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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
Luiza Mara Reis Furtado Campos
A WEB 2.0 NO AMBIENTE INTERNO DAS ORGANIZAÇÕES:
um estudo de caso sobre as intranets sociais de Cemig e Unimed-Rio
Belo Horizonte
2012
Luiza Mara Reis Furtado Campos
A WEB 2.0 NO AMBIENTE INTERNO DAS ORGANIZAÇÕES:
um estudo de caso sobre as intranets sociais de Cemig e Unimed-Rio
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação e Artes da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação Social. Área de concentração: Interações midiáticas Orientadora: Profª. Drª. Ivone de Lourdes Oliveira
Belo Horizonte
2012
FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Campos, Luiza Mara Reis Furtado C198w A Web 2.0 no ambiente interno das organizações: um estudo de caso sobre
as intranets sociais de Cemig e Unimed-Rio / Luiza Mara Reis Furtado Campos. Belo Horizonte, 2012.
133f. : il.
Orientadora: Ivone de Lourdes Oliveira Dissertação (Mestrado)- Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social.
1. Interação social. 2. Intranets. 3. Comunicação nas organizações. 4. Web 2.0 (Sistema de recuperação da informação). I. Oliveira, Ivone de Lourdes. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. III. Título.
CDU: 301.175.1
Luiza Mara Reis Furtado Campos
A WEB 2.0 NO AMBIENTE INTERNO DAS ORGANIZAÇÕES:
um estudo de caso sobre as intranets sociais de Cemig e Unimed-Rio
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação e Artes da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação Social.
_______________________________________________
Ivone de Lourdes Oliveira (Orientadora) – PUC Minas
_______________________________________________
Geane Alzamora – UFMG
_______________________________________________
Mozahir Salomão – PUC Minas
Belo Horizonte, 21 de dezembro de 2012.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a meus pais, que sempre priorizaram a educação em minha vida, fazendo o
possível e o impossível para que eu pudesse estudar em boas escolas. A base forte que me
proporcionaram é o que me ajuda a ir longe. Agradeço a eles por acreditarem em mim,
incondicionalmente.
A meus irmãos, amigos em quem posso confiar, que sempre torcem por mim e vibram
com minhas conquistas. A minha amiga Natália, pela amizade pra sempre e pra todas as
horas. A meus queridos Kenia, Tati, Cibele, Jonatas e Ana Luíza, amigos que vivenciaram
todas as etapas do mestrado, participando especialmente delas com palavras de apoio,
tranquilidade, racionalidade e com toda a disponibilidade e paciência para ajudar no que fosse
preciso. Ao Lilo, pela companhia nas madrugadas de desespero e ao meu tio Geraldo, pelas
orações na gruta.
A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social:
Mestrado Interações Midiáticas, pelas descobertas teóricas. Agradeço especialmente à Ivone,
orientadora querida e dedicada, com quem aprendi muito e tive a oportunidade de
compartilhar de seu entusiasmo em ensinar. À Marília, companheira de curso, que se tornou
uma grande amiga, revelando maravilhosas coincidências.
À Cemig, por viabilizar um objetivo de vida; aos profissionais da Unimed-Rio, por
terem aceitado tão prontamente o convite para se tornarem meu objeto empírico,
disponibilizando todas as informações de que precisei. A meu colega Paulo Henrique, pela
ajuda imediata em um momento crítico e por ter me aberto as portas na Unimed-Rio.
Ao Léo, pelo amor que me dedica todos os dias, por sua alegria de viver, que me
inspira, por compreender minhas ausências, por me poupar dos problemas e por assumir
sozinho, neste período, responsabilidades de nós dois.
E a Deus, por iluminar meus caminhos e colocar essas pessoas tão especiais em minha
vida.
RESUMO
O objetivo deste trabalho é compreender se há, por parte dos empregados das organizações
Cemig e Unimed-Rio, o reconhecimento do espaço relacional que essas empresas propõem ao
transformarem suas intranets em ambientes desenvolvidos sob a lógica da Web 2.0, conforme
a perspectiva conceitual adotada. A escolha dessas organizações como objeto empírico
justifica-se pelo fato de terem reformulado suas intranets, com o objetivo de transformá-las
em ambientes regidos pelos princípios da Web 2.0, por meio da implementação de recursos
que possibilitassem aos empregados espaços de colaboração e a descentralização da gestão do
conteúdo. A pesquisa é desenvolvida a partir do paradigma relacional, segundo o qual a
comunicação é vista globalmente, como um processo em que interlocutores em interação
produzem e compartilham sentidos, em um dado contexto sócio-histórico. Nessa perspectiva,
este estudo abandona a visão unilateral e parcial da comunicação, que considera apenas os
resultados das estratégias mercadológicas e institucionais das empresas e não leva em conta as
percepções dos demais interlocutores envolvidos. Assim, encontrou-se na análise crítica de
discurso, segundo a abordagem sugerida por Fairclough, uma proposta teórico-metodológica
coerente com o propósito desta investigação. Portanto, a partir de categorias que
possibilitassem encontrar a relação dialética proposta pelo autor, analisaram-se os discursos
dos empregados e também das organizações acerca das intranets. A hipótese da pesquisa
confirmou-se a partir dos resultados, que evidenciaram as contradições existentes entre o que
as empresas dizem e a apreensão desse discurso por parte dos empregados.
Palavras-chave: Web 2.0. Intranets. Organizações. Espaço relacional. Interação. Empregados.
Análise Crítica do Discurso.
ABSTRACT
This study aims to understand if there is an acceptance of the relational space of the Cemig
and Unimed-Rio employees that these companies propose when they transform their intranets
into settings develop by the logic of the Web 2.0 according to the conceptual perspective
adopted. The choice of these two organizations as an empirical object is due to the
reformulation of their intranets, with the aim to transform them into settings ruled by the Web
2.0 principles through the implementation of means which enable the employees spaces of
collaboration and the decentralization of the content management. The research is developed
from the relational paradigm whereby the communication is seen globally as a process which
the interlocutors in interaction produce and share feelings in a specific social historical
context. From this perspective, this study abolish the unilateral view and partial of
communication which considers only the marketing strategies and institutional results of the
companies and does not regard the perceptions of the others interlocutors involved. Thus, it
was found in the Critical Discourse Analysis, according to the approach suggested by
Fairclough, a theoretical methodological proposal consistent with the purpose of this research.
Therefore, from the categories which would enable to detect the dialectic relation proposed by
the author, the discourses of the employees were analyzed and so the organizations about the
intranets. The hypothesis of this study corroborated from the results which stated evidence the
contradictions between what the companies say and the comprehension about this speech by
the employees.
Key Words: Web 2.0. Intranets. Organizations. Relational space. Interaction. Employees.
Critical Discourse Analysis.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 13 2 A WEB 2.0 COMO POSSIBILIDADE DE MUDANÇA DE PERSPECTIVA NA COMUNICAÇÃO NO CONTEXTO DAS ORGANIZAÇÕES .......... ............................... 16 2.1 Sociedade em rede e cibercultura: o surgimento da cultura da participação e interação on-line ..................................................................................................................... 20 2.2 A Web 2.0 vista a partir da colaboração e da descentralização da gestão do conteúdo...................................................................................................................................26 2.3 A Web 2.0 no ambiente interno das organizações ........................................................ 32 3 A POSSIBILIDADE INTERACIONAL DAS INTRANETS SOCIAIS ....................... 36 3.1 O informacional que predomina .................................................................................... 37 3.2 O relacional que se apresenta ......................................................................................... 41 3.3 Construção de sentido nas organizações e o mito da intencionalidade prévia .......... 49 4 WEB 2.0 E INTRANETS: A APREENSÃO DO DISCURSO ORGANIZACIONAL POR PARTE DOS EMPREGADOS DE CEMIG E UNIMED-RIO .... ............................ 56 4.1 CemigNet e Interface: a caracterização do objeto........................................................ 58 4.1.1 Cemig, CemigNet e Web 2.0: o contexto de reformulação da intranet ..................... 59 4.1.1.1 Conhecendo a CemigNet ............................................................................................ 62 4.1.2 O processo de reformulação da “Interface” no contexto de midiatização da Unimed-Rio............................................................................................................................................72 4.1.2.1 Perfil da Interface 2.0: principais espaços e recursos ............................................. 74 4.2 Procedimentos metodológicos ........................................................................................ 84 4.2.1 O processo de análise ................................................................................................... 88 4.2.1.1 O discurso da Cemig ................................................................................................... 90 4.2.1.2 O discurso da Unimed-Rio ......................................................................................... 99 4.2.1.3 O discurso dos empregados ...................................................................................... 105 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 124 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 126 APÊNDICE ........................................................................................................................... 132
13
1 INTRODUÇÃO
A cultura contemporânea, que tem a mídia como sua principal expressão, vem sendo
marcada pela presença cada vez mais fundamental de tecnologias digitais. Como
consequência desses fatores, observamos na sociedade o desenvolvimento de novos modos de
percepção, implicando processos de comunicação que precisam ser melhor compreendidos.
Esse movimento de midiatização da sociedade influencia também o contexto organizacional,
que integra o tecido social e por isso se insere nesse mesmo patamar de mudanças. No novo
cenário, as organizações se veem diante da necessidade de repensar as interações com seus
interlocutores (LIMA; OLIVEIRA, 2012)1, dentro da perspectiva da comunicação.
O fenômeno denominado Web 2.0 é uma evidência desse contexto, uma vez que
inaugura a potencialização dos processos interativos tendo a internet como plataforma. A
segunda geração de redes digitais tem como principal característica a colaboração entre as
pessoas, que se tornam cada vez mais capazes de produzir e distribuir informações na web,
interagir e trocar conhecimento, valorizando a comunicação multidirecional e a inteligência
coletiva. Tendo em vista todos esses fatores, a lógica da Web 2.0 pode trazer mudanças
consideráveis para a comunicação no contexto das organizações, especificamente no que
tange às interações com os interlocutores inseridos no ambiente interno, foco deste estudo.
Nessa direção, percebemos que existe uma tendência das empresas em reformular suas
intranets, visando transformá-las em ambientes web desenvolvidos sob a lógica da Web 2.0.
O Prêmio Intranet Portal, realizado há cinco anos pelo instituto de mesmo nome2, é uma
constatação desse movimento. Conforme informações de seu website, uma das categorias da
premiação é “Melhor Intranet Social e 2.0”, que avalia o nível de colaboração das intranets,
considerando, inclusive, o grau de utilização de redes sociais (INSTITUTO INTRANET
PORTAL, 2012). Organizações como Banco do Brasil, Eletrobras, SBT, Petrobras, ONS e
Unimed-Rio estão entre as participantes das edições do prêmio.
Assim, a motivação para a realização desta pesquisa está em compreender se há, por
parte dos empregados das organizações Cemig e Unimed-Rio, o reconhecimento do espaço
1 Concordando com a perspectiva de Lima e Oliveira, adotaremos neste trabalho o termo interlocutores em vez
de públicos, no entendimento de que os públicos não estão delimitados a priori, mas surgem em uma interação na qual estão implicados, em razão de uma experiência. Nesse sentido, a construção de uma relação pressupõe sujeitos em interação, ou seja, interlocutores, parceiros de uma troca. Cada um assume o seu papel (emissor/receptor ou receptor/emissor) na situação vivenciada.
2 O Instituto Intranet Portal é uma associação sem fins lucrativos, que tem a missão de profissionalizar e fomentar o setor de intranets e portais corporativos do País.
14
relacional que essas empresas propõem ao transformarem suas intranets em ambientes
desenvolvidos sob a lógica da Web 2.0, conforme a perspectiva conceitual adotada.
Destacamos que a ideia deste estudo nasceu de uma experiência profissional relacionada à
implantação de uma intranet 2.0, que despertou a curiosidade de verificar como esse processo
acontecia em outras organizações, tendo em vista o aparente conflito existente entre os
princípios da segunda geração de redes digitais e os processos hierárquicos e as relações de
poder intrínsecos à realidade das empresas.
A escolha dessas organizações como objeto empírico justifica-se pelo fato de terem
reformulado suas intranets, com o objetivo de transformá-las em ambientes regidos pelos
princípios da Web 2.0, por meio da implementação de recursos que possibilitassem aos
empregados espaços de colaboração e a descentralização da gestão do conteúdo. A CemigNet,
intranet da Cemig, foi criada em 1998 e reformulada pela primeira vez em 2005, sendo que
sua versão 2.0 foi lançada em março de 2010. Já a primeira versão da Interface, intranet da
Unimed-Rio, foi implementada no ano de 2005 e sua versão 2.0, em abril de 2010.
A pesquisa é desenvolvida a partir do paradigma relacional, segundo o qual a
comunicação é vista globalmente, como um processo em que interlocutores em interação
produzem e compartilham sentidos, em um dado contexto sócio-histórico. Nessa perspectiva,
este estudo abandona a visão unilateral e parcial da comunicação, que considera apenas os
resultados das estratégias mercadológicas e institucionais das empresas e não leva em conta as
percepções dos demais interlocutores envolvidos.
No capítulo 2, começamos o trabalho conceituando e contextualizando os principais
eixos que permeiam toda a investigação, iniciando pelo processo de midiatização da
sociedade e, consequentemente, das organizações. Em seguida, os temas abordados tratam-se
da sociedade em rede e do surgimento da cibercultura, que favoreceram o desenvolvimento da
Web 2.0. Por fim, após o detalhamento acerca da segunda geração de redes digitais,
apresentamos as características das intranets sociais ou intranets 2.0.
Em seguida, no capítulo 3, buscamos problematizar o entendimento do fenômeno
comunicacional a partir de um conceito interacional do campo, abordando as principais
características do paradigma informacional e do paradigma relacional da comunicação,
procurando relacioná-los à perspectiva teórica da Web 2.0. Apresentamos também o conceito
de interação mútua mediada por computador, que contribui para fundamentar a abordagem
adotada, assim como algumas discussões acerca da construção de sentido no contexto
organizacional.
15
Por fim, no capítulo 4, procedemos ao trabalho de análise empírica, em que
contextualizamos o fenômeno em estudo, apresentando as organizações investigadas, assim
como as condições de criação de suas intranets 2.0. Realizamos também um trabalho de
caracterização descritiva, construindo o perfil das intranets, para possibilitar uma
aproximação maior do fenômeno. As informações partiram da análise de conteúdo dos
ambientes web, de entrevistas em profundidade com os gestores das organizações e também
de alguns documentos e registros em arquivo.
Apresentamos ainda a análise crítica de discurso, segundo a abordagem sugerida por
Fairclough, em que encontramos uma proposta teórico-metodológica coerente com o propósito
desta investigação. Portanto, a partir de categorias que possibilitassem encontrar a relação
dialética proposta pelo autor, analisamos os discursos dos empregados e também das
organizações acerca das intranets. A hipótese da pesquisa confirmou-se a partir dos
resultados, que evidenciaram as contradições existentes entre o que as empresas dizem e a
apreensão desse discurso por parte dos empregados. Culminamos, assim, nas considerações
finais da pesquisa realizada.
16
2 A WEB 2.0 COMO POSSIBILIDADE DE MUDANÇA DE PERSPECTIVA NA COMUNICAÇÃO NO CONTEXTO DAS ORGANIZAÇÕES
O avanço das tecnologias da informação e a presença da convergência midiática vem
causando mudanças significativas na sociedade contemporânea, na medida em que os
indivíduos vivem um momento inédito nos processos de interação e relacionamento sociais.
Podemos dizer que essas transformações fazem parte do movimento de midiatização da
sociedade, caracterizado por muitos autores como um novo modo de ser no mundo.
A ideia desenvolvida por Gomes (2006), por exemplo, diz que estamos vivendo uma
mudança que interfere profundamente na sociedade, fazendo surgir uma outra ecologia
comunicacional. A midiatização torna-se um modelo, de maneira que a sociedade percebe e se
percebe a partir da lógica da mídia, que agora se expande para além dos dispositivos
tecnológicos tradicionais. É por isso que, para Gomes, é possível falar da mídia como um
locus de compreensão da sociedade.
Muito embora exista um real não abarcado pelas câmeras de televisão, é muito difícil dar conta dele. Em uma existência marginal, significa um espaço de resistência ao domínio do processo midiático. Entretanto, quem não se insere dentro do processo corre o risco de exclusão dos grandes leitos de produção de sentido social hoje. Cada vez mais o fato, para ser reconhecido como real, deve ser midiatizado. (GOMES, 2006, p. 135).
Assim como observa Gomes (2006), a convergência de fatores sócio-tecnológicos
também é vista por Fausto Neto (2008b) como causadora de profundas transformações na
sociedade, em suas formas de vida e em suas interações, principalmente nas três últimas
décadas. No entanto, o autor acresenta a essa análise o fato de que já não se trata apenas de
uma sociedade que lida com a existência dos meios, mas de uma sociedade que funciona
tomando como elemento constituinte a própria existência deles, transcendendo os veículos em
si e envolvendo a cultura, a lógica e as operações midiáticas dos meios (FAUSTO NETO,
2010).
Já não se trata mais de reconhecer a centralidade dos meios na tarefa de organização de processos interacionais entre os campos sociais, mas de constatar que a constituição e o funcionamento da sociedade – de suas práticas, lógicas e esquemas de codificação – estão atravessados e permeados por pressupostos e lógicas do que se denominaria a cultura da mídia. (FAUSTO NETO, 2008b, p. 92).
Para o autor, a partir do fenômeno da midiatização, a existência da cultura da mídia
não constitui fenômeno auxiliar, na medida em que as práticas sociais e os processos
17
interacionais tomam como referência o modo de existência e as lógicas dessa cultura. As
mídias deixaram de ser apenas instrumentos a serviço do processo de interação de outros
campos e se converteram em uma realidade mais complexa. Elas perdem o lugar de
auxiliaridade e tornam-se referência engendradora no modo de ser da sociedade e nos
processos e interações entre as instituições e os atores sociais.
É nesse sentido que a mediatização3 , conforme propõe Braga (2006), pode ser
considerada como processo interacional em marcha acelerada para se tornar o processo de
referência, dando o tom aos processos subsumidos, que passam a funcionar segundo suas
lógicas. Dentro da lógica da mediatização, os processos sociais de interação mediatizada
passam a incluir os demais, que não desaparecem, mas se ajustam. Para o autor, o fato de que
um processo interacional se torne “de referência” não corresponde a anular outros processos,
mas sim a funcionar como organizador principal da sociedade, não ainda como processo
completado, mas em estado avançado de implementação. Dessa forma, a situação em que nos
encontramos poderia ser descrita como uma transição da escrita4 enquanto processo
interacional de referência para uma crescente mediatização de base tecnológica (BRAGA,
2006).
A palavra “mediatização” pode ser relacionada a pelos menos dois âmbitos sociais. No primeiro, são tratados processos sociais específicos que passam a se desenvolver (inteira ou parcialmente) segundo lógicas da mídia. Aqui, pode-se falar em mediatização de instâncias da política, do entretenimento, da aprendizagem. Já em um nível macro, trata-se da mediatização da própria sociedade – tema que tem ocupado com freqüência as reflexões da área. (BRAGA, 2006, p.1).
Ainda segundo este autor, no processo de mediatização há uma necessidade de
tecnologia por si mesma, que por sua vez se põe dentro da tecnologização crescente da
sociedade. Nesse contexto, ele aponta para três momentos da proposição tecno-mediática, o
que corresponderia a uma “[...] ‘evolução’ de implantações técnicas a serviço de objetivos de
sociedade ‘anteriores’ para derivações autopoiéticas na elaboração de lógicas próprias.”
(BRAGA, 2006, p. 7). São eles:
3 Braga utiliza o termo mediatização em vez de midiatização. Aqui, esses termos são entendidos como
sinônimos, por considerarmos não haver diferenças conceituais entre as expressões. 4 Segundo o autor, “cultura escrita” corresponde a um período histórico centrado na Europa da instauração
burguesa, em que certos padrões políticos, sociais e culturais da escrita foram desenvolvidos como processo interacional de referência.
18
a) invenção para atender a um problema percebido em uma situação anterior àquela
tecnologia;
b) deslocamento do uso da invenção para outras situações, levando a outros
desenvolvimentos tecnológicos;
c) o sistema se torna autopoiético, tornando-se independente de dinâmicas pré-
mediatização, que tinham sido necessárias para desencadear processos.
Se a mediatização se encontra em marcha acelerada para se tornar um processo de
referência, na opinião de Braga (2006), pode-se considerar que ela já é dominante em vários
processos transmissivos e interacionais, embora ainda não tenha conseguido atender a
diversos requisitos inerentes à lógica interacional, principalmente no que se refere ao
desenvolvimento tecnológico. Ele ressalta que a incompletude é justificável, uma vez que
estamos ainda na fase inicial de um trabalho tecnológico complexo, em que os processos são
necessariamente lentos.
Sodré (2002) acompanha e complementa a perspectiva dos autores citados, até então,
ao afirmar que midiatização é uma qualificação particular da vida, um modo diferente de
presença do sujeito no mundo, ou um bios específico, conforme a classificação das formas de
vida, na visão aristotélica: a midiatização seria um quarto âmbito existencial, em que
predomina a esfera dos negócios, com uma qualificação cultural própria5. É “[...] uma ordem
de mediações socialmente realizadas no sentido da comunicação entendida como processo
informacional, a reboque de organizações empresariais e com ênfase num tipo particular de
interação – a que poderíamos chamar de ‘tecnointeração’6 [...].” (SODRÉ, 2002, p. 21).
Também para o autor, é a tecnologia que se destaca nessa ambiência, que ele classifica como
novo ordenamento do mundo, “[...] não só porque dela provêm os objetos que compõem o
ambiente ou o mundo vital de hoje, mas também porque ela se impõe como uma ordem de
determinações praticamente absoluta.” (SODRÉ, 2002, p. 76).
A partir dessa contextualização em torno da midiatização da sociedade, propomos,
assim, uma reflexão sobre a influência desse processo em uma esfera específica, que é a das
organizações (sejam elas públicas, privadas, do terceiro setor, etc.), atentando-se para o fato
de que o contexto organizacional não pode ser entendido como esfera independente da
sociedade, pois se configura como privilegiado ângulo de análise dos fenômenos sociais mais
5 A “tecnocultura”, de acordo com a classificação aristotélica. 6 Segundo o autor, esse tipo de interação é caracterizado por uma prótese tecnológica e mercadológica da
realidade sensível, chamada medium.
19
amplos. As organizações se transformam com as mudanças na sociedade, que também é
transformada pelas organizações, a partir de suas ações (LIMA; OLIVEIRA, 2010). Estamos
falando, portanto, de uma midiatização das organizações sociais, conceito criado por Lima
(2009), segundo o qual os processos interacionais no contexto organizacional acompanham o
movimento de midiatização da sociedade e passam a ser influenciados também pela lógica da
mídia (LIMA, 2008). Os indivíduos tornam-se usuários multimídia que consomem, ao mesmo
tempo, televisão, rádio, meios impressos e internet, e as organizações, visando acompanhar
cada vez mais ativamente e diretamente essa tendência, “[...] passam a não apenas utilizar-se
de veículos midiáticos, mas a assumir a arena midiática como um de seus principais processos
[...]” (LIMA; OLIVEIRA, 2010, p. 4). Acrescenta-se a isso o fato de que o impacto da
globalização e o avanço das tecnologias digitais, próprios da cultura contemporânea,
aprimoram as possibilidades de interação da sociedade e conformam novos discursos e novas
formas de representação das empresas no espaço midiático (LIMA; OLIVEIRA, 2010).
Lima (2008) recorre a Santaella (2007) ao argumentar sobre a atuação das mídias e das
tecnologias como elementos ordenadores da sociedade contemporânea, afirmando que as
organizações, como sujeitos sociais em interações permanentemente mantidas com a
sociedade, também se reconstituem e reconfiguram suas relações, linguagem, práticas
discursivas e produção de sentido, a partir da lógica midiática, pautada pelas tecnologias da
informação. Nesse contexto, as organizações se veem diante da necessidade de repensar as
interações com seus interlocutores, dentro da perspectiva da comunicação, na medida em que
passam a reconhecer o papel e a importância do outro na relação. Percebe-se uma mudança de
postura por parte das organizações que começam a modificar seu discurso, em um sentido
contrário ao da linearidade e da tecnicidade. Isso “[...] parece-nos fundamental para
contextualizar a ordem social, o ambiente e o tempo em que se inserem os sujeitos em
comunicação na contemporaneidade.” (LIMA, 2008, p. 116).
Tomando as práticas de comunicação empreendidas pelas empresas como exemplo, torna-se possível perceber como o contexto social de mediatização tem transformado o âmbito das organizações. Se, tradicionalmente, estas práticas se resumiam a ações de publicidade e propaganda ou relações públicas, materializadas em veículos de comunicação direcionados a públicos-alvo (jornais de empresa, fôlderes, outdoors, vinhetas etc.), percebemos que, num cenário marcado pela convergência tecnológica, globalização e fragmentação, pautado pela lógica do consumo, as interações tornam-se mais fluidas, o mesmo ocorrendo com a identidade dos próprios sujeitos em comunicação – a organização e seus interlocutores. (LIMA, 2008, p. 116-117).
20
Nesse sentido, retomando a perspectiva de Fausto Neto (2010), cabe ressaltar que a
midiatização altera substancialmente dinâmicas de interação que se apoiavam em lógicas
determinísticas e lineares. Há uma nova forma de produção de sentido que relativiza as outras
dimensões determinísticas sobre as quais se fundava o trabalho de produção de sentidos
realizado por âmbitos de produção de mensagens. O autor entende que essa nova ambiência
desencadeia outras enunciações, pois resulta da conversão de processos tecnológicos em
meios, em situação de produção e recepção de mensagens. Ela redesenha a plataforma de
processos interacionais, transformando os receptores de mensagens em coprodutores de
atividades discursivas midiáticas.
Essa discussão já aponta para o objetivo central deste capítulo, que é o de constatar
como todo esse processo vem ocorrendo no âmbito das organizações, tomando-se como
evidência as intranets sociais, desenvolvidas sob a lógica da chamada Web 2.0 (O’REILLY,
2005)7. Para isso, torna-se, antes, necessária a contextualização do surgimento da segunda
geração de serviços on-line, que utiliza a internet como plataforma e prega a passagem da
ênfase na publicação (ou emissão) de informações para a participação, ampliando os espaços
para a interação entre os participantes do processo.
2.1 Sociedade em rede e cibercultura: o surgimento da cultura da participação e interação on-line
A virada do século coincide com a passagem da comunicação centralizada, vertical e
unidirecional para as possibilidades trazidas pelo avanço técnico das telecomunicações,
relativas à interatividade e ao multimidialismo (SODRÉ, 2002). Podemos afirmar que a
internet é considerada o ícone dessas transformações, das quais também faz parte o processo
de midiatização da sociedade sobre o qual falamos anteriormente, visto que não faltam os que
exaltem o computador e a internet como a revolução do século. Sodré (2002), no entanto,
destaca que a palavra “revolução” pode revelar-se, nesse caso, enganosa. Isso porque coloca
que seu significado está relacionado ao inesperado do acontecimento, ao vigor ético de um
novo valor, e não à mudança pura e simples liderada, nesse contexto, pelas transformações
tecnológicas da informação. Para o autor, elas “[...] mostram-se francamente conservadoras
das velhas estruturas de poder, embora possam aqui e ali agilizar o que, dentro dos parâmetros
liberais, se chamaria de ‘democratização’ [...]”. (SODRÉ, 2002, p. 12-13). Por esse motivo, 7 O primeiro a utilizar esse termo foi Tim O’Reilly, a fim de designar uma segunda geração de comunidades e
serviços baseados na plataforma Web. Sua característica essencial é tirar partido da inteligência coletiva, transformando a web em uma espécie de cérebro global.
21
Sodré (2002) sugere a expressão “mutação tecnológica” como mais adequada do que
revolução, já que não se trata exatamente de descobertas inovadoras, mas da maturação
tecnológica do avanço científico. Há apenas a hibridização dos meios, acompanhada da
reciclagem acelerada dos conteúdos, com novos efeitos sociais. Uma enciclopédia
temporalmente acelerada, por exemplo, torna-se hipertexto, na opinião dele.
Castells (1999), assim como Sodré (2002), reconhece que há o exagero profético e a
manipulação ideológica na maioria dos discursos sobre a revolução da tecnologia da
informação, porém, considera, sim, esse evento histórico uma revolução, no mínimo, da
mesma importância da Revolução Industrial do século XVIII, que trouxe transformações nas
bases materiais da economia, da cultura e da sociedade8. O autor entende que, diferentemente
de qualquer outra revolução, o cerne da transformação da revolução atual refere-se às
tecnologias da informação, processamento e comunicação. Sodré (2002), contudo, defende
que, no que diz respeito à Revolução da Informação, novo mesmo é o fenômeno da estocagem
de grandes volumes de dados e a sua rápida transmissão, acelerando a circulação das coisas
no mundo.
Revolução ou não, o que não podemos negar é que os processos dominantes na
sociedade da era da informação9 estão cada vez mais organizados em torno das redes, que
modificam sobremaneira a operação e os resultados dos processos produtivos e de
experiência, poder e cultura. “Embora a forma de organização social em redes tenha existido
em outros tempos e espaços, o novo paradigma da tecnologia da informação fornece a base
material para sua expansão penetrante em toda a estrutura social.” (CASTELLS, 1999, p.
565). É este autor que nos oferece a definição de redes como
[...] estruturas abertas capazes de expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmo códigos de comunicação (por exemplo, valores ou objetivos de desempenho). Uma estrutura social com base em redes é um sistema altamente dinâmico suscetível de inovação sem ameaças ao seu equilíbrio. Redes são instrumentos apropriados para a economia capitalista baseada na inovação, globalização e concentração descentralizada; para o trabalho, trabalhadores e empresas voltadas para a flexibilidade e adaptabilidade; para uma cultura de descontrução e reconstrução contínuas; para uma política destinada ao processamento instantâneo de novos valores e humores públicos; e para uma
8 Castells tem o cuidado de destacar que grandes partes do mundo e consideráveis segmentos da população estão
desconectados do novo sistema tecnológico. Além disso, a velocidade da difusão tecnológica é seletiva tanto social quanto funcionalmente. Países e regiões apresentam diferenças em relação a oportunidades de acesso ao poder da tecnologia, o que representa fonte crucial de desigualdade na sociedade.
9 Castells utiliza o termo para definir a era em que estamos vivendo na contemporaneidade. Ele explica que a informação representa o principal ingrediente de nossa organização social, devido à convergência da evolução histórica e da transformação tecnológica, que fez com que entrássemos em um modelo genuinamente cultural de interação e organização social.
22
organização social que vise a suplantação do espaço e invalidação do tempo. (CASTELLS, 1999, p. 566).
