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SONIA INEZ EYNG WEBBER A EFICÁCIA DO PROCESSO DE ADOÇÃO INTERNACIONAL Criciúma, 2003

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SONIA INEZ EYNG WEBBER

A EFICÁCIA DO PROCESSO DE ADOÇÃO INTERNACIONAL

Cr iciúma, 2003

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SONIA INEZ EYNG WEBBER

A EFICÁCIA DO PROCESSO DE ADOÇÃO INTERNACIONAL

Monografia apresentada à Diretoria de Pós-Graduação da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC, para a obtenção do título de Especialista em Preparação para a Magistratura Profª. Orientadora: Msc Areti Marie Hartenias Gaidzinski

Cr iciúma, 2003

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RESUMO

A eficácia do processo de adoção internacional tem seu fundamento na Constituição Federal de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/90 e nos tratados internacionais, especialmente a Convenção de Haia de 1983, relativa à proteção das Crianças e Cooperação em Matéria de Adoção Internacional. O estudo registra, em visão genérica, o instituto da adoção, sua origem e evolução no decorrer da história. Expõe a adoção internacional no Estatuto da Criança e do Adolescente, observando a excepcionalidade da medida e os requisitos imprescindíveis para sua efetivação. Destaca os aspectos processuais da adoção internacional, com a participação obrigatória de representante do Ministério Público que atua em defesa dos interesses das crianças e adolescentes. Revela, outrossim, que, embora ocorram desvios no que tange ao cumprimento da lei, a prática da adoção internacional, deve prevalecer como instituto de solidariedade humana. Demonstra que a adoção internacional representa, atualmente, um eficaz instrumento de integração sócio-familiar para crianças e adolescentes abandonados.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................................05

1 O INSTITUTO DA ADOÇÃO..........................................................................................07

1.1 Origem e evolução histórica da adoção ..........................................................................07

1.2 Conceito de adoção........................................................................................................12

1.3 Natureza jurídica da adoção ...........................................................................................13

1.4 Regime jurídico..............................................................................................................15

2. ADOÇÃO INTERNACIONAL NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO

ADOLESCENTE.................................................................................................................17

2.1 A excepcionalidade da medida.......................................................................................17

2.2 Determinação da lei aplicável à Adoção Internacional....................................................19

2.3 Requisitos atinentes ao adotante estrangeiro...................................................................21

2.4 Capacidade para adotar..................................................................................................23

2.5 Capacidade para ser adotado..........................................................................................28

2.6 Da adoção por procuração.............................................................................................29

2.7 Estágio de Convivência..................................................................................................31

2.8 Comissão estadual judiciária de adoção .........................................................................32

3 ASPECTOS PROCESSUAIS DA ADOÇÃO INTERNACIONAL ...................................36

3.1 Requisitos processuais...................................................................................................36

3.2 Manifestação do Ministério Público...............................................................................38

3.3 Sentença Judicial............................................................................................................39

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3.4 Registro de nascimento ..................................................................................................40

3.5 O novo nome do adotado...............................................................................................41

3.6 Autorização para viajar e expedição de passaporte.........................................................42

3.7 Sistema recursal .............................................................................................................43

3.8 Eficácia social do processo de adoção internacional .......................................................44

CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................49

REFERÊNCIAS...................................................................................................................51

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INTRODUÇÃO

O instituto da adoção revela-se, em nosso ordenamento jurídico, valioso

instrumento de amparo ao grave problema social de crianças e adolescentes abandonados.

A adoção internacional, um tema complexo e polêmico, quase sempre envolto em

preconceitos e equívocos, não pode ser compreendida fora da ordem globalizada em que

vivemos.

Nossa realidade atual indica que o destino das pessoas está cada vez mais

entrelaçado, especialmente quando a integração dos países em blocos econômicos produz um

estreitamento dos laços entre os povos, superando divisões político-geográficas entre as

nações. Por isso são celebrados tratados de cooperação técnica, científica e cultural.

A adoção internacional é considerada prestigiosa figura jurídica, amplamente

discutida nos fóruns internacionais, submetida a freqüentes retoques legislativos, visando seu

aperfeiçoamento e a melhor proteção dos infantes acolhidos por famílias estrangeiras.

O tema revela a grande importância do instituto, cujo objetivo primordial é o de

encontrar uma nova família para as crianças e adolescentes segregadas e eternizadas nas

instituições de amparo, tendo em consideração os laços cada vez mais sólidos entre as nações

e culturas.

Este estudo tem o propósito de refletir sobre a eficácia do processo de adoção

internacional, remetendo a discussão para o atual sistema legal desta prática regido pela

Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, e pela lei n° 8.069,

de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e Adolescente).

Destacam-se, também, os tratados internacionais ratificadas, especialmente a

Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação

em Matéria de Adoção Internacional, promulgada no Brasil pelo Decreto n° 3.807 de 21 de

junho de 1999 que configura o principal instrumento de garantia seja dos direitos das crianças,

seja dos direitos de quem deseja adotá-los.

O método de pesquisa util izado foi o bibliográfico, apoiado em citações

doutrinárias e entendimentos jurisprudenciais. O método de direção e orientação do estudo foi

o indutivo.

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O plano de desenvolvimento do trabalho divide-se em três capítulos. Inicialmente

abordou-se a origem e evolução histórica da adoção, seu conceito, natureza jurídica e regime

jurídico.

Na seqüência, no segundo capítulo analisou-se a adoção internacional segundo as

normas do Estatuto da Criança e Adolescente.

O terceiro capítulo desvelou os aspectos processuais da adoção internacional, de

conformidade com as regras que atualmente norteiam o instituto, permitindo que o processo

ocorra legalmente.

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1. O INSTITUTO DA ADOÇÃO

1.1. Origem e evolução histór ica da adoção

A história da humanidade revela a existência de muitos registros referentes à

adoção. Figueirêdo (2002, p. 15) cita os exemplos: “Putifar adotando José do Egito; a adoção

de Teseu Hipólito, mencionada por Sófocles em Fedra: Rômulo e Remo, que foram adotados

por uma loba e depois por Faustulo e Aca Laurentia” .

No passado, entre os povos antigos, a adoção tinha como objetivo principal a

perpetuação dos deuses e o culto famili ar.

Rodrigues (1995, p. 323) entende que a adoção surgiu para assegurar a

continuidade da família, no caso de pessoa sem filhos, citando a obra de Foustel de Coulanges

sobre a cidade antiga, que “mostra o surgimento da adoção como recurso derradeiro, no

sentido de perpetuar o culto famili al” .

Os povos orientais muito se utilizaram deste expediente cultural, como revelam os

Códigos de Hamurabi e Manu .

O Código de Manu já dispunha como cita Chaves (1980, p. 26) que: “Aquele a

quem a natureza não deu filhos pode adotar um, para que as cerimônias fúnebres não cessem”.

Silva Filho (1997, 17) destaca que “as leis de Manu (Livro IX, n. 169)

estabeleciam requisitos prévios à adoção, uma vez que exigiam do adotado conhecimento do

proveito da observância das cerimônias religiosas e o mal que proviria da sua omissão” .

O Código de Hamurabi também legislou sobre o instituto da adoção, conforme

Altavila (1989, p. 51), com “dispositivos que tratam da estabilidade da adoção, revogação por

ingratidão, adoção permanente pelo ensino de um ofício, renúncia da adoção pelo adotado e

irrevogabilidade da adoção” .

Entre os hebreus era possível se encontrar uma espécie de adoção, chamada de

levirato. Na Bíblia encontram-se várias referências à adoção, segundo Figueirêdo (2002, p.16)

“como quando Jacó adotou Efraim e Manasssés, que eram filhos de seu filho José (Gênesis)”.

Ainda, conforme o autor (p. 16): “No livro Sagrado encontramos também o

registro daquilo que para alguns é a primeira referência documentada de uma adoção

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internacional (Termulos, filha do faraó egípcio, adotando Moisés, a quem havia encontrado às

margens do rio Nilo)”.

A adoção, mesmo sem estar normatizada juridicamente, representava na

antigüidade, objetivos bem definidos e diversos daqueles posteriormente almejados, como

transmissão do nome e patrimônio do adotante para o adotado. Visava apenas preservar a

cultura e a tradição dos povos primitivos, sem referência alguma quanto aos interesses do

adotado, sendo a transmissão do patrimônio mera conseqüência.

Também os egípcios e os gregos utilizaram-se do instituto, que teve relevante

função social e política. No direito romano o instituto da adoção encontrou disciplina

sistemática. Fundamentou o seu desenvolvimento e a sua expansão, influenciando

sobremaneira nos direitos dos países do Ocidente.

No auge do império romano a adoção torna-se uma instituição de direito público,

sendo utili zada pelos chefes do poder estatal para designarem seus sucessores. Nesta fase, o

instituto deixa de ser instrumento de direito privado, passando a ter característica de direito

público.

Posteriormente, a adoção deixa de ter como função principal a perpetuação do

culto famili ar, passando a exercer outra: a de dar filhos a casais estéreis.

Na Idade Média o instituto caiu em desuso, com poucas práticas, em face das

contrariedades do instituto com as idéias e costumes que vigoravam na época.

Após a Revolução Francesa, com o Código Francês de 1804, deu-se o

ressurgimento do instituto, por interesse do próprio imperador, que desejava adotar um dos

seus sobrinhos para fazê-lo sucessor.

No entanto, a lei francesa admitia somente a adoção em relação a maiores e exigia

que o adotante fosse maior de cinqüenta anos, tornando, assim, as normas muito rigorosas e,

conseqüentemente inaplicáveis.

Dispõe Silva Filho (1997, p. 212) que:

Baseado nos princípios do Direito Romano o nosso Código Civil Brasileiro consagrou o instituto da adoção, muito embora haja desaparecido aquela inspiração religiosa, substituída pela necessidade de satisfazer o instituto paternal, ou de cumprir as exigências do sentimento de solidariedade humana.

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Até a independência vigoravam no Brasil as Ordenações Fili pinas e é com a Lei

de 22 de setembro de 1828 que surge a primeira legislação tratando da adoção.

A doutrina enfatiza que:

No direito anterior a 1916 o instituto não vinha sistematizado, havendo entretanto, numerosas referências à adoção, que era assim, permitida. (Ordenações, Liv. II, Tít. 35, § 12°; Liv. III, Tít. 9°, § 2°; TEIXEIRA DE FREITAS, Consolidação das Leis Civis (arts. 1635 e 1640), procurou disciplinar a matéria sem contudo cuidar dela com a necessária profundidade. De modo que o Código Civi l, trazendo para o direito brasileiro o que colheu nas legislações estrangeiras, pela primeira vez discipl inou ordenadamente o instituto (RODRIGUES, 1995, p. 324).

No entanto, é no Código Civil (Lei 3.071, de 01.01.1916), que a adoção recebeu

pela primeira vez disciplina sistematizada, instituída pelo capítulo V, do Título V, do Livro de

Família, artigos 368 a 378.

Nas primeiras décadas do século XX havia no Brasil a preocupação com a

infância como reflexo de um futuro problema social. Via-se que na infância estava o futuro

do país, razão pela qual ampliou-se a preocupação em torno de sua proteção, não apenas na

perspectiva caritativa/religiosa, mas no sentido judicializado do termo – defender para

preservar do mal (a criança e a sociedade).

Dessa forma houve a consciência de que era necessário a criação de mecanismos

de proteção à criança dos perigos que pudessem desviá-la do caminho do trabalho e da ordem.

Bem como era preciso defender a sociedade de pessoas que entregues ao vício representassem

ameaça à paz social.

O discurso sobre formas de defesa da criança destaca-se desde o século XIX até

os dias de hoje.

Conforme Rizzini (1997, p. 132) “está na criança o poder de provocar no adulto

sentimentos e atitudes ambivalentes: cuidado, proteção e enternecimento, enquanto pequena,

frágil e indefesa; autoridade, controle e agressividade, quando a criança cresce e mostra-se

menos dependente”.

O período que se seguiu à instauração da República, marcado pela difusão do

higienismo originou a produção de conhecimentos especializados sobre a infância, com a

propagação da prática médica no âmbito doméstico para os devidos cuidados com a saúde

física e moral.

