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Universidade Federal de Alagoas
Formação de Profissionais em Engenharia Civil e Engenharia Química para
o Setor de Petróleo e Gás – PRH40 UFAL/ANP
Calibração dos parâmetros do método dos
elementos discretos para modelos simplificados de
corrida de detritos
Bolsista: Renata Maria Barros Braga
Projeto Final de Graduação em engenharia civil
Orientador
Prof. Luciana Correia Laurindo Martins Vieira, MSc.
Maceió, dezembro de 2014
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CENTRO DE TECNOLOGIA - CTEC
CURSO DE ENGENHARIA CIVIL
Renata Maria Barros Braga
CALIBRAÇÃO DOS PARÂMETROS DO MÉTODO DOS ELEMENTOS
DISCRETOS PARA MODELO SIMPLIFICADO DE CORRIDA DE DETRITOS
Maceió
2014
RENATA MARIA BARROS BRAGA
CALIBRAÇÃO DOS PARÂMETROS DO MÉTODO DOS ELEMENTOS
DISCRETOS PARA MODELO SIMPLIFICADO DE CORRIDA DE DETRITOS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Colegiado do Curso de Engenharia Civil da
Universidade Federal de Alagoas, como requisito
parcial para obtenção do título de Engenheiro
Civil.
Orientadora: Prof.ª Luciana Correia Laurindo
Martins Vieira.
Maceió
2014
FOLHA DE APROVAÇÃO
CALIBRAÇÃO DOS PARÂMETROS DO MÉTODO DOS ELEMENTOS
DISCRETOS PARA MODELO SIMPLIFICADO DE CORRIDA DE DETRITOS
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
ASSINATURAS:
__________________________________________
Renata Maria Barros Braga
Autor
__________________________________________
Prof. Luciana Correia Laurindo Martins Vieira
Orientadora
Maceió
2014
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer, primeiramente, a Deus que sempre esteve guiando minhas
escolhas e iluminando meu caminho.
Agradeço aos meus pais, Rubens e Zenil, por todo o empenho que tiveram em minha
criação, sempre me proporcionando boas oportunidades. Por todo o apoio, incentivo e
conselhos tão importantes em minha trajetória.
A minha irmã, Luiza, por todo o companheirismo, apoio, confiança e amizade. A
minha tia Zenivalda, que sempre me teve como uma filha e sempre acompanhou de perto
todos os meus passos.
Aos meus avós paternos, Amélia (in memoriam) e Darci, e maternos, João Batista (in
memoriam) e Luiza (in memoriam). Aos meus tios que me acompanharam desde a infância e
àqueles que eu não tive a oportunidade de conhecer, em especial, meu tio Renato o qual eu
tive a honra de receber o nome em homenagem.
Aos amigos que sempre estiveram presentes em minha vida e sempre souberam
criticar e apoiar minhas decisões. Em especial, agradecer a Rafaela, a qual esteve em todos os
momentos da minha vida, a Alessandra e a Thais, minhas maiores conselheiras.
Um grande agradecimento a todos meus professores pela dedicação e grande
contribuição na minha formação. Em especial, ao professor William, o primeiro professor a
me oferecer uma oportunidade na universidade, ao professor Jerônimo, ao qual tive a honra de
aprender muito durante a monitoria. A professora Luciana, que não mediu esforços para me
ajudar na elaboração deste trabalho.
Agradeço a todos do Laboratório de Computação Científica e Visualização (LCCV),
especialmente ao Diogo Cintra que me ajudou desde o início do curso. Agradeço também aos
integrantes do Programa de Recursos Humanos da ANP (PRH40) e à ANP, por auxiliarem na
minha formação.
A todos da empresa TPC – Tecnologia em Projetos e Construções, que me receberam
muito bem, me ensinaram muito e me treinaram para a vida profissional. Nessa empresa, eu
tive mais que chefes, eu tive amigos.
Por fim, agradeço a todos os meus colegas de classe, por compartilharem seus
conhecimentos e ajudarem sempre que possível. Agradeço, especialmente, a Bruna, Isadora e
Midlan, por todo o companheirismo desses anos.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo realizar a calibração experimental dos parâmetros de atrito
do Método dos Elementos Discretos (MED) para modelos tridimensionais simplificados de
corridas de detritos, através da comparação entre resultados obtidos em modelos
experimentais e em simulações de modelos computacionais compatíveis com o experimento
físico. As regiões Sul e Sudeste do Brasil, onde está concentrada grande parte das instalações
da indústria petrolífera brasileira, vêm sofrendo continuamente com os efeitos de
deslizamentos de terra. Suas características geológicas e hidrológicas são fatores
determinantes para ocorrência desses eventos. Uma das causas de rompimento de duto de
petróleo são deslizamentos de terra. O vazamento do óleo ou gás expõe a população e o meio
ambiente a risco, além de acarretar prejuízo à indústria petrolífera. A corrida de detritos é um
tipo de movimento de massa caracterizado por sua rapidez e alto poder de destruição. A
importância em estudar fluxo de detritos, deve-se à falta de previsão de ocorrência desses
fenômenos e às consequências trazidas pelos mesmos. O modelo experimental se trata de uma
rampa confeccionada em madeira e acrílico, onde é possível analisar o fluxo de materiais
granulares. O modelo computacional consiste em representar a geometria e dinâmica do
experimento físico. Para isso, utiliza-se a ferramenta PETRODEM, sistema computacional
elaborado com a contribuição do Laboratório de Computação Científica e Visualização
(LCCV/UFAL) e que tem como fundamentação o MED. Os resultados das análises
experimentais são gerados em parceria com a equipe do Laboratório de Geotecnia
(LabGeo/CTEC), utilizando-se de recursos fotográficos. Esses resultados permitem a
calibração do modelo computacional, determinando-se os parâmetros envolvidos no
movimento do fluxo de detritos. Neste sentido, este trabalho pode contribuir nas simulações e
compreensão do fenômeno de corridas de detritos.
Palavras-chave: Corridas de detritos, Calibração experimental e Método dos Elementos
Discretos.
ABSTRACT
This paper aims to conduct the experimental calibration of the friction parameters of the
Discrete Element Method (DEM) for simplified three-dimensional models of debris flow, by
comparing results obtained in experimental models and simulations of computer models with
physical experiments. The South and Southeast regions of Brazil, where it is concentrated
largely in the Brazilian oil industry facilities, have been suffering continuously with the
effects of landslides. Its geological and hydrological characteristics are determinant factors for
the occurrence of these events. One cause of oil pipeline rupture are landslides. Leakage of oil
or gas exposes the population and the environment to risk, besides causing damage to the oil
industry. The debris flow is a type of mass movement characterized by its speed and high
destructive power. The importance of studying debris flow, due to the lack of foresight of
occurrence of these phenomena and the consequences brought about by them. The
experimental model it is a ramp made of wood and acrylic, where you analyze the flow of
granular materials. The computational model consists of representing the geometry and
dynamics of the physical experiment. For this, we use the PETRODEM tool, a computer
system developed with the contribution of Laboratory of Scientific Computing and
Visualization (LCCV / UFAL) and has as its foundation the DEM. The results of
experimental analyzes are in partnership with the staff of the Laboratory of Geotechnics
(LabGeo / CTEC), using photographic capabilities. These results allow calibration of the
computer model, determining the parameters involved in the movement of debris flow. In this
sense, this work can help in understanding the phenomenon and simulations of debris flow.
Keywords: Debris flow, Experimental Calibration and Discrete Element Method.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Porcentagem de ocorrência de movimentos de massa por região, entre os anos de
1991 a 2010. ........................................................................................................................ 11
Figura 2 - Dutos para o transporte de petróleo e derivados no Brasil..................................... 13
Figura 3 - Dutos para o transporte de gás natural no Brasil. .................................................. 14
Figura 4 - Modelo desenvolvido por Hutter et al (1995). ...................................................... 15
Figura 5 - Rampa confeccionada no trabalho de Braga e Vieira (2014). ................................ 16
Figura 6 - Parâmetro altura máxima adquirido no trabalho de Braga e Vieira (2014). ........... 16
Figura 7 - Parâmetros XR, XF e L adquiridos no trabalho de Braga e Vieira (2014). .............. 17
Figura 8 - Estudo da relação L/H em função de . ........................................................ 18
Figura 9 - Estudo da relação l/h em função de . .......................................................... 18
Figura 10 - Deslizamento de terra em Teresópolis em janeiro de 2011. ................................ 20
Figura 11 - Etapas de cálculo do Método dos Elementos Discretos. ...................................... 23
Figura 12 - Plano tangencial às partículas no ponto de contato. ............................................ 25
Figura 13 - Aproximação da área do contato entre as partículas. ........................................... 27
Figura 14 – Representação do contato entre as partículas no modelo Kelvin-Coulomb. ........ 28
Figura 15 - Movimento de rolamento dado pela combinação de rotação pura com translação
pura...................................................................................................................................... 29
Figura 16 - Esquema de forças que agem em um objeto de seção transversal circular. .......... 30
Figura 17 - Esquema de forças em um corpo deformável...................................................... 32
Figura 18 - Etapas para confecção e elaboração do experimento físico. ................................ 34
Figura 19 - Projeto executivo do aparato experimental. ........................................................ 35
Figura 20 - Rampa confeccionada para elaboração do experimento físico. ............................ 37
Figura 21 - Material aplicado no experimento físico: o sagu. ................................................ 37
Figura 22 - Modelo de cápsula utilizada para o cálculo do diâmetro médio das partículas. ... 38
Figura 23 - Posição inicial das esferas de sagu nos experimentos com 45 graus (a) e 30 graus
(b). ....................................................................................................................................... 39
Figura 24 - Perfil de altura de deposição das partículas em um experimento físico. .............. 40
Figura 25 - Fluxograma indicando a metodologia para a calibração do modelo computacional.
