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A APRENDIZAGENS DO CINEMA DE ANIMAÇÃO COMO RECURSO PEDAGÓGICO PARA O LICENCIANDO DO CURSO DE HISTÓRIA Bruno Ferreira UFTM Email: [email protected] Suzane Brochine UFTM Email: [email protected] Váldina Gonçalves da Costa UFTM Email: [email protected] GT: 06 Agência Financiadora: FAPEMIG / MEC/FNDE Resumo Frente ao atual contexto tecnológico, com grande número de informações dispostas na Web, apropriar-se desse meio de comunicação e informação no contexto escolar e na formação de professores faz-se necessário. Dentre os conteúdos disponíveis na Web, os vídeos são utilizados com muita frequência, inclusive no espaço da escola. Nesse sentido, buscou-se investigar as possíveis aprendizagens desenvolvidas na produção de vídeos a partir de oficinas sobre cinema de animação como recurso pedagógico para a sala de aula. Os referenciais teóricos utilizados sobre cinema Pereira para discussão da estética do cinema; Cruz que aborda conceitos de fotografia aplicados à cinematografia, Napolitano que apresenta questões relacionadas ao cinema na educação, entre outros. A metodologia utilizada na produção dos filmes seguiu as etapas descritas por Kindem e Musburger (pré- produção, produção e pós-produção) com uma etapa anterior à pré-produção para contextualizar a linguagem cinematográfica de cenário, iluminação, movimento de câmera, sonoplastia, quantidade de fotos e outros aspectos relevantes. Os resultados expressaram-se na forma de três filmes produzidos por licenciandos do curso de História da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. A pesquisa revelou que as aprendizagens desenvolvidas na produção dos vídeos dizem respeito ao nível da estética, técnica, representação e comunicação. Destaca-se também a imaginação como ferramenta para a produção dos vídeos buscando dar vida a fatos históricos. Palavras-chave: Cinema de Animação. Aprendizagens. Recurso Pedagógico.

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A APRENDIZAGENS DO CINEMA DE ANIMAÇÃO COMO

RECURSO PEDAGÓGICO PARA O LICENCIANDO DO CURSO DE

HISTÓRIA

Bruno Ferreira

UFTM

Email: [email protected]

Suzane Brochine

UFTM

Email: [email protected]

Váldina Gonçalves da Costa

UFTM

Email: [email protected]

GT: 06

Agência Financiadora: FAPEMIG / MEC/FNDE

Resumo

Frente ao atual contexto tecnológico, com grande número de informações dispostas na

Web, apropriar-se desse meio de comunicação e informação no contexto escolar e na

formação de professores faz-se necessário. Dentre os conteúdos disponíveis na Web, os

vídeos são utilizados com muita frequência, inclusive no espaço da escola. Nesse sentido,

buscou-se investigar as possíveis aprendizagens desenvolvidas na produção de vídeos a

partir de oficinas sobre cinema de animação como recurso pedagógico para a sala de aula.

Os referenciais teóricos utilizados sobre cinema Pereira para discussão da estética do

cinema; Cruz que aborda conceitos de fotografia aplicados à cinematografia, Napolitano

que apresenta questões relacionadas ao cinema na educação, entre outros. A metodologia

utilizada na produção dos filmes seguiu as etapas descritas por Kindem e Musburger (pré-

produção, produção e pós-produção) com uma etapa anterior à pré-produção para

contextualizar a linguagem cinematográfica de cenário, iluminação, movimento de

câmera, sonoplastia, quantidade de fotos e outros aspectos relevantes. Os resultados

expressaram-se na forma de três filmes produzidos por licenciandos do curso de História

da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. A pesquisa revelou que as aprendizagens

desenvolvidas na produção dos vídeos dizem respeito ao nível da estética, técnica,

representação e comunicação. Destaca-se também a imaginação como ferramenta para a

produção dos vídeos buscando dar vida a fatos históricos.

Palavras-chave: Cinema de Animação. Aprendizagens. Recurso Pedagógico.

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Introdução

Os recursos audiovisuais, em especial na era tecnológica a qual estamos

submetidos, têm recebido destaque crescente na educação. Tal destaque, porém, não é

exagerado, uma vez compreendida a necessidade de mudança na educação e o potencial

papel destes recursos nesta transformação. Como afirma Ribeiro Júnior (2011, p. 5), “[...],

fica evidente que a cultura audiovisual possui um potencial de transformação quando

aplicada ao processo de educação escolar”. Entretanto, é preciso dizer que estes recursos

não podem ser tomados como exclusivos, no sentido de que, sozinhos não são capazes de

modificar o processo de ensino aprendizagem. É óbvia a necessidade de que outras

mudanças se operem na educação, ainda que, aqui, tratemos de uma única unidade

potencial.

