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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM LENI DIAS DE SOUSA ERDEI A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA ANÁLISE ENUNCIATIVO-DISCURSIVA BAKHTINIANA CUIABÁ MT 2014

A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE LINGUAGENS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM

LENI DIAS DE SOUSA ERDEI

A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

ANÁLISE ENUNCIATIVO-DISCURSIVA BAKHTINIANA

CUIABÁ – MT

2014

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LENI DIAS DE SOUSA ERDEI

A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

ANÁLISE ENUNCIATIVO-DISCURSIVA BAKHTINIANA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem. Orientadora: Professora Dra. Simone de Jesus Padilha.

CUIABÁ – MT

2014

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Com a ajuda de Deus.

Em nome de Jesus.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, porque Ele é bom; Seu amor dura para sempre.

À professora Dra. Simone de Jesus Padilha, meus sinceros agradecimentos por me

aceitar como orientanda. Agradeço pelo aprendizado por meio de seus

conhecimentos, empréstimos de livros, indicações de leituras, correção de trabalhos,

pelo simples convívio diário e pelas orientações claras ou mesmo as “implícitas” que

fizeram nós, os “Simonetes”, lermos tanto e construirmos nosso próprio caminho.

Preciso dizer que Simone Padilha, para mim, foi mais que orientadora, foi amiga,

presença forte, amorosa, protetora e equilibrada durante todo o curso. Em tempos

difíceis ou mais fáceis da pesquisa, ela sempre estava ali bem perto, aguardando para

que fosse chamada.

Ao professor Pós-Dr. Mário Cezar Silva Leite por aceitar ler meu trabalho e fazê-lo

com enorme atenção a ponto de perceber lacunas e, no exame de qualificação e na

defesa, sugerir melhorias, as quais seguramente contribuíram para um trabalho mais

claro, pois sua visão percebeu o que eu ainda não tinha visto.

À professora Dra. Marta Helena Cocco por aceitar ler este trabalho fazendo uma

leitura “bakhtiniana” detalhista, ainda que em pouco espaço de tempo. Obrigada pelas

valiosas sugestões, no exame de qualificação e, também na defesa, as quais me

levaram a refletir e a buscar pela essência desta pesquisa com maior intensidade.

À professora Pós-Dra. Célia Maria Domingues da Rocha Reis por sempre ter uma

solução e um sorriso para mim quando eu precisava e por permitir, também, que meu

Estágio de Docência ocorresse em suas aulas. Além de aprender muito nesse

período, também pude me divertir com os colegas dos Estudos Literários – a Mariana

Miranda Máximo, a Heloisa Helena Ribeiro de Miranda e o João Paulo de Azevedo.

À professora Mra. Alba Valéria Alves Ignácio por me aconselhar a entrar no mestrado

e, mais tarde dizer:

– Vai Leni, vai que Jesus, Maria e José vão te ajudar!

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Aos professores do Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem e Estudos

Literários – MeEL, Célia Maria Domingues da Rocha Reis, Cláudia Graziano Paes de

Barros, Dánie Marcelo de Jesus, Franceli Aparecida da Silva Mello, Maria Rosa

Petroni, Sérgio Flores Pedroso, Simone de Jesus Padilha. Para cada um desses

professores guardo uma imagem carinhosa adquirida durante o convívio em suas

aulas, colóquios, palestras, cursos ou estágio. Ter tido a liberdade de interagir e a

oportunidade de aprender com cada um deles foi realmente um privilégio. Obrigada!

À coordenação do Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem

representada pela professora Dra. Divanize Carbonieri e aos funcionários Nelson,

Winnie e Juliana pela colaboração e simpatia.

À Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –

CAPES pela disponibilização da bolsa de estudos.

Ao meu marido Mauricio pelo companheirismo, por ouvir minhas explicações

bakhtinianas quando eu ficava eufórica, por conta da compreensão teórica e pelo

orgulho que demonstrava ao perceber meu crescimento intelectual.

A minha filha Suzane por me ouvir falar diariamente sobre minha pesquisa, com muita

paciência e tranquilidade, apesar de eu querer, às vezes, que ela acompanhasse o

raciocínio comigo.

Ao meu irmão Robson por me incentivar constantemente. Também por ajudar com

esclarecimentos históricos e sociológicos, os quais foram imprescindíveis para que eu

pudesse compreender teorias necessárias para este trabalho. A minha cunhada

Alessandra e ao meu sobrinho Daniel pelos momentos de convívio roubados.

Ao meu tio José Dias por emprestar sua coleção de livros de faroeste americano para

mim, ainda no primário. Um dos motivos por eu ter adquirido o gosto pela leitura.

Às orações dos amigos do Pequeno Grupo de Oração, liderado pela Genima, da 1ª

Igreja Batista de Cuiabá – MT.

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As minhas irmãs-amigas Eliana Aparecida Albergoni de Souza, Leila Figueiredo de

Barros, Shirlei Neves dos Santos e Viviane Letícia Silva Carrijo, agradeço por

compartilharem comigo as leituras, as lamúrias e as risadas.

À Lucimeire da Silva Furlaneto, pela ajuda em momentos muito difíceis. Muito

obrigada.

À Isabel Cristina Corgosinho, Josilene Auxiliadora Ribeiro e Neiva de Souza Boeno,

agradeço pelas leituras de Pablo Neruda, na mesa do bar, em São Carlos - SP.

Excelente lugar para aprendermos.

Aos colegas do Grupo de Pesquisa Relendo Bakhtin (REBAK) pelos encontros,

conversas, ouvidos, viagens e festas. Foram momentos inesquecíveis!

Ao Anderson Simão Duarte, porque o primeiro livro emprestado no MeEL, jamais

esquecerei.

Ao bibliotecário Douglas Rios do UNIVAG pelo empréstimo de livros.

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RESUMO

Durante nossa pesquisa refletimos sobre a escolarização e a didatização do gênero poema inserido no Caderno Poetas da Escola do Programa Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro (OLPEF), uma parceria público-privada entre o MEC e a Fundação Itaú Social, sob a coordenação técnica da ONG de São Paulo CENPEC. A proposta do material inclui tanto o ensino da leitura e produção textual do gênero poema, para os alunos de escolas públicas brasileiras do 5º e 6º anos do Ensino Fundamental, bem como a formação do professor fundamentada na visão formalista da língua. A OLPEF, continuamente, amplia seu campo de atuação nas práticas escolares diárias, entretanto sua qualidade não é avaliada institucionalmente e nas academias ainda ocupa pouco espaço nas análises. Nossa pesquisa teve origem a partir da consideração de uma das conclusões de Padilha (2005), em sua tese de doutoramento - Os gêneros poéticos em livros didáticos de língua portuguesa do Ensino Fundamental: uma abordagem enunciativo-discursiva. Nela, a autora afirma que as diferentes formas de abordagem dos gêneros dos discursos poéticos nos livros didáticos demonstram as incompreensões teóricas desses materiais, no que diz respeito ao que vem a ser a concepção dos gêneros literários e, mais especificamente, do gênero discursivo poema. Tais empenhos estão atrelados, ainda, a estudos fundamentados na teoria literária, permeados por concepções formalistas que privilegiam, sobretudo, os aspectos da forma composicional. Nosso objetivo foi descrever os modos como o gênero discursivo poema foi didatizado na 2ª edição do Caderno Poetas da Escola do Programa da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010 e sugerir uma leitura e produção do poema na perspectiva enunciativo-discursiva, considerando, além dos aspectos formais, os sócio-históricos, discursivos e ideológicos, imbricados no processo de criação verbal. Nossas reflexões e análises foram fundamentadas, principalmente, na teoria enunciativo-discursiva de abordagem sócio-histórica de Bakhtin e o Círculo e na teoria de ensino-aprendizagem de Vygotsky. A análise do modelo didático revelou que a concepção de língua como comunicação e a abordagem formal do poema leva o ensino para uma direção tradicional em que identificar, memorizar e localizar são prioridades no estudo do texto poético. Adicionada a isso, a sequência didática elaborada pelos estudiosos genebrinos tende a tratar o poema de forma rígida sem dar abertura ao professor para modificações no planejamento. Ao término de nossa investigação, desejamos que os alunos possam assumir, desde cedo, a palavra de modo democrático no país em que vivem, portanto o olhar do ensino de língua materna deve estar voltado para a leitura e produção de textos em diferentes gêneros discursivos e, ainda, para a busca e compreensão das relações dialógicas que há neles. Palavras-chave: Olimpíada de Língua Portuguesa; gênero discursivo poema; didatização.

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ABSTRACT

During our research, we reflected on schooling and didactization of the poem genre, inserted in the Poets of School Notebook of the Portuguese Language Olympics Program Escrevendo o Futuro (Writing the Future) (OLPEF), a public-private partnership between MEC and Fundação Itaú Social, under the technical coordination of São Paulo’s NGO CENPEC. The proposed material includes both the teaching of reading and textual production of the poem genre, for the Brazilian public school students in the 5th and 6th years of elementary school, as well as teacher training based on the formalist view of language. The OLPEF continuously expands its field in daily school practices, though its quality is not evaluated institutionally, and, in the academies, it still occupies little space in the analyses. Our research originated from the consideration of one the findings of Padilha (2005), in her doctoral thesis - Os gêneros poéticos em livros didáticos de língua portuguesa do Ensino Fundamental: uma abordagem enunciativo-discursiva. In it, the author states that the different ways to approach the genre of poetic discourse in textbooks demonstrate the theoretical misunderstandings of these materials, in regards to what is to be the conception of literary genres and, more specifically, of poems discursive genres. Such endeavors are linked, still, to studies grounded in literary theory, permeated by formalist conceptions which privilege, especially, the aspects of compositional form. Our objective was to describe the ways in which discursive genre poem was taught in the 2nd edition of the Poets of School Notebook of the Portuguese Language Olympics Program Escrevendo o Futuro (Writing the Future) 2010 and suggest a reading and production of poem in the enunciative-discursive perspective, considering formal, socio-historical, discursive and ideological aspects, embedded in the verbal creation process. Our reflections and analyses were based mainly on enunciative-discursive theory of socio-historical approach of Bakhtin and the Circle and in the theory of teaching and learning of Vygotsky. The analysis of the didactic model revealed that the conception of language as communication and formal approach of the poem takes the teaching to a traditional direction in which identifying, memorizing and locating are priorities in the study of the poetic text. Added to this, the didactic sequence, developed by Genevan scholars, tend to treat the poem rigidly, without giving opening to the teacher for changing the planning. At the end of our investigation, we wish that students can take, early on, the word, in a democratic way, in the country in which they live, so the gaze of the teaching of the first language should be facing the reading and production of texts in different discursive genres and, furthermore, to the search for and understanding of dialogical relations in them. Keywords: Portuguese Language Olympics; poem discursive genre; didactization.

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SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 12

Apresentando nosso objeto de pesquisa ............................................................. 12

1.1 Objeto de Pesquisa ......................................................................................... 14

1.2 Metodologia de pesquisa: a compreensão dos dados ..................................... 16

1.3 Apontamentos teórico-metodológicos para a investigação científica em

Ciências Humanas ................................................................................................. 17

1.4 A base metodológica para a coleta de dados .................................................. 20

CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 24

Ensino e didatização do poema: diversos caminhos para atingir o mesmo fim

.................................................................................................................................. 24

2.1 Vygotsky: educação de natureza social ........................................................... 24

2.1.1 Zona de Desenvolvimento Proximal: processo de autonomia do aluno e

mediação do professor ....................................................................................... 26

2.2 Escolarização da literatura ............................................................................... 29

2.2.1 Didatização: diferentes caminhos em busca da mesma essência ............ 32

2.2.2 PCN: texto literário em suas particularidades ........................................... 48

2.3 Considerações genebrinas: gêneros e desenvolvimento da linguagem .......... 54

2.3.1 Gêneros secundários: uma continuação dos primários ............................. 56

CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 63

Mapeamento descritivo da proposta pedagógica do Caderno do Professor da

Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro 2010 ............................ 63

3.1 Refletindo sobre o que estaria dito na capa do Caderno: uma reflexão sobre a

imagem .................................................................................................................. 63

3.2 Breve comentário sobre o aspecto físico do material da OLPEF ..................... 68

3.3 Organização preliminar do Caderno ................................................................ 69

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3.3.1 Carta ao Professor .................................................................................... 69

3.3.2 Apresentação da Coleção ......................................................................... 70

3.3.3 A proposta do Caderno apresentada ao Professor ................................... 71

3.3.4 Organização interna do Caderno do Professor ......................................... 75

3.4 Distribuição interna das oficinas ...................................................................... 79

3.5 Por que não está considerada A Outra Face do Jano? Uma proposta de

exame analítico de alguns dados do Caderno Poetas da Escola .......................... 91

3.6 Levantamento das atividades recorrentes ....................................................... 93

3.6.1 Os dados sob um olhar bakhtiniano .......................................................... 96

3.6.2 Uma análise comparativa dos aspectos discursivos e dialógicos ............. 98

3.7 Exame do corpus: o oculto bem à vista no Caderno Poetas da Escola ......... 119

3.7.1 OFICINA 1 – Memória de versos e mural de poemas ............................. 120

3.7.2 OFICINA 2 – O que faz um poema ......................................................... 126

3.7.3 OFICINA 6 – Sentido próprio e figurado .................................................. 132

3.7.4 OFICINA 7 – Comparação, metáfora, personificação ............................. 139

3.7.5 OFICINA 8 – Sonoridade na poesia ........................................................ 148

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES .............................................................................. 153

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 158

ANEXOS ................................................................................................................. 164

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CAPÍTULO 1

Apresentando nosso objeto de pesquisa

Desde o início do século XX a educação brasileira esteve em pauta para

aqueles que se dedicam ao ensino oferecido pelo Estado e para a sociedade em geral.

Contudo, depois das revoluções sociais ocorridas na década de 60, a problemática da

educação direcionou-se a novos rumos e tornou-se mais evidente. Com o aumento

populacional nas cidades e a industrialização a todo vapor, surgiu o interesse por uma

educação universal no país, isto é, de acordo com os Parâmetros Curriculares

Nacionais (1998) “necessidade política para as nações do Terceiro Mundo a partir da

metade do século XX” (BRASIL, 1998, p. 17).

Como vivemos em sociedades conectadas umas com as outras, a educação

na contemporaneidade deveria contribuir para, por meio de uma reciprocidade entre

as culturas, com a autonomia do sujeito, preparar esse estudante, a partir de

conhecimentos adquiridos de modo sistematizado, para que ele participe ativa e

criticamente das questões sociais.

Conforme esclarecem os PCN (1998), as discussões se voltaram para o ensino

de Língua Portuguesa, porém a preocupação principal era modificar a metodologia

desse ensino e não o conteúdo. A estrutura da língua era o foco principal das

prioridades que se destacavam no campo educacional.

As crenças existentes eram as de que se os alunos dominassem as regras e

as exceções da norma-padrão, estariam preparados para participar das práticas

sociais, culturais, políticas e decisivas da sociedade letrada em que viviam. Contudo,

com o passar dos anos, o método de ensino que valorizava a estrutura da língua

perdeu o status que o tornava digno de “superioridade”.

A educação formal passou a se distanciar da normatividade e dos textos

descontextualizados e construídos para ensinar a norma-padrão. Assim, a escola

assumiu uma posição em direção ao respeito às variedades linguísticas próprias dos

alunos que, na maioria das vezes, eram estigmatizadas, e passou a trabalhar com

textos contextualizados e autênticos, ou seja, os variados gêneros do discurso que

circulam nas esferas da comunicação discursiva como objeto de ensino de língua

portuguesa.

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De acordo com o filósofo russo Mikhail Bakhtin (2010[1952-53;1979]), todas as

esferas da comunicação humana estão entrelaçadas, por meio dos usos da linguagem

e devemos compreender que as especificidades e as formas desses usos sejam

proporcionais à infinidade de espaços sociais.

Se em todas as esferas de atividade são estabelecidas diferentes relações

sociais e linguísticas entre as pessoas, há, então, a necessidade do aluno ser

apresentado aos atos de fala que concretizam os enunciados e surgem no interior

dessas relações. Em todos os momentos necessitamos de habilidades específicas

para desenvolvermos as relações dialógicas de acordo com a demanda das práticas

sociais, por exemplo, no trabalho, nas compras, nos passeios turísticos, ao vermos

um filme ou uma peça de teatro, etc.

Dentre as diferentes esferas, temos a esfera artístico-literária que da mesma

forma, possui suas especificidades. Tal esfera vem de longa data fazendo parte do

ambiente escolar e das práticas escolares no ensino de línguas. A literatura, contudo,

ainda não conseguiu integrar de maneira satisfatória a cultura letrada do aluno

brasileiro. Apesar das proximidades entre as artes, por exemplo, entre a música e a

poesia, a formação do leitor literário, na escola, ainda deixa a desejar.

Conforme Padilha (2005), sobre o tema, “o professor encontra-se totalmente

despreparado para o ensino do texto poético” (PADILHA, 2005, p. 48). O professor

não consegue, por exemplo, reconhecer os efeitos de sentido produzidos pela

fonética, inferir o significado de palavras ou expressões que estão contidas no texto,

por meio do contexto, respeitar a importância e a utilização da pontuação adequada,

etc. Ou seja, os aspectos formais são estudados de forma separada, não se

retornando ao texto para se indagar a respeito de quais efeitos de sentido são

sugeridos quando se reflete sobre o todo do enunciado.

Nesse sentido, nossa pesquisa surge a partir da consideração de uma das

conclusões de Padilha (2005), em sua tese de doutoramento, Os gêneros poéticos

em livros didáticos de língua portuguesa do Ensino Fundamental: uma abordagem

enunciativo-discursiva. Nela, a autora afirma que as diferentes formas de abordagem

dos gêneros dos discursos poéticos nos livros didáticos demonstram as

incompreensões teóricas desses materiais, no que diz respeito ao que vem a ser a

concepção dos gêneros literários e, mais especificamente, dos gêneros discursivos

poemas.

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Tais empenhos estão atrelados, ainda, a estudos fundamentados na teoria

literária, permeados por concepções formalistas1 que privilegiam, sobretudo, os

aspectos comunicativos e da forma composicional.

1.1 Objeto de Pesquisa

O objetivo principal deste trabalho é analisarmos a inter-relação entre modelo

teórico adotado e a abordagem didática decorrente e suas implicações para o

processo de ensino da língua materna, no caso específico, da linguagem literária, na

2ª edição do Caderno Poetas da Escola do Programa da Olimpíada de Língua

Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010 (OLPEF). Vale dizer que o material proposto

nesse estudo, ou seja, o trabalho com o gênero poema é reservado ao 5º e 6º anos

do ensino fundamental. Por meio dele, pretende-se compreender efetivamente o

poema como gênero discursivo, a partir da perspectiva enunciativo-discursiva

bakhtiniana.

Além disso, pensamos que estamos em consonância com os Parâmetros

Curriculares Nacionais de 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental, que sugerem para

as práticas de ensino-aprendizagem de Língua Materna alguns gêneros literários,

entre eles o poema.

A união entre o Ministério da Educação, da Fundação Itaú Social e do Centro

de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC)

resultou na realização de um trabalho colaborativo em busca de ensino de qualidade

para todos. Abrimos parêntesis para explicar que a Olimpíada de Língua Portuguesa

Escrevendo o Futuro nasceu com a implantação do Plano de Desenvolvimento da

Educação (PDE). O plano foi lançado oficialmente em 24 de abril de 2007, ao mesmo

1 Segundo Carlos Ceia (2010) “Corrente de crítica literária que se desenvolveu na Rússia a partir de 1914, sendo interrompida bruscamente em 1930, por decisão política. O nome do movimento foi objecto de discussão e, muitas vezes, se disse que era inadequado [...] Os formalistas russos são responsáveis por uma renovação da metalinguagem crítica, fornecendo novos termos de análise do texto literário, discutíveis individualmente, sem dúvida, mas que constituem ainda hoje objecto de reflexão e discussão, o que prova a sua importância. Muitos dos temas teóricos escolhidos para investigação nunca antes haviam sido discutidos: as funções da linguagem, em particular a relação entre a função emotiva e a função poética [...], a entoação como princípio constitutivo do verso [...], a influência do metro, da norma métrica, do ritmo quer na poesia quer na prosa [...] a metodologia dos estudos literários [...], etc.” Disponível em: <http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=viewlink&link _id=212&Itemid=2>. Acesso em: jan. 2014.

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tempo em que foi promulgado o Decreto n° 6.094, dispondo sobre o “Plano de Metas

Compromisso Todos pela Educação” (SAVIANI, 2007, p. 1233).

De acordo com Saviani (2007), o PDE é a mola propulsora de todo o projeto.

No entanto, a composição global do PDE agregou outras 29 ações do Ministério da

Educação e Cultura (MEC). Os níveis escolares da educação básica foram

contemplados com 17 ações, nas quais 12 delas têm caráter global e 5 são

especificas.

Em meio a essas ações foi lançada “‘Gosto de Ler’, que pretende, por meio da

Olimpíada Brasileira da Língua Portuguesa, estimular o gosto pela leitura nos alunos

do ensino fundamental” (SAVIANI, 2007, p. 1235).

Em comparação entre o Plano Nacional da Educação (PNE) e o PDE, Saviani

(2007) afirma que, teoricamente, o PDE não se configura como plano, mas ações e

estratégias para a concretização dos objetivos e das metas – alvos do PNE. Conforme

o autor, além de diagnosticar, fornece diretrizes e mantém o foco em “mecanismos

que visam à realização progressiva de metas educacionais” (SAVIANI, 2007, p. 1239).

Nesse sentido, no Ensino Fundamental, por exemplo, o programa “Gosto de Ler”, ao

tornar efetiva a Olimpíada Brasileira da Língua Portuguesa, incentiva a leitura e a

escrita, mesmo não sendo diretamente cumpridora das metas do PNE. Assim,

contribui para a melhoria da qualidade da leitura e da escrita da língua materna.

A Fundação Itaú-Social considera a iniciativa de colaborar para a melhoria de

ensino e aprendizagem de língua materna como prioridade. Em 2002, a intervenção

foi denominada como Programa Escrevendo o Futuro. Nos cinco anos seguintes, o

Programa foi um sucesso, pois houve participação nas atividades de 3,5 milhões de

alunos. Em 2008, um novo avanço, isto é, o reconhecimento “como iniciativa

importante para alcançar a melhoria da qualidade de educação pública do governo

federal, o programa foi nomeado Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o

Futuro”. Em seguida tornou-se parte do PDE, do Ministério da Educação.

Sendo assim, a Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro consiste

em programa que mobiliza, a cada dois anos, os professores em ações de trabalho,

visando a formação desses. Em anos pares, proporciona aos alunos a oportunidade

de participarem de um concurso de produção de texto, com tema específico. Tal

concurso é destinado aos alunos desde o 5º ano do Ensino Fundamental até o 3º ano

do Ensino Médio. Nos anos ímpares, o trabalho é dirigido aos diferentes profissionais

da área educacional que trabalham com a formação, são eles: os técnicos de

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secretarias de educação que desenvolvem o trabalho como formadores, os diretores

das escolas e os professores.

Conforme a OLPEF (2010), não há interesse em se buscar talentos entre os

alunos, mas sim em contribuir para o aprendizado deles no sentido de melhorar sua

produção de textos, pois a partir do estudo acerca das características do gênero

textual abordado, poderão assumir a palavra, na sociedade em que vivem, como

cidadãos preparados para defenderem seus direitos.

Compreendemos que a produção didática da Olimpíada, ou seja, os materiais

didáticos utilizados com os alunos pelo professor, nas oficinas reservadas a cada

gênero, são representantes de um filão do mercado atual da produção editorial

brasileira voltada para o ensino-aprendizado de língua materna: os paradidáticos e os

materiais didáticos alternativos, ou seja, materiais que estão presentes na escola, mas

não passam pelo crivo de avaliação do Ministério da Educação.

1.2 Metodologia de pesquisa: a compreensão dos dados

Não interrogamos a natureza e ela não nos responde. Interrogamos a nós mesmos,

e nós, de certa maneira, organizamos nossa observação ou nossas

experiências a fim de obtermos resposta.

Mikhail Bakhtin

A metodologia de pesquisa escolhida é de base qualitativa e documental. Os

estudos bibliográficos também buscam dar suporte à escolha dos critérios de análise

do Caderno Poetas da Escola.

A pesquisa relatada, neste texto, foi realizada no âmbito dos Estudos

Linguísticos voltados para a compreensão de língua materna, no caso pesquisado, o

português e seu ensino em contexto escolar. Na pesquisa de ensino-aprendizagem

de língua materna, selecionamos como objeto de investigação do material didático –

sequência didática na forma de caderno do professor – com vistas à análise das

características discursivas e pedagógicas do objeto.

Constitui, de certa maneira, um estudo de interface entre a produção teórica

sobre a língua e a transposição e modelização didática, questão fundamental para o

ensino de língua materna. Entendemos que a escolha teórica, no campo aplicado, é

relevante, pois configura, de certo modo, a abordagem prática. Dessa forma, as

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categorias didáticas selecionadas acabam por definir o que os alunos precisam

aprender e isso está relacionado à eficácia social da proposta de ensino (ROJO,

2004).

Desse modo, o objetivo principal deste trabalho é analisar a inter-relação entre

modelo teórico adotado e abordagem didática decorrente do trabalho desenvolvido

pelo Material do OLPEF e suas implicações para o processo de ensino-aprendizagem

da língua materna. O trabalho pretende contribuir para a compreensão dos processos

de articulação entre modelo teórico e modelo didático na modelização dos objetos de

ensino a partir da abordagem enunciativo-discursiva.

O material para didatização selecionado compõe a coleção de material didático

da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, um programa oficial

nacional que desenvolve ações de práticas de ensino da leitura e da escrita e de

práticas de formação do professor, propondo-se a contribuir com melhorias nessas

práticas no contexto da escola pública brasileira. Em meio à coleção composta por

quatro cadernos, optamos por analisar o caderno do professor “Poetas da Escola” de

autoria de Anna Helena Altenfelder e Maria Alice Armelin (2010).

Na próxima seção, explicitaremos o paradigma no qual se insere a pesquisa, a

metodologia de análise e a estratégia de geração de dados.

1.3 Apontamentos teórico-metodológicos para a investigação científica em Ciências

Humanas

O que confere ao texto um caráter de obra é a palavra do autor dialogicizada nas vozes das

personagens, diálogo inacabável, infinito. Problemas de épocas

diferentes e pontos de vista diferentes desfazendo fronteiras.

Augusto Ponzio

A abordagem sócio-histórica, no campo das ciências humanas, orienta a

investigação desta pesquisa, que é de cunho qualitativo. Os princípios que

caracterizam, de certa forma, esse procedimento de pesquisa são os de atividade

situada e de abordagem interpretativa, que surgem em contraposição aos postulados

científicos ligados ao positivismo, cujo método investigativo prioriza procedimentos

que garantam uma visão objetiva e neutra em relação à pesquisa (DENZIN; LINCOLN,

2006).

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A visão de uma ciência objetiva e neutra, hoje, capaz de formular leis gerais

cujo valor de verdade seria garantido pela aplicação criteriosa do método já não

encontra sustentação. A maioria dos cientistas admite que nenhum conhecimento é

inteiramente objetivo e que os valores e crenças do pesquisador podem interferir no

trabalho, por se tratar de um processo intersubjetivo. Por isso, esse processo permite

identificar as perspectivas do pesquisador, decorrentes de convicções e importância

atribuída e associadas conforme a inserção social e a história dele. Para a

compreensão, geração, coleta e tratamento dos dados, a metodologia adotada foi a

dos estudos bakhtinianos.

Bakhtin, no texto Metodologia das Ciências Humanas (2010 [1974-79]), já

observava que o conhecimento da coisa e o conhecimento dos sujeitos sociais

requerem procedimentos diferentes. Segundo o filósofo russo, a coisa morta

(geralmente objeto de conhecimento das ciências exatas como, por exemplo, uma

pedra) só existe para o outro, portanto, pode ser totalmente revelada por um ato

unilateral desse outro.

A coisa não tem interior próprio, coincide consigo mesma, por isso, a exatidão

é necessária para a assimilação prática. Já o conhecimento do indivíduo envolve um

ato bilateral, porque ele possui núcleo interior, impossível de ser absorvido e

consumido pelo outro. Ele conserva sempre uma distância que lhe permite

permanecer também para si, então, só pode ser objeto de desinteresse. O objeto das

ciências humanas concentra-se na voz do homem e em sua não concernência consigo

mesmo, portanto, isso o faz inesgotável em seu sentido e significado. O ser expressivo

não pode ser tolhido nem forçado a se revelar, porque é livre e não apresenta

nenhuma garantia. Para Bakhtin (2010[1974-79]), o pesquisador pode partilhar nessa

(re)liberdade, nunca tolhê-la com um ato de conhecimento (material).

Sendo assim, o pesquisador em ciências humanas não faz a pergunta a si

mesmo nem a um terceiro em presença da coisa, mas ao próprio pesquisado. Nesse

sentido, o ser da expressão é bilateral, isto é, sua realização ocorre na interação, no

encontro de duas consciências (a do eu e a do outro). Por isso, fazer pesquisa, em

ciências humanas, é uma relação dialógica, isto é, envolve uma relação entre sujeito-

sujeito(s), não uma interação sujeito-objeto.

Compreender o ser humano implica uma participação ativa dos interlocutores,

uma compreensão responsiva que, no ato de escuta do outro, traz em si as sementes

de uma resposta. Por isso, compreender o ser humano transcende a uma mera

Page 20: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

19

empatia, porque, colocar-se no lugar do outro não permite o conhecimento do ser

único em seu acontecer. Conhecer o outro implica a penetração mútua com

manutenção da distância, de uma posição exotópica que pode levar o pesquisador a

compreender o ser cognoscível no acontecimento singular, uma vez que atividade de

criação “começa propriamente quanto retornamos a nós mesmos e ao nosso lugar

fora da pessoa que sofre, quando enformamos e damos acabamento ao material da

compenetração” (BAHKTIN, 2010[1920-1924], p. 25).

Dessa forma, se nas ciências exatas/naturais prevalece uma forma monológica

de construção de conhecimento em que o pesquisador, diante de seu objeto de

estudo, assume uma atitude contemplativa, de quem observa e se expressa sobre o

objeto, nas ciências humanas, a construção de conhecimento exige uma postura

dialógica em que o pesquisador está defronte de outro ser que também expressa

pensamentos, constrói sentidos e significados, realizados e dados ao pesquisador

apenas sob a forma de textos, considerado, por isso, o ponto de partida das disciplinas

em ciências humanas:

As ciências humanas são as ciências do homem em sua especificidade, e não de uma coisa muda ou um fenômeno natural. O homem em sua especificidade humana sempre exprime a si mesmo (fala), isto é, cria texto (ainda que potencial). Onde o homem é estudado fora do texto e independente deste, já não se trata de ciências humanas (anatomia e fisiologia do homem, etc.). (BAKHTIN, 2010[1959-1961], p. 312)

Não há possibilidades de acessar o homem, sua vida, seu trabalho, sua luta, a

não ser por meio dos textos sígnicos criados e por criar. A ação física do homem tem

de ser compreendida como um ato, mas esse ato não pode ser interpretado fora de

sua expressão sígnica que é criada:

Por toda parte há o texto real ou eventual e a sua compreensão. A investigação se torna interrogação e conversa, isto é, diálogo. Nós não perguntamos à natureza e ela não nos responde. Colocamos as perguntas para nós mesmos e de certo modo organizamos a observação ou a experiência para obtermos a resposta. Quando estudamos o homem, procuramos e encontramos signos em toda parte e nos empenhamos em interpretar o seu significado. (BAKHTIN, 2010[1959-1961], p. 319).

Assim, ainda que nosso objeto nos seja acessível por meio de base

documental, um material didático constituído na forma de um caderno do professor

Page 21: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

20

Poetas de Escola, não anula a abordagem dialógica escolhida, uma vez que “todo

texto tem um sujeito um autor (o falante ou quem escreve)” (BAKHTIN, 2010[1959-

61], p. 308). Nesse sentido, a ação de conhecimento não recai sobre o material

didático em si, mas sobre os pensamentos, os sentidos, as escolhas, os valores

construídos pelos sujeitos do discurso, marcados na linguagem, sobre determinado

objeto, o poema, pensado para uma situação específica e que se configura como uma

esfera social de circulação de discursos – a escola.

Na seção seguinte, expomos o procedimento utilizado para a geração de

dados.

1.4 A base metodológica para a coleta de dados

A pesquisa qualitativa envolve estudar e/ou usar diversos materiais empíricos,

porém, em nosso caso, tentamos compreender o modo de tratamento dispensado ao

ensino-aprendizagem do poema nos discursos dos sujeitos autores do Caderno do

Professor da OLPEF, por meio da pesquisa documental. Nossa intenção

fundamentou-se em Bakhtin (1929) a partir da perspectiva de que ele: “critica também

as posições empíricas e idealistas do que denomina de objetivismo abstrato e

subjetivismo idealista e propõe, em sua perspectiva dialógica, o estudo da língua em

sua natureza viva e articulada com o social” (FREITAS, 2002, p. 22).

Dessa forma, o sentido de nossa pesquisa reside em compreender qual a

motivação para o discurso autoral. Em uma época como a que vivemos, de tão

complexas formas de linguagem, a dimensão formal da língua ainda é privilegiada e

concretiza-se em materiais didáticos de grande repercussão nas salas de aula

brasileiras. Esse fato é revelador, na medida em que representa tratamento

descontextualizado e desconectado dos aspectos discursivos que levariam o aprendiz

a construir seu perfil de cidadão contemporâneo, conforme é o almejado por alguns

segmentos da sociedade brasileira.

A especificidade do nosso objeto de pesquisa e que pretendemos desvelar, ao

realizar a análise dos dados gerados e coletados, consiste nas relações, nos sentidos,

nos processos contidos no Caderno, a partir dos textos contidos nele. Para isso, foi

necessário adotarmos conceitos bakhtinianos e identificarmos se havia tais

parâmetros e qual a incidência deles no Material. Esperávamos, com isso,

Page 22: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

21

percebermos no discurso autoral e nos dados evidências que comprovassem a

metodologia escolhida pela OLPEF.

Assim, nossa finalidade fundamentou-se na descrição do processo de

didatização do gênero poema e na comparação entre o que está sendo abordado no

Caderno Poetas da Escola e as exigências do novo perfil de cidadão (leitor crítico),

idealizado pela educação contemporânea, e nos apontamentos de Rojo (2005) para

os diferentes letramentos.

Para nortear os procedimentos de nossa investigação, elaboramos os

seguintes objetivos:

1) Descrever os modos como o gênero discursivo poema foi didatizado no

Caderno do Professor da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010.

2) Explicar como seria a contemplação das capacidades de leitura e produção

do gênero poema numa perspectiva enunciativo-discursiva, levando em conta, para

além dos aspectos formais, os sócio-históricos, discursivos e ideológicos, imbricados

no processo de criação verbal.

Tais objetivos geraram as seguintes questões de pesquisa:

1) Como foi sistematicamente elaborada a proposta de trabalho com o gênero

do discurso poema no Caderno Poetas da Escola?

2) Quais e como as contribuições teóricas bakhtinianas podem fundamentar a

transposição didática, privilegiando uma abordagem discursiva dialógica no ensino-

aprendizagem do gênero poema?

O Caderno do Professor constitui um material de apoio em que há uma

proposta de sequência didática que auxilia o professor no ensino-aprendizagem de

língua materna por meio de gêneros textuais, como: artigo de opinião, crônica, poema

e memórias literárias.

Esta pesquisa se ocupa em investigar a base teórico-metodológica na qual

fundamenta a sugestão do Caderno Poetas da Escola, bem como as atividades

didáticas dispostas nesse Material para o ensino e a aprendizagem do gênero poema.

A partir desse corpus de análise, esperamos ter construído um sólido alicerce

para compreensão de nosso objeto, com o intuito de atingir os nossos objetivos.

Page 23: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

22

Conforme Denzin & Lincoln (2006), os pesquisadores da área qualitativa

“utilizam uma ampla variedade de práticas interpretativas interligadas, na esperança

de sempre conseguirem compreender melhor o assunto que está ao seu alcance”

(DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17). Nesse sentido, contamos com as contribuições

cientificas bibliográficas de diversos autores a respeito de nosso tema. A pesquisa

documental focou o Caderno do Professor da OLPEF. Também lançamos mão de um

aspecto da pesquisa quantitativa, a contagem das atividades recorrentes e de acordo

com nossas categorias de análise: gêneros discursivos e relações dialógicas.

Com a finalidade de analisarmos o material didático, realizamos leitura prévia

de todo o material. A partir da leitura panorâmica, fizemos levantamento da

organização global do caderno, da sistematização geral da sequência didática

(descrevendo as oficinas com apontamento de título e objetivo) e, por fim,

levantamento da organização das atividades da sequência a fim de classificarmos as

atividades-tipo (recorrentes) do projeto de ensino do gênero poético poema.

A contagem, procedimento relacionado à técnica de análise quantitativa, foi

necessária para selecionarmos a parte qualitativa pertinente para os objetivos

propostos na pesquisa. Pois, dessa forma, pudemos constatar que o enfoque da

sequência didática privilegiou os elementos formais da teoria literária e comunicativa

para o ensino. Nisso, as evidências mostraram que a concepção de gênero assumida

pelo Material didático da OLPEF é textual, isto é, o gênero poema literário.

Esta pesquisa foi delineada da seguinte forma: no 1º capítulo, Apresentando

nosso objeto de pesquisa, descrevemos nosso objeto, a metodologia de pesquisa

utilizada para a compreensão dos dados, os apontamentos teórico- metodológicos

para a investigação científica em Ciências Humanas de Bakhtin (2010[1974-1979]) e

a base metodológica para a coleta de dados.

O capítulo 2, intitulado Ensino e didatização do poema: diversos caminhos para

atingir o mesmo fim, exploramos as contribuições do pensamento de Vygotsky para o

ensino-aprendizado da linguagem, e as questões que envolvem a didatização dos

gêneros poéticos.

Já no 3º capítulo, Mapeamento descritivo da proposta pedagógica do Caderno

do Professor da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010,

inicialmente, refletimos sobre a imagem na capa do Caderno e, também o aspecto

físico, a organização preliminar do Material, a distribuição interna das oficinas. Em um

segundo momento, sob o título Por que não está considerada A Outra Face do Jano?

Page 24: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

23

Uma proposta de exame analítico de alguns dados do Caderno Poetas da Escola,

buscamos compreender nosso segundo questionamento de pesquisa, fizemos uma

breve contextualização do trabalho, refletimos sobre nossos dados e expomos em

linguagem gráfica, descrevemos, analisamos e avaliamos as oficinas 1, 2, 6, 7 e 8.

Dessa maneira, nosso desejo é que, a partir de nossas reflexões nesta

pesquisa, possamos contribuir para futuros estudos na área de Linguística Aplicada,

para o ensino-aprendizagem de Língua Materna e, também, para as políticas de

ensino, já que os materiais didáticos da OLPEF abarcam em sua amplitude de

produção de materiais específicos, além de concessões financeiras cedidas pelo

Governo Público Federal, a participação no funcionamento das escolas sem serem

avaliados pela instituição de ensino, e de forma ainda bastante incipiente pela

academia.

Page 25: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

24

CAPÍTULO 2

Ensino e didatização do poema: diversos caminhos para atingir o mesmo fim

Não me contentando com as ciências que nos ensinavam,

percorrera todos os livros que pudera ter em mãos.

Descartes

A aprendizagem demanda pesquisas para compreendermos sua dinâmica. Por

isso, neste capitulo, apresentamos as contribuições de Lev Semenovich Vygotsky

para a educação. Referente à nossa pesquisa, os estudos vygotskyanos serão base

teórica para fundamentar a análise do Caderno poetas da escola e irão nos auxiliar

em relação às atividades que iremos propor ao final de nosso trabalho. Em seguida,

discorreremos brevemente sobre a escolarização da literatura, para depois tratarmos

de alguns procedimentos utilizados por alguns professores/autores que trabalham

com a didatização do poema e, finalmente, abordaremos o que dizem os PCN sobre

o ensino da literatura.

Enfocaremos, em primeiro lugar, a assertiva de Vygotsky ao defender que a

apreensão do processo educacional é originada categoricamente a partir de

referências históricas e relacionamentos sócio-históricos. Ainda, seguindo o

pensamento do psicólogo russo, comentamos a respeito do conceito Zona de

Desenvolvimento Proximal, imprescindível para o ensino-aprendizagem de forma

geral, e o importante papel do professor enquanto mediador do processo educacional.

Dialogamos com diversos professores/autores que desenvolvem atividades

significativas tanto em relação às suas teorias sobre escolarização da literatura quanto

às práticas pedagógicas para a didatização do poema e a posição dos PCN para com

esses modos de ensino-aprendizagem dos textos literários.

2.1 Vygotsky: educação de natureza social

A educação em todos os países e em todas as épocas sempre foi social.

Vygotsky

As pesquisas de Lev S. Vygotsky (1869-1934) demonstram em seu conteúdo

reflexões e formulações a respeito do relacionamento entre o desenvolvimento da

Page 26: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

25

criança na idade escolar e seu desenvolvimento humano. Tais estudos estão

fundamentados em observações da psicologia do desenvolvimento e, também, sobre

os próprios estudos de Vygotsky. Dessa forma, o desenvolvimento do homem, bem

como a natureza social do indivíduo são ideias centralizadoras das pesquisas do

psicólogo russo. Assim, tais pressupostos se estendem e são imprescindíveis ao

campo da educação.

Nessa perspectiva, Vygotsky (2007[1935]) participando ativamente em torno

dessa temática, percebe que, para Koffka (1886-1941), há uma complexa relação

entre o ensino e o aprendizado, na qual o desenvolvimento se movimenta sempre à

frente do aprendizado. Já para Thomrdike (1874-1949), o desenvolver do sujeito dá-

se paralelamente à aprendizagem da criança, como se fosse quase estático. Vygotsky

(2007[1935]), então, acrescenta algo novo às teorias desses psicólogos.

Para Vygotsky (2007[1935]), os processos de aprendizagem iniciam-se logo

quando a criança nasce. Mas, a formação das funções psicológicas superiores

desenvolve-se nas interações sociais. Oliveira (2009) esclarece que a aprendizagem

significa “o processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes,

valores, etc. a partir de seu contato com a realidade, com o meio ambiente e com as

pessoas” (OLIVEIRA, 2009, p. 59). Logo, é um processo no qual o ser humano, além

das qualidades biológicas inerentes à sua constituição, como por exemplo, a

capacidade de visão e o processo de maturação do organismo, em que as células

sexuais masculinas e femininas desenvolvem-se, sem nenhuma informação externa,

preparando o sujeito para a vida reprodutiva, desenvolve também outras habilidades

responsáveis pela formação das funções psicológicas superiores, as quais, conforme

Ignácio (2010):

Não são imaginadas, muito menos nascem subitamente, isto é, essas funções se constroem a partir das experiências vivenciadas. São funções mediadas da natureza histórica e origem sociocultural. Nesse sentido, o pensador defende que as interações sociais tem uma importância basilar na construção das funções psicológicas humanas. (IGNÁCIO, 2010, p. 08).

