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    Todos os direitos reservados E-Pappers Servios Editoriais. proibida a repro-

    duo ou transmisso desta obra, ou parte dela, por qualquer meio, sem a prviaautorizao dos editores.

    Impresso no Brasil.

    Alexsandro Oliveira

    Eduardo Freire

    www.e-papers.com.br

    Rua Mariz e Barros, 72 - sala 202Praa da BandeiraCEP: 20.270-006Rio de Janeiro, RJ - Brasil

    Tel.: (21) 2273-0138

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    Agradecemos aos professores e alunos do Programa de Ps-

    graduao em Comunicao e Cultura Contemporneasda UFBa, em especial, queles que participam dos grupos

    de Pesquisa da Linha de Anlise de Produtos e Linguagens daCultura Meditica, coordenados por Giovandro Ferreira, ItniaGomes, Jeder Janotti, Jos Benjamin Picado, Wilson Gomes.

    A nossa especial deferncia ao CNPq que atravs do EditalUniversal tornou possvel o Seminrio Metodologias de Anlisede Telenovelas, realizado em 2003 (PosCom/UFBa), e a publica-

    o deste Livro. O reconhecimento das valiosas colaboraes dosparticipantes do Seminrio, principalmente de Benjamin Picado,Amaranta Csar, Francisco Serafim, Iara Sydenstricker, EstherHamburger, Pina Coco, Rodrigo Barreto e Slvia Borelli.

    O carinho especial aos integrantes do Grupo de Pesquisa A-Tev e aos inestimveis bolsistas PIBIC que viveram esta aventura:Juliana Brito (CNPq), Elen Vila Nova (FAPESB) e AlexsandroOliveira (CNPq).

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    ALinha de Pesquisa Anlise de Produtos e Linguagens daCultura Meditica, criada em 2001 no Programa de Ps-graduao em Comunicao e Cultura Contemporneasda Universidade Federal da Bahia, reinventou uma inflexo nas

    pesquisas realizadas no Grupo de pesquisa A-tev, coordenadopor Maria Carmem Jacob de Souza. Assim, desde esta poca,o Grupo enfrenta os desafios da criao de mtodos de anlisetextuais de telenovelas.

    O Seminrio Metodologias de Anlise de telenovelas,realizado em 2003 (PosCom/UFBa) pelo Grupo de Pesquisa A-tev, com o apoio do CNPq, visava promover uma interlocuocom especialistas em telenovelas e em outras reas de estudos para

    colaborar nos debates advindos das questes mais candentes doProjeto de Pesquisa em andamento sobre a Anlise da autorianas telenovelas Renascer, O Rei do Gado e Esperana (CNPq)e nas indagaes que compem as investigaes que se dedicamas anlises internas de telenovelas e outros produtos ficcionaisaudiovisuais televisivos e flmicos. O livro Analisando telenovelasapresenta aos leitores resultados das reflexes desenvolvidas nesteSeminrio.

    , Professora do Programade Ps-graduao em Comunicao e Cultura Contemporneasapresenta no artigo Analisando Autoria nas Telenovelas asproposies gerais do mtodo de anlise das marcas de autoriaque considera tanto os modos de organizao do processo deelaborao das telenovelas quanto os modos de funcionamentodas suas estratgias discursivas.

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    , professora do Programa de Ps-graduaoem Cincias Sociais da Pontifcia Universidade Catlica de SoPaulo, examina em Comicidade e fantstico: dilogos com omelodrama, a narrativa estabelecida nas fronteiras de diferentesterritrios de ficcionalidade melodrama, comicidade e fantstico observados na telenovelaA Indomada. Retoma a importncia daanlise das estratgias de comunicabilidade dos gneros ficcionaispara a compreenso dos modos de reconhecimento e leitura dastelenovelas por parte dos telespectadores.

    , professora do Programa de Ps-graduao em Le-tras da Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro, expeem Herona e suas metamorfoses uma das situaes narrativasestruturantes das telenovelas, a presena constante, mesmo queem novas modulaes, das heronas de lgrimas e sofrimento.

    , mestre do Programa de Ps-graduao em

    Comunicao e Cultura Contemporneas (UFBa), participantedo Laboratrio de Anlise flmica deste Programa desde 2000,foi convidado a examinar a potica do primeiro captulo das te-lenovelas O Clonee Terra Nostra. Uma incurso exploratria nasinvestigaes sobre as marcas de autoria dos realizadores nastelenovelas produzidas pela TV Globo, em particular, do escritorresponsvel e da direo geral.

    Espera-se que os leitores deste livro sintam-se estimuladosa colaborar na produo de conhecimento sobre a linguagem datelenovela, produto meditico de expressiva ressonncia na socie-dade brasileira que vem encantando telespectadores de diferentesrecantos do mundo.

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    Otelespectador assduo e experiente de telenovelas no

    Brasil identifica diferenas entre uma telenovela e outra.Os ndices mais usados so aqueles que dizem respeitoao ambiente das histrias: no campo ou na cidade; ao momentoda narrativa: histrias no passado ou na atualidade; ao modo deencenar o amor: gua com acar ou amores erticos e desa-vergonhados; ao modo de tratar as questes sociais e polticas:campanhas sociais ou discursos polticos; ao modo de caracteri-zao de personagens: a espera do retorno de certos viles ou

    heronas; ao modo de suscitar emoes: expectativas do riso fcil,da indignao ou da tristeza. Indices outros podem ser lembradose mencionados num pas, como o Brasil, onde mais de quarentaanos de telenovelas consagraram escritores, diretores e atores quecom regularidade compareceram na telinha.

    Tem-se assim consumidores capazes de enumerar um con-junto de marcas que identificam determinadas telenovelas comdeterminados escritores. Para lembrarmos dos mais recentes

    e expressivos, a senhora das oito da Tv Globo, Janete Clair,

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    que escreveu Selva de Pedra, Irmos Corageme tantas outras queinfluenciaram outros escritores. Telenovelas associadas ao modode narrar de diretores como Daniel Filho e atores como FranciscoCuoco e Regina Duarte. Um outro senhor das oito a ser lembrado Gilberto Braga com seus sucessos marcantes nas telenovelas eminissries, acompanhado com freqncia desde os anos noventapelo diretor Dennis Carvalho e pelas atrizes Malu Mader e ClaudiaAbreu. Uma lista extensa poderia ser aqui apresentada1, contudo,o intuito destas lembranas oferecer elementos para caracteri-zar o fenmeno da autoria das telenovelas que compreende na

    sociedade brasileira telespectadores assduos, principalmente osda TV Globo, maior produtora deste gnero no Brasil, capazesde diferenciar umas das outras e de apontar que estas diferenasdizem respeito aos autores das telenovelas, quer dizer, aos traosparticulares daqueles que as escreveram.

    No campo cientfico os especialistas tambm examinam talfenmeno, afirmando que as telenovelas brasileiras da TV Globomanifestam marcas de autoria, estratgias estilsticas particulares,

    no obstante ser um produto coletivo, comercial, fabril, marcadopela repetio, esquematizao e padronizao2. Estudos queindicam que alm do reconhecimento autoral do escritor tem-sedesde os anos noventa a evidente presena da direo geral queindica uma autoria compartilhada (Souza, 2002). Os exemplosmais evidentes desde os anos noventa na TV Globo, por exem-plo, so as experincias de trabalhos das parcerias continuadas deManoel Carlos com Ricardo Waddington; Benedito Rui Barbosa

    Consultar o Dicionrio da TV Globo de programas de dramaturgia e entretenimento(2003), assim como o livro de Mauro Alencar (2002).Consultar Souza (2004); Balogh (1996 e 2002); Tesche (2000); Borelli (1996, 1997 e2002); Ortiz et al. (1989); Mattelart (1989); Calza (1996); Campedelli (1985); Nogueira(2002); Pallottini (1998); Hamburger (1998); Kehl (1979 e 1986), entre outros.Manoel Carlos com Waddington: Por Amor(1998); Laos de Famlia(2000) eMulheres

    Apaixonadas(2003). Benedito Rui Barbosa com Luiz Fernando Carvalho: Renascer(1993);O Rei do Gado(1996) eEsperana(2002). Barbosa com Monjardim: Pantanal(1990, TVManchete) e Terra Nostra(1999). Braga com Dennis Carvalho: O Dono do Mundo(1992);

    Ptria Minha (1995) e Celebridade(2004).

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    com Jayme Monjardim e Luiz Fernando Carvalho; Gilberto Bragacom Dennis Carvalho3 e muitos outros.

    Estes estudos lanam mo de uma noo de autoria quepressupe a existncia da possibilidade do ato criativo, inovadorassociado expresso das marcas e estilos prprios, num contextode produo fortemente fabril, serial e comercial. Nestes casosbuscam demonstrar a impertinncia da premissa que afirma sera autoria possvel apenas quando o realizador ou os realizadorestm o controle quase absoluto sobre o processo de produo edistribuio das obras, condio necessria para o surgimento do

    novo, do prprio e particular, da ousadia, do inusitado.Newcomb (1993) ao mapear as principais pesquisas rea-

    lizadas sobre a criao do drama televisivo europeu e norte-americano apontou como todas elas estavam preocupadas emverificar a participao dos realizadores nas tomadas de decisono processo de elaborao deste tipo de programa televisivo.Muitos investigadores se mostravam descrentes quanto capa-cidade efetiva de criao e de tomar decises nos contextos de

    produo analisados. Preocupao que concerne tambm aosrealizadores, pois, sem dvida, quanto maior o poder sobre oprocesso, maior o poder para escolher os recursos e as estrat-gias empregadas.

    O que estas reflexes reafirmam a pertinncia do foco deateno das investigaes sobre as relaes entre as situaes detrabalho dos realizadores e o processo de uma criao autoral,sobre as condies de um processo de trabalho que permita

    efetuar escolhas associadas a expresso de estilos e ao reconhe-cimento autoral. Consideraes que apontam para a necessidadede ampliar o conhecimento sobre as condies do processode criao e de reconhecimento da autoria na teledramaturgia.Conhecimento que ajude a compor categorias de anlise maisprecisas para enfrentar os limites interpretativos postos pelosestudos nesta rea que insistem na antinomia inovao-repetio,desconsiderando as experincias autorais no mbito da produo

    comercial massiva.

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    Esta abordagem leva o pesquisador a interrogar, por exemplo,se a questo da autoria faz parte dos interesses dos envolvidos nasinstncias de produo, distribuio e consumo das telenovelas.Caso seja, indagar sobre os pontos de vista presentes neste campode interesses, querendo saber onde e como se manifestam. Estaatitude tende a evitar posturas aprioristicas do analista que oradesautoriza, ora defende a existncia da autoria.

