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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL MECÂNICA DOS SOLOS II PROFESSOR: MARCELO DE VASCONCELOS BORGES HIDRÁULICA DOS SOLOS Parte 1 – Fluxo Unidimensional Índice 1. INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 2 2. ÁGUA NO SOLO .......................................................................................................... 2 2.1 Água Estática .......................................................................................................... 3 2.2 Lei de Darcy ........................................................................................................... 4 2.3 Determinação do coeficiente de permeabilidade .................................................... 6 2.3.1 Permeâmetro de carga constante .................................................................... 6 2.3.2 Permeâmetro de carga variável....................................................................... 7 2.3.3 Ensaios de Campo .......................................................................................... 9 2.3.4 Métodos Indiretos ........................................................................................... 9 2.3.5 Empíricos ...................................................................................................... 10 2.4 Valores Típicos do coeficiente de permeabilidade do solo (k) ............................ 10 2.5 Fatores que influenciam no coeficiente de permeabilidade do solo ..................... 11 2.5.1 Grau de saturação ......................................................................................... 11 2.5.2 Estrutura e Anisotropia ................................................................................. 11 2.5.3 Influência da temperatura ............................................................................. 13 3. VELOCIDADE DE DESCARGA E VELOCIDADE REAL ...................................... 13 4. CARGAS HIDRÁULICAS .......................................................................................... 14 5. FORÇA DE PERCOLAÇÃO ....................................................................................... 16 6. TENSÕES NO SOLO SUBMETIDO À PERCOLAÇÃO........................................... 17 7. GRADIENTE HIDRÁULICO CRÍTICO .................................................................... 19 8. EXERCÍCIOS............................................................................................................... 20 9. REDUÇÃO DO GRADIENTE HIDRÁULICO CRÍTICO ......................................... 25 10. REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 27

03-23 Hidraulica Dos Solos - 1

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL

MECÂNICA DOS SOLOS II PROFESSOR: MARCELO DE VASCONCELOS BORGES

HIDRÁULICA DOS SOLOS Parte 1 – Fluxo Unidimensional

Índice

1. INTRODUÇÃO..............................................................................................................2 2. ÁGUA NO SOLO ..........................................................................................................2

2.1 Água Estática..........................................................................................................3 2.2 Lei de Darcy ...........................................................................................................4 2.3 Determinação do coeficiente de permeabilidade....................................................6

2.3.1 Permeâmetro de carga constante ....................................................................6 2.3.2 Permeâmetro de carga variável.......................................................................7 2.3.3 Ensaios de Campo ..........................................................................................9 2.3.4 Métodos Indiretos...........................................................................................9 2.3.5 Empíricos......................................................................................................10

2.4 Valores Típicos do coeficiente de permeabilidade do solo (k) ............................10 2.5 Fatores que influenciam no coeficiente de permeabilidade do solo.....................11

2.5.1 Grau de saturação .........................................................................................11 2.5.2 Estrutura e Anisotropia.................................................................................11 2.5.3 Influência da temperatura .............................................................................13

3. VELOCIDADE DE DESCARGA E VELOCIDADE REAL......................................13 4. CARGAS HIDRÁULICAS..........................................................................................14 5. FORÇA DE PERCOLAÇÃO.......................................................................................16 6. TENSÕES NO SOLO SUBMETIDO À PERCOLAÇÃO...........................................17 7. GRADIENTE HIDRÁULICO CRÍTICO ....................................................................19 8. EXERCÍCIOS...............................................................................................................20 9. REDUÇÃO DO GRADIENTE HIDRÁULICO CRÍTICO .........................................25 10. REFERÊNCIAS .......................................................................................................27

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1. INTRODUÇÃO

A água que ocupa os vazios dos solos pode se encontra em diferentes

fases. Quando os solos encontram-se saturados, a água submetida a uma

diferença de potencial se desloca em seu interior. Este deslocamento é

comumente chamado de “percolação da água no solo”. O estudo da percolação da

água tem grande importância em vários problemas práticos, tais como:

• Cálculo da vazão, por exemplo, como a quantidade de água que se infiltra numa

escavação.

