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1. INTRODUÇÃO O presente relatório é o produto final de 60 horas de estágio realizadas para a disciplina Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa: Alfabetização, ministrada pela Profª Gabriela Rodella. Realizei a atividade no Jardim II (Educação Infantil) e 1º ano do Ensino Fundamental I em uma instituição particular de ensino, durante os meses de setembro e outubro de 2015. O estágio foi uma ótima oportunidade para observar as diversas possibilidades do processo de alfabetização à luz dos conceitos discutidos nas aulas da disciplina em questão. Além disso, o trabalho de observação também me permitiu observar com clareza a realidade da rotina escolar; Imprevistos, necessidades imediatas das crianças, preparação de diversas ocasiões concomitantemente sem que eu estivesse inserida nela enquanto participante ativa destes processos. As 60h exigidas foram de grande valia para que eu pudesse colocar alguns objetivos pessoais a serem atingidos durante a atividade. Tais como: entender o processo de alfabetização tradicional, posto que eu já havia tido contato com outras metodologias (sócio interacionista e montessoriana), observar as fases da alfabetização em um processo diferente do que estava acostumada, observar a rotina de uma sala sem envolvimento prático, ter contato com material apostilado de ensino na fase da alfabetização. Estas questões se tornaram importantes para mim à medida em que, com o tempo, percebi que muitas escolas de “alto rendimento” utilizam o método tradicional na alfabetização, além da maioria das instituições públicas de ensino. Senti necessidade, então, de entender mais o funcionamento deste método até para que, possivelmente, diminuísse a minha resistência em relação a ele. Com isso, o relatório a seguir não tem como foco o pleno relato, mas também, as impressões, sentimentos, pensamentos causadas em mim durante esta rica experiência. Para que esta ideia fique mais clara, a seguir coloco a forma como este relatório será configurado:

1 . I N T R O D U Ç Ã O · Na primeira vez, selecionei um livro, contei a história, conversamos sobre ela e desenhamos os ... Para Maria Montessori, a livre escolha

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1. INTRODUÇÃO

O presente relatório é o produto final de 60 horas de estágio realizadas para

a disciplina Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa: Alfabetização, ministrada

pela Profª Gabriela Rodella.

Realizei a atividade no Jardim II (Educação Infantil) e 1º ano do Ensino

Fundamental I em uma instituição particular de ensino, durante os meses de

setembro e outubro de 2015.

O estágio foi uma ótima oportunidade para observar as diversas

possibilidades do processo de alfabetização à luz dos conceitos discutidos nas

aulas da disciplina em questão. Além disso, o trabalho de observação também me

permitiu observar com clareza a realidade da rotina escolar; Imprevistos,

necessidades imediatas das crianças, preparação de diversas ocasiões

concomitantemente sem que eu estivesse inserida nela enquanto participante ativa

destes processos.

As 60h exigidas foram de grande valia para que eu pudesse colocar alguns

objetivos pessoais a serem atingidos durante a atividade. Tais como: entender o

processo de alfabetização tradicional, posto que eu já havia tido contato com outras

metodologias (sócio interacionista e montessoriana), observar as fases da

alfabetização em um processo diferente do que estava acostumada, observar a

rotina de uma sala sem envolvimento prático, ter contato com material apostilado de

ensino na fase da alfabetização.

Estas questões se tornaram importantes para mim à medida em que, com o

tempo, percebi que muitas escolas de “alto rendimento” utilizam o método

tradicional na alfabetização, além da maioria das instituições públicas de ensino.

Senti necessidade, então, de entender mais o funcionamento deste método até para

que, possivelmente, diminuísse a minha resistência em relação a ele.

Com isso, o relatório a seguir não tem como foco o pleno relato, mas

também, as impressões, sentimentos, pensamentos causadas em mim durante esta

rica experiência. Para que esta ideia fique mais clara, a seguir coloco a forma como

este relatório será configurado:

1. Introdução;

2. Observações na sala de aula;

3. Conclusão;

4. Anexos;

5. Referências bibliográficas.

2. OBSERVAÇÕES NA SALA DE AULA

Em geral, as aulas giram em torno apenas de exposição do conteúdo, cópia,

ditados e atividades mecânicas. Não há reflexão sobre as hipóteses das crianças

sobre a escrita das palavras ou exercícios de leitura e escrita espontânea, ainda que

elas demonstrem imenso interesse por estes dispositivos.

