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1 A NOVA SISTEMÁTICA DE REALIZAÇÃO DO ATIVO E PAGAMENTO DO PASSIVO NA FALÊNCIA 1 1. O Sistema Anterior. No regime do DecretoLei 7.661/45 detectavamse duas fases bem distintas no processo falimentar: a primeira fase consistia na fase de apuração ou “fase de informação”, como a doutrina costumava chamar. Nesta fase eram realizados os procedimentos de apuração do ativo (formação da massa objetiva), mediante a arrecadação dos bens do falido e cobrança de seus devedores, e de fixação do passivo (formação da massa subjetiva), mediante definição dos credores do falido. Já na segunda fase, denominada de “fase de liquidação”, que se iniciava somente após a arrecadação dos bens do falido e a consolidação do quadrogeral de credores (art. 114 c/c 69, XIX do DL 7.661/45), procediase à venda dos bens arrecadados para que, com os valores obtidos com esta alienação, fossem pagos os credores falenciais. Vale ressaltar que entre os citados períodos, a lei possibilitava ao devedor a oportunidade de restabelecer sua atividade comercial, que havia sido interrompida (art. 40 do DL 7.661/45), mediante a utilização da extinta concordata suspensiva (art. 177 do DL 7.661/45). Com a concessão judicial deste benefício legal, o devedor podia continuar na administração e no exercício de sua atividade comercial, sendo obstada a venda (realização) do ativo de sua empresa (art. 183 do DL 7.661/45). Ao revés, se o requerimento de concordata suspensiva fosse indeferido pelo juiz da falência, prosseguiase 1 MARCUS VINICIUS TEIXEIRA DA COSTA. Monitor Acadêmico de Direito Empresarial da EMERJ; Advogado, Diretor do Escritório de advocacia MARCUS TEIXEIRA Advogados Associados, especializado na área empresarial.

A Nova Sistematica de Realizacao Do Ativo e Pagamento Do Passivo Na Falencia

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A NOVA SISTEMÁTICA DE REALIZAÇÃO DO ATIVO E PAGAMENTO DO PASSIVO NA FALÊNCIA 1

1. O Sistema Anterior.

No regime do Decreto­Lei 7.661/45 detectavam­se duas fases

bem distintas no processo falimentar: a primeira fase consistia na fase de

apuração ou “fase de informação”, como a doutrina costumava chamar. Nesta

fase eram realizados os procedimentos de apuração do ativo (formação da

massa objetiva), mediante a arrecadação dos bens do falido e cobrança de

seus devedores, e de fixação do passivo (formação da massa subjetiva),

mediante definição dos credores do falido. Já na segunda fase, denominada de

“fase de liquidação”, que se iniciava somente após a arrecadação dos bens do

falido e a consolidação do quadro­geral de credores (art. 114 c/c 69, XIX do DL

7.661/45), procedia­se à venda dos bens arrecadados para que, com os

valores obtidos com esta alienação, fossem pagos os credores falenciais.

Vale ressaltar que entre os citados períodos, a lei possibilitava ao

devedor a oportunidade de restabelecer sua atividade comercial, que havia

sido interrompida (art. 40 do DL 7.661/45), mediante a utilização da extinta

concordata suspensiva (art. 177 do DL 7.661/45). Com a concessão judicial

deste benefício legal, o devedor podia continuar na administração e no

exercício de sua atividade comercial, sendo obstada a venda (realização) do

ativo de sua empresa (art. 183 do DL 7.661/45). Ao revés, se o requerimento

de concordata suspensiva fosse indeferido pelo juiz da falência, prosseguia­se

1 MARCUS VINICIUS TEIXEIRA DA COSTA. Monitor Acadêmico de Direito Empresarial da EMERJ; Advogado, Diretor do Escritório de advocacia MARCUS TEIXEIRA Advogados Associados, especializado na área empresarial.

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no procedimento falimentar e, conseqüentemente, na realização dos bens

arrecadados para pagamento do passivo falencial (art. 184 do DL 7.661/45).

2. O Atual Sistema.

O sistema de realização do ativo e pagamento do passivo sofreu

grande transformação com o advento da Lei nº 11.101/05. Não se distinguem

mais, de forma nítida, aquelas duas fases do processo falimentar que existiam

sob a égide do DL 7.661/45. Na sistemática implementada pela nova lei de

falência, a realização do ativo tem início tão logo arrecadados os bens do

falido, com a juntada do auto de arrecadação, pelo administrador judicial (que

substituiu a figura do Síndico), aos autos do processo de falência (art. 139 da

LF). De acordo com a nova sistemática, a venda dos bens do falido tem início

independentemente da consolidação e publicação do quadro­geral de credores

(§2º, do art. 140 da LF).

Essa grande alteração engendrada pela Lei nº 11.101/05, no que

diz respeito à realização do ativo, deve­se a duas razões principais: a primeira

delas diz respeito à extinção da concordata suspensiva. Ora, como vimos

anteriormente, o deferimento da concordata suspensiva, como se depreende

do próprio nome do instituto, suspendia o processo falimentar, impedindo a

venda dos bens arrecadados, e permitia, ao falido, continuar na administração

destes, com o escopo de dar continuidade às suas atividades comerciais.

Assim, com a extinção deste benefício legal, não é mais prevista hipótese de

suspensão do processo falimentar (com a finalidade de recuperar o devedor.

