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UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação JAQUELINE APARECIDA FORATTO LIXANDRÃO SANTOS A PRODUÇÃO DE SIGNIFICAÇÕES SOBRE COMBINATÓRIA E PROBABILIDADE NUMA SALA DE AULA DO 6º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL A PARTIR DE UMA PRÁTICA PROBLEMATIZADORA ITATIBA 2015 JAQUELINE

a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

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Page 1: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação

JAQUELINE APARECIDA FORATTO LIXANDRÃO SANTOS

A PRODUÇÃO DE SIGNIFICAÇÕES SOBRE

COMBINATÓRIA E PROBABILIDADE NUMA SALA

DE AULA DO 6º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL A

PARTIR DE UMA PRÁTICA PROBLEMATIZADORA

ITATIBA

2015

JAQUELINE

Page 2: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

APARECIDA FORATTO LIXANDRÃO SANTOS

A PRODUÇÃO DE SIGNIFICAÇÕES SOBRE

COMBINATÓRIA E PROBABILIDADE NUMA SALA

DE AULA DO 6º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL A

PARTIR DE UMA PRÁTICA PROBLEMATIZADORA

Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-

Graduação Stricto Sensu em Educação, da

Universidade São Francisco, sob orientação da Prof.a

Dra. Adair Mendes Nacarato para obtenção do título de

Doutora em Educação, na linha de pesquisa:

Matemática, Cultura e Práticas Pedagógicas.

Page 3: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

ITATIBA

2015

Ficha catalográfica elaborada pelas bibliotecárias do Setor de

Processamento Técnico da Universidade São Francisco.

371.399.51 Santos, Jaqueline Aparecida Foratto Lixandrão.

S236p A produção de significações sobre combinatória e probabilidade numa sala de aula do 6º ano do Ensino Fundamental a partir de uma prática problematizadora / Jaqueline Aparecida Foratto Lixandrão Santos – Itatiba, 2015. 191 p.

Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade São Francisco. Orientação de: Adair Mendes Nacarato.

1. Raciocínio combinatório. 2. Pensamento

probabilístico. 3. Educação Estatística. 4. Ensino e

aprendizagem. 5. Educação. I. Nacarato, Adair Mendes.

II. Título.

Page 4: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade
Page 5: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

Dedico esse trabalho àqueles que (re)significam minha vida,

meus filhos − Igor e Yasmin − e minhas sobrinhas − Maynah

e Maria Eduarda. Amo vocês!

Page 6: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente a meu marido Carlos por me apoiar nessa caminhada e cuidar de

nossos filhos nos momentos em que estive ausente;

A meu irmão Théo e minha cunhada Patrícia pelo apoio e pelo incentivo;

Prof D.ra Regina Célia Grando e Prof D.ra Adair Mendes Nacarato, que com carinho,

alegria e dedicação me mostraram os melhores caminhos, contribuindo não só para minha

formação acadêmica, mas também para a minha formação profissional e pessoal;

Ao Prof. D.r Antonio Carlos de Souza, Prof D.ra Daniela Dias dos Anjos, ao Prof. D.r

Leandro de Oliveira Souza e Prof D.ra Milena Moretto pelas valiosas contribuições e

sugestões no Exame de Qualificação;

Aos professores do mestrado, do doutorado e a todos os docentes que passaram pela minha

vida por compartilhar seus conhecimentos;

Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela

concessão da bolsa durante todo o período de realização deste doutorado;

Aos funcionários da USF-Itatiba que (in)diretamente me auxiliaram durante meu percurso na

Universidade;

Aos colegas e amigos do mestrado e do doutorado, do Grucomat e do grupo de Orientandos

pelo apoio e pelas sugestões à pesquisa;

Aos alunos do 6º ano B, turma de 2010, às Gestoras e aos professores da escola “Dionysia

Gerbi Beira”, da cidade de Amparo, que contribuíram para que esta pesquisa se realizasse;

Aos meus familiares e aos demais amigos por compreenderem minha ausência física em

momentos importantes;

A Deus por permitir que eu concluísse mais essa caminhada.

Page 7: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

Tocando em Frente

Ando devagar por que já tive pressa

E levo esse sorriso por que já chorei demais

Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe,

Só levo a certeza de que muito pouco eu sei

Nada sei.

Conhecer as manhas e as manhãs,

O sabor das massas e das maçãs,

É preciso amor pra poder pulsar,

É preciso paz pra poder sorrir,

É preciso a chuva para florir

Penso que cumprir a vida seja simplesmente

Compreender a marcha e ir tocando em frente

Como um velho boiadeiro levando a boiada

Eu vou tocando dias pela longa estrada eu vou

Estrada eu sou.

Conhecer as manhas e as manhãs,

O sabor das massas e das maçãs,

É preciso amor pra poder pulsar,

É preciso paz pra poder sorrir,

É preciso a chuva para florir.

Todo mundo ama um dia todo mundo chora,

Um dia a gente chega, no outro vai embora

Cada um de nós compõe a sua história

Cada ser em si carrega o dom de ser capaz

E ser feliz.

Conhecer as manhas e as manhãs

O sabor das massas e das maçãs

É preciso amor pra poder pulsar,

É preciso paz pra poder sorrir,

É preciso a chuva para florir. (SATER; TEIXEIRA, 2013).

Page 8: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

SANTOS, Jaqueline Aparecida Foratto Lixandrão. A produção de significações sobre

combinatória e probabilidade numa sala de aula do 6º ano do Ensino Fundamental a

partir de uma prática problematizadora. 2015. 191 p. Tese (Doutorado em Educação)−

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação, Universidade São Francisco, Itatiba,

2015.

RESUMO

Este estudo, que possui cunho qualitativo, procura compreender o que se revela em um

trabalho pedagógico com alunos do 6o

ano do Ensino Fundamental, feito a partir da

perspectiva da problematização, que busca desenvolver o pensamento probabilístico e o

raciocínio combinatório por meio de uma articulação entre eles. Baseia-se na perspectiva

histórico-cultural, que considera a sala de aula – um ambiente de aprendizagem de alunos

e, neste caso, professora-pesquisadora – como contexto de pesquisa, tal como propõe

Freitas (2009, 2010). As contribuições da perspectiva histórico-cultural na formação de

conceitos científicos, na produção de significações são pautadas em Fontana (2005, 1993),

Friedrich (2012), Núñez (2009), Oliveira (2004), Smolka (2010) e Vygotsky (1991, 2001),

autores que orientaram o desenvolvimento desta pesquisa. Têm-se como objetivos:

reconhecer as ideias que surgem na comunicação oral e escrita em um contexto de

problematização em sala de aula, compreender quais tarefas são propícias para o raciocínio

combinatório e procurar sinais da contribuição de um estudo da combinatória vinculado ao

desenvolvimento do pensamento probabilístico. A pesquisa foi realizada com alunos do 6º

ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede estadual de ensino do interior do estado

de São Paulo, que realizaram uma sequência de 18 tarefas com foco na linguagem

relacionada à combinatória e à probabilidade, bem como no raciocínio combinatório e no

probabilístico. Ao final dessas tarefas, os alunos realizaram individualmente outras 5 sobre

probabilidade para investigar os indícios do trabalho realizado, de acordo com Hiebert et al

(1997). As tarefas propostas foram desenvolvidas a partir dos estudos de Antonio Lopes

(2000), Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994); Celi Lopes (2003); Godino, Batanero

e Cañizares (1996); Macedo; Petty; Passos (1997); São Paulo (1998); e Skovsmose (2008).

A dinâmica de desenvolvimento das aulas segue as orientações de Christiansen e Walther

(1986), que propõem três fases − apresentação, atividade independente e reflexão

conclusiva. A análise centra-se em dois eixos. No primeiro deles, episódios, estudam-se as

ideias de combinatória que emergem em um processo de comunicação oral e escrita, em

um contexto de problematização. No segundo eixo, são analisadas as contribuições do

estudo da combinatória ao pensamento probabilístico. A partir da análise, é possível

observar que os alunos possuem conceitos sobre combinatória e probabilidade e − ao se

verem diante de uma proposta de ensino problematizadora, relacionada à linguagem e a

uma cultura de aula de Matemática apropriada − podem se envolver em um processo de

elaboração conceitual, (re)significando conceitos, atingindo outros mais complexos.

Ademais, a articulação da combinatória e da probabilidade com elementos mediadores –

linguagem, tarefas e ambiente de aprendizagem – leva à imbricação do raciocínio

combinatório e do pensamento probabilístico por meio de significações, permitindo a

aprendizagem com compreensão.

Palavras-chave: Raciocínio combinatório. Pensamento probabilístico. Educação

Estatística. Ensino e aprendizagem.

Page 9: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

SANTOS, Jaqueline Aparecida Foratto Lixandrão. The production of combinatory and

probability meanings in an Elementary School 6th year’s classroom through a

problematizing practice. 2015. 190p. Thesis (Doctorate‟s degree in Education) – Stricto

Sensu Post-graduation Program in Education, University São Francisco, Itatiba, 2015.

ABSTRACT

This qualitative study aims at understanding the insights gathered in pedagogic work

through the perspective of problematisation with students in the 6th

year of Elementary

School The main goal is to develop the students‟ probabilistic thinking and combinatory

reasoning by articulating these two. Our theoretical basis is the historic-cultural

perspective, which considers the classroom – a learning environment to the students and in

this case to the teacher-researcher as well – a context for the research, as proposed by

Freitas (2009, 2010). The contributions of this perspective in the formation of scientific

concepts and in producing meanings are based on the works of Fontana (2005, 1993),

Friedrich (2012), Núñez (2009), Oliveira (2004), Smolka (2010) and Vygotsky (1991,

2001), also taken as the research‟s main guiders Our goals include: recognizing ideas that

emerge from oral and written communication in a context of problematization in

classroom; understanding which tasks enable combinatory reasoning; and looking for the

contribution of a combinatory study linked to the development of probabilistic thinking.

The research was carried out with students in the 6th

year of Elementary School in a state

school located in the countryside of São Paulo. The students have performed a sequence of

18 tasks focused on language related to combinatory and probability. At the end of those

tasks, they have engaged individually into other 5 activities regarding those topics in order

to investigate clues resulting of the work performed, according to the definition of Hiebert

et al (1997). The suggested tasks were developed with the support of Antonio Lopes

(2000), Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994); Celi Lopes (2003); Godino, Batanero

and Cañizares (1996); Macedo; Petty; Passos (1997); São Paulo (1998); and Skovsmose

(2008). The dynamics of class development followed the guidelines of Christiansen and

Walther (1986), who suggest three distinct phases – presentation, independent activity and

conclusive reflection. There are two axes for the analysis. In the first one, episodes, the

ideas of combinatory emerging in oral and written communication processes are analyzed

in a problematization context. In the second ax, the study turns to the contributions of the

combinatory study and probabilistic thinking. One can observe that students possess

concepts regarding combinatory and probability and when confronted to a problematizing

learning proposal – related to language and a culture of class of appropriated mathematics

– can involve themselves in a process of conceptual elaboration, (re)signifying concepts

and therefore reaching newer and more complex ones. Furthermore, the articulation of

combinatory and probability with mediating elements – language, tasks and learning

environment – leads to the intermingling of combinatory reasoning and probabilistic

thinking through significations, allowing a process of comprehensive learning.

Keywords: Combinatory reasoning. Probabilistic thinking. Statistical education. Teaching

and learning.

Page 10: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

FIGURAS

Figura 1 – Diário de Campo da professora-pesquisadora: 04 de novembro de 2010 ..............92

Figura 2 – Registro da dupla Lucas e Bianca (tarefa 1: “linguagem probabilística”)...............94

Figura 3 – Diário de Campo da pesquisadora: 29 de novembro de 2010 ..............................118

Figura 4 – Registro das alunas Bruna e Luana, itinerários para ir de A a C: representação por

meio de letras.......................................................................................................119

Figura 5 – Registro dos alunos Alex e Felipe, itinerários para ir de A a C: princípio

multiplicativo.......................................................................................................120

Figura 6 – Registro das alunas Julia e Jenifer, itinerários para ir de A a C: traçado dos

diferentes itinerários ............................................................................................120

Figura 7 – Registro das alunas Núbia e Natasha, itinerários para ir de A a C: representação

numérica...............................................................................................................120

Figura 8 – Registro dos alunos Lucas e Guilherme, itinerários para ir e voltar: diagrama de

árvores..................................................................................................................121

Figura 9 – Registro da dupla Lucas e Augusto: tarefa 9, item b ............................................122

Figura 10 – Diário de Campo da pesquisadora: 30 de novembro de 2010 (1) ......................127

Figura 11 – Diário de Campo da pesquisadora: 30 de novembro de 2010 (2) ......................128

Figura 12 – Registro da dupla Augusto e Guilherme: o problema das cordas .......................130

Figura 13 – Registro da dupla Elder e Walter: o problema das cordas ..................................131

Figura 14 – Registro da dupla Julia e Jenifer: o problema das cordas ...................................131

Figura 15 – Registro da dupla Luana e Natasha: o problema das cordas ..............................131

Figura 16 – Registro da dupla Anne e Thadeu: o problema das cordas .................................132

Figura 17 – Registro da dupla Andréa e Raquel: número de cordas em uma circunferência

com 10 pontos ...................................................................................................133

Figura 18 – Registro da dupla Anne e Thadeu: número de cordas em uma circunferência com

10 pontos ...........................................................................................................133

Figura 19 – Registro da dupla Jéssica e Gustavo: número de cordas em uma circunferência

com 10 pontos ...................................................................................................134

Figura 20 – Registro da dupla Luana e Natasha: número de cordas em uma circunferência

com 10 pontos ...................................................................................................134

Page 11: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

Figura 21 – Registro da dupla Stela e Lívia: número de cordas em uma circunferência com 10

pontos ............................................................................................................... 135

Figura 22 – Registro da dupla Lucas e Felipe: número de cordas .........................................137

Figura 23 – Registro: sugestão de contagem .........................................................................141

Page 12: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Dissertações postadas no Portal Domínio Público ................................................19

Quadro 2 – Dissertações postadas no Banco de Teses da Capes..............................................19

Quadro 3 – Instrumentos de produção dos dados ....................................................................72

Quadro 4 – Roteiro das tarefas .......................................................................................... ......77

Quadro 5 – Organização das tarefas: características dos problemas ........................................80

Quadro 6 – Síntese das respostas da tarefa 1: “linguagem probabilística”...............................93

Quadro 7 – Quantos itinerários há para ir de A a C? .............................................................119

Quadro 8 – Quantos itinerários há para ir e voltar? ...............................................................119

Quadro 9 – E se não puder ir e voltar pelo mesmo caminho? ...............................................119

Quadro 10– Síntese das respostas da tarefa 1 sobre probabilidade ........................................151

Quadro 11 – Síntese das respostas da tarefa 2 sobre probabilidade .......................................152

Quadro 12 – Síntese das respostas da tarefa 3 sobre probabilidade .......................................153

Quadro 13 – Síntese das respostas da tarefa 4 sobre probabilidade .......................................155

Quadro 14 – Síntese das respostas da tarefa 5 sobre probabilidade .......................................157

Page 13: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Possibilidades de somas no jogo de “par ou ímpar” ....................................99

Tabela 2 – Análise das possibilidades no jogo de “par ou ímpar” .............102

Page 14: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

LISTA DE ESQUEMAS

Esquema 1 – Articulação entre raciocínio combinatório e pensamento probabilístico..........65

Esquema 2 – Movimento entre raciocínio combinatório e pensamento probabilístico..........66

Page 15: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

LISTA DE DIAGRAMAS

Diagrama 1 – Análise de possibilidades do jogo de “par ou ímpar” ...................................97

Diagrama 2 – Possibilidades de itinerários para ir e voltar de A a C ....................................124

Diagrama 3 – Itinerários diferentes ........................................................................................124

Page 16: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

DC Diário de Campo

D.r Doutor

D.ra Doutora

Enem Exame Nacional do Ensino Médio

ETEC Escola Técnica Estadual

GPEE Grupo de Pesquisa em Educação Estatística

Grucomat Grupo Colaborativo de Matemática

IESI Instituto de Ensino Superior

MEC Ministério de Educação e Cultura

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

Prof. Professor

Prof Professora

PUC/SP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

SP São Paulo

UFCG Universidade Federal de Campina Grande

Unesp Universidade Estadual de São Paulo

Unifia Faculdades Integradas de Amparo

USF Universidade São Francisco

Page 17: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...........................................................................................................18

1.1 Apresentando a pesquisadora ...................................................................................24

2 RACIOCÍNIO COMBINATÓRIO E PENSAMENTO PROBABILÍSTICO:

LINGUAGEM, CONCEITOS E PROBLEMATIZAÇÕES NA PERSPECTIVA

HISTÓRICO-CULTURAL........................................................................................33

2.1 A formação de conceitos na perspectiva histórico-cultural: possibilidades em

contexto escolar...........................................................................................................33

2.2 Conceitos sobre combinatória e probabilidade: articulações entre linguagem e

contextos.......................................................................................................................40

2.3 Articulações entre a combinatória e a probabilidade a partir de uma prática

problematizadora .......................................................................................................54

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: DESCREVENDO O OBJETO DE

INVESTIGAÇÃO ...................................................................................................... 68

3.1 O foco de investigação ................................................................................................68

3.2 As opções metodológicas ............................................................................................69

3.3 A escola, a comunidade e a comunidade escolar .....................................................73

3.3.1 A sala de aula e os alunos .............................................................................................74

3.4 Contextos gerais da pesquisa de campo ...................................................................77

3.5 As tarefas ....................................................................................................................80

3.5.1 Dinâmica das tarefas: ambiente de aprendizagem .......................................................85

3.6 Procedimentos de análise dos dados..........................................................................87

4 A PRODUÇÃO DE SIGNIFICAÇÕES PARA CONCEITOS SOBRE

COMBINATÓRIA EM CONTEXTO DE COMUNICAÇÃO EM SALA DE

AULA............................................................................................................................89

4.1 Episódio 1 − A linguagem probabilística e o jogo do par ou ímpar: produção de

significações..................................................................................................................90

4.2 Episódio 2 − Tarefa “itinerários”: possibilidades de construção e significação de

procedimentos de enumeração e contagem ............................................................117

4.3 Episódio 3 − Tarefa “o problema das cordas”: análise de regularidades e

possibilidades.............................................................................................................126

4.4 Sínteses relativas às tarefas analisadas....................................................................147

Page 18: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

5 O MOVIMENTO DAS CONCEPÇÕES PROBABILÍSTICAS DOS ALUNOS A

PARTIR DE DO TRABALHO REALIZADO .....................................................150

5.1 As tarefas sobre probabilidades: indícios do trabalho

realizado.....................................................................................................................151

5.2 Considerações relativas às tarefas de probabilidade.............................................160

6 SIGNIFICAÇÕES DO TRABALHO REALIZADO .......................................... 162

REFERÊNCIAS........................................................................................................169

ANEXO A – LINGUAGEM ................................................................................ ...177

ANEXO B – TAREFAS DE COMBINATÓRIA ...................................................178

ANEXO C – JOGOS DE COMBINATÓRIA E PROBABILIDADE..................182

ANEXO D − CARTA ...............................................................................................189

ANEXO E – TAREFAS DE PROBABILIDADE...................................................190

Page 19: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

18

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa se insere no campo da Prática Pedagógica em Educação

Matemática, com foco nas significações produzidas pelos alunos do 6º ano do Ensino

Fundamental a partir da articulação entre a combinatória e a probabilidade. Considero1 a sala

de aula em que atuei como professora-pesquisadora2 como espaço de investigação.

Este estudo desencadeou-se a partir da pesquisa de mestrado que realizei no programa

de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação, na Universidade São Francisco, intitulada O

movimento do pensamento probabilístico mediado pelo processo de comunicação com alunos

do 7º ano do Ensino fundamental e defendida em março de 2010. A pesquisa de doutorado

iniciou-se após a de mestrado, ou seja, no segundo semestre de 2010.

Na pesquisa de mestrado, algumas observações relacionadas à probabilidade e à

combinatória me deixaram inquieta, bem como a provocação da banca de defesa para o

aprofundamento da questão em novos estudos. Constatei que diversos alunos não estimavam

a probabilidade da maneira esperada devido a equívocos de interpretação de espaço amostral.

Por exemplo, em uma tarefa que envolvia o lançamento de duas moedas, os alunos

consideravam apenas três possibilidades, cara-cara, coroa-coroa e cara-coroa, sendo que o

inverso, coroa-cara, não era calculado e até mesmo aceito como mais uma possibilidade, pois

alegavam ser a mesma possibilidade que cara-coroa.

Outro apontamento foi a indicação, por parte dos alunos, dos termos possibilidade e

probabilidade, os quais eram colocados como sinônimos. Tal constatação também me

preocupou, pois definir as possibilidades no lançamento de um dado não é mesmo que

determinar as probabilidades.

Além do exposto, observei que, quando solicitei que um aluno que estimava a

probabilidade de maneira formal escrevesse todas as possibilidades de determinada situação,

ele as organizou de forma alfabética − por exemplo, AB, AC, BA, BC, CA e CB −, não

aleatória − BA, CB, AB, BC, AC, CA. Isso pode ser um indicativo da importância de

organização dos dados ao definir o espaço amostral.

1 Optei por utilizar a primeira pessoa do singular, entendendo que minha voz traz múltiplas vozes, dos autores,

dos alunos e dos parceiros desta pesquisa. Além disso, compartilho das considerações de Coracini (1991), que

considera que o uso da primeira pessoa em discurso (texto) científico não rompe com a objetividade, uma vez

que é garantida pela forma dêitica. 2 Em alguns momentos utilizo o termo professora-pesquisadora porque a pesquisa foi realizada na sala de aula

em que atuava como professora de Matemática dos sujeitos investigados. Assim, professora e pesquisadora

eram a mesma pessoa.

Page 20: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

19

Na revisão bibliográfica que realizei no banco de dissertações e teses postadas no

“Portal Domínio Público”3 e no “Banco de Teses da Capes”

4, verifiquei que há poucos

trabalhos envolvendo o ensino da combinatória, sendo que na maioria deles o foco é o Ensino

Médio. Quanto ao ensino da probabilidade, o número de pesquisas é um pouco maior; no

entanto, poucas relacionadas ao processo de ensino e aprendizagem no Ensino Fundamental.

Conforme se observa nos quadros a seguir.

Quadro 1 – Dissertações postadas no Portal Domínio Público

Área de conhecimento:

Educação e Ens. de

Ciências/Matemática

Palavra-chave: combinatória

Área de conhecimento:

Educação e Ens. de

Ciências/Matemática

Palavra-chave: probabilidade

Área de conhecimento:

Educação e Ens. de

Ciências/Matemática

Palavra-chave: Estatística

Mestrado Doutorado Mestrado Doutorado Mestrado Doutorado

2 0 7 0 20 3

Fonte: Organizado pela pesquisadora

Quadro 2 – Dissertações postadas no Banco de Teses da Capes

Área de conhecimento:

Educação e Ens. de

Ciências/Matemática/

Educação Matemática

Palavra-chave: combinatória

Área de conhecimento:

Educação e Ens. de

Ciências/Matemática/

Educação Matemática

Palavra-chave: probabilidade

Área de conhecimento:

Educação e Ens. de

Ciências/Matemática/

Educação Matemática

Palavra-chave: Estatística

Mestrado Doutorado Mestrado Doutorado Mestrado Doutorado

9 0 6 2 15 1

Fonte: Organizado pela pesquisadora

As dissertações e teses postadas no “Portal Domínio Público” não são as mesmas que

as do “Banco de Teses da Capes” O número de pesquisas relacionadas Estatística é maior e 3 O "Portal Domínio Público", biblioteca virtual do Ministério de Educação e Cultura (MEC), lançado em 2004,

propõe o compartilhamento de conhecimentos, dentre eles de dissertações e teses produzidas em diferentes

áreas. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaPeriodicoForm.jsp>. Acesso em:

4 fev. 2015. 4 http://bancodeteses.capes.gov.br/. Acesso em: 3 jun. 2015.

Page 21: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

20

a diversificação também, pois observei trabalhos relacionados ao ensino e à aprendizagem

desde a Educação Infantil até o Ensino Superior; estudos sobre as concepções de professores,

análise de currículo e livros didáticos quanto à temática; entre outros. Acredito que essa

ênfase se dê devido à obrigatoriedade da disciplina nos diversos campos de formação

acadêmica e a sua influência explícita em ações cotidianas.

Na área de conhecimento da Matemática do “Portal Domínio Público”, não

apresentada no quadro acima, foram encontrados 18 trabalhos, sendo que apenas 3 deles

trazem questões relacionadas ao ensino e à aprendizagem da Educação Básica e da Formação

de Professores No “Banco de Teses da Capes”, 7 trabalhos da área da Matemática não

estavam relacionados às questões de ensino e/ou aprendizagem da Educação Básica, do

Ensino Superior ou da Formação de Professores.

Dentre os grupos colaborativos, o grupo “Geração” da Universidade Federal de

Pernambuco tem se dedicado a estudos em raciocínio combinatório. Ele é formado por duas

pesquisadoras, Prof D ra Rute Elizabete de Souza Rosa Borba e Prof D ra Cristiane de

Arimatéa Rocha, e por estudantes de graduação e pós-graduação. Desde seu registro em 2009,

o grupo vem estimulando a pesquisa neste campo. Até o momento, quatro de seus integrantes

realizaram pesquisa de mestrado e um de doutorado. Esses trabalhos não são compartilhados

no “Portal Domínio Público”, mas sim no blog do grupo.5

O Grupo de Pesquisa em Educação Estatística (GPEE)6 − organizado pelo Programa

de Pós-Graduação em Educação Matemática e pelo Departamento de Estatística, Matemática

Aplicada e Computação da Unesp, Rio Claro/SP − tem desenvolvido estudos relativos ao

Ensino e à Aprendizagem da Estatística desde os anos iniciais do Ensino Fundamental até o

Ensino Superior. Os principais trabalhos do grupo envolvem Modelagem Matemática,

Tecnologia e Educação à Distância, Educação Ambiental, Formação de Professores,

Educação Matemática e Crítica e História do Ensino de Estatística. O grupo é composto pela

Prof D ra Maria Lúcia Lorenzetti Wodewotzki e por seus orientandos e ex-orientandos.

Pesquisas no campo da Educação Estatística também são desenvolvidas pelos

estudantes do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da

Universidade Cruzeiro de Sul7, em São Paulo, orientados pela Prof D ra Celi Espasandin

5 Disponível em: <http://geracaoufpe.blogspot.com.br/p/tcc.html>. Acesso em: 5 fev. 2015.

6 Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/igce/pgem/gpee/>. Acesso em: 03 jun. 2015.

7 Os trabalhos da Universidade Cruzeiro do Sul não são publicados no “Portal Domínio Público” nem no site da

Instituição.

Page 22: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

21

Lopes. Além disso, há estudos sendo feitos no Programa de Pós-Graduação em Educação

Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP)8, por um grupo

coordenado pela Prof D ra Cileda Coutinho.

O trabalho de Antonio Carlos de Souza, O desenvolvimento profissional de

educadoras da infância: uma aproximação à Educação Estatística, assim o como da Prof

Adriana Luziê de Almeida, da Universidade Federal de Ouro Preto, intitulado Ensinando e

aprendendo análise combinatória com ênfase na comunicação matemática: um estudo com o

2º ano do Ensino Médio, auxiliaram-me em minha pesquisa. Ambos se desenvolveram em um

ambiente que estimulava a argumentação e a discussão de situações-problema relacionadas à

combinatória e à probabilidade, mas com sujeitos distintos: professoras da Educação Infantil e

do 1º ano do Ensino Fundamental (SOUZA, 2013) e alunos do 2º ano do Ensino Médio

(ALMEIDA, 2010).

Assim como no mestrado, encontrei dificuldades para localizar trabalhos de pesquisa

sobre a combinatória. Mesmo porque nem todos são divulgados em sites oficiais de pesquisa,

mas sim em eventos; e Anais nem sempre estão disponíveis, dificultando que um

levantamento bibliográfico seja desenvolvido de maneira ampla. Há instituições que não

disponibilizam os próprios trabalhos. Busquei pesquisas disponibilizadas no “Portal Domínio

Público” e no site da Capes relacionadas à combinatória e à probabilidade e não encontrei

nenhuma investigando a articulação desses conceitos. A não localização de trabalhos nessa

perspectiva sinaliza a importância da presente pesquisa, realizada em uma sala de aula regular

de Ensino Fundamental de uma escola pública, na qual a pesquisadora atua como professora,

tendo como foco a articulação entre combinatória e probabilidade.

Assim, busco, a partir das ideias apresentadas pelos alunos do 6º ano do Ensino

Fundamental, articular os conhecimentos sobre probabilidade e pensamento combinatório e

encontrar respostas para a seguinte questão de investigação: “Quais indícios de articulação

entre conceitos probabilísticos e combinatórios podem ser identificados em uma prática

problematizadora, pautada nas interações e na produção de significações com alunos do 6º

ano do Ensino Fundamental?” Tal questão remete a alguns objetivos específicos:

8 Disponível em: <http://www4.pucsp.br/~cileda/>. Acesso em: 06 ago. 2015.

Page 23: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

22

Identificar as ideias sobre combinatória que emergem do processo de

comunicação oral e escrita, tendo como contexto a problematização em sala

de aula;

identificar quais tarefas são potencializadoras para o raciocínio

combinatório;

buscar indícios da contribuição de um estudo da combinatória articulado ao

desenvolvimento do pensamento probabilístico.

A tese está centrada no pressuposto de que um estudo articulado entre combinatória e

probabilidade possibilita o desenvolvimento do pensamento probabilístico com significação

aos alunos do Ensino Fundamental. Compreendo que evidências poderão ser obtidas em um

contexto de sala de aula que inclua tarefas em uma prática problematizadora. Na literatura, há

autores que defendem a importância de tal articulação, como Lopes e Coutinho (2009);

entretanto, raras são as evidências apresentadas em dados concretos de sala de aula, em suas

reais condições de trabalho. Esse fato é observado por Fernandes, Correia e Roa (2010), que

destacam a reduzida exploração de investigações didáticas sobre combinatória e

probabilidade.

Diante do exposto, optei por fazer uma pesquisa de cunho qualitativo, baseada na

perspectiva histórico-cultural, que considera a sala de aula um ambiente de aprendizagem de

alunos e professores, tratando-a como contexto de pesquisa, como espaço de formação, tal

como propõe Freitas (2009; 2010). Essa perspectiva leva em conta os pressupostos de

Vygotsky9, que considera a linguagem como uma função básica para o desenvolvimento do

ser humano a partir do intercâmbio social e do desenvolvimento do pensamento generalizante.

As contribuições da perspectiva histórico-cultural na formação de conceitos científicos, na

produção de significações, são apontadas por autores como: Fontana (1993; 2005), Friedrich

(2012), Núñez (2009), Oliveira (2004), Smolka (2010) e Vygotsky (1991; 2001), os quais me

orientaram na realização desta pesquisa.

Os sujeitos envolvidos são alunos do 6º ano do Ensino Fundamental, com idade entre

11 e 13 anos, de uma escola da rede pública estadual da cidade de Amparo, interior de São

9 Diferentes grafias são utilizadas para o nome “Vygotsky” Nesse texto ela será adotada da forma como se

apresenta nas diferentes obras referenciadas. No entanto, em momentos em que me refiro ao autor, por suas

concepções apresentadas em várias obras, utilizarei a forma “Vygotsky” Nesse caso também não utilizarei

data da obra, por não estar me referindo a uma obra específica e sim a seus conceitos.

Page 24: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

23

Paulo, em que fui professora de Matemática durante 11 anos. A pesquisa foi desenvolvida no

decorrer das aulas de Matemática sendo eu a pesquisadora e a professora (professora-

pesquisadora). A sala de aula possuía 28 alunos.

Os dados da pesquisa foram produzidos no primeiro semestre do doutorado, uma vez

que as classes do 6º ano nas quais eu ministrava aulas eram propícias à investigação. Esses

dados foram produzidos a partir de: registos dos alunos diante das tarefas propostas, Diário de

Campo da professora-pesquisadora, transcrições de áudio do diálogo entre professora-

pesquisadora e alunos no desenvolvimento das tarefas de investigação em grupos e gravações

em vídeo dos momentos de socialização coletiva das tarefas realizadas.

Foram desenvolvidas inicialmente 18 tarefas com os alunos, que proporcionaram a

eles o contato com a linguagem ligada à combinatória e à probabilidade, bem como o

raciocínio combinatório e probabilístico. Tais tarefas tinham como objetivo principal

promover a reflexão sobre a análise combinatória e pensamento probabilístico nas aulas de

Matemática. Ao final dessas tarefas, os alunos realizaram individualmente outras cinco tarefas

sobre probabilidade, as quais eu já havia proposto, em minha pesquisa de mestrado, aos

alunos do 7º ano do Ensino Fundamental, visando evidenciar quais as concepções sobre

probabilidade emergiram nas respostas desses estudantes.

As tarefas propostas sobre raciocínio combinatório e pensamento probabilístico foram

desenvolvidas a partir de estudos feitos por Batanero, Godino, e Navarro-Pelayo (1994).

Outros autores também foram referências para este trabalho: Antonio Lopes (2000), Celi

Lopes (2003), Godino, Batanero e Cañizares (1996), Macedo, Petty e Passos (1997), São

Paulo (1998) e Skovsmose (2008).

Para o desenvolvimento das tarefas desta pesquisa de doutorado, os alunos foram

organizados em duplas, mas alguns trios foram formados quando a quantidade de alunos da

sala de aula era ímpar. Em minha dissertação de mestrado (SANTOS, 2010), optei por

realizar todas as tarefas em grupos de quatro pessoas. Entretanto, essa experiência evidenciou

que nem sempre essa disposição se tornava produtiva, observei que em algumas ocasiões dois

alunos produziam enquanto outros dois pouco se envolviam com a tarefa. Dessa forma, para a

pesquisa de doutorado, optei por desenvolver a maioria das tarefas em duplas. Além disso,

selecionei algumas duplas para os momentos de socialização, aquelas que evidenciaram

estratégias diferenciadas de resolução. Certamente, enquanto pesquisadora e professora, tinha

o cuidado para que as diferentes duplas tivessem a oportunidade de expor seu modo de

Page 25: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

24

pensar. A dinâmica de desenvolvimento foi elaborada a partir da proposta de Christiansen e

Walther (1986), sugerindo três fases10

: (1) apresentação; (2) atividade independente; e (3)

reflexão conclusiva.

A fase de apresentação é aquela em que o professor apresenta a tarefa que será

desenvolvida pelos alunos. A de atividade independente é aquela em que os alunos realizam

as tarefas propostas, discutem no grupo, ou na dupla, suas considerações. A fase da reflexão

conclusiva é o momento em que os grupos discutem coletivamente suas considerações,

tentando chegar a uma conclusão coletiva.

Em todas as fases, o professor tem um papel fundamental, o de mediador de

conhecimentos. As tarefas, organizadas por ele, têm como propósito desenvolver

determinados conceitos matemáticos, mas é por meio de problematizações provocadas pelas

tarefas e da mediação do professor no momento de sua elaboração e de sua socialização que

ideias serão apresentadas e desenvolvidas pelos alunos.

Acredito que o processo de produção, interpretação e análise na pesquisa qualitativa é

permeado por opções as quais realizei no decorrer de minha trajetória. De acordo com Smolka

(2010), a dinâmica da personalidade é drama que invade/permeia o gesto de ensinar. Nesse

sentido, apresento um pouco de minha trajetória estudantil e profissional.

1.1 Apresentando a pesquisadora

Nasci em Monte Alegre do Sul, pequena cidade do interior de São Paulo. Foi lá que

iniciei minha trajetória estudantil aos 5 anos, quando minha mãe me matriculou na pré-escola

da Escola Estadual “Prof Clodoveu Barbosa” Morávamos na zona rural da cidade, e todos os

dias eu, meu primo e outras crianças do sítio em que residíamos caminhávamos cerca de dois

quilômetros até essa escola, que ficava na zona urbana. Ela era a única da zona urbana e

oferecia todos os níveis de ensino; as demais escolas do município, as isoladas, tinham uma

única professora para todas as turmas dos anos iniciais do Ensino Fundamental e contemplava

somente essa modalidade de ensino – eram as classes multisseriadas. Estudei nessa escola até

o 3º ano do Ensino Fundamental, e, nesse percurso, era considerada uma boa aluna, tinha boas

10

A tradução do texto de Christiansen e Walther (1986) apresentada pelo Departamento de Educação da

Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa utiliza o termo estágio em vez de fase. Considero adequado

para o texto a última forma, a qual usarei no decorrer no texto.

Page 26: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

25

notas, principalmente na disciplina de Matemática. Além dos estudos, participava de teatros,

desfiles, apresentações, tarefas múltiplas, atividades que tenho ainda em minha memória.

Iniciei o 4º ano do Ensino Fundamental em uma escola da cidade de Jaguariúna/SP,

porque minha família se mudou para lá. Não tive problemas em me adaptar na nova escola e

rapidamente já estava envolvida nas atividades educativas. Era uma criança muito

comunicativa, na verdade falante, estava sempre sorrindo. Lembro-me, que a professora da 4ª

série11

toda semana nos dava uma redação para fazer, algumas vezes com um único tema para

a classe, outras com temas diferentes para os alunos. Uma vez disse que o meu seria “A

cabritinha alegre”, toda sorridente fiz a redação, sem perceber porque recebi aquele tema

Estudei em outra escola dessa cidade até o último ano do Ensino Fundamental, quando

eu e minha família retornamos a nossa cidade natal. Quando isso ocorreu já estava em período

de iniciar o Ensino Médio e optei pelo Magistério, pois tinha o desejo de ser professora; além

disso, essa parecia uma boa opção, porque depois de quatro anos já teria uma profissão. Como

só havia magistério no período da manhã, pela necessidade de os alunos estagiarem, ingressei

também em um curso técnico, Processamento de Dados, no período noturno. Concluí ambos

os cursos em 1993.

Como aluna da Educação Básica sempre tive boas notas, principalmente nas

disciplinas da área de ciências exatas. Porém, compreender todas as regras e suas exceções

nas aulas de Língua Portuguesa não era, para mim, tarefa fácil. Minha prática de leitura

resumia-se aos gibis que meu vizinho me emprestava e a alguns livros que a professora

distribuía nas aulas de leitura.

Minhas aulas de Matemática foram marcadas pelas longas listas de exercícios e pelo

uso de fórmulas, na maioria das vezes apresentadas por meus professores, de forma que os

exercícios só poderiam ser resolvidos por meio delas. Quando havia prova, ao estudar, seguia

os passos dados pela professora na sala de aula, refazia todos os exercícios do caderno e

geralmente me saía bem.

Aulas práticas não faziam parte da rotina da escola, mas do meu dia a dia sim: desde

muito pequena ia à padaria e ao supermercado para minha mãe, prática comum nas cidades do

interior, onde a maioria das pessoas se conhece. Comprava o que ela me pedia, calculava o

quanto gastaria e qual deveria ser meu troco antes de chegar ao balcão. Os jogos com baralho

faziam parte de nossas reuniões familiares e as crianças, para não atrapalharem os adultos,

11

Atual 5º ano.

Page 27: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

26

recebiam um baralho para também jogar. Aprendi a jogar cedo e demonstrava habilidade,

elaborava diversas estratégias para tentar vencer, mas às vezes o azar não permitia que isso

acontecesse; e, para tentar livrar-nos dele, criávamos alguns rituais, como não cruzar as

pernas na hora de receber as cartas, esfregar as mãos quando se iniciava um novo jogo, trazer

alguns amuletos no bolso, etc. As quatro operações, necessárias para a realização do jogo,

eram feitas mentalmente por mim, sem grandes dificuldades.

O período do Ensino Médio foi uma época muito difícil, pois minha família passava por

sérias dificuldades financeiras. Muitas vezes pensei em desistir de estudar e arrumar emprego,

porém a vontade de estudar era maior, e a oportunidade não tardou a aparecer, pois comecei a

atuar em uma escola particular de Educação Infantil antes mesmo de me formar, o que

possibilitou que eu ingressasse na Faculdade após a conclusão do curso do Magistério.

Dessa forma, em 1994 iniciei a graduação em Ciências com habilitação em

Matemática na Faculdade de Ciências e Letras “Plínio Augusto do Amaral”, atual Centro

Universitário Amparense, Faculdades Integradas de Amparo (Unifia), na cidade de

Amparo/SP. Assim que conclui essa graduação, iniciei o curso de Pedagogia na mesma

Universidade.

Sobre minha experiência como docente, como já mencionei, quando estava no último

ano do curso de magistério (1993) comecei a atuar como auxiliar de professor em uma escola

particular de Educação Infantil, na cidade em que fazia o Magistério e, dois meses depois, fui

contratada como professora. Após um ano e meio de trabalho nessa escola, fui aprovada em

um concurso público para o cargo de professora de Educação Infantil no município em que

morava, o que me despertou interesse em fazer Pós-Graduação em Educação Infantil. Nesse

município, trabalhei por 13 anos: além da Educação Infantil, ministrei aulas no Ensino

Fundamental I, inclusive em classe de Alfabetização, e desempenhei a função de professora-

coordenadora no Ensino Fundamental II. Durante esse tempo, também me efetivei como

professora de Matemática na rede estadual de ensino, em que trabalhei por 17 anos. Trabalhei,

portanto, em municípios, escolas, funções, segmentos e, principalmente, em realidades muito

distintas.

No período em que atuei no município, vivenciei as mudanças que ocorriam a cada

troca de Secretário de Educação. Houve aquele que não adotava metodologia alguma: cada

professor utilizava o que conhecia ou era conveniente. Houve momentos em que trabalhamos

com uma “metodologia holística”, fazíamos relaxamento com as crianças, caminhadas na

Page 28: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

27

areia, eventos com pais tocando violões, coleções de pedras, etc. Depois veio o momento do

construtivismo, em que desenvolvíamos tarefas individuais para identificar em que fase do

conhecimento lógico-matemático os alunos se encontravam. O sistema apostilado também foi

adotado, com o discurso de “unificar o ensino nas escolas municipais” A descontinuidade de

metodologias e concepções é prática comum a cada nova troca de Secretário, pois, sob o

ponto de vista político, as administrações são marcadas pela diferença e, com isso, adotam

“ou impõem” modismos, deixando de lado o processo específico de ensino e os agentes

(professores), que raramente são ouvidos, atendidos ou bem interpretados pelos novos

gestores.

