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revista de cultura e politica numero 4. Julho de 2014. Temas a poesia e a revolução. Causas da Guerra civil de 32.
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REVISTA PAULISTA DE CULTURA E POLÍTICA
Nº 4 Julho/2014
JULHO DE 2014
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REVISTA PAULISTA DE CULTURA E POLITICA
Editorial ....................................................................................................................... 03
A trincheira que não se rendeu! .................................................................................. 04 Roberto Tonin São Paulo e a Federação ...............................................................................................12 Roberto Tonin
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Editorial
Para os paulistas, o dia 9 de julho possui enorme significado. Mas infelizmente muitos
desconhecem esse fato marcante de nossa história.
Porque houve a guerra civil em 1932 no Brasil?
Porque o povo paulista se uniu para lutar contra o governo federal?
Após a guerra se batizou o episódio de “constitucionalista”, por recato, apenas. Mas ninguém
morreria por uma constituição. Ninguém faria tantos sacrifícios apenas para ter uma Carta e
um Estado de Direito. Um povo inteiro não se mobilizaria, não doaria sua riqueza, não
sacrificaria seus filhos numa guerra por algo tão simplório quanto uma constituição ou um
‘Estado de Direito’.
Não, não foi pela constituição que o povo paulista sangrou. A Guerra Civil de 1932 foi
complexa. Muitas causas se entrelaçaram e envolveram todo o povo paulista, e os conduziram
apaixonadamente para a luta. E muitos foram os fatores que motivaram as pessoas, que as
forçaram a arriscar a própria vida para lutar contra o governo federal. Falaremos dessas
causas mais adiante.
Antes trataremos do papel da poesia na revolução paulista. Os ideais de liberdade e
autonomia dos bandeirantes enraizadas na alma paulista, e que jamais deixarão esta terra,
enquanto houver paulistas vivendo nela. Poetas, oradores, radialistas, todos a seu jeito
deram sua contribuição á causa paulista, citaremos alguns exemplos para ilustrar esse
interessante aspecto da luta em São Paulo. E que ela não seja esquecida, jamais.
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A trincheira que não se rendeu. – A literatura e a poesia atendendo ao chamado da
causa paulista.
Junto com as memórias e análises, surgiram em abundancia nos anos subseqüentes á
revolução, também os poemas e versos, como um tributo aos que pelejaram e deram tudo por
São Paulo.
“pretendeu cultuar a memória dos que tombaram pela lei depositando sobre os seus sagrados
túmulos algumas flores de paulistanismo – as mais lindas que pode colher no jardim do passado!
Flores de Saudade! Do tempo em que São Paulo não sofria, não aceitava humilhações! Saudade da
época em que os paulistas, atentos e esclarecidos, não entregavam a aventureiros políticos os
destinos gloriosos de seu estado!” Raul Gomide de Andrade – Rimas e Verdades, 1955,
Com o desenrolar dos anos, finda a guerra civil, permanecia São Paulo refém dos poderes
centralistas. A cada ano pagava alto tributo por sua condição, e sua liberdade jamais fora
restituída. São Paulo permanecia seqüestrado, subjugado, escravizado. Todas as tentativas de
restituir a autonomia estadual eram denunciadas de golpismo e elitismo pelos centralistas
corruptos. E nos meandros da dialética esquizofrênica dos discursos dos falsos patriotas
brasileiros, corriam as riquezas do paulista, alimentando os vermes da podridão em Brasília.
Não bastasse a espoliação econômica sofremos também o acorrentamento político, seja na
injustiça da representação parlamentar, seja nas sujeiras das campanhas políticas e toda a
sorte de mentiras e calúnias a qualquer candidato paulista. Não por outra razão que desde
1930, os paulistas foram banidos da presidência da republica. E os agentes do centralismo e
corrupção tentam por todas as maneiras e estratégias sujas se apoderar também das rédeas
dos governos em S.Paulo. Mas, nas palavras de Raul Gomide:
“São Paulo sabe perder batalhas democráticas; já o provou dentro de sua própria casa. Bem por essa
razão acatará o pronunciamento soberano de urnas honestas. Reagirá, todavia, a curto ou longo
prazo, contra as forças impatrióticas que insistem em amordaçá-lo política e economicamente.”
(Raul Gomide de Andrade – Rimas e Verdades, 1955).