Segundo Padilha (2005), os postulados Vygotskyanos consideram “o processo

de desenvolvimento intelectual em termos de apropriação mediada pelo signo e pelo

outro” (PADILHA, 2008, p. 42). Significa dizer que os usos das diferentes formas de

linguagem, nas situações reais de comunicação, dependem da interação entre os

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26

sujeitos e da internalização dos signos que surgem no processo interacional, ou seja,

via linguagem, das atitudes dos outros, observadas, ressignificadas e praticadas pela

criança.

Para Vygotsky (2001[1926]), toda a educação é essencialmente de natureza

social, apesar de ter sido constituída sobre nossa base biológica, cujas condições

naturais não podem ser modificadas por fatores externos. Mesmo assim, é na

sociedade que “se erige um sistema de reações adquiridas” (VYGOTSKY, 2001[1926],

p. 63) por nós, quer estejamos de acordo ou não2.

Conforme Vygotsky (2001[1926]), então, a possibilidade de um professor

qualquer educar o aluno, do ponto de vista científico, não existe. Somente o próprio

educando a partir de suas experiências pessoais pode modificar seu comportamento.

Não podemos esperar, portanto, que somente a ação pedagógica isolada do professor

seja capaz de educar e modificar as ações de um aluno seja na sala de aula ou na

vida diária. Por isso, Vygotsky (2001[1926]) adverte “nossos movimentos são nossos

mestres” (VYGOTSKY, 2001[1926], p. 64).

Nesse sentido, veremos na próxima etapa como Vygotsky (2007[1935])

denominou e descreveu a Zona de Desenvolvimento Proximal.

2.1.1 Zona de Desenvolvimento Proximal: processo de autonomia do aluno e

mediação do professor

No processo de educação o mestre deve ser os trilhos por onde se movimentam com

liberdade e independência os vagões, que recebem dele apenas

a orientação do próprio movimento.

Vygotsky

Já na ocorrência da elaboração, em que a criança passa do estágio do senso

comum à reflexão, elaborando sínteses, mas com a ajuda do professor. Retornamos,

pois, à questão em que Vygotsky concorda com o psicólogo Koffka (1886-1941), ao

reconhecer que há diferença entre o aprendizado na pré-escola e na escola, isto é, no

primeiro não existe sistematização, mas, no segundo, a aprendizagem é

2 Vale a pena comentar que Vygotsky na época da elaboração desta obra, direcionava a ênfase de seu pensamento sobre a educação adquirida pelo meio social, ao passo que na década de 30 seu foco estava na colaboração entre os participantes do processo educativo.

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27

sistematizada. Vygotsky (2007[1935]), entretanto, visualiza outro item e argumenta

que entre o desenvolvimento humano e o aprendizado é necessário considerarmos a

existência de dois níveis: A Zona de Desenvolvimento Real (ZDR) e a Zona de

Desenvolvimento Proximal (ZPD).

Conforme Vygotsky (2007[1935]), as crianças aprendem mesmo antes de

iniciarem seus percursos na escola. No que se refere à linguagem, por exemplo, a

criança, no início de sua vida escolar, é apresentada à modalidade escrita da língua –

conhecimento científico –, entretanto a oralidade de sua língua materna, bem como

sua variante, já foi dominada em casa, por meio da interação com outras pessoas,

pois “o aprendizado e o desenvolvimento estão inter-relacionados desde o primeiro

dia de vida da criança” (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 95). Assim, a criança, ao chegar

à escola, já domina bem a própria língua e não precisa da ajuda de outros sujeitos

para interagir.

Logo, temos as duas funções da linguagem, as quais contribuem para o

desenvolvimento humano: instrumento de inter-ação (a responsável pela

comunicação com o outro) e a função de organização do pensamento (a constituidora

de conhecimentos das funções psicológicas superiores), Vygotsky (2007[1935])

afirma ser esta observação um ponto extremamente relevante, o qual não deve ser

esquecido. O primeiro desses estágios foi denominado pelo psicólogo de “nível de

desenvolvimento real [...] das funções mentais da criança que se estabeleceram como

resultado de certos ciclos de desenvolvimento já completados” (VYGOTSKY,

2007[1935], p. 95-96). São tarefas executadas, portanto, pelas crianças sem auxílio

de outros ou mesmo pistas de algum procedimento a se tomar para finalizar

determinado trabalho manual ou intelectual.

Entretanto, para Vygotsky (2007[1935]), se a criança não consegue concluir

uma tarefa sozinha, não significa dizer que sua capacidade de desenvolvimento

mental já esteja definida e estagnada, pois existem ainda possibilidades de alterações

na execução das atividades por outras pessoas, tais interferências geram situações

definidas por Vygotsky (2007[1935]), como:

Zona de desenvolvimento proximal. Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 97).

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Conforme Vygotsky (2007[1935]) a ZPD indica com mais clareza o

desenvolvimento mental do sujeito que a Zona de Desenvolvimento Real, já que na

Zona de Desenvolvimento Proximal devemos considerar, além do componente

intelectual, os fatores externos que influenciam na aprendizagem do aluno. Mas, de

acordo com Oliveira (2009), não é qualquer pessoa que pode se beneficiar da

interferência do outro, porque para a obtenção desses benefícios é necessário que o

sujeito esteja em um momento de desenvolvimento acessível às modificações em

suas ações individuais. Assim,

A zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamadas de ‘brotos’ ou ‘flores’ do desenvolvimento, em vez de ‘frutos’ do desenvolvimento. (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 98).

Se nas pesquisas de Vygotsky as interações sociais constituem fator essencial

para a formação mental do ser humano, na educação não é diferente e o professor

tem o papel de mediador da aprendizagem, significa dizer que o mestre atua, de forma

sistematizada, como facilitador no sentido de que o aluno alcance seu potencial de

conhecimento.

Nesse sentido, para Vygotsky (2007[1935]), o educador atua da mesma forma

em relação ao ensino-aprendizado, organizando e administrando o meio social

educativo, onde coloca à disposição do aluno os recursos que poderão ser utilizados,

no momento da aprendizagem e, ainda, a formação de duplas ou grupos, em que uns

serão os pares avançados dos outros, estabelecendo assim a colaboração entre eles.

Mas, ao mesmo tempo, o mestre, assim como o trabalhador, é inerente à ação

pedagógica atuando, também, como mediador-aprendiz. Aqui, está a segunda função

do professor explicitada por Vygotsky (2007[1935]) “Nas formas mais primitivas e nas

mais complexas de trabalho humano, o trabalhador exerce um duplo papel: por um

lado como organizador e administrador da produção, por outro, como peça de sua

própria máquina” (VYGOTSKY, 2007[1935], p. 66).

Nessa perspectiva, portanto, Vygotsky (2007[1935]) apresenta sua fórmula do

processo educacional, isto é, processo no qual o ato educacional, contando com as

experiências vivenciadas do aluno – determinadas pelo meio social ou específico – e

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29

em conjunto com a atuação organizadora e administrativa do professor, cooperam

para a instauração de uma educação mais efetiva. Os pontos vygotskyanos

abordados, principalmente relativos à Zona de Desenvolvimento Proximal, serão úteis

como suporte teórico para a análise de atividades em nosso último capítulo. Na

próxima seção, compreenderemos a escolarização da literatura vista nos modos de

Magda Soares.

2.2 Escolarização da literatura

A questão fundamental das relações entre literatura infantil e escola

é que é necessário saber (ou descobrir?) como realizar, de

maneira adequada, a inevitável escolarização da leitura.

Magda Soares

Soares (2001) afirma existir relações entre a escola e a literatura infantil e

juvenil. No decorrer do texto, a autora reflete sobre essas conexões. A apropriação é

o primeiro olhar observado por Soares (2001), pois “nesta perspectiva, analisa-se o

processo pelo qual a escola toma para si a literatura infantil, escolariza-a, didatiza-a,

pedagogiza-a, para atender a seus próprios fins – faz dela uma literatura escolarizada”

(SOARES, 2001, p. 17), isto é, demonstra a noção de que existe uma literatura

utilizada nas práticas pedagógicas escolares e que seja de interesse das crianças.

O segundo olhar da autora se volta para a escolarização da literatura como

produção, ou seja, “analisa-se o processo pelo qual uma literatura é produzida para a

escola, para os objetivos da escola, pela clientela escolar busca literatizar a

escolarização infantil” (SOARES, 2001, p. 17). Uma literatura produzida para as

crianças e jovens tendo a escola como ‘utilizadora’ desse material, ou mesmo sendo

a escola intermediária em um processo de produção e consumo. Nesse sentido, para

Soares (2001), o enunciado “escolarização da literatura infantil toma um sentido de

literatização do escolar, isto é, de tornar literário o escolar” (SOARES, 2001, p. 18).

Na visão de Soares (2001), esse incorreto procedimento é necessário, visto

que tal pensamento deve-se à responsabilidade inerente à escola, que é a de formar

e de educar. Nesse sentido, a autora relembra, por exemplo, um fato ocorrido em

1921, quando Monteiro Lobato publicou a obra A menina do nariz arrebitado,

afirmando que o livro era dirigido às segundas séries e, em consequência, o Governo

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30

de São Paulo o comprou e distribuiu. Soares (2001) acrescenta, ainda, que no Brasil

o desenvolvimento da literatura infantil e juvenil caminha paralelamente ao

crescimento da educação escolar. A autora conclui dizendo que tal afirmação pode

ser comprovada quando comparamos o aumento da multiplicação de vagas escolares

com o “boom da literatura infantil e juvenil” (SOARES, 2001, p. 19).

Entretanto, Soares (2001) diz que existem posições antagônicas a essa relação

entre produtores e consumidores de livros como, por exemplo, a de Marisa Lajolo,

denunciando o pacto entre a literatura infantil e a escola, bem como a posição de Nelly

Novaes Coelho, afirmando que depois da década de 70, os livros infantis saíram da

dimensão que eram lidos por prazer e tornaram-se ferramentas de trabalho para que

os professores transmitissem valores morais como a política, a ética, a estética, etc.

aos alunos, assim como transformar suas ideologias.

Em conclusão ao seu exposto, Soares (2001) coloca provas concretas da

existência de tal relação, ou seja, as fichas sobre a compreensão da leitura, para o

aluno responder; o grande número de escritores de literatura infanto-juvenil que visita

as escolas e, finalmente, os próprios professores que atuam, também, como

escritores. Porém, a relação em que a autora demonstra mais interesse em discutir

em A escolarização da literatura infantil e juvenil consiste na escolarização da

literatura que se destina à criança, bem como desperta o interesse nela. Portanto, o

foco maior é a literatura como apropriação pela escola.

O conceito de escolarização, para Soares (2001), pode ou não ter conotação

depreciativa. Porém,

Não há como ter escola sem ter escolarização de conhecimentos, saberes, artes: o surgimento da escola está indissociavelmente ligado à constituição de ‘saberes escolares’, que se corporificam e se formalizam em currículos, matérias e disciplinas, programas, metodologias, tudo isso exigido pela invenção, responsável pela criação da escola, de um espaço de ensino e de um tempo de aprendizagem. (SOARES, 2001, p. 20).

Antes do século XVI, conforme Soares (2001), o aprendizado era corporativo,

mas, a partir dessa época, houve modificações que revolucionaram o ensino como o

surgimento do espaço e do tempo para ensinar. A partir disso, consequentemente,

surgiu, também, a necessidade da sistematização: “os graus escolares, as séries, as

classes, os currículos, as matérias e disciplinas, os programas, as metodologias, os

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manuais e os textos – enfim, aquilo que constitui até hoje a essência da escola”

(SOARES, 2001, p. 21).

Portanto, o ensino depende de uma uniformização, assim como a literatura

também necessita de um processo de escolarização para ser abordada. Nesse

sentido, conforme Soares (2001), não é possível esquivar-se desse processo

inevitável em teoria, já que ele é necessário para a própria existência da escola, mas

se não existe a possibilidade de evitá-lo, no mínimo devemos tentar da melhor maneira

tornar a escolarização em atitudes mais próximas do que deveria ser.

De acordo com Soares (2001), se não podemos evitar a escolarização da

literatura infantil ou outra qualquer, assim como é impossível recusarmos essa

escolarização, porque seria negarmos a própria escola, já que essa instituição tem

seu funcionamento e métodos sistematizados, por conta do próprio ensino

escolarizado é necessário, portanto, que as ações inerentes a tal processo sejam

feitas de forma adequada.

O que precisamos criticar é a escolarização

[...] inadequada, a errônea, a imprópria escolarização da literatura, que se traduz em sua deturpação, falsificação, distorção, como resultado de uma pedagogização ou uma didatização mal compreendidas que, ao transformar o literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o, falseia-o. (SOARES, 2001, p. 22).

Portanto, conforme Soares (2001), para discutir e tentar resolver a questão da

inadequada escolarização da literatura, existe uma vasta bibliografia descrevendo

regras para o tratamento dos textos literários, porém a pretensão da autora está em

discutir as circunstâncias em que a literatura infantil tem sido inadequadamente

escolarizada.

A escolarização da literatura é realizada, conforme Soares (2001), a partir de

três divisões: “a biblioteca escolar; a leitura e estudo de livros de literatura, em geral

determinada e orientada por professores de Português; a leitura e o estudo de textos,

em geral componente básico de aulas de Português” (SOARES, 2001, p. 22-23).

Desse modo, durante o decorrer do texto, a autora aponta diversas dificuldades a

respeito da inadequada escolarização da literatura na escola.

Magda Soares (2001) conclui dizendo que se a escolarização do gênero é

inevitável, então, que tal processo seja realizado adequadamente. Assim, em acordo

com Soares (2001), percebemos que existem tentativas de a escola trabalhar os

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32

textos poéticos, porém a prática, em certa medida, torna-se inviável por conta de

vários motivos.

Mais adiante, veremos alguns métodos de trabalho direcionados ao gênero

poema.

2.2.1 Didatização: diferentes caminhos em busca da mesma essência

Que a criança goste de ler, de sorver devagarinho, sem pressa,

a poesia que encontrar...

Fanny Abramovich

Para a configuração de um novo ser que se quer menos fragmentado e

mais consciente de sua missão global do que o ser

dessubstancializado do nosso passado recente

Sylvia Helena Cyntrão

Considerar os aspectos para além dos tradicionais em análises de textos

poéticos, na contemporaneidade, com representações da linguagem em diversas

formas, torna-se imprescindível. Desse modo, as práticas sociais demandam do leitor

a articulação dos sentidos explícitos ou implícitos formadores da estrutura interna de

um texto em consonância com seus aspectos formais exteriores. Assim, atuar

participativamente como mediador do processo educativo, demonstrando interesse no

aprendizado do outro, requer uma postura diferenciada.

Em virtude de ilustrarmos o aspecto geral de como tem sido trabalhado o

gênero discursivo poema, nas salas de aula, apresentamos a visão de alguns

professores/autores a respeito dessa temática.

Abramovich (2005), em primeiro lugar, tece alguns comentários sobre o

pensamento de algumas pessoas, as quais não são citadas, no que diz respeito à

poesia. Logo após, a autora compartilha com José Paulo Paes o pensamento de que

a poesia consiste em uma brincadeira com palavras. Assim,

Há poetas que brincam com as palavras dum modo gostosíssimo de a criança ouvir e ler. Lidam com toda uma ludicidade verbal, sonora, às vezes engraçada, no jeito como vão juntando palavras, fazendo com que se movam pela página quase como uma cantiga, e ao mesmo

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33

tempo jogando com os significados diferentes que uma mesma palavra possui. (ABRAMOVICH, 2005, p. 66).

Ao dar continuidade ao raciocínio de J. P. Paes, a autora relembra os recursos

utilizados, como os linguísticos: os fonológicos, morfológicos, sintáticos e semânticos.

Abramovich (2005) explica que, em alguns poemas, o jogo com as palavras

torna-se um meio em que os poetas podem representar os sonhos, os desejos. A

autora não aprova, por exemplo, o tratamento da poesia repetindo as odes patrióticas

decoradas, os temas3 moralizadores ou a pieguice gasta, mas defende a emoção

verdadeira.

Na seção Como trabalhar poesia com as crianças? Abramovich (2005), sugere

que, ao ler um poema para a classe, a professora deve conhecê-lo bem e, por isso é

importante

que o tenha lido várias vezes antes, que o tenha sentido, percebido, saboreado. Para que passe a emoção verdadeira, o ritmo e a cadência pedidos, que sublinhe o importante, que cada ouvinte possa cobrir – por si próprio – cada passagem, cada estrofe, cada mudança. (ABRAMOVICH, 2005, p. 95).

A respeito dessa citação, cabe ressaltar, em nosso ponto de vista, a leitura

antecipada feita pelo professor, porque é necessário que ele duvide e questione o que

está escrito (ou implícito), no poema. Dessa forma, a emoção a ser compartilhada,

nas aulas, será perceber que as infraestruturas (a educação, a ciência, a religião, a

família, etc.) são responsáveis pelas relações sociais e que, no ambiente dessas

relações, existem as interações verbais (da comunicação), nas quais nascem e são

desenvolvidas as questões ideológicas e as formas (os gêneros do discurso), pelas

quais podemos desvelar os pensamentos da sociedade. Sendo assim, “o ritmo e a

cadência [...] estrofe, mudanças” (ABRAMOVICH, 2005, p. 95) devem ser analisados

depois dessa compreensão, como disse Bakhtin/Volochinov (1929).

Posteriormente, a sugestão de Abramovich (2005) consiste em analisar textos

com temáticas semelhantes, neste caso, a finalidade é perceber que formas diferentes

3 Bakhtin/Volochinov (1929), esclarece que na concepção bakhtiniana o tema tem a ver com a realização de novos sentidos, nas interações reais de comunicação, ou seja, o “tema da enunciação é concreto, tão concreto como o instante histórico ao qual ela pertence” (BAKHTIN/VOLOCHINOV 1929 PG 134). Mas, o “tema” de uma obra refere-se à “unidade temática” do texto, portanto, conceitos diferentes.

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34

podem conter a mesma temática. Em seguida, abrir espaço aos alunos para que eles

discutam e exponham suas ideias.

Sugere Abramovich (2005), em seguida, que os alunos escrevam seus próprios

poemas, pois poderiam descobrir eles mesmos um “jogo de rimas – fáceis ou difíceis

–, de significados, de inversões, de brincadeiras, com o sentido das palavras, por meio

da cor, da textura, do movimento de cada palavra, cada frase ou estrofe”.

(ABRAMOVICH, 2005, p. 94). Vimos, então, a defesa da autora pela adoção das

formalidades da língua como primeira via de acesso ao significado do poema,

entretanto, conforme nossa assunção ao pensamento enunciativo-discursivo

bakhtiniano, a ordem de análise consiste em observarmos os seguimentos da

sociedade, depois os gêneros discursivos e, por último, as formas linguísticas.

No caso da seleção do texto, conforme a autora, com exceção dos alunos não

alfabetizados, a atitude mais sensata está em “recorrer àqueles autores que já

dominam o verbo, constroem o verso, controlam o ritmo, sabem eliminar o supérfluo,

para condensar-se – de modo exato e belo – as imagens, para provocar

encantamento, suspiros, concordância, gostosura [...]” (ABRAMOVICH, 2005, p. 95).

De acordo com o exposto na obra de Abramovich (2005), desde o início,

percebemos a ênfase de uma combinação das formas do sistema da língua com os

aspectos subjetivos sendo utilizada para a compreensão do gênero poema, por isso

precisamos esclarecer que em Bakhtin e o Círculo, nossa filiação teórica, a

subjetividade para Bakhtin “considera o ato de fala como individual e é por isso que

tenta explicá-lo a partir das condições da vida psíquica individual do sujeito falante”

(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 113), mas para esses estudiosos o processo

enunciativo é proveniente de natureza social.

Cunha (1987) inicia seu texto posicionando-se contra a ideia difundida de que

não há interesse, por parte das crianças, em poesia. Em seguida, salienta que a

escolha dos poemas a serem tratados em sala de aula é feita de forma inadequada,

pois contém uma tendência de incutir nos alunos valores morais. Tal constatação da

autora faz com que a mesma afirme que esses textos são elaborados por professores

e não por poetas.

Nesse sentido, Cunha (1987) pontua que a decisão mais sensata seria

selecionar textos em antologias poéticas e que sejam aqueles que provoquem maior

repercussão entre as crianças, a partir de tal afirmação, a autora afirma que

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35

ressonâncias como a sensibilidade e a fantasia são inicialmente preferidas pelas

crianças por conta do sentimento sensorial.

Na visão de Cunha (1987), portanto, ocorre que a poesia é para ser sentida,

muito mais que compreendida e uma das principais características é exatamente a

ambiguidade, a conotação. Logo, para a autora, a sensibilidade deve ser incentivada

ainda quando a criança está na infância, desse modo na fase adulta o indivíduo estará

inclinado à apreciação da poesia que encontrará em diferentes gêneros poéticos.

De fato, necessariamente, concordamos com a sensibilidade criativa da

criança, desde os primeiros anos de vida. Mas, retornando à subjetividade derivada

do meio social, como já comentamos sobre o pensamento bakhtiniano, seria

adequado trabalharmos a sensibilidade já incentivando as crianças a perceberem que

a leitura de um poema envolve aspectos sócio-ideológicos da realidade. Pois se

observarmos nossos relacionamentos com as pessoas e com o universo que está ao

nosso redor, as ligações que o discurso do poema herda do passado, a

verossimilhança com nosso presente e as conexões com o futuro poderíamos assumir

posturas próprias refletindo, planejando e concretizando nossos projetos individuais

ou sociais. Portanto, incentivaríamos a sensibilidade usando os eventos ou materiais

da realidade para a reflexão.

O ritmo e a rima surgem como uma outra preocupação de Cunha (1987) e a

importância desses elementos consistem em fazer com que a criança logo entre em

contato com a atividade lúdica da poesia uma vez que “A linguagem [...], deve ser

simples: o rebuscamento e a retórica, mesmo na poesia mal suportados pelo adulto,

são inaceitáveis pela infância” (CUNHA, 1987, p. 94).

A autora refere-se ao excesso do caráter sutil, do poeta, resultantes de sua

subjetividade unida à sua intelectualidade, visto que esses provocam dificuldade de

compreensão na criança. Por isso, os tropos4 são aceitáveis, contudo os poemas e os

versos curtos são os mais indicados para o ensino-aprendizado das crianças.

Cunha (1987) acrescenta que o interesse das crianças por diversas cantigas

populares se estende aos poemas e aos versos curtos exatamente pela semelhança

4 Conforme Antonio Candido os tropos estão divididos em três famílias, com as funções de: ornar e significar, apenas significar e somente ornar. “1. Do primeiro tipo havia as seguintes: metáfora, alegoria, ironia, metonímia, metalepse, antonomásia, onomatopeia, hipérbole. 2. Do segundo tipo: sinédoque, epíteto. 3. Do terceiro tipo: perífrase, hipérbato.” (CANDIDO, 2006, p. 129).

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que há entre esses dois gêneros, por conseguinte, os poemas modernistas são os

mais apreciados pelos alunos ainda na infância.

Conforme Cunha (1987), o resultado de sua pesquisa sobre o tratamento

realizado com o poema em sala de aula tanto no Ensino Fundamental quanto no

Ensino Médio demonstrou que os professores deixam o gênero poema em segundo

plano, porque não conhecem a forma de abordá-lo, pois no momento da pesquisa os

poemas a serem trabalhados eram selecionados pela escola e priorizavam aspectos

moralizantes ou mesmo eram escolhidos como pretexto para ensinar em outras

disciplinas.

Cunha (1987) sugere, para o tratamento da poesia, a leitura expressiva (ler

várias vezes) tanto do aluno como do professor. Salienta que o educador deve evitar

a memorização ou o ditado, já que tais atividades impedem a compreensão textual,

pois,

Todas as estratégias capazes de aguçar a sensibilidade da criança e do adolescente para a poesia são válidas. Parece-nos importante ressaltar, entretanto, que para essa sensibilização é fundamental a frequência com que a poesia lhes é apresentada. (CUNHA, 1987, p. 96).

Em Cunha (1987), por conseguinte, além da articulação entre características

subjetivas e os elementos da formalidade para o tratamento do poema, o educador

deve expor à criança o contato com os poemas o maior número de vezes possível,

para um bom aprendizado.

No trabalho de Held (1980), são discutidas as dificuldades em relação aos

efeitos do imaginário existente nos produtos culturais que se destinam às crianças. A

autora faz um questionamento problemático: o fantástico na literatura infantil seria

realismo ou fantasia? Logo adiante, responde assumindo uma posição contra o

fantástico ter como característica primordial a angústia ou mesmo o imaginário dos

tradicionais contos de fada, nos quais os príncipes se casam com as plebeias.

Acrescentado a isso, neles são incentivadas, ainda, as decisões fatalistas, bem como

as revoltas de injustiçados. Assim, a autora salienta “o imaginário de que nos

ocuparemos não é [...] pseudo-imaginário com função de esquecimento, de exorcismo

e de diversão, que desvia a criança dos verdadeiros problemas do mundo de hoje e

da vida” (HELD, 1980, p. 12).

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37

Nesse sentido, Held (1980) compreende ser inconcebível pensar uma obra de

arte qualquer como sendo irreal - um imaginário do senso comum. Para a autora, a

arte, primeiramente, precisa ser imaginada na subjetividade do artista, conforme o seu

querer, o irreal torna-se real (verossimilhante), portanto. Para Held (1980), o produto

final já exposto na realidade existiu, antes, no espírito do autor. Dessa forma, o

fantástico (verossímil) expõe os desejos interiores do homem de projetar e construir

um universo particular estritamente como em seus pensamentos.

Logo, o imaginário fantástico e a realidade estão em constante relação

dialógica, isso nos remonta, novamente à subjetividade bakhtiniana e, por isso

lembramos a importância de constantemente buscarmos, na compreensão do poema

a ligação que há entre o passado e a contemporaneidade que há neles. Além disso,

vale a pena ressaltar, que no momento da escrita do trabalho de Held (1980), a

preocupação da autora estava na “necessidade vital de resgatar a categoria do

imaginário como fator de desenvolvimento e de renovação das potencialidades

humanas nas artes, na literatura, na ciência e na vida em geral” (HELD, 1980, p. 13).

A preocupação de Held (1980), bem como de outros representantes de

diversos segmentos da sociedade francesa era visível, por conta do pensamento

racionalista cartesiano, vigente na época, pois apesar de desenvolver extremamente

as capacidades intelectuais de forma mecânica, outras habilidades eram desprezadas

no desenvolvimento humano.

Nessa perspectiva, Held (1980), a princípio, ao tratar a abordagem do ensino

com o poema, critica o ensino de forma tradicional que incita a criança a repetir os

modelos criados pelo professor, porque o aluno ainda pequeno tem a capacidade de

inventar suas próprias criações poéticas e fantásticas e tal habilidade deveria ser

incentivada para se estender até a vida adulta, pois resultaria em jogo poético e

fantástico, manifestações lúdicas em sons e ritmos e também em nonsense5, isto é, a

ressignificação do mundo.

Held (1980), na mesma linha do pensamento freudiano, a respeito da palavra

espirituosa, diz que há interesse na criança, particularmente, pela pluralidade e

5 Se recorrermos à sua etimologia — non («não») + sense («sentido») —, de origem inglesa, depreende-se o significado do termo nonsense: “expressão, linguagem ou situação ilógica, absurda, desprovida de sentido ou de coerência”. Disponível em: <http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php? id=19429>. Acesso em: jan. 2014.

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38

ambiguidade das palavras, ou o resultado de sua imaginação para o início de uma

produção de poema,

O envolvimento inicial da criança pela linguagem se assemelha, em muitos aspectos, do ponto de vista dos interesses psicológicos, ao gosto pelos brinquedos de montar, pelos quebra-cabeças. Procura inconsciente ou semi-consciente do infinito. Encantamento diante do fenômeno de encaixe, das inumeráveis combinações inconcebíveis. (HELD, 1980, p. 201).

Para Held (1980), o mais importante para a criança é que, ao aprender a utilizar

a língua, o professor encontre um equilíbrio entre a estrutura da linguística e a

capacidade psicológica de criar, entretanto, para a autora, mesmo quando o aspecto

gramatical é observado, não é permitido à criança o direito da liberdade criadora, pois

é necessário que ela compreenda a ordem direta das orações e não a inversa. Nesse

sentido, Held (1980) sugere a desconstrução de textos para que o equilíbrio entre a

liberdade criadora e os aspectos gramaticais sejam vivenciados na prática de

aprendizado das crianças.

Contudo, há um problema, para Held (1980), a criança, ainda interagindo no

meio com os adultos, logo aprenderá que existem palavras diferentes, e embora

precise de tudo que é dito ao seu redor, para enriquecer seu vocabulário, a língua

poderá se transformar em obstáculo se for vista como unívoca. Pois, conforme Held

(1980), existe diferença entre a linguagem – instrumento e linguagem criadora. Na

primeira, a palavra tem uma função específica, já na segunda é criadora. Adicionado

a isso está o fato de que tudo que é redundante na linguagem instrumental constitui

material significativo para o surgimento da redundância na poesia. A esse respeito diz

Held que

O próprio da linguagem poética e fantástica, o que a torna insubstituível na formação equilibrada de uma criança, é a sua essência multiunívoca. É convite à viagem ao país das palavras. Dá á criança, ou prolonga nela, o sentido de uso gratuito, não utilitário, da linguagem. (HELD, 1980, p. 215).

Sendo assim, Held (1980) assume a posição de ser contra o ensino tradicional

da língua, ou seja, o que segue modelos. Esclarece que a noção de fantástico na

literatura infantil tem conexões com a realidade, já que o imaginário é formado ainda

na psique do indivíduo. Portanto, para autora, o imaginário deve fazer parte do

aprendizado e, por meio da ludicidade com as palavras, sugere a desconstrução de

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textos para ensinar poesia, pois o jogo e a ambiguidade reprimidos na linguagem

funcional é imprescindível na linguagem criadora.

No livro A poesia na Escola de Ana Elvira Luciano Gebara, afirma-se que para

o aluno ler poesia na escola é preciso ser estimulado. Assim, a proposta de Gebara

(2002) é que haja estratégias preparadas e orientadas pelos professores nesse

sentido. O livro é dividido em duas partes, uma teórica e outra prática, essa divisão

proposital auxilia o professor no momento da aplicação dos conteúdos em sala de

aula. Na segunda parte, são utilizados pela professora poemas de José Paulo Paes

para a análise e interpretação desses textos poéticos.

Na opinião de Gebara (2002), para o aluno alcançar uma boa compreensão da

leitura de poemas é necessário um estímulo. A autora, então, sugere a “atividade

lúdica, como o jogo, resultando em fonte de prazer capaz de seduzir e conquistar

pequenos leitores” (GEBARA, 2002, p. 09), ou seja, a ludicidade se tornará

componente das aulas de língua portuguesa, quando o conteúdo envolver o trabalho

com poemas.

No texto Ora, direis escrever poemas... certo perdeste o senso? – Poema da

Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro – edição 2010, a professora

Ana Gebara apresenta o resultado da análise de um grande número de textos

produzidos para a 2ª edição da Olimpíada 2010.

Gebara (2010) comenta que embora os poemas não tenham lugar privilegiado

na escola, são responsáveis pela “natureza da linguagem poética, assim como as

particularidades do fazer poético” (GEBARA, 2010, p. 08).

Segundo a autora (2010), entretanto, a Olimpíada se constitui como espaço em

que há liberdade para que os professores os tragam para as práticas diárias de

ensino-aprendizagem de língua materna, por meio dos textos contidos no Caderno

Poetas da Escola e também de suas orientações para a produção.

Gebara (2010) comemora o sucesso do desafio lançado pela OLPEF e

descreve o percurso metodológico percorrido pelos professores ao ensinar os

elementos da composição formal do poema. Desse modo, a forma composicional e

as figuras de linguagem foram privilegiadas fundamentando sua avaliação, pois:

Os poemas analisados apresentam distribuição gráfica adequada, mantendo, inclusive, certa regularidade no aspecto visual quanto a versos e a estrofes. Nesses versos as coincidências sonoras finais, a rima, e a procura de métrica regular surgiram como uma constante. [...] quanto ao metro, observa-se uma tendência à regularidade,

Page 41: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

40

muitas vezes baseada no cumprimento dos versos gráficos, numa clara percepção de simetria visual. [...] as estruturas paralelísticas [...] Importante mencionar também como os alunos-poetas distribuíram seus versos nas páginas. A estrutura mais frequente foi o quarteto. (GEBARA, 2010, p. 09-11, grifo da autora).

Para Gebara (2010), os resultados da Olimpíada em relação à produção dos

alunos foram satisfatórios. Mas, entre diversas observações, a professora afirma que,

em alguns momentos, “Os alunos-poetas ainda parecem muito preocupados com o

que têm a dizer, deixando em segundo plano a procura da forma mais adequada a

seus conteúdos” (GEBARA, 2010, p. 11). Percebemos, portanto, o foco da

preocupação de Gebara ao tratar o gênero discursivo poema centralizado nas

formalidades linguísticas. Acrescentado a isso, nos questionamos por que a

preocupação excessiva do trabalho com poemas no Poetas da Escola com a forma,

se o objetivo não é o talento artístico.

Jolibert (1994) fundamenta sua pesquisa nas teorias de C. Freinet, A. Vasques

e F. Oury. Adota uma pedagogia de projetos e o cooperativismo entre os sujeitos

envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, para o tratamento tanto da leitura

como para a produção textual. Referente ao primeiro volume, em que o centro está

na leitura, coloca um questionamento pertinente: o que é ler? Em seguida, temos em

sua resposta esclarecimentos a respeito de que ler não é decifrar o sistema linguístico

e também não consiste em oralizar por meio de grupos respiratórios, mas a validade

efetiva do ato de ler significa “atribuir diretamente um sentido a algo escrito”

(JOLIBERT, 1994, v. 1, p. 15). Para isso, é preciso que sejam desenvolvidas, no aluno,

competências inerentes à compreensão da leitura, portanto, as competências

linguísticas. Não é só isso que garante a leitura, além do que os sentidos são múltiplos.

Em relação aos dois volumes, Jolibert (1994) adota procedimentos

metodológicos interessantes, para dinamizar as relações estabelecidas entre os

alunos e os meios em torno desses componentes, assim,

A vida cooperativa em sala de aula, e da escola, e a prioridade conferida à prática da elaboração e conduta de projetos explicitamente definidos juntos permitem, de uma maneira exemplar, que a criança viva seus processos autônomos de aprendizado e se insira num grupo e num meio considerados como estrutura que estimula, que exige, que valoriza, que provoca contradições e conflitos e que cria responsabilidades. (JOLIBERT, 1994, v. 1, p. 20).

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Percebemos, aqui, uma criança envolvida em um organismo, cujos elementos

vivos (equipe escolar e os pais), materiais (recursos) ou circunstanciais

(oportunidades de vivenciarem a preparação e a ação pedagógica) as influenciam,

para interagirem como sujeitos ativos, em que consequentemente o aluno tem a

percepção de que faz sentido o frequentar a escola durante tantos anos. Há, também,

resultado para seus ensino-aprendizagem, porém não tanto eficaz, visto que

pensamos ainda estar ausente o componente da perspectiva enunciativo-discursiva

bakhtiniana para a compreensão efetiva do poema. Na visão de Jolibert (1994), a

forma sintética metodológica para o tratamento da leitura da representação poemática

deve ser:

– ao nível da superestrutura: a “silhueta” do poema é construída no quadro, e as crianças propõem utilizá-la para escrever poemas “à maneira de...” No final da sequência, ela serve para ajudar a implementar a memorização do poema; – ao nível das rimas: as crianças recapitulam as palavras que terminam com a rima [ã] [...] e as leem oralmente; procuram outras rimas; – ao nível dos sufixos: analisa-se e decompõe-se a palavra ‘rafraîchissant’ [refrescante]; – ao nível dos verbos: estabelece-se a seguinte classificação: comer comido tornar tornado, etc. (JOLIBERT, 1994, v. 1, p. 190).

Vimos, na síntese, Jolibert (1994) se referindo à análise feita pelo professor

juntamente com os alunos do poema Les quatre éléments6. É possível visualizarmos,

nesse recorte, o que havíamos dito, anteriormente, acerca da leitura em Jolibert

(1994), não apresentar os parâmetros enunciativo-discursivos para tal análise, pois as

orientações vão em direção da identificação da linguística textual.

Nas atividades empreendidas para a produção textual da poesia, Jolibert (1994)

comenta sobre sua insatisfação ao ver os colegas professores enfatizando “mais o

desbloqueio do imaginário, a expressão ou a liberação pela poesia do que os

aprendizados” (JOLIBERT, 1994, v. 2, p. 185). Para a autora, esses componentes

devem ser abordados em unidade, mas os aprendizados a que se refere a autora

abrangem três dimensões: a linguística, a afetiva e a imaginária. O aprendizado

consiste no processo de conhecimento e domínio das habilidades linguísticas.

6 Os quatro elementos

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42

A especialista em didática defende, portanto, que a poesia seja

desescolarizada. No entanto, tal fenômeno é visto por ela como um paradoxo, pois ao

mesmo tempo em que uma das funções da escola é preparar o aluno para que ao

final de sua escolarização tenha adquirido a capacidade de ler, declamar e produzir

poemas independentemente, é no espaço escolar que se dão as experiências reais

da criança com o poema, isto é, com

– atividades, espaços e encontros poéticos que convidam para viver em poesia com o passar dos dias; – dois módulos sistematizados de aprendizado de produção de poemas, diferentes, porem convergentes, os ateliês de impulsão afetiva e imaginária e os canteiros com dominante linguística; – atividades de treinamento de dicção. (JOLIBERT, 1994, v. 2, p. 187).

O canteiro é definido como “módulo de aprendizagem [...] centrado em um tipo

de texto” (JOLIBERT, 1994, v. 2, p. 38). Nessa perspectiva, em que o poema é visto

sob esse aspecto, a inclusão de canteiros na ação pedagógica, para abordar o poema,

demonstra a intenção da professora em privilegiar as competências linguísticas a

serem aprendidas.

Diz Jolibert (1994), que tanto na leitura como na produção textual do poema,

as formalidades devem ser superadas abrindo passagem para a poesia

contemporânea. Mas, as diretrizes pertinentes a seu trabalho convergem, ao final,

primordialmente, para a valorização dos aspectos linguísticos ou da teoria literária

com as suas funções poéticas.

Dessa forma, diz Dolz & Schneuwly (2010) é chegado o momento de refletirmos

sobre uma nova abordagem para o ensino de língua materna e já que, conforme os

pesquisadores, o período das tipologias textuais é passado, percebe-se, então, a

necessidade de aderirmos a outra perspectiva como, por exemplo, a coesão entre a

concepção sócio-histórica de Vygotsky e a enunciativo-discursiva de Bakhtin. Nas

considerações de Dolz & Schneuwly (2010) são esclarecidos os conceitos

vygotskyanos de instrumentos ou ferramentas, bem como gêneros do discurso

primários e secundários de Bakhtin. Assim, o pesquisador sentencia que como em

toda pesquisa científica é preciso a classificação, por isso, os gêneros também devem

ser classificados.

Pinheiro (1995), outro autor sobre a didatização do poema, diz que devido à

própria experiência em trabalhar em alguns estados diferentes, percebeu que “a

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43

ausência da poesia na sala de aula é uma constante” (PINHEIRO, 1995, p. 10). Por

isso, lamenta o fato de que há uma carência de professores leitores de poesia,

principalmente, da tradição poética.

Nesse sentido, Pinheiro (1995) critica a abordagem privilegiando apenas o jogo

pelo jogo e desprezando os sentidos, pois o aluno mais experiente ao adquirir novos

conhecimentos, por meio de diversos tipos de leitura, torna-se desinteressado pelas

“assonâncias, aliterações, ecos, paranomásias, paralelismos [...] recursos

sonoros/semânticos que povoam muitos poemas infantis” (PINHEIRO, 1995, p. 16).

Além disso, existe, ainda, o problema da moralização por meio do texto poético.

Para o professor é necessário que o educador esteja atento, porque a utilização

de tais recursos não garante a literariedade, um aspecto constitutivo dos poemas e

que, em certa medida, enriquece os sentidos sem tornar-se demasiadamente comum.

A poesia expressa sentimentos e expressões individuais, os quais somente podem

ser reconhecidos por usuários da mesma língua.

Pinheiro (1995) defende que mesmo os alunos resistentes à leitura de poemas

podem estar receptivos ao aprendizado com esse gênero se refletirmos sobre a

‘função social da poesia’ (PINHEIRO, 1995, p. 16). O autor retoma as palavras de T.

L Elliot em A função social da poesia e diz que em primeiro lugar é essencial que o

leitor esteja atento à intenção do poeta ao escrever o texto:

As pessoas suspeitam à vezes de qualquer poesia com um propósito particular, isto é, poesia em que o poeta defende conceitos, morais, políticos ou religiosos, assim como outras pessoas julgam amiúde que determinada poesia seja autêntica só porque exprime um ponto de vista que lhe apraz. (T. S. ELLIOT, 1991, apud PINHEIRO, 1995, p. 17).

Pinheiro (1995) explica que a função essencial da poesia consiste em ser um

ato prazeroso para o leitor, vivenciar a cada nova leitura e relacioná-la com a

realidade, para a qual não temos explicação. Assim, nossa consciência será ampliada

e sempre exercerá uma ponte de comunicação para uma nova experiência, ou uma

compreensão do que já nos é familiar ou a expressão de algo que já experimentamos,

entretanto, não temos palavras para explicar, dessa maneira, segundo o autor a

ampliação de nossa consciência será aperfeiçoada para reprogramarmos nossas

atitudes.

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44

Pinheiro (1995) defende que o valor da poesia consiste em expressar

sentimentos e expressões individuais, mas ao mesmo tempo tem uma função social,

pois somente os conhecedores da mesma língua – idioma – podem compreender seus

possíveis sentidos. Já ao artista cabe o papel de conduzir aos homens para um mundo

de fantasia e da reflexão sobre o universo real, pois ‘em nossas origens, toda a poesia

é uma ato social, em que comungam o poeta e o povo’ (THOMSON, 1977, apud

PINHEIRO, 1995, p. 19).

Quanto à metodologia, diz Pinheiro (1995) que em seus diálogos com

professores de língua materna, esses constantemente lhe pedem técnicas para

auxiliá-los no momento da leitura oral do poema, principalmente no que diz respeito

aos poemas do Modernismo, pois existe a “falta de pontuação, as elipses, a ausência

de uma direção de leitura” (PINHEIRO, 1995, p. 29). Por isso, indica a leitura e a

releitura em voz alta, pois na oralização percebemos as pausas, identificamos o valor

de cada palavra e as formas apropriadas para o tom.