Foi nesse contexto de organização da sociedade em rede que o conceito de
cibercultura difundiu-se, da forma como o entendemos hoje, a partir do final do século XX,
juntamente com a popularização da internet como plataforma de comunicação. Assim, o
entendimento de cibercultura por parte de vários comunicadores e intelectuais tem a ver com
a transformação dos novos aparatos de informação em recurso de uso cotidiano por parte de
pessoas e instituições (RÜDIGER, 2011). A palavra cibercultura vem para dar conta dos
fenômenos que nascem em torno das novas tecnologias de comunicação, com destaque para a
mídia digital interativa. Rüdiger (2011) faz o alerta de que a comunicação humana é sempre
interativa, mas deixa de ser quando não é imediata, passando a depender de outros meios que
não a linguagem, quando se desenvolvem os meios materiais de comunicação. O surgimento
da expressão cibercultura situa-se nesse contexto e, segundo o autor, deve sua criação à
engenheira, informata e empresária norte-americana Alice Hilton, fundadora do Instituto de
Pesquisas Ciberculturais (1964). Cabe destacar que, conforme afirma Rüdiger (2011), o
epicentro de todo esse movimento é o computador pessoal ligado às redes informáticas,
através dos mais variados equipamentos e que não vão parar de se desenvolver.
Quando o progresso tecnológico e a expansão do capital confluem no sentido da exploração do campo da informática de comunicações e, por essa via, os aparatos digitais interativos se convertem em bens de consumo de massas estão configuradas as bases para a expansão de uma cibercultura, da colonização do ciberespaço pelos esquemas e práticas de uma indústria cultural que, desde quase um século, vinha se convertendo em princípio sistêmico de formação do nosso mundo social e histórico. (RÜDIGER, 2011, p.10-11).
Retomando a questão da interação nos processos comunicativos, o autor dá ênfase às
diferenças existentes entre a comunicação das “velhas mídias” e a da mídia digital, com
destaque para a mudança de foco que vem ocorrendo da instância da produção para a da
recepção, quando os receptores de mensagens começam a tornar-se coprodutores de
atividades discursivas midiáticas. De acordo com a perspectiva de Rüdiger (2011), o
problema, se havia, da comunicação no âmbito dos impressos e dos primeiros meios
audiovisuais não era a recepção mecânica, como muitos dizem, mas a interação passiva e o
fluxo de mão única das mensagens, levando-se em consideração a perspectiva aberta com o
desenvolvimento da mídia digital. O modelo transmissionista instituído pelas “velhas mídias”
de que fala Rüdiger (2011) era o padrão considerado para o estudo da midiatização da
23
sociedade contemporânea, antes da internet ocupar o centro do debate comunicacional
(ANTOUN, 2008).
O caráter hipnótico da emissão de uma mensagem com frequência intensa e amplamente distribuída casa-se com a sua sonâmbula recepção de extensa ressonância, configurando uma massa estúpida que reproduz a disposição que lhe foi sugerida nesse processo feito à base de redundância. (ANTOUN, 2008, p. 12).
O autor, no entanto, pondera que a abordagem feita pela teoria da recepção e dos
estudos culturais tenta abrandar o teor apocalíptico desse fenômeno, lembrando-nos de que
ninguém pode sonambular eternamente. A teoria da recepção vai valorizar a capacidade do
receptor de construir seus próprios significados, interpretando originalmente o que lhe é
enviado pelo emissor. Antoun (2008) destaca, porém, que uma liberdade de leitura e
interpretação não representa uma liberdade de construção e emissão, uma vez que, mesmo o
leitor mais ativo é ainda passivo no que se refere à produção de informação capaz de
transformá-lo em um sujeito autônomo. Apesar dessas considerações, contudo, ele aponta
para uma futura mudança desse contexto por meio da internet, recorrendo a Levine, Locke,
Searls & Weinberger (2000) para afirmar que “A internet teria empoderado uma demanda de
participação, produção e honestidade incompatível com as comunicações invasivas e
unilaterais [...]” (ANTOUN, 2008, p. 14).
Nesse sentido, aqui voltamos a Rüdiger (2011) para retomar a discussão sobre o
processo interativo na mídia digital. Ele defende que, neste âmbito, a comunicação é
interativa, porque permite a interação humana ativa e em mão dupla com os próprios meios e
equipamentos que a viabilizam e permite ainda a interação social ativa e em mão dupla entre
os seres humanos, por meio de redes sociotécnicas participativas que vão além da interligação
social, como acontecia na “velha mídia”. Rüdiger (2011) retoma Castells (1999) ao afirmar
que “Os clientes da velha mídia estão se tornando criadores de conteúdo e, assim, sujeitos não
só da recepção, mas, ainda, da emissão e do intercâmbio de todo o tipo de produtos culturais,
através da mídia digital.” (RÜDIGER, 2011, p. 131). Para Castells (1999), a internet e as
mídias digitais interativas não podem ser consideradas meios de comunicação no sentido
tradicional, porque seus processos de interação suprimem as fronteiras existentes entre os
mass media e as demais formas de comunicação. Rüdiger (2011) aponta as redes sociais,
portais e blogs, chats e sites de todo o tipo, os sistemas de trocas de mensagens, o cinema, o
rádio, a música e a televisão interativos como apenas algumas das expressões que estão
ajudando a estruturar a cibercultura.
24
É esse autor que também nos oferece visões diferenciadas – contrárias e favoráveis –
acerca da cibercultura. Na perspectiva dos tecnófilos, estamos em um momento de expansão
das mídias digitais interativas, que tende a reduzir o poder de grandes empresas multimídia
sobre o público e anuncia o declínio da autoridade dos especialistas em cultura e
comunicação. Para eles, o princípio social mais importante instituído pela cibercultura é o de
que o público determina a forma e o conteúdo do meio, estrutura e controla a comunicação:
A Internet criou uma rede mundial de computadores, e a popularização dos equipamentos de informática está permitindo a milhões de pessoas interagirem livremente e se tornarem sujeitos engajados ativamente no processo de comunicação. O conhecimento passou a se disseminar horizontalmente, conferindo maior poder ao indivíduo, relativamente às organizações verticais e centralizadas dos tempos da velha mídia e das indústrias da cultura. (RÜDIGER, 2011, p. 32).
Rüdiger (2011) destaca algumas ideias de Pierre Lévy, que sustenta, assim como
outros tecnófilos, que a internet inaugura um espaço de comunicação inovador, inclusivo,
universal e transparente, e que o principal fundamento da cibercultura é o compartilhamento
de interesses comuns e do saber, é algo sobre a aprendizagem cooperativa e processos abertos
de colaboração. Seu foco, porém, não está na promoção abstrata da máquina pela máquina,
pois, para ele, “A Internet se desenvolve como parte de um processo não planificado, mas
bastante orgânico, cuja substância é o social, o meio é técnico e o sentido é o progresso
civilizatório”. (RÜDIGER, 2011, p. 161).
Lee Siegel (2008), por sua vez, é citado por Rüdiger (2011) como um dos
representantes que tratam a cibercultura com um posicionamento não muito favorável, ao
defender que ela consiste essencialmente em um estágio mais avançado de um processo de
domínio da consciência pelo mercado que já opera na mídia tradicional. Ao contrário do que
afirmam os profetas da cibercultura, para Siegel (2008), ela não possibilita a desmassificação,
mas potencializa a homogeneização. Segundo o autor, seria um abuso ideológico afirmar que
estamos saindo da condição de receptores passivos para a de produtores independentes de
conteúdo, apenas porque agora podemos compartilhar ideias através dos novos meios de
comunicação. Também com uma visão contrária, Baudrillard, considerado por Rüdiger um
tecnófobo esótérico, defende que, na conversação on-line, existe, no máximo, apenas uma
apresentação alternada de um e de outro sujeito. A interação, quando existe, é simulada e o
que acontece é um eterno feedback consigo mesmo. Por meio do ciberespaço, a comunicação
cancela a verdadeira interação entre as pessoas, que pensam estar interagindo, sendo que o
que ocorre de fato é um diálogo consigo mesmo através da máquina.
25
Além dessas visões, Rüdiger nos apresenta seu próprio posicionamento em relação à
cibercultura:
Vendo bem, a cibercultura não constitui em sua espinha dorsal e cotidiana senão um cenário avançado ou high-tech da cultura de massas e da indústria cultural, conforme estas foram estudadas, no passado, por autores como Edgar Morin ou Theodor Adorno. Eles a viram no começo da era da televisão, nós a estamos vendo entrar na era da multimídia interativa. Quem examina o fenômeno em sua superfície observa que suas expressões apenas transplantam aquelas manifestações para o ciberespaço, sem tocar nas estruturas de sentido que elas agenciam desde os primórdios do século XX. (RÜDIGER, 2011, p. 47).
O maquinário que a torna [a cibercultura] possível tem se desenvolvido cada vez mais de forma a tornar cotidianos recursos que, antes, eram acessíveis apenas em nível profissional, mas seu uso social, por sua própria dependência ao processo, não tem logrado ir além ou sequer conseguido propor uma alternativa ao que já se tornara padrão na vida do espírito, quando da conversão da indústria cultural em sistema. (RÜDIGER, 2011, p. 48).
Nessa mesma direção, destacamos o conceito de mass self-communication, de Casttels
(2009), atribuído a uma nova forma de comunicação, em que o termo mass communication10
se explica por ser possível alcançar uma audiência global, postando um vídeo no YouTube,
um blog ou uma mensagem para uma lista massiva de e-mail. Ao mesmo tempo, essa nova
forma de comunicação é self-communication11, porque a produção da mensagem é gerada
individualmente e a definição de quem irá receber essa mensagem também é feita pelo
indivíduo. Assim, com a difusão da internet, surge uma nova forma de comunicação
interativa, caracterizada pela capacidade do envio de mensagens de muitos para muitos, em
tempo real, com a possibilidade da utilização de uma comunicação ponto a ponto
(CASTTELS, 2009).
Segundo o autor, a mass self-communication surgiu a partir do desenvolvimento da
chamada Web 2.0, um conjunto de tecnologias, serviços e aplicações que propiciam a
proliferação de espaços sociais na internet. Ele destaca que a difusão da internet e seus
desdobramentos possibilitaram o desenvolvimento de uma rede horizontal de comunicação
interativa, que conecta o local e o global em um tempo determinado. À medida que as pessoas
apropriam-se de novas formas de comunicação, por meio de blogs, wikis entre outras redes
sociais na internet, elas constroem seus próprios meios de comunicação de massa
(CASTTELS, 2009).
10 Comunicação de massa (tradução nossa). 11 Comunicação individual, de mim mesmo (tradução nossa).
26
É todo esse cenário, portanto, que, para Antoun (2008), favorece o surgimento da
chamada Web 2.0, destacando-se com seus blogs, wikis12, folksonomics, youtubes, formando
redes sociais. O termo criado por Tim O’Reilly, em 2005, surge na virada do milênio, quando
o site Cluetrain Manifest13, posteriormente transformado em livro, começa a falar sobre a
mudança na comunicação a partir do surgimento de um público auto-organizado e
participativo, em um momento no qual “A mediação da publicidade ou dos grandes mídia
estava sendo trocada pelas interações e recomendações obtidas através das redes sociais.”
(ANTOUN, 2008, p. 11). É sobre esse ambiente de cooperação, colaboração e livre expressão
que vamos falar a partir de agora, abordando a explosão participativa proporcionada por ele,
fato que é, hoje, o convite para decifrar a relevância da comunicação e sua nova era
(ANTOUN, 2008).
2.2 A Web 2.0 vista a partir da colaboração e da descentralização da gestão do conteúdo
O fenômeno denominado Web 2.0 é uma evidência do processo de midiatização da
sociedade – e, consequentemente, das organizações – sobre o qual falamos, uma vez que
inaugura a potencialização dos processos interativos tendo a internet como plataforma. A
segunda geração de redes digitais, disseminada a partir dos anos 2000, tem como uma de suas
características a colaboração entre os interagentes (PRIMO, 2006)14, que se tornam cada vez
mais capazes de produzir e distribuir informações na web, interagir e trocar conhecimento,
valorizando a comunicação multidirecional e a inteligência coletiva.
É Primo (2008) quem define a Web 2.0 como a segunda geração de serviços on-line,
caracterizada por potencializar as formas de publicação, compartilhamento e organização de
informações, além de ampliar os espaços para a interação entre os participantes do processo.
A nova plataforma tem repercussões sociais significativas, “[...] que potencializam processos
de trabalho coletivo, de troca afetiva, de produção e circulação de informações, de construção
social de conhecimento apoiada pela informática.” (PRIMO, 2008, p. 102). Para o autor, ela
refere-se não apenas a uma combinação de técnicas informáticas, “[...] mas também a um
12 “Sistema que permite a colaboração na produção de conteúdo de um site, com o uso de um browser comum e
sem a necessidade de conhecer a linguagem HTML.” (PRIMO, 2006, p. 4). 13 Blog no qual publicitários e empreendedores pensam a internet como um lugar capaz de revolucionar o
modelo invasivo, caro e coercitivo comandado pela mídia proprietária de massas. 14 O termo será utilizado aqui como sinônimo da palavra “usuário”, apesar de concordarmos com a perspectiva
de Primo de que o termo “interagente” é muito mais adequado ao contexto, por destacar a participação ativa no processo interativo.
27
determinado período tecnológico, a um conjunto de novas estratégias mercadológicas e a
processos de comunicação mediados pelo computador.” (PRIMO, 2008, p. 101).
Se na Web 1.015 os sites eram trabalhados como unidades isoladas, passamos agora
para uma estrutura integrada de funcionalidades e conteúdo. Transitamos de um modelo que
se limita à publicação de informações para uma estrutura integrada, que muda
fundamentalmente a forma como as informações e as responsabilidades de colaboração são
compartilhadas no ambiente. Na era 2.0, a web deixa de desempenhar o papel de mera
provedora de informações em mão única (conteúdo → usuário), para atuar em um modelo de
duplo sentido de direção, no qual as pessoas são incentivadas a participar e colaborar,
opinando, escrevendo e organizando conteúdo (FREITAS, 2006). No entendimento de
Patriota e Pimenta (2008), na Web 2.0, além de publicar, os interagentes podem gerenciar as
informações que inserem na rede. A plataforma representa para os autores um novo
paradigma, em que a colaboração ganha força suficiente para concorrer com os meios
tradicionais de geração de conteúdo. Nesse sentido, eles sugerem que a segunda geração de
redes digitais parte de duas idéias principais: de que a internet atua como uma plataforma, não
como um amontoado de documentos digitais, e de que o importante não é o conteúdo em si,
mas o que as pessoas fazem com ele.
Primo também ressalta a passagem da ênfase na publicação (ou emissão, segundo o
autor, conforme o limitado modelo transmissionista) para a participação:
Trata-se de um processo emergente que mantém sua existência através de interações entre os envolvidos. Esta proposta, porém, focar-se-á não nos participantes individuais, e sim no “entre” (interação = ação entre). Isto é, busca-se evitar uma visão polarizada da comunicação, que opõe emissão e recepção e foca-se em uma ou noutra instância. Uma rede social não pode ser explicada isolando-se suas partes ou por suas condições iniciais. Tampouco pode sua evolução ser prevista com exatidão. Como fenômeno sistêmico, sua melhor explicação é seu estado atual. (PRIMO, 2008, p. 105).
Do ponto de vista de Antoun (2008), o enigma do poder dessa rede está diretamente
relacionado à explosão participativa proporcionada por ela, fato que gera intensa produção de
conhecimento, entretenimento e experimentação criativa, com os quais o homem comum do
meio social está envolvido. Podemos afirmar que a Web 2.0 materializa-se na multiplicação
dos blogs e em seu crescimento em importância como fonte de informação, na disseminação
das redes peer-to-peer16 e da troca incontrolável de arquivos e no aumento da prática de
escrita coletiva (ANTOUN, 2008). A segunda geração de redes digitais é caracterizada pelo 15 Primeira geração da web. 16 Usuário a usuário.
28
que passou a ser chamado de redes sociais, plataformas de comunicação que as pessoas sem
conhecimento especializado se habilitam a operar mais ativamente com seus equipamentos e
em que passam a interagir colaborativamente umas com as outras, tais como o Facebook, o
Twitter e o Youtube (RÜDIGER, 2011). Sua essência está presente em comentários, fóruns,
lista de discussões, blogs e fotologs, comunidades, grupos e sites participativos, nos quais os
consumidores utilizam todas as ferramentas disponíveis para divulgar suas experiências
pessoais e opiniões (PATRIOTA; PIMENTA, 2008).
Aqui, cabe destacar a perspectiva de Recuero (2012) sobre sites de rede social, ou seja,
ferramentas que proporcionam a publicação e construção de redes sociais17 , que são
modificadas pela mediação das tecnologias e pela apropriação delas para processos de
comunicação. Segundo a autora, as tecnologias “[...] passam a proporcionar espaços
conversacionais, ou seja, espaços onde a interação com outros indivíduos adquire contornos
semelhantes àqueles da conversação, buscando estabelecer e/ou manter laços sociais.”
(RECUERO, 2012, p. 16). Assim, para a autora, os sites de rede social geram uma nova forma
conversacional, que ela conceitua como conversação em rede.
O primeiro a utilizar o termo Web 2.0 foi Tim O’Reilly, a fim de designar uma
segunda geração de comunidades e serviços baseados na plataforma web. Segundo O’Reilly
(2006), o conceito teve início em uma conferência entre as empresas O’Reilly Media e
MediaLive International, na qual Dale Doughherty, vice-presidente da O’Reilly, notou que a
web estava mais importante do que nunca, destacando-se com aplicações novas e por meio da
eclosão surpreendente de sites. Formulou-se, então, a ideia de Web 2.0, a partir das
transformações percebidas no que se entendia por Web 1.0: dos sites pessoais, chega-se aos
blogs; a otimização para ferramentas de busca substitui a especulação com nomes de domínio;
o processo de publicação transita para a lógica da participação, e o da taxonomia, para a
folksonomia18. Ao nos questionar sobre como diferenciar uma abordagem Web 1.0 de uma
2.0, O’Reilly (2006) afirma ser essa uma atividade difícil, “[...] porque a noção de Web 2.0
tornou-se tão disseminada que atualmente companhias estão usando o termo como uma
palavra-chave de marketing sem realmente entender o que quer dizer”. (O’REILLY, 2006, p.
2). E, segundo ele, muitas dessas organizações, ao contrário do que afirmam, não são “2.0”.
O criador do termo define a nova plataforma como uma atitude, não uma tecnologia.
Um ambiente que valoriza o posicionamento do interagente de controlar seus próprios dados e
17 Para Recuero, as redes sociais são as estruturas dos agrupamentos humanos, constituídas pelas interações, que
constroem os grupos sociais. 18 Conceito em que nos aprofundaremos mais adiante.
29
que tem como competências centrais a arquitetura da participação, a confiança radical nas
pessoas e o emprego da inteligência coletiva. Além dessas, outras características essenciais
são a descentralização radical, o princípio de colaboração, a participação em vez da simples
publicação, o conceito de cauda longa19 e a ideia de que o serviço fica automaticamente
melhor quanto mais as pessoas o utilizam. O’Reilly (2006) ressalta o fato de que o adjetivo
“2.0” não significa uma novidade e sim uma realização mais completa do verdadeiro
potencial do ambiente web. Nessa direção, ele lembra que muitos dos recursos que estão
sendo explorados atualmente já estavam disponíveis há alguns anos.
Embora várias características tenham sido apontadas acerca da Web 2.0, o foco deste
trabalho será compreender os processos da colaboração e da descentralização da gestão de
conteúdo, princípios que, de certa forma, resumem o significado daquele ambiente.
Destacamos, no entanto, que são conceitos intimamente relacionados, fato que dificulta a
diferenciação entre um e outro. Em Costa (2008) encontramos a definição de colaboração
como uma dinâmica de integrações. Segundo o autor, a percepção da inteligência coletiva e
das redes sociais emerge, para a consciência dos indivíduos, quando situações de interação
social demonstram que há interdependência entre suas ações. “A integração dessas ações é
resultado de um processo de socialização concomitante, processo que integra simpatias,
afetos, interesses, estima. É a essa dinâmica de integrações que chamamos colaboração.”
(COSTA, 2008, p. 30). Para o entendimento desse princípio, vale destacar que, agora, as
pessoas, por meio da internet, podem formar seu próprio habitat de comunicação sem ter de
passar por qualquer mediação. Conforme propõe Malini (2008), isso configura-se como um
plano de antagonismo com os sistemas de comunicação que a antecederam.
Esse antagonismo ocorre porque a colaboração crescente dos usuários na produção de conteúdos para sites públicos e comuns na internet gera uma “nova audiência” em “novos meios de comunicação”, que contêm conteúdos multimídia que complementam, subvertem ou, ainda, divergem daqueles emitidos pelos veículos da mídia de massa. (MALINI, 2008, p. 84).
Exemplo disso são sites que só funcionam por meio da colaboração das pessoas na
publicação, troca e avaliação de conteúdos. Eles podem ser editados, moderados, comentados
e administrados pelos próprios interagentes, tais como ferramentas de publicação de blogs e
wikis, ferramentas de troca de vídeos, imagens, links e músicas, ferramentas de discussão,
como fóruns e chats, redes sociais, como o Orkut, o Facebook e o Twitter (MALINI, 2008).
19 Termo criado por Chris Anderson definido como o poder coletivo de pequenos sites que constituem a maior
parte do conteúdo da rede.
30
Ressaltamos novamente a perspectiva de Casttels (2009), que sugere uma abordagem
diferente da de Malini (2008), ao afirmar que esses sites sobre os quais falamos são exemplos
de processos de comunicação de massa, embora sejam diferentes dos meios de comunicação
de massa tradicionais. Casttels (2009) explica seu posicionamento afirmando que qualquer
pessoa pode postar um vídeo no YouTube e que os usuários selecionam o que querem ver e
comentar em uma imensa lista de possibilidades. O autor afirma que, tendo em vista a
abrangência conquistada pelo YouTube, ele pode ser considerado o maior meio de
comunicação de massa do mundo.
Voltando a Malini (2008), é também esse autor que coloca em questão o papel do
comunicador social em um contexto no qual a cultura da colaboração em rede tece uma
comunicação horizontal, sem passar pelas hierarquias. “Daí que seu efeito colateral é a crise
do profissional da mediação dos meios de comunicação de massa”. (MALINI, 2008, p. 86). O
fato de todos poderem comunicar e criar faz com que as competências desses profissionais
estejam em crise. Para o autor, a aceleração da socialização dessas competências reduz o valor
do trabalho do jornalista e do crítico, mas aumenta o surgimento de vários mediadores da
cultura.
Rüdiger (2011) complementa a ideia de Malini (2008) ao citar o jornalista Dan
Gillmor (2005), que explora a perspectiva de que agora, pela primeira vez na história,
qualquer pessoa que tenha uma ligação à internet pode ser proprietária de seu próprio órgão
de comunicação. Qualquer pessoa pode elaborar e publicar notícias, rompendo o monopólio
que exerciam as empresas jornalísticas e de comunicação. Para Dan Gillmor, os
comunicadores profissionais continuam a ser uma parte importante, mas vivenciamos a
emergência de um círculo mais alargado de interessados em elaborar e difundir material de
tipo informativo. Novos criadores de conteúdo que estão surgindo em escala de massas no
âmbito da cibercultura.
Esses fatores traduzem o significado do princípio da descentralização da gestão de
conteúdo, a partir do qual “[...] as tecnologias da comunicação digital estão redesenhando as
arquiteturas das formas de participação, possibilitando, pela primeira vez na história, uma
tomada de palavra generalizada que permite, a cada tecnoator, criar conteúdo e difundi-lo na
rede.” (DI FELICE, 2012, p. 158). Ainda segundo o autor,
[...] depois do advento da Web 2.0, a consolidação de redes sociais digitais (social network) está impondo a difusão de uma cultura do acesso que além de decretar tecnologicamente o fim dos pontos de vista centrais, dadas às qualidades colaborativas da rede, espalhou uma cultura da interação e da simultaneidade. Esta tem como efeito a produção de uma tomada coletiva da palavra, por setores, etnias e
31
pessoas em geral, que de simples espectadores passam a produzir conteúdo e a disponibilizá-lo na rede, por meio de interfaces e tecnologias, cada vez mais eficientes e cada vez mais populares. (DI FELICE, 2012, p. 158).
Para que o entendimento dos princípios da Web 2.0 de colaboração e descentralização
de conteúdo torne-se ainda mais claro, cabe aqui citar alguns exemplos, por meio dos quais
será possível apreender, inclusive, a ideia de que os dois conceitos muitas vezes não
apresentam diferenças entre si. Segundo O’Reilly (2006), gigantes nascidos na era Web 1.0
sobreviveram para liderar a 2.0 porque souberam aproveitar o poder da rede de tirar partido da
inteligência coletiva. O autor explica isso utilizando-se de algumas evidências, como o uso
dos hiperlinks, que são o resultado da atividade coletiva de todos que utilizam a rede. “À
medida que os usuários adicionam conteúdo e sites novos, esses passam a integrar a estrutura
da rede à medida que outros usuários descobrem o conteúdo e se conectam a ele. Do mesmo
modo que se formam sinapses no cérebro.” (O’REILLY, 2006, p. 9). O autor cita também a
eBay, uma empresa de comércio eletrônico cujo principal produto é a atividade coletiva de
quem a utiliza. Assim como a web, a eBay cresce de maneira orgânica em resposta à atividade
do internauta e o papel da empresa é possibilitar um contexto em que essa atividade possa
acontecer. A Amazon é outra companhia de venda de produtos na internet que segue a lógica
da anterior. Segundo O´Reilly (2006), ela desenvolveu uma ciência sobre o engajamento das
pessoas, por meio da qual podem avaliar os produtos, participar de várias formas em todas as
páginas do site e – o mais importante – ter sua atividade considerada para produzir melhores
resultados de busca.
O crescimento dos blogs também é algo marcante da era 2.0 e, conforme afirma o
idealizador do conceito
Se uma parte essencial da Web 2.0 é tirar partido da inteligência coletiva, transformando a web em uma espécie de cérebro global, a blogosfera equivale a um constante bate-papo mental que tem lugar na parte frontal do cérebro, a voz que todos ouvimos em nossas cabeças. Pode não refletir a estrutura mais profunda do cérebro – frequentemente inconsciente – mas equivale ao pensamento consciente. E, como reflexo do pensamento consciente e da atenção, a blogosfera começou a exercer um poderoso efeito. (O’REILLY, 2006, p. 15).
A prática da folksonomia é também uma exemplificação dos dois princípios da Web
2.0 escolhidos para o desenvolvimento deste estudo. Aquino (2008) cita os sites del.icio.us e
Flickr como os pioneiros desse processo, no qual os usuários adicionam tags20 às informações
e passam a recuperá-las através dessas tags. Assim, processos de recuperação de informação,
20
A tradução mais adequada para o termo seria etiquetas.
32
que antes eram atividades exclusivas de programadores e profissionais da informação, passam
a fazer parte do universo dos internautas, que “[...] podem desvencilhar-se dos buscadores e
gerenciar conteúdo com base não em padrões fixos e vocabulários controlados, mas em uma
prática colaborativa e aberta”. (AQUINO, 2008, p. 150). A autora recorre a Quintarelli (2005)
para distinguir folksonomias de taxonomias. Folksonomias surgem a partir de um conjunto de
tags sem estruturação hierárquica e são criadas pelos próprios interagentes ao mesmo tempo
em que publicam, inserem ou catalogam itens; taxonomias são geradas antes da catalogação
dos itens e criadas por profissionais que determinam as necessidades de conteúdo das pessoas.
Conforme conceitua Aquino (2008), folksonomias relacionam-se a uma visão colaborativa
descentralizada e taxonomias, a uma visão autoritária centralizada.
A partir do entendimento dos princípios que permeiam a segunda geração de serviços
on-line e de todo o contexto apresentado até então, partimos para a conceituação do objeto de
estudo desta pesquisa: as intranets sociais, que se configuram como uma evidência do
processo de midiatização das organizações.
2.3 A Web 2.0 no ambiente interno das organizações
A Web 2.0 pode gerar mudanças no contexto organizacional, a partir da perspectiva da
comunicação, influenciando os processos de interação com os interlocutores, especificamente
aqueles inseridos no ambiente interno das organizações. Observa-se uma crescente
preocupação das empresas em substituir suas intranets21 desenvolvidas sob o paradigma da
Web 1.0 por intranets sociais, que propõem um ambiente colaborativo por excelência,
seguindo a lógica proposta pela Web 2.0. De acordo com Viberti (2011), as intranets sociais
são ambientes caracterizados por reunir plataformas de mídias sociais digitais, como fóruns,
blogs, wikis, comunidades, podcasts, entre outros, objetivando a colaboração. Na opinião
deste autor, a intranet social aumenta as possibilidades de uma organização inovar em todos
os seus processos, uma vez que
[...] dá voz ativa a quem está realmente na ponta do negócio e sabe o que fazer para buscar melhorias. [...] Ao dar voz a todos aqueles que tiverem acesso à Intranet, as ideias surgem, os laços pessoais e profissionais se estreitam, as comunidades se organizam dinamicamente em torno de interesses comuns e o conhecimento torna-se realmente evidente. (VIBERTI, 2011).
21 As intranets podem ser consideradas uma versão privada da internet, interna às organizações. O acesso a seu
conteúdo geralmente é restrito aos empregados.
33
Platt (2007) complementa o entendimento de Viberti (2011), focando na perspectiva
dos interlocutores internos das organizações, que podem utilizar o ambiente como gestores de
conteúdo, sem depender do setor de tecnologia da informação para realizar suas próprias
experiências. O autor aponta para as novas possibilidades trazidas pelas intranets sociais, por
meio das quais é possível visualizar as informações em páginas dinâmicas da web e publicar
conteúdo próprio em blogs, wikis e sites que compartilham fotos e vídeos. “As pessoas
estabelecem colaboração, listas de discussões e comunidades online; combinam dados,
conteúdo e serviços de várias fontes para criar experiências e aplicativos personalizados.”
(PLATT, 2007).
A definição mais aceita é de que uma intranet social deve conter múltiplas ferramentas
de interação integradas, permitindo a colaboração e o compartilhamento de conhecimento
entre os funcionários de uma empresa, de forma não hierárquica, conforme a seguir
(INTRANET..., 2012):
a) blogs e comentários de usuários: uma utilização típica de blog deve permitir que
qualquer funcionário possa criar, manter e editar seu blog na intranet.
b) Wiki: permite a criação coletiva de conteúdo, para que os usuários possam
compartilhar o conhecimento que possuem de forma não estruturada.
c) Fórum: uma intranet pode conter dezenas de fóruns para estimular a discussão sobre
assuntos diversos, desde projetos e novos produtos até a próxima partida do time da
empresa.
d) Rede social: permite a troca de informações, fotos e arquivos via intranet. Deve
oferecer ferramentas e funcionalidades semelhantes às do Facebook.
e) Tageamento: permite que os usuários criem etiquetas para facilitar a recuperação de
informações publicadas.
f) Minha home page: cada usuário cria e customiza sua própria página inicial da intranet.
A tendência das organizações em transformar suas intranets em ambientes 2.0
explica-se por diversas razões e entre as principais, conforme aponta Figueiredo (2005), estão
34
a dificuldade de acesso à informação no ambiente virtual, ausência de personalização em uma
intranet que oferece tudo para todos, falta de informação e conteúdos aplicáveis ao trabalho,
muitos caminhos para se chegar ao objetivo, interfaces de acesso despadronizadas,
desperdício de tempo na procura de conteúdos, existência de várias intranets em uma mesma
empresa e baixos índices de colaboração entre os interlocutores internos da organização.
