
depois de conquistar o 4º grau dentro desse nível, é tam-
bém considerado um Sensei. Vale lembrar que, segundo a
filosofia oriental, o objetivo jamais deve ser a chegada,
mas sim a caminhada.
Para praticar, basta carregar um quilo de arroz
O Aikido não está ligado a nenhuma prática reli-
giosa ou de alimentação. Naturalmente, acontece de
as pessoas procurarem uma vida mais equilibrada e sau-
dável, pois, com o tempo, adquirem uma consciência
maior em relação ao seu corpo. Pessoas muito agressi-
vas ou antiecológicas não permanecem. Elas mudam,
ou vão embora. O criador, Ueshiba, dizia que para pra-
ticar basta conseguir carregar um quilo de arroz. Ou
seja, é uma prática bastante democrática e procurada
por crianças e mulheres. “O Aikido é a arte marcial do
terceiro milênio, a mais feminina de todas elas”, diz
Vargas Sensei. Mesmo assim, a maior parte dos alunos
ainda são homens, 80% profissionais liberais com cur-
so superior e acima de 25 anos.
“O Aikido não é um modo de lutar ou de derro-
tar os inimigos; é uma maneira de reconciliar o mun-
do e fazer de todos os seres humanos uma família”;
ou ainda, “O Aikido é primeiramente uma forma de
conseguir a própria maestria física e psicológica”. São
frases que estão no site www.aikido.com.br. Se você
achar que vale a pena experimentar essas sensações,
vá lá. Só não se esqueça de baixar a cabeça em reve-
rência ao seu mestre. Mesmo que ele seja mais novo
do que você, é mais experiente.
O AIKIDO UTILIZA AS
ARMAS DO ADVERSÁRIO
CONTRA ELE MESMO
AS FOTOS FORAM REALIZADAS
NO PARQUE ESPORTIVO DA PUC
RS COM OS FAIXAS PRETAS LE-
ANDRO LOPEZ E NÁDYA PESCE
DA SILVEIRA
78 Estilo Zaffari
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83677 aikido3.p65 9/13/05, 11:29 PM9
Bem Viver
A atividade física regular é que melhora a qualidade de vida
ATLETAS DE FIM DE SEMANA
Nos sábados e domingos os parques costumam ficar
cheios dos famosos "Atletas de Fim de Semana", pessoas ca-
minhando, jogando, correndo ... atitudes saudáveis, mas que
deveriam ser mantidas pelo menos quatro vezes por semana.
Muitas vezes essas atividades físicas vigorosas e esporá-
dicas, como jogar bola com os amigos de vez em quando ou
desafiar seu adversário para aquele jogo de tênis no sábado à
tarde, são consideradas por muitos como uma forma prazerosa
de lazer, enquanto outras pessoas cultivam este hábito com o
objetivo de interagir com os amigos e, acima de tudo, procu-
rando espantar o famoso estresse. Saiba que essas atitudes
aparentemente saudáveis podem ser responsáveis por algu-
mas surpresas desagradáveis.
Entretanto, as atividades físicas, mesmo que esporádi-
cas, jamais devem ser desencorajadas, porém os praticantes
devem ter uma avaliação médica e orientação física adequa-
da para poderem executá-las com segurança.
Antes de iniciar alguma atividade é necessária a reali-
zação de uma avaliação médica para afastar alguma patologia
importante. Essa avaliação deve ser realizada por todo o pra-
ticante de atividade física, independentemente da idade. Já
em pessoas com mais de 40 anos ou que apresentam diabetes,
hipertensão arterial, colesterol elevado, obesidade ou são fu-
mantes, o acompanhamento deve ser no mínimo anual.
SAIBA QUE...
É fundamental manter o condicionamento físico ade-
quado praticando alguma atividade física regularmente (no
mínimo 4 vezes por semana).
O bom condicionamento físico reduz drasticamente o
risco de lesões osteomusculares.