Há, contudo, a possibilidade de continuação da atividade do falido, com o

escopo de maximizar o ativo – art. 99, inciso XI da LF). Em outras palavras, o

procedimento falimentar, nos moldes traçados pela atual legislação, é contínuo,

não sofrendo solução de continuidade e, assim, tão logo sejam arrecadados os

bens do falido estes devem ser alienados, para melhor atender aos interesses

da massa falida subjetiva. A segunda razão está no fato de que a imediata

alienação dos bens arrecadados propicia a obtenção de maiores recursos para

o pagamento dos credores do falido, já que, a venda, assim realizada, poderá

atingir preços mais elevados. Isto porque, os bens alienados estarão mais

conservados e, conseqüentemente, serão melhor recepcionados pelos

interessados em comprá­los, que por eles pagarão um valor que esteja mais de

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acordo com seu preço de mercado. Outrossim, a venda imediata dos bens do

falido é mais vantajosa, pois, evita o dispendioso gasto com a guarda e

conservação dos bens arrecadados. 3. A Venda dos Bens do Falido (Realização do Ativo).

A venda dos bens arrecadados do falido pode ser Ordinária,

Extraordinária ou Sumária, adotando­se, sempre, aquela que mais interessar à

massa. Por Alienação Ordinária entende­se aquela realizada em estrita

obediência às formas (art. 140 da LF) e às modalidades (art. 142 da LF)

previstas na lei de falência. Alienação Extraordinária é aquela realizada sem

observância a esses parâmetros legais de forma e modalidade. Seu

fundamento legal está nos artigos 144 e 145 da LF. Já a Alienação Sumária ou

Antecipada ocorre sempre que o valor dos bens a serem vendidos não justificar

o custo dos procedimentos de uma ou outra modalidade de venda (art. 111 da

LF).

Importante ressaltar que, segundo entendimento pacífico da

doutrina, o instrumento da impugnação (art. 143 da LF) poderá ser utilizado,

pelos seus legitimados (credores, Ministério Público e devedor), em qualquer

modalidade de alienação do ativo (ordinária, extraordinária e sumária),

malgrado o dispositivo mencionado referir­se apenas às modalidades

ordinárias. Fundamenta­se tal entendimento na aplicação analógica do instituto

às demais hipóteses de alienação.

3.1. Alienação Comum ou Ordinária.

Consoante afirmado alhures, na alienação comum ou ordinária, a

venda dos bens do falido se faz em observância às formas (art. 140 da LF) e às

modalidades (art. 142) previstas na lei.

Quanto às formas de alienação, previstas no art. 140 da LF, o

legislador estabeleceu uma ordem de preferência entre elas. Em primeiro lugar,

estabeleceu a alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos

em bloco (art. 140, I da LF). Em segundo, determinou a alienação da empresa,

com a venda de suas filiais ou unidades produtivas isoladamente (art. 140, II da

LF). Em terceiro, na ordem de preferência estabelecida pelo legislador, está a

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alienação em bloco dos bens que integram cada um dos estabelecimentos do

devedor (art. 140, III da LF). Por último, a lei prevê a alienação dos bens do

falido individualmente considerados (art. 140, IV da LF).

Cabe ao Administrador Judicial, como responsável pela prática

dos atos necessários à realização do ativo (art. 22, inciso III, alínea “i” da LF), a

escolha de um plano de venda que melhor atenda aos interesses da massa

falida. Assim, faculta­lhe, a lei, adotar mais de uma forma de alienação,

podendo livremente conjugá­las (§1º, art. 140 da LF), desde que esta

conjugação seja mais vantajosa aos credores. O administrador judicial deverá

submeter seu plano de venda ao Comitê de Credores, caso este tenha sido

criado, para que o mesmo dê seu parecer a respeito. Em todo caso, a decisão

final sobre o plano de venda será proferida pelo juiz da falência, que

determinará qual forma e modalidade serão adotadas na venda do ativo.

No que tange às modalidades ordinárias de alienação do ativo, o

art. 142 da LF faz referência a três hipóteses: a) Leilão, por lances orais (inciso

I); b) Propostas fechadas (inciso II); c) Pregão (inciso III). Assim, ouvido o

Administrador Judicial e atendida a orientação do Comitê, se houver, o juiz

deverá determinar por qual das modalidades ordinárias implementar­se­á a

forma ordinária escolhida para alienação do ativo (art. 142 da LF).

Insta salientar que, no que se refere ao procedimento para a

escolha da modalidade ordinária de alienação, surge, na doutrina, controvérsia

sobre a obrigatoriedade, ou não, da manifestação da Assembléia de Credores

a respeito. Um primeiro posicionamento, defendido por Sérgio Campinho,

sustenta a desnecessidade da convocação e deliberação, pela Assembléia de

Credores, para a escolha da modalidade ordinária de alienação do ativo.

Fundamenta seu entendimento na falta de exigência expressa do art. 142, caput, da LF. Ademais, invoca o art. 35, inciso II, alínea “c” c/c art. 145 da LF, para afirmar que a assembléia­geral de credores só deve ser convocada a

deliberar no caso de adoção de modalidade extraordinária de alienação. Ao

revés, para a segunda corrente, sustentada por Fábio Ulhoa Coelho, é

obrigatória a convocação e deliberação da assembléia­geral de credores sobre

a escolha de qualquer modalidade de alienação do ativo do falido, seja ela

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ordinária ou extraordinária, pois, em qualquer caso, estarão em jogo os

interesses dos credores do falido (art. 35, inciso II, alínea “d”).