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A política da época encontrou particular interesse pela infância, porque havia

afinidade com o projeto civil izatório que se desenhava para o país no momento. Objetivava-

se, na verdade, moldar a criança de acordo com o que se queria para o país, ou seja, educar

um “povo-criança” , direcionando-o para o trabalho, sem tornar-se ameaça aos governantes.

A idéia de salvação da criança confundia-se com a proposta de salvação do país –

um país a ser moldado como se molda uma criança. E embora visto como um enorme desafio,

parecia perfeitamente viável, como demonstram os ânimos exaltados e os discursos

esperançosos de nossos idealistas reformadores e suas instituições filantrópicas.

Visando atender às necessidades da época, o Código Civil disciplinou a matéria

limitando e restringindo os direitos e possibili dades de adoção. Seus artigos definiram apenas

a estrutura da adoção tradicional, silenciando sobre a adoção por estrangeiro não residente no

país.

Devido às excessivas exigências previstas no Código Civil , seus dispositivos

nunca tiveram muita aplicação no país.

Prova disso é que os artigos 368 e 369 estabeleciam que só os maiores de

cinqüenta anos, sem prole, poderiam adotar e que entre adotante e adotado deveria existir uma

diferença de dezoito anos de idade.

Em 1957, a Lei 3.133 atualizou o instituto, alterando a concepção de 1916,

reduzindo o limite mínimo de idade do adotante para trinta anos e diminuindo a diferença

etária entre o adotante e o adotado para dezesseis anos, permitindo a adoção, mesmo no caso

de existir prole. Possibili tou, ainda, a utilização de o adotado usar o nome do adotante.

Essa adoção atribuía a condição de filho para todos os efeitos legais, salvo no caso

de sucessão, quando concorresse com filho legítimo superveniente. Assim dispunha o artigo

377 do Código Civil: “Quando o adotante tiver filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos,

a relação de adoção não envolve a de sucessão hereditária”.

Posteriormente, em 1965, surge a Lei 4.665 estabelecendo a legitimação adotiva,

cujos princípios acabaram acolhidos na adoção plena implementada pelo Código de Menores

(Lei 6.697, de 10.10.1977).

Sobre a legitimação adotiva, segundo ensinamento de Rodrigues (1995, p. 322):

“Tratava de Instituto que tirava algo da adoção e algo da legitimação, pois, como naquela

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estabelecia um liame de parentesco de primeiro grau, em linha reta entre adotante e adotado,

e, como na legitimação, este parentesco era igual ao que liga o pai ao filho consangüíneo”.

A legitimação adotiva previa a possibilidade de se adotar menores de sete anos,

que se encontrassem em situação irregular, com todos os direitos e deveres de filho legítimo,

salvo o caso de sucessão hereditária, igualmente como ocorria com a lei n. 3.133/57, já

comentada.

A Lei 4.665 trouxe inovações, cumprindo destacar: a irrevogabil idade da adoção,

ainda que, dos adotantes viessem a nascer filhos legítimos (art. 7°), e a modificação do

prenome do legitimado.

O Código de Menores, instituído pela Lei 6.697, de 10.10.1979, encampou

princípios advindos com a lei 4.665/65, que institucionalizou a legitimação adotiva e admitiu,

para os menores, duas formas de adoção: a simples e a plena.

A doutrina assim as diferencia:

A adoção plena, para atender a sua destinação, há de ser irrevogável, coincidindo a sua duração com a da família natural. A adoção simples, ao contrário, é irrevogável, porque os seus efeitos diferem dos efeitos da adoção plena, segundo os quais o adotado adquire a situação de filho do adotante, extinguindo-se as relações familiares entre o adotado e os seus ascendentes e colaterais naturais, exceto os impedimentos matrimoniais. Já os efeitos da adoção simples l imitam-se às relações entre o adotante e o adotado. O adotado não adquire quaisquer direitos (sucessórios ou alimentícios) contra os parentes do adotante, nem estes parentes adquirem quaisquer direitos da mesma natureza contra o adotado ou seus descendentes (ALBERGARIA, 1996, p. 114).

Mas tais dispositivos foram inteiramente revogados pelo artigo 227, § 6° da

Constituição de 5 de outubro de 1988 que dispôs terem os filhos, havidos ou não da relação de

casamento, ou por adoção, os mesmos direitos e quali ficações, sendo proibida qualquer

designação discriminatória relativa a fil iação.

Assim, os filhos havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção passaram

a ter os mesmos direitos e quali ficações.

Neste contexto, surge o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de

julho de 1990. Elaborado em consonância com a Carta Magna, vem substituir o Código de

Menores e legislações anteriores.

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Atualmente vigoram apenas a adoção prevista no Novo Código Civil, Lei n.

10.406, de 10.1.2002, artigos 1.618 e seguintes e a adoção disciplinada no Estatuto da Criança

e Adolescente.

Segundo o Novo Código Civil (arts. 1618, 1.619), só a pessoa maior de 18

(dezoito) anos pode adotar, devendo o adotante ser pelo menos 16 (dezesseis) anos mais velho

que o adotado.

A nova lei veio suavizar as exigências do Código de 1916 em que apenas os

maiores de 30 (trinta) anos é que podiam adotar, proibindo a adoção, para casados, senão

decorridos 5 (cinco) anos após o casamento.

1.2. Conceito de adoção

Segundo dicionário de língua portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira

(1993, p. 12), caracteriza-se a adoção como “ação ou efeito de adotar” – traduzindo a idéia de

aceitação de uma criança como filho.

Juridicamente, o instituto da adoção se materializava de forma simples, regido

pelo princípio da autonomia da vontade das partes, mediante a lavratura de uma escritura

pública.

Para Figueirêdo (2002, p.17): “Esta visão privatista do instituto pode ser bem

avaliada a partir da leitura das definições de alguns dos maiores civil istas brasileiros” , a saber:

a) Pontes de Miranda: “ato solene pelo qual se cria entre o adotante e adotado relação fictícia de paternidade e fil iação”. b) Caio Mário da Silva Pereira: “a adoção é, pois, o ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independentemente deexistir entre elas qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim”. c) Carvalho Santos: “ato jurídico que estabelece entre duas pessoas relações civis de paternidade e fi liação”. d) Clóvis Bevilacqua: “ato civil , pelo qual alguém aceita um estranho na qualidade de fi lho” . e) Orlando Gomes: “ato jurídico pelo qual o vínculo de fil iação é criado arti ficialmente”. f) Silvio Rodrigues: “ato do adotante pelo qual traz ele, para sua famíl ia e a condição de fi lho, pessoa que lhe é estranha” (FIGUEIRÊDO, 2002, p.17).

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Em contraposição a essa corrente privatista, também conhecida como

contratualista, tratando a adoção como um negócio jurídico, existe a corrente publicista,

definindo a adoção como um instituto de direito público, coadunando-se com o sentido dado

pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Com o passar dos tempos, gradualmente, a corrente publicista vem se impondo,

demonstrando a alta função político-social do instituto.

Em nosso país, o primeiro passo relevante foi o Código de Menores, quando mesmo para as adoções simples se exigia a tramitação no sistema de justiça, embora culminando com a materialização em uma escritura pública. O certo é que, principalmente neste instituto marcado por tantos preconceitos, o C.M. serviu de importante e indispensável estágio sem o qual teria sido impossível o salto das regras privatistas do Código Civi l para as bem delineadas disposições contidas no Estatuto da Criança e do Adolescente (FIGUEIRÊDO, 2002, p. 18).

Já a adoção internacional, que nos interessa nesse estudo, conforme Mônaco

(2002, p. 83) “é aquela levada a efeito em território nacional, a qual, no mais das vezes,

refere-se a criança ou adolescente sob a guarda do Estado ou de terceiro residente no território

brasileiro”.

Ou seja,

A adoção internacional é ato jurídico solene e complexo que, como tal, envolve vários aspectos de estraneidade. Em decorrência disso, apresenta-se uma multiplicidade de elementos de conexão a serem verificados em cada vertente da relação, de forma a se garantirem os interesses de todas as partes e Estados envolvidos (MÔNACO, 2002, p. 129).

Em suma, a adoção caracteriza medida de proteção aos direitos da criança e do

adolescente, proporcionando o convívio e a segurança de uma vida em família àqueles que

não a tem.

1.3 Natureza jur ídica da adoção

Não há uniformidade de tratamento na doutrina, a respeito da natureza jurídica da

adoção.

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Durante longo período preponderou a concepção privatista da adoção, em razão

de que o ato baseava-se na autonomia da vontade, exigindo consenso das partes.

Mas seu caráter publicista foi reconhecido em decorrência da prevalência do

interesse público e o preponderante papel desempenhado pelo juiz. Nessa ótica, o

consentimento exigido pela lei é considerado pressuposto da decisão judicial.

Foram colacionadas, em breve síntese, as várias teorias que tratam da natureza

jurídica da adoção, examinadas em face da adoção estatutária:

Esta não decorre exclusivamente de um ato, próprio da autonomia da vontade. O ECA (Lei 8.069/90) revela, a partir do seu primeiro artigo, a sua finalidade: “proteção integral à criança e ao adolescente”. As suas várias disposições apontam, de forma clara, a prevalência dos fins marcadamente públicos. Sendo assim, por opção constitucional (art. 227, § 5°) e legislativa (art. 47), a adoção constitui-se por decisão judicial. Ao Poder Judiciário foi confiada a tarefa de aferir não só a legalidade do ato, mas também, e com certa parcela de discrição, a oportunidade e conveniência da adoção. A circunstância de exigir-se consentimento dos pais ou do representante legal do adotando (art. 45, caput) ou deste quando maior de doze anos (art. 45 § 2°), por si só, não constitui a adoção. O vínculo, pelo consenso, não subsiste e nem produz os seus efeitos próprios (SILVA FILHO, 1997, p. 61).

A vontade caracteriza-se como ato inicial à formulação do pedido de adoção e tem

fundamental importância. Razão porque reconhece-se uma concepção intermediária da

natureza jurídica da adoção estatutária, considerando o consentimento das partes e a sentença

judicial como elementos integrativos da sua constituição. A Constituição da República

Federativa do Brasil ao dispor que a adoção deve ser assistida pelo poder Público (art. 226, §

5°), não exigiu que houvesse intervenção judicial. Esta derivou de opção legislativa. Foi o

Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) que dispôs que o vínculo da adoção

constitui-se por sentença judicial (art. 47).

Na nova sistemática, não são mais os adotantes que escolhem os filhos adotivos.

Mas, nos termos do art. 50 do ECA, a autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro

regional, um registro de pessoas interessadas em adotar. São candidatos a adotantes, que

precisam apresentar os requisitos legais.

Vale lembrar que a adoção só será deferida quando apresentar reais vantagens

para o adotando e fundar-se em motivos legítimos (art. 43, ECA).

Como se vê, na adoção o juiz decide, julga se o pedido inicial deve ou não ser

deferido, segundo os interesses do menor. Além disso, é o art. 48 que afirma ser a adoção

irrevogável. Portanto, fica afastada a concepção de tratar-se de um contrato. Na realidade,

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trata-se de uma sentença constitutiva. Mas, além da sentença, a adoção necessita, para se

constituir, da manifestação de vontade das partes interessadas.

A adoção implica em modificação do estado jurídico das partes e alteração do

status familiar, com repercussões que interessam à família, à sociedade e ao Estado, razão

pela qual, a tarefa de controle da legalidade e da conveniência da adoção, no Brasil , foi

entregue ao Poder Judiciário.

1.4 Regime Jur ídico

A adoção induz a idéia de aceitação de uma criança como filho.

No direito brasileiro, atualmente, existem duas espécies de adoção: a primeira,

disciplinada pelo Código Civil e, a segunda, regulada pelo Estatuto da Criança e do

Adolescente (Lei 8.069, de 13.07.1990).