Simultaneamente a estes achaques dos centralistas, chegavam aventureiros políticos de todas
as procedências. Rotulados de interventores, chefes de policia, diretores executivos, etc, tais
ostensivos prepostos do governo ditatorial praticavam toda a sorte de crimes contra São Paulo
e seus filhos. Mas esta prática de trazer gente de fora para ocupar cargos de chefia,
nomeações a troco de favores pessoais e políticos se perpetuou ao longo das décadas.
Mas essa gente de fora, vinda dos mais sombrios cantos deste país, imbuídas por um discurso
de ‘mudança’ de construir um ‘novo futuro’, enquanto eram colocadas em seus postos pela
força das armas ou do apadrinhamento, enquanto ameaçavam os que ousavam questionar
esta invasão sorrateira. Os tais revolucionários, uma vez no poder, trocavam os seus ideais (se
é que algum dia os possuíram!) por uma fúria de enriquecimento sem escrúpulos, a curto
prazo. O país passou a ser repartido como bens de família ou um mero bolo! Fortunas se
fizeram, milagrosamente, da noite para o dia.
Na medida em que era fulminada por estes acontecimentos, São Paulo, atingido na sua
dignidade, esbulhado de seus direitos políticos, sentia saudade do tempo em que a liberdade e
a lei moravam, decentemente, dentro da constituição e da democracia!
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A juventude paulista, outrora valorosa, pela voz de seus mais corajosos representantes,
começou a reagir, na medida do possível. Os perigos que enfrentava eram enormes; a traição e
subserviência que se instalaram no Estado, maiores, ainda.
Todavia, o brio da gente bandeirante, seus ideais cívicos, a
sede de liberdade e de decência foram, pouco a pouco,
tomando preciosas posições. Das faculdades, das ruas e
praças públicas a estudantada começava a atira as
primeiras pedras no telhado da ditadura.
A população ordeira e laboriosa passou a ser contaminada
pelo entusiasmo dos valentes moços. Os comícios passaram
a improvisar-se aqui e ali. Quase sempre eram dissolvidos
violenta e covardemente pela policia.
Em um desses dias agitados, precisamente a 23 de maio de 1932, na praça da Republica,
quando a voz corajosa da mocidade vibrante se fazia ouvir em alvoradas libertadoras, correu
muito sangue. Mortos e feridos tombaram ante a metralhadora assassina, cínica, da policia
ditatorial.
De nada, porem, adiantaria aos inimigos da lei e da liberdade a carnificina fria da noite quente
de civismo.
Não se matam ideais com tiros de fuzis! Não se abafam vozes sonoras de patriotismo com
estampidos que morrem, instantaneamente, depois de haverem deixado suas gargantas
metálicas!
Não se calará, jamais a ...
SENTINELA DA PÁTRIA Crê, rapas, no que te digo... E vai confiante. Leva o ideal contigo! Fronte altiva, olhar sereno, Ergue a voz no território Que, ainda, é livre Porque és forte. Solta o verbo, em alvoradas, Mesmo que te ameace a morte Na tribuna das Arcadas, De onde jorra a liberdade Pela voz do coração De tão guapa mocidade! Crê, rapas, no que te digo... E vai, confiante. Leva o Ideal contigo! Vai... e mostra a toda gente, neste teu Onze de Agosto. que há no peito o orgulho,
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que tu lutas por gosto como os bravos que tombaram por causa de Nove de Julho! Crê, rapas, no que te digo... E vai, confiante. Leva o Ideal contigo! Solta o verbo da tribuna. Diz ao povo, ao forasteiro, Que és sentinela da Pátria... Sendo PAULISTA, primeiro!”
(Raul Gomide de Andrade – Rimas e Verdades, 1955,p. 14 – 17).
Mas a revolução paulista de 1932 foi, sobretudo, romântica.
De um lado a praticidade material, engenheiros, técnicos, médicos, soldados, operários,
cozinheiros. De outro lado, poetas, escritores, oradores, jornalistas, dirigentes.
Um era a ação. O outro o verbo. O que unia os dois era o ideal paulista, mas também o receio
da sombra da perdição getulista.
Um dos personagens mais emblemático era Ibraim Nobre. Ibraim era o orador da Revolução.
Por meio do rádio, ou direto da tribuna, seus discursos enchiam de brios os paulistas. Sua
eloqüência fazia uma bela combinação de ideais, e imagens, gestos e palavras. Ibraim não
falava. Atirava as palavras e as cravava no coração e na mente dos que o ouviam.