Retomando, então, a mudança do processo educacional, concordamos com

Candau (2005) quando afirma a efetiva necessidade de que a escola se transforme e seja

reinventada, passando a ser concebida como um

[...] espaço de busca, construção, diálogo e confronto, prazer, desafio,

conquista de espaço, descoberta de diferentes possibilidades de expressão e

linguagem, aventura, organização cidadã, afirmação da dimensão ética e

política de todo processo educativo. (CANDAU, 2005, p. 15).

Entre os maiores desafios que impedem a concretude desta visão da escola

afirma a autora que há pouca comunicação real entre educador e educando, entre o

conhecimento e a curiosidade epistemológica do aluno. Deste modo, é preciso propor

novas maneiras, viáveis, de se estabelecer uma comunicação efetiva com os educandos,

de modo que o processo de ensino aprendizagem seja alçado a um nível de reflexão

abstrata do conhecimento, capaz de levar ao aluno à construção do saber. Como propõe

Freire (1996, p. 47), “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades

para a sua própria produção ou a sua construção”, ou seja, a Educação, enquanto processo,

deve incluir o educando numa aprendizagem não apenas expositiva/receptiva, mas sim

possibilitar sua construção, sua reflexão.

Em relação às tecnologias Saad (2011, p.9) afirma que

[...]a resistência de alguns professores às tecnologias é ainda

um agravante no processo ensino-aprendizagem. O professor

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com resistência está sendo compelido a se modificar pelas

pressões que os alunos, a sociedade e a direção fazem. Os

alunos excluem o professor que não brilha em suas aulas

utilizando tecnologias disponíveis.

Para o autor, essa resistência por parte dos professores muitas vezes deve-se ao

medo de que as novas tecnologias possam substituir seu posto, não a vendo como aliada

para executar sua aula. Há também o fato de os professores estarem em uma zona de

conforto que os impede de ver a mudança constante no perfil de seus alunos, que cada

vez mais estão diante de novas tecnologias, que são atrativas para eles.

Nesse cenário, incentivar a verem a real intenção dos novos recursos, e suas

possibilidades para melhorar a interação professor-aluno, bem como se adequar às

tecnologias que estão presentes em nosso cotidiano, se faz necessário e o mais importante:

entender que são recursos para auxiliar sua aula, e não substituir seu trabalho como

docente.

Assim, os recursos audiovisuais, como os demais recursos didático-pedagógicos,

são ferramentas potenciais, embora não exclusivas, na busca de se preencher as falhas da

educação tradicionalista, ou seja,

[...] com a utilização de recursos didático-pedagógicos, pensa-se em preencher

as lacunas que o ensino tradicional geralmente deixa, e com isso, além de expor

o conteúdo de uma forma diferenciada, fazer dos alunos participantes do

processo de aprendizagem. (CASTOLDI; POLINARSKI, 2009, p. 68).

Cabe lembrar que o recurso por si só não gera conhecimento, é preciso saber

propor atividades que provoquem a investigação. É nesse contexto que pensamos em

mídias de grande alcance, como o cinema. Assim propusemos o uso do stop motion para

os licenciandos do Programa de Educação Tutorial (PET) História e Conexões de Saberes

para o ensino, destacando a importância da cinematografia nos filmes de animação aliados

a diversas aprendizagens, intrínsecas ao processo de criação. Mas o que é stop motion?

A técnica de animação denominada stop motion “(...) consiste em tirar uma série

de fotografias e depois reproduzi-las em sequência criando a ilusão de movimento com a

ajuda de um programa do computador.” (BOSSLER; LOPES; NASCIMENTO, 2010,

p.4). Ou seja, a ilusão do movimento é criada a partir de imagens fixas vistas rapidamente.

Por meio do uso da técnica de stop motion,

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[...] aliamos a arte, ao uso criativo, e muitas vezes crítico, das tecnologias de

informação e comunicação. Atualmente as tecnologias de informação e

comunicação, a imaginação e a criação são elementos essenciais para os

desafios que muitas vezes parecem mais problemas insolúveis do que

oportunidades. (BOSSLER; LINHARES; CALDEIRA, 2013, p. 2).

