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FREDIE DIDIER JR., LEONARDO J. C. CUNHA, PAULA SARNO BRAGA E RAFAEL OLIVEIRA 518 2.3. A averbação da execução no registro de bens do devedor (art. 615-A, CPC) Segundo o art. 615-A do CPC, incluído pela Lei Federal n. 11.382/2006, o exeqüente poderá, no ato da distribuição da sua ação executiva, obter certidão que comprove o ajui- zamento da execução, com identificação das partes e indicação do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto. O art. 615-A, CPC, foi objeto de comentários em item próprio, no capítulo relativo à boa-fé na execução, a cuja leitura fazemos remissão. 3. ATOS INICIAIS DA EXECUÇÃO POR QUANTIA FUNDADA EM TÍTULO JUDICIAL 3.1. Introdução O procedimento da execução por quantia fundada em título judicial está regulamen- tado, basicamente, nos artigos 475-J e seguintes do CPC. O legislador deu-lhe o nome de cumprimento de sentença. Em regra, a execução por quantia fundada em título judicial desenvolve-se como fase do processo no bojo do qual o direito subjetivo foi certificado, mas é possível que a sua promoção exija a instauração de um processo autônomo. É o que pode ocorrer, por exemplo, quando se tem como título executivo judicial a sentença penal condenatória, a sentença arbitral, a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 475-N, II, IV e VI, CPC, respectivamente) ou o acórdão que julga procedente a revisão criminal (art. 630, CPP). Nesses casos, deve-se tomar como base o procedimento execu- tivo regulamentado nos arts. 475-J e seguintes do CPC, fazendo-se, porém, as adaptações necessárias, conforme se verá mais adiante. O procedimento executivo da prestação de pagar quantia calcada em título judicial apresenta, tal como ocorre com o procedimento executivo calcado em título extrajudicial, duas fases bem definidas: (i) a primeira, denominada de fase inicial ou fase de cumprimento voluntário, por meio da qual se defere ao devedor um determinado prazo para que cumpra, espontaneamente, o dever que lhe foi imposto; (ii) a segunda, denominada de fase de execu- ção forçada, em que se praticam atos tendentes à satisfação compulsória do direito de pres- tação do credor. A fase inicial é, como já se viu, preliminar à segunda fase, no sentido de que esta somente ocorrerá se não houver o adimplemento espontâneo durante a primeira fase. 3.2. As fases do procedimento de cumprimento de sentença 3.2.1. Fase inicial: o cumprimento voluntário e a multa legal coercitiva O devedor, condenado ao pagamento de quantia, terá quinze dias para cumprir espon- taneamente a decisão judicial, sob pena de o montante da condenação ser acrescido de multa no percentual de dez por cento sobre o valor da dívida (art. 475-J, caput, CPC 27 ), 27. Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

2.3. A averbação da execução no registro de bens do ... · A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, v. 1, cit., p. 80: “Nestes casos, as contas necessárias para

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2.3. A averbação da execução no registro de bens do devedor (art. 615-A, CPC)Segundo o art. 615-A do CPC, incluído pela Lei Federal n. 11.382/2006, o exeqüente

poderá, no ato da distribuição da sua ação executiva, obter certidão que comprove o ajui-zamento da execução, com identificação das partes e indicação do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.

O art. 615-A, CPC, foi objeto de comentários em item próprio, no capítulo relativo à boa-fé na execução, a cuja leitura fazemos remissão.

3. Atos iniCiAis dA exeCução Por quAntiA fundAdA em título judiCiAl3.1. introdução

O procedimento da execução por quantia fundada em título judicial está regulamen-tado, basicamente, nos artigos 475-J e seguintes do CPC. O legislador deu-lhe o nome de cumprimento de sentença.

Em regra, a execução por quantia fundada em título judicial desenvolve-se como fase do processo no bojo do qual o direito subjetivo foi certificado, mas é possível que a sua promoção exija a instauração de um processo autônomo. É o que pode ocorrer, por exemplo, quando se tem como título executivo judicial a sentença penal condenatória, a sentença arbitral, a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 475-N, II, IV e VI, CPC, respectivamente) ou o acórdão que julga procedente a revisão criminal (art. 630, CPP). Nesses casos, deve-se tomar como base o procedimento execu-tivo regulamentado nos arts. 475-J e seguintes do CPC, fazendo-se, porém, as adaptações necessárias, conforme se verá mais adiante.

O procedimento executivo da prestação de pagar quantia calcada em título judicial apresenta, tal como ocorre com o procedimento executivo calcado em título extrajudicial, duas fases bem definidas: (i) a primeira, denominada de fase inicial ou fase de cumprimento voluntário, por meio da qual se defere ao devedor um determinado prazo para que cumpra, espontaneamente, o dever que lhe foi imposto; (ii) a segunda, denominada de fase de execu-ção forçada, em que se praticam atos tendentes à satisfação compulsória do direito de pres-tação do credor. A fase inicial é, como já se viu, preliminar à segunda fase, no sentido de que esta somente ocorrerá se não houver o adimplemento espontâneo durante a primeira fase.

3.2. As fases do procedimento de cumprimento de sentença3.2.1. Fase inicial: o cumprimento voluntário e a multa legal coercitiva

O devedor, condenado ao pagamento de quantia, terá quinze dias para cumprir espon-taneamente a decisão judicial, sob pena de o montante da condenação ser acrescido de multa no percentual de dez por cento sobre o valor da dívida (art. 475-J, caput, CPC27),

27. Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

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incluindo ao valor da obrigação reconhecida por sentença a parcela relacionada às verbas da sucumbência28.

É preciso fazer algumas observações sobre esse novo regramento.

a) O legislador instituiu uma multa legal com o objetivo de forçar o cumprimento voluntário da obrigação pecuniária. Trata-se de medida de coerção indireta29 prevista em lei, que dispensa manifestação judicial30: é hipótese de sanção legal pelo inadimplemento da obrigação. A multa tem, assim, dupla finalidade: servir como contramotivo para o inadimplemento (coerção) e punir o inadimplemento (sanção).