Nesse sentido, os professores não se interessam por uma educação que

sensibilize aos alunos para a poesia. Entretanto, Pinheiro (1995) afirma ser importante

trabalhar com a poesia em sala de aula, respeitando critérios estéticos na escolha das

obras ou na confecção de antologias.

Um pouco mais adiante, Pinheiro (1995) elenca três regras encontradas por ele

durante seus estudos. A primeira regra é ler o poema ‘todo sem parar, quer você ache

que entende quer não’ (ADLER, 1974, apud PINHEIRO, 1995, p. 31), para captar a

unidade de sentido do todo textual. Na segunda sugestão é aconselhado que o leitor

‘leia o poema todo novamente – mas leia-o em voz alta’ (ADLER, 1974, apud

PINHEIRO, 1995, p. 31). Segundo essa regra, na pronúncia das palavras em voz alta,

é possível corrigirmos um verso mal compreendido, na leitura anterior. A terceira

norma diz que devemos fazer alguns questionamentos ao próprio poema:

Por que certas palavras soltam do poema e atraem a atenção? Será por causa do ritmo? Ou da rima? Ou são palavras repetidas? Várias estrofes parecem referir-se às mesmas ideias: sendo assim, essas ideias seguem algum tipo de sequência? (ADLER, 1974, apud PINHEIRO, 1995, p. 32).

De acordo com Pinheiro, tais sugestões, se realizadas em conjunto, podem

contribuir para a compreensão do poema, entretanto, o autor ressalta que o aluno, ao

longo de seus estudos, “construirá” seu próprio modo de ler o gênero poema, pois a

Page 46: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

45

leitura de um poema lírico requer uma busca pelas descobertas de sentidos de um

grande poema, que pode se estender por toda uma vida.

Outro procedimento que pode ser adotado, pelo professor, para a abordagem

do gênero poema, segundo Pinheiro (1995), é a Organização de Antologias devido à

dificuldade de se encontrar obras com poemas adequadas na literatura juvenil. A partir

da leitura das antologias, o aluno buscará os estilos e as temáticas de seus poetas

preferidos.

A última possibilidade para o trabalho com a poesia em sala de aula, apontada

por Pinheiro (1995), constitui as Pequenas montagens teatrais. O autor explica que o

teatro está localizado em um campo de fronteira, pois enquanto texto poético podemos

abordar a inflexão da voz, a linguagem gestual, a dinâmica dos movimentos nos

cenários, portanto “o teatro é uma arte que, como a poesia, lida com a emoção, com

o sentimento, com a subjetividade. [...] a aproximação poesia-teatro muito pode ajudar

na criação do hábito de ler poesia” (PINHEIRO, 1995, p. 36).

Já Cyntrão (2004) reflete acerca das manifestações em diferentes gêneros e

investiga como se constituem os significados em cada texto a partir do ponto de vista

do “analista literário; manifestações autônomas em sua existência como

representação, mas antenas e prismas em suas possibilidades dialógicas”

(CYNTRÃO, 2004, p. 07).

Durante o percurso de seu texto, Cyntrão (2004), apresenta olhares de Roland

Barthes, Humberto Eco e Otávio Paz sobre a literatura, bem como inclui leituras do

antropólogo Canclini e do sociólogo Gilbert Durand necessárias para a análise

denominada pela autora de inter-trans-textual da poesia. Desse modo, Cyntrão (2004)

propõe “análises que partem da intertextualidade comparativa para chegar à trans-

textualidade de abertura semiótica” (CYNTRÃO, 2004, p. 08). Uma leitura, portanto,

que visa a re-problematizar a relação autor-leitor, via texto, e a possibilitar uma

amplitude de reflexões sobre o sujeito impresso nas representações simbólicas.

Cyntrão (2004) afirma que o ato de ler um poema significa buscar os sentidos

derivados do imaginário do poeta, mas não nas formas iniciais vivenciadas por esse

artista, no contexto sócio-histórico, e sim em outras diferentes formas estruturais, e é

nessa perspectiva que o artista, em primeiro lugar, age como um catalisador de

experiências comportamentais ou de linguagens e as transforma em outras diferentes

manifestações poéticas, porque

Page 47: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

46

Buscar no texto poético sentidos significa identificar as estruturas psicológicas e sociológicas significadas em sua semântica, já que se a palavra é o fenômeno ideológico por excelência, os signos emergem do processo de interação entre uma consciência individual e outra e a construção do objeto poético subordina-se à verdade (real ou imaginária) do sujeito e do grupo. (CYNTRÃO, 2004, p. 12).

Para Cyntrão (2004), essencialmente, “ler um poema consiste em decifrar-lhe

o sentido tensionado, nascido do imaginário do poeta e transformado pela via da

representação estética na construção do objeto textual” (CYNTRÃO, 2004, p. 11). A

defesa da autora está em que o leitor, no momento da leitura, traga para seu contexto

conexões com diferentes áreas de conhecimento da cultura humana para, enfim,

desvendar os possíveis sentidos que parcialmente foram sugeridos no texto.

Cyntrão (2004) explica que o fazer poético é um movimento de escolhas

conscientes do poeta. O movimento que existe é por conta dos confrontos que existem

na subjetividade e seleção estilística. Essas escolhas pertencem ao sujeito eu-lírico,

mas existe a relação entre os dois autores (autor/poeta e autor/lírico), conforme

Bakhtin (2003), e o leitor.

A intenção de quem quer desvelar as formas simbólicas é a tensão criada entre

esses três interlocutores, para em seguida ressignificar os sentidos de acordo com o

histórico, pois interpretar é a vontade de se compreender e compreender o outro.

Para Koch (1970), a preocupação consiste em como atrair a atenção das

crianças e também em como melhorar o ensino da poesia. Apesar de esse

pesquisador ter realizado seu trabalho na década de 70, o tema ainda é atual. Em

nosso trabalho, comentaremos apenas o capítulo Teaching children to write poetry,

em que o autor expõe a técnica utilizada para estimular a criatividade dos alunos na

escrita da poesia. Indiretamente, Koch (1970) pretendia ensinar aos professores e

diretamente aos alunos.

A primeira direção tomada pelo autor foi não utilizar a mesma linguagem para

adultos e crianças, porque para estas, a linguagem daqueles poderia ser monótona.

Para motivar os alunos, inicialmente, o pesquisador solicita que eles produzam um

poema em conjunto oralmente, mas cada criança contribuiria apenas com uma frase.

Às crianças foi esclarecido que não havia a necessidade de competição, pois não

haveria julgamento de valores. Contudo, as frases não seriam aleatórias, ou seja,

seguiriam um fio condutor ou uma amarração que as unissem em uma unidade de

sentido ao serem finalizadas. Assim, os alunos seguiriam regras e instruções simples.

Page 48: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

47

Em primeiro lugar, a frase deveria conter “I wish” – eu desejo – (KOCH, 1970, p. 10),

ao final do texto, torna-se perceptível que a união de frases resultou em um poema,

com a finalização do professor.

O sucesso do empreendimento deve-se ao fato de que as frases fazem parte

da realidade das crianças e foi sugerido, então, aos alunos, que produzissem um texto

escrito seguindo o mesmo critério. Todavia, foi-lhes apresentada a segunda

precaução de Koch (1970), concernente ao não uso de rimas. Para o professor,

apesar de as rimas serem “belas”, as crianças perderiam o fluxo da escrita ao tentarem

combinar as terminações das palavras.

Outra linha bastante abordada em poemas e desconsiderada por Koch (1970)

foi o uso da metáfora, pois se percebeu que, para elas, era significativamente mais

fácil e compreensível a adoção das comparações.

Uma particularidade a mais foi um fator de reflexão para Koch (1970), isto é,

ao ensinar poemas, professores se deparam com a sextina7. Existem, basicamente,

duas correntes teóricas, uma que preza pela forma estrutural e pouco enfatiza o

sentido do poema. E outra, na qual o sentido do texto é defendido e a forma assume

segundo plano. Koch (1970) propõe, portanto, uma técnica prazerosa e

simultaneamente enigmática, para a inclusão da sextina na produção textual: escreve

as palavras do poema no quadro e incentiva as crianças a completarem a produção

do texto.

Koch (1970), por conta das diferentes faixas etárias, considerou trabalhar com

a linguagem adequada para cada uma. Por isso, o pesquisador encontrou como

solução incluir trechos de autores renomados, que se aproximassem da perspectiva

poética das crianças, a fim de despertá-las para a leitura das poesias dos adultos.

Finalmente, durante o trabalho desenvolvido por Koch (1970), uma prática

interessante e eficaz foi percebida. O rendimento da escrita em sala de aula era

superior ao desempenho em casa. Nas palavras do autor:

A surprising discovery I made at P.S. 618 was that children enjoyed writing poems at school more than at home. I had assumed that like grownup writers they would prefer to be comfortable, quiet, and alone

7 Composição de origem provençal, formada por seis sextilhas e um terceto. Disponível em: <http://www.infopedia.pt/$sextina>. Acesso em:jan. 2014. 8 P.S. 61 é a nomenclatura usada no estado de Nova York para designar as escolas públicas. Mais precisamente Public School 61. Nota do tradutor.

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48

when they wrote, but I was wrong. Once it had to be done away from school, poetry was part of the detestable category “homework”, which cuts one off from the true pleasures of life; whereas in school it was a welcome relief from math, spelling, and other required subjects. Closing their heavy books to hear about a new idea for a poem made the children happy and buoyant.9 (KOCH, 1970, p. 31-32).

Dessa forma, vimos o papel do professor como mediador, conduzindo muito

bem sua tarefa de auxiliar o aluno a encontrar meios mais claros que a exploração

das formas fixas da língua, para chegar ao objetivo final da produção do texto, já que

trabalhavam com a busca e a construção dos múltiplos sentidos do texto.

2.2.2 PCN: texto literário em suas particularidades

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada

com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu

preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Constituição Federal de 1988

O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais populares e acesso às

fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das

manifestações culturais.

Constituição Federal de 1988

Pela linguagem os homens e as mulheres se comunicam, tem acesso à informação,

expressam e defendem pontos de vista, partilham ou constroem

visões de mundo, produzem cultura.

Parâmetros Curriculares Nacionais

Para a educação brasileira tornar-se eficiente, o Ministério da Educação, por

meio dos PCN e estes subjacentes à Constituição Federal de 1988, baliza as

9 “Uma descoberta surpreendente que eu tive na escola pública 61 foi que as crianças gostam muito mais de escrever poemas na escola que em casa. Eu acreditava que como escritores adultos elas iriam preferir estar confortáveis, quietas e sozinhas quando elas escrevessem, mas eu estava errado. Uma vez que a poesia tivesse que ser feita fora da escola ela faria parte da detestável categoria de “dever de casa”, o qual tira as pessoas dos verdadeiros prazeres da vida; enquanto que na escola era um alívio bem-vindo e distante da matemática, de soletrar palavras e outras tarefas requisitadas. Ao fechar os livros pesados para ouvir sobre novas ideias para um poema deixava as crianças alegres e felizes” (Tradução livre de Robson Dias de Assis).

Page 50: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

49

condições em que funcionam os currículos na escola e também os conteúdos

disciplinares a serem ministrados na sala de aula, com a finalidade de garantir uma

educação básica de qualidade, pois os alunos devem

Compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repudio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito. (BRASIL, 1998, p. 07).

Dessa forma, se às crianças devem ser garantidos esses direitos e deveres e

também o aprendizado e prática dos valores necessários para a convivência

harmoniosa em sociedade, compreendemos a importância dos alunos manterem

contato constante com a literatura, pois

O texto literário constitui uma forma peculiar de representação e estilo em que predominam a força criativa da imaginação e a intenção estética. Não é mera fantasia que nada tem a ver com o que se entende por realidade, nem é puro exercício lúdico sobre as formas e sentidos da linguagem e da língua. (BRASIL, 1998, p. 26).

A literatura, portanto, possibilita ao indivíduo a formação intelectual e,

consequentemente, a prática do que foi internalizado, porque em seus textos existe,

constantemente, um movimento entre os acontecimentos da realidade e suas

representações. Assim, se as transformações sociais, políticas e históricas são bases

para a criação literária, podemos perceber uma relação entre os discursos reais e a

escolarização da literatura.

Em vista disso, ao se preocupar com o valor do ensino literário na escola - visto

que por meio de leituras literárias, os alunos podem refletir sobre o que leem,

estabelecer relações entre eles mesmos, o autor e o texto e a partir disso desenvolver

competências de leitura – os PCN (1998), então, indicam para o ensino de Língua

Materna a leitura de diversos textos, unidade fundamental do ensino-aprendizagem

de língua materna, os quais veremos adiante.

Conforme os PCN, o texto literário como representação significa “um modo

particular de dar forma às experiências humanas” (BRASIL, 1998, p. 26), ou seja, não

se submete aos critérios científicos, às diferentes maneiras de observação da

realidade nem às regras linguísticas. O texto literário transgride todos os padrões para

mediar relações “entre o sujeito e o mundo, entre a imagem e o objeto, mediação que

Page 51: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

50

autoriza a ficção e a reinterpretação do mundo atual a dos mundos possíveis”

(BRASIL, 1998, p. 26).

De acordo com os PCN, por meio dessas relações, nascem diferentes diálogos

em um movimento de aproximação e afastamento, por isso surgem, para o aluno,

diferentes pontos de vista. Assim, a relativa autonomia da literatura constitui fonte de

conhecimento.

Considerando as condições de produção da contemporaneidade, conforme os

PCN (1998), o texto literário ainda deve ser analisado do ponto de vista linguístico e

acrescenta-se que, embora existam textos escritos dentro da norma padrão da língua,

“a composição verbal e os recursos linguísticos obedecem à sensibilidade e a

preocupações estéticas” (BRASIL, 1998, p. 27), por isso as criações literárias têm a

liberdade de se afastar das convenções do sistema linguístico. A língua, portanto,

torna-se matéria prima para a dimensão semiótica do objeto literário

[...] na exploração da sonoridade e do ritmo, na criação e recomposição das palavras, na reinvenção e descoberta de estruturas sintáticas singulares, na abertura intencional a múltiplas leituras pela ambiguidade, pela indeterminação e pelo jogo de imagens e figuras. Tudo pode tornar-se fonte virtual de sentidos, mesmo o espaço gráfico e signos não-verbais, como em algumas manifestações da poesia contemporânea. (BRASIL, 1998, p. 27).

Nesse sentido, os PCN (1998) nos alertam para estarmos atentos à forma

inadequada de abordagem dos textos do campo literário, pois não podemos tratá-los

como pretexto para o ensino da gramática nem como veículo de transmissão de

valores morais, os quais poderiam ser assimilados pelas crianças, mas sim que os

alunos sejam “capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a

extensão e a propriedade das construções literárias” (BRASIL, 1998, p. 27).

Os documentos oficiais delineiam os objetivos específicos para o 3° e o 4°

ciclos, isto é, habilidades que deveriam ser desenvolvidas nos alunos, para cada uma

das atividades globais de leitura e de produção de textos orais e escritos, bem como

análise linguística, além da preocupação com a ZPD de Vygotsky.

Salientam os PCN que os conteúdos a serem apresentados aos alunos no 3°

e 4° ciclos devem abranger os objetivos específicos para esses ciclos e também para

o Ensino Fundamental, mas primeiramente sugerem uma relação de gêneros a serem

abordados.

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51

Quadro 1 – Prática de escuta de textos orais e leitura de textos escritos

GÊNEROS PRIVILEGIADOS PARA A PRÁTICA DE ESCUTA E LEITURA DE TEXTOS

LINGUAGEM ORAL LINGUAGEM ESCRITA

LITERÁRIOS

DE IMPRENSA

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

PUBLICIDADE

cordel, causos e similares

texto dramático

canção

comentário radiofônico

entrevista

debate

depoimento

exposição

seminário

debate

palestra

propaganda

LITERÁRIOS

DE IMPRENSA

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

PUBLICIDADE

conto

novela

romance

crônica

poema

texto dramático

notícia

editorial

artigo

reportagem

carta do leitor

entrevista

charge e tira

verbete enciclopédico (nota/artigo)

relatório de experiências

didático (textos, enunciados de questões)

artigo

propaganda

Fonte: Organizado pela autora/2013, de BRASIL (1998, p. 54).

Quadro 2 – Prática de produção de textos orais e escritos

GÊNEROS SUGERIDOS PARA A PRÁTICA DE PRODUÇÃO

DE TEXTOS ORAIS E ESCRITOS

LINGUAGEM ORAL LINGUAGEM ESCRITA

LITERÁRIOS

DE IMPRENSA

canção

textos dramáticos

notícia

entrevista

debate

LITERÁRIOS

DE IMPRENSA

crônica

conto

poema

notícia

artigo

carta do leitor

Page 53: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

52

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

depoimento

exposição

seminário

debate

DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

entrevista

relatório de experiências

esquema e resumo de artigos ou verbetes de enciclopédia

Fonte: Organizado pela autora/2013, de BRASIL (1998, p. 57).

A intenção dos PCN em sugerir os grupos de gêneros visa auxiliar o professor

a reunir a seleção de conteúdos para a prática de análise linguística.

Há grande número de gêneros que circulam na sociedade, por isso, é preciso

selecioná-los, e o critério é: dar prioridade ao gênero “cujo domínio é fundamental à

efetiva participação social, encontrando-se agrupados, em função de sua circulação

social, em gêneros literários, de imprensa, publicitários, de divulgação cientifica,

comumente presentes no universo escolar” (BRASIL, 1998, p. 53):

Os princípios organizadores dos conteúdos de Língua Portuguesa (USO –> REFLEXÃO –> USO), além de orientarem a seleção dos aspectos a serem abordados, definem, também, a linha geral de tratamento que tais conteúdos receberão, pois caracterizam um movimento metodológico de AÇÃO –> REFLEXÃO –> AÇÃO que incorpora a reflexão às atividades linguísticas do aluno, de tal forma que ele venha a ampliar sua competência discursiva para as práticas de escuta, leitura e produção de textos. (BRASIL, 1998, p. 65).

Lembram os PCN (1998), entretanto, que essa seleção é aberta, pois quanto

ao tratamento didático dos conteúdos, a informação a ser transmitida pelo professor

e o método de ensino com os gêneros devem ter em vista o desenvolvimento do aluno,

já que é esperado, ao final do Ensino Fundamental, que as habilidades, nos ciclos

anteriores, tenham se convertido em competências para escutar, ler e produzir textos.

Nesse sentido, faz-se necessária, ainda, a avaliação para saber se os conteúdos

foram apreendidos pelos alunos.

Conforme os PCN (1998), no caso do ensino de língua materna e, cremos que

especificamente com a literatura, os alunos podem ter no professor leitor um exemplo,

se este vivencia diariamente esse hábito em sala de aula, pois os alunos ao

observarem os atos de leitura do educador podem se familiarizar com isso e tomar

com prática cotidiana deles.

Page 54: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

53

Finalmente, os PCN (1998) sugerem que além de novos conteúdos que

precisam ser apresentados à sala, o aluno deveria ter acesso a diversos gêneros, pois

os conceitos e os métodos referentes à análise de cada um dos textos, bem como os

recursos discursivos e linguísticos na formação de cada um deles, precisam ser

(re)visitados.

Os PCN (1998) nos advertem, ainda, sobre ser necessária uma reavaliação a

respeito da formação do professor:

Isso implica revisão e atualização dos currículos oferecidos na formação inicial do educador e a implementação de programas de formação continuada que cumpram não apenas a função de suprir as deficiências da formação inicial, mas que se constituam em espaços privilegiados de investigação didática, orientada para a produção de novos materiais, para a análise e reflexão sobre a prática docente, para a transposição didática dos resultados de pesquisas realizadas na linguística na educação em geral. (BRASIL, 1998, p. 67).

Nossa pesquisa está inserida, pois, nessa linha de pensamento. Buscamos

descrever o modo como foi abordado o poema no Caderno Poetas da Escola e, em

seguida, apresentar apenas algumas contribuições bakhtinianas no sentido de

acrescentar, para uma maneira diferente de lidar com tal gênero poético. Por

enquanto, de acordo com os PCN (1998), expomos as sugestões didáticas

responsáveis pela formação de um leitor, mas no caso de pretendermos formar

leitores capazes de compreensão crítica seria necessária a leitura colaborativa, em

que

[...] o professor pode selecionar situações didáticas adequadas que permitam ao aluno, ora exercitar-se na leitura de tipos de texto para os quais já tenha construído uma competência, ora empenhar-se no desenvolvimento de novas estratégias para poder ler textos menos familiares, o que demandará maior interferência do professor. (PCN, 1998, p. 72).

Dessa forma, vejamos os outros tipos de leitura, conforme os PCN (1998):

Leitura autônoma – leitura de textos, em que o aluno já seja proficiente no

gênero e de forma silenciosa.

Page 55: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

54

Leitura em voz alta pelo professor – leitura compartilhada pelo professor em

voz alta, para auxiliar o aluno, ainda não capacitado para compreender a estética ou

permanecer lendo um longo capítulo.

Leitura de escolha pessoal – leitura na qual o aluno realiza em casa, escolhe

seu autor ou gênero, com a intenção de relatar aos colegas suas impressões.

Leitura colaborativa – leitura estratégica, feita em conjunto pelo professor e os

alunos para que eles adquiram autonomia em relação ao ato. São observados

recursos linguísticos que dão sustentação ao texto e produzem sentidos,

antecipações, inferências, diferenciação entre ficção e realidade, ideologias, imagens,

projeto discursivo do autor etc. Logo, tal procedimento torna-se essencial para a

formação do leitor crítico (PCN, 1998, p. 72-73).

2.3 Considerações genebrinas: gêneros e desenvolvimento da linguagem

O gênero pode ser considerado um instrumento psicológico,

no sentido vygotskyano do termo

Dolz & Schneuwly

Schneuwly (2004), em concordância com o pensamento de A ideologia alemã

afirma:

A apropriação não é senão o desenvolvimento das capacidades individuais correspondentes aos instrumentos materiais de produção. A apropriação de uma totalidade de instrumentos de produção é o desenvolvimento de uma totalidade de capacidades nos próprios indivíduos. (MARX; ENGELS, 1845-1846[1969], apud SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 20-21).

O pensamento filosófico alemão, o qual seduziu grande parte da população

mundial defendia a ideia de que os instrumentos materiais estão disponíveis para

desenvolver pessoalmente tudo o que o homem constrói. Pois este, ao se apropriar

das capacidades em lidar com os instrumentos, se desenvolveria. Entretanto, a não

apropriação revelaria, para a sociedade, o estado em que esse sujeito se encontra:

homem sem cultura.

Dessa forma, Schneuwly (2004[1994]) coloca duas visões psicológicas

esclarecedoras para demonstrar que o instrumento constitui “fator de desenvolvimento

das capacidades individuais” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 21).

Page 56: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

55

A psicologia, inicialmente, considera a atividade humana dividida em duas

extremidades, em uma está posicionado o sujeito e na outra o objeto sobre o qual a

ação se desenvolve, por intermédio desse sujeito, tal como acredita Piaget, mas

Na perspectiva do interacionismo social, a atividade é necessariamente concebida como tripolar: a ação é mediada por objetos específicos, socialmente elaborados, frutos das experiências das gerações precedentes, através dos quais se transmitem e se alargam as experiências possíveis. Os instrumentos encontram-se entre o indivíduo que age e o objeto sobre o qual ou a situação na qual ele age: eles determinam seu comportamento, guiam-no, afinam e diferenciam sua percepção da situação na qual ele é levado a agir. (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 21).

Para Schneuwly (2004[1994]), o instrumento (texto), nessa perspectiva, não

mais apenas constitui uma ponte de ligação entre o aluno e a atividade executada,

mas sim determina a situação e molda o comportamento desse homem conforme a

especificidade desse instrumento.

Em nosso caso, em relação ao tratamento didático dispensado ao poema, em

sala de aula, por exemplo, apenas identificar o sistema linguístico selecionado para a

construção textual (no instrumento texto) já não mais se configura como ação

pedagógica eficiente a favor do aprendizado do aluno. Pois, ao educando não mais

interessa, na contemporaneidade, identificar as formalidades linguísticas em um

gênero qualquer. É necessário, portanto, que sejam ampliadas as suas possibilidades

de compreensão a partir dessa materialidade textual, já que o poema foi elaborado

como instrumento de comunicação anteriormente pela demanda social da esfera

artística. Entretanto, existe como lugar privilegiado das representações da sociedade

e dessa forma, então, as possibilidades semióticas e dialógicas implícitas ou

explícitas, nesse texto, devem receber atenção especial, pois os contextos onde

circulam esse instrumento poderão ser modificados.

Em seguida, Schneuwly (2004[1994]) analisa o gênero na proposição de duas

faces. Primeiramente, existe a dimensão (etapa) exterior do sujeito, cuja função

constitui materializar as finalidades para as quais se destinam o instrumento. E por

outro ângulo, existem os esquemas de utilização do objeto. Portanto, um instrumento

com que provoca mudanças nos objetos e controla os processos da natureza. Um

instrumento, por exemplo, um poema pode ser uma fonte de novas visões de mundo

ou de pensamento para o estudante. Assim, a essência passa a ser controlada no

sentido de que jamais as ideias serão as mesmas a partir do momento da leitura,

Page 57: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

56

principalmente se o aprendiz domina sua forma de utilização, isto é, seus esquemas

de utilização.

Schneuwly (2004[1994]) explica que há três importantes particularidades na

definição bakhtiniana de gênero discursivo, em primeiro lugar, o gênero é elaborado

a partir do objetivo para o qual a situação real discursiva exige e por conta da

necessidade dos possíveis destinatários e do conteúdo temático. Em seguida, o

gênero é escolhido entre várias possibilidades de textos existentes nas esferas da

comunicação conforme o que mais se adapta à situação interativa. Em terceiro lugar,

apesar de os gêneros serem flexíveis e mutáveis em seus conteúdos, obedecem a

uma rigidez estrutural que não é absoluta de acordo com sua função, com a interação,

bem como o estilo individual e do gênero.

Schneuwly (2004[1994]) cita um outro problema, ou seja, devido ao “rico

repertório de gêneros” surge a dificuldade para o aluno adaptar-se ao grande número

de gêneros e mesmo assim, ainda, não aparece na teoria bakhtiniana a presença dos

esquemas de utilização dos gêneros.

Schneuwly (2004[1994]), entretanto, divide os esquemas de utilização da língua

em duas formas: o primeiro esquema de utilização do “gênero como instrumento –

unidade de conteúdo temático, composição e estilo – deve poder ser adaptado a um

destinatário preciso, a um conteúdo preciso, a uma finalidade dada numa determinada

situação” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 24). Todavia, esse mesmo esquema

funciona de forma contrária, por exemplo, para que o homem possa ser bem sucedido

quanto à utilização do gênero instrumento é necessário que ele reconheça uma

situação em que somente um determinado tipo de gênero se adapta a ela, pois esse

indivíduo deve conhecer o gênero e também os mecanismos de controle sobre o

instrumento. Dessa forma, se existe a possibilidade de lançarmos mão dos

conhecimentos sobre o instrumento para realizar nossa intenção discursiva, significa

dizer, então, que temos o conhecimento. Logo, conforme Schneuwly (2004[1994]) “o

instrumento é um meio de conhecimento” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 25).

2.3.1 Gêneros secundários: uma continuação dos primários

Schneuwly (2004[1994]) aponta os ângulos em que podemos perceber o modo

de existência do gênero primário: ideias são compartilhadas mutuamente e

Page 58: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

57

controladas pelo contexto onde estão inseridas no ato da comunicação. Nessa

interação, portanto, quase não existe a preocupação com a metalinguística. “O gênero

simples, dessa maneira, basta-se a si mesmo; funciona como que por reflexo de

automatismo” (SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 26-27).

Em relação à especificidade dos gêneros complexos, para Schneuwly

(2004[1994]) ocorre um processo de maneira diferente, pois embora não sejam

controlados pela ação imediata da situação real de comunicação, são

contextualizados. O controle de seu funcionamento e sua metalinguística é feito

obedecendo aos objetivos do campo comunicativo para o qual foram elaborados.

Para Schneuwly (2004[1994]), portanto, a criança se utiliza dos gêneros

primários, em primeiro lugar, para participar das diferentes situações de comunicação

que fazem parte de seu cotidiano. Entretanto, o diálogo – gênero primário – torna-se

instrumento capacitando as crianças a utilizá-lo sempre, mas abordando diferentes

temas. A partir disso, os diálogos simples sofrem uma modificação, pois os “gêneros

se complexificam e tornam-se instrumentos de construções novas, mas complexas”

(SCHNEUWLY, 2004[1994], p. 27).

Dolz & Schneuwly (2004[1996]) apresentam, então, um quadro, com cinco

agrupamentos, os quais balizam seus trabalhos com os textos. Os professores

ressaltam que os critérios para os agrupamentos tentam equilibrar coerentemente

seus estudos com os objetivos externos. Os estudiosos declaram, entretanto, que

suas ênfases não estão em colocar à disposição dos educadores mais um

agrupamento, visto que já existem tantos outros, mas sim em definirem, nos gêneros,

as capacidades de linguagem globais, comuns em relação às tipologias já existentes

e necessárias à aprendizagem do aluno durante o período de sua educação formal.

Quadro 3 – Proposta provisória de agrupamento de gêneros

Domínios sociais de comunicação

Aspectos tipológicos Capacidades de linguagem dominantes

Exemplos de gêneros orais e escritos

Cultura literária ficcional

Narrar Mimeses de ação por meio da criação da

íntegra no domínio do verossímil

conto maravilhoso conto de fadas fábula lenda narrativa de aventura narrativa de ficção científica

Page 59: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

58

narrativa de enigma narrativa mítica sketch ou história engraçada biografia romanceada romance romance histórico novela fantástica conto crônica literária adivinha piada

Documentação e memorização das ações humanas Relatar

Representação pelo discurso de experiências vividas, situadas no tempo

relato de experiência vivida relato de viagem diário íntimo testemunho anedota ou caso autobiografia curriculum vitae ... notícia reportagem crônica social crônica esportiva ... histórico relato histórico ensaio ou perfil biográfico biografia ...

Discussão de problemas sociais controversos

Argumentar Sustentação, refutação e negociação

de tomadas de posição

textos de opinião diálogo argumentativo carta de leitor carta de reclamação carta de solicitação deliberação informal debate regrado assembleia discurso de defesa (advocacia) discurso de acusação (advocacia) resenha crítica artigos de opinião ou assinados editorial ensaio ...

Transmissão e construção de saberes

Expor Apresentação textual de diferentes

formas de saberes

texto expositivo (em livro didático) exposição oral seminário conferência comunicação oral

Page 60: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

59

palestra entrevista de especialista verbete artigo enciclopédico texto explicativo tomada de notas resumo de textos expositivos e

explicativos resenha relatório científico relatório oral de experiência ...

Instruções e prescrições

Descrever Ações Regulação mútua de comportamentos

instruções de montagem receita regulamento regras de jogo instruções de uso comandos diversos textos prescritivos ...

Fonte: Organizado pela autora/2013, de Dolz & Schneuwly (2004[1996], p. 51-52).

Conforme Dolz & Schneuwly (2004[1996]), os agrupamentos, por serem

diferentes, possuem características particulares a cada um e por esse motivo

esclarecem o porquê da progressão ser elaborada retornando sempre ao ponto

anterior, isto é, os alunos aprendem, mas depois é necessário desenvolver o que foi

aprendido durante as práticas didáticas com eles, nos outros ciclos, assim se

consolidam as capacidades de linguagem necessárias para a apropriação dos

gêneros. Dolz & Schneuwly (2004[1996]), nesse ponto, estão pensando no

desenvolvimento do instrumento, pois, de forma análoga, há a transferência de

capacidades adquiridas em um gênero, tais capacidades podem, também, serem

transferidas para outros do mesmo grupo. Para além disso, os autores, em uma visão

mais ousada, dizem esperar que haja, também, os transagrupamentos.

Ao apresentar, todavia, a tabela com os agrupamentos, há uma nota

esclarecedora dos estudiosos “Ignoramos propositadamente a poesia, que não pode,

absolutamente, ser tratada como agrupamento de gêneros. Para um tratamento

interessante, ver Jolibert, Sraiki, e Herbeaux 1992” (DOLZ; SCHNEUWLY,

2004[1996], p. 50).

Recorremos à pesquisa de Padilha (2005), entretanto, em que coloca seus

pontos de discordância nas questões pontuadas a respeito dos cinco agrupamentos

Page 61: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

60

de gêneros, porque conforme a pesquisadora, inicialmente, se o poema pertence às

representações sociais de uma determinada sociedade, como qualquer outra

produção literária ou cultural, mesmo que não haja versos em todo o texto existe

essência literária e, portanto, essas manifestações literárias constituem o quadro com

os cinco agrupamentos delimitados por Dolz & Schneuwly (2004[1996]).

Padilha (2005) acrescenta que relativamente os poemas respondem ‘às

necessidades da linguagem em expressão escrita e oral’ (DOLZ; SCHNEUWLY, 1996,

apud PADILHA, 2005, p. 245) o que nos remete, por exemplo, aos poemas da

literatura engajada, seguramente os anseios de uma sociedade qualquer, por meio da

linguagem descrevem seus acontecimentos históricos ou suas aspirações, já que nos

domínios da esfera artística está incluída a literatura, com seu modo diferente de

discursos em que transgride as possibilidades de uso da língua.

Para o segundo critério, ‘certas distinções tipológicas’, Padilha (2005) também

apresenta uma contrapalavra, pois a ciência literária sempre descreveu configurações

de poemas.

No que diz respeito ao terceiro critério, conforme a base teórica bakhtiniana de

Padilha (2005), em que o poema é visto e analisado como único e, ainda, que o poeta

sempre estará em busca de novos modos eficazes para a produção de textos ou

discursos, a pesquisadora apresenta, portanto, uma serie de vocábulos que são

sinônimos, para representar o aspecto tipológico da poesia: versejar, linguajar, poetar,

poetizar, poetificar ou, ainda, o termo sonetear. Finalmente, a autora defende que a

elaboração de agrupamentos não deve ser baseada nas capacidades de linguagem,

isto é, fundamentada em critérios formais, pois tais capacidades dependem do “devir

da corrente verbal, ao momento e ao processo de atualização das leituras, num

espaço discursivo dos interlocutores” (PADILHA, 2005, p. 247). Dessa forma, os

grupos poderiam ser pensados segundo seus espaços e tempos – cronotopos –

apropriações intergenéricas, visando sempre o conceito de memória do gênero

bakhtiniano.

Retornando, então, à nota de advertência contra a poesia ter seu lugar no

agrupamento de gêneros de Dolz e Schnewly (2004), buscamos tal sugestão e vimos

que Jolibert, em suas obras, Formes des enfants lecteurs (tome 1), bem como Former

des enfants lecteurs et producteurs de poèmes (tome 2), ambos (1994),

decididamente não tratam o poema como gênero discursivo, mas sim como tipo de

texto exatamente ao contrário do que diz Batista (2008), descrevendo o que seria

Page 62: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

61

necessário incluir na análise desse texto, isto é, “uma filologia ao contrário ou [...] uma

ecdótica às avessas – um trabalho de reintegrar ao texto elementos que lhe foram

subtraídos na construção histórica, pela atividade filológica, da noção do texto”

(BATISTA, 2008, p. 138).

Após comparar o gênero com um instrumento que se desenvolve por

continuidade e ruptura do simples ao complexo, Schneuwly (2004[1994]) afirma que

tal conceito configura-se como um instrumento de grande valia no desempenho de

uma atividade discursiva sobre a realidade concreta, pois é considerado como

“‘megainstrumento’, como uma configuração estabilizada de vários subsistemas

semióticos (sobretudo linguísticos, mas também paralinguísticos), permitindo agir

eficazmente numa classe bem definida de situações de comunicação” (SCHNEUWLY,

2004[1994], p. 25).

O enunciador, no momento da interação verbal, busca utilizar diferentes

artifícios para se fazer entender como: metáforas, linguagem gestual, informal,

entonação ou qualidade da voz etc. Logo, os instrumentos semióticos de mediação

encontram um elo de compreensão entre o projeto discursivo inicial daquele que

enuncia e o sentido no imaginário do interlocutor.

Nessa perspectiva, se para cada novo período de tempo é essencial que os

discursos sejam adequados em relação a sua importância e seu valor,

consequentemente nos deparamos com a necessidade de haver uma “revisão

substantiva dos métodos de ensino e à constituição de práticas que possibilitem ao

aluno ampliar sua competência discursiva na interlocução” (BRASIL, 1998, p. 23).

Entretanto, o que pudemos perceber que, em alguns materiais didáticos

utilizados para trabalhar como gênero discursivo poema, apesar de ser preciso

observar diversos recursos para analisar um texto poético, ainda existe uma

significativa preocupação com somente um dos recursos sendo priorizados: as

formalidades do jogo com as palavras, as figuras de linguagem, o imaginário, a

subjetividade, etc. E mesmo que os materiais didáticos estejam bem intencionados e

planejados, seguem teorias que, do ponto de vista bakhtiniano, não oferecem

compreensão efetiva do gênero em questão.

Uma vez tendo entrado em contato com trabalhos de vários

pesquisadores/professores, percebemos ser necessário refletirmos sobre nossas

práticas diárias com relação ao método de abordagem para a leitura e escrita do

poema. Vale frisar que não esperamos uma mudança em curto prazo, porém

Page 63: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

62

pensamos que, ao estimular as crianças na leitura, escrita e entendimento de poemas,

estaremos colaborando para que elas possam ler, refletir e, imediatamente, produzir

sobre o que leram.

Dessa forma, portanto, apesar de exemplos da postura de professores leitores

empenhados a incitar a motivação à descoberta dos múltiplos sentidos, ao despertar

da consciência dos alunos para a ideologia e dialogismo nos poemas, dentre outros

fatores, a preocupação com a forma deve ser considerada somente para um plano

secundário, visto que outras são as competências necessárias para que os aprendizes

dominem o gênero discursivo poema com maestria.

Na próxima seção, veremos o mapeamento descritivo do Caderno. A

distribuição interna das oficinas, o levantamento das atividades recorrentes e o exame

do corpus.

Page 64: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

63

CAPÍTULO 3

Mapeamento descritivo da proposta pedagógica do Caderno do Professor da

Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro 2010

Neste capítulo, pretendemos descrever a sistematização das atividades do

Caderno Poetas da Escola exatamente como estão dispostas na elaboração das

autoras. Para isso, na primeira parte, refletiremos sobre o que poderia estar implícito

na ilustração da capa. Depois, veremos o aspecto físico. Mais adiante, em outra

seção, nosso olhar estará voltado para a disposição estrutural generalizada do

Caderno, em que em que a decomporemos em três blocos: uma parte preliminar, outra

com todas as oficinas e na última os critérios de avaliação e as referências. Em

seguida, resumiremos a distribuição interna dos ateliês.

A finalidade de descrição do capítulo consiste em uma síntese para que o

possível destinatário que não esteja familiarizado com o Caderno em versão original

tenha ao menos uma visão sintética e panorâmica da totalidade de onde será

recortada nossa amostra para a análise.

3.1 Refletindo sobre o que estaria dito na capa do Caderno: uma reflexão sobre a

imagem

Então se a criança muda a função de um

verbo, ele delira.

E pois.

Em poesia que é voz de poeta, que é a voz

de fazer nascimentos –

O verbo tem que pegar delírio.

Manoel de Barros

Para entendermos o processo de elaboração do Caderno Poetas da Escola,

serão necessárias algumas análises em seu conteúdo temático, entretanto para a

realização de uma leitura mais significativa deste Manual, antes, é necessário

refletirmos brevemente sobre a capa, pois ela tem a função de proteger e aumentar a

durabilidade de um livro e para, além disso, funciona como um convite a visitarmos o

interior dele.

Page 65: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

64

Nesse sentido, tentamos compreender o enunciado em seu todo, conforme

Brait (2008) nos orienta,

Um enunciado verbo-visual e, portanto, imagens (cores, figuras, lugar que ocupam no espaço enunciativo etc.) e sequências verbais estão inteiramente articuladas, interatuantes, a partir de um projeto ‘gráfico’, de um projeto discursivo. Por essa razão, para efeito de análise e produção de sentidos, não podem ser ‘separadas’. (BRAIT, 2008, p. 72-73).

Além disso, temos ainda que pensar em outros efeitos informativos, porque são

esses diálogos feitos com o texto que esclarecerão muitas de nossas dúvidas. Nossa

observação deve ser voltada para a esfera de circulação, ao contexto social, ao tema,

aos destinatários, às relações entre diversos discursos e entre textos, aos agentes

que praticam a ação, ao formato e às cores das fontes, ao conjunto estabelecido pela

disposição dos tons, da iluminação, a valoração a respeito dos objetos, porque sem

esses critérios de leitura não poderíamos compreender o enunciado. Sendo assim,

vejamos a imagem da capa.

Figura 1 – Capa do Caderno do Professor

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor:

orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010.

Page 66: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

65

Dentro dos parâmetros de nossa interpretação, a primeira imagem que nos

chama a atenção é a do título Poetas da escola. A locução adjetiva “da escola” está

associada ao substantivo “poetas”, mas, uma análise separada desse termo nos

remete à noção das pessoas, com habilidade para escrever, dedicadas à escrita de

versos poéticos (poemas), isto é, ao trabalho de um artista independente de

escolarização formal.

A associação do termo “poetas” à expressão “da escola” por meio da contração

da preposição “de” + artigo definido “a”, entretanto, ressignifica o sentido do primeiro

termo restringindo esse poeta ao ambiente escolar nos esclarecendo que os alunos

serão apenas produtores de textos sem a obrigação de serem novos talentos

literários. Portanto, no título, a afirmação do discurso autoral do Caderno em que não

objetiva a busca de jovens talentos está em consonância com o papel da escola que

é o ensino-aprendizagem formal da leitura e da escrita.

Em seguida, temos a ilustração de uma menina-moça, semblante alegre,

inocente, com olhar adocicado e longos cílios como se quisesse ter acesso à visão

dos segredos guardados no infinito. A imagem é composta por linhas suaves e

onduladas o que poderia ser o reflexo de um estado de espírito espontâneo. Como

uma linha descreve a história do movimento de um ponto, os círculos e os semicírculos

sugerem a continuidade, a velocidade, a agilidade, o mistério, e, novamente, a

infinitude.

Sendo assim, há indícios dessas características no cabelo, o que poderia

indicar a fluidez da imaginação humana, nas ondas coloridas de toda a extensão da

capa e nas folhas do livro que estão unidas ao alinhamento da saia conferindo uma

ambivalência, pois um mesmo elemento é visto com duas funções, isto é, a

representação de uma saia e de uma mesa.

De fato, a roupa da menina aguça nossa imaginação, pois na blusa temos mais

linhas arredondadas e a própria saia tem formato circular, mas com arabescos cujas

características pertencem à cultura islâmica. Para os mulçumanos, essas formas

geométricas têm uma importância para além da materialidade e do mundo perceptível,

porque elas representam a natureza infinita criada por Deus. Tais símbolos nos

lembram a evasão romântica, na qual eram empregados elementos exóticos para

compor a idealização da realidade.

