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Uma apresentação da obra de Andreia Galvão sobre movimentos sociais fazendo contextualização.
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O MARXISMO IMPORTA NA ANÁLISE DOS MOVIMENTOS SOCIAIS?
ANDRÉIA GALVÃO – UNIFESP/GUARULHOS
32º ANPOCS - 2008
Autora
• Andréia Galvão é professora de Sociologia da
Unifesp/Guarulhos. Este artigo foi elaborado a
partir das discussões do grupo de pesquisa
“Neoliberalismo e classes sociais”, vinculado
ao Cemarx/Unicamp.
Introdução
• A América Latina tem sido, no período recente, palco de diferentes
movimentos sociais: movimentos rurais, como o MST no Brasil;
urbanos, como os piqueteiros na Argentina; de caráter étnico, como
os movimentos indígenas na Bolívia, Peru, Equador e México. Esses
movimentos têm sido analisados por perspectivas teóricas distintas,
que destacam, sobretudo, sua composição social e sua plataforma
reivindicativa,especialmente no que concerne a demandas de
participação popular e ampliação da cidadania.
Discute-se
• Como o marxismo analisa os movimentos sociais e quais as
especificidades de uma análise marxista dos movimentos
sociais contemporâneos.
• Tratar criticamente perspectivas como a dos novos
movimentos sociais e distinguir a análise marxista de classes
de outras análises que, embora se valendo de um conceito
de classes, não se inserem na perspectiva marxista.
Estrutura do Texto:
• Na primeira, a autora trata de algumas considerações críticas às
abordagens supra-mencionadas. Não se trata, aqui, de apresentá-las
de forma menorizada, mas tão somente de apontar seus limites.
• Na segunda parte, buscamos indicar os elementos que nos parecem
fundamentais para uma análise marxista dos movimentos sociais.
• Por fim, empreendemos uma breve análise dos movimentos sociais
na América Latina hoje à luz dos elementos que, a nosso ver,
caracterizam uma abordagem marxista.
1. Algumas polêmicas com a bibliografia
• As teorias dos novos movimentos sociais e a da
mobilização de recursos, desenvolvidas,
respectivamente, na Europa e nos EUA, constituem-se
em contraposição ao marxismo. Touraine (sociólogo
Francês), é um dos mais profícuos e controversos
estudiosos dos movimentos sociais, aponta para o
caráter histórico, datado do conceito (Touraine,1985).
Touraine define movimento social
• Touraine define movimento social como “a combinação de um
princípio de identidade (lutamos em nome de quem?), de um
princípio de oposição (contra quem?) e de um princípio de totalidade
(que designa a dinâmica societária)” (Touraine, 1978, p.109). A partir
dessa definição geral, o autor identifica uma sucessão de formas de
conflito que portam a “historicidade”, o sentido da sociedade,
fazendo uma série de exigências (que variam de uma obra a outra)
para que um movimento possa ser qualificado de movimento social.
Identificando algumas idéias centrais de Touraine• A primeira delas é que as mudanças verificadas na sociedade levariam a
uma oposição entre “novos” e “velhos” movimentos sociais. O “novos” se
definiriam por aspectos sociais e culturais: se situam no campo da cultura,
da sociabilidade, do modo de vida, dos valores, da identidade de
“minorias”; não se caracterizam pela luta pela igualdade, mas pelo direito
à diferença. Nesse sentido, não concernem mais diretamente os
problemas da produção, da economia, nem dizem respeito a um conflito
estrutural: “o conflito não está mais associado a um setor fundamental da
atividade social, à infraestrutura da sociedade, ao trabalho em particular;
ele está em toda a parte” (Touraine, 1989, p. 13).
Continuando a ideia de Touraine – 8.1
• A consequência dessa formulação é que os
conflitos de classe teriam sido ultrapassados e a
luta de classes não seria mais uma categoria
analítica relevante: “Descobrimos que os conflitos
de classes não representam mais os instrumentos
de mudanças históricas” (Touraine, 1989, p. 15).