Se você tem o hábito de jogar futebol apenas no final
de semana, é importante realizar uma caminhada de 45 mi-
nutos em três dias da semana. Além de você reduzir o risco
de lesões, terá uma resistência física bem mais adequada.
Exigir a manutenção física apenas com o futebol, tênis
ou vôlei – todas atividades de impacto – é uma agressão ao
corpo. É como tirar um veículo do zero e exigir que em segun-
dos ele chegue a 200 km/h e mantenha esse desempenho.
Antes e após cada atividade física, principalmente as
de maior impacto, é imperativa a realização de alongamentos
por aproximadamente 10 minutos. Esse simples exercício re-
duzirá o risco de lesão muscular e as dores musculares do dia
seguinte.
Desenvolver atividades de forma desordenada e sem
uma avaliação e orientação médica adequada aumenta o ris-
co de desenvolver lesões osteomusculares, crises hipertensivas
e até infarto agudo do miocárdio.
Prevenção! Essa é a resposta para você poder praticar o
seu esporte preferido tranqüilamente. Se você realiza seu check-
up periodicamente e mantém seu condicionamento físico, além
do futebol, vôlei ou tênis do final de semana, você colherá bons
frutos em sua saúde e boas vitórias no seu esporte.
Alerta! No entanto, se você não faz nada disso e du-
rante a prática esportiva vem sentindo algo diferente, pare e
procure um médico. Esse pode ser um sinal de que algo não
está bem em seu corpo.
Por fim, manter uma atividade física regular, além de ser
prazeroso e manter a integridade física, certamente estará pro-
porcionando um grande incremento na sua qualidade de vida.
C É Z A R V A N D E R S A N D
CÉZAR VAN DER SAND É CARDIOLOGISTA, MEMBRO DA SOCIEDADE
BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA E DA SOCIEDADE GAÚCHA DE CARDIOLOGIA
80 Estilo Zaffari
83677 bem Viver.p65 9/12/05, 1:36 PM1
Lugar
83677 unique garden.p65 9/12/05, 8:04 PM2
NO INTERIOR PAULISTA, UMA ÁREA DE 300 MIL METROS QUADRADOS DE VERDE, MUITO VERDE, FOI TRANSFORMADA EM
UM HOTEL SPA. QUEM CONCEITUOU O EMPREENDIMENTO FOI VICTOR SIAULYS, EMPRESÁRIO QUE JÁ HAVIA COLOCADO
SUA ASSINATURA NO CÉLEBRE HOTEL UNIQUE DA CAPITAL PAULISTA. NO UNIQUE GARDEN, A ADEQUADA COMBINAÇÃO
DE REQUINTE E BOM GOSTO SE FAZ PRESENTE, TENDO A NATUREZA E A TRANQÜILIDADE COMO BÔNUS. ELE FICA A 60
QUILÔMETROS DA CAPITAL, NO PARQUE ESTADUAL DA CANTANEIRA, PERTO DA CIDADE DE ATIBAIA.
T E X T O S E F O T O S C R I S B E R G E R
únicoSer
Estilo Zaffari 83
83677 unique garden.p65 9/13/05, 7:11 PM3
Lugar
83677 unique garden.p65 9/13/05, 7:15 PM4
Esta versão garden do padrão Unique de hotelaria
quer transmitir paz e tranqüilidade. A proposta é ser
único e tratar o hóspede de forma ímpar. São apenas 25
chalés que vêm acompanhados de deliciosas mordomias:
massagens terapêuticas, vinhoterapia, banhos de ervas,
acupuntura e ofurô. Mimos que podem ser usufruídos
em meio a jardins e trilhas.
Grandes nomes assinam arquitetura e gastrono-
mia. Cheguei no Unique imaginando encontrar um
pedacinho do paraíso na Terra, e foi exatamente com
isso que me deparei. Posso dizer que o Unique Garden
cabe perfeitamente nos sonhos de quem deseja viver
uma lua-de-mel no melhor estilo ou simplesmente se
desconectar da frenética vida urbana.