Outra característica preponderante das intranets sociais, e princípio fundamental da
Web 2.0, é a descentralização da gestão do conteúdo e da informação para outras áreas de
negócio da organização, o que comumente se restringia, até então, ao setor de comunicação
das empresas. O novo cenário que se impõe agora dá poder a outras áreas organizacionais
para que, institucionalmente ou oficialmente, também possam “fazer comunicação”,
principalmente em relação ao negócio de cada uma delas, isso porque, assim como lembra
Aisenberg (2005), a complexidade de um portal exige um conjunto de competências
possibilitado apenas pela colaboração, não sendo possível, portanto, centralizar a gestão de
um canal que é multidisciplinar. Nesse contexto, a área de comunicação deixaria, então, de ser
a única a deter a fala oficial. Conforme destaca Viberti,
[...] a primeira coisa que você deve fazer para começar a pensar em uma Intranet Social é refletir sobre a cultura de sua empresa. Se a sua empresa tem uma cultura corporativa 1.0, as chances de um ambiente 2.0 dar certo são praticamente nulas. Em uma empresa fortemente centralizada, extremamente hierarquizada, na qual a voz dos colaboradores não tem vez, não há plataforma de mídia social que funcione. (VIBERTI, 2012).
Pressupomos, a partir dessa contextualização, que o estudo dos reflexos da Web 2.0
inserida no ambiente interno das organizações, por meio das intranets sociais, pode ser um
caminho para uma mudança de perspectiva dos estudos sobre comunicação organizacional,
marcados por um viés predominantemente linear, tecnicista, gerencial e prescritivo, assim
como acontece muitas vezes nas próprias práticas profissionais. Os estudos parecem não mais
se referir aos complexos fenômenos da sociedade contemporânea, como o da midiatização,
demandando um intenso esforço de revisão conceitual da área de comunicação organizacional
e colocando em questão a própria identidade do campo (LIMA, 2008).
Assim, podemos afirmar que este trabalho apresenta-se como um caminho, ao se tentar
compreender se há, por parte dos empregados de Cemig e Unimed-Rio, o reconhecimento do
espaço relacional que essas organizações propõem ao implantar as intranets sociais. E então,
seguindo a perspectiva de Pinto (2008), torna-se necessário questionar se o papel da área de
comunicação das organizações é o de gestão controladora, “radar captador de algo lá para
35
poder devolver a coisa comunicada em forma de uma certa instrumentalidade inteligível,
utilitária, iluminada” (PINTO, 2008, p. 87). E, se não for o papel da gestão, talvez o ambiente
requeira uma mudança de atitude por parte dos comunicadores, pois, segundo Pinto (2008), há
gente interessada nas estruturas dissipativas, uma teoria das incertezas, em que o chamado
real é só mais uma das muitas possibilidades. Nessa direção, a análise que segue busca
entender de que forma a passagem da Web 1.0 para a Web 2.0, no contexto organizacional,
parece acompanhar a mesma lógica de transformação da perspectiva do entendimento da
comunicação: de uma visão informacional para uma abordagem relacional do campo.
36
3 A POSSIBILIDADE INTERACIONAL DAS INTRANETS SOCIAIS
A partir do movimento de midiatização do contexto organizacional, influenciado pela
midiatização da sociedade e sua consequente complexificação, as organizações se veem diante
da necessidade de repensar as interações com seus interlocutores, dentro da perspectiva da
comunicação. Nesse sentido, uma evidência desse contexto, como já vimos no capítulo anterior,
é o momento em que as organizações implementam intranets sociais, inaugurando um possível
processo de mudança da lógica da Web 1.0 para a lógica da Web 2.0. Podemos afirmar que esse
movimento parece acompanhar o mesmo processo de transformação da perspectiva do
entendimento da comunicação: de uma visão prescritiva e instrumental, própria de um modelo
transmissional, a comunicação passa a ser enxergada por um viés relacional.
Diferentemente do modelo informacional, a Web 2.0 se torna a arena da circulação de sentidos e a comunicação entre organização e sujeitos assume, por natureza, um caráter processual, assim como na perspectiva relacional. (NEIVA; BASTOS; LIMA, p. 194-195). [...] um fator relevante para a adoção das tecnologias da Web 2.0 pelas organizações, na interação com os seus públicos, é a superação do paradigma clássico da comunicação, cuja ênfase estava na transmissão de informações e no controle, para o modelo relacional, cujo foco está na interação. (NEIVA; BASTOS; LIMA, p. 194-195).
A comunicação no contexto organizacional tem deixado, de forma gradual, a abordagem
infomacional, adotando-se uma concepção interacional dos processos comunicacionais,
caracterizados pela circularidade de intenções dos atores sociais que se relacionam com as
organizações. “Com isso, os avanços paradigmáticos das teorias da comunicação se fazem
sentir nos estudos da comunicação organizacional.” (OLIVEIRA, 2008, p. 6). Na mesma linha
de pensamento, Lima e Oliveira (2010) concordam com a ideia de que as novas formas de
interação das organizações na contemporaneidade podem ser entendidas, principalmente, a
partir do contexto da midiatização e acrescentam que as práticas de comunicação mais
avançadas vão muito além da transmissão de valores por meio de um discurso impositivo e
unilateral, quando tentam criar um quadro de significados comum a partir do qual sentidos
podem ser partilhados. As organizações passam a reconhecer o papel do outro e a importância
do contexto e da história vivida, que também são determinantes na relação (LIMA; OLIVEIRA,
2010). Para um melhor entendimento da constatação que introduz este texto, cabe aqui uma
contextualização acerca do paradigma informacional e do paradigma relacional da
comunicação.
37
3.1 O informacional que predomina
De acordo com a revisão teórica sugerida por França (2001a), a partir de 1930, nos
Estados Unidos, começa a se desenvolver um tipo de pesquisa voltada para os efeitos e
funções dos meios de comunicação de massa e são esses estudos que teriam inaugurado a
teoria da comunicação, possibilitando a formulação das primeiras teorizações acerca do papel
dos meios e o processo de influência. Esses estudos, fortemente ligados a motivações de
ordem política e econômica, estimulam o desenvolvimento de pesquisas voltadas para a
análise do comportamento das audiências e para o aperfeiçoamento das técnicas de
intervenção e persuasão.
Como exemplo dessa tendência, na explicação de Primo (2008), evidencia-se a Teoria
Matemática da Comunicação, também chamada de Teoria da Informação, desenvolvida, em
1949, pelos engenheiros de telecomunicações Shannon e Weaver, que visaram um modelo e
uma teoria para o processo de transmissão de sinais. Identificada como uma das primeiras
tentativas de se criar uma teoria da comunicação, seu principal foco era na quantidade de
informação que um canal poderia transmitir, com a influência de ruídos deteriorando a
mensagem. O modelo é linear, de uma só via e possui cinco variáveis: fonte de informação,
transmissor, canal, receptor e destinatário. São também considerados o sinal recebido, a
mensagem e o ruído (tido como um fator disfuncional). O receptor localiza-se em posição
inferior na hierarquia e pode apenas gerar feedback para o emissor, que julga a eficácia de sua
mensagem, “[...] o que pode fazer sentido em um estudo de transmissão de sinais ou sobre
persuasão, mas que fica a dever em uma abordagem mais ampla da comunicação
interpessoal.” (PRIMO, 2008, p.140).
França (2001a) afirma que essa é apenas uma etapa da história que contextualiza o
surgimento dos primeiros estudos sobre os meios de comunicação de massa, mas ressalta que
é uma etapa marcante para o desenvolvimento posterior desses estudos, que imprimiu à
comunicação um caráter transmissivo, tendo como objetivo a persuasão. A autora conta que
surgiram, mesmo nos Estados Unidos22, tendências voltadas para a comunicação humana e
social na contramão dessas pesquisas, como a Escola de Chicago e a perspectiva conhecida
como interacionismo simbólico. No entanto, tais estudos permaneceram até muito
recentemente apartados da chamada teoria da comunicação, por não estarem dedicados à
problemática do conhecimento e obtenção de efeitos. Ocupados com as relações e formas 22 Estudos sobre os meios de comunicação desenvolvidos sob o paradigma informacional também foram
desenvolvidos na Europa e na América Latina (FRANÇA, 2001a), como a Teoria da Escola de Frankfurt e a Teoria do Imperialismo Cultural.
38
comunicativas interpessoais, vêm sendo incorporados ao domínio da comunicação nos
últimos tempos enquanto contribuições pertinentes (FRANÇA, 2001b). Após 1970, há uma
reconfiguração das teorias e uma perspectiva mais comunicativa começa a surgir. Essas
mudanças fazem parte dos reordenamentos vividos pela sociedade no final do século XX,
com destaque para as profundas modificações no campo das tecnologias da informação
(FRANÇA, 2001a).
Esse quadro teórico sobre o qual falamos compõe o paradigma informacional23,
modelo hegemônico entre os estudos da área “que entende a comunicação como um processo
de transmissão de mensagens de um emissor para um receptor, provocando determinados
efeitos.” (FRANÇA, 2001b).
[...] pautado na naturalidade e evidência da lógica transmissiva, as análises vão se ocupar dos seus resultados: uma dada mensagem foi ou não bem transmitida, provocou que tipo de efeitos. Um segundo caminho, dado que o processo é tomado mecanicamente, e cada um de seus elementos tem seu papel fixo, definido previamente, é estudá-los separadamente: estuda-se a lógica da produção, dos emissores; as características dos meios (natureza técnica, modos operatórios); as mensagens (conteúdos); a posição e atitude dos receptores. (FRANÇA, 2001b).
Nesse modelo, o processo de significação é reduzido às funções de codificação e
decodificação, como se o sentido pudesse ser transferido. Os interlocutores são considerados
agentes isolados e de fora da relação, existindo, separadamente, um tempo do emissor e um
tempo do receptor. Além desses fatores, a ideia de um espaço partilhado, de uma ambiência
comum entre os participantes da relação de comunicação também não existe (ARAÚJO, 2012).
“Configura-se uma noção desenraizada, que deixa de fora o fator humano, o contexto social, as
operações semióticas de significação.” (ARAÚJO, 2012).
Ainda nessa direção, tendo como foco o contexto organizacional, pode-se afirmar
também que os estudos sobre o campo da comunicação ao longo da história fundamentaram-
se, basicamente, no campo da administração, o que contribuiu para a formação de um olhar
instrumental e tecnicista da comunicação organizacional. Segundo Oliveira (2008), muitas
pesquisas, seguindo essa tendência, se esquecem de que a comunicação é inerente aos
processos de interação e, dessa forma, elemento constituinte do contexto organizacional.
A partir dessa breve contextualização, torna-se relevante destacar a visão de Primo
(2008), segundo a qual é incontestável o fato de que a lógica do paradigma informacional da
23 França (2001b) cita ainda outros dois paradigmas identificados por Mauro Wolf, o semiótico-informacional e
o semiótico-textual, e acrescenta o dialógico. Todos eles considerados simplificadores diante da complexidade do processo comunicacional.
39
comunicação seja a mesma do termo interatividade, muito utilizado em discussões sobre
cibercultura e interações mediadas por computador. Conforme critica o autor, apesar de ser o
termo da moda, vem sendo adotado de forma acrítica, imprecisa e escorregadia, tornando-se
vazio diante de uma discussão mais aprofundada. Primo (2008) recorre a Machado (1997)
para quem o termo interatividade tem sido utilizado das formas mais desencontradas e
elásticas, com o objetivo de abarcar um grande número de fenômenos, sem nada mais
representar: “desde salas de cinema em que as cadeiras sacodem até programas de televisão
em que o telespectador pode votar por telefone em alguma alternativa apresentada.” (PRIMO,
2008, p. 28).
Por esse caminho, aponta Primo (2008), fica evidente a influência do modelo
transmissionista da Teoria da Informação, onde o campo da comunicação formou raízes, que
impregna a reflexão acerca das interações mediadas por computador. Naquela concepção, a
complexidade da comunicação é reduzida à emissão de informações e à reação do receptor,
assim como acontece nos princípios da interatividade, em que a conhecida fórmula emissor →
mensagem → meio → receptor é apenas atualizada para webdesigner → site → internet →
usuário24. Os termos são diferentes, mas a ideia – caduca, segundo o autor – é a mesma. A
única diferença é que não apenas se recebe o que o emissor transmite, mas também é possível
buscar a informação que se quer. Dessa maneira, conforme destaca Primo (2008), o novo
modelo ou a fórmula do que o autor chama de interatividade seria: webdesigner → site →
internet ← usuário, à qual se associa o par comportamentalista de estímulo-resposta,
característico da Teoria da Informação. Nesse sentido, se retomarmos os conceitos detalhados
no capítulo anterior, podemos perceber que Web 1.0 e o termo interatividade – segundo o
entendimento de Primo (2008) – obedecem ao mesmo modelo.
Mesmo se podendo reconhecer o avanço dessa formulação em contraste com o tradicional modelo informacional e massivo, é preciso denunciar a deficiência da proposta. Mantém-se ainda a polarização e a supremacia de um extremo, que tem o privilégio de se manifestar, enquanto a outra ponta ainda é reduzida ao consumo, mesmo que agora possa escolher e buscar o que quer consumir. (PRIMO, 2008, p. 11).
Assumindo um posicionamento oposto ao da interatividade e de seus desdobramentos,
o autor, ao tratar de interações mediadas por computador, não pretende apenas ressaltar as
facilidades de publicação ou de acesso a informações, visto que essas perspectivas incorporam
24 Para Primo, o termo “usuário” remete à ideia de uma hierarquia pré-estabelecida entre os envolvidos na
interação, ressucitando-se o personagem “receptor” da Teoria da Informação.
40
uma visão polarizada de comunicação, como é possível observar na ambiência da Web 1.0.
Ao destacar, de forma tecnicista, ou emissão ou recepção, “[...] minimizam ou deixam de lado
as formas dialógicas que emergem através das mais diferentes interfaces na Internet [...]”
(PRIMO, 2008, p. 14).
Se antes apontava-se para que o receptor apenas assistia a um programa de televisão transmitido pelo produtor/emissor, agora a indústria e mesmo a academia se orgulham em falar das alternativas (configuradas como links) que o webdesigner (que reencarna a pele do emissor) programa em um site e transmite através da Internet para o “usuário”. [...] Enquanto no modelo informacional o ‘emissor transmite’, no novo modelo diz-se que o ‘webdesigner disponibiliza’. (PRIMO, 2008, p. 146).
O autor procura deixar claro que interagir não significa apenas clicar e afirma que os
textos acerca da interatividade recorrem com frequência às características técnicas da
máquina, à capacidade do canal, que é uma preocupação da Teoria da Informação. Primo
(2008), no entanto, tem o cuidado de ressaltar que não pretende diminuir a importância de
considerações técnicas na análise de interações mediadas por computador, mas quer
evidenciar que frequentemente as abordagens sobre interatividade não conseguem ultrapassar
os princípios da Teoria da Informação e considerar a complexidade do processo.
Assim sendo, como a interação mediada por computador é, na maioria das vezes,
valorizada mais pela tecnologia do que pela comunicação, Primo (2008) demonstra sua
preocupação em resgatar a mediação do diálogo, da livre expressão, já que a ênfase excessiva
em questões de processamento e transmissão de dados resultam em um estudo parcial do
tema. “Reduzir a interação a aspectos meramente tecnológicos, em qualquer situação
interativa, é desprezar a complexidade do processo de interação mediada. É fechar os olhos
para o que há além do computador.” (PRIMO, 2008, p. 30). Diante disso, o autor propõe uma
abordagem sistêmico-relacional25 para a interação mediada por computador, focando no
estudo do relacionamento entre os interagentes, um olhar que se posiciona no centro dos polos
da produção e da recepção. “Entendendo que interação é ‘ação entre’ e comunicação é ‘ação
compartilhada’, quer-se estudar o que se passa entre os participantes da interação, aqui
chamados de interagentes.” (PRIMO, 2008, p. 56). Conclui-se, portanto, que o autor se
apropria da ideia central do paradigma relacional da comunicação, concepção que também é a
que melhor se adequa à lógica da Web 2.0.
25 Segundo Primo, a concepção sistêmica observa o mundo a partir de relações e de integração. As propriedades
dos sistemas não podem ser reduzidas, pois os sistemas são totalidades integradas, em que o todo nunca é apenas a soma de suas partes.
41
3.2 O relacional que se apresenta
Em uma abordagem relacional, a comunicação é vista globalmente, como um processo
no qual interlocutores em interação produzem e compartilham sentidos, em um dado contexto
sócio-histórico. E é a perspectiva de G. H. Mead, identificado como o pai do Interacionismo
Simbólico, que nos ajuda a pensar por meio desse viés. Novamente, é França (2007) quem nos
oferece uma leitura de sua obra clássica, Mind, Self and Society, visando explorar as
contribuições fundamentais desse autor para a comunicação, mesmo não sendo um teórico do
campo. Vale destacar que, já há alguns anos, existe um grande interesse dos estudos da
comunicação pelos princípios do interacionismo simbólico, porém a referência a essa corrente
ainda mostra-se tímida (FRANÇA, 2007).
A interpretação que França (2007) faz da obra de Mead contribui para a compreensão
de que a comunicação não se trata apenas de um processo de estímulo-resposta através de
gestos, mas é decorrente da natureza desses gestos, ou da potencialidade de se produzir gestos
simbólicos, ou seja, dotados de significação.
Os gestos [...] são estímulos que devem provocar uma resposta do organismo ao qual eles se dirigem, mas os gestos significativos têm uma particularidade: essa consciência da significação faz com que eles afetem não apenas o outro ao qual se dirigem, mas igualmente aquele que o produz. O estímulo, na comunicação humana, é um estímulo para o outro, mas também para aquele que o emitiu, e provoca uma resposta nos dois organismos. (FRANÇA, 2007, p. 3).
A dinâmica que permite a um indivíduo responder a seu próprio estímulo significa que
ele tem a capacidade de assumir o papel do outro, a partir e através de sua provável resposta.
Como coloca França, “É pela participação do/no outro que o indivíduo pode ver-se a si
mesmo como o outro o vê, e pode controlar seu próprio comportamento da mesma maneira
como procura intervir no comportamento do outro. A aposta central da comunicação é esta
afetação mútua [...].” (FRANÇA, 2007, p. 3). Para a autora, o que marca o perfil relacional do
pensamento de Mead é exatamente essa reversibilidade do gesto significativo, que existe
“entre”, que é tanto um estímulo para o outro quanto uma resposta às possíveis reações desse
outro. A comunicação, na visão de Mead, é a dupla afetação dos atos, a existência de
significados diversos e compartilhados, e de um processo de mediação.
Sujeitos em comunicação, portanto, são sujeitos interlocutores, inscritos em um
contexto institucional, mas são, acima de tudo, sujeitos em experiência, que afetam e são
afetados pela co-presença e pela mediação simbólica que os coloca em polos de uma
interação. Tomar a interação como pressuposto, entendendo que o processo comunicativo é
42
uma interação, é analisar o cerne da relação, a força que coloca os interlocutores produzindo
sentido, afetando o outro e o social e sendo afetados mutuamente e pelo social. É analisar a
comunicação como lugar de força, como lugar, espaço ou forma que suscita a ação e permite
o imprevisível (FRANÇA, 2006).
Importando esse entendimento para o contexto organizacional, conclui-se que
compreender as relações é perceber a linguagem como conformadora e mediadora de
discursos. “Os sujeitos da comunicação organizacional – organização e interlocutores – são
atores postos em relação e por isso tomam posições, têm presença discursiva, efetuam
significações e constroem sentido a partir de suas vivências historicamente situadas.” (LIMA;
OLIVEIRA, 2010, p. 2).
Diferentemente do que ocorre na corrente informacional, como vimos, na relação de
comunicação em uma abordagem relacional
[...] não é possível analisar a intervenção de um emissor sem levar em conta o outro a quem ele se dirige e cujas respostas potenciais (as respostas do outro imediato e de Outrem – o grupo ao qual pertencem) já atuam com antecedência sobre o seu dizer; não é possível analisar o receptor separado dos estímulos que lhe foram endereçados e que o constituíram como sujeito daquela relação [...]. (FRANÇA, 2007, p. 7).
Do ponto de vista da autora, como as contribuições de Mead vêm antes da maioria das
teorias que influenciam os estudos sobre comunicação na contemporaneidade, não cabe
perguntar se trazem algo de novo, mas sobre o quanto elas guardam de atualidade e antecipam
questões que permeiam as reflexões de hoje.
Naturalmente não encontramos em seu pensamento uma teoria que responda a todos os desafios trazidos pela comunicação; muitos aspectos (o tratamento da linguagem, o processo de significação, os conceitos de representação e imagem) são pouco desenvolvidos por ele. Mas para pensar o processo comunicativo, a dinâmica relacional, a configuração das interações, sua contribuição é insubstituível. Os atuais estudos da recepção são devedores de seu pensamento – e a metodologia de pesquisa nesse campo ainda não deu conta de responder a contento à presença da relação ternária, da reflexividade (do arco reflexo), dos indivíduos e comportamentos que se constroem em relação, face ao outro. O pensamento de Mead nos coloca ainda hoje um desafio; ele fala da comunicação como momento de costura, de construção, de transição. A comunicação, portanto, é da ordem do movimento. Nosso desafio é desenvolver os instrumentos adequados para captar esse movimento. (FRANÇA, 2007, p. 10).
Nesse contexto, França (2001b) advoga a necessidade de um modelo mais sólido e
complexo que legitime um outro ponto de vista para a área de comunicação, considerando que
o paradigma informacional, ainda que hegemônico entre as abordagens contemporâneas,
revela-se insuficiente para a apreensão das particularidades da realidade em que vivemos.
43
Assim, a autora propõe alguns caminhos, a partir das contribuições de Mead, para se tratar a
comunicação de uma outra forma:
a) a comunicação deve ser um processo de troca, ação partilhada, interação, e não apenas
servir a uma lógica de transmissão de mensagens;
b) atenção deve ser dada à presença de interlocutores – mais do que simples emissores e
receptores –, de sujeitos sociais que desempenham papéis em processos de construção
de sentidos;
c) o que interessa no processo é a identificação dos discursos – e não de mensagens –,
das formas simbólicas que trazem as marcas da produção desse discurso, dos sujeitos e
do contexto;
d) em vez do recorte de situações isoladas, propõe-se a apreensão de processos
produzidos situacionalmente, de práticas discursivas e do panorama sócio-cultural de
uma sociedade.
Assim, essa proposta objetiva resgatar a especificidade do olhar da comunicação, que
é um processo global, por meio da interseção de três dimensões básicas: a interacional (a
relação dos interlocutores), a simbólica (as práticas discursivas e a produção de sentido) e a
contextual (situação sócio-cultural). Essas três dimensões, afetando-se mutuamente,
estabelecem o quadro relacional que compreende a comunicação.
Ao dialogar com as reflexões de França (2001b), Lima (2008) detalha as três
dimensões sugeridas pela autora, começando pela contextual, que corresponde ao conjunto de
circunstâncias nas quais as interações acontecem, às características que possibilitam
identificar os sujeitos na sociedade. “Já que a situação em que se estabelece a interação
conforma os sujeitos, moldando seus discursos e a própria relação que estabelecem,
influenciando na produção de sentido, torna-se fundamental a reconstituição do contexto para
análise da comunicação.” (LIMA, 2008, p.114). A dimensão simbólica, por sua vez, é
percebida nos discursos dos interlocutores, que trazem evidências do contexto da interação,
das características dos sujeitos e da própria relação. O discurso trata-se da construção de
enunciados no processo comunicativo e, conformado pela linguagem, é o que emerge da
relação entre consciências. Por fim, a dimensão da interação compreende os sujeitos
interlocutores em um processo de afetação mútua, no qual se instituem na relação com o
outro, com a linguagem e com o simbólico. A interação é a centralidade do processo
comunicativo.
44
Pelo ângulo relacional, portanto, o processo comunicativo trata-se “de algo vivo,
dinâmico, instituidor – instituidor de sentidos e de relações; lugar não apenas onde os sujeitos
dizem, mas também assumem papéis e se constroem socialmente; espaço de realização e
renovação da cultura.” (FRANÇA, 2001b). Visto dessa forma, podemos considerar que o
paradigma relacional traz ricas contribuições para o campo da comunicação como um todo e
pode ser utilizado como aporte teórico e metodológico, visando um outro entendimento da
comunicação no contexto organizacional, que ainda não conseguiu superar a hegemonia do
modelo transmissional em suas práticas e até mesmo em estudos que a contemplam.
Ratificando essa ideia, Bastos (2010) aponta que, em uma análise da comunicação no
contexto organizacional, do ponto de vista do modelo informacional, pressupõe-se que a
informação é entendida pelo receptor exatamente da forma como foi transmitida pelo emissor.
Nessa situação, o sentido é entendido como uma propriedade intrínseca à mensagem, que
seria incorporada por um receptor passivo.
[...] um emissor (geralmente, a organização) cria mensagens (planeja ações comunicacionais, elabora seu conteúdo, seleciona os canais e define a forma de interação) e as divulga por meios de comunicação (veículos próprios ou mídia massiva) a seus receptores (públicos-alvo). A intenção é buscar sempre a maior eficácia do processo (o menor ruído, o mínimo de imprevisibilidade). Pressupõe-se que a informação seja exatamente aquela transmitida, como se o sentido fosse uma propriedade intrínseca à mensagem e, portanto, algo que seria incorporado integralmente pelo receptor passivo. Em outras palavras, esse paradigma considera a comunicação não apenas um processo de transmissão de informação, mas de sentido – como se isso fosse possível. (LIMA; BASTOS, 2012, p. 34-35). Este tipo de análise mostra-se cada vez mais insuficiente para o entendimento do fenômeno comunicativo por se tratar de uma visão fragmentada e instrumental da comunicação, em que a mesma é concebida como uma seqüência linear de partes encadeadas de modo a gerar resultados específicos. Mais que isso, ao pré-definir os papéis que cada interlocutor ocupa no proceso, com suas funções específicas, o fenômeno passa a ser analisado a partir de parâmetros limitadores. (BASTOS, 2010, p. 33).
É possível perceber que a maioria das organizações adotam uma lógica transmissional,
ao acreditar que “[...] a intencionalidade impressa em suas estratégias irá produzir os sentidos
almejados.” (LIMA; OLIVEIRA, 2010, p. 3), menosprezando os papéis que assumem seus
interlocutores. Sendo assim, se antes as organizações acreditavam ser possível controlar os
diferentes processos a partir de estratégias de comunicação, hoje, a complexidade própria da
sociedade se reflete nos processos que marcam a relação com seus interlocutores. E nesse novo
contexto, as organizações precisam lidar com situações inesperadas e imprevistas, advindas de
uma crescente movimentação dos sujeitos relacionada à produção de sua comunicação e à
45
influência no cotidiano das organizações, inaugurando uma outra forma de diálogo
(OLIVEIRA; LIMA; MONTEIRO, 2011, p. 4).
É nessa direção, portanto que o modelo relacional da comunicação apresenta-se como
o mais pertinente para a compreensão das relações que as organizações estabelecem com seus
interlocutores e dos processos de comunicação que ocorrem no contexto organizacional. Vale
aqui resgatar a perspectiva de Lima e Bastos, segundo a qual
Sob a luz do paradigma relacional, entendemos a organização como um ator social coletivo constituído por sujeitos que, em relação e interação constante uns com os outros, se institui. Do mesmo modo, pelos processos de comunicação, a organização se relaciona com outros interlocutores, que também se instituem na relação. Isso nos ajuda a perceber que o papel da comunicação no contexto organizacional é, então, de mediadora e organizadora desses processos de interação. E que esses processos pressupõem trocas, organização de perspectivas compartilhadas, construção de um lugar comum no qual haverá uma relação. (LIMA; BASTOS, 2012, p. 40).
Concordando com Oliveira e Paula (2012), acreditamos que algumas organizações já
percebem que é necessária uma mudança de postura, no sentido de que não podem querer
controlar os processos comunicacionais nem deixar de reconhecer que os interlocutores do
processo interativo constroem sentidos para e a partir das ações organizacionais.
Reconhecemos a existência de um desnivelamento desse processo entre as organizações, uma
vez que cada uma tem sua natureza e seu tipo interferindo em seu entendimento: há aquelas
que já consideram a nova realidade e vêm adaptando suas práticas e seus discursos, há aquelas
que reconhecem que ainda não têm prática nessa direção, e outras que simplesmente ignoram
as mudanças no contexto em questão.
A partir deste ponto, cabe retomarmos a perspectiva de Primo (2008), que se apropria
dos princípios do paradigma relacional para propor uma análise das interações mediadas por
computador. Do seu ponto de vista, e com toda a contextualização desenvolvida até o
momento, será possível apreender que as intranets sociais surgem como uma possiblidade de
mudança de perspectiva acerca do entendimento da comunicação no contexto organizacional.
A contribuição de Primo (2008) nesse sentido trata-se do seu conceito de interação
mútua mediada por computador, que prega a necessidade de se evitar a observação exclusiva
no comunicador individual. Como visto, o autor parte da perspectiva sistêmico-relacional, em
que o sujeito deixa de ser a unidade de análise. “Ou seja, na interação construída
relacionalmente não faz sentido observar uma ação como expressão individual ou como
mensagem transmitida. A ação deve ser valorizada no contexto global do sistema.” (PRIMO,
2008, p. 102). Para complementar seu pensamento, ele recorre à definição de Fisher (1987)
46
sobre interação: conexão entre ações e, consequentemente, entre as pessoas que realizam
aquelas ações. Nota-se que Fisher centra-se no relacionamento e não em um participante
específico, pois, no seu entendimento, além de participarem da definição de suas relações, os
participantes são definidos pelos relacionamentos, havendo uma reflexividade, ou seja, as
relações afetam os participantes, assim como seus relacionamentos futuros.
Além dos fatores especificados acima, há outras características das interações mútuas
que evidenciam sua abordagem relacional, a exemplo da possibilidade de novas ações
redefinirem o relacionamento, com a condição de serem criadas e ganharem sentido durante a
interação. Isso significa, como já é sabido, que não há como prever qual será o resultado das
trocas comunicativas, uma vez que o relacionamento apenas pode ser definido no decorrer da
interação. “Como a interação mútua não conhece a causalidade linear – pois uma ação não
conduz necessariamente a outra –, é apenas na interconexão global dos eventos em contexto
que o relacionamento se transforma e evolui [...]” (PRIMO, 2008, p. 116).
As interações mútuas ocorrem através do choque dos comportamentos comunicativos
dos interagentes, ou seja, o processo de negociação de diferenças que faz parte da
comunicação interpessoal. Para se compreender esse processo, é necessário observar de que
maneira as forças combinam-se na interação. Torna-se relevante destacar a diferenciação que
Primo (2008) faz entre interações mútuas e reativas, observando-se que as primeiras
possibilitam o embate de ideias e oferecem abertura para o contestar, para o discordar, o que
não acontece nas interações reativas mediadas por computador, em que o debate não tem
lugar, por se caracterizarem pela repetição das mesmas reações programadas. A partir dessas
conceituações parece-nos que as interações mútuas estão relacionadas à lógica da Web 2.0,
caracterizada por potencializar as formas de publicação, compartilhamento e organização de
informações, além de ampliar os espaços para a interação entre os participantes do processo,
conforme a perspectiva conceitual adotada nesta pesquisa.
