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À Procura De Uma Noiva (Search For A Wife) Barbara Cartland Série Nº 382 Um Homem comum, culto e carinhoso... Era tudo que Vita desejava ! 1815, Inglaterra Ivor, marquês de Milverton, precisava de uma esposa, mas que não soubesse que era rico e nobre. Vestiu-se então como um camponês e começou a percorrer pequenas aldeias distante de Londres. O destino quis que ele encontrasse Vita, uma moça simples, porém descendente de nobres, e se apaixonasse

Barbara cartland à procura de uma noiva

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À Procura De Uma Noiva(Search For A Wife)

Barbara CartlandSérie Nº 382

Um Homem comum, culto e carinhoso... Era tudo que Vita desejava !

1815, Inglaterra

Ivor, marquês de Milverton, precisava de uma esposa, mas que não soubesse que era rico e nobre. Vestiu-se então como um camponês e começou a percorrer pequenas aldeias distante de Londres. O destino quis que ele encontrasse Vita, uma moça simples, porém descendente de nobres, e se apaixonasse perdidamente por ela. O amor foi recíproco e o pedido de casamento, aceito. Ivor, no entanto, sentiu-se temeroso de revelar sua verdadeira identidade a Vita, afinal, tudo o que ela menos desejava era unir-se a um nobre !

Digitalização : Ale M.Revisão : KATIA

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Título original: Search for a wifeCopyright: © 1995 by Barbara Cartland

Tradução: Carmita Andrade

EDITORA NOVA CULTURALuma divisão do Círculo do Livro Ltda

Alameda Ministro Rocha Azevedo, 346 - 2Q andarCEP 01410-901 - São Paulo - SP - Brasil

Copyright para língua portuguesa: 1996

CIRCULO DO LIVRO LTDA.

Fotocomposição: Círculo de LivroImpressão e acabamento: Gráfica Círculo

NOTA DA AUTORA

White's Club, fundado em 1764, teve uma base sólida formada por homens de caráter, cultos e responsáveis.O

Entre esses homens estava o primeiro duque de Leeds, o primeiro conde de Spencer, o primeiro conde de Macartney, o primeiro conde de Lucan, lorde Charlemont, lorde Palmerston e Charles James Fox.

Não era fácil ser convidado para fazer parte do White's. Os membros do Clube Literário, no início, jantavam lá cada duas semanas; mais tarde uma vez por semana, e depois das sessões do Parlamento.

Quando fundado, o clube funcionava em Gerrard Street. Depois mudou-se para Saville Street, mais tarde para Dover Street e finalmente para St. James Street.

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Havia dez regras, como mencionei nesta história, que tinham de ser firmemente obedecidas.

Durante a Regência os jogos de azar eram muito populares. Foi no White's Club que George Brummell, o Beau, se tornou famoso, a ponto de ser transformado quase numa lenda.

George Brummell cursou Eton onde adquiriu a reputação de ser bom no críquete, bom no remo, e acima de tudo um bom rapaz.

Fez muitos amigos e era conhecido como o homem mais bem vestido de Londres, o "Rei dos Dândis".

A briga de George Brummell com o Príncipe Regente não o arruinou socialmente.

O Regente tinha muitos inimigos, mais do que Brummell, e este era por longe o mais simpático dos dois.

O que finalmente destruiu George Brummell foi o jogo. Suas altas dívidas o fizeram fugir do país e obrigaram-no a morar era Calais.

Quem substituiu Brummell no mundo social de Londres foi lorde Alvanly, rapaz bem educado que herdara do pai enorme fortuna.

CAPÍTULO I

1815

marquês de Milverton desceu de sua elegante carruagem e entrou no White's Club, um lugar onde ele tinha certeza de encontrar

amigos. E, no momento, precisava terrivelmente de amigos.OO White's Club, localizado em St. James Street era o clube mais

importante de Londres, com exigências rigorosas para se tornar sócio.A primeira condição consistia em ser votado; a segunda, em que

ninguém poderia ser proposto sem que houvesse pelo menos doze sócios presentes. Havia sete outras exigências, seguidas pela surpreendente décima condição Esta dizia que ninguém seria proposto ou votado se não ocupasse ou tivesse ocupado uma cadeira no Parlamento.

E qualquer sócio rejeitado esforçava-se por manter o caso em segredo, pois sentia vergonha por não poder brilhar na elite de Londres. Isso durante o reinado do Príncipe Regente.

Entre as personalidades da Regência e membros do White's estava o próprio Regente, o mais importante de todos os sócios.

Seus dois irmãos, o duque de Cambridge e o de York, notáveis membros do Parlamento, eram também sócios.

O marquês de Milverton pertencia ao clube desde que fora proposto pelo pai, ao atingir a maioridade. Para ele, como para a maior parte dos sócios, o clube funcionava tal qual um segundo lar que freqüentavam duas ou três vezes ao dia, quando em Londres.

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Tendo cumprimentado o porteiro que respondera comum amável "Bom dia, milorde", o marquês entrou na sala dos fumantes. Dois de seus amigos já se encontravam lá. Outros apareceriam mais tarde.

Harry, o conde de Landock, levantou-se para cumprimentá-lo.— Achei que você viria esta manhã, Ivor — ele disse. — Estou ansioso

para saber se seu cavalo vai correr amanhã em Epsom.— É claro que vai — o marquês respondeu. Sentou-se em seguida

perto do conde de Landock que saboreava uma taça de champanhe.— Está começando cedo com a bebida hoje, Harry — o marquês

comentou.— Preciso depois do que passei ontem à noite — Harry explicou.Os outros amigos que chegaram mais tarde sentaram-se ao lado dele e

perguntaram:— O que houve, afinal?— Eu lhes conto daqui a pouco. No momento preciso me acalmar e

nada melhor para isso que uma taça de champanhe.— Concordo com você — o marquês disse e fez sinal ao garçom

que, sabendo da preferência do grupo, trouxe uma garrafa do melhor champanhe. E começou a servir.

Enquanto fazia isso, dois jovens muito elegantes juntaram-se ao grupo.— Achamos falta em você durante sua viagem, Ivor — um deles falou

ao marquês. — Estamos curiosos para que nos conte o que houve.— Imaginei que estivessem — o marquês respondeu. E contou aos

amigos que, antes de partir para a casa de campo de sua família, o pai já lhe havia arranjado uma linda mulher para esposa. Era, soube logo, uma herdeira rica.

O duque seu pai achava que não poderia haver esposa melhor para o filho.

— Como é ela? — o conde de Landock perguntou quando o garçom se foi, após ter enchido as taças.

— Horrenda! — o marquês respondeu. Os amigos o fitaram atônitos.— Horrenda? — um dos homens repetiu. — Mas disseram a você que

era linda charmosa e imensamente rica.— Ser rica é sua única qualidade — o marquês declarou. — Mas é feia,

pouco inteligente e não posso imaginar nada pior do que me ver casado com essa bruxa.

— E o que você fez? — o conde perguntou.— Fugi assim que pude! Decidi não voltar mais à casa de minha família

enquanto não tivesse a promessa deque não seria forçado a me casar. Francamente, não posso mais agüentar tanta pressão.

O marquês falava com tal segurança que os amigos o encararam surpreendidos. E um deles perguntou:

— Acha que seus parentes vão ouvir você? Após uma pausa, o marquês respondeu:— Duvido. Mas não tenho intenção de me casar simplesmente porque

meu pai e o resto de meus detestáveis parentes resolveram escolher uma mulher para mim. Se um dia me decidir, e no momento duvido muito que o farei, será com alguém que realmente ame.

— É exatamente o que todos nós desejamos — o conde de Landock confirmou. — Mas sabe tão bem quanto eu que, na nossa condição, seremos atormentados continuamente até nos casarmos.

— É verdade — lorde Dromont concordou.

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Este era um rapaz atraente, de vinte e seis anos de idade, e muito rico. Possuía maravilhoso castelo na Escócia. E, graças à sua extrema habilidade, ainda não fora levado ao altar por seus parentes.

— Se eu ouvir mais uma vez alguém de minha família dizer "você precisa providenciar um “herdeiro” juro que fugirei de Londres e darei a volta ao mundo! — um jovem lorde exclamou.

— Se acha que está sofrendo nas mãos de seus familiares, precisa conhecer os meus — outro jovem queixou-se. — Falam às vezes tanto de uma determinada moça com quem simpatizam que fico cansado só de ouvir o nome dela. Isso antes de vê-la. Então, quando a conheço, constato que é bem diferente do que diziam.

Explodiu uma gargalhada geral. E outro homem disse:— Vocês deviam ver o horror que me foi apresentado há uma semana.

Era gorda, incapaz de manter uma conversa sobre qualquer assunto exceto sobre si mesma. Meu pai achava que eu seria feliz porque a candidata tinha um dote tão grande quanto ela.

— Essa, naturalmente, foi a atração — outro rapaz comentou com sarcasmo.

— Então você precisa fazer como eu — o marquês interveio —, precisa recusar voltar a casa se houver uma mulher esperando-o à sua chegada.

O conde riu e acrescentou:— Isso, naturalmente, depende da mulher, Ivor. Muitas são atraentes.

É claro que não me refiro às meninas que acabaram de sair da escola, às famosas debutantes.

— É verdade — o marquês concordou. — Como poderemos saber se irão se tornar atraentes, como é de se desejar de uma companheira para o resto de nossas vidas?

— Mas, francamente, considero tolice das grandes gastar tempo com debutantes. Seremos logo acusados de arruinar-lhes a reputação e o único meio de escaparmos da fúria dos pais será oferecendo-lhes uma aliança de casamento.

— Pura verdade — outro rapaz observou. — Concordamos com Ivor. É interessante ficar longe da casa de nossos pais até que eles parem de suplicar que casemos com alguma idiota da qual nos cansaríamos antes de sair da igreja.

Houve uma pausa até que um dos homens opinou:— O problema é que eu gosto de visitar meus pais. Adoro minha mãe,

e meu pai tem os melhores cavalos da Inglaterra.— E como não pode se casar com um dos cavalos tem de se contentar

com a moça que ele escolher para você— alguém comentou.Todos riram, mas havia uma expressão preocupada na face de cada

um que revelou ao marquês claramente que sofriam com o problema do casamento tanto quanto ele.

Esses jovens tinham sido contemporâneos do marquês na escola secundária, portanto estavam mais ou menos com a mesma idade. Alguns vinte e cinco anos, outro vinte e seis e outros ainda quase vinte e sete.

Muitos dos amigos do marquês já tinham se casado e moravam longe da cidade. Iam a Londres só em ocasiões especiais. E quando o faziam, visitavam o White's para saber das novidades.

Mas o marquês achava que esses seus amigos se tornavam cada vez menos interessantes e menos divertidos do que tinham sido antes do casamento.

O garçom começou a servir mais champanhe.

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— Vou beber a saúde dos solteiros — o marquês disse, erguendo a taça — e espero que permaneçamos solteiros por, no mínimo, outros três ou quatro anos.

— Eu beberei com você pela mesma causa — o conde de Landock ergueu sua taça.

E lorde Dromont acrescentou:— É bom nos sentirmos otimistas acerca desse assunto. Mas não

podemos esquecer de que, mais cedo ou mais tarde, teremos de nos casar, querendo ou não. Isso simplesmente porque nossos títulos e as posses que estiveram na família por gerações têm de ser preservados.

Houve um silêncio geral. Quando todos os homens viraram a cabeça para encará-lo, lorde Dromont continuou:

— Como Ivor, sou filho único. Embora deteste o comportamento de meus parentes, sei que eles têm razão. Preciso ter um filho, talvez dois ou três, para garantir a transmissão da minha herança.

Os que o escutavam sabiam que seu título datava do reinado de Charles II, título esse que fora outorgado aos antepassados após a batalha de Agincourt.

Por segundos todos ficaram sérios e preocupados. E se capacitaram de que, embora se revoltassem contra os fatos, tinham uma responsabilidade inegável sobre suas costas.

— Mas por que — um dos rapazes perguntou — as moças atuais são tão sem graça? Todos nós já nos apaixonamos um dia por mulheres atraentes cuja identidade não pode ser revelada neste clube porque são casadas. Mas por que, Santo Deus, por que as mulheres da nova geração hão de ser tão pouco atraentes?

Ouvindo-o, o marquês convenceu-se de que o amigo dizia algo em que ele muitas vezes pensara. Mas ainda não encontrara uma resposta à sua indagação.

Debutantes desfilavam diante dele como cavalos numa feira de primavera. Eram não apenas pouco interessantes como cansativas. Quando dançavam pareciam incapazes de manter uma conversa agradável. Gaguejavam, coravam, e não davam respostas inteligentes às perguntas que ele fazia.

Os pais podiam insistir que se transformariam em mulheres atraentes. Mas como poderia ele ter certeza disso? Muito facilmente ficaria preso a uma vida entediante, sem remédio.

— Sei exatamente no que você está pensando, Ivor — Harry, o conde de Landock observou. — Muitas vezes pensei no mesmo. Mas com certeza deve haver mulheres em algum lugar do mundo que também sejam atraentes. E nos tentarão como as lindas criaturas que apenas esperam que os maridos estejam ocupados para nos dar o que esperamos delas.

—Tem razão, Harry — o marquês concordou. — Deve mesmo haver em algum lugar do mundo mulheres pelas quais poderemos nos apaixonar.

— É claro que há — lorde Dromont anuiu. — O problema é que aqui em Londres não as encontramos. Mas precisamos procurá-las em vez de esperar que caiam em nossos braços como frutas maduras.

— Por certo, Tony — o marquês respondeu. — Mas a questão é, onde devemos procurá-las?

— Em qualquer lugar exceto em Londres. A última mulher com quem um de nós deseja se casar é uma das moças cuja única arte é dançar nos salões de Carlton House.

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— Concordo — outro rapaz entrou na conversa. —Minha irmã, por exemplo, casou-se com um homem que vivia numa pequena cidade da Inglaterra e nunca vi casal mais feliz em toda minha vida.

Outro comentou:— Você está certo. Conheci uma moça no campo e pensei seriamente

em me casar com ela. Porém fui vagaroso, e meu melhor amigo passou na minha frente. Agora eles têm dois filhos e formam o casal mais satisfeito do mundo.

— O que você está dizendo, pelo visto —, Harry, o conde de Landock declarou —, é que estamos procurando uma esposa no lugar errado. Esperamos encontrar Afrodite, a deusa do amor, em Carlton House! Se ela estivesse lá, Sua Alteza Real sem dúvida já a teria conquistado antes de nós.

Ecoou uma gargalhada no ar e outro homem disse:— Harry tem razão, estamos procurando a mulher no lugar errado.

Não vamos encontrar uma esposa linda e inteligente, nos salões de Londres e certamente nem entre as prostitutas com quem gostamos de passar uma noite ou duas, não mais.

— Bem, então, onde você sugere que as procuremos? —lorde Dromont interrogou.

— Acho que a resposta está em qualquer lugar menos onde nos encontramos no momento — o marquês insistiu.

— Mas, naturalmente, se um homem na verdade pensa em ter um herdeiro, precisa se casar.

Ivor sabia que, como filho único, cabia a si providenciar esse herdeiro. Casas e enormes glebas de terras pertenceram aos Milverton por centenas de anos. Geração após geração gastara dinheiro em reformas, tornando-as cada vez mais valiosas do que o foram quando inicialmente anexadas ao patrimônio da família.

Tomou o resto do champanhe que sobrava em sua taça E o mesmo se passava com todos os herdeiros de títulos e propriedades. Contudo, apesar de haver mulheres atraentes na sociedade que freqüentavam o namoro nunca durava muito, por uma razão ou por outra. Mas, de qualquer maneira, precisavam encontrar uma esposa e formar um lar.

Por não saber mais o que falar o marquês ergueu a taça para chamar a atenção do garçom que se aproximou imediatamente, enchendo-a de novo.

Um senhor de idade, sentado a pequena distância, lia um jornal.O marquês viu-o e reconheceu-o imediatamente. Era o duque de

Sandelford, amigo de seu pai. Harry o conhecera desde menino.— Perdoe-me, Ivor — o duque disse —, por estar ouvindo a conversa

de vocês, que, aliás, achei muito interessante.— Eu é que peço que nos desculpe por termos perturbado Vossa

Graça — o marquês respondeu.— Não me perturbaram. Mas me admirei pela inesperada sagacidade

com que discutiam um assunto que surge em cada geração de famílias nobres, desde o início dos tempos.

— Espero que Vossa Graça tenha compreendido nossas dificuldades. — Ivor sorriu.

— Não apenas compreendi como também tive pena de vocês. Esse problema foi algo que me atormentou quando eu tinha exatamente a mesma idade.

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Os jovens o escutavam atentamente e o duque prosseguiu:— Resolvi-o enfim e tive muita sorte, pois me casei com uma mulher

que eu amava e que me amava. E tenho orgulho de dizer que ainda a amo. Como você deve saber Ivor, tive a felicidade de ter três filhos homens. Mas... um deles alistou-se no exército e morreu lutando. Outro não goza de boa saúde e nunca terá filhos. Eu dependia, portanto, do último para conseguir um herdeiro de meu título. E sinto-me muito feliz porque, depois de duas netas, agora ele me deu um neto.

— Parabéns, Excelência — o marquês cumprimentou-o.— Pode entender como estou contente, não, Ivor? Mas o que você

disse é verdade: encontrar uma mulher que o faça feliz para o resto da vida não é fácil. Eu, como já mencionei, tive muita sorte. Mas grande número de amigos meus sofrem anos de tristeza e desânimo só porque foram forçados a se casar sem amor.

Ele falava pausadamente, mas os rapazes continuavam ouvindo-o com atenção.

— O que quero dizer a vocês — o duque continuou — é que façam o que Ivor sugeriu e procurem uma mulher para se casar, mas uma mulher que amem; porém não as procurem nos salões de Londres, tampouco nas casas de prazer. E não porque vocês são importantes, mas porque são homens e elas mulheres.

— É o que todos nós desejamos! — Harry, o conde de Landock, exclamou.

— Entendo a ansiedade de vocês — o duque concordou. — E, para tornar o caso mais emocionante, prometo um prêmio ao que chegar aqui me dizendo que se apaixonou pela mulher ideal e que essa mulher aceitou o pedido de casamento ignorando quem era o pretendente, na escala social.

— Não sabendo quem somos?! — o marquês perguntou intrigado.—Isso mesmo — o duque respondeu. — Vão à procura dessa mulher

sem declinar seus títulos e sem demonstrar que não são homens comuns. E tragam a moça aqui para mim. Darei aos que a trouxerem um presente de mil libras que lhes permitirá começar uma vida de casados com o conforto a que estão habituados.

— Mil libras! — o conde exclamou. — É um presente de fato muito bom!

— Felizmente tenho condições de dá-lo. Não prejudicarei meus herdeiros, pois sempre investi dinheiro muito bem, usando o mesmo bom senso com que escolhi minha esposa. É o que peço que vocês façam que usem de bom senso. Em vez de ficarem falando e bebendo aqui no clube, tão cedo pela manhã, deviam fazer como os Cavaleiros do passado, ir à procura de aventuras. E garanto que a encontrarão.

— Vossa Graça é muito dadivoso — o marquês declarou. — Aceito a proposta. Mas ainda não disse o que teremos de pagar se perdermos.

O duque riu muito.— Se perderem, a resposta é fácil. Terão de se casar dentro de um ano

com a mulher escolhida por suas famílias. Depois disso só podem esperar que, no decorrer dos anos, ela se transforme numa atraente mulher casada, dessas de que vocês gostam tanto.

Os rapazes riram, pois se lembraram do que haviam comentado durante a conversa.

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— Naturalmente — o duque prosseguiu —, não há razão para qualquer um de vocês aceitarem meu desafio. Apenas peço-lhes que, se concordarem com ele, antes de iniciar a emocionante aventura, ponham embaixo de minha porta seu cartão de visita. Não haverá necessidade de nenhuma explicação. Somente deixem o nome e saberei que estão se candidatando ao maior prêmio que qualquer homem poderia ter na vida. E o prêmio a que me refiro não é apenas o dinheiro, mas o verdadeiro amor e afeto à mulher que amam. Agora desejo um bom dia a vocês, meus filhos, e boa "caçada".

O duque saiu da sala e o marquês correu atrás dele para acompanhá-lo à porta.

— Vossa Graça nos deu algo em que pensar — disse. — Acho impossível não aceitar sua oferta e começarei minha busca amanhã de manhã.

— Imaginei que acharia minha sugestão irrecusável, Ivor. E tenho quase certeza de que você e a maioria de seus amigos encontrarão o que procuram.

— Espero que Vossa Graça tenha razão. Mas trata-se sem dúvida de um desafio a que homem algum que se diz homem pode resistir.

— Foi o que pensei quando falei com vocês — o duque declarou. — E estou certo de que, se nada mais acontecer, ao menos isso dará a seus amigos um novo sentido devida, coisa que jamais poderiam adquirir no momento, aqui em Londres.

Enquanto ele falava, sua carruagem encostava a porta do clube. O duque entrou e inclinou-se para estender a mão ao marquês. Acenou depois.

Com expressão séria no olhar, o marquês voltou à sala dos fumantes. Seus amigos conversavam animadamente, atônitos que estavam com a oferta do duque. E se perguntavam por onde deveriam começar e como seria possível viajar sem um valete ou um cavalariço, condição indispensável para permanecer anônimo.

Quando o marquês se uniu a eles houve um silêncio geral. Mas logo o conde perguntou:

— Como pôde isso acontecer conosco tão inesperadamente, sem que tivéssemos a menor idéia de que o duque nos ouvia?

— Eu nem percebi que Sua Graça estava aqui — o marquês comentou. — Mas sem dúvida ele nos desafiou de um modo que considero irresistível:

— Concordo com você — o conde tomou novamente apalavra. — Só me preocupo se não encontrar essa mulher maravilhosa que amarei. Em tal caso, serei obrigado a aceitar qualquer uma que minha família acredite ser a esposa certa para mim.

Lorde Dromont riu e falou:— Nada será pior do que está acontecendo no momento. Seu pai

parece desesperado para que você se case simplesmente porque detesta seu primo que herdará o título caso você morra sem deixar um filho.

— Como meu primo tem o dobro de minha idade —o conde explicou —, é pouco provável que eu morra antes dele.

— Nunca se sabe — o marquês opinou. — Você sempre pode perder a vida num duelo ou ser atropelado.

— Francamente — o conde disse —, acho a idéia do duque muito divertida e não teremos nada a perder. E há sempre a chance de

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ganharmos mil libras; e, se não ganharmos, tudo ficará exatamente como agora; teremos de nos casar com quem nossa família escolher.

— É verdade — o marquês concordou. — Afinal, é uma aventura que ao menos evitará que continuemos com esta vida monótona, que é a nossa atualmente.

— Você fala por si — o conde protestou. — Eu, no momento, estou encantado com uma beldade que dança divinamente bem e que acabei de instalar numa casinha em Chelsea.

— Mas pode ter certeza de uma coisa — lorde Dromont comentou. — Ela não o esperará caso você viaje. Esse é o problema que sempre tive com minhas encantadoras amantes.

— Não se preocupe Harry, não é provável que haja uma fila esperando por sua ausência — alguém comentou. — Afinal, não muitos de nós somos ricos como você para manter "uma casinha em Chelsea", que sem dúvida tem todo o conforto que se possa imaginar.

O conde não deu resposta e um dos rapazes observou:— Pessoalmente, ficarei muito feliz em sair de Londres. Acho a vida

aqui tremendamente dispendiosa e estou o tempo todo me queixando de que não tenho o retorno devido ao meu dinheiro.

— Pelo que imagino — o marquês comentou — se tivermos de ser completamente anônimos, precisamos partir desacompanhados e esperar que, como resultado dessa aventura sugerida pelo duque, caia do céu uma beldade ou surja das águas do lago.

— Se pretende encontrar uma ninfa ou uma sereia, perca as esperanças — outro rapaz disse, — Eu, de minha parte, ficarei nas estradas, pois tenho o pressentimento de que as moças bonitas, simples, são encontradas nas aldeias.