Essa multa não tem origem em decisão judicial, diferentemente do que ocorre com a multa coercitiva fixada nos termos dos §§ 4º e 5º do art. 461 do CPC. Assim, é desnecessário que haja pedido da parte ou mesmo imposição expressa na decisão. A multa incorporar-se-á ao montante devido ao credor. Frise-se, ainda, com CaSSio SCarPineLLa Bueno, que a multa é fixa e de incidência única: a multa não passará a 20% sobre o montante da dívida, se o devedor pagá-la após trinta dias31.

b) A lei fixa o prazo de quinze dias para o adimplemento voluntário da obrigação. Trata-se de prazo legal criado com o objetivo de determinar o momento a partir do qual o devedor será considerado inadimplente. O inadimplemento é um dos pressupostos para o início da atividade executiva. O devedor que não cumprir voluntariamente a obrigação nesse prazo será considerado inadimplente e, então, poderá o credor, agora exeqüente, requerer o início do cumprimento forçado da sentença (execução da sentença), como deixa claro a parte a final do caput do art. 475-J do CPC.

MarCeLo aBeLha rodrigueS entende que a multa pode ser dispensada se o devedor demonstrar que, no prazo de quinze dias, não teve condições de desfazer-se do seu pa-trimônio, transformando-o em dinheiro. Poderia o devedor, por exemplo, oferecer bens como dação em pagamento. Essas alegações poderiam ser deduzidas na impugnação32.

A não-aplicação da multa ao devedor que não tem patrimônio penhorável seria manifestação do princípio da adequação do processo às peculiaridades da causa33.

28. BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 83.

29. Em sentido diverso, entendendo tratar-se apenas de multa punitiva, sem caráter coercitivo, NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Reforma do CPC. São Paulo: RT, 2006, p. 219. Entendendo ser uma multa com caráter punitivo e coercitivo, SHIMURA, Sérgio. “A execução da sentença na reforma de 2005 (Lei 11.232/2005)”. Aspectos polêmicos da nova execução. Teresa Wambier (coord.). São Paulo: RT, 2006, p. p. 567.

30. Assim, também, RODRIGUES, Marcelo Abelha. A terceira etapa da reforma processual civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 129.

31. BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, cit., v. 1, p. 81.32. RODRIGUES, Marcelo Abelha. A terceira etapa da reforma processual civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p.

131. Em sentido bem semelhante, BARIONI, Rodrigo. “Cumprimento da sentença: primeiras impressões sobre a alteração da execução de títulos judiciais”. Aspectos polêmicos da nova execução. Teresa Wambier (coord.). São Paulo: RT, 2006, p. 535.

33. AMARAL, Guilherme Rizzo. A nova execução. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 124-125.

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c) Para que incida o caput do art. 475-J, é preciso que a dívida seja líquida; enquanto não for liquidado o valor da obrigação pecuniária devida, não se pode falar de inadim-plemento, muito menos de multa sobre um montante que não se sabe qual é. Eis a razão do trecho do caput: condenado o devedor “ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação”.

d) A principal discussão doutrinária sobre esse dispositivo relaciona-se com a neces-sidade ou não de intimação para cumprimento espontâneo da decisão.

Explica-se.

Se a decisão transitar em julgado, o prazo de quinze dias para cumprimento da obri-gação começa a fluir automaticamente34, ou é necessário proceder à intimação do devedor, para que cumpra espontaneamente a decisão?

Parece que a melhor interpretação é a que exige a intimação do devedor, que pode ser feita pela imprensa oficial, dirigida ao seu advogado35, consoante a tendência que se vem firmando em nosso ordenamento (p. ex.: arts. 57, 316, 475-A, § 1º, 475-J, § 1º, 659, § 5º etc.). Isso porque podem surgir dúvidas sobre a data do trânsito em julgado (se o último recurso não foi conhecido, há controvérsia sobre o tema, conforme exposto no v. 3 deste Curso, para onde se remete o leitor) e sobre o montante da dívida, que, muitas vezes, exige, no mínimo, a elaboração prévia de cálculos aritméticos pelo próprio credor (art. 475-B, CPC)36.

“Seria absolutamente equivocado imaginar-se que o demandado tenha perdido seu prazo em satisfazer a obrigação sem que ao menos soubesse na data do termo inicial

34. Assim, por exemplo, SANTOS, Ernane Fidélis dos. As reformas de 2005 do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 54; ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 212; CARNEIRO, Athos Gusmão. “Nova execução. Aonde vamos? Vamos melhorar”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2005, n. 123, p. 118.

35. Assim, BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, cit., v. 1, p. 78; ARAÚJO, José Henrique Mouta. “O cumprimento da sentença e a 3ª Etapa da Reforma Processual – primeiras impressões”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2005, n. 123, p. 148; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Reforma do CPC. São Paulo: RT, p. 214. Em sentido diverso, entendendo que a intimação deve ser pessoal, dirigida ao executado, um dos autores deste livro, Leonardo José Carneiro da Cunha, que aqui ressalva o seu entendimento, e CÂMARA, Alexandre Freitas. A nova execução da sentença. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2006, p. 113; RODRIGUES, Marcelo Abelha. A terceira etapa da reforma processual civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 129; BARIONI, Rodrigo. “Cumprimento da sentença: primeiras impressões sobre a alteração da execução de títulos judiciais”, cit., p. 534. Também entendendo necessária a intima-ção, sem examinar a possibilidade de ela poder ser feita na pessoa do advogado, SHIMURA, Sérgio. “A execução da sentença na reforma de 2005 (Lei 11.232/2005)”, p.567.