Esse recurso, aliado ao potencial tecnológico atual, pode apresentar uma

perspectiva renovadora para o ensino, contribuindo para uma visão mais efetiva do

processo educativo, uma vez que possibilita uma interação mais significativa entre o

educando e o saber, onde o que parece ser brincadeira pode contribuir muito para o ensino.

Além dessa perspectiva promotora da construção do conhecimento, o stop

motion também proporciona, à prática educativa, uma quebra da mesmice catastrófica a

qual se reduziu o exercício de ensinar e aprender nos dias atuais. Isso porque, o stop

motion, enquanto prática que exige o fazer propriamente dito, exige também a interação,

a troca de conhecimentos, o diálogo, o que eleva a prática a uma condição de ludicidade

fundamental.

Dessa forma este estudo investigou as possíveis aprendizagens desenvolvidas

pelos estudantes do PET História na produção de vídeos a partir de oficinas sobre cinema

de animação a ser utilizado como recurso pedagógico.

Referencial Teórico

Incluir novas técnicas e métodos na formação de professores, buscando em um

segundo momento, também evidenciá-las durante a formação do aluno é pertinente na

atualidade e deve ser tratado com a devida importância. Diante de análises sobre a atuação

da escola frente as mudanças e atualizações da sociedade, detecta-se um ensino previsível,

muitas vezes tradicional, contrário ao caminhar da sociedade. As práticas vigentes nas

escolas, por vezes demonstram sua incompatibilidade com o contexto histórico-social,

possuidor de rápidas transformações em diversos aspectos, tornando evidente a

necessidade de utilizar novas linguagens e procedimentos, incluindo aqui ferramentas de

natureza tecnológica, nesse estudo as mídias.

As mídias se apresentam em diversos formatos (desde jornais, folhetos

informativos, fotografias, imagens na internet, filmes e uma infinidade) grande parte

possui um ponto em comum, utilizam estímulos visuais, imagens, que dialogam conosco

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o tempo todo, informando, trocando ideias, conectando culturas. Porém para compreender

as mensagens que as mídias veiculam através das imagens necessitamos interpretar o que

são estas imagens e o que são estas mídias, já que ambas foram criadas dentro de

determinadas concepções, dentro de uma ideologia, de forma não neutra (PEREIRA,

2011).

Desta forma, acreditamos que o corpo constituinte da escola poderia pensar num

trabalho com mídias, visto sua capacidade de desencadear diferentes reflexões, auxiliar

no processo de criação, e por esta característica, ampliar a visão do indivíduo, tornando

possível diversas leituras do mundo, atravessando o campo da crítica, sensibilidade e

imaginação.

Assim, enxergar as mídias como recursos pedagógicos e apropriar-se de seus

benefícios, traria a possibilidade de manter a escola a sociedade no mesmo tempo e

espaço, compartilhando as mesmas ferramentas e linguagens. Pensando no contexto da

escola, as mídias auxiliam na contextualização do ensino, bem como no desenvolvimento

do pensamento crítico e também na autonomia, o que contribui para melhorar a

aprendizagem e a construção do conhecimento.

Não é possível para um professor trabalhar com todas as mídias, mas é possível

escolher a que atinja grande parte do seu público. Visto dessa forma a produção

cinematográfica é uma ótima escolha, que contempla diferentes aspectos: a) trabalha

diretamente e como principal componente a imagem, muito difundida e por vezes pouco

compreendida; b) é uma linguagem universal, já estamos familiarizados com seus

truques, já fomos “alfabetizados” por esta linguagem sem perceber (RAMOS, 2009),

consequência da sua superexposição durante muitos anos. O autor nos dá um exemplo

claro de como entendemos estes truques muitas vezes sem perceber:

[...] um homem e uma mulher estão se casando, há um corte para a próxima

cena e vemos o mesmo casal alguns anos mais velho e com três crianças

brincando ao redor em um quintal meio apertado. Nada é preciso que seja dito

para que saibamos que o tempo passou entre uma cena e outra. (RAMOS, 2009,

p.78)

Por estes motivos o cinema já apresenta um vasto campo para se trabalhar, um

campo já experimentado pelo sujeito, que já reconhece alguns aspectos ou precisa de

orientações sutis para percebê-los. Algumas aprendizagens contidas na produção de um

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filme passam pelas dimensões da estética, técnica, comunicação, representação, além de

contribuir para o desenvolvimento da autonomia contida na produção. Esta autonomia

possibilita ao sujeito produzir conhecimento sobre ‘o que cria enquanto cria’,

estabelecendo um diálogo com a arte, agregando valores e dando significados para o que

foi proposto, procurando corresponder ao que foi pedido, e para além disso, deixando sua

marca pessoal na produção (PEREIRA, 2011). São estas aprendizagens que buscamos

diagnosticar nas produções concebidas na oficina realizada.

