A JUDICIALIZAÇÃO DOS DIREITOS VERSUS ACESSO À JUSTIÇA – CNJ/UNIVALI – 2012

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Publicação do Programa de Mestrado em Ciência Jurídica da Univali.

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Zenildo Bodnar Mrcio Ricardo Staffen Jos Antonio Savaris Maria Raquel Duarte

A JUDICIALIZAO DOS DIREITOS VERSUS ACESSO JUSTIA

Itaja 2012

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ReitorProf. Dr. Mrio Csar dos Santos Vice-Reitora Prof. Dr. Amndia Maria de Borba Procurador Geral Vilson Sandrini Filho, MSc. Secretrio Executivo Prof. Mrcio Jacobsen, MSc. Pr-Reitora de Ensino Prof. Dr. Cssia Ferri Pr-Reitor de Pesquisa, Ps-Graduao, Extenso e Cultura Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho

DiagramaoMaria Raquel Duarte Carlos Henrique Carvalho Ferreira Junior

Comit Editorial E-books/PPCJPresidente Dr. Alexandre Morais da Rosa Diretor Executivo Alexandre Zarske de Mello Membro Jos Everton da Silva Membro Dr. Liton Lanes Pilau Sobrinho Membro Clvis Demarchi Membro Srgio Ricardo Fernandes de Aquino

OrganizadoresDr. Zenildo Bodnar Mrcio Ricardo Staffen, MSc. Dr. Jos Antonio Savaris Maria Raquel Duarte

Crditos ArticulistasCelio Ribeiro dos Santos Diana Magaly Correa Valero Fernanda Odorissi Jos Enas Kovalczuk Filho Maria Raquel Duarte Marcio Ricardo Staffen Marlenny Diaz Cano Natacha Souza John Octaviano Langer Sergio Augustin Zenildo Bodnar Este e-book foi possvel por conta do Projeto CNJ ACADMICO/CAPES/PPCJ, Editora da UNIVALI e a Comisso Organizadora composta pelos Professores Doutores: Paulo Mrcio Cruz e Alexandre Morais da Rosa e pelo Editor Executivo Alexandre Zarske de Mello

EndereoRua Uruguai n 458 - Centro - CEP: 88302-202, Itaja - SC Brasil - Bloco D1 Sala 427, Telefone: (47) 3341-7880

Projeto GrficoRogrio Marcos Lenzi

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APRESENTAO

No mbito do Conselho Nacional de Justia - CNJ so desenvolvidos grupos de pesquisa relacionados a temas especficos, em funo de sua alta relevncia acadmica e profissional, grupos estes denominados CNJ Acadmicos. O CNJ Acadmico visa promover a realizao e a divulgao de pesquisas cientficas em reas de interesse prioritrio para o Poder Judicirio, por meio do incentivo aos programas de ps-graduao das principais universidades brasileiras. Para a implementao do CNJ Acadmico o Departamento de Pesquisas Judicirias (DPJ) firmou termo de cooperao com a Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES) com o objetivo de viabilizar a concesso do auxlio financeiro aos alunos regularmente matriculados em cursos de mestrado e doutorado que optem por desenvolver suas dissertaes e teses nos temas prioritrios para o Judicirio. Em outubro de 2010, a CAPES publicou o resultado do Edital n. 20/2010 constando as temticas selecionadas para desenvolvimento da pesquisa. As pesquisas giram em torno dos temas O Sistema de Justia Criminal no Brasil seus problemas e desafios, Anlise do desempenho dos rgos do Poder Judicirio, Aprimoramento dos instrumentos para uma prestao jurisdicional mais eficiente, Atuao, competncias e interfaces CNJ com os demais rgos do Poder Judicirio e dos outros Poderes, Utilizao da tecnologia da informao para o aprimoramento do Poder Judicirio limites e desafios e Principais problemas no processo de reviso das decises nos Juizados Especiais Federais. A Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS e a Universidade de Vale do Itaja UNIVALI participam do projeto de pesquisa desenvolvendo estudos relacionados investigao do funcionamento da estrutura dos Juizados Especiais Federais e das Turmas Recursais da Justia Federal intitulada: JUIZADOS ESPECIAIS E TURMAS RECURSAIS DA JUSTIA FEDERAL: Diagnsticos e Prognsticos para os principais problemas no processo de reviso das decises judiciais Especificamente o objetivo da parceria firmada entre o CNJ, a CAPES, a UNISINOS e a UNIVALI dotar o Conselho Nacional de Justia de informaes precisas a respeito de aspectos importantes sobre o funcionamento dos Juizados Especiais Federais e Turmas Recursais da Justia Federal. A principal meta a ser atingida identificar questes relevantes que possam efetivamente contribuir com a proposio de polticas judicirias destinadas ao aperfeioamento e a melhora contnua dos Juizados Especiais Federais. O ncleo da pesquisa, portanto, est na anlise do funcionamento e da estrutura operacional dos Juizados Especiais Federais e suas Turmas Recursais com vistas a diagnosticar problemas, examinando sua eficcia e efetividade na concretizao de direitos. Objetivando fornecer embasamento terico pesquisa o grupo de pesquisa formado pela Universidade do Vale do Itaja - UNIVALI em setembro do ano de 2012 realizou I Seminrio Internacional Constitucionalismo e Juizados Especiais Federais. Durante o evento foram promovidas palestras e estudos tratando de temas relacionados Equidade e Justia Restaurativa nos Juizados Especiais; Devido Processo Legal, duplo grau de jurisdio e os Juizados Especiais Federais; Juizados Especiais Federais e a Turma Nacional de Uniformizao de Julgados; Constitucionalismo e Juizados Especiais e Novos Paradigmas 4

do Acesso Justia; bem como, foi realizada a apresentao e defesa de trabalhos encaminhados pela comunidade acadmica versando sobre temas de natureza Constitucional, bem como, foram encaminhados trabalhos versando, especificamente, sobre temas atinentes aos Juizados Especiais Federais. A presente obra consubstancia um dos resultados j colhidos pelo grupo de pesquisa da UNIVALI abordando a temtica Juizados Especiais e Turmas Recursais da Justia Federal: Diagnsticos e Prognsticos para os principais problemas no processo de reviso das decises judiciais. Em razo dessa diversificao temtica os ensaios encaminhados pela comunidade acadmica para discusso e anlise durante o evento foram divididos em grupos de forma a dar organizao pesquisa o que resultou na concretizao de duas obras. A primeira obra intitulada JUIZADOS ESPECIAIS FEERAIS EM DEBATE e, a segunda A JUDICIALIZAO DOS DIREITOS VERSUS ACESSO JUSTIA. A primeira obra intitulada JUIZADOS ESPECIAIS FEERAIS EM DEBATE e, a segunda A JUDICIALIZAO DOS DIREITOS VERSUS ACESSO JUSTIA. Este livro, A JUDICIALIZAO DOS DIREITOS VERSUS ACESSO JUSTIA materializa uns dos principais objetivos do Projeto CNJ Acadmico sobre Juizados Especiais Federais e acesso Justia que exatamente na produo cientfica. Neste livro so abordados temas importantes como a promoo do efetivo acesso justia, a realizao de direitos Sociais, judicializados em sede de Juizados Especiais Federais. Nesta segunda obra destacamos a analise de temas relacionados sustentabilidade e a efetivao de direitos fundamentais. Observou-se que a partir de reflexes crticas da comunidade acadmica em geral ser possvel propor e desenvolver polticas judicirias para o aperfeioamento do Poder Judicirio realizando Diagnsticos e Prognsticos para os principais problemas no processo de reviso das decises judiciais em sede de Juizados Especiais e Turmas Recursais da Justia Federal. A coordenao do Projeto CNJ- Acadmico vinculada Universidade de Vale do Itaja - UNIVALI, realizada pelos professores Zenildo Bodnar e Jos Antonio Savaris, orientadores do Doutorando Mrcio Ricardo Staffen e da Mestranda Maria Raquel Duarte, est satisfeita por ter cumprido a funo de oportunizar elevadas discusses jurdicas e fomentar a realizao de pesquisas e de trabalhos acadmicos que, certamente tero repercusso no objetivo do projeto CNJ Acadmico.

Os Organizadores

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SUMRIO

Apresentao ......................................................................................................................... 4 Sumrio ................................................................................................................................... 6 A TUTELA JUDICIAL-PARTICIPATIVA DO AMBIENTE: O LUGAR DOS JUIZADOS ESPECIAIS ......................................................................................................... 9 INTRODUO .................................................................................................................... 9 1. O PAPEL DO PODER JUDICIRIO NA CONCRETIZAO DAS NORMAIS AMBIENTAIS ...................................................................................................................... 10 2. NECESSIDADE DE UMA NOVA DOGMTICA PROCESSUAL TUTELA DO AMBIENTE .......................................................................................................................... 12 2.1 PRINCPIO DA PARTICIPAO E O ACESSO JUSTIA AMBIENTAL .......... 13 2.2 AUDINCIA JUDICIAL PARTICIPATIVA ................................................................ 15 2.3 O PROCESSO COMO PROCEDIMENTO EM CONTRADITRIO .................... 16 3. AFINAL, QUAL O LUGAR DOS JUIZADOS ESPECIAIS? ........................................ 19 CONCLUSES ARTICULADAS ...................................................................................... 21 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................. 21 APLICAO DO PRINCPIO CONSTITUCIONAL DA SUSTENTABILIDADE COMO FORMA DE EFETIVAO DOS PRINCPIOS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS ....................................................................................................... 24 CONSIDERAES INICIAIS ........................................................................................... 24 1 - CONCEITUAO DE SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL................................................................................................................... 24 2 - A SUSTENTABILIDADE COMO PRINCPIO CONSTITUCIONAL E A CORRELAO ENTRE A SUSTENTABILIDADE E A DIGNIDADE HUMANA ...... 29 3 - A APLICAO DO CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE SOCIAL COMO FORMA DE EFETIVAO DOS PRINCPIOS NORTEADORES DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. ....................................................................................................... 34 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................... 39 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................. 39 O PRINCPIO DA FUNO SCIO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE LUZ DA CONSTITUIO FEDERAL DE 1988 ............................................................................. 42 INTRODUO .................................................................................................................. 42 1.A EFICCIA NORMATIVA DOS PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS ............................................................................................................................................... 43 2. A ORDEM ECONMICA E A CONSTITUIO FEDERAL DE 1988 .................... 47 3. A TENDNCIA MUNDIAL DE PRESERVAO AMBIENTAL............................... 49 6

