A Intertextualidade No Genero Resenha

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"A Intertextualidade No Genero Resenha" Eliana Maria Severino Donaio RuizMelissa Bortoloto Faria

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  • A INTERTEXTUALIDADENO GNERO RESENHA1

    Eliana Maria Severino Donaio Ruiz2Melissa Bortoloto Faria3

    Resumo: O presente trabalho tem como objetivo investigar, sob a perspectiva terica da LingusticaTextual, como se manifesta o fenmeno da intertextualidade no gnero resenha. Para tanto, delimitaram-se como dados de pesquisa textos empricos recentes de resenhas publicadas nas esferas acadmica ejornalstica, nos quais buscou-se identificar as marcas das diversas categorias de intertextualidade.Partindo do pressuposto de que a resenha um texto dialgico que se prope a apresentar e avaliar outrotexto, os resultados obtidos com a anlise nos levam a confirmar nossa hiptese de que a intertextualidadeno gnero tecida, sobretudo, por meio da explicitude desse dilogo com textos e autores.Palavras-chave: Intertextualidade. Gnero Textual. Resenha.

    1 INTRODUOSem dvida, a resenha um dos gneros textuais mais praticados

    entre os trabalhos acadmicos, sobretudo a ttulo de aferio de leitura.Afora o contexto escolar, entretanto, a resenha tem espao garantido emsuportes tpicos como jornais e revistas, tanto na esfera jornalstica comona acadmica, ganhando a grande destaque, no somente por descrever,apresentar e avaliar objetos culturais, mas igualmente por articular, nessemovimento, o dilogo com textos e autores, de modo a permitirquestionamentos e reflexes diversas por parte tanto do leitor como doautor resenhado.

    Em vista disso, julgamos oportuno realizar uma pesquisa queinvestigasse a natureza da relao entre o gnero resenha e o fenmenoda intertextualidade na linguagem.

    1 Este artigo, elaborado em coautoria, fundamenta-se na monografia Intertextualidade: um estudodo fenmeno no gnero resenha, desenvolvida por Melissa Bortoloto Faria e orientada pela Profa.Dra. Eliana Maria Severino Donaio Ruiz, em 2009, no curso de Letras da USF - Universidade SoFrancisco, Itatiba, SP.2 Professora do Programa de Ps-graduao em Letras da UNINCOR Universidade Vale do RioVerde; ps-doutoranda em Lingustica Aplicada pela Unicamp. Email: [email protected] Licenciada em Letras pela USF Universidade So Francisco. Email: [email protected].

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    Embasado nos postulados tericos da Lingustica Textual, nossotrabalho procura, pois, responder seguinte pergunta de pesquisa: comose manifestam as relaes intertextuais no gnero resenha? E, tendocomo pressuposto o dialogismo bakhtiniano, incorporado pelaLingustica Textual princpio constitutivo da linguagem, que garanteque todo enunciado se constitui como rplica de outros, numa relao dealiana ou confronto, e segundo o qual todo discurso essencialmentedialgico tanto pelo fato de que procede de algum como pelo fato deque se dirige para algum (BAKHTIN, [1977] 1981, p. 113), em outraspalavras, a ideia de que a intertextualidade um dos mais importantesrecursos para a construo do sentido de um texto , hipotetizamos que,no gnero resenha, as relaes intertextuais so estabelecidas por meioda utilizao, por parte do resenhador, de marcas lingusticas explcitasdo dilogo com textos e autores.

    Buscaremos, portanto, investigar essa necessria presena dooutro naquilo que dito na resenha, analisando os recursos deintertextualidade que so utilizados em textos empricos. O corpus seconstitui de exemplares do gnero das esferas jornalstica e acadmica:resenhas publicadas durante o ms de agosto de 2009, pelo jornal Folhade S. Paulo, e resenhas acadmicas extradas de peridicos de Lingusticaeditados no primeiro semestre do mesmo ano.2 VISO GERAL DO GNERO RESENHA

    Quando o tema so os gneros do discurso, no h como deixarde fazer remisso clssica definio de Bakhtin ([1979] 1997, p.279),reiterada em diversos trabalhos acadmicos, de que cada esfera deutilizao da lngua elabora seus tipos relativamente estveis deenunciados, sendo isso que denominamos gneros do discurso.

    Tais formas-padro relativamente estveis de estruturao dosenunciados so portadoras de valores de uso determinados por uma dadaformao social e so selecionadas pelo agente produtor em funo daao de linguagem que este deseja executar numa situao especfica deenunciao e em uma determinada esfera de atividade humana. Comoaponta Bronckart (1994), cabe ao agente produtor, numa situaodefinida, tomar uma srie de decises que levam em conta os objetivos

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    visados, o lugar social, os papis dos participantes, e que dizem respeito escolha no s do gnero mais adequado, mas tambm da organizaosequencial ou linear do contedo temtico, dos mecanismos detextualizao e dos mecanismos enunciativos.

    A escolha do gnero configura-se, pois, como uma decisoestratgica por parte do agente produtor, que envolve uma confrontaoentre os valores por ele atribudos aos parmetros da situao (mundosfsico e sociosubjetivo) e os usos atribudos aos gneros do intertexto este constitudo por uma espcie de reservatrio de modelos textuais, ouseja, pelo conjunto de gneros de texto elaborados por geraesanteriores e que podem ser utilizados numa situao especfica, comeventuais transformaes (KOCH; BENTES; CAVALCANTE, 2007).

    Nesse sentido, o ato de resenhar uma ao de linguagem que,ao dar crdito ao trabalho desenvolvido por produtores de textos ou aobras de uma determinada rea, visa a uma apresentao crtica de umdeterminado fato cultural por exemplo, a publicao de um livro, olanamento de um CD, DVD, filme ou pea teatral, um show, umaexposio etc. servindo, dessa forma, como uma bssola ao leitor(FERRAZ, 2007). Por esta razo, a resenha tem espao privilegiado emesferas especficas de atividade humana, como a acadmica e a dojornalismo cultural, sendo definida por Machado, Lousada e Abreu-Tardelli (2007, p. 14) como:

    um gnero que pode ser chamado por outros nomes, comoresenha crtica, e que exige que os textos que a ele pertenamtragam informaes centrais sobre os contedos e sobre outrosaspectos de outro(s) texto(s) lido(s) como, por exemplo, sobreo seu contexto de produo e recepo, sua organizao global,suas relaes com outros textos etc., e que, alm disso, tragamcomentrios do resenhista no apenas sobre os contedos, mastambm sobre todos esses outros aspectos.

    Assim, resenhar uma atividade que exige do produtorconhecimento sobre o assunto, para estabelecer comparaes, alm dematuridade intelectual, para fazer avaliaes e emitir juzos de valor(MEDEIROS, 2000, p. 137).

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    Veiculada em suportes especficos como jornais e revistas(acadmicas ou no) e destinada, principalmente, a leitores epesquisadores que visam, sobretudo, a alargar sua compreenso acercado objeto cultural resenhado. A resenha , segundo Oliveira (2007),constituda de dois grandes movimentos textuais, que em geralapresentam-se imbricados: o resumo (ou descrio, apresentao) daobra e a opinio (julgamento de valor) do resenhista acerca desta sendoque, no que diz respeito opinio, parece haver, sobretudo no caso dasresenhas de cunho acadmico, um acordo tcito no sentido de umcuidado em se manter a polidez, a fim de se evitar tom agressivo, sejarelativamente ao objeto resenhado seja ao seu autor.