Enquanto as interações mútuas se desenvolvem em virtude da negociação relacional durante o processo, as interações reativas dependem da previsibilidade e da automatização nas trocas. Se um ato foge daquilo que era esperado previamente, ele pode ser ignorado e recusado no processo ou até mesmo acabar com a situação interativa, por se constituir em um erro incontornável. (PRIMO, 2008, p. 149).
Apesar de intensificar as diferenças entre uma e outra, o autor alerta que não tem a
intenção de julgar a priori as interações mútuas como boas e democráticas, contudo, aponta,
firmemente, que a construção do conhecimento pode ocorrer apenas por meio do debate. Ele
pondera que, ainda que muitas críticas tenham sido feitas à visão transmissionista, suas
47
influências ainda são fortes, inclusive, entre pesquisadores contemporâneos. Por outro lado,
esforços em diferentes campos chamam atenção para os relacionamentos que emergem na
interação.
Comunicar não é sinônimo de transmitir. Aprender não é receber. Em sentido contrário, quer-se insistir que interação é um processo no qual o sujeito se engaja. Essa relação dinâmica desenvolvida entre os interagentes tem como característica transformadora a recursividade. E para que isso seja compreendido, é preciso observar o próprio conhecer como relação. (PRIMO, 2008, p. 71-72).
A discussão sobre as possibilidades de interação no contexto organizacional ganha
força na contemporaneidade e amplia a reflexão sobre a comunicação nesse contexto e sobre
as práticas comunicativas das organizações. A implementação de intranets sociais por parte
das organizações é um exemplo disso, ressaltando-se, inclusive, que, regidas pelos princípios
da Web 2.0, são o reflexo daquilo que Primo (2008) considera como interação mútua.
As intranets sociais incentivam os internautas a participar e colaborar, opinando,
escrevendo e organizando conteúdo. Os empregados podem utilizar o ambiente como gestores
de conteúdo, uma vez que um dos princípios da Web 2.0 é a descentralização da gestão do
conteúdo e da informação para outras áreas de negócio da organização, o que comumente se
restringia, até então, ao setor de comunicação das empresas. As intranets sociais dão poder a
outras áreas organizacionais para que, institucionalmente ou oficialmente, também possam
“fazer comunicação". Na era 2.0, a web deixa de desempenhar o papel de mera provedora de
informações em mão única (conteúdo → usuário), para atuar em um modelo de duplo sentido
de direção, em que os empregados podem atuar não só como receptores, mas como emissores,
assim como acontece com a organização. Oliveira e Paula compartilham dessa opinião:
Vivemos em uma realidade de amplo acesso às informações, facilitado pelo avanço acelerado das tecnologias de informação, sobretudo com a internet e a web 2.0, que possibilitam outras formas de relacionamento e de busca de informações. Nesse cenário, as organizações perdem a centralidade do processo e deixam de ser o único polo de emissão. Elas passam, cada vez mais, a conviver com a multiciplidade dos fluxos informacionais e com mídias sociais como o Twitter, os blogs e os sites de relacionamento. (OLIVEIRA; PAULA, 2012, p. 69-70).
É impossível desconhecer os processos espontâneos de trocas bem como separar a comunicação formal – pensada com base em políticas da organização – da comunicação informal – que acontece no contexto das organizações, independentemente de sua vontade ou decisão. Por isso, ao elaborar e implementar processos intencionais de comunicação, é necessário reconhecer os diversos discursos presentes nos processos interativos. (OLIVEIRA; PAULA, 2012, p. 69-70).
48
Nesse contexto, é importante ressaltar que a organização, como enunciadora, passa
códigos para seus interlocutores por meio do discurso. A partir de um repertório próprio e de
um contexto específico, esses interlocutores leem esses códigos, considerando um sistema de
regras, que constitui a linguagem, e, a partir daí, constroem sentidos. Assim, Bastos (2010)
recorre a Véron (1980) para explicar que esse processo torna-se circular, em que o receptor
assume o papel de enunciador e a organização, o papel de instância de recepção e construção
de sentido.
Fausto Neto (2010) nos traz uma visão mais aprofundada a respeito da circulação,
apontando, primeiramente, para o fato de que alguns estudos procuram ressaltar que conceitos
e experimentações analíticas que marcavam a enunciação na sociedade dos meios, como os de
defasagem, diferença e desajuste, para aludir ao processo de dessimetria entre processos de
produção e de recepção de discursos, parecem, hoje, insuficientes para explicar as complexas
realidades que envolvem as processualidades e as operações enunciativas ali praticadas. Cabe
aqui explorar as ideias de Fausto Neto (2010) que também fala da existência da circulação,
mas como uma outra instância além da produção e da recepção, presente no ambiente da
midiatização. A circulação seria um espaço compartilhado, cujo modo de ser dissolve
fronteiras e faz emergir zonas de pregnâncias. O autor cita o linguista Antoine Culioli, que
tem uma formulação que aponta para esta nova região (a circulação) e na qual se encontram
as estratégias institucionais de produção de sentido e aquelas que emanam dos receptores,
enquanto atores sociais. O linguista aproxima a noção de circulação como um novo lugar,
designando-o como zonas de transformações, aquele que resulta do deslocamento e de
transformações para além das bordas de fronteiras.
Nessa nova realidade de interação – produção-recepção-circulação – os sujeitos
interlocutores tem de “jogar um outro jogo”, através de regras que os desloquem das
fronteiras internas de um sistema e, na forma de zigue-zague, dar conta do que se passa entre
partes nos processos enunciativos que envolvem tais zonas de interpenetração (FAUSTO
NETO, 2010). É importante ressaltar que Fausto Neto cita Bateson (1979) como o
responsável por formular a imagem de zigue-zague e por falar da importância da tessitura que
os interlocutores devem fazer, deslocando-se de formas e processos, voltando às formas,
fazendo, de uma passagem a outra, descrições e classificações sobre seus elementos.
Dialogando com Fausto Neto (2010), La Fuente e Paula (2012) também abordam a
circulação como uma outra instância constituinte do processo comunicativo, envolvendo as
instâncias, os sentidos produzidos, os ruídos, os códigos, os suportes, a linguagem, o
conteúdo. “Nesse circuito comunicativo, [...] organizações e grupos de interesses
49
intercambiam seus papéis, sendo, ao mesmo tempo, produtores e receptores, em um
movimento de elaboração e compartilhamento de sentidos que ocorre na circulação de todos
esses elementos [...].” (LA FUENTE; PAULA, 2012, p. 128).
Nessa direção, Lima e Bastos (2012) vão um pouco além ao afirmar que a produção de
sentidos acontece na instância da recepção. Concordamos com o ponto de vista das autoras,
que propõem que a comunicação se dá no receptor e, dele, surgem novas possibilidades. Por
esse caminho, pressupomos que a recepção não é algo fechado, pois sempre abre chances de
uma nova comunicação, mantendo viva a dinâmica do processo. “Emissor e receptor não são
polos isolados da comunicação, mas, antes, sujeitos em interação que, ao se referenciarem e
se afetarem mutuamente, instauram – e permanentemente renovam – a circularidade do
processo.” (LIMA; BASTOS, 2012, p. 42).
A partir desses apontamentos e conceituações, vamos abordar, em seguida, o processo
de produção de sentido entre sujeitos interlocutores, considerando a comunicação no contexto
organizacional e as possibilidades de interação que a lógica da Web 2.0, imbricada nas
intranets sociais, sugerem. As discussões partem, principalmente, da ideia de que o discurso
organizacional não pode ser sempre elaborado a partir de uma intencionalidade prévia, uma
vez que só se realiza quando é interpretado pelos interlocutores, a partir de suas próprias
escolhas, situadas em um contexto sócio-cultural, independentemente do que esteja sendo
proposto.
3.3 Construção de sentido nas organizações e o mito da intencionalidade prévia
Uma vez que se observa a tendência das organizações em substituírem suas intranets
obedientes à lógica do paradigma informacional por intranets sociais, pressupomos que detêm o
entendimento de que a comunicação – e especificamente a comunicação no contexto das
organizações – é relacional. E, a partir do momento que compreendem o processo dessa forma,
devem concordar com a ideia de que não é possível querer controlar os processos
comunicacionais nem deixar de reconhecer que os interlocutores do processo interativo
constroem sentidos. Entendem que os ruídos precisam existir, que não é possivel impor uma
interpretação de um discurso, que imprevistos fazem parte do processo comunicativo e que este
é circular: a preocupação não é com a distinção entre emissores e receptores, mas com o que
acontece entre os participantes da relação. É importante que as organizações não implementem
a lógica da Web 2.0 apenas para seguir uma tendência de mercado ou instaurar a imagem de
50
empresa inovadora e tecnológica ou ainda apenas para melhorar processos e evoluir
tecnicamente e visualmente o ambiente web. Destacamos que, nesse comportamento, o viés
informacional/tecnicista/transmissional permanece e torna-se nítido que o objetivo é impor aos
empregados um discurso não real de colaboração e interação, percepção que se intensifica
quando também entra em jogo a cultura da organização. Podem surgir contradições no ambiente
interno, por exemplo, quando uma organização com princípios muito rígidos de hierarquia
insere a Web 2.0 em seus processos. “A escolha de um modelo de comunicação interna está
vinculada ao modelo de gestão adotado pela organização. Naturalmente, um modelo de gestão
aberta oferece bases para o desenvolvimento do paradigma relacional.” (OLIVEIRA; PAULA,
2009, p. 24).
Acrescenta-se a isso o fato de que, geralmente, instalar a cultura de participação nas
empresas é papel do empresário, que passa as informações necessárias aos empregados. Aí já
está implícito o continuísmo hierárquico das relações de trabalho: “‘alguém’ (que não é
empregado) ‘cria a cultura’ e ‘passa informações necessárias aos empregados’.” (AMARAL,
2010, p. 228). Deduz-se que, se existe alguém que pode passar, existe quem recebe, havendo,
assim, uma relação de superioridade e inferioridade, ordem, obediência. Seguindo essa mesma
maneira de pensar, Oliveira e Paula (2009) recorrem a Cabrera (2002), que afirma que, em
geral, o gestor da mudança informa e quer que as pessoas se comprometam. Na visão dele,
dificilmente isso vai acontecer. Primeiro porque as pessoas não querem ser mudadas, mas
entender a mudança e participar dela.
Entretanto, já é sabido que não é possível prever o sentidos que serão produzidos em
uma relação de comunicação, a partir de um determinado contexto. Vamos agora aprofundar
nessa e em outras questões que irão contribuir para a compreensão dos pontos acima colocados,
começando por Primo:
[...] suponha-se agora que uma organização crie uma nova seção em sua Intranet, procurando impor aos funcionários certos valores e procedimentos importados de uma nova “moda” do marketing. Por serem incompatíveis com as expectativas das equipes e seu modo atual de operar e de se relacionar, tal pacote encontra reações de oposição, mesmo que as páginas digitais apresentem sofisticados recursos persuasivos. Suponha-se também que os espaços de encontros informais tenham sido desfeitos (como a abolição em muitas empresas da “sala do cafezinho”). Mesmo assim, os trabalhadores podem organizar-se e debater como resistir a tais imposições através da própria Internet. Através da rede, os funcionários podem trabalhar na conscientização de seus colegas de que tais procedimentos são inadequados para o trabalho que desempenham. E via e-mails coletivos podem também decidir como lutar contra o processo deflagrado. (PRIMO, 2008, p. 131).
51
Sobre isso, vale resgatar a proposta de Oliveira e Paula acerca dos estudos sobre a
comunicação no contexto das organizações. De acordo com as autoras, é fundamental
considerar que não é possível prever “a significação das práticas comunicativas na
intencionalidade da organização, evidenciando a debilidade dos processos que se pretendem
totalizantes, uma vez que o sentido tem uma abertura para a significação que foge à
previsibilidade e intencionalidade da instância de produção.” (OLIVEIRA; PAULA, 2008, p.
100).
A partir de seus repertórios interpretativos, a instância receptora das ações organizacionais imprime sentidos que podem ser os não desejados e planejados pela organização, numa ressignificação que foge ao controle da gestão. Aí, a comunicação, enquanto processo social de articulação entre as instâncias de produção, distribuição e consumo, abre perspectiva para o imprevisto e o não-habitual. (OLIVEIRA; PAULA, 2008, p. 104).
Fausto Neto (2008a) compartilha dessa perspectiva, ressaltando a importância de se
pensar a questão dos sentidos não como uma atribuição específica e unilateral de um ou de
outro interlocutor, mas como um “feixe de relações”. Os efeitos de uma mensagem não
estariam na competência de um dos polos (produção/recepção), já que nem um e nem outro
pode estabelecer a priori os modos como seu interlocutor lidará com a mensagem que lhe foi
destinada. O autor reitera que “[...] a comunicação não é um ato de atribuição de sentidos, que
se realizaria automaticamente entre produtor e receptor. Mas, pelo contrário, um jogo no qual
a questão dos sentidos se engendra em meio às disputas de estratégias e de operações de
enunciação.” (FAUSTO NETO, 2008a, p. 54).
Nesse contexto, defende o autor, parece que, quanto mais as organizações pregam o
ideário da transparência, no ambiente da crescente midiatização, mais ocorrem descompassos
entre as suas lógicas e as lógicas de apropriação e construção de sentidos pelos sujeitos
interlocutores. Há uma defasagem entre sistemas de informação e práticas de uso, emergindo
o que Fausto Neto (2008a) chama de pontos de fuga, iniciativas ou ações não previstas pelos
mecanismos de regulações idealizados por políticas e estratégias informacionais. Torna-se
relevante destacar aqui um ponto interessante proposto pelo autor para caracterizar esse perfil
tecnicista da comunicação organizacional. Ele sugere a metáfora do radar, na qual a
comunicação é associada à ideia de radar, enquanto um dispositivo que teria o objetivo de
“proteger através de captura, processamento, análise e de disseminação de informação – as
atividades e a vida de uma organização face às manifestações do ambiente que lhe oferecem
perigo ou restrições ao seu funcionamento” (FAUSTO NETO, 2008a, p. 42). A metáfora do
radar seria, talvez, a que melhor traduz o caráter informacional da comunicação no âmbito das
52
organizações. A proposta de entendimento que segue é também uma visão crítica sobre essa
questão:
Uma tentativa de reintrodução da assepsia no lugar da sujeira, o que parece ser uma ‘missão’ contraditória, uma vez que estes processos e suas lógicas não podem assegurar novas uniformidades em ambientes estruturados em torno das diversidades de lógicas. É sabido que a proliferação de redes, permeando as vidas pessoal e institucional, e o intenso processo de conexismo não asseguram, necessariamente, a transparência. Pelo contrário, vinga a opacidade, com a permanência do ‘obscuro’. Ou a diversidade enquanto ocorrência de ‘desvios’. (FAUSTO NETO, 2008a, p. 43).
A partir desse ponto de vista, o autor levanta a discussão sobre a importância de se
questionar se o dissenso interacional não estaria completamente relacionado à própria
comunicação, na qual a interação realiza-se em termos assimétricos, em meio a processos de
defasagens e de complexidades. No contexto organizacional, buscam-se mecanismos
corretores para os “ruídos”, que, conforme aponta Fausto Neto (2008a, p. 55), são, na
realidade, as molas constituintes de novas possibilidades, afinal de contas, “é na diversidade
de sentidos produzidos em ‘feixes de relações’ que se constitui a multinatureza da vida das
próprias organizações.”.
Concordando com o posicionamento de Fausto Neto (2008a), Pinto (2008, p. 86)
sugere que um modelo de pensamento comunicacional baseado nas linearidades de um
modelo transmissivo verticalizador deveria assegurar que “‘posso dizer aqui com certeza de
que serei totalmente entendido lá’ se conseguir eliminar os ruídos que podem interferir na
mediação.”. Porém, o autor destaca que os ruídos fazem parte do processo comunicativo, de
maneira que não existe nada sem ruído. “Essa é uma questão imanente ao signo, exatamente
constituído de opacidade e intransparência e potencial mal-entendimento. Não há garantias na
produção da mensagem, não há garantias na mensagem, não há garantias na sua recepção.”
(PINTO, 2008, p. 86).
O autor quer esclarecer que fala-se muito na linguagem como instância de produção de
sentido, mas muitas vezes a noção de sentido vem como sinônima de significado. Para isso,
faz a diferenciação entre um e outro, destacando que o significado é anterior a novas
manifestações de uma palavra ou de um signo, ou seja, é o “já-dado”. O sentido, por sua vez,
“[...] é um ser do futuro, um vir-a-ser, Sentido é isso, portanto: futuro significado em
contexto.” (PINTO, 2008, p.83). Destaca-se, assim, que o sentido depende das escolhas do
receptor, ou seja, daquilo que o atinge ou que ele quer atingir. “O sentido é aquilo que a
escolha do receptor vai, de certa forma, fazer para que os significados ou as significâncias
circulem.” (PINTO, 2008, p.83).
53
Ao defender que as intranets sociais inauguram possibilidades de interação no
contexto das organizações, reforçamos que as particularidades do processo de construção de
sentidos entre sujeitos interlocutores – considerando, claro, as organizações como sujeitos
sociais – são intrínsecas a eles. Além disso, é importante considerar também que os princípios
de colaboração e de descentralização de gestão do conteúdo que marcam a Web 2.0 e por
conseguinte, as intranets sociais, suscitam outras questões. A partir do momento em que, por
meio dos portais, os empregados passam também a integrar a instância da produção e a “fazer
comunicação” de forma oficial, é fundamental considerarmos a visão de Baldissera (2008).
Partindo dos princípios do Paradigma da Complexidade26, o autor defende que, seja da
qualidade do oficial ou do não-oficial, quando os sentidos em circulação nos processos de
comunicação disserem respeito à organização, eles serão considerados comunicação
organizacional.
Sendo assim, a noção de comunicação organizacional precisa ser ampliada e ultrapassar
a fala autorizada, que é apenas “o lugar da autoridade que quer informar/formar, persuadir,
seduzir, controlar/acompanhar/avaliar, coordenar/dominar e, mesmo manipular. É o lugar da
reprodução, da obediência, da normatização e da normalização.” (BALDISSERA, 2008, p.
47). A comunicação organizacional não pode ser reduzida a planos, programas, projetos, pois,
para além dessas práticas, que se referem apenas ao organizado, ao gerenciável, há fluxos de
comunicação de qualidades e intencionalidades variadas, observáveis apenas no acontecer,
quando os sentidos são produzidos. Esses fluxos podem, de maneira dialógica e recursiva,
“complementar, potencializar, qualificar, agilizar e/ou resistir, subverter, confundir, distorcer
os processos formais/oficiais” (BALDISSERA, 2008, p. 32). Dessa forma, é na tensão
existente na relação comunicativa entre a organização e seus interlocutores, em um contexto
específico, que os sentidos são disputados e construídos. Nessa direção o autor cita a si
próprio ao afirmar que a comunicação é um “[...] processo de construção e disputa de
sentidos.” (BALDISSERA, 2008, p. 33).
[...] disputa dos sentidos postos em circulação na cadeia de comunicação e que serão apropriados e internalizados de diferentes formas pelos sujeitos em relação comunicacional, em um contexto específico. Portanto, os sentidos que serão individuados, em disputa interpretativa, sofrerão influências das escolhas que esses sujeitos realizarão (conscientemente ou não) a partir de seus lugares eco-sócio-histórico-culturais e de suas competências (psíquicas, lingüísticas, filosóficas etc.). (BALDISSERA, 2008, p. 34).
26 Edgar Morin assume a complexidade como Paradigma, destacando-se seus três princípios básicos: o dialógico,
o recursivo e o hologramático (BALDISSERA, 2008).
54
O autor compartilha da mesma opinião de Fausto Neto (2008a) e Pinto (2008) quando
afirma que os processos comunicacionais também abrangem fraturas, fissuras, dobras, fugas,
desvios. Ele também ratifica a ideia de que os sentidos propostos por um sujeito em
comunicação não são, obrigatoriamente, os mesmos sentidos que serão internalizados por seu
interlocutor.
Vale atentar para o fato de que comunicação organizacional não se qualifica como mera estratégia de controle e, também, não se reduz a simples sistema de transferência de informações. Portanto, por mais que a ordem posta tente sufocar os processos comunicacionais não-oficiais, existirão fissuras pelas quais esses processos comunicacionais se infiltrarão, resistindo, desafiando, subvertendo os possíveis mecanismos de controle. As estratégias renovam-se a cada acontecer. Comunicação formal/oficial, e informal/não-oficial, dialética, dialógica e recursivamente, constituem o mesmo processo ‘comunicação organizacional’. (BALDISSERA, 2008, p. 44).
Assim sendo, a ideia de comunicação organizacional não pode ser reduzida apenas aos
conceitos de comunicação interna e externa, relações públicas, marketing corporativo,
assessoria de imprensa, enfim, apenas às práticas de comunicação organizacional que são
visíveis, controláveis, tangenciáveis. Para Baldissera (2008), isso faz com que a comunicação
organizacional tenha sua criatividade eliminada, já que é possibilitada pelas tensões entre o
organizado e o desorganizado, o formal e o informal, o planejado e o espontâneo.
Nesse contexto, o autor reconhece a necessidade de refletir sobre o papel da
comunicação e aponta para uma direção que acaba por responder certos questionamentos
sobre o possível papel do comunicador social nesse novo cenário, no qual receptores tornam-
se emissores e emissores tornam-se receptores. De acordo com Baldissera (2008), apesar da
profusão de sentidos possíveis nas relações ‘eu-outro’, a desorganização causada é limitada. A
comunicação surge como um lugar que organiza os sentidos em circulação. “Na perspectiva
do princípio dialógico27, pode-se dizer que, no seio da unidade comunicação (o organizado),
está a dispersão de sentidos – a significação possível (o desorganizado – possibilidade, risco,
imprevisibilidade); a dualidade no seio da unidade.” (BALDISSERA, 2008, p. 41). Podemos
dizer que é importante haver certo nível de planejamento na comunicação organizacional,
uma vez que é necessário informar, instituir-se, persuadir, no sentido de atender às
necessidades de continuidade da organização. No entanto, para além da fala autorizada, a
comunicação organizacional abrange a dispersão, a incerteza, os ruídos, as contradições, o
27 O princípio dialógico, de acordo com Morin, compreende a associação complexa de instâncias necessárias à
existência de um fenômeno organizado. Representa a dualidade na unidade, juntando termos como organização/desorganização, ordem/desordem (BALDISSERA, 2008).
55
impensado, o diálogo, a diversidade, a rebeldia, ou seja, possibilidades relacionais e de
produção de sentido.
Para concluir, propomos a discussão de mais uma tendência que pode interferir em um
discurso organizacional hipnotizado pela ideia de democratização absoluta, muitas vezes,
atrelada à noção que se tem acerca das tecnologias digitais, em geral. Para isso, retomamos a
perspectiva de Primo (2008), que faz a diferenciação entre a interação reativa mediada por
computador e a interação mútua mediada por computador e mostra que nem tudo que é
tecnologia digital implica interação, colaboração, participação. Ele explica que essa ideia
surgiu a partir
[...] da disseminação de uma concepção de que as tecnologias digitais seriam suficientes para a liberdade de expressão, para a construção de uma sociedade mais democrática. Ora, a possibilidade de um internauta publicar uma página no infinito ciberespaço (podendo jamais ser encontrada ou lida no emaranhado de sites já existentes) ou clicar freneticamente por entre links de um interminável hipertexto não sigmifica que ele esteja participando de um diálogo transformador, ou mesmo que suas ações tenham alguma repercussão. (PRIMO, 2008, p. 134).
O autor acrescenta, nessa direção, que não podemos deixar de lado o estudo das
tensões que percorrem o ciberespaço:
Os discursos tentadores de que a facilitada comunicação através da Internet promoverá por si só mais bem-estar, amizade, crescimento intelectual e nos conduzirá, finalmente, a um regime mais democrático escondem deliberadamente toda discórdia e mesmo hostilidade debaixo do tapete. Os slogans cativantes de construção de um mundo “mais humano” a partir de mais comunicação também ignoram que o conflito é próprio do humano e que comunicação não é sinônimo de transmissão inquestionável nem de intercâmbio consensual. (PRIMO, 2008, p. 198).
Sendo assim, entendendo como sentido algo construído a partir de um receptor e suas
escolhas dentro de um universo de significados, ou seja, o significado produzido dentro de um
contexto (PINTO, 2008), pretende-se perceber como os empregados das empresas Cemig e
Unimed-Rio escolhem seu caminho para a construção de sentido a partir de seu repertório, na
busca de significados para a realidade organizacional na qual estão inseridos.
56
4 WEB 2.0 E INTRANETS: A APREENSÃO DO DISCURSO ORGANIZACIONAL POR PARTE DOS EMPREGADOS DE CEMIG E UNIMED-RIO
Neste capítulo, apresentamos o percurso metodológico que nos permitiu chegar ao
objetivo principal desta pesquisa: compreender se há, por parte dos empregados das
organizações Cemig e Unimed-Rio, o reconhecimento do espaço relacional que essas
empresas propõem ao transformarem suas intranets em ambientes desenvolvidos sob a lógica
da Web 2.0, conforme a perspectiva conceitual adotada.
Dessa forma, a investigação considerou como ângulo privilegiado de análise instâncias
de recepção, na tentativa de compreender a apropriação do discurso organizacional. Isso
possibilita a apreensão do movimento comunicacional do processo de interação entre as
organizações e seus interlocutores, assim como seus interesses e posicionamentos, por meio
de seus discursos.
Nesse ponto, fica evidente a abordagem relacional deste estudo, que entende que o
processo comunicativo é uma interação: é analisar o cerne da relação, a força que coloca os
interlocutores produzindo sentido, afetando o outro e o social e sendo afetados mutuamente e
pelo social. Aqui, a comunicação é analisada como lugar de força, que suscita a ação e
permite o imprevisível (FRANÇA, 2006).
O desenvolvimento deste trabalho foi composto, primeiramente, por uma ampla
pesquisa bibliográfica e, em seguida, pela investigação empírica, desenvolvida a partir da
realização de estudo de caso dos processos de reformulação das intranets da Cemig e da
Unimed-Rio. A escolha dessas organizações como objeto empírico justifica-se pelo fato de
terem reformulado suas intranets, com o objetivo de transformá-las em ambientes regidos
pelos princípios da Web 2.0, por meio da implementação de recursos que possibilitassem aos
empregados espaços de colaboração e a descentralização da gestão do conteúdo.
Coincidentemente, as duas empresas inauguraram suas novas versões no primeiro semestre do
ano de 2010 e, atualmente, preparam-se para implementar uma outra versão, com mais
funcionalidades, seguindo o conceito da Web 2.028.
A metodologia do estudo de caso foi adotada de acordo com a perspectiva de Braga
(2007), que a considera um modelo epistemológico bem ajustado à necessidade atual da
comunicação, uma vez que se preocupa com a construção do campo comunicacional pelo
desentranhamento de seu objeto e com a busca de espaço no qual se desenvolvam articulações
28 Essas informações foram obtidas em entrevistas com os gestores da área de comunicação organizacional das
duas empresas e em material das campanhas de divulgação das novas intranets aos empregados.
57
entre realidades específicas e geração teórica. É nesse contexto, portanto, que Braga (2007)
destaca a variedade dinâmica de fenômenos que solicitam uma apreensão de seus aspectos
propriamente comunicacionais, ressaltando que “não dispomos de uma provisão suficiente de
grandes regras básicas próprias ao campo, com formalizações teóricas transversais à
generalidade do objeto, nem suficientemente consensuais, que permitam fazer reduções
preliminares.” (BRAGA, 2007, p. 4).
Nesta pesquisa foram abordadas as fases de documentação, registros em arquivo e
entrevistas, algumas das fontes de dados elencadas por Duarte (2010b) para a coleta de
evidências em um estudo de caso. A documentação envolveu o levantamento de relatórios,
apresentações, memorandos, atas de reuniões, entre outros documentos que registram o
processo de reformulação das intranets investigadas. O acesso a registros em arquivo também
foi fundamental para a formação do corpus da investigação, abordando os materiais
produzidos pelas áreas de comunicação das duas empresas, como campanhas e pesquisas
direcionadas aos empregados, registros de ações de planejamento, resultados obtidos, além de
outras informações relevantes para análise.
Por fim, chegamos às entrevistas, uma das mais importantes fontes de informação para
um estudo de caso, concordando com Duarte (2010a). Na Cemig foram realizadas entrevistas
em profundidade (quatro, no total) com um dos idealizadores da nova intranet, com o gerente
de Comunicação Interna, com a responsável pelo processo de governança da intranet e com o
coordenador da intranet. Na Unimed-Rio foram entrevistados o gerente de Comunicação
Corporativa, que também foi o idealizador da intranet 2.0, e a coordenadora da intranet. Cabe
destacar que todos os profissionais fazem parte da área de comunicação organizacional das
empresas.
Além das entrevistas em profundidade, por meio das quais obteve-se a visão das
organizações, foram conduzidos dois grupos focais – um em cada empresa – compostos por
nove29 empregados30 do corpo operacional de áreas diversas que tinham acesso à intranet. Na
Cemig, as pessoas foram escolhidas considerando-se dois perfis: usuários comuns da intranet e
empregados que, além de usuários, têm a função de proprietários de site, ou seja, são os
responsáveis por gerenciar o site de sua área, postando e editando informações, atualizando
dados, entre outras atividades que serão detalhadas mais a frente. Na Unimed-Rio, a seleção dos
entrevistados foi realizada pela Gerência de Comunicação Corporativa e a maioria das pessoas
29 Foram convidadas 12 pessoas em cada empresa para que conseguíssemos uma participação de 8 a 10
empregados, número considerado ideal para um grupo focal. 30 A Unimed-Rio utiliza o termo “colaboradores”.
58
faz parte do grupo de Correspondentes Internos, empregados que são pontos focais do setor de
comunicação nas demais áreas da empresa.
Houve a preocupação de não selecionar representantes do corpo gerencial para os
grupos, já que o objetivo do grupo focal, especificamente, era considerar as percepções dos
empregados acerca das intranets e não o ponto de vista das organizações.
A mediação do grupo focal contou com um roteiro de perguntas (APÊNDICE A),
utilizado apenas como referência, subdividido em cinco momentos: Aquecimento; Intranet:
relacionamento, cotidiano e significação; Intranet como espaço de interação; Mudanças da
intranet; Finalização. Na segunda parte da dinâmica, com o objetivo de incentivar as
discussões, aplicou-se a técnica projetiva de colagem, em que os participantes responderam,
por meio de figuras, o que a intranet significava para eles. Cada um explicou o motivo da
figura colada e os demais puderam comentar, realizando o que é caracterizado como
desdobramento coletivo. Todo o áudio das discussões foi gravado, com a permissão dos
participantes, totalizando um arquivo com duração de 01h56min21s e outro com
01h38min58s. Para analisar todo o material coletado, utilizamos a proposta teórico-
metodológica de Fairclough (2001) de análise crítica do discurso (ACD).
Ainda para a formação do corpus, analisou-se o conteúdo das intranets da Cemig e da
Unimed-Rio, identificando suas principais características e destacando o que é considerado
pelas organizações como recursos da Web 2.0.
