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 1 A FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL E A QUESTÃO REGIONAL A sair no livro “50 anos da FEB”, em 2009, p ela Ordem dos Economistas do Brasil Leonardo Guimarães Neto Carlos Antonio Brandão Introdução A dimensão continental do País; a unidade territorial construída na sua formação econômica e  política sobre uma grande diversidade social; a grande heterogeneidade de sua economia; o tempo histórico diferenciado da formação, consolidação e declínio ou transformação dessas economias regionais, constituindo-se no “arquipélago regional (expressão de Francisco de Oliveira) que foi  posteriormente articulado e integrado , constituem, certament e, campo propício para o surgimento de agudas “questões regionais” e, em decorrência, de estudos que buscam compreender a lógica do desenvolvimento e das relações entre essas várias economias espaciais que constituem uma só economia nacional. O poeta João Cabral de Melo Neto ao se referir a este contexto sintetizou, em uma frase, a  problemática regional brasileira: “O Brasil é o Império britânico de si mesmo, e sem dispersão”. Está subjacente no poema Conversa em Londres, 1952 a percepção das diferenças econômicas, culturais e políticas, das revoltas que tinham como objetivo maior autonomia e até a independência das economias regionais, que marcaram a história do Brasil, bem como críticas às relações  prevalecentes entre as regiões 1 . É sobre a influência dessa realidade heterogênea e complexa que no Brasil, antes e depois de Celso Furtado, consolidou-se uma enorme literatura sobre a questão regional que se desenvolveu nas mais variadas dimensões: política, geográfica, histórica, social, sociológica, econômica, cultural, etc. A contribuição de Celso Furtado constituiu um marco na produção de estudos sobre a questão regional brasileira, a partir do final dos anos 50, quando surgiram a  Formação Econômica do Brasil , Uma Política para o Desenvolvimento Econômico do Nordeste e Operação Nordeste, todos os três em 1959. Além disso, deve-se considerar que, antes, em 1957, em conferências em curso de treinamento em problemas de desenvolvimento, publicado posteriormente no livro  Perspectiva da Economia Brasileira , em diversas oportunidades, Celso Furtado aborda temas relacionados com a questão regional brasileira. O primeiro dos textos referidos,  Formação Econômica do Brasil , a obra magna de Celso Furtado, permite várias leituras a das raízes do subdesenvolvimento brasileiro e da sua industrialização, a da formação do mercado interno e do mercado de trabalho, a da análise comparativa da formação econômica brasileira e norte-americana, a das questões associadas aos  problemas da industrialização e dos desequilíbrios externos da periferia, a do papel do Estado no  processo de industrialização – entre as quais a leitura da gênese e consolidação das grandes diferenças regionais no desenvolvimento brasileiro, desde o período colonial. Os dois últimos trabalhos citados, Uma Política para o Desenvolvimento Econômico do  Nordeste e Operação Nordeste constituem os textos básicos que muito influenciaram a criação do CODENO (Conselho de Desenvolvimento do Nordeste) e, posteriormente, da SUDENE que, dirigida por Celso Furtado, até 1964, deu início à implantação da política voltada para o desenvolvimento regional. Ainda durante a fase de superintendente da SUDENE, em dois trabalhos, 1  Celso Furtado, em uma das suas últimas obras, assinala que na primeira me tade do século XIX, houve revoltas, abertas ou veladamente separatistas, em nove províncias incluídas entre elas as de maior contingente de população (Furtado, 1999: 105).

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A FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL E A QUESTÃO REGIONAL

A sair no livro “50 anos da FEB”, em 2009, pela Ordem dos Economistas do Brasil

Leonardo Guimarães NetoCarlos Antonio Brandão

Introdução

A dimensão continental do País; a unidade territorial construída na sua formação econômica e política sobre uma grande diversidade social; a grande heterogeneidade de sua economia; o tempohistórico diferenciado da formação, consolidação e declínio ou transformação dessas economiasregionais, constituindo-se no “arquipélago regional (expressão de Francisco de Oliveira) que foi posteriormente articulado e integrado, constituem, certamente, campo propício para o surgimento deagudas “questões regionais” e, em decorrência, de estudos que buscam compreender a lógica dodesenvolvimento e das relações entre essas várias economias espaciais que constituem uma sóeconomia nacional.

O poeta João Cabral de Melo Neto ao se referir a este contexto sintetizou, em uma frase, a

 problemática regional brasileira: “O Brasil é o Império britânico de si mesmo, e sem dispersão”.Está subjacente no poema Conversa em Londres, 1952 a percepção das diferenças econômicas,culturais e políticas, das revoltas que tinham como objetivo maior autonomia e até a independênciadas economias regionais, que marcaram a história do Brasil, bem como críticas às relações prevalecentes entre as regiões1.

É sobre a influência dessa realidade heterogênea e complexa que no Brasil, antes e depoisde Celso Furtado, consolidou-se uma enorme literatura sobre a questão regional que se desenvolveunas mais variadas dimensões: política, geográfica, histórica, social, sociológica, econômica,cultural, etc.

A contribuição de Celso Furtado constituiu um marco na produção de estudos sobre aquestão regional brasileira, a partir do final dos anos 50, quando surgiram a  Formação Econômica

do Brasil , Uma Política para o Desenvolvimento Econômico do Nordeste e Operação Nordeste,todos os três em 1959. Além disso, deve-se considerar que, antes, em 1957, em conferências emcurso de treinamento em problemas de desenvolvimento, publicado posteriormente no livro  Perspectiva da Economia Brasileira, em diversas oportunidades, Celso Furtado aborda temasrelacionados com a questão regional brasileira.

O primeiro dos textos referidos,  Formação Econômica do Brasil , a obra magna de CelsoFurtado, permite várias leituras – a das raízes do subdesenvolvimento brasileiro e da suaindustrialização, a da formação do mercado interno e do mercado de trabalho, a da análisecomparativa da formação econômica brasileira e norte-americana, a das questões associadas aos problemas da industrialização e dos desequilíbrios externos da periferia, a do papel do Estado no  processo de industrialização – entre as quais a leitura da gênese e consolidação das grandesdiferenças regionais no desenvolvimento brasileiro, desde o período colonial.

Os dois últimos trabalhos citados, Uma Política para o Desenvolvimento Econômico do Nordeste e Operação Nordeste constituem os textos básicos que muito influenciaram a criação doCODENO (Conselho de Desenvolvimento do Nordeste) e, posteriormente, da SUDENE que,dirigida por Celso Furtado, até 1964, deu início à implantação da política voltada para odesenvolvimento regional. Ainda durante a fase de superintendente da SUDENE, em dois trabalhos,

1 Celso Furtado, em uma das suas últimas obras, assinala que na primeira metade do século XIX, houve revoltas, abertasou veladamente separatistas, em nove províncias incluídas entre elas as de maior contingente de população (Furtado,1999: 105).

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o referido autor centra suas preocupações na questão regional nordestina. Em 1962, com a  Pré-revolução Brasileira e, em 1964, com Dialética do Desenvolvimento.

Durante o exílio e em fases posteriores, na sua volta ao país, Furtado retorna ao tema daquestão regional, centrando, grande parte dos seus trabalhos, no exame das transformaçõesocorridas no Nordeste, numa avaliação críticas das políticas regionais e, ao mesmo tempo, re-

visitando, em livro de memória (  Fantasia Desfeita), a sua experiência de estudo da questãonordestina e de criação e implantação da estrutura administrativa responsável pela implantação da política regional para o desenvolvimento do Nordeste.

Esta retomada dos estudos regionais, posterior ao golpe militar que cassou seus diretos políticos, está presente em vários capítulos de livros publicados sobre a economia nacional, entre osquais (i) O Brasil Pós-“Milagre”, de 1981, em sua terceira parte (O Nordeste) com capítulos sobre  Diretrizes de uma Política de Desenvolvimento e   Alternativas Institucionais; (ii)   A Nova Dependência, de 1982, com o capítulo O Nordeste: Novo Modelo de Desenvolvimento?; (iii)Cultura e Desenvolvimento em Época de Crise, de 1984, com um capítulo:  Nordeste: Reflexões sobre uma Política Alternativa de Desenvolvimento; (iv) A Fantasia Desfeita, de 1989, que registroda experiência nordestina de concepção e implantação de políticas regional de desenvolvimento e(v) Seca e Poder – Entrevista com Celso Furtado, de 1998.

  Neste capítulo, após analisarmos as contribuições de Celso Furtado em seu texto maisconhecido de 1959 e nas partes de seus livros posteriores que trataram da questão regional brasileira, abordaremos as contribuições de outros autores que, entendemos, seguiram, mais diretaou indiretamente, as questões e problemáticas e/ou a base teórico-analítica concebidas eestruturadas por este grande cientista social.

Formação Econômica do Brasil

Começando pela  Formação Econômica do Brasil 2, de 1959, o que se deve assinalar é que na sualeitura sobre a questão regional, ao redefinir – como destaca Francisco de Oliveira – a tradicional  periodização da histórica econômica brasileira a partir dos “ciclos” de produtos voltados para a

exportação, Celso Furtado examina as diferentes fases da evolução econômica até aindustrialização, e, simultaneamente, explicita as características fundamentais das economiasregionais, em suas estruturas diferenciadas, em suas relações de produção e em sua dinâmica. Emoutras palavras, o livro é trabalhado, simultaneamente, em uma (i) dimensão temporal na qual, ao passar pelos diferentes ciclos, é explicitado o gradativo aumento da complexidade e diversificaçãoda economia, até a consolidação da industrialização, e em (ii) uma dimensão regional/espacial naqual são descritas para cada uma das mais relevantes economias regionais a sua estrutura e suadinâmica. Assim são tratadas, entre outras, as chamadas “economia escravista de agriculturatropical”, a “economia escravista mineira” e a “economia cafeeira”.

Em cada uma das economias regionais é explicada a sua evolução: gestação, o auge, acontração ou regressão e as saídas e transformações, com a superação da estrutura precedente. Destaforma é construído um painel no qual para as distintas economias regionais, cada vez mais

articuladas, são explicitadas suas diferenças quanto à estrutura, quanto à capacidade de evoluir nosentido da industrialização e quando as formas de relacionamento que mantêm entre si.

  No que se refere à “economia escravista de agricultura tropical” vale o destaque para osignificado da organização que está por trás da consolidação do grande empreendimento colonial de produção de açúcar que contou entre os determinantes do seu êxito desde a experiência técnica e

2 Furtado, (2000). As citações que seguem da   Formação Econômica do Brasil referem-se à 27ª edição da Editora Nacional e Publifolha, publicada no ano 2000.

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comercial dos portugueses nas ilhas do Atlântico, à contribuição comercial e financeira dosholandeses e ao conhecimento e domínio dos portugueses no mercado africano de escravos. Esteempreendimento de grande êxito teve seu sucesso garantido enquanto permaneceu, da perspectivaeconômica, o seu monopólio e, da perspectiva política, as relações de forças na Europa. Já nasegunda metade do século XVII, a desorganização do mercado e a forte concorrência tiveramimpactos negativos significativos que o induziram a longos períodos de estagnação embora com

  preservação de sua estrutura. A este respeito, afirma o autor que essa economia localizada no Nordeste e voltada para a exportação resistiu “mais de três séculos às mais prolongadas depressões,logrando recuperar-se sempre que o permitiam as condições do mercado externo, sem sofrer nenhuma modificação estrutural significativa” (p. 56). Os novos produtos de exportação quesurgiram no decorrer da sua história econômica (algodão, cacau), o processo de urbanização e amaior complexidade da sua economia não mudaram os seus aspectos fundamentais.

Para compreensão da estrutura dessa economia regional, que comporta o segmentoexportador de alta produtividade e sua projeção numa atividade de subsistência centrada na  pecuária, vale o destaque para a descrição do “complexo econômico nordestino”, na qual CelsoFurtado, ao mostrar as estreitas relações que mantêm os dois sistemas – o açucareiro e o criatório –,ressalta, logo no início da sua análise, que “As formas que assumem os dois sistemas da economianordestina .... no lento processo de decadência que se inicia na segunda metade do século XVII,constituem elementos fundamentais na formação do que no século XX viria a ser a economia  brasileira” (p. 63). Essa idéia da permanência das estruturas, sobretudo em relação à economianordestina, é retomada em 1989, na primeira parte do livro de memória  Fantasia Desfeita, quandodestaca (p. 15) que: “É difícil exagerar com respeito ao Nordeste do Brasil. Aí tudo escapa aexplicações fáceis. A sociedade não é fruto nem de conquista nem de um projeto de colonização.Desde os seus primórdios, tudo se apresenta como definitivo, com os traços básicos que persistiriam por séculos” (Furtado, 1989).

Segundo o referido autor, está na forma como a produção açucareira e a pecuária searticulam a explicação para o comportamento ou evolução no longo prazo da economia nordestina.  Na faixa litorânea, a economia açucareira, estreitamente dependente dos fluxos e refluxos dademanda externa, nas fases de declínio, sem capacidade para amortizar seu capital – inclusive a

mão-de-obra escrava considerada como tal – reduzia seus custos e liberava a mão-de-obra nãoescrava, alimentando o sistema de subsistência que a absorvia e continuava sua expansão a níveisextremamente baixos de produtividade. Deste modo, a dinâmica do complexo econômiconordestino ocorria a partir do sistema de menor produtividade. Ressalta Celso Furtado, a esterespeito, na  Fantasia Desfeita: “Assim, com o tempo, o segmento de mais baixa produtividade iaaumentado sua importância econômica relativa” (p. 16).