Com o advento da Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do

Adolescente de 1990, surgiram novas regras a respeito da proteção integral à criança e ao

adolescente, prevendo a Constituição Federal a possibili dade de adoção por estrangeiros:

Do conceito extraído da adoção estatutária e da sua natureza jurídica, pode-se afirmar que há dois momentos na constituição do vínculo adotivo. No primeiro, preponderante é a vontade das partes, partícipes da relação jurídica que se instaura. As pessoas praticam ato próprio do direito privado, exercendo na plenitude a liberdade de expressão. Exige-se a capacidade civil dos que manifestam intenção adotiva e o consentimento dos pais ou responsáveis do adotado. Excepciona-se o consentimento dos pais na hipótese de a criança não tê-los ou quando ocorrer a destituição. O próprio adotado deverá externar a sua vontade quando tiver mais de doze anos (SILVA FILHO, 1997, p. 63).

Conveniente examinar as regras referentes à adoção estatutária, compreendendo-

se: as pessoas envolvidas na relação jurídica, seus requisitos formais, seus efeitos e os

problemas relacionados à ineficácia da adoção.

Os requisitos pessoais regulam-se pelo direito civil , com as inovações trazidas

pelo ECA. As nulidades, também estão situadas na legislação civil.

Quanto aos requisitos formais, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece

regras que envolvem disposições de direito material e processual, finalizando com a sentença

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judicial. Essa relação converge para o direito público, em que a vontade das partes cede ao

exercício da atividade exercida pelo Poder Judiciário.

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2 ADOÇÃO INTERNACIONAL NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO

ADOLESCENTE

2.1 Excepcionalidade da medida

A questão relativa à adoção internacional tem caráter de instrumento excepcional

de proteção à criança e adolescente. A regra da Lei 8.069/90 é que toda criança e adolescente

tem direito à convivência famili ar. Em primeiro lugar à família natural. Em sua falta ou

impossibilidade, como exceção, à família substituta (at. 19 da Lei 8.069/90).

Idêntico entendimento vem expresso no parágrafo único do artigo 23 do mesmo

diploma legal, assim expresso: “Não existindo outro motivo que por si só autorize decretação

da medida (perda ou suspensão do pátrio poder), a criança ou adolescente será mantido em

sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de

auxílio”.

O estatuto prevê a modalidade de família substituta, dispondo que a colocação da

criança e do adolescente nessa família será feita mediante guarda, tutela ou adoção,

independentemente da situação jurídica, nos termos da lei.

Dispõe, também, que nos pedidos de adoção formulados por estrangeiro residente

ou domiciliado fora do território nacional, deve ser observado o art. 31, que expressa que a

colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível

na modalidade de adoção.

A restrição tem como objetivo defender os interesses da criança e adolescente,

que deixam o país em companhia de família substituta, o façam com a situação devidamente

regularizada e definida.

A intenção do legislador foi a de autorizar a adoção por estrangeiro apenas de

forma excepcional, devendo sempre dar preferência a casais brasileiros e, somente na falta

destes deferi-la a casais estrangeiros que atendam as exigências legais.

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Não diverge a lição de Neves (1995, p. 674), ao dizer: “A adoção por estrangeiros

é uma exceção, isto é, só depois de esgotadas todas as possibilidades de o menor ser adotado

por brasileiros é que ela poderá vir a ser permitida” .

Tal proteção ocorre pelo fato de inserir-se a criança ou adolescente, até então

privada dessa inserção, no contexto de uma família, por questões sociais, econômicas ou

políticas.

O instituto da adoção cumpre a missão de suprir eventual lacuna existente em

relação a um ambiente familiar adequado ao desenvolvimento da criança, transformando-se

em meio de proteção dos direitos da criança.

Conforme a mais moderna conceituação civil ista nacional

A adoção pode ser tomada como a inserção num ambiente famili ar, de forma definitiva e com aquisição de vínculo jurídico próprio da fil iação, de uma criança que, por quaisquer motivos e de forma reconhecida legal e judicialmente, está desprovida de tal inserção famil iar e de tais vínculos (LIBERATI apud SOUZA, 2001, p. 89).

Se por um lado à adoção tem a possibilidade de inserir a criança num seio

familiar, com formação de vínculos legais que se equivalem a vínculos sangüíneos, por outro,

somente pode ser vista como medida excepcional, porque tal ambiente deve

preferencialmente, ser aquele decorrente dos laços naturais da própria criança.

Apesar de se revelar em instrumento de proteção dos direitos da criança,

permitindo sua inserção num contexto familiar adequado ao seu pleno desenvolvimento,

reveste-se de caráter excepcional, privilegiando a manutenção dos laços familiares originais.

Como então vislumbra a possibilidade da adoção internacional, que, além de quebrar os

vínculos familiares originais, quebra, também, os laços de nacionalidade e cultura.

A Convenção Relativa à Proteção e Cooperação Internacional em Matéria de

Adoção Internacional – 17ª Conferência de Haia de Direito Internacional Privado enfrentou a

questão a partir de duas realidades fáticas manifestas:

A primeira diz respeito ao fato de que qualquer ambiente familiar,

comprovadamente adequado e apto a receber uma criança nos termos da própria Convenção e

das legislações pertinentes, seja ele de mesma origem nacional da criança ou não, é mais

propício ao pleno desenvolvimento da criança do que a institucionalização dessa em entidades

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ou abrigos, que normalmente estão impossibil itadas de suprir as necessidades de amor e

compreensão, expressas na Declaração Universal dos Direitos da Criança em seu 6° princípio.

A Segunda é a constatação de que, mesmo que não houvesse a possibili dade de

adoção internacional, em respeito aos direitos culturais e de nacionalidade da criança, ainda

assim crianças seriam privadas de tais direitos por meio do tráfico ilícito de crianças e, pior,

teriam violados outros de seus direitos humanos ao ser objeto da exploração e da mercancia,

restando absolutamente desprotegidas.

Em ambas as situações, ao admitir a possibil idade da adoção internacional a

Convenção alicerça-se em seu fundamento principal, a Doutrina da Proteção Integral da

Criança, de forma a buscar qual seja o interesse maior da própria criança.

Conforme Souza (2001, p. 90-91), o artigo 21 da Convenção, ao tratar da adoção,

é expresso ao afirmar que os Estados Partes: “atentarão para o fato de que a conservação

primordial seja o interesse maior da criança”.

2.2 Determinação da lei aplicável à adoção internacional

A determinação de qual lei seja aplicável para regular questões que envolvem

elemento estrangeiro é o cerne do Direito Internacional Privado. As normas de Direito

Internacional Privado têm estrutura bastante peculiar. Diferentemente das normas de direito

material, não prescrevem um comportamento, determinando uma sanção para os casos de sua

inobservância. Ao contrário indicam uma determinada matéria para, posteriormente, eleger

um elemento de conexão considerado primordial em decorrência do elemento estrangeiro

existente.

Assim leciona o ilustre doutrinador:

O aplicador de uma norma de Direito Internacional Privado deve em princípio, qualificar a hipótese sub judice, verificando qual a matéria a que se refere . Enquadrada a hipótese que contém o elemento estrangeiro, deve o intérprete buscar a norma de solução de conflito espacial para verificar qual o elemento de conexão que o legislador privilegiou [...] (MÔNACO, 2002, p.78).

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Portanto,

Quando a norma do art. 7° da LICC diz que para os casos de direito de famíl ia (matéria) deve ser aplicada a lei do domicílio (elemento de conexão) dos envolvidos, nada mais faz que dizer ao intérprete: “verifique em que Estado estão domicil iados os envolvidos, pois é a norma de seu ordenamento que regulará a questão de famíl ia entre eles pendente de solução” (MÔNACO, 2002, p. 78).

No que concerne à adoção internacional convém registrar as doutrinas de Direito

Internacional Privado existentes, colacionadas por Mônaco (2002), no que se refere à lei

aplicável enquanto critério de solução do conflito.

Segundo a teoria da aplicação cumulativa, a adoção internacional só se perfaz

mediante o atendimento dos critérios comuns às legislações pessoais de todas as partes.

A teoria da aplicação distributiva também procura atender aos critérios exigidos

pelas leis de ambos os ordenamentos em que a adoção transnacional irradie seus efeitos,

fazendo-o, todavia, não de forma cumulativa, mas, sim, sob um critério de repartição. Assim,

alguns dos aspectos envolvidos se disciplinam por uma das leis contactadas pelo caso

concreto, ao passo eu outros o são pela outra lei. É claramente o critério adotado pelo Brasil

por meio do Código Bustamante, de 1928, da Lei de Introdução ao Código Civil, das

convenções Interamericana de Direitos Internacional Privado – CIDIP, firmada em La Paz

(1984), do México e da Convenção de Haia de 1993.

Tarcísio José Martins Costa, Juiz da Infância e Juventude de Belo Horizonte, ao

abordar o tema Adoção Internacional, assim leciona:

A aplicação do critério distributivo, que conta com maior apoio doutrinário, respeita a característica internacional da adoção, não recorrendo à solução cumulativa de quase impossível aplicação. Critério este que, na tentativa de concili ar os requisitos da lei do adotante com os da lei do adotado, conduz a um tal número de impedimentos que torna praticamente impossível a adoção internacional. O Código de Bustamante, de 1928, e a Convenção Interamericana sobre o Confli to de Leis em Matéria de Adoção de Menores, firmada em La Paz, em 1984, consagraram a aplicação distributiva das leis em confli to nos arts. 4 e 73, respectivamente. A ressalva da parte final do art. 4 da Convenção em evidência resguarda adequadamente os interesses da criança, ao inclinar-se para a aplicação da lei do adotado, quando os requisitos da lei do adotante forem manifestamente menos restriti vos do que aqueles exigidos pela lei da residência habitual do adotado (Disponível em: http://www.tjmg.gov.br/ji j /adocinte.html. Acesso em: 27/11/2002).

Uma terceira teoria prega a aplicação exclusiva da lei pessoal do adotante, se

solteiro, ou a lei que rege a relação matrimonial dos adotantes casados. Os argumentos são os

de que o adotando passará a integrar a família de seu adotante e que, por isso, deve ter sua

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vida regulada pela lei daquele, no sentido de se ver igualado aos filhos legítimos existentes ou

supervenientes; e, ainda, aquele argumento segundo o qual a maior parte dos efeitos da

adoção se produzirão no Estado de residência habitual, domicílio ou nacionalidade dos

adotantes, para onde será levado o adotado.

Intermediariamente a essas duas últimas teorias surge aquela que busca privilegiar

a lei mais favorável ao adotando. Caberia, assim, ao intérprete verificar a lei mais benéfica e

fazê-la incidir. Tal teoria, porém, se adotada sem limites pode levar ao arbítrio e à tirania de

órgãos do Poder Judiciário, que à guisa de estar fazendo o bem aos envolvidos, garantindo às

crianças e adolescentes lares mais equilibrados econômica e socialmente, acabariam por

determinar a perda do pátrio-poder-dever decorrente de interesses os mais variados.

Por fim, a última teoria, desloca o problema da lei pessoal aplicável para a

verificação da competência internacional. Uma vez determinado o foro competente, este

estaria autorizado não só a aplicar a lei do local, referentemente ao procedimento adotivo,

como também e principalmente a sua própria lei material para reger as relações daí

decorrentes.

2.3 Requisitos atinentes ao adotante estrangeiro

A Lei de Introdução ao Código Civil , art. 7º, disciplina que a lei do país em que

for domicili ada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o

nome, a capacidade e os direitos de família, fundamentando o estatuto pessoal na lei do país

onde a pessoa está domiciliada.

Assim, no Brasil, prevalece a lei do domicílio, atendendo-se as exigências das leis

do adotante e do adotando naquilo que lhes for peculiar, sendo, em princípio, lícito a qualquer

estrangeiro adotar.

No entanto, deverá preencher todos os requisitos previstos na lei brasileira. Sem o

cumprimento das exigências legais, a adoção não se confirmará.

Oportuno registrar a distinção entre domicílio e residência, sendo que o primeiro é

o local onde a pessoa exerce a sua atividade habitual, enquanto a última é o local onde ela

mora, com a intenção de ali permanecer.