Para facilitar a exposição das aula, dividirei esta parte do trabalho em dois

tópicos - Jardim II e 1º ano.

2.1. A EXPERIÊNCIA NO JARDIM II

Apesar de ter tido contato com a turma apenas no segundo semestre, ainda

foi possível perceber o quanto as crianças ansiavam pelo tão esperado momento de

“saber ler”. O que elas ainda não haviam percebido era que já sabiam ler a maior

parte das palavras. Talvez, pelo fato de que o aprendizado era dividido pelas

consoantes e suas sílabas correspondentes e as palavras eram sempre formadas

de acordo com estas letras.

Ex.: ____lito (PA)

____reia (SE)

____caco (MA)

Durante as observações, as aulas de introdução as letras, apesar de

tradicionais, com as crianças organizadas em fileiras, eram emocionantes para elas,

pois, ali, se iniciava um novo aprendizado que as possibilitaria ler mais e mais

coisas. “A letra do meu nome!” (P., 5 anos).

Nas aulas que introduziam a letra “P”, por exemplo, as crianças falavam as

sílabas “pa - pe - pi- po- pu ” e ali identificavam, ainda que apenas sonoramente, o

inicio de algumas palavras. “Olha, PU de pulicia!” (M., 6 anos).

Após a exposição, as crianças registravam as sílabas no caderno de

caligrafia e repetiam o processo algumas vezes. Em um outro momento,

completavam palavras que começavam com a letra ensinada e faziam exercícios de

construção de palavras apenas com as sílabas da letra ou vogais (produzidos pelas

professoras) e, normalmente, realizavam exercícios na apostila, de construção de

palavras, pintura da letra correta, cruzadinha etc..

Exemplos de exercício dos materiais produzidos pelas professoras:

Junte as sílabas e forme uma palavra:

PA A

PE E

PI I

PO O

PU U

Res.: Papo, Pipa, Pai, Pão, Pau, Pia

Depois faziam alguma produção relacionada ao novo conteúdo. Podia ser em

forma de cartaz, pesquisando palavras e figuras que começavam com a letra

aprendida, desenhando ou buscando objetos pela escola.

Aparentemente, estes eram os momentos em que as crianças mais

gostavam, pois havia uma questão autônoma que envolvia a atividade. Além disso,

nos momentos de pesquisas de figuras com a letra inicial aprendida, as crianças se

empolgavam com as descobertas umas das outras, quando conseguiam ler as

primeiras sílabas do que estava escrito nas revistas e anúncios, assim como

descrito nas experiências de Maria Montessori, no livro “A Criança” (1936).

Para a autora, há um impulso nas crianças em aprender as letras. Compara o

processo de alfabetização com gotículas de água que, juntas, formam um curso de

água definido, o que seriam as palavras e frases (MONTESSORI, 1936).

No pouco tempo em que tive a oportunidade de estar com as crianças do

Jardim II da Tia Cristiane, pude perceber este curso d’água se formando e dando

origem ao início do processo de escrita destas crianças.

Nos momentos de regência (nunca sozinha) consegui verificar que as

crianças tinham muitas hipóteses sobre a escrita de algumas palavras que poderiam

ser aproveitadas. Para completar a escrita de “___reia”, por exemplo, J. escreveu

“creia”. Quando perguntei o que ela tinha escrito, me respondeu, em tom de

surpresa: “Creia, ué! A do mar, igual a Ariel.”, corroborando a hipótese de

fonetização da escrita proposta por Emilia Ferreiro (1990).

Em alguns momentos, tive a oportunidade de contar histórias para eles.

Surpreendentemente, era um momento raro para as crianças, que pouco usavam a

sala de leitura, por isso precisamos fazer alguns combinados relacionados a postura

adequada para aquele momento e o cuidado com os livros.

Na primeira vez, selecionei um livro, contei a história, conversamos sobre ela

e desenhamos os momentos que mais gostamos. As crianças se mostraram muito

atentas e felizes com o momento e, no final, pediram para escolher livros para lerem

sozinhos. Com o aval da professora, deixei que eles fizessem o que pediram.

Circulei entre eles para acompanhar a leitura individual e auxiliar na interpretação do

texto.

O resultado desta experiência foi muito positivo. As crianças descobriram ali

que conseguiam ler parte das palavras e ficaram muito felizes com a descoberta.

Depois deste dia, quando eu chegava na sala, eles perguntavam se naquele dia

iríamos para a sala de leitura ler livros.

