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Alternativas funcionais à avaliação e ao diagnóstico tradicionais 1 Tradução: Maly Delitti A fim compreender a avaliação funcional, deve- se entender exatamente os objetivos da mesma e como esta difere de outros tipos de avaliação. Neste capítulo focalizaremos primeiramente a conceitualização funcional do caso. A conceitualização funcional do caso tem como objetivo a avaliação e a conceitualização de comportamentos considerados problemáticos do ponto de vista clinico, compreendidos adequadamente em seu contexto histórico, com a finalidade de identificar uma intervenção e um tratamento que produzam a mudança desejada. Assim, um dos padrões de medida da conceitualização funcional do caso diz respeito à possibilidade de uma determinada intervenção ser realizada ou não sem a avaliação. Se este procedimento ou qualquer outro tipo de avaliação, não conduzir a uma intervenção diferente, pode ser que o tratamento não tenha 1 Follette, W., Naugle, A. E. & Linnerooth, P. J. (2000). Functional Alternatives to Traditional Assessment and Diagnosis. In: M. J. Dougher (Ed.) Clinical Behavior Analysis : Theory, Research, and Treatment. Reno, NV: Context Press. 1

Alternativas Funcionais à Avaliação e Ao Diagnóstico Tradicionais

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Alternativas funcionais

à avaliação e ao diagnóstico tradicionais 1

Tradução: Maly Delitti

A fim compreender a avaliação funcional, deve-se entender

exatamente os objetivos da mesma e como esta difere de outros

t ipos de avaliação. Neste capítulo focalizaremos primeiramente a

conceitualização funcional do caso. A conceitualização funcional

do caso tem como objetivo a avaliação e a conceitualização de

comportamentos considerados problemáticos do ponto de vista

cl inico, compreendidos adequadamente em seu contexto histórico,

com a finalidade de identif icar uma intervenção e um tratamento

que produzam a mudança desejada. Assim, um dos padrões de

medida da conceitualização funcional do caso diz respeito à

possibil idade de uma determinada intervenção ser realizada ou não

sem a avaliação. Se este procedimento ou qualquer outro t ipo de

avaliação, não conduzir a uma intervenção diferente, pode ser que

o tratamento não tenha uti l idade (Hayes, Nelson & Jarret, 1987)

não cabendo, portanto, nenhuma análise do tipo “custo-benefício”.

A avaliação, por si só, é meramente um conjunto de dados. A

avaliação funcional, ou a análise funcional do caso é um processo

de l igação dos dados da avaliação a uma estrutura mais específica

de tratamento.

Os meios mais tradicionais de avaliação costumam ter três

objetivos (Barrios, 1988). O primeiro é ajudar no diagnóstico ou na

classif icação dos problemas clínicos. Por exemplo, pode-se

realizar uma entrevista estruturada para fazer um diagnóstico de

1 Fol let te, W., Naugle, A. E. & Linnerooth, P. J. (2000). Funct ional Al ternat ives

to Tradi t ional Assessment and Diagnosis. In: M. J. Dougher (Ed.) Clinical

Behavior Analysis : Theory, Research, and Treatment . Reno, NV: Context

Press.

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depressão. Segundo, a avaliação tradicional procura identif icar a

origem do problema. Talvez os procedimentos da avaliação possam

levar a algum indício a respeito da fonte original de um problema

atual, tal como um histórico de abuso sexual da infância que possa

levar a uma disfunção sexual atual. Em terceiro lugar, a avaliação

tradicional é projetada para ajudar na realização de um

prognóstico. Por exemplo, um escore em uma medida

psicopatológica pode levar à conclusão que um determinado cliente

não chegará a um nível mais elevado de funcionamento. Esses

objetivos são, em grande medida, descrit ivos.

Por outro lado, a avaliação funcional tem quatro objetivos: 1)

identif icar os comportamentos-alvo e as circunstâncias que

mantêm tais comportamentos; 2) auxil iar na seleção de uma

intervenção apropriada; 3) fornecer meios de monitoramento dos

progressos do tratamento; e 4) auxil iar na avaliação da eficácia de

uma intervenção.

Assim uti l izaremos os termos avaliação funcional ou análise

funcional do caso. Pode-se observar a similaridade entre o que

nós descrevemos acima e o que comumente se denomina avaliação

(assessment) comportamental. De fato, a avaliação funcional e a

avaliação (assessment) comportamental parecem signif icar a

mesma coisa, mas não o são.O assemment comportamental

signif ica fazer contagens de comportamentos. Pode-se observar

esta postura no DSM-IV (Associação Psiquiátrica Americana,

1994), onde um episódio depressivo pode ser diagnosticado como

depressão, principalmente se forem observados cinco ou mais

sintomas predefinidos durante um período de duas semanas (por

exemplo, First, Frances, Widiger, Pincus & Davis, 1992). Enquanto

a avaliação pelo DSM se concentra meramente no número dos

sintomas, a avaliação comportamental funcional identif ica sob que

circunstâncias estes comportamentos depressivos são mais

prováveis de ocorrer e o que acontece quando eles acontecem.

Nós usaremos o termo avaliação funcional durante todo este

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capítulo enfatizando nosso interesse na função do comportamento

muito mais do que sua simples forma ou topografia.

Uma visão geral das suposições da avaliação funcional

Esta seção esboça algumas das suposições básicas nas

quais as avaliações funcionais se apoiam. Compreender as

implicações destas suposições ajudará a compreender as

diferenças entre a avaliação tradicional e a funcional.

A distinção entre o topografia e Funcionalidade

A primeira característica da análise funcional é que o

comportamento é entendido de acordo com a sua funcionalidade,

ou com as suas finalidades, ao invés de levar em conta seus

aspectos formais (Hayes, Follette & Follette, 1995). A função do

comportamento é compreendida pelo exame das variáveis

relevantes que controlam um comportamento objetivo definido,

incluindo seus antecedentes, conseqüências, e as condições sob

as quais o comportamento ocorre mais freqüentemente. A

compreensão dos comportamentos em termos de sua função e não

meramente em relação à sua forma ou topografia é essencial para

uma avaliação adequada. Como exemplo óbvio, pode citar a

diferença entre o tratamento da dor de garganta de um sujeito que

sofre de uma dor de garganta por infecção, do tratamento da

garganta de um indivíduo que sofre de ansiedade. A forma de

tratamento da garganta pode ser idêntica, contudo a função é

muito diferente nestes dois casos.

Como um exemplo com relevância clínica, considere o caso

de um cliente que chora durante a terapia. O mero fato de chorar

não é especialmente informativo. O cliente está chorando porque

está tr iste? O cliente está chorando porque está aliviado? O cliente

está chorando porque deseja que o terapeuta pare de seguir uma

l inha determinada de questionamento? O cliente chora por

simpatia? Até que se compreenda qual a função do chorar, isto é,

apenas com a observação de que o cl iente está chorando não se

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pode fazer nada. Quando se compreende exatamente o motivo que

desencadeou o choro, e que mudanças no ambiente são

associadas com as oscilações do choro, pode-se afirmar que foi

realizada uma avaliação funcional do choro e o que poderia afetar

a sua ocorrência.

Classes funcionais

Temos falado até agora sobre o comportamento isolado.

Entretanto, continuando a distinção entre a topografia e a função,

em uma análise funcional comportamentos individuais ou estímulos

são considerados freqüentemente como membros de classes

funcionais maiores. Muitos comportamentos à primeira vista

desconexos podem vir a ser compreendidos como membros de uma

classe particular da resposta. Classes de resposta são

agrupamentos hipotéticos de comportamentos que comparti lham a

mesma função mesmo que a topografia dos comportamentos

individuais em uma classe particular possa parecer completamente

diferente (Malott, Whaley & Malott, 1996; Sturmey, 1996). Tudo o

que é necessário para dois ou mais comportamentos serem

elementos em uma classe de resposta é que os comportamentos

tenham uma função similar no ambiente.

Vamos novamente considerar o caso de um cliente que chora

freqüentemente durante a terapia. Depois de uma análise

cuidadosa podemos concluir que o cl iente chora sempre que o

terapeuta tenta eliciar alguma confiança do cliente. Quando o

terapeuta para com esse tipo de tentativa de aceitação por parte

do cliente, este diminui o ato de chorar. Neste caso nós temos o

começo de uma compreensão funcional do chorar. Após

considerável trabalho na terapia, o terapeuta observa que a

freqüência do choro do cliente caiu a um nível razoável.

Simultaneamente, entretanto, o cl iente torna-se cada vez mais

irr i tado durante a sessão. Fazendo um exame mais profundo, o

terapeuta percebe que a raiva do cliente está funcionando na

mesma maneira que o choro funcionou anteriormente. Isto é,

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quando o terapeuta procura a confiança do cliente, o cl iente

torna-se irr i tado por qualquer motivo. A raiva e choro podem ser

entendidos aqui como membros da mesma classe de resposta

porque ambos funcionam para bloquear os esforços do terapeuta

em conquistar a confiança no relacionamento. Pode ser que se o

terapeuta mudasse de atitude, e tentasse discutir com o cliente a

raiva, este começasse a chegar tarde para as sessões da terapia,

comportamento este decorrente da tentativa em moderar o grau

de confiança que o cl iente vem demonstrando no processo de

terapia. Pedimos a atenção do leitor, entretanto, para o fato de

que este não é o mesmo que um modelo hidráulico do

comportamento onde obstruir um comportamento causa a

emergência devido a uma descarga intrapsíquica de energia. A

noção de uma classe de resposta implica simplesmente que há

maneiras múltiplas pelas quais um cliente pode alcançar um

determinado objetivo. No exemplo da confiança, o cl iente pode

chorar, irr i tar-se, chegar atrasado para as sessões da terapia, ou

exibir uma infinidade de outros t ipos de comportamentos que

poderiam funcionar para manter alguma distância entre ele e o

terapeuta. É mais eficiente pensar em termos das funções que os

comportamentos podem adquirir para um cliente do que entender

cada comportamento isolado dos outros. Identif icar as funções

comuns que diferentes comportamentos podem ter para um

cliente pode simplif icar a compreensão de todos os

comportamentos novos que um terapeuta possa ver.

