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SIMBOLISMO Entende-se aqui por Simbolismo, não o conjunto de manifestações espiritualistas do último quartel do séc. XIX e o primeiro quartel do séc. XX (como têm entendido alguns), mas, num sentido mais especificamente histórico-literário, uma escola ou corrente poética (incluindo a poesia em prosa e a poesia teatral), que se afirma sobretudo entre 1890 e 1915 e que se define por um conjunto de aspectos, aliás variáveis de autor para autor, que dizem respeito às atitudes perante a vida, à concepção da arte literária, aos motivos e ao estilo. Sem dúvida esta corrente literária insere-se na atmosfera mental, antipositivista, de fins do séc. XIX; mas certos caracteres de técnica literária, de forma, são inerentes ao conceito de Simbolismo aqui adoptado. Entretanto, há ainda um conceito mais restrito: o daqueles que, tomando como pontos de referência paradigmáticos Mallarmé e Claudel, definem o Simbolismo pela busca obstinada duma verdade metafísica, demanda cujo instrumento de descoberta seria o símbolo. Com efeito, se teimássemos em definir o Simbolismo tão-só pela visão do Universo como teia de analogias, floresta de misteriosas «correspondências» (na acepção baudelairiana) que o poeta se propõe

Texto Simbolismo

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Page 1: Texto   Simbolismo

SIMBOLISMO

Entende-se aqui por Simbolismo, não o conjunto de manifestações espiritualistas do último quartel do séc. XIX e o primeiro quartel do séc. XX (como têm entendido alguns), mas, num sentido mais especificamente histórico-literário, uma escola ou corrente poética (incluindo a poesia em prosa e a poesia teatral), que se afirma sobretudo entre 1890 e 1915 e que se define por um conjunto de aspectos, aliás variáveis de autor para autor, que dizem respeito às atitudes perante a vida, à concepção da arte literária, aos motivos e ao estilo. Sem dúvida esta corrente literária insere-se na atmosfera mental, antipositivista, de fins do séc. XIX; mas certos caracteres de técnica literária, de forma, são inerentes ao conceito de Simbolismo aqui adoptado.

Entretanto, há ainda um conceito mais restrito: o daqueles que, tomando como pontos de referência paradigmáticos Mallarmé e Claudel, definem o Simbolismo pela busca obstinada duma verdade metafísica, demanda cujo instrumento de descoberta seria o símbolo. Com efeito, se teimássemos em definir o Simbolismo tão-só pela visão do Universo como teia de analogias, floresta de misteriosas «correspondências» (na acepção baudelairiana) que o poeta se propõe desvendar, então não teria havido Simbolismo autêntico em Portugal: os poetas portugueses dessa época ter-se-iam limitado a copiar grosseiramente gestos cujo sentido profundo não alcançavam. Mas os próprios autores considerados representantes do Simbolismo francês, de que o nosso deriva (Baudelaire, Rimbaud, Verlaine, Mallarmé, Laforgue, Régnier, A. Samain, Valéry, etc.), seguiram caminhos divergentes, a ponto de Johansen afirmar que discordavam uns dos outros em quase tudo excepto quanto à existência dum ideal em poesia e na aguda consciência do estilo.

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Tendo em conta os aspectos inovadores que dão à poesia portuguesa, no período atrás indicado, certa fisionomia comum, serão simbolistas os poetas que participam de todas, ou quase todas, as seguintes características: revivescência do gosto romântico do vago, do nebuloso, do impalpável; amor da paisagem esfumada e melancólica, outoniça ou crepuscular; visão pessimista da existência, cuja efemeridade é dolorosamente sentida; temática do tédio e da desilusão; distanciamento do Real, egotismo aristocrático, e subtil análise de cambiantes sensoriais e afectivos; repúdio do lirismo de confissão directa, ao modo romântico, expansivo e oratório, e preferência pela sugestão indecisa de estados de alma abstraídos do contexto biográfico, impersonalizados; mercê de fina e vigilante inteligência estética (sob dado ângulo, os simbolistas são os herdeiros do Parnasianismo pelo exigente culto da Beleza e pelo papel atribuído à vontade na realização do poema), combinação muito hábil de «inspiração» (abandono aos acenos do inconsciente, às associações espontâneas) e «lucidez» (comando e aproveitamento desses elementos irracionais), com resultados inteiramente novos em poesia; larga utilização, não só do símbolo tipicamente simbolista, polivalente e intraduzível, mas da alegoria, da imagem a que deliberada e claramente se confere um valor simbólico, da comparação expressa ou implícita, da sinestesia (sobreposição de sensações, como «som branco», etc.), da imagem simplesmente decorativa; linguagem concreta ou mesmo impressionista, na medida em que o estado de alma se comunica através de imagens fragmentárias da Natureza exterior, ou impregna de elementos anímicos a paisagem que descreve (ocorre falar aqui de panteísmo, de pampsiquismo); carácter fugaz, dinâmico, da imagem, pronta a dissolver-se na tonalidade afectiva e no fluir musical do poema; musicalidade que não se reduz ao jogo de sonoridades do verso, antes, como observa Marcel Raymond, se prolonga em ressonância interior até para além da leitura do texto; libertação de ritmos; vocabulário rico de palavras complexamente evocativas, ou graças à própria expressividade fonética, ou mediante um jogo subtil de incidências dumas palavras sobre as outras (lição de Mallarmé:

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«rendre un sens plus pur aux mots de la tribu»). Outros caracteres da poesia entre 1890 e 1915 serão acidentais, ou acessórios, ou de cunho mais precisamente «decadentista»; assim o gosto dos cenários exóticos, luxuosos, que vem dos parnasianos, o amor das fulgurações barrocas e dos malabarismos rítmicos - típicos sobretudo de E. de Castro e discípulos menores.

Admitido este conceito de Simbolismo, não será difícil averiguar os sinais precursores do movimento em Portugal. Por um lado, o Simbolismo radica num espiritualismo, numa ânsia de absoluto, cujo reverso é o ódio a este mundo vulgar e tangível, o tédio, a desistência, um pessimismo haurido nomeadamente em Schopenhauer - e tudo isto se descobre nos sonetos de Antero de Quental, ora confiado num optimismo metafísico, ora niilista, taciturno, suspeitoso de que, para além das formas transitórias, há apenas um «vácuo tenebroso», o abismo do Não-Ser. [...]

Fonte: faroldasletras.no.sapo.pt

SIMBOLISMO

O simbolismo foi uma característica da pintura européia nas últimas décadas do Século 19 (em especial entre 1880 e 1890), bastante presente, apesar de não ter sido realmente organizado como um movimento.

Possui estreita ligação com o movimento poético simbolista. Rejeitava as formas naturalistas e realistas e principalmente o conceito, bastante comum na época, de que a arte só poderia ser realizada através de imagens não abstratas que representassem com fidelidade o mundo real.

O poeta Jean Moréas (1856-1910) foi um dos primeiros a rejeitar tais idéias artísticas em seu Manifesto Simbolista publicado em 1886, defendendo a aproximação da idéia numa forma sensível.

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MORÉAS (Ioannes PAPADIAMANTOPOULOS, dito Jean), poeta francês (Atenas, 1856 - Paris, 1910). A princípio simbolista (Cantilenas, 1886), fundou a escola romana e dedicou-se a uma arte clássica (Estâncias).

O simbolismo nas artes plásticas, tal como na poesia, apresentava forte misticismo e referências ao oculto. Procurava diminuir o hiato entre o mundo material e o espiritual. Os pintores deveriam expressar, através de imagens, esses temas e essa visão de mundo, desenvolvidas pelos poetas simbolistas em sua linguagem.

Para esse fim, utilizavam-se principalmente de cores e linhas, entendidos como elementos extremamente expressivos que por si só poderiam representar idéias. Confiavam mais na simples sugestão de algo que na sua forma explícita.

A inspiração temática simbolista costumava vir de poesias do movimento, além de uma certa fixação em assuntos como a morte, a doença, o erotismo e até a perversidade.

Há inúmeros artistas de estilos diferentes considerados simbolistas, por apresentarem traços do movimento em suas obras.

Exemplos podem ser dados por nomes como Moreau, com a riqueza de suas pinturas exóticas, Puvis de Chavannes e a melancolia em seus quadros, Gauguin e suas imagens agradáveis. Até Munch é considerado, sob certos aspectos, um artista simbolista.

Os simbolistas receberam sérias críticas de vanguardistas modernistas, em especial de Cézanne, pela forte presença do elemento decorativo de suas pinturas.

Fonte: www.pitoresco.com.br

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SIMBOLISMO

CONTEXTO

O Simbolismo - que também foi chamado de Decadentismo, Impressionismo, Nefelibatismo - surgiu na França, por volta de 1880, e de lá difundiu-se internacionalmente, abrangendo vários ramos artísticos, principalmente a poesia. O período era de profundas modificações sociais e políticas, provocadas fundamentalmente pela expansão do capitalismo, na esteira da industrialização crescente, e que convergiram para, dentre outras conseqüências, a I Guerra Mundial. Na Europa haviam germinado idéias científico-filosóficas e materialistas que procuravam analisar racionalmente a realidade e assim apreender as novas transformações; essas idéias, principalmente as do positivismo, influenciaram movimentos literários como o Realismo e o Naturalismo, na prosa, e o Parnasianismo, na poesia.

No entanto, os triunfos materialistas e científicos não eram compartilhados ou aceitos por muitos estratos sociais, que haviam ficado ao largo da prosperidade burguesa característica da chamada "belle époque"; pelo contrário, esses grupos alertavam para o mal-estar espiritual trazido pelo capitalismo. Assim, como afirmou Alfredo Bosi, "do âmago da inteligência européia surge uma oposição vigorosa ao triunfo da coisa e do fato sobre o sujeito - aquele a quem o otimismo do século prometera o paraíso mas não dera senão um purgatório de contrastes e frustrações". A partir dessa oposição, no campo da poesia, formou-se o Simbolismo.

O movimento simbolista tomou corpo no Brasil na década de 1890, quando o país passava também por intensas e radicais transformações, ainda que diversas daquelas vivenciadas na

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Europa. O advento da República e a abolição da escravatura modificaram as estruturas políticas e econômicas que haviam sustentado a agrária e aristocrática sociedade brasileira do Império. Os primeiros anos do regime republicano, de grande instabilidade política, foram marcados pela entrada em massa de imigrantes no país, pela urbanização dos grandes centros - principalmente de São Paulo, que começou a crescer em ritmo acelerado -, e pelo incremento da indústria nacional.

Nas cidades, a classe média se expandiu, enquanto a operária começou a tornar-se numerosa. No campo, aumentaram as pequenas propriedades produtivas e o colonato. A jovem república federativa, que ainda definia os limites de seu território, conheceu a riqueza efêmera da borracha na Amazônia e a prosperidade trazida pela diversificação da produção agrícola no Rio Grande do Sul. Mas era o café produzido no Centro-Sul a força motriz da economia brasileira, e de seus lucros alimentou-se a poderosa burguesia que determinava o destino de grande parte dos projetos políticos, financeiros e culturais do país.

No Brasil ainda sustentado pela agricultura e dependente de importações de produtos manufaturados, máquinas e equipamentos, a indústria editorial engatinhava. O público leitor era reduzido, já que a maior parte da população era analfabeta. As poucas editoras existentes concentravam-se no Rio de Janeiro e lançavam autores de preferência já conhecidos do público, em tiragens pequenas, impressas em Portugal ou na França, e mal distribuídas. Era principalmente nas páginas de periódicos que circulavam as obras literárias, e onde se debatiam os novos movimentos estéticos que agitavam os meios artísticos. Foi por meio do jornal carioca Folha Popular que formou-se o grupo simbolista liderado por Cruz e Souza, provavelmente o mais importante a divulgar a nova estética no país.

Também por força dessas circunstâncias, muitos autores do período colaboraram como cronistas para jornais e revistas, atividade que contribuiu para a profissionalização do escritor brasileiro. Raul Pompéia, ficcionista ligado ao Realismo, foi um

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deles, e abordou importantes acontecimentos e debates da época em suas crônicas, como a questão do Voto Feminino e Voto Estudantil ou os problemas da Viação Urbana. Além dos periódicos, as conferências literárias eram outra fonte de renda e de divulgação para os autores brasileiros, que também costumavam freqüentar salões artísticos promovidos por membros da elite, como a Vila Kyrial de José de Freitas Vale, senador, mecenas e autor de versos simbolistas que posteriormente patroneou autores modernistas.

