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A liquidação e prescrição das dívidas tributárias Jesuíno Alcântara Martins Professor Adjunto, ISCAL – Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa [email protected] Área Temática: C - Fiscalidade

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A liquidação e prescrição das dívidas tributárias

Jesuíno Alcântara Martins Professor Adjunto, ISCAL – Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa

[email protected]

Área Temática: C - Fiscalidade

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A LIQUIDAÇÃO E PRESCRIÇÃO DAS DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS

RESUMO

No presente estudo visa-se estabelecer as diferenças e finalidades dos institutos jurídicos

da caducidade e da prescrição dos tributos tributários.

Quanto ao exercício do direito à liquidação faz-se a descrição e análise jurídica do seu

regime, bem como das causas de suspensão do prazo de caducidade. Dá-se especial relevo

à suspensão derivada da ação de inspeção externa e da suspensão do procedimento de

inspeção tributária, dando-se destaque às posições da jurisprudência firmada pelos

Tribunais Tributários Superiores.

Quanto à prescrição põe-se em evidência os diversos regimes aplicáveis aos diferentes

tributos, bem como se escalpelizam os factos interruptivos e suspensivos do prazo de

prescrição.

Faz-se referência à opção da jurisprudência de aplicar subsidiariamente o artigo 327.º do

Código Civil, o que implica que após a citação do executado no processo de execução

fiscal não exista prescrição das dívidas tributárias.

Por fim, evidencia-se a inconsistência das decisões jurisprudências.

Palavras-Chave: tributo, caducidade, prescrição, suspensão, interrupção

1. INTRODUÇÃO

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O dever de pagar tributos emerge da relação jurídica tributária ou da relação jurídica

contributiva. A relação jurídica tributária constitui-se com o facto tributário, conforme se

prescreve no n.º 1 do artigo 36.º da Lei Geral Tributária (LGT). O facto tributário

representa uma situação ou posição jurídica que determina a realização da tributação. A

substância do facto tributário pode consistir no exercício de uma atividade profissional ou

económica, na aquisição de bens ou de direitos ou na titularidade de bens patrimoniais, e,

independentemente da tipologia da sua formação, instantânea ou sucessiva, vai-se

subsumir nas normas de incidência de cada cédula de tributação.

A tributação visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades

públicas e promove a justiça social, a igualdade de oportunidades e as necessárias

correções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, finalidade que

cumpre os objetivos do sistema fiscal, nos termos consagrados no artigo 103.º da

Constituição da República Portuguesa (CRP).

A relação jurídica contributiva constitui-se com o exercício de uma atividade profissional e

traduz-se num vínculo de natureza obrigacional que, designadamente, liga o sistema

previdencial e os trabalhadores, as entidades empregadoras e os trabalhadores

independentes. A obrigação contributiva tem por objeto o pagamento regular de

contribuições e de quotizações por parte das pessoas singulares e coletivas que se

relacionam com o sistema previdencial de segurança social.

O fundamento e fins das espécies tributárias que integram o conceito de tributo é

diversificado e plural, todavia, a sua aplicabilidade deve observar os princípios da

generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material. O conceito de tributo

absorve todas as espécies tributárias, cuja classificação consta do artigo 3.º da LGT. A

CRP atribui poder tributário ao Estado (art.º 165.º, n.º 1 al. i)), às regiões autónomas (art.º

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227.º, n.º 1, al. i)) e às autarquias locais (art.º 238.º, n.º 4), determinação jurídica que

motiva a existência de tributos Estaduais, regionais e locais. Daqui decorre que o sujeito

ativo da relação jurídica tributária possa ser uma entidade de direito público distinta do

Estado. Acresce que algumas espécies tributárias (taxas, tarifas, contribuições especiais e

financeiras) podem ser liquidadas por pessoas de direito público que, embora constituam

entidades de direito público, não pertencem à Administração direta do Estado.

Nos termos do n.º 3 do artigo 3.º da LGT, as taxas e as contribuições financeiras deviam

beneficiar de um regime jurídico especial, o qual, não obstante os anos decorridos desde a

entrada em vigor da LGT, continua a ser inexistente, registando-se, assim, multiplicidade

de critérios e regimes vigentes.

As taxas e demais espécies tributárias das autarquias locais estão sujeitas ao regime geral

constante da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro (RGTAL).

O exercício da atividade tributária visa a prossecução do interesse público, de acordo com

os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da

imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais

obrigados tributários, bem como, nos termos do normativo da alínea a) do n.º 2 do artigo

8.º da LGT, a liquidação e cobrança dos tributos, incluindo os prazos de caducidade e de

prescrição, estão vinculados ao princípio da legalidade. Importa, então, referir que a

liquidação de tributos resulta de relações jurídico-tributárias estabelecidas entre a

Administração Tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares e coletivas e outras

entidades legalmente equiparadas a estas. Sendo que, para este efeito, integram a

Administração Tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira, as demais entidades

públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobrança dos tributos, o Ministro das

Finanças ou outro membro do Governo competente, quando exerçam competências

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administrativas no domínio tributário, e os órgãos igualmente competentes dos Governos

Regionais e autarquias locais.

A gestão dos tributos parafiscais pertence aos órgãos da Administração da Segurança

Social.

A caducidade e a prescrição são dois institutos jurídicos essenciais para a arrecadação das

receitas tributárias. Porém, cada um tem a sua regulação jurídica, quer no Código Civil,

quer no domínio do ordenamento jurídico tributário, sendo que a sua conformação técnico-

jurídica não é coincidente, sendo indispensável atentar nas especificidades que estas

figuras jurídicas têm nas leis tributárias.

2. CARACTERIZAÇÃO DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO

O ato de liquidação é o ato tributário por excelência, que se materializa nas operações de

lançamento e de liquidação. A liquidação dos tributos pode estar atribuída ao sujeito

passivo da relação jurídica tributária ou a outro obrigado tributário e, neste caso, fala-se de

autoliquidação, de retenção na fonte ou de pagamento por conta. Quando a liquidação do

tributo pertence ao sujeito ativo da relação jurídica tributária, fala-se de liquidação

administrativa, de liquidação adicional ou corretiva e ainda de liquidação oficiosa. Poder-

se-á dizer que a liquidação consiste numa operação que se traduz na aplicação de uma taxa

ou mais que uma taxa a um rendimento ou matéria tributável. As regras gerais sobre a

avaliação da matéria tributável constam dos artigos 81.º a 90.º da LGT, devendo-se, para

determinação, quantificação ou fixação da matéria tributável, articular estes normativos

com as regras específicas inseridas em cada código e aplicáveis a cada cédula de

tributação. A tributação deve ser feita com base na capacidade contributiva dos

contribuintes e deve visar fundamentalmente o rendimento real, salvo quando, nos termos

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da lei, a verdade sobre os factos e a justiça material apenas sejam emergentes dos sistemas

de avaliação indireta.