Durante os anos de atuação como professora de Matemática de crianças e

adolescentes, observei o que me deixava muito angustiada: os alunos habitualmente

apresentavam dificuldades em resolver problemas, insistindo em encontrar números e “fazer

uma conta”, sem a preocupação de “pensar sobre” o problema encontrado Muitos estudantes

diziam não gostar da disciplina porque não encontravam sentido no que faziam ou nos

problemas convencionais propostos pelos materiais didáticos. Procurei colegas da área para

refletirmos sobre essas questões e ouvi muitos comentários como: “Eles não sabem ler e

interpretar, e só o professor de Língua Portuguesa pode auxiliá-los nisso”; “Falta

conhecimento prévio, e não sou professor primário e não sei como resolver isso”; “Eles não

têm interesse e isso não é culpa minha e sim da família que não os incentiva”, etc. Para

minimizar essas angústias e, talvez criar outras, resolvi fazer o mestrado, pois buscava, por

meio dos estudos e das pesquisas, redimensionar minhas crenças e meus valores sobre o

ensino da Matemática.

Meus anseios e os estudos no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação

da Universidade São Francisco, sob a orientação da Prof D ra Regina Célia Grando, na linha

de pesquisa Matemática, Cultura e Práticas Pedagógicas, conduziram-me a desenvolver

pesquisa na escola em que atuava como professora de Matemática em turmas do 7º ano do

Ensino Fundamental. Essa foi minha primeira experiência como professora-pesquisadora, e o

foco de estudo foi o Pensamento Probabilístico.

Quando estava no mestrado fui convidada por minha orientadora para integrar o Grupo

Colaborativo em Matemática (Grucomat12

), o qual ela coordenava com a professora Adair

12

O Grupo Colaborativo de Matemática (Grucomat) é um grupo institucional, vinculado ao Programa de Pós-

Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade São Francisco (USF), campus de Itatiba/SP. O Grupo

tem se constituído como um espaço de estudos e pesquisas sobre a Matemática na escola básica. É composto

Page 29: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

28

Nacarato. Fazer parte de um grupo colaborativo de pesquisa foi muito importante, tanto para a

minha pesquisa − porque o tema seria passível de análise e discussão no Grupo, uma vez que

esse era o conteúdo de estudo do grupo naquele momento − quanto para minha formação

enquanto pesquisadora, pois as investigações eram desenvolvidas pelo grupo em uma

perspectiva dialógica, todos os integrantes tinham “voz”, eram ouvidos Os estudos eram

planejados coletivamente. Esse contexto, essa experiência, para um ingressante na pesquisa

acadêmica é significativo.

Como mencionado, assim que concluí o mestrado ingressei no programa de doutorado

da mesma instituição. Também como supracitado, buscava investigar os conceitos produzidos

a partir de um trabalho articulado entre a combinatória e a probabilidade em uma perspectiva

problematizadora.

No período em que estava cursando o doutorado fui aprovada no concurso para a vaga

de Professor de Matemática para atuar em classes do Ensino Médio das escolas: ETEC “João

Belarmino”, em Amparo/SP, e ETEC “José Maria Stevanatto”, em Itapira/SP Essa

oportunidade veio a acrescer para minha experiência docente, pois já havia atuado em todos

os níveis de ensino, a maior parte na escola pública. No entanto, mesmo as ETECs sendo

escolas públicas, são administradas pela Secretaria de Tecnologia do Estado de São Paulo.

Dessa forma, diversos fatores as diferenciam das escolas de Ensino Médio Estadual, como a

quantidade de aulas por disciplina − no caso da Matemática, são três aulas semanais apenas −,

os investimentos nos laboratórios de ensino e a forma como o processo de ensino e

aprendizagem são avaliados.

Tal avaliação ocorre uma vez ao ano, quando profissionais da Administração Central

compareciam escola para fazer o “observatório”, que consiste em uma análise completa de

todo o trabalho desenvolvido por meio de documentos e discursos de funcionários e alunos

escolhidos aleatoriamente com o intuito de verificar a veracidade dos documentos e, a partir

daí, emitir uma nota e estabelecer metas para o próximo ano. Não considero essa avaliação,

formas de controle, como positivas ao processo de ensino e aprendizagem, mas o fato de a

escola ter um trabalho organizado, com objetivos definidos, contribui para uma boa prática

educativa.

pelas professoras que atuam na Universidade, por professores da escola básica e do ensino superior, bem como

por alunos da pós-graduação (mestrado e doutorado em Educação), que também são professores da escola

básica. Há mais informações disponíveis em: <http://grucomat.blogspot.com.br/>. Acesso em: 30 ago. 2014.

Page 30: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

29

Concomitante a esse período, iniciei a experiência com o Ensino Superior, quando fui

contratada pelo Instituto de Ensino Superior (IESI), na cidade de Itapira/SP, como professora

de Matemática do curso de Ciências da Computação para ministrar aulas de Cálculo e

Álgebra Linear. A minha contratação no IESI foi possível devido ao mestrado, pois o instituto

procura contratar professores com tal formação. Atuar no Ensino Superior tem sido uma

experiência relevante em minha carreira profissional, já que atuei em outros níveis. No início

de 2012, fui convidada pela coordenadora do curso de Pedagogia da instituição para ministrar

a disciplina de Alfabetização e Letramento, oportunidade que abracei de imediato, pois

desejava ministrar aulas para esse curso, já que sempre estive envolvida com os processos de

ensino e aprendizagem da Educação Básica. À convite da então coordenadora, assumi não

somente as aulas, como me tornei a coordenadora do curso de Pedagogia. A experiência se

ampliou e contribuiu para que minhas atuações enquanto formadora passassem do ambiente

de sala de aula, com os alunos da Educação Básica, para um espaço de formação de

professores para nela atuar.

A princípio, assumir a coordenação foi assustador, pois a realidade das escolas em que

atuei se difere muito da encontrada na universidade, tanto na parte administrativa e

burocrática como na parte pedagógica. Percebi, neste ambiente, que o conhecimento e as

experiências que vivenciei na atuação em Educação Básica eram relevantes para o

desempenho da função de professora e de coordenadora, mas que outros saberes eram

fundamentais, pois o público envolvido precisa de conhecimento prático e científico para se

convencer e se formar. A relação teoria e prática necessita ser o eixo articulador da formação

docente, tendo a pesquisa como uma possibilidade dessa relação.

Nesse período já era aluna do doutorado, e os estudos realizados em disciplinas como

“Trabalho Docente” e a troca com profissionais que atuavam no ensino superior foram

fundamentais para que eu cumprisse essa jornada. Além disso, a minha participação no

Grucomat colaborou para o desenvolvimento dessa função, uma vez que estava envolvida em

pesquisas relacionadas à Educação Matemática e também encontrava espaço para discutir as

problemáticas relacionadas ao ensino e à aprendizagem das(os) futuras(os) pedagogas(os).

Atuando há três anos no Ensino Superior, percebo que novas habilidades foram

incorporadas em minha prática pedagógica. Considero que todas as experiências vividas

foram relevantes para minha formação profissional, mas que o “espírito investigativo”

desenvolvido, ou aflorado, com o ingresso no mestrado foi o ponto-chave.

Page 31: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

30

A partir da “postura investigativa”, participei de muitos eventos relacionados

pesquisa em Educação Matemática no Brasil e em países da América Latina, como Uruguai e

Colômbia. Também fui à Universidade de Granada, na Espanha, para conversar com a

professora e pesquisadora Carmen Batanero, que desenvolve pesquisas na área de Educação

Estatística e foi uma das produtoras do material em que me orientei para desenvolver a

presente pesquisa. Conversei também com o professor Rafael Roa, que foi orientando da

professora Carmen Batanero e desenvolveu uma pesquisa sobre o conhecimento da

combinatória dos alunos que faziam licenciatura em Matemática; nossas conversas foram

enriquecedoras para minha pesquisa.

Nesses encontros na Universidade de Granada, apresentei minhas pesquisas − a de

mestrado, que estava concluída, e a de doutorado, em andamento e os dados do doutorado que

já estavam coletados. Discutimos um pouco sobre conceitos, mas focamos nas tarefas

realizadas pelos alunos e nas possibilidades de categorias de análise. O fato de desenvolver

pesquisa em sala de aula e ser professora-pesquisadora foi muito apreciado por Batanero.

Depois da visita Universidade de Granada, participei do “Encuentro Colombiano de

Educación Estocástica”, que aconteceu em Bogotá, Colômbia, em 2014. Considero que essa

participação foi relevante para a solidificação de ideias a respeito da combinatória e da

probabilística, uma vez que o foco das apresentações do evento foi a estocástica13

. Como o

encontro não envolveu muitos participantes, houve a possibilidade de conversas com os

pesquisadores para além das apresentações. Trocamos referências, sugestões de leitura,

discutimos pontos de algumas apresentações, entre outras coisas.

De forma semelhante ao observado na revisão bibliográfica realizada, a maioria dos

trabalhos apresentados abordava a Estatística, e alguns, a probabilidade. Dos 50 trabalhos

apresentados, apenas um tinha como foco a combinatória. Todos discutiam a relação de

ensino e aprendizagem da estocástica a partir de livros didáticos, organização do currículo,

nas concepções dos professores sobre o tema, etc. Percebi, nesse evento, a preocupação dos

latino-americanos a respeito do ensino e da aprendizagem da Estocástica voltados para os

alunos.

13

Entende-se “estocástica” como um termo europeu utilizado para incluir combinatória, probabilidade e

estatística. Como afirma Shaughnessy (1992, p 465): “Stochastics the common European term to include

„probability and statistics‟”

Page 32: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

31

Recentemente, uma oportunidade foi acrescentada a minha trajetória profissional: fui

aprovada no concurso de Professor de Ensino Superior da Universidade Federal de Campina

Grande (UFCG), para o campus de Cuité/PB, área de Educação Matemática do curso de

Licenciatura em Matemática. Assumi o cargo em fevereiro e estou ministrando aulas nas

disciplinas de Metodologia e Prática de Ensino II − cujo foco é o ensino da Matemática no

quarto ciclo do Ensino Fundamental, 8º e 9º anos − e Estágio Supervisionado II, na qual

oriento o estágio nos anos finais do Ensino Fundamental.

Desde o início de minha trajetória sempre atuei em mais de uma instituição e em

diferentes níveis. Muitas vezes, não conseguia realizar o trabalho da forma como desejava,

por falta de tempo para o planejamento e até mesmo por cansaço; nos últimos anos lecionava

em três períodos: manhã, tarde e noite. Com isso, muitas vezes me senti frustrada. O fato de

atualmente trabalhar exclusivamente em uma instituição tem me deixado muito satisfeita, pois

tenho conseguido estudar, planejar e ministrar minhas aulas e também participar de reuniões

na instituição. Essas ações fazem parte do trabalho do professor; portanto, penso que devem

estar incorporadas a sua jornada de trabalho. Pretendo desenvolver projetos de pesquisa no

próximo semestre, pois neste estou concluindo a tese de doutorado.

Essa nova experiência tem sido um grande desafio, pois, ao me mudar para lá, não

conhecia nenhuma pessoa nem mesmo o local no qual trabalho; a cultura é bem diferente da

que eu vivi no interior de São Paulo, mas estou me adaptando bem. Em alguns momentos da

aula, em que estou dialogando com os alunos, não compreendo alguns termos que utilizam em

seu vocabulário, assim como eles também não compreendem todos que emprego. Assim, a

partir de suas colocações busco alguns de seus termos para utilizá-los em minha fala para que

me compreendam melhor. Dessa forma, comunicamo-nos muito. Essa experiência tem sido

muito interessante para mim e para os alunos, pois percebo que a vivência que tive, atuando

por 21 anos como professora de Educação Básica, tem me ajudado como formadora de

futuros professores de Matemática. Além disso, percebo que os alunos olham minha trajetória

e observam que a prática docente aliada aos estudos pode conduzi-los a uma melhor atuação e

também a possibilidades de progressão.

Concluir a pesquisa de doutorado neste momento, depois de uma longa trajetória

profissional e estudantil, em que estou diante de uma nova e experiência, tem me deixado

muito feliz, pois confesso que diante de minha realidade isso parecia um sonho quase

impossível. Os estudos do Doutorado me ajudaram a perceber que minha trajetória não foi

Page 33: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

32

desenvolvida de forma linear, como parece, mas espiralada, de modo que os saberes

adquiridos nas diferentes experiências se movimentam, até se distanciam em alguns

momentos, mas não se separam, pois são (re)significados. O constante e dinâmico

envolvimento nas vivências de contexto escolar, quando aluna, participando em eventos, e

como professora, atuando em sala de aula, conduziu-me a desenvolver pesquisas em contexto

de sala de aula, universo que é muito significativo para mim.

Quando apresento esta pesquisa, esclareço que sou professora-pesquisadora, ou seja,

desenvolvo duplo papel diante dessa investigação: o de pesquisadora, enquanto aluna do

doutorado que desenvolve sua tese, e o de professora, enquanto profissional que desenvolve

as tarefas com seus alunos em suas aulas de Matemática. Ao analisar o episódio 1, busquei,

enquanto pesquisadora, olhar para minha atuação enquanto professora, confesso que não foi

fácil, pois percebo, no decorrer da transcrição, que minha atuação não é diferente das de

outras aulas, em que não estou desenvolvendo a pesquisa. Dessa forma, tudo me parece muito

natural. Não consigo olhar inicialmente e perceber algo que “me salta aos olhos”

Precisei refletir um pouco mais para perceber que o duplo papel assumido nessa

pesquisa é adotado por mim, desde meu ingresso como aluna do mestrado, pois desde então

desenvolvi o papel de professora e pesquisadora. Os estudos e as reflexões desenvolvidos no

ambiente acadêmico, como estudiosa na área da pesquisa, foram incorporados à minha prática

como professora, dificultando, assim, a dissociação dos papéis.

Porém, entendo que em alguns momentos, os saberes específicos de cada papel

sobressaem-se, como os da pesquisadora diante do processo de pesquisa e os da professora no

desenvolvimento das aulas. Percebo agora, ao olhar para o episódio 1, a presença de uma

professora mediadora, que busca, por meio de uma dinâmica de comunicação e interação com

seus alunos, articular conceitos espontâneos a problematizações, objetivando a formação de

conceitos científicos, incorporada a uma pesquisadora que tem a intencionalidade de

desenvolver a produção de significados sobre combinatória e probabilidade dos alunos do 6º

ano do Ensino Fundamental.

Finalizando esta apresentação, inicio a dos pressupostos teóricos que estruturam esta

pesquisa. Discuto três aspectos considerados fundamentais, na perspectiva histórico-cultural,

para o ensino da Matemática: a linguagem simbólica, o sistema conceitual e a

problematização.

Page 34: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

33

2 RACIOCÍNIO COMBINATÓRIO E PENSAMENTO PROBABILÍSTICO:

LINGUAGEM, CONCEITOS E PROBLEMATIZAÇÕES NA PERSPECTIVA

HISTÓRICO-CULTURAL

Pretendo, neste capítulo, explicitar algumas ideias relacionadas ao referencial teórico

em que me baseei para a análise dos dados produzidos, das quais compartilho. Para tal,

procurei discutir os três aspectos considerados fundamentais para o ensino da Matemática − a

linguagem simbólica, o sistema conceitual e a problematização − na perspectiva histórico-

cultural, que considera que o processo de conceitualização emerge da linguagem, do outro e

do aprendizado em sua gênese e em seu desenvolvimento (FONTANA, 2005).

Entendo que as ideias de Lev Vygotsky e de seus colaboradores sobre as implicações

das relações sociais na produção, a apropriação e a transformação de conceitos em circulação

na sociedade em que o sujeito está inserido, estão imbricadas e devem ser consideradas na

organização do ensino da Matemática. Dessa forma, considero pertinente expor também

aspectos específicos da linguagem probabilística, dos conceitos de combinatória e

probabilidade, além da cultura social de aula de Matemática na perspectiva de

problematização.

2.1 A formação de conceitos na perspectiva histórico-cultural: possibilidades em

contexto escolar

De acordo com Vygotsky (2001), a linguagem constitui duas funções básicas para o

desenvolvimento do ser humano: o intercâmbio social e o desenvolvimento do pensamento

generalizante Para o autor, “é para se comunicar com seus semelhantes que o homem cria e

utiliza os sistemas de linguagem” (OLIVEIRA, 2004, p 42) Dessa forma, a linguagem é

muito mais do que palavras, inclui formas de comunicações verbais e extraverbais, como

gestos, sons, olhares, etc. É por meio dessa linguagem, gerada e desenvolvida no diálogo, que

o ser humano cria seu mundo interior, apropria-se da sociedade em quem que vive e a

transforma.

Na concepção de Vigotsky, o pensamento verbal e a linguagem racional surgem

quando os processos de pensamento e linguagem se unem. Dessa forma, o sujeito tem a

possibilidade de um desenvolvimento psicológico mais elevado, o pensamento generalizante.

Page 35: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

34

É essa função de pensamento generalizante que torna a linguagem um

instrumento de pensamento: a linguagem fornece os conceitos e as formas de

organização do real que constituem a mediação entre o sujeito e o objeto de

conhecimento. A compreensão das relações entre pensamento e linguagem é,

pois, essencial para a compreensão do funcionamento do psicológico do ser

humano. (OLIVEIRA, 2004, p. 43).

O processo de construção de si, de desenvolvimento, que acontece pela reconstrução

interna de operações externas é denominado por Vygotsky como internalização. Para o

pesquisador, a internalização se dá por meio de práticas e conceitos desenvolvidos em

determinados contextos, por meio das funções básicas − linguagem e pensamento

generalizante−, que são apropriadas, (re)significadas e transformadas pelo sujeito. Assim,

pelas relações sociais (atividade interpessoal), o sujeito desenvolve modos de ação/elaboração

particulares (atividade intrapessoal) que o constituem. Esse processo, de acordo com

Vygotsky, é uma reconstrução que

[...] tem como base a mediação semiótica (particularmente a linguagem), e

envolve as ações do sujeito, as estratégias e conhecimentos por ele já

dominados, as ações, estratégias e conhecimentos do (s) outro (s) e as

condições sociais reais de produção da (s) interação (ões). (FONTANA,

2005, p. 12).

À medida que o sujeito internaliza os modos de ação, os papéis e as funções sociais na

interação com o outro, isso passa a dirigir seu próprio comportamento. No entanto, a

possibilidade de autorregulação, considerada essencial ao desenvolvimento, permite que a

atividade mental seja desenvolvida e transformada em funções mediadas, conscientes e

deliberadas.

De acordo com Smolka (2000, p. 26), a internalização é um construto teórico central

na perspectiva histórico-cultural. Isso porque “se refere ao processo de desenvolvimento e

aprendizagem humana como incorporação da cultura, como domínio dos modos culturais de

agir, pensar, de se relacionar com outros, consigo mesmo”.

Dentre as formas superiores de ação consciente, Vygotsky destaca a elaboração

conceitual, “modo culturalmente desenvolvido dos indivíduos refletirem cognitivamente suas

experiências” (FONTANA, 2005, p 12) A elaboração conceitual decorre de um processo de

abstração e generalização de dados sensoriais, que é mediado e materializado pela linguagem.

Os conceitos, segundo Fontana (2005, p. 13),

Page 36: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

35

[...] não são analisados como categorias intrínsecas da mente, nem como

reflexo da experiência individual, mas sim como produtos históricos e

significantes da atividade mental mobilizada a serviço da comunicação, do

conhecimento e da resolução de problemas.

Segundo Vygotsky, a evolução do pensamento verbal nas crianças é fator

determinante para a formação de conceitos, cuja evolução é marcada por duas linhas de

desenvolvimentos. Uma delas se desenvolve espontaneamente na vida cotidiana, constituindo

os conceitos espontâneos. A outra se desenvolve no contexto escolar, estabelecendo os

conceitos científicos.

De acordo com suas pesquisas, Vygotsky concluiu que a formação dos conceitos

científicos na criança passa por três fases básicas. Estas são compreendidas como estágios que

se encontram nos períodos de desenvolvimento do pensamento e não de maturação biológica.

São elas: pensamento sincrético, pensamento por complexo e pensamento conceitual

(NÜÑEZ, 2009).

O pensamento sincrético é produzido na internalização de significados de uma

determinada palavra pela criança, formado pelo conjunto de elementos dispersos, agrupados

com base em conexões vagas e subjetivas. É um pensamento sensitivo, intuitivo, apresentado

por meio de relações difusas e não relacionadas entre si. Qualquer estímulo externo pode

desarticular esse tipo de pensamento. Os critérios utilizados para constituí-lo são imprecisos e

podem ser alterados com muita facilidade durante a atividade. Ele se expressa no pensamento

cotidiano. O avanço dessa fase, a princípio, é estabelecido por tentativas de ensaio e erro, por

circunstâncias no tempo e no espaço e, depois, por agrupamentos elaborados.

O pensamento por complexos é marcado por nexos e relações de impressões

desordenadas, que são unificadas e organizam dados de experiências. Nesta fase, a criança

agrupa objetos e fenômenos por suas semelhanças, por seus contrastes e por suas

proximidades no espaço. As associações apresentadas nesse estágio fazem com que as

palavras em funções disjuntas deixem de ter sentido isolado e passem a ter sentido na

generalização. Como consequência de várias conexões desenvolvidas por diferentes tipos e

níveis de complexos, Vygotsky observou nessa fase cinco “sub-estágios”, classificados por

ele como: tipo associativo, coleção, cadeia, complexos difusos e pseudoconceitos.

Para o referido autor, os pseudoconceitos e os conceitos possuem uma característica

semelhante de formação: ambos agrupam objetos a partir de suas características particulares,

Page 37: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

36

mas se diferenciam psicologicamente, em virtude das especificidades das abstrações geradas

em seu processo de elaboração. Nos pseudoconceitos, a criança isola atributos essenciais dos

conceitos, porém não os separa da experiência. Eles não se fundamentam em um sistema

lógico abstrato como os conceitos, que desenvolvem sínteses por meio da diferenciação de

elementos e a partir da abstração de outros elementos, rompendo com conjunto de atributos

concretos. O domínio da abstração e do pensamento por complexo possibilita na criança a

formação de conceitos verdadeiros, o pensamento conceitual.

O pensamento conceitual é a fase caracterizada pela formação de conceitos potenciais.

Esta é resultante de um ato real e complexo do pensamento, o qual inclui operações mentais e

sínteses em formas mais elaboradas. A criança, nesta fase, desenvolve generalização abstrata

de propriedades essenciais dos conceitos, abstraindo as demais. A generalização abstrata se

torna a forma principal do pensamento, o qual se concebe e se torna consciência no contexto.

Esses conceitos, concebidos como funções psicológicas superiores que representam

generalizações em nível abstrato, concretizam-se na função simbólica da linguagem, como

aponta Nüñez (2009, p. 37):

A estratégia assumida pelos sujeitos mostra que suas operações são

realizadas totalmente no plano lógico-verbal e que a palavra recebe um novo

significado abstrato estável. Nessa etapa, os traços ou atributos do conceito

se separam da situação concreta e são percebidos em suas características

gerais e as palavras alcançam significados “no sentido restrito”

As três fases do processo de formação do conceito não representam um percurso

linear, limitado por idade cronológica ou maturação biológica; e a terceira fase não aparece

quando a segunda se completa com o pensamento por complexo. Essas últimas coexistem e

em determinados momentos se unem e admitem o surgimento de conceitos científicos. Elas

não desaparecem no processo evolutivo da formação de conceitos. As diferentes pessoas, até

mesmo as mais letradas, não apresentam sempre pensamentos genuínos, em contextos

cotidianos também usam pseudoconceitos (VYGOTSKY, 1991).

Para Vygotsky, a divisão entre conceitos espontâneos e conceitos científicos não se dá

pelos conteúdos dos conceitos, mas pelo caráter específico de sua formação. Conceitos

espontâneos são os desenvolvidos no cotidiano, enquanto os científicos são desenvolvidos no

contexto escolar.

Page 38: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

37

Considera-se que a criança, ao ingressar na escola, já possui certo nível de maturidade

de funções mentais superiores, como percepção, atenção e memória; são funções consideradas

fundamentais para o desenvolvimento de conceitos científicos, mas não determinantes. O

processo de construção conceitual no espaço escolar possui característica sistematizadora,

estabelecida em um processo social mediado e culturalmente contextualizado.

Os conceitos escolarizados emergem do desenvolvimento social e histórico da

educação formal em instituições escolares, baseados em conceitos científicos. O

desenvolvimento desse tipo de conceito na escola

[...] começa pelo trabalho do próprio conceito em si, por sua definição

discursiva, seguido de atividades que pressupõem o uso consciente dos

atributos que compõem a definição do conceito na solução de diversas

tarefas, tais como identificar, comparar, classificar, que são procedimentos

relacionados à definição de conceito. (NÚÑEZ, 2009, p. 42)

Na concepção de Vygotsky, a formação dos conceitos científicos se inicia pela

definição verbal, pela apresentação e esclarecimento de atributos essenciais e sua aplicação

incide sobre a variedade de objetos do contexto, possibilitando ao aluno adquirir consciência

do conceito mediante sua aplicação. Dessa forma, os conceitos científicos se iniciam por

procedimentos analíticos, e não apenas por experiência concreta.

De acordo com Núñez (2009), as condições nas quais os conceitos espontâneos e

científicos se desenvolvem são diversas, pois dependem de como o processo de formação é

organizado e sistematizado. A diferença na organização e no desenvolvimento do processo de

aprendizagem pode conduzir os alunos a sentidos diversos na construção do pensamento

conceitual.

Como já mencionado, a linguagem tem papel fundamental no desenvolvimento do

pensamento generalizante. No contexto escolar seu papel é preponderante, uma vez que

possibilita a elaboração de processos psicológicos como a abstração, a generalização, a

conscientização e a regulação de conceitos das diferentes disciplinas escolares.

A relação entre o homem e o mundo passa pela mediação do discurso, pela

formação de ideias e pensamentos através dos quais o homem apreende o

mundo e atua sobre ele, recebe a palavra do mundo sobre si mesmo e sobre

ele-homem, e funda sua própria palavra sobre esse mundo. (VIGOTSKY,

2001, p. XII)

Page 39: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

38

O desenvolvimento de conceitos no contexto escolar transcorre da linguagem e do

outro. No entanto, a forma como são mediados os contextos de aprendizagens históricos e

culturais influencia na formação de conceitos científicos.

A mediação, de acordo com a perspectiva vygotskyana, é compreendida como “toda

intervenção de um terceiro „elemento‟ que possibilite a interação entre os „termos‟ de uma

relação” (SIRGADO, 2000, p. 38) e está entrelaçada a dois tipos de mediadores externos: os

instrumentos e os signos, que regulam as ações dos sujeitos sobre os objetos e seu psiquismo.

Nesse contexto, a mediação semiótica, que considera as raízes sociais e históricas como

conceito mediador que pode explicar as características específicas das sociedades históricas,

torna-se importante, uma vez que é considerada “um bom instrumento para se pensar o

psiquismo humano como um processo permanente de produção que envolve o indivíduo e seu

meio sociocultural numa interação constante” (SIRGADO, 2000, p. 48).

Smolka (2010) leva em conta que a atividade de ensino é enigmática, pois em alguns

momentos é surpreendente, em outros inusitada e até mesmo desconcertante. Para a autora, na

perspectiva histórico-cultural o ensinar está relacionado ao significar, uma vez que o processo

de ensinar e significar implica em “formas de (inter) ação, (oper) ação mental e trabalho com

signos” (SMOLKA, 2010, p 108)

O movimento de significação não é unívoco nem imediato. É (re)configurado,

estabelecido e convencionalizado na relação entre as pessoas. A possibilidade e a necessidade

de construção de sentidos leva o sujeito a problematizar as condições e as dimensões da

produção e da construção de conhecimentos nas relações de sentidos.

Segundo Smolka (2010), vale a pena explorar, nas relações de ensino, a compreensão

da produção de sentidos, porque o trabalho simbólico das interações nos possibilita pensar na

dinâmica interdiscursiva em diferentes dimensões: individual, social e ideológica. A autora

afirma que, de acordo com Vygotsky, é por meio da mediação do outro e dos signos que o

conhecimento se constrói, mas ressalta que as raízes históricas também estão envolvidas nas

implicações e nos sentidos daquilo que assumimos ou defendemos. Ensinar, portanto,

significa “um trabalho com signos, um trabalho de significação por excelência, que implica

incansáveis gestos indicativos nas orientações de olhares, nas configurações dos gestos, nas

formas de referir, de conceituar” (SMOLKA, 2010, p 128)

A criança, desde o início de sua vida, está inserida em um contexto cultural

historicamente constituído, no qual o adulto procura inseri-la no conjunto de ações e

Page 40: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

39

significações elaboradas e acumuladas pela sociedade. É na mediação do/pelo outro −

revestida de gestos, atos e palavras (signos) − que a criança vai se integrando às formas de

atividades consolidadas em sua cultura, em um processo dinâmico de articulação entre o

pensamento e a linguagem.

Diante do exposto, a mediação é considerada como uma potencialidade no

desenvolvimento da pessoa. No entanto, é importante ressaltar que isso não significa que seu

desenvolvimento será sempre positivo, pois pode acontecer de maneira equivocada.

De acordo com Fontana (1993), há diferença na relação da criança com o adulto no

contexto cotidiano e no escolar. No cotidiano, a influência do adulto não reprime a criança na

formação de generalizações, mas a oculta. Nas interações escolarizadas, o processo é

diferente, há uma orientação deliberada e explícita do adulto para a formação de

conhecimentos científicos pela criança. Nesse contexto, a criança é envolvida em um processo

para compreender os conceitos científicos, nos quais as atividades “são organizadas de

maneira discursiva e lógico-verbal” e “a relação da criança com o conceito é sempre mediada

por algum outro conceito” (FONTANA, 1993, p. 124). Assim, a mediação do adulto é

consciente, deliberada e planejada.

No contexto escolar, a ação mediadora do adulto é percebida pelo estudante. Ou seja,

ele tem a imagem de seu papel e o do papel do professor na instituição, os quais geralmente o

conduzem a realizar as tarefas que lhe são propostas. De acordo com Vygotsky (2001), o

aprendizado escolar desempenha papel fundamental na construção e no desenvolvimento das

funções psicológicas básicas para que o sujeito tome consciência de seus próprios processos

de constituição de pensamentos e de elaboração conceitual.

As diferenças existentes entre os conceitos espontâneos e os científicos não os

configuram como conceitos contraditórios, mas articulados. No processo de elaboração de um

conceito desconhecido, o estudante busca em signos conhecidos, em experiências concretas,

uma aproximação para significá-lo. Dessa forma, os conceitos espontâneos possibilitam que

conceitos sistematizados sejam confrontados com situações concretas, criando relações de

generalizações. Por outro lado, os conceitos científicos criam estruturas para o

desenvolvimento de novos conceitos espontâneos a partir das relações de sistematizações, do

uso deliberado da consciência e do desenvolvimento de novas percepções da atividade

intelectual. De acordo com Friedrich (2012, p. 101), “é nesse jogo de dependência e

independência entre o escrito e o oral, entre as generalizações de primeira e segunda ordem,

Page 41: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

40

entre os conceitos cotidianos e científicos adquiridos na escola, que a aprendizagem escolar

deve se fundar”

Diante do exposto, conclui-se que o processo de elaboração conceitual é dinâmico e

articulado, não se esgota quando uma generalização é elaborada ou quando um conceito

científico é desenvolvido. Isso porque, ao se deparar com uma nova problemática, conceitos

científicos fazem com que conceitos espontâneos sejam desenvolvidos e utilizados para que

outros conceitos científicos sejam desenvolvidos e/ou (re)significados.

Considero que as informações apresentadas sobre o processo de formação de conceitos

são de extrema importância para os estudos no campo da Educação, seja no processo de

ensino e de aprendizagem de maneira generalizada, seja em campos específicos, como o da

Matemática, por exemplo; pois a forma como a criança desenvolve conceitos das diferentes

disciplinas de estudo, em sua gênese, não se difere. Os conceitos são permeados por produtos

históricos e culturais, têm a linguagem como fator preponderante em sua formação,

consideram o outro como agente ativo em seu processo de desenvolvimento individual e

coletivo. Sua formação consiste em um processo dinâmico de (re)significação.

No entanto, conforme mencionado, as diferenças na organização e na elaboração do

processo de aprendizagem podem conduzir os alunos a sentidos diversos no desenvolvimento

do pensamento conceitual, a diferentes níveis de generalização. Desse modo, a interlocução

entre a formação de conceitos na perspectiva Vygotskyana, a formação de conceitos

específicos do campo de estudo e a dinâmica no processo de ensino e de aprendizagem

possibilita um trabalho significativo em contexto escolar.

Diante do exposto, considero que essa discussão esteja contemplada no processo de

ensino e de aprendizagem da combinatória e da probabilidade, tal como proponho nesta

pesquisa. Assim, apresento os conceitos específicos desse campo de estudo para melhor

compreensão da pesquisa desenvolvida.

2.2 Conceitos sobre combinatória e probabilidade: articulações entre linguagem e

contextos

Acredito que a compreensão da linguagem matemática não é algo simples, pois

consiste na relação da língua materna com a matemática, com símbolos e significados

construídos no cotidiano e no contexto escolar, carregados de concepções históricas e

Page 42: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

41

culturais. Considero que esse aspecto deve ser levado em conta nas aulas de Matemática, uma

vez que o uso de linguagem possibilita o desenvolvimento de conceitos diversos; a linguagem

matemática, portanto, propicia a compreensão e o desenvolvimento de conceitos matemáticos,

estabelecendo formas específicas da comunicação matemática com as situações do cotidiano.

No caso específico da combinatória e da probabilidade há certo repertório de palavras

relacionadas à linguagem probabilística − como impossível, possível, pode ser, certo, seguro,

se espera que, provável, bastante provável − que são utilizadas pelos alunos para expressar as

medidas de chances de determinados eventos, mas que não são compartilhadas por todos,

conforme apontei em minha pesquisa de mestrado (SANTOS, 2010).

É comum observarmos que as pessoas usam esses termos relacionadas à combinatória

e à probabilidade em seu cotidiano, por exemplo: “Eu vou ao dentista com frequência”, “É

provável que eu vá ao cinema no final de semana” ou ainda “Pode ser que eu tire uma boa

nota na prova”. No entanto questiono-me: se esses termos fazem parte do vocabulário das

pessoas, inclusive dos alunos da Educação Básica, ou, em outras palavras, se os alunos

possuem conceitos espontâneos, por que ainda encontram dificuldades em interpretá-los, no

contexto escolar, nos problemas relacionados à combinatória e à probabilidade? Seria a

ausência de um trabalho que possibilite a articulação entre os conceitos espontâneos e

científicos?

Pesquisas sobre probabilidade desenvolvidas em alguns países apresentam resultados

contributivos para pensarmos sobre a linguagem probabilística, como a de Green (1982),

realizada com estudantes da Grã Bretanha com idade entre 11 e 16 anos. O pesquisador

observou que os alunos possuem limitações linguísticas para expressar conceitos sobre

probabilidade, o que contribui para respostas inadequadas. Além disso, o pesquisador

notouque eles atribuem significados comuns a termos que indicam diferentes graus de

probabilidade, como improvável e não pode acontecer.

As pesquisas desenvolvidas com estudantes na Espanha conduziram Godino, Batanero

e Cañizares (1996) a constatarem dificuldades na estimação probabilística e na interpretação

dos termos apresentados. Isso ocorreu, pois diferentes medidas foram atribuídas a um mesmo

fenômeno probabilístico.

De maneira semelhante, em minha pesquisa de mestrado (SANTOS, 2010),

investiguei o movimento do pensamento probabilístico dos alunos do 7º ano de uma escola

pública do interior de São Paulo e observei que as ideias que os alunos possuem dos termos

Page 43: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

42

do vocabulário probabilísticos não são compartilhadas comumente por todos, mas que há

certa regularidade em categorias de palavras. Para os termos que expressam valores

quantitativos “exatos” da probabilidade − por exemplo, seguro, certo, impossível e sem

dúvida −, as concepções foram compartilhadas por todos os alunos pesquisados. Nos termos

que envolvem valores “flexíveis” − como pode ser, há alguma probabilidade, é possível e se

espera que −, em alguns momentos os alunos partilhavam das ideias dos colegas, em outros

não, porém validavam as justificativas apresentadas por eles, ou seja, mesmo não utilizando o

termo adotado pelo colega, consideravam que seu uso era adequado. A maior discordância

surgiu nas relações estabelecidas com os termos frequência e quase sempre, pois, apesar de

estarem diante de exemplos consistentes de situações que podem envolver esses termos, os

alunos não mudavam sua opinião, nem validavam as ideias e os argumentos apresentados

pelos colegas.

De acordo com Watson (2006), a discussão sobre a linguagem probabilística em

diferentes contextos é importante, pois as respostas dos alunos podem apresentar conceitos

dos contextos pessoais, do ambiente escolar imediato ou do mundo externo, ou seja, referem-

se aos conceitos espontâneos. Segundo a autora, apresentar situações que abordem os

diferentes contextos em sala de aula, estabelecendo relações entre a linguagem coloquial e a

formal é importante para o desenvolvimento de conceitos científicos sobre probabilidade.

Compreendo que esse seria o movimento entre os conceitos espontâneos e os científicos.

Gal (2005) aponta que não tem sido dada muita atenção à linguagem probabilística,

mas que ela é muito importante, pois apresenta aspectos relevantes nas relações abstratas que

se estabelecem entre as situações apresentadas e os termos utilizados para expressar a medida

de chance e também para apresentar suas reais interpretações probabilísticas. Segundo

Nacarato e Grando (2013), a linguagem probabilística tem um papel fundamental na

elaboração de conceitos sobre probabilidade dos estudantes, uma vez que o produto de um

trabalho de negociação de significados das palavras do vocabulário probabilístico é a

conceitualização.

Minha pesquisa anterior também apontou o quanto é importante a discussão sobre

termos da linguagem probabilística no início dos estudos sobre probabilidades. Com ela,

equívocos sobre a interpretação de enunciados e conceitos são minimizados, uma vez que fica

evidente, para os alunos e para o professor, quais são suas considerações sobre os termos. A

pesquisa constatou também que os alunos passam a utilizar a linguagem probabilística na

Page 44: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

43

apresentação de suas considerações sobre as tarefas14

desenvolvidas e até mesmo no cotidiano

da sala de aula.

Reforço minha colocação anterior (SANTOS, 2010) de que é significativa a discussão

da linguagem probabilística nos processo de ensino e de aprendizagem de probabilidade.

Compreendo que conceitos sobre as probabilidades são desenvolvidos a partir de tarefas

potencializadoras. Tal entendimento decorre de a linguagem desempenhar papel essencial na

formação intelectual do indivíduo, pois há coesão entre comunicação e generalização

(VIGOTSKY, 2001). Dessa forma, considero que os diferentes sentidos atribuídos pelos

alunos às palavras do vocabulário probabilístico são produtos de conceitos espontâneos e

científicos desenvolvidos em contextos escolares e não escolares por meio da linguagem, de

experiências vivenciadas e de mediação consciente do professor, deliberada e planejada por

ele.

Dentre as diversas informações apontadas em meu trabalho anterior (SANTOS, 2010),

destacam-se as interpretações dadas pelos alunos aos termos possibilidades e probabilidades.

Para apresentar minha análise, elaborei um quadro com as ideias que os alunos, organizados

em grupos, apresentaram sobre os termos “pouca possibilidade” e “muita probabilidade” A

partir dele, constatei que metade dos grupos entende os termos possibilidade e probabilidade

como sinônimos. Para esses alunos, tais palavras expressam a medida de chance. Significado

este, que se refere ao termo “probabilidade” e não “possibilidade” Esse apontamento é um

indicativo de que mesmo conceitos equivocados podem ser compartilhados, uma vez que são

elaborados a partir de vivências sociais e culturais.

Percebe-se no que foi exposto até o momento que apenas mencionou-se o termo

“linguagem probabilística” e não combinatória. Isso acontece porque a maioria das palavras

do vocabulário relacionadas à combinatória e à probabilidade é comum. Além disso, parece

ser usual a opção pelo uso do termo linguagem probabilística, pois se entende que a

combinatória está inserida na probabilidade, porém o contrário, não necessariamente.

Na pesquisa atual, tais apontamentos são importantes, pois os sentidos atribuídos pelos

alunos às tarefas propostas, assim como a compreensão de como eles são atribuídos e/ou

desenvolvidos, é fundamental. Isso porque tenho como objetivo analisar as articulações entre

14

Compreendo, de acordo com Christiansen e Walter (1986), tarefa como um conjunto de ações – exercícios,

problemas, situações-problemáticas, estratégias de ensino – organizadas pelo professor, visando que conceitos

da Matemática sejam compreendidos e desenvolvidos pelos alunos.

Page 45: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

44

o raciocínio combinatório e o probabilístico, bem como a compreensão das concepções sobre

o pensamento combinatório.

Pesquisas como as de Gal (2005), Celi Lopes (2008), Roa (2000) e Watson (2006),

sobre a formação de conceitos de combinatória e probabilidade, normalmente analisam-na a

partir da habilidade (ou não) de resolução de problemas. Desse modo, apontam que os alunos

apresentam dificuldades com a temática e atribuem tal fato ao processo de ensino e

aprendizagem.

Segundo Roa (2000), as dificuldades dos estudantes em resolver os problemas de

combinatória se dão devido a dois motivos. Um deles é a estrutura complexa de resolução. O

outro se refere às deficiências do processo de ensino, que enfatiza o uso de fórmulas e

procedimentos em detrimento de componentes mais primários do raciocínio combinatório.

De acordo com as investigações de Gal (2005), a probabilidade não é uma

característica palpável dos acontecimentos, mas uma percepção ampla, que pode ser expressa

por meio de uma notação formal da Matemática quanto à probabilidade de ocorrência de um

evento Para o autor, muitas das situações cotidianas exigem que as pessoas sejam “letradas

probabilisticamente”15

; e, para que o letramento16

aconteça, não basta que haja no processo de

ensino uma simples instrução, é preciso que diferentes elementos de conhecimento estejam

envolvidos no processo, havendo uma interação entre diferentes conceitos de probabilidade,

maneiras de descobrir a probabilidade de um evento, linguagem, contexto e questões críticas.

Sobre a temática, Watson (2006) afirma que muitos elementos estão ligados ao

conceito de probabilidade; no entanto, os principais são as ideias associadas à linguagem, às

maneiras de mensurar as probabilidades e às questões relacionadas ao contexto. Segundo a

autora, para que o pensamento probabilístico dos alunos seja desenvolvido é preciso que três

conceitos sobre probabilidade estejam inseridos no currículo escolar: o subjetivo, o

frequentista e o formal. Esses conceitos são apresentados pelas pessoas em situações

cotidianas e estão presentes em circunstâncias diversas, assim como outros conceitos sobre

probabilidade, como o clássico e o lógico.

É possível observar que as pessoas apresentam diferentes pensamentos a respeito da

probabilidade. Por exemplo, se perguntar àquelas que jogam na megassena o que levam em

15

Probability literacy. 16

Compreendo letramento probabilístico como um conjunto de habilidades como: ler, compreender, interpretar,

analisar, avaliar e expressar situações de incerteza por meio de conceitos, vocabulário e terminologia e/ou

símbolos adequados aos diferentes contextos.

