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OSTEOPATIA EMARD TRIANCE OSTEOPATIA EDITORIAL EsTAmPA 1996

OSTEOPATIA · Web viewA osteopatia pratica-se há mais de 100 anos. Nos Estados Unidos da América, onde foi fundada, esteve integrada na medicina tradicional, e a maior parte dos

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OSTEOPATIAEMARD TRIANCE

OSTEOPATIA

EDITORIAL EsTAmPA

1996

AGRADECIMENTOS

Os meus agradecimentos a Howard

pela ajuda nas ilustrações.

FICHA TÉCNICA

Título original: Thorsons Introductory Guide to Osteopathy Tradução: Alice Telles

íNDICE

INTRODUÇÃO 91. HISTóRIA .............................................................................. 13

2. UM POUCO DE TEORIA ........................................................ 17

3. OBSERVAÇÃO OSTEOPÁTICA ............................................... 21

O esqueleto .......................................................................... 22 Os músculos .... .................................................................... 24 A superfície ........ ................................................................. 25 As fasciae ............................................................................ 25

4. LESõES OSTEOPÁTICAS ....................................................... 27

5. EFEITOS DA LESÃO OSTEOPÁTICA ...................................... 31

Dorso inferior ...................................................................... 33 Compressão de nervos ........................................................ 34 Plexo braquial .......................................................... . .......... 34 Circulação ............................................................................ 36 Danificação dos discos ....................................................... 37 Desgaste da articulação ...... ...........................................

..... 37 As vias nervosas ................................................................. 37

Articulação da anca ............................................................ 41 Outras articulações .............................................................. 44 Crianças ............................................................................... 45 Sintomas de tensão ............................................................. 45

6. POSTURA E MOVIMENTO ..................................................... 47

Ocupação ............................................................................. 48 Factores hereditários ........................................................... 49 Anomalias estruturais .......................................................... 53

7. AS FASCIAE E OS EFEITOS DA TENSÃO ............................... 59

Distorção pélvica ................................................................ 60 Células ................................................................................. 60 Distorções do pescoço ........................................................ 62

8. HOMOEOSTATIS ..................................................................... 65

9. DANIFICAÇõES DOS DISCOS ................................................ 69

Causas .................................................................................. 70 Estrutura dos discos ............................................................ 70 Alguns tipos de danificação dos discos ............................ 72

Aperto das

superfícies ................................................... 72 Discos comprimidos ....................................................... 74 Estreitamento do espaço do disco ................................ 74 Ligamentos em tensão ................................................... 75 Compressão das articulações (vertebrais) ..................... 76 Danos mais graves ......................................................... 76 Problemas de diagnóstico de lesões dos discos ................ 79 Tratamento de lesões discais .............................................. 81

10. TRATAMENTO ..................................................................... 8311. OSTEOPATIA CRANIANA .................................................... 91

12. PERSPECTIVA ACTUAL DA OSTEOPATIA ........................... 95

13. CASUíSTICA ........................................................................ 103

INTRODUÇÃO

A osteopatia pratica-se há mais de 100 anos. Nos Estados Unidos da América, onde foi fundada, esteve integrada na medicina tradicional, e a maior parte dos osteopatas são praticantes da medicina intensamente treinados, que fizeram os seus cursos em colégios universitários com grande simpatia pela filosofia osteopática. Depois da graduação podiam praticar como médicos de clínica geral, cirurgiões ou especialistas, fazendo-o ao lado dos que tinham estudado nas escolas ortodoxas, com a vantagem de poderem introduzir o tratamento osteopático, quando necessário. O paciente podia decidir se preferia um médico osteopata e tinha o direito de mudar de médico à vontade.

No Reino Unido, a osteopatia é praticada de um modo restrito, como alternativa à medicina tradicional. Os pacientes que procuram um tratamento osteopático nem sempre têm conhecimento de como é poderosa esta terapia alternativa e de como o seu campo de acção seestende muito para além de técnicas manipulativas destinadas ao tratamento de danos físicos menores. Milhares de pacientes receberam tratamento osteopático à margem do sistema médico ortodoxo, cujos profissionais têm na generalidade conhecimento das actividades osteopáticas mas preferem usar “antolhos” médicos.

Há cinquenta anos muita gente pensava que a osteopatia era um tratamento cujo instrumento fundamental eram as mãos, e que curava

o doente de uma forma misteriosa. Ao longo dos últimos vinte anos a imagem da osteopatia melhorou grandemente. Sob muitos aspectos, contudo, sofreu de uma excessiva divulgação de determinados aspectos da sua filosofia e prática, em detrimento de outros, completamente ignorados.

Muito pouca informação factual se publicou sobre os seus princípios, e, até certo ponto, os pacientes de hoje são deles mais desconhecedores do que aqueles que procuraram tratamento cinquenta anos atrás. A maior parte da publicidade dada à osteopatia está mesclada de informações sobre as suas formas de tratamento por manipulação e de perfis de osteopatas dados como “manipuladores de articulações”, com pouco interesse por algo que ultrapasse os problemas dos “discos intervertebrais”. Foi dada tanta ênfase a este tipo de classificação, que os pacientes ficaram muito surpreendidos ao teremconhecimento de que os osteopatas lidavam com variadas situações, tais como: enxaquecas, dores no peito e distúrbios gástricos. Muitos ficaram ainda mais surpreendidos ao saberem que as técnicas osteopáticas podem ser usadas como terapia de doenças funcionais como a insônia, a enxaqueca, a vertigem, a asma, a enterite, a colite ou a úlcera; de doenças originadas em distúrbios que afectam o fígado, a vesícula biliar ou o cólon; e ainda problemas cardíacos. O paciente britânico pensa que o osteopata é um médico que trata uma variedade muito grande de doenças. Em França, contudo, onde aprofissão de osteopata é muito recente, encontra-se normalmente umaabordagem mais consciente e os profissionais aplicam os princípios osteopáticos de um modo mais amplo. Estes aspectos não devem preocupar demasiado os pacientes em perspectiva, desde que saibam que há uma larga variedade de osteopatas, com especialidades diferentes, tendo uns, e outros não, o treino e a experiência necessários para lidar com os seus problemas específicos.

Em 1892, depois de trinta e seis anos de aplicação dos seus princípios, o fundador da osteopatia, Andrew Taylor StilI, afirmou: “A osteopatia está na sua infância.” Desde então desenvolveu-se e alargou o seu campo de acção, pelo esforço dos seus discípulos. Existe uma grande quantidade de material nos estabelecimentos de pesquisa10

osteopática, nos Estados Unidos, que confirma cientificamente os princípios da osteopatia e regista os sucessos clínicos da sua terapia.

É desejável que, fora dos Estados Unidos, os princípios osteopáticos sejam integrados naquilo que hoje se chama medicina tradicional e que o interesse emergente pelas “medicinas alternativas” seja o impulso para uma maior aceitação da importância das causas mecânicas da doença e da incapacidade. Este livro traça o perfil do fundador da osteopatia, Andrew Taylor StilI, conta as circunstâncias que o levaram a fundar uma Universidade de Osteopatia e a sua interpretação pessoal de alguns dos princípios osteopáticos. Fornece um pouco de explicação teórica e define o termo lesão osteopática, seus efeitos e tratamento, condição central das filosofias osteopáticas perante o binómío doença/saúde. Como este livro foi concebido para o paciente que necessita do tratamento osteopático, dá algumas indicações acerca do que pode esperar da consulta, e igualmente da espécie de tratamentos a serem administrados. Também contém a descrição do tratamento das lesões do ---disco intervertebral”, devido ao qual os osteopatas são agora famosos, e é aflorada sucintamente a questão da osteopatia craniana, a mais importante área de prática, para a qual só alguns profissionais estão preparados.

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HISTóRIA

Andrew Taylor Still nasceu na Virginia em 1828, filho de um pastor metodista. Ainda rapaz, teve experiências ocasionais de tratar doenças, porque o pai foi destacado para uma missão metodista, para índios, no Karisas. Inicialmente estudou engenharia durante cinco anos, mas, a seguir, entrou para a Escola de Médicos e Cirurgiões da Cidade de Karisas, por volta de 1855, tornando-se mais tarde cirurgião do exército e participante na Guerra Civil. As suas experiências médicas durante a guerra, combinadas com a perda trágica dos seus três filhos numa epidemia de meningite, provocaram-lhe a descrença nos tratamentos médicos ortodoxos e levaram-no a questionar-lhes o valor.

Para perspectivar correctamente a fundação da osteopatia temos que compreender qual o estado da prática da medicina num país tão vasto como a América do Norte, cem anos atrás. Praticamente não havia drogas em lado nenhum com um efeito específico sobre a doença, como o ferro para o tratamento da anemia ou o quinino para a malária, e poucas drogas tinham efeito significativo no alívio dos sintomas. Muitas vezes eram injectadas de um modo acidental, e o uso de sanguessugas, sangrias e purgantes com mercúrio era ainda prática comum. A cirurgia era ainda um negócio sangrento e brutal, e anestésicos como o éter e o óxido nitroso eram modernas inovações. O que13

o Dr. Still se sentiu impelido a fazer foi encontrar uma forma mais compassiva de lidar com os problemas médicos e procurar uma alternativa à medicamentação indiscriminada dos pacientes. A sua preparação académica de engenheiro compelia-o a encontrar razões lógicas para a administração de tratamentos médicos, e a sua capacidade de observação e argumentação conduziram-no a um desapontamento sério relativamente à prática da medicina. Receitas passadas ao acaso não constituíam terreno onde se pudessem prever resultados de modo exacto, e as suas observações dos falhanços médicos no tratamento da doença, em casos visivelmente simples nos quais eram usados osmelhores cuidados médicos existentes, conduziram-noà renúncia do uso de drogas.

Tivesse ele vivido actualmente e não teria sentido tão apaixonadamente a questão de como encontrar e utilizar as drogas. Mas preparações como a insulina para a diabetes, ou o salvarsan para a sífilis, não tinham ainda sido descobertas, e é fácil compreender as razões da sua pesquisa de um método alternativo. O método vulgar de tratamento da pneumonia incluía a aplicação de sacos quentes, administração de morfina, whisky, digitalina ou estricnina. Ele descobriu que a aplicação exclusiva de métodos manuais era notavelmente mais eficiente numa muito alta percentagem de casos.

Em 1874 começou a usar as técnicas manuais, que denominou de osteopatia, em conjunção com a cirurgia, e adquiriu uma prática muito grande, tornando-se famoso pelos bons resultados conseguidos. Dezoito anos mais tarde, tendo provado que estas técnicas eram infinitamente mais eficientes que os tratamentos existentes, fundou a primeira Escola de Medicina Osteopática em Klrksville, Missuri. Foi então que se desenvolveram e multiplicaram as escolas osteopáticas, paralelamente às escolas de medicina tradicional, e que se ensinaram novos métodos de cirurgia, obstetrícia e tratamentos da doença, na sua generalidade”. Os licenciados nestas escolas estavam habilitados em todas as disciplinas médicas, mas usavam as técnicas osteopáticas sempre que possível, de preferência a qualquer outro tratamento, porque tinham sido educados numa perspectiva osteopática. É importante afirmar que o Dr. Still não pôs de parte toda a teoria médica mas procurou uma nova abordagem do tratamento da doença, com ênfase

para as causas mecânicas. O seu amigo e camarada na criação da primeira escola foi um cirurgião de Edimburgo, que, como ele, acrditava ser necessário realizar operações para reparação e correcção das condições que impediam as funções normais do corpo doente. Contudo, ele não poderia realizar uma operação como a ablação das amígdalas, a menos que estivesse convencido de que isso era absolutamente preciso e de que essa condição não era uma mera manifestação de doença no indivíduo como um todo.

Nos Estados Unidos um osteopata moderno faz um curso completo de medicina. Na maior parte dos estados, o seu diploma é equivalente ao de um médico tradicional ou ao de um cirurgião. Hoje há sete universidades osteopáticas, centenas de hospitais osteopáticos e milhares de médicos osteopatas. Muitos médicos osteopatas são clínicos gerais e, embora tenham a mesma visão da prática médica que os médicos tradicionais, dão uma grande ênfase à importância das mecânicas normais do corpo e às filosofias do Dr. StilI, nos aspectos do diagnóstico e do tratamento.

Fora dos Estados Unidos, os osteopatas não têm a mesma qualificação médica e algumas universidades só com muita tenacidade puderam sobreviver ao domínio das escolas médicas tradicionais. Se não fosse a “Common Law”, no Reino Unido, seria improvável que a osteopatia tivesse podido desenvolver-se antes dos anos 40. A sua prática nos países da Comunidade Europeia ainda muito recentemente era ilegal. Embora, noutros países que não os Estados Unidos, os osteopatas estudem por um período longo e lhes sejam exigidas altas qualificações, quer para a admissão quer para os exames finais, as suas universidades são pequenas e não dã o acesso a um completo treino médico. Só os profissionais que se tornaram osteopatas qualificados depois de concluírem o curso de medicina tradicional têm o mesmo statu que os seus homólogos americanos. Consequentemente, os osteopatas ficam restringidos à prática privada e trabalham como independentes. Ficam inevitavelmente limitados nalgumas áreas potenciais do seu trabalho, mas, ainda assim, podem dar ajuda inestimá vel num amplo leque de doenças. Que tenham sobrevivido e se tenham distinguido por levar alívio a milhões de pacientes é a prova da autenticidade de grande parte da teoria do Dr. Stili.

UM POUCO DE TEORIA

A pesquisa alternativa, que o Dr. Still seguiu quando fundou aprimeira escola osteopática, foi sem dúvida influenciada pela suaexperiência de juventude como estudante de engenharia. Apresentava frequentemente os seus trabalhos com uma terminologia própria da engenharia, usando analogias constantes com a máquina a vapor, recentemente inventada. Muito do que escreveu foi frequentemente ridicularizado fora da América, e os seus escritos ainda são citados erradamente, quando tomados fora do contexto. Contudo, a sua intuição e a sua capacidade intelectual conduziram-no a fazer avaliações de aspectos científicos que só hoje estão a ser demonstrados.

Confere ao papel da natureza na saúde e na doença o seu exactovalor, demonstrando que um bom médico deve saber como ajudar anatureza na manutenção ou na construção das forças homeo-estáticas que conduzem à saúde. Há três princípios básicos que considerou fundamentais e que são válidos ainda hoje:

1. O corpo normal saudável contém em si mesmo o mecanismo de defesa e de reparação dos estragos causados pelos traumas, infecções ou outros agentes tóxicos.17

2. O corpo é uma unidade, e uma estrutura ou uma função anormais numa das suas partes exercem uma influência igualmente anormal noutras partes.

3. O corpo pode funcionar melhor, na defesa ou na reparação, quando está na plenitude da sua mobilidade e flexibilidade estruturais.

Que o corpo cria as defesas contra a doença é agora um facto indiscutível. Sabemos hoje, por exemplo, que estudos científicos do sistema linfático confirmaram a sua função na defesa contra a infecção, e esta resistência é a reacção normal das células vivas saudáveis para destruírem os germes e os micróbios, que apenas se tornam virulentos quando encontram um estado doentio ou subvital no sangue ou nos tecidos em que podem reproduzir-se.

O Dr. Still ensinou aos seus alunos que o corpo produz a sua defesa da vida e as suas substâncias de cura. Hoje poderíamos denominar este conceito como biológico. Talvez devamos atentar nas próprias palavras do Dr. Still sobre o assunto:

... que todos os remédios necessários à saúde existem no corpo humano emtal condição que eles mesmos podem associar-se uns aos outros e aliviar o aflito.

O corolário da ideia do corpo como tendo os seus próprios mecanismos de defesa é regra geral; a doença desenvolve-se quando as defesas estão enfraquecidas e quando esta fraqueza é acentuada, entre outras coisas, por um corpo que está mecanicamente mal.

Quando confrontado com a doença, o Dr. Still parava e examinava o paciente como um todo. Abandonou a prática usual de tratar ossintomas sem se esclarecer sobre as suas causas.

Inevitavelmente, tomando em consideração a pessoa inteira e investigando todos os seus problemas, começou a partir de uma avaliação da sua estrutura básica, nomeadamente do esqueleto. Examinava tudo: altura, peso, postura, idade, comportamento e locomoção, deformidades congénitas, desenvolvidas ou resultantes de acidentes, e a amplitude do movimento de cada articulação. Depois examinava os músculos e os ligamentos que mantêm o esqueleto unido: o seu com-18

primento, tónus, condição geral, qualquer evidência de desgaste, qualquer flacidez ou espasmo. Estava muito atento à acção dos músculos como alavancas do corpo e à sua actuação como suporte das articulações. A seguir, o seu exame incluía os tecidos de ligação que localizava onde era possível, por profunda e delicada procura com os dedos. O exame incluía o que denominamos fascia. As fasciae consistem em faixas ou camadas de tecidos fibro-elásticos que envolvem o corpo inteiro, sob a superfície da pele. Formam múltiplos revestimentos que alojam os músculos, os órgãos e os nervos. Deve ser dada atenção especial a algumas áreas, como o pescoço, onde as tensões podem ser facilmente localizadas em determinadas fasciae. Durantea sua observação, o Dr. Still examinava a maior parte das vezes osórgãos internos, tais como o estÔmago e o fígado, actuando da mesmaforma que os médicos fora-de-moda de outrora, procurando indícios da doença através do corpo inteiro e identificando assim os problemas físicos. O Dr. Still realçava assim a importância dum exame completo:

É necessário que possuas a atenção do engenheiro, porque para ele um facto é uma verdade.

Argumenta com inteligência. Pára sempre nos pontos doentes, quer sejam músculo ou osso. Tira a tua conclusão indo à causa que produziu a condição anormal, partindo da causa de fricção que produziu a aderência do osso, a doença do osso, a inflamação e a doença da carne...

e, noutra ocasião, disse:

... se um mecânico é tão atento na inspecção de cada parte, sobretudotratando-se de uma máquina a vapor, para poder obter bons resultados, podereis vós, como engenheiros, esquecer um osso do corpo e proclamar-vos como verdadeiros engenheiros? Podereis dizer que cada parte não tem fisiologicamente importância no motor da vida? Lembrai a vossa responsabilidade no quarto do doente. Ou raciocinais ou falhais.

Este tipo de abordagem tem hoje o nome de holismo.O conceito do Dr. Still sobre a resistência do corpo aos padecimentos ensinou-o a procurar a condição que no momento produzia os sintomas. É evidente que todos os médicos se preocupam com ossinais e os sintomas da doença, mas os osteopatas dão uma importân-19

cia maior às causas, ainda que remotas, do ponto de vista da doença do momento.

O Dr. Stili acreditava que muitas causas das doenças, bem comoos factores que a elas conduziam, podiam ser encontrados, sobretudo, na estrutura do corpo. Por estrutura ele pretendia significar o corpo inteiro, o esqueleto, os músculos, as fasciae, os órgãos e até a pele. Ele não sustentou sempre, como frequentemente se diz, que toda a doença era causada pela desorganização das articulações ou da coluna. E nunca afirmou que toda a doença era causada pela desorganização da estrutura. O que ele ensinou foi que estrutura e função estão inextrincavel mente inter-relacionadas. Estas são as suas palavras:

O sistema músculos-esqueleto, os ossos, os ligamentos, os músculos, as fasciae, formam uma estrutura que, quando desorganizada, pode efectuar mudanças na função doutras partes do corpo.

Contrariamente a ideias hoje divulgadas, o Dr. Still achava tão importantes as fasciae como a coluna na elaboração do diagnóstico edo tratamento adequados. Eis o seu alerta:

As fasciae constituem o local onde procurar a causa da doença, o lugar a consultar e o lugar onde iniciar a acção dos remédios em todas as doenças.

A insistência na importância dasfasciae não pode ser exagerada, e o Dr. Still escreveu muito sobre o assunto. Estes conceitos de estrutura e função, e da importância dasfasciae, em estreita ligação comoutros enunciados também pelo Dr. StilI, serão introduzidos mais adiante, neste livro. Entretanto, desenvolverei outros aspectos da estrutura delineada acima e explicarei o que faz um osteopata moderno, antes de chegar a um diagnóstico ou de prescrever qualquer tratamento. Isto habilitá-lo-á a saber que espécie de exame esperar e aquilo que o motiva.20

OBSERVAÇÃO OSTEOPÁTICA

Um osteopata examina primeiro a zona com problema e depois volta a sua atenção para a superstrutura do corpo - o esqueleto. Comoo nosso esqueleto, diferente do do insecto e do do invertebrado, está dentro dos nossos corpos e não constitui a sua concha protectora, não podemos observar o seu estado. Contudo, um osteopata é treinado para examinar o paciente de um modo que lhe dará uma considerável quantidade de informações sobre a sua saúde geral, a sua ocupação, e até sobre a história da sua vida, apenas por mera observação. Ainda antes de estender um dedo para o paciente, um osteopata experiente terá notado como o paciente entrou no consultório, qual a postura do corpo e a capacidade de mobilidade e de controlo quando convidado a sentar-se. O modo como o paciente sustenta a cabeça, por exemplo, pode dar pistas imediatas acerca das curvas da coluna e, frequentemente, de desorganizações aparentemente tão afastadas da sustentação da cabeça como a diferença de comprimento das pernas.