    Em suma, acredita-se que estas premissas exigem do inves-tigador a formulao de perspectivas de anlise e interpretaodas marcas de autoria adequadas as condies de produo da

    teledramaturgia. Marcas que dependero da histria de produodas emissoras e da histria dos tipos de programa que podemser agrupados na rubrica teledramaturgia: telenovelas, miniss-ries, seriados, unitrios e outros. No caso das telenovelas, ondea autoria do escritor suposta, torna-se vital elaborar definiese estratgias metodolgicas para identificar e compreender estaexperincia particular de autoria.

    Um outro aspecto associado ao anterior toca nas estratgias

    metodolgicas que contemplero a imbricao das dimensesexternas da produo e as dimenses internas da autoria exa-minadas no texto audiovisual. Explicando melhor, a dimensoexterna aquela que investiga os realizadores que se pensam ouse comportam como autores, as instncias de reconhecimentoe consagrao destes autores, a histria do universo particulardos modos de fazer e pensar as telenovelas que permitiram aexistncia dos autores e os outros aspectos que se referem ao

    contexto de produo das telenovelas que conformam a emer-gncia do autor. A dimenso interna diz respeito aos modosde funcionamento e organizao da telenovela que podemapresentar marcas de autoria dos realizadores consideradosautores: os temas tratados, os tipos de personagens construdos,o tratamento do espao e do tempo, os programas de efeitosparticulares.

    Esta imbricao analtica entre as dimenses externas e inter-

    nas tem sido evidenciada em estudos que investigam produtos e

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    linguagens dos meios de comunicao de massa, mesmo quandono tratam da questo da autoria4. Por um lado, evidenciam oslimites dos resultados das pesquisas que ao tratarem das dimen-ses externas tecem afirmaes sobre os modos de organizaoe funcionamento interno dos produtos, sem de fato as teremexaminado. Por outro lado, evidenciam os limites das proposiesque fazem o movimento inverso, tecem afirmaes sobre as di-menses externas tendo contemplado de modo rigoroso apenasas dimenses internas dos produtos.

    Estas ponderaes geram desafios metodolgicos impor-

    tantes, em especial quando o problema da questo da autoria nastelenovelas foi construdo supondo a imbricao destas dimenses.Este artigo decorre destas preocupaes e apresenta os resultadosparciais de uma investigao sobre a autoria5, conduzida pela ques-to central: Como examinar a questo da autoria nas telenovelasbrasileiras levando em considerao tanto os modos de organiza-o do processo de elaborao das telenovelas quanto os modosde funcionamento das suas estratgias discursivas?

    As primeiras partes deste artigo desenvolvem as proposies eestratgias do mtodo de anlise do processo de elaborao das tele-novelas que gerou o sistema de localizao, identificao e seleodos autores e das telenovelas que podem ser objeto de estudo dasmarcas de autoria. Nas partes seguintes, apresenta-se as linhas geraisdas etapas do mtodo voltadas para a anlise textual, mostrando a

    Ver especialmente as argumentaes de Gomes (1996 e 2003); Featherstone (1995);Bourdieu (1996); Foucault (1992); Martn-Barbero (1987); Jensen & Jankowski (1993).A pesquisa em curso vem sendo apoiada pelo CNPq desde 2001. Atualmente desenvol-

    vemos o Projeto : Campo da telenovela e autoria: anlise das telenovelas Renascer(1993),O Rei do Gado (1996),Esperana (2002). As telenovelas foram escritas por Benedito RuyBarbosa e dirigidas por Luiz Fernando Carvalho. A pesquisa coordenada por MariaCarmem Jacob de Souza, pesquisadora do CNPq, responsvel pelo grupo de pesquisa

    A-Tev. Professora do Programa de Ps-graduao em Comunicao e Cultura Con-temporneas da Universidade Federal da Bahia. Participante da linha de pesquisa de

    Anlise de Produtos e linguagens da cultura meditica deste Programa. Este momentoda pesquisa contou com a participao da bolsista de iniciao cientfica (Fapesb) Elen

    Vila Nova e Alexsandro Oliveira (CNPq).

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    importncia da articulao destes mtodos para a construo docorpustpicos de anlise das marcas de autoria nas telenovelas.

    Importante esclarecer ainda que este artigo apresenta resulta-dos mais expressivos concernentes ao uso do mtodo de anlisedas condies de produo das telenovelas gerador da com-preenso das funes das instncias de produo e dos autores.Os exerccios de aplicabilidade do mtodo de anlise das marcasde autoria nas telenovelas encontram-se em um estgio embri-onrio. No obstante, este artigo apresenta um dos resultadospreliminares do uso do mtodo de anlise interna: a formulao

    das hipteses de trabalho sobre as definies dos fragmentos oucorpustpico de anlise das marcas de autoria nas telenovelas. Porfim, os autores e telenovelas objeto de ateno foram: BeneditoRuy Barbosa com Renascer (1993), O Rei do Gado(1996) eEsperana(2002), todas elas com direo geral de Luiz Fernando Carvalho(TV Globo, 21 horas)e com Terra Nostra6 (1999, direo geralde Jayme Monjardim, TV Globo, 21 horas) e Manoel Carlos comMulheres Apaixonadas(direo geral de Ricardo Waddington, TV

    Globo, 2003, 21 horas). As indagaes e proposies aqui apre-sentadas decorrem, pois, destas circunstncias.

    As experincias de anlise textual de obras audiovisuais, prin-cipalmente cinematogrficas, tendem a contemplar a figura do

    diretor como um critrio importante para definir a classe de filmesa ser estudada e o propsito da anlise. Nestes casos comum aexigncia metodolgica de examinar todos os filmes j produzidosno perodo selecionado e de situ-los em uma histria das formasflmicas, relacionado-os as correntes, tendncias e escolas estticas(Vanoye & Goliot-Lt, 1994, p. 23). Essa escolha pela direo

    Os resultados de um exerccio de anlise textual empregando o mtodo proposto neste

    artigo foi formulada por Rodrigo Barreto e encontra-se neste livro.

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    como evidncia da autoria da obra cinematogrfica pressupeuma dada construo social do autor, quer dizer, pressupe ummomento da histria da produo cinematogrfica que permitiueclodir obras que incentivavam o surgimento da noo de autor.No caso especfico do cinema americano e europeu, ocorreu nesseprocesso a tendncia de associar o autor figura do diretor7.

    A proposta mais usual de anlise dos filmes que introduz afigura do autor considera, assim, a necessidade de contextualizaras obras na histria das formas flmicas, procurando identificar eexplicar as relaes entre o fundo cultural que serviu de inspi-

    rao para os cineastas e os movimentos efetuados pelo cineastatendo em vista esse contexto (p.37).

    Supondo a pertinncia desta experincia de anlise flmica,estamos diante da seguinte indagao: como adequar esta abor-dagem para examinar a autoria nas telenovelas? Pesquisadores,realizadores e telespectadores afirmam que a telenovela brasileiracomporta a figura do autor. Sendo assim, cabe conhecer tanto qualdos realizadores envolvido reconhecido como autor, quanto a

    histria das formas narrativas e audiovisuais deste produto tele-visivo. Isto para melhor identificar e interpretar as inspiraesdos autores existentes observveis nas telenovelas. Estes aspectosimplicam no uso de um conhecimento acumulado sobre o assunto,que no caso especfico da telenovela incipiente. Supe, ainda, umaoutra tradio analtica inexistente nesta rea de estudo, aquela quecompara obras de um mesmo autor e obras de autores diferentes,de pocas diferentes.

    Outros problemas associados a estes se referem ao volumee ao tipo de material a ser analisado. As telenovelas reconhecidascomo autorais produzidas pela TV Globo, por exemplo, tm emmdia hoje mais de 150 captulos exibidos de segunda a sbadodurante mais de seis meses, tanto no horrio das 18h, das 19h

    Trabalho de Bernardet (1994) deixa clara a polmica quanto aos critrios de definiodo autor no cinema, uma obra coletivamente produzida. O roteirista, o produtor e at

    mesmo a ausncia da idia de autor so evocadas.

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    quanto no das 21 horas. Uma nica telenovela pode significar,portanto, mais de 150 horas de material a ser examinado. Almdisso, este material produzido em carter fabril, sendo reconhe-cidamente um material para apreciao rpida (com timos, bonse pssimos momentos), no sendo todo ele, em tese, passvel domesmo cuidado analtico para identificao das marcas autorais.

    Decorrem destas condies de pesquisa curiosas implicaes.A primeira refere-se a dificuldade de obter e organizar o material aser examinado, j que o acervo de imagens no disponibilizadofacilmente para o pesquisador, que precisa constru-lo, levando

    assim meses para o registro, quando assim o consegue. A segun-da toca na seleo do material a ser analisado quando a questodiz respeito as marcas de autoria: quais captulos, momentos datelenovela seriam mais apropriados?

    Logo, infere-se que preciso construir tpicos especficos deobservao e anlise que permitam tornar vivel a possibilidadedo exame cuidadoso do material audiovisual das telenovelas quepossa reconhecer e examinar as marcas autorais. Admitir essas

    lacunas no significa a impossibilidade da proposta de anlise,mas a reafirmao da necessidade de se instituir uma linha depesquisa nesta rea8.

    Enfim, sabendo destes limites, esclarecemos que a reflexo aser aqui desenvolvida est apoiada, mais fortemente, no estudo derealizadores e telenovelas da TV Globo, produzidas e exibidas nohorrio que sucede oJornal Nacional durante os anos noventa.

    Infelizmente, o acervo de imagens do NPTN/USP foi seriamente danificado, mas aospoucos a instituio o vai recompondo. A Rede Globo aprimorou seu intercmbio comas universidades e tem colaborado com o acesso a imagens e aos realizadores. O acessoas imagens e aos dados das outras emissoras de televiso produtoras de telenovelas noBrasil ainda precrio. Vale ressaltar que os apaixonados por telenovelas organizadospelo pas j tm um acervo de imagens que precisa ser recuperado pelas universidades,ampliando assim os acervos de imagens para estudos mais relevantes sobre a histriadas formas narrativas e audiovisuais das telenovelas. Outros pesquisadores tambmesto desenvolvendo pesquisas nesta rea e acredita-se que nos prximos anos ter-se-

    um acmulo de conhecimento mais significativo a este respeito.

