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78 HSM Management 13 março-abril 1999 A comparação entre a Stew Leonard’s Dairy Store e a Disney não é nova; tanto o jornal The New York Times como a revista Fortune já a fizeram antes. Porém fica mais válida cada dia que passa. A empresa, que administra duas gigantescas lojas de produtos alimentícios no Estado de Connecticut perto de Nova York, nos EUA, e está prestes a abrir a terceira, conseguiu se transformar em lugar onde as pessoas se divertem comprando. Por quê? Porque oferece experiências alegres aos clientes, como animais de brinquedo que entretêm crianças ao som de música, funcionários fantasiados de animais, uma fazendinha de animais de verdade, a usina de engarrafamento de leite dentro da loja, e por aí vai. A empresa faz “um show em cada canto”, como diz o especialista em administração Tom Peters. E, além do show, vende produtos de alta qualidade por preços extremamente competitivos e com atendimento muito especial ao cliente. Esta reportagem mostra em detalhe por que a Stew Leonard’s vem sendo estudada por organizações como IBM e Citibank, reconstituindo sua história e descrevendo os quatro conceitos sobre os quais se apóia: satisfação do cliente, trabalho de equipe, excelência e encantamento. A Stew Leonard’s é o novo modelo do setor varejista transplantado para a vida real. Empresa dos EUA do ramo de alimentos, ela registra, com apenas duas lojas, vendas anuais de aproximadamente US$ 360 milhões, graças às divertidas experiências que proporciona aos clientes A Disney do DOSSIÊ Não é que a Stew Leonard’s Dairy Store, com duas lojas situadas no Estado de Connecticut, nos EUA, ofereça de tudo aos clientes sem deixar espaço para a concorrência. Ao contrário. Ela tem um mix limitado de mil produtos, distri- buídos pelos setores de laticínios (o dairy do nome), açougue, peixes, padaria, sanduíches, pratos quentes, hortifrutigranjeiros e secos e molhados –estes com normalmente uma marca por categoria. Isso faz geridas dos EUA”. Talvez esse conjunto possa ser resumido nas palavras de Stew Leonard Jr., presidente da empresa e filho do fundador: “A maioria das empresas varejistas fala de ofertas da semana, margens brutas e atendimento ao cliente; a Stew Leonard’s fala em fazer as pessoas felizes”. Não é demagogia. O que a Stew Leonard’s faz na prática com essa finalidade pode ser acompanhado pela sigla que ela usa para transmitir seus principais valores para os fun- cionários, os clientes e os fornecedo- res: STEW –S de satisfy (satisfazer –o cliente), T de teamwork (trabalho de equipe), E de excellence (excelência) e W de wow (ou uau, como se diz sobre o que encanta e surpreende). Esses conceitos são praticamente sinônimos das características do novo modelo do varejo que vêm sendo apontadas pelo especialista Leonard Berry (veja artigo na página 58): mercadorias de primeira linha e preços justos equivalem a excelência; respeito pelos clientes corresponde a satisfazê-los e ao trabalho de equipe que possibilita isso; e diversão é sinônimo de uau! ”S” de satisfação do cliente Uma cliente foi à Stew Leonard’s de Norwalk para reclamar da peça com que seus clientes sempre tenham de ir a outro lugar para comprar o que falta, geralmente um poderoso supermercado da cidade vizinha de Nova York. No entanto, os clientes conti- nuam indo à Stew Leonard’s, cada vez mais. Por quê? A explicação está em determinado conjunto de valores e habilidades operacionais, traduzido pelo especialista em administração Tom Peters como “uma das empresas mais bem

A Disney do - Prof. Randes€S” de satisfação do cliente Uma cliente foi à Stew Leonard’s de Norwalk para reclamar da peça com que seus clientes sempre tenham de ir a outro