Quando o paciente está despido, o olho treinado do osteopata reconhece imediatamente o hospedeiro de condições estruturais que podem influenciar o estado de saúde. A observação de um paciente, sentado, de pé ou deitado, mostrará o equilíbrio geral e global do21

corpo. O osteopata anotará mentalmente características como umaperna curta, uma pelve inclinada, uns ombros baixos, desigualdade de altura das espáduas, acentuada reentrância de curvatura da coluna (cifose), curvatura anormal (escoliose), sustentação da cabeça e do queixo na direcção anterior, desenvolvimento particular das pernas edos pés e assim por diante - tudo o que possa induzir doença física. Então o osteopata fará testes para aferir não só da eficiência do movimento das principais articulações do corpo, mas também de todas as articulações da coluna.

O Dr. Still disse que o movimento era a ligação entre a estruturae a função. Nesta fase, ter em consideração o movimento é de primordial importância para a observação osteopática. Quando um osteopata examina o seu paciente, não é apenas para olhar o movimento da caixa torácica ou definir o seu significado em relação à respiração do paciente. Ele está atento ao movimento como um todo - no âmbito das articulações, dos segmentos da coluna, da caixa torácica e, sobretudo, da amplitude total do movimento de todo o corpo. E ainda mais atento está à restrição do movimento, ou aos movimentos discordantes.

O esqueleto

Antes de avançar mais, deve sublinhar-se que nenhum ser humano é uma estrutura perfeita. Muitos padrões estruturais são, com certeza, hereditários, mas quase naturalmente, ou talvez não naturalmente, omodo de vida de uma pessoa afecta a sua postura. As variações de mudanças de postura, resultantes da ocupação da pessoa, são inumeráveis.

Torna-se claro que uma pessoa que despende 50% da sua vida em pé, defronte de uma máquina, escrevendo cartas, fazendo cálculos ou puxando alavancas, para enumerar apenas alguns exemplos, sofrerá as consequentes mudanças de postura, e, passado um tempo, a forma do seu esqueleto muda, nomeadamente no modo como se ajusta a si mesmo e no modo como se move. O osteopata relacionará as suasdescobertas não apenas com o problema que o paciente lhe apresen-22

tou, mas também com os factores que conduziram a que o problema surgisse. Veremos seguidamente como é importante que assim seja quando considerarmos as outras partes da estrutura e a relevância do tratamento.

Deve dizer-se aqui que, embora a formação do esqueleto seja de extrema importância no diagnóstico osteopata, o exame do paciente não é conduzido no sentido do que deveria fazer-se para alterá-la. Não é intenção da osteopatia endireitar” a estrutura básica do paciente. Qualquer ideia de que a estrutura básica do paciente possa ser alterada directamente, por tratamento de manipulação, é bastante ridícula. Assimcomo um jardineiro sabe que não é possível endireitar o caule da planta que nasceu distorcida, também o osteopata tem a noção de que a coluna não pode ser “endireitada”; mas, como o jardineiro, sabe que uma forma mais harmoniosa pode ser conseguida. O sucesso dessa mudança será naturalmente mais provável num paciente jovem. A coluna é uma estrutura viva cujas células são submetidas a reconstrução e, obviamente, tal se verifica no padrão do seu próprio meio. Os traços estruturais do homem moderno estão em estreito relacionamento com a sua vida e ocupação na sociedade civilizada.

O Dr. Still descreve o osso como um laboratório”. Muita gente acredita que os ossos do esqueleto humano sã o sólidos, estáveis e imutáveis, e essa é a impressão que vos ficará, se estudarem o modelo dum esqueleto. É completamente ilusório. O osso é, de facto, um tecido vivo com vasos sanguíneos e nervos próprios, e sofre a influência dos mesmos factores que actuam em outras estruturas menos sólidas do corpo.

O osso é moldado pelo seu meio, pode mudar como resposta a pressões e esforços e é consequentemente moldável por natureza. A base inorgânica do osso, que constitui 60% dele, está sujeita a contínua renovação durante a vida duma pessoa. Pode-se daqui deduzir, então, que um esqueleto pode ser treinado para alterar a sua forma alterando- se-lhe o meio durante um longo período de tempo; é com certeza possível educar o crescimento dum esqueleto controlando-lhe os hábitos de postura durante os anos de formação do crescimento; se um esqueleto sofrer uma lesão grave, como um fémur partido, o que23

resultará num encurtamento da perna, o consequente coxear coloca aestrutura fora de ordem, causa pressões que eventualmente alteram aforma e as superfícies das articulações e, mesmo, dos próprios ossos.

Os efeitos dessa lesão na simetria da estrutura serão muito maiores se tal acontecer durante a infância. Este é um exemplo do relacionamento entre JÚnção e estrutura.

Os músculos

Do interesse inicial do osteopata serão aqueles músculos que estão ligados à postura do paciente. Se o osteopata observou que havia problemas com o esqueleto, então os músculos que suportam a estrutura afectada serão pormenorizadamente examinados. Se, por exemplo, houver uma curvatura da coluna para a frente (lordose), os grandes músculos que suportam a coluna serão examinados, primeiro separadamente e, depois, em relação ao conjunto da postura. A preocupação do osteopata não é comparar o paciente com a cópia fotográfica de um esqueleto, mas entender o que é normal para aquele paciente - “não há duas pessoas iguais”.

O osteopata vê o que são de facto os resultados do esforço da estrutura daquele paciente para conseguir obter ou manter uma simetria, em face das exigências funcionais que lhe foram feitas durante toda a sua vida. A osteopatia não observa as peculiaridades da estrutura como estritamente “anormais”. Compreende como a estrutura do paciente se adaptou à vida que teve.

A menos que a postura tenha mudado daquilo que era o normal para o paciente devido a uma agressão recente, como o prolapso de um disco, a osteopatia não advoga que ela deva ser corrigida por nenhum tratamento directo. Se nestas circunstâncias for exigido um tratamento, será dentro de um programa gradual, e tratar-se-á, como podeis compreender, de exercícios de correcção.

Os músculos envolvidos no suporte e controlo de quaisquer articulações que não estejam funcionando adequadamente serão cuidadosamente examinados.24

Aqueles que estiverem integrados na zona de agressão recente receberão uma atenção imediata.

A superfície

Após examinar os músculos, o osteopata continuará a sua cuidadosa observação agora pela superfície do corpo, usando uma técnica muito especializada geralmente conhecida por “palpação”. A palpação é a arte mestra do osteopata conhecedor e habilita-o a detectar mudanças estruturais, por vezes minimas, que podem ter efeitos muito radicais sobre uma larga superfície e afectar o trabalho das estruturas noutras partes do corpo que são temporariamente substituídas através dos itinerários dos nervos de ligação. As mãos são o seu principal instrumento de diagnóstico, e a qualidade de um osteopata e a profundidade do seu treino podem ser julgadas pela sua perícia neste campo. Um profissional experiente localizará rapidamente as causas das queixas físicas depois de uma leve palpação nas áreas suspeitas. Com umapalpação mais profunda diagnosticará as origens de uma vasta gama de problemas. Os males que o preocupam são a fragilidade, músculos endurecidos ou “filamentosos”, sinais de imobilidade muscular e dos tecidos de ligação, o estado do “tónus” muscular e zonas de inflamação ou tumefacção. Também procurará informar-se sobre as condições dos ligamentos de suporte, dos tendões, e sobre mudanças no inter-relacionamento das articulações. Este exame não causará nenhum desconforto ao paciente, e a palpação não tem nada a ver com dedos perfurantes ou com movimentos do tipo fricção.

As fasciae

Uma palpação mais profunda é obviamente necessária para o exame das fasciae. Um bom osteopata fará um exame minucioso dos tecidos de ligação. De novo procurará um amplo leque de possíveis causas de doença. Não avaliará meramente os tecidos no seu papel de25

estruturas de suporte, mas estudará o seu inter-relacionamento e efeitos de força sobre questões tão importantes como a respiração. Procurará provas de inflamação e traços de concentração de fibras de colagénio. Os efeitos secundários da tensão das fasciae produzem compressão, tumefacção e alongamento dos feixes nervosos.

Isto, por seu turno, causará dor ou interferência nos impulsos nervosos, no sangue ou no fornecimento de linfa a essas áreas, como veremos mais tarde. As áreas que a profissão médica descreve como essenciais estarão incluídas neste exame. Os problemas mais específicos da doença do paciente serão naturalmente alvo de uma consideração especial, mas não de uma forma isolada. Cada profissional procederá de um modo diferente e articulará convenientemente toda a variedade de procedimentos de diagnóstico que achar aplicáveis acada caso. Uma coisa que fará é assegurar-se de que o paciente não será de nenhum modo prejudicado pelo tratamento que prescrever. Embora o processo possa parecer “mais que minucioso” e talvez aborrecido para o paciente, vereis que um osteopata experiente não demorará um tempo excessivo a utilizá-lo, e, de facto, o diagnóstico osteopático pode frequentemente fazer-se com rapidez.

O exame osteopático difere da prática médica corrente, mais preocupada com a identificação de doenças do que com condições não específicas que existam antes de a doença aparecer. A abordagem osteopática do exame é, portanto, de natureza biológica e holística.26

LESõES OSTEOPÁTICAS

Debruçar-nos-emos agora mais pormenorizadamente sobre os meios teóricos e práticos que o osteopata está apto a aplicar na avaliação do paciente e da sua importância para o o diagnóstico.

Vamos analisar sucintamente as condições que trouxeram maissucesso à osteopatia, a ajudaram a ganhar o respeito público e, durante os últimos anos, originaram uma mudança de atitude para com ela por parte da classe médica em geral. Referimo-nos a uma situação frequentemente denominada como ---dor de costas”. Por causa do seu inegável sucesso no tratamento de problemas das costas, muitas pessoas se habituaram a olhar os osteopatas como profissionais que apenas tratavam delas. Isso eles são-no sem dúvida e continuarão a sê-lo, porque é inevitável que qualquer profissional treinado para procurar as causas de uma má saúde, através de um exame meticuloso da estrutura, deve saber consideravelmente mais sobre os seus mecanismos de trabalho que qualquer outro terapeuta. O tratamento das dores de costas é, contudo, apenas uma pequena parte do total do conhecimento aplicado pelas terapias osteopáticas.

O diagnóstico osteopático inclui uma situação particular que pode ocorrer em qualquer articulação e que é usualmente descrita como a27

lesão osteopática”. Não foi este o termo usado pelo Dr. StilI, que preferiu “desarranjo”, mas por causa dos muitos mal-entendidos sobre o que os osteopatas faziam para chegar a resultados de sucesso, sem aquilo a que os meios médicos chamassem uma explicação científica, fez-se sentir como necessária uma base científica que descrevesse a situação que eles tratavam. “Lesão osteopática” foi a escolhida, e ides ouvir os osteopatas referir-se a lesões quando referirem os seus diagnósticos. Durante setenta anos, aproximadamente, foram feitas pesquisas acerca das suas causas, existência e efeitos, e há sobre isso muitos volumes de informação factual, especialmente nos Estados Unidos. A palavra lesão, que deriva do latim laesio, usa-se em linguagem médica para descrever qualquer dano ou ferimento, e não era usual para os médicos falar de lesões da coluna a menos que se referissem a danos muito graves. Contudo, como o seu interesse pela osteopatia cresce, começaram familiarizar-se com o termo. Em 1968, uma comissão recomendou que fosse acordado um termo que indicasse a lesão osteopática e pudesse ser aceite quer pelos médicos osteopatas em formação, quer pelos internos dos hospitais. Foi adoptado o termo “disfunção somática”.

Cada articulação do corpo humano foi desenhada para mover-sedentro de uma amplitude limitada. De acordo com o que aqui nospropomos, descreveremos o movimento das articulações de qualquer indivíduo como normal quando não houver deformidade congénita ou dano grave que possa ter danificado, mudado ou impedido o livre movimento das articulações, ou alguma doença ou distúrbio que tenham provocado condições patológicas que alterem o movimento das articulações.

As articulações são sustentadas por ligamentos, tendões e músculos, bem como pelafascia, e são ligadas por côndilos ou charneiras. Umas pessoas têm um mais amplo movimento das articulações que outras, por razões muito diferentes. Quando se verifica a rotação de uma articulação, em qualquer direcção, de uma maneira que não seja a adequada para a forma dessa articulação, então, algumas vezes acontece uma compressão ou uma solidificação. A articulação fica então agarrada pelos ligamentos de suporte, tendões, músculos e côndilos, numa posição que é o limite extremo da sua amplitude normal.28

Quando a articulação permanece nesta posição limite temos aquilo que o osteopata descreve como uma lesão osteopática. O leitor notou que eu salientei muito cuidadosamente que a articulação estava comprimida numa posição que era o limite extremo da sua amplitude normal; porque se estivesse comprimida numa posição contrária à suaamplitude normal seria não uma lesão osteopática, mas sim uma deslocação ou uma deslocação parcial. Como as articulações podem ser comprimidas até ao limite da sua amplitude normal, nenhum raio-X poderá mostrar nada que um não praticante da osteopatia possa considerar de importância ortopédica.

Daí que muita frustração seja expressa pelos pacientes, que tendo sido informados pelos seus clínicos gerais de que o raio-X eraexacto”, descobriram a ajuda da osteopatia e obtiveram alívio. Pacientes que experimentaram movimentos das articulações que lhes aliviaram os sintomas durante o tratamento osteopático não conseguem perceber o porquê de a perturbação não ter sido diagnosticada mais cedo, sobretudo tendo sido tiradas radiografias.

A lesão osteopática não é, portanto, um grande movimento dos ossos, mas mais um suave ceder da articulação e a sua fixação no limite da sua normal amplitude de movimento. Os osteopatas discutem uns com os outros formas de desorganização das articulações, mas essa parte do seu trabalho fica fora do âmbito da presente análise. As lesões osteopáticas têm uma importância tão grande, que precisam de ser compreendidas por aqueles que procuram a ajuda osteopática. Uma lesão osteopática deve ser cuidadosamente diagnosticada antes que se escolha o tratamento adequado. O tratamento dado por um profissional inexperiente, de um modo fortuito, pode parecer aliviar os sintomas mas pode muito bem tornar-se mais tarde prejudicial, ou, na melhordas hipóteses, dar apenas um alívio temporário, sobretudo se não setiveram em conta os factores que induziram os problemas. Como é vital um diagnóstico aturado, o treino nesta área é complicado e demorado. Usam-se testes mecânicos para estabelecer qual é a amplitude normal de movimento de cada paciente. Estes são seguidos de testes para localizar as articulações que estão afectadas, combinados com técnicas de diagnóstico mais pormenorizadas, que utilizam apalpação.29

EFEITOS DA LESÃO OSTEOPÁTICA

Antes de chegar à identificação de alguns dos efeitos prejudiciais duma lesão osteopática, devo sublinhar que ela acontece em qualquer articulação do corpo e que está ligada aos mecanismos do corpo como um todo. Como veremos, os efeitos duma lesão osteopática podem parecer desproporcionados em relação à causa, que não é mais que a fixação mínima duma articulação dentro da sua amplitude normal. Contudo, se o momento em que a articulação cede devido à pressão for estudado à luz de todos os factores posturais e mecânicos que a induziram, será visto como mais uma parte do processo que progredirá se não for invertido. O tratamento osteopático não pode ser reduzido à ideia agradável de que “um osso fora de posição causa sintomas que são automaticamente remediados quando esse osso é recolocado na sua posição normal”. O paciente deve abandonar por completo este conceito e pensar em termos de avaliação estrutural total. Mesmo que os sintomas agudos que levaram o paciente ao osteopata sejam aliviados, os factores de causa permanecerão, a menos que seja feita alguma coisa para os alterar.

Para simplificar a ideia de causa e efeito considerem as seguintes experiências práticas. Procure uma pequena veia nas costas da mão e31

pressione-a com o polegar da outra mão durante, digamos, 25 segundos. Então anotará, quando retirar o polegar, quanto tempo leva osangue a chegar à área comprimida. Se mantiver a pressão por 60 segundos poderá começar a experimentar uma leve sensação de entorpecimento e, depois de 100 segundos, começará a sentir aquilo que reconhecerá como uma pequena dor. Se quiser uma demonstração mais dramática, coloque um elástico bem apertado em volta do dedo indicador e veja quão rapidamente experimentará a sensação de entorpecimento, inchaço e desconforto crescente.

Muita gente já experimentou a frustração de não ser capaz de fazer pegar o carro e o alívio de descobrir que pela mera remoção dum terminal ligado à bateria, que se seca antes da recolocação, o carropassa a trabalhar normalmente. Todos os especialistas em avarias de motores sabem como um parafuso no meio de um distribuidor pode desprender-se lentamente e resultar num distúrbio da aceleração oumesmo na completa paragem do carro. Do mesmo modo a saúde é uma questão de equilíbrio perfeito, e a sua harmonia pode ser perturbada por circunstâncias igualmente insignificantes. Pode argumentar que as dificuldades mecânicas que mencionámos provêm de falta de cuidado ou revisão regular, e esse é um assunto que examinaremos mais tarde em relação ao corpo humano. O que observamos é a acção de uma lei formulada por Maupertius, um matemático francês; nomeadamente, que a quantidade de acção necessária para efectuar qualquer alteração na natureza é a menor possível. Falando dum ponto de vista osteopático, a quantidade de desarranjo da mobilidade normal, necessário para iniciar um processo de má saúde, com reacções clínicas marcadas, é também muito pequeno.

Apliquemos este conceito apenas a três ou quatro partes da anatomia nas quais a lesão osteopática possa acontecer. Primeiro, visualize um osso, ou uma vértebra, na coluna. Cada articulação da coluna tem uma pequena abertura através da qual passam os nervos da própria corda espinal. O espaço é apenas o suficiente para permitir a passagem duma fibra nervosa e está forrado dum tecido próprio e revestido dum fluido. Não há lugar para nenhum grande movimento da fibra32

além daquele que ocorre na movimentação diária do corpo. Imagine o que acontece se houver uma ligeira cedência da articulação entre esse osso e o de baixo, e as articulações se colarem ou se esmagarem. Lembre-se de que os ossos da coluna são suportados e operados por inúmeros músculos e fasciae, que toda a coluna deve ter um balanço flexível e sem restrições e é afectada por quase todos os movimentos do corpo, e que estes músculos efasciae realmente levantam o tronco e o mantêm fixo.

Dorso inferior

Se este osso a que nos referimos se localiza na parte inferior das costas, serão fáceis de ver os efeitos prejudiciais de tal restrição. De cada vez que um movimento ocorre do outro lado, um certo número de músculos efasciae será ferido ou esticado em graus variados e um movimento súbito e brusco, ao contrário, poderá causar-lhes um entorse, muitas vezes grave. Alternativamente, se não houvesse um acidente desta espécie, mas alguém com uma lesão osteopática sentisse apenas um desconforto mínimo e rigidez, e se as suas actividades quotidianas não fossem afectadas a nã o ser quando fizesse certos movimentos, a pessoa poderia “viver com” essa condicionante, evitando aquilo que a agravasse. E então agora? Agora temos uma determinada área, afectada pela tensão que esta restrição produz. Quando digo tensão, quero significar resistência do corpo em puxar o que é necessário para permitir o movimento. As partes afectadas podem ficar inflamadas, frágeis ou mesmo inchadas. A circulação do sangue, nos finos vasos capilares em volta, é restringida e pode ser cortada. Este sangue é o meio de proporcionar nutrição à articulação. Sem aprofundar muito a importância da livre circulação do sangue é fácil verificar que uma condição semelhante se encontrará na pequena área que rodeia a articulação, como acontece quando o elástico é apertado em volta do dedo indicador. Qualquer área do corpo desprovida de nervos próprios ou abastecimento de sangue e, consequentemente, de nutrição, tornar-se-á eventualmente doente.33

Compressão de nervos

Um dos efeitos mais comuns da lesão osteopática é a compressão de nervos. Esta é uma ideia da qual a maior parte das pessoas parece apanhar o significado, e os pacientes dizem frequentemente que pensam ter um “nervo comprimido” antes do início da consulta. Diz-se frequentemente que os nervos são comprimidos pelos discos da coluna. Num certo sentido isto pode ser verdade, mas, de facto, não é o mais usual.

