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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
HERNANDO JOSÉ PACHECO BARRIONUEVO
Vídeos online sobre classificação biológica: Uma análise de suas
aplicabilidades na educação não formal
São Paulo
2016
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HERNANDO JOSÉ PACHECO BARRIONUEVO
Vídeos online sobre classificação biológica: Uma análise de suas
aplicabilidades na educação não formal
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito exigido para a conclusão do curso de Bacharelado de Ciências Biológicas e de Licenciatura em Ciências Biológicas Orientador: Prof. Dr. Adriano Monteiro de Castro
São Paulo
2016
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“A tradição de todas as gerações oprime como
um pesadelo o cérebro dos vivos.” (Karl Marx)
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente gostaria de agradecer ao Centro de Ciências Biológicas e da
Saúde por me proporcionar a oportunidade de cursar uma Licenciatura diferenciada,
da qual me sinto parte integrante;
Gostaria de agradecer o meu orientador Prof. Dr. Adriano Monteiro de Castro,
pela orientação e pela coordenação do curso, sem o qual teríamos ainda mais
dificuldades em manter a biologia como um curso que trata tão bem as ciências
humanas. Agradeço também a Profa. Dra. Magda Medhat Pechliye e a Profa. Dra.
Rosana dos Santos Jordão, companheiras de categoria, pelo tanto que aprendemos
juntos e pela amizade;
Agradeço à minha família pelo privilégio de cursar o ensino superior, e aos
meus companheiros e companheiras da faculdade, em especial a Sol;
Agradeço aos companheiros e companheiras da Chapa Práxis Coletiva e aos
companheiros e companheiras do Coletivo Ubuntu;
Um agradecimento muito especial aos camaradas do Jornal Inverta, que me
ensinaram o que é a luta;
E o agradecimento maior, a companheira Flávia, pelo que é estar junto.
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RESUMO
A classificação biológica pode ser trabalhada como um dos temas estruturantes do
pensamento biológico, fazendo-se de grande importância que se analisem os textos
didáticos sobre a área. Seguindo a linha de outros trabalhos que já analisaram nesse
sentido livros didáticos, o presente estudo tem como objetivo identificar o conteúdo
conceitual de classificação biológica em espaços não formais de educação, mais
especificamente o Youtube, ferramenta compartilhadora de vídeos, que vem cada dia
mais mostrando sua relevância para o ensino e para a formação continuada de
professores. Acreditando que somente o tratamento dos conteúdos conceituais não
basta, identificaram-se também as bases pedagógicas dos vídeos, buscando entender
sob quais bases epistemológicas, estão fundados esses vídeos. Nesse sentido foi
realizada uma análise documental dos vídeos e o resultado foi a observação, da
mesma maneira que se verifica em espaços formais de educação, de uma biologia a-
histórica e que não trabalha os conceitos estruturantes como evolução ou
descendência com modificação.
Palavras-chave: Ensino de Biologia, classificação biológica, epistemologia, vídeos,
espaços não formais de educação.
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ABSTRACT
Biological classification can be worked as one of the structuring themes of biological
thinking, making it very important to analyze the didactic texts about it in the area.
Following the line of other works that have already analyzed this in didactic books, the
present study aims to identify the biological classification content in non-formal spaces
of education, more specifically in YouTube, a video sharing tool, that comes every day
more showing its Relevance to teaching and continuing teacher education. Believing
that only the treatment of conceptual content is not enough, we also identified the
pedagogical bases of the videos, seeking to understand under which epistemologics
bases, these videos are founded. In this sense a documental analysis of the videos
was performed and the result was the observation, just as in formal spaces of
education, of an a-historical biology that does not work structuring concepts like
evolution or descent with modification.
Key words: Teaching Biology, biological classification, epistemology, videos,
non-formal spaces of education
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Sumário
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 8
2. REFERENCIAL TEÓRICO ........................................................................................................................ 9
2.1. Biologia e a classificação biológica ................................................................................................... 9
2.2. As pedagogias e suas epistemologias ............................................................................................ 11
2.3. O ensino de classificação biológica ................................................................................................ 14
2.4. Educação não formal e compartilhadores de vídeos ..................................................................... 16
3. MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................................................... 17
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................................................... 19
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................... 25
6. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................... 25
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1. INTRODUÇÃO
O ensino da classificação biológica pode ser parte importante do ensino de
evolução, contribuindo para ensinar a pensar evolutivamente (DE CARVALHO; NETO;
EL-HANI, 2014), trabalhando os conceitos de descendência com modificação, a
filogenia e, portanto, podendo contribuir para um ensino da diversidade biológica de
forma histórica, comparativa e não fragmentada.
Assim sendo, o tratamento evolutivo da classificação biológica é essencial para
ensinar o conceito estruturante da evolução biológica, e nesse sentido se faz
importante analisar os textos para o ensino da classificação biológica, tal como fizeram
Roma e Motokane (2007) analisando livros didáticos, mas também analisar outros
textos, como os presentes em espaços não formais de educação, tais como o
Youtube. A importância de analisar esses textos, também se explica pelo fato de nos
últimos anos, estes serem muito utilizados por professoras e professores para a
formação docente própria (SELLES & FERREIRA, 2004).
