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Publicação do curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva
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Àbórisá mojubá(respeito a quem cultua o orixá)
porque o rap se
tornou o foco do
movimento negro
| páginas 3 a 6
o neoliberalismo
da pec que apoia
a terceirização
| páginas 14 e 15
mulher & cerveja:
taí a verão que não
nos deixa mentir
| páginas 20 a 22
Pedro Munhoz
LINCE Jornal
laboratório
do Curso de
Jornalismo
do Centro
universitário
newton paiva
Nº 64 | Maio de 2015
da
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l o
liv
er
2 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Dezembro de 2014
Cor res pon dên Cia
NP4 - Rua Ca tumbi, 546
Bairro Cai çara - Belo Horizonte - MG
CEP 31230-600
Contato: (31) 3516.2734
sugestoeslince@hotmail.com
Este é um jor nal-la bo ra tó rio da
dis ci plina la bo ra tó rio de jorna lismo ii.
o jor nal não se res pon sa bi liza pela
emis são de con cei tos emi ti dos em ar ti-
gos as si na dos e per mite a re pro du ção
to tal ou par cial das ma té rias, desde
que ci ta das a fonte e o au tor.
SugEStõES DE pautaS?participE Do jornal lincE.
uma publicação feita pelos alunos do curso de jornalismo do centro universitário newton.
E-Mail: sugestoeslince@hotmail.com
ExpedienteOpiniãO
LINCEJornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton
A edição 64 do Lince chega com
boas reportagens investigativas. Uma
delas avalia a liberdade de religião em
BH, que é prevista por lei, mas sua
infração está, não só na boca do povo,
como no olhar e no ato de julgar. Isso
porque os seguidores de doutrinas
afrodescendentes reclamam (com
razão) que convivem com o precon-
ceito de adeptos de outras crenças. E
o Lince, como não poderia deixar de
ser, foi às ruas para acompanhar uma
manifestação contra o ódio religioso.
Ainda na questão do precon-
ceito, buscamos entender o incô-
modo que mulheres enfrentam por
beber, cada vez mais, socialmente. E
afinal, por que a maioria das publici-
dades de cervejarias são voltadas para
o público masculino?
Aqui, você também lê a reporta-
gem especial sobre a trajetória do rap
nacional, e sua grande influência a
favor do Movimento Negro. Um cen-
tro educacional do aglomerado da
Serra é movido pelo hip hop, e atua
na ocupação de jovens de periferia.
Vale a pena conferir ainda a entre-
vista com Zeca Perdigão, o mito
mineiro da moda. E fomos entender
um pouco mais sobre o esporte que
vem crescendo em BH e atraindo
novos praticantes: o Crossfit. No
papel, uma ótima forma de eliminar
calorias, mas, e na prática? Analise os
prós e contras.
Recomendo que reservem um
tempinho para ler todas as matérias e
possam curtir, assim como eu, mais
uma bela obra da Central de Produção
Jornalística da Newton Paiva. Bom
aprendizado!
presidente do Grupo spliCe
Antônio Roberto Beldi
reitor
João Paulo Beldi
ViCe-reitora
Juliana Salvador Ferreira de Mello
Coordenadora dos
Cursos de CoMuniCaÇÃo
Juliana Lopes Dias
Coordenador da
Central de
produÇÃo JornalistiCa - CpJ
Pro fes sor Eus tá quio Trin dade Netto
(DRT/MG 02146)
pro Jeto Grá fiCo e
direÇÃo de arte
Helô Costa
(Registro Profissional 127/MG)
Monitores
Fernando Oliveira e Roger Leon
reportaGens
Alu nos do Curso de Jornalismo
do Centro Universitário New ton Paiva
diaGraMaÇÃo
Kênia Cristina e Márcio Júnio
Estagiários do Curso de Jornalismo
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Qu
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Fernando oliveira
5º Período
O prazEr Em sEr
rEpórtEr
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 3
Fernando oliveira
5º Período
A manifestação artística de brincar
com as palavras surgiu na Jamaica, na
década de 1960, mas foi impulsionada
quando chegou aos guetos de Nova York,
no início dos anos de 1980, onde a repres-
são racista ainda indignava os moradores
dos bairros pobres. Eram jovens revolu-
cionários que se baseavam em ideias
liberais influenciadas pela busca por
Justiça, fortemente pregadas por ícones
afrodescendentes — de Martin Luther
King e Malcom X a Nelson Mandela. Foi
criada assim, uma forma de disseminar a
luta contra o sofrimento do negro ainda
enraizada no racismo, representada pelo
acrograma R-A-P: Rhythm and Poetry.
O estilo de vida motivado pela sinto-
nia contagiante entre ritmo e poesia foi
inicialmente fragmentado em quatro
elementos. O primeiro é o DJ, responsá-
vel pela produção do arranjo sonoro, as
batidas que transformam o ambiente. O
segundo é o MC, que é quem compõe a
revolta em forma de poesia. Outro com-
ponente é o ‘break’, quando, por meio da
dança, a manifestação corporal reflete o
envolvimento da periferia com o ritmo.
E por fim, o grafite, que dá vida às pare-
des cinzentas, e constitui a expressão do
Hip Hop em imagens.
Apesar de existirem comunidades
carentes em todas as partes do mundo,
um dos países que aderiram ao movi-
mento norte-americano com bastante
disciplina foi o Brasil. Uma nação aba-
lada pela desigualdade social e pela forte
interferência do Estado como empeci-
lho para o desenvolvimento da classe C.
O brasileiro, antes envolvido pelo ritmo
do funk, que dominava os bailes de peri-
feria dos anos de 1970, e pelas tradicio-
nais confraternizações proporcionadas
pelo samba, encontrou no rap uma
forma de proclamar sua indignação. O
Hip Hop foi abraçado como um movi-
mento que dá voz aos excluídos pela
sociedade, e ganhou força em todo o
país, principalmente em São Paulo.
Diversos grupos foram se desta-
cando no mercado musical, e as rádios,
percebendo a nova tendência, sempre
destinavam espaço em seus programas
para o Hip Hop. O fenômeno do rap
nacional tomou consistência ao longo da
década de 1990. No entanto, o esforço
dos rappers em gravar suas músicas —
mesmo sofrendo com a censura ou com a
inviabilização de recursos — a princípio,
não traria retorno financeiro adequado,
se comparado a outros estilos musicais.
O que empolgava era o sucesso na missão
de espalhar a informação. Ficar rico com
o rap era inimaginável.
rEvOLuçãO através
das paLavras“Se liga, Juca! Favela pede paz, lazer, cultura e inteligência. Não, muvuca” - Sabotage
cena urbana
daniel oliver
4 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
O “Lá na Favelinha” é um coletivo de
BH que tem o rap como princípio ativo, e
oferece a jovens do Aglomerado da Serra
a oportunidade de descobrir seus talen-
tos artísticos. O programa conta com ofi-
cinas de leitura, poesia, dança de rua, e
agora possui aula de inglês, aos sábados.
Mano-betto é um dos coordenadores do
projeto e afirma que falta informação ao
povo da periferia, fato que faz o rap se
tornar o principal instrumento a favor do
Movimento Negro.
— Aqui na comunidade, as pessoas
não têm acesso à cultura. Os principais
meios de comunicação acabam fazendo
com que os próprios moradores de perife-
ria desconheçam a cultura negra — ana-
lisa Mano-betto.
Ele aprofunda na questão ao reiterar
que “uma mulher negra quer alisar o
cabelo porque ela tem vergonha de ter o
cabelo duro; o menino está com vergonha
de sair de casa porque acha feio ter beiço e
nariz grande”.
— Só que aí vem o rap e os ensina a se
aceitarem do jeito que são, a reconhecer
as origens e saber como usar o talento
para fazer a diferença.
Mano-betto descobriu seu talento para
compor no “Lá na Favelinha”, se tornou
MC, e já está gravando um clip para alavan-
car seu trabalho como músico. Hoje, parti-
cipa de saraus, dá palestras, é oficineiro e
sempre está presente nas rodas de conver-
sas do projeto. Segundo Mano-betto, as
crianças que entram no programa com a
intenção de se tornar MC, acabam sendo
incentivadas a desenvolver a leitura.
— Quem quer fazer rap tem que falar
bem, e para falar bem, você tem que prati-
car a leitura — ensina.
“Então”, continua Mano-betto, “isso
força os meninos a buscarem informação.
E o intuito do Hip Hop é justamente esse:
trazer as crianças para um diálogo”
Em certo momento, ficou perceptí-
vel que o rap age diretamente no resgate
dos jovens de periferia que, só enxergam
o mercado de substâncias ilícitas como a
única saída para o sucesso. Sem estudo,
sem apoio, sem trabalho e muitas vezes
sem a referência da figura paterna, mas
que precisam se manter. A estudante de
Serviço Social e militante do Movi-
mento Negro, Júnia Morais, acusa o
poder público por não se manifestar
como deveria. Ela relata que o ingresso
de jovens de periferia na criminalidade
é responsabilidade do governo. Desta
forma, cabe aos MC’s o papel funda-
mental de prevenir o futuro desses garo-
tos que crescem nas favelas.
— Os rappers vivenciam situações
parecidas e tentam, através da música,
alertar esses jovens que nem sempre o
caminho mais fácil para se conseguir o
que se quer seria a melhor opção.
Segundo Júnia, o rap pode mudar
essa realidade. “Pode ser o preenchi-
mento desta lacuna que está vazia, por-
que, quando em contato com o rap, os
jovens se identificam, se reconhecem e
se apropriam do seu espaço”.
— O rap nacional é, em suma, de
cunho político-interventivo.
O estigma de “música de preto“ ou
“isso é coisa pra bandido ouvir”, reforçou
a marginalização do estilo. Até porque,
agradar a elite nunca foi sua intenção.