4.1 CemigNet e Interface: a caracterização do objeto
Procedendo ao trabalho de análise empírica, contextualizamos o fenômeno em estudo,
apresentando as organizações investigadas – Cemig e Unimed-Rio –, assim como as
condições de criação das intranets 2.0 das duas empresas. Essa fase é embasada por dados
secundários e pelas informações obtidas durante as entrevistas em profundidade e nas fases de
documentação e registros em arquivo, citadas anteriormente. Realizamos também um trabalho
de caracterização descritiva, construindo o perfil das intranets, para possibilitar uma
aproximação maior do fenômeno. As informações partiram da análise de conteúdo das
intranets, das entrevistas em profundidade e também de alguns registros em arquivo.
59
4.1.1 Cemig, CemigNet e Web 2.0: o contexto de reformulação da intranet
A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), um dos mais sólidos e importantes
grupos do segmento de energia elétrica do Brasil (COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS
GERAIS, 2012b), possui mais de 8 mil empregados, sendo que todos têm acesso à CemigNet
– intranet da empresa –, conforme afirma o gerente de Comunicação Interna31. A Cemig é
uma organização de capital aberto, controlada pelo Governo do Estado de Minas Gerais, com
114 mil acionistas em 44 países. Suas ações são negociadas nas Bolsas de Valores de São
Paulo, Nova York e Madri (COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012b).
Com participações em 114 sociedades, 15 consórcios e um fundo de participação, a
Companhia atua em 22 estados brasileiros e no Distrito Federal, além do Chile, e ocupa a
posição de maior grupo do setor de energia elétrica em valor de mercado na América Latina,
ainda de acordo com seu website. É a maior empresa integrada do setor de energia elétrica do
País, sendo o maior grupo distribuidor, responsável por aproximadamente 12% do mercado
nacional. É ainda o terceiro maior grupo transmissor, com 10.060 km de linha, e o terceiro
maior grupo gerador, com um parque formado por 65 usinas hidrelétricas, térmicas e eólicas,
e capacidade instalada de 6.964 GW. Em Minas Gerais, responde por 96% da área de
concessão, com mais de 7 milhões de consumidores, em 774 municípios. A Empresa também
investe em outras fontes renováveis, como energia solar e eólica, biomassa, pequenas centrais
hidrelétricas e projetos de cogeração (COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS,
2012b).
Segundo o gerente de Comunicação Interna32, tanto na percepção da organização
quanto dos empregados, atualmente a intranet é o principal veículo de comunicação interna,
por ter a tecnologia, o alcance e a agilidade na divulgação de informações como
características principais. A CemigNet foi criada em 1998 e depois reformulada pela primeira
vez em 2005, como conta o idealizador da intranet 2.033. Ele afirma que a versão de 2005
tratava-se de um site estático, que não possuía uma ferramenta de gerenciamento de conteúdo,
fato que tornava muito difícil o processo de atualização e gestão das informações. A área de
comunicação dependia do setor de tecnologia da informação para publicar qualquer conteúdo
no ambiente web, causando lentidão nas atividades. Além disso, a intranet não era um veículo
de comunicação atrativo para os empregados e havia a necessidade de contratar empresas
31 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 32 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 33 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
60
especializadas para o desenvolvimento de novos sites, o que representava custos e prazos
altos.
Ainda de acordo com o idealizador da intranet 2.034, após certo tempo, a CemigNet
havia crescido desordenadamente e apresentava informações redundantes e desatualizadas. A
tecnologia tornara-se ultrapassada e a falta de credibilidade na integridade das informações
por parte dos empregados era notável, assim como a despadronização do conteúdo. A partir
desse contexto, a Cemig decidiu reformular a CemigNet, “criando um novo ambiente web
fortemente vinculado aos objetivos estratégicos da empresa, garantindo um canal de
comunicação eficiente e um instrumento de gestão do conhecimento e colaboração.”
(Idealizador da CemigNet 2.0)35. O idealizador destaca que aquela situação não combinava
com o perfil da organização, que foi a primeira concessionária do setor elétrico a criar um site
na internet e a primeira empresa brasileira a registrar um domínio “.com”, em 17 de agosto de
199536.
Assim, o processo de reformulação da CemigNet iniciou no ano de 2007 e o principal
objetivo da área de comunicação foi desenvolver uma intranet seguindo os princípios da Web
2.0 de colaboração, interação e descentralização da gestão de conteúdo para os outros setores
da Cemig, além da Comunicação. Além disso, a equipe responsável pela implementação
definiu como características da intranet 2.0 a evolução tecnológica, a padronização do leiaute
e do conteúdo, a facilidade de atualização e a agilidade na gestão das informações. O
idealizador da CemigNet 2.0 explica37 o porquê da escolha pela segunda geração de redes
digitais:
A CemigNet era estática, com uma gestão centralizada na Comunicação, e a nossa intenção era possibilitar aos empregados uma colaboração maior, o que representa o próprio conceito da Web 2.0. Além disso, a Web 2.0 é uma tendência, a exemplo das redes sociais, que comprovam isso. Se no ambiente externo isso já acontece, por que não nas corporações? (Idealizador da CemigNet 2.0)38.
Do ano de 2007 a março de 2010, quando a CemigNet 2.0 foi lançada, realizaram-se
várias atividades, que receberam o nome de Projeto Cemig 2.039 , conforme conta o
34
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 35
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 36 Informação divulgada no portal UOL. A fonte da matéria foi Demi Getschko, integrante do Comitê Gestor da
Internet Brasileira, órgão responsável pelo registro dos domínios de internet. 37 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 38
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 39 O Projeto Cemig 2.0 contemplou a reformulação da intranet e do portal externo da Cemig na internet. No
entanto, o foco deste trabalho é a reformulação da intranet.
61
idealizador da nova intranet40. Inicialmente, com o objetivo de definir o perfil do portal, a
equipe visitou grandes empresas que haviam implementado novas intranets e realizou
entrevistas com empregados de diversos níveis hierárquicos e áreas da Cemig, para identificar
as necessidades de cada um em relação ao ambiente web. As principais funcionalidades
requeridas foram o gerenciamento de conteúdo, ferramentas que possibilitassem a
colaboração entre os empregados, como blogs, chats, enquetes e fóruns, a personalização das
informações, além de recursos multimídia, como álbum de fotos, vídeos e áudios. A partir
disso, elaborou-se o edital de licitação para contratar a empresa responsável pela
implementação do novo portal.
Segundo o idealizador da CemigNet41, houve a preocupação de envolver toda a
organização na fase de desenvolvimento da intranet, tendo em vista a complexidade e a
importância do processo. Ele destaca que cerca de 300 empregados foram selecionados para
se tornar proprietários de site, sendo capacitados para trabalhar o conteúdo de suas unidades.
Os proprietários de site têm autonomia para elaborar e publicar as informações relacionadas a
sua área na intranet. Eles são a referência para o conteúdo que os setores pretendem divulgar,
no site específico da unidade ou em sites corporativos, para toda a Empresa. O idealizador
ressalta que a Cemig ministrou cursos específicos para os proprietários, que foram treinados
em gerenciamento de conteúdo, redação para web, arquitetura da informação e administração
da intranet. Hoje, cada site conta com dois proprietários, em média.
Como a nova versão da CemigNet dá autonomia a outras unidades da empresa para
criar e publicar conteúdo, a Superintendência de Comunicação Empresarial da Cemig criou a
área de Governaça de Web, reponsável pela gestão do ambiente. De acordo com o idealizador
da CemigNet 42, cabe a essa área monitorar toda a intranet, a partir de regras que orientem sua
utilização adequada. A equipe de governança realiza uma ronda semestral, para garantir a
manutenção da identidade visual e evitar conteúdos inadequados, e uma ronda trimestral, para
identificar sites em branco ou com informações desatualizadas ou inexpressivas. Além disso,
a Governança é responsável por orientar os proprietários de sites na atualização do portal,
promover treinamentos e sempre priorizar a evolução tecnológica da CemigNet.
40 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 41 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 42
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
62
4.1.1.1 Conhecendo a CemigNet
Uma característica marcante da versão 2.0 da CemigNet, segundo a responsável pelo
processo de governança da intranet43, é a gestão descentralizada do conteúdo, o que é
evidenciado pelos sites de unidades administrativas e sites corporativos. Para a definição da
estrutura do portal, procurou-se atender os direcionamentos de navegação identificados nas
entrevistas com os empregados, que apontaram para a necessidade de organizar a intranet
priorizando-se seus processos de negócios, sem deixar de considerar, no entanto, a estrutura
hierárquica da empresa.
Os sites de unidade administrativa são espaços direcionados para gerências,
superintendências e diretorias. A coordenadora da Governança explica44 que são sites de
trabalho e devem conter informações que interessam apenas às pessoas daquela unidade
especificamente, que irão utilizar esse conteúdo em seu dia a dia. Eles estão localizados no
menu lateral laranja, à esquerda das páginas, e só aparecem para as pessoas que fazem parte
do setor. A criação das páginas e a publicação do conteúdo ficam sob a responsabilidade dos
proprietários de site, que cuidam de todas as informações restritas às suas áreas.
Os sites corporativos, por sua vez, são estruturados por negócios e processos e
abrangem informações de interesse de toda a empresa. A coordenadora da Governança
destaca45 que, mesmo sendo áreas de conteúdo institucional e comum a toda organização, os
sites corporativos também são mantidos por proprietários de site de várias áreas e não apenas
da Comunicação. Eles estão representados pelos menus de cor verde, localizados na parte
superior e na lateral esquerda das páginas.
43 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012. 44
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012. 45
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012.
63
Figura 1 – Página principal da CemigNet
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012a
64
Figura 2 – Site de unidade administrativa
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012a
65
Figura 3 – Site corporativo
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012a
66
A coordenadora da Governança explica46 que os proprietários de site têm total
liberdade para a criação das páginas e seus respectivos conteúdos, tanto nos sites de unidade
administrativa quanto nos corporativos. Eles têm à disposição os mesmos recursos que a área
de comunicação possui para construir suas páginas. No entanto, há normas que devem ser
seguidas e o cumprimento delas é observado nas auditorias que são realizadas
frequentemente. A Governança tem o poder de bloquear aqueles sites que não seguem as
regras. De acordo com a coordenadora, atualmente há 500 sites na intranet, sendo que, desses,
apenas 38 são atualizados constantemente. Ela afirma que, de maneira geral, os sites de
unidades administrativas são pouco atualizados. Há também muitos casos de sites que foram
criados e abandonados logo depois ou sites que nunca tiveram conteúdo algum. Atualmente, a
CemigNet conta com cerca de 800 proprietários, considerando a existência de duas pessoas
responsáveis pelo mesmo site.
A página principal, cuja responsabilidade é da Comunicação Interna, possui onze
espaços para publicação de notícias (“Notícias” e “Destaques”), que são atualizadas
diariamente. As matérias, além do texto, podem contar com imagens, vídeos ou áudios,
trabalhados de forma complementar. Aquelas de maior destaque são publicadas com imagens,
na seção randômica de “Notícias”. De acordo com o coordenador da intranet47, as notícias
mais acessadas são relacionadas a assuntos sobre recursos humanos, seguidas por temas
ligados a produtos e serviços. O espaço “TV Cemig” também é dedicado à divulgação de
matérias, produzidas em formato de vídeo. O conteúdo é feito pela equipe de TV própria da
Cemig e pensado para os empregados. As matérias duram, em média, dois minutos e são
atualizadas semanalmente. Além das seções jornalísticas, a página principal da CemigNet
contempla as seguintes áreas:
a) Comunicados – divulgam informações não jornalísticas para públicos segmentados,
com informações sobre serviços importantes para as atividades dos empregados. Os
comunicados mais recentes ganham destaque na página inicial e podem ser
classificados por cor, de acordo com a prioridade. Todos os avisos já divulgados ficam
armazenados e podem ser consultados a qualquer momento.
b) Álbuns de fotos – nessa seção são publicadas fotos de eventos realizados ou
patrocinados pela Cemig ou fotos institucionais relacionadas ao negócio da empresa.
46 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012. 47 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
67
c) Reconhecimento – nesse espaço são divulgados os prêmios recebidos pela
organização.
d) Meteorologia – serviço que informa a previsão do tempo para o dia presente e para os
quatro seguintes, de todos os municípios do Estado. Essa seção é mantida pela área de
hidrometeorologia da Cemig.
e) Outros destaques – espaço para publicação de conteúdos que a Comunicação
considera como assuntos de destaque no momento. Há links para outros veículos de
comunicação interna, blogs, serviço de clipping, acesso para a intranet antiga,
manuais, calendários, documentos, entre outras informações.
f) Grupo Cemig – nessa área destacam-se as principais empresas do grupo, com link
para o website de cada uma delas.
g) Cabeçalho – localizado no topo de todas as páginas do portal, é utilizado como espaço
para divulgação de campanhas internas, eventos de grande porte e pesquisas. Além
disso, o cabeçalho possui uma programação anual de peças digitais, cujo tema são os
negócios da organização.
68
Figura 4 – Página principal da CemigNet: continuação
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012a
Os espaços de colaboração da CemigNet, conforme explica a coordenadora da
Governança48, são representados por blogs e fóruns. Ela destaca que a criação de blogs ainda
não pode ser realizada pelos proprietários de site, de maneira que eles devem pedir
autorização à Comunicação, caso queiram utilizar o recurso em sites pelos quais são
responsáveis. Nesse caso, a área de Governaça de Web analisa a relevância e o alcance do
blog, antes de criá-lo. Atualmente, existem três blogs na CemigNet:
a) Cemig na Mídia – destaca as notícias divulgadas sobre a Cemig na imprensa,
ressaltando a presença positiva ou negativa da empresa, em veículos de abrangência
regional e nacional. De acordo com o coordenador da intranet49, o blog não é muito
acessado e as atualizações deixaram de ser constantes.
48 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012. 49 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
69
b) Cemig 2.0 – foi criado com o objetivo de dar apoio aos proprietários de site na
produção de conteúdo para suas páginas, por meio da divulgação de recursos
disponíves, dicas de leiaute, entre outros assuntos.
c) Diálogo – espaço criado pelo Comitê de Negociação Sindical da Cemig, com o
objetivo de divulgar para os empregados informações relacionadas às negociações do
Acordo Coletivo de Trabalho. O blog existe há dois anos e é publicado pontualmente,
de novembro a janeiro, durante o período das negociações entre a Cemig e os
representantes sindicais. Destaca-se que a Comunicação atua apenas dando apoio na
formatação das informações.
No caso dos fóruns, os proprietários têm autonomia para criá-los nos sites de unidade
administrativa, o que não é possível acontecer nos sites corporativos. Neste caso, é necessário
solicitar a criação para a área de Governança de Web, assim como acontece com os blogs.
Existe hoje na CemigNet apenas um fórum corporativo, ou seja, que é comum a todos os
empregados: o “Fórum Cemig 2.0”, um espaço de discussão criado para que os proprietários
de site tirem suas dúvidas sobre a utilização do SharePoint. Este é o nome da ferramenta de
portal implantada na Cemig, ou seja, é o sistema que está por trás da intranet, conforme
explica a coordenadora.
Ainda segundo ela, a utilização de blogs e fóruns na CemigNet acontece de forma
muito tímida. A causa disso pode ser atribuída à falta de estímulo para o uso daqueles
recursos. “Por problemas técnicos não previstos, não foi possível estimular o uso de blogs e
fóruns na primeira versão 2.0 da CemigNet. Como é que estimulamos essa utilização, se não
podemos liberá-la?” (Coordenadora de Governança de Web da Cemig)50. Ela reconhece que
esses espaços colaborativos, se bem explorados, podem dar certo na organização, a exemplo
da experiência com o blog “Diálogo”, que sempre atinge o recorde de visitas e comentários.
Em 2011, primeiro ano do blog, registraram-se 432 mil acessos nos meses de novembro e
dezembro. Para o coordenador da intranet51, essa alta adesão é uma indicação de que “os
empregados querem se manifestar, querem falar, querem que a empresa se posicione
mesmo.”.
50 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012. 51
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
70
Figura 5 – Blog Diálogo
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012a
71
Figura 6 – Site de Governança de Web: blogs e fórum
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2012a
A CemigNet contempla ainda sites de serviços, links para aplicativos e formulários,
sistema de busca por cargos e pessoas, sistema de ponto on-line e sites de apoio, com
destaque para o “RH Fácil”, que contém todas as informações relacionadas à vida do
empregado na organização. Há também links para o portal da Cemig na internet, para o e-mail
corporativo e acesso para sites de outras instituições de interesse do empregado. É importante
ressaltar que a CemigNet possui uma quantidade significativa de conteúdo, o que nos levou a
destacar nesta pesquisa as áreas da página principal mais citadas durante as entrevistas em
profundidade, além dos espaços que a caracterizam como uma intranet 2.0, de acordo com os
72
entrevistados. Conforme afirma a coordenadora da Governança52, cerca de 8 mil empregados
acessam a CemigNet diariamente, sendo que os sites mais visitados no mês de novembro
foram “Área de Notícias53”, blog “Diálogo” e “Biblioteca”54, nessa ordem.
4.1.2 O processo de reformulação da “Interface” no contexto de midiatização da Unimed-Rio
A intranet Interface é considerada o principal veículo de comunicação interna da
Unimed-Rio, onde 98% dos empregados têm acesso ao ambiente web, conforme afirma o
gerente de Comunicação Corporativa da organização55. A Unimed-Rio é uma cooperativa de
médicos que existe há 40 anos e possui cerca de 850 mil clientes, o que a faz líder do mercado
de planos de saúde da cidade do Rio de Janeiro. A empresa conta com mais de 5 mil médicos
cooperados, em quase 50 especialidades, e 2,6 mil empregados (UNIMED-RIO, 2012b). O
website da organização destaca que ela é a maior cooperativa do Sistema Unimed em termos
de faturamento e que, nos últimos anos, recebeu alguns dos principais reconhecimentos do
país por sua gestão econômico-financeira, além de estar presente nas listas de melhores
empresas para se trabalhar em todo o Brasil (UNIMED-RIO, 2012b).
De acordo com o gerente de Comunicação Corporativa56, o processo de transformação
da Interface em uma intranet 2.0 teve início quando a Unimed-Rio percebeu que era o
momento de a Comunicação Interna contribuir para promover a encontrabilidade entre as
pessoas, por meio da organização do conteúdo e da gestão da informação. Para isso, a intranet
foi o meio escolhido, uma vez que havia conseguido se firmar como o canal oficial de acesso
à informação, tornando-se o principal veículo de comunicação interna da empresa. Nesse
contexto, o objetivo da Unimed-Rio era conseguir aproveitar essa aceitação dos empregados,
para evoluir, em termos de comunicação, no quesito relacionamento.
A primeira versão da Interface foi implementada no ano de 2005 e seu perfil
assemelhava-se ao de uma revista eletrônica, de caráter puramente informativo e jornalístico.
O gerente conta57 que o modelo, que era inovador para a época, tornou-se um problema quatro
anos depois, quando a intranet havia transformado-se em um repositório de informações.
Assim, em janeiro de 2009, a área de comunicação, em parceria com o setor de tecnologia da 52 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 19 nov. 2012. 53 Site em que é possível acessar todas as notícias divulgadas na CemigNet. Elas são classificadas por editorias. 54 Site da Biblioteca da Cemig, onde os empregados podem solicitar reservas de livros e outros periódicos. 55 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 56 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 57 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
73
informação, inicia o planejamento da nova intranet, uma vez que a atual já não atendia mais
as necessidades da organização.
O gerente de Comunicação Corporativa explica58 que a equipe responsável pelo
desenvolvimento da Interface 2.0 escolheu como modelo intranets de grandes empresas que
são referência, como Google, Vivo, Volvo, McDonald’s, entre outras, e realizou estudos
aprofundados em usabilidade e arquitetura da informação, com o objetivo de criar uma
intranet pensada a partir da visão de seus usuários. Para isso, empregados de diversas áreas
foram envolvidos na etapa de estruturação e ordenação do conteúdo. A nova intranet,
conforme afirma o gerente59, foi desenvolvida de acordo com a lógica da Web 2.0, com foco
em colaboração, de maneira que as áreas recebem um canal exclusivo para que elas mesmas
postem seus conteúdos; blogs e fóruns surgem como novos recursos; e empregados podem
comentar as matérias. Segundo ele, a escolha pela Web 2.0 justifica-se pelo fato de que a
organização tem de acompanhar os fenômenos que acontecem na sociedade e a lógica da
segunda geração de redes digitais já faz parte do cotidiano das pessoas:
Os sites de maior sucesso, hoje, são baseados nessa lógica, que já faz parte do cotidiano das pessoas. Os negócios, cada vez mais, estão criando versões que contemplem esse tipo de coisa. Nenhum de vocês não fez nenhuma reclamação de alguma empresa via Twitter ou Facebook, até hoje? A forma de comunicação mudou. Você hoje não tem mais paciência para ler 4 parágrafos de texto, porque você está acostumado a ler 140 caracteres. Você quer essa informação rápida, porque você não tem mais tempo. Então é uma revolução que mudou a nossa forma de comunicação. A gente não pode mais atuar dessa forma, achando que vai ter os resultados de antigamente. Você não vai. Então, a gente tem que caminhar junto, a empresa tem que amadurecer, tem que aceitar essa realidade, tem que se adequar a ela. (Gerente de Comunicação Corporativa da Unimed-Rio)60.
A Interface 2.0 foi concebida com a premissa de estabelecer uma relação de confiança
entre usuário e site, sendo que toda a informação publicada pelo empregado na intranet vai ao
ar imediatamente, sem passar por qualquer moderação. O gerente afirma61 que, ao mesmo
tempo, as postagens são identificadas pelo nome da pessoas.
Ainda de acordo com o gerente62, empregados de todas as áreas foram treinados para
aprender a trabalhar com os novos recursos da Interface. Hoje eles são os responsáveis pela
publicação de conteúdo de sua área e, na época de implementação da intranet 2.0, atuaram
58 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 59 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 60 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 61
Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 62
Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
74
como multiplicadores do ambiente virtual. A Interface 2.0 foi lançada em abril de 2010 e
recebeu alguns prêmios, como o Intranet Portal 2010 e o Aberje Rio 2011.
4.1.2.1 Perfil da Interface 2.0: principais espaços e recursos
A página principal da Interface versão 2.0, implementada em abril de 2010, contempla
a publicação de seis notícias no total, com imagem, sendo que duas delas recebem um
destaque maior, em banners localizados no alto da página. De acordo com a coordenadora da
intranet da Unimed-Rio63, todas as matérias podem ser comentadas pelos empregados, sem
haver mediação, de maneira que a área de comunicação interfere apenas quando há algum
comentário que vá contra às regras de conduta da organização. As postagens são identificadas
pelo nome das pessoas. Em seguida, também no miolo da home64, encontra-se a área “Últimos
Vídeos”, em que são publicados, principalmente, vídeos de campanhas institucionais e
entrevistas. Há três em destaque para visualização na própria página principal.
63 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 64 Página principal de um site.
75
Figura 7– Página principal da Interface
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
76
Figura 8 – Página de notícias com comentários
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
Na sequência, há a “Agenda Corporativa”, na qual o calendário do mês informa os
principais eventos, e, ao lado, o espaço de destaque dos blogs intitulados “Para viver melhor”,
77
da área de Gestão da Saúde Médica, “Verticalizando”, do setor de Empreendimentos,
“Terceiro Andar”, da Gerência de Comunicação Corporativa, “Reaja!”, que é resultado de um
programa sobre consumo consciente, e “ANS em foco”, do setor atuarial. Segundo o
coordenador da intranet65, qualquer área tem direito a ter um blog, solicitando a criação do
site à Comunicação, que tem a responsabilidade de avaliar a pertinência da solicitação e
aprová-la. A participação nos blogs é considerada baixa pelo gerente de Comunicação
Corporativa66, que revela que os espaços de colaboração da Interface dão certo apenas quando
o assunto não é institucional, ou seja, quando não é diretamente relacionado ao negócio da
empresa.
Figura 9 – Página principal da Interface: Agenda Corporativa e destaque de blogs
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
Conforme explica a coordenadora da Interface67, a seção “Últimos Tweets68”, criada
como referência ao Twitter, foi implementada para proporcionar às áreas espaços onde elas
mesmas pudessem publicar suas informações para toda a organização. Nela ficam destacadas
as mensagens (tweets) recém-postadas nas páginas das áreas. Os tweets podem ser criados por
pessoas autorizadas em cada setor, que divulgam textos de até 140 caracteres sobre assuntos
65 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 66 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 67 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 68 Nome dado às mensagens que são publicadas no Twitter. O site de rede social na internet permite a postagem
de textos de até 140 caracteres.
78
específicos das gerências. O espaço é rotativo, de maneira que, à medida que novas
mensagens são publicadas, as últimas saem do destaque da home.
Figura 10 – Página principal da Interface: “Últimos Tweets”
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
Além dos blogs e dos comentários das notícias, o gerente de Comunicação
Corporativa afirma69 que a Interface conta com outros espaços de colaboração, como a
enquete de destaque e a área “Últimos Classificados”, que sempre registra um grande número
de acessos. Ela foi criada com o objetivo de permitir a venda de produtos na organização, que
percebeu que isso era algo inevitável. Qualquer empregado tem permisão para publicar seu
produto na página “Classificados” e os recém-criados vão sendo destacados na home, em
“Últimos Classificados”. A seção “Recentemente publicado”, por sua vez, segue a mesma
lógica da “Últimos Tweets”, dando destaque aos últimos arquivos colocados na página das
áreas por empregados que têm permissão para essa atividade.
69 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
79
Figura 11 – Página principal da Interface: últimas seções
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
Os menus da Interface são organizados em “Canais” e “Áreas”. As áreas, identificadas
pela cor laranja, estão localizadas na parte lateral esquerda das páginas e correspondem aos
processos da Unimed-Rio (Administrativas, Comerciais, Comunicação e Marketing,
Controller, Financeiras, Intercâmbio, Jurídicas, Recursos Humanos, Médicas, Planejamento e
Processos, Relacionamento com Clientes, TI), sob os quais estão suas respectivas gerências e
subáreas. O gerente de Comunicação Corporativa destaca70 que, após a implementação da
Interface 2.0, cada gerência e subárea passou a ter a sua página, mudança empreendida com o
objetivo de descentralizar a gestão do conteúdo para outros setores da empresa, além da
Comunicação. Na página, o empregado autorizado pode atuar por meio da publicação de
tweets, sobre os quais falamos anteriormente, para a divulgação de informações sobre seu
setor, e por meio da publicação de arquivos, como documentos e projetos. Além disso, há um
70 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
80
texto inicial de apresentação, que é atualizado pela Comunicação, a partir de informações
repassadas pelas áreas. Os últimos tweets e arquivos publicados de todos os setores aparecem
na home, de maneira rotativa, nos espaços já apresentados aqui. Todos os empregados têm
acesso a essas páginas.
Figura 12 – Página de área
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
81
Figura 13 – Página de área: publicação de arquivos
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
Os canais, identificados pelas cores verde e azul, ficam na parte superior das páginas e
referem-se aos sites de conteúdo institucional, atualizados por diversos setores, a saber:
“Colaborador”, da área de Recursos Humanos, “Verticalização”, cuja responsabilidade é da
Comunicação, “Gestor”, que é um site restrito para os gestores da Unimed-Rio, “Espaço
82
Saúde” e “Sustentabilidade”, das áreas de mesmo nome. A coordenadora da intranet explica71
que o site “Colaborador” é um dos mais acessados, por abranger três seções importantes: o
“Portal do Colaborador”, que contempla todas as informações de interesse do empregado,
como contracheque, marcação de férias, dentre outras; o site de gestão de desempenho e o
sistema para agendamento do Shiatsu, um serviço de massagem oferecido aos empregados.
Os links para os blogs e fóruns da Interface também integram os canais. Destacamos que a
participação nesses espaços não é significativa, conforme ressalta o gerente de Comunicação
Corporativa72.
Figura 14 – Fórum
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
71 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 72
Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
83
Outro espaço de colaboração, segundo o coordenador da Interface73, é o fórum
“Classificado Solidário”, onde qualquer empregado pode publicar pedidos de doações e outras
iniciativas solidárias ou participar dos tópicos abertos por outras pessoas.
Figura 15 – Fórum “Classificado Solidário”
Fonte: UNIMED-RIO, 2012a
A Interface contempla ainda, na parte lateral esquerda, o destaque “Últimas”, onde são
divulgadas notas informativas, a seção “Clipping”, em que é possível acessar matérias
divulgadas nos veículos de comunicação relacionadas à Unimed-Rio, e a área “Metas 2012”,
que informa dados institucionais, como número de clientes e faturamento da empresa. Há
também links para o e-mail corporativo e para a página de aniversariantes do dia, que tem um
número significativo de visualizações, conforme afirma a coordenadora da Interface74. Ela
também destaca que a média mensal de acessos à intranet é de 42 mil visitantes e que as áreas
mais requisitadas são “Notícias”, “Classificados” e “Colaborador”, nesta ordem.
73 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 74 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
84
4.2 Procedimentos metodológicos
Os procedimentos para análise do corpus foram definidos tendo como referência o
paradigma relacional, segundo o qual a comunicação é vista globalmente, como um processo
em que interlocutores em interação produzem e compartilham sentidos, em um dado contexto
sócio-histórico. Nessa perspectiva, esta pesquisa abandona a visão unilateral e parcial da
comunicação, que considera apenas os resultados das estratégias mercadológicas e
institucionais das empresas e não leva em conta as percepções dos demais interlocutores
envolvidos.
O estudo objetiva apreender o movimento comunicacional na perspectiva interacional,
a partir da análise das práticas discursivas. Nesse sentido, buscou-se um percurso
metodológico de abordagem crítica e contextualizada, que permitisse compreender a
comunicação por meio dos interlocutores organizacionais, “[...] não para medir a eficiência
das mensagens da organização pesquisada, mas para compreender como significa a ação
organizacional em suas vidas e como elabora discursivamente seus posicionamentos frente a
ela.” (OLIVEIRA; LIMA; MONTEIRO, 2011b, p. 3).
Assim, para compreender se há, por parte dos empregados das organizações Cemig e
Unimed-Rio, o reconhecimento do espaço relacional que essas empresas propõem por meio
de suas intranets 2.075 , encontramos na análise crítica de discurso (ACD), segundo a
abordagem sugerida por Fairclough (2001), uma proposta teórico-metodológica coerente com o
propósito desta investigação. Portanto, a partir de categorias que possibilitassem encontrar a
relação dialética proposta pelo autor, analisamos os discursos dos empregados e também das
organizações acerca das intranets. “Assim, buscou-se perceber como os interlocutores usam o
discurso para elaborar sua identidade, sua relação com o outro e sua realidade social, de forma
ampliada.” (OLIVEIRA; LIMA; MONTEIRO, 2011a, p. 7).
Fairclough (2001) sugere uma teoria social do discurso e adota uma perspectiva
tridimensional, segundo a qual todo evento discursivo, ou seja, todo exemplo de discurso é
considerado simultaneamente como um texto, uma prática discursiva e uma prática social. Sua
principal preocupação é estabelecer conexões entre os modos de organização e interpretação
social, atentando-se para a forma como os textos são produzidos, distribuídos e consumidos e
para a natureza da prática social em termos de sua relação com as estruturas e as lutas sociais.