a) Leilão, por lances orais (art. 142, inciso I c/c seu §3º): considera­se

leilão a venda realizada em hasta pública judicial, no transcurso da qual os

interessados em adquirir a empresa ou os bens do falido apresentam, de viva

voz, o preço que estão dispostos a pagar por eles, sagrando­se vencedor

aquele que maior lance (lanço) apresentar, ou seja, aquele que maior preço

pagar. Nesta modalidade de alienação ordinária destacam­se alguns pontos

relevantes, que devem ser analisados. Inicialmente, deve­se ressaltar que no

leilão por lances orais, aplicam­se, no que couber, e no que não contrariar as

normas especiais da lei de falência, as regras do CPC sobre o assunto. Neste

diapasão, não se aplicam, por exemplo, as normas do CPC relativas à

publicação e aos prazos no leilão, já que tais assuntos gozam de disciplina

específica e diferenciada na lei de falência (§1º, art. 142 da LF). Não se

aplicam, ademais, as normas do CPC que distinguem a hasta pública em razão

da natureza do bem vendido, chamando a de bens imóveis de “praça” (art. 697

do CPC) e dos bens móveis, de “leilão público” (art. 704 do CPC). Seja uma ou

outra categoria de bens a alienar no juízo da falência, a Lei nº 11.101/05

chama a hasta pública realizada com lances de viva voz sempre de “leilão”

(FÁBIO ULHOA). Outrossim, não se aplicam ao leilão, de que trata a lei

falimentar, aquelas normas do CPC que determinam que os bens, na primeira

licitação, sejam vendidos pelo preço mínimo da avaliação e, em segunda, a

quem mais der (arts. 691 e 692 do CPC). Desde a primeira licitação, a

alienação dar­se­á pelo maior valor oferecido, ainda que este seja inferior ao

valor de avaliação (§2º, art. 142 da LF). Por fim, outra questão relevante sobre

o leilão diz respeito à escolha do leiloeiro. Na sistemática do DL 7.661/45, o

leiloeiro era escolhido diretamente pelo síndico, sendo o referido diploma claro

nesse sentido (§1º, art. 117 do DL 7.661/45). Na nova sistemática

implementada pela Lei nº 11.101/05, o legislador quedou­se silente sobre o

assunto. Assim, a doutrina sustenta que, por força da aplicação da regra do

CPC que regula o assunto, a qual determina que o leiloeiro será escolhido pelo

credor exeqüente, sem intervenção do magistrado (art. 706 do CPC), na

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falência, fazendo­se as devidas adaptações, a nomeação do leiloeiro deverá

ser feita pelo administrador da falência, sem que nessa decisão intervenha o

juiz falimentar (CAMPINHO). Isto porque é ele responsável pela prática dos

atos destinados à realização do ativo (art. 22, inciso III, alínea “i” da LF).

b) Propostas Fechadas (art. 142, inciso II c/c seu § 4º): a venda por

propostas fechadas realiza­se mediante a entrega em cartório e sob recibo, de

envelopes lacrados, a serem abertos pelo juiz, no dia, hora e local designados

no edital, lavrando o escrivão o auto respectivo, assinado pelos presentes, e

juntando as propostas aos autos da falência. O juiz é quem decidirá, se não

houver maiores complexidades, qual é a proposta mais vantajosa para a

massa. Havendo complexidade, o juiz poderá determinar o encerramento da

audiência de abertura dos envelopes, determinar a juntada dos envelopes aos

autos do processo e colher a manifestação do administrador judicial e, se

houver, do Comitê de Credores, antes de decidir. Em qualquer caso, o

parâmetro a ser adotado para a escolha da melhor proposta é aquele previsto

no §2º, art. 142 da LF, ou seja, o do maior valor ofertado, ainda que este seja

inferior ao valor de avaliação do bem. Isto porque esta regra se aplica a todas

as modalidades ordinárias de alienação.

c) Pregão (art. 142, inciso III c/c seus §§ 5º e 6º): esta modalidade de

alienação ordinária consiste na combinação das duas modalidades anteriores

e, por esta razão, é chamada pela lei de “modalidade híbrida”. Possui duas

fases distintas: a do recebimento das propostas, na forma do § 4º do art. 142 (a

lei, erroneamente, faz alusão ao § 3º); e a do leilão por lances orais, da qual

participarão apenas aqueles que apresentarem propostas não inferiores a

noventa por cento da maior proposta ofertada (na primeira fase). Considera­se

como a maior proposta aquela de maior valor oferecido, ainda que seja inferior

ao valor de avaliação do bem (§2º, art. 142 da LF). As regras do pregão estão

previstas nos incisos do § 6º, art. 142 da LF.

Insta salientar que, em qualquer das modalidades ordinárias de

alienação do ativo, o Ministério Público deverá ser intimado pessoalmente, sob

pena de nulidade (§ 7º, art. 142 da LF). A lei impõe a obrigatoriedade quanto à

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intimação pessoal do membro do parquet, porém, o seu não comparecimento, após devidamente intimado, não acarretará a nulidade do processo de falência.

Por fim, deve­se ressaltar que o direito de impugnação da venda,

previsto no art. 143 da LF, e do qual são legitimados os credores, o devedor e

o Ministério Público, a despeito do que dispõe o mencionado dispositivo legal,

poderá ser manejado em qualquer das modalidades de alienação do ativo, seja

ela ordinária, extraordinária ou sumária. A doutrina sustenta que deve­se fazer

uma interpretação analógica do instituto, para que este alcance também as

modalidades extraordinária e sumária de venda, pois, não há lógica defender

entendimento diverso, já que tal instrumento foi engendrado com o escopo de

beneficiar os interesses da coletividade de credores do falido. De qualquer

modo, a impugnação é apenas um dos meios processuais adequados para

questionar a regularidade da venda dos bens na falência. Assim, por outros

ações próprias (de conhecimento, mandado de segurança, etc.) podem os

prejudicados buscarem a tutela de seus direitos, independentemente do

manejo da impugnação (FÁBIO ULHOA).