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    O estudo do autor aqui empreendido parte da premissa deque existe uma construo social do autor especfica do campode produo das telenovelas. Pressuposto formulado a partir dosconceitos elaborados por Bourdieu: o espao das obras, as toma-das de posio dos realizadores e o campo de produo destasobras. A partir destes conceitos formulamos a hiptese de quequanto mais se conhece o campo de disputas e definies prpriodas prticas de produo e apreciao das telenovelas, maiorescondies o pesquisador ter para estabelecer as hipteses inter-pretativas sobre as relaes entre as escolhas narrativas e textuais

    operadas pelos realizadores e as defesas de um determinado tipode marca autoral nas telenovelas duma determinada emissora,numa determinada poca.

    Tal perspectiva centra a ateno nos realizadores ou produ-tores culturais, transformando-os em um dos vetores-chave daanlise. Isto significa que examinar as trajetrias dos realizadoresna histria de produo da telenovela permitir localizar o efetivopapel que eles tm cumprido nas interfaces entre as demandas da

    emissora e a satisfao necessria dos telespectadores; entre o re-conhecimento do realizador-autor e as escolhas estticas, narrativase tcnico-operativas que tenham configurado uma marca estilsticapeculiar reconhecvel: este um enquadramento freqente nastelenovelas dirigidas pelo Luiz Fernando Carvalho, esta umapersonagem-herona prpria do universo ficcional do escritorManoel Carlos, este um dilogo caracterstico das telenovelasescritas por Carlos Lombardi.

    Examinar as marcas de autoria nas telenovelas significa, naperspectiva analtica aqui enunciada, um esforo de compreensodo processo de construo social dos autores das telenovelas.Esta etapa objetiva tanto selecionar os autores e as telenovelasa serem examinadas, quanto localiz-las na histria das formasnarrativas e de expresso das telenovelas, no seu espao depossveis. Estratgia que redunda na construo mais rigorosado corpus de anlise.

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    A cincia das obras formulada por Bourdieu (1996) propeum mtodo para identificar um campo particular de relaes quepermite observar tanto as prticas de produo, distribuio econsumo de uma obra, quanto as instituies, grupos e agentesque atuam neste sistema. Identific-los significa posicion-losno jogo das disputas particular deste campo, conhecendo o quepensam, dizem e fazem. Ao pensar o fenmeno da autoria se deveobservar o jogo particular de disputas que dizem respeito ao reco-nhecimento e a consagrao dos agentes. A existncia dos autores visto, portanto, como fruto de um sistema de reconhecimentoe consagrao passvel de ser cartografado.

    Nessa medida, as premissas metodolgicas formuladas porBourdieu levaram a um interessante mtodo de observao e an-lise que contribuiu para a compreenso seja dos envolvidos naslutas em prol do reconhecimento e da consagrao dos autoresde telenovelas, seja das prticas desenvolvidas para tal fim. Permi-tiu entender, por exemplo, o significado das lutas concorrnciasentre as emissoras de televiso na constituio do sistema devalorizao e definio do escritor de telenovela enquanto autor,pois se tornou uma marca de distino das emissoras ter no roldos escritores contratados os mais consagrados autores do gnero(Souza, 2002 e 2004).

    A identificao dos autores e de suas trajetrias de consagra-o, estagnao ou declnio, implica nesta abordagem o cuidado de

    relacionar as escolhas dos realizadores quanto aos modos de enun-ciar e representar nas telenovelas com a posio que ocupavam nocampo no momento de produo da telenovela investigada. Istoporque, neste caso, as escolhas ou tomadas de posio significampontos de vista assumidos sobre o que deva ser uma telenovela,sobre o que se espera da funo, responsabilidade e autonomiada figura do autor neste tipo de programa de televiso. Mapean-do este conjunto de pontos de vista o analista torna-se capaz de

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    compreender o que eles representam no jogo de disputas, nas lutasde reconhecimento travadas com outros agentes, localizando osmovimentos e tendncias do campo.

    Para ampliar a compreenso dos pontos de vista, das escolhasoperadas pelos realizadores uma outra dimenso precisa ser ob-servada: as experincias acumuladas sobre o fazer telenovelas queservem de referncia para as tomadas de posio ou decises dosrealizadores-autores quanto ao modo de construir seus persona-gens, as estratgias narrativas etc. Bourdieu chama a ateno queas experincias acumuladas sobre este fazer incluem as categorias

    perceptivas conscientes e inconscientes destas experincias.Logo, os escritores de telenovelas, por exemplo, tm uma

    percepo quanto ao que precisa ser pensado e ser executado paraser considerado um autor. O que se observa, todavia, que nemtodos parecem ter a mesma capacidade de percepo e uso desteespao de possveis, desta herana acumulada pelo trabalhocoletivo, do espao de possibilidades de escolhas, representaese atos que podem se realizar, (...), adversrios a combater, toma-

    das de posio estabelecidas a superar (...) conjunto de sujeiesprovveis que so a condio e a contrapartida de um conjuntocircunscrito de usos possveis (Bourdieu, 1996, p.266). Herana,portanto, que envolve as prticas, as percepes das experinciase as telenovelas produzidas. Parafraseando Bourdieu (1996, p.226)dir-se-ia que a ao das telenovelas sobre as telenovelas se exerceto somente por intermdio dos autores cujas estratgias devemtambm sua orientao aos interesses associados sua posio na

    estrutura do campo.Por isso, supe-se que quanto maior a capacidade para iden-

    tificar e fazer uso desta herana os agentes tiverem, maiores aschances de reconhecimento e consagrao, maiores as chances deserem considerados autores.

    Depreende-se desta afirmao um vetor a mais de observaodas representaes e prticas dos realizadores - autores: de quemaneira a compreenso e conhecimento que tm sobre as formas

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    narrativas e audiovisuais das telenovelas realizadas, interferem,participam das escolhas que efetuaram, tendo em vista os interessesque os movem nas lutas por reconhecimento e consagrao ?

    Em suma, para examinar a questo da autoria faz-se neces-srio, tambm, considerar a relao dos criadores com as obras.Sendo mais especfico, o espao das telenovelas ou conjuntodas telenovelas que fazem parte da histria do campo pois,cada telenovela reflete em seu corpo um nmero de determinadasdecises estticas dos seus realizadores. Essas decises no foramtomadas em estado de isolamento nem motivadas exclusivamente

    por disposies internas dos seus realizadores. So principalmentedecises tomadas a partir de determinada posio no interior deum sistema de contraposies, ou campo, constitudo por todosenvolvidos na instncia de realizao de telenovelas. As estratgiastextuais da telenovela reconhecidas como autorais correspondem,ento, a certas decises estilsticas que foram realizadas no interiorde um universo de possibilidades de escolhas dado pela histriado campo, pelo espao das telenovelas e pela trajetria dos realiza-

    dores, ou posies sucessivas que ocuparam ao longo da histriade produo das telenovelas.

    Considerar o papel das tomadas de posio ou escolhas dosrealizadores - autores de telenovelas torna-os, assim, um doselementos centrais da investigao, um ponto de partida que ob-jetiva garantir que os resultados da investigao tero como eixoos agentes e suas prticas, estilos e modos prprios de esboar otom pessoal autoral.

    A idia de autoria tende a remeter a possibilidade de um

    realizador (individual ou coletivo) ser reconhecido como capazde dominar determinadas habilidades e elaborar um produto va-lorizado positivamente por apreciadores capazes de reconhecerestas caractersticas, a suposta qualidade da obra e do realizador.

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    Sabe-se tambm que nas lutas pela autonomia dos campos daproduo cultural essa noo de autoria vai apresentar nuances adepender da poca, do tipo de obras, das classificaes de autoriaem jogo, etc.

    Reportar esta noo de autoria a cultura meditica contem-pornea remete a concepes de autoria e projetos de criaodiretamente associados a um sistema fabril que envolve um con-junto amplo de profissionais e um conjunto assaz diferenciadode tipos de obras. Nas artes plsticas a redundncia e a repetiocomo forma de criticar a dimenso da inovao associada a autoria

    vai ganhar fora no meio dos adeptos da condio ps-moderna(Featherstone, 1995). No campo das obras massivas, a autoria vemse transformando numa importante dimenso para diferenciarde algum modo os nveis de autonomia que os realizadores terodiante daqueles que detm maior poder nas escolhas das ativida-des coletivas de produo e daqueles que financiam o produto(Canclini, 1989 e Souza, 2002).

    Nos modos destes realizadores construrem uma auto-defi-

    nio de suas prticas, que no mais dependem apenas do reco-nhecimento dos pares e de outros especialistas, passou a vigoraras exigncias de aceitabilidade e consumo advindas de um pblicocaracterizado pela extenso e por diferentes modos de apreciao.Alm disso, o debate sobre a autoria passou a estar associado sdisputas no mbito dos direitos autorais.

    O exame do significado da autoria no campo de produoespecfico da telenovela exigiu, portanto, uma investigao sobre

    os profissionais, instituies, grupos que participam do processo apartir de um cuidado metodolgico bsico, aquele que evita umadefinio prvia de autoria. Nesse sentido, buscou-se identificare compreender tanto as diversas formas de se conceber a autorianaquele universo de prticas concernentes a telenovela, quanto osenvolvidos neste universo: o largo espectro dos realizadores, as emis-soras de TV, o pblico consumidor, os anunciantes e um conjuntode agentes, grupos e instituies afetados hoje pelas telenovelas.

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    O que se privilegiou na anlise foi, principalmente, a concep-o de autoria formulada pelos profissionais realizadores, pelosrepresentantes das emissoras e pelos principais crticos de televiso(Souza, 2002). Um procedimento usado foi a identificao destesagentes e instituies a partir das suas caractersticas mais rapi-damente observveis. Este inventrio foi elaborado a partir dosdiscursos existentes sobre as prticas dos envolvidos, formuladospor eles ou por outros, veiculados pelos mais diferentes meios decomunicao impressos e audiovisuais (de jornais e revistas da Tvimpressos e on-line, a depoimentos em programas de televiso e

    outros meios). A todo o momento, cuidou-se para estabelecer asrelaes entre o material identificado e a histria de produo dastelenovelas no Brasil, ou seja, relacionar as maneiras deste progra-ma de televiso ser concebido, elaborado, distribudo, consumidoe apreciado com um determinado momento da histria particulardeste programa. Este procedimento permitiu ao analista, por umlado, vislumbrar a histria particular dos criadores de telenovelas,marcada pelos seus habituse pelas posies sucessivas no campo

    (trajetria) e, por outro lado, conhecer as dinmicas prprias deelaborar, distribuir e consumir telenovelas consideradas autorais.Melhor dizendo, foi possvel relacionar determinadas definiessobre telenovela, com as posies dos realizadores e das emissorasque a produziram e com os dispositivos geradores de reconheci-mento e consagrao autoral.

