Acórdão STj - Direitos Individuais Imprescritíveis

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Acórdão do STJ sobre direitos individuais imprescritíveis

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 962.934 - MS (2007/0145328-6) RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMINRECORRENTE : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL PROCURADOR : FELIPE M GIMENEZ E OUTRO(S)RECORRIDO : GONALVES GRISOSTE PACFICO ADVOGADO : ALMIR SILVA PAIXO - DEFENSOR PBLICO

    RELATRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator):

    Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, "a", da

    Constituio da Repblica, contra acrdo assim ementado:

    APELAO CVEL AO DE INDENIZAO PRELIMINARES VIOLAO AO PRINCPIO DA DIALETICIDADE INOCORRNCIA PARTE-RECORRENTE REBATE OS FUNDAMENTOS DA SENTENA INPCIA DA INICIAL PEDIDO QUE DECORRE LOGICAMENTE DA NARRAO FTICA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM ESTADO RESPONSVEL PELA EDIFICAO E REFORMA DOS PRESDIOS AUTARQUIA CRIADA PARA ATENDER O FIM ENUMERADO NA LEI QUE A INSTITUI PRELIMINARES AFASTADAS MRITO DANO MORAL CARACTERIZADO TEORIA DA RESERVA DO POSSVEL CONJUGADA COM O MNIMO EXISTENCIAL HONORRIOS ADVOCATCIO DEFENSOR PBLICO PREQUESTIONAMENTO MATRIA SUFICIENTEMENTE DEBATIDA E DISCUTIDA PELO RGO COLEGIADO RECURSO IMPROVIDO.

    Tendo a parte-apelante impugnado os pontos da sentena objurgada, apontando as razes pela quais, a seu ver, a deciso deve ser modificada, no h falar em violao ao princpio da dialeticidade.

    Presentes a causa de pedir e o pedido na ao de indenizao, somando-se o fato de que da narrao ftica decorre logicamente a concluso, padece de amparo a assertativa de que a exordial inepta.

    A autarquia criada para atender um determinado fim, cujas atribuies encontram-se enumeradas na lei que a criou. O pedido de indenizao est ligado ao sofrimento causado pela superlotao dos presdios e ausncia de melhoramentos estruturais, adequao do aspecto fsico, sendo que essas atribuies no se encontram no rol legal previsto para a Agepen. Se a omisso estatal geradora de danos morais a causa de pedir (relao jurdica posta em juzo) do preso, parte legtima passiva ad causam a pessoa jurdica titular dos deveres constantes nessa mesma relao jurdica (Estado).

    O Estado ser responsabilizado a indenizar quando, por ato omissivo, tenha causado dano a particular, desde que comprovada a conduta culposa ou dolosa do ente federativo.

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    Demonstrado que os problemas de superlotao e de falta de condies mnimas de sade e higiene do estabelecimento penal (presdio) no foram sanados, aps o decurso de um lapso quando da formalizao do laudo de vigilncia sanitria, est devidamente comprovada a conduta omissiva culposa do Estado (culpa administrativa).

    No sendo assegurado o mnimo existencial, no h falar em aplicao da teoria da reserva do possvel.

    A Emenda Constitucional n 45/2004 concedeu autonomia funcional Defensoria Pblica que, por via reflexa, deixou de ser um rgo auxiliar do governo e se tornou um rgo constitucional independente, recebendo, tambm, autonomia administrativa e financeira, Por no estar a Defensoria Pblica subordinada ao Poder Executivo, so devidos os honorrios advocatcios ao defensor pblico.

    Para o cabimento dos recursos excepcionais indispensvel que a matria constitucional ou federal que se quer levar aos tribunais superiores tenha sido julgada, no havendo necessidade de constar, expressamente, o artigo da CF ou da lei na deciso recorrida, para que se tenha a matria como prequestionada.

    Recurso improvido. (fls. 337-338)

    Foram opostos aclaratrios, rejeitados pela Corte de origem (fls.

    377-381).