O artigo 75.º da LGT consagra uma presunção de verdade e de boa-fé em relação às

declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como dos

dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem

organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. De entre outras situações

legalmente previstas (n.º 2 do art.º 75.º da LGT), esta presunção cessa quando as

declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios

fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real ou

quando o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua

situação tributária. O procedimento de liquidação da responsabilidade dos serviços da

Administração Tributária, embora hoje esteja absolutamente informatizado e

desmaterializado, é instaurado com base nas declarações apresentadas pelos contribuintes

(n.º s 1 e 2 do art.º 59.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)).

Com base nas declarações dos contribuintes, desde que estes as apresentem nos termos

previstos na lei e forneçam à Administração Tributária os elementos indispensáveis à

verificação da sua situação tributária, os órgãos competentes procedem ao apuramento da

matéria tributável e, subsequentemente, efetuam a liquidação do tributo. Esta operação

traduz o que se pode designar por ato de liquidação em sentido estrito, isto é, a aplicação

da taxa à matéria tributável, estando a eficácia deste ato dependente da sua válida

notificação ao sujeito passivo da relação jurídica tributária (n.º 6 do art.º 77 da LGT e n.º 1

do art.º 36.º do CPPT). A este propósito sublinha-se que Campos (2012:359) refere que [a]

notificação do contribuinte deve ser validamente feita no decurso do prazo de quatro anos.

Sem o que, o prazo decorrerá. Com efeito, a notificação, e só ela, torna a dívida tributária

certa e exigível”.

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Se as declarações apresentarem omissões ou inexatidões, na sua falta ou caso não tenham

sido apresentadas nos termos da lei, a liquidação será feita pela entidade competente da

Administração Tributária com base nos elementos de que disponha ou venha a obter. Esta

liquidação poderá ser uma liquidação oficiosa1, feita de acordo com as regras legais, ou

uma liquidação cujos fundamentos poderão constar no relatório final de procedimento de

inspeção tributária, independentemente da metodologia aplicada na avaliação da matéria

tributável (correções meramente aritméticas ou métodos indiretos).

Independentemente dos fundamentos do ato de liquidação, a sua realização e notificação

têm de ser feitas no prazo de caducidade, o qual representa o segmento temporal para o

exercício do direito à liquidação. O princípio da legalidade e o subprincípio da

indisponibilidade dos créditos tributários impõem um poder/dever ao sujeito ativo da

relação jurídica tributária de efetuar o ato de liquidação. A caducidade do direito à

liquidação não é de conhecimento oficioso, mas consubstancia um vício de lei que pode ser

invalidante do ato de liquidação, caso seja oportuna e atempadamente invocado pelo

interessado em meio procedimental ou processual idóneo. Deste modo, é indispensável que

os sujeitos da relação jurídica tributária conheçam e observem os respetivos direitos e

deveres tributários. Os princípios da boa-fé, da proteção da confiança, da certeza e da

segurança jurídicas impõem que, uma vez decorrido o prazo de caducidade, a

Administração Tributária não proceda à liquidação e notificação do tributo. Todavia, a

circunstância de se tratar de atos em massa, o seu universo pode inviabilizar o rigoroso e

adequado controlo, pelo que podem ser praticados atos extemporâneos ou ilegais, sendo

legítimo que o legislador tenha transferido para os seus destinatários o controlo da

legalidade, impondo a estes a arguição dos vícios ou factos invalidantes. Para o efeito,

1 Cfr. Artigo 88.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), art.º 76.º, al. b) do n.º 1 do

Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), art.º 90.º, al. b) do n.º 1 do Código

do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) e art.º 19.º do Código do Imposto Municipal

sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT).

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impõe-se que os contribuintes tenham o domínio concetual do instituto da caducidade do

direito à liquidação dos tributos, cuja conformação legal consta do artigo 45.º da LGT.

2.1 CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO

A caducidade é o instituto jurídico que representa a extinção do direito. Se o tributo não for

liquidado e validamente notificado ao contribuinte o direito à liquidação extingue-se no

termo do prazo legalmente previsto para o efeito. Outrossim, na perspetiva de Glória

(2015.142) [à] obrigação de os sujeitos passivos pagarem impostos e outros tributos

corresponde o direito da administração fiscal de liquidar e cobrar os mesmos. No entanto,

como garantia dos contribuintes e em nome da segurança jurídica, o direito da

administração fiscal à liquidação dos impostos está sujeito a um prazo de caducidade.

Obviamente, passado esse prazo de caducidade sem que a administração fiscal proceda à

liquidação do imposto ou outro tributo, a relação jurídica obrigacional tributária, que havia

nascido, ex lege, com a ocorrência do facto tributário, extingue-se definitivamente”.

O n.º 1 do artigo 45.º da LGT prescreve que “[o] direito de liquidar os tributos caduca se a

liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando

a lei não fixar outro”. Esta norma contém o prazo geral de caducidade, outros prazos

especiais estão legalmente prescritos, os quais, nos termos do n.º 3 do artigo 7.º do Código

Civil (lei especial impõe-se à lei geral) se sobrepõem a este prazo geral de quatro anos.

Exemplo de prazo especial é o de oito anos previstos no n.º 1 do artigo 39.º do Código do

Imposto do Selo (IS) ou no artigo 35.º do CIMT.

O artigo 45.º da LGT estabelece o prazo geral de caducidade e fixa outros prazos especiais.

O n.º 2 daquele artigo fixa um prazo de três anos aplicável em caso de erro evidenciado na

declaração do sujeito passivo. Este prazo só é aplicável nos casos de autoliquidação,

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portanto, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e de

Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), quando o contribuinte tenha cometido algum

erro no preenchimento da declaração modelo 22-IRC ou na declaração periódica do IVA e

a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), através da análise formal e de coerência da

declaração identificar o erro. O n.º 3 do artigo 45.º da LGT prescreve que, caso tenha sido

efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício

desse direito. Ao direito à dedução aplica-se o prazo de quatro anos previsto no n.º 2 do

artigo 98.º do CIVA. O prazo de caducidade do crédito de imposto é o previsto na lei que

permitir o respetivo crédito, ou seja, a lei que tiver criado o benefício fiscal. No n.º 7 do

artigo 45.º da LGT está previsto um prazo de caducidade de sete anos apenas aplicável às

situações nele previstas. O n.º 5 do referido artigo estabelece um prazo que, prima facie,

não se sabe exatamente qual é a sua extensão, apenas se sabe que, quando for instaurado

um processo de inquérito, o prazo de caducidade é alargado até ao arquivamento do

processo penal tributário ou ao trânsito em julgado da decisão condenatória, e é acrescido

de um ano. Isto é, depois do processo por crime tributário ser extinto, por arquivamento ou

por trânsito em julgado da decisão condenatória, a este facto ou momento temporal acresce

um ano durante o qual a Administração Tributária pode liquidar e notificar o tributo, sendo

que o arquivamento ou o trânsito em julgado pode ocorrer no tribunal de Comarca, no

tribunal da Relação ou no Supremo Tribunal de Justiça, circunstância que, à partida, induz

muita incerteza quanto à data previsível para a ocorrência da caducidade do direito à

liquidação do tributo.