Entendendo que apenas a correção de erros conceituais não basta para atingir
os objetivos de aprendizagem, e dando igual importância às concepções de ensino e
aprendizagem das práticas educativas, o trabalho se propõe a analisar dez vídeos
para o ensino de classificação biológica, na sua dimensão pedagógica e mais
especificamente também na dimensão conceitual, analisando qual concepção de
ensino e aprendizagem estão presentes nos vídeos.
O presente trabalho apresenta referencial teórico divido em quatro partes: uma
primeira parte sobre a própria classificação biológica e seu lugar na biologia, sendo
importante para analisar a parte conceitual dos vídeos; uma segunda parte sobre as
diferentes concepções e ensino e aprendizagem, resgatando autoras e autores
importantes para analisar as dimensões pedagógicas dos vídeos; uma terceira parte
sobre o ensino da classificação biológica e o que há de estudado nesse sentido; e
uma quarta parte sobre os espaços não formais de educação, explicando o que são
no geral, e no particular falando sobre os compartilhadores de vídeos, objetos de
estudo desse trabalho.
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Após o referencial teórico, o leitor ou a leitora, encontrará, o item Material e
Métodos no qual estão apresentados os vídeos para a posterior análise, e os métodos
para a escolha e a análise destes. No item Resultados e Discussão os resultados
foram colocados em um quadro para uma melhor visualização, e segundo ela, foram
discutidos utilizando o apoio do referencial teórico. O texto é fechado com as
considerações finais e as referências bibliográficas segundo normas da ABNT.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. Biologia e a classificação biológica
Ao longo da história da ciência, um dos embates mais centrais e fundamentais
foi entre uma visão que considera o universo/natureza coisas estáticas, a visão
chamada fixista, ou uma visão que considera o universo/natureza como algo em que
o movimento e a mudança são regras, a visão chamada evolucionista (TRIPICCHIO,
2005).
O desenvolvimento científico no final do século XVIII impulsionado pela
ascensão da burguesia gerou um contexto no qual as ciências naturais foram
vanguarda do pensamento evolucionista dentre as demais ciências. Este contexto
apresentou: um modelo de estrelas e sistema solar em transformação apresentados
por Laplace e Kant respectivamente; Hutton com uma geologia que propunha o relevo
como um momento de uma ação contínua de processos que ainda hoje ocorrem;
Buffon ainda que somente esbarrando na ideia de evolução (MAYR, 1982), e Lamarck
apresentando uma biologia que propunha as espécies como formas momentâneas da
história da vida, que podem se modificar ao longo do tempo (TRIPICCHIO, 2005).
Embora já necessariamente opostas em muitos sentidos às ideias metafísicas,
como as de Linneu, - para citar nome importante da classificação biológica - de que
as espécies são imutáveis (MAYR, 1982), as ideias de Buffon e Lamarck sustentavam
a mudança das formas de vida, porém embasadas totalmente em preceitos idealistas
como a ideia de que a evolução biológica tem um sentido do menos complexo para o
mais complexo, ou de que os seres se modificam linearmente ao longo da vida com a
finalidade de conseguir realizar certas funções (MAYR, 1982).
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Os dois nomes que apresentaram uma concepção evolucionista das formas de
vida, sem atribuir uma direção determinada da evolução em sentido ao ser humano,
foram Darwin e Wallace em 1858, sugerindo um modelo de evolução no qual a
modificação não se dá de forma linear, mas sim de uma divergência sucessiva a partir
de ancestrais em comum e, portanto, de uma ramificação a partir da qual todos os
seres vivos tem alguma relação de parentesco (MEYER & EL-HANI, 2005). Além
disso, Darwin e Wallace desenvolveram uma teoria sobre os processos que causariam
as mudanças evolutivas, dentre eles o da seleção natural (MAYR, 1982).
Dentro da biologia, a sistemática, área que interpreta e organiza a diversidade
biológica (ROMA & MOTOKANE, 2007), sofreu também fortes influências da biologia
evolutiva proposta por Darwin, Wallace e seus sucessores e sucessoras. A
classificação biológica passa então a ser feita por conta do parentesco entre as formas
de vida, ou seja, pela filogenia, e não pelo conceito de caracteres essenciais por
exemplo. Darwin foi o fundador de todo o campo da classificação biológica evolutiva
(MAYR, 1982).
A classificação biológica é feita desde os primórdios das civilizações humanas,
sendo o registro mais antigo, o de Shen Nung, imperador da China, por volta de 3000
a.C. incluindo 365 plantas medicinais, há também registros de papiros no Egito Antigo
(1500 a.C.) classificando plantas medicinais (MANKTELOW, 2010).
Segundo Guimarães (2005), antes de Darwin, a classificação biológica, e toda
a sistemática, formalizada por Lineu, eram extremamente embasadas na ideia de
mundo estática, na qual as espécies eram imutáveis. Lineu era abertamente um
criacionista, acreditando que as espécies foram colocadas na Terra por um criador, e
que, além disso, eram imutáveis. Apesar disso, as contribuições de Lineu foram muito
importantes para o desenvolvimento da sistemática, sendo ele, por exemplo, quem
criou o sistema binomial de classificação e a definição de diversos táxons (MEYER &
EL-HANI, 2005). A questão de Lineu era muito objetiva, as grandes navegações de
sua época, nunca antes possíveis, permitiram a vinda de infinidades de espécies
vegetais e animais, forçando-o a criar novos critérios para a nomenclatura e
classificação biológica. (MANKTELOW, 2010).