Os simbolistas contribuíram muito para a evolução do mercado de periódicos, pois lançaram grande número de revistas, em vários estados brasileiros. Ainda que os títulos durassem, na maioria das vezes, apenas alguns números, o que é também indicativo da fragilidade do mercado editorial e da cena literária, representaram grande avanço no setor, notavelmente pelo apuro gráfico. Dentre os periódicos simbolistas destacam-se as cariocas Rio-Revista e Rosa-Cruz, as paranaenses Clube Curitibano e O Cenáculo, as mineiras Horus e A Época, a cearense A Padaria Espiritual, a baiana Nova Cruzada, entre muitas outras. No começo do século XX, foram publicadas revistas que ficariam famosas pela qualidade editorial e gráfica, como Kosmos e Fon-Fon!. As inovações formais e tipográficas praticadas pelos simbolistas, como os poemas figurativos, as páginas coloridas, os livros-estojo exigiam grande requinte técnico e, por conseqüência, terminaram por ajudar a melhorar a qualidade da indústria gráfica no país.

CARACTERÍSTICAS GERAIS

Os poetas simbolistas acreditavam que a realidade é complexa demais pra ser apreendida e descrita de maneira objetiva e racional, como pretendiam os realistas e parnasianos. Eles voltaram-se para o universo interior e os aspectos não-racionais e não-lógicos da vida, como o sonho, o misticismo, o transcendental. Propunham o exercício da subjetividade contra a objetividade - retomando, de modo diferente, o individualismo romântico.

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É preciso diferenciar, todavia, poesia simbolista de poesia simbólica. Como afirma o crítico Afrânio Coutinho, "nem toda literatura que usa o símbolo é simbolista. A poesia universal é toda ela na essência simbólica". O Simbolismo, para Coutinho, "posto não constituísse uma unidade de métodos, antes de ideais, procurou instalar um credo estético baseado no subjetivo, no pessoal, na sugestão e no vago, no misterioso e ilógico, na expressão indireta e simbólica. Como pregava Mallarmé, não se devia dar nome ao objeto, nem mostrá-lo diretamente, mas sugeri-lo, evocá-lo pouco a pouco, processo encantatório que caracteriza o símbolo."

No Brasil, onde o Parnasianismo dominava o cenário poético, a estética simbolista encontrou resistências, mas animou a criação de obras inovadoras. Desde o final da década de 1880 as obras de simbolistas franceses, entre eles Baudelaire e Mallarmé, e portugueses, como Antonio Nobre e Camilo Pessanha, vinham influenciando grupos como aquele que se formou em torno da Folha Popular, no Rio, liderado por Cruz e Souza e integrado por Emiliano Perneta, B. Lopes e Oscar Rosas. Mas foi com a publicação, em 1893, de Missal, livro de poemas em prosa, e Broquéis, poemas em versos, ambos de Cruz e Souza, que principiou de fato o movimento simbolista no país - embora a importância desses livros e do próprio movimento só tenha sido reconhecida bem mais tarde, com as vanguardas modernistas.

Entre as inovações formais que caracterizam o Simbolismo estão a prática do verso livre, em oposição ao rigor do verso parnasiano, e o uso de "uma linguagem ornada, colorida, exótica, poética, em que as palavras são escolhidas pela sonoridade, ritmo, colorido, fazendo-se arranjos artificiais de parte ou detalhes para criar impressões sensíveis, sugerindo antes que descrevendo e explicando", de acordo com Afrânio Coutinho. Traços formais característicos do Simbolismo são a musicalidade, a sensorialidade, a sinestesia (superposição de impressões sensoriais). O antológico poema Antífona, de Cruz e Souza, é exemplar nesse sentido; sugestões de perfumes, cores, músicas perpassam todo o poema, cuja linguagem vaga e fluida é plena

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de recursos sonoros como aliterações e assonâncias. Há também em Antífona referências a elementos místicos, ao sonho, a mistérios, ao amor erótico, à morte, os grandes temas simbolistas.

Ainda com relação à forma, o soneto foi cultivado pelos simbolistas, mas não com a predileção manifestada pelos parnasianos, nem com sua paixão descritiva. Em sonetos como Incenso, de Gilka Machado, e Acrobata da Dor, de Cruz e Souza, está presente a linguagem que sugere, em lugar de nomear ou descrever, além de elementos como o questionamento da razão, a dor da existência, o interesse pelo mistério, a transcendência espiritual, que são característicos do Simbolismo. Lembre-se a propósito, também, do poema O Soneto, de Cruz e Souza, em que a linguagem poética simbolista transfigura e recria a forma da composição soneto. É importante lembrar que as correntes simbolistas e parnasianas coexistiram e se influenciaram mutuamente; assim, há na obra de adeptos do Simbolismo traços da estética parnasiana e, do mesmo modo, impregnações simbolistas na obra de poetas ligados ao Parnasianismo, como Francisca Júlia.

O Simbolismo e o Parnasianismo, segundo José Aderaldo Castello, projetaram-se nas primeiras décadas do século XX, "deixando importante legado para herdeiros que se fariam grandes poetas do Modernismo". O Simbolismo, porém, "mais do que os adeptos da poesia ‘científico-filosófica’ e realista, provocou o debate, aguçando o confronto de gerações."

Os principais autores simbolistas brasileiros são Cruz e Souza e Alphonsus de Guimaraens, mas merecem destaque também Gilka Machado e Augusto dos Anjos.

Cruz e Souza é considerado o maior poeta simbolista brasileiro, e foi mesmo apontado pelo estudioso Roger Bastide como dos maiores poetas do Simbolismo no mundo. Para a crítica Luciana Stegagno-Picchio, "ao firme, sapiente universo do parnasiano, à estátua, ao mármore, mas também ao polido distanciamento e ao sorriso, o simbolista Cruz e Souza contrapõe seu universo

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sinuoso, mal seguro, inquietante, misterioso, alucinante". Negro, o poeta sofreu preconceitos terríveis, que marcaram de diversos modos sua produção poética. Os críticos costumam indicar a "obsessão" pela cor branca em seus versos, repletos de brumas, pratas, marfins, linhos, luares, e de adjetivos como alva, branca, clara. Mas Cruz e Souza também expressou as dores e injustiças da escravidão em poemas como Crianças Negras e Na Senzala.

A obra de Alphonsus de Guimaraens é fundamentada pelos temas do misticismo, do amor e da morte. Em poemas como A Catedral e A Passiflora, repletos de referências católicas, a religiosidade é o assunto principal. O poeta também voltou-se para outro tema caro aos simbolistas, o interesse pelo inconsciente e pelas zonas profundas e desconhecidas da mente humana. Ismália, talvez seu poema mais conhecido, tematiza justamente a loucura. O amor, em sua poesia, é o amor perdido, inatingível, pranteado, como em Noiva e Salmos da Noite; reminiscências da morte prematura da mulher que amou na juventude.

Gilka Machado "foi a maior figura feminina de nosso Simbolismo", segundo o crítico Péricles Eugênio da Silva Ramos. Seus poemas, de intenso sensualismo, chegaram a causar escândalo, mas revelaram novas maneiras de expressar o erotismo feminino. Emiliano Perneta também imprimiu forte sensualismo em seus versos, característicos além disso pelo satanismo e decadentismo. Sua poesia, para Andrade Muricy, é "a mais desconcertante e variada que o simbolismo produziu entre nós". Já a obra de Augusto dos Anjos - extremamente popular, diga-se de passagem - é única, e há grande dificuldade entre a crítica para classificá-la. Seus poemas, que chegam a ser expressionistas, recorrem a uma linguagem cientifista-naturalista, abundante de termos técnicos, para tematizar a morte, a destruição, o pessimismo e mesmo o asco diante da vida.

Fonte: www.itaucultural.org.br

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SIMBOLISMO

SIMBOLISMO NO BRASIL

A publicação de Broquéis e Missal (1893), de João da Cruz e Souza, inaugura este movimento, que se caracteriza por melancolia, gosto dos ritmos fluidos e musicais, incluindo o uso de versos livres; uso de imagens incomuns e ousadas. O cuidado na evocação das cores e de seus múltiplos matizes mostra, também, uma influência do Impressionismo.

Alphonsus de Guimaraens (Câmara ardente) é um outro grande nome desse período. O simbolista tardio Guilherme de Almeida (Eu e você) funciona como uma ponte entre essa fase e o pré-modernismo. Uma figura isolada é Augusto dos Anjos (Eu e outras poesias), fascinado pelo vocabulário e os conceitos da ciência e da filosofia, que faz uma poesia de reflexão metafísica e de denúncia da injustiça social.

João da Cruz e Souza (1861-1898), filho de escravos libertos, luta pelo abolicionismo e contra o preconceito racial. Muda-se de Santa Catarina para o Rio de Janeiro, onde trabalha na Estrada de Ferro Central e colabora no jornal Folha Popular. A sua poesia é marcada pela sublimação do amor e pelo sofrimento vindo do racismo, da pobreza, da doença. Renova a poesia no Brasil com Broquéis e Missal. Em Últimos sonetos trata a morte como a única forma de alcançar a liberação dos sentidos.

TEATRO

A exemplo do realismo, tem seu auge durante a segunda metade do século XIX. Além de rejeitarem os excessos românticos, os simbolistas negam também a reprodução fotográfica dos realistas.

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Preferem retratar o mundo de modo subjetivo, sugerindo mais do que descrevendo. Para eles, motivações, conflitos, caracterização psicológica e coerência na progressão dramática têm importância relativa.

Autores simbolistas – Os personagens do Pelleas e Melisande, do belga Maurice Maeterlinck, por exemplo, são mais a materialização de idéias abstratas do que seres humanos reais. Escritores como Ibsen, Strindberg, Hauptmann e Yeats, que começam como realistas, evoluem, no fim da carreira, para o simbolismo. Além deles, destacam-se o italiano Gabriele d'Annunzio (A filha de Iorio), o austríaco Hugo von Hofmannsthal (A torre) e o russo Leonid Andreiev (A vida humana).

Auguste Strindberg (1849-1912) nasce em Estocolmo, Suécia, e é educado de maneira puritana. Sua vida pessoal é atormentada. Divorcia-se três vezes e convive com freqüentes crises de esquizofrenia. Strindberg mostra em suas peças – como O pai ou A defesa de um louco – um grande antagonismo em relação às mulheres. Em Para Damasco cria uma obra expressionista que vai influenciar diversos dramaturgos alemães.

Espaço cênico simbolista – Os alemães Erwin Piscator e Max Reinhardt e o francês Aurélien Lugné-Poe recorrem ao palco giratório ou desmembrado em vários níveis, à projeção de slides e títulos explicativos, à utilização de rampas laterais para ampliar a cena ou de plataformas colocadas no meio da platéia. O britânico Edward Gordon Craig revoluciona a iluminação usando, pela primeira vez, a luz elétrica; e o suíço Adolphe Appia reforma o espaço cênico criando cenários monumentais e estilizados.

Nenhum movimento cultural é globalizante. Não se pode imaginar que todos os setores e pessoas da sociedade viveram da mesma forma em determinado momento. Por isso, pode-se dizer que em

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certas épocas há uma ideologia predominante, porém não globalizante.

No final do século passado, por exemplo, ao mesmo tempo que ainda vigorava a onda de cientificismo e materialismo que deu origem ao Realismo e ao Naturalismo, já surgia um grupo de artistas e pensadores que punha em dúvida a capacidade absoluta da ciência de explicar todos os fenômenos relacionados ao homem.

Já não se crê mais no conhecimento "positivo", que levaria a humanidade para um estágio evoluído. Acredita-se que, assim como a ciência é limitada, igualmente a linguagem não pode pretender representar a realidade dentro como ela de fato é. Pode-se, no máximo, sugerí-la.