Conforto e gastronomia especial
Ruy Othake projetou os dez chalés da Vila Con-
temporânea. Com seu tradicional traço, criou dois es-
tilos distintos: frio e quente. Mármore e pedra deco-
ram os frios; madeira, os quentes. Em cada chalé, atra-
ções sem fim: varanda, sala de estar, televisor de plas-
ma, lençóis de algodão egípcio, móveis de design, dois
chuveiros e ofurô.
Os chalés da Vila Mediterrânea têm o teto lilás.
Ficam em volta de um jardim de flores e da fonte da
amizade, outra criação de Othake. O Chalé das Flores
oferece alguns diferenciais: banheira de hidromassa-
gem, sala de massagem, jardim de inverno e ofurô ao
ar livre.
Sofisticação é o principal ingrediente utilizado pelo
chef francês Michel Darque na elaboração dos pratos.
Apesar de ser considerado um spa, o Unique Garden
não adota a linha de restrições alimentares e o hóspede
tem a opção de montar seu próprio cardápio dentro do
conceito de gastronomia personalizada do hotel, além
de contar com uma carta de vinhos com 150 rótulos.
A SOFISTICAÇÃO É A MARCA DOMINANTE NA
ARQUITETURA E NA GASTRONOMIA DO HOTEL
Estilo Zaffari 85
83677 unique garden.p65 9/13/05, 7:28 PM5
MORDOMIAS, MIMOS, BONS TRATOS E
PRODUTOS EXCLUSIVOS. ASSIM É O SPA PANDORA
Lugar
86 Estilo Zaffari
QUEM LEVA
GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES
WWW.VOEGOL.COM.BR – 0300 7892121
MAIS INFORMAÇÕES
WWW.UNIQUEGARDEN.COM.BR – (11) 4486.8700
OBS.: CÃES SÃO BEM-VINDOS NO HOTEL E GANHAM UM PET KIT
Mimos no Spa Pandora
O Unique Garden foi projetado para agradar às
mulheres. Estas são palavras de Victor Siaulys, absolu-
tamente comprovadas quando observamos tantos mi-
mos e detalhes. O Spa Pandora é a prova mais fiel das
boas intenções deste conhecedor da alma feminina.
Eu posso contar que este centro de tratamento te-
rapêutico e estético tem 15 salas, saunas secas e úmidas,
masculinas e femininas, mais um salão de beleza – e você
vai ficar impressionado como eu fiquei. Mas o que real-
mente me conquistou foi a personalidade expressa em
seus 2.500 metros quadrados. É fascinante admirar as
peças de decoração que Victor trouxe de suas viagens,
ao redor do mundo, e que hoje emprestam charme ao
Pandora.
O fisiologista Roberto Nogueira é quem comanda
a equipe de profissionais que são orientados a sugerir,
dentro do menu de tratamentos do Pandora, a terapia
que mais se encaixa com o gosto do cliente. Neste car-
dápio de prazeres está o Rasul (aplicação de argila ama-
zônica seguida de sauna), banhos em ofurôs com ervas
retiradas do ervanário do hotel, banhos cromáticos e
para casais e massagem a seis mãos.
Dentro do conceito de exclusividade, todos os cre-
mes e óleos do Unique são preparados na farmácia de
manipulação do hotel, de acordo com a preferência de
cada hóspede. Afinal, lembre-se: aqui a ordem é fazer
você sentir-se único.
83677 unique garden.p65 9/13/05, 7:20 PM6
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(con)vivências
Quem se atreve a dar conselhos às mulheres?