............................................................................................................................................ 42
Figura 26 - Malha com elementos triangulares que representam a cápsula experimental. ...... 43
Figura 27 - Modelo computacional da rampa: a) com inclinação de 45 graus; b) com
inclinação de 30 graus. ......................................................................................................... 44
Figura 28 - Posicionamento inicial das partículas. a) antes da acomodação e 45º; b) depois da
acomodação e 45º; c) antes da acomodação e 30º; d) depois da acomodação e 30º ............... 45
Figura 29 - Representação dos parâmetros obtidos no perfil de altura. .................................. 47
Figura 30 - Superfície de resposta da relação L/H em função de e µ. ......................... 48
Figura 31 – Primeiro experimento realizado após a pintura da base com 8500 partículas e
inclinação de 45 graus: a) vista superior; b) vista lateral. ...................................................... 51
Figura 32 - Experimento realizado em outubro de 2014 com 8500 partículas e inclinação de
45 graus: a) vista superior; b) vista lateral. ........................................................................... 52
Figura 33 - Gráfico com os perfis de altura dos experimentos das Figuras 31 e 32. ............... 53
Figura 34- Perfil de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus. .... 54
Figura 35 - Perfil de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 30 graus. ... 54
Figura 36 - Perfil de altura do experimento com 17000 partículas e inclinação de 45 graus. . 55
Figura 37 - Curva média dos experimentos com 8500 partículas de sagu e inclinação de 45
graus. ................................................................................................................................... 55
Figura 38 - Busca direta pela combinação cujos os resultados estão dentro do intervalo de
busca experimental............................................................................................................... 57
Figura 39 - Valor da altura máxima em função do atrito estático. Mantêm-se fixo os valores
do atrito cinético e de rolamento. ......................................................................................... 58
Figura 40 - Valor da posição x da altura máxima em função do atrito estático. Mantêm-se fixo
os valores do atrito cinético e de rolamento. ......................................................................... 58
Figura 41 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus e
dos modelos computacionais das combinações da Tabela 02. ............................................... 59
Figura 42 - Perfis de altura do experimento com 17000 partículas e inclinação de 45 graus e
do modelo com a combinação 01 de parâmetros do MED e raio igual a 2.05 mm. a) sem
escala; b) em escala. ............................................................................................................. 60
Figura 43 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus e do
modelo com a combinação 01 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm. ..................... 61
Figura 44 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus e do
modelo com a combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm. ..................... 63
Figura 45 - Perfis de altura do experimento com 17000 partículas e inclinação de 45 graus e
do modelo com a combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm. ................ 63
Figura 46 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 30 graus e do
modelo com a combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm. ..................... 64
Figura 47 - Perfis de altura dos experimentos realizados com 8500 sagus e inclinação de 45
graus e do modelo com a combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm. .... 64
Figura 48 - Valor da altura máxima em função do atrito estático. Mantêm-se fixo os valores
do atrito cinético e de rolamento e iguais a 0.4 e 0.05, respectivamente. ............................... 65
Figura 49 - Influência do coeficiente de atrito cinético da distância percorrida pelas partículas
para µe igual a 0.7. ............................................................................................................... 66
Figura 50 - Resultado final da simulação do modelo com 85000 partículas e raio de 2.05mm:
a) vista lateral; b) vista frontal. ............................................................................................. 67
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Tabela com os valores dos parâmetros da curva média do experimento com 8500
sagus e rampa com inclinação de 45 graus............................................................................ 56
Tabela 2 - Tabela com os resultados da calibração dos modelos com raio de 2.05mm. ......... 57
Tabela 3 - Resultados obtidos da superfície de resposta com modelos de raio igual a 2.168
mm. ..................................................................................................................................... 61
Tabela 4 - Resultados obtidos da superfície de resposta com modelos de raio igual a 2.168
mm, utilizando novos parâmetros de perfil de altura. ............................................................ 62
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 9
1.1 Considerações Iniciais ...................................................................................................... 9
1.2 Objetivos ........................................................................................................................ 10
1.2.1 Objetivo Geral ............................................................................................................. 10
1.2.2 Objetivos específicos ................................................................................................... 10
1.3 Justificativa .................................................................................................................... 11
1.4 Contribuição para a Indústria de Petróleo ....................................................................... 11
1.5 Referencial Teórico ........................................................................................................ 15
1.5.1 Trabalhos sobre corridas de detritos: experimentais. .................................................... 15
1.5.2 Trabalhos sobre corridas de detritos: numéricos........................................................... 17
1.6 Delimitação do trabalho ................................................................................................. 19
2 CORRIDA DE DETRITOS .............................................................................................. 20
3 MÉTODO DOS ELEMENTOS DISCRETOS ................................................................... 22
3.1 Programa Computacional Utilizado: DEMOOP .............................................................. 23
3.1.1 Cálculo das Forças de Contato ..................................................................................... 25
4 METODOLOGIA ............................................................................................................. 34
4.1 Modelo Experimental ..................................................................................................... 34
4.1.1 Definição da geometria e dinâmica do modelo experimental........................................ 34
4.1.2 Escolha dos materiais .................................................................................................. 35
4.1.3 Estimativa do diâmetro médio das partículas ............................................................... 38
4.1.4 Procedimentos experimentais ...................................................................................... 39
4.1.5 Obtenção do perfil de altura de deposição das partículas .............................................. 40
4.2 Modelo Computacional .................................................................................................. 41
4.2.1 Elaboração da geometria do modelo e geração de partículas ........................................ 42
4.2.2 Simulações dos modelos computacionais no DEMOOP............................................... 45
4.2.3 Geração de perfis de altura computacionais no DEMVIEW ......................................... 47
4.2.4 Cálculo dos parâmetros do perfil de altura ................................................................... 47
4.2.5 Gera superfície de resposta .......................................................................................... 48
4.2.6 Busca dos parâmetros do MED com resultados próximos ao experimental .................. 49
6 RESULTADOS E ANÁLISES.......................................................................................... 51
6.1 Resultados experimentais ............................................................................................... 51
6.1.1 Estudo da repetibilidade do experimento ..................................................................... 51
6.1.2 Resultados de experimentos com quantidade de partículas e inclinações distintas ........ 54
6.2 Resultados numéricos ..................................................................................................... 56
6.2.1 Calibração do modelo numérico (raio 2.05mm) ........................................................... 56
6.2.2 Calibração do modelo numérico (raio 2.168mm) ......................................................... 60
6.3 Análises dos resultados numéricos ................................................................................. 65
7 Considerações finais ......................................................................................................... 68
7.1 Recomendações para trabalhos futuros ........................................................................... 69
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 70
9
1 INTRODUÇÃO
1.1 Considerações Iniciais
Movimentos de massa são fenômenos naturais responsáveis pela geomorfologia da
superfície terrestre, porém, vêm causando catástrofes em grande parte do Brasil. Dentre suas
classificações, encontram-se as corridas de detritos, movimentos caracterizados por sua
rapidez e alto poder de destruição. De acordo com Bigarella (2003), esses eventos podem ser
causados por diversos fatores, como declividades das vertentes, intensas chuvas,
desmatamento e ação do homem.
A instalação de cidades próximas às encostas ou sobre as vertentes altera as
características do relevo daquela região (retirada da vegetação, cortes para passagem de
dutovias e estradas, por exemplo), desprotegendo-o contra os efeitos da chuva e do
intemperismo. É nesse cenário que se encontra a maioria das cidades da região centro-sul do
país, região essa margeada pela Serra do Mar. Só no estado do Rio de Janeiro ocorreram três
dos piores desastres naturais do Brasil, dois no ano de 1967 (BIGARELLA, 2003) e um em
2011 (CENAD, 2012).
As graves consequências acarretadas por esses fenômenos, desde perdas materiais a
vítimas fatais, vêm mobilizando vários estudos na área. É comum, em estudos sobre
estabilidade de taludes, a utilização de métodos numéricos como o Método dos Elementos
Finitos (MEF) e o Método de Equilíbrio Limite (MEL). Ambos possuem um grande ramo de
aplicação, porém, neste trabalho propõe-se o uso do Método dos Elementos Discretos (MED),
que se destaca na modelagem de meios granulares o qual corresponde a este trabalho
(CINTRA E CARVALHO, 2006).
Atualmente, uma das linhas de pesquisa nessa área é a determinação dos parâmetros
numéricos do MED que caracterizam o problema em estudo. Porém, o estudo desses valores
utilizando dados reais de corridas de detritos pode apresentar um alto custo computacional,
devido à grande quantidade de partículas envolvidas no problema e a complexidade do
mesmo. Uma alternativa é a calibração experimental de modelos reduzidos do problema.
Assim, a confecção de um modelo experimental contribui para o estudo dos parâmetros do
MED e a calibração do modelo computacional contribui para estudos de corridas de detritos.
10
Este trabalho integra um projeto maior desenvolvido no Laboratório de Computação
Científica e Visualização (LCCV) em parceria com a PETROBRAS sobre o estudo do
fenômeno Corrida de Detritos com o título: Simulação da Corrida de Detritos no Sistema
PETRODEM – DEMTRITO.
1.2 Objetivos
1.2.1 Objetivo Geral
O objetivo deste trabalho é realizar a calibração experimental dos coeficientes de atrito
do Método dos Elementos Discretos para modelos tridimensionais simplificados de corridas
de detritos e, dessa maneira, contribuir para estudos sobre o fenômeno em questão.
A calibração desses parâmetros de atrito que representem um fluxo de detritos é
realizada através da comparação dos resultados de um experimento físico com os resultados
apresentados em simulações de modelos computacionais.
1.2.2 Objetivos específicos
Os objetivos específicos deste trabalho são:
a) determinar quais as variáveis globais são utilizadas para caracterizar uma
determinada corrida de detritos;
b) determinar quais os parâmetros numéricos de atrito têm influência nas variáveis
globais escolhidas e que, portanto, serão calibrados;
c) a partir de simulações numéricas com o MED, analisar o comportamento observado
do fluxo de partículas em função da escolha de diferentes valores para os
parâmetros numéricos;
d) dados os resultados experimentais, encontrar os valores dos parâmetros do MED
que melhor representem o experimento físico.
11
1.3 Justificativa
Apesar de serem conhecidas as causas desse fenômeno, a sua imprevisibilidade de
ocorrência é um dos principais motivos para que se desenvolvam mais estudos na área. O
estudo do comportamento do fluxo de detritos é complexo, mas vem sendo analisado por
vários pesquisadores através de métodos numéricos. Porém, o equacionamento dos mesmos
depende de parâmetros, muitas vezes, desconhecidos. Trata-se de parâmetros característicos
dos materiais envolvidos no problema, como o coeficiente de atrito da superfície em que
ocorre o fluxo ou o atrito no contato entre as partículas. Assim, este trabalho pretende estudar
a influência desses parâmetros no fluxo de detritos.
1.4 Contribuição para a Indústria de Petróleo
Grande parte das indústrias petrolíferas brasileiras está localizada na região Sudeste do
país. Na Figura 1, nota-se que, entre os anos de 1991 e 2010, essa região foi a que mais sofreu
deslizamentos de terra. Dessa forma, o estudo sobre esses eventos se tornou de extrema
importância para o setor petrolífero.
Figura 1 - Porcentagem de ocorrência de movimentos de massa por região, entre os anos de 1991 a 2010.
Fonte: CEPED,2012.
Essa alta porcentagem de incidência de deslizamentos na região Sudeste está associada
a sua geografia. Trata-se de uma região de transição de clima, caracterizada por grande
variação de relevo, temperatura, vento e precipitação. A Serra do Mar, uma área montanhosa
12
que se estende desde o sul da Bahia até Santa Catarina, é a zona onde são notados os maiores
índices pluviométricos e a área onde mais são notados deslizamentos de terra no Brasil,
principalmente nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Além disso, a ocupação
populacional desordenada em áreas de risco é mais um fator determinante do índice exposto
na Figura 1 (CENAD, 2012).