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Observa-se que, a capacidade para adotar e ser adotado está regida pela lei

domiciliar do adotante e do adotando, vale dizer, a lei do domicílio do adotante definirá se ele

tem ou não capacidade para adotar, enquanto que a lei do domicílio do adotando determina

sua capacidade para ser adotado.

Com o advento da Convenção de Haia em 1993, relativa à proteção das Crianças e

Cooperação em Matéria de Adoção internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo 01/99,

ratificada pela Presidência da República e promulgada pelo Decreto Presidencial 3.087/99, se

impõe um novo conceito do que seria uma adoção internacional.

Assim, de acordo com o art. 2º da Convenção de Haia, considera-se adoção

internacional quando uma criança com residência habitual em um Estado Contratante (o

Estado de Origem) tiver sido, for, ou deva ser deslocada para outro Estado Contratante (o

Estado de Acolhida), quer após sua adoção no Estado de origem por cônjuges ou por uma

pessoa residente habitualmente no Estado de acolhida, quer para que essa adoção seja

realizada, no Estado de acolhida ou no Estado de origem. Portanto, o que irá definir a adoção

como internacional é o deslocamento da criança ou adolescente do país de origem para o de

acolhida.

A adoção se concretizará, na medida em que a lei brasileira e a estrangeira forem

analisadas e, por conseguinte, cumpridos os requisitos exigidos em ambas.

Deverá haver sintonia entre as normas do país do adotante e o do adotando, caso

contrário, como pondera Liberati (1995, p. 51) [...] “se a lei estrangeira for manifestamente

contrária à ordem pública ou ofensiva aos interesses da criança e do adolescente, ficará

vedada a sua aplicação em território brasileiro” .

No contexto nacional, é a Lei 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente

que regula a adoção, tanto nacional quanto internacional, estabelecendo nos artigos 29, 42 e

51 os requisitos exigidos aos pretendentes estrangeiros em adotar.

Tais preceitos, analisados em conjunto, demonstram a preocupação do legislador

em eleger como prioridade à efetiva proteção dos direitos da criança brasileira, em detrimento

da colocação de família substituta estrangeira, dado o seu caráter excepcional, visando, com

esta atitude prevenir os possíveis riscos da integração do menor na família adotiva. Tudo isso

em prol do interesse do menor.

No tocante à adoção feita por estrangeiros, o Estatuto prevê alguns requisitos

peculiares. Como já dito, a adoção internacional é uma exceção; por isso, além das exigências

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gerais acima enumeradas, o interessado estrangeiro deverá, com base no estabelecido nos

parágrafos do art. 51 do ECA, comprovar sua habil itação à adoção através de documento

expedido por autoridade competente, conforme as leis do seu país.

Além disso, apresentará estudo psicossocial favorável à adoção, elaborado por

agência especializada e credenciada no país de origem..

A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá

exigir a apresentação do texto da legislação pertinente e permissiva, acompanhado de prova

da respectiva vigência.

Os documentos em língua estrangeira serão juntados aos autos, devidamente

traduzidos e autenticados pela autoridade consular, observados os tratados e convenções

internacionais.

Uma vez processado o pedido, o Magistrado determinará o estágio de

convivência, ficando, por fim, estabelecido que o adotando não poderá sair do território

nacional antes de consumada a adoção.

Visando a efetiva proteção ao interesse superior da criança ou do adolescente, o

legislador estatutário impôs certas exigências e restrições por ocasião do estabelecimento do

vínculo de adoção, bem como, para evitar possíveis fraudes.

2.4 Capacidade para adotar

Adotar, conforme Ferreira (apud MÔNACO, 2002, p. 83) é “atribuir (a um filho

de outrem) os direitos de filho próprio” . Assim, capacidade para adotar é um atributo que o

ordenamento jurídico confere ao sujeito de direito para que este receba, como seu, conferindo-

lhe os direitos próprios de filho, um filho de terceiro.

A adoção internacional é aquela levada a efeito em território nacional, a qual, no

mais das vezes, refere-se a criança ou adolescente sob a guarda do Estado ou de terceiro

residente no território brasileiro. É que, se a criança a ser adotada está sob custódia do Estado

brasileiro, está ela domicili ada no Brasil . Dessa forma, para que se configure o caráter

transnacional da adoção, o elemento estrangeiro repousa, geralmente, no domicílio dos

adotantes, embora essa premissa seja passível de não se verificar quando os adotantes ou

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mesmo o adotando, ou ambos, não têm nacionalidade brasileira (configurando o elemento

estrangeiro), mas aqui residem (quando então o problema se resolverá pela aplicação da lei

brasileira, vez que é a lei da residência habitual de ambas as partes, a lei do foro e a lei sob

cujo império hão de produzir os efeitos). Nesta última hipótese, qualquer estrangeiro aqui

radicado poderá adotar, mesmo que a lei de seu país de origem ignore o instituto da adoção.

Como a norma do art. 7° da Lei de Introdução ao Código Civil estatui que “a lei

do país em que for domicil iada a pessoa determina as regras sobre o começo e fim da

personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família”, a capacidade para adotar será

sempre regulada pela lei do local em que domiciliado estiver o pretendente.

A Convenção de Haia de 1993 consagrou como elemento de conexão,

relativamente à capacidade par adotar, o local de residência habitual (art. 2° - 1 da Convenção

de Haia relativa à proteção da criança e à cooperação em matéria de adoção internacional) do

pretendentes. Assim, no que concerne a adoções internacionais, a capacidade será sempre

determinada pela lei do Estado em que os pleiteantes habitualmente residam, vez que tal

Convenção se encontra ratificada e vigorando no ordenamento brasileiro por força do Decreto

Executivo 3.087, de 21.06.1999, como lei ordinária especial aplicável à adoções

internacionais, capaz, portanto, de revogar a norma genérica do art. 7° da Lei de Introdução ao

Código Civil, que completava a norma do art. 73 do Código Civil, verbis: Art. 73 – “A

capacidade para adotar e ser adotado e as condições e limitações para adotar ficam sujeitas à

lei pessoal de cada um dos interessados” .

Assim, denota-se que nosso legislador de Direito Internacional Privado, no que se

refere às adoções internacionais, entendeu que a capacidade de direito e a capacidade de fato

devem ser reguladas pela lei sob cujo império resida o adotante. É, portanto, à lei estrangeira,

que o juiz de Direito nacional deverá se ater para verificar se o pretendente preenche os

requisitos que lhe atribuem a capacidade:

O candidato tem que comprovar que está devidamente habil itado, segundo as leis de seu país, mediante documentação enviada pela autoridade competente do seu domicílio (residência habitual). O solicitante precisa apresentar estudo psicossocial elaborado por agência especial izada e credenciada no país de origem, que atestará sua sanidade mental, sua idoneidade moral, suas condições econômicas para adotar etc (FONSECA apud MÔNACO, 2002, p. 85).

A autoridade competente a que o ECA faz referência é, para os Estados

contratantes da Convenção da Haia de 1993, a autoridade Central, que deve ser instituída e

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receber a competência determinada pelos arts. 6° a 9° e 13. As agências especializadas

também referidas pelo Estatuto devem ser credenciadas junto às Autoridades Centrais

respectivas, segundo as determinações dos arts. 10 a 12.

Podemos destacar, em linhas gerais, os seguintes requisitos, considerados

essenciais, extraídos dos artigos 29, 42 e 51 do ECA:

1) ser maior de vinte e um anos de idade, independentemente do estado civi l; 2) se a adoção for realizada por ambos os cônjuges ou concubinos, pelo menos um deles deverá ter completado vinte e um anos de idade; 3) comprovar a estabil idade da relação conjugal; 4) ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho que o adotando; 5) estar habil itado à adoção, segundo as leis de seu País; 6) apresentar estudo psicossocial elaborado por agência credenciada em seu País e 7) Ter compatibil idade com a adoção e oferecer ambiente famil iar adequado (LIBERATI, 1993, p. 88).

Observa-se a tendência progressiva de redução de idade do adotante no Direito

Positivo Nacional. Pela redação original do Código Civil exigia-se a idade de 50 anos (art.

368), reduzido para 30 anos pela Lei 3.133 de 08.05.1957, e que foi mantida na adoção plena

do Código de Menores, Lei 6.697, de 10.10.1979.

O ECA, no art. 42, caput, permitiu a adoção por maiores de vinte e um anos,

independentemente do seu estado civil .

Esta legitimação para adotar corresponde à capacidade civil de que trata o art. 9º,

não se admitindo para tanto as demais formas de cessação da incapacidade, pela emancipação.

Dentro da orientação do ECA, que condicionou a capacidade para adotar à

maioridade civil , o artigo 1618 do novo Código Civil estabeleceu que “ só pessoa maior de

dezoito anos pode adotar”.

No que diz respeito ao pedido formulado por estrangeiro aplica-se tão-somente a

modalidade de adoção (art. 51 e 31), vez que a guarda e a tutela não são permitidas aos

interessados estrangeiros.

A lei não estabeleceu o limite máximo de idade, permitindo que pessoas de idade

avançada possam adotar, ficando a critério do Magistrado da Infância e Juventude analisar a

conveniência ou não desta adoção.

Quanto ao estado civil, não há qualquer restrição, entre homens e mulheres

solteiros, casados, viúvos, separados judicialmente, separados de fato, divorciados ou

concubinos, estes últimos podem adotar, uma vez que a Constituição Federal elevou a união

concubinária à categoria de entidade famili ar, com o reconhecimento da estabilidade conjugal,

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dispondo no art. 226, § 3º: “Para efeito da proteção do Estado, e reconhecendo a união estável

entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facil itar sua conversão em

casamento” .

A adoção poderá ser requerida por um só dos cônjuges; porém o outro deverá

concordar. Isto não significa que passado determinado tempo o outro cônjuge não possa

adotá-lo.

A Lei 8.069/90 veda expressamente a adoção por ascendentes e irmãos do

adotando (§ 1º art. 42).

A razão desta restrição legal seria para evitar confusões de parentesco, mantendo

desta forma a ordem parental derivada da própria natureza. Sendo os descendentes parentes

biológicos, não convém desvirtuar-se a ascendência, por via da adoção. Além disso, a

finalidade da adoção é colocar em família substituta quem não tem ou quem, pela sua própria

família natural, foi abandonado.

Neste caso o melhor caminho, que satisfaz a proteção integral da criança e do

adolescente, é a concessão da tutela aos avós.

A adoção poderá ser feita por ambos os cônjuges, ou concubinos, desde que um

deles tenha atingido a capacidade civil e que haja estabili dade famili ar, a ser comprovada

mediante provas testemunhais e de qualquer outra espécie.

Há de se ressaltar que se um dos concubinos não tiver capacidade civil, deverá ser

assistido por seus pais ou tutores, pois o concubinato, ao contrário do casamento, não

emancipa o relativamente incapaz.

A questão da estabili dade famil iar, quando conjunta a adoção, não ficou

condicionada à idade dos adotantes.

Importante ressaltar que o Código Civil originariamente havia estipulado uma

diferença mínima de dezoito anos entre o adotante e o adotado, e atualmente o adotante deve

ser – pelo menos- dezesseis anos mais velho do que adotado, por exigência do Estatuto (art.

42, § 3º), sendo esta regra mantida no Novo Código Civil pelo art. 1619.

Na adoção singular, a diferença de idade, pelo menos de dezesseis anos, deve ser

respeitada. Razoável exigir-se tal requisito, na hipótese de adoção conjunta por casais ou

concubinos, apenas de um dos adotantes.

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Registre-se que em uma leitura gramatical da Convenção de Haia, o Juiz natural

da adoção deveria indeferir pedidos de adoção internacional formulados por concubinos. Em

Pernambuco esta proibição chegou a ser incluída no texto do art. 1°, I, da Resolução 04/99 da

CEJA-PE, ora transcrito na íntegra:

Art. 1° DETERMINAR aos juízes do Estado de Pernambuco com jurisdição em matéria de Infância e Juventude para observarem os seguintes aspectos: 1) indeferir pedido de adoção internacional formulado por concubinos, face à Convenção de Haia que prevê o instituto para pessoas casadas civilmente ou pedidos isolados de solteiro, mantendo-se, contudo, a possibili dade do deferimento para pretendentes brasileiros ou estrangeiros com visto de permanência no Brasil , os quais estejam em união estável, por haver amparo para tal pretensão na Constituição Federal e na Lei 8.069/90, que não são alcançadas pela aludida Convenção que fixa a competência pelo critério do domicíl io (FIGUEIRÊDO, 2002, p,131).