    Segundo a NBR 6028 (ABNT, 2003), resenha ou recenso omesmo que resumo crtico. J a nomenclatura resenha crtica, utilizada poralguns autores, parece-nos redundante, como bem apontam Barros eNascimento (2008, p. 45), visto que o teor valorativo elementoessencial para a composio desse gnero. Motta-Roth (2002) postulaque o gnero resenha envolve um contnuo entre descrio e avaliao, jque textos exemplares do gnero tendem ou para um ou para outrodesses extremos. Assim, resenhas mais objetivas podem serrepresentadas por textos mais descritivos do contedo do objetoresenhado, com uma avaliao menos explcita do resenhador; j quandoeste um especialista da rea e parte de seu conhecimento e de suaexperincia profissional para estabelecer a relevncia do objetoresenhado, as resenhas podem tender para um extremo avaliativo.

    Na academia, esse gnero discursivo usado para avaliar (elogiarou criticar) o resultado da produo intelectual em uma rea doconhecimento, sob o ponto de vista da cincia naquela disciplina,informada pelo conhecimento produzido anteriormente sobre aqueletema: por meio da avaliao de novas publicaes, o conhecimento nadisciplina (as teorias e os autores em voga, o saber partilhado entre ospares, as abordagens adotadas, os valores consagrados) se reorganiza e asrelaes de poder, de status acadmico se reacomodam (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010, p. 27).

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    Porm, lembram-nos essas autoras, embora a avaliao seja afuno que define o gnero resenha, ela no seu nico componente nocaso de resenhas acadmicas: h uma expectativa quanto descriodetalhada do contedo e da organizao do livro (MOTTA-ROTH;HENDGES, 2010, p. 44), Logo, este gnero avaliativo e informativo,ao mesmo tempo, sendo o teor avaliativo um fator que varia entre asdisciplinas, uma vez que cada rea tem seus prprios critrios deavaliao. No caso da Lingustica, por exemplo, parece ser importante,segundo elas, que o resenhador informe o valor do livro para o pblico-alvo e estabelea a contribuio do trabalho para inovar a rea eresponder s expectativas dos leitores. Esse tipo de avaliao afetada,complementam, pela natureza dos assuntos tratados, o tratamento dosdados e a velocidade com que os programas de pesquisa avanam emcada disciplina.

    Pode-se, ainda, acrescentar que o estilo de se fazer resenha naesfera jornalstica parece se diferenciar do da esfera acadmica,sobretudo no que se refere ao dilogo com outros textos e autores.Conforme aponta Silva (2009), resenhas acadmicas encontradas emrevistas e peridicos especficos apresentam, em geral, vozes de outrosautores e referncias bibliogrficas, alm de extenses maiores, quandocomparadas a resenhas que, diariamente, so publicadas em jornais erevistas para o grande pblico.

    Uma resenha objetiva fundamentalmente responder a questesbsicas como: quem o autor do objeto resenhado, qual o seu tema,como se compara o texto em resenha com outros trabalhos do mesmoautor e/ou de outros autores e/ou do mesmo assunto e/ou da mesmarea.

    Certamente, o dilogo instaurado resenhista-leitor-autor nopressupe acordos. Por essa razo, como aponta Oliveira (2007), espera-se encontrar numa resenha um trabalho de argumentao convincentepara persuadir o leitor. Em virtude disso, embora a resenha sejaconsiderada um gnero hbrido em termos tipolgicos j que seconfigura como um misto de sequncias descritivas, de relato eargumentativas, no sentido de Bronckart (1994) e Marcuschi (2002,2008) , trata-se de um gnero de tipo predominantementeargumentativo:

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    resenhar tem tudo a ver com um texto argumentativo, que visa aexpressar a opinio de seu autor, supostamente algum com umreferencial de conhecimento capaz de avaliar o que est sob suaviso e possuidor de argumentos que convenam que essaavaliao correta ou, pelo menos, flua na direo exata(FERRAZ, 2007, p. 63).

    De acordo com Machado, Lousada e Abreu-Tardelli (2007), aresenha acadmica organizada globalmente em diferentes partes, sendoque, no incio, encontram-se informaes sobre o contexto e o objetoque est sendo resenhado e, logo depois, os objetivos do produtor.Segundo as autoras, antes de apontar seus comentrios, o resenhistaprecisa fazer uma descrio estrutural do objeto resenhado, que pode serfeita por captulos ou agrupamento de captulos (no caso de se tratar delivros); e, aps esse procedimento, uma apreciao sobre o mesmo.Conforme pontuam, muito importante que haja tanto comentriospositivos como negativos sobre o objeto resenhado, para que oresenhista possa, de fato, nortear o leitor; e, na sequncia, uma conclusodo autor, que deve explicar ou reafirmar sua posio (des)favorvel sobreo objeto, recomendando (ou no) sua leitura.

    Para Motta-Roth e Hendges (2010), contudo, tais partes do textode resenha acadmica (estgios textuais) so, na realidade, o resultado dequatro grandes movimentos retricos executados pelo resenhista, quepor sua vez se desdobram em estratgias especficas (MOTTA-ROTH;HENDGES, 2010), como as descritas sumariamente abaixo:4

    a) Apresentar o livro: informar o tpico geral do livro e/oudefinir o pblico-alvo e/ou dar referncias sobre o autor e/oufazer generalizaes e/ou inserir o livro na disciplina;

    b) Descrever o livro: dar uma viso geral da organizao do livroe/ou estabelecer o tpico de cada captulo e/ou citar materialextratextual;

    c) Avaliar partes do livro: realar pontos especficos;4 A descrio do gnero nesses termos deve ser tomada como uma constatao de como as pessoasescrevem resenhas em determinado espao geogrfico (resenhas publicadas em peridicosinternacionais e em ingls) e temporal (dcada de 1990), e no uma norma a ser seguida( MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010, p. 29).

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    d) (No) recomendar o livro: desqualificar / recomendar o livro,ou recomendar o livro apesar das falhas indicadas.

    Segundo as autoras, o resenhador pode usar todas essas estratgiasconjuntamente ou escolher apenas as que lhe interessar, variando emextenso, de acordo com o qu e o quanto deseja enfatizar em suaanlise, ou em frequncia, de acordo com as caractersticas da obra ou oseu estilo.

    Mas, seja como for, a resenha se encerra com uma recomendaofinal (velada em se tratando de livro resenhado em contexto acadmico),de tom persuasivo, que ressalta a importncia e a atualidade do materialresenhado (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010). Alm disso,frequentemente, ao recomendar a obra, resenhadores aconselhamexplicitamente o leitor a ler (ou talvez, no ler) o livro, ressaltando oimpacto significativo da obra (ou a falta dele) para a disciplina como umtodo.