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A comparação entre a Stew Leonard’s Dairy Store e a Disney não é nova;tanto o jornal The New York Times como a revista Fortune já a fizeramantes. Porém fica mais válida cada dia que passa. A empresa, queadministra duas gigantescas lojas de produtos alimentícios no Estado deConnecticut perto de Nova York, nos EUA, e está prestes a abrir a terceira,conseguiu se transformar em lugar onde as pessoas se divertem comprando.Por quê? Porque oferece experiências alegres aos clientes, como animaisde brinquedo que entretêm crianças ao som de música, funcionáriosfantasiados de animais, uma fazendinha de animais de verdade, a usinade engarrafamento de leite dentro da loja, e por aí vai. A empresa faz“um show em cada canto”, como diz o especialista em administração TomPeters. E, além do show, vende produtos de alta qualidade por preçosextremamente competitivos e com atendimento muito especial ao cliente.Esta reportagem mostra em detalhe por que a Stew Leonard’s vem sendoestudada por organizações como IBM e Citibank, reconstituindo suahistória e descrevendo os quatro conceitos sobre os quais se apóia:satisfação do cliente, trabalho de equipe, excelência e encantamento.

A Stew Leonard’s é o novo modelo do setor varejistatransplantado para a vida real. Empresa dos EUA do ramo dealimentos, ela registra, com apenas duas lojas, vendas anuaisde aproximadamente US$ 360 milhões, graças às divertidasexperiências que proporciona aos clientes

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OSS

Não é que a Stew Leonard’sDairy Store, com duas lojas situadasno Estado de Connecticut, nos EUA,ofereça de tudo aos clientes semdeixar espaço para a concorrência.Ao contrário. Ela tem um mixlimitado de mil produtos, distri-buídos pelos setores de laticínios(o dairy do nome), açougue, peixes,padaria, sanduíches, pratos quentes,hortifrutigranjeiros e secos emolhados –estes com normalmenteuma marca por categoria. Isso faz

geridas dos EUA”. Talvez esseconjunto possa ser resumido naspalavras de Stew Leonard Jr.,presidente da empresa e filho dofundador: “A maioria das empresasvarejistas fala de ofertas da semana,margens brutas e atendimento aocliente; a Stew Leonard’s fala emfazer as pessoas felizes”.

Não é demagogia. O que a StewLeonard’s faz na prática com essafinalidade pode ser acompanhadopela sigla que ela usa para transmitirseus principais valores para os fun-cionários, os clientes e os fornecedo-res: STEW –S de satisfy (satisfazer –ocliente), T de teamwork (trabalho deequipe), E de excellence (excelência)e W de wow (ou uau, como se dizsobre o que encanta e surpreende).

Esses conceitos são praticamentesinônimos das características donovo modelo do varejo que vêmsendo apontadas pelo especialistaLeonard Berry (veja artigo na página58): mercadorias de primeira linhae preços justos equivalem aexcelência; respeito pelos clientescorresponde a satisfazê-los e aotrabalho de equipe que possibilitaisso; e diversão é sinônimo de uau!

”S” de satisfação do cliente

Uma cliente foi à Stew Leonard’sde Norwalk para reclamar da peça

com que seus clientes sempretenham de ir a outro lugar paracomprar o que falta, geralmente umpoderoso supermercado da cidadevizinha de Nova York.

No entanto, os clientes conti-nuam indo à Stew Leonard’s, cadavez mais. Por quê? A explicação estáem determinado conjunto devalores e habilidades operacionais,traduzido pelo especialista emadministração Tom Peters como“uma das empresas mais bem

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varejode carne gordurosa que haviacomprado. O gerente pediu mildesculpas e lhe deu outra, com umadúzia de rosas junto. Outro clientequeixou-se, em abril, de que aárvore de Natal adquirida lá secara.Recebeu o dinheiro de volta. Umaterceira cliente levou os ossos doperu de Ação de Graças alegandoque este estava ressecado (emboranão tivesse sobrado nada). Foireembolsada.

Esses clientes e os funcionáriosque as atenderam apenas levamao pé da letra o que diz a pedramonumental na entrada das lojas–a “Commitment Rock” (Pedra doCompromisso, na foto ao lado):“Regra número 1: O cliente temsempre razão. Regra número 2:Caso o cliente esteja errado, releia aregra número 1”. É assinada pelopróprio Stew Leonard.