No entanto, por ocasião da elaboração da proposta de uniformização de

procedimentos, em sugestão da CEJA-MG, constatou-se a radicalização da leitura do texto

constitucional neste aspecto, danosa aos interesses de crianças à espera de pais adotivos, pois,

se no país de acolhimento existir norma análoga à brasileira, nenhum prejuízo haveria para o

adotando, levando o Conselho das Autoridades Centrais Brasileiras a regulamentar a questão

na Resolução 03/2001, nos seguintes termos:

SÉTIMA CLÁUSULA – O Brasil reconhece a união estável como entidade familiar e não proíbe aos companheiros que adotem em conjunto, crianças e adolescentes (ECA, art. 42). Nessa condição, devem as CEJAIS e os juízes do processo verificar se o país de origem dos pretendentes (considerando que é um Estado ratificante da Convenção) protege, igualmente, a união estável, com todas as conseqüências jurídicas de modo a resultar numa adoção plena de direitos para atender o superior interesse da criança. Se positivo, não há impedimento para a realização da adoção internacional aos casais estrangeiros que vivem em união estável. APROVADA POR UNANIMIDADE (FIGUEIRÊDO, 2002, p. 131).

Ocorrendo separação ou divórcio, e tendo o estágio de convivência se iniciado na

constância da sociedade conjugal, poderá a adoção ser concedida a ambos os pretendentes,

desde que acordem sobre a guarda e o regime de visitas.

Observa-se que este preceito, por sua vez, contemplou apenas os brasileiros com

tal possibilidade, em virtude da incompatibili dade como o que estabelece o parágrafo 4º do

art. 51: “Antes de consumada a adoção não será permitida a saída do adotando do território

nacional” .

Se a lei exige que a criança tenha iniciado o estágio de convivência com o casal na

constância da sociedade conjugal e que este seja cumprido no território nacional, é

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incompatível o que dispõe neste parágrafo para adotantes estrangeiros, posto que uma criança

brasileira não poderá estar convivendo com um casal de estrangeiros, no exterior, sem que

tenha sido adotada.

O art. 44, do ECA, estabelece que “ enquanto não der conta de sua administração

e saldar seu alcance, não pode o tutor, ou o curador adotar o pupilo ou curatelado” . Como se

percebe, este dispositivo nega a adoção ao tutor e o curador se estes não prestarem contas de

sua administração, mas, se ambos desempenharem bem a sua função, não se estende a eles tal

proibição.

A razão da proibição é impedir que a adoção se converta em meio idôneo para

afastar responsabil idade decorrente de má ou infiel administração, frustrando a prestação de

contas, em evidente prejuízo do adotando. Na hipótese de o tutor e o curador desempenharem

bem a sua função, tal proibição a eles não se estende.

Por fim, estabelece o § 5° do art. 42 do ECA, que, mesmo se o adotante vier a

falecer no curso do processo, se ele deixou inequívoca sua manifestação de vontade de adotar,

a adoção poderá ser deferida e, ato contínuo, consumada. Nesta hipótese, os efeitos da adoção

retroagem à data do óbito, dicção do art. 47 § 6º da Lei 8.069/90.

2.5 Capacidade para ser adotado

A competência para julgar ações constitutivas de adoção internacional sempre que

a criança ou o adolescente tiver por residência habitual o território nacional, será do juiz

brasileiro. Dessa forma, será sempre a lei brasileira a aplicável para que se determine a

capacidade para ser adotado.

Segundo estabelece o Estatuto da Criança e Adolescente, só poderão ser

plenamente adotadas as pessoas menores de dezoito anos, salvo se já estiverem sob guarda ou

tutela dos adotantes, o que não ocorrerá em relação aos estrangeiros, por força do art. 31 do

mesmo estatuto legal, porque a colocação em família substituta estrangeira só ocorrerá na

modalidade de adoção.

Outra exigência feita por nossa lei é aquela referente à diferença de idade entre

adotante e adotando. Por força da norma inserta no § 3° do art. 42 do ECA, tal diferença é de,

no mínimo 16 anos.

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Dessa regra podem surgir confli tos, quando a lei do adotante exija diferença de

idade diversa.

Na hipótese em que a lei estrangeira exigir diferença menor que a de 16 anos

prevista pela lei brasileira nas palavras de Mônaco (2002, p. 97) ”deve o juiz aplicar a lei

nacional, restringindo o leque de opções dos adotantes, mas procurando garantir um futuro

saudável aos adotandos”.

Se, por outro lado, a lei estrangeira, exigir diferença maior que a nacional,

aplicável seria a lei nacional, se, no ordenamento em que devam se produzir os efeitos da

sentença, estiver em vigor qualquer dos tratados internacionais de que o Brasil seja parceiro,

tratados esses que prevejam a imediata produção daqueles efeitos. No entanto, se não houver

a reciprocidade ou mesmo a previsão da produção imediata dos efeitos, deverá o juiz verificar

a diferença etária determinada pela lei pessoal do adotante, sob pena de não ser reconhecida a

sentença no ordenamento jurídico em que se visa produzir a nova relação fili al.

Terá capacidade para ser adotado o menor de 12 anos cujos pais ou responsáveis

que estejam no pleno exercício do pátrio-poder-dever, da tutela ou da guarda tenham

consentido. Inexistindo responsáveis e sendo os pais desconhecidos, será dispensado o

consentimento daqueles, que é presumido pelo legislador. Estando o adotando entre os 12 e os

18 anos, será necessária a obtenção, também, de seu consentimento.

2.6 Da adoção por procuração

O Parágrafo Único do art.39 da Lei 8.069 veda expressamente a adoção por

procuração, quer dizer, não é mais possível nos procedimentos de adoção, sejam eles

requeridos por brasileiros ou estrangeiros, a utilização (intervenção) da procuração, tendo em

vista a dificuldade da intermediação processada entre o requerente e o juiz.

No mais, a adoção é ato personalíssimo, não podendo o pretendente se fazer representar por

qualquer procurador.

Marmit (1993, p. 11) explica que “o fundamento dessa proibição está no fato de

que os adotantes, mesmo que estrangeiros, precisam ter uma pequena convivência com o

adotado, em estágio de convivência, como condição prévia, a fim de evitar dissabores e

arrependimentos futuros” .

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Mais adiante prossegue sugerindo que a proibição tem por objetivo levar a

presença do magistrado todos os interessados no ato jurídico, propiciando ao julgador melhor

convencimento das vantagens da outorga da adoção.

A nova abrangência advinda do Estatuto da Criança e do Adolescente não

consentiu que interessados estrangeiros em adotar crianças brasileiras viessem ao nosso País

somente quando tudo estava pronto, faltando apenas receber a criança.

A nova lei, agora, obriga os interessados em adotar a estarem presentes ao ato

processual, requerendo a adoção pessoalmente ou por meio de profissional habili tado, não

podendo mais ser substituído por procurador.

Convém registrar que, diante da irrevogabili dade da adoção, há necessidade

sempre de que seja feita uma avaliação psicossocial antes de deferida a medida, quando será

verificada a adaptação entre adotante e adotado. Neste caso, se houvesse a intervenção de

intermediário, seria impossível tal averiguação.

Neste sentido a Jurisprudência é tranqüila:

Situação irregular adquiram pais adotivos, fica vedada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente a adoção por procuração, uma vez Não obstante o interesse do Poder Judiciário de que menores em que os adotantes ainda que estrangeiros, têm que ter o mínimo de contato com a criança a ser adotada, isto, é, um reduzido estágio de convivência, para que não ocorra arrependimento futuro quanto àquela escolhida por procurador (SILVA FILHO, 1997, p. 130).

Não é proibida a presença do advogado, mas somente a sua intermediação. Logo,

os adotantes devem comparecer pessoalmente, mesmo que tenham constituído advogado.

Tal exigência possibili ta o contato direto do juiz, do promotor de justiça e dos

técnicos com os adotantes, para melhor análise do caso.

Por fim, a vedação da adoção por procuração permite um maior controle dos

intermediários que, muitas vezes, operam no campo da adoção com objetivos que não

protegem os interesses das crianças e ingressam pura e simplesmente na obtenção de

vantagens financeiras.

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2.7 Estágio de convivência

Como já visto, além da excepcionalidade da adoção, o Estatuto impõe ao

estrangeiro não residente no País outra restrição, a qual se encontra disciplinada no art. 46, §

2º, exigindo “estágio de convivência, cumprido no território nacional”, no mínimo de quinze

dias para crianças de até dois anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de

adotando acima de dois anos de idade.

Para assim concluir, basta verificar que o caput do mencionado art. 46, com certa

rigidez, trata, justamente do estágio de convivência do adotante estrangeiro com o adotando

nacional, dispondo que a adoção será precedida de estágio de convivência, pelo prazo que a

autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso.

Entretanto, no parágrafo 1º, permite-se à dispensa do estágio quando o adotando

tiver menos de um ano de idade, ou quando já estiver na companhia do adotante durante

tempo suficiente que permita avaliar a conveniência da adoção, cabendo ressaltar que essas

exceções se aplicam tão-somente aos adotantes nacionais.

No mesmo diapasão, reafirmando a exigência do estágio de convivência, o art.

167, do mesmo diploma legal, confere ao juiz o poder de decidir e avaliar as conclusões do

estágio de convivência, através da realização do estudo social ou de perícia efetuada por

equipe interprofissional, composta de técnicos ou auxiliares do juiz, constituída de assistente

social, pedagogos, psicólogos, médicos, psiquiatras, etc.

O estágio de convivência pode ser assim definido:

[...] é o período necessário para que seja avaliada a adaptação da criança ou do adolescente à sua famíl ia. A flexibili dade do prazo, e, mesmo, a possibil idade de dispensa do mesmo, no caso de bebês de menos de um ano, está de acordo com a diversidade de situações existentes. No caso de crianças muito pequenas, a adaptação depende fundamentalmente dos pais adotivos e se assemelha bastante à adaptação dos novos pais biológicos com seu recém-nascido. Nesses casos, é mais importante o período de espera, em que o acompanhante técnico é de muita util idade. Seria como uma gestação psicossocial, em que todos os aspectos relativos à adoção, as necessidades e direitos de uma criança, as expectativas e fantasias dos futuros pais adotivos, devem ser franca e amplamente ventilados. É conveniente que as equipes técnicas que lidam com a adoção sejam bem preparadas, pois de seu trabalho dependerá, em muito, o sucesso da medida (BECKER apud CURY; AMARAL E SILVA; MENDEZ, 2000, p. 158).

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Na seqüência, afirma:

No caso de crianças mais velhas e de adolescentes, é prudente fixar um estágio de convivência mais dilatado, para que se dê tempo, sem pressões, para que o conhecimento mútuo permita o estabelecimento dos vínculos. Não é demais lembrar que essas crianças e adolescentes já vivenciaram rejeições e rupturas e foram, inclusive, muitas vezes, alvo de maus tratos e abusos (BECKER apud CURY; AMARAL E SILVA; MENDEZ, 2000, p. 158).

Nota-se a grande importância da realização do estágio de convivência, eis que

oportuniza um prévio convívio, com o intuito de se aferir à existência de afinidades entre

adotante e adotando, vislumbrando-se a adaptação, ou não, da criança ou adolescente na

futura família.

Ao fixar prazos para a convivência a serem cumpridos em território nacional com

o menor, quis o legislador acautelar-se sobre a adoção por casais estrangeiros, objetivando

coibir o “ tráfico de menores” , os quais às vezes são adotados com desvio de sua verdadeira

finalidade.