Assim como os comportamentos podem ser elementos de

uma classe de respostas maior, pode-se também pensar em

diferentes estímulos como sendo membros de uma classe comum.

Para um cliente que tenha um histórico de relacionamentos

fracassados, pode-se imaginar que para ele todos os

relacionamentos sociais sejam vistos como potencialmente

dolorosos. Neste caso, o cl iente pode incorretamente discriminar

que todos os relacionamentos terminam em sofrimento, ao invés de

permitir que ele perceba que algumas pessoas podem ser

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perigosas, outras não, uma diferença que seria importante ele

começar a perceber.

Etiologia e topografia

Pode ser óbvio que um evento específico, histórico ou

etiológico pode resultar em topografias comportamentais muito

diferentes dependendo primeiramente da sua história pessoal, e os

acontecimentos subseqüentes ao evento original. Por exemplo, em

um caso onde uma jovem mulher que acabou de ficar noiva, e seu

noivo morre em um acidente de automóvel, não se pode predizer

como a mulher responderia a essa situação simplesmente sabendo

que seu noivo morreu. Há a possibil idade de a mulher enlutar e

logo depois conhecer outra pessoa, assumir um outro contato

social com outro homem. Também, ela poderia tentar fugir da

situação usando o álcool ou se metendo em uma série de

relacionamentos em curto prazo, superficiais. Qual destes ou

qualquer que seja o comportamento emitido deve ser compreendido

no contexto inteiro de sua história. Do mesmo modo, não há

nenhum comportamento que pode resultar de um e somente um

evento antecedente. É um erro crasso dizer, por exemplo, que o

medo do escuro em uma mulher de vinte e cinco anos é sinal

definit ivo de que ela sofreu de abuso sexual durante a infância.

Não se trata de dizer que alguns comportamentos não podem estar

mais provavelmente relacionados a alguns antecedentes do que

outros, ou que alguns antecedentes não conduzem a alguns

resultados que são mais prováveis do que outros. Nós estamos

enfatizando aqui o fato de que a l igação entre antecedentes e

comportamentos é complexa e determinada multiplamente por

vários fatores.

Significado versus Amostra

Para chegar a uma compreensão funcional de um problema

particular, nós executamos uma análise funcional a f im identif icar e

compreender suas variáveis controladoras. Determinadas formas

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de avaliação tradicional partem da suposição que quando nós

observamos um comportamento estamos observando um sinal de

algum problema subliminar e não o comportamento em si

(Goldfried & Kent, 1972; Livingston, 1977). Por exemplo, pode-se

pensar que quando se observa a automutilação, não é a

automutilação em si que é importante, mas ao invés disso, que

este comportamento é um sinal de raiva ou ódio dirigido

subjacente.Em uma avaliação funcional supõe-se que o

comportamento acima é uma amostra de uma classe básica dos

problemas que comparti lham de uma função similar para o cl iente.

Neste caso nós estaríamos interessados em compreender a própria

automutilação e todos os comportamentos funcionalmente

relacionados. Quando ocorre? Como as pessoas respondem e

quando? Há outros comportamentos que tem a mesma função?

Esta diferença, entender o comportamento como sendo o próprio

problema e não um sinal de alguma outra circunstância subjacente

é uma característica importante da avaliação funcional.

Unidade da análise

Uma outra suposição importante da avaliação funcional ou de uma

análise funcional é que a unidade de estudo é a pessoa inteira que

interage com um determinado contexto ambiental. Isto é, não se

pode compreender o comportamento de uma pessoa isolado das

circunstâncias sob as quais ele ocorreu primeiramente e sob as

quais funciona atualmente. Por exemplo, considere duas crianças

que recebem a avaliação de seu professor de educação física.

Imagine que uma das crianças tem um histórico crônico de ter sido

crit icado e isolado em casa. Imagine uma segunda criança que

tenha um histórico de ser incentivado para tentar comportamentos

novos e ser apoiado quando não trabalhava bem. Caso se adote

uma perspectiva analít ico-funcional percebe-se que a experiência

que cada uma destas crianças está tendo ao receber a avaliação

do técnico é muito diferente, dadas as suas histórias pessoais

individuais. Assim, uma avaliação funcional ocorre em um nível

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psicológico e não considera o comportamento como meramente o

movimento através do tempo e do espaço.

O processo de Análise Funcional

Lembre-se que a conseqüência desejada em uma avaliação

funcional é uma análise que tenha alguma uti l idade no tratamento.

Em uma situação ideal, uma análise funcional bem feita rende um

bom resultado no tratamento.Assim sendo, duas características

básicas relacionadas caracterizam uma análise funcional.

Primeiramente, uma análise funcional é interativa. Isto signif ica

que ela deve ser feita freqüentemente durante com o processo de

avaliação para conduzir a uma intervenção bem sucedida. A

segunda característica-chave é que o processo analít ico funcional

é autocorretivo. Ele circula por todo o processo até que se inicie o

resultado clínico desejado. Um diagrama esquemático do processo

é mostrado na figura 1.

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PASSO 1: Identif icar

característ icas do cliente

PASSO 2:Organizar essas características de acordo com o problema

do paciente em termos de princípios comportamentais

PASSO 3:Planejar uma intervenção

baseada na avaliação

PASSO 4:Implantar a intervenção

PASSO 5:Avaliar os resultados

PASSO 6:O resultado foi o

esperado?

Avaliação e intervenção completas

Reformular a conceituação funcional do caso

SimNão

Figura 1: Representação esquemática de uma análise funcional clássica

O passo 1 neste processo é famil iar à maioria dos psicólogos

clínicos. Neste momento a tarefa é identif icar os problemas

apresentados pelo cl iente organizando-os em alguma espécie da

hierarquia de importância clínica. Além disso, é feita uma

avaliação dos recursos e habil idades do cliente. Os recursos

podem incluir características como a sua vida social, atributos

pessoais incluindo recursos financeiros e diversidade de

atratividade nas fontes da vida social e do estado físico/saúde. Os

riscos podem envolver coisas como oportunidades sociais

l imitadas, várias inabil idades, comprometimentos f inanceiros e

problemas legais.

As características originais da análise funcional tornam-se

aparentes no passo 2. Aqui o analista funcional realiza uma análise

dos problemas do cliente nos termos de princípios

comportamentais. Uma análise funcional tem seu embasamento na

teoria de aprendizagem comportamental e se baseia em princípios

do condicionamento operante e clássico para compreender a

função do comportamento.A partir da aplicação de princípios

comportamentais é definida uma estratégia de intervenção como

mostrado no passo 3. Uma vez que uma estratégia de intervenção

foi formulada, será então executada no passo 4. Apesar de

indicado diretamente na figura 1, a avaliação do resultado

mostrada no passo 5 ocorre continuamente durante todo o

processo do tratamento. Para simplif icar, o passo 6 indica que os

resultados da avaliação mostrados na etapa anteriores são então

analisados. Se o resultado do tratamento baseado em uma

avaliação funcional for bem sucedido, a avaliação e a intervenção

podem ser encerradas. Se, entretanto, a avaliação indicar que os

problemas identif icados no passo 1 não foram resolvidos

adequadamente, o analista funcional supõe que a análise foi

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incorreta ou inadequada. Esta perspectiva difere de uma

interpretação do fracasso do tratamento que se uti l ize constructos

como a resistência por parte do cliente. Freqüentemente as

conceituações funcionais são bem sucedidas e se tornam cada vez

mais sofisticados conforme o tempo vai passando. Não é

surpreendente ou ameaçador para o analista comportamental

descobrir que a avaliação inicial baseada em informações l imitadas

não foi adequada. O que é importante é que quando um resultado

bem sucedido não foi conseguido o processo continue. As

interações sucessivas são geralmente mais eficientes porque a

avaliação fica então embasada por uma famil iaridade muito maior

com a situação do cliente, e seus recursos.

Uma das propostas que tornam este processo mais fácil foi

chamada de construtiva (Goldiamond, 1974. Goldiamond, 1975;

Howkins, 1986). Usando esta abordagem, no fim do passo 1, o

analista funcional estabelece o objetivo ou o resultado a ser

alcançado final de uma intervenção bem sucedida. Este processo

serve a dois objetivos. Primeira força o analista a identif icar um

repertório comportamental que seja úti l ao cl iente ao final da

terapia. Este repertório deve ser facilmente observado e não deve

se ater apenas a estados estritamente internos. Segundo, um

objetivo bem-especif icado facil i ta a avaliação do resultado no

passo 6. Além de especif icar o resultado desejado, requer-se do

analista que dê uma descrição do repertório inicial do cliente, o

que auxil iará muito no alcance do comportamento f inal desejado

com a terapia. Isto nos leva então a prestar atenção nos atributos

posit ivos que o cl iente pode trazer à situação ao invés de

focalizarmo-nos somente nos déficits do cliente. Na abordagem

construtiva, a avaliação funcional requer a especif icação e o uso

de procedimentos de mudança que expandirão o repertório inicial

do cliente para produzir o resultado desejado através de

aproximações sucessivas. Esta aproximação molda o processo da

intervenção tão posit ivamente quanto possível para o terapeuta e o

cl iente. Finalmente, o procedimento de avaliação deve identif icar

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as variáveis naturais de manutenção que podem ser usadas para

causar e manter a mudança, mais do que uti l izar as conseqüências

arbitrárias ou extrínsecas do processo (Ferster, 1967). A f inalidade

desta exigência é assegurar-se de que os reforçadores uti l izados

para o início do processo de mudança na situação terapêutica

sejam os mesmos reforçadores que o cl iente encontrará no mundo

real, assegurando-se desse modo, que os ganhos do tratamento

produzidos em toda a intervenção sejam mantidos no ambiente

natural.