No final do século XIX, a literatura que representou essa nova forma de ver o mundo foi o Simbolismo. Os Simbolistas, insatisfeitos com a onda de cientificismo e materialismo a que esteve submetida a sociedade industrial européia na segunda metade do século passado, representam a reação da intuição contra a lógica, do subjetivismo contra a objetividade científica, do misticismo contra o materialismo, da sugestão sensorial contra a explicação racional. O Simbolismo começa por ser, portanto, uma negação do materialismo, do positivismo, do determinismo e outras atitudes científico-filosóficas que embasaram a estética Realista/Naturalista/Parnasiana. É, por outro lado, um retorno ao subjetivismo romântico, ao predomínio do "eu", da imaginação e da emoção, ainda de modo mais profundo e radical. É também uma volta à atitude conflitual tensa do Barroco e ao espiritualismo e religiosidade da era medieval.

Para saber mais sobre o Simbolismo sugere-se: conhecer a obra de pintores impressionistas e pós-impressionistas como Renoir, Manet, Cézanne, Van Gogh, Gaughin, Toulouse-Lautrec e Klimt; ouvir a música de Claude Debussy e pesquisar sobre as relações entre o Simbolismo e o Romantismo, principalmente a 2° geração da poesia romântica e a tendência gótica.

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A linguagem da música.

Nenhuma arte é inteiramente objetiva. Até uma fotografia, por exemplo, que se aproxima bastante da realidade, depende da seleção que o fotógrafo faz: o que fotografar, de que ângulo, a que distância, com que luz, em que momento. Essas variantes estão sujeitas às intensões do fotógrafo; são, portanto, subjetivas e podem modificar o resultado final, a foto.

Os simbolistas não acreditavam na possibilidade de a arte e a literatura poderem fazer um retrato total da realidade. Duvidavam também das explicações "positivas" da ciência, que julgava poder explicar todos os fenômenos que envolvem o homem e conduzi-lo a um caminho de progresso e fartura material.

Assim, os simbolistas representam um grupo social que ficou à margem do cientificismo do século XIX e que procurou resgatar certos valores românticos varridos pelo Realismo, tais como o espiritualismo, o desejo de transcendência e de integração com o universo, o mistério, o misticismo, a morte, a dor existencial (sem, contudo, cair na afetação sentimental romântica.)

A ciência, até a pouco dona da verdade, passa a ser questionada, impondo um forte desencanto, pois à ela, que a tudo enquadrava nuna forçada relação de causalidade, mostrava-se impotente, deixando incocadas as grandes questões da vida, que continuavam como um profundo mistério. É exatamente esse mistério que vai seduzir alguns filósifos e artistas desse período, na busca, muitas vezes, de um modo supra-racional de conhecimento. Este caminho é o "coração" de Pascal ("O coração tem razões que a própria razão desconhece") e logo será, para muitos pensadores, a "intuição", ou aquilo que, há muito tempo, têm experimentado os místicos, sem nenhuma explicação concreta e provável.

Essa reação antimaterialista situa-se num contexto mais amplo da vivido pela Europa no último quarto do século XIX, a forte crise

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espiritual a que sem tem chamado de decadentismo do final do século, ou ainda mal do século.

Conceito e âmbito

O símbolo sempre existiu na Literatura, mas somente no século XIX é que seu emprego se difundiu e se tornou moda com a denominação de Simbolismo.

Restringindo-nos a um ciclo histórico mais próximo, verificamos que o Simbolismo deita raízes no Romantismo e que alguns ideais românticos, sobretudo os mais vagos, tiveram que aguardar o Simbolismo para realizar-se de forma mais ampla. Nesse sentido, o Simbolismo para realizar-se de forma mais ampla. Neste sentido, esse movimento pode ser considerado um prolongamento ou uma etapa mais avançada da concepção do mundo e dos homens inaugurada pelos românticos, transfigurando-a e levando-a às últimas consequências. Em suma, o Simbolismo só se compreende quando inscrito no contexto sócio-cultural decorente da Revolução Francesa e da implantação das doutrinas romântico-liberais.

Contrariamente aos românticos, os simbolistas propuseram que "a poesia não é somente emoção, amor, mas a tomada de consciência desta emoção; que a atitude poética não é unicamente afetiva, mas ao mesmo tempo afetiva e cognitiva". Por outras palavras, a poesia carrega em si uma certa maneira de conhecer.

Na busca do "eu profundo", os Simbolistas iniciam uma viagem interior de imprevisíveis resultados, ultrapassando os níveis de razoabilidade em que, afinal de contas, se colocavam os românticos, mesmo os mais descabelados e furiosos.

Imergindo nas esferas inconscientes, acbaram por atingir os estratos mentais anteriores à fala e à lógica, tocando o universo íntimo de cada um, onde reina o caos e a anarquia, em

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decorrência de ali vegetare as vivências vagas e fluídas, pré-lógicas e inefáveis, e que não se revelam ao homem comum senão por recursos indiretos como o sonho, a alucinação ou a psicanálise.

Mais do que tocar os desvãos do inconsciente, pretendiam sentí-los, examiná-los.

O problema mais difícil era o de como transportar as vivências abissais para o plano no consciente a fim de comunicá-las a outrem. Como proceder? Como exprimi-las? Como represent-alas sem esvaziá-las ou destruí-las? A gramática tradicional, a sintaxe lógica, o vocabulário comum, petrificado nas várias denotações de dicionário, enfim o material linguístico e gramatical corriqueiro eram insuficientes para comunicar os achados insólitos da sensibilidade, antes desconhecidos ou apenas inexpressos.

Era necessário inventar uma linguagem nova, recuperando expressões consideradas obsoletas, ivificando outras cujo lastro semântico ia sofrendo desgaste ou cristalização. Essa nova linguagem estaria fundamentada numa sintaxe e gramática "psicológicas", num vocabulário adequado à comunicação de novidades estéticas, pela recorrência a neologismos, inesperadas combinações vocabulares, emprego de arcaísmos e de termos exoóticos ou litúrgicos, e ainda de recursos gráficos de várias ordens (o uso de maiúsculas alegórizantes, das cores na impressão dos poemas ou partes de livros, de formas arcaicas, etc...)

Trata-se pois de uma revolução da expressão literária e, não obstante conectado com as outras artes, o Simbolismo é antes e acima de tudo Literatura e nenhuma escola foi mais literária, no sentido de "uma estética que se aproximou de pura, vacinada contra todo o contátio nõa estético, ou que, sendo estético, atentasse contra suas prerrogativas literárias. (Massaud Moisés, "O Simbolismo", A literatura Brasileira, vol. IV, Cultrix, SP, 1973).

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Características da Poesia Simbolista

Como movimento antimaterialista e anti-racionalista, o Simbolismo buscou uma linguagem que fosse capaz de sugerir a realidade, e não retratá-la objetivamente, como queriam os realistas. Para isso, faz uso de símbolos, imagens, metáforas, sinestesias, além de recursos sonoros e cromáticos, tudo com a finalidade de exprimir o mundo interior, intuitivo, antilógico e anti-racional. Podem ser encontrados esses traços em poetas e pensadores pré-Simbolistas, que acabaram por dar as origens dessa escola. São eles:

Charles Baudelaire

poeta francês pós-romântico e precursor do movimento simbolista, para quem a poesia é a expressão da correspondência que a linguagem é capaz de estabelecer entre o concreto e o abstrato, o material e o ideal. Coube a ele desmistificar a poesia, trazendo-a para o plano do homem já então angustiado por uma existência sem deuses ou mitos válidos. Sua poesia satânica, irreverente e cáustica, impulsionada por uma ânsia trágica de libertação e narcisamento, influenciou nõa só o âmbito ético-literário, mas revolucionou o próprio campo da expressão, graças à sua Teoria das Correspondências, expressa no trecho abaixo.

Como longos ecos que de longe se confundem numa tenebrosa e profunda unidade. Vasta como a noite e como a claridade, os perfumes, as cores e os sons se correspondem.

A Teoria das Correspondências porpõe um porocesso cósmico de aproximação entre as realidades físicas e as metafísicas, entre os seres, as cores, os perfumes e o pensamento ou a emoção, que se expressa através da Sinestesia, um tipo de metáfora, que consiste na tranferência (ou "cruzamento") de percepção de um sentido para outro, ou seja, a fusão, num só ato de percepção, de

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dois sentidos ou mais. É o que ocorre em "ruído aspero" (audição e tato); "música doce" (audição e gustação); "som colorido" (audição e visão); "noite de veludo" (visão e tato).

Essas correspondências entre os campos sensorial e espiritual envolvem obrigatoriamente a sinestesia. Sinestesia é o cruzamento de campos sensoriais diferentes: por exemplo, tato e visão, como nas imagens "noite de veludo", "amarelo quente", "cinza frio".

Em termos de ideologia, o Parnasianismo e o Simbolismo são movimentos diametralmente opostos, já que aquele pregava uma poesia objetiva, racionalista, e voltada a temas universais. Apesar disso, ambos apresentam em comum uma preocupação intensa com a linguagem e certo refinamento formal. Isso talvez possa ser explicado pelo fato de ambas as tendências terem nascido juntas, na França, na revista Parnasse Contemporain, em 1866. Cruz e Souza, o principal simbolista brasileiro, apresenta influências parnasianas em alguns de seus poemas.

Características da linguagem simbolista

As características da linguagem simbolista podem ser assim esquematizadas:

Linguagem vaga, fluida, que prefere sugerir a nomear. Utilização de substantivos abstratos, efêmeros, vagos e imprecisos

Presença abundante de metáforas, comparações, aliterações, assonâncias, paronomásias, sinestesias

Subjetivismo e teorias que voltam-se ao mundo interior

Antimaterialismo, anti-racionalismo em oposição ao positivismo

Misticismo, religiosidade, valorização do espiritual para se chegar à paz interior

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Pessimismo, dor de existir

Desejo de transcendência, de integração cósmica, deixando a matéria e libertando o espírito

Interesse pelo noturno, pelo mistério e pela morte, assim como momentos de transição como o amanhecer e o crepúsculo

Interesse pela exploração das zonas desconhecidas da mente humana (o inconsciente e o subconsciente) e pela loucura.

Observação: Na concepção Simbolista o louco era um ser completamente livre por não obedecer às regras. Teoricamente o poeta simbolista é o ser feliz.

Contexto histórico

O movimento simbolista surge no último quarto do século XIX, na França, e representa a reação artística à onda de materialismo e cientificismo que envolvia Europa desde a metade do século.

Tal qual o Romantismo, que reagiria contra o racionalismo burguês do século XVIII (o Iluminismo), o Simbolismo rejeita as soluções racionalistas, empíricas e mecânicas trazidas pela ciência da época e busca valores ou ideais de outra ordem, ignorados ou desprezados por ela: o espírito, a transcendência cósmica, o sonho, o absoluto, o nada, o bem, o belo, o sagrado dentre outros.

A origem dessa tendência espiritualista e até mística situa-se nas camadas ou grupos da sociedade que ficaram à margem do processo de avanço tecnológico e científico do capitalismo do século XIX e da solidificação da burguesia no poder. São setores da aristocracia decadente e da classe média que, não vivendo a euforia do progresso material, da mercadoria e do objeto, reagem contra ela. Propõem a volta da supremacia do sujeito sobre o objeto, rejeitanto desse modo o desmedido valor dado às coisas materiais.

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Assim, os simbolistas procuraram resgatar a relação do homem com o sagrado, com a liturgia e com os símbolos. Buscam o sentimento de totalidade, que se daria numa integração da poesia com a vida cósmica, como se ela, a poesia, fosse uma religião.

Sua forma de tratar a realidade é radicalmente diferente da dos realistas. Não aceitam a separação entre sujeito e objeto ou entre objetivo e subjetivo. Partem do princípio de que é impossível o retrato fiel do objeto; o papel do artista, no caso seria o de sugeri-lo, por meio de tentativas, sem querer esgotá-lo. Desses modo, a obra de arte nunca é perfeita ou acabada, mas aberta, podendo sempre ser modificada ou refeita.

Os malditos

Essa concepção da realidade e da arte trazida pelos Simbolistas suscita reações entre setores positivistas da sociedade. Chamados de malditos ou decadentes, os simbolistas ignoram a opinião pública, desprezam o prestígio social e literário, fechando-se numa quase religião da palavra e suas capacidades expressivas.