A conjugação de um complexo econômico, com uma grande desigualdade de renda e comuma enorme capacidade de absorver, mesmo com estagnação ou redução da produtividade, oexcedente da população, que não podia ser ocupada na produção voltada para a exportação, e olongo processo de atrofiamento da economia, consolidou uma estrutura produtiva cujos traçoscoloniais estiveram presente durante vários séculos, quase imunes às transformações econômicas,sociais e políticas pelas quais passou o Brasil desde a colônia à República..

Com relação à “economia mineira escravista”, cabem referências do autor a respeito dosignificado econômico – para a Metrópole e para a colônia, numa fase de “prostração e pobreza” pela qual passavam no final do século XVII – que teve a exploração do ouro numa vasta área que iada Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, à região de Cuiabá, no Mato Grosso, passando por Goiás. Além disso, assinala a importância do fato de que a atividade de mineração implicou odeslocamento espacial do centro econômico, possibilitando uma articulação das regiões e seu  povoamento. Vale, neste particular, o destaque para o novo ciclo migratório europeu, dadas asoportunidades econômicas oferecidas para os que dispunham de poucos recursos, e para a grande

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dependência que esta economia especializada tinha de fornecedores externos, sejam produtores dealimentos, seja de animais de transportes. Com relação à demanda de animais, seu impacto ocorreuem relação à pecuária do Sul, ao criatório do Nordeste que se desloca tendo em vista a proximidadedo mercado representando pela nova atividade em expansão, e em relação ao gado do Mato Grosso.As distâncias das regiões de mineração do litoral teriam contribuído para profundas impactoseconômicos nas regiões vizinhas, sobretudo em decorrência do complexo sistema de transporte

exigido para atender a demanda das áreas de produção de ouro3.  No que se refere à sua organização, embora tendo por base o trabalho escravo, essa

economia se diferenciava da economia açucareira em razão da menor participação da dessa população no total da força de trabalho e do fato de que a sua forma de utilização permitiu maior iniciativa aos escravos. Por outro lado, as possibilidades que tinham os homens livres eram bemmaiores que na economia nordestina, dada a menor necessidade de capitais para iniciar a atividade.Com relação ao seu dinamismo, cabe registrar que, iniciada nos primeiros anos do século XVIII, talatividade alcança o seu apogeu entre 1750 e 1760, para vinte anos depois registrar declíniosignificativo do nível de exportação.

Em razão de não haver criado formas permanentes de atividade econômica, a não ser alguma agricultura de subsistência, as regiões mineiras, com a redução da produção de ouro, entram

em “uma rápida e geral decadência”. A desagregação das empresas, a impossibilidade de reposiçãoda mão-de-obra escrava, a transformação dos empresários de lavras em simples faiscadores, a lentadestruição dos ativos dos que persistiam são os sintomas marcantes de um “sistema que se ia assimatrofiando, perdendo vitalidade, para finalmente desagregar-se numa economia de subsistência” (p.89). Constata Furtado, ainda, que uma população que viria a se constituir o principal núcleodemográfico do país, expandir-se-á, em seguida, num contexto de atrofiamento da economiamonetária, desarticuladamente, trabalhando a níveis baixos de produtividade. Conclui: “Emnenhuma parte do continente americano, houve um caso de involução tão rápida e tão completa deum sistema econômico constituído por população principalmente de origem européia” (p. 90)

A “economia cafeeira” é examinada em capítulos que integram as duas partes da Formação  Econômica do Brasil (  Economia de Transição para o Trabalho Assalariado e   Economia deTransição para um Sistema Industrial ), considerando sua gestação, os problemas da mão-de-obra, acrise da economia cafeeira, os mecanismos de defesa e o deslocamento do centro dinâmico.Inicialmente trata das mudanças ocorridas na economia nacional – que vivia um processo deletargia a partir da regressão econômica da mineração –, provocadas pelo surgimento da economiacafeeira no final do século XVIII e início do século XIX. Destaca, então, que tal economia utilizarecursos pré-existentes e subutilizados, resultantes da desagregação da economia mineira, sobretudomão-de-obra. Não obstante este fato, reconhece que essa economia foi montada sobre novas bases,notadamente pelo surgimento de uma nova classe empresarial que, diferentemente da classe quecomandava a economia nordestina, era capaz de decidir sobre os aspectos fundamentais do processoeconômico, notadamente o da comercialização. Com consciência clara dos seus próprios interesses,essa nova classe vai encaminhar soluções para viabilizar sua atividade, inclusive o problema damão-de-obra, e utilizar o governo como instrumento de política para concretização dos seusinteresses. Ao fazer essa afirmação o autor adverte que o que singulariza os produtores de café não

3 “A economia mineira abriu um novo ciclo de desenvolvimento para todas elas [refere-se a economia de subsistência dePiratininga, e à economia pecuária do Rio Grande do Sul e Mato Grosso]. Por um lado elevou substancialmente arentabilidade da atividade pecuária, induzindo a uma utilização mais ampla das terras e dos rebanhos. Por outro lado, fezinterdependentes as diferentes regiões, especializadas umas na criação, outras na engorda e distribuição e outrasconstituindo os principais mercados consumidores. É um equívoco supor que foi a criação que uniu essas regiões. Quemas uniu foi a procura de gado que se irradiava do centro dinâmico constituído pela economia mineira” (Furtado, 2000: 81).Essa idéia é enfatizada no resumo da   Formação Econômica que o autor faz no seu livro de memória a  FantasiaOrganizada: “É graças a este núcleo de mercado interno, para onde aflui a produção de outras regiões, que começa aemergir a matriz de um economia nacional” (Furtado, 1985: 207).

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é o fato de controlar o governo, mas o fato de saber utilizá-lo para alcançar fins bem definidos deuma política.

Tendo solucionado o problema da mão-de-obra a partir do trabalho assalariado, em fase  posterior de sua consolidação, do que decorre uma bem melhor distribuição de renda que nasatividades anteriores, a presença de um significativo mercado interno passa a ser uma característica

marcante dessa nova atividade. Por essa razão, na  Fantasia Organizada Celso Furtado volta aenfatizar esse aspecto ao afirmar que: “A emergência de um importante fluxo de renda sob a formade salários traduzia uma mudança qualitativa na estrutura econômica existente. O antigo binômioeconomia de exportação–economia de subsistência era substituído por outro: economia deexportação–economia de mercado interno” (p. 211).

É a partir da identificação dessa estrutura e organização produtiva que Celso Furtadoexplica, com base em um conjunto complexo de interações, como tem lugar o processo deindustrialização e o “deslocamento do centro dinâmico” da economia nacional. Nessa explicaçãosão destaques a política de defesa da produção cafeeira, os mecanismos de defesa da atividade produtiva na Grande Crise com as políticas que constituíram um “verdadeiro programa de fomentoda renda nacional” (p. 205) por intermédio, sobretudo, da formação e destruição de estoques de cafée o efeito multiplicador desses investimentos, o uso ativo da política cambial através da

desvalorização da moeda nacional. Agregue-se a isto o desequilíbrio externo que tal política provoca numa economia, como a brasileira que não dispunha de divisas para atender as importaçõesdecorrentes da renda gerada na política de defesa da economia do café. Neste ponto Celso Furtadoformula a indagação da maior relevância: “Que destino tomava essa renda, que, devendo ser despendida no exterior em importações, ficava represada dentro do país pelo mecanismo corretor da  baixa no referido coeficiente [de importação]?” (p. 208). Sua resposta: pressionar os produtoresinternos, pois “grande parte da procura por importações se contraia com a alta relativa dos preços”(p. 209). Com isto é criado na economia nacional, através das melhores oportunidades oferecidas, osetor que produzia para o mercado interno que passa a ter a preponderância no processo deformação de capital. A agricultura e sobretudo a indústria voltadas para a demanda internarecuperam-se e registram avanços significativos após a Grande Crise, inclusive através dadiversificação produtiva nas atividades industriais. Além do “deslocamento do centro dinâmico”, de

grande significado para a economia nacional, há que considerar que o comportamento da regiãocafeeira, diferentemente das demais, não deu lugar a uma regressão ou involução, traduzida numretorno, relativo, à economia de subsistência, mas a um processo de diversificação produtiva4.

Além dessas economias regionais e suas trajetórias, Celso Furtado, na  Formação  Econômica do Brasil apresenta análises específicas sobre o Maranhão, a Amazônia e destacaaspectos significativos da articulação comercial e da estrutura produtiva da economia porçãomeridional e do Centro-Oeste do país.

 No capítulo final, ao ressaltar o fato de que o desenvolvimento da economia brasileira, da perspectiva regional, apresenta-se como um processo de articulação das distintas regiões em um  sistema com o mínimo de integração (p. 248), Furtado destaca, também, as desigualdadesexistentes, os impactos diferenciados da articulação ocorrida a partir da formação do mercado

interno, e conclui que se, na metade do século XX, “a economia brasileira havia alcançado um certograu de articulação entre as distintas regiões, por outro a disparidade de níveis regionais de rendahavia aumentado notoriamente. Na medida que o desenvolvimento industrial se sucedia à prosperidade cafeeira, acentuava-se a tendência à concentração da renda” (p. 249). A evolução emfases distintas das economias regionais com os seus movimentos (formação, auge e crise) foi

4 “Assim como a segunda metade do século XIX se caracteriza pela transformação de uma economia escravista degrandes plantações em um sistema econômico baseado no trabalho assalariado, a primeira metade do século XX estámarcada pela progressiva emergência de um sistema cujo principal centro dinâmico é o mercado interno” (Furtado, 2000:245).

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constituindo as “ilhas” do arquipélago brasileiro até que, através do processo de industrialização,elas se articulam num sistema, ainda, pouco integrado.

Esta análise apresentada por Celso Furtado na  Formação Econômica do Brasil constitui amatriz da concepção moderna da questão regional brasileira que influenciará inúmeros estudos, pesquisas e propostas de intervenção no ano de sua publicação e nos anos posteriores, como se verá

mais adiante.Outras Contribuições de Celso Furtado antes do Exílio

  No mesmo ano em que aparece a Formação Econômica são publicados dois trabalhos de CelsoFurtado que vão ter importância fundamental no aprofundamento do conhecimento sobre a questãoregional nordestina e em uma das maiores intervenções governamentais de política regional: Uma Política de Desenvolvimento Econômico para o Nordeste5 e Operação Nordeste6 . Antes porém, emestudos anteriores a 1959, Furtado examinou a questão regional do País. Cabe mencionar uma sériede conferências realizadas no segundo semestre de 1957 em curso patrocinado pela CEPAL, peloentão BNDE, além de outras instituições, que foram publicadas no livro de sua autoria  Perspectivada Economia Brasileira, em 1958 e, em segunda edição, em 1960.

 Na   Perspectiva da Economia Brasileira7 , cujo objetivo é “equacionar o problema de

desenvolvimento da economia brasileira em sua etapa atual”, há uma parte relacionada com ummodelo interpretativa da economia e outra voltada para uma política sistemática dedesenvolvimento. A questão regional é tratada, já no primeiro capítulo, a partir de umaregionalização que identifica um vazio econômico e demográfico (Amazônia) e dois sistemaseconômicos autônomos: o nordestino (do Ceará à Bahia) e o sulino (de Minas Gerais ao Rio Grandedo Sul). As características marcantes do sistema nordestino eram, na sua visão, os baixos níveis derenda, a descontinuidade de sua articulação econômica interna, a ausência de condições de gerar espontaneamente poupança necessária para crescer e uma classe capitalista (comerciantes em geral)com reduzida propensão a investir produtivamente na economia. O sistema sulino, relativamenteintegrado, com maior nível de renda, recebe seus dinamismo do núcleo ligado ao comérciointernacional e do núcleo industrial. A sua produtividade média e as dimensões absolutas domercado interno chegaram a nível elevado que permitia ao sistema condições para impulsionar o

 próprio crescimento.  No capítulo específico sobre as disparidades regionais, o autor volta a insistir que a

economia nacional é constituída de sistemas autônomos e com distintas potencialidades, e assinalaque seria um equívoco pensar que tal problema seria resolvido espontaneamente ou concentrandorecursos apenas nas regiões de maior potencialidades. Destaca a necessidade de amplo programa decolonização para ocupar os excedentes demográficos, notadamente do Nordeste, mas chama aatenção para o fato de que isto não é suficiente. É necessário que nas regiões de escassos recursossejam definidas ações para que sua utilização seja mais eficiente. Aproveitar a dinâmica de regiõesem expansão no interior do país seria um caminho a ser percorrido por economias regionais como anordestina e para isto é necessário dar condições para sua implantação através da modernização dainfra-estrutura. No entanto, ao lado dessas questões existe uma fundamental a ser considerada que éa relação com as demais regiões, pois o Nordeste não é uma economia independente, e está inseridanum contexto de um único sistema monetário e fiscal. Sem poder proteger-se por tarifas, um processo de industrialização do Nordeste terá que tirar vantagens de sua mão-de-obra abundante ede reorganização da agricultura, sobretudo para abastecer o mercado local. Reside na escassez deterras e na deformação resultante da monocultura latifundiária o problema mais relevante para o

5 Esse trabalho, de autoria de Celso Furtado, conforme relato na  Fantasia Desfeita, ficou conhecido como Relatório doGTDN . (Ver GTDN, 1967)6 Furtado, 1959.7 Furtado, 1960.

