Diferença não é deficiência

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resenha crítico-informativa

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  • 1. INTRODUO A proposta do livro analisar as relaes entre a linguagem e a escola com o objetivo de compreender os problemas educacionais das camadas populares do Brasil. A partir de dados estatsticos, Soares afirma que a escola brasileira destinada quase que exclusivamente para o povo as camadas populares - porm esta no est preparada para atend-lo, antes o discriminando, fato este comprovado pelos altos ndices de evaso e repetncia. Uma das principais causas do fracasso dos alunos pertencentes a estas camadas a utilizao da linguagem, j que estes so obrigados a usar padres das classes mais elevadas. A prtica pedaggica e, particularmente, o ensino da lngua materna tem sido dissociado das determinaes sociais e sociolingusticas. O presente trabalho vai expor / apresentar as consideraes desenvolvidas nos captulos do livro Linguagem e Escola, da autora Magda Soares relevando os pontos fundamentais das teorias e propostas pedaggicas que dizem respeito s relaes entre sociedade, escola e linguagem, segundo uma perspectiva social, e direcionando-se para sua articulao e integrao no sentido de se compreender o carter poltico-ideolgico do uso e do ensino da lngua numa prxis compromissada com a transformao social que a realidade requer. DEFICINCIA LINGUSTICA? A investigao do problema das dificuldades de aprendizagem e do fracasso, na escola, das crianas pobres, antes de buscar a sua explicao na marginalizao de grande parte dessas camadas populares pela estrutura capitalista da sociedade, concebeu, sob diversas maneiras, causas e solues imprprias para tal fato, podendo o desenvolvimento do seu raciocnio evolutivo ser sintetizado nas teorias da deficincia lingustica, teoria das diferenas lingusticas e teoria do capital lingustico escolarmente rentvel, seguidas de uma concepo de escola transformadora. A primeira dessas ideologias procurou, atravs de uma anlise supostamente cientfica, realizada principalmente pela Psicologia, responsabilizar a prpria condio da criana pobre e seu contexto cultural por, segundo essa teoria da deficincia cultural, gerar

2. doenas, defeitos, deficincias, numa verdadeira patologizao da pobreza, enquanto as reais causas econmicas, sociais e polticas da desigualdade permaneciam dissimuladas por explicaes convenientes estrutura capitalista das sociedades em que se manifestava o questionamento do sistema de ensino. Dentre as ideias da teoria da deficincia cultural, a hiptese do dficit lingustico afirma que as crianas das camadas populares chegam escola com uma linguagem deficiente, com vocabulrio pobre, sintaxe confusa e outros problemas relativos s atividades escolares e aprendizagem. A teoria de Bernstein, de que a estrutura social que determina o comportamento lingustico, colaborou involuntariamente para a teoria da deficincia lingustica, embora o socilogo ingls ressalte que o cdigo lingustico no apenas reflete a estrutura de relaes sociais, mas tambm a regula. Segundo esse terico, existem duas variedades lingusticas, o cdigo elaborado e o cdigo restrito, que so determinadas pela forma de relao social, com as crianas de classe mdia participando de um processo de socializao que levaria aquisio de ambos os cdigos, enquanto as crianas de classes menos favorecidas teriam acesso apenas ao cdigo restrito em seu processo de socializao. A soluo encontrada pela ideologia da deficincia cultural para os problemas da escola foi oferecer s camadas populares programas especiais de uma educao compensatria para contrabalanar as deficincias e carncias culturais e lingusticas geradas pela suposta privao cultural do mbito social e familiar, com tais modelos chegando ao Brasil com um atraso de quase vinte anos. Em relao sua origem, em que j eram ento questionados, o que explica parcialmente o seu insucesso, seja pelo preconceito por parte dos professores, cujas expectativas de fracasso do aluno se tornavam realidade, seja pelo fracasso da escola, patente no repdio do comportamento lingustico das crianas das camadas populares, ou ainda pela responsabilidade da prpria sociedade e sua estrutura discriminatria como causas desse insucesso. DIFERENA NO DEFICINCIA O conceito de deficincia lingustica foi criado por socilogos e principalmente por psiclogos, recebendo severas crticas de linguistas e sociolinguistas, por revelar-se cientificamente falso ao aceitar a premissa de que pode haver lnguas ou variedades 3. lingusticas superiores e inferiores, melhores ou piores. Esses sociolinguistas acreditam que a lngua sofre