Continuando a ideia de Touraine - 8.2
• Touraine, negligencia as continuidades e
supervaloriza as mudanças. Uma das maneiras
de fazê-lo é dissociar os movimentos sociais
dos processos de exploração e de dominação
capitalistas.
Touraine enfatiza um segundo aspecto
• O conflito só é dinâmico se não se institucionaliza; se se dirige ao
Estado, deixa de ser movimento social. Por isso não considera mais o
sindicalismo um movimento social (Touraine, 1989, p. 11). Então
segundo a autora na medida em que este aceita se integrar ao
aparelho de Estado, acaba “funcionando apenas como uma agência
de regulação” (Andreia Galvão, 2002, p. 161). Já Mouriaux fala que ao
se institucionalizar, o movimento operário deixa de ser um ator social
para ser um ator político ( René Mouriaux, 2003, p. 18).
Terceiro aspecto enfatizado por Touraine
• O terceiro aspecto é que o autor não se coloca
a questão da unidade do movimento social:
cada movimento social é único, não havendo
um princípio político que unifique os
diferentes movimentos sociais (Touraine,
1985, p. 777).
Obra de outros estudiososdos novos movimentos sociais.
• Para Melucci (1980, p. 200), o marxismo carece de
instrumental analítico para compreender os novos
atores sociais, já que estes reúnem coletivos distintos
das classes. Os novos conflitos sociais se dão em
nome da defesa da identidade, da busca do
reconhecimento enquanto indivíduo, e não se
restringem a uma única classe.
Teorias dos novos movimentos sociais
• Para Evers, os novos movimentos sociais “não diz[em] respeito
principalmente ao poder, e sim à renovação de padrões sócio-
culturais e sócio-psíquicos do quotidiano”(Evers, 1984, p. 12)
• Para Offe (1985, p. 819), os novos movimentos sociais seriam
afastados em relação ao Estado e à regulação política ou,
conforme Melucci (1980, p. 220), não são focados no sistema
político.
Base dos novos movimentos sociais
• A base dos novos movimentos sociais é
predominantemente de classe média, Offe (1985, p.
833) entende que esta não é movida por uma
consciência de classe, porque não age em nome de
seus interesses exclusivos, mas sim em nome de
demandas e valores universais (como a paz, o meio-
ambiente, os direitos humanos...)
A teoria da mobilização de recursos
• Autores como McCarthy e Zald (1977), enfatiza os recursos,
principalmente econômicos e coercitivos, que possibilitam a
mobilização coletiva. Nesse sentido, privilegia menos o
movimento, a ação coletiva em si, e mais os meios que são
mobilizados para se atingir os objetivos pretendidos. Por esse
motivo, tende a desconsiderar as razões que levam à
mobilização, menosprezando as crenças, as ideologias, as visões
de mundo (Chazel, 1995, p. 325).
Tarrow mostra como surgem os movimentos sociais
• O autor destaca, entre os aspectos importantes para explicar o
surgimento dos movimentos sociais: o funcionamento do sistema
econômico, as motivações individuais, as capacidades organizativas
do grupo, a criação ou expansão de oportunidades políticas
(considerando que essas mudam ao longo do tempo) e o elemento
transnacional (isto é, a capacidade das experiências nacionais serem
influenciadas por similares estrangeiras ou serem articuladas
internacionalmente) (Tarrow, 1999).
Ideia de Honneth
• A concepção de Honneth é fortemente individualista: por
luta social entende o “processo prático no qual
experiências individuais de desrespeito são interpretadas
como experiências cruciais típicas de um grupo inteiro, de
forma que elas podem influir, como motivos diretores da
ação, na exigência coletiva por relações ampliadas de
reconhecimento” (Honneth, 2003, p. 257).
A reabilitação do conceito de classe sem a perspectiva marxista
• Eder (2001) discorda daqueles que consideram que a noção de classe
deixou de ser importante. Embora os novos movimentos sociais não
considerem classe como um elemento definidor de sua identidade,
podem ser definidos como movimentos de classe média: “são formas de
radicalismo de classe média e protesto de classe média” (Eder, 2001, p. 7).
