46
Revista bimestral do Lectorium Rosicrucianum “MEU MOMENTO AINDA NÃO CHEGOU...” O HOMEM VERDADEIRO NÃO MORRE O SOL ESPIRITUAL O JUGO DO INTELECTO CORAGEM, TEMERIDADE, HUMILDADE AMPLIAÇÃO E APROFUNDAMENTO DA INFRA-ESTRUTURA A MÚSICA DAS ESFERAS O PROFETA NIKOLAI BERDIAIEV O FILÓSOFO DA LIBERDADE NADA DE PRESENTE, TUDO EMPRESTADO PentagramA 2004 número 1

PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Revista bimestral do

Lectorium Rosicrucianum

“MEU MOMENTO AINDA NÃO CHEGOU...”

O HOMEM VERDADEIRO NÃO MORRE

O SOL ESPIRITUAL

O JUGO DO INTELECTO

CORAGEM, TEMERIDADE, HUMILDADE

AMPLIAÇÃO E APROFUNDAMENTO DA INFRA-ESTRUTURA

A MÚSICA DAS ESFERAS

O PROFETA

NIKOLAI BERDIAIEV – O FILÓSOFO DA LIBERDADE

NADA DE PRESENTE, TUDO EMPRESTADO

PentagramA2004 número 1

Page 2: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

PENTAGRAMA

C O N T I N U A Ç Ã O D O T E M A :

A promessa espiritual

da Europa oriental

O conceito Gnosis remete ao Conhecimento,

o conhecimento misterioso e secreto.

No sentido original, Gnosis é a soma das

antigas sabedorias, o conjunto do conhecimento

relativo à vida original divina, à corrente de

vida verdadeiramente humano-divina.

(De leste para oeste, página 9)

Pégaso. Página de rosto de

Unparteyische Kirchen und Ketzer-

Historie de Gottfried Arnold,

Frankfurt-am-Mayn, 1699.

ÍNDICE

2 “MEU MOMENTO AINDA

NÃO CHEGOU...”

6 O HOMEM VERDADEIRO

NÃO MORRE

9 O SOL ESPIRITUAL

15 O JUGO DO INTELECTO

19 CORAGEM, TEMERIDADE,HUMILDADE

22 AMPLIAÇÃO E

APROFUNDAMENTO DA

INFRA-ESTRUTURA

32 A MÚSICA DAS ESFERAS

36 O PROFETA

38 NIKOLAI BERDIAIEV – OFILÓSOFO DA LIBERDADE

42 NADA DE PRESENTE,TUDO EMPRESTADO.

ANO 26NÚMERO 1

Page 3: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

“Meu momento ainda não chegou...”

Alexander Nicolaievitch Skriabin(1872-1915) foi um fenômeno na cul-tura russa. Suas idéias e sentimentosultrapassavam os da média dos russos.Ele trouxe uma nova visão de mundo.Sua presença era irradiante e vivente etinha claro caráter profético.

kriabin desenvolveu pensamentosextremamente pessoais. Ele absorveua idéia teosófica de ciclos cósmicos,nos quais se desenrola a evolução su-perior da humanidade, porém, era daopinião de que o ser humano não pre-cisa esperar indefinidamente para al-cançar um alto nível espiritual. Comsua arte, ele tentou forçar o surgimen-to de uma consciência universal e colo-car fora de ação a dimensão do tempoe destruí-la. Suas composições estavamcompletamente impregnadas dessafilosofia. Com sua música ele preten-dia curar a humanidade. Ele dizia quetodas as artes deveriam fundir-se emuma poderosa síntese que ajudaria ahumanidade a experimentar o misté-rio do mundo. Tal acontecimento mo-dificaria toda a humanidade.

Na transmissão dessa mensagemele não era, de maneira alguma, humil-de. Em sua época viviam grandes per-sonalidades que, aos olhos do ser hu-mano moderno e realista, se compor-tavam de forma muito teatral. Era aépoca dos grandes poetas que, comuma maré de quadros brilhantes,trouxeram à tona novas formas e co-

res. Assim também surgiu no palco davida, o muito talentoso, Alexander Ni-colaievitch Skriabin, compositor, pia-nista, poeta e filósofo, famoso duran-te a vida, porém rapidamente esqueci-do após a morte. Ele via como sua mis-são, transmitir à humanidade, comsua música, uma mensagem elevada.

Sua educação foi determinada portrês mulheres. Alguns críticos são daopinião de ser essa a razão de sua pos-tura exaltada. Mas Skriabin vivia na“idade de prata” russa (fim do séculoXIX, início do século XX), quando acultura da Europa oriental teve umrápido e elevado impulso. Era umaépoca de florescimento, em que mui-tos grandes personagens tiveram umimportante, mas sobretudo estimu-lante, papel na música, na literatura etambém na poesia. Era uma época

S

2

O compositor

russo Skriabin.

Page 4: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

inspiradora, intrigante e colorida, cu-jos principais personagens eram certa-mente influenciados pelo Espírito.Novas idéias acerca do futuro da hu-manidade ganharam vida. Um novocaminho deveria ser aberto, novas di-mensões deveriam ser pesquisadas.Também foi a época em que H. P.Blavatsky realizou sua obra. Ela de-nominou este tempo como o fim do

Kali Yuga – o fim de um período e oinício de um novo desenvolvimentopara o homem e a criação. Outras no-vas e renovadoras forças e pensamen-tos abriam caminho. Tradições e anti-gos hábitos de vida e de pensamentoforam descartados.

Skriabin foi inspirado pelo pensa-mento teosófico, que estudou nos li-vros A doutrina secreta e A chave pa-

3

As montanhas

do Himalaia, nas

quais o pintor

Roerich se

inspirou. Foto

Pentagrama.

São Petersburgo.

Page 5: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

4

ra a Teosofia de Blavatsky. No entan-to, apesar de ele ter sido tocado poressas idéias, não se sentiu atraído poresse movimento, não se tornando mem-bro dele e nem de outra sociedadeesotérica. Mesmo assim, mantinhacontato com ocultistas e esotéricos,como era costume entre as camadasdirigentes daquela época.

“O brilho do aço”

Sem descanso ele procurava pornovos temas, novas técnicas, novostons, combinados com um espectrode doze cores, que estavam em con-traposição com os espectros de seteou oito cores usados na época. Por servidente, ele podia perceber a analogiaentre cores e tons, e para expressartais relações, utilizava, por exemplo,três cores “azuis”. Com o “brilho doaço”, ele caracterizava a emergentetecnologia do período industrial, po-rém não são conhecidos os significa-dos de todas as cores que utilizava,nem o que queria expressar com elas.Em todo caso, na visão do mundo teo-sófico, cores estão relacionadas com oestado de alma do homem. O azul in-

tenso indica, por exemplo, sentimen-tos puros e religiosos; vermelho escu-ro, ganância, egoísmo e raiva. Tais in-dicações também se encontram napartitura da ígnea poesia de Skriabin,Prometeu (1908-1910). Nela existemduas vozes associadas a luz e cor. Eleindicou a cor pertencente a determi-nada nota e a atmosfera que ela deveriatransmitir: misteriosa, fogosa, refleti-va, ou ainda o despertar da consciênciado ser humano, alegria de viver, dor,êxtase. Desse modo ele tentou expres-sar a transcendência do ego. Ele de-signava a base de todas as experiênciascomo “pleroma”. Esta é uma expres-são gnóstica que significa “plenitude”,ou seja, o mundo divino, completa-mente apartado da realidade terrena.

Alexander Skriabin buscava con-cretizar seus pensamentos em umafilosofia absolutamente pessoal. Comisso ele se distanciava de forma mar-cante do cristianismo, o que indicamsuas anotações de 1894. Regularmen-te ele tomava parte nos encontros daassociação religioso-filosófica de Mos-cou, nos quais também teve contatocom as idéias de Soloviev sobre omundo. No início, não deu muito va-lor às tendências místicas desse autor,pois, para Skriabin, era mais um“renunciar ao pequeno eu para con-quistar o grande eu (a consciência uni-versal, liberta do tempo e espaço)”.Portanto, estou consciente de que omundo é minha criação, de que tudodeve ser resultado de meu livre-arbí-trio e de que nada pode existir fora demim. Eu sou um ser absoluto. Todo orestante são fenômenos nascidos dasradiações da minha consciência.

Templo de matéria etérica

Esse processo de desenvolvimentointerior encontrava expressão nas com-

Prometeu e

a águia.

Litogravura de

Michelangelo

Page 6: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

posições de Skriabin. Ele experimen-tava combinações com muitos instru-mentos, no estilo de Richard Wagner,em moda na época. Mas Skriabin foimais longe do que Wagner, a quematribuía pouca profundidade.

Nas suas obras sobressai, acima detudo, sua dedicação ao Mistério, as-sim como ele mesmo o definia e escre-via com letra maiúscula. Esse Mistériodevia se consumar na Índia, em umtemplo de finíssima matéria etérica,um templo feito de música, cores eluz. Eu pensei muito a respeito de co-mo seria possível vocês fazerem a es-trutura do templo fluídica e criativa. Ede repente ocorreu-me que as colunaspoderiam ser de incenso. Elas serãoirradiadas pelas luzes da orquestra deluz, expandindo-se e contraindo-se!Serão enormes mastros de fogo. E otemplo interior deve ser feito deles. Aconstrução deve ser fluídica e mutávelcomo a música. Suas formas devemrefletir as esferas da música e dos sons.

Quem adentrar esse templo deveiniciar como candidato e percorrer asdiversas fases da iniciação. Após a re-velação desse Mistério, o tempo, comodimensão, não deveria mais existir.Com essa visão Skriabin esteve muitoalém de seu tempo. Na sua opinião,através desse Mistério, toda a huma-nidade percorreria um outro caminhoevolutivo, que a levaria a um planosuperior.

Todas as músicas sinfônicas escritaspor Skriabin foram especialmentepensadas para a preparação desse gran-de Mistério. Ele assim pensou, pres-sentiu e o expressou. Mas ele não erao único que refletia a respeito de mú-sica, luz e cor. Ainda no século XVII,o jesuíta francês Castel tinha cons-truído uma espécie de címbalo comteclado, com o qual ele podia combi-nar música e cor e, em 1863, o físico

alemão von Helmholz fazia experi-mentos com sons e cores. Sendo as-sim, a idéia de Skriabin não era nova,mas foi ele quem realmente começoua apresentá-la, e em grande estilo. Di-ferente de Wagner que, por exemplo,expressava seus mistérios em óperas,Skriabin procurava por novas expres-sões de estilo. Ele recebia os impul-sos da nova época e estava conscien-te de não dispor de muito tempopara a obtenção de resultados positi-vos. Portanto, tinha de duplicar seusesforços. Incansavelmente ele cha-mava a atenção da elite social parasuas visões e experimentos, pois esta-va convicto de que existia um princí-pio superior, do qual tudo provinha:a unidade da criação.

Não lhe foi possível realizar suasidéias de forma completa. Morreu re-lativamente jovem, de uma infecçãoinicialmente inofensiva. Muitos escri-tores, poetas, compositores e pinto-res, tanto de sua época quanto poste-riores a ela, foram por ele inspirados.

5

Skriabin: “Em uma sociedade verdadeira e sincera,os artistas devem estar no topo da hierarquia. Os artistas e as pessoas sábias, pois são eles que têmas mais elevadas e maiores idéias e que possuem amais elevada clareza. Montanhas e massas – sãosempre matéria, mas nós precisamos aspirar à desmaterialização”.Da mesma maneira, músicos modernos fazem experimentos com luz. Nos concertos de músicapop, rock e em discotecas, é provocada a ilusão deum majestoso templo musical através de fumaça eluz colorida. Mas não era a isso que Skriabin aludia.

Page 7: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

migo: – Diga-me, Pamwa, tu, queestudas há tanto tempo, conheces umsalmo de Davi?Pamwa: – Sim, conheço um.Amigo: – Só um?Pamwa: – Sim, só um.Amigo: – Qual?Pamwa: – Aquele que inicia assim:“Disse comigo mesmo: Guardarei osmeus caminhos, para não pecar com alíngua” (Salmo 39 – red.). Mas já nãotenho medo disso porque pus um fer-rolho em minha boca e um selo emminha velha língua.Amigo: – Falar é verter um fluxo depalavras cuja fonte é a língua. Porém,meu caro Pamwa, se o Senhor te liber-tou da vaidade de tua língua, é porqueEle te revelou a exatidão da língua deDavi, que estudou cada dia a verdadedivina e anunciou seu poder para aposteridade.Kwadraat: – Sim, é claro. Podemosfalar do branco sem conhecer o preto?É o mesmo sentido do paladar que nosensina ao mesmo tempo o amargo e odoce. Similarmente, se o Senhor per-mite a uma língua melíflua que se ex-presse, não inspirará Ele também a pa-lavra justa ao que estudou a sabedoria?Anton: – Ah, dizes aqui algo de for-midável. Aquele que, portanto, não co-nhece a palavra nova só pode ignorara antiga, não é mesmo?Pamwa: – Sem dúvida nenhuma. Oantigo ressoa até o momento em queo novo se afirma. Já se viu alguématestar da escuridão sem conhecer a

luz? Dize-me, será que uma toupeirapoderia nos explicar a diferença entreo dia e a noite?Anton: – Uma toupeira não poderia,mas um homem, sim.Pamwa: – Acreditas que um cego po-deria, diante de um quadro, dizer on-de se encontra a parte clara?Anton: – Não, isso ele não poderia.Pamwa: – E por que não?Anton: – Porque ele nunca viu o escuro.Se ele conhecesse uma das duas coresopostas, ele poderia identificar a outra.

O homem verdadeiro não morreConversa entre o staretz Pamwa, Anton, Kwadraat e Amigo.Trecho extraído de “Narciso” de Grigori Skovoroda.

Pomba em

mármore. Foto

Pentagrama.

