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3 A INTEGRAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO: UMA VISÃO CLINICA A pluralidade da constituição humana não é captada completamente numa avaliação psicológica. No texto, GORAYEB (2001) faz uma diferenciação da avaliação clinica feita pela psicopatologia e a feita pela medicina. Enfatiza que para um estudo psicopatológico é necessário que leve em consideração a questão vivencial do sujeito, com o ambiente que está inserido, as pessoas com quem convive, considerando a questão vivencial para aqueles que dela participam. O desenvolvimento do sujeito dar-se-ia através das suas experiências vivenciadas dentro do contexto que o contém, ou seja, do contexto onde está inserido o indivíduo. Assim, a psicopatologia tem um interesse e um campo especifico de aplicação, que não se confunde com o ideal médico da anatomia patológica, que pretende detectar um distúrbio anatômico ou funcional para cada manifestação clinica encontrada. A psicopatologia leva em consideração, independentemente de alguma deficiência anatomopatológica, as vivências do sujeito, pois é a partir daí que para a psicopatologia irá se constituir um sujeito saudável ou não psicologicamente. Para um desenvolvimento saudável de uma criança é necessário que o ambiente e também sua interação com o mesmo seja saudável. O ambiente não pode ser hostil, principalmente se esta criança possui uma deficiência anatomopatológica. Esse ambiente deve lhe proporcionar a aceitação e a integração com a sua dificuldade no convívio diário com as pessoas, e as

A Integração e Desenvolvimento Resenha Final

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A INTEGRAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO: UMA VISÃO CLINICA

A pluralidade da constituição humana não é captada completamente numa

avaliação psicológica. No texto, GORAYEB (2001) faz uma diferenciação da

avaliação clinica feita pela psicopatologia e a feita pela medicina. Enfatiza que para

um estudo psicopatológico é necessário que leve em consideração a questão

vivencial do sujeito, com o ambiente que está inserido, as pessoas com quem

convive, considerando a questão vivencial para aqueles que dela participam.

O desenvolvimento do sujeito dar-se-ia através das suas experiências

vivenciadas dentro do contexto que o contém, ou seja, do contexto onde está

inserido o indivíduo. Assim, a psicopatologia tem um interesse e um campo

especifico de aplicação, que não se confunde com o ideal médico da anatomia

patológica, que pretende detectar um distúrbio anatômico ou funcional para cada

manifestação clinica encontrada. A psicopatologia leva em consideração,

independentemente de alguma deficiência anatomopatológica, as vivências do

sujeito, pois é a partir daí que para a psicopatologia irá se constituir um sujeito

saudável ou não psicologicamente.

Para um desenvolvimento saudável de uma criança é necessário que o

ambiente e também sua interação com o mesmo seja saudável. O ambiente não

pode ser hostil, principalmente se esta criança possui uma deficiência

anatomopatológica. Esse ambiente deve lhe proporcionar a aceitação e a integração

com a sua dificuldade no convívio diário com as pessoas, e as pessoas também

precisam lhe proporcionar a mesma aceitação sem a presença de nenhum

preconceito. Assim na visão da psicopatologia essa criança irá se desenvolver com

um psiquismo saudável, independente da sua deficiência anatomopatológica, porque

ela desde pequena saberá conviver com esta diferença.

O autor afirma que o diagnóstico psicopatológico não pode ser o mesmo que

o da medicina, porque os diagnósticos médicos visam à identificação da doença,

desconsiderando a pessoa. Já na psicopatologia, o que se leva em conta é

justamente a pessoa e a suas experiências vivenciais. Pode-se dizer que há

tendência à integração do sujeito com o meio onde vive e com aqueles que o

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cercam, e a avalição psicopatológica deve levar em consideração esses pontos na

vida da pessoa, neste caso da criança.