Convém salientar que o novo Código Civil deixou de se referir à regulamentação

do estágio de convivência como previsto no art. 46 do ECA quanto à adoção nacional;

tratando-se de “adoção por estrangeiro” , preferiu o legislador do novo Código Civil, no artigo

1629, determinar que se obedecerá “nos casos e condições que forem estabelecidos em lei” .

2.8 Comissão estadual judiciár ia de adoção

Sobre a Comissão Estadual Judiciária de Adoção, assim dispõe o artigo 52 do

Estatuto da Criança e do Adolescente: “a adoção internacional poderá ser condicionada a

estudo prévio e análise por uma comissão estadual judiciária de adoção, que fornecerá o

respectivo laudo de habilitação para instruir o processo competente, devendo ainda manter

registro centralizado de interessados estrangeiros em adoção” .

Tal dispositivo demonstra que o principal objetivo do legislador foi de evitar os

abusos praticados principalmente pelos adotantes estrangeiros, extirpando-se de vez com os

desvios de finalidade da adoção, procurando salvaguardar os menores brasileiros que se

encontram disponibilizados para adoção transnacional.

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Entretanto, Marmit (1993, p. 144) reconhece que: “Sem embargo de sua utili dade,

a existência da comissão não é obrigatória, mas facultativa. Também não precisa o adotante

ser um dos selecionados pela comissão, podendo a escolha recair em quem não conste do

cadastro” .

A aproximação dos estrangeiros interessados com o procedimento de adoção é

feita por uma Comissão Estadual Judiciária de Adoção, a qual compete, conforme disposto no

parágrafo único do artigo 52 do Estatuto, manter registro centralizado dos interessados

estrangeiros em adotar crianças brasileiras, examinando e facilitando o pedido. Mas o Estatuto

da Criança e do Adolescente não estabeleceu obrigatoriedade no que pertine o “estudo prévio

e análise” por uma comissão. O Estatuto também não prevê um acompanhamento dessa

adoção no exterior.

Com a leitura do artigo em comento, extrai-se que a existência da “CEJA ou

CEJAI – Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional é facultativa e não obrigatória

vez que o legislador, ao instituí-la, firmou que a adoção internacional “poderá” ser

condicionada a estudo prévio e análise das condições dos interessados, ao passo que, se o

legislador tivesse usado a expressão “deverá”, certamente toda e qualquer adoção feita por

estrangeiros no Brasil teria que, obrigatoriamente, passar pelo estudo e análise da Comissão.

Conclui-se, portanto, que tal comissão pode ou não ser criada no seu âmbito de

atuação, isto é, no seu Estado-membro.

É importante salientar que a Comissão Estadual Judiciária de Adoção de Santa

Catarina foi instituída pela Resolução nº 001/93/TJ, de 02.06.93, e está regulamentada pelo

Provimento nº 12/93 da Corregedoria Geral de Justiça.

Tal resolução deixa claro o posicionamento do TJSC a respeito da adoção por

estrangeiros residentes no exterior, entendida como medida excepcional, determinando que

nenhuma adoção internacional será processada em Santa Catarina sem a prévia habilitação do

adotante pela CEJA.

Como visto anteriormente, a CEJA é órgão de existência opcional, estando

vinculado ao Poder Judiciário Estadual. Como não é órgão de existência obrigatória, acredita-

se que nos Estados onde não foi constituído, o juiz poderá aceitar o pedido inicial da adoção,

tendo contudo a cautela de endereçá-la à equipe interprofissional para o estudo prévio, análise

psicológico e social e verificação do estágio de convivência.

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Atuando como órgão consultivo, a CEJA é composta por desembargadores e

juízes de direito, procuradores e promotores de justiça, psicólogos, sociólogos, pedagogos,

assistentes sociais, advogados, médicos e outros, que prestam serviços gratuitamente, em face

de serem estes considerados de natureza pública relevante. Seus agentes emitem pareceres de

natureza opinativa, onde o juiz da Infância e da Juventude certamente vai se apoiar para

deferir ou não o pedido formulado por estrangeiro.

São atribuições das Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção Internacional:

I- Organizar, no âmbito do Estado, cadastros centralizados de: a) pretendentes estrangeiros, domici liados no Brasil ou no exterior, à adoção de crianças brasileiras; b) crianças declaradas em situação de risco pessoal ou social, passíveis de adoção, que não encontrem colocação em lar substituto em nosso País; II – Manter intercâmbio com órgãos e instituições especializadas internacionais, públicas ou privadas, de reconhecida idoneidade, a fim de ajustar sistemas de controle e acompanhamento e estágio de convivência no exterior; III- Trabalhar em conjunto com entidades nacionais, de reconhecida idoneidade e recomendadas pelo Juiz da Infância e da Juventude da Comarca; IV – Divulgar trabalhos e projetos de adoção, onde sejam esclarecidas suas finalidades, velando para que o instituto seja usado somente em função dos interesses dos adotandos; V- Realizar trabalho junto aos casais cadastrados, visando favorecer a superação de preconceitos existentes em relação às crianças adotáveis; VI – Propor às autoridades competentes medidas adequadas, destinadas a assegurar o perfeito desenvolvimento e devido processamento das adoções internacionais no Estado, para que todos possam agir em colaboração, visando prevenir abusos e distorções quanto ao uso do instituto da adoção internacional; VII – Expedir o Laudo ou Certificado de Habil i tação, com validade em todo o território estadual, aos pretendentes estrangeiros e nacionais à adoção, que tenham sido acolhidos pela Comissão (LIBERATI, 1985, p. 129).

Como se vê, o trabalho desenvolvido pela CEJA surge como uma esperança para

os adotantes estrangeiros, que terão um órgão idôneo e seguro para administrar seus interesses

frente à adoção desejada.

É através da expedição do Laudo de Habili tação, que a Comissão Estadual

Judiciária de Adoção Internacional autoriza o interessado estrangeiro a requerer a adoção, e

tal habil itação declara estar o candidato apto à adoção em qualquer cidade do Estado.

Dentre as atividades realizadas pela CEJA, poderá também, por meio do art. 50 e

parágrafos do ECA, coordenar a criação do registro centralizado de interessados em adoção

de crianças e adolescentes em condições de serem adotados.

Tal registro deverá conter o cadastramento com os dados pessoais da criança,

como as características físicas, a idade, fotografia, o histórico de saúde e, enfim, todos os

elementos que compõem a vida social e efetiva do menor. Estas informações têm por objetivo

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possibilitar a adequação entre o adotando e amenizar as expectativas do adotante que obterá

maiores facilidades em encontrar quem que deseja adotar.

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3 ASPECTOS PROCESSUAIS DA ADOÇÃO INTERNACIONAL

3.1 Requisitos processuais

Pelo sistema vigente, a Vara da Infância e da Juventude é competente para

conhecer e julgar os processos de adoção e seus incidentes, por força do artigo 148, inciso III ,

do Estatuto. Nas Comarcas em que não houver vara especializada a competência funcional

será do juiz que exercer essa função na forma da Lei de Organização Judiciária local,

conforme artigo 146 do mesmo diploma legal.

Entretanto, há que se observar que a competência territorial para processar o

pedido de adoção é determinada pelo domicílio dos pais ou responsáveis, ou pelo lugar onde

se encontre a criança ou o adolescente, na falta dos pais ou responsáveis.

A prática processual pretendida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente a fim

de iniciar ao processo de adoção internacional desenvolve-se perante à Comissão Estadual

Judiciária de Adoção. É bem verdade que a inscrição do interessado estrangeiro perante a

CEJA é considerada como pré-requisito do processo de adoção, isto é, nos Estados em tal

comissão esteja constituída.

Destarte, considerando-se o objetivo traçado pelo Estatuto, analisa-se o

procedimento do interessado estrangeiro em adoção em que obteve sua habilitação junto à

Comissão, estando aquela apta para requerer o pedido de adoção no Juízo Especializado.

O procedimento para o processo de Adoção será de jurisdição voluntária quando

houver a anuência dos genitores do adotando, ou de jurisdição contenciosa quando tivermos a

pretensão resistida, firmando-se o contraditório quando inexistir a manifestação positiva de

vontade dos genitores e esse seguirá o rito ordinário previsto nos artigos 282 a 475 do Código

de Processo Civil .

Entretanto, independentemente do procedimento utilizado nos autos de adoção,

também se faz necessário o consentimento do adotando maior de doze anos de idade,

considerando que este já possui condições de expressar seus desejos.

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Não se pode olvidar que, na ausência dos genitores, o juiz nomeará curador

especial, para a proteção de seus interesses e promover sua defesa.

O pedido inicial, no processo de adoção, formulado por interessados nacionais ou

estrangeiros, deverá conter os requisitos exigidos no artigo 282 do Código de Processo Civil

e, especialmente, aqueles previstos no 165 do Estatuto, a saber:

I – quali ficação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste; II – indicação de eventual parentesco do requerente e de seu cônjuge, ou companheiro, pela criança ou adolescente, especificando se tem ou não parente vivo; III – quali ficação completa da criança ou adolescente e de seus pais, se conhecidos; IV – indicação do cartório onde foi inscrito o nascimento, anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão; V – declaração sobre a existência de bens, direitos ou rendimentos relativos à criança ou ao adolescente. Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar-se-ão também os requisitos específicos.

A petição inicial, além de conter os requisitos supracitados, deverá ser instruída

com o laudo de habili tação emitido pela CEJA, os documentos de identificação pessoal do

interessado e os documentos da criança.

No procedimento de adoção que existir lide (contraditório), o pedido formulado

deverá ser feito por advogado legalmente habilitado, vez que nessas hipóteses, a assistência

daquele é indispensável. Se o requerente possuir recursos, deverá constituir seu patrono, do

contrário, poderá usufruir do benefício da assistência judiciária, dispondo de procurador

dativo (arts. 141, § 1º, 159 e 206 § único, ECA).

Ao contrário, a Lei Estatutária no caput do art. 166 assim dispõe: “Se os pais

forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do pátrio poder, ou houverem aderido

expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado

diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes” .

Como se vê, a petição inicial poderá ser assinada pelos próprios requerentes, ante

a inexistência de li tígio, os quais formularão o pedido de adoção diretamente em cartório, e,

desta forma, dispensa-se à assistência do advogado.

O processo de adoção é de jurisdição graciosa, eis que não existem custas ou

emolumentos a serem recolhidos aos cofres públicos, conforme determinação expressa do

artigo 141 do Estatuto.

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3.2 Manifestação do Ministér io Público

As atribuições do Ministério Público, confiadas pela Constituição Federal e pela

Lei 8.069/90 (art. 200 a 205), são amplas e objetivam a proteção integral da criança e do

adolescente.

Desta forma, o Ministério Público deverá intervir, obrigatoriamente, em todos os

procedimentos de competência da Infância e Juventude, podendo a falta acarretar nulidade do

feito, que será declarada de ofício pelo juiz, ou a requerimento de qualquer interessado.

Não se pode deixar de mencionar que, além da intimação pessoal (art. 203,

Estatuto) no processo de adoção, o representante Ministerial atuará como custos legis,

verificando a sua regularidade processual e formal, proferindo seu parecer final.

Neste sentido, preconiza o art. 202 da Lei Estatutária: “Nos processos e

procedimentos em que não for parte, atuará obrigatoriamente o Ministério Público na defesa

dos direitos e interesses de que cuia esta lei, hipótese em que terá vista dos autos depois das

partes, podendo juntar documentos e requerer dil igências, usando os recursos cabíveis”.

Ou, ainda, na dicção do art. 168, do mesmo diploma legal: “Apresentado o

relatório social ou o laudo pericial e ouvida, sempre que possível, a criança ou o adolescente,

dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de cinco dias, decidindo a

autoridade judiciária em igual prazo”.

Dentre tantas tarefas atribuídas ao Ministério Público, a este compete, através de

seu representante legal, fiscalizar os atos e documentos necessários à formação do processo de

adoção, podendo inclusive requerer à autoridade judiciária que determine a realização de

estudo social, providência permitida pelo art. 167 do Estatuto.

Muito embora o estudo social ou laudo pericial realizado pela equipe

interprofissional sirva apenas de base ao convencimento do membro do Ministério Público, é

documento considerado imprescindível para a manifestação do parecer.