A partir desse entendimento,
75 Utilizamos o termo “intranet 2.0” reproduzindo o discurso das organizações.
85
A análise de um discurso particular como exemplo de prática discursiva focaliza os processos de produção, distribuição e consumo textual. Todos esses processos são sociais e exigem referência aos ambientes econômicos, políticos e institucionais particulares nos quais o discurso é gerado. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 99).
Torna-se importante destacar que, ao usar o termo “discurso”, Fairclough (2001)
propõe o uso de linguagem como forma de prática social e não como uma prática unicamente
individual ou reflexo de variáveis situacionais. “O discurso contribui para a constituição de
todas as dimensões da estrutura social que, direta ou indiretamente, o moldam e o restringem:
suas próprias normas e convenções, como também relações, identidades e instituições que lhe
são subjacentes.” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 91). Nesse sentido, o autor destaca que o
discurso, além de ser uma prática de representação do mundo, é também uma prática de
significação do mundo, “[...] constituindo e construindo o mundo em significado.”
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 91).
Conforme explicita o autor, a dimensão do texto é relacionada à análise linguística de
textos76. A dimensão da prática discursiva, por sua vez, é a própria interação e diz respeito à
natureza dos processos de produção e interpretação textual. Por fim, a dimensão da prática
social cuida de questões ligadas à análise social, como as circunstâncias institucionais e
organizacionais do evento discursivo e de que maneira elas dão forma à natureza da prática
discursiva. Nessa direção, a abordagem de Fairclough (2001, p. 27) “[...] permite avaliar as
relações entre mudança discursiva e social e relacionar sistematicamente propriedades
detalhadas de textos às propriedades sociais de eventos discursivos como instâncias de prática
social.”.
Sendo assim, a metodologia proposta pelo autor revela-se aderente à pesquisa, que
parte do princípio de que a comunicação é um “[...] processo de construção e disputa de
sentidos.” (BALDISSERA, 2008, p. 33). É na tensão existente na relação comunicativa – ou
na prática discursiva –, entre a organização e seus interlocutores, em um contexto específico,
que os sentidos são disputados e construídos, apropriados e internalizados de maneiras
diferentes pelos sujeitos em relação.
Buscou-se, portanto, relacionar a prática discursiva e os processos de construção de sentidos à prática social, entendendo que é este o movimento da comunicação, que se materializa em discursos que emergem como expressão de uma relação e de uma realidade social. Compreender essa dinâmica de afetação do social no discurso e do discurso no social é tarefa do pesquisador de comunicação. (OLIVEIRA; LIMA; MONTEIRO, 2011b, p. 6).
76 O autor utiliza a palavra “texto” para se referir a qualquer produto escrito ou falado. Sua ênfase é sobre a
linguagem.
86
[...] é no discurso que os pesquisadores podem buscar apreender o movimento da comunicação, a partir do posicionamento adotado pelos interlocutores e das marcas sociais e culturais que engendram seus atos de fala – já que as práticas discursivas implicam necessariamente em escolhas e seleções, feitas em determinados contextos de interação. (OLIVEIRA; LIMA; MONTEIRO, 2011b, p. 7).
Por uma escolha metodológica, nesta investigação as análises serão orientadas para os
sentidos produzidos na interação, ou seja, o foco será nas dimensões da prática discursiva e da
prática social. Não será considerada, portanto, a análise das formas linguísticas que integra a
análise textual sugerida, embora, segundo Fairclough (2001, p. 102), “[...] ao analisar textos
sempre se examinam simultaneamente questões de forma e questões de significado.”. As
formas linguísticas, como explica o autor, tratam-se do vocabulário (palavras consideradas
individualmente), da gramática (combinação das palavras em frases e orações), da coesão
(ligações entre frases e orações) e da estrutura textual (propriedades organizacionais dos
textos).
Nessa direção, a prática discursiva é uma forma particular da prática social e, em sua
concepção, “[...] um texto só faz sentido para alguém que nele vê sentido [...]”.
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 113). Destaca-se que essa também é a perspectiva da visão
relacional da comunicação, que tem como foco a produção de sentido em seus processos. Na
prática discursiva interessam as dimensões sociocognitivas do processo de produção e
interpretação textual, ou seja os recursos que os participantes do discurso têm interiorizados e
que, de forma inconsciente e automática, levam para o processamento textual, o que
determina sua eficácia ideológica. Assim,
Os processos de produção e interpretação são socialmente restringidos num sentido duplo. Primeiro, pelos recursos disponíveis dos membros, que são estruturas sociais efetivamente interiorizadas, normas e convenções, como também ordens de discurso e convenções para a produção, a distribuição e o consumo de textos do tipo já referido e que foram constituídos mediante a prática e a luta social passada. Segundo, pela natureza específica da prática social da qual fazem parte, que determina os elementos dos recursos dos membros a que se recorre e como [...] a eles se recorre. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 109).
A prática social, por sua vez, corresponde à dimensão mais ampla, que abrange os
aspectos econômicos, políticos e institucionais nos quais o discurso é gerado. Nela,
Fairclough (2001) discute o conceito de discurso em relação à ideologia e ao poder e situa o
discurso em uma concepção de poder como hegemonia. Primeiramente, o autor entende que
as ideologias são significações da realidade, que são construídas em várias dimensões dos
sentidos das práticas discursivas, contribuindo para a produção, a reprodução ou para a
87
transformação das relações de dominação. Nesse contexto, os sentidos são produzidos nos
processos de interpretação dos textos, que estão sujeitos a diversas interpretações com níveis
diferentes de importância ideológica. Acrescenta-se a isso o fato de que os processos
ideológicos são processos entre as pessoas e que
Não se deve pressupor que as pessoas têm consciência das dimensões ideológicas de sua própria prática. As ideologias construídas nas convenções podem ser mais ou menos naturalizadas e automatizadas, e as pessoas podem achar difícil compreender que suas práticas normais poderiam ter investimentos ideológicos específicos. Mesmo quando nossa prática pode ser interpretada como de resistência, contribuindo para a mudança ideológica, não estamos necessariamente conscientes dos detalhes de sua significação ideológica. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 120).
Na abordagem do discurso que concebe o poder como hegemonia, tem-se uma forma
de analisar se as relações de poder reproduzem, reestruturam ou desafiam as hegemonias
existentes, e um modo de entender a própria prática discursiva como uma luta hegemônica,
que reproduz reestrutura ou desafia as ordens de discurso77 existentes. Na visão de Fairclough
(2001, p. 122), o significado de hegemonia vai muito além do que a simples dominação de
classes subalternas, por meio de meios ideológicos para obter seu consentimento. Hegemonia
é a construção de alianças, é uma constante luta entre classes e blocos “[...] para construir,
manter ou romper alianças e relações de dominação/subordinação, que assume formas
econômicas, políticas e ideológicas.”. A partir desse entendimento, portanto, pode-se
considerar que
[...] a prática discursiva, a produção, a distribuição e o consumo (como também a interpretação) de textos são uma faceta da luta hegemônica que contribui em graus variados para a reprodução ou a transformação não apenas da ordem de discurso existente (por exemplo, mediante a maneira como os textos e as convenções prévias são articulados na produção textual), mas também das relações sociais e assimétricas existentes. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 123-124).
Sendo assim, a partir da perspectiva teórica em questão, a tentativa de apreensão do
movimento comunicacional evidencia que, por meio do discurso, sujeitos compartilham
sentidos em um determinado contexto social. Concordando com Oliveira, Lima e Monteiro
(2011a), a análise crítica do discurso sugerida por Fairclough (2001) traz contribuições para
compreender, a partir da interação negociada, a amplitude da comunicação no contexto
organizacional, assim como suas marcas de conflito e contradições. O modelo tridimensional
77 Relação do discurso com os contextos político, social e cultural dos interlocutores que influencia na produção
e interpretação dos sentidos.
88
ajuda-nos a entender a interação na perspectiva dos interlocutores envolvidos, o poder que
manifestam e a construção dos sentidos de acordo com os contextos de cada um.
4.2.1 O processo de análise
Durante o percurso metodológico, quatro categorias analíticas tornaram-se evidentes
no discurso dos interlocutores. A seguir, relacionamos cada uma delas, explicitando suas
principais características, assim como o motivo de suas escolhas. Ressaltamos que, a partir
delas, a concepção tridimensional do discurso de Fairclough pode ser percebida de maneira
articulada nas análises da investigação.
a) Interação/colaboração
Observamos que o discurso das organizações, no momento de reformulação de suas
intranets, explorou a interação e a colaboração como características dos novos ambientes,
desenvolvidos sob a lógica da Web 2.0. De acordo com a perspectiva conceitual adotada neste
estudo, a segunda geração de redes digitais se apoia na ideia de colaboração entre as pessoas,
que se tornam cada vez mais capazes de produzir e distribuir informações na web, interagir e
trocar conhecimento, valorizando a comunicação multidirecional e a inteligência coletiva.
Destacamos, no entanto, que essa não é a percepção dos empregados acerca das intranets da
Cemig e da Unimed-Rio, fato que nos levou a criar a categoria em questão. Por meio dela,
portanto, foi possível constatar que os sentidos são disputados e construídos, apropriados e
internalizados de maneiras diferentes pelos sujeitos em relação.
b) Descentralização da gestão do conteúdo
Destacamos no decorrer da pesquisa que uma característica preponderante das
intranets sociais, e princípio fundamental da Web 2.0, é a descentralização da gestão do
conteúdo e da informação para outras áreas de negócio da organização, o que comumente se
restringia, até então, ao setor de comunicação das empresas. Nessa abordagem, o cenário que
se impõe dá poder a outras áreas organizacionais para que, institucionalmente ou
oficialmente, também possam “fazer comunicação”, principalmente em relação ao negócio de
cada uma delas. Nesse contexto, a área de comunicação deixaria, então, de ser a única a deter
89
a fala oficial. Assim, a escolha dessa categoria justifica-se pelo fato de a gestão
descentralizada ter sido um tema marcante no discurso das organizações e também dos
empregados, por meio dos quais foi possível perceber algumas contradições interessantes para
análise.
c) Utilização da intranet como ambiente informacional
Consideramos relevante realizar nossa análise pelo ângulo dessa categoria, uma vez
que o tema está muito presente no discurso das organizações e dos empregados, evidenciando
a tensão existente na relação comunicativa. Notamos que, apesar das organizações divulgarem
suas intranets como ambientes regidos pelos princípios da Web 2.0, propondo um espaço
relacional, os empregados utilizam-nas como ambientes informacionais. Para eles, as intranets
são locais para publicação/divulgação, acesso/leitura de informações, não sendo apreendidas
como espaços de relacionamento.
d) Hegemonia/controle
Criamos essa categoria com o objetivo de analisar os discursos das organizações e dos
empregados, a partir da proposta de Fairclough (2001) que situa o discurso em uma
concepção de poder como hegemonia. Nesse contexto, percebemos que a ideia de controle
está muito presente nas falas dos interlocutores acerca das intranets, o que revela um paradoxo
em relação à perspectiva conceitual sobre Web 2.0 adotada pelas próprias empresas, ao
divulgarem as características de suas intranets para os empregados.
É importante destacar que há o entendimento de que a ideia de colaboração também se
faz presente no princípio da descentralização da gestão do conteúdo. Além disso,
compreendemos que a interação é o processo em sua amplitude, que abrange todos aqueles
conceitos. No entanto, a distinção foi feita apenas para fins de categorização, seguindo a
maneira conforme a qual os interlocutores entendem/adotam os termos em seus discursos.
Ressaltamos ainda que adotamos o termo “interação”, a partir da perspectiva de interação
mútua, de Primo (2008), que foca o relacionamento. Segundo o autor, as interações mútuas
ocorrem através do choque dos comportamentos comunicativos dos interlocutores, ou seja, o
processo de negociação de diferenças que faz parte da comunicação interpessoal. As
interações mútuas desenvolvem-se em virtude da negociação relacional durante o processo.
90
Primeiramente, iremos identificar as quatro categorias em conjunto nos discursos das
organizações. Em seguida, para a análise do discurso dos empregados, as categorias serão
consideradas individualmente.
4.2.1.1 O discurso da Cemig
Conforme conta o idealizador da intranet78, o processo de transformação da CemigNet
em uma intranet 2.0 durou aproximadamente três anos – de 2007 a 2010 – e, durante o
período de desenvolvimento do novo ambiente, a Cemig preocupou-se em envolver todos os
empregados e gestores da organização, tendo em vista a complexidade e importância da
participação de toda a empresa no processo.
Para isso, segundo o idealizador, o Projeto Cemig 2.0, sobre o qual falamos
anteriormente, era divulgado em todos os veículos de comunicação interna (jornal, jornal
mural, e-mail e intranet). Havia também uma comunicação direcionada (por meio de reuniões,
comunicados, e-mails, cartas e eventos) aos proprietários de site, gerentes, superintendentes e
diretores, com o objetivo de informar sobre o andamento do projeto e visando o envolvimento
deles em atividades específicas. Em seguida, analisaremos algumas peças da campanha
institucional do Projeto Cemig 2.0 que exemplificam essa divulgação.
78
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
91
Figura 16 – Folheto de divulgação direcionado aos empregados
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2009
92
Figura 17 – Folheto de divulgação direcionado aos empregados (verso)
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2009
Na peça acima, podemos observar, logo no título, a referência feita à Web 2.0, no
próprio nome dado ao projeto de reformulação da intranet: "Cemig 2.0". Destacamos que o
texto aborda os conceitos da segunda geração de redes digitais, conforme a perspectiva teórica
adotada nesta pesquisa, ressaltando a colaboração e a interação entre os empregados, por meio
de enquetes, blogs e fóruns, como as principais características – e os principais benefícios –
do novo ambiente. A empresa também garante a colaboração, ao fazer a promessa de um
espaço favorável para o “compartilhamento do conhecimento organizacional”, característica
relacionada à ideia de inteligência coletiva, da Web 2.0.
A gestão descentralizada do conteúdo também é divulgada como um dos pilares da
segunda geração de redes digitais e uma das vantagens da intranet, que passa a oferecer o
“Gerenciamento de conteúdo de forma dinâmica e independente” e “Mais flexibilidade e
autonomia para a publicação e atualização de conteúdos”. Ainda nessa direção, o texto faz
referência aos proprietários de site, os 300 empregados que foram capacitados para ter a
autonomia de elaborar e publicar as informações relacionadas a sua área na intranet. O
93
discurso do idealizador da versão 2.0 da CemigNet79 reforça a ideia proposta pelo folheto
apresentado:
[...] a intenção era entender que essa reformulação deveria ser pensada como um ambiente de colaboração. Uma forma de os empregados também participarem, contribuírem nesse processo de comunicação e não ficar só a cargo da Comunicação. A parte institucional, ela continua com a Comunicação [...], ela tem que traçar as diretrizes, tem que definir estratégias. Mas, no dia a dia, fazer esse trabalho de atualização [de conteúdo] é praticamente impossível. [...]. Então é importante que essas áreas também tenham autonomia para desburocratizar o processo. Porque nem toda informação que é publicada, que é disponibilizada, ela tem que, necessariamente, passar pela Comunicação. Eu até acredito que a maioria [...] não tem que passar por aqui [...]. Então, é importante que as áreas tenham essa autonomia. [...] o projeto foi pensado numa tendência de descentralização mesmo. (Idealizador da versão 2.0 da intranet da Cemig)80.
O idealizador discorre sobre a necessidade de se deslocar de uma gestão de conteúdo
centralizada na Superintendência de Comunicação Empresarial da Cemig, em direção a um
ambiente que possibilite desburocratizar o processo de comunicação, por meio da colaboração
dos empregados na intranet. Em seu discurso, constatamos a apreensão do princípio de
descentralização da gestão do conteúdo da Web 2.0, no contexto organizacional, segundo o
qual outras áreas organizacionais passam a ter “poder” para que, institucionalmente ou
oficialmente, também possam “fazer comunicação”, principalmente em relação ao negócio de
cada uma delas. Para o idealizador, é importante que a área de comunicação deixe de ser a
única a deter a fala oficial, cabendo a ela definir estratégias e diretrizes.
Outro ponto importante constatado na análise é o discurso da organização de que a
lógica da Web 2.0 faz parte de seus objetivos estratégicos, o que nos leva a entender que o
corpo gerencial passa a atribuir uma importância maior à intranet como espaço de
relacionamento entre os empregados, que, como veremos, não têm essa percepção.
Prosseguimos, agora, à análise de um cartaz divulgado nos jornais murais de todas as
unidades da Cemig.
79 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 80 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
94
Figura 18 – Cartaz divulgado nos jornais murais da Cemig
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2009
Observamos que o conteúdo do cartaz contempla conceitos e recursos relacionados à
Web 2.0, visando proporcionar aos empregados uma familiaridade com os termos e,
consequentemente, com o novo ambiente web. As possibilidades de interação e colaboração
95
surgem novamente como características da intranet, o que constatamos no significado que o
texto dá a “Blog”, “Fórum” e “Wiki” e na conceituação de Web 2.0: “A idéia é que o
ambiente web se torne mais dinâmico e interativo e que os usuários colaborem para a
construção e organização de informações.”. Destacamos que, apesar de divulgar para os
empregados os recursos de colaboração da CemigNet, a empresa faz a ressalva de que eles
“serão gradativamente liberados para uso”, condição que pode gerar frustração ou
desconfiança entre os interlocutores. De acordo com o idealizador da intranet81, a ressalva foi
feita com o objetivo de testar o funcionamento das novas ferramentas, antes de liberar sua
utilização por completo.
Outra preocupação que a gente teve durante o projeto foi a de não disponibilizar uma série de ferramentas de uma só vez. Até porque corríamos o risco de não funcionar como a gente gostaria. Então pensamos em fazer isso gradativamente: lançar cada ferramenta e esperar para que as pessoas absorvessem isso, tomassem conhecimento e passassem a utilizar e a disseminar. Mas a gente não conseguiu implantar tudo ainda que a gente entende que é importante. E que vai contribuir muito.
Ressaltamos que o discurso acima também evidencia que a organização ainda não
disponibilizou todos os recursos para uso dos empregados. Esse é um dos motivos para que
eles não considerem a intranet como um espaço de relacionamento, revelação constatada no
discurso dos empregados, que analisaremos mais adiante.
Ainda de acordo com o idealizador da intranet82, a passagem de um ambiente estático
e sem incentivo à participação para um espaço de colaboração era outra vantagem da
CemigNet divulgada para os empregados, durante a fase de projeto. Ele afirma que
Ela [a CemigNet] era uma intranet um pouco estática, a gestão era mais centralizada e a intenção, com esse projeto da Web 2.0, é que fosse possibilitada uma colaboração maior, o que é o próprio conceito da Web 2.0 [...]. Então o projeto tinha esse objetivo de reformular, de trabalhar no sentido de atualizar também esse ambiente com ferramentas que possibilitassem um dinamismo maior. (Idealizador da intranet 2.0 da Cemig)83.
Notamos que, mais uma vez, a colaboração surge no discurso organizacional como
princípio diretamente relacionado à lógica da Web 2.0. Neste momento, passamos a analisar o
discurso da organização, na ocasião do lançamento da versão 2.0 da CemigNet, ocorrido no
mês de março de 2010.
81 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 82
Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 83 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012.
96
Figura 19 – Cartaz divulgado nos jornais murais da Cemig
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2010
97
Figura 20 – Cartaz divulgado nos jornais murais da Cemig
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2010
98
Figura 21 – E-mail enviado aos empregados
Fonte: COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2010
O mote da campanha de divulgação foi relacionado à diminuição da distância entre os
empregados espalhados por todo o estado de Minas Gerais, além da colaboração e da
interação que lhes seriam proporcionadas. Criaram-se banners, adesivos de elevadores,
cartazes e móbiles, peças que foram utilizadas em todas as unidades da empresa. Os próprios
empregados foram os modelos da campanha, em que representavam seu local de trabalho.
Além disso, a divulgação foi realizada por meio dos veículos de comunicação interna, levando
a ideia de novos recursos que proporcionariam mais proximidade entre as pessoas. Abaixo,
destacamos um trecho de uma matéria publicada na versão não reformulada da intranet sobre
o lançamento da CemigNet 2.0, que aconteceria dias depois.
Na ocasião, será apresentada a nova ferramenta que vai comportar espaço para comentário de matérias, interação com outros usuários, baixa de arquivos e edição de documentos online. Estes recursos irão promover maior agilidade nos processos e permitir a produção e visualização de conteúdo de forma descentralizada, além de aproximar os empregados de todo o Estado. (COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS, 2010).
99
O idealizador da intranet reforça a intenção da campanha, ao ressaltar84 que um dos
objetivos da CemigNet 2.0 é aproximar as pessoas e fazer com que atividades possam ser
desenvolvidas por meio do ambiente web, sem a necessidade de deslocamento. Nesse
contexto, segundo ele, o maior benefício da CemigNet 2.0, para a organização e seus
interlocutores, é a interação entre os empregados, que prossibilita “estar mais perto”, uma vez
que a Cemig possui uma área de abrangência muito grande, com pessoas atuando em regiões
geográficas diferentes.
Concluímos aqui a análise do discurso da Cemig sobre o processo de reformulação da
CemigNet, realizada a partir das categorias “interação/colaboração” e “descentralização da
gestão do conteúdo”, que se evidenciaram no material coletado. A seguir, apresentamos a
análise do discurso da Unimed-Rio, a partir da campanha de lançamento da Interface 2.0.
4.2.1.2 O discurso da Unimed-Rio
A campanha de lançamento da nova intranet da Unimed-Rio foi realizada por meio de
vídeos curtos, caracterizados como teasers multimídia, que contaram com a participação dos
próprios empregados, atuando como atores ou dublês da voz de atores consagrados. Conforme
explica o gerente de Comunicação Corporativa85, com essa iniciativa, a ideia foi utilizar a
colaboração, ou seja, o envolvimento dos empregados na campanha, para falar de colaboração
e participação, alguns dos benefícios da Interface 2.0. Os vídeos foram disponibilizados na
antiga intranet, semanas antes do lançamento do novo ambiente, sendo um a cada semana,
destacando-se os princípios da Web 2.0 de colaboração, interação e descentralização da
gestão do conteúdo como principais pontos de contribuição.
De acordo com o gerente, a escolha do vídeo como formato foi uma maneira de
marcar ruptura com o perfil da antiga intranet e mostrar a diferenciação que ela pretendia
trazer86 em relação a um modelo já ultrapassado. Nesse sentido, a produção do material foi
desenvolvida de forma “caseira”, tanto o roteiro quanto a dublagem, em referência ao modelo
YouTube.
O primeiro vídeo, de 1min40s, é uma paródia de um trecho do filme “Tropa de Elite”,
em que os empregados dublam a voz do capitão Nascimento, interpretado pelo ator Wagner
84 Entrevista em profundidade realizada na Cemig, dia 23 nov. 2012. 85 Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 86 Informações obtidas durante a entrevista em profundidade realizada com o gerente de Comunicação
Corporativa da Unimed-Rio.
100
Moura, e dos soldados de seu batalhão, atribuindo-lhes novas falas. As frases entre aspas
referem-se às falas dos soldados:
Uma boa intranet precisa ser colaborativa, precisa ser um auxílio na gestão da informação e precisa dar voz aos colaboradores da empresa. Os senhores estão anotando o que eu tô dizendo? “Sim, senhor!”. A intranet precisa oferecer serviços da Web 2.0, como blogs, fóruns, ajudar a disseminar o conhecimento sobre o que cada área faz. “Senhor coordenador [...], senhor 05 tá dormindo.”. Senhor 05 tá dormindo. [...]. Senhor 05, nós estamos construindo uma nova intranet para a Unimed-Rio, senhor 05. É um site que depende basicamente de colaboração, do engajamento de todos nós. Você vai dormir, senhor 05? Você vai estragar o projeto? “Não, senhor!”. Ótimo, senhor 05, contamos com o senhor. (UNIMED-RIO, 2010).
Figura 22 – Imagem do filme “Tropa de Elite” utilizada na campanha
Fonte: UNIMED-RIO, 2010
Podemos caracterizar a fala do capitão Nascimento como um monólogo, na ocasião
em que ministra uma palestra a seus soldados, que apenas escutam e anotam o que ele diz.
Apesar de seu discurso contemplar os benefícios de colaboração que a intranet 2.0
proporciona aos empregados, dando “voz aos colaboradores da empresa”, não é isso o que
acontece na prática. O discurso do capitão Nascimento é autoritário, controlador, revelando o
caráter tecnicista da comunicação e a contradição existente em relação à lógica da Web 2.0.
Acrescenta-se a isso o fato de que, geralmente, instalar a cultura de participação nas
empresas é papel do empresário, que passa as informações necessárias aos empregados. Aí já
está implícito o continuísmo hierárquico das relações de trabalho: “[...] ‘alguém’ (que não é
empregado) ‘cria a cultura’ e ‘passa informações necessárias aos empregados’.” (AMARAL,
2010, p. 228). Deduz-se que, se existe alguém que pode passar, existe quem recebe, havendo,
assim, uma relação de superioridade e inferioridade, ordem, obediência. Seguindo essa mesma
maneira de pensar, Oliveira e Paula (2009) recorrem a Cabrera (2002), que afirma que, em
geral, o gestor da mudança informa e quer que as pessoas se comprometam. Na visão dele,
101
dificilmente isso vai acontecer. Primeiro porque as pessoas não querem ser mudadas, mas
entender a mudança e participar dela.
O vídeo evidencia o que Baldissera (2008, p. 47) afirma sobre a noção de
comunicação organizacional que precisa ser ampliada e ultrapassar a fala autorizada, que é
apenas “o lugar da autoridade que quer informar/formar, persuadir, seduzir,
controlar/acompanhar/avaliar, coordenar/dominar e, mesmo manipular. É o lugar da
reprodução, da obediência, da normatização e da normalização.”. Baldissera (2008) destaca
que a comunicação organizacional não pode se qualificar como mera estratégia de controle
nem se reduzir a um sistema de transferência de informações. Assim, por mais que a ordem
posta tente suprimir os processos comunicacionais não-oficiais, a exemplo do cochilo do
soldado, “existirão fissuras pelas quais esses processos comunicacionais se infiltrarão,
resistindo, desafiando, subvertendo os possíveis mecanismos de controle. (BALDISSERA,
2008, p. 44). Destacamos que, para além da fala autorizada, a comunicação organizacional
abrange a dispersão, a incerteza, os ruídos, as contradições, o impensado, o diálogo, a
diversidade, a rebeldia, ou seja, possibilidades relacionais e de produção de sentido
(BALDISSERA, 2008).
Esse contexto também nos remete à metáfora do radar sugerida por Fausto Neto
(2008a, p. 42), na qual a comunicação é associada à ideia de radar, enquanto um dispositivo
que teria o objetivo de “proteger através de captura, processamento, análise e de disseminação
de informação – as atividades e a vida de uma organização face às manifestações do ambiente
que lhe oferecem perigo ou restrições ao seu funcionamento.”. A metáfora do radar seria,
talvez, a que melhor traduz o caráter informacional da comunicação no âmbito das
organizações.
O segundo vídeo, com duração de 1min44s, também trata-se de uma paródia de uma
cena emblemática do filme “Titanic”, em que dois empregados emprestam suas vozes a Jack
Dawson e Rose DeWitt Bukater, personagens de Leonardo DiCaprio e Kate Winslet, em um
diálogo romântico na proa do navio. Jack é quem inicia a fala, com um discurso bem diferente
do original: “No início é meio diferente, mas você se acostuma rápido [...]. [...]. A partir de
agora, tudo o que você escrever vai estar disponível pra todos na empresa, isso não é uma
maravilha? Não te dá uma sensação de liberdade? Isso se chama intranet colaborativa.”
(UNIMED-RIO, 2010). Rose, emocionada, responde: “Incrível! Fantástico! Eu sou a rainha
da informação!” (UNIMED-RIO, 2010).
102
Figura 23 – Imagem do filme “Titanic” utilizada na campanha
Fonte: UNIMED-RIO, 2010
O vídeo destaca a descentralização da gestão do conteúdo como benefício da Interface
2.0, em que é dada aos empregados a liberdade de publicar conteúdo de sua área na intranet,
para que todos da organização possam acessar. Essa nova possibilidade de falar oficialmente
pela empresa e também “fazer comunicação” em relação a seu negócio é colocada como algo
“maravilhoso” e colaborativo. Entretanto, a fala de Rose revela um paradoxo: não é possível
ser “rainha da informação” em um ambiente que se propõe participativo, por meio da gestão
descentralizada de conteúdo. No contexto da Web 2.0, não cabe o papel de provedor de
informações em mão única (conteúdo → usuário), numa abordagem informacional,
concepção segundo a qual a complexidade da comunicação é reduzida à emissão de
informações e à reação do receptor. A segunda geração de redes digitais atua em um modelo
de duplo sentido de direção, no qual as pessoas são incentivadas a participar de processos de
interação, que, segundo Lima e Bastos (2012, p. 40), “pressupõem trocas, organização de
perspectivas compartilhadas, construção de um lugar comum no qual haverá uma relação.”.
Considerando a análise dos dois vídeos, ressaltamos que, durante a entrevista com o
gerente de Comunicação Corporativa, percebemos que as contradições apontadas no discurso
organizacional não foram intencionais. Entretanto, como afirma Fairclough (2001), na prática
discursiva interessam as dimensões sociocognitivas do processo de produção e interpretação
textual, ou seja os recursos que os participantes do discurso têm interiorizados e que, de forma
inconsciente e automática, levam para o processamento textual, o que determina sua eficácia
ideológica. O autor entende que as ideologias são significações da realidade, que são
construídas em várias dimensões dos sentidos das práticas discursivas, contribuindo para a
produção, a reprodução ou para a transformação das relações de dominação. Percebemos,
portanto, que o discurso presente nos vídeos contribui para manter as relações de
103
subordinação existentes nos processos hierarquizados das organizações. Nesse contexto, os
sentidos são produzidos nos processos de consumo dos textos, que estão sujeitos a diversas
interpretações com níveis diferentes de importância ideológica.
Não se deve pressupor que as pessoas têm consciência das dimensões ideológicas de sua própria prática. As ideologias construídas nas convenções podem ser mais ou menos naturalizadas e automatizadas, e as pessoas podem achar difícil compreender que suas práticas normais poderiam ter investimentos ideológicos específicos. Mesmo quando nossa prática pode ser interpretada como de resistência, contribuindo para a mudança ideológica, não estamos necessariamente conscientes dos detalhes de sua significação ideológica. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 120).
Por fim, o último vídeo, de 1min30s, é uma paródia da novela “Páginas da Vida”, do
autor Manoel Carlos, produzida e exibida pela Rede Globo, nos anos de 2006 e 2007. Todos
os dias, um capítulo da novela encerrava-se com o depoimento de pessoas “da vida real”, que
contavam sua história. No vídeo da campanha, uma empregada foi escolhida para encenar,
fantasiada, esse trecho característico de “Páginas da Vida”, dando seu depoimento.