• Análise de recalques, uma vez que estes podem estar associados a redução dos

vazios pela expulsão da água.

• Estudo da estabilidade de taludes, como é o caso na determinação das pressões

neutras decorrentes das variações do lençol freático.

• Dimensionamento de drenos.

• Dimensionamento de filtros em barragens.

• Lagoas de decantação e dimensionamento de aterros sanitários, onde interessa

saber a permeabilidade da camada que irá reter o produto.

• Outras.

2. ÁGUA NO SOLO

Grande parte da abordagem será feita tomando-se como referências os

permeâmetros, que são equipamentos destinados a determinar o coeficiente de

permeabilidade de um solo, conforme será visto mais adiante. No caso em

questão, entretanto, estes equipamentos serão tomados como um modelo

reduzido para simular situações reais.

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2.1 Água Estática

Considere a Figura 1, onde se tem um permeâmetro (um tubo

comunicante) onde um dos lados é posto uma amostra de areia com comprimento

L. A amostra é retida por uma peneira na parte inferior. Neste caso, os níveis

d’água em cada tubo encontram-se na mesma altura. Como se observa não há

transbordamento.

Figura 1. Permeâmetro sem fluxo (PINTO, 2000)

Considere agora que a água no tubo do lado esquerdo do permeâmetro

da Figura 1 seja elevado a uma altura h, acima da condição inicial, e mantida

nesta condição por uma fonte externa, conforme a Figura 2. Neste caso, a água

tenderá a buscar o equilíbrio, provocando o transbordamento no tubo do lado

direito. Neste caso a água encontra-se agora em movimento, comumente referido

de fluxo. A velocidade com que a água percola dentro dos vazios do solo depende

de uma propriedade denominada “permeabilidade”, que, por sua vez dependerá

do tipo de solo. O primeiro a estudar o fluxo da água no solo foi Darcy (1850), o

que gerou uma Lei com o seu nome.

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2.2 Lei de Darcy

Experimentalmente, Darcy verificou como os diversos fatores

geométricos, indicados na Figura 2, influenciam a vazão da água, chegando-se à

seguinte expressão:

(1)

Onde:

Q = vazão;

A = área do permeâmetro;

k = coeficiente de permeabilidade;

h = carga dissipada na percolação;

L = distância na qual a carga é dissipada.

Figura 2. Água percolando em um permeâmetro (PINTO, 2000)

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5

K = é uma constante para cada solo, denominada “coeficiente de

permeabilidade” (cm/s, m/s).

A Equação 1 pode ser reescrita na forma:

(2)

Onde:

Defini-se “i “como gradiente hidráulico do solo.

A vazão dividida pela área indica a velocidade com que a água sai do

solo, ou seja, a velocidade com que a água percola. Esta velocidade é definida

como “velocidade de percolação”, dada por:

(3)

Da Equação 3, conclui-se que o coeficiente de permeabilidade indica a

velocidade de percolação da água quando o gradiente for unitário. Seu valor é

muito baixo, sendo normalmente expresso como uma potência de 10. Exemplo:

K = 2,5 x 10-3 cm/s para areia

Na prática, o expoente é mais importante do que o multiplicador, razão

pela qual é comum referir a permeabilidade de um solo apenas à potência 10 -X.

Para se ter uma idéia da importância da permeabilidade de um solo em

problemas práticos, considere dois solos:

Solo A (areia) com coeficiente de permeabilidade de 10-4m/s e o solo B

(argila) com valor de K = 10-9m/s.

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Admitindo-se que ambos os solos sejam submetidos a um gradiente

hidráulico unitário, o tempo necessário para uma partícula de água atravessar uma

camada de 1,0m de espessura será:

Solo A : 2,8 horas

Solo B : 32 anos

Por esta razão, quando se pretende construir uma represa utiliza-se solo

argiloso para formar o núcleo impermeável e quando se pretende construir um

dreno utiliza-se a areia.

2.3 Determinação do coeficiente de permeabilidade

Para determinação do coeficiente de permeabilidade no laboratório

podem ser empregados dois tipos de equipamentos:

a) permeâmetro de carga constante e,

b) permeâmetro de carga variável.