Ainda sobre a linha, vale ressaltar, que não há o traçado da superfície do solo,

mas, se o homem na vida real tem a necessidade inerente de equilíbrio tanto físico

Page 67: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

66

como psicológico e, por isso, os pés dele devem estar firmados na terra, por conta

dos efeitos da gravidade, a imagem da jovem saltitando com os pés no ar, induz-nos

ao pensamento de que ela está alheia ao que se passa ao seu redor, mais uma vez

tal suposição está em acordo, portanto, com a expressão reflexiva e tranquila do rosto.

Na capa, é possível vermos ainda a diferenciação dos tons sendo divididos por

linhas. Na vida real, por meio deles, podemos ver profundidade ou superficialidade,

escuridão ou claridade, por isso a tonalidade está relacionada à nossa sobrevivência.

Os tons justapostos uns sobre outros têm a finalidade de representar os espaços

escuros ou claros para que possamos visualizar a dimensão dos objetos e a totalidade

do ambiente. Nesse sentido, o Caderno apresenta mescla tonal demonstrando ilusão

de ótica com cores claras e escuras representando espaços profundos ou superficiais

revelando, além das dimensões ilustrativas por todo o Manual, também, a ênfase do

discurso autoral no interior do Caderno, quando destaca mais alguns aspectos que

outros.

As cores estão ligadas às nossas reações emocionais e dependem da

valoração individual de cada um, já que nossas lembranças são particulares, mas isso

se pensarmos de forma descompromissada. Contudo, substâncias coloridas são

utilizadas por comunicadores visuais impregnadas de informação.

No Caderno, as cores predominantes são o azul, cor primária significando

serenidade na representação do céu estrelado. A cor laranja classificada como

secundária e com carga semântica de entusiasmo ou alegria sugere, talvez, o amor.

Na logomarca da OLPEF temos o verde que está associado à esperança. Vale

frisar, que tais cores aparecem, desde a capa e ao longo do Caderno com variados

matizes. Nossa inferência nos leva ao seguinte pensamento: o azul transmite uma

conotação de céu estrelado, pois há nele pequenas marcas brancas. O laranja teria a

intenção de incentivar os alunos à produção de poemas. O verde, para a criança mais

observadora, poderia demonstrar a esperança de competir na Olimpíada com chance

de chegar à final do campeonato.

As cores, as tonalidades, as formas geométricas apresentadas na capa se

estendem por toda a extensão do Caderno. Logo, nossas observações nos induzem

ao pensamento de que há nas imagens características do Romantismo. Percebemos:

aspectos delicados de todo o corpo da menina indicando, talvez, que ela seja uma

sonhadora em busca de desvendar mistérios ainda não revelados e formas

geométricas exóticas simbolizando a fuga da realidade, pois em Bakhtin/Volochinov

Page 68: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

67

(2010[1929]) “Todo fenômeno que funciona como signo ideológico tem uma

encarnação material, seja como som, como massa física, como cor, como movimento

do corpo ou como outra coisa qualquer [...] Um signo é um fenômeno do mundo

exterior” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 31).

Diante disso, rememoramos as palavras de Padilha (2005) ao afirmar que os

meninos sentem aversão em relação ao poema, pois em suas visões este é “coisa de

mulher” (PADILHA, 2005, p. 10). Entretanto, eles comentam suas habilidades e o

prazer que sentem quando compõem letras de canção. De acordo com a

pesquisadora, o que os meninos ainda não perceberam é que as palavras em suas

letras tornam-se apenas elementos musicais, pois já estão carregados de poesia

antes mesmo de serem cantadas. Logo, embora o aspecto físico e as imagens –

diagramação – do Caderno sejam de excelente qualidade, os meninos poderiam ver

nesse material uma propriedade feminina para o trabalho com os poemas e não se

sentirem motivados à aprendizagem.

De acordo com Choppin (2004), o livro didático exerce quatro funções variáveis

conforme “o ambiente sociocultural, a época, as disciplinas, os níveis de ensino, os

métodos e as formas de utilização” (CHOPPIN, 2004, p. 553). Uma delas:

Função ideológica e cultural: é a função mais antiga. A partir do século XIX, com a constituição dos estados nacionais e com o desenvolvimento, nesse contexto, dos principais sistemas educativos, o livro didático se afirmou como um dos vetores essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes. Instrumento privilegiado de construção de identidade, geralmente ele é reconhecido, assim como a moeda e a bandeira, como um símbolo da soberania nacional e, nesse sentido, assume um importante papel político. Essa função, que tende a aculturar – e, em certos casos, a doutrinar – as jovens gerações, pode se exercer de maneira explícita, até mesmo sistemática e ostensiva, ou, ainda, de maneira dissimulada, sub-reptícia, implícita, mas não menos eficaz. (CHOPPIN, 2004, p. 553).

Se uma das funções do livro didático é transmitir culturas e ideologias, já que

as palavras e, como já vimos, as imagens, também são veículos condutores de ideias,

poderíamos pensar que a ilustração da capa não motivaria os meninos a aprenderem

a ler ou a escrever o poema. Talvez, se olhássemos com um olhar mais reflexivo

perceberíamos que a figura feminina estampada na capa transmite à percepção

masculina de que algo inerente ao gênero poema espelha um alerta, por exemplo, de

que esse gênero literário não é direcionado aos homens.

Page 69: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

68

Por outro lado, portanto, se em uma obra de arte são instigadas as capacidades

cognitivas, imaginativas, afetivas e emocionais do aluno por meio da estética, temas

transversais poderiam ser tratados nela como a Pluralidade Cultural e a Orientação

Sexual, abordando as diferenças com a finalidade de ajudar a construir conceitos e

formar a opinião singular de cada aluno. As imagens constitutivas da capa do OLPEF,

também trazem inúmeras possibilidades de interpretações para quem as observa.

Portanto, de acordo com nossa leitura, pensamos que tais imagens, cores, formas etc.

deveriam estar aliadas aos temas contemporâneos que norteiam as experiências dos

alunos e como isso poderia influenciar a atuação deles em cenários reais.

Logo, se queremos formar leitores críticos e proficientes em muitos e diferentes

gêneros, temos de pensar primordialmente que as configurações humanas devem ser

representadas nos enunciados, contudo é imprescindível a interpretação e reflexão,

entre professor e aluno, em seu aspecto tanto verbal como visual.

3.2 Breve comentário sobre o aspecto físico do material da OLPEF

O kit disponibilizado para cada escola é um conjunto de materiais muito bem

elaborado no aspecto físico, bem como de excelente qualidade gráfica, portanto, um

material com preço elevado. A capa do Caderno do Professor e da Coletânea de

Poemas dos alunos é produzida com papel Triplex de 300 gramas, com um

acabamento especial chamado de Laminação BOPP Fosca – um modo de

plastificação – com a finalidade de agregar maior durabilidade, já que seria

manuseado por várias pessoas. Além disso, as folhas em contato com a superfície de

outros materiais não perderia a qualidade da imagem ou das cores.

A parte interna do caderno, chamada pelos gráficos de miolo, é produzida com

papel sulfite normal (o conhecemos como papel A4) usado na impressora de nossa

casa, mas a resma que compramos usualmente tem uma gramatura de 75 g/m²

(setenta e cinco gramas por metro quadrado), e o papel utilizado no caderno tem 90

g/m², ou seja, ele é um pouco mais espesso que o papel A4 convencional em que

imprimimos os nossos trabalhos no dia-a-dia. O Caderno do Professor tem o

acabamento final das folhas unidas por cola e na Coletânea dos alunos elas são

grampeadas.

A caixa que acomoda a Coleção também é feita com papel Triplex de 300

gramas, com acabamento Laminação BOPP Fosca. O corte arredondado das bordas

Page 70: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

69

é feito com uma ferramenta especial, para um acabamento diferenciado. As dobras

do kit são coladas com uma cola quente especial, pois, como o material possui

laminação, uma cola normal não o fixaria.

As dimensões físicas e a arte final da coleção não dependem da gráfica, são

definidas por seus organizadores. Devemos elogiar, portanto, aos idealizadores de

todo esse trabalho, por todos os aspectos acima citados, pois são de excelente

qualidade. Mas um questionamento nos perturba: seria também o conteúdo desse

material didático tão relevante para a melhoria da qualidade do ensino de leitura e

escrita do gênero discursivo poema? No próximo capitulo trataremos dessa questão.

3.3 Organização preliminar do Caderno

A organização do Poetas da Escola está colocada da seguinte forma: uma carta

de boas-vindas, da equipe da OLPEF, direcionada ao professor, na qual se explica

que se trata de um concurso utilizado como ferramenta de trabalho para o ensino e a

aprendizagem de gêneros textuais via sequência didática, em seguida, há uma

apresentação da Coleção da Olimpíada.

3.3.1 Carta ao Professor

Esta define o que é a Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro e

traz diretrizes para as escolas e os professores trabalharem o material com seus

alunos. Enumera os componentes da parceria envolvidos no Programa, a saber, o

MEC, a Fundação Itaú Social e o CENPEC. Apresenta seu “objetivo em comum:

proporcionar ensino de qualidade para todos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p.

03), por meio da metodologia do Programa Escrevendo o Futuro e utilizando o método

de sequência didática para ensinar o gênero textual poema. Informa o tema da

produção de texto “O lugar onde vivo” e conta com a participação dos professores,

dos diretores, dos pais e da comunidade onde está situada a escola. A 2ª edição foi

desenvolvida em torno de quatro gêneros:

Page 71: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

70

Poema – 5º e 6º anos do Ensino Fundamental.

Memórias literárias – 7º e 8º anos do Ensino Fundamental.

Crônica – 9º ano do Ensino Fundamental e 1º ano do Ensino Médio.

Artigo de opinião – 2º e 3º anos do Ensino Médio.

Mas, apesar do público alvo ser grande, a equipe OLPEF deixa claro que não

está em busca de talentos e sim de “cidadãos mais bem preparados”

(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 03), visto que ao final do Concurso os alunos

seriam mais competentes no gênero trabalhado.

3.3.2 Apresentação da Coleção

Após o processo de confecção, são distribuídas nas escolas públicas

brasileiras a Coleção da Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro

contendo uma pasta, e nela há um Caderno do Professor, dez exemplares da

Coletânea de Textos e um CD-ROM, materiais auxiliares para o professor no ensino-

aprendizagem da leitura e da produção do gênero poema. A Coleção é composta de

quatro pastas, mas cada uma delas preparada para um gênero textual, e destinadas

aos alunos desde o 5° ano do Ensino Fundamental até o 3° ano do Ensino Médio.

Figura 2 – Capa dos cadernos do professor

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010.

Memórias Literárias

9° - E.F. e 1° E.M.

Poemas

5° e 6° - E.F.

Memórias Literárias

7° e 8° - E.F.

Artigo de Opinião

2° e 3° - E.M.

Page 72: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

71

O Caderno do Professor consiste em um material para auxiliar o professor no

plano e desenvolvimento das aulas. O Manual contém uma sequência didática,

dividida em oficinas dedicadas ao ensino de gêneros diferentes, como: o Poema, as

Memórias Literárias, a Crônica e o Artigo de Opinião.

Em cada pasta há os seguintes componentes: 01 Caderno do Professor, 10

exemplares da Coletânea de textos e 01 CD-ROM.

Figura 3 – Composição da pasta da Coleção Poetas da Escola

Coletânea de Textos Caderno do Professor CD-ROM

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010.

Os textos explorados nas oficinas podem ser vistos pelos alunos na Coletânea

e/ou no CD-ROM. As orientações para a produção textual dos alunos estão dispostas

no Caderno do Professor, um material de apoio elaborado a partir de uma sequência

didática. Tais atividades devem ser utilizadas no planejamento e realização das aulas.

Entretanto, nosso material a ser investigado serão alguns aspectos, sobre

leitura e produção do poema, no Caderno Poetas da Escola, elaborado para o

tratamento desse gênero literário.

3.3.3 A proposta do Caderno apresentada ao Professor

A apresentação dos Cadernos é feita por Joaquim Dolz, um dos pesquisadores

que, ao lado de Jean Paul Bronckart, Bernard Schneuwly e outros estudiosos

pertencem à chamada Escola de Genebra. Seus trabalhos influenciam fortemente a

educação brasileira, incluindo a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais

Page 73: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

72

(PCN). As explicações a respeito de Dolz resumem-se a alguns dados da vida e das

atividades profissionais do pesquisador.

No prefácio de Joaquim Dolz, há uma explicação inicial referente à idealização

referenciando os jogos olímpicos com a Olimpíada de Língua Portuguesa, isto é, a

“igualdade social e democratização da atividade desportiva” (DOLZ, 2010, p. 09). Por

conta das dificuldades do ensino e de leitura no Brasil, a equipe da Olimpíada

organizou um programa que tenciona ir de encontro ao problema da leitura e escrita

brasileira tendo três objetivos:

Primeiro, busca-se uma democratização dos usos da língua portuguesa, perseguindo reduzir o “iletrismo” e o fracasso escolar. Segundo, procura-se contribuir para melhorar o ensino da leitura e da escrita, fornecendo aos professores material e ferramentas, como a sequência didática – proposta nos Cadernos –, que tenho o prazer de apresentar. Terceiro, deseja-se contribuir direta e indiretamente para a formação docente. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 09).

Nesse sentido, conforme Dolz (2010) “Ler e escrever: prioridades da escola”

(DOLZ, 2010, p. 10), a educação formal deve estar preocupada com uma educação

cidadã que ultrapasse os limites das habilidades em decifrar os códigos linguísticos

para a leitura e escrita. Tem como função, portanto, levar o aluno à compreensão e

produção de textos, os quais fazem parte das atividades diárias dos indivíduos, porém

isso implica a mobilização das capacidades de linguagem, para um efetivo

entendimento e maior participação das instâncias sociais, culturais e psicológicas.

Assim, no âmbito social, é imprescindível o domínio de diversos gêneros para

a democratização das produções culturais. Em nível psicológico, é necessário que o

aluno desenvolva diferentes estratégias de leitura para que se torne um leitor

autônomo. Dessa forma, o aluno, no que diz respeito à cognição, estudando e

aprendendo sozinho, selecionando conforme sua afetividade os textos a serem lidos

e

Finalmente, permite desenvolver a capacidade verbal, melhorando o conhecimento da língua e do vocabulário e possibilitando observar como os textos se adaptam às situações de comunicação, como eles se organizam e quais as formas de expressão que os caracterizam. (DOLZ, 2010, p. 10).

Page 74: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

73

Nessa perspectiva, portanto, o papel do professor é induzir o aluno à aquisição

de estratégias para a compreensão e apropriação da cultura. Além de decifrar os

códigos da língua, o aluno precisa:

Aprender a relacionar, hierarquizar e articular essas informações com a situação de comunicação e com o conhecimento que ele possui, a ler nas entrelinhas o que o texto pressupõe, sem o dizer explicitamente e a organizar todas as informações para dar-lhes um sentido geral. (DOLZ, 2010, p. 10-11).

Para que o aluno organize as informações no momento da leitura, precisa

receber instruções das ferramentas características do gênero, pois “precisa aprender

a tomar certos distanciamentos dos textos para interpretá-los criticamente e ser capaz

de identificar suas características e finalidades” (DOLZ, 2010, p. 11).

Conforme a equipe da OLPEF, se a pretensão primordial do programa é

incentivar a escrita, já que um indivíduo que não domina as habilidades dessa

modalidade em diferentes gêneros, seguramente, dependerá de pessoas que saibam

produzir textos. Além disso, há também a questão de que a vida profissional desse

sujeito poderá ser afetada.

Nesse sentido, precisamos lançar mão de armas estratégicas, para vencermos

o inimigo da incompetência para a escrita no ensino-aprendizagem da língua materna

abrangendo as dimensões constitutivas do homem.

A primeira instância a ser observada pela OLPEF são os campos da sociedade

e os textos que circulam nela. Significa dizer que a relevância está em “trabalharmos

os usos e as normas dela [da língua], bem como sua adaptação às situações de

comunicação” (DOLZ, 2010, p.11).

Percebemos na citação acima, a preocupação com o aprendizado da estrutura

do texto, a norma padrão linguística e a função à qual o texto está destinado.

Pensamos, sobre esse aspecto, que ainda faltam pontos a serem trabalhados ou, no

mínimo, a hierarquia de análise deveria ser invertida.

O Caderno apresenta outros mecanismos para o âmbito psicológico, ou seja, Preparar-se para escrever pressupõe ler, fazer registros pessoais, selecionar informações... atividades cognitivas, todas elas. Mas escrever é também um auxílio para a reflexão, um suporte externo para memorizar e uma forma de regular comportamentos humanos. (DOLZ, 2010, p.12).

Page 75: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

74

Salientamos, nesse item, a importância da reflexão em torno de nosso objeto,

como prioridade, pois é evidente que primeiramente pensamos sobre acontecimentos

observados ao nosso redor, depois buscamos informações armazenadas em nosso

“mapa mental” e somente, em seguida, é que usamos a tecnologia da escrita para os

registros.

Finalmente, na dimensão da linguagem, diz o Caderno que precisamos

considerar:

[...] a situação de produção do texto, isto é, quem escreve, qual é o seu papel social (jornalista, professor, pai); para quem escreve, qual é o papel social de quem vai ler, em que instituição social o texto vai ser produzido e vai circular (na escola, em esferas jornalísticas, científicas, outras); qual é o efeito que o autor do texto quer produzir sobre seu destinatário (convencê-lo de alguma coisa, fazê-lo ter conhecimento de algum fato atual ou de algum acontecimento passado, diverti-lo, esclarecê-lo, sobre algum tema considerado difícil); planificar a organização do texto e utilizar os mecanismos linguísticos que asseguram a arquitetura textual: a conexão e a segmentação entre suas parte, a coesão das unidades linguísticas que contribuem para que haja uma unidade coerente em função da situação de comunicação. Esses aspectos de textualização dependem, em grande parte, do gênero do texto”. (DOLZ, 2010, p. 12).

Sobre essa última afirmação do Caderno acerca das estratégias para o

aprendizado da escrita, parece-nos que mais uma vez os aspectos formais ou

estruturais do sistema da língua são privilegiados. Entretanto, preferimos o conceito

de arquitetônica bakhtiniano ao de arquitetura colocado pela equipe OLPEF. Pois, no

primeiro, os objetos devidamente valorados pelo homem é que estruturam o gênero e

a forma e o conteúdo não se divide a partir desse ponto de partida, podemos

selecionar os meios linguísticos, os quais serão utilizados. Por fim, Dolz (2010)

ressalta que se considerarmos o ato de escrever como um processo e não como

produto é necessário observarmos “as atividades de revisão, de releitura e de

reescrita, que são necessárias para chegarmos ao resultado final” (DOLZ, 2010, p.

12).

Depois, como consideramos a análise discursiva dialógica da reflexão

bakhtiniana, pensamos que o termo “efeito” no singular estaria incompleto, pois os

efeitos produzidos por uma materialidade linguística, em contexto real de

comunicação, dependem do que poderia vir a ser. Além de observarmos a fonética,

inferirmos significados nas palavras ou nas expressões, pensamos que as relações

Page 76: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

75

dialógicas nos levariam a outros e novos diferentes modos de vida, pois os sentidos

estão situados nas interações reais, posto que nesses relacionamentos interativos

mais imediatos, bem como nos desenvolvidos no contexto mais amplo, é que

modificamos a nós mesmos e aos outros.

Por fim, Dolz (2010) ressalta que se considerarmos o ato de escrever como um

processo e não como produto é necessário observarmos “as atividades de revisão, de

releitura e de reescrita, que são necessárias para chegarmos ao resultado final”

(DOLZ, 2010, p. 12).

Tudo isso se resume em um “real desafio do ensino da produção escrita”

(DOLZ, p. 13), conforme a Olimpíada, nessa perspectiva é lançada, portanto, a

proposta de ensino segundo os passos da sequência didática, pois os organizadores

afirmam ser esse o caminho mais viável para um processo de ensino mais abrangente.

3.3.4 Organização interna do Caderno do Professor

O Manual está organizado em 15 oficinas, sendo que cada uma delas

apresenta os objetivos e uma “nota” intitulada “Prepare-se!”, que dialogam e instruem

o professor tanto sobre o desenvolvimento das aulas como os conteúdos.

Abaixo, podemos observar o sumário enumerando as divisões das oficinas,

como estão colocadas no Caderno, com seus respectivos títulos.

Figura 4 – Sumário do Caderno do Professor

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 06-07.

Page 77: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

76

Após a capa, portanto, a estrutura do Caderno está delineada em uma carta de

boas-vindas ao professor, uma descrição da Coleção da Olimpíada, um convite para

que o professor se inscreva no Concurso, o sumário, a apresentação e o prefácio de

Joaquim Dolz informando que o Programa tem na sequência didática uma ferramenta

de ensino e de aprendizagem de textos para conter a falta de letramento.

Na introdução, a equipe do Caderno apresenta o poema “Convite” de José

Paulo Paes, esclarecendo que o poema é apenas um dos muitos gêneros poéticos e

podem ser apresentados de diversas formas e que, além disso, é uma brincadeira em

que são utilizadas as palavras. Salientamos que, desde o início, a formalidade é o

foco principal do ensino no Caderno. Vejamos:

Figura 5 – Poema “Convite”

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 17.

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77

O poema é criado como se fosse um jogo de palavras. Ele motiva o leitor a descobrir não apenas a leitura corrente, mas também a buscar outras leituras possíveis. E como o poeta faz isso? Ora... com as palavras e com tudo o que se pode fazer com elas. O poeta busca mostrar o mundo de um jeito novo, com a intenção de sensibilizar, convencer, fazer pensar ou divertir os leitores. Ele sugere associações entre palavras, seja pela posição que ocupam no poema, seja pela sonoridade, seja por meio de outros recursos. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 18).

A defesa do Caderno é que a originalidade e inovação da palavra poética está

relacionada a partir das formas linguísticas e de seus (re)arranjos, estes dizem

respeito aos movimentos internos no texto poético, mas em nossa perspectiva

enunciativo-discursiva consta como relações dialógicas internas, as quais foram

desprezadas neste Material. O Caderno afirma, ainda, que em contato com tais jogos

de palavras podem surgir, no aluno, o interesse por outros poemas.

O Material define o poeta como o “artista que usa as palavras para fazer uma

obra de arte – o poema” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 20). Compreendemos

que essa convicção nos incita a pensar que todo o processo criativo do gênero

discursivo poema é condensado ao elemento combinatório de palavras por parte do

artista, bem como dos fatores surpresa e/ou comoção gerados no leitor, visto que o

poema seria, apenas, uma atividade de “recriação mecânica de palavras”.

A seguir, diz o Caderno (2010), que por meio das atividades propostas, a

intenção é que o aluno atinja a proficiência na linguagem e nas palavras para se

comunicar e se expressar. Mas o caminho para se encontrar os sentidos no poema é

a técnica do poeta, esta adquirida somente em anos de experiência de trabalho do

artífice e na habilidade do aluno em repetir as combinações de palavras. Entretanto,

em nosso cotidiano, em nossa realidade, o que faríamos com a arte de declamações

precisas e vazias de reflexões acerca dos objetos implícitos do texto?

Em seguida, o Caderno cita o trabalho Palavras de encantamento de Marisa

Lajolo, para definir poeta como alguém que “brinca com as palavras” (ALTENFELDER;

ARMELIN, 2010, p. 21), diz também que “poema é um jogo com a linguagem.

Compõe-se de palavras [...]. Além de diferentes pela sonoridade e pela disposição na

página, os poemas representam uma maneira original de ver o mundo, de dizer coisas

[...]” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 21). E o trabalho do poeta é utilizar

palavras, descrevendo elementos emocionais, da natureza, da vida etc., inventando

poesia.

Page 79: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

78

Finalmente, com uma citação de Versos, sons, ritmos de Norma Goldstein, a

diferenciação entre poema e poesia consiste em que a ‘poesia está presente no

poema, assim como em outras obras de arte que, como o poema, convidam o

leitor/espectador/ouvinte a retornar à obra mais de uma vez, desvendando as pistas

que ela apresenta para a interpretação de seus sentidos’ (GOLDSTEIN, 2006, apud

ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 22).

Figura 6 – Poema ou poesia?

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 22.

Há, de fato, uma distinção entre esses dois conceitos, porque a poesia é vista

como uma abstração, algo em que não podemos tocar, mas que representa estados

e sentimentos da essência humana, em grande medida, por meio de imagens. No

caso do poema consiste em um texto “‘marcado por recursos sonoros e rítmicos [...]

permite outras leituras, além da linear’, pois sua organização sugere ao leitor a

associação de palavras ou expressões ‘posicionadas estrategicamente no texto’”

(GOLDSTEIN, 2006, apud ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 22). Nessa

circunstância, a definição é concreta, corresponde simplesmente ao produto

elaborado, definitivamente à obra de arte.

Quanto ao período de tempo necessário para o desenvolvimento das oficinas

o Caderno, diz ser necessário de uma a quatro aulas para cada ateliê e que é preciso

planejamento para cumprir o “Cronograma de atividades” que deverá permanecer na

sala de aula.

Page 80: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

79

3.4 Distribuição interna das oficinas

A quadra é um vaso de flores que o Povo põe à janela da sua alma

Fernando Pessoa

O manual do professor contém 15 oficinas cujas temáticas e cujos objetivos

apontam para a relação de aproximação correspondente entre a estruturação da

sequência didática para o ensino-aprendizagem do gênero poema e o procedimento

“sequência didática” previsto pelo modelo didático de gênero da Escola Didática de

Genebra. Ressaltamos, porém, que a proposta de ensino parte dos princípios do

procedimento didático, por isso, o aparecimento de um passo a mais, como é o caso

da oficina 15, preferimos denominar de divulgação por não se encaixar no passo a

passo previsto no modelo.

Apresentaremos, em seguida, no quadro 4, os objetivos das 15 oficinas no

Caderno Poetas da Escola, referentes à proposta pedagógica que visa proporcionar

o ensino de qualidade, formando o aluno em leitor e escritor literário, no que diz

respeito ao gênero literário poema.

Quadro 4 – Objetivos das Oficinas

Oficina Páginas

Título da Oficina Objetivos das Oficinas

01

24 a 29

Memória de versos e mural de poemas

Resgatar e valorizar a cultura da comunidade;

Avaliar e ampliar o repertório de poemas conhecidos pelos alunos;

Reconhecer os poemas em suas diversas formas.

02

30 a 37

O que faz um poema Conhecer e sistematizar informações sobre as características de um poema: versos, estrofes, ritmos, rima, repetição.

03

38 a 41

Primeiro ensaio

Apresentar a situação de produção;

Escrever um primeiro poema para avaliar o conhecimento dos alunos.

04

42 a 47

Dizer poemas Conhecer alguns poetas consagrados da literatura brasileira;

Descobrir a importância de ouvir e de dizer poemas.

05

48 a 63

Toda rima combina? Reconhecer rimas em poemas;

Conhecer as diferentes combinações de rimas;

Produzir poemas com rimas.

06

64 a 67

Sentido próprio e figurado

Apresentar os conceitos de denotação e conotação;

Delimitar o texto poético.

Page 81: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

80

07

68 a 79

Comparação, metáfora, personificação

Identificar e usar as figuras de linguagem.

08

80 a 87

Sonoridade na poesia Investigar as relações entre som e sentido na poesia;

Observar a expressividade das repetições de palavras ou da mesma consoante;

Escrever textos com repetições.

09

88 a 99

Poetas do povo

Trabalhar com o poema popular;

Perceber a importância do ritmo no poema;

Escrever versos observando rima e ritmo.

10

100 a 109

O lugar onde vivo Estudar poemas de diferentes autores sobre a terra natal;

Resgatar observações, conhecimentos e sentimentos dos alunos sobre o lugar onde vivem.

11

110 a 117

Um novo olhar Possibilitar um olhar novo e original sobre o lugar onde os alunos vivem.

12

118 a 123

Nosso poema Produzir um texto coletivo sobre o local onde vivem os alunos.

13

124 a 129

Virando poeta Escrever um poema individualmente sobre o tema “O lugar onde vivo”.

14

130 a 135

Retoque final Aprimorar os poemas produzidos.

15

136 a 139

Exposição ao público

Organizar um sarau para a apresentação dos poemas;

Selecionar três poemas que serão enviados para a Comissão Julgadora da escola.

Fonte: Organizado e adaptado pela autora/2013, de ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. (2010).

Conforme o quadro acima e o próprio esclarecimento da equipe OLPEF,

pudemos observar que cada oficina foi organizada para cumprir os objetivos da

Olimpíada, de três formas distintas. Em primeiro lugar, busca atingir uma

democratização dos usos da língua portuguesa, com o propósito de reduzir o fracasso

escolar. O segundo objetivo busca cooperar para melhoria do ensino da leitura e

escrita, para que os professores tenham ferramentas adequadas em sala de aula para

isso. E o terceiro demonstra a intenção da OLPEF na contribuição direta e indireta

para a formação adequada do professor.

O quadro 5 apresenta a organização interna de cada uma das 15 oficinas, de

como elas foram organizadas, para que o professor possa planejar e conduzir suas

aulas, bem como os materiais necessários para cumprir os objetivos de cada tarefa.

Page 82: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

81

Para isso, cada oficina foi dividida em seções, e cada uma delas contém: os

“Objetivos” específicos da oficina; um quadro denominado “Prepare-se!” com algumas

orientações de cada tarefa; um quadro “Material” com a lista de materiais e

ferramentas necessárias para o desempenho da oficina em sala de aula e as “Etapas”

da oficina, que variam de 1 até 4 etapas, dependendo da complexidade do tema

abordado. Além disso, algumas oficinas possuem boxes exclusivos, com poemas,

alertas e informações adicionais ao professor.

Quadro 5 – Organização Interna das Oficinas

Oficinas Organização interna das oficinas

Oficina 01 Memória de versos e mural de poemas

0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Memória de versos dos alunos Atividades 2ª etapa: Memória de versos da comunidade Atividades 3ª etapa: Um mural caprichado Atividades Boxe explicativo (sugestivo): Há palavras que o vento não leva.

Oficina 02 O que faz um poema

0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: Leitura do mural Atividades 2ª etapa: Sistematização das observações Atividades Boxe (de advertência): Atenção Poema (texto): Tem tudo a ver Boxe: A importância de participar Boxe: Paralelismo sintático (seção de conteúdo?)

Oficina 03 Primeiro ensaio

0bjetivos Prepare-se Primeiro poema Atividades Boxe: Primeira escrita Boxe: Atenção

Oficina 04 Dizer poemas

0bjetivos Prepare-se Material Atividades Orientação para o trabalho com leitura de poemas Boxe: Buscando sentido

Oficina 05 Toda rima combina?

0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Rimas e quadras Atividades Boxe: Rimas e Versos Atividades

Page 83: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

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2ª etapa: Onde estão as rimas? Atividades Boxe: Fique rima com pique 3ª etapa: Mais quadras Atividades Quadras ao gosto popular 4ª etapa: Qual o papel das rimas? Atividades Boxe: Poema Boxe: Rimas externas e internas Atividades Boxe: Estratégia de leitura Boxe: Sobre “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”

Oficina 06 Sentido próprio e figurado

0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Sentido próprio, ou denotação, e sentido figurado, ou conotação Atividades Boxe: Poema Boxe: Alguns sentidos 2ª etapa: Qual o sentido? Atividades 3ª etapa: Definições poéticas Atividades

Oficina 07 Comparação, metáfora, personificação

0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: Recursos que aproximam dois termos Atividades 2ª etapa: Personificação Atividades 3ª etapa: Estabelecer comparações Atividades 4ª etapa: Transformar comparações em metáforas

Oficina 08 Sonoridade na poesia

0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Som e sentido Atividades Aliteração Ritmo irregular 2ª etapa: Trava-línguas Atividades

Oficina 09 Poetas do povo

0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: O varal de cordel Atividades Boxe: Poema 2ª etapa: Quadrinhas divertidas Boxe: Poema Atividades

Oficina 10 O lugar onde vivo

0bjetivos Prepare-se Material

Page 84: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

83

1ª etapa: O lugar onde o poeta vive Atividades Boxe: Poema Atividades Uma análise aprimorada Boxe: Poema Sobre “Cidadezinha” 2ª etapa: Temas semelhantes, recursos parecidos Atividades Recursos expressivos

Oficina 11 Um novo olhar

0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: A observação dos pequenos detalhes Atividades A matéria-prima da poesia 2ª etapa: Uma viagem imaginária Atividades

Oficina 12 Nosso poema

0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: Um passeio pelas oficinas Atividades 2ª etapa: O poema coletivo Atividades

Oficina 13 Virando poeta

0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: A análise Atividades 2ª etapa: A produção Atividades Afinando um pouco mais o olhar

Oficina 14 Retoque final

0bjetivo Prepare-se Material 1ª etapa: A primeira produção Atividades 2ª etapa: Passando a limpo Atividades Boxe: Atenção

Oficina 15 Exposição ao público

0bjetivos Prepare-se Material 1ª etapa: Escolha de textos e ensaio de apresentação Atividades 2ª etapa: Arrume “a casa” para o sarau Atividades 3ª etapa: Seleção interna Critérios de avaliação para o gênero poema Boxe: Poema

Fonte: Organizado e adaptado pela autora/2013, de ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. (2010).

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84

A partir do quadro 5, podemos agora explicar, por meio de uma visão geral e

resumida, as etapas internas de cada uma das 15 oficinas e entender como se deu a

elaboração dessa sequência didática por parte de seus autores.

Na oficina de número 1, intitulada “Memórias de versos e mural de poemas”,

visa-se à consideração da cultura do aluno, ativação do conhecimento e, também, o

reconhecimento de formas de poemas. Essa oficina está dividida em três etapas de

atividades. Na primeira etapa, é levantado o conhecimento prévio sobre poemas, para

realizar um diagnóstico, no sentido em que talvez haja apreciação ou não do gênero

e o que motivou tal gosto e, também, uma identificação dos elementos formais: ritmo,

rima e forma com o intento de diagnosticar pontos a serem trabalhados.

Na 2ª etapa, “Memórias de versos da comunidade”, a entrevista consiste na

estratégia de ensino e o foco é alimentação temática. Os alunos precisam conversar

com os parentes e a comunidade para coletar dados a respeito de poetas clássicos

ou contemporâneos e usá-los na alimentação temática. Finalmente, fixá-los no mural.

Na 3ª fase, “Um mural caprichado”, há uma sugestão para que professor e alunos

construam um mural e registrem todas as produções feitas pelos alunos. Essa tarefa

objetiva leituras futuras.

“O que faz um poema” intitula a oficina 2. Nela, há uma leitura do mural e

discussão convergindo em torno do conteúdo temático e da forma composicional do

poema, bem como avaliação oral baseada na forma. Na 2ª etapa “Sistematização das

observações”, há um momento interativo, leitura ou audição de “Tem tudo a ver”,

exposição em Datashow, localização de palavras ou repetição de versos, informação

dos conteúdos a serem trabalhados, definição da poesia e cópia das conclusões dos

alunos no caderno.

A oficina 3, “Primeiro Ensaio”, não está dividida em etapas. Tem o intuito de

fazer com que os alunos produzam o primeiro texto tematizando “O lugar onde vivo”,

que servirá de diagnóstico ao professor, para as devidas intervenções. Além, disso

motiva a participação no concurso.

A Oficina 4, “Dizer Poemas”, também não está dividida em etapas. Assim, seus

objetivos são: leitura, audição e tomada de conhecimento de poetas e poemas, ambos

consagrados. A leitura e audição são centralizadas nas formalidades linguísticas

como: “recursos sonoros e ritmo dos textos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 44).

Há, também, incentivo aos questionamentos do professor quanto aos conteúdos

temáticos e as impressões despertadas no aluno ou mesmo perguntas como “o que o

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85

autor quis exprimir” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 47). Todavia, pensamos que

dentro do projeto discursivo do autor foi dito o que ele planejou, isto é, o acabamento

escolhido por ele. Cabe, ao leitor – o aluno – refazer esse acabamento, conforme o

meio social em que ele mesmo vive e da individualidade dele – já estabelecida,

também, na sociedade. Uma outra preocupação são os sentidos localizados nas

próprias palavras do texto.

O ponto principal da oficina 5 “Toda rima combina?” é reconhecimento de rimas

simples e populares, por exemplo, a quadrinha. A professora é orientada a escrever

uma quadra incompleta, na lousa, e solicitar dos alunos uma rima para completá-lo.

Para a construção do poema as rimas devem ser encontradas no dicionário.

Entretanto, para Bakhtin/Volochinov (1929), “as palavras são tecidas a partir de uma

multidão de fios ideológicos que servem de trama a todas as relações sociais em todos

os domínios” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 40). Há, na palavra, diversos

julgamentos valorativos fundamentados em critérios cognitivos, científicos e éticos.

Depois de uma leitura em voz alta e análise em conjunto, com a professora de

a “Canção do exílio”, observam qual a maneira de seleção de alguns termos por

Gonçalves Dias.

Pois “Os versos e as estrofes não são construídos apenas com palavras que

rimam entre si, mas de modo que esses elementos se articulem com o conjunto para

produzir um sentido” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 51). No final da etapa,

definem: rima, versos regulares, versos brancos e verso solto. Privilégio do ritmo, som

e verso. Na etapa de número 2, “Onde estão as rimas?” os alunos reunidos em grupos,

observam duas quadras na lousa para reconhecer se há rimas e identificar em quais

versos elas aparecem.

Na 3ª fase, “Mais quadras”, o professor contextualiza o autor e explica a

diferença entre pseudônimo e heterônimo. Há também a compreensão da “redondilha

maior”. Depois, os alunos produzem coletivamente alguns versos, ouvem a Coletânea,

revisam e socializam suas produções, para fixar no mural. Na 4ª etapa “Qual o papel

das rimas?”, a professora solicita aos alunos que produzam uma quadra

coletivamente. Discutem em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que

deixam a gente feliz”, de Otávio Roth.

Ouvem esse poema em busca de possíveis temas, já que o título nos remete à

simplicidade cotidiana. A compreensão e busca do conhecimento de mundo é

realizada via assimilação e relacionamento entre grafema e poema. Conversam para

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86

a percepção das rimas internas capaz de formar “uma lista” de coisas, Identificam e

transcrevem recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto. Discutem no

sentido de levantar e comparar termos com temas sociais. Exploram o título,

compreendem que os aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do

texto. Tomam conhecimento de técnicas que agrupam a lista de termos, bem como

sublinhar e circular que são estratégias de leitura e as formas linguísticas para uma

produção coletiva. Selecionam, individualmente, no dicionário, palavras, mas em trio

compõem versos. Depois, elaboram o texto em coletivo utilizando palavras e rimas

que combinam. Elegem a ordem em que os versos devem estar e escolhem o título.

A nosso ver, a palavra já tem sua própria carga valorativa.

A oficina 6 “Sentido próprio e figurado” tem a finalidade de apresentar os

conceitos de Denotação (sentido próprio) e Conotação (sentido figurado), além de

delimitar o texto poético. Na 1ª etapa são esclarecidas aos alunos as particularidades

do poema e a diferença com outros textos, porque os recursos expressivos sugerem

vários sentidos. Há uma atividade em grupo, audição do poema “Livros e flores” de

Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.

A compreensão do texto é percebida por meio da verificação de termos no

dicionário. É nessa etapa que se define o sentido próprio e sentido figurado na

produção textual. São trabalhados ainda a ambivalência do termo, estranhamento

causado pela inversão sintática “recurso que favorece o ritmo” (ALTENFELDER;

ARMELIN, 2010, p. 69) e a observação da sequência lógica textual. A 2ª etapa “Qual

o sentido?” instrui o professor a colocar textos na lousa e solicitar dos alunos a

localizar sentidos denotativos e conotativos. A etapa 3 “Definições poéticas” visa a

apresentação das “definições poéticas”: Modéstia, Reticências e Recordação de Mário

Quintana. Os alunos fazem uma atividade em grupo, leem e discutem sobre as

“definições poéticas” para descobrir significado e expõem suas conclusões em

atividade lúdica de apresentação. Em seguida, é proposto que eles realizem uma

atividade para fixação, individualmente ou em grupos, produção escrita empregando

as definições poéticas.

A oficina 7, “Comparação, metáfora, personificação”, tem como meta a

identificação e, também, a utilização das figuras de linguagem. Essa oficina está

dividida em 4 etapas. Na 1ª “Recursos que aproximam dois termos” é apresentado o

conteúdo: a linguagem figurada, com ênfase na identificação, aprendizagem e

emprego das figuras comparação, metáfora e personificação. Há a solicitação para a

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87

realização de uma atividade em grupo. Os alunos serão “avaliados”, a partir de uma

leitura da letra de canção “O leão” de Vinícius de Morais.

Novamente, comentam sobre o sublinhar, como estratégia de leitura e a

explicação seguinte: “a metáfora produz efeitos de sentido que ampliam a significação

do texto e as possibilidades de interpretação” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p.

76). Na 2ª etapa “Personificação” temos a definição dessa figura. O trabalho é

desenvolvido em leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu e cópia na

lousa para observação das partes sublinhadas: metáfora e personificação. Na 3ª

etapa “Estabelecer comparações” é pedido aos alunos que façam atividade escrita:

produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”. Eles são

questionados para ativar o conhecimento, e a compreensão escrita se dá através por

meio de preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas. Depois,

são solicitados apresentação e debate sobre a tarefa e, também, cópia pela

professora dos exercícios de outros alunos. A 4ª etapa “Transformar comparações em

metáforas” consiste na criação de metáforas eliminando os termos de comparação e

leitura das melhores frases construídas pelos grupos.

A oficina 8, “Sonoridade na poesia”, foi dividida em duas etapas. Na 1ª “Som e

sentido” os alunos leem em grupo e em voz alta “Pássaro livre”, de Sidônio Muralha,

além de “Haicai” da autora “Ângela Leite”, com o objetivo de perceber as repetições

de palavras, de versos e de letras que produzem sons, bem como a definição de

Aliteração (repetição da mesma consoante), ritmo regular, ritmo irregular. Debatem

sobre os possíveis efeitos de sentido irregular que pode surgir em “Pátria minha”, de

Vinicius de Moraes. Na 2ª etapa “Trava-línguas”, conversam construindo o conceito

de trava-línguas, depois leem textos da lousa e os alunos são desafiados a decorá-

los e apresentá-los. A professora divide a turma em grupos para treinarem, mas

individualmente os meninos são responsabilizados por apenas um. Por meio de

sorteio, são convidados a apresentar, pois “Falar trava-línguas é uma verdadeira arte”

(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 85). Em seguida, ouvem o trava-trovas “O

pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa”, da

autoria de Ciça. Depois de uma competição, os melhores da 1ª etapa são convidados

a lerem em voz alta e individualmente ou em grupos a produzirem e registrarem, no

caderno, trava-línguas ou trava-trovas usando encontros consonantais ou sons

parecidos. Após, leitura em voz alta e socialização das produções, revisão e

exposição dos textos no mural.