Não é apenas isso. Na hora deatender o cliente insatisfeito, a siglaSTEW recebe uma versão especial:S de sorry (desculpas), T de thanks(obrigada, por identificar o pro-blema), E de explain (explicar asprovidências que serão tomadas),e W de win (“ganhar” o cliente,dando-lhe flores, por exemplo).

A lógica por trás disso é aseguinte: um freguês típico gastaUS$ 100 por semana. Isso significaUS$ 5,2 mil por ano, ou maisde US$ 25 mil no período de cincoanos. Quando os funcionários seconscientizam disso, não queremcorrer o risco de perder um cliente.

Na Stew Leonard’s, a estruturade atendimento ao cliente contacom bem mais “mecanismos” doque em uma loja convencional. Porexemplo, não há uma caixa únicade sugestões, mas várias –uma porcheckout. As caixas de sugestões sãoesvaziadas diariamente às 8h, e às10h já há um relatório sobre elasna mesa de cada gerente. A tarefamais importante dos gerentes,diariamente, é ligar para os clientes,resolver eventuais problemas delesou, caso se trate de uma idéia nova,experimentá-la. E isso não é fácil,porque cada loja recebe, em média,100 bilhetes por dia só das caixasde sugestões, sem considerar oF

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telefone de atendimento ao cliente. Também são feitas reuniões

semanais com clientes no centrode treinamento (veja quadro napágina 83) para que eles sugiramformas de melhorar a loja. Con-sequência de uma dessas reuniõesfoi a introdução de displays deprodutos a granel, como morangose pistache, que os clientes podemexperimentar à vontade. Umsucesso.

O relacionamento da StewLeonard’s com alguns clienteschega a ser tão leal que o queos especialistas chamam de “clien-tes divulgadores” (veja artigo napágina 72) já é praticamente umainstituição da empresa: trata-se dosautodenominados “Embaixadoresda Boa Vontade”, clientes que jálevaram as sacolas da loja paratodas as partes do mundo e tiraramfotografia com elas. Cada uma dasduas lojas tem uma parede especialpara pregar mais de 8 mil fotogra-fias de pessoas com sacolas StewLeonard’s em lugares tão diversoscomo o Kremlin de Moscou, a

Muralha da China e as pirâmidesdo Egito.

“T” de trabalho de equipe

“Quando as pessoas vêmfotografar nossos equipamentos,sempre dizemos: ‘Tirem fotos denossos funcionários. São eles quefazem as coisas andar. Nós pro-gredimos graças às pessoas’”. Essafrase, dita por Stew Leonard Jr., éuma pequena amostra da políticade motivação dos funcionáriosconduzida pela empresa, chamadade MBA, em inglês (Managementby Appreciation, ou Gestão porReconhecimento). Nas duas lojas,

fotos de funcionários eleitos “Estre-las do Mês” estão por toda parte e,nos checkouts, há cartazes sobre aque-les que foram promovidos paracargos superiores. As várias publica-ções internas da empresa valorizamos funcionários, e os clientes tam-bém se envolvem no trabalho, de-positando bilhetes elogiosos na caixade comentários sobre funcionáriosamáveis –bilhetes esses que StewLeonard Jr. não esquece de divulgar.E importante: tudo isso se traduz emdinheiro, de acordo com um abran-gente programa de abonos, recom-pensas e incentivos.

Outro ponto significativo da po-lítica de motivação da Stew Leonard’sé fazer com que os funcionários sedivirtam. “Acho que as pessoas ado-ram trabalhar aqui também porquese sentem em um palco”, diz LeonardJr. Imagine os funcionários de umlaticínio trabalhando em um localcom uma grande janela de vidro emilhares de pessoas lá fora todos osdias observando-os trabalhar. É umshow e tanto.

O objetivo da empresa é que hajamotivação tanto individual como deequipe, pois todos são vistos comoparte uma grande e feliz família. Oambiente familiar é reforçado porpeculiaridades como o fato de maisde 50% dos funcionários das lojasterem no mínimo um parente quetambém trabalha lá e o “Programadas Mães”, de contratação de mu-lheres que precisam de horáriosreduzidos e flexíveis para cuidardos filhos.