6

A

Page 8: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Pamwa: – Sim, e isso é também válidono caso que nos interessa. Se compre-endemos a juventude, podemos com-preender a velhice.Anton: – O que me surpreende, mes-mo assim, é que não temos um conhe-cimento inato nem sobre a juventude,nem sobre a velhice, e muito menossobre nascer de novo.Pamwa: – A luz ilumina o que não dis-tinguimos no escuro. Do mesmo mo-do, somente Deus pode conceder averdade absoluta. O homem terrenotende a compreender. Mas não é tam-bém desse modo que um recém-nas-cido vê coisas, num estado de semi-consciência, em realidade, invisíveis?A Luz nascente apaga todos os outrosclarões. Cada um conhece conceitoscomo tempo, vida, morte, amor, pen-samento, alma, paixão, consciência,graça, eternidade. Acreditamos sabero que significam. Mas quando se tratade explicá-los, esgotamo-nos ao refle-tir sobre eles. Quem pode dizer o quesignifica o conceito de tempo antes deter penetrado até as profundezas divi-nas? O tempo, a vida, e todas essasidéias estão em Deus. Quem pode com-preender alguma coisa dessas criaçõesvisíveis e invisíveis, se não discerniudelas nem o princípio nem o funda-mento[...]?

Se, portanto, queres conhecer eanalisar uma coisa, deves primeiro es-calar a montanha do conhecimento deDeus. Lá, serás iluminado pela irradia-ção secreta de Deus e poderás explo-rar tudo o que quiseres. Não somentea primeira infância e a velha veste gas-ta, mas também tempos muito maisantigos e até mesmo o céu dos céus.Mas, quem nos alçará para fora doabismo da ignorância? Quem nosconduzirá à montanha de Deus? On-de estás, Tu, nossa Luz, Jesus Cristo?Somente Tu exprimes a Verdade em

teu coração. Tua Palavra é a Verdade.Teu evangelho é uma lâmpada acesa.Tu és a Luz das Luzes. Esse é o únicomeio de escapar à ilusão e às trevasgeradas pela ignorância. Essa é a casa

7

Grigori Skovoroda (ver Pentagrama n°6, ano 25,p.24) chamou ao seu diálogo “Narciso” (ca. 1870)seu “filho primogênito”. As cinqüenta páginas desselivro encerram numerosos aspectos do caminho espi-ritual. No prólogo, Skovoroda oferece uma visãoinsólita do mito de Narciso e define o transfiguris-mo como uma doutrina relativa a um processo deunião, de fusão e de transformação. O staretz Pamwatoma parte dessa sétima conversação, que acabou deser apresentada. Até o século XX, o staretz (o ancião)era um conselheiro amado e respeitado. Em “Os ir-mãos Karamazov”, Dostoievski faz o retrato de umstaretz. “Mas, o que é um staretz senão uma espéciede eremita ou de monge? Na época muito ilumina-da em que vivemos, ouvimos muitas vezes pronun-ciar a palavra monge com uma ponta de ironia; tor-nou-se até mesmo um insulto. E quanto mais se fa-la, pior fica. É verdade, é infelizmente mais do queverdade que entre os monges perambulam malan-dros, lúbricos, glutões, os que fogem das tarefas e osque não têm nem fé, nem lei. É contra esses que aspessoas honestas têm algo: ‘Em nossos dias, nosmeios esclarecidos, pronuncia-se este termo com iro-nia, por vezes mesmo como uma injúria’. E isto vaiaumentando. É verdade, ai, que se contam, mesmoentre os monges, muitos mandriões, sensuais, libidi-nosos e desavergonhados vagabundos. ‘Não passaisde preguiçosos e membros inúteis da sociedade, vi-vendo do trabalho alheio, mendigos sem vergonha.’Entretanto, quantos monges são humildes e mansos,aspiram à solidão para nela se entregar a fervorosaspreces! Não se fala deles, cercam-nos de silêncio ecausarei espanto a muita gente dizendo que são elesque salvarão, talvez, ainda uma vez a terra!Porque estão verdadeiramente prontos para ‘o dia ea hora, o mês e o ano’. Guardam na sua solidão aimagem do Cristo, esplêndida e inata, na pureza daverdade divina.”Dostoievski, F.M., Os irmãos Karamazov, São Paulo:

Abril Cultural, 1970.

Page 9: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

de Davi, onde o Trono da Justiça con-dena e aniquila toda mentira. O quemais queres saber, Anton? Busca o in-terior dessa casa bem-amada. E se nãoencontrares a entrada da primeira sa-la, bate a uma outra porta, à décima, àcentésima, à milésima, à décima milé-sima. Exteriormente a casa de Deus ésemelhante a um estábulo, mas, no in-terior, a Virgem dá a luz àqueles aquem os anjos louvam sem cessar. [...]Não entres lá como um ladrão. Buscaas portas e bate até que elas se abram.Não serás encontrado digno de entrarenquanto concederes tua preferênciaa este mundo em vez de preferires amontanha de Deus. Ninguém teráacesso a ela se ainda tiver a menor resis-tência. E não tentes forçar uma porta,pois, então, serás mergulhado em tre-vas ainda mais profundas.

Amigo: – Já não posso me calaragora que ouvi a santa e suave mensa-gem da serena ressurreição. Emborapermaneça na escuridão gelada emortal, percebo em mim mesmo ummisterioso raio que aquece meu cora-ção. Ah, Pamwa, que possamosimpedir essa centelha divina de ser

sufocada sob o granito e a cinza dostúmulos que somos! Ó divina cente-lha, semente e embrião! Semente deAbraão. Filho de Davi. Jesus Cristo.O novo homem celeste. Cabeça, co-ração e Luz da criação inteira. Centroabsoluto. Força, Lei e Reino da Li-berdade. Destra de Deus. Ó Res-surreição! Quando poderei provartua Graça? Tu és o verdadeiro ho-mem, a carne tornada pura. Esse ho-mem, nós não o conhecemos; só co-nhecemos o homem mortal comum.O homem verdadeiro não morre.Aquele que conhece o homem verda-deiro, imperecível, se torna imortal.A morte não tem mais poder sobreele. Como fiel servo, ele governa comseu Senhor para todo o sempre. Eledespojou-se da carne como de umaveste usada e recebeu um novo cor-po, criado para ele. Ele não adorme-cerá na morte, mas se transformará;mãos inalteráveis substituirão suasmãos carnais, e no lugar de seus ouvi-dos, de seus olhos, de sua língua deanimal e de todos os seus membros,ele receberá os membros verdadeirosocultos em Deus.

Caniços

ondulantes

vergam, mas não

se rompem.

Lago Balaton.

Hungria. Foto

Pentagrama.

8

Page 10: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

O sol espiritual

Visto da terra, o sol caminha de lestepara oeste. Ele se levanta no leste, co-mo se costuma dizer, e se põe no oeste;e esse movimento se repete indefini-damente. A vida na superfície da ter-ra depende do sol visível. Mas hátambém um sol invisível, que coman-da mecanismos imperceptíveis e osconserva.

sol visível é uma expressão do solinvisível que os egípcios chamavam deAton, os gregos de Hefestos e os ro-manos de Vulcano. O sol visível, toda-via, é mais do que a contraparte mate-rial do sol invisível. Ele também pro-digaliza as forças que o sol espirituallibera em proveito do sistema solar.Ele é um chamado que ressoa doOriente.

O leste e o oeste são representaçõesgeográficas determinadas pela rotaçãoda terra. Se os pólos mudassem deposição, o leste e o oeste também mu-dariam de localização, como é mencio-nado nos arquivos dos templos egíp-cios. Na Índia, na Grécia e na Romaantigas, as palavras usas, eos e auroraeram utilizadas. Essas palavras signifi-cavam tanto o ciclo diurno, a deusado dia, como o brilho do ouro. A pa-lavra “oeste” é derivada do sânscritoantigo avas, do grego hespera e do la-tim vesper que significam descer (na ma-téria), ir para baixo, e também a estre-la do pastor, o ocidente, lá onde o soldesaparece e onde nascem as trevas.

Segundo os ensinamentos univer-sais que descrevem seu plano de evo-lução, a humanidade encontra-se hojena era ariana, que toma seu nome dapalavra arya. Na Índia antiga, esta pa-lavra significa “nobre”. O berço daraça ariana está na Ásia central. De láprovieram os sete impulsos espirituaisque estão na origem das sete grandesreligiões mundiais. Estas sete religiões,assim como as grandes civilizaçõesque surgiram delas, deixaram vestí-gios materiais, etéricos e astrais aolongo de seu avanço de leste paraoeste, iluminando as trevas em suapassagem.

Uma grande parte desses vestígios éinvisível, mas encontramos nos tem-plos palavras, símbolos e imagens quetestemunham do futuro do homem ede seu retorno à origem. No Evan-gelho de João (1:1-3), está escrito: Noprincípio, era o Verbo, e o Verbo esta-va com Deus, e o Verbo era Deus. Eleestava no princípio com Deus. Todasas coisas foram feitas por ele, e sem elenada do que foi feito se fez. A forçadesta sentença mágica parece ter-seperdido. Em todo caso, ela não se di-rige ao homem materialista, assentadoem suas bases, e que muitas vezes dáum sentido comum às divisas bíblicas,empregando-as sem discernimentopara corroborar suas opiniões. A for-ça mágica, então, teria aparentementese perdido. Na realidade, não é assim.Sem o Verbo de que trata o Evangelhode João, nada do que foi feito teria

9

O

Page 11: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

sido feito. Esse Verbo é a força decrescimento e de realização de todasas coisas. A força que aperfeiçoa aCriação irresistivelmente, metodica-mente. O acaso e o arbitrário estãototalmente excluídos disso.

O conhecimento vivo da vida original

O Livro dos preceitos áureos, doqual ignora-se as fontes e do qual H.P.Blavatsky tirou A voz do silêncio, tra-ta do Jnâna, que significa o puro co-nhecimento ou sabedoria. Infeliz dacorça que é alcançada pelos demôniosladradores antes de ter atingido o valedo refúgio chamado de Jnâna Mârga.Jnâna Mârga é traduzido literalmentepor senda do puro conhecimento. Umlivro sânscrito, o Jnanashwari, traz,em uma magnífica exposição, o teordo ensinamento que Krishna transmi-te a Arjuna.

Os gregos chamam de Gnosis esseconhecimento vivente da vida original.Quando o conceito cristão “Deus”começou a perder seu conteúdo, a pa-lavra “Gnosis” foi redescoberta e re-cuperou toda a sua importância. De-pois da Renascença, os tempos esta-vam maduros para investigar as raízes

da vida gnóstica e passar à prática.Depois de um longo período de clan-destinidade e uma breve fase prepara-tória, levada a bom termo por pionei-ros como H.P. Blavatsky, Max Hein-del, Rudolf Steiner e muitos outros, aGnosis foi desvelada. Esse novo passofoi decisivo para levar a humanidade aum outro estágio de desenvolvimento.

Extraído das cavernas e dos deser-tos do esquecimento, um ensinamen-to intacto apareceu à luz do dia. Des-cobertas como a de Nag Hammadi,no Egito, voltaram a colocar a Gnosisem foco. Apesar da oposição inicialde um grupo de conservadores, osmanuscritos foram traduzidos e apre-sentados a um grande público. A sa-bedoria dos antigos gnósticos ressur-giu em nossa época e pouco a poucoobteve reconhecimento.

A Gnosis é amplamente recebidacomo uma fonte secreta de inspiração,como a voz de um outro mundo, deum mundo que, especialmente noscírculos esotéricos, é objeto de pro-fundos estudos. Porém “Herodes”,ainda sempre presente como eternoadversário, tenta manter o controle.Ele joga sobre a Gnosis uma luz sinis-tra, ao mesmo tempo em que reco-nhece a marca que ela deixou como

10

O deus Dionísio,

nascido do

abraço de Zeus

e criado por

Hermes.

Baixo-relevo,

Museu do

Vaticano, Roma.

Page 12: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

fenômeno histórico. Mas pouco im-porta, pois isso não impede a Gnosisde envolver a humanidade com amorinefável e de guiá-la com paciência nocaminho da evolução. É preciso que acriança cresça, torne-se robusta e sedesembarace das faixas do tempo e dailusão.

Para o homem do presente, é damais alta importância “respirar” coma cabeça e o coração, preencher-se daforça divina, vivente e regeneradora, aGnosis, a fim de se elevar acima doscaminhos de perdição nos quais se en-contra extraviado. Essa é a condiçãobásica. Somente um coração e umacabeça iluminados fazem de nós ser-vidores da Gnosis. O caminho gnós-tico de evolução é rico de testemu-nhos. Ele foi seguido por todas as ci-vilizações. No decorrer de um passa-do mais recente, esse fio condutor foiagarrado pelos bogomilos, os cátaros,os franco-maçons e os rosacruzes.

Pesquisar todos os níveis de vida

No tumulto de nossa época, muitaspessoas estão conscientes de uma mo-tivação interior desconhecida e supe-rior. Eles formam grupos de pesquisa-dores de todos os níveis. Alguns sejuntam, como no passado, em frater-nidades que professam ideais eleva-dos. Em função dos novos poderes daalma, eles constroem uma unidade quelhes permite ultrapassar os limites daforma e do conteúdo e colocar-se a ser-viço de seus semelhantes. A força deluz que eles recebem e liberam servede alívio para o sofrimento humano.

Ao ter êxito em realizar o Graal ou,como diz a Bíblia, o “mar vítreo”, elesmostram que triunfaram da vida infe-rior. Uma tal comunidade de ho-mens-alma se eleva ao patamar onde a

Gnosis se revela a eles, a serviço dahumanidade em busca da Libertação.

A Gnosis é onipresente e penetra todos os seres

Às vezes ouvimos dizer que ostempos estão maduros: na prática, amaturidade significa que o tempo dacolheita chegou. O mesmo acontecena vida espiritual. A Gnosis fala por sisó. Sua força é onipresente e envolve epenetra todos os seres. E aquele que abusca deve poder reconhecê-la na-queles que a transmitem. No entanto,ela só se torna reconhecível aos quesão conscientes e que a liberam e acomunicam a serviço da vida total.Chega, então, um tempo em que a hu-

Schamash, deus

do sol, alimenta um

príncipe babilônico.