Muito pelo contrário, o rap era executado
para despertar o discernimento das pes-
soas em relação à vulnerabilidade socioe-
conômica. Como resultado, a oposição
preconceituosa contribuiu para acen-
tuar ainda mais a divergência entre o
público do Hip Hop e o Estado. “Há um
preconceito racial grave acerca de tais
comentários disseminados pela mídia”,
observa Júnia, lembrando que “o rap faz
denúncias sérias a respeito do genocídio
da juventude negra, violência policial,
precarização da educação pública, saúde
pública, dentre outros”.
Jovens enxergam novos rumos
“Aqui na favela ninguém tem a oportunidade de virar um cantor sertanejo ou um cantor de pop, aqui é o rap que te dá a oportunidade de colocar a cara na mídia e falar a sua verdade — sem hipocrisia — falar aquilo que você vive.” — Mano-betto
Centro Educativo Lá na Favelinha atua no resgate
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 5
no final da década de 1990, o ritmo e a
poesia dominavam as frequências radio-
fônicas nos barracos das regiões periféri-
cas. e representando a dificuldade do
negro pobre em sobreviver no Brasil,
rappers brasileiros se tornaram idolatra-
dos. diante da fama, alguns se enriquece-
ram, outros não. exemplo de quem não
teve a oportunidade de ser reconhecido
como deveria foi sabotage.
ele ficou eternizado no cenário
do rap nacional após ser assassinado
em janeiro de 2003 , no auge do
sucesso, vítima do envolvimento com
tráfico de drogas. denominado como
“Maestro do Canão”, levava como
lema de vida a sentença “rap é com-
promisso” e alertava em suas letras
sobre os perigos da relação minu-
ciosa que tinha com o tráfico.
“... os manos que foram ficou na
memória. por aqui, só fizeram guerra
a toda hora. acontecimentos vêm e
revelam: a vida do crime não é pra nin-
guém! nem enquanto houver desvan-
tagem. só ilude um personagem, é
uma viagem. a minha parte não vou
fazer pela metade...”
os racionais MC’s reconheciam o
rap como uma ferramenta de oposição
contra tudo que envolvia a interferên-
cia do estado. o principal grupo de
música negra do Brasil, no auge do
movimento, negava se render às gra-
vadoras ligadas à mídia e, em várias
oportunidades, recusou convites para
se apresentar em tV aberta. na letra
“racistas otários”, se percebe a
denúncia à negligência estatal contra
o pobre negro:
“...50 anos agora se completam da
lei antirracismo na Constituição. infa-
lível na teoria, inútil no dia a dia.
então, que se ferrem eles com sua
demagogia. no meu país, o precon-
ceito é eficaz. te cumprimentam na
frente e te dão um tiro por trás...”.
outro grupo que se destacou por se
radicalizar contra o sistema foi o fac-
ção Central. dentre vários pontos,
conseguia traduzir, de maneira ímpar,
o drama do povo periférico. Bem como
na música “Mulheres negras”, compo-
sição de eduardo com participação de
Yzalú, na qual afirma o quanto essas
mulheres são imperceptíveis nos espa-
ços midiáticos. ao se tratar de ter nas-
cido com a pele escura, lutar pelo femi-
nismo agrega algumas pelejas a mais
em prol da liberdade.
“...não fomos vencidas pela anula-
ção social. sobrevivemos à ausência na
novela, no comercial. o sistema pode
até me transformar em empregada,
mas não pode me fazer raciocinar como
criada. enquanto mulheres convencio-
nais lutam contra o machismo, as
n e g r a s d u e l a m p a r a v e n c e r o
machismo, o preconceito, o racismo.
lutam para reverter o processo de ani-
quilação que encarcera afrodescen-
dentes em cubículos na prisão...”
O impacto do rap no Brasil
o rapper Mano Brown na apresentação especial
de 25 anos dos racionais MC’s, em BH
Fernando oliveira
Outras camadas da sociedade
foram aceitando o movimento, e nos
anos 2000, se tornou comum ver
jovens brancos, de classe média alta,
moradores de bairro nobre, dirigindo
carro rebaixado com o som no último
volume tocando “Negro Drama”, dos
Racionais MC’s. Neste momento, até
os disseminadores do rap no Brasil
reconheceram que o movimento podia
ser abraçado por todos que lutam por
igualdade. E o Hip Hop engajado,
mesmo sendo um movimento de
minorias, explodiu em rede nacional.
O produtor musical e professor
de História, Jairo Mendes Versiani,
41, ressalta que, como qualquer
estilo, o rap acompanhou a transição
de gerações, e hoje se encontra disse-
minado em diversas camadas sociais.
Inclusive nas que não é direcionado.
— A globalização fez com que sur-
gissem novas pessoas interessadas em
movimentos de rua. No entanto, isso
não significa, necessariamente, que o
rap teve uma ascensão, mas demostra
que ele passa por uma nova fase. Hoje o
rap se tornou um estilo musical como
qualquer outro. Possui várias espécies,
ainda adota a resistência como princi-
pal mecanismo, mas que abre espaço
para outras opiniões.
Além dos grupos que faziam letras
compactuáveis com a cultura original
do manifesto, surgiram os que repre-
sentam em suas letras a realidade de
outras classes sociais. O que gerou o
questionamento em relação a mudança
de foco do movimento, que estaria per-
dendo sua essência.
— Essa nova safra do rap não sofre
tanto quanto antiga, mas também tem
o direito de se manifestar. Alguns falam
de álcool, drogas e mulheres; temos o
rap da ostentação; outros falam de
amor e fazem o ‘rap romântico’. Foram
vertentes que, querendo ou não, se
integraram e formaram a cena atual do
hip hop no Brasil — teoriza Versiani.
Em Belo Horizonte é comum encon-
trar grupos que incentivam os movimen-
tos artísticos de rua. Batalha da Pista, a
Rapa do Papa, a Batalha do Santê e a
Batalha da Estação são exemplos de ocu-
pação na cidade. Os Duelos de MC’s sem-
pre revelam novos talentos e também
atuam como estímulo para que os jovens
deem sua contribuição para o rap. Um
deles é João Paiva, rapper mineiro que vai
representar o Brasil em uma competição
de poesia na França, em junho. Em 2014,
ele foi campeão do SLAM-BR (o nome é
uma referência aos torneios de esportes
como o tênis — Grand Slam), competição
em que poetas campeões dos SLAM’s de
BH, São Paulo e Rio de Janeiro interpre-
tam composições autorais. João conquis-
tou a vaga para o SLAM mundial, que é
realizado uma vez por ano, em Paris, e
recebe representantes de 24 países.
“Esse momento que a cultura de rua
de BH está vivendo está muito bonito”,
acredita João, observando que “não só por
este patamar que atingimos, num nível
mundial, mas também por que a partir
desses movimentos, a gente percebe que
cada vez mais pessoas têm tomado consci-
ência de que a cidade é nossa, é do povo”.
— E nossa função é tomá-la para nós.
Temos que abraçá-la, ocupá-la e, quando
falo ocupar, é ocupar a rua mesmo, o pas-
seio, as praças, os viadutos, tudo. É literal-
mente tudo nosso!
Tendo o rap como principal artifício
para atrair jovens para mobilizações de
arte, João Paiva destaca a importância des-
sas atividades de rua como forma de cons-
cientização. Ele afirma que as ocupações
artísticas mostram para as pessoas que elas
não precisam esperar que o governo faça
algo de bom por elas — “elas podem fazer
por si mesmas e garantir que tudo seja do
nosso jeito e não do deles”, completa.
Certo é que, se o Estado não dá o
devido incentivo à periferia, as pessoas de
lá tomam a iniciativa e enfrentam a reali-
dade do seu jeito. Mostram para o mundo
que ali onde cresceram também existe
gente capaz de executar belas obras. O rap
é apenas uma delas. Afinal, a flor de lótus
nasce no pântano.
Nova realidade do rap
Das ruas de BH
para o mundoarQuivo “lá na Favelinha”
6 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 7
sE fICar, O CarrO pEga;sE COrrEr, pEga tambémSemáforos de BH causam problemas. A disputa entre motoristas e pedestres mais se parece com um verdadeiro ringue
YCaro rodarte e elias Costa
3º Período
Cada vez mais, o cidadão que vive nas
grandes cidades brasileiras se sente como
um “estranho no ninho”. As cidades, dia
após dia, se mostram como um espaço pla-
nejado apenas para os automóveis. E cada
vez menos para os humanos. Em alguns
casos, o simples ato de atravessar uma rua
se torna um problema tão grande, que
ganha contornos quase surreais. Exemplo
disso é o que acontece na Avenida Carlos
Luz, no bairro Caiçara, região Noroeste de
Belo Horizonte, na altura do número 800.
O local é ponto de travessia de estu-
dantes de dois grandes estabelecimen-
tos de ensino e há um sinal de trânsito
programado com tempo de aproximada-
mente... 13 segundos! Isso tem provo-
cado dores de cabeça nos pais de alunos
do Colégio Franciscano Sagrada Família
e nos estudantes do Centro Universitá-
rio Newton Paiva, que convivem diaria-
mente com o perigo.
QUeBra-Molas
“A empresa responsável pelo trân-
sito não pode fazer a alteração de um só
sinal devido ao sincronismo que existe
entre os demais sinais instalados ao
longo da via”, é o que explica o diretor do
Colégio Sagrada Família, Ilton de Oli-
veira, 48. Ele ainda conta que já foram
entregues três ofícios à BHTrans solici-
tando melhorias no local. Um deles é
justamente o pedido para aumentar a
duração do tempo do semáforo aberto.
Outro problema exposto foi o fato de a
escola receber alunos a partir de dois anos
de idade e também alunos do CEAME
(Centro de Estudos e Atividades para
Melhor Idade), esses com idade entre 80 e
90 anos. Os idosos são obrigados a fazer um
esforço além da capacidade para alcançar
o outro lado da movimentada avenida. Há
dificuldade até nos desembarques em
frente ao prédio da escola por não haver
sinalização, permitindo parada para
embarque e desembarque de pessoas.