2.3.1 Permeâmetro de carga constante

Os permeâmetro de carga constante são, normalmente, empregados

para determinação da permeabilidade de solos de elevada permeabilidade, tal

como os solos arenosos. Trata-se do emprego direto da lei de Darci, conforme

esquematizado na Figura 2.

Basicamente consiste em manter uma carga hidráulica constante (h),

até que se atinja uma condição de fluxo permanente, que pode ser verificado por

meio da vazão. Na prática, determina-se a vazão da água que sai do permeâmetro

por meio de uma bureta graduada. Isso é feito marcando-se o tempo e medindo-

se o volume de água num dado intervalo de tempo, obtendo-se assim a vazão.

Normalmente este procedimento é repetido, pelo menos, três vezes, até se obter

três medidas iguais. Nesta condição é dito que se atingiu a condição de fluxo

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permanente (transiente). A Determinação do coeficiente de permeabilidade é feita

aplicando a Equação 2.

(4)

2.3.2 Permeâmetro de carga variável

O permeâmetro de carga variável é empregado quando se pretende

determinar solos de baixa permeabilidade, tais como os solos argilosos. Na Figura

3 encontra-se ilustrada uma representação esquemática deste tipo de

permeâmetro.

Baseia-se no princípio de que a vazão que atravessa a amostra, com

uma determinada área A, é a mesma que atravessa um tubo de alimentação com

área a.

Figura 3. Permeâmetro de carga variável (PINTO, 2000).

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8

Da Figura 3 tem-se:

(5)

(6)

(7)

(8)

Integrando (8)

(9)

(10)

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9

2.3.3 Ensaios de Campo

A permeabilidade pode também ser determinada por meio de ensaios

de campo, dentre os quais os mais empregados são:

a) Ensaio de Infiltração (sondagens, cavas) – este tipo de ensaio

consiste basicamente em medir a velocidade de infiltração de água, mantido o

nível d’água constante por meio de uma fonte externa. Conhecido o volume de

água adicionado para manter o nível constante, pode-se, por meio de uma

interpretação adequada da lei de Darcy determinar o coeficiente de

permeabilidade.

b) Bombeamento – este tipo de ensaio consiste em medir o volume de

água bombeado em uma escavação ou poço, necessário para rebaixar um

determinado nível d’água. Conhecido o volume de água e o tempo requerido,

pode-se determinar a permeabilidade do solo de forma semelhante ao ensaio de

infiltração.

c) Ensaio de rebaixamento em furo de sondagem – consiste em, durante

uma sondagem, preencher o furo com água e, em seguida, determinar o tempo

necessário para que ocorra uma determinada variação do nível d’água. O

coeficiente de permeabilidade pode ser determinado por meio de uma

interpretação adequada da Lei de Darcy.

2.3.4 Métodos Indiretos

a) Ensaios edométricos (laboratório) – pela teoria do adensamento, a

velocidade com que uma argila recalca é proporcional a saída de água dos vazios.

Logo depende da permeabilidade do solo. Por meio da interpretação da teoria do

adensamento é possível determinar o coeficiente de permeabilidade do solo num

determinado nível de tensão.

b) Piezocone ou CPTU (Campo) – o piezocone é um tipo de ensaio de

campo que permite determinar a resistência de ponta e atrito lateral oferecida pelo

solo à penetração de um cone com dimensões padronizadas. Este cone possui

uma pedra porosa conectada a um sistema de medição que permite a

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determinação da pressão neutra ou poro-pressão da água no solo. Após cravar o

cone, o tempo necessário para a completa dissipação da pressão neutra depende

da permeabilidade do solo. Logo, por meio de uma interpretação adequada do

ensaio é possível determinar o coeficiente de permeabilidade de um solo.

2.3.5 Empíricos

Os coeficientes de permeabilidade são tanto menores quanto menores

os vazios nos solos e, consequentemente, quanto menores as partículas.