A BÍBLIA SOBRE O ÓBVIO
Deveria ser óbvio, mas não é. Ao menos para as mu-
lheres da atualidade, não parece ser tão óbvio que um
homem deva ser descartado só porque ele não telefona
ou porque não respondeu a um torpedo. Afinal, ele pode
estar muito ocupado, ser traumatizado ou avoado, andar
complicado ou querer se sentir abandonado... Ninguém é
perfeito. Muitas mulheres costumam compreender com
generosidade namorados que somem, não respeitam ho-
rários, não se interessam pelos assuntos delas, não as de-
sejam na cama, não as acompanham em visita a parentes,
não as presenteiam ou não lhes dizem a verdade. Mesmo
assim, o livro “Ele simplesmente não está a fim de você”
chegou recentemente às livrarias se achando a cartilha
da libertação feminina. Dos autores Greg Behrent e Liz
Tuccillo, a publicação diagnostica e cataloga as mais vari-
adas formas masculinas de descaso, manipulação, indife-
rença, menosprezo e negligência. “Ele telefona durante a
semana, mas desaparece no sábado? Abra o olho que é
casado. Vai todas as noites na sua casa mas não assume o
namoro? Dispense! Ele está só ‘passando uma chuva.’ Che-
gou de viagem, virou pro lado e dormiu? Caia fora, ele está
pensando em outra.” Ufa! Que seria de nós, mulheres, se
não tivesse aparecido em tempo essa verdadeira bíblia sobre
o óbvio! Compre vários exemplares! Use um na bolsa, um na
mesa de cabeceira, um na cintura e outro junto da lista
telefônica! Esteja prevenida!...
Depois do mico de ficar na fila do caixa agarrada
num livro com esse título, fui comentá-lo com outras
mulheres e ouvi uma delas dizer: “Não deve existir nenhu-
ma mulher que não tenha cometido, em algum momento
de sua vida, pelo menos um dos mil pecados que o livro
descreve”. Concordo. Mas alguém já pensou por que razão
uma mulher moderna necessitaria da ajuda de um manual
de bolso para se dar conta dessas aparentes obviedades? Pois
se até hoje não foram escritos livros suficientes sobre o que
não é legal no amor, convenhamos que não faltam clássicos
sobre a ousadia da homarada em chegar junto quando o
negócio é paixão forte. De Adão a Rodrigo Cambará – pas-
sando por Julio César, Romeu e Tristão (só para citar os que
me vêm à mente neste momento) –, eles pulam muros, fa-
zem serenatas, se batem em duelos, abrem mão do paraíso,
tomam porres, tomam veneno, tomam atitudes, mas parados
é que não ficam. Sim, todas nós sabemos muito bem identi-
ficar um homem realmente motivado. O que talvez Greg
Behrent tenha esquecido é que grande parte da beleza do
amor vem justamente dos casos mal-resolvidos. Nelson
Rodrigues, que atacava de conselheiro sentimental nos anos
50, sob o pseudônimo de “Mirna”, poderia muito bem expli-
car a questão dizendo: “Meu filho, qualquer um de nós já
amou errado, já odiou errado... É a soma de todos os amores
falhados que torna o ser humano capaz de amar e de ser
amado”. É, Greg, não é assim tão simples dar conselhos a
uma mulher...