Apesar da publicação da Origem das Espécies, apenas passados 100 anos,
este livro atinge com importância a classificação biológica, passando-se a estudar a
11
filogenia, como sendo algo importante para a classificação biológica (GUIMARÃES,
2005). O estudo da filogenia, porém, foi a princípio criticado por diversos estudiosos,
por não apresentar métodos explícitos. Na década de 1950, é possível entender dois
grupos de estudiosos na área da sistemática, ambos trabalhando na falta de rigor dos
estudos de filogenia: os feneticistas e os cladístas. Os feneticistas, ou taxonomistas
numéricos, entendiam que seria impossível reconhecer a filogenia tal como era e,
portanto, se utilizavam das similaridades gerais como critérios para a classificação.
Do outro lado, os cladístas entendiam a filogenia como a principal ferramenta
organizadora da classificação (GUIMARÃES, 2005). Fora esses dois grupos, é
costume se utilizar da denominação de mais uma escola sistemática, a da sistemática
evolutiva, ou seja, a escola que se manteve entendendo a importância da filogenia
sem, porém, abraçar as metodologias propostas pelos outros dois grupos.
Hoje, embora haja tendência de se valorizar a sistemática filogenética e suas
metodologias (ROMA & MOTOKANE, 2007), já que se entende a filogenia como
fundante da classificação biológica, os rótulos não fazem muito mais sentido, já que
todas as escolas, e também outros linhas como a biologia molecular, trouxeram
importantes contribuições para a sistemática (GUIMARÃES, 2005).
Devido às contribuições da filogenética, hoje faz sentido, para uma biologia que
considera as formas de vida como continuas e históricas, trabalhar com a classificação
apenas de grupos monofiléticos, ou seja, grupos que contenham todos os táxons
descendentes de um ancestral em comum que apresentou uma autapomorfia (caráter
derivado próprio). A sistemática moderna não utiliza grupos polifiléticos, ou seja, que
contém táxons derivados de mais de um ancestral, nem grupos parafiléticos, ou seja,
que não contém todos os táxons derivados de um ancestral (GUIMARÃES, 2005).
2.2. As pedagogias e suas epistemologias
Assim como as ciências naturais, a educação enquanto uma ciência, também
participou com seus/suas intelectuais dos embates entre visões de mundo estáticas
ou em transformação. Este debate se dá de forma aberta na educação por conta
desta, ter o conhecimento humano como um de seus objetos centrais de estudo,
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trabalhando necessariamente com o estudo da epistemologia, ou seja, com o estudo
sobre a gênese do conhecimento humano (BECKER, 1994).
Rosa (2003) classifica em três, as principais epistemologias presentes na área
da educação: as epistemologias empiristas, as epistemologias inatistas e as
epistemologias interacionistas. Segundo Rosa (2003), as epistemologias empiristas
concebem o conhecimento enquanto algo que já existe, acabado e completo no
mundo natural, nesse sentido, descobre-se o mundo através de experiências.
Segundo Tsé-Tung (2014), o erro dos empiristas está em não compreender que
embora, sem dúvida alguma, os dados da percepção sensível sejam reflexos da
realidade, estes são reflexos superficiais, unilaterais e incompletos.
Utilizam pressupostos epistemológicos empíricos, a abordagem tradicional e a
comportamentalista segundo Mizukami (1986). A abordagem tradicional
historicamente se fortaleceu e se enraizou na nossa sociedade, sendo até hoje a que
mais se manifesta na escola, sendo um constante referencial de comparação para
todas as pessoas e um constante referencial de abordagem ideal pelo senso comum.
A sala de aula tem um formato que condiz com seus pressupostos pedagógicos: os
alunos em fileiras observam o professor que lhes palestra conteúdos falando e pela
lousa, os alunos copiam, caso consigam reproduzi-los sem questionar, melhor.
Tal abordagem abarca a avaliação formal por meio de provas orais ou escritas,
nas quais se medem a quantidade de respostas iguais às do professor
(MIZUKAMI,1986). Assim sendo, aprender é responder igual ao professor e essa
concepção de aprendizagem é categorizada por Mauri (2006), como uma das
frequentes concepções de aprendizagem das professoras e professores.
Ainda segundo Mauri (2006), uma das práticas comuns dos professores que
têm essa concepção de aprendizagem é o uso de reforços positivos e negativos, como
forma de imprimir nos estudantes comportamentos desejáveis e inibir
comportamentos indesejáveis. O uso de reforços, porém, é apresentado por Mizukami
(1986) como prática típica da abordagem de ensino, nomeada por ela, como
comportamentalista.
Também se baseando na epistemologia empirista, a abordagem
Comportamentalista se utiliza de estudos da psicologia comportamental, tendo
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Skinner como principal referência, buscando novas formas de atingir os mesmos
objetivos da abordagem tradicional. Embora já comum na abordagem tradicional, a
abordagem comportamentalista é a que propõe as muitas repetições de exercícios
semelhantes (MIZUKAMI,1986).
Do outro extremo, a partir da definição de Rosa (2003), as epistemologias
inatistas concebem o conhecimento como sendo algo que tem origem exclusivamente
do interior dos seres humanos, das suas ideias.