Page 46: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

45

conta na hora de escolher os números para colocar em seu cartão, veremos que cada uma

busca uma justificativa coerente para fazer sua escolha: colocar a data de nascimento de

pessoas da família, fazer uma análise dos números que saíram nas últimas rodadas e colocar

números diferentes, escolher um número de cada dezena, jogar sempre os mesmos números,

etc. Dessa forma, em uma mesma situação os sujeitos buscam alternativas para escolher

números que, segundo critérios pessoais, dar-lhes-ão chances de ganhar.

Esse fato é observado por Fernandes (1999), que acredita que as diferentes

características das concepções sobre probabilidade podem induzir a diferentes perspectivas.

De acordo com Shaughnessy (1992), a tradição dualista da probabilidade – como grau de

crença e como cálculo de frequência – conduz diversos debates de pesquisas.

Características sobre as diferentes concepções probabilísticas são indicadas por

autores como Fernandes (1999), Godino, Batanero e Cañizares (1996) e Hawkins e Kapadia

(1984). As diferentes concepções probabilísticas apresentadas pelos autores coincidem em

alguns termos e características. Na sequência expomos cinco conceitos de probabilidade,

segundo Godino, Batanero e Cañizares (1996) e Fernandes (1999), quais sejam: o clássico ou

laplaciano, o frequentista ou empírico, o subjetivista, o lógico e o axiomático ou formal.

O conceito clássico ou laplaciano

O conceito clássico da probabilidade foi definido por Laplace em sua obra Théorie

analytique des probabilités, publicada em 1812. Essa definição é atribuída às situações em

que o espaço amostral é equiprovável. Nesse contexto, a probabilidade é estabelecida pela

razão entre o número de casos favoráveis em relação ao número de casos possíveis, desde que

todos os resultados sejam igualmente prováveis. De acordo com Fernandes (1999, p. 59),

nessa definição “[ ] assume-se implicitamente a equiprobabilidade de todos os

acontecimentos elementares do espaço amostral”, constituindo “uma abordagem a priori da

probabilidade, pois calculam-se probabilidades antes da realização de qualquer experiência

física” Segundo Godino, Batanero e Cañizares (1996), a característica de equiprobabilidade

também é garantida pela estratégia de utilização de simetria física.

É possível observar tal perspectiva teórica em jogos de azar relacionados a moedas e

dados (não viciados) e em extração de bolas em urnas. De acordo com Godino, Batanero e

Cañizares (1996), isso é possível por se tratar de fenômenos cujas variáveis são discretas, e

supõe-se que seja plausível selecionar, como espaço amostral, um conjunto de sucessos

Page 47: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

46

elementares que garantam a equiprobabilidade. No lançamento de uma moeda, a simetria que

permite aceitar a probabilidade de ½ para cada uma das faces pode ser tomada como

argumento.

Há muitas concepções equivocadas nos jogos de azar, mesmo que os resultados

apresentem simetria, como no caso da megassena. As pessoas acreditam que a probabilidade

de um cartão com seis números alternados ser sorteado é maior do que a de um cartão com

seis números consecutivos. Dificilmente a semelhança entre essas probabilidades será aceita

pelas pessoas; a observação da frequência dos resultados obtidos as conduzem a equívocos,

pois é difícil observar o resultado da megassena com seis números consecutivos, sendo que se

observa mais números aleatórios alternados. A frequência, não dessa forma equivocada,

também é utilizada para determinar a probabilidade.

O conceito frequentista ou empírico

No conceito frequentista, a probabilidade é determinada a partir de um processo de

experimentação. De acordo com Godino, Batanero e Cañizaes (1996), a probabilidade

frequentista é calculada a partir de frequência relativa observada em resultados de provas

repetidas.

Suponhamos que um acontecimento particular A nos interessa; observamos

repetidamente e anotamos a quantidade que A ocorre em certo experimento;

então, a razão entre o número de vezes que se ocorre A, nA, e o número total

de repetições n (razão frequencial ou frequência relativa de que A ocorra,

nA/n) parece tender a um limite quando n tende a infinito. (GODINO;

BATANERO; CAÑIZAES, 1996, p. 24, tradução minha17

).

Neste conceito, as probabilidades são determinadas a posteriori, pois é calculada após

os experimentos terem sidos realizados. Segundo Godino, Batanero e Cañizares (1996), a

teoria frequentista foi defendida por Richard Von Mises na obra Probability, statistics and

truth; no entanto, John Venn já havia recomendado o cálculo de probabilidade por meio de

frequências relativas presentes em sua obra The logic of chance. Godino, Batanero e

Cañizares (1996) exploraram tal teoria, ao simular o experimento aleatório de lançamento de

moedas com o auxílio de um computador. Em uma sequência de 14 mil repetições,

17

Supongamos un sucesso particular A que nos interessa; tomamos observaciones repetidas anotando las

ocasiones en que ocurre A; entonces la razón entre el número de veces que sucede A, nA, y el número total de

repeticones n (razón frecuencial o frecuencia relativa de que A ocurra nA/n) parece tender a un límite cuando n

tende a infinito.

Page 48: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

47

observaram que a frequência de caras era muito próxima da probabilidade teórica, ½. Esse

experimento exemplifica que, quanto maior o número de acontecimentos, maior a

proximidade entre a probabilidade a posteriori e a probabilidade a priori, calculada sem

manipulação experimental, baseada em dados teóricos e no conceito clássico.

Em nosso cotidiano, uma situação de probabilidade frequentista, tida como referência,

com a qual nos deparamos é o valor monetário atribuído ao seguro contra furtos de veículos.

Observa-se que o valor a ser pago varia de acordo com o índice de roubo da região em que o

proprietário reside e também com a marca e/ou o modelo do veículo. Segundo Santos (2011,

p. 3),

Para fazer o cálculo do valor do seguro dos veículos as seguradoras realizam

uma pesquisa estatística sobre o índice de furto dos mesmos, e por meio

desses dados calculam a probabilidade de o proprietário do automóvel “x”

ter seu carro furtado, ou seja, a razão entre o número de possibilidades

favoráveis, automóveis “x” furtados, e o número total de possibilidades,

automóveis “x” em circulação

Considerações obtidas a partir de experimentos simples como este, que envolvem a

aleatoriedade, podem levar os alunos a interpretações equivocadas, pois é possível obter

eventos pouco prováveis. Tal fato pode conduzir os estudantes a conclusões ingênuas de que

eventos desse tipo têm maior chance de ocorrer. Esse tipo de situação foi observado por

Fernandes (1999) que o chama de equívoco em relação à compreensão dos conceitos de

aleatoriedade e semelhança.

O conceito subjetivista

No conceito subjetivista o sujeito faz uso de suas experiências e conhecimento sobre o

assunto para determinar a probabilidade de um sucesso. De acordo com esta perspectiva, as

probabilidades exprimem grau de crença e percepção pessoal, o que ocasiona a geração de

diferentes medidas para um mesmo evento Fernandes (1999) a nomeia como “personalista”,

pois, segundo ele, os conceitos clássico e frequentista são propriedades do mundo real,

enquanto na percepção subjetivista as probabilidades são avaliações pessoais de situações

aleatórias, próprias da mente do indivíduo. Assim, a probabilidade passa de uma avaliação

externa ao sujeito para uma avaliação centrada no sujeito. Segundo Godino, Batanero e

Cañizares (1996), este conceito não se baseia na repetitividade de um sucesso, pois é possível

avaliar a probabilidade de um sucesso que ocorreu apenas uma vez.

Page 49: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

48

Nas situações que envolvem jogos de azar esse conceito de probabilidade é bastante

utilizado, uma vez que estando em situação de risco (excitação emocional) o grau de

confiança individual é muito forte. Acredita-se que no conceito subjetivista os jogadores

seguem regras básicas ao apostar (confiar) em determinado acontecimento. Os subjetivistas

consideram que coerência e consistência são categorias de informação que, combinadas,

geram a probabilidade do evento em questão. Dessa forma, as informações prévias e as

experiências cotidianas compõem a probabilidade de determinado acontecimento

(FERNANDES, 1999).

De acordo com Godino, Batanero e Cañizares (1996), o critério de coerência é

bastante notado no conceito subjetivista, e este pode ser o precursor para o ensino da

probabilidade na universidade, uma vez que concepções como a clássica, por exemplo,

requerem a destreza ao determinar a probabilidade por meio de uma razão; a subjetiva

depende das probabilidades percebidas. Além disso, os autores consideram que o enfoque

subjetivista tem aproximações ao conceito de probabilidade lógica.

O conceito lógico

O conceito lógico da probabilidade é empregado em situações distintas das que

aplicam os conceitos clássico ou frequencial. Está presente em situações que tentam explicar

uma indução, defendendo uma relação lógica entre o enunciado evidente e as hipóteses que

este possibilita, uma generalização das relações implícitas e contraditórias.

Neste conceito, o grau de confiança é medido de duas maneiras extremas – certo ou

impossível –, “ uma proposição p é dada pela informação de outra proposição q, [...] se p é

uma consequência de q, a proposição q dá a p a probabilidade 1 e a contradição, o caso de que

p e q sejam contraditórios, a probabilidade dada por q à p é 0” (GODINO; BATANERO;

CAÑIZARES, 1996, p. 23, tradução minha18

).

Destaco um exemplo que apresenta propriedades da probabilidade lógica: foram

colocadas em uma caixa 10 bolinhas coloridas, sendo cinco verdes, duas vermelhas e três

amarelas. Foram extraídas oito bolinhas dessa caixa, sendo duas vermelhas, três amarelas e

três verdes. Qual a cor das bolinhas que estão na caixa?

18“ una proposición p a luz de la información aportada por otra proposición q, ..., si p es consecuencia de q, la

proposición q da a la p a probabilidad 1, y a contradicción, em el caso de que p e q seam contradictorios, a

probabilidade dada por q a p es 0” (GODINO; BATANERO; CAÑIZARES, 1996, p. 23)

Page 50: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

49

Este conceito, de maneira geral, parece fácil, mas na prática não é. Isso porque

observações subjetivistas e frequentista fazem parte do ideário das pessoas ao analisar as

proposições.

Conceito axiomático ou formal

De acordo com Godino, Batanero e Cañizares (1996), o conceito formal ou axiomático

da probabilidade originou-se dos trabalhos de Kolmogorov como uma oposição ao conceito

clássico, que impõe a equiprobabilidade dos sucessos. Também é conhecido como

probabilidade objetiva ou normativa.

No conceito axiomático ou formal, a probabilidade de determinada situação (S) é

medida quando se elege E como espaço amostral e A como um subconjunto de E. A partir

dessas informações a probabilidade P(S) é definida pelo quociente entre a medida de A e a

medida de E (GODINO; BATANERO; CAÑIZARES, 1996). A probabilidade é

compreendida como um valor entre 0 e 1, 0 < P(S) < 1, sendo que um sucesso impossível é

dado por P (E) = 0 e um sucesso certo por P (E) = 1.

Para Fernandes (1999, p. 54), “a probabilidade formal é um conceito definido

implicitamente por um sistema de axiomas e um conjunto de definições e teoremas deduzidos

daqueles axiomas” O autor ainda afirma que “a abordagem estrutural não esclarece a própria

natureza da probabilidade, apesar de os teoremas deduzidos constituírem um indicador de

possíveis interpretações” (FERNANDES, 1999, p. 54).

Segundo Fernandes (1999), a concepção estrutural pode ser vista como um conceito

que estabelece estrutura teórica para as duas principais concepções de probabilidade: a

posição objetivista, apresentada acima como o conceito formal ou axiomático, e a subjetivista.

Fernandes (1999), baseando-se em Hawkins e Kapadia, esclarece tal perspectiva:

No primeiro caso, os axiomas de Kolmogorov são usualmente vistos como

justificação da posição objetivista. No segundo caso, os axiomas sobre o

comportamento racional no ato de apostar, como coerência e consistência,

fornecem regras para as probabilidades, as quais devem obedecer aos

axiomas de Kolmogorov e suas consequências. (HAWKINS; KAPADIA,

1984 apud FERNANDES, 1999, p. 54).

Entende-se, de acordo com o exposto, que é possível que uma pessoa possa fazer uso

do conceito formal ao apresentar um conceito subjetivista. Com suas vivências e suas

observações, o sujeito define o espaço amostral E e a medida dos sucessos de A, subconjunto

Page 51: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

50

de E, e, a partir dessa medidas, extrai o quociente, ou seja, a probabilidade de determinado

evento.

Na pesquisa de mestrado observei que esses conceitos estão presentes no discurso e no

ideário dos alunos da Educação Básica, “principalmente daqueles que ainda não tiveram a

oportunidade de vivenciar teoricamente conceitos relacionados à probabilidade como medida,

ideia de aleatoriedade, probabilidade condicional, etc ” (SANTOS, 2010, p 18) Reitero,

assim, que “as situações relacionadas incerteza podem ser interpretadas de diferentes

maneiras, por diferentes conceitos probabilísticos, conduzindo ou não as pessoas às respostas

adequadas” (SANTOS, 2010, p 175)

Percebe-se pelo exposto que as diferentes interpretações e significações sobre

probabilidade se fundamentam nos distintos conceitos sobre os quais estão imbricados.

Conceitos esses que se desenvolvem em variados contextos. Esse fato é relevante para se

pensar no processo de ensino e de aprendizagem da probabilidade, pois, mesmo estando

presente em algumas situações didáticas no contexto escolar, será que eles são percebidos

pelos professores? Até que ponto é possível um professor desenvolver o raciocínio

combinatório e o pensamento probabilístico dos alunos já que a combinatória e a

probabilidade se apresentam de formas diferentes de acordo com as situações?

Segundo Celi Lopes (2008), para desenvolver o pensamento probabilístico dos alunos

é preciso possibilitar a eles a realização de atividades de ensino com sentidos e que permitam

o entendimento de chance e de eventos aleatórios. A essas considerações acrescento que na

proposta de ensino os diferentes conceitos precisam estar envolvidos e que a dinâmica de

trabalho deve ter como objetivo articulá-los e/ou confrontá-los para que sentidos e conceitos

sobre as situações de incerteza sejam desenvolvidos pelos alunos.

Algumas pesquisas específicas sobre o desenvolvimento do raciocínio combinatório

foram desenvolvidas, como as de Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), Navarro-Pelayo

(1994) e Roa (2000). Essas pesquisas, assim como outras, foram realizadas a partir da teoria

do conhecimento elaborada por Jean Piaget, mais especificamente a partir da publicação A

origem da ideia do acaso19

, de Piaget e Inhelder (1951).

Diante desse fato, considero importante expor alguns apontamentos sobre as pesquisas

desses autores e também esclarecer que isso − mesmo tendo me orientado em Batanero,

Godino e Navarro-Pelayo (1994), pesquisadores que se orientam nos estudos de Piaget − não

19 Título original: La genese de l`idée de hasard chez l`enfant. Tradução: Ana Maria Coelho.

Page 52: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

51

significa que estou compartilhando das matrizes teóricas e metodológicas nas quais se

baseiam. Mesmo porque a perspectiva adotada para a escolha e para o desenvolvimento das

tarefas é que vai delinear minhas concepções teóricas e metodológicas.

Especificamente, quanto à combinatória e à probabilidade, Piaget e Inhelder (1951)

afirmam que os sujeitos que não possuem a capacidade de análise combinatória desenvolvem

apenas conceitos probabilísticos em situações restritas, como as laplacianas, em que se podem

enumerar diretamente as possibilidades do espaço amostral. Eles consideram que as operações

que ocorrem na análise combinatória não se refletem apenas na forma de interpretar os fatos,

mas nas hipóteses que são enunciadas verbalmente e podem ser aplicadas a dados físicos e

experimentais, o que possibilita que falsas hipóteses combinatórias sejam desconsideradas.

Para os referidos autores, os aspectos relacionados à combinação de fatores também

estão ligados à dissociação destes e à indução das leis, característica apresentada no período

lógico-formal20

, associada à formação de um espírito experimental. Segundo os autores, esses

aspectos eram negligenciados pela escola, mesmo sendo pontuada a relevância técnica e

científica na sociedade moderna. Eles consideravam que se métodos relacionados às

operações proposicionais fossem “treinados” nas escolas, as estruturas lógicas específicas

seriam desenvolvidas.

As pesquisas realizadas por Piaget e Inhelder (1951) provocaram muitos estudos na

área de Educação, como as de Vergnaud sobre os campos conceituais. A teoria desenvolvida

por Vergnaud (1990) é classificada como uma teoria psicológica do conhecimento que

permite identificar e analisar as ligações tanto dos conhecimentos conceituais como dos

saberes expressados. A teoria tem sido utilizada em pesquisas relacionadas aos campos

conceituais das estruturas aditivas e multiplicativas, da lógica e da álgebra.

Várias pesquisas desenvolvidas no Brasil, envolvendo a combinatória, são organizadas

a partir da teoria dos campos conceituais de Vergnaud, uma vez que os problemas de

combinatória, como apresentado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997),

fazem parte das estruturas multiplicativas. As investigações desenvolvidas pelo grupo de

estudos sobre raciocínio combinatório “Geração”21

, formado por pesquisadores e alunos da

20

Fase compreendida entre a pré-adolescência e a adolescência, faixa etária de 10 a 15 anos. 21

O Grupo de Estudos em Raciocínio Combinatório, o grupo “Geração” foi registrado em 2009 no Diretório de

Grupos de Pesquisa do CNPq pela Prof.a D.ra Rute Elizabete de Souza Rosa Borba, no Centro de Educação da

Universidade Federal de Pernambuco. Surgiu com o objetivo de desenvolver e divulgar estudos relativos ao

conhecimento de Combinatória. Mais informações estão disponíveis em:

<http://geracaoufpe.blogspot.com.br/p/historico.html>. Acesso em: 23 set. 2014.

Page 53: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

52

Universidade Federal de Recife, orientam-se nos campos conceituais apresentados por

Vergnaud.

Dentre os resultados apresentados pelo grupo destaca-se o avanço sobre a

compreensão dos problemas de combinatória e as representações simbólicas apresentadas por

professores e alunos de diferentes níveis de ensino, inclusive da Educação de Jovens e

Adultos, quando colocados em situações que possuam ensino adequado e intervenção de um

docente no decorrer do processo.

Fischbein (1975), considerando a combinatória importante para o ensino da

probabilidade, buscou em suas pesquisas analisar as reflexões de Piaget e Inhelder (1951)

sobre o desenvolvimento de conceitos sobre combinatória e probabilidade, talvez na tentativa

de validá-las ou não. O pesquisador investigou os efeitos produzidos pela instrução,

experimentos de ensino, no desenvolvimento e na capacidade de combinar de crianças com

idade entre 10 e 15 anos.

Os resultados de suas pesquisas conduziram Fischbein (1975) a discordar de Piaget e

Inhelder (1951) em alguns apontamentos, por exemplo, quanto ao tempo atribuído por esses

pesquisadores para a aquisição da aprendizagem da combinatória pelas crianças e para sua

aquisição por completo ao atingir o estágio do pensamento formal. Em suas pesquisas,

Fischbein (1975) constatou que a criança adquire gradativamente habilidades de análise

combinatória e que essa habilidade passa por etapas: combinações, arranjos e permutações.

De acordo com Fischbein (1975), a análise das possibilidades (ou a investigação de

possíveis casos) não pode ser reduzida a uma simples enumeração de elementos, mas deve ser

ampliada a uma investigação que “pressupõe um processo racional, construtivo, que, com

base na informação existente, cria o espaço amostral de todos os resultados possíveis”

(FISCHBEIN, 1975, p. 99, tradução minha)22

. Para o autor, tal análise, normalmente é

elaborada por meio de análise combinatória Isso significa que, “[ ] se o sujeito não possui

capacidade combinatória, o conceito de probabilidade só pode ser usado em caso muito

restrito, em que os possíveis resultados podem ser diretamente enumerados” (FISCHBEIN,

1975, p. 99, tradução minha)23

.

22“[…] presupposes a rational, constructive process which, on the basis of existing information, sets up a sample

space of all possible outcomes” 23“[ ] if the subject does not possess combinatory ability, the concept of probability can only be used in the very

restricted case where the possible outcomes can be directly enumerated”

Page 54: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

53

Segundo o autor, a partir da análise dos possíveis resultados, pode-se estabelecer a

probabilidade de determinados eventos com maior precisão. Além disso, Fischbein (1975)

ressalta a importância das intuições primárias nos processos cognitivos, uma vez que essas

intervêm diretamente nas atividades práticas e mentais dos sujeitos, e também a relevância da

instrução para a realização de generalizações interativas e construtivas das estruturas

combinatórias.

Minha pesquisa anterior (SANTOS, 2010) se aproxima das considerações de

Fischbein ao constatar que as escolhas didáticas são fundamentais para a apresentação e para

o desenvolvimento de conceitos probabilísticos. Também considero que há implicações do

raciocínio combinatório no pensamento probabilístico. No entanto, o modo como esse

raciocínio pode contribuir ao pensamento probabilístico é nosso objeto de investigação nesta

pesquisa.

Compreendo que o desenvolvimento do raciocínio combinatório dos alunos não seja

tarefa fácil para o professor, porque, conforme apontado por Fischbein (1975), ele se

desenvolve gradativamente. Dessa forma, entendo que obter um resultado satisfatório em

determinada tarefa não é garantia de que o raciocínio combinatório do aluno foi desenvolvido,

mas um indício de que o trabalho realizado está promovendo tal desenvolvimento. Além

disso, o professor não está alheio a esse processo de formação de conceitos. O fato de ter

desenvolvido estudos sobre combinatória em sua formação, não significa que seus conceitos

estejam em alto nível de generalização e/ou que se mantenham diante de diferentes contextos,

como as situações vivenciadas no processo de ensino e aprendizagem de seus alunos.

Conforme mencionado anteriormente, segundo Vygotsky (2001), o processo de formação de

conceitos não representa um percurso linear, limitado por idade cronológica ou maturação

biológica.

Diante do exposto, acredito que tanto professor como alunos, no contexto escolar,

estão envolvidos em um processo de desenvolvimento pessoal e coletivo, seja de maneira

ampla, enquanto sujeitos, seja em questões específicas do processo de ensino e de

aprendizagem escolar, como a construção de conceitos sobre combinatória e probabilidade.

Assim, não podemos pensar no processo de ensino e de aprendizagem da análise combinatória

e da probabilidade dissociado da forma como os conceitos são desenvolvidos na concepção de

Vygotsky.

Page 55: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

54

As reflexões aqui produzidas sinalizam as escolhas realizadas nesta pesquisa. O fato

de esta ter sido desenvolvida em uma sala de aula regular, com toda sua complexidade e a

constante produção e negociação de significados, evidencia a adequação da perspectiva

histórico-cultural. Nessa perspectiva não há neutralidade do pesquisador, que também aprende

e se transforma no processo.

Conhecer o que já foi produzido na área, em uma vertente piagetiana, possibilitou

pensar na natureza das tarefas a partir dos trabalhos de Batanero, Godino e Navarro-Pelayo

(1994). No entanto, os modos de desenvolvimento e sistematização dos conceitos de

combinatória e de probabilidade, pautados na negociação de significados, nas mediações e nas

interações, na intencionalidade pedagógica, são coerentes com a perspectiva histórico-

cultural. Nesse sentido, a presente pesquisa poderá trazer contribuições para o debate sobre o

ensino de probabilidade e combinatória ao se aproximar de outras perspectivas teóricas do

campo educacional e ser realizada em um contexto de sala de aula da escola pública, em que

os papéis de pesquisadora e professora coexistem.

Assim, a formação de conceitos sobre probabilidade é permeada por significações

diversas, de acordo com o contexto. Ações visando ao ensino e à aprendizagem se fazem

necessárias, como a articulação entre a combinatória e a probabilidade. Entendo que tal

articulação seja possível com um trabalho pautado em práticas problematizadoras em sala de

aula.

2.3 Articulações entre a combinatória e a probabilidade a partir de uma prática

problematizadora

Problemas relacionados à combinatória têm provocado o interesse dos homens de

diferentes culturas desde a Antiguidade. No entanto, a trajetória histórica dos métodos de

resolução de tais problemas apresenta certa lentidão, indicada pela dificuldade da temática.

De acordo com alguns estudos, o interesse pelos diferentes tipos de problemas combinatórios

foi se diversificando, ao longo do tempo, de modo a constituir outros aspectos e campos de

atividade mais definidos, ou seja, áreas destinadas à resolução de problemas de cunho prático

ou teórico (BATANERO; GODINO; NAVARRO-PELAYO, 1994).

A combinatória, como um instrumento de modelização da Matemática, tem ampla

aplicação tanto na própria disciplina de Matemática quanto em outras disciplinas escolares

como a Física, a Química, a Biologia e a Economia. Tais aplicações são desenvolvidas em

Page 56: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

55

situações práticas e problematizadoras, nas quais as pessoas, por meio de procedimentos

combinatórios, desenvolvem estratégias para sua resolução. Esse fato justifica a presença da

combinatória no currículo da Matemática.

No entanto, o que se observa no processo de ensino da Combinatória é o ensino de

regras e técnicas de contagem. Isso reflete a pouca articulação com contextos com os quais os

alunos possam estar inseridos.

Em conversas informais, obtive relatos de professores do ensino público do Estado de

São Paulo que indicam que o ensino de combinatória acontece de maneira um pouco tímida

nos anos iniciais do Ensino Fundamental por meio de situações-problema denominadas

problemas de contagem, relacionadas à forma de combinar roupas ou tipos de sorvete. Essa

informação aponta que o trabalho dos professores segue as orientações dos Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN) de Matemática (BRASIL, 1997), que apresentam, nos anos

iniciais do Ensino Fundamental, a combinatória no bloco de números e operações, uma vez

que é abordada como um princípio multiplicativo. Outras situações-problema, nomeadas de

contagem indireta, são inseridas nos anos finais do Ensino Fundamental, como as sugeridas

nos PCN de Matemática para essa etapa de ensino (BRASIL, 1998).

No Ensino Médio, um estudo mais sistematizado, previsto a partir da Proposta

Curricular do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2008), é introduzido no segundo ano.

Situações-problema envolvendo a análise combinatória − como permutações, arranjos e

combinações − são desenvolvidas, na maioria das vezes, por meio de fórmulas, visando a

auxiliar o ensino de probabilidade que acontece na sequência.

O exposto sugere que os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) propõem um

ensino fragmentado da combinatória. Não há a sistematização em seu ensino ao longo dos

anos de estudo na Educação Básica nem mesmo a articulação com outras disciplinas

escolares.

Quanto ao ensino e à aprendizagem de análise combinatória, Lopes e Coutinho (2009,

p 62) afirmam que precisa ser “superada a aplicação de fórmulas para permutações, arranjos

e combinações” As autoras destacam que, para que haja tal superação, é necessário um

trabalho com processos de resolução de problemas que envolvam o raciocínio combinatório.

O desenvolvimento de diversos tipos de registros e a explicitação de estratégias de resolução

também se fazem relevantes no desenvolvimento do raciocínio combinatório.

Page 57: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

56

Segundo as autoras, a combinatória deve possibilitar a aquisição de conhecimentos, de

forma a permitir a construção de relações entre pensamento estatístico, combinatório e

probabilístico. Dessa forma, os problemas de combinatória são importantes porque

possibilitam modelar situações, uma vez que por meio deles “[...] há várias possibilidades de

construção de agrupamentos, de caminhos, fornecendo um tipo específico de interpretação

quando se devem levar em conta os resultados possíveis para cada um desses agrupamentos

ou caminhos” (LOPES; COUTINHO, 2009, p 62)

O trabalho em sala de aula com problemas de combinatória é apontado por Lopes e

Coutinho (2009) como um fator importante para o desenvolvimento do raciocínio

combinatório. Isso porque possibilita diferentes agrupamentos e caminhos para sua resolução.

Considero relevante esse trabalho para o processo de ensino da combinatória. No

entanto, ressalto que o não conhecimento dos diferentes problemas de combinatória, atribuído

às características dos problemas e às possibilidades de resolução, pode produzir problemas no

processo de ensino e de aprendizagem dos alunos da Educação Básica, uma vez que o

desenvolvimento de determinado tipo de problema de combinatória, não garante que outro

tipo de problema seja desenvolvido com êxito pelos alunos.

Os diversos problemas em que a combinatória está inserida abordam características

peculiares que conduzem as pessoas a diferentes interpretações e resoluções, como os

apresentados por Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), que, visando a um caráter

organizacional para as unidades didáticas que envolvem o ensino da combinatória, elaboraram

sequências de tarefas a partir de critérios de classificação dos problemas de combinatória.

Mesmo com a estrutura dirigida e normativa, os autores afirmam que elas não foram

apresentadas com o objetivo de serem seguidas “ao pé da letra” e também não garantem que

tal situação apresente melhores resultados.

As características dos problemas que envolvem a análise de combinatória são

organizadas em cinco tópicos, sendo que esses apresentam diferentes atributos presentes em

problemas de combinatória que podem envolver variadas soluções e conceitos. Inicialmente,

apresento tais tópicos e, em seguida, uma descrição detalhada de cada um. São eles:

Tipo de problemas/solução:

- Existência;

- enumeração;

Page 58: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

57

- contagem;

- classificação;

- otimização;

- propriedade dos números combinatórios e manipulação algébrica.

Operações combinatórias:

- Simples;

- composta.

Modelo combinatório implícito no enunciado:

- Seleção;

- colocação;

- partição;

- ordenação;

Tipos de objetos que se combinam:

- Pessoas;

- números;

- letras;

- objetos ...

Tamanho e variabilidade dos parâmetros:

- Pequenos;

- grandes;

- não variáveis;

- variáveis.

Considero relevante o levantamento apresentado por Batanero, Godino e Navarro-

Pelayo (1994), uma vez que diferentes características estão presentes nas diversas situações

relacionadas à combinatória e podem conduzir os alunos, e mesmo professores, a ideias

equivocadas. Além disso, é importante que o professor explore esses variados traços nas

Page 59: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

58

tarefas que propõe a seus alunos. Tais características também estão presentes na sequência de

tarefas que organizei e foram desenvolvidas com os alunos nesta pesquisa.

De acordo com os referidos autores, para a apresentação dos conteúdos de

combinatória é importante expor classificação e descrições dos principais tipos de problemas.

Eles destacam que diferentes classificações são indicadas por distintos autores

(PREPARATA; YEH, 1973; RÍBNIKOV,1988; KAUFMANN, 1971 apud BATANERO;

GODINO; NAVARRO-PELAYO, 1994), as que se diferenciam são os problemas de

existência, enumeração, reconto, classificação e otimização.

Os problemas de existência são aqueles que tentam provar ou não a existência de um

determinado tipo de estrutura discreta. De certo modo, esse tipo de problema busca verificar

as possibilidades de agrupamentos a partir de determinados conjuntos de elementos, podendo

ser ordenados ou não e possuir ou não repetição.

Alguns exemplos deste tipo de problemas são:

O problema dos matrimônios

- Adela conhece Andrés, Benito e Carlos.

- Beatriz conhece Benito e Carlos.

- Carmen conhece Carlos, Estevan e German.

- Daniela conhece Andrés e Benito.

- Elisa conhece Andrés, Benito e Carlos.

- Felisa conhece David, Estevan e Francisco.

Represente essa situação por meio de um diagrama.

É possível buscar um marido para cada garota entre os garotos que

conhecem? (BATANERO; GODINO; NAVARRO-PELAYO, 1994, p. 135,

tradução minha24

).

Com as letras A, B, C, D, E, F e G quantos anagramas de quatro letras

distintas podem ser formados? Desses, quantos terminam por vogal?

(JULIANELLI; DASSIE; LIMA, 2009, p. 35).

Os problemas de enumeração são aqueles cujo objetivo é enumerar ou fazer uma lista

de elementos que possuem determinada propriedade. Para resolver problemas desse tipo,

24

El problema de los matrimonios

- Adela conoce Andrés, Benito y Carlos.

- Beatriz conoce a Benito y a Carlos.

- Carmen conoce a Carlos, Estevan y German.

- Daniela conoce a Andrés y Benito.

- Elisa conoce a Andrés, Benito y Carlos.

- Felisa conoce a David, Estevan y Francisco.

Represente mediante un diagrama esta situación.

¿Es posible buscar un marido para cada chica entre los chicos que conocen?

Page 60: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

59

algumas vezes é necessário apresentar todas as possibilidades, outras não, podendo utilizar

algoritmos para determinar o número de elementos.

São exemplos destes tipo de problemas:

Uma escola quer organizar um torneio esportivo com 10 equipes de forma

que cada equipe jogue exatamente uma vez com cada uma das outras.

Quantos jogos terá o torneio? (JULIANELLI; DASSIE; LIMA, 2009, p. 51)

Escreva todas as somas de números naturais que resultam em 7. (BIGODE,

2012, p. 40).

Segundo Batanero, Godino, Navarro-Pelayo (1994), os problemas de contagem são

aqueles que determinam o número de elementos de um conjunto finito que possui uma

propriedade ou uma coleção. Todos os exemplos anteriores se caracterizam como problemas

de contagem e o seguinte também : “O que é mais fácil ao lançar dois dados, obter dois

números iguais ou dois números diferentes?” (BATANERO; GODINO; NAVARRO-

PELAYO, 1994, p. 137; tradução minha25

).

De acordo com os referidos autores, os problemas de classificação se traduzem na

busca de um número contido em tais subconjuntos que definem a classificação. Por exemplo:

Na garagem de Alicia há cinco vagas. Como a casa é nova, até agora só tem

dois carros, o de Alícia e o de Benito, que podem colocar toda noite, cada

carro no lugar que preferirem, se não estiver ocupado. Este é um esquema da

garagem:

1 2 3 4 5

Você seria capaz de fazer uma tabela ou um diagrama para representar todas

as formas diferentes em que Alícia e Benito podem estacionar seu carro? (Os

dois estacionam seu carro na garagem todas as noites) (BATANERO;

GODINO; NAVARRO-PELAYO, 1994, p. 143, tradução minha26

).

Problemas como o último são apresentados nos livros didáticos. Normalmente podem

ser resolvidos utilizando o princípio multiplicativo e são separados em dois grupos, aqueles

25

¿Qué es más fácil al lanzar dos dados, obtener dos números iguales o dos números distintos? 26

El garaje de Alicia tiene 5 plazas. Como la casa es nueva, hasta ahora solo hay 2 coches, el de Alicia y el de

Benito, que pueden colocar cada noche el coche en el lugar que prefieran, si no está ocupado. Este es un

esquema de la cochera:

1 2 3 4 5

Como puedes ver, las plazas están numeradas.

¿Serías capaz de hacer una tabla o diagrama para representar todas las formas diferentes en que Alicia y Benito

pueden aparcar su coche? (Los dos aparcan su coche en la cochera todas las noches)

Page 61: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

60

que se alteram quando mudam a ordem de seus elementos e aqueles que não se alteram

quando a ordem dos elementos é modificada.

Os problemas de otimização se apresentam em ocasiões em que se pode atribuir valor

total ao conjunto de soluções e determinar um conjunto de ordem de todos os elementos. De

acordo com o resultado dessas ações, é possível estabelecer um grupo de valores de máximo e

mínimo. O problema da garagem de Alícia e Benito é um exemplo deste tipo de problema.

Segundo Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), há problemas cujas

características envolvem propriedade dos números combinatórios e manipulação algébrica,

uma vez que estabelecem conceitos básicos da teoria dos conjuntos, das relações de ordem, de

equivalência, de estruturas algébricas elementares, etc. Um exemplo deste tipo de problema

seria: De quantas formas diferentes posso colocar três bolas iguais em três caixas iguais?

O número de operações também conduz os problemas de combinatória a serem

classificados em simples e compostos. Os problemas simples são aqueles que envolvem

diretamente um método de contagem e propõem quatro modelizações diferentes entre si:

Seleção, que consiste na seleção de uma amostra a partir de um conjunto de

objetos;

Colocação, na qual objetos são inseridos em caixinhas (caixa, células,

urnas);

Partição, situação em que são criados subconjuntos a partir de um conjunto

de objetos;

Decomposição, contexto em que um número natural é decomposto visando

a uma soma.

Problemas com tais características são desenvolvidos no cotidiano escolar; no entanto,

outros aspectos lhes são acrescentados se os elementos ou subconjuntos estão ordenados ou

não, se são distintos ou não, etc. Para alguns desses problemas, os algoritmos básicos para a

resolução são soma, produto e quociente.

Os problemas que envolvem uma complexidade de situações combinatórias são

classificados como compostos. As técnicas para sua resolução são diversificadas e podem

envolver funções geradoras, procedimentos lógicos, grafos, diagrama de árvore, matrizes,

probabilidades etc.

Page 62: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

61

Problemas deste tipo são desenvolvidos com mais ênfase no Ensino Médio. Todavia,

alguns problemas desenvolvidos no Ensino Fundamental possuem complexidade em sua

resolução, mas podem ser resolvidos por técnicas não tão complexas, como tabelas.

Um exemplo desse tipo de situação seria: “Escreva todas as possibilidades de um jogo

de par ou ímpar entre dois colegas. Cada jogador só pode usar os dedos de uma das mãos”.

Ao trabalhar com alunos do 7º ano do Ensino Fundamental, observei que esse problema

“mostrou-se como um rico contexto para a mobilização e o desenvolvimento do pensamento

probabilístico, pois a interação entre os alunos, os grupos e a professora foi fundamental para

a avaliação dos raciocínios e para a obtenção do resultado” (SANTOS, 2010, p 68).

Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994) acrescentam que os problemas de

combinatória também podem ser classificados pelo tipo de objetos que combinam − pessoas,

números, letras, objetos, etc − e pelo tamanho dos parâmetros e das características − pequenos

e grandes, variáveis e não variáveis.

Ressalto que os autores não classificam os problemas em Arranjo, Permutação ou

Combinação. Mas seus conceitos estão presentes nos diferentes tipos de problemas

apresentados.

Diante de tantas características pergunto: quais as implicações desses conhecimentos

da resolução de problemas combinatórios para esta pesquisa? Considero a apresentação das

diferentes características presentes nos problemas de combinatória importantes para o

trabalho do professor na organização de tarefas com o objetivo de desenvolver o raciocínio

combinatório e o pensamento probabilístico. Isso porque, como mencionado anteriormente,

eles se apresentam de diferentes formas em diferentes contextos e possuem determinadas

particularidades, podendo conduzir professor e alunos a distintos conceitos. Concordo com

esses autores quando afirmam que a apresentação de certa organização não é garantia de

resultados satisfatórios, mesmo porque acredito que há vários fatores que influenciam o

desenvolvimento do raciocínio combinatório, como a motivação do aluno, o papel do

professor no desenvolvimento das tarefas, a dinâmica de desenvolvimento das tarefas, a

intencionalidade do professor, entre outras coisas.

O início do trabalho com a combinatória é indicado por Celi Lopes (2003) desde a

Educação Infantil por meio de problematizações. Tal apontamento foi evidenciado por Souza

(2014), que afirma que há possibilidades de trabalho com ideias matemáticas na Educação

Infantil, inclusive com a combinatória.

Page 63: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

62

Embora ainda existam dúvidas por parte dos professores sobre o trabalho com a

resolução de problemas, tanto no desenvolvimento de conceitos sobre combinatória e

probabilidade quanto em outros conceitos matemáticos, compreendo-a como um processo

desencadeado a partir de

[...] uma situação desafiadora que não apresenta uma solução imediata e

única; uma situação de hesitação e impasse que necessita de conhecimentos

diversos – matemáticos ou não – e o estabelecimento, por parte do aluno, de

relações entre eles, além de reflexões e investigações, constituindo-se em um

movimento de criação de processos próprios de resolução, podendo o aluno,

nesse movimento, ampliar seus conhecimentos e criar novos conceitos.

(GRANDO; MARCO, 2007, p. 100).

Christiansen e Walther (1986) apresentam algumas considerações sobre problemas e

exercícios observadas no contexto escolar. Segundo os autores, as situações em que já há uma

solução prevista são chamadas de exercícios e aquelas cujos procedimentos são

desconhecidos, de problemas.

Segundo os autores, as tarefas rotineiras podem ser classificadas como exercícios de

reconhecimento, de algoritmos e de aplicação. Já tarefas não rotineiras são as que envolvem

problemas de processo, pesquisa aberta e situações-problema.

De maneira geral, Christiansen e Walther (1986) consideram as tarefas rotineiras como

as que estão presentes no cotidiano escolar, que normalmente fazem parte da cultura das aulas

de Matemática, que precedem uma situação que será apresentada, que envolvem treino de

determinadas técnicas algorítmicas; além de serem aquelas em que os alunos já identificam

ideias de resolução. Eles apresentam as tarefas não rotineiras como aquelas que contribuem

para o desenvolvimento de conhecimento genuíno, que diferem do treino e das práticas

isoladas e que promovem motivos pessoais para o seu desenvolvimento.

Tais autores colocam que o papel pedagógico das tarefas, seja um exercício ou um

problema, deve estar em função do processo de ensino e aprendizagem na perspectiva dos

alunos − levando em conta suas necessidades, seu interesse e seu desempenho − e também na

perspectiva de interação entre tarefa, professor e alunos. Consideram também que o papel do

professor no trabalho pedagógico é extremamente complexo, uma vez que envolve conceitos

e interpretações sobre os componentes e suas relações: professor - alunos - objetivos

matemáticos -conteúdos/currículo - tarefas.

Page 64: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

63

Christiansen e Walther (1986) colocam que as potencialidades das tarefas não

rotineiras propiciam condições favoráveis para o desenvolvimento cognitivo, pois novos

conhecimentos são construídos pelos alunos, e outros já adquiridos são consolidados e

alargados. No entanto, defendem que um conjunto de tarefas não rotineiras não é uma

garantia para o desenvolvimento de potencialidades educacionais, alguns fatores, como as

fases de interação entre professor e alunos, devem estar presentes na realização das tarefas

organizadas e/ou desenvolvidas pelo docente.

As características dos problemas e exercícios apresentadas por Christiansen e Walther

(1986) são importantes para pensar no processo de ensino e de aprendizagem da Matemática.

Acredito que, para o desenvolvimento de conceitos científicos dos alunos, os problemas não

rotineiros são potenciais porque possibilitam que novos conhecimentos sejam construídos e

outros sejam (re)significados.

Creio que as considerações de Christiansen e Walther (1986), quanto aos problemas

não rotineiros, estejam imbricadas com as 18 tarefas organizadas para esta pesquisa, assim

como as fases de interação proposta pelos autores. Estas são indicadas pelos autores como um

novo padrão de trabalho em sala de aula. Ele envolve três fases: apresentação, atividade

independente e reflexão conclusiva.