36. Em sentido diverso, entendendo que a multa pode incidir independentemente da elaboração dos cálculos pelo credor, BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, v. 1, cit., p. 80: “Nestes casos, as contas necessárias para a quantificação do valor da condenação são passíveis de realização pelo próprio devedor. Ele, querendo cumprir o julgado – e, com isto, deixar de se sujeitar à multa do art. 475-J –, pode, tomando a iniciativa de elaborar os cálculos, pagar a quantia devida justificando o valor respectivo”. O autor parte da premissa, que não é a deste curso, que a elaboração de cálculos pelo credor não é propriamente uma liquidação. Entendendo que há, sim, liquidação, quando o credor elabora os cálculos, é preciso que o devedor seja intimado desse valor, para que possa cumprir espontaneamente a obrigação.

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de contagem de prazo de quanto era o valor dessa obrigação. A crença do legislador de que mesmo uma sentença líquida ou com liquidez fixada no procedimen to de liquidação de sentença não necessita de atualização não é confirmada na praxe forense, na qual sempre haverá – mínima que seja – uma atualização. (…) Dessa maneira, não só a intimação do demandado deverá ser realizada – insista-se, na pes-soa do advogado –, como isso somente ocorrerá após o demandante apresen tar um memorial de cálculo que indique o valor atualizado a ser pago pelo demandado”37.

É possível que, por má-fé, o devedor desconstitua o seu antigo advogado, nos esterto-res da fase de conhecimento, como estratégia para dificultar o cumprimento da sentença, em razão da necessidade de que a sua intimação seja, então, feita pessoalmente, e não por intermédio do seu patrono. Constatada a má-fé, é caso de aplicação da sanção do art. 18 do CPC38. Convém lembrar, porém, que incide no caso a regra do art. 39, par. ún., do CPC39, que reputa válida intimação feita no endereço constante dos autos, se, tendo havido mudança, o advogado não tiver providenciado comunicá-la ao juízo.

Acaso o devedor não tenha, por qualquer motivo, advogado constituído nos autos, deverá ser intimado pessoalmente para cumprir a decisão. Não tendo sido encontrado, parece possível aplicar aqui o que diz o art. 653 do CPC, autorizando que o oficial de justiça proceda à pré-penhora dos bens do executado. Remetemos à leitura do que, sobre o tema, falamos no item anterior deste mesmo capítulo.

Enfim, para que a multa do art. 475-J incida, é preciso que, antes, o executado tenha sido intimado para cumprir espontaneamente a obrigação40.

No julgamento do REsp n. 954.859/RS, a 3ª T. do STJ, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, entendeu que o prazo para cumprimento espontâneo previsto no art. 475-J começa a correr independentemente de intimação das partes. Ou seja, o prazo começa a correr do trânsito em julgado da decisão. Não era esse o posicionamento adotado por este Curso, como se viu. A decisão repercutiu bastante, embora tivesse sido proferida por apenas uma das turmas do STJ. Ainda não se poderia dizer que a jurisprudência do STJ estava uniformizada. A Turma teria agido de maneira mais correta se, ao invés de julgar o recurso especial, remetesse a questão à Seção a que pertence, prevenindo, portanto, eventual divergência jurisprudencial com outra Turma. Essa afirmação ratificava-se pelo dissenso encontrado no próprio Superior Tribunal de Justiça. Nas Execuções em Sentença

37. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Reforma do CPC, cit., p. 214.38. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Reforma do CPC, cit., p. 217.39. Art. 39 do CPC: “Compete ao advogado, ou à parte quando postular em causa própria: I – declarar, na

petição inicial ou na contestação, o endereço em que receberá intimação; II – comunicar ao escrivão do processo qualquer mudança de endereço. Parágrafo único. Se o advogado não cumprir o disposto no nº I deste artigo, o juiz, antes de determinar a citação do réu, mandará que se supra a omissão no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de indeferimento da petição; se infringir o previsto no nº II, reputar-se-ão válidas as intimações enviadas, em carta registrada, para o endereço constante dos autos”.

40. “Como a fluência de prazos não pode depender de dados subjetivos, parece-me, com os olhos bem voltados para o dia-a-dia forense, que este prazo correrá do ‘cumpra-se o v. acórdão’, despacho bastante usual que, em geral, é proferido quando os autos do processo voltam do Tribunal…” (BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, v. 1, cit., p. 78).

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Estrangeira Contestada (como, por exemplo, a de nº 2.990-US, j. em 30.08.2007, e 866, j. em 23.05.2007), o Presidente do STJ, Min. Barros Monteiro, determinou a intimação do executado, na pessoa do seu advogado, para que cumprisse espontaneamente a obri-gação – seguindo, portanto, a orientação defendida neste Curso. O vaticínio confirmou-se no início de 2010, quando a Corte Especial do STJ (REsp n. 940.274/MS), seguindo a orientação defendida neste Curso, entendeu que é necessário que, após o trânsito em julgado, os autos retornem ao juízo de origem para intimação do advogado, a partir de quando deverá ter início o prazo de 15 dias para pagamento.

No julgamento da 3ª Turma do STJ, há, ainda, um obiter dictum bastante polêmico. Afirma o voto condutor que “o bom patrono deve adiantar-se à intimação formal, prevenindo seu constituinte para que se prepare e fique em condições de cumprir a condenação”. “(…) Se, por desleixo, omite-se em informar seu constituinte e o expõe à multa, ele (o advogado) deve responder por tal prejuízo”. A 3ª T. antecipou-se à discussão sobre o ponto e já afirmou, ainda que como obiter dictum, a responsabi-lidade do advogado pelo pagamento da multa, caso não comunique o seu cliente a respeito do início do prazo para cumprimento espontâneo. Esse posicionamento serve como um novo fundamento para justificar a conduta de algumas empresas, que expressamente têm feito constar no contrato de prestação de serviços advoca-tícios a obrigatoriedade de o advogado comunicá-las sobre a fluência do prazo para cumprimento espontâneo da sentença, sob pena de o próprio advogado arcar com a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC.

