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A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES, INGRID ELISABETE PRANKE

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UNIVERSIDADE DE BRASILIAFACULDADE DE PLANALTINA

LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

INSTITUTO TÉCNICO DE CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA REFORMA AGRÁRIA - ITERRA

TURMA PATATIVA DO ASSARÉ

A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES.

Ingrid Elisabete Pranke

Nome do orientador: Rafael Litvin Villas Bôas

Brasília-DF, abril de 2010

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UNIVERSIDADE DE BRASILIAFACULDADE DE PLANALTINA

LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

INSTITUTO TÉCNICO DE CAPACITAÇÃO E PESQUISA DA REFORMA AGRÁRIA - ITERRA

TURMA PATATIVA DO ASSARÉ

A UTILIZAÇÃO DO AUDIOVISUAL PELA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MEDIO JOCELI CORRÊA E SUAS IMPLICAÇÕES.

Ingrid Elisabete Pranke

Monografia de final de curso submetida à Faculdade UnB Planaltina, da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos necessários à obtenção do Grau de Licenciado em Educação do Campo, com habilitação na área de Linguagens.

Orientador: Rafael Litvin Villas Bôas

Brasília-DF, abril de 2010

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RESUMO

Esta pesquisa foi elaborada a partir de observações, entrevistas e relatos de educandos e educadores pertencentes a Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa de assentamento no município de Jóia, RS, com o objetivo de questionar e diagnosticar a utilização do audiovisual durante as aulas. A maioria dos filmes com os quais os educadores trabalham pertencem a produção industrial e não dialogam com a forma com a qual o conteúdo se organiza. Normalmente o que acontece é que os educadores pedem como trabalho relatórios enfatizando o que o enredo do filme traz, não questionando de fato o que este trabalha. A pesquisa tenta relacionar a consequência do uso dos filmes na formação dos educandos, especialmente a formação estética, ou não dos educandos.

Palavras chave: educandos; audiovisual; filmes; imagem; educadores; indústria cultural.

SUMÁRIO

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1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................4

Capítulo 1: A vida permeada pelo sistema capitalista..................................................................6

1.1 Escola e hegemonia............................................................................................................6

1.2 Escola, racionalidade técnica e indústria cultural.............................................................14

1.3 Escola e emancipação x escola e precarização da vida.....................................................17

2. Contextualização da realidade pesquisada..........................................................................19

2.1 Início do assentamento.....................................................................................................19

2.3 Educadores que atuaram e atuam nessa escola.................................................................28

2.4 Educandos que estudam nessa escola...............................................................................30

Capítulo 2 – Utilização do audiovisual no contexto da Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa.........................................................................................................................................32

2.1. Utilização do vídeo na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa.........................32

Capítulo 3 - Análises de algumas obras trabalhadas na escola Joceli Corrêa.............................44

3.1- Análise do filme Anjos e demônios.................................................................................44

3.2 Análise do filme Desafiando Gigantes.............................................................................45

CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................................48

REFERÊNCIAS...................................................................................................................50

ANEXOS..............................................................................................................................51

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1 INTRODUÇÃO

A referida pesquisa foi realizada num território de assentamento da reforma agrária no município de Jóia RS. A localidade foi nomeada de Assentamento Rondinha. O foco principal da pesquisa foram os sujeitos da Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa, com educandos e educadores dos anos finais do ensino fundamental e ensino médio.

O fato de essa escola estar localizada dentro de um território de reforma agrária, com famílias provenientes de um movimento social que é o MST e consequentemente este continuar atuante foi um dos fatores que estimularam o desenvolvimento do trabalho a respeito do audiovisual. Ou seja, com a utilização dos filmes durante as aulas, tanto nos anos iniciais do ensino fundamental, anos finais e ensino médio. Mesmo com essa atuação (do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), sendo um contraponto a proposta hegemônica de sociedade, os filmes utilizados constantemente e para diversas ocasiões, tanto em aulas como em finalizações de trabalhos como, por exemplo, a Semana Paulo Freire que acontece todos os anos na escola no mês de maio, são na sua maioria filmes em que a forma apresentada é a mesma dos padrões estadunidense de produção e, a maneira com a qual este sempre foi trabalhado na escola não se traduzia diferente do que o todo do contexto escolar trabalha. Mesmo que a história dessas pessoas tenha sido de lutas reais, tanto no período de acampados como no período de assentamento, a forma importada de produção do audiovisual é empregada na escola sem aprofundamentos.

Inicialmente foram realizadas observações das aulas, conversas informais com educandos e educadores. Foi diagnosticado o descontentamento de parte dos educandos em relação a quantidade de filmes que os educadores utilizavam, algumas vezes no mesmo dia foram passados dois filmes, ou seja, o período todo de quatro horas era preenchido com filmes (constatado através de entrevistas). A maioria dos entrevistados (educandos) citou que pelo menos duas vezes ao mês os filmes eram utilizados, com maior ênfase nas disciplinas de português, história, espanhol, geografia. Importante também foi o fato de observar nos educadores não determinarem outros trabalhos, como por exemplo, identificar e analisar os sons, a movimentação das imagens, dos personagens, todo trabalho que há por trás da produção desse audiovisual, enfim, realmente analisar o todo das obras. O que se observou é de que provavelmente não tinham essa orientação de trabalho, ou seja, não foram preparados para analisar e trabalharem com os educandos de maneira diferente que apenas fazer a interpretação da história do filme que assistiam, responder questões a respeito do assunto assistido ou desenhar sobre o que assistiam.

A metodologia utilizada para diagnosticar e perceber o que se concretizava a esse respeito foi de entrevistas com educandos, educadores, funcionários da escola, observações de como aconteciam os procedimentos quanto ao uso dos filmes, leitura de relatórios dos educandos, pesquisa nos documentos da escola a fim de perceber qual o perfil de formação pretendido para os educandos, e a contradição ou não do trabalho com filmes, ou seja, se existia contradição entre o trabalho realizado com essa linguagem em relação ao pretendido como formação para os educandos.

As entrevistas com educandos e educadores serviram para verificar o quanto os filmes faziam parte da vida escolar e a importância ou não, dos mesmos no aprendizado e formação da consciência sobre a sociedade da qual fazem parte.

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Inicialmente foi realizada uma parte escrita em que são abordados aspectos dessa realidade como os conceitos discutidos, uma contextualização do local de pesquisa, dos sujeitos envolvidos nesse processo.

Nos passos seguintes da escrita são mencionadas falas dos sujeitos pesquisados dentro do contexto, diálogo com o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, diálogo com alguns autores como Maria Rita Kehl, Theodor Adorno, Antonio Candido. Também são acrescidas as percepções que ficaram, questionamentos, considerações finais.

Vários passos foram dados para que o trabalho pudesse ser concluído, entre eles a manutenção firme de que este foco era de real importância e daria algumas pistas sobre o que é desenvolvido na escola, como é desenvolvido e qual a dimensão que atinge entre os que assistem os filmes. E para além do recorte local, a pesquisa também é focalizada para o universal, pensando que o local faz parte do universal e vice-versa.

A hipótese inicial era de que os filmes na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa eram passados com muita frequencia e de que os educandos não conseguiam absorver tudo o que os educadores gostariam. A hipótese foi comprovada.

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Capítulo 1: A vida permeada pelo sistema capitalista

1.1 Escola e hegemonia

Questionar o formato escolar no modelo que ainda prevalece na atualidade pressupõe

que levemos em consideração todos os séculos ao qual este está submetido. A organização

deste não corresponde a algo atual, por mais que “enfeitem” os velhos moldes com a parte

física melhorada, por exemplo. Podemos perceber essa questão no fato, principalmente, da

relação professor aluno. Esta se constitui como forma de um dominar o outro, colocado como

regra de sobrevivência dentro desse sistema social que é o capitalismo. Como cita Luiz Carlos

de Freitas:

É preciso notar que a relação professor/aluno foi antagonizada a mando das relações

sociais que acirram esse processo no interior da sala de aula, como meio de adaptar

o aluno a uma forma de poder que é a forma que foi e será valorizada no âmbito da

sociedade capitalista. (2008, pg. 58)

Inicialmente adaptada e vinculada ao rigor da disciplina religiosa a escola funcionava

como uma espécie de continuidade da igreja, ou dos conhecimentos adaptados por ela. A

moralidade tratada nos diversos assuntos curriculares ainda permanece atualmente,

principalmente quando educadores tentam corrigir seus educandos por alguma razão qualquer,

uma briga, por exemplo: “isto não está correto”, “você deve fazer assim”, “não deve bater em

seu colega”. A noção do certo e do errado se coloca como o centro dessa valoração moral. É

como se o sentido do pecado permanecesse nessas correções. A punição “divina” perpassava

a escola, a obediência passava por ela também. A reiteração do moralismo em relação ao que

é certo ou errado, que provém direta ou indiretamente da questão religiosa, ainda continua

acontecendo no meio escolar. Conforme o que o era pregado e ensinado na Idade Média na

escolástica, a moral religiosa era a “pedra fundamental” para todos os ensinamentos, ou seja, a

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filosofia, a dialética, a literatura. Todas as formas de ensino passavam por essas “medidas” da

igreja católica que queria manter a dominação através de sua doutrina.

Mesmo que o domínio da igreja hoje não seja o mesmo de outrora, ainda permanecem

incutidas nas pessoas, essas “sequelas” de forma inconsciente. Podemos perceber isso nas

atitudes diante dos problemas que se apresentam no dia a dia, como por exemplo, os problemas

comportamentais. Palavras como estas: “você não deve bater em seu colega porque isso é feio,

está errado”. Não se procura o verdadeiro motivo por tais atitudes, tão pouco o questionamento

para que a pessoa que cometeu a atitude pense sobre o que fez. A solução seria resolvida em

longo prazo e como estamos na sociedade capitalista em que o imediatismo para resolução das

questões está presente em todos os aspectos da vida, não poderia deixar de sê-lo também na

escola. Esse imediatismo faz com que procuremos perceber diretamente no ato acontecido e

não nas prováveis convivências anteriores, ou problemas mais sérios de família, por exemplo.

A família, muitas vezes, é encarada como determinante de mais clientela para que a escola

funcione. A escola em questão E.E.E.Médio Joceli Corrêa, por sua vez, funciona como todas as

outras escolas dentro da burocracia que o Estado estabelece. Muitas vezes o que é tomado

como correto, condiz com as mesmas resoluções que dariam aqueles a quem interessa que a

sociedade permaneça dessa forma, ou mais especificamente, a organização escolar permaneça

como está. A parte burocrática está sempre em primeiro plano (pode-se perceber esse aspecto

até mesmo quanto a merenda, que para adquiri-la é necessário que o responsável (diretor) faça

várias tomadas de preço, licitações para então comprá-la para os educandos), mesmo que não

seja esta uma atitude consciente. Ou melhor, é uma atitude consciente, no entanto, a

formalidade em preencher documentos muitas vezes poda o lado humano do trabalho, aquele

que realmente daria resultados. Quanto aos pais, aparentemente, possuem certo encantamento

de que a escola será a ponte entre a melhoria de vida de seus filhos no futuro aceitando de certa

forma o que esta trabalha sem questionamentos mais consistentes. Os pais identificam na

escola um espaço para que esse futuro melhor se concretize. Pode-se perceber isso quando os

pais colocam na escola a responsabilidade daquilo que os filhos precisam aprender para esse

avanço, além disso, depositam na escola e na pessoa do professor a confiança dizendo que

estes poderão até mesmo “puxar as orelhas se for o caso”. De certa maneira há um

condicionamento dos pais em relação à escola, a condição para melhorar de vida está em

passarem pelo processo escolar e nesse processo os professores são aqueles que irão dar esta

contribuição, ou até mesmo serem a ‘salvação’ de seus filhos. Esse condicionamento está

vinculado ao próprio valor que o sistema capitalista propõe a todos para discussões sobre

valores, ou discussões sobre determinados temas estudados. Como referencia Eugenio Bucci e

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Maria Rita Kehl, de que a imagem se tornou para os seres humanos da atualidade algo

imprescindível, uma idolatria infinita daquilo que podemos chamar de sedução ilimitada, em

qualquer ponto que olhamos lá está ela pronta para alvejar quem estiver pela frente.

(...) Vivemos uma era em que tudo concorre com a imagem, para a visibilidade e para a composição de sentidos no plano do olhar. É nessa perspectiva que falamos em videologia, ou seja, na perspectiva de que a comunicação e mesmo a linguagem passam a necessitar do suporte das imagens num grau que não se registrou em outro momento histórico. Os mitos, hoje, são mitos olhados. (...) (Kehl, 200, pg. 16)

Quem estiver de acordo ou não com as situações impostas pelos meios televisivos, está

sujeito à banalização do que estes oferecem. Todos teriam direito a todas as obras elaboradas

até então, seja por meio da música, por meio do teatro, por meio da linguagem visual. No

entanto, o que é oferecido as classes menos privilegiadas em termos de cultura, é o que a

indústria cultural define como padrões a serem consumidos e consequentemente o lucro

revertido para aqueles que têm oportunidades de comprar para si a cultura elaborada e negada a

classe trabalhadora, por exemplo.1 Mesmo que outras elaborações existam, e existem, não

fazem parte da veiculação por meio de propagandas. Se as pessoas tivessem outras opções,

mesmo seduzidas pela redundância dos sons, das imagens que a indústria enfatiza, teriam

escolhas, questionariam mais. Veiculando mais, o lucro com a venda da imagem construída do

herói e do bandido não teria o mesmo efeito.

A estrutura escolar tomando-a como instituição, como todas as outras esferas da

sociedade está envolta do domínio econômico. O domínio religioso cedeu lugar ao domínio

econômico. Marx já previu isso nas teses de Feuerbach. A educação como um todo não está

livre do que os alicerces econômicos estabelecem. Por mais que a formação de hoje não seja

para mão de obra como foi para as antigas fábricas, o ensino continua obedecendo a aspectos

que direcionam a qualificação de mão de obra para futuros empreendimentos, ou seja, para o

que a economia ditar. Antes mesmo da necessidade dessa mão de obra existir já são induzidos

para essa formação. Esta já começa nos primeiros anos, na alfabetização.

A economia estabelece os parâmetros para que o poder se instaure em diversos setores,

tornando possível dessa forma que estabeleça conexões entre todos eles. A lógica da

1 Não se pode negar que a cultura existe em qualquer situação que nos deparemos, até mesmo nas escolas de samba ela se manifesta, no entanto, fica claro que a produção industrial não se deteve somente as necessidades humanas em termos físicos, e sim, em termos de emoção, se sentimentos. Ela não se contentou em ficar em um âmbito apenas, mas tomar parte do todo da vida.