Uma boa indicação disto é a correlação estatística obtida por Hazen,

para areias entre o coeficiente de permeabilidade e o diâmetro efetivo do solo

(Defet = D10), onde D10 é o diâmetro que, na curva granulométrica, corresponde à

porcentagem que passa igual a 10 %.

(11)

Nesta expressão, o diâmetro é expresso em cm, embora

costumeiramente ele seja referido em milímetros, e o coeficiente de

permeabilidade em cm/s.

2.4 Valores Típicos do coeficiente de permeabilidad e do solo (k)

A Tabela 1 apresenta típicos valores do coeficiente de permeabilidade

para diferentes solos. Estes valores podem ser vistos apenas como indicadores,

podendo não corresponder a alguns solos com as mesmas características

granulométricas.

Por exemplo, é comum alguns solos argilosos tropicais apresentar uma

estrutura em forma de grumos (agregado de partículas). Nesta situação, solos

argilosos tendem a se comportar como solos arenosos, apresentando elevado

coeficiente de permeabilidade.

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Tabela 1. Valores típicos do coeficiente de permeabilidade (PINTO, 2000)

2.5 Fatores que influenciam no coeficiente de perme abilidade do solo

2.5.1 Grau de saturação

O solo quando se encontra no estado não saturado, os meniscos

capilares formados na interface água-ar geram uma pressão negativa na água dos

poros que, por sua vez, aumenta a tensão efetiva, aumentando assim a

aproximação entre os grãos. Por conseqüência, os vazios tendem a reduzir,

dificultando a passagem da água através dos poros. Logo, a permeabilidade tende

a reduzir com a redução do grau de saturação.

2.5.2 Estrutura e Anisotropia

Além dos vazios do solo, a permeabilidade depende também da

disposição relativa dos grãos. Conforme comentado no item 2.4, em alguns solos

argilosos tropicais as partículas granulares se dispõem de forma aleatória,

formando grumos (agregados de partículas). Nestas condições, os solos podem

apresentar comportamento semelhante às areias, influenciando nas suas

propriedades, dentre as quais a permeabilidade. Um típico exemplo são as argilas

porosas de Brasília, cujos vazios, em alguns casos, chegam a serem percebidos a

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olho nu. Estas argilas apresentam coeficientes de permeabilidade da ordem de

10-4 m/s (típicos de areias), em detrimento de sua granulometria

predominantemente argilosa.

Este fato é também marcante em solos compactados. Geralmente,

quando compactado no ramo seco da curva de compactação, a disposição

aleatória das partículas conduz a uma estrutura floculada, permitindo maior

passagem da água.

Quando compactado com uma umidade maior que a ótima, o solo

apresenta uma estrutura com as partículas orientadas ou dispersas, facilitando a

passagem da água em uma direção preferencial, ainda que apresente o mesmo

índice de vazios.

A Tabela 2 apresenta um exemplo para uma amostra de solo argiloso

utilizado na barragem de Ilha Solteira.

Tabela 2. Variação do coeficiente de permeabilidade da Barragem de Ilha Solteira

(PINTO, 2000)

No estado natural, solos sedimentares apresentam uma estrutura com

as partículas orientadas na direção horizontal (paralelas ao plano horizontal), em

especial os solos argilosos. Nesta condição o solo tende a apresentar maior

coeficiente de permeabilidade na direção horizontal do que na vertical. Tal efeito é

de grande importância em problemas de percolação bidimensional.

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2.5.3 Influência da temperatura

A temperatura influenciará no coeficiente de viscosidade (µ) da água

(permeante), tornando menos viscosa à medida que aumenta a temperatura (ver

Equação 12). Logo, quanto menos viscoso for o permeante, maior será a

permeabilidade do solo a este permeante. Em outras palavras, a permeabilidade

aumenta com o aumento da temperatura. Portanto, ao se determinar o coeficiente

de permeabilidade no laboratório, este deve ser corrigido para uma temperatura

de referência (normalmente 20oC), conforme a expressão abaixo.

