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Você Tem Competência Considerações Em Torno Do Conceito de Competência Nos Estudos Linguísticos José Nilton
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Revista Vozes dos Vales da UFVJM: Publicaes Acadmicas MG Brasil N 02 Ano I 10/2012 Reg.: 120.2.0952011 PROEXC/UFVJM ISSN: 2238-6424 www.ufvjm.edu.br/vozes
Ministrio da Educao
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri UFVJM Minas Gerais Brasil
Revista Vozes dos Vales: Publicaes Acadmicas Reg.: 120.2.0952011 UFVJM
ISSN: 2238-6424 N. 02 Ano I 10/2012
http://www.ufvjm.edu.br/vozes
Voc tem competncia?
Consideraes em torno do conceito de competncia nos estudos lingusticos
Jos Nilton Cruz Jnior Mestrando do Programa de Ps-graduao em Lngua e Cultura da Universidade
Federal da Bahia UFBA Bahia - Brasil. E-mail: jniltonjunior@gmail.com
Prof. Dr. Antonio Marcos Pereira Professor Adjunto do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia UFBA
Bahia - Brasil. E-mail: antoniomarcospereira@gmail.com
Resumo: O presente artigo visa tratar da noo de competncia a partir do uso
inaugural desses termos nos estudos lingusticos contemporneos. Para tanto, far-se- uma breve contextualizao histrica, retomando os trabalhos dos linguistas norte-americanos Noam Chomsky e Dell Hymes em torno dessa noo. Este trabalho tenciona problematizar o impacto que a noo de competncia gerou para os estudos mais recentes em Lingustica, bem como o tratamento que autores da atualidade do a essa noo. Alm disso, busca-se estabelecer uma relao conceitual da noo de competncia com a Lingustica Aplicada e com questes relacionas ao ensino aprendizagem de lnguas.
Palavras-chave: competncia, ensino de lnguas, lingustica aplicada.
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INTRODUO
O conceito de competncia dentro dos estudos lingusticos tem sido
amplamente discutido e utilizado. Pesquisadores-docentes, sobretudo no campo de
ensino de lnguas, recorrem a tal conceito no intuito de elaborar estratgias que
sejam eficientes para o desenvolvimento de seu exerccio acadmico. Alunos de
graduao, primariamente, e ps-graduao tambm so expostos a esse conceito
ao longo do curso de Letras/ Lingustica e constroem um repertrio mnimo- assim
se espera- de compreenso acerca do que vem a ser a chamada competncia.
Entretanto, algo que aparece com certa frequncia na concepo desses
agentes o entendimento por vezes ambguo do que, de fato, configura a
competncia, seja qual for a apropriao do conceito terico desse termo tomada
por quem o utiliza. Para muitos, a definio de competncia parece ser algo ainda
camuflado, indefinido e subjetivo. Alguns veem tal conceito sob uma perspectiva
dicotmica: por um lado, a competncia lingustica, inaugurada e defendida por
Noam Chomsky, a partir da dcada de 1960; por outro, a reformulao ou a tentativa
de problematizao desse conceito inaugural feita por Dell Hymes, na dcada de
1970, o que conhecemos por competncia comunicativa.
Decidir a favor de uma perspectiva e no de outra implica na tomada de uma
determinada postura do professor, bem como do pesquisador, em sua prtica de
ensino ou de pesquisa de modos seno diametralmente opostos, minimamente
distintos. Atribuir um juzo de valor para qualquer uma dessas posturas requer
bastante reflexo no que diz respeito s contribuies e empecilhos que essas duas
principais perspectivas oferecem. Assim sendo, apropriado que exploremos a
noo de competncia. Todos desejam possuir, em certa medida, alguma
competncia, inclusive os tericos contemporneos que trabalham com a linguagem.
Mas o que mesmo competncia? Existe uma definio conceitual que d conta
dessa noo? Esse no apenas um problema de cunho terico, mas tem
implicaes diretas no modo como atuamos enquanto pesquisadores, discentes ou
docentes.