Quando se começa uma avaliação funcional a primeira

pergunta óbvia é "a que tipos das coisas devo me ater?” Quando

não houver nenhuma resposta precisa a esta pergunta, Haynes e

O'Brien (1990) sugeriram focalizar-se nas variáveis que são

importantes, controláveis e relacionadas aos problemas

apresentados pelo cl iente. Segundo Haynes e O'Brien variável

importante é a que explique uma parte signif icativa do problema

apresentado. Por exemplo, um cliente pode se apresentar

desejando aumentar a satisfação conjugal em seu casamento. A

análise funcional poderia indicar alguma melhora se o marido

gastasse menos tempo com a televisão, e uma enorme melhora

caso ele gastasse mais tempo conversando com sua esposa, sobre

os aspectos emocionais de sua relação. Pelos critérios de Haynes

e de O'Brien neste caso, a avaliação deveria indicar modificações

no padrão de comunicação do casal.

O segundo critério que Haynes e O'Brien usam para identif icar

variáveis importantes em uma análise funcional é se a variável é

passível de ser controlada.Este é um aspecto particularmente

interessante, pois pode opor-se a tópicos que são do interesse do

cliente e do terapeuta. Por exemplo, a variável histórica

freqüentemente não satisfaz este critério. Em uma análise

funcional não é úti l apenas saber se alguém sofreu de abuso

sexual quando criança. Aqueles eventos ocorreram no passado e

aqueles fatos não podem ser mudados e estão, conseqüentemente,

fora de controle da maneira que Haynes e O'Brien entendem o

12

controle. Naturalmente, os cl ientes e os terapeutas tendem a dar

um status causal do a tais eventos históricos vividos. Para que um

evento histórico seja importante em uma análise funcional,

entretanto, a avaliação deve focalizar em como esse histórico se

manifesta no presente. Não é suficiente dizer que um histórico de

abuso sexual na infância é a razão pela qual uma determinada

pessoa não consegue manter relacionamentos pessoais

próximos.Seria preciso identif icar como este histórico interfere nas

relações deste indivíduo no presente. Esta visão pode conduzir a

uma avaliação se o cl iente tem dif iculdade em manter e responder

à intimidade ou à confiança no momento presente. Tais hipóteses

podem derivar do conhecimento do abuso sexual da infância, mas

é a resposta à intimidade e ao comportamento de “confiar” que

podem ser controlados; e este é o objeto de estudo em uma

análise funcional. Assim, as variáveis históricas podem ser

importantes para conduzir a uma identif icação das variáveis de

controle contemporâneas importantes. Se não, o mero

conhecimento de fatos históricos não constitui uma análise

funcional suficiente.

O terceiro critério para identif icar que variáveis levar em conta

em uma análise funcional é que elas devem ser causais. A noção

de Haynes e de O'Brien da causalidade é prática e simples. Para

que uma variável seja causal em uma análise funcional ele deve

covariar com o comportamento problema. Isto signif ica que

manipulando a variável causal proposta, o comportamento alvo

deve mudar também. Haynes e O'Brien não estão usando o termo

causal no sentido estrito da fi losofia da ciência. Não é importante

se há um trajeto causal direto entre uma variável e outra ou se a

mudança está mediada através de uma terceira variável. A

característica importante da causalidade é que quando nós

mudamos uma variável outra muda conseqüentemente. Sua

segunda exigência para a causalidade deriva da necessidade de

compreender como causar a mudança do comportamento. Aqui,

para uma variável ser considerada causal, as mudanças na

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variável causal devem preceder mudanças no problema

determinado. Em resumo, ao decidir que variáveis e o foco em uma

análise funcional, deve-se dar prioridade àquelas que são

importantes, controladoras, e causais.

Organizando a Análise

Usando Princípios Comportamentais

A avaliação funcional é feita no sentido de planejar uma

intervenção que cause a mudança desejada do comportamento. Há

uma ligação forte entre a avaliação e a intervenção. A análise

funcional aplica princípios comportamentais para compreender a

manutenção e a modificação de comportamentos problema

observados. A fim de conduzir uma análise úti l do comportamento

deve-se ser perito na aplicação de princípios comportamentais.

Durante os passos 2 e 3 da análise funcional é feita a aplicação de

princípios comportamentais a um caso particular com o objetivo de

se traçar uma estratégia de intervenção.

Não há nenhuma “receita” a seguir durante uma análise

funcional. Entretanto, uma compreensão de princípios

comportamentais pode ajudar a organizar a busca por variáveis

funcionalmente importantes e o planejamento da estratégia de

intervenção. O restante desse capítulo esboça alguns princípios

comportamentais básicos e descreve como eles podem aparecer na

clínica. Uma descrição mais completa de princípios de

aprendizagem pode ser encontrada em muitas outras fontes (por

exemplo, Kimble & Catania, 1992; Malott et al., 1996; Michael,

1993).

Será úti l rever um diagrama do paradigma operante, uma

vez que ele organiza o material a seguir

14

15

Operações estabelecedoras

(Estados Motivacionais)

Estímulos Discriminativos

(Situações onde o comportamento será reforçado se ocorrer)

Comportamento ou Resposta

(Alvo da Intervenção) Contingência

(Conseqüências do Comportamento)

Figura 2: Esquema dos Comportamentos Operantes

Contingência

(Conseqüências do Comportamento)

A parte à esquerda deste diagrama esquemático descreve as

circunstâncias ambientais em que um comportamento pode ocorrer.

As duas caixas l igadas são as operações estabelecedoras e os

estímulos discriminativos. A l igação indica que estas duas

circunstâncias ocorrem e devem ser avaliadas simultaneamente. A

caixa seguinte, à direita, indica o comportamento que está sendo

estudado. Do ponto de vista clínico este é t ipicamente o problema

ou o comportamento que é foco da intervenção. Observe que entre

os estímulos discriminativos e a caixa da resposta há um ponto. O

ponto representa uma função de probabil idade e indica que em

uma dada circunstância há uma probabil idade que um

comportamento aconteça. Em seguida, temos uma seta que l iga o

comportamento a alguma contingência no ambiente. A natureza

dessa contingência determinará se o comportamento em questão é

mais ou mais menos provável de ser emitido sob a mesma

condição ou condições similares de estímulo.

Antecedentes e controle de estímulo

Conforme as circunstâncias ambientais mudam os

comportamentos também mudam. Os antecedentes são os

estímulos ambientais que precedem o comportamento como

indicado na figura 2. Os antecedentes são relacionados geralmente

aos estímulos discriminativos. Os estímulos discriminativos são os

eventos ambientais que estabelecem a ocasião na qual uma

determinada resposta particular é provavelmente reforçada.

Geralmente, um estímulo discriminativo ocorre em relativa

proximidade temporal ao comportamento. Entretanto, as

circunstâncias antecedentes que exercem o controle sobre o

comportamento podem freqüentemente ser complicadas (por

exemplo, ocorre algum tempo antes do comportamento).Controle

por estímulo é uma operação que determina e sinaliza as

circunstâncias sob as quais o comportamento provavelmente será

reforçado. Considere um exemplo simples, não clínico. Os oficiais

da lei usam estratégias de controle de estímulo colocando os

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sinais que detectam e indicam sua velocidade atual ao longo das

seções da estrada onde estão tentando controlar a velocidade dos

veículos. Os sinais (e a viatura policial esperando por você um

pouco mais adiante na estrada!) agem como estímulos

discriminativos que sinalizam que uma contingência particular está

por ocorrer. Estes estímulos incluem uma ocasião para o

comportamento dos motoristas de verif icar e de ajustar sua

velocidade atual para evitar a conseqüência aversiva de uma multa

em caso de excesso de velocidade.

Contingências de Reforço

Estímulos reforçadores são aqueles estímulos que ocorrem

após um comportamento e aumentam a probabil idade de sua

ocorrência. O reforço posit ivo é a l iberação de um estímulo que

fortalece o comportamento e aumenta sua probabil idade de

ocorrência.Exercer o papel de mãe, por exemplo, freqüentemente

envolve a uti l ização de reforçadores arbitrários e naturais a f im de

aumentar a probabil idade do comportamento desejável de uma

criança. Elogiamos as crianças que arrumam seus quartos e

comentamos o quão felizes f icamos quando vemos dois irmãos

brincando harmoniosamente. Tanto os elogios como as

recompensas monetárias podem servir como reforçadores, e

influenciar a ocorrência do comportamento que se quer modelar.

O reforço negativo reforça também o comportamento que é

contingente, mas envolve a remoção de um estímulo aversivo.

Tanto a fuga, escapar da estimulação aversiva como a esquiva de

eventos aversivos são exemplos de reforço negativo. Em alguns

casos o comportamento assertivo pode ser negativamente

reforçado. Por exemplo, imagine dirigir um carro com um conhecido

que acende um cigarro. A presença da fumaça dentro do

confinamento de um automóvel é particularmente aversiva a você.

Você pede polidamente pedir que o passageiro apague o cigarro,

um pedido que ele ou ela atende. A remoção da condição aversiva

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é entendida aqui como reforçador negativo de seu comportamento

assertivo.

A punição, por outro lado, diminui a probabil idade da

ocorrência de um comportamento através de um estímulo aversivo.

Usando um exemplo de pais e f i lhos uma outra vez; pode-se

conseguir um comportamento de criança muito nova que tenta

tocar um fogão quente com um alto e severo "Não!" Neste exemplo,

o comportamento de tocar da criança é punido pela verbalização

áspera do pai e a probabil idade da criança tocar o fogão quente no

futuro é diminuída. Além de especif icar as contingências que

mantêm o comportamento problemático, uma análise funcional

adequada deve também identif icar as contingências ambientais que

dif icultam um comportamento mais eficaz (Sturmey, 1996). É

possível que o comportamento eficaz ou desejável nunca seja

aprendido, que tais comportamentos nunca sejam adequadamente

reforçados, ou que contingências de punição tenham diminuído a

ocorrência do comportamento. Em termos simples, isto signif ica

que uma pessoa pode não ter um repertório comportamental

suficientemente desenvolvido para uti l izar as oportunidades que

poderiam conduzir a benefícios pessoais importantes.

Operações estabelecedoras

Operações estabelecedoras ou motivacionais diferem das

operações de controle de estímulo (Michael, 1982; Michael, 1993).