R U Z A A M O N
RUZA AMON É JORNALISTA
88 Estilo Zaffari
83677 convivencias.p65 9/13/05, 3:31 PM1
Perfil
83677 perfil.p65 9/13/05, 6:01 PM2
P O R P A U L A T A I T E L B A U M
F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O
Ar
da
pa
lavra
Estilo Zaffari 91
83677 perfil.p65 9/9/05, 10:23 PM3
Perfil
PROCURO UMA ÚNICA PALAVRA: POETA... MÚSICO... CRIA-
DOR... CRIATURA... TITÃ... NÃO ENCONTRO. E NÃO ENCON-
TRO PORQUE É REALMENTE IMPOSSÍVEL DEFINIR ARNALDO
ANTUNES COM UMA SÓ EXPRESSÃO VERBAL. ELE NÃO É
RÓTULO. É PURO CONTEÚDO. ARNALDO DAS MUITAS PA-
LAVRAS: PALAVRA POÉTICA, PALAVRA VISUAL, PALAVRA MU-
SICAL, PALAVRA MOVIMENTO. NASCIDO ARNALDO AUGUSTO
NORA ANTUNES FILHO, ESSE PAULISTA TALVEZ POSSA SER
DEFINIDO MAIS COMO PERFORMER DO QUE COMO PERSO-
NAGEM. SE BEM QUE QUANDO NÃO ESTÁ NO PALCO OU NA
FRENTE DAS CÂMERAS, ARNALDO TEM UMA EXPRESSÃO
CALMA, QUASE CÂNDIDA. CONVERSEI COM ELE NA GALE-
RIA BOLSA DE ARTE, UM POUCO ANTES DA ABERTURA DA
EXPOSIÇÃO PALAVRA IMAGEM, ONDE O DESTAQUE ERA
UMA SÉRIE CALIGRÁFICA DE MONOTIPIAS QUE ME LEM-
BROU MIRÓ. NOS BASTIDORES DA CONVERSA, ARNALDO
DEU ATENÇÃO PARA UMA FÃ, RECEBEU PRESENTES, FOI
SIMPÁTICO COM TODOS. O QUE ME FEZ PENSAR QUE TAL-
VEZ EXISTA UMA PALAVRA, SIM, UMA MICROPALAVRA CON-
TIDA NO SEU PRÓPRIO NOME: AR. ARNALDO ANTUNES É
AR. ETÉREO E FUNDAMENTAL...
UMA IMAGEM VALE POR MIL PALAVRAS?
Isso é uma máxima que funciona para uma determina-
da circunstância. Claro que você ver uma cena pode ser
muito mais revelador do que um monte de gente te contar
o que tinha naquela cena. Agora, a palavra poética não é
bem a palavra, é quase como se ela fosse uma cena. Mes-
mo quando ela está desprovida do tratamento visual que
eu dou, que também é pensado junto, estruturalmente, ela
apresenta o mundo muito mais do que diz ele. Então eu
diria que sim, uma imagem vale por mil palavras. Mas a
palavra poética não seria uma dessas mil aí.
COMO É O SEU PROCESSO DE CRIAÇÃO?
Depende... Ou o poema já vem impregnado de pensa-
mento visual ou vem o texto primeiro e eu descubro uma
forma gráfica. Agora, nesse trabalho de monotipia, quase
que o visual vem antes, tem um pré-texto na cabeça, mas
o fazer é muito obsessivo, muito físico, muita tinta, acaba
sendo um exercício da poesia vindo da coisa caligráfica.
VOCÊ FICA O TEMPO INTEIRO PENSANDO NAS PALAVRAS, NA
SONORIDADE DELAS?
Eu fico. Na verdade, eu não distingo trabalho de lazer, o
meu trabalho é o tempo todo. Hoje, por exemplo, eu acordei
com uma idéia, aí fui anotar... Pode ser durante a noite, pode
ser andando na rua, essa coisa de as idéias virem... é claro que
a palavra em si tem uma dimensão visual, uma dimensão so-
nora... Os poemas têm uma carga fonética importante...
COMO VOCÊ DEFINIRIA A SUA RELAÇÃO COM AS PALAVRAS?
O código verbal é como se fosse um porto seguro de
onde eu parto pra visitar outros códigos. Eu faço música,
faço canções, uso a palavra cantada. Faço trabalhos visuais,
“A PALAVRA POÉTICA NÃO É BEM A PALAVRA,
É QUASE COMO SE ELA FOSSE UMA CENA”
92 Estilo Zaffari
83677 perfil.p65 9/13/05, 6:04 PM4
83677 perfil.p65 9/9/05, 10:23 PM5
Perfil
“TEM UMA MÚSICA
EM QUE EU
DIGO: SOMOS
O QUE SOMOS,
INCLASSIFICÁVEIS”
palavras para serem lidas e vistas ao mesmo tempo. Faço
vídeo, a palavra falada em movimento... Eu nunca me senti,
por exemplo, artista plástico, o que eu faço é poesia visual.