Uma das catástrofes mais conhecidas que envolve diretamente o setor petrolífero é a
corrida de detritos ocorrida em 1994, na Bacia do Rio de Pedras, na cidade de Cubatão-SP,
onde houve o transporte de um volume de 300.000m³ que chegou a atingir a Refinaria
Presidente Bernardes, interrompendo suas atividades durante duas semanas (LOPES E
RIEDEL, 2007).
Outra preocupação na área de petróleo está nas dutovias brasileiras, pois a maior
concentração de dutos está localizada também no sudeste do país, como pode ser notado nas
Figuras 2 e 3.
14
Figura 3 - Dutos para o transporte de gás natural no Brasil.
Fonte: ANP (2014).
O modal dutoviário só tende a crescer no Brasil, pois vem se mostrando a maneira
mais segura de realizar o transporte de petróleo e gás natural comparado a outros modais.
Porém, uma das causas do rompimento de dutos é o deslizamento de terra. O duto acaba não
suportando as cargas solicitadas após o deslizamento e rompe. O vazamento do óleo ou gás
devido ao rompimento do duto expõe a população e o meio ambiente a risco, além de
acarretar prejuízo à indústria petrolífera. Foi registrado um caso em 1994 em que o
movimento de massa causou o rompimento do Oleoduto TEBAR/RPBC, em São
15
Sebastião/SP, onde 2.700 m³ de óleo vazaram, causando vários impactos ambientais ao atingir
área de vegetação de Mata Atlântica e praias (CETESB, 2010).
1.5 Referencial Teórico
O estudo de trabalhos no mesmo âmbito de aplicação serve como base para elaboração
do tema do trabalho e direcionamento do mesmo. Nesse sentido, busca-se trabalhos sobre
corridas de detritos utilizando experimentos físicos e outros com aplicação de métodos
numéricos.
1.5.1 Trabalhos sobre corridas de detritos: experimentais.
Na literatura, o trabalho desenvolvido por Hutter et al (1995) confecciona o modelo
em forma de calha com três inclinações distintas: 40º, 50º e 60º (Figura 4). O estudo do fluxo
de partículas é realizado com materiais granulares distintos. Uma parede móvel segura as
partículas na região superior e, ao levantá-la, as partículas passam a se mover pela calha. O
autor avalia o comportamento descrito por cada material através de vídeos e fotos. Segundo
Crosta et al (2001), esse trabalho é uma das fontes mais importantes no ramo de experimentos
sobre as corridas de detritos.
Figura 4 - Modelo desenvolvido por Hutter et al (1995).
Fonte: Hutter et al (1995).
16
Outro trabalho no ramo experimental sobre corrida de detritos é o desenvolvido por
Braga e Vieira (2014). Trata-se da confecção de uma rampa similar à apresentada na Figura 4,
porém não apresenta a curvatura no encontro entre as superfícies planas, é confeccionada com
outros materiais e possui inclinação de 45º (Figura 5).
Figura 5 - Rampa confeccionada no trabalho de Braga e Vieira (2014).
Fonte: Braga e Vieira (2014).
Nesse trabalho, os autores buscam analisar a configuração final das partículas após
rolarem pela rampa, adquirindo os parâmetros hmáx, L, XR e XF, apresentados nas Figuras 6 e
7Figura 6, utilizando imagens. São realizados experimentos com um material granular, o sagu
de Mandioca.
Figura 6 - Parâmetro altura máxima adquirido no trabalho de Braga e Vieira (2014).
Fonte: Braga e Vieira (2014).
17
Figura 7 - Parâmetros XR, XF e L adquiridos no trabalho de Braga e Vieira (2014).
Fonte: Braga e Vieira (2014).
1.5.2 Trabalhos sobre corridas de detritos: numéricos.
O trabalho desenvolvido por Braga e Vieira (2014) também possuem aplicação
numérica. Os autores buscam representar a rampa confeccionada computacionalmente,
utilizando um modelo escalado. Nesse estudo, procura-se verificar a possibilidade de se
representar o fluxo de detritos utilizando o Método dos Elementos Discretos, modificando-se
a relação kt/kn, que são as rigidezes tangencial (kt) e normal (kn). Os resultados experimentais
e numéricos são comparados apenas com os valores dos parâmetros hmáx, L, XR e XF.
No Relatório 3 (2014), foi realizado um estudo da influência da relação em
fluxo de detritos. Para isso, os autores definiram quais parâmetros da corrida deveriam ser
analisados. As Figuras 8 e 9 mostram os resultados do estudo da influência da relação
nos parâmetros H/L e h/l, onde H é a diferença da altura do centro de massa do arranjo inicial
das partículas (antes do deslizamento) pela altura no centro de massa da deposição final, L é a
diferença na horizontal desses pontos, h é a máxima da deposição das partículas e l é o
espalhamento final das partículas (comprimento de deposição). Além disso, avaliaram os
resultados utilizando modelos com arranjos iniciais diferentes (10, 15 e 20 modelos distintos),
onde as posições e os diâmetros das partículas são escolhidos randomicamente.
18
Figura 8 - Estudo da relação L/H em função de .
Fonte: Relatório 3 (2014)
Figura 9 - Estudo da relação l/h em função de .
Fonte: Relatório 3 (2014)
Pelas figuras acima, os autores concluíram que os comportamentos das curvas dos
parâmetros em função da relação são semelhantes para 10, 15 e 20 modelos com
arranjos iniciais diferentes. Assim, a variação no arranjo das partículas não apresenta
diferenças significativas no resultado final do perfil de altura. Além disso, notaram que a
partir da relação igual a 0.5, nos dois gráficos, a variação dos parâmetros da corrida passa a
19
ser pequena. Dessa forma, qualquer valor adotado para entre 0.5 e 1 não acarretará
grandes influências nos resultados dos modelos numéricos.
1.6 Delimitação do trabalho
Neste trabalho são analisados os resultados gerados a partir de um modelo de rampa
tridimensional, que reproduz o modelo físico de uma rampa confeccionada no Laboratório de
Geotecnia da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). São analisados os parâmetros do
modelo numérico possíveis de serem alterados também no modelo físico, como a quantidade
de partículas e a inclinação da rampa. Todas as simulações e experimentos são realizados com
partículas secas, não faz parte deste trabalho o estudo da influência da presença de água no
processo. Nas simulações, as partículas são sempre esféricas e de mesmo diâmetro, e é
analisada apenas a influência dos parâmetros de atrito do MED no fluxo de detritos.
20
2 CORRIDA DE DETRITOS
Os movimentos de massa são fenômenos naturais que vêm preocupando as
autoridades públicas e privadas, devido às graves consequências acarretadas pelos mesmos.
Esses movimentos podem ser lentos ou rápidos, podem carregar um grande ou pequeno
volume de sedimentos grossos ou finos. A corrida de detrito é um tipo de movimento de
massa caracterizado por altas velocidades e alto poder de destruição.
Um dos desastres naturais mais graves do mundo foi o deslizamento de terra ocorrido
na região serrana do estado do Rio de Janeiro no início de 2011. Segundo CENAD (2012),
esse desastre afetou diretamente quatro municípios (Teresópolis, Nova Friburgo, Petrópolis e
Sumidouro), matando 912 pessoas e deixando cerca de 45 mil pessoas desabrigadas (Figura
10).
Figura 10 - Deslizamento de terra em Teresópolis em janeiro de 2011.
Fonte: Veja (2011).
Dentre os métodos para classificação dos movimentos de massa apresentados até a
atualidade, costuma-se adotar o método proposto por Varnes (1978), em que a divisão é
determinada de acordo com o tipo de movimento e o tipo de sedimentos que são
transportados. As corridas de detritos são comparadas às corridas de lama devido à rapidez
(característica das “corridas”). Porém, diferencia-se em seu material transportado, por
apresentar uma mistura de sedimentos (solo e rocha) em que há predominância do material
mais grosso (SILVEIRA, 2008). Assim, podem-se considerar as corridas de detritos como o
movimento de massa com maior poder de destruição.
21
Dentre os tipos de movimentos de massa, Augusto Filho (1992) diferencia as corridas
de acordo com a sua dinâmica e o tipo de material transportado. As corridas possuem
velocidade de média a alta, normalmente transportam grandes volumes de materiais, se
desenvolvem ao longo de canais de drenagem e costumam atingir um extenso raio de alcance.
Em relação às causas desses fenômenos, Bigarella (2003) afirma que os principais
fatores condicionantes para formação de movimentos de massa são a estrutura geológica, a
declividade da encosta, o regime de chuvas, a perda de vegetação e a atividade antrópica.
A geomorfologia das encostas determina o canal de drenagem e, quando as
declividades são altas, as instabilidades de taludes são maiores. O regime de chuvas está
ligado à saturação do solo, que faz com que a coesão diminua e com que surjam forças de
percolação, podendo ou não ocorrer a erosão do solo (SILVEIRA, 2008). O desmatamento
desprotege o solo, acentuando o efeito de chuvas intensas. E a atividade antrópica como causa
de movimentos de massa está relacionado a todos os fatores citados anteriormente.
Normalmente, é comum verificar cidades em cima de encostas e cortes em taludes para
passagem de estradas. Apesar de ser um movimento natural, a atuação do homem acaba
acelerando a ocorrência desses movimentos.
Existem diversos métodos de investigação de movimentos de massa, tais como estudo
geológico regional, critérios de identificação direta no campo (verificar existência de fraturas
em taludes, de raízes expostas, de deformações em obras de alvenaria), mapeamento
geológico da encosta (GUIDICINI E NIEBLE, 1984), além de estudos meteorológicos.
Entretanto, é difícil prever sua ocorrência e determinar a área afetada pelas corridas de
detritos, bem como a velocidade e a distância alcançada por eles.
22
3 MÉTODO DOS ELEMENTOS DISCRETOS
O avanço da tecnologia permitiu o desenvolvimento de métodos numéricos para
resolução de problemas complexos de engenharia. Atualmente, pode-se contar com a
formulação de vários métodos, dentre eles, estão o Método dos Elementos Finitos (MEF), o
Método dos Elementos de Contorno (MEC) e o Método dos Elementos Discretos (MED). O
tipo de problema em estudo é que define qual método apresentará mais vantagens na sua
resolução.
Na modelagem de fenômenos como fragmentação, colisão, impacto e, em especial
para a simulação de fluxo de materiais granulares, o MED vem se destacando entre os demais
por apresentar melhores resultados (CINTRA E CARVALHO, 2006). Dessa maneira, o MED
se torna apropriado na análise de fluxos de corridas de detritos.
A formulação desse método foi inicialmente proposta por Cundall e Strack (1979) e
descreve o comportamento de um conjunto de discos e esferas. Posteriormente, Cundall e
Hart (1992) determinaram que um método computacional é denominado Método dos
Elementos Discretos se puder calcular individualmente os deslocamentos e rotações dos
elementos e, durante a análise, atualizar os contatos automaticamente.