4. A PRESERVAO AMBIENTAL NA LEGISLAO BRASILEIRA - O PRINCPIO DA FUNO SCIO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE ............................................. 50 CONCLUSO ..................................................................................................................... 54 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS: ................................................................................. 55 TRABALHADOR RURAL, CONSTITUCIONALIZAO DA SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA E CRISE ECONMICA MUNDIAL .......................................... 57 INTRODUO .................................................................................................................. 57 1.OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E A CONSTITUCIONALIZAO DA SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA. ............................................................................. 58 2. DOS DIREITOS HUMANOS, FUNDAMENTAIS E SOCIAIS. ................................ 60 3. CRISE ECONMICA, DIREITOS SOCIAIS E A PONDERAO DE VALORES CONSTITUCIONAIS. ....................................................................................................... 63 4. TRABALHADOR RURAL E O PRINCPIO DA UNIVERSALIDADE E DA UNIFORMIDADE E EQUIVALNCIA DOS BENEFCIOS E SERVIOS S POPULAES URBANAS E RURAIS. ............................................................................ 66 CONSIDERAES FINAIS. .............................................................................................. 70 REFERNCIAS BIBLIOGRAFICAS .................................................................................. 70 POR UM MODELO DE TUTELA COLETIVA DOS DIREITOS SOCIAIS COMO INSTRUMENTO DE ACESSO JUSTIA .................................................................... 73 INTRODUO .................................................................................................................. 73 1.OS DIREITOS SOCIAIS E SUA EXIGIBILIDADE JUDICIAL ............................................................................................................................................... 74 1.1 CONCEITUAO E ESPECIFICAO DOS DIREITOS SOCIAIS ..................... 74 1.2 A EXIGIBILIDADE JUDICIAL DOS DIREITOS SOCIAIS ....................................... 76 2. A TUTELA COLETIVA ....................................................................................................78 2.1 O LITGIO ...................................................................................................................... 80 2.2. O PROCESSO ............................................................................................................... 81 2.3. O JUIZ ........................................................................................................................... 82 2.4. AS PARTES .................................................................................................................... 83 3. A TUTELA COLETIVA DOS DIREITOS SOCIAIS .....................................................85 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................... 89 REFERNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................................................... 90 AnexoS................................................................................................................................... 93 Ementa Integral: .................................................................................................................... 93 ESTADO-MERCADO E PILANTROPIA NO BRASIL .................................................... 95 INTRODUO .................................................................................................................. 95 1 UMA DEMOCRACIA DE MERCADO. ......................................................................... 97

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2 POBREZA, PILANTROPIA E BURGUESIA EM NOME DE UMA LEI FUNDAMENTAL. .............................................................................................................. 98 3 INDCIOS DE MODERNIDADE. .................................................................................. 99 4 QUE A PILANTROPIA SEJA FILANTROPIA. ......................................................... 103 5 O BRASIL NO MERCADO GLOBALIZADO............................................................. 105 CONSIDERAES FINAIS. ............................................................................................ 107 BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................. 108 TEORIA PARA A CONSTRUAO DE UM ESTADO DO DIREITO AMBIENTAL NA COLOMBIA ....................................................................................................................... 110 Introduo ........................................................................................................................... 110 1 TEORIA DO ESTADO ................................................................................................... 111 1.1 CARACTERIZAO DO ESTADO CONTEMPORNEO. .................................. 111 1.2 ESTADO SOCIAL DO DIREITO NA COLMBIA. ................................................ 111 1.3 RELAO MEIO AMBIENTE, SOCIEDADE E ESTADO NA CONSTITUIO POLTICA DA COLMBIA. ............................................................................................ 112 1.4 ESTADO DO DIREITO AMBIENTAL...................................................................... 112 2 A sociedade do risco global ............................................................................................... 113 2.1 ESTADO E TRANSNACIONALIDADE: .................................................................. 114 2.2. HACIA UM CONSTITUCIONALISMO GLOBAL? ............................................. 115 Consideraes finais: Os desafios dos Estados do Direito ambiental no contexto globalizado ............................................................................................................................................. 115 Bibliografia .......................................................................................................................... 116

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A TUTELA JUDICIAL-PARTICIPATIVA DO AMBIENTE: O LUGAR DOS JUIZADOS ESPECIAIS12Mrcio Ricardo Staffen3 Zenildo Bodnar 4

SUMRIO: INTRODUO; 1. O PAPEL DO PODER JUDICIRIO NA CONCRETIZAO DAS NORMAIS AMBIENTAIS; 2. NECESSIDADE DE UMA NOVA DOGMTICA PROCESSUAL TUTELA DO AMBIENTE; 2.1 PRINCPIO DA PARTICIPAO E O ACESSO JUSTIA AMBIENTAL; 2.2 AUDINCIA JUDICIAL PARTICIPATIVA; 2.3 O PROCESSO COMO PROCEDIMENTO EM CONTRADITRIO; 3. AFINAL, QUAL O LUGAR DOS JUIZADOS ESPECIAIS?; CONCLUSES ARTICULADAS; REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS. INTRODUO A sociedade contempornea da globalizao, da revoluo tecnolgica e de ataques suicidas do homem ao meio ambiente, caracteriza um novo tempo. Um tempo de grandes mudanas e transformaes, as quais atingem espaos jurdicos, polticos, econmicos e at culturais. Surgem, ento, novos direitos, novos atores sociais e novas demandas, as quais reclamam novas formas de equacionamento e proteo de bens juridicamente considerados.

Artigo desenvolvido no mbito do Projeto de Pesquisa CNJ Acadmico: Juizados Especiais, Turmas Recursais e Turmas de Uniformizao da Justia Federal. Com fomento do Conselho Nacional de Justia (CNJ) e da Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES). 2 Agradecimentos especiais ao Prof. Dr. Michel Prieur e Prof. Dr. lvaro Sanchez Bravo pelas lies ministradas. Doutorando e Mestre em Cincia Jurdica pela Universidade do Vale do Itaja, na linha de pesquisa Principiologia, Constitucionalismo e Produo do Direito. Pesquisador do Conselho Nacional de Justia CNJ. Possui graduao em Direito pela Universidade do Vale do Itaja. Professor em cursos de Especializao UNIVALI e Coordenador do Ncleo de Prtica Jurdica - UNIDAVI. Advogado (OAB/SC). E-mail: [email protected] Possui graduao em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, Mestrado em Cincia Jurdica pela Universidade do Vale do Itaja, Doutorado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina, Ps Doutorado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e Ps Doutorado em Direito pela Universidad de Alicante Espanha. Professor nos programas de Doutorado e Mestrado em Cincia Jurdica da Universidade do Vale do Itaja. Coordenador do Projeto de Pesquisa CNJ Acadmico sobre Juizados Especiais, turmas recursais e turmas de uniformizao da Justia Federal. Pesquisador CNPq. Juiz Federal. E-mail: [email protected] 94 3

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Esta nova realidade impe grandes desafios ao Judicirio e exige de seus integrantes novas formas de prestao jurisdicional, mais democrticas, eficazes socialmente, e comprometidas com os reais anseios da comunidade, que transcenda a ideia de processo como direito subjetivo, e avance alm da viso instrumental, presa as questes individuais, tpicas do paradigma liberal-normativista e que, de alguma maneira, expe a surrealidade de Kafka. Neste artigo, defende-se a necessidade de uma nova dogmtica processual para a tutela do meio ambiente. Respostas jurisdicionais mais efetivas necessitam de uma nova construo processual, capaz de resolver os problemas da atualidade. Pois, como de notrio conhecimento, as questes do sculo XXI so debatidas, ainda a partir da lgica jurdica do sculo XVIII, derivada imediata das glosas medievais. Sem demora, faz-se imperioso olhar o novo com a viso renovada. Prope-se a consolidao de uma nova cultura na prestao jurisdicional para a proteo do direito fundamental ao meio ambiente sadio e equilibrado. Cultura esta que efetivamente contribua para a emancipao do homem na sociedade, dotada de sensibilidade moderna, com uma perspectiva mais humana, que efetivamente transforme o foro judicial em um espao ampliado de cidadania substancialmente democrtica . 5 Com urgncia, na vigncia do Estado Democrtico de Direito, preciso resgatar o devido processo legal material e, necessariamente o princpio do contraditrio na ptica de Elio Fazzalari. Para tal desiderato, ganha relevo a anlise do lugar dos Juizados Especiais em relao a tutela judicial-participativa do ambiente. A partir de sua sistemtica processual prpria, pautada pela postura ativa dos destinatrios da deciso em conexo com a simplicidade das formas vislumbram-se novas possibilidades de efetiva proteo ambiental. 1. O PAPEL DO PODER JUDICIRIO NA CONCRETIZAO DAS NORMAIS AMBIENTAIS A Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 impe ao Estado e sociedade o dever de preservar e proteger o meio ambiente em todos os lugares e tempos para todas as geraes vindouras (CRFB/1988 art. 225). O Poder Judicirio como um dos Poderes do Estado tem a funo proeminente de fazer valer este comando constitucional e tambm o dever fundamental do proteger o meio ambiente. A funo promocional do direito presente nas decises do Poder Judicirio merece especial realce em matria ambiental tendo em vista a natureza pedaggica das decises as quais devem promover uma nova cultura ecolgica conservacionista estimulando aes concretas em prol do meio ambiente saudvel. Destaca Freitas (1998, p. 29-30) que o juiz possui papel relevante por exercer um dos poderes da Repblica em nome do povo e ter por obrigao defender e preservar o meio ambiente para presentes e futuras geraes (CRFB/1988, arts. 1, pargrafo nico e 225, caput) e tambm como intrprete das normas ambientais. Os problemas do direito do ambiente so altamente complexos e cada vez mais rodeados de incertezas e novos desafios. As frmulas generalistas estabelecidas pelo Estado atravs de seus legisladores para o meio ambiente nem sempre so adequadas para a soluo da infinita quantidade de casos e situaes existentes, considerando o conceito aberto e relativo do prprio ambiente.