(12)

3. VELOCIDADE DE DESCARGA E VELOCIDADE REAL

A velocidade calculada pela Lei de Darcy (Equação 2) é normalmente

referida como a velocidade de descarga. No entanto, a água percola através dos

vazios do solo, numa área menor do que a área total. Uma vez que a vazão será

sempre a mesma em qualquer ponto, é razoável afirmar que a velocidade da água

no interior do solo, referida como velocidade real, será sempre superior a

velocidade de descarga. O esquema da Figura 4 ilustra esta diferença. Uma vez

que a vazão será sempre a mesma em qualquer seção, tem-se:

(13)

A relação entre a área de vazios e a área total é igual a relação entre os

volumes correspondentes, que é, por definição, a porosidade do solo (n). Logo, a

velocidade real ou de fluxo pode ser calculada pela expressão:

(14)

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14

Figura 4. Esquema referente as velocidades de percolação e de fluxo

(PINTO, 2000)

4. CARGAS HIDRÁULICAS

No estudo de fluxo da água, é conveniente expressar as componentes

de energia pelas correspondentes cargas hidráulicas em termos de altura de

coluna d’água. Como demonstrado por Bernoulli, a carga total ao longo de

qualquer linha de fluxo de fluido incompressível mantém-se constante.

A carga hidráulica total (ht) é igual a soma de três componentes:

1. Carga altimétrica (ha) – é simplesmente a diferença de cota entre o

ponto considerado e qualquer cota definida como referência.

2. Carga piezométrica (hp) – é a pressão neutra no ponto

considerado expressa em termos de altura de coluna d’água.

3. Carga Cinética – é a parcela decorrente da velocidade da água no

interior das partículas. É considerada, normalmente, desprezível para fins práticos,

pois a velocidade da água é muito baixa.

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15

Logo a expressão da carga total pode ser resumida por:

(15)

Considera-se a figura 5. Na face superior da areia, a carga altimétrica é

igual a L (tomando-se a cota da face inferior como referência) e a carga

piezométrica é z . A carga total é L + z. Na face inferior, a carga altimétrica é nula

e a carga piezométrica é L+z. As cargas totais são iguais. Não há fluxo, ainda que

a carga altimétrica na face superior seja maior ou que a carga piezométrica na

face inferior seja maior.

Portanto, não haverá fluxo quando a carga total for igual em qualquer

ponto.

Figura 5. Permeâmetro sem fluxo (PINTO, 2000)

Quando há diferença de cargas totais, há fluxo, e ele seguirá o sentido

do ponto de maior carga total para o de menor carga total. Considere-se a figura 6.

Na face superior, a carga altimétrica é L, a piezométrica é z e a total é L + z . Na

face inferior, a altimétrica é nula e a total é igual à piezométrica, valendo L+z+h. O

fluxo se dará de baixo para cima, ainda que a carga altimétrica na face superior

seja maior.

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Figura 6. Água percolando em um permeâmetro (PINTO, 2000)

5. FORÇA DE PERCOLAÇÃO

A diferença de carga total (h) gerará um fluxo no meio poroso. Esta

carga por sua vez, se dissipa através do meio devido ao atrito viscoso com as

partículas. Como é uma energia que se dissipa por atrito, ela provoca um esforço

ou arraste na direção do movimento. Esta força atua nas partículas, tendendo a

carregá-las. Só não o faz porque o peso das partículas a ela se contrapõe, ou

porque a areia é contida por outras forças externas.

A força dissipada é:

(16)

Onde A é a área do corpo de prova.

Num fluxo uniforme, esta força se dissipa uniformemente em todo o

volume de solo.

Logo a força por unidade de volume é:

(17)

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17

Sendo j denominado força de percolação. Observa-se que ela é igual ao

produto do gradiente hidráulico i, pelo peso específico da água.

A força de percolação é uma grandeza semelhante ao peso específico.

As duas se somam quando atuam no mesmo sentido ( fluxo d’água de cima para

baixo) e se subtraem quando em sentido contrário (fluxo d’água de baixo para

cima).