Apesar de existir em várias pesquisas sobre o MED, o mesmo se encontra em um
estágio de desenvolvimento inferior comparado ao Método dos Elementos Finitos e ao
Método dos Elementos de Contorno. Dessa forma, a formulação sofre alterações de acordo
com o problema em que se deseja analisar (MANUAL, 2009).
Nesta direção, pesquisadores do Laboratório de Computação Científica e Visualização
(LCCV) da UFAL vêm desenvolvendo um programa computacional para estudo de problemas
de natureza descontínua, utilizando o MED em sua formulação e atualizando-a quando
necessário. Esse programa é denominado DEMOOP e é uma das ferramentas do sistema
PETRODEM, desenvolvido também no LCCV em parceria com a Petrobras (LCCV, 2014).
Neste trabalho, para análise numérica será utilizado o DEMOOP. Nos próximos itens
são discutidas as ferramentas desse programa e as variáveis do MED que são de interesse para
este trabalho.
23
3.1 Programa Computacional Utilizado: DEMOOP
O DEMOOP utiliza a estratégia de cálculo do MED, que é realizada em etapas, de
acordo com o diagrama ilustrado na Figura 11.
Figura 11 - Etapas de cálculo do Método dos Elementos Discretos.
Fonte: Adaptado de Manual (2009).
A etapa inicial é onde o usuário passa a geometria do problema para o programa e
define as condições iniciais e de contorno como, por exemplo, forças externas atuantes nas
partículas. Definida as condições iniciais, faz-se a busca pelos contatos entre as partículas e,
assim, calculam-se as forças de contato. Essas forças fazem com que a partícula se desloque,
sendo necessário calcular deslocamento, velocidade e aceleração das mesmas. Por fim, são
24
encontradas as novas posições da partícula. Essas quatro últimas etapas se repetem até o
término da análise (MANUAL, 2009).
Em problemas que utilizam o MED, costuma-se gerar modelos com um grande
número de partículas. Dessa forma, a detecção de contatos é uma etapa que exige um alto
custo computacional (CINTRA E CARVALHO, 2006). O DEMOOP permite a utilização de
três algoritmos de busca por contatos. O mais simples é o Método de Verificação Direta, em
que o contato entre as partículas é determinado pelo valor da interpenetração entre as mesmas.
São verificadas partículas individualmente, exigindo um alto tempo de simulação. Os outros
dois métodos fazem um mapeamento do domínio, dividindo-o em células quadradas de
mesmo tamanho, onde é realizada a verificação do contato. Em situações em que há grande
variação nas dimensões das partículas, o Mapeamento por Células é mais indicado. Nesse
método, as células possuem lado igual ao diâmetro do menor elemento discreto. Já no
Mapeamento Direto, as células possuem lados iguais ao diâmetro do maior elemento, sendo
indicado para problemas em que as partículas possuem tamanhos semelhantes (MANUAL,
2009).
A força resultante é encontrada pela seguinte equação:
(1)
onde ,
e são as forças externas, internas e de amortecimento global da partícula,
respectivamente.
A força peso é um exemplo de força externa. As forças internas são as forças de
contato geradas na interação entre as partículas ou entre as partículas e os obstáculos e são
calculadas em função da velocidade relativa entre as partículas que colidiram. Já a força de
amortecimento global é calculada de acordo com a velocidade instantânea da partícula,
havendo dissipação de energia da partícula mesmo sem a mesma estar em contato com outra.
A aceleração de cada partícula é calculada pelo conceito da segunda lei de Newton
(Equação 2) e é governada pela equação do movimento para corpos rígidos (MANUAL,
2009).
(2)
25
onde f é o vetor com as forças e momentos resultantes na partícula i, m é a massa da partícula
e ü é a aceleração.
3.1.1 Cálculo das Forças de Contato
As forças de contato possuem intensidade e direção de acordo com a relação força-
deslocamento, que por sua vez dependem das velocidades e deslocamentos relativos
tangenciais e normais. Para definir as direções tangencial e normal, imagina-se um plano no
ponto de contato entre as partículas, tangenciando-as (Figura 12).
Figura 12 - Plano tangencial às partículas no ponto de contato.
Fonte: Manual Demoop
Na Figura 12, C representa o centroide das partículas i e j, π é o plano tangente e Ft e
Fn são as forças nas direções tangencial e normal ao plano, respectivamente.
No DEMOOP, a análise numérica é aplicada apenas a corpos rígidos, onde o contato
entre as partículas ocorre em um único ponto. Na prática, o contato entre dois corpos acontece
em diversos pontos, devido à deformação dos mesmos ao colidirem. Para representar esse
fenômeno, o programa utiliza como alternativa o Método da Penalidade, em que é gerada uma
força repulsiva capaz de evitar a superposição entre as partículas, de acordo com um
parâmetro de penalidade (MANUAL, 2009).
A relação força-deslocamento pode ser calculada por diversos modelos disponíveis no
programa. Alguns deles analisam apenas o contato por uma relação elástica linear, em que as
forças dependem das rigidezes e dos deslocamentos. Já outros acrescentam uma parcela de
relação viscosa linear, havendo também dependência da velocidade relativa entre as partículas
(MANUAL, 2009).
26
Neste trabalho, o contato entre as partículas é representado pelo Modelo de Kelvin-
Coulomb, enquanto que na interação entre as partículas e os obstáculos há uma alteração da
parcela da força tangencial, sendo aplicado o equacionamento do movimento de rolamento.
3.1.1.1 Contato Partícula – Partícula
As interações entre as partículas são calculadas pelo Modelo de Kelvin-Coulomb, em
que se analisam relações elástica e viscosa lineares nos contatos (MANUAL, 2009). A força
na interação das partículas é decomposta em tangencial e normal, como visto na Figura 12. A
força normal é dada pela Equação 3.
(3)
onde é a componente normal da força de contato, é a rigidez, é o deslocamento
relativo, é o coeficiente de amortecimento e é a velocidade relativa, todos na direção
normal.
A rigidez normal está relacionada à força repulsiva do Método da Penalidade, citada
no item 3.2, e pode ser estimado um valor mínimo para a mesma em cada tipo de análise. Para
isso, deve-se estudar a sobreposição (α) entre as partículas. Usualmente, é aceitável um α
igual a 1% do raio ( ) da partícula. Considerando um recipiente preenchido com partículas
até uma altura (mesma altura útil utilizada no modelo), a tensão na parte inferior desse
recipiente será:
(4)
onde ρ é a massa específica da partícula e g é a aceleração da gravidade. O cálculo da força
máxima de repulsão é dado pela multiplicação da tensão máxima pela área de projeção do
contato da partícula (Figura 13), segundo a Equação 5.
27
Figura 13 - Aproximação da área do contato entre as partículas.
Fonte: Elaborado pelo autor.
(5)
Existe um valor de que multiplicado pela sobreposição resulta nessa força máxima.
Como não é desejável uma sobreposição maior que 1% do , encontra-se, então, a rigidez
normal mínima ( ) para cada tipo de análise pela Equação 6.
(6)
A componente tangencial da força de contato, no modelo de Kelvin - Coulomb, é dada
pelas mesmas parcelas da força normal, porém com um acréscimo do atrito de Coulomb. O
cálculo dessa força é dado pela relação apresentada na Equação 7 e o contato entre as
partículas é representado na Figura 14.
(7)
onde é a componente tangencial da força de contato, é a rigidez tangencial, é o
deslocamento relativo na direção tangente ao contato, é o coeficiente de amortecimento
tangencial, é a velocidade relativa tangencial, é a força de atrito (Equação 8) e
é uma função sinal dada pela relação exposta na Equação 9.
28
(8)
(9)
onde é o coeficiente de atrito. A Figura 14 esquematiza as forças de contato do Modelo
Kelvin-Coulomb.
Figura 14 – Representação do contato entre as partículas no modelo Kelvin-Coulomb.
Fonte: Manual (2009).
3.1.1.2 Contato Partícula – Obstáculo
No contato entre partículas e obstáculos, o DEMOOP apresenta uma nova formulação,
acrescentando ao cálculo da componente tangencial da força de interação parcelas da equação
do movimento de rolamento realizado pela partícula, as quais são discutidas neste item.
Geralmente, objetos de seção transversal circular, ao receberem ação de uma força,
realizam um movimento denominado de rolamento. Segundo Halliday, Resnick e Walker
(2008), rolamento pode ser estudado como a junção dos movimentos de rotação de um corpo
em torno de seu centro de massa (rotação pura) e de translação do mesmo (translação pura),
como mostra a Figura 15.
29
Figura 15 - Movimento de rolamento dado pela combinação de rotação pura com translação pura.
Fonte: (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2008)
Sendo a velocidade linear do centro de massa e ω a velocidade angular ao redor
do centro de massa.
Pela Figura 15, verifica-se que no ponto em que a roda toca a superfície (ponto P), a
velocidade linear é igual a zero. Nesse caso, diz-se que o corpo está em rolamento puro, ou
seja, o mesmo não desliza sobre a superfície. Quando a velocidade em P é diferente de zero,
há o movimento dito por rolamento com escorregamento. Essa variação da velocidade está
relacionada ao atrito do corpo com a superfície.
3.1.1.2.1 Atrito no movimento de rolamento
Para simplificar o entendimento sobre o assunto, faz-se o estudo em corpos rígidos.
Alguns autores analisam o movimento em cilindros rígidos (PINTO E FIOLHAIS, 2001),
outros em experimentos com um carretel (SOUSA, 2012), sendo todos os objetos de seção
transversal circular. O mesmo modelo matemático pode ser aplicado a esferas, modificando
apenas o raio de giração em sua formulação. Neste trabalho, o estudo em esferas é essencial
devido à limitação do DEMOOP em trabalhar com discos (modelos bidimensionais) e esferas
(modelos tridimensionais).
É importante salientar, que nesse tipo de movimento, a força de atrito pode ser no
mesmo sentido que se dá o rolamento, como no sentido contrário, diferente do que acontece
ao analisar translação de um bloco ou partícula, que a força de atrito sempre se opõe ao
30
movimento. O sentido dessa força está relacionado à altura em que são aplicadas forças
externas (PINTO E FIOLHAIS, 2001). Para corpos rígidos existem dois tipos de atrito, o
estático e o cinético.
Supondo que um corpo de massa e raio esteja inicialmente em repouso sobre uma
superfície plana. Aplica-se uma força a uma altura da esfera e o corpo passa adquirir uma
velocidade linear no centro de massa ( ) de acordo com a magnitude dessa força. Surge,
então, a força de atrito , responsável por reduzir a velocidade de translação do corpo e
realizar torque, aumentando a velocidade angular ω (ANDRADE et al, 2013). Na Figura 16 é
representado o esquema de forças na sessão transversal do corpo.
Figura 16 - Esquema de forças que agem em um objeto de seção transversal circular.
Fonte: Adaptado de Pinto e Fiolhais (2001).