3.2. Alienação Extraordinária.

Trata­se de modalidade de alienação em que a venda dos bens

da sociedade falida é feita por meios não previstos especificamente na lei de

falência. Em outras palavras, sempre que a alienação dos bens da falida se der

por modalidade diversa daquelas previstas no art. 142 da LF (as chamadas

modalidades ordinárias de alienação), estaremos diante da denominada

Alienação Extraordinária. A alienação extraordinária pode ser autorizada por

decisão judicial (art. 144 da LF), mediante requerimento fundamentado do

administrador judicial ou do comitê de credores, se este existir. Igualmente,

poderá ser autorizada pela assembléia­geral de credores, pelo voto de 2/3

(dois terços) dos credores presentes à sessão de julgamento (art. 46 da LF),

cabendo, ao juiz, neste caso, apenas homologar a decisão assemblear (art.

145 da LF). A lei traz como exemplo de alienação extraordinária a constituição

de sociedade de credores ou dos empregados do devedor, na qual os créditos

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serão convertidos em cotas ou ações, conforme a forma societária adotada

(§2º, art. 145 da LF). Ademais, possibilita a participação, nestas sociedades,

dos próprios sócios da falida ou de terceiros interessados (art. 145, 2ª parte, da

LF). Em todos os casos, a alienação extraordinária será adotada quando esta

se apresentar como a modalidade mais apta a otimizar os recursos da massa,

isto é, o meio mais eficaz e mais vantajoso, para os credores da massa, de

realização do ativo falimentar.

Ainda no que diz respeito a esta modalidade de alienação, insta

ressaltar que, com fulcro no §3º, art. 145 da LF, desde que convencido de sua

adequação e proficiência e, uma vez ouvidos o administrador judicial e o comitê

de credores, se este existir, poderá o juiz adotar a modalidade extraordinária de

alienação que tenha sido apresentada e rejeitada pela assembléia de credores.

Em outros termos, o juiz da falência não está vinculado à decisão da

assembléia de credores que denegou proposta de alienação extraordinária do

ativo. Malgrado a decisão denegatória daquele órgão da falência, o magistrado

poderá, a bem da massa, decidir pela adoção da proposta alternativa para a

realização do ativo falimentar.

3.3. Alienação Sumária ou Antecipada.

Trata­se de modalidade de venda do ativo falimentar aplicável

sempre que não existirem bens no ativo da sociedade falida de valor suficiente

a compensar os custos da venda ordinária ou extraordinária (art. 111 da LF).

Conforme lição de Fábio Ulhoa Coelho, “pode ocorrer, e a situação não é rara, de os bens encontrados pelo administrador judicial no estabelecimento empresarial da sociedade falida, quando da arrecadação, serem de valor irrisório, não se justificando a adoção dos relativamente custosos procedimentos de leilão, proposta ou pregão”.

Sendo esta a situação encontrada, o juiz, ouvido o Comitê de

Credores, se houver, poderá autorizar os credores a adquirir ou adjudicar, de

imediato e de forma individual ou coletiva, os bens arrecadados, pelo valor de

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avaliação, atendida a regra de classificação e preferência prevista nos arts. 83

e seguintes.

3.4. Sucessão nas obrigações do falido.

A sucessão do adquirente nas obrigações do falido sempre se

apresentou como uma das questões mais desafiadoras do direito falimentar.

Antes do advento da Lei nº 11.101/05, a doutrina controvertia

sobre o assunto. Rubens Requião, apoiado em doutrina de Miranda Valverde,

sustentava que o adquirente do ativo falimentar não sucedia nas obrigações do

falido. Argumentava que, a alienação “seja por leilão público ou por propostas, seja pela constituição de nova sociedade pelos credores, ou cessão, não importa a transferência de seus ônus para o adquirente. Surgirá sempre novo empresário que encetará, pela sua atividade, nova empresa”. Ao revés, Waldemar Ferreira sustentava que “a sociedade, que os credores organizarem, será continuadora do negócio do falido e, então, se terá a sucessão comercial, de tal arte que a sociedade se sub­rogará no ativo e no passivo da massa falida, assumindo­lhe as obrigações e investindo­se nos direitos, que lhe eram pertinentes”.

A nova lei de falência, no entanto, espancou a dúvida que antes

atormentava a doutrina. Trouxe, no art. 141, inciso II, norma clara sobre o

assunto, que determina que “o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes do trabalho”. Assim, de acordo com a nova legislação falimentar, pode­se afirmar, com tranqüilidade, que o adquirente da falida não

sucede em suas obrigações, sejam elas de que natureza jurídica forem. Tal

norma vem apoiada e referendada pelos §§ 1º e 3º, art. 133 do CTN, com a

nova redação que lhe foi dada pela Lei Complementar nº 118/05. Ademais, tem

como corolário, diversas outras normas da lei falimentar, a saber: § 2º, art. 141;

§ 1º, art. 145 e art. 146, todas da LF.

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A sucessão nas obrigações do falido apenas acontecerá nas

hipóteses excepcionais previstas pela legislação falimentar. Tais hipóteses se

referem aos casos em que o arrematante seja: I – Sócio da sociedade falida,

ou sociedade controlada pelo falido (inciso I, § 1º, art. 141 da LF); II – Parente,

em linha reta ou colateral até o quarto grau, consangüíneo ou afim, do falido ou

de sócio da sociedade falida (inciso II, § 1º, art. 141 da LF); III – Identificado

como agente do falido com o objetivo de fraudar a sucessão (inciso III, § 1º, art.

141 da LF). Tais exceções visam impedir a prática de fraude, que a expressa

desoneração nas obrigações do falido pode incentivar. Assim, por exemplo, o

controlador de sociedade falida pode, por interpostas pessoas, adquirir a

mesma empresa que anteriormente explorava, liberando­se da obrigação de

pagar o passivo.