— Concordo — o marquês observou. — Mas cada um de nós terá de traçar o próprio rumo. E espero que o duque tenha tido razão ao sugerir que lindas mulheres são encontradas no campo, essas que nunca estiveram em Londres e que são bem diferentes das noivas que se alinham nos salões de baile de Mayfair.

— Bem, acho tudo isso ridículo e sem esperança — um jovem opinou.— Então fique em casa — o marquês aconselhou-o — e espere que a

mulher que se interesse mais por seu coração do que por seu título caia pela chaminé.

— Suponho que todos nós queiramos isso — foi a resposta imediata do tal rapaz. — Mas é duvidoso, muito duvidoso, que realmente existam essas lindas, inteligentes mulheres que procuramos. Se quiserem saber a verdade, elas só se encontram nos livros ou nos palcos.

— Oh, cale essa boca! — outro homem disse. — Você está estragando toda a brincadeira. Se não se sente disposto a percorrer estradas como um Cavaleiro da Idade Média e a matar o Dragão para salvar uma linda jovem, eu estou.

— Mas tenha cuidado para não ser devorado pelo dragão. Todos riram a valer.

E o marquês sugeriu:— Acho que temos de nos pôr a caminho. Se nossa busca não surtir

efeito depois de três ou seis meses, poderemos então desistir de tudo e aceitar o casamento com a mulher que nossa família achar apropriada, como é nosso dever.

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— Bem, dê-nos um pouco mais de tempo para respirar— o conde pediu. — Três meses não são suficientes. As mulheres que procuramos não irão cair em cima de nós como um maná vindo dos céus.

— Sei disso — o marquês concordou. — Mas temos obrigações e eu não gostaria de abandonar meus afazeres e meus cavalos por mais de três meses.

Houve um murmúrio geral. Enfim um dos rapazes presentes concordou em nome de todos.

— Tudo bem, Ivor, você venceu. Vamos tentar resolver tudo em três meses e poderemos conceder outros três meses para a compra do enxoval.

— Tenho a impressão de que encontraremos o que vamos procurar — o marquês garantiu. — Fica combinado então que nos encontraremos daqui a três meses, neste lugar, e o duque será nosso convidado de honra. Apenas espero que a brincadeira não fique cara demais a Sua Graça caso todos nós encontremos uma noiva.

Ivor falava de maneira otimista. Mas, bem no fundo não tinha muita certeza de que encontraria a mulher ideal, aquela com quem viveria feliz até o fim de seus dias.

Naturalmente houvera mulheres em sua vida, como o duque bem dissera, mas eram todas casadas. Mulheres divertidas, sabidas, sensuais, ansiosas por conceder seus favores quando os maridos viajavam.

Por ser um homem inteligente e perspicaz, o duque adivinhara isso tudo. E sabia também que não era suficiente. Ivor precisava de muito mais para sua felicidade completa.

Quanto a Ivor, embora se ressentisse do modo como os familiares interferiam em sua vida, achava que tinham razão.

Ele precisava se casar, mais cedo ou mais tarde. Precisava ter um herdeiro.

A única pergunta que o atormentava era: mas casar-se com quem?

CAPÍTULO II

epois do almoço o marquês saiu do White's e voltou para sua residência em Berkeley Square.D

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Era uma casa grande, suntuosa, situada numa das extremidades da Praça. Nos fundos havia um jardim sendo que metade pertencia ao duque de Devonshire cuja mansão dava para Park Lane.

O marquês pensava, enquanto dirigia a carruagem com grande destreza, que sentiria falta nos cavalos que deixaria em Londres, apesar de ter excelentes montarias em Milverton Hall.

Durante todo o almoço seus amigos não conversaram sobre outro assunto além do desafio apresentado pelo duque de Sandelford.

Cada rapaz tinha uma idéia diferente quanto ao caminho a seguir. E Ivor considerava um grave erro dois deles procurarem a noiva na mesma área. Poderiam vira gostar da mesma mulher; e seria um desastre na certa.

— Francamente — um dos rapazes disse —, duvido que tenhamos sucesso em nosso empreendimento. Mas será uma experiência interessante que nos fará apreciar melhor a noiva com quem iremos enfim nos casar.

Contudo, o marquês achava que o duque ficaria muito desapontado se eles não encontrassem mulher alguma que os satisfizesse.

Ao chegar a Berkeley Square, Ivor mandou chamar o secretário. Queria saber que compromissos tinha nas próximas semanas. E ficou horrorizado ao constatar que aceitara convites para praticamente cada dia até o fim do mês.

Havia também grande número convites ainda não respondidos.O secretário aguardava ordens pacientemente.— Preciso fazer uma viagem, Harrison — o marquês comunicou enfim

—, e o deixarei a cargo de minha correspondência. Mas tenha bastante cuidado para não revelar onde me encontro e nem quando voltarei.

Harrison, que trabalhava com o marquês há muitos anos já, ficou chocado.

— Mas milorde aceitou convites para muitas festas já — ele esclareceu. — Seus amigos ficarão bem desapontados se milorde não aparecer no último momento.

— Não é uma questão de "último momento" — o marquês protestou. — Partirei amanhã ou depois de amanhã em longa viagem. Há tempo de sobra para preveni-los sobre minha ausência. E informe todos que você não poderá entrar em contato comigo até meu regresso.

— Milorde tem idéia dos compromissos que o aguardam?— Sei que são todos para festas sem importância, uma exatamente

igual à outra. Não acredito que eu seja indispensável. O que você tem a fazer, Harrison, é acalmar meus amigos com desculpas e, naturalmente, com flores para as anfitriãs. Se achar necessário, mande uma caixa de champanhe ou de vinho do Porto ao dono da casa.

— Tentarei cumprir suas ordens, milorde, mas não será nada fácil — o secretario disse, fazendo com as mãos um gesto de desânimo. — Em especial quando seus amigos íntimos querem vê-lo.

— Isso será impossível agora, pois nem eu mesmo sei onde vou estar. Tudo o que posso dizer é que voltarei assim que puder e você terá apenas de acalmar os ânimos de todos até minha volta.

Harrison suspirou mas não disse nada.O marquês então ditou meia dúzia de cartas para as pessoas que

julgou mais importantes. Declarou que fora inesperadamente chamado, mas que os informaria de tudo assim que voltasse a Londres.

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— E o que direi a Sua Alteza Real? — Harrison indagou. O marquês ficou gelado. Esquecera-se por completo de que o príncipe

esperava-o na próxima festa de Carlton House. Sua Alteza Real invariavelmente contava com os amigos íntimos para ajudá-lo quando dava uma festa grande e de alguma importância.

Ele organizava em geral bailes, e os jardins eram decorados de modo suntuoso que sempre encantava os presentes.

E o marquês refletia agora sobre como informar Sua Alteza Real que não estaria à disposição. Mas, se falasse alguma coisa antes de partir, o príncipe sem dúvida o impediria de viajar durante uma semana. Daria uma ordem que tinha de ser obedecida.

— Acho que a melhor solução — o marquês finalmente disse após longa pausa — é esperar até Sua Alteza Real mandar me chamar com urgência. Então você irá a Carlton House e explicará que não tem idéia de onde me encontro, sendo, portanto impossível obedecer às instruções enviadas.

Harrison suspirou e respondeu:— Não vai ser nada fácil.— Sei disso — o marquês declarou. — Mas só você pode me ajudar a

impedir que haja uma gritaria geral por eu ter saído sem comunicar ninguém acerca do "motivo" de minha viagem.

Ele acentuou a palavra "motivo" e Harrison perguntou:— Essa é a verdade, milorde? Está sendo forçado?— Não, não é bem isso — o marquês retrucou. — Estou saindo de livre

e espontânea vontade e, para sua informação, fizeram-me um desafio importante que envolve minha vida atual e a do futuro, e não posso recusá-lo.

— Um desafio, milorde? Soa como algo emocionante. — Os olhos de Harrison brilharam de curiosidade.

— Apenas espero que seja emocionante para mim. Mas, falando a verdade, Harrison, duvido que eu consiga o sucesso que espero.

— Farei o possível para ajudar Vossa Senhoria, mas não nego que aguardarei ansiosamente por sua volta.

— Eu também desejo voltar logo — o marquês respondeu. — Porém agora preciso providenciar o necessário para a viagem, e cabe a você cuidar para que não haja curiosos à porta da frente na hora em que eu partir.

Harrison continuava preocupado. Sabia muito bem que surgia grande agitação na cidade quando o marquês saía de Londres sem deixar o endereço. Mas não havia nada mais que ele pudesse dizer.

Começou a abrir as cartas que tinham chegado naquela manhã. Chamou-lhe atenção um envelope colorido e perfumado com a palavra: Confidencial.

Passou-o então ao marquês, sem abri-lo. E continuou com o trabalho de verificar carta por carta.

Foi só uma hora mais tarde, quando o secretário saiu da sala, que o marquês abriu o envelope azul. Ele reconheceu logo de quem era por causa do perfume que exalava. Nem precisou olhar a assinatura.

Leu:Querido, maravilhoso Ivor.Arthur parte esta tarde e só voltará terça-feira à noite. Estarei sozinha

esperando por você às dez horas, se puder escapar cedo da festa em Devonshire House.

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O marquês leu a carta duas vezes.Ele vinha tendo um romance com a autora da carta, com Juno, a

condessa de Claremont, uma das beldades da alta roda.Não havia um só homem em toda Londres que não se encantasse

quando ela lhe sorria.De cabelos ruivos, olhos verdes, ganhou prestígio no mundo masculino

assim que chegou na cidade. Sem dúvida era a mulher mais linda dos bailes a que comparecia.

O marquês se interessou por ela desde a primeira vez em que dançaram juntos. E ficou exultante ao receber um convite para ir a Claremont House. Juno recebeu-o sozinha.

Jantaram, não na enorme sala de jantar, mas nos aposentos particulares da condessa. Era óbvio o que ela esperava do marquês quando os criados se retirassem.

O conde fora, Ivor adivinhou logo, às corridas de Somerset.Ao atravessar a porta do quarto de dormir ele acreditou estar entrando

no paraíso que havia sido recusado a grande número de outros homens. Pelo menos foi o que pensou na ocasião.

O ato de amor com a condessa era altamente excitante. E a ligação deles continuou por muito tempo; mas não foi fácil. O marido, terrivelmente ciumento e consciente da beleza e atração da esposa, raramente deixava-a só.

E, quando precisava mesmo sair sozinho, providenciava com muito tato para que um membro de sua família ficasse em Claremont House enquanto ele estivesse fora.

Entretanto, dizer que o marquês sentia-se terrivelmente apaixonado por Juno seria exagerar um pouco os fatos. Achava-a atraente, mas durante o mesmo período de tempo fizera amor com uma infinidade de outras mulheres.

Depois do primeiro enlevo e da onda de vaidade por ter sido escolhido pela condessa, descobriu que não havia nada diferente no ato de amor realizado com ela do ato de amor que experimentara outras vezes antes.

A condessa era linda, sem dúvida, e o considerava o amante mais ardente que já conhecera.

— Tenho de ver você de novo — ela dissera na última vez em que estiveram juntos.

— Espero que me informe quando é possível — o marquês respondera.

— Arthur raramente sai sem mim. — Ela suspirou. — Sabe, Ivor, eu quero você..., eu desejo você...

— E eu quero você — o marquês respondeu. — Mas não podemos querer o impossível e o máximo que posso fazer é esperar à porta de sua casa até que fique sozinha.

— E se eu for à sua casa? — Juno sugeriu de súbito.—Seria perigoso — ele retrucou firmemente. — Por mais cuidadosos

que fôssemos os transeuntes veriam sua carruagem à porta de minha casa e os empregados comentariam.

—Tem razão. — Ela suspirou de novo. — Mas preciso de você, quero você! Tenho a impressão de que estivemos afastados por uma eternidade.

O marquês era super cuidadoso. Sabia-se que o conde já desafiara dois homens em duelo, e um deles ficara tão ferido que precisou sair do país, completamente inválido.

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Uma coisa que o velho marquês insistira com o filho era que nunca permitisse um escândalo na família Milverton. Por isso Ivor achava melhor não se aproximar muito da condessa.

Só cedia quando absolutamente certo de que não seria interrompido e quando o conde estava bem longe para consistir numa ameaça.

Mas por sorte havia muitas outras mulheres que atraíam sua atenção. Ademais, ele já começava a achar as queixas da condessa cansativas.

Era claro que dançava com Juno em todas as festas em que ela estivesse presente. E ouvia-a dizer o tempo todo:

— Eu quero você! Eu quero você e fico acordada a noite inteira esperando e rezando para que pense em mim e não em outra mulher.

Isso foi bom no início. Mas depois de algum tempo ele ficou cansado daquela repetição. Sentia-se aprisionado.

Logo após ler a carta da condessa concluiu que encontrava enfim um modo interessante se bem que um tanto quanto dramático de dizer adeus à antiga vida.

Se encontrasse a mulher maravilhosa sugerida pelo duque, não haveria mais lugar para a linda condessa. E nem para qualquer outra beldade considerada irresistível pelo Beau Monde.

"Será que vai ser possível para mim ficar fiel a uma única mulher pelo resto de minha vida?", ele se perguntava.

Em seguida lembrou-se de que era o que seus pais diziam ser à base de um casamento perfeito. Mas jamais acreditara conseguir isso, embora desejasse muito.

"Talvez", refletiu, "ao dizer adeus a Juno direi adeus a todas as outras mulheres e às tentações que elas representam."

Ele tivera uma infinidade de mulheres em sua vida, mas nenhuma delas significara muito. Em geral era ele quem terminava com o romance. Não podia entender porque motivo uma beldade que antes achara irresistível de repente e sem razão plausível cessava de atraí-lo.

"Juno é um pouco diferente", dizia a si mesmo. "Contudo, no momento em que eu encontrar o que procuro, direi adeus também a ela. Mas quero que Juno pense em mim com carinho."

Aí se lembrou do que acontecera com freqüência no relacionamento de ambos.

— O que fiz para aborrecer você? — ela dizia. — O que fiz para irritá-lo tanto? Por que não me ama mais?"

Ivor ouvira as mesmas perguntas centenas de vezes. Mas não as respondera. Aos poucos se convencia de que, aquilo que lhe parecera maravilhoso no passado, não mais o atraía.

Ele leu a carta mais uma vez. Depois a rasgou e jogou-ano lixo. Nem mesmo a respondeu.

A condessa tinha certeza, pois homem nenhum a rejeitara antes, de que jantariam juntos conforme planejara.

Bem mais tarde naquele dia o marquês mandou chamar seu secretário. Perguntou-lhe onde deveria ir naquela noite.

— Espero que Vossa Senhoria não tenha se esquecido de que aceitou o convite, há três dias, para jantar em Devonshire House.

— Mande então um recado com esta carta — o marquês ordenou.E sentou-se à escrivaninha para escrever uma nota de desculpas à

duquesa.Explicava que fora convocado, por uma parenta muito doente, a

comparecer à aldeia onde ela morava.

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E disse que não poderia recusar o pedido, mas que lamentava profundamente cancelar seu comparecimentoà festa, no último instante.

Ele tinha certeza de que ninguém acharia sua falta. As festas em Devonshire House eram sempre muito freqüentadas. Não menos de trinta pessoas eram homenageadas em geral com um delicioso banquete na majestosa ala de jantar.

Depois haveria um baile onde todos se divertiriam muito.O duque, esse, nunca abandonava a mesa de jogo.Muitos convidados chegavam depois do jantar e assim aumentava o

número de visitas.Tratava-se de um tipo de noitada que o marquês achava divertida.No entanto, se ia dizer "adeus" a Juno para sempre, não poderia perder

sua última oportunidade de estar sozinho com ela.Um lacaio foi enviado a Devonshire House com a carta para a duquesa

tão logo o marquês terminou de escrevê-la. E Harrison providenciou um enorme buquê de flores a ser entregue junto com a carta.

Em seguida o marquês pôs-se a pensar por onde começaria a viagem de aventura. Pareceu-lhe evidente que deveria ser por sua casa de campo em Herefordshire. Lá conseguiria melhores cavalos dos que possuía em Londres. As maravilhosas estrebarias de sua propriedade, das quais tinha tanto orgulho, ficavam em Milverton Hall.

Ele já visitara a mãe, que morava em Essex, antes de ir para Londres. Também em Essex residiam seis de seus parentes, os que insistiam no casamento. E, tal qual o conde de Landock, ele estava cansado de ouvir sempre a mesma conversa. Case-se. Case-se.

Dissera à mãe, com toda a clareza, que não iria mais vê-la a menos que lhe prometesse não tocar no assunto de casamento.

Por ter passado tanto tempo em Londres, o marquês negligenciara sua casa de campo, Milverton Hall. E agora achava necessário começar por lá a viagem; mas não tinha idéia de onde iria depois.

Mesmo assim, pediu ao valete que pusesse na mala apenas roupas bem simples.

— A maioria delas ficou no campo, milorde — o valete respondeu. — Aqui em Londres Vossa Senhoria sempre se veste a rigor.

Enquanto se trocava para o jantar Ivor informou o criado que partiriam bem cedo na manhã seguinte. Portanto toda a bagagem devia estar pronta à noite.

— É estranho Vossa Senhoria ir ao campo justamente agora que Londres se encontra em plena temporada — o empregado comentou. — Pretende ficar muito tempo lá?

— Ainda não sei. Mas lhe direi assim que chegarmos.— Muito bem, milorde — o valete disse e começou a fazer as malas.

Mas se perguntava o que acontecera a Sua Senhoria para voltar à casa de campo tão cedo no ano.

Ele sabia que o patrão tinha uma enorme lista de compromissos a cumprir.

O marquês ordenou que a carruagem fechada o aguardasse à porta a um quarto para as oito.

Exatamente a essa hora ele saiu, muito bem vestido como se fosse a uma festa a rigor.

Os criados que o viram passar pelos corredores pensaram que não poderia existir em toda Londres cavalheiro mais elegante que seu amo, e ao mais tempo mais viril.

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Ele entrou na carruagem e o tapete vermelho foi retirado da calçada logo após. Os criados puseram-no no lugar apropriado, a fim de ser recolocado quando ele voltasse.

Para não revelar seu destino, o marquês pediu ao cocheiro que parasse a alguns metros de distância da residência da condessa, onde havia uma casa desabitada da qual ele possuía a chave, dada pela própria condessa. Entrou no hall escuro e esperou até que a carruagem partisse. Saiu da casa, trancou a porta e pôs a chave no bolso. E não pôde deixar de pensar para quantos homens Juno já dera a mesma chave antes.

Aí caminhou até a residência dela.O mordomo que lhe abriu a porta cumprimentou-o respeitosamente:— É um prazer vê-lo de novo, Excelência. Sua Senhoria a condessa

está um pouco cansada esta noite e decidiu que o jantar fosse servido em sua saleta particular. Assim ela não precisará descer.

— Acho bastante prudente Sua Senhoria não fazer mais do absolutamente necessário — o marquês respondeu.

Ele teve vontade de rir ao se lembrar de que essa fora a mesma troca de palavras que tiveram na última visita. Mas o importante era que o mordomo adorava a patroa, sendo de absoluta confiança.

Ivor seguiu-o nas escadas. Ao abrir a porta da saleta, o mordomo anunciou:

— O marquês de Milverton, milady.E o marquês entrou. Conforme esperara, Juno usava um traje longo,

extremamente sedutor. E a sala estava repleta de flores cujo aroma misturava-se ao perfume exótico dela, muito familiar ao marquês. O perfume ficava impregnado em sua pele toda vez que a visitava, e muitas vezes ele o sentia até no dia seguinte.

— Ivor, como você foi amável em vir hoje que eu estava só e sentindo-me tão solitária! — a condessa exclamou.

E, quando o mordomo fechou a porta, atirou-se nos braços dele, dizendo:

— Você está aqui enfim! Tive medo que não viesse quando o desejava tanto!

— É claro que eu viria. E parece que faz séculos que não nos vemos.— Sim, faz mil anos! — a condessa declarou, num tom de voz

apaixonado. — Mas agora que está aqui, nada mais importa. Oh querido, maravilhoso Ivor, senti tanta saudade de você!

Juno ofereceu-lhe os lábios e ele sentiu logo um fogo queimando-lhe as entranhas.

Depois do delicioso jantar servido na saleta pelo mordomo e por dois lacaios, o marquês recostou-se na poltrona.

Com seu preferido licor na mão pensava apenas na condessa que o recebia sempre em estilo tão glamouroso.

Todas as outras mulheres com quem mantivera um romance convidavam-no também para jantar, mas sempre em restaurantes e na companhia de outros amigos. Depois inventavam que sua carruagem não chegara forçando-o a lhes oferecer condução. Era o pretexto para receberem-no em casa.

Outras vezes, o que talvez fosse mais simples, o marquês jantava no Clube. Depois ia a casa delas às dez horas da noite quando a maioria dos criados já estava dormindo.

Nessas ocasiões entrava com a própria chave que lhe fora dada pela amante. Às vezes a porta era deixada aberta.

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A dona da casa lhe garantia sempre que a criada era confiável, pois trabalhava com ela há anos.

A condessa também afirmara que o mordomo lhe era devotado, mais do que ao seu marido. Quanto aos dois lacaios teriam medo de falar com quem quer que fosse sobre o que se passava.

E, ao mesmo tempo, ela tornara bem claro que quando o marido viajava tinha o direito de receber seus amigos.

— O conde não se importa que você me convide? — o marquês perguntara certa ocasião.

— Nunca lhe conto que estamos sozinhos. Apenas digo que tivemos uma pequena festa e que você fazia parte dos convidados. Prefiro não esconder sua presença aqui. Quanto menos minto, menos tenho a esconder.

O marquês concordara com ela. Achava interessante entrar no jogo de Juno. A única coisa com que tomava cuidado era de não envolver seus próprios criados. Eles nunca sabiam com quem o patrão estava jantando.

Agora, terminada a deliciosa refeição, Ivor aceitara o licor das adegas do conde. E reconhecia que mulher alguma poderia ser mais linda do que sua anfitriã. Ela era divertida também, pois o fizera rir durante todo o jantar.

Levantaram-se e foram para o sofá enquanto os criados tiravam a mesa.

— Mais alguma coisa, milady? — o mordomo perguntou.— Nada, Barker. Sua Senhoria sairá sozinho, por isso não vai ser

necessário que o lacaio o espere. Sei que vocês tiveram uma longa semana e devem estar cansados.

— É muita amabilidade de Vossa Senhoria. O mordomo saudou-os e retirou-se.Fechada a porta, a condessa ergueu os braços para o marquês.— Finalmente! — exclamou. — Quase morri de saudades de você. Oh,

como senti saudades!— E eu de você — o marquês replicou.Ele procurou os lábios da condessa que perguntou:— O que estamos esperando?Os dois foram para o quarto que estava cheio de flores e às escuras,

com exceção de um pequeno candelabro de três velas ao lado do enorme leito com dossel de musselina.

— Eu amo você! — ela sussurrou. — Esperei uma eternidade por este momento.

O marquês beijou-a e Juno começou a tirar o vestido. Ivor também se despiu num canto escuro do quarto.

Voltou para perto da cama e Juno estendeu-lhe os braços. Seus cabelos louros caíam sobre os ombros nus.

E se amaram. Algum tempo mais tarde ele achou que estava na hora de voltar para casa. Por minutos ambos ficaram silenciosos, exaustos devido aos arroubos da paixão.

Ele enfim se mexeu na cama e Juno perguntou:— Já vai?— Acho que está na hora. Vou à minha casa de campo bem cedo

amanhã e não quero estar muito cansado.— À casa de campo? — Juno repetiu. — Mas não pode sair de Londres

agora. Esperava vê-lo amanhã à noite. Arthur não voltará até terça-feira.

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Mas o marquês levantou-se para se vestir. Chegou a considerar a hipótese de adiar sua ida ao campo. Contudo... O que acontecera naquela noite fora muito agradável, mas era pouco aconselhável tentar repetir qualquer coisa prazerosa. Tudo de bom que era repetido resultava quase sempre em desaponto.