Napolitano (2009), importante pesquisador desta área, contextualiza o cinema

como uma das experiências sociais mais fortes da sociedade, desde as primeiras décadas

do século XX, contando com a contribuição da TV no final dos anos 40, ambos

construídos em espaços de lutas sociais, culturais e políticas, objetos de disputas

econômicas, veículos de inculcação ideológica e de projeções de utopias e sentimentos,

ou seja, possuem força para transmitir informações, criar discussões e gerar

posicionamentos.

Outra característica do cinema é sua capacidade de dialogar e incluir outras

linguagens (teatro, livros, quadros, quadrinhos), de uma forma própria, que se apoia em

características inerentes: o movimento das imagens; o fracionamento das cenas

produzidas, chamado decupagem; e a montagem, ato de ordenar as cenas decupadas. A

interação destes recursos tem o poder de direcionar o olhar e entendimento do espectador,

na ordem das cenas escolhidas, sem que o indivíduo se perca na história, expressando o

que Ramos (2009) denomina a alma do cinema.

De acordo com o surgimento destes recursos o cinema passou a possuir linguagem

própria, marcada pela manipulação da imagem captada, de acordo com a ideologia,

cultura, sentimentos e o que mais estiver envolvido em sua produção. Logo, se for desejo

do professor criar um filme para trabalhar com a sala, ele possui a capacidade de incluir

no roteiro pontos que deseja discutir, na ordem que deseja, dialogando com o que achar

relevante, tomando cuidado para não cometer exageros ou equívocos.

Dentre os gêneros do cinema, destacamos o cinema de animação, que possui todas

as características assumidas pelo cinema descritas até o momento e conta ainda com

outras possibilidades. Dentre estas possibilidades destacam-se a capacidade de usar o

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lúdico, associado com desenhos animados e/ou tratar assuntos com olhares críticos e

seriedade. Nada impede que estes aspectos sejam trabalhados juntos, na mesma produção,

o que dependerá das intenções de quem dirige a produção, ou seja, é versátil, com ele

podemos representar mundos de fantasias ou fatos históricos, ou qualquer assunto que

seja possível ser representado por meio de imagens.

Atualmente o cinema de animação pode ser produzido no formato de Computer-

Generated Imagery (CGI), por meio de computação gráfica e no formato de stop motion

ou pela interação de ambos dentro de uma mesma produção. Porém trabalhar com stop

motion na sala de aula é mais simples que com CGI que requer conhecimentos mais

específicos na área da computação gráfica e recursos refinados. Conseguir os recursos

necessários para o stop motion não é difícil, esses podem ser câmera, tripé, computador

com editor e qualquer material que possa atuar nas cenas, tais como sucata, massinha,

entre outros. Para a produção é imprescindível um editor de vídeo, a câmera pode ser

substituída por um celular com câmera e o tripé, por exemplo, um cabo de vassoura

improvisado. A imaginação já começa a ser trabalhada a partir destas escolhas e

improvisações, caso sejam necessárias. Vale dizer que para além destas facilidades o stop

motion traz consigo uma beleza própria: a maior parte de sua produção é feito pelas mãos

de quem o cria, literalmente, conforme nos mostra Priebe (2011, p. xvii) citado por Traldi

e Zuanon (2012, p. 3): “A animação stop motion está nas mãos das pessoas.”

Metodologia

Apresentamos o cinema de animação procurando expor para o licenciando do

curso de História conceitos que tornariam possível desenvolver as aprendizagens nas

dimensões da técnica, estética, representação e comunicação, ou seja que possibilitassem

ao licenciando saber como produzir os movimentos e editá-los; como construir a cena,

definindo padrões e proporções; como evidenciar e representar de forma artística o que é

almejado; e quais as linguagens utilizadas para atingir o que se espera. Dar importância a

estas dimensões e procurar desenvolvê-las é ensinar ao sujeito não apenas a ver, e sim

enxergar e ser capaz de discutir o que o filme tem a dizer. Dar esta consciência é permitir

que o aluno se aproprie desta linguagem e possua autonomia para transmitir suas próprias

mensagens, criando seus filmes, cenários, personagens, dialogando com palavras ou

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imagens, controlando e viajando no tempo. A sensibilidade para compreender outros

meios de comunicação vem como consequência, diante da capacidade, já comentada, do

cinema em dialogar e incluir outras mídias durante sua construção.