    Esta perspectiva analtica permitiu aferir em qual contextogeral e em qual situao particular os realizadores podem ser

    denominados de autores, mesmo quando avaliam o que fazemcomo rascunhos (termo muito usado por Gilberto Braga). Umprocedimento necessrio para estabelecer as bases gerais para aseleo das telenovelas que sero submetidas a anlise textual dasmarcas autorais, seja porque identifica as telenovelas e seus auto-res, seja porque constri as hipteses de localizao das marcastextuais audiovisuais reconhecidas pelos autores, pelas emissorase at mesmo por um conjunto de apreciadores como autorais.

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    Convm lembrar que as posies consagradas correspondemcapitais simblicos adquiridos numa relao com um conjunto deinstncias de reconhecimento e consagrao prprios do campoestudado ou advindo de campos conexos. No caso das telenovelasbrasileiras, desde as primeiras trs dcadas de experincias de suaproduo, observa-se que importantes realizadores defensoresdos temas nacionais e de estratgias narrativas prprias partici-pavam ativamente do campo literrio, teatral e cinematogrfico,importando, de certo modo, capitais simblicos destes campospara o campo da telenovela. (Ortiz et al., 1989, klagsbrunn, 1991

    e Souza, 2004).

    No final dos anos setenta, por exemplo, a equipe de profis-sionais responsvel pela teledramaturgia na TV Globo j estavaregida por um sistema de autoridade que definia as funes dosespecialistas e a distribuio de poder, de modo a garantir a reali-

    zao das obras ao longo de sua exibio, num prazo determinado,com um determinado nvel de qualidade e com uma determinadaestimativa de rentabilidade.

    Um olhar retrospectivo sobre este tipo de organizao con-cernente s telenovelas exibidas no horrio que sucede o JornalNacional, mostrou, por exemplo, que desde o incio dos anos oitentahavia um tipo de deciso sobre a recorrncia de certos escritorese diretores. Deciso apoiada num conjunto de variveis definidas

    a partir de um leque de dados que conjugavam desde os ndicesde audincia conquistados, as hipteses sobre as expectativas dotelespectador quanto aos temas, as estratgias narrativas, o elenco,at as avaliaes quanto s estratgias da concorrncia e s prefe-rncias dos anunciantes.

    Basta lembrar a ordem dos escritores de telenovelas exibidasdepois do Jornal Nacional de 1989 a 2004. Neste perodo foramexibidas 25 telenovelas. Destas, sete foram escritas por Aguinaldo

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    Silva e quatro por Benedito Ruy Barbosa. Gilberto Braga, GlriaPerez, Slvio de Abreu e Manoel Carlos escreveram cada um delestrs telenovelas. Cassiano Gabus Mendes escreveu mais uma eDias Gomes uma outra. Tem-se, ento, em 14 anos, vinte e cincotelenovelas e seis escritores recorrentes (ver Quadro I).

    Interessante notar que os escritores parecem cuidadosamentedistribudos. Um primeiro caso: em maro de 1993 estreava Renas-cer, escrita porBenedito Ruy Barbosa e Luiz Fernando Carvalho.Os dois surgiram neste horrio pela primeira vez e se consagraramnesta posio. Retornam trs anos depois com O Rei do Gado. Em

    1999, Benedito Ruy Barbosa volta ao ar com Terra Nostra, mas destavez dirigida por Jayme Monjardim. Em 2002,Esperana, tambmde Benedito Ruy Barbosa e Luiz Fernando Carvalho foi ao ar.

    Outro caso: Aguinaldo Silva tem sido o escritor mais assduono horrio. Antes de Renascerestrear ele escreveu Pedra sobre Pedra,que foi sucedida por Corpo e Alma, de Glria Perez. Depois deRenascer, ele escreveu, em seguida, Fera Ferida, com Dennis Carva-lho, na direo geral. Gilberto Braga foi o escritor seguinte, com

    a telenovela Ptria Minha (1994), tambm dirigida por DennisCarvalho. Depois de 1994, temos Slvio de Abreu e novamenteGlria Perez. Dias Gomes, num curto perodo, vem em seguida,antes de Benedito Ruy Barbosa. Aguinaldo Silva, mais uma vez,escreveu uma telenovela depois de Barbosa. Desta vez, foi ManoelCarlos que veio em seguida, marcando sua recorrncia trienal:em 2000, Laos de Famliae, em 2003,Mulheres Apaixonadas. Nestemeio tempo, os escritores que escreveram foi Slvio de Abreu,

    Aguinaldo Silva, Barbosa e Glria Perez. Depois de 1994, Bragase ausentou do horrio, retomando-o em 2004, depois de umatelenovela de Manoel Carlos, com Celebridades. A cuidadosa enge-nharia de produo, novamente, pode ser observada: AguinaldoSilva escrever a telenovela seguinte a ser substituda por umaoutra de Glria Perez. Estes dados mostram que Aguinaldo Silvae os demais escritores, como Braga e Glria Perez, foram por maisde duas dcadas os mais freqentes escritores das telenovelas do

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    horrio mais importante da Tv Globo, e que por mais de uma vez,as telenovelas foram exibidas uma aps a outra9.

    Sabe-se assim que a Tv Globo congrega um conjunto expres-sivo de especialistas da produo simblica (escritores, diretores,atores, cengrafos, produtores de arte, figurinistas e tantos outros)que a elaboram dentro de um sistema fabril, racionalizado e hierar-quizado de trabalho. Em linhas gerais, de acordo com Daniel Filho,o produtor ou o representante da emissora participa na definiodo escritor, este seleciona sua equipe de colaboradores e ambosavaliam a indicao do diretor geral, aquele que considerado a

    ponte entre o produtor e o escritor. O diretor geral define osoutros diretores e o restante de profissionais que comporo todaa equipe. Decises que supem um processo que envolve essastrs figuras: produtor, escritor e diretor geral.

    Qual desses especialistas pode ser considerado o autor daobra? Como essa autoria definida pelos agentes que participamdo processo de produo, distribuio e consumo da telenovela?De sada, existem aqueles que argumentam ser difcil a determi-

    nao dessa autoria, j que, alm de ser coletivamente produzida,ela de longa durao e aberta (elaborada ao longo da sua exi-bio), sendo por isso difcil manter o mesmo nvel de controleda obra e dedicao dos profissionais envolvidos durante maisde 150 captulos. Caractersticas do processo de produo quetorna a obra muito sensvel s mais diversas interferncias quepodem mudar os rumos e a qualidade da narrativa audiovisual.Outros consideram que o carter comercial do produto associado

    ao controle relativo dos escritores e diretores sobre a obra noadmite sequer contemplar a figura do autor. Certos escritores ediretores, assim como certos crticos, afirmam ser o escritor oautor, apesar do carter coletivo que caracteriza a feitura da obra e

    Outras regras do sistema de produo e exibio das telenovelas, presentes desde osanos setenta, nos trs horrios tradicionais de telenovelas desta emissora, no quesitoescritores, diretores, elenco, figurinistas, cengrafos, produtores de arte podem serobservadas, demonstrando um rigoroso senso de organizao do processo (ver Souza,

    2004; Alencar, 2002 e Dicionrio da TV Globo, 2003).

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    da crescente ampliao do poder do diretor geral diante da versofinal da telenovela.

    Daniel Filho comunga da vertente que considera o escritor oautor, o rei na TV, principalmente no caso da telenovela brasi-leira, onde a redao do roteiro acompanha concomitantemente agravao e a exibio. dele que parte tudo, diz Daniel Filho. Aodiretor geral e sua equipe compete o papel de contar a histria ede conduzir todo o processo de elaborao/ gravao exibio.Como responsvel pela forma final da obra, espera-se dele umdilogo franco com o autor e o produtor sobre o entendimento

    da obra (...) como pretende encenar, contar a histria, de modo aconformar uma cumplicidade entre especialistas colaboradores quetm funes e limites bem definidos. O produtor aps passar abatuta para o diretor-geral, acompanha o trabalho com o objetivode ser um contraponto importante na percepo de conjunto deum mega espetculo como a telenovela. No caso da TV Globo,existe a expectativa que seus diretores gerais assumam a funo deprodutores, objetivo que explica em parte a criao dos Ncleos de

    Produo. De qualquer modo, o acompanhamento da funo dodiretor geral necessrio, sendo exercida por aquele que coordenaa Central Globo de Produo (Daniel Filho, 2001).

    Esta defesa de autoria de Daniel Filho representa, no esta-do atual da histria do campo da telenovela, um consenso: osprofissionais que detm a maior capacidade de deciso e a maiorresponsabilidade diante do produto final so o diretor geral e oescritor, sendo que, em geral, ambos contam com mais de um

    colaborador. Nesta situao a tendncia considerar o escritorresponsvel como o grande definidor das escolhas que conformamuma telenovela. Tanto que elas so divulgadas como a histria doescritor responsvel, reafirmando como ele tende a ser consideradoo autor da telenovela.

    Alm disso, como a telenovela um produto comercialque deve atender aos interesses do pblico, o escritor necessitaatend-lo. Ao faz-lo, resguarda os interesses da empresa e dos

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    anunciantes, garantindo a tendncia de permanecer no processo equem sabe conseguir negociar com mais liberdade a incorporaode determinados temas, ritmo das gravaes e at mesmo, expe-rincias na composio dos recursos narrativos, cnicos, visuaise sonoros. Mas o processo no acaba a, o que a crtica tem a di-zer, o que os pares tm a dizer tambm fazem parte desta buscacomplexa de novas definies da telenovela e novas maneiras dese conceber o autor.

    O escopo deste artigo no permite explicitar tais posies. Oque interessa aqui reafirmar a importncia de conhec-las para

    definir um dos pontos centrais do mtodo de anlise das marcasde autoria aqui proposto. Dizendo de outro modo, definir o signi-ficado da existncia da figura do autor para os agentes envolvidosno campo, autoria que prefigura uma determinada concepo detelenovela, formulada num sistema comparativo com outras teleno-velas j realizadas, que permite demarcar a partir destas definies,obras e realizadores que podero ser objeto de anlise textual.