Também nunca me senti músico, no sentido de querer fazer
música instrumental. Eu faço canções que têm o uso da pa-
lavra associada a todo um universo musical.
COMO VOCÊ SE DEFINIRIA?
Eu faço várias coisas, mas não acho que tenho ne-
nhum mérito por isso. Acho que é apenas uma adequa-
ção à época em que a gente vive, onde está se tornando
cada vez mais comum esse trânsito por várias linguagens.
A tecnologia está resgatando um aspecto meio da comuni-
dade primitiva, onde não havia diferença entre arte e vida,
onde a dança era associada à música que era associada ao
canto religioso que era associado à prática de guerra e à
relação com a natureza... era tudo junto. A civilização foi
dividindo os sentidos do homem, e de certa forma a
tecnologia foi contribuindo pra gente resgatar um pouco
desses laços.
94 Estilo Zaffari
83677 perfil.p65 9/9/05, 10:24 PM6
OK, MAS COMO VOCÊ SE DEFINIRIA, ENTÃO?
Não sei... Eu acho que não precisa. Tem uma música em
que eu digo: somos o que somos, inclassificáveis. Na verdade,
eu estou falando da questão racial no Brasil, mas isso poderia
servir para a minha condição estética pessoal, entende? Eu
prefiro assim. A necessidade de nomear é sempre redutora,
então não precisa disso.
VOCÊ TEM FILHOS?
Tenho quatro.
E COMO É A RELAÇÃO ARTÍSTICA ENTRE VOCÊS? ELES INSPI-
RAM? VOCÊ APRENDE COM ELES?
Eu sou muito influenciado pelo olhar deles. Eu
aprendo tanto com eles quanto eles devem aprender
comigo. Espero que eles aprendam alguma coisa comi-
go... Muito do meu olhar poético vem desse convívio com
criança. O olhar da criança é muito virgem, essa coisa de
fazer associações com o que vê... Eu já usei literalmente
frases dos meus filhos. A própria construção gramatical,
por exemplo. Criança fala “beija eu” em vez de “me beija”.
QUAL A PALAVRA QUE VOCÊ MAIS USA?
Em português acho que a palavra que a gente mais usa
é “é”. Essa maçã “é” vermelha. Isso “é” bonito... Pro chinês
e pro tupi não existe o verbo ser como verbo de ligação.
Tanto que a gente vê nos filmes americanos índio falando:
“maçã vermelha”, “índio bonito”... O ser não tá deslocado
da palavra.
SE VOCÊ PUDESSE, TIRARIA O VERBO “SER” DA NOSSA LÍNGUA?
Acho que a gente já tira um pouquinho fazendo poesia...
EXISTE ALGUMA IMAGEM QUE VENHA COM FREQÜÊNCIA À SUA
CABEÇA?
(Silêncio) Não...
E UMA IMAGEM INESQUECÍVEL...
O parto dos meus filhos. Assisti a todos e foi uma coisa
maravilhosa...
Estilo Zaffari 95
83677 perfil.p65 9/14/05, 11:05 AM7
ISSO QUER DIZER QUE O QUE TORNA UMA IMAGEM INESQUECÍ-
VEL É A EMOÇÃO QUE ESTÁ CONTIDA NELA?
Pode ser, mas eu acho que a memória não obedece tan-
to à emoção. Às vezes a gente lembra muito bem de coisas
irrelevantes emocionalmente, e existem outras coisas que
podem ser importantíssimas e que você esquece. Então eu
acho que a coisa seletiva da memória não obedece tanto
assim à emoção. Mas claro que algumas imagens são
marcantes por serem muito intensas.