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mercadoria é o “material” que conduz a essa apropriação do poder. Tudo o que é rentável se

torna mais rentável, e o que não é um dia será. Lembrando da discussão de Marx quanto ao

valor de troca e o valor de uso. Enquanto o valor de uso prevaleceu não havia um equivalente

que fosse trocado e sim como diz o próprio nome era o valor do útil para determinados fins.

Quando o valor de uso começou a ser dissipado e o valor de troca tornou-se a principal fonte de

organização um equivalente de troca, que hoje é o dinheiro, entra a lógica da mercadoria que

corresponde resumidamente naquilo que presenciamos hoje: todos os bens transformados em

algo vendável, trocados por um valor equivalente que não é o valor de uso. O discernimento

entre o que precisamos para viver e o que é supérfluo deixou de existir. Aparentemente tudo é

necessário, até mesmo o que não usamos. O desejo do consumo tomou proporções assustadoras

e sem limites de intromissão na vida dos sujeitos. Como Guy Debord define:

A primeira fase da dominação da economia sobre a vida social levou, na

definição de toda a realização humana, a uma evidente degradação do ser em ter. A

fase presente da ocupação total da vida social em busca da acumulação de resultados

econômicos conduz a uma busca generalizada do ter e do parecer, de forma que

todo o «ter» efetivo perde o seu prestígio imediato e a sua função última. Assim,

toda a realidade individual se tornou social e diretamente dependente do poderio

social obtido. Somente naquilo que ela não é, lhe é permitido aparecer. (2003, pg.

17).

As imagens entram com força total para que a manutenção desse poder econômico

prevaleça. A venda da imagem, sob qualquer pretexto (alimentos, roupas, perfumes, pessoas)

vale para a economia. A sensibilidade para discernir entre o que se configura como real,

existente, verdadeiro fica debilitada pelo fato de não existirem opções, poderíamos chamar

assim. As opções estão envoltas num emaranhado de fantasias, de imagens. Talvez essas

mesmas imagens, de um mundo ou, futuro melhor para os filhos, esteja configurada no

pensamento dos pais, por essa razão a entrega para a escola de seus filhos. A venda das

imagens, nos meios de comunicação diversos que existem na atualidade, estimula não só a

venda da mercadoria, mas a venda de um sonho. O sonho de grandeza entra na vida das

pessoas como alcançável para todos “só depende de cada um”. Toda a parafernália que a

sociedade se encontra, com meios de exclusão, de ilusão descarada, não está ao alcance do

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entendimento da maioria das pessoas. Não se pode dizer com isso que as pessoas são

impossibilitadas por ignorância, ou algo do gênero, no entanto, o “abrir dos olhos” não é de

interesse para quem domina, pois nesse caso, estariam colocando em jogo seus rendimentos.

No contexto escolar os filmes, em sua maioria, são trabalhados de maneira alienada de

todo procedimento de produção, trabalho envolvido, ideais repassados, e principalmente o

modelo de produção homogênea que passam a ideologia proveniente de um país que detém o

poder econômico e ideológico (Estados Unidos). Se trabalhados com os estudantes como

apenas objetos de entretenimento que conciliam mensagens de valores, ou em parte alguma

motivação para o aprendizado da disciplina estudada, focando apenas o enredo, a ‘história

emocionante, linda’, fica restrita e incapaz de perceber o domínio instalado nessas imagens,

que vão adentrando os pensamentos e ações repetitivas sem a percepção propriamente delas. O

questionamento, a percepção da linguagem, dos movimentos, das ações e reações, tanto das

imagens, quanto daqueles que as assistem, seria uma atitude própria de quem está preocupado

com a formação de estudantes. Se o significado atribuído a mercadoria e sua imagem não

dialogam com a intensidade que esta envolve a vida das pessoas, quando o trabalho com filmes

é desenvolvido, este não entra na profundidade que o tema merece. Trabalhar apenas com as

imagens veiculadas na forma importada e com conteúdos estabelecidos anteriormente (dentro

dessas obras) não contribui para a compreensão do que estas tentam promover. Como traz

Eugênio Bucci e Maria Rita Kehl na introdução de Videologias:

A tirania da mercadoria se exponencia na tirania da imagem da mercadoria. O capitalismo contemporâneo é um modo de produção de imagens. (...) a questão é compreender e decifrar os mecanismos pelos quais toda política, assim como toda religião e toda ciência, toda cultura e toda forma de representação, convergem para a imagem, como partes do modo de produção de imagens, e só circulam e só adquirem existência como imagem. (...) (2005, pg. 23)

No entanto, quem trabalha com filmes na escola não está preparado nesse sentido, do

questionamento e da análise. A não ser que as imagens estejam estreitamente ligadas à

disciplina especificamente, como por exemplo, biologia estudando determinados animais,

plantas, doenças, não está dentro de um questionamento, ainda assim a abordagem fica restrita

ao conteúdo especifico da disciplina e não da relação entre forma e conteúdo. Isso leva a crer

que todos têm muito a aprender em relação a essa linguagem que possui sua propriedade e não

deveria ser considerada apenas com o propósito de justificar a abordagem de algum conteúdo.

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Apesar da não formação dos educadores a respeito do audiovisual para desenvolver os

trabalhos em sala de aula, poderia existir a procura por esse aperfeiçoamento no sentido de ter

nessa linguagem algo próprio a ser trabalhado sem a pretensão de esgotá-la apenas como início

de um conteúdo. Daí acreditar que os filmes são utilizados na maioria das vezes como pretexto

para momentos de lazer na escola, como pretexto para uma produção textual, como pretexto até

mesmo de análise.2 Nos cursos de formação de educadores (não generalizando), normalmente

os filmes são encaixados como um recurso a ser utilizado no intuito de desenvolver trabalhos

posteriores, por exemplo, trabalhar sobre determinados temas como as estações do ano.

Pensando nisso, poderíamos afirmar que existe uma explicação para o descompromisso quanto

a linguagem audiovisual como linguagem específica: os educadores não são treinados para

olhar o filme na sua íntegra.

Remetendo-me a escola pesquisada Joceli Corrêa, chamou-me atenção quando uma

educadora em sua aula manifestou que iriam assistir a um filme e esta pediu que escrevessem

posteriormente uma resenha crítica. Um dos educandos questionou o que seria uma resenha

crítica. Não recebeu a explicação, apenas uma desculpa de que em outro momento explicaria

caso contrário não daria tempo de assistir o filme (é bom lembrar que o período da maioria das

disciplinas é de duas horas). O educando saiu com dúvidas sobre o que observar no filme para

escrever a resenha pedida pela educadora. Aparentemente aceitou sem maiores problemas, já

que em outras disciplinas aconteciam situações semelhantes.3

Os filmes que são assistidos durante os períodos de aula, algumas vezes fazendo-se

necessário tempo de outra aula, ou negociação com outros educadores para que concluam a

visualização do mesmo, não são comentados no início e na maioria das vezes nem mesmo no

final deles, a não ser sobre o enredo do mesmo (não um roteiro do que trabalhar depois de ter

assistido o filme). Isso é sintoma de um despreparo não meramente conjuntural, mas de ordem

estrutural da escola brasileira. A preparação do profissional em educação é voltada para que

trabalhe bem didaticamente os conteúdos de cada disciplina. Não é somente uma crítica para

esse fato e sim as possibilidades de alargamento dessa formação poderiam ser considerados.

Não se pode condenar, mas compreender e contribuir. De acordo com a realidade de escola do

campo e com aspectos específicos de tal realidade se observa que não são filmes que estão de

2 A palavra análise aqui está determinando um momento em que foi presenciado em sala de aula, com segunda série do ensino médio, em que foi sugerida a análise do filme “Anjos e demônios”. A análise consistia em falar sobre a fumaça que saia da chaminé e saber qual o significado e, referência aos iluminados da época.

3 Não quero dizer com essa afirmação de que todos os educadores procedam da mesma maneira em relação ao trabalho com os filmes, ou seja, utilizando os filmes de maneira aleatória e rotineira.

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acordo com ela. No entanto, considerar apenas ela como aspecto fundamental para desenvolver

o estudo, não é o único material ou aspecto para a compreensão de todos os fenômenos que

deveriam ser colocados em pauta. Como defende Freitas a teoria é pressuposto básico para

estudar a realidade da qual os educandos fazem parte. Nesse caso então, a utilização dos filmes

poderia ser considerada um alicerce ou um embasamento para aprofundar outros assuntos,

poderia ser considerado como uma parte teórica. Compreender e analisar a linguagem do

audiovisual com as características estéticas que existem em tal linguagem, com o

aprofundamento que merecem, esta deveria ser tarefa para quem se especializou no assunto, ou

pelo menos que saiba o significado, as dissonâncias que esta revela quando a usamos para

determinar apenas o suporte para o salto a outros conteúdos. Por outro lado justificar o fato de

passar os filmes com boa intenção e, sabendo a maioria dos educadores alheios a esse trabalho,

não é argumento forte o suficiente para que este permaneça com a mesma ênfase durante as

aulas, lembrando que quando este é passado para assistir toma todo tempo do período que

normalmente é de duas horas. Percebe-se nesse fato que não há tempo disponível para

discussões posteriores e durante o filme isso também não acontece.

Quanto aos filmes que assistem os educandos se manifestam de maneira pacífica (a

grande maioria) há aqueles que gostariam de discutir o porquê de passarem tantos filmes, no

entanto não são ouvidos. Outra oportunidade em que os educandos tiveram essa manifestação

de descontentamento foi quando o conjunto de educadores acordou para que o início das

atividades relacionadas com o projeto interdisciplinar do ensino médio (na ocasião da Copa do

Mundo de futebol masculino) seria um filme. Um dos educandos expressou a seguinte frase:

“vai ser uma matação”4 . O que ficou foi uma indignação por parte da maioria dos educadores e

decidiram pelo não trabalho com filmes por um longo tempo para que se dessem conta de que

não era apenas uma “matação”. A conclusão a que chegaram não foi apenas de se indignar com

o comentário e sim, pelo fato de perceber o quanto os filmes eram banalizados, passados sob

qualquer pretexto e sem preparação e quando um filme foi discutido e verificado se era mesmo

esse o pontapé inicial dos trabalhos, não foi levado em consideração.

Pode-se perceber que nem todos aceitam pacificamente esse método de trabalho, o que

por um lado é bom. Porém, se apenas são compreendidos como questionadores sem

preocupação, e não forem devidamente pesquisados sobre o que os levam a se manifestarem

com disposição sobre o assunto, então, será em vão a revolta.

4 O filme que assistiram para o trabalho interdisciplinar foi O poder de um Jovem, no período da copa do mundo no ano de 2010. Este foi o ponto em comum com as quais todas as disciplinas dariam o pontapé inicial para os trabalhos sobre a copa, como também, para o desenvolvimento de seus conteúdos.

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Pensando nas avaliações externas que dão a entender que seja necessário desenvolver

trabalhos em tempos determinados e sem a preocupação do tempo de cada sujeito aprender, os

conteúdos são ministrados aleatoriamente sem preocupação com a realidade. Os filmes também

entram nesse contexto de relativização do que é importante aprender, considerando como são

trabalhados.

Todos os trabalhos são direcionados para o fato de que os educandos se dediquem a

“apreenderem” os conteúdos trabalhados para participarem de olimpíadas, de avaliações

externas como SAERGS (Sistema de avaliação do rendimento escolar do Rio Grande do Sul),

prova Brasil, avaliações referentes aos projetos de alfabetização (como, por exemplo, o

projeto Alfa e Beto), enfim, são avaliados a todo o momento de uma maneira ou de outra, o

fato é que todos são avaliados. Essas avaliações são repassadas pelos gestores do Estado e

administrados pelos gestores e educadores das escolas como fundamentação para desenvolver

o projeto de acordo com os interesses daqueles que estão no poder, ou seja, de acordo com a

rapidez com que gostariam que este seja colocado em prática. No entanto, o que se ouve

desses projetos, mesmo considerando a concepção dos educadores, é de que servem para

prever o que os educandos estão realmente aprendendo, não se colocam como continuadores

desse modelo de sociedade que projeta novos dominados. Involuntariamente ou não, aqueles

que trabalham diretamente com os educandos também têm sua parcela de responsabilidade

nessa questão, mesmo que pensem nessa responsabilidade de maneira inconsciente. O

professor por sua vez também é avaliado nessa perspectiva, se o educando não correspondeu

aquilo que estava sendo pedido nas avaliações considera-se que os ministrantes das aulas são

incompetentes. As escolas são colocadas no patamar de competição já que tem seus nomes

num informativo dizendo qual a classificação de cada uma. A concorrência é brutal e bárbara.

O que poderia justificar a reação dos educadores por escolherem trabalhar de forma

descontextualizada, com conteúdos que não dizem respeito aquele público ou local. (Não

quero dizer com isso que devam somente estudar conteúdos específicos daquela realidade,

mas considerar o contexto em que trabalham).

A padronização dos conteúdos a serem trabalhados (estes serão cobrados nas

avaliações externas já citadas) no decorrer do ano letivo faz com que exista uma espécie de

coerção involuntária, ingênua (ou talvez não tão ingênua assim, ela pode ter sido pensada com

antecedência, por quem organiza os conteúdos e por quem os ministra posteriormente). Os

educandos são submetidos aos conteúdos que não fazem parte do seu contexto e depois de

algum tempo (anualmente) são avaliados com avaliações externas que são corrigidas por

outras pessoas, não aquelas com quem trabalharam.

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Pensando no fato de que nestas colocações das escolas há competitividade entre elas e

de certo modo uma desqualificação dos educadores que nelas trabalham, podemos entender

que a avaliação não se restringe somente aos educandos e à “melhoria” do sistema

educacional, ou, a preocupação com essa melhoria. Está calcada também como método de

colocar no educador a “culpa” pelo baixo rendimento dos educandos. Pois desde que a

religião foi trocada pela economia, até mesmo da educação se espera rendimento e não

formação de seres humanos na sua integridade. Assim, mesmo que o Projeto Político

Pedagógico (PPP) da escola esteja calcado na formação integral do ser humano, esses tipos de

avaliações e trabalhos desvirtuam o que é proposto.

Do mesmo modo que as avaliações externas vem organizadas por outras pessoas sem

levar em conta o contexto na qual serão aplicadas, avaliando os mesmos conteúdos para

todos, os filmes com sua forma estética importada, também não situados no contexto,

exprimem uma coerção inconsciente. Aqueles que assistem sofrem um coerção permanente,

sem mesmo perceberem.

1.2 Escola, racionalidade técnica e indústria cultural.

Resumindo o fato dessa maneira aparentemente designa algo simplificado: de um lado

o que a industrialização definiu e de outro os não aprendizados, cegueira perante a realidade

histórica que se apresentava reforço de que seres humanos expropriados dos meios de

produção e da terra, servirem como massa de manobra sem sentimentos, sem desejos, sem

necessidades, sem vida. De outro lado, a técnica sendo assumida por poucos “capazes” de

comandar os meios de produção e adequá-los a suas exigências de padrão de vida e de poder.