    A primazia dada ao escritor no permite inferir que se deve

    desconsiderar o papel daquele que transforma um roteiro em textoaudiovisual. Atualmente, evidente o peso na criao da parceriaque o autor constri com a direo geral e as implicaes delano modo de contar a histria. Escritores e diretores desafinadospodem comprometer gravemente os resultados econmicos, atmesmo artstico e esttico. As telenovelas de sucesso confirmamo xito dessas parcerias que tendem a se repetir mais de uma vez,mostrando fortes evidncias de uma autoria compartilhada asso-

    ciada ao reconhecimento de determinadas estratgias estilsticas.A anlise da histria do campo da telenovela no Brasil mostrou

    que a partir de meados dos anos setenta os principais escritorespassaram a ter o primeiro grande contato com as ingerncias dasregras de mercado e das presses do governo autoritrio. A res-posta desses profissionais a essa nova caracterstica se deu pelatentativa de subverso dessas regras e presses. Aprenderam aolongo do perodo a fortalecer os sistemas internos de consagrao

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    de suas prticas, a ampliar o poder de negociao dos espaos decriao e das condies de trabalho com as empresas. A inversona formao dos profissionais e nos equipamentos introduziunovos elementos no debate e nas formas de se conceber as tele-novelas, como foi o caso da experincia com as externas e suarepercusso na concepo de uma linguagem audiovisual maismadura, que naquele momento foi chamada de cinematogrfica,e de enredos mais voltados para a realidade brasileira. Cresceu opapel do diretor geral, que nos anos oitenta tem se destacado noprocesso de elaborao de telenovelas, sendo capazes de definir

    uma linguagem audiovisual prpria e particular do gnero. Asso-ciado ao crescimento do papel da direo observvel a tendnciados escritores a escolherem cada vez mais uma parceria constantecom aquele que vai se responsabilizar pelo produto final: Slvio deAbreu e Jorge Fernando; Manoel Carlos e Ricardo Waddington;Benedito Rui Barbosa e Luiz Fernando Carvalho; Gilberto Bragae Denis Carvalho etc.

    A consolidao de uma linha de trabalho voltada para a

    especificidade da expresso audiovisual da telenovela tem sidoconsiderada, principalmente pelos diretores e produtores, umimportante desafio. Quando se observa a histria do horrio quesucede oJornal Nacionalda TV Globo, pode-se dizer que, desdeos anos 70, Daniel Filho e Walter Avancini foram diretores quebuscaram garantir, apesar das condies adversas, a construode uma linha de trabalho que defendia o maior controle do pro-cesso que favorecia a qualidade esttica da telenovela e o maior

    reconhecimento autoral dos diretores-gerais. Daniel Filho, porexemplo, mantinha uma regularidade de trabalho com Janete Clair(Xexo,1996), e foi, enquanto diretor do ncleo de telenovelas daTv Globo, um dos responsveis pela formao de uma equipe deproduo e de diretores (vale destacar a presena dos diretoresRoberto Talma e Paulo Ubiratan) que deixaram marcas autoraisnas telenovelas do horrio das oito dos anos 80, conformandouma forte referncia para qualquer produo do gnero.

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    No se pode negar o trabalho estafante e pouco avesso scondies ideais da produo artstica, nem mesmo as condiesfabris, industriais a que estes realizadores se submetem. Ortiz eRamos (1989, p.156) demonstraram que a criatividade mobilizadapara a criao da telenovela esbarra necessariamente na forma jpadronizada do produto, que limita as inovaes, e nos imperativoseconmicos e industriais que o caracterizam.

    Entretanto, dentro deste contexto adverso, observa-se con-cepes criativas e autorais de telenovelas e de prticas dos reali-zadores. O caso de Daniel filho e o depoimento de Florisbal, atual

    superintendente comercial da TV Globo (Souza, 2004), ilustrambem o papel criativo e inovador dos realizadores, deixando claroque a prpria empresa tambm viabiliza a existncia dos canais dereconhecimento das marcas e estilos autorais, j que esse fenmenoalimenta a exigncia das empresas e do pblico de manterem acessaa tenso necessria entre as novidades e as frmulas repetitivas10

    geradoras do sucesso.Uma caracterstica demandada pelos representantes dessa ten-

    dncia tem sido a importncia do diretor para desenvolver formasde expresso prprias para a teledramaturgia e para a telenovelaque sejam fruto da articulao com outras linguagens audiovisuais,como o cinema. Articulaes que devem preservar e desenvolvera particularidade da televiso e dos recursos tecnolgicos prpriosdeste meio. Esta preocupao com a linguagem especfica da te-lenovela traduz um dos temas centrais presentes nas disputas emtorno de critrios de consagrao e reconhecimento.

    O debate sobre a linguagem da televiso j se fazia sentir nofinal dos anos cinqenta. Nesta poca j estava instalada uma in-teressante diferena entre os escritores e diretores (pois poca,muitos deles acumulavam essas funes) quanto ao valor da pre-ocupao esttica na televiso. Os realizadores que trabalhavamnas emissoras no Rio concordavam com Pricles Leal que dizia

    Atente-se para a leitura do artigo de Pina Coco, neste livro, que examina as frequentes

    recorrncias de certos modos de construo das heronas.

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    haver um modo diverso de pensar a linguagem entre o Rio e SoPaulo. Os paulistas sonhavam em fazer uma TV auto-suficiente,com sua prpria linguagem. No Rio era diferente, a TV era encara-da mais como veculo que difundia teatro, msica, e tantas outrasatividades artsticas. Herval Rossano, por exemplo, concordava edizia ser excessiva a preocupao dos paulistas pois, entre outrascoisas, tornava a televiso menos dinmica: podia-se levar attrs horas para dizer eu te amo (Klagsbrunn e Rezende,1991,p.44). Vale insistir que os espaos da experimentao existiram emambos locais: a TV de Vanguardaem So Paulo e a Cmera Um,no

    Rio11, por exemplo.Essa diferena sugere a permanente tenso entre os grupos

    que defendem uma televiso mais voltada para resultados comer-ciais, sem grandes preocupaes poticas e estticas, e aqueles quebuscam uma possibilidade de aliar as demandas econmicas como desenvolvimento da linguagem televisiva de qualidade.

    Tal tenso esteve presente desde as primeiras experinciasde elaborao da telenovela, tendo sido a TV Globo um espao

    privilegiado para o seu desenvolvimento. Benedito Ruy Barbosa um exemplo interessante. Ele tem sido um importante defen-sor dessas inovaes, responsveis pela linguagem prpria datelenovela, sendo o escritor que trouxe, nos anos noventa, im-portantes marcos renovadores do gnero: Pantanal12 e Renascer13.Luiz Fernando Carvalho, um dos mais expressivos representantes

    Jacy Campos introduziu mudanas importantes em termos de linguagem quando criouo Camera Um, usando uma nica cmera em movimento no teleteatro. Cmera Um deixoua marca da busca de uma linguagem prpria para a televiso, inovando no tratamentocnico, brincando com o telespectador ao lidar com a cmera e os seus limites, umacmera que, muitas vezes, narrava sem cortes (Klagsbrunn e Rezende,1991, p. 43)Pantanalfoi exibida em 1990 pela TV Manchete, alcanando, pela primeira vez depoisde muitos anos, ndices de audincia superiores a telenovela da TV Globo exibida nesteperodo, no mesmo horrio.Renascer conhecida como a novela que deixa nova marca na televiso brasileira. Umdos responsveis foi o diretor Luiz Fernando Carvalho. Os primeiros quatro captulosde Renascerforam considerados um dos melhores da TV Brasileira (Jornal do Brasil,13

    nov. 1993. Revista da TV).

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    contemporneos dessa tendncia autoral da direo de telenovela,fez de Renascerum sucesso exemplar. Experincia que mostrouum novo patamar na histria da telenovela e da teledramaturgia:o cinema no seria mais a fonte dos critrios de avaliao e reco-nhecimento, eles j seriam encontrados na histria da produoaudiovisual da televiso14.

    Por fim, tanto Barbosa quanto Carvalho tm sido contumazesdefensores da maior autonomia no processo de feitura da teleno-vela, representando uma postura autoral bem acentuada: Barbosano admite dividir a escrita e Carvalho quer deixar sua caligrafia

    prpria em qualquer produto que elabora. O exemplo deste casode autoria compartilhada pode ser observada em Renascer(1993),Rei do Gado(1996) eEsperana(2003). As duas primeiras de muitosucesso e a ltima delas com problemas de aceitao pelo pblicoque associados a problemas pessoais do escritor, exigiu a mudanadele nos captulos finais da telenovela. Esta mudana permitiunotar o estilo do escritor que o substituiu (Walcyr Carrasco) e amanuteno da segura direo geral da equipe de Carvalho, que

    nestas circunstncias de risco garantiram nveis respeitveis naqualidade e no ndice de audincia.

    Esta parceria - diretor-geral com o escritor responsvel - desen-volve estratgias prprias de trabalho, mais ou menos integradas,para lanar mo de recursos tcnicos e humanos oferecidos pelaemissora de televiso. Observa-se, ainda, a tendncia dos diretoresgerais e dos escritores responsveis de escolherem equipes de apoioregulares. Estas equipes atuam ao longo do processo de realizao

    das telenovelas segundo os modos particulares de conduo opera-dos por estes diretores gerais e escritores responsveis chamados

    O jornalista Hugo Sukman pergunta a Luiz Fernando Carvalho: por que se diz quequando a TV tem qualidade cinematogrfica e, quando ruim TV mesmo? Eleresponde: h uma tendncia geral em diminuir a televiso e sou completamente contraisso. As pessoas costumam fazer a comparao: cinema, bom, mesmo que no seja; televiso, ruim, mesmo que seja bom. A narrativa cinematogrfica totalmentediferente da televiso, no lida com tantos dilogos, tantos planos fechados (Jornal doBrasil, 12 maio 1995. Caderno B).

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    de autores. Estas dinmicas particulares de trabalho precisam serconhecidas para se caracterizar as funes destes profissionais nasescolhas das estratgias empregadas ao longo dos mais de cemcaptulos das telenovelas. Como o diretor geral e seus seletos di-retores distriburam responsabilidades e tarefas? Como o escritordistribuiu as tarefas na equipe, que tipo de controle instituiu naequipe? Quais os critrios que estes profissionais usam para avaliara telenovela, os momentos que foram considerados primorosos,as marcas de tom pessoal mais evidente, etc?