• Para o autor, não adianta atribuir o caráter de classe de um movimento
social à composição social de seus integrantes e apoiadores. O importante
é analisar a cultura do movimento, o que pode ser feito através da
identificação de seus interesses, normas e valores.
Sallum Jr. Da ênfase a questão da cultura
• Sallum Jr. também enfatiza a importância da cultura, criticando autores como Melucci,
Offe e Inglehart por não conseguirem explicar de modo satisfatório por que a classe
média predomina nos novos movimentos sociais. Para Sallum Jr., esses autores
“subestimam a relevância da cultura não apenas na articulação entre classe e ação
coletiva, mas na conformação mesma dos dois termos... as classes e seus interesses são
considerados como dedutíveis de suas posições sócio-econômicas” (Sallum Jr., 2005, p.
23-4).
• As classes sociais não são, por si só, atores coletivos, “mas fixam balizas, por sua posição
relativa nos planos material e cultural, à sociabilidade cotidiana, aos movimentos
sociais...” (Sallum Jr., 2005, p. 40).
2. Elementos para uma abordagem marxista dos movimentos sociais
• As contribuições dos autores vinculados a essa
abordagem, sobretudo os clássicos, priorizaram a
discussão sobre as formas partido e sindicato, e a relação
entre ambas. Nesse sentido, o movimento operário era o
movimento social por excelência, de modo que a noção
de movimento social estava vinculada à condição de
classe e à luta entre capital e trabalho.
Marxismo na questão urbana
• Nos anos 70, três estudos de autores vinculados ao marxismo se destacaram por
abordar essa temática. Trata-se de La question urbaine, de Manuel Castells (1972), de
Le marxisme, l’Etat et la question urbaine, de Jean Lojkine (1977) e de Luttes urbaines
et pouvoir politique (1973), de Manuel Castells. Os dois primeiros trabalhos não tinham
como foco os movimentos sociais: Castells faz menção às lutas sociais urbanas,
apontando a determinação, em última instância, dos elementos estruturais sobre as
práticas sociais; Lojkine, por sua vez, discute o conceito de Estado capitalista e analisa
as políticas sociais urbanas a partir dos interesses de classe. Apenas na conclusão do
livro de Castells encontra-se, sob a forma de “tese exploratória”, uma definição de
movimento social urbano
Lojkine e conceito de movimento social
• Movimento social é definido “pela capacidade de um conjunto de agentes das classes
dominadas diferenciar-se dos papéis e funções através dos quais a classe (ou fração de
classe) dominante garante a subordinação e dependência dessas classes dominadas com
relação ao sistema sócio-econômico em vigor” (Lojkine, 1981, p. 292). Ele compreende dois
processos sociais: “A) Um processo de ‘pôr-se em movimento’ de classes, frações de classe e
camadas sociais. Esse primeiro processo define a intensidade e a extensão (o campo social)
do movimento social pelo tipo de combinação que une: a) a base social, e; b) a organização do
movimento social [....] B) Do ‘pôr-se em movimento’ ao ‘desafio’ político” (Lojkine, 1981, p.
296-7).
Assim, “o movimento social será definido, em última instância, por sua capacidade de
transformar o sistema sócio-econômico no qual surgiu” (Lojkine, 1981, p. 298).
Os autores
• Consideram o movimento social como expressão da luta
de classes; não estabelecem uma cisão entre mobilização
e poder político, entre movimento social e organização
política; e apontam para as diferentes dimensões políticas
do movimento social: lutar pela transformação do
sistema sócio-econômico não equivale a dizer que o
movimento seja revolucionário.
Castells define movimentos sociais urbanos
• Castells definindo os movimentos sociais
urbanos como “sistemas de práticas sociais
contraditórias que controvertem a ordem
estabelecida a partir das contradições
específicas da problemática urbana” (Castells,
1991, p. 3).
Crise do marxismo
• Nos anos 80, já num contexto de crise do marxismo, dois autores
influenciados por Gramsci, Laclau e Mouffe (1985) produziram um trabalho
que criticava tanto a teoria dos novos movimentos sociais quanto uma certa
abordagem marxista, na medida em que recusava a idéia de um agente
histórico privilegiado, seja ele um grupo ou uma classe social. Os autores
criticavam o marxismo da Segunda Internacional, opondo-se ao economicismo
e à tese da proletarização das classes médias e do campesinato, considerando
que sem levar em conta as especificidades dessas classes não seria possível
construir uma alternativa hegemônica das classes dominadas.