Baixo-relevo, Suza,

Mesopotâmia,

século XII,

Louvre, Paris.

11

Page 13: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

12

manidade se beneficia dessa ajuda.À época do trabalho para o homem

e com o homem segue-se a época emque a Gnosis trabalha por meio dohomem, desde que ele esteja prepara-do. O gnosticismo pode representaraos olhos de alguém autoritário e con-servador uma corrente herética; aosolhos de um outro, ele será uma fontedessedentadora para sua árida visãoda Criação e de sua própria existênciae o fará descobrir numerosas possibi-lidades e, acima de tudo, o alvo novoe libertador a ser alcançado.

A Gnosis não está ligada ao tempo.Ela o transcende. Ela é a verdadevivente desde a aurora da Criação, oVerbo do princípio pelo qual todas ascoisas foram feitas, e sem ele nada doque foi feito se fez.

A humanidade chegou ao final deum período de desenvolvimento. Aluz matinal de uma nova era de evolu-ção anunciou-se. O homem de hojedeve testemunhar do Verbo, da Gno-sis, em ação e em verdade. Na Bíblia édito que Jesus Cristo se fez carne. Issosignifica que o Conhecimento vivo e aVerdade desceram no homem paraserem revelados nele e por ele.

O gnóstico transfigurista J. vanRijckenborgh escreve, em A GnosisUniversal, que o conceito “gnosis”remete ao Conhecimento, o conheci-mento misterioso e secreto. No senti-do original, ela é a soma das antigassabedorias, o conjunto do conheci-mento relativo à vida original divina, àcorrente de vida verdadeiramente hu-mano-divina. A Gnosis não está noslivros. Isso não é possível. Ela só setransmite oralmente, onde for útil enecessário, e no momento exigido.Está fora de questão que a Gnosis serevele e se transmita em sua integrali-dade, como um sistema.

O Graal é uma baliza na noite dos tempos

Todos os livros de sabedoria uni-versal, inclusive a Bíblia, não são reve-lações da Gnosis; ainda não. Essestextos especiais testemunham da Gno-sis, dão informações sobre a intangí-vel unidade original e sobre o aconte-cimento que constituiu a separaçãoentre o divino e o não divino. Elesaparecem muitas vezes em forma dediálogo entre um mestre e um aluno

Hefestos forja

um escudo. Novo

museu do Palazzo

Conservatori, Roma.

Page 14: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

13

em busca da unidade original. Muitaslendas e relatos aludem também à ori-gem e ao caminho que leva a ela. OGraal é muitas vezes mencionadocomo o símbolo final desse processo.O Graal segue de leste para oeste, daluz para as trevas, e representa umabaliza na noite dos tempos.

Ele é o emblema deste segundo pe-ríodo do cristianismo: o tempo da co-lheita e do testemunho daqueles queencontraram o caminho do Graal epuseram em prática suas exigências.Esse caminho está registrado nos qua-tro Evangelhos da Bíblia. Mas elesnão são os únicos a dar testemunho dis-so. Um certo número de escritos apó-crifos lançou uma nova luz sobre pas-sagens obscuras dos Evangelhos elevantou o véu da Gnosis, revelando-a.

Em sua maioria, os próprios men-sageiros da Gnosis não deixaramescritos. Suas palavras foram transmi-tidas por outros, e as transcrições ori-undas dessas tradições foram objetode uma recompilação.

Cada batida do coração é um chamado

Esse processo é às vezes descrito deforma tão límpida que podemos nosperguntar como proporcionalmentetão poucas pessoas vejam e encon-trem o caminho gnóstico de liberta-ção. Terão elas tão pouca compreen-são? Serão elas letárgicas ou não sen-tem necessidade disso? Será que elassó priorizam suas preocupações eseus prazeres cotidianos? Não têmelas nenhuma idéia da situação emque se encontram? Conscientementeou não, em dado momento, num bati-mento do coração, mais de uma pes-

soa é tocada pela Gnosis. Elas podemfechar o coração, mas também podemabri-lo. Neste caso, elas se tornarãocada vez mais conscientes do sentidoverdadeiro da vida e sentirão como apromessa da aurora surge no oriente ecomo aproxima-se o dissipar das tre-vas. O tempo chegou, e elas percebemo impulso que as impele para umanova evolução.

Para compreender a Gnosis é preci-so uma nova alma. As consideraçõesfilosóficas sobre o passado gnóstico eseus vestígios na História são, para anova alma, de um interesse secundá-rio. O que conta, antes de tudo, é oato, é reagir de forma positiva ao cha-mado da Gnosis. O conhecimentoadquirido pela nova alma é, assim,ampliado, pois a Gnosis é o conheci-mento vivente alimentado pelo fogooriginal. Quando o candidato se tornaconsciente do processo, essa realidade

Relevo de uma

palmeira.

Palmira, Síria.

Foto

Pentagrama.

Page 15: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

permeia totalmente sua vida. Porém,ele deve velar para não deixar seusconceitos sobre Gnosis e gnósticoescorregarem para o nível do desco-nhecimento generalizado. São concei-tos muito elevados e, com a ausênciade pura compreensão, existe o terrívelrisco de nivelar por baixo: cai-se facil-mente no falatório e na dispersão,acarretando mais mal-entendidos econfusão.

Filosofar sobre Gnosis é uma ilu-são, diz J. van Rijckenborgh. Segundoele, a Gnosis não é nem filosofia, nemreligião, nem método do que querque seja. Ela não apela nem aos nos-sos poderes intelectuais, nem aosemocionais. No início, ela se apresen-ta ao pesquisador sob uma formaespecial. Ela é justamente a força doverdadeiro reino, que veio unir-se aomicrocosmo da maneira mais simples.

No livro Os mistérios gnósticos daPistis Sophia, ele escreve: Quandovoltais vosso olhar para a aurora evosso inteiro comportamento está emsintonia com ela, então a Luz se elevano oriente. A vibração do microcosmose eleva e as correntes magnéticas dooriente e as do ocidente devem se har-monizar com ela. A corrente que saiexpulsa o que é ímpio, e a corrente queentra evoca o passado original dosfilhos de Deus.

Em seu livro O anjo na janela doocidente, Gustav Meyrink descreve omodo pelo qual as forças que repeli-mos continuam tentando exercer suainfluência magnética, batendo muitotempo na porta do eu, para aí seremadmitidas novamente. É por isso quea neutralidade do eu é a base e o pon-to de partida do processo de liberta-ção. A Gnosis trabalha na câmara in-terior quando o candidato, na Suaforça, dá forma ao trabalho exterior.Todos os homens de nosso tempo sãochamados a essa nobre tarefa. O tra-balho sobre o exterior é uma colabo-ração consciente com a colheita, pelapreparação daqueles que não encon-traram ainda o caminho. O trabalhona câmara interior prepara para a re-cepção da descida da Gnosis no cora-ção ardente de desejo.

O sol avança infalivelmente de lestepara oeste, em toda a vida materialassim como em toda a vida espiritual.Por isso é dito: “Trabalha enquanto édia e aguarda tua hora”.

Assim testemunhamos da Glóriaintangível de Deus.

14

A terra, como todos os corpos celestes do sistemasolar, é alimentada, mantida e purificada pelaenergia do sol. A corrente de energia chamadavento solar, emanada do sol, lançou, nestes últimosonze anos, chamas a até um milhão de quilômetrosde altura. Em outubro e novembro de 2003, essa“circulação sanguínea” do sol mostrou sinais dearritmia. Entre dois “batimentos do coração”houve uma erupção, no dia 28 de outubro, depotência estimada em sete megatons, seguida, nodia 29 de outubro, de uma erupção de dez mega-tons e, no dia 4 de novembro, por uma tempestadesolar de potência de vinte e oito megatons. Em dezdias foram contadas seis erupções muito fortes,mais fortes do que normal. A última erupção foifilmada e vemos uma chama gigantesca, como a deum cuspidor de fogo. Mas os aparelhos medidoresdos satélites, ultrapassados por uma tal violência,ficaram momentaneamente em pane.

Page 16: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

O jugo do intelecto

“O mais elevado saber é nada saber.”No mundo inteiro, há pessoas que che-garam a esta conclusão. Para os ou-tros, a antiga sentença dos rosacruzes éum paradoxo incompreensível. O queé, pois, a verdade?

classificação em categorias e os li-mites estabelecidos pelo intelecto po-dem servir para ordenar a vida co-mum. Mas enquanto esses métodosgovernam o pensamento, eles blo-queiam sua expansão e novamentenos encontramos no caminho errado.O filósofo russo Leon Chestov(1866-1938) é um dos maiores pensa-dores que desenvolveram a “filosofiareligiosa”. Para ele, o intelecto é pordemais limitativo. Em Paris, ele fre-qüentou os encontros semanais de seuamigo, o filósofo russo Berdiaiev. Nas-cido em Kiev, seu nome civil era LeonIsaak Schwarzmann. Ele estudou nasuniversidades de Moscou, Roma eBerna e, fugindo dos bolcheviques,foi para Genebra. Convidado pelaSorbonne, passou seus últimos anosem Paris. Faleceu em 1938, deixandouma importante obra filosófica.

No decorrer de sua busca pela ver-dade, Chestov concebe muitos pensa-mentos profundos que incessante-mente reformula. Ele descreve o mo-do como cada pessoa, constrangidapelo mental, desvia-se do caminhotraçado. Ele se pergunta quem for-mou sua vida e por que sua pesquisa o

leva sempre de volta do exterior parao interior, para a enigmática e inson-dável profundeza. Ele orienta sua pes-quisa especialmente para as motiva-ções de nossos atos e luta a vida todacontra o domínio do cérebro biológi-co. Essa é uma das razões pela qual écontado entre os filósofos mais im-portantes do século XX. Ele fala dacompreensão objetiva ilimitada, por-que ele mesmo venera esse conceitoque domina todos os poderes supe-riores do ser humano. A tendência dereprimir a vida puramente interior ecolocar à frente o intelecto de manei-ra parcial não é nova.

“O filósofo das profundezas”

Para se distinguir de todos os mo-vimentos que se ocupam dessa ques-tão, ele se autodesigna como “o filó-sofo das profundezas”; contra a ten-dência à extensão ilimitada do intelec-to, propõe a apoteose da profundezainsondável. Ele quer mostrar que asprofundezas enigmáticas e ocultas sãoinacessíveis ao intelecto, porém, que énelas que se revela a dimensão espiri-tual, pois é justamente essa profunde-za que abre espaço para a manifesta-ção de aspectos espirituais. Ele fala daprópria vivência porque tudo o queexperimenta do Mistério e do inefávellhe oferece finalmente a chave para aprofunda compreensão da existência.Ele sente e supõe uma tremendamen-te criadora liberdade por detrás dos

15

A

Page 17: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

16

limites do intelecto. Portanto, ele uti-liza sua própria energia e atenção parase livrar de princípios intelectuais pré-estabelecidos.

Chestov observa com precisão queater-se ao racional em tudo represen-ta um perigo para a vida espiritual.No livro O poder das chaves ele mos-tra como o intelecto cultivado é teme-rário e presunçoso: ele quer até de-monstrar Deus. O que a razão já nãose permitiu no decorrer da história! Arazão extraviada até estabeleceu seuspróprios critérios da existência dadivindade, e Deus só precisa ajustar-se a esses critérios. Com que compla-cência o pretensioso intelecto dignou-se a demonstrar a existência de Deus!

A solução está onde não há mais solução

Aonde leva a via que Chestov to-mou? Ele afirma: A única verdadeirasolução começa quando já não há maissolução segundo os critérios humanos.Precisamos nos voltar para o insondá-vel para nos aproximarmos do impos-sível [...] Lá está Deus. E isso justa-mente porque o insondável não cor-responde a nenhuma categoria inte-lectual. Num outro relato, ele explica:Devemos mergulhar em Deus e nos li-bertar de um só golpe de todo o racio-nal. Podemos fazer um paralelo entreChestov e um dos primeiros autorescristãos, Tertuliano, que declara: Cre-do quia absurdum! Creio porque éabsurdo, porque isso ultrapassa os li-mites da compreensão. Em Atenas eJerusalém (1938), Chestov dá sua vi-são do mundo: Jerusalém deve ir aAtenas para receber a benção. E nolivro A balança de Jó, nas fontes da

verdade eterna (1929), ele emprega amesma imagem: É dito que tudo o quevem de Jerusalém deve ser pesado emAtenas. O que isso significa? Chestovdesigna por Atenas a capital do purointelecto, e Jerusalém, a do sentimen-to religioso. Ele não vê nenhum com-promisso possível entre a intelectuali-dade de Atenas e a espera cheia deesperança de Jerusalém. As duas seexcluem. O saber não pode ser o maiselevado objetivo do homem! É porisso que Chestov condena a caça aosaber em filosofia. Segundo ele, todosos conhecimentos impedem de perce-ber o verdadeiro dom de Deus. Comessa expressão ele designa a liberdadeabsoluta e criadora surgida da fé que,ela sim, pode perceber. É preciso re-jeitar o jugo do intelecto: Deus estáonde nenhum saber domina, mas on-de a liberdade respira e vive. Ele estáconvencido de que a primeira precau-ção em relação às atividades do inte-lecto ressoa no mito da queda. ParaChestov, a queda é exclusivamente deordem intelectual, tendo o homem sefechado à penetração do Mistério in-sondável. A queda foi provocada pelodesejo do saber, por comer dos frutosvenenosos.

“O fechamento do caminho da verdade”

Chestov qualifica a ciência moder-na de tumor cancerígeno. A ciênciaganha terreno de hora em hora e tor-na as nuvens em torno do Mistériooriginal mais espessas. Como todos osautênticos exploradores das frontei-ras, ele sente intensamente o muro deseparação da contra natureza, que seergue entre o ser e o insondável. Des-

Page 18: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

se aprisionamento, ele diz: É como seuma força houvesse resolvido, desdeantes da criação do mundo, fechar ocaminho da verdade. Depois, a razãoerra por caminhos obscuros. Ou nos-sa construção do mundo é falsa, ou en-tão temos tomado o caminho erradopara ir para a verdade!