Como foi dito anteriormente, estímulos discriminativos são aqueles

estímulos que precedem diretamente o reforço contingente a uma

resposta particular. Estímulos estabelecedores são condições

ambientais tais como a privação, a saciedade, o estímulo aversivo,

ou outros processos psicológicos que determinam um estímulo

discriminativo como uma ocasião para o reforço ou a punição.

Pode-se pensar em operações estabelecedoras como aquelas

condições que produzem um estado motivacional. Estímulos

estabelecedores podem mudar o valor do estímulo reforçador ou

punit ivo.

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A intoxicação por álcool ou droga é um exemplo de uma

operação estabelecedora relevante às populações clínicas

(Wulfert, Greenway & Dougher, 1996). O nível de intoxicação pelo

álcool ou por outras substâncias i l ícitas pode alterar a eficácia de

um reforçador. Um exemplo disto é i lustrado pela pergunta se as

intervenções farmacológicas e psicológicas concomitantes para a

ansiedade são ou não uma combinação eficaz. As intervenções

baseadas na exposição podem ser menos efetivas quando

combinadas com os medicamentos ansiolít icos. Tais intervenções

são baseadas na suposição que repetindo a exposição prolongada

às circunstâncias que invoquem o medo ou a ansiedade haverá

uma redução na ansiedade. Os aspectos de condicionamento

clássico nas intervenções por exposição supõem que a redução na

ansiedade está relacionada diretamente ao nível da resposta que é

gerada durante os estímulos da exposição (Falls, 1998).

Conseqüentemente, reduzindo a ansiedade com medicamentos não

permite uma resposta máxima do medo sob as circunstâncias da

exposição.

O papel de eventos privados

Atualmente, na análise do comportamento os eventos

privados, tais como pensamentos, sentimentos, e respostas

f isiológicas são considerados legítimos e devem ser

compreendidos como qualquer outro comportamento. Isto é,

quando se conduz uma análise funcional nós examinamos eventos

privados de acordo com suas funções ou examinando as variáveis

de controle relevantes. Por exemplo, um terapeuta cognit ivo pode

selecionar pensamentos negativos de um cliente como o alvo para

a intervenção (isto é, "eu sou um fracasso completo!"). De uma

perspectiva de análise funcional nós procuramos compreender a

função ou a f inalidade de tal pensamento examinando as variáveis

ambientais que o controlam. Quais são os antecedentes sob os

19

quais o pensamento ocorre? Quais são as contingências de reforço

que mantêm tal pensamento?

Aspectos funcionais de problemas clínicos

Nós demos uma visão geral elementar de alguns dos

princípios comportamentais que podem ser úteis na análise do

comportamento - problema dos clientes. Para ajudar melhor a

organizar estas idéias, vamos considerar alguns exemplos

específicos. A seguinte l ista de aspectos funcionais é adaptada

dos exemplos de problemas clínicos e das intervenções esboçadas

por Hayes, por Follette & por Follette (1995). Nós revisaremos os

aspectos dos antecedentes, do comportamento, e dos

conseqüentes indicando diferentes maneiras como um problema

clínico poderia ser compreendido.

Antecedentes

Falta de antecedentes apropriados. Considere um cliente

que se apresente para o tratamento dizendo que se sente

desconectado das pessoas ao seu redor. Ao fazer a análise

funcional você não identif ica nenhum déficit aparente de habil idade

social ou de comunicação. Fazendo o levantamento do meio social

do cliente pode-se descobrir que ele ou ela não tem nenhum

amigo. Isto signif ica que o cl iente passa por poucas ocasiões em

que teria uma oportunidade de emitir os comportamentos que

realçariam a intimidade e serviriam como comportamentos

reforçadores. Sem esta análise cuidadosa das condições

antecedentes pode-se equivocadamente trabalhar muito com este

cl iente seu repertório de habil idades sem nenhum proveito. A

intervenção apropriada, revelada pela investigação e análise

funcional cuidadosa, deveria facil i tar a descoberta pelo cl iente de

que é importante sua participação nos ambientes onde o contato

social é mais provável de ocorrer.

20

Falta do controle discriminativo. Há casos onde o

comportamento do cliente pode ocorrer e ser apropriado em alguns

contextos, mas inapropriado em outros. Nestes casos, o cl iente

não identif ica as circunstâncias exatas sob as quais o

comportamento de alguma classe será mais adequado que outro.

Por exemplo, um cliente pode demonstrar muitos atributos

interpessoais posit ivos que o fariam uma companhia desejável.

Entretanto, tal cl iente pode apresentar-se para a terapia

queixando-se que ele ou ela não é capaz de desenvolver ou manter

relacionamentos pessoais próximos. Uma análise funcional do

comportamento social do cliente revela que ele pode iniciar com

sucesso relacionamentos, mas no terceiro encontro, ele acaba

dizendo coisas do tipo, "eu te amo para todo a eternidade e quero

que você seja a mãe dos meus fi lhos”.Aqui o comportamento de

mostrar-se apaixonado, não seria um problema caso ele t ivesse

sido emitido quando o relacionamento fosse mais signif icativo e

duradouro. Neste caso, entretanto, o cl iente não discriminou as

condições precisas do estímulo sob as quais sua expressão de

afeição seria afirmação imprópria do ponto de vista temporal. A

conseqüência de sua inadequação e da sua falta de timing pode

levar a sua parceira a terminar prematuramente o relacionamento.

Controle discriminativo impróprio. Há alguns

comportamentos que são inadequados sob qualquer situação de

estímulo e mesmo assim afetam o ambiente em uma maneira que

seja desejável para o cl iente. No exemplo de uma criança com

atraso de desenvolvimento, comportamentos tais como balançar a

cabeça ou arroubos físicos de pedido de carinho poderiam

funcionar para terminar algum evento aversivo. Por exemplo, auto

muti lação ou agressão podem permitir que a criança evitasse o

treino de uma habil idade difíci l de autocuidado. Neste caso seria

muito mais úti l para o cl iente ser lhe apresentada uma forma para

discriminar o contexto de atividades do autocuidado como uma

oportunidade de emitir um comportamento funcionalmente

21

equivalente, mas menos destrutivo, tal como um pedido verbal

simples para auxíl io ou para uma breve interrupção do

treinamento.

Conseqüências

Falta de conseqüências apropriadas. Em algumas

situações o indivíduo desenvolve comportamentos inapropriados

porque o ambiente simplesmente não favorece respostas mais

posit ivas. Por exemplo, em uma família onde os pais estivessem

tão completamente l igados um com outro a ponto de serem

incapazes de dar atenção à criança, esta poderia inicialmente se

engajar em um comportamento social apropriado sendo que esse

seu comportamento passaria despercebido. Nesses casos um

analista funcional poderia antecipar que o comportamento

apropriado diminuiria a algum nível aquém da l inha de base, e

seria substituído eventualmente por comportamentos mais

dramáticos, mais inapropriados que chamassem eficazmente a

atenção dos pais. A diminuição no comportamento pró-social neste

exemplo é uma função direta de uma falta de conseqüências

apropriadas.

Controle por conseqüências concorrentes. O mundo real é

um lugar complexo. Algum dado comportamento pode ser

determinado e refinado por uma variedade de influências

concorrentes. Muitos t ipos de comportamento desenvolvem-se sob

um tipo de circunstâncias, mas tornam-se mais tarde influenciados

por uma variedade de outras. Nestes casos o comportamento não é

fácil de predizer porque é às vezes difíci l identif icar as

contingências que estão mantendo o comportamento. As crianças,

por exemplo, desenvolvem freqüentemente um repertório social e

interpessoal perfeitamente razoável quando são novas. Pessoas no

ambiente que comparti lham de valores comuns são os primeiros a

controlar este repertório. Os pais, os avós, e os professores da

pré-escola, todos modelam comportamentos de cooperação,

responsabil idade, respeito ao próximo, e parti lhar. Assim que

22

alcançam a adolescência, outras pessoas, que não comparti lham

mais dos mesmos valores passam a exercer uma influência

signif icativa sobre o comportamento social deste indivíduo. Os

companheiros, por exemplo, podem modelar o comportamento

menos responsável, mais hedonístico. Enquanto o tempo passado

com seus parceiros aumenta e o tempo com os pais diminui, o

comportamento que estava sob o controle de influências parentais

passa a f icar sob o controle do grupo de amigos. Em tal situação, o

repertório social do adolescente pode substancialmente mudar,

para tr isteza e afl ição dos pais. Outros exemplos de controle por

conseqüências concorrentes não envolvem o reforço mediado

socialmente. Por exemplo, fazer dieta é um exemplo claro de como

o comportamento “comer” está claramente sujeito às contingências

concorrentes. O comportamento “comer de forma prudente” pode

estar sob o controle de vestir uma roupa e perceber que esta ainda

serve, enquanto a tendência a abandonar a dieta é controlada pela

gratif icação do sabor de um determinado alimento desejado.

Freqüentemente quando duas contingências concorrentes

controlam o comportamento de forma igual, a contingência mais

imediata é provavelmente a mais determinante.

Controle por conseqüências inadequadas. Para alguns

indivíduos os comportamentos são mantidos por estímulos

reforçadores que não são apropriados. Um exemplo óbvio é o da

pedofi l ia onde o comportamento sexual com uma criança reforça o

comportamento de um adulto. Uma vez que um reforçador

apropriado é identif icado, a tarefa seria planejar o ambiente para

restringir o acesso ao reforçador impróprio ou aumentar o custo da

resposta de emitir o comportamento impróprio.

Comportamento

Excessos comportamentais. Quando se conduz uma análise

funcional de caso, o foco inicial está no comportamento que o

cl iente identif ica como problemático. Um meio para se atingir a

compreensão do comportamento deve ser a determinação se o

comportamento está ocorrendo com muita freqüência ou com

23

demasiada intensidade. Tais comportamentos podem ser

considerados excessos comportamentais. Lembre-se que quando

nós falamos do comportamento nós estamos implicitamente nos

referindo às classes da resposta ao invés comportamentos

específicos. A tarefa é identif icar as classes dos comportamentos

que ocorrem com maior freqüência e reforçar então os

comportamentos alternativos que serão mais adequados para o

cl iente.