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1. UMA BREVE CONTEXTUALIZAO
Em meados da dcada de 1960, o linguista norte-americano Noam Chomsky
lana a sua obra intitulada Aspectos da Teoria da Sintaxe, onde o autor estabelece a
dicotomia competncia versus desempenho. Nessa obra, a competncia definida
como o conhecimento tcito que o falante-ouvinte possui da estrutura da sua
lngua, conforme Oliveira (2007). Chomsky sugere que para que um indivduo seja
competente linguisticamente ele deve possuir conhecimento internalizado de
estruturas gramaticais de seu sistema lingustico. Quanto ao desempenho,
realizao imperfeita da competncia, Chomsky prefere no se ater com maior
vagar, dando primazia, em seus trabalhos, parte mais abstrata e teoricamente
objetiva, isto , previsvel, da lngua.
Justamente por tratar de questes cognitivas referentes a um conhecimento
tcito internalizado da lngua, Chomsky interpretado, sob a perspectiva de alguns
autores, tal qual Oliveira (2007), como um autor cujos trabalhos remontam teorias de
cunho estruturalista, e por isso recebeu duras crticas quando do lanamento de sua
proposta. Vale-se ressaltar, no entanto, que as contribuies de Chomsky para os
estudos lingusticos emergem como divisores de guas nos estudos lingusticos
modernos, uma vez que a partir de sua teoria gerativa transformacional houve
grande inquietao na comunidade cientfica dos estudos lingusticos, de modo que
isto favoreceu o surgimento de trabalhos posteriores que ora contestavam os
postulados de Chomsky ora defendiam as ideias elaboradas por tal autor. No
entanto, no nos deve passar despercebido a repercusso que a noo de
competncia lingustica fomentou para a aparecimento de uma nova noo que
ocuparia um lugar de destaque entre os linguistas e os pesquisadores da teoria da
comunicao ou mesmo da etnografia da linguagem.
Logo no incio da dcada de 1970, o linguista norte-americano Dell Hymes
publica trabalhos em que discorda da postura chomskyana. Hymes afirma que a
competncia lingustica, em si mesma, no suficiente para a interao
comunicativa, uma vez que falar uma lngua implica estar integrado a determinada
comunidade de falantes, a um conjunto de prticas sociais relacionadas
comunicao entre pessoas. (MORATO, 2008, p.42) Essa nova noo elaborada
por Hymes no necessariamente desconsidera o postulado de Chomsky. Em
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momento algum Hymes afirma que a competncia lingustica inexiste ou que deva
ser execrada. Hymes apenas sugere que necessrio algo que transpasse o nvel
apenas intuitivo, levando em considerao que compartilhamos de uma comunidade
de fala e que esta, por sua vez, estabelece normas que em certa medida regulam as
estruturas gramaticais possveis a serem realizadas por um falante.
Dessemelhante da teoria chomskyana, Hymes no pressupe um falante
ideal, vivendo em uma comunidade de fala ideal. As condies de produo so
influenciadas por fatores externos lngua, que figuram na esfera social e no
puramente lingustica. Por esta razo, a competncia comunicativa parece mais
incrementar do que negar a competncia lingustica, no sentido de que as duas
teorias dialogam e permanecem vlidas e operacionalizveis a partir de perspectivas
distintas.
A partir de ento, a noo de competncia assume um lugar de destaque nos
estudos lingusticos e passa a configurar um dos debates conceituais mais perenes
em Lingustica. Prova disso, que ainda hoje muitos autores dedicam parte do seu
trabalho para tratar do conceito do termo competncia. Entretanto, vlido chamar a
ateno para o fato de que tais autores, por vezes, discordam, em parte, do que
compe a competncia- ou as competncias- e do que exatamente sugerem essas
competncias em termos funcionais.
2. A QUESTO DA COMPETNCIA NA SEARA DOS AUTORES
CONTEMPORNEOS
A partir de agora, faremos uma explorao comparativa entre autores
contemporneos que se apropriaram dos conceitos de competncia tanto de
Chomsky quanto o de Hymes ou que dialogam com esses autores na tentativa de
redescrever a noo de competncia, que continua bastante presente nos estudos
lingusticos hodiernos.