Chestov não reprova o pensamen-to, porém volta-se contra sua depen-dência, que provoca todo tipo de des-vios de modo que o mais sutil intelec-to já não compreende a si mesmo. Elebusca em vão a harmonia entre o co-ração e a cabeça. Para ele, a consciên-cia está envolta em véus. O homemvive envolto por um número infinitode mistérios [...] A forma pela qual elese separou de sua origem, da fonte desua vida, permanece um enigma. Eleestá convencido de que imensas for-ças dormitam na alma humana e quesomente elas podem induzir a expe-riência direta da profundeza insondá-vel. Em 1898, no livro A idéia do bem,ele mostra como isso pode acontecer:O amor fraterno não é Deus. É prefe-rível encontrar o que ultrapassa a com-paixão, a comiseração, o bem. É preci-so buscar a Deus! Sua busca começaonde o caminho ultrapassa a razão e amoral. Depois da publicação de suasobras, Chestov passou a ser conside-rado como o mais importante repre-sentante do renascimento religioso naRússia.

Quais são os pontos culminantesde sua busca? Ele experimenta que acontradição entre fé e ciência é irredu-tível. Além disso, ele prova que, pelasua fé, recebeu revelações interiores eque a revelação é absolutamente dife-rente do saber; que ela só acontece namontanha. Ele vê Moisés no Sinai e

Jesus no Monte das Oliveiras, e apre-senta esta imagem a seus irmãos hu-manos para que reflitam. Os esforçosintelectuais intensivos só concernemaos domínios inferiores da vida. Asverdades materiais alcançadas dessemodo são para ele apenas erros encar-nados. Ele sente sua filosofia comouma música superior. No sentido dePlatão.

“O homem deve se manter sobre sua balança interior”

Chestov, como filósofo, não viviaretirado. Ele manteve intercâmbio compensadores famosos como MartinBuber, Albert Einstein, Marinan Zve-taïeva, Martin Heidegger e EdmondHusserl. Boris Pasternak foi inspiradopor sua visão do mundo. Seu jovemamigo filósofo, Serguei Bulgakov, es-creveu: Era impossível não amar Ches-tov e não compartilhar de sua visão de

As funções

cerebrais

representadas

num modelo em

porcelana.

17

Page 19: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

mundo. Sua extraordinária delicade-za, sua surpreendente bondade e suabenevolência o explicam. Essa era anota fundamental de suas relaçõescom outrem, sem a menor ambição doque quer que seja. Ao mesmo tempo,ele travava um duro combate para suarealização espiritual.

Para ele, o mais importante é semanter sobre sua balança interior. Opotencial da alma deve se revelar. Eleescolhe como exemplo o personagemde Jó, do Antigo Testamento. Jó per-manece fiel a sua consciência. Elemantém sua confiança em Deus ape-sar de seus sofrimentos e de sua misé-ria. Quando estes se tornam mais pe-sados do que a areia dos mares, elegrita em sua angústia e desespero (Jó6:3 e 31:6): Pese-me em balanças fiéise saberá Deus a minha sinceridade!Chestov é profundamente impressio-nado pelos males suportados por Jóem seu caminho, mas acima de tudopor sua tenacidade. Sem protestar, eleaceita e suporta seu destino. Se tivessese confiado ao intelecto, ele teriaentrado em contenda com Deus. Suaaceitação fascina Chestov, que consi-dera essa a marca do verdadeiro bemem um ser humano. Sedutores cercamJó nas pessoas de sua esposa e de seusamigos que lhe dão, com “bons moti-vos” – pensam eles – o conselho de ab-jurar Deus, pois onde está a justiça di-vina quando alguém sofre tanto? MasJó nada quer saber desses conselhos“razoáveis”, e permanece surdo a eles.

“A apoteose do insondável”

Com o tema de A balança de Jó,Chestov quer mostrar que em sentidoprofundo o que importa não é a com-preensão intelectual porque Deus vê ocoração. Ele ouve os gritos desespera-dos que saem das profundezas, mas

Ele ignora os raciocínios dos amigos deJó. Assim se manifesta a lei das leis e areconhecemos. Eis a apoteose das pro-fundezas, uma realidade superior quepermanece oculta à inteligência isola-da. Deus é uma força que ultrapassa arazão humana. A compreensão, talcomo ela se desenvolve no gênero hu-mano atual, não é senão temporal.Quem se agarra a ela se enraíza naescuridão.

Chestov mostra que o buscadordeve se subtrair à tutela do intelectopara experimentar a verdadeira vida.É renunciando à visão do mundo de-finida pela razão que ele encontrará ocaminho de retorno para a pátria espi-ritual. Como Jó, ele não deve alimen-tar a menor esperança no mundo. Eleestá consciente de ser um estrangeirono mundo diário e ao mesmo tempoexperimenta-o como uma graça, poispode se libertar do jugo do intelecto.No livro A voz do silêncio, traduzidopor H.P.Blavatsky, é dito: o mental éo grande destruidor. É preciso aniqui-lá-lo e, segundo Chestov, substituí-lopor um novo pensar. A filosofia daRosacruz Áurea descreve em detalhescomo se desenvolve esse novo pensarque ultrapassa os limites do humano.

Fontes:Leo Schestow: Athen und Jerusalem, Versucheiner religiösen Philosophie, Matthes & Seits,Munique, 1994.Idem, Potestas clavium – die Schlüsselgewalt,Verlag Lambert Schneider, Heidelberg, 1956.Idem, Tolstoj und Nietsche, die Idee desGuten in iheren Lehren, Matthes & Stein,Munique, 1994.Idem, Auf Hiobs Waage, Wanderungen durchdas Seelenreich, Verlag Herder, Viena, 1950.Sergei Bulgakow, citando Gustav A. Conradiem: Leo Schestow oder das paradiesischeLeben in der Schrift die Idee des Guten.Antigo Testamento, Livro de Jó, 31:6.

18

Page 20: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Coragem, temeridade, humildade

A palavra coragem remete a diferentesassociações de idéias. Quanto a mostrarcoragem, cada um tem sua própria in-terpretação. Há a coragem física, a so-cial, a moral e a capacidade de suportar.Examinaremos se existe uma coragemespiritual e quais seriam suas relaçõescom as formas de coragem conhecidas.

ma definição simples de coragem é:ousar fazer algo difícil. Para uma crian-ça, é preciso coragem para dar a mão auma pessoa estranha, andar de bicicle-ta sem o apoio de outra pessoa, pularnuma piscina, pedir a outra criança pa-ra devolver-lhe seu brinquedo. Os paisestão aí para encorajá-la. Eles se esfor-çam por desenvolver a coragem dascrianças, sua vontade, sua capacidadede suportar, a fim de que ela possa, umdia, tomar seu lugar na vida. As crian-ças, por sua vez, respeitam aquele que“tudo ousa”: ele se torna seu herói.Nos contos de fadas, o personagemprincipal convida à coragem. Na Ho-landa, o jornal da Escola contém umarubrica intitulada O herói da semana.Ela faz parte de um programa que tempor objetivo dar exemplos às criançase contribuir com a luta contra a bagun-ça, o racismo e a violência gratuita. Os“azes” do futebol e outras pessoas cons-tituem pretexto para mostrar princí-pios e valores justos. A História evocaos heróis de tempos passados que sedestacaram pelos seus atos de grandevalor. Assim, as crianças aprendem adistinguir a coragem moral da cora-

gem física. Depois, as situações se tor-nam mais provocantes: por exemplo,em uma discussão, atacar alguém quejulgamos ter uma idéia errada; arriscartomar parte em atos de violência naescola ou na rua; jogar-se de uma alturade cem metros preso a uma corda elás-tica amarrada na perna; ou partir sozi-nho, de mochila, para a Austrália...

Os jovens querem determinar quaissão seus limites, dominar o instinto queos impele a fugir, ou seja, a levantar odesafio e, pela vontade, vencer o medoda existência ou o medo de ter de ex-pressar suas convicções. Isso lhes dáautoconfiança e a percepção de sua for-ça. Resulta daí que corajosamente olha-rão de frente qualquer situação e aban-donarão facilmente caminhos já per-corridos. Às vezes é a indignação quesustenta a coragem e que impele a com-bater a injustiça; por exemplo, passarpara a ação e, em casos extremos, pro-curar unir-se a um grupo decidido afazer uma guerrilha e defender pelaviolência os oprimidos desta terra. Es-sa coragem vai até o desprezo pela mor-te. No entanto, a força assim adquiri-da pode suscitar orgulho, arrogância,crueldade e outros abusos de poder.

Quem tem coragem de considerarhonestamente o conceito de amor uni-versal só pode concluir: essa espécie decoragem não resolve, e jamais resolveu,o problema da injustiça neste mundo.Lao Tsé disse: As melhores armas sãoinstrumentos de infelicidade. Aqueleque possui Tao, portanto, não se preo-cupa com isso. Porém, para o idealista

19

U

Page 21: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

que está no impasse, já não é mais pos-sível deixar covardemente tudo acon-tecer. É preciso que ele aja: o homemnão é chamado a ser guardião de seusirmãos? Em seus comentários sobre oTao Te King, J. van Rijckenborgh diz:O único meio de ajudar a humanida-de é na aplicação mais radical da forçado amor universal. Esse amor divino, oamor que está acima de tudo, podenascer naquele cuja alma é liberta.

O que isso significa? Primeiramen-te, que há uma possibilidade de auxiliaro homem de maneira absoluta; em se-gundo lugar, que é preciso ter uma al-ma liberta. Poderíamos expressar essaidéia com as palavras: estar no mundo,mas não ser mais do mundo. Será issopossível? Supondo que alguém esco-lha esse rumo, que queira alcançar esseestado, uma coisa é certa: para isso épreciso coragem, mas uma espécie decoragem pouco comum. É preciso, deinício, ousar examinar todas as liga-ções que retêm o eu e o mantém presoa este mundo. É preciso, portanto, ad-quirir um rigoroso autoconhecimentopara, em seguida, usar o machado demodo radical e renunciar a todo ego-centrismo. Na Bíblia é dito a respeitodaquele que domina semelhante medo:Aquele que vence a si mesmo é maisforte do que aquele que conquista umacidade. E no budismo: O sábio não temnenhum medo.

Esse processo é uma penosa luta in-terior que exige uma coragem formi-dável. De fato, ver cada vez melhor ecompreender quem somos traz muitasdesilusões, e o desânimo pode ser tãogrande que caímos no desespero di-zendo a nós mesmo: Não conseguirei.Não, não conseguirei me tornar umaalma liberta capaz de pôr em prática oamor universal. Em Os versos áureos,

Pitágoras dá o seguinte conselho: Se nãotens coragem, toma, contudo, coragem.Quando a força da vontade já não po-de dar coragem porque o eu foi neu-tralizado, é possível haurir coragemno coração renovado pela Alma. Já nãose trata da coragem do eu, mas da mo-déstia, da humildade ou auto-rendiçãoà força do amor universal. É assim quea nova alma cresce e que, graças a umcomportamento verdadeiramente pu-ro, podemos liberar uma corrente deamor contínua.

“Bem-aventurados os mansos”

O que segue é inspirado nas três pri-meiras bem-aventuranças do Sermãoda Montanha relatadas no Evangelhode Mateus. A primeira é assim conce-bida: Bem-aventurados os pobres emespírito pois deles é o Reino dos Céus.Trata-se de seres humanos que, apósterem corajosamente combatido nestemundo, se afastam dele, consternados,pois se dão conta de que são realmen-te “pobres em espírito”. São aquelesaos quais se refere J. van Rijckenborghem O Mistério das bem-aventuranças:Tendo experimentado tudo no terrenodas experiências e tentativas humani-tárias, alguns chegaram à conclusão deque eram habitantes de Éfeso, ou seja,sujeitos às limitações de uma bondadeque a cada momento pode se transfor-mar em seu contrário, pois o humanita-rismo é a bondade organizada quepersegue o mal, sem jamais alcançá-lo.O humanitarismo tenta neutralizar omal; ora, ao longo dos séculos, em suacorrida na natureza dialética, ele estáatrasado em muitas voltas.

Encontrar-se em tal impasse trazprofundo desespero de alma, até quese reconheça estar “desprovido de es-

20

Page 22: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

21

pírito”. Essa humildade, que nos fazver nossa fraqueza e nossa impotência,é a condição necessária para sentir ochamado do amor universal. Pensamosaqui no oitavo cântico de arrependi-mento da Pistis Sophia, do qual J. vanRijckenborgh diz: Ela renuncia a to-das as afirmações de sua personalidadeaté os recônditos mais afastados do bem.Ela se entrega e engaja-se no períododa humildade. Ela tem a coragem deaceitar o não-agir com a prece: ‘Lem-bra-te de mim, segundo tua graça e emnome de tua bondade, ó Senhor.’ Assimela realiza o maior ato que poderia exe-cutar segundo seu estado natural, emrelação à Gnosis.

A segunda bem-aventurança é aseguinte: Bem-aventurados os aflitos,pois serão consolados. Trata-se aqui daaflição do coração e da alma dilacera-da pelo imenso sofrimento do mundoe da humanidade. O idealista que che-gou ao impasse está profundamenteaflito e cheio de piedade no mais íntimode seu ser. Então, a Luz responde a elee envia-lhe o consolo que a compreen-são representa: saber como se prepararpara poder verdadeiramente trazer seuauxílio à humanidade. A consolação égrande quando se compreende que ocaminho da libertação da alma é aces-sível e que a alma liberta pode pôr emprática o amor universal.

