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EM RIO DA MINHA ALDEIA (FERNANDO PESSOA)

Estruturas textuais em o rio da minha aldeia

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EM RIO DA MINHA ALDEIA

(FERNANDO PESSOA)

As estruturas textuais

O texto apresenta três estruturas.

Uma superficial em que ocorremelementos concretos e que é, digamos, uma leituraprimária. É o chamado texto figurativo.

Uma intermediária onde ainda ocorremelementos concretos, mas em sentido geral, alguém, umhomem...

Uma leitura atenta irá depreender a estruturaprofunda, em que as ideias em conflito sãoapresentadas. É a estrutura com palavras abstratas.

O cachorro e o reflexo

Um cachorro, que carregava na boca um pedaço de carne, ao cruzar uma ponte sobre um riacho, de repente, vê sua imagem refletida na água.

Diante disso, ele logo imagina que se trata de outro cachorro, com um pedaço de carne maior que o seu.

Ele não pensa duas vezes, deixando cair no riacho o pedaço que carrega, e ferozmente se lançando sobre o animal refletido na água. Seu objetivo é simples, tomar do outro aquela porção de carne que julga ter o dobro do tamanho da sua.

Agindo assim, ele acaba perdendo a ambos. Aquele que tentou pegar na água, por se tratar de um simples reflexo, e o seu próprio, uma vez que ao largá-lo nas águas, a correnteza acaba por levar para longe.

Esopo

No nível superficial temos a leitura primária, literal: um cachorrocom um pedaço de carne na boca vê refletida na água sua imagem e imaginaser outro cão, com uma carne que lhe parece maior. Abre a boca para atacar ooutro e tomar-lhe a presa. Acaba deixando cair sua comida rio abaixo e ficasem nada.

Em nível intermediário: alguém que possui algo que lhe éprecioso, imagina ver algo igual ou até melhor que o seu e, sem pensar,lança-se em busca do novo bem ilusório. Acaba ficando sem o que possuía esem o que pretendia conseguir.

A estrutura profunda, formada de palavras abstratas, de ideias,noções: egoísmo e falta de reflexão levam à ruína.

Fernando Pessoa

(1888 - 1935) foi um poeta e escritor português, nascido em Lisboa. É considerado um dos maiores poetas da língua portuguesa e da literatura universal.

Mar Português

Ó mar salgado, quanto do teu salSão lágrimas de Portugal!Por te cruzarmos, quantas mães choraram,Quantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casarPara que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a penaSe a alma não é pequena.Quem quer passar além do BojadorTem que passar além da dor.Deus ao mar o perigo e o abismo deu,Mas nele é que espelhou o céu.

O rio da minha aldeia (Fernando Pessoa)

Imagens do Tejo

O rio da minha aldeiaFernando Pessoa

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia, Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeiaPorque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia. O Tejo tem grandes navios E navega nele ainda, Para aqueles que veem em tudo o que lá não está,A memória das naus.O Tejo desce de EspanhaE o Tejo entra no mar em Portugal.Toda a gente sabe isso.Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeiaE para onde ele vaiE donde ele vem.E por isso porque pertence a menos gente, É mais livre e maior o rio da minha aldeia.Pelo Tejo vai-se para o Mundo.Para além do Tejo há a AméricaE a fortuna daqueles que a encontram.Ninguém nunca pensou no que há para alémDo rio da minha aldeia.O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

O Tejo é o rio mais extenso da Península Ibérica. A sua baciahidrográfica é a terceira mais extensa na península, atrás do rio Douro e dorio Ebro. Nasce em Espanha a 1 593 m de altitude na Serra de Albarracín edesagua no Oceano Atlântico, banhando Lisboa, após um percurso de cercade 1 007 km. A sua bacia hidrográfica é a segunda mais importante daPenínsula Ibérica depois da do rio Ebro.