Como se não bastasse, alguns moto-
ristas também não respeitam o sinal ama-
relo. Não são poucos os que aceleram
ainda mais para avançar antes que acenda
o sinal vermelho. Para o diretor do colégio,
a saída mais viável, no momento, seria
construir uma elevação (o popular que-
bra-molas) na faixa de pedestres, a fim de
obrigar os motoristas a reduzirem a acele-
ração dos carros. Até agora, nenhuma
providência foi sequer cogitada.
trânsito
daniel oliver
8 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
SEM TRANQUILIDADE
A assessoria de comunicação da
BHTRANS informou que a empresa está
avaliando o local para possível implanta-
ção de Traffic Calming, método empre-
gado em alguns países da Europa, como a
Alemanha e Holanda. Nada mais é do que
uma política para a redução da velocidade
dos veículos em áreas edificadas, tendo
em vista a redução do impacto ambiental
produzido por esses automóveis. Prevê
também a criação de ciclovias.
Teoricamente, a inserção do projeto
tende a garantir a tranquilidade para a
população e os demais circulantes. Ape-
sar de nem ter data prevista para o início
das atividades no local, os alunos veem a
promessa como um avanço. Estudante do
curso de secretariado da Newton, Luíza
Vieira, 19, acredita que “diante dos pro-
blemas e reclamações existentes nesse
ponto, sem dúvida alguma a criação vai
oferecer bem-estar e conforto para todos”.
Mas Mauro César Rodrigues, 38, que tra-
balhou de garçom durante 15 anos em um
bar das proximidades, prefere dar uma de
São Tomé. “Tem 15 anos que eles estão
prometendo dar um jeito nisso e até
hoje... Nada”, duvida.
Sobre os acidentes no curso da ave-
nida, os boletins de ocorrência são feitos
no 34º Batalhão de Polícia Militar/1
RPM e direcionados para o Batalhão de
Polícia de Trânsito (BPtran) situado na
Avenida Amazonas no bairro Gameleira,
que faz o monitoramento na região.
Todos os dados com o balanço final de
envolv idos são repassados para o
Estado, com as informações de vítimas
fatais ou não fatais.
O problema não é de hoje e já houve
vários atropelamentos no local. A ave-
nida possui um canteiro central
pequeno, que é insuficiente para a quan-
tidade de pessoas que precisam fazer a
travessia. Amanda Cordeiro da Silva,
23, é recepcionista de uma concessioná-
ria de automóveis próxima ao semáforo
e conta como é difícil chegar do outro
lado sem ter que apressar os passos. “O
tempo é insuficiente, quando você está
no meio da avenida, o sinal do outro lado
da rua já fechou”, conta.
Pior ainda para os alunos de uma
escola infantil localizada no mesmo
quarteirão, que não podem atravessar
sozinhos e são obrigados a aguardar a
vez em cima da pequena calçada cen-
tral. “O canteiro fica cheio de crianças, é
um perigo; as professoras passam
aperto danado para atravessar todas as
crianças em segurança”, afirma
Amanda.
Desde que assumiu a direção da
escola, Ilton de Oliveira afirma não ter
ciência de acidentes envolvendo os alu-
nos. Isso, no entanto, não tranquiliza os
responsáveis pelas crianças. Alina
Mariani de Souza vem buscar a sobri-
nha e conta que os riscos são muitos,
“pois as crianças são imprevisíveis e
qualquer descuido pode se transformar
em uma tragédia”. A recomendação
feita pelos colaboradores do colégio é de
sempre manter a calma e não ter pressa
na hora de atravessar a rua, além de
dividir os estudantes em pequenos gru-
pos para que se tenha o mínimo de segu-
rança possível.
EM AVALIAÇÃO...
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 9
Pedro MUnHoz
3º Período
No dia 15 de abril, uma quarta feira
ensolarada, homens, mulheres, idosos e
crianças se paramentaram de branco e
seguiram para a Praça da Liberdade, na
Zona Centro-Sul da capital mineira, para
lutar por um direito que, curiosamente,
já lhes é garantido pela Constituição: o de
exercer livremente sua religião.
A Praça, que já havia sediado, dias
antes, um protesto de natureza política,
parece, no entanto, não guardar a mesma
quantidade de liberdade para todos os
manifestantes que desejam fazer uso
dela. Enquanto na primeira manifesta-
ção, a de natureza política, notou-se a
presença de carros de som, a esta, bem
menor, foi negado pela prefeitura o
direito ao uso de som mecânico. “Acaba-
ram de dizer que não pode usar o som”,
explicou Makota Celinha, presidente do
Centro Nacional de Africanidade e Resis-
tência Afro-Brasileira (CENARAB),
enquanto, ainda sem seus paramentos,
esmerava-se em montar o evento, junto
com cerca de vinte pessoas, a apenas
meia hora do começo estipulado para a
realização.
Makota explicou que, para que o uso
de som fosse permitido, era necessário
que o evento fosse classificado como
manifestação e, ao que parece, aquele
movimento não se qualificava para a pre-
feitura como tal, mas como um “ato”.
A organizadora do protesto (ou ato),
ainda relatou que teve dificuldades para
licenciar o evento que teria lugar na
Praça. A prefeitura havia, segundo
Makota, declarado que “a Praça da Liber-
dade já estava reservada para o uso do
Exército Brasileiro”. Porém, vencida a
questão do exército que, por algum
motivo, desistiu de ocupar a praça, o local
foi, rapidamente, decorado com belas
flores, vasos, tambores e esteiras no chão.
A ideia, segundo a presidente do CENA-
RAB, era “ocupar a Praça com beleza,
para afastar a feiura do preconceito”.
QUeM Fala Mais alto?
O motivo do ato, que enfeitou a
Liberdade de flores e levou até um dos
cartões postais de Belo Horizonte o som
de cânticos e o rufar de tambores, é que,
no caso do Brasil, a voz do preconceito,
muitas vezes, fala mais alto do que a das
leis. Membros de religiões relativamente
pequenas e muito estigmatizadas, os
candomblecistas, umbandistas e segui-
dores das religiões de matriz africana
como um todo, embora tenham sua liber-
dade de culto garantida pelas leis, são
cotidianamente obrigados a conviver
com os olhares enviesados, com a pecha
de satanistas ou de feiticeiros e, até
mesmo, com ataques brutais aos seus
locais de culto por parte de seguidores de
outras crenças.
A reportagem d’O Lince acompa-
nhou o ato promovido em Belo Hori-
zonte, que tinha por objetivo contribuir
para a difusão da cultura do Candomblé e
entregar ao Ministério Público Federal
uma carta que pede a investigação dos
O CaNdOmbLéCONtra O ódIO
Em ato pacífico, praticantes do Candomblé lutam contra o preconceito e pedem por liberdade e respeito. Mas por que?
Religião
10 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
“Gladiadores do Altar”, grupo ligado à
seita Igreja Universal do Reino de Deus,
que adota ritualística próxima do milita-
rismo e que, na visão dos membros das
religiões de matriz africana, pode consti-
tuir séria ameaça ao estado laico e à liber-
dade religiosa.
A Igreja Universal do Reino de Deus,
aliás, é vista por boa parte dos entrevista-
dos como uma das principais difusoras
do ódio contra as religiões de matriz afri-
cana no Brasil. Desde que o “bispo” Edir
Macedo, ainda em 1997, publicou o livro
Orixás, Caboclos e Guias, deuses ou
demônios?, em que considerava as enti-
dades cultuadas por Candomblé e
Umbanda como demoníacas, a religião
tem atacado em seus programas televisi-
vos e jornais impressos a religiosidade de
matriz africana incansavelmente, contri-
buindo para reforçar os estigmas negati-
vos que sempre acompanharam os Povos
de Santo no Brasil.
deleGaCia de CostUMes
De fato, segundo Márcio Tata
Kamus’ende, presidente do Afoxé Ban-
darerê e seguidor do Candomblé desde
a infância, a história do preconceito
contra a sua religião é antiga. “Até 1988,
quando mudou a Constituição, nossa
Casa era obrigada a levar livro de atas
na Delegacia de Costumes, do mesmo
jeito que prostíbulos e casas de jogo de
azar”, relembrou.
Toda a história do Brasil parece ser
marcada por uma perseguição sem tré-
guas à religiosidade dos Povos de Santo.
No período colonial, a lei punia com
castigos corporais as pessoas que se
recusassem a seguir a religião católica e
uma parte considerável dos acusados
de feitiçaria pela Inquisição Portu-
guesa no Brasil estava, na verdade,
realizando rituais de origem africana
ou indígena. Durante o Impér io,
quando a religião oficial do Brasil ainda
era o catolicismo, os africanos ou brasi-
leiros escravizados eram, por decreto,
obrigados a seguirem os dogmas da
Igreja Católica.
Quando, finalmente, o país deixou
de ter uma religião oficial, passando a se
considerar como laico, crimes como os
de charlatanismo e curandeirismo conti-
nuaram a ser usados pelas polícias para
discriminar as religiões de matriz afri-
cana. No entanto, a polícia faz vista
grossa para as promessas de exorcismos e
de banhos de descarregos praticados a
torto e a direito pelas neopentecostais.
Agora, depois de garantida pela lei a
liberdade de culto, os praticantes do Can-
domblé passaram a ter que enfrentar os
ataques cada vez mais virulentos de
membros de religiões neopentecostais,
projetos de lei que, na prática, vão limitar
a liberdade religiosa e os fantasmas da
incompreensão quanto às crenças e ritos
inerentes à sua religiosidade.
ESTADO LAICO?Em abril de 2014, após o Ministério Público
Federal entrar com uma ação pedindo a reti-
rada de vídeos da internet, a maior parte deles
ligados à Igreja Universal do Reino de Deus,
em que se desferiam ataques contra a religio-
sidade de matriz africana, o Juiz Eugênio
Rosa, da 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro,
proferiu uma sentença, no mínimo, polêmica.