O Simbolismo

com as propostas de inovação, oposição e pesquisa trazidas pela geração de Verlaine, Rimbaud e Mallarmé - não sobrevive muito. O mundo presencia a euforia capitalista, o avanço científico e tecnológico. A burguesia vive a belle époque, um período de prosperidade, de acumulação e de prazeres materiais que só terminaria com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914.

Nesse contexto, o Simbolismo desaparece. Mas deixa ao mundo um alerta sobre o mal-estar trazido pela civilização moderna e industrializada, além de códigos literários novos, que abrirão campo para as correntes artísticas do século XX, principalmente o Expressionismo e o Surrealismo, também preocupados com a

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expressão e com as zonas inexploradas da mente humana, como o inconsciente e a loucura.

O Simbolismo no Brasil

Ao contrário do que aconteceu na Europa, onde o Simbolismo se sobrepôs ao Parnasianismo, no Brasil o Simbolismo foi quase inteiramente abafado pelo movimento parnasiano, que gozou de amplo prestígio entre as camadas cultas até as primeiras décadas do século XX. Apesar disso, a produção simbolista deixou contribuições significativas, preparando terreno para as grandes inovações que iriam ocorrer no século XX, no domínio da poesia.

As primeiras manifestações simbolistas já eram sentidas desde o final da década de 80 do século XIX. Apesar disso, tradicionalmente se tem apontado como marco introdutório do movimento simbolista brasileiro a publicação,. Em 1893, das obras Missal (prosa) e Broquéis (poesia), de nosso maior simbolista: Cruz e Souza.

Além de Cruz e Sousa, destacam-se, dentre outros, Alphonsus de Guimaraens e Pedro Kilkerry (recentemente descoberto pela crítica).

Cruz e Sousa: O Cavador do Infinito

Cruz e Sousa (1862 - 1898), filho de escravos, foi amparado por uma família aristocrática, que o ajudou nos estudos. Ao transferir-se para o Rio, sobreviveu trabalhando em pequenos empregos e sempre foi alvo do preconceito racial. Na juventude, teve uma grande decepção amorosa ao apaixonar-se por uma artista branca. Acabou casando-se com Gravita, uma negra, que mais tarde ficaria louca. De quatro filhos que o casal teve, apenas dois sobreviveram. Cruz e Souza morreu com 36 anos, vítima de tuberculose. Suas únicas obras publicadas em vida foram Missal e Broquéis.

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Hoje Cruz e Souza é considerado o mais importante poeta simbolista brasileiro e um dos maiores poetas nacionais de todos os tempos. Seu valor, contudo, só foi reconhecido postumamente, depois que o sociólogo francês Roger Bastide colocou-o entre os maiores poetas do Simbolismo universal. Sua obra apresenta diversidade e riqueza. De um lado, encontram-se aspectos noturnos do Simbolismo, herdados do Romantismo: o culto da noite, certo satanismo, pessimismo, morte, etc. Observa-se algumas dessas características nesses versos do poema "Inexorável":

Ó meu Amor, que já morreste, Ó meu Amor, que morta estás! Lá nessa cova a que desceste Ó meu Amor, que já morreste, Ah! Nunca mais florescerás?

Ao teu esquálido esqueleto, Que tinha outrora de uma flor A graça e o encanto do amuleto Ao teu esquálido esqueleto Não voltará novo esplendor?

De outro lado, há certa preocupação formal que o aproxima dos parnasianos: a forma lapidar, o gosto pelo soneto, o verbalismo requintado, a força das imagens; de outro, ainda, a inclinação à poesia meditativa e filosófica, que o aproxima da poesia realista portuguesa, principalmente de Antero de Quintal.

A forma encontrada pelos Simbolistas de suspender a dor seria a música. Daí advém a tentativa de produzir textos tão melodiosos e ritmados. Um exemplo claro é um dos mais belos textos de Cruz e Sousa. Ao le-lo, deve-se ficar atento à musicalidade das palavras e construções.

Violões que choram... Cruz e Souza

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Ah! plangentes violões dormente, mornos, Soluços ao luar, choros ao vento... Tristes perfis, os mais vagos contornos, Bocas murmurejantes de lamento.

Noites de além, remotas, que eu recordo, Noites de solidão, noites remotas que nos azuis da Fantasia bordo, Vou constelando de visões ignotas.

Sutis palpitações à luz da lua, Anseio dos momentos mais saudosos Quando lá choram na deserta rua As cordas vivas dos violões chorosos.

Quando os sons dos violões vão soluçando, Quando os sons dos violões nas cordas gemem, E vão dilacerando e deliciando, Rasgando as almas que nas sombras tremem.

Harmonias que pungem, que laceram, Dedos nervosos e ágeis que percorrem Cordas e um mundo de dolências geram Gemidos, prantos, que no espaço morrem...

E sons soturnos, suspiradas mágoas, Mágoas amargas e melancolias, No sussurro monótono das águas, Noturnamente, entre ramagens frias.

Vozes veladas, veludosas vozes, Volúpias dos violões, vozes veladas, Vagam nos velhos vórtices velozes Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.

Tudo nas cordas dos violões ecoa E vibra e se contorce no ar, convulso... Tudo na noite, tudo clama e voa Sob a febril agitação de um pulso.

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Que esses violões nevoentos e tristonhos São ilhas de degredo atroz, funéreo, Para onde vão, fatigadas do sonho, Almas que se abismaram no mistério.

Poesia metafísica e dor de existir

Juntamente com o poeta realista português Antero de Quental e o pré-modernista brasileiro Augusto dos Anjos, Cruz e Sousa apresenta uma das poéticas de maior profundidade em língua portuguesa, quanto à investigação filosófica e à angústia metafísica.

O drama da existência, em sua obra, revela uma provável influência das idéias pessimistas do filósofo alemão Shopenhauer, que marcaram o final do século passado. Além disso, certas posturas de sua poesia - o desejo de fugir da realidade, de transcender a matéria e integrar-se espiritualmente no cosmo - parecem originar-se não apenas do sentimento de opressão e mal-estar trazido pelo capitalismo, mas também pelo drama racial e pessoal que vivia.

A trajetória de sua obra parte da consciência e da dor de ser negro, em Broquéis, à dor de ser homem, em busca da transcendência, em Faróis e Últimos sonetos, obras póstumas. Observa-se a dor existencial por exemplo, em versos de "Cárcere de Almas":

Ah! Toda alma num cárcere anda presa Soluçando nas trevas entre as grades Do calabouço olhando imensidades Mares, estrelas, tardes, natureza.

Ó almas presas, mudas e fechadas Nas prisões colossais e abandonadas, Da Dor no calabouço atroz, funéreo!

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As características mais importantes da obra de Cruz e Sousa são

No plano temático: a morte, a transcendência espiritual, a integração cósmica, o mistério, o sagrado, o conflito entre a matéria e espírito, a angústia e a sublimação sexual, a escravidão e uma verdadeira obsessão por brilhos e pela cor branca ("Ó Formas alvas, brancas, Formas claras / De luares, de neves, fluídas, cristalinas...."). No plano formal: destacam-se as sinestesias (cruzamento de campos sensoriais diferentes: tato e visão como em "noites de veludo ou visão e olfato como "cheiro das cores"), as imagens surpreendentes, a sonoridade das palavras, a predominância de substantivos e utilização de maiúsculas, com a finalidade de dar um valor absoluto a certos termos. Mais poemas de Cruz e Souza aqui

Alphonsus de Guimaraens

Alphonsus de Guimaraens (1870 - 1921) nasceu em Ouro Preto, estudou Direito em São Paulo e foi durante muitos anos juiz em Mariana, cidade histórica, vizinha de Ouro Preto.

Marcado pela morte da prima Constança - a quem amava e contava apenas 17 anos -, sua poesia é quase toda voltada ao tema da morte da mulher amada, que aconteceu apenas dois dias antes de seu casamento. Todos os outros temas que explorou, como natureza, arte e religião, estão de alguma forma relacionados àquele. A exploração do tema da morte abre ao poeta, por um lado, o vasto campo da literatura gótica ou macabra dos escritores ultra-românticos, recuperada por alguns simbolistas; por outro lado, possibilita a criação de uma atmosfera mística e litúrgica, em que abundam referências ao corpo morto, ao esquife, às orações, às cores roxa e negra, ao sepultamento, conforme exemplifica a estrofe a seguir:

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Mãos de finada, aquelas mãos de neve De tons marfíneos, de ossatura rica, Pairando no ar, num gesto brando e leve Que parece ordenar mas que suplica.

O conjunto da poesia de Alphonsus de Guimaraens é uniforme e equilibrado. Temas e formas se repetem e se aprofundam, no decorrer de quase trinta anos produção literária, consolidando uma de nossas poéticas mais místicas e espiritualistas.

O crítico Alfredo Bosi considera que "de Cruz e Sousa para Alphonsus de Guimaraens sentimos uma descida de tom", isto porque a universalidade, a dor da existência e as sensações de vôo e vertigem que caracterizam a linguagem simbolista de Cruz e Sousa ganham limites mais estreitos na poesia de Alphonsus de Guimaraens, presa ao ambiente místico da cidade de Mariana e ao drama sentimental vivido na adolescência.

Formalmente o poeta revela influências árcades e renascentistas, sem contudo, cair ao formalismo parnasiano. Embora preferisse o verso decassílabo, Alphonsus chegou a explorar outras métricas, particularmente a redondilha maior, de longa tradição popular, medieval e romântica.

Fontes Filosóficas seguidas pelo Simbolismo

Como já foi dito, o Simbolismo representou uma negação do materialismo, do Positivismo e do Determinismo, ou seja, das atitudes científico-religiosas dos estilos Naturalista e Realista.

É também uma volta à atitude conflitual e tensa do Barroco e ao espiritualismo da Idade Média.

O Simbolismo seguiu algumas correntes filosóficas em voga no fim do Século XIX. São elas:

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Intuicionismo, por Henry Bergson

Tinha como objetivo a busca de novas realidades interiores. No entanto, essas realidades interiores, o "eu" profundo, serão praticamente incomunicáveis, por constituirem um mundo extremamente vago, complexo e corrompido à simples tentativa de ser traduzido em palavras, já que a própria consciência e natureza dessas realidades são irredutíveis à fala, colocando-se fora de todo controle do pensamento e da razão.

Os poetas apelam então para a evocação, para a sugestão, a fim de buscar a tradução do "eu" profundo. Apenas sugere os conteúdos sentimentais e emotivos, sem narra-los ou descreve-los.

Bergson reconhece porém que a maioria dos homens vive apenas num "eu" de superfície, atravessando a existência sem jamais experimentar a verdadeira liberdade, que só seria alcançada ao romperem-se as barreiras da moral e da religião.

Teorias de Arthur Schopenhauer

Em "O Mundo Como Vontade e Representação", Schopenhauer afirma que por mais maciço e imenso que seja este mundo, sua existência depende, em qualquer momento, apenas de um fio único e delgadíssimo: a consciência em que aparece. Assim, para o autor, o mundo não passa de uma representação, ou melhor, é igual à nossa percepção. Por isso, não chegamos jamais à essência em si, ao Absoluto.

Por outro lado, o espírito ou a nossa psiquê corresponde à vontade, e essa é que seria real. Isto significaria dizer que no fundo de todo ser ou coisa viveria a vontade. A filosofia do autor sustenta ainda que o real em si é mesmo cego e irracional, enquanto vontade. As formas racionais não passariam de

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ilusórias aparências e a essência de todas as coisas estaria alheia à razão.

Há nessa teoria um pessimismo extremo, já que a vontade é sem meta e gera dor. A felicidade seria apenas uma interrupção temporária de um processo de infelicidade maior, pois não existiria satisfação durável. Em suma: viver significaria sofrer.

Teorias de Soren Kierkegaerd

Definem o homem como uma síntese de infinito e finito; de temporal e eterno; de liberdade e de necessidade. Kierkegaerd entende que qualquer opção do ser humano conduz ao desespero pela impossibilidade de conciliar a finitude e a infinitude; a transcendência e a existência.

Filosofia oriental

De acordo com essa filosofia, a forma mais completa de salvação para o homem estaria na renúncia ao mundo e suas solicitações, na mortificação dos instintos, na auto-anulação da vontade e na fuga para o nada, para o nirvana dos filósofos budistas.