Para que o sujeito passivo da relação jurídica tributária possa determinar quando ocorre a

caducidade do direito à liquidação, não é suficiente que se saiba qual a extensão do prazo

de caducidade, é ainda necessário saber quando ocorre o termo inicial do prazo de

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caducidade, bem como é essencial determinar se existe ou não alguma causa de suspensão

prevista no artigo 46.º da LGT ou noutro normativo legal.

Para determinar o termo inicial do prazo de caducidade, o legislador da LGT adotou a

opção que classifica os tributos em impostos periódicos e em impostos de obrigação única,

sem prejuízo da exceção que estabeleceu para as retenções na fonte a título definitivo e

para o IVA. Nesta conformidade, a norma do n.º 4 do artigo 45.º da LGT prescreve que

“[o] prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em

que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em

que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos

impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a

título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte

àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto

tributário”.

Nos impostos sobre o rendimento, visto que o facto tributário ocorre no último dia do

período de tributação (v.g. n.º 9 do art.º 8.º do CIRC), o início do prazo de caducidade

regista-se no primeiro dia do mês de janeiro do ano seguinte. No caso do IVA, a regra é

similar, mas tem por base a data da exigibilidade do imposto sendo esta determinada com

base nas regras dos artigos 7.º, 8.º e 36.º do CIVA. A exigibilidade corresponde à data de

emissão da fatura ou, caso esta não seja emitida dentro do prazo, a data da exigibilidade é a

do termo do prazo para a emissão da fatura de cada operação (n.º 1 do art.º 8.º do CIVA).

Determinada a exigibilidade do imposto a caducidade tem início no ano civil seguinte

àquele em que se tiver verificado a respetiva exigibilidade.

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Nos impostos de obrigação única (v.g. IMT e IS) a caducidade tem início no dia seguinte

ao da ocorrência do facto tributário (data da prática do facto, da celebração do negócio ou

da outorga do ato).

Para determinar o termo final do prazo legal para o exercício do direito à liquidação é

ainda necessário considerar as causas legais de suspensão do prazo de caducidade.

2.2 SUSPENSÃO DO PRAZO DE CADUCIDADE

Em termos gerais, as causas de suspensão do prazo de caducidade estão previstas no artigo

46.º da LGT. Outras situações estão previstas de forma isolada e casuística noutros

normativos tributários, de que, a título de exemplo, se destaca o n.º 5 do artigo 92.º da LGT

e o n.º 12 do artigo 22.º do CIVA. A caducidade só se suspende nos casos previstos na lei e

ao contrário do que acontece na lei civil (n.º 1 do artigo 333.º do Código Civil), na lei

tributária a caducidade não é de conhecimento oficioso, tem de ser invocada pelo

interessado. A suspensão é um segmento temporal determinado por um termo inicial e um

termo final, cuja extensão não é considerada no cômputo do prazo de caducidade aplicável

a cada situação jurídica. De entre as diversas causas de suspensão previstas no artigo 46.º

da LGT, a mais relevante, e talvez, aquela que ocorre em maior número de situações, é a

prevista no n.º 1 cuja norma estabelece que “[o] prazo de caducidade suspende-se com a

notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início

da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o

seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses

após a notificação, acrescido do período em que esteja suspenso o prazo para a conclusão

do procedimento de inspeção”. Em resultado da efetivação de um procedimento de

inspeção tributária interno, ou seja, quando os atos de inspeção são efetuados

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exclusivamente nos serviços da Administração Tributária, através da análise formal e de

coerência dos documentos por esta detidos ou obtidos no âmbito do referido procedimento

(al. a) do artigo 13.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e

Aduaneira, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de dezembro (RCPITA), não

ocorre qualquer suspensão do prazo de caducidade. Esta mesma ideia é referida por

Guerreiro (2001:222) quando diz que “(…), a inspeção externa não notificada ao

contribuinte ou a própria inspeção interna, casos em que o prazo de caducidade do direito à

liquidação não sofre qualquer suspensão, por força do seu início”.

Por outro lado, nos termos do n.º 1 do artigo 36.º do RCPITA, as ações de inspeção

tributária podem ter início até ao termo do prazo de caducidade do direito à liquidação dos

tributos, sem prejuízo do direito de exame de documentos relativos a situações tributárias

já abrangidas por aquele prazo, que os sujeitos passivos e demais obrigados tributários

tenham a obrigação de conservar. O procedimento de inspeção é contínuo e deve ser

concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início, podendo,

com fundamento nas circunstâncias previstas no n.º 3 do artigo 36.º do RCPITA, ser

ampliado por mais dois períodos de três meses, mediante decisão fundamentada e

notificada ao contribuinte. Todavia, na ação de inspeção externa (aquela em que os atos de

inspeção são realizados total ou parcialmente nas instalações do contribuinte ou de terceiro

- al. b) do art.º 13.º do RCPITA) sempre que se registe prorrogação do procedimento

inspetivo ou, então, quando a sua duração, compreendida entre a notificação da ordem de

serviço ou do despacho do superior hierárquico que o tiver determinado, ultrapassar seis

meses fica sem efeito a suspensão prevista no n.º 1 do artigo 46.º da LGT, e o prazo de

caducidade é contado de forma contínua desde o seu termo inicial. Face à relevância do

prazo de caducidade para o exercício do direito à liquidação do tributo, o contribuinte é

que tem de proceder ao cômputo do prazo e ao controlo da verificação ou não de causas de

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suspensão e da sua duração, daí que os atos ou factos que determinam a ocorrência do

termo inicial e do termo final da suspensão têm de ser notificados ao contribuinte, como

acontece de forma inequívoca na ação de inspeção externa (n.º 2 do art.º 51.º e n.º 2 do art.º

62.º do RCPITA). Esta notificação é fundamental para garantir rigor, certeza e segurança

jurídicas na determinação do termo do prazo de caducidade. Não obstante a continuidade

dos atos inspetivos e do procedimento de inspeção tributária, estes podem, nos termos da

lei (n.º 5 do art.º 36.º e art.º 53.º do RCPITA) ser suspensos. Porém, só a suspensão do

procedimento de inspeção tributária é que afeta o cômputo do prazo de caducidade. As

causas de suspensão da ação de inspeção são taxativas e só quando o procedimento de

inspeção for externo é que influenciam o prazo de caducidade aplicável aos tributos

incluídos no âmbito do procedimento inspetivo.