“Você que está me ouvindo, aí, na doçura do seu lar, junto ao rádio, já cumpriu o seu dever?” –
Essa pergunta abria com freqüência seu trabalho nas rádios.
O locutor César Ladeira, da rádio Record de São Paulo, ficou conhecido como “A Voz da
Revolução”, ao transmitir mensagens radiofônicas diárias conclamando a bravura do povo.
Outro radialista com importante papel na revolução foi João Neves da Fontoura, que
descrevia pelo microfone a mobilização dos paulistas. Dizia o locutor: “O entusiasmo de São
Paulo em armas entusiasmaria até mesmo os céticos. Há uma estranha beleza nessa
metamorfose marcial. Um povo de trabalhadores despe a blusa e veste a farda”. Ao fundo,
ecoava a marcha Paris Belfort, que acabou virando o hino da Revolução Constitucionalista de
1932.
Com golpe de Estado de 1930 “tenentes”, invasores e apadrinhados de Getúlio, vinham
governar os paulistas. As falcatruas políticas sorviam as riquezas de São Paulo, e enchiam de
vergonha a toda pessoa decente. Forasteiros inundavam São Paulo e criavam grupos de apoio
a Getulio, pai dos pobres. Pobres criados por ele mesmo – o maior de todos os ‘coronéis’ ou
caudilho como era chamado no Rio Grande do Sul. Por que nos negavam, então, o direito de
defender nossa própria gente, e governar nossa própria terra?
Ibrahim manifestou a indignação que corroia a alma paulista com este libelo pela autonomia:
“Minha Terra, minha pobre terra” - Ibrahim Nobre
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“São Paulo, lume da minha terra!
Em tua vigília fez-se o calor, a célula, o altar.
Presidiste os destinos da Família. Foste a glória do pão ganho com Honra.
Marcaste o nome, a propriedade, o Lar!...
Terra Paulista! Da tua carne massapé e honesta, do teu ventre de mão,
fecundo e são, veio à alma que realizou a nacionalidade, imprimindo-lhe o
sentido da Independência e os rumos da Civilização. De ti proveio o Homem
que confrontou a natureza peito a peito, e que a venceu e a dominou, a
facão e a fé!
Nossa Terra era justa, era boa!
O inimigo, fingindo-se de irmão, invadiu-a, desfê-la, lesou-a, reduziu-a a
senzala, a prisão.
Não há crime! Abençoada que seja toda a ação que se opõe ao labéu! Nosso
sangue, ao cair na peleja, se transforma em estrelas no céu! E que importa
morrer?
Que nos valha a consciência de um justo porvir! É mister rechaçar a
canalha!
Redimir, redimir, redimir!...
Mães paulistas! Ensinai aos vossos filhos que o sangue nada vale pelo que
corre humanamente nas veias, mas pelo que palpita divinamente no
coração. Esposas e noivas de minha Terra! Afirmai aos vossos maridos, aos
vossos prometidos que o amor não se prova pelo que obtém, mas pelo que
renuncia! Que não há lar livre em terra escrava!
Meus patrícios!
Olhai! Lá fora estão passando os funerais da nossa geração e do nosso
pudor!
E então, Homens?”
Quando as tropas federais, muito mais numerosas avançaram contra as terras paulistas. O
Povo se mobilizou ao extremo. “Tudo por S.Paulo”. Alianças, correntes, moedas, pepitas
brutas, todo o ouro disponível, foi reunido e doado para a compra de armas. Armas para
defender o povo, armas para defender o ideal paulista!
A campanha “Ouro para a vitória” deveu-se, sobretudo, aos poetas que instigaram e
cativaram a todos ao ultimo sacrifício, o esforço final para lutar contra o leviatã que a todos
queria dominar e controlar.
Há quem diga que foi um esforço inútil. Tão fácil de se dizer, como o conformado com os
grilhões diz que não vale a pena se levantar e resistir.
Mas o poeta Guilherme de Almeida exprime bem o sentimento dos paulistas de outrora:
MOEDA PAULISTA
Guilherme de Almeida
Moeda Paulista, feita só de alianças,
feita do anel com que Nosso Senhor
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uniu na terra duas esperanças:
feita dos elos imortais do amor!
Quanto vale essa moeda? Vale tudo!
Seu ouro eternizava um grande ideal:
e ela traduz o sacrifício mudo
daquela eternidade de metal.
Ela, que vem na mão dos que se amaram,
Vale esse instante, que não teve fim,
em que dois sonhos juntos se ajoelharam,
quando a felicidade disse: SIM.