E se o executado tiver sido revel no processo de conhecimento e, além disso, não possuir advogado constituído nos autos?

É certo que o revel não será intimado das decisões contra ele proferidas (art. 322, CPC). Não é, por exemplo, intimado da sentença, embora haja quem, como Calmon de Passos, defenda essa intimação.41

A situação é um tanto diferente em relação ao cumprimento da sentença.

Parece, realmente, ser necessária a sua intimação pessoal para que cumpra a sentença, se não houver constituído advogado nos autos (isso porque é possível que o réu seja revel e tenha advogado nos autos, como, p. ex., o autor revel na reconvenção). Realmente, o prazo de quinze dias previsto no art. 475-J do CPC dirige-se à parte, a fim de que seja efetuado o pagamento da obrigação reconhecida na sentença. Não há qualquer efetividade em manter a regra do art. 322 do CPC quanto ao prazo do art. 475-J do CPC, exatamente porque tal lapso temporal destina-se ao cumprimento espontâneo da obrigação. Daí parecer mais adequado determinar a intimação do revel, com vistas a permitir a satisfação do crédito.

A mesma solução se impõe no caso de réu revel em favor de quem tenha sido desig-nado curador especial (art. 9º, II, CPC).

41. Para Calmon de Passos, sempre que haja uma ordem do juiz para que o réu pratique algum ato, este deve ser intimado, ainda que revel e sem advogado regularmente constituído (PASSOS, J. J. Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, v. 3, n. 260.1, p. 452).

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Se, no momento do cumprimento da sentença, o réu estiver em lugar incerto, desco-nhecido ou inacessível (art. 232, II, CPC), deverá ser intimado por edital.

A propósito, convém referir ao acórdão proferido pela 3ª T. do STJ, proferido no REsp. n. 1.009.293-SP, rel. Mina. Nancy Andrighi, j. em 06.04.2010: “em razão da absoluta falta de comunicação entre o curador e o réu revel, não há como presumir que o revel tenha ciência do trânsito em julgado da decisão que o condena; consequentemente, não há como impor-lhe, automaticamente, a multa do art. 475-J do CPC. Para que incida o referido artigo, não se deve considerar suficiente a ciência do curador especial sobre o trânsito em julgado da condenação, não em razão apenas da mencionada falta de comunicação entre ele e o réu revel, mas também porque a multa constitui sanção imposta àquele que voluntariamente deixe de cumprir a sentença, comportamento que não pode ser atribuído ao curador de ausentes, visto que o réu revel mantém sua capacidade material, isto é, sua livre manifestação de vontade, bem como sua condição de parte substancial no processo. Nas hipóteses em que o cumprimento da sentença volta-se contra réu revel citado ficta-mente, a incidência da multa do art. 475-J do CPC exigirá sua prévia intimação nos termos do art. 238 e seguintes do CPC”.

e) Considerando a necessidade de intimação do devedor para cumprimento espontâneo da decisão, deve-se perguntar se essa intimação depende de requerimento do credor ou se poderá o magistrado determiná-la de ofício (por exemplo, após o retorno dos autos da instância superior, poderá despachar determinando o cumprimento do acórdão?).

Essa intimação do executado pode ser determinada ex officio; a exigência de provoca ção do exeqüente restringe-se à instauração da fase de execução forçada, após o inadimplemento do executado. Assim, transitada em julgado a decisão, pode o magistra-do intimar o devedor para o seu cumprimento, requerendo, se for o caso, que o contador judicial providencie a elaboração dos cálculos de atualização da dívida (aplicam-se, por analogia, o art. 475-B, § 3º, e o art. 52, II,42 da Lei Federal n. 9.099/1995, que cuida dos Juizados Especiais Cíveis).

Certamente, na praxe forense, o próprio credor vai antecipar-se, pedindo que seja intimado o devedor e que, ato contínuo, em caso de não pagamento no prazo de 15 dias, seja expedido o mandado de avaliação e penhora dos bens indicados pelo próprio credor.

Interessante a observação de danieL aSSuMPção: se o credor precisa atualizar o valor da dívida, para que o devedor seja intimado a cumprir espontaneamente a obrigação, convém ao exeqüente, ao indicar o valor do crédito, já requerer o início da fase executiva, com a expedição de mandado de penhora e avaliação, acaso o devedor não cumpra espontaneamente a obrigação. Concentram-se em um mesmo ato diversos requerimentos. É possível, no entanto, embora não recomendável, que o credor apenas peça a intimação do devedor para cumprir espontaneamente e, após

42. Art. 52. […] II – os cálculos de conversão de índice, de honorários, de juros e de outras parcelas serão efetuados por servidor judicial.

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frustrada a expectativa pelo adimplemento espontâneo, formular novo requerimento de instauração da fase executiva43.

Parece, contudo, que, se não o fizer, poderá o magistrado determinar de ofício a inti-mação para cumprimento espontâneo. Isto porque, em se tratando de ato de procedimento que não tem propriamente caráter executivo, mas de mera provocação para cumprimento espontâneo, é possível havê-lo como subsumido à regra do impulso oficial prevista no art. 262 do CPC. Ademais, quando o legislador quis que o curso do procedimento dependesse de ato a ser praticado pela parte, ele disse isso expressamente: é o que se dá em relação à expedição do mandado de avaliação e penhora, para o que se exige o requerimento do credor (art. 475-J, in fine, do CPC).

f) De acordo com o § 4º do art. 475-J do CPC, efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput deste artigo, a multa de dez por cento incidirá sobre o restante.

g) Discute-se se a multa prevista no caput do art. 475-J do CPC deve incidir nos procedimentos executivos iniciados antes da vigência da Lei Federal n. 11.232/2005. Como cediço, a lei processual nova, salvo disposição em contrário, tem eficácia imediata, passando a incidir sobre os atos processuais subseqüentes ao termo inicial da sua vigência.