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MIGLINO, Arnaldo. La democrazia come diffusione del potere. Archivio giuridico. Roma, v. CCXXX, n. 1, p. 57, 2010. 10

A dogmtica processual tradicional construda apenas para resolver conflitos individuais, tambm no equaciona com eficcia as ofensas aos bens ambientais. Por isso, deve o Estado constitucional ecolgico facilitar o acesso do cidado justia ambiental, no apenas criando novos instrumentos de defesa, mas principalmente conferindo uma interpretao adequada aos instrumentos processuais j existentes como da Ao Civil Pblica e a Ao Popular, para conferir-lhes a verdadeira amplitude e potencialidade. Dentro deste contexto, o papel do Poder Judicirio ainda mais importante na concretizao do direito fundamental, ao meio ambiente saudvel e do dever fundamental de todos de proteg-lo para a construo deste verdadeiro Estado constitucional ecolgico. As tenses entre o homem e a natureza formam uma constante na histria da humanidade. A busca irresponsvel do progresso tem levado o homem a ser o inimigo nmero um da natureza medida que o maior protagonista de condutas ofensivas ao ambiente. Assim, o compromisso de todos e em especial do Poder Judicirio contribuir para a mudana deste paradigma individualista desenvolvendo uma nova tica mais solidria, responsvel e comprometida com o meio ambiente, patrimnio maior de toda a humanidade. Para alcanar este desiderato a jurisdio dever focar a anlise na idia de dever fundamental, pois o meio ambiente antes de ser um direito intergeracional um dever fundamental que impe uma conduta ativa de todos os membros da sociedade organizada em especial dos poderes pblicos. A construo de uma nova hermenutica focada na idia de dever fundamental certamente representar um ganho de efetividade, pois muito mais importante identificar os responsveis pelo descumprimento do dever fundamental do que os titulares de eventual direito subjetivo. Na jurisdio focada na idia de dever fundamental, merece destaque o papel do magistrado em especial a sua sensibilidade humana. Isso porque a deciso precisa ter a cara do juiz, de seu pensamento responsvel e de seu sentimento de justia afinado com os reais anseios da sociedade a que serve. Os juzes, enquanto peas chaves para o engrandecimento da democracia, devem protagonizar em cada ato a transformao da sociedade, cada vez mais plural e diversificada no novo milnio. O magistrado idealista precisa acreditar que pode mudar o mundo para melhor, banindo dele a tica egosta e disseminando uma tica solidria e ambientalmente correta. O escopo social e poltico do processo ambiental exige a adoo de procedimentos mais flexveis e democrticos, que possibilitem a participao mais efetiva das partes e de todos os interessados, mormente em questes que envolvam expressivo nmero de pessoas e interesses colidentes, como ocorre nas lides ambientais, pois nestes casos a demanda no interessa apenas s partes formalmente constitudas e representadas na relao processual, interessa a toda sociedade. A sociedade atual da revoluo tecnolgica e da intensificao do fenmeno da globalizao muito mais desafiadora para os juzes. Este quadro demonstra a grande responsabilidade que tem a magistratura para a construo de um mundo melhor, mais humano e igualitrio e com mais oportunidades para todos. O juiz cidado, comprometido com os novos reclamos da sociedade contempornea, deve buscar no cotidiano de sua atuao, ampliar os mecanismos de acesso ao pleno desenvolvimento humano, conferindo especial proteo aos direitos fundamentais (sociais e individuais), previstos pela nossa Constituio explcita ou implicitamente (meio ambiente, alimento/salrio, moradia, educao, sade, emprego e outros).

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Pajardi6 defende que devemos criar um novo operador do direito, menos tcnico e que saiba superar, integrar e completar a tcnica com sensibilidade social e abundncia de humanidade. A importncia da sensibilidade social do julgador tambm destacada por Faria 7o qual enftico ao afirmar que na resoluo de conflitos sociais o juiz deve atuar como um arquiteto social, modificando as concepes discriminatrias da ordem jurdica vigente, valendo-se de suas sentenas como instrumentos, que auxiliem os grupos e as classes subalternas a se constiturem efetivamente como sujeitos coletivos de direito. concretizando os Direitos Fundamentais e em especial o direito de todos ao meio ambiente protegido, que o magistrado estar legitimando a sua atuao diante da sociedade. Ibaez 8 enftico ao concluir que a legitimidade original do juiz deve completa-se necessariamente mediante o exerccio do poder judicial numa autntica qualidade constitucional, pela sua funcionalidade efectiva de garantia dos direitos fundamentais. Como pacificador social deve o magistrado incentivar com responsabilidade a conciliao, valorizando frmulas e critrios eleitos pelos prprios litigantes para colocar fim ao litgio, ainda que tenha que utilizar procedimentos no previstos pelo legislador processual, como audincias pblicas, com a participao de representantes de associaes, autoridades pblicas, dentre outros, ainda que no estejam formalmente includos na relao processual. 2. NECESSIDADE DE UMA NOVA DOGMTICA PROCESSUAL TUTELA DO AMBIENTE A configurao dos novos direitos a sua ordem de conflituosidade, que comportam e a diversidade de configurao exigem uma nova dogmtica processual para sua adequada tutela. No possvel solucionar de maneira eficaz os conflitos envolvendo interesses difusos e coletivos com os instrumentos jurdicos construdos para a tutela judicial dos direitos interindividuais. Para a maioria da doutrina a ao ainda entendida como sendo um direito subjetivo, ou seja, direito de cada um. Seu exerccio vlido requer que seja demonstrado j no incio de forma instrumental e provisria que a pretenso objetiva e subjetivamente razovel (possibilidade jurdica do pedido) e quem pede o provvel titular da relao jurdica de direito material (legitimidade). As aes constitucionais utilizadas na proteo do meio ambiente perdem a sua efetividade em funo da teimosia dos operadores do direito em aplicar as concepes clssicas do processo tradicional s lides coletivas, fato este que empobrece a sua eficcia e diminui a potencialidade destes importantes instrumentos de tutela dos novos direitos. Os direitos difusos exigem uma reviso acerca de institutos como: legitimidade, verdade real, contraditrio, coisa julgada, adstrio ou congruncia, inrcia, dentre outros dogmas do processo tradicional arquitetado para a soluo dos conflitos individuais. A legitimidade tanto ativa como passiva deve ser vista numa perspectiva ampliada. A coisa julgada deve ter efeitos erga omnes. O juiz deve julgar alm do pedido quando outras medidas forem necessrias para a plena proteo do meio ambiente e no pode ser um mero

PAJARDI, P. 1988. Io Giovanna: Diario esistenziale immaginario di Giovanna dArco. Roma, Borla, 192 p.7

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FARIA, Jos Eduardo. Justia e conflito. Os juzes em face dos novos movimentos socis. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais: 1992.

IBAEZ, Perfecto Andrs. Poder judicial e democracia poltica: lies de um sculo. Revista da AJURIS. Porto Alegre, n. 85, p. 381, mar. 2002. 12

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expectador inerte do desenrolar do processo, deve antes assumir uma postura ativa na busca da verdade suficiente e da plena realizao da justia. Na tutela ambiental no precisa o juiz buscar a verdade material, tendo em vista que esta por demais utpica e inatingvel, dever lutar por uma verdade ideal, suficiente, especialmente em sede de cognio sumria quando instado a prestar a tutela de urgncia. As inevitveis crises de incertezas na avaliao da prova devem sempre colocar o risco do lado oposto ao meio ambiente9 . O contraditrio como garantia constitucional substancial no pode ser entendido como um singelo direito de informao e de reao da parte formalmente habilitada no processo. O contraditrio no apenas a faculdade de dizer e de contradizer, mas sim a oportunidade concreta de participao das partes e intervenientes na construo ativa do provimento jurisdicional final como se ver na sequncia. O provimento jurisdicional ser produzido efetiva cooperao de todos e no ser um ato de capricho ou autoritarismo do magistrado. A superao dos obstculos efetividade das aes constitucionais depende da mudana da mentalidade dos operadores do direito. Os institutos processuais devem sempre ser entendidos/interpretados luz da Constituio Federal, e o acesso justia como princpio bsico do Estado Democrtico de Direito deve ser compreendido numa noo bem mais ampla que a singela preocupao com custas judiciais. A utilizao adequada e eficaz das aes constitucionais, com a superao dos conceitos e dogmas da processualstica clssica, antes at de grandes reformas legislativas, depende principalmente da conscientizao dos operadores jurdicos para que o to almejado acesso justia seja um ideal ao alcance de todos os cidados. Importa reconhecer, em linhas gerais que no panorama que se desnuda j no basta advogar por um circuito clssico procedimentalista, adstrito ao modelo liberal. preciso reconhecer o Poder Judicirio como instituio basilar nas democracias hodiernas, no limitado s funes meramente declaratrias. O Judicirio, o Ministrio Pblico e demais instituies envolvidas na prtica jurdica, necessitam reger um efetivo sistema de freios e contrapesos interessado na participao dos destinatrios do ato decisrio, a partir de um ambiente democraticamente substancial que substitua a ideia de que a deciso judicial uma mera aplicao lgico-aritmtica. A prestao jurisdicional tambm possui um carter pedaggico, pois deve servir como forma de educao, confirmando-se assim a concluso de Nalini 10quanto ao papel do Juiz na conscientizao ecolgica segundo o qual o julgamento contm, subsidiariamente soluo da controvrsia soluo da controvrsia, um ensinamento.2.1 PRINCPIO DA PARTICIPAO E O ACESSO JUSTIA AMBIENTAL

Um dos princpios ambientais mais importantes o princpio da participao segundo o qual os cidados devem participar dos procedimentos e das decises ambientais, no apenas por serem os destinatrios diretos destas, mas tambm pelo compromisso que todos devem ter para com a defesa e a proteo do meio ambiente. A participao de todos na proteo dos bens ambientais salutar para o desenvolvimento de uma tica ambiental comprometida com um modo de vida ambientalmente correto e afinada com os princpios

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LUHMANN, Niklas. Legitimao pelo procedimento. Braslia: UnB, 1980, p. 107.