Vale o que vale a união de duas vidas,
que riram e choraram a uma só voz
e, simbolicamente desunidas,
vão rolar desgraçadamente sós.
Vale a grande renúncia derradeira
das mãos que acariciaram maternais,
o menino que vai para a trincheira,
e que talvez... talvez não volte mais...
Vale mais do que o ouro maciço:
vale a glória de amar, sorrir, chorar,
lutar, morrer e vencer... Vale tudo isso
que moeda alguma poderá comprar!
Um poeta, cuja identidade me é desconhecida, imaginou um encontro de um anel de ouro,
numa noite, dentre vários presentes de noivado, com o anel de ferro:
“Numa noite feliz, de sonho e de noivado, O anel de ouro encontrou-se a sós, com o anel de ferro; Era de festa o ambiente, e, em torno, se não erro, Pairava em tudo um suave aroma de pecado.
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O anel de ouro fitou, então, o anel de ferro, E ouviu-se, no silencio, um discurso exaltado: ‘Pelas mãos de um artista insigne, cinzeladio, Sou a jóia melhor do escrínio em que me encerro... O dedo em que eu fulgir dispensará safiras, Esmeraldas, rubis e outras lindas mentiras, Pois valho como jóia e valho como idéia’. O anel de ferro ouviu e respondeu, tristemente: ‘Eu dei meu ouro por São Paulo!’ Nesse instante, A alcova se inundou de um clarão de epopéia!”
A luta findou e São Paulo perdeu. Tristeza e desesperança toma conta de todos. A ditadura
triunfou no Brasil e a liberdade e autonomia foram sufocadas. O que restou de São Paulo?
Ibrahim Nobre, novamente transmite os sentimentos do povo bandeirante:
"A Revolução não deveria terminar assim. Depois que fossem os filhos,
iriam os pais. depois que eles morressem, iriam as irmãs, as noivas.
Todos morreriam. Mais tarde, quando alguém passasse por aqui, neste
São Paulo deserto, sem pedra sobre pedra, levantando os olhos para o
céu, haveria de ler, no epitáfio das estrelas, a história de um povo que não
quis ser escravo."
“Calai protestos que em minha alma enjaulo
Ante a paisagem que daqui se avista
Esta terra ainda pode ser São Paulo
Mas esta gente já não é paulista.”
Tudo foi dominado por um povo escravo. Os paulistas remanescentes se calam para
preservar as migalhas que lhes restaram. Migalhas diante do colosso bandeirante, migalha
diante da terra mater paulista, migalha diante das artérias de ferro de outrora que
alimentava fabricas tão numerosas de cujas torres pareciam um canavial de ferro e
concreto ... mas hoje ... são só migalhas do que foram. Lutar para preservar migalhas é uma
mesquinhez que desonra nosso passado.
A guerra veio e levou centenas de paulistas. A dor da derrota, a morte dos entes
queridos, o lamento pela terra bandeirante entregue á espoliação, violência da ocupação. O
Poeta Geraldo Goulart redigiu uma oração para aqueles que buscavam consolar seus
corações esmagados:
Canto II – “Mater Admirabilis” - Regina Coeli. Salve Maria ... Sempre Atenciosa Sacrário do Gentil Nazareno A Quem na Infancia amparastes A Quem na Mocidade assististes A Quem no Calvário velastes ...
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Maria ... Mãe Imaculada Com todo o Ser sublimado Sobre este “Senhor do Vale” Cercado de verde arvoredo Verdeal como os Virides sonhos Do esperançoso Paes Leme Que passou pelo Tietê ... Acolá Com barcas ... Ninhos de bacamartees... Daqui ... Sentindo a nossa lembrança Retornamos a escutar os clarins Convocando para a Liberdade Tornamos a ouvir os tambores Que o Civismo Paulista rimavam Revemos as tropas marchando Ao som da “Paris Belfort” ... Rememoramos ... Virgem Augusta Aquela Mãe com itálico sangue Mãe de jovens brasileiros Que já termidada a Epopéia Em “São José” de Euclides da Cunha Recebera “aviso” de um Filho Prisioneiro na Ilha Infernal Da paradisíaca Guanabara Afirmando que muito em breve Para os seus voltaria ... Filho este ... Ferrucio Tolesi1 Que dias depois morreria Na cerca eletrificada Saturando de dor e de luto O coração de Thereza ... Sua Mãe A qual hoje ... Aguarda Maria O Fim da sua Peregrinação Com a certeza de reencontrar Aquela Flor da sua Alma No Vosso Jardim Perenal. (Poeta Geraldo Goulart)
Já o poeta Paulo Bomfim relembra a glória passada de S.Paulo e os últimos suspiros de
liberdade de seu povo:
"Minha terra paulista de onde partiram tantos passos inventores do Brasil! Ah! São Paulo bandeirante, com a saga de meus mortos vem voltando lá do sertão! Ah! Meu São Paulo dos cafezais cor de esmeraldas, semeando cidades e ferrovias garimpeiras do horizonte. Ah! Meu São Paulo de 32, percorrendo os trilhos do Trem Blindado, dando sua vida por um ideal.