    Segundo Barros e Nascimento (2008, p.54), a ltima parte daresenha acadmica, destinada a dar um parecer geral sobre a obraresenhada, nunca traz uma aprovao ou reprovao explcita da obranos termos de recomenda-se ou no se recomenda, pois os agentesprodutores sofrem coeres scio-histrico-ideolgicas que os levam aagir com certa polidez discursiva, isentando-se de expressar seusposicionamentos valorativos negativamente, bem como de macular aimagem do autor da obra resenhada. Como concluem as autoras, issomostra como a resenha acadmica difere de uma resenha de livro escritapara um jornal ou uma revista comercial, pois neste caso ela produzidapor um profissional que pertence a outra esfera social e tem comopblico-leitor um sujeito neutro nesse jogo discursivo, que nocompartilha dos mesmos interesses/conflitos ideolgicos daquele queresenha e daquele que resenhado. J na resenha acadmica, ummembro da academia que hoje esteja no papel social de resenhador,legitimado a avaliar o trabalho de um colega seu, amanh pode ser oalvo das crticas, o autor de uma obra resenhada, o que deixa claro que,neste domnio discursivo, os interesses se cruzam e, muitas vezes, sechocam.

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    Esse aspecto igualmente elucidado por Motta-Roth e Hendges(2010, p. 36), ao especificarem que, ao fazer comentrios avaliativossobre os temas abordados num determinado livro, o resenhador chamapara si o papel de especialista (autoridade) frente ao leitor que, por suavez, se constitui como membro (aspirante ou especialista) de umacomunidade acadmica. O objetivo do autor da resenha acadmica,portanto, parece ser, segundo essas autoras, demonstrar autoridadedentro da disciplina, enquanto membro capaz de avaliar criticamenteuma nova publicao, tendo como pano de fundo a literatura prvia nadisciplina e sua habilidade em fazer julgamentos plausveis e coerentes,fornecendo evidncias para tanto.

    Quanto linguagem usada em resenhas, destaca-se o emprego deverbos no presente do indicativo, para descrever a atualidade e arelevncia do tema (A internet uma das ferramentas que mais se destacanesse contexto), para descrever a organizao do objeto resenhado, no casode livro (A obra divide-se em duas partes) e para avali-lo (Um dascontribuies do livro est em) (MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010). Aavaliao, em geral, feita por meio de julgamentos de valor, elogios ecrticas, que vm expressos por adjetivos (provocativo, belo, instigante, bom),advrbios (certamente, realmente, inegavelmente, pretensamente) e comentriosvrios sobre a obra (no trabalho cada tema discutido com cuidado; o livro esgota-se em si mesmo; bem embasado teoricamente; sob a capa do discurso acadmico etc.).

    Como lembra Ferraz (2007), alm de funcionarem como forma deatualizao para muitos estudiosos, as resenhas acadmicas ajudam naseleo bibliogrfica, para a elaborao de trabalhos tcnico-cientficos,evitando-se, assim, perda de tempo com leituras desnecessrias.

    Todavia, o que no se pode negar que o gnero, tanto naesfera acadmica como na jornalstica cultural, se constitui de granderelevncia e, conforme expe Ferraz (2007), isso s possvel porque aresenha oscila da sntese para a anlise e vice-versa, sendo o texto bem-sucedido se equilibrar esses dois aspectos.

    Tendo em vista o fato de que, na literatura especializada sobre ognero resenha pouco se fala a respeito da intertextualidade sob a ticada Lingustica Textual, vamos, a seguir, tratar do conceito sob esseenfoque terico, para, na sequncia, analisar como o fenmeno semanifesta no gnero.

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    3 O FENMENO DA INTERTEXTUALIDADEA intertextualidade um tema que tem ocupado o interesse de

    pesquisadores de distintas perspectivas tericas. Falar deintertextualidade pressupe partir de uma concepo de texto, conceitoque, segundo Koch, Bentes e Cavalcante (2007), no de consenso nementre as disciplinas tericas que dele tratam, nem no interior da prpriaLingustica Textual, em cujo contexto vem se transformando desde asegunda metade dos anos 1960, quando essa disciplina tomou corpo nosestudos lingusticos. Assim, para efeito do presente trabalho, adotaremoso conceito de texto que tem se firmado na Lingustica Textual a partirdos anos 1990, quando da adoo do sociocognitivismo e dointeracionismo bakhtiniano, que prev cada texto como constitudo pelapresena do outro, naquilo que dizemos/escrevemos, ououvimos/lemos:

    o texto como lugar de constituio e de interao de sujeitossociais, como evento, portanto, em que convergem aes lingusticas,cognitivas e sociais [...] por meio das quais se constroem interativamenteos objetos de discurso e as mltiplas propostas de sentidos, como funode escolhas operadas pelos co-enunciadores [...] construto histrico esocial, extremamente complexo e multifacetado (KOCH, 2002, p.9).

    Introduzido na dcada de 1970 pela Teoria Literria, atravs dacrtica francesa Kristeva (1974), e tendo sido estudado sob outros pontosde vista tericos como a Anlise do Discurso e a LingusticaAntropolgica, o termo intertextualidade pode, segundo o dicionrio deTrask (2004, apud KOCH, BENTES; CAVALCANTE, 2007, p.13) seraplicado aos casos clebres em que uma obra literria faz aluso a umaoutra obra literria, no se referindo apenas a textos que remetemdiretamente a outros j produzidos e citados, mas a todo oprocessamento de ordem cognitiva na produo e recepo de sentidos.

    Sob esse vis, Koch, Bentes e Cavalcante (2007), que tomaremoscomo base para as consideraes que seguem, postulam a existncia deduas grandes categorias de intertextualidade, abordando-a nos termos deum dilogo: a intertextualidade em sentido amplo (lato sensu), constitutiva de

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    todo e qualquer discurso, e a intertextualidade em sentido restrito (stricto sensu),atestada pela presena de um intertexto, que pode ser repensada emtermos da seguinte recategorizao: temtica, estilstica, explcita, implcita eautotextualidade.

    A intertextualidade em sentido amplo um princpio terico norteadore uma categoria possvel de ser mobilizada para a anlise dos processosde produo e recepo de textos. No que se refere produo, postula-se que o produtor do texto (diferentemente de um caso especfico derecepo, como o da anlise textual), nem sempre tem conscincia sobreo tipo de dilogo entre textos que ele pe em funcionamento, j que nopodemos construir um texto sem nos ligarmos a outros previamenteenunciados (BAKHTIN, [1977] 1981) seja pela manipulao dedeterminados intertextos (textos efetivamente presentes), seja por meioda manipulao de modelos, os gneros do discurso.

    Assim, para falar desse princpio de intertextualidade, diversosautores, sob diferentes perspectivas tericas, recorrem a designaesespecficas, que no fundo remetem a um mesmo fenmeno: mosaico decitaes (KRISTEVA, 1974), intertexto (GREIMAS, 1966), dilogo entrepersonalidades (BAKHTIN, [1979] 1997), resposta direta ou indireta(PCHEUX, 1969), j-dito (GRSILLON; MAINGUENEAU, 1984),diferena (VERN, 1980) e heterogeneidade (AUTHIER-REVUZ, 2004).