A produção de filmes foi realizada com os alunos do PET História da UFTM,

por meio de oficinas organizadas em três encontros. A metodologia utilizada nas oficinas

seguiu as etapas descritas por Kindem e Musburger (1997): pré-produção, produção e

pós-produção. Antes destas etapas foi feita uma introdução a linguagem cinematográfica

na qual foram discutidos os conceitos de: cenário, iluminação, movimento de câmera,

sonoplastia e enquadramento.

A pré-produção consiste na preparação, planejamento e projeto do vídeo a ser

produzido, ou seja, desde a concepção da ideia inicial até a filmagem. Divididos em três

grupos, os estudantes escolheram um tema do campo da História, produziram o roteiro e

criaram os cenários e seus personagens.

A produção é a etapa em que são feitas as cenas que irão compor o vídeo, feitas

em tomadas, ou seja, com intervalos de tempo entre o início e o término de cada gravação.

Essas tomadas vão compor uma cena e as várias cenas no seu conjunto formarão o filme.

Nessa etapa os estudantes, com auxílio da câmera fotográfica e o tripé, tiraram fotos do

cenário construindo suas histórias.

A pós-produção é a etapa na qual é feita a edição e a organização das tomadas

gravadas para a composição das cenas e do vídeo como um todo. Nesse momento cada

grupo editou seu filme utilizando software Movie Maker e apresentou aos demais.

Resultados

Após todo o desenvolvimento da pré-produção, produção e pós-produção os

produtos finais da oficina expressaram-se na forma de três curtas, intitulados

“Holocausto”, “Cultura Afro-brasileira” e “O imaginário da travessia” todos abordando

fatos históricos de diferentes períodos.

Analisamos todos os filmes procurando pontuar quais as dimensões presentes

buscando exemplificar, também procuramos mostrar a forma como eles interagem e

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interferem na produção e a importância desta interação para a desenvoltura do filme,

mostrando como estão diretamente relacionados.

No vídeo “Holocausto” destacam-se as dimensões da estética e da representação.

A escolha do cenário monocromático, na cor preta, representou a ideia de um clima

pesado, que juntamente com os diversos ângulos utilizados no momento da fotografia e

os efeitos adicionados na hora da edição, deixaram expresso o ar de loucura. Além disso,

o contraste das roupas dos personagens - judeus e Adolf Hitler, ajudou a evidenciar a

personalidade dos sujeitos reforçando a dimensão da representação, pois utilizaram nos

judeus roupas claras (azul e branco) e em Hitler, uma farda negra. Uma integrante do

grupo mostrou destreza para confeccionar os bonecos, os judeus foram feitos sem rostos

(figura 01), representando a totalidade deste grupo. Hitler foi representado no filme com

suas famosas características (figura 04), dando a certeza de quem se tratava. Os bonecos

também ajudaram a retratar a ideia do Holocausto sem as imagens violentas trazidas pelos

documentários.

A técnica que o grupo usou para a movimentação dos bonecos foi uma haste longa

de metal (figura 03), presa ao corpo dos bonecos. Porém, estas hastes apareciam todo o

tempo, o que atrapalhou a estética e tirou um pouco da “vida” dos personagens, já que

eles não se movimentavam sozinhos, claramente alguém os movimentava.

A representação reforçou a comunicação, pois utilizou elementos presentes em

desenhos animados (figura 02) e histórias em quadrinhos (figura 04)acentuando condição

e impressão – a condição de morte ao colocarem um X no lugar dos olhos dos judeus e a

impressão de multidão ao usarem diversos balões expressando a fala: Heil Hitler!.

Também utilizaram a imagem de uma suástica e uma caveira que trazem, por si só, muitos

significados, e no vídeo tiveram a função de ancorar as legendas.