A terceira bem-aventurança é a se-guinte: Bem-aventurados os mansos,pois herdarão a terra. Quando alguémse ligou à força do amor universal, re-cebe igualmente a força para trabalharcom a luz do amor e estabelecê-la nanatureza. A única chave necessária é abondade. Deixemos mais uma vez fa-lar J. van Rijckenborgh tal como ele sedirige a seus alunos: Mansidão é acoragem absoluta que nada força nem,

aliás, poderia fazê-lo, em virtude doestado de ser interior do aluno que seapóia sobre duas colunas. A primeira éa ligação com o Reino, e a segunda é aforça para executar o trabalho. Estadupla graça divina deve ser estabeleci-da na natureza com doçura, e com elaa grande vitória deve ser alcançada.

A coragem segundo a natureza sem-pre tem algo de forçado. Freqüentemen-te ela é a expressão de um instinto, deuma paixão. Agindo sob o seu impulso,tem-se sempre o aspecto de um assal-tante. A coragem segundo a naturezasempre fere; ela dilacera ou destrói.Mas a coragem nascida da ordem espi-ritual de Jesus Cristo é o efeito de umnovo equilíbrio da vontade.

O manso não anseia pelo êxito ime-diato e retumbante. Ele sabe que o bri-lho de semelhante êxito é passageiro.O manso não se desencoraja diante deum trabalho sem resultado aparente,nem mesmo quando o seu campo detrabalho é envolvido pelas forças satâ-nicas do desentendimento. Por detrásde tudo isso, ele vê a consecução finaldo seu objetivo brilhando como um solque nunca se põe. [...] Em nome daEternidade, o manso brilha no tempocomo uma luz suave e calma; e a con-solação crística é o combustível quenão cessa de afluir para ele com regu-laridade constante.

FontesRIJCKENBORGH, J.V., A Gnosis chinesa, Editora Rosacruz. (No prelo);RIJCKENBORGH, J.V., O mistério das bem-aventuranças, São Paulo: Lectorium Rosicrucianum, 1983.RIJCKENBORGH, J.V., Os mistérios gnósticos da Pistis Sophia, Editora Rosacruz (no prelo),cap. 4,6.PITÁGORAS, Os versos áureos.

Page 23: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

“Quem pesquisa pode se tornar um rosacruz”(Jornal de Sofia, Bulgária)

Cento e cinqüenta alunos búlgaros eoitenta e cinco convidados vindos daAlemanha, da Holanda, da Croácia eda Sérvia se encontraram sexta-feira,dia 28 de novembro de 2003, em Lyu-lin-Sofia, para a inauguração do pri-meiro Centro de Conferências da Bul-gária. Depois que um pequeno grupode interessados recebeu sua primeiracarta de contato, em 1997, seu núme-ro foi crescendo, em Sofia, a capital,em Burgas e Varna, no Mar Negro, naSilésia, no nordeste, e na Slavônia, emStara Zorga, no centro da Bulgária. Aprimeira Conferência de Renovação

aconteceu em 1998 e, em 2001, os alu-nos adquiriram um hotel ainda nãoacabado. Dois anos de trabalhos inin-terruptos transformaram milagrosa-mente essa construção em um Centrode Conferências adequado ao traba-lho internacional do Lectorium Rosi-crucianum. Três andares são destina-dos aos serviços templários, às pales-tras públicas e às atividades de núcleo.No quarto andar encontra-se um dor-mitório para os alunos que vêm delonge.

Se o trabalho espiritual se desenvol-ve tão rapidamente na Bulgária é devi-do sobretudo ao grande impulso gnós-tico dos bogomilos (literalmente “osamigos de Deus”). Naquela época essaregião era considerada como a porta

Ampliação e aprofundamento da infra-estrutura

22

de costume que a primeira Pentagrama do anodê um apanhado geral das atividades da EscolaInternacional da Rosacruz Áurea no conjunto deseus campos de trabalho. Ela atua agora em 47países. Num ano, a ênfase é dada à construção e à abertura de novos núcleos e Centros de Conferências, num outro a preferência é dada às atividades destinadas a atrair a atenção dopúblico. Durante o último ano, a Escola Espiritualse esforçou especialmente por tornar conhecida sua obra mundial, organizando simpósios, ciclosde palestras, exposições, concertos e representaçõesteatrais, a fim de dar aos pesquisadores interessados uma idéia da meta seguida pelos seus alunos e do seu modo de vida.

É

Page 24: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

pela qual o chamado da Gnosis podiatocar a Europa. Onde a Luz brilhouuma vez, para lá ela retorna. A Bul-gária é a antiga Trácia, o país dos mis-térios de Dionísio e de Orfeu. A pala-vra Trácia significa “espaço etérico”, etambém “firmamento”. Para Platão e

seus discípulos, a Trácia “era o país dapura doutrina e das santas lendas”. ABulgária era também o país dos pauli-cianos e do messianismo, movimen-tos que atuaram nos primeiros sécu-los do cristianismo gnóstico. Na Ida-de Média, os bogomilos retomaram o

23

Inauguração em

Sofia, Bulgária.

Foto Pentagrama.

Abaixo: Jornal

búlgaro:“Quem

pesquisa pode se

tornar um

rosacruz.”

Page 25: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

24

archote e o passaram, em seguida, aoscátaros. No século XX, o mestre espi-ritual Peter Deunov (1864-1944)atraiu aproximadamente quarenta milalunos, cuja intenção era de viversegundo o impulso gnóstico. Ele mor-reu uma hora antes que a políciasecreta da Rússia o detivesse. No rela-tório da polícia constava esta frasedele: Meus alunos estão neste mundo,mas não são deste mundo.

Em sua alocução inaugural, o Sr.G. Friedrich, membro do Presidium,declarou: Pelo que vivemos em con-junto esta noite, o mistério de Dio-nísio-Orfeu-Cristo se liga novamenteao país búlgaro. Uma base é colocadae, pelo trabalho a serviço da EscolaEspiritual, um “espaço etérico puro”pôde ser novamente formado para ospesquisadores.

Em A pedra do cume de abril de1976, J. van Rijckenborgh escreveu so-bre o caráter muito peculiar dessa re-gião em Os mistérios de Orfeu: Nóscompreendemos que há doze mil anosos mistérios órficos e dionisíacos des-pertaram para a nova vida milharesde pessoas; ocorreu aí uma reação po-

derosa e maciça, de tal magnitude, que,mesmo após todos esses séculos, per-maneceram mitos e contos extrema-mente surpreendentes, apesar de esta-rem misturados com relatos insensatos,deformados pelos que não compreen-diam nada disso. Há milhares de anos,essa parte do mundo foi um vasto focode um toque universal e os povos quehabitavam esse grande território vi-venciaram essa graça. O Egito, Canaã,a Síria, a Pérsia e o sul dos Bálcãs fo-ram o objeto de uma grandiosa colhei-ta por parte dos santos mistérios daFraternidade Universal. Podemos di-zer que a colheita daquela época con-tava muito mais do que dez mil almaslibertadas para a nova vida.

No decorrer da consagração do tem-plo, o Sr. A.H. van den Brul, da Di-reção Espiritual Internacional, pro-nunciou estas palavras: Na Idade Mé-dia a Bulgária era considerada como“fonte de todas as heresias”, o que ar-rastou a Igreja a perseguições sangren-tas. Podemos, no entanto, afirmar quea luz da Gnosis brilha novamente naBulgária e que o chamado dos Amigosde Deus, nunca foi totalmente apaga-do. O fato de a chama ter-se perpetua-do, apesar da extrema força da contra-natureza, é comprovado pela ação dePeter Deunov, que realizou um imen-so trabalho preparatório. Citamosdele as seguintes palavras: “Vossa al-ma é um botão de rosa que aguardadesabrochar. Se vossa consciência seconcentra nela, vivereis, então, o ins-tante mais grandioso de vossa vida.Abrireis vossa alma aos raios do soluniversal que ilumina o mundo divi-no.” Pois bem meus amigos! As semen-tes que foram assim espalhadas na Bul-gária, através dos séculos, começarama germinar. Entramos, meus amigos,

Page 26: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Programa

do simpósio

Retorno à

Fonte.

em um período de forte atividadegnóstica. O Sr. van den Brul terminousua alocução com esta prece bogomila:Purifica-me, ó meu Deus, purifica meu interior e meu exterior.Purifica Corpo, Alma e Espírito paraque em mim cresça a semente de Luze eu possa me tornar um archote.Possa eu ser minha própria chamapara levar para a Luz tudo o que estáem mim e ao meu redor.

Dia de palestras no Centro J. van Rijckenborgh

No Centro J.van Rijckenborgh, emHaarlem, três palestras foram realiza-das, no domingo 12 de janeiro de 2003,sobre a vida e a obra de J. van Rijcken-borgh. O convite para esse animadodia dizia: Em estreita colaboração comZ.W.Leene e Catharose de Petri, J.van Rijckenborgh fundou a modernaEscola de Mistérios, cujo princípio cen-tral é a transfiguração. Ele explicou osmistérios da Rosacruz clássica, queconstituem aspectos viventes e indis-pensáveis da pesquisa atual. O apogeudesse mistério universal é o nascimen-to, o crescimento e a ressurreição deum novo tipo humano: o homem inte-rior, o homem de Aquário. A Escola daRosacruz Áurea trabalha em 47 paí-ses; e muitos milhares de alunos, como“homens desta natureza”, estão diaria-mente voltados para sua transforma-ção em homens-alma-Espírito.

Retorno às fontes

No Centro de Conferências Reno-va, em Bilthoven, aconteceu, em maiode 2003, um simpósio com o tema:Retorno às fontes. Foi empreendidauma pesquisa sobre as raízes comuns

da Gnosis do cristianismo primitivo,do sufismo e do pensamento gnósticomoderno. As raízes se encontram nosescritos atribuídos a Hermes Trisme-gisto. O professor G. Quispel falouda filosofia poética e do grande alcan-ce de Valentinus, um dos mais pro-fundos representantes da sabedoriahermética e autor de O Evangelho daVerdade. Ele salientou a conexão en-tre os ensinamentos de Valentinus eos mistérios egípcios.

O professor H. Witteveen mostrouque a sabedoria hermética enriqueceuprofundamente o sufismo. A influênciado hermetismo sobre a religião e a li-teratura foi maior no Oriente Médiodo que no Ocidente, onde os escritosherméticos não foram conhecidosantes dos séculos XIV e XV.

Durante a terceira apresentação, oSr. J. R. Ritman mostrou as perspecti-vas do futuro contidas nesses 4500anos de pensamento hermético. Segun-do ele, uma vez atravessada a fronteirado terceiro milênio, defrontamo-noscom um novo desafio: o retorno daGnosis original e a possibilidade denosso retorno a ela. A rica tradiçãohermética responde à pergunta: “Queé o homem e quem é ele?” O apro-fundamento interior, em vista de uma

25

Page 27: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

verdadeira elevação espiritual, exige aformação de uma nova comunidadede homens, uma comunidade originalhermética.

Atividades dos jovens alunos no Brasil e na França

Em julho, uma centena de jovensalunos e membros do staff foi ao Cen-tro de Conferências do Rio de Janeiropara renová-lo. Eles pintaram a facha-da, as grades e embelezaram o jardim.

Jovens alunos que vieram de dezes-sete países se encontraram no Centrode Conferências La Licorne, no Sul daFrança, durante um final de semana deconferência européia, em agosto de2003. Apesar do calor que ultrapassavaos 35 graus, esses jovens reformaramos caminhos e os jardins, iniciaram asobras de um local para o armazena-mento de água e de uma livraria. Elescortaram árvores de trinta metros queatrapalhavam o escoamento das águas.

Novo prédio em Koblenz,Alemanha

Após três anos, o novo núcleo deKoblenz havia se tornado muito pe-

queno. Instalado em 23 de outubrode 1999, a nova construção foi postaem uso no domingo 31 de agosto de2003. Com uma área de 305 m2, olocal oferecia suficiente espaço paraampliações futuras. O núcleo estásituado na Schlosstrasse, no calçadãodo centro da cidade. As numerosasjanelas do terceiro andar abrem-separa uma praça tranqüila. O pé direi-to é alto e as salas são claras e demuito bom gosto. O proprietáriodo imóvel escreveu: Sem exagerar,podemos dizer que algo de espiritualse tornou aqui visível e tangível. Co-mo especialista, admiro os acabamen-tos em todos os seus detalhes. Essegrupo dispõe agora de suficienteespaço para as conferências, as diver-sas reuniões, as exposições e os inter-câmbios.

Reunião de médicos e de terapeutas vindos de doze países

Cento e sessenta participantes esta-vam presentes numa reunião interna-cional de médicos, no final de semanade 31 de agosto de 2003, no Centro deConferência Christianopolis, emBirnbach. O tema escolhido era: Fun-

Núcleo de

Koblenz,

Alemanha.

26

Grupo de jovens

alunos no Centro

de Conferências

Novo Sol, Rio de

Janeiro, Brasil.

Page 28: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Centro de

Conferências Foyer

Catharose de Petri,

Caux, Suíça.

ções fisiológica e espiritual do cora-ção. Após um relatório dos desenvol-vimentos e resultados dos cinco últi-mos anos, em quatro línguas, a Sra.Hamelink-Leene concluiu: É precisocompreender bem que em todo o vos-so trabalho é a força da intuição divi-na que inspirará a compreensão neces-sária para vossa ação. A força de Be-thesda é alimentada e mantida de múl-tiplas maneiras. Saibam que a forçacolocada à disposição do doente queestá voltado para ela é absolutamenteimpessoal.

O vigésimo quinto aniversáriodo Lar Catharose de Petri

Dia 9 de setembro de 1978 foi con-sagrado o primeiro templo no que foio Grande Hotel de Caux, depois oHotel Regina. No dia 22 de janeiro de1989 aconteceu a consagração do tem-plo atual, o sétimo Grande Templo dotrabalho gnóstico. Anteriormente, asConferências de Renovação ocorriamem Zurique.