Como é necessário estudar a velocidade no ponto P ( ) para verificar se existe ou não
escorregamento no movimento, calcula-se pela seguinte equação:
(10)
Para que não haja escorregamento, deve ser igual a zero e, nessa situação, temos:
(11)
Nessas condições, o movimento é de rolamento puro e o atrito é dito estático. O valor
máximo que a força de atrito estático pode assumir é:
31
(12)
onde μe é o coeficiente de atrito estático e é a força normal.
Se a força aplicada no corpo superar a ação da força de atrito estático máxima, a
velocidade de translação passa a aumentar. Como o atrito atingiu seu valor máximo, não há
aumento do torque exercido por essa força. Dessa forma, de acordo com a equação (10),
passa a ser diferente de zero e o corpo passa a rolar e deslizar. Logo, passa a atuar no corpo
uma força de atrito cinético, calculada por:
(13)
onde μc é o coeficiente de atrito cinético.
No trabalho desenvolvido por Pinto e Fiolhais (2001), os autores afirmam que o
coeficiente de atrito estático deve sempre ser maior que o cinético, visto que se μc > μe, o
corpo continuaria na condição de rolamento puro.
Verificando agora um movimento em que uma esfera é lançada em um plano
horizontal rígido com uma velocidade linear e sem rotação, desprezando a resistência do ar.
Neste caso a velocidade é maior que a velocidade de rotação da partícula. Dessa forma,
inicialmente, o atrito que atua no corpo é cinético, pois é diferente de zero (Equação 10). A
força de atrito, então, reduz e aumenta a velocidade angular. Como, nesse caso, não há
uma força que realize trabalho na esfera, a mesma tende a entrar no movimento de rolamento
puro. Andrade et al (2013) realizaram esse estudo e verificaram que, após os corpos rígidos
atingirem esse movimento, a força de atrito é nula e a velocidade passa a ser constante.
Porém, na prática a tendência é que a esfera pare com o tempo. Nesse contexto, é
necessário estudar o movimento em corpos deformáveis. A Figura 17 representa as forças que
atuam em um corpo deformável em contato com a superfície.
32
Figura 17 - Esquema de forças em um corpo deformável.
Fonte: Andrade et al (2013).
Pela Figura 17 é possível verificar que a força normal em corpos deformáveis se
desloca do centro de massa. Dessa forma, passa a agir o atrito de rolamento, sujo coeficiente é
dado pela Equação 14.
(14)
onde é o coeficiente de atrito de rolamento, é a distância horizontal do centro de massa
ao ponto onde a força normal atua e é o valor do raio da partícula.
No trabalho desenvolvido por Andrade et al (2013), os autores encontram a função
horária da velocidade de uma esfera deformável (Equação 15).
(15)
onde é a velocidade inicial da esfera, é a gravidade e é o tempo. Com isso, a esfera
para quando a função é zero, em um tempo dado pela Equação 16.
(16)
A formulação do DEMOOP considera apenas que todas as esferas são rígidas. Logo, a
estratégia utilizada para que a partícula pare é a verificação do movimento, ou seja, quando o
corpo tender a uma velocidade constante, é aplicado o valor do atrito de rolamento no
equacionamento.
33
Os valores dos coeficientes de atrito, da rigidez normal e tangencial de um tipo de
material ou de uma superfície nem sempre são encontrados na literatura. Dessa forma, este
trabalho estuda a influência desses coeficientes no movimento das partículas em uma rampa e
busca encontrar quais são os valores que melhor representam esse experimento.
34
4 METODOLOGIA
A metodologia para a calibração dos parâmetros do Método dos Elementos Discretos e
influência dos mesmos no fluxo de partículas é dividido em duas etapas distintas:
experimental e computacional. Nos itens 4.1 e 4.2, encontram-se os procedimentos para
realização dessas etapas.
4.1 Modelo Experimental
Essa etapa do projeto é realizada no Laboratório de Geotecnia (LabGeo) da UFAL,
com o apoio da equipe do mesmo. A Figura 18 descreve a metodologia utilizada nessa etapa
do trabalho.
Figura 18 - Etapas para confecção e elaboração do experimento físico.
Fonte: Elaborado pelo Autor.
4.1.1 Definição da geometria e dinâmica do modelo experimental
O ponto inicial para a confecção do modelo experimental é a definição da geometria e
da dinâmica do mesmo. Crosta et al (2001) relatam, em seu trabalho, que movimentos de
Definição da geometria e dinâmica
do modelo experimental
Escolha dos materiais
Estimativa do diâmetro médio das
partículas
Realização do experimento
Obtenção do perfil de altura de
deposição das partículas
Média dos perfis de altura
35
massa podem se originar ao longo de pistas abertas ou em canais de drenagem e que a camada
de deposição não é uniforme (apresenta variação na altura ao longo da camada). Com isso,
elabora-se um modelo no qual o fluxo se origina em um canal e que é possível observar o
espalhamento ao final do mesmo.
De acordo com os trabalhos relatados no item 1.5.1, utiliza-se a rampa confeccionada
no trabalho de Braga e Vieira (2014). Esse modelo tem bastante influência do trabalho
desenvolvido por Hutter et al (1995).
Assim, o modelo possui uma região em forma de calha composta por um plano
inclinado e outro horizontal e uma área de espalhamento. A região inclinada possui 75 cm de
comprimento útil para o movimento das partículas e há a possibilidade de inclinar em 30º e
45º com a horizontal. A base na horizontal possui 50 cm, espessura interna de 10 cm, altura
de 20 cm para evitar que as partículas não saiam do canal. Acima dos 75 cm há uma parede
móvel, onde são colocadas as partículas antes do movimento. Ao mover essa parede na
direção perpendicular ao plano inclinado, as partículas escorregam pela rampa até o repouso.
A Figura 19 mostra o projeto do modelo, com todas as dimensões definidas.
Figura 19 - Projeto executivo do aparato experimental.
Fonte: Elaborado pelo autor.
4.1.2 Escolha dos materiais
Os materiais escolhidos para a confecção da rampa elaborada por Braga e Vieira
(2014) são a madeira (para a base e parede móvel) e o acrílico (nas paredes). A escolha do
36
primeiro material se deve à facilidade de se encontrar mão de obra especializada para
trabalhar com o mesmo, pelo seu peso específico e resistência, que garante a estabilidade no
experimento e por apresentar uma rugosidade maior na superfície quando comparado ao
acrílico.
Nesse experimento, não se analisa fluxo com aplicação de água, pois este trabalho se
trata de uma análise inicial dos parâmetros de corridas de detritos e, ao utilizar água no
problema, aumentaria a complexidade de análise tanto experimental quanto numérica. Dessa
forma, a madeira é o material mais adequado para a confecção da base.
Nas paredes, a utilização de acrílico é essencial para a visualização do fluxo das
partículas, devido a sua transparência. Comparado ao vidro, o acrílico possui peso específico
menor, podendo apresentar uma altura maior para pequenas espessuras. Além disso, é um
material que garante mais segurança ao usuário e, atualmente, existem várias fábricas que
confeccionam formas complexas com esse material, possibilitando ao usuário liberdade na
criação das peças desejadas.
A rampa pode ser adaptada, à medida que sejam notadas dificuldades para obtenção
dos resultados. Neste trabalho, a rampa passa a ter a base e uma de suas paredes na tonalidade
azul escura em relação à rampa confeccionada por Braga e Vieira (2014). Essa adaptação
serve para obter contraste e, assim, melhorar a visualização da corrida. A aplicação de tinta na
base da rampa requer um tempo de espera (no mínimo uma semana) para secagem, antes de
começar a realizar os experimentos. A espera serve para evitar influência da tinta fresca
(pegajosidade) nos resultados do experimento.
O modelo experimental confeccionado é considerado de baixo custo, pois o valor total
não ultrapassou R$900,00. A Figura 20 mostra a rampa final utilizada na execução dos
experimentos.
37
Figura 20 - Rampa confeccionada para elaboração do experimento físico.
Fonte: Elaborado pelo autor.
O material granular utilizado é o mesmo do trabalho de Braga e Vieira (2014): o
“sagu” (Figura 21), um material feito de mandioca. Para a escolha, consideram-se as seguintes
características: esfericidade das partículas e regularidade na dimensão dos diâmetros. A
esfericidade se deve a necessidade de poder representar o experimento o mais fielmente
possível, visto que no DEMOOP só pode ser analisada esférica perfeita. O sagu atende às
duas condições.
Figura 21 - Material aplicado no experimento físico: o sagu.
Fonte: Elaborado pelo autor.
38
4.1.3 Estimativa do diâmetro médio das partículas
O valor do diâmetro médio das partículas nem sempre é fácil de ser estimado. Dessa
forma, neste trabalho é realizado um estudo da influência desse valor nas simulações. Para
isso, aplicam-se duas metodologias para medição do diâmetro médio que retornam resultados
distintos, porém próximos. A primeira se trata de encontrar o diâmetro pela média dos valores
medidos com paquímetro em esferas diferentes. Já na segunda, encontra-se a quantidade de
partículas que cabem em um recipiente com dimensões conhecidas e estima-se o diâmetro
computacionalmente, por meio de um programa de geração de partículas. Para isso, preenche-
se o recipiente até o topo com sagu (Figura 22) e, logo após, mede-se a massa que continha no
mesmo.
Figura 22 - Modelo de cápsula utilizada para o cálculo do diâmetro médio das partículas.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Para a determinação aproximada da quantidade de partículas no recipiente, encontra-se
uma relação linear entre quantidade de partículas pela massa (em gramas), da seguinte
maneira: pesa-se 5g de cada material e faz-se a contagem de partículas; repete-se essa
contagem e o resultado se dá pela média dos valores encontrados. Assim, conhecendo-se essa
relação e sabendo a massa que contém no recipiente, estima-se a quantidade de partículas.
39
4.1.4 Procedimentos experimentais
Para garantir uma uniformidade dos experimentos, os procedimentos devem ser
seguidos rigorosamente. Definem-se duas massas fixas a serem utilizadas nos experimentos
de acordo com a relação linear entre a quantidade de partículas e a massa, descrita no item
4.1.3. Assim, são realizados experimentos com 405g e 810g de sagu, equivalentes a
aproximadamente 8500 e 17000 partículas, respectivamente. A medição dessas massas é
realizada em uma balança com precisão de 0.01g. A realização de experimentos com massas
diferentes e inclinações diferentes serve para conferir a eficácia da calibração do modelo
computacional.
O posicionamento das partículas no experimento com inclinação de 45 graus é
conforme a Figura 23a, onde se procura representar um prisma de base triangular perfeito.
Quando a inclinação é de 30 graus, procura-se posicionar as partículas de forma que no topo
seja um plano horizontal.
Figura 23 - Posição inicial das esferas de sagu nos experimentos com 45 graus (a) e 30 graus (b).