O homem tem trinta e um pares de nervos que têm a sua origem na espinal medula e que passam através de túneis fibrosos ou aberturas nos ossos da coluna (as vértebras), que já mencionámos. São descritos como raízes e são a origem de dois feixes nervosos, cada um com uma passagem definida, os quais, por um lado, alimentam os músculos do corpo bem como os órgãos que se movimentam e, por outro, recebem informações de toda a estrutura que depois transmitem para o cérebro. (Isto é evidentemente a simplificação grosseira de um tema complicado sobre o qual os osteopatas têm obrigatoriamente que fazer um estudo aturado e minucioso.)

A divisão das fibras nervosas está feita por grupos, chamados plexos, que servem diferentes áreas do corpo.

Plexo braquial

Tomemos como exemplo o plexo braquial, que se situa na parte superior das costas e serve todos os músculos do braço (ver fig. 1). Uma lesão osteopática numa articulação da coluna, donde este plexo emana, pode causar irritações mecânicas de um dos nervos de raiz que passa pelo orifício das vértebras e provocar directamente dor, ausência de sensibilidade e perda de força a qualquer parte do braço, mesmo tão longe como nos dedos, ou provocar os sintomas que surgem mais localmente na área da omoplata, ou ainda fazer tudo acontecer ao mesmo tempo. Qualquer coisa que origine um aumento de pressão sobre as raízes, tal como uma tossidela ou uma acção de esticamento,34

PLEXO BRAQUIAL

PLEXO LOMBAR

Esquema elementar da distribuição dos nervos pelos sistemas sensorial e motor

Figura 1 - Sistemas sensorial e motor

aumentará a dor. Um diagnóstico feito a tempo e a remissão duma lesão osteopática aliviarão muito rapidamente esse sintoma. Como uma lesão osteopática imobiliza a articulação, os músculos, os tendões e as fasciae tentam mover uma articulação que está diminuídana sua amplitude de movimento, e ela, por seu turno, causará distorção nesses músculos, tendões e fasciae. De novo isso resultará em inflamação das estruturas envolvidas. Quando os músculos, os tendões e as fasciae passam por cima de nervos, há sempre a possibilidade de comprimi-los nesse local, especialmente em zonas onde as fibras nervosas mudam o seu curso através de feixes fibrosos.

Como as lesões osteopáticas podem ocorrer em qualquer articulação do corpo, poderá compreender que qualquer danificação do ombro, cotovelo, pulso ou de quaisquer articulações do braço ou da mão resultarão nos mesmos problemas, acontecendo estes, particularmente, abaixo do nível da articulação envolvida. Deste modo uma parte das fibras nervosas que partem do plexo braquial serão comprimidas ou perto da articulação ou a alguma distância dela, nasestruturas que lhe estão ligadas. Um nervo pode ser indirectamente afectado e inflamar-se, quando, não sendo ele mesmo comprimido, estiver perto da estrutura que está danificada.

Circulação

Os ossos da coluna (vértebras) estão envolvidos pelafascia que secontrai em conjunção com os músculos quando há actividade física. Entre cada camada de fascia passam as artérias, os nervos e os vasos linfáticos.

A fascia não só serve de suporte a essas artérias, veias e nervos, mas também mantém as veias distendidas, alargadas ou comprimidas, quando os músculos se contraem. Neste sentido está ligada à circulação sanguínea. Quaisquer espasmo ou tensão dos músculos, directa ou indirectamente ligados à coluna vertebral, ainda que muito longe da lesão osteopática, interferirão com a liberdade de a fascia fazer o seu trabalho, e, como resultado, o fornecimento de sangue será restrin-36

gido ou mesmo cortado. Podem então acontecer situações patológicas, e pode haver consequências sérias se permitirmos que essa condição se mantenha.

Danifícação dos discos

Se permitirmos que uma lesão osteopática persista por muito tempo, tornar-se-á mais difícil remetê-la, e, depois de um período de dois ou três anos, é pequena a possibilidade de obter uma remissão permanente sem uma prolongada reeducação das causas indutoras. Pesquisas laboratoriais provaram que, mesmo que não haja deslocamento do disco, pousado entre as vértebras, a capacidade de esse disco absorver água do sangue e da linfa fica reduzida se persistir uma lesão osteopática. Isto provoca-lhe alguma redução de volume, e a sua função como amortecedor do choque fica afectada até que gradualmente ele perca o seu efeito de almofada. Este é outro motivo pelo qual as lesões osteopáticas devem ser remetidas o mais depressa possível.

Desgaste da articulação

A existência contínua de uma lesão osteopática aumenta a probabilidade de desgaste de qualquer articulação, pela mesmíssima razão que uma parte móvel de qualquer estrutura ou maquinaria que esteja permanentemente sob pressão será muito mais susceptível de desgaste e distorção se estiver fora do alinhamento.

As vias nervosas

A maior parte de nós está familiarizada com o uso dos computadores domésticos, e, para explicar o seu comportamento, a função do cérebro foi comparada com a deles. Seria, talvez, mais apropriado dizer que a espinal medula é o computador e o cérebro a pessoa que37

nele opera. A raiz do nervo está relacionada com os “interfaces” entre as várias partes do equipamento, nos super- sofisticados sistemas do corpo. Os cientistas não identificaram num grau conclusivo ligações entre partes do cérebro e acções individuais do corpo, com excepção do cérebro posterior (cerebelo). Logo que o cérebro anterior (cérebro) tenha aprendido alguns movimentos que requeiram concentração, como andar, nadar, dançar ou andar de bicicleta, assume o controlo do cerebelo que harmoniza todos os movimentos e trabalha de um modo inconsciente em conjunção com a espinal medula. O cerebelo é, e sempre foi, programado para lidar com actividades de aprendizagem. Isto não é exactamente verdade, mas torna-se uma analogia muito útil para explicar as vias nervosas. Como as vias nervosas são um sistema de duas vias, temos que assumir que o cerebelo e a espinal medula estão programados para dar instruções e agir sobre as informações recebidas dos impulsos sensoriais (ver fig. 2). Se pensarmos nas vias nervosas em termos de impulsos semelhantes àqueles que são vistos como gráficos num ecrã e nesses impulsos como um prolongamento daqueles que correm através do cerebelo e da espinal medula, compreende-se a ideia de que eles não trabalham de um modo fragmentado mas como um extenso impulso. Quando as linhas dos impulsos nervosos atingem as várias vértebras, separam-se para servir as várias partes do corpo, os músculos e os órgã os, sob a forma de fibras minúsculas.

Quando há um erro num programa, ocorre uma distorção dos gráficos no vosso ecrã, e, de modo semelhante, quando a informação errada é recebida pelo cérebro e pela espinal medula, o computador humano recebe impulsos distorcidos. Quando há uma desorganização das vértebras que circundam as fibras nervosas, há interferência na entrada e saída de informações. Informações incorrectas podem ser recebidas e emitidas a partir do cerebelo e da espinal medula. Alguém que tenha tentado caminhar numa perna picada por alfinetes e agulhas saberá das dificuldades de coordenação que ocorrem quando o cérebro está a receber uma informação errada. Interferências contínuas podem deteriorar a área local da espinal medula. Tendo em mente que esses sinais ou impulsos também são responsáveis pelo funcionamento das38

vísceras do corpo, é lógico concluir que uma desorganização vertebral pode de algum modo ser prejudicial à saúde desses órgãos. A perturbação, em qualquer posição, da fibra nervosa, pode acontecer comoresultado de uma lesão osteopática em qualquer parte da estrutura que lhe é adjacente, um pulso, um cotovelo, um ombro etc., ou onde a fascia possa ter sido esticada ou ter formado uma aderência. Estas perturbações são maiores quando as fibras passam através dos ossos e especialmente nas raízes, na zona espinal. Os impulsos nervosos são conduzidos de um modo ritmado, e a compressão das fibras causará uma interrupção desse ritmo e excitará o impulso. As funções que essas fibras nervosas desempenham podem não ser completamente cortadas; podem mesmo não ser perturbadas ou prejudicadas de uma forma evidente, mas os impulsos serão distorcidos e instalar-se-ão sintomas insidiosos. Todas as instruções que o cérebro dá envolvem um extraordinário número de impulsos, porque cada movimento que fazemos é incrivelmente complicado; portanto, é mais exacto pensar em informações inexactas para e a partir da espinal medula, do que pensar em fibras nervosas sendo comprimidas e num sinal ou impulso desajustados.

Os osteopatas, excluindo alguns nos Estados Unidos, não são cientistas, não têm especialização neurológica e não podem com exactidão traçar as origens de perturbação da inervação de qualquer órgão do corpo.

O que eles sabem de experiências actuais é que os sintomas frequentemente diminuem e desaparecem depois de remetidas as lesões osteopáticas, e isto é a prova de que os impulsos motores da desorganização podem estar relacionados com articulações específicas da coluna. A ocorrência deste fenômeno tem vindo a ser registada há mais de cem anos e é demasiado regular para que lhe chamemos acidental. Do que podemos estar certos é que as lesões osteopáticas se instalam antes de os sintomas começarem a aparecer. O Dr. Still disse: “Se há qualquer variação nos ossos, se os músculos ou ou nervos forem comprimidos, removam a causa e o resultado será harmonia sentida através de todo o sistema.”40

A terapia química pode ser eficiente para o alívio destes sintomas mas não os remove, e tem que ser mantida enquanto as causas não forem erradicadas. Uma vez a doença orgânica instalada, resultará disso uma agressão permanente dos órgãos que um tratamento osteopático pode já não ser capaz de curar.

Articulação da anca

Voltemos a nossa atenção, muito sucintamente, para outra parte da estrutura do corpo que pode estar sujeita a uma lesão osteopática: a articulação da anca (ver fig. 3). Esta tem uma importante função no suporte da pelve, uma ponte sobre a qual a superstrutura do corpo se movimenta. A resistência e a fixação desta no limite da sua amplitude normal pode ser descrita, de uma forma simplista, como uma deslocação da anca. A fixação mínima da anca provocará dores fortíssimas na parte da frente da coxa, em baixo, e na virilha, e ainda uma grande desarmonia no andar. O Dr. Still identificava a danificação da anca como causa do desenvolvimento de condições largamente propícias à doença. Como a articulação da anca é muito grande, as consequências da restrição dos seus movimentos são muito óbvias. Contudo, e frequentemente, um paciente que sofre de alguns sintomas graves pode não se aperceber de que é a articulação da anca que está afectada. Os ligamentos e os músculos da pelve prendem-se à anca formando uma “abraçadeira” que deve manter-se equilibrada enquanto carrega o peso do tronco. Qualquer desvio da anca da sua posição normal perturbará a função dessa “abraçadeira”. Tal resultará no peso do tronco a forçar o alargamento da articulação sacro-ilíaca. A articulação sacro-ilíaca fica então em perigo de dar de si sob a acção de um esforço extra.

Por sua vez, os músculos e os ligamentos causarão compressão sobre os nervos e os vasos sanguíneos. O resultado disto poderá serdor na área sacro-ilíaca, dor a todo o comprimento da perna, indo mesmo até ao dedo grande do pé, diminuiçã o da sensibilidade, picadelas e sensações de queimadura.41

SACRO

As articulações da anca suportam apelve do mesmo modo que os pilares suportam uma ponte. Uma deslocação da anca para a frente obrigará as articulações sagradas a ceder sob a pressão das estruturas colocadas acima.

As articulações sagradas são cobertas por uma complexa massa constituída por nervos vitais envolvidos porfasciae, músculos e tendões.

ARTICULAÇÃO SACRO-lUACA

Figura 3 - As articulações da anca suportant a pelve

42

Quando o paciente com uma fixação da anca caminha ou se senta, a compressão exercida na “abraçadeira” da pelve causará um efeito de torção nos largos ossos pélvicos. Normalmente, tal forçará os ossoslombares que são carregados em conjunto com os músculos, ligamentos e a fascia que os suporta, afectará a postura e a base do crânio. Se a anca não for tratada das suas restrições, ocorrerão inevitavelmente outras lesões osteopáticas nas articulações da espinha dorsal. Daí resultará a compressão automática da raiz dos nervos das vértebras lombares, e, muito provavelmente, seguir-se-á uma ciática. Como os nervos das áreas pélvica e lombar alimentam todos os órgãos vitais do baixo abdômen, como o fígado, útero e parte do cólon, os impulsos das vias nervosas para estes órgãos serão por sua vez distorcidos. Por dentro da pelve, uma complicada estrutura, compreendendo trinta e seis músculos, sofrerá de compressão, particularmente do lado onde a anca está fixa, e os efeitos disso desenvolver-se-ão com a contínua movimentação que o paciente executa nas suas actividades diárias. A pelve está também cheia de tendões, ligamentos efasciae, através dos quais passam os nervos, todo este conjunto suportando os órgãos abdominais e assistindo-os com a sua operação de fornecimento de sangue e nutrição, A tensão criada pelo efeito de torção dos ossos pélvicos será logicamente transferida para os tendões, ligamentos e fasciae, esforçá-los-á para além do normal, comprimindo os nervos e os vasos sanguíneos envolvidos. São fáceis de perceber os graus de desarmonia e de prejuízo que daí resultam. O único sistema de drenagem dos órgãos contidos dentro da pelve é através das veias abdominais. Qualquer tensão que impeça a circulação e a drenagem pode rapidamente induzir condições como congestão do fígado, enfraquecimento do pavimento pélvico, ou, no caso das mulheres, torção do sistema de ligamentos que suspendem o útero. Se permitirmos que estes distúrbios físicos continuem, os sintomasde doença desenvolver-se-ão.

Os músculos da anca estão presos a esta de modo a puxarem a articulação respectiva para o seu encaixe, desde que funcionem normalmente. Se ocorrer uma deslocação, a pelve ficará inclinada para a frente e a articulação perderá a sua estabilidade. Um paciente nestas43

condições terá dificuldade em andar, e a irritação contínua da articulação provocará uma artrite.

Outras articulações

Consideremos, de passagem, outras restrições menores no movimento das articulações, tais como a do ombro, do joelho, do tornozelo ou mesmo da costela, que podem trazer problemas à coluna e produzir aí lesões osteopáticas.

Para ilustrar esta ideia observemos o tornozelo. A estrutura do tornozelo combinada com a da parte inferior da perna está concebida para absorver os choques com origem nos grandes ossos da coxa, que ficam acima. O peso do corpo é distribuído igualmente pelos pés, e o controlo é feito pelos músculos e ligamentos que suportam o tornozelo. É muito vulgar um dano menor quando se torce o tornozelo. Tal acontece durante acções repetitivas como correr, por exemplo, quando o corredor mete o pé num buraco ou cai num terreno acidentado com o pé torcido por baixo de si. Isto origina pressão na articulação do tornozelo, que pode ser acompanhada de dor ou inchaço comdor, durante alguns dias, ou ainda, apenas dor com tendência para persistir. Ocasionalmente o tornozelo pode ficar com entorse, mas o mais comum é uma simples deslocação da articulação dentro da sua amplitude normal de movimento. Uma observação ortopédica normal não revelará nada de importância clínica, e o descanso é normalmente recomendado. O desconforto ou o inchaço continuarão por muito tempo e serão agravados pela corrida e, algumas vezes, pela marcha. A fisioterapia poderá eliminar os sintomas, especialmente se houver inchaço. É vulgar, se os sintomas agudos persistirem, que o paciente suporte estoicamente o desconforto residual que atinge o seu auge durante a acção ou depois dela. Durante uma actividade prolongada, o paciente protegerá instintivamente o tornozelo transferindo algum peso para o outro pé e criando assim um desequilíbrio na distribuição do peso. Tal provocará mudanças no equilíbrio através de todo o corpo, mesmo a um nível tão alto como o do pescoço. Se permitirmos44

que esta condição se mantenha por muito tempo, terá lugar um encurtamento dos ligamentos da perna, da pelve e sobretudo das costas e do pescoço. Estas ligeiras mudanças causarão gradualmente outras lesões osteopáticas que ocorrerão nas áreas espinais que com elas estão relacionadas. Depois de um período de muitos anos, a perturbação da harmonia da marcha poderá provocar alterações anatómicas dos músculos, ligamentos e fasciae. Outros acidentes menores, como o esforço das costas, resultarão igualmente noutras lesões osteopáticas.

Crianças

As lesões osteopáticas das crianças são muitas vezes ignoradas etratadas como dores de crescimento. As pequenas mas acumuladas perturbações do equilíbrio tornarão o indivíduo muito mais vulnerável a outras restrições das articulações, mesmo que estas só causem um desconforto ocasional, de tensão postural, durante os anos de formação. Contudo, ao longo da vida, distúrbios orgânicos hão-de manifestar-se.

Sintomas de tensão

Muitos pacientes com lesões osteopáticas desenvolvem fadiga, irritabilidade e sintomas vagos que não se adaptam aos diagnósticos médicos. Muitas vezes são considerados neuróticos. A correcção das lesões osteopáticas remete os sintomas não diagnosticáveis que lhes esgotaram a energia e dá-lhes uma sensação de bem-estar e de renovado vigor.

Mais adiante, veremos os efeitos da tensão mental na saúde global.45

POSTURA E MOVIMENTO

O interesse osteopático na postura do paciente tem duas vertentes. Primeiro: um osteopata preocupa-se com a totalidade da postura. Tal inclui as condições dos músculos e o seu papel como estruturas de suporte que têm uma função semelhante aos pilares que sustentam um edifício. Como o corpo tem que ser mantido direito, estes músculos precisam de força para actuar, como talas que lhe mantenham a verticalidade. A postura inclui também as características do esqueleto e o estado das articulações, em particular restrições articulares recentes ou já com muito tempo, tais como lesõesosteopáticas. O modo de vida do paciente terá sem dúvida influenciado a sua postura presente, tanto como o seu desenvolvimento físico infantil, caraterísticas hereditárias ou quaisquer acidentes que tenham ocorrido. É importante para o osteopata saber as influências da postura sobre o estado dos músculos e das articulações e as queixas que levaram o paciente a procurar o seu conselho.

Segundo: o osteopata está preocupado com os efeitos que a postura teve ou está prestes a ter sobre a saúde do paciente.47

Ocupação

A ocupação é um dos principais factores que afectam a postura do homem moderno. Actividades não naturais no trabalho envolvem concentração mental e física. Por concentração física quero significar o esforço sobrecarregado dos músculos, que trabalham mesmo quando estamos sentados ou de pé. Os músculos da parte inferior das costas, por exemplo, estão a trabalhar quando alguém escreve à máquina, e o pescoço e os músculos da cabeça trabalham quando vigiam uma máquina, mesmo que não sejam eles os directamente envolvidos na actividade. De facto, a maior parte dos músculos do corpo está sempre envolvida numa qualquer tarefa. A tensão é dada aos músculos por atitudes posturais, e o corpo sempre tenta contrariá-la por movimentos contínuos do queixo, do tronco, das pernas ou da cabeça. Se este processo não se desse, o corpo cairia. Mas muitas vezes esse processo é inadequado para reduzir a tensão, tão rapidamente ocorrem as mudanças de postura. A quantidade de trabalho feita pelos músculos quando sustentam o corpo numa posição fixa é maior que a necessária para muitos movimentos.

O trabalho normal dos músculos, quando feito regularmente e sobretudo por prazer, é bom para a saúde do corpo. Quando os músculos trabalham para realizar qualquer movimento, fazem-no contraindo-se bastante e as fibras musculares encurtam e apertam. Esta contracção é efectuada por impulsos que trabalham sob as fibras, eestas fibras precisam de alimento, em forma de oxigénio, que éfornecido pelo corpo. Uma contracção extra precisará com certezade sangue extra, e existe um aumento na produção de toxinas (dióxido de carbono, etc.) que devem ser lanç adas fora através das veias e da linfa, para excreção urinária. A contracção muscular necessária a umaconcentrada atenção física provocará a acumulação destas toxinas demasiado depressa nas fibras musculares e originará fadiga dos músculos. Quando estas toxinas estagnam dentro de um músculo, cujo fornecimento de sangue não é suficiente para providenciar o oxigénio e a eliminação daquelas, a fraqueza muscular instala-se depressa. Se isto for uma experiência habitual, a restrição das arti48

culações seguir-se-lhe-á. Quando o corpo está continuamente colocado numa posição particular por um período de anos, adaptar-se-á ao meio, e a atitude do indivíduo mudará para se acomodar à situação, com a consequência última de uma grande alteração de postura. Mesmo os ossos, como explicámos, adaptar-se-ão por um período de anos, e grandes alterações posturais tornar-se-ão praticamente irreversíveis.

Factores hereditários

Adquirimos características físicas de ambos os pais, e a estruturaque herdámos tem uma grande influência sobre a nossa postura. Embora possamos não desenvolver os mesmos hábitos posturais dos nossos pais ou o mesmo estilo de vida, a nossa estrutura óssea básica imporá problemas posturais que eles também já tiveram. “Tipologia somática” é um sistema de classificação física. Este método baseia-se no trabalho de William Sheldon, que descreve três tipos de estrutura corporal: endomórfica, mesomórfica e ectomórfica. Esta classificação está essencialmente relacionada com a forma e não com o tamanho. De acordo com Sheldon, cada um de nós tem um modelo dos três na sua ossatura básica estrutural. Estes tipos estruturais podem muito bem ter origens etnológicas. Em partes remotas do mundo onde ocorreram poucas alterações territoriais e quase não havia subjugação por invasores, as variedades de tipo estrutural são menos evidentes.