    O recorrente alega violao dos arts. 267, VI, do CPC e 186, 381 e 927

    do CC. Argumenta que a condenao do Estado para indenizar o autor, que

    presidirio, a ttulo de dano moral em decorrncia da precariedade de sua situao, no

    ir melhorar as condies do estabelecimento prisional ou contribuir para resolver o

    problema da superlotao carcerria, carecendo assim o autor de ao. Sustenta ser

    invivel o pagamento de honorrios Defensoria Pblica do prprio Estado,

    porquanto se trata da mesma pessoa jurdica, incidindo o instituto da confuso, ou seja,

    credor e devedor so a mesma pessoa.

    Ressalta ser indevido responsabilizar o ente pblico subjetivamente por

    omisso na prestao de servio pblico, porque a hiptese cuida do exerccio de

    poder de polcia. Aduz que inexiste ilicitude ou negligncia no fato de no haver

    recursos pblicos para ampliar as estruturas carcerrias. Menciona a aplicabilidade ao

    caso do princpio da reserva do possvel diante da escassez de recursos. Requer a

    reforma do decisum para que seja reconhecida: a) a preliminar de carncia de ao, ou,

    no mrito, b) a inexistncia de dever de indenizar, mediante pagamento mensal ao

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    recorrido durante todo o tempo em que estiver encarcerado, e c) a inviabilidade na

    condenao em honorrios advocatcios (fls. 389-411).

    Contra-razes apresentadas (fls. 441-454).

    O Ministrio Pblico Federal opina pelo parcial provimento do recurso,

    to-somente para isentar o Estado do pagamento das custas e honorrios Defensoria

    Pblica (fls. 468-479).

    o relatrio.

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    RECURSO ESPECIAL N 962.934 - MS (2007/0145328-6)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): A

    irresignao merece acolhida.

    O Tribunal de origem consignou, por maioria e vencido o relator, que as

    condies insalubres a que o recorrido estava submetido no estabelecimento prisional

    fazem jus concesso de indenizao a ttulo de danos morais, no valor de R$

    3.000,00, mais juros de mora na taxa de 1% ao ms. O referido valor dever ser pago

    pelo Estado de Mato Grosso do Sul enquanto o condenado estiver cumprindo pena.

    Apesar de as razes principiolgicas em especial a dignidade da pessoa

    humana e a violao do mnimo existencial terem servido de norte tese vencedora,

    no vislumbro qualquer razoabilidade ou mesmo proporcionalidade em onerar o ente

    estatal com mais uma rubrica despida de finalidade pblica, em sua essncia.

    Com razo o voto vencido, ao mencionar que h "necessidade de se ter

    uma melhoria urgente no sistema prisional, o qual dever ser feito por meio de

    construes e reformas, e no de pagamento pecunirio aos apenados" (fl. 349).

    No se trata de aplicao da clusula da reserva do possvel (Vorbehalt

    des Mglichen ), consagrada pelo Bundesverfassunsgericht tedesco, que pode ser

    traduzida como a "possibilidade do indivduo em exigir racionalmente certas medidas

    da sociedade (...) para concretizao de direito fundamental tido como violado"

    (BVerfGE 33, 333: Auch soweit Teilhaberechte nicht von vornherein auf das jeweils

    Vorhandene beschrnkt sind, stehen sie doch unter dem Vorbehalt des Mglichen im

    Sinne dessen, was der Einzelne vernnftigerweise von der Gesellschaft beanspruchen

    kann . In: Garcia, Rafael B. O Poder Judicirio e as polticas pblicas no Brasil:

    anlise doutrinria e evoluo casustica . SP: Revista dos Tribunais, vol. 879,

    jan/2009, pp. 62-98; p. 67, nota 18).

    Igualmente no se est a averiguar se o dano moral devido, pois, caso

    assim o fosse, incidiria o bice sumular 7/STJ, conforme precedentes que se

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    transcrevem:

    PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAO. DANO MORAL. CONFIGURAO. REEXAME DO CONJUNTO FTICO-PROBATRIO. IMPOSSIBILIDADE. SMULA 7/STJ.