6. TENSÕES NO SOLO SUBMETIDO À PERCOLAÇÃO

Terzaghi estabeleceu o Princípio de Tensões Efetivas, que pode ser

expresso em duas partes:

1) A tensão efetiva, para solos saturados, pode ser expressa por:

σ’ = σ – u (18)

sendo σ a tensão total e u a pressão neutra ou poro-pressão; e

2) Todos os efeitos mensuráveis resultantes de variação de tensões nos

solos, como compressão, distorção e resistência ao cisalhamento são devidos a

variação de tensões efetivas.

A Figura 7 exemplifica, analiticamente, o procedimento de cálculo das

tensões efetivas em um solo submetido a um fluxo ascendente.

Figura 7. Tensões no solo num permeâmetro com fluxo ascendente

(PINTO, 2000)

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18

A tensão efetiva na face da peneira é:

(19)

A Equação 19 pode sofre as seguintes alterações:

(20)

(21)

(22)

A tensão efetiva, portanto, tanto pode ser calculada como a tensão total

menos a poro-pressão, como pelo produto da altura pelo peso específico

submerso, só que, quando há percolação, deve-se descontar a força de

percolação.

A Figura 8, mostra os procedimentos de cálculo das tensões efetiva

para o caso de um permeâmetro com fluxo descendente.

Figura 8. Tensões no solo num permeâmetro com fluxo descendente (PINTO, 2000)

Neste exemplo, em que o fluxo é descendente, os cálculos são

semelhantes, mas a tensão efetiva aumenta com a percolação em relação à

situação sem fluxo, e vale:

(23)

No exemplo da figura 7, a força transmitida à peneira que sustenta a

areia é proporcional ao peso específico submerso, mas aliviada da força de

percolação, que tende a arrastar as partículas do solo para cima.

Já no exemplo da figura 8, ocorre o contrário: a força transmitida à

peneira soma o efeito do peso específico submerso com o da força de percolação

que empurra os grãos para baixo.

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7. GRADIENTE HIDRÁULICO CRÍTICO

No exemplo da figura 7, com fluxo ascendente, considere-se que a

carga hidráulica h aumente progressivamente. A tensão efetiva ao longo de toda a

espessura irá diminuindo até o instante em que se torne nula. Nesta situação, as

forças transmitidas de grão a grão são nulas. Os grãos permanecem,

teoricamente, nas mesmas posições, mas não transmitem forças através dos

pontos de contato. A ação do peso dos grãos (gravidade) se contrapõe à ação de

arraste por atrito da água que percola para cima (força de percolação).

Como a resistência das areias é proporcional à tensão efetiva, quando

esta se anula, a areia perde completamente sua resistência. A areia fica num

estado definido como areia movediça.

Para se conhecer o gradiente que provoca o estado de areia movediça,

pode-se determinar o valor que conduz a tensão efetiva a zero, na expressão

abaixo:

(24)

(24b)

Este gradiente é chamado de gradiente crítico. Seu valor é da ordem de

um, pois o peso específico submerso dos solos é da ordem do peso específico da

água.

Logicamente, só ocorre o estado de areia movediça quando o gradiente

atua de baixo para cima. No sentido contrário, quanto maior for o gradiente, maior

a tensão efetiva.

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8. EXERCÍCIOS Exercício 01.

Para a Figura E.1, obter:

a) Os diagramas de cargas hidráulicas (3 é o ponto de referência).

b) As tensões efetivas nos pontos 1 e 2 e os diagramas de tensão total,

pressão neutra e tensão efetiva.

Figura E.1

a) Solução

A determinação das cargas hidráulicas nos pontos indicados pode ser

feita tomando-se como referência a cota correspondente ao ponto 3. Logo as

cargas de altura serão tomadas pela altura em relação à cota do ponto 3. A carga

de pressão é obtida considerando as condições limites (fronteiras) cujas pressões

são conhecidas. São elas as correspondentes aos pontos 0, 1 e 3. No ponto 2,

uma vez que a pressão no ponto 3 é a atmosférica (zero), para que ocorra o

equilíbrio da coluna d’água do ponto 2 a 3, é necessário que a pressão neutra em

2 seja negativa e de igual valor da pressão decorrente da coluna d’água. Na tabela

abaixo encontra-se um resumo dos cálculos.