O primeiro caso que mencionaremos est presente no trabalho j mencionado
de Morato (2008). A autora expe em termos gerais a noo de competncia
referenciando as teorias de Chomsky e Hymes, aos quais aponta como sendo
habilidade intrnseca dos indivduos e capacidade desenvolvida socialmente,
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respectivamente (MORATO, 2008, p.39). A autora parece entrar em contradio por
considerar essas duas posies antagonistas, ao passo que mais ao longo do seu
texto afirma que
[...] a noo de competncia em Hymes parece-nos mais complementar do que propriamente alternativa em relao de Chomsky, na medida em que aquela se acrescenta a esta ao focalizar a descrio das regras de uso social da linguagem (a competncia comunicativa), e no apenas o conhecimento gramatical ou o sistema de regras internalizado dos falantes. (MORATO, 2008, p.45)
Morato ainda faz referncia ao trabalho de Kerbrat-Orecchioni (1986) que,
segundo a autora, define competncia como atitude ou capacidade do sujeito de
controlar as regras de uso da lngua em situaes e gneros variados (MORATO,
2008, p.46). Essa competncia chamada de retrico-pragmtica, embora parea
se aproximar em muito da competncia comunicativa de Hymes. Alm disso, Morato
menciona, tambm nos trabalhos de Kerbrat-Orecchioni, uma chamada
hipercompetncia, composta de mais quatro competncias distintas: lingustica
(responsvel pela codificao e decodificao dos enunciados, portanto, distinta da
competncia lingustica de Chomsky), enciclopdica, retrico-pragmtica e lgica.
Luciano Amaral Oliveira (2007) classifica a competncia lingustica de
Chomsky como sendo uma teoria estruturalista, por se ater ao conhecimento
gramatical, estrutural, ao passo que confere competncia comunicativa um
carter scio-cultural, estados emocionais e psicolgicos. interessante notar que
Oliveira aponta para o fato de que Hymes refere-se tambm habilidade de usar o
conhecimento, e no somente o prprio conhecimento, para definir a competncia
comunicativa. Conforme a perspectiva desse autor, a competncia qual Chomsky
se refere equivale ao conhecimento tcito da lngua, no entanto, para Hymes, o
conhecimento apenas parte da competncia. Portanto, a partir dos seus
argumentos elaborados, o que Oliveira nos sugere uma oposio conceitual entre
as duas competncias mencionadas.
Oliveira faz referencia queles que se coadunaram ao pensamento
hymesiano, os linguistas canadenses Merril Swain e Michael Canale. Em acrscimo
ideia de competncia comunicativa, esses autores, em especial Canale, propem
um aperfeioamento de conceito sugerindo mais quatro competncias: competncia
gramatical que, assim como a competncia lingustica de Chomsky, refere-se aos
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conhecimentos que um falante-ouvinte tem a respeito das regras e caractersticas da
sua lngua; competncia sociolingustica, que se relaciona ao conhecimento das
regras scio-culturais do uso da lngua; a competncia discursiva que se refere s
regras do discurso; competncia estratgica, isto , que seria a habilidade do falante
de usar estratgias verbais e no verbais para compensar possveis falhas nas
demais competncias mencionadas.