    1. Hiptese em que o Tribunal de origem concluiu, com base na prova dos autos, ser a indenizao por danos morais indevida. A reviso desse entendimento implica reexame de fatos e provas, obstado pelo teor da Smula 7/STJ.

    2. Agravo Regimental no provido.(AgRg no REsp 869.599/MS, Rel. Ministro Herman Benjamin,

    Segunda Turma, julgado monocraticamente em 6.5.2009, DJ 7.2.2008, p. 298)

    PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAO. DANO MORAL. CONFIGURAO. REEXAME DO CONJUNTO FTICO-PROBATRIO. IMPOSSIBILIDADE. SMULA 7/STJ.

    1. Hiptese em que o Tribunal de origem concluiu, com base na prova dos autos, ser indevida a indenizao por danos morais. A reviso desse entendimento implica reexame de fatos e provas, obstado pelo teor da Smula 7/STJ.

    2. Agravo Regimental no provido.(AgRg no Ag 807.659/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin,

    Segunda Turma, julgado em 6.3.2007, DJ 7.2.2008, p. 298)

    A tese que prevaleceu parte de dois pressupostos equivocados, a saber a)

    deve haver indenizao com funo pedaggica, para fins de melhoria do sistema

    carcerrio, e b) h necessidade de apaziguar o sofrimento do recorrido de modo

    pecunirio.

    Observo contradio entre ambas as premissas, porquanto, a rigor,

    quanto mais verbas pblicas forem colocadas disposio do patrimnio particular de

    um detento, evidente que, em dado momento, os recursos estaro muito mais parcos

    do que j esto, comprometendo ainda mais a manuteno das condies carcerrias.

    No faz muito sentido tirar verbas do caixa do Estado para indenizar,

    individualmente, por dano moral, um ou s alguns presidirios, quando o desconforto

    do ambiente prisional afeta a todos. A compensao financeira da ofensa moral

    individual, em tais circunstncias, s servir para mascarar, nunca para reduzir, acabar

    ou solucionar, a dor coletiva, a vergonha que o sistema prisional em todos os Estados

    do Pas.Documento: 8779290 - RELATRIO E VOTO - Site certificado Pgina 5 de 12

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    A permitir tal entendimento, estar-se-ia admitindo um papel absurdo do

    Estado como segurador universal: ou seja, sempre que algum servio pblico essencial

    do Estado for falho e isso uma realidade nacional, no apenas "privilgio" do

    Estado recorrente , em vez de uma soluo global e racional, com medidas planejadas

    estrategicamente a mdio e longo prazo, buscar-se- uma sada "meia-sola" (de

    preferncia financeira), sem a menor repercusso na melhoria do sistema como um

    todo.

    Argumentando-se com a tcnica da reductio ad absurdum , a tese

    vencedora no acrdo de origem possibilita concluir que muito mais intolervel a

    situao de mero desconforto individual de um condenado do que casos em que

    detentos sofrem violao na sua integridade fsica (e no apenas moral).

    Esse um entendimento que conflita com as seguintes situaes:

    PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAO POR MORTE DE PRESO EM CADEIA PBLICA. DEVER DE VIGILNCIA DO ESTADO (ART. 5, XLIX, CF/88). INDENIZAO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ART. 37, 6 DA CONSTITUIO FEDERAL. CULPA E NEXO DE CAUSALIDADE COMPROVADOS. SMULA 07/STJ.

    1. O dever de ressarcir danos, inclusive morais, efetivamente causados por ato dos agentes estatais ou pela inadequao dos servios pblicos decorre diretamente do art. 37 6 da Constituio, dispositivo auto-aplicvel, no sujeito a intermediao legislativa ou administrativa para assegurar o correspondente direito subjetivo indenizao. No cabe invocar, para afastar tal responsabilidade, o princpio da reserva do possvel ou a insuficincia de recursos. Ocorrendo o dano e estabelecido o seu nexo causal com a atuao da Administrao ou dos seus agentes, nasce a responsabilidade civil do Estado, caso em que os recursos financeiros para a satisfao do dever de indenizar, objeto da condenao, sero providos na forma do art. 100 da Constituio.