A relação que se estabelece a partir de então, reforça a ideia da desumanização em

razão do “aproveitamento” dos seres humanos para a produção de coisas, de mercadoria. O

trabalho encarado no início como uma necessidade e como algo que revelava o homem, sua

construção, sua completude, agora designado com árdua tarefa do apenas fazer e não do

pensar o que fazer como fazer, por que fazer e para quem fazer. O ser humano condicionado a

realizar sem pensar no que realiza. Essa relativização do trabalho trouxe a relativização das

necessidades da vida. O supérfluo passou a ser a “real” necessidade, o real passou para

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segundo plano e o ser, não encontra a importância que deveria, pois a satisfação se resume ao

que se vê, ao belo convencionado. A barbárie instalada pelo sistema capitalista define essa

desumanização. O ser humano não possui as condições necessárias de sobrevivência:

alimentação, vestimenta, moradia, no entanto, prioriza através da necessidade instaurada pela

lógica do consumo, produtos que possivelmente não terá condições de adquirir, ou até faz um

esforço extremo de conseguir o que está a venda para se igualar a todos, mostrar que está

também acompanhando as últimas tendências da moda.

Quanto ao consumo de mercadorias as pessoas se sentem desejosas e culpadas ao

mesmo tempo. O desejo por algo é sempre alimentado pelas propagandas de toda natureza,

sentem-se culpadas antes de realizar o ato do consumo e depois que o consumiram. A culpa

vem pelo produto ser muito caro, pelo fato de ter consumido muitas calorias, pelo fato de ter

de corresponder ao que dita à moda, pelo simples prazer de consumir. Religião e consumo

determinam a mesma natureza de elementos: a culpa e o prazer estão estreitamente ligados.

Como cita Frei Betto no artigo A arte de seduzir:

Estamos todos sob o efeito hipnótico do consumismo. Não importa se o produto é frágil ou de má qualidade. Seu design nos cativa. Sua publicidade nos faz acreditar que estamos comprando a oitava maravilha do mundo! E, ingenuamente, que se trata de um produto durável, mesmo conscientes de que o capitalismo não se importa com o direito do consumidor, e sim com a margem de lucro do produtor.(Betto,2011)

Assim como a economia e o consumo estão estreitamente ligados também o estão o

trabalho e a escola, considerando a escola a partir da organização da fábrica. A necessidade de

pessoas para o trabalho organizou o espaço escolar para suprir a demanda de operários. A

formação para esse fim sempre foi maior que a objetividade declarava. Grandes multidões

formadas alienadamente para servir ao capital. No momento em que estão prontos para o

ingresso no mercado de trabalho (pessoas ingressando no mercado de trabalho sem deixarem

de ser mercadoria, pois vendendo sua força de trabalho que é uma mercadoria, se igualam a

própria mercadoria produzida), esse mercado já não tinha tais necessidades colocando outros

empecilhos para que esta entrada nele se efetivasse, exigindo mais formação, mais

qualificação. A escola em meio a essas exigências tem o papel de continuar o projeto inicial

que é formar mão de obra barata e em grande quantidade, ou seja, sempre produzindo a mais

do que o necessário. O trabalhador por sua vez fica sempre distante do sonho de conseguir se

estabelecer como essa mão de obra empregada em razão das exigências cada vez maiores de

18

qualificação. Esse método de escolha que o sistema possui desumaniza na medida em que a

disputa constante faz com que um ser humano meça forças com outro constantemente,

gerando um desequilíbrio no entendimento do que realmente é necessidade ter, ou mesmo,

não encontrando mais o sentido do ser significativo nessa sociedade que escraviza um ao

outro pelo desejo. O desejo por qualquer objeto também ocorrendo na transformação da

própria pessoa em objeto de troca. Mesmo que a evolução da tecnologia tenha atingido

índices elevados na atualidade, ainda podemos perceber a procura por “qualificação” para

entrar no mercado de trabalho, ou seja, a escravidão acontece da mesma forma, mas se

caracteriza em outra forma de escravidão e dominação: por meio da “sedução”.

As relações que se estabelecem na sociedade consequentemente se manifestam na

escola ou em outro lugar qualquer basta fazer parte dessa mesma sociedade, não se caracteriza

uma novidade esse aspecto. O estímulo para o consumo exacerbado de quaisquer produtos,

não importando a origem, a utilidade, ou qual a consequência desse ato para o meio em que

vive ou tenta sobreviver.

(...) A violência da sociedade industrial instalou-se nos homens de uma vez por todas. Os produtos da indústria cultural podem ter a certeza de que até mesmo distraídos vão consumi-lo alertamente. Cada qual é um modelo da gigantesca maquinaria econômica que, desde o início, não dá folga a ninguém, tanto no trabalho quanto no descanso, que tanto se assemelha ao trabalho(...) (Adorno, 1940 pg. 119)

A imagem está acima de todo o “bem” e de todo “mal”. O mundo atual se resume na

imagem. Qualquer natureza de produtos, incluindo o ser humano, tem na imagem sua grande

revelação. Juntamente com os produtos, que podemos considerar produtos de fato, como um

calçado, um perfume, uma jóia, uma roupa, está determinado pelo modelo atual de barbárie,

que à venda também está aquele ou aquela que utiliza tais produtos, colocando-se a venda a

imagem, o corpo que se estabelece através da imagem ou, o corpo “perfeito” representado

naquela imagem.

...o processo de esteticização da barbárie elevou, para uma escala muito

maior, a naturalização da violência cotidiana, sendo veiculado cotidianamente por

diversas mídias, de forma recorrente, de maneira que esses valores são introjetados

profundamente e servem mesmo a produção de determinadas formas de

subjetividade que não só não se espantam mais com a violência como também já a

aplaudem e a elogiam.... ( Campos e Lobo, 20..p. 201)

19

Estamos permeados, em todos os sentidos, pela organização estabelecida nessa

sociedade, capitalista até o último grau de compreensão. Estamos dentro dessa sociedade,

parte dela, sugados por ela. Questionar essa realidade e não cair no engodo de defendê-la,

mesmo que involuntariamente, seria o papel do educador. Para sair desse mergulho capitalista

se faz necessário uma dose elevada de entendimento do que significa o “ser histórico”, o ser

real, organizado, ativo (sem considerar aqui ativo aquele que faz sem pensar), participante,

emancipado, que interage, defende a vida. Caso agissem sempre com a disposição de quem

almeja de fato contribuir na formação de sujeitos, os sujeitos seriam formados, bastaria que a

metodologia de Paulo Freire fosse compreendida e vivida: que propõem um educador

mediador do conhecimento e não um ditador do ensinamento, dono da verdade.

A escola poderia ser a estrutura capaz de formar o ser humano não apenas

cognitivamente, formá-lo como sujeito capaz de intervir no sistema tentando modificá-lo nas

suas bases. Mas como a escola é apenas um apêndice do que existe por trás dela como fazer

para que a formação atinja o grau de compreensão que desejamos que cada ser humano tenha

de acordo com o entorno em que vive? Em que aspecto acreditar primeiro, quais as possíveis

“armas” para essa organização que se mantém há séculos evoluir, e não evoluir apenas no

sentido pejorativo da palavra, entendendo evolução como progresso, mas como avanço,

superação do velho, construção do novo.

1.3 Escola e emancipação x escola e precarização da vida

A base da escola não pode ser compreendida em termos físicos e educandos como a

clientela atendida por ela. A base são os educandos, mesmo que na maioria das vezes estes

sejam os últimos a serem motivos de preocupação. Temos que trabalhar com a base da escola

para que exista possibilidade de transformação da organização vigente (organização escolar)

e, por conseguinte a emancipação dos sujeitos que dela participam. Iniciar essa emancipação

pressupõe que tenhamos compreensão do que significa esse termo. Para que os sujeitos se

formem como sujeitos emancipados se faz necessário não reduzi-lo. Emancipação não se

realiza num período curto de tempo e sim processualmente como consta nos documentos da

20

escola, por exemplo, sobre a avaliação: que será processual, que o acompanhamento será

assíduo, constante, mas que concretamente não se realiza nesses termos. Como consta no PPP

da escola:

A avaliação será compreendida como processo de construção, cumulativo, constante, investigativo, de acompanhamento da aprendizagem do/a educando/a.A avaliação, por ser um processo contínuo e cumulativo, é compreendida, numa perspectiva mediadora, como a análise do desenvolvimento do processo educativo de cada educando/a, assim, acompanha-se diariamente o desenvolvimento de cada um/a, nas mais variadas situações de aprendizagem, visando compreender as hipóteses que este/esta vem formulando a respeito de determinados assuntos e nas diferentes áreas do conhecimento. (PPP, 2006 pg. 12)

As interpretações e compreensões a esse respeito poderiam ser inúmeras. Poderíamos

começar pelo fato de que a escola não está distante da burocracia, que precisa ensinar certos

conteúdos e nesse caso fica limitada no sentido de proporcionar momentos de reflexão e

entendimento sobre determinados fatos e ações. Poderíamos questionar então qual o papel do

filme nesse contexto da burocracia escolar que não se restringe a esse contexto, pois, em todas

as escolas este existe como recurso. Assim como na avaliação, que não acontece na forma de

acompanhamento do que os educandos realmente estão compreendendo e aprendendo, os

filmes são fonte de disseminar o que já existe pronto e assim alienar aqueles que assistem de

todo o processo de produção.

Entre o que está escrito/descrito nos documentos e a realização do que está conferido

neles existe certa distância. A escola pesquisada não se dedica diretamente ao educando

preocupada com o crescimento intelectual e a formação humana integral (mesmo

considerando os projetos que estão desenvolvendo, como a exemplo do interdisciplinar no

ensino médio). A crítica a não preocupação com os educandos não está relacionada a um

educador em especifico, mas sim aos educadores enquanto classe de trabalhadores. A falta de

condições adequadas de trabalho em que se encontram esses profissionais da educação faz

com que seu trabalho não tenha a mesma proporção que poderia ter. A dedicação ao

educando não se estabelece, ou seja, como citou e trabalhou Freitas: “a última preocupação

que a escola considera são os educandos”. Essa não é uma crítica exclusiva dessa escola, bem

conhecemos que a realidade da educação brasileira carece desses pressupostos. Devemos

considerar a organização escolar que inclui professores mal remunerados e por essa razão

trabalhando a cada dia mais para poder manter um padrão de vida digno. Poderíamos até

questionar o fato de trabalharem em mais de uma escola para aumentar a renda e, como

gostam de dizer em todos os relatos que escutamos dos estágios dos educandos da

21

Licenciatura em Educação do Campo: “vendem produtos da revista da Avon”. No entanto,

devemos lembrar que estes também são frutos dessa educação alienada de formação

humana,.Por outro lado não podemos justificar os erros e as marcas que estes deixam nas

crianças, adolescentes e jovens pautados por essa educação arbitrária. O que nos leva a crer

que a maioria das ações não corresponde às necessidades reais que as crianças apresentam.

Ainda assim, esta é uma boa justificativa. Mesmo que esta classe queira procurar por

melhores aprendizados enquanto professores, continuarem sua formação, esta não está ao

alcance com tamanha facilidade quanto poderia (as facilidades de acesso a formação na

atualidade são maiores do que há alguns anos, mesmo assim, esta somente acontece em razão

da necessidade que o governo exige para permanecerem no cargo de professores e não

necessariamente pelo motivo da procura de aperfeiçoamento e superação das sequelas que a

educação inicial deixou em cada um dos educadores dessas novas gerações).

2. Contextualização da realidade pesquisada

2.1 Início do assentamento

O Assentamento Rondinha, território do município de Jóia que se localiza na região

noroeste do estado do Rio Grande do Sul, se constituiu a partir de três realidades

diferentes, ou seja, pessoas vindas de três acampamentos, apesar de que a luta se constituía

para a mesma finalidade, com os mesmos objetivos. Os acampamentos que fizeram parte

desse assentamento foram: Não Me Toque, São Miguel das Missões e Lagoa Vermelha

(Ao acampamento de Não Me Toque juntaram-se pessoas provenientes da região de Bagé).

Algumas dessas pessoas já estavam acampadas há mais tempo que outras o que

possibilitou que estas fossem assentadas em primeiro lugar. Os que se reuniram era parte

da luta pela terra juntamente com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, dessa

forma como já foi citado tinham os mesmos objetivos. Anteriormente a essa luta por

assentamento não existia concretamente luta do MST considerando essa região específica.

No RS a luta iniciou com o acampamento da fazenda Anoni no ano de 1985. Na realidade,

como foi descrito acima, a reunião em acampamentos não se deu na região de Jóia

propriamente e sim em outras regiões como Não Me Toque, São Miguel das Missões e

22

Lagoa Vermelha. A região de Jóia foi “escolhida” pelo fato de oferecer territórios

disponíveis para reforma agrária. Depois do Assentamento Rondinha, aconteceram outros

assentamentos nos arredores: Assentamento Barroca, Assentamento Estrela que Brilha,

Assentamento 25 de Novembro, também há um Reassentamento com o nome de 31 de

maio que está ligado ao movimento atingido por barragens (MAB), como também o

Reassentamento Novo Amanhecer. Mais próximo a área urbana de Jóia também se formou

outro assentamento: Simon Bolívar.

O Assentamento Rondinha e outros dos arredores foram conquistados devido a luta

do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e essa luta no RS já estava

acontecendo desde a década de 80. Na região de Jóia propriamente não existiam lutas

dessa natureza, o território era tomada pelos grandes proprietários de terra.

No ano de 1995 os trabalhadores acampados realizaram uma ocupação numa

fazenda pertencente à Companhia de Aviação Riograndense (VARIG) que estava

improdutiva e que mantinha oito trabalhadores em sua sede. Na primeira ocupação foram

despejados. Outras tentativas foram realizadas até que finalmente em maio de 1995, o

assentamento foi conquistado. A empresa de aviação proprietária inicial desse território

tinha uma dívida com o governo federal o não pagamento do Instituto de Previdência

Social (INSS) e por essa razão a terra foi vendida em troca dessa dívida.

O assentamento recém iniciado ficou com o nome de Rondinha que já possuía uma

história anterior ao assentamento. Antigamente era a paragem de tropeiros que passavam

por esse local e deixavam seu gado. À noite faziam a ronda, ou seja, faziam a vigia do

gado, por isso o local passou a ser denominado de ronda. Mais tarde passou a ser chamado

de Rondinha. Nesse local foram assentadas 232 famílias, numa área de 4.200 hectares.

O município tem uma área total de 1.240 km² e aproximadamente 8.500 habitantes.