O linguista francs Daniel Coste (1997) apresenta a definio que o Dicionrio
de Didtica das Lnguas (GALISSON; COSTE, 1976) d ao termo competncia
comunicativa:
[...] conhecimento representando uma contestao e uma extenso da noo chomskyana da competncia. Hymes designa sob a expresso competncia comunicativa o conhecimento (prtico e no necessariamente explicitado) das regras psicolgicas, culturais e sociais que comandam a utilizao da fala num quadro social. (Dictionnaire de didactique des langues apud COSTE, 1997, pg. 11)
Como podemos observar nessa perspectiva, a competncia comunicativa no
vista como oposta competncia lingustica, mas como uma postulao
complementar, embora se afirme que aquela veio em contestao a esta. Isso
provoca certo estranhamento, afinal de contas, o que mais relevante nesse caso- o
fato de termos uma noo de competncia que contesta a outra, ou o fato de serem
noes complementares? Coste ainda comenta sobre equvocos que tem surgido a
respeito do uso da noo de competncia comunicativa. Numa dessas investidas, o
autor argumenta que existe uma tendncia em se colocar tais competncias, a
lingustica e a comunicativa, como sendo to somente complementares, sem
nenhuma outra relao de imbricao. Coste defende que, em se tratando de
lnguas naturais, no podemos desconsiderar o fato de que tanto a competncia
lingustica quanto a competncia comunicativa configuram uma relao bvia de
interdependncia, visto que o falante- ouvinte, em termos pragmticos de uso da
lngua, precisa ter conhecimento das leis gramaticais e respeitar os limites impostos
tanto pelo sistema lingustico quanto pela situao de interao comunicativa. Assim
sendo, o autor afirma que, partindo do princpio de que uma lngua est vinculada a
uma cultura, aprender uma lngua o mesmo que aprender uma competncia
comunicativa.
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Jos Carlos P. Almeida Filho (2008) discute relaes de ensino-aprendizagem
em lnguas estrangeiras e menciona que, no intuito de formar professores
capacitados para a atividade docente, necessrio o desenvolvimento de cinco
competncias bsicas: a competncia espontnea ou explcita, uma denominada
competncia lingustico-comunicativa, competncia terica, a competncia
resultante sinttica ou aplicada e a competncia profissional/reflexiva. notrio o
fato de que esse autor se apropria do vocbulo competncia e atribui variadas
adjetivaes. Almeida Filho faz um esforo em enumerar competncias a serem
desenvolvidas tanto pelos docentes que trabalham com ensino de ensino de lnguas,
mas no formula nenhuma reflexo a respeito dessas competncias. D-se, nesse
caso, nfase ao uso do termo competncia como sendo um pressuposto do sucesso
para os docentes que trabalham com o ensino de tais e quais lnguas estrangeiras.
Mas a noo de competncia, a exemplo de autores j mencionados, aparece de
forma enigmtica, fragmentada e pluralizada.
Chama-nos tambm a ateno o fato de que os Parmetros Curriculares
Nacionais - doravante PCN- faam referncia competncia, ao menos na parte
dedicada ao ensino da Lngua Portuguesa, no ensino fundamental e mdio. Os PCN
fazem aluso a uma competncia discursiva como sendo questo central no
processo de ensino-aprendizagem de Lngua Portuguesa. No intuito de esclarecer o
conceito dessa terminologia, o documento afirma em uma nota de rodap que a
competncia discursiva , naquele documento,
[...] compreendida como a capacidade de se produzir discurso- orais ou escritos- adequados s situaes enunciativas em questo considerando todos os aspectos e decises envolvidos nesse processo (Parmetros Curriculares Nacionais, Lngua Portuguesa, 1997, p. 29)
Nos Objetivos Gerais de Lngua Portuguesa para o Ensino Fundamental os
PCN afirmam que a passagem do aluno pelo ensino fundamental deve proporcionar-
lhe o desenvolvimento progressivo de uma competncia, sem qualquer adjetivao,
mas aponta que esta competncia deva permitir que aluno tenha aptido quanto
resoluo de problemas e acesso aos bens culturais e participao plena no
mundo letrado. Fica claro como a noo de competncia, embora em alguns
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momentos figure com uma definio terminolgica assumida, ganha um carter
impreciso e generalista.