1 Ferrucio Tolesi foi um voluntário rio-pardense que morreu num campo de concentração brasileiro na
Ilha das Flores. Foi empurrado por guardas para uma cerca eletrificada onde pereceu.
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Falam os numes tutelares deste Tribunal na saudade e na esperança de um povo. No universo paralelo onde gestos são verdades, Manuel da Costa Manso2 e Carlos de Souza Nazareth3 prosseguem irmanados sob a Bandeira Paulista. Setenta e sete anos são passados e o pequeno escoteiro de 324 acampa agora, para sempre, no coração do Tribunal de Justiça. Ah! Meu São Paulo de eternidade!"
Paulista, há atrás de nós uma longa trajetória de grandes feitos e empreendimentos.
Conquistamos terras de outrora grandes impérios, conquistamos e domamos as forças da
natureza e a colocamos ao serviço da civilização. Criamos o exemplo, e temos orgulho disso.
Mas nossa glória desperta enorme ressentimento e inveja. Nosso passado glorioso incomoda
aqueles que nos odeiam sem razão. Ódio dos que tentam reescrever nossa história, tentam
apagar nossa memória, tentam derrubar nossos monumentos, tentam subverter nossos
símbolos, tentam putrefar nossos ideais. Conseguirão eles seu intento?
Francisco Poti faz uma irreverente ode á glória de ser paulista como resposta a esta
insensatez que ainda persiste:
Bandeira Paulista, de Francisco Pati. “Esta é a bandeira adorada Que tanto me fala à vista Tenho-a sempre bem gravada Na minh’ alma de paulista. Penso às vezes, com vaidade, Que Deus foi um grande artista, Quando pos na humanidade O bravo povo paulista. Apesar de tão pequeno Ergo ao céu as mãos e a vista,, E agradeço o Deus sereno Que me fez nascer paulista. Mesmo que a vida inclemente Não ponha outros bens na lista, Eu hei de morrer contente Só por ter sido paulista.”
2 Manuel da Costa Manso era presidente do Tribunal de Justiça em São Paulo em 1932 e defendeu
ardorosamente a causa paulista. 3 Carlos de Souza Nazareth foi presidente da Associação Comercial de São Paulo em 1932, responsável
pela organização de um sistema de suprimentos e apoio logístico ao Exercito Paulista. 4 Aldo Chioratto, escoteiro de apenas 9 anos, servia como mensageiro durante a guerra civil de 1932 e
morreu num ataque aéreo da aviação brasileira.
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São Paulo e a Federação.
por Roberto Tonin
“Aquele que não trabalha não deve comer”. (São Paulo, aos Tessalonicenses, - Bíblia, atos III,
8, 10, 12).
Em 1932, contra a opressão, contra a ditadura, levantaram-se os Paulistas. Quem são os
paulistas?
Os Paulistas foram os bandeirantes quem fizeram as fronteiras desse país, conquistando 3
milhões de km² de território espanhol. Os Paulistas foram os Andradas que conduziram a
independência frente ao império português, os Paulistas foram homens como Feijó que
pacificaram a federação, os Paulistas foram aqueles que tanto fizeram pela abolição da
escravatura que há 100 anos atrás, já havia uma grande e sólida classe
média negra, coisa que até hoje não existe nos outros estados. Paulistas foram os que
tomaram as rédeas para estabelecerem a República, onde todos os homens são iguais
perante a lei e o poder.
Viva São Paulo ninho fecundo de abnegados apóstolos da
liberdade. Dessa seiva de esplendidas qualidades é
natural que surgisse o sucesso administrativo e
econômico como se observa pela pujança produtiva
paulista. Disso todos os Paulistas têm consciência. Disso
todos os que para cá vieram sabem. É dessa energia
pioneira que provém a força assimiladora de São Paulo.