Autores Franceses numa concepção marxista
• Apenas nos anos 90 houve uma renovação dos
estudos dos movimentos sociais a partir de
uma perspectiva teórica marxista.
Para Vakaloulis , movimentos sociais
Reconhecer a existência de movimentos policlassistas não significa que a dominação e a exploração de classes deixaram de ser importantes. Admitir que os movimentos sociais não surgem apenas da luta de classes, não é o mesmo que afirmar que estas foram eliminadas. Por fim, embora esses movimentos não sejam anticapitalistas, não se situam no exterior da relação capital/trabalho. Para o autor, os movimentos sociais são “fatores de politização e de emancipação das trocas sociais” (Vakaloulis, 2003, p. 81).
A dimensão política dos movimentos sociais pode ser observada nos seguintes aspectos:1. os movimentos sociais levantam e politizam problemas como emprego, segurança social,
saúde, aposentadoria...2. 2. ao mesmo tempo, recusam a instrumentalização pela e a submissão à política partidária e
institucional, o que não significa uma versão pósmoderna do anarco-sindicalismo, mas a demanda por igualdade com o político.
3. adotam práticas que ampliam o espaço público (participação direta, novosrepertórios de ação).
Vakaloulis,
• “A força de um movimento social não se mede somente por seus efeitos
conjunturais (impacto temporário) ou substanciais (satisfação de
reivindicações). Nem exclusivamente por sua capacidade de ‘pesar’ sobre a
política institucional, modificando o que os cientistas políticos chamam de
‘estrutura de oportunidades políticas’. Se se coloca do ponto de vista de uma
política de emancipação, a contribuição fundamental dos movimentos sociais
é a de colocar os explorados e os dominados na frente da cena, mostrando
que o espaço de contestação se constrói não em termos de contra-poderes
mas, sobretudo, em termos de positividade” (Vakaloulis, s/d, p. 17).
Polissemia do movimento social
• Béroud, Mouriaux e Vakaloulis apontam a
polissemia da expressão movimento social e
utilizam-na para designar “um processo amplo
e multiforme de mobilizações” em busca de
transformações sociais (Béroud et al., 1998, p.
21).
Os movimentos sociais emergem num contexto determinado, no qual há uma
dificuldade de apreender a esfera política (as dificuldades de se exprimir
através das instituições disponíveis, dos canais de representação tradicionais).
Ou seja, eles não exprimem uma rejeição à política, tampouco se dirigem
somente ao Estado. Eles têm projetos próprios, alternativos, expressam uma
tentativa de transformação da sociedade. Não demandam apenas uma
reorientação da política de Estado, uma intervenção, uma política pública,
eles tentam fazer política de outro modo, são portadores de concepções
distintas do que deve ser a política de Estado.
Partindo da contribuição de Tarrow,
• Define movimentos sociais como “contestações coletivas, baseada em
objetivos comuns e solidariedades sociais, numa interação prolongada com
elites, oponentes e autoridades” (Tarrow, 1994, p. 4), esses autores se
propõem a prolongar a problemática marxista do movimento social,
definindo-o como a “dinâmica própria de um grupo social portador de
reivindicações importantes, duráveis e conflituosas” (Béroud et al., 1998, p.
57). Distinguem movimento social de outras formas de expressão coletiva, que
não se excluem mutuamente, para sustentar que nem toda ação coletiva é um
movimento social.
Perspectiva marxista nos movimentos sociais
• A partir dessas considerações, pode-se afirmar que a
perspectiva marxista faz diferença (ou importa) na
análise dos movimentos sociais ao buscar a relação
entre ideologia e classe, entre política e economia.
Compreender o posicionamento de classe requer a
análise das condições materiais, do impacto da
ideologia dominante, da relação com as outras classes.