Os conceitos de família e equipeacabam se sobrepondo na StewLeonard’s. Um dos enunciados dapolítica da empresa para construirum ambiente colaborativo é provadisso: “Se você está treinando

O pai Stew e os filhos Stew Jr.,Beth, Jill e Tom. Esse é o núcleo daStew Leonard’s Dairy Store, umaempresa familiar. Stew Jr. é opresidente da empresa desde que opai e fundador se aposentou. Bethresponde pelo departamento depanificação à francesa, uma dasestrelas do negócio. Jill cuida daStew Leonard’s University (vejaquadro na página 83). Tom comandaa loja de Danbury. Além disso, mais36 parentes trabalham no negócio.

Os quatro filhos se envolveramna loja de Norwalk desde cedo.Cresceram lá, fazendo de tudo umpouco, desde limpar os recipientesde leite e arrumar prateleiras até sefantasiar de vaquinha leiteira parareceber os clientes. Quando peque-nos, nunca ouviam o pai se queixarde dificuldades do trabalho –ele sófalava das coisas divertidas. Resulta-

Um negócio familiar e divertidodo: ao crescerem, os filhos quiseramse divertir também. Como diz Stew,o pai: “Por que Frank Sinatra seguiucantando por tantos anos? Não pelodinheiro; ele nem conseguiriagastar tudo. Foi pelo prazer. Umempresário também deve fazer algode que goste”.

A mãe Marianne não ficou defora: ela faz o papel de consultoraexterna da Stew Leonard’s. Além deaclamada “professora” de atendi-mento ao cliente –foi ela que disseque se deve dar razão ao clientemesmo quando ele não tem razão–,é a autora da receita do famosobolo de carne (meat loaf) da StewLeonard’s, um dos sucessos daslojas, com mais de 52 toneladasvendidas por ano.

E o futuro? A família esperaque esse seja um negócio para aterceira geração.

“Por que Frank Sinatra seguiu cantandopor tantos anos? Não pelo dinheiro;ele nem conseguiria gastar tudo. Foi peloprazer. Um empresário também devefazer algo de que goste” Stew Leonard

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Uma grande foto pendurada naparede do andar de cima da StewLeonard’s de Norwalk mostra umrapaz andando pela neve paraentregar leite. É Stew Leonard.Desde os 8 anos de idade ele levavade porta em porta o leite produzidona usina do pai, a Clover FarmsDairy, que fora fundada em 1921em Norwalk, Connecticut. Leonardvivia um relacionamento muitopróximo de fornecedor–cliente:ele tinha a chave da porta de váriascasas para entrar e colocar o leite nageladeira.

Em 1952, com 22 anos e jáformado na School of Agricultureda University of Connecticut, seupai morreu. Da noite para o dia, elee o irmão Jim se viram com quatrorotas de entrega de leite em domicí-lio e sete funcionários, e foi assimpor cerca de 15 anos. Um diaapareceram dois engenheiros dogoverno estadual dizendo que iamdesapropriar a propriedade paraconstruir uma rodovia.

O irmão Jim, mais velho, aposen-tou-se e foi viver na Flórida. Ele, aos37 anos, resolveu partir para umnovo negócio. Como a rodoviatinha financiamento federal, pôdetomar um empréstimo de US$ 492,5mil a juros de 5% ao ano e abriruma leiteria –loja para venderapenas os sete produtos que trans-portava no caminhão: leite, creme,manteiga, ovos, pão, suco de laranjae suco de frutas. Sem entrega emdomicílio, ele conseguiria reduzirseu preço do meio galão de 69 centspara 49 cents, o mesmo do super-mercado mais barateiro da região.E vendendo um leite melhor.

Leonard se inspirou na lojinhaque uma usina montara com sucessoem Long Island, nas vizinhanças. Eraa idéia da loja de fábrica levada àsúltimas consequências, pois deixavaa fábrica presente na loja. Assim seiniciava o “show and sell” (exibir evender) que caracteriza a StewLeonard’s até hoje.