O filho do estrangeiro que convivia com paulistas,
paulista queria ser. Havia vontade nisso. Havia orgulho
nisso.
Habituado a vencer em tudo pelo esforço de seu trabalho, o Paulista ignorou o perigo que o
espreitava. Apesar de ser gloria exclusiva do paulista, o sucesso de São Paulo não deixou de
beneficiar a toda comunidade nacional. Produto de um esforço honesto, longe de ser
unanimente admirado, desperta ciúmes injustificáveis, que, não raro, explodem em
agressões. Ou pior, em despeitos. Blasfemam do sucesso paulista. Blasfemam de sua
riqueza e de seu orgulho.
O orgulho paulista emana do esforço legítimo de seu trabalho, e isso é nobre e digno de
respeito. São Paulo é rico porque trabalha. São Paulo trabalha porque é honesto. São Paulo
é honesto porque é educado e culto.
Trabalho, honestidade e educação são coisas que os outros estados podem se fazer valer
para obter a prosperidade que São Paulo alcançou.
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Mas ao invés disso, preferem caluniar àqueles que lhes serve de exemplo. Negando-nos o
fruto de nosso esforço. Insidiosamente tentam crer e nos fazer crer que não foram os
paulistas quem construíram São Paulo. Há 460 anos que Paulistas suam e sangram por essa
terra, e esses tolos que cá estão há alguns poucos anos berram que foram eles quem
construíram São Paulo, pasmem, isso não é mais do que estrebuchice de desmiolado, uma
verdadeira prova de odiosidade e ignorância.
Desde o golpe militar de 1930 se impõe aos currículos escolares uma grande mentira: que
os governos republicano de 1889-1930 eram marcados pela política ‘café com leite’, numa
fantasia onde o governador paulista e mineiro se revezavam no poder central.
Evidentemente é um sofisma.
Os dois primeiros presidentes foram alagoanos, os três seguintes eram paulistas, e após
houve uma sucessão de quatro mineiros, dois fluminenses, um gaucho, e um paraibano. Em
1930 o governador Julio Prestes, excelente administrador, que pretendia instalar uma
fábrica da Ford no país, propôs sua candidatura a presidente, após os paulistas ficarem 21
anos fora do poder central.
A vitória cabia ao partido com mais votos, devido a melhor coligação. Julio Prestes do
paulista PRP criou uma coligação com baianos, fluminenses, paulistas e mato-grossenses
Ocorre que o candidato Antonio Carlos do mineiro PRM, exigiu ser o candidato a presidente,
e não sendo aceito como cabeça de chapa na coligação com o paulista PRP, recusou a vaga de
vice e afirmou: “Se o próximo presidente não for mineiro, não o será paulista!”. Ele e o PRM
aderiram ao partido do gaúcho Getulio Vargas, cujo vice era o paraibano João Pessoa.
Curiosamente havia 21 anos que um paulista não se elegia presidente da republica, o que
evidencia um ódio injustificável por parte dos golpistas.
Júlio Prestes se elegeu presidente com a maioria dos votos do povo. Mas o candidato
derrotado nas urnas, Getúlio Vargas redigiu um manifesto ofendendo o vencedor da eleição e
fazendo acusações infundadas. Logo depois seu vice de chapa, João Pessoa, foi assassinado
por razões pessoais. Getúlio usou esse fato como estopim para reunir renegados militares -
os tenentistas, os coronéis de vários estados, o Partido Democrático e outros derrotados
nas eleições para dar um golpe militar. E em 3 de outubro de 1930, a chamada revolução de
1930, os derrotados nas eleições tomaram o poder pela força. Suprimiram a constituição,
as liberdades civis, confiscaram os equipamentos
das policias estaduais, dissolveu o congresso, e substituiu todos os governadores e prefeitos
eleitos, por interventores nomeados pelos golpistas de Getúlio Vargas.
Os getulistas não aceitando serem derrotados pelo povo tramaram o golpe, tomaram o poder
e invadiram S.Paulo. Bárbaros como hunos, saquearam e atemorizaram. Invejosos do
progresso e civilidade alcançada pelos paulistas vieram e arrancaram nossa autonomia, nos
impedido de governar a nossa própria casa. Impôs-nos um governador militar e de outro
estado, escolhido entre os amigos do ditador Getúlio Vargas, para mandar nos paulistas.