Entre as duas guerras, esse hotel eraconsiderado o mais amplo e confortá-vel da Suíça. Durante sua construçãochegava-se a ele por uma trilha poronde subiam burrinhos carregados demateriais de construção. A rainha Eli-zabeth da Inglaterra ficou nesse hotelquando pequena, e a imperatriz da Á-ustria, Sissi, tinha aí sua residência. Em1899 foram acrescidos um andar eduas torres. O hotel tem 400 quartos esalas. Em 1947, ele foi comprado pelaUnião do Rearmamento Moral e, em1978, pelo Lectorium Rosicrucianum.Por causa do estado deteriorado e dameta almejada, foi necessário realizarreformas indispensáveis: foram res-taurados o telhado, o elevador, as

fachadas, escadarias, quartos e corre-dores, bem como o aquecimento cen-tral. Foi construído um galpão subter-râneo utilizado como garagem. Novosprojetos relacionados com os sanitá-rios e o aquecimento são difíceis de serbem resolvidos.

Muito rapidamente o primeiro tem-plo, provisório, revelou-se muito pe-queno e foram feitas plantas para oconjunto templário exterior ao prédioprincipal. Essa magnífica construçãofoi consagrada dia 22 de janeiro 1989por Catharose de Petri.

No campo de trabalho brasileiro

Com a unificação nacional dos te-mas das palestras, o Trabalho Públicobrasileiro tomou um novo impulso.Em muitas cidades palestras foramrealizadas, também fora do âmbito daEscola. Em 2003, novas salas de con-tato foram instaladas em Jundiaí eRibeirão Preto. Em Goiânia, Salvadore num lindo local na Vila Madalenaem São Paulo, as palestras das quar-tas-feiras foram iniciadas.

Graças ao empenho e à unidade degrupo dos alunos de Patos de Minas,a doações e ao financiamento da fun-dação internacional, foi possível com-

27

Page 29: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

prar um terreno de aproximadamentedez mil metros quadrados para a Es-cola. Dessa forma, a área templária es-tá agora protegida tanto na parte pos-terior como na lateral.

A mesma dedicação ocorre em Vi-tória, onde os alunos se empenham nareforma da futura sede do Núcleo deVitória, para inaugurá-lo em 2004.

Também em Manaus os alunos tra-balham ativamente para a transforma-ção de sua sala de contato em Núcleode Manaus.

O templo de Lorena, inauguradoem 2002, teve sua fachada e a varandade 160 m2 terminadas.

Para os obreiros de Fortaleza, 2003foi muito dinâmico, com muitas via-gens a Maceió, Teresina, Recife e JoãoPessoa, com a realização de palestras,serviços templários e atividades damocidade.

Ampliação do núcleo de Bonn,Alemanha

Durante um ano, os alunos do Nú-cleo de Bonn não pararam de cons-truir e de pintar, para tornar seu núcleocompatível com sua missão. O antigoprédio havia se tornado pequeno. Emnove anos de atividade, o número dealunos aumentou cinqüenta por cen-to. Dia 21 de setembro de 2003, o no-vo núcleo abriu suas portas no HoheStrass, de acesso fácil. Os cerca de du-zentos convidados que vieram para ainauguração ficaram um pouco aper-tados na nova oficina templária, quesó conta com cento e sessenta lugaressentados.

Reconstrução do núcleo de Milão, Itália

Em Milão, a primeira palestra pú-blica do Lectorium Rosicrucianumocorreu em setembro de 1981 e emdezembro de 1983 foi aí consagrado oprimeiro núcleo da Itália. Em 1989,um novo núcleo foi adquirido nessa

Convite para a

inauguração do

Núcleo de Milão,

Itália.

28

Núcleo de Bonn,

Alemanha.

Page 30: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

cidade e adaptado, tendo em vista asConferências de Renovação que acon-teceram ali até 1995. Depois disso, LaNuova Arca, em Dovadola, tornou-seo Centro de Conferências Nacional.Como o núcleo de Milão ficou, então,muito grande, buscou-se um novo locale, em 25 de setembro de 2003, os alunositalianos, e em especial os de Milão,abriram as portas do lindo novo núcleo.

“É preciso pedras vivas paraconstruir o Templo”

Esta divisa presidiu a celebração dosdez anos de existência do núcleo deEindhoven, na Dierenriemstraat, no dia16 de setembro de 2003. Muitos alu-nos e membros da Escola assim como“os construtores da primeira hora” seencontraram em torno de um bufê friopara fazer uma retrospectiva do passa-do e lançar um olhar no futuro. Nodomingo 21 de setembro houve outrafestividade para a qual foram convida-dos todos os habitantes do bairro.

O trabalho de Eindhoven começouno dia 9 de setembro de 1979 em umaantiga fábrica situada na Kleine Berg,onde foi realizado um dos desejos maisexplícitos de J. van Rijckenborgh. Eleconsiderava a região de Brabant como

uma cabeça-de-ponte para a difusãoda Escola Espiritual em direção ao sul.

Aquisição de um Centro deConferências em Oristano,Sardenha

Em setembro de 1997, os alunos daSardenha haviam alugado uma cons-trução modesta, em Oristano, paraevitar fazer a cada vez a longa viagematé o Centro de Conferência La Nuo-va Arca, em Dovadola. Um pequenotemplo foi aí consagrado para Con-ferências locais, mas faltavam dormi-tórios. Então, esse pequeno núcleo foicomprado e totalmente reformado.

“Em tua Luz contemplamos a Luz”

No Centro de Conferências Reno-va, aproximadamente quatrocentos e

Jardim do núcleo

de Eindhoven,

Holanda.

Alojamentos

em Oristano,

Sardenha.

Page 31: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

A torre de Babel.

Athanasius

Kircher,

Amsterdam, 1679.

Alojamentos

em Melbourne,

Austrália.

cinqüenta convidados assistiram, emnovembro, a um simpósio sobreRobert Fludd (1574-1637), tambémconhecido como De Fluctibus, odefensor da herança hermética dosrosacruzes clássicos. Fludd consa-grou uma grande parte de sua vida à

redação de comentários e à defesa daFraternidade da Rosacruz. Em todasas suas publicações, ele se destacavapor um conhecimento enciclopédicosobre as leis do macrocosmo e domicrocosmo. Uma projeção de slidesmostrou claramente até que pontosua visão das coisas era justa e uni-versal e quanto sua obra e seu enga-jamento contribuíram para a trans-missão da sabedoria, muitas vezesincompreendida, da Rosacruz.

Um templo provisório emMelbourne, Austrália

Os alunos da Austrália alugaramum pequeno espaço para servir detemplo e fazer nele Conferências deRenovação.

Dante e a Torre de Babel

Em Graz, capital cultural da Eu-ropa 2003, houve uma bela represen-tação teatral sobre o tema da Torre deBabel. Ao mesmo tempo, os alunos aus-tríacos organizaram uma projeção deslides sobre A divina comédia. Essasduas manifestações estavam em per-feita harmonia entre si. Pode-se conje-turar se a forma em espiral da torre,

No livro de Fludd, Summum Bonum (1629) (O Bemsupremo), aparece uma representação da Rosacruzsob a forma de uma rosa com sete vezes sete pétalas,cercada de colméias e teias de aranha. Uma abelhaestá sobre uma rosa, uma outra voa em direção a ela.No fundo, à direita, encontram-se quatro colméiascercadas de abelhas, à esquerda uma cerca coberta deteias de aranha. Essa ilustração tem por legenda: “Arosa dá seu mel às abelhas”. A rosa representa a forçae a sabedoria da Rosacruz. A abelha simboliza ozelo. Ela deposita o mel na colméia, onde se alimentaquando os tempos são difíceis. As operárias traba-lham para sua rainha. Elas sacrificam sua vida paraas próximas gerações. É possível ver aí a imagem deuma meta sublime.O inverso da abelha é a aranha. Esta tece sua teiacomo a abelha forma os raios de sua colméia. Ela nãoa tece para acumular o doce mel da rosa, mas parasugar até a morte os insetos capturados. O que a ara-nha produz é um veneno mortal, enquanto a abelhaelabora a vida nova.

30

Page 32: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

que aparece em ilustrações dos séculosXV, XVI e XVII não corresponde àdupla espiral do Inferno e do Purgató-rio de A divina comédia de Dante. Arelação tornou-se flagrante graças aosslides e aos comentários que foramacompanhados com grande atenção.

Novos desenvolvimentos nos Bálcãs

Neste último ano foram inaugura-dos dois núcleos: em Maribor e emBelgrado. O número de alunos e deinteressados está crescendo rapida-mente e planos para novas ampliaçõesestão sendo desenvolvidos. Estão sen-do preparados uma nova oficina tem-plária e dormitórios.

Koszalin, quarto núcleo na Polônia

Oito de janeiro de 2004: os 35 alunosdo norte da Polônia possuem final-mente um núcleo. Ele está situado emKoszalin, no mar Báltico, entre Szc-zecin e Gdansk. Como a maioria per-tencia ao núcleo de Vroclav, precisa-vam viajar 415 km para assistir às reu-niões e aos serviços templários. Suaalegria com esse novo local moderno eiluminado é grande. À consagração pormembros da Direção Espiritual Inter-nacional, assistiam o Presidium e alu-nos dos três outros núcleos poloneses.Havia um magnífico bufê nesse dia,assim como na véspera, dia de “portasabertas”, no decorrer do qual muitosconvidados, entre os quais represen-tantes das autoridades locais, vizinhos,família e amigos dos alunos se benefi-ciaram de palestras sobre a Escola Es-piritual e sobre as tradições gnósticasda Polônia. Para encerrar esse dia, umaluno polonês deu um concerto dedi-cado à música de Chopin.

Inauguração do Núcleo de Rennes, França

Rennes tem agora um belíssimo nú-cleo, cercado por um amplo jardim.No dia 24 de junho de 2000 foi desati-vado o núcleo da rua Vasselot. Em no-vembro de 1999, os alunos haviam ad-quirido um terreno e começaram atraçar planos. Em forma de Pentagra-ma, o templo previsto para 50 pessoas,com possibilidade de expansão paraconter 80, ocupa agora o coração doprédio. À consagração dessa oficina detrabalho no oeste da Fran-ça, dia 3 de janeiro 2004,assistiram alunos holande-ses, suíços e franceses.

O novo núcleo

de Rennes,

França.

31

Planta do

Núcleo de

Koszalin,

Polônia.

Page 33: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Todos já provaram a grande influênciada música, que tanto pode ser sublimequanto diabólica. Ela também é tantocapaz de inspirar a paz ou a alegriaquanto de deixar depressivo. A músicade base caótica perturba a alma.

m nós e ao nosso redor, o barulhonão cessa, e sons de diferentes forças ealturas escapam à nossa consciência.Nós estamos habituados a eles. O cor-rer da água, o canto de um pássaro, sonsde passos, o tilintar do vidro, o rangerde uma porta, o ronco dos motores, avoz humana, todos esses ruídos for-mam o pano de fundo de nossa vidadiária. O silêncio também ressoa, mes-mo que a vibração seja totalmente di-ferente. O cosmo tem igualmente umacerta sonoridade; o universo inteiro emi-te um hino à alegria, mas nosso ouvi-do não está em condição de percebê-lo.

O cosmo está sujeito à lei da har-monia. Conscientemente ou não, to-das as criaturas sentem que há umarelação entre sua vida e a dos deuses.Desde o remoto passado tudo mostraao homem que romper a harmoniadessa troca entristece o céu e irrita osdeuses. É por isso que as vibraçõesemitidas pelas criaturas devem corres-ponder às da criação.

Os sons, entre si, estão na mesmarelação que as forças. O acorde har-monioso dos sons age de modo po-tente e positivo; as dissonâncias per-turbam e destroem. Em A doutrina

secreta, H.P.Blavatsky escreveu: Pitá-goras considerava a Divindade, o Lo-gos, como o centro da unidade e a fon-te da harmonia [...] Por essa razão, es-perava-se dos candidatos que estudas-sem aritmética, astronomia, geometriae música como preparação à suaadmissão aos Mistérios [...] Os pitagó-ricos afirmavam que o mundo foi for-mado, a partir do caos, por sons orde-nados segundo uma certa harmonia,segundo as leis das relações musicais,que os sete planetas evoluiriam emharmonia e que o valor dos intervalosentre os diferentes sons musicais, quedeterminam seu acorde, produz a har-monia perfeita, uma música na qual asublimidade nos é inaudível pois nos-sos ouvidos não estão adaptados a ela.

Pitágoras considerava a música co-mo sons em movimento, entrecortadosou ininterruptos. Esses sons se ajus-tam segundo o tom e o modo. Os in-tervalos estão em relação com o de-senvolvimento espiritual dos seres hu-manos e com a harmonia do cosmo.Para Pitágoras, a distância da Terra àLua representa um tom. Da Lua a Mer-cúrio e de Mercúrio a Vênus há umsemitom; de Vênus ao Sol, um tom emeio; do Sol a Marte, um tom; de Mar-te a Júpiter e de Júpiter a Saturno, umsemitom; e de Saturno ao Zodíaco, umtom e meio. Esses tons formam juntosuma oitava, base da harmonia universal.

Na Grécia antiga, a música e os deu-ses estavam em estreita ligação. Apolotrazia uma lira como símbolo de sua

A música das esferas

32

E

Page 34: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

vitória sobre o caos. Quando ele toca-va, todas as criaturas ficavam ensimes-madas a ouvi-lo, todos os conflitos emesmo as guerras eram interrompidos,Áries (Marte) cessava de fazer corrersangue. A música de Apolo elevava oespírito dos homens e lhes dava paz dealma. A alma que experimenta a har-monia contempla o cosmo (cosmo sig-nifica ordenação). Nos mistérios órfi-cos aparece Dionísio, que leva o homemao êxtase. Segundo J. van Rijckenborgh,Dionísio é o terrível guardião do Es-pírito. Quem estuda esse personagempode afirmar, com grande seriedade,que ele encarna a atividade do EspíritoSanto, o Espírito que, como um ventode tempestade, sopra sobre o mundopara acordar os seres humanos detodos os lugares (A Pedra do Cume,abril de 1976).