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desenvolvimento da região. No caso da Amazônia assinala que o encaminhamento de sua soluçãoestá fora “do alcance de qualquer economia em nossos dias” (p. 62), no entanto, é necessárioidentificar nessa economia segmentos produtivos capazes de serem utilizados no curto e médio prazo.

Muitos dos temas considerados nos capítulos referidos da   Perspectiva da Economia

 Brasileira, voltaram a ser tratados nos textos que alimentaram a política de desenvolvimento do Nordeste, a partir do final dos anos 50, comandada pelo próprio Celso Furtado, na SUDENE. Neste  particular, é importante lembrar as linhas básicas do diagnóstico e das propostas contidas no Relatório do GTDN . Nele, afirma a seu respeito Francisco de Oliveira, todas as “teses cepalinasestão de volta agora na moldura nordestina”8. Em quatro páginas na introdução, Furtado resume ostraços básicos do diagnóstico e da proposta de ação a ser adotada na política regional. Vale lembrar que este texto teve influência marcante nos planos da SUDENE (quatro planos diretores aprovados pelo Congresso) e nos programas e estratégias que os sucederam, tanto no período anterior ao golpede 1964, como no regime militar 9.

  No que se refere ao diagnóstico, em primeiro lugar há o reconhecimento de que adisparidade de renda entre o Nordeste e o Centro-Sul constitui o mais grave problema a ser enfrentado. Some-se a isto o fato de o ritmo de crescimento nordestino ter sido inferior ao do

Centro-Sul e o reconhecimento do caráter cumulativo e de difícil reversão de tal processo. Dessadiferença decorre o agravamento produzido pelas próprias políticas de desenvolvimento pois, àscausas estruturais profundas do atraso nordestino – escassez de terras, irregularidade das chuvas,concentração da renda na economia açucareira e predomínio da agricultura de subsistência nointerior – somam-se os efeitos decorrentes da política de industrialização, notadamente as medidasde controle das importações e aos impactos decorrentes das transferências de renda do Nordeste emrelação ao Centro-Sul associados às relações inter-regionais e internacionais dessas regiões.Relativamente ao duplo fluxo de renda – o do setor público em favor do Nordeste e dos capitais privados desta região para o Centro-Sul – é importante considerar os diferentes efeitos econômicos:as transferências realizadas pelo setor público estavam voltadas para obras assistenciais e as dosetor privado dirigidas para investimentos produtivos fora da região.

Segue, ainda no diagnóstico, o reconhecimento de que a dinâmica do Nordeste decorria dosetor exportador que não se tem mostrado capaz de induzir a economia a acompanhar a do Centro-Sul. Some-se a isto os prejuízos decorrentes da política cambial adotada. Há que considerar que osetor público gasta mais no Nordeste do que arrecada, não obstante, ao lado da natureza dos gastos,  predominantemente, associados a objetivos assistenciais, deve-se levar em conta o caráter regressivo do sistema tributário nacional. Como nem sempre estão presentes oportunidades paradinamizar a economia através das exportações, o desenvolvimento só e factível através dadiversificação da produção via industrialização. Sem prejuízo das exportações, esse é o caminho aser seguido, sobretudo quando se considera o alto nível de desemprego e subemprego existente noscentros urbanos nordestinos. Há que considerar, além disso, a economia do semi-árido – umcomplexo de pecuária extensiva e agricultura de subsistência –, sujeita a colapso na sua produção de

8 Oliveira, 2003: 22. O autor se referia entre as teses cepalinas a da deterioração dos termos de intercâmbio entre o Nordeste e o Centro-Sul, a tese de que a política nacional de comércio exterior (cambial e tarifária) penalizava o Nordestee a teses de que a região só sairia da situação de periferia e só venceria o subdesenvolvimento através de um processo deindustrialização.9 Algumas frases de Celso Furtado ajudam a compreender a sobrevivência do Relatório do GTDN : “O texto foi concebidoe redigido por mim....Mas evitei assiná-lo ... Foi distribuído entre os presentes na reunião do Palácio do Catete... Estátática de apresentação foi providencial para sua sobrevivência quando caíram sobre nós os dias sombrios da ditaduramilitar e que me cassou os direitos e tornou “suspeito” tudo que contivesse o meu nome... Desligado do nome do seuautor, pôde ele continuar a exercer sua função de desvelador da realidade nordestina, enterrando as falácias quesecularmente serviram para justificar a utilização de dinheiro publico na perpetuação de estruturas anacrônicas e anti-sociais” (Furtado, 1989: 56).

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alimentos, com as secas que assumem a dimensão de uma calamidade social, por alcançar ossegmentos sociais mais frágeis da região. Neste caso, as medidas devem considerar uma reavaliaçãodas políticas que vêm sendo adotadas, que não mudaram os dados gerais do problema das secas efixaram, em condições vulneráveis, excedentes demográficos crescentes no semi-árido10.

 No que se refere à proposta do Plano de Ação quatro foram os pontos fundamentais. Um

  primeiro associado à criação de centro autônomo de produção manufatureira através daintensificação dos investimentos industriais. Outro, à transformação da agricultura da “faixa úmida”orientando-a para a produção de alimentos para os centros urbanos nos quais deveria ocorrer aindustrialização. O terceiro, voltado para o semi-árido, que contempla a transformação progressivada sua economia através da elevação da produtividade e redução da sua vulnerabilidade ao impactodas secas. Finalmente, o quarto objetivo está associado ao conjunto de ações voltadas para odeslocamento da fronteira agrícola regional, notadamente nas terras úmidas maranhenses queabsorveriam os excedentes populacionais decorrentes da reorganização do semi-árido.

Muitos dos analistas que avaliaram o referido documento ressaltaram a relevância da visãofornecida sobre os problemas do semi-árido. O próprio Celso Furtado, na Fantasia Desfeita procedea uma avaliação ao assinalar que: “Um diagnóstico preciso da problemática da região semi-áridaconstitui um dos pontos fortes do documento. Complexo da pecuária extensiva e agricultura de

subsistência, a economia dessa região opera como uma armadilha para reter um excesso de população que somente sobrevive porque o governo federal a assiste periodicamente” (p. 55).

O texto que tem como título Operação Nordeste, também de 1959, é um documento queregistra a exposição e o debate realizado (13-06-1959) na sede do ISEB (Instituto Superior deEstudos Brasileiros). Começa assinalando que no país se repetem as relações e as diferençasencontradas entre os países industrializados e os produtores de produtos primários, que tendem a seinstitucionalizar e consolidar formas de exploração das quais resultem conflitos econômicos e políticos capazes de comprometer o desenvolvimento do país. Que a “Operação Nordeste” partedessa perspectiva e da percepção de que há um agravamento das disparidades entre as regiões e que podem tornar-se irreversível e comprometer a unidade nacional a partir do antagonismo de gruposregionais. Descendo aos aspectos operacionais, ressalta a insuficiência administrativa atual e oencaminhamento que pretende dar através da SUDENE e do seu caráter renovador, e volta aexplicitar a gênese do problema do Nordeste:é a mais extensa área de todo Hemisfério Ocidental demais baixo desenvolvimento, sua organização produtiva permitiu crescimento da população mesmocom baixa produtividade, suas melhores terras foram apropriadas pela monocultura em atividadeque favorece o latifúndio que determinaram a maneira como evoluiu a economia açucareira e sua  baixa capacidade de absorção da mão-de-obra, num contexto de alta concentração de renda. O povoamento do seu interior, a partir da pecuária, ao saturar o agreste, expande-se cada vez mais nadireção do semi-árido, região sujeito à incidência da seca, que passa a ser responsável pela produção de alimentos. “Em linhas gerais, foi este o processo de formação histórica da economianordestina: quando as exportações do açúcar perderam o impulso de crescimento, esgotou-se todaforça dinâmica do sistema que se revelou incapaz de propiciar a transição automática para aindustrialização” (p. 24). No que se refere ao plano de ação, Celso Furtado faz referência ao Relatório do GTDN , e cita os pontos fundamentais, anteriormente resumidos.

10 Vale aqui registrar observação de Francisco de Oliveira a respeito do Relatório do GTDN : “... Furtado resolve de formaadmirável a velha queixa regionalista do atraso do Nordeste em relação ao Centro-Sul emoldurando-a num quadro maisamplo e racionalizando-a: sim, os nordestinos tinham razão em suas queixas, mas eram outras as causas. A causa

  principal, desde logo, residia na arcaica estrutura agrária, que produzia simultaneamente excedentes populacionais quemigravam para o Centro-Sul e uma economia extremamente vulnerável ... A economia do Nordeste era viável, seu

 permanente saldo de divisas utilizadas pelo Centro-Sul para pagar as importações o demonstravam. Reforçar a viabilidadeda economia do Nordeste significa simultaneamente atacar a estrutura agrária e promover uma vigorosa política deindustrialização ...” (Oliveira, 2003: 21).

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Durante o período que passou como superintendente da SUDENE, Celso Furtado em duasoportunidades voltou a tratar, em livros, da questão regional nordestina. Uma no meio de suagestão, em 1962, com a  Pré-Revolução Brasileira, e outra, em 1964, nos meses finais à frente dareferida instituição, com Dialética do Desenvolvimento.

A Pré-revolução Brasileira (Furtado, 1962) constitui um livro dedicado aos universitários,

numa fase em que o autor assinala que o país passa por transformações da maior relevância e que,em decorrência dessas modificações estruturais aumentou a exigência de maior eficácia dasdecisões no plano da política econômica do que resultam maiores responsabilidades na definição deobjetivos e estratégias. Ao abordar as questões associadas à pré-revolução brasileira, às reformas de base, ao subdesenvolvimento, ao estado democrático, Celso Furtado reserva um capítulo para tratar do problema do Nordeste. Nele, retoma questões anteriormente consideradas nas suas análises quefundamentaram a política regional e incorpora experiência na direção da política dedesenvolvimento voltada para o Nordeste.

Refere-se inicialmente aos indicadores sociais extremamente baixos da região e ressalta aconsciência do problema do subdesenvolvimento adquirida recentemente, centrando a análise na problemática regional na qual volta a enfatizar as relações inter-regionais: o fato de não ser umsistema econômico autônomo expões a região a uma intensa concorrência de mercados de produtos

e capitais, muito desigual, tendendo a comportar-se, em relação com o Centro-Sul, como um paíssubdesenvolvido face às nações industrializadas. Decorre daí a necessidade de que sejamdesenvolvidos esforços no sentido de criação de um centro dinâmico, capaz de garantir acontinuidade de sua própria expansão econômica de forma diversificada. No entanto reconhece queisto não é suficiente, pois, somente seria concretizado caso consiga vencer a fragilidade de suaagropecuária, caracterizada por uma estrutura arcaica e pelo monopólio das terras úmidas e  próximas aos maiores urbanos: pelo minifúndio e o desperdício da mão-de-obra nas regiõesintermediárias; e pela instabilidade, baixo nível técnico e uma excedente estrutura de mão-de-obrano semi-árido. Enfatiza em seguida: “Na logística do desenvolvimento nordestino o problemaagrário ocupa a posição central. Se não for possível dotar a região de uma agricultura moderna,tampouco será possível desenvolvê-la” (p. 53). Para isto a região necessita contar com recursosexterno, pois nas condições atuais, sem o aporte de recursos de fora da região não seria possível

realizar a tarefa de reconstruir, sob novas bases, a economia agropecuária da região11

.O outro livro, que possui um capítulo sobre a problemática do Nordeste, escrito quando o

autor comandava a política de desenvolvimento regional, Dialética do Desenvolvimento, prefaciado – em janeiro de 1964 – às vésperas do golpe militar, é considerado, pelo autor, em um dos seuslivros de memória, o seu testamento intelectual12. A primeira parte do livro trata da Dialética doDesenvolvimento e a segunda, Diagnóstico da Crise Brasileira. Esta última tem um capítulo quetrata do Nordeste. Desaparece o tom otimista do livro anterior e o capítulo referente à região é  precedido de uma análise das “causas econômica da crise atual” que finaliza com o exame doaumento das tensões estruturais e do impasse e opções prováveis. O último capítulo, tem como

11 Neste trabalho, no que se refere ao Nordeste, Celso Furtado enfatiza mais que anteriormente as relações inter-regionais

e com mais clareza destaca a questão agrária e suas formas diferenciadas nas zonas litorâneas, no Agreste e no semi-árido.Vale aqui assinalar um comentário de Francisco de Oliveira sobre o referido livro: “A  pré-revolução brasileira é um dosmais brilhantes ensaios de Furtado, injustamente esquecido. Aqui ela abandona a postura de economista para alcançar asdimensões de um pensador político, numa linha que talvez nunca tenha retomado com o mesmo vigor. A  pré-revolução éuma proposta de reforma de base” (Oliveira, 2003: 25).

12 “Sentindo que o horizonte se fechava, apressei-me a ordenar essas notas [de conferências, debates, mesas-redondas],com o propósito de colocar à disposição dos jovens um conjunto consistente de idéias capaz de dar respostas às perguntasque com mais freqüência me dirigiam. Certos conceitos eram utilizados de maneira confusa, a outros atribuia-se o poder de exorcizar os males sociais como num passe de mágica” (Furtado, 1985: 182). O item no qual é resumido o referidolivro tem como título Testamento Intelectual.

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título “o processo revolucionário no Nordeste”. Neste particular, Furtado é motivado pelaconsciência de que, vivendo processo sob vários aspectos revolucionário, considerava importanteanalisar a realidade nordestina, identificar as tendências mais prováveis e interferir a favor desoluções de menor custo social.