A condessa sentou-se na cama.— Você não pode partir amanhã — disse. — Que idéia ridícula! Além

do mais, não pode deixar Londres durante a temporada.— Sei disso — o marquês falou abotoando a camisa. —Mas preciso ir a

Milverton Hall e não sei quando voltarei.— Ora, querido Ivor, podemos não ter outra oportunidade igual tão

cedo. Sabe como Arthur detesta viajar, e esta chance como que caiu do céu. — Ela suspirou antes de acrescentar: — Em geral ele prefere estar a serviço de Sua Alteza Real aqui em Londres, ou quer me arrastar a todos os bailes da cidade. Talvez muitas semanas se passasse até ele viajar de novo. Portanto, não vá embora. Não pode!

Pelo tom de voz da condessa Ivor percebeu que sua retirada iria ser difícil. Isso já acontecera outras vezes no passado. Era uma situação desagradável que ele preferia evitar a todo custo.

— Farei o possível para voltar logo — prometeu.— Precisa! Precisa! Realmente precisa! Como posso viver sem você,

Ivor? E por que quer ir embora tão cedo hoje? É ainda muito cedo!— Como já lhe disse, tenho de fazer uma viagem amanhã — o

marquês explicou. — Se adiar, prejudicarei meu trabalho.Ele vestiu o paletó e pôs a gravata no bolso. Ai, inesperadamente,

ouviu-se uma pancada na porta.— Quem é? O que deseja? — a condessa perguntou após uma pausa.— Sua Senhoria acabou de chegar, milady — alguém falou do lado de

fora.A condessa deu um grito de horror.— É Arthur — disse. — Voltou de propósito. Eu estava meio receosa,

mas tinha certeza de que ele não desconfiava de você.— Como posso sair daqui sem ser pela porta da frente?— o marquês

indagou.— Apenas pulando a janela. Pode ser perigoso, mas a queda não é

muito alta até o telhado da cozinha.Ele não hesitou. Puxou as cortinas. Viu, pela janela aberta, um teto

plano logo abaixo e um cano de água onde ele poderia se segurar para descer, evitando dar um salto como a condessa sugerira.

Sem titubear, pôs uma perna sobre o parapeito. E, ao fazê-lo, ouviu a porta do quarto se abrir.

— Arthur! — A voz da condessa foi mais um grunhido que uma exclamação de prazer. — Que surpresa agradável! Não tinha idéia de que voltaria tão cedo. Oh, querido, querido! É tão maravilhoso vê-lo!

O marquês começou a deslizar vagarosamente, agarrando o cano. Imaginava que, no quarto, a condessa passava os braços em torno do pescoço do marido.

— Estou encantada em ver você, estou mesmo — ela dizia. — Foi uma surpresa maravilhosa.

— Voltei por outras razões além de vê-la — o conde disse, com voz grave. — Quem esteve com você aqui esta noite?

O marquês já estava quase chegando ao telhado da cozinha. Podia ainda ouvir, pois a janela continuava aberta, a conversa do quarto.

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— Só convidei dois amigos para jantar — a condessa declarou. — Mas foi muito desagradável o jantar sem você, meu querido marido. E até fiquei contente quando todos foram embora.

— Foram embora mesmo? — O conde estava duvidoso. — Vou verificar, eu próprio.

— Não seja ridículo! — a condessa protestou.O marquês supôs que ela segurava o marido, impedindo-o de sair à

janela. Nesse instante, ele chegava à beirada do telhado. Havia um espaço entre o local onde estava e a casa vizinha. Com a ligeireza de homem atlético, pulou para o outro telhado. Atingiu-o sem se machucar.

Não ousou olhar para cima, receando que o conde estivesse na janela e pudesse vê-lo. Escondeu-se num canto escuro e ouviu a condessa dizer:

— O que está procurando, Arthur? Não há ninguém na rua a esta hora da noite.

— Mas que barulho é esse que ouvi? — o conde perguntou.— Acho que são os malditos gatos. Acordaram-me ontem à noite. Já

disse à cozinheira que tampasse bem as latas de lixo. Eles brigam disputando restos de comida. E agora pare de olhar pela janela e deite-se na cama. Não há nada para se ver a esta hora da noite.

Sem erguer a cabeça o marquês não podia enxergar o conde, mas tinha certeza de que ele olhava em todas as direções.

Teve vontade de tossir, mas segurou a tosse.Segundos mais tarde concluiu que o conde tinha entrado e fechado a

janela, pois não podia mais ouvir vozes.Muito, muito devagar olhou para cima e constatou que a cortina

também estava fechada. Então, pé ante pé saiu de seu esconderijo. Ainda havia algum risco, pois o conde poderia muito bem tornar a espiar para fora. Havia luar e as estrelas brilhavam no céu. Qualquer homem solitário andando pelas ruas chamaria atenção.

Esgueirando-se pelos muros das residências, cabeça baixa, chegou até a rua dos fundos da casa e deu um suspiro de alivio.

Tinha absoluta certeza de que, se o conde tivesse a mínima suspeita de que ele estivera lá, o desafiaria em duelo. E como cavalheiro e homem honrado, precisaria aceitar o desafio. Para piorar as coisas, o conde era excepcionalmente bom no tiro.

No entanto, embora houvesse alguma suspeita, não existiam provas. Quanto à condessa, não o trairia. Não...? Sempre poderia haver alguma possibilidade.

De volta a Berkeley Square, a pé, Ivor dizia a si mesmo:"Se não houvesse outra razão para eu deixar Londres amanhã, agora

tenho uma desculpa perfeita. Vou ao campo e ficarei por lá durante muito tempo."

CAPÍTULO III

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marquês partiu de Londres bem cedo pela manhã. Conduzindo sua carruagem puxada por três cavalos, a grande velocidade,

chegou à sua propriedade no campo em três horas. Não foi um recorde, por já fizera a mesma viagem em menos tempo, porém num veículo menor.

O Ele estava muito satisfeito com o desempenho de seus três animais.O valete e a bagagem seguiam atrás e chegariam mais tarde, pois a

carruagem era conduzida por dois cavalos apenas.O marquês encantou-se com o aspecto da fazenda. Os jardins de

Milverton Hall estavam cheios de flores. Embora não tendo aparecido lá durante muito tempo, tudo parecia em perfeita ordem. Os empregados, de absoluta confiança, haviam todos sido contratados por seu pai. Conseqüentemente, o resultado era que a propriedade não lhe causava problemas de espécie alguma.

Ao entrar na casa, de pronto decidiu ficar mais tempo do que planejara.

A propriedade estivera nas mãos dos Milverton durante trezentos anos. De repente, Ivor sentiu ímpetos de desistir do desafio do duque e ficar em Milvertona fim de usufruir o prazer dos cavalos maravilhososde suas estrebarias.

De qualquer maneira, passaria alguns dias na fazenda antes de iniciar a aventura.

Durante o trajeto para o campo, refletiu sobre o que ocorrera na noite da véspera. No momento, precisava se afastar de Londres. Tinha consciência de que, a par do perigo do duelo com o conde, haveria o escândalo que prejudicaria toda sua família.

Agora admitia que fora mesmo muito tolo. Não havia sido prudente ter continuado o romance com a condessa durante tanto tempo. Devia ter imaginado que, mais cedo ou mais tarde, alguém contaria ao conde a traição da esposa. E esse alguém não precisaria nem ser um homem em quem ela estivesse interessada.

Todos em Londres sabiam que o conde era extremamente ciumento. Ivor sentia-se grato pelo milagre que o salvara. Ao menos não teria de enfrentar uma família furiosa, a sua. Isso além de arriscar a própria vida em Green Park na madrugada do dia seguinte.

Teve vontade de jurar que nunca mais teria um romance com mulher casada. Mas se deu conta de ser quase impossível. Uma linda mulher era irresistível, casada ou não. Portanto, a solução era divertir-se e tentar não ser apanhado.

O sol refletia nas vidraças das janelas de sua casa dando-lhe um aspecto acolhedor. Aquilo tudo era parte integrante de sua família, e ele se deu conta de que tinha de providenciar um herdeiro. Mas esse era um assunto sobre o qual preferia não pensar no momento.

Assim que estacionou a carruagem, a porta da frente se abriu e os lacaios estenderam no chão o tapete vermelho.

Ivor reconheceu logo o velho mordomo que trabalhava na casa há anos.

Dois cavalariços vieram correndo para segurar os animais. O marquês trocou algumas palavras com o chefe das estrebarias que ficou encantado ao saber que o patrão fizera a viagem em tempo recorde.

Na entrada da casa Newman, o mordomo, cumprimentou-o:

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— Bem-vindo seja, milorde. Há muito que o esperávamos aqui. E estamos contentes por ver que não nos esqueceu.

— Nunca me esqueço de vocês, Newman. É que tenho estado muito ocupado em Londres. Por sinal, fui também visitar minha mãe em Essex.

— Espero que ela esteja gozando de boa saúde. Garanto, que Sua Senhoria acha falta em Milverton Hall.

— Penso que sim — o marquês concordou. — Mas, como sabe Newman, grande número dos parentes dela mora lá agora. Aqui minha mãe estaria muito só.

O marquês encaminhou-se para o escritório, local onde seu pai sempre ficava quando não tinha visitas. Newman, que o seguia, disse:

— Quero comunicar a Vossa Senhoria que sua tia, lady Matilda Fletcher, encontra-se aqui.

— Lady Matilda?! Que faz ela em Milverton Hall? E como não fui avisado?

— Sua Senhoria apareceu apenas ontem à noite. E está, penso, a caminho de Londres. Mas quando souber que Vossa Senhoria chegou, ela ficará muito feliz.

— Sem dúvida! — o marquês declarou com sarcasmo. — Veio sozinha?Newman hesitou antes de responder:— Não, milorde! Trouxe consigo uma jovem lady.O marquês encarou o mordomo e com esforço não disse o que estava

na ponta de sua língua. Apenas perguntou:— Onde está Sua Senhoria?— No escritório, milorde. Ela achou que Vossa Senhoria iria para lá

imediatamente, pois era o lugar, onde o velho milorde sempre ficava.Com muita dificuldade o marquês conteve-se para não dizer:"Ela devia ter me esperado na sala de visitas, não no escritório!"Se havia um parente que Ivor realmente detestava era a irmã mais

velha de seu pai, lady Matilda Fletcher.Ela estava sempre criticando tudo e interferindo nos negócios da

família. E Ivor sabia muito bem por que a tia o procurava agora. Não pudera comparecer à festa que sua mãe dera para ele.

Na verdade, cada membro da família que fora à festa apresentara uma sugestão quanto à mulher com quem ele deveria se casar. E não havia dúvida de que tia Matilda não ficaria em paz até poder dar sua opinião também.

Mas lady Matilda era uma mulher cansativa, com quem ele não desejava se encontrar.

Por segundos teve vontade de evitar esse encontro indo a qualquer outro lugar. Mas, mesmo em Londres, ela o procuraria.

E agora era muito tarde para qualquer decisão.Newman abriu a porta do escritório. O marquês entrou e foi ao

encontro da velha senhora com a testa franzida. Até o mordomo teve pena dele, e sentia-se culpado pelo incidente que estragara a chegada do patrão.

Como Ivor esperara, tia Matilda tinha o mesmo olhar agressivo que ele tão bem conhecia. Estava sentada na beirada do sofá, com as costas eretas. Ao lado dela havia uma jovem de aspecto muito simples.

Lady Matilda estendeu a mão ao sobrinho.— Oh, é bom ver você, Ivor — disse. — Imagino que fez a viagem de

Londres até aqui em tempo recorde. Edith e eu o esperávamos.

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A marquesa tocou a jovem com o cotovelo e Edith levantou-se.Era uma moça um pouco gorda, com longos cabelos castanhos.— Aperte a mão dele, Edith — lady Matilda ordenou — É meu sobrinho

Ivor, o marquês, de quem lhe falei. Aposto que Ivor ouviu falar de seu pai.Ivor apertou a mão trêmula de Edith.— O pai de Edith — lady Matilda continuou agora se dirigindo ao

sobrinho — é lorde Bellew, cujos brilhantes discursos na Câmara dos Lordes foram publicados em todos os jornais do país. Tenho certeza, embora tendo estado muito ocupado em Londres, de que leu ou ouviu falar sobre esses discursos.

O marquês não estava interessado em política no momento. Contudo, lembrava-se vagamente de ter escutado o nome de lorde Bellew.

Na verdade, ele raramente lia os discursos dos membros da Câmara dos Lordes porque os achava maçantes.

— Senti muito não ter comparecido à festa na casa de sua mãe — lady Matilda dizia. — Escrevi a ela dizendo que estava ansiosa para que você conhecesse a querida Edith, e decidi-me levá-la a Londres.

Matilda fez uma pausa, percebendo que o marquês não a escutava. Ele atravessara a sala indo até a escrivaninha.

— Estou falando com você, Ivor! — ela disse, irritada.— E eu estou escutando, tia Matilda. Quis verificar se havia chegado

alguma correspondência urgente enquanto estive em Londres. É aqui que Newman coloca as cartas para que eu as veja logo.

E não se enganara; um pedaço de papel estava sobre a mesa. Leu-o:Skylark pariu um lindo potro ontem. Os homens da estrebaria esperam

que Vossa Senhoria tenha tempo de vê-lo enquanto estiver aqui.O marquês ficou encantado. Comprara essa égua, Skylark, de um

amigo muito necessitado em dinheiro. E o rapaz lhe garantira que qualquer potro nascido dela teria grande chance de ser um vencedor nas corridas.

"Com certeza irei vê-lo antes de partir", ele se propôs.Esforçando-se para não pensar no assunto, deu atenção à tia Matilda.— O que eu queria que você fizesse — ela disse — era dar um baile em

homenagem a Edith em Londres. O pai dela insiste que está velho demais para conhecer jovens que seriam os convidados da ocasião. Aposto, caro Ivor, que você conhece todos os rapazes que freqüentam os elegantes salões de Londres durante as temporadas.

O marquês percebeu imediatamente que se tratava de um meio hábil de apanhá-lo em armadilha. Como poderia ele oferecer um baile a qualquer mulher, em especial não sendo sua parenta?

Os comentários seriam incríveis e ele acabaria tendo de se casar com a moça. Aí estava Ivor concluiu logo, o plano de tia Matilda.

— É claro que não farei isso, tia — ele protestou. — Ademais, estou de partida para uma grande viagem e não sei quando voltarei a Londres.

— Como pode deixar Londres no meio da temporada?! — Matilda exclamou, quase gritando.

— Muito facilmente, como vê. Bati um recorde chegando aqui em três horas e partirei amanhã. Você me pegou por acaso.

— O que pode ser mais importante para você, Ivor, do que estar em Londres agora, quando há lá tantos bailes e divertimentos? Sei que Sua Alteza Real dará uma de suas magníficas recepções. Como vai ele se arranjar sem você, caro Ivor?

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— Espero que se arranje. Como não tenho idéia de quando voltarei Sua Alteza Real não pode contar comigo. Agora, se me dá licença, preciso me vestir para o almoço.

Ele saiu da sala sem que tia Matilda tivesse tempo de prendê-lo. Subiu e foi ao quarto principal da casa onde dormira desde que o pai morrera.

Concluiu que devia ter esperado por aquilo. Tudo o que acontecia em sua família, tinha tia Matilda por trás. Ela era quem tomava todas as iniciativas.

"Se tia Matilda pensa que sou tão idiota a ponto de me casar com a moça sob sua proteção, está redondamente enganada", ele disse a si mesmo.

Lembrou-se de repente que lorde Bellew descendia de uma antiga família aristocrática e que era imensamente rico. E aquela criatura simples devia ser a donzela que sua família considerava a esposa ideal para ele. A tia sem dúvida iria usar de todas as artimanhas para induzi-lo ao casamento.

"Eu gostaria que essas mulheres me deixassem em paz", refletiu. "Seria um bom castigo para elas se eu, em minhas andanças por sugestão do duque, acabasse me casando com uma plebéia. Aí, adeus sangue azul."

Essa idéia divertiu-o. Imaginou como os parentes, em especial tia Matilda, ficariam furiosos. E tinha certeza de que qualquer mulher seria melhor que a escolhida pelos tios e tias.

O almoço foi excelente, pois a cozinheira, que adorava Ivor e o conhecia desde pequeno, preparara seus pratos preferidos.

O marquês sentou-se à cabeceira da mesa, a tia à direita e Edith à esquerda.

Matilda falava o tempo todo não dando chance a Edith de emitir uma única palavra.

A um dado momento o marquês dirigiu-se a ela e perguntou:— Você gosta da vida no campo?— Nunca morei... em outro lugar... — ela sussurrou.— Tem prazer em montar?— Só se o cavalo for muito manso. Tenho medo... de

montar um animal desconhecido. Embora lady Matilda tenha me dito que suas estrebarias são... famosas.

— Espero que sejam — o marquês respondeu. — Não deixam de ser importantes para mim. Por isso perdoem-me se as abandono agora para ver meus cavalos.

Ivor inventou essa desculpa porque não podia mais agüentar a conversa de tia Matilda. Ela insistia o tempo todo em impressioná-lo sobre os antepassados de Edith Bellew.

Ele só aguardava pelo instante em que a tia iria lhe perguntar: Você se casaria com Edith? E sua resposta seria: Não! Porém, achou melhor fugir.

— O chá será servido no salão — lady Matilda disse quando ele já estava na porta.

— Se me atrasar, não esperem por mim.Ele foi para as estrebarias sabendo que o chefe dos cavalariços

contava com sua visita. E não se enganara.Os cavalos estavam todos muito bem tratados, melhor ainda do que

quando os vira pela última vez.Um deles, Ivor soube, era o melhor saltador do condado.

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Havia outro que os cavalariços garantiam que ganharia a corrida de obstáculos se entrasse na competição daquele ano. Havia sempre competições desse tipo na região. O mencionado cavalo vencera no último ano e no ano anterior, e tinha bastante chance de ganhar mais uma vez.

Esse animal, comprado por preço barato, se transformara numa verdadeira preciosidade.

O marquês e os cavalariços ficaram muito tempo trocando idéias sobre cada cavalo. E Ivor inspecionou os que possuíam mais qualificações para corridas, indo de baia em baia.

— Que animal Vossa Senhoria prefere montar agora? — o chefe dos cavalariços perguntou depois de o marquês ter ficado quase duas horas nas estrebarias.

Para agradar os empregados, ele escolheu aquele que os rapazes desejavam que ganhasse a próxima corrida de obstáculos.

E, ao montá-lo, concluiu que tinham razão, pois o fez pular várias cercas e o resultado foi surpreendente.

Ivor passou a tarde toda cavalgando, o que lhe deu enorme prazer. Quando voltou a casa já havia passado há muito a hora do chá. E admitiu que, se de fato queria ir à procura da noiva conforme sugerira o duque, precisava partir logo. Mas de uma coisa estava certo; se falhasse não se casaria com Edith Bellew por melhores que fossem seus antepassados.

Quando entrou em casa Newman lhe disse que as mulheres o haviam esperado para o chá durante algum tempo, mas que depois decidiram tomá-lo sozinhas. Informou também que Sua Senhoria fora ao quarto a fim de descansar antes do jantar.

— E por onde anda miss Bellew, a senhorita que chegou com minha tia? — Ivor teve curiosidade em saber.

— Foi para o jardim, milorde.O marquês resolveu então ir ao escritório. E deu instruções ao

mordomo para que não dissesse a ninguém onde ele se encontrava.No escritório, leu os relatórios referentes às fazendas. Estavam sobre

sua escrivaninha."Se pretendo de fato partir amanhã, preciso ler tudo isto hoje", pensou.

Os relatórios eram mais interessantes do que ele imaginara. E examinando-os o marquês se entreteve até a hora do jantar. Enfim, subiu para se trocar.

O valete já havia preparado o banho no quarto. E Newman insistiu em levar-lhe uma taça de champanhe porque ele perdera a hora do chá.

— Vossa Senhoria não pode se atrasar para o jantar o mordomo insistia. — A cozinheira trabalhou a tarde toda preparando seus pratos favoritos. Por sinal, ficou muito desapontada por Vossa Senhoria não ter provado o bolo que ela fez para o chá.

— Diga-lhe que ponha um pedaço de bolo na mesa de cabeceira, ao lado da minha cama — o marquês pediu. — Se eu acordar com fome, o devorarei.

Newman riu muito e observou:— Vossa Senhoria não acordará com fome depois do jantar que ela

fez. Todos na cozinha trabalharam sem parar desde que soubemos da vinda de Vossa Senhoria. Se ficar por muito tempo, terá de alargar suas roupas.

— Conversarei com a cozinheira mais tarde e lhe agradecerei antes de sair. Parto definitivamente amanhã e já informei os cavalariços a que horas desejo minha montaria. Será logo após o café.

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— Vossa Senhoria vai sozinho? — Newman encarou-o surpreendido.— Vou, vou sozinho. E não quero saber de perguntas quanto ao meu

destino e o porquê de minha viagem. Conto com você para controlar os curiosos.

— Vai ser difícil, milorde. O que devo responder quando me perguntarem onde Vossa Senhoria foi e quando voltará?

— Invente uma resposta qualquer. Sei que você sabe fazer isso muito bem, Newman. A verdade é que vou desaparecer por curto espaço de tempo e não adianta ninguém tentar entrar em contato comigo ou me seguir.

— Isso não me surpreende milorde. Lembro-me de quando Vossa Senhoria era adolescente e desaparecia de vez em quando. Farei o possível para impedir que o procurem, mas, se o pessoal morrer de curiosidade, a culpa não será minha.

— Você sempre me ajudou Newman, em todas as loucuras que fiz. Espero que me ajude agora também.

— Farei o possível, milorde, mas não se trata de uma tarefa que gosto de executar. E as mulheres, nossas hóspedes, ficarão furiosas com seu desaparecimento.

O marquês percebeu que Newman estava realmente preocupado. Mas não havia nada que ele pudesse fazer.

Desceu para o jantar e tentou manter uma conversa mais interessante do que a do almoço. Apenas falando conseguia que a tia ficasse calada por alguns minutos. Mas a cada instante ela o interrompia insistindo ser impossível a ele partir no dia seguinte quando havia tanto que ela desejava ver na propriedade. Achava interessante os três visitarem juntos algumas das fazendas.

O marquês nem se deu ao trabalho de responder.Depois do jantar dirigiram-se ao Salão Azul onde o café e os licores

foram servidos.Ele mal havia saboreado o primeiro gole quando sua tia disse:— Vou deixar vocês dois sozinhos para se conhecerem melhor. Ouça

Ivor, o que Edith tem a lhe dizer; acredito que achará muito interessante.Matilda não esperou que o sobrinho respondesse por recear que ele

protestasse. Saiu depressa da sala fechando a porta.Ivor foi para perto da lareira. Pensava em como se livrar do que supôs

que iria ser um embaraçoso tête à tête.Então, para sua grande surpresa, Edith Bellew encarou-o e disse,

sussurrando:— Sinto... muito. Sinto... muito.O marquês fitou-a e achou que ela não era tão insignificante como

julgara de início. Era apenas jovem, inexperiente e tímida.E ele declarou:— Receio que minha tia seja muito sem tato, como, aliás, é toda

minha família.— Você não quer... se casar comigo? — ela perguntou, gaguejando.

— Francamente, não! — O marquês sacudiu a cabeça. — No momento, não desejo me casar com ninguém.

Edith deu um suspiro de alívio. Sorriu e murmurou:— Eu imaginava... que essa fosse a resposta. Mas ainda... tinha um

pouco de medo.— Medo de que eu quisesse me casar com você? — Ivor perguntou.— É!

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O monossílabo surpreendeu-o. Ele estava interessado em saber o porquê de tudo aquilo.

— Então, por que permitiu que minha tia a trouxesse até aqui e tornasse bem óbvia sua finalidade?