Um dia, o sátiro Marsias, que sim-boliza a humanidade – metade animal,metade deus – encontrou uma flautaenviada por Atenas. Ele começou atocar e decidiu imediatamente que na-da o impediria de se equiparar a Apo-lo. Sua audácia foi duramente punida,pois ninguém pode sobrepujar Deus esua música. Orfeu, que com sua melo-dia subjugava homens e animais, per-sonificava o ser que compreende aharmonia divina. Seus poderes espiri-tuais eram tão grandes que mesmo osespíritos infernais se calavam paraouvi-lo. Ele podia atravessar os infer-nos porque se fazia acompanhar desonoridades divinas e estava destituí-do de medo.

No princípio era o Verbo

Deus, criador desconhecido douniverso, imprimiu nos átomos mate-

riais um movimento que emite umsom. No Primeiro Livro de Pimandro(versos 9 a 10), Hermes Trismegistodeclara: Pouco depois surgiu, numaparte dela, horrível e sombria escuri-dão, que se movia para baixo e giravaem espirais tortuosas, tal como umaserpente, segundo me pareceu. Então,essa escuridão transformou-se numanatureza úmida e indizivelmente con-fusa, da qual se levantou uma fumaçacomo a que provém do fogo, ao passoque ela produzia um som como de umindescritível gemido. Então, da úmidanatureza ressoou um grito, um cha-mado sem palavras, que comparei àvoz do fogo, enquanto que da Luz sepropagou sobre a natureza um santoVerbo, e um fogo puro ergueu-se ful-

33

A música das esferas.

Ilustração de Robert

Fludd em Utriusque

Cosmi, 1617.

Page 35: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

gurando da natureza úmida, fogo su-til, impetuoso e poderoso.

No “estrato terrestre dos arquéti-pos” (J.v. Rijckenborgh, , O adventodo novo homem, São Paulo, cap. 8) en-contram-se os arquétipos de todas ascriaturas. Cada arquétipo vibra e emi-te um som que lhe é próprio. Os áto-mos que o arquétipo atrai se agrupamsegundo essa vibração e constituemuma forma que lhes é particular, deacordo com o plano vivente e vibran-te de Deus relativo a cada ser huma-no. É pelo arquétipo que podemossentir a harmonia divina e nos mani-festar verdadeiramente.

Cada criatura possui sua própria nota fundamental

Anteriormente comparamos o serhumano com um instrumento musi-cal. Ele não está consciente disso por-que esse instrumento está em tão mauestado que não pode produzir a justasonoridade da harmonia divina. Nocérebro encontram-se sete cavidadesrepletas de éteres, cada uma emitindouma entonação de acordo com os tonsda gama sétupla. E cada ser humanopossui sua própria nota fundamental.

Todas essas modulações têm umatarefa a cumprir, de acordo com seulugar no plano divino. Quando ascavidades cerebrais estão preenchidasde éteres terrestres, elas não estão emcondição de reagir ao chamado docampo de vida original. O fogo ser-pentino que, para continuar a analo-gia, pode ser considerado como o dia-pasão pessoal de cada um, não emite apura sonoridade e cada ser humanofaz soar uma nota falsa. Se ele não po-de soar de acordo com a harmoniadivina, não pode fazer outra coisa se-não se manifestar em dissonância e,para ele, uma vida superior está forade questão. Entretanto, sua reminis-cência lembra-o de que seu ser ressoa-va, antigamente, de acordo com a har-monia das esferas. Podemos conside-rar a música em geral como uma rea-ção a essa reminiscência.

Pitágoras começava o dia com música

Porfírio, o biógrafo de Pitágoras,conta que este último começava seuscursos tocando a lira e cantando anti-gas melodias, a fim de fazer esqueceras mágoas, acalmar a irritação e apazi-guar as paixões, e também para reve-renciar os deuses. As sonoridades

34

Pitágoras

demonstra seu

ensinamento

musical. Gravura

em madeira em

Theorica musica

de F. Gaffario,

Milão, 1492.

Page 36: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

35

harmoniosas agem direta e positiva-mente sobre os éteres, concorrendopara o justo acorde das sete notas dosistema de cada indivíduo e atraindoas forças correspondentes. Encon-tramos as mesmas práticas nas reli-giões de todos os povos, há séculos.

Como as condições etéricas são es-pecíficas para cada raça, os instru-mentos e formas musicais são diferen-tes. Em certas regiões domina o rit-mo, em outras, a melodia. Cada povotem sua própria música, mas isso nãoquer dizer que ela esteja de acordocom a harmonia divina e que tenhaefeitos positivos.

É possível retornar à harmonia original?

A vida divina está sempre minima-mente presente no ser humano comocentelha provinda do domínio origi-nal. Podemos reanimar e inflamar no-vamente essa centelha se, como uminstrumento musical, nos ajustamos àharmonia divina. Então voltamos anos ligar à força de Cristo, cuja notafundamental é o amor divino. Pode-mos visualizar isso como uma cordaque vibra continuamente, embora,evidentemente, no início esse aindanão seja o caso. Esse processo de vi-bração em acorde perfeito acompanhaa transmutação de todo o ser a fim deque surja uma nova consciência, umaconsciência gnóstica. Então poderáser dito que o homem voltou a se tor-nar um instrumento musical que par-ticipa da harmonia original das esfe-ras. J.van Rijckenborgh descreve esseprocesso no primeiro tomo de AArquignosis egípcia, São Paulo, 1984,p.21: Quando a consciência hermética

dirige-se ao Espírito e desse modo oespírito-fogo acende-se, no foco doencontro forma-se uma estruturaluminosa de linhas de força (como emuma flama – red.). É então que ohomem hermético encontra Piman-dro. E dessa estrutura de linhas de for-ça que assim se formou flui uma vibra-ção para o interior do homem hermé-tico. Esta vibração tem um som e umacor, os quais estão em perfeita harmo-nia com o propósito do homem hermé-tico de elevar-se ao Campo do Es-pírito. E, deste modo, esta manifesta-ção, este encontro, adquire uma carac-terística muito especial. Só deste modoé que Deus fala ao homem. Este é oencontrar e ouvir o Nome Inefável.

É possível que um compositor ou musicista aben-çoado pela Gnosis possa servir como ponto focalpara as irradiações que emanam da harmoniadas esferas, dos núcleos da melodia primordialsétupla. Por isso, através de gênio musical, cadatom pode ser emitido em toda sua pureza, porém– digamo-lo francamente – a esfera divina difi-cilmente se deixa circunscrever. Para poder julgarse toda a plenitude gnóstica está refletida nesteou naquele repertório musical clássico elevado,seria necessário, no mínimo, conhecer o conteúdode toda a plenitude gnóstica.(Trecho tirado de Cartas, Catharose de Petri, São Paulo: Lectorium Rosicrucianum, 1987)

Page 37: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

m busca do Espíritoavançava penosamente nas areiasde solidões desérticas.Alcancei a extremidade de meu país.Um anjo, guarnecido de seis asas,ergueu-se diante de mim.

Com as pontas de seus finos dedos de luz,ele tocou meus olhos;minha vista turvou-se como num sonhoe, repentinamente, por um novo dom,minha consciência iluminou-se.

Mal o anjo roçara-me os ouvidos,um oceano de clamores de abalar os céusengoliu-me, e eu pude, desde então, ouviro elevado vôo dos anjos no firmamento,o lamento das criaturas ancoradasnos abismos escuros,como o longínquo vibrar de sarmentoscarregados de promessas.

Depois, inclinando-se sobre mim,ele arrancou minha língua ímpia,abundante fonte de malícia,de impostura e de orgulho,infligindo-me um horrível ferimento.Com sua destra ensangüentada,ele enfiou em minha boca moribundao aguilhão da sabedoria.

Com um golpe de seu gládio cortante,ele abriu-me o peito e empunhou meu coração todo palpitanteantes de depositar em meu seiouma centelha do fogo divino.Meu corpo jazia, morto, no deserto.

Ouvi, então, a voz de Deus ressoar:“Levanta-te, profeta, levanta-te e vê.Põe-te a caminho. Percorre as terras e os mares.Anuncia minha Palavra aos corações dos homens.”(Tradução Pentagrama)

O ProfetaAlexandre Puchkin (1799-1837)

36

O profeta. Bronze de Pablo Cargallo,1933.

À direita: Serafim de seis asas, cada uma representando uma virtude.

Pintura sobre pergaminho. Bibliothèque de l´Arsenal, Paris.

E

Page 38: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-
Page 39: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

Nikolai Berdiaiev, nascido em 6 de mar-ço de 1874, em Kiev, foi um dos pensa-dores russos mais incisivos e radicais.Ele era tido como o Filósofo da Li-berdade. A liberdade era a fonte de seupensar, de sua inquietude e de sua per-severança. Em função de seu indefectí-vel amor à liberdade ele se tornou umpensador radical. A Rússia dos tzares oexilou e a dos comunistas o expulsou.

pesar de tudo, sua ligação com aigreja ortodoxa russa sempre perma-neceu profunda. A igreja não sabia sedeveria aceitá-lo como “filho crente”ou bani-lo como “herege”. Da Ale-manha, onde fundou em Berlim umaacademia filosófico-religiosa, ele che-gou à França, onde veio a falecer em1948. Ele se tornou mundialmente co-nhecido por seus muitos livros tradu-zidos em vários idiomas. Hoje, exata-mente na Rússia, esses livros experi-mentam um renascimento através dereedições. Sua interpretação da liber-dade foi o resultado de seu profundoautoconhecimento e de suas análisessobre o sentido da existência humana.Ele escreve: Liberdade pressupõe aexistência de um princípio espiritualque não é determinado pela naturezanem pela sociedade. Liberdade é umprincípio espiritual no ser humano.Quando o ser humano é totalmentedominado pela natureza e pela socie-dade nenhuma liberdade é possível.

Em seu livro Autoconhecimento Ber-diaiev escreve: “Eu te amo, oh eterni-

dade”, diz Zaratustra. O mesmo eudisse a mim mesmo a vida inteira. Anada podemos amar, senão tão so-mente à eternidade, e com nenhumoutro amor podemos amá-la senão como amor eterno. Não existindo a eterni-dade, absolutamente nada existe. Oespírito pede pela eternidade. A maté-ria, porém, somente conhece o tempo-ral. Para Berdiaiev o motivo de todafilosofia não é o ser, mas sim a liberda-de. A liberdade, no entanto, provocasofrimento. Ela é um impulso interiorque surge tão logo limitações são im-postas. Muitas vezes essa liberdade éum bem natural, simples e evidente,

Nikolai Berdiaiev – o filósofo da liberdade

38

O saber é necessário para nos defen-dermos das potestades negativas danatureza. Não somente um sabermecânico, qual um escudo técnico,mas também um saber da vidainterna do cosmos, da estruturainterna do mundo. Para esse saber oser humano precisa estar preparadoespiritualmente. Ele deve possuir amente crística, não a mente naturale racional sobre a qual fala o concí-lio do vaticano, porém uma menteiluminada. Então o ser humano nãocorre mais o perigo de ser rasgadoem pedaços pelas forças cósmicas ecair no poder dos demônios. AGnosis crística repousa na aquisiçãoda mente crística, do saber humano-divino em Cristo e através deCristo.(Do livro: Liberdade e Espírito)

A

Page 40: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

porém pode também ser um fardo in-conveniente que é jogado fora de bomgrado na esperança de aliviar o desti-no. Para Berdiaiev liberdade é umaforça de uma totalmente outra dimen-são, algo transcendente. Ele escreve:A liberdade humana consiste no fatode existir fora do reino de César – nos-so mundo estruturado pelo poder – oreino do Espírito. A existência de Deusé revelada na existência do espírito nohomem. E Deus não se iguala à forçada natureza e menos ainda ao poderda sociedade e do Estado.

Toda a vida de Berdiaiev foi acom-panhada de uma forma especial de “té-dio doloroso do mundo”. Não era atristeza de um ser humano que sentefalta de algo ou que perdeu algo. Nãoo afligia a falta de algum bem materialterreno específico. Esse “tédio dolo-roso do mundo” também não era me-lancolia e nem fruto de seu tempera-mento. Ele mesmo o denominou co-mo uma saudosa dor pelo transcen-dente. Essa dor era a constante com-panheira que estimulava seu desen-volvimento espiritual. Muitas vezesela se tornava cheia, qual maré, torna-va-se forte e mais forte, para entãovazar. Essa “dor do mundo” muitasvezes tornava-se muito mais intensaquando ele experimentava momentosde grande felicidade. Exatamente nes-ses momentos ele se lembrava espe-cialmente do sofrimento da vida. EmO sentido da História (1950) ele assimexpressa a causa da dor: Isto é, enfim,a questão entre a relação de tempo eeternidade. Existe como que uma opo-sição sem trégua entre tempo e eterni-dade, e nenhuma conexão poderá serestabelecida entre eles. O tempo é co-mo que a negação da eternidade, umestado que não possui nenhuma raizna vida eterna.

Em suas obras, Berdiaiev muitas

39

O filósofo russo

Berdiaiev.

Nikolai Alexandrovich Berdiaievnasceu em Obuchovo (estado deKiev) em 6 de março de 1874. Sob a influência do filósofo religiosoVladimir Soloviev, ele se ocupou dequestões religiosas. Em 1919, fundoua Academia Moscovita Livre para aCultura Espiritual. Em função desuas “atividades inimigas ao idealis-mo comunista” foi expulso da UniãoSoviética em 1922, fixando-se em Berlim, onde fundou aAcademia de Filosofia das Religiõese teve uma participação considerávelna estruturação do InstitutoCientífico Russo em Berlin. Em1924, mudou-se para Paris, ondeigualmente inaugurou a Academiade Filosofia das Religiões. Faleceuem 23 de março de 1948, emClamart, Paris.