A questão regional é examinada a partir das relações de trabalho e de poder, e da luta de

classe, sobretudo no meio rural, nas três sub-regiões: zona úmida litorânea, as zonas intermediáriase a caatinga sertaneja. Na primeira, enfatiza o domínio político e econômico da classe proprietáriavoltada para a produção de açúcar sobre uma classe trabalhadora com baixo nível de organização.Ressalta o processo de conscientização que ocorrera recentemente, associado às transformações dasrelações de trabalho – a mudança do morador em assalariado – e econômicas, destacando ascondições favoráveis de mercado. Assinala o acirramento das contradições num períodoextremamente curto13 e o seu arrefecimento quando algumas conquistas foram obtidas. Conclui esta  parte, afirmando que a evolução dessa economia dependeria do comportamento da classe proprietária, pois o movimento camponês já se havia definido “em suas linhas básicas como um processo de consolidação do status de uma classe assalariada e de defesa dos benefícios contratuais.Resta saber se a atual classe proprietária, marcada por todas as taras de uma estrutura feudal queainda não desencarnou poderá colocar a agroindústria em condições de sobreviver, ou se terá deabandoná-la como ferro velho e máquina de fazer déficit público” (p. 161 e 162).

Com a relação às zonas intermediárias, assinala a sua grande capacidade de retenção damão-de-obra, e sua atividade produtiva voltada para a agricultura de subsistência articulada àatividade pecuária e, temporariamente, vinculada aos latifúndios produtores de cana. Ressalta que a  produção do algodão permitiu ampliação da renda do trabalhador vinculado à agricultura desubsistência e lembra que a presença do latifúndio e da pequena propriedade voltada para asubsistência permitiu uma forma de associação, através de qual os grandes proprietários permitiamao agricultor o acesso às suas terras, sob a condição de abandoná-las toda vez que o proprietárionecessitasse soltar o gado. Essa cessão ocorria, por vezes, condicionada à cobrança de dias detrabalho grátis da parte do agricultor. “O crescimento da população, por um lado, e a valorização a  pecuária, por outro, colocaram os trabalhadores agrícolas do Agreste, no período recente, emsituação cada vez mais precária. Na medida em que a unidade agrícola familiar era simples

complemento da atividade pecuária na grande propriedade, inexistia a possibilidade de organizar aagricultura sob novas bases” (p. 166). Neste contexto de tensões crescentes, o fato de os agricultoresviverem em comunidades colocava-os em melhores condições do que os da Zona da Mata paraadquirir consciência coletiva do problema. Isto explica a grande propagação das ligas no Agreste.Sua luta estava voltada para a posse da terra que utilizavam, ameaçadas, também, pela expansão dacana. Na síntese que faz a respeito da situação do Agreste, Celso Furtado ressalta o impasse,constatado, de um lado, pelo fato de que as reivindicações dos trabalhadores exigiriam areestruturação da agricultura local, e de outro lado, que essa reestruturação, de modo a permitir umamelhora das condições de vida, conflita com os interesses dos proprietários. “Os termos em que estácolocada a luta social do Agreste levam, portanto, inexoravelmente, a uma definição de posição quesomente encontrará solução em processos radicais” (p. 169).

  No que se refere ao Sertão, após descrever os aspectos físicos, ecológicos e as secas, ocapítulo trata da ocupação do território e das relações de produção que se estabeleceram no interior de uma organização produtiva comandada pela pecuária extensiva associada à agricultura de

13 “Para compreender esse fenômeno inusitado que foi a formação de uma consciência de classe nos camponeses doaçúcar, em um período que pouco excede de um qüinqüênio, é necessário ter em conta a tenacidade com que a classe

 proprietária pretendeu salvar a sua constelação de privilégios feudais até o presente momento” (p. 153) ..... “O movimentode organização da classe camponesa ... apresentou, até 1962, todas as características de uma arregimentaçãorevolucionária do tipo clássico. Os líderes, fossem de formação marxista ou católica, tinham todos a preocupação de dizer 

 bem alto que estavam lutando contra a ordem de coisas prevalecentes” (Furtado, 1964: 154).

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subsistência e à produção do algodão. Ressalta a combinação da pecuária com o algodão quemodificou a base da economia sertaneja e transformou a seca em um grande problema social, quealcança sobretudo a produção agrícola, em particular a de alimentos..A partir de então os programasgovernamentais de combate aos efeitos das estiagens se desdobram na construção de barragens eaçudes que beneficia principalmente a pecuária e não modifica nem beneficia a agricultura, e, nasfrentes de trabalho, em obras públicas, que absorvem os grandes contingentes da população na fase

crítica da seca e é do interesses dos grandes proprietários como forma de manter uma força detrabalho disponível na sub-região. Confrontando o Sertão com as demais sub-regiões, mostra que ostrabalhadores sertanejos se encontram em condições menos favoráveis para tomar consciência desua situação e das modificações necessárias para melhoria das suas condições de vida. Nãoobstante, considera que as vitórias obtidas no Agreste, notadamente no que ser refere à redução darenda da terra, terão repercussão nas relações de produção do Sertão. E, dadas as condições de vida,a exigências de profundas transformações relacionadas com a concentração da propriedade, os baixos níveis de produtividade e a vulnerabilidade da economia sertaneja, os movimentos sociais podem assumir a forma de processos revolucionários.

Conclui, assinalando, que a convergência da irracionalidade social do desenvolvimentoagrícola nas sub-regiões examinadas e a politização de parte crescente dos trabalhadores ruraiscontribuíram para a formação de um potencial revolucionário no Nordeste. Agrega que a evoluçãodesse potencial dependerá das condições históricas que venham prevalecer não somente na região,mas no conjunto do país.

Contribuições Pós-1964

Em 1981, em O Brasil Pós-“Milagre”, Celso Furtado, após o exame da economia nacionalna fase posterior à sua expansão durante o regime militar (na qual estuda a estrutura agrária, o seucentro dinâmico, as opções do decênio 60, a turbulência e desgoverno dos anos 70, os desafios paraos anos 80 e o esboço de uma estratégia) investiga o quadro internacional e, posteriormente, o  Nordeste. Nesta terceira e última parte propõe diretrizes de uma política de desenvolvimentoregional e de alternativas institucionais. Antes do expor as diretrizes enfatiza a profundidade daquestão nordestina14, ressaltando a grande rachadura entre regiões decorrentes do processo atravésdo qual ocorreu a industrialização brasileira. O problema nordestino não é um problema entreoutros, pois tal postura significa condenar um grande contingente da população à frustração e àmiséria. Aponta para o processo de industrialização que está ocorrendo, a partir de um certo tipo deintegração – produção de insumos para o Centro-Sul recebendo desta região equipamentos e outrosinsumos – que reduz progressivamente a autonomia regional. Com isto Furtado constata o avançoda integração regional, bem distinta da constatação da  Formação Econômica, de 1959, quando nocapítulo final destaca, como foi registrando anteriormente, que havia ocorrido a articulação dasdistintas regiões em um sistema com o mínimo de integração. Qualifica essa integração como umanova dependência que reside em uma subordinação à lógica de uma industrialização do Centro-Sule transforma o Nordeste num simples apêndice de um mercado dominado por uma clientela de nívelmais alto de renda (p. 123 e 124)15.

14 “O Nordeste é, na verdade, a face do Brasil em que transparece com brutal nitidez o sofrimento do seu povo. Aí semostram sem disfarces as malformações maiores de nosso desenvolvimento. Se não existir política adequada para o

 Nordeste pode-se dar por certo que os problemas maiores do país se estão agravando...” (Furtado, 1981: 119).15   Neste ponto o autor faz uma espécie de avaliação da política de industrialização administrada pela SUDENE, nosseguintes termos: “É fora de dúvida que os incentivos criados pela SUDENE estão na origem do surto industrial dos anos60 ...É também verdade que a partir de 1964 esse órgão limitou-se a criar facilidades, favorecendo os grandes grupos e

 punindo as pequenas empresas. Contudo, não se pode afirmar que, sem a participação da SUDENE, a industrializaçãohouvesse tomado outra rumo na região. O máximo que se pode dizer é que essa agência se omitiu face às tendências

 perversas que se iam definindo, quando sua tarefa precípua era orientar os investimentos subsidiados pelo governo emfunção dos interesses da população nordestina” (Furtado, 1981: 125).

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Com base nessas constatações, associadas a questões relacionadas com a estrutura agrária ea miséria da grande massa da população regional, Celso Furtado propõe três eixos básicos de ação:(i) o de transferência maciça de recursos para a região, voltada sobretudo para transformar asestruturas rurais, implantar infra-estruturas econômicas e sociais e dar vitalidade às pequenas emédias empresas; (ii) o de modificações estruturais que melhorem as condições de vida e acapacidade de iniciativa dos trabalhadores rurais; seu objetivo estratégico é eliminar o “latifúndio

 predatório e o minifúndio asfixiante que, conjugados, formam um sistema brutal de exploração dohomem” (p. 129); (iii) e o terceiro eixo com ações voltadas para o aumento, de forma substancial,da participação do Nordeste nas atividades industriais do país, “numa forma complementar que nãocrie dependência e sim tenha em conta as particularidades sociais e ecológicas da região mais pobre” (p. 128). Enfatiza que tais eixos são complementares.

O livro   A Nova Dependência: dívida externa e monetarismo, de 1982, dedicado aos“economistas brasileiros da nova geração que não se deixaram embair pelo brilho falso domonetarismo” centra sua preocupação na dívida externa e no monetarismo da política adotada e temum capítulo no qual são feitas considerações sobre o Nordeste e um novo modelo dedesenvolvimento. Nesse capítulo, assinala que considera como problemas mais prementes do Brasila reconstrução das instituições democráticas e a forma de enfrentar as mudanças que estãoocorrendo. No que se refere à redemocratização, retoma o tema da luta pela descentralização do  poder político e o revigoramento do federalismo, inclusive com a consolidação de instânciasdecisórias intermediárias, como foi a da experiência da SUDENE, no período inicial. Situa o Nordeste no modelo de desenvolvimento que vem sendo seguido, intrinsecamente desigualitário, doqual resulta um quadro social que não encontra justificativa no nível médio de renda da região. Aquestão central, segundo Furtado, “é menos de pobreza do que de mal-desenvolvimento, deagravação de tendências estruturais anti-sociais que se apresentam no conjunto do país” (p. 139).Para o autor, as características essenciais do modelo são: as escassas repercussões dosinvestimentos sobre o mercado de trabalho (emprego e salário), o fato de os investimentossubsidiados realizados na agropecuária terem agravado a polaridade minifúndio-latifúndio, de osrecursos transferidos gerarem empregos no terciário reproduzindo os padrões do Centro-Sul e de oefeito demonstração, irradiado no terciário, ter operado como novo fator de concentração de renda.Chama a atenção “para a necessidade de nova reflexão sobre a situação do Nordeste nesta fase emque a perda de dinamismo da economia brasileira exigirá de uma ou de outro forma reajustamentosna região” (Furtado, 1982: 144).

Há nesta avaliação que faz, o reconhecimento de que foram realizados esforçosconsideráveis para dotar a região de infra-estrutura de transporte e energia, e para o conhecimentodo Nordeste no que se refere a solo, água, clima, secas, estrutura agrária e suas projeções no planosocial e econômico. Acrescenta a respeito: “É a partir desse nível mais avançado de conhecimentoque nos devemos perguntar: que lugar cabe no desenvolvimento do Brasil a essa região nordestinaonde vivem mais de 30 milhões de brasileiros e onde tem raízes seculares uma das matrizes maisfecundas da cultura no nosso país?” (p. 145). Responde assinalando que isto só será positiva se aregião estiver capacitada para gerar a vontade política necessária para modificar as tendências prevalecentes. Passa então a assinalar “os pontos que estão a exigir profundas mudanças de rumos”

(p. 145). Em primeiro lugar o problema das secas que deverá contemplar a criação de umaeconomia agrícola ecologicamente adaptada que elimine a polaridade proprietário parceiro, com base na unidade familiar capaz de assimilar inovações técnicas e engendrar formas de solidariedadesocial. Em segundo lugar, a política econômica deve ser modificada para dar prioridade à criação deemprego e a vinculação da atividade produtiva ao mercado local, fortalecendo o tecido das  pequenas e médias empresas e reduzindo os privilégios estabelecidos para os grandesempreendimentos desvinculados da iniciativa empresarial local. Finalmente, é importanteconsiderar que a experiência tem mostrado que o verdadeiro desenvolvimento é “um processo deativação e canalização de forças sociais, de avanço da capacidade associativa, de exercício da

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iniciativa e da inventividade. Portanto, trata-se de um processo social e cultural e só ancilarmenteeconômico” (p. 149)16.