A integração é um comportamento natural dos indivíduos no seu processo de

desenvolvimento. Nesse processo, há tendência na integração de diversos aspectos

fragmentados, de diversos sentimentos e impulsos, e por fim, uma tendência à

integração do indivíduo no meio em que ele vive e com aqueles que o cercam.

Essas tendências fazem parte do processo de desenvolvimento, quando ocorre

modificações neste rumo é um sinal de anormalidade.

Muitos indivíduos, na tentativa de alcançar o equilíbrio e manter sua tendência

à integração, apresentam atitudes que podem ser consideradas sintomas graves de

distúrbios mentais. Sendo assim, é mais adequado fazer uma investigação clínica

nos elementos que participam do processo de integração, tais como a organização

mental dos indivíduos.

As experiências vividas subjetivamente, na medida em que o tempo passa,

tornam-se elementos integrantes da estrutura mental, mesmo que

inconscientemente. Essas experiências podem ser revividas em algum outro

momento da vida. Uma pessoa que possui um comportamento regressivo, não quer

dizer que ela volta ao tempo, mas sim que, ela apresenta comportamento que antes

já havia predominado em sua vida, e foi integrado juntamente com outros elementos,

à sua estrutura mental.

Os instrumentos para o diagnóstico são fundamentais para facilitar a

comunicação entre profissionais bem para construir uma abordagem para

intervenção (PAOLIELLO, 2001). Contudo, uma redução do sofrimento humano as

tabelas classificatórias ou aos resultados obtidos com a aplicação dos instrumentos

favorece a criação ou manutenção de preconceitos (GORAYEB, 1985). A crítica

atual sobre a tendência na psiquiatria – e porque não dizer nas ciências – de reduzir

o homem aos dados coletados em processos cada vez mais tecnológicos procura

destacar a necessidade de voltar o olhar do psiquiatra para a pessoa enquanto ser

desejante e gozoso (PAOLIELLO, 2001), que, a sua frente, diz, fala, expressa seu

sintoma. Este por vezes não significa uma patologia, mas uma maneira de estar no

mundo e se adequar ao modus vivendi no qual está inserido. Essa tendência é bem

materializada na utilização quase hegemônica dos manuais de classificação, seja o

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DSM ou o CID. Sua utilização para diagnósticos em crianças é controvérsia, pois

como nem sempre leva “em consideração fatores básicos como as fases de

desenvolvimento, sua correlação com os sintomas e a resiliência. Também não

exploram as possíveis relações entre o sintoma, o ambiente familiar e outros

eventos de vida da criança” (KESROUANI & CELERI, 2007). Por isso, o trabalho

com crianças em psiquiatria dependerá da concepção teórica do profissional. Esse

embasamento teórico terá consequências na prática clínica tanto na escolha do

modelo diagnóstico a seguir como na abordagem terapêutica a ser usada.

Importa destacar que há concepções teóricas diferentes, por vezes,

divergentes. A psiquiatria baseada no modelo anatomopatológico considera o

sintoma como uma alteração em alguma parte orgânica que produz sintomas

específicos, identificáveis em quaisquer sujeitos, passíveis de regulação através de

medicação (GORAYEB, 1985). Esse modelo visa atender a um processo histórico

que buscou dar cientificidade a psiquiatria, almejando uma objetivação e

exteriorização da psiquiatria, reduzindo a atividade psíquica do homem a uma

atividade cerebral. De acordo com PAOLIELLO, essa redução é um ato ideológico

destituindo a psiquiatria de sua função de articuladora da complexidade dos

fenômenos humanos (2001). Ocorre com isso uma exclusão da subjetivação.