Page 89: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

88

A oficina de número 9 “Poetas do povo” está dividida em duas etapas: a 1ª “O

varal de cordel” retoma o trabalho com o poema popular, rapidamente abordado na

oficina 1 e também as formalidades da língua valorizadas no decorrer do todo o

Caderno. Na 1ª fase, há contextualização do poeta, ativação do conhecimento sobre

o cordel “Emigração e as consequências” de Patativa do Assaré, com audição e

leitura, de acordo com as orientações da oficina 4, para a interpretação desse poema.

Faz-se um comentário a respeito da definição de Estilo como "maneira de se

expressar de um escritor, de um grupo literário ou dos autores de determinado

período. O termo também pode ser usado por todas as pessoas que escrevem e criam

um modo pessoal” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 97). Então, Assaré tem um

estilo com vocabulário simples, mas com habilidade para a criação de metáforas e

comparações. Acrescentado a isso, exploram os “assuntos” presentes no texto, a

construção dos sentidos via figuras de linguagem e a escansão (divisão) do poema

em sílabas métricas. Depois, propõe-se a leitura de “A valsa” do poeta Casimiro de

Abreu, para a compreensão do ritmo cadenciado (marcado). Na 2.a etapa

“Quadrinhas divertidas”, há o trabalho com a noção de ritmo nas quadras do poema

“O buraco do tatu”, de Sergio Caparelli, para audição e leitura. Realiza-se, também,

uma retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos,

rimas, repetição dos versos. Propõe-se observação da sequência de ideias para a

forma do poema, em atividade individual ou em dupla. Em seguida, incentiva-se a

produção de quadras, acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu, a partir

do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”

(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 99). Em seguida, é proposta uma leitura em voz

alta das quadras. Ao final, atividade lúdica: montagem de um painel ilustrado com o

novo percurso do tatu.

A Oficina 10 “O lugar onde vivo” está distribuída em duas etapas e visa resgatar

os conhecimento e os sentimentos dos alunos, através por meio de textos de autores

sobre a terra natal deles. Na 1ª etapa “O lugar onde o poeta vive”, o poema escolhido

é “Milagre no Corcovado” de Mário Quintana. Há, portanto, ativação do conhecimento.

Em seguida, leitura de “O Milagre do Corcovado” e retomada das orientações da

oficina 4. Propõe-se exploração do tema: “Comente com eles a diferença de dimensão

que os objetos assumem, vistos de longe e de perto” (ALTENFELDER; ARMELIN,

2010, p. 104). Leitura e releitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana, para

imaginar a intenção do autor e como é a cidade dos alunos, focando-se a forma e a

Page 90: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

89

idealização. Compreensão do tema e do tom via forma. Solicita-se busca do

significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário. A seguir, comparação

entre as cidades dos dois poemas e uma descrição das diferenças e semelhanças.

Interpretação dos sentimentos do poeta com foco nas formas linguísticas. Na 2ª etapa

“Temas semelhantes, recursos parecidos”, faz-se retomada dos dois poemas,

observando os recursos expressivos. São Identificadas semelhanças na organização

composicional, rimas, ritmo marcado e repetições representando uma apreciação

valorativa positiva. Já para simbolizar as diferenças temos o tom alegre e triste dos

poetas. A Oficina 11, “Um novo olhar”, tem uma divisão em duas etapas e visa

direcionar a percepção do aluno para um olhar diferente e original. Na etapa de

número 1, “A observação dos pequenos detalhes”, são apresentadas a situação de

produção e a ativação do conhecimento, para a delimitação do tema que retrata a

cidade. É pedido aos alunos que conversem ou passeiem para a coleta de dados

sobre a cidade, focalizando as impressões e sensações. Em seguida, propõe-se

debaterem para descobrirem a intenção discursiva de Alberto Caieiro. Leem

“Confidência do Itabirano” de Carlos Drummond de Andrade e “Alma Cabocla” de

Paulo Setúbal, para a percepção do tema. Há um privilégio das características

literárias. Na 2ª etapa “Uma viagem imaginária”, a professora propõe uma viagem

imaginária objetivando a busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas

à produção, bem como registro de palavras e impressões dos alunos. É proposta uma

atividade lúdica com desenhos das impressões dos alunos em um painel.

Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade. Finalmente,

pede-se uma colagem dos elementos transcritos no painel.

A Oficina 12 “Nosso poema” está decomposta em 2 etapas e tem como objetivo

a produção coletiva a respeito do local onde vivem os alunos. Na etapa de número 1,

“Um passeio pelas oficinas”, é observado o painel, para refletir sobre o que já foi

aprendido e realizado, é solicitada a produção de um quadro-resumo, os alunos

deverão ouvir e ler alguns poemas, retomando o aprendizado do significado de:

poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação,

aliteração. Na 2ª etapa “O poema coletivo”, a professora deverá copiar na lousa e

conversar sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do

poema coletivo, também precisará escrever os versos criados em conjunto na lousa,

recompondo as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os

versos e estrofes. Em seguida, os alunos deverão ler em voz alta para adequação do

Page 91: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

90

tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês, por fim, reler o poema e a pensar a

escolha do título.

A Oficina 13 “Virando poeta” tem como objetivo a escrita do poema individual

sobre “O lugar onde vivo” e está dividida em duas fases. Na 1ª denominada “A análise”

é realizada uma leitura e análise do poema vencedor do último concurso para

motivação e, também para a percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.

Na 2ª etapa “A produção”, são retomadas a situação de produção de “O lugar onde

vivo”, a delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria

Literária. É solicitada a 1ª produção individual, com escrita e (re)escrita do poema. O

Caderno privilegia recursos literários, linguísticos enfatizando a aproximação dos

aspectos da cidade.

A Oficina 14 “Retoque final” propõe um aprimoramento dos poemas produzidos

e está separada em duas etapas. Na etapa de número 1, “A primeira produção”, a

professora copia o poema na lousa e, em seguida, os alunos devem ler e debater

sobre alguns versos para aperfeiçoamento do texto, e adaptação do título ao tema.

Recomenda-se que eliminem as repetições de termos na construção do som e

aperfeiçoem o estilo e reescrevam o poema. Na 2ª etapa, “Passando a limpo”, é

proposta a revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática;

harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens;

efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo

sintático); figuras de linguagem.

A Oficina 15 “Exposição ao público” está decomposta em 3 etapas e tem como

proposta a organização de um sarau para divulgar os poemas e a seleção dos três

melhores que serão enviados para a Comissão Julgadora da escola. Na 1ª etapa

“Exposição ao público”, é sugerida a realização de um sarau para os pais e a

comunidade, bem como uma atividade lúdica. É feita a sugestão da leitura de um

poema de poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. O foco deve ser

no ritmo, pausas e entonação da voz. A 2ª etapa “Arrume ‘a casa’ para o sarau”, o

professor é orientado a decorar o local e, se quiser, complementar com música e

teatro. A finalização poderá ter um lanche comunitário. Na 3ª etapa, “Seleção interna”,

após o sarau, devem ser escolhidos três poemas pelos alunos e pela Comissão

Julgadora da Escola, com a finalidade de escolher o melhor poema por essa

Comissão.

Page 92: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

91

Ao finalizarmos nosso propósito, portanto, esperamos que nosso leitor tenha

verificado a implicação de uma leitura em que considera a linguagem verbo-visual do

texto. Além da preocupação da parceria entre o Ministério da Educação – MEC, a

Fundação Itaú Social e o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e

Ação Comunitária CENPEC em confeccionar um material de boa qualidade, e que

também possa ter percebido os passos da sequência didática conforme os

pressupostos de Dolz & Schnewly (2010[1996]).

Na próxima seção, iremos analisar algumas oficinas do Caderno do Professor,

na tentativa de perceber quais as semelhanças ou diferenças que podem ser vistas

no ensino-aprendizagem do gênero poema subjacente ao pensamento da Teoria

Literária Escola de Genebra, e qual poderia ser a contribuição da filosofia da

linguagem de Bakhtin e seu Círculo10.

3.5 Por que não está considerada A Outra Face do Jano? Uma proposta de exame

analítico de alguns dados do Caderno Poetas da Escola

Não basta abrir a janela

Para ver os campos e rios.

Não é bastante não ser cego

Para ver as árvores e flores.

Alberto Caeiro

Nossa pesquisa, não objetiva principalmente expor possibilidades de

inadequações na proposta pedagógica do Caderno, mas seguir os resultados dos

dados levantados, e a reflexão sobre o tratamento didático dispensado ao gênero

poema no Manual, conforme os estudos bakhtinianos, comprovado em três gráficos,

para finalmente tentarmos contribuir para o conhecimento científico acerca da teoria

10 Durante entrevistas com Viktor Duvakin (2008), Mikhail Bakhtin menciona e explica particularidades de alguns Círculos de estudos, os quais reuniam pessoas com interesses em comum sobre conhecimentos literários ou filosóficos. Tais Círculos eram denominados como “salões”. Conforme Bakhtin declara em Duvakin (2008) que sua preferência era ouvir. Sendo que no Círculo de Pavel Nikolaevich Medvedev a ocupação dos participantes era a recitação de poesias e leitura de narrativas, e, em seguida, discussões sobre os textos. Alguns participantes do Círculo foram: Mikhail Bakhtin (1895-1975), Matvei Isaevich Kagan (1889-1937); Pavel Nikolaevich Medvedev (1891-1938); Lev Vasilievich Pumpianskii (1891-1940); Ivan Ivanovich Sollertinskii (1902-1944); Valentin Nikolaevich Voloshinov (1895-1936).

Page 93: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

92

enunciativo-discursiva de Mikhail Bakhtin e seu Círculo, pois cremos ser necessário

nos adaptar às condições da contemporaneidade no que diz respeito a “Um dos

objetivos principais da escola é justamente possibilitar que seus alunos possam

participar de várias práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita

(letramentos) na vida da cidade, de maneira ética, crítica e democrática”. (ROJO,

2009, p. 107, grifo da autora).

Logo, a educação linguística deve interessar-se em viabilizar caminhos que

conduzam o aluno à aceitação dos multiletramentos ou letramentos múltiplos tanto

das culturas locais quanto das culturas valorizadas, também ao contato com os

letramentos multissemióticos, ou seja, não mais apenas à interpretação de textos em

materiais impressos e sim às leituras que podem fluir provenientes do progresso

tecnológico os quais nos fazem perceber outros sentidos nos sons, nas imagens, nos

desenhos, nas cores etc., com a finalidade de esse aluno agir como protagonista

frente aos próprios julgamentos éticos, já que qualquer texto nasce das concepções

de cada um, situados sócio e historicamente.

De outro ângulo, contudo, tentaremos colaborar para uma análise do gênero

discursivo poema diferenciada e considerando todo o seu processo, visto que os

dados por nós investigados estão alicerçados em outras perspectivas de ensino-

aprendizagem do gênero literário poema – a teoria literária e a teoria comunicativa –,

nas quais pensamos, tratam as características constitutivas do gênero em questão

de forma inversa e, às vezes, insuficiente quando comparamos tais teorias ao método

sociológico de análise dialógica do discurso bakhtiniano.

Durante nossa revisão bibliográfica, entramos em contato com diversos textos

e tentaremos mobilizar compreensões adquiridas e concretizá-las em nossos

apontamentos a seguir. Cremos, portanto, que, a partir dos novos conhecimentos

adquiridos pelo professor, o aluno será beneficiado e buscará situar os discursos em

seus devidos cronotopos e, desse modo, desvelará as vozes e os discursos, por meio

das relações dialógicas e assumirá a condição de leitor e/ou produtor literário

competente.

A partir da orientação teórica de Bakhtin e seu Círculo, então, buscaremos

compreender e explicitar nosso segundo questionamento de pesquisa, isto é: quais

as contribuições teóricas bakhtinianas e como elas podem fundamentar a

transposição didática, privilegiando uma abordagem discursiva dialógica do ensino-

aprendizagem do gênero discursivo poema no Caderno da OLPEF.

Page 94: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

93

Este capítulo foi delineado da seguinte forma: breve contextualização de nosso

trabalho; observação do recorte de nossos dados em linguagem gráfica; descrição,

análise e avaliação das oficinas 1, 2, 6, 7 e 8 e, por fim, faremos algumas constatações

sobre o que percebemos no Caderno em geral e nas atividades citadas. Assim,

realizamos cuidadosamente mais uma leitura do projeto e atribuímos valor qualitativo

às oficinas e às atividades sob a ótica da análise dialógica discursiva de Bakhtin e seu

Círculo.

3.6 Levantamento das atividades recorrentes

Quanto a mim, em tudo eu ouço vozes e relações dialógicas entre elas.

Mikhail Bakhtin

Primeiramente, levantamos o conjunto de tematizações enfocadas nas

atividades do Caderno, com base no encaminhamento dos moldes da sequência

didática, e que poderá ser observado nos tipos de atividades desenvolvidas em cada

uma das suas 15 oficinas, e que são classificadas conforme Dolz; Noverraz e

Schneuwly (2004[2001]) em: situação de produção, alimentação temática, produção

oral, produção escrita, reescrita e, no caso do Poetas da Escola, há seção para

divulgação dos textos dos alunos.

Dessa maneira, elaboramos o gráfico 1, que traz a representação percentual

de um total de 188 atividades, encontradas nas 15 oficinas, e distribuídas conforme a

classificação da sequência didática acima descrita. Essas atividades foram

catalogadas na “TABELA 1 – Tipos de atividades nos moldes da Sequência Didática”,

e se encontra no anexo deste trabalho.

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94

Gráfico 1 – Tipos de atividades na configuração da Sequência Didática

Fonte: Organizado pela autora/2013, com informações compiladas da TABELA 1 no anexo.

Observamos então, por meio do gráfico 1, a distribuição das respectivas

atividades e concluímos que a produção oral foi a atividade que mais contribuiu para

o desenvolvimento das oficinas, com uma representatividade de 35%, seguida dos

elementos fundamentais do poema com 23% do total e situação de produção com

19%. A produção escrita soma 12%, a alimentação temática 7% e, por fim, a que tem

a menor representatividade é a reescrita, com apenas 3% de atividades em todas as

15 oficinas do Caderno.

Através dessa visualização, em que o Caderno apresenta uma sequência

didática focada com maior incidência na produção oral, tendo em vista que das 188

atividades analisadas em suas oficinas, os 35% observados acima representam 66

tarefas que se preocuparam com a oralidade entre professor e aluno, em que 1/3 do

Manual está destinado às tarefas de produção oral.

A partir desse resultado, verificamos que, de fato, há grande preocupação com

tal modalidade da língua, entretanto são voltadas para a situação de produção,

diagnóstico do que representa poema na visão dos alunos, apreciação do texto

poético pelo alunado, orientações de como devem ser desenvolvidas as atividades,

identificação das unidades da língua como: ritmo, rima, forma, figuras de linguagem.

Parece-nos que, referentemente ao pensamento de Bakhtin/Volochinov

(2010[1929]), em que a língua corresponde à interação verbal, o discurso autoral

0%

10%

20%

30%

40%

50%

19%

7%

23%

35%

12%

3%

Page 96: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

95

ainda não está conscientizado dessa dimensão da linguagem, já que não

encontramos nas conversas entre professor e alunos a contextualização ampla do

gênero ou as vozes sociais (na subjetividade dos alunos), demonstrando que

compreenderam as outras vozes de cada um dos atores existentes nos textos.

Também, não há sugestão do Caderno, para que o professor ajude aos alunos a

perceberem, que tais ecos sempre são de natureza social e que a

[...] orientação da palavra em função do interlocutor tem uma importância muito grande. Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade [...] A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 117).

Nesse sentido, se a palavra está orientada para os interlocutores e consiste

exatamente a “realidade fundamental da língua” (IBDEM, p. 127). Percebemos que o

Caderno segue o que Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) nos orienta a não fazer, isto é,

considerar o diálogo face a face como único, apesar de ser o principal, lembrando que

nos textos também há diálogos. Vimos, nas interações entre professor e alunos,

digamos, uma forma menos aprofundada de diálogo com/sobre os textos.

Como não vimos a preocupação com as ideologias, os confrontos entre os

valores sociais – físicos, intelectuais, morais, religiosos, etc. – com a finalidade de

relativizar ou de se posicionar exotopicamente e, também, de respeitar os valores do

outro, sugerimos a reflexão sobre esses pontos. Nesse sentido, nos lembramos de

uma passagem de Notas do Subterrâneo de Dostoiévski:

‘Anda, Vânia, desce por aqui! É o destino dela: até aqui ela vai de cabeça para baixo [...] Segura a corda, animal!’ – ‘Está bem assim’. – Mas não vês que ela está deitada de lado? Afinal, foi uma criatura humana, mas não tem importância, joga a terra! [...] Taparão a cova o mais depressa possível, com uma camada de terra lamacenta, e irão para a taberna. É o fim e ninguém mais pensará em ti. (DOSTOIÉVSKI, 2010, p. 116).

No trecho prosaico, há uma multiplicidade de vozes, a do protagonista se

dirigindo a interlocutora Vânia - uma prostituta a quem tentava convencer de que tal

profissão traria muitos sofrimentos para ela, seu enterro não teria importância e depois

disso ninguém mais se lembraria que ela existiu -, bem como os diálogos dos

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96

personagens que são duas pessoas representando os coveiros. Então, se para

Bakhtin (2010[1920-1924]) viver significa assumir posições diante dos atos, nesse

trecho, é possível ouvir as vozes de cada personagem posicionado e agindo de acordo

com seu lugar social.

Logo, não vimos essa preocupação do discurso autoral quanto a esse ponto

nas atividades, pois quando o momento é de leitura elas são para identificação,

localização e análise de aspectos formais da língua. Mas se no poema está

sobressalente a voz do poeta sem os discursos diretos da prosa, o Caderno poderia

ampliar a preocupação referente às vozes dos papeis sociais, as quais estão implícitas

e constituem o texto, bem como as marcas que elas estão imprimindo no pensamento

das crianças. Se fosse para abordarmos algo no fragmento de Dostoiévski poderia

ser, por exemplo, a questão do preconceito e, também discutirmos sobre o Princípio

da dignidade da pessoa humana tão em alta, nos últimos tempos. Assim, a falta de

compreensão pode gerar o desinteresse pela leitura do gênero poema, por isso é

necessário a mediação do professor entrar em cena.

3.6.1 Os dados sob um olhar bakhtiniano

Em seguida, fizemos um levantamento das atividades do Caderno com foco em

dois importantes conceitos bakhtinianos. O primeiro deles, o gênero do discurso, com

suas características constitutivas: o conteúdo, o material e a forma, sendo o material

dividido em estilo individual e estilo do gênero, e o segundo conceito, as relações

dialógicas, em três partes distintas: 1) uma constitutiva do enunciado; 2) o discurso

citado; e 3) e a outra a formação da consciência. Descobrimos, ainda, ser necessário

adotarmos uma nova classificação das tarefas, com vistas à igualdade entre o termo

“assunto” que encontramos na sequência didática do Caderno e o “tema” bakhtiniano.

O resultado desse levantamento está representado no gráfico de número 2, por

meio de porcentagem, referente a um total de 135 informações extraídas do Material,

das atividades presentes nas 15 oficinas, e compiladas na “TABELA 2 – Tipos de

atividades: perspectiva bakhtiniana”, e que também poderá ser visto no anexo deste

trabalho.

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97

Gráfico 2 – Atividades na perspectiva bakhtiniana

Fonte: Organizado pela autora/2013, com informações compiladas da TABELA 2 no anexo.

Na representação gráfica dos dados acima e com vistas do gráfico 2, o conjunto

de tarefas no Caderno demonstra que o maior número de atividades se refere à

Forma, uma das dimensões do gênero discursivo, além disso, a característica formal

esteve presente em 59% das atividades de todas as oficinas. Em seguida o Material

apresentou 22%, sendo que o “estilo individual” teve uma representatividade de 21%,

enquanto o “estilo do gênero” apenas 1%. A participação do conceito “Conteúdo”

definido por Bakhtin (2010[1924]), foi de 10%, enquanto que “Assunto”, na

denominação da SD, representou 8%.

Para finalizar, buscamos atividades articuladas às relações dialógicas, contudo,

tanto a “dimensão constitutiva do enunciado” como o “discurso citado” e até mesmo a

“formação da consciência”, não foram comentadas nas atividades. Entendemos que

se olharmos esses itens pelo viés bakhtiniano, todos os poemas são dialógicos

considerando, em primeiro lugar, que a palavra do poeta já foi pronunciada por alguém

em um outro tempo e em um outro espaço qualquer. Segundo, não encontramos

discurso citado direto ou indireto livre, mas temas ou sujeitos retratados nos poemas

pertencem ao contexto interacional, histórico, sociológico e ideológico, pois o poeta é

um indivíduo da sociedade. Em terceiro, todas as formas de linguagem, inclusive o

gênero discursivo poema, pertencente à esfera artística literária, contribui para a

formação de nossa consciência. Dessa maneira, a reflexão de tais itens constituidores

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98

de toda a produção textual, com os alunos seria retomada por eles, nas leituras e

produção de poemas.

Diante do resultado obtido no segundo gráfico, verificamos que houve, em

grande medida, uma preocupação do discurso autoral com os aspectos formais

durante o processo de ensino nas oficinas, pois encontramos 79 atividades

classificadas nessa categoria, em um universo de 135 tarefas analisadas ao longo das

15 etapas, o que representa 59% de participação no processo de execução das

tarefas. Nesse sentido, entendemos que foi concedido à Forma o status de prioridade.

Ainda seguindo esse mesmo raciocínio a respeito do aspecto formal é inevitável

comentarmos que na concepção desse Material a Forma é vista como apenas uma

dimensão. Todavia, nos estudos de Bakhtin e seu Círculo, para efeitos de

compreensão e análise de obras quaisquer ela pode ser dividida/pensada em “forma

composicional” e “forma arquitetônica”, mas divisões que são complementares.

Cabe ressaltar, nesse momento, que a elaboração da sequência didática

privilegia o ângulo formal e semântico da língua sendo, portanto, bem sucedida em

projeto inicial. Porém, o Caderno poderia as relações dialógicas pois, se pensarmos

em nossa perspectiva bakhtiniana, lamentavelmente, outras faces de análise dos

gêneros discursivos deveriam ter sido acrescentadas, como complemento do ensino-

aprendizagem do poema, nosso argumento se baseia no discurso do MEC, da

Fundação Itaú Social e do CENPEC, a saber, “proporcionar ensino de qualidade para

todos [...] democratização dos usos da língua portuguesa, perseguindo o ‘iletrismo’

[...] e o fracasso escolar [...] contribuir direta e indiretamente para a formação docente”

(ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 03-09).

No próximo subtópico, buscaremos comparar a discursividade com o

dialogismo.

3.6.2 Uma análise comparativa dos aspectos discursivos e dialógicos

Para concluirmos essa fase em busca de evidências, preocupamo-nos, agora,

em trazer um comparativo dos aspectos discursivos e das relações dialógicas,

encontradas em cada uma das 15 oficinas do Caderno. Para cumprir nosso intento,

foi necessário quantificar e apresentar novamente as atividades que trazem os

conceitos de gênero do discurso (o conteúdo, o material e a forma), comentadas no

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99

gráfico 2 acima, mas de forma consolidada. Quanto às atividades em que

encontramos os conceitos de relações dialógicas, o levantamento foi feito apenas para

nosso crescimento intelectual e detalhado em sete partes, a saber:

1) Contexto Sócio-histórico: aspectos que envolvem diferentes épocas e

períodos de tempo;

2) Contextualização do autor: dados da vida real e do trabalho do poeta;

3) Relações autor-herói (questões dialógicas internas): são relacionamentos

entre o poeta (autor-criador) e o eu lírico;

4) Projeto discursivo: a intenção ou querer dizer, questões ideológicas,

colocadas pelo autor, mas representadas na voz do eu lírico;

5) Reconstrução de sentidos pelo leitor: novos e diferentes sentidos

conectados à realidade do aluno;

6) Discurso alheio (citado) e/ou vozes: discursos de outras pessoas ou funções

de instituições sociais, citados direta ou indiretamente;

7) Intertextualidade ou Interdiscursividade: coincidência de unidades

linguísticas em textos diferentes ou, mesma unidade de sentido em textos

de diferentes espaços e períodos de tempo.

Cabe destacar que esse quadro comparativo que se encontra no anexo do

trabalho “TABELA 3 – Aspectos discursivos/dialógicos” serviu para compreendermos

como se deu a distribuição interna das atividades, dentro dos conceitos bakhtinianos

apresentados, e qual a possível intenção teórico-metodológica do Caderno. Abaixo,

no gráfico 3, podemos visualizar como foi o comportamento desses conceitos, de um

total de 181 atividades que o Caderno apresenta nessas características.

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100

Gráfico 3 – Aspectos discursivos e dialógicos

Fonte: Organizado pela autora/2013, com informações compiladas da TABELA 3 no anexo.

Conforme dissemos no primeiro parágrafo deste tópico, os conceitos de gênero

discursivo foram apresentados novamente de forma unificada, daquela vista

anteriormente no gráfico 2, mas cabe destacar que, embora a quantidade de tarefas

sejam as mesmas em ambas as análises, o percentual encontrado para cada conceito

foi diferente, tendo em vista que acrescentamos as atividades das sete relações

dialógicas distintas da primeira. E, enquanto no item anterior mencionamos um

universo de 135 tarefas, nesta análise esse parâmetro subiu para 181 tarefas,

acrescido de 46 atividades das novas relações dialógicas.

Mesmo diante deste novo prisma, o Caderno demonstra que o conteúdo, o

material e a forma continuam em destaque. A forma persiste no primeiro lugar, com

uma representatividade de 44% das atividades, o material vem a seguir com 17%, já

somados com estilo individual e com estilo do gênero, mais o conteúdo perfazendo

um total de 14% e, há de lembrar, que o assunto nesta análise foi incorporado ao

conteúdo. Para as relações dialógicas, o que se destaca é o projeto discursivo, com

8% do total, em seguida temos 6% para a contextualização do autor e a reconstrução

de sentidos pelo leitor. O contexto sócio-histórico representa 4% e a intertextualidade

ou interdiscursividade 2%. Por último, sentimos a falta de discussões sobre as

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101

relações autor-herói e discurso alheio e/ou vozes. Talvez essas questões não tenham

sido abordadas, porque a concepção da linguagem seja a Teoria da Comunicação11.

Dos estudos de Saussure, surgiu a denominação de receptor, por conta da

relação existente entre enunciação e enunciado. A evidência de dois autores, um

“autor intrínseco ao enunciado e o autor como pessoa real” (ZAVALA, 2012, p. 158)

se comunicando em uma alteridade dialógica e percebendo a ligação entre a

enunciação e a vida real, constitui essa relação que torna possível apreendermos o

mundo por meio de signos.

A respeito do olhar extralocalizado bakhtiniano, Zavala (2012) aponta para o

fato de que

Bakhtin estabelece uma diferenciação entre duas consciências, a do autor e a consciência do criador, [...] A consciência do autor é a consciência da consciência, uma consciência ampla porque abrange a do personagem e a do seu próprio mundo. A do personagem se apresenta como extraposição à do autor, em uma unidade conclusiva: se a do autor é onisciente, sabe como concluir o personagem que vai criando. Além disso, como criadores estamos fora de nós mesmos, e esse fora, essa extralocalidade ou exotopia, gera um processo de elaboração muito amplo. Mediante os cronotopos se estabelecem inter-relações de caráter dialogístico, mas esse diálogo não pode ser incorporado ao mundo representado, já que se encontra fora dele, no mundo do autor e do intérprete, dos ouvintes e dos leitores. (ZAVALA, 2012, p. 159).

Nesse sentido, sob a visão bakhtiniana, por conta dos cronotopos, são

elaboradas relações dialógicas no mundo exterior ao texto, ou seja, não nos espaços

da representação, mas entre autor-artista e as interpretações, porque há duas

consciências diferentes. Uma em que o autor envolve a consciência da personagem,

no caso do poema a consciência de eu-lírico, que está situada fora desse elemento

consciente do autor, possibilitando a ele um todo conclusivo, já que esse autor é

onisciente.

Além disso, as relações dialógicas que envolvem o outro e a enunciação são

responsáveis pelo estilo e a escolha do gênero, pois ela tem dupla orientação: é

orientada para o próprio enunciado e para o destinatário. Vale lembrar que pertence

11 Na teoria da comunicação o texto deve ser analisado considerando a sociedade e a época que o produziu, bem como sua intenção ou finalidade. Os elementos constitutivos da linguagem são o emissor, a mensagem, o receptor, o canal de comunicação, o código e o contexto. A partir desses elementos Roman Jacobson desenvolveu as funções linguísticas: a referencial, a emotiva, a conativa, a fática, a metalinguística e a poética. Elas são uteis para a análise ou produção textual, mas nenhum texto apresenta uma só função, isto é, existe o predomínio de alguma delas mesclada às outras.

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102

à arquitetônica a função de integrar o material, a forma e o conteúdo, organizar o

espaço, o tempo e os sentidos na construção, tornando possível a unidade de sentido

total dos enunciados.

Após releitura de alguns textos do Círculo de Bakhtin, em busca de

esclarecimentos para a compreensão do discurso poético, Padilha (2005) afirma ter

encontrado três caminhos, os quais tendem para o mesmo fim. Em primeiro lugar, a

ética e a estética são interconectadas, sendo que esta última sempre estará repleta

dos valores de experiências reais. Depois, a formulação de uma noção de linguagem,

em que o autor é partícipe ativo no processo criativo de uma obra de arte e em terceiro,

que as próprias considerações do Círculo, sobre o discurso no romance nos

esclarecem a respeito do discurso poético em sentido estrito (o poema).

Seguindo essa linha de pensamento, no texto de Bakhtin Para uma Filosofia do

Ato (1920-1924), o filósofo russo iniciou suas preocupações relacionadas à ética e à

estética, em outras palavras, a atividade real da vida cotidiana em correlação com a

atividade estética, as quais foram mais detalhadas em obras subsequentes. Nesse

texto de 1920-24, Bakhtin vê em uma manifestação literária, mais precisamente o

poema Razluka (Separação) de Pushkin12, condições para demonstrar a arquitetônica

do ato responsável, em nosso mundo concreto. Tal empreendimento é proposta de

seu projeto de pesquisa uma filosofia primeira ou filosofia moral, pois ela estabelece

uma relação em que é permitida a manutenção da alteridade do centro de valor de

toda a arquitetônica. O centro é considerado de modo exotópico e transgrediente. Tal

relacionamento se dá entre o autor e o herói no interior do texto.

Na arquitetônica de Bakhtin (1920-24), não há divisão entre o mundo das

experiências vividas na realidade e embora haja diferença, unicidade e singularidade

constituindo a personalidade de cada sujeito, não existe indiferença entre eles. Ao

contrário, no mundo oficial, relacionamentos são estabelecidos e mantidos a partir de

identidades, tais comportamentos subjugam o mundo da vivência – experiências reais

– porque está sendo considerada a separação entre esses dois universos. Para

Bakhtin (1920-24), entretanto, eles estão interligados, por meio da alteridade. Então,

12 Alexander Sergueievitch Pushkin (1799 - 1837). Romancista e poeta russo da era romântica é considerado por muitos como o maior poeta russo. Fundador da literatura moderna russa, Pushkin foi pioneiro no uso do discurso vernacular nos seus poemas e peças teatrais criando um estilo de narrativa que misturava drama, romance e sátira associada com a literatura russa, influenciando fortemente os futuros escritores. Também escreveu ficção histórica, poemas, novelas e peças teatrais (MATRIOSHKA, 2010; Disponível em: <http://mundoeslavo.blogspot.com.br/2010/03/alexander-

sergueievitch-pushkin.html>). Acesso em: jan. 2014.

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a arquitetônica bakhtiniana obedece a um movimento essencial composto de três

momentos que são o “eu-para-mim, o outro-para-mim, e eu-para-o-outro” (BAKHTIN,

2010, p. 23).

Vejamos como Bakhtin (1920-24) nos apresenta a arquitetônica real do mundo

realmente experimentado e sua análise em um poema narrativo, uma obra de arte,

para que compreendamos seu pensamento filosófico a respeito do Ser (ativo e capaz

de tomar posições concretas) e da vida.

Razluka (Separação)

Alexander Sergueievitch Pushkin

Em direção às margens da pátria distante

Estavas deixando o solo estrangeiro.

Na hora atroz que o tempo não cura,

Muito já chorei enquanto perto de ti eu estava,

Procuravam os meus dedos gelados

Segurar-te ainda por algum momento.

Que a mordaz pena da partida

Não terminasse implorava meu lamento.

Mas eis que do meu beijo doloroso

Então os teus lábios separaste.

Da terra do exílio tenebroso

A uma outra terra tu me convocaste.

Disseste: o dia no qual nos encontraremos

Debaixo do céu sempre azul na cor,

Lá na sombra dos olivais reuniremos,

Amigo meu, os beijos do amor,

Mas, ai de mim, onde do céu resplandece

O arco de um azul festivo

E a sombra das oliveiras sobre as águas se estende

Tu para sempre adormeceste.

A tua beleza e cada tormento teu

Desapareceram na urna sepulcral –

E também o beijo do teu encontro...

Mas eu a espero, a tua promessa vale!

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104

Nesta poesia há dois personagens: o herói lírico (o autor objetivado) e ela (Riznich), e, em consequência, dois contextos de valores, dois pontos concretos que são correlatos e momentos valorativos concretos do existir. Além disso, o segundo contexto, sem perder a própria independência, é, sobre o plano dos valores, abrangido pelo primeiro (é afirmado sobre o plano dos valores deste); e ambos são, por sua vez, envoltos pelo contexto estético unificante e que afirma os valores, do autor-artista e contemplador, o qual se acha colocado fora da arquitetônica da visão de mundo da obra (diversamente do autor-heroi, que é membro desta arquitetônica). O lugar singular do sujeito estético (do autor, do contemplador) no existir, o ponto de irradiação da sua atividade estética – do seu amor objetivo por um certo homem – tem uma só definição: a sua exotopia [vnenachodimost] em relação a todos os momentos da unidade arquitetônica da visão estética, que torna pela primeira vez possível abraçar a arquitetônica inteira, seja espacial ou temporal, com uma única atividade afirmativa dos valores. A empatia estética – visão do herói, do objeto, a partir do interior – se realiza ativamente deste lugar singular exotópico, e precisamente a partir daqui se realiza a recepção estética, afirmação e enformação da matéria da empatia e da visão, torna possível, pela primeira vez, a atividade estética da informação. (BAKHTIN, 1920-24, p. 131-132).

Após verificarmos no poema lírico “Separação” a realização da arquitetônica

descrita por Bakhtin (1920-24), foi possível compreendermos que assim como no

Romance, também no poema, o homem, um ser humano, é apresentado – objetivado

– por Bakhtin (1920-24) como herói e, por isso, há relação autor-herói.

No poema de Pushkin (1830), localizamos dois centros de valores reais e

concretos, ou seja, um herói e uma heroína. O âmbito valorativo do autor-herói (o

herói-lírico), abrange o centro de valor dela e ao mesmo tempo os dois centros são

intrapostos, porque a partir do olhar dele a heroína está partindo para a Itália, um país

distante. De fato, o que para ela significa um retorno, para ele é uma partida. Assim,

o herói acrescenta uma outra conotação – de atos éticos – para a realidade que é

percebida pelo observador e que gera um entre muitos outros acabamentos, conforme

o olhar do leitor. O dinamismo desse outro âmbito é formado em movimento de

exotopia, isto é, o espaço e o tempo em que o leitor observa fora dele mesmo e,

também, de quem está sendo observado, tudo isso relacionado ao herói e ao autor-

artista. A valoração positiva ou negativa ocorre neste ponto. Já que o leitor esteve

afastado para a leitura, deve voltar, entretanto, esse retorno adiciona algo à

constituição dele mesmo. As características culturais daquele “antigo” leitor, que

incluiu os centros de valores, tanto do heroi-lírico como do autor-artista, englobam

todos eles, ou seja, o “eu” do leitor é distinto do próprio leitor. Dessa forma,

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105

considerando o ato da empatia, do ponto de vista temático, tal objeto, será sempre

uma experiência positiva ou negativa, conforme o valor, para cada leitor.

Desse modo, a análise de um poema, pelo viés bakhtiniano, deve considerar o

conteúdo, o material e a forma, sendo que o conceito material nos lembra que todo

esse processo de análise, somente é possível por conta de nossa concepção de

língua como interação – fenômeno extraordinário – duplicidade de centros de valores,

em que os relacionamentos do mundo real e da ficção fluem infinitamente, com o

acréscimo de que o contemplador tem participação ativa nas criações ficcionais.

A análise, na sala de aula, portanto, em nossa opinião, precisa ser realizada

“na prática” e não somente na esfera científica, já que a partir dessa demonstração,

feita por Bakhtin (1920-24), verificamos a existência de relações dialógicas, na vida

(ética) e na arte literária (estética). Desse modo nessa inter-relação que resulta em

uma obra artística verificamos a participação ativa entre o autor-artista, o autor-criador

e o contemplador como seres ativos no processo da criação.

Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) afirma que a verdadeira natureza da língua

não constitui as formas linguísticas do código, nem manifestações monológicas

isoladas, menos ainda atos fisiológicos de produção, mas sim “fenômeno social da

interação verbal” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 127), ou seja, uma língua

real e que evolui continuamente. Então,

O diálogo, no sentido estrito do termo, não constitui, é claro, senão uma das formas, é verdade que das mais importantes, da interação verbal. Mas, pode-se compreender a palavra ‘diálogo’ num sentido amplo, isto é, não apenas como comunicação em voz alta, de pessoas colocadas face a face, mas toda comunicação verbal, de qualquer tipo que seja. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 127).

Como Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) opõe-se às abordagens objetivistas e

idealistas da linguagem, a interação verbal designa trocas verbais e respostas entre

interlocutores. O ato de fala, desde o início, surge em uma relação estabelecida no

ambiente da “arena em que se defrontam e lutam duas entonações, dois pontos de

vista, dois discursos” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 174). Essa dinâmica

se dá em um cenário de conflitos ideológicos e, nesse caso, não suscita respostas

mecânicas ou automáticas, antecipam o conteúdo das reações dos interlocutores do

diálogo, esses materializam suas respostas a partir da compreensão ativa responsiva

originando novos sentidos. Assim,

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106

A orientação dialógica é naturalmente um fenômeno próprio a todo discurso. Trata-se da orientação natural de qualquer discurso vivo. [...] o discurso se encontra com o discurso de outrem e não pode deixar de participar, com ele, de uma interação viva e tensa. Apenas o Adão mítico que chegou com a primeira palavra num mundo virgem, ainda não desacreditado, somente este Adão podia realmente evitar por completo está mútua orientação dialógica do discurso alheio para o objeto. (BAKHTIN, 2010[1934-1935], p. 88).

Bakhtin (2010[1934-1935]) diz que uma orientação interna e constitutiva da

linguagem é fundamentada em dois preceitos. O primeiro, a vinculação com os

enunciados já ditos e noções concebidas anteriormente por outras pessoas e o

segundo, a presunção da resposta do outro, respostas conforme a compreensão ativa

do interlocutor. Embora essa dialogicidade interna seja adquirida por meio do contato

com o outro, na sociedade, ela se dá na subjetividade do falante, constituindo a

formação de sua própria consciência, já existem nesse ambiente duas consciências

em diálogo simultâneo. Entrelaçamento da consciência em formação e de tudo que é

percebido no social, por exemplo, ao aceitarmos uma regra já estabelecida ou não.

Por isso, temos discursos que, por um lado se mostram monológicos, mas, por outro,

são dialógicos.

Sobral (2009), em harmonia com o pensamento de Bakhtin e o Círculo, a

respeito do discurso, comenta a dialogicidade discursiva, esta responsável por

podermos visualizar, principalmente na contemporaneidade, em unidade de sentido

os diferentes discursos, inclusive os poemas. Sobre esse movimento interativo tanto

com o passado como com o futuro o dialogismo

[...] busca dar conta do elemento constitutivo não apenas dos discursos como da própria linguagem e mesmo do ser e do agir humanos. Para o Círculo, a recepção presumida dos discursos é tão parte da criação do sentido quanto o são sua produção e sua circulação: não há sentido fora da diferença, da arena, do confronto, da interação dialógica, e assim como não há um discurso sem outros discursos, não há eu sem outro, nem outro sem eu. (SOBRAL, 2009, p. 20).

Sobral (2009) comenta a respeito das dimensões do enunciado: a constitutiva

inerente ao ato da enunciação, em que pronunciamos palavras que já foram ditas por

outras pessoas, mas que quando nós as pronunciamos tornam-se nossas.

Também, os aspectos presumidos geradores de sentidos, a produção e a

circulação de um enunciado que ocupam o mesmo plano de relevância na criação de

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107

um enunciado, por isso os enunciados somente realizam-se nas interações sociais e

o eu e o outro, com todas as suas diferenças, completam as lacunas em branco

reciprocamente e, ainda, a terceira, a formadora da consciência do indivíduo, pois tal

formação tem início nas relações, no meio social. Dessa forma, podemos dizer que

em todos os poemas há relações dialógicas, ainda que de modos diferentes.

Considerando, então, as dimensões constitutivas do enunciado não pode haver

enunciado, que seja apenas monológico, poderia sim ter uma tendência ao

monologismo, por exemplo, uma ordem. Contudo, mesmo assim, essa ordem estaria

formando o caráter de alguém. Ou como o próprio Sobral (2009) diz:

Aquele que se mostra, em termos de sua organização, e de seu projeto enunciativo [...], voltado, tanto em termos de incorporação como de negação, para a “neutralização”, na superfície discursiva, das vozes que o constituem, pondo em destaque a voz do locutor/enunciador, ou seja, criando o efeito de instauração de uma só voz como a voz dominante. (SOBRAL, 2009, p. 20).

Dizendo em outras palavras, vozes de discursos sociais dominantes. “A palavra

mais monológica não é senão o grau mais baixo de alusão à palavra do outro”

(PONZIO, 2010, p. 38). Retornamos, portanto, ao ponto principal deste tópico: todo e

qualquer discurso tem um componente dialógico.

Para Bakhtin/Volochinov (2010[1929]) é no terreno da linguagem, na interação

verbal, que se dá o amplo processo de transmissão e recepção de informações e,

nesse processo, são incorporados todos os tipos de comunicação denominados, pelo

filósofo, russo como diálogo, inclusive, a poesia.

Quando se leva em conta o “confronto” de vozes de que fala o Círculo, percebe-se com clareza que todo discurso (e mesmo toda palavra) é arena, lugar de confronto, de presença do outro, não se podendo pois conceber um discurso monológico como discurso que neutralize todas as vozes que não a daquele que enuncia (SOBRAL, 2009, p. 24).

De acordo com Sobral (2009) os textos poéticos, ainda que sejam os poemas

épicos, que apresentam personagens sem representação de diálogo face a face,

tendem a somente deixar que sobressaia a voz objetivada (tematizada) do poeta,

mesmo que haja a forma convencional do diálogo, enquanto nos textos prosaicos, há

uma grande variedade de diálogos.