Comparemos dois tipos de estruturas, que, por simplicidade, descreveremos como tipo “esguio” e tipo “entroncado” (ver fig. 4).

Um tipo esguio não indica um tipo magro mas um individuo com uma fina e alongada estrutura óssea. Uma pessoa assim terá curvas mais pronunciadas na coluna, como consequência de ter músculos mais longos e mais estreitos, e, portanto, terá também um suporte mais fraco. Um indivíduo alto e “esguio” desenvolve frequentemente uma curvatura do corpo para a frente. O corpo inclina-se para trás, o peito tende a ser raso e os ombros caídos. Os tipos “esguios” são normalmente mais flexíveis que os entroncados. A vida moderna não49

(a) TIPO “ESGUIO”

(b) TIPO “ENTRONCADO”

Figura 4 - Classificação da estrutura óssea: (a) tipo “esguio “; (b) tipo “entroncado “

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nos requer o uso total e regular de todos os músculos e ligamentos naactividade quotidiana e predispõe portanto a problemas posturais. Devido às suas características físicas, os tipos “esguios- são mais atreitos a essas influências.

No interior da estrutura do tipo “esguio”, os órgãos encontram-se mais em baixo, o que não é o ideal “normal”. Como o peito obriga o diafragma a uma posição inferior, o coração fica por cima dele, e o fígado, o estômago e o baço imediatamente abaixo.

Por outro lado, os tipos “entroncados”, com ossos e músculos mais espessos, têm normalmente ligamentos mais curtos e não são tão flexíveis. Regra geral, não têm tendência para deficiências posturais, embora se engordarem venham a ter problemas cardíacos, de pressão sanguínea e respiratórios. Ambos os tipos, “esguio” e “ entroncado”, podem ser altos ou baixos. Isso não tem a ver com o tamanho mas está relacionado com o controlo exercido pela glândula pituitária sobre a tiróide e as gónadas e à libertação duma hormona específica de crescimento. Um tipo “esguio- nunca se tornará num tipo “entroncado”, e vice-versa.

Aqueles que durante muitos anos estudaram as razões funcionais da doença, concluíram que o tipo “esguio” é mais susceptível à doença. Há neles uma maior incidência de perturbações gástricas, gripe, bronquite e colite e são também mais propensos às doenças mentais, como a depressão. Têm também uma maior tendência para perturbações estruturais, pela razão óbvia de que, sendo as suas “estruturas” menos compactas, lhes é mais difícil resistir às agressões de forças externas.

O tipo “entroncado”, tendo naturalmente menos movimentos articulares, músculos muito mais espessos e fortes e ligamentos mais curtos, é menos vulnerável aos factores de indução das lesões osteopáticas. Contudo, ironicamente, quando sofre desses problemas, eles são de remissão bem mais difícil. Os indivíduos que desenvolveram uma má postura, quer durante os seus anos de formação, quer no tempo despendido a trabalhar, se essa má postura piorar, estão mais propícios a sofrer lesões osteopáticas. Seguir-se-á uma previsível susceptibilidade à doença. Se a postura ficar tão alterada que atire o peso da parte superior da coluna para trás, para uma posição por detrás da51

Figura 5 - Má postura é a causa da restrição de articulações e do estreitamento dos discos intervertebrais

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linha das ancas, a pressão será tão grande que forçará as articulaçõesa uma posição no limite da sua amplitude normal de movimento, e assim se criarão restrições. Isto pode ser visto como o resultado de um subtil processo, continuado ao longo de muitos anos (ver fig. 5).

As alterações posturais trazem consigo o encurtamento e a contracção dos músculos, o que reduz a amplitude normal das articulações, e a amplitude a que normalmente são forçadas no dia-a-dia torna-se o seu limite normal. Se levadas para além dessa amplitude as articulações serão forçadas e induzir-se-á uma lesão osteopática. Se isso se der subitamente, poderá haver uma danificação do disco intervertebral.

Anomalias estruturais

Um dia, o Dr. Still colocou a seguinte questão: será que um ossoconstrói o seu próprio habitat? A resposta é claramente positiva. Isto confirma-se, quando houve um distúrbio mínimo da posição de umaarticulação, por exemplo, da anca, durante a infância. O desenvolvimento e a própria forma da articulação está dependente de factores mecânicos.

Um grande número de pessoas têm uma perna mais curta que aoutra. Se esta perna cresceu menos durante os primeiros anos da vida, o esqueleto ter-se-à progressivamente deformado. A coluna terá criado um envolvimento de tensão que a terá forçado a inclinar-se sobre um lado, na base e, como compensação, a fazer outra curva mais acima (ver fig. 6). Uma curvatura lateral permanente (escoliose) resultará desta situação, e os músculos de suporte de cada lado da coluna terão um desenvolvimento desigual. Esta situação nunca se corrige a si própria, e a deformidade muitas vezes aumenta, sobretudo quando se escolhe uma ocupação desadequada. Uma distorção muscular e uma contracção dos ligamentos será particularmente vulgar em indivíduos altos e esguios.

Os que têm anomalias do tipo de uma perna mais curta são sempre muito mais susceptíveis a lesões osteopáticas e a perturbações na53

EFEITOS CAUSADOS POR UMA PERNA DIREITA MAIS CURTA

EXEMPLO DE UMA MÁ POSTURA

Figura 6 - Efeitos sobre a coluna de uma perna direita mais curta

coluna, em baixo, no meio e no pescoço, tendo frequentemente nessas zonas problemas muito graves.

Estas lesões osteopáticas podem causar sintomas agudos, tais comodor e restrição de movimento, com todos os seus factores complementares.

Às vezes a situação torna-se crónica, se não for rectificada rapidamente, e, frequentemente, toda a estrutura do corpo se modifica para se lhe adaptar. Então persistirão mudanças mecânicas e posturais irreversíveis. Processos inflamatórios desenvolver- se-ão nas articulações, com as inerentes dores na área abdominal, provocadas pela irritação das raízes dos nervos. Por causa dos efeitos secundários das lesões osteopáticas, outros sintomas dolorosos podem sentir-se na vizinhança da bexiga, do baço, no baixo abdômen e no apêndice, por exemplo.

Há outras maneiras de um doente ter adquirido um encurtamentoda perna. Uma causa óbvia pode ser um acidente, no qual a perna tenha sido partida de uma forma grave e encurtada quando tratada. Quando isto acontece, o corpo é forçado a compensá-lo pelo seu próprio ajustamento, o que traz tensão a toda a estrutura. Um notório encurtamento da perna resultará geralmente num uso pouco habitual da articulação da anca, seguido de condições patológicas como a artrite.

Pode acontecer que uma deformação dos pés ocorra durante o nascimento ou se desenvolva durante a infância, e todos os problemas mencionados se agravarão com o crescimento e se transformarão em comportamentos posturais permanentes, aos quais a criança se adaptará. Este é um problema com o qual os ortopedistas e fisioterapeutas ligados à pediatria se têm preocupado. Também eles entendem como sendo da maior importâ ncia a correcção dos erros posturais das crianças.

A má postura, principalmente a adquirida por hábitos ocupacionais prolongados, terá efeitos facilmente visíveis e adversos sobre os órgãos do corpo e resultará em má saude. A função de qualquer órgão do corpo poderá ser influenciada, desde o fígado aos rins, pulmões, cólon ou mesmo coração. Alterações da postura que afectem o tórax interferirão na acção do diafragma, impedindo a respiração, e terão55

efeitos adversos sobre as veias torácicas e abdominais que passam através dele, o que por sua vez provocará congestão de sangue na pelve e no baixo abdômen. Seguir-se-á um repuxamento do estômago para baixo, que afectará os nervos que vêm do coração e os que chegam do pescoço. Para além da pressão física no coraçã o, a interferência no seu fornecimento nervoso penalizá-lo-á duplamente. Estes problemas posturais, quando combinados com as lesões osteopáticas que podem ter causado, poderão ser identificados como a causa inicial de uma interminável lista de doenças, sendo que uma das mais frequentes é a perturbação gástrica.

Cada indivíduo tem uma postura “normal” com a qual funciona adequadamente, mesmo com defeitos mecânicos, mas algumas pessoas, cuja postura é má, são mais vulneráveis que outras. A incidência de lesões osteopáticas que forcem as estruturas de suporte e criem restrições à mobilidade são suficientes para alterar o delicado equilíbrio entre o “normal melhor do indivíduo” e a situação de mobilidade restringida, que é o primeiro passo para uma má saúde.

Ligadas a estes problemas posturais estão as condições a que se chega quando os relacionamentos anatómicos dos órgãos internos são alterados por eles. Como demonstrámos, a menor desorganização de qualquer estrutura pode iniciar um processo que conduza à doença. Quando um órgão como o diafragma, o fígado ou a bexiga está muito deslocado, podem surgir sintomas muito dolorosos. Um exemplo muito claro desta situação encontrar-se-á estudando o duodeno. Esta estrutura fica junto do pâncreas, e parte dela está sujeita a pressõ es de sectores do intestino delgado. Como o duodeno é um tubo, pode facilmente ser fechado por uma pressão exterior. Este tubo pode também fazer um nó por pressão exercida para baixo pelas estruturas adjacentes, com as perturbações gástricas que são a sua consequencia inevitável.

Esta breve exposição dos problemas posturais serve para ilustrar o princípio do Dr. Still de que o corpo é uma unidade e que qualquer estrutura ou função anormais numa das suas partes exerce uma influência anormal sobre as outras partes (ver fig. 7). Eis por que os osteopatas acham que é fundamental fazer o reconhecimento do tipo de56

O pressuposto das inter-relações anatómicas dos órgãos internos mostra como as alterações posturais lhes podem causar compressão e deslocá-los das suas posições “normais”.

Figura 7 - O inter- relacionamento dos órgãos internos obriga a que as alterações posturais lhes causem compressão e deslocamento das posições “normais”

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indivíduo que estão a examinar, da forma e do tamanho do seu esqueleto, do seu tipo de articulações, de posição das vísceras e de comportamento mecânico. Pensar num tratamento sem esta abordagem será, no melhor dos casos, apenas um paliativo.

A doença para a qual o paciente procura ajuda é normalmente aponta do iceberg, e o tratamento de, digamos, uma dor de costas, sem que se considerem todos os seus factores de indução, será próprio de uma osteopatia indigente e incapaz de trazer benefícios duradouros.

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7

AS FASCIAE E OS EFEITOS DA TENSÃO

Embora a formação da estrutura óssea, a condição e a saúde dos ligamentos, tendões e músculos sejam os factores mais importantes que gerem o êxito maior ou menor do equilíbrio postural, não podemos subvalorizar a importância das fasciae. Estudando livros de anatomia, verificamos haver uma tendência para separar as estruturas do corpo em partes claramente definidas a fim de identificar as suas funções específicas. De facto, este é um exercício necessário, mas para entender a abordagem osteopática tem que tomar-se como pressuposto a compreensão da interligação entre todas as estruturas físicas necessárias à execução de uma mobilidade livre, essencial a uma boa saúde. O estudo da osteopatia inclui a biomecânica e a cinética além da anatomia e da fisiologia.

Todas as estruturas que mantêm o corpo unido e o sustentam devem ser flexíveis e elásticas. Se, por qualquer motivo, perdem a suaelasticidade ou a sua flexibilidade, haverá uma diminuição de eficiência na execução das suas funções e pode ser perturbado não só omovimento da estrutura do corpo mas também os processos internos de regulação da sáude.

Como exemplo, examinemos brevemente as fasciae da pelve. A superfície da pelve é coberta por muitas camadas de fasciae que59

também envolvem as veias e as artérias circundantes. Na parte inferior do abdômen essas camadas defasciae reforçam a acção dos músculos e dos ligamentos. A fascia forma uma rede que umas vezes serve de sustentação e outras de protecção a órgãos, músculos e ossos. É um revestimento brilhante que num local pode ser macio, noutro pouco firme e semelhante a uma teia, e que, outras vezes, é mais espesso nas zonas de maior peso, onde a protecção se torna necessária. Permanece entre os músculos e forma um amortecedor tão forte que lhes aumenta o poder.

Distorção pélvica

Há uma tira específica de fascia na pelve, conhecida como fascia lata que funciona como um revestimento de todos os músculos da coxa e cobre completamente a parte posterior da pelve, estendendo-se através dos músculos do baixo abdômen. Desce até ao joelho, sobre o qual passa, e interliga-se com a fascia da parte inferior da perna. Ao lado da coxa forma a ligação mais forte do músculo mais importante, o tensorfascia lata (ver fig. 8). A função deste músculo é a de apertar o total do revestimento da fascia lata e a de voltar a coxa para dentro com suavidade e segurá-la. Afascia embrulha-se emvolta dos músculos da coxa e protege alguns músculos da sobrecarga de trabalho, assegurando assim o movimento livre da anca.

Qualquer restrição das articulações da anca, do joelho, da pelve ou, mesmo, da coluna lombar produzirá de imediato sintomas de incapacidade em toda a extensão dafascia lata e nas partes à qual ela serve de suporte. Dentro da pelve, como vimos, quando há uma deslocação da anca, as consequentes distorções dos órgãos, das artérias e das veias encorajarão efeitos prejudiciais.

Células

Podemos agora considerar uma possibilidade muito mais séria esubtil: nomeadamente, a perda de flexibilidade e elasticidade dos tecidos que impede a sua capacidade regeneradora. Já não é só uma60

Área das pernas e do tronco envolvida pelo tensorfascia lata, o tecido mais importante responsável pela postura.

Figura 8 - Área das pernas e do tronco envolvida pelo tensor fascia lata

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questão de a função química dos nossos corpos ser capaz de sintetizar os produtos necessários à continuação da saúde. Envolve a importante questão do movimento; não só o movimento dos ossos, músculos, tendões, ligamentos, fasciae ou sangue nas artérias e nas veias adjacentes, mas o movimento das células. As células têm que ser livres de movimentar-se para exercerem a sua acção de agentes da reparação normal dos elementos dos tecidos, necessários à nossa actividade diária.

Se afascia perder a sua textura aberta, o que pode acontecer por força duma pressão contínua, e se tornar progressivamente menos flexível, o movimento das células será também gradualmente reduzido. Proporcionar-se-ão condições de doença, se o corpo se tornar incapaz de compensar adequadamente essa falha.

O Dr. Still reconheceu e atribuiu grande importância a esse perigo:

Durante muitos anos pensei que os sistemas linfáticos e celulares da fascia se enchiam com fluidos impuros e doentios muito antes de a doença fazer o seu aparecimento, e que esse processo de mudanças conhecido como fermentação, com os seus distúrbios electromagnéticos, era a causa de uma grande percentagem das doenças que procuramos curar.

Como um notável exemplo da importância dafascia para a saúde e a doença, observemos o pescoço.

Distorções do pescoço

Bastante afastado das raízes dos nervos (ver capítulo 5) que emanam da espinal medula, há um outro sistema nervoso conhecido como o sistema autónomo, que normalmente se subdivide nos sistemas simpático e parassimpático. As possibilidades de perturbação deste sistema são infinitas. Ele não só abastece as glândulas secretoras e muitos músculos conhecidos como “lisos”, mas também está ligado a numerosas funções corporais de acção involuntária, tais como as do estômago e intestinos, alterações do calibre dos vasos sanguíneos, batimento do coração e manutenção do processo metabólico.

A parte principal do sistema consiste numa série de formações de células nervosas situadas em duas filas, uma de cada lado e em frente62

TUBO DE FASCIA

CÉLULAS NERVOSAS

Figura 9 - Parte do sistema nervoso simpático do pescoço, onde podeobservar-se a íntima relação entre os ossos e o tubo de fascia

da espinal medula. Uma das partes mais importantes deste sistema (o gânglio cervical), encontra-se dentro do pescoço e forma os nervos dos vasos sanguíneos da cabeça e estruturas tão importantes como as glândulas sudoríparas da cabeça e as fibras nervosas que dilatam o olho.

Está ligado a importantes nervos do pescoço. Os distúrbios desta parte do sistema nervoso reconhecem-se por causarem respostas emocionais tais como enfraquecimento, choro, palpitações e diarreia.

Localizado na frente dos ossos da espinha, correspondentes ao pescoço, está uma importante fascia que começa na base do crânio e se suspende como um tubo (ver fig. 9). Este tubo de fascia está fixado à parte da frente da coluna por um ligamento logo abaixo do pescoço, ao nível do ombro, e daí continua sob outra forma até ao começo da caixa torácica. Passando através deste tubo do lado do pescoço estão os revestimentos de artérias que fornecem o sangue à cabeça. Este tubo de fascia realiza o trabalho vital e sensitivo de adaptação e estabilização dos complicados movimentos da cabeça e do pescoço. Se permitirmos que se mantenham os distúrbios de posição das vértebras, e se daí resultar uma postura de adaptação, seguir-se-á uma hoste de desorganizações das funções do corpo. As próprias veias e artérias estão muito perto da estrutura óssea. Tanto uma má postura como lesões osteopáticas podem causar tensão nestes vasos e interferir assim na circulação da cabeça. A pressão dafascia pode impedir o sangue de correr.

A conclusão do Dr. Still era a seguinte:

O papel das fasciae na vida e na morte é um dos grandes problemas aresolver. Elas rodeiam cada músculo, veia, nervo e cada órgão do corpo. Há uma teia de células nervosas e de tubos correndo de e para elas... são atravessadas e sem dúvida semeadas de milhões de centros nervosos e fibras que continuam o trabalho de segregar e excretar fluidos. Pela sua acção vivemos e pela sua falha morremos.

A liberdade de circulação através do organismo inteiro é também apenas assegurada se afascia estiver em boas condições de tónus. Um tónus saudável ajuda os músculos, ligamentos e tendões, que por sua vez ajudam o equilíbrio do corpo. A condição de um depende da do outro e, por conseguinte, os ossos, músculos, tendõ es, ligamentos e as fasciae actuam como uma equipa harmoniosa.64

HOMOEOSTATIS

Cada célula do corpo humano vive num fluido chamado “fluido extracelular” que banha os espaços mínimos entre as células e é transportado pelo sangue de uma parte para outra do corpo.

Este fluido extracelular é feito de constituintes que são elaborados através da função da maior parte dos órgãos do corpo. Os pulmões, por exemplo, transportam o oxigénio do ar para o sangue, que por sua vez o transporta para os tecidos e as células. O sistema digestivo absorve para o sangue os nutrientes da comida. As glândulas endócrinas e o fígado convertem os nutrientes para o sistema digestivo em substâncias que possam ser utilizadas pelas células. A corrente sanguínea é, antes do mais, o local em que todas essas substâncias são misturadas e mantidas numa constância correcta que permita uma boa saúde. Foi um fisiologista americano, Walter Cannon, quem descreveu esta manutenção de condições constantes do fluido como homoeostatis. Para que as células do corpo sobrevivam, a composição do fluido que as envolve tem que ser mantida com precisão.

O Dr. Still descreveu os órgãos do corpo como “funcionários” com responsabilidades individuais e afirmou:65

O corpo humano como um todo é um funcionário com tarefas a executar. O cérebro é um funcionário cujo trabalho é preparar e enviar para a frente, através da agência do sistema nervoso, as forças e os fluidos necessários à acção dos órgãos de todo o sistema, sem excepção de nenhum, e essa função tem que ser executada com vista a um grau perfeito de saúde.

Os fisiologistas concordam que a homoeostatis é perturbada pelo stress, o qual neste sentido significa qualquer estímulo que crie desequilíbrio no fluido extracelular. O stress pode vir de factores como o calor, o frio, sons elevados ou falta de oxigénio ou ocorrer dentro do próprio corpo, originado na dor, tumores, emoções destrutivas, etc. A maior parte do stress não é violento mas pode haver um stress extremo originado em factores como infecções graves, operações cirúrgicas e assim por diante.

O corpo tem uma capacidade notável para repor os fluidos extracelulares em equilíbrio por meio de instrumentos reguladores designados como homoeostatis. Uma alta resistência ao stress é frequentemente observada, e os seres humanos podem adaptar-se a extremos de ambiente tais como o calor do deserto e o frio árctico, por exemplo.O sistema nervoso detecta quando o corpo se está a desviar do seu estado de equilíbrio e, enviando mensagens aos órgãos apropriados, actua sobre o stress e trabalha para regular a homoeostatis.

O Dr. Still explicou quando falava de um órgão importante:

Se este funcionário falhar no recebimento da força exacta por parte do sistema nervoso, o sangue arterial será de uma qualidade inferior e impura. E, deste modo, todos os órgãos ficarão doentes na proporção da má qualidade do sangue arterial que receberem e do qual retirem alimento.