Ao contrário das epistemologias empiristas e inatistas, que entendem o
conhecimento como tendo origem em apenas um dos polos da relação humano-
natureza, as epistemologias interacionistas entendem a construção do conhecimento
na interação entre ser humano e a natureza, em todas suas dimensões,
histórica/cultural/social/biológica/psicológica (ROSA, 2003).
Mizukami (1986) apresenta duas abordagens que tem pressupostos
epistemológicos interacionistas. A primeira, a abordagem Cognitivista é representada
pela linha piagetiana. Tal linha ressalta fortemente, os estágios de desenvolvimento
das crianças, portanto, uma preocupação com determinações biológicas da
aprendizagem. Nessa mesma linha podemos classificar a perspectiva construtivista
de Gagliardi (1986 apud DE CARVALHO; NETO; EL-HANI, 2014), segundo a qual, é
ressaltada a importância de conceitos estruturantes para o conhecimento, já que para
essa teoria os conceitos não são entidades possuidoras de sentidos por si só, mas
apenas quando relacionadas em uma rede que lhes confere significado.
Outra abordagem caracterizada por Mizukami (1986) é a sociocultural,
representada por Paulo Freire. Tal abordagem tem como objetivo a desmistificação
do mundo. As pessoas educadoras-educandas e as pessoas educandas-educadoras
devem entender-se como sujeitos parte do mundo/sociedade e, portanto pessoas
capazes (e compromissadas) de transforma-lo. A transformação a qual Freire se
refere é a superação do mundo onde haja a contradição Oprimido-Opressor. Aprender
é, portanto, comprometer-se na luta pela libertação (MIZUKAMI,1986).
Dentre as epistemologias interacionistas, podemos classificar o movimento
materialista-dialético do conhecimento (TSÉ-TUNG, 2014), que começa no
conhecimento sensível, mas se desenvolve em conhecimento racional, pela análise,
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síntese, ordenação e elaboração das sensações, pelo grau das sensações, e os juízos
e deduções dessas.
Ainda segundo Tsé-tung (2014), o movimento materialista-dialético do
conhecimento não termina aí, essa seria sua metade menos importante, o mais
importante não é conhecer o mundo, mas sim modifica-lo. Nesse sentido, Freire
(2006) entende a prática educativa em duas possibilidades: uma que entende um
mundo como algo que não pode ser modificado, a educação bancária; e outra que
entende o mundo como algo a ser transformado, a educação libertadora.
A educação deve, segundo Freire (2006), ser uma forma de modificação do
mundo, sustenta-se daí que a educação deve, portanto, ter tanto uma prática que
permita com que os educandos sejam sujeitos, construindo ambientes democráticos,
quanto um conteúdo que seja permeado por uma visão de mundo transformável.
2.3. O ensino de classificação biológica
A ideia da ciência como sendo uma instituição neutra, a-histórica e produtora
de verdades absolutas, tal como descreve Lewontin (2001), contribui para um ensino
das ciências descontextualizado e fragmentado (GUIMARÃES, 2005). Também se
observa nesse sentido, um ensino de biologia altamente enciclopédico (DE
CARVALHO; NETO; EL-HANI, 2011), no qual prevalecem as listas de descrição de
estruturas, o que pode ser explicado entre outras coisas pela influência dos exames
vestibulares para a estruturação do currículo expresso de biologia (KRASILCHIK,
2004).
Nesse sentido também são importantes, as considerações de Selles e Ferreira
(2004), a cerca do currículo, que também se aplicam especificamente ao currículo de
biologia. Segundo as autoras, os currículos escritos, nos livros didáticos, são
resultados de processos históricos e sociais naturalizados, influenciados fortemente
pela cultura europeia em específico e mais tarde pela estadunidense (SELLES &
FERREIRA, 2004). Além da análise da dimensão conceitual, Ferreira e Selles (2003)
apontam para a necessidade de se analisar os textos não apenas nessa dimensão
chamada por elas de ‘análise da ciência de referência’ mas também os analisando a
partir da sua função pedagógica.
15
Sendo assim, é necessário criticar os conteúdos escritos seja nos livros
didáticos, seja em espaços não formais, ainda mais levando em conta o quadro de
proletarização e precarização da categoria das professoras e professores (ALVES,
2009), que explica uma dependência cada vez maior do livro didático e dos meios não
formais de educação na dimensão de formador docente, uma vez que a categoria não
é mais composta na sua maioria por pessoas com acesso à cultura oficial (FERREIRA
& SELLES, 2003).
A respeito do currículo expresso em biologia De Carvalho, Neto e El-Hani
(2014) também faz importantes reflexões a cerca da seleção de conteúdos
conceituais, segundo os autores a biologia tem uma quantidade absurda de conteúdos
conceituais que deveriam ser trocados por uma quantidade menor garantindo a
qualidade do trabalho com os conceitos, e suas escolhas levando em conta os
conceitos estruturantes segundo a teoria de Gagliardi (1986 apud DE CARVALHO;
NETO; EL-HANI, 2014).
Especificamente falando do ensino da classificação biológica, são
interessantes as afirmações de De Carvalho, Neto e El-Hani (2014), a cerca da
resistência dos livros didáticos em fazer a transição da classificação proposta por
Linneu para a sistemática filogenética. Além disso, os autores mostram como o
conteúdo de sistemática em livros didáticos é carente de conteúdos conceituais
relacionados a processos, e exagerado de conteúdos conceituais relacionados a
padrões e componentes sistêmicos.