Mais da metade dessa população reside no meio rural (76,16%) e o restante no meio

urbano (24,84%).

Nos primeiros anos de assentamento como não havia infraestrutura para que todos

os moradores se alojassem adequadamente foram se instalando conforme a condição

permitia. Nessa primeira etapa existiram grandes dificuldades. Continuaram na sua maioria

morando em barracos de lona preta, os recursos que vinham inicialmente eram escassos

mantendo somente o básico como a alimentação e algum vestuário. Outro fator importante

era o de que as famílias acampadas não sendo dessa localidade levaram certo tempo para

se adaptarem, tanto ao local propriamente, quanto ao preconceito em relação aos

assentados. Um exemplo disso é o de que quando morria alguém era indicado que esta

23

pessoa fosse enterrada na sua base (o termo se refere ao local de onde provinham as

pessoas, ou seja, local em que residiam anteriormente ao assentamento) e não no

assentamento, não considerando este local como aquele ao qual pertenciam.

Quanto ao preconceito sofrido pelas famílias no início este estava diretamente

relacionado com o fato de serem sem terra, considerados como vagabundos arruaceiros,

preconceito esse não restrito a esse território. Este também se estendeu durante os

primeiros anos de assentamento e perpassou todos os aspectos da vida das pessoas, tanto

na convivência em festas, na relação comercial, escolar. Não se podia esperar de uma

região como esta em que a centralidade das terras estava nas mãos de poucos proprietários

e que estes por sua vez compreendessem a chegada e permanência de pessoas provenientes

de acampamento e de uma luta por terra, ou seja, a reação era compreensível olhando sob

esse aspecto, não quer dizer aceitável. Ainda hoje, na atualidade ainda são percebidos

comentários desagradáveis em tons de brincadeira, principalmente quando pessoas do

assentamento não estão em condições de vida mais confortável, de que só poderiam ser dos

sem terra. O que continuam não compreendendo é de que os sem terra continuam fazendo

parte da mesma sociedade e por essa razão sujeitos aos mesmos problemas das demais

pessoas.

2.2 Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa

A Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa como é conhecida hoje passou

por vários processos até que sua existência atual se formasse.

Com a luta pela terra, além das lutas por recursos para que a produção iniciasse e

para a infraestrutura se efetivar, aconteceu também à luta por educação, especificamente

nesse caso a educação por escola em termos físicos. Essa luta por escola aconteceu desde o

momento que a necessidade por escola surgiu, a partir do momento em que as pessoas

vieram para o assentamento, no ano de 1995. As primeiras providências tomadas foram de

mandar os filhos para escolas mais próximas do município, depois a luta por uma escola

dentro do assentamento.

Antes que a escola existisse nesse local, como gostariam os novos munícipes dessa

localidade, os educandos tiveram de se sujeitar ao que estabeleceu o governo daquele

24

momento, ou seja, precisaram frequentar a escola do município localizada a oito

quilômetros do assentamento, de acordo com a localização de cada família nesse mesmo

assentamento a distância poderia aumentar. Nesse caso as crianças precisavam de

transporte escolar para se deslocar até ela, o que foi fornecido, no entanto com a

precariedade que se conhece no município: ônibus lotado, crianças mal acomodadas, em

dias de chuva a situação piorava em razão da situação das estradas. Os educandos que

frequentavam essa escola que era municipal e de ensino fundamental incompleto. A escola

em que cursavam existe ainda hoje e tem o nome de uma antiga moradora daquela

localidade Leonilda Zardin Nicolleti.

O fato de os educandos seguirem com transporte escolar até as escolas mais

próximas, que não eram tão próximas assim, houve um rendimento maior para o município

se considerarmos que os educandos são uma “fonte de renda” indispensável. Não tomando

mais o transporte para outras escolas, o município ficou sem esta fonte de renda. Esse fato

pode ser observado na dificuldade da implantação do prédio da escola no assentamento, a

demora no início da construção da obra, por exemplo. A manutenção dos educandos de um

local para outro através do transporte escolar não deixa de ser um método de manutenção

do sistema, a vida no campo se distancia de certo modo, outra realidade que não é a deles

entra no seu cotidiano. Não quer dizer que sua realidade não seja permeada pelo meio

externo, no entanto, o deslocamento de um local para outro, além de esgotar os sujeitos

fisicamente, esgota também outras possibilidades que teriam de se arraigarem ao campo

recém conquistado.

No entanto, essa situação inicial teve de ser repensada pelo fato de serem muitos os

educandos de anos iniciais e o prédio em que funcionava a escola não ter condições de

acolher a todos. A prefeitura do município teve uma solução provisória que foi a de

concluir a construção de um prédio de madeira (que foi feito por uma parte da comunidade

do assentamento, para funcionar como igreja e salão de festas): colocar o piso, construir

banheiros, cozinha e colocar as divisórias para que as salas de aula funcionassem. Porém,

esse prédio também não atendia as necessidades dos educandos em razão de não ter

iluminação adequada, não existiam divisórias adequadas atrapalhando a execução das

atividades, pois quando um educador falava o outro de outra sala escutava e vice-versa. Ou

seja, as condições para o desenvolvimento dos trabalhos eram prejudicadas no seu

conjunto.

O outro grupo de educandos que cursavam os anos finais do ensino fundamental foi

matriculado na localidade de São José também no município de Jóia, distante há doze

25

quilômetros do assentamento, isso considerando a saída do assentamento como referência.

Essa escola, Escola Estadual Edmar Kruel, é uma instituição de ensino fundamental

completo, ou seja, atendia educandos de primeira a oitava série. (Ainda hoje a escola

funciona como escola de ensino fundamental completo.)

Os educandos que frequentaram esse período nessa escola tiveram várias

dificuldades além das costumeiras. Enfrentaram diariamente o transporte escolar em

estrada de chão, aumentando o distanciamento de acordo com a localização das moradias

do assentamento. Houve nessa escola por parte dos educadores e educandos da localidade

de São José discriminação em relação aos educandos que estavam se integrando aquela

instituição. Foram separados em sala de aula específica, não se misturando com os que já

estavam cursando, os educandos os discriminavam também pelo fato de serem

provenientes de um assentamento e este por sua vez ser proveniente da luta dos

trabalhadores rurais sem terra. Essa mesma discriminação se estendeu também a todos os

assentados, também por serem sem terra.

Em razão de todas essas dificuldades e por serem pessoas que vieram de uma luta

maior, os assentados, pais ou não das crianças, continuaram lutando para que uma escola

fosse construída de acordo com as necessidades desses educandos e desse local.

Depois de várias tentativas em 1996 foi liberada pelo Estado a construção de uma

escola no assentamento. Mas como o município tinha interesse nessa escola, gostaria que

fosse municipalizada, e, o problema maior era de que existiam complicações quanto às

licitações das empresas construtoras, esse foi um dos motivos pelos quais a construção

demorou a ser iniciada. O prédio foi concluído no ano de 1998 e no ano seguinte iniciaram

as atividades escolares no local.

A escola estava dentro de uma área de assentamento de reforma agrária,

conquistada também pela luta das pessoas envolvidas no processo anterior. As discussões

de como funcionaria e de quais as pessoas que dariam continuidade considerando o espaço

pedagógico foram feitas também pela comunidade escolar que envolvia pais, educandos,

educadores que já atuavam e todos os interessados em como esta seria pautada: como

organizar, respeitando os princípios do Movimento, enfim, não desconsiderando todo

processo anterior.

Dentro dessa organização inicial, os educadores que já atuavam na escola

improvisada não eram suficientes para a continuidade dos trabalhos. Foi necessário que

outros se integrassem a esse contexto. Além dos educadores que já atuavam, vieram

educadores da área urbana do município de Jóia, outros provenientes dos municípios de

26

Santo Ângelo e Eugênio de Castro. Essa integração se deu em meio a vários atritos,

discordâncias entre ideias e jeitos de desenvolver os trabalhos. Os momentos em que as

discussões aconteciam normalmente eram de ênfase ao processo de desenvolvimento de

trabalhos com os educandos, dentro do que se acreditava como essencial para a formação

de sujeitos completos, formação essa defendida no PPP da escola nas concepções de

educação:

Educação voltada para as várias dimensões da pessoa humana.Buscamos a Educação Omnilateral, ou seja, a educação deve trabalhar em cada uma de suas práticas, as várias dimensões da pessoa humana e de um modo unitário ou associativo, em que cada dimensão tenha sintonia com a outra, tendo por base a realidade social em que ação humana vai acontecer”.(2006, pg.6, PPP)

O trabalho estava pautado dentro dessa formação como essencial, do que

discordavam em parte alguns educadores, pois consideravam o conteúdo (das disciplinas)

mais apropriado do que quaisquer outros aprendizados. Como a proposta pedagógica

estava em seu início, muitos se aproveitaram do fato de a maioria não se sentir segura

quanto ao projeto defendido e distorcer o que pretendia, ou seja, era um projeto a ser

construído e não apenas tomar o que já estava pronto e aplicar, o que era defendido por

parte dos educadores, apenas aplicar o conteúdo das disciplinas por exemplo. A primeira

organização considerada nessa escola foi a de que o coletivo deveria prevalecer. Foram

organizados núcleos de base que funcionavam no desenvolvimento do trabalho realizado

na escola (essa organização em núcleos foi uma continuidade da organização que existia

no assentamento como um todo) e considerado de fundamental importância no processo

educativo, o trabalho era considerado educativo. Esses núcleos e trabalhos realizados pelos

educandos também envolvia os educadores de toda escola. Essa organização de coletivos

de trabalho foi uma tentativa de organizá-la diferente da organização escolar existente e

também uma continuidade do que existia no acampamento, uma maneira de fazer

prevalecer a identidade sem terra. Essa organização poderia ser considerada contrária e

eficaz para combater o individualismo nas resoluções e planejamentos, especialmente

relacionados ao trabalho prático. Vale lembrar que apesar dos núcleos de base (grupos de

trabalho) se dedicarem ao trabalho prático, existia planejamentos e avaliações de como este

tinha sido feito, o que dava discussões que enriqueciam maneiras de pensar, construindo

sujeitos que necessitavam se posicionar e argumentar sobre seus posicionamentos. No

entanto, a escola não pode se manter distante da organização já existente, organização esse

27

que diz respeito a divisão por disciplinas, carga horária, enfim, todo aparato organizativo já

atuante há séculos. Ela não pode se distanciar dessa previsão, pois é uma instituição que

faz parte do sistema vigente. O trabalho continuou por algum tempo, em torno de três anos

com maior ênfase, depois foi se diluindo, outras exigências como tempos para realizá-lo

fizeram com que não tivesse mais o mesmo espaço. A burocracia do que exige a

organização escolar foi deixando de lado a organização proposta no início. Cabe pensar

sobre isso: primeiramente o público foi mudando, não tinha mais a mesma força que os

primeiros participantes da escola; a comprovação do que estava sendo feito, as papeladas a

serem preenchidas eram demasiadamente limitadoras para que os sujeitos da escola

continuassem batendo de frente com as regras estabelecidas; era mais fácil seguir o que já

está previsto (como de fato é); os sujeitos educadores sempre foram diferentes nas ações,

nas atuações dentro e fora da escola também se tornando um fato difícil de administrar

pelo menos de acordo com os princípios baseados em Paulo Freire, Roseli Salete Caldart,

Pistrak, entre outros. As justificativas são inúmeras e vem de um ponto de vista de quem

atuou algum tempo nessa escola, mas são válidos, tem um fundo de verdade. O fato de

fazer do trabalho um aparato importante e digno de pensar os outros projetos da escola foi

relevante, mas não surtiu o efeito esperado, talvez porque não tenha sido discutido e

valorizado mais juntamente com os educandos. Ele foi sendo deixado de lado, a

importância do ato de realizá-lo não se constitui mais em ato a ser pensado, o que

prevalece é que se um educando precisa realizar algo, sempre questiona e diz não precisar

realizar tal trabalho nem em casa, como terá de realizá-lo na escola? As oficinas

pedagógicas também foram um fator importante na aprendizagem dos educandos.

Aconteciam em todos os anos do ensino básico. Uma porcentagem de educandos se

inscrevia em determinada oficina ou, o educador direcionava o educando necessitado de

desenvolver tal atividade mais do que outros. Permanecia um trimestre, ou um bimestre de

acordo com a organização dos anos em questão (ensino fundamental ou ensino médio).

Quem coordenava cada oficina era um educador de acordo com aquela que mais se sentia

preparado. Existiam oficinas de artesanato, canto, culinária, conto, reciclagem, entre

outras.

Depois da construção do prédio, o desafio seguinte era o de construir um projeto

político pedagógico que levasse em consideração as movimentações realizadas até então

para a conquista da terra, da escola. O que foi proposto então era de que a comunidade

contribuísse nessa construção.

28

A comunidade, juntamente com o conjunto de educadores elaborou o Projeto

Político Pedagógico que seria o documento que estabelecia os parâmetros para a educação

desenvolvida a partir daquele momento. Essa elaboração teve maior ênfase na

oportunidade em que o governo do estado lançou a Constituinte Escolar, que previa a

discussão da organização escolar nos moldes em que se encontrava e a proposição por

parte de todos os integrantes do processo escolar (a comunidade escolar) de mudanças que

acreditavam necessárias para o melhor aproveitamento dos educandos, mudanças de

nomenclatura, como por exemplo, “delegacia de educação” para “coordenadoria de

educação”.

O Projeto Político Pedagógico e Planos de Estudo construídos a partir de 2000

enfatizam a formação de sujeitos críticos, que saibam como proceder diante das situações

que se apresentarem nessa sociedade. Como referenciado nesses documentos, a

importância da formação dos estudantes para que exerçam plenamente a cidadania e nesta

consta o fato de serem políticos em seus atos, é plenamente reiterada. Nesse sentido os

trabalhos realizados com estes precisariam de fato acolher as necessidades que possuem

também levando em conta seus estágios de desenvolvimento, além desses, o grau de

socialização que possuem entre os colegas e professores e a tarefa fundamental que essa

socialização propõe para o grau de amadurecimento e entendimento tanto dos conteúdos

quanto da convivência um com outro, ou seja, compreender que somente com o outro é

que a formação se torna plena e cheia de sentidos. Como indica o Projeto Político

Pedagógico da escola:

Contribuir na construção de sujeitos com capacidades da analisar, refletir e interagir com a realidade local e geral, ensinando fazer pela prática, preparando igualmente para o trabalho manual e intelectual, tornando-se sujeito da história e da sociedade que almejamos. (P.P.P. da Escola Joceli Corrêa, 200.., página...)5

Apesar dessa preocupação demonstrada no documento escolar e toda

movimentação para que os aprendizados não se tornem obsoletos, existe uma parcela de

despreocupação ao mesmo tempo. Não há como manter sob rigoroso acompanhamento o

que todos os educadores estão trabalhando com os educandos ou, como estão trabalhando.