Déficits comportamentais. Em complemento ao excesso

comportamental temos a identif icação de déficits comportamentais.

Um cliente pode ter déficits em habil idades de assertividade, pode

ser deficiente na tomada de decisões, ou ter dif iculdade em

expressar emoções ou experimentar a intimidade. Os problemas de

um cliente serem considerados excessos ou déficits

comportamentais depende freqüentemente da perspectiva do

analista funcional quando realiza a avaliação. O repertório de um

mesmo indivíduo poderia ser avaliado como: emitir um grau

excessivo de falas sobre si próprio, ou pode-se afirmar que esta

pessoa fala tanto que não permite que o outro fale. A pergunta

sobre qual análise está correta depende de qual favorece uma

estratégia mais eficaz de intervenção.

Comportamentos incompatíveis. Às vezes é úti l identif icar

os comportamentos que interferem no potencial de um cliente para

emitir outros comportamentos mais úteis que estejam já em

repertório. Uma análise funcional pode revelar que um cliente não

está sendo socialmente tão bem sucedido como se pôde antecipar

tendo em vista seus recursos interpessoais aparentes. Durante

uma avaliação de role-playing ou na observação in vivo , pode-se

observar que um cliente repete o f im das sentenças durante

conversações com o outro. Além de ser irr i tante este

comportamento, pode ser considerado um excesso comportamental

e impede que o cl iente seja um ouvinte eficaz e uma companhia

social agradável. A distinção entre comportamentos incompatíveis

e excessos comportamentais é que os primeiros impedem que o

24

cliente emita os comportamentos alternativos mais eficazes. Esta

circunstância deve ser entendida e tratada antes que os

comportamentos alternativos possam ser estabelecidos em um

nível úti l . Os excessos comportamentais por outro lado podem, a

princípio, ser substituídos por comportamentos mais eficazes

usando a aproximação construtiva descrita anteriormente.

Aplicando a Análise para o Self

Kanfer e Grimm (1977) separaram cada um dos aspectos

descritos acima e revisaram os objetivos da avaliação em termos

de como um cliente pôde ter problemas de autoregulação em

vários aspectos de sua vida. Apesar de a maioria destas

avaliações serem derivadas de âmbitos maiores dos quais fazem

parte, nós os apresentamos individualmente porque podem ter

valor heurístico na condução de uma análise funcional.

Déficits na auto-regulação. Kanfer e Grimm descreveram

oito áreas de avaliação que podem ser úteis para consideração.

Embora se possa provavelmente esclarecer cada um dos seguintes

déficits específicos sob a categoria mais geral de déficits

comportamentais, os exemplos de avaliação talvez possam ter

uti l idade na realização de uma análise funcional.

1. Conhecimento inadequado para fazer escolhas

comportamentais. Nós trataremos logo deste tópico

da perspectiva do controle do comportamento por

regras. Por agora, entretanto, nós podemos

considerar que este seja um déficit do indivíduo em

saber traçar a relação entre uma situação ambiental

particular e a conseqüência de alguma escolha

comportamental. Em termos simples, uma pessoa

que manifesta este déficit não sabe o que fazer em

uma situação particular a f im produzir um resultado

específico.

25

2. Déficits das habil idades. Neste caso a cl iente falha

em emitir um comportamento social aceitável por

causa dos déficits específicos das habil idades. Esta

categoria é simplesmente uma subcategoria

particular de déficits comportamentais.

3. Déficits em habil idades de autodireção. Neste caso a

pessoa exibe uma inabil idade para suplementar ou

opor influências ambientais imediatas a f im regular o

seu próprio comportamento. Os indivíduos que se

apresentam com problemas de controle de impulso

ou são controlados por reforçadores imediatos mais

que por reforçadores em longo prazo mesmo que

mais importantes podem ser considerados como

tendo déficits em habil idades de autodireção.

4. Déficits no auto-reforço. Há muitos aspectos da vida

onde as contingências externas não estão presentes

no momento. Nestes casos um indivíduo deve prover

seus próprios reforços imediatos para o

comportamento apropriado. Por exemplo, um

estudante deve se manter responsável em seus

estudos mesmo que as provas (a contingência

mediada externamente) possam ocorrer somente

uma vez após diversas semanas. Para ser bem

sucedido na vida acadêmica, o estudante deve

aprender estruturar seu ambiente de modo a reforçar

o hábito de estudar diariamente.

5. Déficits no automonitoramento. A f im predizer

corretamente resultados é necessário monitorar o

seu próprio comportamento. O automonitoramento

pode ser pensado de duas maneiras. Primeiramente,

pode-se monitorar o seu próprio comportamento,

enquanto ele ocorre, a f im de determinar se ocorreu

de maneira razoável. Se o indivíduo estiver

monitorando seu comportamento e a situação social,

26

deve-se certif icar primeiramente se estão

observando de modo adequado, com um contato de

olho razoável, uma escuta reflexiva, adequando seu

humor ao contexto, etc. A segunda e mais importante

parte do automonitoramento requer que se avalie o

impacto real que seu comportamento está tendo

naqueles ao seu redor. Isto é, deve-se monitorar

eficazmente se o comportamento emitido tem ou não

o efeito desejado. Se o cl iente conseguir monitorar

exatamente ambos, o que faz e se funciona, é

provável ele será socialmente bem sucedido.

6. Controle do self. Esta avaliação requer que se avalie

o grau em que seu cliente pode alterar suas

respostas em uma situação de confl i to. Quando um

cliente é envolvido em uma situação de confl i to, o

objetivo de ganhar pôde transformar-se na maior

fonte de controle do comportamento. Quando isto

ocorre ao ponto em que impede a mudança do

comportamento do cliente em detrimento de objetivos

mais eficazes, o autocontrole pode se tornar um alvo

para a mudança do comportamento.

7. Déficits na escala dos reforçadores. Esta categoria

de problemas pode ser mais bem entendida na

questão das conseqüências. Há alguma uti l idade,

entretanto, em ajudar o cl iente a aceitar a

responsabil idade de assegurar-se de que sua vida

contenha uma variedade de comportamentos que são

satisfatórios. Os clientes podem apresentar-se para

a terapia quando algum aspecto central de sua vida

foi rompido. Isto pode ocorrer, por exemplo, dentro

do contexto de um relacionamento íntimo, de um

trabalho, ou de alguma mudança importante no

status de saúde. A maior amostra de afl ição

psicológica será observada quando o cliente que

27

“apostou todas as suas fichas em um jogo” , vê esse

jogo “começar a virar” . Se um determinado cliente

retirar a maior parte de seu prazer social em uma

única relação, então, quando esse relacionamento se

vê abalado, o isolamento e a depressão são comuns.

Para um cliente que sente orgulho e dispôs vários

reforçadores em seu trabalho ao ponto em que se diz

“ele é o que ele faz” , um stress psicológico após a

perda do trabalho pode certamente acontecer.

Avaliar os reforçadores disponíveis para os cl ientes

pode formar um importante aspecto de qualquer

avaliação funcional. A tarefa do terapeuta poderia

ser identif icar quando o cl iente está vulnerável a por

ter uma grande parte de reforçadores dependentes

de um único aspecto de sua vida.

8. Déficits de habil idade em comportamentos cognit ivos

ou motores necessários para dar conta da vida

cotidiana. É importante avaliar se o cl iente tem a

capacidade de emitir comportamentos que são

necessários para encontrar satisfação pessoal

(reforçadores). Em um nível mais simples, há com

certeza l imitações físicas e cognit ivas que podem

tornar difíci l para o cl iente dar conta das demandas

diárias de sua vida. Um caso mais complexo ocorre

quando a pessoa estabelece objetivos para si que

são impossíveis de serem alcançados. Quando essas

demandas são auto-impostas, a avaliação deve se

focar na questão do estabelecimento de objetivos

irreais ou outros que sejam razoavelmente possíveis

de serem alcançados.

Excessos comportamentais de auto-referência

1. Ansiedade excessiva resultante do medo impróprio de

objetos ou eventos. Quando se observa a ansiedade ou o

28

medo como o problema apresentando preliminarmente, é

úti l avaliar se esta é uma resposta decorrente de

condicionamento clássico que poderia com sucesso ser

tratada com um procedimento baseado na exposição.

2. Automonitoramento excessivo.

É possível um indivíduo emitir excessivamente o comportamento

de auto-observação. Em tal caso, o indivíduo atentará

excessivamente a seu próprio comportamento e inibirá

conseqüentemente o seu desempenho. Hoberman e Lewinsohn

(1985) sugeriram que isto pode conduzir às auto-avaliações

negativas. Os leitores que participaram de competições atléticas

podem lembrar-se de que o automonitoramento por parte do

opositor é um comportamento complexo que faz parte da arte

dos jogos. Imagine que você está jogando golfe em um

importante torneio. Imediatamente antes que você dê sua

tacada seu oponente lhe diz ocasionalmente, "eu admiro

realmente a maneira que com você realiza sua transferência do

peso durante seu backswing”.Se essa observação induzir a um

excedente automonitoramento, interferirá certamente na

“produção da tacada" afetando o comportamento motor

complexo. O mesmo fenômeno pode ser visto nos clientes que

se acabam introspectivos ou se são socialmente ansiosos.

Controle inadequado de estímulo autogerado

1. Autorotulação. A avaliação em torno dos padrões de

autorotulação implica em identif icar as autodescrições que

funcionam como dicas para o comportamento que tem

resultados negativos. A topografia de tal comportamento

pode ser óbvia, como o cliente que afirma “Não sou uma

pessoa que valha a pena”. Além de funcionar como uma

profecia de autopiedade, este comportamento verbal pode

funcionar como um estímulo discriminativo para evitar

relacionamentos sociais novos. Se proclamados

publicamente, a autorotulação do cliente, esteja ela certa ou

não, pode restringir a atenção de outras pessoas e afetar

29

negativamente novas interações sociais. Por exemplo, é às

vezes úti l ensinar aos clientes que não revelem

prematuramente os aspectos de seu histórico que funcionam

como rótulos negativos para os outros. Apesar de não ser

desejável ensinar os cl ientes a mentir, é geralmente bom

ensiná-los a não começar conversações com frases como “Oi,

Eu sou Bob. Eu sou alcoólatra”.