Em face do instituto jurídico da suspensão, facilmente se compreende que, verificando-se

esta em relação ao prazo do procedimento inspetivo externo, o cômputo dos seis meses não

pode ser feito de forma contínua, não podendo deixar de relevar para o efeito a duração da

suspensão das circunstâncias previstas no n.º 5 do artigo 36.º do RCPITA. Porém,

nalgumas decisões a jurisprudência assim não considerou, tendo inclusive fixado doutrina

em sentido diverso. Como nota desta corrente jurisprudencial refere-se o acórdão do

Supremo Tribunal Administrativo (STA), proferido no processo n.º 0346/14, datado de

17.06.2015, em que se firmou jurisprudência a prescrever que “[o] procedimento de

derrogação de sigilo bancário insere-se na ação inspetiva externa sendo um

subprocedimento daquela e não revestindo quanto a ela autonomia. Por tal razão a

suspensão para conclusão do procedimento de inspeção por força da interposição do

recurso com efeito suspensivo em processo especial de derrogação do sigilo bancário

prevista no n.º 5 do artigo 36.º do RCPITA não tem a virtualidade de alargar o prazo de

suspensão da caducidade do direito à liquidação motivado pela inspeção externa”. Em face

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desta jurisprudência, de modo a proteger o interesse público, o legislador optou por alterar

o normativo do n.º 1 do artigo 46.º da LGT e, através do artigo 228.º da Lei n.º 42/2016, de

28 de dezembro – Orçamento do Estado para 2017 – aditou naquela norma um segmento a

estabelecer que o lapso temporal de seis meses correspondente à duração da ação de

inspeção é “acrescido do período em que esteja suspenso o prazo para a conclusão do

procedimento de inspeção”.

As regras para determinação da caducidade do direito à liquidação dos tributos têm

beneficiado de entendimentos consensuais e pacíficos, quer por parte da Administração

Tributária, quer por parte dos Tribunais Tributários. Todavia, nos últimos tempos têm

surgido algumas posições jurisprudenciais que são suscetíveis de gerar alguma

controvérsia. É evidente que os Tribunais Tributários são órgãos de soberania (art.º 202.º

da CRP) e as suas decisões são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e

prevalecem sobre as de qualquer outras autoridades (n.º 2 do art.º 205.º da CRP). Sem

embargo desta caracterização das decisões dos tribunais, numa sociedade democrática,

moderna, robusta, saudável e evoluída, tais decisões não podem deixar de ser alvo de

reflexão e de críticas, designadamente, quando o seu sentido normativo se afastar da letra,

do mens legislatoris, e entrem em colisão com a unidade do sistema jurídico. De modo a

exemplificar uma dessas situações faz-se referência ao acórdão do Tribunal Central

Administrativo do Norte (TCAN), tirado no processo n.º 02143/15.7BEPRT, datado de

16.02.2017, em que a jurisprudência que se fixou afirma que “[o] prazo de caducidade do

direito à liquidação é, em regra, de quatro anos contados, nos impostos periódicos, a partir

do termo do ano em que se verificou o facto tributário. Tal prazo suspende-se com a

notificação ao contribuinte de início de ação inspetiva externa, mas esse efeito suspensivo

cessa caso esta ultrapasse o período de seis meses contados a partir daquela notificação. O

procedimento de derrogação de sigilo bancário insere-se na ação inspetiva externa sendo

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um subprocedimento daquela e não revestindo, quanto a ela, autonomia. Não pode, por

isso, erigir-se a causa prejudicial prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 46.º da LGT, para

suspensão da caducidade do direito à liquidação”. Esta decisão jurisprudencial não acolhe

a nossa concordância, porquanto, coloca em crise alguns aspetos fundamentais, desde logo

dá por adquirido que a derrogação do sigilo bancário ocorre exclusivamente na ação de

inspeção externa, o que, na verdade, não é exatamente correto. A lei apenas impõe que tal

procedimento se verifique no âmbito de procedimento de inspeção tributária, podendo este

ser de natureza interna. Por outro lado, entende que o procedimento de derrogação de sigilo

bancário não é autónomo da ação de inspeção. A ser assim, como entender que a decisão

do Diretor-geral da AT que determinar a derrogação do sigilo bancário seja direta e

autonomamente sindicável (n.º 5 do art.º 63.º-B da LGT e art.º 146.º-B do CPPT). É certo

que a finalidade da derrogação do sigilo bancário é o apuramento da situação tributária, e

no caso do sujeito passivo da relação jurídica tributária, o efeito do recurso judicial é

meramente devolutivo. Há que sublinhar, desde já, que este efeito devolutivo apenas é

relevante no tocante ao acesso aos documentos bancários e financeiros, pelo que, mesmo

que o contribuinte interponha recurso judicial para sindicar a legalidade da decisão, a AT

tem acesso imediato aos dados e documentos bancários e pode praticar os atos inspetivos,

razão pela qual o legislador não incluiu esta situação no n.º 5 do artigo 36.º do RCPITA. O

n.º 5 do artigo 36.º do RCPITA apenas contempla situações em que a AT está

objetivamente impedida de praticar atos administrativos, de natureza inspetiva ou não, no

procedimento de inspeção tributária. Contudo, uma vez apresentado recurso judicial pelo

sujeito passivo, em nossa opinião, o prazo de caducidade tem de se considerar suspenso ao

abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 46.º da LGT. Este recurso configura uma ação judicial

em que está latente um “litígio judicial de cuja resolução dependa a liquidação do tributo”

e a prová-lo está o facto do legislador na norma do n.º 6 do artigo 63.º-B da LGT ter

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estabelecido que “[n]os casos de deferimento do recurso previsto no número anterior (n.º 5

do art.º 63-º B da LGT), os elementos de prova entretanto obtidos não podem ser utilizados

para qualquer efeito em desfavor do contribuinte”.

Em face desta norma é inequívoca a vontade do legislador de que, enquanto não existir

decisão com trânsito em julgado proferida em sede de recurso judicial interposto contra a

decisão do Diretor-geral da AT que determinou a derrogação do sigilo bancário, e não

obstante os atos inspetivos tenham sido todos praticados, o procedimento inspetivo não

pode ser concluído, uma vez que os elementos de prova obtidos pela AT ainda não podem

ser utilizados. Esta vontade do legislador faz sentido e está ancorada no normativo da

alínea a) do n.º 2 do artigo 46.º da LGT, porque a não conclusão do procedimento inspetivo

impõe que o prazo de caducidade se encontre suspenso desde a interposição da ação

judicial até ao trânsito em julgado da decisão nela proferida, ainda que por via de recurso

jurisdicional. A não ser assim, a não utilização dos meios de prova e respetiva conclusão

do procedimento de inspeção tributária conduziria à caducidade do direito à liquidação. O

legislador conhece os efeitos negativos desta circunstância para o interesse público pelo

que não os pode ter desejado, bem como, ao inserir no artigo 63.º-B da LGT a norma do n.º

6 não pode ter pretendido que ela seja letra morta e alvo de violação, em absoluto

desrespeito pelos interesses do contribuinte. Deste modo, em face da norma do n.º 1 do

artigo 9.º do Código Civil, e porque a unidade do sistema jurídico é fundamental num

Estado de Direito, tem de se considerar que o prazo de caducidade está suspenso nos

termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 46.º da LGT, sempre que o sujeito passivo da relação

jurídica tributária interpuser recurso judicial contra a decisão de derrogação do sigilo

bancário. A não ser assim, e visto que não existiria qualquer outra suspensão do prazo de

caducidade, a AT teria de concluir o procedimento de inspeção tributária violando de

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forma grosseira a norma do n.º 6 do artigo 63.º-B da LGT e, concomitantemente, os

princípios da legalidade, da proteção da confiança, da certeza e da segurança jurídicas.