• A abordagem marxista também permite ao analista
se interrogar sobre a diversidade dos movimentos
e, ao mesmo tempo, buscar seus elementos
comuns. Ainda possibilita compreender os
movimentos de modo não linear, uma vez que a
conflituosidade é feita de avanços e retrocessos.
3. Os movimentos sociais na América Latina em questão
• Buscaremos refletir sobre algumas experiências
latinoamericanas recentes. Essa reflexão – que toma
por base a bibliografia disponível (nem toda ela
inspirada no marxismo, é bom que se diga) – leva em
conta os seguintes aspectos: a composição social, a
plataforma reivindicativa e a forma de atuação desses
movimentos.
Algumas questões e de algumas hipóteses
• 1) Que condições teriam possibilitado a constituição e a
ascensão desses movimentos? A hipótese presente na maior
parte da bibliografia sustenta que esses diferentes
movimentos, a despeito de sua heterogeneidade, constituem
uma resposta aos efeitos nefastos da política neoliberal que
vem sendo implantada, desde os anos 70 (se se leva em conta
a experiência do Chile) por diferentes governos da região.
• 2) Que tipo de relação esses movimentos estabelecem com a esfera política? Essa
questão contém em si mesma um suposto, qual seja, o de que esses movimentos
possuem uma dimensão política, dimensão essa que pode ser observada sob dois
ângulos: de um lado, porque se constituem em contraposição a instituições, projetos
e medidas políticas; de outro porque ao resistirem a essas instituições, projetos e
medidas produzem um impacto político de monta. Esse impacto político passa pela
criação de novas forças políticas; por sua posição – de oposição ou apoio – frente
aos governos; por sua relação com os partidos políticos e com os demais
movimentos sociais, como o sindical; pela luta por uma inserção institucional ou pela
recusa a ela.
• 3) Como definir esses movimentos? Esses movimentos caracterizam-se pela luta por
direitos econômicos, como acesso à terra, garantia de trabalho ou benefícios sociais; e
políticos, como o direito à participação política. Não se trata de lutar somente pelo
reconhecimento de identidades étnicas ou de “minorias”, pois as reivindicações vão além
dessas questões. Também não se trata de novos movimentos sociais stricto senso, não
apenas porque alguns desses movimentos não são tão novos assim17, mas porque também
não constituem necessariamente uma oposição ao movimento operário e sindical, mas se
associam a ele, de formas distintas. Além disso, ao contrário do que propugnam as teorias
sobre os novos movimentos sociais, é possível encontrar um caráter de classe nesses
movimentos, o que permite pensar sua unidade, a despeito de sua heterogeneidade.
3.1 A relação entre neoliberalismo e movimentos sociais
• As causas que se encontram na origem desses diversos movimentos
sociais são múltiplas, mas é possível encontrar, em todos eles, um
aspecto comum: eles constituem uma reação ao neoliberalismo,
muito embora a política neoliberal se apresente sob formas distintas
e tenha sido aplicada com intensidade variada nos países latino-
americanos. A Argentina talvez tenha sido o caso mais exemplar de
uma política neoliberal levada ao extremo, cujo colapso teve um
efeito devastador, dando origem à crise de 2001.
• Essa conjuntura deu origem a movimentos distintos, cuja unidade
pode ser encontrada no questionamento do neoliberalismo. São
movimentos que reagem ao desemprego, à precarização e à pobreza,
exprimindo o descontentamento com as falsas promessas do
neoliberalismo e com o slogan da modernidade: compreendem o
panelaço da classe média contra o corralito, os piquetes dos
desempregados, o movimento das fábricas recuperadas, as
assembléias de bairro (Chesnais, Divès, 2002; Palomino, 2006).
O impacto negativo do neoliberalismo
• O impacto negativo do neoliberalismo afetou, embora o tenha feito
de maneira diferente, não apenas a classe operária, mas também as
classes médias e até “grupos de burguesia dependente vinculados ao
mercado interno” (Quijano, 2004, p. 75), produzindo uma contínua e
crescente polarização social da população: “As três décadas de
neoliberalismo na América Latina criaram as condições, as
necessidades e os sujeitos sociais de um horizonte de conflitos sociais
e políticos” (Quijano, 2004, p.82).