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108

Concordamos com Padilha (2005), no seguinte: antes é necessário refletirmos

sobre a concepção de romance, para chegarmos ao conhecimento da noção de

poesia.

Bakhtin (1934), ao discorrer sobre as particularidades de O Discurso na Poesia

e o Discurso no Romance diz ser complicado compreendermos, às vezes, o tema nos

discursos. Isso, deve-se ao fato de que já incidiu sobre as palavras um

desacreditamento sócio-verbal em que as palavras já avaliadas, retomadas e com

novas nuanças de sentidos retornam ao contexto real comunicativo.

Desse modo, para o filósofo russo, é necessário conhecer a natureza do

enunciado e as relações estabelecidas entre as esferas e os gêneros e as

características destes. Dessa maneira, não corremos o risco de analisar o enunciado

formalmente como se fossem apenas formas abstratas da língua.

Já nas considerações de Medviédev (2012[1928]), todos os enunciados – os

das esferas ideológicas – obedecem às condições de exigência da avaliação social,

inclusive os enunciados complexos do campo literário e uma “combinação de palavras

em um enunciado concreto ou em uma apresentação literária é sempre determinada

pelos seus coeficientes de avaliação e pelas condições sociais de realização desse

enunciado” (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 187).

Medviédev (2012[1928]) diz que, apesar de sua preocupação se ocupar em

caracterizar o enunciado poético, a avaliação social está presente em todos os

enunciados concretos e singulares, pronunciados em todos os campos da

comunicação humana, ainda que eles sejam compostos por uma única palavra, pois

o enunciado concreto é um elemento da comunicação inerente à vida, é

[...] um fenômeno histórico. [...] possui significado histórico e social, [...] também, o próprio fato de sua pronúncia e, em geral, de sua realização aqui e agora, em dadas circunstâncias, em dado momento histórico, nas condições de dada situação social. (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 183).

Toda modificação feita pelo ser humano se torna, em algum período de tempo,

objeto histórico. Seja uma transformação na natureza, seja uma modificação

tecnológica ou uma criação intelectual. Nesse sentido, quando o homem cria um

"enunciado concreto", o que se insere na criação intelectual, o enunciado poderá em

algum período histórico virar objeto de análise científica das ciências humanas. Ora,

tal relação ocorre devido ao sentido, ao significado que esse enunciado teve no

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109

momento da sua criação. Em outras palavras, quando o poeta, ou qualquer outro

intelectual, molda seu enunciado, este tem um sentido, uma significação, uma

relevância para a compreensão de algum aspecto sócio-histórico naquele momento,

assim a circunstância daquele momento deve ser contextualizada com outras fontes

de análise no hoje, no aqui e agora.

Nessa perspectiva, de acordo com Medviédev (2012[1928]), cabe à avaliação

social atualizar o ato, pois é imprescindível tentar perceber se tal ato se tornou um fato

social. Vale ressaltar que, na teoria de Émile Durkheim (1858-1917), o fato social, que

tem como características ser externo ao indivíduo, ser coercitivo e universal, tende a

impor, às vezes de modo imperceptível embora presente, a intenção do enunciado. O

ato enunciativo ao se tornar um fato social desencadeia toda uma estrutura, toda uma

engrenagem social que proporcionará a sua própria continuidade mesmo que esta

seja a visão de um grupo dominante ou de um único enunciador, o que estabelece por

sua vez o próximo enunciado, já possuidor de um conteúdo e uma forma pré-definida

amplamente (re)conhecida pelos indivíduos que o legitimam.

Por isso, “a avaliação social determina todos os aspectos do enunciado,

penetrando-o por inteiro, porém, ela encontra a expressão mais e típica na entonação

expressiva” (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 185). Disso, Medviédev (2012[1928])

conclui, sobre o enunciado, que ele não pode ser analisado distanciado da

comunicação social, pois ele se tornaria objeto. A palavra como símbolo, suas formas

gramaticais definidas a partir do ponto de vista da linguística são sinais técnicos com

apenas um sentido e que ainda não foram individualizados na história. Assim a

avaliação social surge da renovação do enunciado.

Precisamos compreender o enunciado “no contexto da sua contemporaneidade

e da nossa (caso elas não coincidam). É necessário compreender o sentido do

enunciado, o conteúdo do ato e a realidade histórica” (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p.

185). Portanto, aquela avaliação social é demonstrada com mais intensidade na

entonação expressiva do enunciado, ela é quem

dá cor a cada palavra do enunciado reflete sua singularidade histórica, diferente da entonação sintática que é mais estável. O caráter expressivo é determinado não pelo esquema lógico do sentido, mas por toda a sua plenitude e integridade individual, e por toda sua situação concreta e histórica. Da mesma forma, a entonação expressiva dá cor ao sentido e ao som, aproximando-os de forma intima na união peculiar do enunciado. (MEDVIÉDEV, 2012[1928], p. 185).

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Conforme Medviédev (2012[1928]), a palavra entra no enunciado por meio da

vida, em que de enunciado em enunciado vai se construindo a comunicação, então,

essas palavras, seguramente, só entram nos enunciados com a permissão da

avaliação social. E isso diz respeito tanto ao enunciado das diversas esferas

ideológicas quanto ao enunciado poético.

Neste trabalho, foi possível compreendermos que o enunciado é a unidade da

comunicação real, com suas próprias caraterísticas singulares e a necessidade de ele

ser analisado, por meio das interações reais da comunicação. Além disso, convém

sabermos sua natureza e, também, como se dão suas relações nas esferas

comunicativas. Por final, percebemos que a avaliação social é responsável por cada

novo enunciado concreto.

Retornando ao que dissemos sobre a Teoria da Comunicação em que

A compreensão passiva do significado linguístico de um modo geral não é uma compreensão; é apenas seu momento abstrato, mas é também uma compreensão passiva mais concreta do sentido da enunciação, da idéia do falante. Permanecendo puramente passiva, receptiva, não trazendo nada de novo para a compreensão do discurso, ela apenas o dubla, visando, no máximo, a reprodução completa daquilo que foi dado de antemão num discurso já compreendido. (BAKHTIN, 1934, p. 90).

E Bakhtin (1934) acrescenta mais adiante que o falante (emissor) fica isolado,

não ultrapassa seus próprios limites de contexto ou de círculo, não deixando espaço

para a compreensão, réplicas e outros novos sentidos. Entretanto, nas interações

reais discursivas “a compreensão concreta é ativa”, porque apenas na resposta – na

dialogicidade - é que encontramos graus diferentes de entendimento. (BAKHTIN,

1934, p. 90).

Dessa forma, portanto, em um poema poderíamos encontrar o discurso alheio

e/ou vozes, por exemplo, expresso em uma língua estrangeira, mas ainda temos o

dialogismo constitutivo de toda linguagem, em que Bakhtin (1934) assegura que

apenas o Adão bíblico “podia evitar por completo esta mútua orientação dialógica do

discurso alheio para o objeto” (BAKHTIN, 1934, p. 88).

O projeto discursivo de Bakhtin era representar a arquitetônica de um mundo

real, mas representado na estética. Pensamos que o empreendimento bakhtiniano

pode ser transposto para o ensino da língua materna nas escolas, inclusive pelo

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material didático OLPEF, porque Bakhtin (1920-24) nos leva ao entendimento de que

seus estudos partem de bases literárias para tratar temáticas relativas à linguagem.

Na obra de Cristovão Tezza Entre a prosa e a poesia: Bakhtin e o formalismo

russo, no quarto capítulo, o professor tenta articular as considerações bakhtinianas

sobre as diferenças entre o discurso prosaico e o discurso poético. Tomando como

base as distinções feitas por Bakhtin (1934), denomina as considerações do filósofo

russo como tese ou hipótese bakhtiniana.

Ao longo da história há processos de centralização e descentralização na

existência da corrente verbal e ideológica de todas as línguas. Nesse contexto o

discurso poético configura a “expressão das forças centrípetas da linguagem; e o

discurso romanesco das formas centrífugas” (PADILHA, 2005, p. 29). A pesquisadora

cita as palavras de Tezza (2003) afirmando que “O estilo poético necessitaria [...] de

uma ‘atitude isolante diante do plurilinguismo’, um ‘apagamento deliberado da

dimensão dialógica da palavra’, a linguagem num poema se realiza como algo

‘indiscutível’, ‘indubitável’, englobante’ (PADILHA, 2005, apud TEZZA, 2003, p. 277)

Ao escolhermos, então, seguir a orientação dialógica da linguagem bakhtiniana

e de seu Círculo, devemos pensar em qualquer discurso, inclusive o poético, como

manifestação viva da linguagem. “Porque neles se instauram e reinstauram relações

dialógicas diversas, cujos níveis vão aflorar ou ‘hibernar’ de acordo com movimentos

e fatores sócio-historicamente determinados” (BAKHTIN, 1929, p. 123).

Tipos de enunciados – os gêneros discursivos –, por conta do momento verbal

e da demanda de cada esfera da sociedade, são criados, estabilizados, legitimados e

oficializados como “forma prototípicas”. Ex.: nos gêneros poéticos temos “o soneto, e

os versos decassílabo e alexandrino” (PADILHA, 2005, p. 30).

Dessa forma, “os gêneros poéticos serviram, sim, à centralização, à unificação,

e o romanesco era expressão ainda nascente, das forças descentralizadoras, em

oposição à vida linguística-ideológica oficial” (PADILHA, 2005, p. 30).

Desse modo, portanto, é que precisamos entender o texto poético como

centralizado e o discurso romanesco como descentralizado, mas conforme Tezza

(2003) ainda vai haver outra forma de descentralização e centralização – que não

pode ser mecânica, porque na língua tudo acontece de fora para dentro e de dentro

para fora.

A atitude do poeta é responsável por decidir todas as ações do herói (lírico) e

seu tema tendo como base a relação autor-herói-objeto. Tudo isso resulta na

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112

“composição formal e [...] a centralização ou descentralização do discurso, a presença

ou não da palavra alheia” (PADILHA, 2005, p. 32).

Padilha (2005), nos alerta sobre a referência de Mikhail Bakhtin no texto, em

que ele discorre sobre o romance de Dostoievski com as muitas vozes, consciências

independentes umas das outras que não se mesclam e a polifonia, pois o filósofo

russo delineia algumas características que diferenciam o discurso poético do discurso

no romance. A esse respeito Bakhtin(1961) esclarece que ele considera o “discurso

[...] em sua integridade concreta e viva, e não a língua como objeto especifico da

linguística, [...] abstração absolutamente legítima e necessária de alguns aspectos da

vida concreta do discurso” (BAKHTIN, 1961, p 207).

O discurso poético, no sentido restrito, requer a uniformidade de todos os discursos, sua redução a um discurso do primeiro tipo ou pertencer a variedades atenuadas de outros tipos. Aqui, evidentemente, também são possíveis obras que não reduzem toda a matéria de seu discurso a um denominador; embora esses fenômenos sejam raros e específicos no século XIX. Situamos nesse contexto a lírica “prosaicização” de Heine, Barbier, Niekrássov e outros (só no século XX ocorre uma acentuada “prosação” da lírico). Uma das peculiaridades essencialíssimas da prosa está na possibilidade de expressividade acentuada sem reduzi-los a um denominador comum. Nisso reside a profunda diferença entre os estilos em poesia e em prosa. Mas, na poesia toda uma série de problemas essenciais tampouco pode resolver-se sem incorporação daquele plano de exame do discurso, porque diferentes tipos de discurso requerem em poesia elaboração estilística diversa. (BAKHTIN, 1961, p. 174).

Padilha (2005) explica a declaração bakhtiniana em afirmar a respeito da

problemática dos tipos de discurso prosaico ao analisarmos textos poéticos. “O

tratamento ‘estilístico’ diferente aponta para uma crítica a uma estilística que só

conhece e só sabe pensar seu objeto em termos de uma fala direta pertencente ao

autor e orientada para o referente” (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1961, p. 174).

Para Bakhtin (1961) as falas estão inter-relacionadas. Um enunciado poético é

concreto, configura o início de um texto com diferentes significações e tem como

participantes ativos um autor, um herói e um ouvinte, que “fisicamente” estão

localizados em um determinado período de tempo e espaço real. Assim, o enunciado

adquire suas próprias marcas – impossíveis de serem apagadas – orientadas para os

dois lados: do autor para o herói e o tema, simultaneamente, a outra orientação parte

do ouvinte em direção ao objeto e ao herói.

Page 114: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

113

Bakhtin (1920) pensava dessa forma em relação ao princípio criador na relação

entre o autor e o herói, isto é, uma oposição dele ao texto de Barthes, mesmo antes

deste ter escrito algo sobre “A morte do autor”, nas palavras de Padilha (2005):

Subvertendo a ordem cronológica dos fatos, Bakhtin, nos textos de 1920-1930, em defesa do princípio criador na relação do autor e do herói, já constatava a imensa confusão contestada por Barthes e parece responder, anos antes ao alarde e ao que foi alardeado, anos depois. (PADILHA, 2005, p. 34). A prática mais corrente consiste em extrair um material biográfico de uma obra e, inversamente, em explicar uma obra pela biografia, contendo-se com uma coincidência entre fatos pertencentes respectivamente à vida do herói e à do autor [...] Denunciamos simplesmente o procedimento puramente factual, desprovido de qualquer princípio, tal como é praticado atualmente, baseado na confusão total entre o autor-criador, componente da obra, e o autor-homem., componente da vida (BAKHTIN, 1920-1930[1979], p. 29-31).

Do ponto de vista bakhtiniano (1930) são destacados o movimento produtivo da

atividade criadora uma reação ativa e englobante do autor sobre o herói:

Um autor não é o depositário de uma vivência anterior, e sua reação global não decorre de um sentimento passivo ou de uma percepção receptiva; o autor é a única fonte de energia produtora da forma, a qual não é dada à consciência psicologizada, mas se estabiliza em um produto cultural significante (BAKHTIN, 1920;1930[1979], p. 28)

Nesse fragmento, percebemos a imprescindível atuação do autor. Padilha

(2005) explica que do ponto de vista bakhtiniano o autor é aquele que produz com

participação ativa e os julgamentos valorativos dele decidem ativamente na

construção da obra. Por isso, o autor não pode ser como queria Barthes um produtor

com “papel passivo, receptivo de formas e discursos anteriores” (PADILHA, 2005, p.

34).

Como os julgamentos de valor são decisivos para a seleção de palavras em

uma obra, Padilha (2005) nos relembra outros textos a respeito:

Julgamentos de valor antes de tudo, determinam a seleção de palavras do autor e a recepção desta seleção (a co-seleção) pelo ouvinte. O poeta, afinal, seleciona palavras não do dicionário, mas do contexto da vida onde as palavras foram embebidas e se impregnaram de julgamentos de valor [...] (BAKHTIN/ VOLVOCHINOV, 1926, p. 11).

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114

Todos os elementos do estilo de uma obra poética estão também impregnados da atitude avaliativa do autor com relação ao conteúdo e expressam sua posição social básica. Frisemos uma vez mais que aqui não nos referimos que aquelas avaliações ideológicas que estão incorporadas no conteúdo de uma obra na forma de julgamentos ou conclusões, mas àquela espécie mais entranhada, mais profunda de avaliação via forma que encontra expressão na própria maneira pela qual o material artístico é visto e disposto (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1926, p. 14).

A intenção de Padilha (2005), foi demonstrar que a relação entre autoria, estilo,

forma, apreciação valorativa estabelecida por Bakhtin é essencial demonstrar que o

poeta e o prosador na posição de autores de enunciados poéticos diferentes,

assumem posições díspares frente aos seus objetos. Cada um desses artistas

escolhem estabelecer relações não semelhantes com a matéria prima, que resultam

em obras artísticas com aspectos diversos, porque o material bruto linguístico já está

embebido de posicionamentos avaliativos, anteriores.

Padilha (2005) conclui que, se na visão bakhtiniana, os enunciados participam

ativamente dos diálogos de todo o contexto social e de infinitas formas, seus discursos

são aproximados de seus objetos enunciativos, essa concretização é realizada de

maneira diferente, ou seja, no discurso poético a orientação se dá sem intermediários,

já no discurso romanesco as vozes alheias são presentes.

Se representarmos a intenção, isto é, a orientação sobre o objeto de tal discurso pela forma de um raio, então nós explicaremos o jogo vivo e inimitável de cores e luzes nas facetas da imagem que é construída por elas, devido à refração do ‘discurso-raio’ não no próprio objeto (como jogo de imagem-tropo do discurso poético no sentido restrito, na ‘palavra isolada’), mas pela sua refração naquele meio do discurso alheios, de apreciações e de entonações através do qual passa o raio, dirigindo-se para o objeto. A atmosfera social do discurso que envolve o objeto faz brilhar as facetas de sua imagem (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1934-35, p. 87).

Em mais um excerto de Bakhtin (1934) vemos particularidades essenciais do

discurso poético e prosaico. Padilha (2005) torna claro que a ação do prosador é

permitir a expansão de vozes em meio à totalidade discursiva, ao contrário, no caso

do poeta, a ação é a de isolar. Então, em um espaço e tempo determinados, há um

encontro entre o artista e o objeto. Nesse momento, a linguagem artística (a forma e

o conteúdo) é produzida pelo autor-criador e como co-participante ativo entra em cena

Page 116: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

115

o leitor, resultando em uma obra com vida própria. Percebemos, assim, nessa

diferenciação a importante característica do discurso poético – o isolamento.

De acordo com Padilha (2005), “O isolamento a que se refere Bakhtin é [...]

uma marca da atitude do poeta em relação ao seu objeto” (PADILHA, 2005, p. 36).

Pois, ao manusear o material verbal o isolamento da palavra usada no cotidiano é

feito na própria linguagem do poeta. Esse trabalho artístico insere e o integra na

própria obra de arte.

Para Bakhtin, além de nos fazer notar o discurso poético, tal isolamento é

inerente ao conteúdo. “O isolamento ou a separação não se relacionam nem com o

material, nem com a obra, como coisas, mas com o seu significado, com o seu

conteúdo, que liberta de algumas ligações indispensáveis com a unidade da natureza

do evento ético do ser” (BAKHTIN, 1924, p. 59-60).

Segundo Padilha, novamente, temos o conceito de estilo, isto é, uma relação

entre “forma-autor, material e conteúdo” (PADILHA, 2005, p. 36).

O isolamento torna possível pela primeira vez a realização positiva da forma artística, pois possibilita uma relação não cognitiva e não ética com o acontecimento, possibilita uma livre moldagem do conteúdo, libera a atividade do nosso sentimento do objeto, do sentimento do conteúdo e libera também todas as energias criativas desse sentimento. Assim o isolamento é a condição negativa do caráter pessoal, subjetivo (mas não psicologicamente subjetivo) da forma; ele permite que o autor-criador se torne um elemento constitutivo da forma (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1924, p. 59-61).

Como explica Padilha (2005) o autor-criador em sua relação espaço-temporal-

avaliativa toma conhecimento da palavra habitual e a isola para que o conteúdo

(semântica) dela, por meio dos sons, do ritmo, das imagens, sejam combinadas e

tragam novidades que não façam parte da rotina nem do âmbito em que vivem as

pessoas. Nesse sentido,

A língua do poeta é sua própria linguagem, ele está nela e dela é inseparável. Ele utiliza cada forma, cada palavra, cada expressão no seu sentido direto (por assim dizer, “sem aspas”), isto é, exatamente como a expressão pura e imediata de seu pensar. Quaisquer que tenham sido as “tormentas verbais” que o poeta tenha sofrido no processo de criação, na obra criada a linguagem passa a ser um órgão maleável, adequado até o fim ao projeto do autor. (PADILHA, 2005, apud BAKHTIN, 1934-1935, p. 94).

Page 117: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

116

No discurso poético, apesar das tormentas verbais enfrentadas pelo poeta

durante o processo de criação da obra poética, a linguagem torna-se adequada ao

projeto discursivo do autor até o final do trabalho, sendo que o modo de apropriação

das formas, das palavras e das expressões é de modo direto (expressão pura e

imediata de seu pensar) sem a intermediação das aspas para demarcar discursos os

alheios.

Na imagem poética, em sentido restrito (na imagem-tropo), toda ação, a dinâmica da imagem-palavra, desencadeia-se entre o discurso (em todos os aspectos) e o objeto (em todos os seus momentos). A palavra imerge-se na riqueza inesgotável e na multiformidade contraditória do próprio objeto com sua natureza “ativa” e ainda “indisível”; por isso, ela não propõe nada além dos limites de seu contexto (exceto naturalmente o tesouro da própria língua). A palavra esquece a história da concepção verbal e contraditória do seu objeto e também o presente plurilíngue dessa concepção. (BAKHTIN, 1934-1935, p. 87).

No poema, as imagens-tropo (as figuras de linguagem) adquirem movimento

em uma ação dinâmica entre a imagem e a palavra. Esse movimento suscita entre o

aspecto cientifico, religioso, filosófico, poético etc, por exemplo, e o objeto em todos

os espaços de tempo. Mas, o compromisso do poeta é com a arte linguística dele e,

por isso em seu objeto não há contaminação com os discursos vigentes do outro. O

poeta, apenas, usando suas figuras de linguagem é capaz de criar, descrever, definir

sem se importar com a historicidade da língua ou contextos externos.

Padilha (2005) recorre a Antônio Candido (1992) para nos auxiliar no

esclarecimento do trecho de Bakhtin (1934), em que, por meio da mobilização das

imagens-tropo13 o poeta pode construir, desfazer ou refazer um universo de

novidades.

Portanto, na comparação, sobretudo em sua forma mais radical, a metáfora, o mundo está e não está presente. De fato, graças a ela o escritor acentua a intensidade da analogia até parecer que não há mais mundo, mas sim uma mensagem com vida própria, podendo inclusive não se referir a algo que a experiência comprove. (...) Nesse processo de desfazer a realidade o mundo se vai desfigurando e o objeto referido pela palavra parece passar dele para ‘dentro’ do discurso. Aparentemente, não é mais o mundo, é outra coisa, que parece não existir fora dos limites do texto. (PADILHA, 2005, apud CANDIDO, 1992, p. 41-42).

13 Conforme Padilha “compreendo a expressão imagem-tropo por todos os recursos expressivos da língua, as chamadas figuras de linguagem da qual o poeta lança mão ao criar um poema: metáforas, metonímias, antíteses, aliterações etc.” (PADILHA, 2005, p. 37).

Page 118: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

117

Padilha (2005) completa o raciocínio, ou seja, Cândido dialoga muito bem a

respeito do “esquecimento” de que fala o filósofo russo. Trata-se do autor-homem

fazer “ressurgir sob a autoridade da voz do poeta [...] o mundo refeito pela linguagem”

(PADILHA, 2005, p. 38).

Ao contrário da descentralização do discurso romanesco, o poeta centraliza sua

linguagem, fecha-se em seu próprio trabalho, com a língua, garantindo para sua

criação a autoridade semântica do texto. Nesse ponto Padilha (2005) nos lembra a

distinção bakhtiniana entre sinal e signo relacionada à linguagem, em outras palavras,

o artefato representando a língua e o poema a obra artística. A pesquisadora retorna

a Bakhtin.

Nos gêneros poéticos, a consciência literária (no sentido da unidade de todas as intenções semânticas e expressivas do autor) realiza-se inteiramente na sua própria língua; ela é inteiramente imanente, exprimindo-se nela direta e espontaneamente sem restrições nem distâncias. A língua do poeta é sua própria linguagem, ele está nela e é dela inseparável. Ele utiliza cada forma, cada palavra, cada expressão no seu sentido direto (por assim, dizer, “sem aspas”), isto é, exatamente como a expressão pura e imediata de seu pensar. Quaisquer que tenham sido as “tormentas verbais” que o poeta tenha sofrido no processo de criação, na obra criada a linguagem passou a ser um órgão maleável, adequado até o fim ao projeto do leitor. (BAKHTIN, 1934-1935, p. 93-94)

Como Bakhtin explica a consciência literária – unidade da intenção expressiva

e semântica do autor realizada inteiramente na língua dele – “é imanente, exprimindo-

se nela direta e espontaneamente sem restrições nem distância” (PADILHA, 2005,

apud BAKHTIN, 1934-1935[1975], p. 93-94). A língua em que o poeta escreve é a

linguagem dele, o poeta está representado nessa linguagem e não pode separar-se

dela.

O poeta utiliza formas, palavras e expressões no sentido direto – discurso direto

– sem citar o discurso de ninguém, isto é, como uma expressão pura e imediata de

seu próprio pensamento. Mesmo que o poeta tenha tido “tormentas verbais” no

processo de criação, a linguagem na obra criada (resultado) passa a ser um órgão

maleável, que se adequa até o fim ao projeto do autor.

A particularidade do “oficio” do poeta é denominada de “consciência literária”,

uma junção de todas as expressões e significações do querer do poeta são

concretizadas na língua dele mesmo. Ele faz todas as escolhas verbais ou semânticas

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118

conforme sua própria vontade. Grosso modo, o trabalho é do poeta sem a interferência

do discurso de mais ninguém e, por isso quem está definitivamente representado na

linguagem poética é o poeta.

Como Bakhtin em “diversas” considerações esclarece que o discurso poético é

centralizador, tal afirmação pode ser confundida com compreensões voltadas para

que a centralização corresponda a discurso monológico e autoritário, ao contrário do

discurso romanesco. Vejamos o que nos diz Tezza (2003):

A ideia de centralização da linguagem é um conceito complexo, e seria pueril toma-lo apenas no sentido “autoritário”, que o termo implica, dando a essa entonação, digamos assim, como diriam Bakhtin e Voloshinov, uma marca temática ou ideológica necessariamente excludente. Há muitos planos a considerar no aspecto centralizador do estilo poético, e o primeiro deles é também estritamente formal, como queriam os formalistas (e paravam aí). Do ponto de vista da linguagem, a centralização não é primordialmente um fenômeno temático (manifestação de uma opinião “autoritária”, por exemplo, que exigiria a análise conteudística do momento verbal, o seu “tema” para decidir o grau de “autoridade”), mas dialógico; na sempre dupla orientação da palavra, é preciso avaliar que espaço o meu centro de valor dá ao centro de valor alheio e a todos os centros de valores que pulsam no objeto quando a ele me refiro. (TEZZA, 2003, p. 258).

Para Padilha (2005), se o discurso poético, na visão bakhtiniana, a realização

da linguagem se dá como algo indubitável, indiscutível, englobante, porque a língua

do poeta é a própria língua da obra, ela não comporta controvérsias, nada pode ser

contestado. “A ideia da pluralidade de mundos linguísticos, igualmente inteligíveis, e

significativos, é organicamente inacessível para o estilo poético” (BAKHTIN, 1934, p.

94).

No poema, ainda que não haja diferentes linguagens sociais ou ideológicas,

existe no âmbito de nosso cotidiano, em nossos parâmetros éticos ou cognitivos, são-

nos dadas possibilidades de liberdade para contestarmos a palavra do outro. Na

contemplação do artístico, porém, isso nos é proibido, exceto, como diz Padilha

(2005), seria possível discordarmos “desta imagem se pudéssemos, outrossim, na

posição de poetas, contrapor a ela outra imagem” (PADILHA, 2005, p. 40).

Padilha (2005) complementa citando o próprio Bakhtin.

Na obra poética a linguagem realiza-se como algo indubitável, indiscutível, englobante. Tudo o que vê, compreende e imagina o poeta, ele vê, compreende e imagina com os olhos da sua linguagem, nas formas internas, e não há nada que faça sua enunciação sentir a necessidade de utilizar uma linguagem alheia, de outrem. A ideia da

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119

pluralidade de mundos linguísticos, igualmente inteligíveis e significativos, é organicamente inacessível para o estilo poético. (BAKHTIN, 1934, p. 94).

De acordo com Bakhtin (1934), as condições para a realização da intenção

individual e direta do caráter poético são as formas linguísticas dispostas, pelo poeta,

e a qualidade de ser unicamente dele originadas, a partir da fluência de seu intelecto.

Entretanto, o filósofo apresenta uma exceção, isto é, o plurilinguismo (as outras

linguagens sócio-ideológicas) podem ser encontradas em gêneros poéticos

‘inferiores’, sátiras, comedias etc. Por exemplo, nas falas dos personagens como

objetal essencialmente “como uma ‘coisa’ e não no mesmo plano da linguagem real

da obra: trata-se do gesto representado do personagem e não do discurso que

representa” (BAKHTIN, 1934, p. 94-95).

De tudo o que já vimos, no Material do OLPEF, considerando a teoria

enunciativo-discursiva bakhtiniana, mais uma vez, o Caderno demonstra que há uma

preocupação com os elementos do poema e que nos aproximariam do pensamento

bakhtiniano, se não fosse o privilégio da forma, que somados totalizam 75% das

atividades, e desprezam alguns pontos do dialogismo, uma vez que aparece apenas

em 25% do conjunto, ou seja, 3/4 do caderno ensaiam as relações dialógicas.

3.7 Exame do corpus: o oculto bem à vista no Caderno Poetas da Escola

Quantos véus que escondem a face do ser mais próximo, não precisamos [...] levantar, véus

depositados nele pelas casualidades de nossas reações, de nosso relacionamento com ele

e pelas situações da vida, para ver-lhe o rosto em sua verdade e seu todo

Mikhail Bakhtin

Após termos descrito sucintamente a organização interna de cada uma das

oficinas, no capítulo 5 e anteriormente termos apresentado alguns gráficos para

facilitar a visualização do quadro geral das atividades, analisaremos agora algumas

atividades as quais são pertinentes ao tema geral desta pesquisa, que consiste em

investigar os indícios relacionados ao processo de ensino-aprendizagem das autoras

do Caderno Poetas da Escola, no sentido da qualidade de formação do aluno em

leitores e produtores do gênero literário poema, nas escolas públicas brasileiras.

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120

Por enquanto, as informações estão dizendo o que nosso olhar comum já havia

observado: uma tendência formal. Em seguida, foram surgindo outros aspectos, por

exemplo, a nulidade discursiva, isso caracteriza ocultação dialógica bastante visível,

mas continuemos nossa investigação.

Nesta seção, analisaremos de forma mais detalhada nosso corpus, 5 oficinas,

as quais pensamos serem as mais representativas, conforme os aspectos que

buscamos identificar e comentar durante o percurso de nossa pesquisa, ou seja, como

vem sendo tratado o gênero poema no Caderno do professor da OLPEF e como

poderia ter sido se o método de análise sociológico bakhtiniano tivesse sido adotado

como referencial teórico da elaboração e operacionalização das atividades no

decorrer da sequência.

Após reler este material, nós decidimos pelas oficinas 1, 2, 6, 7 e 8, que

parecem ser as que mais representam a dimensão formal e que, de acordo com nossa

perspectiva discursivo-enunciativa de Bakhtin, encontramos menor ênfase nesses

aspectos.

3.7.1 OFICINA 1 – Memória de versos e mural de poemas

Na realidade, todo signo ideológico vivo tem, como Jano, duas faces.

Bakhtin/Volochinov

Figura 7 – Oficina 1

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 24-25.

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121

A oficina de número 1, intitulada “Memórias de versos e mural de poemas”, visa

à consideração da cultura do aluno, ativação do conhecimento e, também, o

reconhecimento de formas poéticas. Essa oficina está dividida em três etapas de

atividades. Na primeira etapa, é feito levantamento do conhecimento prévio sobre

poemas, para diagnosticar, com o intuito de descobrir se há ou não apreciação do

gênero, o que motivou tal gosto e, também, uma identificação dos elementos formais

como ritmo, rima e forma.

Nessa atividade, temos pontos relevantes a serem comentados. A preocupação

com o diagnóstico inicial nos lembra a teoria vygotskyana, uma vez que tal

procedimento e detecção dos conhecimentos prévios pode tornar mais eficaz e

eficiente o ensino-aprendizagem da língua e, também, que a cultura do aluno está

sendo admitida. A princípio, temos ainda a impressão de que existe atenção

dispensada à apreciação quanto à poesia/poema, por conta de nossa visão

bakhtiniana. Todavia, um pouco mais adiante, está claro que tal valoração é

direcionada aos elementos do poema e à forma composicional. Nesse sentido, na 1ª

interação entre alunos e professores, portanto, teria sido uma excelente oportunidade

para iniciar o trabalho com as considerações de Medviédev (2012[1928]) em que

afirmam serem todos os enunciados – cremos que mais intensamente os das esferas

ideológicas – submetidos às condições de exigência da avaliação social, inclusive os

enunciados complexos do campo literário.

Esta etapa chama a atenção ao seguinte trecho “Se a maioria conhece poemas

infantis vamos apresentar alguns clássicos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 26).

Amorim (2009) apresenta o conceito de memória de passado e memória de futuro

bakhtiniano, em que a autora apresenta dois níveis para tais conceitos. O primeiro,

em que a “memória que o outro guarda de mim é fundamental para a construção da

minha unidade” (AMORIM, 2009, p. 09), está relacionado à relação entre o autor e o

eu-lírico e corresponde ao relacionamento que estabelecemos com o outro. Uma

condição de união em que um complementa o outro, por meio de um olhar externo,

obtido também de uma posição externalizada e, por isso, na visão bakhtniana, uma

memória do passado responsável pelo acabamento do herói-lírico.

Ainda, no primeiro nível podemos visualizar o que Amorim (2009), esclarece

em seu texto, a memória de futuro, ou seja, que “a memória do herói é futura, porque

está intrinsecamente comprometida com o por-vir” (AMORIM, 2009, p. 10). É

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122

interessante constatar que tal memória é constituída conforme a amplitude do

horizonte e dos valores, mas a memória artística do passado diz respeito ao todo

estético da personagem ou do herói-lírico.

Nesse contexto, portanto, e conforme Amorim (2009) surge uma diferença entre

os atos éticos do autor e da personagem, na qual “o ato ético do artista não coincide

com o ato do herói e, em relação ao herói que o artista retrata, o trabalho da memória

é um trabalho de acabamento” (AMORIM, 2009, p. 10). Significa dizer que embora a

ética, a cognição e a estética estejam entrelaçados, o acabamento pertence à estética,

após a criação, uma finalização no plano artístico, já que o artista tem posição externa

privilegiada, na qual observa a situação de fora e valorativa – com seus próprios

julgamentos – e que o autor-lírico não tem. Mas, “a diferença de posição não indica

apenas uma relatividade de pontos de vista, mas vai mais longe e produz qualidades

distintas de memória” (AMORIM, 2009, p. 10).

Na primeira etapa do Caderno, pensamos que seria significativo se como disse

Bakhtin/Volochinov (2010[1929]), “na realidade, todo signo ideológico vivo tem, como

Jano, duas faces” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 48) e que elas poderiam

ser exploradas, com os alunos, de forma que eles pudessem identificar as relações

entre o autor e a personagem (autor-lírico) e, por meio delas, pudessem encontrar as

representações do outro e deles mesmos como sujeitos nos textos trabalhados, isto

é, conectando a realidade à arte.

Ainda, nesse sentido, Amorim (2009) afirma que a posição diferente dos

sujeitos não indica somente que os pontos de vista são relativos, antes demonstram

outras qualidades da memória. Veremos como na próxima etapa.

Na etapa de número 2 “Memórias de versos da comunidade”, a entrevista é

utilizada como estratégia de ensino e o foco é a alimentação temática. Os alunos

precisam conversar com os parentes e a comunidade para coletar dados a respeito

de poetas clássicos ou contemporâneos e, finalmente, fixá-los no mural. O título

“Memórias de versos da comunidade” nos traz uma reflexão sobre a concepção de

Memória de passado e Memória de futuro de Bakhtin (2010[1979]), pois levando em

consideração que os enunciados são inerentes às relações humanas, percebemos

ser necessário identificarmos a ideologia que os regem. Mas não se trata do conceito

de ideologia marxista, em que uma falsa consciência baseada em uma única

interpretação, pertencente a um só estrato da sociedade (os burgueses, na época de

Page 124: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

123

Marx) e com tendência monológica é imposta à classe “dita” dominada pela esfera

dominante.

A ideia a que nos referimos diz respeito ao pensamento bakhtiniano, no qual é

possível, além de refletirmos, interpretarmos e transformarmos nosso mundo

concreto, formar nossas características culturais e noções satisfazendo às classes

sociais com discursos contraditórios ou não no mesmo tempo e espaço e, ainda assim

convivermos em harmonia e colaboração uns com os outros. Cabe ressaltar que,

nessa perspectiva, a ideologia do cotidiano pode ser vista como forma de rompimento

de regras convencionadas.

Nesse sentido, Amorim (2009) designa a memória do objeto. Arraigada na

cultura, em todos os pensamentos, nas representações dos indivíduos e nas relações

referentes à essência individual de cada um, ela reconstitui a intersubjetividade

paralelamente às relações externas. A autora cita Bakhtin:

As tradições culturais e literárias (inclusive as mais antigas) se conservam e vivem não na memória individual e subjetiva de um homem isolado ou em algum “psiquismo” coletivo, mas nas formas objetivas da própria cultura (inclusive nas formas linguísticas e verbais), e nesse sentido elas são intersubjetivas e interindividuais (consequentemente, também sociais); daí elas chegam às obras literárias, às vezes quase passando por cima da memória individual subjetiva dos autores. (BAKHTIN, 2002, apud AMORIM, 2009, p. 10).

Como o poema configura uma das representações linguísticas e verbais,

poderíamos abordar a memória do objeto em conjunto com os alunos, mas conforme

já explicitamos, em nossos gráficos 2 e 3, não encontramos nos aspectos dialógicos

algo em que os alunos pudessem se atentar para os signos. Um poema é um signo

repleto de poesia, melhor dizendo, um poema constitui uma obra de arte, com uma

existência na linha divisória do material/signo e uma outra nas ideologias e na

estrutura sócio-histórica e econômica de um povo.

Em direção contrária, vimos aspecto rechaçado por Bakhtin/Volochinov

(2010[1929]), o psicologismo, na oficina 4. Vejamos um trecho da seção Orientações

para o trabalho com leitura de poemas, em que são disponibilizadas ao professor

diretrizes, as quais devem servir de orientação a qualquer poema. Nesse ponto, o

Caderno indica coleções de textos (em CDs) de autores famosos como a “Coleção

Poesia Falada, da editora Nossa Cultura; Ou isto ou aquilo, da gravadora Luz da

Cidade (poemas de Cecília Meireles lidos por Paulo Autran)” (ALTENFELDER;

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ARMELIN, 2010, p. 47). O Material não especifica um poema em particular para a

compreensão.

Figura 8 – Sugestão do Caderno

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 45.

Os questionamentos presentes, na citação, nos levam a comparar a

perspectiva sociológica durkheiniana (Sociologia Funcionalista – Émile Durkhein) com

o pensamento bakhtiniano. Na primeira, cada indivíduo tem sua própria função social

e, desse modo, é aceitável construirmos um álibi. Contudo, no momento em que um

indivíduo transgride a um papel, ele já está sendo legitimado. Na concepção

bakhtiniana (2010[1920-1924]), temos outras categorias, com as quais podemos

trabalhar: a assinatura significa dizer que representamos um papel na sociedade, mas

respondemos por ele com responsabilidade, não temos o direito de construir álibi

(justificativa) em nossa existência e quando reconhecemos nossa singularidade

participativa, tal assinatura já equivale à nossa própria ação.

Nesse sentido, os valores construídos e cultivados pelos grupos sociais e,

também, as ideologias delineiam o horizonte social – o contexto sócio-histórico –, por

isso é imperativo que o aluno reconheça tanto a discursividade por meio da memória

dos objetos, como a materialidade linguística (da palavra), se aspiramos a uma

significativa formação de leitor literário para o aluno. Logo, retomando o raciocínio de

Bakhtin/Volochinov (2010[1929]), o melhor é ajustar nossas leituras de poemas às

duas faces do Jano, em outras palavras, uma atenção que deveríamos dispensar a

uma conexão entre a vida real e da cultura em nossas interpretações a propósito, esse

é um questionamento provocador que colocamos no título desse capítulo.

Seguindo esse raciocínio, de acordo com o pensamento bakhtniano e Amorim

(2009), seria mais proveitoso ao trabalho com o gênero discursivo poema refletirmos

sobre a intenção discursiva e as ideologias rememoradas no objeto, pois, ao

analisarmos obras artísticas, é imprescindível pensarmos em duas dimensões

Page 126: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

125

constituidoras da arte, a saber: uma polifonia como fator transgressor e responsivo,

mas ao mesmo tempo elemento de transformação. Referente à condição

transgressora, a arte transgride às ideologias totalitárias e tendenciosas ao

monolinguismo liberando e difundindo vozes, outrora apagadas, por discursos em que

há somente uma interpretação.

Assim, seria interessante que os alunos fossem levados ao reconhecimento ou

a percepção da existência das expressões (das visões de mundo ou das intenções

discursivas, isto é, os presumidos) pertencentes aos papeis sociais no poema, uma

vez que eles são os responsáveis pela presença e pelo movimento das ideologias,

para se possível e de acordo com o querer do aluno transgredi-las. Por exemplo,

considerando o poema como gênero discursivo, o autor (herói-lírico com seus

aspectos éticos e cognitivos) e o contemplador (o leitor) constroem o objeto de forma

conectada, mas um outro autor (o poeta) com uma visão de totalidade e

transgrediência a respeito do todo do texto lhe conferindo acabamento estético.

Nesse contexto as respostas são construídas não no psicologismo, em que há

um “eu” absoluto e sem estar relacionado a um outro, pois é a relação de dois

pensamentos ativos (o do autor –poeta e, também do autor-lírico) trabalhando em

conjunto. Em Bakhtin/Volochinov (1929), a língua e a ideologia não são originadas na

consciência e, também não constituem produtos dessa consciência. Por isso, os

questionamentos do Caderno, no trecho, poderiam ser um gancho, para conversar

com os alunos, sobre a natureza social da enunciação – ponto fundamental para

lermos ou produzirmos um texto -, ou seja, é preciso observar e refletir sobre o que

existe e acontece ao próprio redor. Buscar material para a interpretação dos poemas

na realidade que abrange os aspectos interacionais, históricos, sociológicos e

ideológicos.

Cabe salientar a importância da linguagem simplificada do professor ao se

dirigir às crianças, visto que são alunos de 5º e 6º anos.

Na 3ª fase, “Um mural caprichado”, há uma sugestão para que professor e

alunos construam um mural e registrem todas as produções feitas pelos alunos. Essa

tarefa objetiva leituras futuras.

Page 127: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

126

3.7.2 OFICINA 2 – O que faz um poema

Figura 9 – Oficina 2

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 30-31

Já dissemos antes, na leitura do gráfico 1, que a distribuição das atividades

revelam maior número para a produção oral nas oficinas, com representatividade de

35% em que demonstra 1/3 das atividades do Manual destinadas à oralidade e, em

seguida, temos os elementos fundamentais do poema com 23%. Na etapa 1, veremos

atividades de oralização.