Pude repetir a experiência mais uma vez durante o estágio no Jardim II e,

desta vez, eles já sabiam que iriam novamente na sala e escolheram alguns livros

antes para que lêssemos juntos e cada um já tinha escolhido seu livro para ler

individualmente. Ficaram muito animados.

Levei uma nova proposta onde eu contava o começo da história e eles

precisavam continuar de acordo com as imagens dadas. A criatividade dele nos

surpreendeu, a professora usou, posteriormente, elementos da história que eles

criaram para fazer outra atividade de escrita.

A professora foi muito receptiva com as ideias de contação de histórias. Sua

relação com as crianças era ótima. Era visível o carinho e admiração que as

crianças tinham por ela. Ela adota uma postura bastante exigente, porém é muito

carinhosa e não negligencia as necessidades dos seus alunos, sejam afetivas,

cognitivas ou os conflitos entre eles.

Ao explicar, usa tom de voz baixo, verifica em todos os momentos se todos

estão entendendo. Prefere organizar as carteiras em fileiras e demarca os lugares,

colocando os alunos com mais dificuldade na frente. De tempos em tempos, procura

fazer um rodizio destes lugares e os redefine de acordo com as novas necessidades

das crianças.

Durante as atividades individuais, circula pela classe e ajuda as crianças.

Normalmente, pede para que as que acabaram primeiro, auxiliem os colegas que

solicitarem ajuda, enquanto ela ajuda outros. Frisa a todo momento que os que

acabaram antes devem interferir na atividade de outro amigo apenas quando forem

solicitados.

Esta medida pareceu bastante positiva, as crianças respeitam se os colegas

recusam a ajuda e fazem bastante esforço para ajudar aqueles que aceitaram,

quando não conseguem sanar a dúvida do amigo, recorrem a professora que, ao

invés de ensinar a criança com dificuldade, ensina a outra como ajudar o seu

colega. Caso não funcione, ela toma a frente sem desmerecer a criança que não

obteve êxito ajudando outra criança. Caso verifique uma dificuldade geral da sala,

retoma o conteúdo e, se não obtém êxito, elabora outras atividades para que as

crianças tenham contato de outra forma com o conteúdo.

Como dito anteriormente, as atividades de leitura são raramente feitas. A sala

tem uma cesta pequena com alguns livros de histórias, as crianças costumam

pegá-los em momentos livres, porém é perceptível a pouca intimidade que elas tem

com a prática de leitura. A professora raramente lê livros para ou com as crianças.

Apesar disso, a professora gosta muito de realizar atividades corporais com

as crianças no pátio. Lá, ela realiza atividades com bola e as relaciona com

palavras. Por exemplo: Vou jogar a bola, quem pegar terá que me dizer uma palavra

que começa com a letra “S”.

Além disso gosta de levá-las a brinquedoteca. Para ela, é importante que as

crianças tenham momentos de livre brincar. Para Maria Montessori, a livre escolha

dos objetos e brincadeiras nos dá os parâmetros das reais necessidades psíquicas

das crianças (1936). A professora acredita que pode conhecer melhor as crianças

vendo-as brincar, por isso encara estes momentos como uma análise importante

das questões socio-interativas dos seus alunos.

Além destas práticas, a professora elabora um material paralelo ao usado

pela escola pois acha que apenas o material apostilado não atende as

necessidades dos seus alunos. Junto com a professora do Jardim II do outro

período, elabora fichas e exercícios complementares para os alunos levarem de

lição de casa ou fazerem para complementar o que é proposto pela apostila.

Para verificar os alunos com dificuldade, a professora usa as atividades

realizadas em sala e as atividades avaliativas para delimitar quais são e definir

medidas para ajudar este aluno. Normalmente, o aluno é colocado nas carteiras da

frente, faz atividades extras em casa e a professora redobra a atenção durante as

aulas para verificar o aproveitamento deste aluno, raramente os responsáveis são

chamados para avaliação externa.

A nova coordenadora, durante o tempo em que estive lá, estava verificando

com as professoras os alunos que tinham mais dificuldades, assistindo as aulas e

acompanhando a produção destas crianças para verificar se o problema podia ser

sanado apenas na escola ou seria necessário apoio multidisciplinar.

Em conversa com a professora Cristiane, ela disse que nunca haviam feito

este tipo de trabalho na escola e achava que era mais do que necessário. Relatou

que alguns alunos não precisavam apenas de reforço escolar ou maior atenção,

mas também trabalhos com fonoaudiólogos, por exemplo. Citou que, em alguns

casos, estes tratamentos poderiam ajudar muito no processo de alfabetização,

posto que algumas crianças faziam trocas sonoras nas palavras pois não

conseguiam pronunciá-las corretamente.