A loja abriu as portas em 30 denovembro de 1969. Logo teve de

contratar um segurança para sódeixar entrar uma pessoa quandosaía outra, de tão cheia que ficava.Leite fresco por preço baixo eranovidade na região.

Indo além da dairy store

A expansão da linha de produtosaconteceu por acaso. Após algunsmeses de funcionamento, umgrande caminhão parou em frenteda loja. Trazia 2 mil melancias deSouth Carolina para um cliente,mas o negócio fora cancelado, e omotorista perguntou se Leonard nãoqueria comprar algumas por US$ 2a unidade. Era 2 de julho, dois diasantes de um dos principais feriadosdos EUA, o Dia da Independência.Ele propôs-se a comprar toda a cargapor US$ 1 a unidade, contanto queo caminhão pudesse ficar estaciona-do ali durante o fim-de-semana. Ohomem acabou aceitando e umafaixa foi pendurada: “Melancias–US$ 1 cada. Máximo: 3 por pessoa”.

Vendendo pelo preço de custo,Leonard não teve lucro. Mas ne-nhum cliente saiu da loja naquelefim-de-semana sem três melanciase muito entusiasmo. E quem foicomprar melancias encheu as sacolasde leite, suco de laranja, pão etc. Asvendas subiram significativamente.

Depois do episódio, os freguesespediram outros produtos agrícolase Leonard começou a negociardiretamente com fazendeiros paracomprar batatas, tomates etc. agranel. A seção de carnes foi acresci-da no fim da década de 70, tambéma pedido –a tarefa foi delegada aum profissional da área. A loja deNorwalk teve 26 ampliações aolongo dos anos. Os quatro filhos deLeonard assumiram o negócio e asegunda loja surgiu em 1991, emDanbury, a uma hora de Norwalk,com investimentos de US$ 20milhões. O local foi testado antes,por quatro anos: a empresa vendiahortifrutigranjeiros em uma tendamontada lá. A terceira loja deve seraberta em Yonkers, no Estado deNova York, em setembro próximo.

alguém para ser melhor do quevocê em seu trabalho, você é umadas pessoas mais valiosas de nossaempresa… e uma das mais prováveiscandidatas à promoção”.

Stew Leonard Jr. enfatiza, noentanto, que tão ou mais importanteque o programa de motivação é apolítica de contratação: “Quandoentrevistamos alguém, examinamos,em primeiro lugar, sua personalida-de. Precisamos de pessoas bem-humoradas que gostem de lidarcom gente. O resto se ensina”. Semalegria, diz o presidente da empresa,é quase impossível manter clientesfelizes. Como todos os funcionáriosdas lojas –dos caixas aos seguranças,passando pelas padeiras– atendemmais de 20 clientes por dia, a per-sonalidade de cada um torna-serealmente fator fundamental.

“E” de excelência

Há alguns anos, Stew Jr. estavapara entrar em uma reunião comum eminente consultor empresariale telefonou para o pai a fim de sa-ber se havia algo particularmenteimportante que ele gostaria de verdiscutido.

“Sim. Ontem eu comprei milhopara o jantar e achei que não estavamacio como devia”, respondeu o pai.

Pacientemente, Stew Jr. retrucou:“Pai, não se trata desse tipo de reu-nião. Vamos falar sobre estratégiae marketing. Há alguma coisa real-mente importante que o senhorqueira levantar?”

“Sim. O milho não está macio!”A partir daí, relembra Stew Jr., a

conversa com o consultor discorreusobre como ter um milho maisfresco. “Reorganizamos totalmentenossa logística, o agricultorcomeçou a colher o milho maiscedo e nós começamos a vendermais tarde, a partir das 10h. Antes,o produto já estava na loja às 7hporque trazíamos na noite anterior,mas não era suficientemente bom.”