    No limite entre a intertextualidade em sentido amplo e aintertextualidade em sentido restrito, esto, segundo as referidas autoras,a intertextualidade (inter)genrica e a intertextualidade tipolgica.

    A intertextualidade (inter)genrica se d quando o produtor do texto,contando com o conhecimento prvio dos interlocutores a respeito dosgneros textuais possveis na nossa sociedade, apresenta, no lugarprprio de determinada prtica social, um gnero pertencente a umaoutra, com o objetivo de produzir determinados efeitos de sentido.Marcuschi (2002) chamou isso de configurao hbrida, ou seja,quando um gnero exerce a funo de outro como ocorre, porexemplo, com o uso de fbulas, contos de fada, cartas etc. em colunas dejornais, funcionando como artigos de opinio, ou como gneros irnicosou argumentativos tal como as charges polticas. Nesses casos, a

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    mobilizao de modelos cognitivos de contexto (VAN DIJK, 1983) responsveis pela competncia metagenrica, que possibilita oreconhecimento das relaes intertextuais de semelhana entre textos deum mesmo gnero, no que diz respeito forma composicional, aocontedo temtico e ao estilo essencial para a deteco, pelointerlocutor, da ironia, da crtica, do humor e, portanto, para aconstruo de um sentido que se aproxime da proposta do produtor dotexto. Caber a ele fazer esse exerccio para descobrir os intertextos nelepresentes. Os modelos de contexto so usados para monitorar oseventos comunicativos. Eles representam intenes, propsitos,expectativas, opinies e outras crenas dos interlocutores sobre ainterao em curso, ou sobre o texto que est sendo lido ou escrito, bemcomo sobre as propriedades do contexto (tais como tempo, lugar,circunstncias, condies, objetos e outros fatores situacionais) quepossam ser relevantes para a realizao adequada do discurso. Encerramtodo o conhecimento sociointeracional mobilizado nos diversoscontextos interacionais, inclusive o conhecimento relativo ao formato,estilo, tipo e contedo dos diversos gneros textuais e sua adequao aosmltiplos tipos de prticas sociais.

    A intertextualidade tipolgica, por sua vez, decorre do fato de sepoder reconhecer um conjunto de caractersticas comuns entredeterminadas sequncias ou tipos textuais (narrativos, expositivos,argumentativos etc.), em termos de estruturao, seleo lexical, uso detempos verbais, advrbios (de tempo, lugar, modo etc.) e outroselementos diticos, e assim agrup-las em uma determinada classe. pelarecorrente representao na memria de tais caractersticas que osfalantes constroem modelos mentais tipolgicos especficos(BEAUGRANDE; DRESSLER, 1981), as superestruturas (VAN DIJK,1983), que vo lhes permitir reconhecer sequncias de diversos tipos.Cada gnero seleciona para a sua constituio uma ou algumas dessassequncias, o que faz com que um conto, por exemplo, apresente, aolado das sequncias narrativas responsveis pelo enredo, sequnciasdescritivas com apresentao de caractersticas de ambientes epersonagens e sequncias expositivas com apartes do narrador.

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    A par da intertextualidade em sentido amplo, a intertextualidade emsentido restrito ocorre quando em um texto se insere outro texto, anterior eefetivamente produzido, que faz parte da memria discursiva dosinterlocutores, e com o qual estabelece algum tipo de relao. Trata-se,pois, de uma retextualizao (MARCUSCHI, 2000), que implica umaalterao da fora ilocucionria e do efeito perlocucionrio do texto deorigem. Nessa tica, diversos tipos de intertextualidade tm sidopropostos pelos estudiosos, cada qual com caractersticas prprias, entreas quais as principais: intertextualidade temtica, intertextualidadeestilstica, intertextualidade explcita, intertextualidade implcita eautotextualidade.

    A intertextualidade temtica encontrada entre textos que partilhamos mesmos temas, como, por exemplo, as matrias jornalsticas de ummesmo dia ou perodo, os textos literrios de uma mesma escola, ostextos acadmicos de uma mesma rea ou corrente do conhecimento, ashistrias em quadrinhos de um mesmo autor, as canes de um mesmocompositor, um livro e seu filme, as vrias encenaes de uma pea deteatro etc.

    J a intertextualidade estilstica ocorre quando se repetem, imitam,parodiam certos estilos ou variedades lingusticas em um texto, emfuno de diversos objetivos, como o caso da reproduo da linguagembblica, de jarges profissionais, de dialetos, do estilo de um determinadognero, autor ou esfera de atividade humana.

    Tem-se intertextualidade explcita quando no prprio texto se fazmeno ao intertexto, ou seja, quando outro texto citado e atribudo aoutro enunciador, reportado como tendo sido dito por outro. o casodas tradues, citaes, referncias e menes; ou do recurso aoargumento de autoridade, para dar maior credibilidade ao que se diz; oudas retomadas do texto do parceiro, em situaes de interao face aface, para encadear sobre ele, contradit-lo, ou demonstrar interesse nainterao.

    A intertextualidade implcita, por outro lado, ocorre quando seintroduz intertexto alheio no prprio texto sem que haja qualquermeno explcita da fonte, seja com o objetivo de seguir-lhe a orientaoargumentativa, com parfrases mais ou menos prximas do texto fonte intertextualidade das semelhanas (SANTANNA, 1985) ou captao

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    (GRSILLON; MAINGUENEAU, 1984) , seja de problematiz-lacom enunciados parodsticos e/ou irnicos, apropriaes, reformulaesde tipo concessivo, inverso de polaridade afirmao/negao, entreoutros intertextualidade das diferenas, para SantAnna, e subverso, paraGrsillon e Maingueneau.

    No caso da intertextualidade implcita com valor de captao, oprodutor do texto espera que o leitor/ouvinte seja capaz de reconhecer,durante o processamento textual, a presena do intertexto, pela ativaodo texto-fonte em sua memria discursiva. Em casos de plgio, essarecuperao indesejvel por parte do produtor, que espera que ointerlocutor no tenha em sua memria o intertexto e sua fonte, ou novenha a proceder sua ativao, razo pela qual procura camufl-lo pormeio de pequenas operaes de ordem lingustica, na materialidadelingustica do texto, como apagamentos, substituies de termos,alteraes de ordem sinttica, transposies etc.

    Em se tratando de intertextualidade implcita com valor desubverso, vital a descoberta do texto-fonte pelo interlocutor, para aproduo do sentido, embora no haja garantia de que isso ocorra seno ocorrer, estar prejudicada a construo do sentido pretendido.Nesses casos, trata-se de fontes de intertextos que fazem parte damemria coletiva da comunidade falante: trechos de obras literrias,msicas populares, bordes de programas humorsticos, provrbios,ditos populares etc.

    Por fim, cabe a categoria de autotextualidade, atribuda ao caso deum autor ou compositor inserir em seu texto trechos de outras obras desua autoria, muito embora haja tericos que no a reconheam comosendo intertextualidade, reservando este termo para os casos em que serecorre a intertextos alheios e no prprios. As autoras nas quais nosbaseamos no distinguem, contudo, tais categorias.