— Ela é grande amiga de meu pai — Edith respondeu. — Os dois combinaram que devíamos nos encontrar e lady Matilda prontificou-se a fazer com que você se casasse comigo.

— Interessante. — O marquês sorriu. — Sugiro que diga a seu pai que no momento não quero me casar. Mas, por falar em casamento, há algum homem em sua vida com quem desejaria se casar?

Uma luz brilhou nos olhos de Edith e o marquês acrescentou:— Conte-me verdade, pois acabei de ver que não aprecia em nada a

missão de minha tia como casamenteira.— Fiquei... com medo! Eu estava terrivelmente apavorada! Receei que

você dissesse sim.—Mas, por quê? — o marquês insistiu. — Há um homem em sua vida?

— ele repetiu.— Há. — Edith olhou para a porta a fim de ver se havia alguém por lá.O marquês sentou-se então ao lado dela no sofá e pediu:— Conte-me tudo sobre seu problema. Talvez possa ajudá-la de uma

maneira ou de outra.— Já me ajudou muito... não querendo se casar comigo. Eu estava

desesperada quando cheguei aqui, temendo que você concordasse com lady Matilda.

— Nunca concordo com ela, se possível. Agora fale-me de você, Edith. Estou realmente interessado.

— Não vai... dizer nada à sua tia? — ela perguntou.— Não! Claro que não! Não direi nada à minha tia e nem a qualquer

outra pessoa.— Pois bem. Quero me casar com um homem que mora perto de nós.

No momento ele não pode pedir para se casar comigo porque papai o rejeitaria na certa, pois ele não tem dinheiro e nem uma casa onde morarmos.

— Fala-me mais sobre esse seu amor — o marquês insistiu, agora com muito carinho.

—Suponho que o amei desde que começamos a dança nas festas. Ele é quatro anos mais velho e disse que, embora tenha viajado por todo o mundo, nunca encontrou uma mulher pela qual se apaixonasse; exceto a mim.

A expressão no rosto de Edith a transformara completamente. De menina simples, insignificante, passara a ter o aspecto de uma deusa.

— O que seu jovem namorado pretende fazer para ganhar a vida? — Ivor perguntou.

— Ele é perito em flores, em jardinagem de um modo geral — Edith respondeu. — Economizou dinheiro e foi ao Nepal onde são nativas as mais maravilhosas orquídeas. E quis conhecer as raras e lindas flores do Himalaia.

O marquês ficou surpreendido, mas não a interrompeu.— Peter, meu namorado — ela prosseguiu —, trouxe de lá grande

quantidade de mudas de flores pouco conhecidas na Inglaterra. Ele insiste que, quando as cultivar em nosso país, muitas pessoas, em especial de Londres, desejarão comprá-las. São lindas, muito mais lindas do que as flores que se vendem por aqui atualmente.

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— Por que razão seu amigo Peter sabe tanto sobre flores? — o marquês perguntou; estava muito interessado no assunto.

— Ele sempre gostou de flores, desde menino. Trazia freqüentemente flores de seu jardim para mim. E eram flores lindas.

— Você disse que ele não tem uma casa para vocês morarem depois de casados? — Ivor perguntou.

— É verdade. Peter me falou que não pode se aproximar de papai porque não tem nada a me oferecer, exceto seu amor.

O marquês ficou emocionado com a simplicidade de Edith. E indagou:— O que pretende fazer? Seu pai impede que você veja Peter?— Não, isso não. Papai não criou grandes problemas quanto ao meu

namoro e nem se importou pelo fato de eu não querer ir a Londres como debutante. Acho que ele gosta de me encontrar em casa quando volta nos fins de semana. Mas lady Matilda decidiu que eu devia me casar com você e convenceu papai de que eu perdia tempo com Peter.

— E que fez seu pai?— Disse que, se você me pedisse em casamento, eu precisava

aceitar. E vi logo que não adiantaria nada eu insistir que amava Peter e dizer que tudo o que eu mais queria era estar com Peter e ajudá-lo a vencer na vida.

— Entendo como se sente — Ivor declarou. — Mas acho que tenho uma idéia de como poderei ajudá-la, e impedir que minha tia continue tentando me forçar a entrarmos na igreja juntos.

— E... qual é essa idéia?— Soube hoje que um de meus chalés, na verdade não se trata

propriamente de um chalé, mas de uma casa, está vago agora. Era habitado pelo antigo chefe dos jardineiros que se aposentou e foi morar em outra aldeia. Meu administrador comunicou-me que não precisamos de mais jardineiros, já temos o suficiente. Portanto a casa poderá ser alugada ou vendida. — Ele sorriu antes de continuar. — Acho que a propriedade me daria um bom dinheiro se fosse vendida com parte do terreno.

Edith o ouvia, os olhos arregalados. O marquês prosseguiu:— Que tal eu investir em seu amigo Peter fazendo-o cultivar flores

exóticas para o mercado de Londres? As pessoas que amam jardins como eu as comprariam na certa. Não apenas as flores como as mudas.

— In... investir? — Edith sussurrou.— Não pensei em pedir um aluguel de vocês. Eu financiaria as

despesas de seu namorado a fim de que ele pudesse começar com o negócio. — Ivor fez uma pausa para refletir e depois explicou: — Naturalmente precisamos de estufas apropriadas, e as construiremos. Porém necessitamos de tempo para isso. — Ele sorriu e acrescentou: — Mas quando tudo estiver terminado e as orquídeas como também as outras flores forem postas à venda, será fácil iniciar o mercado em Londres. Só então Peter me dará uma parte do lucro.

Edith bateu palmas e exclamou:— É verdade o que me diz?! Tem mesmo uma casa onde poderemos

morar?— Pode ir ver a casa amanhã mesmo. E garanto que seu pai achará

esse um bom começo para seu casamento. Naturalmente Peter poderá também aprender muito com os jardineiros que trabalham aqui há anos. E você deve saber, pois acredito que tia Matilda já tenha lhe falado que os

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jardins de meu pai eram os mais famosos do condado, em beleza e originalidade.

— Peter e eu seremos, de fato, uma parte disso tudo? — Edith perguntou.

— É o que sugiro que diga a Peter. Ele poderá explicara seu pai, melhor do que você, as possibilidades do novo empreendimento.

Edith deu um grito de alegria e depois abraçou o marquês, beijando-lhe o rosto.

— Obrigada! Obrigada! — disse. — Como pode ser tão maravilhoso? Tão diferente do que eu esperava?

Havia lágrimas nos olhos dela e o marquês pensou que nunca vira uma mulher se transformar tão de repente, de insignificante a radiosa, como se tivesse sido tocada por uma varinha mágica.

— O que farei agora — o marquês explicou —, considerando-se que vou partir amanhã, é escrever tudo o que foi combinado para você levar a Peter. Amanhã, antes de eu ir embora, direi a meu administrador que seu namorado poderá entrar em minha propriedade livremente.

Edith ouvia-o estarrecida. E o marquês acrescentou:— Vá ver a casa e diga que reformas quer que sejam feitas. Temos

carpinteiros e pintores nas fazendas que farão o que desejar.— Você é o homem mais maravilhoso do mundo. Mal posso acreditar

que isto esteja realmente acontecendo. Penso estar sonhando!— Espero que seu pai entenda minha intenção e perceba que sua

felicidade é mais importante do que todo o resto. Porém temo que você tenha alguns problemas com minha tia.

— Acho que, depois de sua oferta generosa, poderei enfrentar qualquer problema — Edith comentou. — Tudo é tão maravilhoso que tenho vontade de correr ao encontro de Peter para lhe dizer que nossas dificuldades foram resolvidas.

— Rezo para que tudo corra bem. Se quiser um conselho, seja firme com minha tia e não permita que ela interfira. Seu casamento é escolha sua. A única pessoa que poderá dar uma opinião é, naturalmente, Peter.

Edith riu e depois disse:— Peter vai ter vontade de dar um pulo até a lua e, como eu, achará

você a pessoa mais maravilhosa do mundo, tal qual um anjo descido do céu para nos ajudar.

— Providenciarei para que tudo seja encaminhado antes de minha viagem — o marquês acrescentou. —Agora sugiro que vá dormir e sonhe com Peter, e com ninguém mais.

—Sonharei que estamos agradecendo a você e trabalhando para fazer uma grande fortuna.

Edith levantou-se e, quando Ivor abriu a porta, ela beijou-lhe gentilmente o rosto.

— Boa sorte! — ele murmurou —, e possam seus sonhos se transformar em realidade!

— É o que você já fez! Obrigada! Obrigada de novo! Espero que todos os seus sonhos também se transformem em realidade. Vou rezar.

— Duvido que isso aconteça. — O marquês sorriu. — Mas suas preces podem ser mais poderosas que as minhas.

Edith saiu correndo da sala, e Ivor teve a impressão de que ela corria atrás do homem que amava.

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Ele voltou para a escrivaninha. Após dar uma vistad'olhos nos relatórios das fazendas escreveu o que queria que fosse feito em favor de Edith. Entregou em seguida as instruções ao administrador, certo de que ele, como homem competente que era, faria tudo e sem muitas perguntas.

Ao menos, o marquês pensava, alguma pessoa iria feliz para a cama naquela noite.

"Agora apenas posso esperar", disse a si mesmo, "que um dia eu me sinta como Edith se sente agora."

Mas achava pouco provável. A menos que houvesse um milagre, não encontraria a mulher que procurava.

Porém, foi com uma sensação de prazer que subiu para o quarto. Afinal ele conseguira, ainda que por acaso, fazer uma pessoa feliz.

Não tivesse sido por causa da idéia do duque para que ele procurasse o amor, nunca teria mudado a vida de Edith. Acreditava que tudo fora como um verdadeiro passe de mágica.

"É o que desejo para mim", pensou antes de ir para a cama.Mas sabia que pedia o impossível. A vida, afinal, já lhe dera tanto!

Seria avidez pedir mais.Ao fechar os olhos teve a sensação de que Edith, em algum quarto da

casa, rezava por ele.

CAPÍTULO IV

marquês partiu às sete horas em ponto, antes de seus hóspedes descerem para o café da manhã. Ele não queria ver mais a tia.O

Além disso não desejava conversar de novo com Edith sobre o que fora combinado na véspera. Tudo poderia ficar estragado se a troca de palavras se fizesse na frentede tia Matilda.

Ele escrevera uma carta não apenas para Peter sobre a casa e as flores como também para lorde Bellew. Contou a este último que estava encantado por ter conhecido sua filha. Comunicou ao lorde que sugerira a Peter uma sociedade.

Sabia que, depois disso, lorde Bellew encontraria dificuldade em recusar à filha permissão para o casamento com o homem que ela amava.

Firefly, o magnífico puro sangue, estava pronto à espera. O cavalariço ajudou o patrão a colocar as duas grandes malas na montaria. Ivor achava pouco elegante aquele modo de viajar, mas não havia outra maneira decarregar sua bagagem.

Se queria mesmo parecer um sr. João Ninguém, era importante que não aparecesse dirigindo carruagem elegante ou qualquer outro meio de condução que evidenciasse riqueza.

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Enquanto seguia pela estrada pensava no nome que se daria ao iniciar a aventura. Decidiu por Milton, nome comum e fácil de ser lembrado. E, por que não John Milton? John era o nome de seu avô. Ivor na realidade fora batizado como Ivor John. Pois bem, seu nome seria John Milton dali por diante.

O dia estava lindo. Havia apenas uma brisa suave que acariciava-lhe a face.

Ele atravessou a aldeia agora silenciosa. As venezianas das casas ainda se mantinham fechadas. E comparou-se a um forasteiro em terra estranha, sem saber para onde ir e não tendo pessoa alguma com quem se encontrar.

Abandonou a estrada e entrou na floresta. Os primeiros três quilômetros ainda faziam parte de suas terras. Quando chegou à fronteira, tomou a direção do norte, pois imaginava que seus amigos seguiriam para o sul.

Passou por um grande número de pequenas aldeias sem ver nada que lhe prendesse a atenção. As horas corriam e sua fome apertava. Parou então numa estalagem com aspecto decente.

Era toda pintada de branco e dava para um jardim público onde havia um lago com patos.

"A comida talvez seja boa", pensou, "e terei chance de perguntar o que está acontecendo de interessante por aqui."

Montado em Firefly ele foi à estrebaria que ficava nos fundos da estalagem. Lá, providenciou um balde de água para o cavalo antes de entrar no restaurante, pequeno, mas agradável. Perguntou à pessoa que o recebeu se havia algo para comer.

O homem com quem falou devia ser o dono. Ele sorriu como se fosse uma coisa excepcional ter um freguês àquela hora.

— Quer sentar-se fora ou dentro, sir? — o homem perguntou.— Acho que fora é melhor — o marquês respondeu. — O dia está

lindo.Fora, havia a costumeira longa mesa onde os homens da aldeia

sentavam-se à noite para conversar e tomar cerveja, quando o dia de trabalho terminava.

Naquele instante não havia ninguém e Ivor acomodou-se no banco duro.

Os chalés ficavam um pouco além e eram atraentes com seus telhados vermelhos e janelas cheias de jardineiras com flores.

O dono da estalagem voltou correndo e disse que sua mulher estava preparando a comida. Perguntou o que ele gostaria de beber.

O marquês escolheu cidra, pois tinha esperança de que tivesse sido feita em casa.

— Não é sempre que temos fregueses a esta hora do dia — o proprietário comentou. — Todos aqui trabalham até mais tarde. Minha mulher sempre se queixa que a comida armazenada estraga facilmente.

— Bem, mas como estou faminto, nada vai se estragar hoje. Fale-me de sua aldeia. Nunca estive aqui antes, portanto não sei nada acerca do local.

— O nome da aldeia é Little Meadowick — o estalajadeiro informou — e, como vê, é um lugar quieto e nada acontece de diferente aqui, ano após ano.

— E os jovens, o que fazem? Devem se aborrecer muito.

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— Bem, alguns tentam dar um pouco de movimento região. E, como não fazem desordem, não posso me queixar.

— Conte-me alguma coisa sobre esses jovens alegres. O proprietário riu.— As mais entusiasmadas são as duas filhas do novo pastor da aldeia,

homem muito bom.— Quer dizer que a família do vigário é que anima a aldeia?

O estalajadeiro riu mais uma vez.— O senhor poderá julgar por si próprio — disse. — Elas virão aqui em

poucos minutos a fim de comprar o necessário para a festa da floresta.— Uma festa na floresta?! — o marquês exclamou. — Coisa bem fora

do comum e interessante.— Diga isso a elas; talvez o convidem. Assim que o proprietário acabou de falar, a mulher o chamou da

cozinha. O homem correu e pegou a bandeja com a comida preparada para o marquês. Era simples, mas deliciosa e bem feita. Ivor comeu com prazer e pediu outro copo de cidra, bebida que nunca tomava em Londres, mas que achava apropriada para o campo.

Gostou do queijo, também feito na estalagem. Estava muito fresco.— Você é um homem de sorte por ter mulher tão eficiente — o

marquês observou.— Sim, ela é muito ativa e quer como eu, ganhar algum dinheiro

enquanto somos jovens. Por isso tentamos atrair fregueses e trabalhamos tanto.

Como o homem parecia não ter mais do que trinta e cinco anos, o marquês sorriu e disse:

— Você tem muito tempo ainda para fazer fortuna. Mas, como sua mulher é bastante talentosa na cozinha, é uma pena ficar perdida nesta aldeia.

— É verdade — o proprietário concordou. — Muitas pessoas aqui nem sabem o que é uma boa refeição.

Antes que o marquês pudesse responder, viu duas moças atravessando o gramado. Adivinhou pelo modo como se vestiam que eram as filhas do pastor.

E não se surpreendeu quando o proprietário exclamou:— Cá estão elas! O senhor vai conhecer miss Alice e miss Melanie, e

saberá o que pretendem fazer.As moças se aproximaram. Deviam ter mais ou menos dezesseis ou

dezessete anos e eram simpáticas ainda que não lindas.Encararam o marquês com curiosidade.— Boa tarde — ele disse. — Acabei de saber, pelo proprietário desta

encantadora estalagem, que vocês são a alegria da aldeia.A que parecia ser a mais velha das duas, Alice, explicou:— Ele deve ter contado muitas histórias sobre nós. Mas todos nesta

aldeia são pacatos demais, e precisamos fazer alguma coisa para animá-los.

— É claro que precisam — concordou o marquês. — Conte-me o que estão fazendo agora.

As duas irmãs se entreolharam como se achassem que ele tinha alguma razão especial para fazer o pedido. Mas, que razão?

O proprietário, que chegava com outro copo de cidra, disse:

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— Este cavalheiro gostou muito de nosso jantar. E, enquanto comia, eu lhe falava sobre as duas moças que alegravam nossa Little Meadowick.

— É o que fazemos — Alice declarou.— Que tal vocês duas sentarem-se aqui comigo para contar tudo

sobre isso? — o marquês sugeriu. — Tomem um copo de cidra ou de qualquer outra bebida pela qual tenham preferência.

Foi Alice quem respondeu:—É muita amabilidade sua e aceitamos o convite embora meu pai

insista que não devemos conversar com estranhos.— Pelo que vejo — o marquês observou —, não há muitas pessoas

com quem eu possa conversar. E, estando sozinho, seria uma amabilidade de vocês conversarem comigo.

Melanie sorriu e concordou:— É o que se espera das filhas do pastor e, naturalmente, a casa

paroquial é um lugar onde a amabilidade é grátis.— Agora diga-me o que vão fazer — o marquês pediu.— Vamos ter uma festa na floresta esta noite — Melanie respondeu. —

Se fizéssemos essa festa no salão da igreja ou em qualquer outro lugar da aldeia, os mais velhos protestariam dizendo que estão sendo incomodados! Portanto, pedimos aos jovens que desejam aproveitar a vida que se juntem a nós nas festas da floresta. Assim os mais idosos não serão perturbados.

— Muito boa idéia — o marquês aprovou-a.O dono do restaurante apareceu com uma enorme xícara de café,

dizendo:— Minha mulher acha que nas melhores casas toda a refeição termina

com café. Por isso trouxe-lhe uma xícara, sir, e espero que goste de nosso café.

— Vou gostar. Estas duas jovens também vão beber alguma coisa.— Acontece que acabamos de receber uns limões frescos da

mercearia. Minha mulher sabe fazer uma limonada deliciosa.— Oh, por favor, dê-nos então um copo dessa limonada — Melanie

pediu. — Adoro limonada e é difícil encontrar limões nas mercearias.— É verdade — o proprietário concordou. — Minha mulher vai então

preparar uma limonada para as meninas.— Aonde o senhor está indo? — Alice perguntou ao marquês assim

que o estalajadeiro foi para a cozinha.— Passeava um pouco a cavalo, sem destino — ele respondeu

evasivamente.— Nesse caso, se está fazendo uma parada aqui, deve ir à nossa festa

esta noite. É um pouco mais velho que o pessoal do nosso grupo, mas acho que vai gostar.

— Tenho certeza que sim. E muito obrigado pelo convite. Você me ajudou a resolver ficar aqui. E, uma vez que a comida foi boa, acho que a cama também será.

Alice sussurrou:— O dono é um homem muito competente, bom demais para esta

aldeia. Estamos sempre com medo que se mude e vá a um lugar onde haja mais pessoas que comprem sua cerveja.

— E vocês, de onde vieram? — o marquês perguntou.— Meu pai era um cura em Bristol, e quando lhe ofereceram uma

posição aqui, imaginou que iria subir na hierarquia da igreja. Ele não tinha idéia de que este local era tão ermo!

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— Vocês se divertiam mais em Bristol?— Claro que sim — Alice respondeu. — íamos a uma escola onde

havia grande número de rapazes. No Natal tínhamos uma infinidade de festas. No verão jogávamos tênis, nadávamos e praticávamos todo o tipo de esportes.

— Sinto muito por vocês — o marquês declarou. — Mas tenho certeza de que preferem morar no campo do que na cidade.

— Não exatamente! — Melanie respondeu. — Afinal, não é nada agradável não se ter com quem falar a não ser com os velhos aposentados. Os jovens abandonam a aldeia para trabalhar fora; e papai, acho, já se arrependeu de não ter ficado em Bristol.

— Estou certo de que se seu pai conversar com o bispo que o mandou para cá e lhe disser que deseja sair daqui, ele o mandará a uma diocese bem mais agradável.

— Duvido — Alice afirmou. — A igreja sempre envia um pastor à diocese onde há vaga, não se importando se ele tem qualidades para ocupar posição melhor.

— Mas eu vou lhe dizer o que o senhor pode fazer para nos ajudar — Melanie declarou. — Pode transportar a cerveja e os sanduíches até o lugar que escolheremos para a festa. Com um cavalo, tudo fica mais simples. Teremos chance de encontrar um local mais distante do que o usual, e melhor.

O marquês sorriu e prontificou-se:— Vou ajudá-las. Tenho a impressão de que a festa de vocês é

diferente de qualquer outra festa do mundo.As duas irmãs riram.— Sem dúvida — Melanie concordou. — Mas espere para ver. Ficará

surpreendido ao constatar como nossos convidados se divertem.O marquês estava intrigado. Não entendia como essas duas quase

meninas podiam viver naquela pacata e distante aldeia. No entanto, diferente das demais jovens que conhecera, queriam fazer alguma coisa para dar vida ao local.

Ele terminou de tomar café enquanto as duas bebiam limonada.Em seguida foi buscar Firefly na estrebaria e levou-o ao pátio. As

moças já estavam lá, carregando uma caixa com grande quantidade de garrafas de cerveja.

— Achamos — Alice disse ao marquês —, que seria muito mais fácil o senhor levar isto, pois tem uma montaria. Nas outras vezes nós mesmas transportamos tudo em sacos nas costas.

Ivor não fez oposição, mas achou que Firefly já estava bastante carregado, considerando-se as malas que foram colocadas em ambos os lados da sela.

Não quis discutir, mas, se resolvesse mesmo passar a noite na estalagem, seria bem mais interessante deixar já toda sua roupa lá.

— Vou lhes contar o que pretendo fazer — disse então. — Conversarei com o proprietário e perguntarei se posso pernoitar na estalagem. No caso afirmativo, minha bagagem ficará aqui e poderei pôr mais peso na montaria.

As meninas concordaram e o proprietário ficou encantado com o novo hóspede.

O melhor quarto foi-lhe imediatamente preparado e as malas foram retiradas do lombo de Firefly.

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A mulher do estalajadeiro acondicionou as garrafas de cerveja em duas caixas menores e colocou-as de cada lado da montaria.

Isso levou algum tempo para ser concluído.O marquês, embora nunca tivesse feito nenhum trabalho manual, teve

muito mais agilidade que as moças Para transformar Firefly num útil animal de carga.

Depois que as garrafas de cerveja foram arrumadas, vieram os sanduíches, os biscoitos e os bolos. Tudo precisava ser posto em posição segura.

O marquês amarrou os volumes na sela e se deu conta de que não havia lugar para ele.

Então, puxando Firefly pela rédea, pediu às duas moças que seguissem na frente.

— Nunca antes fizemos uma festa no lado da aldeia aonde iremos agora — Alice comentou. — Jamais revelamos aos convidados o local até nos encontrarmos no adro da igreja.

O marquês teve vontade de dizer que não achava uma igreja lugar apropriado para o início das festividades. Mas logo imaginou que isso fizesse parte da atração da festa.

Todos reunidos, as duas moças caminharam na frente. O grupo seguia vagarosamente. Ivor lamentou não estar montado, mas Firefly parecia muito feliz.

Na extremidade da floresta havia um excelente local, isolado, perfeito para o tipo de festa que iria ter lugar. As meninas consideraram-no perfeito.

Explicaram ao marquês que no ano anterior a festa fora do outro lado da aldeia. Como o solo estivesse lamacento, as mães fizeram um escarcéu quando os filhos voltaram para casa cobertos de lama.

Alice e Melanie comentaram que passaram horas lavando seus vestidos e que grande parte da lama não desaparecera.