Rosa, para negar que os vídeos atentassem
contra a liberdade religiosa, dando ganho de
causa à IURD, simplesmente declarou que os
cultos afro-brasileiros não podem ser conside-
rados religiões.
O juiz, para sustentar sua afirmativa, ale-
gou que faltariam aos “cultos”, os traços
necessários para uma religião que, segundo o
juiz, seriam “um texto-base (corão, bíblia,
etc.), ausência de estrutura hierárquica e
ausência de um Deus a ser venerado”. A sen-
tença, da qual se retratou o juiz no mês
seguinte, ilustra com bastante pertinência a
preocupação de muitos dos praticantes do
Candomblé entrevistados. Parece haver, no
Brasil, para a maioria deles, um secularismo
pela metade que protege o cristianismo, em
suas diferentes vertentes, mais do que religi-
ões como o Candomblé e a Umbanda.
Fotos daniel oliver
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 11
12 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
O advogado e sacerdote do culto Omo-
lokô, Fernando de Paula Cortese Filho,
entrevistado em seu escritório, externa
essa preocupação: “Se você quiser fazer
um culto, hoje, na Praça Sete, você vai
sofrer perseguição, enquanto os evangéli-
cos chegam lá com a Bíblia, levam o micro-
fone e fazem o culto deles livremente. Essa
é liberdade plena, mas não é plena para a
gente”, afirmou Cortese, como vários
outros entrevistados. O também advogado
Paulo Afonso Moreira reforça a diferença
de tratamento que o estado confere às reli-
giões de matriz africana e às derivadas do
cristianismo: “O Estado quer que exerça-
mos nosso culto, mas não quer que toque-
mos nosso candomblé, não querem que
sacrifiquemos nossos animais... que liber-
dade de culto é essa?”.
A controversa questão do sacrifício de
animais, praticado no Candomblé, que
tem sido alvo de reiteradas tentativas de
proibição tanto por parte de parlamenta-
res ligadas às igrejas neopentecostais
quanto da parte de defensores da causa
animal, também interfere, segundo os
entrevistados, na liberdade religiosa.
Márcio Tata Kamus’ende observa
que, por vezes, as pessoas ficam reclusas
por quinze ou vinte dias no terreiro e que
os animais sacrificados são, todos eles
utilizados para a alimentação. “Se eu
mato um cabrito e alguns frangos pra
essas pessoas poderem comer, sou eu que
sou ruim? A JBS, dona da Friboi, mata
milhares de bois por dia e não é problema.
O peru de natal morre por causa de uma
festa religiosa e não é problema. E o meu
bode, o frango que eu mato para dar de
comer ao pessoal é problema?”, desabafa.
Essa diferença de tratamento atribu-
ído às diferentes religiões, segundo afir-
maram, unanimemente, os entrevista-
dos pode ser atribuída, além de à igno-
rância sobre os preceitos do Candomblé,
também ao racismo. Paulo Moreira
observa que não é apenas o Candomblé
que é alvo de preconceito no Brasil, mas a
música negra, a capoeira, os trajes, os
tambores. “Tudo que se relaciona à ques-
tão do negro no Brasil é uma verdadeira
luta. Matamos não um, mas cinco leões
por dia. É claro que esse preconceito tem
relação com o racismo.”
QUE LIBERDADE É ESSA?
Fernando Cortese, no mesmo sentido, afirma que
nossa sociedade ainda tem imensa dificuldade para
respeitar qualquer manifestação, seja religiosa, cultu-
ral ou acadêmica, que venha do negro: “vivemos em um
país de maioria negra, com grande influência africana
e quase nada se discute a esse respeito nas escolas e nas
faculdades”, observa.
A caracterização do Brasil como estado laico que, signi-
fica, em suma, não adotar religião oficial para que se possa
defender a liberdade de exercício e igualdade de condições
entre todas elas, parece esbarrar, ainda hoje, nas desigual-
dades históricas que forjaram a história do país.
Uma boa solução para o preconceito religioso parece
ser a lapidar observação de Donné Sandra de Vodun Djó:
“Tudo que passa pelo sagrado e que respeite o ser humano
é bom, e a melhor religião do mundo é aquela em que a
pessoa se sente bem nela. Ninguém tem o direito de agre-
dir a religião de ninguém, e quando eu vejo evangélico
agredir outro religioso, eu vejo o Cristo dele sendo crucifi-
cado novamente”. Parece simples, não?
DESIGUALDADES HISTÓRICAS
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 13
RELIGIÃO ECOLÓGICA
O Candomblé deriva dos cultos ani-
mistas africanos e se transformou em uma
religião unificada devido ao fato de os
africanos escravizados de diferentes ori-
gens que aqui aportaram terem, constan-
temente, convivido e trocado experiências
entre si. Segundo Flávio de Oxalá, estu-
dioso e adepto do Candomblé, original-
mente, cada cidade ou nação africana
cultuava um orixá diferente. Apenas no
Brasil, com a mistura entre pessoas oriun-
das de diferentes culturas nas senzalas,
reuniu-se, no mesmo panteão, o culto a
diferentes orixás, voduns ou nkisis, pala-
vras diferentes que designam as entidades
responsáveis por forças da natureza, todas
elas cultuadas pela religião.
Flávio faz, ainda, questão de diferenciar
o Candomblé da macumba. A palavra
macumba, segundo o estudioso, pode signifi-
car tanto uma árvore africana, como um
instrumento musical feito da madeira dessa
árvore, não sendo termo apropriado para
designar religião alguma. O termo, no
entanto, tem sido utilizado, de forma pejora-
tiva, para desqualificar tanto o Candomblé
quanto a Umbanda.
“Candomblé é a preservação da vida
em toda a sua plenitude, tanto dos vege-
tais das águas... tudo, tudo, tudo é
sagrado.”, afirma Doné Sandra de
Vodun Djó, uma senhora negra, de cerca
de 70 anos de idade, que desmente,
ainda, a concepção de que o Candomblé
seja, essencialmente, uma religião poli-
teísta: “Deus para nós é um só, mas cul-
tuamos a essência da natureza”. Flávio
de Oxalá, que estava ao lado de Sandra,
completa: “Cada orixá representa um
elemento da natureza. Cultuamos a
água doce, a água salgada, o fogo, o tro-
vão, o ferro, toda a natureza, que é o que
nos mantém vivos. Mas o Deus, o cria-
dor, é um só”.
Ainda segundo Doné Sandra, o sin-
cretismo religioso, manifestado pelo fato
de diversos orixás serem representados,
no Brasil, pelas imagens de santos católi-
cos, não se deve apenas à perseguição
sofrida pelos escravos e pela tentativa de
camuflar sua religiosidade: “Eles joga-
vam os búzios e descobriram que, em
vida, Santo Antônio era regido por Ogum,
que Santa Bárbara era regida por Iansã.
Eles viram que Nossa Senhora era filha
de Oxum e pode-se dizer, também, que o
anjo da guarda de Maria era Oxum. E
assim se fez o sincretismo”.
ENTENDA O CANDOMBLÉ
Extraordinariamente rico, o panteão
do Candomblé contempla mais de 600
orixás. A proximidade da religião com os
fenômenos naturais faz dela, segundo o
advogado e axogun Paulo Afonso Moreira,
70, “uma religião ecológica”. De acordo
com Paulo, inclusive, todo o preconceito
que existe contra a sua religião advém,
justamente, da ignorância a seu respeito.
“Se as pessoas conhecerem o Candomblé
do jeito que ele é, sem distorcer, o precon-
ceito acaba”, sentencia.
O Xikaringoma (cantor ritual do
Candomblé) Márcio Kamus’ende parece
concordar que a principal maneira de
combater o preconceito é por meio da
educação. “No final do ano, todo mundo
de cara cheia, dá três pulinhos na onda lá.
Não sabe porque, mas dá. Joga lá uma
rosinha, sem saber porque, mas joga... é
moda, é bonito, mas tem pouca informa-
ção. Isso tinha que ir para as escolas, para
as universidades, de forma qualificada.”
Márcio alega que só recentemente o Bra-
sil passou a ter, por meio das cotas raciais,
estudiosos negros que conhecessem,
mais de perto, a cultura afro-brasileira,
havendo, ainda, poucos professores capa-
zes de ensinar aos jovens algo sobre o
Candomblé.
De acordo, porém, com Dona
Ivone, 76, católica, que passava pela
praça ao sair do cinema com uma
amiga e se fascinou pelo evento, o ato
que estava em curso, seria, já, uma
abertura para que o preconceito con-
tra o Candomblé começasse a ser
debelado. Segundo ela, aquela era
uma boa oportunidade para as pes-
soas conhecerem a religião e “abrirem
um pouco a cabeça”. Durante a entre-
vista, no entanto, uma jovem que
passava por perto do coreto, olhou
para o evento com cara fechada e fez o
sinal da cruz.
14 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
economia
tErCEIrIzar Ou NãO:
EIs a quEstãO? Projeto segue rumo ao Senado para nova discussão, gerando mais conflitos entre a classe trabalhista e empregadores
eUriCo de soUza
3º Período
Uma queda de braço como há muito
não se via. A discussão que envolve o Pro-
jeto de Lei 4330, que praticamente libera
os processos de terceirização no Brasil,
repudiado pelas esquerdas e pela classe
trabalhadora, redesenha, mais uma vez a
nova face da direita, num debate cheio de
marchas e contramarchas. De um lado, os
sindicalistas, que temem o fim dos direitos
trabalhistas, achatamentos de trabalho e
demissões em massa. Do outro, empresas
com discurso de que a terceirização traria
mais competitividade e novas vagas no
mercado. E em meio a isso tudo, muita
gente perdida, sem saber o que representa
o Projeto de Lei.