    2. A aferio acerca da ocorrncia do nexo causal entre o dano e a conduta do agente pblico demanda a anlise do conjunto ftico-probatrio carreado aos autos, interditada em sede de recurso especial por fora da Smula 07/STJ. Precedentes desta Corte: RESP 756437/AP, desta relatoria, DJ de 19.09.2006; RESP 439506/RS, Relatora Ministra Denise Arruda, DJ de 01.06.2006 e RESP 278324/SC, Relator Ministro Joo Otvio de Noronha, DJ de 13.03.2006.

    3. In casu , o Juiz Singular e Tribunal local, com ampla cognio ftico-probatria, concluram pela obrigao de indenizar do Estado, ao argumento de que o ordenamento constitucional vigente assegura ao preso a

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    integridade fsica (CF, art. 5, XLIX) sendo dever do Estado garantir a vida de seus detentos, mantendo, para isso, vigilncia constante e eficiente.

    4. Recurso especial desprovido.(REsp 936.342/ES, Rel. Ministro Francisco Falco, Rel. p/

    Acrdo Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 11.11.2008, DJe 20.05.2009)

    PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAO. OMISSO. INEXISTNCIA (VIOLAO DO ARTIGO 186 DO CDIGO CIVIL BRASILEIRO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PLEITO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. MORTE EM PRESDIO. ESGANADURA. CABIMENTO DA INDENIZAO. ONUS PROBANDI DO ESTADO. RESPONSABILIDADE CONFIGURADA. INDENIZAO FIXADA NA SENTENA A QUO . JUROS MORATRIOS E CORREO MONETRIA.)

    1. Os embargos de declarao so cabveis quando houver no acrdo ou sentena, omisso, contradio ou obscuridade, nos termos do art. 535, I e II, do CPC, ou para sanar erro material.

    2. Considerando a deciso embargada no sentido de que "mesmo cometido o fato danoso por colega de cela e mesmo havendo culpa concorrente da prpria vtima no evento - o que no se encontra configurado nos autos - ao Estado cabia, primeiramente, a ao preventiva tais incidentes atravs da separao de indivduos cuja personalidade demonstrasse inclinao violncia gratuita, e, num segundo momento, a ao repressiva quando dos fatos, evitando o resultado morte.(...)Presente a responsabilidade estatal quanto ao fato danoso, devida a indenizao pelos danos dele advindos impe-se a inverso dos nus sucumbenciais.

    3. A utilizao do indexador "salrio mnimo" na fixao de indenizao por danos morais admitida pela jurisprudncia desta Corte. Precedentes: REsp n 737.797/RJ, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 28.08.06, REsp n 790.090/RR, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 10.09.07;REsp 1026088/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03.04.2008, DJ 23.04.2008;REsp 713.764/RS, Rel. Ministro FERNANDO GONALVES, QUARTA TURMA, julgado em 04.03.2008, DJ 10.03.2008;REsp 792.416/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 07.08.2007, DJ 17.08.2007.

    4. A apreciao dos pedidos referentes inverso dos nus sucumbenciais e fixao da verba honorria merece acolhida, porquanto restaurada a sentena de fls. 115 no voto vencedor, tambm neste ponto, verbis:Parcialmente sucumbentes, arcaro os autores com 40% das custas processuais, cabendo ao demandado os outros 60%. Honorrios ao procurador dos demandantes em 10% sobre o valor da condenao, e ao Estado em 5%, tambm sobre o valor da condenao, considerados o trabalho desenvolvido e o tempo despendido (art. 20, 3 do CPC). Inexigvel a verba sucumbencial dos demandados face a Assistncia Judiciria Gratuita, forte no art. 12 da Lei 1060/50" (fls. 115)

    5. Embargos de declarao parcialmente acolhidos.(EDcl no REsp 944.884/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Pimeira

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    Turma, julgado em 14.10.2008, DJe 3.11.2008)

    ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. INDENIZAO. MORTE DE DETENTO. REBELIO. EXISTNCIA DO DANO. NEXO DE CAUSALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

    (AgRg no Ag 986.208/MT, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/04/2008, DJe 12/05/2008)

    ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. MORTE DE DETENTO. HONORRIOS DE ADVOGADO DEVIDOS PELO ESTADO DEFENSORIA PBLICA. IMPOSSIBILIDADE. CONFUSO. ART. 381 DO NOVO CDIGO CIVIL.