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Eles passaram a ditar o que deveríamos fazer. Isso não é suprema humilhação?! Nós que
tanto fizemos para a grandeza da federação, nós que tanto sofremos por esse país, agora
nos achamos submetidos a uma gentinha que nada fez! Que nada sofreu!
Essa situação nos remete as reflexões de um grande poeta, que cantava as mazelas do Brasil
na época da colônia:
“Que falta nesta cidade? .......Verdade Quem a pôs neste socrócio?.....Negócio Que mais por sua desonra?.......Honra Quem causa tal perdição? .....ambição Falta mais que se lhe ponha......Vergonha E o maior desta loucura? ....Usura. O demo a viver se exponha, Notável desventura Por mais que a fama a exalta, De um povo néscio, e sandeu, Numa cidade, onde falta Que não sabe, que o perdeu Verdade, Honra, Vergonha. Negócio, Ambição, Usura.”
Gregório de Matos.
A ditadura de Getúlio apelava, como todos os que são desprovidos de inteligência, para a
truculência. Censurando e dificultando o trabalho da Justiça; proibindo os jornais de criticar
o governo; recolhendo as armas dos Estados para impedir que eles resistam à ditadura;
colocando amigos, parentes e partidários nos cargos públicos, parasitando o povo que é
obrigado a pagar os privilégios e luxos para essa gentinha oportunista; eles alegando que o
dinheiro paulista era usado em S.Paulo passaram a enviar tudo para os outros estados e não
deixavam nada em S.Paulo, o paulista trabalhava para sustentar os outros, e o nosso dinheiro
oriundo de nosso trabalho eram dados aos amigos e aliados do partido de Getúlio nos outros
estados, sempre por critério político; Getúlio e seus ministros falavam diariamente nas
rádios, o meio de informação mais popular na época, e seus partidários enchiam as ruas de
propaganda do governo ditatorial, a fim de manipular as pessoas.
Isso já bastava para uma rebelião, mas havia ainda outro agravante. As conseqüências
econômicas que uma ditadura irracional traria ao país. Já que o progresso é obtido com o
desenvolvimento das capacidades inerentes á terra, o que é em grande parte propiciado por
capitais estrangeiros que aqui investem. Mas os
capitais estrangeiros só vão para países estáveis
politicamente, que garanta, por meio de uma
constituição, os direitos das pessoas e dos
empreendedores. E isso não existia na Ditadura
Getulista, porque os povos que colocaram Getúlio no
poder, lá vivem dos recursos enviados pela União. Daí
não se interessarem por capitais estrangeiros. Daí não
se interessarem pela constituição. Daí seus políticos
mesquinhos, que em sua terra mandam em tudo e em
todos, serem contra uma lei que garanta os direitos dos
povos e os deveres dos governantes. Daí a sua
indiferença a golpes e ditadura. Daí seu ódio contra os
paulistas. Daí as humilhações e rapinagens.
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Em 1932, há 80 anos, S.Paulo pensou que para poder viver livre seria preciso arriscar a
morrer. E marchou para a guerra. Guerreou pela liberdade... Sozinho. Guerreou contra uma
multidão raivosa de povos que urrava pela barbárie, clamava pela ditadura getulista,
sedenta de sangue dos justos. A águia vive solitária, os urubus é que vivem em bandos.
S.Paulo lutou pela constituição, S.Paulo lutou pela justiça, S.Paulo lutou pela dignidade do
povo paulista, S.Paulo lutou pela liberdade que lhe fora
arrancada e que até hoje não foi devolvida.
Disso surgiu a questão da Autonomia. Mas o que movia o paulista para as trincheiras era o
espírito de ‘paulistanidade’. O amor á cultura do povo e ás coisas de nossa terra.
Porque os gaúchos são elogiados por valorizar sua cultura e história e defender seu Estado?
Porque os baianos são elogiados por valorizar sua cultura e história e defender seu Estado?
Porque os mineiros são elogiados por valorizar sua cultura e história e defender seu
Estado? Ora porque isso é nobre e digno de respeito. Mas porque então quando nós paulistas
tentamos fazer exatamente o mesmo que eles, e somos atacados e caluniados?!
Tenha orgulho de Ser Paulista, preserve sua cultura, sua história e sua integridade moral e
isso será o maior golpe que esses falsos nacionalistas terão. Se S.Paulo bater forte em
cada coração paulista, S.Paulo se levantará e retomará o lugar que lhe é de direito.