Ainda considerando o que os PCN dizem a respeito da competncia, ou
competncias, vale notar que na parte de Ensino de Lngua Portuguesa no terceiro e
quarto ciclos do ensino fundamental esse documento faz referncia novamente
competncia discursiva, mas, se observarmos com maior cautela a definio que
dada, veremos de imediato que se trata conceitualmente da competncia
comunicativa hymesiana:
Um dos aspectos da competncia discursiva o sujeito ser capaz de utilizar a lngua de modo variado, para produzir diferentes efeitos de sentido e adequar o texto a diferentes situaes de interlocuo oral e escrita. o que aqui se chama de competncia lingustica e estilstica. (Parmetros Curriculares Nacionais,Lngua Portuguesa,1998, p. 23)
A meno competncia lingustica, que aqui no posta como habilidade
inata, no se refere mesma postulada por Chomsky e a competncia estilstica,
que seria a capacidade de adequar o estilo de fala s situaes comunicacionais de
forma conveniente ao contexto, parece integrar aquilo que concebemos como
competncia comunicativa. Ao trmino das consideraes acerca do uso da noo
de competncia nos PCN, permanecem os seguintes questionamentos: se
demasiadamente imprecisa e generalista a noo de competncia, para que nos
serve? Justifica-se o fato de que esse documento use a noo de competncia
comunicativa hymesiana e lhe atribua outro termo- a competncia estilstica?
O que ainda nos deve chamar a ateno em relao aos PCN que se trata
de um documento de carter oficial, recomentado pelo Ministrio da Educao para
abalizar os procedimentos dos docentes que cuidam do ensino de Portugus como
Lngua Materna. Portanto, imaginemos, trata-se de um aporte terico-conceitual que
se espraia em todo o territrio nacional, atingindo todos os docentes de discentes
que esto numa situao formal e institucionalizada de ensino de Portugus.
Portanto, h uma relevncia significativa neste documento e dos conceitos de que
trata, em virtude de seu carter oficial e de sua expanso no contexto educacional
brasileiro contemporneo.
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3. Lingustica Aplicada e as Competncias: interseces
sempre vlido destacar que o termo e a noo de competncia no so
propriedades da Lingustica Aplicada (LA). Essa rea dos estudos lingusticos, por
sua formao histrica, no entanto, apropriou-se desse conceito numa tentativa de
elucidar as questes tericas e prticas que giram em torno do ensino de lnguas,
sobretudo o ensino de lnguas estrangeiras.
Almeida Filho (2007) aponta para o fato de que a LA j superou a marca de
uma cincia ligada aplicao de teorias da Lingustica Tradicional cujo enfoque se
estabelece nas metodologias de ensino de lnguas estrangeiras. Embora em sua
fundao a LA tenha sido marcada pelo ensino de lnguas- impulsionado pelo
contexto histrico da Guerra Fria, momento em que se fazia necessrio estabelecer
contato com aliados falantes de outras lnguas- pode-se notar que a vocao atual
predominante da LA gira em torno de questes que priorizam os aspectos sociais
tendo a lngua como o foco do problema.
Alm disso, a LA constitui-se como uma disciplina interdisciplinar, ainda que
possua seus prprios construtos tericos. Moita Lopes (1998, p.114), a respeito
dessa questo, postula que o linguista aplicado, partindo de um problema com o
qual as pessoas se deparam ao usar a linguagem na prtica social e em um
contexto de ao, procuram subsdios em vrias disciplinas. Portanto, pensar em
LA contemporaneamente nos remete a temticas que dialogam sistematicamente
com a engrenagem social na qual estamos imersos como utentes de uma lngua,
seja ela qual for.
A partir dessas questes, a problemtica do desenvolvimento de
competncias na relao ensino-aprendizagem no deve ser apenas visto como um
problema de cunho terico ou cientfico. A relao entre competncia e ensino- e
no s o ensino de lnguas- algo que se constri dentro de um determinado
contexto social e tem impacto direto naquilo que acontece dentro da sala de aula
bem como naquilo que integra a realidade para alm dos muros da escola.