NALINI, Jos Renato. O futuro das profisses jurdicas. So Paulo: Oliveira Medes, 1998, p. 11 13

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da ecologia, os quais religam o homem com a teia da vida11 O princpio da participao conforme Fiorillo12 o agir em conjunto que contempla dois elementos fundamentais: a informao e a educao. A participao relevante para que o cidado seja informado acerca de suas responsabilidades para com o meio ambiente. A participao dos cidados nos procedimentos fundamental para que tenham a plena convico de que no processo tudo acontece pelo esforo srio, justo e intenso na investigao da verdade e na busca da justia para que tenham certeza que a ajuda das instituies em especial do Poder Judicirio repercutir positivamente na proteo dos seus direitos13 A importncia da participao nas aes judiciais como forma de acesso justia destacada por Machado14 o qual aps apontar como fundamentos para a participao a Conveno de Aarhus (Art. 9. 1-5) e a Declarao do Rio de Janeiro de 1992, enfatiza que: a possibilidade de as pessoas e de as associaes agirem perante o Poder Judicirio um dos pilares do Direito Ambiental. A participao no procedimento para Luhmann15 tem um valor especial cooperao de todos, fato que serve no apenas para a compreenso das premissas obrigatrias de comportamento e de compromisso pessoal. O devido processo legal substancial aplicado ao meio ambiente deve ser construdo a partir da concretizao dos direitos e garantias fundamentais e da participao dos cidados nos procedimentos administrativos e judiciais. A participao o ponto de partida para a proteo efetiva do meio ambiente. Ningum vai salvar o planeta sozinho, pois somente o engajamento de todos na gesto dos recursos naturais e do potencial ecolgico do planeta que garantir um projeto civilizatrio mais promissor para o futuro da humanidade. A construo da deciso em matria ambiental no pode prescindir da efetiva participao, especialmente considerando as suas necessrias imbricaes dos fatores econmicos, polticos e sociais. A interao destes fatores potencializa o interesse da populao na construo das decises quer seja no plano legislativo, administrativo ou judicial. O Estado no pode abrir mo da parceria efetiva da sociedade civil na tutela do ambiente, pois foi exatamente da tomada da conscincia coletiva da crise ecolgica do planeta que surgiu o Direito Ambiental. Para que os cidados reconheam a importncia das normas e das decises ambientais de fundamental importncia que participem da sua construo, pois como principais destinatrios delas precisam antes de tudo de informao e de tomada da conscincia. Neste cenrio, as figuras petrificadas ganham vida, de sorte que o direito e o ideal de justia transcendem o carter de fico para invadir a realidade.

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BOFF, Leonardo. Ethos mundial: um consenso mnimo entre os humanos. Braslia: Letraviva, 2000, p. 39.

FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 4. ed. ampl. So Paulo: Saraiva, 200313 14

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LUHMANN, Niklas. Legitimao pelo procedimento. Braslia: UnB, 1980, p. 105

MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 9. ed. So Paulo: Malheiros, 2000, p. 7715

LUHMANN, Niklas. Legitimao pelo procedimento. Braslia: UnB, 1980, p. 96.97 14

Na atual sociedade de riscos incertos, globais e futuros fundamental a participao de todos os atores na tomada de deciso. Esta necessidade destacada por Leite e Ayala16 segundo os quais a composio de interesses e ponderaes completas somente sero possveis mediante processos bem informados, que garantam participao pblica e democrtica no momento da seleo das escolhas adequadas. Especialmente porque a cincia no fornece respostas corretas e conclusivas acerca das complexas questes da atual sociedade do risco, sendo imprescindvel uma abordagem transdisciplinar. Isso tudo porque a gesto ambiental democrtica, alm de imprescindvel, um convite ao dos cidados para participar na produo de suas condies de existncia e em seus projetos de vida 172.2 AUDINCIA JUDICIAL PARTICIPATIVA

A possibilidade de convocao de audincias pblicas, para a discusso de importantes temas de interresse coletivo, passou a ganhar especial ateno do legislador a partir da Constituio de 1988. O artigo 58, 2, inciso II, prev a possibilidade de convocao de audincias pblicas pelas comisses legislativas, com entidades da sociedade civil e com especialistas em determinadas matrias. O Direito Ambiental Brasileiro, seguindo uma tendncia mundial18, assegura ao cidado a possibilidade de participar da poltica ambiental, nas diversas esferas de poder do Estado: a) Legislativo: no processo de criao do Direito Ambiental por meio de iniciativa popular, referendo e plebiscito; b) Executivo: composio de rgos colegiados, a exemplo do CONAMA, e a participao em audincias pblicas realizadas na execuo dos Estudos de Impactos Ambientais e na apresentao dos respectivos relatrios (nos casos de impacto ambiental mais significativo, conforme resolues de n 001/86 e 009/87 do CONAMA); c) Judicirio: legitimidade para propor: ao popular, mandado de segurana e mandado de injuno. Apesar destas possibilidades, formalmente garantidas ao cidado, o que se observa na prtica um grave dficit democrtico, especialmente no que se refere ao acesso justia. No h notcia de participao popular no processo de criao do Direito Ambiental no Brasil, pois os rarssimos casos em que ocorreu a iniciativa popular, plebiscito e referendo, trataram de outros temas. A participao do cidado nas audincias pblicas realizadas na fase do licenciamento, apesar de constituir um importante avano est estratgia de legitimao ainda no vem sendo utilizada adequadamente. Especialmente pela falta de conscientizao da populao, pela falta de oportunidade de manifestao qualificada para o pblico em geral e at em funo dos locais e horrios em que estas audincias so realizadas. O que mais relevante destacar, considerando os objetivos especficos deste artigo, a carncia de legitimao democrtica para a gesto e implementao das polticas pblicas e LEITE, Jos Rubens Morato, AYALA, Patryck. Transdisciplinariedade e a proteo jurdico-ambiental em sociedades do risco: direito, cincia e participao. In: LEITE, Jos Rubens Morato; BELLO, Ney de Barros Filho. Direito ambiental contemporneo. So Paulo: Manole, 2004, p. 121. LEFF, Henrique. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Trad. Lcia Mathilde Endlich Orth. Petrpolis: Vozes, 2005, p. 57. 18 A participao no processo de licenciamento assegurada como estratgia democrtica de implementao ambiental nos seguintes pases: Canad, Frana, Sua, Noruega, Itlia, Grcia e recomendada por diretiva para todos os pases da Unio Europeia. 1517 16

das decises em matria ambiental no mbito da jurisdio. No Direito Brasileiro o cidado, apesar de o maior interessado na tutela do ideal meio ambiente, foi praticamente esquecido pelo legislador que somente reservou algumas hipteses restritas que possibilitam a sua interveno. A Lei da Ao Civil Pblica, apesar da incluso recente da Defensoria Pblica como legitimada, ainda exclui, numa opo infeliz e autoritria, a participao ativa do cidado da tutela do meio ambiente ao negar ao maior advogado do meio ambiente o poder de ao que uma forma de exerccio substancial de democracia. No caso da Ao Popular a participao do cidado na tutela do meio ambiente, mesmo aps o advento da Constituio de 1988, ainda restrita aos casos em que h participao do Poder Pblico, pois exige que atos ou omisses deste sejam impugnados. Neste contexto, fundamental que o cidado tenha oportunidade de participar, como sujeito ativo e protagonista das decises ambientais, por intermdio das audincias pblicas judiciais, contribuindo com o tratamento adequado das lides ambientais. A convocao de audincias pblicas no processo judicial dever em todos os casos em que a participao popular seja relevante em razo do alto grau de litigiosidade e da quantidade de direitos fundamentais envolvidos e em rota de coliso. Como, por exemplo, nos caos de ocupaes irregulares de reas de Preservao Permanente, criaes de parques, dentre outros. A democratizao do Acesso Justia Ambiental por vias especiais, com ampla participao popular, por intermdio de audincias pblicas judiciais, a melhor forma de legitimar a atuao do Poder Judicirio na tutela do ambiente e tambm servir como mecanismo estratgico de conscientizao e educao ambiental. com a cooperao de todos e com a inteligncia coletiva que ser possvel assegurar a proteo efetiva dos interesses e direitos fundamentais envolvidos direta ou indiretamente nos litgios ambientais, em especial a garantia plena da higidez ambiental para uma melhora contnua das condies de existncia humana no planeta. Acerca deste prisma, aproximando Psicologia e Direito parece relevante no estgio em que se vive concordar que o Direito caminha rumo uma zona de conforto19 e preveno de danos, prejuzos e vtimas. H nisso uma confluncia de interesses com o modo de jurisdicionar em sede de audincia judicial participativa, onde os participantes propem uma resposta legal a todas as principais causas de conflito suscitadas pela alteridade, desigualdade ou pela relao de foracluso do terceiro via contraditrio.2.3 O PROCESSO COMO PROCEDIMENTO EM CONTRADITRIO

Os direitos acerca do meio ambiente reclamam enquanto direitos difusos uma nova caracterizao teoria do processo. Tal renovao impe uma compreenso prpria que substitua a ideia de que o rito se fazia pelo rito e a forma se cumpria pela forma. A cincia processual no s a cincia das peties, das provas, dos recursos, das execues, das orientaes jurisprudenciais, das formas, dos prazos.20 De igual forma, na vigncia do Estado Democrtico de Direito, fixar o conceito de processo como relao jurdica, na questo do direito subjetivo ou na teoria da situao

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Sugere-se: MELMAN, Charles. O homem sem gravidade: gozar a qualquer preo. Trad. Sandra Regina Felgueiras. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2008., p. 105-106). GONALVES, Aroldo P. Tcnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 47. 16

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jurdica reproduz o problema do direito subjetivo como poder de exigir a conduta de outrem. A prtica do processo como relao jurdica corrobora na noo de ascendncia do sujeito ativo sobre o sujeito passivo21, uma vez que este obrigado a satisfazer a vontade daquele no importando as razes da celeuma. Por sua vez, a teoria da situao jurdica d um passo avante quando substitui a mxima da relao jurdica sustentada no direito subjetivo pela disciplina da lei que regula as faculdades, poderes e deveres. Isto, porm, pouco. Apenas tira o processo da ideia de individualismo para centr-lo num espao normativo, ambos tpicos do paradigma de Estado Liberal alicerado no dogma da autonomia da vontade. Por tudo o que j foi adiantado alhures, Elio Fazzalari apresenta uma senda hbil ao escopo democrtico-participativo do processo. Ao estabelecer com primazia a noo de processo como procedimento em contraditrio, e fazer do contraditrio o elemento distintivo de processo e procedimento, Fazzalari afastou o retrgado clich da relao jurdica processual que sustenta a instrumentalidade do processo, incapaz neste momento de dar respostas efetivas aos problemas sociais. Neste quarto, a proposta do processo como procedimento em contraditrio traduz o pice do pensamento jurdico na conduo efetivamente dialtica e democrtica do processo. justamente o contraditrio que distingui o processo do procedimento. Para se identificar, portanto, o processo fundamental a participao dos destinatrios da deciso em contraditrio paritrio. Isso no significa a mera participao dos sujeitos do processo, no o dizer e o contra dizer, no se resume em discusso. De igual forma, o contraditrio no se exaure com a mera oitiva da parte, cuja mxima ainda impera na noo de audiatur (...) et altera pars (viso instrumental). Para Gonalves 22o contraditrio a igualdade de oportunidade no processo, a igual oportunidade de igual tratamento, que se funda na liberdade de todos perante a lei, para quem a igualdade jurdica propiciada pelo contraditrio condio de justia no processo. Acrescente-se, que a exteriorizao do princpio do contraditrio, na proposta de Fazzalari se opera em dois momentos. Inicialmente com a informazione, consistente no dever de informao para que possam ser exercidas as posies jurdicas em face das normas processuais e, em seguida, num segundo momento, a reazione, revelada pela possibilidade de movimento processual, sem se constituir, todavia, em obrigao. Deste argumento brota a noo de contraditrio em simtrica paridade, que vincula compulsoriamente o autor, o ru, o interveniente, o juiz, o representante do Ministrio Pblico (quando necessrio) e seus auxiliares a atuarem em p de igualdade. Aqui novamente visualiza-se um contraponto a noo instrumental do processo, pois garante a dialtica participao no s de autor e ru, tradicionais destinatrios do ato, mas tambm das demais pessoas envolvidas na atividade jurisdicional. Sob este enfoque, todos so partes. Contudo, as lies de Fazzalari 23 no se encerram na noo de processo como procedimento em contraditrio. Traz a baila o conceito de norma como um cnone de

FAZZALARI, Elio. Instituies de direito processual. Trad. Elaine Nassif. Campinas: Bookseller, 200622

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GONALVES, Aroldo P. Tcnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 127.