Teorias de Nicolal Von Hartamn

Em sua Teoria do Inconsciente, Von Hartamn cria o inconsciente, entidade desconhecia que existe por trás de tudo e que é totalmente inalcançável.

O inconsciente daria explicação aos fenômenos, mas essa explicação não chegaria ao conhecimento do homem. O sentimento de impotência diante do enigma do Universo, essa incógnita, gera o pessimismo.

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Resumo das características do Simbolismo

Conteúdo relacionado com o espiritual, o místico e o subconsciente: idéia metafísica, crença em forças superiores e desconhecidas, predestinação, sorte, introspecção. Esse maior pelo particular e individual do que pelo geral e Universal: valorização máxima do eu interior, individualismo.

Tentativa de afastamento da realidade e da sociedade contemporânea:

valorização máxima do cosmos, do misticismo, negação à Terra. Os textos comumente retratam seres efêmeros (fumaça, gases, neve...). Imagens grandiosas (oceanos, cosmos...) para expressar a idéia de liberdade.

Conhecimento intuitivo e não-lógico.

Ênfase na imaginação e na fantasia.

Desprezo à natureza: as concepções voltam-se ao místico e sobrenatural.

Pouco interesse pelo enredo e ação narrativa: pouquíssimos textos em prosa.

Preferência por momentos incomuns: amanhecer ou entardecer, faixas de transição entre dia e noite.

Linguagem ornada, colorida, exótica, bem rebuscada e cheia de detalhes: as palavras são escolhidas pela sua sonoridade, num ritmo colorido, buscando a sugestão e não a narração.

ORIGENS

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"O O pintor austríaco Klimt, em Música I (1895), enche o quadro de alusões simbólicas para representar a criação

musical.

A partir de 1880, na França, verifica-se uma reação contra as concepções cientificistas da classe dominante, representadas na literatura pelo fatalismo naturalista e pelo rigor parnasiano.

Neste sentido, o Simbolismo surge não apenas como uma estética oposta à literatura (poesia, especificamente) objetiva, plástica e descritiva, mas como uma recusa a todos os valores ideológicos e existenciais da burguesia. Em vez da "belle époque" do capitalismo financeiro e industrial, do imperialismo que se adonava de boa parte do mundo, temos o marginalismo de Verlaine, o amoralismo de Rimbaud e a destruição da linguagem por Mallarmé.

O artista experimenta agora, à maneira dos românticos, um profundo mal-estar na cultura e na realidade. Mergulha então no irracional, fugindo ao mundo proposto pelo racionalismo burguês, e descobrindo neste mergulho um universo estranho de associações de idéias, lembranças sem um significado definido. Universo etéreo e brumoso, de sensações evanescentes que o poeta deve reproduzir através da palavra escrita, se é que existem palavras para exprimi-las. O Naturalismo e o

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Parnasianismo estão definitivamente mortos, conforme sentenciou um crítico literário da época:

Em uma época que, sob o pretexto naturalista, a arte foi reduzida somente a uma imitação do contorno exterior das coisas, os simbolistas voltam a ensinar aos jovens que as coisas também têm alma, alma da qual os olhos humanos não captam mais do que o invólucro, o véu, a máscara.

O Simbolismo define-se assim pelo anti-intelectualismo. Propõe a poesia pura, não racionalizada, que use imagens e não conceitos. É uma poesia difícil, hermética, misteriosa, que destrói a poética tradicional.

SURGIMENTO

Os primeiros indícios do movimento encontram-se em Baudelaire, cuja obra máxima, As flores do mal, antecipa certas perspectivas simbolistas. Em 1884, Verlaine publica sua Arte poética, onde os princípios da escola já são evidentes. Em 1886, Jean Moréas vale-se de um manifesto para elaborar teoricamente o Simbolismo. Diz Moréas:

Inimiga do ensinamento, da declamação, da falsa sensibilidade, da descrição objetiva, a poesia simbolista procura vestir a Idéia de uma forma sensível.

CARACTERÍSTICAS

1) SUBJETIVISMO

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Absinto (1876), do francês Degas, ilustra o mundo boêmio, semi-marginal e próximo das vertigens oferecidas pelo

absinto e outras drogas, no qual os simbolistas franceses viviam.

Os simbolistas retomam a subjetividade da arte romântica com outro sentido. Os românticos desvendavam apenas a primeira camada da vida interior, onde se localizavam vivências quase sempre de ordem sentimental. Os simbolistas vão mais longe, descendo até os limites do subconsciente e mesmo do inconsciente.

Este fato explica o caráter ilógico ou o clima de delírio de grande parte de sues poemas, como no fragmento de Cruz e Sousa:

Cristais diluídos de clarões álacres,Desejos, vibrações, ânsias, alentos,Fulvas vitórias, triunfamentos acres,Os mais estranhos estremecimentos.

2) O EFEITO DE SUGESTÃO

Diz Mallarmé:

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Os parnasianos tomam os objetos em sua integridade e mostram-nos. Por isso carecem de mistério. Descrever um objeto é suprimir três quartas partes do prazer de um poema, que é feito da felicidade de adivinhar-se pouco a pouco. Sugerir, eis o sonho. E o uso perfeito deste mistério é o que constitui o símbolo: evocar o objeto para expressar um estado de alma através de uma série de decifrações.

Sua observação é chave para o entendimento da poética simbolista. Abandona-se o descritivismo parnasiano em busca de uma revitalização do gênero lírico. São criadas novas imagens, novas metáforas e símbolos. Acentua-se o caráter obscuro de certas palavras e o emotivo de outras, tudo como repúdio à linguagem poética usual, carregada de lugares-comuns, clichês e frases-feitas que se repetiam de geração em geração.

Trata-se de reinventar a linguagem, explorar suas possibilidades, recriá-la palavra após palavra, à procura de imagens originais e envolventes. A verdadeira poesia consiste em não-dizer, não-declarar, não designar as coisas pelos seus nomes triviais. A verdadeira poesia está em insinuar, dizer figuradamente, sugerir.

Cruz e Souza foi especialista na utilização de imagens ousadas com efeito de sugestão. Angústia sexual e erotismo misturam-se na exaltação de uma mulher que parece devorar os homens:

Cróton* selvagem, tinhorão* lascivo, Planta mortal, carnívora, sangrenta, De tua carne báquica* rebenta A vermelha explosão de um sangue vivo

Cróton - arbusto ornamentalTinhorão - erva ornamentalBáquica - relativo a Baco, deus grego do vinho e da dissipação

3) MUSICALIDADE

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Na tentativa de sugerir infinitas sensações aos leitores, os simbolistas aproximam a poesia da música. Entendamos: não se trata de poesia com fundo musical, mas poesia com musicalidade em si mesma, através do manejo especial de ritmos da linguagem, esquisitas combinações de rimas, repetição intencional de certos fonemas, sujeição do sentido de um vocábulo a sua sonoridade, etc. Realiza-se assim a exigência de Verlaine: "A música antes de qualquer coisa."

Rimbaud surpreende a França com o ardor de seus versos malditos, escritos em plena adolescência. Verlaine leva a

musicalidade e o efeito sugestivo das palavras a um limite até então desconhecido na literatura européia.

Somos atingidos pelo efeito dos ritmos e dos sons de qualquer poema simbolista, mesmo que não conheçamos profundamente o idioma em que ele foi escrito. Verlaine, por exemplo, deixou os mais célebres versos desta sedução pela música em Canção de outono:

Le sanglots longs / Des violons / De l´automne / Blessent mon coeur / D´ une langueur / Monotone *

* Os lamentos longos / Dos violinos / Do outono / Ferem o meu coração / De um langor / Monótono.

A música é obrigatória, como nesta espécie de receita poética de Cruz e Sousa:

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Derrama luz e cânticos e poemasNo verso e torna-o musical e doce Como se o coração, nessas supremasEstrofes, puro e diluído fosse.

Mesmo a morte, na obra do simbolista brasileiro, possui uma terrível musicalidade:

A música da Morte, a nebulosa,Estranha, imensa música sombria,Passa a tremer pela minh'alma e friaGela, fica a tremer, maravilhosa...

4) IRRACIONALISMO E MISTÉRIO

No princípio, os simbolistas têm como projeto "revestir as idéias de uma forma sensível", isto é, traduzi-las para uma linguagem simbólica e musical. Pouco a pouco, este intelectualismo se converte numa aventura anti-intelectual, numa negativa à possibilidade de comunicação lógica entre os homens.

"Nós não estamos no mundo", brada Rimbaud, o mundo concreto se esvaiu, perdeu sua inteligibilidade. Agora é puro mistério: atrás da ordem aparente das coisas estão o caos, a névoa, a bruma, a neblina, o incorpóreo, o fantasmagórico, o estranho, o inefável*.

Tempestade, de Wilian Turner, reflete este mundo nevoento,

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nebuloso e quase incorpóreo que os simbolistas tanto valorizam.

Rimbaud considera o artista um vidente que foge da realidade ilusória e penetra na realidade inexplorada das sensações. Para adquirir esta vidência é indispensável um "desequilíbrio de todos os sentidos", uma ponte em direção ao ilógico e à loucura. Só os "alquimistas do verbo" podem enxergar além da obviedade do cotidiano e deparar-se com a essência misteriosa da vida. Cruz e Sousa chega a implorar pelo mistério:

Infinitos, espíritos dispersos,Inefável, edênicos*, aéreos,Fecundai o Mistério destes versosCom a chama ideal de todos os mistérios.

Inefável - indescritível, o que não pode ser expresso.Edênicos: que procedem do Éden, do paraíso

O SIMBOLISMO NO BRASIL

CONTEXTO CULTURAL

O Simbolismo no Brasil é um movimento que ocorre à margem do sistema cultural dominante. Seu próprio desdobramento aponta para províncias de escassa ressonância: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. É como se o gosto dos poetas da escola por neve e névoas, outonos e longos crepúsculos exigisse regiões frias e nebulosas.

Há quase um fatalismo geográfico: Alphonsus de Guimaraens produz seus textos nas cidades montanhosas e fantasmagóricas de Minas Gerais. No Rio de Janeiro, de grandes sóis e clima tropical, o agrupamento simbolista, mesmo com o reforço de Cruz e Sousa - que emigrara da antiga cidade do Desterro (hoje

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Florianópolis) - acaba sufocado pela luz, pelo calor e pela onda parnasiana.

Os adeptos da nova estética tornam-se alvo de zombarias, quando não de desprezo. A maioria dos críticos não os compreende e o público leitor mostra-se indiferente ou hostil frente aquela poética aristocrática, complicada, pretensiosa. Somente depois do triunfo modernista, alguns desses poetas seriam revalorizados.

Não se pense contudo que a marginalidade simbolista implica numa mudança das relações de dependência entre os letrados brasileiros e os valores europeus. A exemplo dos parnasianos - e às vezes é difícil identificar diferenças poéticas entre ambos - os simbolistas transplantam uma cultura que pouco tem a ver com a realidade local. Daí resulta uma poesia freqüentemente distanciada tanto do espaço social quanto do jeito íntimo de ser brasileiro. Um pastiche dos "padrões sublimes da civilização".

Outra vez estamos diante do velho sonho colonizado: reproduzir aqui os modelos recentes da arte européia. A grande exceção neste contexto parece ser a obra de Cruz e Sousa, embora outros poetas do período tenham deixado criações isoladas de relativo interesse e qualidade.

As primeiras experiências de acordo com os novos preceitos são realizadas por Medeiros e Albuquerque, a partir de 1890. Porém, os textos que verdadeiramente inauguram o Simbolismo pertencem a Cruz e Souza que, em 1893, lança duas obras renovadoras: Broquéis e Missal. A primeira compõe-se de poemas em versos e a segunda de poemas em prosa.