A fase de apresentação tem como objetivo expor como a tarefa é constituída, qual a

dinâmica em que será desenvolvida. Este momento é visto por Christiansen e Walther (1986)

como uma atividade do professor que deve almejar a constituição da tarefa para cada aluno. O

uso tradicional de exemplos introdutórios sobre o trabalho do aluno deve ser evitado, o foco

deve estar no despertar do desejo do aluno em desenvolver a tarefa, na motivação. O motivo

do professor precisa também ser o do aluno.

A fase de atividade independente não significa necessariamente que a tarefa será

desenvolvida individualmente, pois diferentes agrupamentos podem ser realizados. Neste

estágio o trabalho será realizado em uma esfera menor com o objetivo de manter um fluxo

apropriado para a aprendizagem individual.

A fase de reflexão conclusiva é o momento de sintetizar os conceitos, de promover

uma reflexão coletiva. É indispensável para verificar o uso comum de linguagem e símbolos,

a negociação de significados, o grau de aprendizagem partilhada e a negociação de papéis e

potencialidades da tarefa desenvolvida (CHRISTIANSEN; WALTHER, 1986). Esta fase

possibilita observar as dimensões pessoais e sociais da aprendizagem.

Page 65: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

64

Entendo que, ao adotar essa dinâmica no trabalho em sala de aula, professor e alunos

estão inseridos em um processo de aprendizagem que visa não apenas à aquisição de

conhecimento, mas à mudança, à reorganização e ao enriquecimento dos envolvidos. Nessa

perspectiva, a mediação do processo de ensino e de aprendizagem envolve uma prática

problematizadora que se apoia no desenvolvimento e no uso de estratégias cognitivas,

constituída em um jogo de confronto entre sentidos produzidos na enunciação.

Conforme mencionado, neste contexto, a ação pedagógica do professor é fundamental,

pois é por meio de sua intencionalidade que o trabalho em sala de aula é orientado. Esse

trabalho, de acordo com Fontana (2005), envolve: conhecimento do conceito,

problematização, elaboração, sistematização do conceito e problematização da sistematização.

Segundo a autora, mais que um passo a passo, ao assumir essa dinâmica de interação em sala

de aula, o professor deve pensar nesta como um lugar de viabilizar o espaço do outro e a

circulação dos dizeres, dos questionamentos, das sistematizações e dos redimensionamentos.

Fontana (1993) defende que o professor, no ato de ensinar, também aprende, pois está

exposto aos efeitos dos sentidos emergentes, dos dizeres em circulação. Porém, ressalta que

“essa tecitura só é possível se o professor conhecer, se ele elaborar conceitos, explicitando a

multiplicidade de vozes e sentidos configurados” (FONTANA, 1993, p. 149).

De forma semelhante, Smolka (2010) coloca que o gesto de ensinar é algo complexo,

que condensa muitos gestos, como o de apontar a pergunta “o que, por que e para onde?”

Segundo Gómez-Granell (2002), ao propor situações que permitam o levantamento de

questões, a pesquisa, a discussão, a exploração e a especulação, a problematização pode ser

considerada como um instrumento de contextualização.

Avalio a proposta de trabalho em sala de aula envolvendo diferentes momentos −

apresentação da tarefa, atividade independente e reflexão conclusiva −, em uma prática

problematizadora, na qual a tarefa não é compreendida apenas como uma situação a resolver,

mas como desencadeadora de conceitos articulados em diferentes contextos. Desse modo,

constitui-se uma prática adequada para o desenvolvimento do raciocínio combinatório e do

pensamento probabilístico, uma vez que esse ambiente de aprendizagem favorece uma cultura

de aula de Matemática baseada na negociação e na construção de ideias compartilhadas.

É fato que há intersecção entre o raciocínio combinatório e o pensamento

probabilístico; contudo, diante do apresentado neste capítulo, acredito que, para que haja a

construção de sentindo nessa intersecção, é preciso que esses raciocínios sejam articulados.

Page 66: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

65

Penso que essa articulação é estabelecida a partir de um trabalho que promova a mediação

entre conceitos cotidianos e conceitos científicos. Para que essa mediação aconteça, a

linguagem, a sequência de tarefas e o ambiente de aprendizagem também precisam estar

imbricados com essa articulação, conforme apresentado no esquema abaixo.

Esquema 1 − Articulação entre raciocínio combinatório e pensamento probabilístico

Fonte: Elaboração da pesquisadora.

Esse esquema apresenta os componentes mediadores necessários para a articulação do

raciocínio combinatório e do pensamento probabilístico: tarefas envolvendo diferentes

problemas de combinatória e probabilidade, linguagem como mediadora do processo de

abstração e generalização e ambiente de aprendizagem desenvolvido na interação dialógica

entre professor e alunos.

Porém, para que haja a produção de significações sobre a combinatória e a

probabilidade, é preciso que exista movimento entre os conceitos espontâneos e os científicos,

presentes no ideário dos envolvidos no processo. Compreendo que, de acordo com a

perspectiva vygotskyana, há uma interdependência entre os conceitos espontâneos e os

científicos. É papel da escola a formação dos conceitos científicos, visto que os cotidianos são

adquiridos “em situações informais de aprendizagem O fato de que esses conceitos se

formam na experiência, logo, no contato direto com o mundo, explica que eles têm um nível

de abstração pouco elevado” (FRIEDRICH, 2012, p 99). Isso pode ser identificado em

relação ao conceito de probabilidade. O uso de termos do vocabulário probabilístico nas

Page 67: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

66

experiências cotidianas dos alunos faz com que eles tenham ideias pouco formalizadas de

conceitos de aleatoriedade; assim, cabe à escola promover esse desenvolvimento conceitual.

Se, por um lado, os conceitos científicos são desenvolvidos na escola; por outro, os

conceitos espontâneos vão produzir sentidos iniciais aos científicos. Estes vão se

desenvolvendo em relação com outros conceitos.

Vigotski mostra que um conceito científico tem uma relação tanto com os

objetos do mundo, quanto com os outros conceitos. Isso significa duas

coisas: 1) os conceitos científicos sempre se apoiam nos conceitos

cotidianos, não podendo existir sem eles e 2) um conceito científico existe

sempre no interior de um sistema de conceitos. (FRIEDRICH, 2012, p. 100).

Em alguns casos, há que se promover rupturas com os conceitos espontâneos de

probabilidade e combinatória para que o estudante se aproprie dos conceitos científicos. Estes,

por sua vez, ressignificam os conceitos espontâneos e consequentemente vão se elevando de

acordo com os níveis de generalização. Essa conjectura sugere o seguinte esquema:

Esquema 2 – Movimento entre raciocínio combinatório e pensamento probabilístico

Fonte: Elaboração da pesquisadora.

Page 68: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

67

Assim, considero, conforme o esquema apresentado, que a construção de conceitos

sobre combinatória e probabilidade pressupõe um sistema que parte do conhecimento das

relações entre a combinatória e a probabilidade, da mobilização e do desenvolvimento de

conceitos espontâneos e científicos, articulados por componentes mediadores – linguagem,

tarefa e ambiente de aprendizagem – em um trabalho pedagógico com uma perspectiva

problematizadora. Dessa forma, em um movimento espiral, os conceitos sobre combinatória e

probabilidade vão adquirindo novos níveis de generalizações.

Nesse contexto, o professor tem um papel estratégico e, por consequência, duplo : o de

articulador de conceitos com os alunos e o de organizador de todo o esquema. Dessa forma, o

conjunto de suas ações precisa estar pautado em sua intencionalidade. Ou seja, o professor, ao

organizar todo o trabalho, precisa ter ideia de “onde” e “como” vai atingir seus objetivos e

também dos indicadores de desenvolvimento do processo de ensino e de aprendizagem, como

a fase de reflexão conclusiva, proposta por Christiansen e Walter (1986).

Nesse esquema, conforme mencionado, o professor também tem seus conceitos sobre

o processo de ensino de combinatória e probabilidade. Se mobilizados, eles possibilitam que

novos níveis de generalização sejam construídos nesse movimento.

No próximo capítulo, apresento a descrição dos procedimentos metodológicos desta

pesquisa. Esses desencadearam minhas conclusões para o desenvolvimento do esquema de

movimento entre raciocínio combinatório e pensamento probabilístico.

Page 69: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

68

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: DESCREVENDO O OBJETO DE

INVESTIGAÇÃO

Neste capítulo apresento o percurso metodológico da pesquisa. Para tal, descrevo os

procedimentos utilizados, o contexto e as ações desenvolvidas, visando a responder à questão

de investigação − “O que se evidencia sobre o desenvolvimento do pensamento probabilístico

com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental quando ele se articula ao desenvolvimento do

raciocínio combinatório por meio de um trabalho pedagógico na perspectiva da

problematização?” Busco, ainda, atingir os objetivos propostos:

Identificar as ideias sobre combinatória que emergem do processo de

comunicação oral e escrita, tendo como contexto a problematização em sala

de aula;

identificar quais tarefas são potencializadoras para o raciocínio

combinatório;

buscar indícios da contribuição de um estudo da combinatória articulado ao

desenvolvimento do pensamento probabilístico.

3.1 O foco de investigação

Este estudo teve como foco central a interação entre o raciocínio combinatório e o

pensamento probabilístico de alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. Insere-se no campo

da prática pedagógica em Educação Matemática, que considera a sala de aula do professor

pesquisador como um espaço de investigação. Ele foi desenvolvido a partir da pesquisa de

mestrado realizada no programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Educação, na

Universidade São Francisco, concluída em 2010 e intitulada O movimento do pensamento

probabilístico mediado pelo processo de comunicação com alunos do 7º ano do Ensino

Fundamental.

Na pesquisa de mestrado, algumas observações relacionadas à probabilidade e à

combinatória me deixaram inquieta, como os equívocos de interpretação de espaço amostral

apresentados por diversos alunos ao estimarem a probabilidade em diferentes situações, o

modo organizado de um aluno escrever as possibilidades e a frequência com a qual ele

determinava a probabilidade dos eventos apresentados de maneira formal. Considerei que esse

Page 70: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

69

fator poderia ser um indicativo sobre a importância da organização dos dados na definição do

espaço amostral. Essa necessidade foi reforçada quando constatei que boa parte dos alunos

indicava os termos possibilidade e probabilidade como sinônimos, o que me preocupa, pois

determinar as possibilidades em certa situação não é o mesmo que determinar as

Probabilidades.

Conforme mencionado, a pesquisa de doutorado se iniciou na sequência do mestrado,

no segundo semestre de 2010. Durante o primeiro semestre do doutorado, todos os dados da

pesquisa foram produzidos, pois as classes do 6º ano em que ministrava aulas eram propícias

à investigação; eu acreditava que esses alunos haviam vivenciado poucas experiências sobre

combinatória e Probabilidade em contexto escolar. Tal situação era favorável à pesquisa

relacionada à probabilidade, pois, como apontado por Shaughnessy (1992), as concepções

equivocadas sobre estocástica são difíceis de serem mudadas ou superadas pelos estudantes.

Visando responder ao problema e aos objetivos de pesquisa, parti das considerações

dos três aspectos, ou dimensões, considerados por Batanero, Godino, e Navarro-Pelayo

(1994) fundamentais para o ensino da Matemática: a linguagem simbólica, o sistema

conceitual e a atividade de resolução de problemas, conforme discutido no capítulo anterior.

Para tanto, desenvolvi um ambiente de aprendizagem composto por mim, professora-

pesquisadora, e uma turma de 28 alunos do 6º ano do Ensino Fundamental, constituída por

sujeitos únicos, com conceitos diferenciados e expectativas particulares, envolvidos em um

contexto ora como autores/atores principais, ora como secundários. Os dados relacionados aos

sujeitos serão descritos no decorrer do capítulo.

Diante de tais considerações e a partir das situações didáticas apresentadas por

Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), organizei uma sequência de tarefas que

possibilitavam a discussão da linguagem probabilística, o desenvolvimento de conceitos de

combinatória e probabilidade e o contato com jogos e problemas envolvendo a combinatória e

a probabilidade. Para o desenvolvimento das tarefas e da pesquisa, procedimentos

metodológicos permearam a investigação.

3.2 As opções metodológicas

As características da pesquisa qualitativa são abordadas na Educação por diversos

autores, como: Bogdan e Biklen (1994), Goldenberg (1997) e Lüdke e André (1986). Dentre

Page 71: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

70

essas abordagens, destaco a apresentada por Lüdke e André (1986, p.13): “A pesquisa

qualitativa ou naturalista envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto

do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se

preocupa em retratar a perspectiva dos participantes”.

Goldenberg (1997, p.19) esclarece que na pesquisa qualitativa os pesquisadores

“buscam compreender os valores, crenças, motivações e sentimentos humanos, compreensão

que só pode ocorrer se a ação é colocada dentro de um contexto de significado” Além disso, a

autora complementa que o seu resultado não pode ser “fruto da observação pura e simples,

mas de um diálogo e de uma negociação de pontos de vista, do pesquisador e pesquisados”

(GOLDENBERG, 1997, p. 24).

De forma semelhante, D‟Ambrósio e D‟Ambrósio (2006, p. 78), pesquisadores na área

da Educação Matemática, destacam que nas últimas décadas a pesquisa qualitativa tem sido

considerada a mais adequada para a Educação, uma vez que “tem como foco entender e

interpretar dados e discursos mesmo quando envolve grupos de participantes” e depende da

relação observador-observado. O desenvolvimento da investigação em que o professor

também assume o papel de pesquisador é visto pelos referidos autores como uma ação que

resulta em aprendizagem, pois esse tipo de pesquisa pode “gerar nova compreensão sobre a

matemática de seus alunos, sobre a realidade de sua sala de aula, sobre sua prática

pedagógica, sobre a qualidade de seu currículo, sobre a matemática em si, ou sobre a

aprendizagem matemática” (D‟AMBRÓSIO; D‟AMBRÓSIO, 2006, p 83)

Tais características são compartilhadas e explicitadas na perspectiva histórico-cultural.

Os autores que assumem esse ponto de vista defendem que as interações sociais e a linguagem

são determinantes para a aprendizagem, para o desenvolvimento humano. Segundo Vygotsky

(1991), a tarefa de pesquisa deve estudar o fenômeno em um processo vivo, em sua

historicidade. A partir dessa concepção, professor e alunos se envolvem em um sistema

dialógico de significações sociais, uma vez que “pela mediação do outro, revestida de gestos,

atos e palavras, a criança vai se apropriando (das) e elaborando as formas de atividade prática

e mental consolidadas (e emergentes) de sua cultura, num processo em que pensamento e

linguagem articulam-se dinamicamente” (FONTANA, 1993, p. 122). Para Freitas (2010, p.

13), “fazer pesquisa qualitativa na perspectiva histórico-cultural consiste não apenas em

descrever a realidade mas também em explicá-la realizando um movimento de intervenção

nessa mesma realidade”

Page 72: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

71

De acordo com essa compreensão, professores e alunos se constituem como sujeitos

em interação que participam e se desenvolvem com a pesquisa. Dessa forma, a mediação do

pesquisador e as ações dos pesquisados provocam significações para ambos.

A análise de tais significações, parte dos dados produzidos na investigação. Lüdke e

André (1986) recomendam o uso de estratégias adequadas de produção de dados para a

pesquisa qualitativa, como: 1) a delimitação progressiva do foco de estudo; 2) a formulação

de questões analíticas; 3) o aprofundamento da revisão de literatura; 4) a testagem de ideias

com os sujeitos; e 5) o uso de comentários, observações e especulações ao longo da coleta.

Os dados desta pesquisa foram coletados na sala de aula, no ambiente em que eu e

meus alunos, pesquisadora e sujeitos de pesquisa, compartilhamos de modo regular durante o

ano letivo. No entanto, para a pesquisa, houve um recorte espaço-temporal de

aproximadamente um mês, sem que acontecimentos vivenciados em nossa rotina escolar

fossem anulados, uma vez que esses fatos são preponderantes para a investigação.

A pesquisa foi realizada especificamente no mês de novembro, final de semestre,

porque, como ingressei no doutorado no segundo semestre, precisei de certo tempo de estudo

e pesquisa para a elaboração da sequência de tarefas. Além disso, Estatística era o tema de

estudo do 4º bimestre do Currículo do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2011); dessa

forma, o trabalho com a combinatória e a probabilidade estaria em concordância com a

Proposta Curricular.

A equipe gestora da instituição de ensino em que a pesquisa foi realizada tinha ciência

da pesquisa e de seus procedimentos de coleta de dados e, desde o início, não colocou

empecilhos para sua realização nas aulas de Matemática. Pelo contrário, apoiou-a, uma vez

que eu já havia desenvolvido trabalho semelhante na pesquisa de mestrado e observaram que

os alunos não foram prejudicados, mas beneficiados por estar envolvidos em uma dinâmica de

ensino em que a comunicação e o desenvolvimento de ideias matemáticas eram privilegiados.

Parto do pressuposto de que um estudo articulado entre a combinatória e a

probabilidade promove o desenvolvimento do pensamento probabilístico com significação

aos alunos do Ensino Fundamental. Compreendo que essa proposição possa ser adquirida em

contexto de sala de aula com tarefas envolvendo a problematização e as estratégias adequadas

de produção de dados. Assim, os dados desta pesquisa foram produzidos a partir dos

seguintes instrumentos:

Page 73: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

72

Registros escritos dos grupos de alunos em folha impressa fornecida

pela professora, realizados durante as atividades;

registros em áudio e vídeo de alguns grupos durante o desenvolvimento

das tarefas pelas duplas;

registros em vídeo da classe durante a socialização das tarefas;

registros escritos pela professora-pesquisadora no Diário de Campo.

Para facilitar a compreensão dos dados produzidos e dos instrumentos de produção

utilizados, usei alguns recursos visuais para representá-los, os quais apresento no Quadro 3:

Quadro 3 – Instrumentos de produção dos dados

INSTRUMENTOS MODOS DE REPRESENTAÇÃO

Registro escrito

Diário de campo

Fragmentos de registro em vídeo

Fragmentos de registro em áudio

Fonte: Elaboração da pesquisadora.

Os dados foram coletados em uma instituição de ensino que possui características

peculiares, determinadas pela comunidade em que está inserida e pela comunidade escolar, as

quais considero importante apresentar.

Page 74: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

73

3.3 A escola, a comunidade e a comunidade escolar

A escola, instituição de ensino, na qual a pesquisa foi realizada é de ensino regular e é

constituída por 8 classes de Ensino Médio no período noturno e 18 classes de Ensino

Fundamental II no período diurno, sendo as turmas do 8º e 9º anos no período da manhã e as

de 5º e 6º anos no da tarde. É a única que atende esses níveis de ensino no bairro, que possui

aproximadamente 20 mil habitantes − o maior bairro da cidade de Amparo/SP, considerado o

bairro dos trabalhadores. Possui espaço físico adequado para sua demanda, como salas de aula

e quadra esportiva, porém outros ambientes específicos de aprendizagem, como laboratórios,

sala de vídeo e biblioteca, são improvisados e possuem uso limitado aos professores para

retirada de materiais.

Ela foi marcada nas últimas duas décadas pelas transformações ocorridas na sociedade

brasileira, principalmente no que diz respeito ao aumento de renda da população. Dito isso,

poderia ser classificada como uma instituição de ensino de periferia que oferta mão de obra

pouco qualificada para as empresas do entorno ou para o setor de serviços da cidade. A cidade

de Amparo cresce a olhos vistos, principalmente na região onde se localiza a escola – Jardim

São Dimas –, e isso tem criado na população um sentimento de progresso; a vida universitária

é uma realidade para os alunos que terminam o Ensino Médio, pois quase todos prestam o

Enem e entram nas faculdades particulares; todavia, as públicas ainda estão muito distantes.

Cotidianamente tem-se a impressão de que a escola compete com outras instituições

educativas ou projetos que se concretizam na vida dos alunos em período contrário ao das

aulas regulares, exemplos: Guarda Mirim27

, Senai28

e Formare29

. Essas outras “instituições”

ou já são parte da vida dos alunos ou estão no horizonte deles e de suas famílias. Nesse

aspecto, a escola, muitas vezes fica em segundo plano, já que não garante de imediato renda

ou possibilidade concreta do emprego.

Diante disso, a comunidade escolar tem cada vez mais se colocado diante dessas

questões e pensado em formas de dialogar com as instituições. Até aqui não tem tido muito

sucesso, o motivo talvez seja o fato de que cada uma delas dialoga com um contexto

específico da vida do aluno, e a instituição escolar pensa no aluno como futuro cidadão do

27

Instituição pública que capacita e emprega adolescentes, denominados “guardinhas” 28

Instituição que oferece cursos técnicos para jovens em diversas áreas tecnológicas do ramo industrial. 29

Projeto institucional que visa desenvolver a potencialidade de jovens de famílias em situação de

vulnerabilidade social, possibilitando sua inserção no mundo do trabalho. Informação disponível em:

<http://formare.org.br/formare/o-que-e-o-formare/proposta-pedagogica>. Acesso em: 25 jan. 2015.

Page 75: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

74

mundo, não se prendendo à carteira de trabalho, ao emprego, pois isso não é mais problema

para os alunos ou para seus familiares, já que há opções de trabalho na região. Atualmente, a

comunidade escolar tem se preocupado em criar estratégias para que os alunos ampliem seus

horizontes, sobretudo no que diz respeito à escolha de profissões não convencionais para seu

contexto.

Noto que a instituição escolar ainda busca sua identidade ou tem problemas com isso,

pois ainda se coloca em comparação com as outras escolas da cidade. O professor vive um

conflito com relação a seu papel, porque, de um lado, a comunidade ou a sociedade o

delimitam, por outro, a academia, as políticas públicas e a sociedade organizada todos os dias

apresentam uma novidade para ele. Quanto à formação docente, esta também se vê às voltas

com a quebra de paradigmas e a construção de novos. O professor, em sala, precisa lidar com

as dificuldades teóricas e práticas e com suas expectativas de trabalho, que quase sempre se

chocam com as dos pais e de todos que "pensam" a educação, como os demais funcionários

da escola, os quais muitas vezes agem como juízes dos professores e não se dão conta de seu

envolvimento na escolarização, parece que a problemática do ensino não lhes diz respeito.

No entanto, nesse contexto em que diferentes representações se confrontam e se

constroem há um ambiente de ensino. Mesmo com diferentes expectativas, professores e

alunos se envolvem nele buscando o desenvolvimento individual e social.

3.3.1 A sala de aula e os alunos

Eu, professora-pesquisadora, ministrei aulas de Matemática de 2003 a 201430

nessa

escola em turmas do Ensino Fundamental e Médio. O grande desafio eram os 6ºs anos, pois

normalmente são formados por 4 ou 5 turmas com cerca de 35 alunos cada, sendo que a

maioria deles vem de duas escolas municipais que há no bairro, e alguns de outros estados

brasileiros, já que o bairro é próximo de grandes empresas e emprega muitas pessoas. Muitos

alunos, e até mesmo pais, chegam à escola assustados, pois a realidade é bastante diferente

das escolas municipais, que recebem apenas alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental

e têm demanda menor. Esses alunos apresentam realidades muito distintas tanto de poder

aquisitivo como de aprendizagem escolar.

30

Deixei de ministrar aulas nessa escola ao ser aprovada em um concurso para professora na Universidade

Federal de Campina Grande e assumir o cargo em fevereiro de 2015.

Page 76: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

75

Diante desse contexto, há certa preocupação por parte dos gestores e dos professores

com esses alunos e com o modo de acolhê-los e inseri-los em um novo espaço de

aprendizagem. A preocupação com o conhecimento matemático dos estudantes é grande, pois

a avaliação da aprendizagem em processo31

, realizada em fevereiro e agosto de cada ano,

indica índices baixos de acertos nas questões apresentadas. Uma atitude tomada por mim e

por outra professora de Matemática que também ministra aulas na escola era acompanhar as

mesmas turmas por, no mínimo, dois anos. Assim, era estabelecido em sala de aula, por meio

de uma relação de conhecimento e confiança, um ambiente de aprendizado compartilhado

entre alunos e professora. Conforme apontado por Hiebert et al (1997, p. 7, tradução

minha32

), “a sala de aula, de qualquer tipo, é um sistema Ela é composta de muitos elementos

individuais que trabalham juntos para criar um ambiente de aprendizagem”

No período da pesquisa, eu ministrava aulas em quatro turmas do 6º ano, mas optei por

realizar a pesquisa em apenas uma, já que a quantidade de tarefas seria grande, e a maioria

dos agrupamentos seria realizada em duplas. Assim, um número elevado de alunos dificultaria

a análise, já que a pesquisa se insere em uma abordagem qualitativa, na perspectiva histórico-

cultural, e se deseja observar as implicações do raciocínio combinatório no desenvolvimento

do pensamento probabilístico dos alunos em um espaço de negociação de ideias entre

estudantes e professora-pesquisadora.

Escolhi o 6º ano D devido ao horário33

dessa turma. Eram seis aulas na semana, sendo

todas duplas, uma na sequência da outra. Assim, havia cerca de 100 minutos de aulas, três

vezes na semana, para a pesquisa. Nas demais classes as aulas eram distribuídas nos cinco

dias da semana, e quando havia aula dupla, era intercalada por aulas de outra disciplina. A

pesquisa foi desenvolvida no período de um mês, tempo considerado adequado para a

realização das tarefas, em praticamente todas as aulas foram desenvolvidas as tarefas da

pesquisa.

Os sujeitos envolvidos eram 28 alunos do 6º ano do Ensino Fundamental, 14 meninos

e 14 meninas, com idade entre 11 e 13 anos, nenhum deles em situação de inclusão34

. O ano

31

O exame aplicado para diagnosticar o nível de aprendizado dos alunos do 2º ano do Ensino Fundamental, dos

anos finais do Ensino Fundamental e de todas as séries do Ensino Médio matriculados na rede estadual de

ensino do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.educacao.sp.gov.br/avaliacao-aprendizagem>.

Acesso em:25 jan. 2015. 32“Classroom instruction, of any kind, is a system It is made up of many individual Elements that work

together to create an environment for learning” 33

A duração de cada aula é de 50 minutos. 34

Estudante com deficiência física, comprometimento mental ou necessidade de atenção especial.

Page 77: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

76

de pesquisa era também o de ingresso desses alunos na escola, porém esse fato não causou

estranhamento, pois, como a pesquisa aconteceu no segundo semestre de 2010, eles já

estavam acostumados com a “nova” escola Minha experiência como professora dos anos

iniciais do Ensino Fundamental foi um facilitador na relação harmoniosa que foi estabelecida

com os alunos logo no início do ano, uma relação de compreensão da importância do outro no

processo de ensino e de aprendizagem. Acredito que esse contexto favoreceu a comunicação

de ideias e o desenvolvimento de (re)significações conceituais em diferentes âmbitos,

individual e coletivo.

Como mencionado, os alunos vinham de realidades de aprendizagem diferenciadas,

porém, mesmo diante desse fato, representações da escola e das aulas de Matemática eram

compartilhadas por muitos alunos dessa turma. Muitos falavam sobre suas dificuldades com a

aprendizagem da Matemática, e alguns alunos se mostraram bastante tímidos quanto à

apresentação de ideias nas aulas. Percebi, como é comum em uma sala heterogênea, que

alguns alunos se comunicavam mais e falavam sobre seus conceitos espontaneamente, outros

nem tanto.

No período anterior à pesquisa, a dinâmica das aulas não era a mesma adotada, pois,

de acordo com as orientações dos gestores das escolas, os professores deveriam desenvolver

as situações de aprendizagem indicadas no material impresso que alunos e professores

recebem, organizadas a partir do Currículo do Estado de São Paulo. No entanto, mesmo

estando limitada às situações de ensino que deveria propor, desde o início do ano procurei

criar um ambiente de comunicação de ideias, em que os alunos expunham suas concepções

sobre o que estava sendo estudado nas aulas de Matemática, trocavam opiniões, questionavam

os colegas e a professora e eram questionados por estes. Tal fato possibilitou que o espaço

social da sala de aula fosse favorável à produção de conhecimento, conforme apontada por

Sadovsky (2007, p 57) ao afirmar: “elaborar conhecimento em cooperação com os outros

abre espaço, de maneira geral, a um intercâmbio que permite aprofundar as ideias em jogo

num determinado momento”

Acredito que o fato de alguns alunos, no decorrer desta pesquisa, apresentarem mais

indícios de (re)significação de conceitos que outros, dando a ideia de que estão em nível

diferenciado de aprendizagem, é um indicativo da complexidade das relações de ensino e da

emergência da produção de sentidos e da construção de conceitos nas relações de ensino

Page 78: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

77

(SMOLKA, 2010). Para tanto, faz-se necessária uma organização no trabalho a ser

desenvolvido em sala de aula que possibilite significações na aprendizagem.

A partir da intencionalidade pedagógica do professor, o trabalho em sala de aula deve

ser organizado, visando a (re)significação de procedimentos e conceitos. O fato de ter uma

organização não significa que o processo de ensino deva ser estático, mas não deve ser

espontâneo. Ele pode e deve ser alterado à medida que problemáticas vão surgindo no

processo. Enfim, neste trabalho tanto a ação pedagógica quanto a investigativa pautam-se na

perspectiva histórico-cultural.

Na apresentação desta pesquisa, os nomes dos alunos foram substituídos para

preservar suas identidades.

3.4 Contextos gerais da pesquisa de campo

A pesquisa de campo se iniciou com a escolha das tarefas e com a ordem de

desenvolvimento delas. Dessa forma, antes de começar a pesquisa de campo, elaborei o

seguinte roteiro para o desenvolvimento das tarefas:

Quadro 4 − Roteiro das tarefas

TAREFAS

Tarefa 1 – Linguagem probabilística

Tarefa 2 – Criação de Bandeiras

Tarefa 3 – Quadrados

Tarefa 4 – Construção de torres

Tarefa 5 – Padrão de cores

Tarefa 6 – Prisioneiros

Tarefa 7 – Árvore Genealógica

Tarefa 8 – O problema do táxi

Tarefa 9 – Itinerários

Tarefa 10 – Número de Telefones

Tarefa 11 – O problema das cordas

Tarefa 12 – Jogo: senha

Tarefa 13 – Corrida de cavalos

Tarefa 14 – Lançamento de dardos

Tarefa 15 – Jogo do Lobo Mau e da Chapeuzinho

Tarefa 16 – Lançamento de moedas: situação-problema

Tarefa 17 – Lançamento de moedas: experimento

Tarefa 18 – Jogo de par ou ímpar

Tarefas sobre probabilidade: de 1 a 5

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora

Page 79: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

78

A partir do roteiro, o material utilizado em cada tarefa era organizado antes de sua

aplicação; ele incluía: folha impressa para a apresentação da tarefa e para o registro dos

alunos, tiras de papéis coloridos, dados, moedas, tabuleiro/folhas impressas de jogos, entre

outros. Para cada dia de pesquisa, eu planejava o desenvolvimento de três tarefas, mas nem

sempre isso acontecia, pois o tempo de realização de cada uma se alterava de acordo com suas

características, algumas necessitavam de maior tempo para se concretizarem − uma aula ou

um pouco mais −, outras não.

Assim como o material, as duplas também eram planejadas previamente. Em minha

experiência em sala de aula, percebi que a organização dos agrupamentos interfere no

processo de ensino e de aprendizagem. Ou seja, a quantidade de alunos que realizam cada

tarefa é significativa. Por exemplo, agrupar quatro alunos para a fase de desenvolvimento

independente em uma tarefa como a “linguagem probabilística” pode dificultar a reflexão dos

alunos, pois o fato de muitas ideias serem explicitadas, a princípio, pode gerar obstáculos para

o processo de significação deles. No entanto, na fase da reflexão conclusiva a diversidade de

ideias é importante para a elaboração conceitual, pois os alunos têm a oportunidade de

(re)significar suas ideias.

Em minha experiência também notei que alguns agrupamentos são mais produtivos,

que outros. Dessa forma, critérios pedagógicos são relevantes à interação e à produção de

conhecimentos, como as facilidades e/ou as dificuldades apresentadas nas aulas de

Matemática e outras características pessoais, por exemplo, liderança, flexibilidade e

responsabilidade. Diante desses critérios, organizei os agrupamentos para o desenvolvimento

das tarefas desta pesquisa. Acredito que esse trabalho é feito com frequência pelo professor

que atua em sala de aula, uma vez que as experiências cotidianas possibilitam que esses

aspectos sejam observados nos alunos. Em algumas tarefas, as duplas eram modificadas, em

outras, elas eram mantidas, pois algumas duplas nem sempre apresentavam afinidade a ponto

de que significações fossem produzidas. Esse fato é compreensível porque marcas de

subjetividades – sensibilidade e solidariedade – transcendem as interações entre professor e

alunos na sala de aula (SMOLKA, 2010).

Tendo em mãos o material necessário, os agrupamentos planejados e os materiais para

a coleta de dados – folha para registro dos alunos, Diário de Campo e gravadores de áudio e

vídeo –, eu iniciava o trabalho de pesquisa de campo, pois as aulas no 6º ano D eram as

Page 80: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

79

primeiras que ministrava no turno da tarde. O planejamento, a organização prévia das tarefas

e minha experiência como professora desse nível de ensino possibilitaram que o tempo

previsto para a pesquisa fosse potencializado, sendo, assim, suficiente.

Logo no início da aula, eu falava com os alunos sobre as tarefas que realizaríamos e

como seriam os agrupamentos. Depois disso, eles se organizavam com os colegas. Na

sequência, iniciávamos a dinâmica da aula fazendo a apresentação da tarefa. Nessa fase, eu

procurava explicar a tarefa de maneira clara e objetiva, questionava os alunos sobre suas

ideias quanto às palavras usadas no texto da tarefa e ao tema a ser estudado.

Na fase da atividade independente os alunos realizavam as tarefas normalmente em

duplas. Nesse momento, eu conversava com algumas duplas procurando saber quais eram

suas concepções sobre o que estavam desenvolvendo e quais as ações fariam para chegar ao

resultado. Após essa fase, realizávamos a da reflexão conclusiva. Nesse momento, as duplas

apresentavam para os colegas da classe suas conclusões, e os colegas refutavam ou não os

demais. Em diversas situações, os alunos explicavam para os colegas como chegaram à

determinada conclusão. O objetivo era que os alunos refletissem sobre as diferentes

considerações e chegassem ou não a um consenso.

Meu papel enquanto professora, nesse estágio, era de mediar as ideias dos alunos,

visando a elaboração de conceitos sobre a combinatória e a probabilidade. Muitas vezes, para

que isso acontecesse, diferentes estratégias eram utilizadas, como: apresentação de registros

escritos dos alunos em slides para que observassem semelhanças e diferenças, seleção de

algumas duplas para exporem suas ideias de maneira detalhada aos colegas e contraexemplos

para que ideias equivocadas fossem observadas. Minhas ações enquanto pesquisadora tinham

o propósito de envolver os alunos em um movimento de construção de sentidos entre

raciocínio combinatório e pensamento probabilístico por meio da linguagem, das tarefas

propostas e do ambiente de aprendizagem, os quais classifico como componentes mediadores

de conhecimento.

No decorrer dessa dinâmica, os alunos realizaram registros escritos sobre as tarefas.

Eu fiz de gravações de áudio e vídeo de algumas duplas e gravação de vídeo da fase de

reflexão conclusiva. Os alunos não se sentiam intimidados diante desses recursos.

As tarefas que fizeram parte da sequência tinham características e objetivos

específicos. Indicá-los-ei na seção seguinte.

Page 81: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

80

3.5 As tarefas

Conforme mencionado anteriormente, foram desenvolvidas inicialmente 18 tarefas,

que proporcionavam aos alunos o contato com a linguagem ligada à combinatória e à

probabilidade, o desenvolvimento do raciocínio combinatório e do pensamento probabilístico

e o contato com problemas relacionados a essas duas áreas que envolviam diferentes

características e possibilidades de resolução. Tais tarefas tinham como objetivo principal

promover a reflexão sobre a combinatória e a probabilidade nas aulas de Matemática.

No segundo momento, foram desenvolvidas cinco tarefas focadas na probabilidade

que, no entanto, possibilitavam que conceitos sobre combinatória fossem explicitados nas

respostas apresentadas pelos alunos. Essas tarefas foram realizadas individualmente. De

acordo com Hiebert et al (1997), em um ambiente de aprendizagem, tarefas que possibilitam

a interação social em sala de aula são essenciais para a compreensão conceitual, mas esse

contexto precisa deixar resíduos. Ou seja , os conceitos desenvolvidos precisam ser

incorporados à prática dos alunos na resolução de outros problemas em contextos diferentes.

A maioria das tarefas foi organizada a partir das sugestões de Batanero, Godino e

Navarro-Pelayo (1994). Contudo, outros autores também embasaram o trabalho: Antônio

Lopes (2000); Godino, Batanero e Cañizares (1996); Lopes (2003); Macedo, Petty e Passos

(1997); São Paulo (1998); e Skovsmose (2008). Os diferentes tipos de problemas relacionados

à análise de combinatória apresentados por Batanero, Godino, e Navarro-Pelayo (1994),

descritos no capítulo anterior, foram contemplados na sequência de tarefas, conforme o

quadro apresentado a seguir.

Quadro 5 − Organização das tarefas: características dos problemas

Tarefa

Solução pedida

Número de

operações

combinatórias

Modelo

combinatório

explícito no

enunciado

Tipo de

objetos que se

combinam

Tamanho dos

parâmetros/va

riabilidade

Linguagem

probabilística

Contagem,

classificação e

otimização.

Composto Probabilidade Dedos Pequenos /

variáveis

Criação de Bandeiras Enumeração,

contagem e

classificação.

Simples Seleção e

participação

Cores Pequenos /

variáveis

Page 82: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

81

Quadrados Enumeração,

contagem e

classificação.

Simples Seleção e

participação

Quadrados Pequenos /

variáveis

Construção de torres Enumeração e

contagem.

Simples e

composto

Seleção e

colocação

Cores Pequenos /

variáveis

Padrão de cores Enumeração e

contagem.

Simples e

composto

Seleção e

colocação

Padrões de

cores

Pequenos /

variáveis

Prisioneiros Enumeração e

contagem.

Simples e

composto

Seleção e

colocação

Pessoas Pequenos /

variáveis

Árvore Genealógica Enumeração e

contagem.

Simples e

composto

Seleção e

colocação

Pessoas Pequenos /

variáveis

Problema do táxi Existência,

enumeração,

contagem e

otimização.

Simples Seleção Percursos Pequenos /

variáveis

Itinerários Existência,

enumeração,

contagem e

otimização.

Simples e

composto

Seleção Itinerários Pequenos /

variáveis

Número de telefones Enumeração e

contagem

Simples Seleção Números Pequenos /

variáveis

Problema das cordas Existência e

enumeração.

Composto Procedimentos

lógicos

Cordas Pequenos /

variáveis

Jogo: senha Existência,

enumeração,

contagem,

classificação e

otimização.

Simples Seleção e partição Letras e

números

Pequenos /

variáveis

Corrida de cavalos Existência,

enumeração,

contagem,

classificação e

otimização.

Composto Probabilidade Dados Pequenos /

variáveis

Lançamento de

dardos

Enumeração e

contagem.

Composto Probabilidade Dardos Pequenos /

variáveis

Jogo do Lobo Mau e

da Chapeuzinho

Existência,

enumeração,

contagem e

classificação.

Simples e

composto

Participação Moedas Pequenos /

variáveis

Lançamento de

moedas: situação-

problema

Contagem Composto Probabilidade Moedas Pequenos /

variáveis

Lançamento de

moedas: experimento

Enumeração e

contagem

Simples Seleção Moedas Grande /

variáveis

Jogo de par ou ímpar Existência,

enumeração,

contagem e

classificação.

Simples Partição Dados Pequenos /

variáveis

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Page 83: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

82

Acredito que tais ações venham ao encontro das considerações de Hiebert et al

(1997)quando defendem que, ao iniciar um trabalho a partir de problemas que estimulem os

alunos a desenvolver soluções, procedimentos e entendimentos estarão fortemente

relacionados, possibilitando a construção de conceitos matemáticos significativos.

De acordo com Christiansen e Walther (1986), a linguagem tem papel indispensável e

central nos processos de significação para o aluno. Desse modo, a dinâmica de aprendizagem

e a sequência de tarefas devem possibilitar a comunicação de ideias e a formação de

conceitos.

Conforme mencionado, ao organizar a sequência de tarefas procurei selecionar

situações-problema de acordo com a classificação dos problemas que envolvem a análise

combinatória proposta por Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), apresentada no

segundo capítulo. Dessa forma, os cinco tópicos apresentados – tipo de solução, operações

combinatórias, modelo combinatório implícito no enunciado, tipos de objetos que se

combinam e tamanho dos parâmetros – foram contemplados na sequência de tarefas. Ao

revisar essa e outras literaturas, observei certa variedade de características no enunciado de

problemas de combinatória; tal fato conduz a diferentes formas de pensar e resolver esses

problemas.

Acredito que, assim como o exposto, outras questões precisavam ser contempladas nas

tarefas para que o raciocínio combinatório e o pensamento probabilístico fossem

desenvolvidos, como a linguagem probabilística. Dessa forma, a primeira tarefa35

, “linguagem

probabilística”, visava promover a discussão sobre a interpretação e os valores atribuídos a

termos do vocabulário probabilístico, pois, conforme observado em pesquisa anterior, tarefas

deste tipo possibilitam “que o aluno se sinta confiante em expressar suas ideias e motivado a

realizar outras tarefas, uma vez que as compreende” (SANTOS, 2010, p. 174).

Na sequência da tarefa “linguagem probabilística”, organizei dez tarefas36

visando

possibilitar que procedimentos específicos sobre combinatória fossem desenvolvidos. Dentre

esses procedimentos se destacam:

Experimentação de procedimentos de enumeração;

busca de procedimentos sistemáticos de enumeração;

contagem de elementos de produtos cartesianos e de conjuntos;

35

Tarefa 1: anexo A. 36

Tarefas 2 a 11: anexo B.

Page 84: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

83

classificação de objetos por propriedade comum;

representação simbólica de configurações combinatórias;

cálculo do número de configurações mediante enumeração;

interpretação de diagrama de árvore previamente construída;

cálculo de número de configurações por meio de cálculo de produto;

interpretação e construção de grafos;

contagens de caminhos em um grafo;

construção de diagrama de árvore para representar elementos de

produtos cartesianos.

Considero que o desenvolvimento de situações-problema que contemplem tais

procedimentos possa conduzir os alunos ao desenvolvimento de conceitos a partir de

problemas combinatórios e minimizar a dificuldade de resolver problemas sobre

combinatória, apontada por Roa (2000). Isso se deve ao processo de ensino e às situações

apresentadas favorecerem a mobilização do raciocínio combinatório.

Acredito que as tarefas selecionadas estão em consonância com as considerações de

Fischbein (1975), que, como já indicado, afirma que a análise das possibilidades não pode ser

reduzida a uma simples enumeração de elementos. Tal análise, para o autor, deve ser um

processo que, com base nas informações existentes, desenvolva de modo racional e

construtivo a criação do espaço amostral dos resultados possíveis.