No contexto escolar, a classificação biológica aparece em grande parte das
vezes, na forma proposta por Whittaker (1969 apud ROMA; MOTOKANE, 2007, p.3)
e modificada por Margulis, Dolan e Schwartz (1988 apud ROMA; MOTOKANE, 2007,
p.3), na qual os seres vivos são divididos em cinco reinos: Monera, Protista, Fungi,
Plantae e Animalia; Ou ainda no contraponto a essa proposta, de Woese et al (1990),
de três domínios: Archae, Bacteria e Eukarya (ROMA;MOTOKANE,2007). Essas
formas também são apresentadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,
1999).
É interessante ressaltar a constatação feita por Kawasaki e El-Hani (2002) de
que a diversidade biológica é apresentada nos livros didáticos, inclusive do ensino
superior, na forma de uma escala dos seres vivos, que remonta a ideia da scala
16
naturae, proposta por Linneu, supondo uma linearidade de progresso e
aperfeiçoamento das formas de vida, culminando no ser humano.
2.4. Educação não formal e compartilhadores de vídeos
Na área da educação, encontramos controvérsias na designação da educação
em dois ou três tipos de espaços onde ocorrem e devido à sua natureza. Alguns
autores como Jacobucci (2008) defendem dois tipos de educação, a formal e a não-
formal, diferenciando-as pelo espaço em que ocorrem. A própria autora porém, mostra
como não há consenso na área. O consenso existe em relação ao entendimento da
educação formal enquanto a educação dentro de uma instituição de ensino (escolas
e universidades), que seguem um programa pré-determinado e políticas de educação
(CHAGAS, 1993; JACOBUCCI, 2008; MARANDINO et al., 2004).
Marandino et al (2004) ainda ressalta as diferenças na literatura anglofônica e
lusofônica para os termos. São interessantes as definições de Chagas (1993) e
Marandino et al (2004), que trazem além da categoria educação formal, as categorias
da educação informal e da educação não formal, sendo a primeira não intencional que
ocorre no dia-a-dia das pessoas, e a segunda que ocorre fora da esfera escolar porém
em ambientes com o propósito de ensinar ciências a um público determinado.
Seriam então ambientes de educação não formal, entre outros, os museus, os
meios de comunicação (CHAGAS, 1993), onde se podem incluir os meios digitais de
comunicação como os compartilhadores de vídeo, dentre eles o Youtube como o
maior compartilhador de vídeos desde sua criação, apresentando dezenas de
milhares de vídeos que tratam de conteúdos curriculares com milhões de
visualizações (DA SILVA & SALES, 2010). Tal plataforma reforça sua importância
nesse sentido quando cria o Youtube Educação, plataforma que dispõe de mais de
12.000 vídeos de professoras e professores brasileiros, categorizados por disciplinas
e ciclos de ensino.
O crescimento dos vídeos desse tipo vem acompanhado do discurso de que
aprender online é mais eficiente, mais inovador, motivador, dinâmico (DE COIMBRA
REZENDE FILHO et al., 2015), ou de que dão a possibilidade de os/as estudantes
decidirem a ordem e ritmo dos conteúdos (DA SILVA & SALES, 2010). É comum
17
também, observar a relação entre a produção desse tipo de vídeo e o público que vai
prestar provas vestibulares ou o ENEM, como um objetivo explicito dos vídeos (DA
SILVA & SALES, 2010).
3. MATERIAL E MÉTODOS
Os materiais utilizados para o estudo foram escolhidos seguindo os seguintes
critérios:
- Vídeos da plataforma Youtube Educação foram escolhidos preferencialmente;
- Vídeos com mais de 10.000 visualizações;
- Vídeos com menos de 20 minutos, pois verificou-se que os vídeos com maior
duração, tratavam de outros conteúdos que não importam para este estudo, ou se
destinavam ao ensino superior;
- Vídeos que continham os termos ‘classificação biológica’ ou ‘taxonomia’ ou
‘sistemática’
- Vídeos produzidos com a função de serem espaços educacionais não formais
para o ensino de estudantes do ensino básico;
- Vídeos em língua portuguesa.
Na plataforma compartilhadora de vídeos Youtube dentro da parte Youtube
Educação, parte da plataforma designada apenas a vídeos com conteúdos
curriculares do ensino básico, foi selecionada a área ‘Biologia’, em seguida a subárea
‘Diversidade da Vida’ e aplicada a busca com o filtro ‘Mais Vistos’. Da busca foram
selecionados os 05 vídeos em ordem de visualização que tinham como tema a
classificação biológica no geral, sendo os inúmeros outros vídeos, sobre a
classificação de um táxon específico, ou que não se encaixavam nos critérios. Todos
os vídeos escolhidos continham a palavra ‘Taxonomia’ no seu título, e não continham
a referência a nenhum táxon específico.
Em seguida, na busca comum do Youtube foi feita a busca por ‘taxonomia’, já
que esse termo aparece em todos os nomes, e então foram encontrados 05 vídeos
18
dentro dos critérios e desconsiderando os vídeos já escolhidos no Youtube Educação.