Se no livro anteriormente considerado o objetivo era a dívida externa e o monetarismo, emCultura e Desenvolvimento em Época de Crise, Celso Furtado (1984) centra sua atenção na crise,“vista como custo social e como desafio” (p. 9). Aborda a questão regional, com maior ênfase, nos

capítulos referentes ao novo federalismo, ao papel da universidade no desenvolvimento do Nordestee no capítulo de reflexões sobre uma política alternativa de desenvolvimento para a região. Sobre auniversidade destaca o papel que ela deve desempenhar na dupla dependência que tem o Nordeste:a econômica e a cultural e sobre a políticas alternativas de desenvolvimento regional, re-visitaquestões que já haviam tratado anteriormente. Neste caso, a abordagem centra-se nodesenvolvimento nordestino no contexto de uma crise nacional que já ultrapassara o seu quarto ano.Antes de descer às alternativas destaca o conhecimento bem maior que se tem da região, oreconhecimento de que não se pode confundir crescimento econômico com desenvolvimento e deque se reconhece que a crise pela qual passa o país tem múltiplas causas mas nenhuma tãoimportante como o desgoverno. Destaca que o primeiro passa para repensar o Nordeste é repensar oBrasil, suas relações com o sistema financeiro e suas exigências, o direito que tem o povo brasileirode superar esse contexto de crise e a partir daí refletir sobre o que significa desenvolver a região. O  problema regional fundamental, para Furtado, reside (i) na seca e na calamidade social querepresenta ao alcançar o segmento mais frágil da sociedade, na fragilidade do setor agrícola e asdistorções de sua estrutura agrária; (ii) na redefinição do processo de industrialização regionalenfatizando as atividades com vínculos mais significativos com a economia local e com a criação deemprego e que constitua um segmento capaz de gerar o seu próprio crescimento, sem constituir-seum mero prolongamento da indústria do Centro-Sul. Para isto, é necessária a participação de todauma geração e a constituição de uma vontade política consciente de que os problemas regionaissomente terão solução a partir da própria região.

 Na  Fantasia Desfeita, de 1989, segundo livro de memória de Furtado, o autor rever, da perspectiva histórica, os alicerces do subdesenvolvimento do Nordeste, o quadro internacional e sua  projeção no Brasil e, em seguida registra aspectos fundamentais dos esforços realizados paraconcepção e implantação da política de desenvolvimento regional (a operação Nordeste, o

CODENO, a SUDENE e seus planos), a experiência do Plano Trienal e o final do seu mandato àfrente da Sudene, quando ocorre o golpe militar e seu exílio.

Considerações Adicionais

Alguns pontos adicionais merecem destaques, após essas considerações sobre os estudos maisrelevantes de Furtado a respeito da questão regional, no que se refere, particularmente, àimportância da Formação Econômica do Brasil . Este estudo representa, no que se refere à análiseda problemática regional brasileira, não só a matriz que influenciou os estudos de Celso Furtado aesse respeito e definiu os alicerces da sua visão, desdobrada posteriormente em vários estudos,como a matriz para grande parte dos estudos, de vários autores, que, após os anos 60, foramrealizados em todo Brasil. Nos curtos capítulos da referida obra está não só a descrição da trajetóriadas regiões brasileiras, mas a explicitação da sua visão a respeito da gênese das desigualdades

espaciais que caracterizam a economia nacional e sua evolução. É o livro ao qual os estudos da

16 Celso Furtado enfatiza, nesta fase de luta pela redemocratização, no final do livro que: “Uma verdadeira política dedesenvolvimento terá que ser a expressão das preocupações e aspirações de grupos sociais que tomam consciência de seus

 problemas e se empenham em resolvê-los ... É necessário que a discussão desses problemas venha a ocupar um espaçocentral na vida política, se é nosso propósito que o povo tenha uma efetiva participação na definição de seu destino. Esse éo caminho da verdadeira redemocratização, pois é a maneira mais segura de instilar um conteúdo substantivo à prática

 política. É neste sentido que o processo de redemocratização é a via de acesso ao desenvolvimento. E que uma autêntica política de desenvolvimento constitui a forma mais segura de legitimar o poder” (Furtado, 1982: 149 e 150).

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maioria dos analistas sobre as regiões brasileiras têm como referência, ora aceitando suasconclusões, ora revendo ou complementando-o e criticando-o.

  Formação Econômica do Brasil definiu uma abordagem que tem na história a suafundamentação e este ponto influenciou, seguramente, os procedimentos metodológicos seguidos  por grande número de economistas brasileiros. Numa análise que faz desse livro, Francisco de

Oliveira chama a atenção para o fato de que em Celso Furtado, como em outros interpretes clássicosda sociedade brasileira, o que ocorre “é a construção de uma complexa relação entre a teoria e ahistória. Assim, não há uma teoria que se aplique à história, nem o contrário, uma história que sejaexplicada pela teoria: o andamento se faz tecendo os fios de uma construção auto-estruturante, emque a história é teoria e a teoria é história” (Oliveira, 2003: 84)17. Esta percepção traduz bem o queo próprio Celso Furtado assinala, em seu primeira livro de memórias, a  Fantasia Organizada,quando se refere aos procedimentos adotados na elaboração da Formação Econômica do Brasil : “Ométodo era o mesmo que utilizava em trabalhos anteriores: aproximar a História (visão global) daanálise econômica; extrair desta perguntas precisas e obter respostas para a mesma na História” (p.204 e 205).

Examinando esses procedimentos – da teoria como perguntas ou premissas às quais ahistória deveria responder – em relação à questão regional, ficam evidentes os passos dados pelo

autor na montagem da sua percepção a esse respeito. A questão regional examinada no livro Perspectiva da Economia Brasileira, é enriquecida com a análise da questão regional abordada na  Formação Econômica (escrito entre novembro de 1957 e fevereiro de 1958) e toma a formadefinitiva, em relação ao Nordeste, no  Relatório do GTDN . E sua obra posterior, antes e depois doexílio, vai sempre incorporando elementos da realidade vividos e analisados por Furtado, nodecorrer dos anos. Um exemplo é a integração, na   Dialética do Desenvolvimento, na parteespecífica sobre o Nordeste, de uma analise profunda sobre as relações de produção e de poder nasáreas rurais nordestinas e os impasses gerados por uma estrutura fundiária das quais resultava a pobreza e alto grau de exploração da força de trabalho. No mesmo sentido, deve-se considerar arevisão que faz nos estudos realizados pós-1964, quando percebe a intensidade do processo deintegração das regiões como momento de superação da situação constatada no final da  Formação Econômica do Brasil de que a economia nacional se caracterizava como um sistema articulado de

regiões com o mínimo de integração. É essa integração, que ocorre pós anos 60, percebida por Celso Furtado em livros posteriores, que põe por terra a proposta do   Relatório do GTDN demontagem de um centro autônomo de produção manufatureira, no Nordeste, capaz de permitir a propagação do seu próprio dinamismo regional.

Pelo menos duas grandes influências da obra de Celso Furtado podem ser assinaladas noque se refere à produção posterior sobre a questão regional brasileira. Neste particular cabe lembrar a produção de vários estudos sobre a evolução da economia nacional, obedecendo aos vários cortesregionais, a partir das várias fases pelas quais passou o país no seu processo de industrialização e dediversificação do processo produtivo, que, em geral, avançaram no tempo abrangendo fases que nãohaviam sido consideradas na da Formação Econômica do Brasil . Alguns desses trabalhos, como severá, retomam o itinerário de Furtado, desde a gênese do processo de diferenciação espacial, eacompanham a construção de uma estrutura produtiva, cujo dinamismo passa a ser comandado por uma complexa economia industrial e seu do mercado interno.

Em segundo lugar, deve-se levar em conta a influência de Celso Furtado na grande produção de estudos sobre regiões específicas do Brasil, sobretudo o Nordeste e Amazônia, e quetomaram a forma de duas abordagens marcantes: (i) a de análises regionais, que tinham como

17 No final do capítulo em que resume e analisa o livro Formação Econômica do Brasil e Celso Furtado, Francisco deOliveira conclui: “O uso fecundo do método, tensionando teoria e história, havia dado seus frutos e, como no Evangelho,eles eram bons” (Oliveira, 2003: 102).

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objetivo estudar e atualizar o conhecimento dos espaços regionais específicos, diante dastransformações que estavam em curso na economia, notadamente no período posterior a 1960; (ii) aum conjunto de avaliações das políticas regionais voltadas para o Nordeste, de início, e para outrasregiões, envolvendo não só o estudo dos impactos das políticas explicitamente regionais (caso do Nordeste e Amazônia) como o exame dos impactos regionais das políticas implicitamente regionais(comércio exterior, financiamento, políticas agrícolas e industriais, tributárias), abrangendo todas as

regiões brasileiras.Alguns desses aspectos serão considerados a seguir.

As contribuições das pesquisas de outros autores críticos a partir da obra de Celso Furtado

A publicação da obra seminal de Furtado em 1959 instigou um amplo debate e orientou análisesimportantes das especificidades urbano-regionais brasileiras. Também a conjuntura política eacadêmica da época, a publicação das Contas Regionais, o processo objetivo de concentraçãoespacial da riqueza, a criação da Sudene etc, determinaram a colocação dos desequilíbrios inter-regionais nas agendas acadêmica e pública do país.

A quantidade e a diversidade de estudos nestas últimas cinco décadas é enorme. Há umagrande produção de estudos sobre a questão regional nas universidades (UNICAMP, USP, UFMG,

UFRGS, UFPA, UFPE, UFRJ, UnB, dentre outras) e instituições de pesquisas (IPEA, IBGE,FUNDAJ e vários órgãos estaduais de estudos como a FEE, IPARDES, SEI etc) que vemampliando significativamente o conhecimento sobre esta decisiva problemática.

  Neste sentido, optou-se aqui por construir nesta parte uma narrativa que segue umatrajetória pontuada pelas constribuições de autores, em alguma medida, herdeiros da tradição de pensamento crítico e histórico-estrutural de Celso Furtado. Esses autores, orientados pelas questõeslevantadas por este grande cientista social, lograram construir uma revisão crítica (bastante exitosa)da análise da estrutura e da dinâmica das economias regionais e dos espaços urbanos no Brasil.

Dois caminhos foram seguidos pelos que, nas trilhas abertas por Celso Furtado, deram suacontribuição para o conhecimento das economias regionais brasileiras e suas relações. Aqueles quese voltaram para a visão conjunto do país e de sua heterogeneidade e disparidades regionais,

interpretando sua evolução a partir de diferentes periodizações. E os que tentaram aprofundar oconhecimento sobre regiões específicas, sua forma de inserção da economia nacional e a avaliaçãodessa articulação e integração e das políticas regionais e nacionais que haviam sido implantadas.

Paul Singer, em trabalho de 1968, desenvolveu importante reflexão sobre a estrutura e adinâmica de cinco espaços urbano-regionais (São Paulo, Blumenau, Porto Alegre, Belo Horizonte eRecife), em que sugere um interessante aporte analítico que busca tratar de forma articulada ascidades e seu hinterland nos diversos momentos históricos de suas trajetórias de desenvolvimento.

Em 1971, Antonio Barros de Castro publicou o polêmico “A Herança Regional doDesenvolvimento Brasileiro” (Castro, 1971) em que discute as distintas histórias regionais e suasarticulações, lançando argumentos que procuram negar a clássica idéia do isolamento entre osespaços regionais brasileiros e colocando a ênfase no momento cíclico de descenso exportador 

desses espaços, que segundo ele ensejariam impulsões para o estabelecimento dos nexos inter-regionais.

As contribuições de Wilson Cano – a partir da defesa (1975) e publicação de sua tese dedoutoramento “Raízes da Concentração Industrial em São Paulo” – são marcantes e decisivas para aestruturação do debate reginal brasileiro crítico. Ao contrário de algumas vertentes da literaturanesta temática, procura demonstrar que as desigualdades inter-regionais no Brasil foram originadasem processos regionais específicos anteriores ao processo de industrialização. Procurou, em ampla eaprofundada pesquisa histórica, apresentar a tese de que: “antes de 1930, a economia nacional nãoera integrada e cada uma de suas regiões havia tido uma história e uma trajetória econômica

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específicas, que lhe deixaram uma herança cultural, demográfica e econômica – notadamente a daestrutura da propriedade e da renda – demarcadora de diferentes graus de pobreza absoluta erelativa e de diferentes estruturas produtivas” (Cano, 1981: 312).

 Neste sentido, Cano (1975), resgata a tradição de pensamento crítico furtadiana, em umainterpretação muito próxima do peso do passado, semelhante a importantes questões e aspectos que

Furtado também tinha apontado em sua tese de doutoramento, defendida em 1948, sobre o nosso passado colonial e o ambiente construído herdado no Brasil. Peso18 de um passado de “reproduçãosimples” mercantil e unificadora de padrões fundiários perversos e excludentes, de amplas massashumanas, dos círculos de poder, propriedade e riqueza. Relações que se davam em um ambienteurbano restrito. Assim, em sua tese doutoral, Furtado defende que “o desenvolvimento da vidaurbana se fará no Brasil à sombra do domínio patriarcal. Este tem primazia econômica,administrativa e religiosa. O núcleo urbano dele depende para tudo” (...) “O centro urbano, por simesmo, nada representa. Sua população, constituída de pequenos artesãos, de comerciantes aretalho e de pequenos agricultores das proximidades, se anula diante do prestígio econômico esocial do grande senhor dominial”. (...) “Entre os extremos da escala social flutua uma massaamorfa desligada da vida econômica da Nação” (Furtado, 1948: 166). Em síntese: grandes unidades  produtoras (agrícola, mineradora e extrativista), rígida ordem escravocrata e senhorial, altíssimaconcentração de renda, riqueza e poder, orientação dos excedentes sociais para o exterior, amplamassa de deserdados, incipiente divisão social do trabalho, o “caudilhismo” local prevalecerá,embotando as possibilidades de constituição de uma sociedade menos autoritária, o que legará comoherança formas atrasadas (que se perenizam) de convivência social19.

A dimensão continental do Brasil, suas heterogeneidades estruturais e seu caráter dispersivoforam tratados por Furtado e outros autores. Becker e Egler (1993: 52) resumem assim estemomento: “Na ‘marinha’ (litoral) estava a ‘civilização’, as  plantations açucareiras, as cidades, os  portos. No ‘sertão’, uma sociedade rude e um povoamento rarefeito e disperso, que dificultavaqualquer controle, uma nebulosa de estabelecimentos isolados que se disseminavam por uma áreade mais de dois milhões de km2”.