Page 41: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

40

vezes denomina o homem de micro-cosmo, no qual estão compreendidasestruturas do divino, do terrestre, dohumano e do pessoal. Interessavam-lhe o desenvolvimento e o objetivo dohomem e a época na qual este vivia.Nunca me interessou a pesquisa domundo tal qual ele é, porém o destinodo mundo e o meu próprio. A mim in-teressam, portanto, “a finalidade dascoisas”. Minha filosofia não é científica,porém profética e escatológica quanto àsua classificação [...] Trinta anos atráseu imaginava saber muito mais do queacredito saber hoje, no nível atual demeus conhecimentos [...] Eu principio asaber que nada sei (Autoconhecimen-to, 1950). Ele sempre via todas as ex-periências, consigo mesmo e com aspessoas de sua época, tendo como pa-no de fundo a evolução até o homem-divino: Nos homens, um eu inferior eum eu superior muitas vezes me decep-cionaram; eu experimentei muitas bai-xarias, mentiras, armadilhas, dureza decoração, traição, inúmeras decepçõesnas relações com os seres humanos, efui eu mesmo o causador e o culpadodessas decepções [...] E mesmo assim eupreservei a fé no plano de Deus com oshomens (Autoconhecimento).

Autoconhecimento é para Berdiaievo instrumento que permite a viagempara o “imutável”. O Homem conhece-te a ti mesmo é o início de todo pen-

sar filosófico que inicia com o autoco-nhecimento e avança em direção aoconhecimento do homem e do mun-do. Ele descreve a essência de seuautoconhecimento da seguinte forma.Eu descubro o significado de meu pen-samento existencial quando compreen-do que há dois caminhos: o caminhoda objetividade e o da transcendência.No primeiro somos prisioneiros de umpoder perfeitamente fantasmagórico emaciço, e no segundo estamos no cami-nho da transcendência em direção aum mundo transfigurado e liberto, omundo divino. Não somente o pensa-mento criativo, porém a paixão criado-ra e o sentir apaixonado têm de abrir aconsciência petrificada e torná-la flui-da ao mundo objetivado por ela. Eupude me manter no mundo sem meapoiar em nada a não ser na busca pelaverdade divina (Autoconhecimento).

Na história, bem como na natureza,existe um ritmo, um desenrolar rítmi-co de épocas e mudanças de tipos deculturas. Maré e vazante, crescimentoe fenecimento, ritmo e periodicidadesão parte de toda a vida. Nikolai Ber-diaiev descreve em seu livro O sentidoda História que, com a queda do im-pério romano, a antiga civilizaçãochegou ao final. A seguir, veio a IdadeMédia, que ele denomina de “períodonoturno”, na qual as estruturas crista-linas da Antigüidade foram demoli-das. Todos os valores dos quais ahumanidade vivia nos períodos cultu-rais anteriores perderam sua validade.O mundo adentrou novamente emum novo “período noturno” com otérmino da Idade Moderna, no iníciodo século XX: A contar pelos indícios,nós já ingressamos no período notur-no. As falsas aparências cairão, e serárevelado o que é bom e o que é mau.Esse período, porém, também já estásendo impregnado com idéias para o

A ciência do mistério da vida cós-mica foi proibida pela consciênciareligiosa. O trabalho dogmáticodos professores das igrejas e dosconcílios ecumênicos não era gnós-tico. Ele consistiu na elaboraçãode fórmulas para a prática religio-sa comum e em um trabalho derefutação das falsas doutrinas.(Do livro: Liberdade e Espírito)

Page 42: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

tempo vindouro. Idéias antigas e no-vas se debatem e tornam o ser huma-no inseguro. Simultaneamente, esseperíodo força o homem a uma refle-xão positiva sobre sua origem. Suavivacidade espiritual nunca esteve tãoativa; suas possibilidades de com-preender a origem primeva de suaexistência humana raramente foramtão grandes.

As épocas culturais que são deno-minadas por “período diurno” sãosuperficiais e via de regra não permi-tem um olhar profundo na evoluçãoda humanidade. Um tal “períododiurno” foi a denominada Idade Mo-derna. Ela trouxe à tona a visão atô-mica do mundo. A ciência começou afragmentar todas as inter-relações, areduzir todas as partes a pequenoselementos, para poder descrevê-los eclassificá-los. O ser humano experi-mentou uma individualização e umaisolação como nunca anteriormente.

Vivemos atualmente em uma fasenoturna. Nesta época, as comportasdo abismo serão arrebentadas e o serhumano será confrontado com todasas mazelas de sua existência nestemundo. Nesta fase duas reações dahumanidade são possíveis: medo epânico ou entrega ao Espírito Divino.Para o primeiro grupo Bardiaievescreve em O reino espiritual e o reinode César (1952): Muito falsa é a afir-

mação do pragmatismo de que a ver-dade seja útil à vida. A verdade crísti-ca pode até ser muito perigosa... E porisso a verdade pura do cristianismo foiadaptada à vida cotidiana do ser hu-mano e tão extensamente mutilada, quese corrigiu a obra de Cristo, como dizo Grande Inquisidor em Dostoievski.

O segundo grupo é formado peloshomens que não retrocedem ante avisão do abismo. Eles dão atenção aossinais da época, e uma saudade dolo-rosa e inexprimível se apodera deles.Sobre isso diz Berdiaiev: Quandoacreditamos na salvação por meio daverdade, nós o fazemos em um senti-do completamente diferente. Atravésda verdade acontece a divisão do queé “de Deus” e do que é “de César”, en-tre o Espírito e o mundo. A verdade,porém, é percebida somente após umelevado grau de comunidade espiri-tual. Somente em comunhão com ou-tros seres humanos o homem está emcondição de alcançar um nível espiri-tual elevado, além do mundo subjeti-vo e do mundo objetivo. Não existenada superior à busca pela verdade eao amor por ela. A única e oniabar-cante verdade é Deus, e o conheci-mento da verdade é um penetrar avida divina (A nova Idade Média,1927).

O aparecimento de Cristo, o deus-homem, é justamente a união per-feita de dois movimentos: de Deuspara o homem e do homem paraDeus; o nascimento definitivo deDeus no homem e do homem emDeus, a realização do mistério daunidade do dois em um, do misté-rio da humanidade-divina.(Do livro: Liberdade e Espírito)

O cristianismo é a religião do amor,não a religião da justiça. No cristia-nismo a lei é superada, tanto a leinatural como a lei da justiça humana.O ser humano que se tornou partedo mistério da salvação, que aceitouCristo em si e faz parte da linhagemde Cristo, não está mais sujeito àsleis cármicas. Ele escapa do dever deviver o passado em evoluções infini-tas, segundo um processo contínuo,sistemático e imparcial.(Do livro: Liberdade e Espírito)

41

Page 43: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

“Nada de presente, tudo emprestado”

A poetisa polonesa Wislawa Szym-borska ocupa-se de diversas maneirascom as grandes questões da vida.Embora não escreva mais do que umapoesia por ano, ela é muito popular, enão somente na Polônia. No dia 3 deoutubro de 1996 ela recebeu o prêmioNobel de Literatura. Ao ser informa-da de que receberia o prêmio, ela disseque sua vida tranqüila teria, prova-velmente, acabado.

islawa Szymborska gosta de per-manecer por detrás dos bastidores.Ela escreveu, é verdade, sobre o acon-tecimento de 11 de setembro de 2001,mas mal participa de eventos literá-rios, e tem uma grande repulsa porassociações políticas. Ela é profunda-mente tocada por tudo que aconteceno mundo, e suas poesias dão teste-munho disso. Assim ela escreve sobreo ser ideal:

O infinito eterno poderia continuar existindoliberto do escuro,feito de luz,em seus idílicos jardins por sobre o mundo.Por que, maldito,mergulhaste na aventura,na péssima companhia da matéria?

As raízes de Wislawa Szymborskaestão em Kornik, Posen, no oeste daPolônia. Ela nasceu no dia 2 de Julhode 1923. Os seus primeiros anos de vi-da foram passados no vilarejo de Bnin.Em 1931, aos 22 anos, ela se mudoupara Cracóvia, anteriormente cidadereal, onde, imediatamente após a 2ªguerra mundial, estudou Literatura po-lonesa e Sociologia. Durante 28 anos,de 1953 a 1981, trabalhou como reda-tora do Jornal Zycie Literackie. Seusprimeiros sucessos vieram em 1957com a coletânea de poesias Wolanie

W

42

Page 44: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

43

do Yeti (tradução livre: O chamadodo yeti) e com a coletânea Sól (Sal)editada em 1962. Depois disso, ela pu-blicou 12 coletâneas poéticas, algumasdas quais traduzidas para o alemão,inglês e holandês. Na Alemanha, suaobra foi premiada com o Prêmio Goe-the da cidade de Frankfurt (1991) eem com o Prêmio Herder (1995).

Sua popularidade é fruto da simpli-cidade da linguagem com a qual elaaborda as complicadas questões davida tantas vezes tratadas pela “gran-de” literatura. Seu pensamento é com-plexo, mas sua linguagem é simples,disse um tradutor de suas obras,quando ela recebeu o Prêmio Nobel.Um outro motivo para sua populari-dade é, na opinião dos críticos, o fatode que sua obra é para os leitores po-loneses um “ponto de referência”. Elaaborda temas universais da vida decada um, que vão muito além do coti-diano, da política ou da igreja. Szym-borska é uma poetisa do cotidiano, doincompreensível e do inexprimível naexistência humana; e também do serhumano que se maravilha com suaexistência como ser humano, que elevê como produto de um milhão deanos de evolução contínua, como pro-

duto de história e cultura, sem, contu-do, enfatizar o meio ambiente nacio-nal polonês, observou um outro tra-dutor de suas obras.

Com doce maravilhamento ela re-gistra seus comentários. A pena com aqual ela cria sua poesia é maleável esolta. Ainda menininha, com poucosanos de idade, ela descobre a força dagravidade. Ela puxa a toalha da mesa ese pergunta como as xícaras e as co-lheres que balançam no canto da mesase comportarão: Voarão para o teto?Ou ao redor da lâmpada? Saltarãopara o parapeito da janela e de lá paraa árvore? Ela se recorda do medo quesentia, quando criança, de pisar numapoça de água de chuva e escreve:

Eu iria dar um passoe de repente afundar-me totalmente;voaria para as profundezase mais profundo, sempre mais profundo,iria ao encontro das nuvens refletidas,talvez até mais além.

Tudo isso pode contribuir paradespertar a admiração da alma. Mas apoça poderá secar, e daí não se pode-rá voltar mais. E quando a própriaSzymborska se encontra sem pala-vras, no cemitério, perto das covas detrês crianças pequenas, não está tãocomovida a ponto de não poderadmiti-lo:

Mas o que podes dizer de um dia de vida,um minuto, um segundo:escuridão, daí um raio de luz e novamente escuridão?Cosmos – macrocosmos,Cronos – paradoxos.Somente o petrificado idioma gregotem palavras para isso.

Existe incompreensão e incompre-

Abertura em

unidade de grupo,

Portugal. Foto

Pentagrama.

Três palavras sumamentesingulares

Quando pronuncio a palavraFuturo a primeira sílabaconduz ao passado.

Quando pronuncio a palavraCompreensão eu a destruo.

Quando pronuncio a palavraNada crio algo que em nenhumaexistência cabe.

Page 45: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

44

ensão. A primeira provavelmente en-colheria os ombros diante do acúmu-lo de fatos. A segunda, a incompreen-são de Szymborska, não teoriza a res-peito para então encolher os ombros,pois onde ela vê uma oportunidadequalquer, ela apreende a realidade e securva profundamente diante dela. Avida, então, talvez seja inexplicável,mas as perguntas que daí nascem nãoo são. A alma, por exemplo, é algointangível, mas em Algumas palavrassobre a alma, a poetisa escreve:

Raramente ela nos acompanhadurante atividades desgastantescomo deslocar móveise carregar malas,ou percorrer um caminhocom sapatos apertados.

Justamente na sutileza de suas abor-dagens é que se esconde a compreen-são do indescritível sobre a alma. As-sim ela escreve em A curta vida denossos ancestrais:

Bem e mal –eles não sabiam muito a respeito, mas em tudose o mal triunfa,o bem se esvai;sempre que o bem se revela,o mal aguarda oculto.Nem um nem outro é transcendívelou irreversivelmente mantido à distância.Por isso a alegria possuiconstantemente um hálito de medo,e ao desespero nunca faltasilenciosa esperança.E a vida, ainda que longa, curta sempre será,curta demais para acrescentar algo.

Que buscador da verdade não vive-rá um momento de identificação, ao

ler a seguinte poesia, que tem comotítulo Nada de presente?

Nada de presente, tudo emprestado.Estou atolada em dívidas até às orelhas.Eu tenho comigoque tenho de pagar para mim mesma,dar minha vida pela minha vida.

Assim, fica estabelecidoque o coração precisa retornare que o fígado precisa retornare cada dedo em especial.

Muito tarde para queimar o contrato.Dívidas são cobradas,e chegam-me às orelhas.

Eu caminho no mundo,na multidão, com tantos outros devedores.Alguns são obrigadosa dar suas asas como pagamento.Outros precisam –quer queiram, quer não –pagar suas faturas.

Do lado do débitoconsta cada fibra em nós.Nem um cílio, nem o menor filamentopodemos reter para sempre.

A lista não tem fim,e parece que depoisvamos ficar para trás, de mãos vazias.

Eu não posso me lembraronde, quando e por queeu deixei abrir tal conta.

Aquela que chamamos de almaprotesta.E ela é a únicaque não consta na lista.

Page 46: PentagramA · A promessa espiritual ... são gnóstica que significa “plenitude”, ou seja, o mundo divino, ... sos da nova época e estava conscien-

A vida divina está sempre minimamente presente no

ser humano como centelha provinda do domínio original.

Podemos reanimar e inflamar novamente essa centelha se,

como um instrumento musical, nos ajustamos à harmonia

divina. Então voltamos a nos ligar à força de Cristo,

cuja nota fundamental é o amor divino.

(A música das esferas, página 32)