Para Dolz & Schneuwly (2004[1998]) “O oral é tudo aquilo que é dito em voz

alta” (DOLZ; SCHNEUWLY, 2004[1998], p. 127) e que a oralidade comporta

dimensões e particularidades. A voz é produzida pela boca do latim os, oris, oral. A

oralidade diz respeito à linguagem falada, por meio do aparelho fonador. Há também

concretização particular do som, o timbre da voz, o qual consiste na multiplicidade de

registros e de intensidade de sons emitidos e da configuração em geral e

particularidades singulares vocais de cada emissor. Dolz & Schneuwly (2004[1998])

acrescentam a importância do controle audiovisual para a oralização porque, ao

mesmo tempo em que fala, o emissor também pode ouvir. Sendo assim, temos a voz

como suporte de propagação da fala e nela são emitidos os sons, as vogais, e as

consoantes que finalmente são agrupados em sílabas.

Dolz & Schneuwly (2004[1998]) esclarecem que há na Linguística, por exemplo,

correntes responsáveis pelo estudo da produção e da característica física dos sons

humanos como a Fonética descritiva. Existe também a Psicolinguística direcionada

Page 128: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

127

para estudos da recepção dos sons pelo ouvinte e, ainda, a Fonoestilística que “estuda

a variabilidade fônica – tanto do ponto de vista da produção como da recepção – como

informação suplementar de uma expressão, no sentido linguístico e sociolinguístico”

(DOLZ; SCHNEUWLY, 2004[1998], p. 128).

Verificamos, portanto, a riqueza e a complexidade do campo de estudos da

oralização dos sons que têm em sua extensão de existência desde a articulação de

vogais e consoantes – os fones – até suas diferentes combinações em que resultam

nas silabas, mas, além disso, temos os prosodemas que são agrupamentos de sílabas

em “unidades vocais maiores de nível supra-segmental” (DOLZ; SCHNEUWLY,

2004[1998], p. 129), em que para a linguística europeia o fluxo da fala se desenvolve

de modo linear conforme seu próprio ritmo e melodia. Assim, a prosódia é responsável

pelo tom (altura), pelo acento (intensidade) e pelo ritmo (duração).

Dolz & Schneuwly (2004[1998]) dizem que existem vários níveis que passam

da oralidade espontânea para a escrita oralizada, mas dois tipos podem ser

enfatizados, pois têm particularidades diferentes. Primeiramente, o “oral espontâneo”,

uma improvisação estabelecida nos diálogos durante as interações, isto é, o modelo

pelo qual se dá a comunicação, somado a isso, existe a “vocalização”, ou seja, um

texto lido ou recitado por alguém. Então, em meio a esses dois tipos de oralidade,

desde previsíveis ou restritas, bem como em seus aspectos conteudísticos ou formais,

há todas as modalidades orais.

Dolz & Schneuwly (2004[1998]) comentam, ainda, sobre as ‘escorias’ do oral

espontâneo, ou seja, quando comparamos um discurso escrito e formal que foi

elaborado, lido e reescrito como um espontâneo, logo percebemos inadequações.

Seguindo então esse raciocínio, se o discurso das autoras do Caderno é o de que

pretendem formar cidadãos protagonistas que assumam posições críticas a partir das

práticas de linguagens sociais, por que há, então, grande ênfase nas atividades do

Poetas da Escola relacionadas à oralização apenas para identificar elementos formais

caraterísticos e recorrentes no poema sem reflexão?

Para ilustrar o que foi dito temos na 2ª etapa uma retomada da 1ª. Vejamos o

poema “Tem tudo a ver” de Elias José, o qual fundamenta o trabalho de distinção

entre o gênero poema e outros gêneros discursivos.

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128

Figura 10 – Poema “Tem tudo a ver”

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 02.

Figura 11 – Algumas questões sobre o poema

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 32-33.

Na elaboração desses questionamentos, pelo discurso autoral, os meninos são

incentivados a perceberem a forma composicional do poema separada da poesia.

Page 130: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

129

Figura 12 – Atividades da Oficina 2

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 35.

Em primeiro lugar, entretanto, é necessário comentar que o último item das

atividades citadas no quadro acima, afirma que “Algumas pessoas acham que a

função da poesia é cantar amores ou mágoas, mas, na verdade, a poesia pode falar

de qualquer assunto”. Essa afirmação contradiz ao que percebemos em nossa

reflexão, sobre a capa, pois nela encontramos características do Romantismo. Além

disso, como transmitir culturas e ideologias é uma das funções do livro didático,

poderíamos, então pensar, com mais cuidado, na explicação de Bakhtin/Volochinov

(1929), a respeito dos discursos ideológicos do cotidiano (que ainda não foram

oficializados), mas que estão em constante diálogo com as ideologias das instituições

como a ciência, a religião, a cultura, a mídia e a educação, por exemplo.

De acordo com esses estudiosos, é entre o campo – espaço- intermediário das

pessoas comuns e de tudo o que elas expressam em formas de linguagem no dia-a-

dia e, também entre o sistema social-ideológico (regente das normas de um povo),

que se dá a materialização da palavra ou dos signos. Disso decorre, portanto, nosso

Page 131: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

130

cuidado em não permitir a perpetuação de pensamentos equivocados nem ao

esquecimento em buscar pelos implícitos em nossa realidade concreta, para que eles

não se sejam legitimados no sistema ideológico oficial.

Os alunos, entretanto, são conduzidos a compreensão e interpretação dos

poemas balizados pelos parâmetros da forma composicional separada do conteúdo,

o que na visão bakhtiniana essas duas formas são únicas e inseparáveis. Verificamos

que eles podem falar, já não estamos essencialmente diante do ensino bancário de

Paulo Freire, entretanto, suas falas não incidem sobre questões essenciais para a

compreensão e o que esperamos que os alunos sejam capazes é de compreender os

textos e, além disso produzir suas próprias réplicas.

Nesse sentido, Rojo (2004), após discorrer sobre a decodificação como uma

leitura “de maneira simplista – apenas como um processo perceptual e associativo de

decodificação de grafemas (escrita) em fonemas (fala), para se acessar o significado

da linguagem do texto” (ROJO, 2004, p. 02), afirma que mesmo que sejam

capacidades importantes, são insuficientes para realizar uma efetiva compreensão.

Em seguida, capacidades mais eficazes em que se aliam simultaneamente a

visão de mundo, o entendimento das práticas sociais e o domínio básico ou mais

avançado dos conhecimentos linguísticos, revelam leitura compreensiva. A leitura

como compreensão textual foi dividida em dois períodos: o primeiro, a compreensão

textual, em que havia relação entre o leitor e o texto. O ponto convergente estava em

o leitor encontrar o significado somente no texto, por meio de “estratégias (cognitivas,

metacognitivas) do leitor” (ROJO, 2004, p. 03). Logo depois, foi incluído o autor no ato

de leitura, nesse momento, havia interação entre as orientações disponibilizadas pelo

escritor, o material textual e a interpretação do leitor.

Do ponto de vista mais recente, há a leitura como réplica:

[...] um ato de se colocar em relação um discurso (texto) com outros discursos anteriores a ele, emaranhados nele e posteriores a ele, como possibilidades infinitas de réplica, gerando novos discursos/textos. O discurso/texto é visto como conjunto de sentidos e apreciações de valor das pessoas e coisas do mundo, dependentes do lugar social do autor e do leitor e da situação de interação entre eles – finalidades da leitura e da produção do texto, esfera social de comunicação em que o ato da leitura se dá. (ROJO, 2004, p. 03, grifos da autora).

Partindo dessa breve reflexão teórica e do foco das atividades ao longo do

Caderno, vimos um índice extremamente baixo de discursividade no tratamento

Page 132: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

131

didático. Especificamente na oficina de número 2, o questionamento “Do que tratam

os poemas?” vimos na primeira orientação do Caderno, para que haja conversa entre

professor e aluno, sobre o que acharam do poema. A princípio, temos a impressão de

que haverá análise discursiva, entretanto, ao avançarmos nos questionamentos

seguintes, constatamos a busca por elementos formais. Na segunda etapa, há

direcionamento das autoras para a temática do poema “Tem tudo a ver”, mas não há

atividades, nas quais demonstram a leitura como réplica, conforme a citação de Rojo

(2004), nem a investigação de suas características junto aos alunos.

A nosso ver, a fala espontânea não está contribuindo para a ampliação de

conhecimento menos ainda para assumir posição ativa e crítica da parte dos meninos.

Essa dificuldade também poderia ser vista de outro modo à luz de Ponzio (2010), um

grande estudioso de Mikhail Bakhtin.

Ponzio (2010) aponta a diferenciação entre a palavra ordinária (a cotidiana) e

a palavra literária. A primeira caracterizada pela escrita científica, a propagandística,

a informativa etc, ou seja, uma palavra submetida às funções sociais ocupadas pelo

indivíduo. Os que utilizam essa palavra se identifica como o “eu” proprietário dela e,

por isso têm a responsabilidade e respondem por ela.

Seguindo ainda o raciocínio de Ponzio (2010), na Palavra literária, todavia, há

fuga do único tom de voz. O texto literário não está submetido ao significante nem ao

significado decidido a priore. Uma criação literária não serve aos significados

normativos, também não está limitada a um vocabulário restrito. A homogeneidade

jamais é componente das regras morfológicas e sintáticas, e finalmente as

irregularidades e as exceções são marcas fundamentais dessa palavra.

De acordo com Ponzio (2010), uma das particularidades da obra literária é o

caráter dialógico, ou seja, as possibilidades de vivermos experiências diretas e

concretas de percepção, de reação e de resposta à palavra dos outros, mas tais

experiências são materializadas depois de apreendermos o grau de dialogicidade

interna da palavra, isto é, o conteúdo, a semântica e os recursos expressivos.

Na direção de Ponzio (2010), portanto, estudar os textos complexos se faz

necessário, pois tais textos estão envolvidos em relação dialógica constante, em

posições contrárias ou a favor, por conta das interações nas atividades humanas.

Dessa forma, acreditamos que os alunos podem assumir posição ativa e crítica.

Depois de termos compreendido o conceito de oralização, conforme Dolz e

Schnewly (2010), uma orientação do Caderno, em que pensávamos ser leitura

Page 133: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

132

significativa, mas era simplista, finalmente, sugerimos leitura dialógica, com infinitas

possibilidades de réplicas. A seguir, veremos a linguagem no uso denotativo e

conotativo.

3.7.3 OFICINA 6 – Sentido próprio e figurado

Chamo de sentidos às respostas e perguntas. Aquilo que não responde

a nenhuma pergunta não tem sentido para nós.

Mikhail Bakhtin

Figura 13 – Oficina 6

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 64-65.

A oficina 6 “Sentido próprio e figurado” tem a finalidade de apresentar a

diferença entre os conceitos de Denotação (sentido próprio) e Conotação (sentido

figurado), além de delimitar o texto poético. Na 1ª etapa o discurso autoral explica que

o poema se aproxima de outros textos literários, mas apresenta suas próprias

especificidades. Vejamos.

O convívio e o trabalho com textos poéticos ajudam a desenvolver nos alunos a capacidade para perceber esses recursos expressivos. [...] descobrir que o poema, quando lido com atenção, sugere múltiplos sentidos, todos decorrentes dos recursos selecionados pelo poeta para compor seu texto. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 66).

Page 134: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

133

Concordamos com a asserção do caderno, em que textos poéticos são capazes

de despertar no indivíduo a curiosidade por termos desconhecidos e,

consequentemente, a revelação de seus possíveis significados e, conforme o Caderno

do Professor (2010),

Figura 14 – Alguns sentidos na Oficina 6

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 68.

O trecho acima nos faz refletir sobre a diferença entre o discurso na vida e o

discurso na poesia de Bakhtin/Volochinov (1926), porque na vida há dois

interlocutores que discutem algo e participam, simultaneamente, do processo da

criação verbal e o tema é exterior a esse processo, mas, na poesia também existe

uma relação a três: o autor, o herói (tema14) e o contemplador. Este pode ser um leitor

ou um ouvinte e consiste na voz social que é ouvida pelo autor artista e é representada

na fala do herói.

Uma característica desse contemplador é que ele não tem a função de apenas

assumir ou adotar valores passivamente, porque se assim o fosse os textos literários

apenas repetiriam valores sociais. O leitor/ouvinte/contemplador consiste em

apreciador, ou seja, tem o direito de refletir, utilizar, modificar um pensamento, uma

ideia, embora a propriedade da obra não lhe pertença.

Na criação do discurso artístico (da poesia), portanto, existe ao mesmo tempo

relação de união dos sujeitos sociais por um lado: autor/poeta com o autor/eu-lírico e

14 Conforme já citamos em nota as palavras de Bakhtin/Volochinov (2010).

Page 135: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

134

o contemplador, mas que são sujeitos dissociados, por outro, podemos ver alguns

pontos divergentes entre o Discurso na vida e o discurso na Arte.

a) A divulgação dos presumidos no discurso artístico, em outras palavras, de

acordo com o nosso horizonte social, que pode ser mais ou menos amplo,

ocorre a naturalização de nossa cultura. Porque, naturalizamos valores

abstratos, a partir de acontecimentos reais ao nosso redor e, assim refratamos

(reproduzimos) um valor que nos é estranho como se fosse evidente,

unicamente, porque antes ele já nos foi refletido (transmitido). Assim,

pensamos que os discursos artísticos constantemente propõem interrogações

como, por exemplo: quem somos nós, de onde viemos, para onde vamos e, tal

discurso, provoca no observador estranhamento. Como observadores temos,

então, condições de extrapolar o limite somente do conhecimento das

ideologias e perceber, de fato, o que é inerente a nossa existência e

comportamento.

b) O estranhamento, outra diferença,

Figura 15 – Poema “Livros e Flores”

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 67.

É correto dizer, como no Caderno, que a inversão sintática provoca, no aluno,

um espanto para favorecer o ritmo do poema e que convém colocar na ordem direta

da norma padrão para facilitar o entendimento. No entanto, se considerarmos o poema

como gênero discursivo, devemos buscar, também, os sentidos em sua

Page 136: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

135

historicidade15, contextos, características constitutivas intrínsecas ao enunciado

concreto e o tema e significação que nos levam ao entendimento de que, além de

serem formas linguísticas, as palavras encerram sentidos diferentes a cada nova

situação de uso real.

Nesse sentido, poderíamos nos preocupar com os efeitos provocados, nos

alunos, nos momentos reais de comunicação, durante a aula, em primeiro lugar e,

depois com as abstrações linguísticas.

E quanto ao sentido figurado ou estranhamento que poderia ter sido explorado

no Caderno? O que vimos, portanto, na voz das autoras, talvez seja um

direcionamento para que o aluno siga o raciocínio e a conclusão do Material de apoio.

A tendência é que respondam que o poeta ama a pessoa a quem dedica os versos e quer saber se é correspondido. A página, denotativamente, pode ser lida e se revela a todos os leitores; a página, conotativamente – no contexto do poema –, só pode ser lida por quem conhece bem os olhos nos quais ela se esconde. Um sentido não descarta o outro, ambos se complementam. (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 69).

Por estarmos conscientes de que um sentido é complemento do outro,

conforme o trecho acima, parece-nos estar manifestada uma das lacunas deste

Manual, porque a ênfase concedida às unidades linguísticas direcionam o aluno para

concluir o que já está exposto como verdade e não o que poderia ter suscitado, de

acordo sua própria reflexão e naturalização referente a sua cultura, comparado ao seu

contexto amplo e imediato e que resulta em sua leitura particular.

c) Na última diferença entre os discursos, é preciso examinarmos qual a

voz social interiorizada no autor-artista-poeta e que está sendo

demonstrada. Aqui, seria uma oportunidade adequada para

relembrarmos, com os alunos, a relação entre

autor/herói/contemplador e quais os papeis que cada um ocupa na

elaboração do texto. Comentando, ainda, que a voz descrita em

“Livros e flores” provavelmente seria de um interlocutor que deseja

obter, ou já representa o papel social de namorado, noivo ou marido

15 Fiorin (2008), esclarece que por conta do confronto dialógico de vozes, do contexto real, a historicidade dos enunciados é semântica, visto que, de fato, o que buscamos é a entonação das palavras que conferem sempre novos sentidos, já que a História está contida neles.

Page 137: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

136

ou mesmo só um pretendente. Este papel configura o “lugar social”,

que foi internalizado pelo autor-escritor, a partir da instituição familiar,

mas revelado na construção do todo textual pelo autor-herói. Portanto,

essa é a terceira característica que diferencia os discursos na vida e

na arte.

Uma sugestão para ser trabalhada nesse poema é a historicidade, pois

Machado de Assis cria metáforas baseadas em uma concepção de namoro com as

características de sua época (século XIX). Mas, um namorado, hoje, não escreveria

desse modo para a namorada. Com isso, o aluno perceberia que a linguagem já

constituída pode ser revisitada ou refeita de outra forma, porque o desuso traz marcas

históricas e que o poema pertence à Estética Romântica, que perdura até hoje, mas

sofre alterações históricas, sociais e culturais.

A citação de Bakhtin/Volochinov (1929), no capítulo Tema e Significação, que

discute, especificamente, a questão do sentido próprio e figurado, da conotação e

denotação é adequada, nesse momento. Vejamos:

Para constituir uma ciência sólida da significação, é importante distinguir bem entre o tema e a significação e compreender bem a sua inter-relação. Até o momento ninguém compreendeu a importância dessa conduta. Tais distinções como as que se estabelecem entre o sentido usual e ocasional de uma palavra, entre o seu sentido central e os laterais, entre denotação e conotação, etc., são fundamentalmente insatisfatórias. A tendência básica subjacente a todas essas discriminações – de atribuir maior valor ao aspecto central, usual da significação, pressupondo que esse aspecto existe e é estável – é completamente falaciosa”. (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2010[1929], p. 136).

De acordo com a afirmação de Bakhtin/Volochinov (2010), se considerássemos

a ciência da significação com suas relações entre si, não desprezaríamos o tema, pois

ele somente pode ser localizado em uma compreensão ampla e, já na espera de uma

resposta ativa, abrangendo tanto o contexto imediato como o amplo.

A etapa 3 “Definições poéticas” visa à apresentação das “definições poéticas”:

“Modéstia”, “Reticências” e “Recordação” de Mário Quintana.

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137

Figura 16 – Definições poéticas

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 11.

Os alunos fazem atividade em grupo, leem e discutem sobre as “definições

poéticas” para descobrir o significado e expõem suas conclusões em atividade lúdica

de apresentação. Em seguida, é proposto que eles realizem uma atividade para

fixação, individualmente ou em grupos, produção escrita empregando as definições

poéticas. Nessa etapa, a nosso ver, temos a atividade lúdica como estratégia de

ensino-aprendizagem do poema como ponto positivo, pois a ludicidade é capaz de

levar os alunos ao conhecimento de diversas linguagens da arte, as quais mobilizam

o interesse deles para a leitura, tanto de textos poéticos como especificamente do

poema, e em seguida nos tornarmos atores em nosso próprio teatro.

Ao final deste tópico, verificamos os conceitos de denotação e conotação, os

quais são diferentes dos sentidos – como respostas e questionamentos –, para o

Círculo bakhtiniano, as relações entre o autor e o herói, bem como o tema e a

significação de Bakhtin/Volochinov (1929), em que há o inerente germe ativo da

resposta compreensiva. Vale ressaltar que Bakhtin/Volochinov (1929) afirma que

diferenciar significado e tema é um dos problemas mais complexos para a Linguística.

Por isso, em Marxismo e Filosofia da Linguagem esses termos foram analisados no

sentido de colaborarem com a clareza dessa dificuldade. Esclarece, ainda, que apesar

da compreensão e distinção do que sejam significação e tema, não há como

estabelecer uma divisão rígida entre eles.

Segundo Bakhtin/Volochinov (1929) a significação é como uma tecnologia para

que o tema se realize. Isto é, as palavras registradas no dicionário são códigos

linguísticos, em que cada um desses registros tem diversas significações. Por

exemplo, nos dicionários, o registro das palavras “Teus olhos são meus livros”

assumem outro significado.

Page 139: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

138

No momento da enunciação, contudo, as formas da língua adquirem diferentes

temas. Bakhtin/Volochinov (1929) denomina, assim, o tema “um sistema de signos

dinâmico e complexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de um

momento da evolução. O tema é uma realização da consciência em devir ao ser em

devir” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 132).

O tema parte das formas estáticas e abstratas da língua para se realizar, de

modo sempre dinâmico nas situações reais de interação entre os interlocutores. Uma

mesma palavra pode, em muitas situações comunicativas diferentes, assumir uma

variada pluralidade de sentidos.

Dessa forma, na unidade temática é que são respondidos variados

questionamentos como: quem produziu? Onde? Quando? Para quem? Qual o

conteúdo? Por isso, as formas fixas e convencionais da língua são utilizadas na

concretização do tema, nas esferas de comunicação, de acordo com o fluxo

permanente da consciência e as novas situações de produção de discursos que ainda

irão surgir.

Lembramos a participação do outro na construção do tema.

Verificamos que só o outro como tal pode ser o centro axiológico da visão artística e, consequentemente, o herói de uma obra, que só ele pode ser essencialmente enformado e concluído, pois todos os elementos do acabamento axiológico – do espaço, do tempo, do sentido – são axiologicamente transgredientes à auto-consciência ativa, estão fora da linha de uma relação axiológica consigo mesmos. (BAKHTIN, 2010, p. 174).

A interação, entre o outro e o eu, torna realizável a troca de experiências as

quais o sujeito que absorve, interioriza e compreende o sentido na ação do outro, do

que exterioriza, e vice-versa. Vale ressaltar que, em alguns casos, essa inter-relação

nem sempre ocorre de maneira cordial, amigável, mas sempre consciente. Mesmo

que os indivíduos envolvidos estejam em lados antagônicos na esfera social, ou seja,

membros de grupos que se hostilizem, há sim troca de percepções do eu e do outro.

Afinal, tão logo a identidade de um indivíduo seja colocada à prova, este mesmo

indivíduo começa a ver sua própria identidade com a percepção do outro. Nesse

processo de trocas, é importante frisar que o indivíduo passa a questionar seus

valores morais, pessoais, éticos, religiosos etc. Essa postura dependerá apenas da

consciência do indivíduo, seja ele o eu ou o outro.

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139

Nesse cenário, portanto, surgem os infinitos temas a serem desenvolvidos sob

o acabamento do outro. Finalmente, vimos as definições poéticas. Por conta do

sentido próprio e figurado, nesta seção, aprofundaremos nossa compreensão sobre

as figuras de linguagem no próximo capítulo.

3.7.4 OFICINA 7 – Comparação, metáfora, personificação

A índole responsiva do sentido.

O sentido sempre responde a certas perguntas.

Aquilo que a nada responde se afigura sem sentido para nós, afastado do diálogo.

Mikhail Bakhtin

Figura 17 – Oficina 7

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 72-73.

Nesta oficina são retomados aspectos que buscam os sentidos colocando a

forma linguística em primeiro lugar, mas sob nossa visão bakhtiniana, cremos em

sentidos como respostas a questionamentos, pois se não há argumento e

contrapalavra não há diálogo. Dessa forma, relembraremos os estudos de Roman

Jakobson, no Círculo Linguístico de Praga, em que se busca a compreensão das

finalidades em que a língua é utilizada, isto é, como se dá a comunicação entre o

codificador (falante ou escritor) e o decodificador (ouvinte ou leitor). Entretanto, o

objetivo do professor era estabelecer o lugar da função metafórica entre as outras

Page 141: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

140

funções da linguagem, porque ela era o fator transformador de uma mensagem verbal

em obra de arte. Conforme Jakobson (2005), há uma diferença entre a linguagem

poética e as outras materialidades verbais constitutivas de outras expressões, nesse

caso, a Poética deveria sim ter lugar definido na Linguística.

Nesse contexto, tomando por base os elementos constitutivos do processo

comunicativo, conforme Jakobson (2011) temos: 1) remetente (codificador); 2)

mensagem; 3) destinatário (decodificador); 4 contexto (ao qual se faz referência

durante a comunicação e deve ser de possível compreensão ao destinatário); 5)

código (deve ser parcial ou totalmente comum ao remetente e ao destinatário; 6)

contato (canal físico a partir do qual se estabelece a comunicação, envolve também

uma conexão psicológica entre remetente e destinatário). E Jakobson esclarece que

“cada um desses seis fatores determina uma diferente função da linguagem”

(JAKOBSON, 2005, p. 123).

Os estudos do professor Roman Jakobson a respeito das funções da

linguagem16 nos interessam, porque encontramos bases da teoria da comunicação

nas atividades do Caderno do Professor e que demonstraremos mais adiante.

Assim, a oficina 7, “Comparação, metáfora, personificação”, tem como meta a

identificação e, também, a utilização das figuras de linguagem. Essa oficina está

dividida em 4 etapas. Na 1ª “Recursos que aproximam dois termos” é apresentado o

conteúdo: a linguagem figurada, com ênfase na identificação, aprendizagem e

emprego das figuras: comparação, metáfora e personificação. Essas imagens são

apresentadas, pelo Caderno, como forte característica da linguagem poética. Desse

modo, “a metáfora produz efeitos de sentido que ampliam a significação do texto e as

possibilidades de interpretação” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 76). Após

leitura de “O leão” de Vinicius de Moraes temos as seguintes atividades:

16 De acordo com Padilha “as formulações de Jakobson sobre as funções da linguagem estiveram (e ainda estão) presentes nos livros e manuais didáticos, de ensino fundamental e médio no Brasil, constituindo-se, por muito tempo, em teoria obrigatória para a explicação/compreensão dos fenômenos da linguagem e da mesma forma, dos poéticos” (PADILHA, 2005, p. 57).

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141

Figura 18 – Poema “O leão”

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 12.

Figura 19 – Atividades da oficina 7

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142

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 74 - 76.

Como já dissemos, anteriormente, os sentidos (a significação) das figuras de

linguagem residem nas interações reais de comunicação e, assim deveriam ser

explorados por esse viés. De acordo com Bakhtin/Volochinov (1929) ao nos

comunicarmos (interagirmos) expomos todo um conteúdo de vozes sociais, as quais

fazem parte de nossa consciência. Por meio da língua, sempre com suas duas

direções, uma originada do enunciador e a outra destinada a alguém. Essa linguagem,

portanto, é o resultado da interação entre o locutor (falante) e o interlocutor (ouvinte),

além disso, todas as nossas palavras são ideológicas e já carregam avaliações. Por

isso, a interação é um evento dinâmico, em que temos a liberdade de compartilharmos

os nossos valores.

Nessa perspectiva, em Arte e responsabilidade, Bakhtin (2010[1919]) discorre

sobre o constante diálogo existente entre as dimensões da cultura humana, a saber,

Page 144: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

143

a ciência, a arte e a vida. Para o filósofo russo, somente assim suplantaríamos a

dialética mecanicista abrindo espaço para as relações dialógicas entre essas três

instâncias para compreendermos a arte em total responsabilidade, pois “O poeta deve

compreender que a sua poesia tem responsabilidade pela prosa trivial da vida, e é

bom que o homem da vida saiba que a sua falta de exigência e a falta de seriedade

de suas questões vitais respondem pela esterilidade da arte” (BAKHTIN, 2010[1919],

p. XXXIV).

Um tratamento mais esclarecedor para o poema “O leão”, de Vinícius de

Moraes, poderia ser a reflexão a respeito da totalidade do texto, considerando o

poema como gênero discursivo, uma discussão em torno de que consiste em um

gênero complexo, pertencente ao campo artístico, a situação de produção, a

historicidade, os participantes, o conteúdo temático, a forma composicional, o estilo,

as relações dialógicas, além dos aspectos presumidos, o estranhamento e as vozes.

Compreendemos, assim, que é necessário equilibrar a materialidade das

formas linguísticas com os sentidos que os indivíduos aprendem na utilização da

língua viva, durante as experiências vividas em episódios de interação.

Entretanto, tal possibilidade poderia ter sido melhor explorada, pelo Caderno,

inclusive, se o poema não tivesse sido apresentado em fragmentos. A nosso ver,

compreendendo as relações autor-herói, ou seja, em que o herói – autor criador –

dialoga “dita” ao poeta o que é necessário dizer, principalmente a relação axiológica

– valores sociais, histórico-culturais – inerente ao objeto estético, em outras palavras,

ao tema em questão desenvolveríamos um trabalho fundamentado na visão da

unidade dialógica bakhtiniana, isto é, perspectiva em que há diálogo entre o autor

(poeta), o autor (criador) e aos múltiplos acabamentos de cada contemplador

considerando, também, as experiências vividas desse último.

Um ponto relevante da oficina 7 é que o Material auxilia o professor a mostrar

caminhos, para que o aluno reconheça determinadas figuras de linguagem em que,

às vezes, nem mesmo o professor consegue identificá-las sozinho, mas esse

tratamento, poderia executar dois movimentos. Por um lado, representaria controle

dos sentidos e, por outro, o papel do professor, nesse momento, seria o de mediador,

conforme disse Vygotsky (1935). Dessa forma, ainda que a proposta do OLPEF não

seja a ideal, torna-se legítima e o desenvolvimento das atividades depende da

habilidade do professor em permitir que os alunos se manifestem antes que a resposta

– para a atividade – seja do conhecimento deles.

Page 145: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

144

Na 2ª etapa “Personificação”, encontramos a definição dessa figura. O trabalho

é desenvolvido em leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu, e cópia

na lousa para observação das partes sublinhadas: metáfora e personificação.

Figura 20 – Poema “Meus oito anos”

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 12.

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145

Vejamos um trecho da atividade:

Figura 21 – Atividades da oficina 7

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 77.

O poema “Meus oito anos” exalta a infância e foi escrito nos moldes do

Romantismo. Nesse sentido, pensamos que a escolha do texto não foi adequada para

as crianças, porque, por exemplo, na contemporaneidade infância feliz estaria

atrelada à posse e domínio de diferentes aparatos tecnológicos, enquanto que para o

eu-lírico de Casimiro de Abreu a felicidade estaria baseada em contemplar “o céu

bordado de estrelas”.

Dessa forma, como nos fundamentamos na perspectiva enunciativo-discursiva

bakhtiniana pensamos que, embora o Caderno tenha trabalhado o material (as

metáforas), o professor deveria ter sido orientado a trabalhar com a materialidade

sócio-histórica (saudade da infância) somado ao ponto de vista dos alunos, bem como

à contextualização do autor e o contexto sócio-histórico. Vale lembrar que, de acordo

com nosso gráfico número 3, esses itens tiveram pouca representatividade. Assim,

tratamento mais apropriado com “Meus oito anos” visa estabelecer conexão entre os

fatos reais e esclarecimento de que foi Casimiro de Abreu durante o século XVIII e a

vida real dos alunos de hoje, além de observarmos a materialidade linguística.

A didatização recorre à mesma estratégia de localização de figuras de

linguagem, da oficina 6, entretanto, pensamos em um trabalho mais significativo, isto

é, considerar as relações entre os seres humanos nas dimensões cognitiva, artística

e da vida real para alcançarmos uma compreensão efetiva do todo.

Na 3ª etapa “Estabelecer comparações”, é solicitado aos alunos que façam

uma atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde

vivo”. Eles são questionados para ativar o conhecimento, a compreensão escrita se

Page 147: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

146

dá por meio de preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.

Depois, serão feitos apresentação e debate sobre a tarefa e, também cópia pela

professora dos exercícios de outros alunos. Existe, nesse sentido, o aspecto positivo

do trabalho colaborativo.

A respeito dessa etapa, é preciso lembrar que já discutimos em nosso primeiro

capítulo sobre a afirmação bakhtiniana de não existir “nada absolutamente morto:

cada sentido terá sua festa de renovação. Questão do grande tempo” (BAKHTIN,

2010[1974;1979], p. 410), conforme cada devida situação e espaço de tempo, mas, é

possível estabelecermos uma complementação entre essa afirmação e o explicitado

por Amorim (2009):

Criar não é dar livre expressão a um suposto gênio individual ou deixar agir a inspiração. A criação em Bakhtin supõe duplamente a memória coletiva. Do lado do leitor ou ouvinte, face ao objeto criado por mim, porque ele inscreve o que crio em uma cadeia discursiva e assim confere sentido ao objeto. E do lado do próprio criador que cria sempre no diálogo com outros. Para ouvir e fazer ouvir minha voz em um enunciado-objeto é preciso ouvir e fazer ouvir as vozes que nele falam. Não há, de acordo com a perspectiva baktiniana, criação sem repetição. (AMORIM, 2009, p. 12).

Vimos o mesmo esquecimento referente ao movimento retrospectivo da

memória de passado e o subsequente da memória de futuro abordado na oficina 1.

Os alunos poderiam ter sido instigados a investigarem quem são os sujeitos e os

modos de convivência dentro de cada contexto espacial e temporal, para assim

suscitarem diversas ideias para a construção textual, visto que a individualidade é

formada na intersubjetividade.

Para Amorim (2009), no primeiro momento, a preservação da cultura era

passada de um corpo a outros corpos, por meio da oralidade, de gestos ou de pinturas.

Mas, depois da invenção da escrita, a memória deixa o corpo do indivíduo e se instala

nas palavras que constituem um texto. É nesse material, portanto, que encontramos

os diferentes sujeitos e suas crenças, mas não só de materialidade são escritos os

textos, também dos valores contidos nas palavras. Por isso, tanto a tradição oral como

a escrita deveriam ser analisadas da mesma forma.

Amorim (2009) afirma que, em relação à educação e a formação do sujeito, é

imprescindível observarmos a verdade sobre os objetos sobre os quais falamos ou

escrevemos, porque “de nada adianta transmitir a técnica da escrita se não se

Page 148: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

147

transmite um conhecimento verdadeiro” (AMORIM, 2009, p. 16). O que resultaria de

tal transmissão seria um equívoco por parte dos educandos, uma vez que acreditariam

serem detentores da verdade, mas ao contrário, isso não procederia.

Tal contexto nos leva à verdade istina17 e à pravda de Bakhtin (2010[1920-24]).

Na primeira, a verdade em si mesma, a abstração das formas linguísticas. Na

segunda, uma verdade de caráter autêntico – a pravda – responsável, alicerçada na

totalidade do interior do ato de leitura e escrita, que mantém seu olhar livre e indireto

contra a anulação de seus efeitos, plena de conhecimentos de seu contexto e

legitimada. Portanto, uma formação de sujeito capaz de refletir, pensar e agir

conforme suas convicções e vontades. De fato, concordamos em que as figuras

auxiliam na demonstração da linguagem poética, como disse Augusto Ponzio

(2010)18.

Mas não vimos busca pela verdade pravda, nessa etapa, no sentido de

enriquecer as imagens com conteúdo nem respostas originadas dos diálogos, não

vimos a busca pelo que alguém estaria querendo dizer nem pelo que um outro alguém

poderia ouvir. Em direção oposta, deparamo-nos com a orientação ao professor no

Caderno, para “adaptar as frases e ampliar seu número, conforme os lugares que

sejam significativos para os alunos” (ALTENFELDER; ARMELIN, 2010, p. 78).

Evidenciaria, nessa atividade elementar de completar os espaços em branco, um

preenchimento de palavras esvaziadas de sentido, porque logo abaixo é solicitado

aos alunos “um debate”, então essa hierarquia está invertida, porque em nossa ótica

bakhtiniana, primeiro, haveria o debate e depois a atividade escrita.

A 4ª etapa “Transformar comparações em metáforas” consiste na criação de

metáforas eliminando os termos de comparação, leitura das melhores frases

construídas pelos grupos. Compreendemos que seria, apenas, continuação do que já

vimos na etapa 3.

Neste tópico, vimos a índole do sentido que questiona e aguarda reposta. Além

disso, as figuras de linguagem, como ponto de partida para a criação do poema, mas

sem a preocupação com as relações internas ou externas do texto e que deveriam

17 Conforme Amorim (2012) a verdade istina “diz respeito à leis universais e a um universo de possibilidades [...] A palavra russa pravda traz em sua espessura semântica a ideia de validade e de justiça” (AMORIM, 2012, p. 22). 18 Ironia, a paródia, a metáfora, a alegoria, a parábola: esses são os elementos por meio dos quais se pode falar em maneira indireta, nos quais não existe a imposição do silêncio ligada à situação na qual existe alguém que quer dizer ou que quer ouvir e quer interrogar (PONZIO, 2010, p. 25).

Page 149: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

148

estar associadas às memórias de passado e de futuro. Finalmente, pensamos sobre

como poderia ser a formação de um sujeito crítico, reflexivo e ativo, se ele fosse levado

a buscar a verdade, não das abstrações linguísticas, mas da realidade. Em nossa

próxima subseção, veremos a questão do som na poesia.

3.7.5 OFICINA 8 – Sonoridade na poesia

Não há arte de transmitir ou de ensinar se não se conhece a verdade sobre os

objetos (social-histórico-cultural) a respeito dos quais se fala ou escreve.

Marilia Amorim

O velho tanque!

Uma rã mergulha nele: tchimbum!

viMatsuo Bashô

Figura 22 – Oficina 8

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 80-81.

A oficina 8, “Sonoridade na poesia”, foi dividida em duas etapas. Na 1ª, “Som e

sentido”, os alunos leem em grupo e em voz alta “Pássaro livre” de Sidônio Muralha,

além de “Haicai” da autora Ângela Leite, com o objetivo de perceber as repetições de

palavras, de versos e de letras que produzem sons, bem como a definição de

aliteração (repetição da mesma consoante), ritmo regular, ritmo irregular. Debatem

sobre os possíveis efeitos de sentido irregular que pode surgir em “Pátria minha” de

Vinicius de Moraes.

Page 150: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

149

Figura 23 – Poemas “Pássaro livre” e “Haicai”

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 14.

Na 2ª etapa “Trava-línguas”, conversam construindo o conceito de trava-

línguas, depois leem textos da lousa e os alunos são desafiados a decorá-los e

apresentá-los.

Figura 24 – Trava-línguas

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 14.

A professora divide a turma em grupos para treinarem, mas individualmente os

meninos são responsabilizados por apenas um. Por meio de sorteio, são convidados

a apresentar, pois “Falar trava-línguas é uma verdadeira arte” (ALTENFELDER;

ARMELIN, 2010, p. 85). Em seguida, ouvem o trava-trovas “O pedreiro Pedro Alfredo”,

“Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” da autoria de Ciça. Depois

de uma competição, os melhores da 1ª etapa são convidados a lerem em voz alta e

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150

individualmente ou em grupos a produzirem e registrarem, no caderno, trava-línguas

ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos. Após, leitura em

voz alta e socialização das produções, revisão e exposição dos textos no mural.

Figura 25 – Travatrovas

Fonte: ALTENFELDER, A. H.; ARMELIN, M. A. Poetas da escola: Coletânea de poemas. São Paulo: Cenpec, 2010, p. 03.

Inicialmente, é possível encontrarmos na 1ª etapa uma sugestão de leitura em

voz alta para observação de repetição de palavras, de versos e de letras. Temos,

portanto, as aliterações (repetição das consoantes) que formam um ritmo regular. No

final, vemos aliterações formando o ritmo irregular e versos diferentes.

Na orientação para a leitura retomamos a fala de Dolz & Schneuwly

(2004[1998]), por meio de sua afirmação de que o oral é tudo que pode ser dito em

voz alta, isto é, uma oralidade espontânea, mas ainda segundo esses autores, existem

diferentes níveis em que essa oralidade chega a ser uma escrita oralizada.

Dolz & Schneuwly (2004[1998]), entretanto, dizem que há também a

“vocalização”, texto lido ou recitado por alguém. Afirmam que em discurso oralizado e

transformado em escrita, quando recitado, pode haver a perspectiva de que haja

Page 152: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

151

inadequações. Nesta oficina, além de haver a leitura oral sem reflexão, há também a

priorização da busca pelas formas linguísticas como se elas pudessem sozinhas dar

sentido ao poema.

Entre o final do século XIX e o início do século XX, a construção artística era

tema de algumas teorias da arte. Umas viam a criação artística como imitação, outras

como expressão e, ainda, outras como expressão. O analista literário deveria “revelar

a unidade construtiva da obra e a as funções puramente construtivas de cada um de

seus elementos” (FARACO, 2011, p. 22), ainda nessa direção, o autor nos lembra que

Mikhail Bakhtin critica “as abordagens biográficas e sociológicas da arte” (IBDEM, p.

22). Os estudos bakhtinianos desse período, portanto, focam o estético-formal para a

análise das obras de arte.

Faraco (2011) menciona um texto de Pável Madviédev (1926) intitulado

“Sociologismo sem sociologia”, no qual esse membro do Círculo bakhtiniano critica

P.N. Sakulim – teórico russo da literatura – pela pretensão de unir a poética literária

(estudo imanente da arte), com o “método sociológico para o estudo histórico, causal

da arte” (FARACO, 2011, p. 21). A contrapalavra de Medviédev (1926) aponta para a

dicotomia desses métodos ao não reconhecerem as relações internas do texto nem a

unidade sistemática de formação textual.

A respeito dessa primeira divisão dicotômica, a crítica recai sobre as relações

internas entre o autor e o eu, já acerca da segunda, incide na exclusão dos fatos

históricos, sociais e culturais do processo de criação artística.

Com base nos estudos de Bakhtin e de seu Círculo, para o estudo metodológico

da língua, retornamos à nossa oficina 8, e nos questionamos, por exemplo, o que

acrescentaria na formação do leitor e produtor de textos literários as atividades tanto

da 1ª quanto da 2ª etapa?

Temos uma leitura para ser recitada, porém desconectada da realidade, mas,

há uma atividade lúdica, na qual sabemos que é importante para a coordenação

motora e memorização de aspectos cognitivos. E, ainda, há a competição, que

funciona para mensurar a habilidade em algo. No caso do leitor literário, contudo, não

sei se conseguiríamos atribuir valor a um poema muito bem recitado, mas que esteja

apenas repetindo palavras sem reflexão. Isso, apesar de sabermos sobre a relevância

da forma aliada ao som, principalmente nos poemas visuais.

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152

Walter (2011), aliás, comenta a respeito do poeta Haroldo de Campos ter

estudado “a relação entre os ideogramas japoneses utilizados na língua japonesa para

aplicação em seus poemas (WALTER, 2011, p. 33).

Conforme Walter (2011) o Método Ideogrâmico de Haroldo de Campos consiste

na aplicação das relações existentes entre os ideogramas nos poemas do poeta

brasileiro. Para o poeta, tanto o material como a forma eram importantes na

elaboração do significado, porque ele considerava o poema como um ideograma, uma

vez que a forma e o conteúdo têm relação de semelhança.

Pensamos que a forma apenas acompanha o conteúdo e precisamos de todas

as faces da língua para podermos, por exemplo, compreendermos o porquê de um

Haicai representar o instante em que uma rã pula dentro de um tanque.

Nesta oficina, vimos a prioridade formal para a construção e compreensão do

texto em oposição às relações de sentido subjacentes ao pensamento de Bakhtin e

seu Círculo de estudos. Nesse caso, principalmente, pudemos ver a crítica de

Medviédev (1926), pois para ele a compreensão deve estar aliada tanto às questões

sociológicas, históricas e causais como às formas fixas do sistema linguístico.

Mas, as palavras, os enunciados entram novamente na corrente dialógica

concretizadas nos atos de fala de formas diferentes.