FAZZALARI, Elio. Instituies de direito processual. Trad. Elaine Nassif. Campinas: Bookseller, 2006, p. 49. 17

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valorao de uma conduta, entendida como alguma coisa de aprovvel, de prefervel em determinada cultura. Assim, a exposio deste panorama permite afastar a nefasta proposta de Kelsen que concentrou o estudo da juridicidade no ilcito, para quem o processo traduz um24. Para Fazzalari, portanto, o processo deve ser compreendido e praticado como uma garantia, logo, quando se inicia um processo no se exercita um ilcito, ao reverso, se pratica um direito constitucionalmente assegurado. Embora j consignado, ainda vivencia-se um momento de soluo de conflitos orientado pela matriz individual-liberal-normativista suportada pelo primado da autoregulao. Todavia, como nos instrui Nunes25 a noo de legitimidade est vinculada aos procedimentos que possibilitam a participao igualitria e efetiva do indivduo na construo do provimento, sendo que a legitimidade do direito se d pela empreitada cooperativa, que se apresenta por meio de procedimentos que possibilitam a participao igualitria e efetiva de todos os interessados no processo de produo das leis, bem como no processo de aplicao das normas. Neste quadro renovado, a Constituio passa a ser a pedra angular para a edificao de um sistema decisrio democrtico cultivado dialeticamente que, necessita ser compreendida, essencialmente, como a interpretao e a estruturao de um sistema de Direitos Fundamentais que subsidia as condies procedimentais de institucionalizao jurdica das formas de comunicao, nos dizeres de Oliveira26 exatamente neste contexto comunicativo-processual-constitucional que o princpio do contraditrio na percepo de Fazzalari ganha relevncia, uma vez que defende um modelo substancial de participao, alm de um simples procedimento. Atravs do princpio do contraditrio que se estabelece racionalmente uma relao comunicativa [argumentativa] entre os destinatrios do provimento jurisdicional, tanto na esfera administrativa quanto na judicial. Recordando as aulas de Fsica, o princpio do contraditrio necessita urgentemente ser praticado como uma fora centrpeta que, por sua dinmica tem o condo de trazer todas as consideraes para o ncleo do processo. Como bem observa Habermas27 todo aquele que se envolve numa prtica argumentativa tem que supor inicialmente que, em princpio, todos os possveis afetados podem participar, na condio de livres e iguais, de uma garimpagem cooperativa em busca da verdade, na qual a coero que se admite a do melhor argumento, exclusivamente. Logo, o processo deixa de ser uma luta, cujo objetivo erradicar o adversrio, para assumir o carter de um jogo, em que impera a racionalidade dos atores que buscam vencer pela maior liquidez de seus argumentos. Pela perspectiva habermasiana, pode-se afirmar que todos os participantes do processo, quaisquer que sejam seus fundamentos, fornecem, via princpio do contraditrio,24

GONALVES, Aroldo P. Tcnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 155.

NUNES, Dierle J. C. Direito constitucional ao recurso: da teoria geral dos recursos, das reformas processuais e da comparticipao das decises. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2006, p. 52. OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de. Direito processual constitucional. Belo Horizonte: Melhoramentos, 2001, p. 257.27 26

25

HABERMAS, Jrgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. v. II. 2. ed. Trad. Flavio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 215. 18

contribuies ao discurso que, praticado em simtrica paridade possibilitam que a deciso final seja uma fuso de horizontes, como quer Gadamer28 No resta dvida que, segundo Gonalves:[...] se lhes garantido, pelo contraditrio, a participao nos atos processuais que preparam o provimento, uma conseqncia dessa garantia que as partes saibam por que um pedido foi negado ou por que uma condenao foi imposta. Elas viveram o processo, ou tiveram a garantia de viv-lo, participaram do seu desenvolvimento, reconstruindo a situao de direito material sobre que deveria incidir o provimento e, nessa reconstruo, fizeram, juntamente com o juiz, o prprio processo, na expectativa do provimento final.29

Por esta razo, a verdade das proposies ou a correo das normas depende, em ltima instncia, de que se possa alcanar um consenso num ambiente de total liberdade e de simetria entre os envolvidos no dilogo discursivo-argumentativo de ATIENZA.30 Ademais, o Direito Ambiental enquanto direito difuso requer para a sua execuo o engajamento do maior nmero possvel de indivduos, haja vista o real interesse de todos. Para tanto, preciso constituir espaos de cidadania e democracia para tal tarefa. Ante o exposto, evidente que o contraditrio no se resume simplesmente em um princpio ou Direito Fundamental. Sua existncia e satisfao substancial tipificam a materializao do Estado Democrtico de Direito. Assim, para que este seja realmente produtivo, h de se ter um verdadeiro espao ao contraditrio, cabendo aos rgos jurisdicionais velar pela real simetria e equilbrio das posies cultivadas discursivamente. 31 Eis o papel das audincias judiciais participativas e a capacidade da proposta de Elio Fazzalari que convidam todos isonmica e indistintamente para participarem dos processos decisivos. 3. AFINAL, QUAL O LUGAR DOS JUIZADOS ESPECIAIS? Em linhas gerais, o excesso de formalismo, a morosidade na prolatao de decises somadas ao custo pecunirio da demanda so causas comuns suposta crise do Poder Judicirio e o nascedouro do sistema dos Juizados Especiais. A concluso de que tais mculas acabam por afastar o jurisdicionado da jurisdio reclama novas formas de resolues de pretenses resistidas no seio do Estado. Do contrrio, o sentimento de descrdito produzido cria uma bolha de litigiosidade contida paralela a modos privados de autotutela a qual escapa do controle estatal. Ainda que se reconhea um progressivo esforo na Constituio de medidas judiciais em matria ambiental, com a expanso das aes previstas na legislao, tal como, ao civil pblica, ao popular, mandado de segurana, aes de procedimento sumarssimo, aes28

GADAMER, Hans-Georg. Verdade e mtodo I. Trad. Flvio Paulo Meurer. Petrpolis: Vozes, 2003, p. 251. GONALVES, Aroldo P. Tcnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 167.

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ATIENZA, Manuel. As razes do direito: teorias da argumentao jurdica. 3. ed. Trad. Maria Cristina Guimares Cupertino. So Paulo: Landy, 2003, p.163. IBAEZ, Perfecto Andrs. Garantismo: una teora crtica de la jurisdiccin. In: CARBONELL, Miguel; SALAZAR, Pedro (Eds.). Garantismo. Estudios sobre el pensamiento jurdico de Luigi Ferrajoli. Madrid: Trotta/Instituto de Investigaciones Jurdicas-UNAM, 2005. 1931

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cautelares, tutelas inibitrias e afins preciso admitir que o sucesso destas medidas passa necessariamente pela informao e pela participao em juzo. No bastam as propostas de erradicao de litigiosidade contida decorrente da represso, conteno ou represso de direitos sem uma prvia minimizao da litigiosidade latente, na qual os indivduos vivem em completa inrcia, privados de discernimento e reivindicaes. 32 Neste sentido, o sistema dos Juizados Especiais, pensado a partir da Lei 9.099/1995, determina uma nova forma de processualidade, orientada compulsoriamente pela oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade (Lei 9.099/95, art. 2), cuja competncia atinge as causas pautadas em aes individuais (as quais no podem ser descartadas na seara ambiental) cveis de menor complexidade e infraes penais de menor potencial ofensivo (CRFB/88, art. 98, I). justamente sobre tais princpios que uma nova prtica de tutela judicial-participativa do ambiente carece ser implementada. Prtica esta que se movimente no sentido de dar vazo conciliao e equidade no intuito primeiro de trazer resoluo dos conflitos ambientais de forma direta e substancial os destinatrios da deciso e beneficirios de um ambiente sadio e equilibrado. Contudo, o sucesso da iniciativa no se faz por si s. Conforme j dito, necessrio se apresenta uma nova compreenso terico-normativa-processual, que transcenda a mobilizao excludente da Teoria Geral do Processo, para avanar em propostas inclusivas, participativas e democrticas, ciente, por sua vez, da necessidade de baixa formalidade e alta participao. No por acaso:Para que a jurisdio obtenha resultados positivos na realizao de mltiplos objetivos sociais, solucionando falhas de mercado ou do processo poltico, como um importante produtor de decises sociais preciso ensejar aos interessados amplo acesso, de forma a lhes conferir iniciativa em defesa dos valores juridicamente protegidos. A aptido da jurisdio em proporcionar a fcil propositura de aes deve ser proporcional efetividade de suas respostas, de forma a atuar no apenas na soluo de litgios, mas tambm a demover e a desestimular os agentes da prtica de atos contrrios ao interesse pblico protegido. 33