A jurisprudência firmada nos tribunais é uma fonte de conhecimento e de aprendizagem,

não só pelos ensinamentos recolhidos através da aplicação do direito ao caso concreto, mas

outrossim, porque proporciona a reflexão sobre diferentes perspetivas de análise e de

integração normativa, bem como abre novos caminhos de reflexão crítica. E esta

proporciona a evolução das decisões jurisprudências na incessante busca da melhor

interpretação da lei e da boa aplicação do direito, permitindo que da composição dos

litígios resulte equilíbrio entre os interesses conflituantes com vista à realização da justiça.

2.3 A AUSÊNCIA DE CADUCIDADE NA AUTOLIQUIDAÇÃO E NA RETENÇÃO

NA FONTE

A caducidade do direito à liquidação pressupõe que o ato de liquidação seja da

responsabilidade do sujeito ativo da relação jurídica tributária, o qual através de um órgão

competente tem de efetuar as operações administrativas de quantificação e liquidação do

tributo, bem como a sua válida notificação. O ato de liquidação é, portanto, um ato

administrativo que tem de ser praticado por um órgão competente e tem de integrar os

requisitos materiais e formais estabelecidos na lei. A eficácia do ato de liquidação depende

da sua válida notificação (n.º 6 do art.º 77.º da LGT), bem como a sua validade exige uma

adequada fundamentação nos termos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 77.º da LGT. A sua

notificação, quanto à substância, tem de obedecer às regras estabelecidas no n.º 2 do artigo

36.º do CPPT e quanto à forma às regras previstas nos artigos 38.º e 39.º do CPPT. O ato

de liquidação descrito pode ser denominado como uma liquidação administrativa em

contraponto à liquidação ou apuramento do imposto realizado pelo contribuinte ou outro

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obrigado tributado, que é designado por autoliquidação ou retenção na fonte. Nesta

situação não existe um ato administrativo de liquidação, existe sim, é um ato voluntário de

entrega do imposto nos cofres do credor tributário, realizado pelo próprio sujeito passivo

da relação jurídica tributária ou contributiva ou pelo substituto tributário. O artigo 20.º da

LGT estabelece que “[a] substituição tributária é efetivada através do mecanismo da

retenção na fonte do imposto devido”, ou seja, por imposição legal, a prestação tributária é

exigida a pessoa diferente do contribuinte.

Na autoliquidação é o contribuinte que procede ao apuramento da matéria tributável, efetua

a operação de liquidação e, nos termos da lei, entrega o imposto nos cofres do Estado. Sem

prejuízo das respetivas especificidades, é esta situação que se regista no IRC, no IVA, nas

contribuições e quotizações da Segurança Social e noutros tributos, como por exemplo,

nalguns casos no imposto do selo.

Quando o contribuinte ou obrigado tributário procede à entrega da declaração – declaração

de rendimentos, declaração de remunerações mensal, declaração periódica ou declaração

de remunerações, e não entrega ao credor tributário o tributo autoliquidado ou retido na

fonte, os serviços competentes não procedem à realização de qualquer ato de liquidação

administrativa, ao invés, procedem à extração das certidões de dívida para instauração dos

processos de execução fiscal para efeitos de cobrança coerciva dos tributos em dívida (n.º 2

do art.º 15.º do Decreto-Lei n.º 492/88, de 30 de Dezembro, n.º 6 do art.º 27.º do CIVA e

art.º 186.º do Código Contributivo).

Se as declarações não forem apresentadas são efetuadas liquidações oficiosas nos termos

da lei. Estas liquidações têm na sua base pressupostos ou fundamentos específicos, mas

formalmente podem ser caracterizadas como liquidações administrativas, materializadas

num ato administrativo que carece de fundamentação e de notificação válida.

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2.4 PRAZO DE CADUCIDADE NA SEGURANÇA SOCIAL

Os tributos da Segurança Social têm for finalidade financiar o sistema previdencial da

segurança social, classificando-se como tributos parafiscais, cuja liquidação é da

responsabilidade dos contribuintes, pessoas singulares ou coletivas e entidades equiparadas

a estas, que desenvolvam ou proporcionem o exercício de uma atividade profissional ou

económica. O sistema de liquidação e pagamento destes tributos é a autoliquidação e a

retenção na fonte, podendo, nos termos do artigo 40.º do Código contributivo, ocorrer o

suprimento oficioso em caso de falta ou insuficiências das declarações de remuneração.

Na sua sistematização, o Código Contributivo não contém qualquer normativo a regular o

instituto da caducidade do direito à liquidação, apenas integra normas referentes ao

instituto da prescrição do direito à cobrança dos tributos. A ausência de regras jurídicas

referentes à caducidade do direito à liquidação tem conduzido a que alguns órgãos da

Segurança Social e alguns autores tenham assumido a defesa de que aos tributos da

Segurança Social não se aplica a figura da caducidade, invocando que a inexistência de

normas sobre a matéria no ordenamento jurídico da Segurança Social, designadamente no

Código Contributivo, encerra de forma inequívoca ter sido essa a vontade do legislador.

Contra esta perspetiva, outros autores defendem posição contrária, argumentando que, por

força da norma da alínea a) do artigo 3.º do Código Contributivo, a LGT se aplica

subsidiariamente à relação jurídica contributiva. Nesta medida, as normas da LGT que

regulam a caducidade do direito à liquidação serão aplicáveis à Segurança Social,

designadamente, nos casos de suprimento oficioso (art.º 40.º do Código Contributivo) e nas

situações em que os tributos sejam liquidados na sequência de ações de fiscalização. É esta

mesma posição que tem vindo a ser perfilhada pela jurisprudência dos Tribunais

Tributários, pelo que a título de exemplo se refere o acórdão do STA, tirado no processo

n.º 01481/13, de 26.02.2014, em que se determina que “[n]estas situações a inscrição e a

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declaração de remunerações bem como o cálculo das contribuições que lhe correspondam,

efetuados oficiosamente pela Segurança Social, com base em elementos de prova obtidos,

designadamente, no âmbito de ações de fiscalização ou de inspeção, constituem um

verdadeiro ato administrativo declarativo de liquidação de um tributo. Sendo assim, ao

direito de liquidar tais contribuições é aplicável, por força do disposto nos artigos 1.º, 2.º e

3.º da Lei Geral Tributária, o regime de caducidade do direito à liquidação previsto no art.º

45.º do mesmo diploma legal, uma vez que o regime específico das quotizações e

contribuições à Segurança Social não fixa um prazo especial de caducidade do direito de

liquidação”.

3. A PRESCRIÇÃO DO DIREITO À COBRANÇA DOS TRIBUTOS

A prescrição determina o prazo que o credor tem para exercer o direito à cobrança do seu

crédito. No ordenamento jurídico tributário a prescrição é de conhecimento oficioso (art.º

175.º do CPPT) ao contrário do que acontece no Código Civil (art.º 303.º) no âmbito do

qual a prescrição tem de ser invocada pelo interessado. Completada a prescrição, tem o

beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por

qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (art.º 304.º do Código Civil).