A vida dentro do corpo humano é portanto como uma corrente que entra de um lado da piscina e sai do outro. Enquanto este movimento da corrente for ininterrupto, a água da piscina será clara e fresca. A água que sai deixa espaço para a água que entra e proporciona alimento à vida que nela floresce e que será a homoeostatis. Se o fluxo de saída for obstruído, não haverá corrente através da piscina e a água tornar-se-á estagnada.66

Consideremos o processo principal da vida: devemos inspirar oxigénio e expirar dióxido de carbono e resíduos gaseificados. Precisamos de comida para reconstruir as células do corpo e para providenciar a energia, o que é completado pela ajuda do oxigénio. Produtos inúteis dos tecidos musculares e células são rejeitados para o sangue e a linfa e descarregados do corpo. Os intestinos e o sistema urinário são os caminhos de saída para os resíduos. Também o sistema digestivo trabalha de um modo similar ao da piscina que atrás descrevemos.

Também os poros da pele são essenciais para a absorção dos efeitos da luz, ar e água, eles próprios lançando fora os resíduos, através da transpiração.

É de vital importância manter activamente abertos todos estes caminhos de saída. Quando aí existem habitats vivos prejudiciais, eles tornam-se inevitavelmente obstruídos e as suas acções preguiçosas, resultando daí que os intestinos, os rins, os pulmões e a pele fiquem estagnados, no mesmo sentido em que falámos disso sobre as correntes. Eventualmente, as células do sangue, o estômago, o fígado e os intestinos ficarão por sua vez congestionados pela acumulação de resíduos tais como ácidos, toxinas e substâncias venenosas, que serão reabsorvidos pelo próprio sangue. Deste modo, as forças homoeostáticas do corpo sofrerão de tensão e a sua função será prejudicada. Desenvolver-se-ão sintomas de catarro, resfriados, gripe, bronquite, enxaquecas, artrite e perturbações dos rins e do fígado. Estes podem de início ser ocasionais e manifestar-se como breves crises agudas. Serão sinais de que o corpo está a tentar eliminar os produtos nocivos. Se os sintomas forem temporariamente suprimidos pelas drogas e nadase fizer para alterar os hábitos que os produziram, então eles tornarse-ão situações crónicas apenas controladas por paliativos.

Vimos no capítulo 7 como a tensão das fasciae pode impedir importantes movimentos das células e como perturbações gástricas podem advir de uma má postura. Tornou-se claro, também, que restrições estruturais, tais como lesões osteopáticas, contribuem para uma má saúde pela alteração do processo homoeostático e, em parti-67

cular, pela interferência no alimento nervoso dos órgãos e dos mecanismos que regulam a homoeostatis.

Pode interferir-se na estabilidade homoeostática sob forma psicológica, através do medo e da ansiedade. Essa situação pode manter-se pela existência de tensão muscular em qualquer parte do corpo. Muita energia vital é reprimida pelo retesamento dos músculos. Isto provoca fadiga desnecessária e cansaço muscular em grupos de músculos que podem estar alternadamente tensos e relaxados, rivalizando uns com os outros. Esta situação pode também conduzir a lesões osteopáticas. A mobilidade normal só será recuperada depois de essas lesões serem remetidas e obtido o relaxamento mental e muscular. As funções digestivas e o batimento cardíaco podem ser restaurados, a respiração voltará a ser relaxada e a leveza da espinha e dos membros será reencontrada. O adelgaçamento e a dureza dos discos intervertebrais serão menos prováveis se a resistência à força da gravidade for diminuída por uma nova postura.

Será razoável aceitar que uma grande variedade de factores pode influenciar a homoeostatis e que esta tem uma enorme capacidade de fazer ajustamentos capazes de enfrentar processos perturbadores. Contudo, uma vez instalada a desarmonia, não é fácil restabelecer o equilíbrio, e, se os fluidos do corpo não se reequilibrarem rapidamente, chegaremos a um mau estado de saúde. Corrigir apenas uma das causas de perturbação não é suficiente. Se uma pessoa, por exemplo, com uma úlcera gástrica, dores nas costas, enxaquecas e má postura induzida pelo tipo de ocupação, se tornar uma doente crónica, não haverá cura se lhe tratarmos simplesmente a úlcera, de uma forma isolada. A remissão da lesão osteopática, um programa de exercícios de reeducação, um tratamento com técnicas de relaxamento dos órgãos e dos músculos, incluindo algumas aplicadas pelo próprio, tornar-se-ão necessários, em simultâneo com a dieta, essencial à cura. E assim regressamos à ideia do tratamento da pessoa e de todos os seus problemas como um todo, em vez de tratar apenas os sintomas, paralelamente à necessidade de ter sempre presente que um distúrbio numa parte do corpo não está desligado de outro que exista noutra parte.68

DANIFICAÇõES DOS DISCOS

Um dos mais espantosos problemas para os pacientes é compreender e tentar conciliar a imensidade de diagnósticos que lhes é feita para as suas queixas do “disco”. A descrição dos diagnósticos inclui discos protuberantes, discos deslocados, discos gastos, lesões do disco e, com certeza a expressão mais ouvida, hérnia discal. Um grande número de pacientes acredita que os discos saem do sítio e que os osteopatas, por meios especiais só deles conhecidos, os voltam a pôr no lugar. Hérnia discal, não sendo um termo osteopático propriamente dito, entrou na sua terminologia. O termo tem a vantagem de ser uma forma simples de explicar a um paciente que tem um problema do disco sem o preocupar com demasiados pormenores, assegurando-lhe ao mesmo tempo que não sofre de nada mais sério. Infelizmente, “hérnia discal” foi frequentemente interpretado literalmente, como se um disco tivesse “escorregado” e se tivesse separado das articulações da coluna. O termo “hérnia discal” também se tornou sinónimo deprolapso do disco”. Isto, acrescido da deturpação do modo de aplicação do tratamento osteopático, voltou a dificultar aos pacientes acompreensão do diagnóstico.69

Tentarei clarificar os problemas de diagnóstico das danificações do disco e dos problemas das costas com elas relacionados, bem como explicar a abordagem osteopática do seu tratamento.

Causas

Existem basicamente duas causas principais para os problemas discais. A primeira são os efeitos previsíveis dos desequilíbrios contínuos da postura do corpo e, em particular, os efeitos de uma bacia em desequilíbrio. Estes desequilíbrios podem ser hereditários, adquiridos por desenvolvimento gradual ou por acidente. Por outras palavras, muitas danificações dos discos têm as mesmas causas básicas das lesões osteopáticas e são por isso identificáveis com um processo contínuo de pressão e esforço que finalmente obrigam as articulações da coluna a dar de si quando alguns movimentos frequentes do corpo alteram o equilíbrio das forças que suportam a espinha. Alguns dos factores mencionados nos capítulos 4 e 6 sobre lesões osteopáticas epostura podem contribuir para a danificação de um disco ou provoca-la. Em muitos destes casos as lesões osteopáticas já existem antes que ocorra uma danificação do disco e os pacientes podem ter sofrido dores de costas e dificuldade de movimentação antecipadamente. Este é outro importante motivo pelo qual as lesões osteopáticas devem ser encontradas e remetidas o mais cedo possível.

A segunda causa principal da danificação dos discos é o esforço súbito e forte.

Estrutura dos discos

A estrutura de um disco intervertebral é vulgarmente explicada como sendo uma almofada que actua como um amortecedor de choque entre as vértebras. Isto é verdade, mas deve dizer-se que o disco é constituído por uma espessa fibro-cartilagem, rodeada de uma porção laminada e que cresce entre um osso (vértebra) e outro. Não estão separados, e cada disco está firmemente ligado a um comprido e forte70

ligamento que se estende a todo o comprimento da parte anterior da coluna, desde a bacia até à cabeça, o mesmo acontecendo com a parte posterior. Unidos, juntamente com os ossos, discos, tendões efasciae, fazem com que a coluna trabalhe como um todo. Portanto, a ideia de que essas almofadas deslizam para fora é ilusória e não pode ser tomada literalmente. De facto, durante a adolescência, os ossos da coluna estão muito mais susceptíveis de dar de si quando sujeitos a uma violência do que os discos, desde que não tenham sinais de enfraquecimento, o que veremos mais adiante. Se pudéssemos seccionar um disco veríamos que se parece bastante com uma bola de golfe comprimida. O exterior consiste num tecido fibroso laminado, conhecido pelo anulus fibroso, e o interior é de um tecido mais macio denominado nucleus polposo. É essencial que se compreenda que há uma considerával alteração na maleabilidade do disco à medida que a pessoa envelhece. Isto porque o interior ou núcleo muda com a idade. Quando se nasce, os tecidos maleáveis ocupam uma grande superfície. À medida que a idade avança, estes tecidos são gradualmente substituídos por uma fibro-cartilagem mais forte, e a diferença entre as estruturas interiores e exteriores é mais difícil de distinguir, tanto assim que na velhice seria necessário um microscópio para detectar a diferença de estrutura do núcleo. Por vezes, depois dos trinta e normalmente antes dos quarenta anos, começa um processo gradual de secagem do disco e a sua progressiva perda de elasticidade. Nas idades avançadas os discos serão mais estreitos, como consequência de perda do fluido que diminui progressivamente nas articulações. Contudo, não é fora do comum que o estreitamento de um disco ocorra numa idade relativamente jovem. Estes casos mais jovens são possíveis devido à ocorrência precoce de uma lesão osteopática provocada por problemas de postura anormal. Ocasionalmente, podem dever-se a acontecimentos da infância.

Estreitamentos ou contracções de um disco podem acontecer aqualquer momento, em presença de uma lesão osteopática, mesmodurante o seu período de vida maleável. Quando se verifica uma ligeira cedência da articulação dentro da amplitude normal de um movimento e a articulação dos ossos se fixa por muito tempo, esta fica privada de nutrição e os fluidos dos tecidos são em menor quantidade.71

A elasticidade dos discos depende do volume de fluido que contêm, e, se a lesão osteopática persistir, as articulações tornar-se-ão inevitavelmente mais vulneráveis às pressões e aos esforços. Em certas circunstâncias darão de si, causando dano, mais tarde, à própria articulação.

Alguns tipos de danificação dos discos

Para ajudar os pacientes a compreender o diagnóstico dos problemas dos discos vamos observar alguns diferentes tipos de danificação dos mesmos.

Aperto das superfícies

O mais comum dos distúrbios discais é causado pelo esmagamento ou aperto de superfícies determinadas dos ossos da coluna. Quando isso acontece, a diferença entre os graus de restrição e de gravidade dos sintomas é muito ampla. Se estudar a Figura 10 verá que a arquitectura articular do osso do topo, que deveria assentar no interior e articular-se com as ranhuras da arquitectura articular do osso inferior, se deslocou. Os músculos adjacentes, ligamentos, tendões efasciae, estão todos envolvidos numa reacção de tensão e estão portanto sustentando os ossos numa posição de fixação anormal.

Os músculos ter-se-ão involuntariamente contraído para preservarem de danos maiores a articulação e permanecerão a resguardá-la, criando desse modo uma limitação do movimento. O próprio disco não ficará deslocado mas será sujeito a um esforço na ligação com os ossos de cima e de baixo e também na sua ligação aos compridos ligamentos que suportam a espinha e estão presos a cada vértebra. A dimensão da contracção está na razão directa da dimensão do deslocamento que ocorreu.

Esta situação é quase idêntica à da lesão osteopática. É quase, masnão exactamente a mesma, e pode produzir sintomas de vários graus, semelhantes, mas não exactamente os mesmos. A diferença reside principalmente em que o disco foi ferido como resultado do incidente72

A causa mais vulgar de dores nas costas e de restrição é o estreitamento das superfícies articulares. Isto resulta num aperto da articulação e comprime o disco intervertebral.

CORPO VERTEBRAL

DISCO

SUPERFíCIES ARTICULARES

A SETA INDICA A TENSÃO FORÇADA DO DESVIO E NÃO O MOVIMENTO

Figura 10 - A causa mais comum de dores nas costas e de restrição é o estreitamento das superfícies articularesque causou a situação. Os sintomas não serão tão subtis, porque quando o esforço se produziu, os ligamentos, tendões, músculos e fasciae correspondentes deverão ter sido subitamente feridos de um modo mais traumático. Geralmente, todos os tecidos adjacentes ficam inflamados, e outros sintomas, tais como inchaço ou dilaceramento dos músculos, podem ocorrer.

O que é talvez mais importante que se compreenda é que muito raramente uma articulação dá de si sob pressão, sem que outro esforço coincidente se verifique noutras partes do corpo, na área adjacente à qual a articulação está directa ou indirectamente ligada. Em alguns casos, partes do corpo que ficam a alguma distância da zona danificada podem ser afectadas. Isto é lógico se considerarmos que os ligamentos e as fasciae que se ligam à bacia estão também ligados à base do crânio, Todos os que tiveram problemas de costas experimentaram73

dores e a sensação de repuxamento sentida na parte inferior das costas, quando, por exemplo, moviam a cabeça para a frente.

Podem surgir todos os sintomas que acompanham uma lesão osteopática, tais como entorpecimento, alfinetadas e picadelas, ciática, etc. A bacia é frequentemente afectada quando os ossos lombares inferiores sofrem de restrição, porque é também a articulação da anca.

Quando consultar as implicações posturais mencionadas no capítulo 6, verificará que os sintomas são variáveis de caso para caso.

Uma pessoa “entroncada” e baixa poderá sofrer de mais espasmos musculares que uma pessoa alta e “esguia---; do mesmo modo, umtrabalhador braçal de fortes músculos poderá experimentar mais dor provocada pela contracção de músculos que um trabalhador de escritório. Uma pessoa de estrutura pouco flexível, de ligamentos curtos, poderá ter mais dores ciáticas do que outra pessoa mais maleável.

Os doentes entenderão que não é apenas uma questão de decidir a dimensão da danificação que ocorreu, ou, no caso de lidarem com um problema de disco menos sério, da soma dos movimentos que o causaram. Um paciente pode ter sintomas agudos e não ter sofrido grande danificação, enquanto outro pode sofrer de maior dano no interior do próprio disco e não ter sintomas tão agudos.

Discos comprimidos

Aparece uma danificação menor quando houve um acidente que provocou uma movimentação da articulação, mas esta voltou logo à sua posição normal. É então que acontece um esforço do disco, semque se verifique nenhum deslocamento. Isto pode produzir sintomas de pressão ou ligeiro dilaceramento nos ligamentos adjacentes, bemcomo uma ligeira dor. Todos estes sintomas terão desaparecido quase por completo ao fim de uma semana, sem tratamento.

Estreitamento do espaço do disco

Já expliquei como os discos começam um processo de degenerescencia quando o indivíduo envelhece e como podem surgir outras74

alterações do mesmo tipo. O raio-X revela frequentemente umestreitamento do espaço entre as articulações quando comparado comradiografias anteriores. Quando isto é descoberto diz-se aos pacientes que houve um desgaste, o que pode ser deprimente, especialmente sesó chegaram à meia idade. A degenerescencia pode ter-se desenvolvido por uma sequência de danos menores que provocaram falta de nutrição à articulação. Frequentemente, um tratamento osteopático poderá conseguir o alívio dos sintomas. Se houver uma debilidade da articulação, poder-se-ão esperar problemas posteriores de tempos a tempos. Que o raio-X mostre a degenerescência de um disco não é necessariamente grave; pode ser genético e, a menos que muito acentuada, poderá nem sempre ser a causa principal dos sintomas, que serão mais da responsabilidade da pressão dos encaixes da articulação.

Descrições de casos como diminuição da superfície do disco, desgaste do disco ou o seu estreitamento relacionam-se e provêm da degenerescência do mesmo. Uma radiografia que mostre um espaço entre duas vértebras, menor que o das vértebras adjacentes, pode não ser a demonstração de uma degenerescência, sobretudo se não houver um raio-X anterior, com o qual se faç a a comparação, e se a estrutura geral da superfície da articulação parecer saudável. Pode tratar-se de um simples caso de espaço insuficiente ou de postura incorrecta, que, ainda que tendo contribuído para a danificação, não seja a sua causa principal.

Ligamentos em tensão

Os ligamentos e os tendões podem ser esticados ou torcidos quando as articulações sofrem uma deslocação. A situação melhorará apenas com repouso e não há nenhum tratamento osteopático para a sua cura.

Contudo, se depois de os ligamentos e dos tendões estarem curados as dores persistirem por algum tempo, torna-se claro que ocorreu umadanificação da articulação que necessitará de ser tratada para que opaciente fique completamente bom. Com isso desaparecerá qualquer pequeno dano causado ao disco.75

Compressão das articulações (vertebrais)

Outra situação bastante comum, especialmente entre aqueles que têm ocupações sedentárias ou vidas inactivas, é uma compressão das articulações, originada pela falta de um uso regular. Esta compressão pode acontecer sem outra causa que uma inactividade prolongada, a exemplo do que acontece com os motores que gripam quando não são usados. Esta compressão pode causar muitos sintomas e, quando aparece em várias articulações, pode ser a responsável por uma parte considerável dos sofrimentos e dores que atingem o homem moderno e produzir muitos dos efeitos da lesão osteopática. Se a situação nãofor de longa duração responderá bem a um tratamento osteopático ea exercício físico devidamente controlado. A compressão da articulação afectará o fornecimento de fluidos a essa área e a alimentação necessária aos discos.

Quando a compressão das articulações acontece repentinamente, deve-se normalmente ao facto de o paciente ter sofrido uma força, com acção de baixo para cima, através das pernas e da pelve, como pode ocorrer quando se salta desajeitadamente dum muro. Nestes casos, há mais exactamente uma compressão do disco entre as articulações. Esta situação requer um diagnóstico cuidadoso e responde bem a técnicas osteopáticas adequadas. Nestes casos, a própria pelve é muitas vezes afectada, origina-se um problema sacro-ilíaco e faz-se pressão sobre a parte inferior da coluna. Os sintomas são dolorosos, e as tentativas de cuidar das articulações da coluna não terão êxito sem um tratamento correcto da pelve e da anca.

Danos mais graves

As mais sérias danificações dos discos podem envolver o que poderá ser descrito como uma protrusão.

A existência de discos salientes não é de facto tão frequente como somos encorajados a acreditar. Nos últimos vinte anos foi dada muita publicidade a este assunto, sem se dar relevo suficiente a muitas outras situações que são bem mais vulgares. As ilustrações deste76

problema em jornais ou revistas médicas são enganosas porque mostram grandes porções do disco saindo das articulações, quando o quesai, na realidade, é uma porção minúscula.

Um disco pode tornar-se saliente quando, depois de repetidas danificações de uma articulação, se dá um movimento mais brusco originando que uma parte do disco se distenda e se apoie sobre a espinal medula (ver fig. 11). A protrusão pode ocorrer também durante uma acção física ligeira; a articulação dá de si, o disco rompe-se e faz bojo, exercendo pressão sobre estruturas adjacentes. Normalmente, isto afecta de forma indirecta as bases dos nervos espinais. Neste caso o paciente pode nunca ter tido problemas de costas e serfisicamente forte.

A mais vulgar das danificações graves é a ruptura de um disco e, clinicamente, chama-se disco com hérnia.

Uma danificação séria do disco pode obrigá-lo a extravasar, fazendo pressão na espinal medula.

ESPINAL MEDULA

DISCO SAUDÁVEL

DISCO EXTRAVASADO

CORPO DA VÉRTEBRA

Figura 11 - A danificação grave do disco pode originar a sua protrusão e aconsequente pressão sobre a espinal medula77

Mais raramente, o conteúdo interno do disco, o tecido mais macio denominado núcleo, extravasa através de uma fenda no tecido externo mais fibroso, o ânulo, ocorrendo o prolapso do disco (ver fig. 12). Isto pode exercer pressão sobre o canal espinal se o dano se verificar na parte posterior da vértebra. Concluirão, daquilo que foi dito sobre aestrutura do disco e sobre os efeitos do processo de envelhecimento, que o prolapso do disco atingirá mais provavelmente uma pessoa antes da meia idade e ainda mais facilmente à volta dos trinta anos. Que os prolapsos aconteçam mais cedo ou mais tarde, tal depende da saúde física e da história clínica do indivíduo. Depois da meia idade, a espécie de agressão que o prolapso de um disco poderá provocar é semelhante à que causa a protrusão de uma porção de disco degenerado, endurecido ou talvez fendido.