  Neste contexto, para analisar as experiências históricas de organização das atividadeseconômicas neste momento de dispersão do “arquipélago regional”, Cano (1975) propôs edesenvolveu o conceito de “complexos regionais”, como um “conjunto econômico integrado” quetem sua estrutura e dinâmica duplamente determinada: pela forma e natureza do engate de cadacomplexo econômico com o exterior; e pelo modo singular como o capital invade, conecta eatravessa as diferentes localidades e atividades produtivas regionalizadas. Neste sentido, WilsonCano defende que a superioridade do complexo regional cafeeiro da economia paulista é a matrizdas forças produtivas capitalistas mais modernas que se desenvolveram no Brasil.

Suas mais avançadas relações sociais de produção e uma conjunção virtuosa de fatoresalçará este complexo ao comando e à sobredeterminação de sua economia sobre as demais. Cano(1975) contrapõe esta forma superior e acabada de complexo regional com as outras experiências

18 “Pareceu-me ilusório imaginar que tínhamos condições de provocar uma mutação em nosso processo histórico (...)Temos de reconhecer que a matriz patrimonial e escravista que está na base da formação do Brasil continua presente naconfiguração do povo brasileiro (...) É preciso conhecer as forças internas e externas que condicionam o nosso evolver histórico…”. (Furtado, 1948: 6).19 “Instituído o regime municipal como divisão política territorial, continuou a supremacia do domínio, que fará domunicípio seu simples valet . Com efeito, o município brasileiro é uma divisão territorial mais ou menos arbitrária (...)

  Neste país, o domínio patriarcal perduraria como célula da sociedade. O município será uma expressão meramenteexterior. Muitas vezes o senhor dominial achará conveniente fazer sentir a sua força na sede do município” (...) “Ainexistência de interesses comuns que liguem os domínios semi-autônomos e a tendência ao mandonismo resultante daherança escravista dificultam qualquer entendimento ou colaboração entre os senhores patriarcais. Por outro lado, esseisolamento de grupos semi-autônomos fechará o caminho à formação de uma mentalidade política e de uma consciênciade coletividade” Furtado (1948: 169).

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regionais brasileiras: 1) Na Amazônia, a expansão da extração da borracha, baseada na economia doaviamento, gerou ponderável excedente, sobretudo entre 1890 e 1920, mas teve dificuldades deretê-lo e diferenciar sua economia. O capital comercial atravessador dos inúmeros produtoresindependentes pulverizou-se em aplicações que não se dirigiam para a sua metamorfose em capital produtivo; 2) No Nordeste, também com sua economia fundada em débeis relações capitalistas de produção, a concentradíssima estrutura de propriedade e de renda, a vulnerabilidade de sua inserção

internacional etc acarretarão limites estruturais à sua diversificação; 3) No Extremo Sul, com suaestrutura fundiária bastante desconcentrada, e com estabelecimentos manufatureiros pequenos emédios, não conseguiria sustentar a contento sua histórica vocação de “celeiro” nacional, tendocrescentes dificuldades para diversificar sua “economia pulverizada”; 4) Na Guanabara, que seencontrava dominada e estrangulada por seu capital comercial e financeiro, que drenava oexcedente da cafeicultura fluminense, capixaba e parte da mineira, mas não o direcionava para aacumulação reprodutiva; 5) Em Minas Gerais, além do café desenvolveu expressiva pecuária e uma ponderável agricultura de alimentos; 6) No Centro-Oeste estava pouco ocupado economicamente.Ficava patente que “os complexos regionais eram pouco integrados, tendo cada região sua ‘própriaeconomia’ ” (Cano, 1981: 63).

Enquanto em São Paulo, a profunda articulação de diversas frações do capital, garantiu areprodução ampliada e o aprofundamento da divisão social do trabalho, baseada em economiaurbana superior, pode forjar capacidade para uma expansão diversificada e concentradora,alargando recorrentemente seus horizontes de acumulação. O capital mercantil cafeeiro desdobrou-se em múltiplas faces: café, ferrovias, bancos, comércio, indústria, infra-estrutura, etc. Estareprodução exigirá um segmento urbano para sua ampliação e diversificação. O café plantarácidades. Novas funções urbanas serão impostas pela acumulação cafeeira. Todas estas faces serãosintetizadas no espaço urbano, cada vez mais diferenciado e dinâmico.

 Neste período anterior à integração do mercado nacional, havia uma grande precariedade denexos mais permanentes entre as regiões. Lógicas oligárquicas locais/regionais, que não possuíammaiores interesses nacionais e tinham como um dos alicerces de seu poder o fechamento e oisolamento do “seu” espaço regional de acumulação circunscreviam e controlavam as regiões, bloqueando maiores articulações inter-regionais.

Sobre esta questão, cabe lembrar que Francisco de Oliveira (1977a), na tradição furtadianade pensar centros de decisão, elabora uma definição primorosa do que é uma região e de como ela écontrolada e “fechada” pelo seu bloco de elite no poder: “O ‘fechamento’ de uma região pelas suasclasses dominantes requer, exige e somente se dá, portanto, enquanto estas classes dominantesconseguem reproduzir a relação social de dominação, ou mais claramente as relações de produção.E nessa reprodução, obstaculizam e bloqueiam a penetração de formas diferenciadas de geração dovalor e de novas relações de produção. A ‘abertura’ da região e a conseqüente ‘integração’ nacional,no longo caminho até a dissolução completa das regiões, ocorre quando a relação social não podemais ser reproduzida, e por essa impossibilidade, percola a perda de hegemonia das classesdominantes locais e sua substituição por outras, de caráter nacional e internacional” (Oliveira,1977a: 31-2).

Ignácio Rangel (1968) já tinha apontado, de forma bastante perspicaz a natureza deste processo, ao afirmar que “a compartimentação do mercado nacional resultava de instituições quetentavam cristalizá-la e, conseqüentemente, a unificação do mesmo mercado teria que importar emmudanças institucionais que impedissem essa cristalização,  pari passu com medidas econômicascom o mesmo endereço” (2000: 184). Em palestra no então BNDE, apresentou a correta perspectivada reacomodação das estruturas produtivas regionais que o processo de integração coloca: “o problema da integração das economias regionais [processa-se...] no sentido de incorporá-las maisestreitamente a um esquema único de divisão nacional do trabalho”.

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A partir dos impactos que foram sendo detectados com base na intervenção do Estado  brasileiro sobre o Nordeste, antes e depois do regime militar, vários estudos começam a ser desenvolvidos sobre a questão regional nordestina. Destaque-se, por exemplo, Goodman eAlbuquerque (1974) e Albuquerque e Cavalcanti (1976), dentre muitos outros. Em 1977, Franciscode Oliveira publicou “Elegia para uma re(li)gião”, procurando desenvolver uma “economia  política” do planejamento regional para o Nordeste, em que analisa o processo de integração,

citando Rangel (1968), e seus impactos no conflito político posto no Nordeste e intensificado nasegunda metade dos anos 1950, a partir do qual foi deflagrado um padrão de intervenção planejadana região, cuja objetivo central, na concepção do autor, foi o de produzir uma forma transformadado conflito e sua ação pelo Estado, no seu relacionamento com a sociedade.

Tânia Bacelar, em 1979, com sua tese de doutoramento, em Paris, na qual Celso Furtado participou da banca, analisa a “Divisão inter-regional do trabalho no país e o exemplo do Nordeste”e detecta ao lado da divisão inter-regional de trabalho em curso, o processo de integração produtivaque através da nova indústria estava ocorrendo a partir dos instrumentos da política econômicaadministrados pela SUDENE. Ao lado da influente tese de Raimundo Moreira (1976), “A políticade industrialização do Nordeste”, que pesquisou o processo de integração regional e a expansão daindústria incentivada, estes e outros trabalhos aprofundaram a discussão sobre a questão regionalnordestina.

Wilson Cano, em sua tese de livre docência (1981), procura interpretar o  sentido maior daformação e integração do mercado nacional. Apesenta uma periodização, que parte da consolidaçãoda economia cafeeira (a partir de 1850) e vai até a “crise de 1929” - momento de constituição domercado nacional. A partir da recuperação dessa crise, em 1933, discute como avança a articulaçãointer-regional em dois momentos distintos, com natureza e dinâmica diferenciadas do processo deintegração do mercado nacional nos períodos:- de 1933 à 1955, a industrialização se encontrava restringida e a articulação inter-regional, a

conquista e o alargamento dos mercados se deu via comércio de mercadorias (integração através deuma potente articulação mercantil entre as regiões, ou seja, “via dominação do mercado demercadorias”);- de 1956/1962 em diante, sob as determinações da industrialização pesada, a integração do

mercado nacional se processou “via acumulação de capital”, em um contexto em que“estabeleceram-se os determinantes da acumulação à escala nacional” e procedeu-se ao transplantedo capital produtivo, entre as regiões, na direção da periferia (promovendo a integração produtiva),transformando totalmente o “padrão de dominação do mercado nacional” e imprimindo relaçõescentro-periferia dentro do País.

  Naquele primeiro momento, a articulação comercial passa a comandar o processo deintegração do mercado nacional, soldando os mercados regionais e engedrando complementaridadesmercantis inter-regionais. Consolidado o processo de formação e integração do mercado nacional,as economias regionais periféricas foram impedidas de levar à frente qualquer projeto de replicar atrajetória da economia paulista. Restava integrar-se complementarmente à economia do pólodinâmico da acumulação, submetendo-se e enquadrando-se à hierarquia comandada por aquelecentro do processo de decisões atinentes ao processo de acumulação de capital que ditaria o ritmo ea natureza da incorporação de cada região no “ranking ” nacional. Assim, após 1930 o avanço  produtivo periférico passaria a ter natureza condicionada. Deveria buscar complementação,“passando a se submeter a um duplo condicionamento, do exterior e da economia paulista” (...)“impedindo um processo mais aberto de desenvolvimento”, de acordo com Cano (1981). Aseconomias periféricas poderiam sofrer, durante o jogo da coerção da concorrência inter-capitalistanacional, efeitos de estímulo, inibição/bloqueio e destruição, sobre suas respectivas estruturas  produtivas. Não obstante, é bom lembrar que ao longo do período 1930/70, se sobressariam os

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efeitos de estímulo, do que decorreu que todas as economias das macrorregiões tiveram continuado processo de crescimento.

Já no segundo momento, o período de 1956 à década de 1970, ocorre a integraçãoindustrial, durante o movimento da industrialização “pesada”. A integração do mercado nacional se processa via acumulação de capital.

Desde a implementação do Plano de Metas da gestão de Juscelino Kubistschek (1956-60)  promoveu-se uma verdadeira revolucionarização do aparelho produtivo (inclusive de seu suporteinfra-estrutural). Assim, a partir do início da década de 60, sob a lógica da industrialização pesada,“estabeleceram-se os determinantes da acumulação de capital à escala nacional” e procedeu-se aotransplante do capital produtivo, entre as regiões, na direção da periferia (integração produtiva).Destacaram-se, neste processo, as políticas para o Nordeste e o Norte, subsidiando pesadamente osinvestimentos que se dirigiram para aquelas áreas. Neste período, a periferia nacional é,transformando totalmente o “padrão de dominação do mercado nacional, pois agora ele se processavia acumulação de capital. O pólo conduz a forma e o ritmo da acumulação” (Cano, 1981).Amplificam-se os fluxos de capital produtivo e as relações centro-periferia ganham nova forma edinâmica.

Esse novo momento deve ser visto como um processo de redefinição do modo dearticulação entre as regiões brasileiras: “antes espaços distintos, integrantes de mesmo sistemacomercial com sua individualidade, agora, partes de um único sistema de produção situados nointerior de uma hierarquia”, como bem sintetizou Guimarães Neto (1989). No novo ambiente derelações à base do capital produtivo: “a indústria que neste período consolida seu padrão deindústria pesada, e o movimento cíclico da economia que em determinados momentos potencializaas condições objetivas que são capazes de redefinir as relações entre os diversos espaços nacionais”(...) [determinam que] (...) “tal acumulação tenda a ocorrer num ritmo que pouco tem a ver com osinteresses imediatos e os limites estreitos do potencial de acumulação da região que se constitui odestino das transferências de capital produtivo” (Guimarães Neto, 1989: 11-18).

As novas fronteiras abertas de valorização das diversas frações do capital eram amplas,mesmo para as regiões mais atrasadas. Constroi-se assim uma “convivência pacífica”, a soldagem

de interesses de diversas frações mais modernas do capital com a persistência e até aprofundamentodas relações de dominação de antigas formas do capital mercantil, aliança mantida graças àintocabilidade da questão da propriedade fundiária, rural e urbana. Wilson Cano (1981) “...aeconomia paulista, sendo o núcleo da acumulação do país, ao crescer imprimia tambémdeterminações (regionalmente diferenciadas, é claro) de crescimento aos seus complementoseconômicos espaciais (as demais regiões). Assim, embora a dinâmica de acumulação fosseconcentradora, em seus resultados concretos, articulava, entretanto, também o crescimentoregional.” (Cano, 1981: 313).