Sendo assim os vídeos escolhidos estão enumerados e descritos no quadro 1 a
seguir:
Quadro 1 – Dados dos vídeos selecionados.
Nº NOME DO
VÍDEO
NOME DO
CANAL
DURAÇÃO
DO VIDEO
NÚMERO DE
VISUALIZAÇÕES
Youtube
Educação
1 Taxonomia –
Biologia
Cantada –
Prof. Paulo
Jubilut
Paulo Jubilut 7’18’’ 413.848
2 Biologia -
Taxonomia
Aula De 18’41’’ 171.088
3 Taxonomia
Sistemática -
Introdução
Descomplica 5’21’’ 92.448
4 Taxonomia e
a árvore da
vida
Khan
academy em
português
12’47’’ 17.287
5 Fundamentos
de taxonomia
Descomplica 3’19’’ 6.908
Busca
comum
do
Youtube
6 Taxonomia –
Sistemática –
Classificação
dos seres
vivos – Carlos
Lineu – Aula
grátisa de
Biologia
Curso Online
Gratuito
12’28’’ 308.529
7 Classificação
dos Seres
vivos –
Gabriel
Moraes
9’04’’ 64.031
19
Taxonomia /
Cladística
8 Zoologia –
Taxonomia e
nomenclatura
das espécies
Kinapse
vestibulares
11’25’’ 56.918
9 Classificação
dos seres
vivos
(taxonomia) –
Prof. Vanylton
Matias
Bio 21 –
Vídeoaulas
14’29’’ 45.868
10 23 –
Classificando
os seres vivos
– Biologia –
Ens. Médio -
Telecurso
Novo
Telecurso
13’16’’ 33.288
*Disponível em: <https://www.youtube.com/>. Acesso em 23 de novembro e 2016.
A partir disso foi feita uma análise documental, que segundo Sá Silva, De
Almeida e Guindani (2015) resulta em utilizar documentos, no caso vídeos que foram
assistidos, como fonte de informação, a análise é portanto indutiva dentro de um
quadro teórico, após a descrição dos fragmentos relevantes dos textos e imagens.
Seguindo a proposta de análise de Roma e Motokane (2007), montaram-se
quadros para a melhor apresentação dos dados.
4. Resultados e discussão
A maioria dos vídeos segue uma sequência semelhante de estratégias e ordem
dos conteúdos a serem trabalhados. Tal fato pode ser observado na Quadro 2, onde
estão enumerados os vídeos e em seguida a marcação se tal conteúdo foi ou não
trabalhado. A escolha dos conceitos foi feita após a observação dos vídeos. Quadro
20
2 – Principais conceitos presentes nos vídeos.
Os vídeos 1, 3, 4 e 6 começam com o professor dando uma explicação do que
é taxonomia. Os vídeos 1 e 6 a definem como ‘A ciência que classifica os seres vivos’
e o vídeo 4 como ‘A ciência que classifica as coisas’. Já o vídeo 3 a define como ‘o
processo de descrição nomenclatura que é empregado na classificação biológica’
(sic). Os outros vídeos simplesmente não a definem.
Quanto à importância da classificação biológica, o vídeo 1 diz que
‘necessitamos de uma ciência que organize classifique esses organismos em
determinados grupos pra que fique mais fácil de estudar’ (sic), os vídeos 2, 3 e 9 dizem
coisas semelhantes. No vídeo 2, o professor diz ‘pra que a gente consiga ordenar e
saber qual é mais aparentado com qual indivíduo’. Essa fala pode dar a entender que
o parentesco é consequência da classificação e não um critério fundamental desta.
No vídeo 6, o professor diz que ‘com as explorações feitas pelo mundo inteiro,
diversas espécies de animais e plantas eram levadas do mundo inteiro... O mesmo
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
SIGNIFICADO
TAXONOMIAX X X X
IMPORTÂNCIA
CLASSIFICAÇÃOX X X X X
HISTÓRICO
CLASSIFICAÇÃOX X X X X
NÍVEIS
TAXONÔMICOSX X X X X X X X X
REGRAS DO
SISTEMA
BINOMINAL
X X X X X X X X X X
IMPORTÂNCIA
DO SISTEMA
BINOMINAL
X X X X X X X X X
PARENTESCO X X X X X X
Nº
Conceito
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animal recebia mais de um nome... Lineu disse “a gente não têm um bom critério de
organização”’. Essa abordagem parece interessante, pois entende as mudanças
realizadas na ciência como um processo de causas do mundo
material/econômico/social, embasando-se em algo muito mais próximo de uma
epistemologia interacionista (ROSA, 2003), diferente das explicações de base inatista
que parecem dar importância apenas para uma suposta genialidade dos cientistas,
deslocando-os de seu momento histórico.
Sobre o histórico da classificação biológica, os vídeos 2 e 6 falam sobre como
‘o Biólogo ser humano sempre quis classificar’ (sic) (vídeo 2), o vídeo 6 comenta da
classificação biológica que já era realizada pelos seres humanos há muito tempo: ‘eles
olhavam pra uma planta, sabiam que aquela planta eles podiam comer... uma outra
planta não poderia ser comida porque iria matar eles, isso era classificação’ (sic). Aqui
o vídeo 2 apresenta uma ideia de inatismo de uma suposta vontade do ser humano
em classificar as coisas, parecendo um raciocínio em cima de uma base
epistemológica inatista, já o vídeo 6 busca uma explicação na relação ser humano-
mundo para explicar o ato de classificar, o que parece ter uma base epistemológica
interacionista (ROSA, 2003).