2. Comportamentos encobertos que servem como dicas para

comportamento inadequado. Os comportamentos encobertos

incluem atividades simbólicas que funcionam como os

estímulos que sinalizam stress ou perigo. Se durante o curso

da avaliação funcional do comportamento o cl iente exibir

comportamentos de esquiva que façam pouco sentido para o

terapeuta, seria interessante investigar se o cl iente está

respondendo a algumas características de estímulo da

situação que sinalize que esta é aversiva. Considere um caso

onde você esteja trabalhando com um cliente com o objetivo

de aumentar suas interações sociais. Em diversas ocasiões,

o cl iente descreveu oportunidades para encontros, mas

subseqüentemente fala que “Alguma coisa aconteceu” e

acabou não indo para o encontro. Neste momento, pode-se

gerar e testar a hipótese que o cl iente está engajado em

algum comportamento encoberto que funciona para fazer com

que a situação de encontrar alguém novo pareça perigosa

(veja Hayes, 1994).

3. Discriminação falha de dicas internas. Um problema comum

que confronta muitos cl ientes é uma inabil idade para nomear

corretamente estados internos ou sentimentos e comunicar

estes a outros. Isto pode sinalizar a presença de um ou dois

problemas. O primeiro é que o cl iente pode não se dar conta

de como responder emocionalmente às pessoas ao seu redor.

Pode-se observar indícios deste problema no consultório

quando você pergunta a um cliente como se sentir ia sobre

alguma interação. Se o cl iente freqüentemente responder “Eu

30

não sei”, ou se usar quase que exclusivamente a mesma

verbalização tal como “Legal” para descrever seus

sentimentos, isto pode indicar que o terapeuta deve prestar

mais atenção na avaliação da sofisticação do repertório dos

clientes para nomear sentimentos. A segunda conseqüência

de ter um repertório inadequado para discriminar e classif icar

dicas internas é que é difíci l para um cliente dizer para os

outros sobre o impacto que eles têm em sua vida. Isto

dif iculta que as pessoas no ambiente dos clientes respondam

corretamente às suas necessidades. Um contexto comum em

que se pode ver exemplos deste problema é interação entre

pais X adolescentes . Quando o adolescente diz “Eu não sei”

ou “Eu não me importo” para a maioria das perguntas dos

pais ainda que essas respostas possam ter outras funções,

um efeito é que fica difíci l , tanto para o adolescente como

para os pais, entender o que fazer para melhorar a relação

entre eles.

Comportamento Governado por Regras

Uma das características particular dos organismos verbais,

isto é, as pessoas é que elas podem descrever algumas das

contingências que controlam seu comportamento. Estas descrições

das contingências podem vir a funcionar como regras para o

indivíduo. O grau em que essas regras funcionam de uma maneira

úti l envolve geralmente uma relação da mesma com a situação.

Quando um indivíduo se depara com uma situação nova, ele pode

reconhecer aspectos similares às situações famil iares e supor que

sabe que comportamentos conduzirão a quais contingências. Tal

predição a respeito do relacionamento entre o comportamento e as

contingências é uma regra. Quando estas predições estão

inteiramente corretas, pode-se supor um repertório existente sem

ter que começar do zero. Há uma eficiência óbvia neste

comportamento governado pela regra. Não se tem que tratar cada

31

situação nova como sendo inteiramente única. Na realidade,

entretanto, existem elementos originais a quase todas as

situações. Obedecendo às regras, as pessoas podem não observar

e não responder aos aspectos da novidade das situações nas

maneiras que trariam as melhores conseqüências. Além disso, há a

evidência experimental que uma vez que uma regra determina uma

contingência particular, é difíci l modificar essa regra quando as

contingências realmente mudam (Hayes, Brownstein, Zettle,

Rosenfarb & Korn, 1986). Embora as regras podem ser eficientes

para indivíduos, elas podem também ser uma fonte de problemas

clínicos.

Geração regras falsas. As regras são úteis somente na

medida em que descrevem exatamente o relacionamento entre o

comportamento e a conseqüência. Uma fonte de muitos problemas

clínicos pode ser que um indivíduo não constrói as regras que

descrevem exatamente esta relação. Por exemplo, depois que um

cliente experimentou o f im de um relacionamento íntimo, ele pode

gerar uma regra como “todos os relacionamentos levam a finais

dolorosos, conseqüentemente para proteger-me eu nunca mais

entrarei de cabeça em outro relacionamento”.Tal regra claramente

não está correta e, se seguida, l imitará e impossibil i tará fontes

novas signif icativas do reforço interpessoal.

Dificuldades em aquiescer. O termo aquiescer(pliance) vem

da palavra obediência (compliance) e descreve um tipo particular

de comportamento governado por regras onde o próprio

comportamento está sob o controle de conseqüências socialmente

mediadas. Se alguém emitir um comportamento que corresponda a

uma regra, e outra então reforçar esse comportamento, entende-se

que a regra funciona então como uma aquiescência . Por exemplo,

um amigo diz “Quando for pedir um aumento, seja f irme e não dê

pra trás” e um indivíduo exibe tal comportamento para estar em

conformidade com o conselho do amigo, ele estaria demonstrando

aquiescência . Se outro, intencionalmente não seguisse o conselho,

este seria um exemplo da contra aquiescência . Aquiescência é

32

seguir regra e como tal, é modelada pelas conseqüências de seguir

regras assim como conseqüências naturais de um comportamento

particular em uma determinada circunstância. Isto quer dizer que,

sob algumas circunstâncias o que é reforçador é simplesmente

seguir regras. Seguir regras por si mesmo pode prover uma

conseqüência suficiente para manter um comportamento. Sob

outras circunstâncias o comportamento de seguir uma regra pode

ser mantido somente se conduz a uma conseqüência ambiental úti l .

Em uma análise funcional podemos observar exemplos de

aquiescência fraca. A aquiescência fraca é um problema clínico

quando o indivíduo não emite adequadamente os comportamentos

governados pela regra. O resultado clínico pode ser que o cl iente

entre em contato com as conseqüências aversivas que poderiam

ser evitadas caso ele t ivesse seguido a regra. Um exemplo simples

ocorre quando uma criança não segue o que seus pais aconselham

quando dizem “Coloque a capa de chuva que está chovendo lá

fora”.

Pode-se observar também o problema oposto, denominado

aquiescência excessiva. O aquiescência excessiva signif ica que

um indivíduo obedece excessivamente regras ou convenções que

podem não corresponder às conseqüências reais de seu

comportamento. O resultado é que o indivíduo parece rígido e

insensível. A aquiescência excessiva pode facilmente ser

observada em situações sociais ambíguas, isto é, naquelas

circunstâncias onde não se pode predizer prontamente o resultado

de determinados comportamentos e deste modo,

conseqüentemente, reverter a alguma regra implícita ou explícita.

Qualquer um que passou por uma supervisão clínica viu exemplos

de aquiescência excessiva por parte dos terapeutas iniciantes. Em

uma sessão da supervisão, o supervisor pode sugerir “Na próxima

sessão você deve começar com o histórico de seu cliente”. Na

sessão seguinte, entretanto, o cl iente abre com a indicação, “Eu

tenho me sentido realmente mal, e não sei se poderei continuar

com iss por mais tempo”. Os terapeutas iniciantes, exibindo a

33

aquiescência excessiva, provavelmente responderão com “Então...

pode me dizer mais sobre o relacionamento mais importante que

você já teve”. Aqui, a tarefa é ensinar indivíduos a reconhecer

quando seguir regras será mais úti l versus situações em que

devem ficar atentos às circunstâncias ambientais que exigem a

flexibil idade comportamental.

Rastreamento fraco. Rastreamento (tracking) aqui se refere

ao comportamento de seguir uma regra e está sob o controle da

aparente relação entre a regra e como o mundo parece funcionar.

Pode-se dizer “Para se dar bem na escola, você deve ter certeza

que compreendeu corretamente as suas atribuições, e então, fazer

seu dever de casa”.Se o indivíduo seguir esta regra porque havia

uma correspondência aparente entre a regra e como o mundo

parece funcionar, seria um exemplo de seguimento. Um

rastreamento fraco seria uma falha no seguir as regras que, de

fato, correspondem a como o mundo funciona. Nesta discussão,

nós não distinguiremos quando alguém tenta seguir a regra, mas

falha na detecção de uma alternativa de alguém que não

reconhece a correspondência entre a regra e a contingência. Na

prática clínica esta distinção pode ser importante.

A Classificação Funcional e a Utilidade do Tratamento

O aspecto principal de uma avaliação funcional é

compreender problemas clínicos usando os princípios

comportamentais empíricos que foram derivados e estudados no

laboratório. Há uma ciência do comportamento humano que deve

ser usada para dirigir nossas atividades clínicas uma vez que nós

temos uma compreensão funcional dos problemas dos clientes. É a

tarefa do cientista clínico aplicado compreender cl inicamente o

comportamento relevante usando princípios empiricamente

derivados. No geral, nós supomos que os problemas clínicos são o

resultado do individuo agir em um contexto que estabeleça e

mantenha comportamentos disfuncionais. Os comportamentos

34

disfuncionais são aqueles que, em longo prazo, servirão menos à

pessoa que outros que poderiam vir a ser alternativas

comportamentais mais úteis. Os comportamentos clinicamente

problemáticos ou disfuncionais não são anormais no sentido que

não podem ser compreendidos usando princípios comportamentais.