    A noo de dtournement, formulada por Grsillon e Maingueneau(1984), se ampliada, poderia, segundo Koch, Bentes e Cavalcante (2007),dar conta de uma grande parte de casos de intertextualidade implcita:consiste em se produzir um enunciado que possui marcas de umaenunciao proverbial, mas que no pertence ao estoque de provrbiosconhecidos. Seu valor militante (no meramente ldico), pois semprevisa a orientar a construo de novos sentidos pelo interlocutor, dandoautoridade ao intertexto (captao) ou destituindo-o de tal autoridade

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    (ironizando-o, contraditando-o, reorientando-lhe o sentido etc.), emnome de interesses das mais diversas ordens (subverso). O dtournementocorre por meio de operaes lingusticas de vrias espcies, comosubstituio (Quem espera nunca alcana), adio (Devagar se vai ao longe, masleva muito tempo), supresso (Para bom entendedor, meia palavra bas) outransposio (Aja duas vezes antes de pensar). Sua maior frequncia deocorrncia est na publicidade, no humor, na msica popular e emcharges polticas, e seu valor argumentativo vai depender, tambm, docotexto e do entorno visual (ilustraes, grficos), em funo docontexto situacional mais amplo em que se insere.

    Finalmente, uma pequena palavra sobre as relaes entreintertextualidade e polifonia, segundo as autoras citadas. H entre ambasuma relao de incluso: a polifonia engloba todos os casos deintertextualidade, mas seu espectro bem mais amplo que o desta, pois aintertextualidade requer a presena de um intertexto. O conceito depolifonia, tal como proposto por Ducrot (1980), a partir de Bakhtin, dizrespeito a que se representem, ou encenem, em dado texto, perspectivasou pontos de vista representados por enunciadores reais ou virtuaisdiferentes, sem que se trate, necessariamente, de textos efetivamenteexistentes. A polifonia, portanto, um fato constante no discurso.

    Acreditamos que essa perspectiva adotada por Koch, Bentes eCavalcante (2007), de compreender a intertextualidade em termos dedilogo, que aqui retomamos a ttulo de fundamentao terica para aanlise que segue, bastante produtiva, pois, ao mesmo tempo em queexplicita as diferenas, revela as semelhanas de pontos de vista.4 A INTERTEXTUALIDADE NO GNERO RESENHA

    Para analisar como se configura o fenmeno da intertextualidadeno gnero resenha, selecionamos um corpus composto por oito textosexemplares do gnero, sendo seis da esfera jornalstica (publicados nojornal Folha de S. Paulo Ilustrada, entre 01/08/2009 e 31/08/2009), edois da esfera acadmica (peridicos de Lingustica publicados noprimeiro semestre de 2009). No que se refere ao contexto do jornalismocultural, foram selecionadas resenhas que tematizavam filmes, livros emsicas (dois textos de cada), a saber:

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    Quadro 1 Textos do corpus:Resenha Ttulo Esfera/Tema Data de publicao

    R1 Tom impessoal enfraquece drama"real"Jornalstica/Filme:

    O Contador de Histrias 02/08/09R2 Longa fracassa ao querer seguirpassos de "Sex and the City"

    Jornalstica/Filme:Marido por Acaso 07/08/09

    R3Consolao, novo trabalho dapsicanalista Betty Milan, fazparalelo entre perda pessoal e

    morbidade socialJornalstica/Livro:

    Consolao 22/08/09

    R4 Contos de Sabino so dramas deexpressoJornalstica/Livro:A Boca da Verdade 15/08/09

    R5 Carlos Renn aproxima clssicosamericanos MPBJornalstica/CD:

    Nego 19/08/09R6 Novo disco de Simone fazaquecimento para o futuro

    Jornalstica/CD:Na Veia 19/08/09

    R7 Anlise de Discurso Crtica Acadmica/Livro:Anlise de Discurso Crtica 2009

    R8Introduo s Cincias daLinguagem: discurso e

    textualidadeAcadmica/Livro:

    Introduo s Cincias da Linguagem:discurso e textualidade

    Jan./abr. 2009

    Fonte: Corpus da Pesquisa.O procedimento de anlise adotado foi qualitativo e quantitativo.

    Assumindo que a intertextualidade em sentido amplo constitutiva detodo e qualquer discurso, realizamos a leitura desses textos, visando aidentificar a ocorrncia de marcas das diversas categorias deintertextualidade em sentido restrito (explcita, implcita, temtica,estilstica e autotextualidade) e os casos especiais de intertextualidade(intergenrica e tipolgica) propostos por Koch, Bentes e Cavalcante(2007), conforme especificamos sumariamente abaixo:Intertextualidade explcita: citao, referncia, aluso, sumarizao, traduoIntertextualidade implcita: parfrase, plgio, provrbio, frase feita, bordoIntertextualidade temtica: retomada de temas (cientficos, jornalsticos ou literrios)Intertextualidade estilstica: pardia, imitaoAutotextualidade: trecho de outro texto do mesmo autorIntertextualidade intergenrica: gnero textual exercendo a funo de outroIntertextualidade tipolgica: sequncia tipolgica outra que no a prevista

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    A seguir, computamos as ocorrncias dessas diferentes marcas eorganizamos um quadro comparativo, com base no qual pudssemosnos pautar para determinar a frequncia de uma ou de outra categoria deresenha nos textos analisados relativamente esfera de atividade e aotema (no caso das resenhas jornalsticas). Foi identificado um total de102 marcas de intertextualidade no corpus, cujas amostras apresentaremosa seguir, adotando, na recuperao dos excertos dos textos analisados, orecurso grfico do grifo (negrito) para melhor focaliz-las.

    4.1 INTERTEXTUALIDADE EXPLCITAA anlise revelou ser a intertextualidade explcita a categoria de

    maior ocorrncia nos dados, pois foram encontradas marcas desse tipoem todos os textos do corpus. No total, foram 67 marcas deintertextualidade explcita, sendo 60 por citao e 7 por referncia oualuso a autores e obras, conforme a Tabela 1:

    Tabela 1 Marcas de intertextualidade explcita em resenhas:Resenhas

    Jornalsticas AcadmicasFilmes Livros Msicas

    Intertextualidade Explcita R1 R2 R3 R4 R5 R6 R7 R8 Totalcitaes 1 1 1 10 8 8 10 21 60

    referncias, aluses 1 1 2 1 1 0 1 0 7resumos, tradues 0 0 0 0 0 0 0 0 0

    Total 2 2 3 11 9 8 11 21 67

    Fonte: Elaborao prpria.

    Fato digno de nota que as resenhas acadmicas apresentam umnmero muito maior de marcas de intertextualidade de tipo explcita,comparativamente s resenhas jornalsticas (conforme Tabela 4, ao finaldesta seo).

    Vejamos alguns exemplos.

  • RUIZ; FARIA A intertextualidade no gnero resenha

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    Exemplo 1(R8) Compreendido como efeito de sentido entre locutores (PCHEUX,1997), o discurso o tema do primeiro captulo da obra, redigido por Eni P.Orlandi. [...] Vogt traa um panorama histrico das duas linhasfundamentais de constituio da semitica e semiologia, que tm como marcoos estudos de Saussure (1977), e do filsofo Charles Sanders Peirce.(DELA-SILVA, 2009).