Terceirização é quando o trabalha-
dor deixa de ter contato direto com o
empregador/tomador de serviços e
passa a servir a prestadora de serviços
que vai ter contato direto com a empresa
responsável, tendo essas três partes. O
principal objetivo do PL 4330 é regula-
mentar esse processo. Na Legislação
atual, não há nenhuma lei direta sobre a
terceirização, sendo administrada pelo
Tribunal Superior do Trabalho, com a
súmula 331, de 2003, que diz que a ter-
ceirização só é possível para as ativida-
des que não correspondem à atividade-
-fim, ou seja, o produto final da empresa.
A principal polêmica da nova pro-
posta envolve exatamente a atividade-
-fim, pois pede que, mesmo nos setores
de objetivo final de uma empresa, seja
possível a terceirização. Na votação pela
Câmara dos Deputados, o destaque fica
por conta da aprovação da emenda que
impede a terceirização nos órgãos públi-
cos. De acordo com a advogada especia-
lista em direito trabalhistas, Amanda
Azeredo, é preciso esperar, para ver
quais mudanças vão realmente aconte-
cer na prática.
— O projeto ainda vai passar pelo
Senado e pode ser que haja emendas,
sem falar que ainda tem que passar pela
Presidente Dilma Rousseff, que poderá
vetar ou aprová-lo.
A existência de uma lei específica
para a terceirização é um ponto defen-
dido pelos simpatizantes do projeto. A
regra, para os simpatizantes, traria mais
estabilidade e segurança jurídica para
trabalhadores e empregadores. No
entanto, a possível aprovação da tercei-
rização traria o risco de redução na
remuneração dos trabalhadores, uma
vez que um estudo realizado pela Cen-
tral única dos Trabalhadores (CUT), em
parceira com o Departamento Intersin-
dical de Estatística e Estudos Socioeco-
nômicos (DIEESE), em 2014, apontou
que o trabalhador terceirizado receberia
cerca de 25% a menos pelo mesmo ser-
viço prestado.
Se a direita tem seus trunfos, os críti-
cos do PL 4330 já pontuam alguns de
seus pontos negativos. A terceirização vai
degradar as relações de trabalho, uma
vez que não existirão problemas de falta
por adoecimento do trabalhador, atrasos
e dificuldades para o cumprimento do
contrato de trabalho. Sem falar no esfa-
celamento da organização sindical e
achatamento salarial. O PL 4330 estabe-
lece que somente quando a terceirização
for entre empresas da mesma categoria
econômica é que seria assegurada a
mesma representação sindical. Isso rara-
mente acontece, uma vez que a empresa
contratada para prestação de serviços é
de outro setor econômico, prejudicando
assim a organização da categoria. Com
isso, os Acordos Coletivos e Convenções
Coletivas estão ameaçadas.
Pontuando ainda, o estímulo à pejo-
tização, o projeto de lei legaliza e amplia
a figura dos PJs, que são empresas de
uma pessoa só. A modalidade de relação
será estimulada porque o ônus ficará
apenas para o trabalhador, que não terá
direito a adoecer, tirar férias, faltar ao
trabalho, ter FGTS. E o INSS terá que
ser incluído no custo de sua empresa,
caso ele queira pagar.
De acordo com o professor Ramon
Peres, mestre em administração de empre-
sas e especialista em planejamento estraté-
gico e gestão de pessoas, “o argumento de
que o PL 4330 irá salvar a economia é balela,
falácia de empresários que visam o aumento
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 15
de seus lucros”. Peres divide a ideia que os
lucros gerados pela precarização do traba-
lho não serão investidos em prol da socie-
dade, mas sim em função de aumentar as
riquezas de quem os conseguiu. “A visão do
empresário é de maximizar lucros e acho
que ele não está errado, não, mas é preciso
lembrar que o que as empresas têm de mais
importante são as pessoas, seus funcioná-
rios, que não têm sido valorizados e tratados
com carinho pelas organizações”. Isso se
comprava pelo aumento do número de tra-
balhadores que estão com problemas psico-
lógicos (depressão e estresse) gerados no
trabalho, afirmou o professor.
Na opinião do estudante de ciências
sociais, Tales Augusto, a terceirização
acarreta em grande proporção, a precari-
zação do trabalho e das condições do tra-
balhador. Para ele, a terceirização é
herança do neoliberalismo econômico,
que nos anos 1980, precisava de leis traba-
lhistas flexíveis para controlar a força de
trabalho. Assim, sindicatos enfraquecidos
e a mão de obra fragmentada faziam com
que as reivindicações dos trabalhadores
fossem dificultadas, se tornando muito
complicada a união pela luta por melhores
direitos. “A terceirização só beneficia o
empregador”, finaliza o estudante.
A estudante de jornalismo, Kelly
Cristina Santos, também não concorda
com a aprovação desta lei, pois acredita
que o PL 4330 livra as empresas de mui-
tas responsabilidades que ela deve ter
para com o trabalhador.
— Prejudica muito, e traz como prin-
cipal consequência a instabilidade no
emprego. Com uma lei mais flexível, pode
ser que haja maiores índices de acidente.
O professor Ramon Peres lista algu-
mas das principais consequências. “Pri-
meiro, aumentará a precarização do
trabalho, dos salários e dos direitos dos
trabalhadores; os terceirizados ganham
em média 24% menos e têm jornadas
pelo menos três horas semanais a mais.
Sem falar que não recebem participação
nos lucros e valores ínfimos referentes a
tíquetes refeição e raramente recebem
auxílio-alimentação”.
Aumento dos acidentes, adoecimen-
tos e mortes no trabalho são outro item
forte na pauta dos detratores do PLK
4330, segundo o advogado trabalhista
Maxuel Nascimento da Silva, “pois as as
empresas, na perspectiva de reduzir cus-
tos, vão gastar muito menos em treina-
mentos, formação e equipamentos de
segurança no trabalho, além de aplica-
rem maior intensidade no trabalho, com
jornadas mais longas e extenuantes”.
Segundo Nascimento, as estatísticas
mostram que em cada dez acidentes com
vítimas fatais de trabalho no Brasil, oito
são trabalhadores terceirizados.
Maior rotatividade de pessoal,
queda na arrecadação do Estado com
impostos e encargos sociais, comprome-
tendo aposentadorias, pensões e licen-
ças saúde seriam outros pontos negati-
vos. A advogada Helenice Vieira não
acredita na queda na qualidade dos
produtos ou prestação dos serviços,
mesmo quando questionada sobre o fato
de o trabalhador terceirizado não ter
identificação com a cultura da organiza-
ção, pois não faz parte dela e está ali
somente para desempenhar uma fun-
ção sem perspectivas de promoção.
“Tudo depende de uma boa conversa
entre patrões e empregados”, acredita.
O Projeto, já aprovado na Câmara dos
Deputados, agora segue para o Senado.
16 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
“a mOda é OfIO CONdutOr dE tudO”
A roupa mais democrática que existe é o jeans!
Não ter preconceito, isso é feio ou aquilo é bonito. Tudo vale da personalidade
pessoal. Não precisa ter rótulo.
É importante você aprender a
conhecer as pessoas através
da imagem e não julgá-las.
entrevista
Fernando Bezerra e BrUnna alves
3º Período/ 5º Período
Paris, Milão e Nova York são capitais que se tornaram
referências no mundo da moda. Ditam tendências que
influenciam os estilistas brasileiros, mais precisamente em
São Paulo e Rio de Janeiro, onde são realizados os principais
desfiles do país — São Paulo Fashion Week e Rio Fashion
Week. No entanto, o cenário da moda em Minas Gerais
também tem ganhado força. E pode-se atribuir parte dessa
ascensão a Zeca Perdigão, um dos percussores da moda
mineira.
Desde os doze anos de idade, Zeca já brincava de desenhar
roupas para as mulheres que admirava. Seus pais eram donos
da loja de tecidos mais bem conceituada da cidade, a “Casa
Rolla”, que tinha várias outras lojas da marca espalhadas pela
cidade. Com o passar do tempo, foi tomando gosto pela moda,
e, o que começou como brincadeira, se tornou um trabalho
sério e reconhecido. Hoje é um dos produtores de moda mais
importantes do Brasil; participou de todas as sete marcas do
Grupo Mineiro de Moda e produziu mais de duzentos desfiles.
Zeca Perdigão falou à reportagem d’O Lince:
“
“
Fotos: Fernando bezerra
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 17
linCe - De que forma a personalidade
influencia no estilo pessoal de se vestir?
zeCa - Olha, eu acho que o fundamental
é ter personalidade pra você se destacar. A
moda é um instrumento. Não tem essa histó-
ria de a pessoa estar bem vestida, mal vestida,
ser jeca, ser cafona. Cada um tem sua tribo,
escolhe a melhor maneira de se vestir. Não
tem como dar conselho sobre moda; a moda
é um conjunto de fatores. Envolve o cinema,
a cultura, o teatro, a literatura, a curiosidade
das pessoas. É não ter preconceito, isso é feio
ou aquilo é bonito. Tudo vale da personali-
dade pessoal. Não precisa ter rótulo.
linCe – O importante é se sentir bem...
zeCa – Claro. A pessoa deve se vestir de
maneira que ela se sinta bem. Agora, a moda
é um instrumento pra você conseguir várias
coisas na sua vida, pois nosso primeiro con-
tato, uns com os outros, é visual. Se ela é da
minha tribo ou se eu vou fazer de tudo pra
entrar na tribo dela. É importante você
aprender a conhecer as pessoas através da
imagem e não julgá-las. É aprender com
aquilo. Eu acho o ser humano divertido e a
moda divertida. A personalidade e a moda
são duas coisas que devem andar juntas, não
importa como sejam.
linCe - É possível aliar o conforto ao bom
gosto?
zeCa- Eu acho que sim, porque você
deve estar vestido adequadamente ao
ambiente em que você se encontra. A forma
que você vai arrumar o cabelo, você tem que
estar bem maquiada... Não que eu me
importe com isso. Mas não se deve julgar as
pessoas. “Ah, você é baranga, você não está
bem vestida” ... Não é por ai. Você tem que se
adequar ao momento em que se encontra.