e exerce influncia sobre seus usurios, meio fsico e o contexto sociocultural. Havendo, portanto, uma razo social e no lingustica na comparao entre variedades. Apesar de ser fruto do preconceito e, por isso, ser uma impropriedade cientfica, o conceito de deficincia lingustica tem servido para legitimar a discriminao na escola dos alunos de camadas populares. Desse modo, acreditamos, portanto, nas diferenas lingusticas e no nas deficincias. Frente aos fenmenos da variao, no basta somente uma mudana de atitudes; a escola precisa cuidar para que no se reproduza em seu espao a discriminao lingustica. Desse modo, no pode tratar as variedades lingusticas que mais se afastam dos padres estabelecidos pela gramtica tradicional e das formas diferentes daquelas que se fixaram na escrita como se fossem desvios ou incorrees (PCN, 1998, p.82). Nessa perspectiva, William Labov, pesquisador norte-americano, contesta a teoria da deficincia. Ele percebeu que esta teoria era um mito, pois as crianas dos guetos americanos recebiam bastante estimulao verbal. Estas atuavam numa cultura verbal muito intensa e as pesquisas mostravam o fracasso dessas crianas, porque eram experimentos controlados em ambientes diferentes daqueles em que viviam. Para esse terico, o contexto social o mais poderoso determinante do comportamento verbal. Passamos ento a indagar: qual a soluo para sanar e/ou amenizar a teoria das deficincias lingusticas? Nesta teoria lingustica existem conflitos estruturais e funcionais entre o dialeto - padro e o no-padro. Da h necessidade de erradic-los. Para a teoria das diferenas lingusticas existe apenas um conflito funcional entre os dialetos; eles tm o mesmo valor, mas s um aceito, logo os falantes ficam sem alternativa lingustica. Assim, a soluo amplamente adotada no mbito das diferenas dialetais o bidialetalismo: os falantes de dialetos no-padro devem aprender o dialeto-padro para utiliz-lo nas situaes em que requerido, pois segundo o PCN (1998, p. 81): certamente, ele (aluno) capaz de perceber que as formas da lngua apresentam variao e que determinadas expresses ou modos de dizer podem ser apropriados para certas circunstncias, mas no para outras Tal soluo pressupe que a sociedade no responsvel pelos conflitos funcionais que nela ocorrem entre dialetos no-padro e dialeto padro, pretendendo-se uma adaptao das classes desfavorecidas s condies sociais, com a escola tendo o papel de 4. preservar o equilbrio social, retificando desvios. O bidialetalismo funcional dissimula as contradies e as discriminaes das sociedades estratificadas em classes. NA ESCOLA, DIFERENA DEFICINCIA Em relao teoria anteriormente formulada, das diferenas lingusticas, considera-se que ela no contribui efetivamente para o esclarecimento ou resoluo da situao de marginalizao das classes populares em sua relao com a escola, porque apenas incorporaria um novo termo para o vocabulrio da discriminao social, econmica e educacional, sem buscar a causa essencial da problemtica das verdadeiras relaes entre educao e sociedade. As causas estruturais da marginalidade social, seja por deficincias, seja por diferenas, no so postas em questo pelas respectivas teorias anteriores, da deficincia cultural e lingustica e das diferenas culturais / lingusticas, que consideram a escola como instrumento de superao dessa marginalidade, ignorando as determinaes externas e movendo-se no sentido no da transformao da sociedade discricionria, mas sim rumo a uma integrao e adaptao dessas classes sociedade tal como ela , discriminante e marginalizadora.. Para os socilogos Bordieu e Passeron, a escola exerce um poder de violncia simblica, de imposio da cultura e, com esta, da linguagem das classes dominantes s classes dominadas, emprestando legitimidade tanto cultura como linguagem dos grupos dominantes. Assim, a finalidade da escola tem sido precisamente manter e perpetuar a estrutura social, suas desigualdades e os privilgios que confere a uns em prejuzo de outros, e no, como deveria ser, promover a igualdade social e a superao das discriminaes e da marginalizao. Nesse sentido, no se pode mais postergar a interveno no Ensino Mdio, de modo a garantir a superao de uma escola que, ao invs de se colocar como elemento central de desenvolvimento dos cidados, contribui para a sua excluso (PCN, 2000, p. 12). Assim, os alunos pertencentes a classes dominantes, sobretudo do Ensino Fundamental e Mdio, chegam escola j em condies de usar a lngua que nela se mostra como legtima (com maiores possibilidades de domnio do capital lingustico escolarmente rentvel) enquanto os alunos pertencentes a camadas populares adquirem, familiarmente, uma linguagem