As dívidas tributárias não deviam prescrever visto que os princípios do Estado de Direito

impõem um dever fundamental de pagar impostos. Em função da respetiva capacidade

contributiva, todos devem contribuir para o erário público, por forma a que este faça face

às necessidades financeiras do Estado e de outras entidades de direito público. Com efeito,

como refere Nabais (1998:451) “(…), o pagamento dos impostos, enquanto condição da

existência e funcionamento do Estado, é da responsabilidade de todos os cidadãos

independentemente da utilidade ou benefício auferido (…)”.

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As ações que consubstanciem atos de fraude e de evasão fiscais são eticamente

condenáveis e alvo de penalização criminal ou contraordenacional. Contudo, a vida em

sociedade é regulada pelo direito, o qual estabelece regras de ordenamento jurídico,

económico e social, no sentido de garantir a convivência harmoniosa, integrativa, inclusiva

e pacífica. Daí que, não obstante os fins do sistema fiscal, o legislador tenha estabelecido

um prazo para o credor exercer o direito à cobrança do crédito. A evolução da sociedade,

em termos económicos, tecnológicos e meios de informação, tem levado o legislador a

reduzir os prazos de prescrição das dívidas tributárias. Este prazo foi de vinte anos até 30

de junho de 1991, entre 1 de julho de 1991 e 31 de dezembro de 1998, o prazo de

prescrição foi de dez anos, e a partir de 1 de janeiro de 1999, o prazo de prescrição das

dívidas tributárias passou a ser de oito anos. A sucessão destes prazos no tempo fez-se nos

termos previstos no artigo 297.º do Código Civil.

O conceito de tributo está fixado no artigo 3.º da LGT, e não obstante a diversidade das

espécies tributárias que o integram, é possível identificar alguma coexistência e

proximidade na finalidade das diversas receitas tributárias que emergem dos diversos

tributos, quer estes sejam estaduais, regionais ou locais, e ainda, segundo outra

classificação, fiscais ou parafiscais. Desde logo, o seu titular é uma pessoa ou entidade de

direito público. Nesta medida, é pouco compreensível que no acervo jurídico integrante do

ordenamento jurídico tributário e da Segurança Social existam três regimes de prescrição

para receitas, que, embora tenham na sua base pressupostos diferentes, todas emergem de

tributos. O artigo 48.º da LGT estabelece o prazo e o regime de prescrição para as dívidas

fiscais e os demais tributos, que não sejam tributos locais, visto que para estes o regime da

prescrição, embora o prazo também seja de oito anos, consta do artigo 15.º do RGTAL,

aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro. O regime de prescrição dos tributos –

contribuições e quotizações – da Segurança Social consta do artigo 187.º do Código

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Contributivo, o qual estabelece um prazo de cinco anos. São três regimes diferentes, ainda

que tenham regras ou aspetos comuns e coincidentes. Uma vez que está em causa o prazo

para exercer o direito à cobrança de tributos que são devidos por contribuintes, pessoas

físicas ou jurídicas, que exercem uma atividade profissional ou económica, ou, então, são

apenas cidadãos, afigura-se nos que o regime de prescrição destas dívidas de natureza

tributária poderia obedecer a um regime de prescrição uniforme. Esta hipótese seria,

seguramente, integradora e de enormes vantagens, quer para os devedores, quer para os

credores, porque não só potenciaria a simplificação do sistema, bem como, permitiria

certeza, segurança, eficácia e clareza no cômputo do prazo, na determinação e

reconhecimento da prescrição.

Não fazemos a apologia da prescrição, antes pelo contrário, entendemos que as obrigações

tributárias têm de ser cumpridas, sendo que a responsabilidade da cobrança dos tributos

pertence ao sujeito ativo da relação jurídica tributária. Nesta medida, e visto que o Estado

detém uma máquina de cobrança coerciva extremamente eficaz e célere, afigura-se-nos que

a prescrição só deve ocorrer nas situações em que o devedor não possua rendimentos ou

bens patrimoniais que, nos termos da lei, possam ou devam responder pelas dívidas

tributárias. Com efeito, pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do

devedor suscetíveis de penhora (art.º 601.º do Código Civil), podendo estes, de acordo com

a lei substantiva, ser objeto de execução, que pode ser extensiva não só aos bens do

devedor originário, mas, outrossim, a bens de garantes ou de terceiro (art.º 735.º do Código

de Processo Civil (CPC)). As dívidas de tributos são cobradas através do processo de

execução fiscal, o qual se caracteriza pela simplicidade, celeridade e eficácia, devendo, nos

termos do artigo 117.º do CPPT, estar extinto no prazo de um ano contado da sua

instauração, salvo causas insuperáveis, devidamente justificadas. Ora, os prazos de

prescrição previstos nas leis tributárias são todos muito superiores àquele prazo de um ano.

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Nesta medida, se os devedores forem titulares de rendimentos, de bens ou de direitos é

incompreensível que as dívidas prescrevam. E quando os devedores adotem

comportamentos ou medidas tendentes a frustrar a cobrança dos créditos tributários, os

credores poderão (devem) acionar os instrumentos previstos na lei (art.º 88.º do Regime

Geral das Infrações Tributárias e art.º 610.º do Código Civil) - ação criminal e impugnação

pauliana - adequados para sancionar aquelas condutas.

O ordenamento jurídico tributário e da Segurança Social estabelece prazos de prescrição,

os quais são acompanhados de causas de suspensão e de interrupção, que são eficazes não

só em relação aos devedores originários, mas também em relação aos responsáveis

solidários e subsidiários (n.º 2 do art.º 48.º da LGT), cuja aplicação determina que o prazo

real de prescrição seja, em regra, muito superior ao prazo de prescrição legal estabelecido

na lei.

Importa salientar que a prescrição das dívidas tributárias visa sancionar a inércia do

devedor quando este tem condições jurídicas para exercer o respetivo direito e não o faz.

Podendo o credor tributário acionar todos os procedimentos conducentes à realização da

cobrança, é inaceitável que não o faça em tempo útil e juridicamente eficaz. Esta inação do

devedor não é justificável numa sociedade moderna, civilizada e justa, pelo que a

prescrição apenas é compreensível, e foi para isso que o legislador a estabeleceu, quando o

devedor não beneficia de bens ou rendimentos, visando, neste caso, a prescrição a

possibilidade do devedor tributário ser reintegrado na sociedade, refazendo a sua vida

pessoal, profissional ou empresarial, num contexto de paz social e de harmonia

sociológica. Longe vão os tempos em que os devedores eram presos ou o seu cadáver era

penhorado para obrigar os familiares a satisfazer a obrigação creditícia. Talvez com

prejuízo dos credores, a sociedade de hoje é mais humanizada e muito mais inclusiva em

termos económicos e sociais. Nesta linha de raciocínio Sousa (2008:18) refere que “(…),

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no direito tributário, a necessidade de segurança ou certeza jurídica é o fundamento comum

de ambos os institutos. Na verdade, subjacente ao estabelecimento de um regime de

conhecimento oficioso da prescrição, está o entendimento de que o interesse ou certeza

jurídica deve prevalecer sobre o interesse patrimonial do credor tributário”.