DISCO

PARTE EXTRAVASADA DO NÚCLEO DO DISCO

Figura 12 - Exemplo de prolapso grave78

Problemas de diagnóstico de lesões dos discos

O médico de família, quando consultado por um paciente sofrendo de sintomas discais, preocupa-se com a elaboração de um diagnóstico que lhe permita estabelecer a severidade da agressão e o habilite a tomar uma decisão sobre a acção imediata a ser tomada. Os métodos de diagnóstico são perfeitamente satisfatórios desde que indiquem quando existe uma agressão grave, o que requererá uma supervisão hospitalar imediata, ou uma agressão menor, que poderá melhorar apenas com o descanso, sendo seguida de posterior avaliação. Por vezes, como expliquei, há uma tensão grave dos músculos ou dos ligamentos. Quando tal acontece não é necessário administrar nenhum tratamento físico e o descanso é a medida mais vulgar e sensata a aconselhar. Este método inicial de diagnóstico não é específico e não precisa da identificação do local exacto da agressão nem da extensão precisa da danificação da articulação, antes que o clínico geral possa aconselhar o tratamento que ataque de imediato os sintomas. Existe uma longa lista de graus de agressão, e alguns pacientes podem não ter sentido melhoras com o descanso forçado, enquanto outros podem tê-lo achado suficiente para o alívio dos seus sintomas dolorosos. Globalmente, contudo, o sistema preventivo da prescrição de um curto período de repouso enquanto se inicia o processo de cura é o melhor procedimento nos casos mais simples, e muito adequado, se existir uma agressão mais grave do disco. O tratamento osteopático pode serministrado de imediato, quer nas lesões mais graves, quer nas outras.

Contudo, o que o osteopata decidir fazer dependerá de um diagnóstico muito cuidadoso e, em casos graves, poderá apenas aliviar os sintomas do paciente, se considerar que outro tratamento será inutil nosprimeiros dez dias. Em casos menos graves ele dará, tão depressa quanto possível, um tratamento que liberte as articulações afectadas.

Durante as décadas de 60 e 70, tornou-se prática comum para muitos praticantes da medicina escrever PDI (prolapso de disco intervertebral) nos certificados médicos, em aproximadamente todos os casos em que existissem sintomas discais, e, embora esses casos não fossem confirmados por ortopedistas, um grande número de pacientes acreditou ter sofrido de prolapsos discais.79

Uma grande parte destes pacientes obteve alívio rápido com otratamento osteopático e daí o desenvolvimento de uma situação confusa, que apresentava erradamente o osteopata como aquele que dava cura a esses casos, quase instantaneamente. Isto acarretou o desdém da classe ortopédica, que sabia que tais resultados não eram possíveis, e a confusão de muitos pacientes que ficaram desiludidos com os resultados de um tratamento médico prévio. O diagnóstico de PDI é agora menos usado pelos clínicos gerais e foi substituído pela descrição mais apropriada de “lesão do disco-, preferível por tudo o que envolve e por cobrir uma maior variedade de casos de danificação. Logo, uma agressão menos grave do disco não envolve a sua protrusão. Todos os deslocamentos sérios são capazes de provocá-la, mas só uma pequena percentagem resulta em prolapso.

O treino que os osteopatas recebem para fazer o diagnóstico de lesões osteopáticas arma-os com todo um sistema de técnicas de diagnóstico que não têm rival na avaliação do estrago do disco e que é único pela característica de abarcar, na totalidade, o estado físico do paciente. Mesmo as radiografias, que são essenciais para eliminar suspeitas de lesões ou de patologias em desenvolvimento, proporcionam pouca ou nenhuma informação sobre a danificação dos discos, para além da que é obtida através da observação osteopática. Não há prova de que um movimento possa ser fixado por uma radiografia. Acontece algumas vezes que uma radiografia que mostra uma pequena deformidade conduz o terapeuta a uma localização errada da danificação. Também os mielogramas têm as suas limitações. São essenciais para que o cirurgião saiba a exacta localização do prolapso discal, mas não fornecem nenhuma indicação sobre a quantidade de músculo rasgado ou contraído, ou sobre os factores que, a alguma distância do local da lesão, podem influenciar a sua recuperação. A técnica osteopática de exame pela tensão dos tecidos é valiosa, pode ajudar no diagnóstico de graves situações dos discos e poupar muito desconforto ao paciente por lhe permitir um mais rápido acesso ao tratamento.

Os doentes crónicos da coluna conhecem por experiência própria as dores súbitas que atacam por efeito de movimentos tão simples80

como pegar numa chávena ou numa revista. E sabem também como a dor poderá agravar-se de imediato, algumas horas mais tarde ou alguns dias depois. Tudo isto são pormenores relevantes que o osteopata precisa de conhecer para poder fazer um diagnóstico exacto. Em quase todos os casos houve um crescendo de tensão da articulação, durante algum tempo, devido a questões posturais ou lesões osteopáticas não tratadas. Mesmo nos casos de súbita agressão do disco, a estrutura terá dado de si na direcção de forças comandadas pela postura e pela forma do paciente. O tipo e a duração das dores, as áreas nas quais elas são sentidas, o número de contracções nos músculos e até pormenores como a temperatura da superfície da pele são dados importantes para um diagnóstico exacto. A história dos problemas discais do paciente pode revelar que a articulação afectada foi local de graves incidentes anteriores de esforço, logo, estando mais predisposta a ceder sob tensão. Quando o paciente está com muitas dores, o osteopata não lhe prolongará o sofrimento levando a cabo um exame osteopático completo. Contudo, numa primeira consulta, precisará sempre de determinar a extensão da danificação e não poderá começar nenhum tratamento sem esse dado.

Tratamento de lesões discais

Com muito poucas excepções, todas as lesões discais, seja qual fora sua espécie ou gravidade, respondem bem ao tratamento osteopático, e as menos graves são rápida e efectivamente aliviadas. As mais graves demorarão mais tempo a tratar dependendo da extensão da lesão. Um prolapso grave, consequência de acidente violento ou traumático, responderá a longo prazo ao tratamento osteopático, mas casos há em que o mesmo não surtirá efeito. É então que a cirurgia para remoção de parte do arco da vértebra e do disco com prolapso se torna inevitável.

É opinião dos osteopatas que a cirurgia não deve ser executada antes de experimentados os métodos de tratamento osteopático, amenos que o paciente esteja a sofrer de modo intolerável.81

Um prolapso genuíno não poderá ser reparado por nenhum tratamento, pela razão óbvia de que o núcleo se escapou através de umaestreita fenda. Contudo, métodos especializados podem aliviar a pressão na articulação e ajudar à cura. Há muito tempo já que se sabe de muitos casos de prolapso que se conseguiram curar. Os tecidos circundantes mostraram ser capazes de erguer uma nova parede fibrosa em volta do material que saiu da sua capa protectora. Pensa-se que todo esse processo demora entre nove e doze meses, tempo durante o qual toda a vida do paciente ficará limitada pelos sintomas. Esta é mais uma forte razão para optar pela operação. O tratamento osteopático a efectuar durante este período requer um diagnóstico cuidadoso, que determine o grau de danificação e uma administração conscienciosa. Osteopatas qualificados usam técnicas especiais para o tratamento de prolapsos discais e consideram que qualquer outro tratamento por manipulação é desaconselhável, uma vez confirmada a existência de prolapso.

Um diagnóstico osteopático cuidadoso será, na generalidade, capaz de determinar os resultados a esperar do tratamento proposto e otempo que demorará a fazê-lo.

Quando um paciente sofreu de uma danificação discal de que securou, formar-se-ão aderências fibrosas em volta das articulações afectadas, que podem causar sintomas desconfortáveis e necessitar de ser removidas por meio de métodos osteopáticos.

Excluindo acidentes violentos, nenhuma danificação do disco acontece, sem que para isso exista predisposição fisiológica. Estas causas podem ser pesquisadas na estrutura básica do indivíduo, na sua postura, ocupação, hábitos sociais e na sua história fisiológica. É prática osteopática a tentativa de identificação dessas causas, e, sempre que possível, a sua correcção através de um programa de tratamentos combinados com exercícios e ainda o aconselhamento para a mudança de más condições ambientais. Deste modo, o tratamento osteopático tanto contribuirá para uma recuperação completa como desempenhará um papel preventivo.82

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TRATAMENTO

Antes de se escolher o tratamento tem de ser feito um diagnóstico cuidadoso. Em termos osteopáticos isto não envolve necessariamente a denominação da situação, que do ponto de vista médico é a etiquetagem dos sintomas. Um osteopata, porque está preocupado fundamentalmente com as falhas mecânicas, anormalidades da estrutura e restrições da mobilidade, identificará as suas causas independentemente dos sintomas daí resultantes. Mesmo assim deve haver uma consulta,completa e pormenorizada na qual o paciente fornecerá a sua história clínica, o relato de toda a medicação que toma ou tomoue o diagnóstico do seu médico, quer ache ou não que isso se relacionacom o seu problema osteopático. O osteopata deve decidir quando umtratamento é contra-indicado ou precisa de alteração. Esta é a principal razão pela qual um osteopata deve ser adequadamente treinado ea única justificável para que um médico seja cauteloso quando recomendar um paciente para manipulação a um determinado técnico.

Muitos pacientes convenceram-se de que tinham problemas “discais” e podem pensar que, sem uma consulta completa, um osteopata não aceitará a sua convicção. E isto porque uma dor de costas pode ter origem em perturbações de estômago, vesícula biliar, rins ou83

pulmões, independentemente de condições musculares; em osteom@elites, doença de Paget ou outros males das articulações. Mesmo quando um osteopata se convence de que essas condicionantes não existem, os problemas mecânicos do paciente serão importantes quando se planificar o tratamento e, por isso mesmo, procurará identificá-los. Um bom osteopata deve reconhecer pela experiência adquirida quando a manipulação é desaconselhável e, devido ao seu treino especializado, descobrir problemas fisiológicos ou das articulaçõ es que passaram despercebidos ao médico de família, dado não serem relevantes para o tipo de tratamento que prescreveria.

O raio-X não é muito utilizado pelos osteopatas, e muitas informações significativas podem ser obtidas por um exame fisiológico. Contudo, quando um osteopata tiver a mais leve suspeita de qualquer doença da coluna vertebral ou das articulações, impeditiva de determinado tratamento, pedirá um raio-X antes de prescrevê-lo. São muito raras as situações em que o raio-X não revele essa situação proibitiva da manipulação, mas, vulgarmente, o paciente terá uma história de sintomas que conduziram anteriormente a investigação médica ou que o osteopata descobrirá durante a consulta. Se por qualquer razão opaciente não consultou ainda o seu médico de família sobre os sintomas que o afligem, e se o osteopata tiver necessidade de um exame específico, não prescreverá tratamento algum enquanto as suas dúvidas não forem esclarecidas. Além disso, um paciente poderá sempre consultar um osteopata qualificado, com direito a sigilo absoluto.

Um osteopata conhecedor e experimentado utilizará um amplo leque de técnicas variadas no seu trabalho diário. Aplicará as suas técnicas de acordo com a exigência da situação e a duração do tratamento variará consoante as necessidades do paciente. Um tratamento durará em média de vinte a trinta minutos.

Durante a primeira consulta, o osteopata fará uma avaliação das necessidades básicas de cada paciente bem como dos seus sintomas; não se esperará, por exemplo, do paciente mais idoso, que se vista rapidamente durante o tratamento; não se exigirá a um paciente com tensão arterial alta ou vertigens que permaneça com a cabeça fixa para trás durante muito tempo; um paciente com espasmos graves dos84

músculos mais profundos não será examinado ou tratado de modo que lhe cause um agravamento desnecessário da dor. Os pacientes que estão nervosos ou tensos serão ajudados a descontrair-se antes de qualquer tratamento. Mesmo pacientes muito calmos ficam muitas vezes temerosos de novas experiências, e o osteopata precisará de estabelecer com eles uma relação de confiança.

O tratamento osteopático nunca poderá ser uniformizado; um tratamento individual será criado para cada paciente, numa situação particular, a fim de ir ao encontro de condições precisas. A primeira coisa que um paciente observará ao consultar um osteopata é que ele não tem qualquer equipamento para além das próprias mãos. Se tiverem um equipamento eléctrico é porque são ligados à fisioterapia e provavelmente especializados no tratamento de danificações superficiais, mas não terão necessidade dele para casos osteopáticos. Alguns osteopatas também estão qualificados como acupunctores e poderão ter ainda aparelhos de medir a tensão no seu consultório. Poderão por vezes usá-los para confirmar um diagnóstico. Tratamentos englobando a acupunctura pareceram eficazes em certas circunstâncias, mas qualquer dessas terapias é em si mesma completa e não devem ser usadas conjuntamente, a menos que o seu praticante esteja muito bem treinado em ambas.

Os osteopatas utilizam o que denominam ‘tratamentos dos tecidos moles”. Aos olhos do paciente, parecem uma espécie de massagem. De qualquer modo, os tratamentos dos tecidos moles não têm nenhuma semelhanç a com a espécie de massagens que se fazem nos banhos turcos, ginásios ou centros de massagem. Nem são parecidas com as massagens terapêuticas de massagistas diplomados; têm uma função diferente. O tratamento dos tecidos moles utilizado pelos osteopatas é, na verdade, exclusivo da aprendizagem osteopática e não é usado mesmo por outro tipo de terapeutas por manipulação. A razão pela qual a osteopatia desenvolveu o tratamento dos tecidos moles é consequência da técnica do Dr. Still de “pesquisa e de começo de tratamento de todas as doenças nas fasciae”, que só pode ser influenciado através dos tecidos moles. As técnicas de tratamento dos tecidos moles exigem um instinto especial que não se aprende de forma mecânica85

e, por isso, variam de praticante para praticante. O tratamento dos tecidos moles, quando usado correctamente, pode aliviar completamente os sintomas e tornar desnecessário outro tratamento por manipulação.

O osteopata pode usar um certo número de técnicas para relaxar opaciente, envolvendo pressões leves em determinadas partes do corpo, particularmente nas costas, e movimentos respiratórios. Imaginemos um paciente estruturalmente “desorientado” e que a função do osteopata seja orientar as suas estruturas de suporte. Isto poderá significar acolocação do paciente num diferente número de posições e o uso de métodos que sincronizem a respiração por leves ajustamentos. O diafragma ou o queixo podem ser alvo de atenção especial. Há umavariedade inumerável de tratamentos osteopáticos para redução da tensão e preparação dos pacientes para um relaxamento confiante. Todas as técnicas mencionadas devem proporcionar agrado e conforto.

Todas as informações obtidas pelo osteopata durante a primeira consulta serão pertinentes para orientar o tratamento e modificá-lo, segundo circunstâncias especiais.

Será dada atenção a cada lesão osteopática detectada. As articulações afectadas serão localizadas e tratadas. A ordenação do tratamento será cuidadosamente elaborada, e nenhum movimento das articulações será descuidado por um bom osteopata. Ele está habilitado aidentificar as articulações que mais recentemente foram restringidas, antes de quaisquer outras, e providenciará antecipadamente a preparação de músculos e ligamentos. Sempre que possível, o osteopata utilizará métodos mais ligeiros que as técnicas manipulativas. Esses métodos são por vezes descritos como “funcionais” ou como “correcções posicionais”. Um bom osteopata poderá tentar reintroduzir o movimento em articulações restringidas há muito tempo. Poderá aconselhar um programa de tratamentos de correcção usando métodos de tracção provavelmente combinados com exercícios de rotina.

Quando existiram lesões ou equilíbrio postural alterado, durante alguns anos, a situação apresenta-se como crónica ao osteopata e exige uma cuidadosa avaliação. Nenhum osteopata competente tentará corrigir rapidamente uma situação destas. Fazê-lo seria tonto e peri-86

goso, porque a tentativa de correcção desse problema iria provocar o desenvolvimento de situações crónicas posteriores. Por esta razão, umosteopata competente explicará as causas há muito tempo instaladas e encorajará o paciente a ter em conta as questões posturais tanto quanto os exercícios de correcção do programa sugerido. O movimento súbito das articulações não originará necessariamente a mobilidade normal, objectivo primeiro do tratamento osteopático. Um paciente pode pensar que o osteopata minimiza o trabalho dos tecidos moles, no primeiro tratamento, quando em presença de condições agudas, mesmo que julgue necessário reduzir o espasmo e o provável inchaço na proximidade das articulações. Os pacientes gostariam muitas vezes de ter uma “boa massagem”, mas nem sempre isso é aconselhável. As situações agudas são acompanhadas de inflamação que se reduzirá se os principais factores de causa forem remetidos, e, por isso, o osteopata tentará primeiro aliviar as articulações. Nestes casos, a manipulação casual é definitivamente desaconselhável e pode agredir os próprios tecidos moles. Os osteopatas recebem um longo treino para se assegurarem de que os quadros em que se produziram as lesões são correctamente diagnosticados e para aplicarem o método mais eficiente de cura, sem agravar os sintomas ou causar desconforto desnecessário ao paciente. Nisto levam eles a palma aos profissionais não osteopatas. O alívio dos sintomas agudos poderá parecer, por si só, a um paciente distraído, um meritório consolo, mas não deveria ignorar a necessidade de tratamento mais demorado para prevenir a recorrência dos sintomas. Por vezes é preferível sofrer de sintomas agudos por alguns dias mais, se com isso se obtiver um alívio mais prolongado. Quando emprega técnicas de manipulação, o osteopata escolherá umaou duas entre as 150 disponíveis. De novo, aqui, ele adaptará o seutratamento às necessidades do paciente. A forma e a altura do paciente influenciarão a escolha. Ele julgará mais simples usar uma técnica num paciente muito grande, e outra, completamente diferente, em alguém leve, e outra, ainda, em alguém com curvatura lateral da coluna (escoliose), e outra em alguém com inclinação posterior ou anterior (cifose ou lordose), enquanto que pacientes mais idosos poderão precisar de diferente tratamento. Muitos pacientes não têm87

estruturas flexíveis, e o osteopata evitará agarrar, digamos, uma anca, ao tentar uma confortável amplitude de movimento. As técnicas osteopáticas são frequentemente fáceis de copiar mas não são levadas a cabo de forma efectiva ou segura sem treino e experiência.

As manipulações osteopáticas não têm que ver com as manipulações cirúrgicas usadas nos hospitais para tratar deslocações. Um qualquer paciente que tenha feito uma deslocação reposicionada não deve esperar que o tratamento osteopático lhe seja de algum modo semelhante. As técnicas usadas para mobilizar articulações e remeter as lesões osteopáticas são denominadas “ajustamentos”. Esta foi a palavra que os osteopatas julgaram mais eficaz e é de facto uma expressão muito usada pelo Dr. Still nos seus escritos. Embora haja livros de textos sobre técnicas osteopáticas de manipulação e métodos específicos definidos para usar em determinados tipos de restrições, não é, nem nunca foi, o objectivo ideal do osteopata usar a mesmamanipulação para o mesmo caso, em pacientes diferentes. A arte da manipulação é como a de tocar piano; cada intérprete saberá ler a partitura mas dar-lhe-á inevitavelmente uma volta diferente. Os críticos musicais detectam facilmente diferentes interpretações do mesmo concerto, quando tocadas por pianistas de talento. Os pacientes fazem indubitavelmente o mesmo e reconhecerão facilmente um bom ou um mau osteopata. Além disso, os melhores osteopatas não se ficarão por tratamentos específicos, ainda que modificados e adaptados a necessidades especiais, mas descobrirão os seus próprios métodos de reabilitação de articulações. Um treino osteopático minucioso terá necessidade de um grande conhecimento anatómico.

Os pacientes gostam de saber se o tratamento vai doer. A manípulação não provocará esse efeito. Contudo, poderá ser experimentado por momentos um certo desconforto, quando se fizer um ajustamento, e tal poderá ser acompanhado, por segundos, de um estímulo doloroso. Tal dependerá inteiramente da intensidade de dor que o paciente experimentou desde o início da doença. Nenhuma dor será causada a um paciente, pelo tratamento osteopático, se ele não a sentir já. Se lhes surgir uma dor aguda durante a consulta, é muito improvável que o osteopata lhes administre um tratamento que a agrave. Contudo, se o88

paciente estiver com uma dor muito aguda, é natural que sinta algumas técnicas como momentaneamente dolorosas ou desconfortáveis. Dado que o osteopata pode usar o corpo do paciente como uma alavanca para reabilitar articulações restringidas, ou colocar o paciente em posições pouco comuns, para fazer a tracção das articulações envolvidas, este poderá sentir-se “repuxado”. Essa sensação estará relacionada com aintensidade da dor ou do desconforto que já sentia antes, e aqueles que recebem tratamento sem os sentir podem achá-lo extremamente agradável. O motivo da colocação dum paciente em caracol ou numa posição ligeiramente contorcida é o de possibilitar ao osteopata oacesso a uma articulação com o mínimo esforço possível. Frequentemente, as articulações podem ser reabilitadas colocando o paciente em posições fora do comum e sem que haja nenhuma espécie de manipulação. Por vezes, o osteopata julga totalmente contra-indicada a manipulação das articulações e aplica outras técnicas como tracção, respiração rítmica ou tratamento reflexo.