Isso é que é correto.
linCe - E de forma econômica, dá pra
andar na moda?
zeCa: Sim, pois a roupa mais democrá-
tica que existe é o jeans. A Forever por exem-
plo, vende jeans a R$ 39 e tem jeans a R$ 700.
Então, quer dizer, é uma roupa democrática.
Uma chuck branca e uma calça jeans, se ela
for correta, limpinha, bacana, ótimo! Um
chinelo de dedo, uma sandália havaiana...
Eu não consigo imaginar uma pessoa perto
da praia que não esteja de sandália havaiana.
Claro, eu não vou usar pra sair, mas todo
mundo usa. Há, sim, um jeito de andar na
moda de maneira muito econômica. Você
usar uma bermuda, uma calça jeans, chega
ser até um chame.
linCe - Muitos de nossos estudantes
aliaram a moda com o humor pra se vestir.
Você concorda com isso?
zeCa- Adoro! Eu acho que tem que ser
engraçado. Eu adoro gente divertida. Tem
pessoas que eu vejo com uma camiseta ou
uma regata com mensagens bacanas. Eu sou
um palhaço, eu sou uma personagem tam-
bém! Procuro uma personagem todo dia; eu
me canso com minha figura. Eu gosto disso,
de brincar com a moda, de criar uma perso-
nagem, de ser engraçado, leve. Adoro isso,
adoro uma pessoa divertida!
linCe – Você teria algum conselho para
as pessoas que ainda não definiram o estilo
próprio?
zeCa - Eu acho que é assim, gosto todo
mundo tem. Bom gosto é o que poucos têm.
Gosto é indiscutível. Bom gosto, não. Então,
assim, se informando, acabar com os precon-
ceitos. Você pode ser muito bem vestido, com
chinelo de dedo da maneira que você quiser.
Mas tire alguma coisa, seja divertido e bola
pra frente! Porque não tem como sugerir pra
uma pessoa, faça isso ou faça aquilo. E não
precisa comprar roupa cara. É até ridículo
pra uma pessoa estar grifada de cima a baixo,
isso é falta de personalidade. O legal é a mis-
tura de etiqueta cara com uma camisa
barata. São essas misturas que eu acho
bacana, essas tribos misturadas, é isso que é
bacana. Mas gosto de especialmente assim,
de pessoas que se encontram e que são
daquela turma: se são punks são punk’s; se
são hipsters são hipsters, se são universitá-
rios... Eu gosto quando elas se encontram
sem brigarem entre si, que se unam e que
formem a moda. Mas é importantíssimo que
você tenha cultura de moda. Eu tenho uma
estante que só tem revista de moda, de editor
desde os anos oitenta. Hoje tem a internet,
você tem mil acessos, é importante você ver.
Cinema, acompanhar os desfiles, é bom você
estar ligado com isso.
linCe - Normalmente os homens têm
mais resistência.
zeCa – Muito mais resistência. “Ai, eu
não quero ver isso!”. Mas eu acho que isso
deixa um homem mais bacana. Eles ficam
mais sensíveis. Isso faz bem para as pessoas,
e junto com isso cinema, literatura, arte. A
moda envolve tudo isso, é um condutor, é o
fio condutor disso tudo! E isso faz com que as
pessoas se tornem diferentes, mais criativas e
que se deem melhor.
18 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
NzambI Ia ImOxI(O dEus é úNICO)
EnSAiO FOTOGRÁFiCO
Fotos daniel oliver
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 19
20 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
comportamento
ONdE CErvEja é COIsa dE muLhEr?Por enquanto, ainda é na publicidade (não é, Verão?), mas elas já estão chegando lá também como consumidoras. Mesmo que ainda enfrentem o preconceito para conquistar esse espaço
daniel silva e BárBara Bernardes
3º Período/ 1° Período
Por muitos anos o envolvimento da
mulher com a cerveja se dava somente na
publicidade. A comercialização da maioria
das bebidas alcóolicas tinha (e, em parte,
ainda tem) como pilar a exposição da
mulher. Uma exposição que acontecia de
maneira tendenciosa e machista — mulher
não entende de cerveja e só serve pra ajudar
a vender. Hoje, tudo faz crer que essa ideolo-
gia começa a se tornar coisa do passado.
Apesar de ainda pequeno, o crescimento no
consumo, por parte das mulheres, já é rele-
vante em relação aos anos anteriores. Esse
novo modelo de atuação promoveu mudan-
ças consideráveis no mercado.
MUlHer, CrianÇa e CaCHorro
Mas, a imagem da mulher ajuda real-
mente a vender cerveja? Segundo o
publicitário e professor Lamounier
Lucas, 41, esse modelo de exposição da
mulher não tem uma resposta exata. Ele
acredita que a exposição feminina já
acontece desde o início da publicidade,
quando as propagandas eram voltadas
para o público masculino.
— Os apelos eróticos eram cada vez
maiores, o que ocasionou o surgimento
das pinups, que eram mulheres desenha-
das ou fotografadas de forma bem sen-
sual, explorando o erotismo para as
campanhas publicitárias.
Vale lembrar que, de acordo com
uma pesquisa, as publicidades obtêm
mais sucesso quando utilizam esses três
modelos em sequência: mulher, criança
e cachorro. No entanto, um novo cami-
nho encontrado pela publicidade é a
utilização do humor.
— Assim como o brasileiro aprecia o
erotismo, ele também gosta de dar risadas.
Uma observação interessante des-
tacada pelo professor é em relação à
publicidade feita pela cervejaria Bavá-
ria, que se contrapõe às demais. A cena
protagonizada por um senhor apre-
ciando a cerveja é interrompida por um
jovem que o questionava sobre a falta de
mulheres no comercial. O velhinho
retruca, afirmando que a qualidade do
produto não dependia do apelo sexual.
Ou seja, não era necessário mostrar
mulheres nuas para vender cerveja.
ClUBe das destiladas
Na contramão das cervejas, os des-
tilados não adotam o mesmo modelo de
publicidade. Mas, para Lamounier, há
uma explicação real, já que este tipo de
estratégia de marketing só faz sentido no
Brasil, devido ao clima tropical do país.
— Aqui, a cerveja é considerada
uma bebida refrescante. É sempre asso-
ciada ao calor, praia e mulher de biquíni.
De fato, o clima parece que interfere e
não só aqui. Em países latinos, de clima tro-
pical e cultura machista, como o México,
por exemplo, cerveja e, principalmente, a
tequila são associadas, em sua publicidade,
a calientes imagens femininas.
Outra explicação está no período do
dia em que os destilados são consumidos,
uma vez que, uma pessoa normalmente
consome esse tipo de drink em locais com
temperaturas mais amenas e agradáveis.
Mas isso não a isenta de usufruir da
sensualidade feminina. Quem não se
lembra da propaganda do vermute Cam-
pari? A mulher que, em uma festa, não
conseguia ser notada, derrama proposi-
talmente uma bebida de cor averme-
lhada em seu vestido branco, se tor-
nando mais provocante e diferente das
demais. O desfecho do comercial se dá
com a moça seduzindo um rapaz.
Outras bebidas, como os uísques,
por exemplo, flertam mais com a tradi-
ção, com o luxo e com ambientes mais
clássicos, mas sempre profundamente
masculinos, reforçando, pelo menos em
parte, o mito de que mulher não gosta de
uísque. “Não conheço nenhuma mulher
que gosta”, observa o empresário Cláu-
dio Prado Jr., 28, que já fez parte de um
“Clube do Uísque”, formado só por
homens. Cláudio, que estudou e fez
intercâmbio nos Estados Unidos, lem-
bra que, lá, uma das bebidas mais famo-
sas, o bourbon Jack Daniels, sempre
teve sua publicidade associada ao blues
e a elementos da cultura do sul dos Esta-
dos Unidos.
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 21
em 2000, o Conar (Con-selho nacional de autorre-gulamentação publicitá-ria), por meio do artigo 44 anexo “p” - Cer ve jas e Vinhos — regulamentou para as empresas publicitá-rias a não indução ao con-sumo exagerado ou irres-ponsável; apelo à sensuali-dade em áudio ou vídeo que sugira o consumo.
Mas ainda não é o que se vê nas publicidades que cir-culam nos meios de comuni-cação. taí a Verão que não nos deixa mentir! Vem, Verão!!!
A LEI
22 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
O consumo de bebidas por parte
das mulheres era bem menor se com-
parado aos tempos de hoje. A justifica-
tiva talvez esteja no crescimento de
espaços gourmets e cervejarias artesa-
nais no Brasil. “O espaço para as
mulheres foi se ampliando, tanto que
hoje é possível encontrar cartas de cer-
vejas iguais às de vinhos”, afirma
Lamounier. A explicação estaria no
“paladar aguçado das mulheres, que
consegue distinguir de maneira suave
os sabores de uma boa bebida”.
A advogada e funcionária pública
Paula Noce, 35, é produtora e degusta-
dora de cervejas artesanais. Ela acredita
que, “infelizmente”, o espaço cervejeiro é
dividido em duas partes.
— Um lado é da produção em larga
escala, ou seja, das cervejas de maior con-
sumo no Brasil, onde o machismo ainda é
grande. O outro lado é o das produções de
cervejas artesanais, onde a mulher já tem
seu espaço consolidado, tanto na organiza-
ção de eventos, quanto na produção. Algu-
mas já atuam até como mestre cervejeiras.