    A citao e a referncia bibliogrfica no corpo do texto (chamada,segundo a ABNT, 2002) so recursos de argumentao por excelnciautilizados em trabalhos acadmicos de vrias ordens. Constituemargumento de autoridade, ou seja, a palavra de honra, dada por algumcomo nica prova de uma assero (OLBRECHTS-TYTECA EPERELMAN, 2002, p. 347). No caso em tela, o resenhista traz para seutexto o conceito de discurso de Pcheux, um autor reconhecido na rea,e faz referncia obra clssica de Saussure, no s para mostrarconhecimento e se constituir como especialista frente a seus pares, maspara que sua resenha adquira o reconhecimento desejado no contexto dacomunidade acadmica.

    Vejamos um exemplo em que, diferentemente do caso anterior, acitao tem outra funo na resenha:

    Exemplo 2(R4) O livro de contos A Boca da Verdade termina com a nota autoralUma Palavra, em que Mrio Sabino escreve: O mundo pode ser divertidoe proporcionar momentos de alegria genuna, mas o que faz a boa literatura a infelicidade. Ela, a infelicidade, roda do mundo do escritor. Os melhoresromances e contos so aqueles em que os protagonistas so movidos porangstia, tormento, sofrimento. (PINTO, 2009).

    Aqui a citao parece ser o recurso utilizado pelo resenhista parachamar a ateno do leitor para o livro de Sabino, citado pelo autor dotexto resenhado, que trata de temas supostamente de interesse geral dopblico leitor do suporte em que foi publicada a resenha, como ainfelicidade, a angstia e o sofrimento, recomendando veladamente sualeitura.

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    Veja um exemplo de intertextualidade explcita por aluso a autor:Exemplo 3(R1)Quanto mise-en-scne, alm de uma direo de atores precrios (Mariade Medeiros est bem entres os atores mal conduzidos), ela consegue perder omomento mais promissor da trama: quando o jovem e ameaador Cabelinhoinvade a casa de Margherit. Por um instante parece que teremos umasequncia hitchcochiana. No. Ela amorfa como, mais ou menos, todo oconjunto. (ARAJO, 2009).

    A aluso a Alfred Hitchcock (1899-1980) cineasta inglsconsiderado um dos mais comentados e reverenciados de todos ostempos, conhecido como o senhor do suspense e do mistrio feitapelo uso da expresso referencial hitchcochiana. Levando em consideraoo prestgio que o cineasta apresenta at os dias atuais, o resenhista a elese refere com o propsito de criticar negativamente a qualidade da cenaem questo no filme resenhado, por meio de comparao.

    Um caso tpico de intertextualidade explcita o que se d porreferncia a ttulos de textos, como o que segue:

    Exemplo 4(R7)Afirma-se, alm disso, como desdobramento natural de estudos que, nadcada de 1970, se convencionou chamar de Lingustica Crtica, ganhandomais consistncia na dcada de 1990, sobretudo pela obra de Fairclough,como Language and Power (1989). Nesse como noutros textos posteriores, olinguista britnico estuda os efeitos sociais dos textos e suas possveisinteraes com as relaes assimtricas de poder. (SILVA, 2009).

    Embora em resenhas acadmicas seja mais comum o recurso achamadas, em funo das normalizaes internacionais, Silva prefere seimpor estilisticamente, mudando o jeito acadmico de escrever resenhas,e escolhe fazer a remisso ao texto de Fairclough com a apresentao doseu ttulo na ntegra, e no de forma abreviada, como reza a conveno.

    Outro caso de intertextualidade explcita por referncia a ttulospode ser exemplificado pela sequncia abaixo, em que o resenhista fazreferncia a um livro anterior do mesmo autor do texto resenhado (OAntinarciso), a fim de contextualizar a obra resenhada (A Boca da Verdade)relativamente ao trabalho desse autor como escritor:

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    Exemplo 5(R4) A exemplo do seu livro anterior O Antinarciso (Record), A Bocada Verdade reparte os contos em trs sees, Inexistncias, Recortes eRepresentaes. (...) Nos trs contos de Representaes, surgempersonagens, criam-se enredos como o do cardeal de O Grande de Impostor que se v eleito papa no momento em que descobre seu atesmo ou doadvogado de Demnio com corao de Mrmore que comete umparricdio simblico contra o scio que permitiu sua ascenso social (e cujomau gosto esttico lembra sua origem de novo rico). (PINTO, 2009).

    As referncias s sees do livro (Inexistncias, Recortes,Representaes) tm funo claramente descritiva, e as relativas a contosanteriormente escritos pelo autor resenhado (O Grande de Impostor,Demnio com corao de Mrmore), funo argumentativa, em que tem lugara comparao.

    No foram encontrados casos de tradues nos textos analisados.E as ocorrncias de resumo no se computaram, em virtude de as termoscategorizado como casos de intertextualidade tipolgica, conformeexplicaremos na seo 4.3.4.2 INTERTEXTUALIDADE IMPLCITA

    No que tange intertextualidade implcita, foram encontradasapenas cinco ocorrncias nos textos analisados, como mostra a Tabela 2:

    Tabela 2 Marcas de intertextualidade implcita em resenhas:ResenhasJornalsticas AcadmicasFilmes Livros Msicas

    Intertextualidade Implcita R1 R2 R3 R4 R5 R6 R7 R8 Totalparfrases, plgio 0 0 0 0 0 0 3 0 3provrbios, frases feitas 0 2 0 0 0 0 0 0 2bordes 0 0 0 0 0 0 0 0 0Total 0 2 0 0 0 0 1 0 5

    Fonte: Elaborao prpria.

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    O mais curioso que tais casos constituem ocorrncias de frasesfeitas e em uma mesma resenha, parecendo se tratar de uma questo deestilo do resenhista:

    Exemplo 6(R1)No , sejamos francos, questo que se apresente, pois, ainda que seja, ofilme nos lana num beco sem sada. [...] Se a ideia de Margherit (isto , dofilme) demonstrar que as pessoas no so ms por natureza, mas agem emgrande medida em vista do ambiente social que frequentam, tambm aestamos chovendo no molhado: as mentalidades liberais acreditam nisso hum sculo, as conservadoras jamais acreditaram, haja o que houver.(ARAJO, 2009).

    Como se v, as expresses beco sem sada e chovendo no molhado tmfuno fortemente argumentativa, de firmar a opinio desfavorvel deArajo em relao ao filme O Contador de Histrias fraco, segundo ele,por no acrescentar nada de inovador ao tratamento do tema.

    Confirmando nossa expectativa de ser uma das marcas deintertextualidade implcita bastante empregada em textos acadmicos, aparfrase teve trs ocorrncias numa nica resenha, conforme exemplo aseguir:

    Exemplo 7(R7) Para chegar a esse modelo, a Anlise de Discurso Crtica, segundo asautoras, refuta o conceito saussuriano de parole (excessivamenteindividualista), bem como teorias que consideram a relao entre lngua esociedade de forma unilateral. (SILVA, 2009).