    Ampliar o conhecimento sobre estas dimenses auxilia o

    desenvolvimento da fase seguinte do mtodo de anlise da au-toria nas telenovelas, qual seja: o processo de transmutar dadossobre a produo, o processo de criao e o sistema de avaliaodas telenovelas em dados para elaborar os critrios de seleo docorpustpico de anlise textual que servir de base para examinaras marcas autorais.

    Em suma, j se configurou uma hiptese de que as marcas deautoria so observveis nas telenovelas da Tv Globo, num certo

    horrio, de uma certa poca. Alm disso, os autores que devero serobjeto de anlise so os escritores, sem desconsiderar as parceriascom os diretores. Neste ponto, sabe-se tambm que nas situaesonde existe uma parceria produtiva e estreita com os diretoresgerais, tratar-se- a autoria como compartilhada.

    A etapa da investigao mais voltada para o contexto de pro-duo das marcas de autoria nas telenovelas atinge o seu objetivocentral quando identifica os realizadores-autores na histria docampo da telenovela, conhecendo as definies em jogo sobreas telenovelas e sobre o processo de criao autoral, a ponto deformular hipteses de trabalho sobre as tendncias das escolhasde gneros destes realizadores. Esta etapa gera a compreenso

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    da trajetria destes realizadores sem descurar das relaes com ouniverso de telenovelas que tm feito parte da histria do campoe das escolhas que fizeram. Esta etapa fornece, assim, as hiptesesiniciais de trabalho para conformar a amostra representativa astelenovelas e os trechos das telenovelas que ser objeto de anlisedas estratgias internas de organizao dos efeitos das telenovelas,estratgias que traduzem marcas autorais, um tom pessoal.

    Para a seleo dos trechos das telenovelas, construiu-se umadiversidade de corpusde anlise de carter tpico (Bauer & Aarts,2002), especfico. Processo necessrio quando se est manipulando

    um texto audiovisual caracterizado pela sua extenso (de 150 a 200captulos, de segunda a sbado, de 45 minutos). Tamanho que difi-culta tanto a observao sistemtica de todos os captulos de umatelenovela, quanto a comparao destes captulos com de outrastelenovelas j realizadas pelos escritores e diretores selecionadosou por outros realizadores. O corpustpico necessrio, ainda,para examinar textos audiovisuais onde o realizador consideradoautor trabalha coletivamente. Alguns escritores autores permitem

    seus colaboradores ficarem responsveis pela criao de certospersonagens e pela conduo de suas histrias durante a trama.Alguns diretores gerais tambm distribuem responsabilidadesque podem significar ter um diretor da equipe responsvel pelacriao e conduo de mais de um captulo da telenovela. Nestescasos, imprescindvel poder localizar estas situaes, a fim depoder avaliar se possvel identificar recorrncias e dissonnciasque atestem marcas de autoria da direo geral e dos diretores da

    equipe nestas telenovelas, por exemplo. Em suma, a construode amostras tpicas para a anlise textual oferece maior seguranaao investigador de que est formulando interpretaes que consi-derem a complexidade das instncias de produo e das instnciasda obra - telenovela.

    A proposta de anlise das marcas de autoria das telenovelasescritas por Benedito Ruy Barbosa e dirigidas por Luiz FernandoCarvalho, por exemplo, traduziu a hiptese de uma correspon-

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    dncia das posies que estes realizadores tinham no campocom a disposio inovadora que buscaram desenvolver em seustrabalhos, a qual estava associada a um tipo de reconhecimento econsagrao que buscavam imprimir marcas de autoria no gnero(Souza, 2002).

    Todavia, sabe-se que posicion-los num campo especfico deprticas no suficiente para identificar, examinar e interpretaras marcas de autoria na instncia da obra. Sabe-se, ainda, que noso suficientes para construo do conjunto de corpus tpico dastelenovelas a ser examinado. Para tanto foi preciso formular um

    mtodo apropriado para anlisar os modos de funcionamento eorganizao textual das telenovelas.

    O mtodo de anlise textual da telenovela em exerccio nogrupo de pesquisa A-tev15 nasceu das experincias desenvolvi-das pelo Laboratrio de Anlise flmica. A perspectiva de anliseadotada, formulada por Gomes a partir de uma releitura da Po-tica de Aristteles, explora com acuidade as estratgias textuaisdesenvolvidas pelos realizadores autores do filme: estratgias

    de agenciamento e organizao dos elementos de composioque prevem e solicitam determinados efeitos dos apreciadores(Gomes, 1996, p.113). Formulao apropriada para um mtodode anlise das estratgias textuais das telenovelas, programa deteleviso que busca garantir a maior margem de coincidnciaentre o efeito esperado e a resposta adequada a ele por parte dosapreciadores-telespectadores. O autor-realizador (individual oucoletivo) pensado como estrategista especializado na construo

    de instrues de leitura que devem provocar determinado efeitos,sob pena de perder no apenas o reconhecimento, mas tambma condio para imprimir as marcas de autoria.

    Reafirma-se a fase preliminar desta experincia associada as lacunas da pesquisadoraque tem sua formao ancorada nas cincias sociais. A clareza dos limites impostos pelaorigem da formao fomentou uma reordenao no campo de estudos da pesquisadoradesde 2000 para aprimorar a capacidade analtica de textos e discursos audiovisuaismediticos. Resultados deste percurso transdiciplinar guiar, certamente, o processo

    de investigao em curso e os futuros trabalhos nesta rea.

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    Seguindo os rastros das premissas anteriores, o mtodo deanlise textual das telenovelas deve ser conduzido por uma teoriasobre o funcionamento deste programa de televiso examinada apartir de dois pressupostos bsicos. O primeiro exige que se deli-mite o objeto, telenovela, a partir da representao da ao quelhe particular, dos gneros discursivos de representao, pois aeles corresponderia um conjunto de efeitos prprios e esperados.Isto quer dizer que esboar uma teoria sobre o funcionamentoda telenovela exige um conhecimento sobre a sua destinao,finalidade, o efeito esperado sobre aqueles que a apreciaro. O

    segundo pressuposto diz respeito a natureza desta apreciao,pois a telenovela s existe quando apreciada.

    Uma implicao metodolgica deve ser ressaltada: o inves-tigador deve se concentrar na instncia da obra, no texto, nosrecursos e meios estrategicamente postos na obra16, pois so comestas estratgias que o apreciador se relaciona, os dispositivos quepermitem o apreciador experimentar ou no os efeitos agenciadosque foram colocados a sua disposio.

    Privilegiar o lugar da apreciao, instncia da obra destinadaa produo de efeitos, centraliza a ateno do investigador nesteagenciamento de efeitos operados pelo texto. Agenciamento quefaz uso de meios, recursos, materiais ordenados, estruturados de talmaneira a produzirem os efeitos que se espera atingir no apreciador.Os meios indicados so os narrativos, cnicos, visuais e sonoros.Os efeitos mencionados so os estticos (sensoriais), emocionais eos comunicacionais (de sentido). Como a cada obra corresponderia

    um conjunto de modos possveis de se organizar, distribuir, fazeruso, compor estes materiais no processo de gerao de efeitos, aoinvestigador cabe decifrar estes modos possveis, assim como osprogramas artsticos especficos da obra examinada, o conjunto deescolhas que ela representa (Gomes, 2003 e Eco, 1991).

    O termo obra aqui usado como trabalho artstico em geral, no importanto sereconhecida como erudita, popular ou massiva. Em alguns momentos do texto, poder

    tambm referir-se a produo total de um realizador.

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    Derivam destes pressupostos alguns procedimentos. O desta-que dado aos processos que permitem a identificao dos efeitos compreensvel, pois so eles pontos de partida para a efetivaobservao das estratgias e dos dispositivos que foram capazesde ger-los.

    Estes pressupostos indicam, portanto, a necessidade do in-vestigador estabelecer as leis gerais de programao dos efeitosnas telenovelas que estiver examinando. Para tanto, precisaridentificar os cdigos internos de funcionamento da composiodestas telenovelas a partir dos gneros de efeitos em que elas, em

    linhas gerais, tm se especializado.At o momento, gneros ficcionais17 dizem respeito s estra-

    tgias de comunicabilidade textuais desenvolvidas nas telenovelas,estratgias que demarcam regras de conduo das orientaes deescritura e de apreciao dos telespectadores. Regras e estratgiashistoricamente construdas no imaginrio de produtores e teles-pectadores, que tendem a sofrer recriaes e redefinies (Borelli,2002 e Souza, 2004). Estabelecidas estas premissas gerais, algumas

    hipteses de trabalho concernentes a construo do conjuntode corpus tpico a ser examinado surgiram. Este artigo indicaralgumas delas, sem a pretenso de esgot-las.

    A primeira delas diz respeito aos critrios para selecionarquais momentos do texto narrativo devem ser objeto de atenodo investigador. Para tanto, os materiais reunidos foram: registrosaudiovisuais dos captulos, sinopse da telenovela, boletim de pro-gramao, resumos das revistas da TV impressa e dos resumos dis-

    ponveis em stios na Internet, depoimentos de telespectadores.As telenovelas contam em geral com uma sinopse, que pode

    chegar a ter trinta pginas, e quase duzentos captulos, cada umdeles tambm com este nmero de pginas. O roteiro e a sinopse

    Mais uma vez irrefutvel a necessidade de aproximao e apropriao de outras reasdo conhecimento para ampliar a compreenso dos gneros ficcionais, as suas formas deexpresso na literatura, em especial nos romances folhetins, no cinema, no teatro e nateledramaturgia, para poder compreender melhor a relao entre as estratgias textuais

    impostas pelos gneros ficcionais e os efeitos previstos.

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    no podem servir de base para a anlise porque muitas vezes nocorrespondem ao desenvolvimento final da histria exibida na te-leviso. Alm disso, o acesso do pesquisador a este material escritoe a todos os captulos exibidos muito difcil, cabendo ao pesqui-sador imaginar outros caminhos para conhecer o texto narrativo,a histria contada nas suas nuances e modos de elaborao.

    Nestas circunstncias algumas etapas foram estabelecidas:i) elaborao de um resumo da histria baseado nos boletins deprogramao, nas sinopses, quando houver, nos resumos dos cap-tulos exibidos; ii) elaborao de um resumo descritivo e ampliado

    do desenrolar da histria, buscando respeitar a composio e oritmo da narrativa; iii) criao de um quadro geral que permitaobservar o ritmo da narrativa ao longo das semanas e dos meses,configurando as curvas dramticas segundo as tramas centrais esecundrias. Os dois ltimos itens lanam mo das mesmas fontes,precisando recorrer a memria e ou depoimentos de telespecta-dores que assistiram a telenovela. Neste momento tambm soreunidas as matrias da imprensa mais significativas que oferecem

    dados sobre a audincia e sobre as repercusses da telenovela navida social e na vida de telespectadores.