A 3.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça chegou a se posicionar no sentido de que a referida multa não seria aplicável às sentenças transitadas em julgado antes da vigência da Lei Federal n. 11.232/200544. Felizmente, porém, modificou o seu entendimento. Por meio de acórdão relatado pela Ministra Nancy Andrighi, a mesma Turma firmou, mais recentemente, entendimento no sentido de que, conquanto a regra processual nova deva incidir imediatamente, atingindo os processos em curso, o juiz da causa tem que avaliar se a imposição da multa de que trata o art. 475-J é viável no caso concreto.

Eis a ementa do julgado:

“PROCESSO CIVIL. MEDIDA LIMINAR VISANDO A ATRIBUIR EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL. APLICABILIDADE DA MULTA DISPOSTA NO ART. 475-J A EXECUÇÕES AJUIZADAS ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO DOS EMBAR-GOS OPOSTOS APÓS TAL VIGÊNCIA, COMO MERA IMPUGNAÇÃO, SEM EFEITO SUSPENSIVO.

- No panorama jurídico anterior à Lei nº 11.232/2005, a sentença condenatória tinha, como eficácia específica, a declaração do débito e do inadimplemento, mais a constituição do título executivo. Não havia, na sentença, uma ordem específica proferida pela autoridade judiciária, determinando ao devedor o adimplemento da obrigação. A determinação de adimplemento contida na sentença nada mais era que a que previamente estava contida na lei cuja violação motivou a propositura da ação.

- Com a introdução do art. 475-J, a sentença condenatória passou a ser dotada de uma nova eficácia. Além de declaração do direito e constituição do título executivo,

43. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Reforma do CPC, cit., p. 215.44. STJ, 3ª T., REsp n. 962.362/RS, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. em 06.03.2008, publicado no

DJe de 24.03.2008.

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ela também passou a conter uma ordem específica e independente, dirigida ao devedor, para que cumpra a obrigação. A independência dessa ordem, dada pelo juiz, verifica-se pela existência de uma sanção específica para punir o respectivo inadimplemento, que é a multa fixada pelo art. 475-J. Essa multa apenas se aplica ao devedor que inadimplir a sentença. Ela, portanto, torna o ato judicial algo mais que a lei, cujo inadimplemento gera sanções autônomas.

- Assim, para as execuções posteriores à reforma legislativa, a aplicação da multa do art. 475-J é automática.

- As execuções anteriores à reforma também podem ser por ela colhidas. Todavia, tendo em vista as diferentes fases em que o processo executivo pode se encontrar, por uma questão de política legislativa a melhor medida é estabelecer que o Juízo de Primeiro Grau possa, avaliando cada hipótese concreta, determinar, mediante intimação do advogado do executado, o pagamento do débito em quinze dias, contados da intimação de tal determinação. Transcorrido 'in albis' esse prazo, incidirá a multa.

- A oposição de embargos à execução obedece a lei vigente no momento de sua apresentação. Assim, se a execução foi iniciada antes da vigência da Lei nº 11.232/05, mas os embargos somente foram opostos após a vigência dessa Lei, é correta a decisão que os recebe como mera impugnação, sem suspensão do processo executivo. Medida liminar parcialmente deferida, apenas para afastar a cobrança da multa do art. 475-J, cuja incidência, em execução anterior à reforma, deve ser precedida de intimação do devedor, na pessoa de seu advogado.” (MC 14.258/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/06/2008, DJe 24/11/2008)

No caso em análise, a ação de execução judicial foi proposta e o mandado de inti-mação da penhora foi expedido antes da vigência da Lei Federal n. 11.232/2005. Mas o mandado só foi entregue à executada depois de a referida lei estar em vigor. O juízo de primeiro grau recebeu os embargos da executada como impugnação e aplicou a multa, por entender que ela deveria ter feito o pagamento dentro dos quinze dias subseqüentes à intimação. A segunda instância de julgamento negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela devedora, mantendo a decisão singular. Por meio de recurso especial a questão chegou ao STJ.

De fato, a despeito de a lei processual nova ter eficácia imediata, atingindo os processos em curso, é necessário que seja ponderada cada situação concreta para que se possa decidir pela aplicação, ou não, da multa do art. 475-J do CPC. Essa ponderação é necessária para que se evitem decisões-surpresa, por meio das quais o executado venha a ser surpreen-dido com a imposição da multa coercitiva, sem que sequer soubesse da possibilidade de sua incidência. Assim é que, em nome dos princípios da cooperação, do contraditório substancial e da adaptabilidade do procedimento, cabe ao juízo da execução adequar a incidência da multa à situação concreta, determinando a intimação do devedor, por meio do seu advogado, para que fique ciente de que o não pagamento do valor principal do débito no prazo de quinze dias implicará a aplicação da multa de que fala o art. 475-J do CPC. Só assim é que se poderá falar em aplicação da multa às execuções iniciadas antes da vigência da Lei Federal n. 11.232/2005.

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h) Há séria controvérsia sobre a incidência, ou não, da multa em execução provisória45-46.