Essa pequena história do milhoverde é a essência da filosofia daexcelência na Stew Leonard’s. Aempresa decidiu concentrar-se nasmil mercadorias “mais importantespara as pessoas” e vendê-las com

A história da empresa

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o menor preço e a maior qualidadepossível. Para isso, compra dire-tamente dos produtores, eliminan-do os intermediários. Geralmentehá um só fornecedor de cada pro-duto e a compra é feita a granel, emgrandes quantidades –mais de doisterços de suas lojas funcionamcomo área de armazenamento.Com isso, a Stew Leonard’s con-segue preço baixo, o que permitegiro rápido e permite o frescor(e a qualidade) dos alimentos.

Além disso, a Stew Leonard’ssabe que não basta haver excelên-cia; o que importa é a excelênciapercebida. Não por outra razãoé partidária daquilo que foi deno-minado “exibir e vender” (“show andsell”). Os clientes vêem a usina deleite e a padaria em atividadeem cada loja, e isso contribui paraaumentar as vendas.

As lojas Stew Leonard’s dãono todo uma forte impressão dequalidade. Como diz Stew Jr., ospisos são de ladrilho verdadeiro,as tabuletas de madeira verdadeira,as paredes têm azulejos verdadeiros.“A percepção é muito importante.Quando alguém coloca floresfrescas nos toaletes, tanto no femi-nino como no masculino, o clientededuz que deve haver limpeza

na cozinha. Isso é percepção.” A impressão de fartura também

é muito forte na Stew Leonard’s. Ossecos e molhados, por exemplo, sãoexibidos em caixas abertas empilha-das em displays grandes e chamativos.A empresa seguiu, com bom senso,um velho ditado do comércio dosEUA: “Pile them high and watch thembuy” (Empilhe bem alto e fique vendoo pessoal comprar).

Além do feedback dos clientes eda vigilância da direção, há o que sepode chamar de parâmetro daqualidade percebida pelos funcio-nários. O objetivo da empresa é ter

tanta qualidade que, mesmo quan-do uma pessoa deixar de trabalharlá, ela deve querer continuarfazendo compras em suas lojas.

“W” de wow (uau)!

A diversão, o grande diferencialda Stew Leonard’s, deve-se emgrande parte a um capricho dodestino. Em 1967, nas preliminaresdo negócio, Stew Leonard, pai,encontrou o terreno ideal para aloja, parte de uma fazenda juntode uma encosta, mas a proprietárianão queria vender, porque criavaali muitos animais. Ele prometeu

Fundação: 1969 Faturamento total em 1998: US$ 360 milhões Lojas: 2 (Norwalk e Danbury). A terceira está em construção Tamanho das lojas: 115 mil pés quadrados (10,7 mil metrosquadrados) e 200 mil pés quadrados (18,6 mil metros quadrados)

Vendas por pé quadrado: US$ 2.000 (US$ 21.528 por metro quadrado) Índice de crescimento: 15% a 20% ao ano Itens comercializados: 1.000 Clientes: 50 milhões até 1998 Funcionários: 1.300 Itens vendidos: 2,5 milhões por semana

Os números da empresa

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Apesar de ter apenas duas unida-des, a Stew Leonard’s montou umcentro de treinamento próprio: aStew Leonard’s University. Por elapassam todos os funcionários novos,que aprendem sobre a história daempresa e sua filosofia de atendi-mento ao cliente, além de questõestécnicas, como a temperatura certade cozimento e resfriamento, comoprevenir bactérias etc.

Situado no meio do escritórioadministrativo, no segundo andarda loja de Norwalk, o centro serveapenas para treinamento básico,com orientação estabelecida nosmoldes do programa da Disney.Depois dele, há também possibilida-de de treinamento externo financia-do pela empresa, o que depende decada funcionário. Quem se destaca éenviado para o curso Dale Carnegie,um dos mais conceituados na áreade vendas e comunicação nos EUA.

A University foi aberta tambéma pessoas de fora da empresa. Entreos alunos externos encontram-segerentes de IBM, Citibank, AT&T,Kraft, Chase Manhattan e de muitasoutras grandes companhias.