    1. O Estado responde objetivamente por dano advindo de morte de detento provocada por demais presidirios dentro do estabelecimento prisional.

    2. Nas demandas em que a parte contrria for representada pela Defensoria Pblica, o Estado no paga honorrios advocatcios.

    3. Extingue-se a obrigao quando configurado o instituto da confuso (art. 381 do Cdigo Civil atual).

    4. A circunstncia de o valor fixado a ttulo de indenizao por danos morais ser inferior ao pleiteado no configura hiptese de sucumbncia recproca (CPC, art. 21).

    5. Recurso especial parcialmente provido.(REsp 713682/RJ, Rel. Ministro Joo Otvio de Noronha,

    Segunda Turma, julgado em 1.3.2005, DJ 11/04/2005, p. 286)

    Em conflito com a tese, veja-se o entendimento da Corte Suprema, verbis :

    CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS PBLICAS. ATO OMISSIVO DO PODER PBLICO: ESTUPRO PRATICADO POR APENADO FUGITIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALHA DO SERVIO. C.F., ART. 37, 6.

    I. - Tratando-se de ato omissivo do poder pblico, a responsabilidade civil por tal ato subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, esta numa de suas trs vertentes, a negligncia, a impercia ou a imprudncia, no sendo, entretanto, necessrio individualiz-la, dado que pode ser atribuda ao servio pblico, de forma genrica, a falta do servio.

    II. - A falha do servio - faute du service dos franceses - no dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ao omissiva atribuda ao poder pblico e o dano causado a terceiro.

    III. - Crime de estupro praticado por apenado fugitivo do sistema penitencirio do Estado: nesse caso, no h falar em nexo de causalidade entre a fuga do apenado e o crime de estupro, observada a teoria,

    Documento: 8779290 - RELATRIO E VOTO - Site certificado Pgina 8 de 12

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    quanto ao nexo de causalidade, do dano direto e imediato. Precedentes do STF: RE 369.820/RS, Ministro Carlos Velloso, "DJ" de 27.02.2004; RE 172.025/RJ, Ministro Ilmar Galvo, "DJ" de 19.12.1996; RE 130.764/PR, Ministro Moreira Alves, RTJ 143/270.

    IV. - RE conhecido e provido.(RE 409203, Rel. Min. Carlos Velloso, Relator p/ Acrdo:

    Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgado em 7.3.2006, DJ 20.4.2007 PP-00102 EMENT VOL-02272-03 PP-00480 RTJ VOL-00200-02 PP-00982 LEXSTF v. 29, n. 342, 2007, p. 268-298)

    CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS PBLICAS. ATO OMISSIVO DO PODER PBLICO: LATROCNIO PRATICADO POR APENADO FUGITIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIO. C.F., art. 37, 6.

    I. - Tratando-se de ato omissivo do poder pblico, a responsabilidade civil por tal ato subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, esta numa de suas trs vertentes, a negligncia, a impercia ou a imprudncia, no sendo, entretanto, necessrio individualiz-la, dado que pode ser atribuda ao servio pblico, de forma genrica, a falta do servio.

    II. - A falta do servio - faute du service dos franceses - no dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ao omissiva atribuda ao poder pblico e o dano causado a terceiro.

    III. - Latrocnio praticado por quadrilha da qual participava um apenado que fugira da priso tempos antes: neste caso, no h falar em nexo de causalidade entre a fuga do apenado e o latrocnio. Precedentes do STF: RE 172.025/RJ, Ministro Ilmar Galvo, "D.J." de 19.12.96; RE 130.764/PR, Relator Ministro Moreira Alves, RTJ 143/270.