(a)
(b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
O procedimento para a realização dos experimentos deve seguir as seguintes etapas:
a) pesa-se a quantidade de sagu definida anteriormente, referente ao experimento que
deseja realizar;
b) posicionam-se as partículas, conforme a Figura 23, em cima da parede móvel
(comporta);
40
c) movimenta-se a comporta na direção perpendicular ao plano inclinado, para que
as esferas rolem pela rampa. Nessa etapa, deve-se movimentar a comporta com
uma velocidade alta para não interferir no resultado;
d) quando as esferas atingem o repouso, obtém-se imagens do perfil de altura de
deposição das mesmas. Caso seja necessário, esse fluxo pode ser registrado
através de vídeos.
Nessa última etapa é colocada uma régua na parede da calha para servir de escala para
análise do resultado. Repete-se o experimento quantas vezes necessitar.
4.1.5 Obtenção do perfil de altura de deposição das partículas
Ao obter uma imagem da configuração final da corrida, utiliza-se o software
AutoCAD Education, uma ferramenta gratuita voltada a desenho gráfico 2D e 3D
(AUTODESK, 2014), para obter o perfil de altura das partículas em cada experimento. São
aplicados fatores de escalas nas imagens, para que as dimensões encontradas sejam em
centímetros. Com a utilização do comando Polyline, traça-se o perfil de altura com o x
variando de 0,5 cm. O resultado final para calibração do modelo computacional é a curva
média dos perfis de altura experimentais e da mesma pode-se obter qualquer parâmetro
desejado. A Figura 24 representa o perfil traçado de um dos experimentos físicos.
Figura 24 - Perfil de altura de deposição das partículas em um experimento físico.
Fonte: Elaborado pelo autor.
41
A critério de análise, adota-se o ponto (0,0) como sendo o ponto da descontinuidade da
rampa, ou seja, a interseção do plano inclinado com o plano horizontal. O mesmo referencial
foi adotado no modelo computacional.
4.2 Modelo Computacional
Na modelagem, utiliza-se o DEMOOP (Manual, 2014) para o processamento e o
DEMVIEW (AMORIM; CINTRA; LIRA, 2006) para a visualização das simulações e
obtenção dos perfis de altura. O DEMVIEW é um programa desenvolvido por pesquisadores
do LCCV, compatível com o DEMOOP, utilizado para pós-processamento.
A utilização desses programas está inserida na metodologia para a calibração dos
parâmetros do MED. A Figura 25 representa um fluxograma da estratégia adotada na
calibração dos modelos.
42
Figura 25 - Fluxograma indicando a metodologia para a calibração do modelo computacional.
Fonte: Elaborado pelo autor.
4.2.1 Elaboração da geometria do modelo e geração de partículas
A geometria do modelo é composta por uma malha de triângulos. Não há necessidade
que a malha seja robusta, com triângulos de dimensões pequenas, por isso os nós são
definidos manualmente. Nos modelos criados, a malha é constituída por apenas 16 triângulos.
Elaboração da geometria do modelo
e geração de partículas
Simulações dos modelos
computacionais no DEMOOP
Geração de perfis de altura computacionais
no DEMVIEW
Cálculo dos parâmetros do perfil
de altura
Gera superfície de resposta
Busca dos parâmetros do MED com
resultados próximos ao experimental
Simulação dos modelos com os
parâmetros encontrados
Comparação do resultado com o perfil de altura experimental
Modelo Calibrado
43
Para a geração das partículas, necessita-se de duas ferramentas, uma para gerar a
malha que delimita a região das partículas e outra para gerar as esferas dentro da malha. Para
criar malha, aplica-se o Gmsh, um programa que gera malhas de elementos finitos e é
constituído por quatro módulos: geometria, malha, solver e pós-processamento (GEUZAINE;
REMACLE, 2014). Neste trabalho, esse programa é utilizado apenas para pré-processamento.
Já para a geração de partículas, passa-se a malha gerada e o raio da partícula para o Cilynder,
ferramenta do PETRODEM que gera um arquivo contendo as posições x, y e z das esferas
espalhadas no volume determinado na malha.
Essa estratégia para gerar partículas é utilizada também para estimar o diâmetro médio
das esferas do experimento. Conhecendo-se as dimensões da cápsula da Figura 22, faz-se uma
malha representando esse recipiente (Figura 26a). As partículas geradas possuem o mesmo
raio e são posicionadas de maneira a preencher toda a região interna dos obstáculos (Figura
26b). Assim, a quantidade de esferas que cabem no interior do recipiente depende do raio
informado. Passa-se para o gerador de partículas, uma estimativa inicial para o raio. O mesmo
preenche o recipiente com o máximo de partículas possíveis e retorna esse valor. Caso não
seja a quantidade encontrada no experimento, estima-se outro valor para o raio. Repete-se
esse procedimento até convergir para a quantidade mais próxima ao experimental.
Figura 26 - Malha com elementos triangulares que representam a cápsula experimental.
(a)
(b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
Na elaboração do modelo computacional, mostrado nas Figuas 27a e 27b, adota-se os
mesmos valores de largura, comprimento e declividade da rampa do aparato experimental.
44
Figura 27 - Modelo computacional da rampa: a) com inclinação de 45 graus; b) com inclinação de 30 graus.
(a)
(b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
As partículas da simulação são esféricas devido à restrição do programa utilizado,
possuem mesmo diâmetro e são posicionadas formando um prisma triangular perfeito
conforme o experimento físico (Figura 28a). Como essa configuração inicial é gerada por um
algoritmo geométrico, as partículas não se encontram em equilíbrio estático, causando
perturbações no início da análise. Então, na simulação espera-se um segundo para
acomodação das partículas e, posteriormente, levanta-se a comporta. A Figura 28 ilustra o
posicionamento das partículas para os modelos de 30 e 45º, antes e depois da acomodação.
45
Figura 28 - Posicionamento inicial das partículas. a) antes da acomodação e 45º; b) depois da acomodação e 45º;
c) antes da acomodação e 30º; d) depois da acomodação e 30º
(a)
(b)
(c) (d)
Fonte: Elaborado pelo autor.
4.2.2 Simulações dos modelos computacionais no DEMOOP
Na simulação, o comportamento das partículas está relacionado com os parâmetros do
MED. No problema em questão, utilizando o modelo de contato citado no item 3.1.1, oito
variáveis devem ser estudas para representar o fluxo de partículas:
a) coeficiente de amortecimento normal ( );
b) coeficiente de amortecimento tangencial ( );
c) rigidez normal ( );
d) rigidez tangencial ( );
e) coeficiente de atrito entre as partículas ( );
46
f) coeficiente de atrito estático ( );
g) coeficiente de atrito cinético ( );
h) coeficiente de atrito de rolamento ( ).
Os valores para amortecimento usuais são de 0.99 (RELATÓRIO 3, 2014). A rigidez
normal é calculada pela Equação 6, adotando-se o valor da sobreposição de 1% do raio da
partícula e as condições do problema físico com maior valor de tensão (Equação 4).
Com intenção de reduzir a quantidade de variáveis do MED a serem estudadas,
procura-se estimar valores para kt e kn. De acordo com o trabalho descrito no item 1.5.2, no
Relatório 3 (2014) há um estudo sobre parâmetros de corridas de detritos em função da
relação . Como, para valores entre 0.5 e 1, essa relação não apresenta influência
significativa nos parâmetros da corrida (Figuras 8 e 9), neste trabalho adota igual a 0.5.
Após definir valores para alguns parâmetros do MED, o estudo se restringe à
influência de quatro variáveis: coeficiente de atrito entre as partículas, coeficiente de atrito
estático, cinético e de rolamento; todas relacionadas ao atrito do sistema. Esse estudo se trata
da comparação entre o perfil de altura de deposição das partículas obtido no experimento e o
obtido em cada modelo computacional (modelos com combinação das variáveis diferentes).
Assim, são elaborados vários modelos variando os coeficientes de atrito entre as
partículas, o estático e o cinético em 0.1 e o coeficiente de atrito de rolamento em 0.025 (por
ser um coeficiente de ordem de grandeza menor). Essa variação atende à condição citada no
item 3.1.1.2.1 de que o atrito cinético não pode ser maior que o estático. A geometria do
modelo para a calibração é similar ao experimento com 8500 partículas e rampa com
inclinação de 45 graus. Adota-se esse experimento por possuir um número menor de
partículas, reduzindo o tempo computacional da simulação.
Os modelos são simulados no DEMOOP com duração de 5 a 6 horas de computação
cada, utilizando o cluster destinado ao projeto DEMTRITO, ao qual este trabalho está
inserido. Com a utilização desse cluster, cerca de 180 modelos são simulados em
aproximadamente 24 horas. Após realizar as simulações, utiliza-se o DEMVIEW para gerar
os perfis de altura em cada simulação.
47
4.2.3 Geração de perfis de altura computacionais no DEMVIEW
Nessa etapa, são gerados os perfis de altura de cada simulação computacional. Para
isso, utiliza-se a tag “--height_profile” do programa DEMVIEW, a qual é possível capturar o
perfil de altura em qualquer passo de tempo, é possível adquirir o perfil de altura de qualquer
simulação. É necessário que a malha dos obstáculos e as partículas possuam mesmo
referencial geométrico do experimento físico, sendo o eixo y a componente vertical do
sistema, pois é nesse eixo que atua a gravidade.
4.2.4 Cálculo dos parâmetros do perfil de altura
Com as informações do perfil de altura, vários parâmetros podem ser retirados para
análise das simulações. Valores como o ponto de altura máxima do perfil (xmáx, ymáx), os
parâmetros “a”, “b”, “b/a” e a área acima de uma reta de referência horizontal são parâmetros
que, quando observados em conjunto, auxiliam na busca de um modelo com deposição de
partículas próxima ao do modelo experimental. Esses parâmetros estão representados na
Figura 29.
Figura 29 - Representação dos parâmetros obtidos no perfil de altura.
Fonte: Elaborado pelo autor.
A importância em traçar a reta para a determinação dos parâmetros “a” e “b” se
deve à dificuldade em se estimar, tanto no modelo experimental quanto no computacional, os
48
pontos em que começa e termina o acúmulo de partículas. O valor mínimo para deve ser de
dois diâmetros, para garantir que as esferas estão se acumulando. Neste trabalho, adota-se
Para encontrar os valores dos parâmetros do perfil de altura, implementa-se uma
função no MATLAB (MATHWORS, 2014) que recebe os pontos (x,y) do perfil de altura, faz
uma interpolação linear com uma função própria do programa (função “interp1”) e retorna os
parâmetros “xmáx”, “ymáx”, “a”, “b”, “b/a” e área. A utilização do MATLAB se deve a
facilidade apresentada por esse programa em trabalhar com matrizes. A aplicação da técnica
de interpolação faz com que o resultado dos parâmetros seja o mais próximo do real.
4.2.5 Gera superfície de resposta
Para a calibração do modelo computacional, adota-se a mesma estratégia utilizada no
Relatório 3 (2014) para o estudo dos parâmetros do perfil de altura de deposição final das
partículas, em que é gerada uma superfície de resposta com os resultados previamente
simulados. A Figura 30 ilustra um exemplo de uma superfície de resposta gerada para o
estudo de duas variáveis no domínio. Para superfícies com mais de duas variáveis, o resultado
não pode ser visualizado por se tratar de uma análise com mais de três dimensões.