Considerando as razes expostas, as manifestaes em enunciado do Frum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE 97) e Frum Nacional dos Juizados Especiais Federais (FONAJEF 22) e as prticas experimentais com Juizados Especiais Volantes Ambientais nos Estados de Mato Grosso e Amazonas merecem ser ampliadas em nvel nacional a fim de diminuir procedimentos esparsos para litgios ambientais, maior exigibilidade e efetividade dos direitos relativos ao ambiente e conscientizao da populao. Eis o lcus dos Juizados Especiais. Assim, a questo suscitada acerca do lugar dos Juizados Especiais na defesa do ambiente prope um fluxo de expanso dos seus limites de ao. No se resume em um desafio dogmtica jurdica ou teoria geral do processo, mas, sobretudo, ao modo que se exercita judicialmente a tutela ambiental alm do carter repressivo dos Juizados Especiais Criminais. A par dessa fluidez processual e funcional, a universalidade da jurisdio supera a clssica ideia de direito de demandar em juzo para apresentar-se como uma das possibilidades (no residual, mas constitucionalmente assegurada) de resoluo dos

WATANABE, Kazuo. Filosofia e caractersticas bsicas do juizado especial de pequenas causas. ______. (Coord.). Juizado especial de pequenas causas. So Paulo: RT, 1985. SALLES, Carlos A. Execuo judicial em matria ambiental. So Paulo: RT, 1998, p. 126. 2033

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conflitos, a qual no pode ser encarada como um convite litigncia, nos dizeres de Mancuso. 34 CONCLUSES ARTICULADAS O Poder Judicirio deve facilitar o acesso justia ambiental e a democratizao do processo judicial com a utilizao de procedimentos que assegurem a participao direta dos cidados nos procedimentos jurisdicionais em matria ambiental. A participao efetiva dos destinatrios das normas ambientais a melhor estratgia a ser utilizada para o tratamento das lides ambientais mais complexas, tendo em vista que concretiza tambm os princpios da: informao, educao, conscientizao e comprometimento solidrio com proteo do meio ambiente. Para tanto, faz-se imperioso inaugurar uma nova concepo de teoria do processo, voltada para o Direito Ambiental que, fundamentalmente promova a garantia do processo como procedimento em contraditrio; um processo de incluso dos indivduos em um ambiente dialtico, no qual se reconhece o mrito de tratar cada sujeito do direito como igual e idntico, e no qual prevalea a simplicidade e a efetividade das decises, tal como se propem o sistema dos Juizados Especiais. A melhor forma de assegurar o princpio da participao no processo judicial a realizao de audincias judiciais participativas, em espaos judiciais prprios, nos quais deve ser oportunizada a participao direta dos cidados, de especialistas na matria e das autoridades pblicas, tudo para a construo conjunta da deciso social e ambientalmente mais justa e consequente. Desta forma, a discusso no se apresenta somente sobre o tipo de processo que se possui e as consequncias da sua prtica irrefletida, mas, sobretudo, impe uma meditao sobre o tipo de Estado que se vislumbra. Somente quem est envolvido no processo de defesa do ambiente tem substancialmente interesse neste propsito. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ATIENZA, Manuel. As razes do direito. teorias da argumentao jurdica. 3. ed. Trad. Maria Cristina Guimares Cupertino. So Paulo: Landy, 2003. BERI, Mario. La magistratura nello stato democratico. Quaderni di Iustitia. n. 18. Padova: Giuffr, 1989. BOFF, Leonardo. Ethos mundial: um consenso mnimo entre os humanos. Braslia: Letraviva, 2000. FARIA, Jos Eduardo. Justia e conflito. Os juzes em face dos novos movimentos sociais. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais: 1992. FAZZALARI, Elio. Instituies de direito processual. Trad. Elaine Nassif. Campinas: Bookseller, 2006. FIORILLO, Celso Antnio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 4. ed. ampl. So Paulo: Saraiva, 2003.

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APLICAO DO PRINCPIO CONSTITUCIONAL DA SUSTENTABILIDADE COMO FORMA DE EFETIVAO DOS PRINCPIOS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAISMaria Raquel Duarte1

SUMRIO: CONSIDERAES INICIAIS; 1 - CONCEITUAO DE SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL; 2 - A SUSTENTABILIDADE COMO PRINCPIO CONSTITUCIONAL E A CORRELAO ENTRE A SUSTENTABILIDADE E A DIGNIDADE HUMEEEANA; 3 A APLICAO DO CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE SOCIAL COMO FORMA DE EFETIVAO DOS PRINCPIOS NORTEADORES DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS; CONSIDERAES FINAIS; REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.CONSIDERAES INICIAIS A sustentabilidade um assunto muito discutido na atualidade, o tema frequentemente relacionado s questes ambientais, sobretudo no que diz respeito preservao doFFs recursos naturais no sentido puramente ecolgico. Contudo, na verdade, o significado de sustentabilidade muito mais abrangente, e a questo ambiental apenas um de seus fundamentos. O objetivo deste paper conceituar sustentabilidade e desenvolvimento sustentvel demonstrando que estes conceitos vo alm do slogam ecolgico transbordando ao Direito Constitucional, para posteriormente contextualiza-los na aplicao e efetivao dos Princpios norteadores dos Juizados Especiais Federais. 1 - CONCEITUAO DE SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL Sabe-se que o meio ambiente constitui direito fundamental de todos os cidados, que tambm tm o dever no auxlio para mant-lo equilibrado, preservando para as presentes e futuras geraes. Pois bem, como ento o Estado poderia incentivar esta conduta dos seus cidados.

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Advogada militante em direito Previdencirio. Mestranda em Cincias Jurdicas pela Universidade do vale do Itaja UNIVALI - Pesquisadora do Conselho Nacional de Justia - CNJ - Especialista em Direito Civil UFSC. Especialista em Direito Previdencirio CESUSC. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho UNIDERP/ LFG. 24

IGNCIO SACHES como forma de se aproximar dos princpios da democracia participativa, onde a sociedade civil organizada tem um papel predominante nessa mudana e usa a expresso sociedade sustentvel para salientar suas ideias. Esta matriz fundamentase na crtica civilizao capitalista, enfatiza a equidade social e faz oposio ao reducionismo econmico e tecnolgico, defendendo que no h sustentabilidade se no houver a incorporao das desigualdades sociais e polticas e de valores ticos de respeito vida e s diferenas culturais.2 Segundo ALOSIO RUSCHEINSKY a Sustentabilidade um termo relativamente antigo, de origem no saber tcnico na agricultura no sculo XIX. 3 Apenas em 1972, na Conferncia de Estocolmo (Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente Humano), comeou a surgir na esfera mundial a preocupao com os problemas ambientais fruto da preocupao das naes ricas e industrializadas com o crescimento populacional e a degradao ambiental causada pelo avano econmico e esgotamento dos recursos naturais. Em 1992, na Conferncia das Naes Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - CNUMAD 4 ocorrida no Rio de Janeiro, conhecida como Eco 92 ou Rio 92 introduziu o conceito de desenvolvimento sustentvel no mbito do direito internacional, fazendo-o constar de vrios dos princpios contidos na "Declarao do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento". Na mesma ocasio, a Agenda 21 reforou a ideia de que o desenvolvimento e a preservao do meio ambiente devem andar lado a lado. 5 A Agenda 21 trouxe as diretrizes para promover padres de consumo e produo que reduzam as presses ambientais e atendam s necessidades bsicas da humanidade, bem como desenvolver uma melhor compreenso do papel do consumidor e da forma de se implementar padres de consumo mais sustentveis. Desde ento as palavras mgicas da ordem do dia relativas ao Direito Ambiental, referem-se a tudo que diz respeito aos termos sustentvel e sustentabilidade sendo utilizadas na estratgia para aprovar projetos econmicos ou para alterar polticas pblicas, angariar fundos e conquistar mercados. Tudo o que possui o slogan ecolgico merecedor de elogio e de adeso. Contudo, conforme dito inicialmente, o termo sustentvel vai alm do Direito Ambiental transbordando no direito Constitucional e nos Direitos Fundamentais no momento que nos referimos ao termo Sustentabilidade Social. Salienta-se aqui que os termos Sustentabilidade e Desenvolvimento Sustentvel consistem em conceitos de, a bem da verdade, bastante amplos e admitem variaes de acordo com interesses e posicionamentos. Neste norte poderamos dizer que, a sustentabilidade se define como um princpio de uma sociedade que mantm as caractersticas necessrias para um sistema social justo,

2

SACHS, Ignacy. Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir. So Paulo: Vrtice, 1986.

3 Rev. eletrnica Mestr. Educ. Ambient. ISSN 1517-1256, Volume 10, janeiro a junho de 2003 4 (CNUCED), United Nation Conference on Environment and Development.5

Revista de Direito Ambiental, n. 37, p. 144. 25

ambientalmente equilibrado e economicamente prspero, por um longo perodo de tempo indefinido. No obstante, nota-se que a sustentabilidade no uma cincia, nem um processo ou sistema, nem um indicador estatstico, mas est intrinsecamente ligada entre a necessidade e a vontade e, eminentemente ligada interveno humana. O conceito clssico de SUSTENTABILIDADE a qualifica de forma ampliada e abrangente como o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras geraes satisfazerem as suas prprias necessidades (BRSEKE, 1995, p. 33).6 CLOVIS CAVALCANTI nos ensina que a sustentabilidade significa a possibilidade de se obterem continuamente condies iguais ou superiores de vida para um grupo de pessoas e seus sucessores em dado ecossistema (CAVALCANTI, 2003).7 Na atualidade este conceito assume um sentido polismico, multidisciplinar, transposto e aplicvel a diferentes situaes, contextos e objetivos. Com o intuito de auxiliar na compreenso do conceito de sustentabilidade, SACHS8 a divide em cinco classificaes: a sustentabilidade ambiental, a sustentabilidade econmica, a sustentabilidade poltica, a sustentabilidade ecolgica e a sustentabilidade social. Sustentabilidade ambiental refere-se manuteno da capacidade de sustentao dos ecossistemas, o que implica a capacidade de absoro e recomposio dos ecossistemas em face das agresses antrpicas. Sustentabilidade econmica - refere-se a uma gesto eficiente dos recursos em geral e caracteriza-se pela regularidade de fluxos do investimento pblico e privado. Assegurar a gerao de renda e sua distribuio equitativa Implica a avaliao da eficincia por processos macro sociais. (benefcios financeiros a nvel macrossocial) Sustentabilidade poltica. refere-se ao processo de construo da cidadania para garantir a incorporao plena dos indivduos ao processo de desenvolvimento. Sustentabilidade ecolgica - refere-se base fsica do processo de crescimento e tem como objetivo a manuteno de estoques dos recursos naturais, incorporados as atividades produtivas. Sustentabilidade social refere-se ao desenvolvimento e tem por objetivo a melhoria da qualidade de vida da populao. Para o caso de pases com problemas de desigualdade e de incluso social, implica a adoo de polticas distributivas e a universalizao de atendimento a questes como sade, educao, habitao e seguridade social.