Caso Boliviano - Neoliberalismo
• A relação entre neoliberalismo e movimentos sociais também é
evidente no caso boliviano: a Marcha Indígena pelo Território e a
Dignidade, de 1990, constitui uma reação às políticas de ajuste
estrutural que passaram a ser aplicadas em 1985 (com a eleição de
Victor Paz Estenssoro) e que se chocavam com as autonomias
departamentais, já que pretendiam restaurar a autoridade e a
unidade do Estado (Regalsky, 2007), e com as autonomias indígenas,
como a justiça comunitária.
Os exemplos= critica ao Neoliberalismo
• Esses exemplos indicam que esses movimentos exprimem
uma crítica ao neoliberalismo e, ao mesmo tempo, sinalizam
que as criticas e resistências à política neoliberal provocam
mudanças e adaptações no neoliberalismo, contribuindo para
deslegitimá-lo política e ideologicamente, bem como para
modificar o cenário político, como se verifica por meio da
eleição de partidos de centro-esquerda20.
3.2 A composição social dos movimentos e as formas de luta
• Esses movimentos possuem uma abrangência
social ampla, sendo possível apontar, em
alguns casos, a múltipla condição dos
mobilizados.
Exemplo
• No caso brasileiro, a composição social do MST inclui desempregados urbanos e
trabalhadores informais, bem como camponeses expulsos de suas terras. Com
efeito, a política neoliberal bloqueia as possibilidades de acomodar os ex-
camponeses e assalariados rurais nas cidades. Impossibilitados de encontrar um
emprego, mesmo que no setor informal, estes se juntam ao MST. O mesmo acontece
com os desempregados urbanos, ao verem negadas as oportunidades de se
reintegrar à empresa ou de serem “requalificados” e transferidos a uma outra
ocupação. Nesse sentido, as conseqüências das políticas neoliberais, no campo e nas
cidades, acabam fornecendo uma base social para a expansão do MST (Coletti,
2002).
• Esses movimentos, tão diversos em sua
composição social e em suas demandas,
também se diferenciam em termos de
correntes e tendências político-ideológicas,
bem como em suas formas de atuação.
• Os movimentos latino-americanos se originam ou se amplificam num contexto de
crise da democracia representativa, cuja expressão são os limites à participação
popular (decorrentes de sistemas políticos excludentes) e a degeneração de
instituições políticas tradicionais (partidos e sindicatos marcados pela corrupção,
por práticas autoritárias e pela incapacidade de representar as demandas sociais
que emergem nesse novo contexto histórico). Sua constituição desafia o espaço
institucionalizado da política tradicional, fazendo frente à crise de representação,
recusando a democracia delegativa e buscando novas formas de participação.
Essas formas de participação passam pela constituição de organismos sem
inserção no sistema político tradicional.
3.3 As reivindicações e suas implicações políticas
É possível afirmar que esses movimentos,
exprimem uma recusa às instituições políticas
tradicionais, recusa essa que passa pela
criação de novas forças políticas – ainda que a
relação com organizações já existentes não
esteja descartada.
• A presença marginal do movimento no governo e sua incapacidade de
alterar a agenda neoliberal levaram à deterioração e à ruptura da aliança,
após 7 meses. Embora tenha resistido a medidas governamentais, como o
aumento do preço do gás, “o movimento político Pachakutik é pego em
suas próprias contradições: deve questionar o sistema político desde
dentro, mas ao participar finalmente o legitima” (Dávalos, 2004, p. 190).
Isso evidencia os limites do potencial transformador dessa forma de
participação, que se dá com determinados aliados e numa determinada
conjuntura.
Conclusão
• Por fim, os conflitos sociais que conduziram a esses movimentos
podem ser lidos à luz do pertencimento de classe. Nesse sentido,
há uma articulação entre identidades étnicas e ocupacionais e
condição de classe. A despeito das diferentes classes e identidades
envolvidas, são movimentos de classes trabalhadoras
(consideradas aqui em sentido amplo, a fim de incluir as classes
médias e os camponeses), que têm em comum o fato de partilhar
uma ideologia antineoliberal.