Francisco de Oliveira e Henri Reichstul (1973), em “mudanças na divisão inter-regional dotrabalho no Brasil”, apontam que o processo de industrialização, a partir da região Sudeste,redefiniu a divisão social do trabalho, estreitando o raio de manobra e a autonomia das demaisregiões. Em trabalho posterior Franscisco de Oliveira (1977b: 3) afirmaria que “é apenas quandosurge uma forma de capital infinitamente superior às controladoras pelas burguesias regionais, nocaso o capitalismo monopolista, que a integração ocorre; e essa integração é, em verdade, aconsumação do processo de ‘nacionalização’ do capital”, isto é, logra invadir todos as porções docontinental espaço nacional. Arremata sua análise com a célebre frase, que se tornaria a expressãosíntese do processo de integração do mercado nacional brasileiro: “há a substituição de umaeconomia nacional formada por várias economias regionais por uma economia nacional localizadaem diversas partes do território nacional”.

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Também neste momento questões estruturais colocadas por Celso Furtado se manifestam,com destaque para a natureza extensiva (e predatória) do desenvolvimento capitalista brasileiro. Aapropriação contínua de porções territoriais em (re)estruturação nas áreas das frentes de expansão  permitia ganhos extraordinários, apesar dos baixos rendimentos físicos da terra em seu eternodeslocamento de fronteira. Furtado ressalta, por exemplo, a persistências da itinerância daagricultura pelo vasto território nacional20. A predação de terras também é ressaltada da agricultura

itinerante reproduzia os padrões estruturais econômicos e políticos. “A dilatação da fronteiraagrícola reproduzia o padrão de concentração da propriedade, da renda e do poder, a ‘ofertaelástica’ de mão-de-obra, nesse caso excluída não só de propriedade, mas também de posse,mantendo a estrutura das relações sociais predominantes: patrimonialismo, submissão emarginalidade social” (Cano, 2002: 119). É uma história de marcha predatória de fuga para frenteterritorial. Vários autores na tradição de Furtado irão destacar os entraves estruturais que o legadohistórico perverso (estrutura concentrada de propriedade e de renda, débeis relações capitalistas de produção, etc) colocava às suas diversas regiões, sobretudo às periféricas, impedindo a formação“mais natural” de espaços de produção manufatureira “regionalizados”. Isso porque “só se poderiaimaginar desconcentração com uma efetiva distribuição de renda e de terra (…) [sem isso, noBrasil] o desenvolvimento destes mercados ficava restringido a algumas áreas e o restante doterritório nacional integrava-se, apenas parcialmente, aos circuitos mercantis que se formavam nas

regiões mais atrasadas e mais pobres do país; praticamente obstaculizava-se a expansão industrialregionalizada” (Negri, 1994: 135).

Ignácio Rangel ensinava, já em trabalhos da década de 1960, que a correta interpretação daquestão dos desníveis regionais brasileiros deve ser realizada no âmbito da discussão do processo deintegração das economias regionais inserido no contexto do desenvolvimento da economia nacional.“ao mesmo tempo que pugnava – com o apoio das massas progressistas do povo – pelaconsolidação das barreiras externas, delimitadoras do espaço econômico no qual se desenvolveria ocapitalismo industrial brasileiro, a burguesia industrial pugnava pela supressão gradual das barreirasinternas, que compartimentavam o mercado nacional de fatores e de produtos” [dirigindo suasforças política e econômica] “contra o complexo de interesses pré-capitalistas que tendia a dividir omercado nacional numa constelação de mercados regionais...” (...). Assim, “a unificação domercado interno, ao soldar, num único mercado nacional a constelação de mercados regionais eestaduais, ampliava a escala dos possíveis projetos substituidores de importações” (2000: 181-184).

Furtado colocou nestes termos o dilema: “Num país de baixo nível de renda, afragmentação regional do mercado interno constituía sério obstáculo à formação de um sistemaindustrial (...) Inexistia base econômica em que fundar a unidade política” (1999: 50).

  Não obstante, o processo de industrialização avançou – sem “homogeneização social” – arrastando e acicatando o conjunto das atividades econômicas terciárias, agropecuárias, de suporteinfra-estrutural, etc. Transformações materiais abrangentes se processaram, porém nunca foramacompanhadas de habilitação ou maior acessibilidade, por parte da maioria da população, à  propriedade, à terra rural ou urbana, à educação e saúde de qualidade, à moradia, aos serviçosurbanos, à inserção formal no mercado de trabalho, à renda com permanência e segurança, ou seja,sem direitos à economia urbana moderna, etc. Contudo, avançou-se na construção de um espaçonacional, consolidando uma capacidade de dar coerência à valorização de uma ampla frente decapitais – bastante assimétricos, segundo os cortes setoriais, regionais, de porte, etc – mas agoraintegrados produtivamente, persistindo e até aumentando as desigualdades entre as regiões do país.

O trabalho do PIMES (1984), “Desigualdades Regionais o Desenvolvimento Brasileiro”,em quatro volumes, se constitui em esforço de longo alcance procurando analisar as diversas facetasdestes persistentes desequilíbrios regionais do país e as políticas públias implementadas para seu

20 Em capítulo neste livro, Wilson Cano destaca este aspecto das contribuições de Furtado.

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enfrentamento. Investiga, sob diferentes prismas, tais desequilíbrios, adequadamente inseridos nocontexto do movimento cíclico do ambiente macroeconômico e seus específicos impactos espaciais.Entre os variados aspectos aprofundadamente pesquisados, procura verificar como as estruturaseconômicas regionais são transformadas a partir da integração com os centros hegemônicos,discutindo como a natureza destas articulações, se competitivas ou complementares, determinam,em parte, o dinamismo das mesmas. Para o período pós 1970 sugere ligeira tendência à

desconcentração, quando a escala espacial de análise são as cinco macro-regiões, apontando, por outro lado, para o aumento das desigualdades intra-regionais.

As pesquisas de Vilmar Faria (1991) demonstram que se consolidou no Brasil umacomplexa sociedade urbano-industrial, que segundo, seria marcada pelas especificidades de ser “pobre, de consumo, heterogênea e desigual e erguida na periferia pobre do sistema capitalista,crescentemente desigual”.

Preservou-se, recriou-se, e até amplificou-se os traços de atraso estrutural, exclusão social ede afirmação de estruturas de dominação arcaicas (de renda, da propriedade, de dominação política,de acesso ao Estado, etc.) (Cano, 1981). Mas, sobretudo, manteve-se sem resolução a dramáticaquestão agrária. Vários fatores amortecedores do “caos social” foram criados e aperfeiçoados.Sobretudo conheceu-se uma enorme (talvez uma das maiores do mundo) mobilidade social e

espacial. Dentre estes amortecedores cabe destaque às fronteiras agrícolas, que se constituíram emverdadeiras “válvulas de escape”.

Todo este processo histórico de desenvolvimento econômico foi caracterizado, no período1930/1970, por intenso processo de concentração econômica na região Sudeste, principalmente emSão Paulo. O ano de 1970 apresentou o auge da concentração industrial. O Sudeste, naquele ano,respondia por 81% da produção industrial do país, sendo que São Paulo detinha 58% do totalnacional. Outro dado ilustra a situação de região mais dinâmica do país concentradora não apenasda produção industrial mas também da agrícola e terciária: em 1970 o Sudeste contribuía com 2/3do PIB brasileiro, sendo que São Paulo contribuía com 40% (Cano, 1981).

Durante a década de 1970 esse quadro de grande concentração industrial começou a mudar,afirmando-se o processo de desconcentração econômica em direção ao interior de São Paulo e às

demais regiões do país. Ocorreu a perda de importância da Região Metropolitana de São Paulo e a“interiorização da indústria paulista” foi bastante expressiva, ao mesmo tempo algumas subregiõesda periferia nacional receberam investimentos. Assim, revela-se o processo de desconcentraçãoindustrial regional (1970/1985): na busca por novos horizontes de acumulação, a periferia éacionada e se torna mais complexa e urbanizada.

Uma vasta literatura, desde o final da década de 1980 vem analisando em detalhes asdiversas dimensões e dinâmicas que favoreceram esse processo de desenvolvimento interiorizadona economia paulista (Cano, 1988 e 1992) e a polêmica sobre os determinantes do processo dedesconcentração produtiva (Azzoni, 1986); (Diniz, 1993); (Negri, 1994); (Cano, 1995); (Pacheco,1996); (Guimarães Neto, 1995 e 1997), dentre outros.

Carlos Azzoni (1986), em aprofundado trabalho, procurou contestar as teses do mainstream

da economia regional sobre “reversão da polarização” da RMSP, discutindo o papel do “campoaglomerativo” (raio de 150Km a partir da cidade de São Paulo). Diniz (1993) apresentou a definiçãode um polígono, que segundo ele ampliaria o conceito anterior de campo aglomerativo, levando emconsideração uma região mais ampla21. Negri (1994) questionou esse conceito por não contemplar as dinâmicas que estariam fora da área poligonal. Cano (1995) ponderou que a desconcentração

21 Que “tenderia a atingir as cidades do interior do próprio estado de São Paulo, o sul do triângulo de Minas Gerais e onorte do Paraná, podendo estender, no sentido sul para o estado de Santa Catarina e nordeste do Rio Grande do Sul e, nosentido norte, para a região central de Minas Gerais” (Diniz, 1993: 31).

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apresentava também forte viés estatístico22. Pacheco (1996) apresentou a tese dos riscos defragmentação da economia nacional, na medida em que “ilhas de dinamismo”, poderiam se inserir diretamente na economia globalizada, desfazendo os históricos os nexos de solidarização entre onúcleo e as periferias. Guimarães Neto (1995 e 1997) sintetizou o debate e apresentou asimplicações sociais e no mercado de trabalho neste processo.

Estes e outros autores contribuíram para a análise da dinâmica regional brasileira, aoapontarem como os principais determinantes do processo de descontração produtiva: o aumento daschamadas deseconomias de aglomeração da área metropolitana de São Paulo (preço dos aluguéis,das terras, dos salários relativos e também da pressão sindical etc), enquanto outras áreas do país,além do interior paulista, começaram a se tornar mais atrativas, induzidas e acicatadas por investimentos, incentivos e coordenação do papel estruturante do Estado; Destacaram ainda: aconcorrência intercapitalista, a integração produtiva do mercado nacional, a expansão das fronteirasagrícola e mineral, a forma desconcentrada do sistema urbano brasileiro, as novas formas deorganização empresariais, os efeitos da crise nas áreas mais industrializadas etc, dentre os fatoresdesconcentradores da atividade econômica por áreas seletivas do amplo território nacional.

A ação estatal, sobretudo na periferia nacional, vinha reforçando, desde a implementação do bloco de investimentos do II PND, a infra-estrutura básica, promovendo investimentos diretos de

suas estatais, antes de tudo, voltado para a expansão da indústria de insumos básicos e de bens decapital. A expansão do agribusiness, dos complexos agromercantis e agropecuários eagroindustriais, as diferentes formas de inserção das matrizes produtivas regionais nos específicosmercados internacionais, de acordo com suas “especializações” setoriais produtivas etc,determinaram que diversas porções periféricas lograssem dinamizar suas bases produtivasregionais, gerar inserção ocupacional para certas parcelas da população e diversificar algumas desuas cidades-pólo.

Implantam-se equipamentos urbanos de porte e serviços sofisticados, com a expansãogeneralizada do terciário, introjetando novos estilos de vida, padrões de consumo, formas de morar,de se deslocar, etc que requereram a construção de um urbano moderno ao longo da rede urbana,que avança em extensividade e intensificação de porte e complexidade. Essa expansão beneficiou osramos executores das obras públicas de porte, nas áreas de rodovias, saneamento (abastecimento deágua), energia elétrica, etc representaram setores-chave da preferência do capital nacional pelasórbitas não-industriais, segundo Lessa e Dain (1982).

Carlos Vainer (1990) tinha lançado a idéia, agora retomada em suas pesquisas, de que “nãoeram os planejadores regionais que planejavam a região, mas os planejadores e tomadores dedecisão em cada um dos macro-setores de infra-estrutura: no setor elétrico, a Eletrobrás e suascoligadas (CHEFS, Eletronorte, Furnas, Eletrosul, Light), bem como algumas grandes empresasestaduais (Eletropaulo, Copel); no setor mínero-metalúrgico, a Companhia Vale do Rio Doce, asgrandes companhias siderúrgicas estatais; no setor petroquímico, a Petrobrás” (Vainer, 2007: 83).

O período autoritário e de tratamento tecnocrático da questão nacional, em geral, e dasquestões urbanas e regionais, em particular, contribuiu para soldar os interesses mercantis maisarcaicos em torno da expansão urbano-regional. Tal esquema expansivo urbano representará papeldecisivo no “pacto de compromisso” das oligarquias regionais. Os espaços regionais e a cidade  brasileira vão se enredando na malha desses interesses patrimonialistas e especulativos. Noterritório se arma uma equação político-econômica eficaz entre os proprietários fundiários, o capitalde incorporação, o capital de construção e o capital financeiro, que passam a desfrutar de condições

22 pois “a crise dos anos 80 parece ter afetado mais a economia de São Paulo, aumentando a desconcentração muito mais pelas quedas mais altas da produção paulista do que por ‘maiores altas’ na produção periférica, constituindo, talvez, umadesconcentração mais de caráter ‘estatístico’ ” (Cano, 1995).

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vantajosas e a auferir ganhos extraordinários. Estas questões foram estudadas por Ermínia Maricato(2001), que afirma que o Brasil é marcado pelo gigantesco movimento de construção de cidades,mas, ao mesmo tempo, o processo de urbanização se apresenta como uma máquina de produzir favelas e depredar o meio ambiente. A rápida produção desse ambiente socialmente construído possibilitou a auferição de ganhos pecuniários e trocas políticas, sobretudo pelo papel central que acidade ilegal desempenha nesse processo.