Eu nunca entendi muito bem o que eles queriam dizer com gestão da informação. Ficava confusa, com dúvidas, ao mesmo tempo, tinha dificuldade pra entender o que as outras pessoas faziam em outras áreas. Tinha muitos amigos, mas sabia pouca coisa do trabalho deles. Um dia, descobri que uma outra área estava fazendo o mesmo projeto a que eu estava me dedicando há meses. Fiquei triste [...]. Mas as coisas melhoraram muito com o lançamento da nova intranet. Quando eu vi que cada área tinha um canal exclusivo para postar as próprias informações, entendi o que é gestão da informação. [...]. Pra mim, é o lugar onde a informação está sempre disponível de forma organizada, pra todo mundo. Comecei a pesquisar mais sobre o trabalho das outras áreas e entender, sobretudo, como o meu trabalho impactava no trabalho deles. Foi um grande desenvolvimento pra mim. Intranet 2.0: eu recomendo! (UNIMED-RIO, 2010).
Figura 24 – Imagem da paródia de “Páginas da Vida”
Fonte: UNIMED-RIO, 2010
104
Podemos notar que a gestão descentralizada do conteúdo, aqui nomeada de “gestão da
informação”, também é o tema desse vídeo, que destaca as vantagens da nova possibilidade
da Interface 2.0, onde cada área passa a contar com “um canal exclusivo para postar as
próprias informações”. Percebemos que a ideia da Web 2.0 de distribuir informações na web,
interagir e trocar conhecimento, valorizando a comunicação multidirecional e a inteligência
coletiva está presente no discurso, quando a personagem fala da importância de “entender o
que as outras pessoas faziam em outra áreas”, “pesquisar mais sobre o trabalho das outras
áreas e entender, sobretudo, como o meu trabalho impactava no trabalho deles” e conhecer as
atividades que cada setor desenvolve, para evitar o retrabalho. Destacamos, entretanto, a frase
“Pra mim, é o lugar onde a informação está sempre disponível de forma organizada, pra todo
mundo.”, que evidencia a hegemonia do paradigma transmissional, por meio do qual a
intranet é percebida como o local para publicação/divulgação, acesso/leitura de informações.
A campanha buscou retratar os principais objetivos da Unimed-Rio com a
implementação da Interface 2.0 e, de acordo com o gerente de Comunicação Corporativa87, a
partir do momento em que a intranet firmou-se como um canal oficial de acesso à informação,
coube à empresa conseguir aproveitar a aceitação das pessoas, para dar um salto no
relacionamento em termos de comunicação. Assim, a organização percebeu que poderia
contribuir por meio da descentralização da gestão do conteúdo, pois, segundo o gerente, havia
uma quantidade considerável de informações produzida pelas áreas que não era
compartilhada, gerando desperdício para o negócio. “Então, a gente percebeu que poderia
começar a contribuir por meio de encontrabilidade, organização do conteúdo, gestão
descentralizada da informação [...]. (Gerente de Comunicação Corporativa da Unimed-Rio)88.
Antes de prosseguir à análise crítica do discurso dos empregados, destacamos que
todas as categorias foram consideradas na análise do discurso da Unimed-Rio. O primeiro
vídeo integra a categoria “Hegemonia/controle” e “interação/colaboração”. O segundo e o
terceiro, por sua vez, fazem parte da categoria “descentralização da gestão do conteúdo”,
sendo que o último também é contemplado em “utilização da intranet como ambiente
informacional”.
87
Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012. 88
Entrevista em profundidade realizada na Unimed-Rio, dia 25 out. 2012.
105
4.2.1.3 O discurso dos empregados
Passamos agora a focar a análise do discurso dos empregados, a partir da abordagem
individual das categorias. Como as percepções dos interlocutores mostraram-se muito
coincidentes em quase todos os aspectos, unimos os discursos dos empregados das duas
organizações nas categorias. Entretanto, os pontos que apresentam divergências são
destacados durante a análise.
a) Interação/colaboração
Durante a análise do material, foi possível perceber que todos os empregados
consideram a intranet muito importante para o seu trabalho, emboram destaquem que o
ambiente não se tangibiliza como espaço de interação, de relacionamento. Nesse contexto, os
discursos demonstram que essa ainda não é a realidade das organizações, tendo em vista a
percepção dos empregados segundo a qual a intranet ainda não cumpre a promessa de seguir a
lógica da Web 2.089. Ressaltamos que é consenso o fato de que gostariam de participar mais,
criando e publicando conteúdo, postar comentários, interagir uns com os outros, compartilhar
ideias por meio da intranet.
Elas poderiam se comunicar pela intranet, mas não se comunicam. (Empregado da Cemig). [Utilizo a intranet] só de forma corporativa, como eu te disse, para disseminar informações da área. Ou seja, o trabalho que você está realizando e que interessa, de alguma forma, para as outras pessoas, das outras áreas. Mas não como meio de comunicação. (Empregado da Cemig).
Eu uso para essas burocracias. Para mim, hoje, significa burocracia, quando ela deveria significar mais integração. (Empregado da Cemig).
Não. Interação, não. Ela serve como fonte de informações. (Empregado da Cemig). Então eu não tenho esse sentimento de interação, só de utilização, pura e simples. (Empregado da Cemig). Às vezes, a gente demora para conseguir falar com alguém. Eu, às vezes, preciso, porque [...] sou engenheira de segurança do trabalho e tem os técnicos de segurança do trabalho espalhados no estado todo. (Empregado da Cemig).
Assim, para mim, eu costumo mandar e-mail, ligar. Mas, pela Interface, eu não tenho esse costume de interagir com outras áreas, não. (Colaborador da Unimed-Rio).
89 Conforme a perspectiva predominante da revisão bibliográfica apresentada acerca do conceito de Web 2.0.
106
São duas coisas que o colaborador pode fazer: publicar dentro do “Classificados”, que ali você coloca o que você quiser, e comentário em determinada matéria. Só isso. (Colaborador da Unimed-Rio). Os espaços para interação não existem. (Colaborador da Unimed-Rio). A parte de comunicação é ótima, mas a parte de interação... (Colaborador da Unimed-Rio). Interação, não tem muita interação. Mais é comunicação mesmo. (Colaborador da Unimed-Rio).
Segundo Antoun (2008), entende-se que os princípios de interação e colaboração estão
diretamente relacionados à dimensão participativa proporcionada pela segunda geração de
redes digitais, fato que gera intensa produção de conhecimento, entretenimento e
experimentação criativa. A Web 2.0 é caracterizada pelo que passou a ser chamado de redes
sociais, plataformas de comunicação que as pessoas sem conhecimento especializado se
habilitam a operar mais ativamente e em que passam a interagir colaborativamente umas com
as outras. Nessa direção, os discursos revelam que essa perspectiva teórica não faz parte da
realidade dos processos comunicacionais no contexto das organizações pesquisadas. Os
empregados não percebem as intranets como espaços de interação, mas como ambientes de
“fonte de informações” e de “utilização, pura e simples”. Além disso, no momento em que
atribui-se à CemigNet o significado de “burocracia”, constatamos que a intranet segue a
direção oposta do que sugere Malini (2008), quando afirma que a cultura da colaboração em
rede tece uma comunicação horizontal, sem passar pelas hierarquias.
Assim, destacamos que os empregados não apreendem a ideia de interação e de
colaboração que as organizações propõem em seus discursos, ao divulgarem suas intranets
2.0. Para eles, a lógica de cooperação, colaboração e livre expressão (ANTOUN, 2008)
proposta pela Web 2.0 não existe no contexto organizacional em que se inserem. Um dos
discursos direcionados à Interface demonstra, por meio da expressão “Só isso”, que a intranet
oferece poucos espaços participativos. Já um discurso relacionado à CemigNet revela que a
intranet, ao contrário do que foi prometido pela empresa, não contribui para aproximar
pessoas: “Às vezes, a gente demora para conseguir falar com alguém. Eu, às vezes, preciso,
porque [...] sou engenheira de segurança do trabalho e tem os técnicos de segurança do
trabalho espalhados no estado todo.”.
É importante destacar a percepção que se tem sobre comunicação nas frases “A parte
de comunicação é ótima, mas a parte de interação...” e “Interação, não tem muita interação.
Mais é comunicação mesmo.”, em que é entendida como algo separado da interação, ou seja,
seriam conceitos distintos. Nesses depoimentos, a comunicação é vista como um processo
107
informacional, de transferência de sentidos para um receptor, fato que se evidencia,
principalmente, na segunda fala.
A partir dessas análises, torna-se fundamental considerar que não é possível prever “a
significação das práticas comunicativas na intencionalidade da organização, evidenciando a
debilidade dos processos que se pretendem totalizantes, uma vez que o sentido tem uma
abertura para a significação que foge à previsibilidade e intencionalidade da instância de
produção.” (OLIVEIRA; PAULA, 2008, p. 104).
Observamos a seguir que algumas pessoas não se sentem parte da intranet pela
impossibilidade de atuar sobre ou interagir por meio dela.
Eu disse que eu não me sinto parte, porque eu não sinto que eu posso atuar, que eu possa fazer algum tipo de comunicação via intranet. Agora, por outro lado, eu me sinto parte, porque eu utilizo muito a intranet. Como usuária, para obter informações. Mas a troca de informações... (Empregado da Cemig). [...] eu não forneço informação, eu só absorvo. E assim mesmo, eu absorvo muito pouca informação. Então, por isso que eu não me sinto parte. (Empregado da Cemig). Não. Eu me sinto espectadora da intranet. (Colaborador da Unimed-Rio). Se eu não fosse responsável por alimentar a minha área, eu também seria só espectador. (Colaborador da Unimed-Rio).
Evidenciamos que aqueles que se sentem parte não é devido ao ambiente de
colaboração que a intranet proporciona, mas porque precisam dela como usuário, na
concepção sugerida por Primo (2008). Para o autor, o termo “usuário” remete à ideia de uma
hierarquia pré-estabelecida entre os envolvidos na interação, ressucitando-se o personagem
“receptor” da Teoria da Informação. O receptor, assim como o usuário, recebe passivamente o
que o emissor transmite ou busca a informação que se quer.
A crítica à impessoalidade da intranet é outra evidência interessante observada nos
discursos. Os empregados questionam como pode ser possível a interação entre eles, se o
ambiente web não permite que as pessoas consigam identificar umas às outras:
Fazer currículo pessoal de cada um, de cada pessoa, com foto. [...]. A Cemig é uma das poucas empresas que eu conheço que o crachá não tem foto. Na intranet também não tem. [...] na intranet você pode por foto, pode por currículo, pode por várias informações. Não tem. (Empregado da Cemig). Você liga para a pessoa sem saber quem é. (Empregado da Cemig). Se a pessoa chamar Murici, eu não sei se é homem, se é mulher. É verdade! (Empregado da Cemig).
108
Você conversa com a pessoa, conhece por e-mail, mas encontra às vezes no elevador, na escada e não sabe quem é. (Colaborador da Unimed-Rio). [...] acho que a gente deveria conseguir ver a foto da pessoa. Porque às vezes a gente: “Eu falei com alguém, não lembro o nome. Será que é esse, será que é aquele?”. Poder saber se é aquela pessoa. Isso faz bastante falta, eu acho. (Colaborador da Unimed-Rio).
Esses discursos apontam para um conflito existente entre os princípios da Web 2.0 e as
intranets, que se dizem relacionais, embora não garantam, na percepção dos empregados,
condições mínimas para que a interação aconteça entre eles. Podemos interpretar que, nesse
contexto, a interação é reduzida a aspectos meramente tecnológicos, de maneira que as
organizações desprezam “[...] a complexidade do processo de interação mediada. É fechar os
olhos para o que há além do computador.” (PRIMO, 2008, p. 30). Assim, notamos que os
empregados desejam atuar como sujeitos interlocutores, inscritos em um contexto
institucional, sendo, acima de tudo, sujeitos em experiência, que afetam e são afetados pela
co-presença e pela mediação simbólica que os coloca em polos de uma interação. (FRANÇA,
2006).
É consenso entre os participantes dos grupos que, para que a lógica da Web 2.0 dê
certo em processos de comunicação no contexto das organizações, é necessário haver “uma
mudança de cultura” – da empresa e das pessoas –, mudança de atitude e maturidade. É por
esse motivo, portanto, que muitos consideram que a Web 2.0 ainda não é possível no
ambiente organizacional.
Eu acho que ela não libera exatamente porque ela tem receio, porque a cultura não está estabelecida. (Empregado da Cemig). Tem que ter um trabalho intensivo, para mudar essa mentalidade. Você não muda de um dia para o outro. (Empregado da Cemig). O nosso setor fez um blog de tecnologia, não bombou nem dentro do setor. É cultura mesmo. Cultura, assim, de o pessoal não ter costume. (Empregado da Cemig). Isso é política. Porque é aquele negócio, é igual o MSN90, muita gente cogitou a possibilidade de colocar MSN entre empresas. Mas o que acontece? O pessoal vai lá e começa a virar brincadeira. É política. (Empregado da Cemig). [...] eu vou dizer que ela [a intranet] é subutilizada. E eu acho que deveria ser uma atividade de todos. Atitude de mudança de pensamento, atitude de tornar o ambiente realmente colaborativo. Hoje em dia, a própria Cemig restringe que seja colaborativo. Então, eu acho que deveria ter uma atitude de todos. (Empregado da Cemig). Eu acho que a rede social, botou ali, eu acho interessante. Mas eu acho que as pessoas têm que ser educadas, tem que ter regras. Eu acho que as ideias corporativas
90 Serviço de troca de mensagens instantâneas pela internet.
109
podem surgir assim, numa questão dessa. Então, até como ferramenta de gestão, seria muito bom. [...]. Mas eu acho que as pessoas têm que ser educadas. E aí tem certas coisas que vão ser colocadas. [...] se quem matou foi o Tufão, ou foi a Carminha91 [...], coisas desse tipo. Mas aí que faça um acordo com o gestor [...]. Então, quando você começa a colocar alguma coisa da forma correta, consciente, então você vai abrindo espaço ali. (Colaborador da Unimed-Rio). Em termo de rede social, eu acho que não tem maturidade mesmo, não, de ficar muito aberto para as pessoas comentarem tudo, curtir tudo. Talvez uma interação moderada. (Colaborador da Unimed-Rio). Ter treinamento, até para a pessoa receber aquilo ali e pensar aquilo de uma forma diferente, porque é empresa. Não é o seu Facebook, não é o seu Twitter. (Colaborador da Unimed-Rio). Eu acho que funciona sim e já vi funcionando, principalmente, em fóruns de discussão sobre assuntos da empresa. E você consegue até criar fontes de conhecimento com isso. Só que a empresa precisa chegar num nível de maturidade para atingir uma coisa funcionando legal. Então, assim, se coloca hoje, se não for bem explicado, bem proposto e se não tiver um caminho devagar, não vai atingir o objetivo do que eu já vi funcionar. (Colaborador da Unimed-Rio).
Alguns discursos, entretanto, mostram-se mais favoráveis à segunda geração de redes
digitais no contexto organizacional, considerando que tudo é uma questão de postura
profissional e independe da tecnologia que se oferece.
Dá na mesma. Se eu tenho afinidade com uma pessoa, eu fico conversando com ela o dia inteiro, eu não vou trabalhar, eu vou ficar batendo papo o dia inteiro. (Empregado da Cemig). [...] acho que a questão de segurar tanto não faz nem sentido, porque tudo o que você faz lá tem a sua matrícula no meio, o seu login da máquina. (Empregado da Cemig). Mas você pode ficar no ramal telefônico também. (Empregado da Cemig). Você pode ficar passando e-mail, né? (Empregado da Cemig).
Ao serem perguntados se sentem que a empresa, por meio da nova intranet, passou a
valorizar mais a interação entre eles, os empregados da Cemig reconhecem que houve uma
tentativa, algo muito tímido. Afirmam que a empresa está em um caminho que consideram
promissor, embora ainda não tenham sentido a promessa de interação em seu cotidiano:
Tem potencial [para ser interativa], mas ainda não é. (Empregado da Cemig). Está sendo uma tentativa. Mas melhorou muito em relação à intranet velha. (Empregado da Cemig).
91 Tufão e Carminha eram personagens da novela “Avenida Brasil”, exibida pela Rede Globo, em 2012.
110
Em alguns aspectos sim, realmente ela travou algumas coisas, que eu acho que, no futuro, ela vai liberar. Mas que melhorou milhões de vezes... (Empregado da Cemig).
Os empregados da Unimed-Rio, por sua vez, consideram que a nova Interface
proporciona muito mais interação, mas não no sentido 2.0 do termo.
Era bem estática. [...]. Agora que ela está mais amigável, [...] você se acha melhor dentro dela. [...]. Agora ficou mais fácil, tem os videozinhos que são postados [...]. Eu acho que a interação ficou bem melhor, ficou bem mais amigável, ficou bem mais interessante do que a anterior. (Colaborador da Unimed-Rio).
De acordo com a percepção de Primo (2008), o discurso acima revela a hegemonia do
modelo transmissional da comunicação, uma vez que a palavra “interação” recebe o sentido
de “interatividade”, em que a conhecida fórmula emissor → mensagem → meio → receptor é
apenas atualizada para webdesigner → site → internet → usuário. Os termos são diferentes,
mas a ideia – caduca, segundo o autor – é a mesma. O empregado utiliza o termo “interação”
para se referir, informacionalmente, ao acesso aos vídeos que são postados e à melhoria da
organização do conteúdo na intranet, pois “você se acha melhor dentro dela”.
b) Descentralização da gestão de conteúdo
Durante a investigação, percebemos que esse processo foi apreendido de maneiras
diferentes pelos empregados das organizações pesquisadas, revelando, inclusive, novos
sentidos. Começamos, a seguir, pelos discursos dos empregados da Cemig
[...] chegou num ponto que me incomoda muito. A intranet é extremamente confusa. Ela é confusa e, muitas vezes, redundante. Às vezes, você tem vários caminhos para a mesma coisa e você se perde lá dentro [...]. (Empregado da Cemig). Agora, não é uma crítica ao SharePoint. O SharePoint funciona muito bem, tem funcionalidades incríveis, que a Cemig não usa nem 1%, eu acho. Só que, do jeito que está sendo montado, está ficando muito confuso. (Empregado da Cemig). [...] as pessoas começam a fazer isso, entendeu? “Eu vou criar o meu portal, com as minhas coisas”. Todo mundo vai fazendo isso e esquece que existe um portal grande em cima de todo mundo. (Empregado da Cemig). [...] você não pode dar liberdade sem colocar os limites. (Empregado da Cemig). Tinha que dar liberdade, mas padronizada. Liberdade vigiada. (Empregado da Cemig). E me incomoda muito é essa questão da redundância, da falta de padrão [...]. Incomoda. Se você ficar olhando para aquilo ali todo dia, incomoda. É muita
111
informação jogada na sua cara e coisa que você não está usando. (Empregado da Cemig). A informação que é comum a todos tem que ter um padrão [...]. Normas. Talvez, se migrasse um pouco a inteligência da intranet antiga para a nova, ficaria mais amigável para você localizar os conteúdos comuns a todos os usuários, ou seja, o que todo mundo utiliza. (Empregado da Cemig). A Cemig deveria nivelar o conhecimento das pessoas na confecção de sites, para todo mundo usar o máximo possível. Porque tem gente que tem a boa vontade de querer montar um site, mas o cara não tem um background que um cara que já foi programador tem e consegue explorar muito mais. Então devia ter um nivelamento. Porque fica muito desigual. (Empregado da Cemig).
Na Cemig, a maioria dos empregados considera interessante a liberdade concedida às
áreas da empresa para gerenciar seus próprios sites na intranet, no entanto afirmam que as
pessoas não receberam informações suficientes para que pudessem fazer isso de maneira
satisfatória. Para eles, a liberdade é bem-vinda, desde que haja limites. Hoje, ela gera
confusão, “falta de padrão”. Querem uma “liberdade vigiada”, com regras e padrões
estabelecidos para todos. Em alguns discursos perecebe-se até a preferência pela intranet
antiga, que não permitia a descentralização da gestão do conteúdo.
Notamos que, na Cemig, a liberdade para criação de sites faz com que algumas áreas
optem por não ter um espaço na intranet, fato que gera incômodo entre os entrevistados. Na
visão deles, a situação ocorre por “falta de patrocínio” de algumas gerências e, para isso,
sugerem “[...] um movimento na empresa de mostrar, gerencialmente, a importância do
SharePoint, da intranet, até para que isso desça na pirâmide.” (Empregado da Cemig).
Enquanto na Cemig a descentralização é percebida como algo exageradamente livre,
na Unimed-Rio as pessoas consideram que ela não ocorre, de maneira que a comunicação
ainda centraliza a gestão do conteúdo:
[...] a gente tem esse tweet. Tweet tem um limite de caracteres pequeno, relativamente, é só para você fazer uma chamada. Então não dá para postar uma matéria. Se você quer postar uma matéria, realmente você tem que pedir para a Comunicação. Mas dá para você postar uma chamada de, no máximo, sei lá... uma frase, uma frase grande, não muito grande, [...] para você divulgar alguma coisa que está acontecendo, de uma forma breve. (Colaborador da Unimed-Rio). [...] onde você pode publicar é um tweet muito restrito. Eu, por exemplo, a minha área precisa divulgar muito. E a gente precisa muito da Comunicação. A gente enche o saco lá do pessoal deles para pedir para publicar. Às vezes, o evento já vai acontecer e eles não publicaram ainda, porque têm prioridade, têm muita demanda. (Colaborador da Unimed-Rio). Algumas áreas têm lá estrutura sim, onde tem uma pessoa por área, responsável por publicar informações dentro daquele espaço ali. Mas, pelo que eu percebi aqui, pelos comentários, não deve ser muito utilizado nem para publicações e nem para visualizações. [...]. Como você não tem como publicar a informação ali e colocar
112
uma chamada na página inicial, quase ninguém publica. Porque você publica, está escondida, o cara não vai ver, não sabe que está lá [...].(Colaborador da Unimed-Rio). [...] as grandes chamadas ficam sob responsabilidade da própria Comunicação. E aí eles têm como colocar uma foto que atraia [para] aquela matéria [...]. Os nossos tweets ficam lá embaixo, lá no verdinho, ninguém vê, entendeu? Não tem foto para atrair, não tem nada assim. Então, quando você quer realmente publicar algo que chame a atenção, você tem que pedir para a Comunicação colocar [...].(Colaborador da Unimed-Rio). Podia já você colocar fotos, colocar imagens, você montar com a cara da sua área. Eu acho que se tivesse uma página... Pelo menos para a minha área isso seria fundamental (Colaborador da Unimed-Rio).
Alguns empregados consideram essencial a descentralização no desenvolvimento das
atividades de sua área e gostariam de ter um espaço na intranet em que eles mesmos
pudessem divulgar informações para a empresa, tornando-se independentes da área de
comunicação. Para essas pessoas, o espaço no qual podem atuar hoje na intranet é quase
inexistente, de forma que o conteúdo que publicam quase não é visto pelos demais
empregados. A percepção deles é a de que as informações das áreas não são prioridade para a
área de comunicação – e, consequentemente, para a empresa – o que demonstra que a
centralização atrapalha.
Nesse contexto, os discursos vão de encontro ao conceito da Web 2.0 de gestão
descentralizada do conteúdo aplicada ao contexto organizacional, que dá “poder” a outras
áreas de negócio da organização para que, institucionalmente ou oficialmente, também
possam “fazer comunicação”, principalmente em relação ao negócio de cada uma delas. Na
Unimed-Rio percebemos que a gerência de Comunicação Corporativa ainda centraliza o
processo de comunicação, sendo a área que detém a fala oficial. Nesse sentido, há também
uma contradição em relação à divulgação feita pela empresa, na campanha de lançamento da
Interface 2.0, o que pode ser percebido nas frases “um canal exclusivo para postar as próprias
informações”, “gestão da informação”, “a partir de agora, tudo o que você escrever vai estar
disponível pra todos na empresa”, “ dar voz aos colaboradores da empresa”.
Nos discursos abaixo, no entanto, foi possível observar que, no entendimento dos
entrevistados, a descentralização da gestão do conteúdo na intranet deve ser limitada, de
forma que apenas pessoas específicas, de áreas consideradas estratégicas, possam atuar nesse
sentido. Eles destacam também a necessidade de treinamento para aqueles que seriam os
responsáveis pela gestão do conteúdo e entendem que essa não é uma necessidade de todas as
áreas da organização.
113
É, depende da área. Apenas para áreas estratégicas. (Colaborador da Unimed-Rio). Eu acho que você teria que trabalhar com facilitadores, né? (Colaborador da Unimed-Rio). Uma pessoa treinada dentro dos padrões de comunicação da empresa, da linguagem que a empresa utiliza. Porque senão também fica uma coisa muito aberta, muito ampla. (Colaborador da Unimed-Rio). Eles [a Comunicação] têm mais facilidade para lidar com isso, por estar convivendo com o público a todo o momento. Tem área ali que vai colocar informação excessiva, não vai ter bom senso e vai acabar não atendendo a expectativa do que foi proposto, que a gente está pedindo aqui. Na minha área, por exemplo, eu acesso. Para mim não precisa mais nada [...]. (Colaborador da Unimed-Rio).
Neste ponto observamos que os empregados da Unimed-Rio preferem a “liberdade
vigiada” e “com limites” apontadas pelos empegados da Cemig sobre a gestão descentralizada
do conteúdo. Ambos não concordam com o princípio da Web 2.0 de confiança radical nas
pessoas ou descentralização radical, conforme conceitua O’Reilly (2006), uma vez que gera
despadronização e desorganização no conteúdo da intranet. Percebemos que, na opinião deles,
o controle é necessário nesse caso.
Na Cemig, os empregados que têm a função de proprietário de site e atuam na intranet
publicando conteúdos corporativos e também específicos da área reconhecem os benefícios da
gestão descentralizada. Na opinião deles, houve, nesse quesito, uma evolução em relação à
antiga intranet:
A gente tinha uma intranet muito rígida, muito centralizada na TI92 e alguma coisinha na CE. Para você publicar uma coisinha qualquer, era uma dificuldade danada. E, a partir do 2.0, que você tem essa autonomia e responsabilidade sobre sua informação e o seu público, que você pode dar publicidade para um público definido, com a lista que você quiser e com a colaboração também, pedir a colaboração de quem você quiser, isso ficou bem mais evoluído e mais coerente com a realidade da Cemig. (Empregado da Cemig).
[...] por a gente conseguir fazer tudo mais fácil, usando os bloquinhos como se fosse um lego, ficou mais fácil. Antigamente a gente tinha que chamar empresas para fazer tudo pra gente [...], para tentar criar um padrão. Agilidade também. [...]. Porque, antigamente, para fazer as páginas, demorava. (Empregado da Cemig).
[...] hoje você cria um site interno, um portal. É a liberdade que você tem de você colocar as suas informações. (Empregado da Cemig).
Com muito mais facilidade que antes. Não precisa de um especialista. (Empregado da Cemig).
Podemos notar que agilidade, independência, autonomia e personalização são ideias
marcantes nos discursos destacados. Assim, os empregados reconhecem a importância de um
92 Sigla utilizada para a área de tecnologia da informação.
114
ambiente que valoriza o posicionamento do interagente de controlar seus próprios dados e que
tem como competências centrais a arquitetura da participação e o emprego da inteligência
coletiva. Esses princípios da Web 2.0, segundo O’Reilly (2006), são orientados pela ideia de
que o serviço fica automaticamente melhor quanto mais as pessoas o utilizam.
Existe outro ponto interessante a ser destacado: nas duas organizações, aqueles
empregados que gerenciam um site ou são responsáveis pelo conteúdo de sua área na intranet
utilizam (ou pensam em utilizar, quando a empresa lhe conceder essa autonomia) o ambiente
apenas para divulgar informações para acesso, ou seja, quando assumem o papel de gestores
da informação, fazem uso da intranet sob a lógica da Web 1.0.
No caso do SharePoint, sim, ficou positivo. Porque aí eu centralizei. [...] sou eu que crio todas as páginas, para poder ter um padrão. Porque, se tivesse muitos, aí cada um ia criar de um jeito, ia ficar meio despadronizado. (Empregado da Cemig). Então, de uma maneira muito simples, quer dizer, eu tendo área de servidor disponível para armazenar os meus dados, eu transformo esses dados em PDF, para que ninguém altere, dou permissão de leitura, de modificação a quem queira, no meu site [...]. Criamos o site com essa filosofia. (Empregado da Cemig). Então, nós colocamos lá, basicamente, tudo o que é usual da área. E os links de acesso a instruções, normas, tal, nós fizemos um site bem enxuto, só com essas informações básicas. (Empregado da Cemig). Nós [...] colocamos tudo lá dentro, os links mais importantes da nossa área, o que nós mais utilizamos. Para você não ter que voltar no portal principal e ficar procurando. Aí nós colocamos tudo dentro de um pacote só e fizemos o portal daquela forma. (Empregado da Cemig). [...] colocar todos os P&Ds, que são os projetos em desenvolvimento, para que toda a casa consiga acessar qualquer um deles. (Empregado da Cemig).
Então, assim, a Interface, ela ajuda bastante para a divulgação dos nossos trabalhos, dos nossos eventos e para a questão de pesquisa também. (Colaborador da Unimed-Rio). Às vezes as pessoas ligam para você, para tirar uma dúvida que está tudo na Interface. Assim, ligam muito para a gente, para falar: “Ah, eu queria entender mais sobre a missão, visão...”. Claro que a gente vai estar super aberto para explicar. Mas está tudo tão esmiuçado na Interface... (Colaborador da Unimed-Rio).
Nessa direção, pode-se afirmar que, ao mesmo tempo que os empregados requerem
das organizações um ambiente web relacional, atuam de maneira informacional, quando
assumem (ou pretendem assumir) a gestão de sites na intranet. Na posição de gestores de
conteúdo, os empregados utilizam as intranets como locais para publicação e divulgação de
suas informações para um público que irá acessar ou ler esse conteúdo. Por esse caminho,
aponta Primo (2008), fica evidente a influência do modelo transmissionista da Teoria da
Informação, onde o campo da comunicação formou raízes, que impregna a reflexão acerca das
115
interações mediadas por computador. Naquela concepção, a complexidade da comunicação é
reduzida à emissão de informações.
Com uma perspectiva diferente da que foi apresentada pelos empregados da Unimed-
Rio, os entrevistados da Cemig demandam pela democratização da publicação de conteúdo na
intranet. Conforme afirmam, a participação na CemigNet é restrita aos proprietários de site,
realidade que exclui os demais empregados do processo. Alguns depoimentos evidenciam que
isso ocorre devido ao receio que a empresa tem de “bagunçarem” o ambiente:
[...] não é aberto. Não há possibilidade de se abrir. Então, por exemplo, tem uma área com cinco pessoas, só um ou dois que vão mexer. (Empregado da Cemig). [...] que mais pessoas possam editar, entendeu? Eu acho que há um receio grande de que as pessoas baguncem as coisas. Mas, assim, se você instrui bem e se isso fica bem internalizado, não vai ter tanto... Há o risco ainda. A gente até teve notícia, mesmo com pessoa instruída, que era proprietário de site e tal, o pessoal colocou a imagem do Homer Simpson na página pessoal. Então, assim, era pessoa instruída. (Empregado da Cemig).