Interessante questão é trazida a lume pela doutrina, no que diz

respeito à sucessão nas obrigações do falido. Origina­se de dúvida sobre a

interpretação da norma insculpida no caput do art. 141 da lei de falência. Em suma, a controvérsia diz respeito ao alcance das normas previstas no art. 141,

mormente aquela prevista no seu inciso II. Em outras palavras, indaga­se se a

expressa negativa de sucessão nas obrigações do falido se aplica apenas às

modalidades ordinárias de alienação do ativo, ou também se aplica às

extraordinárias.

Há dois entendimentos sobre o tema: um primeiro entendimento,

sustentado pelo professor Sérgio Campinho, admite a aplicação irrestrita da

referida norma a todas as modalidades de alienação na falência (não apenas

às ordinárias). Fundamenta seu entendimento na falta de expressa restrição,

no art. 141 da LF, à sua aplicação à alienação extraordinária. O caput do dispositivo retro­mencionado reza que as normas previstas nos seus incisos

serão aplicadas a qualquer das modalidades de que trata este artigo. Ocorre

que o art. 141 não dispõe sobre modalidade alguma de alienação. Na

realidade, houve equívoco do legislador, pois as modalidades de alienação

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estão previstas nos arts. 142, 144, 145 e 111 da LF. Destarte, a referência feita

pelo dispositivo deve ser interpretada como qualquer modalidade de venda

judicial, porquanto toda norma de restrição deve ser expressa e inconfundível.

Outrossim, alega que o § 1º, do art. 145 da LF, determina a aplicação do art.

141 a uma das hipóteses que o diploma falencial exemplifica como modalidade

extraordinária de alienação, que é a aquisição do ativo por sociedade

constituída pelos credores ou empregados do próprio devedor, com o fito de

dar prosseguimento ao negócio do falido (art. 145, caput, 2ª parte, da LF). Já um segundo entendimento, capitaneado pelo professor Fábio Ulhoa Coelho,

fundamentado em uma interpretação mais literal e restrita da lei de falência,

sustenta que, no que tange à modalidade extraordinária de alienação, a

desoneração do adquirente na sucessão das obrigações do falido se aplica a

apenas uma hipótese, que é aquela prevista no art. 145, caput, 2ª parte, da LF, por força do que dispõe o §1º, do art. 145 da LF. Para o mencionado

doutrinador, em qualquer outra hipótese de alienação extraordinária, a

sucessão nas obrigações do falido deve ser reconhecida, já que nesta

modalidade de alienação não há obrigatoriedade de disputa entre os

adquirentes interessados, como há nas modalidades ordinárias (isto é, leilão,

apresentação de proposta e pregão), o que facilita a prática de fraudes. Então,

para evitar fraudes, o adquirente, que não concorreu com outros interessados,

deve suceder também nas obrigações do falido.

3.5. Cobrança dos Devedores.

Não basta, para a formação da massa falida objetiva, a alienação

dos bens arrecadados. É necessário, ainda, que o administrador judicial

proceda à cobrança, amigável ou judicial, dos créditos que o falido possui em

face de terceiros. No caso de não lograr êxito na cobrança amigável, o

administrador judicial deverá contratar, em nome e por conta do falido,

advogado para o ajuizamento das ações e execuções necessárias.

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4. Pagamento do Passivo.

Uma vez convertidos em valores os bens arrecadados e cobrados

os devedores do falido, todo dinheiro auferido no procedimento de realização

do ativo deverá ser imediatamente depositado em conta remunerada de

instituição financeira, atendidos os requisitos da lei ou das normas de

organização judiciária (art. 147 da LF).

O pagamento do passivo, que terá início somente após a

consolidação do quadro­geral de credores (art. 149 da LF), será efetuado em

obediência às regras legais que determinam o procedimento desta fase

processual e que fixam a ordem de prioridade entre os credores da falência

(arts. 83 e 84 c/c arts. 149 a 153, todos da LF).

Assim, na ordem de preferência de pagamento dos credores,

primeiro deverão ser pagos os denominados “credores extraconcursais”.

Dentro dessa classe de credores há uma subclasse denominada de “credores

da massa”, a qual subdivide­se em “encargos da massa” e “dívidas da massa”.

A denominação “credores da massa” se deve ao fato de que essa

classe não é constituída de credores do falido, mas, sim, de titulares de crédito

em face da massa falida, créditos esses originados após a declaração da

falência, contraídos diretamente pelo administrador Judicial.

Os credores extraconcursais (art. 84 da LF) não se sujeitam ao

concurso de credores e não se sujeitam à habilitação na falência. Eles devem

receber seus créditos com preferência absoluta em relação aos demais

créditos falimentares (art. 84 c/c 149 c/c 150 da LF). Trata­se de créditos

relacionados à administração da falência, tais como: remuneração do

administrador judicial, remuneração dos auxiliares do administrador judicial e

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despesas de administração dos bens da massa (v. art. 84 e seus incisos da

LF).

Após os credores extraconcursais, devem ser pagos os titulares

de direito à restituição de valores em dinheiro, ressalvada a preferência dos

créditos de que trata o art. 151 da LF (art. 86 c/c 149 c/c 151 da LF). Proceder­

se­á à restituição em dinheiro nas hipóteses elencadas nos três incisos do art.

86 do diploma falimentar.