Ao final, conforme dispõe o art. 205 do Estatuto e art. 129, VIII da Constituição

Federal, as manifestações processuais do representante do Ministério Público hão de ser

fundamentadas, vez que a fundamentação jurídica dos pareceres ministeriais supõe de

antemão o prévio exame dos autos, levando-se em consideração todos os fatos expostos para

análise.

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3.3 Sentença judicial

Com a edição da Lei 8.069/90, deixou a constituição do vínculo de adoção através

de escritura pública, passando a existir tão-somente o ato de instituição de adoção de menores

provenientes de sentença judicial.

Neste sentido, assim determina o art. 47, caput do ECA: “O vínculo da adoção

constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual

não se fornecerá certidão”.

A eficácia da sentença judicial favorável de adoção será ela, simultaneamente,

constitutiva e desconstitutiva, pois desconstituirá o antigo registro de nascimento do adotando

e constituirá um novo assentamento, criando outra ordem de relação parental entre adotante e

adotado, por conseqüência lógica de natureza sucessória.

Com relação às sentenças constitutivas a doutrina registra:

Essas sentenças, como as demais, contêm uma declaração de certeza de relação ou situação jurídica preexistente, mas a isso, como conseqüência, acrescentam um quid, consistente na criação de nova relação, ou modificação ou extinção da mesma relação ou situação jurídica. Há nelas uma declaração de certeza do direito preexistente, das condições necessárias e determinadas em lei para se criar nova relação, ou alterara relação existente, e aí se manifesta a função declaratória, comum a todas as sentenças; e acrescentam a criação, a modificação ou extinção da relação jurídica, como decorrência daquela declaração, e nisso consiste o seu efeito específico, que as caracteriza – efeito constitutivo (SANTOS apud LIBERATI, 1995, p. 160).

É fundamental, para que se conceda a adoção, seja a sentença judicial sempre

fundamentada, sob pena de nulidade, devendo nela estar consignada as reais vantagens para o

adotado, e que os motivos da pretensão sejam verdadeiramente legítimos.

Convém salientar que as vantagens e os motivos legítimos acima referidos são

critérios definidos pelo legislador para o deferimento da adoção.

Assim, a adoção será indeferida quando ausentes as reais vantagens para o

adotando contempladas nos parâmetros do art. 28, § 1º e 2º e art. 29, ambos do ECA, e

quando o pedido do adotante fundar-se em motivos ilegítimos com fins imorais – visando

empregar o menor para trabalhos domésticos, ou ilícitos, objetivando a prostituição.

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Como se vê, a adoção se institucionalizou, no país, no intuito de proteger

integralmente a criança ou o adolescente, interesse este que é o objetivo do pronunciamento

jurisdicional.

Desta forma, a destituição do pátrio poder se impõe quando omitido o dever de

criar, assistir e educar os filhos, constituindo-se o ato destitutório em uma sanção a ser

aplicada aos pais biológicos ou adotivos que não cumprirem os preceitos legais.

Não é demais lembrar que através da sentença judicial da adoção cessam todos os

vínculos do pai biológico com o filho adotado por outrem, tornando-se irreversível a perda do

pátrio poder, em outras palavras, trata-se de uma viagem sem volta.

3.4 Registro de nascimento

O ECA impõe que após o trânsito em julgado da sentença concessiva da adoção

passa a surtir seus efeitos, possibili tando à autoridade judiciária competente à determinação da

expedição de qualquer ato decorrente da adoção decretada, inclusive a nova certidão de

nascimento do adotado.

Com a inscrição da sentença junto ao registro civil , o oficial do cartório procederá

o cancelamento do registro original e posteriormente lavrará um novo assento de nascimento,

sem nenhuma observação às origens do adotado. Nele constará o nome dos adotantes como

pais legítimos, assim como de seus ascendentes, conforme determinação expressa pelo

parágrafo 1º do artigo 47 do Estatuto, que dispõe: “a inscrição consignará o nome dos

adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes”.

Observa-se que ocorre uma integração total do adotado na família do adotante.

Na hipótese de o adotado não possuir certidão de nascimento, o mandado judicial

deverá possibil itar a realização da inscrição do adotado no registro civil, com seus dados

originários da família biológica e somente após isso se procederá ao seu cancelamento. Em

seguida, o Oficial do cartório lavrará os novos dados de fil iação do adotado, como ordena a

sentença judicial.

No tocante ao cancelamento do assento de nascimento, quando a inscrição

primitiva for feita em comarca ou Estado diferente daquele onde tramitou o processo de

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adoção, nada impede que o mandado que contém a terminação do cancelamento da inscrição

seja remetido àquela comarca através de carta precatória, sem prejuízo da tramitação cartorial

na comarca processante da adoção.

Muitas vezes, em face da demora na efetivação das alterações determinadas na

sentença, ou seja, o cancelamento e inscrição de um novo registro, o adotante estrangeiro se

obriga a permanecer por mais tempo em solo nacional, tendo em vista que necessita da

certidão de nascimento original e daquela decorrente da adoção para que possa regularizar a

adoção em seu país.

Não se pode olvidar que, efetivado o registro da sentença, cancela-se o registro

original do adotado. E nenhuma observação sobre a origem do ato, como a filiação,

parentesco, origem e processo, poderá ser feita na certidão do adotando (art.47, § 3º, ECA).

Isto porque os procedimentos que cuidam da colocação de criança ou adolescente

tramitam em segredo de justiça dado o relevante interesse público na proteção das partes

envolvidas. O sigilo das informações se impõe.

Ressalva-se apenas que, “a critério da autoridade judiciária, poderá ser fornecida

certidão para salvaguarda de direitos” (art. 47, § 4º, ECA).

3.5 O novo nome do adotado

O direito ao nome está previsto na Carta da ONU e configura o princípio dos

direitos da criança. Conforme o 3° Princípio da Declaração Universal, a criança terá o direito

ao nome desde o nascimento.

O artigo 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente em seu § 5° reforça este

princípio, dispondo: “A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido deste,

poderá determinar a modificação do prenome”.

Trata-se de uma exceção à regra prevista na Lei dos Registros Públicos, Lei n.

6.015, de 31 de dezembro de 1973, art. 58.

Mas essa modificação dependerá de pedido da parte, sendo deferida ou não no

momento da prolação da sentença.

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Convém consignar que não é aconselhável a modificação do prenome do adotado

quando a criança já tiver idade suficiente para compreender e se identificar com seu prenome,

quando, então, a sua mudança poderá acarretar prejuízo ao adotado, cuja personalidade ainda

em formação.

3.6 Autor ização para viajar e expedição de passaporte

O Estatuto da Criança e do Adolescente, objetivando proteger a infância e a

juventude, registrou em seu texto vários artigos com a finalidade de impedir que o

estrangeiro, não residente no Brasil , leve consigo uma criança brasileira em desacordo com as

formalidades legais.

Neste sentido, o artigo 85 do Estatuto disciplina que: “Sem prévia e expressa

autorização judicial, nenhuma criança ou adolescente nascido em território nacional poderá

sair do País em companhia de estrangeiro residente ou domiciliado no exterior” .

Tal vedação encontra ligação ao disposto no parágrafo 4º do artigo 51, que assim

estabelece: “Antes de consumada a adoção não será permitida a saída do adotando do

território nacional”.

Assim, a saída de adotante estrangeiro do território nacional em companhia de

criança ou adolescente brasileiro estará condicionada a autorização expressa do juiz através de

sentença judicial transitada em julgado.

A decisão também deverá permitir a emissão do passaporte do adotado. Esta

exigência tem fundamento no Decreto 637, de 24 de agosto de 1992, artigo 19 e seu

parágrafo 2º: “São condições gerais para a obtenção do passaporte comum [...] - § 2° -

Quando se tratar de menor de 18 anos, não emancipado, será exigida autorização dos pais ou

do responsável legal ou do juiz competente”.

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3.7 Sistema recursal

A adoção estatutária utiliza-se do sistema recursal do Código de Processo Civil ,

conforme prevê o artigo 198 da Lei 8.069/90.

Assim, são cabíveis todas as espécies de recursos, a saber: 1°. apelação (CPC,

arts. 513 a 521); 2°. agravo (CPC, arts. 522 a 529); 3°. embargos infringentes (CPC, arts. 530

a 534); 4°. embargos de declaração (CPC, arts. 535 a 538); 5°. recurso especial (CPC, arts.

496, VI); 6°. recurso ordinário (CPC, arts. 496, V) e 7°. recurso extraordinário (CPC, arts. 541

a 546).

Os recursos serão interpostos independentemente de preparo (art. 198, inciso I,

Estatuto, em face da isenção de custas e emolumentos previstas no artigo 141, § 2° do mesmo

diploma.

Conforme determinação expressa do artigo 198, inciso II , da Lei Estatutária, o

prazo para interposição e para resposta dos recursos será sempre de dez dias, exceto para o

agravo de instrumento e embargos de declaração. Nestes recursos prevalecem os prazos da lei

processual, ou seja, dez dias para interposição de agravo de instrumento (CPC, art. 522,

caput), com redação determinada pela Lei n. 9.139/95 e cinco dias para os embargos de

declaração (CPC, art. 536, na forma que lhe deu a Lei n. 8.950/94).

A apelação será recebida apenas no efeito devolutivo, salvo quando se tratar de

adoção postulada por estrangeiro residente fora do Brasil , ou se houver perigo de dano

irreparável, ou ainda de difícil reparação, hipóteses em que também será recebida no efeito

suspensivo, consoante expressa o art. 198, inciso VI do Estatuto.

Na apelação de sentença que defere a adoção a estrangeiro é obrigatório e

automático o efeito suspensivo, haja vista que o adotante enfrentará possíveis dificuldades,

pois não poderá levar o adotando consigo antes de consumada a adoção, por força do que

dispõe o artigo 51, § 4° da Lei Estatutária.

Existe a possibil idade de o juiz reformar sua sentença antes de os autos serem

remetidos à instância superior, devendo, para isso, proferir despacho fundamentado, onde

poderá manter ou reformar sua decisão. O magistrado terá o prazo de cinco dias para exarar o

despacho de retratação (art. 198, inciso VII do ECA).

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Mantida a decisão, o escrivão remeterá os autos à instância superior, no prazo de

vinte e quatro horas. Se a autoridade judiciária reformar a decisão, a remessa dos autos

dependerá de pedido expresso da parte interessada ou do Ministério Público, no prazo de

cinco dias, contado a partir da intimação (art. 198, inciso VIII do Estatuto).

No Tribunal de Justiça os recursos terão preferência de julgamento, face à

prioridade absoluta no atendimento aos direitos assegurados às crianças e adolescentes.

3.8. Eficácia social do procedimento de adoção internacional

A questão relativa à adoção internacional, como instrumento excepcionalíssimo

de proteção à criança ocorre pelo simples fato de inserir-se no âmbito familiar uma criança até

então privada dessa inserção por motivos sociais, econômicos ou políticos.

A doutrina destaca, além da Convenção Relativa à Proteção e Cooperação

Internacional em Matéria de Adoção Internacional – 17ª Conferência de Haia de Direito

Internacional Privado, outras convenções relativas à solução de conflitos de leis em matérias

afetas à proteção da criança, ratificadas pelo Brasil , a saber:

a) Convenção de Direito Internacional Privado dos Estados Americanos – Havana

1928 (Código de Bustamante) – Decreto n° 18.871/29, em especial no tocante aos artigos 73 a 77, que tratam da adoção;

b) Convenção Interamericana sobre Conflitos de Leis em Matéria de Adoção de Menores – La Paz 1984 – Decreto Legislativo n°60/96.

c) Convenção Interamericana sobre Restituição Internacional de Menores – Montevidéu 1989 – Decreto Legislativo n° 03/94 e Decreto n° 1.212/94 (SOUZA, 2001, p. 87).

A família representa importante aspecto dos direitos humanos, uma vez que é nela

que se devem reconhecer, primordialmente, os direitos fundamentais de todo o indivíduo.