Os conteúdos demonstrados nos livros didáticos, por exemplo, possuem atrativos

relevantes, já que com estes a aula já está “pronta” e o processo de passar os conteúdos

torna-se facilitado. Não se pode condenar por completo o livro didático, não é essa a

5 P.P.P. significa Projeto Político Pedagógico. Este projeto foi está em reformulação, no entanto, ainda permanece o mesmo embasamento, tem os mesmos objetivos.

29

questão principal, o fato é que como os livros, os filmes também se tornam artefatos

facilitadores de uma aula, se essa linguagem for vista como tal. Essa afirmação se constitui

em algo difícil, no entanto, as observações dos momentos em que os filmes são passados,

fazem-na ser fiel aos fatos que ocorrem. Os livros já vem com as ilustrações, com os

textos, com os conteúdos explicados e com as imagens para ilustrar; os filmes são imagens,

sons e palavras e podem proporcionar momentos de observação, sonhos e também

entretenimento, como mesmo fez referencia um dos estudantes da escola “as vezes um

filminho é bom para distrair”.

Porém, é preciso considerar que existem as pessoas que dão maior ênfase a essa

preocupação com o que e como os educandos aprendem. Estas fazem com que estimulem

momentos de preparação coletiva do que irá ser trabalhado. As tentativas são várias como,

por exemplo, a construção de projetos interdisciplinares para o ensino médio acontecido

durante esse ano de 2010. Atividades conjuntas foram desenvolvidas de acordo com as

especificidades de cada disciplina e houve um momento final de socialização do que cada

grupo de educandos conseguiu estudar, de acordo com a turma em questão.

O trabalho interdisciplinar pode ser considerado como uma iniciativa louvável, pois

o planejamento para as ações coloca os educadores trabalhando em conjunto, pelo menos

os educadores da área de conhecimento afim. Porém, a forma como o encaminhamento é

feito, ou o que é cobrado depois dos educandos se contradiz na medida em que não se

estabelece nenhuma novidade quanto ao método: passar um filme para a atividade inicial,

pesquisa na internet, copias do quadro negro, enfim, toda maneira de organizar esse

aspecto da aprendizagem. Não se pode considerar isso como uma crítica, ou intransigência

da parte de quem observa, ou trabalha com esses aspectos.

2.3 Educadores que atuaram e atuam nessa escola

Os educadores que iniciaram o trabalho na escola ainda extensão da Escola

Municipal Leonilda Zardin Nicolleti, faziam parte do quadro municipal de educadores do

município de Jóia como também alguns desses educadores faziam parte diretamente do

processo de luta pela terra e que por sua vez faziam parte dos assentados dessa localidade.

30

Como a extensão era de uma escola municipal, parte dos educadores era do

município até mesmo pela exigência do poder executivo do território em questão. Os

outros vieram do processo, (início dele), da escola itinerante e também educadores e

formadores em outras frentes dos acampamentos a que pertenciam.

Pelo fato de parte desses educadores terem vindo de um processo de luta por

reforma agrária, tinham ainda o vigor da continuidade dessa luta, de manter a identidade

sem terra que construíram durante o acampamento. Essa questão contribuiu para manter

viva a identidade camponesa nas crianças que vieram também do acampamento como

naquelas que ainda nasceriam no assentamento.

Como já mencionado na primeira parte dessa contextualização, esses educadores

sofreram juntamente com os educandos os problemas que a escola tinha naquele momento:

problemas com a estrutura física do prédio, materiais necessários para manter um ensino de

boa qualidade, tinham apenas giz e quadro negro.

Com o passar dos anos, mais especificamente a partir de 1999 quando o novo

prédio da escola dessa comunidade foi construído, a maioria dos educadores que estavam

nessa primeira etapa de trabalho, foram junto dar continuidade ao que iniciaram na escola

improvisada.

Agora, porém, a escola recém construída era estadual se fazendo necessário

constituir um quadro maior de educadores já que nesse momento a escola ofereceria os

anos iniciais e anos finais do ensino fundamental. Foram contratados pelo estado mais

educadores nas áreas específicas: educadora de educação física, educadora de língua

portuguesa, educadora de geografia e assim sucessivamente. Alguns profissionais que

atuavam na primeira escola tinham habilitações específicas, ou estavam cursando como,

por exemplo: educadora de história, educadores de matemática.

Os primeiros anos transcorreram em meio a grandes discussões de como organizar

essa escola com um prédio recém construído, mas com a estrutura interna a ser

desenvolvida pelas pessoas que agora faziam parte desse coletivo: educadores específicos

de sala de aula, educadores da comunidade (pais, mães e outras pessoas que se sentiam

responsáveis pela construção desse processo).

A primeira tarefa para a qual todos foram chamados foi a de escolher um nome para

essa escola. Como já era esperada essa não foi uma simples escolha já que todos haviam se

empenhado para que esse prédio fosse uma realidade concreta. Existiram três nomes para a

escolha defendidos naquela ocasião: Paulo Freire, Chico Mendes e Joceli Corrêa. Os três

foram defendidos com veemência pelos presentes, no entanto, como Joceli Corrêa foi um

31

dos companheiros que representava diretamente a luta pela reforma agrária e este ter sido

assassinado na época de acampamento influenciou para que fosse o escolhido quase que

por unanimidade.

Esse ato de escolha movimentou os educadores da escola e mais ainda o sentimento

de pertencer à classe trabalhadora.

Nos primeiros dois anos a escola não tinha uma pessoa que estivesse em condições

burocráticas de assumir o papel da direção, nesse caso uma pessoa que estava vinculada

diretamente ao assentamento assumiu o cargo mesmo que em condições de total

dependência da 36ª CRE (Coordenadoria Regional de Educação). Essa dependência se

caracterizava pelo fato de que em qualquer situação que necessitasse de assinatura para

compra de materiais, ou outra atividade burocrática a diretora em questão tinha de ir até a

localização da 36ª CRE para que o coordenador de educação o fizesse, pois estava somente

como uma representatividade nessa atuação. As exigências para que fosse uma direção de

acordo com a legislação seria de que estivesse vinculada ao Estado através de concurso

público, já com três anos de trabalho (tempo do estágio probatório) e tivesse licenciatura

plena concluída. A pessoa que assumiu na época, ano de 1999, tinha apenas licenciatura

curta e não se encaixava em nenhuma das outras exigências. Esta realidade continuou no

ano seguinte em que outro educador assumiu a tarefa, mas nas mesmas condições que a

anterior.

No final do ano de 2000, chegou transferida de um município próximo, Cruz Alta,

uma educadora que tinha as condições exigidas pelo governo do Estado para assumir o

cargo de direção. Como a escola necessitava de uma pessoa para desempenhar tal tarefa,

esta foi bem vinda à instituição para se colocar nessa posição. No primeiro ano assumiu

sem eleição. No ano seguinte foi realizada eleição, se candidatou e permaneceu no cargo

por três anos.

A escola teve mudança do nome, ou, reorganização do mesmo de acordo com a

situação em que se apresentava na época. Antes do nome Joceli Corrêa, teve o nome de

Escola Estadual de Ensino Fundamental no Assentamento Rondinha (que se referia ao

nome da localidade em que estava situada), depois passou a ter o nome de Escola Estadual

de Ensino Fundamental Joceli Corrêa. Alguns anos mais tarde, com a implantação do

ensino médio, a escola passou a se chamar Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa.

No ano de 2004 o ensino médio começou a existir nessa escola também, dando

possibilidades dos trabalhadores que ainda não tinha cursado essa etapa da escolaridade o

fazerem. Antes de existir nessa escola, os educandos que quisessem teriam que se deslocar

32

até a área urbana do município de Jóia à noite, o que aconteceu durante determinado

período. Nessa nova fase em que se encontrava a escola, foi proporcionado também que

viessem outros educadores de outras disciplinas para trabalhar com ensino médio.

Nesses 11 anos de escola muitos foram os educadores que passaram por ela, mais

de trinta no total, dos anos iniciais ao ensino médio. Outros permaneceram ao longo desses

anos tentando alicerçar o projeto de escola pensada a partir das concepções defendidas pelo

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que preserva as concepções de Paulo

Freire, Pistrak.

Provavelmente por essas idas e vindas, o quadro de educadores não conseguiu de

fato estabelecer uma unidade a ponto de colocar em prática a educação progressista a que

se propunha a escola, permanecendo sempre na expectativa de quem assumiria as tarefas

no lugar de quem já não estava mais. Realidade que de certa forma ainda permanece hoje.

O sentimento de pertença à classe trabalhadora sem terra foi diminuindo. O modelo

de escola que foi sendo construído nesse período não pôde se abster de seguir normas

burocráticas estabelecidas pelo Estado. Essa burocracia influenciou diretamente em cada

decisão tomada, influenciando a conduta de cada educador que não se via mais tão

instigado a participar de um coletivo que acompanhava todos os passos das pessoas a sua

volta e colocar esse novo aprendizado, essa nova construção na organização exigida então.

A maioria dos educadores que hoje atua na escola são do assentamento, mais da

metade, outros vem do município de Ijui, Cruz Alta, Tupanciretã. No total são 23

educadores.

2.4 Educandos que estudam nessa escola

Os educandos que estudam na escola são provenientes dos Assentamentos:

Rondinha, 25 de novembro (mais conhecido como Tarumã por ser o nome da antiga

fazenda), Estrela que Brilha (que pertence ao município de Tupanciretã), Barroca e

Reassentamento 31 de maio.

A maioria dos que estudam na escola atualmente, não fez parte diretamente do

processo de luta do acampamento e das ações realizadas nessa época. Aqueles que

pertenciam a esse tempo foram saindo por diversas razões, a principal delas a procura por

trabalho, ou seja, a permanência no assentamento não lhes deu suporte para continuidade

33

da sobrevivência e consequentemente não prosseguiram pelo mesmo caminho. Poucos

seguiram os mesmos passos dos pais, no entanto há os que também passaram por

acampamentos.

Nos primeiros dois anos de escola, 1999 e 2000 os estudantes traziam consigo

enraizados a identidade camponesa estampada. Nos anos seguintes até a atualidade, essa

identidade foi se perdendo, ganhando menos força. Existem várias razões para explicar

esse fato, entre eles a permanência nos lotes para a produção. A disposição para a luta, as

saídas não era mais a mesma, pois precisavam se tornar mais presentes nos lotes com seus

pais e dessa forma não mantiveram a prática da participação como se dava nos tempos de

acampamento e início de assentamento. Vendo sob essa ótica podemos perceber o quanto o

sistema no qual estamos inseridos de certo modo corrompe aqueles que tentam vivenciar

valores diferentes, pois as necessidades físicas se manifestam com maior ênfase e mesmo

não concordando com o que está a nossa volta, com a organização da sociedade e divisão

dos meios de produção acabamos por concordar com algumas situações, como continuar

trabalhando mensalmente para algum grande proprietário de terras.

Apesar de os jovens não permanecerem nos assentamentos, aqueles que passam

pela escola acredito que possuem um grau de consciência sobre essa condição de vida pela

qual seus pais passaram e pela qual eles mesmos passaram. Estar consciente dessa

condição significa dizer que mesmo trabalhando em outros setores da indústria e recebendo

um misero salário no final do mês, pensarão sobre isso e discutirão alternativas em algum

momento da vida. Isso parece folclórico, ou sonhador demais, esperar que se manifestem

pensando no que irão fazer ou dizer quando estiverem em situações com as quais não

concordam.

Capítulo 2 – Utilização do audiovisual no contexto da Escola Estadual de Ensino

Médio Joceli Corrêa

2.1. Utilização do vídeo na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa

34

O recurso didático vídeo vem sendo na atualidade cada vez mais utilizada pelas

escolas, tanto da rede estadual ou municipal.

Para que esse recurso tivesse ascensão, teve incentivos do governo (federal), por

exemplo, de oferecer os materiais necessários para que os estudantes e educadores

pudessem ter o acesso a ele. O fornecimento desses materiais se deu através de programas,

ou seja, cada escola recebeu em mãos DVD, TV e demais equipamentos necessários para

que se efetivasse a utilização do mesmo. Num primeiro momento a escola recebeu como

doação do município de Jóia, de Escola Municipal Leonilda Nicolette, uma aparelho de

vídeo cassete. Depois a escola adquiriu um aparelho de DVD. Mais tarde, no ano de 2001,

um projeto do governo federal, que tinha o objetivo de aparelhar as escolas, proporcionou

que outro aparelho existisse na escola. Essas questões nunca foram discutidas pela escola.

Quanto a filmes, a escola recebeu vários que estão ligados a TV Escola sobre disciplinas,

todos com acesso aos professores. Esses filmes são para os professores, como uma espécie

de consulta que poderão fazer, um material a mais.

A escola em questão, E. E. E. Médio Joceli Corrêa tem hoje doze (12) anos de

existência e desde então o vídeo vem sendo utilizado pelos educadores em suas aulas.

No decorrer desses anos a metodologia para realização dessa tarefa foi como

pretexto para conteúdos que seriam estudados posteriormente. Mesmo nas aulas de história

não havia uma programação anterior ou um estudo aprofundado sobre o filme, apesar de

que a educadora se colocava como questionadora e cada imagem do filme de acordo com

suas intenções parava e explicava o que queria daquela cena ou o que esta representava em

tal contexto histórico que estavam estudando do conteúdo.

Em qualquer um dos anos nesta escola são utilizados filmes: anos iniciais, anos

finais e ensino médio. A princípio em todos os anos do ensino básico, nessa escola, os

filmes foram/são explorados na percepção da história que este traz, fazendo com os

educandos se manifestassem através da oralidade, da escrita ou também algumas vezes

através de desenhos sobre a compreensão que tiveram da referida história que o filme

trazia, não exatamente sobre os conteúdos trabalhados nas disciplinas.

O aprendizado da linguagem audiovisual não é percebido no contexto escolar, pelo

menos, nesse contexto escolar. Com todos os educandos o trabalho com audiovisual não

reflete sobre a “alfabetização estética”, que como enfatiza Antonio Candido no ensaio

Literatura e Subdesenvolvimento

35

Na maioria dos nossos países [latinoamericanos] há grandes massas ainda fora

do alcance da literatura erudita, mergulhando numa etapa folclórica de

comunicação oral. Quando alfabetizadas e absorvidas pelo processo de

urbanização, passam para o domínio do rádio, da televisão, da história em

quadrinhos, constituindo a base de uma cultura de massa. Daí a alfabetização não

aumentar proporcionalmente o número de leitores da literatura, como a

concebemos aqui; mas atirar os alfabetizados, junto com os analfabetos,

diretamente da fase folclórica para essa espécie de folclore urbano que é a

cultura massificada. No tempo da catequese os missionários coloniais escreviam

autos e poemas, em língua indígena ou em vernáculo, para tornar acessíveis ao

catecúmeno os princípios da religião e da civilização metropolitana, por meio de

formas literárias consagradas, equivalentes às que se destinavam ao homem culto

de então. Em nosso tempo, uma catequese às avessas converte rapidamente o

homem rural à sociedade urbana, por meio de recursos comunicativos que vão

até à inculcação subliminar, impondo-lhes valores duvidosos e bem diferentes

dos que o homem culto busca na arte e na literatura (1989, p. 144).