    IV. - RE conhecido e provido(RE 369820, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, julgado

    em 4.11.2003, DJ 27.2.2004 PP-00038 EMENT VOL-02141-06 PP-01295)

    Em resumo, h evidente choque de entendimentos polmicos: por um

    lado, assevera-se que o Estado deve pagar ao delinqente uma quantia mensal pelo

    fato de suas condies de carceragem no serem as melhores; por outro, o Estado no

    deve pagar nada a um cidado que, sem ter praticado qualquer delito, privado do

    convvio de um ente querido, pelo fato de este ter sido executado por um fugitivo, ou

    de ter tido sua integridade fsica e moral violada por um ex-detento.

    Note-se que em todas as situaes acima h tambm uma falha do

    servio estatal, assim como constatado no presente caso.

    Nunca demais lembrar que o sofrimento pelas condies dos detentos

    igualmente se divide com seus familiares, em especial quando o condenado sustentava Documento: 8779290 - RELATRIO E VOTO - Site certificado Pgina 9 de 12

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    o ncleo familiar. Nesses casos, o papel da Defensoria poderia ser mais bem

    aproveitado, no sentido de buscar a concesso de auxlio-recluso aos dependentes dos

    detentos (art. 80 e seguintes da Lei 8.213/91).

    No mbito coletivo , a Defensoria dispe de inmeras possibilidades de

    contribuir para a melhoria no sistema prisional. Vejam-se, por exemplo, as aes

    conjuntas desenvolvidas pelo Conselho Nacional de Justia com os Tribunais e os

    rgos auxiliares da Justia e entes do Governo Federal diretamente ligados

    problemtica (e.g., Departamento Penitencirio Nacional): Programa Comear de

    Novo , Comisso de Acompanhamento do Sistema Prisional , mutires carcerrios

    conduzidos pas afora, entre outros (vide em: www.cnj.jus.br ).

    Todas essas aes contam com a efetiva participao das Defensorias

    estaduais, alcanando tamanha importncia que o CNJ criou, por Lei Federal, o

    Departamento de Monitoramento e Fiscalizao do Sistema Carcerrio e do Sistema

    de Execuo de Medidas Socioeducativas (Lei 12.106/09).

    Infelizmente, a Defensoria Pblica mato-grossense-do-sul parece, com

    aes pulverizadas desta natureza, estar canalizando sua energia para reas menos

    efetivas que o devido acompanhamento da progresso de regime (art. 112 da Lei

    7.210/84), no mbito individual, e o controle da malversao de investimentos no setor

    carcerrio, no mbito coletivo neste caso, deixando de lado importantes instrumentos

    que recentemente passaram a seu domnio (e.g., art. 5, II, da Lei 7.347/85), i.e., o

    ajuizamento de Ao Civil Pblica, para resolver, de forma global e definitiva, o grave

    problema da superlotao carcerria. Tudo isso sem prejuzo de providncias pelo

    Ministrio Pblico, no mbito da Lei da Improbidade Administrativa, com o objetivo,

    se for o caso, de imputar ao servidor ou administrador desidioso a responsabilidade

    pessoal por ofensa ao princpio da dignidade da pessoa humana .

    Numa palavra, em nada contribui para a melhoria do sistema prisional do

    Brasil a concesso, individualmente, de indenizao por dano moral a detento

    submetido superlotao e a outras agruras que permeiam (e envergonham) nossos

    estabelecimentos carcerrios. A medida, quando muito, servir to-s para drenar e

    canalizar escassos recursos pblicos, aplicando-os na simples mitigao do problema Documento: 8779290 - RELATRIO E VOTO - Site certificado Pgina 1 0 de 12

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    de um ou s de alguns, em vez de resolv-lo, de uma vez por todas, em favor da

    coletividade dos prisioneiros.