    O panorama geral da histria oferece ao pesquisador um qua-dro de hipteses de trabalho para rastrear os captulos gravadosbuscando uma correspondncia entre o momento da histria eos captulos registrados. Isto porque dificilmente consegue-se terregistrado em VHS ou DVD todos os captulos exibidos. De possedeste material, o investigador pode passar a fase seguinte, a anlise

    textual do material audiovisual. O investigador j formulou umaprimeira verso do conjunto geral do texto narrativo, do mododo escritor narrar a histria, os temas tratados, a fase de implan-tao da trama central em relao a fase do desfecho, as intrigasprincipais e secundrias, a caracterizao dos personagens, suasaes e motivos, e tantas outros. Tem-se conhecimento inclusivedas situaes consideradas problemas, dos melhores momentospara os realizadores, crticos de televiso e para o pblico. Este

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    primeiro panorama desenha, por fim, um conjunto de hiptesesde trabalho sobre os modos do escritor responsvel e dos direto-res contarem histrias neste entrelaar de estratgias que fazemparte da frmula de sucesso com as estratgias que so produzidasbuscando expressar as marcas pessoais.

    Formula-se, ainda, uma outra significativa hiptese de traba-lho, aquela que traa um mapa, mesmo que inicial e provisrio,sobre as estratgias de gnero utilizadas na telenovela. Caberetomar as intuies provenientes dos resultados de pesquisa deBorelli (2002) sobre os sistemas de identificao e observao

    da composio dos gneros ficcionais nas telenovelas. Borellidemonstrou que possvel identificar as articulaes dos gnerosficcionais melodramtico, cmico, ertico e fantstico na teleno-vela Indomada(Aguinaldo Silva, direo geral Marcos Paulo, TVGlobo, 1997, 20 horas). Borelli associou os ncleos dramticos,plotse at mesmo a caracterizao de personagens e situaes acada um destes gneros. Procedimento que conseguiu ao mapearos fragmentos e situaes onde determinadas estratgias de gnero

    foram acionadas em toda a obra, pois a redundncia, a repetio,a presena de uma estrutura regular ao longo da telenovela soprprias do seu modo de funcionamento. O caminho criado porBorelli18 ajudou, enfim, a buscar critrios de identificao dos g-neros ficcionais nas telenovelas, pois permitiu construir a seguintepergunta: Quais os gneros ficcionais claramente identificados natelenovela, eles esto associados aos ncleos dramticos, ou traamde modo mais abrangente as marcas de composio da maior parte

    destes ncleos? Exemplificando: vamos poder localizar em todasas telenovelas da Tv Globo uma associao das estratgias de co-micidade com determinados ncleos dramticos, ou em algumastelenovelas as estratgias de comicidade no passam apenas detraos de determinados personagens secundrios presentes emncleos fortemente marcados pelas estratgias melodramticas?

    Recomenda-se a leitura do artigo de Borelli neste livro por apresentar esta perspectiva

    de anlise.

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    Em suma, preciso estabelecer uma compreenso maisgeral dos modos de se contar as histrias em cada uma dastelenovelas examinadas buscando identificar quais os ncleosdramticos em ao, como esto articulados e quais as estrat-gias de gnero empregadas em cada uma delas. Procedimentoque indicar com maior preciso os trechos que oferecemmais elementos para o exame dos efeitos, dos materiais e dasestratgias utilizadas. Procedimento que tornar vivel a com-parao de obras dos mesmos realizadores e de realizadoresdiferentes. Procedimento que permitir, inclusive, localizar na

    telenovela, variaes no modo de construo destas estratgias.Isto porque os trechos sero caracterizados a partir de umtratamento cuidadoso da relao deles com o conjunto geralda obra. Procedimento sem dvida essencial para examinar asmarcas autorais dos realizadores.

    Um procedimento que precisou estar associado a todo esteprocesso foi o de identificao e localizao das unidades queconformam uma telenovela, pois a extenso deste tipo de obra

    est associada a serialidade desenvolvida nos captulos dirios, naarticulao entre eles, entre os blocos internos a cada captulo,distribudos por semanas, meses e pelas fases de implantao,desenvolvimento e concluso da histria central e das secund-rias. Cada um dos captulos exibidos, registrados ou no, tem umresumo (de jornal ou revista impressa ou online) caracterizadocom as indicaes gerais de quais personagens, quais momentosda histria, quais os destaques dados, quais os elos de ligao sa-

    lientados. A partir deste material mais um conjunto de hiptesesde localizao das unidades da histria que se deseja analisar assinalado.

    No exerccio realizado com os captulos da primeira sema-na de Mulheres Apaixonadas, Renascer e Terra Nostra localizamosas trajetrias das personagens, o lugar dos protagonistas e dospersonagens das tramas secundrias, o ritmo da exposio dosconflitos, o tempo do seu desenrolar, os enlaces entre os conflitos

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    e personagens durante a primeira semana, comparando com odesenrolar das tramas e os seus desfechos em cada telenovela19.Os resultados deste estudo preliminar construram as hiptesesque iniciaram o tratamento da observao do material audiovisualregistrado.

    Por fim, estes processos de definio do corpus tpico apri-moram um procedimento anterior que formulava como critriode seleo dos fragmentos para examinar as marcas de autoria osmomentos onde o escritor e o diretor geral supostamente tives-sem maior domnio sobre a feitura da obra: quer dizer, os vinte

    captulos iniciais e os vinte finais. Os exerccios de construo docorpus tpico de anlise demonstraram que o mtodo de anlisetextual a ser empregado deve estar associado com os processos derefinamento da localizao do corpus tpico e da compreenso darelao destas unidades com o conjunto da obra. Este processooferece ao investigador as condies para definir um conjunto demomentos da histria e captulos que expressa melhor a dimensoautoral, amplia a visibilidade das mos dos escritores e diretores,

    assim como, se houver, da autoria compartilhada.

    Recomenda-se, mais uma vez, a leitura do artigo de Rodrigo Barreto neste livropois permite observar as diferenas no modo de narrar presentes nos dois primeiroscaptulos de uma telenovela da mesma emissora, exibidas no mesmo horrio, na mesmadcada e com a mesma direo geral de Jayme Monjardim. O artigo apresenta algumashipteses de trabalho sobre as estratgias narrativas particulares dos escritores: Glria

    Peres e Benedito Ruy Barbosa.

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    14 Ago/89a

    31 Mar/90196

    Aguinaldo Silva comRicardo Linhares e

    Ana Maria Moretzsohn

    Adaptao do Roman-ce Tieta do Agreste

    de Jorge Amado.

    Paulo Ubiratan(direo geral),

    Reynaldo Boury eLuiz Fernando Car-

    valho.

    2 Abr/90 a27 Out/90

    177Slvio de Abreu comAlcides Nogueira e

    Jos Antnio de Souza

    Jorge Fernando (dire-o geral),

    Jodelet LarcherRoberto Talma

    (direo executiva)

    29 Out/90a

    17 Mai/91

    173

    Cassiano GabusMendes

    Colaborao deDejair Cardoso,

    Maria Adelaide AmaralLuiz Carlos Fusco (apartir do captulo 20).

    Paulo Ubiratan(direo geral),

    Ricardo Waddingtone

    Reynaldo Boury.Paulo Ubiratan

    (direo executiva)

    20 Mai/91a

    13 Jan/92197

    Gilberto BragaColaborao de

    Ricardo Linhares,Leonor Bassres.

    Apoio de Slvio deAbreu

    Dennis Carvalho(direo geral),

    Mauro MendonaFilho,

    Ricardo Waddington.Ruy Matos

    (direo executiva)

    6 Jan/92 a31 Jul/92

    178

    Aguinaldo Silva comAna Maria Moretz-

    sohn eRicardo Linhares.Colaborao deMrcia Prates

    e Flvio de Campos.

    Paulo Ubiratan(direo geral),Gonzaga Blota,Luiz Fernando

    Carvalho eRuy Matos

    (direo de produo)

    * O termo Horrio das 20h utilizado aqui para as telenovelas exibidas, de segunda

    a sbado, pela TV Globo, apesar de sua impreciso.

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    3 Ago/92 a5 Mar/93

    185 Glria Perez

    Roberto Talma(direo geral),Fbio Sabag eIvan Zettel.

    talo Granato(direo de produo)

    8 Mar/93 a13 Nov/93 213

    Benedito Ruy Barbosacolaborao de

    Edmara Barbosa eEdilene Barbosa.

    Luiz Fernando Car-valho (direo geral),

    Mauro MendonaFilho e

    Emlio Di Biase.Roberto Talma (dire-

    o artstica)Ruy Matos (direo

    de produo)

    15 Nov/93a

    15 Jul/94221

    Aguinaldo Silva comRicardo Linhares e

    Ana Maria Moretzsohn

    Colaborao deFlvio de Campos e

    Marcia Prates.

    Enredo inspirado nouniverso ficcional deLima Barreto, maisespecificamente nosromances Clara dos

    Anjos, Recordaes

    do Escrivo IsaasCaminha, Triste Fimde Policarpo Quares-

    ma, Vida e Morte deM.J. Gonzaga de Se um personagem doscontos Nova Califr-nia e O homem que

    sabia Javans.

    Dnis Carvalho (dire-o geral)

    Marcos Paulo,Carlos Magalhes,

    Paulo Ubiratan(direo artstica)

    Ruy Matos

    (direo de produo)

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    18 Jul/94a

    10 Mar/95203

    Gilberto BragaColaborao de

    Alcides Nogueira,Srgio Marques ,

    ngela Carneiro eLeonor Bassres.

    Dennis Carvalho(direo geral),

    Alexandre Avancini ,Ary Coslov, Roberto

    Naar.Paulo Ubiratan

    (direo artstica)Eduardo Figueira

    (direo de produo)

    13 Mar/95a

    3 Nov/95203

    Slvio de AbreuColaborao de

    Alcides Nogueira eMaria Adelaide

    Amaral.