Os vídeos 2 e 9 mostram Aristóteles como uma suposta primeira pessoa a
realizar classificação biológica, e pulam depois para Lineu como a próxima figura
histórica da área. Os outros vídeos todos falam sobre Lineu.
Sobre os níveis taxonômicos, todos os vídeos exceto o vídeo 5, que não mostra
sequer, mostram as sete categorias taxonômicas propostas por Lineu: Reino, Filo,
Classe, Ordem, Família, Gênero e Espécie. Para isso, os vídeos 1, 3, 6, 7, 8 e 9
apresentam uma técnica mnemônica para se decorar esses nomes na ordem correta:
‘ReFiClOFaGE’. O vídeo mais visualizado do Youtube educação encontrado aqui, tem
como proposta inclusive, ensinar musicas autorais sobre os conteúdos escolares.
Tal ponto evidência um dos grandes públicos-alvo desses vídeos que são as
pessoas que vão fazer testes vestibulares, ou provas na própria escola, e necessitam
decorar tais táxons. Os vídeos 3, 6, 7, 8, 9 explicitam no começo do vídeo, que este
tema (a taxonomia) é cobrado nos vestibulares e no Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM). Tais dados podem corroborar com a constatação de Krasilchik (2004) de que
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os conteúdos conceituais do ensino de biologia são selecionados levando em conta o
que se é cobrado nesses exames.
Sobre o sistema binomial de nomenclatura de espécies proposto por Lineu,
todos os 10 vídeos, continham trechos sobre suas regras e sobre sua importância,
exceto o vídeo 4 que apenas cita suas regras. Sobre as regras do sistema binomial é
dito que: a nomenclatura de espécies é binomial; ‘escrita em latim porque o latim é
uma língua morta’ (vídeo 1) semelhante em todos os outros exceto o vídeo 6; Gênero
primeira letra maiúscula, epíteto específico todas as letras minúsculas; ‘tem que estar
destacado no texto’ (vídeo 1) semelhante nos outros. O vídeo 6 se destaca por dar a
explicação de uso do latim diferente, dizendo que ‘o latim era usado pelas pessoas
com acesso à educação na época’.
Sobre a importância do sistema binomial de nomenclatura de Lineu, o vídeo 1
diz que ‘Lineu criou para ficar mais fácil de se comunicar’, e todos os outros vídeos
explicam algo parecido, citando também ‘padronização’ (vídeo 3 e 7), além do já
explicado diferencial do vídeo 6 sobre a explicação do porque Lineu fez o sistema.
Sobre o parentesco entre as espécies, os vídeos 4, 5, 6, 7, 8 e 9 salientam a
importância deste, para a classificação biológica. No vídeo 4 é dito sobre a importância
do estudo da Evolução, do registro fóssil e da ‘prova genética’ par classificar os seres
vivos. No vídeo 5, quando o professor fala de Aristóteles, ele diz que ‘o problema é
que essa classificação não é baseada em parentesco’. No vídeo 6, o professor diz que
‘hoje a classificação biológica vai muito além de dar nomes e separar os seres vivos
em grupos pelas suas características, o que a gente faz hoje é traçar uma história da
vida no planeta... porque a gente faz isso através de parentesco’. O vídeo 7 apresenta
‘vários mecanismos para estudar a biodiversidade a evolução dos seres vivos e
agrupa-los conforme suas relações de parentesco’ (sic) e destaca algumas dessas
formas: Morfologia/anatomia, análise do DNA e análise embriológica. O vídeo 8
começa falando que ‘a vide surge a partir de um ancestral em comum’. O vídeo 9 diz
que Lineu era um fixista e que ‘pra classificar considerava critérios estruturais e
anatômicos, não critérios evolutivos’.
O interessante no caso da citação do parentesco evolutivo como base para a
classificação biológica, é que de todos os vídeos que assim citam o parentesco
evolutivo, e que tratam dos níveis taxonômicos, apenas um não utiliza o sistema de
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reinos para a classificação, embora este já tenha sido superado por trabalhar com
categorias poli e parafiléticas (ROMA & MOTOKANE, 2007). Somente o vídeo 2 cita
por cima o sistema de 3 domínios elaborado por Woese et al (1990 apud ROMA &
MOTOKANE, 2007) mas ainda assim utiliza o sistema de reinos.
Os vídeos 2, 3 e 8 citam os 5 reinos que irão trabalhar: Monera, Protocista,
Fungi, Plantae e Animmalia. Tal fato é curioso, pois a escolha dessas categorias não
condiz com o que foi dito sobre a importância do parentesco para a classificação já
que estes são grupos poli e parafiléticos, baseados em características como a posição
nas cadeias ecológicas de um grupo, e sua organização corporal (ROMA &
MOTOKANE, 2007). A explicação para o uso dessa proposta pode ser a influência
dos exames vestibulares para o conteúdo da biologia como diz Krasilchik (2004) ou
ainda a naturalização de um conteúdo nos textos didáticos devido a sua tradição
histórica, como explicam Selles e Ferreira (2004). De qualquer forma, isso reforça a
tese de De Carvalho, Neto e El-Hani (2011) de que os textos didáticos tem uma
resistência em fazer a transposição da obra de Lineu para a filogenética.