Desse modo, de acordo com Bakhtin (1934), no romance há muitas vozes – as

visões de mundo, opiniões –, porque há “liberdade” para a realização delas, todas

com suas refrações, reproduções, o que nos remonta a “qualquer conversa é repleta

de transmissões e interpretações das palavras dos outros” (BAKHTIN, 1934, p. 139).

Na próxima seção apresentaremos nossas considerações finais.

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153

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O paradigma no qual se insere nossa pesquisa é o qualitativo e sócio-histórico,

a abordagem dialógica foi nossa metodologia de análise e a estratégia de geração de

dados, a pesquisa documental.

Buscamos nos estudos de Bakhtin e o Círculo a compreensão para embasar

nosso trabalho assumindo o poema como gênero discursivo, segundo a perspectiva

enunciativo-discursiva bakhtiniana. As categorias analíticas principais foram os

gêneros do discurso e as relações dialógicas com vistas à análise da linguagem

poética e, posterior, análise do Caderno Poetas da Escola.

Exploramos as contribuições do pensamento de Vygotsky para o ensino-

aprendizado da linguagem, no segundo capítulo, em que o psicólogo defende que a

apreensão do processo educacional é originada categoricamente a partir de

referências históricas e relacionamentos sócio-históricos, a relevância da criação da

ZPD pelo educador para o desenvolvimento do aluno, a defesa do acesso à literatura,

a escolarização e a didatização do poema, a assunção do gênero discursivo como

objeto de ensino-aprendizagem da língua e as particularidades do texto literário, as

considerações de Dolz & Schnewly para ensinar língua materna e, finalmente, o

gênero secundário como seguimento do gênero primário.

A compreensão de todas essas reflexões nos deram subsídios importantes para

esboçar os contornos de nossa pesquisa. Vimos o encontro de pensamento entre

Vygotsky e Bakhtin ao defenderem que a língua é adquirida no social e, portanto, o

indivíduo aprende desde criança, com as pessoas que o rodeiam. A ZPD é outro ponto

a ser comentado, visto que sua importância abrange tanto a avaliação do próprio

professor como a do aluno. Na escolarização e didatização da literatura,

lamentavelmente tivemos a oportunidade de tomar conhecimento das abordagens que

não representam a cultura de alguns grupos de alunos e, ainda, em grande medida

estratégias de ensino que privilegiam somente um dos aspectos do gênero em

questão. Entretanto, outro problema que em nosso julgamento se mostra

decepcionante está no fato de que muitos professores ainda trabalham com a

sequência didática elaborada para ensinar língua materna em Genebra, país

totalmente diferente do Brasil, mas aqui ainda temos a SD em nossa cultura.

Page 155: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

154

Na terceira parte, examinamos teorias, as quais fundamentam o Caderno:

primeiramente, a Teoria Literária – figuras linguísticas de Roman Jakobson –, PCN

(1998). Em seguida, os pressupostos teóricos a respeito da sequência didática como

ferramenta de ensino do gênero literário poema, pois sabemos que professores de

Língua Portuguesa, em grande medida, por um ou outro motivo, não têm acesso aos

conhecimentos bakhtinianos e, por isso, planejam e desenvolvem suas aulas com

referência nos mesmos princípios teóricos e estruturais da sequência de Joaquim Dolz

e Bernard Schneuwly, proposta curricular para o ensino do francês.

Em seguida descrevemos a sistematização das atividades do Caderno Poetas

da Escola e refletimos sobre o que poderia estar implícito na ilustração da capa,

verificamos o aspecto físico do material, delineamos a estrutura generalizada do

Caderno, em que a decompomos em três blocos: uma parte preliminar, uma outra

com todas as oficinas e na última os critérios de avaliação e as referências e

resumimos a distribuição interna dos ateliês. Nessa descrição, objetivávamos o

possível destinatário, não familiarizado com o Caderno e selecionar nossa amostra

para a análise. Assim, o que mais nos chamou a atenção foi a excelente qualidade da

matéria prima do Caderno. Talvez, em nossa concepção, não valha a pena Material

extremamente caro e tão bem ilustrado que reserve 70% de suas atividades

fundamentadas em somente uma teoria. A título de ilustração, fazemos das palavras

de Cyntrão (2004) as nossas, é preciso que o leitor, no momento da leitura, traga para

seu contexto conexões com diferentes áreas de conhecimento da cultura humana,

para enfim desvendar os possíveis sentidos que parcialmente foram descritos no

texto.

Finalmente fizemos breve contextualização de nosso trabalho, em segundo

lugar uma observação do recorte de nossos dados em linguagem gráfica, e, em

terceiro, descrição, análise e avaliação das oficinas 1, 2, 6, 7 e 8. Por último, algumas

constatações sobre o que percebemos no Caderno em geral e nas atividades citadas.

Assim sendo, realizamos cuidadosamente mais uma leitura do projeto e atribuímos

valor qualitativo às oficinas e às atividades sob a ótica da análise dialógica discursiva

de Bakhtin e seu Círculo.

A princípio, constatamos o que já sabemos desde a nossa infância, na escola,

em relação à abordagem do poema, isto é, a história se repete, o ensino é voltado

para as questões da teoria literária e comunicativa, porque não encontramos o texto

sendo considerado nas dimensões constitutivas do gênero discursivo nem a análise

Page 156: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

155

dos aspectos dialógicos. Essa era nossa suposição que estava implícita, mas foi

revelada na contagem das atividades recorrentes. Além disso, vimos que a oralidade

é presente em vários momentos dos encontros, todavia para a explicação de

conteúdos pelo professor ou identificação de elementos formais do poema.

Por isso, reavaliamos o que já havíamos pesquisado, lido e decidimos estender

um pouco mais nossa busca. Percebemos que se o poema pertence à esfera artística

literária, reivindica tratamento artístico, portanto. No entanto, os documentos oficiais

ainda não apresentam uma sistematização, para o gênero poema.

Nossa opção em trabalhar com o gênero poema é devida à frustração em

relação ao aprendizado desde a infância até a vida adulta. A princípio a intenção era

investigar por que os professores não são bem sucedidos na tarefa do ensino.

Contudo, nossa orientadora sugeriu que não entrássemos nessa questão, pois

sairíamos do escopo da Linguística Aplicada de estudarmos a língua em seus usos

cotidianos.

Após termos apresentado nosso percurso é necessário respondermos aos

questionamentos de pesquisa. Assim, a análise de nosso corpus teve como foco

principal analisar a inter-relação entre modelo teórico adotado e a abordagem didática

decorrente e suas implicações para o processo de ensino da língua materna, no caso

específico, da linguagem literária, na 2ª edição do Caderno Poetas da Escola do

Programa da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010. Com a

explicitação de nosso objetivo direcionamos nosso trabalho com a seguinte pergunta:

Objetivos específicos:

1) Descrever os modos como o gênero discursivo poema foi didatizado no

Caderno do Professor da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2010.

2) Explicar como seria a contemplação das capacidades de leitura e produção

de tal gênero em uma perspectiva enunciativo-discursiva, levando em conta, para

além dos aspectos formais, os sócio-históricos, discursivos e ideológicos, imbricados

no processo de criação verbal.

Page 157: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

156

Perguntas de pesquisa:

1) Como foi sistematicamente elaborada a proposta de trabalho com o gênero

do discurso poema no Caderno Poetas da Escola?

A equipe da Olimpíada organizou programa que tenciona ir de encontro ao

problema da leitura e escrita brasileira, e apresenta os seguintes objetivos.

Democratizar os usos da LP no sentido de combater o iletrismo e fracasso

escolar, pois no âmbito social o indivíduo precisa estar preparado para participar das

práticas letradas. Isso pode ser possível, conforme o Caderno se o aluno domina as

capacidades dos gêneros pertencentes à esfera social. É preciso também, na visão

psicológica da OLPEF, desenvolver diferentes estratégias de leitura para que se torne

um leitor autônomo.

Entretanto, tal concepção de língua como comunicação e a abordagem formal

do poema, implica em ensino tradicional de identificação, reconhecimento e

memorização de elementos formais do poema. Além disso, a estratégia de ensino se

dá por meio de sequência didática, elaborado pelos genebrinos, Dolz & Scnewly, cuja

estrutura trabalha o gênero de forma rígida sem dar oportunidade ao professor de

ampliar seus planejamentos.

Vale lembrar, que na seção “Prepare-se”, no início de cada oficina, em que o

professor é orientado para a realização do trabalho, cremos que além do que já existe

poderia haver outros enfoques, porque no texto poético existem relações dialógicas

internas e externas, as quais devem ser desveladas.

Logo, a preocupação do OLPEF enfatiza o aprendizado da estrutura do texto,

a norma padrão linguística e a função, a qual o texto está destinado, em nosso caso

a função poética. Pensamos, sobre esse aspecto, que ainda faltam pontos a serem

trabalhados ou no mínimo a hierarquia de análise deveria ser invertida, porque uma

reflexão de análise dialógica do discurso bakhtiniana extrapola os parâmetros do

Caderno.

2) Quais e como as contribuições teóricas bakhtinianas podem fundamentar a

transposição didática, privilegiando abordagem discursiva dialógica no ensino-

aprendizagem do gênero poema?

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157

Como o objetivo de nossa primeira pergunta de pesquisa foi definir o gênero

literário, para então podermos compará-lo com o gênero discursivo na perspectiva

bakhtiniana, percebemos algumas lacunas no tratamento do primeiro.

Em contraste, sugerimos, sucintamente, que o modo de lidar, com o gênero em

questão, requer a análise das particularidades do gênero do discurso bakhtiniano,

inclusive, não esquecendo da memória de passado e de futuro. Acrescentado a isso,

é imperativo situá-lo em contexto imediato e, também, um mais amplo, observar as

relações dialógicas internas para ouvirmos as vozes sociais, buscando a verdade

istina (superficial) e a verdade pravda (sem relativismo adquirido em olhar externo) e,

consequentemente, respondê-las transgredindo e assinando, ou seja, assumindo

nossa responsabilidade sobre nossos atos. Jamais desconsiderarmos a crítica de

Bakhtin à estética material por não compreender que as formas arquitetônicas são as

que sustentam as formas composicionais e preenchem o material de significação,

portanto, tudo isso resulta na totalidade da obra de arte, mas, vale lembrar que em

outra ocasião Bakhtin e Volochinov sugerem um método sociológico de análise da

linguagem eficaz, que seria a investigação dos campos de comunicação humana (as

esferas), dos atos de fala (os gêneros discursivos) e a materialidade (o sistema

linguístico), devendo ser considerados nessa ordem.

Estamos conscientes de que um trabalho como este requer mudanças

significativas nas políticas públicas da educação, a reflexão do Governo Federal a

respeito dos investimentos aplicados, obtidos da arrecadação de impostos, abarcam

em sua amplitude de produção de materiais específicos, além de concessões

financeiras cedidas pelo Governo Público Federal, a participação no funcionamento

das escolas sem serem avaliados pela instituição de ensino, e de forma ainda bastante

incipiente pela academia.

Mas, também, acreditamos que a formação educacional se dá em contextos

diferentes, por isso desejamos a princípio que tenhamos contribuído com a

investigação de nosso objeto de pesquisa, ainda que pouco. Entretanto, uma pesquisa

cientifica gera outras discussões, e estas podem dar continuidade ao nosso raciocínio

ou de outros pesquisadores, ampliando a discussão em outras frentes de trabalho.

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158

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164

ANEXOS

TABELA 1 – Tipos de Atividades nos moldes da Sequência Didática

Tipos de Atividades: nos moldes da sequência didática

Conjunto de tematizações enfocadas nas atividades do Caderno

Situação de produção: apresentamos, neste item, atividades que exploram elementos como autor, leitor, suporte, finalidade, título e temática da produção.

Ativação de conhecimento prévio.

Predição dos conteúdos.

Diagnóstico. Esclarecimento das características e situação de produção do poema.

Incentivo aos alunos para que participem do Concurso.

Estabelecimento do prazo da apresentação.

Discussão em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”. Audição do poema em busca de possíveis temas.

Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.

Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.

Apresentação das “definições poéticas”: Modéstia, Reticências, Recordação de Mário Quintana.

Apresentação do conteúdo: linguagem figurada.

Explicação para o termo metáfora.

Leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu.

Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.

Esclarecimento/definição de personificação.

Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.

Definição de aliteração (repetição da mesma consoante).

Localização recorrente de repetição de palavras, rimas e aliteração.

Apresentação da aliteração construindo um ritmo irregular em fragmentos de “Pátria minha” de Vinícius de Moraes e “Coisas do reino da minha cidade” de Vintém de Cobre?.

Explicação a respeito de que as repetições provocam ritmos regulares ou irregulares em poemas, cantigas e brincadeiras infantis.

Explicação de trava-línguas.

Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.

Contextualização da poesia popular brasileira.

Ativação do conhecimento.

Esclarecimentos: Patativa do Assaré e a temática da narrativa em versos.

Constatação de que existem regras para acentuar os versos.

Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.

Retomada das orientações da oficina 4 (página 45).

Exploração do tema. “Comente com eles a diferença de dimensão que os objetos assumem, vistos de longe e de perto”.

Releitura do poema para imaginar a cidade. Comparação entre as cidades dos dois poemas e descrição das diferenças e semelhanças.

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165

Apresentação da situação. Ativação do conhecimento.

Delimitação do tema que retrata a cidade.

Atividade lúdica. Desenhos das impressões dos alunos em um painel.

Leitura e análise do poema vencedor do último concurso para motivação.

Retomada da situação de produção “O lugar onde vivo”.

Delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria Literária.

Cópia na lousa, leitura e debate sobre alguns versos para aperfeiçoamento do texto.

Alimentação temática: organizamos, neste tópico, as atividades que apresentam diferentes estratégias de busca e seleção de informações para fundamentar a produção de texto.

Discussão para saber se há apreciação do gênero e qual seria a motivação.

Alimentação temática para ampliação dos conhecimentos.

Entrevista com os moradores do bairro.

Sugestão de interação entre a comunidade e os alunos.

Coleta de material de poetas clássicos ou modernistas.

Seleção dos poemas preferidos.

Providenciar cópias dos textos preferidos pelo professor e alunos para lerem em grupos.

Solicitação aos alunos para que selecionem poemas que serão fixados no mural.

Explicação sobre a diferença entre pseudônimo e heterônimo.

Esclarecimentos sobre Fernando Pessoa.

Busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas à produção.

Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade.

Atividade lúdica. Colagem dos elementos transcritos no painel.

Reflexão do que foi aprendido e realizado.

Elementos fundamentais do poema: sonoridade (rima), ritmo, metro, verso; unidades expressivas:

Leitura. Descrição da representação de poema para os alunos.

Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.

Localização de palavras ou versos repetidos nas estrofes.

Conversa. Definição da função da poesia.

Leitura e compreensão do texto a ser apresentado com foco nos recursos linguísticos e lógicos do texto.

Análise do poema “Canção do exílio” de Gonçalves Dias com vistas a apreensão do modo como foram selecionadas as palavras, as rimas, versos e estrofes para articularem o sentido.

Definição dos conceitos de rima, versos regulares, versos brancos e verso solto.

Localização das rimas nos versos. Identificação dos modos como as rimas são apresentadas em quadras diferentes.

Identificação de rimas após leitura e audição nas quadras.

Compreensão. Busca do conhecimento de mundo via assimilação e relacionamento entre grafema e poema.

Conversa e percepção de grafema (rima interna) capazes de formar “uma lista”.

Identificação e transcrição de recursos linguísticos.

Organização dos recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto.

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166

Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.

Exploração do título.

Aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do texto.

Técnicas que agrupam a lista de termos e as formas linguísticas para uma produção coletiva.

Seleção individual de palavras. Localizar no dicionário.

Eleição da ordem em que os versos irão seguir.

Escolha do título do poema.

Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.

Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.

Compreensão do texto. Verificação de termos no dicionário.

Definição de sentido próprio e sentido figurado.

Esclarecimento de ambivalência do termo, estranhamento causado pela inversão sintática.

Observação da sequência lógica textual.

Localização de sentido próprio e figurado.

Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.

Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.

Esclarecimento/definição de personificação.

Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.

Percepção das repetições de palavras, de versos e de letras que produzem sons.

Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.

Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.

Levantamento da temática, a partir do estilo do poeta.

Análise da acentuação em versos escondidos (ou divididos) de “Emigração e as consequências” para observação da acentuação.

Compreensão do tema e do tom via forma.

Busca do significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário.

Retomada dos dois poemas. Observação dos recursos expressivos.

Identificar semelhanças: organização composicional, rimas, ritmo marcado e repetições. Recursos expressivos: figuras de linguagem. Apreciação valorativa positiva.

Produção de um quadro-resumo.

Percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.

Adequação do título ao tema. Repetição ou eliminação de termos na construção do som.

Leitura para aperfeiçoar ou eliminar termos estilo.

Produção oral: caracterizamos este tópico com temáticas voltadas para o uso oral da linguagem.

Reconhecimento dos elementos do gênero poema e localização.

Debate visando o planejamento do mural.

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167

Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.

Avaliação do progresso dos alunos.

Atividade em grupo.

Leitura ou audição do CD do poema “Tem tudo a ver” de Elias José.

Debate e exposição em Datashow da construção composicional do poema.

Conversa. Definição da função da poesia.

Audição, leitura e debate sobre generalizações do ritmo e rima.

Percepção entre a leitura e efeitos sonoros do ritmo textual.

Atividade interativa com leitura oral da seleção de poemas e da coletânea.

Atividade lúdica voltada para o ritmo, as pausas e a entonação da voz.

Oralização. Busca de uma inter-relação entre o empírico e a subjetividade dos alunos com o conteúdo temático dos textos.

Arguição. Ampliação da interpretação do texto com centralização nos recursos expressivos.

Leitura e compreensão do texto a ser apresentado com foco nos recursos linguísticos e lógicos do texto.

Sugestão de audição de outros autores famosos para aperfeiçoar a leitura e a apresentação do texto.

Leitura. Composição de rimas. Localização no dicionário. Atividade trabalho com os elementos linguísticos.

Reconhecimento de rimas simples e populares (as quadrilinhas).

Oralização. Definição do conceito de quadrinha.

Leitura e revisão da quadra. Fixação da quadra no mural.

Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.

Exploração do título.

Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.

Atividade lúdica: apresentação.

Atividade em grupo. Avaliação e leitura da letra de canção “O leão” de Vinícius de Morais.

Questionamento sobre o porque da comparação entre “rugido” e “trovão”.

Leitura do poema “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu.

Questionamentos para a ativação do conhecimento, para a produção textual.

Apresentação e debate sobre a tarefa.

Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.

Leitura das melhores frases construídas pelos grupos.

Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.

Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.

Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.

Atividade em grupo para apresentação de trava-língua. Sorteio do trava-língua. Treinamento.

Competição. Solicitação aos melhores na 1ª etapa para ler em voz alta.

Leitura em voz alta e socialização das produções. Revisão e exposição dos textos no mural.

Audição e leitura do poema “Emigração e as consequências”.

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168

Identificação de assuntos nos versos e estrofes.

Discussão e retomada das figuras: comparação e metáfora.

Leitura de versos. Debate para a identificação do estilo do autor.

Leitura para verificação da temática escolhida pelo poeta.

Leitura em voz alta para a percepção do ritmo cadenciado.

Leitura oral para a compreensão de que poemas, grandes ou pequenos, podem ou não terem ritmos marcados.

Audição e leitura. Retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos, rimas, repetição dos versos. Observação da sequência de ideias para a forma do poema.

Leitura em voz alta das quadras.

Atividade lúdica: montagem de um painel ilustrado com o novo percurso do tatu.

Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.

Exploração do tema. “Comente com eles a diferença de dimensão que os objetos assumem, vistos de longe e de perto”.

Leitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana. Releitura para imaginar a intenção da autora. Foco na forma e na idealização.

Interpretação dos sentimentos do poeta. Foco nas formas linguísticas.

Diferenças: tons alegre e triste dos poetas.

Conversa ou passeio: coleta de dados sobre a cidade. Foco nas impressões e sensações.

Conversa e descrição do ponto mais interessante.

Debate para esclarecer a intenção discursiva de Alberto Caieiro.

Observação do painel.

Audição e leitura de alguns poemas.

Aprendizado do significado de várias palavras: poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação, aliteração.

Cópia na lousa e conversa sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do poema coletivo.

Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.

Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.

Releitura do poema e a escolha do título.

Cópia na lousa, leitura e debate sobre alguns versos para aperfeiçoamento do texto.

Revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática; harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens; efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo sintático); figuras de linguagem.

Atividade lúdica. Leitura de um poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. Foco no ritmo, pausas e entonação da voz.

Local decorado, música e teatro.

Produção escrita: agrupamos, neste tópico, atividades voltadas

Registros de poemas ou trechos conhecidos pelos alunos.

Fixação dos textos no mural.

Page 170: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

169

para o exercício da produção escrita coletiva e individual.

Organização de um mural.

Registro, no mural, dos poemas analisados e produzidos pelos alunos, para futuras leituras.

Cópia das conclusões no caderno.

Produção escrita do 1° texto tematizando “O lugar onde vivo”.

Atividade de escrita. Preenchimento de lacuna, privilegiando o ritmo, o som e o verso para a construção do sentido.

Produção coletiva de quadra.

Em trio: composição dos versos. Elaboração coletiva do texto com a utilização de palavras e rimas que combinem.

Atividade para fixação: individualmente ou em grupos, produção escrita de definições poéticas.

Orientação de estratégia básica de leitura: sublinhar.

Atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”.

Atividade escrita para compreensão. Preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.

Cópia pela professora dos exercícios de outros alunos.

Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.

Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.

Individualmente ou em grupos produção e registro no caderno de trava-línguas ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos.

Atividade individual ou em dupla. Produção de quadras acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu.

Produção a partir do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”.

Registro de palavras e impressões dos alunos.

Escrita dos versos criados em conjunto na lousa.

1ª produção individual. Escrita e (re)escrita do poema. Privilégio de recursos literários, lingüísticos e aproximação dos aspectos da cidade.

Reescrita: organizamos, neste item, as atividades que envolvem atividades de reescrita orientadas coletiva e individualmente.

Sugestão aos alunos para que façam rascunhos para a refacção do texto se necessário.

Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.

Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.

Releitura do poema e a escolha do título.

1ª produção individual. Escrita e (re)escrita do poema. Privilégio de recursos literários, linguísticos e aproximação dos aspectos da cidade.

Reescrita.

Fonte: Organizada pela autora/2013, de ALTENFELDER; ARMELIN, 2010.

Page 171: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

170

TABELA 2 – Tipos de Atividades: perspectiva bakhtiniana

Tipos de Atividades: nos moldes da sequência didática

Conjunto de tematizações enfocadas nas atividades do Caderno

Conteúdo

Ativação de conhecimento prévio.

Discussão para saber se há apreciação do gênero e qual seria a motivação.

Diagnóstico. Esclarecimento das características e situação de produção do poema.

Produção escrita do 1° texto tematizando “O lugar onde vivo”.

Esclarecimentos sobre Fernando Pessoa.

Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.

Contextualização da poesia popular brasileira.

Ativação do conhecimento.

Esclarecimentos: Patativa do Assaré e a temática da narrativa em versos.

Leitura para verificação da temática escolhida pelo poeta.

Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.

Apresentação da situação. Ativação do conhecimento.

Debate para esclarecer a intenção discursiva de Alberto Caieiro.

Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade.

*Assunto

Conversa. Definição da função da poesia.

Discussão em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”. Audição do poema em busca de possíveis temas.

Questionamentos para a ativação do conhecimento, para a produção textual.

Delimitação do tema que retrata a cidade.

Conversa ou passeio: coleta de dados sobre a cidade. Foco nas impressões e sensações.

Conversa e descrição do ponto mais interessante.

Busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas à produção.

Registro de palavras e impressões dos alunos.

Atividade lúdica. Desenhos das impressões dos alunos em um painel.

Cópia na lousa e conversa sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do poema coletivo.

Delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria Literária.

Material: unidades da língua, sons, palavras, imagens.

Estilo individual

Localização de palavras ou versos repetidos nas estrofes.

Leitura. Composição de rimas. Localização no dicionário. Atividade trabalho com os elementos linguísticos.

Reconhecimento de rimas simples e populares (as quadrilinhas).

Atividade de escrita. Preenchimento de lacuna, privilegiando o ritmo, o som e o verso para a construção do sentido.

Page 172: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

171

Análise do poema “Canção do exílio” de Gonçalves Dias com vistas a apreensão do modo como foram selecionadas as palavras, as rimas, versos e estrofes para articularem o sentido.

Localização das rimas nos versos. Identificação dos modos como as rimas são apresentadas em quadras diferentes.

Explicação sobre a diferença entre pseudônimo e heterônimo.

Identificação de rimas após leitura e audição nas quadras.

Conversa e percepção de grafema (rima interna) capazes de formar “uma lista”.

Seleção individual de palavras. Localizar no dicionário

Em trio: composição dos versos. Elaboração coletiva do texto com a utilização de palavras e rimas que combinem.

Atividade escrita para compreensão. Preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.

Apresentação e debate sobre a tarefa.

Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.

Definição de aliteração (repetição da mesma consoante).

Localização recorrente de repetição de palavras, rimas e aliteração.

Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.

Apresentação da aliteração construindo um ritmo irregular em fragmentos de “Pátria minha” de Vinícius de Moraes e “Coisas do reino da minha cidade” de Vintém de Cobre?.

Explicação a respeito de que as repetições provocam ritmos regulares ou irregulares em poemas, cantigas e brincadeiras infantis.

Individualmente ou em grupos produção e registro no caderno de trava-línguas ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos.

Levantamento da temática, a partir do estilo do poeta.

Discussão e retomada das figuras: comparação e metáfora.

Leitura de versos. Debate para a identificação do estilo do autor.

Trabalho com a noção de ritmo nas quadras do poema “O buraco do tatu”.

Produção a partir do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”.

Busca do significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário.

Retomada dos dois poemas. Observação dos recursos expressivos.

Diferenças: tons alegre e triste dos poetas.

Leitura para aperfeiçoar ou eliminar termos estilo.

Estilo do gênero

Oralização. Definição do conceito de quadrinha.

Organização dos recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto.

Forma: diálogo face a face, estética (valoração).

Registros de poemas ou trechos conhecidos pelos alunos.

Reconhecimento dos elementos do gênero poema e localização.

Page 173: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

172

Alimentação temática para ampliação dos conhecimentos.

Entrevista com os moradores do bairro.

Coleta de material de poetas clássicos ou modernistas.

Registro, no mural, dos poemas analisados e produzidos pelos alunos, para futuras leituras.

Debate visando o planejamento do mural.

Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.

Avaliação do progresso dos alunos.

Debate e exposição em Datashow da construção composicional do poema.

Predição dos conteúdos.

Cópia das conclusões no caderno.

Sugestão aos alunos para que façam rascunhos para a refacção do texto se necessário.

Audição, leitura e debate sobre generalizações do ritmo e rima.

Percepção entre a leitura e efeitos sonoros do ritmo textual.

Atividade interativa com leitura oral da seleção de poemas e da coletânea.

Atividade lúdica voltada para o ritmo, as pausas e a entonação da voz.

Oralização. Busca de uma inter-relação entre o empírico e a subjetividade dos alunos com o conteúdo temático dos textos.

Sugestão de audição de outros autores famosos para aperfeiçoar a leitura e a apresentação do texto.

Definição dos conceitos de rima, versos regulares, versos brancos e verso solto.

Produção coletiva de quadra.

Leitura e revisão da quadra. Fixação da quadra no mural.

Compreensão. Busca do conhecimento de mundo via assimilação e relacionamento entre grafema e poema.

Identificação e transcrição de recursos linguísticos.

Aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do texto.

Técnicas que agrupam a lista de termos e as formas linguísticas para uma produção coletiva.

Eleição da ordem em que os versos irão seguir.

Escolha do título do poema.

Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.

Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.

Compreensão do texto. Verificação de termos no dicionário.

Definição de sentido próprio e sentido figurado.

Esclarecimento de ambivalência do termo, estranhamento causado pela inversão sintática.

Observação da sequência lógica textual.

Localização de sentido próprio e figurado.

Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.

Atividade para fixação: individualmente ou em grupos, produção escrita de definições poéticas.

Page 174: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

173

Apresentação do conteúdo: linguagem figurada.

Questionamento sobre o porque da comparação entre “rugido” e “trovão”.

Orientação de estratégia básica de leitura: sublinhar.

Explicação para o termo metáfora.

Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.

Esclarecimento/definição de personificação.

Atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”.

Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.

Leitura das melhores frases construídas pelos grupos.

Explicação de trava-línguas.

Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.

Atividade em grupo para apresentação de trava-língua. Sorteio do trava-língua. Treinamento.

Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.

Competição. Solicitação aos melhores na 1ª etapa para ler em voz alta.

Leitura em voz alta e socialização das produções. Revisão e exposição dos textos no mural.

Identificação de assuntos nos versos e estrofes.

Leitura em voz alta para a percepção do ritmo cadenciado.

Leitura oral para a compreensão de que poemas, grandes ou pequenos, podem ou não terem ritmos marcados.

Constatação de que existem regras para acentuar os versos.

Análise da acentuação em versos escondidos (ou divididos) de “Emigração e as consequências” para observação da acentuação.

Audição e leitura. Retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos, rimas, repetição dos versos. Observação da sequência de ideias para a forma do poema.

Atividade individual ou em dupla. Produção de quadras acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu.

Leitura em voz alta das quadras.

Retomada das orientações da oficina 4 (página 45).

Leitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana. Releitura para imaginar a intenção da autora. Foco na forma e na idealização.

Compreensão do tema e do tom via forma.

Releitura do poema para imaginar a cidade. Comparação entre as cidades dos dois poemas e descrição das diferenças e semelhanças.

Interpretação dos sentimentos do poeta. Foco nas formas lingüísticas.

Identificar semelhanças: organização composicional, rimas, ritmo marcado e repetições. Recursos expressivos: figuras de linguagem. Apreciação valorativa positiva.

Leitura de “Confidência do itabirano” e “Alma Cabocla” para a percepção do tema. Privilégio das características literárias.

Produção de um quadro-resumo

Audição e leitura de alguns poemas.

Page 175: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

174

Aprendizado do significado de várias palavras: poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação, aliteração.

Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.

Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.

Releitura do poema e a escolha do título.

Leitura e análise do poema vencedor do último concurso para motivação.

Percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.

Adequação do título ao tema. Repetição ou eliminação de termos na construção do som.

Reescrita.

Revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática; harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens; efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo sintático); figuras de linguagem.

Atividade lúdica. Leitura de um poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. Foco no ritmo, pausas e entonação da voz.

Fonte: Organizada pela autora/2013, de ALTENFELDER; ARMELIN, 2010.

Page 176: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

175

TABELA 3 – Aspectos discursivos / dialógicos

Tipos de Atividades: nos moldes da

sequência didática

Conjunto de tematizações enfocadas nas atividades do Caderno

Conteúdo

Ativação de conhecimento prévio.

Discussão para saber se há apreciação do gênero e qual seria a motivação.

Diagnóstico. Esclarecimento das características e situação de produção do poema.

Produção escrita do 1° texto tematizando “O lugar onde vivo”.

Esclarecimentos sobre Fernando Pessoa.

Discussão. Levantamento e comparação de termos com temas sociais.

Contextualização da poesia popular brasileira.

Ativação do conhecimento.

Esclarecimentos: Patativa do Assaré e a temática da narrativa em versos.

Leitura para verificação da temática escolhida pelo poeta.

Ativação do conhecimento. Leitura de “O milagre do Corcovado”.

Apresentação da situação. Ativação do conhecimento.

Debate para esclarecer a intenção discursiva de Alberto Caieiro.

Planejamento e confecção do painel, em grupo, que retratará a cidade.

Conversa. Definição da função da poesia.

Discussão em torno do título “Duas dúzias de coisinhas à toa que deixam a gente feliz”. Audição do poema em busca de possíveis temas.

Questionamentos para a ativação do conhecimento, para a produção textual.

Delimitação do tema que retrata a cidade.

Conversa ou passeio: coleta de dados sobre a cidade. Foco nas impressões e sensações.

Conversa e descrição do ponto mais interessante.

Busca de “impressões, sensações e sentimentos” com vistas à produção.

Registro de palavras e impressões dos alunos.

Atividade lúdica. Desenhos das impressões dos alunos em um painel.

Cópia na lousa e conversa sobre os aspectos selecionados no mural para fundamentar a produção do poema coletivo.

Delimitação do tema, interlocutor, seleção de recursos, com foco na Teoria Literária.

Material

Localização de palavras ou versos repetidos nas estrofes.

Leitura. Composição de rimas. Localização no dicionário. Atividade trabalho com os elementos linguísticos.

Reconhecimento de rimas simples e populares (as quadrilinhas).

Atividade de escrita. Preenchimento de lacuna, privilegiando o ritmo, o som e o verso para a construção do sentido.

Análise do poema “Canção do exílio” de Gonçalves Dias com vistas a apreensão do modo como foram selecionadas as palavras, as rimas, versos e estrofes para articularem o sentido.

Localização das rimas nos versos. Identificação dos modos como as rimas são apresentadas em quadras diferentes.

Explicação sobre a diferença entre pseudônimo e heterônimo.

Identificação de rimas após leitura e audição nas quadras.

Conversa e percepção de grafema (rima interna) capazes de formar “uma lista”.

Seleção individual de palavras. Localizar no dicionário

Page 177: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

176

Em trio: composição dos versos. Elaboração coletiva do texto com a utilização de palavras e rimas que combinem.

Atividade escrita para compreensão. Preenchimento de espaços vazios, individualmente ou em duplas.

Apresentação e debate sobre a tarefa.

Leitura em voz alta. Na Coletânea, leitura em grupo, dos poemas de Sidônio Muralha e de Ângela Leite de Souza.

Definição de aliteração (repetição da mesma consoante).

Localização recorrente de repetição de palavras, rimas e aliteração.

Debate sobre os possíveis efeitos de sentido que podem surgir com a aliteração em ritmo regular.

Apresentação da aliteração construindo um ritmo irregular em fragmentos de “Pátria minha” de Vinícius de Moraes e “Coisas do reino da minha cidade” de Vintém de Cobre?.

Explicação a respeito de que as repetições provocam ritmos regulares ou irregulares em poemas, cantigas e brincadeiras infantis.

Individualmente ou em grupos produção e registro no caderno de trava-línguas ou travatrovas usando encontros consonantais ou sons parecidos.

Levantamento da temática, a partir do estilo do poeta.

Discussão e retomada das figuras: comparação e metáfora.

Leitura de versos. Debate para a identificação do estilo do autor.

Trabalho com a noção de ritmo nas quadras do poema “O buraco do tatu”.

Produção a partir do primeiro verso original mantendo “o ritmo e as rimas nos versos pares”.

Busca do significado dos termos “triste” e “melancólico” no dicionário.

Retomada dos dois poemas. Observação dos recursos expressivos.

Diferenças: tons alegre e triste dos poetas.

Leitura para aperfeiçoar ou eliminar termos estilo.

Oralização. Definição do conceito de quadrinha.

Organização dos recursos linguísticos correspondentes aos temas do texto.

Forma

Registros de poemas ou trechos conhecidos pelos alunos.

Reconhecimento dos elementos do gênero poema e localização.

Alimentação temática para ampliação dos conhecimentos.

Entrevista com os moradores do bairro.

Coleta de material de poetas clássicos ou modernistas.

Registro, no mural, dos poemas analisados e produzidos pelos alunos, para futuras leituras.

Debate visando o planejamento do mural.

Debate sobre as características do poema: tematização e forma composicional.

Avaliação do progresso dos alunos.

Debate e exposição em Datashow da construção composicional do poema.

Predição dos conteúdos.

Cópia das conclusões no caderno.

Sugestão aos alunos para que façam rascunhos para a refacção do texto se necessário.

Audição, leitura e debate sobre generalizações do ritmo e rima.

Percepção entre a leitura e efeitos sonoros do ritmo textual.

Atividade interativa com leitura oral da seleção de poemas e da coletânea.

Atividade lúdica voltada para o ritmo, as pausas e a entonação da voz.

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Oralização. Busca de uma inter-relação entre o empírico e a subjetividade dos alunos com o conteúdo temático dos textos.

Sugestão de audição de outros autores famosos para aperfeiçoar a leitura e a apresentação do texto.

Definição dos conceitos de rima, versos regulares, versos brancos e verso solto.

Produção coletiva de quadra.

Leitura e revisão da quadra. Fixação da quadra no mural.

Compreensão. Busca do conhecimento de mundo via assimilação e relacionamento entre grafema e poema.

Identificação e transcrição de recursos linguísticos.

Aspectos metalinguísticos contribuem para a interpretação do texto.

Técnicas que agrupam a lista de termos e as formas linguísticas para uma produção coletiva.

Eleição da ordem em que os versos irão seguir.

Escolha do título do poema.

Esclarecimento das particularidades do poema e diferença com outros textos. Os recursos expressivos sugerem vários sentidos.

Atividade em grupo. Audição do poema “Livros e flores” de Machado de Assis, com vistas à preocupação da organização sintática.

Compreensão do texto. Verificação de termos no dicionário.

Definição de sentido próprio e sentido figurado.

Esclarecimento de ambivalência do termo, estranhamento causado pela inversão sintática.

Observação da sequência lógica textual.

Localização de sentido próprio e figurado.

Atividade em grupo. Leitura e discussão sobre as “definições poéticas” para descobrir significado.

Atividade para fixação: individualmente ou em grupos, produção escrita de definições poéticas.

Apresentação do conteúdo: linguagem figurada.

Questionamento sobre o porque da comparação entre “rugido” e “trovão”.

Orientação de estratégia básica de leitura: sublinhar.

Explicação para o termo metáfora.

Cópia na lousa para observação dos sublinhados: metáfora e personificação.

Esclarecimento/definição de personificação.

Atividade escrita: produção de comparações e metáforas sobre “O lugar onde vivo”.

Criação de metáforas eliminando os termos de comparação.

Leitura das melhores frases construídas pelos grupos.

Explicação de trava-línguas.

Cópia de trava-língua para decorar e apresentar.

Atividade em grupo para apresentação de trava-língua. Sorteio do trava-língua. Treinamento.

Audição de “travatrovas” “O pedreiro Pedro Alfredo”, “Se um dia me der na telha”, “Chegou ‘seu’ Chico Sousa” de Ciça.

Competição. Solicitação aos melhores na 1ª etapa para ler em voz alta.

Leitura em voz alta e socialização das produções. Revisão e exposição dos textos no mural.

Identificação de assuntos nos versos e estrofes.

Leitura em voz alta para a percepção do ritmo cadenciado.

Leitura oral para a compreensão de que poemas, grandes ou pequenos, podem ou não terem ritmos marcados.

Constatação de que existem regras para acentuar os versos.

Page 179: A DIDATIZAÇÃO DO GÊNERO DISCURSIVO POEMA: UMA

178

Análise da acentuação em versos escondidos (ou divididos) de “Emigração e as consequências” para observação da acentuação.

Audição e leitura. Retomada dos conhecimentos: regularidade das estrofes, tamanho dos versos, rimas, repetição dos versos. Observação da sequência de ideias para a forma do poema.

Atividade individual ou em dupla. Produção de quadras acrescentando a cidade dos alunos ao percurso do tatu.

Leitura em voz alta das quadras.

Retomada das orientações da oficina 4 (página 45).

Leitura do poema “Cidadezinha” de Mário Quintana. Releitura para imaginar a intenção da autora. Foco na forma e na idealização.

Compreensão do tema e do tom via forma.

Releitura do poema para imaginar a cidade. Comparação entre as cidades dos dois poemas e descrição das diferenças e semelhanças.

Interpretação dos sentimentos do poeta. Foco nas formas lingüísticas.

Identificar semelhanças: organização composicional, rimas, ritmo marcado e repetições. Recursos expressivos: figuras de linguagem. Apreciação valorativa positiva.

Leitura de “Confidência do itabirano” e “Alma Cabocla” para a percepção do tema. Privilégio das características literárias.

Produção de um quadro-resumo.

Audição e leitura de alguns poemas.

Aprendizado do significado de várias palavras: poema, poesia, poeta, verso, estrofe, estilo, tema, figuras, denotação, conotação, aliteração.

Reler os versos constantemente para compor as rimas, o sentido, as figuras de linguagem, a forma composicional e os versos e estrofes.

Leitura em voz alta para adequação do tamanho dos versos, ritmo e exclusão de clichês.

Releitura do poema e a escolha do título.

Leitura e análise do poema vencedor do último concurso para motivação.

Percepção dos recursos no poema de Carla M. Xavier.

Adequação do título ao tema. Repetição ou eliminação de termos na construção do som.

Reescrita.

Revisão do poema: título, tema, “O lugar onde vivo”, delimitação temática; harmonia do ritmo; organização em versos e estrofes; ocupação da página; margens; efeitos sonoros; ritmo marcado e rimas; repetição da mesma construção (paralelismo sintático); figuras de linguagem.

Atividade lúdica. Leitura de um poeta e outro de um aluno, para ensaio da apresentação. Foco no ritmo, pausas e entonação da voz.

Contexto sócio-histórico

Se conhecerem os grandes poetas, vamos lhes propor poemas populares.

Conhecimento de poetas consagrados, da época modernista e contemporânea 26.

Acontecimentos 28, 46, 112.

Relação com os acontecimentos e as modificações ao longo do tempo 112.

Contextualização com a história da seca no Nordeste e a migração dos nordestinos para o Sul.

Contextualização do autor

Conhecimento de poetas desde o Modernismo à Contemporaneidade 28.

Pseudônimo e heterônimo 55.

Diferentes autores: contexto de Assaré 114. Mas, M. Quintana 71, V. Vinicius de Moraes 74, Casimiro de Abreu 76 só há citação. Assaré 114 está contextualizado. Na 128 e 132 deveria haver contexto.

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179

O reflexo da mineração em Itabira-MG nos trabalhos de Carlos Drummond de Andrade.

Relações autor x herói: questões dialógicas internas

Não encontramos

Trabalho com o projeto discursivo: intenção ou o querer dizer, questões ideológicas

Esclarecimento do que seria a intensão discursiva do autor, mas não faz referência à ideologia. 35

Construção semântica. 66, 67, 68, 69, 70, 75, 76, 93, 104, 107, 113

Projeto discursivo. 114

Valoração da cidade pelos alunos. 116

Na adequação discursiva falta o projeto discursivo.

Trabalho com a reconstrução de sentidos pelo leitor

Pelo viés da forma 35, 93, 104, 123; inspiração 45, experiências e sensibilidade 47, 57, 60, verbo-visual 108, sentidos 113, impressão, sensação e sentimentos 116

Trabalho com o discurso alheio (citado) e/ou vozes

Não encontramos

Trabalho com intertextualidade ou interdiscursividade. Padilha (2005)

Intertexto 109; interdiscurso (identificação do tema e do projeto discursivo do autor) 103, 106

Fonte: Organizada pela autora/2013, de ALTENFELDER; ARMELIN, 2010.