A alfabetização não se dá na proporção da necessidade que apresenta cada sujeito.

Não existiu quando foi iniciado o processo de colonização (nas missões jesuíticas), nem

existe hoje, pois somos alheios ao que se passa e, normalmente vai além do que se vê. A

naturalização desse modo de trabalho está impregnada como está impregnado em cada um

de nós a naturalização e disponibilidade para o consumo. Agindo com esse método, ou

seja, trabalhando os filmes como evocações para administrar outros conteúdos ou para

como refletiram alguns educandos em entrevistas:“sabemos que na maioria das vezes os

filmes não correspondem aos conteúdos trabalhados, e às vezes é um passatempo

necessário, porque somente copiar não dá”.

Percebe-se que os educandos têm consciência do valor que se atribui a linguagem

fílmica, desconsiderando esta como algo importante, pois assim é tratada em diversas

ocasiões. Como argumentou uma educadora na explanação sobre a utilização dos filmes na

escola: “passar filmes é bom para o professor, bom para os educandos, e bom para os pais,

ou seja, todos ficam satisfeitos”.6 Com essa argumentação podemos pensar que há muito

essa linguagem está banalizada. A preocupação com a alfabetização para a linguagem

audiovisual não existe. As imagens são repassadas como algo natural, ou melhor, como

algo de que os educandos irão aproveitar no momento em que se colocarão diante delas. A

6 A educadora fez essa fala durante uma das aulas no curso de Licenciatura em Educação do Campo, convênio com UnB e ITERRA, 2010.

36

compreensão delas fica a cargo dos educandos, algumas vezes com intervenção dos

educadores, dependendo da disciplina da qual estivermos falando. Se esta praticamente é

inexistente, pode-se dizer que é compreensível o fato de os educandos não levarem a sério

o assistir os filmes para desenvolver um trabalho, pensando que este não se constitui em

algo diferenciado, apenas a compreensão superficial do contexto do filme assistido.

Nos anos finais o que sempre prevaleceu foi à utilização do mesmo como material para

interpretação do enredo pelo enredo do filme, não havia e não há outra modalidade de

trabalho com esse tipo de material. Servia e serve como ilustração de um momento da aula

ou até mesmo como válvula de escape por não terem aula preparada ou por não terem

disposição para desenvolver outro tipo de trabalho.

Comentários a respeito dos filmes que vem dos educadores dessa escola:

“Esse ano ainda não passei nenhum filme para meus alunos, vou passar um hoje, teria

educação física, mas como está chovendo vou passar o filme”

Há que se considerar outro fator interessante: nem sempre os educadores vêm com o

material (filmes) em mãos daquilo que querem trabalhar, outros às vezes passaram um

filme para seus alunos e outros colegas educadores o aproveitam para passar também.

Nos anos finais não é diferente, os educandos já tiveram situações em que assistiram

dois filmes no mesmo dia, em disciplinas diferentes por falta de comunicação entre os

educadores. Numa dessas situações uma das educadoras que seria aquela em que

trabalharia o segundo tempo da aula (de duas horas) ficou indignada com o fato de os

educandos não se aterem ao que era passado, pois já tinham assistido a um filme antes do

intervalo. Esta não considerou o que já tinham assistido anteriormente. Os educandos

apenas assistiram aos filmes sem realizar naquele dia algum trabalho a respeito do que

assistiram. Apenas foram pedidos relatos sobre o que viam para entregar na aula seguinte

valendo como avaliação. Na disciplina de língua portuguesa foram passados os filmes:

Olga, 2012, Alvin e os esquilos, Deu a louca na chapeuzinho, Harry Potter e a pedra

filosofal, Anjos e Demônios, Zorro, Dança comigo, entre outros; na disciplina de geografia

foram passados documentários que diziam respeito a disciplina e um filme: A corrente do

bem; na disciplina de história foram passados os filmes: Zorro, A guerrilha; na disciplina

de espanhol foram passados os filmes: Sempre ao meu lado, Alvin e os esquilos, entre

outros.

Entre os educadores entrevistados não existiu nenhum deles que se manifestou

contrário a utilização dos filmes. Por exemplo, quando uma das educadoras referiu-se aos

educandos como não preparados para escrever sobre o que assistiram e pedia que fizessem

37

desenhos, ou, como dizia “dependendo da turma é o que peço de trabalhos, as vezes peço

textos, as vezes desenhos”. Os filmes nessa questão eram da disciplina de espanhol, mas

não eram na língua espanhola, eram filmes com uma “história que dizia algo para os

educandos”, filmes produzidos pela indústria cultural e que não eram aproveitados para o

estudo da língua em questão (espanhol).

Alguns dos educadores se manifestaram quanto aos filmes como mais um instrumento

para facilitar a aprendizagem sobre determinados conteúdos que estivessem estudando,

como exemplo disso assistir desenhos animados como A turma da Monica para produção

de historias em quadrinhos, ou, quando estavam estudando sobre narrativa de aventura, que

por sua vez foi complementado com um filme, no caso, o filme era “Harry Potter e a pedra

filosofal”.

2.2 Relação do audiovisual com a formação da consciência

Quando falamos de audiovisual retratamos a imagem como central, o meio pelo

qual todos se mobilizam, pois trabalha com as emoções daqueles que o assistem.

Principalmente quando nos referenciamos às propagandas: estas são o fio condutor para o

consumo, atingem a grande maioria da população. Não existem ilesos, todos estão

impregnados pelo prazer e desprazer do consumo. Os filmes, produzidos no formato para

venda na indústria, também têm papel fundamental nesse consumo: venda do prazer

efêmero, do corpo perfeito, da magia dos roteiros com final feliz dando a entender que os

contos de fadas não se esgotam, venda da violência como maneira de resolução dos

problemas criados por esse sistema em que estamos na atualidade, venda das mais diversas

situações em que a vida cotidiana se mostra e mais além, os problemas de qualquer

natureza se resolvem, as relações sociais são impregnadas pela ideologia que prega a classe

que determina todo o aparato econômico, político, jurídico, enfim, toda a superestrutura em

que está montado o capital. As relações se estabelecem no âmbito de que o que as pessoas

vivem está retratado na tela e riem da própria desgraça, não se compreendendo como a

margem do processo. A ideologia que as imagens vendem é “irrecusável” ao povo tão

sofrido e cheio de mazelas...

38

Quando um educador utiliza as imagens, agora referindo-me as produções

industriais, e não concebe nestas um direcionamento adequado, um objetivo claro, aqueles

que assistem podem não diferenciar o que veem aqui do que assistem em casa ou em outro

momento de lazer. Nas entrevistas e conversas com educandos, a grande maioria deles, não

sabia dizer o que seria trabalhado com o filme posteriormente7, o que transparecia é de que

estavam somente assistindo por assistir, muitos dos que assistiram não lembravam o nome

nem do que se tratava.

A escola situada no município de Jóia começou a utilizar o recurso didático vídeo

desde o inicio de seu funcionamento. Logo que começaram os trabalhos já existia o

aparelho de televisão, vídeo cassete e várias fitas de vídeo para serem utilizadas: filmes

infantis (contos de fada), filmes de ação, entre outros. A escola hoje tem cerca de 380

educandos que cursam da educação infantil ao ensino médio. Este recurso é amplamente

difundido, pelo menos em se tratando desta realidade, entre os educadores. Tanto a

educação infantil, quanto os anos iniciais e finais do ensino fundamental e ensino médio,

tem contato constante com esse recurso. Normalmente o que pedem como trabalhos a

respeito do que assistiram são relatórios, resenhas críticas, ou apenas um relato do enredo

do filme.8

Esses relatórios são exigidos principalmente nas disciplinas de língua portuguesa,

espanhol, história. Na disciplina de história, segundo o educador, os filmes são utilizados

para retratar aquilo que não consegue através das explicações de acordo com determinados

tempos históricos.9 No entanto devemos ser justos ao fazer essa afirmação, pois, algumas

disciplinas fazem uso dele com maior frequência que outras, como por exemplo, língua

portuguesa, história, espanhol, geografia. Essa constatação foi feita através das

observações realizadas na escola, como também através das entrevistas com educandos. Os

7 Essa situação acontecia com maior frequência no período final do ano letivo, em que segundo o dizer de uma educadora “já tinha concluído todos os conteúdos e por essa razão estava passando filmes”. Os educandos não manifestam contrariedade a esse respeito, no entanto, são conscientes de que os filmes são apenas para passar o tempo das aulas e cumprir os dias letivos que ainda faltam, principalmente no final do ano.

8 Tive acesso a alguns relatórios produzidos pelos educandos, no entanto, não são os mesmos dos filmes analisados.

9 O educador de história demonstrou saber como poderia ser desenvolvido um trabalho utilizando especificamente essa linguagem do audiovisual, ou seja, analisar as imagens, a forma com que foi feito determinado do filme. Mas, o trabalho que realiza está direcionado para o conteúdo com que trabalha e não exatamente com a linguagem do audiovisual. O educador realizou um comentário a respeito desse trabalho que poderia ser realizado.

39

filmes começaram a ser utilizados nessa escola desde o primeiro ano de funcionamento do

prédio oficial (a partir de 1.999), ou seja, desde o momento em que iniciou seu

funcionamento há 12 anos. O fato de ser uma escola do campo não impossibilitou que estes

fossem introduzidos e que lá tivessem permanecido. A impossibilidade aqui na significa

dizer que não pudessem ter acesso ao que existe em termos de tecnologias, está se

referindo ao fato de não conseguirmos nos desligar ou nos desvencilhar do que esta

sociedade nos propõe mesmo que não concordemos com seus feitos. Não há distinção entre

quem utiliza ou não os filmes para trabalhar, o fato é que algumas disciplinas o fazem mais

vezes entre as quais a disciplina de língua portuguesa, história, espanhol, geografia.

Os filmes trabalhados levam em conta somente o roteiro que este apresenta. Na

maioria das vezes os professores nem mesmo assistiram aos filmes antes de serem

trabalhados, ou, já passaram para várias turmas e já sabem do que irá tratar e nem mesmo

assistem novamente com os educandos. Os trabalhos que são solicitados estão resumidos

no ato de escreverem sobre os filmes, resumos, resenhas, a parte que mais gostou ou

desenhos. A linguagem do filme como sendo uma linguagem estética própria não é

considerada, mesmo porque a formação dos educadores não passou por esta dimensão. Ser

“alfabetizado esteticamente” significa dizer algo como compreender todas as dimensões

que podem ser trabalhadas numa determinada obra e para que finalidade se queira trabalhar

com ela. Mesmo um filme como Olga, que poderia ser direcionado para o lado político da

questão e do coletivo que a luta daquele momento encerrava, quando análise escrita foi

feita o que prevaleceu foi a imagem soberana de Olga, principalmente no momento da

tomada da filha de seus braços. Os educandos não conseguiram ir além, por falta de uma

intervenção mais contundente.10

Além dos filmes trabalhados cotidianamente na escola Joceli Corrêa pelos

educadores nas disciplinas já mencionadas, filmes são utilizados na semana Paulo Freire11,

que acontece todos os anos nessa escola. Durante esse ano de 2010, foi utilizado um filme

que não tinha a ver propriamente com o tema tratado que era sobre a vida de Paulo Freire.

As turmas da escola (anos finais do ensino fundamental e ensino médio) realizaram

10 Vale lembrar que os filmes, normalmente assistidos pelos educandos, são produzidos pela grande indústria e o conteúdo expresso neles não se diferencia do que conhecemos : um é o mocinho, outro é o bandido e no final tudo acaba bem, ou seja, o final é feliz.

11 A semana Paulo Freire se refere a uma semana de atividades que acontece na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa alusiva ao dia do livro. Existe uma programação nas turmas da escola coordenada por alguns educadores que se disponibilizam para fazê-lo. Nessa semana há apresentações, feira do livro e culmina normalmente com um filme.

40

pesquisas referentes a esse autor para apresentarem no último dia da semana. As

apresentações foram feitas e no término delas foi passado o filme “Desafiando gigantes”. O

caráter do filme não estava relacionado a expressão que a semana tinha até então. A

diferença entre os outros filmes é que neste foi montada uma estrutura com data show para

a apresentação, deixando com aspecto de cinema o local em que foi assistido.

Os filmes trabalhados não são necessariamente trabalhados como linguagem

própria, pensando que este se encaixa no gênero multimodal. Um filme apresenta

linguagem da palavra, do som, da imagem, das posições em se coloca cada personagem, da

focalização para o individual ou o coletivo, imagens também direcionadas à propaganda de

mercadorias para vender o produto do filme além dos produtos individuais: bebidas, roupas

sempre etiquetadas com “marcas famosas”, enfim, toda uma parafernália instituída para

fins de consumo. Quando assistimos a filmes no âmbito privado estamos consumindo essas

mercadorias e dentro delas compramos a ideologia que a impregna, que por sua vez está

vinculada ao círculo vicioso da reprodução do sistema capitalista. Quando esse consumo

perpassa o âmbito escolar, a compra do produto continua acontecendo. No entanto, esse

consumo, além da compra da ideologia dominante há o reforço dessa dominação através do

professor e da estrutura escolar. Correndo o risco de colocar no professor a

responsabilidade de “introjetar” no educando, ou continuar o trajeto dessa hegemonia

capitalista, há que se considerar que ele tem boa parcela de contribuição nesse processo.

Ele pressupõe a finalização, ele está estreitamente ligado ao público com quem se trabalha,

ou seja, os educandos. E se isso acontece possivelmente ele reitera a ideologia,

principalmente se não teve contato formativo relacionado com a “alfabetização estética”. O

filme como outras linguagens do teatro, por exemplo, se constituem como um adendo a

mais, uma justificativa insignificante para permear, preencher o “tempo vazio”, que reitera

o tempo vazio de fato, pois se essa formação não compreende uma preocupação constante

em formar educandos conscientes de suas atuações presentes e futuras, esta não se constitui

numa educação que corresponda as necessidades do desenvolvimento pleno do educando.

Como o autor Adorno definiu no texto Tempo Livre de que este nada mais é do que a

continuidade do tempo em que a pessoa dedica ao trabalho, um não se desvincula do outro.