    Com o objetivo de apresentar a viso de Resende e Ramalho, asautoras resenhadas, acerca da corrente terica da Anlise de DiscursoCrtica, Maurcio Silva, o resenhista, faz uso de uma parfrase introduzidapela expresso segundo as autoras. Podemos inferir que tal procedimento sedeve a um cuidado do resenhista em definir a linha terica em foco,razo pela qual transfere essa responsabilidade para as referidas autoras,justamente por se tratar de especialistas que se dispuseram a produzir umlivro com esse propsito.

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    J o caso abaixo diz respeito a uma interpretao do resenhistaacerca da referida linha terica, embora venha sob a capa da expressopara os adeptos da Anlise de Discurso Crtica:

    Exemplo 8(R7)Para os adeptos da Anlise do discurso de linhagem francesa, apenas oconceito funcionalista da linguagem aplicvel, j que seu interesse volta-se,sobretudo, para a representao exterior do sistema lingstico; para osadeptos da Anlise de Discurso Crtica, contudo, deve-se buscar umequilbrio entre essa perspectiva e a formalista, no se devendo reduzir alinguagem nem ao papel de ferramenta social, nem imanncia do sistemalingustico.

    Cabe mencionar que no se encontraram casos de utilizao debordes nos textos do corpus, o que no significa que seu emprego estejainterditado em resenhas, o que pede uma investigao mais apurada.Igualmente, no houve ocorrncia de plgio, em razo de ser altamentedesejvel a explicitao da fonte (contrariamente ao que ocorre em casosde plgio), em contextos jornalstico e acadmico, em prol da construode uma imagem letrada e culta do resenhista, a servio das relaes depoder a em jogo, como j apontado por Motta-Roth e Hendges (2010).

    Em relao intertextualidade temtica, no computamos aocorrncia de nenhuma marca especfica no corpus, por nos parecer quetodos os textos podem ser considerados exemplares dessa categoria, hajavista o fato de que, ao fazer a apreciao do objeto resenhado, oprodutor acaba, necessariamente, trazendo para a discusso objetos dediscurso que pertencem a um mesmo campo temtico.

    Importa ressaltar tambm que no foi encontrado nenhum casode intertextualidade estilstica, nem de intertextualidade intergenrica nostextos analisados. Entretanto, no se pode afirmar que tais categorias nosejam tpicas do gnero resenha, dado o fato de a anlise ter se pautadopor um corpus relativamente pequeno. Por outro lado, por se tratar decategorias bastante peculiares relativamente a um gnero que se querargumentativo, pode-se supor que sejam raros tais casos deintertextualidade em resenhas, o que valeria, contudo, confirmar comnovos estudos.

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    Outra observao a ser feita que no foram identificadas marcasde autotextualidade nos textos analisados. Por ser a resenha um textoque tematiza outro, parece no caberem inseres, por parte doresenhista, de trechos de obras suas. Provavelmente isso tem a ver com anatureza da ao de linguagem mobilizada pelo produtor, que restringeos objetos de discurso em funo dos papis socialmentedesempenhados pelos interactantes nas esferas jornalstica e acadmica.Mas essa uma hiptese que mereceria investigao mais cuidadosa, oque extrapola os limites do presente estudo.4.3 INTERTEXTUALIDADE TIPOLGICA

    Depois da intertextualidade explcita, a tipolgica foi a categoriacom maior frequncia de ocorrncia nos textos do corpus, compredominncia nas resenhas de carter acadmico. Muito provavelmente,isso se deve ao fato j mencionado de, nesses casos, haver umaexpectativa de que, ao lado da apreciao do livro, haja tambm umaapresentao de seu contedo.

    Desconsideradas as sequncias da ordem do argumentar umavez que, conforme Ferraz (2007), o gnero j consideradotipologicamente argumentativo, em virtude da necessidade de oresenhista apresentar argumentos suficientemente convincentes parapersuadir o leitor , nossa anlise chegou a um total de 30 ocorrnciasde marcas de intertextualidade tipolgica, sendo 16 de sequncias daordem do expor, 11 de sequncias da ordem do relatar e 3 da ordem dodescrever (BRONCKART, 1994), como mostra a Tabela 3.

    Tabela 3 Marcas de intertextualidade tipolgica em resenhas:ResenhasJornalsticas AcadmicasFilmes Livros Msicas

    Intertextualidade Tipolgica R1 R2 R3 R4 R5 R6 R7 R8 Totalsequncias expositivas 0 0 0 0 0 0 5 11 16sequncias de relato 3 1 2 1 3 1 0 0 11sequncias descritivas 0 0 0 0 0 1 1 1 03Total 3 1 2 1 3 2 6 12 30

    Fonte: Elaborao prpria.

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    Pudemos perceber que esse tipo de intertextualidade ,normalmente, empregado com o propsito de apresentar o objeto queest sendo resenhado, seja por meio de exposies, relatos ou descries. o que ocorre no fragmento abaixo, retirado de uma resenhaacadmica:

    Exemplo 9(R8) Segundo volume da coleo Introduo s Cincias daLinguagem, a obra soma-se aos ttulos A palavra e frase e Linguagem,histria e conhecimento com o propsito de oferecer uma introduoaos estudos da linguagem, direcionada aos interessados em geralo tema lngua/linguagem (sic). Ao reunir artigos de professores epesquisadores conceituados em reas de atuao, Discurso eTextualidade possibilita conhecer a histria dos estudos do texto edo discurso e refletir sobre a situao de suas teorias naatualidade. (DELA-SILVA, 2009).

    Levando-se em considerao que o domnio discursivo da ordemdo expor caracteriza-se pela apresentao textual de diferentes formas desaber (BRONCKART, 1994), percebemos que, ao empregar as frases emdestaque, Dela-Silva, a autora da resenha, tem por objetivo no apenasapresentar o objeto que est sendo resenhado, mas tambm fazer valer oseu conhecimento de especialista perante a comunidade acadmica, jque se trata de uma resenha no contexto da esfera do saberinstitucionalizado.

    Vale mencionar que sequncias expositivas dessa ordem, em geral,constituem interpretaes pessoais do resenhista acerca do objetoresenhado, mas que geralmente incidem (no caso das resenhasacadmicas) sobre as seguintes funes, conforme j mencionado:informar o tema geral, definir o pblico-alvo, dar referncias sobre oautor, fazer generalizaes e/ou inserir o objeto resenhado na disciplina(MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010).

    O exemplo que segue ilustra um caso de sequncia tipolgica daordem do relatar, mais frequente em resenhas jornalsticas, que tratam deenredos de filmes e de livros (6 ocorrncias, num total de 11):

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    Exemplo 10(R1) E a histria, no caso, de Roberto Carlos, um menino que a me, porfalta de condies e acreditando na propaganda da TV, entrega Febemmineira para ser criado pelo Estado. [...] Roberto Carlos aos 13 anos j considerado um caso irrecupervel. (ARAJO, 2009).

    O objetivo de Arajo, aqui, o de apresentar o enredo do filme OContador de Histrias. E como sequncias dessa ordem se fazem por meiode sumarizaes, nos textos analisados no as computamos duplamentecomo marcas de resumo, conforme preveem Koch, Bentes e Cavalcante(2007), que a associam categoria de intertextualidade explcita.