Importante ressaltar que, para Sérgio Campinho, os titulares de

direito à restituição em dinheiro têm preferência em relação a todos os credores

da falência, inclusive, aos extraconcursais. Assim, o doutrinador sustenta que

“as restituições em dinheiro devem ser pagas, prioritariamente, aos créditos extraconcursais”. Invocando uma interpretação sistemática dos preceitos legais e a natureza da restituição, sustenta que “o art. 149, com efeito, deixa entrever uma ordem de prioridades. Alinha, em sequência, a realização das restituições, pagamento dos credores extraconcursais e, por fim, o pagamento dos credores concorrentes, atendido o sistema legal de classificação. A idéia que emerge do preceito vem referendada pelo art. 84 e pelo parágrafo único do art. 86. No primeiro, tem­se assegurada a precedência dos créditos extraconcursais tão­ somente em relação aos créditos concorrentes. No segundo, fica patenteado que o atendimento das restituições em dinheiro somente tem como condição a antecipação dos créditos trabalhistas de natureza puramente salarial, naqueles limites já explicitados, constantes do art. 151, não se lhe condicionando ao prévio pagamento dos créditos concursais. Esse sistema, que resulta da conjugação dos preceitos legais, racionalmente encontra­se justificado na natureza das restituições. Não são os valores devidos a título de restituição, como regra, propriamente créditos, mas sim dinheiro de terceiros em poder do falido. Por isso, se justificam sejam atendidos com prioridade em relação aos credores da massa (créditos extraconcursais) e aos credores do falido”.

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Controvérsia interessante surge, na doutrina, sobre a ordem de

preferência no pagamento das restituições em dinheiro e do crédito aludido no

art. 151 da LF. O parágrafo único do art. 86 determina que “as restituições de que trata este artigo somente serão efetuadas após o pagamento previsto no art. 151 da Lei” (grifamos). Por sua vez, o art. 151 da LF estatui: “os créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos três meses anteriores à decretação da falência, até o limite de cento e cinqüenta salários mínimos por trabalhador, serão pagos tão logo haja disponibilidade em caixa” (grifamos). Analisando ambas as normas, indaga­se: qual a ordem de

preferência entre essas duas classes de credores? Devem ser pagos,

prioritariamente, os titulares de direito à restituição em dinheiro (art. 86 da LF),

ou os titulares de créditos de natureza estritamente salarial que tenham

vencido nos três meses anteriores à decretação da falência e até o limite de

150 salários­mínimos por trabalhador (art. 151 da LF)?

Parte da doutrina, capitaneada por Sérgio Campinho, sustenta

que, como o pagamento desses salários em atraso, no limite de 150 salários­

mínimos, representa mera antecipação, e não uma preferência, o administrador

judicial, podendo calcular que os recursos da massa não serão suficientes para

o atendimento dos créditos prioritários (extraconcursais e restituições em

dinheiro), não deverá atender ao comando legal previsto no art. 151 da LF. Em

outros termos, a antecipação de que trata o art. 151 estará sempre

condicionada à existência de recursos na massa para o pagamento das

restituições em dinheiro e dos créditos extraconcursais, sob pena de se estar

violando o sistema de pagamentos estatuído no art. 149 da LF. Já para outros

doutrinadores, como Fábio Ulhoa Coelho e Amador Paes de Almeida, as

restituições em dinheiro situam­se na pirâmide dos créditos, como deixa claro o

art. 149 da LF, só cedendo lugar ao crédito estritamente salarial previsto no art.

151 da LF. Assim, para essa corrente, que na nossa modesta opinião se

apresenta mais acertada, por estar em consonância com a interpretação

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sistemática dos dispositivos em comento, o crédito de que trata o art. 151 da

LF deve ser priorizado em relação às restituições em dinheiro.

Uma vez satisfeitos os créditos extraconcursais, os créditos

previstos no art. 151 e as restituições em dinheiro, nesta ordem,

respectivamente, o administrador judicial passará ao pagamento dos

nominados “créditos concursais”, também chamados de “credores do falido”.

São assim denominados, pois, já anteriormente à decretação da falência,

portanto, pré à quebra do empresário, já estavam constituídos. Os credores

concursais concorrerão entre si no recebimento de seus créditos, conforme a

ordem de preferência estabelecida no art. 83 da LF.

Sendo assim, observada a ordem legal, os credores concursais

serão pagos na seguinte ordem de preferência: a) Empregados e equiparados;

b) Credores com garantia real; c) Fisco; d) Credores com privilégio especial; e)

Credores com privilégio geral; f) Credores quirografários; g) Credores

subquirografários; h) Credores subordinados. Passaremos a desenvolver os

pontos mais relevantes atinentes a cada uma dessas classes.

a) Empregados e Equiparados: em primeiro lugar, na ordem legal de

preferência entre os credores concursais, está o crédito trabalhista e

equiparados e aqueles oriundos de acidente de trabalho, ocorrido antes

da quebra do empresário. No que diz respeito ao crédito decorrente de

acidente de trabalho, deve­se ressaltar que esse não se confunde com o

benefício a que o trabalhador faz jus em face do INSS. Cuida­se, aqui,

do direito que o empregado tem à indenização pelo acidente causado

por dolo ou culpa do empregador, direito, aliás, de índole constitucional

(art. 7º, inciso XXVIII, in fine, da CRFB). Também nessa classe estão os créditos trabalhistas de qualquer natureza (art. 449, § 1º da CLT).

Quanto a estes, a lei de falência estabeleceu o limite de cento e

cinqüenta salários­mínimos. Assim, o que sobejar a este teto legal

concorrerá na classe dos créditos quirografários (art. 83, inciso VI, alínea

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“c”). O objetivo da limitação é impedir que se consumam os recursos da

massa com o atendimento a altos salários dos administradores da

sociedade falida, bem como visa tutelar o interesse do pequeno

assalariado. Por fim, deve­se atentar ao fato de que concorrem,

também, nessa classe, como credores equiparados aos trabalhistas, os

Representantes Comerciais Autônomos, pelas comissões e indenização

devidas pela representada falida (Lei nº 4.886/65, art. 44, acrescido pela

Lei nº 8.420/92), e a Caixa Econômica Federal, pelo FGTS (Lei nº

8.844/94, art. 2º, § 3º).

b) Credores com Garantia Real: nessa classe, o titular do direito

creditório goza de uma garantia quanto ao pagamento do seu crédito,

que consiste no direito real dado em garantia pelo pagamento da dívida.