45. Admitindo a incidência da multa em execução provisória, pelos mais variados argumentos, examinados neste item, logo a seguir, BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, v. 1, cit., p. 78; _____. “Variações sobre a multa do caput do art. 475-J do CPC na redação da Lei 11.232/2005”. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos da nova execução 3. São Paulo: RT, 2006, p. 149-158; CÂMARA, Alexandre Freitas. A nova execução da sentença. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 115; RODRIGUES, Marcelo Abelha. A terceira etapa da reforma processual civil, cit., p. 131; _____. Manual de execução civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006; LUCON, Paulo. “Nova execução de títulos judiciais e a sua impugnação”. Aspectos polêmicos da nova execução. Teresa Wambier (coord.). São Paulo: RT, 2006, p. 444-445; _____. “Títulos executivos e multa de 10%”. In: SANTOS, Ernane Fidélis dos; WAMBIER, Luiz Rodrigues; NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, p. 991-992;. ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo Eduardo de. “A terceira onda de reforma do Código de Processo Civil – Leis 11.232/2005, 11.276/2006, 11.277/2006 e Lei 11.280/2006”. Revista dos Tribunais. São Paulo: RT, 2006, n. 850, p. 37; CARNEIRO, Athos Gusmão. Cumprimento da sentença civil. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 53-54; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil. São Paulo, RT, 2007, v. 3, p. 237-238; ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 212; BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. O novo CPC: a terceira etapa da reforma. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 88; PAVAN, Dorival Renato. “Procedimento e forma para a intimação do devedor para cumprimento voluntário da sentença: art. 475-J da Lei 11.232/2005”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2006, n. 139, p. 125, 128-129; GÓES, Gisele Santos Fernandes. “Aspectos procedimentais dos arts. 475-J da Lei 11.232/2005 e 740, parágrafo único, da Lei 11.382/2006: ênfase no prazo de 15 dias e a natureza jurídica das multas”. In: SANTOS, Ernane Fidélis dos; WAMBIER, Luiz Rodrigues; NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, p. 811; FERNANDES, Sérgio Ricardo de Arruda. “Os atos de comunicação processual do devedor na disciplina da lei 11.232”. In: SANTOS, Ernane Fidélis dos et al. Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, p. 950; NEVES, Da-niel Amorim Assumpção. “Início do cumprimento da sentença”. Reforma do CPC: leis 11.187/2005, 11.232/2005, 11.276/2006, 11.277/2006 e 11.280/2006. São Paulo: RT, 2006, 211-212; MONTEIRO, Vítor J. de Mello. “Da multa no cumprimento de sentença”. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coord.). Execução civil e cumprimento da sentença. São Paulo: Método, 2006, p. 507; FRIAS, Jorge Eustácio da Silva. “A multa pelo descumprimento da condenação em quantia certa e o novo conceito de sentença”. In: SANTOS, Ernane Fidélis dos; WAMBIER, Luiz Rodrigues; NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, p. 156-161; SANT’ANNA, Paulo Afonso de Souza. “Primeiras observações sobre o novo art. 475-J do CPC”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2006, n. 139, p. 170-171; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. “A execução provisória diante da lei 11.232/2005”. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes (coord.). Execução civil e cumprimento da sentença. São Paulo: Método, 2006, p. 282; SANTOS, Evaristo Aragão. “Breves notas sobre o “novo” regime de cumprimento da sentença”. In: FUX, Luiz; NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Processo e Constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbosa Moreira. São Paulo: RT, 2006, p. 324-326; GRECO, Leonardo. “Primeiros comentários sobre a reforma da execução oriunda da Lei 11.232/2005”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: RT, 2006, n. 36, p. 76-77; FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. “O início do prazo para o cumprimento voluntário da sentença e a multa prevista no caput do art. 475-J do CPC”. In: SANTOS, Ernane Fidélis dos; WAMBIER, Luiz Rodrigues; NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, p. 251; AMARAL, Guilherme Rizzo. “Do cumprimento da sentença”. In: OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de (Coord.). A nova execução: comentários à Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 96-98. TESHEINER , José Maria. “É possível a aplicação da multa prevista no art. 475-J do CPC na execução provisória?”. Revista Brasileira de Direito Processual. Belo Horizonte: Fórum, n. 67, p. 213-214. Rodrigo Barioni, embora admita a incidência da multa em execução provisória, observa que isso não ocorrerá sem problemas (BARIONI, Rodrigo. “Cumpri-mento da sentença: primeiras impressões sobre a alteração da execução de títulos judiciais”, cit., p. 535-536).

46. Para um exame aprofundado do tema, consultar: DIDIER JR., Fredie e ANDRADE, Daniele. “Execu-ção provisória e a multa prevista no art. 475-J do CPC”. Aspectos polêmicos da nova execução. Cassio Scarpinella Bueno e Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.) São Paulo: RT, 2008, v. 4, p. 192 e seguintes. Este tópico foi escrito tomando por base o referido ensaio doutrinário.

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Trata-se, como visto, de multa que tem a missão de forçar o cumprimento espontâneo da decisão. O cumprimento espontâneo pode significar aceitação da decisão e, portan-to, eventual recurso que o devedor/executado tenha interposto pode ser considerado inadmissível, pela prática de ato incompatível com a vontade de recorrer (art. 503 do CPC).

É possível argumentar que o executado, para livrar-se da multa, poderia pedir o depósito judicial do montante devido, que somente seria levantado nos termos do art. 475-O, III, CPC. Foi o que ficou estabelecido na Medida Cautelar 12.743/SP47, mediante decisão monocrática da Ministra Nancy Andrighi, que sugeriu que se fizesse o depósito integral da quantia ou que se prestasse fiança bancária em garantia, a fim de que a multa não incidisse em execução provisória.

Sucede que a norma inserta na primeira parte do caput do art. 475-J visa a que o de-vedor cumpra, sem mais delongas, o comando judicial, de modo a impedir a incidência da multa; exige-se, pois, o pagamento, que remete à idéia de extinção da obrigação. O problema é que, uma vez provocado o reexame da matéria mediante a interposição de recurso, ainda que sem efeito suspensivo, a obrigação ainda não está revestida de certe-za jurídica, não podendo funcionar a multa como instrumento para coagir o devedor a extingui-la, mediante o cumprimento voluntário da prestação pecuniária certificada na decisão exeqüenda. Ocorrendo pagamento, não há como subsistir o recurso interposto. É forçosa a sua inadmissibilidade. Não mais existe obrigação a discutir. Reconheceu-se a procedência do pedido (art. 269, II, do CPC).