AUTORES SIMBOLISTAS

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CRUZ E SOUSA (1861 - 1898)

Vida

João da Cruz e Souza nasceu em Desterro (hoje Florianópolis), filho de escravos libertos pelo marechal Guilherme de Souza, que adotou o menino negro e ofereceu-lhe a chance de estudar com os melhores professores de Santa Catarina. Foi seu mestre, inclusive, o sábio alemão Fritz Müller, correspondente de Darwin. Apesar da morte de seu protetor, conseguiu terminar o nível intermediário e, com pouco mais de dezesseis anos, tornou-se professor particular e militante da imprensa local. Aos vinte anos, seguiu com uma companhia teatral por todo o Brasil, na condição de "ponto". Durante estas viagens entregou-se à conferências abolicionistas. Em 1883, foi nomeado promotor público em Laguna, no sul da província, mas uma rebelião racista na pequena cidade, impediu-o de assumir o cargo, embora esta história seja contestada por algumas fontes.

Primeira edição de Faróis, de Cruz e Sousa

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Voltou a viajar e a cada regresso sentia a ampliação do preconceito de cor. Mudou-se então, definitivamente para o Rio de Janeiro. Lá se casaria com uma moça negra (Gavita) e conseguiria modesto emprego de arquivista na Central do Brasil, já no ano de 1893. Às inúmeras dificuldades financeiras somavam-se o desprezo dos intelectuais da época, que viam nele apenas um "negro pernóstico", o período de loucura mansa vivido pela esposa, durante seis meses, e a tuberculose que atacou toda a sua família: ele, a mulher e os quatro filhos. Numa carta ao amigo e protetor, Nestor Vítor, deixou registrado seu infortúnio:

"Há quinze dias tenho uma febre doida... Mas o pior, meu velho, é que estou numa indigência horrível, sem vintém para remédios, para leite, para nada! Minha mulher diz que sou um fantasma que anda pela casa!"

Este mesmo amigo providenciou uma viagem do poeta à região serrana de Minas Gerais, em busca de paliativo para a doença. Mal chegando lá, Cruz e Sousa piorou e faleceu na mais absoluta solidão. Três anos após - já tendo enterrado dois filhos - Gavina também desapareceria por causa da tuberculose. O terceiro filho morreria em seguida. O último, vitimado pela mesma moléstia, desapareceria em 1915. A família estava extinta numa terrível tragédia humana.

OBRAS PRINCIPAIS

Broquéis (1893) - Missal (1893) - Evocações (1899) - Faróis (1900) Últimos sonetos (1905)

A obra de Cruz e Sousa é a mais brasileira de um movimento que foi, entre nós, essencialmente europeu. Nela opera-se uma tentativa de síntese entre formas de expressão prestigiadas na Europa e o drama espiritual de um homem atormentado social e filosoficamente. O resultado passa, às vezes, por poemas obscuros e verborrágicos mas, na maioria dos casos, a densidade lírica e dramática do "Cisne Negro" atinge um nível só comparável

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ao dos grandes simbolistas franceses. O primeiro aspecto que percebemos em sua poética é a linguagem renovadora.

A linguagem metafórica e musical

Uma das pouqíssimas fotos de Cruz e Sousa.

Ainda que sua formação tenha sido dentro do Parnasianismo - e desta escola ele guarde o cultivo da perfeição e o gosto pela métrica e pelo soneto - Cruz e Sousa foge da objetividade lingüística e dos lugares-comuns verbais de seus antecessores. No seus poemas, abundam substantivos comuns com iniciais maiúsculas e palavras raras. A linguagem denotativa quase desaparece na quantidade de símbolos, aliterações*, sinestesias*, esquisitas harmonias sonoras.

Ao contrário do texto parnasiano, o simbolista exige do leitor um esforço de decifração, de "tradução" da realidade sugerida para a realidade concreta. A todo momento, o poeta apela para a linguagem metafórica:

"O demônio sangrento da luxúria...""Punhais de frígidos sarcasmos..."

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"Ó negra Monja triste, ó grande soberana." (A lua) "As luas virgens dos teus seios brancos...""O chicote elétrico do vento..."

A musicalidade se dá através de aliterações. Sejam em v:

Vozes veladas, veludosas vozes,volúpias dos violões, vozes veladasvagam nos velhos vórtices* velozesdos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas*...

Sinestesias: correspondência entre as diversas sensações, sons, olhares e cheiros.

Aliterações: repetição de fonemas no início, meio ou fim das palavras.

Vórtices: redemoinho, turbilhão.

Vulcanizadas: ardentes, exaltadas.

Sejam em m

Mudas epilepsias, mudas, mudas,mudas epilepsiasMasturbações mentais, fundas, agudas negras nevrostenias

Os exemplos são infinitos. Em s: "Surdos, soturnos, subterrâneos desesperos..." Em f: "Finos frascos facetados" E assim por diante, sempre a "música antes de qualquer coisa." Vale a pena lembrar também que o escritor não ignorava a sinestesia, utilizando-a com frequência: "vozes luminosas" - "aromas mornos e amargos" - "claridade viscosa" - "vermelhos clarinantes", etc.

Da mesma forma, quando necessitado de novas palavras com sonoridade originais, ele não tinha vergonha de inventá-las: "purpurejamento - suinice - tentaculizar - maternizado, etc.

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Temas básicos

No entanto, a poética de Cruz e Sousa vai além destes procedimentos estilísticos inovadores. A junção da linguagem estranha com três ou quatro temas recorrentes e profundos é que lhe garantiu o lugar privilegiado em nossa literatura. A rigor, os seus assuntos são limitados:

A obsessão pela cor branca O erotismo e sua sublimação O sofrimento da condição negra A espiritualização

Manuscrito de Cruz e Sousa

A obsessão pela cor branca

Roger Bastide desvela nos primeiros livros de Cruz e Sousa uma imensa nostalgia de se tornar ariano. O poeta parece ocultar as suas origens numa louvação contínua da cor branca. O branco em seus diversos tons, o branco da neve, do luar, da neblina, da bruma, do cristal, do marfim, da espuma, da pérola, das luzes e

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dos brilhos. O crítico contou em Broquéis cento e sessenta e nove referências a este universo de brancuras.

O primeiro poema do livro, Antífona*, já é indicativo do que virá depois:

Ó Formas alvas, brancas, Formas clarasDe luares, de neves, de neblinas!Ó formas alvas, fluidas, cristalinas,Incensos dos turíbulos* das aras*

A lua, "fantasma de brancuras vaporosas", surge a todo instante:

Clâmides* frescas de brancuras friasFiníssimas dalmáticas* de neveVestem as longas árvores sombrias,Surgindo a Lua nebulosa e leve...

Névoas e névoas frígidas ondulamAlagam lácteos e fulgentes* riosQue na enluarada refração tremulamD'entre fosforescências, calafrios...

Nevrostenias: angústias, neurosesAntífona: versículo recitado antes ou depois da leitura de um salmo.Turíbulo: objeto para espargir incenso Ara: altar Clâmide: manto dos antigos gregosDalmática: túnicaFulgente: brilhante

Também as mulheres que estimulam sexualmente o poeta, em sua maioria, são brancas:

Braços nervosos, brancas opulênciasBrumais brancuras, fúlgidas brancuras

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Alvuras castas, virginais alvuras,Lactescências das raras lactescências.

Se existe uma vingança de Cruz e Souza contra o preconceito de cor, ela não se dá exatamente através de uma aproximação com seu mundo étnico. Ele buscou na aristocratização intelectual, no hermetismo*, na imitação do dernier cri parisiense e no desprezo pela vulgaridade, sua diferença em relação aos escritores brancos vinculados ao Parnasianismo. Como diz Roger Bastide, "criando uma arte de reticências e sutilezas", ele quis mostrar que o negro não era um materialista, preso à terra e ao prazer dos sentidos.

Daí também o platonismo* contínuo de sua poesia, na qual o universo concreto não passa de um reflexo sombrio de Essências e Idéias supraterrestres. Assim a poesia fica imaculada, limpa das impurezas da vida. E a obsessão pelo branco ganha uma dimensão filosófica, que poderia ser representada da seguinte maneira:

Mundo platônico > Mundo das Idéias e Formas Puras > Mundo alvo e nevoento

Este é o mundo ao que o poeta aspira: uma libertação, uma comunhão. Para tentar atingi-lo, destruirá a concepção parnasiana onde se formara: as coisas materiais se enevoarão, se diluirão. Os corpos femininos, no entanto, procurarão puxá-lo para a luxúria da vida terrena, atrapalhando a sua trajetória rumo às Essências.

Hermetismo: fechamento, sentido obscuro.

Platonismo: vem da filosofia de Platão, que afirma ser o nosso mundo uma cópia inferior de um mundo ideal.

Erotismo e sublimação*

A mulheres surgem na obra de Cruz e Sousa como um símbolo de sensualidade. Mas ao contrário das figuras femininas de Olavo

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Bilac - descritas minuciosamente em sua graça corpórea, como esculturas belas e frias - as mulheres do catarinense aparecem, com freqüência, sob a forma de "cruéis e demoníacas serpentes" arrastando o poeta para convulsões, espasmos, anseios e desejos obscuros.

Estamos longe daqueles retratos parnasianos, emoldurados por um erotismo convencional.

Cruz e Sousa prefere mergulhar nas sensações despertadas pelas "carnes tépidas":

Carnais, sejam carnais tantos desejos,Carnais, sejam carnais tantos anseios,Palpitações e frêmitos* e enleios*,Das harpas da emoção tantos arpejos*...

Estes "sentimentos carnais" exasperam o poeta em "febres intensas, ânsias mortais, angústias palpitantes" impelindo-o a necessidade de sublimar as "flamejantes atrações do gozo".

É necessário transportar estes espasmos e desejos para o reino sideral e assim desmaterializá-los:

Para as Estrelas de cristais geladosas ânsias e os desejos vão subindo,galgando azuis e siderais noivadosde nuvens brancas a amplidão vestindo.

Sublimação: Processo inconsciente de desviar a energia da libido para outras esferas ou atividades.

Frêmitos: vibrações, arrepios.

Enleios: laços, atrações.

Arpejos: execução rápida e sucessiva de notas musicais.

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O sofrimento da condição negra

Em Faróis e Evocações (poemas confessionais em prosa), Cruz e Sousa produzirá textos dolorosos e noturnos. A escuridão da noite - sempre associada à idéia de morte - substituirá o culto do branco e do erotismo. Estes dois livros correspondem à época da loucura de sua mulher, das maiores dificuldades financeiras, do preconceito de cor e do descaso dos intelectuais por sua obra. Como que lhe traduzindo a agonia interior, o estilo torna-se mais obscuro e tortuoso do que normalmente. O seu sentimento dominante é o de opressão, como se percebe em O emparedado:

Se caminhares para a direita, baterás e esbarrarás ansioso, aflito, numa parede horrendamente incomensurável de Egoísmos e Preconceitos! Se caminhares para a esquerda, outra parede, de Ciências e Críticas, mais alta do que a primeira. Se caminhares para a frente, ainda nova parede, feita de Despeito e Impotências, tremenda, de granito, broncamente se elevará do alto! Se caminhares, enfim, para trás, há ainda uma derradeira parede, fechando tudo, fechando tudo - horrível! - parede de Imbecilidade e Ignorância, te deixará n'um frio espasmo de terror absoluto. (...) E as estranhas paredes hão de subir - longas, negras, terríficas! Hão de subir, subir, subir mudas, silenciosas, até as Estrelas, deixando-te para sempre perdidamente alucinado e emparedado dentro do teu Sonho...

O sofrimento da condição negra não se transforma em protesto racial, e sim em isolamento, solidão, aristocratização amarga. O Simbolismo é para ele uma forma de revolta contra a sociedade e contra suas próprias origens africanas, pelas quais sente, ao mesmo tempo, orgulho e pesar. O "emparedado" vinga-se das "paredes" que o asfixiam com a sua criatividade poética. É uma revolta estética, raramente quebrada pela denúncia social, a não ser em textos como Litania dos pobres:

Os miseráveis, os rotosSão as flores dos esgotos

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São espectros implacáveisOs rotos, os miseráveis

São prantos negros de furnasCaladas, mudas, soturnas (...)

Faróis à noite apagados Por ventos desesperados(...)

Bandeiras rotas, sem nome,Das barricadas da fome.

Bandeiras estraçalhadasDas sangrentas barricadas.