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BRSEKE, Franz Josef. O Problema do Desenvolvimento Sustentvel. In: VIOLA, Eduardo et al. (Org.) Meio ambiente, desenvolvimento e cidadania: desafios para as cincias sociais. Santa Catarina: Cortez Editora, 1995. p.29-40. CAVALCANTI, Clvis. (org.). Desenvolvimento e Natureza: estudos para uma

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sociedade sustentvel. So Paulo: Cortez, 2003.8

SACHS, Ignacy. Estratgias de Transio para do sculo XXI Desenvolvimento e Meio Ambiente. So Paulo: Studio Nobel Fundao para o desenvolvimento administrativo, 1993. 26

Em linhas gerais podemos dizer que Sustentabilidade Social, implica em construir uma sociedade (civilizao) do ser, em que exista maior equidade na distribuio do ter. Ao fazer referencia sobre a Sustentabilidade Social, em um sentido amplo, Alosio Ruscheinsky assevera que(.....) compreende-se que a emergncia da sociedade sustentvel compreende o desenvolvimento de aes coletivas que venham a enfrentara as desigualdades sociais ou emerge como resultado de mudanas sociais e econmicas contemporneas que permitem novo formato organizativo da sociedade. a nfase que privilegia os atores sociais, o reordenamento jurdico, o Estado de compromisso, as alteraes dos condicionamentos sociais e as bases de sustentao material da vida.9

Feitas tais consideraes, podemos dizer que ao se definir sustentabilidade tambm est se discutindo o que desenvolvimento sustentvel. A partir da Constituio da Repblica Federativa do Brasil, o conceito do desenvolvimento sustentvel ganha fora, de acordo com a previso contida no caput do art. 225 , ao prever que "todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as presentes e futuras geraes". BRUNDTLAND,(1983) conceitua desenvolvimento sustentvel como sendo aquele que atende s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as geraes futuras atenderem as suas prprias necessidades10 A noo de desenvolvimento sustentvel ocupa posio central dentro do movimento ambientalista desde a publicao, em 1987, do relatrio da Comisso Mundial sobre Meio Ambiente da Organizao das Naes Unidas, intitulado "Nosso futuro comum". O relatrio afirmava que sustentvel o desenvolvimento tal que permite satisfazer nossas necessidades atuais sem comprometer a capacidade das geraes futuras de satisfazer as suas 11 Esta a melhor definio conceitual e a mais aceita mundialmente at hoje; nasceu em 1983, quando a Assembleia-Geral da Organizao das Naes Unidas - ONU criou a Comisso Mundial sobre o Meio Ambiente, presidida pela ento Primeira Ministra da Noruega Gro Harlem. O desenvolvimento sustentvel no se refere especificamente a um problema limitado de adequaes ecolgicas de um processo social, mas a uma estratgia ou um modelo mltiplo para a sociedade, que deve levar em conta tanto a viabilidade econmica como a ecolgica. Num sentido abrangente, a noo de desenvolvimento sustentvel reporta-se necessria redefinio das relaes entre sociedade humana e natureza, e, portanto, a uma mudana substancial do prprio processo civilizatrio, introduzindo o desafio de pensar a passagem do conceito para a ao. Pode-se afirmar que ainda prevalece a transcendncia do enfoque sobre o desenvolvimento sustentvel radical mais na sua capacidade de idia fora, nas suas repercusses intelectuais e no seu papel articulador de

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RUSCHEINSKY, Alosio - Rev. eletrnica Mestr. Educ. Ambient. ISSN 1517-1256, Volume 10, janeiro a junho de 2003 - pag. 04 BRUNDTLAND, G. H. Relatrio Nosso Futuro Comum. ONU, 1983.

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NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Desenvolvimento sustentvel do Brasil e o Protocolo de Quioto. Revista de Direito Ambiental, n. 37, p. 144. 27

discursos e de prticas atomizadas que, apesar desse carter, tem matriz nica, originada na existncia de uma crise ambiental, econmica e tambm social (Jacobi, 1997).12 Contudo, considerando que o conceito de desenvolvimento sustentvel foi firmado na Agenda 21, documento desenvolvido na Conferncia Rio 92, e incorporado em outras agendas mundiais de desenvolvimento e de direitos humanos, mister se faz esclarecer que segundo alguns doutrinadores o conceito ainda est em construo vejamos o posicionamento de, CARLA CANEPA (2007), JOS ELI DA VEIGA (2005) e BEZERRA E BURSZTYN, 2000).Para Carla Canepa o desenvolvimento sustentvel caracteriza-se, portanto, no como um estado fixo de harmonia, mas sim como um processo de mudanas, no qual se compatibiliza a explorao de recursos, o gerenciamento de investimento tecnolgico e as mudanas institucionais com o presente e o futuro. 13

Segundo Jos Eli da Veiga o desenvolvimento sustentvel considerado um enigma ainda no resolvido, vejamos:Desenvolvimento Sustentvel: o desafio para o sculo XXI ele afirma que o conceito de desenvolvimento sustentvel uma utopia para o sculo XXI, apesar de defender a necessidade de se buscar um novo paradigma cientfico capaz de substituir os paradigmas do globalismo.14 (VEIGA, 2005)

Segundo os autores Bezerra e Bursztyn o desenvolvimento sustentvel um processo de aprendizagem social onde a pluralidade de atores sociais e interesses da sociedade consubstanciam-se em um estorvo para o desenvolvimento sustentvel.O desenvolvimento sustentvel um processo de aprendizagem social de longo prazo, que por sua vez, direcionado por polticas pblicas orientadas por um plano de desenvolvimento nacional. Assim, a pluralidade de atores sociais e interesses presentes na sociedade colocam-se como um entrave para as polticas pblicas para o desenvolvimento sustentvel 15

Sobre o tema em estudo mister se faz colacionar os dizeres do professor Gabriel Ferrer, proferir palestra sobre sustentabilidade, em maio do corrente ano na Universidade de Alicante/ES, vejamos: Bem vindos construo de um direito ambiental. O direito ambiental das prximas dcadas no ser o que conhecemos agora. Ser o que os agentes jurdicos vo construir. De alguma maneira temos que participar. Temos uma responsabilidade de participar nessa construo (...)Desde a construo do Estado moderno, no entanto, temos criado uma sociedade de

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JACOBI, P. Meio ambiente urbano e sustentabilidade: alguns elementos para a reflexo. In: CAVALCANTI, C. (org.). Meio ambiente, desenvolvimento sustentvel e polticas pblicas. So Paulo: Cortez, 1997. p.384-390.

CANEPA, Carla. Cidades Sustentveis: o municpio como lcus da sustentabilidade. So Paulo: Editora RCS, 2007.14

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VEIGA, Jos Eli da. Cidades Imaginrias o Brasil menos urbano do que se

calcula. Campinas: Editora da Unicamp, 2005.15

BEZERRA, M. C. L.; BURSZTYN, M. (cood.). Cincia e Tecnologia para o

desenvolvimento sustentvel. Braslia: Ministrio do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis: Consrcio CDS/ UNB/ Abipti, 2000. 28

diferenciao. Eu busco meu benefcio em detrimento de seu prejuzo. Temos que rever isso. O princpio da solidariedade deve prevalecer. Este princpio o fundamento da construo do Estado. Tem um fundo valorativo, tico, angular, o princpio da solidariedade. O que ocorre com algum nos afeta, ns compartilhamos tudo. O princpio da solidariedade serviu para a construo do estado moderno, mas precisa ser revigorado. Foi construdo politicamente um mecanismo de solidariedade. A solidariedade, que um valor moral e tico, tem que se converter num princpio jurdico articulador. (....) Eu proponho que a estrutura social no deva ser por nvel de renda. Deveramos ser nivelados por nossas capacidades de agir na sociedade, de atuar. (...)A sustentabilidade um conceito diferente. Uma ideia positiva, que supe a introduo de mudanas que permitam uma sociedade permanecer vivendo neste planeta, que a humanidade possa perpetuar-se vivendo no planeta. Algo insustentvel algo que se sabe que vai entrar em colapso. Temos que considerar e colocar em equilbrio a dimenso ambiental de nosso comportamento, a dimenso social e a dimenso econmica. (....)Na dimenso social da sustentabilidade, se diz que no basta mais sobreviver, que deve haver justia social. A injustia insustentvel.(....)16

Feitas as devidas consideraes conceituais a respeito de Sustentabilidade e desenvolvimento sustentvel, podemos perceber que todas as preocupaes com a sustentabilidade passam pelos problemas sociais, culturais, afetivos e econmicos. Nesta perspectiva a sustentabilidade uma tarefa eminentemente relacionada interveno do homem. No tocante preocupao com o desenvolvimento sustentvel, esta representa a possibilidade de garantir mudanas sociopolticas que no comprometam os sistemas ecolgicos e sociais que sustentam as comunidades. Contudo, deve-se observar sempre que os aspectos humanos e sociais do desenvolvimento sustentvel significam que solidariedade, igualdade, parceria e cooperao so to fundamentais para a proteo do meio ambiente quanto s abordagens cientficas. E neste sentido que ser abordada no prximo tpico a sustentabilidade e o desenvolvimento sustentvel. Considerando visto que ambos necessitam da interveno do homem, relacionada parceria, cooperao igualdade e solidariedade para atingirem a plenitude conceitual, poderemos verificar que a solidariedade embutida na sustentabilidade coaduna com os princpios mximos de nosso ordenamento jurdico. 2 - A SUSTENTABILIDADE COMO PRINCPIO CONSTITUCIONAL E A CORRELAO ENTRE A SUSTENTABILIDADE E A DIGNIDADE HUMANA Ao conceituarmos a sustentabilidade e a diferenciarmos de desenvolvimento sustentvel, verificamos que os referidos conceitos mexem profundamente com valores. Neste contexto podemos realizar a compreenso do conceito de Sustentabilidade como forma de princpio Constitucional relacionado busca da efetividade das ideias que gravitam em torno do Estado Democrtico de Direito. Em razo dos valores embutidos no termo SUSTENTABILIDADE poderamos compreende-la como um princpio constitucional no somente ambiental, mas tambm16