Na maioria dos exemplos os clínicos podem facilmente ver como os

comportamentos inapropriados foram instalados. Não é difíci l

compreender, por exemplo, como uma mulher com um histórico de

abuso sexual na infância e revit imização subseqüente viria exibir a

desconfiança no sexo masculino, acarretando uma dif iculdade clara

para expressar emoções, ou os problemas da experienciar

situações sexualmente mais intimistas. Pode-se prontamente

compreender como estes comportamentos se desenvolveram e

foram adaptativos inicialmente. Os problemas clínicos levantam-se,

entretanto, quando uma pessoa com tal histórico não reconhece

que nem todas as situações ou relacionamentos são abusivos. A

tarefa clínica pode então ser, ensinar o cl iente a discriminar os

parceiros perigosos dos potencialmente seguros, e como

reconhecer e comunicar claramente seus sentimentos e

preferências. Como este exemplo i lustra, o uso do termo “anormal”

é inúti l dentro de uma análise funcional. O termo seria aplicado

apropriadamente somente para aqueles casos onde um cliente não

se comporta de acordo com princípios do condicionamento

operante ou respondente.

Houve diversas crít icas ao sistema atual da classif icação das

desordens mentais descritos no DSM-IV (por exemplo, Follette &

Houts, 1996). Discutir profundamente estas crít icas vai além do

escopo deste capítulo, porém, dois aspectos são particularmente

relevantes ao clínico que busca a mudança do comportamento e

serão discutidos brevemente. O primeiro problema com a

classif icação do DSM-IV é que este esta que faz um diagnóstico

que nos diz muito pouco sobre o que fazer cl inicamente. Isto é, há

pouca uti l idade para o tratamento aplicar a classif icação do DSM-

IV a um determinado cliente.O segundo problema com o método de

35

classif icação DSM-IV é que os problemas clínicos estão vistos nos

termos de desordem, excluindo toda a consideração de o que pode

constituir a saúde psicológica ou o bem estar do indivíduo. O

objetivo aparente do DSM-IV é classif icar a desordem. O objetivo

da análise funcional é fornecer ao clínico uma conceitualização do

caso que permita não somente que este diminua comportamentos

inapropriados dos clientes, mas que permitam identif icar e modelar

também maneiras eficazes para que o cl iente interaja com o

ambiente para promover o seu bem estar psicológico.

Utilidade da Avaliação no Tratamento

Acima, nós esboçamos como uma análise funcional pode

ajudar a identif icar problemas. A natureza da análise funcional

implica que uma vez que se conduziu a avaliação, sabe-se o que

deve ser mudado para melhorar o funcionamento clínico do

indivíduo. Por exemplo, uma avaliação funcional pode indicar que

um cliente que relata estar deprimido tem dif iculdade em identif icar

as situações onde seus comportamentos são provavelmente

reforçadores. Então, o programa do tratamento deve aumentar a

identif icação destas situações por parte do cliente. A avaliação

funcional prescreve o tratamento e assim a própria avaliação é

válida e úti l . Além disso, a avaliação funcional é um processo

interativo e autocorretor. Se a avaliação funcional inicial estiver

incorreta, então o tratamento provavelmente não será bem

sucedido e deverá olhar para trás do processo para refinar a

análise e para alterar o tratamento.

Há situações em que o processo da avaliação não terá

nenhuma uti l idade aparente no tratamento. A uti l idade da avaliação

no tratamento pode ser demonstrada somente quando a informação

da avaliação conduz a uma alteração particular do tratamento para

o benefício do cliente. Assim existem circunstâncias onde uma

avaliação funcional pode não ser úti l para o tratamento, e pode não

ser justif icada.

36

Tratamentos padronizados baseados na topografia. Se o

indivíduo trabalhar em um ambiente onde a forma e o método de

tratamento dependam somente da presença de um diagnóstico

baseado em determinados sintomas manifestos sem considerar

suas origens e funções, então uma avaliação funcional pode não

ser mostrar úti l ao tratamento. Este é geralmente o caso nos

ambientes onde um diagnóstico de DSM-IV é usado para justif icar

a escolha do tratamento. No caso de se assumir um diagnóstico de

depressão usando os critérios de classif icação DSM-IV, então,

escolher-se-á sempre usar um manual determinado da terapia

cognit iva, e fazer um diagnóstico próprio onde a avaliação e o

tratamento são automáticos. Não haverá nenhuma vantagem

adicional em se fazer uma avaliação funcional neste caso porque o

tratamento não seria mudado não obstante a compreensão

adicional que se poderia ganhar a respeito do problema. A menos

que os padrões de tratamento fossem modificados a partir das

novas informações, não há uti l idade da avaliação funcional no

tratamento.

Causas Comuns. A avaliação funcional ocorre em um

contexto clínico onde cliente e terapeuta desejam fazer o uso

eficiente do tempo e dos recursos. Assim, se um problema clínico

resultar de uma etiologia comum, e responder a um tratamento

particular, então não há nenhum sentido do ponto de vista

econômico e racional, conduzir uma avaliação funcional a menos

que o tratamento inicial apresente falhas.

Um exemplo clínico óbvio é o tratamento de fobias simples.

Se um cliente se apresenta com medo de um objeto específico de

estímulo, por exemplo, medo de cachorros, a hipótese da maioria

dos terapeutas comportamentais é que o medo é originado como

uma resposta classicamente condicionada, que vem sendo mantida

no presente pelo reforço negativo que segue à esquiva do objeto

fóbico: o cão (Mowrer, 1939). Outras possibil idades poderiam

existir para a aquisição e a manutenção do medo, mas as

suposições iniciais conduzem a um tratamento (desensibil ização)

37

que é altamente durante boa parte de tempo não justif icando o

tempo e os custos adicionais de uma avaliação funcional mais

profunda. Se, entretanto, o tratamento falhar, então, uma análise

funcional está autorizada. A idéia neste exemplo é que alguns

problemas têm uma etiologia comum ou um conjunto de fatores de

manutenção. Nesses casos nós podemos eficientemente supor que

sabemos a causa funcional do problema, e podemos

conseqüentemente iniciar o tratamento sem uma análise adicional.

Tecnologia de tratamento tendencioso

Há exemplos de problemas clínicos onde mesmo conhecendo

sua causa funcional (ao menos descrit iva), não somos capazes de

realizar uma alteração eficaz do problema. Por exemplo, um cliente

pedófi lo tem um problema claro de ficar sob o controle de

reforçadores impróprios, isto é, na atividade sexual com as

crianças, apesar da moral da sociedade ditar exatamente o

contrário. Nós compreendemos alguns aspectos do problema, mas

mesmo assim não temos nenhuma tecnologia para o tratamento

que leve à alteração das propriedades reforçadoras das crianças

para um pedófi lo. Neste caso, a uti l idade da avaliação no

tratamento não pode ser demonstrada uma vez que não temos um

tratamento que altere estas propriedades reforçadoras. Nós

podemos parcialmente tratar o problema aumentando o desconforto

e a sensibil ização encoberta direta do pedófi lo. Alternativamente

nós podemos usar a prevenção da resposta (prisão). Finalmente,

nós podemos empregar estratégias de controle do estímulo

antecedente ensinando o pedófi lo a interromper a corrente

comportamental que conduz a se pôr na posição de estar perto de

crianças de uma maneira insegura. Nenhuma destas técnicas,

entretanto, altera o problema básico. Não há uma estratégia eficaz

para mudar os reforçadores impróprios que funcionam para o

pedófi lo até agora. Assim, a uti l idade da avaliação neste t ipo de

tratamento não pode ser demonstrada uma vez que não há

nenhuma tecnologia para mudar a causa identif icada. Este exemplo

i lustra, naturalmente, que conduzir uma análise funcional que

38

identif ique o problema é úti l para destacar áreas que ainda

precisem pesquisa adicional. Este resultado por si só é valioso,

embora não demonstre a eficácia real do tratamento.

Combinando programas de tratamento. A tendência geral

em programas de desenvolvimento modernos de tratamento parece

priorizar os programas que usam um grande número de técnicas

para enfocar as causas mais comuns de determinados problemas.

Algumas vezes há esforços para conduzir estudos que identif iquem

a variável ou elemento básico da terapia (Kazdin,1998).No

momento, entretanto, muitas terapias usam técnicas múltiplas na

esperança de incluir algo que será eficaz para uma população de

pessoas com uma topografia definida do problema. Se um

programa do tratamento apresentar muitas manipulações técnicas

das variáveis, presumivelmente, mais cedo ou mais tarde, o

tratamento focará a causa correta. Se isto fosse verdadeiro, no

futuro, haveria pouca oportunidade para a uti l idade adicional da

avaliação no tratamento tornar-se aparente.

Há dois problemas óbvios implícitos nesta idéia.

Primeiramente, há uma ineficácia inerente nos programas de

tratamento que são projetados para tratar todas as causas comuns

ao invés da causa real de um problema para um cliente particular.

Por exemplo, no caso da depressão, um conjunto de tratamento

pode ser projetado tanto para aumentar comportamentos e assim o

acesso aos reforçadores como também lidar com o comportamento

impróprio governado por regras. Neste caso, parte da terapia está

desperdiçada se a causa preliminar da depressão for a falta de

reforço secundário para níveis baixos de atividades. Se os níveis

baixos de atividade fossem o problema preliminar, a terapia

poderia ser feita de modo mais eficaz, por uma avaliação

ideográfica que conduzisse aos objetivos do problema preliminar. A

eficácia pode ser aumentada, neste exemplo, com os benefícios

econômicos de uma terapia mais curta e focalizada. Além disso,

um efeito maior será obtido se for uti l izado o tempo adicional da

39

terapia fortalecendo o componente do comportamento e ignorando

que o controle por regras incorretas pode ser a causa.

Usar tratamentos com multicomponentes tem algumas

vantagens como é o caso em que a terapia pode ser ao menos

parcialmente eficaz para muitos indivíduos sem requerer nenhuma

avaliação. A avaliação custa recursos. A compensação vem quando

o tratamento passa a ser menos eficaz do que ele poderia, ter sido

se fosse feita a avaliação. Permanecendo com o exemplo da

depressão, Biglan (1985) demonstrou que alguns tipos de

depressão observados em mulheres ocorrem porque elas estão

reforçadas negativamente pela redução do abuso do marido

quando a mulher emite comportamentos depressivos. A depressão

pode ser compreendida como uma estratégia de controle

adaptativo nesses casos. Um tratamento para a depressão,

provavelmente não se mostrará eficaz nestes casos, a menos que

esta função do comportamento depressivo seja entendida e

alterada.