Recentemente, tornou-se vulgar descrever a manipulação osteopática como uma técnica que usa impulsos de alta velocidade. Não é de todo uma generalização ideal. A palavra impulso sugere forçosamente empurrar ou puxar e está ligada a forças dirigidas. Há apenas um pequeno número de manipulações em que um puxão súbito e controlado se aplica, com uma intenção bem determinada. O paciente sente apenas um rápido e curto movimento de articulações específicas. Isto pode causar desconforto ou ligeira dor por uma fracção de segundo. Se for feito de forma habilidosa e se o paciente estiver completamente relaxado, sentir-se-á como que surpreendido. Contudo, a maior parte das manipulações não envolve esta técnica de “puxão” e tem mais a ver com movimentos suaves funcionando como alavancas através das articulações. Um osteopata experiente não utilizará movimentos “bruscos”, a menos que o paciente esteja adequadamente preparado. A duração do tratamento a aplicar dependerá de o que o osteopata diagnosticar e do acordo do paciente. Se o paciente não quiser ser manipulado, o osteopata não insistirá.

Se o paciente tiver uma doença já antiga, a primeira consulta pode levar uma hora e incluir o começo do tratamento. O osteopata pode89

sugerir um programa de tratamentos curtos a intervalos cada vez maiores. Saberá avaliar a quantidade de tratamentos necessários. É razoável que o paciente espere do osteopata a informação do tempo de tratamento e dos seus custos aproximados. O paciente decidirá então se quer ou não ser-lhe submetido. Quando uma postura deficiente foi uma das causas principais da dor e o descaimento dos órgãos internos se tornou num factor de agravamento, o tratamento terá em conta essas condições. O tratamento incluirá técnicas para aliviar qualquer bloqueio mecânico da circulação e serão usados métodos próprios para aliviar a congestão dos órgãos. As estruturas serão reerguídas por tratamento manual, e o osteopata completá-lo-á usando as pontas dos dedos para manipular os tecidos moles. O paciente poderá ser tratado deitado de costas, de barriga para baixo ou de lado.

Quando há distúrbios de carácter anatómico, serão usadas técnicas específicas. Alguns exemplos são a drenagem da vesícula, o levantamento do cólon, o relaxamento do diafragma ou o alívio da congestão nas veias portas. Durante a consulta, o osteopata terá verificado cuidadosamente os ritmos do aparelho respiratório. Dado que estes ritmos podem ser alterados pelo equilíbrio ou pela força da gravidade, e o tratamento pode requerer a colocação do paciente em posições pouco comuns, o osteopata terá que comparar as suas alterações.

Como a osteopatia se preocupa com todos os factores causais, otratamento incluirá o diagnóstico e o tratamento de qualquer lesão osteopática. Poderá ainda abranger alguma manipulação da coluna vertebral e incluirá de certeza o tratamento de todas as estruturas que, mesmo de modo remoto, possam afectar a tensão dos órgãos envolvidos.90

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OSTEOPATIA CRANIANA

A osteopatia craniana significa um avanço na medicina osteopática e desenvolveu-se a partir do trabalho do Dr. W. G. Sutherland, umdiscípulo do Dr. Still, que começou a sua investigação há cinquenta anos. O próprio Dr. Stíll sublinhou a importância do conceito de totalidade da terapia osteopática e usou muitas técnicas que envolviam o tratamento da cabeça como elemento integrante do todo que é o corpo do paciente. Ele constatou também que o fluido cérebro-espinal era o “mais importante de todos os elementos conhecidos do corpo humano” e procurou a sua influência na acção curativa.

Contudo, numa primeira fase, o Dr. Sutherland, concentrando a sua atenção na ideia de que as articulações da caixa craniana tinham sido concebidas para a mobilidade, fez descobertas cruciais sobre os movimentos involuntários ligados à respiração, que tinham lugar por todo o corpo, bem como sobre a mobilidade do sistema nervoso central e das suas estruturas de ligação. A consequência disso foi o desenvolvimento de um novo leque de diagnósticos e técnicas de tratamento que alargaram o potencial do tratamento osteopático. Embora relacionados com o tratamento do crânio, proporcionaram aabordagem completa às causas mecânicas da doença com fundamento91

na relação entre os mecanismos cranianos, as funções do resto do corpo e a homoeostatis. Estes avanços, de facto, confirmaram a crença osteopática de que o tratamento devia abarcar o corpo inteiro em vezde se dirigir apenas às partes afectadas. A teoria do Dr. Sutherland sobre a mobilidade dos fluidos cérebro-espinais foi já fundamentada pelas novas descobertas científicas. O trabalho inovador do Dr. Sutherland existe hoje como um capítulo da terapia osteopática que tem actualmente um amplo campo de acção. Poucos terapeutas, fora dos Estados Unidos, estão a adquirir prática neste tipo de tratamentos, mas há por eles um interesse crescente por parte dos terapeutas já existentes, sendo que muitos dos seus princípios estão a ser incorporados nos novos cursos. As técnicas usadas requerem um alto grau de perícia na palpação e uma aplicação sensata. A própria natureza dessas técnicas impede um tipo de manipulação enérgica, e como umgrande número de crianças pode vir a beneficiar com o seu uso, todos os tratamentos devem ser extremamente suaves e bem controlados. A osteopatia craniana preocupa-se com o equilíbrio fisiológico, aquilo que os osteopatas denominam como mecanismo craniano. Este mecanismo pode estar fora de ritmo ou ter o seu equilíbrio perturbado, quer por acidente, quer, por exemplo, por um parto que tenha provocado desequilíbrios estruturais.

Este livro não pretende abordar em profundidade a teoria osteopática craniana, e vamos limitar-nos a falar das perturbações que beneficiaram com a sua prática.

Quer em adultos, quer em crianças, o tratamento craniano obtém melhores resultados quando em presença de sintomas resultantes de trauma directo da cabeça. Muitas vezes, os incidentes que causaramproblemas são rapidamente esquecidos pelo paciente porque se recuperou deles sem necessidade de tratamento hospitalar. Consequentemente, as doenças actuais surgem desligadas da causa. Dores localizadas, enxaquecas, tonturas e náusea são sintomas que podem seravaliados como respondendo bem ao tratamento craniano. Outros menos claros, como fadiga, perda de apetite, anorexia ou perturbações da visão, também podem beneficiar com ele. Alguns dos melhores resultados foram obtidos no tratamento de crianças muito pequenas. Res-92

ponderam ainda a esta terapia problemas de congestão brônquica, ritmos respiratórios alterados, excesso de sensibilidade ao ruído, agitação, comportamento hiperactivo e casos de depressão. Um examecuidadoso revelou distorções na simetria dos ossos cranianos e perturbações da pulsação craniana, que só é detectável por palpação atenta. A forma de muitas cabeças resulta de forças compressoras durante o desenvolvimento fetal e da tensão do próprio nascimento. Estes traumas menores são para os osteopatas causa de interferência no desenvolvimento do sistema nervoso central. Um diagnóstico etratamento feitos a tempo são essenciais para que haja alguma esperança de obter um funcionamento verdadeiramente normal.

Quer nos adultos, quer nas crianças, as distorções das articulações cranianas podem ter origem em compensações posturais a restrições estruturais noutras partes do corpo, sobretudo na pelve e na base da coluna, Também o inverso é verdadeiro, e as distorções respeitantes ao crânio podem provocar funções desordenadas noutr‘as partes do corpo. E estas terão todas as consequências que mostrámos resultarem das lesões osteopáticas, Afascia está muito ligada a estas interacções entre as distorções do crânio e as do resto do corpo.

Muitas situações persistentes e difíceis, que nem sempre se adaptam ao diagnóstico médico ou respondem ao tratamento padrão, podem ser bastante melhoradas pelas técnicas da osteopatia craniana. Todos os diagnósticos osteopáticos procuram descobrir de que forma as características anatómicas são responsáveis por funçõ es desorganizadas, passando-se o mesmo com o diagnóstico craniano. O tratamento craniano, mais do que qualquer outro, pode produzir uma melhoria surpreendente dos sintomas, aparentemente desligada dos mecanismos físicos desorganizados que interessam ao osteopata.

Uma consulta com um osteopata craniano experiente valerá frequentemente a pena, quer antes, quer depois de outros tratamentos terem sido experimentados.93

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PERSPECTIVA ACTUAL DA OSTEOPATIA

Qual a validade dos princípios da osteopatia, enunciados umacentena de anos atrás, à luz da pesquisa moderna, e qual a eficácia da prática osteopática quando minuciosamente investigada por comparação com os resultados do tratamento médico actual?

Os princípios osteopáticos evoluíram com a experiência e o esclarecimento crescentes, mas não mudaram no fundamental, apesar das múltiplas alterações sofridas pelas várias formas de terapia médica. Como vimos, esses princípios dizem respeito à imunidade elaborada pelo próprio corpo, à mobilidade, à estrutura, à função - que têm a ver com a lei natural.

Tanto a pesquisa médica como a osteopática aumentaram enormemente o campo de aplicação dos princípios osteopáticos e confirmaram muitas das convicções do seu fundador. De facto, quanto mais avança a pesquisa científica, mais se fundamenta, com provas materiais, a ideia de que os problemas estruturais conduzem a processos indutores da doença.

Durante os últimos vinte e cinco anos a profissão médica começou a aceitar a importância dos problemas estruturais em situações comoa nevrite braquial, que dantes se acreditava ser causada por desequi-95

líbrios químicos do corpo. Agora, a terapia fisiológica é considerada o tratamento adequado para ela e outros distúrbios semelhantes. Estas mudanças nos modos de abordagem notam-se mais em relação à ortopedia, onde as implicações mecânicas são necessariamente mais pertinentes.

Também os neurologistas esqueceram há algum tempo a primitiva tendência de pensarem na doença como devendo-se meramente a um defeito ou a um distúrbio em alguns componentes do corpo, e é hoje mais frequente que partilhem o conceito de que ela é uma reacção vital do todo que é o organismo.

Consideram esta reacção como sendo a resposta a factores tão adversos quanto a agressão, a infecção, os agentes químicos, os factores psicológicos, e ainda outros factores, como os nutricionais e osambientais. Eles reconhecem que todos estes factores estão intimamente relacionados e defendem a perspectiva de que, por exemplo, os factores ambientais podem baixar a resistência das pessoas ao nível de as tornar susceptíveis à infecção. Os neurologistas defendem também que as influências psíquicas da tensão podem conduzir a dístúrbios físicos e causar eventualmente doenças neurológicas sérias.

Seria bastante errado concluir que a moderna prática médica, emmuitas áreas, não considere tudo o que actua sobre a saúde, embora, numa grande parte dos casos, pareça apenas preocupada com o tratamento dos sintomas. Os médicos ortodoxos, contudo, foram muito lentos na aceitação do conceito de que todas as desorganizações mecânicas podem tornar o homem mais susceptível à doença.

Desde 1874, houve grandes melhorias no serviço de saúde pública. A medicina evoluiu muito no tratamento dos males causados pelos vírus e pelas bactérias. Doenças da maior importância, como a sífilis e a febre tifóide, foram destituídas do seu significado pela terapia moderna. O clínico geral, nos países tecnicamente mais desenvolvidos, tem hoje um papel diferente. As pessoas vivem mais tempo, como resultado dos cuidados de que a velhice é acompanhada. Enquanto há cem anos se preocupavam com doenças da subnutrição,como o raquitismo, ou com doenças infecciosas, têm agora que fazer frente à osteoartríte, à tensão alta ou baixa, aos problemas de cora-96

ção, etc. Os pacientes mais jovens sofrem em geral da neurose e do stress provocados pela sobrevivência numa sociedade tecnológica. As suas queixas são causadas por condições de ordem laboral e de deslocação, sobrealimentação, excesso de proteínas e de açúcar, casas, escritórios e lugares de lazer abafados e mal ventilados, e - não menos - por emoções destrutivas.

A competitiva vida moderna encoraja a procura de prazeres artificiais e a necessidade de adquirir ou experimentar regularmente coisas novas, e o sentimento de inadaptação surge como consequência do desejo excessivo e da ansiedade esgotante. úlceras de estômago, esgotamentos nervosos e tromboses coronárias são as consequências visíveis. Todas as causas de tensão e doença física que descrevemos, relacionadas com ocupações sedentárias e repetitivas, postura deficiente e lesões osteopáticas, estão ligadas a todos estes factores e não lhes são apenas acrescentadas. Podem por si próprias produzir doenças. Uma grande percentagem de doenças tornou-se num problema ecológico, e o homem civilizado não é fisicamente tão forte quantoo seu predecessor por causa do seu modo de vida mais facilitado.

Paradoxalmente, é muito mais difícil ao médico tratar estas doenças. Mesmo nos tempos da tecnologia electrónica, que tanto contribuiu para a exactidão do diagnóstico médico, e das espantosas invenções que podem habilitar os investigadores a testemunhar o crescimento gradual da doença, três quartos dos pacientes de clínica geral não podem beneficiar desses melhoramentos.

O diagnóstico diferencial é um problema complexo, e a osteopatia não tem meios mágicos para lidar com a doença provocada pela tensão, pelas influências ambientais do trabalho e sociais, pelas agressões ou pela depressão. Contudo, os princípios da osteopatia são hoje tão válidos, quando aplicados à doença em geral, quanto o eram à data da sua concepção, apesar das diferenças radicais nas causas da situação do paciente.

O conceito de prática osteopática do Dr. Still era o da intervenção mínima na doença, o que quer dizer que usava apenas os métodos que considerava necessários para ajudar os pacientes “a porem a funcionaro seu poder natural de autocura. A osteopatia não precisa de ajudas”.97

A osteopatia tinha de preocupar-se com a saúde como um contrário da doença. O seu propósito era encontrar as verdadeiras causas básicas do processo que inicia a doença e esforçar-se por alterá-las - enão intervir no processo ou alterá-lo. Os sintomas, do ponto de vista do Dr. Still, eram a expressão natural da doença. “ Dizemos Doença, quando deveríamos dizer Efeito. A doença é tão natural, num corpo anormal, como o é a saúde quando todas as partes estão em ordem. Os princípios fundamentais da osteopatia são diferentes dos de qualquer outro sistema.” O Dr. Still considerava a doença de uma perspectiva diferente; ela podia resultar de “anormalidades anatómicas seguidas de dissonâncias fisiológicas”. Isto parecia implicar que a osteopatia discordava da “teoria dos micróbios”, o que não aconteceu. A osteopatia afirma apenas que o indivíduo estruturalmente saudável está mais defendido de sucumbir aos perigos da infecção do que outro com uma postura deficiente, lesões osteopáticas, negativamente afectado por más condições ambientais ou vítima de subnutrição. O Dr. Stil também constatou que as causas não podiam ser curadas quando os processos de doença tinham avançado de mais ou eram tratados muito tempo com drogas.

Disse-se que o Dr. Still acreditava que todas as doenças podiam sercuradas por meios osteopáticos. Ele proclamou isso tanto quanto omédico moderno proclama que todas as doenças podem ser curadas pelas drogas. O facto de ele ter usado terapia de manipulação no tratamento de casos como a pneumonia pode parecer bizarro àqueles de entre nós que foram levados a pensar que os antibióticos são essenciais à cura desta doença. Mesmo hoje, a terapia de manipulação é uma medida eficaz quando comparada com outras. Actualmente, pode ser mais prático usar outros métodos, e talvez muito poucos tenham sido preparados e sejam capazes de usar terapia de manipulação, mas, na maioria dos casos, ela revelar-se-ia perfeitamente adequada. Seria ilógico que os osteopatas desconhecessem os avanços da prática médica e as descobertas feitas depois da época do Dr. Still, sobretudo quando este tanto ambicionava ver implementadas as conquistas da ciência. Do mesmo modo que os médicos ortodoxos seus98

contemporâneos, os osteopatas abandonaram práticas que se tornaraminúteis, em troca de novos métodos mais benéficos para o paciente.

É pré-requisito da prática osteopática que se crie entre o terapeuta e o doente uma relação de confiança, relaçã o essa que já faz parte do tratamento. Essa relação é muito mais útil que a administração de um analgésico, sem qualquer explicação, para a dor, ou que a prescrição de um anti-inflamatório sem que se explique o que é a inflamação. Se as causas são explicadas e, sobretudo, se são devidas a condições de trabalho, postura ou hábitos sociais, não haverá desapontamento se não se obtiver alívio instantâneo dos sintomas. O paciente que compreenda as causas básicas da sua doença aceitará muito mais prontamente a responsabilidade de manter a própria saúde e de tomar parte num programa que a melhore.

Um dos mais interessantes pensamentos do Dr. Still é bem relevante para o homem moderno - para a economia física do indivíduo muitos sistemas têm que trabalhar em harmonia. O esqueleto, a musculatura, as fasciae, as vísceras, o sistema nervoso sensitivo, o sistema circulatório, etc., têm a ver com o homem no seu todo.O modelo postural do corpo humano é resultado de uma delicada interacção de forças que requerem um controlo perfeito, liberdade de movimento de todas as pequenas partes e não só das articulações do corpo, porque, como demonstrámos, a desarmonia conduz a uma má saúde. Mais do que nunca, as reacções mentais e emocionais condicionam o comportamento neuromuscular, que, por seu turno, afecta materialmente a saúde. Somos seres humanos civilizados, e as nossas actividades habituais não são naturais e originam um comportamento muito tenso. Quando esta tensão é demasiada, ocorre ochamado ---colapso”. As inter-relações mentais e físicas da nossa vida não são separáveis. A fadiga física e a mental estão inextrincavelmente ligadas. As tensões físicas podem provocar ansiedade, o que nos torna menos capazes de fazer frente às tensões mentais. As restrições de mobilidade na estrutura do corpo provocarão a hipertensão muscular e a fadiga das células nervosas do corpo. O ser humano inteiro fica sujeito a esta reacção e o corpo sofre com isso. Logo, a combinação destes dois tipos de tensões acarretará as99

consequências que já delineámos: doenças dos órgãos, doenças crónicas e, por fim, condições patológicas irreversíveis. Este processo só poderá ser alterado por terapias que tenham em conta, como-um todo, a condicionante psicofísica.

Um osteopata de sucesso é um homem muito ocupado que vai construindo relações de respeito mútuo com os seus contemporâneos de outras disciplinas. Ao tratar problemas originados em desordens de tipo mecânico, vai automaticamente aliviar a carga do médico. Não irá minar a confiança do seu paciente no médico de família mas procurará completar-lhe o trabalho. A extensão da ajuda osteopátíca depende muito do que pretende o paciente. Pode pretender apenas ser aliviado de dores agudas, causadas por um mal de coluna, que não responderam ao tratamento típico, ou pretender ir mais longe, manifestando o seu interesse na prevenção da recorrêncía do problema verdadeiro, reconhecendo que os métodos osteopáticos podem serúteis a curto e longo prazos e aliviar muitas doenças crónicas.

Gerou-se muita confusão, originada na opinião generalizada de que a osteopatia” é a “manipulação das articulações”. A manipulação usada pelos osteopatas é apenas uma das técnicas que a sua prática inclui. Lamentavelmente, muitos fisioterapeutas se reclamam praticantes da osteopatia, apenas porque utilizam técnicas manipulativas. Contudo, por muito sucesso que obtenham, não são de facto osteopatas, a menos que apliquem os princípios osteopáticos, façam uma abordagem osteopática e usem o pensamento osteopático. Esta é uma importante distinção que não pode ser menosprezada.

Há hoje um novo movimento dentro do pensamento médico tradicional que é mais capaz de tolerar as convicçõ es daqueles cujas opiníões e aprendizagem são diferentes das suas, e de adoptar algumas técnicas diferentes, em particular as da osteopatia e da acupunctura. Infelizmente, há princípios osteopáticos que continuam ignorados e considerados como não “científicos”. O que temos para dizer sobre o funcionamento do homem não pode restringir-se apenas aos factos que podem ser provados por experimentação “científica”, sob pena de omitirmos muitas coisas que são obviamente importantes na causa da doença. O tratamento de um largo espectro de doenças e um amplo100

leque de técnicas curativas ou preventivas serão negligenciados se nosativermos inteiramente à prova de experimentação laboratorial.

Um técnico de manipulação não osteopático considera que o objectivo da manipulação é a reabilitação da restrição de uma articulação que, segundo ele, estará a causar os sintomas de que actualmente o paciente se queixa. Quando resolve essa restrição e o paciente sesente melhor porque os sintomas e a dor foram aliviados, o técnico de manipulação não osteopático pensa que o paciente está curado. A verdadeira osteopatia vai muito além disto e considera que as desordens estruturais são, por um lado, a manifestação dos distúrbios da saúde do paciente, e por outro, as causas de uma saúde má.

O osteopata considera o seu papel como o do mecânico de uma estrutura, que tenta alterar a progressão desses processos de má saúde por meios manipulativos, até que as forças naturais do paciente se recomponham a fim de detê-los e alterá-los.