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Figura 01 – cena do filme Figura 02 – cena do filme

Figura 03 – cena do filme Figura 04 – cena do filme

O curta “Cultura Afro-Brasileira” revela que erros e limitações da técnica podem

produzir novas decisões e mudar o inicialmente pensado. Neste caso a intenção do grupo

era reproduzir uma roda de capoeira, porém durante o desenvolvimento perceberam a

complexidade em produzir os movimentos propostos. Destacam-se nesse cenário a

fragilidade dos bonecos construídos, o que resultou na simplificação dos movimentos e

na adaptação do roteiro: de uma roda de capoeira para um afro brasileiro tocando atabaque

(figura 05). O cenário criado foi rico, possuía profundidade e muitos detalhes que

representavam ou sugeriam o cotidiano dos personagens (panelas, ferramentas,

plantações...) mas não foi explorado nas filmagens. Cabe destacar também que o grupo

deixou a câmera parada por muito tempo na mesma cena modificando apenas em dois

breves momentos (figura 06 e 07).

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Figura 05 – cena do filme

Figura 06 – cena do filme Figura 07 – cena do filme

O vídeo sobre “O imaginário da travessia” trouxe um caminho que não foi

explorado pelos outros grupos e deu vida a seus barcos feitos de papel. A escolha dos

objetos que iriam movimentar fez diferença, suas caravelas feitas por meio de origami

deslizavam facilmente pelo cenário, produzindo um efeito real de movimento (figura 08).

Além disso, o grupo dividi a história em duas partes, a primeira utilizando a narrativa de

uma carta de conteúdo original escrita ao rei (figura 09) , narrando o desaparecimento de

uma de suas embarcações e, em seguida, as imagens representavam o que as cartas

diziam. Na segunda parte representaram o imaginário, do que supostamente aconteceu

com a caravela (figura 10). Neste momento, os movimentos atingiram níveis diferentes

dos outros grupos, como a expressão facial de um dos tripulantes, que antes de ser

devorado por um monstro do mar faz uma face de espanto, controlada pela abertura da

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boca e o recurso sonoro de um grito (figura 11). No âmbito da dimensão estética há

problemas no cenário, com elementos que não respeitaram as devidas proporções, tais

como o tamanho da ilha e dos barcos (figura 08).

Figura 08 – cena do filme Figura 09 – cena do filme

Figura 10 – cena do filme Figura 11 – cena do filme

Conclusão

Compreender as linguagens envolvidas em uma produção cinematográfica

significa aprender a escrever em outra língua, não apenas palavras, mas utilizando

imagens e sons, por meio de um instrumento multimídia. Essas outras maneiras de

escrever são bem difundidas atualmente e chamam a atenção dos estudantes, motivo pelo

qual deveriam ser mais utilizadas. Muitas competências estão envolvidas neste processo,

os grupos por vezes precisaram mudar o rumo do que haviam pensado a princípio,

buscaram soluções pensando em conjunto e tomaram novas decisões. Souberam explorar

muito bem as capacidades individuais de cada um e dividir o trabalho, na produção de

bonecos, desenhos e na edição dos filmes. Todos precisaram ser práticos e rápidos para

concluir o trabalho dentro do prazo da oficina.

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Apropriar-se da estética, técnica, comunicação, representação, significa olhar de

outra forma para as expressões que nos rodeiam, sejam elas artísticas, culturais, sociais,

publicitárias e, ter condições de criar argumentos e se posicionar diante delas. Fato que

não aconteceu com os grupos. No momento que abrimos para a discussão das produções

e indagamos as escolhas do cenário, das cores e ângulos muitos justificaram como

coincidência, que não tiveram exatamente a intenção, e num segundo momento

concordaram que os resultados expressaram mais do que eles tinham em mente. Isso pode

ser fruto da grande exposição ao cinema e a pouca reflexão sobre o mesmo, tornando tudo

muito automático. Neste caso os alunos fizeram escolhas automáticas, que deram mais

sentido ao filme, mas não tiveram esta consciência. Isso reforça o quanto o cinema está

difundido no cotidiano das pessoas.

O cinema é apenas um dos instrumentos que pode ser utilizado no contexto da sala

de aula, existem muitos outros. Entretanto, por possuir capacidade de incluir diversas

mídias, quando manipulado com consciência pode atingir grandes públicos e construir

vários conhecimentos, razão pela qual deveria ser mais utilizado na Educação. Aplicar

oficinas com esse tema na formação de professores é importante para desenvolver esta

linguagem e fazer com que os professores passem pelo processo e o compreenda, para

poder desenvolver trabalhos conscientes e efetivos com esta ferramenta.

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