    Jorge Fernando (dire-

    o geral),Marcelo Travesso e

    Rogrio GomesPaulo Ubiratan

    (direo artstica)talo Granato

    (direo de produo)

    6 Nov/95a

    3 Mai/96185 Glria Perez

    Dennis Carvalho(direo geral)

    Ary Coslov, CarlosArajo

    Ruy Matos(direo de produo)

    Ncleo PauloUbiratan

    6 Mai/96a

    14 Jun/96

    35Dias Gomes

    Colaborao de

    Ferreira Gullar

    Paulo Ubiratan(direo peral)Gonzaga Blota

    Ruy Matos

    (direo de produo)Ncleo Paulo

    Ubiratan

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    17 Jun/96a

    14 Fev/97209

    Benedito Ruy Barbosacolaborao de

    Edmara Barbosa eEdilene Barbosa.

    Luiz Fernando Car-valho (direo geral),

    Carlos Arajo,Emlio Di Biase e

    Jos Lus VillamarinRuy Matos

    (direo de produo)Ncleo Luiz Fernan-

    do Carvalho

    17 Fev/97a

    10 Out/97203

    Aguinaldo Silva comRicardo Linhares,Colaborao deNelson Nadotti,Marcia Prates e

    Maria Elisa Berredo.

    Paulo Ubiratan

    (direo geral),Luiz Henrique Rios,

    Marcos Paulo eRoberto Naar.talo Granato

    (direo de produo)Ncleo Paulo Ubi-

    ratan

    13 Out/97a

    22 Mai/98191

    Manoel CarlosColaborao de

    Vincius Vianna,Letcia Dornelles,Maria Carolina.

    Paulo Ubiratan (dire-o geral)

    Ricardo WaddingtonAlexandre Avancini ,

    Edson Spinello.Ruy Matos

    (direo de produo)Ncleo Paulo

    Ubiratan.

    25 Mai/98a

    15 Jan/99203

    Slvio de AbreuColaborao deBosco Brasil e

    Alcides Nogueira

    Denise Saraceni(direo geral)

    Carlos Arajo,Paulo Silvestrini,

    Jos Luiz VillamarinNcleo Carlos Manga

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    18 Jan/99a

    17 Set/99209

    Aguinaldo Silva comFernando Rebello,

    Filipe Miguez,ngela Carneiro,

    Maria Helena Nasci-mento,

    Colaborao deMarlia Garcia.

    Inspirada na peaRei Lear de William

    Shakespeare.

    Daniel Filho eRicardo Waddington

    (direo geral),Alexandre Avancini ,Marcos Schechtman,

    Moacyr Ges.Ruy Matos

    (direo de produo)Ncleo RicardoWaddington

    20 Set/99a

    2 Jun/00221

    Benedito Ruy Barbosacolaborao de

    Edilene Barbosa eEdmara Barbosa.

    Jayme Monjardim(direo geral),

    Carlos Magalhese Marcelo Travesso.

    Ruy Matos(direo de produo)Ncleo Jayme Mon-

    jardin

    5 Jun/00a

    2 Fev/01209

    Manoel Carloscolaborao deFausto Galvo,

    Vincius Vianna,Flvia Lins e Silva,

    Maria Carolina.

    Ricardo Waddington(direo geral),

    Marcos Schechtman,Moacyr Ges,

    Rogrio GomesLeandro Nri

    Csar RodriguesRuy Matos

    (direo de produo)Ncleo Ricardo

    Waddington

    5 Fev/01a

    28 Set/01203

    Aguinaldo Silva comRicardo Linhares.

    Adaptao livre dasobras Mar Mortoe A descoberta da

    Amrica pelos turcosdo escritor Jorge

    Amado.

    Marcos Paulo(direo geral)Roberto Naar

    Fabrcio MambertiLuciano Sabino

    Csar Lino(direo de produo)Ncleo Marcos Paulo

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    1 Out/01a

    14 Jun/02221 Glria Perez

    Jayme Monjardim(direo geral)

    Marcos Schechtman.Mrio Marcio Ban-

    darraTeresa LampreiaMarcelo TravessoGuilherme Bokel

    (direo de produo)Ncleo Jayme Mon-

    jardim

    17 Jun/02a

    14 Fev/03209

    Benedito Ruy Barbosacolaborao de

    Edmara Barbosa eEdilene Barbosa

    A partir do captulo147, Walcyr Carrasco

    assumiu a autoria,substituindo Benedito

    Ruy Barbosa

    Luiz FernandoCarvalho

    (direo geral)Carlos Arajo

    Emlio Di Biase eMarcelo Travesso.

    Csar Lino(direo de produo)Ncleo Luiz Fernan-

    do Carvalho

    17 Fev/03a

    Out/03203

    Manoel CarlosColaborao deMaria Carolina,Fausto Galvo,Vincius Viana

    Ricardo Waddington(direo geral)

    Rogrio Gomes,Jos Luiz Villamarim,

    Ary CoslovFlavio Nascimento

    (direo de produo)Ncleo Ricardo

    Waddington

    FontesArquivos do acervo do Grupo de Pesquisa A-tev (PosCom-UFBa). Dados coletados em sites da emissora Tv Globo; jornaisimpressos e on-line O Globo; Jornal do Brasil; Folha de So Pauloe Dicionrio da TV Globo (2003).

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    Se para J. Y. Tadi (1982), I. Calvino (1993) e A. VincentBuffault (1994) a aventura, o erotismo e as lgrimas do melodrama configuram a essencialidade da fico, para Mikhail Bakhtin(1987) a comicidade, o riso compem a essncia da ficcionalidadepopular. Em sua j clssica reflexo sobre a obra de Rabelais, Bakhtinresgata a histria do riso e trabalha com elementos da carnavaliza-o do cotidiano nos contextos da cultura e da literatura populardo XVI; sua anlise permite considerar que esses elementos se

    encontram ainda presentes em inmeras manifestaes popularesde massa na atualidade. A pardia, a stira e o realismo grotescodespontam, em Rabelais, em meio a cenrios vinculados ao banquete- em que abundncia e excesso se manifestam pelos atos de comermuito e beber em demasia - e expressos em marcantes imagens

    Uma verso preliminar deste texto est parcialmente publicada em: LOPES, M. I. V;BORELLI, S. H. S. e RESENDE, V. Vivendo com a telenovela. Mediaes, recepo, teleficcio-

    nalidade. So Paulo: Summus, 2002.

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    reveladoras do baixo corporal. Com este inventrio Bakhtin qualifica acomicidade enquanto gnero popular, enquanto forma de expressooposta quela da cultura medieval oficial, eclesistica e feudal. Soesses mesmos elementos que permitem a Bakhtin esclarecer que acomicidade no homognea; pelo contrrio, explicita-se em suaplena diversificao: o bufo, o burlesco e o grotesco apresentam-secomo categorias diferenciadas dentro de um padro mais amplo eexpressam momentos variados do processo cultural diversificado.Alm disso, a perspectiva bakhtiniana de anlise da cultura abreuma brecha metodolgica de incorporao e transposio dos

    tradicionais referenciais da comicidade do XVI para a atualidade.Vale a pena ressaltar que inmeros traos da comicidade originalencontram-se em manifestaes culturais nos campos da literatura,circo, teatro, televiso e cinema contemporneos.

    A comicidade manifesta-se em A Indomada no s no tomadotado mas tambm, como afirma Aguinaldo Silva:

    ...nas situaes hilariantes como a brincadeira de colocar todo mundo

    falando ingls com sotaque nordests (...) A novela tem um p nacomdia; a gente procura dar um tratamento de humor s situaes,mesmo s mais dramticas, porque acreditamos que o espectador gostamais assim (SinopseA Indomada: 5-6).

    Para reiterar, so vrios os depoimentos de receptores, quereforam os traos da comicidade expressos na proposta de falar

    ingls com sotaque nordests:

    Tinha uma cidade, que parece que era no nordeste, mas eles falavamengraado meio ingls, meio portugus com sotaque do nordeste. Isto eramesmo muito engraado(Tati, Famlia 3, ES).

    Ah, eu acho que o sotaque n, meio... meio ingls assim, acho que, seil, eu achava engraado certas coisas, certas palavras, meio bizarro

    (Beatriz, Famlia 4, ES).

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    O que pegava mesmo, e que eu dava risada, era que tinha o sotaque:era muito engraado, era uma coisa bastante diferente (Paula,Famlia 4, ES).

    Uma das cenas recorrentes, apontadas por vrios dos entre-vistados, como caracterstica da comdia a do raio que cai na cabeada Altiva:

    Agora: bvio que tem o lado cmico que seria o da prpria Altiva, nas brigascom o padre, no raio que cai em sua cabea... (Cristiane, Famlia 3, EG).

    O casamento no aconteceu, mas aconteceu uma coisa ao contrrio doque aconteceu da primeira vez. Em vez do raio cair na igreja, caiu emcima da Altiva: a foi fogo para todo lado, crucifixo... ela ficou dandochoque. O mdico...Como que era o nome daquela menina? Daquelaabestalhada do emprio, aquela loirinha ... a Berbela foi tocar nela e

    tomou choque; depois o Beraldo tambm tomou choque. Mas a quandoo mdico chegou j tinha passado(Lurdinha, Famlia 1, HV)

    Tem tambm a cena que a Altiva levou um raio em cima da cabea,mas meu Deus do cu, parece uma comdia (...) engraado o guardagordo... Se cagava de medo quando era lua cheia, noite de lua cheia. Odelegado Motinha saiu, ele saiu de dia e s voltou no dia seguinte, masesse homem se cagou de medo. Ele corria para a delegacia com medo doCadeirudo. Ele morria de medo do Cadeirudo, com medo de atacar ele..(Fernanda, Famlia 1, EG).

    O padre Jos apontado, em vrios depoimentos, como umatpica personagem cmica:

    Tem o padre Jos; quando a Altiva ameaa, ele fala: Eu vou

    mostrar meu bundo. Mas eu dou tanta risada, dou tanta ri-

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    sada... eu, minha me e a Sheila, morremos de rir! (Fernanda,Famlia 1, EG).

    Primeiro que ele um padre que uma piada, ele tem um litro dewhisky na sacristia, ele bate o maior papo com a imagem da santae bebe. Toda vez que ele vai no British Club, ele toma o whiskynhodele e oferece, sei l, faz uma reverncia e bebe. Mas eu diria que ele autntico, eu acho que ele faria isso dessa forma assumida at nafrente do papa ou do bispo, na frente de quem estiver (Cristiane,Famlia 3, EG).

    Outras cenas, personagens e relaes so tambm reconheci-das como pertencentes ao mesmo territrio de ficcionalidade:

    Ah! Cmico tinha muito n? Quando o Pitgoras falava, voctinha que dar risada, porque do jeito que ele agia; mesmo, a juza

    Mirandinha com aquele namorado dela n? A gente dava risada...(Jo