Figura 30 - Superfície de resposta da relação L/H em função de e µ.
Fonte: Adaptado de Relatório 3 (2014).
No LCCV, pesquisadores desenvolveram um código computacional no programa
MATLAB (MATHWORS, 2014) para gerar essa superfície de resposta. Nesse código, o
usuário envia os valores de um conjunto de variáveis (domínio da superfície) e de seus
49
respectivos resultados (imagem da função) e, através do método dos mínimos quadrados, um
polinômio é gerado, permitindo a busca de um resultado aproximado para qualquer valor do
domínio. Apesar de se tratar de um método de ajuste polinomial, nesse código gera-se um
polinômio de grau máximo, ou seja, grau igual a “n-1”, onde n é a quantidade de pontos
usados. Nessa situação, o ajuste se comporta como uma interpolação.
Este código recebe dois arquivos de entrada, o primeiro deve conter os parâmetros
para gerar a superfície, que neste trabalho são os parâmetros do MED (domínio da superfície)
e os parâmetros do perfil de altura (imagem da superfície), e o segundo deve conter os pontos
que o usuário deseja investigar. O resultado é um arquivo que contém as superfícies de
resposta, porém apenas os resultados cujos domínio são os pontos de “investigação” citado
acima.
Neste trabalho, o arquivo com os pontos que se deseja investigar na superfície de
resposta contém os parâmetros do MED, variando em 0.01 cada, com exceção do atrito de
rolamento, que varia em 0.001.
4.2.6 Busca dos parâmetros do MED com resultados próximos ao experimental
Com o arquivo retornado pelo código que gera superfícies de resposta, deve-se, agora,
fazer uma busca pela combinação dos valores das variáveis do MED que possua parâmetros
do perfil de altura dentro de um intervalo de busca abaixo.
(17)
onde é o valor mínimo do intervalo de busca, é o valor máximo, é o
valor do parâmetro do perfil de altura experimental médio e é um valor percentual do
resultado experimental, utilizado igual a 5%.
Para isso, implementa-se mais uma função no MATLAB que lê o arquivo com as
superfícies e procura a combinação de variáveis de atrito do MED que possuir todos os
parâmetros do perfil de altura dentro do intervalo exposto na equação 17.
50
4.2.7 Verificação e calibração
As combinações de variáveis do MED encontradas são resultados de uma estimativa
realizada pela superfície de resposta que, por sua vez, é gerada pelo Método dos Mínimos
Quadrados. Assim, torna-se necessário verificar se o modelo numérico, cujas variáveis de
atrito correspondam às encontradas no item anterior, possui realmente um perfil de altura
compatível com o apresentado pelo modelo experimental.
Assim, faz-se a simulação desse modelo no DEMOOP, retira o perfil de altura de
deposição das partículas pelo DEMVIEW e o compara com o perfil de altura experimental,
através de gráfico da altura pela distância na horizontal. Se os resultados forem similares, a
combinação de variáveis do MED pode ser utilizada para representar o fluxo do material
granular utilizado no experimento.
A comparação é realizada também em modelos com mesmo material granular, porém
modificando a quantidade de partículas e a inclinação da rampa. Assim, garante-se a
eficiência do programa computacional DEMOOP na aplicação de problemas desse gênero.
51
6 RESULTADOS E ANÁLISES
Esta seção apresenta os resultados do modelo experimental e do modelo numérico.
São realizadas as comparações entre os perfis de altura dos dois modelos e verificada a
influência de cada parâmetro de atrito do MED no comportamento descrito pelas partículas.
6.1 Resultados experimentais
O desenvolvimento do experimento físico seguindo rigorosamente os procedimentos
do item 4.1.4, utilizando sempre a mesma massa, procurando utilizar o mesmo arranjo inicial
das partículas, é de extrema importância para obtenção dos resultados. Procura-se realizar
experimentos em dias diferentes para verificar se há mudança significativa nos resultados
provocados pela montagem e desmontagem da rampa ou mesmo pela degradação do material
que constitui o experimento. Avalia-se assim a repetibilidade dos resultados obtidos.
6.1.1 Estudo da repetibilidade do experimento
O primeiro experimento foi realizado no final de julho de 2014 e está exposto na
Figura 31. Trata-se do experimento realizado com 8500 partículas de sagu na rampa com
inclinação de 45º.
Figura 31 – Primeiro experimento realizado após a pintura da base com 8500 partículas e inclinação de 45 graus:
a) vista superior; b) vista lateral.
(a)
52
(b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
Na Figura 31, ao avaliar a vista superior, nota-se que o experimento apresenta simetria
e, pela vista lateral, o perfil de altura apresenta um centro de massa deslocado para a região
inicial da parte horizontal da calha. Assim, nesse fluxo, maior parte das partículas fica
acumulada na parte inicial e a altura de deposição tende a diminuir com a distância percorrida.
A Figura 32 mostra o mesmo experimento realizado em outubro de 2014. Verifica-se
que os resultados foram semelhantes. Para poder analisar melhor, plota-se os perfis de altura
dos experimentos no gráfico da Figura 33.
Figura 32 - Experimento realizado em outubro de 2014 com 8500 partículas e inclinação de 45 graus: a) vista
superior; b) vista lateral.
(a)
53
(b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 33 - Gráfico com os perfis de altura dos experimentos das Figuras 31 e 32.
Fonte: Elaborado pelo autor.
O gráfico da Figura 33 ratifica o que foi comentado anteriormente, que os
experimentos apresentaram semelhanças, mesmo realizados em dias distintos, e que o centro
de massa está deslocado para a esquerda.
54
6.1.2 Resultados de experimentos com quantidade de partículas e inclinações distintas
Verificando a confiabilidade do experimento, realizam-se os experimentos com
mudança na quantidade de partículas e na inclinação da rampa. Os perfis experimentais de
cada experimento estão ilustrados nas Figuras 34, 35 e 36.
Figura 34- Perfil de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 35 - Perfil de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 30 graus.
Fonte: Elaborado pelo autor.
55
Figura 36 - Perfil de altura do experimento com 17000 partículas e inclinação de 45 graus.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Para cada experimento, realiza-se no mínimo 5 repetições, adotando-se a média das
curvas dos perfis como resultado final para calibração do modelo computacional. Na Figura
37, verificam-se as curvas experimentais e a média do ensaio com 8500 partículas e
inclinação de 45 graus.
Figura 37 - Curva média dos experimentos com 8500 partículas de sagu e inclinação de 45 graus.
Fonte: Elaborada pelo autor.
Os parâmetros do perfil de altura são obtidos da curva média representada na Figura
37 e estão discriminados na Tabela 1, juntamente com os valores mínimos e máximos que
constituem um intervalo de busca citado no item 5.
56
Tabela 1- Tabela com os valores dos parâmetros da curva média do experimento com 8500 sagus e rampa com
inclinação de 45 graus.
PARÂMETROS DO PERFIL DE ALTURA EXPERIMENTAL
Parâmetros xmáx
(cm)
ymáx
(cm)
xa
(cm)
xb
(cm) a (cm) b (cm) b/a |a-b|
a+b
(cm)
Área
(cm2)
17.5 2.25 7.16 38.99 10.34 21.49 2.08 11.15 31.83 25.75
16.63 2.14 6.80 37.04 9.82 20.42 1.98 10.59 30.24 24.46
18.38 2.36 7.52 40.94 10.86 22.56 2.18 11.71 33.42 27.04
Fonte: Elaborado pelo autor.
Os parâmetros xa e xb na Tabela 1 são as posições inicial e final, respectivamente, dos
pontos em que a reta atravessa a curva de perfil de altura. Adotam-se os valores mais
internos tanto no experimental, quanto no computacional, para garantir uniformidade na busca
desses parâmetros.
6.2 Resultados numéricos
As duas metodologias utilizadas para estimar o valor do diâmetro médio das partículas
de sagu retornaram os seguintes valores: raio de 2.05 mm pela medição do paquímetro e raio
igual a 2.168 mm pela aproximação utilizando a cápsula do laboratório e o gerador de
partículas. Dessa forma, realiza-se a calibração de dois modelos com esferas com esses dois
raios e analisam-se os resultados.
6.2.1 Calibração do modelo numérico (raio 2.05mm)
Para calibração dos modelos com raio de 2.05 mm, são gerados modelos com as
seguintes variações das variáveis de estudo:
a) = [0.3;0.9] com Δ=0.1;
b) = [0.4;0.8] com Δ=0.1;
c) = [0.1;0.6] com Δ=0.1;
d) = [0.05;0.1] com Δ=0.025.
57
Após simular todas as combinações de valores dos parâmetros , , e , aplica-se
o algoritmo para gerar as superfícies de resposta. É gerado um polinômio para cada parâmetro
do perfil de altura, onde o domínio são as variáveis do MED. A busca pela combinação que
melhor se adeque ao resultado experimental é realizada diretamente, ou seja, verifica-se no
domínio em um intervalo de 0.01 a 0.01 para cada variável (Figura 38) a combinação que
tiver todos os resultados dentro do intervalo experimental mostrado na Tabela 1. Com isso,
obtêm-se os resultados da Tabela 2.
Figura 38 - Busca direta pela combinação cujos os resultados estão dentro do intervalo de busca experimental.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Tabela 2 - Tabela com os resultados da calibração dos modelos com raio de 2.05mm.
Parâmetros
Combinação
01 0.75 0.41 0.4 0.05
02 0.79 0.55 0.4 0.05
03 0.88 0.61 0.39 0.05
Fonte: Elaborado pelo autor.
Verifica-se na Tabela 2, que os coeficientes de atrito cinético e de rolamento não
apresentaram grande variação, sendo o primeiro próximo a 0.4 e o segundo igual a 0.05. O
atrito entre as partículas ficam próximos a 0.8, sendo que, à medida que o atrito cinético
diminui, é necessário um atrito entre as partículas maior para que o resultado apresente
58
configuração próxima ao experimental. Já o atrito estático tem uma grande variação dos seus
valores, sendo necessário verificar o comportamento dessa variável para o atrito cinético igual
a 0.4 (Figuras 39 e 40).
Figura 39 - Valor da altura máxima em função do atrito estático. Mantêm-se fixo os valores do atrito cinético e
de rolamento.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 40 - Valor da posição x da altura máxima em função do atrito estático. Mantêm-se fixo os valores do atrito cinético e de rolamento.
Fonte: Elaborado pelo autor.
59
Os gráficos apresentados nas Figuras 39 e 40 mostram que os parâmetros do perfil de
altura não apresentam um comportamento definido com a variação do atrito estático.
Diferente do que é observado na Figura 39 em relação à variação do atrito entre as partículas,
que a altura máxima aumenta com a variação do mesmo. Ou seja, o valor do atrito estático
não possui tanta influência no resultado. Porém deve sempre ser seguida a condição de que
esse valor deve ser superior ao atrito cinético.