Para sermos justos com os tratamentos que combinam

diversos componentes, são freqüentes os casos em que múltiplos

fatores operam para manter um problema clínico independente das

circunstâncias que conduziram originalmente à ocorrência do

problema. Assim, os problemas com causas únicas são raros o

bastante para que o “custo-benefício” de uma avaliação funcional

seja difíci l de se demonstrar. O desejo de combinar o tratamento

esteve em moda por muito tempo. Combinar o tratamento está no

cerne da pergunta atualmente clássica de Gordon Paul (1967):

“Que tratamento, por quem, é mais eficaz para esse indivíduo com

aquele problema específico, e sob qual contexto de

circunstâncias?”.

A análise funcional emprega princípios comportamentais

conhecidos da ciência para tentar responder a essa pergunta de

modo que nós possamos maximizar resultados e a eficiência do

tratamento no final do serviço.

40

Limitações da Avaliação Funcional

Dada a longa tradição comportamental da análise funcional e

avaliação funcional quais os motivos que fizeram com que ela não

se tornasse um dos pilares da avaliação psicológica? Há diversas

razões legítimas. Nos casos onde a uti l idade da avaliação para o

tratamento é difíci l de demonstrar, há uma questão real que é se

as práticas funcionais da avaliação podem passar o teste de

demonstrar o “custo-benefício” na era do controle dos cuidados de

saúde. Se for assim, diversos problemas técnicos são pertinentes.

Primeiramente, embora a avaliação funcional esteja claramente

baseada em princípios comportamentais fortes, os advogados da

análise funcional não têm resolvido problemas metodologicamente

importantes. Um problema importante que existe ainda é aquele de

como executar uma análise funcional confiável. Em um capítulo

clássico do diagnóstico funcional, Kanfer e Salsow (1969)

descreveram os elementos de uma análise funcional. O leitor do

capítulo f ica confuso e frustrado por sua falta da especif icidade

metodológica. Nós descrevemos muitos aspectos que podem ser

relevantes ao desenvolvimento e à manutenção de problemas

clínicos. No momento, nós sentimos falta tanto de uma racional

claramente definida para a identif icação de que áreas devem ser

avaliadas primeiramente quanto para decidir quando se examinou

adequadamente os aspectos necessários para fazer uma

conceitualização do caso que tenha uti l idade no tratamento.

De fato, não se sabe ainda como combinar confiantemente a

informação da avaliação em uma conceitualização coerente do

caso. A análise do comportamento ignorou os problemas da

confiabil idade no diagnóstico funcional, aceitando as práticas

tradicionais ideográficas da avaliação. A avaliação ideográfica

enfatiza o fato de que a avaliação e a conceitualização devem

estar aliadas a uma análise particular do indivíduo, em um contexto

específico, usando as práticas da avaliação que são presumidas

como as mais apropriadas para aquelas circunstâncias. No início

do uso da análise funcional isto fez algum sentido. Se um clínico

41

estivesse tratando o balançar de cabeça constante em uma criança

autista, contar o comportamento era simples e tentar obter

f idedignidade poderia talvez ter pouca importância. Entretanto,

quando a observação e a intervenção ocorreram em “settings”

institucionais altamente controlados, o acesso a todas as variáveis

controladoras estava mais prontamente disponível do que no caso

de populações não institucionalizadas, com nível de funcionamento

mais elaborado. Enquanto a avaliação funcional é expandida para

incluir uma classe maior de problemas em contextos menos

controlados, a questão da fidedignidade não pode mais ser

ignorada.

Finalmente, não há nenhuma estratégia específica definida

para caminhar dos dados da avaliação para uma estratégia de

tratamento. Como nós já discutimos anteriormente, em alguns

casos, a estratégia de tratamento decorre logicamente da

conceitualização funcional do caso. Por exemplo, quando se

identif ica que o estado depressivo é resultado do reforço

contingente insuficiente havendo uma covariação entre atividade

social e baixa no humor, o tratamento consiste em aumentar a taxa

de reforçamento. A l i teratura sobre tratamento, entretanto, não

está sempre organizada para l igar a avaliação funcional ao

tratamento correspondente. Embora seja óbvio, na avaliação

funcional, o que fazer, não está sempre claro como fazer .

Hayes e Follette (1992à) descreveram alguns destes

problemas e sugeriram soluções possíveis, mas não existem dados

testados de suas proposições. Por outro lado, na pergunta “como

examinar eficiente e f idedgnamente os aspectos a avaliar quando

nós conduzimos nossa análise funcional”, Hayes e Follette (1992b)

sugeriram que poderia ser possível identif icar procedimentos

funcionais replicáveis da avaliação usando-se algoritmos

especif icados da decisão. Uma vez que estes algoritmos foram

especif icados, seria possível testá-los um em relação ao outro para

ver qual rende resultados melhores nos termos de eficácia e

eficiência. Como desenvolver tais algoritmos é ainda uma pergunta

42

aberta. Nós sugerimos também o uso dos sistemas especiais

baseados em como aqueles que ensinam e conduzem a análise

funcional os estruturam em seu próprio sett ing. A questão

complicada, entretanto, é determinar exatamente o que constitui

um resultado clinicamente signif icativamente melhor quando se

comparam duas intervenções baseadas em estratégias analít icas

funcionais diferentes.

Uma alternativa que pode ser mais prática e famil iar é

reorganizar problemas clínicos em termos de categorias

diagnósticas funcionais ao invés de categorias topográficas, como

é o caso na DSM-IV. As categorias diagnósticas são baseadas em

princípios comportamentais, enquanto a avaliação seria

parcialmente funcional e parcialmente topográfica. Por exemplo,

Hayes e Follette (1993) descreveram uma “desordem de esquiva

emocional” onde a topografia e a função, ambos, estão implicados.

Neste exemplo, um cliente exibe uma classe comportamental,

evitando as emoções fortes que são mantidas pelo princípio

comportamental do reforço negativo. Poderia até haver variações

na categoria funcional naqueles casos onde o problema foi

causado pelo comportamento emocional ter sido punido, levando

desse modo a conseqüências aversivas que o cl iente procuraria

evitar no futuro. Em um outro caso o problema poderia ser causado

pelo fato do cliente responder a uma variedade grande de

estímulos verbais que eliciam sensações afetivas fortes,

experimentadas como aversivas. O tratamento em um caso

focalizaria em alterar as propriedades punit ivas do ambiente, ao

passo que o tratamento no segundo caso tentaria mudar as

funções dos estímulos verbais. A classif icação dependeria de

identif icar as topografias que constituem uma classe de resposta

acima (esquiva emocional), e avaliar então os fatores causais

possíveis que eliciam ou mantêm o comportamento (veja Hayes,

Wilson, Gifford, Follette & Stroshahl, 1996).

O sucesso de um sistema de classif icação funcional depende

em parte da habil idade do clínico de manipular os estímulos

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suspeitos de manterem o comportamento problemático. O sucesso

imediato de tal sistema depende de ter alguma uti l idade para o

tratamento. Assim, as categorias funcionais iniciais poderiam

consistir dos problemas para os quais existe tecnologia para

efetuar mudanças nas variáveis relevantes. Por exemplo, pode-se

trabalhar para além da taxonomia de várias desordens de déficit

comportamental antes de embarcar em desordens de operações

estabelecedoras (isto é, déficits motivacionais), pois, no últ imo

caso não há tecnologia conhecida para alterar fatores

motivacionais em clientes não institucionalizados.

Saúde Psicológica

A tradição comportamental analít ica geralmente não se ateve

aos problemas clínicos do comportamento como a evidência de

uma falha pessoal subjacente ou de uma condição patológica. Os

comportamentos são compreendidos como sendo o resultado de

histórias de aprendizagem particulares e os focos da intervenção

seriam mudanças nas histórias e no ambiente atual. A f inalidade

de fazer uma avaliação e uma intervenção é compreender a

situação clínica o suficiente para modificar o contexto fazendo com

que a pessoa adquira capacidades funcionais. Esta posição se

contrapõe ao modelo das desordens mentais representados pelo

DSM-IV. As intervenções clínicas no DSM-IV são primeiramente

com a finalidade de fazer alguém se l ivrar da doença. Não há nada

na fi losofia por trás da DSM que levaria um clínico a fazer mais do

que remover os sintomas, e, uma vez que os sintomas são

removidos, o indivíduo não tem mais necessidade de ser submetida

a um diagnóstico.

Entretanto, uma conceitualização funcional do caso deve

render uma estratégia da intervenção que ofereça

substancialmente mais a um cliente do que meramente reduzir

seus sintomas. Deve se conduzir uma análise completa do histórico

dos clientes, do ambiente e do repertório comportamental; deve

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seguir que se procure otimizar sua funcionalidade em todos os

domínios sem enfatizar estados de patologia ou de doença

(Follette, 1997; Follette, Bach & Follette, 1993). O objetivo seria

ensinar os cl ientes a manipular eficazmente seus ambientes para

obter os níveis máximos de reforçamento e aumentar os

reforçadores potenciais sem se contrapor aos direitos dos outros.

Planejar uma intervenção funcionalmente baseada é procurar

ensinar um cliente a estar disposto a experimentar a vida sem

medo do medo. Uma intervenção ensinaria o cl iente a estar sob o

controle dos reforçadores auto-identif icados que conduziriam às

experiências ótimas de l iberdade e de controle. O cliente emergiria

com uma compreensão de como antecipar conseqüências e

influenciar aqueles elementos de seu ambiente que conduzirão a

comportamentos relacionados à saúde. Aprender a fazer uma

conceitualização e uma intervenção funcionais do caso requer

dil igência, criatividade, e trabalho, mas os benefícios potenciais

para o terapeuta e o cl iente são igualmente bons e valem o

esforço.

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