no-legtima (para Bordieu, uma linguagem no reconhecida socialmente). Dessa forma, a desigual distribuio, entre as diferentes classes sociais, do capital lingustico escolarmente rentvel constitui uma das mediaes mais bem dissimuladas pelas quais se instaura a relao entre a origem social e o xito escolar 5. Portanto, chega-se concluso de que a soluo no est na escola, pois o fracasso dos alunos das camadas populares apenas mais um aspecto da dominao que tais parcelas da sociedade sofrem, atendendo aos interesses das classes dominantes. A igualdade de rendimento na escola s poderia ser garantida com a eliminao das discriminaes e das desigualdades sociais e econmicas. QUE PODE FAZER A ESCOLA? As respostas das trs teorias estudadas, sobre o que pode fazer a escola a respeito da problemtica social da linguagem apresentam semelhanas e diferenas, ora aproximando uma e outra teoria, ora distanciando-as. No sentido da concepo das relaes entre educao e sociedade, a teoria da deficincia lingustica e a teoria das diferenas lingusticas atribuem escola a funo de adaptar o aluno sociedade enquanto que a teoria do capital lingustico escolarmente rentvel considera que a funo da instituio de ensino manter as discriminaes sociais. Quanto ao papel que a escola pode desempenhar no contexto das relaes entre educao e classes sociais, enquanto a teoria das diferenas lingusticas diz que a escola pode contribuir com a proposta do bidialetalismo funcional, a teoria do capital lingustico escolarmente rentvel nega qualquer possibilidade de soluo da instncia escolar por esta j ser determinada pelos aspectos sociais e econmicos de uma sociedade dividida em classes. Divergindo de ambas, numa atitude prescritiva em relao s diferenas de linguagem entre classes sociais, a teoria da deficincia lingustica chama as diferenas de deficincias, propondo sua correo atravs de uma educao compensatria. A escola redentora tem como encargo libertar o aluno de sua marginalidade lingustica, seja atravs da erradicao das deficincias lingusticas por programas de educao compensatria, seja atravs da aquisio da linguagem de prestgio, para adaptar-se s exigncias da sociedade. Quanto concepo de escola impotente, numa perspectiva crtica da sociedade capitalista, v-se a escola nos moldes segundo as relaes econmicas e sociais de tal sociedade, nada podendo fazer contra as desigualdades e discriminaes geradas fora dela. Assim, a escola chega at mesmo a ser perversa, porque colabora para a manuteno das discriminaes, reproduzindo as desigualdades. 6. Entretanto, h os que consideram a escola como uma instncia de transformao social, integrada aos processos gerados pelas relaes de contradio de uma sociedade estratificada em classes, sendo uma escola progressista. Assim em relao ideia de uma escola transformadora, deve-se a princpio se libertar de alguns mitos: Para cumprir bem a funo de ensinar escrita e a lngua padro, a escola precisa livrar-se de vrios mitos: o de que existe uma forma correta de falar, o de que a fala de uma regio melhor da que a de outras, o de que a fala correta a que se aproxima da lngua escrita, o de que o brasileiro fala mal o portugus, o de que o portugus uma lngua difcil, o de que preciso consertar a fala do aluno para evitar que ele escreva errado (PCN, 1998, p. 31). Se as classes dominantes vem a escola com a funo de legitimar seus privilgios, as camadas populares consideram-na como a instncia de aquisio do instrumental necessrio luta contra a desigualdade. Sua proposta pedaggica na rea da linguagem aproxima-se do bidialetalismo, mas, no aspecto ideolgico, sem rejeitar os dialetos das camadas populares, apenas utilizando-o como instrumentalizao do aluno. Pois, o bidialetalismo de uma escola desse tipo, reflete-se em todas as atividades escolares em que a lngua instrumento bsico de comunicao. 7. UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAU UESPI CAMPUS PROFESSOR ALEXANDRE ALVES DE OLIVEIRA CURSO: LICENCIATURA PLENA EM LETRAS/PORTUGUS DISCIPLINA: MET. DO ENSINO DA LNGUA PORTUGUESA PROF.: ELISA PESSOA ARANHA BLOCO VI; 2012.2 LINGUAGEM E ESCOLA: UMA PERSPECTIVA SOCIAL Magda Soares ACADMICO: Alan dos Santos Oliveira 8. PARNABA-PI 2013 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS: BRASIL. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Mdia e Tecnolgica. Parmetros Curriculares Nacionais: ensino mdio. Braslia: MEC, 2000. ______. Secretaria de Educao Fundamental. Parmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: lngua portuguesa. Secretaria de Educao Fundamental. Braslia: MEC/SEF, 1998. SOARES, Magda. Linguagem e escola: uma perspectiva social. 17 ed. So Paulo, tica, 2001.