Considero que o uso de jogos em uma perspectiva problematizadora, assim como as

tarefas anteriores37

, é importante para a articulação de conceitos sobre combinatória e

probabilidade, uma vez que concordo com a afirmação de Grando (2008, p. 25) sobre o jogo e

a Matemática no contexto de sala de aula:

O jogo, pelo seu caráter propriamente competitivo, apresenta-se como uma

atividade capaz de gerar situações-problema “provocadoras”, onde o sujeito

necessita coordenar diferentes pontos de vista, estabelecer várias relações,

resolver conflitos e estabelecer uma ordem. Aperfeiçoar-se no jogo significa

jogá-lo operatoriamente, considerando todos esses aspectos.

37

Tarefas 1 a 11.

Page 85: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

84

Dessa forma, escolhi como tarefas38

alguns jogos, como “Corrida de Cavalos”39

,

“Senha”40, “Lançamento de dardos”

41, “Lobo mau e Chapeuzinho”

42, “Lançamento de

moedas”43

e “Par ou ímpar”44

. Entendo o uso desses jogos como uma importante estratégia

para a articulação do raciocínio combinatório e do pensamento probabilístico, pois,

desenvolvidos em uma perspectiva problematizadora, eles favorecem a resolução de

problemas com diferentes características e contextos combinatórios. Além disso, é um recurso

que possibilita a análise de possibilidades, o desenvolvimento de estratégias combinatórias e o

cálculo de probabilidades de forma lúdica. Visando tais objetivos, situações-problema foram

elaboradas a partir do jogo. Algumas delas já eram propostas pelos autores, outras foram

adaptadas para a pesquisa.

No desenvolvimento das tarefas com jogos, realizei algumas alterações de acordo com

os objetivos de pesquisa. Dentre elas, o número de dardos estipulado para cada jogador e a

pontuação. Propus que cada aluno lançasse quatro dardos e que, ao invés de ter uma

pontuação inicial da qual fossem subtraídos os pontos, os pontos marcados seriam contados.

Meu objetivo com tais alterações é que os alunos pudessem ter maior número de dados para

analisar as possibilidades e comparar os pontos obtidos com os acertos.

No final do desenvolvimento da sequência de tarefas, decidi pela escrita de uma carta

com os alunos. Essa prática tem sido desenvolvida por alguns professores do Grucomat,

objetivando perceber as impressões e os conceitos elaborados pelos estudantes a partir de um

trabalho específico. De acordo com Penha (2013), integrante do Grucomat, a escrita de carta

pode ser encarada como um recurso para o aluno comunicar suas ideias ao professor que

rompe com um tipo de aula e de avaliação.

Diante dessa decisão, escrevi uma carta45

aos alunos, a qual foi entregue por um

professor da turma que se dispôs a ajudar nessa etapa da pesquisa. A escrita da resposta

também se deu na aula desse professor, que fez apenas o papel de “carteiro”, sem intervir no

38

Tarefas 12 a 18: anexo C. 39

Tarefa adaptada de Skovsmose (2008). 40

(MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997, p. 53-58). 41

O jogo de dardos, além de ser um jogo de competição, também é utilizado como passa tempo entre amigos, o

que possibilita variações nas regras. De maneira geral, o tabuleiro é pendurado, e é estipulado um espaço, o

qual é marcado para que os jogadores se posicionem para atirar os dardos. Oficialmente há um valor de pontos,

o qual é subtraído de acordo com a pontuação do dardo fixado pelo jogador. Vence o jogador que chegar a zero

pontos. O jogo foi adaptado para o contexto. 42

Tarefa baseada em Antonio Lopes (2000). 43

Tarefas adaptadas de Celi Lopes (2003). 44

Tarefa criada por mim a partir de tarefas utilizadas na pesquisa de mestrado. 45

Carta: anexo D.

Page 86: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

85

processo de leitura e de escrita da carta. A opção dessa parceria nessa tarefa tinha como

objetivo criar um contexto para ela, pois não é comum o remetente entregar a carta ao

destinatário e ficar ao lado dele no momento da escrita da resposta. Considero que o

distanciamento entre o destinatário e o remetente possibilita que as relações afetivas sejam

apresentadas na resposta.

Esse recurso foi oportuno à pesquisa desenvolvida, pois a manifestação do aluno

quanto ao prazer ou não de realizar tarefas nas aulas de matemática é um dado relevante à

investigação. Com isso, foi possível romper com a cultura de aula desenvolvida

anteriormente.

Visando investigar os indícios da contribuição de um estudo da combinatória

articulado ao desenvolvimento do pensamento probabilístico, organizei cinco tarefas46

sobre

probabilidade. Essas eram questões de múltipla escolha sobre a probabilidade de

determinados eventos. Depois de escolher o item que considerava correto, o aluno precisava

justificar sua escolha. A opção por esse tipo de questão, depois da sequência de tarefas que

envolvia questões abertas, deu-se com o intuito de observar de forma mais objetiva as

concepções dos alunos sobre probabilidade, na perspectiva do “resíduo”.

Como mencionei ao final do primeiro capítulo, acredito que, para que suceda o

desenvolvimento do raciocínio combinatório e do pensamento probabilístico, componentes

mediadores como linguagem, tarefas e ambiente de aprendizagem precisam estar imbricados.

Assim, indico em seguida como foi composto tal ambiente.

3.5.1 Dinâmica das tarefas: ambiente de aprendizagem

Considero que − para identificar as ideias sobre combinatória que emergem em um

processo de comunicação oral e escrita, identificar quais tarefas são potencializadoras e

buscar indícios da contribuição de um estudo de combinatória para o desenvolvimento do

pensamento probabilístico − é preciso criar um ambiente de aprendizagem que tenha como

estratégia de ensino e de aprendizagem a comunicação de ideias. Para tanto, utilizei a

proposta de Christiansen e Walther (1986) no desenvolvimento da sequência de tarefas da

pesquisa.

46

Tarefas sobre probabilidade: anexo E. As tarefas de 1 a 4 foram adaptadas da tese de doutorado de Celi Lopes

(2003). A tarefa 5 foi adaptada dos trabalhos de Godino, Batanero e Cañizares (1996).

Page 87: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

86

Os autores propõem que o ambiente de aprendizagem seja organizado em três fases

para o desenvolvimento das tarefas em sala de aula. Considero relevante reiterar a explicação

nesse momento, pois ela é fundamental para a composição das tarefas utilizadas com a turma.

A primeira fase é a de apresentação, a segunda é a de atividade independente e a terceira é a

de reflexão conclusiva.

A fase de apresentação é o momento em que a tarefa é apresentada aos alunos, assim

como a dinâmica de desenvolvimento. O uso tradicional de exemplos introdutórios deve ser

evitado, o foco deve ser motivar o aluno a desenvolver a tarefa (CHRISTIANSEN;

WALTHER, 1986).

A fase de atividade independente é o momento que a tarefa será realizada em

pequenos grupos47

. O objetivo é o de construir significações em uma esfera menor.

A fase de reflexão conclusiva é o momento em que as significações produzidas são

sistematizadas, promovendo uma reflexão coletiva. De acordo com Christiansen e Walther

(1986), essa fase é indispensável para verificar o uso comum de linguagem e símbolos, o grau

de aprendizagem partilhada, a negociação de papéis e as potencialidades das tarefas. Essa fase

permite observar “a possibilidade de reversibilidade na relação de ensino: o espaço do

aprender ensinando” (FONTANA, 1993, p. 149).

Tendo como propósito o desenvolvimento do raciocínio combinatório e do

pensamento probabilístico e as evidências sobre esses conceitos, tomei como referência tal

dinâmica no desenvolvimento de todas as tarefas da pesquisa. Dessa forma, iniciava o

trabalho com a apresentação da tarefa. Visando criar um ambiente propício ao

compartilhamento de ideias neste e nos demais estágios, procurava estabelecer uma relação de

comunicação com os alunos para que houvesse um diálogo aberto na sala de aula e a

comunicação das ações e das concepções dos alunos. Para Christiansen e Walther (1986,

p.32),

A linguagem tem um papel central nesta mediação de relações devido aos

seus poderes inerentes, generativos e generalizadores, os quais permitem ao

indivíduo: quebrar a esfera pessoal de experiência; identificar o essencial dos

objetos sob consideração; construir relações teóricas com a realidade; ter um

lugar no conhecimento socializado; e, no total, estabelecer-se e

compreender-se a si próprio como ser humano no contexto social e da

humanidade.

47

A quantidade de alunos em cada grupo é definida pelo professor, de acordo com seus objetivos e suas tarefas.

Page 88: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

87

O processo de comunicação como uma ferramenta de aprendizado também é

defendido por Hiebert et al (1997), ao afirmarem que, ao se comunicar, os alunos refletem

sobre o que fazem e pensam e, assim, constroem conexões importantes sobre a Matemática.

Diante de tais considerações, desenvolvi a pesquisa. Acredito que a dinâmica

apresentada possibilita a criação de um ambiente de aprendizagem em sala de aula em que a

comunicação tem papel relevante e promove condições para que os alunos se sintam

motivados a desenvolver as tarefas apresentadas.

Pleiteando investigar meus pressupostos e atingir os objetivos dessa pesquisa,

apresento no próximo item aspectos pertinentes à análise dos dados da investigação.

3.6 Procedimentos de análise dos dados

A análise foi realizada em dois eixos. No primeiro deles, analisei as ideias sobre

combinatória que emergem em um processo de comunicação oral e escrita, em um contexto

de problematização. No segundo, estudo as contribuições do estudo da combinatória ao

pensamento probabilístico. A escolha desses eixos vem ao encontro da perspectiva histórico-

cultural, permitindo a compreensão dos sentidos e dos significados construídos e

compartilhados entre professora e alunos em um contexto de interação dialógica

(NACARATO; GRANDO, 2013).

Para melhor compreensão dos sentidos e significados construídos entre os envolvidos

na pesquisa, professora-pesquisadora e alunos, selecionei três tarefas. São elas: “linguagem

probabilística”, “itinerários” e “o problema das cordas”

A análise do primeiro eixo foi realizada por episódio, conforme definido por Marocci

(2011, p. 93):

Compreendemos episódio como unidade de análise em que estão envolvidos

eventos em torno de um determinado tema, cujo espaço temporal é delineado

pelas marcas coerentes do início, do meio e do fim. No episódio, estão

contidas falas e ações dos sujeitos de forma a produzir um contexto

sequenciado de ideias, cuja análise do processo de desenvolvimento e do

produto construído na discussão pode ajudar a inferir sobre a produção de

significados e sentidos para um determinado conceito.

Dessa forma, cada tarefa analisada foi considerada um episódio que contemplava as

três fases do desenvolvimento das tarefas em sala de aula, de acordo com a perspectiva de

Page 89: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

88

Christiansen e Walther (1986), apresentada anteriormente. A escolha das três tarefas para

análise se deu a partir da organização e das intensas leituras do material produzido – Diário de

Campo, gravações de áudio e de vídeo e registro dos alunos – visando identificar dados

relevantes.

O segundo eixo, no qual busco analisar as contribuições do estudo da combinatória ao

pensamento probabilístico, constituiu-se a partir das cinco tarefas que os alunos

desenvolveram individualmente após realizarem 18 tarefas, cujo foco era o raciocínio

combinatório. A análise desse eixo aconteceu por meio dos registros escritos dos alunos e do

Diário de Campo da professora, pois a dinâmica de desenvolvimento das tarefas não foi a

mesma das 18 tarefas; eles realizaram individualmente e não houve comunicação oral de

ideias, suas justificativas foram registradas na folha impressa com a tarefa. A mudança da

dinâmica ocorreu, pois o intuito era observar de forma mais objetiva quais os conceitos sobre

a probabilidade os alunos apresentavam em tarefas com diferentes perspectivas e contextos.

Nos próximos capítulos, apresento as análises realizadas.

Page 90: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

89

4 A PRODUÇÃO DE SIGNIFICAÇÕES PARA CONCEITOS SOBRE

COMBINATÓRIA EM CONTEXTO DE COMUNICAÇÃO EM SALA DE AULA

Neste capítulo, apresento o primeiro eixo de análise da pesquisa. Busco analisar as

ideias dos alunos sobre combinatória que emergem no processo de comunicação oral e escrita,

em um contexto de problematizações.

Conforme mencionei anteriormente, para essa pesquisa realizei 18 tarefas com os

alunos; com isso, produzimos grande quantidade de dados em registros escritos e gravações

de áudio e vídeo. Ao tentar criar categorias de análise, na perspectiva histórico-cultural,

percebi que olhar para muitos dados dificultaria compreender os sentidos e os significados

produzidos pelos alunos e pela professora sobre a combinatória e a probabilidade, uma vez

que, diante dessa perspectiva, é no movimento dos signos, dos gestos, da interpretação e da

indicação que os sentidos são produzidos e (re)significados. Além disso, ao olhar para

categorias em um contexto tão amplo, significações relevantes produzidas pelos alunos

podem se perder.

Selecionei três tarefas dessa sequência, as quais apresento em excertos na forma de

episódios. Cada episódio é composto por três fases: apresentação da tarefa, desenvolvimento

nas duplas e nos trios48

(atividade independente) e reflexões conclusivas sobre a tarefa. As

selecionadas foram:

Tarefa 1 − “linguagem probabilística”;

Tarefa 9 − “itinerários”;

Tarefa 11 − “o problemas das cordas”

As fases dos episódios foram analisadas com diferentes instrumentos de produção de

dados, que são:

Fase da apresentação: Diário de Campo da professora-pesquisadora;

fase da atividade independente: Diário de Campo da professora-pesquisadora,

registros escritos das duplas de alunos e gravações de áudio das conversas entre

professora-pesquisadora e duplas de alunos;

48

Quando o número de alunos presente na classe era ímpar.

Page 91: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

90

fase da reflexão conclusiva: Diário de Campo da professora-pesquisadora e

gravações de vídeo das discussões desenvolvidas com toda a classe.

A primeira tarefa que selecionei foi a “linguagem probabilística” A princípio não foi a

que me “saltou aos olhos”, talvez porque já tivesse desenvolvido tarefas semelhantes na

pesquisa de mestrado. No entanto, ao organizar os registros feitos pelos alunos e transcrever

as gravações de áudio e vídeo, constatei as significações atribuídas pelos alunos ao longo de

seu desenvolvimento, o que me levou a ter um olhar mais analítico para ela e considerá-la

neste capítulo.

4.1 Episódio 1 − A linguagem probabilística e o jogo de par ou ímpar: produção de

significações

Conforme mencionei, a tarefa “linguagem probabilística” não foi a que me chamou

atenção em um primeiro momento, pois já havia desenvolvido cinco tarefas49

semelhantes na

pesquisa de mestrado. Em uma das tarefas, os alunos utilizavam os termos do vocabulário

probabilístico para estimar a previsão do tempo em determinado período na cidade em que

moravam; em outra, os alunos relacionavam os termos do vocabulário probabilístico entre si.

De forma semelhante, em todas as tarefas desenvolvidas, os alunos conectavam os termos do

vocabulário probabilístico com possibilidades e/ou probabilidades de determinados eventos.

O objetivo com o desenvolvimento de tais tarefas era que os alunos se apropriassem de

forma significativa dos termos do vocabulário probabilístico, já que eles estavam presentes

nos enunciados das tarefas que desenvolveriam no decorrer da pesquisa. Isso de fato

aconteceu, os termos relacionados à linguagem probabilística passaram a fazer parte do

vocabulário dos alunos na discussão das tarefas da pesquisa e também em situações de sala de

aula, fora do contexto de investigação, após o término da pesquisa, em minha prática

pedagógica.

As observações da pesquisa anterior me conduziram a afirmar que é propícia a

discussão sobre termos do vocabulário probabilístico no início dos estudos sobre

probabilidades, pois equívocos na interpretação de enunciados e na apresentação de ideias

podem ser minimizados. Reitero essa afirmação, no entanto, destacando que tarefas desse tipo

49

Para maiores informações ver Santos (2010): tarefas 1, 2 e 3, páginas 50 e 51; tarefas 1 e 2, páginas 95 e 96.

Page 92: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

91

possuem outras potencialidades, além da apropriação de vocabulário, como pude agora

constatar.

Considero que a tarefa relativa à linguagem probabilística possibilita a produção e a

negociação de significações, não apenas dos termos, mas dos conceitos de combinatória e de

probabilidade. A tarefa, associada à dinâmica desenvolvida, favoreceu o processo de

elaboração conceitual dos alunos. O que corrobora a colocação de Góes (1997, p. 21-22):

[...] o conceito não é apenas representado pela palavra e nem se reduz ao

desenvolvimento de impressões (pela percepção, pela memória). Forma-se

por meio do uso da palavra, que não é um rótulo aderido a uma ideia

estabelecida, a um conceito pronto. Pensamento e linguagem se constituem

mutuamente. Ao incorporar uma palavra, a criança não apenas designa um

objeto, mas também analisa, abstrai propriedades, generaliza-as. Por essa

razão, a palavra participa da significação do objeto e da experiência de

conhecimento de mundo. A palavra reflete e generaliza a realidade. As

relações entre palavra e conceito não ocorrem isoladamente; a palavra é

enunciada e interpretada numa rede de outras palavras, de interpretações

com outras pessoas e de ações sobre o objeto.

Foi esse olhar teórico que me mobilizou a analisar a tarefa “linguagem probabilística”

Essa tarefa foi por mim criada a partir de tarefas utilizadas anteriormente, no mestrado.

Tarefa 1 – Linguagem probabilística

Considerando os possíveis resultados de um jogo de par ou ímpar entre dois colegas − em que

cada jogador só pode usar os dedos de uma das mãos −, classifique com uma das palavras do

quadro abaixo os acontecimentos citados:

Impossível - pode ser – possível - bastante provável – certo - se espera que – seguro- há

alguma possibilidade - há alguma probabilidade - incerto

a) A soma ser um número ímpar:

b) A soma ser um número menor do que 10:

c) A soma ser o número 12:

d) A soma ser um número maior do que 0:

e) A soma ser o número 0:

f) Os colegas apresentarem números de dedos distintos:

g) Os colegas apresentarem números de dedos iguais:

Page 93: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

92

Essa tarefa desencadeou o “episódio 1”, desenvolvido em três fases: apresentação,

atividade independente e reflexão conclusiva. Na sequência, apresento os dados produzidos

em cada fase.

Figura 1 − Diário de Campo da professora-pesquisadora: 04 de novembro de 2010

Iniciei a aula dizendo aos alunos com quem formariam duplas50. Assim que as duplas estavam

formadas, falei como seria a dinâmica da sequência de tarefas que iríamos desenvolver: “

primeiramente vamos ler a tarefa e conversar sobre sua proposta, vocês vão me dizer se

entenderam a proposta e, se possuírem dúvidas, me digam quais são elas. Na sequência,

juntamente com um colega desenvolverão a tarefa; a dupla fará um único registro da tarefa;

eu vou passar pelas duplas e vou conversando com vocês, mas vocês também podem me

chamar, caso achem necessário. Depois, cada dupla apresentará suas considerações sobre a

tarefa para classe e vamos conversar sobre elas, podendo concordar ou não com os colegas”.

Ao final dessa explicação, li a tarefa com os alunos. A princípio ficaram um pouco

apreensivos, depois começaram a realizá-la. (DC, 04 nov. 2010).

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Esse trecho do Diário de Campo aponta a relação dialética da professora e da

pesquisadora quando assumem a mesma função. Percebe-se no relato evidências de

características típicas da professora, como a de querer deixar “clara” a proposta de trabalho a

seus alunos, e da pesquisadora, que se preocupa em zelar pelo desenvolvimento de seu plano

de pesquisa. Esse fato indica também a intencionalidade da professora-pesquisadora, que,

segundo Ponte (2002, p. 9), “tem em vista marcar que a investigação requer um planejamento

e não se reduz a uma atividade espontânea".

Depois da apresentação da tarefa, iniciou-se a fase da atividade independente,

momento em que os alunos desenvolveram a tarefa. Ao todo 27 alunos, doze duplas e um trio,

realizaram essa tarefa.

Julguei necessário organizar, nesse momento de análise, os dados de todas as duplas

em um quadro:

50

Quando o número de alunos da classe era ímpar, um trio era formado.

Page 94: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

93

Quadro 6 − Síntese das respostas da tarefa 1: “linguagem probabilística”

Palavras

empregadas

Acontecimentos Imp

oss

ível

Po

de

ser

Po

ssív

el

Ba

sta

nte

pro

vel

Cer

to

Se

esp

era

qu

e

Seg

uro

alg

um

a

po

ssib

ilid

ad

e

Ince

rto

alg

um

a

pro

ba

bil

ida

de

a. A soma ser um número ímpar 0 4 3 3 1 0 1 1 0 0

b. A soma ser um número menor

que 10

0 3 5 0 4 0 0 0 0 1

c. A soma ser o número 12 12 0 0 0 0 0 0 0 1 0

d. A soma ser um número maior

do que 0

0 1 6 1 4 0 1 0 0 0

e. A soma ser o número 0 2 2 3 0 0 0 0 5 0 1

f. Os colegas apresentarem

números de dedos distintos

1 2 4 2 2 0 0 2 1 0

g. Os colegas apresentarem

números de dedos iguais

3 1 3 0 2 0 0 2 3 2

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Percebe-se pelas palavras atribuídas pelos alunos, nos registros escritos, aos

acontecimentos que em todas as alternativas há respostas equivocadas conceitualmente,

formando as seguintes sentenças: “é bastante provável a soma ser um número ímpar”, “é certo

a soma ser um número maior que zero”, “é incerto a soma ser o número 12”, “pode ser que a

soma seja um número maior do que 0”, “é impossível a soma ser o número 0”, “é certo os

colegas apresentarem números de dedos distintos” e “ é impossível os colegas apresentarem

números de dedos iguais” Tal fato é uma evidência de que a interpretação dos termos do

vocabulário probabilístico não é compartilhada por todos os alunos, conforme apontado por

Godino, Batanero e Cañizares (1996), Green (1982) e Santos (2010).

As respostas dos alunos a essa tarefa foram sucintas, eles colocaram apenas o termo

escolhido por eles em cada acontecimento. Porém, o registro dos alunos Lucas e Bianca, se

Page 95: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

94

diferenciou dos demais, pois foi o único que buscou analisar as possiblidades e realizou

algumas adições.

Figura 2 − Registro da dupla Lucas e Bianca (tarefa 1 − “linguagem probabilística”)

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Percebe-se que o aluno realiza adições e, a partir delas, busca palavras do vocabulário

probabilístico adequadas para estabelecer relações entre o acontecimento e os resultados

obtidos nos algoritmos. Ele faz adições, mas não esgota o espaço amostral. A realização das

adições modifica a hipótese inicial no item a. Esse fato aponta a atividade de autorregulação,

possibilidade favorecida pela dinâmica da aula, considerada essencial ao desenvolvimento da

atividade mental.

Page 96: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

95

Isso também pode ser compreendido como a busca de procedimento sistemático para

descrever as possibilidades de soma dos resultados do jogo de par ou ímpar entre dois

jogadores para, então, atribuir uma palavra ao evento. Mas também pode ser entendido como

uma necessidade de registrar algoritmos ao resolver problemas de Matemática, já que esse

registro normalmente é solicitado pelo professor dos anos iniciais; o que, de certa forma, faz

parte das raízes históricas imbricadas na resolução de problemas da disciplina de Matemática.

Na sequência do desenvolvimento da tarefa, após a conclusão da fase da atividade

independente, foi realizada a reflexão conclusiva da tarefa. Para a socialização dessa tarefa,

escrevi o enunciado de cada item na lousa; e, diante deles, escrevia o termo que cada dupla

dizia ter usado para cada evento. Com isso, os alunos apresentavam suas respostas às tarefas e

também tomavam conhecimento das realizadas pelos colegas. Normalmente, ao final da

apresentação dos termos utilizados em cada item, iniciávamos a discussão.

As gravações de vídeo do momento da reflexão conclusiva da tarefa sobre linguagem

probabilística foram extensas, cerca de 40 minutos. Dessa forma, transcrevo os trechosque

considero significativos à pesquisa. Powell, Francisco e Maher (2004), denominam os

momentos significativos aos objetivos de pesquisa de “eventos críticos” Eles afirmam que as

transcrições desses momentos ajudam a “analisar com atenção elementos como linguagem e

fluxo de ideais” (POWELL; FRANCISCO; MAHER, 2004, p. 113).

Transcrição 1: fragmento da reflexão sobre o item “a

soma ser um número ímpar” (T1)

Possíveis eventos

críticos

1. P51

: Tem algum termo que os colegas colocaram que vocês

não concordam?

2. Augusto: Certo.

3. P: Por que o certo não seria adequado?

4. Gabriel: Porque certo é uma certeza.

5. P: E o que é uma certeza?

6. Luís Felipe: É você ter certeza daquela coisa. Se é

verdade! Verdadeiro.

Movimento:

significado para a

palavra “certo”

51 Entenda “P” como professora-pesquisadora.

Page 97: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

96

7. Augusto: Porque é certo!

8. P: Por que não é certo que vai sair um número ímpar?

9. Luís Felipe: Porque tem as mesmas possibilidades, de par

e de ímpar.

10. Lucas: Possível sim. [O aluno se refere ao termo

“possível”]

11. P: Por que?

12. Luís Felipe: Porque às vezes sai.

13. Augusto: Seguro também não.

14. Bruna: Cai mais o par.

15. Luís Felipe: Não! Tem as mesmas possibilidades.

Construção de

relações entre os

significados das

palavras e o evento

“sair um número

ímpar”

16. Augusto: Depende; se você for esperto, não.

17. P: Como assim Augusto?

18. Augusto: Você fica olhando o número de dedos que a

pessoa sempre coloca, aí você coloca. Meu amigo sempre

coloca um dedo, aí, eu sempre peço par. Ele coloca um

dedo e eu também, dá dois, e eu ganho.

19. P: Neste caso é o jogo que possibilita mais resultado pares

ou a situação que você foi vivenciou? Você confia fazer

dessa forma com outro colega?

20. Augusto: Não! É que ele é pequeno.

Depende do

parceiro do jogo:

análise de

possibilidades a

partir das jogadas

do adversário.

(concepção

subjetivista)

21. P: Tem como verificar as possibilidades de pares e

ímpares neste jogo?

22. Luís Felipe: Tem! A gente fica jogando e outro fica

registrando os números que dá, fica fazendo risquinho no

par ou no ímpar.

23. P: Mas será que essa forma é confiável?

24. Luís Felipe: Não. Como você vai saber se saiu mais par ou

se saiu mais ímpar?

Análise de

possibilidades a

partir de

frequência.

(concepção

frequentista)

25. Gabriel: Lógico que tem!

26. P: Será que não há outra forma, além de ficar marcando o

resultado das jogadas?

Construção do

espaço amostral: de

experimentos dos

Page 98: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

97

27. Thadeu: Tem sim, fazendo com os próprios dedos. Tipo “0

e 1”; “0 e 2”, e assim.

28. P: Tá! Então vai fazendo isso e me falando as

combinações e os resultados que eu vou anotando na

lousa.

29. P: Para ficar organizado, vamos começar com o zero em

uma mão direita. O que podemos colocar na outra?

30. Augusto: 0, 1, 2, 3, 4 e 5.

31. P: E colocando o número um em uma mão. O que

podemos colocar na outra?

32. Thadeu: O mesmo: 0, 1, 2, 3, 4 e 5.

33. Augusto: Assim é com todos os números.

34. P: Até que número eu coloco na mão direita.

35. Augusto: Cinco.

O seguinte diagrama foi construído na lousa, a partir das falas dos alunos:

Diagrama 1 − Análise de possibilidades do jogo de “par ou ímpar”

Fonte: Acervo da pesquisadora.

36. P: E agora?

37. Thadeu: Tem que ver as somas.

38. P: Como podemos fazer isso?

39. Luís Felipe: Vai colocando na frente do esquema.

40. P: Ok. Vocês vão me falando.

Os alunos foram falando a soma e a professora-pesquisadora marcava na

alunos à

sistematização da

professora.

Page 99: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

98

frente do diagrama. Depois disso, partiram para a contagem das somas.

41. P: Quais as somas que temos?

42. Augusto: De zero a dez.

43. P: É possível saber qual soma temos mais?

44. Augusto: É só contar.

A professora colocou na lousa as possibilidades de soma para posicionar

na frente dos números as respectivas quantidades.

45. P: Por onde podemos começar?

46. Thadeu: Pelo “zero”.

47. P: Quanto temos?

48. Luís Felipe: Um.

49. P: E a soma “um”?

50. Classe: “Dois”.

51. P: E a “Dois”?

52. Thadeu: Três.

53. P: Quantas somas “três”?

54. Augusto: Quatro.

55. P: E a “quatro”?

56. Luís Felipe: Cinco.

57. P: E as outras?

58. Lucas: A “cinco” tem seis.

Contagem do

espaço amostral:

observação de

regularidades na

sequência de somas

59. P: E a soma seis?

60. Classe: Sete.

61. P: Por que vocês acham que a quantidade é sete?

62. Luís Felipe: Por que está dando sempre um número a

mais.

63. P: Será?

Lucas contou as somas dos diagramas e disse:

64. Lucas: Não! São cinco.

Alteração da

regularidade das

somas: um conflito

65. Luís Felipe: Ah, só tem cinco tabelas. Busca de

Page 100: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

99

66. P: Como assim?

67. Luís Felipe: Na lousa só tem cinco tabelas [se referia aos

diagramas]. Então, não vai ficar aumentando.

68. P: E com a soma sete?

69. Augusto: Vai diminuindo agora.

70. Luís Felipe: Quatro.

71. P: E as demais?

72. Classe: “8”: 3; “9”: 2 e “10”: 1.

Os alunos foram falando sem fazer contagem, seguindo a sequência.

73. P: Quantas somas temos ao todo?

74. Lucas: Trinta e seis.

Ao final da contagem, produzimos na lousa uma tabela semelhante a esta:

Tabela 1 – Possibilidades de somas no jogo de par ou ímpar

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Somas 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Quantidades 1 2 3 4 5 6 5 4 3 2 1

explicação para a

alteração do padrão

da regularidade da

sequência de somas

75. P: Por que só tem uma possibilidade para a soma “10”?

76. Augusto: Porque só tem duas mãos.

77. Luís Felipe: É. Cinco mais cinco.

78. P: Então, temos mais somas pares ou ímpares?

79. Luís Felipe: O mesmo tanto.

Compreensão das

variáveis e de suas

possibilidades

O trecho transcrito sobre o item a, “a soma ser um número ímpar”, vai além da

verificação das somas serem pares ou ímpares. Ele apresenta a construção de significados e

significações sobre vários termos apresentados na tarefa e também sobre análise combinatória

e probabilidade.

Percebe-se logo no início da discussão (T1)52

que o termo “certo”, usado por uma

dupla, incomoda os colegas. Tal incômodo é justificado na busca de significados para a

52

T1: Transcrição 1.

Page 101: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

100

palavra, como “que é uma certeza” (T1 5)53

e “se é verdade” (T1 6) Além da palavra “certo”,

o termo “seguro” também não foi aceito por Augusto (T1.13). Esses trechos evidenciam a

construção de significados para as palavras do vocabulário probabilístico e de relações entre

os significados dos termos e o evento “sair um número ímpar”

O fato de os alunos considerarem que determinados termos não são adequados e que

os outros termos são adequados, até mesmo os não mencionados, apresentados no trecho T1

(8-15), indica que os estudantes possuem conceitos sobre as possibilidades no jogo de par ou

ímpar, mobilizados no movimento de significação. Classificar esses conceitos no movimento

de significação não é possível, pois, de acordo com Fontana (2005, p 22), “apesar das

diferenças existentes entre conceitos espontâneos (dominados pela criança) e os conceitos

sistematizados (propostos na escola), no processo de elaboração da criança eles articulam-se

dialeticamente”

O evento crítico apresentado no T1 (16-20), em que o aluno Augusto faz a análise de

possibilidades a partir das jogadas do adversário, indica a presença da concepção subjetivista

de probabilidade, determinada a partir das vivências do aluno. As colocações de Augusto

diante da tarefa e do questionamento da professora-pesquisadora − “Você confia fazer dessa

forma com outro colega?” − apontam que o aluno tem ideia de que diferentes contextos

sugerem diferentes interpretações.

A concepção frequentista da probabilidade é apresentada por Luís Fernando quando

sugere que seja calculada a frequência de jogadas para verificar as possibilidades de somas

pares e ímpares no jogo (T1.22). A resposta negativa do aluno (T1.24) ao questionamento da

professora-pesquisadora, “Mas será que essa forma é confiável?”, é mais um indício de que

os alunos possuem conceitos sobre probabilidade a partir de vivências anteriores, escolares e

cotidianas.

A comunicação desenvolvida entre os trechos T1 (16-24) apresenta diferentes

concepções probabilísticas dos alunos Augusto e Luís Fernando no desenvolvimento do

mesmo item da tarefa 1. O fato de ser o mesmo item não significa que seja o mesmo contexto,

pois problematizações desenvolvidas ao longo do diálogo modificaram o percurso da

discussão. A concepção subjetivista foi apresentada a partir da análise de uma situação

particular vivenciada por Augusto, que a compartilhou com a classe; a concepção frequentista

exposta por Luís Fernando foi desencadeada como uma proposta para resolver uma

53

T1. 5: Transcrição 1, fala 5.

Page 102: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

101

problemática que surgiu no decorrer do diálogo. Percebe-se, assim, a importância da

linguagem e da problematização na apresentação dos significados sobre os contextos.

Nesse trecho, também é possível observar que diferentes concepções probabilísticas,

presentes no ideário dos alunos são expostas de maneira espontânea na tentativa de significar

seus conceitos. Compreendo que nessa situação a apresentação dos conceitos probabilísticos

foi espontânea, mas também mediada pela linguagem, pelas problematizações e pelo ambiente

de aprendizagem; o que ressalta a importância da mediação na construção de conceitos.

Percebe-se no episódio 1 que a construção do espaço amostral não surgiu de imediato,

talvez por falta de experiências anteriores com esse tipo de problema de combinatória. Isso só

ocorreu a partir da fala 27, com a sinalização do aluno Gabriel − “Lógico que tem” (T1 25) −

e do questionamento da professora − “Será que não há outra forma, além de ficar marcando

o resultado das jogadas?” (T1 26) Ideias coerentes com a construção de espaço foram

apresentadas por Thadeu (T1.27), sugerindo a utilização dos próprios dedos para a construção

do espaço amostral.

A colocação do aluno Thadeu é um indicativo da necessidade que o aluno tem de

utilizar recursos representativos para a construção do espaço amostral e até mesmo para a

significação da ação que está se desenvolvendo. Esse apontamento é um fato relevante para

pensar no processo de ensino e de aprendizagem da combinatória, desenvolvido muitas vezes

por meio de uma situação-problema, sem a manipulação de instrumentos ou de sentidos para

o aluno.

Outra questão que se observa neste trecho é o papel desempenhado pela professora,

que, movida pela intencionalidade com o intuito de desenvolver conceitos sobre combinatória

em seus alunos, busca, a partir de questionamentos e colocações, articular a ideia apresentada

por Thadeu à construção organizada do espaço amostral. O procedimento analítico

desenvolvido com a problematização indica um processo de formação de conceitos sobre

análise combinatória. Segundo a concepção Vygotskyana, os conceitos científicos se iniciam

por experiências concretas e procedimentos analíticos.

No trecho T1 (25-74) do diálogo, foi construído o espaço amostral e a contagem das

somas (T1.29-74). No decorrer dessa ação fui anotando as informações de forma organizada,

em um quadro construído na lousa, para que os alunos percebessem a regularidade das somas;

e, a partir desses dados, questionei a situação no momento que o padrão da sequência seria

alterado: “Por que vocês acham que a quantidade é 7?” (T1 61) A resposta da classe “7”

Page 103: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

102

(T1 60) e do aluno Luís Fernando “Porque está dando sempre um número a mais?” (T1 62)

indica que perceberam a regularidade da sequência, mas não imaginavam que ela seria

alterada.

O conflito gerado com a alteração do padrão da sequência de somas indicado pelo

aluno Lucas “Não! São 5.” (T1 64) imediatamente é justificado por Luís Fernando: “na lousa

só tem cinco tabelas. Então não vai ficar aumentando.” (T1 67) Esse trecho aponta que

problematizações geradas a partir de conflitos cognitivos criam nos alunos a necessidade da

construção de sentido. Essa construção consequentemente possibilita que conceitos sejam

desenvolvidos ou ampliados Segundo Fontana (2005, p 129), “na busca de compreensão, de

apropriação ativa do dizer do outro, este é aproximado das palavras interiores, dos conceitos

já internalizados e consolidados ou em processo de elaboração, conceitos espontâneos ou

não”

Observa-se, no decorrer do episódio 1, que a linguagem e a dinâmica de

problematização desenvolvida a partir da tarefa 1, “linguagem probabilística”, conduziu os

alunos a desenvolveram generalizações e conceitos sobre análise combinatória e também

padrões numéricos.

Ao organizar os dados para análise da pesquisa, percebi que concepções equivocadas

sobre as somas “pares” e “ímpares” podem ser construídas a partir da tabela apresentada

(Tabela 1), pois há mais elementos pares − 0, 2, 4, 6, 8 e 10 − que ímpares − 1, 3, 5, 7 e 9. No

entanto, a quantidade de somas pares e ímpares é a mesma. Talvez a construção de um quadro

com as possibilidades das somas no jogo de “par ou ímpar” seria mais adequada para observar

essa relação entre as somas e suas possibilidades:

Tabela 2 – Análise das possibilidades no jogo de “par ou ímpar”

Somas ímpares

Somas pares

Fonte: Acervo da Pesquisadora

+ 0 1 2 3 4 5

0 0 1 2 3 4 5

1 1 2 3 4 5 6

2 2 3 4 5 6 7

3 3 4 5 6 7 8

4 4 5 6 7 8 9

5 5 6 7 8 9 10

Page 104: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

103

Com essa tabela é possível observar que a quantidade de somas pares e ímpares são as

mesmas, 18 cada, mesmo tendo mais elementos de soma pares. Essa discussão não foi

realizada na aula porque considerei que a fala do aluno “o mesmo tanto” (T1 79), a partir da

tabela desenvolvida com eles e das observações dos alunos apresentadas na transcrição da

quantidade de possibilidades de cada soma e do total (T1. 45-74), evidenciava que haviam

resolvido a problemática.

Observa-se, com a análise do episódio 1, que − assim como apontado por

pesquisadores como Godino, Batanero e Cañizares (1996), Green (1982) e Santos (2010) − os

termos do vocabulário probabilístico não são compartilhados por todos os alunos. Contudo,

no desenvolvimento da tarefa 1 “linguagem probabilística” os alunos construíram um

movimento de sentidos e significações dos termos do vocabulário probabilístico em diferentes

contextos.

Os conceitos espontâneos sobre a combinatória apresentados pelos alunos foram

pontos de partida para problematizações, que desencadearam ideias, generalizações e/ou

(re)significações. Esse fato ressalta as considerações de Vygotsky (2001) sobre a importância

dos conceitos espontâneos para a formação de conceitos científicos.

As problematizações promovidas e desenvolvidas na tarefa 1 possibilitaram que

diferentes conceitos sobre probabilidade fossem apresentados por alguns alunos. Esse fato é

um indicativo de que a tarefa “linguagem probabilística” proporciona a construção de relações

entre conceitos sobre combinatória e sobre probabilidade. Além dessas relações, a tarefa

também permitiu que observações e conceitos sobre sequência numérica fossem

desenvolvidos.

O procedimento de análise de possibilidade do jogo de par ou ímpar apresentado pelo

aluno Lucas na fase de desenvolvimento da tarefa, por meio de adições, e as sugestões do

aluno Luís Fernando para fazer essa análise a partir do registro de jogadas (T1.22) e do aluno

Thadeu (T1.27) para fazê-la com os próprios dedos indicam que os alunos possuem

conhecimento de diferentes procedimentos de contagem. Todavia, esses procedimentos nem

sempre são utilizados pelos alunos na resolução de problemas sobre combinatória, e, quando

utilizados, muitas vezes não conduzem os alunos à resposta adequada.

Considero que esse fato é um indicativo relevante para pensar no processo de ensino

da combinatória. Sugiro o desenvolvimento de tarefas que possibilitem a construção

significativa de diferentes procedimentos de contagem e uma dinâmica de aprendizagem que

Page 105: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

104

permita que esses conceitos sejam problematizados e sistematizados em um processo de

negociação de ideias entre professor e alunos, como desenvolvido nesta pesquisa.

As observações apresentadas sinalizam que a tarefa “linguagem probabilística”

proporcionou a construção de conceitos sobre combinatória e probabilidade pelos alunos. No

entanto, considero que apenas seu desenvolvimento não torna uma tarefa potencializadora,

pois os componentes mediadores − linguagem, ambiente de aprendizagem e problematizações

−, articulados nas diferentes fases de realização da tarefa, em um contexto real de sala de aula,

possibilitaram o movimento de conceitos e significações sobre a temática.

É evidente, no decorrer desse episódio, a importância das relações sociais, do coletivo,

para a ação/elaboração conceitual particular, conforme apontado por Vygotsky. O movimento

de elaboração conceitual feito no ambiente de sala de aula levou os alunos a desenvolverem

conceitos sobre combinatória e probabilidade, e me conduziu, enquanto professora, a

construir conceitos refletidos em ações que objetivavam o desenvolvimento do raciocínio

combinatório e probabilístico.

Na sequência da realização da reflexão conclusiva sobre o item a, “a soma ser um

número ímpar”, foi realizada a do item b, “a soma ser um número menor que 10” Depois que

os termos utilizados pela dupla no item foram organizados na lousa, iniciou-se a fase de

reflexão conclusiva do segundo item.

Transcrição 2: fragmento da reflexão

sobre o item “a soma ser um número

menor que 10” (T2)

Possíveis eventos críticos

80. Augusto: O que é “há alguma

probabilidade”?

81. P: Alguém já ouviu esse termo?

82. Classe: Sim.

83. P: O que sabem sobre ele?

84. Núbia: Que é provável acontecer.

85. Stela: Que está provando alguma coisa, tipo

assim.

86. P: Quando eu associo esse termo a alguma

Movimento: significado para o

termo “há alguma

probabilidade”

Page 106: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

105

situação, o que posso concluir?

87. Raquel: Que tem alguma chance de acontecer.

88. Augusto: Entendi.

89. P: Pensando no jogo do “par ou ímpar”, qual

a menor soma que temos?

90. Classe: “Zero”.

91. P: E a maior?

92. Classe: “Dez”.

Ideias sobre os limites do

espaço amostral do evento

93. Raquel: “Cinco”.

94. Augusto: De uma pessoa é “cinco” e de duas

são “dez”.