O QUE VOCÊ GOSTARIA DE FAZER E NUNCA FEZ?
Gostaria de saltar de pára-quedas. Tenho vontade e
ainda vou fazer.
QUAL A SUA COR PREFERIDA?
Quando eu era criança, verde. E eu me apeguei a isso
e acho que continua sendo, mais por um apego com essa
coisa da infância.
VOCÊ TEM FOME DE QUÊ?
Ah, de um monte de coisas...
ALGUMA FOME MAIS IMEDIATA?
Não, o que eu quero fazer eu estou fazendo... A coisa
mais imediata que eu quero fazer é respirar. A consciência
disso é importante.
PRA CONQUISTAR VOCÊ, QUE PRATO UMA PESSOA DEVERIA
PREPARAR?
Cuscuz de camarão.
VOCÊ COZINHA?
Adoro cozinhar, mas tenho muito pouco tempo. En-
tão raramente eu consigo ter a serenidade pra fazer algu-
ma coisa e tal, mas quando dá pra fazer é muito bom.
TEM ALGUMA ESPECIALIDADE?
Ah, adoro fazer massas... tem muita coisa... Fazer faro-
fa... Eu sou um bom fazedor de farofa.
VOCÊ É UM APAIXONADO PELAS LETRAS NO SENTIDO LITERAL
DA PALAVRA?
Eu gosto de caligrafia, sou apaixonado por essa coi-
sa da caligrafia desde muitos anos atrás. O meu primeiro
livro era todo caligráfico, eu fiz uma exposição de cali-
grafia no começo dos anos 80... Aí sempre fui fascinado
pela escrita antiga oriental, essa tradição milenar, ára-
be, chinesa, que é maravilhosa. Acabei sempre pensan-
do essa coisa caligráfica como uma forma de entonação
gráfica que sugere sentidos para além do que o discurso
verbal está dizendo, você teria uma expressividade atra-
vés da maneira como escreve, curvatura do traço, do tre-
mor da mão...
VOCÊ SE INTERESSA POR GRAFOLOGIA?
Já me interessei, mas é uma coisa mais mística. Mas
eu acho interessante porque tem toda uma ciência, e eu
já comprei alguns livros de grafologia muito inspirado nis-
so... Uma época eu também me interessei por taquigrafia,
que é uma forma resumida de escrever, escrita rupestre.
Esse interesse por caligrafia se desdobra em outros...
Perfil
“A COISA MAIS IMEDIATA QUE EU QUERO FAZER É
RESPIRAR. A CONSCIÊNCIA DISSO É IMPORTANTE”
96 Estilo Zaffari
83677 perfil.p65 9/9/05, 10:25 PM8
83677 perfil.p65 9/13/05, 6:02 PM9
Assim, ó...
Mesmo sem ir até lá, a leitura pode nos aproximar do Japão
Meu repertório de viagens é restrito à América do Sul e à Euro-
pa, com uma brevíssima escapada a Tânger, no Marrocos, e isso só
porque, estando no sul da Espanha, amigos fizeram toda a força para
cruzar o estreito de Gibraltar, só pra depois poder dizer “Cruzamos
Gibraltar” ou “Fomos à África”. Conto isso para dizer que países de
magnífica história e cultura, como a Índia e o Japão, nunca passaram
pelas minhas hipóteses de direção de passeio. Nem vão, acho eu.