A espiritualização

Como neste quadro de Magritte, a noite exerceu grande fascínio sobre Cruz e Sousa, representando ora o território

da sensualidade, ora o da dissolvência e da morte

A tuberculose veio culminar o processo trágico de Cruz e Sousa e sua família. Os tormentos atingem agora a plenitude, e a morte paira sobre tudo com sua túnica negra. Em Últimos sonetos, a linguagem parece se despir dos excessos anteriores e chega à perfeição. O poeta está diante do grande abismo e procura

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decifrar seu formidável mistério. Já não se trata apenas da angústia de um homem proscrito por causa de sua raça. O sofrimento, de fato, é inerente à condição humana. E, diante do fim, o artista experimentará sensações diversas, desde o desejo de dissolução na "Noite redentora" até a expectativa de ressurreição em outra vida

Seu processo de espiritualização é difusamente católico: dá a impressão de que acredita na sobrevivência dos mortos, que estes serão restituídos a sua "verdadeira pátria", isto é, a pátria das almas e das essências platônicas, onde reina o "Transcendente", o "Absoluto" e onde, por fim, encontrará a paz:

Sorrindo a céus que vão se desvendando,A mundos que vão se multiplicando,A portas de ouro que vão se abrindo!

A religiosidade filosófica permite-lhe - apesar de todos os dramas de sua vida - declarar-se um vencedor, como verificamos no seu derradeiro poema, o antológico Sorriso interior:

O ser que é ser e que jamais vacilaNas guerras imortais entra sem susto,Leva consigo este brasão augustoDo grande amor, da grande fé tranqüila.

Os abismos carnais da triste argilaEle os vence sem ânsia e sem custo...Fica sereno, num sorriso justo,Enquanto tudo em derredor oscila.

Ondas interiores de grandezaDão-lhe esta glória em frente à Natureza,Esse esplendor, todo esse largo eflúvio*.

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O ser que é ser transforma tudo em flores...E para ironizar as próprias doresCanta por entre as águas do Dilúvio!

Mesmo que, em sua fé platônica-cristã, o poeta cante a esperança de uma outra vida, momentos de desespero e tristeza continuam aflorando em sua obra final.

O soneto Vida obscura, que alguns julgam dedicado a sua própria esposa, e que outros vêem como um auto-retrato do artista, é a mais conhecida de suas criações:

"Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,ó ser humilde entre os humildes seres.Embriagado, tonto dos prazeres,o mundo para ti foi negro e duro.

Atravessaste no silêncio escuroa vida presa a trágicos deverese chegaste ao saber de altos saberes,tornando-te mais simples e mais puro.

Ninguém te viu o sentimento inquieto,magoado, oculto e aterrador, secreto,que o coração te apunhalou no mundo.

Mas eu que sempre te segui os passossei que cruz infernal prendeu-te os braçose o teu suspiro como foi profundo!

Manuel Bandeira sintetizou bem a poderosa poética de Cruz e Sousa:

Dos sofrimentos físicos e morais de sua vida, do seu penoso esforço de ascensão na escala social, do seu sonho místico de uma arte que seria uma 'eucarística espiritualização', do fundo indômito de seu ser de 'emparedado' dentro da raça desprezada, ele tirou os acentos patéticos que lhe garantem a perpetuidade de

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sua obra na literatura brasileira. Não há gritos mais dilacerantes, suspiros mais profundos do que os seus.

ALPHONSUS DE GUIMARAENS (1870-1921)

Foto esmaecida do poeta mineiro

VIDA

Nasceu em Ouro Preto, filho de um comerciante português e de uma sobrinha do escritor romântico, Bernardo Guimarães. Fez seus estudos preliminares na cidade natal e depois cursou Direito em São Paulo. Nutre intensa paixão platônica pela filha do autor de A escrava Isaura, Constança, que morreria de tuberculose antes dos dezoito anos e, para quem escreveria muitos de seus versos. Retornou para Minas Gerais, exercendo a função de juiz em Conceição do Serro e, mais tarde, em Mariana. Casou-se com uma jovem de dezessete anos, Zenaide, com quem teve quatorze filhos e com quem encaramujou-se na vida privada, ao ponto de morrer praticamente na obscuridade, às vésperas da Semana de Arte Moderna.

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OBRAS PRINCIPAIS

Setenário das dores de Nossa Senhora (1899), Dona mística (1889), Câmara ardente (1899), Kyriale (1902)

Mineiro, passado quase toda a sua vida nas cidades barrocas e decadentes da região aurífera, Alphonsus de Guimarães sofreu as influências ambientais dessas cidades, povoadas apenas, no dizer de Roger Bastide, "de sons e sinos, de velhas deslizando pelos becos silenciosos, de vultos que se escondem à sombra das muralhas. Cidades de brumas, conhecendo as mesmas existências cinzentas e os mesmos fantasmas noturnos: donzelas solitárias, vestidas de luar." Sua poesia gira em torno de pouco assuntos:

A morte da amada

É um tema dominante em sua poesia: a morte da noiva amada, a doce Constança, desaparecida na flor da mocidade. De certa forma, não conseguirá mais esquecê-la e, assim, os seus poemas de amor sempre se vincularão à idéias fúnebres. Amor e morte é uma velha fórmula romântica, mas Alphonsus a tratará de maneira diferente, fugindo do patético e alcançando um tom elegíaco*, onde predominam a melancolia e a musicalidade.

Nem o casamento, nem o passar do tempo ajudarão o poeta a atenuar esta tristeza. Em vários momentos, a dor parece mais uma convenção poética do que propriamente um sentimento real.

No entanto, um soneto como Hão de chorar por ela os cinamomos guarda forte carga de emoção:

Hão de chorar por ela os cinamomosMurchando as flores ao tombar do diaDos laranjais hão de cair os pomosLembrando-se daquela que os colhia.

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As estrelas dirão: - "Ai, nada somos,Pois ela se morreu silente* e fria..."E pondo os olhos nela como pomos,Hão de chorar a irmã que lhes sorria.

A lua que lhe foi mãe carinhosaQue a viu nascer e amar, há de envolvê-laEntre lírios e pétalas de rosa.

Os meus sonhos de amor serão defuntos...E os arcanjos dirão no azul ao vê-la,Pensando em mim: - "Por que não vieram juntos?"

Silente: silencioso, secreto.

A lembrança do sofrimento nunca o abandona, como se percebe em Ismália, espécie de balada, onde a loucura, a solidão e a morte se interpenetram:

Manuscrito de Alphonsus de Guimaraens

Quando Ismália enlouqueceu,Pôs-se na torre a sonhar...Viu uma lua no céu,Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeuBanhou-se toda em luar...

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Queria subir ao céu,Queria descer ao mar...

E, no desvario seuNa torre pôs-se a cantar...Estava perto do céu,Estava longe do mar...

E como um anjo pendeuAs asas para voar...Queria a lua do céu,Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deuRuflaram de par em par...Sua alma subiu ao céu,Seu corpo desceu ao mar

A religiosidade litúrgica

Alphonsus de Guimaraens, desenho de Calisto

O desaparecimento precoce da noiva associado ao clima místico das cidades barrocas induzem Alphonsus de Guimaraens à religiosidade. Ao inverso de Cruz e Sousa cuja espiritualização é

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angustiada e filosófica, a do poeta mineiro não tem "arroubos ou iluminações fulgurantes", como diz Andrade Muricy.

Trata-se de uma religiosidade emotiva, feita de preces e crenças simples. Nada de abstrações metafísicas. Nada de indagações exasperadas. Seu catolicismo está mais próximo das fontes tradicionais da liturgia. Houve quem lhe apontasse um misticismo exterior e superficial, mas é forçoso reconhecer beleza na série de orações que dirige à Virgem Maria:

Doce consolação dos infelizesPrimeiro e último amparo de quem chora,Oh! Dá-me alívio, dá-me cicatrizesPara estas chagas que te mostro agora.

Aliás, a deificação de Nossa Senhora parece corresponder à sublimação do amor pela noiva morta. O arrebatamento religioso pela Mãe de Deus indicaria a troca de uma paixão concreta por uma devoção católica. Massaud Moisés fala em "platonismo místico" porque, ao encarnar esta paixão na figura da Virgem, "o poeta transcendentaliza e essencializa a mulher amada, conferindo-lhe o atributo de plenitude espiritual válido no contexto católico e de acordo com a sua sensibilidade cristã."

Ilustrativo das tendências simbólicas, místicas e musicais de Alphonsus é o seu poema

A catedral:

Entre brumas ao longe surge a aurora.O hialino* orvalho aos poucos se evapora,Agoniza o arrebol*.A catedral ebúrnea* do meu sonhoAparece na paz do céu risonhoToda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos*:Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus! (...)

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Por entre lírios e lilases desceA tarde esquiva: amargurada precePõe-se a lua a rezar.A catedral ebúrnea do meu sonhoAparece na paz do céu tristonhoToda branca de luar.

E o sino dobra em lúgubres responsos:Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!

O céu é todo trevas: o vento uiva.Do relâmpago a cabeleira ruivaVem açoitar o rosto meu.E a catedral ebúrnea do meu sonhoAfunda-se no caos do céu medonhoComo um astro que já morreu.

E o sino geme em lúgubres responsos:Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!

Hialino: transparenteArrebol: vermelhidão do nascer ou do pôr do sol.Ebúrnea: de marfimResponsos: versículos rezados ou cantados.

OUTROS SIMBOLISTAS

No Rio Grande do Sul, o principal simbolista foi Eduardo Guimarães (A divina quimera, 1916). No Paraná, destacou-se Emiliano Perneta (Ilusão,1911). Na Bahia, surgiu a poética estranha de Pedro Kilkerry. Verdade que estes escritores ficam em segundo plano, diante da figura esplêndida de Cruz e Sousa, mas contribuem para a expansão de uma onda simbolista. Uma onda quase invisível, dado o domínio parnasiano e a posterior vitória modernista, e que só seria percebida nos livros iniciais de Manuel Bandeira, Vinícius de Moraes, Cecília Meireles e Mário Quintana, todos com maior ou menor influência do Simbolismo.

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O caso PEDRO KILKERRY (1885-1917)

Vida

Nasceu em Santo Antônio (Bahia). Estudou em Salvador, onde se formou em Direito. Ao morrer, com apenas trinta e dois anos, não tinha ainda livro publicado, fato que persiste até hoje.

Redescoberto pela vanguarda concretista, Pedro Kilkerry é mais um desses casos estranhos que povoam a história literária. Criador isolado de uma poética fragmentária, feita de aliterações, onomatopéias e neologismos, levou a extremos as possibilidades de expressão abertas pelos simbolistas, aproximando-se do experimentalismo de alguns poetas modernistas.

Veja-se "Horas ígneas":

"Eu sorvo o haxixe do estio*E evolve um cheiro, bestialAo solo quente, como o cioDe um chacal.

Distensas, rebrilham sobreUm verdor, flamâncias* de asa...Circula um vapor de cobreOs montes - de cinza e brasa."**

Em vários momentos, entretanto, esta poesia inovadora descai para a prolixidade e para o vocabulário pedante.

O Simbolismo é um estilo literário, do teatro e das artes plásticas que surgiu na França, no final do século XIX, como oposição ao Realismo e ao Naturalismo.

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Histórico e características

A partir de 1881, na França, pintores, autores teatrais e escritores, influenciados pelo misticismo advindo do grande intercâmbio com as artes, pensamento e religiões orientais - procuram refletir em suas produções a consonância a estas diferentes formas de olhar sobre o mundo, de ver, e demonstrar o sentimento.

Marcadamente individualista e místico, foi com desdém apelidado de "decadentismo" - clara alusão à decadência dos valores estéticos então vigentes. Mas em 1886 um manifesto traz a denominação que viria marcar definitivamente os adeptos desta corrente: simbolismo.

Principais características

Subjetivismo Poesia Subjetiva Musicalidade O uso de Reticências Transcedentalismo Sinestesia Tom vago, impreciso e místico Sonoridade Aliteração

Literatura do simbolismo

Os temas são místicos, espirituais. Abusa-se da sinestesia (sensações produzidas pelos diversos órgãos sensoriais), das aliterações (repetição de letras ou sílabas numa mesma oração) e das assonâncias (aproximação fônica entre as vogais tônicas das palavras) tornando os textos poéticos simbolistas profundamente musicais.