95. Raquel: É “cinco”.

96. Bruna: “Dez”.

97. Augusto: Se cada um coloca cinco, quanto vai

ter?

Conflito com a maior soma:

construção de argumentos para

validar considerações

98. Bruna: Prô, pode colocar duas mãos ou tem

que colocar só uma?

99. Classe: Uma só.

100. Stela: Com um ou com dois jogadores?

101. Lucas: São dois?

102. Raquel: Mais pode ser de mais jogadores.

103. P: No jogo com dois jogadores qual a maior

soma que podemos obter?

104. Raquel: É dez.

Legitimação dos argumentos de

validação

105. P: E se fosse com três jogadores?

106. Augusto: Quinze. Aumenta cinco quando

aumenta um jogador. Sempre assim.

107. P: E a menor soma com três ou mais

jogadores?

Os alunos ficaram quietos por um tempo.

Generalização: espaço amostral

se altera de acordo com os

parâmetros

Page 107: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

106

108. Augusto: Zero. Todo mundo não põe nada.

109. P: Ok. Voltando ao item b: a soma ser um

número menor que dez; o que podemos

concluir?

110. Augusto: Que é certo.

111. P: Como assim?

112. Augusto: Cada mão tem cinco dedos.

113. P: Quando eu digo “menor que dez”, o dez

está incluso ou não?

114. Stela: Não! Você está falando menor que

“dez”.

115. P: E quais são essas somas?

116. Classe: Nove, oito, sete, seis, ..., zero.

117. P: Quando eu digo que é possível cair um

número menor que “dez”, o que eu estou

querendo dizer?

118. Luís Felipe: Que é possível que caia um

número desses.

Equívoco provocado pelo

termo “menor que”

119. P: E se não fosse o menor que dez, que

número seria?

120. Luís Felipe: O “dez”.

121. P: E o pode acontecer nessa situação?

122. Luís Felipe: Pode ser um número menor que

dez: nove, oito, assim.

123. P: E é certo?

124. Bruna: É certeza que vai acontecer.

125. P: Temos certeza que vai sair um número

menor que “dez”?

126. Stela: Não. Mais ou menos.

127. P: Por que mais ou menos?

128. Bruna: Não tem certeza que vai tirar “dez”.

129. Stela: É. Vai saber, ela pode por “cinco” e eu

Negociação de possibilidades e

probabilidades

Page 108: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

107

“um”.

130. Bruna: Aí fica “seis”.

131. P: Vamos olhar para os outros termos. Eu

posso considerar o termo “há alguma

probabilidade”?

132. Classe: Pode.

133. P: Tem algum termo que foi usado pelos

colegas que vocês acham que não é adequado

à situação?

134. Bruna, Augusto e Raquel: O certo.

135. P: E os alunos que colocaram o certo, o que

pensam?

136. Augusto: Eu confundi. Achei que o “dez”

também seria.

137. Lucas: Eu também.

138. Thadeu: Eu também.

139. P: Tem algum termo que não foi usado e que

vocês acham que poderiam ter usado?

140. Augusto: Há alguma possibilidade.

141. Stela: Seguro. Não, não!

142. P: Seguro não?

143. Thadeu: Não, porque não é certo que caia o

“dez”.

Verificação de termos

adequados e não adequados ao

evento

144. Stela: Não é seguro essa resposta, não tem

muitas chances de cair o “dez”.

145. P: Por que o “dez” não têm muitas chances?

146. Stela: Tem muito mais chances de cair os

menores que 10.

Noção de probabilidade

147. P: Tem algum termo que pode ser utilizado em

situações em que as chances são muitas?

148. Stela: Possível.

149. Augusto: Há alguma possibilidade.

Conflito: busca de termo que

representa “muitas chances”

Page 109: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

108

150. P: Para vocês o “possível” e “há alguma

possibilidade” indica que tem muitas chances

de acontecer, mais do que de não acontecer?

151. Classe: É.

152. Melissa: Pode ser.

153. P: O bastante provável pode usar nessa

situação?

154. Stela: Aí, vai saber. Você está afirmando que

vai acontecer.

155. Bruna: Você está quase afirmando que vai

acontecer aquilo.

156. P: Podemos quase afirmar que vai acontecer

de sair um número menor que dez?

157. Bruna: Não, não pode.

158. P: Vamos retomar na análise de

possibilidades de somas que fizemos.

Professora coloca o diagrama feito na lousa, no item anterior

(Diagrama 1).

159. Thadeu: Nós podemos utilizar o “bastante

provável”.

160. P: Por que?

161. Thadeu: Porque o dez tem uma chance só de

sair e os outros tem bastante chances.

162. P: Quantas?

163. Thadeu: Trinta e cinco.

164. P: Afinal, a que conclusão chegamos?

165. Lucas: Que é bastante provável que saia um

número menor que dez.

Procedimento de representação

visual do espaço amostral

Page 110: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

109

A reflexão conclusiva do item b, “a soma ser um número menor que 10”, envolveu

mais alunos na discussão do que no item a. Esse fato indica o desejo, por parte dos alunos, de

expressar suas ideias sobre a tarefa. Acredito que o ambiente de aprendizagem propiciado

para o desenvolvimento das tarefas e a postura dialógica adotada por mim, enquanto

professora, na fase de reflexão conclusiva da tarefa sejam fatores preponderantes para tal

atitude, uma vez que os alunos se sentem envolvidos na dinâmica de ensino e aprendizagem.

Considero que a dinâmica de ensino e essa postura da professora são fatores relevantes para o

desenvolvimento de conceitos e significações sobre combinatória e probabilidade, de acordo

com as considerações de Moura et al (2010, p 83) é no “movimento do social ao individual

que se dá a apropriação de conceitos e significações”

Observa-se, no início do episódio 2 (T2.80-88), que as alunas Núbia, Raquel e Stela

buscam esclarecer a dúvida do colega Augusto, “O que é: há alguma probabilidade?”, e, no

trecho T2 (89-92), que os alunos apresentam suas ideias sobre os limites do espaço amostral

no jogo de par ou ímpar entre dois jogadores ao afirmarem que a menor soma é 0 e a maior é

10. Ambas as situações são desencadeadas por questionamentos realizados por mim, no papel

da professora, que busco, por meio de problematizações, estimular a apresentação dos

conceitos dos alunos sobre a temática em questão e também provocar a construção de

significações para as ideias colocadas por eles. Essa postura adotada indica, mais uma vez, a

relevância da intencionalidade do professor como mediador de suas ações para a construção

de significações nas aulas de Matemática.

O processo de comunicação e circulação de ideias no decorrer do episódio parece algo

natural, os alunos apresentam seus conceitos, contrariam os apresentados pelos colegas, o que

provoca conflitos de ideias, como o apresentado pela aluna Raquel quando discorda de

Augusto, no trecho T2 (93-97), ao afirmar que a maior soma no jogo de par ou ímpar é

“cinco” e não “dez”, como ele coloca A ideia de Raquel também é refutada por Bruna

(T2.96), mas a partir da justificativa e do questionamento de Augusto, “de uma pessoa é cinco

e de duas são dez” T2 (94) e “se uma coloca 5, quanto vai ter?” T2 (97), Raquel valida as

respostas dos colegas (T2.104), as quais indicam que a maior soma no jogo de par ou ímpar

entre duas pessoas é “dez” Nesse momento, na tentativa de convencer a aluna Raquel de que

estava equivocada, Augusto explica as alterações do espaço amostral no jogo de par ou ímpar.

A ideia de que o espaço amostral é alterado de acordo com os parâmetros é compreendido

Page 111: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

110

pelo aluno, tanto que, quando questiono “e se o jogo fosse com três jogadores?”, ele responde

que seria “15” e justifica que “aumenta cinco quando aumenta um jogador. Sempre assim”

Esse trecho evidencia que os conceitos sobre combinatória dos alunos de uma mesma

faixa etária estão em níveis diferenciados. Mas, a partir de um movimento mediado pela

linguagem, os conceitos vão sendo (re) significados, alcançando níveis mais elevados de

generalizações, como aponta Fontana (1993, p 125), “na dinâmica de elaboração conceitual, a

palavra é mediadora da compreensão ativa dos conceitos e da transição de uma generalização

para outras generalizações”

A interpretação errônea do enunciado “a soma ser um número menor que 10” levou

várias duplas a conclusões equivocadas do espaço amostral, incluindo a soma 10 na contagem

e considerando a palavra “certo” adequada para o evento (T2 109-118). Um dos alunos que

apresentou essa concepção equivocada foi Augusto, que no trecho anterior apresentou

conceitos significativos sobre alterações do espaço amostral no jogo de par ou ímpar. Esse

fato traz dois indicativos: a influência dos significados atribuídos à linguagem e à estimação

das probabilidades − pois o aluno que apresentava conceitos científicos sobre o espaço

amostral do jogo de par ou ímpar, em momento subsequente, fez interpretação equivocada do

termo “menor que” e estimação da probabilidade por meio de termo do vocabulário

probabilístico − e a influência dos diferentes contextos no movimento de concepções

espontâneas e científicas desse aluno.

Esse apontamento, de certo modo, é notado por Vygotsky (2001) quando afirma que a

formação de conceitos não apresenta percurso linear e não é limitada por idade cronológica e

maturação biológica. Penso que a formação de conceitos sobre combinatória pode ser

compreendida como um processo circular, que se movimenta de forma vertical e horizontal,

como uma espiral, a partir de interferências do outro, desencadeadas por intervenções

didáticas pedagógicas, pela linguagem, como pensamento verbal e forma de comunicação e

também do movimento individual de significações, tal como apresentado no esquema 2.

A relação entre possibilidades e probabilidade surgiu no diálogo, na negociação entre

as possibilidades do jogo e a probabilidade de sair ou não um número menor que 10 (T2. 119-

130; T2. 145-157). Concepções formais de probabilidade são apresentadas ao justificar alguns

termos que não são considerados adequados para o evento, como o “seguro” (T2 144), e

termos considerados adequados, como o “bastante provável” (T2 159-163). As considerações

do aluno Thadeu para essa problemática − “nós podemos utilizar o bastante provável” para os

Page 112: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

111

números menores que dez, “porque o dez tem uma chance só de sair e as outras têm bastantes

chances” − foram apresentadas depois da retomada das possibilidades de somas no jogo

proposta pela professora a partir da reprodução do diagrama de árvores com as possibilidades

(Diagrama 1) na lousa. Presume-se, com o exposto, que o conceito formal de probabilidade

apresentado e justificado por Thadeu foi instigado pela retomada das possibilidades de somas

na lousa. Ou seja, a representação visual do espaço amostral permitiu que o aluno Thadeu

apresentasse suas considerações sobre as possibilidades e a probabilidade de “sair uma soma

menor que dez no jogo do par ou ímpar” de forma segura

As reflexões produzidas nos itens “b” da tarefa “linguagem probabilística” sinalizam

que a dinâmica de ensino utilizada na pesquisa, desenvolvida a partir da proposta de

Christiansen e Walther (1986), aliada à tarefa, favorece o processo de linguagem e formação

de conceitos sobre a combinatória e a probabilidade. O papel do professor nessa dinâmica de

ensino e de aprendizagem é crucial, pois é ele que, de certa forma, provoca o movimento do

esquema, constituído por componentes mediadores: tarefa, linguagem e ambiente de

aprendizagem e conceitos espontâneos e científicos. O movimento provocado pelo professor

tem origem em sua intencionalidade, no propósito de formar conceitos científicos específicos,

mas é a partir das problematizações que desenvolve, ou conduz, que esse esquema ganha

força para se movimentar e articular conceitos sobre combinatória e probabilidade.

Assim como no item b, na socialização do item c, “a soma ser o número 12”, os

termos que as duplas haviam colocado para esse evento foram registrados na lousa. Nesse

item, as duplas utilizaram apenas os termos “impossível” e “incerto” para o evento. A partir

disso, iniciou-se uma discussão a respeito destes, a qual transcrevo a seguir.

Transcrição 3: fragmento da reflexão

conclusiva sobre o item c: “a soma ser o

número 12” (T3)

Possíveis eventos críticos

166. P: O que acham desses termos?

167. Augusto: É a mesma coisa.

168. Thadeu: Incerto é indeciso.

169. Melina: É impossível!!! Por exemplo, eu

coloco “5” e ela “5”, 10. É impossível dar 12.

Significações das palavras

“incerto” e “impossível”

Page 113: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

112

170. Núbia: Incerto é alguma coisa que não está

certo. Impossível é que não pode acontecer.

171. P: Esse acontecimento é impossível, incerto,

ou os dois?

172. Augusto: Não tem como acontecer.

173. Valéria: Cada um só tem cinco em cada mão.

174. Bruna: Não tem como acontecer! É impossível.

Observa-se, nesse fragmento, que os alunos apresentam significados para as palavras

“incerto” e “impossível” ao mesmo tempo que estabelecem relações das palavras com o

contexto, produzindo, dessa forma, significações. Os dados apresentados nesse trecho são um

indício de que os alunos são capazes de produzir significações sobre combinatória e

probabilidade a partir de problematizações de situações que envolvem termos do vocabulário

probabilístico.

Destaca-se também a importância de se trabalhar com os significados das palavras. . A

palavra “incerto” é considerada por Núbia como antônimo de certo (T1. 170). No entanto,

“não está certo” não é a mesma coisa que “não é certo” Para os alunos, o “certo” está

relacionado a um estado − por exemplo, o exercício está certo −, só que em contexto

probabilístico o “certo” representa certeza

Esse contexto também é um indicativo do desenvolvimento do pensamento

probabilístico dos alunos, pois, de acordo com Celi Lopes (2008), ele possibilita a avaliação

das possibilidades para a medida de chance dos acontecimentos e consequentemente

“instrumentaliza as pessoas em suas previsões e tomadas de decisões” (LOPES, C., 2008, p.

72).

De maneira semelhante ao item anterior, os termos empregados pelos alunos nas

problemáticas apresentadas foram registrados na lousa. No entanto, no momento da

socialização das respostas, na fase de reflexão conclusiva, o aluno Thadeu interrompeu a

professora-pesquisadora na tentativa de adiantar a finalização do trabalho. Esse momento do

episódio é transcrito a seguir:

Page 114: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

113

Transcrição 4: fragmento da reflexão

sobre o item “a soma ser um número

maior que 0” (T4)

Possíveis eventos críticos

175. Thadeu: É igual ao 10. Não precisa nem falar,

pode usar as mesmas palavras. [O aluno se

referia ao b, “a soma ser menor que 10”]

176. Jéssica: É.

177. P: O que os colegas acham?

178. Classe: É mesmo. Não precisa repetir de

novo.

Estabelecendo relações em

diferentes contextos

O diálogo exposto indica que o aluno Thiago avaliou os diferentes eventos, “a soma

ser um número menor que 10” e “a soma ser um número maior que 0”, e constatou que as

possibilidade e as probabilidades são as mesmas. Essa observação indica um processo de

elaboração conceitual do aluno, explicitado por generalizações de uma mesma temática em

uma diferente problemática. De acordo com Vigotsky (2001, p. 9), esse tipo de processo pode

ser compreendido como generalização, pois é “um ato verbal de pensamento e reflete a

realidade duma forma totalmente diferente da sensação e da percepção”

Depois da observação de Thadeu e do consentimento da classe, iniciamos a reflexão

conclusiva do item e, “a soma ser o número 0” Assim como nas tarefas anteriores, os alunos

disseram os termos que utilizaram para o evento, e eu registrei na lousa; depois iniciamos a

socialização desse item da tarefa. Os demais itens da tarefa também foram discutidos.

Transcrição 5: fragmento da reflexão

sobre os itens “a soma ser o número 0”,

“os colegas apresentarem número de

dedos distintos” e “os colegas

apresentarem número de dedos iguais” (T5)

Possíveis eventos críticos

179. P: Nesta situação, o que podemos considerar?

180. Thadeu: Zero e zero.

181. P: Que termos usaram nesse evento?

Termos adequados para o

evento “a soma ser o número

0”: termos adequados ao

Page 115: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

114

182. Augusto: Há alguma possibilidade.

183. Bruna: É possível. Pode ser.

contexto

184. P: Posso usar o termo bastante provável

aqui?

185. Bruna: Não! Bastante provável é que acontece

bastante e isso não acontece.

Conceito de probabilidade

186. P: Como fica a situação dos colegas

apresentarem números de dedos distintos?

187. Valéria: Possível.

188. Augusto: Há alguma possibilidade. Pode ser.

Análise do contexto e termos

adequados: “os colegas

apresentarem número de dedos

distintos”

189. P: E os colegas apresentarem números de

dedos iguais?

190. Raquel: É possível.

191. Luís Felipe: Há alguma probabilidade,

possibilidade.

192. Bruna: Pode ser.

Outro contexto: “apresentarem

números de dedos iguais”

No transcorrer das discussões percebe-se que os alunos passaram a usar palavras

consideradas adequadas para os diferentes eventos com certa facilidade, não havendo

incompatibilidade de opiniões sobre os termos sugeridos. Além disso, eles são mais objetivos

em suas considerações No entanto, os termos “impossível”, “bastante provável” e “certo”,

utilizados nos registros escritos, apresentados no quadro 5, foram omitidos na fase da reflexão

conclusiva. Esse fato indica que as discussões anteriores possibilitaram a construção de

significações para os termos do vocabulário probabilístico, observada pela flexibilidade de

adequação do uso dos termos aos diferentes contextos e de estimativa de probabilidade,

apresentada pela aluna Bruna quanto “soma ser o número “0”

Problematizações como essas e outras desenvolvidas ao longo da tarefa possibilitaram

que os alunos avaliassem situações de combinatória e probabilidade em diferentes contextos,

tal fato é sugerido por Watson (2006), que defende que a exploração de distintos contextos no

ensino da probabilidade possibilita o desenvolvimento de conceitos probabilísticos. Às

considerações da autora, acrescento que um trabalho articulado entre combinatória e

Page 116: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

115

probabilidade, envolvendo variados contextos, proporciona o desenvolvimento do

pensamento combinatório e probabilístico dos alunos.

No final dessa fase de reflexão conclusiva, perguntei aos alunos o que acharam da

tarefa que realizamos. Suas considerações são apresentadas.

Transcrição: fragmento sobre a opinião dos

alunos sobre a tarefa (T6)

Possíveis eventos críticos

193. P: O que acharam da tarefa que realizamos?

194. Bruna: Legal! O tempo passa mais rápido.

195. Augusto: É. Antes passava devagar.

196. Bruna: A Matemática fica mais interessante.

197. Welligton: Parece que a gente aprende mais.

198. Valéria: Depois do problema da balança54

a

Matemática ficou mais legal.

199. Bruna: Foi legal, mas agora está ficando mais

interessante. Eu, que odiava Matemática, estou

começando a gostar.

Sentimentos em relação à

aula de Matemática

As palavras de alguns alunos mostram o quanto estavam satisfeitos com as aulas de

Matemática, mais precisamente com o ambiente de aprendizagem. Neste ambiente, o trabalho

no processo de ensino e de aprendizagem é compartilhado entre professor e alunos. Ao se

sentirem motivados pelo processo, os estudantes se envolvem em uma cultura compartilhada

de construção de significados e significações dos conceitos matemáticos. Como apontado por

Rigon et al (2010, p.58), “o movimento de internalização dos significados e atribuição dos

sentidos dos objetos pelo homem é decorrente da vida em sociedade, pelas relações

interpessoais”

Considero que o ambiente de aprendizagem feito na pesquisa possibilitou que

interações fossem estabelecidas a partir da linguagem, como: professor-aluno, tarefa-alunos e

alunos-conceitos combinatórios e probabilísticos. Nesse processo, a linguagem foi 54

Problema desenvolvido em dinâmica semelhante à aplicada nessa pesquisa.

Page 117: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

116

fundamental para que conceitos sobre combinatória e probabilidade fossem desenvolvidos,

contribuindo, assim, para o desenvolvimento do pensamento combinatório e probabilístico

dos alunos do 6º ano do Ensino fundamental.

Os estudos realizados para esta pesquisa e a análise deste episódio me conduziram a

algumas considerações como as de Godino, Batanero e Cañizares (1996), que observaram que

os alunos apresentam dificuldades nas estimações probabilísticas e na interpretação de termos

do vocabulário probabilístico. Penso, a partir da análise aqui apresentada, que os obstáculos

da estimação probabilística apontada por esses pesquisadores estejam relacionadas aos

equívocos de interpretação dos enunciados dos problemas, envolvendo termos específicos do

vocabulário probabilístico e outros. Dessa forma, o fato de fazer estimação probabilística

equivocada não necessariamente indica que o aluno não possui conceitos sobre probabilidade.

Provavelmente, os alunos estão na fase do pensamento por complexo, ou seja, estabelecem

nexos, mas carregam indícios de verdadeiros conceitos.

A possibilidade de comunicação e circulação de conceitos sobre combinatória e

probabilidade contribui para o processo de interpretação de situações nesse contexto. Desse

modo, o conceito espontâneo apresentado inicialmente é (re)significado, novos níveis de

generalização são alcançados, conduzindo provavelmente os alunos à elaboração conceitual.

No decorrer da tarefa, nota-se que diferentes conceitos sobre probabilidade foram

apresentados e significados pelos alunos. Conforme relatado anteriormente, essa observação

também foi constatada em minha pesquisa de mestrado, ao indicar que diferentes conceitos

probabilísticos estão presentes no discurso e no ideário dos alunos da Educação Básica.

Esse indicativo vem ao encontro das considerações de Watson (2006), ao afirmar que

os conceitos subjetivo, frequentista e formal das Probabilidades devem estar presentes no

currículo escolar. Acredito que as concepções lógica e clássica também devam estar presentes

no currículo escolar. Porém enfatizo sua inclusão no currículo não é suficiente para um ensino

e uma aprendizagem com compreensão.

De acordo com o apontado no referencial teórico e o observado no decorrer da análise,

um aluno pode apresentar conceito formal em determinado momento e subjetivista em outro,

pois há implicações do contexto em que a Probabilidade está sendo utilizada e também das

relações entre conceitos desenvolvidos nas vivências cotidianas e escolares das pessoas.

Dessa forma, as articulações entre conceitos espontâneos e científicos sobre probabilidade

precisam estar inseridas no trabalho pedagógico em sala de aula.

Page 118: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

117

No episódio 1, observa-se de maneira marcante o papel assumido por mim, enquanto

professora, no decorrer dos diálogos. O papel dialógico do docente, de acordo com Fontana

(2003), é uma forma deliberada e explícita para a elaboração conceitual pelo aluno. Além

disso, a autora acrescenta que a imagem que se tem do adulto no cotidiano é diferente da

imagem constituída culturalmente pelo aluno do adulto (professor) como mediador do

trabalho em sala de aula. Compreendo, com o exposto, que o papel culturalmente instituído ao

professor, de promotor do trabalho pedagógico em sala de aula, deve ser usado a favor do

processo de ensino e de aprendizagem. Ou seja, o professor pode aliar essa visão

culturalmente instituída a sua intencionalidade pedagógica, assumindo uma postura reflexiva

diante do processo de formação de conceitos científicos dos alunos, uma prática

problematizadora em sala de aula.

A linguagem, assim como apontada por Vigotsky (2001), é percebida na análise

realizada como uma potencialidade na formação de conceitos sobre combinatória e

probabilidade dos alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. É expressa por meio de coesões

entre comunicação e generalização.

Diante do exposto, observa-se, no decorrer do episódio 1, que a tarefa desencadeou a

construção de conceitos de combinatória e probabilidade e a articulação das relações entre

eles. Esse processo foi mediado pela construção de significações desenvolvidas em uma

dinâmica dialógica entre ambiente de aprendizagem, linguagem e tarefa; que, conduzido pelos

sujeitos envolvidos na pesquisa, provocaram o movimento entre conceitos espontâneos e

científicos.

A segunda tarefa que selecionei para análise foi a “itinerários”. Apresento-a na

sequência, no episódio 2.

4.2 Episódio 2 − Tarefa “itinerários”: possibilidades de construção e significação de

procedimentos de enumeração e contagem

A “itinerários” foi a nona tarefa, de uma sequência de 18 Quando a realizamos55

,

estávamos praticamente na metade do processo de coleta de dados, já havíamos vivenciado

várias problematizações sobre combinatória na sala de aula, produzimos significações sobre

combinatória nas oito tarefas que realizamos anteriormente, como a construção e a produção

55

Eu, professora-pesquisadora, e alunos.

Page 119: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

118

de diversos tipos de registros do espaço amostral de diferentes eventos. Esse foi um dos

fatores que me influenciaram a fazer sua análise. Além disso, não havia trabalhado

anteriormente com tarefa com essa problemática com alunos do 6º ano. Assim, fiquei curiosa

para saber quais significações seriam produzidas a partir dessa tarefa.

Na tarefa 9, “Itinerários”, os alunos deveriam enumerar a quantidade de itinerários

para ir do ponto A ao C, em diferentes condições:

Tarefa 9 − Itinerários

a) Quantos itinerários há para ir de A a C?

b) Quantos itinerários há para ir e para voltar?

c) E se não puder ir e voltar pelo mesmo caminho?

De forma semelhante ao que ocorreu na tarefa apresentada no item anterior, as fases

dos episódios foram analisadas com diferentes instrumentos de coleta de dados, descritos em

cada tópico. Conforme mencionado, as tarefas foram desenvolvidas em três fases:

apresentação, atividade independente e reflexão conclusiva.

Em meu Diário de Campo fiz registros sobre a fase de apresentação da tarefa, um

deles apresento a seguir.

Figura 3 – Diário de Campo da pesquisadora: 29 de novembro de 2010

Depois da tarefa anterior56, os alunos olharam para esta de forma mais “tranquila”.

Alguns não sabiam o significado da palavra “itinerários”, mas de imediato os colegas

disseram: “caminho; percurso; trajeto”. Eles compreenderam o enunciado da tarefa. A

figura que representava os itinerários também foi compreendida por eles. (DC, 29 nov.

2010).

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora

56

Na tarefa 8, “o problema do táxi”, a problematização pedia que criassem formas para enumerar os diferentes

percursos que um táxi poderia fazer em uma “cidade quadriculada”, saindo de O e chegando a A

Page 120: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

119

Na tentativa de observar ou não alguma regularidade nas respostas dadas pelas duplas

de alunos nos registros escritos, organizei-as em quadros. Essa tarefa foi realizada por 19

alunos, sendo oito duplas e um trio. Os demais alunos da classe faltaram nesse dia.

Quadro 7– Quantos itinerários há para ir de A a C?

Quantidade de itinerários determinados pelos alunos: 4 6 13

Número de respostas apresentadas 1 7 1

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Quadro 8 – Quantos itinerários há para ir e voltar?

Quantidade de itinerários determinados pelos alunos: 5 6 12 18 36

Número de respostas apresentadas 1 1 5 1 1

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Quadro 9 – E se não puder ir e voltar pelo mesmo caminho?

Quantidade de itinerários determinados pelos alunos 0 4 6 12 30

Número de respostas apresentadas 2 1 4 1 1

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Os registros feitos pelas duplas apresentavam diferentes procedimentos de

enumeração, como: representação por meio de números e letras, princípio multiplicativo,

traçado dos diferentes itinerários e diagrama de árvores.

Figura 4 – Registro das alunas Bruna e Luana, itinerários para ir de A a C:

representação por meio de letras

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Page 121: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

120

Figura 5 – Registro dos alunos Alex e Felipe, itinerários para ir de A a C: princípio

multiplicativo

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 6 – Registro das alunas Julia e Jenifer, itinerários para ir de A a C: traçado dos

diferentes itinerários

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 7 – Registro das alunas Núbia e Natasha, itinerários para ir de A a C: representação

numérica

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Page 122: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

121

Figura 8 – Registro dos alunos Lucas e Guilherme, itinerários para ir e voltar: diagrama de

árvores

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Embora algumas duplas não tenham chegado ao número exato de possibilidades,

percebe-se que utilizaram diferentes procedimentos de contagem para resolver a tarefa. O uso

desses procedimentos é um indício de desenvolvimento do raciocínio combinatório. Porém, o

uso de procedimentos sistemáticos de contagem, que possuem certa ordem para organizar os

elementos, como o utilizado por Bruna e Luana (Figura 4), pode evidenciar conceitos mais

elevados do raciocínio combinatório. O desenvolvimento de problemas de combinatória é

apontado por Lopes e Coutinho (2009) como relevante para o desenvolvimento do raciocínio

combinatório, pois possibilita diferentes agrupamentos e caminhos para sua resolução.

Durante a realização da tarefa, na fase da atividade independente, conversei com

algumas duplas sobre seus registros. O diálogo estabelecido com Lucas e Augusto sobre os

itens “b” e “c” foi transcrito:

Transcrição 7: fragmento do diálogo

com Lucas sobre os itens “b” e “c” da

tarefa “itinerários” (T7)

Possíveis eventos críticos

200. P: Quantos itinerários há para ir e voltar?

201. Lucas: Tem 18 possibilidades.

Concepção espontânea:

equívoco sobre o total de

possibilidades

202. P: Como chegou a essa conclusão?

203. Lucas: Eu tenho seis caminhos para ir até C. E

Movimento para justificar sua

concepção

Page 123: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

122

seis para voltar, mas ele pode voltar por outro

caminho.

204. P: Como assim?

205. Lucas: Se ele for pelo caminho 1, por exemplo,

ele pode voltar pelo 1, 2, 3, 4, 5 e 6.

O aluno anotou sua fala no diagrama que havia feito em

seu registro escrito:

Figura 9 – Registro da dupla Lucas e Augusto: tarefa 9,

item b

Fonte: Acervo da Pesquisadora

206. Lucas: Então, são 36 itinerários. São 6 vezes 6.

Seis possibilidades anteriores e depois, seis

possibilidades para cada anterior.

Observação de anotação no

diagrama de árvore:

ressignificação de conceito

206. P: E se não puder voltar pelo mesmo caminho?

207. Lucas: São 30 possibilidades, porque se vai pelo

caminho 1, só pode voltar pelo 2, 3, 4, 5 ou 6. Tem 6

possibilidades para ir e 5 para voltar; e 6 vezes 5 são

30.

Percepção de que a situação

pode ser resolvida a partir do

princípio multiplicativo

As concepções espontâneas apresentadas por Lucas (T7. 201) e o registro feito pelo

aluno (Figura 7), em um primeiro momento, representam concepções equivocadas (total 18)

quanto às possibilidades de itinerários de A a C. Tais colocações também podem nos conduzir

a uma interpretação equivocada de seus conceitos sobre combinatória. No entanto, quando

Page 124: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

123

perguntei a ele como chegou a essa conclusão (T7. 202), ele foi instigado a buscar argumentos

significativos para validar sua concepção, percebendo que era um total de 6 x 6 = 36.

De acordo com Vygotsky, a formação de conceitos científicos não tem início apenas

na experiência concreta, mas em procedimentos analíticos. Para o pesquisador, os conceitos

científicos podem ter início na definição verbal, por meio de esclarecimento de propriedades

específicas, e sua aplicação incide em objetos de contextos variados, possibilitando que o

aluno adquira consciência do conceito mediante sua aplicação.

Desse modo, na busca de argumentos para justificar sua resposta, Lucas ressignifica o

conceito equivocado sobre as possibilidades de itinerários e desenvolve generalizações sobre

combinatória ao responder prontamente (T7. 207) que o total seria 30 possibilidades, se não

puder voltar pelo mesmo caminho. Assim como a problematização, o diagrama de árvore foi

um recurso importante para que Lucas percebe-se que a tarefa poderia ser resolvida por meio

do princípio multiplicativo.

Os diferentes registros realizados pelos alunos e a generalização desenvolvida por

Lucas é um indicativo de que a tarefa “itinerários” é importante para o desenvolvimento do

raciocínio combinatório. Lopes e Coutinho (2009) salientam que processo de ensino e

aprendizagem da combinatória deve se pautar na resolução de problemas que permitam a

exploração de diferentes tipos de registros. As autoras atribuem sua importância ao fato de

“[...] modelar uma situação na qual várias possibilidades de construção de agrupamentos, de

caminhos, fornecendo um tipo específico de interpretação quando se devem levar em conta os

resultados possíveis para cada um desses agrupamentos ou caminhos” (LOPES; COUTINHO,

2009, p. 62).

Assim como Lucas, outros alunos apresentaram suas concepções sobre a problemática

proposta pela tarefa. Metade dos grupos colocou que havia 12 possibilidades para ir de A a C

e voltar. A justificativa apresentada no momento da socialização foi a seguinte:

Transcrição 8: fragmento da reflexão sobre os itens b

e c da tarefa “itinerários” (T8).

Possíveis eventos

críticos

208. P: Quantos itinerários há para ir e para voltar?

209. Raquel: Seis de ida e seis de volta.

Conceito de

enumeração x

Page 125: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

124

210. Felipe: É o item a duas vezes.

211. Alex: Duas vezes seis ou seis vezes dois.

conceito

equivocado

212. Lucas: São 36 possibilidades, pois há 6 caminhos para ir,

e para cada um deles há 6 para voltar. Prô, faz os

diagramas na lousa.

Conforme solicitado pelo aluno, fiz os diagramas na lousa.

Diagrama 2 – Possibilidades de itinerários para ir e voltar de A a C

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Aluno explica aos

colegas como

construiu seu

raciocínio

213. P: E se não puder voltar pelo mesmo caminho, como fica?

214. Lucas: Aí são 30 possibilidades, pois não pode voltar pelo

mesmo. Se ele for pelo caminho 1, pode voltar pelo 2, 3, 4,

5 ou 6. Se for pelo caminho 2, pode voltar pelo 1, 3, 4, 5 ou

6.

O aluno seguiu esse raciocínio indicando o percurso de ida e as

possibilidades de volta até o caminho 6. Fui circulando no digrama

feito o caminho que não poderia ser usado para voltar. O diagrama

ficou da seguinte forma:

Diagrama 3 – Itinerários diferentes

Fonte: Acervo da Pesquisadora

Apresentação de

procedimento

sistemático de

contagem:

diagrama de

árvore

Page 126: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

125

215. Lucas: Dá trinta, porque são seis vezes cinco.

216. P: O que a classe me diz da resposta do Lucas e do

Augusto?

217. Luís Felipe: Tá certa.

A classe parecia satisfeita com a conclusão apresentada.

Conceitos

apresentados por

Lucas são

validados pelos

colegas de classe

Ao analisar o primeiro trecho, percebe-se um conflito de conceitos, pois, ao mesmo

tempo em que os alunos apresentam conceitos para enumerar as possibilidades de itinerários

para ir e voltar de A a C, esses conceitos são equivocados. Para justificar o total de itinerários

possíveis, Alex se reporta ao princípio multiplicativo quando afirma que são “duas vezes seis

ou seis vezes dois” (T8 211) Esse procedimento de contagem é adequado situação; no

entanto, a forma como é interpretado, “seis de ida e seis de volta” (T8 209), conduziu-o, bem

como os outros alunos, a uma resposta que não condiz com a quantidade de itinerários do

problema.

A concepção equivocada, apresentada por metade dos alunos, sobre as possibilidades

para ir e voltar de A a C é um indicativo de que tarefas que envolvem situações compostas de

combinatória não são simples para os alunos do 6º ano resolverem. Contudo, segundo

Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), a falta de uso de procedimentos sistemáticos de

enumeração é um dos principais motivos de erros nos problemas de combinatória.

Em minha pesquisa de mestrado, observei que o uso de procedimentos sistemáticos de

contagem conduz os alunos à resposta adequada. Constatei que um aluno se diferenciava dos

demais porque, no desenvolvimento das tarefas que envolviam a combinatória, construía o

espaço amostral de forma organizada, chegando quase sempre ao total de possibilidades dos

eventos.

Penso que essa evidência, assim como as observadas nessa tarefa, é um indicativo da

importância do processo de sistematização de procedimentos de contagem para o

desenvolvimento do raciocínio combinatório. Todavia, considero que não é algo a ser

informado, mas sim desenvolvido de maneira expressiva pelos alunos, assim como fez Lucas

ao explicar aos colegas seu raciocínio no desenvolvimento da tarefa (T8. 212-215).

A tarefa “Itinerários” é um problema de combinatória cujas características envolvem

diferentes tipos de soluções: existência, enumeração, reconto e otimização. Essas

Page 127: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

126

características estão presentes nas problematizações propostas na tarefa e possibilitam que

diferentes significações sejam elaboradas pelos alunos a partir de contexto semelhante. Esse

fato promove o movimento e o desenvolvimento de conceitos mais elevados de combinatória,

como os apresentados pelo aluno Lucas.

Além disso, a tarefa se apresenta como uma potencialidade no desenvolvimento do

raciocínio combinatório, pois possibilita que diferentes procedimentos de enumeração e

contagem sejam construídos e significados pelos alunos A tarefa “o problema das cordas”,

também possibilitou observações a respeito do raciocínio combinatório, as quais apresento no

episódio 3.

4.3 Episódio 3 − Tarefa “O problema das cordas”: análise de regularidades e

possibilidades

A escolha do “o problema das cordas” aconteceu quando eu ainda estava selecionando

as tarefas para a sequência de investigação. De imediato, considerei o problema interessante; a

problemática envolvida se diferenciava das selecionadas até aquele momento, uma vez que

procedimentos lógicos estavam implícitos no processo de contagem das cordas. No entanto,

como o problema fazia parte do livro Experiências Matemáticas (SÃO PAULO, 1998) da 7ª

série, atual 8º ano do Ensino Fundamental, temia que os alunos investigados, turma do 6º ano

do Ensino Fundamental, encontrassem dificuldades ao resolvê-lo. Porém, levando em conta

os pressupostos de Vygotsky de que o aprendizado escolar é fundamental não apenas para o

desenvolvimento de elaboração conceitual dos alunos, mas também para a tomada de

consciência de seus próprios processos mentais, incluí-o na sequência de tarefas.

Achei importante que os alunos já tivessem desenvolvido algumas tarefas sobre

combinatória para realizarmos “o problema das cordas” Assim, na ordem da sequência de

tarefa, sua posição foi a 11a.

Page 128: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

127

Neste episódio, da mesma forma como nos anteriores, foram analisados diferentes

instrumentos de coleta de dados: Diário de Campo, registro escrito dos alunos, gravações de

áudio e vídeo, que são especificados nas fases em que analisados. Ao todo, 22 alunos

realizaram a tarefa, formando, assim, 11 duplas.

O registro que fiz em meu Diário de Campo traz algumas informações sobre a fase de

apresentação da tarefa.

Figura 10 – Diário de Campo da pesquisadora: 30 de novembro de 2010 (1)

Entreguei a folha da tarefa para as duplas, várias leram e disseram que não

entenderam a tarefa. Li com eles o enunciado e perguntei se sabiam o significado da

palavra “respectivamente”. Alguns disseram que não. Assim que expliquei o significado,

percebi que as duplas compreenderam a tarefa. Percebo, muitas vezes, que eles dizem

que não compreenderam a tarefa, mas na verdade parecem inseguros, não confiam na

forma como a interpretaram. Às vezes penso que querem uma confirmação do que

imaginam ser a tarefa antes de a realizarem. (DC, 30 nov. 2010).

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora

Tarefa 11 – O problema das cordas

Marque nas circunferências abaixo, respectivamente, 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 pontos.

Verifique o número de cordas que podem ser traçadas em cada

circunferência, unindo dois pontos.

Organize os resultados obtidos e faça um registro relacionando o

número de pontos e o número de cordas.

É possível determinar, sem traçar, o número de cordas de uma

circunferência com 10 pontos? Justifique sua resposta.

Page 129: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

128

Depois da apresentação da tarefa, as duplas iniciaram a fase da atividade

independente. No início dessa fase surgiram alguns questionamentos, conforme registado no

Diário de Campo:

Figura 11 – Diário de Campo da pesquisadora: 30 de novembro de 2010 (2)

Questionamentos:

Valéria: De um mesmo ponto pode sair duas cordas?

Thadeu: Posso fazer o contrário, sair de um ponto, chegar em outro e voltar ao mesmo?

Para responder a primeira pergunta fiz um círculo na lousa com três pontos e iniciamos um diálogo:

P: O que preciso fazer aqui?

Felipe: Unir dois pontos com um traço. [Executei]

P: E agora?

Augusto: Unir um ponto já marcado com o que está faltando marcar. [Realizei o que o aluno falou]

P: OK! Dá para unir mais pontos?

Lucas: Os outros dois que estão ligados só uma vez. [Liguei os dois pontos]

P: Mais algum?

Felipe: Não.

P: Posso fazer o contrário agora, sair do ponto que cheguei e voltar?

Augusto: Não, é a mesma coisa.

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora

Os trechos do Diário de Campo apresentam uma cena típica de sala de aula: a

princípio os alunos parecem compreender o que está sendo proposto, mas, quando vão

desenvolver a tarefa, surgem dúvidas. Nesse momento, o professor deve pensar em uma

estratégia para que os alunos entendam o que está sendo proposto, mas precisa tomar cuidado

para não apresentar os caminhos para a resolução da tarefa, transformando, dessa forma, um

problema não rotineiro em um exercício, tal como indicam Christiansen e Walther (1986).

Depois que conversamos, os alunos voltaram a realizar a tarefa. Porém, Valéria e sua

colega de dupla, Bianca, me chamaram.

Page 130: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

129

Transcrição 9: fragmento do diálogo com Valéria

sobre “o problema das cordas” (T9)

Possíveis eventos críticos

218. Valéria: Prô, tem alguma coisa que não está certo.

219. P: Por que?

220. Valéria: Com um ponto eu não traço cordas.

Certo?

221. P: OK!

222. Valéria: Com dois pontos eu faço uma corda.

223. P: Sim.

224. Valéria: Com três pontos eu deveria traçar duas

cordas.

225. P: Quantas você traçou?

226. Valéria: Três.

227. P: Por que acha que não está certo?

228. Valéria: Porque estava em uma ordem, e ela

mudou.

229. P: E o próximo círculo, quantas cordas têm?

230. Valéria: Seis.

231. P: E a sequência se manteve do jeito que

imaginava?

232. Valéria: Não. Vou fazer até o final para ver.

A aluna continuou traçando as cordas.

Conflito com a regularidade do

número de cordas

O processo de contagem de número de pontos e de cordas, a princípio, foi

compreendido por Valéria, o que a incomodou foi a alteração no padrão da sequência

elaborada a partir do número cordas, apresentado na transcrição 9. Ao observar que os dois

primeiros números da sequência de cordas eram uma unidade a menos que a quantidade de

pontos, a aluna ficou em dúvida, pois, em sua concepção, a regularidade deveria se manter,

como isso não ocorreu, concluiu que havia algo errado em sua contagem. Esse fato é uma

evidência de que a aluna percebeu certo procedimento lógico na relação entre número de

pontos e cordas.

Page 131: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

130

Poucos estudos relacionados à observação e ao desenvolvimento de sequência

numérica são feitos com os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. As considerações que

os alunos apresentam sobre sequências numéricas são concepções espontâneas, baseadas em

experiências cotidianas, que, na maioria das vezes, só são observadas quando a razão da

sequência se mantém, como no caso da aluna Valéria.