Assim, não prospera o argumento de que o executado deve prestar caução ou depositar a quantia devida – ou, ainda, apresentar fiança bancária, como oportunizou a Ministra do STJ, Nancy Andrighi, na decisão supracitada –, apenas com o intuito de repelir a aplicação da multa, esclarecendo aos órgãos a quo e ad quem que pretende esperar o julgamento recursal (para não caracterizar a prática de ato “sem reserva”, a que alude o parágrafo único do art. 503). Isso não é pagamento, adimplemento, cumprimento voluntário. É apenas garantia do juízo. É oferecer dinheiro à penhora. Não atende ao quanto estatuído no art. 475-J, caput, primeira parte, segundo o qual o pagamento é o único ato do devedor capaz de dispensar a multa de 10% (dez por cento).

Se assim não fosse, e prevalecesse o entendimento esposado na mencionada decisão do STJ, seria possível concluir que, em qualquer execução, provisória ou definitiva, bastaria ao executado tomar uma das duas providências, indicadas pela Ministra, que a multa não incidiria; ou seja, bastaria que a penhora fosse feita em dinheiro ou em carta de fiança bancária, oferecidas pelo executado, para afastar a incidência da multa. Ou seja: a multa serviria não apenas para forçar o adimplemento voluntário, mas, também, para o

47. STJ. Medida Cautelar 12.743-SP, rel. Ministra Nancy Andrighi, decisão monocrática proferida em 25.04.2007, publicada no DJ de 03.05.2007.

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oferecimento de dinheiro ou carta de fiança bancária à penhora (a propósito, curioso o fato de terem sido possibilitadas apenas essas duas garantias).

A diferença entre pagamento da obrigação (art. 651 do CPC) e oferecimento de di-nheiro/fiança bancária (art. 655, I, e art. 656, § 2º, CPC) à penhora parece indiscutível e dispensa maiores considerações; inclusive o valor a ser penhorado já inclui a multa que incidiu em razão do inadimplemento (art. 475-J, CPC).

Desse modo, é imperioso distinguir as situações: cumprir a sentença é remir a dívida, obstando a instauração da fase executiva, que pressupõe o inadimplemento; prestar caução, depositar o dinheiro ou apresentar carta de fiança bancária são condutas que não impedem a execução, ao contrário, “garantem-na”, pois a penhora recairá sobre tais quantias. Há, pois, uma incompatibilidade lógica na aplicação da multa do art. 475-J na execução provisória.

Saliente-se que, caso seja admitida a multa nesse tipo de execução, vislumbram-se três possibilidades. Ao executado, que interpôs recurso sem efeito suspensivo, caberá: (i) ou pagar, para evitar o acréscimo de 10% (dez por cento); (ii) ou depositar/prestar fiança bancária/caução, sem pagar, também para evitar a multa; (iii) ou não fazer nada.

No primeiro caso, o recurso fatalmente cairia, pois teria havido reconhecimento da procedência do pedido. No segundo caso, o recurso prosseguiria (inclusive de acordo com a decisão do STJ), mas a multa não poderia incidir, não obstante não houvesse o cumprimento voluntário, único fato que, na forma do art. 475-J, poderia dispensá-la. Na terceira situação, a multa incidiria e a execução provisória prosseguiria no valor certificado acrescido do percentual legal.

Pergunta-se: transitada em julgado a decisão, iniciar-se-á, novamente, o cumprimento da sentença condenatória. Haveria, então, nova incidência da multa? Parece que ninguém defende ou defenderia isso. Como se não houvesse nova incidência, significa, então, que sempre que se interpuser recurso sem efeito suspensivo, que permite a execução provisória, mas que afinal não lograr êxito, não haverá como a parte derrotada escapar do acréscimo de 10% (dez por cento) no valor da obrigação sem depositá-la, pagando ou simplesmente garantindo o juízo. Retira-se, então, da parte, nestes casos, o direito de cumprir a sentença definitiva, pagando o valor original sem acréscimo. É como se se estivesse defendendo que a derrota em recurso sem efeito suspensivo, que não impediu a instauração da execução provisória, trouxesse consigo, como efeito anexo, o acréscimo de dez por cento no valor certificado na sentença.

De mais a mais, não se olvide que a multa, ao contrário das astreintes, possui natureza não só coercitiva, mas também punitiva, em virtude do inadimplemento da obrigação reconhecida na sentença ou acórdão. Não há como apenar o devedor que, legitimamente, está exercendo o direito de recorrer, demonstrando o seu descontentamento com o pro-nunciamento judicial.

Por conseguinte, se o vencido deseja discutir o título, não lhe pode ser imposto o pagamento, cumprimento voluntário do julgado. Por outro lado, a prestação de caução, de fiança bancária ou o depósito do valor da condenação não podem elidir a multa, dado que não configuram o pagamento demandado pelo art. 475-J.

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Não resta outra possibilidade: a multa não pode ser aplicada na execução provisória48. Há de se aguardar o julgamento do recurso e, sobrevindo o trânsito em julgado da decisão, deve-se intimar o executado para cumprimento voluntário, agora sob pena de incidência da multa, eis que convertida em definitiva a execução. O STJ já acolheu expressamente essa argumentação: 2ª T., REsp n. 1.100.658-SP, rel. Min. Humberto Martins, publicado no DJ de 21.05.2009.

i) Há entendimento do Tribunal Superior do Trabalho no sentido de que a multa de que fala o art. 475-J do CPC é inaplicável ao processo do trabalho, por violar o art. 880 da CLT, que determina que “requerida a execução, o juiz ou presidente do tribunal mandará expedir mandado de citação do executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas ou, quando se tratar de pagamento em dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou garanta a execução, sob pena de penhora”, e por violar o art. 889 da CLT, que determina explicitamente a aplicação das regras relativas ao procedimento da execução fiscal aos trâmites e incidentes do processo de execução. A aplicação do CPC, de acordo com o artigo 769 da CLT, é subsidiária, de modo que somente é admissível quando houver omissão da CLT49.