3.1 REGIMES DE PRESCRIÇÃO DOS TRIBUTOS

É errado pensar que o prazo de prescrição só tem início em momento posterior à

notificação do ato de liquidação do tributo. O ato de liquidação, a sua notificação ou o

prazo de pagamento voluntário é irrelevante para o termo inicial do prazo de prescrição. O

regime jurídico da prescrição das dívidas tributárias consta do artigo 48.º da LGT, e

afirmamos, desde já, que o início do prazo de prescrição é absolutamente coincidente com

o início do prazo de caducidade do direito à liquidação dos tributos. Com efeito, a análise

comparativa do n.º 4 do artigo 45.º com o n.º 1 do artigo 48.º da LGT leva-nos a essa

conclusão.

As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos.

Para determinar o termo inicial do prazo de prescrição, o legislador adotou o critério que

classifica os impostos em periódicos e de obrigação única, e estabeleceu uma exceção para

o IVA e para os impostos sobre o rendimento quando a tributação for efetuada por retenção

na fonte a título definitivo. Em relação a estes o prazo de prescrição conta-se a partir do

início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do

imposto ou o facto tributário. Nos impostos periódicos, o prazo conta-se a partir do termo

do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da

data em que o facto tributário ocorreu. Portanto, o momento determinante para o início do

prazo de prescrição é aquele em que ocorre o facto tributário e, no caso do IVA, a

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exigibilidade do imposto. Qualquer um destes factos verifica-se muito antes da realização

da liquidação ou do apuramento do imposto.

Para determinar a prescrição das dívidas tributárias é necessário conhecer o prazo

aplicável, o seu termo inicial, bem como verificar da existência ou não de causas de

suspensão e de interrupção. A correta determinação ou identificação do termo final do

prazo de prescrição implica a consideração de todas estas variáveis.

As dívidas por taxas às autarquias locais prescrevem no prazo de oito anos a contar da data

em que o facto tributário ocorreu (art.º 15.º do RGTAL). O regime de prescrição destas

dívidas tributárias assenta na articulação do regime da LGT vigente até 31 de dezembro de

2006, isto é, o regime vigente antes das alterações introduzidas pela Lei n.º 53-A/2006, de

29 de dezembro, com o regime vigente no artigo 34.º do Código de Processo Tributário

(CPT)2.

As contribuições e quotizações devidas à Segurança Social prescrevem no prazo de cinco

anos a contar da data em que a obrigação deve ser cumprida. Ora, nos termos do artigo 40.º

do Código Contributivo a declaração é entregue até ao dia 10 do mês seguinte e o

pagamento efetuado até ao dia 20 (art.º 43.º do Código Contributivo). Assim, o prazo de

prescrição tem início no dia 21. Este dia consubstancia o termo inicial do prazo de

prescrição das contribuições e quotizações desde o mês de janeiro do ano de 2011. Com

exceção da data de início do prazo, que em vez do dia 21 era o dia 16, este regime de

prescrição corresponde ao que passou a vigor após a entrada em vigor da Lei de Bases da

Segurança Social, aprovada pela Lei n.º 17/2000, de 8 de agosto.

2 O Código de Processo Tributário teve vigência entre 1 de julho de 1991 até 31 de dezembro de 1999.

Todavia, o artigo 34.º foi revogado pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, diploma

que aprovou a LGT, tendo deixado de vigorar a partir de 1 de janeiro de 1999.

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3.2 SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO

Façamos agora a análise do regime das causas de suspensão e de interrupção do prazo de

prescrição. O legislador do Código Contributivo não estabeleceu no artigo 187.º causas

específicas de interrupção, optou por efetuar uma regulação genérica e abstrata e

determinar que a prescrição se interrompe pela ocorrência de qualquer diligência

administrativa realizada conducente à liquidação ou à cobrança da dívida, e da qual seja

dado conhecimento ao responsável pelo pagamento. É, portanto, admissível a ocorrência

de várias causas de interrupção para o mesmo prazo e a mesma dívida. Quanto à suspensão

remeteu em abstrato para os artigos 48.º e 49.º da LGT, aplicáveis à relação jurídica

contributiva por força da alínea a) do artigo 3.º do Código Contributivo.

O prazo de prescrição das dívidas por taxas às autarquias locais interrompe-se com a

citação, a reclamação e a impugnação. Porém, a paragem dos processos de reclamação,

impugnação e execução fiscal por prazo superior a um ano por facto não imputável ao

sujeito passivo faz cessar a interrupção da prescrição, somando-se, neste caso, o tempo que

decorrer após aquele período ao que tiver decorrido até à data da autuação, convertendo-se,

assim, a interrupção em suspensão.

O legislador estabeleceu no n.º 1 do artigo 49.º da LGT causas específicas de interrupção e

nos n.ºs 4 e 5 causas específicas de suspensão. A partir de 1 de janeiro de 2007, a

interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar (n.º 3

do art.º 49.º da LGT). Em face da atual celeridade do sistema de cobrança coerciva, em

regra, o facto interruptivo que ocorre em primeiro lugar é a citação do executado no

processo de execução fiscal.

O efeito jurídico destes institutos tem de ser recolhido do Código Civil (n.º 2 do art.º 11.º

da LGT). A suspensão determina que a prescrição não corra enquanto o titular do crédito

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estiver impedido de exercer o seu direito (n.º 1 do art.º 321.º do Código Civil),

circunstância que acontece quando se verificar algumas das situações previstas nos n.ºs 4 e

5 do artigo 49.º da LGT. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido

anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (n.º 1 do art.º

326.º do Código Civil). Estes são os únicos aspetos em que é necessário aplicar

subsidiariamente o Código Civil (al. d) do art.º 2.º da LGT), visto que em relação à restante

matéria existe regulamentação própria na LGT.

Não obstante ser de conhecimento oficioso (art.º 175.º do CPPT), a prescrição da dívida

tributária é fundamento de oposição judicial (al. d) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT) e,

quando o prazo da oposição já tiver precludido, ainda pode ser invocada perante o órgão da

execução fiscal através de requerimento atípico e a decisão deste, quando necessário,

objeto da reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT. Para determinar a prescrição da

dívida tributária torna-se necessário equacionar: i) o prazo de prescrição aplicável; ii)

identificar o facto interruptivo relevante; iii) verificar da existência ou não de causas de

suspensão. Só a consideração de todas estas variáveis é que permite fazer de forma correta

o cômputo do prazo, com vista a determinar ou não a prescrição da dívida tributária.

3.3 A POSIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA

Os Tribunais Tributários Superiores têm vindo a firmar sobre a prescrição das dívidas

tributárias uma jurisprudência que é suscetível de colocar em crise os princípios do Estado

de direito, designadamente, os princípios da legalidade, da certeza e da segurança jurídicas.