As observações de Valéria sobre as relações entre número de pontos e cordas é um

indício do pensamento por complexos, fase marcada por nexos e relações de observações

desordenadas que são agregadas e organizadas em determinadas experiência. O pensamento

por complexo é uma das três fases básicas, que, segundo Vygotsky, está presente nos períodos

de desenvolvimento do pensamento científico.

Após a conclusão da fase da atividade independente, verifiquei que as duplas

registraram o número de pontos nas circunferências e o número de cordas de diferentes

maneiras. Apresento a seguir os distintos registros dos alunos.

Figura 12 − Registro da dupla Augusto e Guilherme: o problema das cordas

Fonte: Acervo da pesquisadora

Page 132: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

131

Figura 13 − Registro da dupla Elder e Walter: o problema das cordas

Fonte: Acervo da pesquisadora

Figura 14 − Registro da dupla Julia e Jenifer: o problema das cordas

Fonte: Acervo da pesquisadora

Figura 15 − Registro da dupla Luana e Natasha: o problema das cordas

Fonte: Acervo da pesquisadora

Page 133: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

132

Figura 16 − Registro da dupla Anne e Thadeu: o problema das cordas

Fonte: Acervo da pesquisadora

Assim como observado na tarefa “itinerários”, diferentes procedimentos de

enumeração são utilizados pelos alunos em seus registros. Tais registros possibilitaram que as

regularidades fossem notadas e generalizações fossem realizadas. O fato de os alunos usarem

diferentes procedimentos de contagem em variadas problematizações é mais um indício do

desenvolvimento do raciocínio combinatório. Esse fato é apontado por Lopes e Coutinho

(2009) como importante para que seja superado o uso de fórmulas no processo de ensino de

combinatória.

Ao analisar o número de cordas que as duplas atribuíram para os respectivos pontos

nos registros escritos, constatei que atribuíram o número correto de cordas até os seguintes

pontos:

2 pontos → 2 duplas;

3 pontos → 3 duplas;

4 pontos → 2 duplas;

5 pontos → 4 duplas

Outra regularidade que observei foi que quatro duplas traçaram 14 cordas com 6

pontos. Acredito que o tamanho dos círculos que coloquei na folha da tarefa são pequenos,

assim, quando há muitos pontos fica difícil traçar as cordas e verificar se todos os pontos

Page 134: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

133

estão conectados entre si. Penso que esse fator possa ter dificultado a contagem do número de

cordas.

Com dessa observação, refleti sobre os obstáculos que muitas vezes o próprio

professor coloca a seus alunos, dificultando a resolução da tarefa proposta. A avaliação e a

reflexão do professor diante do trabalho que ele propôs são importantes para que essa situação

seja minimizada.

No registro escrito dos alunos, notei algumas regularidades nos conceitos

desenvolvidos por eles para determinar o número de cordas de uma circunferência com 10

pontos. Percebi que quatro duplas repetiram a diferença entre os números finais da sequência

de quantidade de cordas traçadas a partir dos pontos.

Figura 17 − Registro da dupla Andréa e Raquel: número de cordas em uma circunferência

com 10 pontos

Fonte: Acervo da pesquisadora

Andréa e Raquel concluíram que com 8 pontos traçariam 14 cordas; com 9 pontos, 16

cordas; e com 10 pontos, 18 cordas. Assim, acrescentaram para cada ponto duas cordas.

Figura 18 − Registro da dupla Anne e Thadeu: número de cordas em uma circunferência com

10 pontos

Fonte: Acervo da pesquisadora

Page 135: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

134

Conforme apresentado na figura 16, de acordo com o número de cordas que traçaram,

Anne e Thadeu observaram que a cada ponto inserido no círculo, 4 cordas eram

acrescentadas. Dessa forma, chegaram à conclusão de que com 10 pontos teriam 30 cordas,

como indicado na Figura 18.

Figura 19 − Registro da dupla Jéssica e Gustavo: número de cordas em uma

circunferência com 10 pontos

Fonte: Acervo da pesquisadora

Os conceitos apresentados pelos alunos em seus registros apresentados, mesmo que

equivocados, são um indício de generalizações das relações entre número de pontos e cordas.

De acordo com Nuñez (2009), o fato de os alunos buscarem atributos em uma situação

concreta para, a partir de suas características, criarem uma regra geral para continuar a

sequência em uma situação mais ampla é um processo de generalização abstrata que contribui

para o desenvolvimento do pensamento conceitual.

Também observei nos registros escritos que duas duplas atribuíram uma corda para

cada ponto, justificando que cada ponto é uma corda, como se observa na Figura a seguir.

Page 136: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

135

Figura 20 − Registro da dupla Luana e Natasha: número de cordas em uma circunferência

com 10 pontos

Fonte: Acervo da pesquisadora

Três duplas afirmaram nos registros escritos que não era possível determinar o número

de cordas de uma circunferência de 10 pontos, porque “são muitas”

Stela e Lívia apresentaram resposta diferente dos colegas de classe ao determinar o

número de cordas em uma circunferência com 10 pontos,

Figura 21 − Registro da dupla Stela e Lívia: número de cordas em uma circunferência com 10

pontos

Fonte: Acervo da pesquisadora

As alunas afirmam na justificativa que há 19 cordas, contando com os 10 pontos e os

lados. Os lados que se referem são os espaços entre um ponto e outro; dessa forma, com 10

pontos têm-se nove espaços, ou lados, como as alunas os nomeiam. A cada ponto

consideraram que traçariam uma corda, totalizando, assim, 19 cordas.

Mesmo apresentando diferentes números de cordas e raciocínio, percebe-se que as

duplas buscam, em observações iniciais ou finais da sequência de números de cordas,

identificar alguma regularidade para sustentar sua estimativa da quantidade de cordas em uma

circunferência com 10 pontos. Esse procedimento, apesar de não os conduzir ao número exato

de cordas, pode ser considerado como a construção de significações sobre a relação entre

número de pontos e de cordas. As significações produzidas pelos alunos nessa tarefa são

desencadeadas a partir da análise dos próprios registros que produziram. Dessa forma, a

Page 137: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

136

princípio, a linguagem escrita representa sua forma de pensamento; no entanto, a análise que

foi realizada em seus registros possibilitou que (re)significações fossem desenvolvidas pelos

alunos.

A dupla Lucas e Felipe, na fase da atividade independente, fez observações e produziu

significações, apresentadas na seguinte transcrição.

Transcrição 10: fragmento do diálogo com Lucas e

Felipe sobre o item b da tarefa “o problema das

cordas” (T10)

Possíveis eventos

críticos

233. P: O que observaram na tarefa?

234. Felipe: Vai aumentando as cordas.

235. P: Me expliquem.

236. Lucas: Um amigo: nenhuma corda; dois amigos: uma

corda.

237. Felipe: Aumentou uma corda.

Análise das

regularidades

238. P: Não entendi o termo “amigos”?

239. Felipe: É que pensamos que cada ponto poderia ser um

amigo que joga a corda para salvar o outro.

240. P: Ah, ok!

Busca de contexto

significativo para a

problemática

241. Lucas: Três amigos: três cordas.

242. Felipe: Agora aumentaram duas cordas.

243. Lucas: Com quatro, aumentaram três.

Compreensão da

razão na sequência

de cordas

244. P: Vamos registrar isso?

245. Lucas: Posso colocar aqui do lado mais dois?

O aluno registrou na frente de 3 p = 2 co “+2”

246. Lucas: Aqui vou colocar mais três.

Ele registrou: 4p = 6 co “+3”

Registro favorece

observação de

padrão

Page 138: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

137

247. P: Entendi. E depois, o que acontece?

248. Felipe: Mais quatro. Vai aumentando.

Lucas colocou na frente dos outros números da sequência: +4, +5 e +6.

Figura 22 − Registro da dupla Lucas e Felipe: número de cordas

Fonte: Acervo da pesquisadora

249. P: Estou um pouco confusa. Em que número vai

aumentando?

250. Lucas: No anterior.

251. P: Vamos ver se entendi: zero mais um é “um”; um mais

dois “três”; três mais três “seis”.

252. P: E qual é o próximo?

253. Lucas: Seis mais quatro = dez.

Lucas ficou um pouco quieto, pois havia colocado 14 cordas para a

circunferência de 6 pontos.

254. P: E agora?

255. Lucas: Sim.

Alunos percebem

equívocos na

contagem das

cordas

256. Lucas: Acho que nos esquecemos de contar uma corda.

257. P: Então seriam 15?

258. P: E na de sete pontos?

Parou novamente, pois haviam colocado 20 cordas.

259. Lucas: Esquecemos de contar de novo. É muita coisa!

260. Apagou o número 20 e colocou o número 21.

Confiança no

raciocínio

desenvolvido e

não na contagem

realizada

Page 139: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

138

Assim como seus colegas, Lucas e Felipe encontram uma regularidade entre a

quantidade de pontos e o número de cordas. No entanto, alguns fatores contribuíram com isso,

como a percepção dos alunos de que a diferença entre os números aumentava a cada ponto

acrescentado e minha intervenção, como professora-pesquisadora, para que registrassem a

diferença entre os números. Esse registro possibilitou à dupla observar a regularidade das

diferenças entre os números de cordas e desenvolver um raciocínio de contagem válido para

que pudessem continuar a resolver a tarefa.

Christiansen e Walter (1986) atentam para a importância das intervenções pedagógicas

do professor. Segundo os autores, o trabalho do professor deve envolver a comparação entre

as soluções apresentadas e promover o uso do raciocínio nestas conexões.

Observa-se, com o exposto, que a produção escrita não pode ser considerada apenas

como uma forma de expressão e registro, mas também deve ser vista como uma

potencialidade para o desenvolvimento de conceitos. No ato de registrar ou de explicar seu

registro, o aluno pode refletir sobre suas ideias e produzir (re)significações.

As conclusões de Lucas e Felipe foram apresentadas aos colegas na fase da reflexão

conclusiva. Para iniciar essa discussão, coloquei na lousa sete circunferências e marquei em

cada uma os pontos determinados pela tarefa. Em seguida, começamos o diálogo:

Transcrição 11: fragmento da reflexão

conclusiva sobre a tarefa “problemas das

cordas” (T11)

Possíveis eventos críticos

261. P: Quantas cordas eu consigo traçar na

primeira circunferência?

262. Classe: Nenhuma.

263. P: E com dois pontos?

264. Classe: Uma corda.

265. P: Com três?

266. Classe: Três.

Depois de alunos dizerem o número de cordas, eu anotava o

respectivo número abaixo de cada circunferência, sem fazer

Enumeração das cordas

Page 140: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

139

o traçado.

267. P: E com quatro pontos?

268. Lucas: Seis.

269. P: E aqui, com cinco pontos?

270. Luís Felipe: Não sei.

271. Lucas: Dez.

272. Valéria: Tem que traçar!

Comecei a traçar as cordas na circunferência com cinco

pontos. Alguns alunos foram contando à medida que eu

traçava.

273. Luís Felipe: Olha, formou uma estrela.

Quando terminei de traçar as cordas na circunferência, os

alunos concluíram:

274. Classe: Dez.

275. P: E agora?

276. Stela: Vai unindo os pontos.

Aluna sugere que continue a traçar as cordas.

Sugestão de procedimento de

enumeração

277. Luís Felipe: É mais que 10.

278. P: Por quê?

279. Luís Felipe: Aumentou um ponto.

Compreensão da variação dos

parâmetros

280. Thadeu: São 14.

281. Lucas: Quinze.

Lucas e Felipe diziam “15”, vários alunos “14”

Conforme mencionado anteriormente, quatro duplas

Conflito com as quantidades

de cordas / com a utilização

de procedimento de contagem

Page 141: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

140

colocaram que com 6 pontos seriam traçadas 14 cordas.

Esse fato deu força às duplas para insistirem em sua

hipótese.

282. Valéria: Vamos contando.

283. Thadeu: Vai dar 14.

À medida que eu traçava as cordas, os alunos contavam e

concluímos:

284. Classe: Quinze.

285. P: Com sete pontos quantas cordas tenho que

traçar?

286. Jéssica: Vinte e seis.

287. Lucas: Quinze.

288. Valéria: O Prô, vai traçando do ponto de cima e

esgota todas as possibilidades dele, aí você faz

o mesmo com o próximo.

289. P: OK!

Segui as orientações da Valéria, porém no final errei e tracei

o vigésimo primeiro traço sobre o que havia traçado

anteriormente, o vigésimo. A classe ficou agitada. Uns

dizendo que eram 20 cordas, outros me dizendo 21.

290. P: Vamos começar novamente para conferir.

291. Valéria: Vai anotando quando termina um

ponto.

A aluna queria que eu anotasse o número de cordas assim

que esgotasse as possibilidades de cada ponto.

Comecei de um ponto e esgotamos todas as possibilidades.

Sugestão de procedimento

sistemático de contagem

Page 142: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

141

Os alunos foram contando a cada corda traçada. Anotei o

número de cordas, conforme sugestão da Valéria. Ficou da

seguinte forma:

Figura 23 − Registro: sugestão de contagem

Fonte: Acervo da pesquisadora

Iniciamos a contagem do ponto ao lado do anterior e

contamos cinco cordas.

292. Lucas: Vai diminuindo um Prô.

293. P: Será?

Iniciamos outra contagem

294. Luís Felipe: Agora vai dar quatro.

Contamos quatro cordas e partimos para a próxima

contagem.

295. Luís Felipe: Agora três.

De forma semelhante, a cada contagem Luís Felipe dizia o

número de cordas, uma a menos que a anterior, e a

quantidade se confirmava. Fizemos isso até o final.

296. P: E agora pessoal?

297. Lucas: Deu 21: 6 + 5 + 4 + 3 + 2 + 1.

Observação de regularidade

em processo de contagem

Page 143: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

142

298. P: Ok!

299. P: No item b, era preciso organizar os dados

que fizeram em um registro. Eu observei que as

duplas fizeram diferentes registros. Como

sugerem que eu faça esse registro na lousa?

300. Augusto: Faz uma tabela.

301. P: Pode ser turma?

302. Classe: Pode.

Construí uma tabela na lousa, na primeira linha da primeira

coluna escrevi pontos e na coluna ao lado cordas. De acordo

com as orientações dos alunos fui completando a tabela.

303. Valéria: Um ponto, zero cordas.

304. P: Dois pontos?

305. Guilherme: Uma corda.

306. P: Três pontos?

307. Classe: Três cordas.

308. P: Quatro pontos?

309. Felipe: Seis cordas.

310. P: Cinco pontos?

311. Classe: Dez cordas.

312. P: Seis pontos?

313. Melissa: Quinze cordas.

314. P: Sete?

315. Stela: Vinte e um.

Escolha do registro adequado

para o contexto: tabela

316. P: Olhando para esses números, vocês

observam alguma coisa?

317. Felipe: Que do primeiro ponto aumentou uma

corda. Depois aumentou duas cordas.

Registrei a fala do aluno ao lado da tabela.

318. Lucas: Depois aumenta três.

319. Luís Felipe: Depois quatro.

Comunicação de ideias

Page 144: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

143

320. Valéria: Mais cinco.

321. Stela: Mais seis.

322. P: E dez pontos, quantas cordas teríamos?

323. Felipe: Quarenta e cinco.

324. Thadeu: Sete pontos mais seis dá 28.

325. Lucas: Vinte e oito mais oito dá 36.

326. Felipe: Dez pontos, aumenta nove, aí são 45.

327. Thadeu: E assim por diante.

328. P: Pessoal, fiquei pensando em uma coisa.

Quando contamos as cordas no círculo com sete

pontos, o número de cordas foi diminuindo, e

agora foi aumentando. Alguém tem alguma

ideia por que aqueles números diminuem e

esses aumentam?

Ficaram quietos por uns instantes.

329. Felipe: É que o amigo que joga a corda para

salvar os outros e vai embora. Aí, diminuem os

salvamentos.

330. P: Não entendi, me explique.

331. Felipe: No começo tinha sete amigos, um jogou

as cordas, salvou seis amigos e foi embora.

Outro que ficou, jogou a corda para cinco e foi

embora. Aí vai, até não ter ninguém para

salvar.

A classe não entendeu a explicação que Felipe deu.

Expliquei a eles que a dupla considerava cada ponto

como um amigo e as cordas eram usadas para salvar os

amigos.

332. Classe: Legal!!!

Criação de contexto para

signifcar conceitos

Page 145: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

144

Percebe-se, com a transcrição 11, que a tarefa a princípio gerou algumas dúvidas na

compreensão da proposta de trabalho e depois, na fase da atividade independente, provocou

alguns conflitos cognitivos, como o apresentado por Valéria (T9). Contudo,foi compreendida

e significada pelos alunos à medida que a desenvolviam.

No processo de contagem das cordas, os alunos diziam quantas cordas poderiam ser

traçadas, de acordo com os respectivos pontos, eu marcava essa quantidade abaixo de cada

circunferência (T11. 260-270). Minha ação com esse tipo de registro foi intencional, desejava

que os alunos percebessem a regularidade na sequência de número de cordas, pois penso que,

dependendo da forma como o registro é realizado, essa observação talvez não fosse possível.

Segundo Rosa, Moraes e Cedro (2010), a compreensão de características comuns de um

objeto ou fenômeno em relação a uma classe de objetos e fenômenos similares pode conduzir

os alunos ao desenvolvimento de generalizações.

Na transcrição 11, diferentes colocações são apresentadas na socialização da tarefa

(T11. 269-270), como quando Luís Felipe diz que não sabe quantas cordas podem ser traçadas

com cinco pontos e Lucas diz que são dez. Para resolver essa problemática, Valéria sugere um

procedimento de enumeração: “Tem que traçar!” (T11 271) Percebe-se, nesse movimento,

que as problemáticas que surgem favorecem o desenvolvimento de estratégias para a

resolução de problemas. Nesse processo, os alunos vão se apropriando dos procedimentos de

enumeração e os incorporando a sua prática.

A organização no processo de enumeração e de registro de possibilidades,

característica importante do raciocínio combinatório, foi observada em algumas considerações

de Valéria: “[ ] vai traçando do ponto de cima e esgota todas as possibilidades dele, aí você

faz o mesmo com o próximo” (T11 287) e “vai anotando quando termina um ponto” (T11

290) Tal traço também é notado em uma fala de Augusto, quando sugere: “faz uma tabela”

Conforme já mencionado, de acordo com Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994),

um dos principais motivos de erros na resolução de problemas de combinatória é a falta de

uso de procedimentos sistemático de enumeração, porém a análise apresentada evidencia que

o trabalho desenvolvido nesta pesquisa possibilita que os alunos se apropriem e utilizem

procedimentos sistemáticos de enumeração com compreensão. Esse fato e minhas

observações anteriores (SANTOS, 2010) indicam que o uso de procedimentos sistemáticos de

contagem conduz os alunos às respostas adequadas ao resolver problemas de combinatória e

Page 146: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

145

probabilidade; esse uso pode ser considerado como uma possibilidade para superar a

problemática apontada por Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994).

As alterações da quantidade de possibilidades, ocasionadas com o aumento das

varáveis, número de pontos e cordas, foi observada por Luís Fernando depois que concluímos

que, com cinco pontos, teríamos 10 cordas Ele disse que são “mais que 10” (T11 276) e

justificou o porquê de sua conclusão: “aumentou um ponto” (T11 278) As observações de

Luís Fernando podem ser um indício do pensamento por complexo, pois conexões foram

desenvolvidas entre a regularidade da sequência e os parâmetros de possibilidades.

No decorrer do diálogo, houve vários conflitos com o número de cordas na

circunferência com seis pontos. Lucas e Felipe afirmavam “quinze”, e outros alunos

“quatorze” (T11 279-280). A solução para esse confronto de ideias foi proposta por Valéria,

que se envolveu no diálogo e sugeriu que fôssemos contando a quantidade de cordas a partir

do traçado (T11. 281). Em momento posterior, ao traçar as cordas na circunferência com sete

pontos, errei a representação ao traçar as cordas. Tracei 20, sendo que o correto seriam 21

cordas. A classe ficou agitada, alguns alunos dizendo que seriam 20 cordas, outros 21. Sugeri

que fizéssemos novamente os traçados para verificar qual a quantidade correta (T11. 289).

Valéria novamente se envolveu na discussão e propôs: “vai anotando quando termina um

ponto” (T11 290) As sugestões de Valéria indicam que tem compreensão de procedimentos

sistemáticos de enumeração e de contagem. Esse indicativo é uma característica do raciocínio

combinatório.

Alguns alunos observaram que a quantidade de cordas diminuía de um ponto para o

outro (T11. 291-296). Dessa forma, ao traçar as cordas na circunferência com sete pontos, de

acordo com a sugestão de Valéria de esgotar todas as possibilidades de traçados de um ponto

e fazer o registro da quantidade, antes de iniciar o traçado em outro ponto, construímos uma

adição com sequência de parcelas decrescentes, 6 + 5 + 4 + 3 + 2 + 1, e concluímos que a

quantidade de cordas seria 21. Os dados produzidos nessa e em outras sequências feitas na

tarefa indicam que ela possibilita não apenas o desenvolvimento de conceitos sobre

combinatória, mas também de padrões numéricos. Isso também evidencia a possibilidade de

articulação entre as áreas de estudo da Matemática.

Ao analisar esse trecho da tarefa, percebi que poderia ter explorado mais a constatação

dos alunos sobre a diminuição da quantidade de cordas de um ponto para outro e

desenvolvido outras generalizações. Acredito que, diante do raciocínio apresentado no

Page 147: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

146

desenvolvimento da tarefa, se eu tivesse proposto a eles que observassem se esse fato se

repetia nas demais circunferências, eles poderiam desenvolver outras generalizações e definir

o número de cordas em circunferência, com mais pontos, traçando apenas as cordas do

primeiro ponto. Por exemplo, na circunferência com seis pontos, cinco cordas são traçadas a

partir do primeiro ponto, quatro do segundo, três dos terceiro e assim sucessivamente, até

finalizar com um ponto; na circunferência com cinco pontos, são traçadas inicialmente quatro

cordas, depois três, duas e uma. Diante dessa observação, é possível definir o número de

cordas em uma circunferência qualquer, realizando uma adição com parcelas decrescentes,

iniciando pela quantidade de pontos, menos uma unidade, finalizando no número 1, como

realizado na socialização da tarefa (T11. 296).

Penso que na complexidade do trabalho em sala de aula diversas possibilidades que

favorecem o desenvolvimento de conceitos passam despercebidas pelo professor. Essa

observação foi possível nesse momento em que analiso o registro dos alunos e as discussões

desenvolvidas na aula, e busco indícios de conceitos desenvolvidos por eles. Acredito que a

oportunidade de desenvolver ações como essas, de análise das aulas ministradas e de

produções dos alunos, em uma perspectiva reflexiva e crítica, pode contribuir para o processo

de aprendizagem do professor e dos alunos.

As considerações desenvolvidas por Lucas e Felipe na fase da atividade independente

(T10), que indicavam que a razão da sequência aumentava uma unidade a cada ponto, foram

apresentadas aos colegas de classe quando finalizamos a contagem das cordas e construímos a

tabela com os dados. Tais colocações foram apropriadas pelos colegas, tanto que, no decorrer

da apresentação, alguns deles continuaram a sequência iniciada pela dupla (T11. 318-320),

dizendo qual seria o próximo número. Esse fato é uma evidência de que, por meio das

relações sociais, a pessoa desenvolve ações e elaborações particulares que a constituem como

sujeito, como apontado por Fontana (2005). O receio que tinha incialmente do

desenvolvimento dessa tarefa foi sendo superado na medida em que os alunos apresentavam

suas ideias e suas sugestões nas diferentes fases de seu realização. Não acreditava, a

princípio, que eles conseguissem determinar, sem traçar, o número de cordas de uma

circunferência com 10 pontos. No entanto, considero que superaram essa expectativa com o

uso de procedimentos de contagem e enumeração de possibilidades para a tarefa, com as

diversas maneiras como organizaram e registraram as possibilidades e com as conclusões a

que chegaram a partir da observação de regularidades e de sequência numérica. De acordo

Page 148: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

147

com Lopes e Coutinho (2009), atributos como esses são importantes para o raciocínio

combinatório, que visa o desenvolvimento de uma forma de pensar que permite às pessoas

analisar situações de decisões em contextos escolares e não escolares “que envolvem mais que

uma possibilidade de resultado final do processo e suas possíveis ramificações” (LOPES;

COUTINHO, 2009, p. 62).

4.4 Sínteses relativas às tarefas analisadas

Os dados apresentados fazem parte da análise das tarefas realizadas. Nelas busquei

evidências sobre o desenvolvimento do pensamento probabilístico com alunos do 6º ano do

Ensino Fundamental quando esse pensamento se articula ao raciocínio combinatório por meio

de um trabalho pedagógico na perspectiva da problematização.

No episódio 1, “ a linguagem probabilística e o jogo de par ou ímpar: produção de

significações” ficou evidente o movimento dos alunos na busca de significados para os termos

do vocabulário probabilístico e de significações ao adequá-los a diferentes contextos.

Conceitos sobre combinatória − como a análise de possibilidades, a construção do espaço

amostral, as noções de limite do espaço amostral e as observações das variáveis e de seus

parâmetros − foram apresentados e desenvolvidos pelos alunos na execução da tarefa

“linguagem probabilística”

De acordo com Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994), a combinatória é um

instrumento de modelização da Matemática. Dessa forma, tem papel fundamental nessa e em

outras disciplinas escolares. A concepção sobre padrões numéricos que surgiram no decorrer

da pesquisa é uma evidência dessa potencialidade da combinatória. Considero que tanto a

combinatória como as outras disciplinas escolares e os conteúdos matemáticos, quando

articulados no processo de ensino e aprendizagem, possibilitam que os alunos percebam os

diversos contextos em que a Matemática está presente e passem a estabelecer outras relações

e conceitos, ampliando, assim, o sistema conceitual com novos níveis de generalidade dos

conceitos.

A problematização apresentada na forma escrita, na primeira fase das tarefas, e depois

na forma oral, na terceira fase das tarefas, levou os alunos a analisar, questionar, criticar,

buscar modelos explicativos, comparar, entre outras coisas. Com isso, esse contexto favoreceu

o movimento entre conceitos espontâneos e científicos.

Page 149: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

148

Quanto ao raciocínio combinatório e ao pensamento probabilístico, observa-se que

ambos se alternam enquanto foco da discussão. Porém, em determinado momento da primeira

tarefa, eles se entrelaçam, e os alunos passam a apresentar conceitos sobre ambos.

Ficou evidente que as tarefas “itinerários” e “o problema das cordas” favoreceram a

apropriação de procedimentos de enumeração e contagens pelos alunos. Além disso, houve o

envolvimento deles na construção de significados e significações dos problemas de

combinatória. Também ficou evidente nessas tarefas o movimento entre conceitos

espontâneos e científicos a partir do conjunto de componentes mediadores: tarefa, ambiente

de aprendizagem e linguagem.

No decorrer da análise, busquei verificar se em algum momento, de forma isolada, os

componentes mediadores mencionados foram preponderantes para a obtenção de conceitos.

No entanto, constatei que o processo de elaboração conceitual é mediado pela linguagem, pelo

ambiente de aprendizagem e pela tarefa e que, ao ser envolvido no movimento entre conceitos

espontâneos e científicos, possibilita que novos conceitos sejam desenvolvidos e outros

(re)significados, como organizado no Esquema 2 do segundo capítulo.

O que impulsiona o movimento desse esquema são as pessoas envolvidas no processo

de ensino e de aprendizagem, nesta pesquisa, especificamente, professora-pesquisadora e

alunos. Em concordância com a perspectiva histórico-cultural, é por meio das relações com o

outro, mediadas pelo sistema linguístico, que o sujeito se desenvolve. A mediação do outro

movimenta, de certa forma, um sistema complexo, possibilitando a produção de significados e

sentidos, as significações (FONTANA, 2005). De acordo com Smolka (2010, p. 125), a

produção de sentidos é marcada pelo trabalho simbólico (interações, intertextos) na “dinâmica

interconstitutiva das dimensões individual, social, ideológica”, e o processo de significação

afeta e constitui o corpo e o sujeito.

Dessa forma, é possível dizer que a professora-pesquisadora e os alunos do 6º ano

contribuíram uns com os outros em seu processo de elaboração conceitual. Em que medida

cada um contribuiu? Penso que não seja possível responder isso, mesmo porque foi realizado

um recorte para esta pesquisa, conforme mencionado; e apresento trechos que considerei

relevantes para a análise, outros tão interessantes quanto podem não ter sido analisados.

É possível observar nos episódios que variam os alunos que contribuem com suas

colocações. Na transcrição 1, Augusto e Luís Felipe se destacam quando expõem seus

conceitos sobre termos do vocabulário probabilístico e conceitos probabilísticos,

Page 150: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

149

possibilitando que significações fossem desenvolvidas. Na transcrição 2, quando Stela,

Augusto e Bruna discutem sobre as possibilidades no jogo de par ou ímpar, contribuem para a

elaboração de conceitos sobre as possibilidades e as probabilidades da soma ser um número

menor que dez. As observações e as conclusões de Lucas para a contagem dos itinerários (T7)

foram importantes para a significação dos procedimentos de enumeração. Lucas e Felipe, a

partir das observações que realizaram sobre padrões numéricos, colaboraram para que os

colegas conseguissem descobrir, sem traçar, a quantidade de cordas de uma circunferência

com 10 pontos. As considerações de Valéria contribuíram para a formação de conceitos sobre

procedimentos sistemáticos de enumeração de possibilidades.

O fato de um aluno se expor mais que o outro na fase de reflexão conclusiva não é

uma evidência de que tenha aprendido mais ou de que tenha mais conhecimento que os

colegas. Todos os estudantes se envolveram no desenvolvimento das tarefas propostas nesta

pesquisa, mesmo porque ela envolve três fases. A negociação de ideias, feita na fase da

atividade independente, também cooperou para a formação de conceitos dos alunos. No

entanto, a apresentação de ideias no momento da reflexão conclusiva envolve mais alunos,

contribuindo assim para a validação ou não de ideias elaboradas pelas duplas; possibilitando

que conceitos sejam (re)significados.

Considero que essas observações me possibilitam afirmar que a sequência de tarefas,

as intervenções da professora-pesquisadora e dos alunos, as problematizações, o ambiente de

aprendizagem e a linguagem favoreceram o desenvolvimento do raciocínio combinatório e do

pensamento probabilístico dos alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. Também me

conduziram a significações das potencialidades das tarefas analisadas no trabalho, em

contexto escolar, com combinatória. No entanto, depois dessas observações me questionei:

quais as implicações desse trabalho nas concepções probabilísticas dos alunos do 6º ano do

Ensino Fundamental? Essa será a análise do próximo capítulo.

Page 151: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

150

5 O MOVIMENTO DAS CONCEPÇÕES PROBABILÍSTICAS DOS ALUNOS A

PARTIR DO TRABALHO REALIZADO

Neste capítulo apresento uma síntese dos dados coletados nas tarefas sobre

probabilidade desenvolvidas individualmente no final da sequência destas. Elas foram

realizadas no momento em que os alunos desenvolviam a avaliação interdisciplinar57

, porque

depois dessa avaliação muitos alunos entraram em férias.

Quando comecei a organizar os dados para este capítulo, observei que a aparente

superficialidade da análise das questões de múltipla escolha e a falta de possibilidade de

comunicação com os alunos me deixou angustiada, pois a dinâmica de desenvolvimento

dessas tarefas foi diferente das anteriores. Entretanto, ao buscar indícios dos conceitos dos

alunos a partir das alternativas assinaladas e das justificativas apresentadas, percebi que a falta

de comunicação oral, em determinados momentos, não tornou suas considerações menos

importantes. Pelo contrário, segundo Hiebert et al (1997), esses momentos de avaliação são

fundamentais para se buscar indícios do que ficou, em termos de aprendizagem, para os

alunos após um trabalho realizado.

A possibilidade de buscar indícios é considerada por Hiebert et al (1997) uma

ferramenta importante para avaliar o processo de ensino desenvolvido, pois muitos estudantes

têm problemas para utilizar os conceitos desenvolvidos em um processo de aprendizagem em

outros contextos.

Dessa forma, considero importante para a presente pesquisa, que se insere no campo

da prática pedagógica, analisar o raciocínio combinatório e o pensamento probabilístico de

alunos em diferentes contextos: em um processo de negociação de significados e significações

com a professora-pesquisadora e com os colegas de classe e em um momento individual de

interpretação e reflexão sobre os conceitos apropriados. Esse momento não está dissociado da

perspectiva vygotskyana, que considera que “[...] a pesquisa visa compreender os eventos

investigados descrevendo-os, mas procura também suas possíveis relações, integrando o

individual com o social, focalizando o acontecimento nas suas mais essenciais e prováveis

relações” (FREITAS, 2009, p. 4).

Na sequência, apresento os dados das tarefas sobre probabilidade.

57

Avaliação instituída pela escola, elaborada com dinâmica semelhante a das avaliações externas, com questões

de múltiplas escolhas de todas as disciplinas estudadas, realizada no mesmo dia com os alunos de todas as

classes.

Page 152: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

151

5.1 As tarefas sobre probabilidades: indícios do trabalho realizado

Na busca de alguns indícios de elaboração conceitual dos alunos em probabilidade

organizei em quadros as respostas dadas por eles nas cinco tarefas sobre probabilidade. Vinte

e sete alunos realizaram essas tarefas. Nos quadros, coloquei para cada tarefa a quantidade de

respostas dadas em cada alternativa e as justificativas apresentadas para a escolha da

alternativa. A quantidade de justificativas não corresponde à quantidade de respostas, pois

haviam justificativas iguais.

Quadro 10 – Síntese das respostas da tarefa 1 sobre probabilidade

Tarefa 1. Vou colocar uma ficha azul e uma amarela em um saco e pedir para você tirar uma

sem olhar. Qual você acha que mais provável sair?

ALTERNATIVAS QUANTIDADE DE

RESPOSTAS

JUSTIFICATIVAS58

a. A azul. 2 Porque amarela tem mais.

Pode ser que a azul seja mais tirada ou pode

também ser a amarela.

b. A amarela.

1 Eu acho que a amarela tem mais possibilidades

de sair.

c. Ambas têm as

mesmas

possibilidades.

23 São duas fichas iguais, só muda a cor.

Porque pode tirar uma ou outra.

Porque as duas tem o mesmo número.

Porque tem as mesmas possibilidades.

Porque a azul tem 50% de chances de sair e a

amarela também tem 50%.

Porque há duas: uma chance para cada uma.

Porque tem as mesmas quantidades de fichas.

Porque tem uma de cada cor.

As chances são as mesmas.

Pode sair amarela ou azul.

Porque não tem duas azuis e uma amarela, ou

vice e versa.

d. Não sei responder 0

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Essa tarefa envolve uma situação clássica de probabilidade, uma vez que as

possibilidades de se extrair fichas azul e amarela são equiprováveis. Percebe-se, pelas

respostas dadas pelos alunos e por suas justificativas, que muitos deles identificam essa

característica na problemática quando afirmam: “As duas fichas são iguais, só muda a cor”;

58

Optei por não revisar as justificativas dos alunos, respeitando seu modo de escrever.

Page 153: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

152

“Porque as duas têm o mesmo número”; “Porque tem uma de cada cor”; “As chances são as

mesmas”; “Porque não tem duas azuis e uma amarela ou vice-versa”.

Todavia, três alunos apresentam concepções equivocadas. Um deles talvez por não

compreender o enunciado, pois afirma que “a amarela tem mais”, os outros dois apresentam

indícios de se basearem na concepção subjetivista, pois dão ideias de que perceberam a

equiprobabilidade ao afirmar “Pode ser que a azul seja mais tirada ou pode também ser a

amarela” e “Eu acho que a amarela tem mais possibilidades de sair” e ao assinalar a cor que

acreditam que seja mais provável.

A alteração do espaço amostral da tarefa 2, aumentando uma ficha azul, demanda que

a concepção formal das probabilidades seja apresentada.

Quadro 11 – Síntese das respostas da tarefa 2 sobre probabilidade

Tarefa 2. Se eu colocar duas fichas azuis dentro de um saco e uma amarela, qual é a mais

provável que saia?

ALTERNATIVAS QUANTIDADE DE

RESPOSTAS

JUSTIFICATIVAS

a. Azul 23 Porque tem duas fichas azuis e uma amarela,

então é mais provável que saia a azul.

Porque tem mais fichas azuis.

Porque tem mais fichas azuis que amarela.

Tem uma possibilidade a mais.

Porque tem duas fichas azuis e uma amarela.

Porque você tem duas chances dentre 3.

Porque tem mais que a amarela.

Porque azul tem 75% de chance de sair e a

amarela somente 25%.

b. Amarela 0

c. Ambas têm as mesmas

possibilidades

3 As duas podem ter chances.

Uma das duas vai sair.

Pode sair azul ou amarela, mas o azul tem

mais chances.

d. Não sei responder 0

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Page 154: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

153

A análise do espaço amostral e o reconhecimento das possibilidades para a medida de

chance são indícios da escolha da alternativa a, resposta dada por 23 alunos. Essa eleição é

um indicativo de que os alunos possuem conceitos de probabilidade formal. No entanto, a

opção de três alunos de assinalar a alternativa c – “ambas têm as mesmas possibilidades” –

pode ser um indício de não compreensão da construção do espaço amostral, e o fato da azul

ter uma ficha a mais não é considerado como uma possibilidade a mais. Diante dessa

consideração, a medida de probabilidade não é feita de forma correta. Segundo Sáenz (1999),

quantificar o azar não é fácil, porque a concepção de probabilidade não é natural nem intuitiva; é

fruto de reflexão e prolongado contraste com a realidade. Dessa forma, a realização de tarefas

sobre probabilidade é importante para o desenvolvimento do pensamento probabilístico.

A tarefa 3 provocou alguns conflitos nas concepções probabilísticas dos alunos.

Ela se diferencia das demais, pois sua resolução envolve reflexões sobre os conceitos lógicos de

probabilidade.

Quadro 12 – Síntese das respostas da tarefa 3 sobre probabilidade

Tarefa 3. Com duas fichas azuis e uma amarela dentro do saco, a probabilidade de tirar uma

vermelha é:

ALTERNATIVAS QUANTIDADE DE

RESPOSTAS

JUSTIFICATIVAS

a. Certa. 0

b. Pouco

provável.

11 Porque tem mais chance de tirar a azul.

Nós podemos tirar uma azul ou amarela.

Porque teria duas fichas azuis, uma amarela e uma

vermelha, há mais possibilidades de sair azul.

Depende da sorte.

É muito pouco tirar azul e amarela.

Porque só tem uma amarela e uma vermelha.

Porque a quantidade de vermelha é muito pouca.

Vermelha não tem muitas possibilidades, é como

a amarela.

Há apenas 1 dentre 4.

Pode tirar a vermelha, porque tem duas azuis e

uma amarela.

Porque há outras três fichas para tirar.

c. Impossível. 13 Tem duas azuis e uma amarela, como vai tirar

uma vermelha?

Não tem ficha vermelha.

Só tem fichas azuis e amarelas.

Page 155: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

154

Porque azul tem mais.

Tem duas azuis e uma amarela, não tem como

tirar vermelha.

d. Não sei

responder.

2 Não sei responder.

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

De forma diferente das anteriores, houve certo equilíbrio na escolha da resposta

adequada e não adequada à problemática apresentada. Metade dos alunos compreendeu a

situação apresentada e estabeleceu relações da concepção lógica de probabilidade. A

justificativa dada por um aluno por meio de um questionamento, “tem duas azuis e uma

amarela, como vai tirar uma vermelha?”, indica que ele analisou as variantes da situação,

avaliou as possibilidades e fez críticas quanto à problemática apresentada. O conjunto dessas

ações é apontado por DelMas (2002) como característica do pensamento probabilístico.

Vários alunos optaram pelo termo “pouco provável”; essa escolha − associada a

algumas justificativas, como “tem duas fichas azuis, uma amarela e uma vermelha” e “há

apenas 1 dentre 4” − é um indicativo de que houve equívocos na interpretação do enunciado,

pois vários alunos consideram que a ficha vermelha está inserida no saco com as azuis e a

amarela, que ela faz parte do espaço amostral do evento. Diante dessa consideração, a escolha

do termo “pouco provável” é adequada

O fato de metade dos alunos não assinalarem a resposta adequada é um indício de que

problemas que envolvem a probabilidade lógica não são fáceis de serem interpretados e

podem conduzir os alunos a equívocos, como considerar a ficha vermelha como uma

possiblidade, talvez porque a problemática é definir sua probabilidade. O conceito lógico está

relacionado ao grau de confiança medido de maneira extrema, certo e impossível; e o fato de

ser medido de duas formas apenas, certo ou impossível, 0 ou 1, não o torna fácil de ser

compreendido.

De acordo com Godino, Batanero e Cañizares (1996), o conceito lógico das

probabilidades é desenvolvido a partir de uma relação lógica entre o enunciado e as hipóteses,

conduzindo o sujeito ao desenvolvimento de generalizações de implicações e contradições

disponíveis. Segundo os autores, é preciso encontrar situações distintas da concepção clássica

e frequentista para seu ensino.

Page 156: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

155

A tarefa 4, assim como a 2, possibilita que a concepção formal de probabilidade seja

apresentada. A diferença entre essas tarefas é o contexto e a quantidade de elementos do

espaço amostral.

Quadro 13 – Síntese das respostas da tarefa 4 sobre probabilidade

Tarefa 4. Uma classe tem 19 alunos: 11 meninas e 8 meninos. Se você escrever o nome de cada

um dos alunos em um papel, colocá-los em um saco e retirar um nome ao acaso, o que considera

que seja mais provável?

ALTERNATIVAS QUANTIDADE DE

RESPOSTAS

JUSTIFICATIVAS

a. Que o nome seja de um

menino.

3 Porque tem mais meninos.

Porque na classe tem mais meninos.

Tem mais possibilidades de sair meninos

do que menina.

b. Que o nome seja de uma

menina.

16 A quantidade é maior.

Tem mais nomes de meninas.

Tem mais meninas.

Tem mais meninas que meninos.

Estão na maioria.

Porque tem 11 meninas e 8 meninos. As

meninas são mais.

O número de meninas é maior do que de

meninos.

Porque tem mais meninas na sala que

meninos.

Porque há 11 probabilidades dentre 19.

c. A probabilidade de o

nome ser de um menino é

a mesma que a de ser de

uma menina.

7 Porque pode sair menino ou menina, mas

meninas têm mais chances.

Porque tem as mesmas possibilidades.

Tem duas chances de ser.

Na sala tem 11 meninas e 8 meninos, mas

tem mais possibilidades de sair meninas.

Exemplo: Giovani ou Giovana

Os meninos podem ser tirados ou as

meninas.