A carga semntica que se faz em torno da noo de competncia uma
questo que tem a ver com o social, com a formao identitria do sujeito e com o
ethos construdos por esses sujeitos em seus diversos papis sociais. Afinal,
nenhum docente que trabalhe com ensino de lngua desejar ser taxado pelos seus
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alunos ou seus colegas e gestores de incompetente. Do mesmo modo, os
discentes que esto sendo submetidos a uma disciplina cujo enfoque seja o ensino
de lngua- mas tambm em qualquer outra disciplina- no desejar ser visto como
um sujeito incompetente, dado o estigma social que est latente no valor
semntico dos vocbulos competente ( aquele que est apto, habilitado a realizar
algo e o faz com destreza) e incompetente ( aquele que incapaz, inapto, que no
tem competncia). Assim sendo, o desenvolvimento de uma competncia ou, como
preferimos, de um conjunto de competncias na relao ensino-aprendizagem de
lnguas, maternas e estrangeiras, atinge questes sociais e de formao de
identidade, bem como na autoestima dos indivduos que participam desse processo.
Nesse sentido, a LA, preocupada com questes sociais tendo a lngua como o
foco central, dialoga com o tema aqui tratado. A competncia lingustica e a
competncia comunicativa, bem como as demais competncias que surgem a partir
dessas duas primeiras, so parte de uma engrenagem maior que se instala no ideal
de ensino de lngua materna e estrangeira e que, aqui no Brasil, atinge toda a classe
docente e, consequentemente, a classe discente, tendo em vista ser uma das bases
tericas que fundamentam o texto dos PCN para o ensino de Lngua Portuguesa em
todas as escolas do territrio nacional.
CONCLUSO
O conceito de competncia ainda tem muito valor para os estudos
lingusticos, desde o seu surgimento na dcada de 1960 com os trabalhos de
Chomsky e, j na dcada de 1970, com os trabalhos de Hymes at o momento
contemporneo. Muitos autores usam o termo em suas pesquisas acadmicas, na
prtica docente e at mesmo para construrem a sua concepo de lngua. Os
alunos de graduao e ps-graduao, em especial aqueles que tm uma inclinao
para o ensino, tambm recorrem noo de competncia como uma ferramenta
conceitual que lhes auxiliar no fazer pedaggico.
No entanto, o termo competncia e suas inmeras adjetivaes, longe de ser
um consenso entre tais agentes, tornam-se cada vez mais controverso, ambguo e
mal definido. Isso tem implicaes diretas para a concepo do professor que est
sendo formado. Deixamos aqui alguns questionamentos que so fruto de reflexes
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sobre o conceito de competncia na grande seara dos estudos lingusticos
contemporneos: Que tipo de competncia necessrio dominar para ser um
docente capaz de trabalhar com o ensino de lngua estrangeira ou materna em sala
de aula?At que ponto o entendimento dessa noo terica interfere nas prticas de
ensino dos professores de lnguas?Que tipo de competncia, ou competncias,
buscaremos desenvolver na classe discente em situaes de ensino aprendizagem?
A partir dessas consideraes podemos tomar conscincia de que a prtica
docente envolve tambm uma reflexo terica daquilo que constitui o fazer
pedaggico. Evidentemente, compreender a noo de competncia no
necessariamente nos tornar melhores docentes de lngua materna ou estrangeira.
Mas, a partir desse entendimento, seremos capazes pensar de modo mais eficaz
sobre a nossa atuao, como discentes ou docentes pesquisadores.
Abstract: This article has an intention to address the notion of competence from the
inaugural use of these terms in contemporary linguistic studies. To do so, shall be a brief historical contextualization, resuming the work of the American linguists Noam Chomsky and Dell Hymes around this notion. This work intends to discuss the impact that the notion of expertise generated to the most recent studies in Linguistics, as well as the treatment of today's authors has given this notion. In addition, we seek to establish a conceptual relationship of the concept of competence with the applied linguistics and teaching related issues with language learning.
Keywords: competence, language teaching, applied linguistics.
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REFERNCIAS
ALMEIDA FILHO, J. C. P. Tornar-se professor de lngua(s) na estrangeiridade domada. In: MENDES, E.; CASTRO, M. L. S. (Org) Saberes em portugus: ensino e formao docente. Campinas: Pontes Editores, 2008. ________. Lingustica Aplicada: ensino de lnguas e comunicao. Campinas, SP:
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