48. Com os mais diversos fundamentos, basicamente todos expostos no texto, também não admitem a multa do art. 475-J na execução provisória: SANTOS, Guilherme Luis Quaresma Batista. “Análise da nova execução civil de títulos judiciais”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2007, n. 145, p. 201-203; NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante: atualizado até 1º de março 2006. 9ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2006, p. 388; MONTENEGRO FILHO, Misael. Cumprimento das sentenças e outras reformas processuais. São Paulo: Atlas, 2006, p. 60-61; OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. A nova execução: comentários à Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 194-195; COSTA, Eduardo José da Fonseca. “É possível a aplicação da multa prevista no art. 475-J do CPC na execução provisória?”. Revista Brasileira de Direito Processual. Belo Horizonte: Fórum, n. 67, p. 215-218. ZAVASCKI, Francisco Prehn. “Considerações sobre o termo a quo para cumprimento espontâneo das sentenças condenatórias ao pagamento de quantia”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2006, n. 140, p. 138; PALHARINI JÚNIOR, Sidney. “Algumas reflexões sobre a multa do art. 475-J do CPC”. In: SANTOS, Ernane Fidélis dos; WAMBIER, Luiz Rodrigues; NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, p. 274-275; SANTOS, Ernane Fidélis dos. As reformas de 2005 do Código de Processo Civil: execução dos títulos judiciais e agravo de instrumento. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 56; THEODORO JÚNIOR, Humberto. As novas reformas do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 143-144; NEIVA, José Antônio Lisbôa. “Algumas questões envolvendo a Lei 11.232/2005”. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2006, n. 139, p. 146; CARMONA, Carlos Alberto. “Novidades sobre a execução civil: observações sobre a Lei 11.232/2005”. In: RENAULT, Sérgio Rabello Tamm; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A nova execução dos títulos judiciais: comentários à lei 11.232/2005. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 65-67.

49. Ver, a título de exemplo, o seguinte julgado: “RECURSO DE REVISTA. 1. DA DESCARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO DE BANCÁRIO DO RECLAMANTE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL INESPE-CÍFICA A TEOR DA SÚMULA 296/TST. A jurisprudência trazida a cotejo carece da especificidade exigida pela Súmula 296/TST, porquanto não aborda as mesmas premissas fáticas contidas na decisão recorrida. Não conheço do recurso de revista.2. DA CONTRARIEDADE À SÚMULA 55/TST. INOCORRÊNCIA. O Regional deixou registrado que, pelo contexto probatório dos autos, o reclamante estava inserido na categoria de bancário. Para se chegar a conclusão diversa, necessária seria a incursão nas provas dos autos, o que é vedado nesta instância recursal, a teor da Súmula 126/TST. Não conheço do recurso de revista.3. ARTIGO 475-J DO CPC. INAPLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO. Consoante o en-

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j) Outra questão importante é a de saber como ficaria a prescrição da pretensão exe-cutiva do credor. De acordo com o Código Civil, uma vez interrompida a prescrição, por despacho do juízo determinando a citação ainda na fase cognitiva do procedimento (art. 202, I, CC), o prazo somente voltaria a fluir a partir do último ato do processo em que fora interrompida (art. 202, p. ún., CC).

O problema é que, sendo a execução uma etapa do mesmo procedimento em que se certificou o direito subjetivo do credor, não haveria, a rigor, entre as fases cognitiva e exe-cutiva, o fim de um “processo” ou o início de outro. Assim, a aplicação literal do disposto no parágrafo único do art. 202 do Código Civil geraria distorções no sistema, permitindo que um dispositivo criado para garantir a segurança jurídica nas relações obrigacionais passasse a, em verdade, afastá-la.

Basta pensar na situação do credor que, não tendo obtido espontaneamente o paga-mento do devedor, aguardasse por vinte e cinco anos para só então pedir a expedição de mandado de avaliação e penhora. Aplicando-se literalmente o art. 202, p. único, do CC, esta situação seria absolutamente possível, já que, como o processo não teria ainda sido encerrado, sequer se poderia falar em recomeço do prazo prescricional.

É justamente porque a situação fere o bom senso e, pior, atenta contra a segurança jurídica, que parece ser necessário redescobrir no processo civil o instituto da prescrição intercorrente, assim entendida aquela que se opera mesmo na fluência do procedimento jurisdicional, nos casos de inércia do titular do direito.

Mas dessa constatação surge um outro problema: a partir de quando a prescrição intercorrente passaria a fluir? Ao que tudo indica, deveria fluir a partir do momento em que restasse configurado o inadimplemento do devedor. E isso somente ocorre após o escoamento do prazo de 15 dias para pagamento espontâneo. Vale observar que, a partir daí, o curso do procedimento dependerá de ato a ser praticado pelo credor (pedido de expedição de mandado de avaliação e penhora). Sendo assim, a partir do décimo sexto dia tem início o prazo prescricional para que o credor possa buscar a efetivação do direito subjetivo que lhe fora certificado.

k) A multa legal prevista no art. 475-J não se aplica no caso de execução de sentença homologatória de acordo, judicial ou extrajudicial, em cujo bojo tenha sido fixada multa negocial pelo inadimplemento da obrigação. Haveria bis in idem injustificável.

3.2.2. Segunda fase: execução forçada

Ultrapassada a fase de cumprimento voluntário da sentença, a fase executiva iniciar-se-á a partir do requerimento do credor, que é uma demanda e, como tal, dever ser

tendimento de que o art. 475-J do CPC é inaplicável ao processo do trabalho, por não haver omissão no texto celetista e por possuir regramento próprio quanto à execução de seus créditos, no capítulo V da CLT (arts. 876 à 892), inclusive com prazos próprios e diferenciados, a decisão proferida pelo Tribunal -a quo- merece reforma, para excluir da condenação a aplicação de tal dispositivo à futura execução trabalhista. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR - 644/2007-026-13-00.4 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 17/12/2008, 8ª Turma, Data de Publicação: 19/12/2008)