Segundo GORAYEB (2001), há dois motivos para se não seguir esse modelo

anatomopatológico: o primeiro, é que as doenças entendidas como alterações

dependem sempre da experiência vivencial do sujeito e nem sempre tem relação

estrita com alterações biológicas e, segundo, os modos de adoecimento psíquico

tem uma lógica própria que não é necessariamente igual a lógica fisiológica. O autor

considera que há a possibilidade de existir maneiras peculiares de adoecimento da

mesma forma que há modos próprios de uma vida saudável psiquicamente. Assim

sendo, pode-se afirmar que certas formas de manifestar a doença estão

relacionadas às etapas de desenvolvimento do sujeito. E para que esse processo

aconteça, a integração é fundamental. Há no ser humano uma tendência a

integração dos diversos aspectos fragmentados da vida do sujeito, dos sentimentos

e impulsos bem como a integração do indivíduo com o meio e com aqueles com

quem convive. É sob a ótica dessa tendência de integração que alguns sintomas

podem ser considerados como tentativas de adaptação e não como uma patologia.

Assim temos uma visão dinâmica e evolutiva do indivíduo permitindo-nos analisar os

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diversos fatores envolvidos nesse processo de desenvolvimento normal ou

patológico. Nessa tendência de integração, dois conceitos são importantes:

regressão e fixação. A regressão aqui é entendida como um retorno ao modo de

funcionamento mental que foi predominante em determinada época. Esse retorno

não é aleatório, mas sim ocorre regressão para uma época para a qual ocorreu uma

fixação do sujeito. A regressão funciona então “como mecanismo de defesa, ou seja,

tentativas do aparelho mental de lidar com certas situações angustiantes e

conflitivas” (GORAYEB, 1985). Destaca-se a regressão onde a fixação atua de tal

modo que a busca de uma solução para uma conflitiva atual se baseia em uma

solução anteriormente experimentada. Agregado a esses conceitos está também a

concepção de conflito psíquico, como um fato intrapsíquico, originado nas

tendências instintivas, por vezes contraditórias, existentes na vida emocional. Tudo

está presente na vida do indivíduo e desconsiderar tais característica em prol da

padronização de sintomas pode conduzir a erros diagnósticos e terapêuticos.

É com o olhar clínico, considerando a relação médico-paciente, que os

sintomas adquirem seu valor, sua significação. Citando Winnicott, KESROUANI &

CELERI (2007) afirmam que o sintoma deve ser entendido como “indicador para

uma avaliação completa da história do desenvolvimento emocional da criança em

relação ao seu ambiente e à cultura.” Por isso, podemos alegar que nem sempre um

sintoma aponta para uma patologia e nem sempre as patologias manifestar-se-ão

com sintomas classificados nos manuais. Mesmo assim, podemos considerar os

sintomas como sinal de alerta de irregularidade na vida da criança, como sinais de

falhas no ambiente, como uma tentativa de conciliação do psiquismo com a

realidade e como uma busca de equilíbrio para organização geral do psiquismo. É a

análise dos sintomas que permitirá uma compreensão dos aspectos dinâmicos

envolvidos na história da criança e não uma mera quantificação acordada com os

dados de manuais.

Concordamos com KESROUANI & CELERI (2007) quando afirma que

o diagnóstico de crianças é difícil e depende das reflexões do campo teórico. Por

isso mesmo, somos favoráveis a prática clínica compreendida como ambiente que

possibilita a escuta do sujeito, do seu desejo e de sua dinâmica psíquica.

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REFERÊNCIAS

GORAYEB, Raul. Psicopatologia infantil. São Paulo: EPU, 1985.

KESROUANI, Rosana; CELERI, Eloísa Helena Valler. Diagnósticos em psiquiatria

infantil: uma reflexão a partir da obra de WinnicottRevista Latinoamericana de

Psicopatologia Fundamental [On-line] 2007, 10 (Marzo-Sin mes) : [Data de consulta:

19 / octubre / 2014] Disponível em:<http://www.redalyc.org/articulo.oa?

id=233017474004> ISSN 1415-4714

PAOLIELLO, Gilda. O problema do diagnóstico em psicopatologiaRevista

Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental [On-line] 2001, IV (Marzo-Sin

mes) : [Data de consulta: 19 / octubre / 2014] Disponível

em:<http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=233018218008> ISSN 1415-4714