    A seguir, um exemplo de sequncia tipolgica descritiva:Exemplo 11(R6)De suas dez faixas apenas, apenas trs so regravaes. E mesmo essasescapam do previsvel. (PRETO, 2009).

    Com a expresso grifada, Marcus Preto faz uma breve descriodo novo CD de Simone, a fim de que o leitor tenha uma ideia global domais recente lbum da cantora.

    Outro caso interessante de intertextualidade tipolgica encontradonas resenhas acadmicas do corpus o de sequncia descritiva commarcas de intertextualidade explcita por referncia a autores, como sepode ver no exemplo 12:

    Exemplo 12(R8)Com base na noo de autoria de Foucault e em sua relao com odiscurso e os processos de produo de sentidos, proposta por Orlandi (1996),Lagazzi-Rodrigues alinha-se aos estudos discursivos que pensam a autoriacomo um princpio da unidade textual. (DELA-SILVA, 2009).

    A fim de descrever o captulo, a resenhista refere-se de formaexplcita a autores do campo dos estudos da linguagem, como Foucault eOrlandi, com o objetivo de se impor entre os seus pares especialistas,mostrando que, assim como a autora resenhada, ela tambm temconhecimento, sendo mais uma autoridade no assunto.

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    Por fim, com o objetivo de sintetizar nossa anlise, segue oquadro geral do que pudemos perceber acerca da manifestao dofenmeno da intertextualidade no gnero resenha, a partir de nossocorpus, representado pelas Tabelas 4a e 4b:

    Tabela 4a Intertextualidade em sentido estrito no gnero resenha:ResenhasJornalsticas AcadmicasFilmes Livros Msicas

    INTERTEXTUALIDADEEM SENTIDO RESTRITO R1 R2 R3 R4 R5 R6 R7 R8 Total Intertextualidade Explcita 2 2 3 11 9 8 11 21 67 Intertextualidade Implcita 0 2 0 0 0 0 3 0 5 Intertextualidade Temtica 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Intertextualidade Estilstica 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Autotextualidade 0 0 0 0 0 0 0 0 0Subtotal 2 4 3 11 9 8 12 21 72

    Fonte: Elaborao prpria.Tabela 4b Casos especiais de intertextualidade no gnero resenha:

    ResenhasJornalsticas AcadmicasFilmes Livros Msicas

    CASOS ESPECIAISDE INTERTEXTUALIDADE R1 R2 R3 R4 R5 R6 R7 R8 TotalIntertextualidade Intergenrica 0 0 0 0 0 0 0 0 0Intertextualidade Tipolgica 3 1 2 1 3 2 6 12 30Subtotal 3 1 2 1 3 2 6 12 30TOTAL 5 5 5 12 12 10 17 33 102

    Fonte: Elaborao prpria.Como possvel notar, das 102 ocorrncias de marcas de

    intertextualidade encontradas, 71% delas so de intertextualidade emsentido restrito (explcita e implcita) e 29% de intertextualidadetipolgica. Isso pode ser explicado em funo de dois aspectos que senos afiguram como altamente relevantes na anlise. Foi possvel perceberque o recurso de se empregarem marcas de intertextualidade tipolgica,fazendo uso de diferentes tipos de sequncias, parece estar mais

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    diretamente relacionado com o objetivo do resenhista de apresentare/ou contextualizar o objeto resenhado; enquanto que o uso de marcasde intertextualidade explcita, como a citao e a referncia a autores eobras, tende a funcionar mais como um recurso de naturezaargumentativa, empregado pelo produtor da resenha tanto para imporsua autoridade de especialista, como para convencer o leitor daapreciao final sobre o objeto cultural em questo e, assim, persuadi-loa se interessar (ou no) pelo mesmo: ler o livro, assistir ao filme ou ouvir oCD.5 CONSIDERAES (QUE SE QUEREM) FINAIS

    preciso lembrar que a quantidade de marcas de intertextualidadeencontradas em cada exemplar do gnero resenha analisado no pareceter relao com a extenso do texto varivel, portanto, desconsideradaem nossa pesquisa. Tal quantidade, cremos, deve estar relacionada muitomais natureza do objeto resenhado e leitura que o resenhista dele faz,incluindo a seu estilo pessoal de fazer resenhas e o contexto scio-histrico da publicao.

    Tendo em vista a discrepncia entre o nmero de marcas deintertextualidade explcita encontradas no corpus relativamente s outrascategorias do fenmeno, somos levados a crer que a intertextualidade detipo explcito se configura como uma caracterstica por excelncia dognero resenha, o que vem a confirmar nossa hiptese e, provavelmentetambm, imaginamos, o senso comum a respeito do gnero.

    Certamente, outros dados podero referendar as concluses a quechegamos. Porm, uma convico se afigura firme: a de que muito,ainda, se tem a desvendar quanto ao fenmeno intertextual no gneroresenha. Nesse sentido, acreditamos que as pesquisas que pretendamlidar com essa temtica devem ir alm dos suportes, rea, nmero detextos e marcas ou formas de expresso aqui considerados, para que nose escondam, por trs da obviedade, aspectos mais complexos daquesto; pois como nos sugerem Koch, Bentes e Cavalcante (2007), noque diz respeito intertextualidade, no devemos nos limitar a examinara presena do intertexto naquilo que dizemos (escrevemos) ou ouvimos(lemos); precisamos, antes, ter como propsito a compreenso dosefeitos de sentido que tais intertextualidades geram.

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    Recebido em: 08/05/11. Aprovado em 23/02/12.

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    Title: Intertextuality in the review genreAuthors: Eliana Maria Severino Donaio Ruiz; Melissa Bortoloto FariaAbstract: This study aims to investigate how the phenomenon of intertextuality manifests itself in thereview genre, from the theoretical perspective of Textual Linguistics. To do so, we delimited data fromrecent empirical research texts of reviews published in the academic and journalistic spheres, in which wesought to identify the brands of various categories of intertextuality. Assuming that the review is a dialogictext that purports to present and evaluate another text, the results obtained from the analysis lead us toconfirm our hypothesis that intertextuality in this genre is mainly woven through the explicitness of thedialogue with texts and authors.Keywords: Intertextuality. Textual Genre. Review.Ttulo: La intertextualidad en el gnero reseaAutores: Eliana Maria Severino Donaio Ruiz; Melissa Bortoloto FariaResumen: El presente trabajo tiene como objetivo investigar, bajo la perspectiva terica de la LingsticaTextual, como se manifiesta el fenmeno de la intertextualidad en el gnero resea. Para tanto, sedelimitaron como datos de pesquisa textos empricos recientes de reseas publicadas en las esferasacadmica y periodstica, en los cuales se busc identificar las marcas de las diversas categoras deintertextualidad. Partiendo del supuesto de que la resea es un texto dialgico que se propone a presentary evaluar otro texto, los resultados obtenidos con el anlisis nos llevan a confirmar nuestra hiptesis deque la intertextualidad en el gnero es tejida, sobre tudo, por medio de la explicitud de ese dilogo contextos y autores.Palabras-clave: Intertextualidad. Gnero Textual. Resea.