FERRER, Gabriel Conferncia realizada em 21 de maio de 2012 Alicante/ES Curso de Mestrado e Doutorado UUNIVALI - MADAS 2012. Traduo livre da autora. 29

como princpio constitucional interdisciplinar, social, empresarial, administrativo e econmico. Implica uma compreenso interdisciplinar desse princpio basilar no somente no vis ambiental, mas tambm na perspectiva econmico-empresarial e social. No entender de CANOTILHO, lembramos que: Os princpios so ordenaes que se irradiam e imantam os sistemas de normas; so como ncleos de condensaes nos quais confluem valores e bens constitucionais. 17(CANOTILHO; VITAL MOREIRA apud SILVA, 1998, p.96). Este o entendimento de SAULO DE OLIVEIRA PINTO COELHO E ANDR FABIANO GUIMARES DE ARAJO18. Propem os autores ser a sustentabilidade princpio norteador de nosso ordenamento jurdico. Consoante j explanado entendem os autores que o conceito de sustentabilidade, trata-se de conceito infervel da ordem Constitucional democrtica brasileira e que embasa a sua compreenso como norma dotada de supremacia sobre as demais normas do ordenamento jurdico. A partir da conceituao da sustentabilidade sistmica como princpio jurdico cujo sentido e alcance devem ser inferidos da Constituio, estabelecem os Autores um caminho que objetiva demonstrar como esse conceito embasa as diversas reas do Direito pensadas como desdobramentos das disposies constitucionais em plano infraconstitucional. Asseveram os autores que compreender a sustentabilidade como um princpio constitucional no somente ambiental, mas tambm como princpio constitucional interdisciplinar, social, empresarial, administrativo e econmico, constitui uma importante tarefa da dogmtica jurdica contempornea, em busca da efetividade das ideias que gravitam no entorno da solidariedade e da dignidade como balizas do Estado Democrtico de Direito. A Constituio Federal, em seus artigos 170 a 181, estabelece os princpios gerais da atividade econmica. Esses se relacionam com os estabelecidos na Ordem Social. Ambas, por sua vez, devendo guardar conformao semntica com os princpios e direitos fundamentais, estabelecidos nos Ttulos I e II os quais possuem dentre seus fundamentos a dignidade humana e do trabalho humano, a garantia da livre iniciativa, com incluso e justia social, para construo de uma sociedade livre, justa e solidria, com desenvolvimento que sustente a erradicao da pobreza e marginalizao, a reduo das desigualdades sociais e regionais e a promoo do bem de todos E POR CONSEGUINTE TODOS DISPOSITIVOS ELENCADOS SE RELACIONAM DIRETAMENTE COM O CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE. COELHO E ARAJO partem da hiptese de que a constituio possui um significado complexo para a sustentabilidade como um princpio normativo de aplicabilidade ampla em vrias searas da ordem Constitucional democrtica. Dessa percepo entendem os autores que desdobra-se outra, a de que tal princpio carece de um17

SILVA, Jos Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed. So Paulo: Malheiros, 1998.18

COELHO, Saulo de Oliveira Pinto. ARAJO, Andr Fabiano Guimares de - A Sustentabilidade Como Princpio Constitucional Sistmico E Sua Relevncia Na Efetivao Interdisciplinar Da Ordem Constitucional Econmica E Social: Para Alm Do Ambientalismo E Do Desenvolvimentismo in Revista da Faculdade de Direito de Uberlndia v. 39: 261-291, 2011 ISPONVEL EM: www.domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas /article/.../163 30

tratamento terico-prudencial capaz de dar-lhe consistncia jurdico-discursiva, como condio de eficcia e adequao concreta Constituio. Buscam COELHO E ARAJO evidenciar a sustentabilidade em seu carter sistmico Constitucional, o que implica uma compreenso interdisciplinar desse princpio basilar no somente no vis ambiental, mas tambm na perspectiva econmico-empresarial e social, numa viso que se quer integrada e integrativa desses mbitos, quando alados ao plano constitucional. Neste vrtice, sustentam que a insero da sustentabilidade sistmica como princpio constitucional do Direito no apenas adequada como tambm pertinente, visto que o direito possui a funo de orientar a sociedade num caminho de permanente busca de equilbrio. Neste contexto insere-se a sustentabilidade, como princpio constitucional basilar de todo o ordenamento jurdico, por ser necessria para a continuidade e progresso da sociedade em termos humanitrios. Destarte, a sustentabilidade uma ideia que est inserida em toda a legislao, como noo principiolgica que orienta as normas jurdicas. Tendo em mente os conceitos de sustentabilidade apresentados anteriormente, percebe-se que o elenco de fundamentos da Repblica que, junto ao rol de Direitos Fundamentais da Constituio os quais compreendem na base de nosso ordenamento jurdico e do Direito Brasileiro, agregam os cinco aspectos conceituais as sustentabilidade desenvolvidos por Sachs. A pesquisa dos autores parte do pressuposto de que as normas tm a funo precpua de estabelecer as condutas consideradas adequadas para a harmonia inclusiva das relaes sociais. E, pelo fato de ser um conceito altamente ligado aos aspectos relacionados ao equilbrio necessrio viabilidade da prpria existncia humana digna, a sustentabilidade pode ser utilizada como um importante parmetro de anlise para quaisquer situaes sob o prisma jurdico-reflexivo. Segundo os autores a base conceitual do princpio em comento analisada com a apresentao do conceito sistmico de sustentabilidade, que supera a ultrapassada viso de que esse vocbulo est associado apenas a questes ambientais ou a questes econmicoempresariais. Valor este que coaduna com o apresentado no primeiro captulo do presente estudo. A ideia apresentada pelos Autores para justificar a Sustentabilidade como Princpio Constitucional a de que o conceito sistmico de sustentabilidade, o qual, conforme j exposto, vai muito alm dos aspectos pensados comumente. Destarte, se o desenvolvimento sustentvel um modelo de desenvolvimento, a sustentabilidade pode ser definida como um conceito relacionado continuidade dos aspectos econmicos, polticos, sociais, culturais e ambientais da sociedade humana. Deste modo, para que um empreendimento humano seja sustentvel, deve se basear nesses cinco alicerces, tendo de ser economicamente vivel, politicamente adequado, socialmente justo, culturalmente aceito e ecologicamente correto. Salientam os autores que a partir de uma perspectiva sistmica, fica mais ntido o alto grau de correlao manifestado pelos aspectos da sustentabilidade. Bem como asseveram que o conceito de sustentabilidade desde seu surgimento vem sofrendo detalhamentos e aprimoramentos de grande relevncia. COELHO E ARAJO ao interpretarem a sustentabilidade de uma forma sistmica analisam esta sob o aspecto poltico, social, cultural e constitucional ambiental. 31

Segundo os autores, no mbito poltico, a sustentabilidade est relacionada s decises tomadas pelos governantes. Essas decises representam os rumos a serem tomados em relao s mais diversas questes. Como j salientado, qualquer deciso ter reflexos no equilbrio sistmico do complexo do convvio humano (econmico, social, ambiental, moral, etc.), seja ela adotada em mbito municipal, estadual, nacional ou internacional (tambm em ambientes mais restritos). Enfatizam que para que haja sustentabilidade poltica, os governantes devem tambm ter em mente que o equilbrio s alcanado quando h vantagens para todos. Nesse sentido, a sustentabilidade poltica tambm passa por um aspecto de solidariedade extremamente relevante na elaborao das polticas pblicas. Quanto ao aspecto social, nos ensinam que da sustentabilidade destaca-se principalmente na repercusso das decises polticas em relao s pessoas por elas afetadas. Na Constituio Federal, sua manifestao est expressa como um dos fundamentos da Repblica Federativa do Brasil (art. 1). O respeito dignidade humana essencial para que uma sociedade permanea em equilbrio. Proporcionar a todos uma existncia digna , sem dvida, o ideal do Estado Democrtico de Direito, conceito que por fora do art. 1 da Constituio Federal, aplica-se ao Brasil. O prembulo da Constituio Federal d o norte a partir do qual a sustentabilidade social configurada em suas linhas gerais, enquanto meta a ser alcanada pelo Brasil, pois afirma que os legisladores constituintes originrios se reuniram em Assembleia Nacional Constituinte com o seguinte objetivo, que cabe ressaltar:[] para instituir um Estado Democrtico, destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a soluo pacfica das controvrsias.

Desta forma concluem os Autores a respeito do aspecto social da sustentabilidade que a partir do que est expresso no Prembulo da Constituio, percebe-se que a sustentabilidade social pensada, na viso do paradigma constitucional vigente, enquanto modo de convvio social em que os valores acima elencados possam se fazer efetivar no seio de uma sociedade solidria e participativa. J com relao a sustentabilidade constitucional cultural constatam que na situao atual, que cada pessoa dotada de um conjunto de valores particular, os quais se manifestam em suas atitudes e interesses. Esse conjunto de valores, que forma a identidade de cada qual, insere-se no contexto de um paradigma cultural especfico, aberto, em geral, a outras e novas interaes culturais. Asseveram que O Direito busca conciliar os diversos interesses pessoais por meio das normas e da presena dos rgos judicantes. Neste momento mister se faz relacionar o aspecto constitucional cultural citado pelos autores ao contexto do presente trabalho. Considerando o entendimento a respeito da sustentabilidade constitucional cultural englobraria a atividade judicante, poderamos relacionar tal atividade atuao de nossos operadores jurdicos em sede de Juizados Especiais. Neste diapaso quando tal atitude fosse pautada pelos princpios norteadores dos juizados especiais elencados no art. 2 da Lei 9.099/95, estariam tambm norteados pelo

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princpio maior, qual seja o da Sustentabilidade, considerando que esta coaduna com os princpios mximos de nosso ordenamento jurdico. E por fim mencionam os autores o contexto da sustentabilidade constitucional ambiental Compreendem os Autores, em linhas gerais, que sustentvel algo que pode se manter equilibrado ao longo do tempo, no apenas segundo um critrio ou interesse unilateral, mas segundo um interesse e uma abordagem pluridimensional, sistmica e dinmica. Sustentabilidade no implica apenas em minimizar os dados que os empreendimentos humanos geram no meio ambiente; implica, certas vezes, em se tomar a deciso poltica (em sentido amplo) de se impedir ou limitar um empreendimento, em nome da proteo solidria do bem-estar presente e futuro. Como j foi dito, a sustentabilidade no visa apenas