    A condenao do Estado indenizao por danos morais individuais,

    como remdio isolado, arrisca a instituir uma espcie de "pedgio-masmorra", ou seja,

    deixa a impresso de que ao Poder Pblico, em vez de garantir direitos inalienveis e

    imprescritveis de que so titulares, por igual, todos os presos, bastar pagar, aos

    prisioneiros que disponham de advogado para postular em seu favor, uma

    "bolsa-indignidade" pela ofensa diria, continuada e indesculpvel aos mais

    fundamentais dos direitos, assegurados constitucionalmente.

    A situao do sistema prisional grave e merece soluo global , no

    apenas pontual. Nesse sentido a orientao do Conselho Nacional de Justia:

    PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. INTERDIO DE ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS. NATUREZA JURDICA. COMPETNCIA. ENFOQUE MACRO DO PROBLEMA PRISIONAL. IMPROVIMENTO.

    I. A deciso que decreta a interdio de estabelecimentos prisionais de natureza administrativa e no jurisdicional, no sendo desafivel por meio do recurso de agravo em execuo (art. 197 da LEP), consoante entendimento do STJ (MC 5220/MG e RMS 4059/RS). Analogia com a natureza jurdica da deciso que transfere presos, igualmente consubstanciadora de ato administrativo (STF: HC 64347/SP e HC 67221/PR; STJ: CComp 40326/RJ).

    II. Sendo administrativo, submete-se ao controle hierrquico da Administrao e compete ao juzo da execuo criminal, desde que observadas as formalidades e procedimentos, caso regulamentados, do Tribunal de origem. Exegese conjugada dos arts. 65 e 66, VIII, da LEP.

    III. O enfoque a ser dado ao problema da superpopulao prisional transcende os limites pontuais em cada caso, porquanto macro, sistmico, mundial e complexo. No pode ser abordado isoladamente, mas sim receber tratamento conjunto de todos os rgos setoriais envolvidos dos Poderes Judicirio e Executivo, por meio dos canais competentes , sob pena de usurpao da competncia originria para formulao das polticas pblicas de administrao penitenciria, ocasionando violao ao princpio da separao dos Poderes (art. 2. da CF/88) e clusula da reserva do possvel (APDF 45).

    IV. Procedimento de controle administrativo a que se nega provimento.

    (PCA 200810000002397, Rel. Conselheiro Jorge Maurique, julgado em 9.4.2008, grifos nossos ).

    Por fim, verifica-se que a matria est sendo submetida a uma anlise Documento: 8779290 - RELATRIO E VOTO - Site certificado Pgina 1 1 de 12

  • Superior Tribunal de Justia

    mais detida pelo Supremo Tribunal Federal, que poder, como intrprete final das

    diretrizes constitucionais, orientar o entendimento dos Tribunais no que tange ao

    direito supralegal:

    AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. SUPERPOPULAO CARCERRIA. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. DANO MORAL. INDENIZAO. AGRAVO PROVIDO PARA DETERMINAR A SUBIDA DO RECURSO EXTRAORDINRIO. VISTA PROCURADORIA-GERAL DA REPBLICA.

    (AI 733876, Relator(a): Min. Crmen Lcia, julgado em 11/02/2009, publicado em DJe-039 DIVULG 27/02/2009 PUBLIC 02/03/2009)

    No obstante ficar prejudicada a seguinte questo, caso prevalea o

    entendimento exposto, mister destacar que, igualmente, no que tange aos honorrios

    arbitrados em favor da Defensoria Pblica, a deciso de origem merece reparo.

    Aplica-se, aqui, a novel Smula 421 desta Corte Superior, segundo a

    qual "Os honorrios advocatcios no so devidos Defensoria Pblica quando ela

    atua contra a pessoa jurdica de direito pblico qual pertena".

    Diante do exposto, dou provimento ao Recurso Especial para

    restabelecer o entendimento esposado no voto do relator de origem.

    como voto.

    Documento: 8779290 - RELATRIO E VOTO - Site certificado Pgina 1 2 de 12