O estágio nesta classe foi muito proveitoso, a professora foi muito receptiva e

a classe, que tem 16 crianças, foi extremamente doce e simpática. As crianças

desta turma estão juntas desde muito pequenas, todas são muito amigas e

gostaram de compartilhar suas histórias comigo, também ficaram curiosos para

conhecer a minha e nunca hesitavam em pedir a minha ajuda. Ficaram

descontentes quando souberam que meu “trabalho” na classe deles havia

terminado, quando me encontravam na sala do 1º ano, pediam que eu voltasse para

contar mais histórias (a parte que eles mais gostaram).

2.2. A EXPERIÊNCIA NO 1º ANO

Quando cheguei, as crianças do primeiro já estavam completamente

alfabetizadas. Leêm, constroem frases e pequenos textos, tem domínio da letra

cursiva e interpretam textos sozinhas. As atividades que observei foram de regras

linguísticas.

As crianças tem atividades de ditados,separação de sílabas, aumentativo e

diminutivo regularmente. Portanto, pude auxiliar as produções neste sentido.

Durante as atividades, a explicação era feita de forma expositiva e as crianças

faziam a maioria das atividades de forma autônoma.

O ditado era feito e depois corrigido na lousa, as crianças tinham a obrigação

de acompanhar a correção e fazer as alterações necessárias. Enquanto eu circulava

pela sala, podia perceber que ainda haviam algumas hipóteses fonéticas

(FERREIRO, 1990) na escrita de alguns alunos. Por exemplo: mulé - mulher.

Diferente da professora do Jardim II, esta professora prioriza o uso do

material apostilado, apesar de também fazer materiais complementares para os

alunos. Segundo ela, a “cartilha” é o modo mais eficaz de alfabetizar as crianças.

No 1º ano, as crianças não utilizam mais o caderno pedagógico (linhas

verdes). Todas as atividades são feitas em cadernos com linhas normais e as

crianças são responsáveis por mantê-los organizados, com data e escrita correta

dos enunciados. Os exercícios tinham moldes tradicionais como:

Passe para o diminutivo:

Borboleta -

Casa -

Livro -

Nos registros anteriores, era possível encontrar erros sinalizados pela

professora na grafia das palavras com “s/z”, “lh” e “nh”. Enquanto estive na sala,

verifiquei poucos destes erros e, na maioria das vezes, as crianças percebiam com

facilidade e autonomia onde estava o erro.

Além das atividades colocadas na lousa, as crianças utilizam o caderno para

fazer lições da apostila, olhando o enunciado no material e respondendo no

caderno. A professora mencionou que faz este tipo de exercício porque as vezes o

espaço da apostila é pequeno para responder.

A apostila é dividida por bimestre e em temas, assim como no Jardim II. O

tema da apostila que estavam usando era Pré-história. A apostila continha textos

sobre arte rupestre, vida sedentária, nomadismo e outros. As atividades de

matemática pegavam o gancho da arte produzida neste período para falar de

formas geométricas.

Todas as atividades da apostila envolviam escrita, separação de sílabas,

diminutivo e aumentativo, plural e singular e outros. Os textos serviam de introdução

aos exercícios e as crianças liam com aparente facilidade.

No 1º ano, as crianças tem semana de prova. Aproximadamente duas

semanas antes, é enviado um roteiro de estudos para casa com o conteúdo

abordado, as páginas da apostila e os exercícios do caderno referentes. No dia de

cada prova, a professora reserva os primeiros trinta ou quarenta minutos da aula

para que as crianças possam reler o conteúdo e tirar dúvidas.

Os momentos de regência foram muito variados. O 1º ano tem uma carga

horária muito diferente do Jardim II, o material apostilado engessa a rotina, de

forma que foi difícil desenvolver atividades de contação de histórias iguais as do

Jardim II.

Na maioria das vezes, auxiliei as crianças nas atividades que já seriam

realizadas normalmente. O início da separação de sílabas foi uma das atividades

que pude acompanhar. Após um ditado, as crianças deveriam separar as sílabas

das palavras, era um dos primeiros exercícios autônomos de separação de sílabas

que eles estavam fazendo. Além destas, também houve uma atividade semelhante

de plural que pude auxiliar. Em matemática, pude auxiliar na identificação das

formas geométricas, quantidade de lados de cada uma e escrita dos nomes das

formas.