O marquês achou interessante estar em contato com pessoas que jamais conhecera antes, e notou que cada uma delas dava o melhor de si. Isso o fez lembrar-se de que maioria de seus amigos ricos queixava-se quando não obtinha exatamente o que desejava, e no momento certo.

As duas moças e o marquês desembrulharam a cerveja e os comestíveis. Cobriram estes últimos para que os coelhos não os devorassem.

Quando acabaram de fazer tudo, já estava escuro.— Teria sido melhor se o senhor tivesse jantado antes de vir para cá —

Alice observou. — E, por favor, esconda seu cavalo, caso contrário todos quererão dar uma volta nele.

Isso perturbou um pouco o marquês, pois não gostava que ninguém montasse Firefly.

— Eu irei à estalagem — ele disse — e voltarei para cá na hora que vocês determinarem.

As duas moças se consultaram e chegaram à conclusão de que ele poderia retornar depois das nove; a festa estaria ainda no auge.

Ivor não tinha idéia do que encontraria quando voltasse, nem do que as irmãs estavam planejando. Mas achou que seria melhor não estragar tudo com sua curiosidade.

Disse que estaria com elas um pouco depois das nove horas, e foi dar um passeio montado em Firefly.

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Constatou que a aldeia era bem maior do que pensara ao chegar. Os chalés, pequenos, pareciam muito pobres. Já a igreja era grande e suntuosa.

Ele pôde ver também que a casa paroquial, ao lado da igreja, tinha aspecto acolhedor.

Imaginou que a maioria dos pastores, incluindo o pai das meninas, devia gostar mais de trabalhar em lugares pequenos. Exigiam menos trabalho do que cidades como Bristol.

Contudo, podia entender a razão pela qual Melanie e Alice, moças bastante atraentes, achavam a aldeia monótona. Naturalmente prefeririam ter chance de se divertir mais, como acontecia em cidades grandes.

O dono da estalagem ficou encantado quando o marquês, de volta, pediu para jantar, e sua mulher providenciou uma refeição tão boa quanto à anterior.

Ele não estava só agora. Vários senhores de idade, moradores da aldeia, fizeram-lhe companhia.

Primeiro tomaram suas bebidas no terraço, fumando cachimbo. Ivor conversou com eles e descobriu que todos trabalhavam na lavoura, em terras pertencentes a vários proprietários.

Meia hora mais tarde dois homens, parecendo caixeiros viajantes, entraram. Queixavam-se de que o local era difícil para negócios e que ficariam muito contentes no dia em que pudessem abandonar a região.

O marquês não falava quase nada, apenas ouvia a conversa.Os vendedores continuavam insistindo que era perda de tempo tentar

vender mercadorias a moradores do campo. Tinham muito pouco dinheiro disponível e pareciam satisfeitos com o que já possuíam.

Ouvindo-os, Ivor aprendeu algo novo. Nunca antes se preocupara em saber se os homens que viviam em Milverton eram felizes com suas posses. Nunca antes se preocupara com os problemas deles.

Recordou-se então de que sua mãe, ao contrário, fora maravilhosa. Quando os colonos adoeciam, levava-lhes frutas e mel. Quando um novo bebê vinha ao mundo, corria para ajudar as famílias dos recém-nascidos.

Seu pai também se interessara pela vida dos homens que trabalhavam para ele.

Ivor prometeu a si mesmo que, se um dia decidisse morar em Milverton Hall, poria em ação novos métodos de trabalho para incentivar seus homens.

Pensaria também nos jovens. Era claro que estes sentiam falta dos divertimentos de cidade grande.

"Preciso cuidar disso no futuro", se prometeu.Ele se perguntava se os outros proprietários de terra davam-se ao

trabalho de encarar tais problemas.Resolveu, quando voltasse a Londres, conversar sobre o assunto com

seus amigos do White's Club, e com outros donos de fazendas grandes como a sua.

No fim do jantar Ivor tomou um cálice de vinho do Porto de qualidade média.

Aí constatou que já estava na hora de ir ao encontro das moças na festa.

Já havia trocado de roupa antes do jantar. Usava agora um terno escuro que esperava não chamar muita atenção. Afinal, havia pouca luz na floresta.

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Montou Firefly e rumou para o local onde deixara Melanie e Alice naquela tarde.

A lua clareava a mata e as estrelas começavam a brilhar. Isso facilitaria sua cavalgada por entre as árvores.

Assim que entrou na floresta começou a ouvir a música. Francamente, não esperava que houvesse música.

Chegando bem perto notou que o homem que dedilhava o violão, apesar da pouca idade, tocava muito bem.

Os jovens, e havia mais ou menos uns vinte, dançavam.As moças dançavam sozinhas, sacudindo a saia e exibindo boa parte

das pernas. Os homens davam saltos com as mãos erguidas acima da cabeça.

Aquela cena chocaria até os londrinos e, sem dúvida, sua tia Matilda.Alice foi a primeira a ver o marquês e correu ao encontro dele,

dizendo:— O senhor veio, que bom! Agora vai ver a linda festa que fizemos

aqui, onde ninguém nos vê e pessoa alguma na aldeia pode interferir.Ela precisava falar em voz bem alta por causa do som do violão e dos

gritos dos que dançavam.O marquês, sentado num tronco de árvore caído no solo, observava-os.

Grande quantidade de cerveja era consumida.A dança continuava e os dançarinos ficavam cada vez mais

barulhentos. Isso prosseguiu até a música cessar. Houve então estrondoso aplauso.

— Bis! Bis! — todos gritavam particularmente os homens. Quanto mais jovens, mais barulhentos eram. Alguns tinham ótimo aspecto, corpo atlético. A idade variava entre dezoito e dezenove anos.

A um dado momento um dos rapazes deu um salto mortal e dois outros o imitaram.

Houve uma gargalhada geral da parte das mulheres. Algumas tinham pouco mais de quinze anos, outras mais de vinte. Todas usavam os cabelos soltos e erguiam a saia para dançar.

Um homem começou a tocar violino e a dança prosseguiu com mais entusiasmo ainda.

As mulheres mostravam tanto as pernas que o marquês entendeu por que não queriam que os pais estivessem presentes.

Melanie passou uma garrafa de cerveja para as mãos dele, insistindo:— Beba enquanto ainda temos algumas garrafas. Esta dança deixa os

convidados sedentos.O marquês sorriu e perguntou:— Você está gostando da festa?— É um pouco diferente das que dávamos em Bristol — ela

respondeu. — Mas está animando tanto as pessoas que concordaram em pagar um shilling por festas desse tipo.

— É o que vocês costumavam cobrar?— Não, não. Cobrávamos menos antes — Melanie explicou —, mas

como estão bebendo muito, resolvemos aumentar o preço. Acontece que temos algumas dívidas a pagar, mas Alice e eu não tivemos ainda coragem de dizer-lhes que precisávamos suspender as festas até podermos saldar as dívidas.

— É muita bondade de vocês — o marquês declarou. — Porém continuo pensando que é de grande responsabilidade o trabalho que fazem.

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O marquês só pedia a Deus que essa iniciativa por parte das moças não resultasse em desastre.

E pensou nisso de novo uma hora mais tarde.Duas mulheres, essas não muito jovens, e os homens com quem

dançavam, desapareceram na escuridão da mata.Ninguém pareceu se preocupar com o fato. O marquês, contudo,

admitiu que aquela alegria toda poderia se transformar em lágrimas. A bebida chegava ao fim.

Ambos, o violinista e o violonista estavam exaustos.— Você toca muito bem — Ivor disse ao primeiro. — Onde aprendeu?— Com meu avô. Ele deixou-me seu violino quando morreu e eu

continuei praticando sozinho.— Já pensou em ir para o palco?— Não. Nunca estive num teatro, embora tenha ouvido falar deles. Mas

não sei se posso tocar músicas que agradem um auditório sofisticado.Ele falava com simplicidade e o marquês se pôs a pensar em como

poderia ajudá-lo. Perguntou:— Que tipo de trabalho você faz aqui em Little Meadowick?— Trabalho numa fazenda. Cuido das galinhas e dos cordeiros. E

também ajudo na colheita.— E gosta de morar aqui? — o marquês perguntou.— Não é de todo mau. As meninas do pastor conseguem alegrar a

aldeia. Não era assim antes de elas chegarem.— Você tem prazer em tocar para essa turma? — o marquês indagou.— É melhor do que tocar para mim sozinho, lá em casa. E é bom

acompanhar meu amigo no violão.O marquês achou que as duas moças tiveram muita sorte em

encontrar aqueles talentos na aldeia. E se perguntava se havia o mesmo tipo de talentos em sua aldeia.

Outros casais sumiram na mata. Alice apareceu e disse:— Está na hora de irmos para casa! Gostou da festa?— Muitíssimo! Acho que você e sua irmã são muito habilidosas por ter

conseguido trazer tanta alegria a esta aldeia. E acho que deveriam patrocinar um Concerto aqui para permitir que mais gente ouvisse os dois homens que tocaram esta noite. Merecem, sem dúvida, um auditório mais interessado.

— Francamente, não pensamos nisso ainda. Mas não deixa de ser uma ótima idéia. Porém precisaríamos de dinheiro para alugar um salão, e ninguém tem dinheiro aqui.

— Mas garanto que qualquer pessoa compareceria pelo menos uma vez.

— Sim, uma vez quem sabe; contudo, não voltariam. — Alice garantiu. — E precisamos tomar muito cuidada para não nos sobrecarregarmos de dívidas.

— Vejo que é bastante sensata — o marquês comentou. — Espero que encontrem você e sua irmã, dois homens que as levem a um verdadeiro baile.

— Que bom se isso acontecer. Mas, nesse meio tempo, é interessante termos estas festas na floresta. Todos se divertem.

— Vamos para casa? — Melanie interrompeu o diálogo. Nesse momento, uma das mulheres que desaparecera no mato

juntamente com o companheiro saía da escuridão da floresta.

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Havia qualquer coisa neles que fez o marquês concluir que tinham feito amor.

A lua ainda brilhava no céu e as luzes dos chalés se apagavam uma a uma.

— O que os pais dessas moças pensam dessa idéia de vocês? — o marquês sussurrou.

Melanie sorriu e respondeu:— Como eles não têm permissão de comparecer, não imaginam o que

acontece por aqui. Recomendamos aos rapazes e moças que não comentem nada em casa, do contrário seremos impedidos de continuar com o nosso divertimento.

O marquês receou que essa fosse de fato a verdade. Sabia que as pessoas mais velhas ficariam chocadas como modo como se dançava nessas festas e com o que acontecia na escuridão da floresta. Haveria por certo um escarcéu, em especial entre os mais religiosos.

— Se quiserem minha opinião — ele disse —, vocêsprecisam ser muito, muito cuidadosas para não ficar desmoralizadas e para não desmoralizar Little Meadowick. Eu continuo pensando que um concerto ainda seria a melhor opção. Garanto que vocês duas têm suficiente talento, se quiserem usá-lo.

— Posso cantar — Alice declarou. — Mas não sei se alguém me ouviria.Melanie riu e acrescentou:— E eu posso dançar muito bem. Mas minha dança seria considerada

uma ousadia, sendo eu filha de um pastor.— Acho de acordo com o que testemunhei que você poderia muito

bem dançar num palco, considerando-se sua graciosidade e elegância. Gostaria de vê-la no teatro, em Drury Lane, por exemplo.

Ambas riram bastante entusiasmadas.— Oh! Você já esteve em Drury Lane?! — Melanie exclamou. — Lemos

sobre casas de espetáculos nos jornais, mas papai não tem condições de nos mandar a Londres. Por isso trata-se de algo que nunca veremos.

O marquês hesitou um momento e depois indagou:— Vocês têm alguém em Londres com quem possam ficar?— Oh, sim! — Alice respondeu. — Temos uma tia que mora em

Chelsea. Mas, por que pergunta?— Por quê? Bem, foram tão bondosas comigo hoje, impedindo que eu

tivesse uma noite entediante, que quero deixar algum dinheiro com vocês antes de partir amanhã pela manhã. Esse dinheiro pode levá-las a Londres a fim de ver as danças em Drury Lane.

As moças o fitaram, estarrecidas.— Quer mesmo fazer isso? — perguntaram a uma só voz. —

Naturalmente que gostaríamos de ir a Londres.— E mais ainda, eu lhes darei o número de um camarote onde podem

sentar-se e apreciar o show sem pagar nada. Pertence a um amigo meu.— É a coisa mais maravilhosa que já ouvi! — Melanie exclamou. —

Obrigada! Obrigada! Mas não vai se esquecer?— Prometo que não me esquecerei — o marquês respondeu. —

Quando eu voltar à estalagem escreverei todas as instruções sobre o que devem fazer. Mas têm de me prometer uma coisa.

— O quê? — elas perguntaram.— Não contar a ninguém que fui eu quem as mandou a Londres. E

nem mencionem o nome do dono do camarote que irão ocupar.

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— Prometemos! Nós prometemos! — Alice e Melanie responderam em uníssono.

— Quero também que observem bem a dança e que tentem imitar os passos. Assim criarão um divertimento interessante para esta aldeia, o que animará as pessoas a freqüentar a estalagem e talvez trará mais fiéis para a igreja.

— Papai é que vai ficar muito contente — Alice falou. O marquês decidiu, embora não dissesse nada, que ao voltar para a

civilização conversaria com o arcebispo de Canterbury e lhe pediria que melhorasse a situação do pastor da aldeia de Little Meadowick, enviando-o para outra diocese.

As meninas ficariam mais felizes morando numa cidade grande. O campo fora feito para os camponeses, pessoas que não conheciam outro tipo de vida.

Ao chegarem à aldeia, os jovens que acompanhavam o marquês e as duas moças aproximaram-se para dizer "boa noite".

— Foi uma festa maravilhosa, miss Alice — um dos rapazes falou —, e espero que tenhamos outras muito breve.

— Você está dançando bem melhor do que na ultima vez, Joe — Alice comentou. — E este cavalheiro aqui, nosso visitante, acha que deveríamos organizar um Festival no salão da igreja.

Joe riu muito e disse:— Se pensa que alguém pagará para me ver dançar, está enganada.

Mas, de qualquer maneira, adoro festas.O marquês achou que estava na hora de ir para a cama. Agradeceu às

meninas e prometeu que não se esqueceria da promessa de dar um jeito para que fossem a Drury Lane.

Ele entrou na estalagem. O proprietário, que o aguardava, perguntou:— O que as moças prepararam hoje? O senhor demorou para voltar.— Fiz um grande passeio a cavalo também. Mas, antes de tudo, quero

lhe dizer que todos gostaram muito de sua cerveja. Não sobrou uma única garrafa.

— Bem, ao menos isso é bom para mim — o estalajadeiro respondeu.— Acho que foi bom para toda a aldeia. Essas duas moças têm ótimas

idéias e uma habilidade que poucas pessoas possuem. Eu se fosse você, daria qualquer auxílio a elas. Por sinal, persuadi-as a organizar um Festival no salão da igreja.

— Ótimo sir. Assim venderei mais cerveja.— Esta aldeia é linda e muita gente virá aqui para assistir a uma peça

de teatro ou balé. Recomendarei o local às pessoas que conheço.— É muita bondade sua sir. E posso lhe garantir que será sempre

bem-vindo.— Vou partir amanhã cedo — o marquês informou. — Deixarei uma

carta em suas mãos para que a entregue a uma das filhas do pastor. Posso contar com você?

— É claro que pode — o estalajadeiro prometeu.O marquês foi à estrebaria dar uma última vista d'olhos a Firefly.— Vamos partir amanhã, velho amigo — disse ao cavalo. — Talvez

deparemos com outra aventura na próxima parada e espero que seja tão interessante como esta.

Ele achou que Firefly entendera e concordara. Depois passou a mão pela crina do animal e retirou-se.

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Antes de dormir pensou que na verdade não encontrara o que procurava, mas sem dúvida realizara algo de bom. Fizera três mulheres mais felizes do que haviam sido antes de conhecê-lo: Edith, Alice e Melanie.

"Se nada mais acontecer, terei ao menos três pontos positivos em minha vida.

CAPÍTULO V

marquês levantou-se cedo, tomou um substancial café da manhã e depois despediu-se do estalajadeiro e da mulher.O

— Gostei muito de me hospedar aqui e espero voltar.— E nós gostamos muito de tê-lo conosco — a mulher respondeu. —

Acabei de dizer a meu marido que o senhor era um autêntico cavalheiro.— Obrigado pelo elogio — o marquês disse, sorrindo. Em seguida amarrou as malas de cada lado de Firefly, montou,

acenou com a mão para o casal e partiu.Atravessou campos não cultivados e Firefly teve oportunidade de

galopar.Tomou a direção do norte. Ainda achava interessante conhecer melhor

essa parte da Inglaterra, pois na ocasião em que visitara a Escócia fizera a viagem por mar.

O dia estava agradável. O sol brilhava por toda parte mas o calor era suportável.

Ele havia tirado o paletó antes de montar e o amarrara na montaria.Lamentou não ter ninguém com quem conversar. Se tivesse, poderia

discutir acerca das várias coisas que lhe aconteceram desde que saíra de Milverton Hall. Aprendera muito sobre pessoas com as quais nunca se preocupara antes.

Porém, até agora, ainda não aparecera à linda jovem que procurava."Se eu voltar com as mãos vazias", pensou, "continuarei brigando com

minha família por causa de meu casamento. Francamente, não conseguirei mais agüentar esse tipo de conversa."

Faminto, parou numa aldeia mais ou menos igual à anterior. Porém essa era mantida por um senhor de idade.

Não havia nada que pudessem lhe servir para almoço e teve de se contentar com um pedaço de queijo, pão e manteiga. Um copo de cidra acompanhou essa parca refeição.

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Ele se considerou com sorte por poder rematar o pouco que comera com uma xícara de café.

— A que distância fica a próxima aldeia? — perguntou ao proprietário.— Há uma pequena cidade não muito longe daqui — o homem

respondeu. — E o senhor encontrará lá, se quiser passar a noite, um hotel bastante decente.

O marquês seguiu então por uma estrada deserta até as seis horas da tarde quando divisou os telhados de algumas casas.

Era, pensou uma típica cidade que ninguém visitaria a menos que estivesse interessado em paisagens rurais.

Havia poucas lojas no local, e nada atraentes.Chegou ao hotel, uma construção feia, de quatro andares. Contudo,

achou que já era muito tarde para procurar outro local.Perguntou ao recepcionista se podia passar uma noite lá e a resposta

foi afirmativa.A primeira coisa que Ivor fez foi procurar a estrebaria a fim de instalar

Firefly. Encontrou apenas um pátio horrível, onde não havia feno e nem água para os animais.

— O senhor terá de pagar extra pela alimentação de seu cavalo — um criado informou-o agressivamente.

— Pois pagarei o que for preciso, mas quero que meu cavalo seja bem tratado.

Sem muito entusiasmo o empregado providenciou feno fresco e um balde de água.

Tudo feito, o marquês deu-lhe uma boa gorjeta. Imediatamente a atitude do rapaz mudou.

— Muito obrigado, sir — ele disse. — Vou cuidar bem de seu cavalo e arranjarei qualquer outra coisa que for necessária.

— Acho que Firefly ficará contente com o que já tem. Apenas quero que lhe traga outro balde de água fresca amanhã cedo.

— Farei isso, sir.O marquês entrou na estalagem. O gerente, um homem de meia

idade, tinha maneiras rudes.— O senhor quer passar a noite aqui? — perguntou. Era como se ele estivesse protestando em vez de agradecer a

oportunidade de ter um hóspede.— Sim, quero um quarto confortável e um bom jantar — Ivor

respondeu.Inesperadamente o homem riu.—Isso é pedir demais — disse. — Mas vou perguntar à cozinheira se

sobrou alguma coisa.— Obrigado. E gostaria de ver o melhor quarto que o senhor tem aqui.

Quero também água para o banho.— Banho?! — o gerente repetiu atônito. — Por que quer tomar banho?— Porque viajei o dia todo e estou suado e exausto. Um banho, frio ou

quente, viria a calhar.— Bem, vou ver o que posso fazer. Nunca ninguém pediu banho aqui.— Imaginei que houvesse pessoas que gostassem de tomar banho

numa cidade como esta — o marquês declarou.— Bem, tudo o que tenho a lhe dizer é que jamais recebemos um

pedido para banho. Acho que há um hotel aqui nesta cidade onde o senhor poderá tomar banho, mas não sei bem onde fica. Moro no local há apenas quatro meses.

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O marquês teve vontade de procurar o tal hotel, mas estava tão cansado que resolveu ficar ali mesmo.

Finalmente o gerente levou-o ao segundo andar onde havia vários quartos, todos vazios.

— Estes são os melhores da casa. Mas o senhor terá de pagar mais por eles.

— Tudo bem — o marquês concordou. — Mostre-me o melhor de todos.

O gerente levou-o a um quarto simples, com uma cama de ferro, de casal. Era dura, mas os lençóis estavam limpos.

— Muito bem — Ivor falou. — Fico com este. E lhe serei muito grato se me trouxer um pouco de água quente para eu lavar as mãos e o rosto.

— Só temos água fria. Por isso falei que não era possível providenciar um banho. Como pode uma pessoa ficar sentada na água fria durante muito tempo?

— Entendo, mas assim mesmo quero lavar meu corpo todo. Portanto, se for possível, traga-me essa água fria o mais depressa que puder.

O gerente retirou-se. Ivor podia ouvi-lo falando sozinho enquanto descia as escadas. Sem dúvida estava perplexo pelo pedido tão fora do comum.

Enfim, a água foi trazida. Por gentileza especial, vieram dois baldes de água fria e uma pequena lata de água quente.

O marquês deu gorjetas substancias aos rapazes que carregaram a água.

Para se consolar após banho precário, imaginou que encontraria um lago em local reservado onde pudesse nadar nu.

Enfim desceu para jantar. Havia na sala grande número de pessoas. A comida não era nada apetitosa. Constava de uma sopa sem gosto, de carne dura e mal temperada; os legumes pareciam ter estado nas prateleiras de um mercado durante dias. O marquês recusou a sobremesa, um pudim de aspecto duvidoso. Satisfez-se com um pedaço de queijo. Não havia seleção de vinhos e ele tomou um copo da cerveja local.

Como não tinha com quem conversar, ficou observando cada pessoa da sala. Desejou conhecer a história de todas elas. Seriam pessoas interessantes como as da aldeia anterior? Não pareciam. As mulheres, de meia idade, comiam sem falar enquanto os homens conversavam e gesticulavam o tempo inteiro.

Terminado o jantar uma jovem entrou na sala e foi ao encontro dele. Devia ter mais ou menos vinte e cinco anos de idade, e seus cabelos louros eram obviamente tintos.

Sem pedir permissão, sentou-se à sua mesa e disse:— Vim falar com você porque meu tio, o gerente deste hotel, contou-

me que havia aqui um hóspede diferente dos demais.— Como não há nada de excitante sobre eles — o marquês respondeu

—, fico grato em saber que sou diferente.— É diferente, sem dúvida — ela disse — e, se quiser minha opinião,

não devia se misturar com essa gente.— Talvez você esteja agindo de maneira pouco delicada para com os

hóspedes de seu tio — o marquês observou. — Sei que esses homens sentados à mesa são caixeiros viajantes que tentam vender suas mercadorias.

— Eles tentam, mas não sabem como atrair um comprador — a mulher comentou.

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— E como você os atrairia? — Ivor perguntou.A moça não respondeu. E, apoiando-se com os cotovelos sobre a mesa,

pediu:— Fale-me de você. Nunca encontrei um homem que não quisesse

falar sobre si.— Talvez eu seja a exceção. Mas estou muito interessado em saber

coisas sobre você e seu tio. Ele é dono do hotel e você o ajuda?A mulher achou graça.— Não, meu tio não é o dono, é pago para gerenciar este hotel; e os

donos, acredite-me, são pessoas ávidas de dinheiro.— E o que você faz aqui?— Adivinhe! Dou-lhe três chances para adivinhar.

O marquês achou que pisava em terreno perigoso e preferiu mudar de assunto.

— Fale-me desta cidade. Que divertimentos há aqui para pessoas jovens como você?