A utilização dessa proposta de classificação dos seres vivos também tem como
problema o agrupamento extremamente desigual das formas de vida, colocando em
táxons do mesmo nível, um grupo minúsculo como o dos animais, em comparação ao
grupo Monera e mostra os seres vivos como formas absolutamente descontínuas,
contribuindo para uma visão fixista da natureza (TRIPICCHIO, 2005).
Todos os conceitos trabalhados nos vídeos, estão separados das aulas que
explicam por exemplo, os conceitos de descendência com modificação, ou seleção
natural, ou ainda algum método da cladística, que podem ser formas interessantes de
dar sentido a esses conteúdos, já que esse é um conceito estruturante da biologia
segundo De Carvalho, Neto e El-Hani (2014).
Parece importante também no nível conceitual, destacar alguns erros presentes
nos vídeos. O vídeo 2 é recheado de erros, e para não perder tempo apontando todos
os detalhes errados, podemos destacar alguns importantes: O professor quando vai
falar da Ordem Carnivora, se confunde com a classificação dos seres enquanto
herbívoros ou carnívoros, dizendo que ‘por exemplo nós homens, nós não somos
única e exclusivamente carnívoros, então nós somos eliminados dessa ordem aí’. Tal
confusão evidencia o tratamento das classificações por meio de ideias como a
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nutrição, as relações ecológicas, ou a morfologia das espécies e não por conta do seu
parentesco evolutivo, por parte desse professor (ROMA MOTOKANE, 2007).
Outro erro que parece interessante que surge no vídeo 2, e também no vídeo
4 é a colocação de Lineu como quem ‘inventou essa forma de classificação que é
usada até hoje’ (vídeo 2) ou como ‘o pai da taxonomia moderna’ (vídeo 4). Na
realidade, Lineu apesar de suas contribuições, era um fixista e um criacionista, tendo
ideias contraditórias com preceitos básicos da classificação hoje utilizada. O grande
fundador da classificação biológica atual é Charles Darwin (GUIMARÃES, 2005).
Nesse sentido, o vídeo 4 também coloca o Lineu como criador da árvore da
vida, o que é um absurdo, já que a ideia de árvore que necessariamente remete a
parentesco, foi somente muito tempo depois de sua obre elaborada (KAWASAKI &
EL-HANI , 2002).
Os vídeos 6, 9 e 10 realizam uma forma de contextualização da disciplina, antes
de começar. Os vídeos 6 e 9 apresentam trechos dos professores fazendo analogias
a organização bibliotecária de livros e cd’s. Já o vídeo 10, mostra como os organismos
estão classificados e organizados no zoológico. A ideia de contextualizar é
interessante, porém, essa estratégia talvez só faz um desserviço ao mostrar uma
classificação feita em cima de critérios artificiais das pessoas que trabalham com a
taxonomia.
Podemos entender que todas as aulas se baseiam em uma concepção de
ensino e de aprendizagem tal qual as abordagens tradicional ou comportamentalista
descritas por Mizukami (1986). Assim são, pois adotam uma concepção de
aprendizagem tal qual Mauri (2006) explica como sendo aprender é conhecer as
respostas corretas. Tal concepção é embasada em uma visão de mundo
epistemologicamente empirista, e tal visão condiz com a visão histórica da biológica
apresentada pelos atores nos vídeos.
Nesse sentido, os vídeos cumprem sua função se embasados nessa
concepção de aprendizagem, pois por determinado tempo, as pessoas decoram as
coisas em que prestam atenção, ainda mais se utilizados métodos mnemônicos, e
podem melhorar sua quantidade de acertos em provas vestibulares ou escolares.
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No sentido dos conteúdos conceituais, pode-se dizer que a oferta desses
vídeos é com foco em exames vestibulares, ou mesmo as avaliações escritas
escolares.
Verificou-se também, a falta de uma profundidade no tratamento histórico da
biologia, entendendo a ciência como construção humana, cultural e social, e não
enquanto processo descolado do mundo material, e produzido por mentes brilhantes.
Também percebeu-se a carência de se trabalhar conceitos estruturantes, como é
nesse caso o conceito de descendência com modificação, e de evolução. Outro fato
importante foi a confirmação da afirmação de De Carvalho, Neto e El-Hani (2011)
sobre a dificuldade de ultrapassar a classificação de Lineu, e adotar uma classificação
pautada na filogenética.
Todas essas constatações nos permite afirmar que o ensino de biologia em
vídeos no Youtube, um espaço não formal de educação, apresenta contradições e
problemas muito semelhantes aos da sala de aula. Porém nos cabe a pergunta:
Porque fazem tanto sucesso? Muitas aulas são exatamente iguais às aulas em uma
sala de aula, a diferença é que ela está gravada e publicada no Youtube.
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Eu, professor (a) __________________________________, estou ciente do
conteúdo do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado pelo aluno (a)
_________________________________________________ com o Título
____________________________________________________ a ser defendido em
sessão pública como parte dos requisitos para a obtenção do grau de bacharel em
Ciências Biológicas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Assinatura do aluno
Assinatura do orientador (a) – Universidade Presbiteriana Mackenzie
_____________________________
Local e Data
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