O mesmo conceito deturpado da acupunctura existe por parte daqueles que usam as “agulhas” para aliviar temporariamente a dor, mas ignoram os princípios dessa arte, que tem também um conceito de totalidade em relação à saúde.

A saúde depende hoje de muito mais variantes que há cem anos, e compreende-se portanto que um factor isolado não possa perturbá-la; um cuidadoso teste de laboratório pode identificar simultaneamente algumas dessas variantes. É importante não perdermos de vista que, ao concentrarmo-nos nos pormenores, podemos estar a descuidar o óbvio.101

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CASUÍSTICA

As histórias dos casos que a seguir descrevemos foram seleccionadas para mostrar a amplitude do tratamento osteopático. As referências a“tipo esguio” e “tipo entroncado” usadas nestas descrições foram definidas no capítulo 6. São características estruturais e não indicadores de peso.

Não focaremos casos de pacientes com problemas “discais”, porque esses temas foram tratados no capítulo 9.

Caso 1

Mary, dactilógrafa, de quarenta e oito anos de idade, era alta, do tipo “esguio”. Tinha bastantes problemas de postura básica. O seufémur esquerdo era ligeiramente mais curto que o direito, causando um desequilíbrio na pelve que encorajou a curvatura da coluna. Isto tornou-se mais notório por causa da altura da paciente. Os músculos de suporte eram longos e fracos. Tombava ligeiramente a cabeça para o lado esquerdo e combinava a curvatura da espinha com uma103

inclinação para a frente. Isto foi causado por estar muitos anossentada a máquina de escrever, a ler cópias sempre do seu lado esquerdo.

Esta paciente sofria de dores na anca esquerda com sintomas de entorpecimento na perna do mesmo lado, quando escrevia à máquina por muito tempo. Tinha dores nos ombros, na cabeça e dificuldade em virar o pescoço para a direita quando arrumava o carro. Todos estes sintomas foram aliviados no espaço de um mês. Como a paciente tinha problemas posturais há muito tempo, problemas esses que se tinham agravado com a profissão, não lhe pôde ser garantido que os sintomas não voltariam. A paciente passou a frequentar aulas de ioga e a praticar natação regularmente, resultando daí uma menor frequência na ocorrência dos sintomas, que acabaram por se tornar mais benévolos.

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Caso 2

James, de cinquenta e dois anos de idade, era fisicamente bem constituído e com boa simetria e postura. Era um trabalhador braçal que fazia carregamentos e conduzia uma empilhadora. Durante quatro meses teve uma dor na área do apêndice. O seu baixo abdômen era muito sensível à pressão, e havia tensão nos músculos e tecidos que lhe ficavam por baixo. Por vezes o paciente sentia dores do tipo fisgada na parte da frente da sua coxa direita. Depois de exames médicos exaustivos foi feito o diagnóstico de tensão muscular e de sensibilidade do apêndice.

O exame osteopático mostrou restrições das vértebras lombares edo sacro, com ligeira deslocação da anca direita. O paciente lembrava-se de ter saltado desajeitadamente de um comboio cinco meses antes e de ter sentido leves dores nas costas que logo a seguir desapareceram.

O tratamento das restrições mecânicas aliviou todos os sintomas em três semanas.

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Caso 3

Cathie, de vinte e sete anos de idade, era uma alta e bem constituída enfermeira. Um ano antes começara a ter uma dor muito forte na barriga da perna esquerda. O médico de família prescrevera-lhe por seis semanas um tratamento com anticoagulantes, mas as dores não diminuíram. As análises de sangue e o raio-X nada revelaram. Subsequentemente, desenvolveu uma sensação de queimadura no peito, e dores quando movimentava o ombro esquerdo. Foi recomendada a um especialista que lhe diagnosticou uma fíbrose e reumatismo. Foi-lhe receitado o medicamento adequado ao caso, mas os sintomas persistiram, e a paciente tornou-se psiquicamente deprimida. Nessa altura foram-lhe receitados tranquilizantes.

Esta paciente sofria de restrição na pelve, o que lhe causava asdores na perna. A tensão contínua que isso originava perturbou-lhe o106

equilíbrio da postura e levou à formação de lesões osteopáticas naparte superior das costas, que lhe afectaram o ombro e o peito.

Foi administrado tratamento osteopático no dia da primeira consulta, e, quarenta ‘dias depois, a paciente estava bastante melhor. Já não tinha dores na perna nem no peito, embora persistissem no ombro. Três semanas mais tarde, depois de um tratamento, ficou completamente bem psíquica e fisicamente, e, desde aí, nenhum sintoma voltou.

Caso 4

Phillip, de vinte anos de idade, sofria há sete meses de dores no braço esquerdo, que eram mais fortes de noite e contínuas quando conduzia um furgão, sua ocupação principal. A investigação ortopédica, incluindo o raio-X do pescoço e dos ombros, foi negativa.107

Diagnosticou-se uma nevrose. O paciente tomava oito analgésicos por dia.

A observação osteopática mostrou uma depressão da terceira costela, o que estava a causar um levantamento da clavícula esquerda. Os sintomas desapareceram em três dias, apenas com um tratamentoosteopático. A dor tinha surgido ao paciente um ano antes, após umapartida de rugby.

Caso 5

Gwendolen, de trinta e dois anos de idade, era de baixa estatura, com boa postura. Quatro meses antes tinham-lhe aparecido dores notórax durante uma viagem de comboio. Essas dores persistiram, alastraram para a esquerda e sofriam um agravamento quando se curvavapara a frente. Como trabalhava num ínfantário, o problema era muito desgastante. O raio-X e o electrocardiograma requisitados pelo clínico geral foram negativos. Fez ainda mais exames para afastar a hipótese108

de a dor ser causada por uma úlcera. Mais tarde a dor avançou para o cotovelo esquerdo.

A observação osteopática revelou que tinha uma restrição de uma das costelas, e todos os sintomas desapareceram ao fim de dois tratamentos.

Caso 6

Janet, de quarenta e um anos de idade, era do “tipo entroncado”, com pesada estrutura de ossos. Tinha sofrido, três anos antes, uma danificação da parte inferior das costas, num acidente de automóvel. Ficou incapacitada por um período de quatro meses e recuperou depois de muita fisioterapia. Nunca mais gozou de boa mobilidade da coluna e desenvolveu gradualmente uma restrição da anca direita. Tornou-se necessária uma bengala para se apoiar durante a marcha. A tensão provocada pelo andar, tendo uma tal restrição, e o inclinar-se para se apoiar, causaram uma redistribuição compensatória do109

peso, e isso afectou-lhe a parte superior das costas, passando a sofrer também de dores de cabeça e rigidez do pescoço.

Foi-lhe recomendado um programa de exercícios combinado com dieta para perder peso. Aderiu conscienciosamente, quer à dieta, quer aos exercícios. Recuperou em dois meses a mobilidade da parte inferior das costas, e as dores de cabeça e a rigidez do pescoço desapareceram quase imediatamente. Seguiu-se um melhoramento gradual na amplitude de movimento da anca, e quinze meses depois podia andar facilmente e sem desconforto.

Nota: Enquanto umas restrições da anca se resolvem facilmente, outras requerem a perseverança do paciente na prática de exercícios até ao restabelecimento total, devido ao processo de ossificação das superfícies inter-articulares. Quando esse estado avança muito, só acirurgia pode resolver o problema.

Caso 7

Rose, de quarenta e um anos, era empregada de escritório, tinha uma estrutura esguia” e um peso mediano.110

Tinha notórios problemas posturais, que eram evidentes à primeira vista, produzidos pela sua ocupação principal. Durante muitos anossofreu de enxaqueca e de rigidez nas costas e nos ombros. Tomava regularmente analgésicos e sedativos quando os problemas lhe causavam tensão. Oito meses antes da consulta, quando decorava a casa, deu uma sacudidela às costas quando descia de uma cadeira. No dia seguinte, a dor na parte inferior das costas tornou-se aguda, piorando progressivamente. O seu médico de família diagnosticou uma ciática e receitou fortíssimos analgésicos. Como não se pôde sentar durante muito tempo, teve que faltar ao trabalho durante sete meses.

Quando examinada pelo osteopata, foram diagnosticadas lesões osteopáticas no pescoço e nas partes inferior e superior das costas. Tinha uma depressão pélvica e restrições menores nos tornozelos e nos joelhos. A rotação completa da anca era impossível. Muitas das suas restrições de mobilidade existiam há muito tempo e tinham sido claramente produzidas pela sua postura laboral. O tratamento osteopático aliviou-a em três semanas dos sintomas agudos da ciática, e pôde voltar ao trabalho. Os tratamentos subsequentes ajudaram-na a resolver os outros problemas, e deixou completamente de tomar analgésicos. Foi aconselhada a praticar ioga e, após 14 meses, estava consideravelmente mais flexível e de muito melhor saúde. Durante mais de um ano as enxaquecas e as dores não voltaram.

Nota: Quando a ciática é causada por lesões osteopáticas ou problemas dos discos, responde bem a tratamentos manipulativos e quase sempre desaparece algumas semanas após a reabilitação das restrições que as causaram. Contudo, não é possível determinar com precisão o momento do desaparecimento da dor causada pela inflamação do nervo. Em 60% dos casos a dor aguda pode persistir depois de a causa ter desaparecido. Os pacientes podem ficar desapontados por verem morrer as suas esperanças iniciais no primeiro tratamento, mas mesmo os sintomas mais persistentes desaparecerão após seis semanas de tratamento. A ciática pode ser provocada por tensões que têm o efeito de esticar o nervo, levando assim à inflamação. Nesses casos não é necessária a manipulação osteopática, mas a fisioterapia pode ser aconselhável. Nenhuns sintomas poderão ser completamente aliviados111

nos casos em que as articulações estiverem afectadas, sem que estas sejam devidamente tratadas.

Caso 8

Cyrithia, de cinquenta e dois anos de idade, era do tipo alto eesguio. Tinha a perna direita mais curta, o que, combinado commúsculos e ligamentos finos, lhe causou um desvio postural do pescoço e da cabeça. Quatro anos antes da consulta tinha começado asofrer de vertigens e, depois de exames médicos, foi-lhe diagnosticada a doença de Ménières. Foi medicada para esse mal sem obter nenhum alívio dos sintomas de que sofria. Um ano antes da consulta começou a ter fortes dores de cabeça e de pescoço.

Sustentava a cabeça de modo hirto e tinha medo de a mover livremente por temer a ocorrência de perturbaçõ es do equilíbrio. Começou o seu tratamento osteopático com intervalos de 14 dias, durante oito112

semanas, e iniciou um programa de exercícios adequados, combinados com técnicas de relaxamento.

14 dias após o primeiro tratamento, as dores quase tinham desaparecido, e 14 dias depois do terceiro, melhoraram consideravelmente as perturbações do equilibrio. Só tinha voltado a senti-las uma vez depois do primeiro tratamento, e as dores não voltaram mais.

Voltou para um exame completo dois meses mais tarde e queixou-se apenas de desequilíbrio, que, fez notar, não durara mais de dois dias. Estes problemas menores fizeram-se sentir três meses mais tarde, depois do que desapareceram para sempre. Foi aconselhado à paciente que mantivesse os exercícios de esticamento dos ligamentos como medida preventiva.

Caso 9

George, de cinquenta e oito anos de idade, do tipo alto e “esguio”, trabalhava numa fábrica de sapatos desde os dezasseis anos. Operava uma máquina que lhe exigia o acto de empurrar devagar com o seubraço direito. Durante muitos anos sofreu de dores na parte superior das costas, entre as espáduas, local onde se desenvolveu uma curvatura. Durante o Inverno de 1982 ficou doente com náuseas, vómitos e diarreias. O médico de família começou por prescrever repouso e, como os sintomas persistiram por mais de uma semana, receitou comprimidos contra os vómitos. Os sintomas agudos pararam de imediato mas o paciente continuou a sentir “arrepios”, dores cortantes nas costas e mal-estar generalizado. Os exames hospitalares não revelaram causas para os sintomas, e suspeitou-se de uma pancreatite.

Quatro meses mais tarde, o paciente estava ainda incapacitado por causa da dor, da depressão e dos “arrepios”. Um exame osteopático em Setembro de 1983 revelou a restrição de oito vértebras torácicas e das costelas a elas ligadas. Da cura dessa lesão e do relaxamento do diafragma resultou um alívio espectacular da dor. A seguir, um tratamento manipulativo da área do abdômen superior, sob direcção osteopática, coincidiu com a diminuição gradual do resto dos sinto-113

mas. O paciente foi aconselhado a pedir ao patrão uma ocupação diferente, que não o obrigasse a esticar continuamente o tórax e os ombros.

Casos 10 e 11

Jean e Gillian, de cinquenta e sete e cinquenta e nove anos respectivamente, eram irmãs. Tinham sido ambas operárias de uma fábrica de sapatos durante toda a sua vida de trabalho. Tinham estatura esguia e peso médio. Ambas sentiam, há dezoito meses, dores nos ombros, no pescoço, no braço direito, picadas e alfinetadas nos dedos e dores de cabeça. Jean tinha sido recomendada a um especialista que lhe aconselhou a operação ao canal do carpo (uma incisão no pulso para separar os ligamentos e os ossos afectados, o que proporcionaria o melhoramento da circulação das mãos).114

O exame osteopático revelou que as irmãs tinham alterações posturais da parte inferior das costas e da pelve, ombros curvos eligeira inclinação da cabeça, originadas pela posição em que se sentavam para trabalhar. Foram detectadas restrições das articulações imediatamente abaixo do pescoço e da zona inferior das costas. Era visível algum desgaste das articulações, mas não havia indícios de artrite avançada. O tratamento osteopático trouxe em seis semanas um alívio completo dos sintomas de que Jean sofria, e a operação tornou-se desnecessária. Gillian, sua irmã, foi tratada das dores nos ombros, queixo e braço, mas as alfinetadas e picadelas nos dedos persistiram. Dois meses mais tarde foi aconselhada a consultar o seu médico de clínica geral, e este enviou-a a um especialista que a operou ao canal do carpo, o que a curou dos sintomas residuais. Ambas as irmãs foram aconselhadas a fazer exercícios simples de rotina para manterem amobilidade dos ombros e do pescoço, compensando, assim, as longas horas de trabalho em posições estáticas.115

Caso 12

Geoffrey, de vinte e seis anos de idade, era condutor de camião. Tinha um tipo bem constituído, “esguio”, peso médio, e durante seis meses teve dores na zona inferior do tórax que mais tarde irradiaram para cima. O raio-X e o electrocardiograma foram negativos. O paciente foi tomando analgésicos e continuou a trabalhar.

O exame osteopático mostrou lesões nas articulações da coluna média que estavam a limitar o movimento do diafragma. As áreas da vesícula e do estômago eram dolorosas quando palpadas. Foi-lhe aplicado tratamento osteopático para fazer regredir as restrições das articulações espinais, e a vesícula foi drenada manualmente.

O paciente foi curado de todos os seus sintomas, e desde aí nuncamais se queixou de nenhum problema.116

Caso 13

Edward, de cinquenta e dois anos de idade, era trabalhador de escritório, do tipo alto e “esguio”, com abdômen descaído por falta de actividade física e da posição de trabalho, permanentemente sentado a uma secretária. Durante cinco meses sofreu de uma incontrolável necessidade de urinar frequentemente e teve que ser medicado para o efeito. Quando jardinava esticava os músculos da zona inferior das costas e produzia-se uma dor na área dos rins.

O exame osteopático revelou restrição da segunda vértebra lombar e ainda um descaimento pélvico. As dores desapareceram com a resolução destes problemas. A regressão das adesões na zona abdominal aliviou o paciente dos problemas urinários. Voltou a tratamento doismeses mais tarde, depois de uma ligeira recaída, e, desde então, retomou os seus hábitos normais. Frequenta actualmente um ginásio para exercícios de manutenção que aumentam o tónus dos músculos abdominais.117

Caso 14

Neil, de sessenta anos de idade, era do tipo “entroncado”, aparentemente sem problemas posturais. Tinha um peso um pouco acima do desejável para a estatura. Durante três meses sofreu de dores no lado esquerdo do peito que pioravam à noite e lhe perturbavam o sono. Um exame médico aturado confirmou não haver problemas de coração, e foi também eliminada a possibilidade de doença de estômago.

Prescreveram ao paciente comprimidos para dormir e analgésicos quando necessários. Diagnosticaram uma possível tensão dos músculos que envolviam a zona das costelas. A partir daí o paciente começou a sentir-se tonto. Começou também a sentir necessidade de urinar com mais frequência.

O exame osteopático revelou haver restrição da sexta vértebra torácica, da amplitude de movimento do ombro esquerdo e ainda retesamento na parte inferior do pescoço. Em duas semanas o tratamento aliviou as dores. Desde então o paciente deixou de precisar de soníferos e o sono retomou a normalidade. Os restantes sintomas desapareceram num mês.118

Caso 15

Vera, de quarenta e dois anos de idade, consultou o osteopata por ter lido numa revista que o tratamento osteopático curava muitas vezes a insônia.

Era bastante pesada e de tipo “entroncado”. Até um ano atrás nunca tivera problemas de sono. No momento da consulta acordava às 03.00h e não readormecia até as 07.00h, altura em que devia levantar-se. Não tinha problemas domésticos nem económicos, nem passado de tensões ou doenças nervosas.

A consulta revelou que sofrera de dispepsia durante dezoito mesese sentia um aperto no coração, sobretudo durante a noite. Tinha também sofrido de dismenorreia dez meses antes, que tinha tratado commedicação própria. Descobriu-se uma tensão muscular considerável em volta do ombro e uma lesão osteopática mínima. Com o relaxamento dessa zona e da zona torácica, várias vezes durante um período de dois meses, a paciente readquiriu os seus hábitos normais de sono.119

O tratamento osteopático das costas, da pelve e do abdômen foi seguido de alívio completo de todos os sintomas residuais. Foi-lhe recomendado que perdesse peso e fizesse regularmente exercício.

Caso 16

Malcolin, de quatro anos de idade, sofrera durante dois anos de dores nos calcanhares. Normalmente, as dores eram de baixa intensidade. Ocasionalmente tornavam-se agudas e súbitas, obrigando a criança a gritar, sobretudo à noite. A professora tinha-o classificado comolento, desinteressado e triste.

A observação osteopática detectou uma restrição menor da quinta vértebra lombar e uma pressão vertical no topo da coluna. A criança foi tratada uma vez por semana, durante dois meses. Foi-lhe provocada uma mobilidade diferente da parte inferior da coluna, e foram usadas técnicas cranianas para tratar a área da cabeça. Os sintomas foram aliviados ao fim de um mês e não voltaram até hoje. Malcolin teve a partir daí um comportamento escolar normal.

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Volumes publicados:

1 - A CURA PELA COR 1 Ted Andrews2 - ACUPUNCTURA / Peter Mole3 - MANUAL COMPLETO DE MEDICINA NATURAL / Marcia Starck4 - IRIDOLOGIA / Jarnes e Sheelagh Colton5 - HOMEOPATIA / Anne Clover6 - REFLEXOLOGIA / Inge Dougans e Suzanne Ellis7 - O DIAGNóSTICO PELA RADIESTESIA / Arthur Bailey8 - AROMATERAPIA / Christine Wildwood9 - A CURA ESPIRITUAL Jack Angelo10 -REMÉDIOS FLORAIS Christine Wildwood11 - A TÉCNICA ALEXANDER 1 Richard Brennan12 - NUTRIÇÃO E SAúDE 1 Hasnain Walji13 - SHIATSU / Elaine Liechti14 - CUIDADOS COM O CORPO E A PELE / Sidra Shaukat15 - A MASSAGEM TERAPÊUTICA 1 Stewart Mitchell16 - CHI KUNG 1 James MacRitchie17 - CROMOTERAPIA / Pauline WilIs18 - AYURVEDA / Scott Gerson19 - OS CRISTAIS E A SAúDE / PhyIlis Galde20 - VISUALIZAR PARA CURAR 1 Pierluigi Lattuada21 - GUIA DE MASSAGEM MÁGICA / Angela Donetti e Valerio Lupano22 - COMO CURAR COM A ENERGIA DAS MÃOS / Valerio Sanfo23 - SAúDE E ENERGIA EM 16 ETAPAS / Pauline WilIs e Theo Gimbel24 - OSTEOPATIA 1 Edward Triance25 - HIPNOTERAPIA Hellrnut W. A. Karle26 - QUIROPRÁTICA Michael B. Howitt Wilson27 - CINESIOLOGIA Maggie La Tourelle e Anthea Courtenay28 - MANUAL PRÁTICO DE HOMEOPATIA 1 Ruggero Dujany29 - A MEDICINA CHINESA 1 Tom Williams30 - FITOTERAPIA 1 Vicki Pitman31 - MANUAL DE MEDICINA ORTOMOLECULAR 1 Ana Paula Ivo32 - MANUAL DOS NOVOS MÉDICOS 1 Ted Andrews