O tempo livre não é livre ele é preenchido através do consumismo, pois a falsa liberdade

precisa de produtos para preencher o espaço que deixou de existir no trabalho, o ser

humano foi podado na sua criatividade.

A linguagem visual é apenas uma parte do processo de conscientização,

evidentemente não podemos colocar nesta toda a carga de responsabilidade para essa

41

formação, mas pensando que o visual é reincidente, acontece a todo o momento. A

imagem é reincidente, ela é insistente, ela encanta, envolve, suprime as dores, evoca

ilusões, dá continuidade ao processo de dominação. No entanto, quando desdobrada desta

maneira claro que diz respeito à imagem propagada pela produção industrial de larga

escala, não com o objetivo de fazer ver o que realmente existe de contradição de cada

realidade falada colocada em forma de imagem, apenas com a pretensão de mercantilizar a

produção, vender uma imagem que reitera o consumo, a identificação com o “belo” que,

por sua vez também é construído também pela indústria. Não podemos desconsiderar

produções que levam a construção de uma consciência crítica. Como trabalha Maria Rita

Kehl quanto à imagem e sua produção, levando em conta a dimensão que esta possui na

vida humana:

(...) Da indústria cultural à sociedade do espetáculo, o que houve foi um

extraordinário aperfeiçoamento técnico dos meios de se traduzir a vida em

imagem, até que fosse possível abarcar toda a extensão da vida social. (...) (Kehl,

2004, pg. 44)

Se na vida social a imagem e o que esta quer representar têm proporções

gigantescas em todas as ações, podemos considerar que não estamos livres dessa condição,

ou seja, temos influência direta ou indiretamente dessa manipulação propagada pela

indústria, pois não vivemos fora dessa realidade. Não é uma novidade esse fato, no entanto,

da mesma forma que somos influenciados por ela não temos consciência dessa influência,

não percebemos quando as ideias ou ações estão permeadas pela ditadura do capital ou,

quando conseguimos essa atitude, do questionamento, ainda assim estamos à mercê dessa

influência.

Se os meios de comunicação estão aperfeiçoados a ponto de “entrar em nossas

vidas” deliberadamente, pressupõe-se que não temos escolha. Encontrar uma forma contra

hegemônica de luta e competente ao mesmo tempo (competente no sentido de “convencer”

do contrário propagado e para isso teria que ser excepcionalmente bom), requer dos

interessados na questão aprofundamento dos meios já existentes para contrapor e serem

bem firmes no que diz respeito à defesa política, firmes também nas práticas que realizam

cotidianamente, não apenas na simbologia dos ideais.

42

Existem ações dessa natureza que compõe essa contra hegemonia. Um exemplo que

podemos citar é o filme “Quanto vale ou é por quilo”, que por sua vez se trabalhado de

forma alienada não difere dos outros que são produções padronizadas.

Por mais que existam produções anti-sistêmicas, não há veículos apropriados, ou

seja, os meios de produção não estão dispostos para essa classe (trabalhadora) efetivarem

de fato o que produziram para fazerem pensar aqueles que estão mais afundados no

sistema, sem condição de questionamentos. Seria necessário que estes meios fossem

tomados como forma de também caracterizar a luta contrária. Também seria uma forma de

contradizer o que é produzido na medida em que esta fosse aproveitada para o

questionamento cauteloso e sistemático, como por exemplo, a produção de filmes

hollywoodianos em que os roteiros sempre terminam com a morte ou com soluções

mágicas. Mas para tal desempenho, seria necessário que as pessoas que os questionassem

fossem adequadamente alfabetizadas esteticamente, o que sabemos não aconteceu e nem

acontece com frequência, pois não é do interesse da classe dominante.

O tempo de agora como trabalha Benjamin em suas Teses Sobre o Conceito de

História, dá um novo sentido para o entendimento do que significa realizar algo com

significado, apreender o que importa nas vivências desse mundo tão bárbaro, dar um

significado novo a cada sequência vivida e que somente é significativa no modo coletivo

como este se processa. O tempo do relógio iniciado com o progresso, sempre permeado por

interesses monetários atinge todos os seres humanos sem distinção. O tempo monitorado.

A história dos vencidos não se apresenta para a compreensão de todos, somente para

aqueles que fizerem do tempo vivenciado um tempo significativo que não se cronometra.

O monitoramento do tempo está relacionado também com o tempo de que

dispomos para o entretenimento que por sua vez está relacionado com o trabalho. A

liberdade de escolha passa pelas escolhas que estão previamente determinadas. O trabalho

considerado como mercadoria, venda a quem possui os instrumentos de realização desta,

não pode ser mais visto como trabalho que dignifica e qualifica a vida.

Na imagem está o que podemos chamar de aparência, apenas observamos o que a

princípio está exposto, sem conexões com o que constrói aquela imagem de fato, ou seja, o

que está por trás daquela aparência inicial, o sujeito que se esconde, os sentimentos, os

pensamentos, as defesas. Não se reconhecem a princípio as contradições, se relativiza o

entendimento do fato, do conteúdo proposto na obra que referencia um tempo histórico

contado apenas pela autoria dos vencedores, deixando as margens aqueles que lutaram, até

mesmo pela conquista dos vencidos. Brecht já dizia em seu poema “Histórias de um

43

homem que lê” chamava atenção para o fato de todas as lutas, (mesmo aquelas contrárias

ao que pretendiam como luta, fazendo referência agora aos despojados dos bens

necessários), construções e outras edificações humanas alusivas apenas a uma pessoa como

se esta fosse responsável por todos os atos da conquista: a história é contada a partir da

visão que o conquistador traz, como se sozinho tivesse realizado todos os empenhos para

essas conquistas. É necessário que concentremos a capacidade de entendimento e pesquisa

naquilo ou naqueles que historicamente tiveram seu posicionamento negado, suas lutas não

reconhecidas pela história oficial.

O formato que os produtos apresentam tem intenção de ressaltar aspectos que

levem ao consumo, a sedução, por exemplo: os vidros dos perfumes, cosméticos, garrafas

de água ou refrigerante, entre outros. O que prevalece é o impacto que a economia tem

sobre todas as dimensões da vida humana. Nas sociedades pré-capitalistas: sociedades em

que a divisão do que existia era de maneira igualitária, sociedades agrárias, a estética era

incorporada na vida social de maneira estreita, ou seja, a política era estética, a religião era

estética, a estética perpassava todos os setores dessas sociedades e tinha significado, o que

não se vê na sociedade hoje.

Vender o produto do trabalho não significa mais ser este a única venda. O que cada

sujeito tem como mercadoria, mesmo não representando uma mercadoria, como, por

exemplo, o próprio corpo, que se transformou numa mercadoria com várias opções de

escolha. O prazer fácil, o corpo perfeito, os produtos de beleza a disposição para qualquer

finalidade, as marcas que permeiam todos os lados, executando na vida a marcha fúnebre

do que é deixar se envolver por essa gigantesca parafernália que é o conjunto das

propagandas estimulando a compra e venda a qualquer custo e para o “benefício” daquele

que consome. A infelicidade de não ter para consumir passa pela infelicidade do consumo.

O prazer efêmero atrai como atrai aos peixes uma isca bem colocada no anzol. O prazer de

consumir mesmo que instantaneamente preenche a vida vazia de significados, no entanto

esse preenchimento é apenas por instantes voltando ao seu estado original de insatisfação e

desejo de consumos posteriores. A felicidade se tornou efêmera, todos podem ser trocados

o tempo todo por outros e outras sem distinção de algum valor. Até mesmo os valores

presentes na vida das pessoas hoje também foram incutidos pela influência exercida pelo

modo de organização da sociedade capitalista. Nós que estamos na condição de

marginalizados do processo de atuação histórica na tomada de decisões, acabamos por

tomar esses mesmos valores como nossos.

44

Desde a época em que deu início a colonização de nosso país somos levados a

acreditar que somos seres elaborados apenas para a satisfação das alegorias dos que vem de

outros lugares. Ou melhor, somos impulsionados a crer que representamos no sentido

literal do termo essas alegorias. Apenas viver na fantasia, na ilusão do que poderia ser é

matéria principal para os “degustadores” que estão de guarda, dispostos a incluir qualquer

negociação para manter essa ideia.

A escola tem esse papel: o de convencer o educando de que este precisa estudar

para vencer na vida, indiretamente esses termos ainda são empregados. “É necessário

estudar, é necessário se esforçar”. Mas ao certo não sabem qual é o sentido real do que

estão ouvindo e não sabem exatamente em que momento aproveitarão o que estão

estudando ou escutando. As palavras soam soltas e sem alcance real para esses educandos

que possuem um mínimo de discernimento de que a escola não resolverá seus problemas

sociais, de família, de moradia, de todas as situações que lhes forem apresentadas. O

fetiche da mercadoria está às voltas de todas as relações que se estabelecem.

A televisão estabelece uma relação de domínio direto para quem compreende e

indireto para quem não se compreende dentro desse processo de domínio. Não podemos

desconsiderar o fato de que as pessoas como um todo estão impregnadas desse domínio

supondo que mesmo sem a ligação direta entre o “aparelho” e a ideologia que este

dissemina através das imagens, que soam como realizações concretas, reais, e que

“entram” na vida de cada telespectador como se os acontecimentos fossem a própria vida

de quem assiste. As pessoas se colocam no lugar de cada personagem e o fazem como

formato a ser seguido indiscutivelmente. O que acontece na novela, os nomes dos

personagens permeiam a vida corriqueira dos “personagens” da vida real. As pessoas se

preocupam com os próximos episódios como se estes fossem diferenciar o que vive

naquele momento, cegando o que mostra a realidade a sua volta. Esse envolvimento

também acontece quando os educandos registram em suas mentes o que se passa nos

filmes que assistem, como comentou uma das educandas de oitava série: “depende da

historia do filme as vezes me identifico com o personagem, coloco ele como se fosse na

minha vida”. Essa manifestação nos põe a refletir sobre o que se passa na mente daquele

que assiste. Colocando-se na posição de quem “deve” concordar ou discordar do que

assiste na ideia de que o conteúdo deva servir de uma maneira ou outra em sua vida. Se a

forma como o conteúdo se apresenta não é discutida com os educandos, o que permanece

incutido é o que aparece, o superficial, aquilo que está ideologicamente naturalizado. É

natural assistir cenas de violência e ainda torcer para que aquele que comete o ato

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violento continue ou então, que o mocinho apareça e também com um ato violento conclua

com a morte.

Capítulo 3 - Análises de algumas obras trabalhadas na escola Joceli Corrêa

3.1- Análise do filme Anjos e demônios

Filme trabalhado com segundo ano do ensino médio. O trabalho que foi pedido aos

educandos e que fizessem uma analise critica a respeito do filme e entregassem para

avaliação na disciplina de língua portuguesa.

O filme acima mistura aspectos religiosos com a época em que os iluminados foram

massacrados por suas supostas descrenças na religião. Dialoga entre o que a ciência

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produziu e o que a igreja católica defendeu como prioritário.

No decorrer do filme o sumiço de quatro candidatos ao papado preocupa os

religiosos e, para isso, foi contratado um professor universitário e uma cientista para

descobrir as pistas que o sequestrador deixa e que estão de acordo com o que diz na

história no tempo em que se formou um grupo denominado de Iluminati.

O filme Anjos e demônios está estreitamente ligado a termos religiosos e seus

significados, como exemplo, a escolha do papa. Todo o roteiro dá voltas em torno disso,

mencionando fatos históricos que dizem respeito aos iluministas.

O que aparece com maior frequência durante todo o episódio está ligado a ação em

que os personagens estão envolvidos. Aqueles que assistem ficam na expectativa do

próximo passo, o que irá acontecer. As movimentações que estes realizam dão a impressão

de os expectadores estarem próximos ao que irá acontecer em seguida, como se tivessem o

poder de decisão ou esperando que aquele que está na imagem resolva os fatos a tempo.

Essa percepção acontecia muito quando os personagens do professor e da cientista

tentavam salvar os candidatos a bispo: sempre que chegavam ao local marcado já era tarde,

no entanto, no último candidato como por milagre o salvamento chegou a tempo.

As cenas focalizam sempre o indivíduo, dando a entender que cada um

separadamente é responsável por um contexto maior, ou seja, algumas decisões como na

cena de violar o túmulo do papa restrito a decisão de fazê-lo somente por uma pessoa. Era

uma questão proibida, mas o fizeram mesmo assim. O foco é individual e cada indivíduo é

responsável por uma imensidade de acontecimentos, ou seja, dá a entender que não são

necessárias várias pessoas para resolver ou decidir um problema ou tomar algumas

iniciativas. Esse fato é costumeiramente observado nos demais filmes que seguem o

modelo americano de montagem, o contexto todo não é mostrado, as movimentações

heróicas de ação a todo tempo em que cientistas e professores se transformam em

“salvadores” em determinadas situações e dando a entender também que depende somente

destes para que o mundo se salve. A ação está a todo o momento presente, a cada procura

dos personagens pelos supostos candidatos ao papado. Esta ação está estreitamente ligada à

decepção que se manifesta a cada desencontro, a cada falha do professor e da cientista.

Para aqueles que defendem a igreja, este filme representa uma afronta, pois de uma

maneira questiona aquilo que a igreja propõe. Mesmo que a cientista e o professor fossem

“contratados” para resolver o mistério dos seqüestros e garantir que as vidas dos cardeais

fosse preservada, os dois não são devotos da religiosidade em questão e os procedimentos

adotados por eles não está vinculado ao que prega a religião.

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Como toda a imagem representada, os filmes tem o poder de se manifestarem

diretamente para aquele que está assistindo. O que se passa no filme é transportado em

certa medida para o expectador como se este pudesse vivenciar de fato os acontecimentos.

Sendo assim, no filme Anjos e Demônios, as ações que se sucedem fazem com que a

torcida, a emoção esteja ali, naquele espaço, o corpo da pessoa participa dos movimentos

como fazendo parte da própria ação.

3.2 Análise do filme Desafiando Gigantes

O filme Desafiando Gigantes conta a historia de um fracassado treinador de futebol

americano. Na historia mostra que há seis anos não consegue um título para a escola em

que treina. Além disso, sua vida particular tem problemas, sua mulher não consegue

engravidar, os utensílios domésticos estão precários, a casa tem problemas, enfim, sua vida

é somente desgraça.

Depois de várias quedas, o treinador recebe a visita de um reverendo que cita uma

mensagem bíblica sobre porta aberta.

Desde então, recomeça o treinamento com os alunos de forma que compreendam

que somente por Deus conseguirão treinar e evoluir para a vitória, que devem se submeter

as vontades divinas, que mesmo perdendo deverão agradecer.

O treinador coloca em sua vida também o mesmo método: tudo depende da vontade

de Deus. Até mesmo quando a mulher engravida, foi por obra divina.