Assim, a coisa dada em garantia fica sujeita ao cumprimento da

obrigação. Imperioso ressaltar a importante modificação trazida pela Lei

11.101/05 no que diz respeito à classificação desse crédito na ordem de

preferência entre os credores concursais: o crédito com garantia real

passou a ter prioridade em relação aos créditos fiscais, que, no sistema

de classificação dos créditos previsto no revogado DL 7.661/45, ocupava

a segunda posição na ordem de preferência e, atualmente, cedeu essa

posição para o crédito com garantia real e passou a ocupar a terceira

posição na escala de preferência. Vale salientar que, o crédito com

garantia real não está sujeito a rateio, pois ele é pago com o produto da

venda do bem dado em garantia. Desta forma, se com a venda do bem

dado em garantia obtém­se valor maior do que o crédito garantido, a

parcela que sobejar será utilizada para atender os demais credores,

segundo a ordem de preferência. Por outro lado, se é obtido valor menor

que o valor do crédito garantido, o saldo credor será reclassificado como

crédito quirografário (art. 83, inciso VI, alínea “b” da LF). São exemplos

de credores com garantia real os credores hipotecários, os pignoratícios

e os caucionados, além das instituições financeiras titulares de cédulas

de crédito (rural, industrial, comercial) e dos debenturistas titulares de

debêntures com garantia real (art. 58 da LSA).

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c) Fisco: como já ressaltado no item anterior, o fisco perdeu a preferência

sobre o crédito com garantia real na nova sistemática implementada

pela atual lei de falência. Nessa classe estão os “créditos públicos”,

assim denominados porque disciplinados pelo Direito Público. Os

créditos públicos compreendem os “créditos parafiscais”, que são os

créditos dos entes aos quais foram estendidas a garantias e

prerrogativas do Estado (ex.: SESC, SENAI, etc.), e os “créditos fiscais”,

que são os créditos do Estado e seus desmembramentos. Os créditos

fiscais subdividem­se em “créditos tributários” (ex.: Impostos, Taxas e

Contribuições), obrigatoriamente inscritos na dívida ativa, e “créditos

não­tributários” (ex.: obrigações contratuais e extracontratuais), que

tiverem sido inscritos na dívida ativa. Se o crédito fiscal não­tributário

não foi inscrito na dívida ativa, ele será classificado como crédito

quirografário e concorrerá com os credores dessa classe. O CTN, art.

187, parágrafo único e a LEF, art. 29, parágrafo único, estabelecem uma

ordem interna de pagamento entre os titulares de créditos fiscais e

parafiscais. Assim, primeiramente, receberão a União e suas Autarquias.

Posteriormente, os Estados, Distrito Federal, Territórios e suas

Autarquias. Por último, os Municípios e suas Autarquias. Há quem

sustente a inconstitucionalidade dessas normas legais que estabelecem

essa ordem interna, invocando a paridade constitucional dos entes da

Federação (CARVALHO DE MENDONÇA). Insta salientar que os

créditos tributários não se sujeitam à habilitação na falência (art. 187 do

CTN). Significa dizer que o fisco poderá prosseguir com a execução

fiscal ajuizada antes da quebra, mesmo após a decretação da falência

do devedor, não se sujeitando à regra geral do art. 6º da LF (exceção ao

Princípio do Juízo Universal da Falência). Assim, uma vez finda a

execução fiscal, o fisco não precisará habilitar­se para receber seu

crédito na falência, porém, deverá observar a ordem de preferência

entres os credores da falida (art. 186 do CTN c/c art. 83, inciso III da LF).

Por fim, as multas tributárias e as penas pecuniárias por infração

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administrativa ou desrespeito à lei penal, ainda que inscritas na dívida

ativa, não poderão ser cobradas nessa classe de credores. Serão objeto

de cobrança na classe dos créditos subquirografários (art. 83, inciso VII

da LF).

d) Credores com Privilégio Especial: Crédito com privilégio especial são

aqueles que, por disposição legal, recaem sobre determinados bens.

Nesse aspecto se distinguem dos créditos com garantia real, pois

nesses, o crédito recai sobre determinado bem por disposição das

partes contratantes, e não por força de lei. Assim como os créditos com

garantia real, os com privilégio especial não estão sujeitos a rateio, o

que significa dizer que serão pagos com o produto da venda do bem que

o garante. Vendido o bem sobre o qual recai o privilégio, o produto será

destinado prioritariamente ao atendimento desse crédito. É claro que se

os credores preferenciais que o antecedem (extraconcursais,

empregados e equiparados, com garantia real e fiscais) consumirem

todos os recursos da massa, os credores com privilégio especial não

terão seus direitos satisfeitos (essa regra, mutatis mutandi, também vale para os credores com garantia real). Por outro lado, se com o produto da

venda do bem não é possível pagar, integralmente, o credor com

privilégio especial, este deverá concorrer, pelo saldo credor, na classe

dos credores quirografários. São exemplos de créditos com privilégio

especial: Art. 83, inciso IV, alíneas “a”, “b” e “c”; art. 43, inciso III da Lei

4.591/64; art. 17 do DL 413/69; art. 475 do C.Com.; art. 707 do CC/02;

art. 86 do DL 73/66.