— O que quer que eu responda? Há aqui enorme quantidade de homens. E não será necessário lhe dizer que são todos do mesmo tipo, com apenas uma idéia na cabeça, e é sobre isso que quero lhe falar.

— Suponho que a única idéia que eles têm na cabeça é fazer dinheiro — o marquês respondeu.

— Bem, mas alguns têm outras idéias... E você, o que procura?— Exploro o campo. Tomei a direção norte e essa é a primeira cidade

que visito. Penso que a acharei interessante.— Se pretende encontrar alguma coisa interessante sentado na sela

de um cavalo, desista, pois não a encontrará.— E que divertimentos há por aqui? — o marquês quis saber.

Houve uma pausa. Em seguida a mulher aproximou-se mais dele e disse:

— O que acha? Eu sou o divertimento, é claro!—Tive um longo dia hoje e pretendo ir para a cama cedo — o marquês

explicou. — Mas não quero ser rude não lhe oferecendo um drinque. O que prefere tomar?

— Um conhaque. O garçom sabe qual é minha marca preferida.O marquês ergueu o braço. O garçom veio imediatamente e ele pediu

o conhaque.— O que geralmente tomo Jack! — a mulher informou. — E bem forte,

senão jogo o copo na sua cara.— Não fique nervosa, miss Flo — o garçom disse. — Sabe que o

gerente poderá se irritar com a senhorita.— Você se enerva com o pessoal daqui às vezes? — o marquês lhe

perguntou.— Irritei-me outra noite — Fio respondeu. — Um homem que desejava

se divertir desafiou-me para que eu dançasse em cima da mesa. É claro que fiz o que ele me pedia, mas meu tio ficou furioso, não porque dancei, mas porque a mesa arriou e ele teve de chamar um carpinteiro no dia seguinte.

— Céus! — Ivor exclamou. — Em todo o lugar em que vou há sempre alguém que queira dançar. Deve haver nesta cidade um salão grande onde se possa dançar ao som de uma orquestra.

— Um baile, você quer dizer. Temos bailes aqui de vez em quando, mas não são nada divertidos. Os homens comparecem empertigados e as mulheres usam luvas.

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— Pensei que você gostasse disso — Ivor observou. — Afinal, todos os bailes em Londres são assim e os presentes se divertem muito.

— Acho esse cerimonial todo muito aborrecido. Eu gosto de homem que é homem, e é o que penso que você é.

E mais uma vez ela o encarava de um jeito que Ivor conhecia bastante bem.

O garçom voltou com o conhaque e o marquês pediu a conta.— A conta estará pronta amanhã de manhã quando o senhor sair,

incluindo o pernoite — o garçom respondeu.— Pode reservar esta mesa para meu café amanhã de manhã? — o

marquês pediu. — Espero descer às oito horas.O garçom sacudiu a cabeça mostrando que entendera e retirou-se.— Que tal conversarmos em algum quarto do hotel? — Flo sugeriu. —

Lá ficaremos sozinhos.— É muito amável de sua parte sugerir isso — Ivor respondeu. — Mas

como tenho de partir bem cedo amanhã, e tendo tido um dia longo, precisa entender que necessito ir para a cama. — O marquês levantou-se da mesa. — Foi um prazer conhecer você, Flo, e sinto não poder vê-la dançar esta noite.

— Não tenha tanta certeza disso — ela insistiu. Ivor estendeu-lhe a mão.— Foi um prazer conhecê-la. — repetiu. — Desejo-lhe toda felicidade

no futuro.—Talvez meu futuro feliz não esteja tão longe como pensa — ela

murmurou.O marquês saiu da sala e foi para seu quarto. Olhou á volta. Constatou

que era parcamente mobiliado. Além da cama havia uma cômoda com um pequeno espelho, quatro poltronas e um toalete com duas bacias e jarros de porcelana. E, por incrível que isso pudesse parecer, uma escrivaninha.

Ele despiu-se e entrou na cama. Estava mais cansado do que imaginara. E, embora o colchão fosse duro, tinha certeza de que dormiria em paz.

Havia apenas fechado os olhos quando percebeu que o trinco da porta girava. Mas, segundos depois, ouviu passos no corredor, como se a pessoa que estivera forçando a porta resolvesse se retirar. Adormeceu.

Dormiu sossegadamente e na manhã seguinte desceu para o café.O garçom, contando com boa gorjeta, aproximou-se no mesmo

instante em que ele entrou na sala.Serviu-lhe ovos, bacon e uma xícara de chá preto.Ivor achou aquilo tudo um luxo. Para seu grande alívio, não viu Flo, que

não apareceu nem mesmo quando ele despediu-se do gerente agradecendo-lhe pela atenção.

— Aonde vai agora? — o gerente perguntou.— Não tenho idéia, mas sem dúvida para o norte, e espero encontrar

algo interessante na primeira aldeia em que ficar.— Não vai encontrar nada interessante por aqui. É só a possibilidade

de ganhar dinheiro que atrai negociantes. Mas a maioria deles vai embora de mãos vazias.

— Por que isso? — o marquês indagou.— Porque ninguém tem dinheiro de sobra nestas áreas. 0 que as

pessoas ganham num ano mal dá para comer.— Entendo — o marquês concordou.

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— Só compram algo novo quando o velho não serve mais para nada. Mas penso que, se esses vendedores trouxessem objetos interessantes, algumas pessoas poriam a mão no bolso para comprá-los.

— Tem razão. O que me surpreende é o fato de o senhor não manufaturar algum artigo fora do comum aqui; talvez viesse a ser um sucesso de venda.

O gerente deitou a cabeça para trás e gargalhou— Nós todos queremos fazer isso, mas, se me perguntar o que

realmente desejo, eu lhe respondo que é ter um hotel na praia ou numa cidade onde as pessoas tenham dinheiro e gostem de usufruir o que houver de melhor.

— É verdade. — o marquês disse. — Seria muito bom o senhor se mudar para alguma cidade de população mais densa e de maior poder aquisitivo.

— É o que planejo. E vou lhe confessar uma coisa. Minha sobrinha me amola dia e noite para que mudemos de cidade.

— Compreendo a idéia dela, talvez esteja perdendo tempo aqui — o marquês opinou.

— Bem, então espero que mencione isso aos donos do hotel. Eles têm outros hotéis em Liverpool e em Glasgow, que eu gostaria muito de gerenciar.

— Espero que consiga um desses hotéis — o marquês disse. — Adeus agora e muito obrigado mais uma vez.

Ivor foi ao pátio carregando as malas e as amarrou na sela de Firefly.Deu uma gorjeta ao empregado e montou.Apenas começava a cavalgar quando viu Flo na janela acenando-lhe

adeus. Ele ergueu o chapéu e Flo continuou movendo a mão até que ele desaparecesse.

"Esse é o tipo de coisa que sempre procurei evitar",Ivor pensou. "Quanto mais cedo eu voltar e disser ao duque que tudo

foi uma loucura, melhor.E foi com uma sensação de alívio que se viu de novo no interior da

mata. Os pássaros cantavam empoleirados nas árvores e as borboletas voavam de flor em flor.

Firefly sentiu-se livre e galopou até Ivor segurar-lhe as rédeas.— É melhor irmos com mais calma, amigo — ele disse. — Temos ainda

grande distância a cobrir. Se nada de interessante acontecer nos próximos dois ou três dias, voltaremos para casa e me darei por vencido.

Firefly não respondeu. Claro.Mas o marquês concluiu que fazia a decisão acertada. Achava que os

últimos dias de sua vida passaram como anos em branco. Deixaram-no, de fato, desolado.

Ele começava a refletir por que fora tão idiota aceitando o desafio do duque. Seria impossível encontrar uma mulher linda e excepcional apenas percorrendo a cavalo estradas quase desertas. Também estava numa parte da Inglaterra onde não havia pessoas iguais a ele. Esperara, viajando pelo país, encontrar enormes propriedades como a sua, ou mansões antigas antes ocupadas durante séculos por famílias aristocráticas. Mesmo não conhecendo ninguém, arranjaria um meio de se apresentar.

"Porém nunca pensei que tivesse de encarar este tipo de problema. Meu consolo é que o duque é tão idiota quanto eu", disse a si mesmo.

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Às vezes se perguntava se em Londres estavam achando falta nele. Mas de uma coisa tinha certeza, os convites para festas se empilhavam em sua escrivaninha. Harrison, o secretário, devia estar quase louco.

Bastava pensar no conforto de sua casa em Berkeley Square e em Milverton Hall para concluir que seus amigos acreditavam que ele estava doido. Ficara o tempo todo hospedado em hotéis de baixo nível, sendo o pior da noite da véspera. Dormira claro que dormira, ma não tivera um valete para ajudá-lo a vestir-se pela manhã, nem cavalariços para trazer Firefly à sua porta. De acordo com o planejado, esse desconforto continuaria Durante os próximos três meses.

"Tudo isto está sendo ridículo", admitiu. "Quanto mais depressa eu voltar à realidade, tanto melhor."

À medida que seguia em frente, se perguntava com mais veemência por que fora tão tolo a ponto de aceitar o desafio do duque. De início achou-o divertido, quanto a isso não havia dúvida. Mas agora...

— Estou cansado de tudo, cansado e arrependido — ele falou em voz alta. — Percebeu, tanto quanto eu, Firefly, que as pessoas que encontramos não são do tipo com as quais passaríamos mais do que três dias?

Firefly limitou-se a sacudir a cabeça. E Ivor achou que ele dizia que concordara. Pobre animal fora empurrado numa baia pouco confortável, sem nenhum cavalo conhecido com quem pudesse se comunicar.

— Vou lhe dizer o que faremos Firefly — Ivor continuou falando. — Arriscaremos mais uma vez. Depois seremos suficientemente corajosos para confessar que nos demos por vencidos e voltaremos a casa. Contanto que não apareça tia Matilda para me impor uma esposa, aceitarei qualquer mulher.

Firefly deu início a um rápido trote. Parecia querer regressar logo ao lar.

Estaria ele sentindo falta das coisas emocionantes que aconteciam em Londres? As belezas londrinas eram com certeza mais interessantes do que Flo.

Ivor riu ao pensar que Flo tentara encontrar-se com ele no quarto. Esperava ser aceita tal qual ele aceitara a condessa?

Depois disse a si mesmo que estava jogando fora sua vida, sua juventude, e as alegrias que Londres lhe proporcionava. Mas, ao voltar, de forma alguma arriscaria ver Juno de novo. Em Londres encontraria dúzias de beldades que a rivalizavam. Mulheres que se agarrariam a ele bastando que lhes fizesse um elogio.

— Vamos voltar logo a casa, Firefly!Ivor parou para jantar numa estalagem de estrada. A comida foi

razoável, mas longe de ser excelente. Havia apenas duas pessoas na sala, ambas com aspecto pouco convidativo. Teve ímpetos de voltar a Londres imediatamente. Mas resolveu tentar mais uma chance. Se falhasse, então regressaria sem dúvida ao lar. E diria ao duque que desistira do desafio.

Aceitando a mulher escolhida por sua família, cumpriria a missão de providenciar um herdeiro para o título. E assim acabaria com as censuras que o amofinavam por tanto tempo.

Cavalgou um pouco mais depressa. Se chegasse à próxima aldeia tarde demais, não encontraria uma estalagem onde passar a noite. E tanto ele como Firefly estavam exaustos, um cansaço não apenas físico como mental.

"Foi uma loucura virmos até aqui, para início de conversa", pensou.

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Mas alegrou-se ao ver, um pouco adiante, a torre de uma igreja.— Este será nosso último porto, Firefly — declarou em altas vozes. —

Prometo que terá uma boa noite, amigo, mesmo que, como eu, me sinto sozinho.

Ao falar, enxergou os lindos olhos da condessa, suplicantes. Ela também tinha mãos suaves e lábios convidativos iguais aos das outras mulheres que ele amara.

"Devia estar louco quando concordei em vir aqui", repetiu mentalmente, pela milésima vez.

A próxima aldeia ficava um pouco adiante.Quando ele ia esporear Firefly, um homem surgiu por detrás das

árvores. Estava bem vestido e era apresentável.Ivor segurou as rédeas da montaria pensando se tratar de alguém que

estivesse perdido e precisasse de auxílio. Mas, ao invés disso, o homem declarou:

— Posso ver que o senhor é um viajante indo para minha aldeia. Pode me ajudar muito se hospedando na nova estalagem que eu e meus amigos acabamos de inaugurar.

— Uma nova estalagem?! — o marquês exclamou.— É. Reformamos uma velha e a fizemos mais confortável e diferente

das demais desta aldeia.— Como é nome da estalagem? — o marquês interessou-se em saber.— Waterfold. E posso lhe afiançar que não encontrará nada melhor por

aqui. Ficará muito feliz em nossa nova casa.— É muita bondade sua me convidar.— Terei prazer em servi-lo, sir. Costumamos deixar nossos hóspedes à

vontade e temos um bom cozinheiro.O marquês sorriu e declarou:— Agora você falou algo que me interessa acima de tudo. Meu almoço

foi horrível e estou morrendo de fome.— Bem, prometo não desapontá-lo — o rapaz disse. — E o meio mais

fácil de chegar depressa lá é através da mata. Pela estrada levaria muito mais tempo, devido à infinidade de curvas.

— Vá à frente, então. Eu o sigo.O rapaz obedeceu e o marquês acompanhou-o.A mata era espessa, e árvores altas ladeavam uma aléia coberta de

musgo. Chegaram à clareira onde havia enorme portão.— Que diabos está acontecendo aqui?! — o homem exclamou.O marquês observou melhor e notou que o portão estava amarrado

com corda resistente. O desconhecido tirou uma faca do bolso e começou a cortar a corda.

Foi nesse instante que o marquês ouviu um sussurro atrás de si. Virando-se, deparou com uma jovem encostada em Firefly e olhando para ele. Antes que pudesse falar, a moça murmurou:

— Vou lhe dizer o que faremos — ela disse como se tratasse de um plano pré-elaborado. — Se está nervoso e não quer deixar o cavalo em minhas estrebarias, e tem razão para tal, deixe-o solto aqui no gramado, com Silver Cloud. Não haverá perigo e você mesmo poderá montar guarda em seu magnífico puro-sangue. Ele é mesmo excepcional.

— Tem razão — Ivor concordou. — É o que Firefly é, um magnífico puro-sangue. E brigarei até a morte para impedir que alguém o tire de mim.

— Concordo. E receio que seja algo que terá ainda de fazer.

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Ambos desmontaram. Quando os animais começaram a se mover pelos gramados, a moça

apontou com a mão um banco perto da porta da entrada.O marquês sentou-se, tirou o chapéu e cruzou as pernas.— Agora me conte o que está acontecendo — disse. A moça também tirou o quepe de montaria e jogou-o no chão.Como Ivor esperara, uma cabeleira loura brilhou aos raios do sol, como

parte integrante do astro rei.— O homem com quem você falava — ela disse — é um ladrão de

cavalos e no momento não sei o que poderemos fazer.— Acho que, como todos os habitantes desta aldeia, deveríamos agir

contra esses roubos — o marquês respondeu.— Sei disso. Mas ele faz tudo com muita habilidade.— Vamos começar pelo início — o marquês declarou.

— Antes de mais nada, conte-me quem é você e por que motivo previne os viajantes contra ladrões de cavalos.

— Meu nome de família é Shetland — a moça disse. — Vita Shetland, e esta casa é de meu avô. O nome dele é sir Edward Shetland.

Ivor achou que o nome lhe era familiar. Mas não quis interrompê-la e Vita continuou:

— Três irmãos acabaram de comprar uma estalagem em péssimo estado. Reformaram-na e agora começaram a roubar cavalos de raça do modo o mais ousado possível.

Vita falava com tanta emoção que o marquês resolveu fazer uma pausa antes de perguntar:

— Como podem eles conseguir isso?— Você ouvirá a história pela boca do homem que se encontra aqui,

simplesmente porque o encontrei na estrada desesperado e chorando por ter perdido o cavalo que amava. Isso já se passou com grande número de viajantes, mas eu não nunca ousei interferir.

— Por que não? — o marquês indagou.— Porque esses ladrões são espertos demais. Mas por acaso hoje,

quando eu voltava para casa, divisei seu magnífico cavalo diante de mim. Resolvi salvar você.

— Pelo que lhe sou imensamente grato — o marquês disse. — Na verdade pensou que meu cavalo estava prestes a ser roubado?

— Vou lhe dizer exatamente o que teria acontecido — Vita prosseguiu.Ela hesitou nervosa. E o marquês tentou acalmá-la:— Não tenha pressa! Firefly está salvo agora.— Espero que sim! — ela exclamou.— Mas vamos com sua história. O que teria o homem feito se você não

me tivesse prevenido?— Fui eu quem amarrou o portão ontem à noite — Vita explicou. —

Acho que descobri instintivamente, ou talvez tenha sido Deus quem me revelou que um cavalo muito especial estava para chegar à cidade hoje. O mais maravilhoso animal de montaria que já vi.

— Foi exatamente o que pensei quando o comprei — o marquês concordou. — Mas continue. Conte-me porque amarrou o portão e não permitiu que eu acompanhasse o homem à estalagem.

— Quando você chegasse à estalagem — Vita disse —, ele lhe daria, mais cedo ou mais tarde, uma bebida drogada. Foi o que deu ao pobre homem que está aqui em casa agora, que você conhecerá logo e que ainda chora quando se toca no assunto.

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— Uma bebida drogada?! — o marquês repetiu. — E depois, o que aconteceria?

— Você passaria a noite na estalagem. Quando acordasse na manhã seguinte sentindo-se, imagino, bastante mal, pagaria a conta e seu cavalo seria trazido da estrebaria, completamente ajaezado.

— Meu cavalo? — Ivor indagou intrigado.— Era o que eles diriam a você — Vita continuou. — Naturalmente que

não seria seu cavalo, mas um animal de qualidade inferior, barato. Quanto ao seu, o venderiam na próxima feira de animais, a preço bem mais alto.

— Como poderiam fazer isso? — Ivor protestou. — Eu reconheceria imediatamente que o cavalo não era o meu. E exigiria que me trouxessem de volta aquele com o qual eu chegara.

— Os três irmãos, os proprietários da estalagem, contrataram para trabalhar três ou quatro homens tão desonestos quanto eles. Teriam tudo preparado para ir ao tribunal e jurar que o cavalo que você montava era o mesmo. E até o processo ser levado a julgamento, seu cavalo estaria à milhas de distância.

O marquês ficou silencioso. Logo se deu conta de que haveria uma infinidade de testemunhas para jurar que seu cavalo não fora trocado.

Aquele era, na verdade, um estratagema hábil sobre o qual nunca ouvira falar antes.

— Agora vê — Vita comentou — por que salvei seu cavalo. Apenas espero expulsar esses homens maldosos da aldeia e mandá-los à prisão.

— É algo que precisa ser feito, embora depois do que você acabou de me dizer considero ser uma tarefa difícil. Eles cercam viajantes todos os dias?

— Penso que sim, mas tomo cuidado para que não me descubram. Por isso passo bem depressa por entre as árvores onde um dos homens sempre aguarda pelo visitante.

— E nunca tentaram roubar seus cavalos? — o marquês perguntou.— Não ousariam. Meu avô é muito importante neste lugar. É o dono de

quase todas as casas. Seria loucura enfrentá-lo, apesar de ele estar muito doente no momento.

— Acho que ouvi falar de seu avô — o marquês disse. — Lembro-me do nome.

— Talvez se lembre de meu pai. É um diplomata freqüentemente citado nos jornais.

O marquês soltou uma exclamação. Soube por que o nome lhe era familiar. Conhecera Alisdair Shetland em Carlton House. Por sinal, o Príncipe Regente elogiara muito o sucesso dele na Grécia.

— Papai foi enviado pelo Primeiro Ministro à Rússia no mês passado — Vita comentou. — E eu fiquei aborrecida porque ele não me levou junto.

— Você viaja freqüentemente com seu pai? Foi à Grécia?— Fui. E considero a viagem mais interessante que meu pai fez nos

últimos anos.O marquês achou que ela era jovem demais para ter viajado muitas

vezes com o pai.Como se lesse os pensamentos dele, Vita esclareceu:— Sei que pareço ter saído do berço, mas tenho quase vinte e um

anos. Papai prometeu estar na Inglaterra para meu aniversário, e daremos um baile em Londres.

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— Como seu pai tem sido um sucesso internacionalmente, garanto que o Príncipe Regente oferecerá uma festa em sua homenagem em Carlton House.

De súbito, e pela primeira vez desde que iniciara a viagem, Ivor percebeu que agia como marquês de Milverton e não como John Milton.

— Que bom você já ter ouvido falar de papai! — Vita exclamou. — Agora me diga qual é seu nome — pediu ela.

— Meu nome é John Milton. Li bastante sobre seu pai nos jornais e entendo por que você tem tanto orgulho dele.

— Tenho mesmo — respondeu Vita. — Mas sinto-me muito só aqui sem papai, em especial agora que meu avô está tão doente. Minha tia, que prometeu me fazer companhia, teve de ir inesperadamente a Cornwall porque o filho quebrou a perna.

O marquês comentou então, após uma pausa:— Compreendo por que você precisa ter cuidado com os ladrões de

cavalos desta aldeia. Estando sozinha em casa, apenas na companhia de criados, não é prudente arriscar qualquer providência para prendê-los.

— Isso é o que Evans, nosso velho mordomo, diz. E o homem que está aqui desesperado porque lhe roubaram o cavalo concorda com Evans.

— E o que esse homem pretende fazer? — o marquês indagou.Ele achava estranho Vita ter recebido em casa um desconhecido,

meramente porque se sentia lesado e infeliz.— O que pode ele fazer? — ela respondeu com outra pergunta. — Não

tem dinheiro e percorria o país à procura de emprego. Está desolado por ter perdido o cavalo, sua única posse. Ainda não lhe sugeri que trabalhasse aqui cuidando do jardim ou das estrebarias, mas farei isso assim que ele estiver em melhores condições emocionais.

— Você tem um coração de ouro, Vita.— Acha? Espero que sim — ela disse. — Mas agora que já nos

apresentamos devemos consultar o chefe dos cavalariços quanto ao lugar onde esconder Firefly.

— Esconder? Acha que Firefly ainda está em perigo?— Não quero assustar você — Vita esclareceu — mas todas as pessoas

aqui da aldeia são muito velhas, conviveram com meu avô durante anos. Cuidam dele muito bem, mas são idosos. Francamente receio alguma atitude drástica dos ladrões sabendo que não temos defesa.

— Acha que eles sabem que estou aqui? — Ivor indagou.— Penso que sim. Você me seguiu pela estrada e um dos irmãos nos

viu com certeza. Talvez eu esteja sendo pessimista, mas esses homens são tão espertos que não posso crer que deixem escapar um maravilhoso cavalo como o seu.

— Agora você está me assustando de fato — Ivor disse. — Vamos às estrebarias ver se as baias onde os cavalos são trancados oferecem segurança.

— Sim, vamos.Vita deu um pulo do banco onde estava sentada e assobiou.

Imediatamente seu cavalo, que mordiscava a grama, levantou a cabeça e trotou ao encontro dela.

O marquês teve de ir buscar Firefly.Depois ele e Vita, com suas respectivas montarias, foram às

estrebarias situadas nos fundos da casa.Quando o chefe dos cavalariços viu Firefly, exclamou:— Mas que lindo cavalo o seu, sir. Nunca vi nada melhor.

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— Nem eu — Ivor respondeu, sorrindo — e tenho muito orgulho dele.Vita relatou brevemente ao chefe dos cavalariços o que vinha se

passando.— Não há como segurar esses demônios — o chefe dos cavalariços

comentou. — A única coisa que poderemos fazer é esperar que a polícia os aprisione depressa.

— Alguém já apresentou queixa à delegacia? — o marquês indagou.— Há apenas um policial na aldeia — informou o empregado — e ele

tem mais medo dos ladrões do que nós.— É verdade — Vita concordou. — Já falamos com o policial várias

vezes. Mas precisamos reconhecer que ele é sozinho e o Quartel General fica a quilômetros de distância.