Nas suas margens ficam localidades espanholas como Toledo,Aranjuez e Talavera de la Reina, e portuguesas como Abrantes, Santarém,Salvaterra de Magos, Vila Franca de Xira, Alverca do Ribatejo, Forte da Casa,Póvoa de Santa Iria, Sacavém, Alcochete, Montijo, Barreiro, Seixal,Almada e Lisboa.

Da foz do Tejo partiram as naus e as caravelas dos descobrimentos portugueses.

Em Lisboa o rio Tejo é atravessado por duas pontes. A mais antiga éa Ponte 25 de Abril (inaugurada em 1966, então Ponte Salazar), uma dasmaiores pontes suspensas da Europa, e que liga a capital de Portugal aAlmada. A outra é a Ponte Vasco da Gama, de cerca de 17 km decomprimento. Foi inaugurada em 1998 e liga Lisboa (Sacavém) a Alcochetee Montijo. O local mais largo deste rio chama-se Mar da Palha e fica entre aLisboa, Vila Franca de Xira e Benavente.

Tejo – Não corre pela minha aldeia, tem grandes navios, tem História, desce da Espanha e entra no mar em Portugal, leva ao mundo...

Rio da minha aldeia – Corre pela minha aldeia, é desconhecido, ninguém sabe onde deságua e onde nasce, pertence a menos gente, é mais livre e maior, não faz pensar em nada, é só um rio.

No nível superficial: compara-se o rio Tejo com o rio da minha aldeia. O Tejo é mais belo do que o “rio da minha aldeia” . Mas não é mais belo que “ele” porque o meu rio é menos conhecido, mais íntimo, mais particular, mais livre, maior, é “só” um rio...

Em nível intermediário: comparando um bem que é meu, faz parte da minha vida, com algo da mesma espécie, que todos reconhecem ser maior, melhor, mais valioso, afirmo que o que me pertence me vale mais.

Na estrutura profunda: confronto entre a visão subjetiva e a visão objetiva que se tem de tudo. Individual x universal. Meu x não-meu. Valorização do pessoal .

SUBJETIVO: PESSOAL, PARTICULAR, INDIVIDUAL, EMOCIONAL, PARCIAL, APAIXONADO, TENDENCIOSO, ÍNTIMO, PRÓPRIO, EGOCÊNTRICO...

OBJETIVO: GERAL, UNIVERSAL, IMPARCIAL, ISENTO, NEUTRO, REAL, RACIONAL, REALISTA,

Relacionado com a antítese, é uma figura de linguagem queconsiste no emprego de palavras que mesmo opostas no sentido vão sefundir num mesmo enunciado. É uma declaração que aparentemente éverdadeira, mas que leva a uma contradição lógica, ou que contradiz aintuição comum e a lógica. Alguns exemplos de paradoxo como figurade linguagem são: "O nada é tudo", "Eu estou cheio de me sentir vazio","O silêncio é o melhor discurso".

Em algumas situações, é perceptível que a associação de ideiasou conceitos contrários cria verdadeiras contradições. É o quechamamos de paradoxo. Para o professor Rocha Lima: “Todo paradoxoencerra, em última análise, uma antítese, porém uma antítese especial,que, em vez de opor, enlaça ideias contrastantes.” Em outras palavras,pode-se dizer que o paradoxo é uma oposição no mesmo ser (porexemplo, “um quarto claro e escuro”)Exemplo: “Teu mesmo amor me mata e me dá vida.”

Figuras de linguagem

Paradoxo ou oxímoro

Há quem confunda paradoxo com antítese. Apesar de serem parecidas, elas se diferenciam por que no paradoxo a oposição se funde num mesmo referente, criando um efeito de contradição:

A explosiva descobertaAinda me atordoa.Estou cego e vejo.Arranco os olhos e vejo.

(Carlos Drummond de Andrade)

O mito é o nada que é tudo.O mesmo sol que abre os céusÉ um mito brilhante e mudo -O corpo morto de Deus,

Vivo e desnudo. (Fernando Pessoa)