A Stew Leonard’sUniversity

então que manteria as ovelhas, cabrase galinhas bem na frente da loja,para que ela pudesse vê-las da janelade casa. Gostando da idéia de estarperto de seus animais sem precisarcustear sua manutenção, ela aceitou.

Stew, pai, fez na verdade umarápida associação de idéias: lem-brou-se de seus tempos de entre-gador de leite, quando as pessoasdiziam que não havia nada maischato e detestável do que fazercompras de alimentos, e agiu paramudar esse quadro em sua loja.

A fazendinha (The Stew’sLittle Farm) do lado de foraproporcionaria alguma distraçãoaos clientes e às crianças que osacompanhavam. E, desenvolvendoo raciocínio, Stew, pai, colocoufuncionários fantasiados de animaispara oferecer alguma diversãotambém do lado de dentro.

As crianças adoraram, os paisaprovaram. “Ao longo do caminho,aprendemos que aonde vão ascrianças vão os pais”, explica Stew Jr.Tudo começou assim, e evoluiumuito. Hoje a ida a uma loja StewLeonard’s é uma experiência únicano setor varejista norte-americano,que não passa em branco. No pátio,o cliente vê o minizoológico, ondepode admirar, tocar e alimentarvacas, ovelhas, bodes, perus,frangos, patos, gansos e outrosanimais. Em seguida, entra em umprédio que, se por fora parece umimenso celeiro, por dentro é umum corredor único em forma delabirinto –um layout sem-par nosetor, também um feliz acaso dereformas um tanto improvisadas.

O “hall de entrada” é a padariae o aroma dos pães saindo doforno contamina o ambiente –ea visão dos pães saindo do fornoabre o apetite.

Depois, seguindo pelo corredorúnico, o cliente vai tendo surpresas:

assiste, através de janelas de vidro,ao processo de engarrafamentodo leite fresquíssimo;

dá de encontro com umasimpática galinha-robô, um ovo-robô, um pacote de leite integralmecanizado e outros bonecos, quedançam e cantam musiquinhassobre o frescor dos alimentos (é oconjunto “The Farm Fresh Five”);

avista um fazendeiro mecanizadoem tamanho real que canta e falacom as crianças;

Na Stew Leonard’s, o lucro é visto comouma recompensa, não um direito. Deveser o resultado de um bom trabalho

pode experimentar morangos epistaches à vontade em recipientesque transbordam;

conversa com os funcionários; ouve dois cachorros-robôs de mais

de 2 metros de altura que tocammúsica country em banjos etc.

Enfim, o cliente faz compras deforma bem menos tediosa e, seacompanhado de crianças, bemmais tranquila também. SegundoTom Peters, a mágica da StewLeonard’s está justamente em fazerum show em cada canto.

Nas duas lojas, o merchandisingé ostensivo mas simples. Comoacontece na área de padaria,predominam os cenários, os cheirose os sabores. Em geral, os quevisitam a loja pela primeira vezandam pelo corredor devagar –hámuita coisa para distrair a atenção,mesmo se tratando do maisdecidido dos compradores.

Representando o futuro

Diante de tudo isso, não é desurpreender que alguns dosfregueses da Stew Leonard’s sejamde localidades a até 80 quilômetrosde distância e que suas lojas tenhamse tornado autênticas atraçõesturísticas do Estado de Connecticut.Tampouco surpreendem as vendas,o ritmo de crescimento da empresa eseu faturamento recorde por péquadrado (veja quadro na página 82).

Aliás, a loja de Norwalk entroupara o Guinness Book of Records em1992 como a de maior faturamentopor unidade de área nos EstadosUnidos e foi registrada no Ripley’sBelieve It or Not! (Acredite se Quiser)como a maior loja de laticíniosdo mundo. Além disso, o FoodMarketing Institute constatouque seu setor de padaria vende20 vezes mais do que qualqueroutro localizado dentro de lojanos EUA.

Varejistas como a famíliaLeonard representam o futuro.Pensam na experiência queoferecem e não vêem o lucro comodireito, mas como recompensa.“O lucro é o resultado de um bomtrabalho”, como diz o fundadorStew Leonard.