O marquês sabia que o policiamento das aldeias era precário. E fora só após protestos no Parlamento que algo se fizera a fim de minorar o problema; porém a situação deixava muito a desejar.

— Onde iremos pôr Firefly, esta magnífica montaria do Sr. Milton? — Vita perguntou ao empregado.

— O melhor lugar é dentro de casa, miss Vita.— Dentro de casa? — Vita repetiu vagarosamente. - Eu nunca poderia

ter pensado nisso. Firefly pode então ficar na antiga despensa; estará mais seguro. Há muito não a usamos. E bem fechada e, se os ladrões tiverem idéia de procurar o cavalo lá, o que não acredito, não conseguirão arrombar a porta.

— Resolvido, miss Vita. Agora vou chamar um dos rapazes para tornar a velha despensa confortável.

O chefe dos cavalariços deu um grito e três rapazes vieram correndo de uma das estrebarias.

O marquês pôde observar que havia no local vários cavalos próprios para carruagens grandes e três ou quatro para as menores. Via-se, ele pensou que sir Edward estava bem de vida e que gostava de conforto, como, aliás, se podia constatar pelo número de empregados a serviço na casa.

A velha despensa era um verdadeiro salão. Estava um pouco em desordem, pois, como Vita dissera, não vinha sendo usada há anos.

Os rapazes puseram feno numa pia que transformaram em manjedoura e o marquês considerou o local perfeito. Depois que verificou se Firefly tinha suficiente comida e água, seguiu Vita para dentro da casa onde os criados já haviam levado as malas.

O sol começava a se pôr e a sombra projetada pelas árvores aumentava pouco a pouco.

O hall de entrada da casa era grande e muito bonito. A escadaria antiga, de madeira entalhada, tinha aspecto imponente.

Um mordomo idoso, de cabelos grisalhos, informou o marquês que suas malas já estavam no quarto.

— Para que o Sr. Milton tenha tempo de se trocar com calma, é melhor jantarmos um pouco mais tarde hoje — Vita sugeriu a ele.

— Eu já tinha pensado nisso, miss Vita. — o mordomo respondeu. — O jantar será servido às oito e meia.

— Sinto muito estar dando todo esse trabalho — Ivor desculpou-se.— Não é trabalho, é bom termos visitas em casa — Vita protestou. — E

estou contente por você não haver perdido Firefly. Ao menos não está se lamentando como o outro homem.

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— Acho que eu não estaria me lamentando, mas lutando contra os ladrões.

— Não, se tivesse sido dopado na véspera.— Tudo bem! Você venceu! Aliás, as mulheres querem sempre ter a

última palavra. Agora que me salvou, vamos comemorar a vitória.— Vamos. Faremos o possível para isso — Vita concordou, sorrindo.

Eles continuaram conversando enquanto subiam as escadas.Em cima, Ivor tomou a direção da esquerda e Vita a da direita.Antes de se separarem, ela disse:— Não se apresse, temos muito tempo. Vou agora contar a meu avô o

que houve.Ela entrou num quarto enquanto Evans, o mordomo conduziu o

marquês ao quarto de hóspedes. Era espaçoso e lindamente mobiliado. Suas malas já tinham sido abertas e as roupas penduradas no armário.

Penso sir, que o senhor ficará bem aqui — Evans observou.— Sem dúvida, e estou muito grato a miss Vita por meu cavalo não ter

sido roubado.— Esses ladrões são terríveis, e me preocupo pelo fato de miss Vita

enfrentá-los sozinha. Se alguma coisa acontecer a ela, Sua Senhoria ficará inconsolável.

— Farei o possível para impedir que esses canalhas levem adiante comércio tão vergonhoso — o marquês prometeu.

E pensou imediatamente em entrar em contato com o governador do condado. A autoridade o ouviria e, sem dúvida, fecharia a estalagem.

Também, se houvesse suficiente evidência, os ladrões poderiam ser encarcerados.

Mas..., em tal caso, ele precisaria revelar quem era. Talvez até fosse bom, pois isso poria um fim ao desafio do duque.

"Mas tenho de pensar no caso com cuidado", pensou.Ficou radiante quando um criado apareceu com água para o banho,

um balde de água fria e outro de água bem quente. Tudo foi arrumado em frente à lareira.

Um lacaio, bem treinado para executar a função de valete, estava lá para servi-lo.

Que diferença da noite anterior!Ivor vestiu uma calça preta e um blazer de veludo. Seu valete de

Londres considerara essas duas peças boas para o campo. Muito elegante e atraente, ele desceu às oito horas e vinte minutos.

A anfitriã esperava-o, com um lindo traje de noite.Evans serviu o champanhe e retirou-se a fim de ver se o jantar estava

pronto.Mais uma vez Ivor pensou em como tudo estava sendo diferente de

sua experiência da última noite.Ergueu a taça, dizendo:— Vamos beber ao nosso sucesso evitando que ladrões de cavalos

sujassem suas mãos com mais um roubo.— Beberei com muito prazer — Vita acompanhou-o. — Mas a luta

continua, e não vai ser fácil.— Sei disso — o marquês concordou. — Porém o caso é que estou mais

preocupado com você aqui sozinha nesta casa do que com o aprisionamento dos bandidos. Não sei quantos empregados tem Vita, mas quero que fique bem protegida.

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— Nossos empregados são muito velhos — ela respondeu, tendo antes olhado para a porta a fim de ver se ninguém a ouvia. — Quando papai partiu disse a vovô que estava na hora de contratar pessoal mais jovem para o serviço da casa. Até os lacaios têm mais de quarenta anos, e dois deles estão muito doentes; às vezes durante dias não saem da cama.

O marquês fitou-a bem nos olhos e comentou:— Você é bastante inteligente apesar de jovem e linda.— Há muito eu não recebia um elogio. — Os olhos de Vita brilharam. —

Mas quando estive na França com papai, os elogios surgiam com freqüência. Gostei muito, sabe?

— Esteve na França com seu pai?— Estive. Papai gosta de me levar em suas viagens. Mamãe morreu

quando eu tinha somente quinze anos e às vezes ele se sente muito só.— Entendo — disse o marquês. — Pelo que sei, seu pai está sempre

viajando.— É verdade. Mas, quando pode, me leva. Adorei a Grécia, amei Paris,

e ele prometeu me levar à Espanha assim que voltasse.— Você ficou triste por não ter ido à Rússia?— Muito. Supliquei a papai que me levasse! Porém ele foi irredutível.

Disse que se tratava de uma visita rápida e difícil, e que francamente não confiava nos russos.

— Essa última é a melhor razão de todas. — O marquês sorriu. — Seu pai estava certo.

— Ele voltará daqui a um mês. Depois iremos a Londres.O marquês quase disse que então se encontrariam. Mas logo se

lembrou de seu disfarce.— O que seu avô falou sobre o atentado contra Firefly? — perguntou

ele.— Quis lhe contar, mas desisti; vovô não está nada bem hoje. A

enfermeira achou melhor não perturbá-lo. Por isso decidi adiar a conversa até amanhã.

Tão logo Vita terminou de falar Evans anunciou que o jantar estava servido. Os dois foram à mesa.

A sala de jantar, linda, tinha janelas baixas que davam para o jardim. Havia retratos dos antepassados dos Shetland nas paredes e a mesa estava decorada com flores do campo.

O marquês pensou, com uma sensação de alívio, que era com aquele tipo de coisa que estava acostumado. Tudo bem diferente do que agüentara nos últimos dois dias.

O que ele também achou interessante foi a troca de palavras que teve com Vita enquanto saboreavam uma comida simples mas muito bem feita.

Vita não apenas visitara com o pai lugares que ele conhecia como também lera muito sobre esses lugares. E Ivor ficou surpreendido como moça tão jovem sabia tanto da história de vários países. Era normal que mulheres gostassem de Paris por causa da moda e da alegria da cidade. Mas essas mesmas mulheres nunca se preocupariam em ler sobre os reis e rainhas de países da Europa, por exemplo, ou sobre as batalhas lá havidas.

Na Grécia Ivor fora a Delos e a diversas ilhas. Ficou perplexo ao constatar que Vita sabia muito acerca dos deuses do Olimpo e da influência desses deuses na história da civilização.

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— Você deve achar a vida aqui monótona — o marquês comentou no fim do jantar.

Os empregados já tinham se retirado e Vita sorriu ao responder:—Tenho meus cavalos. Papai comprou três excelentes antes de partir

e pediu-me que cuidasse deles em sua ausência.— Seu pai não tem uma casa no campo? — o marquês perguntou.—Tivemos uma, mas quando mamãe morreu ele não conseguiu mais

ficar sozinho lá. Vendeu-a. Temos uma casa muito boa em Londres, mas papai não permite que eu fique sozinha em cidade tão grande. Por isso estou aqui com meu avô.

Considerando-se como Vita era linda, o marquês não se surpreendeu com a preocupação de sir Alisdair. E insistiu:

— Mas, de qualquer forma, não acha a vida triste nesta aldeia?— Acharia se não tivesse uma ótima biblioteca — Vita respondeu. —

Vou mostrá-la amanhã a você. É maior do que a maioria das bibliotecas particulares e não apenas meu avô adquiriu muitos livros como meu pai.

— Vocês pretendem morar aqui um dia?— Claro. E tenho certeza de que papai "acordará" essa vizinhança e as

coisas serão bem diferentes do que agora. Vovô era um homem divertido e muito cheio de energia antes de adoecer. Todos tinham prazer em conviver ao lado dele. A vida aqui dentro de casa mudou e posso entender por que nossos vizinhos quase não vêm mais nos ver.

—Talvez nem saibam que você está aqui — o marquês apresentou como razão.

—Talvez... Na época em que minha tia morava conosco, visitávamos pessoas que ela conhecia desde menina — Vita contou. — Quando ela foi a Cornwall, quase pedi para ir junto. Mas não podia deixar meu avô sozinho. No momento, com a exceção do pároco, não tenho com quem conversar.

— Sua historia é muito, muito triste. Espero que esse tipo de vida não dure muito.

— Não, não durará. Papai vai voltar logo e iremos a Londres. Mas, você ainda não me contou onde mora.

— Moro em Herefordshire — respondeu Ivor. — E posso lhe garantir que é uma aldeia bem menos isolada que esta.

— Esta de fato fica longe de tudo. Coisas inesperadas acontecem por aqui. Espero que nada fora do comum aconteça esta noite.

— Vamos rezar para isso.Ambos riram enquanto se dirigiam ao salão. E o marquês disse:— Depois de toda a excitação de hoje, acho que devemos ir à cama

cedo. Amanhã passarei pela delegacia de polícia para dar queixa sobre a ameaça de roubo.

— Se conseguir algum resultado positivo, será mais feliz do que eu — Vita declarou. — Que acha de darmos um passeio a cavalo antes do café da manhã?

Fora apenas uma pergunta, mas pela expressão do rosto de Vita parecera mais um apelo.

— É claro que seria interessante — Ivor concordou. — Garanto que Firefly e Silver Cloud vão querer apostar uma corrida.

— Há um lugar, tão bom quanto uma pista de corrida, onde poderemos nos deliciar com um bom galope.

— Vamos então. Não agüento de vontade de correr.

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Eles saíram da sala e subiram.— Amanhã — Vita ia dizendo — você conhecerá o Sr. Tom Brown, o

homem cujo cavalo foi roubado. Ele está agora com o chefe dos cavalariços tentando resolver se quer trabalhar aqui ou não. Continua muito triste.

— Não me surpreende — Ivor disse. — Ele ainda espera recuperar o animal?

— Tem esperança de encontrá-lo no lugar onde talvez seja vendido. Mas não será fácil, pois nem ao menos sabemos em que feira de animais os ladrões tencionam levá-lo.

— Não, naturalmente não vai ser fácil.No topo da escadaria Vita despediu-se do marquês:— Boa noite, Sr. Milton. Durma bem.— Sei que vou dormir, e muito obrigado pelo delicioso jantar.

Ele sorriu e acenou com a mão, achando que Vita parecia uma verdadeira princesa de conto de fadas. Depois foi para o próprio quarto.

Sobre a cômoda estavam a escova de dentes e o pente, e ao lado a pistola que seu valete pusera no fundo da mala.

— Você acha realmente que vou precisar disso? — ele perguntara ao criado.

— Nunca se sabe milorde, o que se pode encontrar nas estradas. E Vossa Senhoria vai sozinho.

— É verdade — o marquês respondera — mas duvido que usarei uma arma. Porém, de qualquer forma, não deixa de ser útil.

— Como vai só, precisa cuidar de sua defesa — o valete insistira.E, naquele instante, no quarto de uma casa desconhecida, Ivor achou

que o valete tinha mesmo razão.Teria sido um idiota se enveredasse pelas matas sem a proteção de

uma arma.Ele verificou se a pistola estava carregada.De súbito, a porta se abriu. Era Vita que entrava, sussurrando:— Os homens estão aqui! Olhei pela janela de meu quarto e os vi

junto às estrebarias. Se não encontrarem seu cavalo lá, podem pegar um dos meus.

— Leve-me a um lugar de onde se possa avistá-los bem — o marquês pediu.

Sem comentar ou discutir, Vita começou a correr ao longo do corredor. Ivor seguiu-a. Bem no fim havia uma porta que conduzia ao sótão.

Ela usava sobre a camisola um négligé leve, azul pálido.No sótão, os dois pularam para o telhado e ficaram escondidos atrás

das chaminés. Avistava-se de lá toda a propriedade, incluindo os jardins e as estrebarias. Vita segurou a mão dele e disse:

— Olhe! Há um homem nos fundos daquela estrebaria. Ela estava certa!

Um homem se esgueirava pelas paredes, com a cabeçaabaixada. Parecia nem desconfiar que era observado.

Em seguida, olhando melhor, o marquês divisou outro homem bem atrás do primeiro, enquanto um terceiro vinha ao encontro deles.

Já tinham chegado à porta da estrebaria. Poderiam facilmente roubar todos os cavalos e os criados só iriam dar pela falta na manhã seguinte.

O primeiro pensamento de Ivor foi lembrar-se de que Firefly não estava lá.

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Mas, os cavalos dos Shetland, sim.Ele ergueu a pistola e apontou para os homens. Puxou o gatilho e a

bala voou pelos ares, causando tremendo barulho. Ele atirou três vezes mais e os homens saíram correndo na direção da estrada.

Somente depois que desapareceram, Vita, que ainda segurava a mão do marquês, sussurrou:

— Foi... maravilhoso! Você foi... maravilhoso!— Sem dúvida os assustei. De propósito não quis atingi-los para evitar

contato com a polícia antes de ter certeza de estar falando com a autoridade competente.

Ele pensava também que, se tivesse ferido ou matado uma pessoa, teria de revelar sua verdadeira identidade. E seria embaraçoso confessar por que motivo viajava disfarçado.

Vita deu um profundo suspiro.— Como foi possível você ter essa arma pronta, no momento exato?— Deve agradecer ao... à pessoa que fez minhas malas — ele

respondeu.Quase escapara a palavra "valete".— Duvido que os ladrões voltem — Vita murmurou.— Pelo menos esta noite, não. Vamos então de novo para a cama.Ambos desceram. Ao chegar ao sopé da escada depararam com o

guarda da noite, tremendo como vara verde.— O que houve miss? — ele perguntou.—Tudo está bem, James. Não se preocupe. Havia alguns

desconhecidos perto das estrebarias e o Sr. Milton quis assustá-los.— Muito bem — o rapaz disse. — Um pouco de fogo assusta qualquer

um.Vita abriu a porta do quarto do avô, que ficava ali ao lado.— Quero ver se vovô acordou com o barulho — disse. Entrou no quarto

e deixou a porta aberta. Ivor resolveu esperar até que ela voltasse para o caso de precisar de alguma coisa.

James, o guarda da noite, retornou ao seu lugar junto à porta de entrada.

O marquês pôs a pistola no bolso e pensava na sorte que tivera por ter a arma na mão. Tinha certeza de que os ladrões não voltariam naquela noite.

Aí viu Vita saindo do quarto do avô. Ia lhe dizer boa noite quando notou que ela estava muito pálida. Havia algo errado.

— O que houve? — perguntou.— Acho... que vovô morreu — ela gaguejou.— Morreu?! — Ivor repetiu e entrou no quarto do velho senhor.

Havia uma lamparina na cabeceira que com certeza ficava acesa durante toda a noite. No enorme leito, com dossel de veludo vermelho, estava deitado o avô de Vita, de olhos fechados.

Ele devia ter sido um homem bonito quando jovem, pois ainda conservava os traços clássicos. Mas Ivor constatou que Vita acertara. Ele morrera.

Com muita gentileza colocou a mão na testa de sir Edward e constatou que estava gelada.

A enfermeira, que dormia no quarto ao lado, apareceu. Tocou também a testa de sir Edward e, com o lençol, cobriu-lhe o rosto.

Sim, Vita acertara de fato, seu avô havia morrido.Ivor foi então ao encontro dela e disse:

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— Seu avô morreu. Mas acho que o barulho do tiro não o assustou; ele tem uma expressão pacífica.

— Achei... também — Vita murmurou.— Quer voltar ao seu quarto? — o marquês indagou.—Não quero... ficar sozinha... no momento.—Entendo — ele disse. — Vamos descer então e tomar alguma coisa.— Só quero conversar... por alguns minutos — Vita acrescentou,

hesitante.— Tudo bem. Para isso estou aqui com você. Eles desceram, lado a lado, e foram ao salão.— Talvez lhe pareça estranho o que vou dizer — Ivor sussurrou — mas,

como acabei de ver uma garrafa de champanhe sobre a mesa, decidi convidá-la para bebermos uma taça juntos. Ambos precisamos muito disso.

— Acho que vovô não se importava de morrer. Sofria há já algum tempo e agora me parece em paz.

Ivor abriu a garrafa de champanhe e encheu duas taças. Levou uma a Vita, que gaguejou:

— Não quero ser um peso... para você. Mas num momento como este... não sei o que fazer.

— Deixe tudo por minha conta. Cuidei do funeral de meu pai e de muitos outros parentes. Vá dormir agora. Prometo que tudo sairá bem.

— Você é tão bondoso! — ela murmurou. — Tive muita sorte em encontrá-lo na floresta.

— O que preciso agora é que me diga o nome de todos os seus parentes da Inglaterra.

— Não há muitos. Papai era filho único e, embora vovô tivesse três irmãs, somente uma é viva.

— A que está em Cornwall? — perguntou o marquês.— Essa mesma. Era a mais moça das irmãs e o filho dela só tem

dezessete anos.— Sua família é muito respeitada e as pessoas que vivem na aldeia

vão querer ir ao funeral.— Você precisa me dizer o que devo fazer. Pode lhe parecer estranho,

mas só fui a um enterro na vida, o de minha mãe, e fora da Inglaterra.— Em que país? — Ivor quis saber.— Na Espanha. A morte de mamãe ocorreu em conseqüência de

infecção causada por horrível vírus que ela adquiriu na África. E não há cura para essa doença. Papai ficou desesperado e eu tive de cuidar dele.

— Claro.— Mas o funeral foi muito modesto — Vita prosseguiu. — Papai não

quis trazer o corpo para a Inglaterra, apesar da insistência da Embaixada.Vita e Ivor conversaram sobre uma infinidade de assuntos. Depois ele

levou-a para o quarto aconselhando-a que tentasse dormir.— Não pense no que aconteceu ou no que irá acontecer— disse. — Pense em algo alegre, num livro que já leu, numa pessoa

da qual goste muito. Vá para a cama enquanto eu fecho as cortinas. Estão abertas par a par.

— É que, antes de me deitar, olhei pela janela a fim de ver se tudo estava bem — Vita explicou. — Foi quando divisei os homens junto às estrebarias.

— Muito boa idéia a sua — o marquês comentou.

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— Mas agora vá dormir do contrário se sentirá mal amanhã. Mas, aconteça o que acontecer, daremos nosso passeio a cavalo.

— Devo... a você o fato de ainda ter cavalos nas estrebarias.O marquês fechou as cortinas e, quando se virou, Vita já havia se

deitado.Estava linda, com os longos cabelos soltos espalhados sobre o

travesseiro.Ele ficou muito tempo observando-a. Depois disse:— Feche os olhos agora e pense na pessoa que você ama, mesmo que

seja Apolo.— Muito bem. — Vita sorriu. — Pensarei em Apolo e... em você.

CAPÍTULO VII

marquês estava muitíssimo ocupado. Na verdade, pensava, nunca trabalhara tanto na vida.O

Antes de tudo fora ver o pároco da aldeia que concordou em realizar o funeral o mais rápido possível, considerando-se não ser necessário esperar por parentes.

— Sempre achei — comentou o pároco — que quando uma pessoa morre é ridículo conservar o corpo em casa por muito tempo.

— Concordo com o senhor — respondeu o marquês. — E ficarei muito grato se pudermos enterrar sir Edward Shetland rapidamente.

Os dois então concordaram em realizar o funeral dali a dois dias.— Não acho provável que os poucos parentes do morto apareçam —

disse o pároco —, mas os habitantes locais estarão presentes.Ivor tinha certeza disso pois sabia que sir Edward era muito querido no

local. Todos ficaram consternados com sua morte.Felizmente, a igreja estava situada a pequena distância da casa. Por

sinal, o próprio terreno da igreja pertencia a sir Edward, sendo uma continuação de sua propriedade.

O jazigo de família também não ficava muito distante.Tudo isso foi um alívio para Ivor. Ele não precisaria providenciar

carruagens ou qualquer tipo de veículo para o transporte do pessoal.Depois de se entender com o pároco ele foi imediatamente à procura

do governador do condado. Era um senhor idoso muito amigo de sir Edward, e que ficou chocado com a notícia.

— Naturalmente que irei ao enterro — disse ele — e muitas pessoas da aldeia também estarão presentes.

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— Eu ficaria grato ao senhor se me fornecesse a lista dos amigos de sir Edward, que deveremos convidar — o marquês pediu. — Não conheço ninguém aqui.

Ivor concordou com Vita de que não seria aconselhável dizer que ele estava hospedado em sua casa, e que se haviam conhecido há apenas um dia e meio.

— Vamos inventar que sou um velho amigo de seu pai — o marquês sugeriu — e que, como estava viajando por esta área, resolvi vê-lo. Essa também será a explicação que darei ao delegado quando me referir aos ladrões de cavalos.

— Ótima ocasião para agir contra os malfeitores — Vita opinou. — Todos no condado quererão vir ao sepultamento de meu avô e os cavalos dessas pessoas precisarão estar seguros.

— Duvido que os ladrões apareçam depois do que aconteceu ontem à noite. Assustei-os com o tiroteio — comentou o marquês.

— Espero... que não venham mesmo.Vita estava assustada. E, para não amedrontá-la ainda mais, Ivor disse:— Acho que devemos antes de tudo pensar nas flores para o funeral.Foram então falar com o chefe dos jardineiros que prometeu encher a

igreja de flores das mais variadas cores.Do jardim Vita e Ivor dirigiram-se às estrebarias. Lá, conversaram com

Tom Brown, o homem que ficara privado de sua montaria e que continuava inconsolável. Era um senhor de estatura baixa, de mais de sessenta anos de idade. Não tinha esposa nem filhos e entendia-se muito bem por que toda sua afetividade concentrava-se no cavalo.

— Economizei durante vinte anos para comprar um cavalo. Admirava e amava aquele animal.

Tom Brown não conseguiu mais falar. Lágrimas corriam-lhe pelas faces.

Por discrição o marquês afastou-se e foi inspecionar os estábulos. Constatou que eram bem construídos. Após o aprisionamento dos ladrões, Firefly poderia ficar lá, na companhia dos outros cavalos.

Afinal, a ventilação parecia ser melhor do que a da velha despensa. Além disso, a despensa era muito úmida.