A ênfase que dá as obras divinas é diagnosticada como que em Deus tudo temos,

tudo podemos. Ele coloca como a resolução da vida de cada um, e que depende de cada um

vencer por intermédio dele.

Não aparece que a sociedade tem seus problemas e que todas as pessoas precisam

através de suas ações conjuntas encontrarem meios para se organizar e lutar. Não se

poderia esperar isso de um filme produzido nos moldes americanizados.

A emoção do treinador é demonstrada a cada momento. Ele chora quando vê um

grupo de estudantes rezando, chora quando ganha um carro de presente de um dos pais de

seus alunos, chora quando a mulher engravida, chora quando vence os jogos. Quem assiste,

provavelmente chorará junto com o treinador como se o que vive fosse extensão do que

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vivemos aqui fora. Mesmo que os sonhos passados por ele sejam impossíveis de serem

realizados nessa sociedade em que vivemos, a mensagem deixada pelo filme é de que tudo

é possível se Deus estiver presente. Não se quer com isso afrontar pessoas que acreditam

no poder divino, questionar essa crença não é a intenção. No entanto, quando o filme é

passado para educandos dos anos finais do ensino fundamental e ensino médio depois de

uma semana inteira de trabalhos relacionados com a vida e obra de Paulo Freire, para

finalização dessa semana, é algo que precisamos considerar como questionável. Educandos

trabalharam nessa pesquisa, do que Paulo Freire representou e representa para a educação,

não somente a brasileira, fizeram várias apresentações a respeito dessa pesquisa e para

finalizar um filme com conteúdo religioso e forma de que para vencer é preciso lutar e

deixar nas mãos de Deus.

Segundo as observações de uma educanda estagiária presente no dia da conclusão

das atividades da semana Paulo Freire, é de que a apresentação do filme “Desafiando

gigantes” não estava de acordo com o que foi elaborado e tratado durante a semana e nem

anteriormente a esta, ou seja, pesquisa sobre obras, pensamento, vida do pedagogo Paulo

Freire, descaracterizando as discussões anteriores. As turmas dos anos finais do ensino

fundamental ficaram responsáveis por elaborarem diferentes materiais a respeito de Paulo

Freire para apresentações durante a semana do livro, entre esses materiais estava à

elaboração de poesias, paródia, pesquisa sobre a vida desse autor, sobre seu método

pedagógico. As apresentações foram realizadas pelas turmas e, no momento da conclusão

passado o filme. Na finalização do filme as pessoas responsáveis fizeram menção a luta

que este passava, que deveriam acreditar no que queriam alcançar que com fé as coisas

aconteceriam. No momento da visualização do filme, também segundo relatos da

estagiária, alguns educandos se emocionaram, no entanto, essa emoção teve de ser

segurada, não existiu um momento de comentar sobre o filme. A maioria dos educadores

ficaram entusiasmados com o que o filme transmitiu, até mesmo argumentando que este

era um material a ser trabalhado com todos os educadores. O filme transmite uma espécie

de fé no indivíduo que este com força de vontade poderá conseguir tudo o que deseja na

vida, basta ser bom. Dá a entender que não precisa necessariamente dos outros e que se não

lutar não terá espaço e só depende desta luta para vencer.

Segundo uma das educadoras que contribuiu na organização da semana Paulo

Freire, esse filme não foi trabalhado com os educandos, a intenção era que ficasse a

mensagem para eles, quer dizer, não foi desenvolvido nenhum conteúdo específico, nem

discussão sobre essa obra. Esta foi apenas utilizada para ilustrar a finalização de um

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momento, mas que não tinha ligação com o que foi discutido durante a semana (pesquisas

referentes às obras e vida de Paulo Freire foram apenas lidas).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com o que foi pesquisado na Escola Estadual de Ensino Médio Joceli

Corrêa em relação à utilização do audiovisual pelos educadores em suas aulas ficou

claro que estes o fazem como um recurso apenas e não como uma linguagem

diferenciada ou, que pode ser trabalhada como tal, com a especificidade que possui.

Conforme diagnosticado nas entrevistas, nas observações, nas conversas

informais, os educadores costumeiramente têm nesse recurso um apoio importante para

as aulas, segundo o pronunciamento da maioria deles. Sempre levando em conta nesses

pronunciamentos de que com os filmes eram trabalhados os conteúdos de cada

disciplina.

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Esse fato não foi comprovado. Em várias aulas como de língua portuguesa,

espanhol, geografia, espanhol, os filmes não tinham a ver com o conteúdo que a

disciplina desenvolvia. Isto foi principalmente observado quando os educadores tinham

formação em outro município (como no caso das Lições do Rio Grande), deixavam

filmes para os educandos assistirem e depois fazerem um relatório deles, ou, nas

cobranças dos próprios educadores durante suas aulas quanto ao que observar sobre os

filmes: o título, quais os temas tratados para fazerem relatórios que por sua vez valeriam

nota.

Sempre que os filmes eram passados sem o educador presente a coordenação

pedagógica pedia que os educandos fizessem silêncio e prestassem atenção ao que

assistiam, pois seria cobrado depois. No entanto, como os educandos percebiam o que

estava acontecendo, o filme era como um suporte apenas para suprir a necessidade do

educador que não estava presente, a atenção deles não estava para o que assistiam.

Os fatos não são falados abertamente. Os educadores não se manifestaram sobre

em algum momento utilizarem esse recurso como ponte para outras finalidades,

tampouco, se o faziam com frequencia, apesar das observações dizerem o contrário.

A comprovação de que não estão habilitados para o trabalho com audiovisual

analisando as formas em foi produzido e o conteúdo trazido por ele pode ser um fato

verdadeiro, porém, não um fato que permeia todos os educadores, pois existem aqueles

que têm compreensão de que a cobrança e discussão sobre os filmes não acontece com a

relevância e compromisso que poderia ocorrer.

O que poderia ser realizado além do assistir os filmes (alienando quem assiste

em termos de consciência e alienando dos processos de produção) é a produção de

material com essa linguagem, observando o como se produz a forma que quer

representar, enfim, o que se quer com o trabalho realizado. A partir do momento em que

os educandos tivessem um objetivo consistente para realizar essa produção certamente

começariam enxergar com outros olhos o fazer de um filme, compreenderiam o trabalho

que permeia essa atividade, não apenas ficariam na condição de expectador passivo,

mas desenvolver a ação, participar do trabalho como um sujeito da obra.

No entanto, se não existir discussão e compreensão da forma com que boa parte

dos filmes é realizada esse trabalho de produção poderá ser transformado em mero

trabalho de reprodução. Nesse caso se faz necessário que todos os envolvidos no

ambiente escolar se proponham ao estudo sobre estética, a forma hegemônica de

produção (de boa parte dos filmes), a intenção com que se apresenta o conteúdo através

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dessa forma, em que os filmes sempre tem o “bem” e o “mal” definidos, dando a

entender que um salva o outro só trará problemas, ou que precisa ter um herói o que na

vida real não existe. É necessário que os educadores atentem para a observação e estudo

sobre as possibilidades que o audiovisual propõe como linguagem e não apenas o estudo

e discussão sobre conceitos relacionados com sua disciplina, ou até mesmo apenas

como mais um recurso disponível.

Este seria um papel importante a ser considerado pelo conjunto da escola, ou

seja, não é um trabalho individual e sim coletivo.

REFERÊNCIAS

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Janeiro: Zahar, 1985.

LOBO, Roberta.(Org.) Crítica da Imagem e educação: reflexões sobre a

contemporaneidade/ Organização de Roberta Lobo. – Rio de Janeiro: EPSJV, 2010

Crítica da Imagem e Educação Popular (Marília Campos e Roberta Lobo).

BUCCI, Eugênio, 1958-Videologias: Ensaios sobre televisão/ Eugênio Bucci, Maria

Rita Kehl. – São Paulo: Boitempo, 2004 (Estado de sítio)

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1987.

MST. O MST e a Pesquisa. Cadernos do ITERRA, Nº 14. Veranópolis, RS, 2007.

52

IASI, Mauro Luiz. Ensaios sobre consciência e emancipação. – 1. ed.- São

Paulo:Expressão Popular, 2007.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 9. ed. Editora Paz e

Terra, 2001.

ADORNO, Theodor. Tempo Livre. In Indústria Cultural e Sociedade. São Paulo:Paz e

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RAMOS, Conrado. Indústria Cultural, consumismo e a dinâmica das satisfações no

mundo administrado. In A indústria cultural hoje. São Paulo:Boitempo, 2008.

CANDIDO, Antonio. A educação pela noite & outros ensaios. São Paulo:Ática, 1989 p.

140-162: Literatura e Subdesenvolvimento.

BETTO, Frei. A arte de seduzir. Correio da Cidadania 08/03/2011.

http://www.freibetto.org. Acessado em 20/03/2011.

GUY, Debord. A sociedade do espetáculo. Tradução em português

WWW.terravista.pt/Ilhadomel/1540. Editorações, tradução do prefácio e versão para

ebook eBookBrasil.com, fonte originária de www.geocities.com/projetoperiferia, 2003.

Projeto Político Pedagógico da Escola de Ensino Médio Joceli Corrêa, Jóia, RS: 2006.

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ANEXOS

ARGUIÇÃO MIGUEL

É um tema pertinente e pouco discutido.É comum que a militância ache que o audiovisual por si só dá conta.Temos que dar retorno para a escola Jusceli Corrêa dos trabalhos realizados sobre a escola.A força do trabalho da Ingrid está na força dos depoimentos, mais do que nas análises. E da forma como Ingrid constriu a argumentação, eles ganham força e desmentem a argumentação pedagógica dos educadores. Os educandos tiveram papel central em sua pesquisa.Tinha expectativa na análise estética das obras.Mas só a análise que Ingrid faz do enredo confirma a hipótese dela.Exemplo da semana cultural na escola com filme de temática de auto-ajuda.Fiquei esperando a grande proposição no final, ainda que as duas principais conclusões ela faz ao final: necessidade do estudo formal e da capacitação dos esducadores.

Acho que o que pode ser melhorado é no sentido estético do texto, e não doproblema de ordem conceitual. No início há uma saraivada de opiniões, de indignação da autora, e o leitor fica meio perdido.Ingrid faz um paralelo entre Indústria Cultural e Educação.Há parágrafos com quatro ou cinco informações densas, e acabamos nos perdendo.

Não há necessidade de ser transparente em sua opinião logo de cara, mas isso é um problema de construção do texto.

Faltaram algumas referências que vc cita no texto.

Senti falta de uma mostra mais quantitativa da pesquisa, em termos de porcentagem.

Poderia dar continuidade como material paradidático, como potencializar o audiovisual na sala de aula.

Acho que a pesquisa cumpre o que propôs.

DEANE

Você escreve claramente, escreve conscientemente, seu trabalho não tem erro de estrutura de linguagem. Escreve com ênfase bastante grande.

Vc tenta dar uma visão de totalidade ao problema, vai para o particular, depois vai para o contexto mais geral de sociedade. A propriedade com que vc fala é tamanha, narrativa de poder muito grande, um grande mérito é vc ter se colocado no trabalho, não ter colocado o objeto como algo diferente daquilo que vc fazia e era.

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Se separasse a escola do processo histórico seria incorrer em fetichismo,a não separação é um ponto alto do trabalho.

Vc fala da questão da identidade, mas não fala dela como algo restrito a algo particular.

Vc demonstrou uma autonomia muito grande de análise. Poderia começar conceituando o que é audiovisual, mas você não faz isso, já entra na análise da questão. É uma estrutura incomum de trabalho.

Talvez pudesse contextualizar maior o problema em termos de Brasil, uma ligação com o processo da educação nacional. E como que acontecia com o Brasil de fato. Os dois filmes analisados são americanos.

Boa citação do Candido: saímos do analfabetismo para o audiovisual.

Leitura de trecho do resumo. Não questionando o que o filme TRABALHA. Questão da formação estética. Especificidade da formação estética, como um direito, como algo que deve ter um lugar na formação do sujeito.

A matéria possui uma forma de ser matéria, no sentido materialista.

O jeito de pensarmos a arte não é qualquer forma de pensar outro processo. A arte inverte a arte dos fenômenos e o faz para falar mais profundamente dos fenômenos.

Você refletiu sobre o lugar da arte na vida humana e na escola. Não pode ser simplesmente ornamento, apêndice, ornamento, etc.

Assisti Anjos e Demônios, e dormi no filme, a ação não me envolveu.

Por que não trabalhar também uma obra que aparentemente esteja mais elaborada, mais erudita, mais separada do contexto imediato. Porque o elemento estético, em si, é o que é negado.

O contraponto aprofundaria bem.

É interessante acharmos história e política onde aparentemente parece que não há.

Por si só o trabalho demonstra que nós mesmos nos privamos do acesso.

Sinto como um diálogo que conseguiu ter fruto. Essa discussão não tem acumulo nem em nível nacional. E se não chegou a aprofundar isso é porque está no processo de apropriação.

Ocorreu um corte na análise da especificidade da linguagem audiovisual.

Ingrid

Medo de usar determinados conceitos e acabar com eles.Criticando o trabalho que acontece lá eu também me critico,porque também já utilizei os filmes de modo aleatório.

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Cida: Desde o início eu incentivei para que fizesse o trabalho sobre esse tea pela pertinência dele. Quero a partir desse trabalho trabalhar com as proposições colocadas.

Godóis: O problema da pesquisa é local e ao mesmo tempo é universal.Há uma ausência de intenção na questão estética por parte dos formadores.

Leila: Depoimento sobre o filme que o Miguel falou que foi passado na escola, nós estávamos estagiando na escola, nós percebemos que a semana aconteceu de modo problemático, era semana cultural Paulo Freire. Avaliamos que no ano seguinte nós poderíamos contribuir.

Lia: Necessidade de trabalhos que discutam o fazer pedagógico.

Roseli: É interessante que a turma inclua em sua reflexão sobre o processo a relação da turma com os filmes.Nessa linha de que não se trata da dimensão explícita, da intencionalidade.

Miguel: No capítulo 2, questão da quantidade de programas que vão aparelhando a escola. Método Sim eu Posso, não fica apenas o esquema de ligar o play e deixar que a telenovela alfabetiza.

Deane: A história da arte na escola é a história da instrumentalização da arte. A arte é política porque ela é estética, e não o contrário.Corremos muito o risco de romantizar a arte.

Rafael

Desproporção entre demanda do problema e espaço que o audiovisual tem no curso: Talvez a insegurança de Ingrid em enfrentar a análise estética do audiovisual seja em parte decorrente do pouco espaço que esse tipo de estudo ocupa no curso.

Havia combinação para análise de Olga. Recepção do movimento sobre o filme.

Contextualização do solo local: MEC USAID, TV Globo, etc.