Dentre os resultados apresentados na Tabela 2, a maior semelhança encontrada com o
perfil de altura experimental é do modelo com a combinação 01. Pela Figura 41, pode-se
verificar que a superfície de resposta retornou uma boa aproximação das combinações dos
parâmetros do MED.
Figura 41 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus e dos modelos
computacionais das combinações da Tabela 02.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Aplica-se a mesma combinação ao modelo com 17000 partículas, e a curva novamente
apresenta semelhança com o perfil experimental. Porém, nota-se uma pequena diferença na
altura máxima (Figura 42a), que deixa de ser notável quando o gráfico é plotado em escala
(Figura 42b).
60
Figura 42 - Perfis de altura do experimento com 17000 partículas e inclinação de 45 graus e do modelo com a
combinação 01 de parâmetros do MED e raio igual a 2.05 mm. a) sem escala; b) em escala.
(a)
(b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
Os resultados apresentados pelo modelo com raio igual a 2.05mm foram bem
semelhantes ao perfil de altura experimental. Sendo assim, esse modelo com os parâmetros do
MED da combinação 01 (Tabela 2) podem representar fluxo de sagu pela rampa.
6.2.2 Calibração do modelo numérico (raio 2.168mm)
Com o estudo anterior, passa-se a entender o intervalo em que esses parâmetros
trariam resultados satisfatórios. Dessa forma, reduz o número de simulações e,
61
consequentemente, o tempo total para adquirir os resultados. Da nova superfície de resposta
são encontradas as seguintes combinações:
Tabela 3 - Resultados obtidos da superfície de resposta com modelos de raio igual a 2.168 mm.
Parâmetros
Combinação
01 0.51 0.77 0.45 0.065
02 0.53 0.51 0.45 0.05
Fonte: Elaborado pelo autor.
Na nova superfície, o atrito cinético e o atrito entre as partículas não apresentam
grandes variações. A diferença entre os atritos estáticos já foi justificada. Os perfis obtidos
nas duas simulações não apresentam muita semelhança com o experimental (Figura 43).
Figura 43 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus e do modelo com a
combinação 01 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Apesar de possuir uma altura máxima semelhante, esse modelo apresenta um
espalhamento maior. Modificam-se, então, os parâmetros do perfil de altura os quais serviam
para a busca na superfície de resposta. Inicialmente, esses parâmetros eram “xmáx”, “ymáx”,
“a”, “b”, “b/a”, “a+b” e “|a-b|”. Como as maiores variações apresentadas são nos pontos de
62
início e fim de acúmulo de partículas, são esses os novos parâmetros estudados, bem como a
“Área” representada na Figura 29. Como mencionado anteriormente, esses pontos são difíceis
de estimar, devendo recorrer à reta y=h e adotar os valores “xa” e “xb”.
Os novos parâmetros de busca na mesma superfície de resposta utilizada no modelo da
Figura 43 apresentam as combinações da Tabela 4.
Tabela 4 - Resultados obtidos da superfície de resposta com modelos de raio igual a 2.168 mm, utilizando novos
parâmetros de perfil de altura.
Parâmetros
Combinação
01 0.54 0.73 0.41 0.05
02 0.59 0.69 0.4 0.05
03 0.60 0.69 0.4 0.05
04 0.61 0.68 0.4 0.05
05 0.63 0.67 0.4 0.05
06 0.68 0.5 0.39 0.05
Fonte: Elaborado pelo autor.
Dentre os resultados da Tabela 4, o modelo computacional com melhor resultado
comparado a todos os experimentos é o do modelo com a combinação 05. Todas as curvas
podem ser observadas nas Figuras 44, 45 e 46.
63
Figura 44 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 45 graus e do modelo com a
combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 45 - Perfis de altura do experimento com 17000 partículas e inclinação de 45 graus e do modelo com a combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm.
Fonte: Elaborado pelo autor.
64
Figura 46 - Perfis de altura do experimento com 8500 partículas e inclinação de 30 graus e do modelo com a
combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Apesar das curvas apresentadas nas Figuras 44, 45 e 46 não serem tão semelhantes
quanto o resultado da Figura 41, o modelo da combinação 05 da Tabela 4 é bastante
representativo do movimento realizado nessa rampa experimental, visto que, em todos os
perfis, o comportamento não se distanciou do que ocorre na prática. Além disso, esses
pequenos erros ocorrem também no experimento. Na Figura 47, faz-se a comparação da curva
final calibrada com todos os experimentos e o comportamento se mostra bastante similar.
Figura 47 - Perfis de altura dos experimentos realizados com 8500 sagus e inclinação de 45 graus e do modelo
com a combinação 05 de parâmetros do MED com raio de 2.168 mm.
Fonte: Elaborado pelo autor.
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
0 10 20 30 40 50
Alt
ura
(cm
)
x (cm)
Perfis de Altura - 45° e 8500 esferas
Experimento 01
Experimento 02
Experimento 03
Experimento 04
Experimento 05
Experimento 06
Experimento 07
Modelo numérico
65
6.3 Análises dos resultados numéricos
Esses resultados serviram para analisar a confiabilidade da aproximação descrita pela
superfície de resposta. Se os parâmetros de análise do perfil de altura forem escolhidos
corretamente, a superfície retorna um resultado bastante satisfatório. Tanto no modelo com
raio de 2.05 mm quanto no de 2.168 mm, a superfície teve boas aproximações.
Verifica-se, então, que modelos com diâmetros ligeiramente diferentes podem
representar o mesmo experimento. Nos dois modelos, pode-se notar que a utilização de um
coeficiente de atrito cinético de aproximadamente 0.4 e de rolamento de 0.05 são boas
estimativas para esse problema. O atrito estático pode variar, já que não influencia muito no
resultado. O atrito entre as partículas é de 0.63 para o diâmetro maior, enquanto que para o
modelo com diâmetro menor, esse valor é de 0.75.
Como o atrito entre as partículas é o único parâmetro com diferença significativa em
todos os resultados, nota-se que é ele o responsável pelo acúmulo ou espalhamento das
partículas, ou seja, para uma mesma configuração final e modelos com esferas de dimensões
diferentes, quanto menor a partícula, maior deve ser o atrito no contato entre elas. Essa análise
também pode ser notada no gráfico da Figura 48, onde o valor da altura máxima cresce com o
aumento desse atrito.
Figura 48 - Valor da altura máxima em função do atrito estático. Mantêm-se fixo os valores do atrito cinético e
de rolamento e iguais a 0.4 e 0.05, respectivamente.
Fonte: Elaborado pelo autor.
66
A influência do atrito cinético no movimento está relacionada à distância percorrida
pelas partículas. Ao comparar a Figura 43 com a Figura 44, em que a primeira se trata de um
resultado com igual a 0.45 e a segunda com 0.4, verifica-se que quando esse atrito é maior,
o perfil de altura se deslocado mais para a esquerda. Assim, à medida que se aumenta o valor
de , as partículas percorrem uma distância menor. O gráfico da Figura 49 confirma essa
afirmação.
Figura 49 - Influência do coeficiente de atrito cinético da distância percorrida pelas partículas para µe igual a 0.7.
Fonte: Elaborado pelo autor.
Para ilustrar os resultados obtidos nas simulações, na Figura 50 é possível visualizar o
resultado final da simulação do modelo computacional com 8500 partículas e raio 2.05mm.
67
Figura 50 - Resultado final da simulação do modelo com 85000 partículas e raio de 2.05mm: a) vista lateral; b)
vista frontal.
(a) (b)
Fonte: Elaborado pelo autor.
68
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo de fenômenos naturais como as corridas de detritos é de grande importância
para todos os setores da sociedade, pois as consequências acarretadas por elas são
incalculáveis. No setor petrolífero, especificamente, a preocupação atual se encontra no
estudo das regiões onde estão instaladas as empresas petrolíferas e as dutovias brasileiras,
pois grande parte está localizada em áreas propícias a deslizamentos de terra.
A aplicação de métodos numéricos é uma alternativa para o estudo das corridas de
detritos. O Método dos Elementos Discretos é o de maior destaque no estudo de problemas
em meios granulares. Sua aplicação depende de algumas de suas variáveis que, por sua vez,
são características dos materiais envolvidos.
A estimativa desses parâmetros pode ser realizada através da calibração experimental.
A definição do experimento é o fator primordial para o desenvolvimento de todo o estudo. A
rampa confeccionada neste trabalho apresentou resultados satisfatórios com pouca variação
nos resultados.
No modelo computacional, foi verificada a importância em elaborar um algoritmo para
busca dos parâmetros do MED que apresentassem um resultado mais próximo do experimento
físico, pois existem várias combinações possíveis desses parâmetros, sendo impraticável a
calibração sem o auxílio computacional.
O algoritmo da superfície de resposta por mínimos quadrados apresentou boas
aproximações para definição do modelo final. Mas para que os resultados sejam mais
semelhantes ao real, a escolha dos parâmetros do perfil de deposição das partículas deve ser
previamente analisada.
Neste trabalho, foram apresentados resultados de dois modelos com partículas de raio
diferentes. Foi verificado que ambos representaram bem o modelo experimental. Em relação à
influência das variáveis do MED no fluxo de detritos, pôde-se notar que o coeficiente de atrito
estático não apresenta uma relação direta com os parâmetros da corrida. O coeficiente de
atrito cinético está relacionado à distância percorrida pelas partículas, quanto maior for esse
valor, menor é o deslocamento das esferas. Para o contato do sagu com a madeira, esse valor
foi estimado em 0.4 e o coeficiente de atrito de rolamento em 0.05. Já o atrito entre as
partículas está relacionado ao espalhamento e altura de deposição das mesmas no movimento
69
e esse valor foi de 0.63 para o diâmetro mais próximo do real e 0.75 para um modelo com raio
menor.
7.1 Recomendações para trabalhos futuros
Visto que tanto o modelo experimental quanto a metodologia para a busca da
combinação de parâmetros do MED são eficazes, um dos fatores que pode ser explorado na
continuação deste trabalho é a calibração de modelos utilizando materiais com características
distintas às dos sagus. Dessa forma, outras variáveis globais do modelo experimental
poderiam seriam estudadas, como, por exemplo, a variação da densidade do material utilizado
e a geometria do mesmo. Após realizar esse estudo, sugere-se avaliar também o fluxo
combinado de dois materiais, utilizando-se no modelo numérico os parâmetros do MED
calibrado.
Outro ponto interessante a ser analisado é o estudo de modelos com partículas de
diâmetro menor, pois em corridas de detritos reais, grande parte das partículas que rola é fina
(solo). Porém quanto menor o raio da partícula, a quantidade de esferas do problema aumenta
e, consequentemente, será necessário um alto tempo de simulação. Um possível estudo para
essa problemática é realizar um experimento com solo seco e verificar se algum modelo
computacional com diâmetro maior poderia representá-lo.
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