Uma vez fora das estrebarias, Vita disse:— Acho interessante irmos dar nosso passeio a cavalo bem cedo

amanhã.O marquês concordou e resolveu verificar se todas as cartas que

escrevera ao pessoal da aldeia haviam sido entregues. Os cavalariços tinham ido de casa em casa durante horas. Várias pessoas escreveram algumas palavras a Vita dizendo como se sentiam infelizes com a morte do velho amigo.

— Já mandei um comunicado à Embaixada Britânica e ao Secretário de Estado das Relações Exteriores — Ivor informou.

— Foi bom você se lembrar. Eu havia me esquecido desse detalhe — comentou Vita.

— Como seu pai herdou o baronato, achei cortês notificar a Câmara dos Lordes também — disse Ivor.

Lembrou-se de que, quando seu pai morrera, os representantes da Câmara dos Lordes mandaram celebrar missa por intenção da alma dele e fizeram dois minutos de silêncio.

Ivor fora cuidadoso em não assinar o próprio nome nas cartas. Sentia-se agora como um mero secretário trabalhando para os Shetland.

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Na tarde anterior ao funeral ele falou com o delegado de polícia, homem autoritário, de meia idade, que tinha orgulho do cargo que ocupava.

Quando o marquês lhe disse que trabalhava para miss Vita Shetland, neta de sir Edward, ele ficou mais obsequioso.

— Naturalmente que irei ao funeral — disse. — A falta de sir Edward será muito sentida nesta aldeia.

— Espero que vá mesmo e que leve consigo vários policiais.O delegado fitou-o intrigado. E o marquês contou-lhe o que estava

acontecendo. Relatou o modo como os ladrões roubavam os cavalos.— Pelo que pude concluir — Ivor prosseguiu —, os cavaleiros eram

convidados a se hospedar na velha estalagem e saíam de lá com montaria diversa daquela em que haviam chegado.

O delegado ficava cada vez mais perplexo.— Desconhecia esse modo de agir entre ladrões de cavalo — disse

ele. — O que não posso entender é por que não fui informado antes.— Se quer mesmo saber a verdade — o marquês declarou —, o

policial da aldeia tem medo de interferir como proprietários da estalagem. Há muitos homens trabalhando lá em função desse crime, e vêm obtendo enorme sucesso.

O delegado prometeu que faria tudo em seu poder para acabar com os roubos.

Ao se despedir, o marquês disse:— Garanto que o pai de miss Vita lhe será muito grato quando voltar

de sua missão na Rússia.No instante em que contou a Vita o que ocorrera, ela ficou encantada.— Essa situação com os bandidos está arruinando nossa aldeia e

assustando seus habitantes — declarou ela. — Todos têm tanto medo do que possa acontecer que só falam em sussurros. Isso não está certo.

— Não está — o marquês concordou.E prometeu a si mesmo que lutaria para mudar tudo, antes de partir.No dia do funeral ele e Vita foram cavalgar as sete horas da manhã.

Percorreram os campos ao calor suave do sol matutino. E Ivor constatou que Vita era sem dúvida a melhor cavaleira que já conhecera. Montava com naturalidade e elegância. Falava o tempo todo com Silver Cloud que parecia entendê-la.

Galoparam pela mata e voltaram vagarosamente através da floresta.Os esquilos avermelhados fugiam à aproximação deles, escondendo-se

nos arbustos.— Tudo é tão lindo aqui! — Ivor exclamou.— Muitas vezes pensei que as fadas e os duendes moravam nesta

floresta — ela comentou. — Mas até agora só tive Silver Cloud com quem conversar acerca desses seres imaginários. Por isso estou achando delicioso falar com você.

O marquês fitou-a e sorriu. Vita estava linda naquela manhã. Com os cabelos presos na nuca era tal qual uma escolar.

Eles cavalgaram até as nove horas. Em seguida ambos os cavalos foram colocados nas baias.

— Agora, antes de ir ao funeral — o marquês disse ao chefe dos cavalariços —, veja se todas as portas estão trancadas e cada janela fechada. Vai ficar quente demais para os cavalos, mas será por pouco tempo. Você poder abrir tudo apenas terminada a cerimônia do enterro.

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— Cuidarei disso, sir —, o empregado respondeu. — Não se preocupe.Ao chegar em casa Ivor viu que o corpo de sir Edward já havia sido

colocado no caixão.Ele providenciara tudo a fim de não sobrecarregar Vita. Escolhera o

que havia de melhor para sir Edward e tinha certeza de que o novo baronete o aprovaria.

Vita estava sendo, ele pensou, muito corajosa e diferente da maioria das mulheres. Não conversava acercada morte do avô e nem chorava em seu ombro.

Admirou o modo como recebia os pêsames. Falava com calma e cortesmente, não entrando em detalhes sobre como sofria com a morte do avô.

A enfermeira, por ordem do marquês, estava sempre ao lado dela com o fim de ajudá-la.

— Não quero que miss Vita se aborreça mais do que for necessário — ele dissera. — Quanto menos se falar sobre a morte de Sua Senhoria, melhor.

— É o que penso sir — a enfermeira concordou. — Infelizmente todo o mundo dá mais manifestação de carinho e consideração depois que a pessoa morre do que quando está viva.

— É verdade. No caso de Vita a situação é especialmente dolorosa. Ela é muito jovem e já perdeu a mãe. É triste ter de sofrer agora com a morte do avô.

— Se quer minha opinião, sir, a morte de Sua Senhoria foi uma bênção. Ele sofria muito e os médicos não sabiam o que fazer.

Depois que Ivor se afastou, a enfermeira disse ao mordomo:— Espero que ele cuide de miss Vita quando eu me for. Mas nunca se

sabe. O Sr. Milton pode preferir mulher mais vivida a uma que sempre morou no campo.

Na noite anterior ao funeral Vita dissera ao marquês, antes de irem à cama:

— É tão maravilhoso para mim ter você aqui. Como vê, nenhum de meus parentes veio, e eu me sentiria infeliz e abandonada.

— Você é que foi maravilhosa impedindo que meu cavalo fosse roubado.

— Foi só por sorte que saí naquela manhã para cavalgar pela aldeia em vez de ir diretamente ao campo — Vita respondeu.

— Meu anjo da guarda devia estar alerta naquele dia — o marquês disse. — Ele sussurrou aos seus ouvidos que havia um trabalho para você naquele lugar.

— Tem razão — respondeu Vita — porque de fato senti que algo errado iria acontecer. Por isso saí de casa bem cedo e amarrei o portão.

— É o que mandei que se fizesse amanhã.— Fizesse o quê? — Vita indagou.— Disse aos cavalariços que amarrassem todos os portões desta área

para que ladrões não ousassem entrar durante a cerimônia do funeral amanhã.

— Muito boa idéia — Vita comentou. — Não pensei nisso. Os portões da propriedade de vovô são bem altos e duvido que até Firefly consiga saltar.

— Não tenho intenção de tentar — o marquês declarou.— Não há nada mais perigoso para o cavalo e o cavaleiro do que um

salto alto demais caso o cavalo prenda a pata no obstáculo.

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— Tenho a impressão de que você é bom no salto — Vita disse. — Acho que precisamos pôr alguns obstáculos em nosso "paddock" para ver quem é o melhor, Firefly ou Silver Cloud.

— Não vou permitir que você pule cercas altas demais — Ivor declarou. — Não quero vê-la com a perna ou o pescoço quebrado.

— Nem eu. Mas detestaria ver você fazer algo que não consigo.— Vamos apostar uma corrida depois de amanhã. Naturalmente,

sendo você mulher, lhe darei uma vantagem.— Isso é um insulto para Silver Cloud — Vita protestou.Após ter proposto a corrida, Ivor se perguntava se poderia permanecer

por mais tempo na casa dela, agora que o avô morrera.Os parentes, caso algum aparecesse, ficariam escandalizados se a

encontrassem na companhia de um homem, numa casa onde havia só empregados.

Mas, enfim, como Vita não levantara o problema, resolveu não dizer nada.

Quando subiram para dormir, ele recomendou:— Não pense no dia de amanhã. Lembre-se de que me prometeu

pensar somente em coisas alegres e, naturalmente, em Apolo.— Não me esqueci, não. E acho que vou pensar na corrida que

vencerei na certa. Só assim nem você e nem Firefly nos olharão com ar de superioridade.

O marquês riu muito e foi para o próprio quarto.Mais uma vez encantava-se com a beleza de Vita. Além de linda, era

sensata. A maioria das mulheres que se sabiam bonitas pouco se preocupavam em ser sensatas.

"Ela é graciosa e nada mimada", dizia a si mesmo.Refletia se depois do funeral deveria voltar para Londres. Era o que

pretendera fazer de início. Depois...Estava cansado e com sono. Adormeceu logo e acordou aos primeiros

raios do sol. Recordou-se então de que era o dia do funeral.Foi à igreja e notou que tinha aspecto diferente da maioria das igrejas

num dia como aquele. O caixão fora colocado no centro da nave e estava completamente coberto de flores brancas e rosadas.

Quando Vita chegou, ficou surpreendida com o arranjo. Não disse nada, mas o marquês percebeu pela expressão dos olhos dela, que estava grata. Sem consultá-la, escolhera dois dos hinos preferidos por sua mãe.

O coro era constituído de jovens na maioria. Pareciam anjos entoando os hinos.

A cerimônia, a pedido do marquês, não durou muito.O ataúde foi levado à sepultura acompanhado por Vita e Ivor, pela

população e autoridades locais.No cemitério o pároco fez uma prece.Enquanto o caixão baixava na sepultura o marquês viu dois cavalos

que galopavam a grande velocidade. Um deles era Firefly, o outro Silver Cloud. Tom Brown deu um grito de horror e se pôs na frente dos animais.

Sem parar, o homem que montava Firefly foi em cima dele e derrubou-o no solo. Tirou em seguida uma pistola do bolso e alvejou-o. Mas errou o alvo por alguns centímetros.

Enquanto se preparava para o funeral, Ivor, talvez por instinto, pusera sua arma no bolso.

Isso apesar de achar quase impossível que, durante o curto espaço de tempo da cerimônia, os ladrões ousassem entrar nas estrebarias.

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Porém... conseguiram entrar e desamarrar um dos portões.Então, quando o ladrão que montava Firefly errou o alvo, o marquês

atingiu-o no braço com um tiro certeiro. Deixando escapar grito de dor, o homem caiu.

O outro ladrão, o que montava Silver Cloud, vinha um pouco mais atrás. O marquês alvejou-o no ombro e ele também caiu no solo.

Vita e Ivor correram ao encontro dos animais.O chefe dos cavalariços e os demais rapazes que trabalhavam nas

estrebarias seguiram-nos.Vita segurou as rédeas de Silver Cloud e começou a dirigir-lhe palavras

amáveis que o acalmaram rapidamente.O marquês teve um pouco mais de dificuldade com Firefly que

escouceava e empinava assustado por causa do barulho.O cavaleiro caído no solo continuava segurando firmemente as rédeas

de Firefly. Somente Ivor conseguiu que o animal parasse de empinar.Olhando ao redor, ele notou que o delegado e outros policiais

observavam os dois homens deitados no chão, gemendo de dor.— Leve-os ao Distrito — o delegado ordenou. — Depois vão à velha

estalagem e prendam todos. Em seguida chamem um médico para tratar dos dois feridos.

Os policiais apressaram-se em obedecer.O marquês pediu a um cavalariço que levasse Firefly de volta à

estrebaria.— Converse com ele — disse. — Logo vai se recuperar do choque.— Pois não, sir — o cavalariço respondeu.O marquês foi então para o lado de Vita. A enfermeira que tratara de

sir Edward ocupava-se de Tom Brown.— Os ferimentos dele não foram graves — informou ela. — O nariz

começou a sangrar, mas não penso tratar-se de algo grave.— Ponha-o na cama depressa — Ivor ordenou — e peça ao médico que

o examine depois de dar atenção aos dois ladrões feridos.— Foi um bom tiroteio, Sr. Milton — alguém atrás dele sussurrou.Virando-se, Ivor deparou com o governador do condado.— Eles achavam que poderiam fugir porque estávamos ocupados com

o funeral — o marquês falou.— Percebi isso. E providenciarei para que todos esses ladrões de

cavalos sejam aprisionados ou deportados.— Providenciei milorde — declarou o delegado, que chegava naquele

momento —, que sejam condenados por latrocínio e assassinato. Apenas por milagre não mataram aquele pobre homem.

O delegado referia-se a Tom Brown.— Acho que o melhor a se fazer agora é darmos prosseguimento à

cerimônia do funeral de sir Edward — o marquês disse, com muita calma. — Esperamos que o senhor vá à casa onde serão servidos refrescos aos presentes.

Todos voltaram ao cemitério. E Ivor admirou Vita mais do que nunca. De cabeça erguida, ela acompanhou a cerimônia até o fim. Jogou um buquê de flores no caixão enquanto o desciam no túmulo.

Terminado o cerimonial, Ivor conduziu-a a casa. Caminharam em silêncio.

As pessoas presentes ao sepultamento acompanharam-nos.

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— Se você não quiser falar com ninguém — Ivor disse —, sugiro que vá para a cama.

— Não acha que me considerarão rude?— Você tem sido extremamente corajosa e se comportado com

dignidade — respondeu o marquês. — Não há necessidade de receber essas pessoas. Eu farei isso por você.

— Obrigada — agradeceu ela. — Fiquei muito nervosa, mas graças a Deus Firefly e Silver Cloud estão salvos.

— Suba agora, Vita. E, assim que puder, irei ter com você.Ela sorriu e obedeceu.Evans, o mordomo, aprontara tudo na sala de jantar. Havia

champanhe, café e refrescos.O governador do condado lamentou o sucedido.— Foi lamentável para a aldeia ter acontecido esse tipo de coisa —

disse ele. — Não posso entender por que a polícia local não agiu mais cedo.

O delegado apresentou todas as desculpas possíveis. Mas, dali por diante, sem dúvida a aldeia ficaria bem mais protegida com a nomeação de maior número de policiais.

Depois que todos se retiraram, com um suspiro de alívio, Ivor subiu.No quarto, Vita estava perto da janela. Seus cabelos dourados

brilhavam como ouro ao reflexo do sol.Assim que Ivor fechou a porta ela correu para os braços dele.— Todos já se foram? — perguntou.— Sim, todos. E você se portou maravilhosamente bem. Automaticamente, Ivor passou os braços em torno da cintura dela e

beijou-a. Um beijo diferente de todos os que dera ou recebera no passado.Os lábios de Vita eram suaves, doces e inocentes.— Eu te amo — sussurrou ela. — Como pôde ser tão bondoso e

encantador comigo?— Eu também te amo querida — Ivor murmurou. — Jamais conheci

uma mulher que pudesse se comportar tão bem em circunstâncias tão difíceis.

E ele beijou-a de novo. Beijou-a como se tivesse esperado por longo tempo pelo êxtase que experimentava no momento.

Quando finalmente Vita pôde falar, ela disse:— Acho que eu deveria ir ver como Tom Brown está passando. Afinal

de contas, se ele não tivesse gritado, não teríamos recuperado os cavalos. — Achei isso também — Ivor concordou. — Pedi notícias dele antes de vir para cá e soube pela enfermeira que está bem.

— Que bom! — Vita exclamou. — Nós precisamos dar lhe um cavalo para substituir o que ele perdeu.

— É claro que precisamos. "Nós" é a palavra certa. Mas agora quero lhe fazer uma pergunta, querida: quer se casar comigo?

— Tem certeza... de que... me ama mesmo? — Vita gaguejou.— Desejo você como nunca desejei mulher alguma antes — Ivor

declarou. — Sei agora que nunca me apaixonei.Ele beijou-a mais uma vez. Beijou-a até ambos quase perderem o

fôlego.— Você é tão maravilhosa, tão perfeita! — Ivor enfim disse. — Tenho

dificuldade em acreditar que seja real.

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— Para mim, você é como Apolo. Quando me mandou pensar em Apolo, eu queria na verdade pensar em você, porque já o amava.

— Sabia então que me amava? — Ivor perguntou.— Acreditava que sim, pois imaginava como iria ser terrível o

momento em que você me abandonasse — sussurrou ela.— Era algo que eu não tinha intenção de fazer, juro— ele falou

firmemente e beijou-a em seguida.A porta se abriu nesse momento e Vita gritou:— Papai! — Ela correu para os braços do pai. — Papai! Você voltou!— Cheguei ontem em Londres e soube que meu pai havia falecido.

Tentei vir a tempo para o enterro, mas Evans acabou de me dizer que a cerimônia terminou há meia hora.

O pai de Vita fitava o marquês atentamente. De súbito, exclamou:— Milverton! O que faz aqui?— Duvidei que me reconhecesse — respondeu o marquês.— Nós nos encontramos em Carlton House. Lembra-se?— É claro que me lembro. Porém, disseram-me lá embaixo que um tal

de Sr. Milton providenciara tudo para o funeral e cuidava de minha filha agora.

— É uma longa história — disse Ivor — que lhe contarei mais tarde. Neste exato instante pedia sua filha em casamento.

Por segundos houve uma expressão de perplexidade no rosto de Alisdair Shetland. E ele falou:

— Que posso dizer? Estou encantado ao ver que vocês dois se amam.— Estou amando, papai — Vita confessou. — Este cavalheiro foi tão

bom para mim, me ajudou tanto nos últimos dias! Conseguiu até que se prendessem os horríveis ladrões.

— Foi o que Evans me contou — sir Alisdair respondeu.— Mas a última coisa que eu esperava era ver você, minha filha, nos

braços do marquês.— Marquês?! — Vita exclamou. E, olhando para Ivor: — Você é um

marquês?— Sou. E sinto-me muito grato por você ter me aceitado sem saber

quem eu era.— Mas, por que escondeu? — Vita perguntou. —Não entendo.— Eu lhe contarei tudo mais tarde. No momento, vamos cuidar de seu

pai que volta de longa viagem.— Longa e extremamente difícil — sir Alisdair declarou. — E claro

que eu gostaria de ter estado presente ao funeral de meu pai, mas alegro-me em saber do casamento de vocês.

Eles desceram e foram ao salão. Lá, enquanto tomavam champanhe, o marquês sugeriu:

— Tenho uma idéia e espero que o senhor a aprove. Trata-se de algo que desejo mais do que qualquer coisa no mundo.

— E o que é? — sir Alisdair indagou.— Que Vita e eu nos casemos imediatamente.— Não quer esperar nem os seis meses de luto? — Vita perguntou,

surpreendida.— Não. Se seu pai permitir, nos casaremos esta noite e partiremos em

lua-de-mel. Quando voltarmos, daremos uma grande festa em minha casa em Londres, para que nossos parentes se conheçam. E não quero que use luto, pois luto sempre me deprime.

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— Acho sua idéia ótima — sir Alisdair concordou. — Seria cruel fazer com que esperassem seis meses. Poderão se casar secretamente e partir em lua-de-mel.

— Iremos à Grécia — o marquês declarou de pronto.—De lá visitaremos outras ilhas do Mediterrâneo que, acredito, Vita vai

adorar conhecer.— Adoro qualquer lugar, estando em sua companhia — ela

murmurou.— Casaremos esta noite então — o marquês insistiu. — E

amanhã embarcaremos em meu iate. Observando-os, sir Alisdair admitiu que nunca vira duas pessoas tão

felizes.— Vou mandar chamar o pároco para providenciar tudo — disse

ele. — E, quando voltarem da lua-de-mel, ficarão aqui.Ai o marquês contou-lhes sobre o desafio do duque. Falou que estava

prestes a desistir quando Vita o salvou dos ladrões.— É a história mais romântica que já ouvi — sir Alisdair declarou. — E

todos se alegrarão quando souberem disso.— Mas não se esqueça de que será necessário guardarmos segredo

durante seis meses — disse o marquês.—Tomarei cuidado — sir Alisdair prometeu. — Mas há uma pessoa que

precisa tomar conhecimento de tudo já: é Sua Alteza Real. Ele gosta de ser o primeiro, a saber, das novidades. E ficará sentido conosco se não lhe contarmos o que aconteceu. Garanto que Sua Alteza Real será o primeiro a lhes oferecer uma festa quando forem a Londres.

Vita bateu palmas e disse:— Tudo fica cada vez mais parecido com um conto de fadas. E estou

muito feliz por ser eu a fada rainha.— Naturalmente que é você, querida — Ivor concordou — Mas

ninguém mais saberá disso até nossa volta a Londres.O almoço foi uma refeição alegre. Logo após sir Alisdair disse que iria

ao túmulo do pai e depois conversar com o pároco.— Se puder providenciar para que o casamento tenha lugar esta noite

— o marquês sugeriu —, ninguém desconfiará de nada na aldeia. E poderemos partir amanhã cedo.

—Boa idéia — sir Alisdair sacudiu cabeça. — Ficarei aqui algum tempo para tomar posse das propriedades de meu pai. Afinal, serei o dono desta casa daqui por diante.

— Tenho inveja de seus cavalos — o marquês confessou. — Deixo meu Firefly aos seus cuidados.

— Cuidarei dele. Se Firefly começar a sofrer, o enviarei a Milverton Hall.

—Acho que ele ficará muito contente aqui com os outros cavalos — comentou o marquês. — E graças a Deus as estrebarias estão agora livres dos ladrões.

— Seremos eternamente gratos a você, Milverton — disse sir Alisdair.Ele já estava a par de toda a história e considerou-a inacreditável.Como em agradecimento pelo fato de Ivor ter cuidado do funeral, sir

Alisdair cuidou dos preparativos do casamento.Naquela mesma noite, usando um lindo vestido branco e véu de renda,

Vita entrou na igreja pelo braço do pai.

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As estrelas já brilhavam no céu e a lua aparecia por detrás das árvores. Era uma noite silenciosa.

Vita sentia-se entrando em outro mundo; não era mais humana, mas parte do céu.

Havia seis velas acesas no altar e o luar penetrava pelos vitrais. Parecia que o espírito de Deus estava com eles e que os anjos cantavam hinos nas alturas.

Ivor esperava por Vita em frente ao altar.Quando se ajoelharam para receber a bênção, ela teve certeza de que

sua mãe estava presente. Até o avô sorria, aprovando o casamento.Terminada a cerimônia, o jovem casal saiu deixando sir Alisdair na

igreja conversando com o pároco.Vita e Ivor caminharam por entre as árvores até a casa. Subiram juntos

sem que ninguém os visse.Cada um foi ao próprio quarto.Vita despiu-se e deitou-se. Minutos após o marquês entrou e ela teve

consciência de que iria viver o momento mais importante de sua vida.Ivor sentiu o mesmo. Durante alguns segundos não disse nada,

extasiado ante a visão de Vita com o amor estampado nos olhos.Enfim ele apagou a vela e entrou na cama.— Eu amo você, meu tesouro — disse com voz grave.— Eu também te amo, querido. E te amo com todas as forças de

meu ser. Quando me recomendou que pensasse em Apolo, o deus do amor pensei apenas em você. Mas receei que não me amasse.

— Eu te amo, Vita, e de um jeito que é impossível explicar. Apenas sei que você é minha e que fomos criados um para o outro. Nada no futuro nos separará.

— Isso é o que eu queria ouvir. Oh, querido Ivor, beije-me e ensine-me tudo sobre o amor. Farei sempre o que você quiser que eu faça.

— É o que espero — respondeu ele. — Sei querida, que um futuro emocionante nos aguarda, porque estamos juntos. Exploraremos o mundo e ajudaremos muitas pessoas a serem felizes como nós.

Ele beijou-a mais uma vez. Com gentileza de início, avidamente depois. Seus beijos eram agora bem diferentes dos beijos do passado.

No instante em que ele fez Vita sua, sentiu que atravessavam os portões do paraíso.

Muito, muito tempo mais tarde, quando o luar penetrava pela janela iluminando todo o quarto, ela sussurrou:

— Eu amo você, meu maravilhoso marido. Não há palavras suficientes para lhe dizer quanto.

— E eu te adoro te idolatro querida — o marquês fez coro à declaração de amor da esposa. — Nós dois somos uma só pessoa, nada e ninguém nos separará.

O luar os abençoava. Deus os unira.