Também participei da produção de um cartaz sobre arte rupestre com as

crianças, que desenhavam e escreviam as funções desta no cartaz com o auxílio

dos textos presentes na apostila e as explicações da professora. A atividade foi feita

em pequenos grupos e foi uma ótima experiência para vê-los trabalhando em uma

produção coletiva.

Em uma atividade de produção de texto para a Mostra Cultural da escola, as

crianças deveriam contar a sua história (quem são, com quem moram, o que

gostam de fazer, comer, o que não gostam etc). Esta foi uma oportunidade rica para

ter contato com as produções textuais das crianças e verificar sua capacidade de

produzir frases que se conectavam e davam corpo a uma história.

Com esta atividade, propus a professora que elaborássemos uma reflexão

acerca dos textos produzidos a fim de que as próprias crianças percebessem os

pontos que podiam ser melhorados na sua produção. A atividade consistiu em

lermos os textos sem dizer o nome do “dono”. Neste sentido, era importante fazer

com que as crianças entendessem que a boa estruturação das frases era de

fundamental importância para a compreensão geral do texto. Além disso, era

preciso mostrar que a coerência pode ser relativa entre os leitores, por isso era

preciso estruturar a história de forma que todos a entendessem (PEREIRA, 2006).

Conforme eu lia, as crianças iam identificando seus textos e dizendo “Esse é

meu! Eu não sabia que estava tão ruim!” (G., 7 anos). Os colegas sugeriam

melhoras uns no texto dos outros e todos encontraram pontos que podiam ser

melhorados. Depois do exercício de reflexão, as crianças sentaram e reescreveram

os textos, pedindo auxílio no aprimoramento. Após todos terminarem, sugeriram que

relêssemos os textos e todos ficaram felizes com a produção da classe. “O seu está

bem melhor agora, G..” (L., 7 anos).

Em outro momento, no fim de uma prova, tive a oportunidade de sentar com

as crianças que iam terminando e ler livros com eles. As crianças pediam para ler

sozinhas, afinal, “a gente já sabe ler!”. Deixei que eles escolhessem as obras e

auxiliava quando era solicitada. As crianças raramente pediam ajuda, os casos mais

recorrentes eram de histórias que apresentavam duplo sentido e causavam dúvida

quanto ao desfecho (Ex.: Lino, André Neves, Editora Callis, 2010).

No que tange a organização da professora, ela produz o semanário que a

coordenação da escola exige, usa o planejamento feito pela escola e a sequencia

da apostila. Ao que parece, a professora é muito experiente e dispensa pequenas

burocracias que não considera importantes como, por exemplo, planejar as aulas de

acordo com as particularidades da turma.

Sua relação com as crianças é satisfatória. É mais velha do que a professora

do Jardim II e igualmente carinhosa. É possível perceber um maior distanciamento

das crianças, o que encarei como algo normal com o amadurecimento das mesmas.

Tem menos necessidade de um contato mais próximo, mas igual de carinho e

afetividade.

É muito sensível as necessidades dos alunos, conhece bem as situações

familiares em que estão inseridos e descreve todos com riqueza de detalhes. Sendo

assim, a professora distribui os lugares de forma que os alunos com mais

dificuldade ficam perto da sua mesa e os com mais facilidade podem ficar mais

distantes. Além disso, a professora preocupa-se em perguntar aos alunos sobre sua

vida e sabe das suas necessidades sem que eles precisem falar, estreitando seu

laço com os alunos e aumentando sua relação de confiança.

Para avaliação dos alunos, além das atividades da sala de aula, a professora

utiliza as provas, momentos de leitura e produções escritas para perceber onde

estão as maiores dificuldades das crianças. Dependendo da dificuldade, adapta

algumas atividades e elabora outras extracurriculares para que as crianças façam

em casa ou na classe em momentos oportunos e redobra sua atenção nos

momentos de auxilio nos exercícios.

Tem uma postura tradicional, com isso, não há muitos momentos em que ela

leva as crianças para a brinquedoteca ou para o pátio. As crianças usam estes

espaços nas aulas de Teatro e Educação Física, ministrados por outros professores.

É possível perceber que esta ação não parte apenas da vontade dela, mas também

das circunstâncias em que o currículo do 1º ano está inserido. O volume de

conteúdo é grande e, com a apostila que deve ser terminada no tempo, sobra pouco

tempo para atividades externas e trabalhar a corporalidade de forma proveitosa e

complementar no processo de alfabetização.