PALADAR AGUÇADO
Paula é frequentadora assídua de even-
tos de degustação de cerveja. E foi em um
desses encontros que ela, juntamente com
mais quinze amigas, resolveu desenvolver
uma confraria feminina. Criada em 2012, a
Cheers (em inglês, saúde) é exclusiva-
mente feminina. Os encontros são realiza-
dos de forma aleatória: Uma vez a cada mês,
cada participante é responsável por organi-
zar as reuniões, que acontecem em casas ou
bares especializados. Os encontros são
encarados com bastante comprometi-
mento, uma vez que a confreira escolhida
do dia tem a responsabilidade de comparti-
lhar seus conhecimentos na área.
“Aqui há pessoas de diversas áreas,
dentista, advogada, entre outras. Nosso
principal objetivo é ampliar o conheci-
mento nesse espaço”, afirma a advo-
gada, explicando que tudo isso é levado
muito a sério.
— Nos encontros é permitido
somente o experimento de três a cinco
cervejas, e 200 ml para cada pessoa; isso
para não comprometer os sabores e
nuances de cada experimento.
A advogada reitera que o objetivo
“não é beber quantidade, mas sim, qua-
lidade.” A confraria já conta com uma
página no Facebook, Instagram (com
fotos dos eventos) e um blog com dicas
de cervejas e harmonizações. A utiliza-
ção do meio midiático tem o intuito de
divulgar os trabalhos realizados e
aumentar o número de mulheres inte-
ressadas no assunto.
CONFRARIA FEMININA
Paula também se aventura na arte de
produzir cervejas artesanais. Junta-
mente com seu noivo, ela iniciou uma
produção caseira de trinta litros por mês,
apenas por hobbie, produzindo somente
para amigos e familiares. A média de
preço da cerveja comercializada por ela
fica entre R$ 7 a R$ 12.
— Hoje produzimos setenta litros.
Pode parecer muito, mas a ideia é
ampliar a produção cada vez mais.
Com o passar do tempo, se torna
mais nítida a importância da mulher
como apreciadora ou profissional da
cerveja. O requinte, o charme e a delica-
deza fazem parte do toque feminino
para uma melhor apreciação deste pro-
duto tão desejado. Mas ainda não há
unanimidade. A estudante de jorna-
lismo Roberta Oliveira, 18, por exemplo,
até admite que gosta de cerveja, mas faz
uma ressalva entusiasmada: “minha
bebida favorita é a tequila”. A tequila,
aliás, vem conquistando terreno cada
vez maior na área feminina. Já se tornou
comum as mulheres iniciarem uma noi-
tada “com uma tequila básica”.
REQUINTE E CHARME
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 23
sOuL E bLuEs Em baNCa dE rEvIsta
cultura
O saudosismo invade as editorias
roGer leon
5º Período
O blues surgiu nos Estados Unidos
ainda na virada do século passado. O soul,
que vem da fusão do ritmo com o blues (o
rhythm’n’blues), em meados da década de
1960. São dois dos gêneros musicais mais
expressivos. Do blues saíram o jazz e o rock.
O soul inspirou quase todos os segmentos da
música negra, dos anos de 1960 para cá.
As músicas começaram a surgir em
épocas políticas muito intensas, em que
as ruas americanas eram tomadas por
movimentos de liberalismo social, movi-
mentos contra o racismo, e contra a
Guerra do Vietnan, a favor do uso de
drogas, entre outros.
A também chamada “música de alma
negra”, apesar de ter surgido dos anos
1960 têm suas primeiras impressões no
começo do século XX em pequenas comu-
nidades negras que viviam no Sul dos
Estados Unidos. O termo soul music pode
ser usado como uma referência à música
negra em geral, independente do estilo,
mas é também um gênero específico da
música. Atualmente, o cenário do blues é
muito diferente do século passado. Para o
músico Pedro Rosa, a cor da pele já não
influencia mais no gênero.
— Se um de nós visse na rua uma pes-
soa como Ana Popovic passando ninguém
jamais falaria que ela é uma cantora e gui-
tarrista de blues. Alta, branca, loira, e um
gênio contemporâneo da música. Esse
negócio de música negra e música branca
não existe mais. É quase a mesma coisa que
falar que funk é música de pobre e música
clássica é música de rico. Toda generaliza-
ção é burra.
Para ele, o soul e o blues mesmo tendo
perdido vários de seus grandes nomes
continuam muito presentes na formação
dos gêneros musicais de hoje. “Se pegar-
mos as grandes músicas que tocam no
rádio hoje, principalmente dos ídolos do
pop, vemos uma grande influência princi-
palmente na sonoridade. Até mesmo no
Brasil. A Legião Urbana e o Barão verme-
lho também vieram do Blues”.
A editora Folha desde o dia 15 de
março começa a levar semanalmente às
bancas a coleção ‘Folha Soul e Blues’. A
coletânea traz biografias e histórias de
canções de grandes intérpretes. O livro da
semana vem acompanhado de um CD
com as músicas que mais marcaram a
carreira do artista biografado. Em cada
volume vemos ilustrações (muitas vezes
raras) e sugestões de filmes, livros e discos
relacionados a cada intérprete.
A coleção se divide em duas partes. A
primeira com 15 volumes é dedicada aos
grandes nomes do soul — de Stevie Won-
der e James Brown a Smokey Robinson. A
segunda, com os grandes nomes do Blues
mescla nomes mais contemporâneos
com lendas como Robert Johnson e B.B.
King. Carlos Calado, o autor e editor dos
dois primeiros livros-CD’s afirmou em
entrevista à Folha que “o blues e o soul
serviram de veículos para que os negros
norte-americanos pudessem se expres-
sar de maneira artística e em diferentes
épocas”.
Em seu blog, uma postagem caracte-
riza seu interesse pelo tema e seus princí-
pios para a realização do trabalho.
— Esse é um projeto que, de alguma
maneira, eu já planejava realizar há bas-
tante tempo. Comecei a ouvir soul music e
blues no início da adolescência, ainda na
década de 1960, e até hoje aprecio muito
esses gêneros musicais. Aliás, aproveito
para deixar aqui uma espécie de dedicató-
ria afetiva a um amigo daquela época: José
Renato Reis, que despertou minha atenção
para as mensagens e inovações sonoras da
soul music.
José Luiz, 46, é dono de uma banca de
revistas no bairro Caiçara, na região noro-
este de Belo Horizonte, e para ele o público
que compra a coleção é grande, porém,
menos diverso do que deveria.
— O que me parece é que quem vem
à banca e para com o objetivo de ver a
coleção são pessoas mais velhas. Saudo-
sistas. Em sua maioria, pessoas que já
conhecem o gênero que ouviam em dis-
cos de vinil. Os mais jovens não se inte-
ressam muito pelo universo musical
antigo já que a internet facilitou muito
cada um achar o que gosta e organizar
de seu próprio jeito.
roGer leon
5º Período
Na tarde da segunda feira, 13 de abril,
morreu o escritor e jornalista uruguaio
Eduardo Hughes Galeano, aos 74 anos.
Galeano é autor de mais de 40 livros de
temas extremamente diversos, passando
de política e jornalismo até a ficção. Nas-
cido em Montevidéu no ano de 1940, veio
de família extremamente católica e cres-
ceu com o sonho de ser jogador de futebol
profissional, devido a seu amor pelo
esporte, sonho que era retratado com fre-
quência em suas obras, principalmente
em um de seus maiores sucessos: “O fute-
bol de sol a sombra” (1995). Ainda na
adolescência, trabalhou de carteiro, pin-
tor de letreiros, caixa de banco, até que,
aos 14 anos, vendeu sua primeira charge
para o jornal El Sol.
Vítima do regime militar de seu país,
Galeano foi preso em 1973 e exilado na
Espanha, onde permaneceu por quase uma
década. Nessa fase, disse uma de suas cita-
ções mais famosas: “as pessoas estavam na
cadeia para que os presos pudessem ser
livres”. Porém, dois anos antes de sua prisão,
escreveu a sua mais célebre obra, “ As veias
abertas da América Latina”, um texto clás-
sico para os seguidores de filosofias anticapi-
talistas, e antiamericanas.
O livro faz uma análise do cenário
econômico desde o período da coloniza-
ção europeia até a idade contemporâ-
nea. O argumento principal é contra as
raízes da exploração que influenciaram
a forma de vida da geração atual. Devido
o grande impacto da obra e do conheci-
mento exarcebado da história, o livro foi
banido em vários países, entre eles
Argentina, Chile, Uruguai e — claro! —
Brasil. A proibição contudo, durou
pouco tempo.
A grande polêmica acerca do livro
veio há pouco mais de um ano, quando
em Brasília, na 2ª Bienal do Livro, Gale-
ano afirmou que jamais leria de novo
sua grande obra.
— Eu não seria capaz de ler de novo.
Cairia desmaiado. Para mim, essa prosa
da esquerda tradicional é chatíssima.
Meu físico não aguentaria. Seria inter-
nado no pronto-socorro. Em todo o
mundo, experiências de partidos políticos
de esquerda no poder às vezes deram
certo, às vezes não, mas muitas vezes
foram demolidas como castigo por esta-
rem certas, o que deu margem a golpes de
Estado, ditaduras militares e períodos
prolongados de terror, com sacrifícios e
crimes horrorosos cometidos em nome da
paz social e do progresso”, disse o escritor.
Mesmo assim Galeano disse não se
arrepender de ter escrito o livro. Mas afir-
mou ter superado a fase”. O ex-presidente
venezuelano Hugo Chávez presenteou o
atual presidente americano com uma cópia
do livro, afirmando que se tratava de “uma
obra prima”. As vendagens dispararam
depois do episódio, na Amazon. O livro, que
estava em 54.295º na lista dos mais vendi-
dos, subiu em 48 horas para a segunda
posição. Galeano quando procurado, afir-
mou que nem Chávez nem Obama enten-
deriam o teor da história. Em julho de 2008,
Galeano foi agraciado com o primeiro título
de Cidadão Ilustre do Mercosul.