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21

b) Solução

Nota: a tensão efetiva no ponto 2 poderia ser calculada através da

Equação 23: σ’=L (γsub + j) = 1,2 [11 + (3/1,2).(10)] = 43,2 kN/m3

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Exercício 02

Para o permeâmetro esquematizado na Figura E.2, obter:

Figura E.2

a) Os diagramas de cargas hidráulicas.

b) As tensões efetivas nos pontos 2 e 3 e os diagramas de tensão total,

pressão neutra e tensão efetiva.

c) O gradiente hidráulico crítico.

d) Qual o acréscimo de carga total para que ocorra a liquefação da

areia.

e) De quanto deveria ser a diferença de carga h para conduzir a um

fator de segurança à liquefação de 2.

a) solução:

Tomando-se como referência a cota do ponto 3, tem-se os seguintes

valores de cargas hidráulicas tabelados abaixo. Para a carga de pressão do ponto

3, esta pode ser obtida pelo tubo da esquerda, que corresponderá à coluna d’água

neste tubo (tubo de alimentação).

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23

b) Solução

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24

c) Solução:

icrit = γsub / γw = 1,1

d) Solução

Sendo o gradiente hidráulico crítico aquele que conduzirá à liquefação

da areia, tem-se:

icrit = h / L → h = 1,1 x 1,2 = 1, 32m

e) Solução

Para que ocorra um fator de segurança de 2, é necessário que a

diferença de carga total entre o ponto 2 e 3 conduza a um gradiente hidráulico

igual a metade do gradiente hidráulico crítico. Logo tem-se:

icrit / 2 = h / L → h = (1,1 x 1,2)/2 = 0,66m

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9. REDUÇÃO DO GRADIENTE HIDRÁULICO CRÍTICO Exercício 03

Uma das formas de reduzir o gradiente hidráulico é dispor na saída um

material com maior permeabilidade, ou que tenha um peso suficientemente

elevado para contrapor à força de percolação exercida nas partículas. Tomemos

como exemplo o permeâmetro da Figura E.2. Vamos admitir que a metade

superior da amostra seja substituída por um material com um coeficiente de

permeabilidade quatro vezes maior do que da areia em questão, porém com o

mesmo peso específico saturado, conforme a figura E.3.

Figura E.3

Como a vazão que atravessa ambos os materiais é a mesma pode-se

dizer que:

Considerando que, para o caso da Figura E.3, A1=A2, tem-se:

Como,

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Logo, o gradiente de saída, na camada superior será:

Na camada inferior o gradiente será:

Embora o gradiente na camada inferior seja superior ao gradiente crítico

(icr=1,1), a camada superior atua como se fosse uma tela, impedindo a remoção

pela força de percolação das partículas do solo da camada inferior. Este

procedimento é adotado no dimensionamento de filtros no pé do talude de jusante

de barragens.

Obviamente, o material a ser utilizado como filtro deve ter

permeabilidade adequada (superior a da camada inferior) e vazios compatíveis

para impedir a saída das partículas do material a ser retido.

Para filtros de proteção contra a liquefação de areias em Barragens,

Terzaghi propôs os seguintes critérios práticos:

1. D15 filtro > 5. D15 do solo

Indicando que o filtro deve ser mais permeável que o solo.

2. D15 filtro < 5. D85 do solo

Limitando o tamanho dos finos do filtro, de forma que não deixem

passagem para os grãos do solo.

D15 e D85 correspondem aos diâmetros dos grãos correspondentes a

15% e 85% que passam, respectivamente, obtidos a partir das curvas

granulométricas do solo e do filtro.

Para o Exercício 03, obtêm-se os diagramas de cargas hidráulicas:

abaixo.

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10. REFERÊNCIAS

• CAPUTO, Homero Pinto (2000) – Mecânica dos Solos e suas

Aplicações, 6ª ed. Vol 1, 2 e 3. Rio de Janeiro, RJ, LTC.

• PINTO, Carlos Souza., (2002), Curso Básico de Mecânicas dos Solos,

2ª ed. São Paulo, SP, Editora Oficina de Textos.