As idas a sala de leitura também são raras. Em momentos livres, as crianças

podem ir a sala de leitura escolher livros e levar para classe para ler. São raras as

idas coletivas a este ambiente. Também não presenciei a leitura de histórias da

professora com os alunos. Os textos da apostila são lidos, em geral, coletivamente e

a professora só auxilia quando há dificuldade na leitura ou interpretação do grupo.

A classe tem como característica ser bem calma, tem dezesseis crianças e,

assim como a classe do Jardim II, todas estão juntas desde muito pequenas e são

muito amigas. Segundo a professora, as mães costumam juntar as crianças aos

finais de semana para fazerem passeios todos juntos. No grupo, há uma criança

com baixa visão e seus colegas a ajudam bastante, não observei nenhum tipo de

discriminação ou bullying. Quando cheguei a classe, a professora me apresentou e,

inicialmente, as crianças hesitaram em falar comigo e ganharam confiança quando

comecei a auxiliá-las em algumas atividades. A professora foi muito aberta as

minhas sugestões e fez questão de me explicar todas suas ações.

A experiência no 1º ano foi diferente de todos os processos de alfabetização

que eu já havia vivenciado. As crianças mostraram hipóteses impressionantes e

esclarecedoras.

3. COMENTÁRIOS FINAIS

O estágio foi muito proveitoso. Apesar de já ter tido experiências em séries

de alfabetização em escolas com outras metodologias, esta atividade foi importante

para que eu pudesse observar, sem vínculo, os processos de alfabetização e a

prática discente.

Como ponto negativo do estágio, eu indicaria o fato da disciplina ser

realizada do segundo semestre do ano, causando um hiato na observação do

processo de alfabetização. As duas classes que pude acompanhar, já estavam em

fases avançadas do processo de aprendizagem, de forma que não pude observar

com clareza a transição das crianças entre as séries.

Inicialmente, teria colocado como um ponto negativo o fato da escola ser

muito tradicional por ir contra as minhas crenças pedagógicas. A experiência,

contudo, me fez mudar de opinião de forma que ter contato com a metodologia

tradicional foi benéfico para que eu pudesse contrastar com as outras experiências

que havia tido profissionalmente.

No mais, foi possível ver algumas teorias dos textos na prática e, inclusive, a

falta delas. A adversidade encontrada foi positiva a medida em que eu pude colocar

algumas atividades discutidas na aula em prática, como o reconto de histórias,

observação das hipóteses de escrita e reflexão acerca das próprias produções das

crianças.

A escolha de usar Maria Montessori para embasar as observações e este

relatório se deu devido a minha identificação com o método montessoriano e a

possibilidade de observar duas metodologias distintas que podem conversar. Posso

dizer que, de fato, consegui observar muito da fala de Montessori no meu estágio. A

curiosidade das crianças, suas hipótese e descobertas vão de encontro, tanto com

as observações de Montessori, quanto as de Emilia Ferreiro. A fala de Luisa Pereira

e seus artigos de compreensão e produção textual também foram esclarecedores

ao observar as produções das crianças.

Com as discussões na disciplina, os textos que tivemos contato e a

bibliografia extra de Maria Montessori, posso dizer com segurança que a

experiência foi rica e de grande valia para minha formação enquanto futura

educadora.

4. ANEXOS

Jardim II

1º Ano

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E NOTAS

5.1. REFERÊNCIAS

FERREIRO, Emilia. A escrita…antes das letras. A produção de noções na criança:

linguagem, número, ritmos e melodias, H. Sinclair ( org.) . Cortez, 1990.

MONTESSORI, MARIA. “A Criança”. Circulo do Livro, 1992 (Licença editorial por

cortesia da Editora Nórdica Ltda.)

PEREIRA, L. A. (2006). “O Desenvolvimento de uma competência

(textual)narrativa”, in F. Azevedo (coord.) Língua Materna e Literatura Infantil.

Elementos Nucleares para Professores do Ensino Básico. Lisboa: LIDEL, pp. 193 –

213 [ISBN - 972-757-420-3]

5.2. NOTAS

*As citações das crianças tiveram os nomes ocultados para preservar sua

identidade, assim como os nomes nos anexos.

*Não foi possível documentar algumas produções das crianças devido a

necessidade imediata do seu uso e impossibilidade de retirá-las da escola.