A densidade histórica desses países velhos talvez seja insuportá-
vel para um ocidental, que é um homem recente. Ouvi não faz muito
uma historinha real ocorrida com uma conterrânea nossa que dá aulas
na Coréia. Perguntada sobre o que se estudava no curso de Letras no
Brasil, ela disse que, entre outras, se estudava a literatura brasileira e a
portuguesa. O coreano que fez a pergunta, também letrado, fez cara de
espanto: como assim, a literatura brasileira e a portuguesa? Ele queria
saber, em seu desolamento, se a gente tinha a pecha, ou o descaramen-
to, ou a loucura, de estudar toda a literatura brasileira e toda a portu-
guesa. Sim, respondeu nossa representante na conversa. E então ela
começou a entender um pouco aquele país: para um coreano, é impos-
sível estudar a literatura coreana, que tem, sei lá, uns 5 mil anos de vida
e seus milhares de autores, ao longo de séculos. Só em mais de uma
encarnação seria possível freqüentar tamanho patrimônio.
Que dizer então da Índia e do Japão? Eu pouco digo; conheço
os limites da minha ignorância. Tenho pedaços de leitura do magní-
fico Mahabharata, conjunto de lendas indianas talvez mais vasto que
a obra de Homero, e mais umas dentadas nos Upanishades; do Ja-
pão, conheço uns poemas, mais o recente romancista Kenzaburo Oe.
Fico imaginando a quantidade e a potencial maravilha da experiên-
cia humana transformada em arte, lá naquela Terra do Sol Nascen-
te, onde jamais porei os pés.
Terra do Sol Nascente: este é um dos cognomes do Japão, cujo
nome é já um mistério para nós, ocidentais. Segundo uma fonte de
grande interesse (El origen de los nombres de los países del mundo – y
de mucha de las islas que éstos poseen, de Edgardo Otero, publicado
pela Editorial De Los Cuatro Vientos, Buenos Aires, 2003), os chine-
ses, mais velhos ainda que os japoneses, usavam para designar o Japão
uns signos que significam “sol” e “origem” ou “fonte”, de maneira que
para eles, chineses, o nome do arquipélago japonês era uma composi-
ção que acabava significando “origem do sol”. Isso porque também
para os chins, assim como para nós, é de lá que vem o sol.
Os japoneses teriam passado a chamar-se com uma palavra
que seria “Ni-Hom” ou “Ni-Pon”, resultado da pronúncia deles para
os signos chineses. Quando o valente italiano Marco Polo andou por
lá, ouviu esta palavra, à qual se acrescentava uma partícula “guo”,
que significa “terra”, “país”. Mas o que ouviu, com seus ouvidos oci-
dentais, não era “Niponguo”, isto é, “Terra do Sol Nascente”, mas
“Cipango”, e foi esta a forma que ficou consagrada aqui no nosso
lado do planeta. Já o nosso Houaiss, o melhor dicionário da língua
portuguesa disponível, diz que a palavra Japão tem origem malaia
(pronuncia-se|djapã|). De forma que “Cipango” era “Nipon” mas
acabou se transformando em “Japão”, forma portuguesa.
Ainda esses dias foram lembrados os 60 anos de uma atroci-
dade que o Ocidente, especificamente os Estados Unidos (um país
sem nome, conforme disse Caetano Veloso), cometeu contra duas
cidades japoneses, Hiroshima e Nagasaki. Bombas atômicas jogadas
contra população civil é qualquer coisa de demencial. Não sei se há
como corrigir; mas para amenizar, sempre há leituras: Crônicas ja-
ponesas, do francês Nicolas Bouvier (L&PM); Viagem ao Japão, uma
edição ilustrada concebida por Renata Cordeiro (Landy editora),
com dados da cultura e da história, além de uma excelente coletâ-
nea de poemas e gravuras japonesas; e Luis Fernando Verissimo, com
a parceria do Joaquim da Fonseca, em seu Traçando o Japão (Artes e
Ofícios). Aliviam o peso de nossa ignorância e nos aproximam da
sensacional cultura japonesa.
L U Í S A U G U S T O F I S C H E R
LUÍS AUGUSTO FISCHER É PROFESSOR DE LITERATURA E ESCRITOR
JAPÃO TÃO LONGE
98 Estilo Zaffari
83677 gauchismos.p65 9/12/05, 1:27 PM1
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