Pode ser tanto menino como menina.

d. Não sei responder. 0

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

Page 157: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

156

Como ocorreu na tarefa 2, a maioria dos alunos percebeu, a partir do espaço amostral,

que há maior probabilidade de retirar o nome de uma menina que de um menino. Esse fato

indica que a concepção formal em diferentes contextos foi apresentada pela maior parte dos

estudantes.

A escolha feita por três alunos, “que o nome seja de um menino”, indica características

da concepção subjetivista, uma vez que não são consideradas as possibilidades do evento

apresentado, mas talvez as possibilidades do contexto em que está inserido. Neste caso, o

número de alunos da classe em que estudam, pois é maior o número de meninos.

Alguns alunos consideram que a probabilidade de o nome ser de um menino é a

mesma que a de ser de uma menina, isso indica que eles avaliam que o fato de ter nomes de

meninos e de meninas no saco, independente das respectivas quantidades, torna a situação

equiprovável. Esse equívoco é um indício da presença da concepção clássica das

probabilidades.

As respostas apresentadas pelos alunos nas tarefas 2 e 4 são semelhantes e favorecem

a reflexão formal das probabilidades. Assim, percebe-se que a concepção clássica destas é

evidenciada na resposta de três alunos na tarefa 2, quando afirmam que “as possibilidades de

fichas azuis e brancas são as mesmas”, e de sete alunos na tarefa 4, quando colocam que “a

probabilidade de o nome ser de um menino é a mesma que a de ser de uma menina”

Justificativas podem ser atribuídas à diferença entre a quantidade de respostas

equivocadas da tarefa 2 para a 4, como a diferença entre as probabilidades de cada evento. Na

tarefa 2 a probabilidade de retirar uma azul bola azul é 66,7% e de escolher uma amarela é

33,3%, a diferença entre elas é de 33,4%. Na tarefa 4 a probabilidade de tirar o nome de uma

menina é 58% e de escolher o de um menino é 42%, a diferença entre elas é de 16%. Outra

justificativa pode ser o contexto das tarefas, pois situações semelhantes a da tarefa 4 podem

ter sido vivenciadas por eles, já que apresenta contexto de sala de aula, conduzindo-os a uma

observação de frequência. O conceito subjetivista também pode ter guiado os alunos em suas

respostas.

A tarefa 5 possibilita que as concepções clássica e formal das probabilidades sejam

comparadas.

Page 158: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

157

Quadro 14 – Síntese das respostas da tarefa 5 sobre probabilidade

Tarefa 5. Em uma vitrine de uma loja de esportes há alguns recipientes transparentes com bolas

brancas e pretas. Veja o desenho abaixo, representando a vitrine.

Recipiente 1 Recipiente 2 Recipiente 3 Recipiente 4

ALTERNATIVAS RESPOSTAS/

QUANTIDADES

JUSTIFICATIVAS

a. Suponha que você fosse

retirar, sem olhar, uma

bola do recipiente 3.

Qual a cor de bola que

provavelmente você iria

retirar? Por que?

Branca – 24

Porque tem mais.

A branca porque tem mais que a preta.

Porque tem maior número.

Porque tem 3 bolas, 2 brancas e uma preta.

A branca porque tem duas bolinhas.

A branca porque tem mais possibilidades.

A branca porque ela tem 2 possibilidades e

a preta tem 1 só. Por isso, a branca é mais

fácil de sair.

A branca tem a maioria das chances.

Pode ser que eu retire à branca, mas tem

chances de sair a preta.

A branca é a mais provável.

A Branca porque tem duas brancas e uma

preta.

A branca porque tem mais possibilidades

de sair, porque tem duas.

A branca porque tem maior quantidade.

Preta – 1

Porque só tem ela.

Ambas - 1

A branca ou a preta, mas a branca tem

mais.

b. De qual recipiente seria

mais provável retirar

(sem olhar) uma bola

preta? Justifique sua

resposta.

Recipiente 1 - 3

Porque tem mais chance de tirar a bolinha

preta.

Porque tem duas bolas.

Porque pode ser que eu tire a branca ou

preta.

Page 159: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

158

Recipiente 2 - 19 Porque tem mais bolas pretas que brancas.

Porque tem duas bolas pretas e uma branca.

No recipiente 2, porque há 2 chances dentre

3.

Tem menos branca e mais preta.

Porque as bolas estão embaixo e tem mais

preta.

Porque tem duas bolas pretas e ela tem

mais possibilidades de sair.

Porque a bola preta está em maior

quantidade.

Recipiente 3 - 1

Porque iria ficar igual, iria ter a mesma

resposta.

Recipiente 4 - 2 Tem as mesmas possibilidades.

Porque tem duas pretas e duas brancas.

Recipiente 2 e 4 - 1 Não justificou

c. Seria mais fácil retirar

uma bola branca do

recipiente 2 ou do

recipiente 1? Explique o

porquê de sua resposta.

Recipiente 1 - 16

Porque tem uma bola branca e uma bola

preta.

Porque tem as mesmas possibilidades.

Tem as mesmas quantidades de branca e

preta.

No 1, porque tem a metade das chances e

no 2, a minoria.

No 1, porque no 2 tem mais pretas que

brancas.

Tem duas bolas pretas e uma branca e a

preta ficaria mais fácil de sair.

Número de bolas iguais.

Tem menos bolas pretas.

Porque há duas bolas se ele tiver sorte tirará

a branca. Digamos que 50% de cada bola.

No 1, porque no 2 tem duas bolinhas pretas.

No 1 dá para retirar uma bola preta ou

branca e no recipiente 2 dá para tirar as

duas pretas.

Porque é mais provável que saia.

No recipiente 2 seria mais difícil sair, pois

contém mais pretas e no 1 tem as mesmas

chances de tirar as duas cores.

Recipiente 2 - 8 No 2, porque tem apenas uma branca em

cada um deles.

Porque no recipiente 1 tem uma bola

branca e no 2 também.

Porque a bola branca está em cima.

Porque tem três bolas e duas delas são

Page 160: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

159

pretas.

Porque iria ficar com duas pretas.

Porque tem duas bolas pretas e uma branca.

Ambos - 1 São as mesmas chances porque tem uma

bola branca em cada recipiente.

Não especificou

recipiente - 1

Porque tem mais chances de sair branco

que preto.

Fonte: Diário de Campo da pesquisadora.

As opções e as justificativas apresentadas pelos alunos nessa tarefa indicam que, assim

como as situações de incertezas conduzem os alunos a diferentes concepções, os enunciados

de problemas de probabilidade também podem os conduzir a diferentes interpretações.

A interpretação de problemas probabilísticos não é fácil, pois envolve a interpretação

dos enunciados e as concepções pessoais. Dessa forma, conceitos subjetivistas e frequentistas

muitas vezes influenciam nas respostas dos alunos por serem utilizados na vida cotidiana. Os

enunciados dos problemas ou as figuras que apresentam também podem contribuir para a

construção de equívocos nas respostas, como os apresentados nessa tarefa, com a disposição

das bolas nos recipientes As respostas “porque as bolas estão embaixo” para a problemática b

e “porque a bola branca está em cima” para a c são indícios de que a forma como as bolas

foram dispostas nas figuras influenciaram os alunos em suas ideias.

De acordo com a perspectiva vygotskyana, interpretações como essa, em que a palavra

estabelece inter-relações entre os objetos são características do pensamento por complexo.

Segundo Fontana (2005), operações de análise são indicadores do movimento do pensamento

por complexo para os conceitos potenciais.

Alguns alunos redigiram respostas equivocadas de alguns alunos para a questão “seria

mais fácil retirar uma bola branca do recipiente 2 ou do recipiente 1?”, afirmando que seria no

2, “porque iria ficar com duas bolas pretas” ou “porque tem duas bolas pretas e uma branca”.

Isso pode ocorrer por conta de fundamentação na concepção frequentista de probabilidade,

talvez porque acreditem que o fato de ter menos bolas brancas é porque ela sai mais ou porque

“a bola branca está em cima”

A falta de compreensão da concepção formal das probabilidades é observada na

resposta de certos estudantes para o item c: “são as mesmas chances de sair branco que preto”

e “no 2, porque tem apenas uma branca em cada uma deles” Eles consideram que o fato de

ter bolas das duas cores nos recipientes torna a situação equiprovável.

Page 161: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

160

Mesmo diante de alguns equívocos, percebe-se nas respostas dos alunos na tarefa 5

que a maioria dos alunos consegue analisar e comparar características de situações

equiprováveis ou não para avaliar e estimar as chances dos diferentes eventos. Essas ações são

evidências do pensamento probabilístico.

5.2 Considerações relativas às tarefas de probabilidade

As respostas dadas pelos alunos na tarefa sobre probabilidade indicam que há um

movimento das concepções probabilísticas dos alunos investigados, mobilizado pelos

diferentes contextos e características das tarefas. O uso de termos do vocabulário

probabilístico como “bastante provável”, “há possiblidades”, “há probabilidades” foi

observado nas justificativas dos alunos, assim como a estimativa das probabilidades por meio

de expressões e porcentagens.

As respostas apresentadas pela maioria alunos nas tarefas sobre probabilidade indicam

que eles estimam de maneira adequada as probabilidades de problemas de diferentes

concepções probabilísticas. Porém, os conceitos frequentista e subjetivista, desenvolvidos a

partir de experiências de âmbito pessoal e de frequência, estão presentes nas concepções de

alguns alunos, em situações diversas de probabilidade. Esse fato é um indicativo de que os

conceitos espontâneos, estabelecidos na vida cotidiana, influenciam na resolução de

problemas escolares de probabilidade. Dessa forma, a dinâmica de aprendizagem realizada na

primeira fase da pesquisa se faz importante para que conceitos científicos sejam estabelecidos.

A tarefa 1, que envolvia a concepção clássica de probabilidade, foi a que teve maior

número de respostas adequadas dos alunos, dando indícios da compreensão do conceito. De

acordo com Godino, Batanero e Cañizares (1996), a representação formal do conceito clássico

está associada à certa destreza no trabalho com frações e conceitos de razão. Considero que

esse fato seja um indicativo para o ensino de probabilidade. Penso que as situações de

probabilidade clássica são oportunas para o desenvolvimento de tal destreza; no entanto, o

fato de iniciar os estudos de probabilidade a partir da concepção clássica pode conduzir os

alunos ao desenvolvimento de conceitos equivocados, como os apresentados por alguns

alunos, que consideram espaço amostral equiprovável em situações que não são. Minha

sugestão é que circunstâncias relacionadas à concepção formal das probabilidades antecedam

casos voltados para a clássica no processo de ensino das probabilidades.

Page 162: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

161

A avaliação dos enunciados dos problemas de probabilidade e de suas representações

gráficas precisam ser consideradas no momento de seleção de tarefas do ensino das

probabilidades. Como observado na análise, os enunciados e suas representações podem

conduzir os alunos ao desenvolvimento de conceitos e estimação probabilística equivocados.

As discussões desenvolvidas na tarefa “linguagem probabilística” possibilitaram

reflexões que envolviam conceitos de todas as concepções probabilísticas – clássica,

frequentista, formal, subjetivista e lógica – por meio de relação entre os termos do

vocabulário probabilístico e as possibilidades no jogo de par ou ímpar. Porém, o foco de

minha investigação era as articulações entre o pensamento combinatório e o probabilístico, e

não o desenvolvimento específico dos conceitos. Dessa forma, as tarefas desenvolvidas não

possibilitaram o desenvolvimento de generalizações de problemáticas lógicas probabilísticas

específicas. Penso que esse apontamento possa ser um objeto de investigação importante, pois

os conceitos de probabilidade lógica são significativos para a resolução de problemas

cotidianos e escolares.

As concepções equivocadas das probabilidades apresentadas em algumas situações são

indícios de que o desenvolvimento do pensamento probabilístico não é espontâneo nem fruto

de trabalho específico de probabilidade, mas de um processo de ensino e de aprendizagem que

permeia todo o período escolar, que envolve o movimento entre conceitos espontâneos e

científicos, articulados pelos componentes mediadores − tarefa, ambiente de aprendizagem e

linguagem − em diferentes contextos. Os resultados também apontam que o processo não é

igual para todos os estudantes, mesmo que tenham vivenciado as mesmas situações de ensino.

Além da tarefa “linguagem probabilística”, outras possibilitaram a articulação entre a

combinatória e a probabilidade, como o “jogo senha”, “corrida de cavalos”, “lançamento de

dardos”, “jogo do lobo mal e da chapeuzinho”, “lançamento de moedas: situação-problema”,

“lançamento de moedas: experimento”, “jogo de par ou ímpar” e “tarefas sobre probabilidade:

de 1 a 5”

Assim como apontando por Hiebert et al (1997), considero que esse momento de

“avaliação” foi importante para buscar indícios sobre a aprendizagem dos alunos quanto

combinatória e à probabilidade e perceber que esse momento não significa o final do

processo, mas o início de outro.

Page 163: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

162

6 SIGNIFICAÇÕES DO TRABALHO REALIZADO

A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do

processo da busca. E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura,

fora da boniteza e da alegria. (FREIRE, 1996).

Foi na busca de resposta para a questão “O que se evidencia no desenvolvimento do

pensamento probabilístico com alunos do 6º ano do Ensino Fundamental quando este se

articula ao desenvolvimento do raciocínio combinatório por meio de um trabalho pedagógico

na perspectiva da problematização?” que me envolvi nesta pesquisa e nas considerações que

trago agora. Não apresento apenas os achados da pesquisa, mas (re)significações elaboradas

na boniteza e na alegria do processo de ensino e de aprendizagem desenvolvido em contexto

de sala de aula.

A análise realizada me possibilitou observar que a interpretação dos termos do

vocabulário probabilístico não são compartilhadas por todos os alunos. Mas, a partir de um

ambiente de aprendizagem em que a comunicação de ideias é permitida, eles desenvolvem um

movimento de construção de significações para os termos, chegando a um consenso entre os

que são adequados aos contextos.

Os alunos possuem conceitos sobre combinatória e probabilidade, mesmo que

espontâneos, mas ao se depararem com uma proposta de ensino problematizadora, articulada

à linguagem e a uma cultura de aula de Matemática adequada, são capazes de se envolver em

um processo de elaboração conceitual, (re)significando conceitos, chegando a outros mais

elaborados.

Os conceitos espontâneos, quando utilizados como ponto de partida no processo de

ensino de combinatória e probabilidade, possibilitam que os alunos os (re)signifiquem. Essa

ação é importante para o desenvolvimento do pensamento científico, uma vez que os próprios

alunos vão coordenando a relação entre seus conceitos e os elementos mediadores,

possibilitando o desenvolvimento do pensamento combinatório e probabilístico.

As situações relacionadas à probabilidade são passíveis de equívocos, pois envolvem a

interpretação dos enunciados, e muitas vezes as concepções desenvolvidas na vida cotidiana

não se aproximam dos conceitos científicos. Assim, a articulação entre os conceitos

espontâneos e os científicos no processo de ensino da probabilidade favorece o

desenvolvimento de conceitos mais elaborados, evitando também que conceitos equivocados

sejam desenvolvidos. Daí a importância de uma cultura social de aula de Matemática

Page 164: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

163

(HIEBERT et al, 1997) que possibilite que essas concepções sejam explicitadas, constituindo

um contexto favorável para o professor tomá-las como ponto de partida.

Os conceitos relacionados à combinatória e à probabilidade envolvem significações do

“possível” e do “provável”, que em diferentes contextos se articulam e em outros não Dessa

forma, não é possível pensar em um processo de ensino estático, sem que haja a comunicação

e a circulação de ideias. É necessária uma prática de ensino dialógica (FREIRE, 1983, 1996).

Um ambiente de aprendizagem dialógico nas aulas de Matemática requer do professor

uma participação ativa. Por meio desta, ele não apenas tem a intencionalidade de propor

tarefas, mas também de promover estratégias de comunicação, reconhecer possibilidades de

reflexão nas ações dos alunos, criar espaços de negociação de significados e, a partir deles,

proporcionar articulações entre os conceitos e as vivências.

As diferentes concepções probabilísticas apresentadas pelos alunos no

desenvolvimento das tarefas são um indicativo da necessidade de um trabalho de ensino que

promova a reflexão entre as concepções probabilísticas em diferentes contextos e níveis de

ensino. É importante para o aluno do 6º ano do Ensino Fundamental o uso de recursos

representativos – objetos manipulativos, esquemas, desenhos, diagrama de árvore, quadro,

registros diversos, etc. – para a construção e a significação do espaço amostral, possibilitando

o desenvolvimento do raciocínio combinatório.

A tarefa “linguagem Probabilística” se mostrou potencializadora na produção de

significações e de articulações entre a combinatória e a probabilidade, quando entrelaçada

com os outros componentes mediadores – linguagem e ambiente de aprendizagem. Além

disso, o movimento dos conceitos espontâneos e científicos − desencadeado no contexto de

sala de aula, no processo de negociação de ideias entre a professora-pesquisadora e os alunos,

mediados por elementos da perspectiva histórico-cultural (a palavra, as mediações, as

interações, o movimento de significações) − foi fundamental para o desenvolvimento dessas

ações.

A referida tarefa também possibilitou observar dados relevantes para o processo de

ensino da combinatória e da probabilidade, como:

A apresentação de diferentes conceitos sobre combinatória e probabilidade e

variados níveis de generalização conceitual de alunos do mesmo ano de

escolaridade;

Page 165: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

164

as possibilidades de problematizações desenvolvidas pelos alunos no decorrer

do processo;

a discussão de procedimentos de enumeração e contagem adequados para a

situação de análise de possibilidades;

a estimação das probabilidades a partir da análise das possibilidades;

o movimento de significações dos termos probabilísticos para os diferentes

contextos.

As tarefas “itinerários” e “o problema das cordas” se mostraram potencializadoras no

desenvolvimento do raciocínio combinatório. Possibilitaram que elaborações conceituais em

diferentes níveis fossem desenvolvidas nas variadas fases de realização das tarefas.

Os procedimentos de enumeração e contagem e as reflexões (re)elaborados na

execução das tarefas da sequência de pesquisa, envolvendo os diferentes problemas de

combinatória – existência, enumeração, reconto, classificação, otimização e propriedade dos

números combinatórios e manipulação algébrica –, possibilitaram que os alunos

desenvolvessem raciocínio e procedimentos adequados aos diferentes problemas.

Ademais, os registros produzidos pelos alunos são recursos importantes para que

possam ser feitas generalizações. Isso porque as regularidades podem ser observadas e regras

podem ser elaboradas, promovendo, assim, o desenvolvimento do pensamento combinatório.

O uso de procedimentos sistemáticos de enumeração, ou seja, de elaboração de

registro das possibilidades de forma organizada, conduz os alunos, diante de problemas de

combinatória e probabilidade, às respostas adequadas. A organização dos registros precisa ser

construída com os alunos na realização das tarefas para que eles percebam os sentidos dessa

ação na prática de resolução de problemas. Novamente se destaca o papel do professor, o

quanto ele precisa estar atento ao nível de desenvolvimento conceitual em que os alunos se

encontram, criando estratégias que os ajudem a avançar na elaboração conceitual. Nesse

sentido, quando percebi que os alunos necessitavam de modelos de organização do espaço

amostral, fiz as intervenções, ajudando-os a organizarem seus registros, partindo das

sugestões dadas por Valéria.

A produção escrita dos alunos não pode ser considerada apenas como uma forma de

registro ou de expressão, mas também deve ser tratada como uma potencialidade na formação

de conceitos. Assim, ao me preocupar com essa produção e valorizar as ideias dos alunos,

Page 166: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

165

possibilitei que eles se sentissem seguros para compartilhar suas concepções e suas estratégias

de resolução das situações propostas.

Os registros produzidos na tarefa “o problema das cordas” possibilitaram que os

alunos desenvolvessem conceitos da combinatória a partir da análise de padrões numéricos

evidenciando a possibilidade de articulação entre áreas de estudos da Matemática.

As tarefas de combinatória “linguagem probabilística”, “itinerários” e “o problema das

cordas” possilitaram que conceitos sobre combinatória e probabilidade fossem elaborados ao

ser desenvolvidas. Isso se deu em um processo em que a linguagem e as interações entre

professora-pesquisadora e alunos permeavam as problematizações em contexto de situação

real de ensino e de aprendizagem.

Considero a proposta de ensino elaborada por Christiansen e Walther (1986)

importante para o trabalho na perspectiva histórico-cultural em sala de aula, uma vez que as

fases indicadas favorecem a linguagem, possibilitam as interações entre os sujeitos e a

sistematização de conceitos e problematizações dessa sistematização. Além disso, possibilita

que o professor compreenda o curso de desenvolvimento de conceitos de seus alunos na

complexidade da sala de aula.

As situações relacionadas à combinação de vários elementos não constituem tarefa

fácil para os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. Mas, por meio de um processo de

ensino dialógico, os sentidos são desenvolvidos e apropriados pelos alunos na interação e na

operação mental, conduzindo-os ao processo de significação.

O professor nesse processo tem um papel importante. É ele que, a partir de um

trabalho intencional, organiza as tarefas e o ambiente de aprendizagem e, por meio de uma

prática problematizadora, possibilita que conceitos espontâneos e científicos, permeados pela

linguagem, se movimentem como uma espiral, desenvolvendo conceitos em níveis mais

elaborados.

As respostas dadas pelos alunos nas tarefas sobre probabilidades evidenciaram que a

maioria deles consegue perceber as pecularidades presentes em situações que envolvem

diferentes conceitos probabilísticos e estimar a probabilidade. As justificativas dadas às

respostas indicam que conceitos sobre combinatória estão presentes no ideário dos alunos ao

fazer estimativas probabilísticas, assim como palavras do vocabulário probabilístico,

significadas na primeira tarefa desenvolvida na pesquisa.

Page 167: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

166

A concepção clássica das probabilidades é muito forte no ideário dos alunos,

conduzindos-os, em alguns momentos, a equívocos na estimação das probabilidades, uma vez

que consideram o espaço amostral de alguns eventos como equiprováveis, quando não são.

Creio que essa problemática ficou em aberto, e uma pesquisa específica sobre essa questão

seria importante para o ensino e a aprendizagem da combinatória.

A resposta dada pelos alunos no problema que envolve o conceito lógico das

probabilidades apontou dificuldades em sua resolução. Segundo Godino, Batanero e

Cañizares (1996), o conceito lógico das probabilidades é desenvolvido a partir de uma relação

lógica entre o enunciado e as hipóteses, conduzindo o sujeito ao desenvolvimento de

generalizações de implicações e contradições disponíveis. Considero que a lógica

probabilística, assim como as demais, permeia as situações cotidianas dos alunos. Dessa

forma, acredito que uma pesquisa nessa área seja interessante para o desenvolvendo de

concepções probabilísticas dos alunos, pois os conceitos de lógica estão relacionados aos

demais.

Como afirmado, iniciei esta pesquisa com o objetivo de investigar o que se evidencia

no desenvolvimento do pensamento probabilístico com alunos do 6º ano do Ensino

Fundamental quando este se articula ao desenvolvimento do raciocínio combinatório por meio

de um trabalho pedagógico na perspectiva da problematização. Compreendo que durante a

trajetória escolar os alunos são envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem da

combinatória, nesse processo, entre outros fatores, visa-se que os conceitos desenvolvidos

sejam articulados aos do ensino e da aprendizagem da probabilidade. No entanto, a forma

como são desenvolvidos nem sempre possibilita a aprendizagem com compreensão.

O pensamento por complexo, uma das três fases básicas do desenvolvimento do

pensamento científico apresentadas por Vygotsky, evidenciado em diversos momentos da

pesquisa, os espontâneos e os científicos são indicativos da importância das interações

escolarizadas para o processo de elaboração conceitual.

Considero que, ao articular a combinatória e a probabilidade com elementos

mediadores – linguagem, tarefas e ambiente de aprendizagem –, o raciocínio combinatório e o

pensamento probabilístico são imbricados por meio de significações, possibilitando a

aprendizagem com compreensão. Para que os alunos desenvolvam conceitos sobre

probabilidade e consigam adequá-los aos diferentes contextos, é necessário que eles sejam

estudados na escola em uma dinâmica adequada. Para que isso ocorra, os conceitos

Page 168: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

167

subjetivista, frequentista, lógico, clássico e formal precisam fazer parte do currículo de

Matemática da Educação Básica.

Acredito que as considerações apresentadas nesse momento final de pesquisa são

relevantes para o processo de ensino e de aprendizagem da combinatória e da probabilidade

na Educação Básica. Mas quero ressaltar que a perspectiva histórico-cultural, na qual me

orientei para realizar este trabalho, foi fundamental para que os objetivos da pesquisa fossem

atingidos.

Da mesma forma como os alunos, também estive envolvida na pesquisa. Desde o

início, vi-me em um processo de (re)significações constantes nas questões relacionadas ao

ensino e à aprendizagem da combinatória e da probabilidade, no desenvolvimento da pesquisa

em contexto real, no duplo papel por mim assumido – professora-pesquisadora –, mas

principalmente no processo de elaboração conceitual na perspectiva vygotskyana.

Desde o Magistério, tinha conhecimento das contribuições de Vygotsky no plano

educacional; porém, desenvolver, a partir de sua perspectiva, um trabalho nas aulas de

Matemática, no qual eu, assim como meus alunos, estaria inserida, não parecia ser possível.

Ao realizar estudos mais específicos sobre essa perspectiva teórica, por sugestão da banca de

qualificação, percebi que características dessa perspectiva estavam presentes em minha

prática docente, como o fato de promover a interação entre os alunos e eu, ao dar “ouvido” ao

que diziam, e o de adotar uma prática problematizadora. Dessa forma, também fui envolvida

em um processo de elaboração conceitual.

Acredito que o presente trabalho deixou marcas significativas da importância do outro

– da professora-pesquisadora e dos alunos – no processo de significação singular e dele e dos

elementos mediadores – linguagem, tarefa e ambiente de aprendizagem– no desenvolvimento

e no movimento de conceitos. Assim, creio que o potencial da intencionalidade do professor

no processo de ensino da Matemática também se evidenciou neste trabalho de pesquisa.

Todavia, ressalto que seu desenvolvimento em sala de aula requer certo conhecimento

pedagógico por parte do professor. Dessa forma, considero que é um fator relevante a ser

discutido nos cursos de formação de professores.

Iniciei a seção com dizeres de Paulo Freire. Novamente recorro a suas palavras, desta

vez para encerrar o texto, pois as considero adequadas para este momento.

Page 169: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

168

O homem, como um ser histórico, inserido num permanente

movimento de procura, faz e refaz constantemente o seu saber.

(FREIRE, 1983).

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177

ANEXO A − Linguagem

Tarefa 1 – Linguagem probabilística

Considerando os possíveis resultados de um jogo de par ou ímpar entre dois colegas – em que

cada jogador só pode usar os dedos de uma das mãos –, classifique com uma das palavras do

quadro abaixo os acontecimentos citados:

Impossível - pode ser – possível - bastante provável - certo - se espera que – seguro-

há alguma possibilidade - há alguma probabilidade - incerto

a) A soma ser um número ímpar:

b) A soma ser um número menor do que 10:

c) A soma ser o número 12:

d) A soma ser um número maior do que 0:

e) A soma ser o número 0:

f) Os colegas apresentarem números de dedos distintos:

g) Os colegas apresentarem números de dedos iguais:

Page 179: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

178

ANEXO B – Tarefas de combinatória59

Tarefa 2 – Criação de bandeiras

Temos que escolher as cores de uma bandeira para nossa escola. A bandeira será formada por

faixas de cores diferentes, que devem ser escolhidas entre três cores: azul, vermelho e branco.

Para decidir qual nós gostamos mais, precisamos desenhar todas as possíveis bandeiras.

Quantas bandeiras desenharam? Qual o procedimento que utilizaram para

ter certeza de que desenharam todas as bandeiras possíveis, de acordo com

as características solicitadas?

Classifique as bandeiras que vocês desenharam de diferentes modos, por

exemplo, segundo a cor da faixa anterior.

Invente uma maneira de desenhar todas as bandeiras de três faixas

utilizando as cores amarelo, branco, vermelho e verde para estar seguro de

que não esqueceu nenhuma. As faixas que estão do lado da outra não podem

ser da mesma cor.

Tarefa 3 – Quadrados

Quantos quadrados há na figura 3.1? E na figura 3.2?

3.1

3.2

Crie um procedimento para estar seguro de que contou corretamente.

Tarefa 4 – Construção de torres

Construa torres encaixando três tiras de cartolina (amarela e azul) uma sobre a outra.

59

As tarefas de 2 a 10 foram desenvolvidas a partir dos trabalhos de Batanero, Godino e Navarro-Pelayo (1994).

Algumas delas foram adaptadas para o contexto A tarefa 11 foi retirada da coleção “Experiências

Matemáticas: 7ª série”, produzida pela Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas do Estado de São

Paulo (SÃO PAULO, 1998).

Page 180: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

179

Quantas torres diferentes podem ser formadas? Registre um procedimento

(esquema, desenho, gráfico, etc.) que mostre todas as possibilidades de

formação das torres.

Sem fazer torres com tiras é possível determinar quantas torres diferentes

podem ser construídas utilizando quatro tiras? Registre sua ideia.

Quantas torres de três tiras podem ser construídas com quatro cores

diferentes? Justifique sua resposta.

Tarefa 5 – Padrões de cores

a) Tendo uma tira formada por cinco retângulos, podendo cada um ser colorido de branco

ou preto, quantas tiras diferentes podem ser feitas utilizando essas duas cores?

b) Alguns dos padrões produzidos são simétricos, como o da figura abaixo:

Quantas formas distintas há para colorir a tira de cinco retângulos com as cores branca

e preta, de modo que se obtenha um padrão simétrico?

Tarefa 6 – Prisioneiros

a) Em uma prisão há somente seis celas. Escreva todas as formas em que se podem

distribuir dois prisioneiros em cada uma delas.

b) Se há 4 prisioneiros, de quantas formas diferentes você pode organizá-los?

Tarefa 7 – Árvore genealógica60

Observe parte do diagrama de árvore feito por João e construa sua árvore

genealógica.

60

Para realizar essa tarefa os alunos realizaram previamente uma pesquisa com seus familiares sobre os nomes de

avós e bisavós paternos e maternos.

Page 181: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

180

JÚLIO (PAI) ANA (MÃE)

JOÃO

Observando o diagrama de árvore que produziu é possível saber quantos

trisavós (pais dos bisavós) e tetravós (pais dos trisavós) uma pessoa possui?

Tarefa 8 – O problema do táxi

A figura abaixo mostra os diferentes percursos que um táxi pode fazer, em uma “cidade

quadriculada”, de O a A.

Em todas as ruas só é permitido seguir uma direção e os únicos caminhos a percorrer são a

quadrícula da direita e a de cima, como mostra o exemplo a seguir:

Crie uma forma de numerar todos os caminhos possíveis para chegar a A

partindo de O. Quantos caminhos ou trilhas pode fazer o táxi para chegar a

seu destino?

Quantos caminhos há em um quadrado 3x3?

Tarefa 9 – Itinerários

Quantos itinerários há para ir de A a C?

Page 182: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

181

Quantos itinerários há para ir e para voltar?

E se não puder ir e voltar pelo mesmo caminho?

Tarefa 10 – Números de telefones

Quantos números de telefones de quatro algarismos podem ser formados

com os dígitos 0 a 9?

Sabendo que na cidade de Amparo os telefones fixos começam com os

prefixos 3807, 3808, 3817, 3839, e que os outros quatros números são

formados pelos algarismos de 0 a 9, descubra o número de linhas

telefônicas que pode haver em nosso município.

Tarefa 11 – O problema das cordas

Marque nas circunferências abaixo, respectivamente, 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 pontos.

Verifique o número de cordas que podem ser traçadas em cada

circunferência, unindo dois pontos.

Organize os resultados obtidos e faça um registro relacionando os números

de pontos e o número de cordas.

É possível determinar, sem traçar, o número de cordas de uma

circunferência com 10 pontos? Justifique sua resposta.

Page 183: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

182

ANEXO C – Jogos de combinatória e probabilidade61

Tarefa 12 – Jogo: Senha

Neste jogo são necessários dois participantes, o desafiante e o descobridor.

Modalidade “ABC” – instruções do jogo

O desafiante escreve, em seu papel, as letras A, B e C em certa ordem, sem que o

descobridor veja. Este, por sua vez, deverá escrever em seu papel as letras na ordem que

supõe correta. Em seguida, o desafiante compara sua ordem com a do descobridor,

informando-lhe – pelos números 0, 1 ou 3, escritos ao lado da sequência proposta por esse

jogador – quantas posições acertou. Se acertar a ordem de todas as letras e, portanto, tirar 3, a

partida termina. Se tirar 0 ou 1, o descobridor fará uma nova proposta e o desafiante indicará

novamente quantas posições acertou. Essa situação prossegue até que o descobridor descubra

a senha criada pelo desafiante.

Exemplo:

CBA são as letras escondidas (senha).

Jogadas Proposta Resultado

1 CBA 1

2 BCA 0

3 CAB 3

Situações-problema do jogo senha – modalidade ABC

O que é melhor o descobridor propor na segunda jogada, quando o

desafiante informa-lhe, pela indicação do resultado 0, que todas as posições

das letras em sua primeira jogada estão erradas?

61

(MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997, p. 53-58).

Page 184: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

183

O que é melhor o descobridor propor na segunda jogada, quando o

desafiante informa-lhe, pela indicação do resultado 1, que acertou a posição

da letra na primeira jogada?

Qual dos dois resultados – 0 ou 1 – oferece mais informação para a próxima

jogada?

Enumere todas as combinações possíveis para as três letras na primeira

jogada.

Na primeira jogada, o descobridor propõe BAC e é informado pelo

desafiante que errou a posição de todas as letras (resultado 0). Com essa

informação, quantas combinações pode, por antecipação, eliminar na

segunda jogada?

Na primeira jogada o descobridor propõe BAC e é informado pelo

desafiante que acertou apenas uma letra (resultado 1). Com essa

informação, quantas combinações pode, por antecipação, eliminar na

segunda jogada?

Modalidade “acerte o número” – instruções do jogo

O desafiante esconde um número composto por três algarismos não-repetidos,

escolhidos entre os números 1, 2, 3, 4 e 5. O descobridor deverá descobrir o número

escondido, escrevendo também números de três algarismos não-repetidos. A cada jogada,

receberá duas informações do desafiante: (a) quantos algarismos acertou (1, 2 ou 3) e (b)

quantas posições acertou. A partida termina quando o número proposto pelo descobridor

coincidir com o número escondido pelo desafiante.

Exemplo:

134 é o número escondido (senha).

Proposta Algarismos Posições

521 1 0

Page 185: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

184

453 2 0

342 2 0

134 3 3

Problematização do jogo

Faça a última aposta levando em conta as informações sobre as posições e

os algarismos relativos às duas primeiras jogadas:

Proposta Algarismos Posições

123 3 0

312 3 0

3 3

Apoiado nas informações contidas no quadro, você acha que a segunda

jogada foi a melhor possível? Por que?

Proposta Algarismos Posições

435 3 1

543 3 1

É possível errar todos os algarismos na primeira jogada, ou seja, ter

resultado 0 na coluna? Por que?

O que produz mais informação na coluna algarismos para a segunda

jogada?

( ) acertar um algarismo na primeira jogada.

( ) acertar dois algarismos na primeira jogada.

Por que?_____________________________________________________________

Observe a situação abaixo:

Page 186: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

185

Proposta Algarismos Posições

435 3 1

Considerando que são cinco os algarismos possíveis (1, 2, 3, 4 e 5) e que dos três

propostos (1, 2 e 3) pelo descobridor apenas um está certo, o que se pode concluir sobre os

dois números que não entraram na sequência?

Tarefa 1362

– Jogo “corrida de cavalos”

Instruções do jogo:

- Os números do tabuleiro correspondem aos cavalos.

- Cada jogador pode apostar em três cavalos.

- A aposta pode ser em um único cavalo, em dois ou em três.

- A aposta deve ser registrada sob o(s) número(s) do(s) cavalo(s) escolhido(s).

- O cavalo avança quando a soma dos números extraídos do lançamento de dois dados for

igual ao número do cavalo. O avanço é marcado com um x no diagrama em frente ao número

obtido.

- Vence o cavalo que primeiro se colocar na linha da chegada.

Tabuleiro: jogo “corrida de cavalos”

CHEGADA

LARGADA 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13

REGISTRO

DAS

APOSTAS

Registre quantas “casas” cada cavalo avançou no jogo 1 e 2

Há algum cavalo que tem mais ou menos chances de vencer que o outro?

62

Tarefa adaptada de Skovsmose (2008).

Page 187: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

186

Justifique sua resposta.

O registro feito no tabuleiro ajudou você a fazer uma análise do jogo? Por

que?

Tarefa 1463

- Jogo “lançamento de dardos”

Instruções do jogo:

Cada aluno deve jogar quatro dardos no alvo.

Vocês devem registrar onde os colegas acertaram e os pontos

que ganharam: vermelha 200, amarela 100 e preta 50.

Quais as possibilidades de acerto ao

jogar os dardos?

Onde a maioria dos alunos acertou?

Qual é a probabilidade do jogador

acertar a cor vermelha do alvo? E a

amarela? E a preta? Há outras

probabilidades?

Tarefa 1564

– Jogo do lobo mau e da Chapeuzinho

Lobo mau propôs o seguinte jogo para Chapeuzinho Vermelho:

- Cada um lança alternadamente, 10 vezes, uma moeda para cima.

- Se as duas moedas apresentam cara, a Chapeuzinho ganha 1 ponto.

- Caso isso não ocorra, o lobo mau é quem ganha 1 ponto.

Ao final de 10 jogadas, quem obtiver o maior número de pontos ficará com os doces da vovó.

a) Você considera o jogo justo? Justifique.

b) Quem tem mais chances de ficar com os doces? Por que?

c) Então, o que é melhor? Ser a Chapeuzinho ou o lobo mau?

Tarefa 1665

– Lançamento de moedas: problematização

63

O jogo de dardos, além de ser um jogo de competição, também é utilizado como passa tempo entre amigos, o

que possibilita variações nas regras. De maneira geral, o alvo é pendurado e é estipulada uma distância, a qual é

marcada para que os jogadores se posicionem para atirar os dardos. Oficialmente há um valor de pontos que é

subtraído de acordo com a pontuação do dardo fixado pelo jogador. Vence aquele que zerar a pontuação. O

jogo foi adaptado para o contexto. 64

Tarefas baseada em Lopes, A. J. (Bigode) (2000).

Page 188: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

187

Se lançarmos uma moeda para cima, qual a face que terá mais chance de sair?

a) cara tem mais possibilidade

b) coroa tem mais possibilidade

c) as chances são as mesmas

d) não sei responder

Por que?_______________________________________________________________

Tarefa 1766

– Lançamento de moedas: experimento

a) Façam o lançamento de uma moeda por 5 minutos, registrando quantas caras e coroas

saíram.

b) Juntem todos os resultados dos experimentos da classe. O que acontece?

Tarefa 1867

– Jogo de par ou ímpar

Decida com seu colega quem será par e quem será ímpar.

Em cada jogada vocês irão lançar dois dados e calcular o produto dos números de pontos que

aparecem na face superior. Em seguida, registrem na tabela o produto e o resultado, ou seja,

indiquem se o número é par ou ímpar.

Ao final de 10 jogadas será vencedor aquele que obtiver mais resultados favoráveis a sua

escolha inicial, par ou ímpar.

Exemplo:

Tabuleiro para registro: “jogo de par ou ímpar”

Jogada Pontos obtidos/produto Resultado (par ou ímpar)

1 2 X 3 = 6 PAR

2 1 X 5 = 5 ÍMPAR

3 . . .

. . .

Jogada Pontos obtidos/produto Resultado

1

2

65

Tarefa adaptada de Celi Lopes (2003). 66

Tarefa adaptada de Celi Lopes (2003). 67

Tarefa criada por mim, a partir de tarefas utilizadas na pesquisa de mestrado.

Page 189: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

188

Quem venceu o jogo?

Você acha que esse jogo é justo? Por que?

O que é um jogo justo para você?

3

4

5

6

7

8

9

10

Page 190: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

189

ANEXO D − Carta

Carta

Queridos alunos,

Esta etapa do nosso trabalho chegou ao fim. Foi muito bom contar e estar com vocês

este ano. A opinião de vocês é muito importante para a pesquisa que realizamos e também

para meu trabalho, por isso desejo que escrevam o que gostaram no trabalho, o que não os

agradou, o que descobriram, o que ainda não sabiam até estudarmos juntos e outras coisas que

queiram me contar.

Beijos e até a próxima,

Professora Jaqueline

Page 191: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

190

ANEXO E – Tarefas de probabilidade

Tarefas sobre probabilidade68

1) Vou colocar uma ficha azul e uma amarela em um saco e pedir para você tirar uma sem

olhar. Qual você pensa que será mais provável sair?

a) a azul

b) a amarela

c) ambas têm a mesma possibilidade

d) não sei responder

Por que?_________________________________________________________________

2) E se eu colocar duas fichas azuis dentro do saco e uma amarela; qual é a mais provável que

saia?

a) a azul

b) a amarela

c) ambas têm a mesma chance

d) não sei responder

Por que?__________________________________________________________________

3) Com duas fichas azuis e uma amarela dentro do saco, a probabilidade de tirar uma

vermelha:

a) é certa

b) pouco provável

c) impossível

d) não sei responder

Por que?__________________________________________________________________

4) Uma classe tem 19 alunos. Há 11 meninas e 8 meninos. Se você escrever o nome de cada

um dos alunos em um papel, colocá-los em um saco e retirar um nome ao acaso, o que

considera que seja mais provável? Assinale, dentre as alternativas abaixo, a que esteja de

acordo com seu pensamento:

68

As tarefas de 1 a 4 foram adaptadas da tese de doutorado de Celi Lopes (2003). A tarefa 5 foi adaptada dos

trabalhos de Godino, Batanero e Cañizares (1996).

Page 192: a produção de significações sobre combinatória e probabilidade

191

a) que o nome seja de um menino;

b) que o nome seja de uma menina;

c) a probabilidade de o nome ser de um menino é a mesma de o nome ser de uma menina;

d) não sei responder.

Por que?_______________________________________________________________

5) Em uma vitrine de uma loja de esportes há alguns recipientes transparentes com bolas

brancas e pretas. Veja o desenho abaixo, que representa a vitrine.

Recipiente 1 Recipiente 2 Recipiente 3 Recipiente 4

a) Suponha que você fosse retirar, sem olhar, uma bola do recipiente 3. Qual a cor de bola que

provavelmente você iria retirar? Por que?

b) De qual recipiente seria mais provável retirar (sem olhar) uma bola preta? Justifique sua

resposta.

c) Seria mais fácil retirar uma bola branca do recipiente 2 ou do recipiente 1? Explique o

porquê de sua resposta.