Na Declaração Universal dos Direitos Do Homem a família, como instituição,

teve seu reconhecimento internacional sendo expressamente mencionada no artigo XVI,

parágrafos 1° e 3°:

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DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM – 1948. Artigo XVI – 1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm direito de contrair matrimônio e funda uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução.

2. ... 3. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da

sociedade e do Estado (SOUZA, 2001, p. 88).

Também a Declaração Universal dos Direitos da Criança, célula mãe de toda a

Doutrina da Proteção Integral da Criança, vislumbrando a importância da família no contexto

dos direitos humanos específicos da criança, em especial relativos ao desenvolvimento

harmonioso de sua personalidade, foi expressa ao afirmar, conforme Souza (2001, p. 88) ser

“desejável que sejam concedidos à família numerosos subsídios do Estado ou outros para a

manutenção das crianças” .

A importância do ambiente familiar como instrumento de proteção dos direitos da

criança ficou definitivamente reconhecida com o advento da Convenção Relativa à Proteção e

Cooperação Internacional em Matéria de Adoção Internacional – 17ª Conferência de Haia de

Direito Internacional Privado, que já em seu preâmbulo definiu a família “como grupo

fundamental da sociedade e ambiente natural para o crescimento e bem estar de todos os seus

membros, e em particular das crianças” (SOUZA, 2001, p 88-89).

Nesse contexto o instituto da adoção cumpre a missão de suprir eventual lacuna

existente em relação a um ambiente famil iar adequado ao desenvolvimento da criança,

tornando-se fator de proteção dos direitos da criança.

Um magistrado da Infância e Juventude de Belo Horizonte ao discorrer sobre os

aspectos jurídicos políticos e sócio-culturais da Adoção Internacional, observa:

Do ponto de vista sócio-cultural a todo instante surgem questionamentos sobre a probabilidade de êxito de uma criança numa sociedade social, cultural, l ingüística e racialmente distinta de sua origem. As investigações realizadas em diversos países já oferecem condições de avaliar se as crianças adotadas por estrangeiros, hoje adolescentes ou adultos, têm tido problemas dessa ordem. As pesquisas científicas realizadas na Suiça e Suécia, assim com a rica experiência dos antigos Juizados de Menores, nesse campo, revelam que a maioria das adoções internacionais, feitas com a rigorosa observância dos critérios legais, tem alcançado notável sucesso na sua finalidade superior de promover a integração plena da criança em seu novo meio familiar e social. Como bem ponderou DENISE SPRING-DUVOISIN (5), autora de uma importantíssima investigação com 300 adoções internacionais, isto por si só bastaria para tranqüili zar todos os opositores da adoção internacional, mesmo que uma baixa percentagem de casos haja conhecido insucesso. O êxito dessas adoções comprova, mais uma vez, o que de há muito a sublime instituição vem demonstrando: que os vínculos famil iares se nutrem muito mais de afeto do que de sangue. (COSTA, 2002. Disponível em http://www.tjmg.gov.br/ji j /adocinte.html).

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E prossegue:

Em que pesem todos os problemas que a envolveram, a adoção transnacional culminou por converter-se em prestigiosa figura jurídica, exaustivamente discutida nos fóruns internacionais. O notável interesse em torno da instituição acabou por gerar intensos estudos jurídicos sobre a matéria e profundas modificações na normativa legal existente. Aprovaram-se diversas Declarações, Tratados e Convenções Internacionais sobre o assunto, que tiveram decisiva influência no desenvolvimento da legislação dos diferentes países, de tal sorte que, atualmente, o novo instituto da adoção internacional pode ser considerado, conforme a fel iz expressão de Opertti Badán, “patrimonio comum de los Estados”. (COSTA, 2002. Disponível em http://www.tjmg.gov.br/ji j /adocinte.html).

As preocupações da comunidade internacional e da Organização das Nações

Unidas com o problema do tráfico internacional de menores culminaram por produzir

importantes instrumentos que vieram contemplar e sancionar tais atividades.

A Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas, de 1990, deu

especial atenção ao problema, havendo comprometimento dos países signatários no sentido de

adotar medidas necessárias para impedir o seqüestro, a venda e o tráfico de crianças para

qualquer fim e em qualquer de suas formas.

Também a Convenção de Haia, de 1993, subscrita por 67 países, procurou evitar o

tráfico e o seqüestro de crianças. Com o objetivo de preservar a adoção internacional, instituiu

mecanismos efetivos de cooperação entre os países, estabelecendo, numa série de

considerações bastante pormenorizadas, efetivas garantias para as crianças adotivas. Como a

mais relevante, foi ressaltado o sistema de Autoridades Centrais a ser estabelecido em cada

país, que deterão a responsabili dade última de vigiar todos os aspectos de uma adoção

internacional, nas suas diversas fases.

A convenção Interamericana sobre Tráfico Internacional de Menores, realizada no

México em 1995, sustentada pelo princípio da proteção integral e efetiva do “menor”

representa o mais importante documento internacional sobre o tema. Tendo estabelecido

minuciosas normas de prevenção e sanção do tráfico nos aspectos civis e penais. Sua

importância se acentua em razão das obrigações assumidas pelos Estados Partes, que se

comprometeram a adotar medidas eficazes, conforme seu direito interno, para sancionar o

tráfico internacional de crianças e adolescentes e estabelecer mecanismos de assistência

mútua, intercâmbio e cooperação. Dentre eles, o referido sistema de cooperação internacional

entre autoridades (Autoridades Centrais), já consagrado na Convenção de Haia, de 1993.

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Diante da moderna ordem legislativa internacional, dos mecanismos de defesa e proteção por ela introduzidos e das modificações que se operaram na legislação interna dos diferentes países visando coibir o tráfico internacional de menores, os procedimentos criminosos que se verificaram, divulgados com grande repercussão nos meios de comunicação não podem mais servir de justificativa para a extinção ou dificultação das adoções por estrangeiros. Devem ser combatidos com todo o rigor da lei, impondo-se que os mecanismos de controle examinados no âmbito deste estudo, já instituídos a nível nacional e internacional, cuidem de eliminá-los operacionalmente (COSTA, 2002. Disponível em http://www.tjmg.gov.br/ji j / adocinte.html).

As alterações procedimentais trazidas pela Convenção Relativa à Proteção das

Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional foram valiosíssimas para

assegurar a lisura do processo de adoção internacional, para evitar o rapto, seqüestro e

comércio de crianças e adolescentes.

Não podemos olvidar que, embora o processo de adoção não seja oneroso, as

adoções internacionais, alvo de organizações mafiosas, movimentam vultosas somas em

dinheiro.

Segundo a Organização das Nações Unidas – ONU, a movimentação de pessoas (refugiados, tráfico de mulheres e crianças etc.) é o terceiro negócio mais rentável do mundo para as organizações mafiosas. Isto, por si só, é um grande sinal de alerta para que se criem sistemas de controle que evitem que a Justiça compactue com irregularidades, sob o manto daquilo que chamo de “aparência de legalidade”. Em contrapartida, o sistema não pode ser tão rígido a ponto de inibir as adoções internacionais, pois, queiramos ou não, sempre haverá, principalmente nos países de terceiro mundo, onde a pobreza é predominante, crianças que, por diversas razões, não podem ficar sem famílias de origem e não têm como serem incluídas em famílias substitutas da mesma nacionalidade (FIGUEIRÊDO, 2002, p. 147).

Diante dessa realidade inevitável e procurando enquadrar a efetivação de adoções

internacionais tão somente nos casos em que seja recomendável, ou seja, o processo adotivo

legal sem a ocorrência de fraudes, destitui as barreiras intransponíveis para sua efetivação.

Para tanto, o processo há que ser transparente, isonômico, com objetivos

claramente definidos em favor da criança e adolescente, que precisa de uma família para seu

perfeito desenvolvimento físico e mental.

Nessa ótica, a existência de diversas declarações e tratados, em especial a

Convenção de Haia, do Estatuto da Criança e do Adolescente e as comissões de adoção nele

previstas estabelecem as garantias necessárias para a efetivação da adoção internacional.

Enfim, constata-se que a adoção internacional merece inserção dentro do contexto

de globalização atual, especialmente ante as facili dades dos meios de comunicação, a

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integração dos países em blocos econômicos, o aumento de uniões entre homens e mulheres

de diferentes nacionalidades, aproximando os povos, configurando verdadeiro intercâmbio

entre nações e povos.

Como os valores famili ares e humanos são superiores aos valores difusos, como

pátria, cultura, língua e outros, verifica-se que a instituto da Adoção Internacional está

amparado em instrumentos eficazes para sua efetivação, superando obstáculos como costumes

e culturas distintas, compatibil izando legislações.

Impõe-se, todavia, a necessidade de minimizar a questão das crianças

desamparadas, centro de todas as preocupações e valor fundamental a defender.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Constituição da República Federativa do Brasil vigente inseriu na ordem

jurídica significativas mudanças, ampliando e modernizando a conceituação de família,

equiparando os filhos havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, conferindo-

lhes os mesmos direitos e qualificações, permitindo até mesmo a adoção por estrangeiros.

A Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente,

observando as normas constitucionais, e objetivando a proteção integral à criança e

adolescente, atualizou e aperfeiçoou o instituto da adoção, direcionando-o especificamente

aos menores de dezoito anos.

A finalidade da adoção tomou diversos rumos de acordo com o momento histórico

com que foi utili zada. No Brasil , somente em 1916, com o advento do Código Civil, viu-se

disciplinado o instituto.

A adoção, na atualidade, é definida como uma instituição jurídica de ordem

pública, que gera laços de paternidade e fil iação entre adotante e adotado. É vista como

instituto de solidariedade social.

A adoção internacional constitui medida excepcional, somente deferida após

esgotadas as possibili dades de adoção por nacionais, que têm preferência legal.

O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe que em se tratando de adotante

estrangeiro, necessário a pré-quali ficação do interessado em seu país de origem, com

apresentação de documento concedido pela autoridade estrangeira provando a devida

habili tação à adoção. Deverá, também, apresentar, estudo psicossocial favorável à adoção,

elaborado por agência especializada e credenciada no seu País.

Com esse pressuposto o interessado estrangeiro deve habili tar-se perante a

Comissão Estadual Judiciária de Adoção – CEJA, que fornecerá o Laudo de Habili tação, onde

constará a declaração de aptidão do candidato à adoção. Ressalte-se, no entanto, que a CEJA

não é órgão de existência obrigatória, vez que a adoção por estrangeiros poderá ser

condicionada a estudo prévio e análise das condições dos interessados.

Desta forma, objetivando-se o interesse maior da criança ou adolescente é

imprescindível que se percorram todas as fases do processo, desde a pré-quali ficação do

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candidato em seu País de origem até a sentença, que, se julgada procedente, comprovará a

eficácia de todo o processo realizado, atingindo a finalidade principal, a de acolher a criança e

adolescente abandonado.

A posição jurídica do magistrado nesse tema tão permeado pela subjetividade,

mormente com a nova legislação brasileira sobre as relações famili ares e, principalmente,

fil iais deve ser interpretada segundo uma conjugação dos valores essenciais como a dignidade

da pessoa humana, direitos humanos da criança e adolescente.

Denota-se que a aplicação ampla e integral dos novos instrumentos legislativos,

especialmente aqueles firmados no seio da comunidade internacional e adotados pelo Estado

brasileiro, constitui-se em garantia do devido processo legal, afirmador da mais ampla defesa

e possibilitador de pleno contraditório das partes que, no âmbito do Poder Judiciário, buscam,

garantir o integral respeito aos direitos da criança e do adolescente.

Nesse contexto, as exigências impostas pelos tratados internacionais, de uma

participação ativa de Autoridades Centrais controladoras da lisura do proceder jurisdicional,

tendem a pôr um fim a possíveis atos discricionários dos magistrados.

Embora haja a possibil idade de fraudes e desvios de finalidade, como nos demais

campos do Direito, isso não retira as vantagens do Instituto da Adoção Internacional, cabendo

ao ordenamento jurídico coibir e punir severamente seu mau uso.

A adoção como uma manifestação de amor, afeto e desprendimento, deve ser

incentivada.

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