Para concluir, destaca-se que todos consideram a área de comunicação das
organizações como a “dona” da intranet, o que, para eles, é a situação ideal de gestão ampla
do ambiente. “Está na mão certa.” (Empregado da Cemig).
c) Utilização da intranet como ambiente informacional
A análise dos discursos dos empregados revelou que eles utilizam a CemigNet e a
Interface como ambientes informacionais e consideram-nas como tal, uma vez que
configuram-se ainda como fonte de informação, estritamente.
Na minha vida e na dos meus colegas, a gente utiliza a intranet da forma como ela é colocada para a gente. (Empregado da Cemig). Mas eu, na minha atividade, eu uso mais para consulta e para divulgação. (Empregado da Cemig). [...] eu vejo a intranet da Cemig como sendo uma convergência de informações. [...]. Eu, todos os dias, acesso a intranet, vejo as notícias, vejo se tem alguma coisa diferente, os banners, tudo, e deixo ela minimizada. (Empregado da Cemig). Bom, para mim, é exatamente como a capa de uma revista. Eu chego lá, abro, tem um monte de link com um punhado de informação, eu vou lá e pego uma informação ou outra. Mas não é algo, assim, que é vital no meu dia a dia. (Empregado da Cemig).
116
O volume de comentários sobre notícias, eles são baixos. [...] é muito difícil ter alguém comentando alguma coisa. [...]. Para qualquer notícia, qualquer informação. (Colaborador da Unimed-Rio). Para ver as informações mais importantes. (Colaborador da Unimed-Rio). [...] pelo menos eu fico mais de usuário mesmo, de navegação, e pegando os arquivos lá que eu preciso, fazendo consulta, mas não posto muita coisa. (Colaborador da Unimed-Rio). É uma fonte muito boa de consulta, de informação, [...] para você pegar um arquivo que você precisa lá, fazer uma consulta, um formulário [...]. (Colaborador da Unimed-Rio).
De maneira geral, os empregados utilizam a intranet para acessar informações
relacionadas a Recursos Humanos, sistema de controle de ponto, normas, formulários,
projetos e serviços e para disponibilizar planilhas, treinamentos e arquivos, o que confirma a
percepção da intranet como fonte de informação, onde se pode ter uma noção geral sobre a
organização. O uso recorrente dos verbos acessar, disponibilizar, divulgar, ler, dentre outros,
evidencia o perfil informacional do ambiente web.
Dessa forma, observamos que a intranet é o local para publicação/divulgação,
acesso/leitura de informações, em que a web ainda desempenha o papel de mera provedora de
informações em mão única (conteúdo → usuário). Mesmo aqueles que consideram a intranet
vital para o seu trabalho, utilizam-na como um ambiente informacional e não como um
modelo de duplo sentido de direção, como um espaço no qual as pessoas são incentivadas a
participar e colaborar, opinando, escrevendo e organizando conteúdo. A ênfase mantém-se na
publicação em vez da participação, predominando-se uma visão polarizada do processo
comunicativo, que opõe emissão e recepção, não havendo interação entre os envolvidos
(PRIMO, 2008).
Ainda nessa direção, observamos, principalmente entre os empregados da Unimed-
Rio, o uso das palavras “interação”, “colaboração”, “diálogo” não no sentido que a Web 2.0
dá a esses termos, mas atrelando-os à ideia de receber/visualizar mais informações com mais
facilidade:
Eu separei algumas palavras que eu acho que simbolizam a Interface, que é: o “encontro”, o “diálogo”, a “vitrine”, porque eu acho que tem essa coisa do reconhecimento. E um espaço excelente, pela quantidade de conteúdo que ela traz. E a imagem que eu coloquei mesmo foi a imagem do diálogo. Que eu acho que é a fonte mais segura. Que apesar de a gente receber informações aí pelos corredores e tal, a gente só tem a certeza de que aquilo é de fato uma notícia quando a gente lê na Interface. Aí não tem como contestar. (Colaborador da Unimed-Rio).
117
Nesse contexto, os discursos acima podem ser caracterizados pela concepção de
interatividade, de Primo (2008), que assume um posicionamento oposto à ideia de interação
mútua. O autor afirma que a lógica da interatividade, ao tratar de interações mediadas por
computador, ressalta apenas as facilidades de publicação ou de acesso a informações, visto
que essas perspectivas incorporam uma visão polarizada de comunicação. Ao destacar, de
forma tecnicista, ou emissão ou recepção, “[...] minimizam ou deixam de lado as formas
dialógicas que emergem através das mais diferentes interfaces na Internet [...]” (PRIMO,
2008, p. 14).
Os entrevistados apontaram vários motivos que, em sua perspectiva, explicam por que
a intranet, mesmo após a reformulação, ainda é utilizada como um ambiente informacional.
Entre eles, destacam-se o não-aproveitamento de seu potencial, a falta de tempo, informações
restritas a um grupo, a ausência de estímulo, a cultura da organização e de seus interlocutores,
e a rapidez na implementação.
Eu não sei que isso existe, que pode ser útil para mim, então eu não vou nem pedir. (Empregado da Cemig). Porque eu acho que o trabalho de implantação da intranet deveria ter sido bem mais a longo prazo. Eu acho que foi muito apertado o prazo. É, tipo assim, você andava com um Fusca aí, em dois meses, falou assim: “Você aprende a dirigir uma Ferrari de Fórmula I”. [..]. É mais ou menos a minha percepção. (Empregado da Cemig).
Isso tudo já está aqui dentro, só falta ser utilizado. Eu acredito que, com a versão 2010 aí, isso vai ser muito modificado. [...] se eles forem colocar isso tudo em prática, vai ser o melhor sistema que a empresa já viu. (Empregado da Cemig).
A intranet é espetacular, eu acho. Eu sou um fiel escudeiro da intranet, mas, para ela ter o que nós todos estamos falando aqui, a gente tem que ter um pouco mais de tempo. (Empregado da Cemig). [...] teria que ter um tempo para se dedicar à intranet. E a Cemig não nos dá esse tempo. (Empregado da Cemig). Eu acho que, se a empresa investiu tanto nessa ferramenta, por que não estimular o uso? E eu acho que também existe um fator cultural. Muita gente ainda não internalizou isso para a sua cultura de trabalho. [...]. Essa ferramenta está disponível, é possível você fazer isso, mas ninguém usa. (Empregado da Cemig). No começo eu comentava até mais. Mas, agora, pela quantidade de serviço, eu tenho comentado menos. (Colaborador da Unimed-Rio). [...] às vezes, a demanda é um pouco grande, não dá para a gente comentar, mas a gente responde o que as pessoas comentam sobre os serviços que a gente coloca lá. (Colaborador da Unimed-Rio). Mas eu confesso que os nossos comentários são só de resposta também. (Colaborador da Unimed-Rio).
118
Tem muita gente na minha área. São, mais ou menos, 400 pessoas. Eu acho que nem todo mundo vê a Interface, não. A gente tem um tempo meio reduzido para isso. (Colaborador da Unimed-Rio).
A análise dos discursos nos leva a crer que os motivos para que os empregados
apreendam a intranet como um ambiente informacional podem estar relacionados à seguinte
afirmação de Primo (2008, p. 131):
[...] suponha-se agora que uma organização crie uma nova seção em sua Intranet, procurando impor aos funcionários certos valores e procedimentos importados de uma nova “moda” do marketing. Por serem incompatíveis com as expectativas das equipes e seu modo atual de operar e de se relacionar, tal pacote encontra reações de oposição, mesmo que as páginas digitais apresentem sofisticados recursos persuasivos.
Entendemos que Primo (2008) compartilha da ideia de Recuero (2012), que afirma
que os processos de comunicação mediada por computador (CMC) não são influenciados
apenas pelas suas ferramentas. “Ela [a CMC] é, também, um produto da apropriação social,
gerada pelas ressignificações que são construídas pelos atores sociais quando dão sentido a
essas ferramentas em seu cotidiano.”. (RECUERO, 2012, p. 24). Assim, concluímos que a
apreensão da lógica da Web 2.0 pelos empregados e também pelas organizações somente irá
acontecer se fizer algum sentido para eles. Dessa maneira, segundo a autora, as conversações
em rede não são determinadas simplesmente pela existência das redes sociais na internet, mas
por “elementos de apropriação dos grupos sociais de ferramentas com potencial
comunicativo.” (RECUERO, 2012, p. 18).
d) Hegemonia/controle
A partir da pesquisa, especialmente com o grupo focal, percebemos que CemigNet e
Interface não se configuram como ambientes desenvolvidos sob a lógica da Web 2.0. Uma
das justificativas é que a cultura de participação proposta pela segunda geração de redes
digitais ainda não é bem aceita nas organizações. Os empregados afirmam que aqueles que
assistem a um vídeo ou leem uma matéria na intranet, por exemplo, são mal vistos pelo
gerente ou até mesmo pelos próprios colegas. Nesse contexto, como participar de blogs,
fóruns ou postar conteúdo em um site, sendo que essas atitudes são relacionadas a “quem não
tem nada para fazer”?
119
[...] por cultura da empresa, às vezes o outro olha: “Olha lá, o cara está vendo vídeo ali. Vagabundo. O cara não tem serviço”. (Empregado da Cemig). Mas é sério isso. A gente às vezes tem que usar a intranet com uma certa restrição. (Empregado da Cemig). Porque é mal visto. Se você está passeando na intranet, você está enrolando. (Empregado da Cemig).
A gente já tentou utilizar o fórum algumas vezes, mas não é útil. [...]. Porque você também se expõe: “Ah, aquela pessoa fica comentando porque ela tem tempo”. Existe isso. Então, assim, quem lê tudo é porque tem tempo. (Colaborador da Unimed-Rio). [...] até para fazer cursos. Tem lugar que isso conta muito. Se você não faz curso, você é desinteressado. Se você faz, você não trabalha. (Colaborador da Unimed-Rio). [...] mas tem gente que não olha [a intranet]. Chega até um pouquinho mais cedo do almoço, almoça cronometrado, para dar uma olhadinha na Interface, olhar o e-mail pessoal e só. (Colaborador da Unimed-Rio).
Ainda nesse contexto, muitos afirmam que a cultura da participação está relacionada à
hierarquia e depende da visão do gestor, ou seja, se ele apoia a interação por meio da intranet,
ela vai acontecer. O contrário também é verdadeiro.
Nesses discursos fica evidente a questão do poder e do controle que impera no
contexto das organizações, constatação que nos leva à abordagem de discurso de Fairclough
(2001) que concebe o poder como hegemonia. Aqui, as falas dos empregados revelam que o
comportamento dos gestores reproduz as relações de poder e as hegemonias existentes no
ambiente interno das empresas, revelando as marcas de assimetria. Para o autor,
[...] a prática discursiva, a produção, a distribuição e o consumo (como também a interpretação) de textos são uma faceta da luta hegemônica que contribui em graus variados para a reprodução ou a transformação não apenas da ordem de discurso existente (por exemplo, mediante a maneira como os textos e as convenções prévias são articulados na produção textual), mas também das relações sociais e assimétricas existentes. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 123-124).
Ressaltamos que a postura dos gestores destacada no discurso dos empregados
comprova a predominância do viés informacional/tecnicista/transmissional das relações,
percepção que se intensifica quando também entra em jogo a cultura da organização. Podem
surgir contradições no ambiente interno, por exemplo, quando uma organização com princípios
muito rígidos de hierarquia insere a Web 2.0 em seus processos. “A escolha de um modelo de
comunicação interna está vinculada ao modelo de gestão adotado pela organização.
Naturalmente, um modelo de gestão aberta oferece bases para o desenvolvimento do paradigma
relacional.” (OLIVEIRA; PAULA, 2009, p. 24).
120
Outra razão para que a intranet não seja considerada um espaço de interação, na
opinião dos empregados da Cemig, principalmente, deve-se ao fato de a empresa não liberar a
utilização das funcionalidades que proporcionam a colaboração, a exemplo de blogs e fóruns
de discussão, ou não divulgar a existência delas. Muitos atribuem essa realidade,
principalmente, à política da organização ou ao perfil do chefe.
É a política da empresa, de não querer utilizar as funcionalidades. Poderia haver fóruns lá dentro, haver blog... (Empregado da Cemig). [Criou-se] uma expectativa muito grande. Aí, quando veio, não veio nada: não pode por foto, não pode criar blog, não pode, não pode, não pode. (Empregado da Cemig). O SharePoint, ele consegue ser muito colaborativo, se você habilitar essa função dele corretamente, né? (Empregado da Cemig). Não querem que usem, né? Porque o programa entrou na Cemig, te cadastrou [...]. Só que alguém tem que te deixar usar, te habilitar. E não tem custo. O custo é zero. (Empregado da Cemig). [...] todas as empresas top do mundo usam isso. Então deve ser muito bom. Eu acho que deve ser muito bom, porque eu não tenho certeza se é, porque não deixam usar ainda. (Empregado da Cemig). Eu acho que o SharePoint é tão aberto, tão aberto, que eles ficaram com medo de virar uma arma do empregado. (Empregado da Cemig). Eu tenho colega que não tem acesso ao Communicator93 porque o gerente não libera. (Empregado da Cemig). É o que eu falei, troca o chefe. (Empregado da Cemig).
A frase “O custo é zero.” evidencia ainda mais o fato de que incentivar a colaboração
entre os empregados por meio da intranet é uma questão mesmo de política e de perfil do
chefe, uma vez que não significa despesa para a organização. Alguns depoimentos revelam
ainda que uma das soluções para esse problema, assim como identificam os empregados, seria
a “[...] conscientização gerencial. [...] o treinamento tem que começar lá em cima.”
(Empregado da Cemig). Outro ponto importante observado é que não há informação
padronizada sobre os recursos da intranet. Há níveis de informação muito discrepantes, uma
vez que alguns têm conhecimento de funcionalidades que outros não sabem que existem.
Assim, não se pode considerar a conclusão de que os empregados não querem colaborar por
meio da intranet, pois a maioria sequer sabe o que é possível fazer.
Na ocasião, vale recuperarmos novamente a metáfora do radar proposta por Fausto
Neto (2008), na qual a comunicação é associada à ideia de radar, enquanto um dispositivo 93 Microsoft Office Communicator é o nome do chat corporativo implementado na Cemig.
121
que teria o objetivo de proteger, por meio do controle, as atividades de uma organização
frente às manifestações do ambiente que lhe oferecem perigo. Nesse sentido, percebemos nos
discursos dos empregados que há o receio por parte dos gestores de liberar os recursos de
colaboração, uma vez que podem representar a perda de controle da empresa. Podemos
concluir que os gestores adotam um modelo de pensamento comunicacional baseado nas
linearidades de um modelo transmissivo verticalizador, que, segundo Pinto (2008, p. 86),
deveria assegurar que “[...] ‘posso dizer aqui com certeza de que serei totalmente entendido
lá’ se conseguir eliminar os ruídos que podem interferir na mediação.”. Porém, o autor destaca
que os ruídos fazem parte do processo comunicativo, de maneira que não existe nada sem
ruído.
Considerando aqui a Cemig, em particular, os entrevistados afirmam que há blogs e
fóruns na intranet, porém destacam que esses espaços de colaboração aparecem “de vez em
quando” e, quando aparecem, vêm “de cima pra baixo”, apenas quando é do interesse da
organização obter informações do empregado.
Só em momentos muito específicos. Igual: teve a negociação sindical ano passado, criou um blog sobre negociação. (Empregado da Cemig).
A intranet permite criação de blog, mas essa ferramenta eu não sei se está disponibilizada para funcionário. Porque, de cima, a empresa consegue criar blogs e criar fóruns, quando ela quer saber alguma coisa da gente. Mas a gente não consegue fazer a mesma coisa. (Empregado da Cemig). Isso fica muito restrito na CE94. [...] lá tem blog, lá tem fórum, lá tem um monte de coisa na CE. Você entra na CE, você vê isso. É ou não é? Mas quem usa? (Empregado da Cemig).
Nos dicursos notamos também que o blog criado pela organização, no período de
negociação sindical, é visto pelos empregados como um ponto positivo, pois, na percepção
deles, houve uma participação significativa. No entanto, o que eles quiseram ressaltar foi o
fato de que o blog demonstrou que há uma demanda reprimida, que deve ser atendida: “[...]
bombou no sentido bom. Quer dizer o quê? Há uma demanda para isso, por que não
explorar?” (Empregado da Cemig). Nesse sentido, a demanda por espaços de interação na
intranet demonstra que os empregados esperam por processos de comunicação dialógicos, que
considerem suas perspectivas.
A partir dessas análises, é possível perceber que a maioria das organizações adotam
uma lógica transmissional, ao acreditar que “[...] a intencionalidade impressa em suas
94 Sigla utilizada para Superintendência de Comunicação Empresarial da Cemig.
122
estratégias irá produzir os sentidos almejados.” (LIMA; OLIVEIRA, 2010, p. 3),
menosprezando os papéis que assumem seus interlocutores. Sendo assim, se antes as
organizações acreditavam ser possível controlar os diferentes processos a partir de estratégias de
comunicação, hoje, a complexidade própria da sociedade se reflete nos processos que marcam a
relação com seus interlocutores. E nesse novo contexto, as organizações precisam lidar com
situações inesperadas e imprevistas, advindas de uma crescente movimentação dos sujeitos
relacionada à produção de sua comunicação e à influência no cotidiano das organizações,
inaugurando uma outra forma de diálogo (OLIVEIRA; LIMA; MONTEIRO, 2011, p. 4).
Ressaltamos que os entrevistados da Unimed-Rio consideram importante a interação
entre os empregados por meio da intranet, porém não a consideram um processo fundamental
para o ambiente de trabalho ou para a atividade que realizam na empresa, diferentemente da
perspectiva dos empregados da Cemig.
Mas eu acho que a única maneira de participar, que são os comentários, as pessoas têm uma restrição com isso. Porque se expõem, entendeu? [...]. Todo mundo vai me julgar se eu escrever errado, se eu falei assim, a maneira como eu falei, etc. Então eu acho que as pessoas têm receio de se expor. Por mais que elas queiram participar, elas querem participar de uma forma mais neutra [...]. (Colaborador da Unimed-Rio). Só para a galera ver, adquirir o conhecimento, mas não vai dar o ponto de vista dela, não vai concordar, discordar. Até porque isso é uma exposição. O cara vai, o negócio que é com “x”, escreve com “s”, aí: “Burro, idiota...” Entendeu? A pessoa não precisa passar por isso. Aí vai e não comenta. [...] uma exposição dessa, assim, é negativa para a imagem profissional dela e pessoal. Eu não comento. Sinceramente, eu não comento por causa disso. Porque a exposição é complicada. (Colaborador da Unimed-Rio). Eu postei no meu Facebook, com as pessoas que estão participando do programa e têm Facebook, eu coloquei lá: “E aí, galera, amanhã tem mais!”. Eu não vou chegar numa Interface da empresa e botar assim: “E aí, galera, todo mundo animado para amanhã?”. [...] Imagina. Vai surgir milhões de comentários sobre: “Quem é essa maluca que está colocando ‘vamos lá, galera, amanhã tem mais’?”. Não é nada demais, porque eu não estou falando nada. Mas eu prefiro ir lá no meu Facebook e falar: “E aí, galera! Amanhã tem mais projeto de verão Unimed!”. (Colaborador da Unimed-Rio). Expressa a sua opinião, mas não se comprometa. (Colaborador da Unimed-Rio). Eu acho que não dá certo, porque a nossa cultura – não é a cultura da empresa, não, é a cultura do povo brasileiro – ela não é voltada para a cultura da mudança, de que tudo muda o tempo todo, cultura evolutiva. [...] tem sempre aquelas coisas de raízes presas, arraigadas, os conceitos e, se alguém tem um conceito diferente, desestrutura, te desconforta. (Colaborador da Unimed-Rio).
Eles trazem um ponto de vista interessante segundo o qual a postura dos empregados
de optar por não participar é a razão que justificaria o fato de a Interface não se revelar uma
123
intranet 2.0. O receio da exposição no ambiente corporativo é marcante nos discursos, o que
evidencia o controle exercido pelas organizações, em um processo de relação assimétrica, e
revela o que Recuero (2012) propõe sobre a existência de laços fracos e laços fortes, no
contexto da conversação em rede95. Concluímos que os laços fracos referem-se àqueles
existentes entre as organizações e seus empregados e também, muitas vezes, entre os próprios
empregados.
Segundo a autora, laços fortes conseguem manter uma conversação com um nível
maior de informalidade, uma vez que há mais intimidade entre as pessoas. Nesse caso, as
normas de polidez são mais maleáveis, pois os atores sabem o que pode ser dito sem gerar
conflito. Por outro lado, Recuero (2012) destaca que, quando os laços são mais fracos, a
polidez é fundamental para permitir a manutenção da conversação. Assim, a autora sugere que
quanto maior a confiança no grupo e nas normas que orientam a interação, maiores as chances
de o interlocutor sentir-se confortável para interagir. Entretanto, ela afirma que
[...] nos laços fracos não há uma percepção tão clara das normas que governam essas interações. Quanto mais distantes os indivíduos no grafo social, menor o compromisso de cooperação que possuem uns com os outros. Os laços fracos tendem a conectar ‘conhecidos’, ou seja, indivíduos que não necessariamente dividem os mesmos contextos de interação offline. Com isso, há um maior risco de uma interação gerar atos de ameaça à face e dificultar a conversação, silenciando os atores. (RECUERO, 2012, p. 162-163).
Para concluir, observamos que a combinação entre texto, prática discursiva e prática
social para a análise dos discursos dos interlocutores organizacionais contribui para o
entendimento das relações no contexto organizacional em sua amplitude, assim como de suas
marcas de conflito e contradições. Nessa perspectiva, afirmamos que a comunicação é um
“[...] processo de construção e disputa de sentidos.” (BALDISSERA, 2008, p. 33), já que é na
tensão existente na relação comunicativa – ou na prática discursiva –, entre a organização e
seus interlocutores, em um contexto específico, que os sentidos são disputados e construídos,
apropriados e internalizados de maneiras diferentes pelos sujeitos em relação.
95 “[…] aquela que surge dos milhares de atores interconectados que dividem, negociam e constroem contextos
coletivos de interação, trocam e difundem informações, criam laços e estabelecem redes sociais.” (RECUERO, 2012, p. 19).
124
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebemos, por meio das análises, que a empiria refuta os princípios teórico-
conceituais acerca da Web 2.0 apontados até o momento, ao considerarmos os processos de
comunicação empreendidos no ambiente interno das organizações. Ressaltamos que os
discursos dos empregados foram coincidentes na maioria dos pontos abordados nas
categorias, levando-nos a concluir que eles não reconhecem o espaço relacional que Cemig e
Unimed-Rio propõem ao transformarem suas intranets em ambientes desenvolvidos sob a
lógica da Web 2.0.
Destacamos que, o fato de a Cemig cumprir, de certa forma, com a promessa de
proporcionar um ambiente cuja gestão de conteúdo é descentralizada não faz com que os
empregados percebam a CemigNet como um espaço de relacionamento, característica
fundamental da lógica da segunda geração de redes digitais. Assim, havia a hipótese de que a
análise do material coletado evidenciaria as contradições existentes entre o discurso das
organizações e a apreensão desse discurso por parte dos empregados, fato confirmado após a
avaliação dos dados.
Nesse contexto, percebemos que há uma defasagem entre sistemas de informação e
práticas de uso, emergindo o que Fausto Neto (2008a) chama de pontos de fuga, iniciativas ou
ações não previstas pelos mecanismos de regulações idealizados por políticas e estratégias
informacionais. Os discursos dos empregados revelam posicionamentos que, em sua maioria,
refutam significados, apontando para novas possibilidades de sentidos que podem emergir na
relação. Destacamos, assim, que o sentido depende das escolhas do receptor, ou seja, daquilo
que o atinge ou que ele quer atingir. Há fluxos de comunicação de qualidades e
intencionalidades variadas, observáveis apenas no acontecer, quando os sentidos são
produzidos, de maneira que os sentidos propostos por um sujeito em comunicação não são,
obrigatoriamente, os mesmos que serão internalizados por seu interlocutor.
Sendo assim, se antes as organizações acreditavam ser possível controlar os diferentes
processos a partir de estratégias de comunicação, hoje, a complexidade própria da sociedade se
reflete nos processos que marcam a relação com seus interlocutores. E nesse novo contexto, as
organizações precisam lidar com situações inesperadas e imprevistas. É nessa direção, portanto,
que o modelo relacional da comunicação apresenta-se como o mais pertinente para a
compreensão das relações que as organizações estabelecem com seus interlocutores e dos
processos de comunicação que ocorrem no contexto organizacional.
125
Durante as entrevistas, notamos que há esse entendimento por parte dos gestores das
áreas de comunicação das empresas, quando falam sobre as intenções e os objetivos que
pretendiam alcançar, ao implementarem as intranets 2.0. Eles reconhecem que CemigNet e
Interface ainda não cumprem a promessa de atuar como ambientes que seguem aquela lógica,
fato que, na nossa percepção, é consequência da racionalidade da gestão das organizações,
que, de tão forte, impera em todos os processos. Os discursos de alguns gestores – que por
definição metodológica não foram contemplados nas análises anteriores – abordam essa
questão, evidenciando que a cultura de participação na web somente será apreendida pelos
empregados quando aqueles que gerenciam a empresa apropriarem-se das intranets para
interagir.
Nesse contexto, observamos que a questão da hierarquia e do controle na realidade das
organizações é tão presente que os empregados da Unimed-Rio consideram impossível a
lógica da Web 2.0 dar certo no ambiente interno das empresas. Para eles, o espaço
organizacional não combina com a ideia de confiança radical sugerida pela segunda geração
de redes digitais e não é o local para que a conversação em rede aconteça. Os empregados da
Cemig, por sua vez, demandam por espaços de relacionamento na intranet e acreditam em sua
possibilidade, embora também não concordem com a ideia de liberdade total, requerendo um
certo controle. Entendemos que esses posicionamentos revelam a eficácia ideológica das
estruturas sociais, normas e convenções efetivamente interiorizadas.
Sugerimos que os processos hierárquicos das organizações contribuem para que
intranets 2.0 sejam ainda uma tendência embrionária entre as empresas, realidade observada,
principalmente, na ocasião da procura pelo objeto empírico. Os próprios gestores de Cemig e
Unimed-Rio confirmam essa constatação, quando afirmam que a intranet “ainda é 1.8, não é
2.0” ou que a quebra do nível hierárquico é uma necessidade, para que a intranet possa
realmente assumir o papel de ferramenta de participação e de integração.
Por fim, destacamos que esta pesquisa nos possibilitou ampliar os conhecimentos
sobre processos interacionais nas organizações e, sobretudo, perceber a importância da
abordagem relacional para sua compreensão. Além disso, relacionar a prática discursiva e os
processos de construção de sentidos à prática social contribuiu para o entendimento de que é
esse o movimento da comunicação, que se materializa em discursos que emergem como
expressão de uma relação e de uma realidade social. Destacamos que este trabalho objetiva
ampliar as possibilidades de pesquisa, abrindo novas frentes de estudo para se repensar a
comunicação no contexto das organizações, contribuindo para uma construção conceitual
menos linear e informacional do campo e muito mais interacional.
126
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APÊNDICE
APÊNDICE A – ROTEIRO PARA MEDIAÇÃO DO GRUPO FOCAL
Roteiro - Grupo Focal
1. Aquecimento
a. Apresentação da técnica;
b. apresentação do objetivo do grupo focal: (parte integrante de uma pesquisa para dissertação de
mestrado da colega Luiza. O tema do grupo é intranet);
c. garantia de sigilo e aviso da gravação.
2. Intranet: relacionamento cotidiano e significação
a. No dia a dia de trabalho, em que momentos, para que finalidades vocês utilizam a intranet?
b. Geralmente, de que forma vocês utilizam a intranet? Apenas leem/veem/apreendem informações;
postam conteúdos também; leem mais do que compartilham/postam conteúdo ou contrário: postam
mais conteúdos do que leem... expliquem como é...
c. Mesmo que seja uma estimativa, por quanto tempo, em um dia de trabalho normal, utilizam a intranet?
d. O que a intranet da Cemig significa para vocês? (Técnica projetiva de colagem - atividade individual) –
Desdobramento coletivo: cada pessoa explicará o motivo da figura colada e as demais poderão
comentar.
e. De maneira geral, como avaliam a intranet da empresa atualmente? Gostaria que falassem de aspectos
positivos e negativos que vocês percebem... O que tem de positivo? E de negativo?
f. Como percebem a importância das informações compartilhadas na intranet: são necessárias para vocês
ou não? Por quê?
3. Intranet como espaço de interação
a. Na opinião de vocês, a intranet é um espaço que possibilita a interação entre os empregados ou não? Por
que percebem dessa forma?
b. Na intranet da Cemig há espaços de colaboração onde os empregados podem discutir ideias, dar
opiniões, fazer comentários, publicar informações ou não? Que espaços são esses? Expliquem de
maneira geral...
c. Os empregados compartilham informações na intranet ou não? Ocorre compartilhamento no dia a dia?
Há segmentos, setores, áreas da empresa que compartilham mais conteúdo na intranet que outros?
Quais compartilham mais? E quais compartilham menos? Como percebem?
d. Vocês próprios participam da criação de conteúdo da intranet?
� (se sim) De que forma isso acontece? Gostariam de participar mais com a criação de conteúdo
na intranet ou não? Por quê?
� (se não) Por que não participam com a criação de conteúdo? Isso é importante para vocês ou
não? Por quê?
e. Se alguém perguntasse para vocês hoje, quem é o proprietário da intranet da Cemig, quem vocês
diriam? Por quê? De que forma percebem isso? Existe algum setor ou área da Cemig que parece ser
proprietária/dona da intranet ou não? Por quê?
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f. De maneira geral, sentem-se parte da intranet da empresa ou não? Por quê?
g. Vocês sentem que a empresa, por meio da nova intranet, passou a valorizar mais a interação entre os
empregados? Por quê? (se necessário, estimular) A intranet é uma forma de incentivo a espaços para
discussões e colaboração ou não? Por quê?
4. Mudanças da intranet
a. Houve uma reformulação da intranet da Cemig em março de 2010. Vocês perceberam muitas mudanças
ou não? (se sim) O que mudou?
b. Na opinião de vocês, a nova intranet apresentou melhorias após a reformulação ou não?
� Em caso positivo, quais foram essas melhorias?
� Em caso negativo, o que piorou em relação à intranet antiga?
c. O que diriam sobre a divulgação dos benefícios da nova intranet? A divulgação da nova intranet foi
intensa, bem divulgada ou não? Por que pensam dessa forma? Que benefícios foram divulgados?
d. Os benefícios divulgados foram percebidos na intranet ou não? Ou seja: os benefícios foram de fato
realizados, foram realizados em parte ou há algo que não se concretizou? O quê?
e. Os empregados puderam dar sugestões para a intranet ou não? Vocês próprios deram alguma sugestão?
(se sim) Qual (is)?
f. Por experiência própria ou pelo que perceberam, vocês consideram que a opinião e as sugestões dos
empregados foram levadas em conta para a criação da nova intranet ou não?
g. E hoje? Suas opiniões e necessidades em relação à intranet são levadas em consideração pela empresa
ou não? Deem exemplos de como isso ocorre.
5. Finalização
a. Há algo mais que gostariam de falar sobre a intranet da empresa?
b. Gostariam de dar sugestões de aprimoramento? O quê?