e) Credores com Privilégio Geral: Enquanto alguns créditos estabelecem

privilégio especial sobre determinados bens, outros atribuem a seus

respectivos titulares um privilégio geral, não sobre bens definidos, mas

sobre todos os bens da massa, respeitados, obviamente, os créditos

preferenciais que o antecedem (AMADOR PAES DE ALMEIDA). Essa

classe de credores está disciplinada no art. 83, inciso V da LF. São

exemplos de crédito com privilégio geral, além daqueles expressos nos

incisos do retro­citado dispositivo, o que titulariza o advogado em

relação aos seus honorários (art. 24 da Lei 8.906/94) e os titulares de

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debêntures com garantia flutuante, na falência da sociedade anônima

emissora (art. 58, § 1º da LSA).

f) Credores Quirografários: Trata­se da instância residual dos credores

do falido. Quer dizer, se o credor não se enquadra, por expressa

disposição de lei, em nenhuma das outras classes, ele é quirografário

(art. 83, inciso VI, alínea “a” da LF). Disputarão as sobras, uma vez

satisfeitos os demais credores que os antecedem. Nessa classe estão

aqueles credores que, por exemplo, têm seu direito documentado em

título de crédito (nota promissória, letra de câmbio, cheque ou duplicata),

em debênture sem garantia (art. 58, caput, da LSA). Também se acham aqui inseridos os credores por obrigação extracontratual, assim os

titulares de indenização por ato ilícito (que não se confundem com as

penas pecuniárias decorrentes dos ilícitos penal e administrativo, que

são créditos subquirografários). Por fim, se encontram nessa classe as

reclassificações (alíneas “b” e “c” do inciso VI, art. 83 da LF), os créditos

públicos não inscritos na dívida ativa e os créditos trabalhistas cedidos,

gratuita ou onerosamente, a terceiros (§ 4º, art. 83 da LF).

g) Credores Subquirografários: Uma vez satisfeitos todos os credores

anteriores, inclusive os quirografários, serão pagos os credores dessa

classe. São as hipóteses previstas no inciso VII, art. 83 da LF. No que

diz respeito à multa contratual (cláusula penal, que tem a finalidade de

pré­fixar as perdas e danos), esta será cobrada nessa classe de crédito.

Ela deve ser destacada do valor principal da dívida, o qual, conforme o

caso, será pago em uma das classes antecedentes (exemplo:

determinada revendedora de automóveis de luxo contrata com a fábrica

produtora a compra de uma Ferrari e emite notas promissórias em favor

da fábrica, estabelecendo­se no contrato que no caso de atraso no

pagamento da promissória será devida multa moratória de 10% sobre o

valor da mesma. Assim, considerando que as notas promissórias foram

todas emitidas com valor de R$ 10.000,00 e que a revendedora atrasou

o pagamento da última, uma vez declarada a sua falência, a fábrica

titularizará, em face da revendedora, um crédito total de R$ 11.000,00,

sendo que o principal (R$ 10.000,00) será pago como crédito

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quirografário e a multa (R$ 1.000,00) será paga na classe dos créditos

subquirografários).

h) Credores Subordinados: Abrange os créditos cujo pagamento somente

pode ser feito após a satisfação integral dos credores do falido.

Pertencem a essa categoria de credores os debenturistas titulares de

debêntures subordinadas, na falência da S/A emissora (art. 58, § 4º da

LSA), os diretores ou administradores da sociedade falida sem vínculo

empregatício (art. 83, inciso VIII, alínea “b” da LF), bem como os sócios

da sociedade falida por créditos de qualquer natureza, excluído o direito

à partilha do remanescente (art. 153 da LF).

No que tange aos direitos dos sócios da sociedade falida na

partilha do remanescente, depois de pagos integralmente todos os credores,

surge controvérsia, na doutrina, sobre a natureza desse crédito. Para Amador

Paes de Almeida trata­se de crédito subordinado e é nessa categoria de

credores que devem ser enquadrados seus titulares (art. 83, inciso VIII, alínea

“b” da LF). Ao revés, Fábio Ulhoa Coelho sustenta que a partilha entre os

sócios e acionistas da falida não se confunde com o crédito subordinado a que

sócios e acionistas fazem jus, mas decorre do fato da falência ser espécie de

dissolução da sociedade. Assim, para o doutrinador, “não se confunde o devido aos sócios e acionistas em função de sua participação societária na falida com eventual crédito subordinado que titularizam. Este último integra o passivo da sociedade falida, enquanto o devido em função da participação societária corresponde ao seu patrimônio líquido”. Assim, finaliza afirmando que o pagamento do crédito subordinado “não guarda relação nenhuma com a proporção da participação de cada sócio no capital social” (art. 153 da LF).

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5. Encerramento da Falência.

Após realizar o último pagamento, o administrador judicial deve

apresentar suas contas ao juiz no prazo de trinta dias (art. 154 da LF). O

Ministério Público deve ser intimado para se manifestar sobre as contas

apresentadas (§ 3º, art. 154 da LF). Processadas e julgadas as contas, o

administrador judicial terá dez dias para apresentar o relatório final (art. 155 da

LF). Apresentado o relatório final, não havendo mais nenhuma outra

pendência, o juiz encerrará a falência por sentença (art. 156 da LF). Contra

essa sentença cabe apelação (art. 156, in fine da LF).

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BIBLIOGRAFIA:

1. ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresa: de acordo com a Lei n. 11.101/2005 ­ 24ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

2. CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa: O novo regime da insolvência empresarial – 3ª ed. Rio de Janeiro: Renivar, 2008.

3. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, volume 3: direito de empresa – 8ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.