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O Simbolismo em Portugal liga-se às atividades das revistas Os Insubmissos e Boêmia Nova, fundadas por estudantes de Coimbra, entre eles Eugênio de Castro, que ao publicar um volume de versos intitulado Oaristos, instaurou essa nova estética em Portugal. O movimento simbolista durou aproximadamente até 1915, altura em que se iniciou o Modernismo.

Literatos simbolistas

Pode-se dizer que o precursor do movimento, na França, foi o poeta francês Charles Baudelaire com "As Flores do Mal", ainda em 1857.

Mas só em 1881 a nova manifestação é rotulada, com o nome decadentismo, substituído por simbolismo em manifesto publicado em 1886. Espalhando-se pela Europa, é na França, porém, que tem seus expoentes, como Paul Verlaine, Arthur Rimbaud e Stéphane Mallarmé.

Portugal

Os nomes de maior destaque no Simbolismo português são: Eugênio de Castro, Antônio Nobre, Camilo Pessanha, Augusto Gil, Alfonso Lopes Vieira, Antônio Patrício, Manuel Laranjeira (poesia), Raul Brandão (prosa), Júlio Dantas (teatro).

Brasil

No Brasil, dois grandes poetas destacaram-se dentro do movimento simbolista: Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens. No primeiro, a angústia de sua condição, reflete-se no comentário de Manuel Bandeira: "Não há (na literatura brasileira) gritos mais dilacerantes, suspiros mais profundos do que os seus".

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Simbolismo nas Artes Plásticas

Oriundo do impressionismo, Paul Gauguin deixa-se influenciar pelas pinturas japonesas que aparecem na Europa, provocando verdadeiro choque cultural - e este artista abandona as técnicas ainda vigentes nas telas do movimento onde se iniciou, como a perspetiva, pintando apenas em formas bidimensionais. A temática alegórica passa a dominar, a partir de 1890. Ao artista não bastava pintar a realidade, mas demonstrar na tela a essência sentimental dos personagens - e em Gauguin isto levou a uma busca tal pelo primitivismo que o próprio artista abandonou a França, indo morar com os nativos da Polinésia francesa...

Gauguin impressionista

Em França outros artistas, como Gustave Moreau, Odilon Redon, Maurice Denis, Paul Sérusier e Aristide Maillol, aderem à nova estética. Na Áustria, usando de motivos eminentemente europeus do estilo rococó, Gustav Klimt é outro que, assim como Gauguin, torna-se becido e apreciado. O norueguês Edvard Munch, autor do célebre quadro "O grito", alia-se primeiro ao simbolismo, antes de tornar-se um dos expoentes do expressionismo.

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Gauguin simbolista

No Brasil, o movimento simbolista influenciou a obra de pintores como Eliseu Visconti e Rodolfo Amoedo.

Les Nabis

Como consequência do Simbolismo, apareceu o grupo de Les Nabis. Tem a particularidade de ter formas mais simplificadas e cores mais puras. A arte torna-se desta forma uma realidade autónoma do real, pois nela estão patentes emoções, sentimentos e ideologias.

Simbolismo no teatro

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Buscaram os autores, dentre os quais o belga Maeterlinck, o italiano Gabriele D'Annunzio e o norueguês Ibsen, levar ao palco não personagens propriamente ditos, mas alegorias a representar sentimento, idéia - em peças onde o cenário (som, luz, ambiente, etc.) tenham maior destaque.

Fonte: pt.wikipedia.org

SIMBOLISMO ÚLTIMO

Movimento Poético do séc. XIX

“Nomear um objeto significa suprimir as três quartas partes do gozo de uma poesia, que consiste no prazer de adivinhar pouco a pouco. Sugerir, eis o sonho.” Mallarmé

O Simbolismo foi uma escola literária de poetas, que tinham colegas por todo mundo como o francês Charles Baudelaire, mas tinham pouco reconhecimento e aceitação artística. Vários de seus integrantes morreram pobres, não tiveram obras publicadas e permaneceram ou permanecem esquecido até hoje.

Movimento de relações com o Modernismo, influencia a maioria dos poetas da 1ª fase do Modernismo. Aqui surgem as primeiras rupturas com os padrões rígidos de composição e restabelecimento da relação entre poesia e existência, separadas pelos parnasianos.

Referências históricas

Complexo momento de transição para o séc. XX:

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1ª GM e Rev. Russa - últimas manifestações simbolistas e primeiras modernistas

o Brasil não teve momento típico para o Simbolismo - produto de importação européia

origens estão no Sul (região marginalizada pela elite cultural), palco da Revolução Federalista (1893/1895)

Revolta Armada (1893/1894) navios da Marinha (camada monárquica) em oposição ao governo Floriano

Floriano consolida a república apesar dos movimentos de revolta

clima marcado por frustrações, angústias, falta de perspectiva, resultando em afastamento do real e busca do sujeito

Características

Esta poesia representa uma reação contra toda produção poética anterior.

nega Realismo e suas manifestações - contra materialismo, cientificismo e racionalismo

valoriza as manifestações metafísicas e espirituais - subjetivismo

eu = universo (também critica o eu “sentimentalóide” dos românticos)

buscam a essência do homem - alma (poesia de auto-investigação)

matéria X espírito, corpo X alma, sonho e loucura busca da purificação com o espírito atingindo regiões

etéreas e integração com o espaço infinito (cosmos) corpo = correntes que aprisionam a alma (libertação só pela

morte) primado do símbolo, valorização da metáfora, onde o

símbolo é sugestão

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palavras transcendem significado - cheio de sinestesias, assonâncias e aliterações

musicalidade do verso “poesia pura” - surge do espírito irracional, não-conceitual e

contrária à interpretação lógica temática da consciência da degradação da vida

Autores

Cruz e Sousa (1861-1898)

Filho de ex-escravos, foi criado por um Marechal e sua esposa como um filho e teve educação de qualidade. Perseguido a vida inteira por ser negro, culminando com o fato de ter sido proibido de assumir um cargo de juiz só por isso. É ativo na causa abolicionista. Morre jovem de tuberculose, vítima da pobreza e do preconceito.

Uma de suas obsessões era cor branca, como mostra a passagem a seguir.

"Ó Formas alvas, brancas, Formas clarasde luares, de neves, de neblinas!...Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...Incenso dos turíbulos das aras..."

É considerado neo-romântico simbolista pois valoriza os impulsos pessoais e sua condição de indivíduo sofredor como fonte de inspiração poética. Suas poesias sempre oferecem dificuldade de leitura. Trata-se de um poeta expressivo, apelidado de “Cisne Negro” ou “Dante Negro".

“Alma! Que tu não chores e não gemasTeu amor voltou agora.Ei-lo que chega das mansões extremas,Lá onde a loucura mora!”

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Prenuncia duas tendências que marcam a poesia moderna: sondagem psicológica, pela expressão do mundo interior e invenção lingüística, pela preferência a estruturas conscientemente elaboradas.

Obras Principais

Poesia: Broquéis (1893), Faróis (1900), Últimos Sonetos (1905)

Poesia em prosa: Tropos e Fantasias (1885), Missal (1893), Evocações (1898)

Alphonsus de Guimaraens (1870 -1921)

Apaixonado desde jovem por uma prima, sofre com a prematura morte da amada e passa por uma crise de doença e boêmia. Forma-se em Direito e Ciências Sociais, colaborando sempre na melhor imprensa paulistana. Fica conhecido como “O Solitário de Mariana”.

São constantes em sua obra a presença constante da morte da mulher amada, os tons fúnebres de cemitérios e enterros, a nostalgia de um medievalismo romântico, além do seu famoso marianismo (culto a Virgem Maria). Sua obra prenuncia o surrealismo

Seus versos tinham musicalidade e sutileza para a atmosfera religiosa que inspiravam, como mostra a passagem a seguir.

"O céu é todo trevas: o vento uiva.Do relâmpago a cabeleira ruivaVem açoitar o rosto meu.E a catedral ebúrnea do meu sonhoAfunda-se no caos do céu medonhoComo um astro que já morreu."

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Obras Principais

Poesia: Setenário das Dores de Nossa Senhora (1899), Dona Mística (1899), Câmara Ardente (1899), Kiriale (1902), Pauvre Lyre (1921), Pastoral aos Crentes do Amor e da Morte (1923), Poesias (Nova Primavera, Escada de Jacó, Pulvis, 1938).

Prosa: Mendigos (1920)

Pedro Kilkerry (1855-1917)

Foi um dos vários poetas simbolistas quase anônimos. Pobre e boêmio, morreu tuberculoso em Salvador. Nada deixou em livro, o que dele se conhece se reduz ao que publicou em revistas simbolistas baianas Nova Cruzada e Os Anais. Sua obra só entrou em evidência em 1970, com Re-visão de Kilkerry (seleção de poemas organizada por Augusto de Campos).

Sua poesia era forte e desconcertante, sendo uma das melhores do Simbolismo brasileiro. Caracteriza-se pela base metonímica e metafórica.

"Primavera! - versos, vinhos...Nós, primaveras em flor.E ai! Corações, cavaquinhosCom quatro cordas de Amor!"

Observação

Com menor expressão ainda apresenta-se como simbolista Emiliano Perneta (1866-1921) que publicou, em livros, jornais e revistas, poesia e prosa poética simbolista.

Sinopse

Page 66: Texto   Simbolismo

Marco inicial = publicação de Missal e Broquéis, ambos de Cruz e Sousa - obras inaugurais em 1893

Marco final = 1922 com a realização da Semana de Arte Moderna

Textos

Cárcere das Almas

Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,Soluçando nas trevas, entre as gradesDo calabouço, olhando imensidades,Mares, estrelas, tardes, natureza.Tu se veste de uma igual grandezaQuando a alma entre grilhões as liberdadesSonha e, sonhando, as imortalidadesRasga no etéreo Espaço da Pureza.Ó almas presas, mudas e fechadasNas prisões colossais e abandonadas,Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!Nesses silêncios solitários, graves,Que chaveiro do Céu possui as chavesPara abrir-vos as portas do Mistério?!

Cruz e Sousa

Pressago

Nas ÁGUAS daquele lagodormita a sombra de Iago...

Um véu de luar funéreocobre tudo de mistério...

Page 67: Texto   Simbolismo

Há um lívido abandonodo luar no estranho sono.

Dá meia-noite na ermida,como o último ai de uma vida.

São badaladas nevoentas,sonolentas, sonolentas...

Do céu no estrelado luxopassa o fantasma de um bruxo

No mar tenebroso e tetrovaga de um náufrago o espectro.

Como fantásticos signos,erram demônios malignos.

Na brancura das ossadasgemem as almas penadas.

Lobisomens, feiticeirasgargalham no luar das eiras.

Os vultos dos enforcadosuivam nos ventos irados.

Os sinos das torres friassoluçam hipocondrias.

Luxúrias de virgens mortasdas tumbas rasgam as portas.

Andam torvos pesadelosarrepiando os cabelos.

Coalha nos lodos abjetossangue roxo dos fetos.

Page 68: Texto   Simbolismo

Há rios maus, amarelosde presságios de flagelos.

Das vesgas concupiscênciassaem vis fosforescências.

Os remorsos contorcidosmordem os ares pungidos.

A alma cobarde Judasrecebe expressões cornudas.

Negras aves de rapinamostram a garra assassina.

Sob o céu que nos oprimelangüescem formas de crime.

Com os mais sinistros furores,saem gemidos das flores.

Caveiras! Que horror medonho!Parecem visões de um sonho!

A morte com Sancho Pança,grotesca e trágica, dança.

E como um símbolo eterno,Ritmo dos Ritmos do inferno.

No lago morto, ondulando,dentre o luar noctivagando,

corvo hediondo crocitada sombra d’Iago maldita!

Cruz e Sousa

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Ismália

Quando Ismália enlouqueceu,Pôs-me na torre a sonhar...Viu uma lua no céu,Viu outra no mar.No sonho em que se perdeu,Banhou-se toda em luar...Queria subir ao céu,Queria descer ao mar...E, no desvario seu,Na torre pôs-se a cantar...Estava perto do céu,Estava longe do mar...

E como um anjo pendeuAs asas para voar...Queria dar a lua do céu,Queria a lua do mar...As asas que Deus lhe deuRuflaram de par em par...Sua alma subiu ao céu.Seu corpo desceu ao mar...

Ref:

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