A partir da crise da dívida dos periféricos, com a ruptura do circuito de financiamentoexterno, tivemos variados constrangimentos naquela trajetória histórica de “fuga para frente”. Umaconjugação de fatores determinou o esgotamento do padrão de crescimento e o desmonte dosmecanismos articuladores do processo de desenvolvimento. O Estado foi imobilizado em sua açãosistêmica, reguladora e estruturante. Este perde poder de coordenação, de orientar e promover frentes de expansão periféricas ou mesmo “dentro do núcleo central”.

As relações dinâmicas entre as decisões públicas e privadas, que era amparado por amplacapacidade de coordenação, se perderam. Com esta perda de capacidade coordenadora do Estado  brasileiro, grande parte do acionamento da periferia se deu seguindo os caminhos de menor resistência, convergindo para o processamento e/ou industrialização de commodities minerais,mínero-metarlúrgicas, siderúrgicas, agrícolas e agroindustriais. Sua competitividade esteve

ancorada em economias de escala e em energia, mão-de-obra e recursos naturais baratos, ou seja,em vantagens competitivas espúrias, altamente favorecidas e amparadas por incentivos fiscais eapoiadas em políticas de atração de investimentos a qualquer custo, muitas vezes com débeisrequisitos de integração intersetorial.

 Nos anos 1990 afirma-se a opção neoliberal no país, conhecido “Consenso de Washington”,avança-se na desregulamentação dos mercados, privatizando os serviços de utilidade pública, osetor produtivo estatal e os sistemas nacionais de infraestrutura. Sem direção e coordenação,“entregando aos mercados” as principais decisões estratégicas, o país viverá experiência decrescente falta de sustentação de sua trajetória de crescimento. Velhos impasses e recorrênciashistóricas se repõem, com a marcante desarticulação econômica, social e política, desvelando osimpasses estruturais da construção da nação brasileira. Furtado (1999) assim sintetizou este estadode coisas: “Em nenhum momento da nossa história foi tão grande a distância entre o que somos e oque esperávamos ser”.

A atração de inversões do capital estrangeiro se dará nos setores do patrimônio público privatizado e em processos de fusões e aquisições, sancionando a regressão produtiva, acentuandoainda mais nosso padrão rentista-patrimonialista, e confirmando os temores de Celso Furtado, desdedécadas anteriores, de entrega dos principais centros de decisão às forças da transnacionalização.Em “Brasil: a construção interrompida”, Furtado (1992: 35) alerta para o fato de que : “em um paísainda em formação, como é o Brasil, a predominância da lógica das empresas transnacionais naordenação das atividades econômicas conduzirá quase necessariamente a tensões inter-regionais, àexacerbação de rivalidades corporativas e à formação de bolsões de miséria, tudo apontando para ainviabilização do país como projeto nacional”.

Vai-se perdendo ainda mais o comando sobre as possibilidades de rumos estratégicos que o  país poderia trilhar. Os investimentos realizados têm baixa qualidade, com baixa capacidade degeração de encadeamentos, empregos e divisas, aprofundado ainda as marcas de estruturas produtivas heterogêneas e pouco diversificadas.

  Neste contexto, os estudos regionais críticos mais recentes passaram a averiguar asensibilidade diferencial das regiões à crise, à política macroeconômica, à deterioração da infra-estrutura econômica, à abertura comercial, aos novos determinantes empresariais emicroeconômicos (sobretudo à “reestruturação produtiva” e organizacional) etc. Procuraramavaliar, em pesquisas minuciosas regionalizadas, como esses processos impactaram as distintas

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  porções do território nacional e o que representaram em termos de desmontagem e penalizaçãoseletiva, regional e setorialmente.

Wilson Cano (2008) procura atualizar o debate sobre concentração e desconcentraçãoregional, apontando os principais desafios da “questão regional brasileira”. Inserindo esta  problemática no contexto nacional e macroeconômico, demonstra como as últimas quase três

décadas de pífio crescimento, desemprego, valorização cambial e neoliberalismo, debilitaram fiscale financeiramente o Estado, nos três níveis de governo, esvaziando suas instituições de planejamento e suas estruturas e instrumentos de desenvolvimento regional. Neste sentido periodizaa dimensão regional do processo de desconcentração produtiva no Brasil, sugerindo um primeiromomento de desconcentração virtuosa entre 1970/1980, advertindo que ao longo da década de 1980a desconcentração industrial prosseguiu, porém em ritmo mais vagaroso, pois havia uma“tendência” desconcentradora entre 1970 e 1985, porém ela já não era tão clara ao se interpretar osdados do período 1985-1989. A partir daí, teríamos ingressado na era neoliberal (1989-2005), emque se consolida um momento de desconcentração espúria. Esclarece que este processo dedesconcentração industrial, apenas analisado pelo prisma da simples redução da participação de SãoPaulo no total nacional, pode ter uma interpretação equivocada, pois pode esconder vários efeitosespúrios, sejam os estatísticos ou outros, como por exemplo a atração artificial por meio dasdisputas da guerra fiscal, com efeitos deletérios para o conjunto do país, não se constituindo emvantagem para nenhuma de suas partes23.

Wilson Cano esclarece que a derrubada do investimento público e as disputas, em diversosrounds da Guerra Fiscal, debilitaram as articulações da periferia com a indústria paulista. Tambémaponta o risco de fragmentação e assume a tese da desindustrialização, afirmando que se não seestrutura um novo projeto de desenvolvimento nacional será impossível a formulação e execução deuma eficaz política de desenvolvimento regional.

O tema do federalismo é uma constância nos debates críticos e em Celso Furtado. SegundoFurtado a história brasileira foi marcada pela “pulsação centralismo-federalismo” decorrente de doismarcos culturais do país: “a consciência de unidade nacional e o irredutível da identidade regional”(Furtado, 1999: 47).

O Brasil vive o esgarçamento de seu pacto federativo e o enfraquecimento dos centros dedecisão interna presentes no território nacional. A Guerra Fiscal vem sancionar a perda de poder dedecisão do ente público, ao comprometer recursos governamentais escassos e transferir decisõesestratégicas de localização produtiva para o espaço privado. O planejamento estadual se subordinaaos interesses e decisões das grandes empresas. O aparato de coordenação da ação pública foidesmantelado em todos os níveis de governo.

O recente trabalho de Aristides Monteiro Neto (2005: 4) sintetiza um conjunto importantede determinações da situação vivida pelo país nas últimas décadas: “As novas formas decoordenação do Estado erigidas nos anos 1990 (abertura comercial e financeira, privatizações etc) eas escolhas de política econômica (câmbio valorizado, juros elevados) agudizaram a crise fiscal efinanceira do setor público ao invés de resolvê-la. No que respeita à questão regional, o ambientedecorrente das reformas institucionais cristalizadas tornou propício o acirramento da guerra fiscalentre unidades da federação; tornou, também, em certo sentido, obsoletos os principais instrumentosde desenvolvimento regional, e reduziu a capacidade de implementação de políticas setoriaisimportantes para o crescimento econômico nas regiões”. Conclui que “os elementos que

23 “A desconcentração no sentido São Paulo-restante do país, se mantida a política neoliberal, continuará tendo um altocomponente espúrio, e padecerá, crescentemente, dos efeitos perversos que a desestruturação industrial está causando.Tais efeitos não só têm prejudicado ainda mais a economia paulista, como também, obviamente, afetam o parqueindustrial periférico, que é muito menos articulado que o de São Paulo” Cano (2008: 196).

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caracterizaram um vetor articulado de coordenação estatal voltado para o desenvolvimento nacional – aí também se inscrevendo sua vertente regional – entre os anos 1960 e 1980, os quais amarravamconcatenadamente a geração de fundos públicos a políticas de gastos visando a transformação emodernização das estruturas produtivas, não se encontram mais presentes no novo ciclo dereorganização da intervenção governamental dos anos 1990”.

As tendências pontuais de concentração e reconcentração confirmaram uma divisão inter-regional do trabalho marcada por grandes desigualdades e heterogeneidades inter e intra-regionais e por alguns poucos focos localizados de maior dinamismo econômico relativo no interior de cadauma das cinco macrorregiões brasileiras.

Após a “retirada da ação estatal sistêmica” esses processos ocorreram de maneira bastantedesordenada e seletiva. Os impactos derivados das mudanças no cenário macroeconômico nãoforam capazes de determinar uma trajetória vigorosa de crescimento da economia brasileira, muitomenos de combater os agudos desequilíbrios entre as suas regiões. As mudanças que ocorreram nãoalteraram radicalmente a configuração do padrão regional brasileiro anterior.

Também a experiência recente de retomada do debate e a formulação de uma políticanacional de desenvolvimento regional não logrou reunir forças políticas para sua efetivaimplementação.

Considerações Finais

A obra magna de Celso Furtado, Formação Econômica do Brasil, a partir de sua publicação em1959, viria a se constituir em matriz e em abordagem definitiva sobre a questão regional do país. Oumelhor, em fundamento último e agenda abrangente de qualquer análise séria que procuredesvendar a natureza, a estrutura e a dinâmica de alguma de suas regiões específicas ou daarticulação entre elas, e pensar o desenvolvimento nacional como um todo, devidamente inserido nocontexto mundial.

Todas as principais questões estruturais sobre o Brasil estão aí: sua dimensão continental;suas marcantes heterogeneidades internas; seu caráter de país subdesenvolvido (a precariedade doscentros internos autônomos de decisão com soberania) e nação em construção; sua natureza

dependente do exterior; a difícil composição de uma unidade territorial, costurada lentamente sobreuma grande diversidade social, geográfica, cultural etc; a distinção da trajetória histórica de nossaformação econômica em relação a casos como o norte-americano; a análise aprofundada da gênese,constituição e consolidação das grandes diferenças regionais no desenvolvimento brasileiro, desde o  período colonial; as marcadas assincronias do tempo histórico diferenciado da formação,movimento cíclico e transformações dessas economias regionais; as raízes de seus processosespecíficos de industrialização; a formação e articulação do mercado interno e do mercado detrabalho; as relações entre essas várias economias regionais, que instituirão posteriormente umaeconomia nacional integrada; a falta de “homogeneidade social”; os percalços da modernizaçãocultural e do comportamento mimético de suas elites; os riscos latentes ou concretos defragmentação, em razão da crise permanente do pacto federativo; a necessidade de presençadecisiva, muita vezes não entendida, do Estado e do Planejamento para estruturar estratégias de

desenvolvimento.Como corretamente afirmou Francisco de Oliveira, Celso Furtado é o pensamento militante

vivo e permanente. Assim, “sua obra deve ser obrigatoriamente ponto de partida, não de chegada”(Oliveira, 2007).

 Neste sentido, buscamos nesse capítulo sistematizar algumas das principais contribuiçõesde Furtado nesta sua obra seminal de 1959 e nos capítulos de seus livros posteriores que analisarama questão regional. Em seguida foram pontuadas algumas contribuições de certos autoresconsiderados herdeiros, em alguma medida, da tradição furtadiana. Certamente esta foi uma

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amostra muito restrita e seletiva frente à riqueza das contribuições que investigaram a problemáticaregional brasileira.

A produção científica voltada ao conhecimento da dimensão regional do processo dedesenvolvimento brasileiro foi enorme neste meio século.

Paralelamente a esse maior conhecimento que a sociedade tem da questão regional, ocorreu,

nas três últimas décadas, um processo de deterioração do planejamento nacional, em particular doregional, no âmbito do Governo Federal, com o desmonte de um conjunto de instituições quetiveram, e poderiam ter, papel relevante no encaminhamento de soluções para nossos dramáticos problemas sociais e regionais.

Entregue a décadas de conjunturalismo, o Brasil concretamente em seu dia-a-dia foi seafastando dos ensinamentos de Furtado no sentido de buscar conceber e concretizar um projetonacional de desenvolvimento capaz de contemplar adequadamente os espaços diferenciados da ricaheterogeneidade da economia e da sociedade brasileiras, criando instrumentos que permitissemacionar e mobilizar tal diversidade social, cultural e geográfica em favor de um desenvolvimentoincludente e soberano.

Furtado denunciou, já no século XXI, que “entregaram uma nação em construção travada

ao mercado”. Ele vinha sugerindo, durante cinco décadas, em sua vasta obra, estratégias concretas para que o Brasil: pudesse colocar em ação as potencialidades latentes de seu sistema de forças produtivas, constituindo um vigoroso “sistema econômico nacional”; desatasse as energias contidasda criatividade e valorizasse a riqueza cultural de nossa civilização nacional, dotada de altadiversidade, “abrindo espaço à realização das potencialidades de nossa cultura”; lograsse garantir “que o desenvolvimento material se difunda por todo o território nacional”; constituísse estruturassociais habilitadas a gerar “forças preventivas e corretivas nos processos de excessiva concentraçãode poder”.

Assim, ele nos deixa uma mensagem eterna e consistente de necessidade contínua deconstrução de cidadania, com radicalidade democrática, redistribuição de renda, riqueza, poder eacesso ao Estado. Esse grande mestre e cientista social também dedicou sua vida a divulgar suaaposta de que o Brasil poderá um dia, tendo por base a potência criativa e a inventividade de seu  povo, enriquecer seu universo de valores e ampliar seus horizontes de possibilidades e suacapacidade de ação, superando a passividade e o imobilismo.

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5/11/2018 A formação econômica do Brasil e a questão regional - slidepdf.com

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