Se naquela época houve sentimento autonomista, o foi como resposta a injustiça do
governo federal que tudo arranca de S.Paulo e nada nos devolve, impostos, taxas, leis,
privilégios para os partidos que tomam o poder, dificuldades para que o paulista possa
governar sua terra. Com a guerra o sentimento autonomista foi redobrado diante das
atrocidades cometidas pelas tropas getulistas que vieram do sul, de minas e do norte.
S.Paulo foi isolado na luta, hostilizado de todas as formas possíveis: bombardeios de
hospitais, bombardeios de 14 cidades, como Campinas,
Guaratinguetá, e S.Paulo, fuzilamento de prisioneiros
paulistas, rádios proferindo calúnias sobre S.Paulo, maus
tratos aos prisioneiros e civis, tropas getulistas
promovendo orgias de saques, roubos, assassinatos,
estupros, torturas e depredações. Difícil seria querer
abraçar àqueles que nos espancam e nos cospem.
Se hoje há um sentimento autonomista o é devido aos 82
anos em que S.Paulo é humilhado. Aos 82 anos em que tentam
apagar nossa inigualável história. Aos 82 anos em que somos
saqueados pelos inúmeros impostos e taxas federais,
arrancando “um quinto” de tudo o que produzimos. Aos 82
anos em que S.Paulo é invadido e depredado. Aos 82 anos em
que somos assassinados e roubados por bárbaros de
metralhadoras em punho, a princípio por bárbaros
uniformizados e agora por bárbaros mascarados. Aos 82 anos em que tentam nos calar, a
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princípio pelos interventores e agora por juízes e políticos corruptos. Aos 82 anos em que
somos obrigados a pagar privilégios a partidos que tomam o poder e a toda o seu curral
eleitoral. É preciso por fim a essa lenta agonia.
Está inscrito no brasão de S.Paulo: “Pro Brasília Fiant Eximia” (pelo Brasil façam-se
grandes feitos). Que outro povo tem isso? Ninguém mais. Pois foi S.Paulo quem construiu o
Brasil. Um país não se faz com festas, músicas, futebol e bundas, como crê os falsos
nacionalistas.
Um país se faz com trabalho e devoção, suor e sangue. E foi com devoção paulista que se
fizeram as fronteiras desse país, no século XVII e XVIII, conquistando 3 milhões de km2
de território espanhol, derramando sangue bandeirante. Que outro povo fez tal epopéia
desafiando o maior império da época? Os ingleses. Sim, os ingleses, e eles sem terem quem
lhes extraísse as forças se tornaram por sua vez uma grande potencia por vários séculos. E
foi com o trabalho paulista que se fez a economia da federação nos séculos XIX e XX.
S.Paulo deu ao país ferrovias, o Proálcool, fábricas de carros, de máquinas e químicas, e
agora fábricas de aviões, de software e biotecnologia. Graças a S.Paulo exportamos alta
tecnologia, desenvolvidas nas nossas universidades estaduais, que são mantidas com o suor
do povo paulista.
Além disso, num esforço incomensurável, enviamos 140 bilhões de reais (70 bilhões de
dólares) para o governo federal. Isso é o triplo do que os estrangeiros investem no país.
Sangue e Suor Paulista por este país! E para quê?
O Paulista fica sem faculdades, sem boas escolas, sem saúde, sem segurança, sem
empregos, sem casa, com medo de andar com suas crianças pelas ruas que construíra, só
para mandar o equivalente ao dobro do orçamento do Estado de S.Paulo para o governo
federal. E para quê? Esta federação é como um barco conduzido por marinheiros paulistas,
que são obrigados a carregar passageiros ingratos, que nada fazem além de comer as
provisões da embarcação, impedido, assim que a federação prossiga na viajem até onde
almejam os Paulistas.
Mas os marinheiros paulistas estão exaustos, são 80 anos navegando sem rumo, porque
desde então o capitão não é paulista e o convés esta apinhado de gaiatos. Talvez seja
chegada a hora dos paulistas irem para o estaleiro, e bradar Pro S.Paulo Fiant Eximia.
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A Revista Paulista de Cultura e Política é uma publicação da
Associação Liga Paulista pela Autonomia.
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Paulista de Cultura e Política se reserve o direito de solicitar matérias
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Coragem de expor os fatos
Compromisso com a participação e o debate.
Escreva, desafie, nós publicaremos.
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