CULTURA
a mENtE abErta dE EduardO gaLEaNO
soBrevivente
Chuck Palahniuk
leYa
Extremamente ácido, o livro do gênio por trás do “Clube Da Luta” é de 1996, mas há pouco chegou ao Brasil. Em uma narrativa completamente fora da ordem cronológica dos acontecimentos, a personagem Bradson resolve se matar e sequestra um avião, contando toda a sua trágica história de vida para ser salva na caixa preta. O final, claro, é surpreendente.
CRÍTiCAS
A história e a tardia mudança de posiçao de um dos ícones da literatura
nada será CoMo antes
Júlio Maria MasterBooks
Uma profunda aula sobre a vida da cantora Elis Regina, desde a adolescência, quando cantava “Fascinação” com as amigas, nas escadarias de um colégio, até seu fim trágico e prematuro. Sem poupar detalhes que poderiam ‘arranhar’ a imagem da artista, o livro pode ser chamado de uma biografia definitiva de Elis. Lançado no dia em que faria 70 anos.
24 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 25
Ambição, falta de ética e foco.
Essas três características se resumem
em uma só pessoa: Lou Bloom (Jake
Gyllenhaal), personagem protagonista
do filme “O Abutre” (Night Crawler -
2014), que faz um denso mergulho no
que se pode chamar de o submundo do
jornalismo policial. A ação se passa em
Los Angeles, onde Bloom é um ladrão
que vive de bicos secundários, até que
um dia sua vida muda, ao ‘descobrir’ a
profissão de vídeo freelance. Estes são
também conhecidos como repórteres
da noite, profissionais sem nenhum
escrúpulo, que vendem vídeos sensa-
cionalistas, sempre envolvendo escân-
dalos e tragédias sangrentas, a peque-
nas redes de TV.
Bloom apanha da concorrência,
mas aprende rapidamente e começa a
fazer vídeos, até convencer a diretora de
jornalismo da rede de TV KWLA, Nina
Ramines (Rene Russo) a comprar um
deles. Ao pressentir as possibilidades do
ramo, Lou Bloom um pobre estagiário
Rick (Riz Ahmed) que acaba se tor-
nando seu GPS humano dentro de seu
pequeno carro. Ágil como sempre, não
hesita invadir e até mesmo interferir em
algumas cenas de crime, em busca de
melhores ângulos para filmar. O passo
seguinte é eliminar a concorrência, o
que significa atropelar livremente a
ética, única forma de sobreviver em um
mundo aparentemente sem leis.
Direção segura do ex-roteirista Dan
Gilroy, que encontra em Gyllenhaal o
parceiro perfeito para encarnar o ambi-
cioso Lou Bloom — ele chegou a ema-
grecer 10 kg para dar à personagem o ar
decadente e faminto de quem sobrevive
como um abutre (boa também a versão
nacional do título). Jake Gyllenhaal, que
é também um dos produtores do filme,
decorou todo o roteiro como se fosse
uma peça de teatro. As atuações mar-
cantes, dele e de Rene Russo, garantem
o clima de um suspense angustiante,
que é deixado bem claro no rosto dos
personagens. Não foram poucos os críti-
cos norte-americanos que reclamaram
dele não ter recebido uma indicação
para o ‘Oscar’.
Nota: 4,8.
“O abutre”, um mergulho no submundo do jornalismo
26 Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015
Carlos Benevides e átila Moreno
4º Período/ 3º Período
Recomendação de médicos e da Orga-
nização Mundial da Saúde, todos já sabem
que a prática regular de exercícios físicos
traz melhorias ao corpo. Atividades como a
esteira ou a bicicleta não são unânimes,
profissionais da área da educação física
vêm propondo novos tipos de modalidades
para manter o corpo ativo de maneira dinâ-
mica e em grupo, como é o caso do crossfit.
Explosão, força e condicionamento são
as prioridades da modalidade que está em
alta no Brasil e no mundo. Os exercícios deste
programa priorizam bastante o uso do peso e
equilíbrio do corpo. Pular corda, levantar
pesos, dar cambalhotas e saltos são alguns
dos desafios que a aula propõe ao aluno. O
crossfit, no entanto, também não é unanimi-
dade. Profissionais da saúde estão discutindo
os malefícios que a prática pode levar. Lesões
musculares e rompimento de ligamentos
estão na pauta de médicos que estão dissua-
dindo quem pensa em fazer a prática.
Para todos
“É um esporte que trabalha o condi-
cionamento de forma geral”, define
Natália Pinheiro, professora da academia
Crossfit BH, a primeira do gênero em
Minas Gerais. Segundo ela, a atividade
prepara a pessoa para qualquer tipo de
situação do cotidiano. Dessa maneira, os
praticantes conseguem correr para pegar
um ônibus, carregar sacolas de super-
mercado e até subir escadas com mais
facilidade e vigor.
Para não ocorrer lesões e contusões,
existe uma curva de aprendizado nos
treinamentos para todas as pessoas, de
todos os tipos de porte físico, como pon-
dera Pinheiro.
— A aula é a mesma para todos, mas,
quando temos um aluno novato, pegamos
apenas a base do crossfit. São os agacha-
mentos, exercícios para levar o peso do
ombro acima da cabeça e ele sempre será
acompanhado pelos professores. Isso serve
não apenas para novatos, mas para pessoas
mais velhas ou que estão lesionadas.
a ONda dO
CrOssfItFebre no Brasil, o Crossfit tem levantado dúvidas quanto ao risco de lesionados. Em contrapartida, é uma excelente opção para entrar em forma e levar uma vida mais saudável
esporte
Quanto às lesões, maior preocupação
que gira em torno do crossfit, Natália dá o
recado: “É preciso humildade. Ninguém
pode chegar aqui e carregar toneladas de
peso. Primeiro a técnica e depois usar um
pouco de peso. Algumas pessoas não
entendem isso”. É fundamental que cada
um conheça seu próprio corpo e seus limi-
tes. Ou o risco de lesão será inevitável.
Após qualquer exercício físico de alta
intensidade, é normal sentir queimação ou
dores musculares. Existe, entretanto, uma
tênue linha entre o cansaço e a lesão. Natá-
lia Pinheiro explica que são sensações bem
diferentes: “A contusão é focada em
alguma parte no corpo. A pessoa, por exem-
plo, sente dor no ombro esquerdo, e não no
direito. No caso da dor muscular, o aluno
sente a fadiga no ombro inteiro. A lesão é
sempre em um ponto específico”.
— É preciso conhecer o objetivo de
cada aluno. Alguns fazem crossfit apenas
para melhorar a saúde e levar uma vida
melhor. Outros, para conhecer e ultrapas-
sar seus limites. Eu mesma sinto dor mus-
cular há quatro anos e digo a todos que isso
é absolutamente normal.
QUAL É SEU LIMITE?
Jornal laboratório do Curso de JornalisMo do Centro universitário newton Paiva - Maio de 2015 27
“Como o crossfit é uma atividade
de alta intensidade, o que eles colocam
é muito peso e repetições com carga
alta”, pontua a fisioterapeuta Miriam
Bastos. Segundo ela, antes de começar
qualquer exercício físico, é necessário
que a pessoa faça uma avaliação para
saber se está apta a praticar ou não. Pelo
fato de o crossfit não ter uma estabiliza-
ção na coluna e nas articulações, o risco
de lesão cresce, segundo ela.
De acordo com Bastos, algumas lesões
sequer provocam dor. Elas atacam de
repente? Não é bem assim. “Tem gente que
tem predisposição a lesão. Se o sujeito tra-
balha oito horas sentado, numa posição
curvada, a contusão pode acontecer de
forma mais natural. Se essa pessoa, após o
trabalho, vai fazer, na sua atividade diária,
um exercício de coluna, ela vai se machu-
car”. Fica a reflexão do motivo da lesão:
peso utilizado ou a péssima postura
durante oito horas?
Para a fisioterapeuta, a dor muscular,
que vem em forma de queimação, dura
geralmente 48 horas. É preciso ficar atento
se a dor persiste ou se ocorre nas articula-
ções. E, caso algum determinado exercício
ou movimento sempre cause um incô-
modo, é um indicativo que há uma lesão ali.
Benefícios do crossfit? Muitos, é o
que diz Miriam Bastos.
— Qualquer atividade traz uma
melhora de vida. Neste esporte em especí-
fico, temos tanto condicionamento físico
quanto aeróbico, força e postura, depen-
dendo do exercício que o professor passar.
Como a obesidade é uma doença
epidêmica do século XXI, quem está
acima do peso pratica o crossfit a fim de
perder gordura. Com treinos de alta
intensidade que priorizam o condicio-
namento, é certo que a pessoa perderá
alguns quilinhos e começará a ter um
corpo mais definido.
Há histórias de pessoas que perderam
praticamente metade do peso do corpo,
baixando os níveis de triglicérides e coles-
terol, algumas das palavras mais temidas
para quem não está em dia com a balança.
“Devemos fazer o que gostamos. As
lesões acontecem em qualquer atividade
física. Se a pessoa gosta do exercício, não
vejo motivos para não praticá-la”, consi-
dera Miriam.
O crossfit é, sem dúvida, um esporte
que está se tornando cada dia mais popular
em nível mundial. A pratica leva à perfei-
ção, uma modalidade que usa questão
competitiva e desafiadora, fazendo com
que o atleta busque sempre melhorar seus
aspectos físicos e também psicológicos.
“Nenhum esporte me prendeu tanto
quanto este”, é o que diz Lívia Gia, 27, que
pratica crossfit há dois. Segundo ela, que
já fez várias atividades físicas, a dinamici-
dade e a alta intensidade se tornaram
uma paixão pelos exercícios que estão
fazendo sucesso no Brasil.
— Em menos de seis meses de cross-
fit, perdi 10kg e praticamente 10% de
gordura. Isso, além do bem-estar da
saúde. Parece que é mentira, mas as pes-
soas realmente viciam. Estou viciada
neste esporte!
“VICIADA NESSE ESPORTE”
CARGA PESADA
Fotos daniel oliver
da
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l o
liv
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