O entendimento dos tribunais assenta na necessidade de aplicar o normativo do n.º 1 do

artigo 327.º do Código Civil, do qual decorre que “[s]e a interrupção resultar de citação,

(…), o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a

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decisão que puser termo ao processo”. As decisões jurisprudenciais do STA ou dos TCA

são múltiplas, a título de exemplo faz-se referência ao acórdão do STA, tirado no processo

n.º 01060/16, datado de 19.10.2016, no qual se estabelece que “[a] interrupção da

prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art.º 49.º da LGT) inutiliza para a

prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou esse facto interruptivo (n.º 1 do

art.º 326.º do CCivil) e obsta ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto

o processo não findar (nº 1 do art.º 327.º do CCivil)”, e ainda o acórdão do Tribunal

Central Administrativo do Sul (TCAS), proferido no processo n.º 07038/13, datado de

04.02.2016, em que se decidiu que “[i]nterrompido o prazo de prescrição pela citação fica

inutilizado todo prazo decorrido anteriormente (art.º 326.º, n.º 1 do Código Civil) sendo

que o novo prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art.º 48.º da LGT não começa

a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art.º 327.º,

n.º 1 do Código Civil)”.

Esta jurisprudência é incompreensível porque conduz a que nas dívidas tributárias só

haverá prescrição se o executado não for citado, dado que após a citação o prazo de

prescrição se interrompe e não começa a correr de novo enquanto o processo não tiver

termo. Ora, o processo de execução fiscal só pode ser extinto por pagamento, anulação ou

por prescrição da dívida. Se não há pagamento nem anulação da dívida o processo não tem

fim, e ficará ad infinitum a aguardar o seu termo, o que se traduz na inexistência de um

prazo de prescrição. Este entendimento viola os princípios do Estado de direito e coloca

em crise os princípios da boa-fé e da proteção da confiança.

Há que sublinhar que esta jurisprudência é claramente maioritária, mas deixou de ser

uniforme, porquanto no acórdão do STA, tirado no processo n.º 01121/16, de 23.11.2016,

foi lavrado por um juiz Conselheiro um voto de vencido do qual se faz uma breve menção,

em que se diz que “[o] art.º 327 do Código Civil não tem aqui aplicação seja porque não

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estamos em face de uma lacuna, seja porque o seu texto está vocacionado para relações

jurídico privadas em que o titular do direito carece de título executivo que obterá com a

sentença, situação muito diversa da que existe numa execução fiscal, em que o título é

emitido pelo credor - certidão de dívida”. (…) O art.º 49.º da Lei Geral Tributária apresenta

opções coerentes, expressas na sua letra, indicando os factos interruptivos no n.º 1, a

impossibilidade de quanto ao mesmo prazo de prescrição funcionarem dois factos

interruptivos, no n.º 3, tudo sem prejuízo de se verificarem um ou mais factos suspensivos

da prescrição, indicados no n.º 4, desde que determinem a suspensão da cobrança da

dívida. (…) Sendo as causas de suspensão do prazo de prescrição uma das garantias dos

contribuintes, quando referidas às relações jurídico-tributárias, estão estritamente

subordinadas ao princípio da legalidade tributária de reserva de lei formal, consagrado no

n.º 2 do art.º 103.º da Constituição da República, pelo que, acompanhando as palavras de

Benjamim Rodrigues, in “A Prescrição no Direito Tributário”, Problemas Fundamentais do

Direito Tributário, Vislis Editores, 1999, pp. 261 e 266, diremos que hão de elas englobar,

“(…) todo o critério de decisão ou de qualificação de quaisquer efeitos concernentes à

prescrição tem de constar da norma de tributação emitida nos sobreditos termos”,

incluindo, por conseguinte, “a enunciação das suas causas de interrupção ou suspensão”. A

interpretação das causas de suspensão expressas na sentença recorrida quanto à suspensão

do processo de execução após a citação do executado apresenta-se, pois, em meu entender,

ferida de inconstitucionalidade, por violação dos art.ºs. 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i),

da Constituição da República Portuguesa”.

Estamos em total acordo com a posição defendia neste voto de vencido e em absoluto

desacordo com a jurisprudência que tem vindo a ser firmada pelos Tribunais Tributários.

Com efeito, a nosso ver, tal jurisprudência enferma de erro doutrinário e de interpretação,

porquanto optou pela aplicação subsidiária do artigo 327.º do Código Civil, e, assim,

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entende que o efeito interruptivo da citação é duradouro e não instantâneo, como decorre

do artigo 326.º do Código Civil. Este artigo, é sim aplicável subsidiariamente ao regime da

prescrição das dívidas tributárias, mas o artigo 327.º não é, uma vez que, no artigo 49.º da

LGT, o legislador estabeleceu causas específicas de interrupção e de suspensão. Deste

modo, estando a matéria da suspensão do prazo de prescrição regulado na LGT não é

preciso aplicar subsidiariamente o artigo 327.º do Código Civil para obter a suspensão da

prescrição, a qual teria por resultado direto um efeito ad eaeternum, com consequências

ilegais e ao arrepio da vontade do legislador que tem sido, inequivocamente, no sentido de

reduzir o prazo legal de prescrição das dívidas tributárias.

4. CONCLUSÕES

O regime do direito à liquidação dos tributos está regulado no artigo 45.º da LGT e é

uniforme para todos os tributos, não obstante existirem vários prazos legais.

Existe um enorme consenso em torno das regras aplicáveis à determinação da caducidade

do direito à liquidação. Somente nos casos de ação de inspeção tributária externa e,

designadamente, nos casos de suspensão do prazo do procedimento de inspeção tributária

(n.º 5 do artigo 36.º do RCPITA) ou nas situações de derrogação do sigilo bancário ao

sujeito passivo, por ato administrativo do Diretor-geral da AT, é que se têm verificado

algumas inconsistências nas decisões jurisprudenciais.

A prescrição das dívidas tributárias depara-se com uma enorme complexidade, uma vez

que existem três regimes diversificados, um para as dívidas fiscais e demais tributos, um

para as taxas das autarquias locais e outro para os tributos da Segurança Social.

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As causas de interrupção das dívidas tributárias não são coincidentes com as das dívidas à

Segurança Social, beneficiando inclusive de regime diverso.

O regime de prescrição da Segurança Social quanto a causas de suspensão faz remissão

para o artigo 49.º da LGT e no artigo 15.º do RGTAL não estão previstas causas de

suspensão.

A jurisprudência optou por aplicar subsidiariamente ao regime das dívidas tributárias o

artigo 327.º do Código Civil, do qual decorre que o ato interruptivo gerado pela citação

tem efeito duradouro, o que determina a inexistência de prescrição das dívidas tributárias.

O artigo 327.º do Código Civil é inaplicável ao regime de prescrição das dívidas tributárias

visto que a matéria está especificamente regulada nas leis tributárias.

A aplicação do artigo 327.º do Código Civil viola os princípios do Estado de Direito, sendo

tal entendimento ilegal e inconstitucional.

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Ginocar Produções. Porto